O POLICIAMENTO VELADO COMO SUPORTE AO POLICIAMENTO OSTENSIVO NA REPRESSÃO IMEDIATA A DELITOS

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POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ DIRETORIA DE ENSINO ACADEMIA POLICIAL MILITAR DO GUATUPÊ ESCOLA DE FORMAÇÃO DE OFICIAIS ASP. OF. PM JOSÉ ELEUTÉRIO DA ROCHA NETO O POLICIAMENTO VELADO COMO SUPORTE AO POLICIAMENTO OSTENSIVO NA REPRESSÃO IMEDIATA A DELITOS SÃO JOSÉ DOS PINHAIS 2010

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Monografia para a conclusão do Curso de Formação de Oficiais Policiais Militares, turma Aspirantes 2010, da Academia Policial Militar do Guatupê (Polícia Militar do Paraná).Autor: José Eleutério

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POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ

DIRETORIA DE ENSINO

ACADEMIA POLICIAL MILITAR DO GUATUPÊ

ESCOLA DE FORMAÇÃO DE OFICIAIS

ASP. OF. PM JOSÉ ELEUTÉRIO DA ROCHA NETO

O POLICIAMENTO VELADO COMO SUPORTE AO POLICIAMENTO OSTENSIVO

NA REPRESSÃO IMEDIATA A DELITOS

SÃO JOSÉ DOS PINHAIS

2010

ASP. OF. PM JOSÉ ELEUTÉRIO DA ROCHA NETO

O POLICIAMENTO VELADO COMO SUPORTE AO POLICIAMENTO OSTENSIVO

NA REPRESSÃO IMEDIATA A DELITOS

Monografia apresentada como requisito parcial àconclusão do Curso de Formação de OficiaisPoliciais Militares realizado junto à AcademiaPolicial Militar do Guatupê.

Orientador de conteúdo: Cap. QOPM RicardoCaron

Orientador metodológico: Cap. QOPM LucianoBlasius.

SÃO JOSÉ DOS PINHAIS

2010

TERMO DE APROVAÇÃO

ASP. OF. PM JOSÉ ELEUTÉRIO DA ROCHA NETO

O POLICIAMENTO VELADO COMO SUPORTE AO POLICIAMENTO OSTENSIVO

NA REPRESSÃO IMEDIATA A DELITOS

Monografia aprovada como requisito parcial à conclusão do Curso de Formação de

Oficiais Policiais Militares realizado junto à Academia Policial Militar do Guatupê pela

seguinte banca examinadora:

Orientador de conteúdo: Cap. QOPM Ricardo Caron

Orientador metodológico: Cap. QOPM Luciano Blasius

Avaliador: Cap. QOPM Marcos Sperka

São José dos Pinhais, 10 de dezembro de 2010

Dedico este estudo aos heróis que ousaram lutar;

àqueles que abriram mão de seus seguros papéis de coadjuvantes do mundo

e se arriscaram

por seus ideais puros.

Sobretudo, dedico este

àqueles magnânimos

que tombaram mortos

na tentativa de legar um mundo melhor.

AGRADECIMENTOS

À minha mãe, pelo incentivo sempre dado à leitura e à produção textual e pela fibra

que me ensinou a ter.

Ao meu pai, pelos tantos ensinamentos, principalmente pelo idealismo que tanto

carrego.

Aos meus grandes amigos de infância, pelo apoio dado sempre que necessário.

Aos mestres, professores, instrutores e tantos outros com quem cruzei nesta vida e

tiveram a paciência de ensinar algo.

Por fim, aos orientadores, Cap. Blasius e Cap. Caron, que dispuseram de seu tempo

livre para colaborar com este modesto estudo.

“A teoria sem prática de nada vale. A prática sem teoria é cega.” (Vladimir Lênin)

ELEUTÉRIO da Rocha Neto, José. O policiamento velado como ferramentacomplementar ao policiamento ostensivo na repressão imediata a delitos. 36f.Monografia (Curso de Formação de Oficiais Policiais-Militares) – Academia PolicialMilitar do Guatupê. São José dos Pinhais/PR, 2010.

RESUMO

O presente estudo foi conduzido a partir da observação empírica de que o

Policiamento Ostensivo (PO) é ineficaz na repressão a alguns tipos criminais, sendo

exemplos mais relevantes o tráfico de substâncias entorpecentes e o furto/roubo de

veículos. Assim, procurou-se demonstrar que o emprego velado de policiais, em

complementação ao policiamento ostensivo, resultaria em significativa redução das

estatísticas criminais. Buscando o embasamento do Policiamento Velado (PV),

estudaram-se doutrinas de emprego policial-militar, jurisprudências, e dispositivos

legais. Com o intuito de apresentar as dificuldades de emprego do PO, foi realizado

grupo focal junto às Rondas Tático-Motorizadas (ROTAM) do 12º Batalhão de Polícia

Militar. Por fim, para verificar o grau de eficácia do emprego do PV sobre tais

dificuldades e expor as deficiências do PV, foi conduzido grupo focal junto ao Grupo

Tático Velado (GTV) do Comando do Policiamento da Capital (CPC). Ao fim da

pesquisa, sugeriram-se ações que visassem à diminuição das estatísticas criminais

no âmbito do Estado do Paraná.

Palavras-chave: Policiamento Velado, policiamento de revestimento, Policiamento

Ostensivo.

ELEUTÉRIO da Rocha Neto, José. Veiled policing as a supplementary tool toostensive policing in imediate crime suppression. 36 sheets. Monograph (MilitaryPolice Officers' Formation Course) – Academia Policial Militar do Guatupê. São Josédos Pinhais/PR, 2010.

ABSTRACT

This study have been proceeded from an empirical conclusion that Ostensive

Policing (OP) is ineffective on repressing some felonies, being drugs traffic and

vehicles thievery. Therefore, it was attempted to demonstrate the application of veiled

policing (VP), in completion to OP, would result in a significant reduction on criminal

statistics. In order to base the use of VP, it was studied Military Police application

doctrine, jurisprudence, and legal texts. By the way of presenting the difficulties of OP

use, it has been held a focal group, composed of police officers from the 12th

Battalion of Military Police’s (12BPM) Rondas Tático-Motorizadas (ROTAM) – the

Portuguese term for Motorized Tactical Patrols. At last, to the end that verifies the

degree of efficacy of the use of VP in opposition to those difficulties and expose the

weaknesses of VP, it has been held a focal group in Grupo Tático Velado (GTV), –

the Portuguese term for Veiled Tactical Group – subordinate to Capital Policing

Command. By the end of this research, it has been suggested actions that shall

reduce criminal statistics in Paraná State.

Keywords: Veiled policing, covering policing, Ostensive Policing.

LISTA DE ABREVIATURAS

APMG – Academia Policial Militar do Guatupê

BPM – Batalhão de Polícia Militar

Cia. P Chq. – Companhia de Polícia de Choque

CPC – Comando do Policiamento da Capital

EsFO – Escola de Formação de Oficiais

GAECO – Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado

GTR – Grupo Tático Reservado

GTV – Grupo Tático Velado

MP – Ministério Público

P/2 – Segunda Seção do Estado-Maior

PM/2 – Segunda Seção do Estado-Maior da Polícia Militar do Paraná

PMERJ – Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

PM – Polícia Militar

PMPR – Polícia Militar do Paraná

PO – Policiamento Ostensivo

PV – Policiamento Velado

SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública

SESP – Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná

SUMÁRIO

1 PROBLEMATIZAÇÃO............................................................................................101.1. QUESTÃO NORTEADORA................................................................................112 OBJETIVOS...........................................................................................................122.1. OBJETIVO GERAL.............................................................................................122.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS...............................................................................123 JUSTIFICATIVA......................................................................................................134 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..............................................................................164.1 HISTÓRICO.........................................................................................................164.2 FUNDAMENTOS DE POLICIAMENTO OSTENSIVO.........................................174.3 DIFICULDADES DO POLICIAMENTO OSTENSIVO..........................................184.4 EMBASAMENTO DOUTRINÁRIO DO POLICIAMENTO VELADO.....................204.4.1 Princípios norteadores do Policiamento Velado...............................................214.4.2 Tipos de policiamento velado...........................................................................224.4.3 Aplicabilidade....................................................................................................224.4.4 O Policiamento Velado versus a investigação criminal.....................................234.5 APLICAÇÃO OPERACIONAL DO POLICIAMENTO VELADO............................244.5.1 O policial empregado em PV............................................................................244.5.2 Fiscalização do PV...........................................................................................244.5.3 Armamentos, equipamentos, aprestos e documentação..................................254.5.4 Recomendações...............................................................................................254.6 EMBASAMENTO LEGAL DO POLICIAMENTO VELADO...................................265 METODOLOGIA.....................................................................................................295.1 PROCEDIMENTOS PARA PESQUISA DE CAMPO............................................305.1.1 Rondas Tático Motorizadas – 12º BPM............................................................305.1.2 Grupo Tático Velado.........................................................................................316. RESULTADOS.......................................................................................................326.1 RONDAS TÁTICO MOTORIZADAS – 12º BPM..................................................326.2 GRUPO TÁTICO VELADO – COMANDO DO POLICIAMENTO DA CAPITAL....347. CONCLUSÃO........................................................................................................37REFERÊNCIAS.........................................................................................................39APÊNDICE A – ROTEIRO PARA GRUPO FOCAL Nº 1...........................................42APÊNDICE B – ROTEIRO PARA GRUPO FOCAL Nº 2..........................................43

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1 PROBLEMATIZAÇÃO.

