Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais,...

141
. umeros: O Imp´ erio dos Irracionais XIII Brincando de Matem´ atico

Transcript of Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais,...

Page 1: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

.

Numeros: O Imperio dosIrracionais

XIII Brincando de Matematico

Page 2: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANADEPARTAMENTO DE MATEMATICA

PROGRAMA DE EDUCACAO TUTORIALTutor: Prof. Dr. Jose Carlos Correa EidamEstudantes: Anna Paula Chiarello Marcon

Bianca Elena WiltuschnigEduardo Magalhaes de CastroGabriel Felipe Dalla StellaJoao Antonio Francisconi Lubanco ThomeLetıcia Ferreira GomesLuiz Henrique Lara dos SantosMarcel Thadeu de Abreu e SouzaMatheus Daniel Galvao de MeloOtavio Cordeiro SantanaThiago Kenhiti YoshidaVitor Emanuel GuliszVivian de Paula Ribeiro

Site: www.petmatematica.ufpr.brFacebook: www.facebook.com/PetMatUFPRE-mail: [email protected]: (41) 3361-3672Data do Evento: 18 a 21 de Julho de 2017

Curitiba, julho de 2017.

Page 3: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Apresentacao

Prezado Estudante!

E uma grande alegria te-lo conosco nesta edicao do Brin-cando! Tenho certeza que estes dias serao muito especiaispara a sua formacao matematica e trarao muitos conheci-mentos novos para voce!

O Brincando e uma atividade de extensao gratuita daUFPR planejada, organizada e conduzida pelos alunos doPET - Matematica com o intuito de oferecer aos estudan-tes de Ensino Medio que possuam interesse e potencial emMatematica a oportunidade de estudar e aprender sobre umtema matematico relevante apresentado de forma acessıvel eludica. Alem disso, o Brincando oferece ao estudante umaoportunidade de conhecer melhor nao somente a infraestru-tura fısica da UFPR, mas tambem de interagir com docentese estudantes de Matematica.

O tema desta edicao suscita muito interesse, ja que con-vivemos com numeros durante todas as fases da vida. Seraoapresentados muitos resultados e curiosidades em todos osdias, sendo que o tema principal foi dividido em quatro par-tes, uma para cada dia. A proposta nesta atividade e apren-der e ensinar matematica de forma leve e descontraıda, semminimizar o aspecto formal e abstrato do tema.

Gostaria de agradecer, de maneira especial, aos colegas

Page 4: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

4 • Brincando de Matematico

do Departamento de Matematica que tem apoiado este tra-balho, a Direcao do Setor de Ciencias Exatas e, de formaespecial, ao Prof. Eduardo Barra, Pro-Reitor de Graduacaoda UFPR, pelo apoio ao projeto e tambem a ajuda com aimpressao do material. Agradeco tambem a cada um dos es-tudantes do PET, pela dedicacao e esmero com que realizamtodas as atividades!

Prof. Jose Carlos EidamTutor do PET-Matematica

Chefe do Departamento de Matematica

Page 5: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sumario

1 Numeros e Conjuntos 71.1 Introducao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71.2 Operacoes com Conjuntos . . . . . . . . . . . 101.3 Operacoes com os elementos . . . . . . . . . . 121.4 Numeros Construtıveis . . . . . . . . . . . . . 131.5 Propriedades dos Numeros Construtıveis . . . 141.6 Enumerabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . 201.7 Cardinalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211.8 Conjuntos enumeraveis . . . . . . . . . . . . . 221.9 O produto cartesiano . . . . . . . . . . . . . . 251.10 Conjuntos nao-enumeraveis . . . . . . . . . . 281.11 A Hipotese do Contınuo . . . . . . . . . . . . 30

2 Numeros Racionais e Irracionais 332.1 Construcao dos Numeros Racionais . . . . . . 332.2 Operacoes nos Racionais . . . . . . . . . . . . 362.3 Representacao decimal . . . . . . . . . . . . . 382.4 Numeros Irracionais . . . . . . . . . . . . . . . 422.5 Raızes racionais de polinomios com coeficien-

tes inteiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 452.6 Numeros Trigonometricos . . . . . . . . . . . 482.7 Numeros Logarıtmicos . . . . . . . . . . . . . 512.8 Numeros Algebricos e Transcendentes . . . . . 52

5

Page 6: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

3 Fracoes Contınuas e Aproximacoes 593.1 Introducao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 593.2 Convergentes e aproximacoes . . . . . . . . . . 643.3 Aproximacao de numeros irracionais . . . . . 723.4 Aproximacoes melhores . . . . . . . . . . . . . 783.5 Aproximacoes a menos de 1/n2 . . . . . . . . 843.6 Retoques finais . . . . . . . . . . . . . . . . . 89

4 Sequencias e Series 914.1 Bases Numericas . . . . . . . . . . . . . . . . 914.2 Sequencias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 984.3 Convergencia e Limites . . . . . . . . . . . . . 1004.4 Series Numericas . . . . . . . . . . . . . . . . 1094.5 Conjunto de Cantor . . . . . . . . . . . . . . . 121

Exercıcios Resolvidos 131

Referencias Bibliograficas 139

Page 7: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Capıtulo 1

Numeros e Conjuntos

1.1 IntroducaoNesta secao, introduziremos os conceitos que servirao de

base para nosso estudo. Comecamos entao com o conceito deconjunto. Afinal, o que e um conjunto? Esta e um questaomatematica bastante delicada cuja solucao foge do escopodeste trabalho, mas podemos nos contentar com a ideia intui-tiva de conjunto, a saber, um colecao de objetos satisfazendodeterminada propriedade.

• A letra grega ∅ denotara o conjunto vazio, ou seja, oconjunto que nao possui nenhum elemento.

• Denotaremos um conjunto nao vazio por uma letramaiuscula do nosso alfabeto, com excecao de algunscasos, os quais ficarao claros no contexto.Exemplo 1.1.1. A = {1, 2, 5}, B = {4,�}

• Se x e um elemento de um conjunto A escreveremos x ∈A (le-se x pertente a A). Se todos os elementos de umconjunto A pertencem a um conjunto B, escreveremos

Page 8: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

8 • Brincando de Matematico

A ⊂ B (le-se A esta contido em B). E se x nao e umelemento de um conjunto A escrevemos x /∈ A (le-se xnao pertence a A)

Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre-quentemente, que recebem nomes e notacoes tambem espe-ciais

• N = {1, 2, 3, · · · } (o conjunto dos numeros Naturais)

• Z = {· · · ,−2,−1, 0, 1, 2, · · · } (o conjunto dos numerosInteiros)

• Q = {m/n ;m,n ∈ Zn 6= 0} (o conjunto dos numerosRacionais)

Estes tres conjuntos acima estao relacionados da seguintemaneira:

N ⊂ Z ⊂ Q

Agora que falamos um pouco sobre conjuntos, vamos in-troduzir o conceito de numero (lembrando que ate agora nosreferimos aos numeros apenas como sımbolos). Para falar so-bre o conceito de numero, vamos voltar um pouco no tempo,mais especificamente para a epoca da Grecia antiga. Para osgregos, o conceito de numero estava ligado ao conceito de me-dida, cada numero representava um tamanho. Acreditava-seque toda a natureza poderia ser descrita atraves de numeros,e para eles a natureza era perfeita, o que os levou a acreditarque todos os numeros existentes apresentavam a mesma per-feicao, sendo mais especıfico, todos os numeros podiam serescritos como fracoes de numeros inteiros (todos os numerospertenciam ao conjunto dos numeros racionais). Hoje sabe-mos que nao e bem assim, existem numeros que nao podemser escritos como fracao de dois inteiros, como por exemplo o

Page 9: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 9

famoso√

2. A existencia desses numeros motivou a criacaode dois outros conjuntos especiais, o conjunto dos numerosirracionais (denotado por IR) que e o conjunto de todos osnumeros que nao podem ser escritos como fracao de doisinteiros e o conjunto dos numeros reais (denotado por R),que e o conjunto de todos os numeros que sao racionais ouirracionais. Em termos matematicos, podemos escrever:

• IR = {x; x /∈ Q}

• R = {x; x ∈ Q ou x ∈ I}

Estes dois ultimos conjuntos tambem se relacionam entresi. E o conjunto dos numeros reais se relaciona com os outrosconjuntos apresentados anteriormente da seguinte forma:

• N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ R

• IR ⊂ R

Daı surge aquela famosa imagem que ilustra essas relacoes

Essa imagem e a que vemos por aı toda vez que se tocano assunto conjuntos numericos. Nesse momento, parece naoter nada mais a dizer sobre estes conjuntos, certo? Pois e, na

Page 10: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

10 • Brincando de Matematico

verdade tem muito mais o que dizer, e e aqui que as coisas setornam interessantes. Por exemplo, repare que quando escre-vemos N ⊂ Z estamos dizendo que todos os elementos de Npertencem ao conjunto Z, ou seja, N cabe dentro de Z, o quenos passa a ideia de que o conjunto Z e maior que o conjuntoN em algum sentido. Mas se pararmos pra pensar, estes doisconjuntos possuem uma infinidade de elementos. E naturalneste momento a pergunta: Se Z e maior que N, existeminfinitos maiores do que outros? No decorrer desta apostila,formalizaremos e responderemos esta pergunta e traremosmuitos outros resultados interessantes sobre relacoes entreesses conjuntos numericos.

1.2 Operacoes com ConjuntosQuando mexemos com objetos matematicos, um dos nos-

sos anseios e fazer contas com eles, e isso nos motiva a defi-nir operacoes entre estes objetos. Entao aqui vamos definiroperacoes basicas entre conjuntos, e que vao nos auxiliarposteriormente.Definicao 1.2.1. Dados dois conjuntos A e B, definimos

• A interseccao de A e B como o conjunto de todos oselementos x tais que x ∈ A e x ∈ B, e denotamos esteconjunto por A ∩B, ou seja:

A ∩B = {x ; x ∈ A e x ∈ B}

• A uniao de A e B como o conjunto de todos os elemen-tos x tais que x ∈ A ou x ∈ B, e denotaremos esteconjunto por A ∪B, ou seja:

A ∪B = {x ; x ∈ A ou x ∈ B}

Page 11: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 11

• O produto cartesiano de A e B como sendo o conjuntode pares ordenados (x, y) tais que x ∈ A e y ∈ B, edenotamos este conjunto por A×B, ou seja:

A×B = {(x, y) ;x ∈ A e y ∈ B}

Podemos generalizar estas operacoes para um numeroqualquer finito de conjuntos A1, A2, · · · , An da seguinte ma-neira:

• A1 ∩A2 ∩ · · · ∩An e o conjunto de todos os elementosx tais que x ∈ Ai para todo i = 1, 2, · · · , n.

• A1 ∪A2 ∪ · · · ∪An e o conjunto de todos os elementosx tais que x ∈ Ai para algum i = 1, 2, · · · , n.

• A1 × A2 · · · × An e o conjunto de todas as n-uplasordenadas (x1, x2, · · · , xn) tais que xi ∈ Ai para todoi = 1, 2, · · · , n.

Em resumo, a interseccao de um certo numero n de con-juntos e o conjunto dos elementos comuns a estes. A uniaode um certo numero n de conjuntos e o conjunto de todosos elementos que pertencem a pelo menos um dos conjuntosunidos. O produto cartesiano de um certo numero n de con-juntos em uma certa ordem e o conjunto das listas da forma(x1, x2, · · · , xn) de elementos de cada conjunto na mesmaordem. Definidas essas operacoes, podemos fazer algumascontas com conjuntos.Exemplo 1.2.2. Considere os conjuntos A = {1, 3, 5}, B ={�,4} e C = {2, 5}. Calcule A ∪ B, A ∩ C e B × C.Resolucao:

A ∪B = {1, 3, 5,4,�}A ∩ C = {5}

B × C = {(�, 2), (�, 5), (4, 2), (4, 5)}

Page 12: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

12 • Brincando de Matematico

Fica como exercıcio encontrar A×B × C.

1.3 Operacoes com os elementosA partir de agora vamos apenas considerar conjuntos

numericos, uma vez que ja sabemos fazer contas com seuselementos (que sao numeros). Tambem porque a enfase destaapostila nao e estudar operacoes com elementos de conjun-tos abstratos. Considere o conjunto dos numeros reais (R).Neste conjunto sabemos somar e multiplicar elementos, quesao numeros. Vamos relembrar algumas propriedades destasoperacoes:

Propriedades da Soma: Sejam x, y, z ∈ R, entao:

1. x+ y = y + x

2. (x+ y) + z = x+ (y + z)

3. 0 + x = x = x+ 0

4. x+ (−x) = 0 = (−x) + x

Propriedades da Multiplicacao: Sejam x, y, z ∈ R,entao:

1. xy = yx

2. (xy)z = x(yz)

3. 1x = x = x1

4. x( 1x) = 1 para x 6= 0

5. x(y + z) = xy + xz

Page 13: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 13

Relembremos tambem que essas propriedades valem paraos numeros racionais e que soma e produto de dois numerosracionais tambem e um numero racional. Por curiosidade,nao apenas os reais e os racionais apresentam esta estrutura.Para alguns conjuntos abstratos nos quais conseguimos so-mar e multiplicar tambem constatamos essas propriedades,chamamos estes conjuntos especiais de corpos. Falaremosagora de um outro conjunto que possui esta estrutura.

1.4 Numeros ConstrutıveisLembremos dos conjuntos especiais introduzidos na secao

anterior, mais especificamente R,Q,Z,N e tambem lembre-mos da relacao de inclusao entre eles

N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ R .

Neste e nos proximos capıtulos, apresentaremos outrosconjuntos especiais que aparecem no meio dessas relacoes.Nesta secao, apresentaremos o conjunto dos numeros cons-trutıveis. Para a geometria euclidiana, construir um seg-mento com regua e compasso significa que podemos usarapenas os seguintes procedimentos para construı-lo:

• Tracar uma reta passando por dois pontos.

• Tracar uma circunferencia conhecendo seu centro e umde seus pontos.

Definicao 1.4.1. Seja x um numero real. Dizemos que x eum numero construtıvel se x = 0 ou se conseguimos cons-truir um segmento de reta com tamanho |x|, a partir de umsegmento de reta tomado como unidade.

Page 14: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

14 • Brincando de Matematico

1.5 Propriedades dos Numeros Cons-trutıveis

Vamos assumir aqui que podemos construir, usando reguae compasso, perpendiculares, paralelas, mediatrizes e bisse-trizes.Proposicao 1.5.1. Se x e y sao dois numeros construtıveisentao x+ y tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. Considere o segmento AB cujo tamanho e x,construa a partir do ponto B um segmento de reta BC cujotamanho e y (possıvel pois y e construtıvel) e de modo queA,B e C sejam colineares. Desse modo AC = AB +BC e otamanho de AC e x+ y.

Proposicao 1.5.2. Se x e um numero construtıvel entao−x tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. | − x| = |x|, portanto segue da definicao que−x e construtıvel.

Proposicao 1.5.3. Se x e y sao dois numeros construtıveisentao x− y tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. Como temos que a soma de dois numerosconstrutıveis tambem e construtıvel, e, pela proposicao an-terior, temos que (−y) e construtıvel. Logo x+(−y) = x−ye construtıvel.

Proposicao 1.5.4. Se x e y sao dois numeros construtıveisentao xy tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. Considere na reta r os pontos A,B,I e Otais que OI = 1, OA = x e OB = y, e seja P um ponto foradela. Construa o trangulo OIP e em seguida um paralela

Page 15: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 15

a IP passando por A. Seja P ′ a interseccao dessa paralelacom a reta OP . Repare que os triangulos OIP e OAP ′

sao semelhantes e portanto OIOA

= OPOP ′ . Agora construa o

triangulo OBP e em seguida uma reta paralela a BP pas-sando por P ′. Seja M a interseccao dessa paralela com areta r. Repare que os triangulos OBP e OMP ′ sao seme-lhantes e portanto OB

OM= OP

OP ′. Juntando as informacoes

temos OPOP ′ = OI

OA= OB

OM, e portanto OI

OA= OB

OM, substituindo

os valores de OA,OB e OI temos que:

1x

= y

OM

e portando xy = OM .

Proposicao 1.5.5. Se x 6= 0 e um numero construtıvelentao x−1 = 1/x tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. Considere na reta r os pontos O, I e A taisque OI = 1 e OA = x. Construa o ponto medio M de OA.Trace uma circunferencia de centro M e que passa por O,repare que esta circunferencia intercepta r nos pontos O eA. Em seguida construa uma circunferencia de centro O que

Page 16: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

16 • Brincando de Matematico

passa por I, esta nova circunferencia intercepta a primeiracircunferencia em dois pontos, tome P como sendo um de-les. Passando por P , trace uma perpendicular a reta r etome Q como sendo a interseccao entre r e esta perpendi-cular.Repare que os triangulos OQP e AQP sao retangulosde hipotenusas OP e PA, respectivamente, pois PQ e per-pendicular a OA. Como OA e diametro da circunferenciaque contem P , o angulo OPA e reto, e portanto o trian-gulo OPA e retangulo de hipotenusa OA. Para simplificar,facamos OQ = a, QA = x − a, PA = y e PQ = h. E comoP esta na circunferencia que contem I, temos que OP = 1.Pelo Teorema de Pitagoras obtemos as seguintes equacoes:

x2 = 1 + y2 ⇒ x2 − y2 = 1 (1.1)

1 = a2 + h2 ⇒ h2 = 1− a2 (1.2)

y2 = (x− a)2 + h2 ⇒ y2 = x2 − 2xa+ a2 + h2 (1.3)

Isolando 2xa na equacao (1.3) obtemos:

2xa = x2 − y2 + a2 + h2

usando as relacoes (1.1) e (1.2) temos:

2xa = 1 + a2 + (1− a2) = 2

concluımos que a = 1/x.

Page 17: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 17

Usando as proposicoes anteriores, podemos concluir quese x e y sao dois numeros construtıveis, entao x/y tambeme construtıvel, basta fazer x/y = x(y−1). Assim, podemosconcluir que todos os numeros racionais sao construtıveis.E como a soma, produto e o inverso de um numeros cons-trutıveis tambem e construtıvel, o conjunto dos numerosconstrutıveis possui uma estrutura de corpo, uma vez queas operacoes de soma e produto nesse conjunto sao as mes-mas dos numeros reais e portanto apresentam as mesmaspropriedades. Ate agora, sabemos que todos os racionaissao construtıveis; a pergunta natural e: existem mais? Aresposta fica por conta da nossa proxima proposicao.Proposicao 1.5.6. Se x > 0 e um numero construtıvelentao

√x tambem e um numero construtıvel.

Demonstracao. Considere na reta r os pontos O, I e A taisque OI = 1 e IA = x. Construa M , o ponto medio de OA.Trace uma circunferencia de centro M passando por O, erepare que essa circunferencia intercepta r tambem em A.

Page 18: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

18 • Brincando de Matematico

Construa uma perpendicular a r passando por I. Esta per-pendicular intercepta a circunferencia em dois pontos, tomeP como sendo um deles. Novamente temos que os triangulosOPA, OIP e PIA sao retangulos de hipotenusas OA, OPe PA, respectivamente. Para simplificar, facamos IP = h,PA = y e OP = z e como OI = 1 e IA = x temos queOA = x+ 1 . Pelo Teorema de Pitagoras obtemos as seguin-tes equacoes:

(x+ 1)2 = z2 + y2 ⇒ x2 + 2x+ 1 = z2 + y2 (1.4)

z2 = h2 + 1 (1.5)

x2 + h2 = y2 ⇒ h2 = y2 − x2 (1.6)

isolando 2x na equacao (1.4) temos:

2x = z2 − 1 + y2 − x2

usando a equacao (1.6):

2x = z2 − 1 + h2

e finalmente, usando a equacao (1.5) obtemos

2x = (h2 + 1)− 1 + h2 = 2h2

e assim concluımos que h =√x.

Page 19: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 19

Temos entao que o conjunto dos numeros construtıveistem mais gente do que o conjunto dos numeros racionais.Mas nem todo numero real e construtıvel, um exemplo fa-moso e o numero 3

√2, que nao pode ser construıdo por regua

e compasso. Uma justificativa simples e a de que, quandofazemos uma construcao usando regua e compasso, repre-sentativamente, estamos lidando com equacoes de retas ecircunferencias. Retas possuem equacoes lineares, ou seja,polinomios de grau 1. Circunferencias possuem equacoesquadraticas, ou seja, polinomios de grau 2. O que significaque, atraves de manipulacoes algebricas usando equacoes decircunferencias e retas, obtemos apenas polinomios de grauno maximo 2. Porem, 3

√2 e raiz do polinomio x3 − 2 que e

um polinomio de grau 3 e nao e muito difıcil de imaginar que3√

2 nao e raiz de nenhum polinomio com coeficientes inteirosde grau menor, por isso, este numero nao e construtıvel.

Entao temos aqui um conjunto de contem todos os nume-ros racionais e possui ainda outros elementos irracionais masainda assim, nem todos os reais sao elementos deste con-

Page 20: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

20 • Brincando de Matematico

junto. Vamos denotar o conjunto de todos os numeros cons-trutıveis por C. Pelo que acabamos de ver, podemos relaci-onar este conjunto aos conjuntos especiais da secao anteriorda seguinte forma:

N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ C ⊂ R

Existem mais conjuntos especiais entre os naturais e os reais?A resposta e sim. Quais sao? Acalme-se, apresentaremos elesno decorrer desta apostila. Se existe essa relacao de ordementre esses conjuntos especiais, podemos medir o tamanhodeles? A resposta e sim. Como? Esse e o tema do nossoproximo capıtulo.

1.6 EnumerabilidadeAgora que ja relembramos e aprofundamos alguns con-

ceitos basicos sobre numeros e conjuntos numericos e fo-mos apresentados ao interessante conjunto dos numeros cons-trutıveis, vamos nessa secao abordar um conceito matematicoconhecido por enumerabilidade. Veremos como a enumerabi-lidade tange a ideia de infinitude, algo que intriga os filosofose matematicos desde os primordios do pensamento humano.Entre esses, o alemao Georg Cantor foi um grande protago-nista no advento dessa nova abordagem na segunda metadedo seculo XIX.

