O PROCESSO COLABORATIVO NA PRODUÇÃO DE...

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Carlos Albano Volkmer de Castilho O PROCESSO COLABORATIVO NA PRODUÇÃO DE INFORMAÇÕES: GÊNESE, SISTEMAS E POSSÍVEIS APLICAÇÕES NO JORNALISMO COMUNITÁRIO Florianópolis 2009

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  • Carlos Albano Volkmer de Castilho

    O PROCESSO COLABORATIVO NA PRODUO DE INFORMAES:

    GNESE, SISTEMAS E POSSVEIS APLICAES NO JORNALISMO

    COMUNITRIO

    Florianpolis2009

  • Carlos Albano Volkmer de Castilho

    O PROCESSO COLABORATIVO NA PRODUO DE INFORMAES: GNESE, SISTEMAS E POSSVEIS APLICAES NO JORNALISMO

    COMUNITRIO

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina UFSC, para obteno do ttulo de Mestre em Engenharia de Produo.

    OrientadorProf. Eduardo Meditsch Dr.

    Co-Orientador

    Prof. Francisco A. P. Fialho Dr.

    Co-OrientadorProf. Neri dos Santos Dr.

    Florianpolis

    2009

    II

  • CARLOS ALBANO VOLKMER DE CASTILHO

    O PROCESSO COLABORATIVO NA PRODUO DE INFORMAES: GNESE, SISTEMAS E POSSVEIS APLICAES NO JORNALISMO

    COMUNITRIO

    Esta dissertao foi julgada e aprovada para a obteno do grau de Mestre em Engenharia e Gesto do Conhecimento no Programa de Ps-Graduao em Engenharia e Gesto do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina.

    Florianpolis, 20 de fevereiro de 2009.

    ________________________Prof. Roberto Carlos S. Pacheco, Dr.Coordenador do Programa - UFSC

    Banca Examinadora: ________________________Orientador Prof. Eduardo Barreto Vianna Meditsch, Dr.Engenharia e Gesto do Conhecimento UFSC. ________________________Co-Orientador Prof. Francisco A. P. Fialho, Dr.Engenharia e Gesto do Conhecimento UFSC. ________________________Prof. Maria Jos Baldessar, Dra.Departamento de Jornalismo UFSC.

    _______________________Prof. Marco M. Chaga, Dr.Faculdades ASSESC - Florianpolis

    III

  • Agradecimentos

    Esta dissertao o resultado de um esforo coletivo. Eu apenas dei o formato final. Os professores Eduardo Meditsch, Francisco Fialho, Marco Chaga e Simone Dias foram mais do que conselheiros e orientadores. Eles so co-autores, aos quais eu devo creditar os eventuais mritos deste trabalho. Mas h tambm uma pessoa cuja participao foi diria e onipresente. Este trabalho para voc, Sonia.

    IV

  • SUMRIO

    Resumo VII Abstract VIII

    1. Introduo 9 1.1 Pergunta de Pesquisa 10 1.2 Objetivos 10

    1.2.1 Objetivo Geral 101.2.2 Objetivos Especficos 101.3 Justificativa Terica 101.4 Procedimentos Metodolgicos 111.5 Aderncia 121.6 Escopo 132 A Era da Informao e do Conhecimento 14

    2.1 Inovao como alavanca do processo que gerou a compu- tao e a internet 14 2.2 Transio cultural provocada pela inovao tecnolgica 17 2.3 Comunidades Virtuais 19

    2.3.1 Caractersticas e diferenas 202.4 A informao na nova cultura digital 212.5 A Nuvem informativa 233 A crise no modelo convencional de jornalismo 263.1 A Crise na Imprensa 263.2 A transio no modelo de negcio da imprensa 27

    3.3 A crise do noticirio local e a perda das bases comunitrias 30 3.4 O ressurgimento da informao local e o jornalismo cidado 32

    3.5 A mdia busca uma nova oportunidade 333.6 A produo colaborativa e a crise da imprensa 344 A Produo Colaborativa de Contedos Informativos 364.1 Marco Conceitual 364.1.1 Contexto histrico 384.1.2 Processo colaborativo na gerao de conhecimento 384.2 Produo Colaborativa em Comunidades 42

    4.2.1 Comunidades de Informao e Comunidades de Prtica 424.2.2 Produo colaborativa de notcias 414.2.2.1 Weblogs individuais 414.2.2.2 Autoria coletiva 424.2.2.3 Investigaes colaborativas 434.2.3 Produo colaborativa de informaes sobre servios 454.2.4 Mediao e recombinao 464.2.5 Certificao de credibilidade na produo colaborativa 48

    4.2.6 Qualidade da informao gerada pelo processo colaborativo 50 4.2.7 Condies essenciais para a implantao da produo colaborativa de informaes em comunidades sociais visando a produo de notcias locais 51 4.2.8 Contexto bsico para o desenvolvimento da produo cola-

    laborativa de notcias locais 52

    V

  • 5 Consideraes Finais 545.1 Consolidao de uma nova rea de pesquisas 556 Proposta de novos estudos 567 Glossrio 588 Referncias 609 Notas 64

    VI

  • RESUMO Esta dissertao de mestrado procura mostrar, com base na pesquisa bibliogrfica e no monitoramento fenomenolgico, a importncia crescente da produo colaborativa de contedos em comunidades sociais como instrumento para suprir o dficit informativo local e hiper-local, provocado pela crise no modelo de negcios da imprensa mundial.Palavras chavesJornalismo online, produo colaborativa, noticirio local, comunidades de informao, crise na mdia.

    VII

  • ABSTRACTThe present dissertation, using a bibliographic research and phenomenologic monitoring approach, stresses the growing relevance of colllaborative content production system in social communities as a tool to minimze the local and hyper local news deficit, caused by the crisis in the business model adopted by the mainstream press.Key WordsOnline Journalism, collaborative production, local news, information communities, media crisis.

    VIII

  • 1. INTRODUO 9

    A Web comeou como uma plataforma de publicao, depois passou a ser

    um ambiente para a interatividade social e ensaia agora os primeiros passos rumo a

    sua transformao em um sistema de produo de conhecimentos, definido por

    Pisani e Piotet (2008) como a alquimia de multides.

    Alquimia uma imagem feliz para descrever o processo de produo

    colaborativa de contedos cuja presena cada vez mais intensa em vrios

    segmentos da atividade humana, como economia, direito, educao e artes. Mas

    talvez na comunicao que ela ganha a sua maior significao porque pode,

    potencialmente, envolver multides.

    A produo colaborativa passa a ser estudada num contexto marcado

    tambm pela crise no modelo de negcios das empresas jornalsticas em quase

    todo o mundo.

    Neste trabalho, vou discutir o uso da produo colaborativa de contedos

    como uma ferramenta para captar, processar e publicar informaes a partir do que

    chamaremos de comunidades de informao, situadas dentro de comunidades

    sociais.

    Mostraremos como esta modalidade de produo de contedos informativos

    tornou-se uma necessidade dentro da internet e descreveremos as suas principais

    caractersticas com base em pesquisa bibliogrfica e observao de experincias,

    para sugerir condies bsicas para uma cooperao entre comunidades de

    informao e veculos de comunicao de massa na produo e publicao de

    notcias locais.

  • 1.1 Pergunta de pesquisa

    Qual o contexto histrico, tecnolgico e social que condiciona a aplicao do

    processo colaborativo na produo de notcias locais com participao comunitria?

    1.2 Objetivos

    1.2.1 Objetivo Geral

    Caracterizar a produo colaborativa de contedos informativos como o

    resultado de um processo de evoluo tecnolgica, econmica e social para

    destacar a sua aplicao na gerao de notcias locais, a partir do envolvimento de

    integrantes de comunidades sociais.

    1.2.2 Objetivos Especficos

    Identificar e quantificar o crescimento exponencial na produo de

    contedos informativos na Web, sua influncia na mudana dos padres de

    informao dos usurios da internet;

    Caracterizar o surgimento das comunidades sociais na Web e a forma

    como elas esto dando origem a uma nova cultura digital, vinculada

    produo de informaes e conhecimento explcito;

    Definir notcias locais, identificar a sua importncia na composio da

    agenda de interesses noticiosos em comunidades sociais urbanas;

    Sugerir procedimentos capazes de permitir a utilizao de contedos

    produzidos de forma colaborativa na elaborao do noticirio local em rgos

    da imprensa convencional.

    1.3 Justificativa terica

    O acelerado crescimento da internet gerou uma avalancha informativa que

    colocou em questo os sistemas analgicos de produo de informaes e

    conhecimentos.

    Este fenmeno ganhou uma grande importncia na rea da comunicao, em

    10

  • especial na atividade jornalstica, onde o modelo de produo de notcias e de

    gerenciamento de negcios mostra-se cada vez mais defasado em relao nova

    realidade criada pela internet.

    Um dos processos que comeam a chamar a ateno de pesquisadores e

    gestores de informao e conhecimento o da produo colaborativa de contedos.

    Trata-se de um sistema adotado pelos pioneiros da internet e que agora est sendo

    testado como uma alternativa crise de produo informativa nos veculos de

    comunicao de massa.

    O sistema de produo colaborativa pode ocupar um papel muito importante

    na captura, processamento e publicao de informaes e conhecimentos a nvel

    comunitrio porque ele permite incorporar o conhecimento tcito de indivduos e

    grupos sociais que at agora estavam marginalizados do processo informativo por

    limitaes estruturais do modelo de produo jornalstica adotado pela imprensa

    brasileira e mundial.

    A produo colaborativa de contedos em redes comunitrias pode oferecer

    imprensa material informativo local a um custo e volume impossveis de serem

    cobertos por jornais e emissoras de rdio ou TV, no quadro atual de cortes

    oramentrios para compensar a queda de receitas com a publicidade. Isto ter

    imediatas repercusses na reorganizao do mapa da imprensa e da sua funo

    social, j que internet acabou com o monoplio da imprensa na publicao de

    notcias.

