O risco sistémico na indústria financeira.
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UNIVERSIDADE DE COIMBRA
∗ FACULDADE DE DIREITO ∗
CURSO DE PÓS – GRADUAÇÃO EM DIREITO BANCÁRIO, DA BOLSA E DOS SEGUROS
O RISCO SISTÉMICO NA INDÚSTRIA FINANCEIRA
ANÁLISE DOS POTENCIAIS IMPACTOS NA ESTABILIDADE EXIGIDA
Filipe José Trigo Simões Coimbra, 13 de Junho de 2011
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Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões, in "Sonetos"
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Índice
1. Introdução ....................................................................................................................................... 5
2. A definição de risco sistémico segundo o FSB e o IAIS .................................................................... 12
2.1. Os critérios utilizados para a identificação de instituições sistemicamente relevantes ........... 12
2.1.1. Dimensão .......................................................................................................................... 14
2.1.2. Interligação ....................................................................................................................... 15
2.1.3. Substituibilidade................................................................................................................ 16
2.1.4. Tempo ............................................................................................................................... 18
2.2. Factores que contribuem para a avaliação da importância sistémica ..................................... 18
2.3. O processo de insolvência e de falência: a experiência da indústria Seguradora .................... 19
2.4. Conclusão sobre os critérios utilizados pelo FSB e o IAIS relativos ao risco sistémico ............. 22
2.5. A limitação interventiva das autoridades públicas competentes e seus efeitos ...................... 23
2.6. A natureza do risco sistémico, e o processo dinâmico de acumulação de riscos..................... 23
2.7. A gestão de risco na indústria financeira................................................................................ 26
2.7.1. Risco de crédito ................................................................................................................. 26
2.7.2. Risco de mercado .............................................................................................................. 27
2.7.3. Risco de liquidez ................................................................................................................ 27
2.7.4. Risco operacional .............................................................................................................. 28
2.7.5. Risco de taxa de juro do Balanço ....................................................................................... 29
3. O nível de concorrência na indústria financeira global ................................................................... 31
3.1. Barreiras à entrada, à saída e à mobilidade na indústria financeira........................................ 33
3.2. Fixação do prémio de risco na actividade desenvolvida pelo sector financeiro ...................... 34
3.3. Fixação por parte do mercado do Prémio de risco do sector financeiro ................................. 34
3.4. Fixação do Prémio de risco por parte dos reguladores para o sector financeiro ..................... 35
4. Identificação de actividades potencialmente sistémicas................................................................. 38
4.1. A organização das actividades de crédito ............................................................................... 38
4.1.1. Nível concorrencial ............................................................................................................ 39
4.1.2. Fixação do Prémio de risco ................................................................................................ 40
4.1.3. Risco sistémico na actividade de crédito............................................................................ 44
4.2. A actividade Seguradora ........................................................................................................ 46
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4.2.1. A organização da actividade seguradora ............................................................................ 46
4.2.2. Nível de concorrência ........................................................................................................ 53
4.2.3. Fixação do prémio de risco ................................................................................................ 54
4.2.4. Solvência II, a configuração de um novo quadro regulamentar prudencial Europeu .......... 61
4.2.5. Os riscos decorrentes da arbitragem regulatória ............................................................... 64
4.2.6. A actividade Seguradora e o possível risco sistémico associado ......................................... 64
4.3. Operações no mercado de capitais ........................................................................................ 66
4.3.1. A organização das actividades no mercado de capitais ...................................................... 67
4.3.2. Nível de concorrência ........................................................................................................ 68
4.3.3. Fixação do preço de risco .................................................................................................. 70