Georg Cantor foi um matematico alemao nascido em 1845.No ano de 1874, ele publicou um artigo que deu inıcio a todauma area da matematica chamada Teoria dos Conjuntos.Suas ideias eram tao revolucionarias e disruptivas que mui-tos dos contemporaneos de Cantor nao apenas as rejeitavam,mas criticavam e humilhavam pessoalmente o virtuoso ma-tematico, que depois de tanto trabalhando incansavelmente

Page 21: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 21

em sua bizarra e fascinante teoria veio perder a sanidadee passou os ultimos anos de sua vida sozinho em um ma-nicomio. Mas seu trabalho nao foi em vao e hoje o legadode Cantor e reconhecido como um dos mais importantes nahistoria da matematica moderna.

1.7 CardinalidadePara estudar os diferentes tamanhos de conjuntos infi-

nitos, vamos precisar estender a ideia de medir conjuntosfinitos. Chamamos de cardinalidade de um conjunto finito onumero de elementos que ele possui. Entao e facil ver queo conjunto A = {3, 5, 8} possui cardinalidade 3, pois pode-mos simplesmente contar os elementos de A, e escrevemos#A = 3.

Agora, considerando o conjunto B = {2, 7, 16} sabemosque #B = 3 = #A. Aqui Cantor observou algo curioso:nao e possıvel estender essa ideia para conjuntos infinitospois nao podemos contar seus elementos, mas podemos me-dir conjuntos nao por contagem, mas por correspondencia.

BijecaoA ideia e a seguinte: vamos supor que nao sabemos con-

tar e alguem nos diz que o conjunto A possui cardinalidade3. Cantor percebeu que podemos garantir que a cardina-lidade de B e 3 mostrando que #B = #A atraves de umprocesso de correspondencia chamado bijecao, isto e, umacorrespondencia de elementos um a um.

A B3 25 78 16

Page 22: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

22 • Brincando de Matematico

Para conjuntos finitos, e evidente que #A = #B se, esomente se existe alguma bijecao entre A e B, e portanto,esta e uma maneira confiavel de se medir conjuntos finitos.O interessante desse novo metodo e que ele nao apresentaproblemas quando tentamos estender ao caso de conjuntosinfinitos, o que e justamente a proposta. Poderemos, embreve, falar de cardinalidade de conjuntos infinitos e oprocedimento de encontrar bijecoes e a principal ferramentaque nos trara uma forma de classificar esses tamanhos dife-rentes de conjuntos infinitos.

1.8 Conjuntos enumeraveisTalvez voce ja tenha se cansado de ouvir falar dos numeros

naturais, mas o fato e que eles representam um importantıssimoalicerce para o estudo dos conjuntos pois a infinitude de N e oponto de partida da nossa investigacao. Isso porque Cantor,intuitivamente entendia que a maneira mais clara de discri-minar tamanhos para conjuntos infinitos era se eles apresen-tam ou nao uma enumeracao, isto e, um modo de contar oulistar os elementos de tal conjunto.Definicao 1.8.1. Um conjunto A e enumeravel se ele ad-mite uma bijecao com o conjunto N.Os proprios naturaisTeorema 1.8.2. O conjunto N e enumeravel.

Pela nossa definicao, devemos achar uma bijecao entre Ne ele mesmo e isso nao deve ser difıcil. De fato, usamos aquia bijecao mais natural possıvel que chamamos de identidade.A identidade e uma bijecao que associa um elemento a elemesmo,

Page 23: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 23

N N0 01 12 23 3... ...

Ou, como funcao

f : N −→ Nn 7−→ f(n) = n

Isso, portanto, nos garante que o conjunto dos naturaise enumeravel, trivialmente e denotamos #N = ℵ0. Mostra-remos agora alguns conjuntos que, de maneira menos obvia,apresentam a mesma cardinalidade que os naturais.

Os pares

Teorema 1.8.3. O conjunto dos numeros pares e enumeravel.Aqui observaremos algo intrigante, pois e evidente que os

pares sao apenas uma parte de todos os numeros naturais;metade deles, na verdade. Como pode ser entao que pos-suem o mesmo numero de elementos? Pois e, esse assuntodiversas vezes traz resultados contra intuitivos, mas podemser facilmente demonstrados.

A bijecao que fara isso por nos e relativamente natu-ral, novamente. Ela tomara o numero n e associara a ele onumero 2n.

Page 24: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

24 • Brincando de Matematico

N 2N0 01 22 43 6... ...

Esta associacao e realmente um-a-um, o que nos com-prova a enumerabilidade dos numeros pares. De maneira to-talmente analoga, e facil ver se kN e o conjunto dos multiplosde qualquer numero natural k, entao kN e enumeravel.

O conjunto dos inteirosTeorema 1.8.4. O conjunto dos numeros inteiros e enu-meravel.

Novamente temos um resultado curioso, pois poderıamosimaginar que em Z ha o dobro de elementos de N. A asso-ciacao que nos evidencia a enumerabilidade de Z e a seguinte:a cada numero ımpar associaremos um inteiro positivo e acada numero par associaremos um inteiro negativo:

N Z0 01 12 -13 24 -2... ...

Podemos tambem escrever a funcao explicitamente:

Page 25: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 25

f : N −→ Z

n 7−→ f(n) =

−n2 , se n e par,

n+ 12 , se n e ımpar.

1.9 O produto cartesianoTeorema 1.9.1. O conjunto N× N e enumeravel.

De fato, e possıvel achar uma bijecao f(m,n). Na figuraabaixo, o valor de f(m,n) esta exposto na posicao (m,n) noplano cartesiano.

O leitor pode verificar os primeiros casos o comportamentoda funcao explıcita:

f : N× N −→ N(m,n) 7−→ f(m,n) = 1

2 [(m+ n)2 + 3m+ n]

Page 26: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

26 • Brincando de Matematico

Os racionaisTeorema 1.9.2. O conjunto dos numeros racionais e enu-meravel.

Aqui encontramos a primeira demonstracao mais elabo-

rada pois a bijecao a ser encontrada nao e tao natural. Uma

ideia e que podemos dispor todos os numeros racionais em

uma tabela11

12

13

14 · · ·

21

22

23

24 · · ·

31

32

33

34 · · ·

... ... ... ... . . .Na tabela acima, ainda temos varios numeros repetidos,

como 1/2 e 2/4. O que fazemos e retirar da tabela to-das as fracoes redutıveis e em seguida podemos enumeraros numeros de Q.

11

12

13

14 · · ·

21 ×

23 × · · ·

31

32 ×

34 · · ·

... ... ... ... . . .

Page 27: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 27

Numeros construtıveis e algebricos

Uma das intencoes desse curso e mostrar que existem im-portantes conjuntos numericos alem daqueles com os quaistemos contato no Ensino Fundamental, como podemos no-tar na imagem acima. Conhecemos os numeros construtıveise conheceremos os numeros algebricos nos capıtulos seguin-tes, mas aqui faremos apenas um breve comentario sobre acardinalidade desses conjuntos.

Observe que comecamos falando dos naturais e depois fo-mos crescendo: adicionamos os negativos para obter o con-junto Z, adicionamos as fracoes e obtemos Q. Continu-ando nesse raciocınio, nos vimos que existem elementos cons-trutıveis que nao sao racionais, como

√2 por exemplo. Pros-

seguindo, obtemos o conjunto dos numeros algebricos comainda mais elementos, mas o fato e que em cada uma des-sas etapas a cardinalidade se manteve. Onde estao os

Page 28: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

28 • Brincando de Matematico

diferentes tamanhos de infinitos entao?

1.10 Conjuntos nao-enumeraveisOs reais

Vamos mostrar um primeiro conjunto com cardinalidademaior do que a cardinalidade dos naturais.Teorema 1.10.1. O intervalo aberto (0, 1) e nao-enumeravel.

Para mostrarmos isso, nos basearemos na demonstracaofeita por Cantor que ficou conhecida como o metodo da di-agonal de Cantor. Comecaremos supondo que o conjuntoI = (0, 1) e, de fato, enumeravel e encontraremos uma con-tradicao.

Bom, se I e enumeravel, entao podemos encontrar umabijecao entre I e N. Em outras palavras, isso significa que epossıvel, de alguma maneira, listar todos os elementos de I.O que fazemos agora e construir essa lista que sabemos que,pela nossa suposicao, deve existir e ela sera algo desse tipo:

1 0, 384721...2 0, 587439...3 0, 759485...4 0, 284735...5 0, 048327... ...

Entao todos os numeros entre 0 e 1 devem estar nessalista, certo? Mas o fato e que sempre podemos achar umelemento que pertence a I, mas nao esta na suposta lista!Fazemos isso da seguinte maneira. Imagine que a parte dosalgarismos depois da vırgula forma uma tabela, uma matrizinfinita e entao construiremos nosso novo elemento olhandopara a diagonal dessa matriz.

Page 29: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 29

3 8 4 7 2 1 ...

5 8 7 4 3 9 ...

7 5 2 4 8 5 ...

2 8 4 7 3 5 ...

0 4 8 3 2 7 ...... ... ... ... ... ... . . .

• O primeiro algarismo do nosso numero sera, obvia-mente, 0.

• O segundo algarismo sera 1 caso o algarismo na posicao1× 1 seja 2; sera 2 caso contrario

• O terceiro algarismo sera 1 caso o algarismo na posicao2× 2 seja 2; sera 2 caso contrario

• O quarto algarismo...

Nesse caso nosso numero ficara algo do tipo

0, 2212121...

e nao deve ser difıcil ver que nao e possıvel que ele pertenca aessa lista. Ela e portanto, incompleta e segue que o conjuntoI e nao-enumeravel.

De fato e possıvel construir varios elementos fora dessalista como 0, 1131313... por exemplo. O importante e que naoimporta como voce construa essa lista, esse procedimentosempre vai gerar um numero fora dela.

Isso ja nos diz que nao e possıvel que R seja enumeravelpois I ⊂ R ja nao e. A cardinalidade do conjunto dosnumeros reais e representada por #R = ℵ1.

Page 30: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

30 • Brincando de Matematico

1.11 A Hipotese do ContınuoPara finalizarmos esse capıtulo, vamos falar de um dos

problemas mais intrigantes da historia da matematica, for-mulado pelo matematico ja aqui apresentado Georg Cantore conhecido pelo nome Hipotese do Contınuo.

Durante os anos de desenvolvimento dessa nova Teoriados Conjuntos, foi-se descobrindo que este era um assuntonem um pouco elementar, recheado de obstaculos e parado-xos. Cantor, o grande precursor do tema, enfrentou variasdessas questoes investigando a cardinalidade de todos essesconjuntos apresentados acima e outros e nessa tarefa, veio aele uma pergunta intrigante.

Ele percebeu que nesse processo de expandir os numerosnaturais para os inteiros e depois racionais e depois cons-trutıveis, etc, a cardinalidade se mantia em ℵ0 e de repente,num salto para os numeros reais calculava-se uma cardi-nalidade superior: ℵ1. Cantor entao se questionou: sera,que entre o conjunto dos numeros naturais e o conjunto dosnumeros reais existe algum conjunto que possua cardinali-dade maior do que ℵ0 e menor do que ℵ1? Ele passou anose anos em busca da resposta desse misterio, mas apos tantotrabalho em vao, passou a suspeitar que nao deveria existirtal conjunto e assim, por Cantor, foi proposta a Hipotese doContınuo.Proposicao 1.11.1. Nao existe conjunto cuja cardinalidadeesteja estritamente entre as cardinalidades de N e de R.

A hipotese, apesar de ser tao facilmente enunciada, mostr-ou-se um tremendo desafio para todos os academicos daepoca, tanto que no ano de 1900, o celebre matematico DavidHilbert apresentou-a em sua lista Os Problemas de Hilbertque ficou famosa na comunidade matematica durante todo oseculo XX.

Page 31: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros e Conjuntos • 31

A resolucao

Depois de profusos anos de progresso conjunto de diver-sos matematicos, apenas na decada de 60 que se obteve enfimuma resolucao para o famoso problema, entretanto o desfe-cho dessa historia e talvez ainda mais enigmatico do que oproprio enunciado ou qualquer outro problema matematico.

Em termos simplificados, descobriu-se que Hipotese doContınuo nao e falsa e nao e verdadeira. Isso porqueem 1940, Kurt Godel demonstrou que nao poderia ser de-monstrado que a Hipotese era falsa e em 1963, Paul Cohenpor sua vez desmontrou que nao poderia ser demonstradoque a Hipotese era verdadeira.

Esse resultado bizarro e nada intuitivo, e extremamenteestranho a nossa concepcao limitada, mas no contexto com-plexo e altamente tecnico da Teoria de Conjuntos e um fatoe significa muita coisa. Ele serve tambem para indicar que,um assunto aparentemente tao simples que nos e apresen-tado desde o ensino fundamental, com o conjunto N, Z e noensino medio nos e tao familiar, no fundo, nao e nada disso.Depois que vamos descascando as camadas e investigamosas entranhas, os fundamentos dos numeros e a natureza dosconjuntos a que eles pertencem, nos encontramos com o pro-vavelmente mais bizarro dos campos da matematica, mergu-lhado em uma colecao de enigmas e paradoxos nao apenasmatematicos, como logicos e filosoficos.

Agora, com os argumentos da enumerabilidade, voce japode entender melhor porque os numeros sao de fato umimperio irracional, uma vez que vimos a gigantesca infinidadede numeros irracionais que deve existir para haverem tantosreais a mais do que racionais!

Nos proximos capıtulos, investigaremos curiosidades so-bre outros aspectos dos numeros reais e conheceremos mais

Page 32: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

32 • Brincando de Matematico

conjuntos interessantes como o conjunto dos numerosalgebricos e o fascinante Conjunto de Cantor, que sur-giu em uma das tentativas de resolver a lendaria Hipotese doContınuo.Exercıcios 1.11.2. .

1. Ache uma injecao de A = N × N para N, provandoportanto que A e enumeravel. (Dica: Lembre-se quetodo numero natural pode ser fatorado de forma unicaem potencia de numeros primos).

2. E possıvel verificar que A×B e enumeravel quando A eB sao enumeraveis. Sabendo que N×Z∗ e enumeravel,prove, formalmente, que Q e enumeravel, como visto nasecao 1.3.3. ( O conjunto Z∗ e o conjunto dos numerosinteiros excluindo-se o numero 0.)

3. Mostre que, se A e enumeravel e B ⊂ A, entao B eenumeravel.

Page 33: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Capıtulo 2

Numeros Racionais eIrracionais

2.1 Construcao dos Numeros Raci-onais

O conjunto dos numeros racionais contem todas as fracoes,isto e, quocientes da forma p

qcom p, q ∈ Z, q 6= 0. O ponto

crucial aqui reside no fato que uma fracao nao admite umaunica representacao, por exemplo 1

2 = 48 = −3

−6 = . . .. Porisso, precisamos encontrar uma maneira de falar de fracoessem necessariamente nos prendermos a uma unica repre-sentacao.

Para isso, consideremos os conjuntos Z∗ = {a ∈ Z; a 6= 0}e

Z× Z∗ = {(a, b); a ∈ Z, b ∈ Z∗}Definicao 2.1.1. Dados (a, b), (c, d) ∈ Z×Z∗, consideremosa seguinte relacao:

(a, b) ≡ (c, d)⇔ ad = bc

Page 34: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

34 • Brincando de Matematico

A ideia que esta por tras da relacao que definimos e quedois pares sao equivalentes se, e somente se, representam amesma fracao. Por exemplo, (3, 9) e (2, 6) sao equivalentespois 3 · 6 = 9 · 2, ou, o que e a mesma coisa, representam a

mesma fracao(

39 = 2

6

).

Proposicao 2.1.2. A relacao definida em (2.1.1) caracterizauma relacao de equivalencia.

Demonstracao. Para termos uma relacao de equivalencia pre-cisamos verificar tres propriedades:

i (a, b) ≡ (a, b), ∀(a, b) ∈ Z× Z∗ (reflexiva)

ii (a, b) ≡ (c, d)⇒ (c, d) ≡ (a, b) (simetrica)

iii (a, b) ≡ (c, d) e (c, d) ≡ (e, f) ⇒ (a, b) ≡ (e, f) (transi-tiva)

As propriedades i e ii decorrem diretamente da definicaode ≡.

Para verificar iii, olharemos para a hipotese:

a · d = b · d (2.1)

c · f = d · e (2.2)Multiplicando a equacao (2.1) por f e a equacao (2.2)

por b, temos

a · d · f = b · c · f (2.3)

c · f · b = d · e · b (2.4)Igualando as equacoes (2.3) e (2.4) temos

Page 35: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 35

a · d · f = d · e · b

Como d 6= 0, podemos cancela-lo em ambos os lados,obtendo

a · f = e · b⇒ a · f = b · e⇒ (a, b) ≡ (e, f)

De posse da relacao ≡, podemos particionar o conjuntoZ× Z∗ em classes de equivalencia. Para cada par (a, b), suaclasse de equivalencia e o conjunto de todos os pares quesao equivalentes a (a, b). Esta classe de equivalencia e, pordefinicao, a fracao a

b. Em sımbolos,

a

b=

{(x, y) ∈ Z× Z∗; (x, y) ≡ (a, b)

}=

{(x, y) ∈ Z× Z∗;xb = ya

}.

O sımbolo a

be chamado de fracao, onde a e o numerador

e b e o denominador.Exemplo 2.1.3.

12 = {(x, y) ∈ Z× Z∗; 2x = y}

= {(1, 2), (−1,−2), (2, 4), (−2,−4), ...}

Alem disso, temos:

12 = −1

−2 = 24 = −2

−4 = ...

O conjunto Q, dos numeros racionais, e, por definicao, oconjunto de todas as classes de equivalencia da relacao ≡,

Q ={a

b; (a, b) ∈ Z× Z∗

}.

Page 36: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

36 • Brincando de Matematico

Uma fracao a

be dita irredutıvel se a e b nao tiverem

fatores primos em comum. Caso contrario, a fracao e ditaredutıvel.Exercıcios 2.1.4. .

1. Mostre que:

(a)15153333 = 15

33 (b)131313999999 = 13

99 (c)23239999 = 23

99

2. Provar os itens da Proposicao (2.1.2) para:

(a)45 (b)7

9 (c)1123

2.2 Operacoes nos RacionaisAgora que definimos explicitamente o conjunto dos nume-

ros racionais, nosso proximo passo e considerar sobre este asoperacoes elementares de soma e multiplicacao.

Comecemos pela adicao. Dados racionais a, b ∈ Q, a =m

ne b = q

r, a soma de a e b, simbolizada por a+ b, pode ser

definida da seguinte maneira:

a+ b = m

n+ q

r= mr

nr+ nq

nr= mr + nq

nr

As seguintes propriedades sao verificadas:

P1 (a+ b) + c = a+ (b+ c),∀a, b, c ∈ Q (associativa)

P2 a+ b = b+ a,∀a, b ∈ Q (comutativa)

P3 a+ b = a se b = 0∀a ∈ Q (elemento neutro)

P4 a+ (−a) = 0, onde a = m

ne −a = −m

n(oposto)

Page 37: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 37

Mantendo a notacao anterior, a diferenca de a e b simbo-lizada por a− b, e definida da seguinte maneira:

a− b = a+ (−b) = m

n+ −q

r= mr

nr+ −nq

nr= mr − nq

nr

Com a propriedade P4 e a definicao de subtracao pode-mos concluir as seguintes propriedades para todo a, b, c ∈ Q

• −(a+ b) = −a− b

• (a− b) + b = a

• a+ c = b⇔ c = b− a

• a+ b = a+ c⇒ b = c

Mantendo a notacao anterior, o produto de a e b, simbo-lizado por ab, e definida da seguinte maneira:

ab = a · b = m

n· qr

= mq

nr

M1 (ab)c = a(bc),∀a, b, c ∈ Q (associativa)

M2 ab = ba,∀a, b ∈ Q (comutativa)

M3 a+ b = a se b = 11 = 2

2 = ..., ∀a ∈ Q (elemento neutro)

M4 aa−1 = 1, onde a = m

ne a−1 = n

m(oposto)

A divisao de a e b, simbolizada por ab

, e definida da se-guinte maneira:

a

b=m

nq

r

= m

n· rq

= ab−1

Page 38: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

38 • Brincando de Matematico

Exercıcios 2.2.1. .

1. Calcule:

(a)47 + 1

3 (b) 59 −

12

(c)2325 ·

1013 (d)1

2 ·67 + 1

3 − 3÷ 35

2. Ache duas fracoes de denominador 3 e 11 cuja diferencaseja igual a 6

33

2.3 Representacao decimalA representacao decimal e uma outra maneira de repre-

sentarmos um numero racional que se encontra na forma a

b.

Nessa representacao o numero pode ser um decimal finito oudecimal infinito.

Por exemplo, a fracao 18, pode ser reescrita da seguinte

forma,18 = 1

10 ·108

= 110

(1 + 1

4

)

= 1 · 110 + 1

102

(104

)

= 1 · 110 + 1

102

(2 + 1

2

)

= 1 · 110 + 2 · 1

102 + 1103

(102

)= 1 · 1

10 + 2 · 1102 + 5 · 1

103

Page 39: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 39

Convencionalmente, entao escrevemos

18 = 0, 125

Este processo sera discutido melhor no capıtulo (4).

Exemplo 2.3.1. Dado A ∈ Q tal que A = 12, a repre-

sentacao de A na forma decimal e 0, 5 = 12 = A sendo 0, 5 a

representacao decimal finita de A.

Exemplo 2.3.2. Considere o numero B = 13 ∈ Q, temos

que a representacao decimal de B e 0, 33333..., sendo queesta e uma representacao decimal infinita.

Como saber se um numero tem representacao decimalfinita?

Para respondermos essa pergunta, vamos olhar para onumero 0,135

0, 135 = 1351000

sabemos que qualquer numero decimal finito pode ser escritona forma de fracao, sendo o denominador uma potencia de10. Vamos simplificar o numero 135

1000, ate sua forma irre-dutıvel, assim

1351000 = 27

200perceba que obtivemos 200 no denominador, sendo que 200 =23 · 52, ou seja, podemos escrever 200 como decomposicao denumeros primos, onde esse primos sao 2 e 5.Exemplo 2.3.3. .

