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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS O antagonismo do receptor de serotonina do tipo 7 da substância cinzenta periaquedutal dorsal reduz a ansiedade experimental basal, mas não aquela gerada pela retirada do etanol em ratos Marana Ali Silveira Natal 2014

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

    CENTRO DE BIOCINCIAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS BIOLGICAS

    O antagonismo do receptor de serotonina do tipo

    7 da substncia cinzenta periaquedutal dorsal

    reduz a ansiedade experimental basal, mas no

    aquela gerada pela retirada do etanol em ratos

    Marana Ali Silveira

    Natal 2014

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

    CENTRO DE BIOCINCIAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS BIOLGICAS

    O antagonismo do receptor de serotonina do tipo 7 da substncia

    cinzenta periaquedutal dorsal reduz a ansiedade experimental

    basal, mas no aquela gerada pela retirada do etanol em ratos

    Dissertao de Mestrado apresentada ao

    Programa de Ps Graduao em Cincias

    Biolgicas da Universidade Federal do Rio

    Grande do Norte para a obteno do ttulo

    de Mestre em Cincias.

    Aluna: Marana Ali Silveira

    Orientadora: Prof. Dra. Vanessa de Paula Soares-Rachetti

    Natal 2014

  • UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede Catalogao da Publicao na Fonte

    Silveira, Marana Ali.

    O antagonismo do receptor de serotonina do tipo 7 da substncia cinzenta periaquedutal dorsal reduz a ansiedade experimental basal, mas no aquela gerada pela retirada do etanol em ratos / Marana Ali Silveira . Natal, 2014. 81 f. : il.

    Orientadora: Prof. Dr. Vanessa de Paula Soares-Rachetti.

    Dissertao (Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Biocincias. Programa de Ps-Graduao em Cincias Biolgicas.

    1. Ansiedade Dissertao. 2. Etanol - Dissertao. 3. Abstinncia - Dissertao. 4.

    Serotonina - Dissertao. 5. Labirinto em cruz elevado - Dissertao. I. Soares-Rachetti, Vanessa de Paula. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Ttulo.

    RN/UF/BCZM CDU 616.89-008.441

  • Por vezes sentimos que aquilo que fazemos no seno uma gota de

    gua no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota.

    Madre Teresa de Calcut

  • DEDICATRIA

    minha querida me que nunca desiste do meu

    sucesso apesar dos vrios tropeos pelo caminho.

  • AGRADECIMENTOS

    Aos meus pais por todo apoio, ensinamento, amparo e pacincia durante a

    minha existncia, por me fornecerem todas as condies para escolher o meu

    futuro, trabalhando e me amparando financeiramente em todo o meu caminho,

    por todo amor e carinho dedicados a mim durante a minha vida e pela certeza

    que eu sempre terei a qualquer momento duas pessoas para me apoiar e me

    dar foras para seguir em frente.

    minha irm querida, pelas boas risadas que partilhamos todos esses anos, e

    tambm pelas brigas, irritaes, pentelhaes... ou seja, pelo pacote todo.

    Todo amor do mundo para ns, por muitos e muitos anos.

    Nelinha e sua famlia por todo acolhimento, cuidado e amor durante esses

    anos de amizade e companheirismo.

    Aos meus amigos por me fazerem sentir especial em todos os momentos.

    Luara Musse, pela sua irmandade, pela amizade em todos os momentos,

    pela pacincia com meus sumios e pelo amor nos reencontros, por oferecer o

    seu lar como uma segunda casa e a sua famlia como se fosse a minha. Por

    todos os momentos compartilhados e pelas alegrias vividas e que ainda viro.

    Andressa Noronha, pelo exemplo de luta e determinao, pelo carinho,

    conversas e caronas, pela acolhida calorosa em todos os encontros, pelos

    sorrisos sinceros e por toda a diverso nesses muitos anos de convvio.

    Aos colegas do Programa de Ps-Graduao em Cincias Biolgicas, por

    todos os momentos compartilhados, pelas boas conversas e discusses

    cientficas que certamente abriram os meus horizontes como mestranda.

    Aos colegas do Farmacolab, pela companhia agradvel a todo momento e por

    todo aprendizado, especialmente Rebecca, Camila, Jarmilla, Aldo e Anthony.

    Raliny Santos, companheira de mestrado e de laboratrio, pela sua

    agradvel companhia desde o primeiro momento, pela certeza de que tudo

    daria certo a qualquer momento do dia, pela conversas indignadas e papos

    furados, por todo carinho, ateno, apoio e sorrisos.

  • minha querida orientadora Vanessa de Paula Soares-Rachetti, pela

    dedicao, pacincia e carinho a todos os momentos. Por acreditar em mim

    quando nem mesmo eu acreditava. Por me ajudar a enxergar atravs de

    palavras doces e sbias o quanto eu era capaz, sem nunca desanimar apesar

    do meu desnimo. Pelo apoio em todos os momentos, no importando o

    motivo. Pela presena sempre segura e afetuosa por todo o caminho da minha

    vida acadmica contribuindo no s para minha formao cientfica, mas

    tambm para a minha formao como pessoa e cidad. Que esses cinco anos

    se tornem uma vida inteira de amizade e carinho tanto na vida profissional

    quanto pessoal. Todo meu amor e a minha gratido para a pessoa que mais

    me marcou durante essa jornada na universidade, parte do meu sucesso

    tambm seu.

    Aos professores Elaine Gavioli e Judney Cavalcante pelas valiosas

    contribuies durante a qualificao.

    banca examinadora, pela ateno dispensada leitura desse trabalho e pela

    disponibilidade para contribuir para a finalizao dessa etapa da minha

    formao.

    Aos funcionrios da secretria do PPGCB, principalmente a Louise, por todo o

    auxlio nesses anos de mestrado.

    Aos sujeitos utilizados na pesquisa, sem vocs nada disso seria possvel, deixo

    aqui o meu profundo respeito e gratido.

    A CAPES pela concesso da bolsa que me permitiu dedicao total a

    realizao desse projeto.

  • NDICE

    RESUMO............................................................................................................9

    ABSTRACT.......................................................................................................10

    INTRODUO...................................................................................................11

    1.1. O etanol e sua problemtica.................................................................11

    1.2. Farmacologia do etanol........................................................................15

    1.3. Etanol e o sistema serotoninrgico......................................................18

    1.4. Papel dos receptores do tipo 5-HT7 na modulao de comportamentos

    relacionados ansiedade...........................................................................25

    1.5. A substncia cinzenta periaquedutal, etanol e ansiedade...................27

    OBJETIVOS......................................................................................................33

    2.1. Objetivo geral.....................................................................................33

    2.2. Objetivos especficos........................................................................33

    MATERIAIS E MTODOS................................................................................34

    3.1. Animais................................................................................................34

    3.2. Drogas.................................................................................................34

    3.3. Exposio ao Etanol............................................................................35

    3.4. Cirurgia Estereotxica..........................................................................36

    3.5. Habituao...........................................................................................37

    3.6. Aparatos, Injeo intra-DPAG e Testes comportamentais...................37

    3.6.1. Labirinto em Cruz Elevado................................................................38

    3.6.2. Campo Aberto...................................................................................39

  • 3.6.3. Desenho experimental.......................................................................41

    3.7. Perfuso...............................................................................................43

    3.8. Histologia..............................................................................................43

    3.9. Anlise estatstica.................................................................................43

    RESULTADOS..................................................................................................44

    Experimento 1.............................................................................................44

    Experimento 2.............................................................................................49

    DISCUSSO.....................................................................................................55

    CONCLUSO...................................................................................................65

    REFERNCIAS.................................................................................................67

  • 10

    RESUMO

    Indivduos dependentes de etanol que diminuem ou interrompem a sua utilizao

    podem apresentar a Sndrome de Abstinncia do lcool, caracterizada por sinais e

    sintomas desagradveis que favorecem a recada, dentre eles, a ansiedade. Por ser

    uma droga psicotrpica, o etanol capaz de promover mudanas comportamentais

    e neurofisiolgicas, atuando sobre diversos sistemas de neurotransmisso, dentre

    outros o sistema serotonrgico, que vem sendo diretamente relacionado aos estados

    aversivos, como o caso da ansiedade. O presente estudo teve por objetivo

    investigar a participao do receptor de serotonina do tipo 7 (5-HT7) da substncia

    cinzenta periaquedutal dorsal (DPAG) na ansiedade experimental basal e naquela

    gerada pela retirada de etanol. Para isso, ratos Wistar com 75-100 dias foram

    submetidos a dois experimentos. No primeiro, os animais receberam as doses de

    2,5; 5,0 e 10 nmoles do antagonista de receptor 5-HT7 SB269970(SB) ou veculo

    intra-DPAG e, dez minutos aps, foram expostos ao labirinto em cruz elevado (LCE).

    No dia seguinte, os animais foram submetidos aos mesmos tratamentos e testados

    no campo aberto (CA). No segundo experimento, os animais receberam

    concentraes crescentes (2%, 4%, 6%) de etanol como nica fonte de dieta lquida

    ou gua (grupo controle), ambos com acesso livre rao. Setenta e duas e noventa

    e seis horas aps a retirada do etanol, os animais receberam SB (2,5 e 5,0 nmoles)

    intra-DPAG dez minutos anteriores ao teste no LCE e no CA, respectivamente. No

    experimento 1, a dose do antagonista de 10 nmoles foi capaz de reverter a

    ansiedade gerada pela exposio ao LCE. No experimento 2, as doses ineficazes no

    LCE de SB (2,5 e 5,0 nmoles) no foram capazes de reverter a ansiedade gerada

    pela retirada de etanol no LCE, embora a dose de 2,5 nmoles de SB tenha revertido

    o seu efeito hipolocomotor neste teste. Esses resultados sugerem que o receptor 5-

    HT7 participa modulando a ansiedade experimental basal de ratos, mas no a

    ansiedade gerada pela retirada do etanol na DPAG.

    Palavras-chave: Etanol, abstinncia, ansiedade, labirinto em cruz elevado,

    serotonina, 5-HT7, SB269970.

  • 11

    ABSTRACT

    Ethanol-dependent individuals who reduce or discontinue its use may present

    Alcohol Withdrawal Syndrome, which is characterized by unpleasant signs and

    symptoms, such as anxiety, that may trigger relapses. Ethanol, a psychotropic drug,

    is able to promote behavioral and neurophysiological changes, acting on different

    neurotransmitter systems, including the serotonergic, which has also been directly

    associated with aversive states, including anxiety. This study aimed to investigate the

    participation of type 7 serotonin receptor (5-HT7) of the dorsal periaqueductal gray

    (DPAG) on basal experimental anxiety and that caused by ethanol withdrawal. For

    this, 75-100 days old Wistar rats were subjected to two experiments. On the first one,

    animals underwent stereotactic surgery for implantation of guide cannulas used for

    administration of the drug directly into the DPAG. After seven days, the animals

    received doses of 2.5; 5 and 10 nmols of type 7 receptor antagonist SB269970 (SB)

    or vehicle intra-DPAG and, ten minutes after, they were exposed to elevated plus

    maze (EPM). In the following day, the animals were submitted to the same treatment

    and tested in the open field (OF). In the second experiment, animals received

    increasing concentrations (2%, 4%, 6%) of ethanol as the only source of liquid diet or

    water (control group), both with free access to chow. Seventy two hours and ninety

    six hours after the ethanol withdrawal, animals received SB (2.5 and 5.0 nmols) intra-

    DPAG ten minutes before the test in the LCE and OF, respectively. In experiment 1,

    the dose of antagonist 10 nmols was able of reversing the anxiety generated by

    EPM. In the experiment 2, ineffective SB doses on the LCE (2.5 and 5.0 nmol) were

    not able to reverse the anxiety caused by the ethanol withdrawal in the EPM,

    although the dose of 2.5 nmols of SB has reversed its hipolocomotor effect in this

    test. This result suggests that the 5-HT7 receptor is involved in the modulation of the

    basal experimental anxiety in rats, but not in the anxiety caused by ethanol

    withdrawal in the DPAG.