    Outra conseqncia terica relevante, como destacado por Castells (2003),

    a possibilidade da produo colaborativa realimentar os vnculos sociais em redes

    comunitrias tanto na esfera local, como no mbito do que Hepp (2008) definiu como

    translocal [1] - entre grupos locais de diferentes pases.

    1.4 Procedimentos metodolgicos

    O presente trabalho usa o mtodo fenomenolgico para identificar as causas

    e conseqncias da crise no modelo de negcios e dos valores adotados por

    empresas de comunicao e jornalistas profissionais. A observao fenomenolgica

    caracteriza-se por retratar o fenmeno pelas suas caractersticas em si.

    A partir de uma pesquisa documental, seguindo a definio de Remor, e do

    11

  • levantamento de contedos publicados na Web, identificamos as inovaes

    tecnolgicas que provocaram a diversificao das fontes de informao e, com isto,

    eliminaram o monoplio da imprensa convencional na contextualizao e produo

    de notcias, gerando uma conjuntura que afetou negativamente os negcios das

    empresas jornalsticas no mundo inteiro, em especial na Europa e nos Estados

    Unidos (REMOR & REMOR, 2008, p. 6).

    A observao fenomenolgica permitiu tambm delinear o processo de

    esvaziamento do noticirio local e hiper-local, iniciado antes mesmo da

    popularizao da internet. As conseqncias deste processo no foram mais

    drsticas graas ao desenvolvimento de sistemas digitais de produo colaborativa

    de contedos informativos.

    O mtodo indutivo nos levou a investigar a possibilidade de usar a produo

    colaborativa a nvel comunitrio como instrumento para reduzir o dficit informativo

    criado pelos cortes dos jornais na cobertura da temtica local e hiper-local em

    comunidades urbanas. A pesquisa bibliogrfica mostrou a existncia de propostas

    tericas, mas muito poucas experincias prticas, notadamente aqui no Brasil.

    A partir desta constatao, desenvolvemos um raciocnio dedutivo para

    levantar a hiptese de uma cooperao entre comunidades de informao baseadas

    no sistema colaborativo de produo de contedos e empresas de comunicao de

    massa.

    1.5 Aderncia

    A produo colaborativa online de contedos informativos , em sua essncia,

    um sistema de converso de conhecimento tcito em explcito. Para desenvolver

    esta funo, ela se apia nos processos de gesto e disseminao da informao.

    Ao ressaltar a sua importncia como ferramenta para a produo de notcias

    locais, estamos enfatizando a disseminao de conhecimentos explcitos, a partir da

    gesto de informaes realizada no interior de comunidades sociais tanto no mbito

    urbano quanto rural.

    Neste sentido, a dissertao est articulada s preocupaes bsicas do

    curso de ps-graduao do Departamento de Engenharia e Gesto do

    Conhecimento da UFSC.

    12

  • 1.6 Escopo

    A proposta ressaltar a importncia terica e histrica da produo

    colaborativa como uma forma de gerao de conhecimentos que ganhou uma

    relevncia crescente no mbito da internet.

    A dissertao de mestrado no pretende modelar um sistema colaborativo

    online para produo de notcias locais. Isto ser objeto de estudo posterior.

    Tambm no pretendemos testar o sistema mediante o uso de pesquisas de campo.

    Pretendemos mostrar as principais experincias nesta rea de

    conhecimento, e listar o contexto bsico para o desenvolvimento de redes noticiosas

    colaborativas em comunidades sociais.

    13

  • 2 A ERA DA INFORMAO E DO CONHECIMENTO

    2.1 Inovao como alavanca do processo que gerou a computao e a internet

    A humanidade nunca assistiu a uma avalancha informativa como a produzida

    a partir dos anos 70 pela combinao da digitalizao com a internet. Este fenmeno

    no s est alterando os processos informativos da sociedade como est gerando

    uma cultura digital, que incorpora novas rotinas, crenas e valores.

    Esta no a primeira vez que a humanidade enfrenta um surto de produo

    massiva de contedos informativos. O anterior aconteceu no sculo XV com a

    introduo, na Europa, do uso de tipos mveis para a impresso em papel. Tanto

    num caso como no outro, a avalancha informativa foi a conseqncia de inovaes

    tecnolgicas que mudaram o modo de produo e gesto do conhecimento, com

    reflexos na comunicao e na organizao social.

    As tecnologias que provocaram grandes mudanas na comunicao,

    definidas por Meditsch como tecnologias intelectuais, foram objeto de estudo de

    pensadores como Marshall McLuhan, Pierre Lvy, Jack Goody e Walter Ong

    (MEDITSCH, 2007, p. 44). Estes autores investigaram como a tcnica pode interferir

    na comunicao mediada e, com isto, alterar estruturas e valores sociais.

    Quando o ourives alemo Johannes Gutenberg criou o sistema de tipos

    mveis por volta do ano 1439, todo o acervo mundial de informaes se resumia a

    30 mil manuscritos guardados em conventos e igrejas (McGARRY, 1999).

    Nos 150 anos posteriores inveno que permitiu o surgimento do primeiro

    livro impresso em 1452, nada menos que 1,25 milho de ttulos foram publicados na

    Europa. S os escritos de Martinho Lutero, impressos em 1517, alcanaram tiragens

    da ordem de 300 mil exemplares. (McGARRY, 1999)

    As conseqncias desta primeira avalancha informativa variaram desde o fim

    do monoplio da Igreja Catlica sobre a cultura da poca, a multiplicao de

    universidades e de bibliotecas por toda a Europa, at as grandes descobertas

    martimas.

    A democratizao da produo textual permitiu a publicao de livros sobre

    temas no religiosos, como os escritos de Galileu e Kepler que revolucionaram a

    cincia da poca. A inveno da imprensa aconteceu em pleno Renascimento e

    14

  • possibilitou a reproduo de autores do sculo XV como Dante Alighieri, Nicolau

    Maquiavel e Giovanni Boccaccio.

    Cinco sculos e meio depois de Gutenberg, uma nova avalancha informativa

    gerou mais uma quebra de paradigmas culturais. Ela resultou da combinao da

    computao eletrnica, da digitalizao de contedos informativos, da formao de

    uma rede mundial de computadores e da criao da interface grfica que

    transformou a rede num canal de produo, gesto e disseminao de informaes.

    Em 2003, os professores Hal Varian e Peter Lyman, da Escola de Sistemas e

    Gerncia da Informao, da Universidade da Califrnia (Berkeley)[2], publicaram um

    trabalho no qual procuraram medir o volume da produo informativa publicada na

    Web e chegaram aos seguintes nmeros:

    - Em 2002 (ano de referncia para a pesquisa), foram publicados cinco

    exabytes[3] de informaes novas, 92% dos quais em formato digital e

    arquivados principalmente em discos duros. Aproximadamente o dobro

    do material produzido em 1999, quando os dois autores fizeram uma

    pesquisa similar.

    - Hal e Lyman calcularam, na poca, que o volume de informao nova

    publicada na Web crescia 30% ao ano. Com base nesta projeo

    conservadora[4], possvel estimar que at o final de 2008, o volume

    total de informaes novas produzidas anualmente pode chegar a 18,5

    exabytes[5].

    - O total de documentos novos produzidos durante o ano 2002 equivale

    criao, por ano, de 37 mil novas Bibliotecas do Congresso norte-

    americano, cujo acervo na poca era de 17 milhes de livros

    cadastrados, sem contar com manuscritos, jornais, revistas, e

    documentos oficiais. Em todo o ano de 2008, a produo mundial de

    documentos novos seria equivalente a 70 mil novas Bibliotecas do

    Congresso norte-americano.

    - Em 2003, o estudo How Much Information[6] calculou que cada ser

    humano produziria (numa mdia terica) 800 megabytes de informao

    por ano. Isto equivale a mais ou menos uma pilha de livros com

    aproximadamente nove metros de altura. Cinco anos mais tarde,

    levando em conta o ritmo estimado pelo documento, poder-se-ia prever

    15

  • que a produo informativa per capita seria de 2.761 megabytes ou

    2,76 gigabytes, e a pilha de livros alcanaria 32 metros de altura, ou

    um edifcio de nove andares[7].

    A disponibilizao de uma tal quantidade de dados, informaes e

    conhecimentos inevitavelmente iria ter repercusses no processo de formao

    daquilo que Yankelovich (1991, p. 5) chama de julgamento pblico[8], ou seja, a

    formao de uma opinio pblica mais qualificada por causa do maior volume de

    insumos informativos.

    Ainda segundo Yankelovich (1991), esta qualificao que est na base das

    mudanas culturais impulsionadas por grandes inovaes tecnolgicas.

    2.2 Transio cultural provocada pela inovao tecnolgica

    A avalancha informativa do sculo XXI, a exemplo da que ocorreu no sculo

    XV, o resultado de uma seqncia de inovaes tecnolgicas e tambm est na

    origem de mudanas culturais, polticas, sociais e econmicas.

    Ambos os processos resultaram de contextos histricos definidos nos quais a

    informao jogou e joga um papel protagnico. No caso da grfica de Gutenberg, o

    barateamento do custo de multiplicao de documentos alterou drasticamente a

    conformao da esfera pblica ao criar um fluxo unidirecional de informaes que

    aumentou o poder das elites de condicionar o debate pblico. A populao

    continuou, no entanto, fora deste debate.

    Neste trabalho, adotamos a definio simplificada de Benkler (2006, p. 177)

    para esfera pblica: (...) o conjunto de prticas que os membros de uma

    sociedade usam para se comunicar em questes que eles consideram temas de

    interesse pblico e que exigem um reconhecimento ou uma ao coletiva.

    A revoluo informativa deflagrada pela inveno de Gutenberg deu origem

    ao que conhecemos hoje como comunicao de massa, ou seja, um sistema de

    transmisso de dados, notcias e informaes baseado na multiplicao de uma

    mesma mensagem para um grande nmero de receptores passivos. A comunicao

    de massa surgiu com os primeiros jornais no sculo XVII, mas adquiriu suas

    caractersticas atuais no final do sculo XIX, quando passou a ter uma influncia

    decisiva na conformao da esfera pblica de debates.

