O Estudo Do Receptor Radiofônico A Partir Da Obra “Meios E...

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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016 1 O Estudo Do Receptor Radiofônico A Partir Da Obra “Meios E Audiências: A Emergência Dos Estudos De Recepção No Brasil 1 Gislaine ZANELLA 2 Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP Resumo A partir dos Estudos Culturais e demais correntes que investigam os meios de comunicação, o receptor tornou-se, ao longo dos anos, um dos principais focos de pesquisas na América Latina. Neste contexto, os ouvintes de rádio também ganham destaque a partir das evoluções sociais e tecnológicas. O presente trabalho analisa os estudos de recepção radiofônica no Brasil, nas décadas de 90 e 2000, a partir da obra “Meios e Audiências: a emergência dos estudos de recepção no Brasil, Volume I (2008) e II (2014), escrito por Nilda Jacks, Daiane Menezes e Elisa Piedras. Palavras-chave: Comunicação; pesquisa; recepção; rádio; Brasil. Introdução Peça fundamental e objetivo central de qualquer meio de comunicação, o receptor é a razão pela qual existe o comunicar. Toda mensagem, ao ser transmitida, tem uma intenção com razões preestabelecidas seja para informar, provocar reflexões ou estimular reações. A diferença entre a comunicação exercida entre indivíduos e a comunicação feita pelos meios de massa é a abrangência alcançada. Uma pessoa consegue repassar uma mensagem a um grande grupo, mas esse deve estar no mesmo lugar e na hora que a mensagem será repassada. Já os meios de comunicação tradicionais, internet, televisão, rádio, revistas e jornais impressos, têm a possibilidade de atingir os mais diversos públicos, em lugares diferentes, e, dependendo da situação, em horários distintos. Neste contexto, o rádio estabeleceu uma rotina aos seus ouvintes ao fornecer informações úteis como, por exemplo, condição climática, trânsito e incidentes. Além disso, para ouvir rádio não é necessário estar prestando total atenção à programação. O ouvinte tem a possibilidade de estar fazendo suas tarefas diárias, trabalhando, conversando e estar com o 1 Trabalho apresentado no GP Rádio e Mídias Sonoras, XVI Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Mestranda do Curso de Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi, e-mail: [email protected].

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O Estudo Do Receptor Radiofônico A Partir Da Obra “Meios E Audiências: A

Emergência Dos Estudos De Recepção No Brasil 1

Gislaine ZANELLA2

Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP

Resumo

A partir dos Estudos Culturais e demais correntes que investigam os meios de comunicação, o

receptor tornou-se, ao longo dos anos, um dos principais focos de pesquisas na América

Latina. Neste contexto, os ouvintes de rádio também ganham destaque a partir das evoluções

sociais e tecnológicas. O presente trabalho analisa os estudos de recepção radiofônica no

Brasil, nas décadas de 90 e 2000, a partir da obra “Meios e Audiências: a emergência dos

estudos de recepção no Brasil, Volume I (2008) e II (2014), escrito por Nilda Jacks, Daiane

Menezes e Elisa Piedras.

Palavras-chave: Comunicação; pesquisa; recepção; rádio; Brasil.

Introdução

Peça fundamental e objetivo central de qualquer meio de comunicação, o receptor é a

razão pela qual existe o comunicar. Toda mensagem, ao ser transmitida, tem uma intenção

com razões preestabelecidas seja para informar, provocar reflexões ou estimular reações. A

diferença entre a comunicação exercida entre indivíduos e a comunicação feita pelos meios de

massa é a abrangência alcançada. Uma pessoa consegue repassar uma mensagem a um grande

grupo, mas esse deve estar no mesmo lugar e na hora que a mensagem será repassada. Já os

meios de comunicação tradicionais, internet, televisão, rádio, revistas e jornais impressos, têm

a possibilidade de atingir os mais diversos públicos, em lugares diferentes, e, dependendo da

situação, em horários distintos.

Neste contexto, o rádio estabeleceu uma rotina aos seus ouvintes ao fornecer

informações úteis como, por exemplo, condição climática, trânsito e incidentes. Além disso,

para ouvir rádio não é necessário estar prestando total atenção à programação. O ouvinte tem

a possibilidade de estar fazendo suas tarefas diárias, trabalhando, conversando e estar com o

1 Trabalho apresentado no GP Rádio e Mídias Sonoras, XVI Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação, evento

componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Mestranda do Curso de Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi, e-mail: [email protected].

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rádio ligado em plano de fundo. Além disso, o receptor está inserido em um contexto regido

pela caótica falta de tempo, e dedicar a atenção por horas a um meio de comunicação é quase

impossível. Assim, enquanto ele tem a possibilidade de continuar seus afazeres, o rádio

permanece ligado, e, quando algo de seu interesse está sendo veiculado, ele volta mais

atenção ao meio.