    Keywords: Ethanol, withdrawal, anxiety, elevated plus maze, serotonin, 5-HT7,

    SB269970.

  • 12

    1. O ETANOL E SUA PROBLEMTICA

    O consumo de drogas pela humanidade no um fato recente: o etanol,

    uma droga que pode ser utilizada de forma recreativa, tem os seus primeiros

    registros de uso h 6.000 anos (CEBRID, 2014), talvez devido a sua fcil

    obteno a partir da fermentao de vrios aucares. Dentre as drogas de

    abuso existentes na atualidade, o etanol uma das mais frequentemente

    utilizadas; por ser lcita na maioria dos pases, alcana um grande nmero de

    pessoas em todo o planeta. A prevalncia anual do uso mundial de lcool

    chega a ser oito vezes maior que a do abuso de drogas ilcitas, chegando a

    42% da populao mundial (World Health Organization, 2004; World Health

    Organization, 2011).

    Seu consumo indiscriminado pode impactar diversos setores da

    sociedade, dentre eles os servios de sade, visto que o abuso de etanol pode

    levar a mais de sessenta tipos de doenas ou agravos diversos, incluindo altas

    taxas de mortalidade (aproximadamente 2,5 milhes de pessoas perdem a vida

    todo ano devido ao abuso do etanol). Tambm causa impactos nos servios

    judicirios e criminais, e est diretamente relacionado com problemas sociais

    (Rehm, et al., 2003; World Health Organization, 2007; Laranjeira, 2007; Gallasi,

    et al; 2008).

    Existem dois tipos de transtornos mentais resultantes do uso

    indiscriminado do etanol segundo o Manual Diagnstico Estatstico de

    Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders,

    DSM-IV-RT, 2000), da Associao Americana de Psiquiatria (APA), o abuso e

    a dependncia. Na sua verso atualizada, o DSM-V de 2013, no existe tal

    distino, e ambos diagnsticos de abuso e dependncia constituem os

    transtornos relacionados ao uso de lcool, com classificao de gravidade em

    trs nveis (leve, moderada e grave). Apesar disso, a verso anterior do

    manual, DSM-IV, permanece como referncia e ainda amplamente utilizada.

    As principais mudanas da nova edio foram, alm da unio dos diagnsticos

    de abuso e dependncia em um nico transtorno, a excluso do critrio de

    problemas legais recorrentes relacionados ao uso da substncia,

    anteriormente utilizado para o diagnstico de abuso, e a incluso do critrio de

    fissura (craving), que o forte desejo ou urgncia em consumir a substncia

  • 13

    (CISA, 2014). Essas mudanas so demonstradas no quadro comparativo

    abaixo.

  • 14

    Quadro 1: Comparao dos critrios diagnsticos: DMS-IV e DSM-5 (CISA, 2014)

  • 15

    Independente dessas diferenas no material utilizado para diagnstico

    de transtornos mentais pelo uso de etanol, ambos destacam a abstinncia

    como um dos fatores participantes dessa patologia. A abstinncia ocorre

    quando indivduos dependentes interrompem, total ou parcialmente, a

    utilizao do etanol. Como resultado, pode ocorrer a Sndrome de Abstinncia

    do lcool SAA, que caracterizada por sinais e sintomas desagradveis que

    podem atuar favorecendo a recada, ou seja, a volta do consumo da substncia

    (Laranjeira et al., 2000). Tremores, insnia, nuseas, inquietao e ansiedade

    surgem aproximadamente 6 horas aps a interrupo do uso. Com o passar

    das horas ocorre uma progresso na severidade dos sintomas, com o

    surgimento de sudorese profunda, febre baixa, alucinaes e taquipnia, que

    podem evoluir para convulso. Em casos extremos, essas crises convulsivas

    podem ser fatais. Se o paciente no for tratado adequadamente o quadro de

    delirium tremens pode ocorrer. Apesar de atingir menos de 5% da populao

    em abstinncia, ele responsvel por grande morbidade e mortalidade

    associadas SAA (Trevisan et al., 1998; Laranjeira et al., 2000, Maciel; Kerr-

    Corra, 2004).

    O transtorno relacionado ao uso do etanol uma condio crnica e

    multifatorial, ou seja, no seu processo de ocorrncia diversos fatores iro

    influenciar. Apesar disso, historicamente, a manuteno do seu uso vem sendo

    atribuda aos sinais fsicos da sndrome de abstinncia. Porm, atualmente se

    sabe que componentes emocionais negativos, como queda no humor, elevada

    ansiedade e atenuao na habilidade de experimentar prazeres reforadores

    naturais, tambm esto envolvidos na manuteno desse ciclo abuso-

    abstinncia, sendo correlacionados com recadas aps perodos prolongados

    de retirada (Zhang et al., 2007; Heilig et al., 2010). Por exemplo, um estudo

    mostra que indivduos dependentes relataram como a razo mais comum de

    recadas esses estados emocionais negativos, da retirada do etanol (Annis et

    al., 1998). Ainda, esses estados emocionais apresentam 3 vezes mais chances

    de resultar em recadas quando comparados com os sinais de abstinncia

    fsica (Hershon, 1977 apud Zhang et al., 2007). A ansiedade, em particular,

    uma caracterstica central da abstinncia alcolica (Becker, 2008).

  • 16

    Por causa da capacidade de atingir diferentes locais em todo o globo

    terrestre e diversas classes sociais, o potencial prejudicial do etanol ilimitado,

    e um entendimento mais aprofundado sobre essa substncia necessrio.

    Para isso diversos estudos visam entender a sua ao aguda e crnica no

    organismo, assim como os transtornos e doenas resultantes da sua utilizao

    e da sua retirada.

    1.2. FARMACOLOGIA DO ETANOL

    O etanol, comumente chamado de lcool etlico, um solvente orgnico

    constitudo por uma molcula extremamente simples de dois carbonos e uma

    funo alcolica (CH3CH2OH). Apresenta baixo peso molecular (46,06844

    g/mol) e tem a capacidade de atingir todas as partes do corpo por causa do seu

    carter hidroflico e lipoflico, atuando em diferentes tecidos, e

    consequentemente, afetando funes vitais (Lieber, 1997).

    Quando ingerido, o etanol rapidamente absorvido por difuso no

    estmago (20%) e no intestino (80%) e ir atingir sua concentrao plasmtica

    mxima entre 30 e 90 minutos. O seu metabolismo pode variar

    consideravelmente entre indivduos e entre diferentes etnias (Ramchandani et

    al., 2001). Aproximadamente 2 a 10% so expelidos sem sofrer transformaes

    pela respirao, pelo suor ou pela urina e aproximadamente 90% do etanol ir

    sofrer biotransformao no fgado. Inicialmente ele oxidado gerando

    acetaldedo, um composto reativo e txico que pode promover hepatotoxidade;

    isso ocorre pela ao da enzima lcool desidrogenase e pelas enzimas do

    sistema microssmico P450. Em seguida, h uma nova metabolizao e todo

    acetaldedo convertido em acetato pela enzima aldedo desidrogenase

    (Goodman; Gilman, 2010).

    Por ser uma droga psicotrpica, ou seja, uma droga que age no sistema

    nervoso central (SNC), o etanol capaz de promover mudanas

    comportamentais, gerando, inicialmente, excitao comportamental, seguida de

    uma inibio comportamental. Afeta tambm as funes emocionais, sensorial,

    de memria e aprendizagem e a coordenao motora. Uma grande ingesto

    aguda dessa droga pode levar ao coma e a morte (Dubowski, 1985). Para

  • 17

    tanto, o etanol atua sobre diversos sistemas de neurotransmisso em

    diferentes reas enceflicas (Rang; Dale, 2001), tanto no consumo agudo,

    quanto no crnico, e sua ao resulta na diminuio da atividade de neurnios

    do SNC e, por isso, classificado como droga depressora (Mukherjee, 2013).

    Estudos moleculares e farmacolgicos demonstram que o etanol tem

    alguns alvos primrios (Vengeliene et al., 2008). Os dois principais sistemas de

    neurotransmissores atingidos pelo etanol so os sistemas do ligante endgeno

    cido gama-aminobutrico (GABA), o sistema GABArgico, maior sistema de

    neurotansmisso inibitrio, que favorecido com a utilizao da substncia, e o

    glutamatrgico, maior sistema de neurotransmisso excitatrio do SNC, que

    inibido pela mesma (Gass; Olive, 2008; Lobo; Harris, 2008).

    A ao do etanol no sistema GABArgico se d, principalmente, pela

    modulao de receptores ionotrpicos do tipo GABAA. Quando ativados, esses

    receptores permitem o influxo de cloreto (Cl-) gerando uma hiperpolarizao

    celular, o que produz um potencial ps-sinptico inibitrio. O etanol favorece

    um maior influxo de Cl-, potencializando a atuao do neurotransmissor

    endgeno GABA nesses canais e favorecendo a inibio celular (Lobo; Harris,

    2008; Golan et al, 2009). J no sistema glutamatrgico essa substncia atua

    sobre os receptores ionotrpicos NMDA (N-metil-D-aspartato) e AMPA (alfa-

    amino-3-hydroxi-5-metilisoxazole-4-propionic acid) sendo os do primeiro tipo

    inibidos por concentraes mais baixas de etanol do que as necessrias para

    afetar os do segundo tipo (Rang; Dale, 2011). Essa ao do etanol nesses dois

    sistemas causa uma perda da homeostase no funcionamento enceflico. Com

    a continuao do uso da substncia, o organismo tenta restaurar o equilbrio

    diminuindo a neurotransmisso inibitria e aumentando a neurotransmisso

    excitatria. Atualmente sabe-se que a utilizao prolongada de etanol resulta

    numa diminuio funcional dos receptores GABAA, provavelmente pela

    diminuio no nmero desses receptores ou por uma alterao das

    subunidades que o compem, o que resulta em uma sensibilidade menor ao

    ligante endgeno GABA (Vengeliene et al., 2008). Com relao

    neurotransmisso glutamatrgica, o consumo crnico de etanol parece gerar

    uma adaptao dos receptores desse sistema, aumentando a atividade

    excitatria. Aps exposio crnica h um aumento na expresso de

  • 18

    receptores NMDA e alguns sintomas comuns da abstinncia vm sendo

    relacionados a esse fator (Vengeliene et al., 2008; McCool et al., 2010).

