Notários. tabeliães, escreventes e escrivães - uma longa história. Sérgio Jacomino - rev. 2013

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    Notrios, tabelies,

    escreventes e escrives(uma longa histria de confuses)

    Srgio Jacomino

    03/01/2006

    EMENTA: Pequeno estudo sobre a antiga figura do auxiliar do tabelio. Indicao de claras referncias na legislaomedieval portuguesa apontado para essa figura coadjuvante dos afazeres notariais.

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    Notrios, tabelies, escreventes e escrives.Uma longa histria de confuses!Srgio Jacomino*

    Sumrio

    Introduo. A penada da Princesa Isabel ............................................................................ 2Notrio, tabelio e escrivo ................................................................................................ 3Tabelliones e tabularii ........................................................................................................ 3Notarius .............................................................................................................................. 5O Escrevente e o tabelio ................................................................................................... 7As novelas justinianias ..................................................................................................... 9Constituio XLV - Dos tabelies e de que deixem os protocolos nos instrumentos ...... 12 Prefcio ........................................................................................................................ 12

    Captulo I...................................................................................................................... 12Captulo II.................................................................................................................... 13Eplogo ......................................................................................................................... 13

    CONST. XLV -DE TABELLIONIBUS ET UT PROTOCOLLA DIMITTANT IN

    CHARTIS (COLL. IV. tit. 7.) .......................................................................................... 14Praefatio ....................................................................................................................... 14Cap. I............................................................................................................................ 14Cap. II........................................................................................................................... 15Epilogus ........................................................................................................................ 15

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    Notrios, tabelies, escreventes e escrives.Uma longa histria de confuses!

    Introduo. A penada da Princesa Isabel

    Nosso amigo e colega TLLIO FORMCOLA quando Oficial-Maior do 24. Tabelionato de Notas daCapital de So Paulo escreveu um pequeno artigo sobre as vicissitudes do notariado brasileiro,texto que foi publicado na edio 110 do Boletim da Associao dos Serventurios de Justia doEstado de So Paulo (jul.1980-jun. 1981, p. 3 e seguintes, reproduzido no CD Thesaurus,editado pelo Irib Instituto de Registro Imobilirio do Brasil).

    Do texto recolhemos a seguinte passagem: Exceto as disposies contidas no Cdigo Civil

    Brasileiro que tratam de testamentos, e alguma outra disposio esparsa, repetidora dasOrdenaes, tivemos, em 1871, promulgada pela Princesa Isabel, a Lei n. 2.033 que em seuartigo 29, 8o permitia aos tabelies lavrar escrituras atravs de escreventes juramentados,escrituras essas que dependeriam de ser subscritas por ditos tabelies, sob sua inteiraresponsabilidade.

    Registra o Presidente do Colgio Notarial (seo So Paulo) que bem provvel que resida a aorigem da hipertrofia do tabelionato no Brasil, especialmente o das grandes cidades. Com efeito,com a necessidade de atender a uma demanda cada vez maior de servios, os tabelies viram-sena contingncia de admitir um nmero cada vez maior de escreventes juramentados, agigantandoos tabelionatos quando o desejvel seria a ampliao da carreira de Tabelio que deveria serestruturada com certas exigncias mnimas para nela ingressar-se. (id., ib.)

    Segue o notrio bandeirante apontando os desajustes e desequilbrios que a organizao doservio no Brasil experimenta: h tabelionatos no Brasil que funcionam com mais de uma centenade escreventes juramentados, permitindo que se indague: h condies de se cumprir o dispostona lei promulgada pela Princesa Isabel? No teria sido melhor ampliar o nmero de notrios nascidades, exigindo dos postulantes alguns pr-requisitos - tais como o titulo de bacharel em direito,certa especializao na matria e reputao ilibada? Nos pases de civilizao avanada, quepraticam o notariado latino, este fato (existncia de tabelionatos com grande nmero deescreventes, muitas vezes, semi-alfabetizados) encarado com incontida apreenso. E a razo meridiana. A subscrio do ato pelo tabelio no tem o condo de aperfeio-lo se foi malelaborado pelo escrevente juramentado. Nem mesmo de expungi-lo de eventuais nulidades, eisque o tabelio s tomar conhecimento de sua existncia aps feito pelo escrevente e assinadopelas partes; ou seja, quando j terminado. Quantas nulidades podero advir deste processoerrneo possibilitado pelo advento da Lei 2.033, de 1871? O ideal teria sido adotar, alm daampliao da carreira, a figura do notrio adstrito, de menor competncia, habilitado a certos atos,funcionando ao lado do notrio propriamente dito, corno os h em vrios pases avanados nestamatria.

    Alm das judiciosas consideraes expendidas pelo Presidente do Colgio Notarial do Brasil(seo de So Paulo), preciso reconhecer que a referncia que faz da legislao Isabelina essencialmente correta. No bojo de ampla reforma do processo judicial, a lei trouxe claras, emboraeconmicas, disposies sobre os auxiliares de tabelies. Vamos ao texto:

    http://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asphttp://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asphttp://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asphttp://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asphttp://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asphttp://www.irib.org.br/leis_imperio/lei20091871.asp
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    Artigo 29 (omissis) - 8 Os Tabellies de Notas podero fazer lavrar as escripturas porescreventes juramentados, subscrevendo-as elles e carregando com a inteiraresponsabilidade; e ser-lhes-ha permittido ter mais de um livro dellas como fr marcado emregulamento.

    Esse problema, to bem apanhado por Tllio Formcola, est na raiz de muitos desajustes que vmde ser superados, em parte, pelos concursos e pela renovao dos quadros notariais. Contudo,gostaria de assinalar que a legislao de 1871, citada como fonte dos problemas, recolhe umalarga tradio da atividade tabelioa reinol, trasladada para c e mantida, como se sabe, com umapureza que ainda denuncia seus signos medievais.

    Sem esgotar o assunto o que ultrapassaria as parcas capacidades deste registrador gostariade assinalar que a figura do auxiliar do tabelio muito mais antiga do que a leitura da legislaodo Brasil Imprio poderia sugerir. Vamos encontrar claras referncias na legislao medievalportuguesa apontado para essa figura coadjuvante dos afazeres notariais.