4.3.4. O VaR como modelo de projecção de perdas potenciais ................................................... 72
4.3.5. Métodos comummente utilizados para o cálculo do VaR de um portfólio ......................... 73
4.3.6. Problemas na avaliação de riscos associados ao VaR ......................................................... 74
4.3.7. A liquidez dos instrumentos financeiros ............................................................................ 75
4.3.8. O papel das agências de rating na avaliação do risco de mercado e de liquidez................. 76
4.3.9. As actividades do mercado de capitais e o risco sistémico ................................................. 77
5. Autoridades europeias que supervisionam o mercado financeiro .................................................. 78
5.1. Sistema Europeu de Supervisão Financeira ............................................................................ 79
5.2. Autoridade Europeia de Supervisão ....................................................................................... 79
6. Conclusão ...................................................................................................................................... 81
7. Bibliografia citada .......................................................................................................................... 84
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1. Introdução
A recente crise financeira lançou a tomada de consciência para a prevenção do risco
sistémico, bem como para o desenvolvimento de modelos, e técnicas prudenciais que
possam de certa forma vir a contribuir para a mitigação dos efeitos que podem incidir
sobre os vários agentes económicos. A noção de risco sistémico não constitui um elemento
novo, abrangendo uma série de questões amplamente debatidas a nível académico, mas
ainda sem a dimensão, e a profundidade desejada, assentes num quadro regulatório
imperativo, amplo e exigente. As consequências da enorme crise do subprime sobre o
mundo financeiro e a economia real, já colocaram o risco sistémico no primeiro plano de
trabalho internacional sobre a regulação financeira. No recente encontro do G20 que
decorreu em Pittsburgh1, onde se discutiu os temas relacionados com os mercados
financeiros, e a economia mundial, foram tomadas decisões no sentido de haver uma
maior regulação dos mercados financeiros, assim como para a importância da reforma das
instituições de Bretton Woods, onde foram assumidos diversos compromissos no sentido
de se criar uma cultura defensiva que vise prevenir e superar, as consequências adversas
que podem resultar, independentemente do seu impacto associados a diferentes tipos de
riscos, e que visem acautelar as instituições financeiras que sejam consideradas
sistemicamente relevantes.
Ainda segundo as palavras de Mário Murteira2, vivemos ou caminhamos, para a “economia
baseada no conhecimento”, ou até para a “sociedade do conhecimento”. Na realidade,
estamos cada vez mais dependentes de frágeis economias baseadas na especulação
financeira. E esta, por seu turno, gera além do mais um conhecimento adequado ao
prosseguimento dessa especulação. Além de tudo isto, e em consequência da evolução
própria da economia norte-americana, a colossal globalização financeira das últimas
décadas, veio dar o predomínio a novas formas de acumulação de capital financeiro, sem
contrapartida na economia real. Fazem-se, e desfazem-se grande “bolhas” no mercado
global de capitais. No aspecto financeiro, tem-se dito que a recente grande crise mundial é
sistémica e não poderá ser resolvida por apressados regressos ao “business as usual”, para
benefício dos grandes manipuladores de dinheiro que ainda dominam a economia
mundial.
1 Pittsburgh G-20 Partnership - Pittsburgh Summit 2009, www.pittsburghg20.org 2 Professor emérito do ISCTE, Instituto Universitário de Lisboa, in Crises e oportunidades, O risco sistémico, Mário Murteira, Junho de 2010.
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De uma forma geral, a percepção do risco sistémico tem origem numa externalidade
negativa3. O termo externalidade negativa, aplicado ao sector financeiro, relaciona os
custos que o sector financeiro impõe à economia real, no caso de uma crise sistémica. Essa
ideia também faz sentido dentro do próprio sector financeiro, na medida em que a falência
de uma instituição financeira, tendo um impacto directo sobre todos os stakeholders4 que
interagem com essa sociedade, pode conduzir a um enfraquecimento de outras
instituições financeiras, devido às relações de interligação, e de dependência que se
estabelecem. Assim, todo o sistema financeiro, e a economia real podem ser afectados pela
materialização de um risco assumido por um único Banco, cabendo identificar os riscos
financeiros de natureza sistémica, que ameaçam toda a comunidade, e que geram custos
que não são assumidos pelos agentes responsáveis por esses riscos.
Essa externalidade pode ser determinada quando, por exemplo, uma grande instituição
financeira não dispõe de recursos suficientes para pagar a uma outra contraparte, fazendo
com que esta também não disponha dos recursos necessários para que possa pagar a uma
terceira entidade, e assim por diante gerando um efeito dominó, o que pode conduzir
eventualmente a uma expectativa de colapso de todo o sistema financeiro, ou seja, a uma
crise sistémica, entendida como uma interrupção na cadeia de pagamentos.
