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Março de 2001 16 Cultivar www.cultivar.inf.br Nossa Capa A Soja ( Glycine max. Merrill), por suas qualidades nutricio- nais,pelafacilidadedeadap- tação, por sua alta produtividade e pela facilidadedecultivopodeserconsidera- da um dos alimentos básicos para popu- laçõesdo futuro,por ser uma grandefon- te de proteína de baixo custo e de alto valornutritivoqueseconheceparaaali- mentação animal e principalmente hu- mana. A soja domina o mercado mundi- al tanto de proteína, como de óleo co- mestível.No Brasil,a sojaé a principal espécie cultivada , contribuindo com aproximadamente US$ 3,8 bilhões em exportações sob a forma de soja tritura- da, farelo de soja, óleo de soja bruto e óleorefinado. Antes de ser processada na indústria a soja pode ser armazenada por até 10 meses.Nessaetapacrítica,amatéria-pri- mapodesofrerdeterioraçõesirreversíveis para a produção de óleo, dependendo dos cuidados a qual foi submetida no pro- cesso de produção inicial, que consiste na condução da lavoura e colheita de forma adequada. Grãos de soja adquiridos de produ- tores que têm suas lavouras mal condu- zidas, ou seja, sem controle adequado de plantas daninhas e principalmente sem um controle eficiente de insetos, propi- ciam à massa de grãos uma série de alte- raçõesfisiológicasequímicas taiscomo o crescimento de fungos, em especial a AspergillusglaucusLinke Aspergillusfla- vus Link. Eles provocam aumento na res- piração, incremento no teor de ácidos graxos livres e elevação da temperatura na massa de grãos de soja armazenada, conseqüentemente, elevam o custo de produção de óleo pela indústria. TEOR DE UMIDADE Outro fator que pode alterar a quali- dade de grãos de soja armazenados é o teor de umidade. Estudos realizados por Napoleão (1997) em grãos de soja arma- zenados com diferentes graus de umida- de, mostraram que houve um aumento acentuado no teor de peróxido em to- dos os graus de umidade. Isso indica que ocorreudeterioraçãooxidativadelipídi- os,quepodetersidoprovocadapelapre- sençade Aspergillus ssp.Essaautoraava- liou a presença de fungos nos grãos e encontrou melhor correlação entre cres- cimento fúngico na massa de grãos e o teor de ergosterol contido na amostra. O teor de aflatoxina em soja aumen- ta de acordo com o aumenta da umida- de em grãos armazenados. As cultivares de soja com nível de ácido fítico mais elevado, produziram menos aflatoxina, em relação a cultivares com menor teor desse ácido, porém sem afetar o cresci- mento micelial de Aspergillus flavus na massa de grãos. Outros fatores que podem influenci- ar na queda da qualidade de grãos para industria é a deterioração do produto na fase de produção da soja, devido ao ata- Um bom cuidado com a lavoura, principalmente no que se refere à escolha de cultivares e controle de percevejos resulta em soja com melhor aproveitamento pela indústria de refino de óleo O que a indústria O que a indústria O que a indústria O que a indústria O que a indústria quer da soja? quer da soja? quer da soja? quer da soja? quer da soja? O que a indústria O que a indústria O que a indústria O que a indústria O que a indústria quer da soja? quer da soja? quer da soja? quer da soja? quer da soja?

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Março de 200116 Cultivar www.cultivar.inf.br

Nossa Capa

ASoja ( Glycine max. Merrill),por suas qualidades nutricio-nais, pela facilidade de adap-

tação, por sua alta produtividade e pelafacilidade de cultivo pode ser considera-da um dos alimentos básicos para popu-lações do futuro, por ser uma grande fon-te de proteína de baixo custo e de altovalor nutritivo que se conhece para a ali-mentação animal e principalmente hu-mana. A soja domina o mercado mundi-al tanto de proteína, como de óleo co-mestível. No Brasil, a soja é a principalespécie cultivada , contribuindo comaproximadamente US$ 3,8 bilhões emexportações sob a forma de soja tritura-da, farelo de soja, óleo de soja bruto eóleo refinado.

Antes de ser processada na indústriaa soja pode ser armazenada por até 10meses. Nessa etapa crítica, a matéria-pri-ma pode sofrer deteriorações irreversíveispara a produção de óleo, dependendo doscuidados a qual foi submetida no pro-cesso de produção inicial, que consistena condução da lavoura e colheita deforma adequada.

