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UMA BRAVE INTRODUQAO A FILOSOFIA constituigao interna totalmente diferente da nos- sa. Mas que raz6estemps para pensar que so- mente as coisas que se comportam maid ou me- nos como n6s, e que t6m uma estrutura fisica observfvel mais ou menos como a nossa, sio capazes de ter aziz:fm tipo de experi6ncia? Tal- vez as &rvores sintam as coisas de um modo to- talmente diferente do nosso, mas nfo podemos saber, pois, no cano degas, nio demos como des- cobrir as correlag6es entry experi6ncia e mani- festag6es observfveis, ou condig6es fTsicas.S6 poderiamos descobrir essas correlag6es se ob- servassemos ao mesmo tempo as experi6ncias e as manifestag6es external, mas nio ha como observar as experi6ncias diretamente, a nio ser em n6s mesmos. Pda mesma razao, nio seria possivel observer a aus6ncla de experi6ncia e consequentemente, a aus6ncia de dais correlag6es, em nenhum outro caso. Nio se pode olhar den- tro de uma irvore para dizer que ela m&o tem ex- periencia, da mesmaforma que nio se pode olhar dentro de um verme para dizer que ele /em ex- periencia Entao, a questao 6: o que voc6 realmente sage sobre a vida conscienceneste mundo, a16mdo fato de que voc6 tem uma mente consciente? $ possivel que hajj bem menos vida consciente do que voc6 sup6e (nenhuma a nfio ser a sua), ou bem mais do que poderia imaginar (at6 mesmo nas coisas que presume serem inconscientes)? 4 O problema ments-corpo Esquegamos o ceticismo e admitamos que o mundo fisico existe, at6 mesmo seu corpo e care bro; e deixemos de lado nosso ceticismo quando a exist6ncia de outras mentes. Admito que voc& 6 consciente, se voc& admitir que eu tamb6m sou Ora, qual pode ser a relagao entre a consci6ncia e o c6rebro? Todos salem que o que acontece na cons- ci6nciadepende do que acontece ao compo. Se voc& der uma topada com o dedo do p6, ele iri doer. Sevoc6 fechar os olhos, nio podera ver o que ha na sua frente. Se morder uma barra de cho colate, sentirf o savor do chocolate. Se algu6m der uma pancada na sua cabega,voc6 podera desmaiar. Ao que tudo indict, para que alguma coisa acontega em sua mente ou consciencia, e preci- so que algo acontegano seu c6rebro. (Voc&nio sentiria dor ao baker o dedio se os nervos que correm por sua perna e coluna nio transmitis- 26 27

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UMA BRAVE INTRODUQAO A FILOSOFIA

constituigao interna totalmente diferente da nos-sa. Mas que raz6es temps para pensar que so-mente as coisas que se comportam maid ou me-nos como n6s, e que t6m uma estrutura fisicaobservfvel mais ou menos como a nossa, siocapazes de ter aziz:fm tipo de experi6ncia? Tal-vez as &rvores sintam as coisas de um modo to-talmente diferente do nosso, mas nfo podemossaber, pois, no cano degas, nio demos como des-cobrir as correlag6es entry experi6ncia e mani-festag6es observfveis, ou condig6es fTsicas. S6poderiamos descobrir essas correlag6es se ob-servassemos ao mesmo tempo as experi6ncias eas manifestag6es external, mas nio ha comoobservar as experi6ncias diretamente, a nio serem n6s mesmos. Pda mesma razao, nio seriapossivel observer a aus6ncla de experi6ncia econsequentemente, a aus6ncia de dais correlag6es,em nenhum outro caso. Nio se pode olhar den-tro de uma irvore para dizer que ela m&o tem ex-periencia, da mesma forma que nio se pode olhardentro de um verme para dizer que ele /em ex-periencia

Entao, a questao 6: o que voc6 realmente sagesobre a vida conscience neste mundo, a16m dofato de que voc6 tem uma mente consciente? $possivel que hajj bem menos vida consciente doque voc6 sup6e (nenhuma a nfio ser a sua), oubem mais do que poderia imaginar (at6 mesmonas coisas que presume serem inconscientes)?