Acompanharam-se os recentes conflitos ocorridos entre facções de

traficantes de entorpecentes e policiais militares do Estado do Rio de Janeiro. Não

seria hiperbólica a idéia de que o Estado do Rio de Janeiro chegou ao ponto da

guerra civil não declarada. Não convém ao estudo a se fazer o juízo das condições

da criminalidade fluminense, mas a referência foi necessária para se ter uma noção

do ponto a que a omissão perante a conduta criminosa pode levar uma sociedade

organizada.

É senso-comum que, independentemente do investimento que se faça em

Segurança Pública, alguns delitos persistem. Por exemplo, em 2005 foram gastos,

no Paraná, mais de 760 milhões de reais em atividades de policiamento (ANUÁRIO

DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2007, p. 68), investimento

aumentado para mais de 910 milhões de reais, em 2006 (Ibidem, p. 68), e para mais

de 930 milhões, em 2007 (Idem, 2008, p. 36), ultrapassando, por fim, a marca de 1

bilhão de reais, em 2008 (Idem, 2009, p. 20). Entretanto, alguns crimes aumentaram

suas estatísticas. Relativamente aos crimes contra a pessoa, por exemplo,

registraram-se 81.800 ocorrências em 2007 (PARANÁ, 2008, p. 8), 107.853 casos

em 2008 (PARANÁ, 2009a, p. 6), 32.420 ocorrências no primeiro trimestre de 2009

(PARANÁ, 2009b, p. 3) e 30.189 casos no segundo trimestre de 2009 (PARANÁ,

2009c, p. 3), o que sugere novo aumento.

Levando-se em conta a estabilidade do efetivo policial-militar ao longo dos

anos, que não dá sinais de aumento em um futuro próximo, faz-se necessário o

desenvolvimento e consequente aplicação de novas técnicas e táticas de emprego

do efetivo, visando maior eficiência e eficácia das ações de polícia. Tais inovações

técnicas e táticas têm-se desenvolvido majoritariamente no campo do policiamento

ostensivo preventivo, em especial na área de Polícia Comunitária.

No entanto, pouco se tem produzido referente ao policiamento repressivo

imediato, logo após o cometimento do delito. Novamente invocando o lapso de

efetivo policial-militar, fazem-se necessárias enormes eficiência e eficácia das ações

repressivas imediatas de polícia, o que só pode ser atingido através do

aprimoramento científico de técnicas e táticas.

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Fica claro, através dos dados da Secretaria Nacional de Segurança Pública,

que a abordagem preventiva da polícia, adotada nacionalmente, é ineficaz no

combate a alguns crimes. Por exemplo, em 2008, foram furtados 3.225 automóveis

no Paraná (PARANÁ, 2009a, p. 34), contra 2.636 carros, em 2007 (PARANÁ, 2008,

p. 35). Noutro exemplo, em Minas Gerais1, registraram-se 3.559 ocorrências de

tráfico de entorpecentes em 2007 (ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE

SEGURANÇA PÚBLICA, 2008, p. 22), contra 3.381, em 2006 (ibidem, p. 20), e

3.299, em 2005 (Idem, 2007, p. 17).

A paradoxal elevação das estatísticas de determinados crimes, frente à

abordagem preventiva que majoritariamente se vem empregando, é o problema

principal a se tratar a seguir.

1.1. QUESTÃO NORTEADORA.

Exposta tal problematização, formula-se a seguinte questão norteadora:

quais as contribuições do emprego do policiamento velado em apoio às ações

repressivas de policiamento ostensivo na PMPR?

1 Usou-se, neste ponto, o exemplo de Minas Gerais porque nem a SENASP, nem a Secretaria deEstado de Segurança Pública do Paraná divulgam dados acerca de tráfico de entorpecentesdesde 2005 (tampouco dados anteriores a esse ano), quando foram registrados 575 casos(ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2007, p. 17).

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2 OBJETIVOS.

2.1. OBJETIVO GERAL.

O presente trabalho acadêmico visa a expor as contribuições do

policiamento velado (PV) como ferramenta de contenção da criminalidade.

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS.

Para atingir o objetivo geral, tivemos como objetivos específicos os

seguintes:

a) Embasar legal e doutrinariamente o emprego do Policiamento Velado (PV)

por parte das Polícias Militares.

b) Apresentar as dificuldades do Policiamento Ostensivo (PO) como ferramenta

de repressão criminal.

c) Revelar os delitos contra os quais a aplicação do PO torna-se mais

vulnerável.

d) Verificar o grau de eficácia da aplicação do PV como subsídio na repressão

aos crimes contra os quais é ineficaz a atuação isolada do PO.

e) Identificar as dificuldades encontradas nas operações de PV.

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3 JUSTIFICATIVA.

Um bom general não deve jamais dizer: ‘Aconteça o que acontecer, farei talcoisa. Irei lá, atacarei o inimigo, sitiarei tal praça’. Somente as circunstânciasdevem ditar a conduta. [...]O general deve conhecer a arte das mudanças. [...] É preciso que saiba empregar corretamente certos artifícios para enganar oinimigo [...] (SUN TZU, 2002, p. 38).

Coube iniciar o presente tratado a partir de citação do grande mestre Sun

Tzu para dar destaque a uma obra escrita há mais de vinte e cinco séculos, mas que

é seguida religiosamente pelos grandes estrategistas até os dias atuais.

Obviamente, em nível de Polícias Militares não cabe mais a terminologia “inimigo”,

bem como a figura do general, entretanto se aplica todo o resto.

A idéia de associação de pessoas para a comissão de delitos é tão antiga

quanto as próprias sociedades; é uma mera extensão da idéia instintiva de

superioridade numérica. Na verdade, pode-se interpretar até mesmo como uma

extensão da própria idéia de sociedade: um grupo de indivíduos lutando pela

conjunção entre interesses individuais e a sobrevivência do grupo como unidade.

A questão é que, nos dias atuais, a organização criminosa tomou proporções

hercúleas, empresariais, e, em muitos casos, ganhou caráter transnacional. Assim, a

estrutura mantida pelas associações criminosas passou a contar com facilidades

para treinamento de recursos humanos, desenvolvimento de estratégias de logística

e de produção, contabilidade especializada, assessoria jurídica e recursos quase

ilimitados para a segurança dos próprios grupos. Para combater tamanha estrutura

são necessárias novas estratégias por parte dos órgãos policiais, conforme

corrobora Rodrigo Carneiro Gomes (2002), delegado da Polícia Federal e professor

da Academia Nacional de Polícia:

Há necessidade de combate diferenciado a uma nova criminalidadeorganizada, que é estruturada, hierarquizada, com divisão de tarefas, buscade vantagem financeira, acesso à tecnologia e que dispõe de suportejurídico e contábil para ocultação de patrimônio e pessoas.

A administração da Segurança Pública no Estado do Paraná tem voltado a

imensa maioria das ações da Polícia Militar ao policiamento ostensivo (PO), via de

regra motorizado. Isso é fruto de um alinhamento com a política nacional de

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segurança pública, que, por sua vez, deve estar alinhada aos tratados internacionais

dos quais o Brasil é signatário.

No entanto, o alinhamento excessivo é prejudicial, uma vez que limita a

visão dos gestores do presente e do futuro no tocante ao desenvolvimento de

soluções para os problemas da segurança pública, conforme constata o jornalista

Marcos Rolim (2007, p. 33), em um artigo de sua autoria:

[...]exceções à parte, chama a atenção o fato de que as políticasimplementadas pelos diferentes governos sejam, quase sempre, tentativasde ministrar doses maiores das mesmas receitas já testadas e sabidamenteincapazes de produzir resultados diversos do notável fracasso jáacumulado.

Em poucas áreas, como nas políticas de segurança pública, osespaços para a inovação são tão estreitos e o apego à tradição tãoconsolidado. Lidamos, então, especificamente nesta área, com umaresistência incomum à inovação, que constitui, em si mesma, parte doproblema a ser enfrentado.

O policiamento ostensivo tem se mostrado ineficiente no combate a

determinados delitos. São casos específicos, mas que têm grande impacto na

sociedade. São exemplos adequados a prática de jogo do bicho, o tráfico de

entorpecentes, o furto/roubo de veículos, o descaminho (especialmente de produtos

eletrônicos) e o contrabando de armas e drogas. Quanto aos dois últimos delitos,

apesar de serem de competência federal, cabe à Polícia Militar barrar a ação dos

criminosos quando da falha da fiscalização aduaneira.