Grãos de soja adquiridos de produ-tores que têm suas lavouras mal condu-zidas, ou seja, sem controle adequado deplantas daninhas e principalmente semum controle eficiente de insetos, propi-ciam à massa de grãos uma série de alte-rações fisiológicas e químicas tais como

o crescimento de fungos, em especial aAspergillus glaucus Link e Aspergillus fla-vus Link. Eles provocam aumento na res-piração, incremento no teor de ácidosgraxos livres e elevação da temperaturana massa de grãos de soja armazenada,conseqüentemente, elevam o custo deprodução de óleo pela indústria.

TEOR DE UMIDADEOutro fator que pode alterar a quali-

dade de grãos de soja armazenados é oteor de umidade. Estudos realizados porNapoleão (1997) em grãos de soja arma-zenados com diferentes graus de umida-de, mostraram que houve um aumentoacentuado no teor de peróxido em to-dos os graus de umidade. Isso indica queocorreu deterioração oxidativa de lipídi-

os, que pode ter sido provocada pela pre-sença de Aspergillus ssp. Essa autora ava-liou a presença de fungos nos grãos eencontrou melhor correlação entre cres-cimento fúngico na massa de grãos e oteor de ergosterol contido na amostra.

O teor de aflatoxina em soja aumen-ta de acordo com o aumenta da umida-de em grãos armazenados. As cultivaresde soja com nível de ácido fítico maiselevado, produziram menos aflatoxina,em relação a cultivares com menor teordesse ácido, porém sem afetar o cresci-mento micelial de Aspergillus flavus namassa de grãos.

Outros fatores que podem influenci-ar na queda da qualidade de grãos paraindustria é a deterioração do produto nafase de produção da soja, devido ao ata-

Um bom cuidado com alavoura, principalmenteno que se refere àescolha de cultivares econtrole de percevejosresulta em soja commelhor aproveitamentopela indústria de refinode óleo

O que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaquer da soja?quer da soja?quer da soja?quer da soja?quer da soja?O que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaO que a indústriaquer da soja?quer da soja?quer da soja?quer da soja?quer da soja?

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que de insetos sugadores, tais como per-cevejo verde (Nezara viridula ), perceve-jo marrom (Euschistus heros ), percevejoverde pequeno (Piezodorus guildinii ) eexcesso ou falta de chuvas nas fases deenchimento e maturação dos grãos.

O ataque de percevejo, em lavourasde soja, pode significar redução no ta-manho das sementes, tornando-as enru-gadas, chochas e de coloração mais es-cura que as normais, conseqüentemen-te, acarreta perda na produção. Os da-nos à soja são causados principalmentepor ninfas de terceiro a quinto instar epor adultos.

A introdução do aparelho bucal dopercevejo, na semente danifica o tecidoe serve de vetor para doenças fúngicas,em especial para a levedura Nematospo-

Soja atacada por percevejos. Essa ação, alémde diminuir a produtividade, reduz aqualidade dos grãos de soja

ra coryli Piglion.Essa levedura é cosmopolita e pode

infectar frutos e sementes de várias plan-tas em condições tropicais e subtropicais.Dentre as hospedeiras de grande impor-tância podemos citar frutos de tomate,laranja, capulho de algodão, sementes defeijão (Phaseolus vulgaris L.), soja, algo-dão (Gossypium hirsutum ), feijão fava(Phaseolus lunatus L.), e, ainda, semen-tes de invasoras tais como algumas es-pécies do gênero Cassia spp. conhecidascomo fedegoso.

As pesquisas realizadas para determi-nar o nível de dano de percevejo na cul-tura da soja, se limitam em avaliar o graude resistência de cultivares de soja ao per-cevejo, nível de danos que o percevejorealiza diretamente em sementes de soja.

A QUESTÃO DA CLOROFILAAtualmente a tendência da maioria

das indústrias para embalar o óleo de sojarefinado para comercialização é a emba-lagem tipo PET (polyethylene terephta-late). Esse tipo de embalagem expõe oóleo a rancidez oxidativa, chamada deautooxidação.

A reação de rancidez oxidativa pro-duz peróxidos e hidroperóxidos. Essesdois compostos por uma série de reaçõesparalelas produzem os compostos volá-teis, aldeídos e cetonas que dão o odor aranço ao óleo. A rotas de formação dosperóxidos e hidroperóxidos podem ocor-rer por radicais livres, fotoxidação e en-zimas-lipooxigenases. Essas reações sãofavorecidas por pigmentos vegetais taiscomo clorofila e caroteno, dentre estescompostos, a clorofila pode estar presen-te nos grãos de soja, causando o escure-cimento do óleo de soja nas gôndolas desupermercados.