    Notrio, tabelio e escrivo

    No gostaria de seguir adiante sem antes fazer um pequeno parntese para aclarar algumasdvidas que ainda cercam as expresses notrio, tabelio e escriba.

    Durante muitos anos desde os glosadores! se vem confundindo a origem dos tabelies com ostabulrios. parte o ncleo do vocbulos, de que nos d pistas a etimologia, veremos que ostabulariidiferiam muito dos tabelliones. Vejamos com maior detalhe.

    FERNANDEZ CASADO, no seu alentado Tratado de Notara (Madrid: Imprenta de la Viuda de M.Minuesa de Los Rios, 1895, Tomo I, p. 56) registra que no territrio dominado pelo povo romanoexistiram diferentes funcionrios conhecidos com os nomes de notarii, scrib, tabeliones, tabularii,chartularii, actuarii, librarii, emanuenses, logographi, refrendarii, cancelarii, diastoleos, censuales,libelenses, numerarii, scriniarii, cornicularii, exceptores, epistolares, consiliarii, cognitorese outrosmais, os quais participaram mais ou menos do carter notarial.

    Obviamente, o elenco compreende uma srie muito grande de atividades que, a rigor, no

    poderiam ser consideradas antecessoras da figura que singulariza o profissional das notas. O fatode terem existido pessoas que tiveram uma atividade relacionada ou assemelhada quela que prpria do notrio no assevera que, na realidade, devamos t-los como antecessores, destacaEDUARDO BAUTISTA POND (Origen e historia Del notariado. Buenos Aires: De Palma, 1967, p. 30).

    J GIMENEZ-ARNAU identifica na rica diversidade de nomenclatura uma prova de que a funonotarial estaria dispersa e atribuda a uma variedade de oficiais pblicos e privados sem queoriginariamente se renam todas as atribuies a uma s pessoa. (G IMENEZ-ARNAU, Enrique.Derecho notarial. 2 ed. Pamplona: Uniersidad de Navarra, S.A. 1976, p. 93).

    Tabelliones e tabularii

    Registra JOS BONO (Historia del derecho notarial espaol. La edad media. Madri: Junta deDecanos de los Colgios Notariales de Espaa. 1979, p. 46) que em Roma, desde a pocaimperial (sculo III) se desenvolve um tipo de escriba profissional dedicado escriturao dosnegcios jurdicos dos particulares. Eram profissionais da escrita que se incumbiam da lavratura deinstrumentos contratuais, bem assim de testamentos e declaraes testificais para os tribunais.Importante destacar que no tinham a considerao de funcionrios pblicos e, por conseguinte,no gozavam do ius actorum conficiendorum, nem podiam imprimir aos atos a fides publica.

    Um pequeno parntese para a questo da f pblica que ao contrrio do que se imagina no eraa marca distintiva dos tabelies na origem. Segundo o mesmo BONO, a fides publica, em matria

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    de direito privado, estava reservada, no Ocidente, s autoridades que possuam o ius actorumconficiendorum(faculdade de formar e autorizar expedientes e autos acta, gesta). Atuavam nosprocedimentos que ante essas autoridades tinham lugar e cujo contedo, manifestado nas cpiasautnticas que emitiam, tinham f pblica. Estes publica monumentatinham valor probatrio nos em relao s ditas autoridades, mas igualmente ante qualquer organismo do Estado,especialmente ante os tribunais, ainda que,naturalmente, se pudesse produzir prova em contrrioem relao ao seu contedo (op. cit. p. 52).

    Alguns extratos que servem de fundamento para a afirmao se acham no CodexJustiniano, oprimeiro em7.52.0. De re iudicata: (BONO)

    Gesta, quae sunt translata in publica monumenta, haberevolumus perpetuam firmitatem. Neque enim mortecognitoris perire debet publica fides(C. 7.52.6).

    Queremos que tenham fora perptua os atos que foramtranscritos em documentos pblicos. Porque no devemorrer a f pblica com a morte do julgador.

    O outro em8.53.0. De donationibus:

    In donationibus, quae actis insinuantur, non essenecessarium iudicamus vicinos vel alios testes adhibere:nam superfluum est privatum testimonium, cum publicamonumenta sufficiant. Verum et alias donationes, quasgestis non est necessarium adlegari, si forte per tabellionem

    vel alium scribantur, et sine testium subnotatione valerepraecipimus, ita tamen, si ipse donator vel alius voluntateeius secundum solitam observationem subscripserit:donationibus, quae sine scriptis conficiuntur, suamfirmitatem habentibus secundum constitutionem Theodosiiet Valentiniani ad Hierium praefectum praetoriopromulgatam.(C. 8.53.31).

    Nas doaes que se insinuam em autuaes, julgamos queno necessrio apresentar vizinhos ou outrastestemunhas; porque suprfluo o testemunho privadoquando sejam suficientes os documentos pblicos. Pormmandamos que sejam vlidas, mesmo sem a assinatura de

    testemunhas, tambm as doaes em que no necessrio sujeitar s autuaes, se nesse caso foramescritas por tabelio ou por outro, com o que, sem dvida, omesmo doador, ou outro por vontade dele, as tivessefirmado na forma costumeira; tendo seu vigor conforme aConstituio de Teodsio e de Valentiniano, dirigida aHierio, prefeito do pretrio, as doaes que se fazem semescrituras.

    A confuso entre tabelies e tabulrios (tabelliones e tabularii), segundo LVARO DORS,corresponde tendncia de equiparar o documento privado notarial ao documento pblico. A fidespublica era propriamente a dos funcionrios com ius actorum conficiendorum que levavam osregistros (acta, gesta, em grego hypomnemata) em que tais documentos se insinuavam. Ante elesse fazem os instrumenta publicaem sentido estrito. (DORS.lvaro.Documentos y notarios en el

    derecho romano post-clasico. InCentenrio de la Ley Del Notariado, secc. 1, estdios histricos,Vol. I, Madri: Junta de Decanos de los COLGIOS Notariales de Espaa, 1964, p. 89).