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O problema ments-corpo

Esquegamos o ceticismo e admitamos que omundo fisico existe, at6 mesmo seu corpo e carebro; e deixemos de lado nosso ceticismo quandoa exist6ncia de outras mentes. Admito que voc&6 consciente, se voc& admitir que eu tamb6m sou

Ora, qual pode ser a relagao entre a consci6nciae o c6rebro?

Todos salem que o que acontece na cons-ci6ncia depende do que acontece ao compo. Sevoc& der uma topada com o dedo do p6, ele iridoer. Se voc6 fechar os olhos, nio podera ver oque ha na sua frente. Se morder uma barra de chocolate, sentirf o savor do chocolate. Se algu6mder uma pancada na sua cabega, voc6 poderadesmaiar.

Ao que tudo indict, para que alguma coisaacontega em sua mente ou consciencia, e preci-so que algo acontega no seu c6rebro. (Voc& niosentiria dor ao baker o dedio se os nervos quecorrem por sua perna e coluna nio transmitis-

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UMA BRAVE INTRODUQAO A FILOSOFIA O PROBLEMA MENTS-CORPO

sem impulsos do dedo ao c6rebro.) Nio sabemoso que se paisa no c6rebro quando voc6 pensa:"Seri que vou ter tempo de costar o cabelo holea tarde?" Mas demos certeza de que algo aconte-ce -- alguma coisa que envolva alterag6es quimi-cas e e16tricas nos bilh6es de c61ulas nervosasque comp6em o seu c6rebro.

Em alguns cason, sabemos de que madeira oc6rebro afeta a mente e de que maneira a meRLeafeta o c6rebro. Sabemos, por exemplo, que cer-tas c&lulas cerebrais pr6ximas da luca, quandorecebem determinado estimulo, produzem ex-periencias visuais. E sabemos que, quando voc6decide server-se de mais um pedago de polo,certas outras c61ulas cerebrais enviam impulsosaos mtlsculos do seu bravo. Desconhecemos mui-

tos dos detalhes, mas 6 evidence que existem relag6es complexas entre o que acontece na suameRLe e os processos fisicos que se desenca-deiam no seu c6rebro. At& aqui, judo o que foiditz 6 assunto da ci6ncia, nio da filosofia.

Mas hf tamb6m uma indagagao filos6ficasobre a relagao entre monte e c6rebro, que 6 aseguinte: a mente 6 diferente do c6rebro. embo-ra esteja vinculada a ele, ou ela d o c6rebro? Seus

pensamentos, sentimentos, percepg6es, sensag6ese desejos silo coisas que acontecem iz/dm de to-dos os processos fisicos que ocorrem no seu c6-rebro, ou sao, das pr6prias, alguns desses pro-cessor flsicos?

O que acontece, por exemplo, quando vocQmorde uma barra de chocolate? O chocolate der-rete na sua lingua e produz alterag6es quimicasnas subs papilas gustativas; as papilas gustativasenviam impulsos e16tricos pelos nervos que li-gam a lingua ao c6rebro e, quando essen impul-sos chegam ao c6rebro, produzem ali mais alte-rag6es fisicas; e, finalmente, uocd sense o gos/o docboco/a/e. O que 6 !ssd SeMfz uma dimples ocorr6ncia fisica em alguns dos seus neur6nios, ousera algo completamente diferente?

Se um cientista retirasse a tampa do seu crf-nio e olhasse o interior do seu c&rebro enquan-to voc6 come a barra de chocolate, a Onica coisaque ele veda 6 uma massa cinzenta de neur6nios.Se ele usasse instrumentos para medir o queacontece ali dentro, detectaria vfrios processorflsicos diferentes e complexos. Mas encontrariao gabor do chocolate?