Este veículo possui uma trajetória intrigante, já que conseguiu manter-se ativo a cada

revolução tecnológica e social ocorrida. Quando o mundo acreditava em sua extinção, com o

nascimento da televisão no início da década de 1950, o rádio se renovou ao incorporar a faixa

de transmissão em modulação em frequência (FM) e aderir o contexto da globalização das

comunicações. Com o surgimento e a popularização da Internet, os veículos de comunicação

passaram por transformações que, em outras instâncias, jamais foram imaginadas. Exemplo

disso é a atividade multimídia que possibilitou a ampliação da interatividade. Diante deste

cenário, o público também passou por transformações. O receptor cada vez mais ativo, a partir

da oferta de inúmeros canais de conteúdos provenientes de toda parte do globo, passa a gerir e

produzir conteúdo. O conceito inicial de emissor-mensagem-meio-receptor é modificado, a

nova comunicação é uma mistura entre mensagem, emissor, meio e receptor, com o objetivo

de interação (BARBEIRO; LIMA, 2001).

Por esse motivo, Prata (2009) destaca a importância de intensificar os estudos sobre

o receptor. Segundo a autora, por muito tempo o emissor foi o centro dos estudos voltados aos

meios de comunicação. Agora as atenções devem estar voltadas a quem recebe o produto

final. Quais são suas preferências e o tempo que dispõe para recebê-las, de que forma

preferem ter acesso às mensagens dos veículos etc. Todos esses fatores passam a ser levados

em conta para obter-se um melhor resultado ao transmitir o conteúdo veiculado pelos meios

de comunicação. Afinal de contas, nem sempre o receptor assimila a mensagem da forma que

o meio intentou transmitir, ele não é um ser totalmente passivo. Os processos receptivos

geram indagações conforme pontua Jacks:

Eu creio que todo este interesse pela recepção e pela audiência é um produto

da crise dos paradigmas, mas ao mesmo tempo é um produto da confusão

que participa algumas posições com respeito à audiência e à recepção,

porque se foi a um extremo totalmente oposto. Quando se acreditou que já

não importava os MCM, o que importava era a mensagem e que os

receptores são livres para interpretá-la como querem, vão re-esquematizar o

que vêem, se foi ao outro extremo. Agora, chegamos ao ponto de equilíbrio.

(JACKS, 1993, p. 29).

Afinal de contas, nem sempre o receptor se apropria da mensagem da forma que o

meio intentou transmitir e diferentemente dos primeiros estudos, hoje ele não é um ser

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totalmente passivo. Desta forma, o presente artigo, por meio de pesquisa bibliográfica,

investiga os estudos de recepção radiofônica no Brasil, nas décadas de 90 e 2000, a partir da

obra “Meios e Audiências: a emergência dos estudos de recepção no Brasil”, Volume I (2008)

e II (2014), escrito por Nilda Jacks, Daiane Menezes e Elisa Piedras. Além disso, apresenta

um panorama das principais correntes que influenciam o campo na atualidade.

A trajetória dos Estudos de Recepção na América Latina

Os primeiros estudos voltados para as consequências socioculturais das mensagens

transmitidas pelos meios de comunicação de grande alcance tiveram suas origens nos Estados

Unidos, por volta da década de 40. Jacks (1995, p. 151) afirma que “o desenvolvimento de

uma nova vertente nos estudos da comunicação – a pesquisa de recepção – não significa

apenas mais um modismo, como apontam alguns críticos, nem sequer pode ser chamada de

nova”. Predominantes até o fim dos anos 60, os estudos, que em sua maioria eram financiadas

pelos produtores, abordavam questões mercadológicas, relações de poder, audiência. “Tais

pesquisas ofereciam, no máximo, resultados empíricos – como vender melhor isto ou aquilo,

como tornar funcional, ‘positivo’ ao sistema o uso dos instrumentos de comunicação etc”

(LIMA, 2011, p.15).

No entanto, em 1973, os estudos ganham novos horizontes a partir de uma

publicação de Stuart Hall. Baseada no sociólogo Frank Parquin, a perspectiva teórica

determina possíveis enfoques: o modo de codificação do emissor; um modo negociado que

desloca parcialmente as significações e um modo de oposição, buscando referências

exteriores para dar andamento ao trabalho de interpretação das mensagens (HALL, 1973,

apud BARROS, 1992). O autor (1973, apud BARROS, 1992) propôs o modelo

Codificação/Decodificação, onde o significado de uma mensagem não é fixo e sim contextual,

multirreferencial e contingencial.