    Alm de seus efeitos sobre os receptores de GABA e glutamato, o etanol

    tambm atua em receptores de glicina, de serotonina, de acetilcolina

    (nicotnico) (Xiao et al., 2013). Outros sistemas de neurotransmisso que

    podem ser influenciados pelo etanol so os sistemas opiide (Gianoulakis,

    1993), endocanabinide (Hungund et al., 2002; Erdozain; Callado, 2011),

    noradrenrgico (Zaleski et al; 2004), neuropeptidrgico (Bison; Crews, 2003),

    do fator liberador de corticotrofina (Wills et al., 2009) e o dopaminrgico

    (Banerjee, 2014).

    A atuao do etanol sobre o sistema dopaminrgico vem sendo

    amplamente relacionada com o efeito reforador desta droga. Sua ao ocorre

    direta e indiretamente sobre a via de recompensa do SNC, que tem como

    principais componentes as estruturas do sistema mesolmbico, cuja ativao

    envolve a liberao de dopamina no ncleo accumbens atravs da estimulao

    de neurnios que partem da rea tegmental ventral do mesencfalo (Boileau et

    al., 2003). Dessa forma, o poder reforador das drogas de abuso, entre elas, o

    etanol, se d via ativao do sistema dopaminrgico de recompensa, que

    contribui para a maior procura da substncia, podendo levar ao abuso e a

    dependncia (Baler; Volkow, 2006; Sulzer, 2011).

    Alm da sua atuao sobre sistemas de neurotransmisso distintos, a

    modulao direta da atividade de canais inicos ou receptores pode,

    posteriormente, conduzir a uma cascata de eventos sinpticos envolvendo

    vrios outros neurotransmissores. Um bom exemplo disso a sua atuao

    sobre receptores de serotonina do tipo 3 (5-HT3). Presentes em interneurnios

    GABArgicos, esses receptores de serotonina, quando modulados pelo etanol,

    podem contribuir para a ao inibitria desse sistema atravs do aumento de

    liberao de GABA (Vengeliene et al., 2008). Curiosamente, alm disso, a

    ativao dos receptores 5-HT3 tambm conhecida por aumentar a liberao

    de glutamato e dopamina, o que ilustra a complexidade na modulao de

    sistemas de neurotransmisso pelo etanol (Lovinger, 1999). Tal complexidade

    aumentada, quando considerado o sistema serotoninrgico.

  • 19

    1.3. A SUBSTNCIA CINZENTA PERIAQUEDUTAL, ETANOL E

    ANSIEDADE

    A PAG uma estrutura que tem uma organizao longitudinal e est

    localizada no mesencfalo circundando o Aqueduto mesenceflico. O aqueduto

    serve de referncia para a subdiviso da PAG em quatro colunas ao longo do

    seu eixo rostro-caudal (iniciando prximo a comissura posterior at o locus

    coeruleus): so elas as pores dorsomedial, dorsolateral, lateral e

    ventrolateral. Essa organizao baseada na anatomia e nas caractersticas

    imunoistoqumicas, densidade de receptores, conexes e detalhes funcionais

    (Bandler; Shipley, 1994; Carrive, 1993). Nesse estudo ser utilizada a diviso

    anatmica proposta por Bandler (2000) onde a denominao substncia

    cinzenta periaquedutal dorsal se refere s colunas dorsomedial e dorsolateral.

    Figura 2: Ilustrao esquemtica das colunas dorsomedial (dm), dorsolateral (dl), lateral (l) e ventrolateral (vl) da substncia cinzenta periaquedutal (PAG) nas suas pores rostrais, intermediria e caudal. (Adaptado de Linnman et al, 2011).

    Sabe-se que essa estrutura est envolvida em diversas funes

    fundamentais para a sobrevivncia do organismo, entre elas a regulao

    autonmica, comportamento maternal, processamento e informao

    nociceptiva ascendente, medo e ansiedade, comportamento predatrio e

    vocalizao (Behbehani, 1995). Todas as funes da PAG parecem

    desempenhar um papel homeosttico das respostas de defesa dos animais

    integrando informaes aferentes provenientes da periferia e informaes

    provenientes de outras estruturas do SNC, como o hipotlamo, a amgdala e os

  • 20

    ncleos da rafe. Alm disso, as respostas evocadas pela ativao da PAG

    podem estar segregadas dentro das suas subdivises anatmicas, ou seja, no

    uma estrutura funcionalmente homognea (Carrive, 1993; Linnman et al.,

    2011).

    A observao de que PAG participa da mediao de respostas

    defensivas associadas ansiedade vem de estudos com humanos e animais.

    H relatos de que a estimulao eltrica da PAG em seres humanos capaz

    de induzir medo extremo, desconforto, angstia, ansiedade e choro (Linnman

    et al., 2011). Em concordncia com esses estudos, as investigaes da

    atuao da PAG em modelos animais mostraram que a estimulao eltrica da

    DPAG, em gatos e em ratos, evoca respostas de luta e fuga (Bandler;

    DePaulis, 1991). Alm disso, tem sido demonstrado que estimulao dessa

    rea favorece a expresso de respostas relacionadas a ansiedade, como a

    esquiva inibitria no labirinto em T elevado (Camplesi et al., 2012; Silva; Nobre,

    2014).

    Alm dessas evidncias, outros estudos reforam a importncia da PAG

    na circuitaria cerebral que processa medo e ansiedade (para reviso ver

    Behbehani, 1995; de Paula Soares, 2004). Essa descoberta valorosa para o

    entendimento desses estados aversivos e suas bases farmacolgicas. Estudos

    que visam elucidar a farmacologia da ansiedade, do medo e da fuga gerados

    pela estimulao da PAG mostram o envolvimento de vrios

    neuromoduladores, como a colecistoquinina (CCK), o GABA, o xido ntrico, os

    peptdeos opiides, a noradrenalina e a serotonina (Graeff, 1994; de Paula

    Soares, 2004; Netto; Guimares, 2004; Lovick, 2008a; Lovick, 2008b; Bonassoli

    et al., 2011 ).

    Ainda que diversos estudos venham investigando a atuao do sistema

    serotoninrgico da PAG nos comportamentos defensivos, inclusive na

    ansiedade (de Paula Soares; Zangrossi, 2004; Moraes et al., 2008; Nunes-de-

    Souza et al., 2008; de Paula Soares; Zangrossi, 2009), poucos trabalhos na

    literatura trazem informaes sobre a ao da retirada do etanol nessa

    estrutura. Apesar disso, evidncias apontam para o envolvimento da PAG na

    abstinncia (Cabral et al., 2006).

    Nesse sentido, Cabral e colaboradores (2006) avaliaram se a DPAG

    poderia estar envolvida no estado de medo induzido pela retirada aps

  • 21

    ingesto crnica de etanol. Os resultados mostram que animais submetidos

    retirada de 48 horas apresentaram comportamento do tipo ansiognico no LCE.

    Alm disso, a avaliao dos comportamentos de congelamento e fuga eliciados

    pela estimulao eltrica da DPAG mostrou um resultado significativo, j que

    houve uma diminuio no limiar de fuga e congelamento dos animais que

    passaram pela retirada do etanol, em comparao com os animais controle.

    Esses dados sugerem que a retirada do etanol sensibiliza o substrato do medo

    na DPAG.

    Outros estudos que evidenciam a atuao da PAG nos sinais e sintomas

    da retirada aps tratamento crnico com etanol tinham entre os seus objetivos

    identificar reas que eram ativadas aps a retirada. Essa abordagem envolve a

    marcao de atividade neuronal e tem sido bastante utilizada para estudos da

    relao estrutura-funo no SNC (Kovacs, 1998). O proto-oncogene c-fos vem

    sendo amplamente empregado, nesse sentido. Ele codifica a protena Fos que

    est envolvida na transduo de sinal da cascata intracelular responsvel por

    mudanas provocadas por eventos extracelulares (Herrera; Robertson, 1996).

    Dessa forma, a expresso dessa protena fornece um ndice da ativao

    neuronal de animais expostos a vrios tipos de situaes experimentais

    (Herrera; Robertson, 1996; Kovacs, 1998).

    Knapp e colaboradores (1998) utilizaram a imunoreatividade a Fos para

    associar regies especficas do encfalo de ratos com a ansiedade gerada pela

    retirada do etanol. Para isso eles utilizaram dois protocolos de administrao

    do etanol, um de 4 dias por via intragstrica, e outro de 14 dias na dieta lquida.

    Durante a retirada dos dois protocolos de tratamento, a protena Fos foi

    induzida com maior destaque em reas frontais do encfalo, embora o

    mesencfalo e o rombencfalo tambm tenham sido representados. Dentre as

    regies que foram marcadas, estavam diversas reas do crtex, septo, ncleo

    accumbens, amgdala, ncleo paraventricular do tlamo e hipotlamo,

    hipocampo, locus coeruleus, e a PAG. Estes resultados sugerem que

    determinadas regies do encfalo, como a PAG, mas no outras, so afetadas

    por e/ou medeiam retirada do etanol.

    J Borlikova e colaboradores (2006), investigaram se mltiplas retiradas,

    aps o consumo crnico de etanol, eram capazes de aumentar a ansiedade

  • 22

    induzida pela abstinncia e modificariam a ativao de regies enceflicas

    relacionadas com esse estmulo. Para isso, eles trataram os animais com

    etanol por 24 dias e fizeram uma nica retirada para um grupo e mltiplas

    retiradas de - 2 a 3 dias - para o outro grupo, alm do grupo controle, que no

    recebeu etanol. Com oito horas de abstinncia, os animais foram testados no

    LCE e, posteriormente, a atividade neuronal e a plasticidade foram avaliadas

    com a utilizao de marcao de c-fos e zif268. O zif268 codifica uma protena

    nuclear que funciona como regulador da transcrio e a sua induo tem sido

    associada com a plasticidade neuronal (Knapska; Kaczmarek, 2004). Como

    resultado, eles encontraram que a retirada de oito horas, para ambos os

    protocolos, aumentou a ansiedade avaliada no LCE, em comparao com os

    animais controle. Ainda, houve ativao neuronal na amgdala, ncleo

    accumbens, hipocampo e PAG. Dentre essas estruturas a nica com resultado

    positivo na anlise do zif268 foi a amgdala.

    Ainda nessa linha de investigao que sugere a ativao da PAG nos

    sinais e sintomas da retirada do etanol, Bertotto e colaboradores (2010)

    objetivaram identificar substratos neurais potencialmente envolvidos no

    aumento da resposta de medo contextual em animais abstmios. Alm disso,

    eles estudaram as marcaes de c-Fos em diferentes reas do encfalo

    relacionadas com o estresse, medo e ansiedade. Os resultados mostraram que

    a retirada da administrao crnica de lcool facilitou a formao de memria

    de medo contextual com um aumento da expresso de c-Fos na amgdala

    basolateral, giro denteado, PAG ventrolateral e PAG dorsomedial.