    No sendo o objetivo desde opsculo descer a detalhes da confeco, extenso e particularidadesda documentao notarial no Imprio Romano, sigamos com a indicao dos rasgos mais geraisda atividade dos tabelliones.

    A atividade do tabellioera jurdica, j que participava do corpo de juristas ps-clssicos. Assumia acondio de assessor em direito.

    J a atividade do tabularius, diversamente, se enfeixava entre as atribuies de um funcionrio.Freqentemente, um escravo pblico, que exerce funes notariais, sim, mas como suplentedos magistrados para documentos pblicos de menor importncia; tambm intervinham como

    testemunhas (DOrs, op. cit. p. 87-88).O tabularius, segundo POND, era o oficial encarregado de fazer as listas de impostos entre osromanos. Tinha o carter de person public isto , condio de funcionrio pblico. Era ofuncionrio que recebia as declaraes de nascimento e registrava as circunstncias relacionadascom o estado civil das pessoas; fazia inventrios da propriedade pblica e privada, contabilidade emantinha sob sua guarda arquivos relacionados com as suas atividades. Destacamos, ento, nostabularii, estes aspectos unidos atividade notarial: redator e guardador de documentos privados,mas com a ressalva de que tambm os redigia e guardava quando eram de carter oficial e que,

    http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#53#53http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ7.htm#52#52
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    neste sentido, desempenhava uma funo como partcipe e integrante da administrao doEstado. (op. cit. p.34).

    Outra atividade muito importante desempenhada pelos tabularii era o censo. No princpio ostabularii desempenharam funes oficiais de censo e seguramente pelo hbito na custdia dedocumentos oficiais (entre os quais o censo era um dos mais importantes) se generalizaria aprtica de que se lhes fossem entregues, em custdia, os testamentos, contratos e atos jurdicosque os interessados estimavam devessem estar guardados com a prudncia devida para que, asem tempo, produzissem efeitos. (GIMENEZ-ARNAU, E. op. cit.p. 94).

    J o scriba tinha sob sua responsabilidade o encargo de anotar em tbuas as atas pblicas,exercendo um cargo parecido com o do escrivo, com f pblica.

    Portanto, tanto o scriba, como os notariie tabulariiostentavam a condio especial de funcionriosque estavam de certo modo integrados no aparelho estatal e esta uma distino substancialaser destacada, pois a essncia notarial reside justamente na especial tutela de interessesparticulares.

    Sobre o antecessor do atual notrio, deixemos POND concluir: A especial condio de atuar nosnegcios privados, de exercitar uma interveno claramente particular, completada por sua aptidoredatora; o conhecimento do direito que lhes permitia atuar maneira de um assessor jurdico e apossibilidade de procurasse a eficaz conservao dos documentos, fazem que seja o tabelioquem, com mais legtimos direitos, se possa considerar um autntico antecessor do notariado dotipo latino. (Op. citp. 35).

    Rolandino de Passaggeri in cattedra (1482).

    Notarius

    O notariusera uma espcie de taqugrafo; o que escreve por abreviaturas, esclarece o SARAIVA(SARAIVA. Francisco Rodrigues dos Santos. Novssimo diccionrio latino-portuguez, Rio de Janeiro:

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    Garnier, 8 ed. 1924). o estengrafo ou taqugrafo. D-nos a sinonmia: escrivo, amanuense,escrevente, copista. segundo CASADO, algum que escrevia por siglas ou iniciais, e com talvelocidade que dele disse Sneca: celeritatem lingu manus sequitur. Era o que hojechamaramos escrevente, copista ou amanuense ordinariamente um servo e os romanos ostinham entre seus domsticos.

    A palavra notrioprovm seguramente de nota. Mas a etimologia de notano segura. Uma vezmais DORS nos d pistas: nota tem como mais genuna acepo a de mancha na pele, isto ,sinal, seja natural, seja artificial, por marca ou tatuagem, que serve para distinguir uma pessoa, umanimal, um objeto qualquer. Numa acepo secundria, nota o sinal de indignidade pessoal, ainfamante nota censoria, ou simplesmente o signo grfico, literrio ou musical. E continua: Emespecial, nota a abreviatura estenogrfica, e notariiso os taqugrafos que redigem as atas dedeterminados trmites por exemplo, as atas dos magistrados. Mas tambm podem ser privados.Estes notarii, muito freqentemente escravos, no so o que hoje entendemos por notrios. Op.cit. p. 80).

    Em 472, conforme DORS, a palavra notariis se estende aos tabelies, mas distinguindo-os dostabulariiou condicionales. Gostaria de disponibilizar o texto original que se acha no Codex,8.17.11(numa traduo muito livre, baseada em GARCA DEL CORRAL):

    Scripturas,quae saepe adsolent a quibusdam secrete fieri, intervenientibus amicis nec ne, transigendi velpaciscendi seu fenerandi vel societatis coeundae gratia seu de aliis quibuscumque causis vel contractibusconficiuntur, quae idiochira graece appellantur, sive tota series eorum manu contrahentium vel notarii aut alteriuscuiuslibet scripta fuerit, ipsorum tamen habeant subscriptiones, sive testibus adhibitis sive non, l icet condicionalessint, quos vulgo tabularios appellant, sive non, quasi publice scriptas, si personalis actio exerceatur, suum roburhabere decernimus. Sin autem ius pignoris vel hypothecae ex huiusmodi instrumentis vindicare quis sibicontenderit, eum qui instrumentis publice confectis nititur praeponi, etiamsi posterior dies his contineatur, nisi forteprobatae atque integrae opinionis trium vel amplius virorum subscriptiones isdem idiochiris contineantur: tunc enimquasi publice confecta accipiuntur.

    Na idade mdia, j perdida a distino entre tabelies e tabulrios, a palavra notarii(ou escrib)servir para designar todo aquele que se dedicava a redigir documentos jurdicos ouadministrativos. Esta confuso se fazia em prejuzo da dignidade dos notrios, que no eramescravos, mas livres registra DORS.