1. 0, 84 = 84100 = 21

25 = 2152

Page 40: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

40 • Brincando de Matematico

2. 0, 2346 = 234610000 = 1173

5000 = 117323 · 54

3. 0.672 = 6721000 = 84

125 = 8453

Nos exemplos acima todos os denominadores podem serescritos com decomposicao de 2 e 5, porem isso nao e coin-cidencia, todo numero decimal finito escrito como fracao terao denominador podendo ser composto somente por 2 e 5.Proposicao 2.3.4. A fracao a

btera representacao decimal

finita se, e so se, b = 2m · 5n, para m,n ∈ N.Quando um numero racional e representado da forma

decimal infinita, temos que nessa representacao tera umasequencia de algarismos que se repete indefinidamente, osnumeros a seguir ilustram a forma decimal infinita,

511 = 0.454545...

30979900 = 0, 31282828...

para facilitar a representacao da dizima periodica, usa-seuma barra sobre os algarismos que se repetem,

511 = 0.45

30979900 = 0, 3128

Exemplos 2.3.5. Escrever os numeros na forma a

b

1. 0, 32222..., vamos considerar

x = 0, 32222...

Page 41: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 41

temos,100x = 32, 222... (2.5)10x = 3, 222... (2.6)

subtraindo (2.6) de (2.5)

100x− 10x = 32, 2− 3, 2

90x = 29

x = 2990

2. 0, 333333..., considerando

x = 0, 33333...

multiplicando por 10 em ambos os lados

10x = 3, 333...

podemos rescrever a equacao da seguinte forma

10x = 3 + 0, 333...

10x = 3 + x

9x = 3

x = 39 = 1

3Exercıcios 2.3.6. .

1. Escreva, em notacao decimal finita, as seguintes fracoes:

(a)14 (b) 3

200 (c)321400 (d) 7

625 (e)352125 (f)3149

2500

2. Escreva os seguintes numeros na forma a

b:

(a)0, 1111 · · · (b)0, 3743 (c)0, 9987(d)0, 0001 (e)0, 9

Page 42: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

42 • Brincando de Matematico

2.4 Numeros IrracionaisDurante a antiguidade os filosofos entendiam que os nume-

ros racionais eram os mais adequados para descrever a har-monia da natureza. Esse pensamento foi muito difundidopelos pitagoricos e alguns de seus predecessores.

Hippasus de Metapontum

Hippasus de Metapontum, membro daEscola Pitagorica, nasceu em torno doano 500 a.C. em Metapontum, cidadegrega da Magna Grecia situada no Golfode Tarento, ao sul da atual Italia. Em-bora as evidencias sejam obscuras, Hip-pasus e tido como o primeiro a provara existencia de numeros irracionais. Ele

observou que a diagonal de um quadrado de lado 1 deveriaser um numero d tal que d2 = 2 (ou seja, d =

√2) e este

numero nao pode ser expresso como quociente de dois intei-ros. Este numero d e chamado de constante pitagorica. Adescoberta e a divulgacao de uma quantidade que nao podiaser expressa como quociente de dois inteiros chocou os mem-bros da Escola Pitagorica, que teriam afogado Hippasus nomar por ter divulgado o fato.

Muito antes disto, os babilonios utilizavam a aproximacao

1 + 2460 + 51

602 + 10603 = 30547

21600 = 1.41421296 .

para√

2, a qual foi encontrada em um fragmento de argila de1600 a.C.! Outra aproximacao interessante e dada no textoindiano Sulbasutras (800 a.C.) da seguinte forma: aumenteo lado pela sua terca parte e esta terca parte pela sua quartaparte menos a trigesima quarta parte deste quarto. Em lin-

Page 43: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 43

guagem moderna, isto quer dizer

1 + 13 + 1

3 · 4 −1

3 · 4 · 34 = 577408 = 1.4142156862745098039 .

O Teorema de Pitagoras diz que a soma dos quadradosdos catetos de um triangulo retangulo e igual a hipotenusaao quadrado.

a2 = b2 + c2

Vamos considerar um triangulo retangulo cujos catetos be c sao iguais a 1; entao pelo Teorema de Pitagoras temos,

a2 = 12 + 12 ⇒ a2 = 2⇒ a =√

2 .

Sabemos que os catetos sao racionais, mas√

2 e racional?Se tivermos

√2 = a

b, sendo a

buma fracao irredutıvel,

elevando os dois lados ao quadrado temos,

2 = a2

b2

2b2 = a2 (2.7)

pela equacao (2.7) temos que a e um inteiro par, assimpodemos escrever a como a = 2c, sendo c ∈ Z, substituindo2c em (2.7) temos,

2b2 = (2c)2

2b2 = 4c2

b2 = 2c2

assim temos que b tambem e par, logo com a e b sao pares ea fracao a

bnao e irredutıvel, contradizendo a nossa hipotese

que ab

e uma fracao irredutıvel.

Page 44: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

44 • Brincando de Matematico

Temos entao que√

2 nao e racional. Isso mostra queexistem numeros muito simples de se construir que nao saoracionais. Vamos chamar empiricamente de irracional qual-quer numero que nao seja racional.Exemplo 2.4.1. Vamos verificar se

√3 e racional ou irraci-

onal. Admitindo√

3 = a

b, sendo a

buma fracao irredutıvel e

elevando os dois membros ao quadrado temos,

3 = a2

b2

3b2 = a2 . (2.8)

Pela equacao (2.8) temos que a e um inteiro divisıvel por3, assim podemos escrever a como a = 3c, sendo c ∈ Z,substituindo 3c em (2.8) temos,

3b2 = (3c)2

2b2 = 9c2

b2 = 3c2

assim temos que b tambem e divisıvel por 3, logo com a e b saodivisıveis por 3 e a fracao a

bnao e irredutıvel, contradizendo

a nossa hipotese que ab

e uma fracao irredutıvel.

Temos entao√

3 e um numero irracional.Exercıcio 2.4.2. Prove que os numeros a seguir sao irraci-onais

(a)√

6 (b)√

2 +√

2 (c)4√

13− 36

Page 45: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 45

2.5 Raızes racionais de polinomioscom coeficientes inteiros

Vamos considerar a seguinte equacao

4x2 − 8x+ 3 = 0 .

Esta e uma equacao polinomial do segundo grau e sabemosque as solucoes sao da forma

x = −b±√b2 − 4ac

2a ,

onde a = 4, b = −8 e c = 3, assim

x =−(−8)±

√−(8)2 − 4 · 4 · 32 · 4 = 8± 4

8

logo, x1 = 32 e x2 = 1

2.A equacao em questao tem coeficientes inteiros e suas

raızes sao numeros racionais. Pondo n1 = 3, n2 = 1 e d1 =d2 = 2 vemos que n1 e n2 dividem o termo independenteda equacao e d1 e d2 dividem o coeficiente do termo lıder.Essa propriedade pode ser verificada em geral para quaisquersolucoes racionais de uma equacao com coeficientes inteiros.Teorema 2.5.1. Consideremos uma equacao polinomial qual-quer com coeficientes inteiros:

cnxn + cn−1x

n−1 + cn−2xn−2 + · · ·+ c2x

2 + c1x+ c0 = 0

Se essa equacao tiver uma raiz racional ab

, com a

buma fracao

irredutıvel, entao a sera divisor de c0 e b um divisor de cn.

Page 46: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

46 • Brincando de Matematico

Demonstracao. Vamos considerar

cnxn + cn−1x

n−1 + cn−2xn−2 + · · ·+ c2x

2 + c1x+ c0 = 0

se a equacao acima tiver solucao racional, sera da forma x =a

bcom a, b ∈ Z e mdc(a, b) = 1, entao:

cn

(a

b

)n+ cn−1

(a

b

)n−1+ · · ·+ c2

(a

b

)2+ c1

(a

b

)+ c0 = 0

multiplicando a equacao acima por bn, temos

cnan + cn−1a

n−1b+ · · ·+ c2a2bn−2 + c1ab

n−1 + c0bn = 0

Assim, podemos concluir que cnan e divisıvel por b e c0bn e

divisıvel por a. Como (a, b) = 1, segue que b divide cn e adivide c0, como querıamos.

Exemplo 2.5.2. Considerando a equacao

2x3 − 9x2 + 10x− 3 = 0

o teorema anterior nos diz que suas raızes racionais, se exis-tirem, devem ser seguinte forma:

+1+1, +1

−1, +1+2, +1

−2, −1+1, −1

−1, −1+2, −1

−2,

+3+1, +3

−1, +3+2, +3

−2, −3+1, −3

−1, −3+2, −3

−2 .

Observe que a lista acima tem apenas os seguintes nume-ros 1, −1, 1

2, −12, 3, −3, 3

2, −32, sendo que desses somente

1, 12 e 3 sao raızes da equacao.

Page 47: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 47

Exemplo 2.5.3. Vamos verificar se√

7 e racional ou irra-cional. Para comecar, vamos fazer a seguinte consideracao:se x =

√7, entao x2 − 7 = 0, portanto x e solucao de uma

equacao polinomial com coeficientes inteiros. Utilizando oTeorema (2.5.1), teremos as seguintes possibilidade para x:

+1+1, +1

−1, −1+1, −1

−1, +7+1, +7

−1, −7+1, −7

−1 .

Assim 1, −1, 7 e −7 sao as possibilidades para x, poremnenhuma dessa satisfaz a equacao, logo

√7 e irracional.

Exemplo 2.5.4. Vamos verificar se√

2+√

3 e racional ou ir-racional. Para comecar, vamos fazer a seguinte consideracao:se x =

√2+√

3, entao x4−10x+1 = 0, portanto x e solucaode uma equacao polinomial com coeficientes inteiros. Utili-zando o Teorema (2.5.1), teremos que ±1 e uma possıvelraiz racional para a equacao, no entanto ±1 nao satisfaz aequacao, logo

√2 +√

3 e irracional.Exemplo 2.5.5. Vamos verificar se

√2 3√

3 e racional ou ir-racional. Para comecar, vamos fazer a seguinte consideracao:se x =

√2 3√

3, entao x6 − 2332 = 0, portanto x e solucao deuma equacao polinomial com coeficientes inteiros. Utilizandoo Teorema (2.5.1), teremos as seguintes possibilidade para x:

±20 · 30, ±20 · 31, ±20 · 32, ±21 · 30, ±21 · 31, ±21 · 32,±22 · 30, ±22 · 31, ±22 · 32, ±23 · 30, ±23 · 31, ±23 · 32 .

Perceba que nenhuma das possibilidades para x, satisfaza equacao, logo

√2 3√

3 e irracional.Exercıcio 2.5.6. Demostre que os numeros a seguir sao ir-racionais

(a) 3√

15 (b) 3√

6 (c)√

3−√

2 (d) 3√

3 +√

2 (e) 3√

5−√

3

Page 48: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

48 • Brincando de Matematico

2.6 Numeros TrigonometricosPara muitos angulos θ os valores correspondentes das

funcoes trigonometricas sao irracionais. Antes de comecar,vamos relembrar as seguintes formulas trigonometricas:

sen(a+ b) = sen(a) cos(b) + sen(b) cos(a)

cos(a+ b) = cos(a) cos(b)− sen(a)sen(b)

A partir dessas igualdades, obtemos:

sen(2θ) = 2sen(θ) cos(θ) cos(2θ) = cos2(θ)− sen2(θ) ,

cos(3θ) = cos(2θ) cos(θ)− sen(2θ)sen(θ)

cos(2θ) = 2 cos2(θ)− 1 = 1− 2sen2(θ) (2.9)

cos(3θ) = 4 cos3(θ)− 3 cos(θ) (2.10)

sen(3θ) = 3sen(θ)− 4sen3(θ) (2.11)

Por exemplo, substituindo θ = 20◦ em (2.10), temos:

cos(60◦) = 4 cos3(20◦)− 3 cos(20◦)

Como sabemos que cos(60◦) = 12, fazendo x = cos(20◦)

temos12 = 4x3 − 3x ⇐⇒ 8x3 − 6x− 1 = 0 .

Podemos verificar que nenhuma das possıveis raızes raci-

onais{±1,±1

2 ,±14 ,±

18

}e de fato raiz da equacao, porem

Page 49: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 49

sabemos que cos(20◦) e raiz da equacao, e que cos(20◦) ediferente de ±1,±1

2 ,±14 ,±

18. Assim, concluımos que

cos(20◦) e irracional.

Usando argumentos semelhantes, provemos que

sen(10◦) e irracional.

De fato, fazendo θ = 10◦ em (2.11), como sen(30◦) = 12,

temos12 = 3sen(10◦)− 4sen3(10◦)

Fazendo x = sen(10◦) ,

12 = 3x− 4x3 ⇐⇒ 8x3 − 6x+ 1 = 0

Da mesma forma que no exemplo anterior, podemos ve-rificar que a equacao nao possui raızes racionais, e sen(10◦)e raiz da equacao; portanto sen(10◦) e irracional.Exercıcio 2.6.1. Mostre que os seguintes numeros sao irra-cionais:

(a) cos(40◦) (b)sen(20◦) (c) cos(10◦) (d)sen(50◦)

Os metodos usados podem ser estendidos para demons-trar que, com algumas excecoes, as funcoes trigonometricasde qualquer angulo igual a um numero inteiro de graus, mi-nutos e segundos, sao irracionais.Proposicao 2.6.2. Se θ for um angulo tal que cos(2θ) eirracional, entao cos(θ), sen(θ) e tg(θ) tambem serao irracio-nais.

Page 50: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

50 • Brincando de Matematico

Demonstracao. Supondo cos(θ) racional, entao, pela equacao(2.9) cos2(θ) e 2 cos2(θ)−1 tambem seriam racionais. Porem2 cos2(θ) − 1 = cos(2θ), que e irracional. Da mesma forma,supondo sen(θ) racional, entao sen2(θ) e 1−2sen2(θ) tambemseriam racionais; mas 1 − 2sen2(θ) = cos(2θ), que e irraci-onal. Supondo tg(θ) racional, entao tg2(θ) seria racional, eutilizando a identidade trigonometrica

1 + tg2(θ) = sec2(θ) = 1cos2(θ)

cos2(θ) seria racional, e cos(θ) tambem teria que ser racional,o que e uma contradicao.

Aplicando esse mesmo raciocınio, podemos provar queuma enorme quantidade de numeros trigonometricos sao ir-racionais

Exemplo 2.6.3. Como cos(20◦) e irracional, podemos afir-mar que os numeros

cos(10◦) sen(10◦) tg(10◦) cos(5◦)sen(5◦) tg(5◦) cos(2◦30′) sen(2◦30′)tg(2◦30′) cos(1◦15′) sen(1◦15′) tg(1◦15′)cos(37′30′′) sen(37′30′′) tg(37′30′′) . . .

sao irracionais.Exercıcio 2.6.4. Mostre que os seguintes numeros sao irra-cionais:

(a) cos(15◦), sen(15◦), tg(15◦)

(b) cos(7◦30′), sen(7◦30′), tg(7◦30′)

(c) cos(22◦30′), sen(22◦30′), tg(22◦30′)

Page 51: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 51

(d) cos(35◦), sen(35◦), tg(35◦)

(e) cos(25◦), sen(25◦), tg(25◦)

2.7 Numeros LogarıtmicosNesta secao, faremos uma analise sobre a irracionalidade

de alguns valores das funcoes logarıtmicas, de forma analogaao que foi feito para as funcoes trigonometricas. Quandomencionarmos logaritmos, estaremos nos referindo a logarit-mos na base 10. Lembre que, para y > 0:

log y = k ⇐⇒ 10k = y

Comecemos provando que log 2 e irracional. Se tivessemoslog 2 = a

be a e b inteiros positivos, entao

2 = 10ab ⇐⇒ 2b = 10a = 2a5a

Essa igualdade nao pode ser verdadeira, porque, qualquerque seja o valor de b > 0, 2b e um inteiro nao divisıvel por5; por outro lado 2a5a e divisıvel por 5, por ser a um inteiropositivo, o que e absurdo. Logo log 2 e irracional.

Usando argumentos semelhantes, vamos mostrar que log 21e irracional. Se tivessemos log 21 = c

de c e d inteiros positi-

vos, entao

21 = 10 cd ⇐⇒ 21d = 10c ⇐⇒ 3d7d = 2c5c

Essa igualdade nao pode ser verdadeira pois, de um ladotemos apenas os fatores primos 3 e 7, e do outro apenas osfatores primos 2 e 5. Chegamos em uma situacao impossıvel;logo log 21 e irracional.Exercıcio 2.7.1. Resolva os itens abaixo:

Page 52: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

52 • Brincando de Matematico

(a) Mostre que, dado c e d dois inteiros nao negativos dis-tintos, log(2c5d) e irracional.

(b) Mostre que log(

32

)e irracional.

(c) Mostre que log 15 e irracional.

(d) Mostre que log 5 + log 3 e irraconal.

2.8 Numeros Algebricos e Transcen-dentes

Dentro do conjunto dos numeros irracionais, podemosdistinguir dois subconjuntos: um deles e formado por nume-ros que podem ser obtidos como solucao de alguma equacaoalgebrica e o outro formado pelos restantes. O primeiro de-les e chamado de conjunto dos numeros algebricos e estesnumeros seriam, via de regra, presumivelmente mais sim-ples que os demais, pois poderiam ser obtidos via processosalgebricos conhecidos (por exemplo, extracao de raızes qua-dradas).Definicao 2.8.1. Um numero real x e dito algebrico se sa-tisfizer uma equacao da forma

anxn + an−1x

n−1 + an−2xn−2 + · · ·+ a2x

2 + a1x+ a0 = 0

para certos an, an−1, an−2, ..., a2, a1, a0 ∈ Z. Em contrapar-tida, um numero que nao e solucao de nenhuma equacaodessa forma e chamado de transcendente.

Alguns fatos simples:

• Todo numero inteiro b ∈ Z e algebrico pois e solucaoda equacao: x− b = 0.

Page 53: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 53

• Todo numero racional c ∈ Q e algebrico, pois c podeser escrito como p

q, com p, q ∈ Z e q 6= 0, que e solucao

da equacao qx− p = 0.

• Assim, como todo numero racional e algebrico, pode-mos concluir que todo numero nao algebrico e irraci-onal, ou seja, todo numero transcendente e irracional.Porem nem todo numero irracional e transcendente,como veremos nos exemplos.

Exemplo 2.8.2.√

2 e algebrico: de fato,

x =√

2 ⇐⇒ x2 = 2 ⇐⇒ x2 − 2 = 0

Mais geralmente, todo numero da forma n√d, d, n ∈ N, e

algebrico, pois e solucao da equacao xn − d = 0.

Exemplo 2.8.3.7√

8546 e algebrico:

x =7√

8546 ⇐⇒ x7 = 85

467 ⇐⇒ 467x7 − 85 = 0

Exemplo 2.8.4.√

7 +√

13 e algebrico:

x =√

7 +√

13 ⇐⇒ x2 = (√

7 +√

13)2 ⇐⇒

x2 = 7 + 2√

7√

13 + 13 ⇐⇒ x2 − 20 = 2√

91⇐⇒ (x2 − 20)2 = 4(91) ⇐⇒ x4 − 40x2 + 400 = 364

⇐⇒ x4 − 40x2 + 36 = 0

Exemplo 2.8.5. 4√√

3− 3√

2 e algebrico:

4√√

3− 3√

2 = x ⇐⇒√

3− 3√

2 = x4 ⇐⇒√

3− x4 = 3√

2

⇐⇒ (√

3− x4)3 = 2 ⇐⇒ 3√

3− 9x4 + 3√

3x8 − x12 = 2

Page 54: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

54 • Brincando de Matematico

⇐⇒ 3√

3 + 3√

3x8 = x12 + 9x4 + 2 ⇐⇒

(3√

3 + 3√

3x8)2 = (x12 + 9x4 + 2)2 ⇐⇒

27+54x8 +27x16 = x24 +18x16 +4x12 +81x8 +36x4 +4 ⇐⇒

x24 − 9x16 + 4x12 + 27x8 + 36x4 − 23 = 0

Exemplo 2.8.6.√

2 3√

3 4√

4 5√

5 e algebrico:

x =√

2 3√

3 4√

4 5√

5 ⇐⇒ x = 2 12 3 1

3 4 14 5 1

5 ⇐⇒

x60 = (2 12 3 1

3 4 14 5 1

5 )60 ⇐⇒ x60 − 230320415512 = 0

Exercıcio 2.8.7. Mostre que os seguintes numeros sao alge-bricos:

(a)√

3 (c)√

2 +√

3 (e) 9√

2 3√

11 7√

3 13√

5

(b) 3√

5 (d) 7√

4 + 3√

11 (f) 3√

2 4√

5 +√

7

Em 1874, George Cantor (1845-1918) provou que o con-junto dos numeros algebricos e enumeravel com o argumentoque descreveremos a seguir. Imagine uma tabela infinitaonde dispomos todas as equacoes do primeiro grau com coe-ficientes inteiros:

... ... ... .... . . x− 2 = 0 2x− 2 = 0 3x− 2 = 0 4x− 2 = 0 . . .

. . . x− 1 = 0 2x− 1 = 0 3x− 1 = 0 4x− 1 = 0 . . .

. . . x+ 0 = 0 2x+ 0 = 0 3x+ 0 = 0 4x+ 0 = 0 . . .

. . . x+ 1 = 0 2x+ 1 = 0 3x+ 1 = 0 4x+ 1 = 0 . . .

. . . x+ 2 = 0 2x+ 2 = 0 3x+ 2 = 0 4x+ 2 = 0 . . .

... ... ... ...

Page 55: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 55

A esta tabela, que chamaremos de T1, associamos o con-junto A1 formado por todas as solucoes destas equacoes. Esteconjunto e enumeravel pois cada equacao tem exatamenteuma solucao. Vamos montar agora uma tabela, que chama-remos de T2, formada por todas as equacoes de segundo graucom coeficientes inteiros:

... ... .... . . x2 − 1x− 1 = 0 x2 − 1x+ 0 = 0 x2 − 1x+ 1 = 0 . . .

. . . x2 + 0x− 1 = 0 x2 + 0x+ 0 = 0 x2 + 0x+ 1 = 0 . . .

. . . x2 + x− 1 = 0 x2 + x+ 0 = 0 x2 + x+ 1 = 0 . . .