Ao que parece, ele nio o encontraria no seuc6rebro, porque sua experi&ncia de saborear ochocolate esb de tal forma trancada dentro dasua mente, que nio pode ser observada por ninguam -- mesmo que ele abu seu crfnio e exami-ne dentro do seu c6rebro. Subs experi&ncias es-tio no interior da sua mente com um /Po de infedomdczde que 6 diferente do modo como seuc6rebro este no interior da sua cabega. Uma ou

tra pessoa pode abrir sua cabega e observar o que

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UMA BRAVE INTRODUQAO A FILOSOFIA O PROBLEMA MENTE-CORPO

hi dentro deli, mas nio pode abrir sua mente eexamine-la nio dessa forma pelo menos.

Nio 6 s6 que o gosto do chocolate 6 um sa-vor e, portanto, nio pode ser visto. Imagine umcientista muito louco que, para tentar observarsua experi6ncia de saborear o chocolate, /rzm-Desse seu c6rebro enquanto voc6 estivesse co-mendo uma barra de chocolate. Em primeiro lu-gar, seu c6rebro provavelmente nio teria paraele o gosto de chocolate. Mas, mesmo que livesse, ele nio teria conseguido entrar na sua mentee observar a sua experi&ncia de provar chocola-te. A Onica coisa que ele teria descoberto, de mo-do bastante bizarro, 6 que, quando voc6 sante ogosto do chocolate, seu c6rebro se altera e paisaa ter gosto de chocolate para as outras pessoas.Ele teria a experi6ncia dele do chocolate, e voc6,a sua.

Se o que acontece na sua experi6ncia esb nointerior da sua mente de um jeito diferente doque acontece no seu c6rebro, parece entio queas suas experi6ncias, bem como seus diferentesestados de espirito, nio podem ser meros esta-dos fisicos do c6rebro. Voc6 deve ser algo maisdo que um compo dotado de um buligoso siste-ma nervoso.

Uma conclusio possivel 6 que deve havenuma alma ligada ao corpo, de tal forma que am-boy possam interagir. Se ipso 6 verdade, entiovoc& 6 constituido de duas coisas muito diferen-

tes: um organismo flsico complexo e uma almapuramente mental. (Esse visio 6 chamada de dualismo, por raz6es 6bvias.)

Muitas pessoas, por6m, acham que a crengana alma 6 ultrapassada e nio cientlfica. Tudo oque existe no mundo 6 frito de materia fTsica --diferentes combinag6es dos mesmos elementosquimicos. Por que nio seria assim conosco tamb&m? Mediante um complexo processo fisico,nosso corpo se desenvolve a partir da Onica c6-lula produzida peta uniio do espermatoz6idecom o 6vulo, no momento da concepgao. Aospoucos, materia comum vai sendo adicionada,de tal forma que a c61ula se torna um beb6, combrazos, pernas, olhos, orelhas e c6rebro, capazde se mover, sentir, ver e, finalmente, falar e pen-sar. Algumas pessoas acreditam que esse sofisti-cado sistema flsico 6 suficiente, por si s6, parafazed surgir a vida mental. Por que nio deveria?Sega como for, como um simples argumento filos6fico pode demonstrar que nio & assim? Se afilosofia nio pode nos dizer do que sio feitos asestrelas e os diamantes, como poderf nos dizerdo que sio feitos ou nio sio feitos os serbs humatos?

A opiniao de que as pessoas nio passam demateria fisica, e que seus estados de esplrito sioestados fisicos cerebrais, & denominada fisicalis-mo (ou, is vezes, materialismo). Os fisicalistasnio t6m uma peoria especifica sabre qual pro

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UMA BREVE INTRODUQAO A FILOSOFIA O PROBLEMA MENTE-CORPO

cesso cerebral pode ser identificado com a expe-ri6ncia de saborear chocolate, por exemplo. Masacreditam que os estados de espirito s&o apenasestados do c6rebro, e que nio hg nenhuma fa-zio filos6fica para pensar que nio sejam. Os de-talhes terfio de ser descobertos pda ci6ncia

A id6ia 6 que podemos descobrir que as ex-peri6ncias sao, na verdade, processos cerebrais.tal como descobrimos que outras coisas conhe-

cidas t6m uma natureza real que nfio poderia-mos ter adivinhado, at6 que foi revelada pdainvestigag:ao cientifica. Por exemplo, os diaman-tes sio compostos de carbono, o mesmo mate-rial do carvio -- s6 que os ftomos se combinamde maneira diferente num e noutro. E a fgua,como sabemos, & formada de hidrog6nio e oxi-g&nio, embora nenhum desses elementos, quan-do isolados, em nada se assemelhe com a aqua.

