O Portador - Antonio Candido

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    O Portador

    Antonio Candido

    Resumo:Artigo publicado em 1946, no Dirio de So Paulo, O Portador um dos marcos da recepo

    de Nietzsche no Brasil. Nele, o autor apresenta a filosofia nietzschiana como aquela que possibilita meios

    ou instrumentos para uma nova concepo do humano.

    Palavras-chaveNietzsche,moral,homem,tcnicas de pensamento,portador.

    preciso afastar, em relao a pensadores como Nietzsche, o conceito de guerrapropagandstico ou

    ingnuo, que o encara como uma espcie de Rosenberg mais fino e procura ver no seu pensamento o

    precursor do nazismo. Esse antipangermanista convicto deve ser considerado o que realmente : um dos

    maiores inspiradores do mundo moderno, cuja lio, longe de exaurida, pode servir de guia a muitos

    problemas do humanismo contemporneo.

    Mesmo rejeitando o contedo das ideias, devemos reter e ponderar a sua tcnica de pensamento, como

    propedutica superao das condies individuais. O homem um ente que deve ser ultrapassado,

    disse ele; e o que prope ultrapassar incessantemente o ser de conjuntura, que somos num dado

    momento, a fim de buscar estados mais completos de humanizao. Talvez pudssemos indicar os rumos

    da sua propedutica, dizendo que visa a uma expanso mais completa das energias de que somos

    portadores, e nesse sentido elucidativa a preocupao de ascese, de exerccio preparatrio, que

    atravessa toda a sua obra. Por isso invoca ou sugere uma certa dureza e a abolio da

    autocomplacncia: ver duro e cru, em si e nos outros, para ser capaz de ver justo e bom, posto que

    justia e bondade repousam sobre a energia com que superamos as injunes, as normas cristalizadas,

    tudo enfim que tende a imobilizar o ser em posies j atingidas e esvaziadas de contedo vivo. O que tacitamente aceito por ns; o que recebemos e praticamos sem atritos internos e externos, sem ter sido

    por ns conquistado, mas recebido de fora para dentro, como algo que nos foi dado; so dadosque

    incorporamos rotina, reverenciamos passivamente e se tornam peias ao desenvolvimento pessoal e

    coletivo. Ora, para que certos princpios, como a justia e a bondade, possam atuar e enriquecer,

    preciso que surjam como algo que obtivemos ativamente a partir da superao dos dados. Obtm a ti

    mesmo o conselho nietzschiano que o velho Egeu d ao filho, no Teseu, de Gide. Para essa

    conquista das mais ldimas virtualidades do ser que Nietzsche ensina a combater a complacncia, a

    mornido das posies adquiridas, que o comodismo intitula moral, ou outra coisa bem soante. Na sua

    concepo h uma luta permanente entre a vida que se afirma e a que vegeta; parecia-lhe que esta era

    acorooada pelos valores rotineiros da civilizao crist e burguesa.Realmente, se submetermos anlise rigorosa a maneira que damos abrigo aos valores espirituais,

    veremos que em nossa atitude h mais de comodismo e flacidez moral do que propriamente crena ativa

    e fecunda. Aceitamos por via de integrao, participao submissa no grupo, tendendo a transformar os

    gestos em simples repetio automtica. E fazemos isso para evitar as aventuras da personalidade, as

    grandes cartadas da vida, julgando pr em prtica valores conquistados por ns mesmo. Ora, a obra de

    Nietzsche nos pretende sacudir, arrancar deste torpor, mostrando as maneiras pelas quais negamos cada

    vez mais a nossa humanidade, submetendo-nos em vez de nos afirmarmos. Encarada assim, a exaltao

    do homem vitale sem preconceitos vale, de um lado, como reivindicao da complexidade do homem,

    contra certas verses racionalistas e simplificadoras.

