O que é a Arquitectura

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Francisco Champlon | #7357 | MIARQ4D O que é a arquitectura? No seguimento dos comentários anteriores, a tarefa presente de definir de modo operativo o conceito de arquitectura convoca aspectos decorrentes de uma reflexão sobre a essência da prática projectual. Importa, portanto, aludir à necessidade de consciência sócio-profissional que se requer do arquitecto face à sua actividade, na medida em que o seu produto tem um efeito social multidimensional e isso comporta para ele implicações de ordem ética. Por isso, é essencial que o arquitecto compreenda para quem projecta, o que implica um trabalho prévio de estudo e análise do habitante/utilizador específico a quem se destina o seu trabalho. Mas, ainda antes disso, o arquitecto tem como missão basilar o planeamento de espaços que sirvam para habitar, num sentido lato, não específico de uma cultura, que tenham uma dimensão antropológica. A essa dimensão antropológica não é alheia a memória. A criação ou preservação dessa dimensão decorrerá obrigatoriamente da materialização de uma identidade concreta nesse lugar, o que só poderá fazer-se com o auxílio da recordação de ambientes ou formas arquitectónicas com características diferenciadas, dentre os quais um arquitecto sábio há-de eleger as mais adequadas ao fim pretendido. Põe-se assim em evidência a necessidade de quem planeia ser um indivíduo dotado de uma matriz cultural alargada, da qual possa servir-se para tomar mais conscientemente estas decisões. Ainda assim, não podemos ignorar que o arquitecto, na sua actividade de intervenção concreta, física no espaço, não actua sozinho; é obrigado a relacionar-se com outros profissionais que desempenham funções que complementam a sua actividade. Portanto, importa também compreender quem deve ser o arquitecto no contexto deste trabalho de equipa, que poderes lhe devem caber, para que possa efectivamente executar a visão que lhe parece materializar melhor o sentido do espaço procurado. A realização de uma tal arquitectura, uma arquitectura propriamente dita, exige a recusa da fragmentação imposta pelo processo de produção industrial, da divisão dos trabalhos por especialistas. A obra arquitectónica é mais do que a soma do trabalho de cada um desses especialistas. O arquitecto não pode ser um especialista. A arquitectura só pode resultar da execução de uma visão global, plena de sentido, à qual as especialidades se submetem, e não o contrário. (360 palavras)

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Breve ensaio acerca da natureza específica da Arquitectura, elaborado para a disciplina de Teoria do Lugar do Mestrado Integrado em Arquitectura da FA-ULisboa.

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Francisco Champlon | #7357 | MIARQ4D

O que é a arquitectura?

No seguimento dos comentários anteriores, a tarefa presente de definir de modo operativo o

conceito de arquitectura convoca aspectos decorrentes de uma reflexão sobre a essência da prática

projectual. Importa, portanto, aludir à necessidade de consciência sócio-profissional que se requer

do arquitecto face à sua actividade, na medida em que o seu produto tem um efeito social

multidimensional e isso comporta para ele implicações de ordem ética.

Por isso, é essencial que o arquitecto compreenda para quem projecta, o que implica um

trabalho prévio de estudo e análise do habitante/utilizador específico a quem se destina o seu

trabalho. Mas, ainda antes disso, o arquitecto tem como missão basilar o planeamento de espaços

que sirvam para habitar, num sentido lato, não específico de uma cultura, que tenham uma

dimensão antropológica.

A essa dimensão antropológica não é alheia a memória. A criação ou preservação dessa

dimensão decorrerá obrigatoriamente da materialização de uma identidade concreta nesse lugar, o

que só poderá fazer-se com o auxílio da recordação de ambientes ou formas arquitectónicas com

características diferenciadas, dentre os quais um arquitecto sábio há-de eleger as mais adequadas ao

fim pretendido. Põe-se assim em evidência a necessidade de quem planeia ser um indivíduo dotado

de uma matriz cultural alargada, da qual possa servir-se para tomar mais conscientemente estas

decisões.

Ainda assim, não podemos ignorar que o arquitecto, na sua actividade de intervenção

concreta, física no espaço, não actua sozinho; é obrigado a relacionar-se com outros profissionais

que desempenham funções que complementam a sua actividade. Portanto, importa também

compreender quem deve ser o arquitecto no contexto deste trabalho de equipa, que poderes lhe

devem caber, para que possa efectivamente executar a visão que lhe parece materializar melhor o

sentido do espaço procurado.

A realização de uma tal arquitectura, uma arquitectura propriamente dita, exige a recusa da

fragmentação imposta pelo processo de produção industrial, da divisão dos trabalhos por

especialistas. A obra arquitectónica é mais do que a soma do trabalho de cada um desses

especialistas. O arquitecto não pode ser um especialista. A arquitectura só pode resultar da execução

de uma visão global, plena de sentido, à qual as especialidades se submetem, e não o contrário.

(360 palavras)