NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si...

40
NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO 1

Transcript of NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si...

Page 1: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

1

Page 2: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

2

Page 3: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

3

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

NO OLHAR, O

ENCONTRO

ORIGINÁRIO

1ª edição

Belém / PA

2019

Page 4: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

4

Copyring© Jonas Matheus Sousa da Silva, 2019

®Todos os direitos reservados

*Correção gramatical e estilística: Prof.: Anselmo

Gomes;

.: Maria Conceição de Lima.

*Diagramação: Jonas Silva

Page 5: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

5

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

Arte belles images femmes –woman. In :

< mamietitine.centerblog.net >

Elabora-se uma hermenêutica filosófica do

poema Teus olhos, de Luciane Oliveira Moraes.

Embasa-se, para tanto, nos pensamentos de

Merleau-Ponty, Jonas, Heidegger, Buber, e Rahner,

entre outras fontes; para refletir o conceito de

Encontro originário, vivenciado pela poetisa,

abrindo a interpretação para o interpessoal-

Page 6: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

6

encontro-inefável, que manifesta o ser-com-os-

outros-no-mundo, fadado ao devir, porém fundado,

assim como todas as coisas, em Deus – “Tu

ete n ”, que mesm in minável, mani esta-se ao

ser humano.

Palavras-chave: Hermenêutica filosófica.

Poema. Encontro originário. Devir. Deus.

1 INTRODUÇÃO

Construindo uma hermenêutica do poema

“Teus lh s”, de Luciane Olivei a M aes, text

disponível na internet, o presente artigo coloca em

relevo a temática do encontro interpessoal, que

parte do olhar como vivência do inefável, momento

do encontro e da compreensão; que acontece no

devir de ser-com-o-outro, enlaçando dois mundos,

nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do

Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”,

d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

encontros originários e garante, para a pessoa

Page 7: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

7

humana, a felicidade perene. Certamente, o

encontro originário, experimentado pela poetisa, no

seu fim, impulsionou-a para compor e escrever o

poema em questão, colocando aquele encontro em-

obra-de-verdade.

Embasa-se esta atividade hermenêutica de

“Teus lh s”, nã tant en atizand a biografia de

Luciane Oliveira que, na fonte virtual não oferece

muitas informações sobre si, porém detém-se no

texto poético e nos enfoques filosóficos e

teológicos, os quais pautam os subtemas que

compõem o desenvolvimento desta, e são:

Merleau-Ponty, Hans Jonas, Martin Heidegger,

Martin Buber, Karl Rahner, entre outros que

preservam sua importância na estrutura vigente.

Fundamentando-se em consideráveis

pensamentos filosóficos e teológicos, pode-se

ent a na iluminaçã de “Teus lh s” que c nv ca

a presença do ser humano na sua dignidade de

portador das centelhas de Deus. Encontrar-se com o

outro ser humano que se faz próximo é

Page 8: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

8

compreender que a existência possui um

fundamento eterno.

Deste modo, o presente artigo está

subdividido na seguinte estrutura temática:

◾O p ema “Teus lh s”;

◾Os olhos;

◾Pôr-em-obra-da-verdade;

◾Hermenêutica do encontro;

◾e O advent d “Tu ete n ”.

2. O OEMA “TEUS OLHOS”

A fim de se trabalhar os pensamentos

filosóficos de Heidegger e Buber, entre outros

autores consultados; evidencia-se como a obra de

arte escolhida - desde que o presente artigo almeja

enfatizar conotações, estética e hermenêutica, em

relação ao ato de olhar-o-outro no encontro - o

p ema “Teus lh s” , publicad em mei

eletrônico: <http://www.webartigosos.com>, em 22

de julho de 2011, assinado por Luciane Moraes

Page 9: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

9

que, além deste poema, divulgou outros escritos

seus, na citada página virtual, intitulados: Mistério

subentendido; Vida; e Sobre equívocos, narcisos e

imediatismos.

Abaixo, cita-se na integra o texto poético

chamad “Teus lh s”:

“Ah! Teus olhos... /Teus olhos são o puro

reflexo da ascensão, /São o reflexo da glória. /São o

reflexo de alguém que tudo pode /E que tudo vê.

