«Não há respostas imediatas para os incêndios» · 2016. 9. 21. · Como explicar ao cidadão...

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Preço €5.22 | Periodicidade - Mensal (10 edições/ano) | Setembro 2016 - Nº 245 | www.oinstalador.com Solar Térmico numa encruzilhada Opinião | Carlos Laia | Pág. 44 Parceiros Electricidade e Electrónica Mobilidade Eléctrica | Pág. 58 «Não há respostas imediatas para os incêndios» Dossier Aquecimento Um sector que resiste | Pág. 14

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«Não há respostas imediatas para os incêndios»

Dossier AquecimentoUm sector que resiste | Pág. 14

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Grande EntrevistaFrancisco Gomes da Silva

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«O contributo da predominância do eucalipto para os incêndios florestais é nenhum»O antigo Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural analisa, em entrevista a’O

Instalador, os problemas que afectam a floresta portuguesa, sobretudo depois do Verão negro de 2016.

Francisco Gomes da Silva considera que existe, nesta matéria, «uma estratégia, baseada numa legislação

com qualidade», e que pode ser melhorada. No que respeita à prevenção, o professor do Instituto Superior

de Agronomia (ISA), diz que é preciso actuar em dois níveis: mudança de comportamentos e através de

uma «alteração profunda na articulação entre a prevenção estrutural (aquela que deverá ser assegurada

pelo Estado) e o combate. As renováveis e as alterações climáticas são ainda outros temas em destaque

nesta entrevista.

Entrevista_Ana ClaraFotos_José Alex Gandum

O Instalador - Foi Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Ru-ral. Este Verão o país voltou a assistir ao flagelo dos incêndios. Passadas tantas décadas por que razão ainda não se consegue minimizar o problema?

Francisco Gomes da Silva - Não estou de acordo com o balanço muito negativo que a sua pergunta deixa antever. Se quisermos ser sérios, não devemos abordar as questões relacionadas com os incêndios com a ligeireza que temos vindo a assistir ao longo do passado mês de

Agosto, situação que se repete em cada Verão mais severo em que as áreas ardidas são maiores. Não há respostas imediatas para o problema dos incêndios e quem afirmar o contrário não está a ser sério. Por muito impopular que possa parecer, sou dos que acham que, particularmente des-de os Verões dramáticos de 2003 e 2005, se percorreu um caminho importante, no qual é necessário porfiar. O pior que pode-ríamos fazer era deitar fora todo o esforço feito até aqui. Poderíamos ter feito melhor? Claro que sim, mas isso é quase sempre

verdade, muito mais numa realidade tão complexa como esta. Esta histeria que nos acompanha em quase todos os Verões, explica-se muito pelo facto de a “opinião pública” (e o que é pior, muitas vezes a opinião publicada) olhar para os incêndios, cheia de paixão e voluntarismo, através de uma perspectiva extremamente enviesada. Olha para a floresta que não temos (uma floresta rentável, saudável e próspera), para uma sociedade que não existe (uma socie-dade rural, cujo dia-a-dia passa por usos múltiplos da floresta, ocupando de forma

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uniforme o território), para um povo que não somos (um povo zeloso, disciplinado e que evita comportamentos de risco), para um clima que não mora aqui (um clima com um Verão ameno e com alguma precipitação) e para um território que não é o nosso (bem planeado e ordenado). Assim, a opinião pública e publicada espanta-se, revolta--se, culpa tudo e todos e pede acções e medidas imediatas e “óbvias”, embora as medidas óbvias sejam muito distintas de opinião para opinião. E o mais dramático de tudo isto, é que, não raras vezes, o poder político (o de hoje como o de ontem) deixa-se levar por esta onda patética, e promete um “mundo novo”: saltam para os jornais as grandes reformas, da floresta e da sociedade, e garante-se que “agora é que vai ser”.

Nunca houve uma verdadeira es-tratégia nacional no que respeita aos incêndios, ao nível da acção preventiva e de meios?