O policiamento velado (PV), em sua essência, pode ser encarado como mais

uma solução complementar, ou mesmo como a principal ferramenta de apoio ao

combate a casos como os supracitados. Cabe deixar claro que não se trata da

atividade de inteligência, tampouco de investigação criminal. À primeira cabe a

produção e a salvaguarda de conhecimento, que subsidiará a tomada de decisão. A

esta, por sua vez, cabe a apuração de autoria e materialidade de delito já ocorrido,

sendo função da Polícia Judiciária. Neste estudo, discorre-se acerca da produção de

informações por militares à paisana, que serão utilizadas para otimizar o emprego do

Policiamento Ostensivo.

O principal ponto na abordagem ao emprego do PV, a conscientização da

própria Corporação quanto à necessidade operacional de emprego de PV, é mais

importante que qualquer conceito teórico. Sendo natural do ser humano, e

amplificada de forma extrema nas classes militares, a resistência a inovações

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representa obstáculo colossal frente à difusão do emprego da atividade de PV. Tal

resistência é concebida pelo fato de que “Ela não está dentro da formação policial-

militar e, portanto, não está ao gosto de boa parcela das mentes policiais-

militares” (MORAES, 1991, p. 55). Dentro dessa idéia, não é objetivo deste autor

defender que o PV seja a única forma eficaz de repressão à criminalidade, mas sim

explorar os aspectos de uma ferramenta poderosíssima e extremamente promissora,

ainda que pouco empregada.

Por se tratar de tema tão controverso o emprego do Policiamento Velado foi

escolhido como tema central do presente estudo, que, até com certa soberba,

pretende esvair as desconfianças sobre esse tipo de policiamento, aumentando sua

empregabilidade dentro da PMPR. Outro motivo é bem explicado por Moraes (1991,

p. 4-5):

[...] reconhecimento da necessidade de aplicar inovações no sistemapolicial-militar, complementando-o de modo a dar-lhe a necessária eprocurada eficácia para a produção de seu objetivo final: ”incolumidade daspessoas e do seu patrimônio e a preservação da ordem pública”.(Constituição Federal, 1988, art. 144 “caput”).

Em adição, a crença de que a disseminação do emprego do Policiamento Velado na

Polícia Militar do Paraná representará um grande avanço policial sobre a

criminalidade, fortalecendo não somente o nome da instituição, mas, principalmente,

a sociedade paranaense como um todo.

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4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para a fundamentação teórica do presente, buscou-se embasar legal e

doutrinariamente o emprego do Policiamento Velado (PV).

4.1 HISTÓRICO

Em 10 de agosto de 1854, criou-se a Companhia da Força Policial, a

primeira força policial do recém-emancipado Estado do Paraná. Tal força,

comandada pelo Capitão de Primeira-Linha do Exército Joaquim José Moreira de

Mendonça, era composta por 67 homens, armados e equipados com material cedido

pela Guarda Nacional. Tinha a missão de “proteger os viajantes contra a agressão

de índios e malfeitores” (AZEVEDO, 2010, p. 3). Com o passar do tempo, a

Corporação prestou valorosos serviços à pátria brasileira, protagonizando grandes

momentos da História. Durante a Guerra do Paraguai, destacou-se na batalha do

Tuiuti e no episódio do Resgate da Bandeira Imperial. Durante a Revolução

Federalista, foi essencial na derrota dos revoltosos, ao manter heróica resistência

durante os vinte e seis dias do Cerco da Lapa e ao compor inúmeros outros esforços

de guerra. Durante a guerra do Contestado, protagonizou a batalha do Irani.

Em 1918, recebeu a denominação de Força Militar. Com essa denominação,

participou das Revoluções de 1924, de 1930 e de 1932. Após esta, passou a ser

chamada Polícia Militar.

Em reconhecimento a esses feitos, juntamente aos de corporações policiais

de outros Estados, em 1934, todas as milícias estaduais passaram a se

denominarem Polícias Militares por força constitucional. A PMPR ainda participou da

Intentona Comunista de 1935.

Por um breve espaço de tempo, entre 1940 e 1946, passou a ser

denominada Força Policial, após o qual, retornou à denominação Polícia Militar.

Assim, ainda participou da Revolução Militar de 1964. Durante a vigência do Regime

Militar, foi a principal responsável pela manutenção da Ordem Pública no âmbito do

Estado do Paraná.

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A missão da Polícia Militar do Paraná (PMPR), bem como os meios

utilizados para cumpri-la evoluíram ao longo do tempo. A Corporação, entretanto,

mantém os velhos ideais de defesa da Pátria e da sociedade paranaense.

4.2 FUNDAMENTOS DE POLICIAMENTO OSTENSIVO

A polícia ostensiva é missão constitucional e exclusividade das polícias

militares. Tal conceito abrange, também, o Policiamento Ostensivo (PO), que, por

sua vez, se define nos termos do art. 2º do decreto nº 66.682, de 8 de julho de 1970

(apud MORAES, 1991, p. 29):

Policiamento ostensivo é a ação policial cujo emprego do homem ou dafração de tropa engajados sejam identificados de relance, quer pela farda,quer pelo equipamento, armamento ou viatura.

Tal ostensividade visa à prevenção do delito: ao mesmo tempo que a

população tem a sensação de segurança elevada pela presença policial, as ações

mal-intencionadas são freadas pela mesma presença.

De acordo com o Maj. PMPR Élio de Oliveira Manoel (2004, p. 44-47), são

características do PO a Identificação, a Ação Pública, a Totalidade, a Dinâmica, a

Legalidade e a Ação de Presença. Tais características são o resultado da aplicação

dos seguintes princípios, igualmente citados por Manoel (ibidem, p. 47-50):

- Universalidade: a especialização significa um maior conhecimento em

determinado tipo de ocorrência, mas não desobriga o policial militar do bom

atendimento às demais.

- Responsabilidade Territorial: a responsabilidade por cada área geográfica

deve ser atribuída a um comandante.

- Continuidade: “as atividades de polícia ostensiva não encerram

nunca” (ibidem, p. 49).

- Aplicação: os responsáveis pela execução do PO devem estar atentos e

atuantes.

- Isenção: o policial não deve “demonstrar emoções ou concepções

pessoais” (ibiedem, p. 49) durante a execução do serviço, em concordância com o

princípio constitucional da Impessoalidade nas ações da administração pública.

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- Emprego lógico: a aplicação do efetivo deve ser estudado e justificado.

- Antecipação: é a essência da prevenção – agir antes de o delito acontecer.

- Profundidade: deve ser feita a cobertura de locais de risco não ocupados.

- Unidade de Comando: cada fração de tropa possui, apenas, um

comandante.

- Objetivo: tranquilidade pública.

Em adição à obediência aos princípios, é “necessário dar ao policiamento

ostensivo procedimentos e métodos de trabalho, habilitando-o a maximizar sua

capacidade” (MORAES, 1991, p. 33).

4.3 DIFICULDADES DO POLICIAMENTO OSTENSIVO

De acordo com o Cap. PMDF Erick Nunes Queiroz (2007, p. 2):

quando há a necessidade de pronta intervenção, quando surge ocometimento do delito, a exemplo do roubo, do furto, do porte ilegal dearmas e drogas, a ostensividade torna-se ineficiente e [sic] muita das vezesprejudiciais ao desfecho positivo do fato, ganhando na maioria das vezes odelinquente, que [sic] consegue evadir-se dentre a comunidade após aconsumação desses delitos.

O Cel. PMPR Iberê Índio do Brasil Pereira de Moraes (1991, p. 30-35)

identificou uma série de fatores que diminuem a eficácia do PO.

A primeiro citado é a evasão dos envolvidos. Quando da ocorrência de um

delito, ela se torna muito mais fácil devido à ostensividade da força repressiva ao se

aproximar. O emprego de olheiros por parte dos criminosos, outro fator identificado,

tem utilizado cada vez mais aparatos tecnológicos, e se vale dessa ostensividade.

A ocultação de objetos ilícitos, especialmente os de pequeno porte, como

entorpecentes, também dificulta o serviço do policiamento ostensivo. Da mesma

forma, pessoas se valem da ostensividade da polícia para se ocultarem com

antecedência quando do desencadeamento de ações policiais. Nesse sentido, torna-

se extremamente penoso o cumprimento de mandados judiciais.

A explicação foi encontrada por Moraes em afirmação do Cel. PMERJ José

Carlos Barbosa Braga (apud MORAES, 1991, p. 36) e é bem simples: se o PO é, por

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essência, uma atividade preventiva, nada mais natural que encontre dificuldades

quando empregado em missões de cunho repressivo.