O desencadeamento de uma crise sistémica começa com um choque, que depois se espalha
por todo o sector financeiro. Este choque pode resultar na insolvência de um mercado ou
de uma instituição financeira. Também pode surgir de uma situação de desequilíbrios
macroeconómicos. Mas nem todos os choques necessariamente conduzem a uma crise
sistémica. Isso pressupõe que o choque se propague por todo o sector financeiro, e
posteriormente por toda a economia real. A difusão apenas sucede se o sistema financeiro
de forma gradual, tiver sido enfraquecido por via da acumulação de riscos que podem vir a
afectá-lo como um todo.
O efeito de amplificação por via de um choque exógeno na economia tem subjacentes
diversos elementos. Primeiro, é sabido que a capacidade de investimento dos diversos
agentes económicos é limitada, por via de uma restrição orçamental, assim como por via
do preço da remuneração do factor produtivo capital, a taxa de juro. Em segundo lugar, o
3 Termo recorrentemente utilizado para descrever uma situação, em que as acções de um agente económico têm um impacto negativo sobre a posição de um outro agente, sem o sofrimento ao anterior pelo dano causado a este último. 4 Por stakeholders entende-se toda a comunidade que envolve uma empresa, e que tem interesse no seu desenvolvimento. Os stakeholders, geralmente com maior interesse na performance de uma empresa incluem dois tipos de parceiros, os parceiros internos (e.g. accionistas, os colaboradores e as equipas de gestores), e os parceiros externos (e.g. os clientes, os fornecedores e o Estado), In Produtividade, J. Eduardo Carvalho, 2004, Quimera Editores.
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nível de actividade económica em termos agregados, condiciona o preço dos factores
produtivos no sector de actividade em causa. Terceiro elemento tem que ver com o preço
dos factores produtivos que vai determinar o ganho individual líquido dos detentores
desses factores. Por último, o rendimento líquido determina a escassez dos seus
constrangimentos financeiros, afectando a disponibilidade, ou o preço do financiamento
externo. Estes factores contribuem para uma considerável redução da actividade
económica, que por sua vez deprime o preço dos activos produtivos, e assim por diante,
conduzindo a um ciclo de auto reforço na queda nos preços dos activos financeiros,
contribuindo para uma deterioração do rendimento líquido, forte restrição nas condições
de financiamento, e no declínio da actividade económica5. O choque pode atingir
inicialmente uma instituição, ou um mercado, propagando-se através de contágio para o
sistema financeiro em geral, ou afectando diversas instituições e mercados em simultâneo.
O mecanismo de ajustamento para um novo ponto de equilíbrio pode ser particularmente
violento, representando uma ruptura completa, e abrupta com o equilíbrio anterior. A
magnitude do choque inicial, e o mecanismo de ajustamento determinam a intensidade do
impacto da crise sobre a economia real, a economia do emprego, dos salários e da
produção, assim como o bem-estar da população.
Segundo Steven L. Schwarcz6, o risco sistémico, é o risco de um choque contra uma parte
limitada do sistema, a falência de uma grande instituição financeira, por exemplo, que se
propaga por todo o sistema financeiro, conduzindo a uma reacção em cadeia de falências, e
à quebra do sistema, manifestando um forte impacto sobre as taxas de juro, câmbio e os
preços dos activos em geral, e condicionando a política económica que possa estar
definida pelos diversos Governos, uma vez que estas variáveis são utilizadas como
variáveis macroeconómicas na definição das diferentes políticas, em contraste com o risco
associado a uma entidade individual, um grupo ou apenas a uma componente do sistema.
O Comité de Bancos de Basileia, definiu o risco sistémico como sendo aquele em que a
inadimplência de uma instituição em conseguir honrar os seus compromissos contratuais
pode vir a gerar uma reacção em cadeia, atingindo grande parte do sistema financeiro.