/São olhos soberanos /E eu, sou apenas mais uma

eterna subalterna desse teu olhar... /Teus olhos são

a água da vida /Que convida a humanidade a

banhar-se. /Teus olhos são profundos, /São puras

bênçãos do grande Rei. /Teus olhos são dádivas,

/Minha dívida benigna. /Teus olhos me dão um

prazer indescritível, /Daria tudo para admirá-los

por toda a eternidade. /Ah! Teus olhos... /São

divinos! /Chego a pensar que não são teus, /Que

são de Deus /Pois o seu brilho cintilante emana a

bênção divina sobre nós, /Meros humanos. /Não

merecemos tanto! /O Sol que há em teus olhos; /Dá

luz, calor, vida aos seres, vida ao Universo. /E

Page 10: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

10

causa inveja às outras estrelas, /Pois elas pouco

duram /E não têm o teu brilho de esperança.

/Quando tu pestanejas, /Não significa que a

Esperança acaba /Que a vida morre, /Que o

Universo explode. /E sim, que é o anúncio de que

temos que encher nossos corações, /Repletos de dor

e tristeza com ainda mais Esperança, /Pois o brilho

que virá será ainda mais intenso /E mais

maravilhoso que o anterior. /Quando tu dormes, /É

chegada a noite aqui na Terra /E todos os seres

vivos permanecem acordados /Para vigiar teu sono

e te admirar dormindo. /Ao final, todos dormem de

olhos abertos, /E sonham coisas maravilhosas, /Pois

teus olhos são o ingresso ao Paraíso. /E mesmo

cobertos pelas tuas pálpebras, /Continuam a brilhar,

/Pois teu brilho está refletido e contido na Lua, que

é o teu sorriso. /E quando tu acordas, /E os abres,

lentamente, /Aqui é chegado um novo dia. /Teu

crepúsculo anuncia as boas novas de Deus!

/Quando tu choras, aqui é chuva. /Não chuva de

tristeza, mas de intensa alegria, /Pois tuas lágrimas

são água pura e cristalina, /E lava a alma dos

Page 11: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

11

homens, /Cura os feridos, /Dá alegria aos que estão

tristes, /Devolve a vida aos que perderam a razão

de viver. /Teus olhos são um enigma indecifrável,

/Eles escondem segredos, /De alguém que tem

muito a dizer; /Mas ninguém ousa tentar descobri-

los /Pois é pecado. /E quem tenta descobrir, /Morre

frustrado, /Apaixonado... /Teus olhos são o reflexo

do Amor, /Não esse amor humano frívolo, /Mas

aquele amor próprio do filho de Deus. /Teus

olhos... /Teus olhos são a luz que me guia dentro

dessa minha escuridão, /Escuridão de sentimentos e

pensamentos. /Teus olhos são a inspiração de uma

poetisa inábil que tem tanto a dizer, /Porém, não

sabe mais escolher e escrever as palavras para

exaltar estes olhos, /Pois as palavras são

Minúsculas e Insignificantes, /Perto desse teu olhar.

/Graças a teus olhos, sei que Deus está no meio de

nós. /Este mesmo Deus a quem peço todos os dias,

/Que não me deixe morrer sem que os veja /Pela

última vez... /Por isso, te imploro que não afastes

de mim estes benditos olhos, /Porque eles me dão a

Page 12: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

12

vida necessária para que, finalmente, /Eu possa

m e p eles”. (MORAES, 2011).

O p ema “Teus lh s” é c mp st de 81

versos, formando uma única e longa estrofe de

configuração-gráfica espiralada. As metáforas que

aparecem nesse texto poético expressam

densamente: fenômenos naturais, oposição trevas-

luz, sentimentos e atos da pessoa humana. O

substantivo olhos, que tematiza esta arte, é repetido

19 vezes, além do título.

Teus olhos expressa uma simbiose entre os

polos do encontro interpessoal e da irrupção

mística da divindade; temas estes, defendidos nos

textos de Luciane Moraes, em detrimento da

fugacidade das relações humanas na esfera da Pós-

modernidade, conforme a própria autora afirma,

seguindo a esteira de Zigmunt Bauman - sociólogo

polonês, autor de Modernidade líquida e Amor

líquido, no texto: Sobre equívocos, narcisos e

imediatismos:

“Os indivídu s, in luenciad s pela vivência

em meio a um mercado de consumo marcado pela

Page 13: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

13

competição, passaram a enxergar o outro como um

inimigo em potencial. Diante disso, entre

relacionamentos superficiais, valores egocêntricos

e atitudes que priorizam o imediato, o altruísmo vai

desfalecendo e se tornando uma raridade no mundo

c ntemp âne ”. (MORAES, 2011).

Zigmunt Bauman

Neste assomo das dimensões do encontro

dialógico e da irrupção do mistério sagrado, os

olhos-do-outro acarretam uma dimensão

transcendente, que dispõe a pessoa que os

c ntempla “apaix nadamente”, num enc nt

ontológico, ou originário.

