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    O Realismo Jurdico Clssico

    Categoria: Direito

    Publicado em 20-12-2012

    Escrito por Clemente Nogueira Visitas: 635

    Os expoentes mximos e as tradicionais fontes inspiradoras da corrente

    realista clssicaforam Aristteles, a experincia jurdica romana e S.

    Toms de Aquino.

    O direito sem dvida nenhuma, acompanha a evoluo da sociedade, sendo

    assim, marcado pelas grandes mudanas que ocorreram em toda a

    histria da humanidade. E por mudanas, podemos entend-las como

    sendo as diversas formas que o homem tem de conceber o mundo, e isso

    vai depender da poca, da organizao social, dos costumes e tradies e

    consequentemente, do modo de pensar, ou seja, da filosofia.

    Como o direito esta estritamente relacionado com a doutrina filosfica seguida por uma sociedade, pois

    esta que oferece ao direito as bases valorativas dos seus princpios e regras, com a substituio da filosofia

    clssica pela filosofia moderna, o direito passa a ser visto de modo diferente.

    O Realismo Clssico de Aristteles

    Aristteles foi o primeiro autor conhecido que falou da diviso do direito naturale o positivo. Porm, a

    terminologia direito natural j havia sido utilizada pelos sofistas.

    Na viso aristotlica, o direito natural tem duas caractersticas:

    1. no se baseia nas opinies humanas e tem a mesma fora em qualquer lugar.2. com ele aparece o justo legal, direito positivo. prprio desse direito provir da conveno humana,

    tendo como caracterstica prpria ser varivel.

    Para o filsofo clssico Aristteles, o Direito a prpria coisa justa, aquilo que se deve atribuir a algum.

    Aristtelesfaz a distino entre uma viso mais ampla dejustia(ajustia geral, virtude moral) e a

    justia particular, que a que atribui a cada um o que seu.

    Foi uma catstrofe civilizacional a perda de todas as obras publicadas por Aristteles, com excepo da

    Constituio de Atenas, descoberta em 1890. Tods obras conhecidas resultaram de notas para cursos e

    conferncias do filsofo, ordenadas de incio por alguns discpulos e depois, de forma mais sistemtica, por

    Andrnico de Rodes(60 a.C.).

    Aristtelesfoi o primeiro filsofo a distinguir a tica da poltica, centrada a primeira na aco voluntria e

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    moral do indivduo enquanto tal, e a segunda, nas vinculaes deste com a comunidade. Dotado de logos,

    "palavra", isto , de comunicao, o homem um animal poltico, inclinado a fazer parte de uma Plis, a

    "cidade" enquanto sociedade poltica. A cidade precede assim a famlia, e at o indivduo, porque responde

    a um impulso natural. Dos crculos em que o homem se move, a famlia, a tribo, a Plis, s esta ltima

    constitui uma sociedade perfeita. Da serem polticas, de certo modo, todas as relaes humanas. A Plis

    o fim (tlos) e a causa final da associao humana. Uma forma especial de amizade, a concrdia, constitui

    o seu alicerce.

    Os regimes polticos caracterizam-se pela soluo que oferecem s relaes entre a parte e o todo na

    comunidade. H trs formas boas: monarquia, aristocraciae politeia(um compromisso entre a

    democraciae a oligarquia, mas que tende primeira). monarquia interessa basicamente a unidade da

    Plis aristocracia, o seu aprimoramento democracia, a liberdade. O regime perfeito integrar as

    vantagens dessas trs formas, rejeitando as deformaes de cada uma: tirania, oligarquiae demagogia.

    A relao unidade-pluralidade aparece, ainda, sob outro aspecto: o da leie da concrdiacomo processos

    complementares.

    Portanto, o Estagiritadiz-nos que o Direitos existe em sociedade. O eremita, por exemplo, no tem

    Direito.

