O processo de transição agroecológica a partir do PAIS: a experiência da família de Josi e...

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O Assentamento Marrecas fica localizado no município de Amontada, Ceará, que faz parte do Território da Cidadania Vales do Curu e Aracatiaçu. Neste assentamento, constituído em 1998, residem 73 famílias assentadas, das quais cinco são participantes do projeto PAIS. Dentre tais famílias, destaca-se a experiência da família de Antônia Josilene dos Santos, de 38 anos, conhecida como Josi, o esposo, José Valmir de Sousa, de 44 anos e seus três filhos Maria Alana (14 anos), José Lano (11anos) e Aline Vitoria (6 anos). O casal, ainda jovem foi morar em Fortaleza, onde se conheceram e logo que resolveram se juntar tomaram o caminho de volta direto para o interior, porque é lá que eles gostam de viver. Quando o casal se juntou, só tinha uma casa de taipa e o lugar, na época, ainda não era área desapropriada. O sogro deu um galo e uma galinha pra eles deitarem e, nascidos, os pintinhos, ela chamou pra dividir, ele levou o galo e a galinha e deixou os pintinhos pra eles darem continuidade. A primeira vaca foi comprada a prestação, da mãe dela. E assim foi começando a criação que, através do acesso ao PRONAF A, destinado a áreas de assentamentos da Reforma Agrária, ampliou. Hoje são 100 cabras, 35 ovelhas, 18 cabeças de gado, 11 capotes grandes e mais 60 pequenos, 50 galinhas, dois gansos e dois perus. Para Jose, a criação é uma parte muito importante do trabalho do agricultor, porque é o que dá mais dinheiro de venda, além de não precisar comprar carne. Com a chegada do PAIS em 2011, a agricultura tomou força e ampliou a estratégia de produção da família. Na época, lembra Josi, só chegou para ela porque três famílias da comunidade desistiram do projeto. Ela, por sua vez, pegou a oportunidade e foi direto para a capacitação, “morrendo de medo porque nunca tinha dirigido moto para longe”. Chegando lá, achou que dava para cuidar com a família e que podia melhorar. Ao voltar para casa, Valmir ia para Amontada, “dei 10 reais a ele pra comprar de verdura. Aí eu disse assim: oh, esses 10 reais que você vai comprar de verdura, esse projeto quando tiver aqui, em vez de comprar 10 reais de verdura, nós já vamos é vender e ganhar”. Ele achou meio estranho, mas topou e, juntos, entraram de cara no projeto. Para se adequar à realidade da família, cercou-se o terreno em que o PAIS seria montado, pois os animais são criados soltos pelo assentamento. “De tardezinha cada um volta para suas casas, que nem gente”, explica. O esterco produzido com a da criação de animais é aproveitado como adubo para a horta e também vende para fora. Valmir conta, ainda, que a opção por criar os animais soltos é por causa do espaço e da economia, pois presos eles teriam que se alimentar exclusivamente de milho e ração, já soltos ela dá o alimento de manhã e pelo resto do dia eles se viram. Com o PAIS no quintal, a mudança do cultivo foi em tamanho e em diversidade. Hoje a família tem perto de O PROCESSO DE TRANSIÇÃO AGROECOLÓGICA A PARTIR DO PAIS: A EXPERIÊNCIA DA FAMÍLIA DE JOSI E VALMIR. ASSENTAMENTO MARRECAS - AMONTADA Edição Especial - I Encontro Estadual do PAIS | Itapipoca (CE) - Maio/2012 Tecendo Redes

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Sistematização de experiência com o PAIS

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O Assentamento Marrecas fica localizado no município de Amontada, Ceará, que faz parte do Território da Cidadania Vales do Curu e Aracatiaçu. Neste assentamento, constituído em 1998, residem 73 famílias assentadas, das quais cinco são participantes do projeto PAIS. Dentre tais famílias, destaca-se a experiência da família de Antônia Josilene dos Santos, de 38 anos, conhecida como Josi, o esposo, José Valmir de Sousa, de 44 anos e seus três filhos Maria Alana (14 anos), José Lano (11anos) e Aline Vitoria (6 anos). O casal, ainda jovem foi morar em Fortaleza, onde se conheceram e logo que resolveram se juntar tomaram o caminho de volta direto para o interior, porque é lá que eles gostam de viver. Quando o casal se juntou, só tinha uma casa de taipa e o lugar, na época, ainda não era área desapropriada. O sogro deu um galo e uma galinha pra eles deitarem e,

