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Karina Maria Dezotti Dissertação de Mestrado OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS NO LIVRO DIDÁTICO DE ENSINO MÉDIO E O DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES DE LINGUAGEM Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, da Universidade São Francisco, sob orientação da Profª. Drª. Luzia Bueno. Itatiba 2008

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Este trabalho analisa a forma como os gêneros textuais notícia e reportagem são abordados nos livros didáticos.

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Karina Maria Dezotti

Dissertação de Mestrado

OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS NO LIVRO DIDÁTICO DE

ENSINO MÉDIO E O DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES

DE LINGUAGEM

Dissertação apresentada como requisito parcial

para obtenção do título de Mestre em Educação,

da Universidade São Francisco, sob orientação

da Profª. Drª. Luzia Bueno.

Itatiba

2008

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1

Ficha catalográfica elaborada pelas Bibliotecárias do Setor de

Processamento Técnico da Universidade São F

,1,

Ficha catalográfica elaborada pelas Bibliotecárias do Setor de

Processamento Técnico da Universidade São Francisco.

806.90:37 Dezotti, Karina Maria.

D519g Os gêneros jornalísticos no livro didático de

ensino médio e o desenvolvimento de capacidade

de linguagem / Karina Maria Dezotti. -- Itatiba, 2008.

260 p.

Dissertação (mestrado) – Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade São

Francisco.

Orientação de: Luzia Bueno.

1. Livro didático. 2. Gêneros. 3. Ensino médio.

4. Capacidade de linguagem. I. Bueno, Luzia.

II. Título.

Oliveira. I I. Título.

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3

Agradeço especialmente as professoras:

Luzia Bueno, pela orientação oportuna, dedicação e profissionalismo com

que me conduziu;

Maria Inês Ghilardi-Lucena, grande inspiradora e incentivadora, por ter

enriquecido imensamente minha formação acadêmica;

Lilia Santos Abreu-Tardelli, Marcia Aparecida Mamador Mascia e Eliane

Gouveia Lousada pelas importantes sugestões.

Agradeço, também, a todos que me apoiaram no decorrer da realização desta dissertação

e à CAPES, pela concessão da bolsa de pesquisa.

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4

Toda introdução de um gênero na escola é o resultado de uma decisão

didática que visa a objetivos precisos de aprendizagem, que são sempre

de dois tipos: trata-se de aprender a dominar o gênero, primeiramente,

para melhor conhecê-lo ou apreciá-lo, para melhor saber compreendê-lo,

para melhor produzi-lo na escola ou fora dela; e, em segundo lugar, de

desenvolver capacidades que ultrapassem o gênero e que são

transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes. (SCHNEUWLY

e DOLZ, 2004, p. 80)

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RESUMO

Este trabalho busca analisar as propostas de ensino de gêneros textuais em livros didáticos de

Língua Portuguesa de Ensino Médio indicados pelo PNLEM/2009. Especificamente,

analisaremos as atividades didáticas propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem e as

respectivas capacidades de linguagem do aluno que poderão ser desenvolvidas por meio delas.

Para tanto, recorreremos ao suporte teórico-metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo

(ISD) de J-P Bronckart e as propostas didáticas de Schneuwly e Dolz voltadas ao ensino de

gêneros na escola. Por meio dos modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem a que

chegamos, pudemos sinalizar quais capacidades de linguagem vêm sendo mobilizadas nas

propostas dos livros e suas implicações para o domínio desses gêneros textuais. Assim,

constatamos na análise que pouco se possibilita o desenvolvimento de capacidades de linguagem

do aluno, conseqüentemente as atividades propostas ao ensino de tais gêneros que circulam

socialmente não permitem seu domínio. Com este trabalho pensamos contribuir com reflexões

em torno do ensino de Língua Portuguesa, por meio dos gêneros jornalísticos, tendo como base

os livros didáticos dessa etapa da educação, além de contribuir, de algum modo, para a melhora

da qualidade desses instrumentos de ensino que permeiam o cenário educacional.

PALAVRAS-CHAVE: gêneros; livro didático; Ensino Médio; capacidades de linguagem.

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6

ABSTRACT

This thesis attempts to analyze the teaching purposes of textual genres in Portuguese Language

textbooks for secondary levels, indicated by PNLEM/2009 (National Textbook Program). We

will specifically analyze the learning activities that involve the genres news and articles and the

learner‟s respective capacities for language that could be developed through them. In order to

reach this goal, we will count on the theoretical and methodological support of Socio-discursive

Interactionism (SDI) by J-P Bronckart and on Schneuwly and Dolz‟s teaching purposes, which

are related to genre teaching at school. Through the teaching models of the genres news and

articles, we could point out which capacities for language have been mobilized by the textbooks

purposes and their implications for knowing as fully as possible those textual genres. Thus, we

noticed on the analysis that the development of student‟s capacities for languages is not well

explored. Consequently, the established activities used when teaching such genres do not give

students the chance to know them well. This work aims to contribute to teaching Portuguese

language through journalistic genres, basing it on the textbooks of the previous mentioned level

on education, and somehow contributing to the improvement in the quality of those teaching

instruments that are part of the educational scene.

KEY WORDS: genres; textbooks; Secondary Level; capacities for language.

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SUMÁRIO

Introdução 11

Capítulo 1. Contextualização da pesquisa 18

1.1 O Ensino Médio atual 18

1.2 O Ensino de Língua Portuguesa 21

1.3 Os documentos oficiais e o ensino de Língua Portuguesa 26

1.4 O livro didático: um objeto multifacetado 27

1.5 O livro didático brasileiro e o PNLEM 30

1.6 O livro didático de Língua Portuguesa 34

Capítulo 2. Gêneros textuais 39

2.1 A questão dos gêneros 39

2.2 Bakhtin e a teoria dos gêneros 41

2.3 Gêneros textuais na abordagem do Interacionismo Sócio-discursivo 44

2.4 Gêneros e aplicações didáticas 50

2.5 Gêneros jornalísticos: a notícia e a reportagem 58

2.6 Modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem 72

Capítulo 3. Procedimentos metodológicos 76

3.1 A seleção do corpus 76

3.2 Critérios de análise 78

3.3 Etapas de análise 79

Capítulo 4. Resultados da análise 80

4.1 Apresentação do livro didático de Ensino Médio 80

4.2 Os gêneros textuais no livro didático de Ensino Médio 91

4.3 O jornal no livro didático de Língua Portuguesa 99

4.4 O gênero notícia 102

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4.4.1 A forma de apresentação do gênero notícia 106

4.4.2 O conteúdo temático do gênero notícia 111

4.4.3 Atividades propostas ao ensino do gênero notícia 112

4.4.4 O gênero notícia e as capacidades de ação 119

4.4.5 O gênero notícia e as capacidades discursivas 124

4.4.6 O gênero notícia e as capacidades lingüístico-discursivas 133

4.4.7 Capacidades de linguagem e o ensino da notícia 139

4.5 O gênero reportagem 142

4.5.1 A forma de apresentação do gênero reportagem 144

4.5.2 O conteúdo temático do gênero reportagem 156

4.5.3 Atividades propostas ao ensino do gênero reportagem 158

4.5.4 O gênero reportagem e as capacidades de ação 165

4.5.5 O gênero reportagem e as capacidades discursivas 173

4.5.6 O gênero reportagem e as capacidades lingüístico-discursivas 182

4.5.7 Capacidades de linguagem e o ensino da reportagem 189

Capítulo 5. Considerações finais 195

5.1 Respostas as perguntas da pesquisa 195

5.2 Reflexões em torno do ensino de gêneros textuais e o

desenvolvimento de capacidades de linguagem em livros didáticos de

Ensino Médio

203

Referências bibliográficas 206

Anexos 212

Anexo I: Livro 1(PL) – Português: linguagens 212

Anexo II: Livro 2 (PLC) – Português: língua e cultura 226

Anexo III: Livro 3 (LP) – Língua Portuguesa 252

Anexo IV: Livro 4 (PEC) – Língua Portuguesa: projeto escola e

cidadania para todos

259

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Lista de quadros

QUADRO 1. Dados do PNLEM 32

QUADRO 2. Tipos de seqüências textuais 48

QUADRO 3. Capacidades e operações de linguagem 54

QUADRO 4. Agrupamentos de gêneros de Schneuwly e Dolz 55

QUADRO 5. Definições de notícia e reportagem 65

QUADRO 6. Descrição e análise do gênero notícia impressa 67

QUADRO 7. Modelo didático do gênero notícia 73

QUADRO 8. Modelo didático do gênero reportagem 74

QUADRO 9. Corpus de análise 77

QUADRO 10. Livro 1: estruturação da obra 83

QUADRO 11. Livro 2: estruturação da obra 86

QUADRO 12. Livro 3: estruturação da obra 88

QUADRO 13. Livro 4: estruturação da obra 90

QUADRO 14. Porcentagem dos capítulos dedicados ao ensino de gêneros 91

QUADRO 15. Livro 1: gêneros ensinados e seus agrupamentos 93

QUADRO 16. Livro 2: gêneros ensinados e seus agrupamentos 94

QUADRO 17. Livro 3: gêneros ensinados e seus agrupamentos 96

QUADRO 18. Livro 4: gêneros ensindados e seus agrupamentos 96

QUADRO 19. Gêneros textuais ensinados nos livros didáticos analisados 97

QUADRO 20. Gêneros textuais ensinados e suas esferas sociais de comunicação 98

QUADRO 21. Organização dos capítulos dedicados ao ensino do gênero notícia 103

QUADRO 22. Tipologias de perguntas de Marcuschi 114

QUADRO 23. Perguntas empregadas no ensino da notícia 115

QUADRO 24. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino

da notícia

124

QUADRO 25. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no

ensino da notícia

134

QUADRO 26. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem 138

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abordadas no ensino da notícia

QUADRO 27. Gênero notícia: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros

didáticos de Português de Ensino Médio analisados

140

QUADRO 28. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada no ensino do

gênero notícia

141

QUADRO 29. Organização dos capítulos dedicados ao ensino da reportagem 143

QUADRO 30. Perguntas empregadas no ensino da reportagem 159

QUADRO 31. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino

da reportagem

172

QUADRO 32. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no

ensino da reportagem

181

QUADRO 33. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem

abordadas no ensino da reportagem

188

QUADRO 34. Gênero reportagem: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros

didáticos de Português de Ensino médio analisados

190

QUADRO 35. Porcentagem da cada capacidade de linguagem trabalhada no ensino do

gênero reportagem

192

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11

INTRODUÇÃO

Esta dissertação de mestrado busca analisar as atividades didáticas propostas ao ensino de

dois dos gêneros midiáticos de grande circulação nos livros de Língua Portuguesa de Ensino

Médio – a notícia e a reportagem – e as capacidades de linguagem do aluno que, possivelmente,

poderão ser desenvolvidas por meio delas.

Esse tema de análise partiu tanto de minha formação acadêmica quanto da prática da

docência. Durante minha graduação no curso de Letras, desenvolvi um projeto de pesquisa de

Iniciação Científica voltado à análise do discurso publicitário, especificamente à análise da

representação da figura masculina em anúncios publicitários (DEZOTTI; GHILARDI-LUCENA,

2005). Tal trabalho aproximou-me de questões relacionadas ao poder da mídia na formação da

opinião pública e, conseqüentemente, a partir de minha atuação profissional como docente em

escola pública, passei a conviver com a notável influência dela no universo estudantil.

Os alunos demonstram constantemente a apropriação que fazem das expressões e gírias

dos personagens de sucesso da televisão, seus materiais escolares trazem a imagem do artista ou

banda do momento, os novos modelos de vestuário das revistas de moda desfilam pela escola,

bem como comentários a respeito das manchetes jornalísticas do dia anterior, além de muitas

vezes se ouvir o slogan de novos produtos circulando na sala de aula. É obvio que essas

situações, como outras de caráter semelhante, não estão somente na escola, mas também fora

dela, enfim nas sociedades modernas, os meios de comunicação interferem na formação e

educação das pessoas, sejam elas crianças, jovens ou adultos, pois ensinam, por meio de modelos

de comportamento, como agir, pensar, consumir, vestir-se (CHARAUDEAU, 1996).

Dessa forma, como atuo no ensino de Língua Portuguesa, um questionamento se fez

presente: a escola tem preparado o aluno para ler (no sentido amplo da palavra) os gêneros da

mídia? Ou seja, a escola tem formado um leitor capaz de interpretar, julgar, confrontar, defender

suas idéias diante daquilo que lhe é exposto em jornais, revistas, internet, televisão?

Portanto, tendo como ponto de partida essa ampla questão dediquei-me à realização de

uma pesquisa que a respondesse, que permitisse investigar em que medida estes gêneros estão

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presentes na aula de Português, como são trabalhados e apresentados aos alunos, isto é, o que é

„feito‟ com estes gêneros na escola, uma vez que as propostas contemporâneas para a educação

brasileira colocam o estudo do texto e da pluralidade de gêneros em papel central no ensino de

Língua Portuguesa.

Segundo a professora e pesquisadora Maria Aparecida Baccega (2003, p. 81):

A formação de cidadãos, atributo da escola, passa obrigatoriamente pela

habilitação do cidadão para ler os meios de comunicação, sabendo desvelar os

implícitos que a edição esconde; [...] para isso, a escola não pode esquecer-se do

ecossistema comunicativo na qual vivem os alunos. Ou seja, ou a escola

colabora para democratizar o acesso permanente a esse ecossistema

comunicativo ou continuará a operar no sentido da exclusão, tornando maiores

os abismos existentes.

Para a autora, os textos oriundos da esfera midiática, que compõem o „ecossistema

comunicativo‟, como ela pontua, no qual se vive na atualidade, precisam ser incorporados à

prática escolar de modo a formar leitores críticos. Caso contrário, a escola não agirá em função

de um acesso efetivo aos meios de comunicação e reproduzirá uma forma de exclusão, ao passo

que formará, muitas vezes, indivíduos incapazes de transcender ao que é dito nestes tipos de

textos para construir o significado, sendo que o não-dito – elemento implícito – em alguns casos,

é mais significativo para a construção de sentidos do que os fatos explicitados (DUCROT, 1987).

Partindo do pressuposto de que, no mundo contemporâneo, conhecer o funcionamento do

discurso midiático se faz necessário para as práticas sociais, pois ler um romance não é o mesmo

que ler uma reportagem, ou assistir a um programa de entretenimento não é o mesmo que assistir

a um noticiário, ou seja, cada gênero exige capacidades de linguagem de seus leitores

(telespectadores no caso dos televisivos). Essas capacidades de linguagem4 são de três ordens:

capacidade de ação, relaciona-se à capacidade do aluno de conseguir contextualizar o gênero;

capacidade discursiva, refere-se à capacidade de saber estruturar o gênero de texto; capacidade

lingüístico-discursiva, compreende a capacidade de empregar adequadamente os mecanismos de

textualização e enunciação e compreender seus efeitos de sentido.

Somente por meio de um trabalho escolar que enfatize o ensino de operações de

linguagem, isto é, tarefas a serem apreendidas, que contribuam para o desenvolvimento de tais

capacidades, poderá ocorrer o domínio de quaisquer gêneros textuais.

4 O conceito de capacidade de linguagem empregado nesse trabalho será retomado e aprofundado no capítulo 2.

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Assim, é impossível preparar indivíduos habilitados à leitura de novelas, anúncios

publicitários, quadrinhos, notícias, reportagens, crônicas, editoriais, artigos, entre muitos outros

que circulam socialmente, sem sua incorporação na sala de aula por intermédio do professor e/ou

sem sua veiculação no material didático.

Pensando em desenvolver uma proposta de trabalho viável e que contribuísse com

reflexões sobre o ensino de Língua Portuguesa, tomei como objeto de análise o livro didático.

Embora sofra críticas quanto à sua eficácia no ensino, o livro didático ocupa grande espaço na

sala de aula, consolidando-se como principal fonte de leitura e letramento da educação brasileira,

ao menos no que diz respeito às instituições públicas, conforme afirmam Rojo e Jurado em seu

estudo com materiais pedagógicos (2006).

Devido ao fato de serem, em alguns casos, a única fonte de leitura de muitos alunos, os

livros didáticos de Língua Portuguesa devem incorporar os mais variados gêneros textuais para

contribuir com o ensino da leitura na escola e ampliar o repertório textual dos alunos. Porém há

concepções divergentes da minha, que argumentam que, a partir do momento que uma notícia é

submetida a atividades escolares, ou qualquer outro gênero, ele é escolarizado e perde sua função

comunicativa social. Entretanto, assim como Rojo e Jurado (2006) e Soares (1999; 2003),

acredito que ao se inserir quaisquer gêneros no ambiente e nas práticas escolares – burocráticos,

jornalísticos, literários – estes serão escolarizados, mas penso que o problema não está na

escolarização, pois dela não há como se fugir uma vez que a escola é um lugar social privilegiado

de ensino-aprendizagem, mas a questão é a qualidade dessa escolarização, isto é, como esses

gêneros são apresentados ao aluno, quais são as propostas didáticas em que eles são trabalhados.

Assim como as autoras citadas, acredito que as práticas de leitura e de escrita que se

realizam socialmente são práticas a se ensinar na escola, que, por sua vez, resultam em práticas

ensinadas e, depois de adquiridas, refletem-se no ambiente social. O conhecimento e estudo das

práticas de leitura e de escrita utilizadas em situações sociais de difícil domínio dos alunos na

escola permitem o reconhecimento delas fora desse ambiente, daí sua necessidade e importância

(SOARES, 2003).

A relação do livro didático com gêneros midiáticos é recente, praticamente iniciou-se a

partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Fundamental (PCN), estabelecidos em

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1998, que realçam a importância do estudo dos variados gêneros textuais em sala de aula,

enfatizando os da mídia. Nos PCN (BRASIL,1998, p. 120) é afirmado que:

A mídia pode ser uma grande aliada no processo educacional: é importante

aproveitar o conhecimento que ela propicia e propor trabalhos de reflexão sobre

as programações, incentivando um olhar crítico. Do ponto de vista educativo, o

problema não está no consumo, mas no consumo passivo de tudo que é

veiculado.

Quanto ao Ensino Médio, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNEM) e sua

complementação PCN+ (BRASIL/SEMTEC, 1999; 2002, p. 55), no que diz respeito ao ensino do

Português, enfatizam os usos sociais da língua, buscando “desenvolver no aluno seu potencial

crítico, [...] sua capacidade como leitor efetivo dos mais diversos textos representativos de nossa

cultura”, além de buscar incorporar na prática escolar os gêneros pertencentes à esfera: literária,

jornalística, publicitária, científica e legal.

Embora os documentos oficiais da educação brasileira, tanto de Ensino Fundamental

quanto de Médio, proponham um trabalho crítico com os gêneros da mídia, estudos realizados

por Bueno (2002), Garé (2004), Zanchetta Jr. (2005), constataram que os livros didáticos para o

terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental atuais estão repletos de gêneros midiáticos,

principalmente os jornalísticos, porém a qualidade com que são apresentados e abordados é

discutível.

Segundo os autores, o uso de textos literários para se ensinar gramática no livro didático

de Português sempre foi motivo para discussão e debate por fazer com que se perdesse a essência

da obra em si, despertando o desinteresse dos alunos pela leitura ao utilizá-los apenas como

suporte textual em atividades de fixação gramatical. Entretanto, este posto foi ocupado ou, em

alguns casos, compartilhado com os gêneros midiáticos que acabam por receber tratamento

acrítico nos materiais didáticos.

Quanto à sua forma, os textos da mídia são apresentados em versões reeditadas e

adaptadas em que suas características principais não são respeitadas: as notícias não são

apresentadas em colunas como nas versões originais, mas em texto corrido; fotos são substituídas

por ilustrações infantis; adaptações são realizadas sem as devidas marcações textuais.

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Quando se trata do estudo do gênero em si a situação ainda é pior, pois são raras as obras

que o fazem e mais raras ainda são as que não apresentam erros conceituais. Portanto, nota-se que

gêneros textuais vêm sendo tratados de modo inadequado e superficial nos livros didáticos de

Ensino Fundamental (BUENO, 2002; GARÉ, 2004).

Zanchetta Jr. (2005, p. 1508), diante dos resultados constatados em sua pesquisa com

esses livros, enfatiza que, para que haja uma abordagem adequada da mídia na escola,

principalmente quanto aos textos jornalísticos, deve-se trabalhar:

...as características dos gêneros e práticas jornalistas, além do funcionamento

dos meios de comunicação na sociedade contemporânea. [...] estimular o aluno a

perceber-se como agente midiático e não como receptor passivo de conteúdos ou

cliente dos meios de comunicação contribui para que ele possa se situar como

indivíduo e como parte de uma coletividade.

Ao invés de apenas veicular os gêneros da mídia com o efeito de somente cumprir os

requisitos dos documentos oficiais de educação, os materiais didáticos devem apresentar

propostas de estudo para esses textos que se dediquem às suas características próprias, argumenta

o autor, como forma de ampliar o repertório e o olhar do aluno em relação ao “ecossistema

comunicativo” da modernidade que é permeado por estes textos nos ambientes sociais

(BACCEGA, 2003, p. 81).

A partir dos resultados apontados nos estudos realizados com materiais didáticos

destinados ao Ensino Fundamental (BUENO, 2002; GARÉ, 2004; ZANCHETTA, 2005),

buscarei me debruçar sobre os de Ensino Médio devido à carência de estudos referentes a esta

etapa da educação, pois muitas pesquisas já se dedicaram à realidade do Ensino Fundamental I e

II, fato que não ocorre com a escolarização posterior.

Segundo trabalho realizado por Mendonça e Bunzen (2006), há uma demanda por

pesquisas aplicadas ao Ensino Médio brasileiro. Assim, dedicar-me-ei à análise, especificamente,

dos livros didáticos de Língua Portuguesa aprovados pelo PNLEM/2009 que são enviados

gratuitamente às escolas públicas após prévia escolha realizada pelos professores para serem

utilizados nos anos 2009, 2010 e 2011. Ressaltamos que os livros que analisarei, possivelmente,

já estão em muitas das salas de aulas brasileiras por terem sido indicados também pelo

PNLEM/2005, primeira versão do programa voltado ao Ensino Médio.

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Devido à inviabilidade de análise de todos os gêneros da mídia presentes nas obras

didáticas, optei por delimitar o campo de análise aos gêneros notícia e reportagem por

proporcionarem a formação de leitores críticos diante de fatos sociais e políticos, e também por

serem, dentre os gêneros dessa esfera de comunicação, os que mais recebem destaque nos

manuais de Língua Portuguesa, conforme pesquisa realizada por Bueno (2002).

Foram selecionados para compor o corpus de análise dessa pesquisa, cujo cunho é

qualitativo, livros didáticos de Português de Ensino Médio, recomendados pelo PNLEM/2009,

que dedicassem unidades ou capítulos ao ensino dos gêneros notícia e/ou reportagem; ou que

dedicassem capítulos ou unidades ao estudo do jornal ou da imprensa e ao ensino desses gêneros,

correspondendo a esse critério 4 obras (36%) das 11 aprovadas e recomendadas pelo

PNLEM/2009. Assim, por meio da análise desses 4 livros didáticos, busquei responder às

seguintes questões:

Quais atividades didáticas são propostas para o ensino dos gêneros notícia e

reportagem no livro didático de Língua Portuguesa de Ensino Médio?

Que implicações tais atividades podem trazer para o desenvolvimento de capacidades

de linguagem dos alunos?

Para respondê-las, procurei analisar os livros didáticos buscando verificar:

Como se organizam os livros de Ensino Médio atuais?

Quais são os gêneros textuais selecionados para ensino nesses livros?

Quais são os tipos de perguntas aplicadas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem

nos livros analisados?

Quais são as operações de linguagem que devem ser mobilizadas para o domínio dos

gêneros notícia e reportagem?

Tais operações de linguagem implicam no desenvolvimento de quais capacidades de

linguagem dos alunos?

Quais capacidades de linguagem do aluno poderão ser desenvolvidas por meio das

atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem nos livros didáticos de

Língua Portuguesa analisados?

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Ao respondê-las, acredito contribuir para uma reflexão em torno do trabalho escolar com

gêneros textuais como forma de ensino de Língua Portuguesa.

Para tanto, recorro ao suporte teórico-metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo

postulado por J-P Bronckart (2003), que apresenta subsídios à análise dos gêneros textuais, e aos

estudos de Schneuwly e Dolz (2004) sobre o trabalho didático-pedagógico com gêneros na escola

e suas implicações no desenvolvimento de capacidades de linguagem. Tais pesquisadores são

membros do departamento de Didática do Ensino de Línguas da Universidade de Genebra (Suiça)

e configuram-se como autores de grande representatividade no campo das teorias de gêneros.

Esta dissertação tem como objetivo apresentar os resultados desta pesquisa. Assim, no

capítulo 1, busquei contextualizar os elementos fundamentais da análise: o Ensino Médio, o

ensino de língua materna, o trabalho do professor, o livro didático de Português e o PNLEM no

presente cenário educacional.

No capítulo 2, apresento as teorias de gêneros com as quais dialogo no decorrer deste

trabalho e o modelo didático a que cheguei para o domínio dos gêneros notícia e reportagem.

Primeiramente, busquei contextualizar a questão dos gêneros da teoria clássica até os estudos

modernos. Em seguida, tratei da perspectiva de gênero presente na obra de J-P Bronckart (2003)

e de seu suporte teórico-metodológico. Realizei ainda a exposição das propostas didático-

pedagógicas de Schneuwly e Dolz (2004) voltadas ao ensino da língua materna por meio da

modelização didática dos gêneros e, por fim, apresento os modelos didáticos dos gêneros notícia

e reportagem aos quais cheguei a fim de orientar as análises dos livros didáticos do corpus.

No capítulo 3, traço os procedimentos metodológicos da pesquisa. Iniciarei pela

apresentação dos critérios para seleção do corpus de análise, em seguida apresento os critérios e

as etapas de análise.

Passo então a apresentação dos resultados das análises e suas implicações. O capítulo 4

trará a descrição dos livros didáticos que compõem o corpus da pesquisa, apresentará a

organização dos capítulos que se dedicam ao ensino dos gêneros notícia e reportagem e delineará

a análise das atividades didáticas propostas, seguindo com a discussão em torno das capacidades

de linguagem que poderão ser desenvolvidas em tais atividades.

O capítulo 5 apresenta as conclusões da análise e reflexões em torno das propostas de

ensino de Língua Portuguesa por meio de gêneros textuais presentes em livros didáticos de

Ensino Médio.

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Capítulo 1

CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

Esta pesquisa tem por objetivo analisar as propostas de trabalho com os gêneros notícia e

reportagem em livros didáticos de Ensino Médio de Língua Portuguesa, recomendados pelo

PNLEM/2009. Assim, neste capítulo, buscaremos contextualizar os elementos fundamentais de

nossa análise: o Ensino Médio, o ensino de língua materna e o livro didático no presente cenário

educacional.

Iniciaremos a exposição situando o Ensino Médio na contemporaneidade e a concepção de

linguagem subjacente à prática de ensino de Português nessa etapa da educação brasileira, além de

tratar das orientações e diretrizes oficiais voltadas ao ensino de línguas. Para compreendermos o

livro didático atual, apresentaremos seu percurso histórico e sua constituição. Descreveremos,

ainda, o PNLEM e seus critérios para avaliação dos livros didáticos de Língua Portuguesa.

1.1 O Ensino Médio atual

O Ensino Médio, a partir de 1996, com promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB), passou a integrar o quadro da educação básica do país, configurando-

se como a etapa da educação em que se busca o aprofundamento nos conhecimentos adquiridos

no Ensino Fundamental com vistas a uma formação crítica, intelectual e profissionalizante,

contemplando os eixos da ciência, da cultura e do trabalho. Ao mesmo tempo em que o Ensino

Médio tem o intuito de preparar o alunado para o ingresso ao ensino superior, não perde de vista

a educação de caráter profissionalizante para oferecer oportunidades àqueles que não

prosseguirão nos estudos.

Somente após a inclusão do Ensino Médio como etapa da educação básica brasileira que

começou a reflexão e a discussão de modo mais aprofundado sobre suas questões, havendo, a

partir de então, intervenções do Estado nessa etapa da educação por meio de publicações de

documentos orientadores da ação docente: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

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19

(DCNEM), em 1998; Parâmetros Curriculares nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), em

1999; Orientações Complementares aos PCNEM (PCN+), em 2002; além de publicações de

pesquisadores que se dedicaram a pensar sobre esses documentos oficiais de Ensino Médio (Rojo

e Moita Lopes, 2005; entre outros).

O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), criado em 1995 para a distribuição

gratuita de livros aos alunos do Ensino Fundamental, foi ampliado em 2003 para a distribuição

aos alunos do Ensino Médio também, configurando-se como Programa Nacional do Livro

Didático de Ensino Médio (PNLEM).

Outra intervenção do Estado no Ensino Médio diz respeito à implantação de sistemas de

avaliações sistemáticas do ensino, que constantemente recebem grande destaque na mídia,

principalmente quanto à divulgação do desempenho dos alunos. Tais sistemas de avaliação de

grande escala são: Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), ampliado ao Ensino

Médio em 1995, e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), criado em 1997.

Tanto o SAEB quanto o ENEM avaliam competências e habilidades com enfoque à

pluralidade de gêneros textuais, priorizando àqueles de esferas sociais de comunicação como

jornalísticos, literários e de lazer, conforme as instruções das diretrizes oficiais de ensino:

No currículo pressuposto pelo SAEB para língua portuguesa, ao término do EM

o aluno deve ser capaz de ler textos argumentativos mais complexos, paródias,

textos mais longos e complexos, poemas mais complexos e cartuns, além de

dominar recursos lingüístico-discursivos utilizados na construção de gêneros. No

currículo pressuposto pelo ENEM, ao término do EM o aluno deve dominar a

norma culta da língua portuguesa e ter uma leitura compreensiva dos textos, o

que implica, entre outras capacidades, saber analisar as funções da linguagem e

conseguir estabelecer relações entre os diferentes textos e o seu contexto sócio-

histórico e cultural. (MARCUSCHI, 2007, p. 81)

Segundo Marcuschi (Ibid.), o que esses exames avaliam deve ser pensado e analisado,

pois eles influenciam no ensino e no currículo de Língua Portuguesa. Entretanto o que dizem as

pesquisas sobre o ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio?

Mendonça e Bunzen em Português no Ensino Médio e formação do professor (2007, p.

13) afirmam que “a tradição da formação para os conteúdos em si mesmos (saber por saber),

geralmente por métodos transmissivos e de memorização, se reflete fortemente no ensino

convencional de gramática” no Ensino Médio, subjacente a uma concepção de aprendizagem

passiva que visa à aprovação em concursos ou vestibulares em que “deixa-se de lado o que é

Page 21: Noticia e Reportagem Nos LDS

20

central – a formação de leitores-produtores que saibam avaliar e analisar seus próprios textos e o

de outros autores” – desviando “o foco da formação: dos usos da língua para o saber sobre a

língua,” distanciando-se das orientações oficiais (MENDONÇA; BUNZEN, 2007, p. 16-17).

Também Rojo e Jurado (2007), após análise de um livro didático de Ensino Médio de

Português, argumentam que a obra nada atendia às propostas das diretrizes ou referenciais

nacionais testados nos exames e avaliações. Enquanto os documentos oficiais centram-se nos

usos sociais da língua, fato que implica no trabalho escolar com uma diversidade de gêneros

textuais de variadas esferas sociais, o livro investigado centrava-se no ensino de conteúdos

gramaticais e literários.

No Ensino Médio, diferente do Ensino Fundamental, ocorre uma tendência à

fragmentação da disciplina Língua Portuguesa em: Gramática, Literatura e Redação, em que,

muitas vezes, cada um dos segmentos corresponde a professores diferentes, ou mesmo quando há

um único professor, o caderno dos alunos é dividido em três matérias independentes. Enquanto as

teorias contemporâneas sobre ensino buscam a interdisciplinaridade e a desfragmentação das

disciplinas, o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Médio está totalmente na contramão, pois

tanto a gramática (análise lingüística do texto), quanto a redação (produção do texto) e a literatura

(leitura, compreensão e análise do texto) são elementos que se relacionam e se complementam

para o ensino de uma língua. Entretanto, na prática da sala de aula, estudos relatam tal

contradição (MENDONÇA; BUNZEN, 2007).

Apesar das divergências entre o que dizem as diretrizes oficiais de ensino do Ensino

Médio e o que ocorre na sala de aula, Mendonça e Bunzen afirmam que já são encontradas

práticas de ensino de língua materna embasadas em novas teorias de ensino, que se desvinculam

do ensino gramatical tradicional, voltadas para o ensino dos gêneros textuais. Porém há a

carência de estudos centrados no ensino de Português no Ensino Médio, enquanto muitos autores

já se debruçaram sobre questões das etapas anteriores da educação, o mesmo não ocorre com a

etapa final da educação básica. Conforme esses autores: “há de fato uma demanda por pesquisas

que ajudem a compreender por que razões, no Ensino Médio, as competências relativas ao campo

da linguagem ainda estão longe do patamar desejado” (Ibid., p. 13) como indicam o SAEB e o

ENEM.

Page 22: Noticia e Reportagem Nos LDS

21

1.2 O ensino de Língua Portuguesa

Neste momento, buscaremos contextualizar o ensino de Língua Portuguesa na

contemporaneidade, para tanto, se faz necessário tratarmos da concepção de linguagem

subjacente à prática de didática de línguas vigente na atualidade para que compreendamos o

ensino atual de Português.

Os estudos sobre a linguagem humana, ao longo dos anos, têm apontado três concepções

a respeito do fenômeno da linguagem, classificando-a, em princípio, como “expressão do

pensamento”. Para esta concepção a dificuldade demonstrada pelo indivíduo ao se expressar de

modo claro corresponderia à dificuldade encontrada, também, ao pensar, presumindo a existência

de regras a serem seguidas para a organização lógica do pensamento humano e,

conseqüentemente, da linguagem; depois, como “instrumento de comunicação”, em que a língua

é vista como um conjunto de signos que se combinam segundo regras capazes de transmitir

mensagens de um emissor a um receptor. Essa concepção é representada pelos estudos

lingüísticos realizados por Saussure e Chomsky; e, finalmente, como processo ou “forma de

inter-ação”(GERALDI, 1999, p.43).

Esta última concepção de linguagem é baseada nos escritos de Mikhail Bakhtin e seu

Círculo que se dedicaram aos estudos da linguagem, destacando seu caráter interativo, social e

dialógico, desenvolvendo um suporte teórico-metodológico vasto e complexo neste campo do

conhecimento. Os estudos realizados por Bakhtin são extremamente reconhecidos e é a partir de

seus postulados que muitos autores desenvolveram suas teorias.

Para que se compreendam as dimensões da arquitetônica bakhtiniana sem simplificações,

distorções ou banalizações de seus conceitos, há de se entender que Bakhtin não era lingüista,

mas filósofo e pensava o homem como ser naturalmente social que se constitui na e pela

interação com o outro. Conseqüentemente, por ter tal concepção, dedicou-se a refletir sobre a

filosofia da linguagem, postulando sobre a natureza dialógica dela, e partindo de uma crítica a

duas orientações do pensamento lingüístico representadas por Humboldt e Saussure.

A tendência lingüística de Wilhelm Humboldt é chamada por Bakhtin de subjetivismo

idealista e “interessa-se pelo ato de fala, de criação individual como fundamento da língua”, na

Page 23: Noticia e Reportagem Nos LDS

22

qual o lingüista “limita-se simplesmente a preparar a explicação exaustiva do fato lingüístico

como proveniente de criação individual” (BAKHTIN, 1999, p. 72).

Já na tendência estruturalista de Saussure, chamada de objetivismo abstrato, há a

dicotomia entre língua e fala em que aquela é entendida como um sistema social e esta como

individual. Para Saussure, o objeto da lingüística é somente a língua enquanto sistema passível de

classificação e normatização, considerando o estudo da fala fora de seu alcance.

Embora realize uma crítica rigorosa a essas abordagens lingüísticas, Bakhtin reconhece a

importância delas, mas as considera insuficientes por enfocarem apenas o enunciado/enunciação

como fenômeno da língua, desvinculando-o do contexto de sua materialização, isto é, enquanto a

lingüística preocupava-se com a frase ou oração como unidades da língua (sistema), a teoria

dialógica bakhtiniana preocupa-se com o enunciado, concebendo-o como unidade de

comunicação verbal.

Para Bakhtin, nunca enunciamos do nada e para o nada. Sempre há um contexto concreto

e determinado histórico e socialmente que marca a enunciação. Toda a enunciação é permeada

pela relação entre o “eu” e o “outro”, e é essa relação de interação e de diálogo que constitui a

linguagem. Daí a natureza dialógica da linguagem, em que toda enunciação há a presença de

outras enunciações. Toda enunciação é uma resposta a outras enunciações, constituindo um

complexo diálogo que se materializa por meio da linguagem.

Portanto, os outros constituem o “eu” que se transforma, dialogicamente, em um outro de

novos “eus” (FARACO, 2003). Assim, o dialogismo diz respeito às relações entre o eu e o outro,

correspondendo a um diálogo nem sempre harmônico.

Para Bakhtin, toda palavra é uma resposta à outra, todo enunciado é produzido levando-se

em consideração os outros já produzidos, e manifestando-se aspectos valorativos sobre os outros

enunciados criando-se, então, um novo enunciado.

Diferente das outras concepções de linguagem, nesta o indivíduo não faz uso da língua

somente para expressar o pensamento ou se comunicar com o outro, mas sim “encara a

linguagem como atividade, como forma de ação, ação finalisticamente orientada; como lugar de

interação” (KOCH, 1992, p.9) entre os sujeitos do discurso.

Daí decorre a concepção de discurso como forma de ação, como o lugar onde o sujeito

age no mundo, de acordo com o meio em que está inserido e com sua história (ORLANDI, 2001),

Page 24: Noticia e Reportagem Nos LDS

23

movido por um “querer dizer” que, em princípio, não é movido pelo sujeito do próprio discurso,

mas se constitui no jogo das relações sociais.

Como é fundamental em muitos discursos, se não for a todos, para influir na vontade de

seu interlocutor, mostrando que o que explana é verdadeiro, recorre-se ao ato de argumentar e de

persuadir, ou seja, a ação de um indivíduo sobre o outro, buscando convencê-lo de algo através

de seu próprio discurso em união a outros discursos, pois “a interação social por intermédio da

língua caracteriza-se, fundamentalmente, pela argumentatividade” (KOCH, 1996, p. 19).

É essa abordagem dialógica e discursiva de linguagem que a vê como ação e interação,

com enfoque nas variedades lingüísticas e textuais, a qual permeia as propostas contemporâneas

de ensino de língua materna e os documentos oficiais da educação brasileira hoje.

Partindo da concepção de linguagem bakhtiniana apresentada, debruçaremos sobre o

ensino de Língua Portuguesa, dialogando, principalmente, com Geraldi (1997; 2002), Possenti

(1996), Soares (2001) e Bagno (2001; 2003), autores que produziram um vasto trabalho na área

de ensino e linguagem e que, por sua vez, também dialogam entre si.

Ao pensar a questão da linguagem e ensino, Geraldi parte da abordagem discursiva que

entende que “a unidade lingüística básica para os processos de ensino/aprendizagem da escrita

não é a palavra, mas o discurso em sua materialidade social e em sua materialidade textual”

(2002, p. 49-50), concebendo que a língua não está de antemão pronta, mas constrói-se a cada

situação comunicativa. Tendo essa concepção dialógica de linguagem, Geraldi discute o ensino

de Língua Portuguesa.

O autor crítica rigorosamente o ensino tradicional da gramática na escola, apontando que

sistematizações a respeito da descrição e estrutura da língua cabem aos lingüistas e aos

professores que devem conhecer seu objeto de estudo e ensino, aos alunos basta “aprender a ler

criticamente e a escrever exitosamente” (2002, p. 72).

Tanto Geraldi, quanto Possenti e Bagno, nas obras já citadas, buscam eliminar o falso

sinônimo de que ensino de Língua Portuguesa é o mesmo que ensino de gramática. No processo

de ensino-aprendizagem, o professor deve ter o objetivo de formar cidadãos conscientes sobre o

uso da língua em suas diversas modalidades para dominá-la e manuseá-la de acordo com a

finalidade específica de cada contexto.

Bagno, na obra Preconceito Lingüístico (2003), compara a atuação do professor ao de um

instrutor de auto-escola. O instrutor busca formar bons motoristas e não mecânicos profissionais,

Page 25: Noticia e Reportagem Nos LDS

24

conhecedores tanto dos nomes quanto do funcionamento das peças do motor do veículo, pois para

se dirigir bem não há necessidade de conhecimentos sobre peças e motor. O mesmo acontece na

escola, o aluno não tem necessidade de saber toda a metalinguagem e as regras de exceção

gramaticais, isso cabe ao professor e só a ele faz sentido, não ao aluno, segundo esses autores.

Geraldi propõe uma forma possível de tornar o ensino de Língua Portuguesa um ensino

efetivo de língua por meio do trabalho a partir de textos em sala de aula, isto é, a partir de

atividades de reflexão sobre a linguagem (atividades epilingüísticas), pois “aquele que aprendeu a

refletir sobre a linguagem é capaz de compreender uma gramática”. E, entretanto, aquele que a

decorou “jamais compreenderá seu sentido” (2002, p. 64). Assim como Bakhtin, o autor pontua

que a comunicação se dá a partir de textos e não de palavras, entendendo o texto como unidade

comunicacional.

Centrar o ensino no texto é ocupar-se com o uso da língua. Trata-se de pensar a

relação de ensino como o lugar de práticas de linguagem e a partir delas, com a

capacidade de compreendê-las, não para descrevê-las como faz o gramático, mas

para aumentar as possibilidades de uso exitoso da língua. (BAKHTIN, 2002,

p.71)

Dessa forma, o trabalho com o texto é o que há de específico na aula de Língua

Portuguesa, porque é nele que a língua se revela em sua totalidade. As aulas de Português devem

refletir, como propõem Mattos e Silva, citados em Bagno (2001, p. 157), “uma pedagogia voltada

para o todo da língua”, sendo os gêneros a materialização desse todo. Para Bagno (Ibid.), “a

escola tem de se abrir a todos os gêneros em que se pode concretizar o uso da língua”, isto é, não

somente aos gêneros literários, mas aos dos meios de comunicação, aos pertencentes a variedades

lingüísticas rurais, urbanas, orais e escritos.