20

4.4 EMBASAMENTO DOUTRINÁRIO DO POLICIAMENTO VELADO

O primeiro passo ao se abordar o emprego do Policiamento Velado por parte

das Polícias Militares sob o ponto de vista doutrinário é defini-lo. De acordo com a

Diretriz Geral de Planejamento e Emprego da PMPR2 (PARANÁ, 2000, p.36), o PV é

“uma atividade de preservação da ordem pública, em apoio ao policiamento

ostensivo [sic] que emprega policiais militares em trajes civis”. A Diretriz de

Inteligência nº 001/07 (DISTRITO FEDERAL, 2007a, p. 1), por sua vez, nos traz que

o objetivo do PV é “produzir informações criminais que [sic] possibilite o eficiente,

eficaz e racional emprego do policiamento ostensivo”. Voltando à diretriz

paranaense (PARANÁ, 2000, p. 36), o PV está em consonância com a idéia de que

o poder público deve desenvolver técnicas de forma a proteger a sociedade de

forma objetiva e com qualidade.

Definição mais completa é trazida pela Diretriz de Inteligência nº 001/07

( DISTRITO FEDERAL, 2007a, p. 3), qual seja:

Policiamento Velado: é uma modalidade de Policiamento, a qual consiste noexercício permanente de ações especializadas, orientadas para produçãode conhecimentos, referentes à preservação da ordem pública, em apoio aoPoliciamento Ostensivo, que emprega policiais militares em trajes civis eque possui características, variantes e princípios próprios.

Raymundo (2007a) preconizou:

[...] sabe-se que a ostensividade, por sua natureza preventiva e inibidora,colabora para que a atividade delituosa diminua ou cesse com a suapresença, porém, percebe-se que a criminalidade ao ser “sufocada” emdeterminado setor de policiamento tende a migrar, de maneira a seguirocorrendo, sendo executada e consumada em outros locais, nas lacunasonde o policiamento preventivo não se encontra [...][...] quando surge o cometimento do delito, a exemplo do roubo, do furto, doporte ilegal de armas e drogas, a ostensividade torna-se ineficiente e muitadas vezes prejudicial ao desfecho positivo do fato [...]

Esse trecho é, apenas, mais um exemplo da conhecida necessidade de cobertura

das deficiências do PO. Parte dessas deficiências é suprida pelas ações preventivas

de cunho social (Polícia Comunitária). Outra parte ainda carece de solução. Uma

das ferramentas disponíveis é o policiamento velado.

2 Diretriz do Comando-Geral nº 004, de 16 de junho de 2000.

21

Nesse sentido, Queiroz (2007, p. 2) coloca o PV como “um suporte

inteligente e eficaz em parceria ao policiamento ostensivo, capaz de transmitir

informações privilegiadas no momento ou até mesmo antes da consumação do

delito”.

4.4.1 Princípios norteadores do Policiamento Velado

A Diretriz Geral de Planejamento e Emprego da PMPR (2000, p. 36-37)

define os seguintes princípios norteadores para o Policiamento Velado (PV):

● Objetividade: o policial militar empregado em PV deve evitar desviar-se da

missão recebida.

● Sustentação: dado o alto risco do PV, é necessário que equipes de PO

estejam dando apoio aos policiais à paisana.

● Inferência: o policial deve deduzir informações a partir dos dados conhecidos.

● Oportunidade: a conveniência do emprego do PV deve ser determinada por

estudo criterioso da situação.

● Reconhecimento: os militares em PV devem ser reconhecidos por seus

comandantes e pelos colegas em PO, através de senhas e outras formas de

identificação.

A Diretriz de Inteligência nº 001/07 (DISTRITO FEDERAL, 2007a, p. 4), por

sua vez, prevê os seguintes princípios, e suas definições, para o PV:

1) Oportunidade – qualquer informação só tem validade se for oportuna. E,para ser oportuna, ela deve ser transmitida ao comandante imediato emprazo que possibilite o seu aproveitamento completo ou parcial para finsoperacionais.

2) Objetividade – a busca de informação operacional deve se desenvolvercom objetivos previamente definidos. O policial militar empregado noPoliciamento Velado deve saber exatamente que tipo de informação eleprecisa obter, e o que ele precisa descobrir.

3) Imparcialidade – para ser útil, a informação não deve conter opiniõespessoais com o objetivo de favorecer ou prejudicar interesses de terceiros.Deve ser imparcial em qualquer situação.

4) Segurança – obtida a informação desejada, esta só deve ser transmitidaàs pessoas que dela devam ter conhecimento e necessitem tomar decisões.

22

5) Amplitude – o teor da informação deve ser o mais completo possível,abrangendo tudo o que se relaciona com o fato ou situação que eladescreve.

6) Controle – todas as ações de Policiamento Velado devem ser praticadassob acompanhamento, adotando-se procedimentos próprios para cadacaso. O policial militar do Policiamento Velado deve seguir as orientaçõesdo serviço e não esquecer de que alguém comanda a operação e que elenão é capaz de fazer tudo sozinho.

7) Interação – nas ações do policiamento velado, a fim de desempenharmelhor as atividades, deve o policial buscar interagir com outros policiais epessoas, visando obter melhores dados para subsidiar a atividade.

4.4.2 Tipos de policiamento velado

A Diretriz Geral de Planejamento e Emprego da PMPR (2000, p. 37-38)

define três tipos de PV:

● Policiamento Precursor: colhe dados para o cumprimento de missão de tropa

ostensiva.

● Segurança de Dignitários: garante a integridade física de autoridades.

● Policiamento de Revestimento: durante as operações policiais, procura

proteger pontos vulneráveis deixados pelo PO.

Pretende-se abordar em estudo, em especial, o Policiamento Velado de

Revestimento.

4.4.3 Aplicabilidade

Deve-se, novamente, recorrer neste ponto ao 1º Tenente PMDF Fabrício

Raymundo (2007b, p. 5) para dizer que “a criminalidade ao ser “sufocada” em

determinado setor de policiamento tende a migrar, de maneira a seguir ocorrendo,

sendo executada e consumada em outros locais, nas lacunas onde o policiamento

preventivo não se encontra”. Cabe complementar que o PV não deve apenas atuar

em tais lacunas de tempo e lugar deixadas pelo PO, mas também em locais

cobertos pelo PO, agindo sobre crimes contra os quais este já se mostrou ineficaz.

23

A ação do PV deve visar, prioritariamente, “buscar o conhecimento da área

de atuação da fração [sic] policial militar” (DISTRITO FEDERAL, 2007a, p. 4), com o

intuito de fornecer ao comandante subsídios para o “eficiente e planejamento do

emprego racional dos meios” (ibidem, p. 4). Em segundo plano (ibidem, p. 7), o PV

tem como objetivo a realização de prisões em flagrante e a prestação de socorro,

“quando da impossibilidade de acionamento do PO” (ibidem, p. 6).

A missão secundária do PV se fundamenta do disposto no âmbito do art. 301

do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941): “Qualquer do povo pode e as

autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que se

encontre em flagrante delito.” (grifo nosso). O dispositivo legal é claro que

qualquer agente da autoridade policial tem a obrigação de realizar a prisão em

flagrante delito, sob pena de incorrer no crime de Prevaricação, previsto no art. 319

do Código Penal (BRASIL, 1940) e no art. 319 do Código Penal Militar (BRASIL,

1969).

4.4.4 O Policiamento Velado versus a investigação criminal

Versa o Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), em seu artigo 4º: “A

polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas

respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da

sua autoria” (grifo nosso). Portanto, pode-se definir a investigação criminal como o

conjunto de medidas tomadas pela polícia judiciária visando apurar autoria e

materialidade de crimes já consumados. Por outro lado, conforme já discutido, é

função do PV o fornecimento de informações para uma melhor aplicação do PO.

Ressalta Queiroz (2007, p. 8) que a polícia militar é única, não diferindo,

portanto, a missão do policiamento velado da executada pelo policiamento fardado.

Levando-se em conta que o PV deve repassar informações ao PO de forma a levar

à prisão em flagrante delito, a polícia judiciária “jamais poderia intervir ou tomar

partido, estando no interior de suas delegacias e possuindo missão constitucional

distinta” (ibidem, p. 8).

24

O Cel. PMDF Paulo Hirofumi, no parecer nº 023/2007 (DISTRITO FEDERAL,

2007b, p.10) é categórico ao concluir que o PV está compreendido na atuação

preventiva da Polícia Militar. Assim sendo, conclui também (ibidem, p. 10), que

[...] não há o que se falar em usurpação de função por parte dos policiaismilitares emprenhados no policiamento velado em detrimento dacompetência e atribuições da polícia judiciária, não se constatando qualqueração por parte daqueles milicianos que configurem aquelas descritas nosartigos 4º, 6º e 13 do Código de Processo Penal.

4.5 APLICAÇÃO OPERACIONAL DO POLICIAMENTO VELADO

4.5.1 O policial empregado em PV

As condições para a habilitação do policial militar ao policiamento velado

variam entre as corporações. Entretanto, são pontos pacíficos a irreparabilidade da

conduta do miliciano, bem como a exigência de certo tempo de serviço operacional

prévio e a rotatividade do efetivo empregado em PV.