Esta definição pressupõe uma elevada exposição directa entre as instituições, assim como
relações de interligação, e de interdependência entre os agentes de um sistema ou
mercado, no qual a insolvência ou falência de uma única entidade ou grupo de entidades
5 Anton Korinek, Systemic Risk-Taking: Accelerator Effects, Externalities, and Regulatory Responses, University of Maryland, October 2008. 6 Systemic Risk, Steven L. Schwarcz Stanley, A. Star Professor of Law and Business Duke University School of Law, Founding Co-Academic Director Duke Global Capital Markets Center, Research Paper No. 163 March 2008.
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pode provocar falências em cascata, o que poderia conduzir o sistema, ou o mercado como
um todo a uma bancarrota.
Mas ainda no seguimento do exposto, convém clarificar um outro conceito que devido à
sua semântica pode ser gerador de algum enleio. Referimo-nos ao conceito de risco
sistemático (systematic risk), que consiste no risco relacionado com o mercado como um
todo, no seu conjunto, como por exemplo, nos seus aspectos políticos, sociais ou
económicos, ou ainda outros que alteram o comportamento da maioria dos investidores.
Este risco é distinto do risco individual de cada um dos valores cotados por ser um risco
do mercado no seu conjunto, e por isso chama-se também risco não diversificável, na
medida em que não é possível reduzi-lo, ou cobri-lo através da diversificação da carteira
por diversos títulos ou sectores. Em contraponto ao que já foi indicado para o risco
sistémico, que se encontra presente no sistema monetário, e que derivado de uma falência
de uma entidade financeira pode desencadear uma reacção em cadeia de falências, que
colocam em risco o próprio sistema. Este risco deriva da teia de relações que liga todas as
entidades financeiras, via relações de crédito, investimento e contraparte. Relações essas
que acontecem num contexto de alavancagens elevadas, fruto da própria concepção do
sistema bancário.
A identificação do risco sistémico requer uma definição de crise sistémica. Na falta de uma
definição teórica, amplamente aceite, vários organismos internacionais têm trabalhado
numa definição em comum, considerando que a crise sistémica consiste numa interrupção
no fluxo de serviços financeiros, (i) causada por uma deficiência no todo ou parte do
sistema financeiro e, (ii) que possa ter difundido consequências negativas sobre a
economia real. O risco sistémico consiste portanto numa ameaça na interrupção do fluxo
de serviços financeiros, e que de um modo susceptível pode afectar todo o sector
financeiro, assim como a economia real.
A identificação do risco sistémico constitui uma tarefa complicada, não se limitando
apenas a um quadro regulamentar predeterminado, ou de um único critério subjacente.
Uma análise da recente crise financeira, não produziu um único critério comum a todas as
instituições financeiras cujos problemas poderiam ter prejudicado em conjunto o sector
financeiro. Por exemplo, o tamanho das instituições financeiras não deve ser o único
critério a servir de base, tendo em vista a identificação das entidades que possam vir a ter
uma importância sistémica. Em primeiro lugar, os riscos apresentados por instituições
financeiras, não podem ser analisados meramente pelo critério do Balanço total, dado o
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peso da sua exposição fora do Balanço de muitos dos valores mobiliários, e instrumentos
derivados que se encontram inscritos fora do Balanço destas entidades, assim como para a
existência de diferenças observadas nas normas contabilísticas que vigoram nos
diferentes países, apesar do crescente trabalho que tem vindo a ser realizado a nível
internacional através da IFRS7 de forma a tornar a informação contabilística comparável.
Em segundo lugar, uma maior dimensão pode traduzir um maior grau de diversificação de
riscos como sucede com os Bancos universais e, por essa via apresentarem uma maior
resistência aos choques exógenos. Em contrapartida, os hedge funds e as seguradoras
podem, em determinadas circunstâncias, ser considerados como entidades
sistemicamente relevantes devido à natureza da sua actividade. A situação
macroeconómica, e os ciclos económicos também podem desempenhar um papel
relevante no surgimento de crises sistémicas. Um estudo realizado pelo Federal Reserve
Bank de Cleveland8, aponta adicionalmente outros 4 factores para além do factor dimensão
na avaliação de uma instituição, cobrindo o risco de contágio, a correlação existente, o
grau de concentração e as condições de contexto.