    Ele exemplifica com a ideia do fogo que queima igualmente na Grciae na Prsia, j o direito

    visivelmente sujeito a variaes. No muda o direito dos deuses mas no mundo, embora exista uma certa

    justia natural, tudo nesta matria passvel de alterao. Mesmo a superioridade da mo direita face

    esquerda.

    Assim, no s o direito em parte mutvel, como a natureza (no jurdica) nem sempre permanece idntica:

    "o fogo queima sempre, mas a mo direita nem sempre a mais destra"...Por isso, nas coisas humanas,

    da natureza humana, ao contrrio do que sucederia com a imutabilidade das rotas dos astros, h lugar

    incerteza e a via para vislumbrar uma sada ser a dialctica. Mas tal no querer significar que o valor das

    nossas ideias sobre o bem, o belo e o justo seja um mero jogo de argumentos ."

    Aristteles, ao verificar um certo caos que reinava najustia helnica(o uso forense de mtodos

    demaggicos sofsticos e a ausncia de especialistas em Direito: quem escrevia os discursos das

    partes, que se auto-defendiam, eram sofistas, mercenrios das palavras e das ideias), pensou que se

    deveria encontrar um campo de aco do Direito, em funo do seu objecto (campo epistemolgico),preconizando igualmente a adopo de um mtodo: o mtodo dialctico. Este mtodo consiste numa

    espcie de "duelo" entre dois argumentadores (advogados) que atravs de todo um processo de persuaso

    tentam convencer um terceiro elemento (juiz) da veracidade das suas razes, atravs de uma retricaque,

    ao contrrio da sofstica, tem regras especiais decorrentes da cientificidade da nova "arte"', a jurdica.

    Tornava-se tambm necessrio existir uma teleologia, que, no caso presente, seria a busca do justo, bem

    como um corpo sacerdotal da cincia (um conjunto de especialistas a alimentar permanentemente a chama

    dessa cincia). Estes especialistas em Direitoseriam uma classe especialmente preparada para resolver os

    problemas jurdicos, uma classe separada das outras.

    Para Aristteles, o direito natural imanente aos homens e s coisas da natureza e no "razo". Eis,

    pois, uma viso de um direito naturalrealista, nas coisas, e no idealista, nas ideias, no vago cu dos

    conceitos, o problema dos universais. Ele decorre do que naturalmente aceite como juridicamente justo

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    em cada sociedade concreta. No estatisticamente, mas exemplarmente. E apercebido pela conscincia

    axiolgico-jurdica desse tempo e lugar.

    Ser que existiria Direitoantes de Aristteles? No podemos responder taxativamente a esta questo, uma

    vez que o Direitoenquanto cincia, dotado de um mtodo, funo e objecto prprios no existia, realmente,

    at reflexo inovadora de Aristteles. O Direitoera confundido com outras realidades normativas como a

    religio, a moral, etc. Portanto, antes de Aristteles, pode afirmar-se que o Direitoexistia como um

    instrumento organizacional de uma sociedade e no existia como uma cincia em todos os seus aspectos.

    O Direitosurge tambm como resultado da cultura e como uma criao epistemolgica, sendo diferente

    (autnomo, especfico) de todas as outras ordens sociais normativas.

    O contributo Romano

    Os esticos(romanos) deram ao Direitoum contributo decisivo. Em grande parte, limitaram-se a adoptar as

    doutrinas helnicas muitas vezes simplificando-as. Um dos grandes divulgadores destas doutrinas,nomeadamente a jusnaturalista, foi Ccero.

    Marcus Tllius Ccero, como esticoafirma que a natureza humana s se pode realizar uma vez

    observada as regras do cosmose a ordem divina das coisas.

    No cosmos que Cceroencontra a reta razo que a tudo ordena, e de acordo com a qual se devem pautar

    todas as condutas humanas. A tica ciceroniana movimenta-se a partir de uma lei absoluta preexistente,

    imutvel, intocvel, soberana e perfeita que tudo governa.