Segundo Possenti (1996, p. 17), “o objetivo da escola é ensinar o Português padrão, ou,

talvez mais exatamente, o de criar condições para que ele seja aprendido”. Para tanto, Geraldi

(1999) apresenta três unidades básicas que devem ser articuladas para esse ensino: a prática de

leitura de textos; a prática de produção de textos; e a prática de análise lingüística.

Mas por que o Português padrão? Contra a hipótese de que o ensino do Português padrão

na escola é uma forma de preconceito lingüístico para com as outras variedades da língua, Magda

Soares argumenta que:

Page 26: Noticia e Reportagem Nos LDS

25

Um ensino de língua materna comprometido com a luta contra as desigualdades

sociais e econômicas reconhece, no quadro dessas relações entre a escola e a

sociedade, o direito que tem as camadas populares de apropriar-se do dialeto de

prestígio, e fixa-se como objetivo levar os alunos pertencentes a essas camadas a

dominá-lo, não para que se adaptem às exigências de uma sociedade que divide

e descrimina, mas para que adquiram um instrumento fundamental para a

participação política e a luta contra as desigualdades sociais. (2001, p. 78)

Dessa forma, com a aquisição da igualdade das condições de uso da linguagem por meio

do ensino do dialeto de prestígio, as camadas populares terão acesso ao capital lingüístico social

rentável e do capital social a que tal dialeto dá acesso.

Segundo os autores visitados, o ensino de Português na contemporaneidade deve

privilegiar o trabalho com o texto, especificamente, com os gêneros em detrimento a um ensino

descontextualizado e fragmentado em partículas fonéticas, fonológicas, morfológicas, sintáticas,

semânticas, repleto de metalinguagem, em que se primava pelo ensino tradicional da gramática

normativa por meio de exercícios de repetições com palavras e frase soltas, desconexas, que

negligenciava as variações lingüísticas do Português.

O que está por trás das diferenças entre o ensino pautado no texto e o ensino pautado na

gramática são as divergentes concepções de linguagem que os fundamenta. Enquanto no primeiro

concebe-se a língua como socialmente constituída, no segundo ela é vista como sistema pré-

estabelecido, como se para a criança ou mesmo um estrangeiro aprender a usar uma língua

bastasse ler um dicionário ou uma gramática. Isso seria improvável, pois, como afirma Bakhtin

(2002), não nos comunicamos por palavras ou frases, mas por textos que se materializam sob a

forma de gêneros com as mais diversas funções e intenções.

Assim, o objetivo das aulas de Português deve ser o desenvolvimento do domínio dos

gêneros que circulam socialmente.

1.3 Os documentos oficiais e o ensino de Língua Portuguesa

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Ensino Fundamental e Médio de Língua

Portuguesa refletem as mudanças decorrentes do desenvolvimento de novas correntes teóricas

Page 27: Noticia e Reportagem Nos LDS

26

como a Análise do Discurso, a Lingüística Textual, a Pragmática entre outras em evidência no

contexto histórico-social ao qual foram produzidos.

Tanto nos PCN de Ensino Fundamental quanto nos de Ensino Médio de Língua

Portuguesa, a linguagem é entendida com atividade discursiva em que:

o objetivo de ensino [...]é o conhecimento lingüístico e discursivo com o qual o

sujeito opera ao participar das práticas sociais mediadas pela linguagem [...]

Nesta perspectiva, não é possível tomar como unidades básicas do processo de

ensino as que decorrem de uma análise de estratos – letras/fonemas, sílabas,

palavras, sintagmas, frases – que, descontextualizados, são normalmente

tomados como exemplos de estudo gramatical e pouco têm a ver com a

competência discursiva. Dentro desse marco, a unidade básica do ensino só pode

ser o texto. (BRASIL, 1998, p. 22-23)

Nesses documentos da educação brasileira, a ênfase do ensino do Português é dada ao

texto, portanto “quando se pensa no trabalho com textos, outro conceito indissociável diz respeito

aos gêneros” (BRASIL/SEMTEC, 2002, p.77), por serem a materialização do todo da linguagem.

Segundo os PCN, há de se priorizar o estudo aprofundado de uma diversidade de gêneros

que pertençam a usos públicos da linguagem, que são aqueles que correspondem às

características da modalidade escrita da linguagem, embora muitas vezes sejam orais como o

debate ou palestra, e que apareçam com mais freqüência na realidade social e no universo escolar.

Assim, os PCNEM e o PCN+, sua complementação, adotam a perspectiva de que as

instituições de ensino devem “abandonar o tradicional esquema das estruturas textuais (narração,

descrição, dissertação)” e incorporar em seus currículos a abordagem de gêneros que circulam

socialmente, como:

na literatura, o poema, o conto, o romance, o texto dramático, entre outros;

no jornalismo, a nota, a notícia, a reportagem, o artigo de opinião, o editorial,

a carta ao leitor;

nas ciências, o texto expositivo, o verbete, o ensaio;

na publicidade, a propaganda institucional, o anúncio;

no direito, as leis, os estatutos, as declarações de direitos, entre outros.

(BRASIL/SEMTEC, 2002, p.77)

As propostas contemporâneas para a educação brasileira colocam o estudo dos gêneros

em papel central no ensino de Língua Portuguesa, uma vez que estarão presentes em todas as

práticas de ensino da língua, tanto nas de leitura e escrita, quanto nas de reflexão lingüística

apontadas nesses documentos, sendo apresentado nos PCN um diálogo com a concepção de

Page 28: Noticia e Reportagem Nos LDS

27

ensino de língua defendida pelos autores visitados anteriormente (Geraldi (1997; 2002), Possenti

(1996), Soares (2001) e Bagno (2001; 2003)).

Dessa maneira, nosso objetivo de trabalho é analisar as propostas de ensino dos gêneros

notícia e reportagem em livros didáticos de Ensino Médio de Língua Portuguesa, aprovados pelo

PNLEM/2009, por ser o trabalho escolar centrado nos gêneros textuais eficaz no

desenvolvimento de capacidades de linguagem (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), por ser

recomendado nas diretrizes de ensino, além de esses gêneros jornalísticos contribuírem à

formação crítica do aluno - um dos objetivos dessa etapa da educação.

A seguir, trataremos do livro didático, porque será nele que veremos as concepções de

linguagem sendo levadas até os alunos.

1.4 O livro didático: um objeto multifacetado

Como nossa pesquisa tem por objetivo analisar as propostas de trabalho voltadas aos

gêneros notícia e reportagem em livros didáticos de Língua Portuguesa, recomendados pelo

PNLEM/2009, apresentaremos a constituição atual do livro didático como forma de

contextualizá-lo no cenário educacional contemporâneo.

O livro didático constitui-se como um objeto familiar, facilmente reconhecível, entretanto

apresenta-se como uma fonte de pesquisa extremamente complexa por envolver em seu processo

de produção diversos fatores tais como econômicos, sociais, culturais e ideológicos que o

influenciam e não devem ser ignorados ao tomá-lo como objeto de estudo.

Configurando-se como um objeto multifacetado, tem despertado o interesse de

pesquisadores de variados campos do saber desde a década de 1960, sendo investigado,

principalmente, enquanto:

...produto cultural; como mercadoria ligada ao mundo editorial e dentro da lógica

de mercado capitalista; como suporte de conhecimentos e de métodos de ensino

das diversas disciplinas e matérias escolares; e, ainda, como veículo de valores,

ideológicos ou culturais. (BITTENCOURT, 2004, p. 471)

O livro didático gera conflitos e debates tanto nas escolas, entre professores,

coordenadores, diretores e alunos, quanto nos meios acadêmico, político e editorial. O professor e

pesquisador Ezequiel Theodoro da Silva, em um de seus trabalhos, refere-se ao livro didático

Page 29: Noticia e Reportagem Nos LDS

28

como “insubstituível muleta”, defendendo que haverá uma melhora na qualidade do ensino

quando o professor abandonar tais muletas e “caminhar com as próprias pernas, com autonomia e

decisão” (1996, p. 8).

Geraldi, ao tratar do ensino, também critica os materiais didáticos, chamando-os de

“parafernália didática” (1997, p. 93). Segundo o autor, com a „democratização do ensino‟ houve a

necessidade do aumento do número de profissionais capacitados para atuarem nas salas de aula,

conseqüentemente foram criados programas de formação de professores de curta duração e de

baixa qualidade. Dessa forma, a solução foi o livro didático que servia tanto para formar os

alunos, quanto para auxiliar os professores mal formados. Antes do aumento da demanda por

docentes, estes eram os próprios produtores do conhecimento, ao passo que, com o livro didático,

tornaram-se controladores do processo ou transmissores de conhecimentos veiculados nestas

obras.

É evidente que há autores que compartilham das idéias defendidas por Silva e Geraldi, ou

seja, que condenam o uso do livro didático, entretanto há aqueles que defendem seu uso por ser

indiscutível o fato de o livro didático manter-se como fundamental no processo de escolarização e

letramento, sendo mesmo o único material impresso de leitura a que as classes menos

privilegiadas têm acesso (ROJO; JURADO, 2007). Isto é, graças às políticas públicas que

desenvolveram o PNLD, milhões de alunos têm acesso a um variado material de leitura.

Assim, este trabalho não pretende condenar ou defender o livro didático, mas sim analisar

as propostas de ensino de Língua Portuguesa neles apresentadas por ser ele um dos únicos

recursos didático-pedagógicos disponíveis a professores no cenário atual como instrumentos de

ensino – sejam chamados de “parafernálias”, “muletas”, ou não – eles permeiam as salas de aulas

brasileiras, e cabe aos estudiosos deste campo de conhecimento refletir sobre suas implicações

para o ensino de língua.

Como já afirmamos, facilmente reconhecemos um livro didático, mas o mesmo não ocorre

para defini-lo. O termo „livro didático‟, usado muitas vezes como sinônimo de material didático

ou material pedagógico, vem apresentando variadas definições por dizer respeito a um grupo

heterogêneo de suportes textuais que circulam na escola como: livros, cartilhas, álbuns, cartazes,

apostilas, cadernos de atividades, cadernos de exercícios, folhetos, etc., dificultando a elaboração

de uma definição precisa.

Page 30: Noticia e Reportagem Nos LDS

29

O pesquisador Antônio Augusto Gomes Batista conceitua o livro didático como “livro ou

impresso empregado pela escola, para o desenvolvimento de um processo de ensino ou de

formação” (1999, p. 534). Contudo, em sua obra, apresenta distintas conceituações de vários

autores ou mesmo de instituições das quais caracteriza as concepções, em casos restritos, como a

conceituação do PNLD que somente adquiri materiais na forma de livro, e em outros

excessivamente amplos, como as que definem o livro didático como documentos pedagógicos.

A conceituação dos livros ou impressos empregados pela escola, segundo Batista, diz

respeito ao processo de produção dos mesmos. Assim, há obras destinadas à escola e outras nela

utilizadas. Portanto, ele pensa em livro didático como sendo “textos que são tanto produzidos

quanto impressos tendo em vista o mercado escolar” (1999, p. 546). Porém, afirma que algumas

obras pertencentes a esse mercado escolar passaram por processo de autonomia e não são mais

percebidas como tais, que é o caso dos dicionários, das gramáticas e dos atlas que conquistaram

espaço fora da escola.

Ocorre, também, o processo inverso, ou seja, textos de diferentes esferas sociais são

incorporados no livro didático: notícias, reportagens, quadrinhos, anúncios publicitários, entre

outros. Fato que demonstra que estudar estas fontes permite analisar as relações da cultura escolar

com outras esferas de produção cultural.

Alain Choppin (1992), ao realizar uma pesquisa com a produção editorial francesa

destinada à escola, propõe quatro categorias, as quais, segundo Batista, podem ser aplicadas à

produção brasileira. São elas: manuais e seus satélites (livros e seus acompanhamentos tais como

cds de áudio, cd-roms, entre outros), edições clássicas (obras clássicas adaptadas ao nível dos

educandos com explicações), obras de referência (dicionários, gramáticas, atlas, entre outros) e

obras paraescolares (complementação ao ensino). Choppin não tinha por objetivo investigar os

problemas advindos da utilização desses materiais, nem os „contratos‟ entre leitores por eles

previstos, que propõem modos de abordagem e de leitura.

Batista (1999) apresenta dois modelos de contratos de leitura e utilização propostos pelo

livro didático. O primeiro dirigia-se ao professor, possibilitando-lhe alto grau de autonomia. O

segundo, que prevalece hoje, é dirigido diretamente ao aluno e passa a ter um caráter consumível.

Tal instabilidade na produção didática é fruto da “complexidade do conjunto de fatores que

condiciona sua elaboração, produção, comercialização e utilização”, ou seja, fruto das condições

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30

de produção dos materiais didáticos como “fatores econômicos e tecnológicos, de ordem

educacional e pedagógica e de ordem social e política” (BATISTA, 1999, p. 554).

Destacamos a seguir um fragmento em que Batista (1999, p. 566) evidencia a

complexidade do livro didático, objeto sob o qual nos debruçamos em nossa análise:

Ele é uma mercadoria e, como tal, é dependente das condições materiais,

econômicas e técnicas de uma determinada época, no quadro de uma

determinada sociedade. Como mercadoria, é dependente também do mercado que

o acolhe e para o qual se destina [...] Mas essa mercadoria produzida para a

escola é também, por último, dependente do estado das relações de força entre

diferentes grupos sociais e políticos de uma determinada formação social e,

assim, do modo como o estado, por meio de sua ação, legitima a estrutura dessas

relações ou deseja modificá-las.

Assim, o livro didático constitui-se como um objeto multifacetado por ser construído por

dimensões subjacentes ao seu processo e contexto de produção, revelando ideologias e lutas

simbólicas por meio de suas escolhas e silenciamentos, comprometidos com a sociedade de sua

época (BATISTA, 1999). Portanto, pensamos que a presença ou ausência dos gêneros notícia e

reportagem, bem como a abordagem dada a eles nos livros didáticos de Ensino Médio,

recomendados por órgãos oficiais, revelará a concepção de ensino de Língua Portuguesa neles

legitimada.

Passemos à descrição da origem histórica dos livros didáticos como forma de

contextualizá-los no cenário educacional contemporâneo.

1.5 O livro didático brasileiro e o PNLEM

O livro didático perpassa um longo percurso de mais de 20 séculos na história da escola e

do ensino. Foi criado na Grécia antiga, mas circulou por todas as sociedades nas mais diversas

formas e com específicos objetivos educacionais. Contudo, com ele sempre se buscou contribuir

no ensino e aprendizagem.

Choppin, em sua obra História dos livros e das edições didáticas (2004), afirma que o

gênero escolar origina-se, inicialmente, da literatura religiosa. No Brasil, a ação pedagógica foi

conduzida pela Companhia de Jesus cerca de duzentos e dez anos, isto é, durante todo o período

colonial foram os jesuítas quase os únicos educadores da colônia. Desta forma, foi a literatura

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31

religiosa, com algumas adaptações, que reinou nos ambientes de ensino e de aprendizagem

existentes na época, configurando-se como a primeira versão didática empregada no Brasil.

Segundo Fernando de Azevedo (1964), os jesuítas promoveram uma educação popular aos

índios, brancos e mestiços nas escolas elementares, base do ensino colonial, em que se ensinava a

catequese, a ler, a escrever, a contar e a falar Português, sendo eles os agentes de desintegração

dos valores nativos, embora ainda os protegessem da escravidão e até do extermínio.

A partir de sua chegada, os jesuítas adotaram a política de que onde houvesse uma igreja

haveria uma escola, fundando uma organização educacional que se ampliava à medida que o

domínio português crescia. José de Anchieta teve papel fundamental na instrução. Ele era

conhecido por suas virtudes evangélicas e intelectuais, recebeu o título de mestre-escola,

educador, protetor e apóstolo dos índios. Devido à falta de livros e materiais para o ensino da

“leitura, escrita e bons costumes”, era ele quem produzia canções, peças de teatro e organizava

cartilhas que, copiados e recopiados, constituíam o material didático usado em todos os colégios

existentes (AZEVEDO, 1964, p. 14).

Entretanto, em 1759, os jesuítas são expulsos das terras brasileiras e inicia-se um lento

processo de organização de uma política educacional. De acordo com Lajolo e Zilberman (1998),

por volta dos anos de 1800, nas poucas escolas estabelecidas, eram utilizados livros didáticos

importados, principalmente, da França e de Portugal, usados em seus idiomas originais, refletindo

a classe social e econômica privilegiada do alunado que possuía acesso à escola. Porém, esses

livros dividiam espaço com a Bíblia, o Código Criminal e cartas que serviam como manuais de

ensino e leitura devido à escassez de livros.

Somente em 1850, começaram a existir os primeiros livros didáticos nacionais, em virtude

da revolta dos escritores brasileiros em relação à inadequação das obras estrangeiras à realidade

educacional do país.

A partir de 1930, o governo toma várias medidas para controlar a produção e distribuição

de livros didáticos, estabelecendo programas e comissões. Segundo Bueno (2002), podemos

dividir a história do livro didático no Brasil em três momentos: o primeiro corresponderia de 1500

a 1930, em que se partiu do uso das cartilhas jesuíticas para os livros importados e, enfim, para a

produção editorial brasileira; o segundo, de 1930 a 1985, período em que o governo estabeleceu

políticas públicas para a compra e distribuição do livro didático; e o terceiro que se iniciou em

1985 com a criação do atual PNLD pelo Ministério da Educação (MEC), por meio de recursos do

Page 33: Noticia e Reportagem Nos LDS

32

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE. Entretanto, é só a partir do terceiro

período que há uma preocupação com a qualidade didático-pedagógica do livro.

O PNLD que tinha o objetivo de adquirir e distribuir gratuitamente os livros didáticos aos

alunos do Ensino Fundamental da rede pública, em 1993, passou, também, a ser responsável pela

avaliação dessas obras. Para tanto, hoje existe uma comissão de professores especialistas

responsável pela avaliação da qualidade dos livros didáticos. Dessa forma, as editoras enviam

suas publicações para análise à comissão responsável, a qual elabora um catálogo, contendo a

síntese das obras aprovadas para o professor realizar a escolha daquele que adotará.

Somente em 2004, foi implantado o PNLEM, ampliação do PNLD à próxima etapa da

educação brasileira, o Ensino Médio público. O programa iniciou a distribuição com livros das

disciplinas Português e Matemática, conseguindo universalizar a distribuição em 2006, para então

iniciar a distribuição de livros das outras disciplinas do currículo.

O quadro a seguir traz alguns dados a respeito do PNLEM referentes à distribuição dos

livros de Português e Matemática:

QUADRO 1. Dados do PNLEM5

Ano de

aquisição

Ano letivo do

PNLEM

Alunos

beneficiados

Escolas

beneficiadas

Livros

Financeiro

R$

2004 2005 1.304.477 5.392 2.705.048 47.273.737,00

2005 2006 7.012.619 13.253 12.581.620 143.834.244,00

2006 2007 6.896.659 15.570 9.175.439 124.275.397,18

Como é apontado no quadro, mais de 15 milhões de alunos do Ensino Médio em todo o

país têm acesso aos livros didáticos distribuídos pelo PNLEM, que se configura como o maior

programa de livro didático do mundo (BITTENCOURT, 2004).

Passaremos a refletir sobre o PNLEM e seus critérios de avaliação, tendo como base o

Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio de Língua Portuguesa, elaborado

pela equipe de especialistas do PNLEM e enviado às escolas para que os professores realizem a

escolha, sendo nele apresentado a síntese dos livros aprovados, orientações à escolha e os critérios

avaliados.

No catálogo do PNLEM/2005 (BRASIL/SEMTEC, 2004, p. 7-8) é afirmado que:

5 Quadro elaborado por meio de dados disponíveis no endereço eletrônico: http://www.fnde.gov.br, acessados em

janeiro de 2008.

Page 34: Noticia e Reportagem Nos LDS

33

Longe de ser a única possibilidade de trabalho, o livro didático é um instrumento

que, utilizado como complemento do projeto político-pedagógico da escola,

certamente contribuirá para promover a reflexão e a autonomia dos educandos,

assegurando-lhes aprendizagem efetiva e contribuindo para fazer deles cidadãos

participativos. [...] Em momento algum o livro será um substituto do professor ou

de suas experiências pedagógicas, mas poderá ser um bom referencial para

ampliar os trabalhos em sala de aula.

Portanto, o livro didático nas propostas do PNLEM/2005 e PNLEM/2009 é concebido

como um instrumento de ampliação e complementação às atividades de ensino e aprendizagem na

sala de aula, isto é, um dos únicos instrumentos didático-pedagógicos disponíveis a professores e

alunos são designados por órgãos oficiais como elementos complementares, eximindo, assim, o

livro didático de quaisquer falhas e incompletudes, centrando a responsabilidade do ensino na

figura do professor.

Embora ambos os catálogos apresentem os mesmos princípios pedagógicos, o catálogo do

PNLEM/2009 traz as análises das obras de modo mais detalhado: descreve passo a passo a

organização dos capítulos ou unidades das obras, apresenta os aspectos positivos e negativos,

realça quais conteúdos deverão ser complementados pelo professor, traz informações sobre o

referencial teórico utilizado pelo autor, mesmo os livros sendo um elemento complementar ao

ensino.

Fazem parte do processo de avaliação dos livros didáticos critérios classificatórios e

critérios eliminatórios. Sendo incorreções dos conceitos e das informações básicas, bem como

desrespeito aos princípios de construção da cidadania e a incoerência metodológica critérios

eliminatórios. Dessa forma, segundo o catálogo do PNLEM/2005 (BRASIL/SEMTEC, 2004,

p.10-11), é eliminada a obra que:

formular erroneamente os conceitos que veiculem;

fornecer informações básicas erradas e descontextualizadas;

mobilizar de forma inadequada esses conceitos e informações, levando o

aluno a construir de forma incorreta conceitos e procedimentos;

privilegiar um determinado grupo, camada social ou região do País;

veicular preconceitos de origem, cor, condição econômico-social, etnia,

gênero, orientação sexual, linguagem ou qualquer outra forma de

discriminação;

divulgar matéria contrária à legislação vigente para a criança e o adolescente,

no que diz respeito a fumo, a bebidas alcoólicas, a medicamentos, a drogas e a

armazenamentos, entre outros;

Page 35: Noticia e Reportagem Nos LDS

34

fazer publicidade de artigos, de serviços ou de organizações comerciais,

salvaguardada, entretanto, a exploração estritamente didático-pedagógica do

discurso publicitário;

fazer doutrinação religiosa.

São postulados três critérios principais para que os livros cumpram adequadamente sua

função didático-pedagógica:

correção das informações, conceitos e procedimentos que integram o

componente curricular;

adequação de sua proposta didático-pedagógica em relação de situação de

ensino-aprendizagem e aos objetivos visados;

sintonia com a legislação e os demais instrumentos oficiais que regulamentam

e orientam a Educação Nacional. (BRASIL/SEMTEC, 2004, p. 10)

Enfatiza-se, ainda, a importância da coerência e adequação metodológicas, exigindo-se

que as escolhas teórico-metodológicas sejam explicitadas e fundamentadas por meio do livro do

professor, cuja qualidade é também avaliada.

Segundo O Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino de 2009, onze livros

didáticos de Língua Portuguesa foram aprovados, sendo o corpus de análise desta pesquisa, que

será apresentado adiante, composto por alguns deles.

1.6 O livro didático de Língua Portuguesa

O livro didático de Língua Portuguesa tornou-se um interessante objeto de estudo em

especial pelas mudanças que vem sofrendo ao longo dos anos. São muitas as pesquisas que

investigam este objeto multifacetado com os mais variados enfoques teóricos e metodológicos,

porém há uma demanda por estudos que enfoquem o livro de Ensino Médio.

Basta folhearmos um livro didático de Português mais antigo, por volta da década de 1970

ou 1980, e o compararmos com os atuais que notamos diferenças, principalmente quanto às

abordagens teórico-metodológicas e ao aspecto visual, entretanto esta obra sempre manteve

relações com o texto.

Até a década de 1960, os livros de Português eram compostos exclusivamente por textos

literários. Seus módulos ou unidades eram organizados a partir de um texto principal, cujas

Page 36: Noticia e Reportagem Nos LDS

35

propostas de estudo eram voltadas às formas estéticas, estruturais e temáticas. Algumas obras

traziam também dois ou três textos complementares.

Conforme Bezerra (2003), com o desenvolvimento da lingüística estrutural e da teoria da

comunicação na década de 1970, os livros começam a apresentar textos não-literários como os

jornalísticos e histórias em quadrinhos, além dos literários. Contudo, somente na modalidade

escrita da língua, pois a oral não era considerada como texto. Aos textos não-literários, o enfoque

era dado aos seus aspectos estruturais e temáticos.

Os livros didáticos de Língua Portuguesa das décadas de 1960, 1970 e até os de 1980 são

semelhantes. Somente a partir de 1990, com a publicação dos PCN influenciado por novas teorias

do campo da linguagem e discurso, que se pode dizer que há uma ruptura na tradição didática dos

livros de Português. Assim, devido aos novos postulados ao ensino da Língua Portuguesa

preconizados nos PCN, os livros renovaram-se, abordando “o tema com uma coletânea de textos

de variados gêneros, predominantemente, autênticos, ou seja, não escritos com finalidades

didáticas, mas com uso constante na nossa sociedade letrada”(Ibid., p. 40). Tal mudança é

conseqüência de questões políticas e econômicas do contexto social de produção dessas obras,

como Batista pontua (1999), pois o mercado editorial renovou-se com vistas a uma boa avaliação

nos programas do governo.

Já que nos PCN os gêneros são apresentados como a base de todo o ensino de língua

materna, é imprescindível sabermos como os livros de Ensino Médio incorporaram essa mudança,

isto é, qual é o tratamento didático neles proposto para o desenvolvimento de capacidades de

linguagem dos alunos.

Assim, passaremos a visitar a obra de autores que se dedicaram a investigar e discutir

algumas questões relativas a essas obras didáticas atuais. Marcuschi (2003), ao analisar os

exercícios de compreensão propostos em livros didáticos de Português de Ensino Fundamental e

Médio, concluiu que entre os livros mais antigos e os atuais há acentuada diferença, entretanto

ambos apresentam problemas. Enquanto os mais antigos apresentam menos textos, mais

exercícios gramaticais e atividades de compreensão de texto equivocadas; os livros de 1990, mais

recentes, já apresentam uma nova concepção de texto, apresentam maior variedade textual, menos

exercícios gramaticais e mais discussão pessoal, embora ainda não abordem a variedade

lingüística e a oralidade. Para o autor, “os livros melhoraram o aspecto visual, mas são menos

densos e mais dispersivos” (2003, p. 52).

Page 37: Noticia e Reportagem Nos LDS

36

Bezerra (2003), que também analisa livros didáticos de Português de Ensino Fundamental

e Médio contemporâneos, mas enfocando especificamente os textos neles veiculados, afirma que

a seleção textual é diversificada e atual, ou seja, esses livros são repletos dos mais variados

gêneros, propiciando aos alunos o contato com gêneros que circulam nas variadas esferas sociais

de comunicação. Contudo, a abordagem a eles dada é inadequada, não há propostas de reflexões

críticas sobre os usos da linguagem, havendo falta de aprofundamento nas abordagens.

Para a pesquisadora, apreende-se a ausência de embasamento teórico dos autores desses

livros. Fato que também se reflete nas palavras de Marcuschi (2003, p. 57) que, quanto aos

exercícios de compreensão de texto, afirma a “total falta de critérios para a organização dos

exercícios de compreensão”, além de “falta de clareza quanto ao que se deve entender por

compreensão de texto”. Para ele, compreensão é um “processo criador, ativo e construtivo que

vai além da informação estritamente textual” (Ibid, p. 58, grifos do autor). As atividades de

compreensão de texto, na maioria dos livros por ele analisados, são correspondentes a exercícios

de cópia de conteúdos do texto ou ainda questões pessoais, que não “levam a reflexões críticas

sobre o texto e não permite expansão ou construção de sentido, o que sugere que compreender é

apenas identificar conteúdos” (Ibid., p. 51).

Bueno (2002, p. 07), ao investigar a inclusão dos gêneros da mídia nos livros de Português

de Ensino Fundamental, conclui que, embora esses gêneros sejam bastante usados nos livros, “não

é o gênero que é explorado”, isto é, os gêneros da mídia veiculam nos livros didáticos como

pretexto para o ensino de gramática ou para a exploração do tema e, se tratando do gênero notícia,

há um pouco do estudo da estrutura textual. Faz-se necessário sabermos se isso ocorre também

nos livros didáticos de Português voltados ao Ensino Médio.

Portanto, não há como negar que “o livro didático de Língua Portuguesa passou a ser o

depositário de uma variedade de textos, dos quais, muitas vezes, o aluno só terá contato na escola,

isto porque grande parte da clientela da rede pública, em especial, não tem acesso a jornais,

revistas, obras literárias, etc.” (GARÉ, 2004, p. 73).

Contudo, não basta apenas incluir tais textos nos livros, há de se trabalhá-los de forma

profunda em que haja a construção ativa do sentido, levando-se em conta as condições de

produção, a exploração das características dos gêneros, a análise lingüística, para proporcionar ao

aluno condições a realização de reflexões críticas sobre o texto e o desenvolvimento de

Page 38: Noticia e Reportagem Nos LDS

37

capacidades de linguagem dos alunos, fato que esta pesquisa busca analisar ao enfocar a

abordagem dada aos gêneros notícia e reportagem nos livros didáticos de Ensino Médio.

Os livros didáticos de Português contemporâneos apresentam pontos positivos como: o

contato com uma variedade de gêneros pertencentes às variadas esferas de circulação social, que

muitas vezes o aluno não teria acesso se não por meio dele; textos atuais e interessantes; aspectos

visuais atraentes. Entretanto, há de se pensar, refletir e rever os modos de se abordar tais textos

para que se favoreça a aprendizagem efetiva da língua, que somente se concretizará por meio do

estudo sistemático dos gêneros na escola.

É imprescindível destacarmos que as questões problemáticas encontradas nos livros

didáticos de Português não invalidam sua utilização em sala de aula, até porque há muitos deles

com contribuições inegáveis. Enfim, mesmo o mais perfeito e completo livro didático não

garantirá o sucesso da aprendizagem de uma língua. O livro didático constitui-se apenas como um

instrumento de apoio que pretende contribuir no processo de ensino-aprendizagem do Português,

cabendo ao professor complementá-lo, adaptá-lo e muitas vezes corrigi-lo.

Pensamos que analisar esse material que acompanha o professor, o aluno, e o ensino de

Língua Portuguesa no Ensino Médio é uma das formas de refletirmos sobre o ensino nessa etapa

da educação com vistas a sua melhora, porém não podemos centrar o processo de ensino-

aprendizagem estritamente na relação professor-aluno-material didático, desprezando outros

elementos constitutivos do trabalho do professor. Segundo Bueno (2007, p. 41), apoiando-se nas

discussões de Machado (2007), ele define o trabalho do professor como:

...uma atividade dirigida ao próprio professor, ao seu objeto, que é organizar um

meio de trabalho coletivo que propicie a aprendizagem de determinados

conteúdos disciplinares e o desenvolvimento de determinadas capacidades dos

alunos, e também dirigida aos outros (alunos, pais, colegas professores, chefes,

sociedade, a própria atividade, os outros dentro do próprio sujeito, etc.).

As relações sociais que interpelam o trabalho do professor influenciam em seu agir

docente. Assim subjacente à relação professor-aluno-material didático estão as prescrições oficiais

de ensino, as prescrições internas a cada instituição escolar, a interação entre pais, grupo docente,

direção e funcionários da instituição, a comunidade em que a escola está inserida, os instrumentos

de ensino disponíveis ao professor (giz, lousa, livro didático, laboratório de informática, etc.),

além de outros elementos. Desta forma, o trabalho realizado pelo professor em sala de aula é

direcionado e instrumentalizado por elementos interligados (MACHADO, 2007).

Page 39: Noticia e Reportagem Nos LDS

38

Neste momento, torna-se inviável aprofundarmos em tais questões devido à complexidade

que nelas se opera, buscamos apenas ressaltar alguns dos aspectos constitutivos do agir docente

como forma de contextualizá-lo no cenário educacional contemporâneo.

No capítulo seguinte, apresentaremos as bases teórico-metodológicas que permearão este

trabalho.

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39

Capítulo 2

GÊNEROS TEXTUAIS

Este capítulo apresenta as teorias de gêneros com as quais dialogaremos no decorrer deste

trabalho e o modelo didático a que chegamos para o domínio dos gêneros notícia e reportagem.

A escolha de tais teorias se justifica devido à grande representatividade delas na

contemporaneidade, constituindo-se como referência básica da área, e por fundamentarem as

diretrizes nacionais de ensino de Língua Portuguesa. Buscamos contextualizar a questão dos

gêneros da teoria clássica até os estudos modernos, para então nos dedicar a apresentação da

teoria dos gêneros do discurso de Bakhtin por ser a precursora. Em seguida, tratamos da

perspectiva de gênero presente na obra de J-P Bronckart (2003) e de seu suporte teórico-

metodológico, enfocando seu modelo de análise de textos. Realizamos ainda a exposição das

propostas didático-pedagógicas de Schneuwly e Dolz (2004) voltadas ao ensino da língua

materna por meio da modelização didática dos gêneros e por fim apresentamos os modelos

didáticos dos gêneros notícia e reportagem aos quais chegamos a fim de orientar as análises dos

livros didáticos de nosso corpus. Assim, este trabalho fundamenta-se, principalmente, na obra

destes autores que dialogam entre si, visto que Schneuwly e Dolz partem da teoria de gêneros de

Bronckart e a aplicam ao ensino de línguas.

2.1 A questão dos gêneros

Decorrente do desenvolvimento dos estudos da linguagem e do surgimento de novas

vertentes teóricas como a Análise do Discurso, a Lingüística Textual, a Pragmática, entre outras,

os PCN colocam o texto e o gênero como centrais nas propostas de ensino de Língua Portuguesa,

desse modo, reconhecendo e privilegiando a dimensão discursiva do texto e postulando os

gêneros como unidades básicas de ensino de língua, uma vez que a linguagem materializa-se

socialmente por meio dos gêneros: instrumentos de comunicação.

Questões relacionadas aos gêneros como sua conceituação, classificação e aplicações

didáticas, têm despertado a atenção de pesquisadores. É notável o grande número de pesquisas e

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40

publicações que abordam o tema à luz de variadas perspectivas teóricas. Os trabalhos em torno

dos gêneros de autores como Bakhtin (1991; 2000; 2002), Maingueneau (2001), Bronckart

(2003), Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2002), Rojo (2005), Machado (2005), entre outros,

configuram-se como referência fundamental desse campo de estudo.

Embora a noção de gêneros tenha recebido destaque com o desenvolvimento dos

modernos estudos e teorias da linguagem, eles já haviam sido pensados pela teoria clássica, tanto

pela poética quanto pela retórica desde os estudos de Platão e Aristóteles, pois a Lingüística

como ciência específica da linguagem é recente e inicialmente dedicava-se ao estudo de unidades

menores que o texto como o fonema, a palavra, a frase, etc. Quando começa a se preocupar com

o texto, o gênero torna-se uma de suas grandes questões.

Alguns exemplos clássicos de classificações de gêneros caracterizam a antiga

preocupação com o assunto como: a abrangente distinção entre a poesia e a prosa; a distinção

entre gêneros lírico, épico e dramático, desde Platão; a antiga distinção entre comédia e tragédia;

a classificação de três gêneros oratórios: judiciário, deliberativo e epidítico, realizada por

Aristóteles em sua obra Arte Retórica.

Como se constata, o estudo dos gêneros perpassa desde a antiguidade clássica até a

contemporaneidade como uma temática constante, mostrando-se não só como objeto de

investigação da área da linguagem, mas de diversos campos do saber. Fato que caracteriza a

variedade de abordagens em torno da questão, resultando, em alguns casos, no uso de

metalinguagem sem definições claras. Brandão (2003, p.19) pontua que “se tem usado às vezes

indistintamente os termos: gêneros, tipos, modos, modalidades de organização textual, espécie de

texto e de discursos,” sem as necessárias especificações e conceituações.

Bakhtin desenvolveu sua teoria dos gêneros do discurso e a partir dela foram realizadas

releituras que ora se aproximam de sua obra, ora se distanciam. Dessa forma, partiremos para a

apresentação da perspectiva defendida por alguns autores de grande representatividade no campo

dos gêneros, com os quais dialogaremos em nossa análise. Iniciaremos pela exposição da teoria

dos gêneros de Bakhtin por ser a precursora.

Page 42: Noticia e Reportagem Nos LDS

41

2.2 Bakhtin e a teoria dos gêneros

É fundamental que compreendamos a filosofia dialógica da linguagem que permeia a

obra de Bakhtin e de seu Círculo para que pensemos os gêneros do discurso como propõe o

autor: considerando o dialogismo do processo interativo.

A primeira vez que o conceito „gêneros do discurso‟ veicula na obra bakhtiniana,

conforme Souza (2002), é em The Formal Method In Literacy Scholarship (1928), criticando os

formalistas por preocuparem-se com a língua enquanto sistema, isto é, com a fonética, o léxico, o

sintático, a gramática, em detrimento do todo, que para Bakhtin é o enunciado ou enunciação,

gerado por seu contexto social de comunicação. Para ele, comunicamo-nos por enunciados e

nunca por orações, sendo, pois, os gêneros do discurso formas desse enunciado que dependem

muito mais do contexto comunicativo e da cultura do que da própria palavra (BAKHTIN, 2000).

Embora o conceito já houvesse aparecido, é no ensaio intitulado Gêneros do Discurso

(1952-1953) que há um enfoque à problemática e a definição teórica dos gêneros. Tal trabalho

era parte de um projeto mais abrangente do autor que não pode ser concretizado.

Bakhtin desenvolveu sua teoria dos gêneros com um olhar voltado à literatura (prosa),

especificamente à estilística, o que não a impede de ser transferida ou aplicada a outros campos,

como fizeram autores como Maingueneau, Bronckart, Schneuwly e Dolz, entre outros, que

realizaram seus estudos sobre gêneros a partir de sua releitura dos postulados bakhtinianos.

O filósofo russo distancia-se das conceituações clássicas de gênero da Retórica e da

Poética por pensar nas diversas esferas de comunicação e nos diferentes usos da linguagem,

dando subsídios para se pensar e transferir suas colocações aos gêneros modernos como os dos

meios de comunicação de massa e mídias digitais, como o faz Maingueneau, apesar de Bakhtin

ter se dedicado às práticas prosaicas sem mencioná-los (MACHADO, 2005).

Um dos conceitos-chave para a compreensão da teoria dos gêneros do discurso de

Bakhtin é a compreensão do conceito de enunciado ou enunciação, como preferem alguns

tradutores. Para o teórico russo, a comunicação verbal se dá por meio de enunciados, entretanto,

esses enunciados não são simples orações ou frases com unidade de sentido, mas compreendem a

um todo, a uma totalidade comunicacional, que propicia ao outro a possibilidade de resposta.

Dessa forma, o todo do enunciado é determinado pelo “tratamento exaustivo” do assunto, “o

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42

intuito” ou objetivo do locutor, “as formas típicas de estruturação do gênero” (BAKHTIN, 2000,

p. 299). Em outras palavras:

Em qualquer enunciado [...] captamos, compreendemos, sentimos o intuito

discursivo ou o querer-dizer do locutor que determina o todo do enunciado: sua

amplitude, suas fronteiras. Percebemos o que o locutor quer dizer e é em

comparação a esse intuito discursivo, a esse querer-dizer [...] que mediremos o

acabamento do enunciado. Esse intuito determina a escolha, enquanto tal, do

objeto, com suas fronteiras [...] e o tratamento exaustivo do objeto de sentido

que lhe é próprio. Tal intuito vai determinar também, claro, a escolha da forma

do gênero em que o enunciado será estruturado (Ibid., p. 300).

Portanto, de acordo como o intuito, objetivo ou intenção do locutor é que este seleciona o

gênero adequado para atingir os objetivos comunicacionais de seu enunciado. Sendo assim, os

enunciados concretizam-se na forma de gêneros do discurso.

Bakhtin propõe uma distinção entre os gêneros em primários e secundários.

Corresponderiam aos gêneros de discurso primário aqueles mais simples, espontâneos, de

linguagem cotidiana, familiar (orais, mas não exclusivamente). Enquanto os gêneros de discurso

secundário são gêneros mais complexos como o conto, o romance, o discurso científico, etc.

(escritos, mas não exclusivamente). Os gêneros secundários formam-se a partir dos gêneros

primários, que ao serem englobados nesta esfera transmutam-se e perdem seu contexto real e

imediato, tornando-se representações dos gêneros primários. Por exemplo, a apresentação de

uma conversa do tipo cotidiana em uma peça teatral é a representação desse gênero primário,

porque não há espontaneidade, nem o contexto real, fato que faz com que a peça seja um gênero

secundário. Há, portanto, a inter-relação entre os gêneros primários e secundários, sendo os

últimos a complexificação dos primeiros.

Em Bakhtin, os gêneros são “tipos relativamente estáveis de enunciados”, que apresentam

uma inesgotável variedade conforme a esfera social a que se vinculam (BAKHTIN, 2000, p.

279). São assimilados, assim como a língua materna, por meio das experiências sociais de

comunicação verbal: ouvindo e reproduzindo, pois sempre falamos por meio de gêneros do

discurso e não os aprendemos em manuais, mas na e pela interação com o social, assim

“aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do outro, sabemos de

imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o gênero” (Ibid., p. 302).