Essa não é a minha opinião. Aliás, e tendo exercido as funções de Secretário de Es-tado das Florestas, se fosse essa a minha opinião, pintava a cara de preto. Acho que existe uma estratégia, baseada numa legislação com qualidade, que tem vindo a ser melhorada e que o pode, evidentemen-te, ser ainda mais. Mas repito: acho que seria um erro deitar tudo fora, só porque não se atingem os resultados que moram no imaginário de cada um dos portugue-ses. Como é evidente (e porque também sou um português) tenho opinião sobre questões que podem ser melhoradas. Para além disso, acho que a maior parte das coisas que se podem melhorar podem perfeitamente ser consensualizadas entre os diversos partidos políticos, de forma a retirar este assunto do combate político. E isto porque os frutos que podemos esperar continuarão a estar distantes do imaginário dos portugueses.

«Investiram-se entre 2006 e 2013, mil milhões de euros em políticas públicas para a floresta. 75% desse investimento foi feito com políticas relacionadas com incêndios». A frase é de Miguel Freitas, relator do grupo parlamentar que em Agosto de 2015 analisava o problema

no Parlamento. Como se explica ao cidadão comum que este investimento valeu a pena?

Não tenho comigo o detalhe desse número, mas certamente engloba quer a despesa pública (associada aos fundos comunitários) quer a despesa que os proprietários da floresta efectuaram em medidas de silvicultura preventiva. Temos uma área de Floresta a rondar os 3 milhões de hectares (sem contar com as áreas de matos). Ora, esse montante, tomando-o por correcto, corresponde a um “investi-mento” de 250 €/ha ao longo dos 8 anos do período referido. Se considerarmos que estão aqui incluídas intervenções estruturais (como a abertura de faixas de rede primária, a melhoria de caminhos e de pontos de água, a constituição e manuten-ção de equipas de sapadores florestais, a constituição e manutenção de Gabinetes Técnicos Florestais junto das autarquias e outras intervenções de monta), resta saber se é de facto um montante excessivo. Como explicar ao cidadão se valeu a pena? Talvez averiguar o que teria acontecido se tal montante não tivesse sido gasto. É claro que terão existido políticas mal desenhadas e, muitas vezes, menos bem operacionali-zadas. No entanto, reafirmo, esse tipo de argumentos mais ou menos populistas em nada contribuem para que se possa fazer mais e melhor.

Prevenção

Falhámos na prevenção?Como comecei por lhe responder, acho

que não se pode afirmar isso de forma tão peremptória. Até porque o significado jornalístico do termo prevenção está muito longe daquilo que de facto se pode considerar como prevenção adequada. Repare na forma como se utiliza o termo “limpeza das florestas” associado às ques-tões da prevenção. É algo de chocante para qualquer profissional que lida com as florestas. Chega-se ao ponto de vermos pessoas com responsabilidade política afirmar que se podem utilizar os presos, os beneficiários de certos apoios sociais e, novidade deste ano, os refugiados a “limpar a floresta”. Sem querer ofender ninguém,

isto é uma estupidez e revela um profundo desconhecimento do que é a floresta que temos. E, pior, indicia a possibilidade de se enveredar por um populismo disruptivo em matéria de política florestal. Felizmente, que eu tenha conhecimento, nunca nenhum responsável político pelo sector Florestal enveredou por tais caminhos. Mas é claro, como também já disse, que há coisas que poderíamos ter feito melhor, tanto ao nível da prevenção (dita estrutural) como do combate. Recentemente, e pela boca de um ex-Secretário de Estado das Florestas, veio a público que um conjunto de pro-postas efectuadas há cerca de 10 anos ao Governo de então, e que colocavam maior ênfase nas questões da prevenção, não tinham sido consideradas (e não o foram de facto). Esse trabalho foi efectuado por um grupo de pessoas competentes e de diversas simpatias políticas. Talvez valha a pena revisitar essas propostas e ver quais poderiam, com ganho, ser recuperadas. Mas dou-lhe dois exemplos de dimensões da prevenção e combate que, na minha modesta opinião deveriam ser olhados com particular cuidado. A primeira tem a ver com os comportamentos de todos nós. Estão disponíveis, na página do ICNF, os resultados das investigações às origens dos incêndios, de onde resulta evidente que, da totalidade dos incêndios cerca de 30% têm origem em comportamento negligente das populações. Se olharmos apenas para aqueles incêndios em que foi possível identificar as respectivas causas, esta percentagem sobe para 56%! O que é que isto significa? Que se os nossos comportamentos mudarem, o número de ocorrências reduz-se drasticamente e, com isso, também a área ardida diminui de forma espectacular. Como se alteram estes comportamentos? Investindo e persistindo num programa sério e duradouro de forma-ção e educação, que inclua esta matéria nos conteúdos escolares do ensino básico e secundário. Em Portugal temos diversas experiências, noutras áreas, em que alcan-çámos enorme sucesso na mudança de comportamentos e atitudes. A prevenção rodoviária e a segurança dos banhistas nas praias são apenas dois exemplos de enorme sucesso. Mas atenção: tal como nos exemplos referidos, os frutos destas