    16

  • As inovaes tecnolgicas no final do sculo XX e incio do sculo XXI

    criaram as bases para o surgimento de um novo sistema de transmisso de dados e

    informaes cuja caracterstica primordial so as redes de computadores

    interligando comunidades sociais (CASTELLS, 2003).

    O sistema de redes inverteu o modelo tradicional, de um para muitos, para

    dar origem ao modelo muito para muitos, onde o fluxo emissor > receptor

    substitudo por uma interao de fluxos informativos entre internautas e as redes,

    criando um sistema comunicativo (DE FELICE, 2008, p. 44).

    A comunicao deixa de ser um processo unidirecional e horizontal para se

    transformar num sistema rizomtico[9] no qual j no mais possvel identificar o

    emissor e o receptor, tornando o mecanismo da produo da comunicao ainda

    mais complexo.

    A teoria rizomtica foi desenvolvida pelo filsofo francs Gilles Deleuze, nos

    anos sessenta, para demonstrar que as construes filosficas tinham invertido a

    lgica secular dos modelos baseados em hierarquias verticais (ou modelos

    derivados de rvores do pensamento) para um novo patamar fundado em prticas

    sociais. (DELEUZE, 1996).

    Sendo assim, possvel pensar que o emissor no emite mais mensagens,

    mas constri um sistema de rotas de navegao e conexes (SANTAELLA, 2004, p.

    163 apud DE FELICE, 2008).

    A inverso do fluxo informativo no ambiente digital da internet provocou

    tambm o surgimento da mdia individual, onde individual no significa isolamento.

    Estamos falando do individualismo conectado, de um individualismo em rede.

    A mdia individual elimina a hegemonia da mdia de massa, mas no a elimina

    como sistema de comunicao. As duas mdias passam a conviver, cada uma dentro

    de sua especificidade.

    As redes digitais conformaram um novo ambiente social onde comeou a

    desenvolver-se o modelo da autoria coletiva, da sabedoria das multides[10] e das

    comunidades inteligentes. So todas expresses cunhadas por pensadores da era

    digital e que tm em comum o fato do comportamento coletivo na gerao de novos

    conhecimentos estar ocupando espaos antes preenchidos pela ao individual.

    (CAVALCANTI & NEPUMOCENO, 2007)

    Se no fluxo informativo as redes digitais resgataram o individualismo, na

    produo de conhecimentos ocorreu o fenmeno contrrio, ou seja, a produo

    17

  • individual perdeu espaos para a ao coletiva, no ambiente digital. No h como

    produzir conhecimentos na intensidade, profundidade e velocidade exigidas pela era

    digital, seno por meio da ao coletiva. Da mesma forma que, sem a computao e

    a robotizao, a corrida espacial e automatizao da produo industrial seriam

    inviveis.

    A expanso contnua e acelerada da Web para mais de um bilho de usurios

    aumentou o impacto social das mudanas de paradigmas na comunicao. Isto

    gerou o surgimento de novos comportamentos, crenas e valores, que entraram em

    conflito com rotinas e valores da era analgica.

    A estabilidade est cedendo lugar mudana constante e fluidez. O

    conhecimento e a informao j no se situam mais em ambientes fixos e

    determinados, mas encontram-se espalhados por toda a rede de pessoas

    conectadas internet.

    Bauman[11] mostra como a crescente fluidez do quotidiano, combinada com a sensao permanente de mutabilidade, criou as condies

    contemporneas para uma existncia lquida, como uma vida precria,

    vivida sob condies de precariedade permanente (DEUZE, 2007, p. 42,

    traduo do autor).

    Deuze criou a expresso jornalismo lquido[12] para identificar o exerccio da

    atividade informativa num ambiente social caracterizado pela fluidez e mutabilidade

    constantes.

    (...) ns tambm estamos assistindo um nvel sem precedentes de ativismo

    e controle social em nossa experincia pessoal de realidade mediada. Um

    jornalismo que pretenda inserir-se nesta ecologia ter necessariamente que

    tornar-se fluido: um jornalismo lquido (DEUZE, 2006, p. 6-7).

    Santaella leva a idia de fluidez na comunicao a um nvel ainda mais

    amplo, ao situ-la num contexto de obra em permanente reelaborao:

    Toda variedade de prticas inclusivas na comunicao via redes correio

    eletrnico, mensagens instantneas, videoconferncias etc. constituem

    um sujeito mltiplo, instvel, mutvel, difusa e fragmentado, enfim uma

    18

  • constituio inacabada, sempre em projeto. (SANTAELLA, 2004, p. 126)

    A gerao de novos comportamentos, crenas e valores pelas tecnologias

    intelectuais acontece dentro do contexto das novas redes digitais onde as

    comunidades virtuais ocupam um lugar preponderante.

    2.3 Comunidades virtuais

    As comunidades virtuais so parte integrante das sociedades em rede e do

    que Benkler[13] e Habermas definem como esfera pblica. As comunidades so os

    nodos (ns) das redes que se interconectam por meio da plataforma fsica chamada

    internet.

    As definies de comunidade virtual, tambm chamada de comunidade

    online, variam muito e, conforme aponta Castells, so fortemente influenciadas pelo

    debate entre socilogos e os pesquisadores da internet. Ainda segundo Castells:

    Talvez o passo analtico necessrio para se compreender as novas formas

    de interao social na internet seja tomar como base uma redefinio de

    comunidade, dando menos nfase ao seu componente cultural e mais

    nfase ao seu papel de apoio a indivduos e famlias, desvinculando sua

    existncia social de um tipo nico de suporte material. (CASTELLS, 2003,

    p. 106)

    Barry Wellman (apud CASTELLS, 2003), define comunidades virtuais como

    (...) redes de laos interpessoais que proporcionam sociabilidade, apoio,

    informao, um senso de integrao e identidade social .

    J Cavalcanti e Nepumoceno (2007, p. 46) caracterizam as comunidades em

    redes virtuais como entidades (...) que acessam o mesmo ambiente virtual, que

    fornecem informaes de forma voluntria ou involuntria, permitindo assim gerar

    conhecimento coletivo.

    Combinando as trs definies poderamos chegar a uma frmula que, para

    efeitos operacionais neste trabalho, poderia ser expressa da seguinte maneira: uma

    comunidade virtual formada por indivduos com algum interesse, vivncia ou

    problema em comum, que se comunicam de forma, basicamente, no presencial

    19

  • usando algum tipo de ferramenta miditica para alcanar uma meta coletiva.

    O termo comunidade virtual j era conhecido antes do surgimento da internet,

    mas tornou-se muito popular depois do livro Virtual Communities (Comunidades

    Virtuais), publicado em 1993 pelo escritor e pesquisador norte-americano Howard

    Rheingold. Desde ento, a obra tornou-se uma referncia entre os pesquisadores de

    comunidades baseadas na internet[14].

    2.3.1 Caractersticas e diferenas

    O surgimento de comunidades virtuais assinala algumas rupturas importantes

    em relao ao modelo convencional de comunidade, como mostra Marcos Palcios

    (1996, p.87):

    Nas sociedades pr-modernas, a maior parte dos indivduos no tinha

    qualquer escolha quanto comunidade a que pertenciam. Eles, em

    geral, nasciam, viviam e morriam numa comunidade, exercendo muito

    pouca opo no que diz respeito a pertencer a outras comunidades,

    fossem elas quais fossem. A Modernidade, com o aumento da

    mobilidade fsica dos indivduos, a urbanizao, o estabelecimento do

    sistema poltico de representao, do direito de cidadania, etc., traz o

    aumento da possibilidade do indivduo eleger a comunidade, ou

    comunidades, a que deseja pertencer. A mltipla inscrio social ,

    indubitavelmente, uma das caractersticas da sociabilidade

    contempornea.

    Ainda segundo Palcios (1996, p.89):

    Nas comunidades de tipo clssico, ou mesmo ps-moderno, a

    existncia de meios prprios de comunicao, quaisquer que sejam eles,

    (jornais, newsletters, servios de alto falantes, jornais murais, circuitos de

    fofocas e mexericos, etc.), constitui um elemento de peso na formulao

    do tipo ideal de comunidade. No caso da comunidade virtual, o meio de

    comunicao (as redes interativas) a prpria razo de existir da comunidade. No h separao possvel entre a comunidade virtual e o

    meio de comunicao que d origem a ela. A comunidade virtual se

    estabelece nesse meio e em virtude da existncia de tal meio.

    20

  • De forma esquemtica, poderamos organizar do seguinte modo as principais

    diferenas entre as comunidades tradicionais (pr-internet) e as comunidades

    virtuais:

    Quadro 1 Comunidades tradicionais e Comunidades virtuais

    O conceito de pertencimento est vinculado a identidades geogrficas,

    culturais, econmicas e afetivas como, por exemplo: nacionalidade, etnias, atividade

    produtiva comum e famlia. Nas comunidades tradicionais, h uma forte conexo

    entre o pertencimento e a territorialidade, enquanto nas comunidades virtuais, h o

    que Giddens chama de desencaixe[15] entre estes dois elementos (GIDDENS,

    1991).

    A noo de desencaixe est ligada diretamente importncia que a

    informao passou a ter na forma pela qual as pessoas se agrupam. Se antes o

    fator de aglutinao era determinado pela geografia e pelo pertencimento, na era

    digital, a informao passou a ser determinante no comportamento dos indivduos.

    As pessoas se juntam para buscar, processar ou disseminar informaes, num

    processo onde os espaos fsicos perderam relevncia para o ambiente digital.

    2.4 A informao na nova cultura digital

    A idia de comunidade est associada a toda a histria da internet. Desde

    que a tecnologia viabilizou a interconectividade entre computadores, estes passaram

    a funcionar como ns ou nodos de redes virtuais, ligando comunidades de usurios.

    Estas comunidades conformam ambientes presenciais e/ou virtuais classificados por

    21

  • Castells e Melucci como laboratrios da nova cultura digital onde possvel

    materializar os efeitos sociais das inovaes tecnolgicas.

    Castells (2003, p. 99) adverte para o fato de que os estudos sobre cultura

    digital ainda esto fortemente influenciados por dicotomias simplistas, ideolgicas,

    que dificultam uma compreenso dos novos padres de interao social.