. . . x2 + 2x− 1 = 0 x2 + 2x+ 0 = 0 x2 + 2x+ 1 = 0 . . .

. . . x2 + 3x− 1 = 0 x2 + 3x+ 0 = 0 x2 + 3x+ 1 = 0 . . .

... ... .... . . 2x2 − 1x− 1 = 0 2x2 − 1x+ 0 = 0 2x2 − 1x+ 1 = 0 . . .

. . . 2x2 + 0x− 1 = 0 2x2 + 0x+ 0 = 0 2x2 + 0x+ 1 = 0 . . .

. . . 2x2 + x− 1 = 0 2x2 + x+ 0 = 0 2x2 + x+ 1 = 0 . . .

. . . 2x2 + 2x− 1 = 0 2x2 + 2x+ 0 = 0 2x2 + 2x+ 1 = 0 . . .

. . . 2x2 + 3x− 1 = 0 2x2 + 3x+ 0 = 0 2x2 + 3x+ 1 = 0 . . .

... ... ...

A esta tabela associamos, como antes, um conjunto, de-notado por A2 formado por todas as solucoes reais das equa-coes de T2. Este ultimo conjunto e enumeravel, pois cadaequacao tem, no maximo, duas raızes. Prosseguindo dessaforma, obteremos para cada n ∈ N uma tabela Tn formadapor todas as equacoes de grau n com coeficientes inteiros e,associado a Tn, o conjunto An formado pelas solucoes dasequacoes de Tn. Como cada equacao tem, no maximo, n

Page 56: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

56 • Brincando de Matematico

raızes reais, o conjunto An e enumeravel. Percebemos queum numero real qualquer e algebrico se, e so se, pertence a al-gum An, o que implica que o conjunto dos numeros algebricose a reuniao de todos os An. Em particular, o conjunto dosnumeros algebricos e enumeravel.

Como o conjunto dos numeros reais e nao enumeravel,concluımos um fato surpreendente: existe uma “quanti-dade” infinitamente maior de numeros transcendentes do quede numeros algebricos. Porem mostrar a transcendencia deum numero e uma tarefa bem mais complicada, que envolvemetodos mais avancados. Aqui temos uma lista com algunsexemplos de numeros transcendentes:

1. π = 3, 141592653589793238462643383279...: E obtidopela razao entre o perımetro e o diametro de umacircunferencia. Atualmente sao conhecidas oito qua-trilhoes (8.000.000.000.000.000) de casas decimais deπ. Carl Louis Ferdinand von Lindemann foi um ma-tematico alemao, conhecido por sua prova, publicadaem 1882, que π e um numero transcendente.

2. Numero de Euler/Numero de Napier:

e = 2, 718281828459045235360287 . . .

O matematico frances Charles Hermite provou, em1873, a transcendencia do numero e.

3. Constante de Champernowne:

0, 1234567891011121314151617181920 . . .

E formado por inteiros sucessivos, e contem em suaexpansao decimal qualquer numero que imaginarmos.O matematico alemao Kurt Mahler provou que essenumero e transcendente.

Page 57: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Numeros Racionais e Irracionais • 57

4. Constante de Liouville:

0.110001000000000000000001 . . .

Este numero possui o algarismo 1 nas casas decimais1!, 2!, 3!, 4!, 5!, . . . e zero nas demais. A sua transcenden-cia foi provada em 1851 pelo matematico frances Jo-seph Liouville.

5. Constante de Gelfand:

eπ = 23.1406926327792690057290 . . .

O matematico sovietico Aleksandr Gelfand foi o res-ponsavel pela determinacao desse numero transcendente.

6. Constante de Gelfond–Schneider:

2√

2 = 2.6651441426902251886 . . .

O matematico russo Rodion Kuzmin provou, em 1930,que esse numero e transcendente.

7. O Teorema de Gelfond-Schneider prova que os numeros√

2√

2,√

5√

7, dentre outros, sao transcendentes. O te-orema diz que dado α, β numeros algebricos (os casosα = 0, α = 1 e β racional foram excluıdos, pois seriafacil provar que αβ e algebrico), αβ e transcendente.

8. O Teorema de Lindemann–Weierstrass prova que e√

2,ln 2, sen(a), cos(a), tg(a) (com a um numero algebricodiferente de zero), entre outros, sao numeros transcen-dentes.

9. Existem mais numeros transcendentes! Voce conhecealgum?

Page 58: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

58 • Brincando de Matematico

Problemas em aberto:

• Constante de Catalan:

G = 0, 91596559417721901505 . . .

Nao se sabe se este numero e irracional, muito menosse e transcendente...

• Constante de Euler:

γ = 0, 5772156649015328606065120 . . .

Acredita-se ser transcendente, tambem nao se sabe see irracional.

• π + e, π − e, πe, πe, ππ, ee, πe, π

√2, eπ

2

Page 59: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Capıtulo 3

Fracoes Contınuas eAproximacoes

3.1 Introducao

Uma maneira interessante de escrever o numero 8532 e a

seguinte:

8532 = 2 + 21

32 = 2 + 13221

= 2 + 1

1 + 1121

=

= 2 + 1

1 + 1

1 + 1011

= 2 + 1

1 + 1

1 + 1

1 + 110

Dizemos que esta ultima expressao e a fracao contınuaque representa o numero racional 85

32. Como obtivemos esseresultado? Utilizando o Algoritmo da Divisao.

Page 60: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

60 • Brincando de Matematico

Primeiro dividimos 85 por 32, para obter o quociente 2 eo resto 21.

85 = 2 · 32 + 21

Assim:8532 = 2 + 21

32 = 2 + 13221

Em seguida continuamos o processo sucessivamente:

32 = 1 · 21 + 11

21 = 1 · 11 + 10

11 = 1 · 10 + 1

10 = 10 · 1 + 0

Mas afinal, o que e uma fracao contınua?

Conceitos Basicos

Uma fracao contınua finita e uma expressao da forma

a1 +b1

a2 +b2

. . . +bn−2

an−1 + bn−1

an

onde a1, . . . , an, b1, . . . , bn sao numeros reais. Na proximasecao, mostraremos que e possıvel aproximar qualquer nume-ro real por uma fracao do tipo acima. Se bn = 1 para todon ∈ N, a fracao contınua e chamada de simples. Neste caso,

Page 61: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 61

para facilitar a escrita, denotamos

[a1, a2, . . . , an] = a1 +1

a2 +1

. . . +1

an−1 + 1an

.

Voltando ao primeiro exemplo temos, entao, que8532 = 2 + 1

1 + 1

1 + 1

1 + 110

= [2; 1, 1, 1, 10]

Exercıcio 3.1.1. Seja p

qum numero racional, onde p e q

sao inteiros. Veja o que acontece com a fracao contınua se:

1. 0 < p < q

2. p < 0 < q

Por exemplo, pense como seria a fracao contınua de 3285 e

−8532 .

Uma pergunta natural que pode surgir e: Qualquer nume-ro racional possui uma expansao em fracao contınua simplesfinita? E, caso a resposta seja afirmativa, tal expansao eunica?

A resposta para questao acima e dada pelo seguinte teo-rema.Teorema 3.1.2. Qualquer fracao contınua simples finita re-presenta um numero racional. Reciprocamente, qualquernumero racional pode ser representado por uma fracao contı-nua simples finita.

Page 62: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

62 • Brincando de Matematico

Demonstracao. A demonstracao da primeira parte e imedi-ata, pois se temos uma fracao contınua simples finita, bastarealizar as operacoes de divisao de fracao e, assim, consegui-mos retornar a uma unica fracao representando um numeroracional.

Para provar a recıproca consideremos um numero racio-nal p

qqualquer. Do algoritmo da divisao obtemos p

q= a0 + r1

q,

onde 0≤ r1 < q, e a0 e o maior inteiro menor que p

q. Se

r1 = 0, pq

e um numero inteiro, e, entao, o processo termina.

Caso contrario escrevemos pq

= a0 + 1q

r1

, tal que 0 < r1 < q,

e repetimos o processo anterior com q

r1.

Observamos que o processo termina quando rn = 0, paraalgum n, e, portanto,

p

q= a0 + 1

a1 + 1

a2 + 1. . . + 1

an−1

= [a0; a1, a2, ..., an−1]

Ou seja, basta aplicarmos o algoritmo da divisao no nume-ro racional que obtemos uma fracao contınua simples finita.

Como1

an−1= 1

(an−1 − 1) + 11

,

segue que [a0; a1, ..., an−1 − 1, 1] e tambem uma expansao donumero p

q.

Entao, se descartarmos a possibilidade de que a ultimaetapa termine com 1

1, podemos garantir que a cada numero

Page 63: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 63

racional corresponde uma unica fracao contınua simples, jaque todos os seus coeficientes foram determinados de formaunica pelo Algoritmo da Divisao.

As fracoes contınuas tambem surgem naturalmente aotentar resolver equacoes quadraticas.

Consideremos a funcao quadratica x2 − bx− 1 = 0, comb um numero inteiro. Se x 6=0, podemos isolar x da seguinteforma:

x2 = bx+ 1⇒x = b+ 1x

Agora, por repeticao, podemos substituir x. Assim temos

x = b+ 1

b+ 1x

Se estendermos este processo finito inumeras vezes, po-demos escrever a seguinte ”relacao” :

x = b+ 1

b+ 1

b+ 1b+ ...

Na proxima secao, mostraremos como o processo infi-nito descrito pela ultima igualdade pode ser matematica-mente formalizado. Um bom exemplo e o famoso Numerode Ouro ou Razao Aurea, que e representado pela seguintefracao contınua simples

x = 1 + 1

1 + 1

1 + 11 + ...

= 1 + 1x

= x+ 1x⇒x2 − x+ 1 = 0

A solucao desta equacao determina o numero de ouro

Φ = 1 +√

52 ≈1, 6180340 . . .. Perceba que o numero de ouro

e irracional.

Page 64: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

64 • Brincando de Matematico

3.2 Convergentes e aproximacoesDados a0, a1, a2, . . . ∈ R positivos, a fim de estudar fracoes

contınuas da forma

[a0, a1, a2, . . . , an] = a0 +1

a1 +1

. . . +1

an−1 + 1an

,

consideremos os convergentes cn, definidos por

cn = [a0, a1, a2, . . . , an] , n ∈ N .

Fazendo os calculos, percebemos que c0 = a0

1 , c1 = a0a1 + 1a1

,

c2 = a0(a1a2 + 1) + a2

a1a2 + 1 ,

c3 = a0(a1(a2a3 + 1) + a3) + (a2a3 + 1)a1(a2a3 + 1) + a3

.

Com um pouco de esperteza, podemos perceber que cadaconvergente pode ser escrito na forma cn = pn

qn, onde

pn = anpn−1 + pn−2 , qn = anqn−1 + qn−2 ,

e definimos p−1 = 1, q−1 = 0, n ≥ 1. Estas relacoes saochamadas de relacoes de recorrencia de Wallis-Euler e saofundamentais para compreendermos a evolucao dos conver-gentes a medida que n cresce. A proposicao a seguir conteminformacoes importantes sobre os convergentes. Mais in-formacoes podem ser encontradas na referencia [10].Proposicao 3.2.1. Mantendo a notacao anterior, temos asseguintes relacoes:

Page 65: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 65

1. [a0, a1, a2, . . . , an, x] = xpn + pn−1

xqn + qn−1

2. pnqn−1−pn−1qn = (−1)n−1 e pnqn−2−pn−2qn = (−1)nanpara n ≥ 2

3. cn−cn−1 = (−1)n−1

qnqn−1e cn−cn−2 = (−1)nan

qnqn−2para n ≥ 2

Demonstracao. Vamos provar a primeira afirmacao por inducaoem n ∈ N, n ≥ 1: se n = 1, entao

[a0, a1, x] = x(a0a1 + 1) + a0

xa1 + 1 = xp1 + p0

xq1 + q0.

Assumindo a formula verdadeira para um certo n ≥ 2, vemosque

[a0, a1, a2, . . . , an, an+1, x] =[a0, a1, a2, . . . , an,

xan+1 + 1x

]

=xan+1 + 1

xpn + pn−1

xan+1 + 1x

qn + qn−1

= x(an+1pn + pn−1) + pnx(an+1qn + qn−1) + qn

= xpn+1 + pnxqn+1 + qn

.

Logo, a primeira igualdade esta provada. A primeira identi-dade do ıtem (2) e imediata para n = 2 e assumindo que amesma seja verificada para um certo n ∈ N, temos que

pn+1qn − pnqn+1 = (an+1pn + pn−1)qn − pn(an+1qn + qn−1)= (−1)n .

Page 66: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

66 • Brincando de Matematico

logo, a referida igualdade e verdadeira para todo n ≥ 2. Aprova da segunda identidade em (2) e analoga. As identida-des do ıtem (3) sao consequencias imediatas do ıtem (2).

Uma consequencia interessante do ıtem (2) do teoremaanterior e que, se cada an e inteiro, entao os numeros pne qn sao sempre inteiros relativamente primos, pois, se a ∈Z e um divisor comum de ambos, entao a e um divisor depnqn−1−pn−1qn = (−1)n−1, ou seja, a = ±1. Este argumentoprova o corolario a seguir.

Corolario 3.2.2. Se cada an e um inteiro positivo entaoos convergentes cn = pn

qnsao fracoes irredutıveis, para todo

n ∈ N.

Como consequencia do ıtem (3) da proposicao (3.2.1), ob-servamos que c0 < c2 < c4 < c6 < . . . < c2n e c1 > c3 > c5 >. . . > c2n+1. Alem disso, c2n+2 < c2n+1 e c2n+1 > c2n, n ∈ N.Logo, se n e par e m e ımpar, concluımos que cn < cm. Por-tanto, existem numeros reais α ≤ β tais que α = limn→∞ c2ne β = limn→∞ c2n+1 (veja o Capıtulo 4). Assumindo que cadaan seja inteiro, segue que os numeros q0, q1, q2, . . . formamuma sequencia crescente de numeros inteiros. Consequente-mente, a diferenca c2n+1 − c2n = 1/q2n+1q2n fica arbitraria-mente pequena. Em particular, α = β. Isto mostra que osnumeros c0, c1, c2, . . . , cn, embora sejam todos distintos entresi, ficam, a medida que n cresce, cada vez mais proximos deum numero real α. Em linguagem matematica, dizemos quea sequencia (cn) converge para o numero real α. O teoremaa seguir esta provado.

Teorema 3.2.3. Dados inteiros positivos a0, a1, a2, . . . , an , . . .,

Page 67: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 67

para todo n ∈ N, a fracao contınua

a0 +1

a1 +1

a2 +1

a3 + · · ·

(3.1)

converge, isto e, a sequencia dos convergentes (cn) definidoscomo cn = [a0, a1, . . . , an] converge para um numero real α.Alem disso, temos que para todo n ∈ N

c0 < c2 < c4 < . . . < c2n < . . . < α < . . . < c2n+1 < . . . < c3 < c1 .

Agora que ja sabemos que uma fracao contınua infinitacomo (3.1) representa um numero real, podemos nos pergun-tar sobre o processo inverso: dado um numero real α, comoobter uma fracao contınua que o represente? Esta perguntaja foi respondida na secao anterior para o caso de um numeroα racional. Vamos estender o processo para um numero αirracional qualquer.

Considere α > 0 um numero irracional, tal que α = β0.Temos que bβ0c = a0, onde a0 e o maior inteiro menor doque ou igual a β0. Podemos escrever β0 = a0 + 1

β1, onde a0

representa a parte inteira e 1β1

representa a parte fracionaria,

assim 0 <1β1

< 1. Entao β1 = 1β0 − a0

> 1 e um numero

irracional. Assim, α = β0 = a0 + 1β1

. Da mesma forma

podemos escrever β1 = a1 + 1β2

, onde a1 = bβ1c e 0 < 1β2

<

1, e obtemos β2 = 1β1 − a1

, que e, tambem, um numeroirracional.

βn = an + 1βn+1

, an = [βn] , n = 0, 1, 2, . . . .

Page 68: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

68 • Brincando de Matematico

Em particular,

α = a1 +1

a2 +1

. . . +1

an + 1βn+1

, n ∈ N .

Este procedimento determina, de maneira unıvoca, os in-teiros nao-negativos a1, a2, . . .. Seja (cn) a sequencia dosconvergentes relativos a sequencia a1, a2, . . ., ou seja, cn =[a0, a1, . . . , an], n ∈ N. Pela propria construcao dos numerosa0, a1, a2, . . .. Podemos concluir que para todo n ∈ N

c0 < c2 < . . . < c2n < . . . < α < . . . < c2n+1 < . . . < c3 < c1 .

Ja sabemos pelo teorema (3.2.3) que a sequencia dos conver-gentes cn = [a1, . . . , an] converge para um numero real, que,pelas desigualdades acima, deve ser igual ao proprio numeroα. Isto prova o teorema a seguir.1

Teorema 3.2.4. Dado um numero real α > 0 irracional,construindo a sequencia a0, a1, a2, . . . ∈ N como no paragrafoanterior, temos que a sequencia dos convergentes

cn = a0 +1

a1 +1

. . . +1

an−1 + 1an

converge para α.1No capıtulo 4 sera apresentado de maneira mais extensiva o con-

ceito de convergencia de uma sequencia numerica; por hora podemosnos contentar com a ideia intuitiva de convergencia, a saber, umasequencia (cn) converge para α se os valores c1, c2, . . . , cn, . . . ficamarbitrariamente proximos de α a medida que n cresce.

Page 69: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 69

Observamos que, se durante o processo de construcaodos numeros β0, β1, β2, . . . houver alguma repeticao, digamosβn = βn+k para certos n, k ∈ N, entao o bloco

an, an+1, . . . , an+k−1

repete-se periodicamente na expansao de α como fracao contı-nua, isto e,

α = [a0, a1, . . . , an−1, an, . . . , an+k−1, an, . . . , an+k−1, . . .]

= [a0, a1, . . . , an−1, an, . . . , an+k−1] .

Nos proximos exemplos, esta propriedade sera verificada.Exemplo 3.2.5. Consideremos o numero α =

√2. Vamos

fazer o procedimento descrito no teorema (3.2.4) para esteα. Temos β0 =

√2, a0 = 1; β1 = 1/(β0−a0) = 1/(

√2−1) =√

2 + 1 ≈ 2.4142. Logo, a1 = 2 e β2 = 1/(β1 − a1) =1/(√

2 − 1) =√

2 + 1 = β1, portanto, a2 = a1 = 2. Assim,√2 = [1, 2, 2, 2, . . .] = [1, 2].

Exemplo 3.2.6. Consideremos o numero α =√

3 ≈ 1.73205.Temos a0 = 1, β0 =

√3 e β1 = 1/(β0 − a0) = 1/(

√3− 1) =

(√

3 + 1)/2 ≈ 1.36602; logo, a1 = 1 e β2 = 1/(β1 − a1) =√3 + 1 ≈ 2.73205. Portanto, a2 = 2 e β3 = 1/(β2 − a2) =

1/(√

3 − 1) = β1 ≈ 1.36602, ou seja, a3 = 1. Logo, a ex-pressao para

√3 e√

3 = [1, 1, 2, 1, 2, 1, 2, . . .] = [1, 1, 2].Exemplo 3.2.7. Consideremos α =

√8 ≈ 2.82842 . . .. Te-

mos a0 = 2, β0 =√

8 e β1 = 1/(β0 − a0) = 1/(√

8 − 2) =(√

8 + 2)/4 ≈ 1.2071 . . .; logo, a1 = 1 e β2 = 1/(β1 − a1) =√8 + 2 ≈ 4.82842. Portanto, a2 = 4 e β3 = 1/(β2 − a2) =

1/(√

8 − 2) = β1, logo, a3 = 1 e a expressao para√

8 e√8 = [2, 1, 4, 1, 4, 1, 4, . . .] = [2, 1, 4].

Exemplo 3.2.8. Da mesma forma, vamos representar πcomo uma fracao contınua. Sabemos que π ≈ 3, 14159265 . . . ,

Page 70: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

70 • Brincando de Matematico

entao a0 = π = 3, β1 = 1π − 3 ≈ 7.0625, logo a1 = 7. Pros-

seguindo, temos β1 = 1/(β0 − a0) ≈ 15, 989, logo a2 = 15.Prosseguindo com os calculos, podemos verificar que π =[3, 7, 15, 1, 292, . . .]. Diferentemente dos casos anteriores, naoha nenhum padrao definindo os an’s.Exercıcios 3.2.9. .

1. Represente os seguintes numeros como fracoes contınuas:

(a) 711 (b)−11

7 (c)−313

(d)√

5 + 1 (e)√

2 (f)8−√

35

2. Verifique se cada um dos numeros abaixo e inteiro, ra-cional ou irracional, justificando convenientemente suaresposta, e escreva os numeros que correspondem asfracoes contınuas:

(a)[7] (b)[2; 1, 3, 4] (c)[1; 4, 2, 1]

(d)[1; 1] (e)[2; 7, 8, 7, 8, 2]

3. Ja vimos que podemos escrever o numero de ouro daseguinte maneira:

Φ = 1 +√

52 = 1 + 1

1 + 1

1 + 11 + ...

Calcule seus convergentes comparando-os com a sequen-cia de Fibonacci, que e a seguinte (1, 1, 2, 3, 5, 8, 13,...).Dica: Observe atentamente a razao de dois termos con-secutivos da sequencia de Fibonacci.

Page 71: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 71

4. Mostre que se α = [a1, . . . , an] entao 1α

= [1, a1, . . . , an].Conclua que [1, 1, a1, . . . , an] = [a1, . . . , an].

5. Dados b, c ∈ R, mostre que se b2 + 4c > 0 entao umadas raızes da equacao quadratica x2− bx− c = 0 podeser escrita como

x = b+c

b+c

b+ . . .

.

Use este fato para expressar os numeros abaixo comofracoes contınuas:

(a) α = 3 +√

13 (b) α = 1 +√

52

(c) α = 1 +√

22 (d) α = 1 +

√2

26. Encontre uma expansao em fracao contınua para cada

um dos numeros a seguir:

(a) α =√

7 (b) α = 1√6

(c) α = 3√

2 (d) α =√

7

7. Mostre que o n-esimo convergente cn de uma fracaocontınua pode ser escrito como

a1 + 1

a2 + 1. . . + 1

an

= 1q1q2− 1q2q3

+ . . .+ (−1)n−1

qn−1qn

para qualquer n ≥ 1.