A eliminação desses fatores indese-jáveis na produção de óleo de soja podeser realizada utilizando-se “terras” oumontimorilonitas, para efetuar o clarea-mento do óleo. Estudos mostram que,para qualquer óleo, tanto a redução novalor de peróxido e o incremento no tem-po de indução são proporcionais à efici-ência de clareamento da terra utilizada.

As terras mais efetivas reduzem osvalores de peróxido, a cor do óleo e in-crementam os tempos de indução. Parase obter o mesmo resultado pode se uti-lizar doses menores de terra. Então, estaetapa de clareamento do óleo elimina osperóxidos e restauram a estabilidade daoxidação.

A decomposição dos pigmentos declorofila, outro fator indesejável para aqualidade do óleo, não é alcançada rapi-damente durante a desodorização. Pode-se reduzir o teor de clorofila, de óleo con-tendo alto teor desse pigmento, a níveisaceitáveis, empregando-se maior quan-tidade de terra ou utilizando-se terra paraclareamento mais seletivas.

Esse estudo teve como objetivosidentificar cultivares de soja mais tole-rantes ao percevejo da soja e que apre-sentem produção de grãos com baixoteor de clorofila (grãos verdes), correla-cionar qualidade dos grãos de soja comqualidade do óleo produzido e a influ-ência de grãos danificados com os cus-tos de produção na indústria.

GRÃOS ARDIDOS, PERCEVEJOS E ACIDEZ DO ÓLEOA qualidade dos grãos de soja foi de-

terminada pela porcentagem de grãospicados por percevejos e ardidos conti-dos na amostra, pelo teste do tetrazólio,

Marcos A. de Freitas

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Março de 200118 Cultivar www.cultivar.inf.br

de acordo com metodologia descrita porFrança Neto et al . (1998).

Para determinar a qualidade do óleode soja contendo diferentes proporçõesde grãos de soja de má qualidade, foramutilizadas amostras de soja contendo di-ferentes quantidades de grãos picadospor percevejos e danificados no proces-so de secagem, adicionadas à diferentesproporções de soja tipo semente, de altaqualidade, da cultivar Msoy-8411.

Dessas misturas, avaliou-se a porcen-tagem de grãos ardidos, realizada porseleção manual dos grãos e determinou-se a porcentagem de acidez do óleo.

Foram criadas 3 classes para a variá-vel grãos ardidos:

• Classe 1 - de 0 a 3,9 % de grãos ar-didos;

• Classe 2 - de 4,0 a 7,9 % de grãosardidos;

• Classe 3 - acima de 8,0 % de grãosardidos.

Observou-se que à medida em que aporcentagem de grãos de soja picados porpercevejos aumenta, a porcentagem degrãos ardidos também cresce, conformefigura 1. A correlação entre picadas depercevejo x grãos ardidos é de 0,92. Es-ses resultados podem variar de acordocom a cultivar, idade fenológica da plan-ta na qual ocorre o ataque de percevejose condições climáticas.

Existem cultivares de soja que mes-mo apresentando uma elevada porcen-tagem de grãos picados por percevejo, aporcentagem de grãos ardidos é baixa,por exemplo, EMGOPA-315 e Msoy-9001. Os resultados da relação entre por-centagem de grãos ardidos e acidez doóleo de soja evidenciaram que a acidezdo óleo aumenta, proporcionalmente,em função do incremento de grãos demá qualidade na amostra de sementes,figura 2.

Ensaios que possibilitam encontrarcultivares de soja que além de alta pro-dutividade apresentem baixa porcenta-gem de grãos ardidos, sobretudo baixaporcentagem de grãos verdes e alta tole-rância a percevejos, características degrande importância para a agroindústriade processamento de soja. Pois a utiliza-ção dessas cultivares é de fundamentalimportância para produção de óleo deexcelente qualidade, redução de custose aumento da competitividade da agro-indústria brasileira.

Nas figuras 3 e 4 encontram-se asavaliações feitas em porcentagem degrãos verdes, porcentagem de grãos pi-cados por percevejos e porcentagem degrãos ardidos em cultivares de soja dociclo de maturação precoce.