    Melucci (1996), por seu lado, assinala que a identificao dos novos valores

    culturais gerados pela interao em redes sociais complicada pela multiplicao de

    modismos e pela mercantilizao extremada dos usos das novas tecnologias.

    Os dois autores coincidem, no entanto, que apesar dos fatores limitantes,

    possvel perceber o surgimento da nova cultura digital, especialmente entre os

    adolescentes e jovens entre 20 e 35 anos.

    H uma variada gama de novos comportamentos e valores culturais

    emergindo no ambiente comunitrio virtual, conforme mostram os estudos de

    Castells (2003), Melucci (1996), Ito (2005), Di Maggio et al. (2001). Mas para efeitos

    deste trabalho, nos deteremos apenas nos que afetam o uso da informao pelos

    usurios da Web.

    Jenkins (2006, p. 25) mostrou como os espectadores de sries de televiso

    como Survivor criaram comunidades virtuais para trocar informaes visando

    antecipar-se ao desenrolar da trama, numa iniciativa motivada pelo simples prazer

    de desafiar o sigilo em torno do nome do ltimo sobrevivente do episdio produzido

    na Amaznia, em 2004.

    No auge do fenmeno das comunidades criadas em torno do programa

    Survivor, mais de cinco mil pessoas, apelidadas de spoilers (predadores), chegaram

    a participar de quase uma centena de grupos na internet que trocavam informaes

    sobre a srie. Foi a primeira vez que as comunidades tiveram um papel

    preponderante num exemplo prtico de convergncia de canais de comunicao.

    A situao chegou a um ponto tal que a rede CBS, a produtora da srie,

    resolveu apelar para a justia norte-americana para tentar impedir que a inteligncia

    coletiva gerada dentro de comunidades acabasse com o mistrio em torno do ltimo

    sobrevivente e que era o grande atrativo para manter audincias da ordem de 40

    milhes de norte-americanos. Os tribunais deram ganho de causa aos spoilers.

    O poder da inteligncia coletiva gerada em comunidades virtuais mudou os

    valores sociais associados a comportamentos tradicionais na rea da informao,

    especialmente a jornalstica. No caso dos spoilers da srie Survivor, quem no

    22

  • tornasse pblica uma informao pessoal acabava enfrentando a ira dos demais

    membros da sua comunidade porque a reteno de um dado obrigava os restantes

    a trabalho adicional.

    As redaes jornalsticas, em especial, sempre valorizaram muito o chamado

    furo, informao indita e exclusiva. No caso dos spoilers, ficou patente a

    superioridade dos coletivos na produo de informao, apesar das resistncias

    culturais ligadas cultura da informao como uma mercadoria capaz de ser

    estocada.

    A coletivizao da cultura informativa nas comunidades ganhou inclusive um

    atrativo comercial com o sucesso de iniciativas concebidas dentro da chamada Web

    2.0, cuja caracterstica mais marcante a participao do usurio como fornecedor

    de insumos informativos.

    Nesta categoria encontram-se as comunidades virtuais criadas em torno de

    sites interativos como Facebook, MySpace, Hi5, Orkut, Bebo e Friendster cujo

    crescimento foi vertiginoso a partir do ano 2006 e que em junho de 2008 reuniam, na

    soma total, cerca de 580 milhes de visitantes nicos em todo o mundo, segundo o

    site ComScore[16].

    Trata-se de um fenmeno realmente global que surgiu nos Estados Unidos e

    Europa, mas hoje registra seus maiores ndices de crescimento na sia, frica e

    Amrica Latina, apesar do atraso tecnolgico nestas regies em comparao aos

    pases ricos.

    Isto representa uma acelerada incorporao de informaes e conhecimentos

    ao capital intelectual disponvel na internet.

    2.5 Nuvem informativa

    Para o socilogo italiano Alberto Melucci (1996, p. 226), professor da

    Universidade de Milo:

    o mundo em que vivemos est irreversivelmente construdo base de

    informao. A viso ingnua de que a informao um espelho da

    realidade no passa de uma ressaca do passado e deve ser abandonada.

    A informao em suas vrias formas realidade, pelo menos no sentido de

    que nossa experincia hoje totalmente mediada.

    23

  • Nesta frase de Melucci, h duas idias centrais: a de que a informao no

    mais vista como um espelho da realidade; e a de que a informao a realidade.

    A idia da informao como espelho, segundo Melucci, est baseada na

    concepo de que a realidade algo que pode ser congelado ou fotografado.

    Quanto mais fiel for esta fotografia ou descrio da realidade, mais objetiva, exata

    e fiel seria a informao.

    Percebemos a realidade por meio dos nossos sentidos, que alimentam a

    formao de mapas mentais que por sua vez servem de base para o

    desenvolvimento do conhecimento individual. Como cada pessoa diferente, porque

    tem histria e contexto distintos, cada uma delas cria um mapa mental diferente.

    Assim, cada pessoa v a realidade de um jeito diferente, portanto, no h um nico

    espelho e sim bilhes de espelhos (FIALHO, 2001).

    A principal conseqncia desta constatao a de que no existe a

    objetividade absoluta na informao e que, portanto, a imprensa no pode mais se

    apresentar como a guardi desta objetividade (MELUCCI, 1996, p. 226).

    Antes da revoluo tecnolgica provocada pela digitalizao da informao e

    pelo surgimento da World Wide Web, a imprensa ainda podia arrogar-se a funo de

    espelho da realidade quotidiana porque a circulao de dados, informaes e

    conhecimentos era limitada, se compararmos com os padres ps internet.

    Mas depois da avalancha informativa provocada pela internet, segundo

    Melucci, houve uma mudana dramtica na natureza de nossa vida social e

    individual aumentando enormemente a importncia da anlise das formas como a

    informao constri a realidade. J no se trata mais de denunciar manipulaes e

    omisses de informaes pela imprensa, mas de fatores muito mais importantes e

    relevantes como a maior ou menor visibilidade dos cdigos que condicionam a

    cultura da imprensa como manuais de redao e cdigos de tica, bem como os

    processos de tomada de deciso e de construo do vocabulrio (MELUCCI, 1996,

    p. 226).

    Alm de perder um guardio da objetividade que funcionava como referncia

    para determinar o que era exato ou inexato e, por conseqncia, um dos elementos

    para determinar o certo ou errado, a sociedade contempornea assiste tambm

    emergncia do fenmeno da informao onipresente e ubqua, porque ela impregna

    24

  • a nossa existncia, na forma de uma nuvem informativa.

    A nuvem informativa um conceito desenvolvido pelo norte-americano

    Thomas Wander Val[17], para definir grandes volumes de informao digitalizada.

    Wander Val (2004) identifica quatro tipos de nuvem informativa:

    a) Nuvem Informativa Global na internet, de livre acesso e sem controle

    b) Nuvem Informativa Externa acesso mediante senha e protegida por firewall;

    c) Nuvem Informativa Local - LANs com acesso limitado;

    d) Nuvem Informativa Pessoal controle individual, mvel e de acesso livre.

    A idia de nuvem informativa global est apoiada no conceito de computao

    em nuvem, ou seja, a multiplicao de softwares e bancos de dados no residentes

    em computadores e acessveis por intermdio da Web. Exemplos deste novo

    conceito de software so as vrias ferramentas desenvolvidas pela empresa Google

    e que esto disponveis grtis na internet.

    Um dos elementos chaves da nuvem informativa global o sistema de

    indexao de contedos por meio de etiquetas eletrnicas (tags) criadas por

    usurios da Web para permitir uma localizao personalizada de contedos digitais.

    Este recurso ganhou uma enorme popularidade depois do sucesso do site Delicious

    e passou a conformar o que muitos chamam de nuvem de tags.

    Ao criar uma tag, um usurio associa conhecimento pessoal a uma palavra

    que, por sua vez, est vinculada a uma pgina ou site na Web. Uma nuvem de tags

    basicamente formada por grandes volumes de informao pessoal circulando na

    rede num processo onde cada usurio pode usufruir a experincia e reputao dos

    demais (WANDER VAL, 2004).

    A nuvem informativa pessoal a que cresce de forma mais acelerada em

    virtude da multiplicao dos equipamentos eletrnicos portteis. O usurio

    virtualmente seguido por uma nuvem contendo seus dados pessoais que podem

    ser baixados por equipamentos do tipo telefone celular, tocador de MP3 (iPod),

    laptop, GPS[18], todos com acesso sem fio Web, em qualquer lugar.

    25

  • Estes equipamentos, como no caso das SMS[19] (Short Message Service),

    estudadas por Rheingold, permitem a comunicao entre as nuvens informativas

    pessoais formando tribos e comunidades virtuais. (RHEINGOLD, 2002, p. 3)

    3 CRISE NO MODELO CONVENCIONAL DE JORNALISMO

    3.1 A crise na imprensa

    Os primeiros sintomas de crise na imprensa norte-americana surgiram no final

    dos anos 70, quando os ndices de leitura e de circulao dos jornais comearam a

    cair de forma contnua. O que mais impressionou os pesquisadores foi a intensidade

    da queda no segmento dos leitores jovens, com menos de 35 anos.

    A situao tornou-se ainda mais grave, a partir dos anos 90, com a crescente

    popularizao da internet como ferramenta de comunicao. O que antes era

    atribudo basicamente a uma questo editorial, tornou-se no final da dcada tambm

    um problema financeiro e estratgico, porque os portais informativos online

    passaram a atrair os leitores mais jovens e conquistar anunciantes tradicionais na

    mdia impressa, como os anncios classificados.

    O grfico a seguir, produzido pelos autores do informe State of the News

    Media 2008 (Estado da Imprensa Noticiosa, 2008)[20] mostra o declnio dos ndices

    de leitura, nas edies durante a semana e nos finais de semana, nos jornais norte-

    americanos desde 2003.