Deste modo, não há uma lógica determinante que permita decifrar o significado ou o

sentido ideológico de uma mensagem. Existem diferentes formas de decodificação, pode-se

ler de diversas maneiras, ou seja, a leitura nunca é fixa. Além disso, toda produção de

informação é decodificada logo no início, quem está comunicando também modifica o

conteúdo segundo seus conceitos e pré-significações. “Se você tem de dizer algo novo, é

porque o processo está transformando os significados que já estão lá. Portanto, cada ato de

significação transforma o estado efetivo de todas as significações já existentes” (HALL, 2003,

p. 363).

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Na década de 80, iniciaram as análises a respeito da interação entre recepção e

comunicação e percebe-se que a recepção “não é apenas uma etapa do processo de

comunicação, é um lugar novo, de onde se deve repensar os estudos e a pesquisa de

comunicação” (MARTÍN-BARBERO, 1995, p. 39).

Orozco (Apud JACKS, 1993) explica que existem cinco grandes

perspectivas de estudos, que estão inspirando modelos distintos de

investigação e distintas aproximações do estudo da recepção: emissão,

recepção, conteúdo, processo, perspectiva integral, ou seja, a combinação de

coisas distintas. No campo da recepção existem hoje três grandes correntes

de estudos, segundo Barros (1992): a pesquisa dos efeitos (o que esses

efeitos fazem no indivíduo?); a perspectiva dos usos e gratificações (o que os

indivíduos fazem com os meios?) e a emergência do quadro culturalista

(concentra-se na problemática da produção, por meio de processos culturais

e sociais, de significações históricas e particulares) (PRATA, 2009, p. 5).

Na América Latina, os estudos sobre recepção têm uma perspectiva metodológica

qualitativa, voltada à cultura popular, seus eixos focam-se na educação, política e costumes

(KASEKER, 2010). Nesse cenário destacam-se as seguintes correntes teóricas metodológicas:

a das Frentes Culturais desenvolvida por Jorge González; a da Recepção Ativa, do Centro de

Indagação e Expressão Cultural e Artística (CENECA); a do Uso Social dos meios proposta

por Jesus Martín-Barbero; o modelo das multimediações criada por Guilhermo Orozco e, por

fim, a do Consumo Cultural, de García Canclini (KASEKER, 2010, p.60).

Na teoria das Frentes Culturais, Gonzáles sugere dimensionar os aspectos

intraculturais, interculturais e transculturais do receptor, colhendo informações estruturais,

históricas, situacionais e simbólicas (KASEKER, 2010). A partir das várias matrizes

idealizadas ao longo dos anos, Martín-Barbero, no Oficio de cartógrafo (2002), afirma que as

lógicas da recepção estão ligadas ao processo de mediações comunicativas da cultura

envolvendo institucionalidade, tecnicidade, socialidade e ritualidade, por meio de uma análise

envolvendo os seguintes campos: comunicação, cultura e a política. Segmentadas em dois

eixos, essas mediações dividem-se em: diacrônico, tensionando as Matrizes Culturais e os

Formatos Industriais; e um sincrônico que relaciona as Lógicas de Produção com as

Competências de Recepção e Consumo. Na Recepção Ativa, o Centro de Indagação e

Expressão Cultural e Artística, (CENECA), analisa o papel da família, da escola e o

direcionamento religioso.

Já Orozco (2005) defende, em sua teoria do modelo das multimediações, que a

recepção é produção e é interação, mediada por fontes diversas, que não ficam restritas ao

momento que o receptor está em contato com os meios. Por fim, o consumo cultural é

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discutido por Canclini, quando analisa de que forma se expressa a cidadania no contexto da

globalização, quando as corporações privadas assumem várias funções no estado e o consumo

passa a ser mais importante do que a cidadania (KASEKER, 2010).

O novo entendimento nascido com os estudos do receptor, segundo Jacks (1995, p.

152) agrega três consequências: “aproximação das noções de cultura e de comunicação,

escolha do cotidiano como espaço-tempo de análise e conhecimento dos receptores populares

como sujeitos capazes de produção de sentido”. Ao mesmo tempo, Sousa (1995) destaca duas

ameaças a esses estudos: a crença que é o consumidor quem tem a palavra e o desligamento

dos processos de produção.

Em meio a este contexto, com o surgimento da internet, entender as práticas do

receptor tornou-se tarefa ainda mais difícil. A convergência possibilitou a transmissão de

inúmeras mensagens ao mesmo tempo. O receptor é bombardeado de informações por todos

os lados e pode compará-las, analisá-las, enfim, usar da forma que mais lhe parecer atraente.