    O parmetro da conduta humana dever ser a observncia da lei natural, e isso porque nela se encontra a

    noo de bem que deve ser seguida. Se o bem louvvel porque encerra em si mesmo algo que nos

    obriga a louv-lo pois o bem no depende das convenes e sim da natureza. Se a razo o distintivo

    humano, a virtude de acordo com a recta razo ser o distintivo do ser humano justo. Para que se possa

    iniciar um estudo acerca das leis, ter-se-, ento, que iniciar um estudo sobre a natureza e as leis naturais,

    a lei a razo suprema da natureza, que ordena o que se deve fazer e probe o contrrio.

    A tica esticacaminha no sentido de postular a independncia do homem com relao a tudo o que o

    cerca e compromete-se com causas e regularidades universais. A preocupao com o conceito de dever(kathkon) irrompe com uma srie de consequncias histrico-filosficas que haviam de marcar nuanas

    anteriores inexistentes. Razo, dever, felicidade, sabedoria e autonomia, relacionam-se com proximidade

    inusitada dentro da tradio romana.

    Ento, a tica estica uma tica da ataraxia. O homo ethicus o que respeita o universo e as suas leis

    csmicas e se respeita. Ele capaz de alcanar a ataraxia, o estado de harmonia corporal, moral e

    espiritual, por saber distinguir o bem do mal. A convivem conhecimentos lgicos e fsicos, no a

    contemplao a finalidade da conduta humana, mas sim a aco, pois nesta que reside a capacidade de

    conferir felicidade ao homem. por meio da aco que surgem as oportunidades de ser ou no ser naaco que reside o ideal de vida estico, determinado pelo cumprimento de mandamentos ticospelo

    simples dever, a ticadeve ser cumprida porque se trata de mandamentos certos e incontornveis da

    aco. Essa obedincia aos mandamentos ticos deve-se ao fato de tais mandamentos decorrerem de leis

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    naturais, daphsis que emanam as normas do agir.

    Porm, o legado de Roma para a filosofia jurdicarevelou-se um tanto escasso do ponto de vista

    especulativo, mas duas contribuies so importantes, a formao da ticaa partir da intuio natural e a

    afirmao da aco.

    Eles criaram um sistema de justia: transformaram em juiz a magistratura do Pretor(que era antes um

    chefe militar) rodeando-o de jurisconsultos, jurisprudentes, que eram como que consultores jurdicos.Estabeleceu-se uma distino entre o Pretor, que decidia as questes em concreto, no plano dos princpios,

    e um outro elemento da lide, que julgava as questes de facto, o judex. Primeiro, julgava-se a questo em

    teoria, e s depois se aplicava o decidido prtica, ou melhor, ao caso sub judice. O Pretordeu mostras de

    uma grande flexibilidade e imaginao para resolver os casos difceis. Ao contrrio do que normalmente se

    pensa, o Direito Romanono era rgido, sendo como tal dotado de grande ductibilidade e inventiva, por

    exemplo patentes no domnio das fces jurdicas.

    O direito primitivo de Roma, conhecido como ius civile, era um direito rgido e formalista aplicvel apenas

    aos cidado romanos. Tal direito comeou a apresentar problemas na consolidao do Imprio Romano

    tornando-se necessrio um direito aplicvel tambm aos estrangeiros. Surgiu a necessidade de adaptar o

    ius civiles novas necessidades, assim como humaniz-lo. Para isso, os juristas romanos recorreram ao

    direito natural.

    Nesse contexto histrico, o direito naturalera o direito comum (ius commune), que a razo natural

    implanta entre todos os homens e entre todos os povos. Por outro lado, esse direito, enquanto razo natural,

    devia ser respeitado pelo ius civile. O direito natural funcionou como humanizador do direito positivo,

    como elemento civilizador, de modo que o direto civil no pode alterar os direitos naturais.

    Manteve-se a mesma idia aristotlicaquanto diviso do direito vigente em direito natural e direito

    positivo.