    Figura 1 ndices de leitura Fonte: Estado da Imprensa Noticiosa (2008)

    Os leitores jovens, com menos de 35 anos, foram os que mais deixaram de

    26

  • ler jornais nos Estados Unidos, ainda segundo as estatsticas do Informe sobre o

    Estado da Imprensa 2008. A queda mais ou menos constante em todas as faixas

    etrias, com um decrscimo mdio de 10 pontos percentuais num perodo de oito

    anos. Ela menos intensa apenas no segmento dos leitores com mais de 65 anos,

    onde a reduo de leitura de jornais foi inferior a 6%, conforme mostra o grfico a

    seguir[21].

    Figura 2 ndices de leitura Fonte: Estado da Imprensa Noticiosa (2008)

    A situao da imprensa nos Estados Unidos est sendo acompanhada por

    estudiosos e profissionais da comunicao porque ela considerada a mais

    avanada do mundo, tanto no aspecto tecnolgico e corporativo, como em matria

    de produo de contedos (MEYER, 2007).

    A crise na imprensa norte-americana tem um significado especial para a ns

    brasileiros, porque a grande maioria dos nossos jornais adotou o modelo norte-

    americano de jornalismo, com adaptaes provocadas por diferenas culturais,

    sociais e econmicas. (SILVA, 1991, p. 58)

    3.2 A transio no modelo de negcio da imprensa

    Em todo o mundo, os principais compradores e assinantes de jornais so

    pessoas na faixa dos 35 a 65 anos. Caso a evaso do pblico jovem continue no

    ritmo atual, quando a gerao que tem hoje 18 a 25 anos chegar maturidade

    plena, ela no ter mais como hbito a leitura de jornais e revistas impressos.

    27

  • Depois da virada do sculo, a acelerada proliferao de pginas pessoais

    chamadas weblogs criou um tem adicional na, j longa, lista de dilemas enfrentados

    pelos grandes grupos miditicos, em especial nos Estados Unidos.

    Desde 2004, a crise obrigou os jornais norte-americanos a reduzirem a

    cobertura internacional para cortar custos, conforme revelou a pesquisa The

    Changing Newsroom: Gains and Losses in Today's Papers[22], que entrevistou

    executivos e editores de 259 jornais de pequeno, mdio e grande porte nos Estados

    Unidos, no primeiro quadrimestre de 2008.

    A investigao mostrou que 2/3 dos jornais norte-americanos eliminaram

    correspondentes estrangeiros e reduziram em quase 70% a cobertura internacional.

    Cortes similares foram feitos no noticirio nacional e na informao econmica,

    provocando uma reduo do espao dedicado s notcias em 3/5 dos jornais

    investigados.

    A situao da imprensa escrita nos Estados Unidos, notadamente dos jornais,

    entrou numa fase considerada crtica a partir de 2003/2004 quando os papis das

    empresas jornalsticas foram muito desvalorizados como conseqncia de

    prognsticos sombrios sobre o futuro do setor. Os acionistas da cadeia Knight

    Ridder, de jornais e emissoras de televiso, obrigaram a famlia Knight, que

    controlava o segundo maior imprio jornalstico do pas, a vender a maior parte dos

    32 jornais da rede.

    No The New York Times, a famlia Sulzberger teve que enfrentar uma forte

    oposio dos acionistas contra o sistema de voto privilegiado, que garante o controle

    do jornal por um reduzido nmero de pessoas e a manuteno da linha editorial que

    transformou o jornal no principal cone da imprensa norte-americana.

    O pessimismo na imprensa norte-americana atravessou o Atlntico, nos anos

    2007 e 2008, contaminando tambm os jornais europeus, notadamente na

    Inglaterra, Frana, Blgica, Holanda e Dinamarca. A maior fonte de preocupao dos

    jornais passou a ser a perda dos anncios classificados para a internet, onde eles

    so publicados de graa, e a migrao para a web de servios que antes atraiam

    muitos leitores como as cotaes da bolsa, ndices financeiros e o segmento de

    lazer (cinemas, teatro, shows, restaurantes e bares).

    Os anncios classificados garantiam, em 2001, 40% da vendagem e 40% do

    lucro lquido dos 100 maiores jornais norte-americanos e europeus, segundo a

    revista Advertising Age. Em 2007, ainda segundo a mesma fonte, a venda de

    28

  • anncios classificados caiu US$ 5,4 bilhes entre 2000 e 2007 (uma queda de

    27,7%). Os setores que registraram as maiores redues foram o de anncios de

    novos empregos (56,3%) e o de vendas de automveis (35%).

    O nico segmento dos anncios classificados que no registrou perdas

    significativas no perodo 2000/2007 foi o setor da habitao, mas a partir deste ano,

    a queda foi intensa conseqncia da crise financeira na rea de crdito imobilirio. A

    nova situao levou especialistas, como executivo e consultor Allan Mutter[23], a

    prever que a receita lquida dos jornais norte-americanos em 2008 pode ficar abaixo

    dos US$ 40 bilhes, no pior desempenho financeiro da indstria de jornais nos

    ltimos 20 anos.

    A reduo progressiva de receitas e a presso dos investidores nas bolsas

    de valores levaram a maioria dos jornais a adotarem medidas de economia que, por

    sua vez, provocaram cortes nas redaes. S nos Estados Unidos, o contingente de

    jornalistas empregados nos grandes grupos da imprensa encolheu de 122 mil para

    116 mil profissionais registrados entre os anos de 1992 e 2002, segundo um estudo

    da Universidade de Indiana[24].

    Mais recentemente, o fenmeno se intensificou com a demisso de mais de

    mil jornalistas em cinco grandes jornais norte-americanos[25], num fenmeno que o

    escritor e jornalista Timothy Eggan[26] comparou leitura de um obiturio.

    A rebelio dos acionistas assustados com a contnua desvalorizao dos

    papis dos principais conglomerados jornalsticos dos Estados Unidos apontou para

    a necessidade de uma reviso do modelo de negcio adotado pela imprensa norte-

    americana, tema que passou a ser um tem na agenda de debates da mdia,

    incluindo a o segmento publicitrio, a televiso e as revistas, em especial as

    semanais de informao.

    Enquanto o pessimismo torna-se endmico na mdia norte-americana, na sia

    e Amrica Latina, a situao da imprensa diferente por conta de uma conjuntura

    econmica marcada pelo aumento do consumo interno e pela expanso mais lenta

    da internet, em especial em pases como China, ndia e Brasil.

    Segundo dados do relatrio da Associao Mundial de Jornais (WAN) a

    circulao dos jornais na Amrica Latina cresceu 6,72% na Amrica do Sul, 4,7% na

    sia e caiu na frica (-0,49%), na Europa (-1,97%), na Amrica do Norte (- 2,14) e

    na Austrlia e Oceania (- 4,28%)[27].

    A euforia econmica chinesa est ligada ao vertiginoso crescimento das

    29

  • empresas de montagem de mquinas e produtos de consumo que usam mo de

    obra barata, e aos investimentos feitos na preparao das Olimpadas de Pequim,

    cujo custo superou os 20 bilhes de dlares, segundo a revista norte-americana

    Dollar & Sense[28].

    O aumento da produo agrcola e de combustveis no Brasil, aliado ao

    saneamento financeiro, provocaram uma estabilidade nos preos que levou as

    pessoas a consumirem mais. Alm disso, a queda da taxa bsica de juros e o

    aumento das facilidades de crdito determinados pelo governo, geraram uma rpida

    expanso dos negcios imobilirios e no setor de automveis, com imediatas

    repercusses no setor publicitrio e, o conseqente, o aumento das receitas da

    imprensa.

    No Brasil, a receita publicitria dos 138 jornais vinculados a Associao

    Nacional de Jornais (ANJ) aumentou 18,91% no primeiro semestre de 2008,

    superando a casa do R$ 1,6 bilho. No mesmo perodo a circulao global

    aumentou 8,1%, segundo dados do Instituto Verificador de Circulao (IVC), citados

    no site da ANJ[29].

    Os nmeros positivos no desempenho da imprensa na Amrica Latina e sia

    provavelmente sero afetados pelo agravamento da recesso norte-americana e da

    reduo do ritmo econmico na Europa, depois da crise nas principais bolsas de

    valores do mundo, iniciada na primeira quinzena de outubro de 2008.

    3.3 A crise do noticirio local e a perda das bases comunitrias

    A perda de importncia do noticirio local dentro da agenda informativa dos

    jornais, emissoras de rdio e de televiso comeou a ser percebida de forma mais

    intensa j nos anos 70 quando a imprensa no mundo capitalista adotou a estratgia

    da globalizao informativa, que levou criao de grandes conglomerados

    jornalsticos.

    Mas o processo comeou bem antes, na dcada de 50, quando a agenda

    noticiosa vinculada disputa ideolgica entre Unio Sovitica e Estados Unidos deu

    ao noticirio internacional e nacional um destaque desproporcional em relao

    informao local, que at ento era o principal elo entre o pblico e a imprensa.

    A slida aliana estabelecida entre mega-corporaes na imprensa e setores

    do comrcio, servios e sistema financeiro, a partir dos anos 80, gerou uma

    30

  • concentrao publicitria nos veculos de maior circulao e audincia. A imprensa

    local, que j vinha perdendo espaos editoriais em funo do baixo custo do

    noticirio internacional produzido por agncias e jornais globalizados, ficou ainda

    mais vulnervel pela reduo aguda das receitas de anncios.

    Os jornais locais foram fechando as portas gradativamente, enquanto no

    segmento das emissoras de rdio e de televiso, a produo local foi substituda por

    programas transmitidos em rede. As estaes locais passaram a ser meras

    retransmissoras, sem equipes jornalsticas, provocando o que Klinenberg (2007)

    chamou de perda de identidade local.

    Como a imprensa local ficou submetida a pautas editoriais impostas por

    redaes situadas a centenas de quilmetros de distncia, as agendas nacional e

    internacional passaram a predominar sobre os temas comunitrios. Com isto a

    produo local de notcias acabou sendo dominada pelo noticirio sobre crimes,

    escndalos, curiosidades, sexo, tragdias naturais e personalidades.

    O descrdito da mdia local tambm foi influenciado pelo fato de que a maioria

    dos jornais e rdios em pequenas cidades geralmente controlada por empresrios

    ou polticos da regio que usam os veculos em beneficio prprio. O jornalismo local

    passou a ser visto com desconfiana pelos leitores, o que tambm contribuiu para a

    queda de sua circulao e de suas receitas com vendagem.