    Com efeito, ele afirma longamente em sua obra (de modo quase sistemtico na primeira parte de Alm do

    bem e do mal, por exemplo) que o homem mais complexo do que supem as normas e convenes.

    http://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/Nietzschehttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/Nietzschehttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/moralhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/homemhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/t%C3%A9cnicas%20de%20pensamentohttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/portadorhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/portadorhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/t%C3%A9cnicas%20de%20pensamentohttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/homemhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/moralhttp://www.cadernosnietzsche.unifesp.br/pt/home/itemlist/tag/Nietzsche
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    Bem antes das modernas correntes da psicologia, assinalou a fora e importncia dos impulsos de

    domnio e submisso, concluindo que h em ns um animal solto que tambm compe a personalidade e

    influi na conduta. Naquela obra, insiste sobre a presena no tecido da vida humana, dessas componentes

    que a moral e a conveno procuram eliminar, depois de as haverem condenado.

    A sua teoria da conscincia como superfcie, afloramento de obscuridades que no se pressentem,

    anuncia a psicanlise, como podemos ver nas longas exposies da Vontade de poderio. Sob este

    ngulo, e apesar do desvirtuamento da expresso, o super-homem aparece como tipo superiormente

    humano, um ente que consegue manifestar certas foras de vida, mutiladas em outros por causa da

    noo parcial que a psicologia e a moral convencionais oferecem de ns. Em meio hipocrisia,

    debilidade da conscincia na burguesia europeia do fim do sculo; ao humanitarismo manhoso com que

    procurava adormecer o sentimento de culpa, Nietzsche assume por vezes uma estatura de justiceiro. E

    um exemplo da ironia que espreita na posteridade as ideias dos filsofos o fato de muitas dessas

    virtudes de dureza propedutica terem sido encarnadas, no sculo XX, por uma raa de homens que ele

    sempre considerou prognie de escravos. Na eliterevolucionria que implantou o socialismo na Rssia,

    encontravam-se, como a realizao impressionante duma profecia, as qualidades de implacvel retidoque atribui, em Vontade de Poderio, ao Legislador do Futuro, que poda sem d a fim de favorecer a

    expanso plena, e cuja dureza aparente , no fundo, amor construtivo pelos homens.

    Nele, porm, esta atitude s adquire significado reposta no conjunto da obra, naquela mistura, to sua,

    de fervor e irreverncia, destruio raivosa e jbilo construtivo, que a nica possibilidade do nosso

    tempo e ele anteviu como profeta. Para a opinio dominante, a sua crtica violenta fez dele um

    personagem incmodo, ante o qual se fecham as portas da cidade, como as que, na parbola final

    de Humano, demasiado humano, rejeitam o peregrino para a noite do deserto. Ele vinha romper uma

    srie de hbitos tacitamente aceitos, e mostrar que prpria filosofia no dava mais conta das obrigaes

    para com a vida.

    Talvez se possa dizer, com efeito, que a partir do sculo XVIII e at o XX, ela cuidou mais da natureza doesprito e das condies de seu funcionamento, que do seu carter de aspecto da atividade humana total.

    Doutro lado, analisou de preferncia tudo que condiciona o comportamento e dele resulta; raras vezes

    desceu s suas razes vivas. Semelhante tarefa coube no raro arte, cuja importncia como forma de

    conhecimento no decresceu no mundo moderno, como se poderia pensar primeira vista. A acuidade

    psicolgica, por exemplo, no se confunde com a competncia dos especialistas, e deve ser buscada

    menos neles do que em obras como as de Dostoievski, Proust, Pirandello ou Kafka; e no de estranhar

    que o maior psiclogo do nosso tempo, Freud, seja uma espcie de ponte entre o mundo da arte e o da

    cincia; entre os processos positivos de anlise e a intuio esttica.