    De maneira interessante, Bonassoli e colaboradores (2011) investigaram

    a ativao de neurnios produtores de xido ntrico (NO) localizados em reas

    do encfalo relacionadas com a ansiedade depois da retirada do etanol;

    concomitantemente, foi utilizada a marcao de protena Fos para identificao

    de possvel atividade neuronal. Para isso, os animais foram submetidos a um

    protocolo de consumo de etanol por 21 dias, seguido pela interrupo abrupta

    do tratamento. Vinte e quatro ou 48 horas depois, os animais passaram pelo

    teste do campo aberto por 10 minutos e, duas horas mais tarde, os encfalos

    foram retirados para anlise imunoistoqumica. No resultado comportamental

    os autores encontraram uma diminuio da explorao do aparato pelos

  • 23

    animais que passaram por 24 horas de retirada, o que os autores consideraram

    como uma expresso do estado ansioso gerado pela retirada. O aumento da

    expresso de Fos foi detectado nos crtices cingulado e piriforme, em vrios

    ncleos do hipotlamo, amgdala, no NDR e na maioria das subdivises da

    PAG. A retirada de etanol ativou neurnios produtores de NO no ncleo

    paraventricular do hipotlamo, PAG dorsolateral e no NDR. Dessa forma os

    autores confirmaram a hiptese de que a retirada do etanol ativa neurnios

    produtores de NO em reas do encfalo implicadas na modulao de

    comportamentos emocional, autnomo e da expresso motora da ansiedade e

    apontaram a PAG como uma possvel rea na modulao da ansiedade

    favorecida pela retirada.

    1.4. ETANOL E O SISTEMA SEROTONINRGICO

    Para entender melhor esse sistema necessrio conhecer os seus

    componentes. A maioria dos neurnios serotoninrgicos est concentrada na

    linha mdia da regio da rafe no tronco enceflico formando um complexo

    conhecido por ncleos da rafe (Abrams et al., 2004, Reis, 2007; Rang; Dale,

    2011). Este complexo formado pelos corpos celulares de neurnios

    serotoninrgicos emite uma rede de terminais que se projetam para quase todo

    o SNC, incluindo muitas partes do crtex, o hipotlamo, o hipocampo, os

    ncleos da base, a amgdala e a substncia cinzenta periaquedutal (PAG);

    algumas dessas reas esto diretamente relacionadas com a emoo (Abrams

    et al., 2004, Reis, 2007; Rang; Dale, 2011). Nessas reas, diferentes tipos de

    receptores de serotonina foram descritos (Celada et al., 2013).

    Os receptores de serotonina, amplamente distribudos pelo SNC so

    bastante variados possuindo diferentes perfis farmacolgicos e papis

    fisiolgicos. Isso explica as diferentes funes atribudas ao neurotransmissor.

    Atualmente so conhecidos 16 subtipos de receptores divididos em 7 famlias.

    Dependendo do subtipo eles podem estar localizados tanto pr, quanto ps

    sinapticamente (Kitson, 2007, Rang; Dale, 2011; Celada et al., 2013).

    Inicialmente, a classificao desses receptores continha apenas as famlias 5-

    HT1 (subdivido em A, B, D, E e F), 5-HT2 (subdivido em A, B e C) e 5-HT3.

    Posteriormente, foram identificados os receptores das famlias 5-HT4, 5-HT5 (A

    e B), 5-HT6 e 5-HT7 (A, B e D) como demonstrado na figura 1 (Pauwels, 2003;

  • 24

    Celada et al., 2013). Funcionalmente, os receptores serotoninrgicos

    subdividem-se em duas classes, o receptor ionotrpico e os receptores

    metabotrpicos; o primeiro grupo tem como nico representante o subtipo 5-

    HT3, que acoplado a um canal inico permevel a sdio (Na+), potssio (K+) e

    clcio (Ca++). J o segundo grupo, que abrange os outros subtipos de

    receptores de serotonina, esta acoplado a uma protena G e quando

    estimulados, atuam em vrios sistemas enzimticos, incluindo aquele da

    adenililato ciclase, da fosfolipases A e C, e canais de ctions, especialmente

    canais de K+ e Ca++ (Lee et al., 2004).

    Figura 1: Receptores serotoninrgicos e respectivas aes intracelulares (Lam; Hesler, 2007).

    As influncias do etanol sobre o sistema serotoninrgico no esto

    completamente elucidadas, mas diversos estudos vm sendo realizados com o

    objetivo de melhor compreend-las (L; Funk, 2005; Kirby et al., 2011).

    Evidncias do envolvimento do sistema serotoninrgico com a dependncia

    surgiram em 1968, quando Myer e Veale demonstraram que a depleo de

    serotonina no encfalo produzia uma supresso forte e duradoura do consumo

    de etanol em ratos (Myer; Veale, 1968 apud L; Funk, 2005).

    Sabe-se que o sistema serotoninrgico est envolvido desde a etapa

    inicial de ingesto aguda do etanol, na manuteno do consumo, na retirada e

  • 25

    na recada (L; Funk, 2005; Vengeliene et al., 2008; Kirby et al., 2011). Sugere-

    se que uma disfuno inata no sistema dopaminrgico e/ou serotoninrgico

    pode ser importante para a preferncia inicial pelo lcool, j que baixos nveis

    de ambos neurotransmissores foram observados em diferentes linhagens de

    ratos que preferem lcool (Vengeliene et al., 2008). Ainda com relao

    aquisio do consumo de etanol, o receptor de serotonina do tipo 3 parece

    exercer um papel importante. Foi demonstrado que o etanol potencializa a ao

    da serotonina atravs da ativao desse subtipo de receptor e a utilizao de

    antagonistas especficos de receptores 5-HT3 foi capaz de suprimir a aquisio

    do consumo de etanol voluntrio em ratos que preferem lcool (Vengeliene et

    al., 2008).

    De maneira aguda, o etanol parece atuar aumentando a liberao desse

    neurotransmissor de forma consistente em vrias regies do encfalo, incluindo

    ncleo accumbens, rea tegmental ventral, amgdala e hipocampo. Este efeito

    parece ser potencializado em linhagens de animais que preferem etanol, em

    comparao com a sua contraparte que no prefere (Kirby et al., 2011).

    Com relao ao consumo voluntrio, estudos conduzidos em animais

    com deleo gnica (animais knockout) e com manipulaes farmacolgicas

    dos vrios componentes do sistema serotoninrgico indicam um papel

    modulador da serotonina neste processo (Vengeliene et al., 2008). Em geral,

    pode ser dito que, apesar de algumas inconsistncias na literatura, os dados

    pr-clnicos gerados nas ltimas 3 dcadas sugerem fortemente que esse

    sistema atue significativamente no consumo de etanol (L; Funk, 2005). A

    deleo de transportadores de serotonina nos animais resulta em uma reduo

    na auto-administrao de etanol, em comparao com animais controle. Alm

    disso, a administrao de inibidores de recaptao de serotonina foi capaz de

    reduzir o consumo de lcool em animais de linhagens selvagens e tambm em

    sua contraparte que preferem etanol (Vengeliene et al., 2008). Por conseguinte,

    bem conhecido que o consumo de etanol pode ser reduzido pelo uso de

    drogas que aumentam a disponibilidade central de serotonina, podendo ser

    pela induo da liberao ou pelo bloqueio da recaptao desse

    neurotransmissor (Casu et al., 2003; L; Funk, 2005; Vengeliene et al., 2008).

    J a deleo de receptores 5-HT1B mostrou aumentar a ingesto de etanol

  • 26

    (Vengeliene et al., 2008). Curiosamente, bloqueadores seletivos de receptores

    5-HT2, 5-HT3, e 5-HT4 parecem reduzir o seu consumo (Casu et al., 2003).

    Quando o consumo do etanol se torna crnico, o seu efeito sobre os

    nveis de serotonina contrrio, quando comparado com a ingesto aguda,

    causando uma diminuio da sua disponibilidade no ncleo accumbens e no

    hipocampo (Kirby et al., 2011). Estudos tambm sugerem que o consumo

    crnico de grandes quantidades de etanol resulta em reduo no nmero de

    neurnios de serotonina (Heinz et al., 1998; Berggren et al., 2002).

    Adicionalmente ao seu efeito sobre os nveis de serotonina, a

    administrao crnica de etanol tambm capaz de modificar a expresso de

    subtipos de receptores serotoninrgicos. Ulrichsen (1991) investigou a

    presena de receptores 5-HT1A, atravs da tcnica de binding, aps uma dieta

    com administrao de etanol intragastricamente durante 4 dias em ratos. Seus

    resultados mostraram uma reduo de receptores 5-HT1A no hipocampo, sendo

    de 25% durante a intoxicao e de 17% durante a retirada. Em outro estudo,

    Nevo e colaboradores (1995), aps tratamento crnico de etanol por 2

    semanas, seguido de retirada de 18 horas em ratos, encontraram uma reduo

    de 20% na marcao do mesmo receptor no hipocampo, e tambm uma

    reduo de 30% no crtex anterior e 32% no posterior. Alm disso, os autores

    tambm encontraram um aumento da marcao de receptores 5-HT1A de

    aproximadamente 30% no ncleo dorsal da rafe (NDR). Os receptores 5-HT1B

    tambm respondem utilizao crnica do etanol, aumentando a sua

    marcao em aproximadamente 55% no globo plido de ratos (Nevo et

    al.,1995).

    Outro receptor de serotonina que vem sendo bastante citado na

    literatura como um alvo promissor para o tratamento dos transtornos

    relacionados ao etanol o 5-HT3. Diversos trabalhos indicam que estes

    receptores esto envolvidos em efeitos comportamentais e neuroqumicos

    importantes do etanol, e que isso pode ocorrer pela capacidade da droga atuar

    diretamente sobre o receptor, potencializando a ao da serotonina endgena

    (Grant, 1995; Ye et al., 2001). Alm disso, sugere-se que o receptor 5-HT3 esta

    envolvido no efeito recompensador do etanol e a utilizao de antagonistas

    desse receptor so eficazes na diminuio do consumo de etanol,

  • 27

    provavelmente mediando a liberao de dopamina no SNC (Grant, 1995; Ye et

    al., 2001). Neste sentido, a ondansetrona, um antagonista de receptores 5-HT3,

    vem sendo utilizada em pesquisas pr-clinicas e proposta na clnica para tratar

    indivduos dependentes. Resultados pr-clnicos indicam que o antagonismo do

    receptor 5-HT3 na rea tegmental ventral, no ncleo accumbens ou na

    amgdala reduz a auto-administrao de etanol e/ou os efeitos associados ao

    etanol. As manifestaes clnicas esto em paralelo aos resultados pr-clnicos

    de tal forma que o antagonismo do receptor 5-HT3, reduz o consumo de lcool

    e de alguns dos seus efeitos subjetivos (Grant, 1995; Ye et al., 2001; Engleman

    et al., 2008).

    Alm da ao do etanol aps utilizao aguda e crnica sobre o sistema

    serotoninrgico, estudos recentes vm investigando sua importncia tambm

    na retirada (Knapp et al., 2004; Overstreet et al., 2003; Uzbay, 2008). H uma

    crescente evidncia de que um desequilbrio do sistema serotoninrgico pela

    exposio em longo prazo a drogas de abuso pode ser a base da alta taxa de

    comorbidade de transtornos afetivos (por exemplo, ansiedade e depresso)

    com a dependncia (Kirby et al., 2011). Esses estados de humor so relatados

    como parte da sndrome de retirada e podem desencadear a procura pela

    droga e a vulnerabilidade recada como um meio de automedicao e

    restaurao de homeostasia no mbito desse sistema (Kirby et al., 2011).

    Estudos iniciais que visavam propor a participao de receptores

    serotoninrgicos na ansiedade gerada pela retirada do etanol utilizaram a

    buspirona, um agonista parcial de receptores serotoninrgicos do tipo 5-HT1A.