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campanhas só aparecem passada uma geração. Ora, politicamente, este tempo de espera é quase proibitivo. A segunda impli-ca uma alteração profunda na articulação entre a prevenção estrutural (isto é, aquela que deverá ser assegurada pelo Estado) e o combate. Sou apologista de que se crie um dispositivo profissional de prevenção e combate, constituído por elementos de diversas especialidades (engenheiros florestais, especialistas em análise e uso do fogo, elementos da engenharia militar, elementos especializados em proteção civil, elementos dos GIPS, elementos dos Sapadores Florestais, também elementos recrutados nos corpos de bombeiros,

etc…), devidamente equipados (com meios mecânicos e outros), que estejam na flores-ta 12 meses por ano. Não faz sentido que o nosso dispositivo de combate assente essencialmente em corpos de voluntários. O combate aos incêndios e a sua preven-ção, são assuntos que dispensam volunta-rismos e heróis anónimos. Por outro lado, isto permitirá um melhor planeamento das acções de prevenção e, muito importante, acabava com a questão estéril da compa-ração de quanto se gasta no combate e na prevenção. Mas, politicamente, este tipo de medidas tem um custo que não é fácil os nossos políticos suportarem: haveria uma “guerra” com as cúpulas dos bombeiros,

hoje guindados a verdadeiros heróis nacionais…

Os fundos europeus – nomeadamente através do Portugal 2020 – podem ajudar a empurrar o sector florestal? Para onde devem ser canalizadas essas verbas?

O modo de utilização dos fundos euro-peus está definido na programação opor-tunamente entregue a Bruxelas, tanto para os fundos agrícolas (PDR 2020) como para os fundos ligados ao POSEUR (do Portugal 2020). Nessa programação está prevista a elegibilidade de investimentos associados à prevenção, e temos que ter presente que a programação pode, a pedido de Portugal, ser ajustada de forma a acomo-dar as acções que permitam concretizar a estratégia definida no âmbito do Acordo de Parceria. Pela minha parte, veria com muito bons olhos que uma parte desses fundos pudesse ser utilizada no estabelecimento de um corpo profissional de prevenção e combate a incêndios, dotado dos meios necessários, tal como lhe referi anterior-mente. No âmbito do PDR 2020, na minha opinião, e tal como está programado, os fundos deverão destinar-se principalmente aos proprietários florestais, às suas asso-ciações e aos prestadores de serviços, para investimentos associados ao aumento do potencial produtivos e ao aumento da resiliência da nossa floresta.

No plano dos baldios, a situação está longe de ser a desejável. Que radiogra-fia traça ao nível da gestão dos mesmos no país?

A situação dos baldios é de uma com-plexidade extrema. Durante o tempo em que fui Secretário de Estado, trabalhámos arduamente para que a chamada “Lei dos baldios” fosse alterada. Isso foi possível, tendo a Assembleia da República aprova-do a alteração e que foi promulgada pelo senhor Presidente da República. Foi uma alteração que visou tornar transparente e fiscalizável aquilo que se passa nos Baldios. A regulamentação dessa Lei foi igualmente aprovada. Infelizmente (na minha opinião, claro está) uma das primeiras coisas que este Governo fez foi revogar a regulamentação. Os Baldios,