Page 72: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

72 • Brincando de Matematico

8. Mostre que se os convergentes cn convergem para αentao:

(a) 0 < c2n+1 − α <1

q2n+1q2n, n ∈ N;

(b) 0 < α− c2n <1

q2n+1q2n, n ∈ N;

(c) 1k(k − 1) < |ck − α| ≤

1(k − 1)2 , k ∈ N.

Como consequencia das desigualdades acima, podemosconcluir que, dado n ∈ N, dentre todas as fracoes comdenominador ≤ qn, a fracao cn = pn

qne a que melhor

aproxima o numero α.

3.3 Aproximacao de numeros irra-cionais

Ja vimos que as fracoes contınuas conseguem aproximarum numero irracional tao bem quanto queremos, mas conve-nhamos que a expansao de uma fracao contınua nao e nemum pouco simples, certo?

Bom... Daı pode surgir uma questao: Sera que conse-guimos aproximar um numero irracional de uma forma quepareca mais simples? Sim! E o que falaremos nesta secao.

Aproximacao por inteiros

Sera que existem numeros racionais pq

que diferem de um

dado numero irracional por menos de 10−20? Veremos que epossıvel obter numeros racionais tao proximos de um numeroirracional dado quanto se deseje.

Page 73: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 73

Podemos arrendondar qualquer numero real para o in-teiro mais proximo, tendo erro menor que 1

2. Por exemplo,se substituirmos 3, 2 por 3, ou 13, 8 por 14, o erro nao sera,em cada caso, maior do que 1

2. Comecaremos a teoria dasaproximacoes com esse caso simples.Teorema 3.3.1. Para qualquer numero irracional α, existeum unico inteiro m tal que

−12 < α−m <

12 .

Demonstracao. Qualquer segmento AB, de comprimentounitario, marcado na reta real contera exatamente um in-teiro, a menos que A e B sejam pontos inteiros.

−3 −2 −1 0 1 2 3

A B

Seja A o ponto correspondente a α − 12 e B, o ponto

correspondente a α + 12 . Como α − 1

2 e α + 12 nao sao in-

teiros, sabemos que A e B nao podem ser pontos inteiros.Chamando de m o unico inteiro no segmento AB, vemos que

α− 12 < m < α + 1

2 .

Subtraindo α, obtemos

−12 < m− α < 1

2 .

Ja que m− α esta entre −12 e 1

2, temos que α−m tambemestara, implicando que

−12 < α−m <

12 .

Page 74: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

74 • Brincando de Matematico

Perceba que o inteiro m e unico, pois se existisse outro inteiron, satisfazendo

−12 < α− n < 1

2 ,

entao n satisfaria

α− 12 < n < α + 1

2 .

Mas o segmento AB contem apenas um inteiro, o que implicaque n = m.

Page 75: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 75

Aproximacao por numeros racionais

Comecemos por um exemplo. Vamos procurar numerosracionais que aproximem

√2 = 1, 41421356237309504880168872420969807...

Note que podemos utilizar qualquer uma das expansoes de-cimais

1; 1, 4; 1, 41; 1, 414; 1, 4142; ...Isso ocorre, pois todos esses numeros sao racionais e se apro-ximam de

√2 pela esquerda. Perceba que a diferenca entre√

2 e sua n-esima aproximacao racional e menor que 101−n,ou seja, quanto maior for o valor de n, melhor sera a apro-ximacao. Uma possıvel aproximacao para

√2 e

√2 ≈ 14142

10000 .

Pergunta: Sera que e possıvel encontrar uma boa apro-ximacao de

√2 que nao tenha um denominador tao grande?

Sim. De todos as fracoes racionais com denominador 12,temos que a que seja mais proxima do valor de

√2 e 17

12.Observe que:

√2–17

12 ≈ −0.0245

√2–141

100 ≈ 0.0421∣∣∣∣∣√2–1712

∣∣∣∣∣ <∣∣∣∣∣√2–141

100

∣∣∣∣∣Perceba que

1712 esta mais proximo de

√2 do que

141100.

Page 76: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

76 • Brincando de Matematico

Para nao dependermos mais dos denominadores que saopotencias de 10, mostraremos a seguir como obter apro-ximacoes por numeros racionais de denominador arbitrario.Teorema 3.3.2. Sejam λ um numero irracional qualquere n um numero inteiro positivo qualquer. Entao existe um

numero racional de denominador n, digamosm

n, tal que

− 12n < λ− m

n<

12n.

Demonstracao. Dado qualquer irracional λ e qualquer in-teiro positivo n, sabemos que, de fato, nλ e irracional. Defi-niremos, entao, m como sendo o inteiro mais proximo de nλe, assim,

−12 < nλ−m <

12 .

Dividindo as desigualdades pelo inteiro positivo n, temos

− 12n < λ− m

n<

12n,

como querıamos demonstrar.

Exemplo 3.3.3. Vimos no inıcio da discussao que

√2 ≈

1712.

Vamos aplicar o Teorema (3.3.2) e mostrar que, de fato,1712

aproxima λ =√

2 para n = 12. Consideremos o numeroirracional 12

√2 que tem valor aproximado

12√

2 = 16, 97056275...

Page 77: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 77

Portanto, o inteiro mais proximo de 12√

2 e 17. Pelo Teorema(3.3.1), temos que

−12 < 12

√2− 17 < 1

2 .

Se dividirmos essas desigualdades por n = 12, obteremos

− 124 <

√2− 17

12 <124 ,

o que querıamos mostrar.Exemplo 3.3.4. Queremos agora encontrar uma aproximacaopara

π = 3, 14159265358979323846264338327950288...

Podemos aproxima-lo utilizando uma de suas expansoes de-cimais, como por exemplo

π ≈ 314100 .

Mas ao inves disto, vamos aplicar a ideia apresentada noTeorema (3.3.2), sendo λ = π e n = 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,10. Note que os inteiros mais proximos de

π, 2π, 3π, 4π, 5π, 6π, 7π, 8π, 9π, 10π

sao, respectivamente,

3, 6, 9, 13, 16, 19, 22, 25, 28, 31.

Portanto os numeros racionais que procuramos sao31 ,

62 ,

93 ,

134 ,

165 ,

196 ,

227 ,

258 ,

289 ,

3110 .

onde o erro em cada uma dessas aproximacoes e menor do

que1

2n. Perceba que as fracoes nao sao necessariamenteirredutıveis.

Page 78: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

78 • Brincando de Matematico

Exercıcios 3.3.5. .

1. Ache os inteiros mais proximos de

(a)√

3 (b)4√

3 (c)√

13 (d)e (e)−3π2

2. Ache numeros racionaism

nque satisfacam o Teorema

(3.3.2), onde n = 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e

(a)λ =√

5 (b)λ =√

17 (c)λ = 4π

(d)λ = 7e (e)λ =2e5

3. Qual dos numeros racionais encontrados no Exemplo(3.3.4) melhor aproxima π? Justifique sua resposta.

3.4 Aproximacoes melhoresComo vimos, qualquer numero irracional λ pode ser apro-

ximado por um numero racional m/n ”a menos de 1/2n”,isto e, com um erro menor do que 1/2n. Sera que essa apro-ximacao pode ser feita a menos de 1/3n ou 1/4n, ou, talvez,com um erro menor ainda? A resposta e sim. No proximo te-orema veremos que λ pode ser aproximado por m/n, a menosde 1/kn, para qualquer k que desejamos especificar: k = 3,k = 4, k = 999999999. etc. Mas, enquanto a aproximacaoa menos de 1/2n pode ser conseguida para qualquer inteiropositivo n, a aproximacao que construiremos no teorema aseguir, com erro menor do que 1/kn, com dado k, nao poderaser obtida para todos os inteiros n.

Sera que podemos aproximar qualquer numero irracionalλ por m/n, a menos de 1/n2 ou 1/n3 ou com um erro ainda

Page 79: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 79

menor? A menos de 1/n2, sim, a menos de 1/n3, nao. Masesses serao topicos de secoes posteriores. Comecemos, entao,com aproximacoes de λ por m/n, a menos de 1/kn.Teorema 3.4.1. Quaisquer que sejam o numero irracionalλ e o inteiro positivo k, existe um numero racional m/n, cujodenominador nao excede k, tal que

− 1nk

< λ− m

n<

1nk.

Antes de apresentarmos a demonstracao do teorema acima,valida para quaisquer λ e k, demonstraremos o teorema numasituacao particular, a saber, para λ =

√3 e k = 8. Inici-

almente, enumeraremos os multiplos na forma λ , 2λ , 3λ , . . .kλ. Facamos uma lista dos multiplos de

√3, escrevendo cada

multiplo como soma de dois numeros positivos, um inteiro eum numero menor do que 1:

√3 = 1 + 0, 732 . . .

√3− 1 = 0, 732 . . .

2√

3 = 3 + 0, 464 . . . 2√

3− 3 = 0, 464 . . .3√

3 = 5 + 0, 196 . . . 3√

3− 5 = 0, 196 . . .4√

3 = 6 + 0, 928 . . . 4√

3− 6 = 0, 928 . . .5√

3 = 8 + 0, 660 . . . 5√

3− 8 = 0, 660 . . .6√

3 = 10 + 0, 392 . . . 6√

3− 10 = 0, 392 . . .7√

3 = 12 + 0, 124 . . . 7√

3− 12 = 0, 124 . . .8√

3 = 13 + 0, 856 . . . 3√

3− 13 = 0, 856 . . .

Dividindo todos os numeros compreendidos entre 0 e 1 em8 intervalos iguais, teremos entao 8 intervalos, I1, I2, I3, I4, I5,I6, I7, I8. Pensando em I1 como o intervalo que vai de 0 ate1/8, I2 o intervalo que vai de 1/8 ate 2/8, e assim por diante.Classificaremos, agora, as oito partes decimais dos multiplosde√

3 nas categorias I1,I2,...I8, da seguinte maneira:

Page 80: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

80 • Brincando de Matematico

(a) 0,732... esta em I6(pois 0,732...esta entre 5/8 e 6/8)

(b) 0,464... esta em I4

(c) 0,196... esta em I2

(d) 0,928... esta em I8

(e) 0,660... esta em I6

(f) 0,392... esta em I4

(g) 0,124... esta em I1

(h) 0,856... esta em I7

Usaremos o numero que esta em I1, na lista acima. Masos numeros em I1 estao entre 0 e 1/8, de modo que

0 < 7√

3− 12 < 18 .

Como o numero 7√

3 − 12 esta entre 0 e 1/8, ele certa-mente estara entre −1/8 e 1/8. Portanto,

−18 < 7

√3− 12 < 1

8 .

Dividindo esta desigualdade por 7, obtemos

− 17 · 8 <

√3− 12

7 <1

7 · 8 .

Esse e um resultado na forma do enunciado do Teorema(3.4.1), com k = 8, n = 7 e m = 12 .

Baseamos nosso argumento no fato de 7√

3−12 estar emI1. O que teriamos feito se nao existisse nenhum numero nointervalo I1? A resposta e que, se no intervalo I1 nao exis-tisse nenhum numero, entao em um dos intervalos I2,I3,...,I8

Page 81: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 81

existiriam dois ou mais numeros. No exemplo acima, taosomente existe um numero em I1, mas tambem existem doisnumeros em I4 e dois em I6, consideremos o par em I6:

(a) 0,732... esta em I6; isto e,√

3− 1 esta em I6;

(b) 0,660... esta em I6; isto e, 5√

3− 8 esta em I6.

Sempre que dois numeros estiverem em I6 (ou, em qual-quer outro dos demais intervalos), eles estarao a menos de1/8 um do outro, de modo que a sua diferenca estara entre-1/8 e 1/8. Em particular, para os dois numeros em I6,temos:

−18 < (5

√3− 8)− (

√3− 1) < 1

8

−18 < 4

√3− 7 < 1

8 .

Dividindo por 4, obtemos

− 14.8 <

√3− 7

4 <1

4.8 .

Esse e outro resultado na forma do enunciado do Teorema(3.4.1) para λ =

√3 e k = 8, dessa vez com n = 4 e m = 7.

Vamos agora apresentar a prova do Teorema (3.4.1).

Demonstracao. Dado um numero irracional λ e um inteiropositivo k, consideremos os k numeros λ , 2λ , . . . , kλ e escre-vamos cada um desses numeros como um inteiro mais umaparte fracionaria ou decimal

λ = α1 + β1 4λ = α4 + β4

2λ = α2 + β2...

3λ = α3 + β3 kλ = αk + βk

Page 82: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

82 • Brincando de Matematico

Em seguida, dividimos o intervalo de 0 a 1 em k partesI1,I2,I3,...,Ik, cada uma de comprimento 1/k. Assim, o in-tervalo I1 contera os numeros entre 0 e 1/k; I2, os numerosentre 1/k e 2/k, I3 os numeros entre 2/k e 3/k, etc. A pala-vra ”entre”esta sendo usada aqui, no sentido estrito, de modoque, por exemplo, os numeros 2/k e 3/k nao sao elementosdo intervalo I3. Observe que, cada um dos β1, β2, β3,...,βke irracional, portanto, nenhum dos β’s pode ser igual a umdos numeros racionais

0 , 1k,

2k,

3k, . . . ,

k − 1k

,k

k.

Portanto, cada βj esta exatamente em um dos intervalosI1,I2,I3,...,Ik. Existem duas possibilidades quanto a I1: ouI1 contem um ou mais β’s, ou I1 nao contem nenhum dosβ’s. Trataremos essas duas possibilidades separadamente.

Caso 1. O intervalo I1 contem um ou mais β’s. Por-tanto existe um β, digamos βn, no intervalo I1. O sımbolon representa um dos inteiros 1, 2, 3, . . . , k. O numero βn eigual a nλ-αn e, portanto, sabemos que

−1k< 0 < nλ− αn <

1k.

Dividindo por n, obtemos

− 1kn

< λ− αnn<

1kn.

Assim, o Teorema (3.4.1) fica provado nesse caso, poispodemos definir m como sendo o inteiro αn.

Caso 2. O intervalo I1 nao contem nenhum dos β’s.Nesse caso, os k numeros β1, β2, β3,. . . ,βk estao nos k − 1intervalos restantes I2 , I3 , . . . , Ik.

Neste ponto vamos aplicar o princıpio da casa dos pom-bos de Dirichlet que afirma: Se k pombos estiverem em k−1

Page 83: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 83

casas, existira pelo menos uma casa com dois ou mais pom-bos. Portanto, existe pelo menos um intervalo contendo doisou mais β’s. Suponhamos que βr e βj estejam no mesmointervalo, com r e j dois numeros distintos entre 1, 2, 3, ..., k.Suponhamos, ainda, que j seja maior que r, de modo quej − r sera um inteiro positivo, menor que k.

Por estarem βr e βj no interior do mesmo intervalo decomprimento 1/k, sua diferenca estara entre −1/k e 1/k.Assim,

−1k< βj − βr <

1k.

Mas βj = jλ− αj e βr = rλ− αr, de modo que

−1k< (jλ− αj)− (rλ− αr) <

1k

ou

−1k< (j − r)λ− (αj − αr) <

1k

Chamando j − r de n e αj − αr de m, temos

−1k< nλ−m <

1k

Por definicao, n e um inteiro positivo, e portanto, pode-mos dividir a desigualdade por n e obter:

− 1kn

< λ− m

n<

1kn.

Alem do mais, sabemos que n, por ser igual a j−r e menordo que k e assim completamos a demonstracao do Teorema(3.4.1). Observe que a fracao m/n nao e, necessariamente,irredutıvel.

Page 84: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

84 • Brincando de Matematico

Exercıcios 3.4.2. .

1. Apos o enunciado do Teorema (3.4.1), ha um exemplopara o caso λ =

√3 e k = 8. que valores de m e

n terıamos obtido se tivessemos escolhido os numer-os 0, 464 · · · e 0, 392 do intervalo I4, em vez dos doisnumeros do intervalo I6?

2. Aplique o metodo dado na demonstracao do Teorema(3.4.1) em cada um dos seguintes casos e obtenha, as-sim, valores de m e n satisfazendo as desigualdades doTeorema (3.4.1):

(a) λ =√

3 e k = 2 (e) λ =√

2 e k = 8(b) λ =

√3 e k = 10 (f) λ =

√5 e k = 8

(c) λ =√

2 e k = 4 (g) λ =√

7 e k = 10(d) λ = π e k = 2 (h) λ = π e k = 8

3.5 Aproximacoes a menos de 1/n2

No comeco da secao (3.4), indicamos a direcao dos nossosestudos, a saber, buscar aproximacoes racionais para qual-quer numero irracional λ. Iniciamos com aproximacoes de λ,por m/n, com erro inferior a 1/2n, n ∈ N qualquer, e depoispassamos a aproximacoes com erro inferior a 1/kn, para al-gum n ≤ k, conforme o Teorema (3.4.1). Vamos obter agoraaproximacoes com erros menores do que 1/n2.Teorema 3.5.1. Para todo numero irracional λ, existeminfinitos numeros racionais m/n, em forma irredutıvel, taisque

− 1n2 < λ− m

n<

1n2 .

Page 85: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 85

Demonstracao. Observemos, inicialmente, que, qualquer nu-mero racional m/n, satisfazendo a desigualdade do Teorema(3.4.1), automaticamente satisfara a desigualdade do Teo-rema (3.5.1). A razao e a seguinte: como n nao excede k,e k ≥ n, podemos deduzir que 1/kn ≤ 1/n2. Portanto,qualquer numero que esteja entre −1/kn e 1/kn devera, cer-tamente, estar entre −1/n2 e 1/n2.

A seguir, mostraremos que, se um numero racional m/n,nao em forma irredutıvel, satisfizer as desigualdades do teo-rema, entao o mesmo numero racional, em forma irredutıvel,satisfara as desigualdades apropriadas. Denotemos por M/Na forma irredutıvel de m/n. Podemos supor que ambos, ne N , sejam positivos, deixando qualquer sinal negativo serabsorvido pelo numerador. Temos, entao que m/n = M/N ,0 < N ≤ n, porque simplificar uma fracao ate torna-la irre-dutıvel nao altera o valor da fracao, mas reduz o tamanhodo denominador. Portanto, se λ satisfizer

− 1n2 < λ− m

n<

1n2 ,

automaticamente satisfara

− 1N2 < λ− M

N<

1N2 .

Para completar a demonstracao do teorema, precisamosdemonstrar que existe uma infinidade de numeros racionais,em forma irredutıvel, satisfazendo as desigualdades reque-ridas. Suponhamos, ao contrario, que exista apenas umnumero finito dessas fracoes, digamos

m1

n1,m2

n2,m3

n3, ...,

mi

ni.

Page 86: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

86 • Brincando de Matematico

Consideremos entao, os i numeros

λ− m1

n1, λ− m2

n2, ..., λ− mi

ni.

Podemos ver claramente que todos sao irracionais, pois λ eirracional, portanto, nenhum deles e zero. Alguns podem serpositivos, outros negativos; vamos escolher um inteiro k, taogrande, que 1/k esteja entre 0 e todos os numeros positivos e−1/k esteja entre 0 e todos os numeros negativos. Isso podeser feito pois, quanto maior escolhermos k, mais proximos de0 estarao os numeros −1/k e 1/k. Escolhamos, entao, k taogrande que as seguintes desigualdades sejam todas falsas.

−1k

< λ− m1

n1<

1k

−1k

< λ− m2

n2<

1k

... ... ... ... ...

−1k

< λ− mi

ni<

1kn

Para esse valor de k, vamos aplicar o Teorema (3.4.1) e obterum numero racional m/n tal que

− 1kn

< λ− m

n<

1kn.

Isso nos diz que λ−m/n esta entre−1/kn e 1/kn e, portanto,λ−m/n tera que estar entre −1/k e 1/k; em sımbolos:

−1k< λ− m

n<

1k.

Mas como todas as desigualdades sao falsas, concluımos quem/n e diferente de cada um dos i numeros m1/n1, m2/n2,...,

Page 87: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 87

mi/ni. Portanto, obtivemos mais um numero racional satis-fazendo as desigualdades do Teorema (3.5.1), contradizendonossa hipotese.

Exemplo 3.5.2. Vamos determinar quatro aproximacoesracionais (em forma irredutıvel) do numero π, suficiente-mente proximas de π para satisfazer as desigualdades doTeorema (3.4.1).

Observemos, inicialmente, que sendo π = 3, 14159 . . .,

− 112 < π − 3

1 <112 e − 1

12 < π − 41 <

112 .

Para achar duas outras aproximacoes, podemos usar outrosmetodos para obter os numeros racionais mais proximos deπ, com denominadores 2,3,4 :

62 ,

93 ,

134 ,

165 ,

196 ,

227 , . . .

Rejeitamos 6/2 e 9/3 por nao serem fracoes irredutıveis etestamos as demais para ver se satisfazem as desigualdadesdo Teorema (3.5.1); por exemplo,

− 136 < π − 19

6 <136 (Verdade!)

Somos, assim, levados a rejeitar 13/4 e 16/5, mas aceitar19/6 e 22/7. Portanto, um conjunto de respostas ao pro-blema seria 3/1 , 4/1 , 19/6 e 22/7.

O numero racional 22/7 e uma aproximacao muito boa epratica de π. Nao existe numero racional com denominadorentre 1 e 56 que esteja mais proximo de π. O numero 179/57esta um pouquinho mais proximo de π do que 22/7, mas naosatisfaz as desigualdades do Teorema (3.4.1). O numero ra-cional 355/113 satisfaz as desigualdades do Teorema (3.4.1)

Page 88: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

88 • Brincando de Matematico

e esta bem mais proximo de π do que 22/7. De fato, suasseis primeiras casas decimais coincidem com as de π.

Pode-se demonstrar a seguinte versao, mais forte, do Te-orema (3.4.1) : Para todo numero irracional λ, existem in-finitos numeros racionais m/n, em forma irredutıvel, taisque:

1n(n+ 1) < λ− m

n<

1n(n+ 1) .

Com ajuda desse teorema, no exemplo acima, o numero 4/1(que e uma aproximacao horrıvel para π) pode ser eliminado.