    Esse agente foi capaz de reverter o comportamento ansiognico de animais

    testados no labirinto em cruz elevado (LCE), um teste de ansiedade, aps a

    retirada aguda de 20 horas e tambm aps 7 dias de abstinncia (Lal et al.,

    1991). Os autores sugeriram que a atividade ansioltica da buspirona

    observada no experimento poderia ser devido a uma diminuio na

    neurotransmisso serotoninrgica atravs da ativao dos auto-receptores pr-

    sinpticos do tipo 5-HT1A. Eles ainda sugeriram que a farmacoterapia com

    agonistas seletivos de 5-HT1A poderia ser benfica na reduo da ansiedade

    durante a retirada do etanol.

  • 28

    Outro receptor de serotonina que foi investigado para um melhor

    entendimento do sistema serotoninrgico nos efeitos da retirada do etanol foi o

    do tipo 5-HT1B. Pandey e colaboradores (1996) administraram etanol na

    concentrao de 9% em uma dieta lquida com a durao de 1 dia ou de 15

    dias em ratos machos Sprague-Dawley at a interrupo do tratamento. Os

    pesquisadores ento avaliaram um dos grupos de animais que receberam

    etanol por 15 dias quanto s alteraes comportamentais relacionadas

    abstinncia aps 24 horas da retirada do etanol. Posteriormente, os encfalos

    foram retirados para quantificao de receptores 5-HT1B atravs da tcnica de

    binding por saturao no crtex, cerebelo, estriado e hipocampo utilizando

    como ligante o 125I-cyanopindolol. O tratamento crnico com etanol produziu

    um aumento significativo na ligao do reagente aos receptores 5-HT1B no

    crtex e no hipocampo dos animais que passaram pelo consumo crnico de

    etanol, e este efeito permaneceu aps 24 horas de retirada do etanol. Em

    contraste, no estriado e no cerebelo, a taxa de ligao se manteve inalterada.

    Estes resultados sugerem um aumento dos receptores 5-HT1B disponveis

    nestas regies, levando os autores a sugerirem uma possvel atuao desses

    receptores na dependncia, representando uma diminuio da atividade

    serotoninrgica durante o consumo crnico de etanol.

    Alm dos receptores supracitados, Gatch e colaboradores (2000)

    investigaram a capacidade da ritanserina, um antagonista de receptores do tipo

    5-HT2A, de modificar comportamentos causados pela retirada do etanol no

    LCE. Ratos Long-Evans receberam uma dieta lquida de etanol a 4,5% durante

    10 dias. Doze horas aps a remoo do etanol, os animais foram testados no

    LCE. Observou-se uma reduo significativa na atividade dos animais nos

    braos abertos, sugestivo de efeito ansiognico. A ritanserina administrada por

    5 dias aumentou o tempo gasto nos braos abertos e reverteu a reduo

    induzida pela retirada sobre o total de entradas nos braos abertos do aparato.

    No teste de interao social, utilizado para avaliao da ansiedade, um

    antagonista seletivo do receptor 5-HT2C bloqueou a reduo da interao social

    causada pela retirada do etanol, mas o mesmo no aconteceu com

    antagonistas de receptores 5-HT1A e 5-HT3 (Knapp et al., 2000 apud Overstreet

    et al., 2003). Posteriormente, Overstreet e colaboradores (2003) investigaram o

  • 29

    papel de alguns receptores de serotonina em ratos que passaram por mltiplas

    retiradas. Para isso, foi utilizado um protocolo de consumo de etanol com 15

    dias de durao, e no 5 e no 10 dia, o etanol era substitudo por gua por dois

    dias, at a reintroduo do etanol. Os autores utilizaram a buspirona, o WAY-

    100635, um antagonista de receptor 5-HT1A, o SB242084, um antagonista de

    receptor 5-HT2C, a ketanserina, um antagonista de receptor 5-HT2A, a

    ritanserina, um antagonista misto de receptores 5-HT2A/2C e o Ro-601075, um

    agonista de receptor 5-HT2C, administrados perifericamente 30 minutos antes

    do teste comportamental, ou administrados no quinto e dcimo dia do protocolo

    de consumo, quatro horas aps as retiradas. As nicas drogas que foram

    capazes de reduzir os dficits na interao social causada pela retirada do

    etanol em ambos os protocolos de administrao foram a buspirona e o

    SB242084. J o Ro-601075 acentuou o dficit comportamental no teste da

    interao social causado pela retirada do etanol. Assim, pde ser sugerido que

    tanto a modulao de receptores 5-HT1A, quanto o bloqueio dos receptores 5-

    HT2C podem melhorar os sintomas de ansiedade associados retirada do

    etanol (Overstreet et al., 2003). Ainda segundo Overstreet e colaboradores

    (2003), o fato de nenhuma das duas drogas (buspirona e SB242084) terem

    alterado o comportamento da interao social em animais controle sugere que

    os seus efeitos resultam de uma ao contrria das possveis anormalidades

    serotonrgicas resultantes da abstinncia.

    Em um estudo visando verificar possveis reas enceflicas envolvidas

    na ansiedade gerada por mltiplas retiradas de etanol, Overstreet e

    colaboradores (2006) administraram a buspirona, o agonista inverso de 5-HT2C

    SB-243213 e o agonista de receptor 5-HT2C Ro-601075 na amgdala, no NDR,

    no ncleo accumbens e no ncleo paraventricular do hipotlamo. Seguindo um

    protocolo de consumo de etanol com a durao de quinze dias, dividido em 3

    ciclos com 5 dias de consumo forado de etanol e dois ciclos de retirada com 2

    dias de durao, os autores observaram que a administrao de SB-243213 na

    amgdala reverteu os dficits apresentados no teste de interao social

    causados pela retirada, enquanto a buspirona reduziu dficits somente quando

    administrada no NDR. Em contraste, o agonista do receptor 5-HT2C, Ro

    601075, acentuou o dficit comportamental aps as administraes na

  • 30

    amgdala. Todas as drogas foram administradas uma vez em cada ciclo de

    retirada.

    Tabela 1: Resumo dos estudos cientficos que avaliaram a participao de receptores de serotonina na ansiedade gerada pela retirada de etanol.

    Os resultados dos estudos da relao do sistema serotoninrgico e o

    etanol sugerem o possvel envolvimento de receptores 5-HT1B, 5-HT1A, 5-HT2c

    e 5-HT3 em reas enceflicas como a amgdala, o crtex e no hipocampo na

    retirada do etanol. Alm disso, como demonstrado na tabela 1, a atuao de

    alguns desses receptores tambm esto relacionadas a ansiedade gerada na

    abstinncia. O papel de outros subtipos de receptores de serotonina, como o 5-

    HT7, na dependncia do etanol menos compreendido.

    1.5. PAPEL DOS RECEPTORES DO TIPO 5-HT7 NA MODULAO DE

    COMPORTAMENTOS RELACIONADOS ANSIEDADE

    O receptor de serotonina do subtipo 7 (5-HT7) foi o ltimo a ser

    descoberto (Leopoldo et al., 2012). Por esse motivo, o conhecimento da

    atuao desse receptor no funcionamento fisiolgico e em processos

  • 31

    patolgicos do organismo considerado pequeno, quando comparado com

    outros receptores de serotonina. Esse atraso se deu principalmente pela falta

    de agentes seletivos que pudessem ajudar na investigao do papel desse

    receptor.

    Com o advento da sntese de antagonistas e agonistas desse receptor e

    do desenvolvimento de animais modificados geneticamente, o entendimento da

    sua atuao em processos fisiolgicos e patolgicos est avanando. Como

    resultado, estudos pr-clnicos avaliando seu envolvimento em transtornos

    psiquitricos vm sendo realizados (Hedlund, 2009; Leopoldo et al., 2012).

    A maioria dos estudos encontrados na literatura utilizam como

    ferramentas para a investigao desse receptor antagonistas considerados

    relativamente seletivos, como o (2R)-1-[(3-hydroxyphenyl)sulfonyl]-2-[2-(4-

    methyl-1-piperidinyl)ethyl]-pyrrolidine (SB-269970) e o 2a-[4-(4-phenyl-1,2,3,6-

    tetrahydropyridyl)butyl]-2a,3,4,5-tetrahydrobenzo(c,d)indol-2-(1H)-one (DR

    4004). Com o mesmo interesse, tambm foram desenvolvidos em diferentes

    laboratrios animais knockout (5-HT7-/-

    ), que no expressam os receptores 5-

    HT7 (Leopoldo et al, 2012).

    Existe uma correlao consistente entre distribuio e funo do 5-HT7

    no encfalo: sua presena no hipotlamo sugere um envolvimento no ritmo

    circadiano, na termoregulao e na regulao endcrina; sua presena no

    hipocampo relevante para o seu papel na memria e na aprendizagem. No

    crtex e no tlamo, a importncia desses receptores correlacionada com o

    sono, a epilepsia e a regulao do humor (Leopoldo et al., 2012). O interesse

    no possvel envolvimento desse receptor em distrbios emocionais surgiu a

    partir de achados experimentais de que frmacos antipsicticos (Roth et al.,

    1999) e antidepressivos (Monsma et al., 1993; Mullins et al., 1999) tm

    afinidade por 5-HT7, e foi reforado pela sua presena em regies relevantes do

    SNC modulao das emoes, tais como a amgdala, o hipocampo, o

    hipotlamo e a poro dorsal da substncia cinzenta periaquedutal (DPAG)

    (Bonaventure et al., 2002; Rang; Dale, 2011; Leopoldo et al., 2012).

    Estudos que tiveram como objetivo avaliar o papel do receptor 5-HT7 na

    ansiedade encontraram resultados variados (Leopoldo et al., 2012). A utilizao

  • 32

    de animais knockout para esse receptor submetidos a testes de ansiedade,

    como a resposta ao alarme sonoro, o LCE e o teste da caixa claro/escuro, so

    inconclusivos (Guscott et al., 2005; Leopoldo et al., 2012). J, estudos com o

    bloqueio dos receptores 5-HT7 pela administrao de antagonista sugerem um

    efeito ansioltico deste bloqueio (Wesolowska et al., 2006a; 2006b).

    A participao do receptor 5-HT7 foi avaliada em trs testes de

    ansiedade, o Teste de conflito de Vogel e o LCE para ratos e o Four Plate test

    para camundongos. Em todos os trs testes a administrao intraperitoneal do

    SB 269970 favoreceu um efeito ansioltico, em relao aos animais controle

    (Wesolowska et al., 2006a). Porm, substratos neurais crticos para a atividade

    ansioltica desse antagonista ainda so desconhecidos. Apesar disso existem

    algumas hipteses baseadas na localizao neuroanatmica do receptor 5-HT7

    e as consequncias da sua manipulao no funcionamento do SNC. Uma

    elevada densidade desses receptores foi encontrada em estruturas como, por

    exemplo, o hipocampo, a amgdala e a PAG (Gustafson et al., 1996;

    Bonaventure et al., 2002). Essa distribuio enceflica de receptores 5-HT7 no

    sistema lmbico indica um potencial papel destes receptores em processos

    afetivos. Vale a pena ressaltar que a transmisso serotonrgica em reas como

    amgdala, hipocampo e PAG vm sendo associadas modulao da

    ansiedade (de Paula Soares; Zangrossi 2004; Wesolowska et al., 2006b;

    Strauss et al., 2013).