Portanto, embora parega surpreendente quea experi6ncia de saborear chocolate nfio deja, tal-vez, mais do que uma complexa ocorr&ncia flsi-ca no c6rebro, isso nio seria maid estranho queas muitas coisas que se descobriram sobre a ver-dadeira natureza de objetos e processor comuns.Os cientistas descobriram o que 6 a luz, como asplantas crescem, coma os mOsculos se movem --e apenas uma questao de tempo para que des-cubram a natureza bio16gica da mente. 11 nissoque os fisicalistas acreditam.

Um dualista retrucaria que essas outras coi-sas sio diferentes. Quando investigamos a com-posigao quimica da igua, por exemplo, estamoslidando com algo que pertence claramente aomundo fisico -- algo que podemos ver e tocar.Quando descobrimos que ela 6 feith de itomosde hidrog6nio e oxig6nio, estamos apenas decompondo uma substfncia fisica externa em pa-nes fisicas menores. Uma caracteristica essencial

desse tipo de anilise 6 que ndo se trata de umadecomposigao quimica do modo como Demos,

senrimos e saboreamos a fgua. Essas coisas econtecem na nossa experi&ncia interns, nio na aguaque foi decomposta em ftomos. A anflise fisicaou quimica da fgua desconsidera essas expe-riencias.

Para descobrir se a experi6ncia que tivemosdo savor do chocolate foi, de faso, apenas umprocesso cerebral, teriamos de analisar algumacoisa mental -- nio uma substfncia Hsica obser-vfvel externamente, mas uma sensagao de savorinterna -- em termos das panes fisicas. E, pormais complexes e numerosas que sejam as ocor-r&ncias flsicas no c6rebro, das nio poderiam seras panes que comp6em a sensagfio do gosto.Um dodo fisico pode ser analisado em panes fisi-cas menores, mas um processo mental, nfio. Nio6 posslvel somar panes f:isicas para obter umtodo mental.

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UMA BREVE INTRODUQAO A FILOSOFIA O PROBLEMA MENTE-CORPO

Hf uma outra visio que difere tanto do dua-lismo quando do fisicalismo. O dualismo afirmaque somos constituidos de um corpo e uma al-ma, e que nossa vida mental tem lugar em nossaalma. O fisicalismo sustenta que a vida mentalconsists em processor flsicos que se desenrolamno c6rebro. Outra possibilidade, contudo, 6 a deque a vida mental ocorra no c6rebro, kinda quesodas essas experi&ncias, sentimentos, pensamen-tos e desejos nfo sejam processor Wsfcos do c&-rebro. lsso significaria que a massa cinzenta dosbilh6es de c61ulas nervosas dentro do seu crfniom&o d aPenczs am o6yero/K/co. Embora tenha mui-tas propriedades fisicas -- uma grande quantidadede atividade quimica e e16trica --, ali tamb6m ocor-rem processor memfa/s.

A concepgfio de que o c6rebro 6 a sede daconsctencia, mas que seus estados consciencesnio sio meros estados fisicos, 6 chamada de peo-

ria do aspecto dual. E assim chamada porque,quando voc6 morde uma barra de chocolate, pro-duz-se no seu c6rebro um estado ou processocom dois aspectos: um aspecto flsico, envolven-do virias alterag6es quimicas e e16tricas, e umaspects mental -- a experi6ncia do gabor de cho-colate. Quando esse processo ocorre, um cien-tista, ao examiner seu c6rebro, poderf observero aspecto fisico, mas 6 voc6, internamente, quepassari pelo aspecto mental: voc6 6 que vai ex-perimental a sensagao de saborear o chocolate.