Nessa avaliação preliminar, visando

Relação entre grãos picados por percevejos (%) e grãosardidos (%), safra 1999/2000

Influência da qualidade de grãos de soja, na porcentagem degrãos ardidos e na acidez do óleo

Porcentagem de grãos verdes, porcentagem de grãos picadospor percevejos e porcentagem de grãos ardidos, em cultivaresde soja do ciclo de maturação precoce (A) e médio (B)

obter cultivares precoces com excelentequalidade de grãos, todas obtiveram su-cesso, figura 3A. Mas as cultivares Msoy-6101, FT-2000 e UFV-19 apresentaramuma tendência a produzir grãos verdes.Problema esse que pode ser solucionadocom o controle adequado de percevejos.Dentre todas a cultivares precoces, a cul-tivar Msoy-7901, apresentou a menorporcentagem de grãos picados por per-cevejo. Além disso, apresentam tambémalta produtividade (3107,6 kg/ha), maso aspecto que se deve levar em conside-ração nessa cultivar é a altura de plan-tas. Por ser de hábito determinado, cres-ce pouco em semeadura no mês de de-zembro. Entretanto, essa deficiênciapode ser contornada pelo aumento dapopulação de plantas e semeadura reali-zada em época mais adequada e em so-los de maior fertilidade.

Nas cultivares de ciclo médio, figura3B, destaca-se a cultivar Msoy-8001, porter tido baixa preferência pelos perceve-jos e por apresentar produtividade aci-ma de 3.000 kg/ha. A cultivar EMGO-PA-315 também se destacou, apesar deter tido alta preferência pelos perceve-jos, apresentou baixa porcentagem degrãos ardidos e, principalmente, baixaporcentagem de grãos verdes. As culti-vares Msoy-8400, Msoy-8411, Conquis-ta e Suprema apresentaram qualidade degrãos semelhantes. Mas essas cultivaresse destacam por apresentar maior pro-dutividade.

Ao analisar os resultados da qualida-de de grãos das cultivares do ciclo tar-dio, figura 4, observa-se que as cultiva-res que obtiveram maior produtividadee grãos de melhor qualidade, foram ascultivares Msoy-8757, Msoy-8800 eMsoy-9001.

Deve-se salientar que esses resulta-dos são preliminares. Mas que essas in-formações são inéditas e de grande im-portância para a continuidade de ensai-os visando à escolha de cultivares de sojacom boas qualidades agronômicas: ciclo,altura de plantas, peso de 100 sementes,produtividade e principalmente, baixapreferência por percevejos, baixa porcen-tagem de grãos verdes e grãos ardidos,proporcionando assim matéria-prima demelhor qualidade para a indústria.

CUSTO DE PRODUÇÃO DO ÓLEO• Custo de terra (argila) - A terra tem

com função básica eliminar alguns fato-res indesejáveis no óleo, tais como pig-mentos de clorofila e peróxidos e restau-rar a estabilidade de oxidação. Sem a eli-minação completa desses fatores, o óleonão será envasado em PET, perdendoimportante participação no mercado por

A

B

Fig. 01

Fig. 02

Fig. 03

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Março de 200120 Cultivar www.cultivar.inf.br

Porcentagem de grãos verdes, porcentagem de grãos picadospor percevejos e porcentagem de grãos ardidos em cultivaresde soja do ciclo de maturação tardio

Custo de terra para clarificação do óleo envasado em latas eem PET, considerando uma planta industrial com capacidadede produção de 50.000 t./ano

Custo de NaOH para neutralizar o óleo de soja produzidodurante 12 meses, considerando a acidez do óleo constante(0,2 %) e variável (0,2 % a 1,0 %). Produção mensal de10.000 t de óleo e o custo NaOH= R$ 0,29/kg

Tempo (h) a mais, necessário para substituir 48 % da produçãode óleo em latas para óleo PET (%), considerando a capacidadetotal de 250000 t de grãos esmagados, a capacidade deesmagamento de soja para produzir óleo envasado em lata de15,0 t/h e óleo em PET de 11,0 t/h

passar para uma faixa de classificaçãoinferior.

O custo de terra para clarificação doóleo de soja envasado em lata e em PET,está representado na figura 5. Observa-se que o custo anual para produção doóleo envasado em PET cresce à medidaque se substitui o tipo de embalagem delatas para PET. Esse incremento óbviono custo de produção ocorre em decor-rência da maior quantidade de argilanecessária para clarear o óleo envasadoem PET. Neste caso, se a soja processadafosse toda tipo “semente”, o custo doóleo PET seria aproximadamente igualao custo do óleo lata.