nascidos, os pintinhos, ela chamou pra dividir, ele levou o galo e a galinha e deixou os pintinhos pra eles darem continuidade. A primeira vaca foi comprada a prestação, da mãe dela. E assim foi começando a criação que, através do acesso ao PRONAF A, destinado a áreas de assentamentos da Reforma Agrária, ampliou. Hoje são 100 cabras, 35 ovelhas, 18 cabeças de gado, 11 capotes grandes e mais 60 pequenos, 50 galinhas, dois gansos e dois perus. Para Jose, a criação é uma parte muito importante do trabalho do agricultor, porque é o que dá mais dinheiro de venda, além de não precisar comprar carne.Com a chegada do PAIS em 2011, a agricultura tomou força e ampliou a estratégia de produção da família. Na época, lembra Josi, só chegou para ela porque três famílias da comunidade desistiram do projeto. Ela, por sua vez, pegou a oportunidade e foi direto para a capacitação, “morrendo de medo porque nunca tinha dirigido moto para longe”. Chegando lá, achou que dava para cuidar com a família e que podia melhorar. Ao voltar para casa, Valmir ia para Amontada, “dei 10 reais a ele pra comprar de verdura. Aí eu disse assim: oh, esses 10 reais que você vai comprar de verdura, esse projeto quando tiver aqui, em vez de comprar 10 reais de verdura, nós já vamos é vender e ganhar”. Ele achou meio estranho, mas topou e, juntos, entraram de cara no projeto.Para se adequar à realidade da família, cercou-se o terreno em que o PAIS seria montado, pois os animais são criados soltos pelo assentamento. “De tardezinha cada um volta para suas casas, que nem gente”, explica. O esterco produzido com a da criação de animais é aproveitado como adubo para a horta e também vende para fora. Valmir conta, ainda, que a opção por criar os animais soltos é por causa do espaço e da economia, pois presos eles teriam que se alimentar exclusivamente de milho e ração, já soltos ela dá o alimento de manhã e pelo resto do dia eles se viram. Com o PAIS no quintal, a mudança do cultivo foi em tamanho e em diversidade. Hoje a família tem perto de

O PROCESSO DE TRANSIÇÃOAGROECOLÓGICA A PARTIR DO PAIS:A EXPERIÊNCIA DA FAMÍLIADE JOSI E VALMIR.ASSENTAMENTO MARRECAS - AMONTADA

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casa coentro, cebolinha, pimentão, couve manteiga, repolho, couve flor, cenoura, beterraba, tomate-cereja, milho, pimenta de cheiro, melão e melancia. Antes da tecnologia social era difícil comer verduras porque, além do dinheiro para comprar, tinha ainda a viagem até a sede do município de Amontada para poder fazer a compra. Agora, tem tudo no terreiro de casa para fazer salada, e todo mundo gosta, a alimentação ficou mais saudável e todas as semanas ela tira 25 reais vendendo o excedente numa comunidade próxima. Outra coisa que melhorou foi em relação ao não uso de agrotóxicos. Antes, eles usavam veneno quando tinha algum problema, por exemplo, no feijão. Recentemente, tiveram problemas com lagarta no plantio de tomate e usaram o defensivo natural preparado com álcool e castanha - e deu certo. “O que faltava era a orientação”, explica Josi. De queimar, o casal já tinha parado há tempos porque planta sempre no mesmo roçado e todos os anos coloca bagana de carnaúba para recuperar a terra. O mesmo processo ela faz nos canteiros, que deram muito trabalho de ser montado por causa do chão de barro do sertão. Depois de experimentar, resolveu por utilizar a mistura da bagana de carnaúba com o estrumo, pois só com o estrumo a terra endurece e com a mistura a terra coberta fica mais umedecida garantido um melhor plantio. O sistema de gotejamento, por sua vez, é bem eficiente, pois a água que cai se espalha pelo chão. Pensando nisso, Josi plantou os pés de pimentão perto dos canteiros de cebolinha para aproveitar a água - “se fosse longe do canteiro precisava eu ir agoar”.

De plantar verdura, ela não deixa nunca mais. “Se der uma seca grande e tudo morrer, a gente para, mas quando acabar a gente volta. O aprendizado já ficou”, afirma Josi orgulhosa e ainda com planos de ampliar a horta para poder entrar no programa governamental de aquisição de alimentos em Amontada. A Família de Josi e Valmir também é participante do projeto de tecnologia social de Sistema Barraginhas. Na unidade familiar foram implantadas três barraginhas e a ideia deles é aproveitar a água e a área molhada que se cria com esta tecnologia social para pasto dos animais e recuperação da vegetação nativa. Além disso, fizeram um buraco próximo à primeira barraginha para tentar montar um cacimbão aproveitando a enxurrada. Desde junho de 2011, Josi é delegada do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Amontada. Ela está sempre tentando ajudar a sua comunidade e, recentemente, levou o Projeto Jovem SABER, que já está com a primeira turma montada no Assentamento e é art iculado pela Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Ceará (FETRAECE) e o próprio sindicato.Quando veio o PAIS, para Josi foi a oportunidade de realizar seu sonho de ter um sítio, mesmo pequeno, cheio de verduras e fruteiras para colher do pé. Já tem uma área cercada separada para as fruteiras e as mudas de carambola, mangueira, ateira, jambo, goiaba, cajueiro e mamão estão esperando para serem plantadas. “Quero ser avó coruja, com sítio e tudo, para meus netos virem, meus filhos virem passar o final de semana com os amigos”, ela sonha, agora com a certeza de que vai realizar.