Para o autor, “a comunicação verbal seria quase impossível” sem a existência e domínio

dos gêneros, pois o caráter normativo deles facilita a eficiência da comunicação (BAKHTIN,

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43

2000, p. 302). É justamente pelo aspecto normativo dos gêneros que Bakhtin critica a lingüística

de Saussure pela oposição: fala (enunciado) como individual e língua (sistema) como social. Tal

concepção peca por ignorar que a fala, ao invés de ser individual, é coletiva, social, por se

estruturar em gêneros que são normativos, embora alguns, como os literários permitam um

pouco mais o uso de criatividade. Entretanto, os gêneros são maleáveis e flexíveis até o ponto de

que não se infrinjam suas características essenciais constitutivas de sua função comunicacional

que consistem em três elementos fundamentais:

a) Conteúdo temático: corresponde ao conjunto de temas que são dizíveis em um gênero

determinado, isto é, cada gênero do discurso engloba conteúdos temáticos que se

relacionam com sua esfera de atividade humana. Não se trata de qualquer tema em

qualquer gênero. O locutor deve selecionar aquele que melhor cumprirá a finalidade de

provocar compreensão e reação no outro;

b) Estilo: consiste no estilo lingüístico empregado nas esferas de comunicação social as

quais o gênero pertence. O estilo verbal, que compreende os recursos disponibilizados

pela língua como lexicais, sintáticos e gramaticais, não devem ser dissociados de seu

gênero. Por exemplo, na esfera jornalística de comunicação, o estilo do gênero notícia

corresponde ao uso de linguagem padrão e objetiva, entretanto, se uma notícia veicular

em um jornal com linguagem coloquial, apresentando gírias e comentários pessoais,

causará certo estranhamento no leitor por não corresponder ao estilo esperado a tal

gênero. O estilo é constitutivo do gênero e se alterado, altera-se conseqüentemente o

gênero;

c) Construção composicional: diz respeito à organização do enunciado, a ordem de sua

apresentação, ao como dizer para atingir o objetivo ou finalidade do gênero. Como

exemplo, pensemos a organização do gênero notícia: manchete (título) e o corpo do texto

organizado na forma de pirâmide invertida (organização textual em que no primeiro

parágrafo (lide) apresentam-se todas as informações fundamentais) (PUBLIFOLHA,

2006). Se essa organização composicional não for cumprida, transmuta-se o gênero.

O conteúdo temático, o estilo e a construção composicional são indissociáveis e

essenciais à constituição dos gêneros do discurso, garantindo a eles a efetividade de suas

finalidades comunicacionais (BAKHTIN, 2000, p. 279).

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44

Passaremos, a seguir, a dialogar com autores que desenvolveram suas teorias sobre o

ensino e estudo de gêneros a partir da obra bakhtiniana para fundamentar nossa análise que é

voltada ao trabalho com gêneros em ambiente escolar, visto que os objetivos de Bakhtin, quanto

à teoria dos gêneros, diziam respeito à linguagem como social, ao enunciado e ao estudo

literário.

Uma importante referência a nosso trabalho é o suporte teórico-metodológico do

Interacionismo Sócio-discursivo desenvolvido por J-P Bronckart (2003) e, em especial, a teoria

didática de Schneuwly e Dolz (2004) que aplicam o modelo de análise de textos de Bronckart ao

trabalho escolar com gêneros. Assim, apresentaremos sumariamente o quadro teórico-

metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo e suas implicações didáticas por

fundamentarem as análises de nossa pesquisa.

2.3 Gêneros textuais na abordagem do Interacionismo Sócio-discursivo

O Interacionismo Sócio-discursivo (ISD) trata-se de uma corrente teórico-metodológica

desenvolvida pelo grupo de pesquisadores da Universidade de Genebra (Suiça), em especial por

J-P Bronckart. É nessa concepção que Bronckart (2003) propõe um modelo de análise

estabelecendo uma relação entre as condições de produção e a organização material de textos. Tal

modelo de análise não possuía fins didáticos, entretanto por contemplar dimensões relevantes ao

ensino, Schneuwly e Dolz (2004), pesquisadores do mesmo grupo, aplicaram-no ao ensino de

línguas. Apresentaremos as propostas de Bronckart, para então tratarmos da teoria didático-

pedagógica de Schneuwly e Dolz que fundamenta as orientações nacionais de ensino de Língua

Portuguesa.

Para Bronckart (2008, p. 87, ênfases do autor), o texto corresponde a “toda unidade de

produção verbal que veicula uma mensagem organizada e que visa a produzir um efeito de

coerência sobre o destinatário” ou “à unidade comunicativa de nível superior”, sendo apreendido

como produto concreto das formas de agir por meio da linguagem que apresentam características

relativamente estáveis e que se configuram em gêneros de texto, contudo tais características, no

decorrer do tempo, podem sofrer alterações refletidas pelas mudanças sociais, uma vez que os

gêneros são concebidos como instrumentos sociais de comunicação responsáveis pela mediação

Page 46: Noticia e Reportagem Nos LDS

45

das interações. Cada uma das formas de agir por meio da linguagem, isto é, cada “agir

linguageiro”, como designa o autor (Ibid. p. 87), pode corresponder a um conjunto de gêneros

possíveis, cabendo ao enunciador/emissor selecionar aquele que melhor se adequar a suas

intenções.

Bronckart, em seu modelo de análise de texto de um dado gênero, traz dois elementos

como fundamentais à compreensão e ao domínio dos textos: as condições de produção e a

arquitetura interna textual. As condições ou contexto de produção dizem respeito a fatores físicos

ou materiais e sociossubjetivos, sendo àqueles referentes ao suporte material, modalidade da

língua, momento histórico, público-alvo, identificação do emissor/enunciador e do

receptor/destinatário da produção, já as representações referentes aos aspectos sociossubjetivos

são: a postura ou papel social assumidos pelo emissor/enunciador e pelo receptor/destinatário na

interação, o objetivo ou intenção da produção. Há ainda possibilidades de representações

decorrentes da situação e dos conhecimentos temáticos e de modelos reconhecidos de gêneros

disponíveis ao produtor (BRONCKART, 2008).

Segundo Bronckart (2006; 2008), ao produzir um texto o emissor/enunciador terá que

selecionar o modelo de gênero que melhor atingirá seus objetivos e adaptá-lo às particularidades

de sua situação de interação, desenvolvendo um duplo processo. Dessa forma, o texto apresentará

características que garantam a eficiência do gênero à realização de seus objetivos

comunicacionais, mas também aspectos individuais refletidos pela seleção vocabular empregada,

pelas vozes sociais ou individuais apresentadas, entre outros de acordo com o contexto de

produção.

A arquitetura interna textual, proposta pelo ISD de Bronckart, é constituída por três níveis

estruturais superpostos: o da infra-estrutura, o dos mecanismos de textualização e o da

responsabilidade enunciativa.

O nível mais profundo do „folhado‟ textual proposto pelo autor corresponde à camada da

infra-estrutura constituída pelo plano geral do texto, que corresponde à configuração estrutural do

texto, pela mobilização de tipos de discurso e suas intercalações, pelas seqüências e outras

planificações como os scripts e as esquematizações de modo a organizar o conteúdo temático.

Os tipos de discurso são “segmentos de texto ou até mesmo um texto inteiro” que

apresentam formas lingüísticas identificáveis e passíveis de classificação devido às regularidades

Page 47: Noticia e Reportagem Nos LDS

46

de organização e de marcação lingüística que apresentam em diferentes níveis (MACHADO,

2005, p. 242, ênfases da autora):

No nível semântico-pragmático: mostram determinada relação com o

contexto físico de produção: de implicação desse contexto ou autonomia em

relação a eles e, [...] exibem determinada forma de apresentação dos

conteúdos em relação ao tempo-espaço da produção [conjunção ou

disjunção];

No nível morfossintático, cada um deles apresenta um conjunto de unidades

lingüísticas discriminativas, que marcam qual é a relação estabelecida com o

contexto e qual é a forma de apresentação dos conteúdos em relação ao

tempo-espaço da produção;

No nível psicológico, são o resultado de operações discursivas de

estabelecimento de relações entre o mundo discursivo e o mundo da

interação [...];

No nível da planificação, os conteúdos dos diferentes tipos de discurso

podem apresentar-se organizados em seqüências textuais, scripts [relatos] ou

planificações [...];

No nível do texto, os tipos de discurso podem ser definidos como segmentos

constitutivos dos textos, mas de forma variável [...].

Para Bronckart (2003; 2008), os textos são compostos por quatro tipos de discurso, a

saber: discurso interativo, discurso teórico, discurso relato interativo e discurso narração, os quais

podem ser combinados de acordo com as finalidades da interação.

O discurso interativo pertence ao mundo discursivo do expor, sendo sua compreensão

dependente do ato de produção. É lingüisticamente marcado pelos participantes da interação, 1ª e

2ª pessoa do discurso, e também pelo tempo verbal presente e pelo modo imperativo. Constitui-se

como predominante nos gêneros diálogo, conversa cotidiana, chat, entrevista, peça teatral, entre

outros.

O discurso teórico ocorre no mundo discursivo do expor, como o interativo, entretanto

apresenta autonomia quanto ao ato de produção. Nele não há marcas dos participantes da

interação, nem ao tempo e lugar da produção. O texto é narrado no presente genérico, sendo

predominante nos gêneros artigo científico, relatório de pesquisa, verbetes, monografia, entre

outros.

O discurso relato interativo apresenta disjunção com o mundo discursivo real, sendo da

ordem do narrar, mas se remete aos participantes da interação mostrando-se dependente do

Page 48: Noticia e Reportagem Nos LDS

47

contexto de produção. Ocorre predominantemente nos gêneros depoimento, biografia, relato,

diário, entre outros.

O discurso narração apresenta autonomia quanto ao ato de produção. Não ocorrendo

marcas lingüísticas dos participantes da interação, do tempo ou lugar da produção. Porém há uma

forte referência temporal absoluta (em 2007, ontem, etc.), sendo constante a presença de

organizadores temporais (advérbios, sintagmas preposicionais, coordenativos, subordinativos,

etc.) que desloca o acontecimento a um tempo disjunto do momento de interação, empregando-se

o presente genérico ou o pretérito perfeito e apenas frases declarativas. Ocorre nos gêneros

sempre monologados como notícia, reportagem, conto, além de outros. Vejamos o seguinte

exemplo6 em que os organizadores temporais e os verbos empregados estão em

destaque:

BUENOS AIRES – três múmias incas em excelente estado de conservação

foram encontradas em um vulcão localizado na Província de Salta, na

Argentina. A descoberta, divulgada ontem pela National Geographic society,

revela que os restos são de duas meninas e um menino sacrificados em um ritual

há 500 anos... (FARACO, 2003, p. 197-198, grifos nossos)

Assim esses quatro tipos de discursos são mobilizados na produção de textos por meio de

combinações. Por exemplo, em uma reportagem há a predominância do discurso narração,

contudo pode haver também a presença de um relato interativo na forma de um depoimento, além

do discurso teórico na forma de argumentos para a explicação ou justificação de algum fato.

A infra-estrutura é caracterizada ainda por uma dimensão seqüencial ou linear do

conteúdo temático. Essa dimensão se organiza em seqüências que, nas palavras de Bronckart

(2033, p. 251), são “formas de planificação convencional, também em número restrito [como os

tipos de discurso], que podem ser observadas no interior de um tipo de discurso”.

Foi Adam quem teorizou sobre a organização textual baseada na noção de seqüência,

assim Bronckart (2003) retoma sua teoria e realiza algumas reformulações, classificando-as em

seis tipos convencionais: narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa, injuntiva e dialogal.

Cada tipo de seqüência possui seu efeito pretendido e suas fases de concretização. Machado

(2005, p. 246-247) elaborou um quadro, o qual reproduziremos a seguir, que sintetiza os efeitos e

6 Fragmento de uma notícia do jornal O Estado de S. Paulo, de 07/04/99, veiculada no livro didático Português:

língua e cultura (FARACO, 2003, p. 197-198).

Page 49: Noticia e Reportagem Nos LDS

48

as fases das planificações convencionais. Não aprofundaremos na exposição de todos os tipos de

planificações, mas somente naqueles mobilizados nos gêneros textuais notícia e reportagem.

QUADRO 2. Tipos de seqüências textuais

SEQÜÊNCIAS REPRESENTAÇÕES DOS EFEITOS

PRETENDIDOS

FASES

Descritiva Fazer o destinatário ver em pormenor elementos

de um objeto de discurso, conforme a orientação

dada a seu olhar pelo produtor

Ancoragem

Aspectualização

Relacionamento

Reformulação

Explicativa Fazer o destinatário compreender um objeto de

discurso, visto pelo produtor como incontestável,

mas também como de difícil compreensão para o

destinatário

Constatação inicial

Problematização

Resolução

Conclusão/Avaliação

Argumentativa Convencer o destinatário da validade de

posicionamento do produtor diante de um objeto

de discurso visto como contestável (pelo produtor

e/ou pelo destinatário)

Estabelecimento de:

- premissas

- suporte argumentativo

- contra-argumentação

- conclusão

Narrativa Manter a atenção do destinatário, por meio da

construção de suspense, criado pelo

estabelecimento de uma tensão e subseqüente

resolução

Apresentação de:

- situação inicial

- complicação

- ações desencadeadas

- resolução

- situação final

Injuntiva Fazer o destinatário agir de certo modo ou em

determinada direção

Enumeração de ações

temporalmente

subseqüentes

Dialogal Fazer o destinatário manter-se na interação

proposta

Abertura

Operações Transacionais

Fechamento

Bronckart pontuou além das planificações convencionais apresentadas no quadro, a

existência de outras planificações, mais elementares, denominadas scripts e esquematizações.

Segundo o autor, o script, que em português corresponde a relato, ocorre em textos da ordem do

narrar em que a planificação apresenta grau zero, isto é, não ocorrem fases e tensões, sendo os

fatos ou acontecimentos dispostos em ordem cronológica. As esquematizações são próprias dos

textos de ordem do expor cuja planificação é zero, ou seja, o objeto do discurso não é contestável

ou problemático não havendo a necessidade da concretização das fases convencionais,

Page 50: Noticia e Reportagem Nos LDS

49

constituindo segmentos de texto puramente informativos ou expositivos que se organizam na

lógica natural.

Para Bronckart é o tipo de discurso que determina as possibilidades de uso e combinação

das seqüências ou outras planificações em seu interior. Aprofundaremos na descrição da

planificação que ocorre no tipo de discurso narração, uma vez que este trabalho trata de gêneros

constituídos por esse tipo de discurso.

A planificação do discurso narração pode ser efetuada em três modalidades, combinando-

se de múltiplas maneiras: o script, a seqüência narrativa e a seqüência descritiva. Como já

dissemos, o script reflete a cronologia efetiva dos acontecimentos, já as seqüências narrativa e

descritiva são constituídas de fases convencionais cujas funções são criar tensão e fazer ver,

respectivamente. Assim crê-se que os gêneros notícia e reportagem são elaborados por meio da

planificação script ou relato, uma vez que os outros tipos de seqüências possíveis à narração são

incoerentes com os objetivos jornalísticos dos gêneros em questão.

O segundo nível da arquitetura textual é constituído de mecanismos de textualização que

possibilitam a coerência temática e linear dos textos por meio de mecanismos de conexão

(organizadores textuais: conjunções coordenativas e subordinativas, advérbios, etc.) e de coesão

nominal (anáforas) e verbal (tempos verbais, advérbios e grupos preposicionais).

O último nível diz respeito a mecanismos de responsabilidade enunciativa e de

modalização. Esse nível possui menor relação com a progressão temática do texto devido a seu

caráter configuracional em que o emissor/enunciador distribui as vozes sociais ou individuais

(polifonia) em seu texto de acordo com seu intuito interativo e nele explicita julgamentos ou

avaliações por meio de modalizações. Dessa forma, o posicionamento enunciativo se dá em

função da organização e emprego das vozes e das modalizações, que guiarão a interpretação do

receptor/destinatário.

Em resumo, segundo o ISD de Bronckart (2003; 2006), os usuários da língua agem

socialmente por meio de textos que se materializam na forma de gêneros, sendo estes os

instrumentos que mediarão as interações, contudo para que haja o domínio de um gênero de texto

há de se mobilizar conhecimentos referentes:

a) ao contexto de produção;

b) à infra-estrutura;

c) aos mecanismos de textualização;

Page 51: Noticia e Reportagem Nos LDS

50

d) aos mecanismos de responsabilidade enunciativa.

Portanto na concepção do ISD, o ensino de línguas deve centrar-se no domínio dos

gêneros de texto, entretanto não os enfocando como objetos reais de ensino e aprendizagem, e

sim como atividades sociais que permitem o agir linguageiro. Para tanto, faz-se necessário o

estudo das operações de linguagem mobilizadas a concretização de cada gênero, que quando

dominadas constituem capacidades de linguagem do aluno (MACHADO, 2005). Compartilhando

dessa concepção, Schneuwly e Dolz realizam as aplicações didáticas ao trabalho escolar com

gêneros como forma de ensino de língua.

2.4 Gêneros e aplicações didáticas

Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz, professores e pesquisadores da Universidade de

Genebra, dedicaram-se, principalmente, ao estudo da didática do francês, bem como ao

desenvolvimento do ensino dos gêneros escritos e orais na escola, elaborando seqüências

didáticas e pensando aspectos curriculares dos gêneros. Embora os estudos realizados por ambos

digam respeito ao francês como língua materna, permitem reflexões sobre o ensino do Português,

pois seu foco de investigação é no ensino de língua.

Os estudos sobre gêneros textuais de Schneuwly e Dolz, principalmente quanto ao

trabalho com gêneros orais e escritos na escola, fundamentam os postulados dos Parâmetros

Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa. Portanto, suas idéias e concepções sobre gêneros

são de grande relevância ao ensino do Português no Brasil.

Esses autores partem da teoria do ISD para desenvolver seus estudos. Para Schneuwly, o

“gênero é um instrumento” (2004, p. 23) no sentido vygotskiano da palavra, ou seja, é por meio

do gênero que agimos socialmente, ele é o instrumento mediador entre o sujeito e o meio social,

sem o qual não há comunicação. A partir da definição de Bakhtin sobre gêneros, Schneuwly

(2004, p. 26) expõe três elementos os quais julga centrais em tal definição:

Page 52: Noticia e Reportagem Nos LDS

51

1. Há a escolha de um gênero, em função de uma situação definida por certo

número de parâmetros: finalidade, destinatários, conteúdo [...]. Dito de outra

maneira: há a elaboração de uma base de orientação para a ação discursiva.

2. Essa base chega à escolha de um gênero num conjunto de possíveis [...].

3.Mesmo sendo “mutáveis, flexíveis”, os gêneros têm uma certa estabilidade:

eles definem o que é dizível [...]; eles têm uma composição [...] eles têm uma

certa estrutura definida por sua função; [...] Finalmente, eles são caracterizados

por um estilo, que deve ser considerado não como um efeito da individualidade

do locutor, mas como elemento de um gênero.

Para Schneuwly, os gêneros são “um meio de conhecimento” ao passo que para se agir

discursivamente é necessário saber empregar o instrumento adequado à situação comunicativa

em questão, isto é, há de se conhecer os elementos constitutivos do gênero para usá-lo, para agir

linguisticamente. Por exemplo, para um aluno relatar um fato que ocorreu na escola no jornal da

instituição, é necessário que ele tenha conhecimentos sobre o gênero notícia para realizar essa

ação discursiva (2004, p. 28).

Ao tratar dos gêneros primários, correspondentes às trocas verbais espontâneas,

vinculadas às práticas de linguagem cotidianas, e dos gêneros secundários, sendo as trocas

verbais complexas, relacionadas ao escrito (BAKHTIN, 1953/1979), Schneuwly propõe que os

alunos, em geral, entrem na escola fundamental, no caso do Brasil, tendo conhecimento dos

gêneros primários e passam a conhecer de modo sistemático, por meio de seqüências didáticas,

os gêneros secundários, que constituem a forma complexa dos gêneros primários já dominados

pelas crianças.

Schneuwly e Dolz afirmam que as práticas de linguagem são o “principal instrumento de

interação social” sendo mesmo “mediações comunicativas, que se cristalizam na forma dos

gêneros”. Portanto, para eles os gêneros “constituem o instrumento de mediação de toda

estratégia de ensino e o material de trabalho, necessário e inesgotável, para o ensino da

textualidade” (2004, p.51). Concebendo que “comunicar-se oralmente ou por escrito pode e deve

ser ensinado sistematicamente” na escola (Ibid., p.51), tais teóricos dedicaram-se à elaboração de

um modelo didático de gêneros e ao desenvolvimento de uma progressão voltada ao domínio de

capacidades de linguagem.

O modelo didático de gênero busca desempenhar o papel de exemplo do gênero a ser

trabalhado. Segundo Machado (2005), para se construir um modelo didático há de se realizar um

Page 53: Noticia e Reportagem Nos LDS

52

levantamento das dimensões ensináveis de um dado gênero por meio de referências teóricas

oriundas de estudos da linguagem e discurso, e de trabalhos de „experts‟ desse gênero,

observação e análise das práticas sociais com o gênero, complementadas pela proposta de análise

de textos de Bronckart. Assim, um modelo didático de gênero deve reunir dados teóricos e

práticos que contribuam em sua constituição.

A partir da elaboração desse modelo, intervenções na forma de seqüências didáticas

podem ser realizadas para o domínio de conhecimentos mobilizados na produção e compreensão

de um dado gênero. Nas palavras de Schneuwly e Doz, as seqüências didáticas:

buscam confrontar os alunos com práticas de linguagem historicamente

construídas, os gêneros textuais, para lhes dar a possibilidade de reconstruí-las e

delas se apropriarem. Essa reconstrução realiza-se graças à interação de três

fatores: as especificidades das práticas de linguagem que são objeto de

aprendizagem, as capacidades de linguagem dos aprendizes e as estratégias de

ensino propostas pela seqüência didática. (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004,

p.51)

As seqüências didáticas constituem-se em atividades que buscam a construção de

conhecimentos relativos ao gênero em questão, com vistas ao desenvolvimento de capacidades

de linguagem, portanto há de se ter cuidado ao empregar o conceito de seqüência didática

proposto por esses autores, não a confundindo com o emprego corriqueiro no qual correspondem

a quaisquer atividades/exercícios didáticos. A sequência didática tal qual proposta por

Schneuwly e Dolz (2004, p. 98) organiza-se na forma do seguinte esquema:

ESQUEMA 1. Seqüência didática proposta por Schneuwly e Dolz

Apresenta-se a situação de produção do gênero ao aluno e pede-se que ele realize a tarefa,

constituindo-se assim a „produção inicial‟ como diagnóstica, por meio dela serão avaliados os

Módulo

n...

Módulo

2

Módulo

1

PRODUÇÃO

FINAL

PRODUÇÃO

INICIAL

Page 54: Noticia e Reportagem Nos LDS

53

conhecimentos sobre o gênero que o aluno já dispõe e quais capacidades de linguagem precisam

ser desenvolvidas para a elaboração dos „módulos‟. Nos módulos serão trabalhados de maneira

sistemática e aprofundada exercícios para o domínio do gênero de acordo com a necessidade do

aluno. É na „produção final‟ que o aluno colocará em prática os conhecimentos adquiridos nos

módulos, sendo esta um meio de avaliação do processo que muitas vezes sinalizará o que ainda

não foi alcançado e direcionará a elaboração de novos módulos (Ibid.).

A noção de capacidades de linguagem empregada por Schneuwly e Doz diz respeito às

“aptidões requeridas do aprendiz para a produção de um gênero numa situação de interação

determinada” (2004, p. 52), sendo classificadas em três tipos: capacidade de ação, capacidade

discursiva e capacidade lingüístico-discursiva.

A capacidade de ação refere-se à capacidade de contextualizar o gênero à circunstância de

interação, adaptando-o ao receptor/destinatário, à esfera de comunicação, enfim ao objetivo da

ação de linguagem. A capacidade discursiva diz respeito à capacidade de mobilizar

conhecimentos referentes à escolha e à organização de tipos discursivos adequados à situação de

interação, isto é, saber organizar um texto e nele posicionar-se de acordo com o plano

comunicativo, corresponde aos conhecimentos necessários à produção e compreensão do nível

mais profundo da arquitetura interna dos textos no modelo de análise de Bronckart (infra-

estrutura). A capacidade lingüístico-discursiva refere-se ao domínio de unidades lingüísticas, ou

seja, saber empregar mecanismos de textualização (conexão e coesão), vozes sociais ou

individuais (polifonia) e modalização de acordo com a circunstância de comunicação, de acordo

com o modelo de Bronckart.

O quadro a seguir, elaborado por Machado (2005, p. 254), visa expor as capacidades de

linguagem exigidas na realização de operações de linguagem e a relação delas com os níveis de

análise de Bronckart.

Page 55: Noticia e Reportagem Nos LDS

54

QUADRO 3: Capacidades e operações de linguagem

Capacidades de

linguagem

Operações Níveis de análise

Capacidades de ação

1) Mobilização de representações

sobre:

- o contexto físico da ação

- o contexto sócio subjetivo

- conhecimentos de mundo que

podem ser verbalizados.

2) Adoção do gênero

1) Levantamento de hipóteses sobre

as representações do produtor:

- o contexto físico da ação

-o contexto sócio subjetivo

-conhecimentos de mundo que podem

ser verbalizados.

2) Levantamento de conhecimentos já

construídos sobre o gênero em

questão

Capacidades

discursivas

3) Gerenciamento da infra estrutura

textual

3.1) escolha do(s) tipos de discurso

3.2) seleção e organização global

dos conteúdos

3) Análise da infra-estrutura textual

3.1) identificação dos tipos de

discurso e de sua articulação

3.2) identificação do plano global do

texto e dos tipos de seqüência

Capacidades

lingüístico-

discursivas

4. Textualização

4.1) estabelecimento de relação

entre os segmentos

4.2) estabelecimento em

posicionamento enunciativo:

- gerenciamento de vozes

- expressão de modalização

5) Construção de enunciados

6) Seleção de itens lexicais

4) Identificação dos mecanismos de

textualização

4.1) da coerência e da coesão nominal

e verbal

4.2) de mecanismos enunciativos:

- de inserção de vozes

- de modalização

Salientamos que operações de linguagem são tarefas aprendidas para a concretização de

ações de linguagem cujo produto é o texto. Assim para a produção e compreensão de qualquer

gênero textual, há de se propiciar o desenvolvimento de capacidades de linguagem que garantam

seu domínio, as quais uma vez adquiridas poderão ser transferidas a gêneros semelhantes.

Schneuwly e Dolz, pensando em uma progressão em torno do trabalho com gêneros,

desenvolveram um agrupamento de gêneros, em que os gêneros são organizados em „domínios

sociais de comunicação‟, „aspectos tipológicos‟ e „capacidades de linguagem dominantes‟.

Page 56: Noticia e Reportagem Nos LDS

55

Vejamos o quadro proposto pelos autores em que se inscrevem os gêneros notícia e reportagem

os quais analisaremos neste trabalho (2004, p. 60):

QUADRO 4. Agrupamentos de gêneros de Schneuwly e Dolz

Page 57: Noticia e Reportagem Nos LDS

56

Domínios sociais de comunicação

Aspectos tipológicos

Capacidades de linguagem dominantes

Exemplos de gêneros orais e escritos

Cultura literária ficcional

Narrar

Mimeses de ação através da criação da intriga no

domínio do verossímil

Conto maravilhoso Conto de fadas

Fábula

Lenda Narrativa de aventura e de ficção científica

Narrativa de enigma e mítica

Sketch ou história engraçada Biografia romanceada

Romance

Romance histórico Novela fantástica

Conto

Crônica literária

Adivinha

Piada

Documentação e memorização das ações humanas

Relatar

Representação pelo discurso de experiências

vividas, situadas no tempo

Relato de experiência vivida

Relato de viagem Diário íntimo

Testemunho

Anedota ou caso Autobiografia

Curriculum vitae

Notícia

Reportagem

Crônica social e esportiva

Histórico Relato histórico

Ensaio ou perfil biográfico

Biografia

Discussão de problemas sociais controversos

Argumentar

Sustentação, refutação e negociação de tomadas de

posição

Textos de opinião

Diálogo argumentativo

Carta de leitor

Carta de reclamação e de solicitação

Deliberação informal Debate regrado

Assembléia Discurso de defesa e de acusação (advocacia)

Resenha crítica

Artigos de opinião ou assinados Editorial

Ensaio

Transmissão e construção de saberes

Expor

Apresentação textual de diferentes formas dos

saberes

Texto expositivo (em livro didático)

Exposição oral

Seminário Conferência

Comunicação oral

Palestra Entrevista de especialista

Verbete

Artigo enciclopédico Texto explicativo

Tomada de notas

Resumo de textos expositivos e explicativos Resenha

Relatório científico

Relatório oral de experiência

Instruções e prescrições

Descrever ações

Regulação mútua de comportamentos

Instruções de montagem Receita

Regulamento

Regras de jogo Instruções de uso

Comandos diversos

Textos prescritivos

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57

O quadro apresenta cinco domínios sociais de comunicação, correspondendo aos aspectos

tipológicos: relatar, narrar, argumentar, expor e descrever ações, e a capacidades de linguagem

globais. Do ponto de vista curricular, os teóricos propõem a progressão das aprendizagens em

„espiral‟ de modo que os cinco agrupamentos sejam trabalhos em cada nível de ensino de forma

gradativa por meio de gêneros diversos, do nível menos formal ao mais formal, retomando os

gêneros de cada agrupamento e estudando aspectos que se destacam em cada um deles.

Pensando no agrupamento da ordem do „relatar‟, por exemplo, no primeiro ciclo do

Ensino Fundamental (1ª e 2ª séries ou 1º, 2º e 3º anos) poderia se trabalhar o gênero relato, já no

segundo ciclo (3ª e 4ª séries ou 4º e 5º anos) os gêneros testemunho e diário íntimo, no terceiro

ciclo (5ª e 6ª séries ou 6º e 7º anos) o gênero notícia e reportagem, e no último ciclo do Ensino

Fundamental (7ª e 8ª séries ou 8º e 9º anos) se trabalharia com os gêneros biografia e crônica

esportiva, constituindo uma progressão curricular em espiral e gradativa para os gêneros

correspondentes a essa tipologia.

Ao defenderem os gêneros como objeto de ensino, Schneuwly e Dolz partem da hipótese

de que “é através dos gêneros que as práticas de linguagem materializam-se nas atividades do

aprendiz” (2004, p. 74). Sendo as práticas de linguagem, para os autores, o funcionamento da

linguagem em relação às práticas sociais em geral, e as atividades de linguagem dizem respeito a

um sistema de ações em que “uma ação de linguagem consiste em produzir, compreender e

interpretar e/ou memorizar um conjunto organizado de enunciados orais ou escritos” (Dolz,

Pasquier e Bronckart apud. SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p. 74). Portanto, o ensino dos gêneros

na escola possibilita que práticas sociais de linguagem materializem-se nas atividades

lingüísticas dos alunos para Schneuwly e Dolz.

Na escola sempre se trabalhou com os gêneros, instrumentos de comunicação, para se

ensinar a ler, escrever, falar, porém, ocorre uma complexidade quando o tomamos como objeto

de ensino, pois “há um desdobramento que se opera em que o gênero não é mais instrumento de

comunicação somente, mas é, ao mesmo tempo, objeto de ensino-aprendizagem”

(SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p. 76).

A complexidade dos gêneros na escola consiste em que esses sofrem mudanças e

transformam-se, sendo sempre uma variação do gênero de referência, ao passo que a função de

comunicar é substituída pela de aprender, no universo do „como se‟ que tange as práticas de

ensino escolares. Entretanto, os teóricos afirmam que tal prática de ensino empregada na escola é

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58

uma “eficiente maneira de aprender” (Ibid., p. 180), pois é por meio das seqüências didáticas

trabalhadas na escola que as dimensões ensináveis dos gêneros são sistematizadas para o

domínio do aluno, possibilitando-lhe acesso a práticas de linguagem novas presentes nas práticas

fora do ambiente escolar.

Enfim, para os teóricos:

toda introdução de um gênero na escola é o resultado de uma decisão didática

que visa a objetivos precisos de aprendizagem, que são sempre de dois tipos:

trata-se de aprender a dominar o gênero, primeiramente para melhor conhecê-lo

ou apreciá-lo, para melhor compreendê-lo, para melhor produzi-lo na escola ou

fora dela; e, em segundo lugar, de desenvolver capacidades que ultrapassam o

gênero e que são transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes.

(SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p.80)

É importante destacarmos que os autores reconhecem que o trabalho com gêneros na

escola, veiculados em livros didáticos ou não, causa-lhes transformações tais como a excessiva

simplificação ou generalização, bem como a ênfase a certos aspectos em detrimento a outros.

Porém, para eles, essas são conseqüências inevitáveis para que os objetivos didáticos sejam

atingidos.

Assim, por meio da teoria didático-pedagógica de Schneuwly e Dolz buscamos refletir se

as atividades propostas ao estudo dos gêneros notícia e reportagem no livro didático de Língua

Portuguesa de Ensino Médio propiciam o desenvolvimento das capacidades de linguagem

necessárias ao domínio desses gêneros.

2.5 Gêneros jornalísticos: a notícia e a reportagem

Neste momento, contextualizaremos os gêneros notícia e reportagem na modernidade e,

recorrendo a diversas obras, apresentaremos as características genéricas desses textos com o

objetivo de traçar suas dimensões ensináveis.

Vivemos em uma época de excesso de informação, isto é, o homem moderno vive numa

sociedade de informação em que tudo ocorre com muita rapidez e o tempo lhe é escasso.

Contudo, este excesso de informação lhe chega por meio da mídia, principalmente, por

meio do discurso jornalístico que antes bombardeava os indivíduos diariamente com notícias,

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59

hoje já os bombardeia minuto-a-minuto via canais de televisão e sites de jornalismo na internet.

Segundo Larrosa (2002, p. 23), “a velocidade com que nos são dados os acontecimentos e a

obsessão pela novidade, pelo novo, que caracteriza o mundo moderno, impedem a conexão

significativa entre acontecimentos.”

O autor argumenta que o volume de informações, muitas vezes, desnecessárias causa a

falta de memória e, conseqüentemente, a falta de experiência, pois para ele, o saber da

experiência se dá no indivíduo por meio dos fatos que realmente, de alguma forma, tocam-no.

Porém, o homem moderno respira novidades e informações de um modo tão rápido que nada o

toca, fazendo com que ocorra a impossibilidade de acúmulo de vivências, a impossibilidade de

memória:

...já que cada acontecimento é imediatamente substituído por outro que

igualmente nos excita por um momento, mas sem deixar qualquer vestígio. O

sujeito moderno não só está informado e opina, mas também é um consumidor

voraz e insaciável de notícias, de novidades, um curioso impenitente,

eternamente insatisfeito. (LARROSA, 2002, p. 23)

Portanto, podemos apreender que o excesso de informação, conseqüência da

modernidade, é impossível à memória humana, pois não há como o indivíduo se lembrar de tudo,

faz-se necessário que se esqueça de determinados acontecimentos para se lembrar de outros, daí

ocorre então a invenção de novos recursos tecnológicos de armazenamento de memória que

permeiam a atmosfera contemporânea.

A globalização encurtou as distâncias e fez com que as informações chegassem à

população praticamente no momento imediato de sua ocorrência. O leitor ou telespectador

contemporâneo não obtém somente notícias regionais e nacionais, mas internacionais. Nos

diversos locais do planeta, fatos ocorrem simultaneamente. Guerras entre nações, assalto a um

banco, rebeliões na cadeia, descobertas científicas, nascimento de uma criança, lançamento de

um novo carro, são inúmeros os acontecimentos que chegam às agências jornalísticas. Entretanto,

quem seleciona o que é de interesse da população? Quem escolhe o que a sociedade deve ou não

saber? Quem delimita a versão divulgada? Quem escolhe como se produzirá ou abordará a

notícia? Enfim, quem decide o que deve ser lembrado ou esquecido? As empresas jornalísticas,

os editores e os jornalistas. Seria uma visão simplista se apontássemos apenas os jornalistas como

responsáveis por todas estas escolhas, pois sabemos que por trás das empresas de comunicação há

ideologias a serem seguidas, objetivos a serem atingidos, vozes a serem explicitadas e outras

Page 61: Noticia e Reportagem Nos LDS

60

silenciadas. Não podemos ser ingênuos a ponto de pensarmos que as notícias são divulgadas

aleatoriamente, por trás delas há evidentemente relações de poder.

Portanto, há de se selecionar quais fatos noticiar e o como relatá-los à população. Para

tanto, as grandes agências de comunicação produzem seus manuais de redação e de estilo

jornalístico que definem os conceitos por eles utilizados. Ao tratarem do gênero notícia, é

apontado que o texto caracterizado como tal deve ser interessante, objetivo, imparcial, apresentar

a descrição exata dos fatos (MARTINS FILHO, 1997; PUBLIFOLHA, 2006).

Assim sendo, os manuais definem a notícia de modo um tanto subjetivo. Um tema pode

ser interessante a todos os leitores? Qual é o critério para se estabelecer o que é interessante ou

não? Podemos interpretar que os acontecimentos são selecionados e os textos elaborados de

acordo com interesses de determinadas camadas da população em detrimento de outras.

No que cabe a imparcialidade na imprensa, sabemos, por meio dos estudos da linguagem

e de discurso, que a imparcialidade e a objetividade são impossíveis. Todo texto é carregado de

marcas que correspondem ao contexto histórico-social em que o texto foi produzido e a ideologia

de seu autor, que se materializam em sua linguagem. Segundo Marcuschi (1991), a própria

escolha dos verbos no discurso jornalístico reflete a opinião do autor diante do fato enunciado.

Quanto à descrição exata dos acontecimentos, é um fato questionável, pois tais descrições

não são livres de subjetividades. Qual é o método de coleta de tais dados? São confiáveis?

Pensemos em um dos métodos, por exemplo, o testemunho. A testemunha, ao relatar os fatos,

recorre a sua memória, como aponta Maurice Halbwachs (1990), a memória é uma reconstrução

do passado com base no presente, um processo mutável, portanto a exatidão é impossível à

memória e, ao que parece, ao jornalismo.

Assim, apreendemos que as empresas jornalísticas, editores e jornalistas selecionam „o

que‟ e „como‟ a população será informada por meio de critérios a ela silenciados, subjacentes a

questões de poder que nos revelam mecanismos de manipulação da memória coletiva. Desta

forma, o discurso jornalístico preenche o imaginário social de crianças, jovens e adultos de

acordo com interesses específicos, ditando o que deve ser lembrado e esquecido, construindo a

memória da população.

Um dos exemplos da influência do discurso jornalístico na construção da memória, no

mundo ocidental, é a guerra no Iraque. Ao se pensar sobre ela, grande parte da população constrói

suas lembranças com base em notícias sobre o acontecimento, pois, na verdade, não o presenciou,

Page 62: Noticia e Reportagem Nos LDS

61

portanto o jornalismo age na transmissão de imagens, ao passo que é a partir delas que a

população faz a imagem de como foi à guerra e constrói sua memória sobre o fato. O jornalismo

age, então, na construção da memória coletiva da população com base em uma visão de mundo

oficializada por seu discurso.

Segundo Le Goff (1996, p. 476), a invenção da imprensa revolucionou a memória no

mundo ocidental, sobretudo por colocar a população diante de uma enorme memória coletiva. O

autor argumenta que a memória coletiva é “um instrumento e um objeto de poder” que garante e

legitima a identidade de uma sociedade. Portanto a memória coletiva é um importante elemento

identitário que na sociedade da informação atual pode ser controlada e produzida pelo discurso

jornalístico e pelos meios de comunicação em geral de acordo com determinados pontos de vista.

Nosso objetivo, entretanto, não é apresentar a imprensa como grande vilã, até porque não

temos esta concepção, mas refletir sobre sua implicação na construção da sociedade

contemporânea com vistas a uma educação escolar que prepare os alunos para a sua leitura e

compreensão.

Os textos jornalísticos são documentos que trazem versões de acontecimentos, passíveis a

reconstruções e a questionamentos. Conforme Le Goff (apud. ALBERTI, 2005, p. 183-184)

O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento que

ele traz devem ser em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu

significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das

sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente –

determinada imagem de si próprias. [...] Todo documento é mentira. Cabe ao

historiador não fazer o papel de ingênuo. [...] É preciso começar por desmontar,

demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de

produção dos documentos-monumentos.

Assim, enquanto o jornalista produz notícia, relata acontecimentos, o historiador estuda,

investiga processos históricos em que a notícia, por ser um documento, torna-se, em alguns casos,

um de seus objetos de investigação a ser desconstruído e analisado. Pensamos, então, que não só

o historiador deve realizar a desconstrução do discurso jornalístico, mas a população em geral,

como forma de ler criticamente a realidade que a cerca, não sendo ingênua e passiva diante do

que lhe é apresentado.

Para tanto, faz-se necessário a atuação da educação formal na formação de cidadãos

conscientes, capazes de fazer a leitura da realidade através das lentes dos meios de comunicação,

fato que somente é possível se crianças, jovens e adultos compreenderem a linguagem, os

recursos argumentativos, a ideologia, as intenções e as condições de produção destes textos.

Page 63: Noticia e Reportagem Nos LDS

62

Assim pensamos que o trabalho didático com gêneros jornalísticos propiciará o desenvolvimento

de capacidades de linguagem necessárias à leitura, compreensão, interpretação e produção desses

textos que circulam socialmente para o efetivo exercício da cidadania.

Neste momento, apresentaremos as definições, os princípios jornalísticos e as

características genéricas referentes à notícia e à reportagem tendo como base diversas fontes, a

saber:

a) manuais de ensino de jornalismo (obras didáticas);

b) textos teóricos da área de comunicação (obras acadêmicas);

c) manuais de redação e estilo jornalísticos (obras de referência);

d) descrição e análise de textos do gênero notícia e reportagem.

Como nossa pesquisa centra-se na análise das atividades propostas ao trabalho didático

com os gêneros notícia e reportagem e suas implicações no desenvolvimento de capacidades de

linguagem exigidas na leitura, compreensão e produção desses gêneros, tal procedimento é

fundamental para levantarmos as dimensões ensináveis da notícia e da reportagem (o que um

determinado texto deve apresentar para ser reconhecido como tal) e relacioná-las às capacidades

de linguagem que devem ser trabalhadas para seu domínio, isto é, levantarmos quais dimensões

ensináveis de cada um desses gêneros correspondem à capacidade de ação, à capacidade

discursiva e à capacidade lingüístico-discursiva. Para então analisarmos quais capacidades de

linguagem estão sendo desenvolvidas nas atividades propostas nos livros didáticos de Português

de Ensino Médio.