Page 14: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

14

3 OS OLHOS

Fazendo advir a temática dos olhos, ou da

visão, aclarando-a na palavra poética, enfatiza-se o

sentido da visão nos pensamentos de Merleau-

nty, c m “O lh e espí it ”, e em Hans J nas,

n text : “A n b eza da visão: um estudo sobre a

en men l gia d s sentid s”.

Evidencia-se, com esses pensadores

contemporâneos o fenômeno da visão, ou dos

“ lh s”, que – na composição poética – pertencem

a um Tu humano. Como transcrevemos de Teus

lh s: “Ah! Teus lh s... /Teus lh s são o puro

reflexo da ascensão, /São o reflexo da glória. /São o

e lex de alguém que tud p de /E que tud vê”.

Para Merleau-Ponty, a humanidade do ser

humano se dá pela corporeidade sentida e

visualizada, pois se o ser humano não pudesse

sentir ou olha seu p óp i c p , “[...] esse c p

quase adamantino que, não fosse carne totalmente,

também não seria um corpo de homem, e não

have ia humanidade” (MERLEAU-PONTY, 1984,

Page 15: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

15

p.89). É com o seu corpo que o ser humano está

atuante no mundo. Enxergando-se como corpo, o

homem tem um impulso para ser consciente de sua

própria existência, na sua possibilidade de ser no

seu mundo cultural, interagindo dialogicamente

com os demais seres humanos. O olhar, ao modo de

propriedade do espírito humano, remete ao pensar-

se e pensar-com-os-outros, pois, para perceber a

existência dos outros seres humanos e entrar em

interação com esses, é necessária a anterior

percepção da própria existência no corpo, pois é

um existir na possibilidade. Os olhos refletem a

ascensão como possibilidade do devir pessoal para

a autenticidade, revelando o homem a si, bem como

ao mundo e aos outros. Possivelmente, é esta a

experiência da poetisa que culmina na redação do

p ema, p is lh é: “Inst ument que se m ve

por si mesmo, meio que inventa seus próprios fins,

o olho é aquilo que foi comovido por um certo

impacto do mundo e que o restitui ao visível pelos

t aç s da mã ” (MERLEAU-PONTY, 1984, p.90-

81).

Page 16: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

16

Os traços grafados pela mão da poetisa, em

Teus olhos, não restitui, pela técnica, sua comoção,

compreendida em seu olhar no encontro, sem

mediação, com o Tu, a quem vê; no entanto, a

poetisa põe o seu mover-se ao encontro, no Tu que

lhe advêm tornando-se tudo, na iluminação

penumbrosa da palavra-poética. Teus olhos fala de

um encontro interpessoal que se dá na

movimentação mundana, mas transcende o mundo,

pois o mundo da autora se compreende com o

mundo do Tu encontrado. Um encontro imediato

que acontece pela somaticidade, esta que é inerente

pelo olhar ao próprio ser humano.

Assim, “A visã não é a metamorfose das

próprias coisas na sua visão, a dupla pertença das

coisas ao grande mundo e a um pequeno mundo

privado. É um pensamento que decifra estritamente

os sinais dados no corpo (MERLEAU-PONTY,

1984, p.95). ”

Page 17: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

17

Merleau-Ponty in:

< postcogtopics.blogspot.com >

A visão, nesse sentido, é compreensão

esvaziada do Eu que se encontra receptivamente

com a indeterminação do ser do Tu que lhe advêm.

Este é o momento de inominável proximidade de

duas presenças que se dão no olhar místico que

ge a a p esia; esta “[...] visã é enc nt , c m

numa encruzilhada, de tod s s aspect s d se ”

(MERLEAU-PONTY, 1984, p.109).

Somente quando o encontro se encerra, com a

não-presença do Tu, o Eu enuncia a essência do

encontro com a palavra-poética, na meia-luz que,

metaforicamente, mostra e esconde o que se deu no

encontro originário.

Page 18: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

18

O olho, como “[...] janela pa a mund e a

mesm temp espelh da alma” (LURKER, 1997,

p.497), assoma, na simb l gia lite á ia de “Teus

lh s”, como elucidação de um autêntico encontro

sem palavras, donde brota a obra de arte.

A visão não se detém à boa saúde dos olhos,

mas está como capacidade inerente ao ser humano,

também chamada contemplação, como quer Hans

J nas: “Os ceg s p dem ‘ve ’ p mei de suas

mãos, não por lhes faltar o uso dos olhos, mas, sim,

por serem dotados da capacidade universal da

‘c ntemplaçã ’ e só acidentalmente te em sid s

p ivad s d ó gã da visã ” (JONAS, 2004, p.165).