Para Kaseker (2010), a velocidade com que as imagens se reproduzem na atualidade faz com

que esse bombardeio de mensagens invasoras e onipresentes tenha interpretação rápida,

dificultando o pensamento crítico. Nem sempre o receptor tem ao seu dispor tempo para

“digerir” tudo que é oferecido. Essa é uma das preocupações de Natansohn (2007), ao

questionar: o que as pessoas fazem online? Como utilizam os recursos da internet? E podemos

ainda acrescentar, como reagem a tanta informação sendo disponibilizada ao mesmo tempo?

Indiferentes, confusos ou estão sabendo lidar com essa nova ordem?

Voltando à questão radiofônica, como destacado anteriormente, os ouvintes criaram

uma forma específica de ouvir a programação. Tendo a possibilidade de aderir à internet

como recurso agregador ou até mesmo podendo substituir o meio tradicional, as pessoas

continuam ouvindo da mesma forma? Segundo Kaseker (2010), o rádio ajudou as pessoas a

definir espaços e tempos, demarcando horários e até mesmo tornando-se o som mais

importante em certos momentos do dia, sendo em casa, no carro, na rua, variando conforme

seu suporte tecnológico. Seguindo essa linha de pensamento, o cotidiano é o lugar

privilegiado para a análise do processo de recepção, pois “encontram-se desde a relação com

o próprio corpo até o uso do tempo, o habitar e a consciência do que é possível ser alcançado

por cada um” (BRITTOS, 2002, p. 30).

A internet se faz, a cada instante, mais presente no cotidiano da população brasileira,

já que, em setembro de 2009, o Ibope/Nielsen constatava 66,3 milhões de internautas no

Brasil e, em dezembro do mesmo ano, apurava que o número subia para 67,5 milhões,

mostrando que em três meses surgiram 1,2 milhões de novos internautas. Assim, da mesma

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forma que o rádio conquistou seu espaço no dia a dia do receptor, a internet também já

garantiu seu espaço e, mais do que isso, incorporou consigo outros meios, como o próprio

rádio. Mas saber de que forma o receptor tem feito uso desse meio não é tão simples, levando

em consideração suas diversas facetas e possibilidades. E, quando se trata de estudar o

comportamento dos dois na mesma plataforma, o cotidiano se torna ainda mais importante.

Martín-Barbero (1995) confirma essa informação ao dizer que há três lugares fundamentais de

mediação: a cotidianidade familiar, a temporalidade social e a competência cultural, ou seja,

as circunstâncias em que o receptor está inserido influenciarão diretamente na forma que ele

se utilizará dos meios ao seu redor.

Entretanto, o poder não está totalmente ao lado do receptor, pois não se pode

desligar-se dos processos de produção do modo como se organizam. “Boa parte da recepção

está, de alguma forma, não programada, mas condicionada, organizada, tocada, orientada pela

produção, tanto em termos econômicos como em termos estéticos, narrativos, semióticos”

(MARTÍN-BARBERO, 1995, p. 56). Ou seja, recepção é um espaço de interação, não

havendo total liberdade na comunicação estabelecida. Assim, esse espaço de interação não se

dá somente com as mensagens, mas com a sociedade e o conjunto que envolve tanto o

receptor quanto o meio e a mensagem.

A grande demanda de oferta criou também um receptor “inquieto” e

“multifacetário”, não linear, explicado pelas correntes pós-modernas. Toma-se como

exemplo um leitor que busca informações em diversas fontes, compara fragmentos de vários

textos ao mesmo tempo e, a partir deles, constrói outro texto. Dessa forma ele também cria

várias identidades, como afirma Orozco Gómez (2005) com o conceito das “múltiplas

mediações”, onde ser audiência não significa deixar de ser sujeito social, por exemplo. Outro

conceito abordado pelo autor está situado no contexto de audienciação, onde as audiências são

múltiplas e simultâneas de diversos meios e de tipos diferentes de referentes midiáticos e

tecnologias.

Por causa dessa “multiplicidade”, o receptor não pode mais ser ignorado. Ele deve

ser considerado, a partir de um contexto histórico, cultural e social, participante

simultaneamente de várias instituições, onde adquire suas identidades, dando sentido às suas

práticas. Trata-se de perceber o receptor como um “múltiplo agente social”. Existem ainda

alguns pontos principais no estudo dessas multimediações, já que a recepção não se esgota no

momento em que se “ouve o rádio”, por exemplo, mas começa bem antes e termina bem

depois, fundindo-se com as práticas cotidianas dos receptores. Destaca-se novamente a

interação existente na recepção, mediada necessariamente de múltiplas maneiras. Quando se

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fala em interação, ela não se dá somente no plano individual, mas com a situação, com as

instituições, com a cultura e com os meios, é nessa interação que se produz o sentido da

recepção, com limites dados não por razões individuais, como na teoria funcionalista, mas

num cenário sociocultural.