Uma análise relativa ao risco sistémico, não se pode limitar somente às entidades
bancárias. Embora o sector bancário tenha sofrido as maiores perdas com a crise do
subprime, muitas contrapartes não bancárias desempenharam igualmente um papel
importante no desencadeamento, e na propagação da crise. Os exemplos incluem os hedge
funds, que prejudicaram os principais Bancos, sobretudo a Banca de Investimento como a
UBS e o Bear Stearns. Identificar o risco sistémico requer uma análise aprofundada da
actividade desenvolvida por todo o sector financeiro, sendo que na ausência de critérios
que possam distinguir claramente as instituições financeiras que podem vir ou não, a
desempenhar um papel relevante em termos sistémicos, o risco sistémico apenas poderá
ser identificado através de uma análise pormenorizada das actividades, e estratégias
financeiras, através de uma combinação adequada de todas as categorias legais.
7 As normas IFRS (International Financial Reporting Standards) foram adoptadas (entre outros) pelos países da União Europeia, através do regulamento 1725/2003/CE da Comissão Europeia, actualizado posteriormente pelo Regulamento 1126/2008/CE, com o objectivo primordial de harmonizar as demonstrações financeiras consolidadas publicadas pelas empresas europeias que tenham o seu capital disperso no mercado de capitais. Actualmente diversos países têm projectos de convergência das normas contabilísticas nacionais para as normas IFRS. O principal objectivo das demonstrações financeiras através das normas IFRS é dar informações sobre a posição financeira, os resultados e as mudanças na posição financeira de uma entidade, que sejam úteis, a um grande número de destinatários (investidores, empregados, fornecedores, clientes, instituições financeiras ou governamentais, agências de notação, e público em geral) no seu processo de tomada de decisão. Assim, os elementos das demonstrações financeiras (Balanço, demonstração de resultados, demonstração dos fluxos de caixa, informações por segmento de negócio, as notas, e as divulgações) podem alcançar características qualitativas das demonstrações financeiras em IFRS, como a compreensibilidade, a relevância, confiabilidade e a comparabilidade. 8 Measuring Systemic Risk, Viral V. Acharya, Lasse H. Pedersen, Thomas Philippon, and Matthew Richardson Working Paper, March 2010.
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Existem duas escolas de pensamento conflituante sobre a origem desta crise. A primeira
destaca a acumulação excessiva de riscos, enquanto a segunda, enfatiza as falhas de
regulação financeira. Dada a multiplicidade de sistemas de supervisão, e de regulação
vigentes à data dos acontecimentos nas diferentes economias, ficou patente que todos se
revelaram como sendo falíveis, não sendo suficientemente eficazes, uma vez que os
mesmos são idealizados, implementados e alimentados por pessoas, e as pessoas como se
sabe falham. Na realidade, este debate revela que os factores macroeconómicos,
nomeadamente os desequilíbrios económicos, e financeiros estão directamente ligados na
manifestação de uma crise sistémica. A origem da crise, em parte, pode igualmente ser
explicada por meio de outros factores, devido ao endividamento excessivo dos agentes
privados em certos países ocidentais, em períodos de expansão económica, chegando a
níveis que não eram mais sustentáveis. Esta situação afectou sobretudo as famílias dos
EUA, através da crise do subprime que começou no Verão de 2007, após a retracção do
mercado imobiliário dos EUA. Estes níveis de dívida foram possíveis graças à abundância
de liquidez a nível mundial, e à flexibilização das condições de crédito, ajudado por baixas
taxas de juro. A desaceleração no mercado imobiliário dos EUA, propagou-se para o sector
financeiro através de operações de habilidosa engenharia financeira, através das
conhecidas operações de titularização ou securitização de crédito. Uma análise das
vulnerabilidades macroeconómicas do sistema financeiro é, portanto, um aspecto
fundamental na identificação do risco sistémico. O risco sistémico é de natureza
macroeconómica, e não está claramente identificado nas normas financeiras, ao contrário
dos tradicionais riscos microeconómicos (risco de taxa de juro, risco de crédito).