    Finalizo esse parntese com uma nota pitoresca. No sculo XIII, nos pases de influncia do direitoromano, os termos notrio e tabelio eram considerados sinnimos, de acordo com P AULFOURNIER, citado por GAMA BARROS (op.cit. p. 363, nota 2). A divulgao do Direito de Justiniano napennsula favoreceu a circulao e difuso de ambos os termos, mas em Portugal,especificamente, o de tabelio radicou-se de tal modo que acabou por singularizar a prpriaatividade, quedando o de notrio reservado quase exclusivamente aos notrios apostlicos.

    E como essa denominao era anelada pelos nossos antecessores!

    Vamos dar voz a um deles, no pleito dirigido nas Cortes de Lisboa de 1439:

    Senhor: geralmente, em todos os reinos e senhorios os escrives das notas chamam-se notarios,salvo nos vossos reinos que lhes chamam tabellies, nome no conveniente ao poder e f quelhes por vs dada, e segundo se mostra por urna carta del-rei D. Joo, vosso av, que proveuisto e mandou que para fra dos vossos reinos que se chamassem notayros. Pedem-vos, senhor,os ditos tabellies por merc, porque nome fremosoe apropriado a seus officios que so denotas, e ainda por todos os ditos senhorios fazem festa com tal nome porque no convem a talofficio, porm, senhor, os ditos tabellies de notas vos pedem merc que mandeis que daqui emdeante geralmente, em todas as escripturas que fizerem, se chamem notayros.

    Resposta do rei:

    http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#17http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#17http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#17http://web.upmf-grenoble.fr/Haiti/Cours/Ak/CJ8.htm#17
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    Mandamos que se guarde a carta de meu av; que quando fizerem escripturas para frase chamem notayros; e de outra guisa, no. (Chancelaria de D. Afonso V, livro XX, f. 151,transcrito por GAMA BARROS, op. cit. p. 365).

    Enfim, essas confuses, pontos de conexo, inverses, enfim, toda a srie fluida de significados

    que vamos encontrar ao longo do tempo, procurando fixar os contornos de uma funo queconsistia basicamente na arte da escrita, demonstra que alm de tradicional, a atividade detabelio ou notrio permeia todo curso da histria do direito e expresso de uma verdadeiranecessidade social.

    O Escrevente e o tabelio

    Por ocasio do transcurso dos trabalhos do XXVIII Encontro dos Oficiais de Registro de Imveis doIrib, realizado em Foz do Iguau em 2001, tivemos a oportunidade de fazer uma breve referncia existncia de escreventes secundando e auxiliando o tabelio nas suas atividades prprias (o textofigura na exposio denominada Publicidade imobiliria na antiguidade oriental, Boletim do Irib,edio especial de 20/9/2001).

    A ligeira referncia que naquela oportunidade se fez ao tema procurou pr em relevo os traosntidos que nos ligam a uma larga tradio do notariado portugus, reminiscncias que assimexplicitadas denotavam o veio profundo da instituio notarial e a necessidade de recolher atradio e seguir adiante, aprofundando o sentido original do notariado do tipo latino eaperfeioando-o no que fosse cabvel. Afinal, a instituio continua a se desenvolver em todo omundo e ns, notrios brasileiros, deveramos estar plenamente conscientes desse movimento.

    Vamos aos clssicos! diria meu mestre R. DIP. Muito bem, tenho um livro fundamental paraconhecer a histria do tabeliado portugus medieval: Histria da Administrao Pblica emPortugal nos sculos XII a XV, numa 2 edio dirigida por TORQUATO DE SOUSA SOARES (Lisboa:Livraria S da Costa editora, 1945). Tenho-o agora frente, numa edio bem-cuidada, comglosas e uma dedicatria tocante do diretor TORQUATO S.SOARES ao mestre de meu mestre, JOSPEDRO GALVO DE SOUSA.

    Henrique da Gama Barros(leo sobre tela. Eduardo Malta)

    Gama Barros registra que depois dos regulamentos de 1305 e de1340, o primeiro diploma em que aparecem reunidos vriospreceitos relativos ao tabeliado portugus a famosa Lei de D.Fernando, publicada (com outras) em Lisboa a 12 de setembrode 1379.

    nessa legislao que encontramos algumas disposies sobreos escreventes e auxiliares do tabelio. Dita lei acabarfigurando, com alteraes, nas Ordenaes Afonsinas (Livro III,ttulo 64).

    As leis desse perodo acomodam e atendem s reclamaes equeixas apresentadas contra os tabelies em cortes (das quais

    se podem citar a de Santarm, de 1331, e no articulado dosregulamentos de 1305, por mim publicados alhures).

    Pois bem, para que se evitem delongas e tardana na lavratura das escrituras notariais ( femtardama, diz o diploma), autoriza a lei que aos tabelies (tambm chamados de escrives-jurados) seja facultado ter escreventes (escrives tambm lhes chama a lei) que quiserem,escolhidos livremente por eles (quaees elles quiferem efcolher).

    Vejamos a antiga disposio vem recolhida pelas Ordenaes Afonsinas (III, 64, 22):

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    E pera outro-fy os Tabaliaes , ou Escripvaes , que fam jurados honde os Tabaliaesnam efcrepverem, ou Efcripvam jurado dado ao Tabaliam pera efcrepver fuas Efcripturas ,poderem fazer as Efcripturas , e dallas s partes afinha , e fem tardama , queremos , eoutorgamos , que effes Tabaliaes aja Efcripvaes , quaees elles quiferem efcolher , quefejam jurados , e dados per noffas Cartas , quaees entenderem , que lhes compre , efezerem mefter , pera notar , e efcrepver , e fazer os ditos Eftromentos , e Efcripturas dosditos comtratos , avenas , e fermidoes, que as partes amtre fy fizerem , e lhes mandaremfazer.