Por fim, os estudos derrubaram o mito de que “o homem comum que habita as

nossas cidades ou procede da periferia rural padece de uma burrice endêmica” (SILVA, 1985,

p. 10), mostrando que as pessoas podem ter uma visão crítica daquilo que recebem dos meios

de comunicação.

Diante das novas configurações que permeiam a comunicação e o receptor, surgem

inúmeras indagações em relação ao cenário dos estudos de recepção no Brasil. Quais são os

diagnósticos em relação a mensagens radiofônicas? Quais são os principais temas e públicos

investigados? A internet está sendo objeto de estudo da recepção radiofônica? Com o objetivo

de investigar estes e outros questionamentos, por meio de pesquisa bibliográfica, realizou-se

uma análise sobre os diversos estudos que apresentaram dados relevantes sobre a pesquisa

radiofônica no Brasil nas duas últimas décadas, bem como possíveis tendências.

Um dos estudos que virou referência no campo nacional é a obra “Meios e

Audiências: a emergência dos estudos de recepção no Brasil”, escrito por Nilda Jacks, Daiane

Menezes e Elisa Piedras (2008). O estudo foi lançado a partir do convite do pesquisador

Guilherme Orosco, que buscava analisar o estado da arte dos estudos de recepção na América

Latina na década de 1990 (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008).

Estudos de recepção no Brasil: década de 90

O estudo realizado pelas autoras, com o objetivo de traçar o desenvolvimento da

pesquisa da década de 1990 – período em que a temática ganha visibilidade no Brasil, refere-

se somente às teses e às dissertações apresentadas na área da comunicação, “entendendo que

abordam também, mesmo que indiretamente, o trabalho de orientadores e o papel das

instituições a que pertencem na consolidação do campo” (JACKS; MENEZES; PIEDRAS,

2008, p. 15). Para a realização da análise das pesquisas, as autoras utilizaram os seguintes

procedimentos:

Partimos do modelo proposto por Maria Immacolata Lopes (1990), para

aprimorar a pesquisa em comunicação, e acrescentamos outras categorias,

com o objetivo de chegar a algumas mais especificas para identificar, além

do problema e objeto de pesquisa, hipóteses e procedimentos e técnicas, os

modelos teórico-metodológico e as premissas teóricas, metodológicas e

epistemológicas (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008, p. 16).

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Na oportunidade, a pesquisa aponta ainda deficiências e oportunidades encontradas

nas pesquisas que podem servir de subsídios para trabalhos futuros. A classificação utilizada

para o estudo foi a proposta por Ana Carolina Escosteguy (2004), que apontou as seguintes

correntes: Sociocultural, comportamental e outras. As abordagens foram definidas como:

Sociocultural – [...] visão ampla e complexa do processo de recepção dos

produtos midiáticos, levando em consideração múltiplas relações sociais e

culturais. Mais do que o estudo do fenômeno de recepção dos produtos

midiáticos, levando em consideração múltiplas relações sociais e culturais.

[...] Comportamental – estudos dos diferentes impactos derivados dos meios,

isto é, o produto midiático é considerado um estímulo que provoca diversas

reações nos públicos. Aí encontram-se aqueles estudos de formação de

opinião, efeitos cognitivos, usos e gratificações, e outras investigações de

caráter psicológico que reduzem o produto midiático ao juízo do público

[...]. Outras abordagens – abordagens diversas em que o receptor é

idealizado sob o ponto de vista do emissor, aplicação da hipótese da agenda

setting, revisão e descrição de teorias da recepção (ESCORTEGUY, 2004

p.135).

O estudo realizado com 1.769 trabalhos, provenientes de 11 programas de Pós-

graduação em comunicação existentes no país durante o período analisado, aponta que:

“somente 49 tratam da relação entre audiência e meios, os chamados estudos de recepção.

Destas 32 tiveram Abordagem Sociocultural; 9 comportamental, e 4 foram designadas como

outras abordagens” (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008, p. 18).

As autoras identificaram nos estudos diversos problemas ligados aos preceitos

básicos do protocolo de pesquisa como, por exemplo, metodologia, revisão de literatura,

citações estratégicas e conhecimento de pesquisas anteriores no campo a ser investigado,

ausência de interdisciplinaridade.

Um dos diagnósticos negativos apontados diz respeito aos procedimentos analíticos

em que o estudo constata que não há uma interpretação dos resultados obtidos com os

entrevistados, apenas transcrição de respostas obtidas em relação aos questionamentos

realizados pelos pesquisadores. Já nos trabalhos quantitativos, por outro lado, não há

formalização adequada dos dados, fragilizando as investigações e resultados (JACKS;

MENEZES; PIEDRAS, 2008).