Distanciar-se do que é visto, possibilita

pensar no momento do encontro e recompô-lo na

linguagem. “A distância d que é vist nece uma

‘imagem neut a’, e esta, di e entemente d e eit ,

pode ser contemplada e comparada, conservada na

memória e recordada, variada na imaginação e

recomposta a bel-p aze ” (JONAS, 2004, p.172).

Em “Teus lh s”, adve samente a um

discurso científico, temos uma recomposição

Page 19: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

19

artística na metáfora poética, que não se deixa

reduzir à relação gnosiológica entre sujeito e

objeto, no entanto, conserva o caráter presencial,

pois a palavra-poética, chama à presença, o

encontro originário.

4 PÔR-EM-OBRA-DA-VERDADE

Trilhando o caminh que desc b e “Teus

lh s”, t azem s p ema à luz da he menêutica da

linguagem, de Martin Heidegger. Para tanto,

evidenciaremos os conceitos heideggerianos que

bem casam com os versos da arte em questão, pois

aqui a “[...] inte p etaçã nada mais é do que o

desenvolvimento do compreender, apropriando-se

das possibilidades em que o poder-se p jeta”

(NUNES, 2002, p.18).

Desse modo, chamam a atenção nas palavras

poéticas de Luciane Moraes, os temas: glória-luz;

anúncio; descobrimento; morte; e palavras,

conforme enfatizamos.

Page 20: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

20

Em “A igem da b a de a te”, Heidegge

a i ma que a essência da b a de a te é “pô -se-em-

obra-da-ve dade” d ente, quando elaborou a

inte p etaçã d quad “Os sapat s da

camp nesa”, de Van G gh. “Na b a de a te, põe-

se em ob a a ve dade d ente: ‘pô ’ signi ica aqui,

erigir. Um ente, um par de sapatos de camponês,

acede na obra ao estar na clareira do seu ser. O ser

d ente acede à pe manência d seu b ilh ”

(HEIDEGGER, 1991, p.27).

"Os sapatos da camponesa", de Van Gogh

Assim, a essência da obra de arte é erigir na

linguagem o desvelamento, à meia-luz, do ente que

Page 21: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

21

é um não-nada. Um desvelamento-encobrimento, o

que signi ica “à meia-luz”, d ente na b a de a te,

que é linguagem e, por conseguinte, poesia,

constitui o momento originário no qual a poetisa se

confronta com o desvelamento do ser do ente; é o

momento do encontro de dois mundos presenciais –

sobretud n cas de “Teus lh s”; é este

momento de enlaçar-se-com, diferentemente de

aprisionar- , desde que “enc nt ” implique

advent e m viment , “[...] lá nde nã

encontramos a palavra certa para dizer o que nos

concerne, o que nos provoca, oprime ou

entusiasma” (HEIDEGGER, 2003, p.123).

“ assand a essaltament de c nceit s

heideggerianos no poema em questão, iniciamos

pela temática “gló ia-luz”, c n me ev ca

p ema: “Sã e lex da gló ia. /[...] /O S l que há

em teus olhos; /Dá luz, calor, vida aos seres, vida

a Unive s ”. Fala de “gló ia-luz” é e e i -se ao

advento glorioso da divindade que, na meia-luz, dá

sentido a um mundo, o mundo da poetisa. Para

tant , s lh s p ssuem um “s l”, d qual depende

Page 22: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

22

a sua vida e de t d “unive s ”; s lhos,

cantad s pela “p etisa da luz”, chegam n enc nt

com uma potência divina, pois estes fazem aparecer

todo um movimento de entes num universo,

iluminando- s. a a Heidegge : “Dignidade e

esplendor não são propriedades, a par e por detrás

das quais está ainda o deus, pelo contrário, na

dignidade, no esplendor, é que advém o deus. No

reflexo deste esplendor, reluz, i. é., brilha o que

chamam s mund ” (HEIDEGGER, 1991, p.34). A

presença, encontrada nos olhos, pelo olhar da

poetisa, é pela arte poética a glorificação divina que

abre um mundo na linguagem.