    Nietzsche se situa no universo dos psiclogos artistas, e da decorre o significado central da sua obra.Enquanto algumas e por muitos lados melhores tendncias do pensamento oitocentista procuravam

    resolver o problema da vida em sociedade criticando as condies de existncia, ele tentou atingir

    diretamente o ncleo da personalidade. Se Marx ensaiava transmudar os valores sociais no que tm de

    coletivo, ele ensaiou uma transmutao do ngulo psicolgico do homem tomado como unidade

    duma espcie, pela qual decisivamente marcado, sem desconhecer, claro, todo o equipamento de

    civilizao que intervm no processo. So atitudes que se completam, pois no basta rejeitar a herana

    burguesa no nvel da produo e das ideologias; preciso pesquisar o subsolo pessoal do homem

    moderno tomado como indivduo, revolvendo as convenes que a ele se incorporam, e sobre as quais

    assenta a sua mentalidade.

    Da a consequente transmutao dos valores morais. Discpulo dos grandes analistas franceses,

    apaixonado por Stendhal e Dostoievski, dando uma sentena de Pascal por toda a metafsica alem,

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    continua os grandes investigadores da conduta, concebida como arte. O seu objetivo lanar as bases

    de uma nova tica, acessvel aos homens que se obtmhomens superiores que alargaro at os outros

    aquilo que conquistaram penosamente, cauterizando em si a herana de uma civilizao desvirtuada.

    certo que todos ns temos laos e afinidades que nos ligam ao santo, assim como um parentesco

    espiritual nos vincula ao filsofo e ao artista, diz numa das Consideraes intempestivas. Em

    consequncia, todo processo no sentido da realizao do super-homem significa riqueza coletiva, na

    medida em que atuam essas afinidades secretas que, ligando-o a todos, a todos enriquecem pela

    comunicao da seiva.

    Para favorecer o aparecimento dos homens superiores, preciso alterar o modo de encarar a vida e o

    conhecimento. O ideal nietzschiano seria o pensador que passeia livremente pela vida e recusa

    considerar a atividade criadora uma obrigao intelectual; o homem que, para fecundar a si e aos outros,

    suprime o hiato existente as mais das vezes entre conhecer e viver.

    No belo trecho final dA irreligio do Futuro, Guyau chama o filsofoamigo do desconhecido: cet ami de

    linconnu. Ele , com efeito, irmo do aventureiro, e no deve renegar o parentesco vivificante. Enquanto

    um se desapega da estabilidade e da rotina para obter em torno de si a mudana permanente das

    pessoas, lugares ou situaes, outro opera de maneira semelhante no terreno do esprito, jogando fora

    convices, crenas, noes, para obter alguma coisa nova ao cabo dessas rejeies mltiplas e por

    vezes fatais. Ambos atiram lenha fogueira, aquecendo-se ao calor de coisas arrancadas sua norma de

    vida: fogueira da existncia ou fogueira do pensamento. Em muitos casos, ambas.

    Vindo aps sculos de filosofia catedrtica, Nietzsche se revolta violentamente contra a mutilao do

    esprito de aventura pela oficializao de doutrinas. E a seu modo foi um aventureiro, no s na existncia

    agitada e ambulante, busca de lugares novos, emoes renovadas (como algum que necessita atritar-

    se com o mundo para despedir fascas da vida), mas tambm no pensamento, busca de ngulos novos,

    posies inexploradas, renovando sem parar as tcnicas do conhecimento. A interveno feliz deumgnio familiarimpediu sempre as suas tentativas de amarrar as ideias em sistemas amplos e

    fechados[1]. Exprimiu-se de preferncia em trechos breves, aforismos e cnticos, a fim de que tudo o que

    borbulha no fosse canalizado pelo desenho geomtrico dos tratados; e para que a filosofia no

    renunciasse ao privilgio da permanente aventura, a troco da estabilidade que se obtm fechando os

    olhos ante a fuga vertiginosa das coisas. O tipo de pensador nietzschiano o Peregrino, o Wanderer, cuja

    sombra se projeta pelos quatro cantos e nunca vende a alma ao estvel, ao tranquilo, porque deseja