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que são propriedade comunitária, tanto podem ser geridos directamente pelos compartes, como podem optar por um regime de cogestão com o Estado (através do ICNF). Neste regime, o Estado assume todas as despesas, e as receitas são divi-didas entre o Estado e os compartes numa proporção de 40%-60%. Este regime é financeiramente insustentável (supõe que 40% das receitas provenientes da floresta são suficientes para pagar os investimen-tos e as despesas de exploração dessa floresta), razão pela qual o Estado muitas vezes é “acusado” de gerir mal os Baldios. Um outro problema reside na definição de comparte, o que faz com que muitos Bal-dios estejam nas mãos de apenas alguns, sem necessidade de prestação de contas de forma minimamente transparente e con-trolável. É um tema muito complexo, e que envolve muitos interesses, nomeadamente

partidários. Mas que o regime jurídico dos baldios constituía um entrave à sua plena utilização ao serviço das populações e do país, disso não tenho duvida nenhuma.

O sector das florestas não só é im-portante para as gerações actuais, do ponto de vista social e económico, mas também estratégico em termos dos mercados internacionais. De que forma temos aproveitado os nossos recursos florestais nesta matéria?

As fileiras de base florestais são extre-mamente importantes para a economia portuguesa, nomeadamente a fileira do sobro e da cortiça e a fileira do eucalipto e da pasta de papel. Temos vantagens comparativas nestas áreas que é um crime não aproveitar. São duas fileiras muitíssimo internacionalizadas, em que Portugal é uma referência mundial. Com aquilo que hoje

sabemos em termos de comportamento das espécies, estamos em condições de expandir as áreas florestadas com estas duas espécies, e acho que devemos fazê-lo. E isto sem colocar minimamente em causa a gestão dos recursos naturais ou a biodiversidade nos espaços florestais. Quem disser o contrário, é porque vive agarrado a fantasmas e a conhecimentos datados e ultrapassados.

Floresta enquanto recurso económico

Um dos problemas, dizem alguns especialistas, é que o país nunca olhou para a floresta enquanto recurso econó-mico. Concorda?

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do “país nunca ter olhado para a floresta enquanto recurso económico”? Somos pe-ritos em dar caneladas nas nossas próprias pernas. Como referi, temos duas fileiras de base florestal, que laboram essencialmente matéria-prima produzida no nosso país, que dão cartas à escala mundial. Temos algumas outras fileiras emergentes, que têm vindo a evidenciar comportamento muito interessantes, como é o caso do pinheiro-manso e de alguns nichos de espécies autóctones. E temos uma espécie (o pinheiro bravo) que tem enormes fragili-dades, e que tem vindo a perder área de forma acelerada nos últimos 20 anos. Tudo indica que a diminuição da área de pinheiro bravo irá continuar, pelo que deveríamos estar a discutir o que é que os proprietários dessas áreas irão fazer delas. Mas em vez disso ouvimos falar da proibição de expandir a área de eucaliptos, por muito bem geridas que sejam. Claro que mesmo as fileiras do sobro e do eucalipto têm problemas sanitários e de produtividade (para já não falar dos incêndios) e também aí deveríamos centrar a nossa atenção em vez de perdermos tempo com parvoíces.

Recentemente, a AIECEP traçou o retrato do sector: 470 empresas, que empregam mais de 10.500 pessoas em Portugal e são responsáveis por 3,1 mil milhões de euros de facturação, repre-sentando 1% do valor acrescentado bruto (VAB) do país e 5% do total gerado pela indústria transformadora portugue-sa. Vê que o país, a curto/médio prazo, possa melhorar estes indicadores?

Indiscutivelmente que sim. Podemos produzir mais matéria-prima, substituindo as importações a que a indústria já tem que recorrer. Este aumento pode ser consegui-do tanto por melhoria das produtividades, por melhoria da qualidade da matéria-prima e por aumento das áreas de povoamentos.

Há um mito que envolve este sector: o de que a indústria papeleira destrói a floresta. E regressando aos incêndios, é realmente verdade?