Para demonstrar a versao mais forte do Teorema (3.5.1),vamos precisar de uma versao mais forte do Teorema (3.4.1).A ideia da demonstracao e similar aquela utilizada na de-monstracao do Teorema (3.4.1), onde usamos o princıpioda casa de pombo de Dirichlet para concluir que, dados knumeros, distribuıdos em k intervalos, ou existe um numerono primeiro intervalo, ou existe um intervalo contendo pelomenos dois desses numeros. Para obter a versao mais forte,basta dividir o nosso intervalo unitario em k+ 1 subinterva-los e observar que dados k numeros, distribuıdos em k + 1intervalos, ou existe um numero no primeiro intervalo, ouexiste um numero no ultimo intervalo, ou existe um intervalocontendo pelo menos dois numeros. Esse uso do princıpio dacasa do pombo, nos permite escrever a seguinte desigualdademais forte

− 1n(k + 1) < λ− m

n<

1n(k + 1) .

Usando esta expressao, a demonstracao da versao mais fortedo Teorema (3.4.1) e imediata.Exercıcios 3.5.3.

1. Para um dado numero irracional λ, demonstre que

Page 89: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Fracoes Contınuas e Aproximacoes • 89

dois dos infinitos numeros racionais m/n do Teorema(3.4.1), tem n = 1, isto e, sao inteiros.

2. Ache dois numeros racionais, nao inteiros, que satisfacamas desigualdades do Teorema (3.4.1) para

(a)λ =√

2 (b)λ =√

3(c)λ =

√5 (d)λ =

√7

3. Complete a demonstracao mais forte do Teorema (3.4.1)baseando-se na ideia que demos antes dos exercıcios, emostre que π − 4/1 e π − 19/6 nao satisfazem a desi-gualdade mais forte, no entanto π − 22/7 a satisfaz.

4. Ache uma boa aproximacao racional para os seguintesnumeros irracionais:(a) λ = e, (e = 2, 7182...)

(b) λ = Φ, (Φ = 1 +√

52 = 1, 61803...)

(c) λ = sen1, (sen1 = 0.8414...)(d) λ = ln 2, (ln 2 = 0.693147...)

3.6 Retoques finaisAte agora, vimos que, para qualquer numero irracional

λ, existem infinitos racionais, m/n tais que

− 12n < λ− m

n<

12n .

Depois, vimos que da para melhorar ainda mais:

− 1kn

< λ− m

n<

1kn

,

Page 90: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

90 • Brincando de Matematico

e fomos ainda mais longe, provando a existencia de uma apro-ximacao do tipo

− 1n2 < λ− m

n<

1n2 .

Conseguimos torna-la ainda mais forte, chegando a

− 1n(n+ 1) < λ− m

n<

1n(n+ 1) .

Fazendo um paralelo com os resultados anteriores, sera quedaria para melhorar ainda mais? Aproximar por

− 12n2 < λ− m

n<

12n2 ?

A resposta e sim! Nao demonstraremos aqui, mas a relacaoacima e verdadeira; a questao e, quao boa e a aproximacao deum numero usando esse tipo de relacao? Existe um teoremafamoso, afirmando que, para qualquer λ irracional, existemm/n tais que

− 1√5n2

< λ− m

n<

1√5n2

.

E mais, que√

5 e a constante que fornece a melhor apro-ximacao possıvel desse tipo. Isso significa que, se substi-tuirmos

√5 por qualquer numero maior, a afirmacao, torna-

se falsa. Portanto, para aproximacoes desse tipo e nıvel, arelacao

− 1√5n2

< λ− m

n<

1√5n2

e a melhor de todas.

Page 91: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Capıtulo 4

Sequencias e Series

4.1 Bases NumericasA necessidade de contar surgiu com o desenvolvimento

das atividades humanas. Assim, foram criados varios sis-temas de numeracao, como o egıpcio, romano, e o sistemaposicional.

O sistema universalmente utilizado atualmente para re-presentar numeros e o sistema decimal posicional, desenvol-vido a partir so sistema Hindu. Apos varias modificacoesfeitas, principalmente, pelos arabes, temos o Sistema comoele e hoje. Esse sistema chegou no Ocidente no no seculo IX,gracas a Abu Jafas Musal-Khwarizmi.

Para entender melhor como funciona o Sistema Posicio-nal, tomemos um numero escrito no sistema decimal usual.Nesse sistema, todo numero positivo pode ser representadocomo uma soma de unidade, dezena, centena, e assim pordiante; de tal forma que teremos uma soma de potencias de10 com coeficientes variando de 0 a 9.Exemplo 4.1.1. O numero 4325 pode ser visto como a somade 5 unidades, com 2 dezenas, 3 centenas e 4 milhares, ou

Page 92: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

92 • Brincando de Matematico

seja, 4325 e uma abreviacao da expressao

4.103 + 3.102 + 2.101 + 5.100

ou ainda

4.103 + 3.102 + 2.10 + 5.

O Sistema Posicional de representacao consiste em escre-ver, de forma unica, um numero N natural utilizando umabase b. No exemplo que acabamos de ver, tınhamos N =4325 e b = 10.

De uma forma mais geral, dados a, b ∈ N, com b > 1,existem numeros naturais c0, c1, . . . , cn menores que b, uni-vocadamente determinados, tais que a = c0+c1b+c2b

2+. . .+cnb

n. Esse resultado segue da aplicacao da divisao euclidi-ana e pode ser verificado que e valido usando o Princıpio deInducao. Se a = 0 ou se a = 1, basta tomar n = 0 e c0 = a.Supondo o resultado valido para todo natural menor que a,vamos prova-lo para a. Pela divisao euclidiana, temos queexistem q e r unicos tais que

a = bq + r, com r < b.

Como q < a, pela hipotese de inducao, segue que existemnumeros naturais n′ e d0, d1, . . . , d

′n com dj < b, para todo j

tais que

q = d0 + d1b+ . . .+ dn′bn′ .

Juntando as igualdades acima, teremos

a = bq + r = b(d0 + d1b+ . . .+ dn′bn′) + r,

que nos dara o resultado colocando c0 = r, n = n′ + 1 ecj = dj − 1 para j = 1, . . . , n.

Page 93: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 93

Exemplo 4.1.2. Representacao de um numero na base 7:

(6241)7 = 6.73 + 2.72 + 4.7 + 1

Essa demonstracao nos fornece, tambem, um algorıtimopara determinar a expansao de um numero qualquer relativa-mente a base b. Trata-se de aplicar sucessivamente a divisaoeuclidiana.Exemplo 4.1.3. Consideremos, o numero (13)10. Ao divi-dirmos por 2, temos quociente 6 e resto 1. Assim, temos que1 e o ultimo algarismo de (13)10 na base 2. Para obter oproximo algarismo, dividimos 6 por 2, obtendo quociente 3e resto 0, onde 0 e algarismo esperado. Por fim, dividimos3 por 2 e obtemos quociente 1 e resto 1, que serao os doisultimos algarismos restantes. Portanto, (13)10 = (1101)2.

As mesmas regras praticas para efetuar calculos no sis-tema decimal sao tambem validas em qualquer outra base.Na adicao, primeiro somamos as unidades, depois passamosa ordem seguinte e assim por diante. Lembrando que deveser feita uma transferencia a ordem seguinte toda vez queem uma ordem se obtem uma soma maior ou igual a base dosistema. A mesma ideia vale para a subtracao.Exemplo 4.1.4. Vamos ver como efetuar a soma entre(23651)8 e (17043)8:

Ja a multiplicacao, e baseada na tabua de multiplicar,que oferece o produto dos numeros menores que a base dosistema. Para multiplicar um numero x por um numero y,

Page 94: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

94 • Brincando de Matematico

localizamos x na 1a coluna e y na 1a linha. Assim, temos oproduto xy na intersecao da linha de x com a coluna de y.Exemplo 4.1.5. Vejamos a tabela de multiplicar da base 5:

Temos, pela tabela

(3)5 · (4)5 = (22)5.

A tabela tambem pode ser utilizada para multiplicar numerosmaiores

E na divisao, aplicamos o mesmo metodo que usamos nosistema decimal (”em chaves”) em qualquer outro sistema,com o auxılio da tabela de multiplicacao e tomando cuidadocom as subtracoes.Exemplo 4.1.6. Vamos ver como calcular (231)5 ÷ (21)5:

.

Ate agora falamos apenas de numeros inteiros, mas re-presentacao decimal dos inteiros e naturalmente estendida

Page 95: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 95

as fracoes decimais. Nesse caso, consideramos nao apenas aspotencias nao negativas do numero, mas tambem as negati-vas (10−1, 10−2, . . .).Exemplo 4.1.7. O numero 45, 532 e abreviacao da expressao

4.101 + 5.100 + 5.10−1 + 3.10−2 + 2.10−3.

Mais que isso, fracoes podem tambem ser representadasem qualquer outra base. Dado α ∈ R+ e uma base b > 1qualquer, existem a0, a1, ..., ar, c1, c2, ..., cs, . . . ∈ {0, 1, . . . , b−1}, tais que

α = (arbr + ...+a1b+a0)+(c1b−1 + c2b

−2 + . . .+ csb−s+ . . .) .

As duas parcelas entre parenteses da soma acima sao, res-pectivamente, a parte inteira de α e a parte nao-inteira deα.Denotamos α = (ar . . . a1a0, c1c2 . . . cs . . .)b.Exemplo 4.1.8. O numero (102, 1201)3 e uma abreviacaoda expressao

1 · 32 + 0 · 31 + 2 · 30 + 1 · 3−1 + 2 · 3−2 + 0 · 3−3 + 1 · 3−4.

A conversao da parte inteira de um numero ja sabemoscomo fazer. A parte fracionaria e um pouco diferente.Exemplo 4.1.9. Seja o numero 42, 75 escrito na base 10 evamos escreve-lo na base 3. Sabemos que sua parte inteira(42)10 = (1120)3. Agora, para converter a parte fracionaria0, 75, usamos a seguinte ideia:

0, 75 · 3 = 2, 25

Guardamos a parte inteira 2 e na proxima etapa, multipli-camos apenas a parte fracionaria:

0, 25 · 3 = 0, 75

Page 96: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

96 • Brincando de Matematico

Guardamos, novamente, a parte inteira 0 e multiplicamosapenas a parte fracionaria:

0, 75 · 3 = 2, 25⇒ 20, 25 · 3 = 0, 75⇒ 0

. . .

Fazendo isso continuamente, obtemos a escrita da parte fra-cionaria na base 3 usando as partes inteiras que obtemos nasmultiplicacoes acima:

(0, 75)10 = (0, 20202...)3

Portanto,

(42, 75)10 = (1120, 20202...)3.

Vamos encerrar esta secao falando um pouco sobre onumero de dıgitos da representacao de um numero em umadeterminada base.Exemplo 4.1.10. Dados n, b ∈ N, b > 1, ja observamos quea representacao de n na base b e composta por uma sequenciade dıgitos (ckck−1 . . . c1c0) determinados unicamente pela igual-dade

n = ckbk + . . .+ c1b+ c0 ,

sendo que c0, c1, . . . , ck ∈ {0, 1, . . . , b − 1}. Como a repre-sentacao acima e unica, e imediato verificar que k = k(n) eo maior inteiro tal que bk ≤ n; em particular, temos bk(n) ≤n < bk(n)+1. Usando a funcao logb(x), logaritmo na base b,temos k(n) ≤ logb n < k(n) + 1. Logo, k(n) = blogb nc + 1,onde bxc denota o maior inteiro menor ou igual a x. Por-tanto, o numero de dıgitos necessarios para representar n nabase b e igual a

k(n) = blogb nc+ 1 .

Page 97: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 97

A formula acima e interessante especialmente porque per-mite determinar o numero de dıgitos da representacao deum numero em uma determinada base sem necessariamenteescreve-lo explicitamente. Por exemplo, no sistema decimal,k(21000) + 1 = blog10(21000)c+ 1 = b1000 · log10 2c+ 1 = 302,ou seja, o numero 21000 possui 302 dıgitos no sistema decimal!Exercıcios 4.1.11.

1. Dados os numeros 4783 e 54,321 na base 10, escreva-osnas bases 2, 3, 6 e 8 com aproximacao de quatro casasdecimais.

2. (Criterio de divisibilidade por 2) Seja dado umnumero a, representado na base 10 por a = an . . . a1a0.Usando o fato de que 2k divide 10k, mostre que 2kdivide a se, e somente se, o numero ak−1 . . . a1a0 edivisıvel por 2k. Em particular, a e divisıvel por 2 se,e somente se, a0 e 0, 2, 4, 6 ou 8.

3. Utilize a tabuada da base 5 para calcular 132 + 413 e23 · 342, sendo que estes numeros estao na base 5.

4. No quadro negro esta escrito um exercıcio de matematicaparcialmente apagado: 23?5? + 1?642 = 42423. Des-cubra em qual sistema numerico foram efetuadas ascontas e quais sao as parcelas desconhecidas.

5. (Unicidade da representacao decimal) Sejam a =0.a1a2 a3 . . . e b = 0.b1b2b3 . . . duas dızimas quaisquerrepresentadas na base 10, com aj, bj ∈ {0, 1, 2, . . . , 8, 9},j ∈ N. Neste exercıcio, vamos provar que, a menos deuma unica ambiguidade, estas dızimas representam omesmo numero se e so se ak = bk para todo k ∈ N.

Page 98: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

98 • Brincando de Matematico

(a) Mostre que a1

10 + a2

102 + a3

103 + . . . ≤ 1, sendo quea igualdade so ocorre se aj = 9 para todo j ∈ N.

(b) Mais geralmente, mostre quea1

10+ a2

102 +. . .+ ak10k+. . . ≤ a1

10+ a2

102 +. . .+ ak10k+ 1

10k

sendo que a igualdade ocorre se e so se aj = 9para todo j > k.

(c) Conclua que se a = b entao, ou aj = bj para todoj ∈ N ou existe k ∈ N tal que aj = bj para j < k,bk = ak + 1, bj = 0 e aj = 9 para todo j > k.Ou seja, as unicas ambiguidades de representacaopossıveis sao do tipo 0.235 = 0.23499999 . . . ou0.19778 = 0.1977799999 . . ., etc. Em particular, arepresentacao decimal de um numero irracional eunica.

4.2 SequenciasO que e uma sequencia? Intuitivamente uma sequencia

numerica e uma sucessao de numeros dada por uma regra ourelacao de recorrencia. A definicao matematica precisa desequencia e mais abstrata e nao iremos aborda-la. Para nos,a nocao intuitiva sera suficiente.Exemplo 4.2.1 (Sequencia de Fibonacci). Uma sequen-cia que aparece em alguns fenomenos e a sequencia de Fibo-nacci (sendo o n-esimo termo dessa sequencia denotado porFn) que e dada pela seguinte relacao de recorrencia:

F1 = 1, F2 = 1, Fn = Fn−1 + Fn−2 .

Ou seja, a sequencia de Fibonacci e 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34,55, . . . . A primeira mencao desta sequencia no Ocidente foi

Page 99: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 99

no livro Liber Abbaci, em 1202, por Leonardo Pisaro, tambemconhecido como Fibonacci. Neste livro, ele propoe o seguinteproblema:

”Um certo homem coloca um casal de coelhos recem nas-cidos num local isolado. Sabendo que um coelho demora ummes para se tornar fertil, que depois de um mes cada ca-sal produz um novo casal e nenhum coelho morre, quantoscoelhos haverao no final de um ano?”

Exemplo 4.2.2. Consideremos a sequencia xn = sen(nπ

2

),

n ∈ N. Os valores da sequencia sao 1, 0,−1, 0, 1, 0,−1, 0, . . . .Observamos que

x4m+1 = sen(

(4m+ 1)π2

)= sen

(2mπ + π

2

)= 1 ,

x4m+3 = sen(

(4m+ 3)π2

)= sen

(2mπ + 3π

2

)= −1

e x2m = sen(

(2m)π2

)= sen (mπ) = 0, para todo m ∈ N.

Isso mostra que a cada quatro termos os valores se repetem,razao pela qual chamamos a sequencia de periodica, neste

Page 100: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

100 • Brincando de Matematico

caso, de perıodo 4. Temos tambem que, a medida que ncresce, os valores da sequencia nao se aproximam de nenhumvalor especıfico.Exemplo 4.2.3. Dado um numero real α > 0, os numerosβn,an e cn, n ∈ N, construıdos na secao (3.2) tambem forne-cem exemplos de sequencias.

4.3 Convergencia e LimitesEmpiricamente falando, dizemos que uma sequencia con-

verge quando os valores da sequencia se aproximam de umvalor fixado, a medida que n cresce. Neste caso, chamamosde limite ao valor do qual a sequencia se aproxima arbitrari-amente e este valor e denotado por limn→+∞ xn, ou simples-mente, lim xn. Dizemos que uma sequencia diverge quandonao ha nenhum valor real do qual a sequencia se aproxima amedida que n cresce.

Quando a sequencia divergente cresce ou decresce inde-finidamente dizemos que, apesar de nao ser convergente, olimite e +∞ ou −∞, respectivamente.

Um bom exemplo de sequencia convergente e dado porxn = 1/n, n ∈ N. E facil perceber que quando n cresce xn seaproxima de 0, pois x1 = 1, x2 = 1/2, x3 = 1/3 = 0, 333 . . .,x10 = 1/10 = 0, 1 , . . . , x100 = 1/100 = 0, 01 , . . ..

Para facilitar o calculo de limites, apresentaremos algu-mas regras aritmeticas simples que sao muito uteis para ocalculo de limites. Sejam (xn), (yn), (zn), (wn) sequencias denumeros reais tais que lim xn = a e lim yn = b. Entao everdade que:

(i) lim (xn ± yn) = a± b;

(ii) lim (xn · yn) = a · b;

Page 101: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 101

(iii) lim(xnyn

)= a

b, se b 6= 0;

(iv) Se xn ≤ zn ≤ yn para n ≥ N , onde N ∈ N e fixado, elim xn = lim yn = c entao lim zn = c;

(v) Se zn ≤ wn para n ≥ N , onde N ∈ N e fixado,e lim zn = +∞ entao limwn = +∞. De maneiraanaloga, se limwn = −∞ entao lim zn = −∞.

Exemplo 4.3.1 (Aproximacoes Sucessivas). Considerea sequencia que aproxima π a partir de suas casas decimais

a1 = 3; a2 = 3, 1; a3 = 3, 14; a4 = 3, 141; a5 = 3, 1415; . . .

Essa sequencia tem limite e limn→∞ an = π.Existe uma categoria de sequencias que apresentam um

comportamento bastante simples, sobre as quais pode-se in-ferir um resultado de convergencia muito importante. Sao aschamadas sequencias monotonas que passamos a descrever.Uma sequencia (xn) e dita crescente se xn < xn+1 e decres-cente se xn > xn+1, para todo n ∈ N. A sequencia (xn) edita monotona se for crescente ou decrescente.

Por exemplo, as sequencias

xn = 1n, xn = −n , xn = 1

n2 + n+ 1sao decrescentes e as sequencias

xn = n− 1n

, xn = 2n+ sen2n , xn = n3 + 3n

sao crescentes. Evidentemente, uma sequencia pode nao sernem crescente nem decrescente, como a do exemplo (4.2.2).O proximo resultado e de grande importancia historica e suademonstracao pode ser encontrada em [12].

Page 102: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

102 • Brincando de Matematico

Teorema 4.3.2. Se (xn) e uma sequencia monotona, entaoexiste limn→∞ xn (podendo ser inclusive ±∞).

Em situacoes praticas, ocorre as vezes de nao ser ne-cessario estudar a totalidade dos termos de uma sequenciapara obter alguma informacao util. Pode ser que estudandoapenas algumas porcoes da sequencia, ja possamos obter al-gumas informacoes relevantes. Estas porcoes sao chamadasde subsequencias, as quais passamos a descrever.

Uma subsequencia de uma sequencia (xn) e obtida a par-tir de uma escolha crescente de naturais n1 < n2 < n3 <. . . < nk < . . ., aos quais correspondem os termos xn1 , xn2 , xn3 ,. . . , xnk

, . . . da sequencia original. Esta nova sequencia e cha-mada de subsequencia da sequencia dada. Evidentemente,qualquer subsequencia de uma sequencia convergente tambemconverge para o mesmo limite que a sequencia original.Exemplo 4.3.3. Dado um numero real a > 0, consideremosa sequencia dada por xn = an, n ∈ N. Para estudar estasequencia, vamos considerar tres situacoes possıveis:

1. Se a = 1, temos que xn = an = 1, n ∈ N, logolimn→∞ xn = 1.

2. Se a > 1, podemos escrever que a = 1 + h para h > 0.Entao, pela expansao binomial,

an = (1+h)n = 1+nh+ n(n− 1)2 h2 + ...+hn ≥ 1+nh ,

para todo n ≥ 1. Como sempre se consegue n de formaque 1 +nh seja tao grande quanto se queira temos quelimn→∞ (1 + nh) = +∞. Pela regra de limite (v), comoan ≥ 1 + nh entao limn→∞ a

n = +∞.

3. Se 0 < a < 1 entao 1 > a > a2 > ... > an, ouseja, a sequencia e decrescente, portanto existe ` =

Page 103: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 103

limn→∞ an. Olhando para a subsequencia x2n = a2n

temos que

` = limn→∞

an = limn→∞

a2n =(

limn→∞

an)2

= `2 .

Logo `2 = ` ⇒ ` = 0 ou ` = 1. Como xn < 1 paran ≥ 1, e xn decresce temos que ` = 0.

Exemplo 4.3.4 (Juros Compostos). Considere um capi-tal inicial C0, o qual aplicaremos a uma taxa de juros com-postos α, α > 0, capitalizado uma vez ao ano. O capital C1apos um ano sera C1 = C0 + αC0 = (1 + α)C0. Ao final dosegundo ano, o capital sera C2 = C1 +αC1 = (1+α)2C0. Aofinal de k anos, o capital sera

Ck = (1 + α)kC0 .

Vamos agora capitalizar os valores de outra forma: ao invesde aplicarmos a taxa de juros em um so momento, vamosdividı-la em duas partes iguais, cada uma das quais seraaplicada a cada seis meses. Sendo assim, o capital apos seismeses sera C1/2 = C0 + α

2C0 =(

1 + α

2

)C0. Apos um ano, o

capital sera C1 = C1/2 + α

2C1/2 =(

1 + α

2

)2C0. De maneira

geral, apos k perıodos de seis meses, o capital sera

Ck/2 =(

1 + α

2

)kC0 .