Na perspectiva do anúncio, “ esia é cant

[...]. O canto é a festa de chegada dos deuses, a

chegada quand tud se aquieta” (HEIDEGGER,

2003, p.141); n p ema, s lh s sã “[...]

anúncio de que temos que encher nossos corações,

/Repletos de dor e tristeza com ainda mais

Espe ança”. Os lh s cantad s anunciam sua

chegada só mediante a linguagem; desse modo, o

Page 23: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

23

que anuncia é a poesia, onde os olhos cantados

advêm, manifestando-se.

Exprimindo a temática da “m talidade”, a

poesia canta a morte intrínseca ao encontro dado-

na-luz. De fato, se a morte não fosse peculiar ao

encontro originário, não se comporia o poema, já

que a arte é uma convocação do não presente que

está vindo.

Canta p ema: “E quem tenta descobrir,

/Morre frustrado, /Apaixonado... / [...] /Porque eles

me dão a vida necessária para que, finalmente, /Eu

p ssa m e p eles”.

Tentar descobrir implica movimento

apropriador sobre o ser do ente, que se dá no

encontro à meia-luz; essa violência sobre o Tu é

frustrada porque o ser é dinâmico; ousar acorrentar

o ser é decretar a morte do encontro, é fechar-se ao

que advêm com a finalidade de se dá no

desvelamento-velador. Tentar descobrir é matar o

encontro, desde que se atenta contra o devir próprio

do ser-do-ente-adveniente; o que significa

robustecer a mortalidade-temporalidade do ser.

Page 24: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

24

“A m te é uma p ssibilidade nt lógica que

a própria presença sempre tem de assumir. Com a

morte, a própria presença é independente em seu

poder-ser mais próprio. Nessa possibilidade, o que

está em jogo para a presença é pura e simplesmente

seu ser-no-mundo. Sua morte é a possibilidade de

p de nã mais se p esença”. (HEIDEGGER,

2009, p.326).

Presença, segundo Marcia Schuback – uma

entre os tradutores de Heidegger no Brasil –

equivale a c nceit heidegge ian “Dasein”, que

compreende a condição humana que é existência;

ser-no-mundo; ser-com-os-outros; e ser-para-a-

morte. Nesses sentidos, tanto o ser do ente que tem

s lh s c l cad s “em-obra-de-ve dade”, quant à

própria poetisa, são presenças que se compreendem

num inominável encontro originário, que veio a ser

poesia pelo caráter mortal do próprio encontro-de-

presenças-mortais. A vida, que a poetisa recebe no

encontro da presença que se desvela no olhar, está

na propriedade de enlaçar-se-com no movimento

inefável do ser e, por isso, a mortalidade da poetisa,

Page 25: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

25

que consiste numa entrega de si, acontece no grafar

e publicar o poema, que traz à luz o seu encontro

originário com a presença do Tu, por quem dá a sua

vida.

Quanto à esfera da linguagem, expressa em

“Teus lh s”, t az à luz a p etisa: “Teus lh s sã

a inspiração de uma poetisa inábil que tem tanto a

dizer, /Porém não sabe mais escolher e escrever as

palavras para exaltar estes olhos, /Pois as palavras

são Minúsculas e Insignificantes, /Perto desse teu

lha ”.

Nesses versos, estão elucidadas a in-

apreensão da linguagem acerca do encontro

originário e a dispa idade ent e “se -acontecendo-

aí”, perante o ato de pensar o encontro que morreu

e o posterior, convocá-lo na nominação poética,

que é di e ente d pensa . is: “A linguagem é a

casa do ser. Nessa habitação do ser mora o homem.

Os pensadores e os poetas são os guardas dessa

habitação. A guarda que exercem é o consumar a

manifestação do ser, na medida em que a levam à

Page 26: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

26

linguagem e nela a c nse vam” (HEIDEGGER,

1998, p.31).

De certo, as palavras são inferiores a

realidade do encontro-acontecendo. As palavras,

em “Teus lh s”, não esgotam o encontro

originário, pois na metáfora poética esse vem à luz

da linguagem, isso o mata, no entanto, pela

imprecisão poética da metáfora, com sua

penumbra. O encontro originário é sempre: vivo,

móvel e adveniente; o encontro cantado na poesia

t anscende a p esia. “A enúncia que p eta

aprende é do tipo de uma abnegação plena, à qual

somente se prenuncia o que há muito se vela e

p p iamente já semp e se c nsente”

(HEIDEGGER, 2003, p. 129 – 130).

Na arte, o momento originário é sempre

possibilidade de acontecimento, pois esse inaugura

um mundo que anuncia o advento do ser no ente,

que, por sua vez, convoca o encontro à meia-luz, o

encontro imediato, presencial e inefável.