No âmbito da PMPR, a Diretriz Geral de Planejamento e Emprego da PMPR

(PARANÁ, 2000, p. 37-38) prevê um período máximo de aplicação do Policial em PV

de 03 (três) anos. Tal miliciano deverá ser um Sargento em bom comportamento ou

Cabo/Soldado com mais de 05 (cinco) anos de serviço, há, no mínimo 03 (três) anos

em bom comportamento. Em adição, o candidato ao desempenho de PV não poderá

ter sido punido por transgressão disciplinar que afete a honra pessoal, o pundonor

militar ou o decoro da classe, nem ter sido condenado por sentença com trânsito em

julgado.

4.5.2 Fiscalização do PV

A fiscalização do PV também é ponto divergente entre as polícias militares.

Enquanto em alguns Estados ela ocorre pelos próprios setores de inteligência, em

25

outros ela é feita pelas Corregedorias ou pelo próprio oficial responsável pelo

policiamento da área.

Na Polícia Militar do Paraná, a Diretriz Geral de Planejamento e Emprego

(PARANÁ, 2000, p. 37) subordina tecnicamente o efetivo do PV às P/2 das

unidades, ficando, pois, a fiscalização a cargo destas.

4.5.3 Armamentos, equipamentos, aprestos e documentação

Os policiais militares lançados em PV (ibidem, p. 38) deverão

necessariamente estarem portando revólver ou pistola e usando a veste balística,

ambos de forma velada. Caso seja necessário o emprego de outro tipo de

armamento, o mesmo pode ser autorizado pelo oficial responsável.

A viatura empregada não poderá ter características que a identifiquem como

viatura policial. Todas as viaturas empregadas em PV deverão ser dotadas de rádio

comunicador e de luz intermitente vermelha escamoteável.

A documentação a ser empregada é a mesma utilizada pelo efetivo em PO:

bloco de notificações de trânsito, Boletim Único de Ocorrência e anexos.

4.5.4 Recomendações

A Polícia Militar do Estado de Minas Gerais elaborou a Cartilha do

Policiamento Velado, na qual, entre outras informações, traz inúmeras

recomendações aos policiais que, por ventura, forem designados para tal função.

À busca de informações, recomendam-se os seguintes meios (MINAS

GERAIS, 1990, p. 8-20):

– Observação: consiste no exame minucioso do ambiente e das pessoas que nele

se encontram.

– Memorização: deve acompanhar a observação, para ela sendo imprescindível a

concentração.

26

– Descrição: exposição das observações pessoais, que deve conter parâmetros

que possam ser verificados por outra pessoa.

– Reconhecimento: inspeção de espaços físicos.

– Vigilância: busca de informações através da manutenção de pessoas, objetos

e/ou locais sob constante observação.

– Entrevista: conversa mantida com o objetivo de angariar informações, que deve

ser meticulosamente preparada.

Dando continuidade, sugere-se a criação de história fictícia para preservar a

identidade do policial em PV (ibidem, p. 23-24). Tal história deve ser simples e

coerente com as características do policial e do ambiente. Outro cuidado a ser

tomado se refere à postura do policial (ibidem, p. 25). Este deve evitar se manter em

posições típicas entre militares (como manter os braços atrás ou à frente do corpo),

bem como evitar o emprego de jargões policiais.

A Diretriz Geral de Planejamento e Emprego da PMPR, por sua vez,

apresenta outras recomendações. A mais veemente delas é a “necessidade de

instrução específica para assegurar a eficiência, eficácia e a efetividade dessa

atividade” (PARANÁ, 2000, p. 39). Igualmente prega a aplicação, no que for

pertinente, de todos os princípios do PO ao PV.

Outra recomendação veemente é a conscientização de que o PV se trata de

esforço coletivo. Desta forma, ninguém dispenderá esforço isolado, nem agirá por

decisão ou conveniência pessoais (ibidem, p. 37).

4.6 EMBASAMENTO LEGAL DO POLICIAMENTO VELADO

A Constituição Federal de 1988 trata da segurança pública no Capítulo III de

seu Título V, sob a égide do art. 144. O caput do referido artigo pode ser dividido em

duas partes. A primeira afirma que a segurança pública é “dever do Estado, direito e

responsabilidade de todos” (CF, art. 144), deixando claro que cada cidadão tem uma

parcela de responsabilidade sobre ela. A segunda parte estabelece os objetivos da

segurança pública: “a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas

e do patrimônio”.

27

De acordo com Valla (2004, p. 3-4), a preservação da ordem pública seria a

“convivência pacífica e harmoniosa da população, fundada nos princípios éticos

vigentes na sociedade”. Também segundo Valla (2004, p. 4), a preservação da

ordem pública engloba ações preventivas e repressivas.

Voltando ao texto do art. 144 da CF/88, em específico aos seus §§5º e 6º,

definem-se as missões específicas das Polícias Militares e dos Corpos de

Bombeiros Militares. O §6º trata da subordinação operacional das Polícias e Corpos

de Bombeiros militares, não sendo, portanto, escopo do presente estudo. Conforme

o §5º do art. 144 da CF/88 às Polícias Militares (PMs), cabem:

- a polícia ostensiva; e

- a preservação da ordem pública.

No tocante às Polícias Civis, a CF/88 a elas atribui, no disposto no §4º, as

funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais.

Álvaro Lazzarini (1989), Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo e referência nacional no ramo do Direito Administrativo, é categórico ao

afirmar que as atividades de polícia judiciária se iniciam após a prática do delito e

após a repressão imediata, a cargo da polícia administrativa (Polícias Militares).

Continuando na linha de idéia de Lazzarini3 (apud MORAES, 1991, p. 23), não é

competência da Polícia Civil a investigação antes do crime, sendo esta requisito

para o PO. Devem, ainda, as Polícias Militares, para se adiantarem à delinquência,

usar todos os meios possíveis e lícitos no combate à criminalidade. Queiroz (2007,

p.2) reafirma o supracitado, lembrando que a administração policial-militar deve

seguir os princípios constitucionais da finalidade e da eficiência/eficácia no

desenvolvimento de suas ações.

Ainda consoante com Lazzarini (1989), cabem às PMs todas as atividades

de segurança pública não atribuídas a outro órgão, compondo a chamada

competência residual das Polícias Militares.

Em adição a isso, vale a doutrina dos poderes implícitos, de validade

universal. Boa definição dela foi dada pelo Desembargador Pedro Gagliardi, em

Acórdão da Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (SÃO

PAULO, 2001, p. 4): “Por ela se compreende que é atribuída a alguém a consecução

3 LAZZARINI, Álvaro. Da Segurança Pública na Constituição Federal de 1988. Revista de

Informação Legislativa. Brasília, ano 26, nº 104, dezembro/1989.

28

de um fim. Daí decorre necessariamente que lhe coloquem à disposição os meios

para tanto”.

O Decreto-Lei nº 667, de 2 de julho de 1969, trata das Policias Militares e

dos Corpos de Bombeiros Militares. Em seu art. 3º, discorre acerca das

competências das PMs, afirmando, em sua alínea c) que as PMs devem atuar de

maneira repressiva em caso de perturbação da ordem, deixando em aberto os meios

a serem empregados.

Deve-se abordar no presente estudo, também, o Regulamento para as

Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares (R-200), definido no Decreto nº

88.777, de 30 de setembro de 1983. O caput do art. 33 do R-200 (BRASIL, 1983)

diz: “A atividade operacional policial-militar obedecerá o planejamento que visa,

principalmente a manutenção da ordem pública nas respectivas Unidades

Federativas”. Novamente, a norma é branca no que tange os meios a serem

empregados.

Isto posto, torna-se evidente que não existe disposição legal, constitucional

ou infraconstitucional, contrária à utilização do PV por parte das PMs, vez que o

mesmo visa reprimir infrações penais que não puderam, ou não poderiam, ser

evitadas, caracterização da repressão imediata, definida por Lazzarini (1989) e por

ele atribuída às Polícias Militares.

Ainda nesse sentido, o Desembargador Pedro Gagliardi relatou no mesmo

acõrdão (SÃO PAULO, 2001, p. 3) que “inexiste qualquer norma que impeça as

corporações militares destinarem alguns de seus componentes no exercício de

algumas funções em trajes civis, como nós chamamos “Serviço Reservado””.

29

5 METODOLOGIA

Visando aos objetivos específicos, e seguindo a classificação proposta por

Appolinário (2004, p. 151), adotou-se uma pesquisa aplicada, descritiva e

transversal, de natureza qualitativa. A pesquisa adotada colheu dados em campo e

na bibliografia.

Para o cumprimento do primeiro objetivo específico (embasar legal e

doutrinariamente o emprego do Policiamento Velado (PV) por parte das polícias

militares (PMs)), utilizou-se a pesquisa bibliográfica em estudos e publicações

especializados na área de Segurança Pública.