Segundo Machado (2005), tais levantamentos são a base para a construção de um modelo

didático dos gêneros o qual não precisa ser perfeito nem teoricamente puro, podendo reunir

referências teóricas diversas, assim como referências oriundas da observação e da análise das

práticas sociais que envolvem o gênero em questão. Assim visitaremos diversos autores com

vistas à construção de modelos didáticos dos gêneros em questão para orientar nossa análise dos

livros didáticos.

Os gêneros notícia e reportagem constituem-se como principais gêneros jornalísticos cuja

função é a de informar, sendo a notícia a matéria-prima do jornal. Entretanto a definição desses

gêneros, bem como os de imprensa em geral, mostra-se como uma tarefa complexa por serem

dadas a eles distintas classificações e definições de acordo com a obra visitada.

Page 64: Noticia e Reportagem Nos LDS

63

A fim de caracterizá-los de modo coerente com as concepções teóricas deste trabalho,

organizaremos a exposição de acordo com os níveis de análise de Bronckart (2003),

correspondendo: ao contexto de produção, à infra-estrututa geral do texto, aos mecanismos de

textualização e aos mecanismos enunciativos, assim retomaremos tais noções já tratadas

anteriormente neste capítulo.

Iniciaremos pela apresentação das características relativas ao contexto de produção dos

gêneros encontradas nas fontes visitadas.

a) Contexto de produção dos textos dos gêneros notícia e reportagem

O contexto de produção de um gênero, como já tratamos, corresponde ao “conjunto dos

parâmetros que podem exercer uma influência sobre a forma como um texto é organizado”

(BRONCKART, 2003, p. 93). Assim ao se ler, compreender e produzir uma notícia ou uma

reportagem tem de se levar em conta certos parâmetros que permitem situar tal produção, como:

a) o suporte material: jornal impresso (em que jornal é/será veiculado o texto);

b) o público-alvo do jornal (qual é o leitor esperado; a que classe social ele pertence);

c) o momento e lugar de produção do jornal (onde se situam emissor/destinatário);

d) a intenção da produção (o que se pretende com a produção);

e) o conteúdo temático (que fatos/assunto são dizíveis por meio da produção) .

Esses elementos contextuais permearão todo o processo de produção desses gêneros.

Uma característica de muitas reportagens – e mais ainda de notícias – é a

obediência a normas próprias de seleção do léxico [...] Em ambos os casos,

procura-se o que é compreensível no registro coloquial (considerando-se o

público-alvo) e aceitável do ponto de vista formal. Na linguagem-padrão, nada

de adjetivos e advérbios que expressem juízo de valor, nenhuma mesóclise, raras

ênclises [...] pretende-se que essa linguagem seja precisa, porque a precisão é

relacionada ao uso e o jornalismo busca atingir público não especializado.

(LAGE, 2002, p. 66-67)

Como podemos apreender, a linguagem da notícia e da reportagem deve adequar-se a seu

público-alvo sem cair no coloquialismo desmedido nem no excesso de formalidade,

apresentando-se acessível à compreensão dos leitores.

Por meio das palavras de Lage, apreendemos o quanto o público-alvo é determinante da

concretização social desses gêneros, isto é, o leitor cujo jornal busca atingir determina o „como‟ o

Page 65: Noticia e Reportagem Nos LDS

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fato será narrado dentro das possibilidades oferecidas pelo gênero. Assim pretende-se aproximar

a linguagem do texto a de seu destinatário desde que não se infrinja o padrão formal, caso

contrário transmuta-se o gênero.

O conteúdo temático é um elemento que permeia o contexto de produção e recepção dos

gêneros. Ele diz respeito aos conhecimentos que o receptor/destinatário ou emissor/enunciador

possuem sobre o gênero, refere-se às representações mentais adquiridas nas interações sociais que

o envolvem. Para que se dominem os gêneros notícia e reportagem é imprescindível que se

(re)conheça os conteúdos temáticos dizíveis por meio deles e também a intenção da interação.

Vejamos as definições de notícia e reportagem apresentadas em fontes diversas. Bahia

(1990, p. 36) afirma que a notícia deve “reunir interesse, importância, atualidade e veracidade”,

enquanto a reportagem é definida como uma notícia “que impõe ao jornalismo um avanço na

medida em que só se realiza com a multiplicidade de versões, de ângulos, de indagações” (Ibid.

p. 50). Passemos a outro tipo de fonte.

No quadro a seguir destacamos definições extraídas de uma obra de referência oriunda do

próprio meio jornalístico – o Manual da redação: Folha de S. Paulo – produção de um dos

grandes jornais brasileiros – a Folha de São Paulo – criado em 1921 (PUBLIFOLHA, 2006):

Page 66: Noticia e Reportagem Nos LDS

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QUADRO 5. Definições de notícia e reportagem

Definições: NOTÍCIA REPORTAGEM

Manual da redação:

Folha de S. Paulo

Relata a informação de

maneira mais objetiva

possível; raramente é

assinada (p. 72).

Puro registro dos fatos sem

opinião. A exatidão é o

elemento-chave da notícia,

mas vários fatos descritos

com exatidão podem ser

justapostos de maneira

tendenciosa. Suprimir ou

inserir uma informação no

texto pode alterar o

significado da notícia. Não

use desses expedientes (p.

88).

Tem por objetivo transmitir ao

leitor, de maneira ágil,

informações novas, objetivas

(que possam ser constatadas

por terceiros) e precisas sobre

fatos, personagens, idéias e

produtos relevantes. Para

tanto, elas se valem de

ganchos oriundos da realidade,

acrescidos de uma hipótese de

trabalho e de investigação

jornalística (p. 24).

Traz informações mais

detalhadas sobre as notícias,

interpretando os fatos; é

assinada quando tem

informação exclusiva ou se

destaca pelo estilo ou pela

análise (p. 72).

Contudo, com base nas informações apresentadas, a notícia é definida como um gênero

exclusivamente informativo, imparcial e objetivo. Quanto à reportagem, trata-se de uma

ampliação do gênero notícia, traz dados novos e detalhados sobre a notícia, apresenta uma

investigação crítica sobre o fato de forma mais objetiva possível (MARTINS FILHO, 1997;

PUBLIFOLHA, 2006).

De modo geral, “a notícia é o relato objetivo de um fato ou evento que, além de inédito,

deve despertar o interesse dos leitores” (LAGE, 2001, p. 50) e a reportagem constitui-se como

uma ampliação dela, fornecendo detalhes e contextualização àquilo que já foi noticiado.

Enquanto uma refere-se ao momento presente, atual e imediato, a outra se refere ao

contemporâneo tendo um caráter mais atemporal.

Após passarmos por essas definições que buscam caracterizar tais gêneros jornalísticos,

chegamos aos elementos que indicam o conteúdo dizível a esses gêneros, embora muitas

definições aprofundem em aspectos que trataremos a seguir. Portanto, para dominar o gênero

notícia deve-se ter conhecimento que o conteúdo nele relatado diz respeito a fatos que sejam

atuais, verdadeiros, precisos e interessantes. Já no gênero reportagem, os fatos ou assuntos devem

Page 67: Noticia e Reportagem Nos LDS

66

ser contemporâneos de modo a ampliar informações sobre um fato já conhecido, isto é, antes

noticiado.

No manual da Folha, são apresentados critérios para determinar a importância de textos

jornalísticos, sendo eles:

1) Ineditismo (a notícia inédita é mais importante do que a já publicada).

2) Improbabilidade (a notícia menos provável é mais importante do que a

esperada).

3) Interesse (quanto mais pessoas possam ter sua vida afetada pela notícia mais

importante ela é).

4) Apelo (quanto maior a curiosidade que a notícia possa despertar , mais

importante ela é).

5) Empatia (quanto mais pessoas puderem se identificar com o personagem e a

situação da notícia, mais importante ela é).

6) Proximidade (quanto maior a proximidade geográfica entre o fato gerador da

notícia e o leitor, mais importante ele é). (PUBLIFOLHA, 2006, p. 44)

Assim tais critérios refletem a influência do público-alvo esperado do jornal na produção

textual, ou seja, demonstram o quanto é imprescindível as condições de produção na

concretização e elaboração do gênero.

Barbosa (2001; 2002), enfocando os gêneros como objetos de ensino-aprendizagem,

realizou uma descrição e análise de um grande corpus constituído por exemplares do gênero

notícia de diferentes jornais (Folha de S. Paulo, Folha da Tarde, Notícias Populares, O Estado

de São Paulo, Jornal da Tarde, Diário Popular, O Globo e Jornal do Brasil) com fins de

elaboração e programações de materiais didáticos. Tal descrição e análise se deram no âmbito de

um curso de formação continuada de professores da rede pública de ensino por ela desenvolvido.

Aqui trataremos apenas de um dos segmentos do trabalho realizado pela autora.

A partir de leitura, estudo e discussão de obras didáticas, teóricas e de referência sobre a

notícia, foram realizadas descrições e análises do corpus com os objetivos: de apropriação do

gênero por parte dos professores do curso, e de sinalizar as principais características do gênero.

Assim, apresentaremos dois dos Quadros Sínteses elaborados pela autora que sintetizam as

características encontradas na análise dos textos (BARBOSA, 2001, p.185-186):

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QUADROS 6. Descrição e análise do gênero notícia impressa

I. ESFERA DE ATIVIDADE/ESFERA DE COMUNICAÇÃO

A esfera imprensa é composta por uma série de empresas privadas que, como quaisquer outras, visam

o lucro. Grande parte dos ganhos de um jornal não advém diretamente de assinaturas ou da venda em

bancas, mas sim da publicidade. Dessa maneira, forma-se um circuito indireto: a notícia e demais

informações disponibilizadas pelos jornais buscam atrair os leitores pois, quanto maior for a tiragem

de um jornal, mais caro será seu espaço publicitário. Tal relação evidentemente estabelece uma

competição entre as empresas concorrentes. Além disso, a notícia pode ser vista como um capital, num

sentido mais ideológico e político da questão. O poder da informação estabelece relações complexas

com o poder econômico e com o poder político, que precisam ser consideradas, quando da leitura de

relatos dos fatos ocorridos nas notícias, por mais que as mesmas se pretendam, na grande maioria das

vezes, neutras. É preciso considerar que os jornais, além de serem um veículo de informação, são

também veículos formadores de opinião;

A instituição imprensa controla e manipula informações em escala industrial e mundial. Muito do

noticiário internacional é ditado para o mundo por algumas poucas agências de notícias localizadas em

países centrais.

A matéria jornalística, mesmo nos países que vivem sob o regime democrático, está sempre

sujeita a vários tipos de censuras internas e externas, determinadas por interesses econômicos e

políticos.

II. SITUAÇÃO DE PRODUÇÃO

a) Leitores múltiplos e desconhecidos (conhece-se apenas estatisticamente o perfil de leitor de um

determinado jornal) que, na sua grande maioria, procedem a uma leitura rápida, muitas vezes,

transversal do jornal;

b) Em alguns casos, o redator é desconhecido (algumas notícias não trazem seus signatários). Em

outros casos o redator aparece identificado. Ele obedece a uma diretriz geral editorial de um jornal. O

redator está subordinado ao editor que pode alterar a notícia, cortar partes, etc. Uma notícia é

freqüentemente reescrita, condensada, traduzida, enfim, submetida a critérios de edição;

c) Objeto – acontecimentos ou fatos do mundo (implica num tipo de discurso mais referencial). Uma

notícia pretende-se afirmar como verdadeira;

d) O processo de escrita de uma notícia é, na grande maioria das vezes, extremamente rápido, dado que

os jornais têm uma periodicidade diária e buscam dar “notícias quentes” antes dos concorrentes ou de

forma mais completa do que esses.

e) Objetivo (declarado pelos jornais) – informar os leitores, interessando-os pela matéria e fazendo-se

entender por eles, o mais neutramente possível e com a maior fidedignidade possível (compromisso

ético- jornalístico);

f) Suporte material da notícia – jornal – periódico diário perecível, de duração fugaz;

g) Sensacionalismo x imparcialidade: sensacionalismo – coleta de informação a qualquer preço e de

qualquer maneira, muitas vezes, sem nenhum critério de apuração e organização dos fatos;

imparcialidade – a busca do desenvolvimento de métodos de pesquisa para apuração e tratamento da

informação. Pode-se pensar que a distinção acima implica em dois tipos básicos de imprensa;

h) Imparcialidade: aspectos éticos e ideológicos envolvidos na seleção, coleta e divulgação de

informação. Por mais que se tenha uma intenção de se ser imparcial, uma imparcialidade total é

impossível, pois o redator tem que escolher como vai contar o fato, o que implica numa dada seleção

lexical, numa escolha do que se estabelece como tópico, etc.

i) Notícia - “matéria-prima” do jornal. Por mais que os jornais tenham diversificado suas sessões e

tenham incorporado e desenvolvido diferentes gêneros, a notícia ainda continua sendo a “matéria

prima” dos jornais. Grande parte dos leitores/consumidores de jornais compra esse periódico por causa

das notícias. Dessa forma, por essa óptica, a notícia pode ser considerada um bem de consumo;

j) A existência de diferentes tipos de jornal é determinada, dentre outros fatores, pelo público alvo que

se pretende atingir, o que implica em diferentes tratamentos à matéria jornalística. É muito comum

uma mesma empresa jornalística possuir mais de um tipo de jornal, buscando com isso atingir a

diferentes públicos.

III. CONTEÚDO TEMÁTICO DA NOTÍCIA

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Do ponto de vista do conteúdo temático, a notícia pode ser vista como o relato de transformações,

deslocamentos ou enunciações observáveis no mundo e consideradas de interesse para o público.

Assim, as proposições essenciais da notícia dão conta de transformações (da ordem do fazer),

deslocamentos (da ordem do ir) ou enunciações (da ordem do dizer). O universo da notícia é as

aparências e não o conhecimento essencial ou teórico (objeto das ciências e afins), a não ser que se

necessite aplicar esses conhecimentos para explicar ou contextualizar fatos...

Os dados apresentados nos quadros revelam-nos que de fato o que é postulado nas obras

visitadas, em especial, nos manuais de referência elaborados pelos jornais, materializa-se nas

práticas sociais envolvendo o gênero notícia, já sinalizando as dimensões ensináveis que devem

ser tematizadas nas atividades propostas nos livros didáticos a tal gênero de texto.

A seguir trataremos das características encontradas quanto à infra-estrutura geral da

notícia e da reportagem.

b) Infra-estrutura geral dos textos dos gêneros notícia e reportagem

A infra-estrutura é composta pelo plano geral, pelos tipos de discurso, pelas seqüências e

as outras formas de planificação mobilizadas em um texto. Como já apresentamos cada um

desses elementos, realçaremos somente aqueles que compõem a infra-estrutura da notícia e da

reportagem.

O plano geral corresponde à organização configuracional do texto. Assim o plano geral da

notícia e da reportagem corresponde a: título, lide e corpo de texto, a saber:

a) Título: apresenta uma síntese do fato; busca atrair a atenção do leitor; deve conter

verbo, de preferência, na voz ativa e no presente, exceto quando o texto se referir a

fatos no futuro ou no passado; empregam-se siglas com comedimento;

b) Lide: corresponde ao primeiro parágrafo do texto, constitui-se das informações

principais, respondendo às questões: o que, quem, quando, onde, como e por quê;

c) Corpo: corresponde aos parágrafos seguintes ao lide, cujas informações podem ser

apresentadas: em ordem decrescente de importância, recurso chamado de pirâmide

invertida (predominante na notícia); ou em ordem de desenvolvimento cronológico,

constituindo pirâmide normal; ou ainda pode-se haver a combinação entre ambas as

pirâmides (normal e invertida) em que no primeiro parágrafo já se apresenta o ângulo

mais atual e forte do acontecimento, seguido pela ordem cronológica dos fatos, sendo

Page 70: Noticia e Reportagem Nos LDS

69

as duas formas de organização mais comuns na reportagem (PUBLIFOLHA, 2006;

BAHIA, 1990).

No que diz respeito à extensão, a notícia configura-se como um texto sintético, menos

extenso, já a reportagem, por buscar ampliar a visão do leitor sobre o fato noticiado, torna-se um

texto mais longo e denso.

Não há dúvida que tanto a notícia quanto a reportagem constituem-se do tipo de discurso

narração. Esses gêneros textuais apresentam autonomia quanto ao ato de produção. Não

ocorrendo marcas lingüísticas dos participantes da interação, do tempo ou lugar da produção.

Porém há uma forte referência temporal absoluta (em 2007, ontem, etc.), sendo constante a

presença de organizadores temporais (advérbios, sintagmas preposicionais, conjunções

coordenativas e subordinativas, etc.) que desloca o acontecimento a um tempo disjunto do

momento de interação, empregando-se o presente genérico ou o pretérito perfeito e apenas frases

declarativas.

Quanto a forma de planificação, ocorre a denominada script ou relato. O script ocorre em

textos da ordem do narrar em que a planificação apresenta grau zero, isto é, não ocorrem fases e

tensões, sendo os fatos ou acontecimentos dispostos em ordem cronológica como é o caso da

notícia e da reportagem.

Vejamos a seguir os mecanismos de textualização característicos desses dois gêneros

c) Mecanismos de textualização dos textos dos gêneros notícia e reportagem

Os mecanismos de textualização possibilitam a coerência temática e linear dos textos por

meio de mecanismos de conexão (organizadores textuais: conjunções coordenativas e

subordinativas, advérbios, etc.) e de coesão nominal (anáforas) e verbal (tempos verbais,

advérbios e grupos preposicionais).

Os gêneros notícia e reportagem são constituídos, como já dissemos, pelo discurso

narração no qual há um eixo de referência espaço-temporal interna por ser um tipo de discurso

autônomo e disjunto do ato de produção. Assim a coesão e conexão são marcadas nesses gêneros

por advérbios, locuções adverbiais, sintagmas preposicionais, conjunções coordenativas e

subordinativas, entre outros elementos, que atuam como organizadores temporais (em 2007,

ontem, etc.) e organizadores espaciais (na Argentina, no alto, etc.).

Page 71: Noticia e Reportagem Nos LDS

70

Passemos as características enunciativas apresentadas na notícia e na reportagem.

d) Mecanismos enunciativos dos textos dos gêneros notícia e reportagem

Os mecanismos enunciativos correspondem à distribuição das vozes e às marcas das

modalizações presentes nos textos, sendo o último nível de análise proposto por Bronckart (2003)

o qual já tratamos neste capítulo.

Nos gêneros notícia e reportagem busca-se alcançar a credibilidade, a objetividade e a

imparcialidade por meio de efeitos de sentidos propiciados pelo emprego de mecanismos

enunciativos.

O manual da Folha faz ressalvas a essas questões no verbete „objetividade‟ no qual é

reconhecido que “não existe objetividade em jornalismo,” pois “ao escolher um assunto, redigir

um texto e editá-lo, o jornalista toma decisões em larga escala subjetivas, influenciadas por suas

posições pessoais, hábitos e emoções.” Entretanto, isto não o exime de ser “o mais objetivo

possível” (PUBLIFOLHA, 2006, p. 46).

Portanto no jornalismo os termos objetividade e credibilidade se inter-relacionam, pois se

busca transmitir objetividade como forma de produzir o efeito da credibilidade e

conseqüentemente de veracidade por meio do uso de recursos lingüísticos como: a atribuição das

informações às fontes e o emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas, que

agem como mecanismos enunciativos por dizerem respeito à distribuição e à forma de introdução

das vozes no texto; já o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se

(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) , agem como

mecanismos enunciativos para se apagar as marcas do narrador; e a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas, agem como mecanismos enunciativos para apagar as marcas modais

(avaliações, opiniões, julgamentos, etc.).

Em relação à imparcialidade jornalística, no manual da Folha é pontuado que a notícia

deve ser “puro registro dos fatos sem opinião,” contudo são realçadas as possibilidades de

manipulação tendenciosa do texto que devem ser evitadas como a seleção dos fatos que devem

ser apresentados ou silenciados, bem como a organização das informações de modo a direcionar a

interpretação do leitor (PUBLIFOLHA, 2006, p. 88).

Page 72: Noticia e Reportagem Nos LDS

71

Cavalcanti (2006) realizou uma pesquisa enfocando o discurso jornalístico e seus gêneros

na qual realiza análise de textos. A autora conclui, com base nos estudos da área da comunicação

e em sua análise de textos, que os gêneros notícia e reportagem apresentam grande proximidade

quanto às dimensões temática e composicional, mas é na dimensão referente ao estilo que há

distinção.

Segundo Cavalcanti, a reportagem apresenta variação na forma composicional do texto,

ora iniciando pela síntese dos fatos, ora pela ordem cronológica, ora pela contextualização do

assunto, ora por interrogações. Tais variações correspondem à liberdade que o gênero propicia ao

autor, postuladas por Lage (2001) que caracteriza a notícia como um gênero mais sintético e de

forma rígida, já a reportagem constitui-se em um gênero menos rígido que propicia um pouco de

liberdade ao repórter.

Porém, a possibilidade de maior liberdade não permite abrir mão dos recursos que

produzem o efeito de objetividade, do uso do tempo verbal presente e da terceira pessoa do

discurso. Entretanto, Cavalcanti concluiu que, quanto ao estilo, na reportagem a preocupação

com o apagamento das marcas do autor e das marcas modais é menor, emitindo-se

constantemente “indícios da subjetividade desse narrador, de suas avaliações, de seu ponto de

vista” (CAVALCANTI, 2006, p. 174).

A distinção entre notícia e reportagem é tarefa complexa até à comunidade jornalística

devido às tênues fronteiras que as diferenciam (Sodré e Ferrari Apud. BONINI, 2003). Tanto uma

quanto a outra, de forma geral, são consideradas como pertencentes à esfera informativa,

caracterizando-se como textos pautados na objetividade. Entretanto, para Lage (2001), a

reportagem se aproxima, mesmo que timidamente, da esfera opinativa por nela o jornalista ser

autorizado a dar um enfoque crítico aos fatos narrados, ou seja, o gênero possibilita transparecer

de modo moderado indícios de subjetividade por meio dos mecanismos enunciativos.

As obras didáticas, teóricas e de referência com as quais dialogamos nesta seção do

trabalho contribuíram imensamente para que chegássemos às características constitutivas dos

gêneros notícia e reportagem, principalmente o manual da Folha por oferecer um padrão preciso

à produção desses gêneros e ser um dos referenciais utilizados pelos autores de livros didáticos ao

tratar de gêneros jornalísticos, conforme as próprias citações dele apresentadas nos livros de

Português de Ensino Médio.

Page 73: Noticia e Reportagem Nos LDS

72

A seguir passaremos a tratar da construção de modelos didáticos para os gêneros em

questão.

2.6 Modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem

Tendo como base as obras visitadas e assumindo a perspectiva de algumas delas, traçamos

as características genéricas da notícia e da reportagem a fim de chegarmos às operações de

linguagem exigidas ao domínio (leitura, compreensão e produção) desses gêneros e às

capacidades de linguagem nelas mobilizadas. Construindo, dessa forma, um modelo didático para

o ensino de textos do gênero notícia e reportagem tal qual é proposto por Schneuwly e Dolz

(2004).

Em suma, foram levantadas as características referentes:

a) à situação de produção dos gêneros;

b) ao conteúdo esperado ou dizível aos gêneros;

c) à organização global dos gêneros;

d) aos mecanismos lingüísticos empregados nos gêneros e seus efeitos de sentido;

e) à manutenção de coesão e coerência dos gêneros;

f) às vozes implícitas e explícitas presentes nos gêneros e a forma de introduzi-las;

g) às marcas modais presentes nos gêneros.

A partir delas, levantamos as operações de linguagem implicadas e as respectivas

capacidades de ação, discursivas e lingüístico-discursivas mobilizadas ao domínio dos textos dos

gêneros notícia e reportagem.

O quadro teórico a seguir, inspirado no modelo didático de resumo elaborado por

Machado (Apud. FERREIRA, 2008, p. 26), apresenta a modelização do gênero notícia a que

chegamos:

Page 74: Noticia e Reportagem Nos LDS

73

QUADRO 7. Modelo didático do gênero notícia

O quadro teórico, a seguir, apresenta o modelo didático a que chegamos para o domínio

do gênero reportagem:

Capacidades de linguagem Operações de linguagem exigidas ao domínio do gênero

notícia

Capacidades de ação

Situação de Produção (contextualização do gênero)

Levar em conta o suporte material em que veicula o

gênero e seu formato de circulação social;

Identificar e considerar o público-alvo esperado, o

lugar e o momento da produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de

muitas pessoas, inéditos, improváveis de acontecer,

que possivelmente despertem a curiosidade ou que

haja identificação com o público-alvo;

Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos.

Capacidades discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero

(título, lide e corpo de texto);

Compreender a função de cada elemento estrutural;

Reconhecer e empregar o tipo de discurso

característico do gênero: discurso narração;

Selecionar e organizar previamente eventos;

Conhecer e empregar a planificação script ou

relato.

Capacidades lingüístico-discursivas

Mecanismos de textualização e mecanismos enunciativos e

seus efeitos de sentido

Empregar a modalidade da língua característica do

gênero: modalidade padrão;

Selecionar adequadamente o léxico;

Manter coerência e coesão;

Empregar organizadores temporais e espaciais

adequadamente;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade (a atribuição das informações às fontes,

o emprego de aspas para indicar a transcrição

fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se

(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da

voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as

marcas do autor; e a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas para se apagar as marcas

modais (avaliações, julgamentos, etc.));

Identificar e empregar vozes implícitas.

Page 75: Noticia e Reportagem Nos LDS

74

QUADRO 8. Modelo didático do gênero reportagem

Capacidades de linguagem Operações de linguagem exigidas ao domínio do gênero

reportagem

Capacidades de ação

Situação de Produção (contextualização do gênero)

Levar em conta o suporte material em que veicula o

gênero e seu formato de circulação social;

Identificar e considerar o público-alvo esperado, o

lugar e o momento da produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de

muitas pessoas, improváveis de acontecer, que

possivelmente despertem a curiosidade ou que haja

identificação com o público-alvo;

Apresentar fatos contemporâneos, verdadeiros e

precisos;

Ampliar relato de fato já noticiado.

Capacidades discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero

(título, lide e corpo de texto) ou suas

possibilidades de estruturação;

Compreender que a estruturação da reportagem é

menos rígida do que a da notícia;

Compreender a função de cada elemento estrutural;

Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos,

quadros, fotos e legendas;

Reconhecer e empregar o tipo de discurso

característico do gênero: discurso narração;

Selecionar previamente eventos;

Conhecer e empregar planificação script ou relato.

Capacidades lingüístico-discursivas

Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e seus

efeitos de sentido

Empregar a modalidade da língua característica do

gênero: modalidade padrão;

Selecionar adequadamente o léxico;

Manter coerência e coesão;

Empregar organizadores temporais e espaciais

adequadamente;

Identificar o papel argumentativo de certos

conectivos (já que, se, por outro lado, etc);

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade (a atribuição das informações às fontes,

o emprego de aspas para indicar a transcrição

fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se

(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da

voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as

marcas do autor; e a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas para se apagar as marcas

modais (avaliações, julgamentos, etc.));

Identificar e empregar vozes implícitas.

Page 76: Noticia e Reportagem Nos LDS

75

Assim, tais quadros teóricos guiarão nossa análise das atividades propostas ao ensino dos

gêneros notícia e reportagem e suas implicações no desenvolvimento de capacidades da

linguagem nos livros didáticos de Português de Ensino Médio, recomendados pelo PNLEM/2009.

Page 77: Noticia e Reportagem Nos LDS

76

Capítulo 3

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este capítulo apresenta os aspectos metodológicos de nossa pesquisa. Iniciaremos pela

apresentação dos critérios para seleção do corpus de análise que é constituído por 4 coleções

recomendadas pelo PNLEM/2009, em seguida apresentaremos os critérios e as etapas de nossa

análise.

3.1 A seleção do corpus

Este trabalho busca analisar as atividades didáticas propostas ao ensino dos gêneros

notícia e reportagem e suas implicações para o desenvolvimento de capacidades de linguagem

dos alunos em livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio, aprovados pelo

PNLEM/2009. Optamos por esta etapa da educação porque há uma demanda por pesquisas que a

enfoque. Como uma das finalidades do Ensino Médio, segundo os documentos oficiais da

educação brasileira, é a formação crítica do aluno, decidimos analisar as propostas de ensino de

língua centradas em gêneros da esfera jornalística por pensarmos que o trabalho com estes

gêneros permitem reflexões críticas diante de fatos sociais e políticos.

Entretanto, a esfera jornalística é constituída por uma grande variedade de gêneros:

notícia, reportagem, editorial, artigo de opinião, crônica jornalística, entrevista, entre outros.

Seria inviável, devido ao tempo, analisarmos todos esses gêneros, então optamos por centrar

nosso trabalho em dois dos gêneros jornalísticos que, segundo Bueno (2002), são os que mais

veiculam nos livros didáticos: a notícia e a reportagem.

A fim de selecionarmos as coleções didáticas que seriam nosso objeto de investigação

realizamos a leitura do Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio de

Língua Portuguesa (PNLEM) de 2005 e 2009. Ambos apresentam os mesmos princípios

pedagógicos e critérios para avaliação das obras. Após a leitura das resenhas dos livros e de

posse das 11 coleções indicadas pelo PNLEM/2009, selecionamos nosso corpus de análise por

meio dos seguintes critérios:

Page 78: Noticia e Reportagem Nos LDS

77

livros didáticos de Português que dedicassem capítulos, unidades ou módulos ao ensino

dos gêneros notícia e/ou reportagem, tendo-os como textos principais; ou

livros didáticos de Português que dedicassem capítulos, unidades ou módulos ao estudo

do jornal ou da imprensa e que neles enfocassem o ensino dos gêneros notícia e/ou

reportagem.

Dessa forma, excluímos os livros didáticos que tratavam desses gêneros de modo

desarticulado com o assunto dos capítulos, unidades ou módulos, portanto selecionamos as obras

que se dedicassem ao estudo da esfera de comunicação da notícia e da reportagem e ao ensino

desses gêneros. Assim, chegamos a 4 livros didáticos, que foram indicados pelo PNLEM de

2005 e 2009:

QUADRO 9. Corpus de análise

Nome da coleção Designações

usadas na

análise

Autores Capítulos que tratam dos

gêneros

Notícia e/ou Reportagem

Português: linguagens

Livro1

(PL)

Thereza Cochar Magalhães

William Roberto Cereja

(Ed. Atual)

Capítulo 27. A Notícia

Capítulo 33. A Reportagem

Português: língua e

cultura

Livro 2

(PLC)

Carlos Alberto Faraco

(Ed. Base)

Capítulo 14. Texto Informativo:

A Notícia

Capítulo 15. Texto Informativo:

A Reportagem

Língua Portuguesa

Livro 3

(LP)

Heloisa Harue Takazaki

(Ed. IBEP)

Capítulo 9. Imprensa

Língua Portuguesa:

Projeto Escola e

Cidadania para todos

Livro 4

(PEC)

Harry Vieira Lopes

Zuleia de Felice Murrie

Jeosafá Fernandez Gonçalves

Simone Gonçalves da Silva

(Ed. Brasil)

Capítulo 26. É da hora! É do dia!

A seguir apresentaremos os critérios de análise dessa pesquisa, cujo cunho é qualitativo,

na qual há a preocupação em analisar cada uma das obras selecionadas de modo amplo e

coerente com o referencial teórico adotado.

Page 79: Noticia e Reportagem Nos LDS

78

3.2 Critérios de análise

Tendo como base o referencial teórico do ISD, em especial aos estudos de gêneros e suas

aplicações didáticas realizados por Schneuwly e Dolz (2004), buscamos verificar se as atividades

propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem trabalham com:

a) a situação de produção (implicando no desenvolvimento de capacidades de ação do

aluno);

h) o conteúdo esperado ou dizível (implicando no desenvolvimento de capacidades de

ação do aluno);

b) a organização textual (implicando no desenvolvimento de capacidades discursivas do

aluno);

c) os mecanismos lingüísticos empregados e seus efeitos de sentido (implicando no

desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do aluno).

Para tanto, recorreremos aos quadros teóricos, apresentados no capítulo 2 deste trabalho,

que trazem as modelizações dos gêneros em questão, os quais foram elaborados a fim de orientar

nossa análise dos livros didáticos selecionados. Tais quadros trazem as operações de linguagem

exigidas ao domínio dos gêneros de texto notícia e reportagem e as respectivas capacidades de

linguagem nelas mobilizadas.

Dessa forma, crê-se possível a realização de uma análise ampla das atividades didáticas

propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem nos livros de Português, na qual serão

verificadas se é propiciado o desenvolvimento das capacidades de linguagem dos alunos

necessárias ao domínio de tais gêneros de texto.

A seguir apresentaremos como se organizará o processo de análise do corpus.

3.3 Etapas de análise

Realizaremos a análise das 4 coleções que compõem o corpus deste trabalho, tendo como

base os critérios descritos. Primeiramente, dedicar-nos-emos à descrição de cada uma das obras

Page 80: Noticia e Reportagem Nos LDS

79

como um todo, apresentando também como elas são descritas nas resenhas dos catálogos do

PNLEM/2005 e 2009, para então nos aprofundarmos na descrição dos capítulos que se dedicam

ao ensino dos gêneros notícia e reportagem.

Em cada um desses capítulos, descreveremos sua organização e analisaremos:

a) o texto principal apresentado (além de outros se houver);

b) as atividades didáticas propostas;

c) as orientações e perspectivas teóricas apresentadas no manual do professor em

relação aos gêneros.

Tais análises, orientadas pelos quadros teóricos de modelização da notícia e da

reportagem por nós construídos, com base nos postulados teórico-didáticos de Schneuwly e Dolz

(2004), objetivam verificar se: a situação de produção, o conteúdo dizível, a organização textual,

os mecanismos lingüísticos empregados e seus efeitos de sentido são, de algum modo,

trabalhados no ensino desses gêneros nos livros de Língua Portuguesa selecionados.

Por meio das análises, buscamos responder se as propostas de ensino encontradas nos

livros de nosso corpus podem levar o aluno a desenvolver capacidades de linguagem exigidas ao

domínio de textos dos gêneros notícia e reportagem. Assim, pensamos contribuir com uma

discussão sobre o ensino de língua materna centrado no estudo de gêneros textuais.

Page 81: Noticia e Reportagem Nos LDS

80

Capítulo 4

RESULTADOS DA ANÁLISE

Neste capítulo, faremos a exposição dos resultados da análise dos livros didáticos de

Língua Portuguesa de Ensino Médio, indicados pelo PNLDEM/2009, que compõem o corpus

desta pesquisa. Iniciaremos pela apresentação geral da estrutura dos livros e os gêneros textuais

neles trabalhados. Em seqüência, trataremos da maneira como o jornal vem sendo abordado no

livro didático atual para então aprofundarmos na análise das atividades propostas ao ensino dos

gêneros reportagem e notícia e as respectivas capacidades de linguagem nelas mobilizadas.

4.1. Apresentação do livro didático de Ensino Médio

Neste momento, apresentaremos a organização de cada uma das 4 obras que compõem o

corpus desta pesquisa a fim de contextualizarmos os capítulos os quais analisaremos e mostrar

como os livros didáticos de Português vêm sendo estruturados na contemporaneidade.

Designaremos os livros didáticos no decorrer da análise da seguinte maneira:

Livro 1 (PL): Português: Linguagens;

Livro 2 (PLC): Português: língua e cultura;

Livro 3 (LP): Língua Portuguesa;

Livro 4 (PEC): Língua Portuguesa – Projeto Escola e Cidadania para todos.

O livro 1 (PL), Português: Linguagens, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar

Magalhães da editora Atual/Saraiva (2005) é obra aprovada tanto no PNLEM de 2005 quanto no

de 2009, entretanto naquele é apresentada a versão em volume único e neste a versão organizada

em 3 volumes, sendo uma para cada série do Ensino Médio. Será nosso objeto de estudo o

volume 2 por serem nele abordados os gêneros notícia e reportagem, especificamente o exemplar

do professor que contêm respostas aos exercícios e orientações pedagógicas.

Page 82: Noticia e Reportagem Nos LDS

81

A obra, que apresenta projeto gráfico atraente e modernos, segundo o catálogo do

PNLEM/2009, é organizada em 4 unidades sendo o fio condutor destas unidades e da obra como

um todo a literatura que é abordada de modo tradicional: em ordem cronológica, apresentando o

contexto histórico e as características dos movimentos literários, os autores consagrados e alguns

textos para leitura e estudo. Cada uma das unidades são constituídas por em média 12 capítulos,

totalizando 48 capítulos que são sistematicamente organizados nos seguintes tópicos: Literatura,

Produção de texto e Língua: uso e reflexão.

No catálogo do PNLEM/2009 de Língua Portuguesa, o tratamento dado nesse livro à

literatura e à produção de texto é elogiado. Enfatiza-se a variada seleção textual que compõe a

obra como um todo e destaca-se o tratamento dado aos gêneros nos capítulos de Produção de

texto:

O trabalho sistemático com os gêneros textuais tem um saldo muito

positivo na obra. Em primeiro lugar, cria as condições ideais para a

produção, sugerindo inúmeras situações-problema que contribuem para a

formação do aluno como ator social. Em segundo lugar, por ter em vista

um leitor, o aluno se conscientiza da necessidade de adequar seu texto (a)

ao gênero envolvido, (b) à situação comunicativa e (c) à variedade

lingüística que melhor atenda suas necessidades de expressão. Além

disso, o trabalho com os gêneros tem a vantagem de colocar o aluno em

contato com textos que ele efetivamente terá de produzir em situações

concretas de interação. (BRASIL/SEMTEC, 2008, p. 27)

Nosso propósito é analisar profundamente se tais adequações pontuadas no catálogo do

PNLEM/2009 de fato ocorrem no tratamento didático proposto ao estudo dos gêneros notícia e

reportagem nesta obra.

Se os tópicos Literatura e Produção de texto são elogiados, o mesmo não ocorre em

Língua: uso e reflexão. Segundo o catálogo do PNLEM/2009, não há reflexão sobre o uso da

língua, mas sim o ensino de gramática prescritiva sob esse título oriundo das recentes teorias

lingüísticas, assim a obra não cumpre a expectativa do título do tópico.

Há ainda outras seções que constituem o livro. No início de cada unidade é apresentada a

seção Fique ligado!Pesquise! em que são apresentados filmes, livros, músicas, sites, obras de

arte, relacionados ao assunto literário da unidade com o objetivo de ampliar o conhecimento do

aluno sobre os fatos estudados e relacioná-los a atualidade, propiciando a ampliação do universo

cultural do aluno. Entre uma unidade e outra há uma seção chamada Intervalo na qual são

Page 83: Noticia e Reportagem Nos LDS

82

propostos projetos e trabalhos de pesquisa com temas variados e multidisciplinares. Há ainda a

seção Em dia com o Vestibular e que é apresentada ao término de algumas unidades, trazendo

uma bateria de exercícios aplicados nesses exames.

No manual do professor apresenta-se a descrição das seções do livro, sugerem-se leituras

extraclasse com roteiros de leitura e explicitam-se as escolhas teórico-metodológicas que

permeiam o livro 1 (PL).

Com o quadro a seguir, buscamos traçar o panorama geral desse livro, trazendo as 4

unidades que o compõem e todos os capítulos em suas respectivas seções.

Page 84: Noticia e Reportagem Nos LDS

83

QUADRO 10. Livro 1: estruturação da obra

LIVRO 1 (PL)

Seções/

Unidades

LITERATURA PRODUÇÃO DE TEXTO LÍNGUA: USO E

REFLEXÃO

Unidade 1

História social do

Romantismo – A poesia

Capítulo 1. A linguagem do

Romantismo

Capítulo 2. Do texto ao contexto do Romantismo

Capítulo 5. A literatura em

portugal Capítulo 7. O Romantismo no

Brasil: primeira geração Capítulo 10. O ultra-romantismo

Capítulo 12. O condoreirismo

Capítulo 13. Diálogos com a poesia romântica

Capítulo 3. O cartaz

Capítulo 9. A mesa-redonda

Capítulo 4. O substantivo

Capítulo 6. O adjetivo

Capítulo 8. O artigo e o numeral

Capítulo 11. O pronome

Em dia com o vestibular

Intervalo: Projeto O Romantismo em revista

Unidade 2

O romantismo – A prosa

Capítulo 14. O romance

romântico e a identidade nacional – o romance

indianista

Capítulo 17. O romance regional

Capítulo 20. O romance

urbano Capítulo 22. A prosa gótica

Capítulo 23. Diálogos com a

poesia romântica

Capítulo 15. O conto (I)

Capítulo 18. O conto (II)

Capítulo 16. O verbo

Capítulo 19. O advérbio Capítulo 21. Termos

relacionais: a preposição e a

conjunção Capítulo 24. A interjeição

Em dia com o vestibular

Intervalo: Projeto Do sarau à taverna: o Romantismo e o Ultra-Romantismo

Unidade 3

História social do Realismo, do Naturalismo

e do Parnasianismo

Capítulo 25. A linguagem do

realismo, do naturalismo e do Parnasianismo

Capítulo 26. Do texto ao

contexto realista Capítulo 29. O Realismo em

Portugal.

Capítulo 32. O Realismo e o Naturalismo no Brasil

Capítulo 35. O Parnasianismo

no Brasil Capítulo 36. Diálogos com o

Realismo e o Naturalismo

Capítulo 27. A notícia

Capítulo 30. A entrevista

Capítulo 33. A reportagem

Capítulo 28. O modelo

morfossintático – o sujeito e o predicado

Capítulo 31. Termos ligados

ao verbo: objeto direto, objeto indireto, adjunto

adverbial

Capítulo 34. O predicado – tipos de predicado

Em dia com o vestibular

Intervalo: Projeto a época do Realismo-Naturalismo

Unidade 4

História social do

Simbolismo

Capítulo 37. A linguagem do

Simbolismo

Capítulo 38. Do texto ao contexto do Simbolismo

Capítulo 39. O Simbolismo em

Portugal Capítulo 42. O Simbolismo no

Brasil

Capítulo 45. O teatro brasileiro no século XIX

Capítulo 48. Diálogo com o

Simbolismo

Capítulo 40. O anúncio

publicitário

Capítulo 43. A crítica Capítulo 46. O editorial

Capítulo 41. Tipos de sujeito

Capítulo 44. Termos ligados

ao nome: adjunto adnominal e complemento nominal

Capítulo 47. Termos ligados

ao nome: aposto e vocativo

Em dia com o vestibular

Intervalo: Projeto A arte, a ciência e a filosofia no século XIX

50% 21% 29%

Page 85: Noticia e Reportagem Nos LDS

84

Como o quadro anterior ilustra, 50% da obra (24 capítulos) é destinada ao estudo de

literatura, 21% (10 capítulos) volta-se à produção de texto e 29% (14 capítulos) enfoca-se o

estudo da língua, portanto há grande ênfase ao estudo literário. A divisão da obra nestes 3

tópicos, que também aparecerão em outras obras, reflete a tendência à fragmentação do ensino de

língua que se opera na atualidade nas práticas de sala de aula, como afirmam Mendonça e Bunzen

(2007).