De todos os riscos aos quais uma entidade, ou sistema como um todo se encontram
diariamente sujeitos (e.g. risco de liquidez, risco operacional, risco legal, risco de crédito,
ou o risco de mercado, entre outros), o risco sistémico, pela sua natureza e impacto talvez
seja o que represente o maior desafio para os supervisores, e para os mercados
financeiros, sendo que um quadro uniforme e flexível de gestão e de controlo dos riscos,
juntamente com os níveis de capital adequados seja essencial para um contínuo e
ordenado funcionamento do mercado financeiro a nível global.
Por fim espaço ainda para uma pequena elucidação para a justificação do título do
presente trabalho, no qual decidi designar como indústria, todo o sector financeiro, dada a
definição de indústria que se encontra desenvolvida no livro do Professor Luís Cabral9,
9 In, Economia Industrial, Mc Graw-Hill, 2001.
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onde se demarca do conceito tradicional de indústria associado ao aço e à ferrugem, para
evoluir em direcção a um conceito mais amplo, e dinâmico, onde se inclui toda a actividade
económica que opere em larga escala (e.g. indústria do turismo, dos seguros), e o sector
financeiro pela sua missão, e dimensão global preenche os requisitos indicados.
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2. A definição de risco sistémico segundo o FSB e o IAIS
Segundo estes dois organismos, o risco sistémico pode ser entendido como, "o risco de
perturbações no fluxo da prestação de serviços financeiros, (i) devido a uma deficiência
identificada no todo ou em parte do sistema financeiro, e (ii) com a possibilidade de vir a
gerar consequências negativas para a economia real." O princípio fundamental subjacente
nesta definição, consiste na ideia de que o risco sistémico está associado a um conjunto de
externalidades negativas e, ou em falhas de mercado, sendo que a insolvência de uma
instituição financeira, ou o seu mau funcionamento, podem prejudicar de forma acentuada
o sistema financeiro e, em último caso transmitir os seus efeitos para a economia real
culminando numa crise capaz de se propagar por diversos patamares, começando por ser
apenas de natureza financeira, evoluindo para uma crise económica, culminando
posteriormente numa crise com contornos sociais agravando os equilíbrios existentes.
2.1. Os critérios utilizados para a identificação de instituições
sistemicamente relevantes10
(i) Dimensão, é medida através do volume de serviços financeiros prestados por
cada elemento do sistema financeiro.
(ii) Interligação, refere-se ao nível de interdependência dos mercados uns sobre
os outros, bem como sobre as instituições que nele operam.
(iii) Substituibilidade, em que medida um outro elemento do sistema pode
fornecer os mesmos serviços, no caso de se observar uma insolvência por parte
de um concorrente, e este já não se encontrar em condições de continuar a
prestar os seus serviços no mercado.
(iv) Tempo, o risco sistémico na actividade seguradora normalmente não gera de
forma imediata os efeitos de um choque, uma vez que a sua actividade se
desenvolve num horizonte temporal mais longo.
10 Guidance to Assess the Systemic Importance of Financial Institutions, Markets and Instruments: Initial Considerations, Prepared by: Staff of the International Monetary Fund and the Bank for International Settlements, and the Secretariat of the Financial Stability Board, October 2009.
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Para as instituições, a dimensão da exposição, os volumes de transacção ou os activos sob
gestão são indicativos da amplitude a que os clientes e os outros membros podem ser
lesados. Um grupo de instituições em termos individuais pode não ser considerado como
relevante, mas em termos colectivos ser significativo, porque em caso de falha, todas as
instituições, independentemente da sua dimensão, sofrem em simultâneo, e ao mesmo
tempo as mesmas dificuldades e consequências. No caso das instituições que prestam
serviços essenciais, tais como os serviços de compensação e de liquidação, necessitam de
assegurar a existência de um membro substituto que possa assumir este papel no caso de
um dos membros deixar de reunir as condições para realizar essa tarefa. A interligação
compreende os casos em que a dificuldade sentida por uma instituição, aumenta a
possibilidade de um outro membro, também ele poder vir a sentir as mesmas dificuldades.