    manter-se fiel ao desconhecido, enfrentando-o com a coragem da aventura. A mencionada pgina final

    de Humano, demasiado humano(1aParte) define este apto permanente da filosofia, e das mais belas

    que se escrevem sobre o destino do pensador, rejeitando a segurana ilusria de que se nutrem os

    homens mdios, para no permanecer de olhos baixos, cego em meio vida que estua no desconhecido,oferecendo aventuras que glorificam e consomem:Quem atingiu dalgum modo a liberdade da razo, no pode considerar na terra outra coisa que oPeregrino, embora no um viajante rumando para uma meta final, pois esta no existe. Comtemplar eter os olhos abertos para tudo que acontece no mundo; no ligar o corao em definitivo a nada denico; deve haver nele algo erradio, pois a sua alegria est no mutvel e no inconstante. Por certo caironoites penosas sobre um homem desses, quando estiver cansado e encontrar fechadas as portas dacidade, que lhe deveria dar repouso. Pode ser, ainda mais, que o deserto chegue at elas, como noOriente, e as feras ululem, ora perto, ora longe, e um vento forte se eleve, e os salteadores lhe roubem osanimais de carga. Desce ento uma noite terrvel, como um segundo deserto no deserto, e o Peregrino sesentir exausto no corao. Quando o sol levantar, abrasando como a divindade da ira, abre-se a cidade,e nas faces dos habitantes ele ver talvez mais deserto, mais sujeira, mais embuste e mais inseguranado que fora de portas, e o dia ser quase pior que a noite. Isso pode, na verdade, ocorrer e um

    Peregrino; mas depois viro, como recompensa, manhs deleitosas, noutra paragem e noutro dia, atravsdo dilculo, ver bandos de musas bailarem perto, na nvoa das montanhas; onde, em seguida, quandopassear sombra das rvores, na serenidade da manh, cair-lhe-o, dentre os ramos e a folhagem,

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    coisas boas e claras, ddivas dos espritos livres, que se acomodam bem, como ele, nos montes,florestas e solides, e so, como ele, de maneira ora alegre, ora pensativa, peregrinos e filsofos.Oriundos do mistrio da madrugada, pensam no que pode fazer to pura, luminosa, jovialmentetransfigurada a fisionomia do dia entre a dcima e a dcima segunda pancada do sino: andam a buscara Filosofia da Manh.

    Sob esta roupagem alegrica, sob a graa deste estilo a que a traduo retira o aspecto por assim dizer

    miraculoso, Nietzsche eminentemente um educador. Prope sem cessar, como aqui, uma srie detcnicas libertadoras, levando-nos ao paradoxo de pensar, como Gide, nos Pretextos, que a sua

    influncia (...) importa mais que a sua obra. Talvez seja verdade, grata a quem exclamou na Gaia

    cincia: Para que serve um livro que no for capaz de nos transportar alm dos livros? Os seus

    conduzem para o terreno da aventura espiritual; livros de movimento, que tm um pacto misteriosos com

    a dana, elemento-chave do seu pensamento:H escritores que, pelo fato de representarem o impossvel como possvel, e falarem do que moral egenial como se ambos no passassem de fantasia, capricho, provocam um sentimento de alegreliberdade, como se o homem se pusesse sobre a ponta dos ps e, graas a um jbilo interior, fosseobrigado literalmente a danar (Humano, Demasiado Humano).

    claro que seus livros, que ensinam a danar, no emanam de um filsofo profissional, mas de algum

    bastante acima do nos habituamos a conceber deste modo. Como poucos, em nosso tempo, umportador de valores, graas ao qual o conhecimento se encarna e flui no gesto de vida. Aqui, a certeza

    um jogo; dir-se-ia que o conhecimento encontrou o seu ato, e que de repente a inteligncia aceita as

    graas espontneas (Valry).

