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O que a vida da videira diz do vinho
As dez maiores importadoras do País abriram espaço para eles. Os três principais
restaurantes da cidade também – D.O.M., Maní e Fasano têm vinhos ecológicos em suas
cartas. E esses são apenas alguns casos. Tintos, brancos e espumantes biodinâmicos,
orgânicos e naturais estão ganhando importância no cenário brasileiro.
Na próxima semana, a Enoteca Saint Vinsaint fará a segunda edição de sua Feira de
Vinhos Naturebas. É um evento pequeno, que reúne produtores e importadores e um
público de pouco mais de 150 pessoas, bem menos que os quase mil convidados que se
encontraram em 2010 na Casa da Fazenda para o Renaissance des Appellations,
ciceroneado por Nicolas Joly, um dos líderes do biodinamismo na vitivinicultura.
Mas o interesse que despertou não deixa dúvidas de que a relevância dos vinhos
ecológicos está aumentando – em ritmo lento, como pedem os naturebas, que fique claro,
mas crescendo, sem dúvida.
Em outras palavras: aproveite o bom momento para entender, de uma vez por todas, o
que há dentro de uma garrafa de vinho ecológico. Nem que seja mais pelo prazer de
retórica, já que para ver o clima esquentar em uma mesa de enófilos basta lançar o
tema que as bandeiras se agitam, acompanhadas do festival de chavões: “orgânicos são
bons, mas muito caros”; “vinho natural é avinagrado”; “biodinâmica é mais fé que
ciência”.
Antes de levar a sério qualquer comentário disparatado, lembre-se que alguns dos
mais cultuados nomes no mundo do vinho (como Romanée-Conti, Leflaive, Selosse,
Coulée de Serrant e Pacalet) fazem parte do grupo de produtores de bandeira verde.
É difícil encontrar números concretos sobre esse mercado. Mesmo os vinhos
orgânicos, um pouco mais populares, ganharam status oficial (normativas) só em 2012
Data:06 -08-2014 Tipo: jornal Origem: Portugal
Pág: Secção:
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na Europa. Definições sobre biodinâmicos e naturais ainda são raras e conflitantes em
todo o mundo. E mais ainda no Brasil.
É arriscado dizer que dá para reconhecer no primeiro gole a maneira como um vinho
foi elaborado, por mais experiente que seja o bebedor. Mas há características evidentes
nos rótulos verdes – explicadas em detalhe nesta e na próxima página.
De maneira geral, biodinâmicos e naturais costumam ser menos concentrados e
alcoólicos, e exibem maior frescor. Nos casos mais radicais, em que não há adição de
SO2 e há teores mínimos de conservante, espere por menor potencial de guarda e
tenha todo o cuidado ao armazenar a garrafa. São vinhos que pedem uma mente
aberta ao serem degustados – não agradam a qualquer um. Mas, como prêmio,
entregam autenticidade e consciência tranquila de consumir um produto com menos
químicos, que causou menos danos ao ambiente.
Há um traço comum aos vinhos ecológicos: eles muitas vezes são túrbidos, o que não é
defeito – a falta de transparência indica que a bebida foi pouco manipulada. Quando o
assunto são vinhos de bandeira verde, portanto, impera a máxima do não julgue pela
aparência.
De toda maneira, as bandeiras dos produtores não significam que o resultado seja
bom. Orgânico, biodinâmico, natural ou convencional apenas definem o modo de
produção.
Mesmo com essa turbidez no cenário, digna dos vinhos naturais, é certo que os vinhos
ecológicos têm ganhado importância. E como a oferta é motivada pelo interesse dos
consumidores, cada vez maior, o surgimento de novos rótulos é questão de tempo.
ORGÂNICO
O conceito está definido por normas que estabelecem os processos que devem ser
adotados para que um vinho exiba a classificação de orgânico no mercado. Por
exemplo, o vinho deve ser produzido apenas com uvas cultivadas sem nenhum insumo
químico – e nada de organismos geneticamente modificados (OGM).
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Conceito. Vinhos orgânicos exigem uvas cultivadas sem insumos químicos
eorganismos geneticamente modificados.
Há, no entanto, algumas concessões no uso do sulfato de cobre (antifúngico), sulfitos
(conservantes) e adição de leveduras selecionadas. Como curiosidade, o Brasil não
reconhece a certificação orgânica feita em outros países. Portanto, vinhos de fora do
País devem certificar-se novamente no Brasil caso queiram trazer no rótulo a
mensagem de vinho orgânico.
Na taça, ele é o mais próximo do vinho convencional entre todos os vinhos de bandeira
verde. E isso quer dizer que, como qualquer tinto ou branco comum, pode ir do
extremo de elegância ao extremo de rusticidade. Em outras palavras: na boca, não se
percebe que é orgânico. A diferença é que seria feito de modo limpo, sustentável.
Covela Branco Ed. Nacional Avesso 2012
Minho / Portugal – R$ 85 (Vino)
Esqueça os vinhos verdes ácidos e diluídos. Claro que há frescor, mas acompanhado
de notas florais e cítricas com alguma estrutura e textura delicada. Nitidez e estrutura
são os destaques aqui.
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Tarima Orgânico 2012
Alicante / Espanha – R$ 49 (Grand Cru)
A variedade Monastrell mostra seu lado mediterrâneo de forma cristalina. A fruta é
madura, com toques terrosos e taninos que pedem por comida. Mérito por não tentar
mascarar a expressão da casta com notas de barricas de carvalho.