Dado n ∈ N, podemos dividir o ano em n perıodos iguais e,de maneira mais geral, capitalizar a taxa de juros α/n ao finalde cada perıodo. Capitalizando desta forma, o capital apos

Page 104: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

104 • Brincando de Matematico

k perıodos sera Ck/n =(

1 + α

n

)kC0 . Escrevendo t = k/n

temos

Ct =(

1 + α

n

)ntC0 =

((1 + α

n

)n)tC0 .

Podemos pensar o que acontece com o capital se capita-lizarmos os juros em perıodos cada vez menores. Em termosmatematicos, basta verificar o que acontece com a expressaoacima quando n→∞. Para simplificar um pouco as contas,vamos considerar α = 1; temos entao a seguinte sequencia

an =(

1 + 1n

)n

Vamos mostrar que e uma sequencia convergente. Temospelo Binomio de Newton que:

an = 1+n(

1n

)+n(n− 1)

2!

(1n

)2

+. . .+n(n− 1) . . . 2 · 1n!

(1n

)n

≤ 1 + 1 + 12! + . . .+ 1

n! ≤ 1 + 1 + 12 + . . .+ 1

2n−1

Na proxima secao mostraremos que para a 6= 1 temos

1 + a+ a2 + a3 + . . .+ an = 1− an+1

1− a ,

logo

an ≤ 1 +1− 1

2n

1− 12

= 1 + 2(

1− 12n

)= 3− 1

2n−1 < 3 .

Consideremos os primeiros termos da sequencia:

a1 = (1 + 1)1 = 1 + 1 = 2

Page 105: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 105

a2 =(

1 + 12

)2

= 1 + 1 +(

12

)2

= 2, 25

a3 =(

1 + 13

)3

= 1 + 1 + 13 +

(13

)3

= 2, 370370 . . .

Observe que a cada termo da sequencia e adicionada umaparcela a soma e cada uma dessas parcelas aumenta. Estepadrao se repetira para o restante da sequencia, que por-tanto, e crescente. Em particular, (an) e convergente.

Dessa maneira podemos definir e .= limn→∞

(1 + 1

n

)n≈

2, 71828. Pode-se mostrar que:

limn→∞

(1 + 1

n

)n= lim

n→∞

[1 + 1 + 1

2! + ...+ 1n!

]= e

e para todo α ∈ R

eα = limn→∞

(1 + α

n

)nVoltando ao problema da capitalizacao, vemos que se o numerode capitalizacoes n→∞, temos

C(t) = limn→∞

C0

(1 + α

n

)nt= C0e

αt .

Assim como o π o numero e aparece naturalmente em variosproblemas na Matematica.Exemplo 4.3.5 (Metodo babilonico para extracao deraızes quadradas). Dado b > 0, consideremos a seguintesequencia

an+1 = 12

(an + b

an

).

Page 106: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

106 • Brincando de Matematico

Se essa sequencia for convergente, ` = lim an e ` > 0, entao

` = 12

(`+ b

`

)⇒ ` = b

`⇒ `2 = b⇒ ` =

√b

Note que se x > 0, entao(x+ b

x

)≥√b e vale a igualdade

somente para x =√b, entao se 0 < a0 6=

√b temos que

an+1 >√b para qualquer n ∈ N. Mostraremos que se a1 ≥√

b entao (an) converge para√b.

an+1 −√b = an

2 −√b+ b

2an= an

2 −√b

2 −√b

2 + b

2an

an+1 −√b = an −

√b

2 − an√b− b

2an= 1

2(an −√b)1−

√b

an

an+1 −√b = 1

2(an −√b)1−

√b

an

(∗)≤ 1

2(an −√b)

(∗) an >√b > 0⇒ −1 < −

√b

an< 0

Logo:

an+1 −√b ≤ 1

2(an −√b) ≤ ... ≤

(12

)n(a1 −

√b)

0 ≤ limn→∞

(an+1 −√b) ≤ lim

n→∞

(12

)n(a1 −

√b) = 0

Segue que a sequencia converge e limn→∞ an+1 =√b.

Suponha b = 2 e a0 = 1:

Page 107: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 107

a1 = 12

(1 + 2

1

)= 3

2 = 1, 5

a2 = 12

32 + 2

32

= 1712 = 1, 416666...

a3 = 12

1712 + 2

1712

= 577408 = 1, 414215...

√2 = 1, 414213...

Exemplo 4.3.6. Seja xn a sequencia dada por

xn = n√n

Observe quex1 = 1 <

√2 = x2

(x2)6 = (√

2)6 = 8 < 9 = ( 3√

3)6 = (x3)6 ⇒ x2 < x3

x3 = 3√

3 >√

2 = 4√

4 = x4

Vemos quen√n > n+1

√n+ 1⇔ ( n

√n)n(n+1) > ( n+1

√n+ 1)n(n+1) ⇔

⇔ nn+1 > (n+ 1)n ⇔ n >

(1 + 1

n

)nAssim, se n ≥ 3 temos que xn > xn+1. Como para qualquern > 1 tem-se que n

√n > n

√1 = 1, entao a sequencia converge,

digamos para `. Antes de mostrar qual e o limite `, mostre-mos que limn→∞

n√

2 = 1. A convergencia e facil, visto quese n > 2, entao n

√n > n

√2 > 1, e para qualquer n ∈ N temos

que n√

2 > n+1√

2. Seja entao b = limn→∞n√

2, deste modo√b = limn→∞

2n√

2 = b⇒ b = 1. Consequentemente,

`2 =(

limn→∞

2n√

2n)2

=(

limn→∞

n√

2)(

limn→∞

n√n)

= limn→∞

n√n = `

Page 108: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

108 • Brincando de Matematico

`2 = `⇒ ` = 1 .Exercıcios 4.3.7.

1. Seja (bn) a seguinte sequencia:

b0 =√

2, bn+1 =√

2 + bn

Mostre por inducao em n que (bn) e crescente paran ≥ 0, seguindo os seguintes passos:

(a) Mostre que a afirmacao e valida para n = 0, ouseja, b0 ≤ b1.

(b) Mostre que se a afirmacao vale para n ≥ 0, entaovale para n+ 1, isto e, se bn ≤ bn+1 entao bn+1 ≤bn+2.

(c) Mostre que (bn) e limitada, utilizando os passosanteriores.

(d) Calcule o limite.

2. Considere a sequencia an =√n2 + 1− n, n ∈ N.

(a) Mostre que a sequencia converge. (Sugestao: Uti-lize o fato que

√n2 + 1 > n, que a2 − b2 = (a −

b)(a+ b), e a diferenca an+1 − an para detectar ocrescimento ou decrescimento).

(b) Calcule o limite.

3. Seja (xn) a sequencia

xn =(

3n+ 12n+ 1

)n

Calcule o limite da sequencia. (Sugestao: Tente recor-rer as sequencias ja trabalhadas usando fatoracao)

Page 109: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 109

4.4 Series Numericas

Agora que voce ja sabe o que e uma sequencia numerica,nos podemos tratar sobre o estudo das series. Mas o queseria isso? Pra comecarmos, uma serie e uma ”soma s =a1 + a2 + a3 + · · · + an + · · · com infinitos termos”. So quedesde que comecamos a estudar matematica, nos fazemos so-mas finitas, e e justamente isto que faremos para series. Nosiremos somar n termos e ver como esta soma se comportaquando o numero de somandos cresce, ou em linguagem ma-tematica

s = limn→∞

(a1 + a2 + a3 + · · ·+ an)

Portanto, reduzimos o problema de somar infinitos ter-mos para o calculo de um limite, e como voce ja estudou,este limite pode ou nao existir. Estudar a existencia destelimite sera a tarefa desta secao.

Convergencia e Divergencia

Seja (an) uma sequencia de numeros reais. A partir dela,podemos formar uma nova sequencia (sn), onde os termossao as somas

s1 = a1 , s2 = a1 + a2 , · · · , sn = a1 + a2 + · · ·+ an

que chamaremos de reduzidas da serie ∑ an. O termo an serachamado de termo geral da serie. Desta forma, se existir olimite

s = limn→∞

sn = limn→∞

(a1 + a2 + a3 + · · ·+ an)

Page 110: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

110 • Brincando de Matematico

diremos que a serie ∑ an e convergente e o limite s sera cha-mado a soma da serie. Daı, escreveremos

s =∞∑n=1

an = a1 + a2 + · · ·+ an + · · ·

Se limn→∞ sn nao existir, diremos que a serie ∑ an e diver-gente.

Serie Geometrica

Um exemplo de serie que voce provavelmente ja viu noEnsino Medio, e a progressao geometrica (P.G.), que consisteem uma soma em que cada somando e obtido multiplicandoo anterior por uma constante, conhecida como razao da pro-gressao. Conseguiu visualizar? Veja esse exemplo

1 + 2 + 4 + 8 + 16 + 32 + · · ·

Neste caso, o primeiro termo da P.G. e 1 e sua razao a =2. Vamos agora, considerar um caso especial, onde a razao−1 < a < 1 e ver como calcular sua soma finita e infinita.Para isso, considere a soma 1+a+a2 +a3 + · · ·+an de razaoa, com |a| < 1. Assim, temos que

Sn = 1 + a+ a2 + a3 + · · ·+ an (4.1)

Se multiplicarmos (4.1) por a, obtemos

aSn = a+ a2 + a3 + a4 + · · ·+ an+1 (4.2)

Agora, se subtrairmos (4.2) de (4.1), os termos do meio secancelam e obtemos Sn − aSn = 1− an+1, ou seja

Sn = 1− an+1

1− a

Page 111: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 111

Veja que obtemos uma formula para calcular a soma da P.G.para n termos, que e dada por Sn. Agora, estamos interes-sados em analisar o comportamento da sequencia Sn quandon ficar cada vez maior, assim

limn→∞

Sn = limn→∞

1− an+1

1− a(∗)= 1

1− a

Nao entendeu o que ocorreu na passagem (∗)? Calma,vamos la. Lembre-se que escolhemos a razao |a| < 1 e javimos no Exemplo (4.3.3) que limn→∞ a

n = 0, temos que

limn→∞

Sn = 11− a . Portanto, a serie geometrica

∞∑n=0

an e con-

vergente, e converge para 11− a .

Criterio da Comparacao

Como acabamos de ver, a progressao geometrica se com-porta bem, e ate sabemos o valor exato para o qual ela con-verge, porem nem tudo sao rosas. Muitas vezes encontra-remos series mais complexas que nao serao uma progressaogeometrica, porem vamos querer pelo menos saber se ela con-verge ou diverge. Para resolver esse problema, vamos utili-zar um criterio muito util que nos ajudara a concluir se umaserie e convergente ou divergente, conhecido como Criterioda Comparacao, que nos diz:Teorema 4.4.1 (Criterio da Comparacao). Sejam ∑

ane ∑ bn series com termos nao negativos. Se conseguirmosmostrar que an ≤ bn, e que a serie ∑ bn converge entao aserie ∑ an tambem vai convergir. Por outro lado, se ∑ andiverge, devemos ter que ∑ bn diverge.

Page 112: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

112 • Brincando de Matematico

Para ilustrar esse teste, vamos verificar que a serie∞∑n=0

43n + 1

converge.Para isso, considere as sequencias an = 4

3n + 1 e bn = 43n .

Entao se voce olhar com atencao, vai perceber que ∑ bn euma progressao geometrica de razao 1

3, como ja vimos. Ouseja

q∑n=0

43n = 4 + 4

3 + 432 + 4

33 + · · ·+ 43q

= 4(

1 + 13 + 1

32 + 133 + · · ·+ 1

3q

)

Entao, se voce aprendeu bem, vai saber que a soma e dadapor∞∑n=0

43n = 4

∞∑n=0

13n = 4

11− 1

3

︸ ︷︷ ︸Soma da P.G.

= 6 (Verifique as contas!)

Portanto, ∑ bn e convergente. Agora vamos tentar usar ocriterio da comparacao para obter an ≤ bn. Para isso, vamosfazer a seguinte conta

bnan

=43n4

3n + 1

= 3n + 13n = 1 + 1

3n ≥ 1 (Verifique!)

Entao, como o quociente acima e maior que 1, temos quean ≤ bn (Por que?), e como todos os termos das series saopositivos, podemos usar o Criterio da Comparacao para con-cluir que ∑ an e convergente.

Page 113: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 113

Teste do Termo Geral

Quando pensamos em uma serie convergente, estamosafirmando que a ”soma de infinitos termos” resulta em umnumero. Assim, e natural que a medida que seguimos com asoma, os somandos devem diminuir, senao sempre estarıamossomando parcelas que nao diminuem e a serie iria divergir.Por exemplo, a seguinte serie

1 + 12 + 1

22 + 123 + 1

24 + 125 + · · ·

converge, como ja vimos, para 2 (Verifique!). Alem disso,seus termos vao diminuindo, pois

1 > 12 >

122 >

123 > · · ·

Esse raciocınio nos garante o seguinte resultado:Teorema 4.4.2 (Teste do Termo Geral). O termo geralde uma serie convergente tem limite zero. Em particular, seo termo geral de uma serie nao converge para zero, entao aserie e divergente.

Porem, precisamos tomar muito cuidado com este resul-tado, pois ele nos diz que se, a serie convergir entao os seustermos diminuem de modo que quando n e muito grande elesse aproximam de zero. Mas, se por acaso so sabemos que otermo geral da serie tem limite zero, nao podemos afirmarsobre a convergencia dela. Essa ideia vai ficar mais claraquando falarmos sobre a serie harmonica.

Vamos ver um exemplo de como podemos utilizar esseteste, considerando a serie ∑ 2n. Veja que 21 < 22 < 23 <. . ., ou seja, o termo geral nao converge para zero quando naumenta, e pelo teste do termo geral a serie e divergente.

Page 114: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

114 • Brincando de Matematico

A Serie Harmonica

Se voce ainda nao ouviu falar da serie harmonica, podeter certeza que ira ouvir. Mas por que ela e ”famosa”? Antesde tentar responder essa duvida, vamos conhece-la. A serieharmonica e dada por

∞∑n=1

1n

= 1 + 12 + 1

3 + 14 + · · ·

Como qualquer outra serie, estamos interessados em sa-ber se ela converge ou diverge, e caso convirja, para qualvalor. Mas primeiro vamos tentar utilizar os resultados quevimos, para falar algo desta serie. Assim, se analisarmoso comportamento da sequencia an = 1

npara valores muito

grandes de n, teremos que

limn→∞

1n

= 0

Entretanto, saber que o termo geral da serie harmonica tendepara zero com o aumento de n, nao nos diz nada sobre suaconvergencia, certo? Vamos tentar uma abordagem dife-rente, considerando a sequencia de reduzidas de ordem 2n,isto e,

s2n = 1 + 12 + 1

3 + . . .+ 12n .

Vemos que s2 = 1 + 12 e

s4 = 1 + 12 +

(13 + 1

4

)

≥ 1 + 12 +

(14 + 1

4

)

= 1 + 2 · 12 .

Page 115: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 115

Temos tambem

s8 = 1 + 12 +

(13 + 1

4

)+(

15 + 1

6 + 17 + 1

8

)

≥ 1 + 12 +

(14 + 1

4

)+(

18 + 1

8 + 18 + 1

8

)

= 1 + 3 · 12 .

Mais geralmente pode-se mostrar que para todo n ∈ N

s2n ≥ 1 + n

2 . (4.3)

Como a sequencia (sn) e crescente e a subsequencia (s2n)verifica a relacao (4.3), segue que lim

n→∞sn = +∞, ou seja, a

serie harmonica diverge. Podemos analisar os termos s2n−1de maneira semelhante aquela utilizada anteriormente, porexemplo:

s3 = 1 +(

12 + 1

3

)

≤ 1 +(

12 + 1

2

)= 2 ,

s7 = 1 +(

12 + 1

3

)+(

14 + 1

5 + 16 + 1

7

)

≤ 1 +(

12 + 1

2

)+(

14 + 1

4 + 14 + 1

4

)= 3 .

Uma analise inteiramente analoga mostra que s2n−1 < n e,como s2n = s2n−1 + 1/2n, concluımos que

1 + n

2 < s2n < n+ 12n ,

Page 116: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

116 • Brincando de Matematico

para todo n ∈ N. Isso mostra que a serie harmonica diverge,mas as reduzidas crescem de forma branda. Para tornar istoum pouco mais explıcito, dado n ∈ N qualquer, consideremosN ∈ N o menor inteiro tal que 2N−1 < n ≤ 2N , ou seja, Ne o menor inteiro com a propriedade N − 1 < log2 n ≤ N .Assim, por um lado, temos

sn ≤ s2N < N + 12N < (1 + log2 n) + 1 = 2 + log2 n

e, por outro,

sn > s2N−1 > 1 + N − 12 >

1 + log2 n

2 .

Portanto,1 + log2 n

2 < sn < 2 + log2 n ,

para qualquer n ∈ N. Esta ultima desigualdade expressamatematicamente o lento crescimento das reduzidas da serieharmonica. Por exemplo, s100.000 < 2 + log2(100.000) < 2 +16.7 < 19 e s1.000.000 < 2 + log2(1.000.000) < 2 + 19.94 < 22,etc.

Mas a pergunta que fica e: por que parece que ela con-verge? Ou ainda, se voce for corajoso e se aventurar a fazeras contas manualmente, vai perceber que quanto mais voceaumenta o n, parece que a soma 1 + 1/2 + 1/3 + . . . 1/n ficaproxima de um numero! Para entender um pouco melhoresse fenomeno, vamos supor que fossemos capazes, de a cadasegundo, somar um termo da serie harmonica. Como o anopossui aproximadamente 365 dias e 6 horas, vamos transfor-mar essa quantidade de dias em segundos, assim, um anopossui

365, 25× 24× 60× 60 = 31.557.600 segundos.

Page 117: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 117

Portanto, no perıodo de 31.557.600 segundos conseguirıamossomar n = 31.557.600 termos da seria harmonica. Incrivel-mente, o valor que resultaria desta soma seria menor que2 + log2(31.557.600) < 27. Em dez anos, terıamos que asoma seria menor que 2 + log2(10 · 31.557.600) < 31, ja em100 anos a soma nao excederia 2+log2(100·31.557.600) < 34.Ao aumentarmos a quantidade de termos, estamos somandofatores muito pequenos, e novamente isso parece ir contranossa intuicao, pois visualmente a serie harmonica parececonvergir, porem como ja vimos isso nao ocorre.

Vamos ir um pouco mais longe na imaginacao, conside-rando que temos a nossa disposicao o computador mais po-tente que existe atualmente. Sabemos da fısica, que nadapode superar a velocidade da luz, assim esse computadorimaginario nao pode efetuar uma soma em tempo inferior a10−23 segundos, que e o tempo gasto pela luz para percor-rer a distancia igual ao diametro de um eletron. Digamos,entao, que nosso computador realize uma soma a cada 10−23

segundos. Usando estimativas um pouco melhores, podemosconcluir que em:

(i) Um ano terıamos 315.576× 1025 termos da serie, cujasoma seria aproximadamente 70,804.

(ii) Mil anos terıamos 315.576× 1028 termos da serie, cujasoma seria aproximadamente 77,718.

(iii) Um bilhao de anos terıamos 315.576× 1034 termos daserie, cuja soma seria aproximadamente 91,5273.

Por fim, se desde o inıcio do universo ha 16 bilhoes deanos, esse computador estivesse ligado e realizando a somados termos da seria harmonica, ele estaria obtendo hoje umvalor de aproximadamente 94,2999, um numero muito pe-queno comparado com a quantidade de termos somados. Ou

Page 118: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

118 • Brincando de Matematico

seja, conseguimos provar que a serie harmonica e divergente,isto e, a soma de seus termos fica arbitrariamente grade,porem isso se da em uma velocidade extremamente baixa,quase parando.

Um fato muito curioso e que, se retirarmos da serie harmo-nica todos os termos 1/n onde n possui o algarismo 9 em suaexpressao na base decimal, entao a serie assim obtida (cha-mada de serie de Kempner) e convergente e sua soma naoexcede 23 . . ..

O Numero e e Irracional

Como ja vimos, e =∞∑n=0

1n! . Entao iremos utilizar for-

temente a determinacao de e por uma serie para mostrarsua irracionalidade. Lembrando, que um numero e irracio-nal quando ele nao pode ser representado por uma fracao dotipo p

q, onde p, q ∈ Z e q 6= 0. Para isso, considere:

0 < e−q∑

n=0

1n! =

∞∑n=q+1

1n! (4.4)

Por outro lado, se expandirmos a serie do e obtemos:

∞∑n=q+1

1n! = 1

(q + 1)! + 1(q + 2)! + · · ·

= 1(q + 1)q! + 1

(q + 2)(q + 1)q! + · · ·

= 1q!

(1

(q + 1) + 1(q + 2)(q + 1) + · · ·

)

<1q!

(1

(q + 1) + 1(q + 1)2 + · · ·

)︸ ︷︷ ︸

Soma da P.G.

Page 119: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 119

= 1q!

11− 1

q+1

= 1

q!1q

Unindo as informacoes que nos temos e substituindo nadesigualdade (4.4)

0 < e−q∑

n=0

1n! <

1q!

1q

Agora suponha, por absurdo, que e ∈ Q, ou seja, ele podeser escrito na forma de fracao do tipo e = p

qcom p, q ∈ Z e

q 6= 0. Assim

0 < p

q−

q∑n=0

1n! <

1q!

1q

0 < q!pq− q!

q∑n=0

1n! <

1q< 1

0 < (q − 1)!p︸ ︷︷ ︸∈Z

− q!q∑

n=0

1n!︸ ︷︷ ︸

∈Z

< 1

Verifique que (q − 1)!p ∈ Z e q!∑qn=0

1n! ∈ Z. Assim,

se voce perceber chegamos em um absurdo. Por que? Vejabem, a ultima desigualdade nos diz que temos um inteiro

q!pq− q!

q∑n=0

1n! no intervalo (0, 1) o que nao pode ocorrer.

Assim, como nos supomos que e era racional e chegamos emum absurdo, devemos ter que e e irracional.