    Adverte-nos o mesmo Gama Barros que no representava qualquer novidade o fato de ostabelies terem ajudantes. Cita, em abono de sua afirmao, alguns exemplos de 1325, extradosdas notas dos tabelies de Lisboa e Braga:

    A traduo do foral de Cezimbra, que a Cmara incumbira a um tabelio de Lisboa, foiescrita em 1325 por F., escrivo jurado por mandado do tabelio que a subscreve; o queno mesmo ano igualmente se observa na carta das sentenas, que a seu favor obtivera oconcelho acerca da iseno da portagem (Livro do Tombo da vila, fol. 2 a 5).

    Cita ainda uma escritura tabelioa, (uma permuta), lavrada em Braga a 5 de maio de 1325, queconclui assim: E eu Joham Domingues tabaliom sobredito a estas cousas rogado presente fuy epor que era empeado per outros negcios este strumento de escambho segundo como per Dantemim passou em minha presena screver fize em el a rogo do dito priol so screui e meu signal pugjem testemonho de uerdade.

    O famoso tabelio de Lisboa, Domingos Martins, recebe de D. Afonso IV, a pedido do arcebispo deBraga, pela carta dirigida por el-rei ao Concelho de Lisboa, um escrivo, com poderes para notarperante o dito Domingos Martins e subscrever todos os instrumentos que houver de fazer o ditotabelio. Domingos Martins deveria apor em todos os instrumentos o seu sinal pblico. Seguereferindo dita carta real o mesmo GAMA BARROS: o escrivo tinha jurado ao rei fazer bem eretamente as cartas e escrituras; lanar nos registros do tabelio os instrumentos de que este devedar testemunho de verdade; guardar os artigos e salrios que el-rei mandava aos tabelies que

    guardassem, dos quais artigos recebeu na chancelaria um exemplar; finalmente, no cobrarsalrios das escrituras antes de as entregar s partes, depois de feitas e acabadas.Conclui odiploma proibindo, sob pena corporal e nulidade do documento, que mais algum lavre quaisquerinstrumentos em nome de Domingos Martins.

    O original figura na coleo diplomtica da Chancelaria de D. Afonso IV (livro IV, fol. 34,reproduzido in Chancelarias portuguesas D. Afonso IV, 1 ed. Lisboa: Instituto Nacional deInvestigao Cientfica Centro de Estudos Histricos da Universidade Nova de Lisboa, 1992, p.245) e merece ser aqui reproduzida para conhecimento de todos os interessados na matria.

    Era M CCC Lxxvii

    DOm Affonsopela graa de deusRey de Portugaledo Algarue A uos Conelho de Lixba

    saude.Sabede queeu querendo fazergraa emeree A domjngos martinz Tabaliomdessa vila ARogo do Arcebispo de Bragaa. dou lhy por scriuam Affonso dominguez. portador destacarta queNote por dant. el escreua depois todalas screturas queesse TabaliomouuerdeffazerE o dicto Tabaliomdeue per seu sinal enessas scrituras queesse scriuamfezer.

    O qual scriuam a mjm Jurou aos sanctos Auangelhos que bem e dereitamente faa ascartas escrituras quefezer equeponha ensseusRegistros do dicto Tabaliomaquelas dequedepoys esse Tabaliomdeue dar testemuynho de uerdade . E queguarde quanto en

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    ele he os Arrtigos e taussaom que eu mando aguardar aos Tabalies dos meusReynos os quaes logo leuou da mha Chancelaria E que nom filhe dinheiros de nenhascritura quefaa ataa quea de fecta eacabada a aquel quea ouuerd auer.

    Poremmando edeffendo quenomseia nenhu ousado enessa vila eenseus termhosque faa carta de venda nemde compra nemd escanbho nemd emprazamento nemdedoaom nem de procuraom nem d apelaom de clerigos. nem de Meyadade nem dalfforria nem stormento de nenha ffirmide senom o dicto scriuam en nome do dictoTabaliomeAqueles qued i sson tabalies ca aquel queendeAl fezerfarey Justia de sseucorpo como for mha meree E as cartas escreturas quefezernomvaleramnada.

    En testemuynho desto dey ao dicto Tabaliomesta mha carta

    Dante en Sanctaren treze dias de Janeiro El Rey o mandou per Pero. do ssem seuChanelor Affonsoannes a ffez Era M.CCC. Lxxvij. AnosPetrusde ssenssu

    Como se v, os ajudantes dos tabelies eram bem conhecidos por essa poca; suas atividadesestavam bem definidas, cabendo ao chanceler-mor passar carta dessas mercs. o que se v das

    Ordenaes Afonsinas (I, 2, especialmente 6):

    4 O Chanceller dar eftes defembargos , e Cartas, que fe feguem : primeiramente asCartas das aprefentaooes das Igrejas a aquelles , que per Ns a ellas foremaprefentados. 5 Item. As Cartas dos Taballiaes affi geeraaes , como efpeciaaes dasCidades , e Villas notavees , a faber , Santarem , Beja , Elvas , Tavilla , Leireea ,Guimaraas , que ouverem primeiramente Noffa dada , que das outras Villas , e terrasChas poder o Chanceller dar por fi. 6 Item. As dos Efcripvaes , que fom dados aosTaballiaes per mercee que Ns queremos fazer.

    Mas os abusos ocorriam. Dando-se como certo o que disseram as Cortes de Guimares (1401), ostabelies mandavam escrever os processos a seus moos e outras pessoas privadas, que notinham o poder de dar f quilo que lavravam e redigiam. Parece certo, fiados nas concluses do

    mesmo Gama Barros, que a ordenao de D. Joo, impondo que os magistrados tal fato noconsentissem, que a queixa se dirigia aos chamados tabelies do judicial, com atribuiesdistintas, como se sabe, daqueles do pao.

    H relatos de indicao de substitutos para o lugar do tabelio em caso de ausncia ou molstia.Nesses casos, cumpria ao substituto cumprir os artigos e salrios que a lei estabelecia aostabelies.

    Como se v, no mbito do direito portugus, a ocorrncia de escreventes no foi um fatodesconhecido. E pelo que se percebe das queixas registradas nas cortes, tal fato trazia, guardadasas devidas propores, os mesmos problemas apontadas por Tullio Formcola. No inovou,portanto, o advento da Lei 2033, de 20 de setembro de 1871, da Princesa Isabel, a faculdade deindicar substitutos dos tabelies.