    Nos anos 80 e 90, surgiram estudos sobre a sociologia comunitria

    mostrando uma acentuada tendncia ao isolacionismo. O livro Bowling alone, de

    Robert Putnam, um clssico da literatura do gnero, onde o autor fundamenta com

    pesquisas o acelerado processo de introspeco na sociedade norte-americana,

    como conseqncia da falta de comunicao interpessoal em comunidades situadas

    dentro do pas que levou mais longe a globalizao informativa. (PUTNAM, 2001, p.

    225-225)

    H 60 anos, existiam nos Estados Unidos 1.300 jornais locais. Na virada do

    sculo XXI, este total caiu para menos de 300, num fenmeno qualificado por

    Overholser (1999) como potencialmente perigoso para a sobrevivncia da

    democracia e da diversidade nas pequenas comunidades norte-americanas.

    31

  • 3.4 O ressurgimento da informao local e o jornalismo cidado

    A partir de 2005, a pesquisa The changing newsroom: gains and losses in

    Today's Papers constatou uma reviso na estratgia editorial dos 259 jornais

    pesquisados. Cada vez mais preocupados com a concorrncia dos weblogs sobre

    temas comunitrios e com perda de assinantes residentes em subrbios ou

    condomnios, os jornais resolveram apostar novamente no noticirio local.

    Esta transferncia de prioridades editoriais do noticirio internacional e

    nacional para o local aconteceu num momento em que as questes comunitrias

    tornaram-se o foco das atenes de centenas de weblogs produzidos por pessoas

    sem formao tcnica em jornalismo, definidas por Gillmor (2004, p. 137) como

    jornalistas cidados[30].

    O jornalismo cidado marca o reaparecimento, na era digital, do jornalismo

    cvico, uma variante do jornalismo profissional que surgiu em meados dos anos 90,

    nos Estados Unidos como uma reao de um grupo de reprteres, editores e

    professores, contra o que Rosen (2001, p.1923) classificou, na poca, de divrcio

    crescente entre a agenda da imprensa e as preocupaes das comunidades

    urbanas.

    O jornalismo cvico, patrocinado por um projeto de 10 milhes de dlares do

    Pew Center For Civic Journalism[31] contou com a adeso de quase 30 jornais

    regionais em diferentes estados norte-americanos. Estes jornais passaram a

    convocar a populao de bairros para participar de assemblias pblicas nas quais

    as autoridades municipais eram questionadas sobre os problemas comunitrios. O

    principal objetivo era aumentar a participao dos moradores em eleies locais.

    A iniciativa provocou uma profunda diviso entre os jornalistas porque

    alterava o tradicional conceito de que os profissionais da informao no devem

    tomar partido em reivindicaes sociais. A polmica entre os jornalistas s no teve

    maiores conseqncias porque o projeto no teve os resultados esperados nas

    eleies legislativas de 1994, nas reas onde ele foi aplicado e as fontes de

    financiamento decidiram no renov-lo.

    Quase 15 anos depois, a rpida expanso dos weblogs reacendeu a polmica

    entre os profissionais da imprensa, agora com o surgimento da figura do jornalista

    cidado e da importncia adquirida pelo que passou a ser chamado de noticirio

    32

  • hiper-local, uma modalidade de busca, produo e publicao de informaes sobre

    agrupamentos humanos em reas urbanas reduzidas como bairros pouco

    populosos, ruas e condomnios.

    O site Melrose Mirror[32] foi criado em 1996 por um grupo de 50 aposentados

    e idosos na cidade norte-americana de Melrose, no estado de Massachusetts, nos

    Estados Unidos. Desde ento, eles se renem todas as quartas-feiras para discutir

    questes locais e decidir quais os assuntos que sero tratados na newsletter

    eletrnica, que considerada por Gillmor como a precursora dos weblogs

    hiperlocais.

    O Mirror surgiu como um projeto experimental do programa News in the

    Future[33] (A Notcia do Futuro) criado pelo Massachusetts Institute for Technology

    (MIT), na poca em que o jornalismo cvico estava em evidncia. A newsletter tinha

    uma edio impressa mensal, at que em 2001 ela passou a ser publicada na web.

    Foi a partir da experincia com o Melrose Mirror que os engenheiros do MIT

    desenvolveram o software Silver-Stringer, usado at hoje por centenas de projetos

    comunitrios ao redor do mundo.

    A idia de jornalismo cidado ganhou novo impulso em 2004 com a criao

    do jornal online sul coreano OhmyNews[34], produzido por cerca de 30 mil

    colaboradores voluntrios e editado por um grupo de 30 jornalistas profissionais. O

    jornal, cujo slogan Cada Cidado um Reprter, teve um crescimento

    vertiginoso at chegar a um patamar de dez milhes de visitantes dirios em mdia.

    O OhmyNews serviu de inspirao para inmeros outros projetos como o

    NetZeitung[35] (alemo), o Observers[36] e AgoraVox[37] (franceses) e o

    iNorden[38] (pases escandinavos).

    Aqui na Amrica Latina, o Chile, Peru e Bolvia so os pases com maior

    nmero de experincias em jornalismo cidado. El Morrocotudo[39] publicado na

    provncia de Arica, o mais acessado site de jornalismo cidado do Chile, onde a

    empresa Dirios Ciudadanos edita outros nove sites regionais no pas.

    No Brasil, a experincia mais recente a do site Boca do Povo[40], editado

    na Bahia e no estado de Tocantins com base em material informativo produzido por

    leitores.

    3.5 A mdia busca uma nova oportunidade

    33

  • O fortalecimento gradual da produo independente de notcias foi

    beneficiado pelo fato das pesquisas de opinio pblica apontarem no final dos anos

    90 uma queda do interesse dos leitores, ouvintes e telespectadores pelo noticirio

    internacional em conseqncia do fim da Guerra Fria.

    Os dados da pesquisa The Changing Newsroom: Gains and Losses in

    Today's Papers mostram que 62% dos jornais norte-americanos estudados

    aumentaram o espao para cobertura de assuntos comunitrios, enquanto 50% dos

    editores entrevistados afirmaram que houve um acrscimo na quantidade de notcias

    publicadas sobre temas regionais ou estaduais.

    Quarenta por cento dos jornais norte-americanos pesquisados publicam blogs

    produzidos por jornalistas autnomos e produtores independentes de notcias locais.

    A insero de weblogs em portais informativos e nas pginas web de jornais tornou-

    se uma tendncia mundial, inclusive aqui no Brasil.

    O site do jornal O Globo publica 85 blogs de colunistas e colaboradores, com

    assuntos que vo desde a poltica at educao infantil. O The New York Times[41]

    publica 63 blogs em sua pgina na web incluindo temas que vo da culinria e

    vinhos, at maternidade e biologia. O jornal francs Le Monde[42] tambm seguiu o

    mesmo caminho com 31 blogs permanentes, mais uma seleo diria de outros 30

    blogueiros convidados.

    Mas apesar do aumento constante no espao concedido aos blogs nos sites

    de jornais convencionais, os editores ainda tm muitas restries aos produtores

    independentes de notcias. Na pesquisa The Changing Newsroom..., 46% dos

    editores de jornais norte-americanos admitiram que os blogs so um componente

    importante nos jornais atuais e futuros, mas 42% de todos os entrevistados

    afirmaram que o material produzido por no profissionais deve ser usado apenas

    como insumo bsico para a produo de notcias.

    Metade dos participantes da pesquisa afirmou que os textos enviados por

    independentes s eram publicados depois de avaliados por reprteres e editores

    profissionais. As fotografias enviadas por informantes autnomos, que inicialmente

    eram publicadas sem checagem, passaram tambm a ser rotineiramente analisadas

    para identificar adulteraes.

    3.6 A produo colaborativa e a crise da imprensa

    34

  • Apesar da forte resistncia produo independente de notcias ainda

    existente nas redaes convencionais, vrias universidades e jornais dos Estados

    Unidos comearam a explorar modalidades alternativas de cobertura local.

    Pouco menos de 38 anos depois de se recusarem a aderir a um projeto de

    investigao coletiva da morte do jornalista Dan Bolles, em Phoenix, Arizona, os

    editores chefes dos jornais The New York Times e The Washington Post admitiram

    num simpsio sobre jornalismo investigativo realizado na Universidade da Califrnia,

    em abril de 2008, que ambas publicaes esto agora dispostas a participar de

    projetos colaborativos[43].

    Por seu lado, vrias fundaes filantrpicas norte-americanas passaram a

    financiar projetos de produo noticiosa independente a nvel local. A Fundao

    Knight Ridder est apoiando os projetos Tandem e Spot.Us[44], voltados para a

    produo colaborativa de notcias. No site Spot Us, indivduos ou organizaes

    sociais podem contratar jornalistas para investigar um determinado tema de

    interesse coletivo, enquanto o Tandem um projeto desenvolvido por sete

    universidades norte-americanas visando produo colaborativa vdeos, udios e

    textos, por cidados comuns. O Tandem apoiado tambm pelo Idea Lab, do

    MIT[45].

    A Fundao Sadler apostou 10 milhes de dlares no projeto Pro-

    Publica[46],voltado para a produo de reportagens para a grande mdia, feitas por

    jornalistas independentes e free lancers. E h vrias outras iniciativas similares

    como a do Pulitzer Center on Crisis Reporting[47], que tambm produz reportagens

    com base em colaboradores independentes.

    O que comea a se esboar uma tendncia no sentido da buscar formas

    alternativas de produo de material informativo, como uma maneira de contornar a

    escassez de recursos das empresas jornalsticas, num momento em que o pblico

    comea a consumir mais informaes locais.

    As limitaes oramentrias surgem num contexto marcado tambm pelo

    aumento da preocupao das comunidades em obter maior visibilidade pblica na

    busca de solues para os seus problemas quotidianos, como pavimentao de

    ruas, rede de esgotos, segurana, transporte etc.