    Para um maior entendimento da ao do antagonista SB 269970 na

    ansiedade, Wesolowska e colaboradores (2006b) aprofundaram a sua

    investigao escolhendo uma rea enceflica de interesse para os

    comportamentos aversivos, o hipocampo. Para tal, os autores administraram o

    antagonista de 5-HT7 SB269970 diretamente nessa regio e avaliaram o

    comportamento dos animais no teste de conflito de Vogel. Os resultados

    obtidos mostraram que o SB 269970 produziu um efeito ansioltico, ao

    aumentar o beber punido durante a sesso experimental.

    Por ser um transtorno complexo, a dependncia ao etanol no fcil de

    ser modelada e as bases neurais envolvidas tanto no uso prolongado do

    etanol, como na sua retirada no esto completamente elucidadas. Estudos

    que visam compreender tais bases mostram que o consumo crnico de etanol

  • 33

    induz alteraes morfolgicas no sistema nervoso central e a retirada no

    capaz de reverter estas mudanas (Garca-Moreno et al., 2000).

    Ainda que tais estudos envolvam diferentes protocolos e tempos de

    retirada, algumas reas enceflicas so frequentemente associadas

    modulao de alguns efeitos da retirada do etanol. So elas: hipocampo,

    hipotlamo, crtex, bulbo olfatrio, colculos inferior e superior, cerebelo, septo,

    ncleo accumbens, ncleo paraventricular do tlamo, locus coeruleus, ncleos

    da rafe, ncleos central e basolateral da amgdala e PAG (pores dorsal e

    ventrolateral) (Pistis et al., 1997; Knapp et al., 1998; Yang et al., 2003;

    Stephens et al., 2005; Borlikova et al., 2006; Cabral et al., 2006; Smith e Aston-

    Jones, 2008; Ikemoto, 2010; Bonassoli et al., 2010).

    A PAG uma rea candidata aos estudos da ansiedade gerada pela

    retirada do etanol j que ela esta relacionada com a ansiedade natural e

    patolgica (Deakin; Graeff, 1991) e parece estar associada com a retirada de

    etanol (Cabral et al., 2006). Apesar disso, ainda so escassos os estudos do

    envolvimento dessa estrutura na retirada do etanol.

    Com base nos resultados de diversos estudos clnicos e pr-clnicos

    sabe-se que a retirada de etanol capaz de gerar ansiedade e que essa tem

    relao direta com diversos sistemas de neurotransmisso, dentre eles o

    sistema serotoninrgico. Tambm a partir da literatura cientfica, existe a

    proposta de que a PAG ativada durante a ansiedade e durante a abstinncia.

    Dessa forma, torna-se interessante investigar o papel dos componentes do

    sistema serotoninrgico presentes na PAG, em particular dos receptores 5-HT7

    da regio dorsal, na ansiedade resultante da retirada do etanol aps consumo

    crnico.

  • 34

    2. OBJETIVOS

    2.1. OBJETIVO GERAL

    Investigar se os receptores do tipo 5-HT7 da DPAG podem mediar a

    ansiedade experimental basal e a ansiedade gerada pela retirada de etanol no

    labirinto em cruz elevado e no campo aberto em ratos.

    2.2. OBJETIVOS ESPECFICOS

    Observar o efeito da administrao intra-DPAG das doses de 2,5; 5 e 10

    nmoles de SB-269970, um antagonista de receptores do tipo 5-HT7, sobre as

    respostas comportamentais de ratos naive no labirinto em cruz elevado e no

    teste do campo aberto.

    Verificar se a administrao intra-DPAG da doses de 2,5 e 5 nmoles de

    SB-269970 seria capaz de reverter as alteraes comportamentais no LCE e

    no teste do campo aberto promovidas pela retirada de etanol por 72 e 96 horas,

    respectivamente, aps consumo por 21 dias em ratos.

  • 35

    3. MATERIAIS E MTODOS

    3.1. Animais

    Foram utilizados ratos machos Wistar, entre 75 e 100 dias, provenientes

    do Biotrio do Departamento de Biofsica e Farmacologia da Universidade

    Federal do Rio Grande do Norte. Os animais foram alojados em grupos de 5

    durante todo o experimento em gaiolas plsticas de 41x34x16 cm, com

    serragem no assoalho. Os animais eram mantidos em condies controladas

    com ciclo de luz claro/escuro de 12x12 horas, com incio do perodo claro s 6

    horas, temperatura mantida em 221C. Os animais receberam gua e comida

    ad libitum at o incio do experimento; aps isso os animais foram divididos

    para o incio do tratamento. Todos os procedimentos experimentais foram

    realizados sob aprovao da Comisso de tica no Uso de Animais da

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Protocolo N019/2010).

    3.2. Drogas

    Foi utilizado o seguinte antagonista serotoninrgico: SB 269970

    hydrocloride (2R)-1-[(3-Hydroxyphenyl)sulfonyl]-2-[2-(4-methyl-1-

    piperidinyl)ethyl]pyrrolidine hydrochloride, Tocris Bioscience) nas doses de 2,5;

    5,0 e 10 nmoles, dissolvido em salina estril 0,9% e Tween 80 a 2%. Os

    animais do grupo controle receberam salina 0,9% e Tween 80 a 2%. Para o

    tratamento com etanol crnico foi utilizado lcool etlico 70% (Alcoolabor

    Segementa) dissolvido em gua a fim de se obter as concentraes de 2, 4 e

    6% da droga. Para o procedimento cirrgico foram utilizados os anestsicos

    Quetamina (80 mg/Kg/ml), Xilazina (10 mg/Kg/ml) e de cloridrato de lidocana

    (2%, 0,2 mL/animal, subcutnea), alm do analgsico com atividade

    antiinflamatria e antipirtica (Banamine) (2,5 mg, 0,2 mL/animal, subcutnea)

  • 36

    e uma associao antibitica de largo espectro (Pentabitico, 10 mg, 0,2

    mL/animal, intra muscular). Para a perfuso transcardaca, os animais foram

    anestesiados com tiopental (100 mg/kg/mL, intraperitoneal), e perfundidos com

    salina (NaCl 0,9%) e posteriormente com formol (10%).

    3.3. Exposio ao Etanol

    Os animais do grupo etanol consumiram gua ad libitum durante o

    crescimento at atingir 75 dias, quando foi iniciado o tratamento com o etanol

    como nica fonte de dieta lquida. O protocolo de exposio ao etanol foi

    montado com base em estudos prvios (Tirapelli et al., 2008; Ali, 2011) da

    seguinte forma: etanol na concentrao de 2% por trs dias, seguido de etanol

    na concentrao de 4% por trs dias e etanol na concentrao de 6% por

    quinze dias totalizando 21 dias de tratamento. Ao final da exposio, foi

    realizada a retirada de etanol da dieta, voltando a oferecer gua livremente

    para os animais. O grupo controle recebeu gua ad libitum e ambos receberam

    dieta slida sem nenhum tipo de restrio durante todo o experimento. A

    exposio ao etanol foi feita somente no experimento 2.

    Quadro 2: Esquema do protocolo de consumo de etanol.

  • 37

    3.4. Cirurgia Estereotxica para Implantao de Cnula Intra-DPAG

    Os animais foram anestesiados com Quetamina (80 mg/Kg/ml) e

    Xilazina (10 mg/Kg/ml). Confirmada a induo anestsica, estes foram

    colocados em um aparelho estereotxico, com a barra dos incisivos fixas em

    2,5 mm abaixo da linha interaural para dar incio aos procedimentos cirrgicos.

    Foi realizada a limpeza do campo cirrgico previamente raspado com uma

    soluo de iodo onde foi administrado por via subcutnea o anestsico local

    cloridrato de lidocana (0,2 mL/animal, subcutnea) associado a um

    vasoconstritor. Alguns minutos depois foi feita a inciso longitudinal para a

    exposio da calota craniana e foi realizada a remoo do peristeo por

    raspagem.

    O prximo passo foi a fixao de um parafuso de ao inoxidvel para a

    ancoragem da prtese de acrlico a ser colocada no crnio do animal; para

    isso, foi feito um orifcio perfurado com broca dental a fim de facilitar o

    procedimento. Para a introduo da cnula-guia, tambm foi feito um orifcio

    com a localizao demarcada a uma distncia de 1,9 mm lateralmente ao

    lambda. A profundidade foi demarcada a partir da superfcie craniana a uma

    distncia de 3,2 mm com uma inclinao de 22 em relao ao plano sagital. A

    confeco da cnula-guia de 12 mm foi feita manualmente a partir de uma

    agulha hipodrmica descartvel (25x6 mm). Para a fixao da cnula-guia na

    calota craniana, foi utilizada resina acrlica autopolimerizvel. Para finalizar, foi

    introduzido pela cnula guia um mandril de ao inoxidvel de mesmo

    comprimento, para evitar possveis entupimentos da cnula.

    Finalizada a cirurgia, os animais foram assistidos no retorno da

    anestesia e, posteriormente, foram levados ao biotrio do laboratrio, onde

    permaneceram at a realizao dos testes comportamentais. Durante o

    procedimento cirrgico foi administrado um potente analgsico com atividade

    antiinflamatria e antipirtica (Banamine) (0,2 mL/animal, subcutneo) e uma

    associao antibitica de largo espectro (Pentabitico, 0,2 mL/animal, intra

    muscular), a fim de prevenir possveis situaes patolgicas.

  • 38

    3.5. Habituao

    No quinto e sexto dia aps a cirurgia, cada animal foi retirado do biotrio

    e levado para sala de teste a fim de ser habituado ao experimentador e s

    condies experimentais. Para isso, o experimentador manuseou o animal por

    5 minutos e, em seguida, o rato foi colocado em uma gaiola com serragem no

    assoalho, onde permaneceu por 10 minutos. A mesma gaiola foi utilizada,

    posteriormente, na execuo dos testes comportamentais.

    3.6. Aparatos, Injeo intra-DPAG e Testes comportamentais

    No stimo dia aps a cirurgia, os animais foram submetidos injeo

    intra-DPAG de SB269970 ou veculo dez minutos anteriores ao teste do

    labirinto em cruz elevado. No oitavo dia ps-cirgico, os mesmo animais foram

    submetidos injeo intra-DPAG com o mesmo tratamento e, dez minutos

    aps, ao teste do campo aberto.

    As injees foram feitas com uma agulha odontolgica (14 mm) inserida

    pela cnula guia, at atingir o alvo 2 mm abaixo da extremidade da cnula. A

    agulha odontolgica estava conectada atravs de um sistema de tubo de

    polietileno a uma microsseringa (Hamilton 701-RN, EUA) de 5 L. Todo o

    sistema estava preenchido por gua destilada. Para verificar se a droga estava

    sendo injetada foi verificado o deslocamento de uma bolha de ar no polietileno

    antes e durante a injeo. O volume e o tempo de injeo foram controlados

    por uma bomba de microinjeo digital (Insight, Brasil), sendo o volume de 0,2

    L da droga injetado durante 2 minutos.

  • 39

    3.6.1. Labirinto em Cruz Elevado (LCE)

    O teste foi realizado em um aparelho de frmica branca elevado do cho

    40 cm, com dois braos laterais elevados (fechados), com paredes medindo 40

    cm de altura e dois braos (abertos), com moldura de acrlico de 1 cm de

    altura, unidos por uma plataforma central comum de 10x10 cm (Pellow et al.,

    1985).