Para o mercado, a avaliação da importância do risco sistémico apresenta desafios mais
conceptuais. A importância sistémica de um mercado deriva para uma extensão a partir
das instituições que nele participam. No entanto, a dimensão de um mercado é um
determinante de potenciais custos económicos em caso de um deficiente funcionamento.
Se a importância de um mercado sob pressão não pode ser replicada por meio de um outro
mecanismo, o impacto económico pode então ser significativo.
A definição do FSB, é a que surge mais vezes sempre que se discute o risco sistémico em
fóruns de supervisão e de regulação. O FSB tem estabelecido alguns critérios relativos à
dimensão, interligação, e substituibilidade através dos quais a relevância relativa ao risco
sistémico de instituições pode ser avaliada. O FSB também especificou critérios
secundários, que podem contribuir para potencializar a vulnerabilidade de algumas
instituições como sejam, a complexidade, a alavancagem e o risco de liquidez.
A IAIS adicionalmente sugeriu a inclusão da variável tempo a estes critérios, reflectindo o
papel crítico que a velocidade de propagação desempenha na transmissão de um evento
exógeno ao sistema financeiro, e o tempo que este demora a ser absorvido. No entanto,
aceitando apenas os critérios que o FSB tem apresentado, é importante fazer notar que o
impacto destes critérios no risco do sistema financeiro pode ser muito diferente nas
diversas actividades desenvolvidas. Importa salientar que os critérios devem apenas ser
aplicados em concreto à actividade desenvolvida, e não às instituições.
Aplicando cegamente os critérios a todos os riscos incorridos pelas diferentes instituições,
acrescentando uma carga adicional de regulamentação sobre o sistema de estabilização
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das instituições, pode-se para além disso, não se estar a contemplar algumas entidades
que possam verdadeiramente desenvolver as actividades que sejam geradoras de risco
sistémico. Concentrando a sua actuação apenas numa lista de instituições, por essa via
torna-se difícil conseguir detectar ou controlar os riscos sistémicos de uma forma eficaz,
em vez disso, é provável que incentive a uma migração do risco, que conduz à
subestimação do risco sistémico, e ao desenvolvimento do risco moral (moral hazard).
2.1.1. Dimensão
A dimensão constitui uma medida imperfeita da avaliação do risco. Se não é tomado em
consideração o capital económico, então os activos e a capitalização de mercado dessa
instituição não se consegue traduzir de forma conveniente o risco associado. Por exemplo,
as grandes seguradoras geralmente encontram-se bem diversificadas, tanto a nível
geográfico, como através de diferentes linhas de negócio. Isso espelha o seu modelo de
negócio, o que faz com que estejam expostas a uma ampla gama de modalidades de riscos
potencialmente seguros, de mercado, de negócio entre outros riscos. Como esses riscos
são na sua generalidade idiossincráticos, e partilham uma relação mútua11, o risco total da
instituição é menor do que a soma dos riscos individuais. Esta diversificação ajuda a
explicar a resistência da maioria das grandes seguradoras durante a crise, sendo notável
que uma grande Seguradora é mais diversificada do que um grande Banco. Assim, o
critério relativo à dimensão, carece de distinção entre a concentração de riscos, e a
diluição do risco através do efeito de diversificação.
Naturalmente que a dimensão de uma instituição constitui um factor relevante, e nem
sempre precisa de ser o caso de um grande Banco, que é menos diversificado do que uma
Seguradora de grande dimensão. Mas, portanto, o significado da dimensão para a análise
do risco sistémico vai depender da composição da actividade desenvolvida por uma
instituição, a dimensão de cada um, e da sua interacção com outros factores de risco
sistémico, tais como as interligações. Não é tanto a dimensão que constitui um perigo
visível, mas sim, uma dimensão não diversificada. Tomando em linha de conta a dimensão
11 O princípio da mutualidade constitui uma das principais características da actividade seguradora, onde se garante através de um contributo individual, a distribuição equitativa por uma comunidade de indivíduos, das consequências da verificação de um risco que possa afectar um elemento daquela comunidade, ajudando-o a fazer face aos respectivos prejuízos. Para o bom funcionamento deste princípio é necessário que os riscos assumidos pela Seguradora sejam semelhantes entre si (riscos homogéneos), e que o contributo de cada elemento da comunidade seja igualmente semelhante. Às comunidades assim constituídas damos o nome de comunidades de riscos. São constituídos pelos diversos ramos ou modalidades de seguros explorados pelas seguradoras, como o ramo vida, o ramo acidentes, ou o ramo automóvel, e devem ser economicamente autónomos, no sentido de que os Prémios recebidos por cada ramo devem ser suficientes para pagar as necessárias indemnizações em caso de sinistro.