Um dos pontos positivos mencionados pelas autoras é a novidade dos temas

abordados e que mesmo, diante das falhas, apontam a relevância da investigação visto que

exploraram empiricamente situações diversas que medeia receptor e os canais emissores. “O

pioneirismo desta etapa pode servir de lastro para a crítica e autocrítica tão salutar para o

desenvolvimento do conhecimento na área” (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008, p. 296).

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O estudo aponta ainda que os autores mais citados foram Orozco e Martín-Barbero,

os meios mais pesquisados foram a TV e o rádio e em relação ao público pesquisado,

apareceram crianças, adolescentes, mulheres. No entanto as autoras destacam a fragilidade

das análises que são incipientes e necessitam de mais exploração empírica, profundidade e

chamam à atenção para a negligência em relação aos estudos já existentes nas referidas

pesquisas que possibilitariam efetuar comparativos e obter novas percepções e também ao

novo cenário de convergência e da internet, que alteraram significativamente a forma como as

pessoas interagem e buscam informação e conhecimento. Apontam ainda a necessidade de

estimular a pesquisa com equipes interdisciplinares.

Diagnóstico sobre a pesquisa radiofônica

O estudo de Jacks, Menezes e Piedras (2008) aponta o rádio como objeto de estudo

de 50 trabalhos, divididos entre teses e dissertações, 40 abordaram aspectos diversificados da

comunicação radiofônica e apenas 10 trataram da recepção. Originados de dissertações de

mestrado, as pesquisas com foco no receptor dividem-se em: 7 com abordagem sociocultural,

2 de corrente comportamental, e um classificado como outras abordagens, pois, de acordo

com o estudo não tratou o receptor de forma empírica. A partir de uma avaliação geral:

O receptor, segundo quase todos os estudos, é um agente ativo no processo

da comunicação. Ele se porta criticamente ante as mensagens, é um agente

social, construtor de significados e com o advento do controle remoto, seu

poder de escolha e decisão aumenta. O receptor não recebe o significado da

mensagem, mas o negocia frente a diversas circunstâncias. (JACKS;

MENEZES; PIEDRAS, 2008, p. 135).

Além dos habituais apontamentos das características do meio, outros pontos comuns

nos trabalhos apontados pelas autoras foram: a influência de fatores particulares (condições

financeiras, conhecimentos, educação, posição social) de cada indivíduo na forma de absorver

as mensagens recebidas; que o emissor é um porta-voz autorizado e que toda ação do meio

possui uma intenção.

Já em relação à problemática que engloba os objetos de pesquisa, as autoras

apontaram os seguintes resultados: outras abordagens – o perfil do receptor, a partir do

discurso, idealizado pelos apresentadores de programas radiofônicos; Comportamental, divido

em duas linhas – 1º os usos e os impactos do rádio em culturas essencialmente orais, assim

como a percepção e as expectativas da comunidade em relação aos veículos e 2º os critérios

de seleção da informação radiofônica no meio rural e as opiniões sobre o tema em questão;

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Sociocultural – influência/relação do meio entre os ouvintes (JACKS; MENEZES; PIEDRAS,

2008). Prevalecente entre os estudos, a corrente sociocultural é guiada pelas correntes

teórico-metodológicas da hermenêutica da profundidade e dos estudos latino-americanos, que

de forma interdisciplinar, citam Martín-Barbero, Canclinim Orozco.

A pesquisa realizada por Jacks, Menezes e Piedras, em 2008, apontou também:

público investigado – comunidades diversas (rurais, indígenas, extrativista), mulheres,

católicos e adolescentes; classe social - média e baixa. Principais técnicas de coleta –

entrevistas, questionários, discussão em grupo, pesquisa participante, etnográfica, pesquisa

documental e análise do discurso (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008).

Entre as deficiências apontadas pela pesquisa nos estudos analisados foram: a

ausência de critérios epistemológicos orientados para o diagnóstico do discurso ou para os

efeitos, além do baixo rigor científico nos relatórios. “Em relação aos limites, é mencionado o

fato de algumas pesquisas de marcante influência antropológica desviar seu foco da relação da

comunidade com o meio para a própria vida comunitária” (JACKS; MENEZES; PIEDRAS,

2014, p. 98). No entanto, o estudo aponta que houve avanços significativos no cenário que

investiga a recepção radiofônica no Brasil durante a década de 90.