Os gêneros notícia e reportagem são trabalhados na unidade 3, História social do Realismo,

do Naturalismo e do Parnasianismo, possivelmente por serem textos relacionados à realidade,

assim como o movimento Realista.

Passaremos a apresentação do livro 2 (PLC), Português: língua e cultura, de Carlos

Alberto Faraco da editora Base (2003), volume único, é obra aprovada e indicada no catálogo do

PNLEM de 2005 e 2009. É um livro voltado a formação de leitores críticos, apresentando uma

grande variedade textual, conforme o catálogo do PNLEM/2009.

Vejamos a apresentação da obra realizada pelo próprio autor, Carlos Alberto Faraco,

presente no site da editora7:

Prezado/a colega professor/a de Português:

...O livro reúne um grande número de textos ligados a diversos gêneros do

discurso. Penso que devemos oferecer a nossos alunos a oportunidade de

se familiarizarem com a diversidade de textos e gêneros que circulam em

nossa sociedade. É esse material que dá os fundamentos do trabalho de

leitura e escrita proposto no livro.

Ao mesmo tempo, não descuidei da gramática. Nossos alunos precisam

aprender a pensar como a língua funciona. Desenvolvi, de forma bastante

inovadora, unidades para o estudo da morfologia e sintaxe do português.

Inclui também uma ampla reflexão sobre as variedades da nossa língua

com dois objetivos: (a) fornecer subsídios para sustentar nossa luta contra

o preconceito lingüístico; e (b) dar base sólida para organizar o ensino da

norma culta.

Por fim, dediquei especial atenção ao estudo da literatura [...] um aspecto

inovador deste livro é a apresentação da literatura africana de expressão

portuguesa. É a primeira obra a fazer isso no Brasil...

Na apresentação do autor, podemos notar a ênfase aos aspectos inovadores da obra, fato

que reflete a dimensão mercadológica do livro didático o qual precisa ser „consumido‟. Assim o

autor recorre à inovação de seu livro para conquistar o público-alvo, os professores de Português.

4 Informações disponíveis em: http://www.baseeditora.com.br. Acesso em agosto de 2008.

Page 86: Noticia e Reportagem Nos LDS

85

Entretanto, busca deixar claro que não se descuidou dos conteúdos tradicionais de Língua

Portuguesa. Ao analisarmos o livro, apreendemos que a apresentação do autor corresponde ao

que é proposto na obra. A abordagem transita entre elementos inovadores e tradicionais no ensino

de língua.

O livro é original na forma de organizar o conteúdo, dispondo os seus 35 capítulos em

blocos denominados de: Textos, Enciclopédia da linguagem, Almanaque gramatical, Guia

normativo e História da literatura.

No catálogo do PNLEM/2009, é afirmado que a obra permite que o professor organize seu

uso de acordo com seu planejamento do curso, entretanto os capítulos do livro buscam uma

relação entre si, um remetendo ao outro.

As seções dos capítulos são longas e organizam-se em torno de, em média, dois textos

principais, além de outros que se relacionam de algum modo com eles, seja pela forma ou pelo

conteúdo. Os tópicos que estruturam as seções são: Leitura, Prática escrita, De olho na língua,

Observando aspectos gramaticais, Leitura lúdica, Leitura complementar e Pausa poética, os

quais variam de um capítulo a outro de acordo com o conteúdo estudado.

Vejamos os capítulos que compõem cada uma das seções do livro:

Page 87: Noticia e Reportagem Nos LDS

86

QUADRO 11. Livro 2: estruturação da obra

LIVRO 2 (PLC)

TEXTOS ENCICLOPÉDIA DA

LIGUAGEM

ALMANAQUE

GRAMATICAL

GUIA NORMATIVO HISTÓRIA DA

LITERATURA

Capítulo 1. Histórias

que a vida conta 1.

Comentários sobre a

crônica

Capítulo 2. Histórias

que a vida conta 2

(crônicas em verso)

Capítulo 3. Histórias

que a nossa

imaginação cria 1

(narrativa)

Capítulo 4. Histórias

que a nossa

imaginação cria 2

(conto em versos)

Capítulo 5. Narrativas

curtas e longas

Capítulo 6. Trilhando

os caminhos do texto

poético 1

Capítulo 7. Trilhando

os caminhos do texto

poético 2

Capítulo 13.

Folheando um jornal:

textos em profusão

Capítulo 14. Texto

informativo: a

notícia

Capítulo 15. Texto

informativo:

reportagem

Capítulo 16.

Narrativas longas: um

plano de leitura

Capítulo 17.

Entrevistas: lidando

com a palavra do

outro

Capítulo 24. Um

tema: vários textos

Capítulo 25. Textos

de opinião: editoriais

Capítulo 26. Um

tema: muitas opiniões

Capítulo 27. Ainda o

texto de opinião

Capítulo 28. O texto

publicitário

Capítulo 8.

Linguagem e

linguagens

Capítulo 9. A origem

da linguagem

Capítulo 10. A

complexidade das

línguas

Capítulo 11. A

flexibilidade das

línguas

Capítulo 12. A

variação lingüística

Capítulo 18.

Palavras, palavras,

palavras: o léxico da

língua

Capítulo 19.

Classificando as

palavras

Capítulo 20.

Construindo

sentenças simples:

um pouco de sintaxe

Capítulo 21.

Construindo

sentenças complexas

Capítulo 22.

Tópicos da língua

padrão

(concordância

verbal/verbos

irregulares)

Capítulo 23.

Tópicos da língua

padrão /regência

verbal/ uso dos

pronomes)

Capítulo 29.

História da literatura

brasileira: período

colonial

Capítulo 30.

História da literatura

brasileira: século

XIX

Capítulo 31.

História da literatura

brasileira: século

XX

Capítulo 32. A

literatura em

Portugal: inícios

Capítulo 33. A

literatura em

Portugal: do

renascimento ao

romantismo

Capítulo 34. A

literatura em

Portugal: os séculos

XIX e XX

Capítulo 35.

Literatura africana

em língua

portuguesa

49% 14% 11% 6% 20%

Page 88: Noticia e Reportagem Nos LDS

87

Como o quadro anterior ilustra, o enfoque principal é dado ao estudo de Textos

correspondendo a 49% da obra (17 capítulos), nesses capítulos trabalha-se o estudo de gêneros

variados como: crônica, conto, poema, notícia, reportagem, entrevista, editorial, dissertação e

anúncio publicitário; 20% é destinado à História da literatura (7 capítulos), apresenta-se o

contexto histórico e os autores consagrados da literatura brasileira, portuguesa e africana

respectivamente; 14% à Enciclopédia da linguagem (5 capítulos), nos quais se enfoca a origem,

complexidade e flexibilidade da linguagem e a variação lingüística do Português; 11% ao

Almanaque gramatical (4 capítulos), em que se trata da formação e das classes de palavras, além

da construção de sentenças; e 6% ao Guia normativo (2 capítulos), trabalha-se a concordância e a

regência verbal e nominal da língua padrão.

A abordagem dada ao ensino de Língua Portuguesa ora se aproxima das teorias de texto e

discurso recentes (capítulos de Textos e Enciclopédia da linguagem) ora se aproxima do ensino

tradicional centrado na gramática normativa (capítulos de Almanaque gramatical e Guia

normativo).

Passaremos então ao livro 3 (LP), Língua Portuguesa, de Heloísa Harue Takazaki,

editora IBEP (2005), volume único. O ensino de língua nesse livro é centrado no texto, como

propõe os PCN. Tal obra constitui-se de 24 capítulos adicionados de duas sínteses finais:

Questões de estilo, em que se abordam os movimentos literários de forma breve e concisa, e

Lingüística e gramática, em que se trata de concepções de linguagem e de gramática, além de

quadros sinópticos de tópicos gramaticais. No livro do professor é afirmado que tais sínteses têm

o objetivo de servir como material de consulta ao aluno, entretanto são nesses dois únicos

capítulos em que os movimentos literários e os conhecimentos gramaticais são sistematizados.

O livro 3 (LP) se propõe ao estudo da linguagem verbal, dos textos e da inter-relação entre

as diversas linguagens que permeiam o meio social, sem compromisso com a cronologia histórica

da literatura e com sistematização gramatical, segundo as informações contidas em seu manual

do professor.

Os capítulos se organizam, de forma geral, em torno de dois ou três textos. No interior de

cada um dos capítulos, as seções variam de acordo com o conteúdo estudado, sendo elas: Ponto

de partida, em que é apresentado o texto principal do capítulo; Estudo do texto, Reflexões e

Troque idéias, seções dedicadas à análise e reflexão sobre os textos propostos; Para confrontar,

em que há textos, geralmente, que se opõem às idéias do texto principal; Para pesquisar, em que

Page 89: Noticia e Reportagem Nos LDS

88

são apresentadas propostas de ampliação do conteúdo estudado; e Produção de texto, seção em

que se propõe a produção do gênero ensinado no capítulo.

O livro 3 (LP), no catálogo do PNLEM/2009, é elogiado pela variada seleção textual, em

especial, aos textos literários e jornalísticos, entretanto é apontado que o trabalho com

conhecimentos lingüísticos são generalizantes, induzindo a erros, sendo este o ponto mais frágil

da obra. No quadro a seguir, apresentaremos sua estruturação geral:

QUADRO 12. Livro 3: estruturação da obra

Como o quadro ilustra, o livro 3 não apresenta explicitamente os capítulos agrupados em

módulos ou unidade de acordo com a tradicional divisão: literatura, língua e texto, entretanto, de

acordo com os títulos e com a análise de cada capítulo, foi possível apreender que os conteúdos

são estruturados de forma fragmentada subjacente a tal divisão, sendo 10 dos capítulos, ou seja,

41% deles dedicados ao ensino de gêneros (capítulos 5, 9, 10, 11, 12, 16, 17, 19, 20 e 23), sendo

7 deles voltados à literatura, correspondendo a 29,5% (capítulos 2, 4, 11, 14, 15, 21 e 22) e os

outros 7 restantes voltados ao ensino da língua (29,5%).

LÍVRO 3 (LP)

Capítulo 1. Língua

Capítulo 2. Literatura

Capítulo 3. Diversidade textual

Capítulo 4. Poesia e Trovadorismo

Capítulo 5. Teatro

Capítulo 7. Explicando o mundo

Capítulo 8. Textos que “devoram” textos

Capítulo 9. Imprensa

Capítulo 10. Discurso político-religioso

Capítulo 11. Sátira e deboche

Capítulo 12. Fala e escrita

Capítulo 13. Variedade da Língua Portuguesa

Capítulo 14. Literatura e história

Capítulo 15. Os clássicos

Capítulo 16. Resenhas

Capítulo 17. Mito e ciência

Capítulo 18. Lingüística

Capítulo 19. Poesia

Capítulo 20. Burocracia e trabalho

Capítulo 21. Semana da Arte Moderna

Capítulo 22. Regionalismo

Capítulo 23. Contar histórias

Capítulo 24. Descrição

Questões de estilo

Lingüística e gramática

Page 90: Noticia e Reportagem Nos LDS

89

O livro 4 (PEC), Língua Portuguesa – Projeto Escola e Cidadania para todos, de Harry

Vieira Lopes, Zuleia de Felice Murrie, Jeosafá Fernandez Gonçalves e Simone Gonçalves da

Silva, editora do Brasil (2004), constitui-se de uma obra volume único, recomendada no PNLEM

de 2005 e 2009, de caráter inovadora tanto na abordagem quanto no aspecto gráfico.

Tal livro é constituído de 30 módulos, subdivididos em áreas temáticas: reflexões sobre

aspectos lingüísticos (oito módulos), conhecimentos literários (sete módulos), narrativas literárias

(seis módulos), textos pragmáticos (nove módulos). Nele é apresentada uma abordagem voltada à

interdisciplinaridade.

Cada módulo é constituído de forma a desenvolver diferentes aspectos sobre um mesmo

tema, a partir de um texto principal, que se articula a textos de outros gêneros, estando presente

na obra uma grande variedade textual. Não seguindo uma ordem preestabelecida, a obra propicia

que a aplicação seja definida pelo professor, segundo o planejamento curricular traçado tanto por

ele quanto pelo projeto pedagógico da escola, no intento de formar um aluno crítico e

participante.

A distribuição interna das seções, em cada módulo, não segue a divisão: leitura, produção

de textos, conhecimentos lingüísticos e conhecimentos literários, tanto em termos da

apresentação do conteúdo quanto da proposição de atividades. Ao contrário, o livro 4 se organiza

dinamicamente de forma a propiciar ao aluno uma experiência ampla sobre o tema que lhe é

didaticamente proposto. Vejamos o quadro a seguir no qual buscamos traçar sua estrutura geral:

Page 91: Noticia e Reportagem Nos LDS

90

QUADRO 13. Livro 4: estruturação da obra

Como o quadro anterior ilustra, o livro 4 (PEC) enfatiza o trabalho em torno de gêneros

textuais, dedicando 50% da obra a seu estudo. Seus módulos se organizam no livro na ordem que

os apresentamos no quadro: primeiramente os voltados ao ensino de aspectos lingüísticos (27%),

seguidos pelos módulos literários (23%) e aqueles voltados aos textos literários e aos textos

pragmáticos (50%). Alguns módulos tratam do estudo de vários gêneros, por exemplo, o Kit de

sobrevivência na escola trabalha com variados gêneros textuais escolares como ficha de leitura, a

aula expositiva, o resumo, a palestra, o seminário, o quadro sinóptico, com vistas a que o aluno

organize seus estudos. O módulo Projeto de pesquisa escolar prepara o estudante ao domínio

desse gênero que o acompanhará na vida acadêmica. O Burocracia: você odeia, mas não vive sem

enfatiza o ensino de gêneros tais como: currículo, ficha catalográfica, formulário, cheque,

cadastro, lei, memorando, correspondências internas, protocolo. O módulo Dois dedos de prosa...

tecnocientífica trata dos diferentes tipos de linguagem por meio do estudo de gêneros

LIVRO 4 (PEC)

Aspectos lingüísticos Conhecimentos literários Textos literários e pragmáticos

Liberdade é poder se

expressar

Você sabe gramática?

Ortografia: maquiagem da

língua escrita.

Fala e escrita: a maravilha

da linguagem

Armadilhas gramaticais

Falando de textos:

coerência.

Falando de textos: coesão.

Nomenclatura gramatical

brasileira.

Classificar é conhecer.

Lutar com palavras é a

luta mais vã.

Literatura: estudo do

termo.

Por oceanos da literatura.

Entre a fantasia e a

realidade.

Um mundo sem

fronteiras.

Só me interessa o que não

é meu.

A poesia nossa de cada dia.

Os tempos sempre foram de

crônica.

Romance: sempre perto de

você.

Quem conta um conto

aumenta um ponto.

Enveredando-se pela trama da

novela.

Quebre a perna! O teatro em

cena.

Pombo-correio, voa depressa.

Kit de sobrevivência na

escola.

Burocracia: você odeia, mas

não vive sem.

Dois dedos de prosa...

tecnocientífica.

É da hora! É do dia!

A alma do negócio.

Projeto de pesquisa escolar.

Se estou sem referências,

estou perdido.

Linguagem e poder: o texto

legal.

27% 23% 50%

Page 92: Noticia e Reportagem Nos LDS

91

tecnocientíficos como fórmulas científicas e tabela periódica. Realçamos o conteúdo desses 3

módulos por enfocarem gêneros pouco freqüentes em livros didáticos.

Em suma, o quadro a seguir mostrará a estruturação geral de cada um dos livros que

constituem nosso corpus de análise:

QUADRO 14. Porcentagem dos capítulos dedicados ao ensino de gêneros

Livros analisados Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Livro 3

(LP)

Livro 4

(PEC)

Capítulos/Módulos 48 35 24 30

Capítulos/Módulos dedicados ao

ensino de gêneros

10

(21%)

17

(49%)

10

(42%)

15

(50%)

O livro 4, como sinaliza o quadro, é a obra que mais dedica capítulos ao ensino de gêneros

textuais. A seguir, apresentaremos quais gêneros são selecionados como objetos de ensino nos

livros didáticos de Português analisados.

4.2 Os gêneros textuais no livro didático de Ensino Médio

Como nosso trabalho é voltado à análise de atividades propostas ao ensino de gêneros

textuais e de suas implicações no desenvolvimento de capacidade de linguagem em livros

didáticos de Português de Ensino Médio, apontaremos quais gêneros vêm sendo tratados nos

livros analisados.

Iniciaremos a exposição pelo tratamento dado aos gêneros textuais no livro 1 (PL). Devido

ao fato de o ensino de gêneros ocorrer nos capítulos de Produção de texto nesta obra,

apresentaremos sua constituição. Os capítulos de Produção de texto são estruturados em 3

segmentos: Trabalhando o gênero, Produzindo o gênero e Para falar/escrever com.... O trabalho

é iniciado pela leitura de um texto do gênero a ser enfocado, observando aspectos da linguagem,

do conteúdo e da estrutura do texto, seguidamente é proposto que o aluno coloque em prática o

que aprendeu, produzindo um texto com as características do gênero estudado.

Page 93: Noticia e Reportagem Nos LDS

92

Por meio da apresentação do trabalho didático voltado ao ensino de gêneros contida no

manual do professor do livro 1, é possível apreender que os autores dispõem de embasamento

teórico coerente com as propostas contemporâneas de ensino de língua presentes nos documentos

oficiais da educação.

No manual do professor, é afirmado que a “produção de texto no ensino fundamental e

médio tem por objetivo formar alunos-escritores capazes de produzir textos coerentes, coesos e

eficazes” (CEREJA; MAGALHÃES (MP), 2005, p. 10). Para tanto, o livro 1(PL) se propõe a

trabalhar a produção textual de modo sistematizado e em gradação espiral de gêneros textuais,

fundamentando-se nos estudos de linguagem e de gêneros de Bakhtin e nos postulados teóricos

de ensino de língua por meio de gêneros e progressão curricular de Schneuwly e Dolz, sendo os

dois últimos enfatizados no manual.

Esses teóricos dividiram as capacidades sociais de linguagem em 5 agrupamentos de

gêneros, os quais, segundo eles, devem ser trabalhados em todos os ciclos ou séries em espiral,

isto é, retomando capacidades de linguagem por meio do estudo sistemático de variados gêneros,

ampliando-os e aprofundando-os de acordo com as habilidades lingüísticas que se destacam em

cada um deles e de acordo com o nível dos alunos, conforme já apresentamos no capítulo 2 deste

trabalho.

Ao analisarmos a organização do tópico Produção de texto na obra como um todo, sem

aprofundarmos na análise detalhada da abordagem dada a cada gênero nos capítulos, pudemos

apreender que ao menos em sua estruturação as aprendizagens são organizadas em espiral, dos

gêneros mais simples aos mais complexos, em gradação como é proposto por Schneuwly e Dolz

(2004), cumprindo com o que é afirmado no manual. Por exemplo, os gêneros correspondentes a

tipologia „relatar‟ são trabalhados em 2 momentos da obra: a notícia é abordada no capítulo 27, é

o primeiro gênero estudado do agrupamento; em seguida a reportagem é tratada no capítulo 33,

gênero que já apresenta um grau maior de complexidade do que o anterior. Assim, a obra

proporciona ao aluno a leitura e produção de gêneros de níveis de complexidade diferentes,

pertencentes a domínios comuns, no decorrer do Ensino Médio.

Entretanto, os capítulos de Produção de texto enfocam gêneros de apenas 4 das capacidades

de linguagem globais agrupadas por Schneuwly e Dolz (2004). Correspondendo ao aspecto

tipológico „narrar‟ o gênero conto; ao „relatar‟ os gêneros: notícia e reportagem ; ao „argumentar‟

os gêneros: crítica, editorial e anúncio publicitário; e ao „expor‟ os gêneros mesa-redonda,

Page 94: Noticia e Reportagem Nos LDS

93

entrevista e cartaz. Não trabalhando com gêneros da tipologia „descrever ações‟, isto é, durante a

2ª série do Ensino Médio os alunos não terão contado, ao menos por meio do livro didático, com

gêneros como regulamento, regras, instruções, textos prescritivos, entre outros do domínio das

capacidades de linguagem relacionadas às instruções e prescrições.

QUADRO 15. Livro 1: gêneros ensinados e seus agrupamentos

LIVRO 1(PL)

NARRAR RELATAR ARGUMENTAR EXPOR DESCREVER

AÇÕES

Conto (I)

Conto (II)

Notícia

Reportagem

Crítica

Editorial

Anúncio publicitário

Cartaz

Mesa-redonda

Entrevista

_____

20% 20% 30% 30% 0%

O quadro anterior demonstra o enfoque dado na obra aos gêneros relacionados às tipologias

argumentar e expor correspondendo cada uma delas a 30% das propostas de produção de texto do

livro 1, já os gêneros relacionados à tipologia de relatar fatos, situações, experiências vividas

correspondem a 20% das propostas, sendo os gêneros notícia e reportagem pertencentes a este

domínio, e aqueles relacionados às capacidades do domínio cultural literário correspondem a

20% das propostas do livro 1.

Passemos aos gêneros no livro 2 (PLC). Nessa obra o autor não trabalha com o termo

„gêneros‟, mas sim com „tipos de textos‟. O bloco Textos, constituído por 17 capítulos, é

dedicado ao ensino de gêneros. Segundo o autor, a finalidade desse bloco é “fornecer meios para

o estudante perceber as especificidades de cada tipo de texto e de analisar seu conteúdo e

estrutura” (FARACO (MP), 2003, p. 17). Assim a afirmação do autor já sinaliza que

possivelmente o livro 2 enfocará o desenvolvimento de capacidades de ação (ao tratar do

conteúdo) e de capacidades discursivas (ao tratar da estrutura) dos alunos.

Os capítulos do bloco Textos organizam-se em torno de textos literários: crônicas, contos,

romances e poemas, textos informativos: notícia e reportagem, textos de opinião: entrevista,

editorial e dissertação, e texto publicitário: anúncio publicitário, como ele designa no decorrer do

livro.

A progressão da aprendizagem dos gêneros se dá da seguinte forma: crônica (capítulos 1 e

2), narrativa (capítulo 3), conto (capítulo 4), retomada da narrativa do tipo curta e longa (capítulo

5), poema (capítulo 6 e 7), o jornal e seus textos (capítulo 13), notícia (capítulo 14), reportagem

Page 95: Noticia e Reportagem Nos LDS

94

(capítulo 15), retomada da narrativa longa/romance (capítulo 16), entrevista (capítulo 17),

editorial (capítulo 25), texto de opinião (capítulo 26), dissertação (capítulo 27) e texto publicitário

(capítulo 28).

Como podemos notar, durante os três anos do Ensino Médio as aprendizagens não são

organizadas em espiral no livro 2, como propõem Schneuwly e Dolz (2004), mas sim de modo

mais tradicional, enfocando na designação do autor textos literários (crônica, narrativa, conto,

poema), que corresponderiam ao agrupamento de gêneros da esfera do „narrar‟ dos teóricos, com

a exceção da crônica; em seguida trabalha-se os textos informativos (notícia e reportagem), que

para Schneuwly e Dolz tratam-se de gêneros da esfera do „relatar‟; após aborda-se textos de

opinião (entrevista, editorial e dissertação) e o texto publicitário (anúncio publicitário), gêneros

da esfera do „argumentar‟ para os teóricos, com a exceção da entrevista que corresponde à

tipologia „expor‟. Assim, o trabalho com os gêneros se dá em progressão do mais simples ao mais

complexo, entretanto a organização é linear, isto é, os gêneros pertencentes a esferas de

comunicação distintas não são intercalados, deixando a forma de aprendizagem em espiral a

cargo do professor na utilização da obra.

QUADRO 16. Livro 2: gêneros ensinados e seus agrupamentos

LIVRO 2 (PLC)

NARRAR RELATAR ARGUMENTAR EXPOR DESCREVER

AÇÕES

Narrativa/

romance

Conto

Poema

Notícia

Reportagem

Crônica

Editorial

Dissertação

Anúncio publicitário

Entrevista ______

30% 30% 30% 10% 0%

O quadro anterior traz cada gênero trabalhado no livro 2 na respectiva tipologia de

Schneuwly e Dolz. Como podemos apreender, tanto no livro 1(PL) quando no 2 (PLC), há a

ausência de gêneros da tipologia „descrever ações‟.

Vejamos em outra obra. O livro 3 (LP) traz uma variedade de gêneros textuais, como já

apresentamos. No manual do professor, as informações dadas são de caráter gerais não

especificando a perspectiva de gênero adotada nem como se dará a progressão de seu ensino na

obra durante os três anos dessa etapa da educação. O único momento em que se expõe um pouco

Page 96: Noticia e Reportagem Nos LDS

95

da perspectiva presente no livro ocorre somente na apresentação dos objetivos do capítulo 3,

Diversidade textual, em que é afirmado:

...este capítulo toma como base duas orientações teóricas básicas para

categorização dos textos: dos gêneros discursivos e das seqüências

discursivas (ou tipos de textos). O que se pretende é que o aluno, em

primeiro lugar, leve em conta que os gêneros, como formas “relativas

estáveis de enunciados”, possuem especificidades, características cuja

apreensão pode facilitar a leitura. (TAKAZAKI, 2005, p. 20)

Observe que no fragmento transcrito do manual do livro 3, cita-se a fala de Bakhtin, mas

não se faz nenhum tipo de referência a ele no texto, sendo somente sinalizado com aspas. Quanto

ao que é dito sobre gêneros, era de se esperar maior embasamento teórico para se expor a questão

em um manual de Língua Portuguesa, em especial, esse que é organizado em torno de vários

gêneros.

Tendo como base as informações contidas no manual do professor, no sumário e a

realização da análise do livro 3, capítulo a capítulo, chegamos a variedade de gêneros textuais

presentes na obra cujo aluno terá contato, a qual apresentamos na seção anterior, porém não são

todos que são tomados como objetos de ensino.

O livro 3 (LP) dedica-se ao ensino de 14 gêneros, a saber: texto teatral (capítulo 5),

notícia e artigo de opinião (capítulo 9), discurso político eleitoral (capítulo 10), charge (capítulo

11), entrevista (capítulo 12), resenha (capítulo 16), divulgação científica (capítulo 17), poema

(capítulo 19), ficha, currículo, carta de apresentação, anúncio classificado (capítulo 20), e conto

(capítulo 23).

QUADRO 17. Livro 3: gêneros ensinados e seus agrupamentos

LIVRO 3 (LP)

NARRAR RELATAR ARGUMENTAR EXPOR DESCREVER

AÇÕES

Texto teatral

Poema

Conto

Notícia

Currículo

Carta de

apresentação

Artigo de opinião

Discurso político

eleitoral

Charge

Resenha

Entrevista

Divulgação

científica

Anúncio

classificado

Ficha

21,5% 21,5% 28,5% 21,5% 7%

Page 97: Noticia e Reportagem Nos LDS

96

O livro 3 (LP), como o quadro sinaliza, trabalha com gêneros dos 5 agrupamentos

tipológicos, sendo nele enfatizado o estudo de gêneros de texto pertencentes à ordem de

„argumentar‟(28,5%).

Passemos aos gêneros no livro 4 (PEC):

QUADRO 18. Livro 4: gêneros ensinados e seus agrupamentos

LIVRO 4 (PEC)

NARRAR RELATAR ARGUMENTAR EXPOR DESCREVER

AÇÕES

Texto teatral

Poema

Conto

Novela

Romance

Notícia

Crônica

Carta

Currículo

Anúncio publicitário Resumo

Aula expositiva

Palestra

Seminário

Projeto de

pesquisa

Verbete

Referência

bibliográfica

Quadro sinóptico

Ficha de leitura

Fórmula científica

Tabela periódica

Instruções

Ficha catalográfica

Formulário

Cheque

Cadastro

Lei

Memorando

Correspondências

internas

Protocolo

17% 13% 3% 37% 30%

O livro 4 (PEC) traz uma grande variedade de gêneros, contemplando as 5 tipologias de

Schneuwly e Dolz. A ênfase é dada, diferente dos outros livros, aos gêneros pertencentes à ordem

do „expor‟, 37%, e à ordem do „descrever ações‟, 30% dos gêneros estudados como o quadro

anterior mostra.

Em suma, o quadro a seguir retoma os gêneros textuais tidos, de alguma forma, como

objetos de ensino em cada um dos livros analisados a partir do agrupamento de Schneuwly e

Dolz (2004).

Page 98: Noticia e Reportagem Nos LDS

97

QUADRO 19. Gêneros textuais ensinados nos livros didáticos analisados

Livros/

Agrupamentos

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Livro 3

(LP)

Livro 4

(PEC)

NARRAR

Conto

Poema

Conto

Narrativa/romance

Poema

Conto

Texto teatral

Poema

Conto

Texto teatral

Romance

Novela

RELATAR

Notícia

Reportagem

Notícia

Reportagem

Crônica

Notícia

Currículo

Carta de

apresentação

Notícia

Currículo

Crônica

Carta

ARGUMENTAR

Editorial

Anúncio

publicitário

Crítica

Editorial

Anúncio

publicitário

Dissertação

Resenha

Artigo de opinião

Discurso político

eleitoral

Charge

Anúncio

publicitário

EXPOR

Entrevista

Cartaz

Mesa-redonda

Entrevista Entrevista

Divulgação

científica

Anúncio

classificado

Resumo

Aula expositiva

Palestra

Seminário

Projeto de pesquisa

Verbete

Referência

bibliográfica

Quadro sinóptico

Ficha de leitura

DESCREVER

AÇÕES

___ ___ Ficha Ficha

Formulário

Instruções Cheque

Cadastro

Lei

Memorando

Correspondências

internas

Protocolo

Construímos também outro quadro no qual organizamos os gêneros tratados nos livros de

acordo com a esfera de comunicação em que circulam socialmente, assim optamos por

categorizá-los em gêneros midiáticos, literários, publicitários, científicos/escolares e burocráticos,

contudo há gêneros de texto que cabem a mais de uma categoria, assim buscamos encaixá-lo

naquela que mais condizia com o enfoque dado a ele no livro didático.

Page 99: Noticia e Reportagem Nos LDS

98

QUADRO 20. Gêneros textuais ensinados e suas esferas sociais de comunicação

Livros/

Gêneros

Livro1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Livro 3

(LP)

Livro 4

(PEC)

Midiáticos

Notícia

Reportagem

Entrevista

Editorial

Crítica

Notícia

Reportagem

Entrevista

Editorial

Crônica

Notícia

Entrevista

Resenha crítica

Discurso político

eleitoral

Artigo de opinião

Charge

Notícia

Crônica

Literários

Conto

Poema

Conto

Narrativa/romance

Poema

Conto

Texto teatral

Poema

Conto

Texto teatral

Romance

Novela

Publicitários

Anúncio

publicitário

Cartaz

Anúncio

publicitário

Anúncio classificado Anúncio

publicitário

Científicos/

Escolares

Mesa-redonda Dissertação Divulgação científica

Resumo

Aula expositiva

Palestra

Seminário

Projeto de

pesquisa

Verbete

Referência

bibliográfica

Quadro

sinóptico

Ficha de leitura

Burocráticos

_____

_____

Currículo

Ficha

Carta de

apresentação

Currículo

Ficha

Formulário

Carta

Instruções

Cheque

Cadastro

Lei

Memorando

Correspondênci

as internas

Protocolo

No quadro, destacamos os gêneros presentes em mais de um dos livros analisados. Como

podemos observar, há certa tendência ao ensino de alguns gêneros como notícia e conto, que

apareceram nos 4 livros (todos); também os gêneros poema e anúncio publicitário, que

apareceram em 3 dos livros analisados. O livro 4 é o único que enfatiza o trabalho com gêneros

burocráticos e científicos/escolares. Salientamos que o livro 1 não se organiza em volume único

Page 100: Noticia e Reportagem Nos LDS

99

como as outras obras, sendo descrito o volume voltado à 2ª série do Ensino Médio, daí a

diferença se compararmos o número de gêneros ensinados nele e nos outros livros.

Constatamos que os principais gêneros selecionados para ensino pelos autores de livros

didáticos de Português de Ensino Médio são os pertencentes à esfera midiática, a qual é

enfatizada nos PCN.

Até o momento concentramo-nos em apresentar cada um dos livros que compõem o corpus

de um modo amplo. Primeiramente, na seção anterior deste trabalho, como um todo, ou melhor,

como se dá a organização de cada livro. Em seguida, dedicamo-nos na exposição dos gêneros

tidos como objetos de ensino nesses livros. Tais procedimentos se fizeram necessários para que

pudéssemos apresentar como se constituem os livros didáticos de Língua Portuguesa que

analisaremos e quais gêneros textuais são trabalhados nessas obras. Salientamos que tais coleções

didáticas estão presentes em várias das salas de aulas brasileiras e continuarão por mais 3 anos, já

que foram recomendadas pelo PNLEM de 2005 (anterior) e de 2009 (atual), que enviará livros às

escolas públicas para uso em 2009, 2010 e 2011.

As próximas seções serão dedicadas à exposição da análise das atividades didáticas

propostas ao ensino dos textos dos gêneros notícia e reportagem e suas implicações ao

desenvolvimento de capacidades de linguagem dos alunos. Entretanto, como observamos que há

uma tendência entre os livros didáticos em apresentar o jornal e sua esfera de comunicação antes

de abordar os gêneros jornalísticos propriamente ditos, delinearemos o enfoque dado ao jornal

nos livros de Português na seção seguinte para nas próximas abordarmos o ensino da notícia e da

reportagem.

4.3 O jornal no livro didático de Língua Portuguesa

Neste momento trataremos dos aspectos gerais do jornal e de sua esfera de comunicação no

livro didático de Língua Portuguesa, portanto não aprofundaremos na análise por não ser este o

foco da pesquisa.

O livro1 (PL) é a única obra de nosso corpus de análise que não aborda de algum modo o

jornal antes de introduzir os gêneros jornalísticos. O livro 2 (PLC) apresenta o capítulo

Folheando um jornal: textos em profusão (capítulo 13) em seqüência traz os capítulos dedicados

Page 101: Noticia e Reportagem Nos LDS

100

ao ensino da notícia e da reportagem (capítulos 14 e 15), sem retomar tal esfera de comunicação

em que veiculam os gêneros em questão no seu ensino.

Esse capítulo do livro 2, destinado ao estudo do jornal, apresenta seu surgimento, sua

linguagem, seus textos, além de tratar da liberdade de imprensa. O enfoque didático proposto é

voltado à leitura crítica desse veículo de comunicação, sendo a seção Lendo a imprensa

criticamente elogiada no catálogo do PNLEM/2009 por colaborar “para o desenvolvimento do

leitor crítico” (BRASIL/SEMTEC, 2008, p. 100).

Tal seção é iniciada com texto expositivo que trata da credibilidade pública da imprensa,

apresentando eventos cabíveis e incabíveis a essa esfera de comunicação, alertando e preparando

o aluno para a leitura crítica desses gêneros:

Apesar disso tudo, não sejamos ingênuos: abusos e erros ocorrem,

acidental ou mesmo propositalmente, na imprensa. Em razão disso, nós,

leitores, temos de nos relacionar com ela sempre criticamente.

(FARACO, 2003, p. 182, ênfases do autor)

Como o fragmento anterior ilustra, há no livro 2 um enfoque voltado nesse capítulo à

formação de alunos capazes de ler criticamente a imprensa, não sendo ingênuos diante dela.

Na seção posterior desse mesmo livro, O jornal e o estudo de Português, estuda-se a

“variedade de tipos de textos” presentes em um jornal, além da “língua-padrão escrita” nele

veiculada por ser uma das fontes de referência do Português padrão (Ibid., p. 186). Neste

segmento trata-se das diferentes linguagens, da diagramação das páginas e a distribuição das

matérias, mas enfatizam-se os tipos de textos que, segundo o autor, podem ser agrupados nos

seguintes blocos: textos informativos (notícias, reportagens, notas, colunas especializadas, etc.);

textos de opinião (editoriais, artigos de fundo, resenhas, etc.); textos de publicidade (propagandas

e anúncios classificados); textos literários (crônicas, contos e poemas); e textos de entretenimento

(palavras cruzadas, piadas e histórias em quadrinhos).

Após tratar dos blocos de textos, o autor já introduz que nos próximos capítulos abordará

textos informativos “tomando-os como ponto de apoio para ampliar [...] a experiência de leitores

e para aprimorar [...] as habilidades de escrita” (Ibid., p. 186). Nada é mencionado a respeito do

ensino de gêneros de texto.

De modo geral, o livro 2 expõe o aluno às especificidades da imprensa e o prepara para o

trabalho com os gêneros notícia, reportagem, entre outros, desta esfera de comunicação que serão

abordados no decorrer da obra. A contextualização do jornal e de seus textos na atualidade e o

Page 102: Noticia e Reportagem Nos LDS

101

trabalho com a liberdade de imprensa realizados nesse livro favorecem o desenvolvimento da

capacidade de linguagem do aluno referente à ação, pois contribui para que ele compreenda o

contexto em que veicula tal gênero de texto e assim agir adequadamente por meio dele.

O livro 3 (LP) apresenta o capítulo Imprensa em que introduz a imprensa e sua função para

então abordar o ensino dos gêneros notícia e artigo de opinião, além de apresentar de modo

sintético gêneros presentes no jornal e a configuração de sua primeira página.

No manual do professor desse livro, afirma-se que as atividades do capítulo Imprensa

“partem do pressuposto de que os alunos já possuem certa familiaridade com os gêneros

jornalísticos”, para atingir o objetivo de que os estudantes “apreendam, gradativamente, os

discursos implícitos e subentendidos de todo texto jornalístico, e que, mais do que informar,

reflitam, discutam e posicionem-se criticamente a respeito do ponto de vista dos autores desses

textos” (TAKAZAKI (MP), 2005, p. 30).

O livro 4 (PEC) traz o módulo É da hora!É do dia! em que aborda o jornal, sua função,

organização e seus gêneros, enfocando principalmente o ensino da notícia. Em seu manual do

professor é afirmado que o principal objetivo do trabalho didático com o jornal é “incentivar nos

alunos a necessidade de ler e interpretar criticamente o jornal” (MURRIE et al. (MP), 2004, p.

134).

De forma geral, de acordo com o que é proposto nos manuais do professor e da análise da

exposição do conteúdo no livro do aluno, sem nos aprofundarmos nas atividades didáticas

apresentadas, concluímos que o jornal veicula os livros de Português com vistas à formação

crítica do alunado e como forma de contextualizar a esfera social de comunicação dos gêneros

notícia e reportagem, entre outros, que se dá em seqüência.

A seguir, aprofundaremos na análise do ensino de dois dos principais gêneros jornalísticos,

a notícia e a reportagem, e das capacidades de linguagem implicadas nesse processo nos livros

em questão. Iniciaremos pelo gênero notícia por seu ensino preceder o da reportagem nos livros

que trazem ambos os gêneros.

Page 103: Noticia e Reportagem Nos LDS

102

4.4 O gênero notícia

Nesta seção, analisaremos a forma de apresentação do gênero textual notícia, a abordagem

dada a ele e os tipos de atividades didáticas propostas a seu ensino, relacionando-as as

capacidades de linguagem dos alunos que poderão ser mobilizadas e desenvolvidas.

Esse gênero textual é objeto de ensino dos quatro livros do corpus. A fim de mostrarmos

como se organizam os capítulos8 dedicados a esse gênero e as diferenças entre as abordagens de

cada livro, construímos o seguinte quadro:

5 As páginas analisadas são apresentadas na seção de Anexos deste trabalho.

Page 104: Noticia e Reportagem Nos LDS

103

QUADRO 21. Organização dos capítulos dedicados ao ensino do gênero notícia

Livro 1 (PL) Livro 2 (PLC) Livro 3 (LP) Livro 4 (PEC)

Capítulos/

Módulos

Cap. 27 – A notícia

(4 páginas)

Cap. 15 – Texto informativo: a notícia

(9 páginas)

Cap. 9 – Imprensa

(7 páginas)

Mód. 26 – É da hora! É do dia!