    A estratgia mais usada pelas comunidades para obter visibilidade a busca

    de incidncia sobre a agenda noticiosa da imprensa, por meio da produo de

    informaes de interesse pblico.

    35

  • Isto cria a possibilidade de combinao de interesses tanto da imprensa como

    das comunidades. Estas poderiam dar mais ateno produo de informaes de

    forma a oferecer material dentro dos parmetros mnimos de exatido, clareza e

    conciso exigidos pela imprensa, enquanto os veculos de comunicao poderiam

    dar maior receptividade ao material produzido pelas comunidades.

    A grande capilaridade das comunidades permite que seus membros estejam

    mais prximos dos eventos noticiosos locais do que os reprteres e editores de um

    jornal, por exemplo. Isto reduz custos operacionais oferecendo a possibilidade de

    uma sinergia entre as redes colaborativas e as redaes jornalsticas.

    4 A PRODUO COLABORATIVA DE CONTEDOS INFORMATIVOS

    4.1 Marco conceitual

    Colaborao e cooperao so dois termos definidos de diferentes formas por

    vrios autores. Nos dicionrios de Aurlio Buarque de Holanda e Antonio Houaiss,

    as duas palavras so apresentadas como sinnimos de uma ao conjunta de vrias

    pessoas tendo em vista um objetivo comum.

    J Bair (1989) afirma num trabalho sobre informtica que a colaborao pe

    mais nfase na participao individual dentro de um esforo coletivo enquanto a

    cooperao preocupa-se apenas com o grupo de pessoas.

    Segundo Kutova (2006),

    num projeto colaborativo, h mais espao para autonomia e para

    relacionamentos informais. A permanncia dentro do escopo pr-

    estabelecido de difcil controle e nem sempre desejada. Deve haver um estmulo interao entre os participantes. J num projeto cooperativo, existe uma interdependncia positiva. As interaes entre os participantes so essenciais. provvel que surja espontaneamente, ou de forma planejada, uma estrutura social, com hierarquias e distribuio de

    responsabilidades.

    Theodore Panitz (apud KUTOVA, 2006), um educador norte-americano citado

    no blog de Marcus Kutova, tambm destaca o foco individual ao tratar da

    colaborao em processos educativos pela internet:

    36

  • As caractersticas individuais so relevantes e o grupo opera em um

    esquema de contribuio mtua, sem competio. J na cooperao, o

    objetivo a concluso de um produto ou tarefa. Pode haver uma autoridade

    que controla o grupo, como um professor, e no h avaliao individual.

    Panitz prope a seguinte distino entre colaborao e cooperao: no

    processo cooperativo, as pessoas se agrupam para cumprir uma determinada tarefa

    ou atingir um objetivo pr-estabelecido sob a coordenao de um professor,

    coordenador, monitor ou moderador; j no processo colaborativo, o grupo de

    indivduos tem mais liberdade e autonomia para fixar objetivos e tarefas, sem a

    existncia de orientadores ou tutores. O ambiente colaborativo mais aberto e

    participativo (PANITZ apud KUTOVA, 2006).

    Assim, ao falarmos de produo colaborativa estamos nos referindo a um

    processo onde grupos de pessoas interagem livremente entre si, sem objetivo

    previamente especificado e sem o controle direto de uma autoridade fsica ou

    jurdica.

    O resultado final surge no decorrer do processo graas recombinao de

    dados, notcias e informaes por meio da interatividade entre os participantes do

    grupo ou comunidade. No caso especfico em estudo nesta dissertao, o produto

    gerado pela interao colaborativa formado por notcias de interesse comunitrio.

    A nossa definio de produo colaborativa baseia-se tambm nos conceitos

    de organizaes em rede, desenvolvidos por Walter Powell (1991), David Stark

    (1996) citados por Anita Chan (2002). Chan, com base nos conceitos de Powell e

    Stark, define as redes colaborativas como estruturas baseadas na heterarquia. Este

    tipo de estrutura organizacional caracterizado pela descentralizao e

    horizontalizao do controle da produo de contedos, valorizando a diversidade,

    iniciativa individual e polifonia de opinies. o oposto da hierarquia, centralizadora e

    vertical, bem como da anarquia, ausncia de controle.

    Stark (apud CHAN, 2002) afirma que a heterarquia especialmente

    adequada para lidar com situaes complexas como o caso das comunidades

    sociais e das redes de usurios da Web. Segundo o mesmo autor, o sistema facilita

    a adaptao e contextualizao em ambientes marcados pela polarizao de

    37

  • opinies.

    4.1.1 Contexto histrico

    A produo colaborativa um sistema associado internet desde os anos 60

    quando cientistas europeus e norte-americanos constataram as limitaes

    individuais e decidiram trabalhar em conjunto para criar uma rede mundial de

    computadores. Foi a primeira aplicao prtica na engenharia eletrnica do princpio

    da colaborao e que mais tarde viria dar origem ao conceito de software livre[48].

    O tema produo colaborativa de notcias entrou para o vocabulrio da

    comunicao em 1999 quando a revista Janes, especializada em armas e

    equipamentos blicos, decidiu suspender a publicao de um artigo sobre ciber-

    terrorismo depois que o texto submetido aos leitores da revista online Slashdot

    recebeu uma avalancha de crticas e correes.

    Foi a primeira vez que uma publicao altamente respeitada admitiu o

    princpio de que a soma dos conhecimentos dos seus leitores era maior do que a

    dos especialistas de renome mundial, que tradicionalmente assinam os textos da

    Janes, considerada uma bblia dos armamentos por militares do mundo inteiro. O

    artigo foi reescrito com a aceitao das observaes de 250 colaboradores

    voluntrios, mais 35 cartas de especialistas renomados.

    Na poca, a revista Slashdot, cujo slogan notcias para nerds[49] (news for

    nerds), tinha pouco mais de dois anos de existncia e o episdio da Janes, alm de

    torn-la mundialmente conhecida, provocou um intenso debate no meio jornalstico

    norte-americano e europeu sobre as relaes entre profissionais e amadores na

    produo de notcias.

    A partir da, a Slashdot tornou-se uma referncia no estudo de processos

    colaborativos online de produo de contedos. Vrios outros projetos, como o

    Kuro5sion e o Plastic foram desenvolvidos com base no Slash, o sistema de

    administrao de contedos desenvolvido pelos criadores da Slashdot e

    disponibilizado pelo sistema de software livre.

    4.1.2 Processo colaborativo na gerao de conhecimento

    38

  • O processo colaborativo relacional, ou seja, envolve mais de um

    protagonista. No caso de nosso campo de estudo, esta relao se materializa a

    partir de uma troca de informaes, o que confere caractersticas especiais e nicas

    ao processo. A troca de informaes se diferencia radicalmente do escambo,

    processo milenar onde um produto fsico trocado por outro.

    No caso da informao, a troca gera uma agregao de valor na medida em

    que as partes envolvidas alm de reterem o que j tinham, incorporam o que foi

    dado pelo outro ou por outros parceiros. No escambo, uma pessoa perde algo para

    ter um produto, servio ou bem. Neste sentido, o escambo s gera valor quando um

    dos parceiros consegue impor, ao outro, condies desiguais na troca.

    No caso da troca de informaes, o ganho exponencial e teoricamente

    infinito, o que confere economia baseada no conhecimento caractersticas inditas

    na histria das relaes humanas.

    A idia de crescimento econmico passa a estar associada diretamente

    ampliao da base de conhecimento, num processo que no enfrenta as limitaes

    da economia baseada em bens fsicos, no renovveis. O processo colaborativo

    pode assim ser considerado uma das ferramentas essenciais na produo de

    conhecimento e um dos elementos estruturais no desenvolvimento da economia

    digital.

    4.2 Produo Colaborativa em Comunidades

    4.2.1 Comunidades de Informao e Comunidades de Prtica

    A produo colaborativa de informaes acontece dentro do que Chan (2002)

    definiu como Redes Colaborativas Noticiosas (Collaborative News Networks),

    sistemas caracterizados por uma estrutura e lgicas informativas diferentes das

    adotadas por organizaes jornalsticas convencionais, que procuram maximizar a

    ordem interna por meio de uma estrutura hierrquica vertical.

    As Redes Colaborativas Noticiosas, ainda segundo Chan (2002), se

    distinguem das demais redes virtuais por adotarem uma estrutura heterrquica[50] e

    por seguirem a lgica da livre recombinao de informaes, dados e

    conhecimentos, sem padres formais pr-estabelecidos.

    Neste trabalho usaremos a expresso Redes Colaborativas Comunitrias

    39

  • para designar um tipo especfico de rede colaborativa noticiosa, que atua dentro de

    uma comunidade social. As redes colaborativas comunitrias so o ncleo

    operacional das comunidades de informao, definidas como o conjunto de pessoas

    de uma comunidade social que fornecem dados, notcias e informaes, mas no

    participam diretamente do processo de produo colaborativa.

    Esta a diviso de funes foi desenvolvida a partir da anlise do trabalho de

    Chan (2002) e do estudo de vrias experincias de produo colaborativa

    comunitria de informaes, pesquisadas pelos autores dos relatrios The Online

    Community Cookbook[51] e The Hype vs Reality VS What People Value: Emerging

    Collaborative News Models and the Future of News[52].

    Ela pode ser visualizada da seguinte forma:

    As comunidades de informao podem ser consideradas uma modalidade

    particular do que Wenger (2002) caracteriza como comunidades de prtica. O autor

    (2002) define as comunidades de prtica como (...) grupos de pessoas que

    compartilham preocupaes ou paixes por algo que elas realizam ou procuram

    fazer melhor, por meio de uma interao regular. [53]

    O mesmo autor (2002) estabelece que para uma comunidade ser considerada

    de prtica, ela deve possuir trs caractersticas essenciais:

    a) Um domnio espao geogrfico ou temtico determinado ou rea

    de interesse de pesquisa e aprendizado;

    b) Pessoas - envolvidas em atividades e discusses de interesse do

    40

  • grupo visando desenvolver novos conhecimentos pelo aprendizado ou

    pela troca de informaes.

    c) Uma prtica as pessoas que integram a comunidade desenvolvem

    conjuntamente uma atividade concreta de interesse comum (WENGER,

    2002, p. 27).