    Aos Romanos, seguiu-se, com a queda do Imprio, uma longa noite de sincretsmo normativo, em que a

    confuso das ordens sociais normativas imperou.

    O contributo de S. Toms de Aquino

    Apenas com a reabilitao de Aristteles, por S. Toms de Aquino, no sc. XIII, se pode voltar a falar de

    Direitoem sentido epistemologicamente rigoroso.

    S. Toms de Aquinosegue a concepo clssica do direito e divide o verdadeiro direito, qual seja, o direito

    vigente, em natural e positivo.

    Aquino fala de coisa adequada ao homem segundo a natureza da coisa, de onde se deduz que o critrio

    primeiro, fundamental e primrio do direito natural a adequao ao homem.

    A diferena entra viso de S. Toms de Aquinoe do jusnaturalismo moderno que a primeira segue o

    realismo jurdico clssicoe, portanto, fala de coisas naturalmente adequadas ao homem, enquanto o

    jusnaturalismomoderno situa-se no subjetivismo e entende os direitos naturais como direitos subjetivos.

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    Portanto a primeira grande distino a considerar entre lei naturale direito natural. A primeira um fundo

    ou resduo de moralidade e rectido que existe em todas as pocas e povos, uma certa conscincia moral

    universal. As propriedades essenciais da lei naturalso a universalidade, a imutabilidade, e, por ltimo, a

    cognoscibilidade (isto , todos os homens tm a possibilidade de a conhecer). A lei natural o fundamento

    do direito natural no o prprio Direito, nem, obviamente, constitui uma lei escrita.

    S. Toms um autor de ordem e de bom senso: at para as insondveis coisas da f, que far para as do

    Homem. No seu exemplar livro sobre S. Toms de Aquino, G. K. Chestertonenaltece a filosofia do Doutor

    Comum precisamente como a filosofia do senso comum. E desenvolve o tema com humor:...a filosofia de

    S. Toms toma como ponto de partida a convico universal de que um ovo um ovo. Um hegeliano dir

    que um ovo uma galinha, porque no passa de um momento do devir um berkeleiano sustentar que os

    ovos de galinha no existem seno na medida em que o sonho existe, porque tanto podemos tomar o sonho

    como causa do ovo, como o ovo por causa do sonho o pragmatista acreditar que o melhor que podemos

    tirar de um ovo estrelado esquecer que se trata de um ovo para no nos recordarmos seno do estrelar.

    (...) O tomista, com todos os seus irmos humanos, constata sob a quente luz do sol, que o ovo no uma

    galinha, nem um sonho, nem uma ideia pura mas uma coisa atestada pela autoridade dos sentidos que vemde Deus.

    Porqu esta insistncia, aparentemente deslocada, no senso comum, como sinnimo de bom senso?

    que a propsito de natureza humana e de Homem os ltimos tempos tm vivido perodos de confuso

    tremenda, e provvel que o futuro prximo ainda muito sofra pela falta de clareza do esprito. que, se

    para S. Tomso Homem precisamente (como para Pascaldepois) nem um animal nem um ente extra-

    sensvel, e o Homem nem sequer (como afinal sucedia para S. Agostinho) se identifica com a sua alma,

    hoje j se comea a no se saber onde comea o homem e acaba a coisa, onde h pessoa apenas humanaou porventura poder haver pessoa animal (stupete gentes!).

    Mas, S. Toms clarssimo, o Homem, o Homem total, corpo e alma: ambas as coisas. E at em corpo e

    alma h-de ressuscitar. Afirma, comentando S. Paulo: A unio de corpo e alma certamente natural, e

    qualquer separao da alma do corpo vai contra a sua natureza e -lhe uma violncia. Assim, se a alma se

    encontra privada do corpo, ela existir imperfeitamente tanto quanto tal situao permanea."

    Por outro lado, o direito naturalno o Direito ideal por oposio ao direito positivo, havendo antes uma

    complementaridade entre os dois. Isto , segundo S. Toms, para o bem da sociedade no bastam osprincpios da lei natural, mas so necessrias leis humanas(positivas), as quais se baseiam sempre

    nestes princpios.