    As novelas justinianias

    Mas curioso que podemos encontrar o mesmo problema relatado com expressivas mincias nosfundamentos do notariado as Novelas de Justiniano, que teremos ocasio de visitar.

    Foi sob o reinado de Justiniano I (527-565) que se elaborou a imortal obra do corpus iuris civilis.Integra essa compilao do direito romano clssico o Codex compilao e seleo dasconstituies imperiais que figuravam nos cdigos Gregoriano, Hermogeniano e Teodosiano; oDigesto (ou Pandectas) seleo de textos da jurisprudncia clssica; as Institutas (ou

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    Instituciones) resumo elementar para uso de estudantes. Foram ainda publicadas, e integram ocorpo, as constituies imperiais baixadas por Justiniano, chamadas Novelas ou Novellae leges.

    precisamente nesta ltima parte que encontramos registradas as instituies romanas queregulam a atividade dos tabelies. E justamente aqui que vamos encontrar, na gema primeva daregulao tabelioa do tipo latino, o germe dos problemas que FORMCOLA identificar muito maistarde.

    O prefcio da Nov. XLIV trata de um caso curioso de uma mulher analfabeta que alegava que oinstrumento, lavrado em etapas sucessivas, no era a expresso de sua vontade. Isto , odocumento notarial no representava o que havia sido disposto por ela. O juiz encarregado desolver o conflito procurava descerrar a verdade pelo testemunho do notrio, que foi convocadopara dar testemunho em juzo.

    Mas o tabelio reconhecia somente em parte o documento. Em relao a outras passagenssignificativas, simplesmente alegava ignorncia, posto que havia encarregado a lavratura a umdos seus. Finalmente, declarou que no concorreu para a concluso do documento, tendoencarregado tal mister a outro. Chamado a juzo o que esteve presente concluso do documento,declarou que tampouco ele sabia de coisa alguma posto que no havia sido o escreventeencarregado da feitura do instrumento.

    Finalmente o texto registra que se no encontrou aquele a quem, desde o princpio, foraencomendado a lavratura do documento. Adverte-nos o redator: se acaso o juiz no tivesse podidoesclarecer o caso por meio de testemunhas, corria-se o risco de se perder completamente oconhecimento do negcio.

    Essa foi a situao que ensejou a edio da Constituio XLV (ou Novela XLIV). Manda que ostabelies intervenham pessoalmente nos contratos, sem encomendar o assunto a seusamanuenses ou escreventes.

    Gostaria de apontar, como nota final, que na cidade de Constantinopla, como o Imperador mesmoassegura, se realizavam tantos negcios e se lavravam tantas escrituras (ubi plurima quidemcontrahentium multitudo, multa quoque chartarum abundantia est) que seria bastante lgico que

    nos locais (stationes) onde se achavam os tabelies acorresse uma multido de clientes. A fim dedar cabo dessas demandas, tambm bastante compreensvel que pudessem ter sob suaresponsabilidade escreventes encarregados de redigir os instrumentos, sujeitando-se, contudo como de fato ocorreu e nos d notcia a constituio justiniania , aos perigos da delegao donobile officiuma quem no pudesse exerc-lo efetivamente.

    Para encerrar este pequeno opsculo e para dar arrimo s teses aqui ventiladas, publico abaixo otexto integral da Constituio XLV (Novela XLIV) De tabellionibus et ut protocolla dimittant inchartis em traduo de D. Ildefonso L. Garca Del Corral, Francisco Tost e outro. Vamos sfontes!

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    Manuscriptum Florentinum (sec. VI, dig. 1.3.36 - 1.5.4)

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    Constituio XLV - Dos tabelies e de que deixem os protocolos nos instrumentos

    O Imperador Justiniano, Augusto, a Joo, segunda vez Prefeito do Pretrio, Ex-cnsul e Patrcio.

    Prefcio

    Tivemos h pouco conhecimento de um litgio que d ocasio presente lei. Por parte da pessoade certa mulher foi apresentado um documento que certamente no tinha sua letra (porque nosabia escrever), mas que havia sido feito por um tabelio e por um escrevente ( tabellione ettabulario), tendo a assinatura dela indicando a presena de testemunhas. Depois, havendo-sesuscitado alguma dvida sobre o documento, por declarar a mulher que no havia sido dispostopor ela o que dizia o documento, o que ouvia o litgio tratava de conhecer, por meio do tabelio, averdade do negcio, e por fim chamou o tabelio. Porm, este ltimo disse que reconhecia a letrado complemento do tabelio, mas no conhecia coisa alguma das que se seguiam; porque no lhehavia sido encarregado absolutamente a ele, desde o princpio, mas que encarregou a um dosseus que fizesse o servio, e depois no acudiu para a concluso, seno que, por sua vez,encomendou a tarefa a outrem. E compareceu certamente o que estava presente concluso, o

    qual disse que tampouco ele no sabia de nada (porque ele no fora o escrevente do documento),e somente manifestou este que terminou estando presente. E no foi encontrado aquele a quemdesde o princpio lhe fora encomendado, pelo que, se o juiz no houvesse podido conhecer o casopor meio de testemunhas, correria certamente o perigo de se perder por completo o conhecimentodo negcio. E isto mereceu, verdade, seu competente exame e este decreto.

    Captulo I

    Pois ns cremos ser conveniente auxiliar a todos, e fazer uma lei comum para todos os casos, afim de que aos mesmos que esto frente do trabalho dos tabelies, se lhes imponha de todos osmodos que formalizem por si o documento, e que estejam presentes at o seu trmino, e no seconclua o documento de outra sorte, seno se tiverem sido feitas estas coisas, a fim de quetenham meios para conhecer o negcio, e quando interrogados por juizes possam saber o que

    aconteceu, e responder, principalmente quando no sabem de letras [anafalfabetos] os queencarreguem tais coisas, em quem fcil e incontestvel a negociao do que verdadeiramente foifeito.