    H, com efeito, seresportadores, que podemos ou no encontrar, na existncia cotidiana e nas leituras

    que subjugam o esprito. Quanto isto se d, sentimos que eles iluminam bruscamente os cantos escuros

    do entendimento e, unificando os sentimentos desparelhados, revelam possibilidades de uma existncia

    mais real. Os valores que trazem, eminentemente radioativos, nos trespassam, deixam translcidos e no

    raro prontos para os raros herosmos do ato e do pensamento. Geralmente, ficamos ofuscados um

    instante quando vemos e, sem fora para os receber, tergiversamos e nos desviamos deles. A opacidadese refaz, ento, a mediania recobra o domnio e s resta a lembrana, de efeitos variveis. Os coevos

    lobrigavam chamas do inferno na barra da tnica de Dante; nos nossos olhos resta igualmente a nostalgia

    do reino perdido, como no soneto admirvel de Antero de Quental:E assentado entre as formas imperfeitas,

    Para sempre fiquei plido e triste.

    Osportadores, que eletrizaram um instante, por via da participao misteriosa de que fala Nietzsche,

    esses, continuam, como ele prprio continuava, irrequietos e irremediveis.

    Entretanto, embora nos iluminemos apenas um instante e osportadoressigam, o que seria da vida e do

    pensamento se no houvesse oportunidades semelhantes? As ideias e valores existem ante ns comoalvos inatingveis, e o nosso destino tender a eles. Por isso a vida uma tendncia sem fim, excetuados

    os momentos de plenitude que suspendem a corrente do tempo. No obstante, enquanto permanecermos

    de um lado, e os valores de outro, o esforo e a lucidez da nossa viso sero mais ou menos frouxos. Na

    vida, s sentimos a realidade dos valores a que tendemos, ou que pressentimos, quando pomos em

    contato com certos intermedirios, cuja funo encarn-los, como portadores que so. A abstrao e o

    sentimento adquirem vida (la connaissance a trouv son acte, diria Valry) e somos capazes de sentir

    plenamente, viver os valores. Ao contrrio da vida, que dispersa, os portadores condensam e unificam

    extraordinariamente; da se imporem como um bloco e fazerem ver a vida como um bloco, que nos afasta

    por um momento da mediania e impe uma necessidade quase desesperada de vida autntica.

    Os homens necessitam constantemente de parteiras. A teoria do super-homem o conjunto de tcnicas

    necessrias, segundo Nietzsche, para formar estas parteiras de que fala. A profundidade do seu

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    desconhecido humanismo provm da deciso fundamental de nada conceber na vida se no for como

    encarnao de valor, corporizado na presena humana. E para encerrar estas notas sobre um dos

    maiores portadores de nosso tempo, nada mais oportuno que a citao de um de seus escritos de

    mocidade:

    Os gregos eram o oposto de todos os realistas, porque, a falar verdade, s acreditavam na realidade doshomens e dos deuses, e consideravam a natureza inteira como uma espcie de disfarce, de mascarada emetamorfose desses homens-deuses. Para eles, o homem era a verdade e essncia das coisas; o restono passava de fenmeno e miragem.

    Na nossa poca, no se abrir a primeira fase da histria em que ser preciso reorganizar o mundo sem

    apelo ao divino, o que se poderia dizer de melhor para instalar o homem na sua pura humanidade?

    Recuperemos Nietzsche.

    Artigo aceito para publicao em 26/03/2013.

    [1] Hoje, aps os trabalhos e a edio de Karl Schlechta, sabemos com certeza que a Vontade

    de poderio, como foi publicada, sobretudo nas ltimas edies, chamadas completas, no passa duma

    ordenao arbitrria de fragmentos que no haviam sido destinados a qualquer obra sistemtica.

    O sistema e suas implicaes capciosas nasceu do interesse fraudulento de sua irm e respectivos

    colaboradores, ingnuos ou cmplices conscientes (Nota de 1959).

    Fonte: .