Page 120: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

120 • Brincando de Matematico

Serie de Leibniz

Como vimos para o numero e, podemos escrever um nume-ro como uma serie infinita, e assim utilizar propriedades dasseries para provar resultados, como por exemplo a irracio-nalidade. Desta forma, o numero π tambem pode ser de-terminado por uma serie, obtida usando Series de Fourier,conhecida como Serie de Leibniz e dada por:

π

4 =∞∑k=1

(−1)k−1

2k − 1

Exercıcios 4.4.3.

1. Calcule as somas abaixo:

(a)∞∑n=0

12n

(b)∞∑n=0

63n

2. Verifique se as seguintes series convergem ou divergem.

(a)∞∑n=1

12n + 1

(b)∞∑n=1

n

n+ 1

(c)∞∑n=1

299n2 + 6n+ 9

(Dica: use o fato que a serie∞∑n=1

1np

com p > 1 e con-

vergente)

Page 121: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 121

3. Usando o criterio da comparacao, prove que∞∑n=1

1n2 con-

verge, usando o fato que a serie∞∑n=1

2n(n+ 1) e conver-

gente.

4.5 Conjunto de Cantor

Nesta secao, aplicaremos alguns conceitos ja estudadossobre bases numericas para estudar o Conjunto de Cantor.Este conjunto foi introduzido pelo matematico Georg Cantor(sobre o qual ja falamos no primeiro capıtulo) em 1874 epossui propriedades muito interessantes, algumas das quaisestudaremos nesta secao.

Escrevendo os elementos do conjunto de Cantor nabase 3

Como vimos na sessao 4.1, podemos representar os numerosem muitas bases, e dependendo da situacao, uma determi-nada base escolhida pode ser muito util. Vamos ver que, nopresente caso e de grande utilidade representar os numeros nabase 3, pois com isso ganhamos uma nova caracterizacao doselementos do conjunto de Cantor. Sendo assim, vamos fazerisso e ver o que acontece. Primeiramente, vamos mostrarque (1)3 = (0, 222 . . .)3, pois iremos utilizar este resultadono decorrer desta sessao.

Provavelmente o leitor ja se deparou com a expressao

Page 122: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

122 • Brincando de Matematico

1 = 0, 999 . . ., que pode ser deduzida do seguinte modo,

0, 999 . . . = x

9, 999 . . . = 10x9, 999 . . . = 9x+ x

9, 999 . . . = 9x+ 0, 999 . . .9 = 9x1 = x

1 = 0, 999 . . .

De modo parecido podemos mostrar que (1)3 = (0, 222 . . .)3,

2 · 3−1 + 2 · 3−2 + . . . = (0, 222 . . .)3

2 · 3−1 + 2 · 3−2 + . . . = x

2 · 30 + 2 · 3−1 + . . . = 3x2 · 30 + 2 · 3−1 + . . . = 2x+ x

2 · 30 + 2 · 3−1 + . . . = 2x+ 2 · 3−1 + . . .

2 · 30 = 2x30 = x

30 = 2 · 3−1 + 2 · 3−2 + . . .

(1)3 = (0, 222 . . .)3

Sabendo disso, agora vamos ver o que acontece quandorepresentamos um numero x ∈ [0, 1] na base 3. Note quepara escrevermos x na base 3 primeiro precisamos obter umaexpressao x = a1 · 3−1 + a2 · 3−2 + a3 · 3−3 + . . ., e portantoteremos que x = (0, a1a2a3 . . .)3, onde os numeros an sao 0,1 ou 2. Tendo x na base 3, vamos ver o que os algarismosa1, a2, a3, . . . significam geometricamente, na figura abaixo.

Page 123: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 123

Se dividirmos o intervalo [0, 1] em 3 partes iguais, entaoo algarismo a1 nos diz em qual destas partes x esta (figuraacima). Vamos dizer que a parte da esquerda corresponde

ao intervalo[0, 1

3

], a parte do meio corresponde ao inter-

valo(

13 ,

23

)e a parte da direita corresponde ao intervalo[

23 , 1

]. Escrevendo estas fracoes, que delimitam os interva-

los, na base 3, temos que a parte da esquerda correspondeaos numeros de (0)3 ate (0, 1)3 = (0, 0222 . . .)3, a parte domeio corresponde aos numeros entre (0, 1)3 e (0, 2)3, e a parteda direita corresponde aos numeros de (0, 2)3 ate (1)3.

Sendo assim, se a1 = 0 entao x esta na parte da esquerda,se a1 = 1 entao x esta na parte do meio e se a1 = 2 entaox esta na parte da direita. Veja que se a1 = 1 e todosos outros algarismos an forem 0, entao vamos escrever x =(0, 0222 . . .)3, e portanto neste caso x estara na parte daesquerda, mas nao da do meio.

Note que quando estamos construindo o conjunto de Can-tor, nos dividimos o intervalo [0, 1] exatamente como acaba-mos de fazer, e depois eliminamos a parte do meio, cujo

intervalo e(

13 ,

23

). Sendo assim, estamos eliminando todos

os numeros do intervalo [0, 1] que, na base 3, sao escritosexatamente da forma (0, 1 . . .)3, isto e, estamos eliminandoos numeros x tais que a1 = 1. Novamente, perceba que naoeliminamos o numero (0, 1)3 pois este e igual a (0, 0222 . . .)3.

Page 124: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

124 • Brincando de Matematico

Deste modo, apos eliminarmos estes numeros, restam apenasos que sao da forma (0, 0 . . .)3 ou (0, 2 . . .)3.

Para o proximo passo da construcao do conjunto de Can-

tor, dividimos os intervalos[0, 1

3

]e[

23 , 1

]em tres partes

cada, uma parte da esquerda, do meio e da direita. Sendoassim, similarmente ao que foi mostrado anteriormente, o al-garismo a2 indica se x esta na parte da esquerda (a2 = 0),na parte do meio (a2 = 1) ou na parte da direita (a2 = 2) de

cada intervalo[0, 1

3

]ou[

23 , 1

]. Este proximo passo da cons-

trucao do conjunto de Cantor consiste em eliminar a parte

do meio de cada intervalo[0, 1

3

]e[

23 , 1

]. Ou seja, consiste

em eliminar os numeros da forma (0, 01 . . .)3, com excecao de(0, 01)3 = (0, 00222 . . .)3, e os numeros da forma (0, 21 . . .)3,com excecao de (0, 21)3 = (0, 20222 . . .)3. Deste modo elimi-namos os numeros x tais que a2 = 1, fazendo restar apenasos numeros da forma (0, 00 . . .)3, (0, 02 . . .)3, (0, 20 . . .)3 ou(0, 22 . . .)3.

Como o leitor deve ter percebido, no proximo passo daconstrucao do conjunto de Cantor eliminamos os numeros xtais que a3 = 1, em seguida no proximo passo eliminamosos numeros x tais que a4 = 1, depois eliminamos aqueles emque a5 = 1, e continuamos sempre deste modo. Isso querdizer que para construir o conjunto de Cantor basta elimi-narmos todos os numeros do intervalo [0, 1] cuja expansaona base 3 possui algum dıgito 1. Porem, note que semprequando tivermos um numero que, na base 3, termina com odıgito 1, podemos substituir este ultimo algarismo por um0 seguido de uma sequencia infinita de algarismos 2, e as-sim nao eliminamos estes numeros. Deste modo, o conjuntode Cantor K consiste de todos os numeros do intervalo [0, 1]

Page 125: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 125

cuja expansao na base 3 possui apenas os algarismos 0 ou 2.

O conjunto de Cantor e nao-enumeravel

. Para esta demonstracao, vamos supor que K e enumeravele deste modo chegar a uma contradicao. O leitor deve lem-brar que um conjunto A e dito enumeravel se este pode serescrito como uma lista {x1, x2, x3, . . .}, com todo elementode A aparecendo em algum lugar da lista. Ou seja, A e enu-meravel se para qualquer elemento de x ∈ A, existe n ∈ Ntal que x = xn.

Vamos entao a demonstracao de que o conjunto de Can-tor K e nao-enumeravel. Vamos supor que K e enumeravel,ou seja, vamos supor que existe uma lista {x1, x2, x3, . . .}com todos os numeros de K. Para chegarmos em uma con-tradicao, vamos mostrar que existe um numero x ∈ K talque x nao esta nesta lista.

Suponha que cada numero xn da lista, representado nabase 3, e dado por xn = (0, an1an2an3 . . .)3, ou seja, os dıgitos(apos a vırgula) de xn na base 3 sao an1, an2, an3, . . .. Agoradefina o numero x = (0, a11a22a33 . . .)3, onde a barra emcima de cada algarismo ann significa que estamos trocandoo dıgito 0 com o 2 e vice-versa, ou seja, ann = 2 se ann = 0e ann = 0 se ann = 2. Note que x ∈ K, pois os algarismosde x, na base 3, possuem apenas os dıgitos 0 ou 2. Contudo,x nao esta na lista {x1, x2, x3, . . .}, pois qualquer que seja onumero xn da lista, teremos que x 6= xn, pois sabemos que xe xn diferem em relacao ao algarismo ann de xn. Portanto,x e um elemento de K que nao esta na lista, o que e umacontradicao, pois a lista {x1, x2, x3, . . .} deveria ter todos oselementos de K. Sendo assim, K nao pode ser enumeravel,ou seja, o conjunto de Cantor e nao-enumeravel.

Page 126: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

126 • Brincando de Matematico

A funcao de Cantor

Nesta sessao vamos definir a funcao de Cantor e analisara sua curiosa representacao grafica.

Vamos chamar a funcao de Cantor de funcao f . Paradefinirmos uma funcao precisamos dizer qual e o seu domınio,contradomınio, e qual e a sua “regra”, ou seja, se x pertenceao domınio de f entao precisamos dizer o que f(x) significa.

A funcao f possui o intervalo [0, 1] como domınio e con-tradomınio e se x ∈ [0, 1], entao definimos f(x) atraves dosseguintes passos:

1. Escreva x na base 3.

2. Verifique se x possui algum dıgito 1 em sua expansaona base 3. Se possuir, troque todos os dıgitos apos oprimeiro 1 que aparecer por zeros. Caso x nao possua oalgarismo 1 em sua expansao na base 3, nao faca nada.Vamos chamar de x′ o numero obtido nesta etapa (es-crito na base 3).

3. Troque todos os algarismos 2’s de x′ por 1’s. Vamoschamar de x′′ o numero obtido nesta etapa (escrito nabase 3).

4. Agora o numero x′′ tera apenas os algarismos 0 ou 1.Sendo assim, interprete x′′ como se estivesse escrito nabase 2. O numero obtido sera f(x).

Encorajamos o leitor a desenhar o grafico desta funcao.Para isso, primeiro obtenha f(x) para os pontos do inter-

valo(

13 ,

23

). Como vimos anteriormente, os numeros deste

intervalo escritos na base , sao da forma (0, 1 . . .)3. Logo,

Page 127: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 127

f(x) = (0, 1)2 = 12 para x ∈

(13 ,

23

). Agora estude os in-

tervalos(

19 ,

29

)e(

79 ,

89

). O leitor chegara a conclusao de

que se x ∈(

19 ,

29

)entao f(x) = 1

4 e se x ∈(

79 ,

89

)entao

f(x) = 34. Prossiga deste modo, estabelecendo os valores que

a funcao f assume para os numeros dos intervalos que reti-ramos quando estamos construindo o conjunto de Cantor, eaos poucos va esbocando o grafico de f .

Note que utilizamos a estrategia acima para obter a repre-sentacao grafica de f , estudando sempre os intervalos que naoestao no conjunto de Cantor, pois sabemos que os numerosdestes intervalos possuem algum algarismo 1 quando repre-sentados na base 3. Deste modo, conseguimos obter o valorde f nestes intervalos.

Apos alguns passos esbocando o grafico de f , o leitor iraverificar que ha um padrao para realizar esta tarefa. Sendoassim, e possıvel imaginar como seria este este grafico secontinuassemos esbocando-o infinitamente. Terıamos entao,a seguinte representacao grafica de f :

Page 128: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

128 • Brincando de Matematico

E curioso observar que f e constante em cada intervaloretirado de [0, 1] para obtermos o conjunto de cantor.

A funcao f possui a seguinte propriedade curiosa: Seja xum numero fixado tal que 0 ≤ x ≤ 1 e tomemos um numeroaleatorio do conjunto de Cantor. Entao, qual e a probabili-dade deste numero estar a esquerda de x? A resposta e dadapor f(x), onde f e a funcao de Cantor.Exercıcios 4.5.1.

1. Verifique quais dos numeros abaixo pertencem ao con-junto de Cantor.

(a) 14

(b) 34

(c) 35

(d) 78

(e) 710

(f) 910

(g) 1320

(h) 140

2. Se escolhermos um numero aleatorio do conjunto de

Page 129: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Sequencias e Series • 129

Cantor, entao qual e a probabilidade deste numero es-tar a esquerda de

(a) 38 (b) 4

5 (c) 1920 (d) 7

40

Page 130: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

130 • Brincando de Matematico

Page 131: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Resposta dos Exercıcios

Capıtulo 2

Exercıcios 2.2.1

1. (a) 1921

(b) 118

(c) 4665

(d) −8921

2. O par de fracao −6− 3t3 ,

−24− 11t11 com t ∈ Z e

solucao.

Exercıcios 2.3.6

1. (a) 0, 25(b) 0, 01(c) 0, 8025(d) 0, 0112(e) 2, 816(f) 1, 2596

Page 132: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

132 • Brincando de Matematico

2. (a) 19

(b) 18534950

(c) 16631665

(d) 19900

(e) 1

Exercıcio 2.6.1

(a) 8x3 − 6x+ 1 = 0

(b) Se sen(20◦) fosse racional, entao sen2(20◦) e 1−2sen2(20◦)seriam racionais. Porem mostramos em (i) que cos(40◦) eirracional. Temos, entao, uma contradicao. E portanto,sen(10◦) e irracional.

(c) Analogo a (ii).

(d) cos(θ) = sen(90◦ − θ)

Exercıcio 2.6.4

(a) cos(30◦) =√

32 e irracional.

(b) Usar (a).

(c) cos(45◦) =√

22 e irracional.

(d) cos(40◦) e irracional e cos(2×35◦) = cos(70◦) = cos(90◦−20◦) = sen(20◦)

(e) sen(40◦) = sen(90◦ − 50◦) = cos(50◦)

Page 133: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Exercıcios Resolvidos • 133

Exercıcio 2.7.1

(a) Supondo log(2c5d) racional, chegaremos que bc = a =db ⇒ bc = db, mas como c e d sao inteiros distintos,logo bc e db sao distintos. Entao, o numero em questaoe irracional.

(b) e (c) Proceder como nos exemplos.

(c) Lembre que log(a) + log(b) = log(ab).

Exercıcio 2.8.7

(a) x2 − 3 = 0

(b) x3 − 5 = 0

(c) x4 − 10x2 + 1 = 0

(d) x21 − 12x14 + 48x7 − 75 = 0

(e) x819 − 291112733117563 = 0

(f) x24 − 7360x12 + (21052232 − 2104127)

Capıtulo 3

Exercıcio 3.2.9

1. (a) [0; 1, 1, 1, 3](b) [−2; 2; 3](c) [−1; 1, 3, 3](d) [3; 4](e) [1; 2](f) [7; 4, 2, 3, ...]

Page 134: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

134 • Brincando de Matematico

3. Apos calcular os convergentes da fracao contınua [1; 1, 1,1, ...] se pode observar que os valores dos convergen-tes sao iguais as razoes de dois termos consecutivos daSequencia de Fibonacci.

Exercıcio 3.3.5

1. (a) 2(b) 7(c) 4(d) 3(e) −5

2. (a) 21 ,

42 ,

73 ,

94 ,

115 ,

136 ,

167 ,

188 ,

209 ,

2210

(b) 41 ,

82 ,

123 ,

164 ,

215 ,

256 ,

297 ,

338 ,

379 ,

4110

(c) 131 ,

252 ,

383 ,

504 ,

635 ,

756 ,

887 ,

1018 ,

1139 ,

12610

(d) 191 ,

382 ,

573 ,

764 ,

955 ,

1146 ,

1337 ,

1528 ,

1719 ,

19010

(e) 11 ,

22 ,

33 ,

44 ,

55 ,

76 ,

87 ,

98 ,

109 ,

1110

3. 227

Exercıcio 3.4.2

1. Os mesmos m e n. m = 7 e n = 4.

2. (a) m = 3 e n = 2.(b) m = 12 e n = 7.(c) m = 4 e n = 3.

Page 135: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Exercıcios Resolvidos • 135

(d) m = 3 e n = 1.(e) m = 7 e n = 5.(f) m = 9 e n = 4.(g) m = 8 e n = 3.(h) m = 22 en = 7.

Exercıcio 3.5.3

2. (a) 4/3 e 7/5.(b) 7/4 e 12/7.(c) 7/3 e 9/4.(d) 5/2 e 8/3.

4. (a) 8/3.(b) 8/5.(c) 5/6.(d) 2/3.

Capıtulo 4

Exercıcio 4.1.11

1. (a) Base 2: 100101010111 e 110110,0101 ; Base 3:20120011 e 2000,0222 ; Base 6: 34051 e 130,1532;Base 8: 11257 e 66,2442.

3. (132)5 + (413)5 = (1100)5 e (23)5 × (342)5 = (20021)5.

4. Base 7. As parcelas que faltam sao 4, 1 e 5, respecti-vamente.

Exercıcio 4.3.7

Page 136: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

136 • Brincando de Matematico

1. (d) Seja l o limite da sequencia, entao:

l =√

2 + l ⇒ l2 = 2 + l⇒ l2 − l − 2 = 0⇒ l = 2 ou l = −1

Sabemos que l ≥ 0, pois bn > 0, logo l = 2

2. limn→∞ an = 0

3.

xn =(

3n+ 12n+ 1

)n=

(3n2n

)n (1 + 13n

)n(1 + 1

2n

)n>

(32

)n (1 + 13

)e1/2

Temos que:

limn→∞

(32

)n (1 + 13

)e1/2 = +∞

Logo limn→∞ xn = +∞

Exercıcio 4.4.3

1. (a)∞∑n=0

12n = 2.

(b)∞∑n=0

63n = 9.

2. (a) Converge.(b) Diverge.(c) Converge.

Page 137: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Referencias Bibliograficas • 137

Exercıcio 4.5.1

1. (a) Pertence(b) Pertence(c) Nao pertence(d) Nao pertence(e) Pertence(f) Pertence(g) Nao pertence(h) Pertence

2. (a) 12 ou 50%

(b) 34 ou 75%

(c) 78 ou 87, 5%

(d) 14 ou 25%

Page 138: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

138 • Brincando de Matematico

Page 139: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

ReferenciasBibliograficas

[1] AVILA, G. A Serie Harmonica e a Formula deEuler-Maclaurin. Matematica Universitaria, n.19, p55-93, dezembro de 1995.

[2] DOMINGUES, H. H.; Fundamentos da Aritmetica.Sao Paulo: Editora Atual, 1991.

[3] FERRAREZI Vilela de Souza, Guilherme FracoesContınuas e suas Aplicacoes Trabalho de Conclusaode Curso, Pro-Reitoria de Graduacao, Curso de Licen-ciatura em Matematica, UCB. Brasılia, 2012.

[4] FIBONACCI, Leonardo. Fibonacci’s Liber abaci: atranslation into modern English of Leonardo Pisano’s.Book of calculation. Springer, 2002.

[5] FOMIN, S. Sistemas de Numeracao. Sao Paulo:Atual Editora, 1994.

[6] GUIDORIZZI, Hamilton Luiz. Um Curso de Calculo,v.1, 5 Ed. IME-USP, 2001.

[7] GUIDORIZZI, Hamilton Luiz. Um Curso de Calculo,v.4, 5 Ed. IME-USP, 2002.

Page 140: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

140 • Brincando de Matematico

[8] HEFEZ, A. Elementos da Aritmetica. Rio de Ja-neiro: SBM, 2003.

[9] HERBERT B. ENDERTON ; Elements Of Set The-ory.1997. Academic Press Inc.

[10] KHINCHIN, A. Ya. Continued Fractions. Universityof Chicago Press. 1964.

[11] LIMA, E. Analise Real. Volume 1. 8. ed. Rio de Ja-neiro: IMPA (Colecao Matematica Universitaria), 2004.

[12] LIMA, E. Curso de Analise. Volume 1. 14. ed. Rio deJaneiro: IMPA (Projeto Euclides), 2014.

[13] MARCHIORI, R.M.; Numeros Transcendentes e deLiouville. Tese (Mestrado Prossional em Matematicaem Rede Nacional) - Universidade Estadual PaulistaJulio de Mesquita Filho, Instituto de Geociencias eCiencias Exatas, 2013.

[14] MARQUES, D. Teoria dos Numeros Transcenden-tes. 1. ed. Rio de Janeiro: SBM (Textos Universitarios),2013. p.29-36.

[15] NIVEN, I.; Numeros: Racionais e Irracionais. Cidade:SBM, 2012.

[16] OLDS, C. D. Continued Fractions, Series Anneli LaxNew Mathematical Library. Sun Jose State: RandomHouse , 1963.

[17] RAMALHO, A.F.A.; DIAS, M.L. Uma Con-versa Sobre Numeros Transcendentes. Uni-versidade Federal de Campina Grande, Centrode Ciencia e Tecnologia, Unidade Academica

Page 141: Numeros:´ O Imp´erio dos Irracionais - … · Facebook: ... Existem alguns conjuntos especiais, os quais usamos fre- ... escritos como fra¸c˜oes de numeros´ inteiros (todos os

Referencias Bibliograficas • 141

de Matematica, Programa de Educacao Tuto-rial.¡http://www.dme.ufcg.edu.br/pet/arquivos/UmaConversa Sobre os Numeros Transcendentes.pdf¿.

Acesso:20mai.2017.

[18] RUDIN, Walter. Principles of MathematicalAnalysis. McGraw-Hill, 1964.

[19] STEWART, James. Calculo, v. 2, 5 Ed. Thomson Le-arning - Sao Paulo, 2007.

[20] STROGATZ, Steven Henry Nonlinear dynamics andchaos: with applications to physics, biology, che-mistry, and engineering, 1994.