Page 27: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

27

5 HERMENÊUTICA DO ENCONTRO

Foram enfatizados neste, os termos: encontro,

compreensão e diálogo; temas estes que vêm a

propósito ao pensar-se numa hermenêutica do

encontro, dada em “Teus lh s”; essa, sublinham -

la a partir do pensamento de Martin Buber, desde

sua b a “Eu e Tu”. Nesta, a es e a das elações

científicas difere da esfera das relações pessoais, a

que n s inte essa. “O mund , como experiência,

diz respeito à palavra-princípio EU-ISSO. A

palavra princípio EU-TU fundamenta o mundo da

elaçã ” (BUBER, 2004, p.55).

Martin Buber

Page 28: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

28

Em “Teus lh s”, a elaçã “Eu–Tu”,

vivenciada pela poetisa, é explícita. Na obra de arte

em questão, os olhos são de um Tu–humano, tanto

quanto a poetisa é uma pessoa humana, conforme o

p ema: “Quand tu ch as, aqui é chuva. /Nã

chuva de t isteza, mas de intensa aleg ia”. Este

“ch a de aleg ia”, d Eu pe ante o Tu que, por

seu turno também chora, não consiste num sadismo

ou perversidade do Eu, porém numa verdadeira

alegria, numa alegria que comove as entranhas do

ser Eu, por ter encontrado um Tu humano que dá

sentido para a sua existência. Tampouco é, aquela,

uma alegria egoísta, no sentido do Eu alegrar-se

primordialmente pela própria possibilidade de ser,

instrumentalizando o encontro com o Tu, pois na

esfera da relação Eu – Tu está o inefável e a relação

científica Sujeito–Objeto não penetra o imediato do

Eu–Tu. “A elaçã c m Tu é imediata. Ent e Eu

e o Tu não se interpõe nenhum jogo de conceitos,

nenhum esquema, nenhuma fantasia; e a própria

memória se transforma no momento em que passa

d s detalhes à t talidade” (BUBER, 2004, p.59).

Page 29: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

29

Na totalidade do encontro Eu–Tu, enfatizada

n s ecentes ve s s de “Teus lh s”, citad s acima,

a relação aparece como condição sem a qual a

pessoa humana não se realiza na sua história

dialógica e de comunhão de sentimentos

propriamente humanos. Aqui tocamos na temática

do destino e da liberdade das pessoas humanas;

ambos impulsionam o ser humano para adentrar ou

rejeitar a esfera do encontro dialógico, desde que

este encontro convoca o Eu a compreender-se

responsavelmente com o Tu, descobrindo sua

realização na vigência do encontro com o Tu; assim

diz p ema: “ iss , te impl que nã a astes

de mim estes bendit s lh s”.

O Tu humano está em movimento perante o

Eu, assim como tudo o que venha a se configurar

como um Tu para um eu e seja aquém da esfera

divina. No entanto, é na liberdade do Eu e do Tu,

sobretudo se humanos, que estes se-movimentam-

para-o-outro, encontrando o enlace feliz do ser-eu-

apenas-no-outro, o que configura a liberdade

pess al n enc nt : “[...] h mem liv e nã tem,

Page 30: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

30

aqui, uma finalidade e, lá, os meios para obtê-lo;

ele possui somente um objetivo e sempre um: a

resolução de ir ao encontro de seu destin ”

(BUBER, 2004, p. 91).

Dado que o encontro do Eu com qualquer Tu

que não seja o divino é fadado ao devir, ao findar-

se no tempo e na mortalidade, o Tu-ausente passa a

se configurar como Isso para o Eu, que, nessa

perspectiva, pode pensar esse Isso e trazê-lo à luz

pela linguagem da obra de arte, que convoca o Tu

cantado (o Isso), à presença, para que passe

novamente a ser Tu, não apenas para a poetisa,

porém também para as demais pessoas humanas

que poderão vivenciar um encontro Eu – Tu, com a

b a de a te; u seja, a “expe iência estética”, p is,

“[...] a b a de a te nã p ssui nenhuma utilidade a

não ser aquela para a qual é construída –

proporciona a expe iência estética” (DUARTE

JUNIOR, 2003, p.42).

A partir da fugacidade de qualquer Tu que se

torne Isso, para o Eu, este Eu busca a realização

plena que preencha o vazio deixado pela ausência

Page 31: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

31

do Tu-não-divino. Aqui, o Eu se volta para a esfera

divina como seu fim último, que não é marcado

pela m tal temp alidade, p is ali habita “Tu

ete n ”, d qual Tu human já p ta sinal

c nv cad . “As linhas de t das as elações, se

prolongadas, entrecruzam-se no Tu eterno./ Cada

Tu individualizado é uma perspectiva para ele.