• Custo de hidróxido de sódio(NaOH) - O custo direto do NaOH paraneutralizar a acidez do óleo de soja é re-lativamente baixo. Se considerarmosuma agroindústria que adquira grãos desoja tipo “semente”, a acidez do óleobruto produzido, ao longo da safra, seriapraticamente constante 0,2%. Mas quan-do se consideram regiões onde os pro-dutores adotam baixa tecnologia, a qua-lidade de grãos é muito heterogênea e aacidez do óleo bruto pode variar ao lon-go da safra devido à má qualidade da sojarecebida, conforme a figura 6. Portanto,o custo de produção anual pode ser trêsvezes maior. A alteração na qualidade damatéria-prima, como já discutimos, émuito variável e depende do nível tec-nológico do produtor, das condições cli-máticas, da cultivar e das perspectivas depreços da soja.

• Perda na capacidade de produção -A capacidade de produção, ou seja, quan-tidade de soja que se processa em umdeterminado tempo (t./h), é uma quali-dade intrínseca do equipamento utiliza-do no processo de industrialização dasoja, desde a preparação dos grãos, daextração do óleo, até o refinamento eenvasamento.

A quantidade de soja que se proces-sa na linha de produção também depen-de do tipo de óleo que se está produzin-do. Ao se produzir óleo para ser envasa-do em PET a velocidade do processo émais lenta do que quando este é produ-zido para ser envasado o óleo em latas.

Considerando uma planta industrialque tenha capacidade para esmagar 15,0t. de grãos/h para óleo envasado em lata,esta mesma planta processa aproxima-damente 11,0 t de grãos/hora, quandoeste óleo é produzido para ser envasadoem PET, correspondendo a 36,0 % deredução na capacidade de produção. Osresultados da quantidade de horas ne-cessárias e o custo do tempo para substi-tuir, paulatinamente, 48% da produçãodo óleo tipo lata em óleo tipo PET, estão

representados na figura 7.A velocidade de processamento de-

pende, também, da qualidade de maté-ria-prima disponível para o processamen-to. Portanto, à medida que a qualidadedos grãos de soja diminui, a velocidadede processamento também é reduzida eo custo do “tempo” se eleva. Então, oaproveitamento máximo dos equipa-mentos só acontece quando se tem ma-téria-prima “tipo semente” na linha deprodução.

• Perda de óleo por arraste - Estudosmostram que as perdas de óleo devido àacidez atingem o dobro do índice de aci-dez. Isso significa que, para cada 0,1%de acidez, ocorre uma perda de óleo de0,2%. No presente trabalho foram consi-deradas perdas de 0,18% por arraste deóleo. Foram calculadas as perdas de óleoà medida que se aumentava a porcenta-gem de óleo de má qualidade. Verificou-se que com aumento da porcentagem deóleo de má qualidade na linha de refina-mento, a quantidade de arraste de óleonos solvente durante o refinamento doóleo de soja também aumenta. A perdadireta também depende da qualidade damatéria-prima e pode atingir até R$19.440,00/ano - figura 8. O valor podeser considerado irrisório, mas se develembrar que este é apenas um dos itensque compõem o custo de produção doóleo de soja.

• Perda devido a grãos verdes - Asperdas, em valores, que ocorrem devidoà presença de grãos verdes, são poucoconhecidas. Sabe-se que o óleo extraídode uma massa com alta porcentagem degrãos verdes terá em sua composição umalto índice de clorofila. E que o excessode clorofila no óleo promove o desenvol-vimento de oxidações indesejáveis. Aextração desse pigmento no óleo é reali-zada com argila. E quanto maior a quan-tidade de clorofila no óleo, maior a quan-tidade de argila necessária para a redu-ção do índice desse pigmento no óleo.Conseqüentemente, eleva o custo deprodução.

As análises cromatográficas do óleoextraídas de diferentes amostras de soja,contendo diferentes proporções de grãosardidos, figura 9, indicam que: à medidaque aumenta a porcentagem de grãosardidos na amostra, o índice de clorofilano óleo também aumenta. A variação dacor do óleo, em unidade vermelho, ana-lisado em cromatógrafo, com a variaçãode grãos ardidos, mostram que à medidaque se aumenta a proporção de grãosardidos na amostra, o valor da unidadevermelho aumenta, figura 10.