Dentre os quais destacamos primeiro os teóricos-metodológicos como a

adoção de uma concepção de cultura como modo de vida, prática cotidiana e

materialidade do tempo presente, também encontrada no passado e no

futuro. Houve uma maior compreensão dos gostos e costumes de classe,

somado ao fato de que a produção de sentindo pode englobar e promover

uma aproximação entre as classes (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2008, p.

149).

Meios e Audiências (2008) destaca ainda três novas hipóteses em relação aos estudos

radiofônicos, a partir da ótica sociocultural: (1) o rádio estabelecer um novo modo de

produção de pensamento; (2) o ambiente comunicacional virar um local do processo de

ascensão profissional da mulher; e (3) os resultados das escutas radiofônicas serem utilizados

em outras áreas do conhecimento, como a ciências humanas e sociais.

Estudos de recepção no Brasil: década 2000

A partir da revisão teórica proposta por Martín-Barbero (1990) na abordagem

sociocultural ainda na década de 90, as autoras apresentam na segunda edição do livro “Meios

e Audiências II: a emergência dos estudos de recepção no Brasil” (2014) algumas mudanças

na classificação das abordagens para mapear as pesquisas investigadas.

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Assim, se na publicação sobre a década de 1990 apareciam três abordagens

[...], aqui só permanece integralmente a sociocultural, à qual foi somada uma

nova abordagem, a sociodiscursiva. Consideramos necessário fazer esses

acrescimentos para dar ênfase a um desenvolvimento identificado na área,

qual seja, a adoção das teorias do discurso, em qualquer de suas

perspectivas, para analisar a recepção (JACKS; MENEZES; PIEDRAS,

2014, p.13).

De acordo com as autoras, a abordagem comportamental e outras utilizadas na edição

de 2008, foram empregadas de formas distintas, sendo que a primeira foi utilizada somente

para quantificar os trabalhos e a segunda foi eliminada.

Assim, a nova abordagem sociodiscursiva é definida como: abordagem que trata “o

discurso dos sujeitos a partir de enfoques teórico-metodológicos que se dedicam à análise dos

discursos sociais, os quais emanam da mídia e dos receptores” (JACKS; MENEZES;

PIEDRAS, 2014, p.14). Nesta categoria foram abordados trabalhos da semiótica, análise do

discurso e de conteúdo qualitativo, retórica, linguística, etc.

No entanto, a metodologia utilizada para analisar os trabalhos permanece a

mesma linha utilizada na primeira edição da obra, que é o modelo proposto por Maria

Immaculada Lopes (1990). Dos 209 estudos analisados pelas pesquisadoras, 49 teses e 160

dissertações, o resultado obtido foi: 112 socioculturais, 32 sociodiscursivas e 65

comportamentais.

Nos processos de recepção analisados pelas pesquisas, a contagem relativa

aos meios selecionados para estudo aponta que a televisão (104) continua

sendo o que desperta mais interesse nos pesquisadores, em todas as

abordagens. Ela é seguida pela internet (26), que, em números totais, já

supera em muito o interesse pelo rádio (19), embora ainda traga muitas

análises centradas na abordagem comportamental (18) (JACKS; MENEZES;

PIEDRAS, 2014, p. 16).

Na nova pesquisa, a mídia impressa e outras mídias, como o cinema, também

surgiram como objeto de estudo: jornal 12; revista 11; mídia 11. A edição 2014 da obra

identificou também 6 trabalhos que buscaram investigar de forma mais ampla, sem focar em

meio específico, a indústria cultural na vida e cultura contemporânea.

Diagnóstico sobre a pesquisa radiofônica

Apesar das mudanças no quadro da pesquisa de recepção, houve um aumento quantitativo e

qualitativo nas pesquisas radiofônicas nos programas de pós-graduação em Comunicação no

País. Jacks, Menezes e Piedras (2014), aponta que cresceu de 10 para 21 o número de estudos

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empíricos, sendo que quatro foram provenientes de teses de doutorado. Em relação à

abordagem e problemáticas, emergiram os seguintes dados: sociocultural – 15 trabalhos,

como foco na inserção do rádio em comunidades, grupos étnicos e zona rural; sociodiscursiva

– 5 trabalhos, que visam explorar as características do discurso radiofônico e a relação com

receptor; e comportamental – 2 trabalhos (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2014).

O estudo revelou também as seguintes informações: 9 trabalhos tratam de identidade

(comunitária, étnica ou de gênero); 4 enfatizam a comunicação comunitária, 4 tratam da

relação emissor/receptor; 3 abordam o papel do rádio em movimentos sociais; 3 exploram

respectivamente, o consumo musical, a memória e a oralidade. Em relação aos procedimentos

metodológicos, o método qualitativo é unanime e de acordo com as autoras (JACKS;

MENEZES; PIEDRAS, 2014), a entrevista é a mais adotada (14), seguida pela observação

(5), e história de vida (4). Foram utilizados também os métodos de analise do discurso (3),

discussão em grupo (3), etnografia (2), análise de cartas (2), biografia radiofônica (1) e

questionário (1).