Para expor as dificuldades do Policiamento Ostensivo (PO) como ferramenta

de repressão criminal e revelar os delitos contra os quais a aplicação do PO torna-se

mais vulnerável foi usada a técnica de grupo focal. A escolha de tal técnica vai ao

encontro da idéia de Gatti (2005, p. 9) de que o grupo focal “permite fazer emergir

uma multiplicidade de pontos de vista e processos emocionais, pelo próprio contexto

de interação criado”. Ademais, a interação grupal pode romper a barreira de

amaneiramento gerada pelo caráter militar da instituição em foco, gerando respostas

mais sinceras, e, portanto, mais confiáveis, que aquelas provenientes uma interação

mais individualizada, a exemplo da entrevista, novamente em consonância com Gatti

(2005, p. 11).

O grupo focal usado para atingir os dois objetivos citados no parágrafo

anterior foi composto por policiais das Rondas Tático Motorizadas (ROTAM) do 12º

Batalhão de Polícia Militar (BPM). Escolheu-se um pelotão de ROTAM como grupo

de pesquisa por se tratar da máxima ostensividade de policiamento encontrada em

um batalhão de área (pois, via de regra, emprega viaturas de grande porte, de cor

clara, facilmente avistadas a longa distância) e por ser o tipo de policiamento

ostensivo de caráter mais repressivo. A escolha do 12º BPM como escopo do estudo

se deve às características de sua área de atuação: extremamente heterogênea,

cobrindo áreas de comércio (Centro e Santa Felicidade), de diversão noturna (Batel

e Largo da Ordem, por exemplo), de moradias de alto padrão (Bigorrilho, Mercês,

Mossunguê, Ecovilleetc.) e de grandes áreas de invasão e bolsões de pobreza

(Parolin, Vila Torresetc.). Os policiais selecionados trabalham em equipes diferentes,

seguindo a recomendação de “não se juntar no mesmo grupo pessoas que se

30

conhecem muito” (GATTI, 2005, p. 21), pois podem tomar atitudes que

“monopolizam ou paralisam a discussão, o que prejudica a interação mais

livre” (ibidem, p. 21). Para possibilitar tal condição, o grupo foi composto por oito

policiais, acima da dimensão mínima de seis integrantes indicada por Gatti (2005, p.

22).

Visando a identificar as dificuldades encontradas nas operações de PV e a

verificar o grau de eficácia da aplicação do PV em apoio na repressão aos crimes

contra os quais é ineficaz a atuação isolada do PO, também foi usada a técnica de

grupo focal, já que se trataram dados e fonte de mesmas características que os

citados anteriormente.

Esse grupo focal foi formado por policiais do Grupo Tático Velado (GTV) do

Comando do Policiamento da Capital (CPC) da Polícia Militar do Paraná. A escolha

pelo GTV se justifica por este possuir caráter essencialmente repressivo. Por sua

vez, a opção pelo CPC se fez devido à sua área de atuação (Curitiba e toda a sua

região metropolitana) e ao seu nível de organização (leia-se efetivo, administração e

recursos), maior que nos batalhões operacionais. Na pesquisa, foi dimensionado

grupo composto por seis policiais, a dimensão mínima estipulada por Gatti (2005, p.

22).

5.1 PROCEDIMENTOS PARA PESQUISA DE CAMPO

5.1.1 Rondas Tático Motorizadas – 12º BPM

O encontro do Grupo Focal nº 1 foi realizado em 30 de agosto de 2010, no

período aproximado das 20h30min às 21h30min. O local escolhido foi a sala das

Rondas Tático Motorizadas, na sede do 12º Batalhão de Polícia Militar. O roteiro

adotado foi o constante no Apêndice A.

Compuseram o grupo o 1º Ten. QOPM Gildo Cézar dos Santos Lima,

comandante da ROTAM/12º BPM, acompanhado por sete praças. Como mais uma

forma de romper o amaneiramento próprio do ambiente castrense, foi proposto

anonimato para as praças participantes. Assim, adotaram-se os pseudônimos

31

Ayrton, Bruno, Carlos, Diogo, Emanuel, Felipe e Gustavo para os outros sete

componentes.

5.1.2 Grupo Tático Velado

O Grupo Focal nº 2, por sua vez, se realizou entre as 18h e as 19h45min do

dia 30 de agosto de 2010. Foi escolhido como local a sede do Grupo Tático Velado

(GTV) do Comando do Policiamento da Capital (CPC), sito no interior do

aquartelamento do Regimento de Polícia Montada Coronel Dulcídio. O roteiro

adotado foi o disposto no Apêndice B.

Fizeram parte do Grupo Focal nº 2 o 1º Ten. QOPM Izoel Pavan de Souza,

comandante do GTV/CPC e cinco praças. Analogamente ao Grupo Focal nº 1, foi

prometido anonimato aos participantes. Desta forma, foram empregados os

pseudônimos Heitor, Ivan, João, Kevin e Marcelo.

32

6. RESULTADOS

6.1 RONDAS TÁTICO MOTORIZADAS – 12º BPM

O Grupo Focal nº 1 foi iniciado com breve explanação acerca do presente

estudo, após a qual foram repassadas orientações sobre os procedimentos a serem

adotados durante o encontro, de forma a deixar claro serem necessárias a

sinceridade e a veracidade das informações repassadas.

O tema despertou o interesse de todos os presentes. Em especial do 1º Ten.

Lima e de Ayrton, que trabalharam no extinto Grupo Tático Reservado (GTR),

subordinado ao 12º BPM. De acordo com explicação do primeiro, o GTR

desencadeava ações policiais veladas, essencialmente repressivas, contra o tráfico

de entorpecentes e contra a receptação de veículos automotores furtados/roubados.

De acordo com Ayrton, o grupo obteve enorme sucesso, mas acabou

desestruturado.

Proposto para que falassem sobre o número de abordagens realizadas por

turno de serviço, Emanuel afirmou não ser possível afirmar ao certo, pois dependia

muito do turno. Diogo o complementou, dizendo que em um turno regular, sem que

fossem feitas abordagens a bares ou efetuadas prisões em flagrante, cada equipe

faz, em média, dez abordagens. Para esse número, considerou-se o número de

vezes que a equipe desembarca da viatura com o intuito de realizar procedimento de

abordagem policial, independentemente do número de pessoas envolvidas.

Proposta discussão sobre as reações dos suspeitos ao avistarem a viatura

da Polícia Militar (PM), acabou-se por criar um clima de sarcasmo e desaprovação.

Conforme já esperado, Bruno afirmou que os criminosos têm reações que variam

entre a tentativa de fuga, a tentativa de desmaterializar o crime, ao tentar se ver livre

do objeto que caracteriza sua conduta delituosa, ou, em último lugar, o confronto

armado. Diogo lembrou-se, então, dos procedimentos mais comuns entre os

meliantes como esconder drogas e/ou armas em locais próximos ou, no caso do

tráfico de entorpecentes, portar pequenas quantidades, de forma a se fazer passar

por usuários.

33

Aproveitando o momento, inverteu-se a ordem dos tópicos, passando-se,

então, para as formas utilizadas para contornar tais dificuldades. O 1º Ten. Lima

afirmou que, na maioria das vezes, tenta-se compensar a ostensividade através de

uma ação rápida e que cause surpresa no abordado. Ayrton lembrou que muitas

vezes são feitas progressões a pé, de forma a aumentar o efeito surpresa. Lembrou,

também, que, em abordagens a grande número de pessoas, são utilizadas outras

equipes em apoio, como o intuito de evitar a fuga.

Voltando ao assunto, então, passou-se a falar acerca das dificuldades

criadas pela ostensividade. Em consequência, as mesmas respostas anteriores, de

quando se falou sobre as reações dos criminosos ao avistarem a viatura PM. Falou-

se, outrossim, no emprego de olheiros por parte dos criminosos, especialmente nas

proximidades dos pontos de tráfico de entorpecentes (as chamadas “bocas-de-

fumo”). De acordo com Felipe, portanto, a ostensividade torna praticamente

impossível a prisão em flagrante. Segundo ele, na grande maioria das vezes só há o

flagrante por conta de um descuido por parte do criminoso.

Indagados sobre os crimes contra os quais a repressão ostensiva se mostra

mais ineficaz, as respostas foram unânimes: tráfico de drogas, em especial as

comercializadas em pequenas dimensões, como o crack e a cocaína, receptação de

produtos furtados e roubados e a posse ilegal de armas de fogo.

Quanto às vantagens que seriam trazidas pelo emprego do PV nos casos

supracitados, todos concordaram que aumentaria enormemente o número de

prisões em flagrante delito.

Ayrton fez algumas ressalvas. Segundo ele, deveria ser composto grupo

especial de policiamento velado, voltado exclusivamente à repressão, a exemplo do

Grupo Tático Velado (GTV) do Comando do Policiamento da Capital (CPC) e do

extinto GTR. Tal grupo deveria trabalhar em conjunto com as ROTAM dos batalhões,

a exemplo do que ocorre na Companhia de Polícia de Choque (Cia. P Chq.).

Segundo o policial militar, nesta, a seção de inteligência repassa informações

diretamente para a atividade operacional, fazendo uso até mesmo de escutas

telefônicas para isso.