Sendo assim, seu c6rebro teria um interior quenio poderia ser alcangado por um observadorexterno, mesmo que ele o abrisse ao meio. Esseprocesso que ocorre no seu c6rebro produziriaem voc& um certs tipo de sensagao ou gosto.

Poderiamos expressar essa id6ia ao dizer quevoc& 6 apenas corpo, nio compo e alma, mas seucorpo, ou pelo menos seu c6rebro, nfio 6 so-mente um sistema flsico. E um objeto com as-pectos fisicos e mentais: pods ser dissecado, mastem um tips de interior que a dissecagao niopode revelar. Se existe algo dentro que parecesaborear o chocolate, 6 porque existe algo den-tro que parece colocar seu c6rebro na condigaoque se produz quando voc6 come chocolate.

Para os fisicalistas, a Onica coisa que existe eo mundo fisico, que pode ser estudado pda ci&n-cia: o mundo da realidade objetiva. Por isso, desprecisam encontrar um lugar nesse mundo paraalojar os sentimentos, desejos, pensamentos eexperi6ncias -- um lugar para vocQ e para mim.

Uma das teorias apresentadas em defesa dofisicalismo & a de que a natureza mental de nos-sos estados de espirito consiste na relagao des-ses estados com as coisas que os causam e comas coisas que des causam. Por exemplo, quandovoc6 machuca o dedo e sense dor, a dor 6 aldoque acontece no seu c6rebro. Mas o que a fazser dor nio 6 apenas a soma das caracteristicasfisicas do c6rebro, e tampouco se trata de algu-

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UMA BREVE INTRODUQAO A FILOSOFIA O PROBLEMA MENTE-CORPO

ma misteriosa propriedade nio fisica. Ao contri-rio, a dor 6 o tipo de estado que se produz no seuc6rebro Lada vez que voc& se machuca, e quegeralmente o faz gritar e pular e evitar a coisa queo machucou. E esse estado poderia ser puramen-te fisico.

Mas isso nio parece ser suficiente para quealgo sega doloroso. icerto que as doren sio cau-sadas por ferimentos e que das nos fazem pulare gritar. Mas tamb6m sfo sen//cios de uma certsmaneira, o que parece ser algo diferente de to-day as relag6es que t8m com causas e efeitos ede sodas as propriedades fTsicas que possum ter-- se 6 que, de cato, silo ocorr6ncias cerebrais.

Pessoalmente acredito que esse aspecto infernoda dor e de outras experi6ncias consciences niopods ser adequadamente analisado em termosde nenhum sistema de relag6es causais com es-timulos e comportamentos fisicos, por maid com-plexos que sejam.

Parece haver dois tipos muito distintos de

colsas que acontecem no mundo: as coisas quepertencem a realidade fisica, que muitas pessoaspodem observar de fora, e as coisas que perten-cem a realidade mental, que coda um de n6s ex-perimenta interna e individualmente. E isso 6verdade nio somente para os serbs humanos:cachorros, gatos, cavalos e pissaros parecem serconscientes, e 6 provfvel que tamb6m os pei-

xes, as formigas e os besouros. Quem sage ondeipso acaba?

Nossa concepgao gerd do mundo seri insu-ficiente at6 que possamos explicar de que modoos elementos fisicos, quando combinados da ma-neira certs, formam nfio apenas um organismobio16gico funcional, mas tamb&m um ser cons-ciente. Se a pr6pria consci6ncia pudesse ser iden-tificada com album tipo de estado fisico, estariaaberto o caminho para uma teoria unificada damente e do corpo e assim, talvez, para uma peo-ria unificada do universo. Mas as raz6es contri-rias a uma teoria puramente fisica da consci6n-cia sio bastante forbes para nos fazer duvidar deque seria possive] uma peoria fisica da realidadetotal. A ci6ncia fisica avangou deixando a mentede fora daquilo que renta explicar, mas pode serque hajj mais sabre o mundo do que a ci6nciaflsica 6 capaz de entender.

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Uma breve introdugaoa, filosofia

Thomas Nagel

TradugaoSILVANAVIEIRA

/V'martins FontesS6o Paulo 2001