    Interessante compreender a teoria do conhecimento racional que S. Toms de Aquinodefendeu: "O homem

    no tem conhecimentos inatos. Quando cada homem comea a existir, o seu entendimento como uma

    lousa limpa na qual no h nada escrito. No que se refere razo prtica, o inato a capacidade de saberes

    e juzos prticos e a virtude da sindrese. Pela virtude da sindrese, a razo prtica realiza um juzo

    fundamental, sempre a posteriori, ou seja, por meio da experincia. Isto , o homem capta algumas coisas

    como boas e outras como ms. O inato ao homem no so os preceitos da lei natural, mas a capacidade de

    raciocnio do intelecto humano e a virtude da sindrese. A razo, retificada pela sindrese, capta o primeiro

    princpio, infalvel, porem no inato."

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    Alm de ter feito a recuperao do pensamento jurdico romano e aristotlico, S. Toms de Aquino laicizou

    o Direito, ou seja, iniciou um processo de secularizao, de separao entre o religioso e o temporal: "A

    Csar o que de Csar, a Deus o que de Deus" constituindo este processo um elemento fundamental

    para a compreenso do conjunto da cultura e da poltica ocidentais, e uma espcie de sua differentia

    specifica. No entanto, um tal movimento no durou muito: o religioso e o secular haviam de se misturar

    novamente, designadamente sob o impacto das correntes nominalistas. Para Guilherme dOccamo bem e

    o mal s derivam da vontade de Deus, que poderia, se assim o desejasse, substitu-los um pelo outro. Da adar ao direito qualquer contedo, desde que ordenado pelo deus-legislador, no vai longo caminho.

    A actualidade do Realismo Clssico

    Nos nossos dias, renasce o realismo clssicoe o direito natural, sobretudo aps a II Guerra Mundial, e

    dela procurando tirar algumas lies. Porm, a situao por vezes confusa, havendojusnaturalistasde

    muitos matizes. Michel Villey, um dos maiores jusfilsofos do sculo, afirmava-se a favor do direito

    natural, mas acabar por se declarar um no-jusnaturalista, pois considerar ojusnaturalismo, hoje, notanto uma teoria, mas antes uma mistura de ideologias.

    Michel Villey, sempre seguindo o Filsofo, d exemplos diversos de como imitamos a natureza. Um

    nos baste: o das belas artes. Mesmo artistas abstractos tm os seus modelos em formas da natureza. E,

    acrescentaramos ns, algumas representaes aparentemente mero fruto do esprito e passariam hoje por

    meros retratos realistas de algumas realidades fsicas, designadamente microscpicas.

    O realismo clssico do presente, imagem dos seus maiores, encara o direito naturalcomo universal,

    evolutivo, aquisitivo (vai "conquistando" direitos, que at vo sendo positivados), e assim tambm

    dinmico, submetido mudana no espao e no tempo. simultaneamente uno e mltiplo, claro e justo,

    atribuindo a cada um o que seu. , pois, pois uma viso dialcticado direito natural.

    A noo de Direito"O Direito a constante e perptua vontade de atribuir a cada um o que seu", de

    Ulpiano, defendida pelo realismo clssico. Esta no uma definio de Direito, mas uma descrio

    sinttica.

    "O que o seu de cada um?" tal a questo, muito frequentemente posta, para contrapor a esta

    passagem de Ulpiano. Responde o realismo clssico: "o seu" algo real pertena de algum, e o " seu de

    cada um" realmente diferente de A para B: isto , os direitos em concreto so supostos como diferentes

    entre si, o que no invalida a igualdade, por exemplo, a dita igualdade perante a lei.