Através de cada Tu individualizado, a palavra-

p incípi inv ca Tu ete n ” (BUBER, 2004,

p.101).

Perante o Eu, assim como o Tu-aquém-do-

humano convoca o Tu humano – na sua limitação

temporal perante a personalidade humana, esta

convoca o Tu eterno, quando esse Tu humano

torna-se Isso. Certamente, aquele Tu humano, ao se

encontrar com o Eu, já faz habitar, no encontro,

centelhas do Tu eterno.

Page 32: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

32

6 O ADVENTO DO “TU ETERNO”

Na pess a que vem a enc nt em “Teus

lh s”, c m en atizam s, há a inv caçã da

divindade, p tant d “Tu ete n ”, d Deus

inominável. O Tu que vem ao encontro do Eu, é -

no poema - sinal da esfera transcendente; como

canta p ema: “Ah! Teus lh s... /Sã divin s!

/Chego a pensar que não são teus, /Que são de

Deus”.

“Deus”, esc it c m inicial maiúscula,

designa o nome da divindade na tradição cristã que

chega aos nossos dias, para falar da divindade em

língua portuguesa. Neste itinerário, pode-se inferir

que, para a poetisa, o Deus que advêm no encontro

com o Tu humano é o Deus dos cristãos, o Deus

uno e trino que habita o coração da pessoa humana,

como escreveu a mística católica, Elisabete da

Trindade, na Carta 258, codificada no seu

epist lá i : “Que aleg ia c e que Deus n s ama a

ponto de habitar em nós, de fazer-se companheiro

de nosso exílio, o confidente, o amigo de todos os

Page 33: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

33

m ment s” (TRINDADE apud SCIADINI, 2006,

p. 218).

Santa Elisabete da Trindade, ocd

Na relação imediata com a pessoa próxima,

há a presença do mistério inefável que envolve e

une o Eu com o Tu na dimensão do encontro.

Trata-se da presença divina que põe em evidência o

Tu que porta a presença inominável, pois, nas

elações humanas c m Deus, “[...] a igu a-se que

Ele está conosco, mantendo-se silencioso atrás de

nós, enquanto não O chamamos e não nos voltamos

para olhá-l’O; mas, se por ventura o fazemos, no

Page 34: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

34

mesm instante, Ele desapa ece” (RAHNER, 1961,

p.41).

De “Teus lh s”, sabe-se que o encontro da

poetisa com o homem dos olhos cantados, não é

algum evento que se dê na ausência de fundamento,

pois a fundação desta relação imediata está na

própria presença de Deus que se dá refletida no Tu

que é recebido com amor, como escreve a poetisa:

“Teu c epúscul anuncia as b as n vas de Deus!

/[...] /Graças a teus olhos, sei que Deus está no

mei de nós”.

Esses versos se erguem contra os

pensamentos niilistas da morte de Deus e negação

do fundamento, dado que é o ser humano que, na

sua mortalidade, falha ao colocar a divindade como

objeto do seu limitado conhecimento. Certamente,

é o ser humano fadado ao devir, quem se projeta

tentando, sem êxito, conceituar Deus e lhe atribuir

a mortalidade. Assim, visto que todo o ser humano

seja mortal, quer queira ou não, a sua mortalidade

anuncia o que Deus não é, dado que o insondável

undament pe manece, desde que, “[...] a palav a

Page 35: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

35

‘Deus’ nã é palav a qualque , mas é a palav a na

qual a língua – ou seja, a consciência de si do

mundo e da existência conjuntamente, que se

expressa – apreende a si em seu undament ”

(RAHNER, 1989, p.67).

Pe. Karl Rahner sj

Enquanto na relação imediata entre pessoas

humanas se der importância para a evocação da

divindade presente no Tu que se encontra, as

relações humanas acontecerão na autenticidade,

posto que estejam fundamentadas na presença

transcendente do mistério inefável, que garante a

Page 36: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

36

dignidade do amor ao próximo, ao modo de evento

basilar de um diálogo genuíno, que perpasse o ser-

do-outro no olhar, até que brote no âmago do ser

humano a palavra autêntica, que garanta a

felicidade à pessoa humana, como ser-com-os-

outros-no-mundo, que na mortalidade manifeste o

assomo do eterno e inefável mistério de Deus.