    1 Para proibir, pois, todas estas coisas, lavramos a presente lei, e queremos que de todo modosejam mantidas estas disposies pelos tabelies, ora estejam nesta venturosa cidade, ora nasprovncias; entendendo-se que se contra estas determinaes tiverem feito alguma coisa,perdero, em absoluto, as praas, e aquele que por eles designado para lavrar o documento enele intervier ser o dono da praa com prpria autoridade, e ser alterada a condio; e elecertamente obter sucessivamente na praa o mesmo cargo que aquele que nela tinha a primazia,saindo dela, ou ser um dos que quele sirvam. Porque havendo certamente desdenhado ele defazer o que a ele se lhe havia concedido, e havendo-o feito o outro por vontade dele, lhe impomospor isso esta pena, a fim de que com respeito aos documentos se faam eles mesmos excelentes,e justos, e mais precavidos, e no perturbem os interesses alheios por seu prprio descanso edeleite.

    2 Mas se por acaso for indigno de receber autoridade na praa aquele a quem contra o que porns tiver sido disposto na presente lei lhe encomendado um documento, perca-se a autoridadecertamente de todo modo por esta causa o tabelio, e seja constitudo outro em seu lugar; semque, em nada, absolutamente haja de ser prejudicado o dono da praa, se houvesse sido umqualquer dos estranhos, e no o mesmo tabelio, e sem que haja de perder os ganhos daquiprovenientes, seno perdendo a primazia somente o que perpetrou tais coisas e desdenhou de

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    cumprir sua misso, devendo se lhes conservar certamente ntegro todo o demais com respeito aodireito da praa aos donos dela pelos mesmos tabelies que em tais coisas pecaram.

    3 - E no finjam os tabelies ocasies para se irem, acaso por doena, ou por ocupaes de talnatureza; porque se tal acontecer, ser-lhes- lcito chamar aos que contratam, e desempenhar porsi mesmos sua misso; porque as coisas que acontecem raramente no causaro impedimento

    generalidade, pois nada h entre os homens que esteja to fora de dvida, que no possa, aindaque alguma coisa seja justssima, ser, sem embargo, objeto de alguma escrupulosa dvida; mastampouco sero faro por isso menores seus lucros, que tm lugar em virtude da freqncia doscontratantes, porque melhor fazer poucas coisas com segurana, que intervir em muitas comperigo.

    4 Mas para que no parea que esta lei seja sumamente dura para eles, ns, atendendo natureza humana, estabelecemos leis nossas moderadas tambm para os mesmos. Pois lhesdamos licena, a cada um deles, para que, com motivo acaso de tais dvidas sujas, nomeiemalgum para isso, havendo-se feito solenemente atuaes ante o mui esclarecido mestre do censodesta venturosa cidade, e lhes dem permisso para que a ele lhe sejam encomendados osdocumentos pelos que vo praa do mesmo, e para estar presente ao serem finalizados, e semque absolutamente qualquer outro que exista naquela praa tenha licena para que lhe seja

    encomendado o comeo, ou para que esteja presente quando se acabem, a no ser que o tabelioque tenha a autoridade, ou o que por ele tenha sido constitudo para isso. Mas se contra isso sefizer alguma coisa, e fosse outro delegado, ento ficar sujeito pena o tabelio, que tem aautoridade por ns antes definida, sem que, entretanto, tenham de ser invalidados os documentospor razo de convenincia dos contratantes. Porque sabemos que por medo lei guardarotambm eles no sucessivo o que por ns foi decretado, e faro com cautela os documentos.

    Captulo II

    Tambm acrescentamos presente lei, que os notrios no escrevam os documentos em papelem branco, mas naquele que a princpio tenha, (o que se chama protocolo), o nome do que oportunidade seja gloriosssimo conde de nossas sacras liberalidades, a data na qual se fez odocumento, e o que em tais folhas se escreve, e que no cortem o protocolo, mas que o deixem

    unido. Porque soubemos que em tais documentos foram provadas antes e agora muitasfalsidades, e por tanto, ainda que haja alguma folha de papel, (porque tambm soubemos disso),que no tenha o protocolo escrito deste modo, mas que leve outra escritura qualquer, no aadmitam, como adulterada e no apta para tais coisas, mas escrevam os documentos somente emfolha de papel tal, como antes dissemos. Assim, pois, queremos que o que por ns foi decretadosobre a qualidade de tais folhas de papel, e sobre a separao do que se chama protocolo, estejaem vigor somente nesta venturosa cidade, onde certamente grande a multido de contratantes, eexiste muita abundncia de folhas de papel. E seja lcito intervir de modo legal nos negcios e nodar-lhes a alguns a ocasio para cometer falsidade, da qual demonstraro que so responsveisos que contra isso tiverem se atrevido a fazer alguma coisa.

    Eplogo

    Portanto, apresse-se sua excelsitude a levar execuo e efeito o que nos parece bom, e foideclarado por meio desta santa lei.

    Dada em Constantinopla a 15 das calendas de setembro, no segundo ano aps o consulado deBELISRIO, homem mui esclarecido [537].

    Texto original em latim

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    CONST. XLV -DE TABELLIONIBUS ET UT PROTOCOLLA DIMITTANT IN CHARTIS(COLL. IV. tit. 7.)

    Imp. IUSTINIANUS Aug. IOANNI, Praefecto praetorio iterum, Exconsuli et Patricio.

    Imperador Justiniano (482-565).