Nesse sentido, os dois policiais militares fizeram uma crítica à

compartimentação das informações. De acordo com eles, não há compartilhamento

entre as informações levantadas pela inteligência da Polícia Militar, as da Polícia

Civil e de outros órgãos, como o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime

34

Organizado (GAECO) do Ministério Público (MP). Muitas vezes, inclusive, não há

compartilhamento de informações dentro da própria PMPR. Para eles, além da

criação do grupo mencionado anteriormente, este deveria ter acesso às informações

de outros órgãos, especialmente no tocante a escutas telefônicas.

Em conclusão, o 1º Ten. Lima afirmou que havendo um grupo velado em

trabalho direto com as ROTAM dos batalhões de área, devidamente estruturado e

em contato com outros órgãos, haveria um enorme salto na repressão às atividades

criminosas.

6.2 GRUPO TÁTICO VELADO – COMANDO DO POLICIAMENTO DA CAPITAL

O Grupo Focal nº 2 foi iniciado com breve explanação acerca do presente

estudo, após a qual foram repassadas orientações sobre os procedimentos a serem

adotados durante o encontro, de forma a deixar claro serem necessárias a

sinceridade e a veracidade das informações repassadas.

O primeiro tópico de discussão tratava das técnicas empregadas durante a

realização de abordagem policial por parte de grupo velado. Nesse ponto, o 1º Ten.

Izoel frisou que a abordagem policial deve ser realizada por grupos velados somente

em último caso, sob pena de denunciar a equipe. Em casos cotidianos, a equipe

deve chamar apoio da viatura ostensiva da área. No caso de ser realizada a

abordagem, é feito grande trabalho de identificação, através do uso de giroflex

móvel na viatura, da verbalização e do uso de coletes e distintivos com o brasão da

Polícia Militar do Paraná (PMPR).

Acerca dos tipos penais contra os quais cotidianamente atuam, houve certa

divergência. Nos dias atuais, o GTV atua, apenas, em repressão a roubos a

transportes coletivos e no interior desses veículos. Segundo João, no entanto,

muitas vezes, as equipes acabam chegando a receptadores e traficantes

relacionados aos crimes mencionados. Marcelo, então, lembrou-se de que até

alguns anos atrás, o GTV agia livremente, contra inúmeros outros delitos, em

especial o tráfico de drogas e o porte ilegal de armas de fogo.

A grande vantagem do emprego do PV, citada por João, é o efeito surpresa

da ação policial. Heitor afirmou que em todos os flagrantes presenciados por ele até

35

o momento, era possível ler o terror e o espanto na expressão facial dos detidos. Os

recursos de dissimulação empregados e a especialização dos policiais nesse tipo de

serviço fazem com que os agentes nunca tenham sido descobertos durante ações.

Duas grandes desvantagens foram citadas pelo 1º Ten. Izoel. A primeira, a

grande insegurança no decorrer das ações. Qualquer deslize da equipe velada em

avisar de suas ações, ou de alguma equipe ostensiva que as desconheça pode

resultar em tragédia. A outra desvantagem está relacionada com a enorme

proximidade do PV com a atividade delituosa. Como o serviço velado ocorre com

menor fiscalização e de forma obviamente discreta, é mais fácil para um policial com

desvio de conduta ceder à corrupção. Neste ponto, já se começou a traçar o perfil do

policial do PV.

Kevin pontuou, por sua vez, que o PV, apesar do que parece, cria uma

aproximação da comunidade e do comércio. Essas pessoas ainda dão mais

informações aos policiais à paisana por não se sentirem intimidados pela farda. Além

disso, é um serviço extremamente gratificante para os policiais militares, que vêm,

de imediato, o resultado de seu trabalho.

Ao se levantar a questão dos crimes contra os quais o emprego do PV é

mais eficiente que o PO, houve uma curiosa reação. Enquanto alguns murmuravam

respostas inaudíveis ou olhavam para baixo, Ivan, que até então se mantivera

calado, levantou-se e me perguntou se eu realmente queria ver o resultado dos

trabalhos do GTV. Ao meu assentimento, levantou-se e retirou de um dos armários

da sala um caderno. Este era usado para o registro de súmulas de ocorrências

atendidas. Ao abrir, deparei com um caderno de 250 folhas contendo em cada linha

uma ocorrência diferente em que houve apreensão de arma (ou armas) de fogo.

Conforme Ivan, no tempo em que o GTV agia contra outros delitos, o grupo

apreendeu, proporcionalmente ao efetivo empregado, muito mais armas e drogas

que as equipes da Cia. P Chq.

Após o incidente, os demais participantes do grupo citaram praticamente os

mesmos delitos citados pelo grupo focal nº 1: tráfico de drogas, receptação de

produtos e veículos furtados ou roubados, posse e porte ilegal de armas de fogo,

adicionados aos crimes relacionados aos transportes coletivos.

Ao serem questionados se qualquer policial seria capaz de desenvolver com

êxito o PV, o 1º Ten. Izoel, juntamente com João, Kevin e Marcelo, assentiram. Os

demais não se manifestaram. O primeiro apenas ressaltou que é necessário um

36

estágio básico, para que o policial do PO perca vícios e trejeitos próprios da

profissão, além de adquirir experiência no trabalho velado. Ressaltou igualmente

que o policial a ser aplicado no PV deve ser extremamente íntegro e de

personalidade forte, devido à demasiada proximidade com a atividade delituosa, já

citada. Outro ponto crucial do policial do PV é o voluntariado. Por se tratar de serviço

muito arriscado e delicado, é impossível trabalhar com policiais que não gostem do

serviço.

Aproveitando o tópico, foi ventilada a possibilidade de criação de um Curso

de Policiamento Velado. O 1º Ten. Izoel disse ser possível e interessante, mas que,

mesmo assim, o estágio seria imprescindível. Explicando-se que tal curso visaria a

aplicar ocasionalmente policiais-militares do PO em PV, houve reação mista. João

afirmou que se tratava de idéia interessante sob o ponto de vista da otimização do

emprego do efetivo. O 1º Ten. Izoel, por sua vez, afirmou que a idéia deveria ser

estudada com cautela. Em primeiro lugar, o policial-militar deveria ser empregado

em PV em área diferente da que trabalha usualmente. Em segundo lugar, deveriam

ser respeitados os critérios de integridade moral e de voluntariado citados

anteriormente. Por fim, não se deveriam misturar esses policiais ao efetivo que

trabalha usualmente no PV, para não comprometer o entrosamento. Concluiu

afirmando que é uma idéia aplicável no âmbito das companhias, salientando que se

deve prezar pela qualidade em detrimento à quantidade de policiais empregados.

Em conclusão ao encontro, Kevin sugeriu, como forma de melhorar a

empregabilidade do PV, a realização de maior número de estudos sobre o assunto.

João, por sua vez, sugeriu maior reconhecimento ao serviço prestado pelos grupos

velados e maior apoio ao serviço desenvolvido, através de convênios com outros

órgãos, citando o exemplo da P/2 da Cia. P Chq., que, através de contato com o

GAECO, consegue informações provenientes de escutas telefônicas, resultando em

grande número de prisões. O 1º Ten. Izoel mais uma vez frisou a necessidade de se

primar pela qualidade sobre a quantidade.

37

7. CONCLUSÃO

A Polícia Militar do Paraná (PMPR) teve participação ativa em todos os

grandes acontecimentos históricos do Estado do Paraná. Isso de deve ao fato de

que a Corporação sempre desempenhou aquilo que lhe foi designado com extrema

competência.

A preservação da ordem pública nos foi incumbida, sendo enfatizado o

policiamento ostensivo fardado. Do policiamento preventivo de presença, evoluímos

para a Polícia Comunitária, que procura, dentro das possibilidades da PMPR,

prevenir a criminalidade na raiz social da mesma. Entretanto, pouco se fez para o

desenvolvimento de tipos alternativos de policiamento, que visem a reprimir o crime

que não pôde ser prevenido.

O policiamento ostensivo (PO), apesar de efetivo para muitos casos,

apresenta sinais de grande ineficácia, conforme o apresentado pela revisão

bibliográfica e confirmado pelas pesquisas de campo. Tal ineficácia é, de certa

forma, natural, visto que o PO foi concebido como uma ferramenta de prevenção, e

não de repressão.

Dessa forma, os delinquentes se valem das fraquezas do policiamento e das

lacunas trazidas por nossos dispositivos legais para driblarem a fiscalização policial.

As ações criminais que mais se beneficiam desses subterfúgios são o tráfico de

drogas, o furto/roubo de bens, posse e porte ilegal de armas de fogo e crimes

relacionados a transportes coletivos.

Conforme provado através das palavras de renomado doutrinador do direito

administrativo Álvaro Lazzarini, o PV está compreendido na missão residual das

Polícias Militares, não se tratando, portanto, de usurpação de função das polícias

judiciárias (Polícias Civis e Polícia Federal), às quais cabem a apuração de infrações

penais, com o intuito de se subsidiar o processo penal com autoria e materialidade.