Voltam os velhos do Restelo… E, neste caso, sobrevem a ignorância e, muitas ve-zes, a má-fé. Claro que a indústria papeleira pode melhorar o seu comportamento em

relação aos produtores florestais. Em meu entender poderá valorizar melhor a madeira que compra e poderá também partilhar de forma mais extensa o enorme conhecimen-to que detém em matéria de silvicultura. De resto, isto é igualmente verdade para a indústria da cortiça. A relação disto com os incêndios é que não sou capaz de descortinar. Tenho dito e repito: com o que hoje se conhece acerca desta espécie e das práticas culturais mais adequadas, caem todos os mitos que surgiram nas décadas de 70 e 80 do século passado, a que muitos continuam agarrados como verdades de fé! Que fique claro: o contri-buto da predominância do eucalipto para os incêndios florestais é nenhum! Isto quer dizer que todos os hectares de eucalipto são bem geridos? Claro que não. Mas esse facto, em nada tem a ver com a espécie e sim com as práticas culturais utilizadas pelos proprietários. Nesta matéria, advogo que as indústrias da pasta do papel deviam ser chamadas a colaborar activamente com o Estado na definição daquilo que interessa e não interessa fazer. Porque no final, se estas indústrias não comprarem a matéria-prima proveniente de povoamentos desadequados, estes deixam de existir. In-felizmente, para outras espécies florestais, não poderemos dizer o mesmo, pois não temos uma indústria forte que possa colo-car-se ao serviço de uma política pública de melhoria dos povoamentos. E enquanto teimarmos em misturar a discussão dos incêndios com o eucalipto estamos todos a perder tempo.

A agricultura e a floresta andam de mãos dadas. O problema da desflo-restação afecta populações e activi-dades económicas. O que temos feito nesta matéria – ao nível agrícola e do despovoamento?

A área florestada tem diminuído ligeira-mente desde 1995. E isso tem acontecido porque a floresta perdeu rentabilidade. Despareceram muitos usos da floresta que não podemos decretar que regressem. E contra isso, não há muito a fazer, a não ser que escolhamos um modelos de socieda-de e de desenvolvimento muito diferente daquele por que optámos. Podem, certa-mente que sim, estimular-se actividades

económicas que revalorizem a floresta: a resinagem é uma delas, a colecta de cogumelos e frutos silvestres é outra, a produção de mel é ainda um outro exemplo interessante. Em algumas regiões do país, a promoção de certos sistemas silvo-pas-toris (como é o caso do montado no Sul, ou dos pequenos ruminantes no centro e no Norte) podem contribuir para uma maior valorização dos recursos florestais e, em simultâneo, para uma reocupação econó-mica destes espaços.

Que futuro pode o país esperar para a floresta nacional? Que outras medidas urgem tomar no imediato?

Espero não ser mal interpretado em rela-ção ao que lhe vou dizer: de imediato, urge que não se tomem medidas nenhumas. E isto porque estamos a falar de um assunto que dispensa excessos de voluntarismo e medidas tomadas sob pressão do es-pectáculo mediático dos incêndios e da opinião pública. Estamos todos um boca-do saturados dos grandes anúncios que, nestas épocas críticas, se fazem. Palavras como reformar, reestruturar, revolucionar e outras que tais deveriam ser evitadas por quem de direito. Como creio que atrás já deixei claro, em minha opinião aquilo que é necessário fazer não se compadece com anúncios espampanantes, nem primeiras páginas de jornais. Vir prometer grandes reformas da floresta (como se isso fosse um remédio para todos os males) e res-postas imediatas às causas próximas dos diversos males (quaisquer que elas sejam) que afecam a floresta, é o caminho mais curto e certo para o descrédito e para a subsequente frustração. Nesta matéria, estaria na hora de levarmos a sério o poeta António Aleixo quando escreve “Vós que lá do vosso império / prometeis um mundo novo, / calai-vos, que pode o povo/ qu'rer um mundo novo a sério”. E temos no nosso país gente com conhecimento e experiência para, longe deste circo mediá-tico de Verão, progredirmos no caminho que temos vindo a percorrer, corrigindo o que está mal e potenciando aquilo que temos de bom. Quando tive tempo de antena nesta matéria disse-o claramente: não consigo entender porque é que a Floresta não é um terreno de não-conflito

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político entre os principais partidos. Era um favor que faziam ao país.