(12 páginas)

Descrição

das seções

internas aos

capítulos

Trabalhando o gênero

(traz o texto principal;

estudo do texto; exposição

didática)

Produzindo a notícia

(proposta de produção de

texto)

Escrevendo com

adequação (estudo de

títulos, subtítulos e

legendas)

Qualidades do texto informativo (abordam-

se algumas características)

Texto 1 (traz o 1º texto principal e atividades

de estudos)

Práticas de escrita (proposta de produção de

uma notícia)

Atividades (propõem-se atividades que

abordam o conteúdo temático da notícia

trabalhada só que em enciclopédia)

Texto 2 (traz o 2º texto e atividades de

estudo)

Prática de escrita (proposta de produção de

resumo do texto 2)

De olho na língua (ensino descritivo do

verbo haver, há x a, voz passiva analítica,

sentenças substantivas e sentenças complexas

com base em frases dos textos estudados; traz

exposição e atividades)

Observando aspectos gráficos (traz

atividades que abordam o uso de siglas, de

maiúsculas, a grafia de países, pontuação e

acentuação, respectivamente)

Pausa poética (traz poema que narra um

acontecimento para tratar da relação entre texto

poético e jornalístico; leitura complementar)

Prática de escrita (apresenta um conto

inspirado em uma notícia e pede-se que o

aluno faça o mesmo)

Leitura complementar (traz uma crônica que

trata do excesso de informação que há na

atualidade)

Ponto de partida (trata da função

da imprensa na atualidade)

Estudo do texto (apresentam-se

dois textos: notícia e artigo de

opinião e sobre eles são realizadas

indagações)

A notícia (estudo de algumas

características do gênero; pirâmide

invertida, tópico frasal (lide))

Estudo do texto (exposição

didática sobre a questão da

neutralidade do texto noticioso;

análise da notícia apresentada)

Produção de texto (proposta de

reescrita da notícia apresentada

segundo instruções dadas)

Artigo de opinião (estudo de

algumas das características do

gênero)

Gêneros do jornal

(caracterização sumária de alguns

dos gêneros jornalísticos)

A primeira página (estudo de

elementos da primeira página:

seleção dos fatos, imagens e

manchetes)

A história viva (exposição didática sobre a

relação entre jornal e sociedade atual)

A primeira página do jornal (expõe a função e

a organização dos elementos da 1ª página do

jornal; e trata das manchetes e do lide)

A notícia (exposição sobre algumas

características do gênero; traz 2 poemas que

narram acontecimentos e propõe-se que o aluno

escolha 1 deles e o transforme em uma notícia;

proposta de produção de notícias para um jornal

da escola)

A organização gráfica (exposição didática que

trata da disposição e função dos elementos

gráficos que compõem o jornal)

Os gêneros jornalísticos (caracterização

sumária de alguns dos gêneros jornalísticos)

Os cadernos (apresentação)

A linguagem escrita do jornal (trata da

necessidade de se escrever bem no jornalismo)

O jornalista (apresenta as funções desse

profissional)

O poder da imprensa e o sensacionalismo

(exposição sobre esses elementos)

Sempre foi assim... (traz a história do jornal)

A praga da censura (aborda a liberdade de

imprensa)

Romance ou reportagem (trata da obra Os

Sertões de Euclides da Cunha)

Page 105: Noticia e Reportagem Nos LDS

104

Como o quadro anterior mostra, a abordagem dada ao gênero notícia é mais

extensa em algumas obras do que em outras. Os livros 1 (PL), 3 (LP) e 4 (PEC) não

trazem o tradicional ensino gramatical nos capítulos ou módulos dedicados à notícia,

sinalizando novas tendências no ensino de Português advindas das teorias recentes,

embora o livro 2 ainda apresente o tradicional ensino descritivo de gramática.

O capítulo A notícia do livro 1 (PL) aproveita a seção voltada ao ensino de

conhecimentos lingüísticos, Escrevendo com adequação, para o trabalho com elementos

que compõem o gênero em questão como a escrita de títulos, subtítulos e legendas. O

livro 2 (PLC) também trabalha elementos importantes à concretização desse gênero nas

seções De olho na língua e Observando aspectos gráficos, porém ao tratar da voz

passiva analítica, por exemplo, não relaciona seu uso a sua função de construir o efeito

de objetividade e imparcialidade no texto, mostrando-se estar centrado estritamente no

aspecto gramatical, usando as frases das notícias estudadas como pretexto.

O livro 2 (PLC), ao iniciar o capítulo sobre a notícia, realiza a seguinte

introdução:

Page 106: Noticia e Reportagem Nos LDS

105

Livro 2 (PLC), 2003, p. 196.

Como a introdução do autor já sinaliza, essa obra abordará o gênero notícia,

assim como a reportagem, com vistas ao ensino sistemático da língua, isto é, focará nos

aspectos, principalmente, estruturais do texto.

Os livros 3 (LP) e 4 (PEC), além de trabalharem o gênero notícia, abordam a

imprensa como um todo e outros gêneros jornalísticos. Dessa forma, em nossa análise

nos centraremos nas propostas de ensino do texto do gênero notícia devido à

inviabilidade de tratarmos de todos os elementos presentes nesses capítulos.

A seguir, apresentaremos a análise da forma de apresentação do gênero notícia

nos livros de nosso corpus.

Page 107: Noticia e Reportagem Nos LDS

106

4.4.1 A forma de apresentação do gênero notícia

Segundo Schneuwly e Dolz (2004), ao entrarem no ambiente escolar os gêneros

de distintas esferas sociais sofrem transformações, entretanto isso não invalida seu

ensino. O trabalho com gêneros textuais na escola consiste em apresentá-los e tratá-los

da forma mais próxima possível das situações de comunicação reais em que eles

circulam para que o aluno possa dominá-los e identificá-los fora do contexto de

aprendizagem.

É de fundamental importância que os livros didáticos apresentem o gênero notícia

respeitando seu formato social de circulação para que o aluno o reconheça e assim

desenvolva a capacidade de linguagem referente à ação.

De modo geral, as modificações que ocorrem na didatização da notícia são

semelhantes as da reportagem, as quais apresentaremos adiante, nos livros de Português

analisados:

muda-se a posição da exibição de fotos;

não se traz o texto em colunas;

ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.

O livro 2 (PLC) apresenta dois textos principais e ambos são retextualizados, isto

é, perdeu-se as características referentes a seu formato de circulação social, como ocorre

também com o gênero reportagem nessa obra. Vejamos o exemplo:

Page 108: Noticia e Reportagem Nos LDS

107

Page 109: Noticia e Reportagem Nos LDS

108

Livro 2 (PLC), 2003, p. 203-204.

Esse exemplo ilustra que, em tal obra, a capacidade de ação do aluno não é

enfatizada nesse capítulo, fato que discutiremos em outro momento.

Nos livros 1 (PL) e 3 (LP) as notícias apresentadas mantêm o formato de

circulação social do gênero: texto em colunas, reprodução de recursos gráficos do jornal

impresso, sendo claramente reconhecidas como tal. Porém no livro 1, as imagens

apresentadas junto à notícia, se pertenciam mesmo a ela, foram mudadas de posição e de

tamanho pois destoam das características da apresentação do gênero em jornais. Já o

Page 110: Noticia e Reportagem Nos LDS

109

livro 3, não traz imagens. Vejamos a reprodução das páginas em que aparece o gênero

nessas obras:

Livro 1 (PL), 2005, p. 240.

Page 111: Noticia e Reportagem Nos LDS

110

Livro 3 (LP), 2005, p. 101.

As páginas reproduzidas anteriormente mostram-nos que as transformações que

esse gênero jornalístico sofre para tornar-se um gênero a ser ensinado na escola, quanto

a seu aspecto visual, permitem seu reconhecimento por manterem características

importantes a sua concretização como a forma lingüística do título, frases em destaque e

texto em colunas.

Ressaltamos que no livro 4 (PEC) se reproduz a primeira página de um jornal,

mas não é apresentada nenhuma notícia para estudo, apenas propõe-se que o aluno leve

para a aula um jornal completo para leitura e análise. É apresentada ao estudante a

função e estrutura da notícia e pede-se que ele produza o gênero. A abordagem de tal

obra é compacta e interdisciplinar, há nela poucas atividades, sendo constituída

Page 112: Noticia e Reportagem Nos LDS

111

basicamente por texto didático-expositivo, deixando a cargo do professor propostas de

atividades de acordo com as necessidades dos alunos e a proposta pedagógica da escola.

Quanto à apresentação do gênero notícia nos livros de Ensino Médio, dos quatro

livros que se dedicam a seu ensino, dois deles (50%) respeitam suas características

sociais em sua apresentação. Passaremos à análise do conteúdo temático da notícia

apresentado pelos livros.

4.4.2 O conteúdo temático do gênero notícia

O conteúdo temático constitui-se como um dos elementos que busca o sucesso do

gênero, isto é, elemento que faz com que o gênero atinja seu objetivo social. Cada

gênero apresenta certos temas esperados de acordo com o público-alvo a que se destina.

O tema deve estar estritamente relacionado aos interesses do leitor, assim para que

ocorra a aprendizagem da notícia, os livros devem apresentar ao aluno exemplares desse

gênero cujos conteúdos temáticos pertençam aos interesses dos jovens e as atividades de

produção de texto devem sugerir assuntos pertinentes ao público-alvo da proposta dada,

adequando o conteúdo ao leitor. Salientamos que as atividades de produção serão

analisadas na próxima seção.

Como os títulos das notícias sinalizam ou, ao menos, deveriam sinalizar seu tema

(PUBLIFOLHA, 2006), descreveremos o título de cada texto principal apresentado nos

capítulos dedicados ao seu ensino:

Livro 1 (PL): Arqueólogos encontram mais de 50 múmias em valas no

Egito (O Estado de S. Paulo, 27/4/2004);

Livro 2 (PLC): Achadas três múmias incas na Argentina (O Estado de S.

Paulo, 07/4/1999);

Para IBGE, envelhecimento tende a aumentar (O Estado

de S. Paulo, 11/3/1999);

Livro 3 (LP): EUA criam núcleo para mentira oficial (Jornal do Brasil,

20/2/2002);

Livro 4 (PEC): não são apresentados exemplares do gênero.

Page 113: Noticia e Reportagem Nos LDS

112

Os títulos ilustram a tendência por seleção de fatos genéricos, isto é, os livros

trazem notícias que relatam acontecimentos não tão pontuais e que possivelmente se

manterão atuais durante certo período de tempo. Tais assuntos não são estritamente

relacionados ao universo jovem, entretanto podem despertar a curiosidade dos

adolescentes, no caso das notícias relacionadas a múmias que ocorrem em dois dos

livros, ou propiciar ao aluno conhecimentos sobre questões sociais e políticas como a

notícia sobre o núcleo criado nos EUA para difundir fatos na mídia de países aliados ou

inimigos, a qual é sensacionalista e parcial, no decorrer das atividades propostas a ela,

no livro 3 (LP), são trabalhadas as capacidades de linguagem lingüístico-discursivas do

estudante. Na notícia sobre o aumento da taxa de envelhecimento no Brasil, que

também propicia conhecimentos sociais e políticos ao leitor, há a ocorrência de uma

vírgula no título, prática que, segundo os manuais de jornalismo, deve ser evitada em

títulos e subtítulos. Contudo o autor do livro 2 (PLC) não faz nenhuma ressalva a tal

fato.

Concluímos, portanto, que o conteúdo temático dos textos apresentados aos

alunos relaciona-se de algum modo com as curiosidades do adolescente, mas pensamos

que se os livros veiculassem temas relacionados à faixa etária dos estudantes de Ensino

Médio como: vestibular, profissões, jovens no mercado de trabalho, sexualidade,

gravidez na adolescência, jovens e as drogas, entre outros, contribuir-se-ia mais com a

formação cidadã do estudante. Ressaltamos que o jornal trata-se de um suporte

heterogêneo de textos, isto é, nele veiculam-se diferentes temas da realidade, porém o

leitor é livre para ler aqueles que lhe interessam, assim ao trazer notícias relacionadas ao

universo jovem o livro didático não simplificaria o caráter de sua esfera de

comunicação.

Na próxima seção deste trabalho, analisaremos as atividades didáticas propostas

ao ensino da notícia.

4.4.3 Atividades propostas ao ensino do gênero notícia

As atividades didáticas propostas ao ensino da notícia, assim como as

apresentadas ao ensino da reportagem, constituem-se de dois tipos: atividades de leitura

e atividades de produção de texto. De modo geral, os capítulos organizam-se em:

Page 114: Noticia e Reportagem Nos LDS

113

apresentação do exemplar do gênero, atividades de leitura, atividade de produção escrita

e ensino gramatical, quando há mais de um texto principal retoma-se a seqüência. As

sistematizações ou os textos didático-expositivos são intercalados entre essas atividades.

Para a análise das atividades de leitura, recorreremos a tipologização de questões

elaboradas por Marcuschi (2003). Esse autor, ao analisar livros didáticos, construiu uma

classificação dos tipos de perguntas voltadas ao estudo de textos, a qual empregaremos

em nossa análise. Assim reproduziremos o quadro por ele elaborado (MARCUSCHI,

2003, p. 54-53):

Page 115: Noticia e Reportagem Nos LDS

114

QUADRO 22. Tipologia de perguntas de Marcuschi

Tipos de perguntas Explicitação Exemplos

1. A cor do cavalo

branco de Napoleão

São P não muito freqüentes e de perspicácia

mínima, auto respondidas pela própria

formulação. Assemelham-se as indagações do

tipo: “Qual a cor do cavalo branco de

Napoleão?”

Ligue:

Lilian – Não preciso falar sobre o que

aconteceu.

Mamãe – Mamãe, desculpe, eu menti

para você.

2. Cópias São as P que sugerem atividades mecânicas

de transcrição de frases e palavras. Verbos

freqüentes aqui são: Copie, retire, aponte,

indique, transcreva, complete, assinale,

identifique etc.

Copie a fala do trabalhador.

Retire do texto a frase que ...

Copie a frase corrigindo-a de acordo com

o texto.

Transcreva o trecho que fala sobre ...

Complete de acordo com o texto.

3. Objetivas São as P que indagam sobre conteúdos

objetivamente inscritos no texto (O que,

quem, quando, como, onde...) numa atividade

de pura decodificação. A resposta acha-se

centrada exclusivamente no texto.

Quem comprou a meia azul?

O que ela faz todos os dias?

De que tipo de musica Bruno mais gosta?

Assinale co um X a resposta certa.

4. Inferenciais Estas P são as mais complexas; exigem

conhecimentos textuais e outros, sejam

pessoais, contextuais, enciclopédicos, bem

como regras inferenciais e analises clítica

para busca de respostas.

Há uma contradição quanto ao uso da

carne de baleia no Japão. Como isso aparece

no texto?

5. Globais São as P que levam em conta o texto como

um todo e aspectos extra-textuais,

envolvendo processos inferenciais

complexos.

Qual a moral desta historia?

Que outro titulo você daria?

Levando-se em conta o sentido global do

texto, pode concluir que...

6. Subjetivas Estas P em geral têm a ver com o texto de

maneira apenas superficial, sendo que a R

fica por conta do aluno e não há como testá-la

em sua validade.

Qual a sua opinião sobre...?

O que você acha do...?

Do seu ponto de vista, a atitude do

menino diante da velha senhora foi correta?

7. Vale-tudo São as P que indagam sobre questões que

admitem qualquer resposta não havendo

possibilidade de se equivocar. A ligação com

o texto é apenas um pretexto sem base

alguma para a resposta.

De que passagem do texto você mais

gostou?

Se você pudesse fazer uma cirurgia para

modificar o funcionamento do seu corpo,

que órgão você operaria? Justifique sua

resposta.

Você concorda com o autor?

8. Impossíveis Estas P exigem conhecimentos externos ao

texto e só pode ser respondidas com base em

conhecimentos enciclopédicos. São questões

antípodas às de copia e às objetivas.

Dê um exemplo de pleonasmo vicioso

(Não havia pleonasmo no texto e isso não

fora explicado na lição)

Caxambú fica a onde? (o texto não falava

de Caxambú)

9. Meta-lingüísticas São as P que indagam sobre questões formais,

geralmente da estrutura do texto ou do léxico,

bem como de partes textuais.

Quantos parágrafos tem o texto?

Qual o titulo do texto?

Quantos versos tem o poema?

Numere os parágrafos do texto.

Page 116: Noticia e Reportagem Nos LDS

115

No quadro, a seguir, apresentaremos a ocorrência dos tipos de indagações em cada

um dos livros de Ensino Médio analisados:

QUADRO 23. Perguntas empregadas no ensino da notícia

Tipos de perguntas

(Marcuschi)

Ocorrências

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Livro 3

(LP)

Livro 4

(PEC)

1. A cor do cavalo

branco de Napoleão __ __ __ __

2. Cópias 1

(3%)

1

(4%)

__ __

3. Objetivas 6

(18%)

9

(35%)

__ __

4. Inferenciais 6

(18%)

12

(46%)

8

(89%)

__

5. Globais 8

(23%)

4

(15%)

1

(11%)

__

6. Subjetivas __ __

__ __

7. Vale-tudo __

__ __ __

8. Impossíveis 1

(3%)

__

__ __

9. Meta-lingüísticas 12

(35%)

__ __ __

Total 34

(100%)

26

(100%)

9

(100%)

0

(100%)

Como o quadro sinaliza, as perguntas mais complexas, inferenciais e globais, as

quais mobilizam processos cognitivos mais sofisticados, aparecem nos três livros que

apresentam indagações, destacando-se no livro 2, correspondendo a 46% das

ocorrências, e no livro 3, sendo 89% das indagações propostas ao estudo da notícia.

Vejamos exemplos da ocorrência desse tipo de pergunta no livro 3 (LP):

Page 117: Noticia e Reportagem Nos LDS

116

Livro 3 (LP), 2005, p. 102.

A atividade reproduzida traz quatro perguntas do tipo inferenciais, pois para

respondê-las o aluno deve mobilizar conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais,

extra-textuais na realização de uma analise crítica para a construção das respostas. Essa

atividade é voltada a identificação das marcas modais presentes no texto apresentado

para estudo, além de trabalhar com o efeito de sentido do emprego da citação (item „d‟).

Observe que nos enunciados das perguntas as partes estruturais da notícia (título, tópico

frasal, desenvolvimento, conclusão, como a autora designa) apresentadas ao estudante

na seção anterior do capítulo, são empregadas. Nessa atividades, é evidente que as

operações de linguagem voltam-se ao desenvolvimento das capacidades lingüístico-

discursivas do aluno, correspondendo aos níveis intermediário (mecanismos de

textualização) e superficial (mecanismos enunciativos) na proposta de Bronckart (2003;

2008).

No livro 1 (PL), destaca-se a quantidade de questões meta-língüísticas aplicadas

ao ensino da notícia, assim como ocorre com a reportagem nessa obra, sinalizando que

trabalha-se com elementos estruturais e lingüísticos no ensino desse gênero textual,

podendo mobilizar então capacidades de linguagem discursivas e lingüístico-discursivas

do aluno. Nessa obra ocorre uma questão do tipo impossível tanto no ensino da notícia

quanto no da reportagem, a qual aborda o mesmo elemento (discurso direto e discurso

indireto) em ambos os capítulos, porém em nenhum deles trabalham-se os

conhecimentos exigidos do aluno. As atividades pedem que o estudante responda qual é

o tipo de discurso empregado em determinado momento do texto, mas não expõe o que

de fato é discurso direto e discurso indireto, não o instrumentando à realização dessa

tarefa.

Page 118: Noticia e Reportagem Nos LDS

117

As perguntas voltadas a identificação a conteúdos inscritos nos textos, as do tipo

objetivas, são enfatizadas tanto no ensino da notícia quanto no da reportagem. No livro

2, esse tipo de indagação corresponde a 35% das ocorrências, refletindo a confusão

teórica entre compreensão e decodificação que se opera nos livros como afirma

Marcuschi (2003).

O livro 4 traz apenas atividades de produção de texto relacionadas à notícia,

devido sua organização inovadora a qual o torna semelhante a uma revista quanto ao

aspecto visual e organizacional, deixando a cargo do professor a elaboração de

atividades de perguntas.

Passaremos a análise das atividades de produção do gênero presentes nos livros

analisados. De modo sumário, descreveremos as propostas de cada obra:

Livro 1 (PL): propõe-se que o aluno escolha entre produzir uma notícia

sobre um fato ocorrido recentemente no Brasil ou no mundo; ou sobre um

fato recente que ocorreu em seu bairro ou escola; tal produção veiculará

em um jornal mural escolar;

Livro 2 (PLC): primeira proposta – a produção é abordada como um

exercício de escrita; há a ausência das condições de produção, apenas

apresenta-se o tema (arqueólogos descobrem tesouro...) e centra-se nas

instruções dos aspectos estruturais do texto; segunda proposta – produção

de resumo sobre uma das notícias apresentadas;

Livro 3 (LP): o aluno deve reescrever a notícia principal, eliminando as

marcas de subjetividade por ele analisadas e defender um outro ponto de

vista sob o disfarce da neutralidade; não há instruções sobre o público-alvo

do jornal cujo aluno será um jornalista contratado;

Livro 4 (PEC): primeira proposta – transformar poemas que narram

acontecimentos em notícias; segunda proposta – produzir uma notícia para

um jornal da escola; o aluno deve escolher o tema que achar interessante a

estudantes e redigi-la de acordo com as características do gênero.

Como podemos apreender, os livros 1 e 4 apresentam propostas coerentes com o

ensino de gêneros na escola, conforme Schneuwly e Dolz (2004), pois pedem que o

aluno coloque em prática as características do gênero estudadas e oferecem-lhe as

condições de produção para tanto, sendo o tema, que deve interessar aos leitores,

inferido pelo próprio estudante.

Page 119: Noticia e Reportagem Nos LDS

118

Já no livro 3, proposta também coerente com os postulados dos teóricos, enfatiza-

se a questão da impossibilidade de haver neutralidade na linguagem e no jornalismo.

Segundo Schneuwly e Dolz (2004), a ênfase em alguns aspectos do gênero em

detrimento a outros, ocorre no processo de didatização para que haja seu ensino na

escola.

Na proposta do livro 2, apreendemos que o objetivo da primeira produção é que o

aluno coloque em prática a estruturação textual que lhe foi ensinada nas atividades e a

linguagem adequada. Segundo o autor da obra, redigir uma notícia “é um exercício

interessante para amadurecer a habilidade de passar informações sem misturá-las com

opiniões” (FARACO, 2003, p. 201). Enquanto o livro 3 esforça-se para tratar da

impossibilidade da neutralidade da linguagem, a obra de Faraco ainda prega tal mito. O

conteúdo temático apresentado ao estudante é genérico e semelhante ao da notícia

estudada nessa obra (arqueólogos descobrem tesouro...). A segunda proposta de

produção do livro 2 não se volta para o ensino do gênero, busca apenas testar a

compreensão do aluno sobre a notícia trabalhada por meio da elaboração de resumo.

Como podemos notar, essa obra é mais centrada no trabalho com a sistematização da

língua e com a textualidade do que com o ensino do gênero propriamente dito,

entretanto nela também se trabalham as características estruturais da notícia, assim o

ensino desse gênero foi simplificado a sua estrutura nesse livro.

Chegamos à conclusão de que, nas propostas de produção de texto, cada obra

aborda a seu modo as características do gênero notícia, enfatizando alguns elementos

em detrimento a outros, processo considerado necessário para que se dê o ensino escolar

dos gêneros sociais, segundo as orientações didáticas de Schneuwly Dolz (2004).

Quanto às atividades didáticas de leitura, o índice de indagações que mobilizam

processos cognitivos sofisticados como: relacionar informações e conhecimentos,

comparar, analisar criticamente o texto para a construção da resposta, é maior em

relação às atividades propostas a reportagem, as quais trataremos em outro momento.

Nas seções seguintes, passaremos a analisar as atividades didáticas propostas ao

ensino do gênero notícia já as relacionando as possíveis capacidades de linguagem do

aluno que possivelmente serão mobilizadas.

Page 120: Noticia e Reportagem Nos LDS

119

4.4.4 O gênero notícia e as capacidades de ação

Segundo Schneuwly e Dolz (2004), as capacidades de linguagem constituem-se

em capacidade de ação, capacidade discursiva e capacidade lingüístico-discursiva. O

desenvolvimento de cada uma dessas capacidades se faz necessário para o domínio dos

gêneros na escola, assim os livros didáticos devem se empenhar no trabalho com

operações de linguagem que propiciem o desenvolvimento de cada uma delas para que

o aluno de fato aprenda a ler, interpretar e produzir os gêneros textuais que circulam

socialmente.

Iniciaremos pela análise das atividades propostas ao ensino da notícia que se

relacionam à capacidade de ação, isto é, as atividades que, de algum modo, trabalharão

com operações que busquem fazer com que o estudante contextualize o gênero e

compreenda a função dos elementos presentes na circunstância de produção como

constitutivos de seu sentido, para que então o aluno possa agir socialmente por meio

dele, se necessário.

De modo geral, as operações de linguagem mobilizadas nas atividades de ensino

da notícia, que se referem ao desenvolvimento de capacidades de ação do adolescente

de Ensino Médio, abordam:

o suporte material em que veicula o gênero;

a relação gênero-leitor-conteúdo;

a intenção do gênero.

As quatro obras de Português analisadas abordam o jornal, suporte material da

notícia, de modo a contextualizá-la em sua esfera de comunicação. Todas as obras

tratam também das intenções do gênero. A reprodução, a seguir, mostra como a relação

entre imprensa e o gênero notícia é tratada em um dos livros analisados:

Page 121: Noticia e Reportagem Nos LDS

120

Livro 3 (LP), 2005, p. 99.

Como podemos apreender, esse livro apresenta distintos pontos de vista sobre a

imprensa, contribuindo para a construção de uma postura crítica do aluno diante dessa

esfera de comunicação, além de atuar na contextualização do gênero a ser trabalhado no

capítulo – a notícia – mobilizando, assim, a capacidade de linguagem referente à ação.

A interdependência entre gênero-leitor-conteúdo consiste na relação entre esses

elementos de modo que o conteúdo temático do gênero deve ser de interesse do leitor

para que a função social da notícia, gênero em questão, seja concretizada. Tal relação é

Page 122: Noticia e Reportagem Nos LDS

121

brevemente abordada no livro 1 (PL) e 4 (PEC), sendo no livro 2 (PLC)

superficialmente mencionada a importância de se considerar o leitor para produção do

gênero.

Reproduziremos, a seguir, páginas dos livros analisados que sinalizam os

aspectos relacionados à capacidade de ação que citamos:

Livro 4 (PEC), 2004, p. 703.

O texto didático-expositivo apresentado sobre o gênero notícia realça algumas de

suas características como: a função do gênero, seus suportes materiais, a importância de

Page 123: Noticia e Reportagem Nos LDS

122

se considerar os leitores do suporte, de modo sumário sem se aprofundar em nenhum

dos elementos.

Vejamos a próxima reprodução:

Livro 1 (PL), 2005, p. 241.

A página reproduzida do livro 1 traz as atividades propostas ao estudo do texto

principal que abre o capítulo. As atividades de números 1 e 2, as quais classificamos

como globais por exigirem que o aluno relacione conhecimentos textuais e extra-

textuais na construção da resposta. O item „a‟ da atividade 1 pede que o estudante

aponte o objetivo da notícia e o item „b‟ indaga sobre os veículos de comunicação em

que ela é transmitida. A atividade 2 visa que o aluno infira qual é a função da notícia:

Page 124: Noticia e Reportagem Nos LDS

123

informar ou comentar. Assim, trabalha-se o objetivo do gênero, seus suportes materiais

e sua função social. O quadro Isto é notícia também contempla o desenvolvimento da

capacidade de ação do aluno por trazer definições do gênero. As outras atividades da

página abordam outras capacidades e serão tratadas em outro momento.

A forma de apresentação do gênero no livro didático contribui para o

reconhecimento da notícia, atuando no desenvolvimento da capacidade de ação do

aluno. Como já tratamos desse tema detalhadamente agora somente retomaremos que

duas das obras (50%) respeitam as características sociais desse gênero.

Sabemos que aspectos mercadológicos influenciam a produção dos livros

didáticos. Subjacente a essa questão está a organização espacial do livro, isto é, o

espaço disponibilizado à apresentação de textos muitas vezes influencia no formato em

que o gênero é exibido. Contudo há de se compreender que o formato em que quaisquer

gêneros circulam socialmente é constitutivo de seu sentido e buscar meios de resolver

tal impasse de modo que não prejudique o processo de ensino-aprendizagem.

O quadro, a seguir, mostra as operações de linguagem, referentes ao

desenvolvimento da capacidade de ação do aluno, trabalhadas em cada uma das obras

analisadas:

Page 125: Noticia e Reportagem Nos LDS

124

QUADRO 24. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino

da notícia

Como o quadro apresenta, os livros 1 e 4 são os que mais se empenham no

trabalho com operações relacionadas à capacidade de ação do estudante. Já o livro 2

pouco aborda tais tarefas. De modo geral, concluímos que a capacidade de linguagem

referente à ação é mobilizada no ensino de gênero notícia nos livros didáticos de Língua

Portuguesa recomendados pelo PNLEM/2009.

Passaremos a análise do desenvolvimento da capacidade discursiva.

4.4.5 O gênero notícia e as capacidades discursivas

A capacidade discursiva corresponde ao nível de análise de Bronckart (2008) mais

profundo da arquitetura interna dos textos. É por meio do desenvolvimento de tal

capacidade que o estudante organiza estruturalmente um gênero e nele posiciona-se com

adequação. O desenvolvimento da capacidade discursiva é fundamental para o domínio

de quaisquer gêneros.

Por meio da análise dos capítulos dedicados ao ensino da notícia, chegamos às

seguintes operações de linguagem que atuam no desenvolvimento de capacidades

discursivas nos livros analisados, isto é, nessas obras abordam-se as seguintes

características do gênero:

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero notícia

Livro 1 (PL)

Livro 2 (PLC)

Livro 3 (LP)

Livro 4 (PEC)

Capacidades de

ação

Situação de Produção (contextualização do gênero)

Levar em conta o suporte material em que veicula o gênero;

X X X X

Apresentar o gênero em seu formato de circulação

social; X X

Identificar e considerar o público-alvo esperado; K

X

X

Identificar e considerar o lugar e o momento da

produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de

muitas pessoas, improváveis de acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja

identificação com o público-alvo;

X

X

Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos; X

X

X X X X

X

X

X

Page 126: Noticia e Reportagem Nos LDS

125

a estruturação do gênero (título, lide, corpo de texto ou desenvolvimento);

a função dos elementos estruturais (em especial o título);

a organização e seleção de eventos;

os acompanhantes do gênero (fotos e legendas).

Uma das características fundamentais da notícia é o seu tipo de discurso e sua

planificação: narração e script (relato), respectivamente, os quais não são trabalhados.

As páginas reproduzidas, a seguir, exemplificam a forma como os livros abordam

as operações de linguagem referentes à capacidade discursiva. Recorreremos às

atividades dos livros 1 (PL) e 2 (PLC). Vejamos o primeiro exemplo extraído do livro 2:

Page 127: Noticia e Reportagem Nos LDS

126

Livro 2 (PLC), 2003, p. 199-200.

A atividade 4, na qual há a exposição didática sobre o lide (do termo em inglês

lead), recorrendo-se ao manual do Estado de S. Paulo, é classificada como inferencial

na tipologia de Marcuschi (2003) por mobilizar conhecimentos textuais e contextuais.

Por meio dela apresenta-se ao aluno a função e estruturação do elemento lide. Em

seqüência, trabalha-se a organização dos parágrafos e a seleção dos fatos. Como

podemos notar, na exposição da estrutura textual da notícia em estudo, o autor desse

livro didático expõe sua análise do texto como legítima e única.

Vejamos exemplos retirados do livro 1 (PL):

Page 128: Noticia e Reportagem Nos LDS

127

Livro 1 (PL), 2005, p. 241.

Esses exercícios são propostos à notícia principal. As atividades 3 e 4 abordam a

estruturação do gênero, enfocando o lide e o corpo do texto. Observe que é no

enunciado das atividades que as definições desses elementos são apresentadas ao aluno.

Enquanto a atividade 3 traz perguntas objetivas sobre o conteúdo do lide, a de número 4

traz a do tipo meta-lingüística sobre a identificação do corpo do texto.

Page 129: Noticia e Reportagem Nos LDS

128

Passemos a apresentar mais exemplos de como as operações de linguagem

relacionadas à capacidade discursiva são trabalhadas nos livros analisados. As páginas

que reproduziremos, a seguir, correspondem à seção Escrevendo com adequação, nelas

são abordadas a escrita de títulos, subtítulos e legendas jornalísticas. Essa seção do livro

1 (PL) é dedicada ao trabalho com conhecimentos lingüísticos, segundo as palavras dos

autores no manual do professor e conforme a resenha da obra presente no catálogo do

PNLEM/2009. Dos livros didáticos que trabalham com o ensino dos gêneros notícia

e/ou reportagem do PNLEM/2009, essas páginas que reproduziremos são os únicos

momentos em que o trabalho com elementos lingüísticos, isto é, seções voltadas a esse

fim, vinculam-se ao ensino do gênero em questão, pois:

Livro 2 (PLC): o trabalho com elementos lingüísticos não se relaciona com o

ensino do gênero, ocorre o ensino de gramática descritiva, usando-se frases dos

textos principais como exemplo sem se apresentar a função ou o efeito de

sentido de tais formas e escolhas lingüísticas no texto;

Livro 3 (LP): no capítulo de ensino da notícia, não há seções voltadas ao ensino

de elementos lingüísticos;

Livro 4 (PEC): no capítulo de ensino da notícia, não há seções voltadas ao

ensino de elementos lingüísticos, como ocorre no livro anterior.

Assim, a ausência do trabalho com elementos lingüísticos empregados nos

gêneros em questão e seus efeitos de sentido ocorre em 75% das obras que visam o

ensino da notícia e da reportagem, sinalizando que pouco se mobiliza a capacidade

lingüístico-discursiva do estudante de Ensino Médio.Vejamos, então, a seção

Escrevendo com adequação do livro 1:

Page 130: Noticia e Reportagem Nos LDS

129

Page 131: Noticia e Reportagem Nos LDS

130

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131

Livro 1 (PL), 2005, p. 243-245.

Tal seção reproduzida é basicamente dedicada ao desenvolvimento da capacidade

do aluno de redigir e compreender elementos estruturais – título, subtítulo e legenda –

implicando assim no desenvolvimento da capacidade discursiva dele. Ao tratar do título

(quadro presente na segunda página reproduzida (p. 244)), esse livro apresenta a relação

entre título e leitor, bem como a função daquele, atuando também no desenvolvimento

da capacidade da ação do aluno.

Page 133: Noticia e Reportagem Nos LDS

132

No quadro Como escrever um título jornalístico (presente na segunda página

reproduzida (p. 244)), recorre-se ao Manual de redação e estilo jornalístico do jornal O

Estado de S. Paulo para orientar as produções dos alunos. É nele que se apresentam os

elementos lingüísticos empregados nos títulos e seus efeitos de sentido.

Observe que esses exercícios expõem o adolescente de Ensino Médio à leitura de

outras notícias, contribuindo para a ampliação do repertório desse aluno na medida que

permite um pouco mais de contato com o gênero. Quanto à forma de apresentação nas

atividades, as notícias podem ser perfeitamente reconhecidas como tal, assim atua-se no

desenvolvimento da capacidade de ação mais uma vez.

Vejamos também como o livro 4 (PEC) mobiliza as capacidades discursivas dos

alunos:

Page 134: Noticia e Reportagem Nos LDS

133

Livro 4 (PEC), 2004, p. 701-702.

Nestas reproduções, o livro dedica-se ao trabalho com elementos estruturais da

notícia como: a elaboração e função do título e do lide, recorrendo ao manual do jornal

O Estado de S. Paulo e a exemplos que atuarão como modelos para a produção dos

alunos. Assim, pode-se propiciar o desenvolvimento das capacidades discursivas do

estudante, correspondendo ao nível da infra-estrutura textual, segundo o modelo de

Bronckart (2003; 2008).

Page 135: Noticia e Reportagem Nos LDS

134

Esperamos que, por meio da apresentação dessas páginas, conseguimos ilustrar o modo

como são abordados os elementos da infra-estrutura textual do gênero notícia nos livros

de Português de Ensino Médio.

O quadro seguinte traça o panorama geral das operações de linguagem, referentes

à capacidade discursiva, trabalhadas em cada uma das obras:

QUADRO 25. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas

no ensino da notícia

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero notícia

Livro 1 (PL)

Livro 2 (PLC)

Livro 3 (LP)

Livro 4 (PEC)

Capacidades

discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto);

X X X X

Compreender a função de cada elemento estrutural;

X X X X

Reconhecer os acompanhantes do gênero como fotos e legendas;

X X X

Reconhecer e empregar o tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;

Selecionar previamente eventos; X X X X

Conhecer e empregar planificação script ou relato.

Concluímos que os livros tendem a tratar de alguns aspectos em detrimento a

outros, decorrência do processo de didatização do gênero (SCHNEUWLY; DOLZ,

2004). Conforme o quadro sinaliza, nesses livros mobilizam-se de algum modo, ou seja,

mesmo que superficialmente, operações que poderão desenvolver capacidades

discursivas dos alunos de Ensino Médio.

Na próxima seção, analisaremos a ocorrência de operação de linguagem que

enfatizam o desenvolvimento da capacidade lingüístico-discursiva dos estudantes.

4.4.6 O gênero notícia e as capacidades lingüístico-discursivas

A capacidade lingüístico-discursiva corresponde ao nível intermediário e

superficial dos textos no modelo de Bronckart (2003; 2008). Refere-se, especificamente,

ao domínio dos mecanismos lingüísticos e enunciativos e seus efeitos de sentido.

Assim para o domínio do texto do gênero notícia, o aluno deve saber empregar:

mecanismos textuais que mantenham a coesão e a coerência do texto; a modalidade

Page 136: Noticia e Reportagem Nos LDS

135

adequada da língua; elementos lexicais adequados; organizadores temporais e espaciais;

vozes verbais; mecanismos de modalização; recursos lingüísticos que produzam o efeito

de objetividade, imparcialidade e credibilidade. Para que os livros didáticos propiciem o

desenvolvimento da capacidade lingüístico-discursiva do estudante devem ser

trabalhadas operações de linguagem que abordem tais elementos descritos.

De modo geral, as operações que se destacam nos livros analisados são as que se

relacionam com: mecanismos coesivos, o emprego das aspas para produzir o efeito de

credibilidade e veracidade aos fatos narrados, mecanismos de modalização e a

modalidade adequada da língua. Os mecanismos lingüísticos empregados para se apagar

as marcas do autor e garantir o efeito de imparcialidade e neutralidade não são

mencionados e nenhuma das obras, assim como os organizadores temporais e espaciais

característicos nesse gênero por marcarem de modo pontual os acontecimentos.

Vejamos a reprodução de atividades que abordam operações lingüístico-

discursivas presentes nos livros didáticos analisados como forma de exemplificarmos

nossa análise:

Page 137: Noticia e Reportagem Nos LDS

136

Livro 3 (LP), 2005, p. 102.

A página reproduzida nos mostra o empenho desse livro em formar leitores

competentes para a leitura e interpretação desse gênero textual. A atividade 1 é

constituída de questões inferenciais nas quais o aluno deve mobilizar conhecimentos de

diferentes ordens para a construção das respostas. Tanto a atividade quanto o texto

didático-expositivo que a acompanha abordam a impossibilidade de neutralidade e de

imparcialidade à linguagem e ao jornalismo, mobilizando operações de linguagem que

implicam no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas. Em seqüência à

atividade anteriormente reproduzida, o livro 3 traz o seguinte exercício de produção:

Page 138: Noticia e Reportagem Nos LDS

137

Livro 3 (LP), 2005, p. 103.

A proposta de produção de texto é coerente com a atividade anterior, pois

permanece na mesma linha de raciocínio, isto é, mantém-se no trabalho centrado nas

marcas da subjetividade do autor, fazendo com que o estudante coloque em prática as

orientações expositivas dadas e os conhecimentos apreendidos por meio da análise da

notícia apresentada para estudo e produza sua notícia empregando recursos lingüísticos

que criam o efeito da neutralidade e imparcialidade no texto.

Embora tal obra enfoque poucas operações de linguagem referentes ao

desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do estudante no trabalho com o

gênero notícia, nela é realizado um trabalho profundo quanto as marcas modais e a

Page 139: Noticia e Reportagem Nos LDS

138

neutralidade da linguagem, fato que não ocorre nos outros livros de Ensino Médio

analisados que passam rapidamente por algumas operações sem se aprofundar em

nenhuma.

Por meio do quadro seguinte, pensamos sinalizar as operações lingüístico-

discursivas mobilizadas no ensino da notícia, as quais poderão implicar no

desenvolvimento da respectiva capacidade de linguagem:

QUADRO 26. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem

abordadas no ensino da notícia

Concluímos que, embora sejam pouco trabalhadas as operações de linguagem

referentes à capacidade lingüístico-discursiva exigidas para o domínio da notícia,

algumas delas são ensinadas nos livros, ficando a cargo do professor complementar a

abordagem dada nesses livros de Português de Ensino Médio de modo a ampliar o

desenvolvimento dessa capacidade de linguagem do estudante, de acordo com as

possibilidades de seu agir docente, isto é, de acordo com elementos que influenciam seu

trabalho como: comunidade em que a escola está inserida, prescrições internas e

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero notícia

Livro 1 (PL)

Livro 2 (PLC)

Livro 3 (LP)

Livro 4 (PEC)

Capacidades

lingüístico-discursivas

Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos

e seus efeitos de sentido

Empregar a modalidade da língua característica do

gênero: modalidade padrão;

X X

Selecionar adequadamente o léxico; X

Manter coerência e coesão; X X X

Empregar organizadores temporais e espaciais

adequadamente;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade, tais como: a atribuição das informações às fontes, o emprego de aspas para indicar a

transcrição fidedigna das falas;

X X X

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice

de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as marcas do

autor;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas para se apagar as marcas

modais (avaliações, julgamentos, etc.);

X X X X

Identificar e empregar vozes implícitas.

Page 140: Noticia e Reportagem Nos LDS

139

externas à instituição, alunos, seus pais, grupo docente, direção escolar, entre outros,

que de alguma forma atuam em sua prática profissional.

4.4.7 Capacidades de linguagem e o ensino da notícia

Por meio da análise dos capítulos ou módulos dedicados ao ensino do gênero

textual notícia, concluímos que há a tendência à abordagem de certas características em

detrimento a outras, processo necessário para que o gênero social torne-se um gênero a

ser ensinado e aprendido, ou seja, para que ocorra sua didatização o gênero passa por

um processo de simplificação em que algumas de suas características são silenciadas

(SCHNEUWLY; DOLZ, 2004). Chegamos, ainda, a conclusão de que as atividades

didáticas propostas à notícia podem implicar no desenvolvimento de capacidades de

linguagem do aluno, embora a capacidade lingüístico-discursiva seja pouco mobilizada,

enquanto as capacidades de ação e discursiva são enfatizadas.