Dentre as alternativas apresentadas, o emprego do Policiamento Velado

(PV), em apoio ao PO, mostrou-se a mais promissora. Isso se provou durante a

realização de pesquisa de campo junto ao Grupo Tático Velado (GTV) do Comando

do Policiamento da Capital (CPC). O efeito surpresa de uma ação desencadeada

através do PV neutraliza os subterfúgios usados pelos criminosos. A citação do

sucesso no emprego do extinto Grupo Tático Reservado (GTR) do 12º BPM, bem

38

como a suposição de que o GTV, quando atuava mais livremente, teve,

proporcionalmente ao efetivo empregado, maiores índices de apreensão de armas

que as equipes das Rondas Ostensivas de Natureza Especial (RONE) da Cia. P.

Chq. carecem de fontes formais. Entretanto, servem como parâmetro para se

aferirem a eficiência do PV e o grande nível de gratificação trazido pelo serviço.

No entanto, é necessária cautela no emprego do PV. Conforme evidenciado

pela mesma pesquisa de campo, os policiais devem ter moral excepcionalmente

íntegra, devido à enorme proximidade com as atividades delituosas e à

relativamente pequena fiscalização in loco exigida pelo serviço. Em adição a isso, é

necessário cuidadoso planejamento junto às equipes do PO, para que não se

exponham as equipes de PV de forma desnecessária.

A pesquisa de campo comprovou a necessidade da difusão da doutrina de

PV. Muitos policiais-militares ainda confundem a atividade de inteligência com PV. A

associação do PV com o trabalho desenvolvido pela P/2 da Cia. P Chq., trazida por

duas vezes à tona durante as discussões, é um excelente exemplo dessa confusão

de conceitos.

Outra doutrina que aparentou carente entre a tropa diz respeito à legalidade

dos métodos para a obtenção de informações. Por exemplo, o uso de escutas

telefônicas, citado algumas vezes, acaba barrado no sigilo de justiça sob o qual as

escutas devem se proceder.

Isto posto, espera-se que a Polícia Militar do Paraná se valha não só desta

ferramenta, mas de tantas outras embasadas cientificamente, para melhor cumprir a

sua missão constitucional. O dinamismo do serviço policial-militar e o consequente

uso de novas ferramentas são imprescindíveis para que nossa Corporação continue

sua história de glórias e grandes feitos prestados à Pátria-mãe e à sociedade

paranaense.

39

REFERÊNCIAS

ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. São Paulo:Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2007. Disponível em:<http://www.forumseguranca.org.br/institucional/wp-content/uploads/2009/01/anuario_completo.pdf>. Acesso em: 23 out. 09.

ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. São Paulo:Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2008. Disponível em:<http://www.forumseguranca.org.br/institucional/wp-content/uploads/2009/01/anuario-2008-fbsp.pdf>. Acesso em: 23 out. 09.

ANUÁRIO DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. São Paulo:Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2009. Disponível em:<http://www.forumseguranca.org.br/institucional/wp-content/uploads/2009/01/anuario_2009.pdf>. Acesso em: 23 out. 09.

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BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de ProcessoPenal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 29 abr. 09.

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar.Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del1001.htm>.Acesso em: 7 jul. 09.

BRASIL. Decreto nº 88.777, de 30 de setembro de 1983. Aprova o Regulamentopara as polícias militares e corpos de bombeiros militares (R-200). Disponívelem: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D88777.htm>. Acesso em: 7 abr.09.

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DISTRITO FEDERAL. Polícia Militar do Distrito Federal. Centro de Inteligência.Diretriz de Inteligência nº 001/07. Emprego do Policiamento Velado. Brasília,2007a.

DISTRITO FEDERAL. Polícia Militar do Distrito Federal. Corregedoria da PolíciaMilitar. Parecer nº 023/07. Exercício da Atividade de Policiamento Velado.Brasília, 2007b.

GATTI, Bernardete Angelina. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais ehumanas. Brasília/DF: Liber Livro, 2005.

LAZZARINI, Álvaro. Da Segurança Pública na Constituição Federal de 1988.Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 26, nº 104, dezembro/1989.

MANOEL, Élio de Oliveira. Policiamento ostensivo com ênfase no processomotorizado. Curitiba-PR: AVM, 2004.

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MORAES, Iberê Índio do Brasil Pereira. O policiamento velado como elemento deapoio ao policiamento ostensivo na contenção da criminalidade. Niterói, RJ:1991.

PARANÁ. Polícia Militar do Paraná. Terceira Seção do Estado Maior. Diretriz nº004/2000, de 16 de junho de 2000. Diretriz Geral de Planejamento e Emprego daPMPR.

PARANÁ. Secretaria de Estado de Segurança Pública. Relatório EstatísticoCriminal – 2007. Curitiba, 2008.

PARANÁ. Secretaria de Estado de Segurança Pública. Relatório EstatísticoCriminal – 2008. Curitiba, 2009a.

PARANÁ. Secretaria de Estado de Segurança Pública. Relatório EstatísticoCriminal 1º Trimestre – 2009. Curitiba, 2009b.

41

PARANÁ. Secretaria de Estado de Segurança Pública. Relatório EstatísticoCriminal 2º Trimestre – 2009. Curitiba, 2009c.

QUEIROZ, Erick Nunes. Levantamento técnico sobre a atividade dePoliciamento Velado. Brasília: 2007.

RAYMUNDO, Fabrício de Andrade. Ostensividade x migração do crime: o quefazer?. Brasília/DF, 2007a. Disponível em:<http://www.forumseguranca.org.br/artigos/ostensividade-x-migracao-do-crime-o-que-fazer-1>. Acesso em: 5 out. 09.

RAYMUNDO, Fabrício de Andrade. Policiamento Velado: de reforço nopoliciamento à necessidade pública. Brasília/DF, 2007b. Disponível em:<http://www.forumseguranca.org.br/download_documento_documentos/1187833417_ensaio__policiamento_velado__ci.pdf>. Acesso em: 6 out. 09.

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SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Habeas Corpus nº339.715.3/1-00 da 2ª Vara Criminal da Comarca de Taubaté, São Paulo, SP, 22 defevereiro de 2001.

SUN TZU. A arte da guerra. Tradução de Sueli Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM,2002. 152p.

VALLA, Wilson Odirley. Doutrina de emprego de Polícia Militar e Bombeiro Militar. 2.ed. Curitiba-PR: AVM, 2004. 234p.

42

APÊNDICE A – ROTEIRO PARA GRUPO FOCAL Nº 1

Duração: encontro único, com duração aproximada de 60 minutos.

Tópicos introdutórios:

● Agradecimento pela cooperação de todos.

● Justificativa da pesquisa:

▪ O crescimento do crime organizado.

▪ A necessidade do investimento em inovações técnicas e táticas.

● Objetivo da pesquisa: expor a eficácia do policiamento velado (PV) como

ferramenta de contenção da criminalidade.

● Explicar os procedimentos a serem adotados durante o encontro.

● Explicar a importância da participação na pesquisa.

● Ressaltar o caráter sigiloso dos dados obtidos em pesquisa e a necessidade

da sinceridade durante a discussão.

● Expor o porquê de ser aquele o grupo selecionado.

Tópicos específicos:

● Número estimado de abordagens realizadas por turno de serviço.

● Reação de marginais ao perceberem a aproximação de viatura da Polícia

Militar em patrulhamento.

● Dificuldades encontradas na repressão a crimes devido à ostensividade.

● Crimes contra os quais essas dificuldades se mostram mais acentuadas.

● Formas usualmente usadas para contornar tais dificuldades.

● Vantagens e desvantagens de uma possível aplicação de grupo velado para a

repressão dos crimes anteriormente citados.

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APÊNDICE B – ROTEIRO PARA GRUPO FOCAL Nº 2

Duração: encontro único, com duração aproximada de 60 minutos.

Tópicos introdutórios:

● Agradecimento pela cooperação de todos.

● Justificativa da pesquisa:

▪ O crescimento do crime organizado.

▪ A necessidade do investimento em inovações técnicas e táticas.

● Objetivo da pesquisa: expor a eficácia do policiamento velado (PV) como

ferramenta de contenção da criminalidade.

● Explicar os procedimentos a serem adotados durante o encontro.

● Explicar a importância da participação na pesquisa.

● Ressaltar o caráter sigiloso dos dados obtidos em pesquisa e a necessidade

da sinceridade durante a discussão.

● Expor o porquê de ser aquele o grupo selecionado.

Tópicos específicos:

● A formas de abordagem policial e identificação utilizadas pelos grupos

velados.

● Tipos penais contra os quais cotidianamente atuam.

● Vantagens encontradas pelo grupo no desenvolvimento da atividade policial

repressiva velada contra tais crimes.

● Desvantagens encontradas pelo grupo no desenvolvimento da atividade

policial velada.

● Apontamentos do grupo quanto ao emprego do PV no combate a crimes

contra os quais o PO é ineficiente.

● Qualquer policial é capaz de desenvolver com êxito uma ação policial velada?

Requisitos para que isso seja uma verdade.

● Sugestões para melhorar a empregabilidade do PV.