O menor índice de coloração do óleoem unidade vermelho é igual a 2. Óleo

Fig. 04

Fig. 05

Fig. 06

Fig. 07

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Março de 2001 Cultivar 21www.cultivar.inf.br

Marcos Augusto de FreitasJoão Luiz GilioliMarcos Antônio Borges de MeloMarciel Martins Borges

Perda de óleo (t.) por arraste durante o refinamento peloaumento da proporção de óleo de má qualidade. Considerandoa produção de 50.000 t. de óleo/ano

Índice de clorofila, com o aumento de grãos ardidos contidosna amostra de grãos (clorofila < 200 ppb teor baixo, clorofilapróximo de 500 ppb alto valor)

Variação da cor do óleo em unidade vermelho, de acordo como aumento da porcentagem de grãos ardidos

de soja com valor próximo a esse é con-siderado de boa qualidade. O óleo debaixa qualidade é considerado aqueleque apresenta um índice de unidade ver-melho de valores próximos ou iguais a10 unidades.

CONSIDERAÇÕES FINAISHouve correlação positiva entre pi-

cada de percevejos, grãos ardidos e aci-dez do óleo, isso mostra a importânciado controle de percevejos nas lavourasde soja. A redução dos danos por perce-vejo proporcionará melhor qualidade nosgrãos de soja recebidos pela indústria,que conseqüentemente produzirá óleo

de melhor qualidade com menor custo.Apesar da correlação positiva existen-

te entre picada de percevejos e grãos ar-didos foi possível identificar cultivares desoja que mesmo sob ataque de perceve-jos apresentaram baixa porcentagem degrãos ardidos e menor porcentagem degrãos verdes. Observou-se também umagrande variabilidade dessas característi-cas nas cultivares de soja utilizadas noensaio.

As informações obtidas com esse tra-balho servirão para direcionar os negóci-os de sementes de soja e direcionar asempresas de pesquisa obtentoras de cul-tivares no planejamento de estratégias demercado para seus cultivares. E tambémdirecionar o programa de melhoramen-to no sentido de obter cultivares queapresentem, além de alta produtividadee resistência à doenças, possua alto teorde proteína e óleo, alta tolerância a per-cevejos, baixa produção de grãos verdese boa qualidade de grãos.

Esses resultados também podem con-tribuir para que as industrias processa-doras desenvolvam programas de incen-tivos a produção de grãos. Programas quepermitam aos produtores a utilizaçãoadequada das novas tecnologias dispo-níveis na condução de suas lavouras desoja. Essa estratégia possibilitará aos pro-dutores uma melhor condição de com-petição, conseqüente-mente, melhoria na suacondição social e de suacomunidade. Assim a in-dústria receberá grãos demelhor qualidade, o cus-to de produção será redu-zido e esta cumpre suaresponsabilidade social.

Atualmente a de-manda por produtos demelhor qualidade e no-tória em todo mundo. Ea indústria tem consciên-cia que um excelenteproduto, com preço com-petitivo e um ótimo ser-viço é uma obrigação.

Sabemos que a qua-lidade da matéria-primaatualmente não é defini-da pela indústria, a in-dústria escolhe a maté-ria-prima e compra. Emuitas vezes adquirematéria-prima de péssi-ma qualidade. Estando amatéria-prima no arma-zém o custo de produçãoestá praticamente defini-do. Se esta for de má qua-lidade, a tendência é de

aumentar o custo de produção durantearmazenamento.

A definição de qualidade da matéria-prima é realizada pelo produtor, quan-do: esse adquire sementes de cultivaresde soja mais adaptada para a sua região;cultivares resistentes à doenças; efetuacontrole de plantas daninhas, de insetose doenças; efetua adubação de acordocom a recomendação técnica; colhe naépoca certa; ou seja, perfil do produtorde semente. É aquele que aceita e pos-sui uma ótima assistência técnica. Esseprodutor terá grande chance de ofereceruma matéria-prima de excelente quali-dade para a indústria.

A mão invisível, como diria AdamSmith, está transformando o conceito deboa cidadania corporativa e/ou de res-ponsabilidade social, numa questão es-tratégica e de sobrevivência das empre-sas, a longo prazo, no mundo dos negó-cios.

Analisando todos estes pontos acima,fica a questão: Por que a indústria de pro-cessamento não participa diretamentena definição da qualidade da matéria-prima? .

Fig. 08

Fig. 09

Fig. 10