O quadro, a seguir, sinaliza o panorama geral das operações de linguagem

mobilizadas nos livros de Língua Portuguesa analisados:

Page 141: Noticia e Reportagem Nos LDS

140

QUADRO 27. Gênero notícia: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros de

Português de Ensino Médio analisados

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero notícia

Livro 1 (PL)

Livro 2 (PLC)

Livro 3 (LP)

Livro 4 (PEC)

Capacidades de

ação

Situação de Produção (contextualização do gênero)

Levar em conta o suporte material em que veicula o gênero;

X X X X

Apresentar o gênero em seu formato de circulação

social; X X

Identificar e considerar o público-alvo esperado; K

X

X

Identificar e considerar o lugar e o momento da

produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de muitas

pessoas, improváveis de acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja identificação com o

público-alvo;

X

X

Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos; X

Capacidades

discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto);

X X X X

Compreender a função de cada elemento estrutural; X X X X

Reconhecer os acompanhantes do gênero como fotos e legendas;

X X X

Reconhecer e empregar o tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;

Selecionar previamente eventos; X X X X

Conhecer e empregar planificação script ou relato.

Capacidades

lingüístico-discursivas

Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e seus efeitos de sentido

Empregar a modalidade da língua característica do gênero: modalidade padrão;

X X

Selecionar adequadamente o léxico; X

Manter coerência e coesão; X X X

Empregar organizadores temporais e espaciais adequadamente;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a atribuição das informações às

fontes, o emprego de aspas para indicar a transcrição

fidedigna das falas;

X X X

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva

(sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas para se apagar as marcas modais

(avaliações, julgamentos, etc.);

X X X X

Identificar e empregar vozes implícitas.

X

X

X X X X

X

Page 142: Noticia e Reportagem Nos LDS

141

Das 22 operações de linguagem a que chegamos para a construção do modelo

didático do gênero notícia, muitas delas foram de alguma forma tratadas nos livros

didáticos. O livro 1 (PL) abordou 67% das operações necessárias ao domínio do gênero

notícia, os livros 3(LP) e 4 (PEC) trabalharam com 52% das operações e o livro 2

(PLC) somente com 43% delas.

De forma geral, há uma tendência a se trabalhar com algumas das características

do gênero em detrimento a outras. As operações de linguagem relacionadas: ao suporte

material da notícia, às intenções de produção, aos elementos estruturais (título, lide,

corpo de texto) e suas funções e à seleção de eventos a serem noticiados são trabalhadas

em todos os livros de Português analisados, correspondendo a 29% das operações

exigidas ao domínio da notícia. Já a porcentagem que equivale às operações que não

foram trabalhadas de nenhum modo nesses livros corresponde a 19%, sendo elas

vinculadas: aos tipos de discurso e planificação característicos do gênero, aos

organizadores espaciais e temporais, aos recursos lingüísticos utilizados para se apagar

as marcas de subjetividade e ao uso de vozes implícitas e explícitas e seus efeitos de

sentidos.

Tais operações que foram negligenciadas estão, em sua maioria, 60%, implicadas

no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do aluno e 40% no

desenvolvimento de capacidades discursivas. Portanto a capacidade privilegiada nos

livros foi a capacidade de linguagem referente à ação. O quadro, a seguir, apresenta o

quanto foi trabalhado de cada capacidade nos livros analisados:

QUADRO 28. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada

no ensino do gênero notícia

Livros/

Capacidades de linguagem

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Livro 3

(LP)

Livro 4

(PEC)

Capacidades de ação 86% 29% 57% 71%

Capacidades discursivas 67% 50% 67% 67%

Capacidades lingüístico-discursivas 50% 50% 37% 25%

Como o quadro sinaliza, quanto ao ensino da notícia os livros 1 (PL) e 4 (PEC)

enfatizam o trabalho com a capacidade de ação do aluno, já o livro 3 (LP) enfoca mais

Page 143: Noticia e Reportagem Nos LDS

142

as capacidades discursivas e o livro 2 (PLC) prioriza tanto a capacidade discursiva

quanto a lingüístico-discursiva. Desta forma, o ensino está, principalmente, focado na

contextualização desse gênero e em sua organização textual (infra-estrutura), entretanto

ao não se ensinar os efeitos de sentido dos mecanismos de textualização e enunciativos

empregados nesse gênero, referentes à capacidade lingüístico-discursiva,

conseqüentemente não se prepara o aluno de Ensino Médio para dominar a notícia, pois

para tanto não basta contextualizá-la e conhecer sua organização textual há se

compreender os efeitos de sentido nela implicados, caso contrário, o aluno não

dominará os conhecimentos necessários para agir e posicionar socialmente por meio

desse gênero textual.

Passemos à análise das atividades didáticas propostas ao ensino do gênero

reportagem.

4.5 O gênero reportagem

Nesta seção, analisaremos a forma de apresentação do gênero textual reportagem,

a abordagem dada a ele e os tipos de atividades didáticas propostas a seu ensino,

relacionando-as as capacidades de linguagem dos alunos que poderão ser mobilizadas e

desenvolvidas.

O gênero textual reportagem é objeto de ensino de dois dos livros do corpus, livro

1 (PL) e livro 2 (PLC). Vejamos como se organizam os capítulos9 dedicados a esse

gênero nos livros analisados:

9 Os capítulos encontram-se na seção de anexos deste trabalho, correspondendo ao Anexo I, as páginas

analisadas do livro1, e ao Anexo II, as do livro 2.

Page 144: Noticia e Reportagem Nos LDS

143

QUADRO 29. Organização dos capítulos dedicados ao ensino da reportagem

Livro 1 (PL) Livro 2 (PLC)

Capítulos Cap. 24 – A reportagem

(3 páginas)

Cap. 15 – Texto informativo: a

reportagem (9 páginas)

Descrição das

seções internas aos

capítulos

Trabalhando o gênero (traz o

texto principal; estudo do texto;

exposição didática)

Produzindo a reportagem

(proposta de produção de texto)

Texto 1 (traz o 1º texto principal e

atividades de estudos)

Praticas de escrita (proposta de

produção de resumo do texto principal)

Texto 2 (traz o 2º e atividades de

estudo)

Pratica de escrita (proposta de

complementação do texto 2)

Texto 3 (traz reportagem com

infográfico e atividades de estudo)

Pratica de escrita (proposta de

produção de texto que traduza as

informações contidas no gráfico

apresentado)

De olho na língua (ensino descritivo

do verbo haver, crase, aposto e

sentenças complexas com base em

frases dos textos estudados; traz

exposição e atividades)

Observando aspectos gráficos (traz 2

atividades que abordam o uso de aspas

e a acentuação de algumas palavras,

respectivamente)

Pausa poética (traz poema com

relação temática com o texto 2; leitura

complementar)

Como é demonstrado no quadro anterior, o trabalho com o gênero reportagem é mais

extenso no livro 2. Enquanto o livro 1 organiza-se em torno de uma única reportagem principal, o

outro organiza-se em torno de três reportagens tidas como textos principais.

Quanto à estruturação dos capítulos, podemos observar que é organizada de modo

tradicional: texto, atividades de estudo do texto, produção de texto e ensino de tópicos

gramaticais. Assim mudam-se as teorias de ensino de língua e os autores de livros didáticos as

adaptam ao modelo já cristalizado, sendo abordados os gêneros das mais distintas esferas sociais

da mesma maneira, não se aproveitando as especificidades de cada gênero para se inovar o modo

de ensino.

Ressaltamos que o ensino de tópicos gramaticais é desarticulado do ensino do gênero

textual. Ocorre no livro 2 o ensino de gramática descritiva abordando o verbo haver, a crase, o

Page 145: Noticia e Reportagem Nos LDS

144

aposto e alguns tipos de sentenças complexas, recorrendo às frases das reportagens em estudo

apenas para exemplificação, sem qualquer relação com o gênero.

Portanto perdeu-se a oportunidade de se trabalhar elementos lingüísticos característicos da

concretização dos textos de gênero reportagem como:

os organizadores espaciais e temporais (advérbios e locuções adverbiais) freqüentemente

empregados para localizar precisamente os fatos narrados;

o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de

indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as

marcas do autor e exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade;

o emprego das aspas para introduzir vozes no texto usado para exprimir o efeito de

veracidade e propiciar credibilidade à reportagem.

O estudo de tais mecanismos oferecidos pela língua propiciariam o desenvolvimento de

capacidades lingüístico-discursivas do aluno, entretanto como há a ausência de um trabalho

voltado ao desenvolvimento de tais capacidades não aprofundaremos na análise das seções

dedicadas a tópicos gramaticais por não haver relação com o gênero e assim fugir de nossa

proposta de análise.

Nas próximas seções trataremos da forma de apresentação e do conteúdo temático do

gênero reportagem nos livros analisados. Salientamos que esses dois elementos permeiam o

desenvolvimento da capacidade de linguagem referente à ação, isto é, para que o livro contribua

com o desenvolvimento da capacidade de ação do aluno diante do gênero reportagem, seja lendo-

o ou produzindo-o, é preciso que propicie meios de (re)conhecer sua forma e seu conteúdo

esperado. Assim trataremos da forma de apresentação da reportagem no livro de Português de

Ensino Médio.

4.5.1 A forma de apresentação do gênero reportagem

Partindo do princípio de que é necessário expor o aluno a textos do gênero reportagem

que sejam apresentados como veiculam em jornais e revistas, isto é, com título, subtítulo, texto

em colunas, acompanhados de fotos com legendas, quadros e gráficos, se possível, para que o

Page 146: Noticia e Reportagem Nos LDS

145

aluno reconheça-o, como é proposto por Schneuwly e Dolz (2004), descreveremos a análise da

forma de apresentação da reportagem em livros de Ensino Médio.

De modo geral, ocorrem as seguintes modificações no gênero reportagem nos livros de

Português analisados:

excluem-se partes do texto, quadros, fotos e legendas;

muda-se a posição da exibição de fotos;

não se traz o texto em colunas;

ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.

No livro 1 (PL), o texto principal que inicia o estudo apresenta título, subtítulo, quadros

estatísticos e foto acompanhada de sua legenda, propiciando fácil reconhecimento do gênero.

Trata-se de uma reportagem de capa extraída da revista Isto é cujo título é Quero ser grande.

Mantém-se o estilo textual jornalístico organizado em colunas e fazem-se as devidas indicações

de que a reportagem foi adaptada.

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149

Livro 1 (PL), 2005, p. 291-294.

Como as reproduções mostram, a reportagem é extensa, ocupando quatro páginas do livro,

constituindo-se como uma excelente seleção textual dos autores, por apresentar tal elemento

característico da reportagem: maior extensão textual que a notícia, já que é uma complementação

àquela. De modo a verificarmos se as características do gênero foram realmente respeitadas no

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150

livro, chegamos à versão original da reportagem. A data de tal edição é 5/5/2004. Observamos

que foi excluída da reportagem original sete das fotos que acompanham o texto na revista.

Quanto ao texto, são eliminados parágrafos e subtítulos, mas há a devida indicação textual de

adaptações.

No livro 2 (PLC), duas das reportagens são retextualizadas, isto é, há a ausência de texto

em colunas, subtítulo, gráficos, quadros, foto e legenda, com a exceção de no texto 2 haver um

subtítulo. Vejamos como é apresentada a reportagem que inicia o capítulo de estudo do gênero no

livro 2:

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153

Livro 2 (PLC),2003, p. 214-216.

Como podemos apreender, ocorre o desrespeito das características constitutivas do gênero,

quanto a seu formato de circulação social.

Na mesma obra, na apresentação do texto 3, Obesidade muda oferta de comida no mundo,

reportagem da Folha de S. Paulo de 6/07/2003, mantém-se fielmente as características do gênero,

chegando a reproduzir a cor da página do jornal, os tamanhos e os tipos de letras do título,

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154

subtítulo e o texto em colunas com as devidas distinções, acompanhados pelo infográfico que

complementa a reportagem.

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Livro 2 (PLC), 2003, p. 222-224.

Concluímos que a forma de apresentação dos textos do gênero reportagem nos livros

didáticos precisa ser repensada e melhorada, ora o livro traz o gênero com suas características

sociais de apresentação, como na reportagem apresentada anteriormente, revelando indícios de

que as teorias de ensino de língua centradas no gênero estão aos poucos permeando o livro

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157

didático; ora as ignora, transmutando o gênero, como ocorre na reportagem Charada no Cafundó,

do mesmo livro.

Assim crê-se que os livros trazem os gêneros como melhor os convier, em momentos

estando de acordo com as teorias recentes, em outros as ignorando, revelando um pouco do

processo de mudança que vem sofrendo os livros didáticos contemporâneos devido ao

desenvolvimento de novos estudos. Entretanto é preciso haver rigor quanto à forma de

apresentação desses gêneros e reconhecer que a forma de configuração deles é elemento

constitutivo de seus sentidos. Não se lê uma reportagem, por exemplo, da mesma maneira que a

um conto. Não se contribuirá para que o aluno desenvolva tal consciência, se alguns livros de

Português os apresentam da mesma maneira sem realizar qualquer tipo de sinalização.

Há de se manter as características que garantem o reconhecimento social do gênero

reportagem como o título, o subtítulo, o texto em colunas, e seus acompanhantes: fotos com

legendas, quadros e gráficos, se possível. Caso contrário, não será propiciado o desenvolvimento

da capacidade de linguagem referente à ação, pois o aluno somente saberá agir ativamente, seja

lendo-o ou produzindo-o, se dominar a forma constitutiva desse gênero e reconhecê-la como tal.

Trataremos na próxima seção do conteúdo temático apresentado nas reportagens

selecionadas para compor os capítulos voltados a seu ensino.

4.5.2 O conteúdo temático do gênero reportagem

Ressaltamos que o conteúdo temático é constitutivo do gênero na medida em que há um

conjunto de temas comunicáveis e aceitos a cada tipo de gênero. Em reportagens, por exemplo, é

esperado o relato de fatos atuais ou contemporâneos que, de alguma forma, possa despertar o

interesse de seu público-alvo. Causaria estranheza se uma revista voltada a adolescentes

apresentasse reportagens sobre a crise na bolsa de valores, assunto alheio ao universo jovem.

Assim buscaremos analisar se a seleção textual dos livros de Português relaciona-se com

possíveis interesses dos adolescentes de Ensino Médio e se o conteúdo temático do gênero é

relacionado, de alguma forma, a sua concretização social nas abordagens dos livros.

Quanto à análise do conteúdo temático, no livro 1 (PL) a seleção do tema do texto está

coerente com o universo dos adolescentes de Ensino Médio. A reportagem apresentada nesse

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158

livro9 trata da juventude brasileira, expondo resultado de pesquisa de grande representatividade

que buscou traçar o perfil do jovem.

Já no livro 2 (PLC) tal relação entre leitor-conteúdo temático não ocorre na primeira

reportagem apresentada na obra. Esse livro traz três textos principais, o primeiro, Charada no

Cafundó10

, é uma reportagem que trata de uma comunidade brasileira que ainda usa palavras de

uma língua de origem africana, tema importante a ser tratado do ponto de vista de ensino de

língua, porém o texto veiculou na revista Veja de 26/04/1978, pensamos que seria mais produtivo

tratar de textos mais atuais já que o capítulo propõe-se a ensinar um gênero relacionado à

atualidade, visto que a reportagem foi publicada há 30 anos e talvez tal comunidade possa até ter

deixado de existir. Assim, a presença de tal reportagem sinaliza a preocupação do autor com o

conteúdo em detrimento ao ensino do gênero reportagem como forma de um agir linguageiro, isto

é, o gênero é usado como suporte de conteúdo temático ao invés de ser abordado como um modo

de agir socialmente, já que se desprezou o caráter temporal da reportagem e também a relação

entre conteúdo e leitor que se opera nos gêneros textuais.

A segunda reportagem do livro 2, A hora do lobo11

, da revista Caminhos da Terra de junho

de 2002, trata da possibilidade do lobo-guará não ser mais considerado um animal em extinção,

tema que aproxima o jovem dos problemas ambientais atuais. A terceira reportagem apresentada

nesse livro trata de um assunto que faz parte do cotidiano de todos: a obesidade, tema que poderá

contribuir para os estudantes conscientizarem-se da importância de uma alimentação adequada.

De forma geral, os temas de algumas das reportagens se aproximam do universo dos

adolescentes e podem contribuir com sua formação cidadã ao abordar questões de saúde e meio

ambiente. Entretanto, quanto o tratamento da relação entre conteúdo e concretização social do

gênero reportagem, no livro 2 (PLC) nada se menciona e no livro 1 (PL) são realizadas ressalvas

nas instruções da atividade de produção de texto.

Assim sendo, no ensino do gênero reportagem não ocorre o estudo sistematizado da

relevância do conteúdo temático como elemento constitutivo do gênero, conhecimento necessário

ao domínio de qualquer gênero de texto. Desta forma, perde-se uma oportunidade nesses livros

de contribuir para o desenvolvimento da capacidade de linguagem do aluno referente à ação.

A seguir, trataremos das atividades didáticas propostas ao ensino do gênero reportagem.

9 Disponível no Anexo I.

10 Disponível no Anexo II.

11 Disponível no Anexo II.

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4.5.3 Atividades propostas ao ensino do gênero reportagem

Os textos do gênero reportagem iniciam os capítulos e são seguidos por atividades didáticas

voltadas a seu ensino. Tais atividades são de dois tipos: leitura e produção de texto. As atividades

de leitura são predominantes nos livros e enfocam, principalmente, a compreensão do conteúdo

do gênero e seus elementos estruturais. As atividades de produção também testam a capacidade

de compreensão do aluno e permitem que ele exercite o que aprendeu no decorrer do capítulo

produzindo um texto do gênero reportagem. Geralmente, a produção escrita finaliza o estudo do

gênero e é seguida pelo ensino de tópicos gramaticais quaisquer.

Iniciaremos pela análise das atividades de leitura que se constituem em perguntas. Para

tanto, recorreremos à tipologização elaborada por Marcuschi (2003), a qual já descrevemos.

Apresentaremos os tipos de questões propostas aos textos de gênero reportagem nos livros

didáticos analisados no quadro a seguir:

QUADRO 30. Perguntas empregadas no ensino da reportagem

Tipos de perguntas

(Marcuschi)

Ocorrências

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

10. A cor do cavalo

branco de Napoleão __ __

11. Cópias 1

(5,5%)

4

(8%)

12. Objetivas 4

(21%)

31

(65%)

13. Inferenciais 5

(26%)

5

(10%)

14. Globais 3

(16%)

1

(2%)

15. Subjetivas __ 1

(2%)

16. Vale-tudo __

__

17. Impossíveis 1

(5,5%)

6

(13%)

18. Meta-lingüísticas 5

(26%)

__

Total 19

(100%)

48

(100%)

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160

Como já mencionamos, o livro 2 (PLC) apresenta um trabalho mais extenso ao ensino da

reportagem, centrando-se em torno de 3 textos principais, daí a diferença entre o número de

questões entre os livros, entretanto o livro 1(PL) é o volume destinado a apenas a 2ª série do

Ensino Médio e o livro 2 a essa etapa completa da educação. Como o quadro ilustra, de modo

geral, destacam-se as perguntas do tipo objetivas, ou seja, perguntas voltadas a identificação de

conteúdos estritamente inscritos no texto, tratando-se de atividades de decodificação que testam a

capacidade do aluno de localizar informações no texto. Portanto, grande parte das atividades de

perguntas propostas em capítulos que se propõem ao ensino do gênero reportagem não abordam

as características do gênero ou mesmo o gênero, mas a localização do conteúdo temático inscrito.

Vejamos um exemplo desse tipo de atividade:

Livro 2 (PLC), 2003, p. 216.

Observe que todos os itens da atividade anterior indagam aspectos bem pontuais do texto,

isto é, conteúdo temático estritamente inscrito, cabendo ao aluno identificá-lo e copiá-lo. Em

atividades como essa não se mobiliza conhecimentos mais sofisticados do aluno como refletir,

analisar, comparar na busca da construção da resposta.

Compartilhamos da afirmação de Marcuschi (2003) de que nos livros didáticos ocorre a

confusão terminológica entre decodificação e compreensão, possivelmente conseqüência dos

fatores mercadológicos que influenciam na produção de livros didáticos e/ou da falta de

embasamento teórico de seus autores. As atividades propostas não testam a capacidade de

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161

compreensão do aluno, mas a capacidade de localizar ou decodificar informações, havendo a

ausência de mobilização da capacidade de análise crítica do aluno, além das capacidades de

realizar inferências, de relacionar conhecimentos lingüísticos, pessoais, enciclopédicos,

operações implicadas nas perguntas do tipo inferencial e global na classificação do autor, as quais

são pouco trabalhadas no livro 2, correspondendo à 10% das ocorrências e no livro 1 (PL) à 26%,

como o quadro mostra. A reprodução, a seguir, traz um exemplo de pergunta do tipo inferencial:

Livro 1 (PL), 2005, p. 296.

Para construir a resposta a essa indagação reproduzida, o aluno deverá mobilizar

conhecimentos de diferentes ordens: textuais, lingüísticos, extra-textuais, de modo a analisar

criticamente a reportagem estudada na busca de suas características, assim a classificamos como

do tipo inferencial. Por meio dela é possível avaliar os conhecimentos adquiridos nas atividades

proposta a esse gênero no decorrer do capítulo. Essa atividade será retomada em outro momento

da análise.

No livro 1 (PL), os tipos de perguntas que se destacam são as inferenciais (26%), já

descritas, e as meta-lingüísticas (26%), isto é, aquelas que indagam sobre a estruturação do texto,

utilizando-se geralmente de meta-linguagem, fato que sinaliza a ênfase ao desenvolvimento de

capacidades discursivas de linguagem nessa obra.

As perguntas impossíveis, a segunda tipologia de pergunta que se destaca no livro 2 (PLC),

dizem respeito a questões que indagam sobre elementos não estudados ou retomados no capítulo.

Salientamos que o livro 2 organiza-se, conforme as palavras do autor no livro do professor e a

resenha do catálogo do PNLEM/2009, em capítulos independentes. Entretanto isso não ocorre

quanto ao ensino de gêneros jornalísticos, pois se a seqüência dos capítulos 13,14 e 15 não for

seguida, muito se perderá sobre o conteúdo. Nessa obra, o capítulo 13 trata do jornal, sua função

e seus textos, como já apresentamos. A seguir, o capítulo14, aborda a notícia sem retomar as

especificidades de sua esfera de comunicação de modo a pressupor que o aluno já a conheceu no

estudo anterior. É nesse capítulo sobre a notícia que são sistematicamente trabalhadas as

principais características dos textos informativos, como designa o autor. Enfim, no capítulo 15,

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162

dedicado ao ensino da reportagem, é pressuposto que o aluno já estudou a esfera de comunicação

e as características do gênero reportagem que na perspectiva do autor trata-se de um tipo de texto

informativo. Devido à relação de dependência entre os conteúdos do livro 2, são propostas 6

perguntas (sendo elas: 2. d/ e/ p. 217; 3.a/ b/c/d/ p. 221) as quais consideramos impossíveis, em

que o aluno deve avaliar as qualidades do texto informativo, sem tê-las estudado no capítulo em

questão. Vejamos a reprodução de uma dessas atividades:

Livro 2 (PLC), 2003, p. 221.

A atividade de número 3 pede que o aluno avalie as qualidades do texto, porém os

conhecimentos necessários a tal tarefa não lhe são apresentados nem retomados. Assim,

possivelmente, as respostam a essas indagações ficarão no campo da opinião, já que não se

instrumentaliza o estudante para respondê-las.

No livro 1 (PL), também há a ocorrência de uma questão do tipo impossível:

Livro 1 (PL), 2005, p. 295.

O item „c‟ da atividade reproduzida pede que o aluno indique se o discurso empregado em

um determinado trecho da reportagem é direto ou indireto, entretanto não se trabalhou nem

retomou no capítulo tais elementos. Como o aluno não é instrumentalizado a responder tal

indagação a classificamos como impossível.

Page 164: Noticia e Reportagem Nos LDS

163

As atividades de produção de texto são propostas em ambos os livros. O livro 1 (PL) traz

uma proposta coerente com o ensino de língua centrado nos gêneros, embora propicie pouca

exposição a ele (uma única reportagem), há a sistematização de algumas características da

reportagem com vistas a seu domínio, como é proposto por Schneuwly e Dolz (2004).

Conseqüentemente ocorre a simplificação desse gênero, pois são enfatizadas algumas de suas

características em detrimento a outras, processo normal, segundo esses autores, para que se dê a

didatização e o processo de ensino dos gêneros.

Pensamos que a atividade de produção textual do livro 1 (PL), a qual será abordada à

frente, simplificou o gênero reportagem como esperado. Entretanto, são apresentados dados da

condição de produção: adequação entre assunto, público-alvo e suporte material, uma vez que o

texto será fixado no mural da escola, o leitor esperado será o jovem estudante, assim os temas

sugeridos vinculam-se a esse universo e a atualidade; além da atenção dada às características

estruturais do gênero, há, portanto, preocupação com aspectos que garantem o sucesso do gênero

na elaboração da proposta de produção.

No decorrer do capítulo da reportagem do livro 1, apresentam-se como suas características:

citações de pesquisas, trechos de entrevistas, dados estatísticos, boxes informativos, tabelas e

gráficos, os quais estão presentes no texto principal. Porém, não se aborda a função nem o modo

de utilizar esses recursos no texto, mas na proposta de produção de texto o aluno deverá pesquisar

um dos assuntos dados, colher opiniões e realizar entrevistas sobre o tema para a redação de uma

reportagem. As atividades propostas ao estudo desse gênero não instrumentalizam o estudante

para a realização de tal tarefa. A partir da realização de entrevistas, gênero específico que

prescinde de certas normas e características que não foram trabalhadas ou de alguma forma

retomadas, e da coleta de opiniões, o aluno deverá produzir a reportagem. Assim a abordagem

dada a essa produção ignora os outros gêneros que a permeiam, simplificando-os.

Concluímos que, na proposta de produção do gênero do livro 1 (PL), enfatiza-se o

desenvolvimento das capacidades de ação, ao fornecer as condições de produção, e as

capacidades discursivas, ao pedir que o estudante empregue a estrutura do gênero, fazendo com

que exercite o que estudou no capítulo, em detrimento das capacidades lingüístico-discursivas.

Já no livro 2 (PLC), há três propostas de produção de texto, a saber:

Page 165: Noticia e Reportagem Nos LDS

164

na primeira, propõe-se que o aluno redija um resumo sobre a reportagem Charada no

Cafundó, portanto o objetivo é testar a compreensão do aluno a respeito do conteúdo da

reportagem;

na segunda proposta, o aluno deve complementar a reportagem A hora do lobo com um

parágrafo incluindo o posicionamento do Ibama sobre o assunto;

na terceira atividade de produção, o aluno deve escrever um texto traduzindo as

informações sobre o gráfico apresentado, objetivando testar a leitura do gráfico realizada

pelo aluno.

Portanto, nesse livro a atividade de produção não busca o domínio do gênero de texto

reportagem, mas somente avaliar a capacidade de compreensão do aluno quanto ao conteúdo dos

textos estudados.

Grande parte das atividades didáticas, tanto de leitura quanto de produção, presentes nos

capítulos de ensino de reportagem centram-se na localização de informações referentes ao

conteúdo temático do texto, não sendo o gênero em si enfocado e sim servindo como suporte para

o estudo de conteúdo temático. Assim o gênero reportagem é depositário de conteúdos sob os

quais se avalia a capacidade de decodificação e compreensão do aluno.

Porém não podemos ignorar que no livro 1 (PL) há atividades que contribuem para o

desenvolvimento de capacidades de ação. Nesses livros didáticos de Português também se

buscam tratar da estrutura textual da reportagem, sinalizando possível ênfase no desenvolvimento

da capacidade discursiva do aluno. Os elementos característicos do gênero que nos parecem mais

comprometidos são os referentes às capacidades lingüístico-discursivas exigidas para o domínio

da reportagem, como os mecanismos lingüísticos empregados para produzir o efeito da

objetividade, impessoalidade e veracidade, que não são tratados. Vejamos como tais elementos

são trabalhados em uma das atividades do livro 1:

Page 166: Noticia e Reportagem Nos LDS

165

Livro 1 (PL), 2005, p. 296.

Por exemplo, na atividade „a‟ do exercício 8, é pedido que o aluno assinale a alternativa que

apresente as características da linguagem da reportagem, é considerada como correta, no manual

do professor, a alternativa que a traz como “clara, objetiva, direta...”, sem qualquer ressalva

quanto aos mecanismos lingüísticos que produzem esses efeitos. Assim perdeu-se a oportunidade

de trabalhar tais mecanismos e mobilizar as capacidades lingüístico-discursivas.

Como nossa proposta trata-se da análise das atividades voltadas ao ensino do gênero

reportagem e das capacidades de linguagem que poderão ser desenvolvidas por meio delas,

passaremos a expor as atividades que mobilizam tarefas exigidas ao desenvolvimento de

capacidades de linguagem dos alunos para o domínio de tal gênero jornalístico nos livros de

Português de Ensino Médio na seção seguinte.

4.5.4 O gênero reportagem e as capacidades de ação

Como postulam Schneuwly e Dolz (2004), as capacidades de linguagem são

conhecimentos exigidos para o domínio dos gêneros, assim para que haja a aprendizagem do

gênero reportagem os livros didáticos devem propor atividades que desenvolvam tais capacidades

dos alunos.

Neste momento, optamos por apresentar a análise das atividades propostas ao ensino do

gênero reportagem, incluindo atividades de leitura (perguntas), produção escrita e sistematização

didática, já as relacionando às respectivas capacidades de linguagem – ação, discursiva e

Page 167: Noticia e Reportagem Nos LDS

166

lingüístico-discursiva – que poderão ser desenvolvidas do aluno. Iniciaremos a exposição pela

capacidade de ação.

A capacidade de ação refere-se à capacidade de contextualizar o gênero à circunstância de

interação, adaptando-o ao receptor/destinatário, à esfera de comunicação, enfim ao objetivo da

ação de linguagem. Segundo o modelo didático que elaboramos para a reportagem, as operações

de linguagem ou as tarefas a serem aprendidas pelo estudante que propiciam o desenvolvimento

de capacidades de ação correspondem a atividades didáticas que, de alguma forma, enfoquem as

condições de produção: público-alvo esperado, o suporte material em que veicula, o conteúdo

temático dizível, o lugar e o momento de produção, as intenções, além da exposição do aluno ao

formato do gênero que circula socialmente para que possa ocorrer seu reconhecimento fora do

ambiente escolar.

Quanto à apresentação do formato real do gênero e quanto ao conteúdo nele esperado já

tratamos anteriormente. Na apresentação ocorrem as seguintes modificações no gênero

reportagem nos livros de Português analisados:

excluem-se partes do texto, quadros, fotos e legendas;

muda-se a posição da exibição de fotos;

não se traz o texto em colunas;

ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.

Esses elementos são constitutivos do gênero o qual é facilmente reconhecido por meio

deles, pois não é necessário ler uma reportagem para perceber de que gênero trata-se basta avistá-

la. Entretanto das quatro reportagens que veiculam os capítulos que analisamos, duas delas

podem ser claramente reconhecidas como tal, isto é, o formato mantém-se como o característico

da reportagem mesmo com algumas modificações como mudança da posição da foto, ausência da

legenda, entre outras, as quais constatamos com a comparação com as versões originais. As duas

reportagens que restaram são retextualizadas, o formato da apresentação social não é respeitado,

havendo nesses casos o comprometimento da capacidade de ação do aluno, pois não se lê da

mesma maneira um fragmento de romance e uma reportagem, por exemplo, cada um pertence a

uma esfera social específica.

O conteúdo temático é constitutivo do sucesso do gênero, o estudante deve apreender que

uma reportagem não relata quaisquer fatos, mas aqueles que despertarão, de algum modo, o

Page 168: Noticia e Reportagem Nos LDS

167

interesse do público a que esse texto se destina. Assim os livros didáticos que se propõem ao

ensino desse tipo de gênero de texto têm de tratar dessa questão.

Infelizmente, o tratamento da relação entre conteúdo e concretização social do gênero não

ocorre no livro 2 (PLC), sendo nessa obra nada mencionado sobre o assunto. No livro 1 (PL), o

único momento em que é ressaltada a relação entre conteúdo e público-alvo ocorre na atividade

de produção textual.

A atividade de produção de texto proposta no livro 1 permite que o aluno exercite o que

foi aprendido por meio da leitura da reportagem, das perguntas e da exposição didática

apresentada ao ensino do gênero, contribuindo para o desenvolvimento da capacidade de ação do

estudante na medida que fornece o contexto de produção:

suporte material: mural da escola;

público-alvo: estudantes;

temática proposta: assuntos atuais que permeiam o universo jovem.

Vejamos a reprodução da atividade:

Page 169: Noticia e Reportagem Nos LDS

168

Livro 1 (PL), 2005, p. 296.

Como podemos apreender, os vocábulos recente, atualmente, lançamento, do momento

presentes nos assuntos sugeridos para a produção, demonstram que a atividade está coerente com

a temática atual que permeia o gênero reportagem. Como a produção será destinada a estudantes,

os assuntos propostos condizem com os interesses de tal faixa etária. Há ainda o enfoque voltado

à busca de informações reais, verdadeiras, coletadas por meio de entrevistas, depoimentos e

Page 170: Noticia e Reportagem Nos LDS

169

pesquisas, elementos que realçam o caráter investigativo e preciso do gênero. Nas últimas

instruções é pedido que o aprendiz planeje o aspecto visual e dê um título que atraia a atenção do

leitor e anuncie o tema, marcando a função dessa estrutura textual, anunciar de modo atrativo o

assunto, considerando o destinatário. A atividade aborda também elementos referentes à

capacidade discursiva os quais trataremos na seção seguinte.

A definição da reportagem é trazida ao aluno, no livro 1, por meio das palavras de Bahia

que a caracteriza diferenciando-a da notícia. A longa citação desse estudioso da área de

comunicação apresentada no livro didático realça que “a notícia se esgota no anúncio; a

reportagem, porém, só se esgota no desdobramento, na pormenorização, no amplo relato dos

fatos” com ênfase de que a reportagem deve apurar fatos que sejam e pareçam verdadeiros

(CEREJA; MAGALHÃES, 2005, p. 295). Portanto, as palavras de Bahia permitem que o aluno

conheça as especificidades da reportagem para que possa agir ativamente por meio dela ao lê-la,

compreendê-la e produzi-la.

A seguir, reproduziremos a página que traz o texto de Bahia e as atividades de leitura

propostas à reportagem:

Page 171: Noticia e Reportagem Nos LDS

170

Livro 1 (PL), 2005, p. 295.

As perguntas da atividade 1 foram classificadas como globais, segundo a tipologia de

Marcuschi, por enfocarem o texto como um todo e prescindirem de conhecimentos textuais e

extra-textuais dos alunos. Por indagarem a respeito da intenção comunicacional do gênero e sobre

Page 172: Noticia e Reportagem Nos LDS

171

seu suporte material, pensamos que poderão contribuir com o desenvolvimento de capacidades de

ação.

A atividade 2 retoma os ensinamentos do capítulo 27 dedicado à notícia, o qual já

analisamos, e indaga se no gênero reportagem é priorizada a informação ou o comentário. Tal

atividade foi classificada como inferencial por exigir que o estudante mobilize conhecimentos,

tanto textuais quanto enciclopédicos, a fim de construir uma análise crítica para respondê-la,

atuando também como atividade motivadora do desenvolvimento da ação do aluno por meio

desse gênero de texto.

As atividades 3 e 4 enfocam a compreensão da reportagem apresentada para estudo.

Classificamos como objetivas as perguntas: 3.b, 4.a/b, por indagarem sobre conteúdos inscritos

no texto, cabendo ao aluno apenas identificá-los; as perguntas: 3.a, 4. c, como inferenciais por

exigirem análise crítica do aluno. Nessas atividades, o gênero é usado para testar a capacidade de

decodificação do estudante e também para o ensino da textualidade sem relacioná-la ao gênero

em si.

As atividades 5, 6 e 7 enfocam questões relacionadas às capacidades discursivas e

lingüístico-discursivas, assim trataremos de sua análise à frente.

No livro 2 (PLC), a única ressalva a elementos que se referem à capacidade de ação é

apresentada superficialmente no parágrafo introdutório ao capítulo de ensino do gênero

reportagem. Nele é afirmado que “a reportagem é um texto mais extenso e resulta de uma

investigação mais detalhada dos fatos”, fazendo “uma apresentação mais panorâmica e em maior

profundidade das informações”. Sobre o suporte material é dito que “ocorre nos jornais e

também, com mais freqüência, em revistas”. Vejamos tal reprodução:

Page 173: Noticia e Reportagem Nos LDS

172

Livro 2 (PLC), 2003, p. 214.

Tal obra centra-se no ensino de capacidades discursivas, em detrimento dos outros tipos de

capacidades de linguagem.

As atividades didáticas que tratam de alguma forma de operações de linguagem exigidas

para o desenvolvimento de capacidades de ação dos aprendizes em relação ao gênero reportagem

presentes nos livros analisados foram descritas no decorrer desta seção. O quadro a seguir traça o

Page 174: Noticia e Reportagem Nos LDS

173

panorama geral das operações que são abordadas nos livros de Português referentes às

capacidades de ação:

QUADRO 31. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino da

reportagem

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio

do gênero reportagem

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Capacidades de

ação

Situação de Produção (contextualização do

gênero)

Levar em conta o suporte material em que

veicula o gênero e sua forma de apresentação;

X X

Identificar e considerar o público-alvo

esperado;

K

X

Identificar e considerar o lugar e o momento

da produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida

de muitas pessoas, improváveis de acontecer,

que possivelmente despertem a curiosidade ou

que haja identificação com o público-alvo;

X

Apresentar fatos contemporâneos,

verdadeiros e precisos;

X

Ampliar relato de fato já noticiado.

O quadro ilustra as diferenças de abordagens dadas ao ensino de gêneros nos livros

didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio. Enquanto o livro 1 dedica-se ao ensino de

operações de linguagem que preparam o aluno para a contextualização do gênero, o livro 2 pouco

mobiliza tais conhecimentos.

Concluímos que a abordagem do livro 1 pode propiciar o desenvolvimento das capacidades

de linguagem referentes à ação, dos aprendizes, exigidas para o domínio da reportagem. Já o livro

2 prescinde de complementação do professor para que os alunos desenvolvam as capacidades

necessárias a contextualização da reportagem e possam assim dominá-la socialmente. Caso

contrário, o gênero em si não será ensinado tornando-se apenas suporte para o estudo de conteúdo

temático.

A próxima seção abordará a mobilização da capacidade discursiva nas atividades propostas

ao ensino da reportagem.

X

X X

X X

Page 175: Noticia e Reportagem Nos LDS

174

4.5.5 O gênero reportagem e as capacidades discursivas

A capacidade discursiva diz respeito à capacidade de mobilizar conhecimentos referentes

à escolha e à organização de tipos discursivos adequados à situação de interação, isto é, saber

organizar um texto e nele posicionar-se de acordo com o plano comunicativo, corresponde aos

conhecimentos necessários à produção e compreensão do nível mais profundo da arquitetura

interna dos textos no modelo de análise de Bronckart (infra-estrutura).

Buscamos, nesse momento, apresentar as atividades didáticas propostas que podem atuar

no desenvolvimento de capacidades discursivas dos alunos nos livros didáticos analisados. O

livro 1 (PL) traz poucas atividades que abordam tal capacidade, especificamente a atividade de

pergunta de número 8 (itens c/d) e algumas das instruções da atividade de produção de texto

(itens a/f). Vejamos a reprodução, a seguir, em que as atividades são destacadas:

Page 176: Noticia e Reportagem Nos LDS

175

Livro 1 (PL), 2005, p. 296

O item „c‟ da atividade de número 8 indaga sobre o tempo verbal e pessoa do discurso

predominantes. Essa atividade foi classificada como do tipo meta-lingüística, segundo a tipologia

de Marcuschi (2003), por enfocar aspectos formais do texto. Já o item seguinte, „d‟, foi

classificado como inferencial por exigir que o estudante associe conhecimentos lingüísticos,

contextuais e de mundo em busca de uma análise crítica para a construção das hipóteses pedidas,

pois ele deveria relacionar o tempo presente, predominante na reportagem, ao suporte material

original desse gênero, à sua função social e às intenções do autor. Entretanto, no livro do

professor, a essa pergunta é dada a indicação de que a resposta é pessoal, consideramos que por

Page 177: Noticia e Reportagem Nos LDS

176

meio dela são mobilizados conhecimentos pessoais além dos lingüísticos e contextuais, sem a

relação entre esses diferentes tipos de conhecimentos o aluno não realizará a análise crítica a que

a pergunta o expõe.

Outro momento em que as capacidades discursivas são tratadas ocorre nas instruções da

atividade de produção de reportagem. Os itens „a‟ e „f‟ abordam a forma de estruturação do texto

desse gênero, enfocando os elementos que o compõem como pesquisa de informações, coleta de

entrevistas (gênero estudado em capítulo anterior da obra), título, fotos, dados estatísticos,

tabelas, e a organização desses elementos na apresentação visual da reportagem. Assim a obra

aproxima o aluno da estrutura reconhecida socialmente desse gênero, propiciando o

desenvolvimento de capacidades discursivas exigidas para seu domínio.

O livro 2 (PLC) apresenta três textos principais seguidos pela seção Estudo do texto na

qual são realizadas perguntas sobre as reportagens. Nessa seção as atividades constituem-se em

perguntas que avaliam a capacidade de decodificação do aluno e em perguntas voltadas ao ensino

da estruturação dos parágrafos do texto. Pouco se explora as capacidades lingüístico-discursivas.

Vejamos a reprodução das atividades propostas à primeira reportagem a qual inicia o

capítulo de ensino desse gênero:

Page 178: Noticia e Reportagem Nos LDS

177

Page 179: Noticia e Reportagem Nos LDS

178

Livro 2 (PLC), 2003, p. 216-217.

Como podemos apreender, a atividade 1 centra-se na decodificação de informações

inscritas na reportagem, sendo classificadas como objetivas, com a exceção do item „d‟ que é do

tipo cópia, conforme a tipologização elaborada por Marcuschi (2003). Assim nela há a ausência

de um trabalho voltado ao desenvolvimento de capacidades de linguagem.

Page 180: Noticia e Reportagem Nos LDS

179

A atividade 2 pede que o aluno verifique se a reportagem apresentada “tem as

qualidades de um bom texto informativo”, entretanto tais qualidades não foram ensinadas no

capítulo. Os itens „c‟ e „d‟ enfocam capacidades lingüístico-discursivas, porém as discutiremos a

seguir.