NATURAL
Provavelmente o mais extremo entre os vinhos ecológicos, o vinho natural não exclui
práticas de cultivo orgânico e biodinâmico, pois também a ele repugna o uso de
químicos de forma absoluta e novidades tecnológicas. O vinho é produzido com o
mínimo de maquinário possível, conforme métodos ancestrais e sem controle de
temperatura.
Barris envelhecidos em vinho. Produtores de vinhos naturais preferem tudo à
moda antiga e usam tanques de fermentação de madeira.
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As uvas, normalmente espécies autóctones ou adaptadas naturalmente à região, são
vinificadas sem adição de sulfitos. Muitas vezes são pisadas em vez de maceradas, e as
fermentações são espontâneas. Esses vinhos são túrbidos, pois não passam por
filtragem ou clarificação. Ao contrário dos orgânicos e biodinâmicos, os naturais não
possuem uma certificação: normalmente, os produtores se reúnem sob um estatuto
próprio de práticas produtivas dos vinhos naturais.
Na boca, esses vinhos são mais delicados e normalmente exibem aromas florais, de
frutas frescas e da levedura e têm a turbidez bastante evidente. Também costumam ser
menos alcoólicos.
Louis Antoine Luyt Huasa de Pilén Alto 2010
Maule / Chile – R$ 98 (World Wine)
A variedade País pode ser bastante rústica se colhida e vinificada com pouco cuidado.
Nas mãos de um bom produtor, a expressão da casta lembra um Cru de Beaujolais,
sutil, mineral e versátil.
SP 68 Rosso Occhipinti 2012
Sicília / Itália – R$ 146 (Casa Europa)
A Sicília é a queridinha da vez de muitos críticos e especialistas. Os vinhos
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demasiadamente alcoólicos e pesados começam a dar lugar a expressões mais frescas e
menos concentradas, como nesta mescla de Nero d’Avola e Frappato sem passagem
por barricas.
BIODINÂMICO
A forma mais simples de entender a biodinâmica é pensar o vinhedo como um ser vivo
autossuficiente. Daí decorre a importância da biodiversidade para manter o equilíbrio
da propriedade e evitar o ataque de doenças, que seriam fruto de um desequilíbrio
naquele ambiente.
Fora dos padrões. Nem o tonel de vinho biodinâmico é convencional; este, por
exemplo, tem o suposto formato de útero.
Os ciclos lunares guiam os trabalhos nos vinhedos e adega, e alguns preparados de
minerais podem ser aplicados nas videiras ou enterrados no solo dentro de chifres
bovinos. Esses compostos atuam como ativadores do metabolismo e sistema
imunológico da planta, segundo a filosofia. Na vinícola, as leveduras são apenas as que
estão nas uvas e no ambiente e nenhum tratamento com produtos comerciais pode ser
aplicado. A certificação é emitida pelo instituto Demeter, mas muitos produtores
dizem que é mais uma questão ideológica que comercial e preferem não se submeter
ao certificado.
Não por acaso, tem gente que gosta de definir a agricultura biodinâmica como uma
mistura de astrologia, homeopatia e fé.
Os melhores biodinâmicos são vinhos mais complexos e profundos, com acidez que os
faz parecer vivos na boca. Costumam ter a textura mais delicada e alguma turbidez, e
em geral possuem mineralidade. O grande berço dos produtores biodinâmicos é a
França, especialmente Jura, Champagne, Loire e Borgonha.
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Domaine Tissot Trousseau Singulier 2012
Jura / França – R$ 110 (De la Croix)
Um dos produtores que é referência na região e entre vinícolas biodinâmicas. A
Trousseau lembra a Pinot Noir pela coloração delicada e aromas florais e de frutas
vermelhas frescas. Apenas os taninos mostram maior vigor que a casta borgonhesa.
Domaine Sainte Claire Chablis 2012
Chablis / França- R$ 160 (Zahil)
Mesmo nesse nível de entrada é possível a marca mineral dos grandes vinhos de
Chablis. A fruta aparece de forma contida e elegante (pera e jambo), pouco lembrando
exemplares do Novo Mundo.
CONVENCIONAL
A vinicultura de larga escala permite diversas práticas. A começar pelo vinhedo, pode-
se escolher uma videira considerada superior às outras e propagá-la de forma clonal
(todas as plantas terão o mesmo DNA). Para evitar ataques de fungos, pragas e outras
plantas concorrentes, aplicam-se herbicidas, pesticidas e fertilizantes sintéticos de
forma preventiva. A aplicação dos produtos e a colheita da uva é feita com máquinas e
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tratores pesados, que compactam o solo e dificultam a vida embaixo da terra. Ao
chegar à vinícola, as uvas recebem dose de anidrido sulfuroso (SO2) para inibir a ação
de bactérias ou leveduras que possam interferir no vinho final. O enólogo pode corrigir
taninos, acidez, álcool, concentrar o mosto, escolher leveduras específicas para
desenvolver certos aromas e adicionar enzimas para chegar à textura desejada.
Embora pouco romântico, conforme o preço, o volume produzido e a proposta da
bebida algumas etapas listadas são necessárias. A conversão de um vinhedo
convencional para orgânico ou biodinâmico só é considerada completa pelos
certificadores a partir do terceiro ano.
URL: http://blogs.estadao.com.br/paladar/o-‐que-‐a-‐vida-‐da-‐videira-‐diz-‐do-‐vinho/