7 CONCLUSÃO

Colocar à luz, pela linguagem poética, a

experiência de um encontro originário, que se

compreendeu no tempo com uma pessoa humana, é

dar relevância a este evento e à pessoa que advêm

com seu olhar, ou seja, com a abertura do seu ser,

num momento inominável, que inclusive convoca -

na sua constituição ontológica, desvelada à meia-

luz no encontro fundante – o advento de Deus,

como “Tu ete n ”, que garante a felicidade de todo

o ser humano, inclusive fundamentando toda a

realidade fadada ao devir existencial e,

paradoxalmente, continuando presente e

Page 37: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

37

inominável, advindo na linguagem místico-poética,

quando respaldada na fé.

Esta he menêutica de “Teus lh s” coloca,

numa linguagem pensada, uma resposta ofensiva a

qualquer investida niilista e relativista, suposto que

o Deus único e eterno, mesmo permanecendo

inominável para o conhecimento humano, funda

todas as coisas, sobretudo o ser-com-os-outros-no-

mundo, mesmo estando este vinculado

existencialmente ao devir.

Page 38: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

38

REFERÊNCIAS

BUBER, Martin. Eu e Tu. 8. ed. São Paulo: Centauro, 2004.

DUARTE JUNIOR, João-Francisco. O que é beleza. São

Paulo: Brasiliense, 2003.

HEIDEGGER, Martin. A caminho da linguagem. 2. ed.

[Trad: Márcia Sá C. Schuback]. Petrópolis: Vozes, 2003.

_______. A origem da obra de arte. Lisboa: Ed. 70, 1991.

_______. Carta sobre o humanismo: carta a Jean Beaufret

(Paris). 5.ed. Lisboa: Guimarães Ed., 1998.

_______. Ser e tempo. 4. ed. [Trad: Márcia Sá C. Schuback].

Petrópolis: Vozes, 2009.

JONAS, Hans. A nobreza da visão: um estudo sobre a

fenomenologia dos sentidos. In: ______. O princípio vida:

fundamentos para uma biologia filosófica. Petrópolis: Vozes,

2004, p.159-180.

LURKER, Manfred. Dicionário de simbologia. São Paulo:

Martins Fontes, 1997.

MERLEAU-PONTY, Maurice. O olho e o espírito. In:

Maurice Merleau-Ponty. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural,

1984, p. 85-111. (Col. Os pensadores).

MORAES, Luciane Oliveira. Sobre equívocos, narcisos e

imediatismos. Disponível em:

<http://www.webartigosos.com/artigos/sobre-equivocos-

narcisos-e-imediatismos/78627/>. Acesso em: 25 out. 2011.

_______. Teus olhos. Disponível em:

<http://www.webartigosos.com/artigos/teus-olhos/72123/>.

Acesso em: 25 out. 2011.

NUNES, Benedito. Heidegger e Ser e tempo. Rio de Janeiro:

Jorge Zahar Ed., 2002.

RAHNER, Karl. Trevas e luz na oração. São Paulo: Heder,

1961.

_______. Curso fundamental da fé: introdução ao conceito

de cristianismo. [Trad.: A. Costa]. São Paulo: Paulinas, 1989.

SCIADINI, Frei Patrício. Eu, Elisabete da Trindade. São

Paulo: Loyola, 2006.

Page 39: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO

39

BIOGRAFIA DO AUTOR

Jonas Matheus Sousa da Silva é paraense, de

Capanema, nascido em 1989. Franciscano-

capuchinho e padre da Igreja Católica Romana. É

licenciado em Filosofia pelo Instituto de Estudos

Superiores do Maranhão e cursou Teologia na

Arquidiocese de Belém. Coach pela FEBRACIS. Já

publicou seis de seus livros filosóficos e poéticos.

Dispõe sua obra literária nas plataformas virtuais:

Recanto das Letras e Clube de Autores. Colaborou

com diversos artigos para os jornais impressos: O

Liberal e O Estado do Maranhão.

Page 40: NO OLHAR, O ENCONTRO ORIGINÁRIO · nos quais o Tu-humano que advêm ao encontro do Eu, p ta em si sign da p esença d “Tu ete n ”, d “Sum ut ”, que dá undament a t d s s

JONAS MATHEUS SOUSA DA SILVA

40

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO, p.6

2. O POEMA “TEUS OLHOS”,p.8

3 OS OLHOS,p.14

4 PÔR-EM-OBRA-DA-VERDADE,p.19

5 HERMENÊUTICA DO ENCONTRO,p.27

6 O ADVENTO DO “TU ETERNO”,p.32

7 CONCLUSÃO ,p.36

REFERÊNCIAS,p.38