    Figura 3: Imagem do Labirinto em Cruz Elevado (Pires et al., 2012)

    Antes do incio do teste, os animais eram realocados nas gaiolas

    utilizadas na habituao e transportados para uma sala adjacente sala de

    experimento para ambientao e injeo da droga. Dez minutos aps o

    tratamento, os ratos foram transportados at a sala experimental e expostos ao

    LCE. Cada animal era colocado na plataforma central com a cabea voltada

    para um dos braos fechados e explorava o labirinto por 5 minutos. Todos os

    testes foram conduzidos durante a fase clara do ciclo de luz, sempre no mesmo

    horrio (13h-18h), em uma sala com baixa iluminao (luz vermelha) e

    temperatura controlada. Aps o teste de cada animal, a limpeza do labirinto era

    realizada com gua. O teste foi gravado para anlise posterior. Foram

    considerados os seguintes parmetros: nmero de entradas nos braos

    fechados, porcentagem de entradas nos braos abertos (entradas nos

  • 40

    fechados+ centro+ abertos como total de entradas) e porcentagem de tempo

    gasto nos braos abertos (tempo total de 300 segundos).

    3.6.2. Campo Aberto

    Esse teste foi realizado em uma caixa quadrada de frmica branca com

    o fundo negro medindo 60cm x 60cm, com paredes laterais de 60cm de altura.

    Inicialmente proposto por Calvin Hall em 1934, utilizado para avaliao de

    atividade locomotora e ansiedade.

    Figura 4: Representao esquemtica do Campo Aberto. Fonte: http://www.scienlabor.com.br/

    A durao do teste foi de 15 minutos, ao longo dos quais foi observada a

    distncia percorrida pelo animal, em metros, como ndice de atividade

    locomotora. Os parmetros distncia percorrida, tempo e nmero de entradas

    no centro do aparato ao longo dos primeiros cinco minutos foram utilizados,

    tambm, para avaliao da ansiedade (Ramos, 2008). Toda a movimentao

    dos animais foi registrada e a anlise foi realizada com o uso do software ANY-

  • 41

    Maze (Stoelting, EUA) para quantificao dos parmetros de interesse. O

    ambiente para realizao do teste era controlado com temperatura constante

    de 221C, com luz vermelha indireta e silncio. Aps o teste de cada animal a

    limpeza do campo aberto era realizada com gua.

  • 42

    3.6.3. Desenho experimental

    No experimento 1, os animais receberam a injeo intra-DPAG do

    antagonista SB-269970 nas doses 2,5 nmoles (n=9), 5 nmoles (n= 9 - 10) e 10

    nmoles (n= 12) ou veculo (n= 9 - 10) dez minutos antes do teste no labirinto

    em cruz elevado e do teste do campo aberto.

    Quadro 3: Esquema do desenho experimental do Experimento 1.

  • 43

    No experimento 2 foi introduzido o protocolo de consumo de etanol a um

    dos grupos e, trs dias aps a retirada, os animais receberam administrao

    intra-DPAG do antagonista SB-269970 nas doses 2,5 e 5 nmoles ou veculo e,

    aps dez minutos, os animais foram submetidos ao teste do LCE. No dia

    seguinte, os mesmos animais passaram pela injeo intra-DPAG com os

    mesmos tratamentos e foram submetidos ao teste do campo aberto. Ao final,

    foram formados os seguintes grupos: gua/veculo (n=7), gua/antagonista 2,5

    (n=9), gua/antagonista 5,0 (n=5), etanol/veculo (n=11), etanol/antagonista 2,5

    (n=8) e etanol/antagonista 5,0 (n=5).

    Quadro 4: Esquema do desenho experimental do Experimento 2.

  • 44

    3.7. Perfuso

    Para preparar os encfalos para anlise histolgica aps o termino dos

    testes comportamentais, os animais foram anestesiados com tiopental (100

    mg/kg/mL) e perfundidos com salina 0,9% e formol 10%. Terminada a

    perfuso, foi injetado 0,2 L de corante fast green atravs de uma microagulha

    (14 mm) inserida pela cnula-guia. Os encfalos corados foram retirados e

    ento fixados em formol 10% para posterior anlise histolgica.

    3.8. Histologia

    Os encfalos foram cortados em seces coronais a mo para

    verificao macroscpica do stio de microinjeo, segundo as fotomicrografias

    do atlas de encfalo de rato de Paxinos e Watson (1986). Foram includos na

    anlise estatstica somente os animais que tiveram a ponta da agulha de

    microinjeo localizada na DPAG.

    3.9. Anlise estatstica

    Todos os dados so apresentados como mdiaerro padro da mdia e

    os resultados experimentais foram submetidos ao teste estatstico ANOVA de

    uma via (Experimento 1) e duas vias (Experimento 2). O teste post-hoc de

    Duncan foi utilizado, quando apropriado. O programa utilizado para anlise foi o

    SPSS, verso 6.0.

  • 45

    4. RESULTADOS

    EXPERIMENTO 1: EFEITOS DA ADMINISTRAO INTRA-DPAG

    DO ANTAGONISTA DE RECEPTORES 5-HT7 SB-269970 SOBRE

    O COMPORTAMENTO DE RATOS NO LCE E TESTE DO CAMPO

    ABERTO.

  • 46

    A figura 5 ilustra os stios de microinjeo de SB 269970 e veculo na

    DPAG de ratos submetidos aos testes do LCE e do campo aberto.

    Figura 5: Representao da localizao dos stios de microinjeo de SB 269970 ou veculo na DPAG.

    Os nmeros fora dos grficos representam o nmero de animais cujo stio de microinjeo estava situado naquela determinada poro da DPAG (n=41, Experimento 1).

  • 47

    A figura 6 ilustra a frequncia de entradas nos braos fechados do LCE

    durante os 5 minutos de teste realizado com os animais que receberam

    microinjees de veculo ou de SB 269970 em diferentes doses. De acordo

    com a ANOVA, no foram observadas diferenas entre os grupos 2,5 nmoles

    (5,780,62), 5,0 nmoles (6,801,00) e 10 nmoles (6,330,78) [F(3,40)=0,22;

    p=0,87].

    Figura 6: MdiaEPM da freqncia de entradas nos braos fechados de animais submetidos ao LCE

    aps a injeo intra-DPAG de SB-269970 ou veculo (n= 9 - 12).

  • 48

    Na figura 7 pode ser observado o efeito da injeo intra-DPAG de SB-

    269970 ou de veculo sobre a porcentagem de entrada nos braos abertos do

    LCE. A ANOVA mostrou que no houve efeito do tratamento com SB 269970

    nas doses de 2,5 nmoles (15,852,26), 5,0 nmoles (17,553,15) e 10 nmoles

    (27,334,35), em relao ao grupo controle (18,812,89) [F(3,40)=2,37;

    p=0,08].

    Figura 7: MdiaEPM da % das entradas nos braos abertos de animais submetidos ao LCE aps a

    injeo intra-DPAG de SB-269970 ou veculo (n = 9 12).

  • 49

    A figura 8 mostra o efeito da injeo intra-DPAG de SB-269970 (2,5; 5 e

    10 nmoles) ou da injeo de veculo sobre a porcentagem de tempo nos braos

    abertos no LCE. A ANOVA mostrou que houve efeito do tratamento sobre esse

    parmetro [F(3,40)=3,19; p=0,03]. O teste post-hoc de Duncan mostrou que a

    dose de 10 nmoles (34,526,32) aumentou a porcentagem de tempo nos

    braos abertos em relao ao grupo veculo (17,933,95).

    Figura 8: MdiaEPM da % do tempo nos braos abertos, de animais submetidos ao LCE aps a injeo

    intra-DPAG de SB-269970 ou veculo (n = 9 12). * p

  • 50

    A tabela 2 mostra parmetros comportamentais relacionados

    ansiedade analisados nos primeiros cinco minutos do teste do campo aberto. A

    ANOVA mostrou que no houve efeito dos tratamentos nos parmetros:

    distncia percorrida no centro da arena [F(3,38)=0,54; p=0,65], tempo gasto no

    centro [F(3,38)=0,91; p=0,44] e nmero de entradas no centro do aparato

    [F(3,38)=1,20; p=0,32] aps injeo intra-DPAG de SB-269970. Em relao

    atividade locomotora dos animais, podemos observar tambm (na tabela 2)

    que o tratamento com SB-269970 no alterou a distncia percorrida pelos

    animais [F(3,38)=0,28; p=0,83] no teste do campo aberto ao longo de 15

    minutos.

    Tabela 2: MdiaEPM dos resultados do teste do campo aberto para avaliao da atividade locomotora

    (distncia total percorrida durante os 15 minutos) e dos parmetros de ansiedade (distncia percorrida no centro do aparato, tempo gasto no centro e nmero de entradas no centro durante os primeiros 5 minutos) pelos animais que receberam veculo e os que receberam o antagonista nas concentraes 2,5; 5 e 10 nmoles intra-DPAG (n= 9 12).

    Distncia

    Percorrida (m)

    Distncia

    percorrida no centro (m)

    Tempo gasto no centro (s)

    N de

    entradas no centro

    Veculo 22,732,84

    1,050,21

    8,801,92

    5,560,77

    SB 269970 2,5 nmoles

    19,902,86

    1,080,13

    12,762,41

    6,221,28

    SB 269970 5 nmoles

    22,712,56

    1,180,13

    8,162,39

    4,330,67

    SB 269970 10 nmoles

    21,281,64

    0,910,15

    8,142,23

    3,921,02

  • 51

    EXPERIMENTO 2: EFEITOS DA ADMINISTRAO INTRA-DPAG

    DO ANTAGONISTA DE RECEPTORES 5-HT7 SB-269970 EM

    RATOS SUBMETIDOS A RETIRADA DE 72 E 96 HORAS DE

    ETANOL APS CONSUMO CRNICO TESTADOS NO LCE E NO

    TESTE DO CAMPO ABERTO.

  • 52

    A figura 9 ilustra os stios de microinjeo de SB-269970 e veculo na

    DPAG de ratos submetidos retirada de etanol e seus controles testados no

    LCE e no teste do campo aberto.

    Figura 9: Representao grfica da localizao dos stios de microinjeo de SB 269970 ou veculo na

    DPAG. Os nmeros fora dos grficos representam o nmero de animais cujo stio de microinjeo estava situado naquela determinada poro da DPAG (n=45, Experimento 2).

  • 53

    Na figura 10 est ilustrada a frequncia de entradas nos braos

    fechados dos animais controle (que receberam gua durante todo o

    experimento) e dos animais etanol (que foram tratados cronicamente e

    sofreram a retirada do etanol 72 horas antes do teste), aps microinjees de

    veculo ou de SB 269970. A ANOVA mostrou uma diferena significativa nos

    resultados do LCE, esse efeito no foi da retirada por [F(1,44)=0,68, p=0,41], e

    tambm no foi do antagonismo do receptor 5-HT7 [F(2,44)=0,73, p=0,48];

    porm, houve interao entre a retirada e o antagonismo [F(2,44)=6,22,

    p=0,00]. O post-hoc de Duncan evidenciou uma diferena significativa entre o

    grupo etanol/veculo (5,180,48) e o grupo gua/veculo (7,710,45),

    mostrando que a retirada do etanol de 72 horas reduziu a locomoo dos

    animais. O SB na dose 2,5 nmoles foi capaz de reverter esse efeito, j que

    houve diferena entre os grupos etanol/ SB 2,5 nmoles (8,250,29) e

    etanol/veculo.