Alterações climáticas e renováveis

O que pensa das alterações climáticas, da estratégia do país e dos seus impactos na floresta e agricultura?

A primeira questão que se coloca aqui, e não é uma questão pacífica nos meios científicos, é se o processo das alterações climáticas é causa ou consequência da sociedade que temos. Quando se olha para os ciclos climáticos, já tivemos no nosso planeta épocas prolongadas de aquecimento e de arrefecimento, e em que a sociedade não é a que existe hoje. Sendo que sabemos que existe um processo de alterações climáticas, precisamos saber o modo que temos – em parti-cular agricultores e produtores florestais – de contribuir para o desacelerar deste processo. A Floresta tem uma função extraordinária que tem muito a ver com o sequestro do car-bono. É, por excelência, a actividade que mais contribui por

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retirar CO2 da atmosfera. Na agricultura menos porque os produtos produzem-se, são transformados e consumidos e nesse processo o CO2 que está sequestrado na matéria seca é libertado. Na floresta não, exceptuando a queima da Biomassa, para produzir energia ou através do fabrico de pellets para alimentar caldeiras, esse é o único uso da madeira que liberta grande parte do CO2 que tinha sido armazenado.

Portugal tem de se adaptar.Sim, sem dúvida. E na Agricultura, por

exemplo, na questão do regadio, mais do que na floresta, tem um papel fundamental por duas razões. Primeiro, num processo de aquecimento, a existência de água permite que as plantas possam transpirar mais, arrefecer e manter o seu ciclo e, para isso, a água é essencial. Por outro lado, a presença da própria água – e temos uma evidência disso no Alentejo, na zona beneficiada por Alqueva, que mudou a pai-sagem com a criação daqueles espelhos de água enormes – a presença da água mitiga o efeito dos fenómenos extremos de temperatura. Existindo ali muita água, a temperatura é mais baixa do que se ela não existisse. Por estas múltiplas razões, penso que a Agricultura e a Floresta terão sempre um papel decisivo quer na mitigação quer na forma como nos adequamos a esse processo.

Como olha para o caminho das Renováveis?

Acho que não há uma solução única que possa resolver o problema da energia fóssil. Todas as alternativas que se possam colocar em cima da mesa - solares, tér-micas, fotovoltaicas, geotérmicas, eólicas, hídricas, etc. – são essenciais. Se olharmos para a solar e para os custos dos painéis há dez anos e aquilo que é o custo do painel – hoje até mais eficiente – os custos diminuíram imenso.

O desincentivo fiscal tende a acabar?É o caminho natural. Uma das funções

das políticas públicas, a qualquer nível, neste caso energético, é que se existe algo que interessa desenvolver, há uma fase inicial em que normalmente acontece um apoio – seja ele qual for – e que num

determinado momento, a tecnologia resol-ve o problema dos custos e deixa de ser necessário apoiar.

Fala-se muito do direito à paisagem e ao choque que muitas vezes a tecno-logia provoca nela. O que pensa sobre este assunto?

Toda a paisagem em Portugal é cons-truída. E aqui há uma grande confusão que a população urbana faz: acha que tem o direito de ter a paisagem que gosta, sem pagar o que quer que seja. A maior parte da nossa paisagem foi construída com base em actividades económicas. Na floresta, por exemplo, em que 98% é privada em Portugal, todos a discutimos na altura dos incêndios, mas não é nossa,

tem dono. Quando queremos impor res-trições por questões paisagísticas, não podemos esquecer que estamos a limitar uma actividade económica, responsável pela manutenção da paisagem. O que o sr. Ministro da Agricultura disse recen-temente em relação às terras sem dono às autarquias é surreal. Um dos erros do sr. Ministro é que disse isso sem referir que a legislação, aprovada no Governo anterior, já existe, está publicada, aprovada pela Assembleia da República, e define o procedimento que o Estado deve ter para intervir nessa propriedade. A lei que existe determina que essas terras entrem imedia-mente para a Bolsa de Terras. Em suma, os anúncios em época crítica são péssimos junto da opinião pública.