    A produo de informaes numa rede colaborativa noticiosa est

    condicionada por dois tipos de demanda por parte dos integrantes de uma

    comunidade social: notcias e servios. A produo colaborativa de notcias atende

    necessidade de resolver problemas coletivos, enquanto a produo colaborativa de

    informaes utilitrias est mais voltada para necessidades pessoais dos integrantes

    da comunidade.

    4.2.2 Produo colaborativa de notcias

    A produo colaborativa de notcias parte de contribuies individuais de

    integrantes das redes colaborativas noticiosas. Estas contribuies podem assumir

    trs formatos finais:

    a) Weblogs noticiosos individuais;

    b) Autoria coletiva, onde vrios colaboradores publicam notcias numa

    mesma pgina web ou usam sistemas de produo colaborativa como a

    plataforma wiki[54];

    c) Reportagens e textos colaborativos.

    4.2.2.1 Weblogs individuaisNeste tipo de produo colaborativa de contedos, indivduos integrantes de

    redes colaborativas noticiosos criam weblogs para produzir notcias com base em

    informaes fornecidas por integrantes da comunidade de informao. a forma

    mais barata e menos complexa do ponto de vista tcnico. Os weblogs podem ser

    publicados de forma isolada ou em grupos, como parte de um projeto social.

    O blog Fim de jogo[55], produzido pela jornalista Cristina Dissat um exemplo

    de iniciativa individual isolada. No seu blog, Dissat oferece informaes para os

    freqentadores do estdio do Maracan, no Rio de Janeiro, sobre jogos, movimento

    41

  • em torno do estdio antes e depois das partidas de futebol. A jornalista reside em

    frente ao Maracan, publica o seu blog desde fevereiro de 2004 e em torno dele se

    desenvolveu uma pequena comunidade de freqentadores do Maracan.

    Outro exemplo de blog individual o Faaala Sambaqui[56], criado pela

    estudante de comunicao Angelita Brando e que passou a recolher informaes

    de moradores do bairro de Sambaqui em Florianpolis.

    Uma das primeiras experincias de produo agrupada de weblogs

    individuais para a promoo da temtica comunitria no Brasil foi o projeto Niteri

    Comunidades[57], lanado em 2007. Alunos do projeto criaram trs weblogs com

    informaes sobre as comunidades de Surucucu, Caixa dgua e Morro do Estado.

    A experincia durou cinco meses e foi interrompida por falta de recursos financeiros.

    Outra experincia brasileira so os blogs produzidos pelos alunos da

    disciplina de Jornalismo online[58] nas Faculdades ASSESC, de Florianpolis, Santa

    Catarina. Cada aluno encarregado da publicao de um blog com notcias sobre o

    bairro, rua ou condomnio onde reside como parte de um exerccio terico/prtico

    sobre produo de notcias locais num ambiente multimdia online.

    Tanto no caso do projeto Niteri Comunidades como no das Faculdades

    ASSESC, os participantes tm um conhecimento direto da problemtica das

    localidades cobertas porque so moradores ou inquilinos. No caso do curso de

    jornalismo online, so estudantes de comunicao que recolhem notcias sobre os

    bairros ou condomnios onde residem.

    4.2.2.2 Autoria coletiva

    Nesta categoria encontram-se os projetos baseados em programas como

    Wiki[59], Google Docs[60], BuzzWord[61] e o Zoho[62], para produo

    compartilhada de contedos online. Os trs ltimos so baseados na Web e de livre

    acesso mediante cadastramento grtis.

    Nestes programas, os participantes podem produzir coletivamente textos e

    projetos conformando uma rede colaborativa dentro da qual cada pessoa pode

    acrescentar, corrigir, eliminar ou refazer textos para publicao numa pgina na

    Web.

    Quase todos os sistemas de produo compartilhada de contedos online

    dispem registro do histrico das alteraes introduzidas e rea para discusso e

    42

  • esclarecimento de dvidas entre os participantes.

    A autoria coletiva de contedos por meio da produo compartilhada a

    modalidade que gera maior envolvimento dos usurios, mas tambm a que exige

    maior responsabilidade social dos participantes. A inexistncia de um controle

    verticalizado obriga os usurios a um processo de negociao de divergncias onde

    os procedimentos ticos e comportamentais ganham mais relevncia do que o

    conhecimento tcnico.

    O projeto mais famoso nesta categoria o da enciclopdia virtual

    Wikipdia[63], criada em 2001 e que nos nove primeiros meses de 2008 recebeu

    684 milhes de visitantes aos seus mais de 10 milhes de textos publicados em 250

    idiomas diferentes, tudo por iniciativa de colaboradores no remunerados.

    Alm da Wikipdia, existem outros 24 projetos de enciclopdias online com

    graus variveis de participao de usurios. Entre as mais conhecidas, esto a

    Citizendium[64] e a Hudong[65].

    A Wikipdia cresceu tanto e se tornou to popular que a sua caracterstica

    original como enciclopdia acabou sendo alterada com o passar do tempo por conta

    dos interesses dos seus colaboradores. Em situaes especiais, como aconteceu no

    caso do furaco Katrina, em Nova Orleans em 2005, os verbetes foram atualizados

    com tanta rapidez que acabaram ganhando caractersticas de fonte noticiosa.

    Noutros casos, como foi a questo da guerra no Iraque, os colaboradores

    adotaram posies to divergentes que a produo de verbetes acabou se

    transformando em verdadeiro foro de debates. A mesa situao se repetiu no

    verbete sobre territrios palestinos no Oriente Mdio.

    4.2.2.3 Investigaes colaborativasEsta modalidade combina dois tipos de participao dos membros de uma

    comunidade:

    1) Os integrantes de uma comunidade social fornecem informaes

    a profissionais do jornalismo que processam o material para publicao

    em weblogs ou pginas Web. Os jornalistas podem ser profissionais

    independentes ou vinculados a algum rgo da imprensa. Nos dois

    casos eles no so considerados membros da comunidade;

    2) Os jornalistas fazem parte da rede colaborativa noticiosa de uma

    43

  • comunidade social, ou so contratados por ela, e funcionam como

    tutores no processo de produo coletiva de informaes ou agentes

    aglutinadores na formao de comunidades de informao.

    Ambas as modalidades tm a vantagem de gerar material com boa qualidade

    informativa ao mesmo tempo em que podem ser usadas em comunidades sem

    acesso direto internet ou cujos integrantes no tem conhecimentos mnimos de

    informtica.

    Na primeira modalidade temos experincias como o blog ZH Moinhos[66],

    criado pelo jornal Zero Hora, do Rio Grande do Sul, e produzido conjuntamente por

    jornalistas e por um Conselho de Blogueiros, formado por moradores do bairro de

    classe mdia alta Moinhos de Vento, em Porto Alegre.

    Nos Estados Unidos, o projeto Backfence uma experincia discutida at

    hoje, depois de fechar as portas em 2007. A iniciativa lanou 13 pginas web com

    notcias locais de 13 cidades norte-americanas produzidas coletivamente por

    cidados comuns e jornalistas autnomos.

    Outra iniciativa do gnero foi o projeto NewsAssignement[67], lanado pela

    Escola de Jornalismo da Universidade de Nova Iorque. Nele, os estudantes de

    jornalismo e os editores da revista Wired participaram de uma experincia com

    profissionais e amadores visando a produo de um artigo sobre a popularizao do

    conceito de produo colaborativa.

    O projeto criou uma rede colaborativa formada por estudantes e editores em

    torno da qual se formou uma comunidade de colaboradores, em sua maioria

    jornalistas, que por sua vez estavam envolvidos com uma comunidade mais ampla

    formada por usurios da Web interessados na questo da produo colaborativa de

    notcias.

    A experincia durou cinco meses, o artigo foi publicado na Wired[68] mas o

    que mais gerou polmica no foi o produto final, mas o processo em si. As

    dificuldades e os mtodos utilizados na experincia foram objeto de inmeros

    seminrios, simpsios e fruns tanto no meio acadmico como nas organizaes

    jornalsticas norte-americanas.

    No rdio, uma experincia inovadora em matria de produo colaborativa foi

    o programa da emissora nova-iorquina WNYC, Are You Being Gouged (literalmente

    Voc est sendo garfado?), onde o apresentador Brian Lehrer[69] reuniu

    44

  • informaes sobre preos de gneros alimentcios de primeira necessidade

    fornecidos por ouvintes para montar um mapa virtual do custo de vida em bairros de

    Nova Iorque.

    Neste caso, os mapas mostrando a defasagem de preos foram usados por

    comunidades de moradores de vrios bairros de Nova Iorque para produzir material

    informativo que serviu de base para movimentos de presso sobre comerciantes e

    supermercados da cidade,

    Outra iniciativa que provocou uma grande repercusso na mdia e nos meios

    intelectuais foi a novela coletiva A Million Penguins (Um milho de pingins), criada

    pela editora Penguin Books[70] em janeiro de 2007, com base no software Wiki. O

    projeto enfrentou dificuldades tcnicas geradas por uma avalancha de contribuies

    (quase 100 por hora) e pela ao de vndalos. Em abril do mesmo ano, a Penguin

    decidiu congelar o projeto.

    4.2.3 Produo colaborativa de informaes sobre servios

    Nesta modalidade de produo colaborativa encontramos projetos como o da

    Slashdot, onde a comunidade de usurios da revista online coleta, processa e

    publica informaes que, em ltima anlise, serviro para o desenvolvimento

    profissional dos participantes.

    A produo colaborativa expandiu-se enormemente no setor de informaes

    utilitrias na medida em que a participao dos usurios provou ser uma ferramenta

    muito eficiente para gerar servios de valor agregado com custo mnimo. o caso

    de projetos como os sites Delicious, Last.Fm, Digg e o Wikia Search Engine.

    O Delicious[71] um sistema de busca, seleo e indexao de endereos na

    Web onde os usurios classificam cada pgina usando etiquetas pessoais (tags).

    Em outubro de 2008, cerca de 5,15 milhes de us