    Esta posio parte do princpio de que existem fins e valores prprios do Direito, que aceita outros valores,

    os quais tambm contribuem para a organizao social. O Direito, ento, apenas a concretizao da

    justia jurdica. O "seu de cada um" do Direito aquilo que pertence a cada um de acordo com uma certa

    conscincia de juricidade e com um ttulo jurdico vlido. Nesta perspectiva, quem possui um ttulo jurdico

    socialmente apto a manter ou transmitir propriedade, tem Direito quem no possui esse ttulo, no tem

    Direito. Quem tem Direitotem possibilidade de aco, o que significa que, em caso de necessidade, podeexigir os seus direitos em tribunal. Segundo alguns autores, os verdadeiros direitos so apenas aqueles que

    tm a possibilidade de ser exigidos em tribunal nesta ptica, os direitos sociais, econmicos e culturais

    no seriam ento verdadeiros direitos. Mas a questo muito complexa para tomar aqui facilmente partido.

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    Poderemos ainda dizer que no haver Direitoenquanto a questo no for posta em tribunal. Os ingleses

    afirmam mesmo que s h Direitodepois de ser conhecida a deciso do Juiz, aplicando o costume

    imemorial do Reino. Mas trata-se sobretudo de uma declarao de princpio e at algo mtica.

    Os ttulos jurdicosso o contrato, o testamento, a lei, o costume, etc. As vrias fontes do Direitoso

    ttulos jurdicos (excepto a equidade). Atravs dos ttulos adquirem-se direitos. Numa viso mais

    modernista, quase se poderia dizer que o elemento da relao jurdica que d pelo nome de "facto jurdico",

    na sua verso de acto jurdico, e sobretudo na de negcio jurdico, constituindo, modificando e

    extinguindo direitos subjectivos, no seno um grande conjunto de ttulos jurdicos.

    Pode criticar-se esta perspectiva, e do prprio ponto de vista dos pressupostos de justia do

    jusnaturalismo. Nesta verso de estrita titularidade, j no o Estado que realiza a imposio (como no

    legalismo) mas sim os ttulos jurdicos - cai-se no mesmo erro do positivismo o que se chama

    jusnaturalismo positivista.

    A esta perspectiva ope-se a existncia de um outro ttulo jurdico: a natureza humanaque confere a cada

    indivduo direitos naturaise inalienveis. Este novo dado pe ainda um outro problema: como que se

    pode conciliar a ausncia de problemas morais no Direito(da contaminao jurdica pelo moralismo) com o

    facto objectivo de se querer evitar que este seja uma mecnica alheada dos problemas sociais? H que

    tentar conciliar estas duas perspectivas. Para isso, ter de relativizar-se quer o sentimento de Justiainato

    e em estado puro (que conduz para fora do mbito jurdico), quer o objectivismo jurista que tudo reduz ao

    jogo de ttulos e socialmente cristalizado.

    O primeiro tpico do Direito a Pessoa: o Direito feito para o Homeme no o contrrio. O "seu" tem em

    conta a dignidade e a irrepetibilidade da pessoa. O outro tpico do Direito a Justia, j que o Direito

    uma busca contnua de justia, ou se preferirmos - e esta verso mais apelativa e interpelante - a luta

    contra a injustia, no plano jurdico (porque outras lutas h: polticas, morais, etc.). No entanto, o que

    justo hoje pode j no o ser amanh, o que torna o Direitouma busca contnua.

    Se a perspectiva de Ulpianofosse positivista, no se poderia referir o modo dinmico, de uma constante e

    perptua vontade.

    Bibliografia

    Paulo Ferreira da Cunha, Pensar o Direito I - Do Realismo Clssico Anlise Mtica, Edies Almedina,

    1990

    Paulo Ferreira da Cunha, Lies Preliminares de Filosofia do Direito, Edies Almedina, 2009

    Wilhelm Dilthey, Sistemas da tica, Diversos, 2006

    Wayne Morrison,Filosofia do Direito - Dos gregos ao ps-modernismo, Martins Fontes, 2006

    G.K. Chesterton, Anton C. Pegis, Saint Thomas Aquinas, Diversos, 1974

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