Em relação ao público, de forma geral, o estudo aponta que não há preferência por

estudar grupos homogêneos, mas ouvintes de determinadas rádios e programas diversificados,

sem levar em consideração classe social, gênero ou qualquer outra distinção. “Nestes casos, e

pode-se dizer que de modo geral na produção da década de 2000, observa-se nítida predileção

pela faixa etária adulta, primando-se pela diversidade de profissão e sexo” (JACKS;

MENEZES; PIEDRAS, 2014, p. 106).

Assim como na década de 90, os estudos culturais são predominantes nas pesquisas

de recepção radiofônicas, tendo como principais estudiosos Martín-Barbero, Orosco e

Canclini, em que é adota a perspectiva da educação para os meios. “Acredita-se que a

preeminência desses pilares justifique o diálogo, frequentemente nas pesquisas, com preceitos

de outras tendências disciplinares, como a Antropologia, a Sociologia, a Semiótica e a

Linguística (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2014, p.107)”.

Em suma, sobre a pesquisa de recepção radiofônica pode-se afirmar, com base no

estudo, que o aumento ocorreu devido à ampliação dos programas de pós-graduação no país.

No entanto, não houve grande diversidade nos estudos, conforme apontam as autoras, que

sugerem que não se pode comemorar a descoberta de novas facetas do rádio no início deste

século. “Observa-se pelo contrário, uma grande sobreposição dos temas eleitos na década

anterior – identidades, questões de gênero, cidadania, relações entre cotidiano [...], geralmente

sem estabelecer diálogo com produções predecessoras, o que configura uma “séria lacuna”

(JACKS; MENEZES, PIEDRAS, 2014, 110). O estudo aponta também que a produção

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nacional é basicamente ignorada, “apenas cinco autores brasileiros estão entre as principais

referências das obras da década de 2000, sendo exclusivamente uma da área de recepção:

Maria Immacolata Vassalo de Lopes (JACKS, MENEZES, PIEDRAS, 2014, p. 112)”. Além

de não fazerem referência ao novo cenário digital e da convergência midiática, as deficiências

apontadas na década de 90 permanecem, como por exemplo, à ausência de critérios

epistemológicos orientados para o diagnóstico do discurso ou para os efeitos, baixo rigor

científico nos relatórios, etc.

No entanto, apesar das fragilidades dos trabalhos analisados, a obra “Meios e

Audiências” (2014) destaca a relevância dos mesmos para o cenário dos estudos de recepção

radiofônica no Brasil no inicio deste novo milênio, ao trazer reflexões e cenários que

instiguem a compreensão da sociedade atual. “Os trabalhos enriqueceram o campo com a

incorporação de novos públicos, técnicas e referencias e pulverizaram férteis temáticas a

serem aprofundadas em trabalhos futuros” (JACKS; MENEZES; PIEDRAS, 2014, p. 116).

Considerações Finais

O receptor radiofônico tornou-se ao longo dos anos um dos principais focos de

pesquisas no Brasil, a partir dos Estudos Culturais e demais correntes que investigam a

influência hegemônica dos meios. No entanto, os estudos voltados para a recepção

radiofônica nas últimas duas décadas foram insipientes. As pesquisas realizadas pelos

programas de pós-graduação em comunicação no país, nos anos 90 e início de 2000,

mantiveram basicamente as mesmas correntes: os estudos latino-americanos, para investigar o

estado da arte dos estudos de recepção radiofônica, tendo como principais autores Martín-

Barbero, Orozco e Canclini.

A partir de estudos realizados nestes períodos, observou-se também a deficiência em

estratégias metodológicas na obtenção de dados mais efetivos nas pesquisas, baixo rigor

científico, o não aproveitamento de estudos já realizados no país, falta de interdisciplinaridade

e a desvalorização de pesquisadores nacionais. Outro agravante no cenário da pesquisa

radiofônica no Brasil é a ausência de estudos voltados ao novo cenário digital e da

convergência midiática, cenários que alteraram consideravelmente o comportamento do

receptor.

No entanto, mesmo diante das fragilidades dos trabalhos analisados, as teses e

dissertações realizadas até o momento são consideradas de extrema relevância, já que, além

de diagnosticar o cenário dos estudos de recepção radiofônica nacional, apontam reflexões e

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questionamentos que visam instigar a compreensão da sociedade atual e o caminho da

pesquisa a ser trilhado no futuro.

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