    Praefatio

    Litem paulo ante audivimus praesenti legi praebentemoccasionem. Ex persona quidem mulieris cuiusdamferebatur documentum, litteras quidem eius non habens (eratenim harum ignara), completum autem a tabellione ettabulario, subscriptionem habens eius, et testium ostendenspraesentiam. Deinde dum quaedam dubitatio super eo fieret,muliere dicente, non esse a se delegata, quae chartaloquebatur, qui litem audiebat quaerebat a tabellionecognoscere negotii veritatem, denique tabellionem deduxit.At ille litteras recognoscere dixit completionis tabellionis, nontamen nosse aliquid horum, quae secuta sunt; nec enim sibiab initio penitus delegata, sed commisisse cuidam suorum

    hoc facere, neque postea venisse ad completionem, sedrursus ahi hoc commisisse. Et is quidem, qui adfuitcompletioni, venit, nihil nec ipse dicens se nosse (etenimneque scriptor fuit documenti), sed solum docuit, quiapraesente se hoc dimissum sit. Nec cui ab initio delegatumest inventus est, unde, nisi per testes iudex valuissetagnoscere causam, pure periculum patiebatur, undiquecadendi negotii notitia. Et illud quidem competentem meruitexaminationem atque decretum.

    Cap. I

    Nos autem credimus oportere universis auxiliari, et communem in omnibus facere legem, quatenus

    praepositis operi tabellionum ipsis per se omnibus modis iniungatur documentum, et, dum dimittitur,intersit, et non aliter imponatur chartae completio, nisi haec gerantur, ut habeant, unde sciantnegotium, et interrogati a iudicibus possint quae subsecuta sunt cognoscere, et respondere,maxime quando litteras sunt ignorantes, qui haec iniungunt, quibus facilis est et inconvincibilisdenegatio horum, quae pro veritate secuta sunt.

    1. Ut ergo omnia haec prohibeamus, propterea praesentem conscripsimus legem, et haeccustodiri modis omnibus volumus a tabellionibus, sive in ipsa felicissima civitate, sive in provinciissint; scientibus, quia, si praeter haec aliquid egerint, cadent omnino iis, quae vocantur stationibus,et qui ab eis dirigitur ad iniungendum documentum et interest, ipse dominus super stationisauctoritate erit, et mutabitur causa; et ille quidem de cetero hoc obtinebit officium in statione, qualequi in ea primatum tenebat, ille vero cadet ea, aut unus erit ministrantium illi. Quoniam ille quidemdedignatus est hoc agere, quod erat concessum ei, ille vero secundum illius voluntatem hoc egerit,propterea nos hanc intulimus eis poenam, ut optimi fiant circa documenta, et iusti, et cautiores, etnon propter suam requiem et delicias corrumpant alienas vitas.

    2. Si vero indignus sit forte potestatem in stationibus suscipere is, cui documentum extra ea,quae a nobis disposita sunt per praesentem legem, iniungitur, tabellio quidem cadat omnibus modishac causa, alter vero pro eo constituatur; nihil omnino damnificando ex hoc stationis domino,quicunque fuerit extraneorum, et non ipse tabellio, neque cadente lucris exinde venientibus, sed illosolo, qui talia perpetravit, et dedignatus est suum complere opus, primatu cadente, omnibusquidem aliis super stationis iure integris dominis eius ab ipsis tabellionibus, qui talia peccaverunt,servandis.

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    3. Et non fingant tabelliones occasiones, per aegritudinem forte discedentes, aut occupationeshuiusmodi; licebit enim eis, si quid tale fuerit, evocare eos, qui contrahunt, et per se causamcomplere; proinde haec, quae contingunt raro, non impedimentum facient universis, eo quod nihilinter homines sic est indubitatum, ut non possit, licet aliquid sit valde justissimum, tamen susciperequandam sollicitam dubitationem; sed nec quaestus eorum minores fieri per hoc, proptercontrahentium frequentiam occasionem habentes, quum melius sit pauca agere caute, quam multisinteresse periculose.

    4. Ut tamen non vehementer eis dura lex esse videatur, nos coniicientes humanam naturam,mediocres etiam eis leges nostras ponimus. Propter tales enim eorum forte dubitationes damus eislicentiam singulis unum ad hoc constituere, gestis apud clarissimum magistrum census felicissimaecivitatis solenniter celebratis, et licentiam eis dare, ut delegentur ei ab iis, qui veniunt ad eiusstationem documenta, et dimissis eis interesse, et nulli omnino alteri in statione exsistenti licentiamesse, ut aut delegetur ei initium, aut quum dimittuntur, intersit, nisi tabellioni, qui auctoritatem habet,aut qui ab eo ad hoc statutus est. Si vero praeter hoc fiat, et alter delegetur, tunc subiacebit poenaetabellio, qui auctoritatem habet a nobis dudum definitam, ipsis tamen documentis propter utilitatemcontrahentium non infirmandis. Novimus enim, quia legis metu de cetero et ipsi custodient, quae anobis decreta sunt, et documenta sub cautela facient.

    Cap. II

    Illud quoque praesenti adiicimus legi, ut tabelliones non in alia charta pura scribant documenta, nisiin illa, quae in initio (quod vocatur protocollum) per tempora gloriosissimi comitis sacrarumnostrarum largitionum habeat appellationem, et tempus, quo charta facta est, et quaecunque intalibus scribuntur, et ut protocollum non incidant, sed insertum relinquant. Novimus enim multasfalsitates ex talibus chartis ostensas et prius et nunc, ideoque licet aliqua sit charta (nam et hocscimus) habens protocollum non ita conscriptum, sed aliam quandam scripturam gerens, nequeillam suscipiant, tanquam adulteram et ad talia non opportunam, sed in sola tali charta, qualemdudum diximus, documenta scribant. Haec itaque, quae de qualitate talium chartarum a nobisdecreta sunt, et de incisione eorum, quae vocantur protocolla, valere in hac felicissima solumcivitate volumus, ubi plurima quidem contrahentium multitudo, multa quoque chartarum abundantiaest. Et licet legali modo interesse negotiis, et non dare occasionem quibusdam falsitatem

    committere, cui se obnoxios exsistere demonstrabunt, qui praeter haec aliquid agerepraesumserint.

    Epilogus

    Quae igitur placuerunt nobis, et per hanc sanctam declarata sunt legem, tua celsitudo operieffectuique tradere festinet.

    Dat. XV. Kal. Septemb. Constantinop. post BELISARII V. C. cons. anno II. [537.]

    * Srgio Jacomino registrador de imveis, Presidente do Instituto de Registro Imobilirio do Brasile doutor em direito (Unesp).