    Figura 10: MdiaEPM da freqncia total de entradas nos braos fechados do LCE durante os 5

    minutos de teste. Os grupos, cujos nomes esto identificados na legenda, indicam os tratamentos intra-DPAG recebidos previamente s exposies ao LCE (n= 5 - 11). *p

  • 54

    A figura 11 mostra o efeito da injeo intra-DPAG de SB-269970 (2,5 e

    5 nmoles) ou da injeo de veculo sobre porcentagem de entrada nos braos

    abertos no LCE de animais submetidos retirada de etanol aps consumo

    crnico e seus controles. A ANOVA mostrou um efeito significativo na anlise

    desse parmetro do LCE, esse efeito no foi do antagonismo [F(2,44)=0,28;

    p=0,75], assim como, no houve interao entre o antagonismo e a retirada de

    etanol [F(2,44)=0,97; p=0,38]. J a retirada apresentou um efeito significativo

    [F(1,44)=17,71; p=0,00]. Apesar desse efeito da retirada, o teste post-hoc de

    Duncan mostrou que no houve diferena entre os grupos etanol/veculo

    (12,463,71) e gua/veculo (26,011,08).

    Figura 11: MdiaEPM da % das entradas nos braos abertos de animais submetidos ao LCE aps a

    injeo intra-DPAG de SB-269970 em diferentes doses ou veculo (n = 5 11).

  • 55

    A figura 12 mostra o efeito da injeo intra-DPAG de SB-269970 (2,5 e

    5 nmoles) ou da injeo de veculo sobre porcentagem de tempo nos braos

    abertos do LCE de animais submetidos a retirada de etanol aps consumo

    crnico. A ANOVA mostrou que no houve efeito do antagonismo

    [F(2,44)=0,33; p=0,72], assim como no houve interao entre os fatores

    antagonismo e a retirada de etanol [F(2,44)=0,28; p=0,75]. J a retirada

    apresentou um efeito significativo [F(1,44)=16,05; p=0,00], e o post-hoc de

    Duncan demonstrou a diferena significativa entre os grupos etanol/veculo

    (14,605,09), etanol/SB 2,5 nmoles (10,412,33) e etanol/SB 5,0 nmoles

    (9,406,91), em relao ao grupo gua/veculo (34,714,30).

    Figura 12: MdiaEPM da % do tempo nos braos abertos de animais submetidos ao LCE aps a injeo

    intra-DPAG de SB-269970 em diferentes doses ou veculo (n = 5 11). *p

  • 56

    A tabela 3 mostra parmetros comportamentais relacionados

    ansiedade analisados nos primeiros cinco minutos do teste do campo aberto. A

    ANOVA mostrou que houve efeito da retirada na distncia percorrida no centro

    [F(1,43)=13,86; p=0,00], mas no com relao ao antagonismo [F(2,43)=0,54;

    p=0,58] e a interao retirada/antagonismo [F(2,43)=0,07; p=0,93]. O teste

    post-hoc de Duncan mostrou que houve diferena entre os grupos

    etanol/veculo e gua/veculo, de forma que a retirada do etanol por 96 horas

    reduzia a distncia percorrida no centro do aparato. Com relao ao tempo

    gasto no centro, a ANOVA mostrou que houve efeito da retirada

    [F(1,43)=12,00; p=0,00] e no houve efeito do antagonismo [F(2,43)=0,92;

    p=0,40] e da interao retirada/antagonismo [F(2,43)=0,63; p=0,53]. Apesar do

    efeito da retirada detectado pela ANOVA, o post-hoc de Duncan mostrou que

    no houve diferena entre os grupos etanol/veculo e gua/veculo. Por ltimo,

    foi analisado o nmero de entradas no centro do campo aberto e a ANOVA

    mostrou que houve efeito da retirada [F(1,43)=9,01; p=0,00] mas no do

    antagonismo [F(2,43)=0,34; p=0,71] e interao retirada/antagonista

    [F(2,43)=0,23; p=0,79]. O post-hoc de Duncan mostrou que, apesar da retirada

    ter efeito significativo na ANOVA, no houve diferena entre os grupos

    etanol/veculo e gua/veculo.

    Em relao atividade locomotora dos animais, a ANOVA mostrou que

    no houve diferena entre os grupos em relao retirada [F(1,43)=2,24;

    p=0,14], ao antagonismo [F(2,43)=0,03; p=0,96], e interao

    retirada/antagonismo [F(2,43)=0,11; p=0,89]. Pode ser observado na tabela 3

    que o tratamento com SB-269970 no grupo gua ou no grupo etanol no

    alterou a distncia percorrida pelos animais no teste do campo aberto ao longo

    de 15 minutos.

  • 57

    Tabela 3: MdiaEPM dos resultados do teste do campo aberto para avaliao da atividade locomotora

    (distncia total percorrida durante os 15 minutos) e dos parmetros de ansiedade (distncia percorrida no centro do aparato, tempo gasto no centro e nmero de entradas no centro durante os primeiros 5 minutos) pelos animais que receberam veculo e os que receberam o antagonista nas concentraes 2,5 e 5 nmoles intra-DPAG (n= 5 11). *p

  • 58

    5. DISCUSSO

    Neste trabalho investigamos a participao dos receptores 5-HT7 da

    DPAG na ansiedade experimental basal e na ansiedade gerada pela retirada

    do etanol aps o consumo crnico. Para isso fizemos, inicialmente, a anlise

    dos efeitos das doses de 2,5; 5 e 10 nmoles do antagonista seletivo de

    receptores do tipo 5-HT7 SB269970 administrado intra-DPAG sobre

    comportamentos relacionados ansiedade gerados pela exposio ao LCE e

    ao CA. Em seguida, utilizando as doses ineficazes por si s do antagonista SB

    de 2,5 e 5 nmoles, para com isso tentar ao mximo excluir os efeitos da ao

    do prprio antagonista e realizar a investigao do papel dos receptores 5-HT7

    da DPAG na ansiedade gerada pela retirada do etanol.

    No primeiro experimento realizado, verificamos que a administrao

    intra-DPAG do antagonista SB269970 no alterou comportamentos

    relacionados ansiedade em animais testados no LCE nas doses de 2,5

    nmoles e 5 nmoles. J a dose de 10 nmoles promoveu um efeito do tipo

    ansioltico neste teste.

    Existem poucos dados disponveis sobre a avaliao do efeito da

    manipulao do receptor 5-HT7 na ansiedade; apesar disso, a literatura sugere

    uma provvel relao entre este receptor e alguns transtornos afetivos. Robert

    e colaboradores (2004) avaliaram camundongos 5-HT7-/-

    na caixa claro/escuro,

    um teste de ansiedade. Nesse experimento no houve diferena significativa

    entre a linhagem geneticamente modificada e os animais selvagens: os animais

    knockout gastaram o mesmo tempo no compartimento claro que os animais

    controle. O mesmo se repetiu para o nmero de transies entre os

    compartimentos claro e escuro, sugerindo que este receptor no esteja

    envolvido na ansiedade analisada neste teste. Utilizando a mesma linhagem,

    Hedlund e Sutcliffe (2007) investigaram a participao do receptor 5-HT7 no

    teste de esconder esferas (marble burying test), um modelo experimental para

    a avaliao comportamental da ansiedade e do transtorno obsessivo

    compulsivo. Nesse estudo, os animais 5-HT7-/-

    tiveram um comportamento

    considerado ansioltico, j que eles esconderam significativamente menos

  • 59

    esferas que os animais selvagens. No mesmo trabalho, os autores tambm

    investigaram a ao do antagonista de 5-HT7, SB-269960, em animais

    selvagens. Os resultados estavam de acordo com o encontrado no teste com

    os animais geneticamente modificados, tendo os animais tratados com o

    antagonista uma reduo significativa no parmetro de esconder esferas, com

    relao aos animais controle. Os autores demonstraram que tanto a deleo

    gnica, quanto o bloqueio do receptor 5-HT7, reduziu o comportamento de

    esconder esferas em um modelo comportamental capaz de gerar respostas

    relacionadas ansiedade, sugerindo a participao deste receptor neste

    estado afetivo.

    Alm dos supracitados, outros testes tambm foram utilizados no estudo

    do papel dos receptores 5-HT7 na ansiedade. No estudo de Guscott e

    colaboradores (2005), no houve diferena significativa entre os camundongos

    5-HT7-/- e os animais selvagens nos parmetros tempo de explorao e nmero

    de entradas nos braos abertos do LCE.

    Tambm utilizando o LCE, Wesolowska e colaboradores (2006a) fizeram

    o bloqueio desses receptores com a administrao intraperitoneal do

    antagonista SB269970 em ratos. O resultado desse estudo contradiz o estudo

    anterior com animais knockout, j que os pesquisadores visualizaram um efeito

    ansioltico significativo. Os animais tratados com o antagonista tiveram um

    nmero de entradas e de tempo gasto nos braos abertos do aparato maior,

    quando comparado com os animais controle. Ainda nesse trabalho, o teste de

    conflito de Vogel, conhecido tambm por teste do beber punido, foi utilizado

    para avaliar a ansiedade. Assim como no LCE, o antagonista teve um efeito do

    tipo ansioltico, aumentando a expresso do beber punido. O grupo ainda

    avaliou a ao do SB269970 na ansiedade em camundongos usando o Four-

    Plate test. O antagonista foi capaz de aumentar o nmero de cruzamentos

    punidos no teste, sugerindo, tambm, um efeito ansioltico (Wesolowska et al.,

    2006a).

    Os efeitos ansiolticos do antagonista de 5-HT7 acima mencionados tm

    sido obtidos, em sua maioria, aps a administrao perifrica da droga, no

    existindo muitos dados que possam indicar o seu local de ao no SNC.

  • 60

    Visando um maior conhecimento das reas enceflicas que poderiam

    estar envolvidas na atuao do receptor 5-HT7, Wesolowska e colaboradores

    (2006b) investigaram o efeito da administrao intra-hipocampal do SB-269970

    na ansiedade experimental. Sugere-se que o hipocampo desempenha um

    papel importante nos estados emocionais e possa estar envolvido no efeito de

    antidepressivos e ansiolticos, assim como do antagonista 5-HT7,

    principalmente pelo fato desses receptores estarem presentes nessa estrutura

    (Bonaventure et al., 2002; Wesolowska et al., 2006b). Para a anlise da

    ansiedade, os pesquisadores utilizaram o teste de conflito de Vogel em ratos.

    Os animais que receberam o antagonista nas doses de 0,3, 1 e 3g tiveram

    aumento significativo no comportamento do beber punido, em comparao com

    os animais controle, mostrando que o SB-269970 tambm capaz de produzir

    um efeito ansioltico quando administrado no hipocampo. Alm do hipocampo,

    a presena do receptor 5-HT7 no sistema olfatrio, septo, tlamo, hipotlamo,

    amgdala, crtex e na PAG (Gustafson et al., 1996; Bonaventure et al., 2002;

    Leopoldo et al., 2012) torna essas reas atrativas para o estudo da atuao

    desse receptor principalmente nos estados aversivos, na ansiedade e na

    dependncia do etanol.

    Os dados da literatura, principalmente os do grupo de Wesolowska e

    colaboradores (2006a, 2006b) embasam e reforam os achados do

    experimento 1 do presente estudo, corroborando a partici