A atividade 3 trata de elementos estruturais do texto remetendo-se ao desenvolvimento de

capacidades discursivas, contudo organiza-se de modo confuso, pois seus itens (a/b/c/d) não

trazem indagações como nos outros exercícios, mas sim a apresentação da análise que o autor faz

do planejamento do texto. Somente o item „f‟ é voltado ao aluno, sendo trabalhado nele a coesão

do texto, correspondendo à capacidade lingüístico-discursiva a qual trataremos na seção seguinte

deste trabalho.

Outro momento em que se trabalha um pouco das operações de linguagem implicadas no

desenvolvimento de capacidades discursivas, ocorre no Estudo do texto proposto à segunda

reportagem apresentada no livro 2, cuja reprodução consta a seguir:

Page 181: Noticia e Reportagem Nos LDS

180

Livro 2 (PLC), 2003, p. 220.

Page 182: Noticia e Reportagem Nos LDS

181

Como a reprodução nos mostra, a atividade 1, constituída de indagações objetivas, centra-

se na decodificação de informações sobre o conteúdo temático da reportagem apresentada. Já a

atividade 2 enfoca a organização textual do gênero, com exceção do item „a‟ que trata ainda do

conteúdo.

O terceiro texto apresentado no livro 2 trata-se de uma reportagem acompanhada por um

infográfico. No parágrafo introdutório à seção do livro, explica-se a função do infográfico e sua

relação com o gênero. Vejamos a reprodução:

Page 183: Noticia e Reportagem Nos LDS

182

Livro 2 (PLC), 2003, p. 222.

Podemos constatar que ao tratar da relação entre a reportagem e seu complemento, bem

como a função do infográfico, o livro propicia o desenvolvimento da capacidade discursiva do

estudante uma vez que permite a ele o contato com o gênero na forma de sua circulação social,

preparando-o para ler e produzir esse gênero.

O quadro, a seguir, sinaliza as operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de

capacidades discursivas trabalhadas, de algum modo, nos livros analisados.

QUADRO 32. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no ensino da

reportagem

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero reportagem

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Capacidades

discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero

(título, lide e corpo de texto) ou suas possibilidades

de estruturação;

Compreender que a estruturação da reportagem é menos rígida do que a da notícia;

Compreender a função de cada elemento

estrutural;

X X

Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos,

quadros, fotos e legendas;

X X

Reconhecer e empregar o tipo de discurso

característico do gênero: discurso narração;

Selecionar previamente eventos; X X

Conhecer e empregar planificação script ou relato.

O quadro nos mostra que ambos os livros trabalharam as mesmas operações de

linguagem, tais como:

a função de elementos estruturais como o título;

a organização dos parágrafos e dos fatos narrados;

a função dos elementos que acompanham o gênero.

Page 184: Noticia e Reportagem Nos LDS

183

Entretanto um dos elementos essenciais da infra-estrutura da reportagem é o tipo de

discurso narração, o qual não é mencionado em nenhum dos livros. Não há como o aluno

dominar um gênero sem saber reconhecer e empregar seu tipo de discurso característico. Os

elementos estruturais da reportagem como título, lide e corpo de texto, bem como suas

possibilidades de modificações e diferenciação da notícia, não são trabalhados nem retomados,

uma vez que tal estudo (do título, lide e copo de texto) ocorre nos capítulos dedicados à notícia

nos livros analisados, mas como essas obras, segundo seus manuais do professor e na resenha

presente no catálogo do PNLEM/2009, constituem-se de capítulos independentes seria

fundamental ocorrer a retomada dos elementos que constituem o gênero, porém não ocorre.

Concluímos que as propostas apresentadas à reportagem pouco trabalham as tarefas de

linguagem ou operações exigidas ao domínio desse gênero, conseqüentemente, propiciando

pouco desenvolvimento da capacidade discursiva do aluno de Ensino Médio. As atividades

didáticas que analisamos demonstram uma abordagem superficial quanto à organização do texto

desse gênero, fato que pode dificultar ao estudante o modo de posicionar-se nas interações sociais

por meio desse gênero e mesmo organizá-lo em circunstâncias de produção.

A seguir, discutiremos as atividades didáticas voltadas ao desenvolvimento de

capacidades lingüístico-discursivas.

4.5.6 O gênero reportagem e as capacidades lingüístico-discursivas

A capacidade lingüístico-discursiva refere-se ao domínio de unidades lingüísticas, ou seja,

saber empregar mecanismos de textualização (conexão e coesão), vozes sociais ou individuais

(polifonia) e modalização de acordo com a circunstância de comunicação, correspondendo aos

conhecimentos mobilizados à elaboração dos níveis intermediário e superficial dos textos no

modelo de Bronckart (2008).

Tais níveis de texto elaborados por Bronckart são pouco trabalhados no ensino da

reportagem proposto nos livros didáticos de Português de Ensino Médio indicados pelo

PNLEM/2009. As obras por vezes chegam a tratar de citações e do emprego das aspas nos textos

em questão, mas sem relacionar seu uso aos efeitos de sentido que propiciam no gênero como

veracidade, credibilidade ao indicar a transcrição fidedigna das falas.

Page 185: Noticia e Reportagem Nos LDS

184

O livro1 (PL) aborda as marcas modais presentes na reportagem em uma de suas

atividades:

Livro 1 (PL), 2005, p. 295.

Nela é pedido que os alunos identifiquem momentos da reportagem em que se apreende a

opinião, julgamento ou avaliação do autor, constituindo-se como atividades do tipo cópia, pois o

estudante deve copiar tais passagens do texto.

Há atividades que enfocam as características da linguagem da reportagem e os elementos

coesivos empregados nesses textos. Ressaltamos que o estudo desses elementos se dão por meio

das atividades propostas, não havendo sistematizações sobre tais assuntos. Vejamos a reprodução

a seguir:

Livro 2 (PLC), 2003, p. 221.

Page 186: Noticia e Reportagem Nos LDS

185

Essa atividade extraída do livro 2, classificada como do tipo meta-linguística, demonstra

como ocorre o trabalho com operações de linguagem com elementos coesivos, implicando no

desenvolvimento das capacidades lingüístico-discursivas do aluno.

Vejamos a reprodução das atividades do livro 1 (PL) as quais poderão implicar também no

desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas:

Livro 1 (PL), 2005, p. 295.

Como podemos notar, a atividade 5 aborda a forma das citações no gênero reportagem. Seu

item „a‟ configura-se como uma indagação objetiva, o „b‟ como do tipo meta-lingüística, o „c‟

como impossível, o qual já foi discutido anteriormente, e „d‟ do tipo global. O emprego de

citações é somente tratado por meio dessa atividade e da seguinte nessa obra:

Livro 1 (PL), 2005, p. 295.

A atividade reproduzida aborda os “vários textos” constitutivos da reportagem e a forma de

apresentação das citações. Essa atividade foi classificada como do tipo meta-lingüísticas,

conforme a classificação de Marcuschi (2003). Tanto a atividade de número 5, quanto a de 7 não

aprofundam na construção do conhecimento sobre a função da citação, sua forma de apresentação

e seu efeito de sentido. Assim, pensamos que o trabalho realizado com tal operação de linguagem

é insuficiente para domínio do emprego de tal recurso lingüístico.

A seguir, reproduziremos a continuidade dessas atividades:

Page 187: Noticia e Reportagem Nos LDS

186

Livro 1 (PL), 2005, p. 296.

A atividade 8 do livro 1, apresentada anteriormente, trata da linguagem da reportagem, com

a exceção dos itens „c‟ e „d‟ que já foram discutidos em outro momento, bem como parte do

quadro Avalie sua reportagem e o item „d‟ da atividade de produção de texto. Já o item „c‟ da

produção de reportagem menciona as conexões que ocorrem entre os elementos do gênero. Tais

Page 188: Noticia e Reportagem Nos LDS

187

atividades enfocaram operações de linguagem relacionadas ao desenvolvimento de capacidades

lingüístico-discursivas do estudante.

A atividade 9, do mesmo livro, é caracterizada como inferencial por mobilizar

conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais e pessoais na análise crítica do gênero para a

construção da resposta, isto é, para a construção das características da reportagem pelo aluno. Por

meio dela, avalia-se o que o estudante aprendeu sobre o gênero reportagem no decorrer das

atividades propostas. Assim essa tarefa contribui para o desenvolvimento das três modalidades de

capacidades de linguagem – ação, discursiva, lingüístico-discursiva – de modo a preparar o

aprendiz para ler, interpretar e produzir o gênero em questão.

Passaremos as atividades do livro 2 (PLC). Vejamos a reprodução da página que traz

atividades relacionadas a capacidades lingüístico-discursivas:

Page 189: Noticia e Reportagem Nos LDS

188

Livro 2 (PLC), 2003, p. 217.

A atividade de número 2 aborda as qualidades do texto informativo sem tê-las ensinado

no capítulo, sendo algumas das tarefas propostas impossíveis devido a falta do embasamento

teórico-didático fornecido ao aluno, assim as respostas dadas as indagações „b‟, „d‟ e „e‟ poderão

ficar no campo da opinião. Os itens „c‟ e „d‟ tratam das marcas modais e do efeito de

credibilidade do texto respectivamente. Enquanto o „e‟ pede que o aluno avalie se a reportagem

proposta ao estudo constitui-se como um bom texto informativo, sem ter explicitado as

características de tal texto no capítulo, assim como não explicita de que se trata a credibilidade e

Page 190: Noticia e Reportagem Nos LDS

189

sua função. Portanto classificamos as indagações „d‟ e „e‟ desse exercício como impossíveis

também.

A atividade 3, a qual já tratamos de elementos relacionados a capacidade discursiva em

outro momento, traz no item „d‟ o enfoque à coesão textual do gênero reportagem, elemento

retomado também nas outras reportagens presentes no capítulo.

O próximo quadro destaca as operações de linguagem relativas à capacidade lingüístico-

discursiva trabalhadas nos livros de Ensino Médio analisados.

QUADRO 33. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem abordadas no

ensino da reportagem

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero reportagem

Livro 1 (PL)

Livro 2 (PLC)

Capacidades

lingüístico-discursivas

Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos

e seus efeitos de sentido

Empregar a modalidade da língua característica do

gênero: modalidade padrão;

X

X

Selecionar adequadamente o léxico;

Manter coerência e coesão; X X

Empregar organizadores temporais e espaciais

adequadamente;

Identificar o papel argumentativo de certos conectivos (já que, se, por outro lado, etc);

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e

veracidade, tais como: a atribuição das informações

às fontes, o emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas;

X X

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice

de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva

(sintética ou analítica) para apagar as marcas do

autor;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para

exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou

expressões qualificativas para se apagar as marcas

modais (avaliações, julgamentos, etc.);

X X

Identificar e empregar vozes implícitas.

Concluímos que algumas das operações de linguagem relacionadas ao desenvolvimento

de capacidades lingüístico-discursivas do aluno são abordadas superficialmente nos livros

didáticos de Português analisados. Por exemplo, em um dos livros dedica-se uma única indagação

Page 191: Noticia e Reportagem Nos LDS

190

ao uso das aspas no gênero reportagem sem aprofundar nos efeitos de sentido e em sua função.

Pensamos que a ausência de explicitação e sistematização dos mecanismos lingüísticos e

enunciativos socialmente empregados no gênero e de seus efeitos de sentidos compromete o

desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas e assim o ensino do gênero reportagem.

4.5.7 Capacidades de linguagem e o ensino da reportagem

De acordo com a análise das atividades didáticas propostas ao ensino do texto do gênero

reportagem apresentadas nos livros de Português de Ensino Médio, concluímos que os livros

passam por alguns dos elementos característicos desse gênero sem se aprofundar em nenhum

deles. Portanto das capacidades de linguagem implicadas no domínio de gêneros na escola, as

quais são capacidade de ação, discursiva e lingüístico-discursiva, a que é, de modo geral,

enfatizada é a capacidade de ação, isto é, os livros enfatizam o trabalho com operações de

linguagem que contribuirão para que o aluno compreenda a função social desse gênero de texto e

apreenda que seu contexto de produção atua na construção de seus sentidos, pouco se

empenhando no trabalho com operações relativas às outras capacidades de linguagem.

O quadro, a seguir, traça o panorama geral das operações de linguagem trabalhadas nos

livros analisados e as respectivas capacidades de linguagem que poderão ser desenvolvidas do

aluno.

Page 192: Noticia e Reportagem Nos LDS

191

QUADRO 34. Gênero reportagem: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros didáticos de

Português de Ensino Médio analisados

Capacidades de

linguagem

Operações de linguagem exigidas ao domínio do

gênero reportagem

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Capacidades de

ação

Situação de Produção (contextualização do gênero)

Levar em conta o suporte material em que veicula o gênero e seu formato de apresentação;

X X

Identificar e considerar o público-alvo esperado; K

X

Identificar e considerar o lugar e o momento da produção;

Precisar a intenção da produção.

Conteúdo Temático

Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de muitas pessoas, improváveis de acontecer, que possivelmente despertem a

curiosidade ou que haja identificação com o público-alvo;

X

Apresentar fatos contemporâneos, verdadeiros e precisos; X

Ampliar relato de fato já noticiado.

Capacidades

discursivas

Apresentação e organização global do gênero

Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto) ou suas possibilidades de estruturação;

Compreender que a estruturação da reportagem é menos rígida do que a da notícia;

Compreender a função de cada elemento estrutural; X X

Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos, quadros, fotos

e legendas; X X

Reconhecer e empregar o tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;

Selecionar previamente eventos; X X

Conhecer e empregar planificação script ou relato.

Capacidades

lingüístico-

discursivas

Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e seus efeitos de

sentido

Empregar a modalidade da língua característica do gênero:

modalidade padrão;

X X

Selecionar adequadamente o léxico;

Manter coerência e coesão; X X

Empregar organizadores temporais e espaciais adequadamente;

Identificar o papel argumentativo de certos conectivos (já que, se,

por outro lado, etc);

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o

efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a atribuição das informações às fontes, o emprego de aspas para

indicar a transcrição fidedigna das falas;

X X

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o

efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se

(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva

(sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor;

Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a

ausência de adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as

marcas modais (avaliações, julgamentos, etc.);

X X

Identificar e empregar vozes implícitas.

X

X X

X X

Page 193: Noticia e Reportagem Nos LDS

192

Das 23 operações de linguagem a que chegamos com a elaboração de nosso modelo

didático do gênero reportagem, 57% delas são, de alguma forma, trabalhadas no livro 1 (PL) e

43% das operações no livro 2 (PLC). Constatamos que há uma tendência entre esses dois livros

em abordar as mesmas características do gênero como: o suporte material em que a reportagem

veicula, as intenções de produção, apresentá-la como uma ampliação da notícia, a função do

título e dos acompanhantes da reportagem (gráficos, quadros, fotos com legendas), a seleção dos

eventos a serem relatados, a modalidade adequada da linguagem, os mecanismos de manutenção

da coerência e coesão do texto, o emprego e função das citações e a identificação das marcas

modais e seus efeitos de sentido.

As operações de linguagem que não foram tratadas em nenhuma das obras referem-se:

à identificação do lugar e momento de produção do gênero (abordado em apenas uma das

obras no ensino do gênero notícia);

ao emprego da estruturação geral da reportagem (elemento estudado na notícia);

à compreensão de que a reportagem trata-se de um gênero de estruturação menos rígida

do que a notícia (característica apenas da reportagem);

ao emprego do discurso narração e da planificação script (elementos sob os quais

também se silenciou no ensino da notícia);

à seleção do léxico (abordada no trabalho com a notícia);

ao emprego de organizadores temporais e espaciais (como na notícia);

à função argumentativa se alguns conectivos que podem ser usados nesse gênero

(característica mais característica da reportagem);

aos recursos lingüísticos usados para se apagar as marcas de subjetividade como o

emprego de voz passiva ou 3ª pessoa do discurso entre outros (recurso também silenciado

no ensino da notícia);

à ausência de qualificações para se apagar as marcas modais (elemento estudado no

ensino da notícia);

à identificação das vozes implícitas presentes no texto (elemento que não foi abordado na

notícia).

Tais operações de linguagem que não foram trabalhadas correspondem a 46% do total,

sendo 56% (5 operações) relacionadas à capacidades lingüístico-discursiva, 36% (4 operações) à

capacidade discursiva e 9% (1 operação) à capacidade de ação. Assim, como no gênero notícia, a

Page 194: Noticia e Reportagem Nos LDS

193

capacidade privilegiada nos livros analisados é a referente à ação, enquanto a que é pouco

mobilizada é a capacidade lingüístico-discursiva, relacionada aos mecanismos lingüísticos e

enunciativos e seus efeitos de sentido.

O quadro, a seguir, traz a porcentagem de cada uma das capacidades de linguagem

enfocadas nos livros de Língua Portuguesa de Ensino Médio analisados:

QUADRO 35. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada

no ensino do gênero reportagem

Livros/

Capacidades de linguagem

Livro 1

(PL)

Livro 2

(PLC)

Capacidades de ação 86% 43%

Capacidades discursivas 43% 43%

Capacidades lingüístico-discursivas 44% 44%

Como o quadro sinaliza, o livro 1 enfatiza o estudo de elementos relacionados à condição

de produção do gênero, como no ensino da notícia, em detrimento dos aspectos vinculados à

organização da reportagem e a seus mecanismos lingüísticos e enunciativos, correspondendo

respectivamente às capacidades discursivas e lingüístico-discursivas. Já o livro 2 trabalha por

volta de 43% de cada capacidade, pouco mobilizando-as.

As operações de linguagem trabalhadas no ensino do gênero notícia e reportagem são

praticamente as mesmas, com a exceção dos elementos estruturais (título, lide, corpo de texto)

que não são retomadas na segunda. Por tratar-se de gêneros semelhantes, os livros poderiam

aprofundar em alguns aspectos no ensino da reportagem, já que esse gênero é uma ampliação do

outro, entretanto não ocorre um aprofundamento, mas sim uma sumária retomada de elementos

antes trabalhados.

Na comparação entre as atividades propostas ao ensino da notícia e da reportagem nos

livros didáticos analisados, constatamos que a abordagem direcionada ao gênero notícia atua de

modo mais profundo no ensino das operações de linguagem relacionadas ao domínio desse

gênero. Contudo ambas as abordagens dadas por esses livros são insuficientes ao domínio tanto

da notícia quanto da reportagem, pois pouco se mobilizam as capacidades de linguagem

Page 195: Noticia e Reportagem Nos LDS

194

necessárias para a leitura, interpretação e produção, se necessário, desses gêneros com os quais o

aluno se depara socialmente.

Ao que parece, a concepção de linguagem que permeia as propostas de ensino de gêneros

textuais dos livros analisados distanciam-se da concepção que a vê como processo de construção

de sentidos que se dá por meio da interação, uma vez que os livros se limitam a dar informações

sobre os gêneros, cabendo ao aluno recebê-las passivamente, isto é, as propostas não propiciam

ao aluno a construção dos sentidos, conseqüentemente, não o levam a agir por meio deles.

Os quatro livros de Ensino Médio de Língua Portuguesa analisados constituem-se nas

únicas obras indicadas pelo PNLEM/2009 que trabalham com o ensino da notícia e/ou

reportagem, no entanto as atividades propostas pouco mobilizam as operações de linguagem

implicadas no desenvolvimento de capacidades de linguagem do estudante, não o levando a

dominá-los.

Page 196: Noticia e Reportagem Nos LDS

195

Capítulo 5

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho dedicou-se à análise das atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e

reportagem e suas implicações para o desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno em

livros didáticos de Língua Portuguesa voltados à última etapa da educação básica brasileira – o

Ensino Médio – indicados pelo PNLEM/2009. Neste capítulo apresentaremos as conclusões a

que chegamos com a realização da pesquisa. Para tanto, retomaremos as perguntas que buscamos

responder e apresentaremos as constatações decorrentes da análise, para então refletirmos em

torno das possíveis contribuições deste trabalho.

5.1 Respostas às perguntas da pesquisa

Este trabalho analisou quatro livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio

indicados pelo PNLEM de 2005 e de 2009. Portanto esses livros, possivelmente, já estão

presentes nas salas de aulas brasileiras e, assim, permanecerão durante os anos de 2009, 2010 e

2011, período de duração do PNLEM/2009. Tais obras foram selecionadas por serem as únicas a

dedicarem-se ao ensino dos gêneros notícia e/ ou reportagem, objetos de análise desse trabalho.

Ao analisarmos como se organizam os livros de Ensino Médio atuais, como forma de

contextualizar os capítulos a quais analisaríamos a fundo, constatamos que nessas obras o ensino

é estruturado de modo fragmentado, isto é, os capítulos dividem-se em três eixos principais: o

trabalho com a literatura, com elementos lingüísticos e com textos, seja enfatizando a leitura e/ou

a produção. Embora as teorias de ensino de língua materna, que fundamentam os PCN, sejam

voltadas a um ensino articulado entre literatura, reflexão lingüística, leitura e produção, isso ainda

não ocorre nesses livros didáticos atuais.

Quanto à estruturação interna dos capítulos, observamos que é organizada de modo

tradicional: texto, atividades de estudo e de produção de texto e ensino de tópicos gramaticais.

Desse modo, mudam-se as teorias de ensino de língua e os autores de livros didáticos as adaptam

Page 197: Noticia e Reportagem Nos LDS

196

ao modelo já cristalizado, sendo abordados os gêneros das mais distintas esferas sociais da

mesma maneira, não se aproveitando as especificidades de cada gênero para se inovar o modo de

ensino.

Ao verificarmos quais são os gêneros textuais selecionados como objetos de ensino nessa

etapa da educação, constatamos que há uma tendência a se trabalhar com certos gêneros como:

conto, poema, texto teatral, romance, notícia, entrevista e anúncio publicitário, os quais são

enfatizados nas obras analisadas. Os gêneros midiáticos foram os que mais veicularam os

capítulos destinados ao ensino de gêneros nos livros, seguidos pelos gêneros já cristalizados no

ensino de língua, correspondentes à esfera literária.

Esta inclusão dos gêneros da mídia nos livros didáticos que se opera na atualidade é

conseqüência das prescrições oficiais da educação brasileira que permeiam o PNLEM, uma vez

que os livros buscam ser bem avaliados nesse programa para que sejam selecionados pelos

professores e adquiridos pelo governo. Assim, na produção desses recursos usados na sala de aula

imperam aspectos mercadológicos que também contribuem em sua constituição, os quais não

devem ser ignorados.

Um dos livros analisados, livro 4 (PEC), destacou-se na análise por tratar do ensino de

gêneros pouco comuns em livros didáticos como: projeto de pesquisa, referência bibliográfica,

memorando, entre outros. Tal obra apresenta recursos gráficos atraentes, várias imagens,

variedade de gêneros textuais, distanciando-se da forma tradicional de organização de livros

didáticos em que se trabalha o texto, as atividades de leitura e de produção, e elementos

lingüísticos. Nela os módulos não apresentam uma estruturação pré-estabelecida, variando na

abordagem conforme o conteúdo estudado, sempre buscando apontar a relação com outras áreas

do conhecimento, tendo, assim, uma proposta pedagógica voltada à interdisciplinaridade. Um

livro didático como esse demonstra que as mudanças teórico-metodológicas no campo da

Lingüística aos poucos vão sendo assimiladas e refletidas nesses instrumentos de ensino.

Na análise de quais são as atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e

reportagem e quais são suas implicações, concluímos que as atividades propostas para o ensino

desses gêneros são de dois tipos: atividades de leitura e atividades de produção de texto.

Constatamos que grande parte das atividades didáticas, tanto de leitura quanto de produção,

presentes nos capítulos de ensino de reportagem, centram-se na localização de informações

referentes ao conteúdo temático do texto, não focando o gênero em si, mas servindo como

Page 198: Noticia e Reportagem Nos LDS

197

suporte para o estudo de conteúdo temático. Dessa maneira, o gênero reportagem é depositário de

conteúdos sob os quais se avalia a capacidade de decodificação e compreensão do aluno.

Quanto ao gênero notícia, destaca-se a ocorrência de questões que mobilizam

conhecimentos mais sofisticados relacionadas à produção de inferências como: analisar,

comparar, refletir sobre determinados aspectos na busca da construção de respostas, mobilizando

conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais, extra-textuais. Embora as perguntas voltadas à

identificação de conteúdos inscritos nos textos também apareçam, configuram-se como minoria.

Os tipos de atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem já sinaliza o

enfoque que é dado nos livros, uma vez que o trabalho com atividades didáticas inferenciais, as

quais predominam no ensino da notícia, poderão contribuir para o desenvolvimento de

capacidades de linguagem do aluno para o domínio dos gêneros em questão. Entretanto já as

atividades predominantes no ensino da reportagem não enfocam o gênero, pelo contrário, ele é

usado como pretexto para o ensino de outros elementos.

A fim de traçarmos quais são as operações de linguagem que devem ser mobilizadas para

o domínio dos gêneros notícia e reportagem e as respectivas capacidades de linguagem nelas

mobilizadas, as quais foram apresentadas e discutidas no capítulo 2, fez-se necessário

levantarmos suas dimensões ensináveis (o que um determinado texto deve apresentar para ser

reconhecido como tal) e relacioná-las às capacidades de linguagem que devem ser trabalhadas

para seu domínio, isto é, levantarmos quais dimensões ensináveis de cada um desses gêneros

correspondem à capacidade de ação, à capacidade discursiva e à capacidade lingüístico-

discursiva, para então analisarmos quais capacidades de linguagem estão sendo desenvolvidas

nas atividades propostas nos livros didáticos de Português de Ensino Médio.

Tendo como base diversas obras visitadas e assumindo a perspectiva de algumas delas,

construímos um modelo didático para o ensino de textos do gênero notícia e reportagem tal qual é

proposto por Schneuwly e Dolz (2004).

Em suma, foram levantadas as características referentes:

a) à situação de produção dos gêneros;

b) ao conteúdo esperado ou dizível aos gêneros;

c) à organização global dos gêneros;

d) aos mecanismos lingüísticos empregados nos gêneros e seus efeitos de sentido;

e) à manutenção de coesão e coerência dos gêneros;

Page 199: Noticia e Reportagem Nos LDS

198

f) às vozes implícitas e explícitas presentes nos gêneros e a forma de introduzi-las;

g) às marcas modais presentes nos gêneros.

A partir delas, traçamos as operações de linguagem, que se constituem em tarefas a serem

aprendidas, implicadas no desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno para o

domínio desses gêneros.

a) Capacidades e operações de linguagem implicadas no ensino do gênero notícia

As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades de ação do

aluno são as relacionadas:

ao suporte material em que veicula o gênero e seu formato de circulação social;

à identificação e consideração com o público-alvo esperado, o lugar e o momento da

produção;

à intenção da produção;

à seleção de fatos que afetarão a vida de muitas pessoas, inéditos, improváveis de

acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja identificação com o

público-alvo;

à apresentação de fatos atuais, verdadeiros e precisos.

As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades discursivas do

aluno são as relacionadas:

ao emprego da estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto);

à função de cada elemento estrutural;

ao tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;

à seleção prévia de eventos;

ao emprego da planificação script ou relato.

Já as operações implicadas no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do

aluno são as relacionadas:

à modalidade da língua característica do gênero: modalidade padrão;

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199

à seleção adequada do léxico;

à manutenção da coerência e da coesão;

ao emprego de organizadores temporais e espaciais adequadamente;

ao reconhecimento e emprego de recursos lingüísticos para exprimir o efeito de

objetividade, imparcialidade e veracidade (a atribuição das informações às fontes, o

emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de indeterminação do sujeito) ou o uso

da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor; e a ausência de

adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as marcas modais (avaliações,

julgamentos, etc.));

ao emprego de vozes implícitas.

b) Capacidades e operações de linguagem implicadas no ensino do gênero reportagem

As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades de ação do

aluno são as relacionadas:

ao suporte material em que veicula o gênero e seu formato de circulação social;

à identificação e à consideração com o público-alvo esperado, o lugar e o momento da

produção;

à intenção da produção;

à seleção de fatos que afetarão a vida de muitas pessoas, inéditos, improváveis de

acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja identificação com o

público-alvo;

à apresentação de fatos contemporâneos, verdadeiros e precisos;

à ampliação de fato já noticiado.

As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades discursivas do

aluno são as relacionadas:

ao emprego da estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto) ou suas

possibilidades de estruturação;

Page 201: Noticia e Reportagem Nos LDS

200

à compreensão que a estrutura da reportagem é menos rígida do que a da notícia;

ao reconhecimento de acompanhantes do gênero: gráficos, quadros, fotos e legendas;

à função de cada elemento estrutural;

ao tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;

à seleção prévia de eventos;

ao emprego da planificação script ou relato.

As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades lingüístico-

discursivas do aluno são as relacionadas:

à modalidade da língua característica do gênero: modalidade padrão;

à seleção adequada do léxico;

à manutenção da coerência e da coesão;

à identificação do papel argumentativo de certos conectivos (já que, se, por outro lado,

etc);

ao emprego de organizadores temporais e espaciais adequadamente;

ao reconhecimento e emprego de recursos lingüísticos para exprimir o efeito de

objetividade, imparcialidade e veracidade (a atribuição das informações às fontes, o

emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do

discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de indeterminação do sujeito) ou o uso

da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor; e a ausência de

adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as marcas modais (avaliações,

julgamentos, etc.));

à identificação de marcas modais (avaliações, julgamentos, etc.);

ao emprego de vozes implícitas.

O levantamento de tais operações de linguagem e as respectivas capacidades de linguagem

mobilizadas por meio delas, ou seja, a elaboração de modelos didáticos para cada um dos gêneros

foi de fundamental importância para a análise das atividades propostas nos livros analisados.

Com base nos modelos didáticos descritos, constatamos, por meio da análise dos capítulos

ou módulos dedicados ao ensino dos gêneros notícia e reportagem, que há a tendência à

Page 202: Noticia e Reportagem Nos LDS

201

abordagem de certas características em detrimento a outras, processo necessário para que o

gênero social torne-se um gênero a ser ensinado e aprendido, ou seja, para que ocorra sua

didatização o gênero passa por um processo de simplificação em que algumas de suas

características são silenciadas (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004).

As seguintes operações de linguagem não foram trabalhadas em nenhum dos livros, elas

referem-se:

à compreensão de que a reportagem trata-se de um gênero de estruturação menos rígida

do que a notícia (capacidade discursiva);

ao emprego do discurso narração e da planificação script (capacidade discursiva);

ao emprego de organizadores temporais e espaciais (capacidade lingüístico- discursiva);

à função argumentativa se alguns conectivos que podem ser usados no gênero reportagem

(capacidade lingüístico- discursiva);

aos recursos lingüísticos usados para se apagar as marcas de subjetividade como o

emprego de voz passiva ou 3ª pessoa do discurso, entre outros (capacidade lingüístico-

discursiva);

à identificação das vozes implícitas presentes no texto (capacidade lingüístico-

discursiva).

Tais operações de linguagem que não foram trabalhadas relacionam-se à capacidade

lingüístico-discursiva e à capacidade discursiva. Assim, a capacidade privilegiada nos livros

analisados é a referente à ação, enquanto a que é pouco mobilizada é a capacidade discursiva e

lingüístico-discursiva, relacionadas à organização textual e aos mecanismos de textualização e

enunciativos e seus efeitos de sentido, correspondendo aos níveis de análise do modelo de

Bronckart (2003; 2008).

Ressaltamos que o ensino de elementos lingüísticos, quando ocorre, é desarticulado do

ensino do gênero textual, perdendo-se a oportunidade de se trabalhar as capacidades lingüístico-

discursivas do estudante nos livros analisados. Por exemplo, no livro 2, ocorre o ensino de

gramática descritiva, em que é abordado o verbo haver, a crase, o aposto e alguns tipos de

sentenças complexas, recorrendo às frases das reportagens em estudo apenas para

exemplificação, sem qualquer relação com o gênero. Portanto perdeu-se a oportunidade de se

trabalhar mecanismos lingüísticos e seus efeitos de sentidos oferecidos pela língua característicos

da concretização dos textos de gênero reportagem como:

Page 203: Noticia e Reportagem Nos LDS

202

os organizadores espaciais e temporais (advérbios e locuções adverbiais) freqüentemente

empregados para localizar precisamente os fatos narrados;

o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de

indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as

marcas do autor e exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade;

o emprego das aspas para introduzir vozes no texto usado para exprimir o efeito de

veracidade e propiciar credibilidade à reportagem.

De forma geral, o ensino proposto à notícia nos livros 1 (PL) e 4 (PEC) enfatiza o trabalho

com a capacidade de ação do aluno, já nos livros 2 (PLC) e 3 (LP) enfoca mais as capacidades

discursivas. Desta forma, o ensino está voltado à contextualização desse gênero em relação à sua

organização textual.

Entretanto, ao não se ensinar os efeitos de sentido dos mecanismos lingüístico e

enunciativos empregados nesse gênero referentes à capacidade lingüístico-discursiva,

conseqüentemente, não se prepara o aluno de Ensino Médio para dominar a notícia, pois, para

tanto, não basta contextualizá-la e conhecer sua organização textual, mas há de se compreender

os efeitos de sentido nela implicados. Caso contrário, o aluno não dominará os conhecimentos

necessários para agir e se posicionar por meio desse gênero textual.

Em suma, com a análise das atividades didáticas propostas ao ensino do texto do gênero

reportagem apresentadas nos livros de Português de Ensino Médio, concluímos que os livros

passam por alguns dos elementos característicos desse gênero sem se aprofundar em nenhum

deles. Portanto das capacidades de linguagem implicadas no domínio de gêneros na escola, as

quais são capacidade de ação, discursiva e lingüístico-discursiva, a que é, de modo geral,

enfatizada é a capacidade de ação, isto é, os livros enfatizam o trabalho com operações de

linguagem que contribuirão para que o aluno compreenda a função social desse gênero de texto e

apreenda que seu contexto de produção atua na construção de seus sentidos. Porém, para se

dominar a reportagem, é necessário mais do que contextualizá-la, é preciso saber empregar e

identificar as formas de sua estruturação e a respectiva função de cada um de seus elementos,

além dos mecanismos lingüísticos e enunciativos nela usados. Se assim não for feito, não será

possível a construção de uma leitura crítica desse texto com o qual o aluno depara-se

socialmente.

Page 204: Noticia e Reportagem Nos LDS

203

As operações de linguagem trabalhadas no ensino do gênero notícia e reportagem são

praticamente as mesmas, com a exceção dos elementos estruturais (título, lide, corpo de texto)

que não são retomadas na segunda. Por tratar-se de gêneros semelhantes, os livros poderiam

aprofundar em alguns aspectos no ensino da reportagem, já que esse gênero é uma ampliação do

outro. Portanto não ocorre um aprofundamento, mas sim uma sumária retomada de elementos

antes trabalhados.

Na comparação entre as atividades propostas ao ensino da notícia e da reportagem nos

livros didáticos analisados, constatamos que a abordagem direcionada ao gênero notícia atua de

modo mais profundo no ensino das operações de linguagem relacionadas ao domínio desse

gênero. Contudo, ambas as abordagens dadas por esses livros são insuficientes ao domínio tanto

da notícia quanto da reportagem, pois pouco se mobilizam as capacidades de linguagem

necessárias para a leitura, interpretação e produção, se necessário.

5.2 Reflexões em torno do ensino de gêneros textuais e o desenvolvimento de

capacidades de linguagem em livros didáticos de Ensino Médio

Com a análise de alguns dos livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio que

realizamos neste trabalho, constatamos que os livros estão pouco a pouco incorporando as

propostas atuais de ensino de língua materna a seu modelo já cristalizado, ora se aproximando

das teorias acadêmicas, ora delas se distanciando, especificamente, quanto ao ensino de gêneros

textuais.

Pensamos que há de se rever as formas de apresentação e abordagem desses gêneros sociais

no cenário escolar, de modo que se ensinem as operações de linguagem que contribuirão para o

desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno, as quais possivelmente poderão ser

transferidas para gêneros semelhantes dentro e fora da escola, ao invés de apenas veicular tais

gêneros, devido às prescrições oficiais (LDB, PCN, PCN+, PNLEM), e abordá-los como melhor

convier, trazendo-os com a finalidade de cumprir requisitos valorizados no âmbito educacional,

mas sem de fato aplicar as formas efetivas de seu ensino.

Assim, este trabalho pode atuar para uma compreensão mais ampla de fatores complexos

que permeiam os livros didáticos atuais, pois se destacou na análise que tais obras são

Page 205: Noticia e Reportagem Nos LDS

204

comprometidas com os documentos oficiais da educação e com as avaliações que o governo, via

PNLD e PNLEM, delas fizer.

Os livros didáticos são comprometidos também com a apropriação de novas teorias de

ensino que seus autores realizam ou não, além do compromisso com o modelo já cristalizado de

livro didático, possivelmente para aproximar-se de um público (professores, coordenadores

pedagógicos, diretores, alunos, pais, entre outros) que valoriza aspectos mais tradicionais, ao

mesmo tempo, buscando manter o compromisso com a inovação – elemento valorizado na

sociedade contemporânea – para aproximar-se de um público adepto a inovações no ensino. São

comprometidos, ainda, com fatores mercadológicos, já que são mercadorias que precisam ser

consumidas, isto é, adotadas por professores, devendo atender às necessidades por eles julgadas.

Desta maneira, os livros didáticos são comprometidos com fatores de diferentes ordens, os

quais atuam em sua constituição. Ao que parece, o livro didático atual tenta ajustar-se para

atender aos interesses: do governo, das editoras, do mercado, dos professores, dos diretores, dos

coordenadores pedagógicos, dos alunos e seus pais, a fim de constituir-se como um instrumento

de ensino usado no trabalho do professor, sendo embutido nesse agir docente vários outros

fatores também de natureza complexa como: as prescrições oficiais de ensino, as prescrições

internas a cada instituição escolar, a interação entre pais, grupo docente, direção e funcionários da

instituição, a comunidade em que a escola está inserida, os instrumentos de ensino disponíveis ao

professor (giz, lousa, livro didático, laboratório de informática, etc.), além de outros elementos.

Portanto, subjacente à produção, adoção e utilização do livro didático estão escolhas e

silenciamentos que se refletem no processo de ensino-aprendizagem, cabendo aos pesquisadores

do campo da educação atuar de alguma forma para que melhoras ocorram e transcendam da

academia à sala de aula, via formação e capacitação de professores e produção de materiais

didáticos qualificados.

O PNLEM é responsável pela avaliação e distribuição dos livros didáticos de Ensino

Médio, entretanto, no que cabe a avaliação, não cumpre sua função. Com a análise, pudemos

constatar que é preciso olhar de modo mais crítico as avaliações de livros didáticos feitas pelo

governo, já que informações dadas pela equipe de avaliadores sobre alguns dos livros no catálogo

do PNLEM/2009 puderam ser contestadas, refletindo a complexidade que se opera no trabalho do

professor, uma vez que a adoção de um instrumento bem-avaliado pelos órgãos oficiais da

educação brasileira nem sempre irá ajudá-lo a melhorar a qualidade de seu trabalho.

Page 206: Noticia e Reportagem Nos LDS

205

Reconhecemos que os livros didáticos apresentam grandes contribuições ao ensino, embora

ainda haja muito a ser melhorado, sendo muitas vezes o único recurso didático disponível a

professores e alunos. Assim, com este trabalho, não visamos desqualificá-lo, ao contrário,

pretendemos contribuir para que esse instrumento que permeia grande parte das salas de aulas

brasileiras torne-se cada vez mais bem-qualificado.

Para tanto, ao analisar as propostas de ensino de dois dos gêneros jornalísticos de grande

representatividade social, com os quais os adolescentes cotidianamente se deparam, buscamos

apresentar como vêm sendo tratados esses gêneros textuais nos livros como forma de refletirmos

sobre a qualidade do ensino proposta nessas obras e propormos o ensino de gêneros por meio do

desenvolvimento de capacidades de linguagem exigidas a seu domínio, tal qual Schneuwly e

Dolz (2004) propõem, devido a esta teoria didático-pedagógica mostrar-se eficaz no ensino de

língua materna por meio de gêneros textuais.

Pensamos que os modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem que produzimos

nesse trabalho poderão contribuir tanto para que os professores planejem o ensino de tais gêneros,

enfocando as operações de linguagem pertinentes a eles, para que ocorra o desenvolvimento das

capacidades de linguagem dos alunos exigidas para o domínio desses gêneros, quanto aos autores

de materiais didáticos na elaboração de capítulos, unidades ou módulos voltados ao ensino da

notícia e da reportagem.

Esta dissertação, além de sinalizar como são as propostas de ensino de gêneros textuais nos

livros didáticos de Ensino Médio atuais e suas implicações ao desenvolvimento de capacidades

de linguagem do aluno, como forma de ensino de Língua Portuguesa, nesta última etapa da

educação básica, permite-nos refletir como as teorias acadêmicas têm chegado às salas de aulas

via livro didático e assim (re)pensarmos em formas de encurtarmos tal distância para a melhora

da qualidade do livro didático e do ensino.

Page 207: Noticia e Reportagem Nos LDS

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ZANCHETTA JÚNIOR, Juvenal. Desafios para a abordagem da imprensa na escola. Educação

& Sociedade, Campinas, v. 26, n. 93, p. 1497-1510, 2005.

LIVROS ANALISADOS

CEREJA, William Roberto; MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: linguagens (Livro do

professor). São Paulo: Atual, 2005.

FARACO, Carlos Alberto. Português: língua e cultura (Livro do professor). Curitiba: Base

Editora, 2003.

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MURRIE, Zuleika Felice et al. Língua Portuguesa: projeto escola e cidadania para todos (Livro

do professor). São Paulo: Editora do Brasil, 2004.

TAKAZAKI, Heloísa Harue. Língua Portuguesa (Livro do professor). São Paulo: IBEP, 2005.

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ANEXOS

Anexo I: Livro 1(PL) – Português Linguagens

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Anexo II: Livro 2 (PLC) – Português: língua e cultura

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Anexo III: Livro 3 (LP) –Língua Portuguesa

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Anexo III: Livro 3 (PEC) – Língua Portuguesa: Projeto Escola e Cidadania para Todos

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