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como variável institucional, pode-se ignorar este problema, e o risco de julgamentos
errados que estão a ser feitos relativos à relevância sistémica.
2.1.2. Interligação
A interligação constitui uma condição necessária para a relevância sistémica. Só no caso de
o risco poder ser transmitido, pode uma instituição, ou as suas actividades constituírem de
facto um risco para o "sistema". As interacções que se registam entre as diferentes
instituições do sector financeiro são de natureza distinta, incluindo, por exemplo,
participações cruzadas, interacções nos sistemas de pagamentos e operações explícitas de
transferência de riscos (e.g. resseguro e derivados).
Mas aparentemente, semelhante tipo de interligação pode ter efeitos muito diferentes
sobre o sistema financeiro. A título de exemplo, podemos considerar dois tipos de
actividades de transferência de risco, operações de resseguro entre as seguradoras e os
resseguradores, e as transacções de CDS entre Bancos. Ambos envolvem várias partes. No
entanto, enquanto as operações de resseguro mitigam o risco sistémico (distribuindo os
riscos existentes entre várias congéneres, e permitindo a diversificação de riscos), as
operações sobre CDS podem agravá-lo. E, enquanto as operações de resseguro constituem
uma pequena parte do Balanço total de uma seguradora, a crise que antecedeu a
negociação dos CDS foi significativa em relação ao total do Balanço dos Bancos.
O Resseguro efectivamente distribui um risco, cujo tamanho constitui um factor limitador
ao interesse subjacente da actividade seguradora, através de diversas partes, ao mesmo
tempo que permite a diversificação dos diferentes riscos. O risco moral é atenuado, porque
a seguradora continua exposta a uma parte das perdas numa operação de resseguro.
No contexto das catástrofes naturais, a estrutura da indústria de seguros contempla duas
linhas de defesa. Os Resseguradores assumem os denominados "riscos de pico", e actuam
na primeira linha de defesa na ocorrência de eventos extremos (e.g. catástrofes),
proporcionando uma barreira que protege as seguradoras primárias de perdas maciças e
de potenciais insolvências. Em caso de perdas extremas que originem a insolvência dos
resseguradores, o capital das seguradoras primárias, proporciona uma segunda linha de
defesa. Teoricamente, é possível que os efeitos decorrentes de um evento sejam tão
grandes que consigam superar toda a indústria seguradora, mas isso seria, então, uma
catástrofe nacional ou global de proporções inimagináveis (e.g. o furacão Katrina
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enquadrou-se dentro da capacidade da indústria). Nesta circunstância, a natureza do
evento teria causado uma perda, e não a actividade da Seguradora em si.
As operações interbancárias realizadas sobre os CDS, pelo contrário, podem desassociar o
risco de detenção do risco subjacente. Quando o Lehman Brothers entrou em processo de
insolvência em Setembro de 2008, detinha US $ 155 biliões em dívida, e ainda US $ 400
biliões em dívida por saldar através de CDS. Por conseguinte, é possível que as perdas dos
CDS decorram a partir de um evento, com impacto de forma substancial em vários
investidores, do que o próprio evento em si, sendo que a interligação existente no mercado
pode conduzir a um contágio do sistema como um todo.
O efeito de contágio pode ser agravado através de um efeito de opacidade. A complexidade
dos vários instrumentos derivados, e o facto de muitos deles serem comercializados em
mercado OTC, ao invés de serem negociados em mercado bolsista, torna mais difícil de
avaliar a posição de risco das contrapartes no mercado interbancário. Esta opacidade
constituiu um factor importante para a perda de confiança no auge da crise no final de
2008. As transacções entre Seguradoras gozam de um grau de transparência muito
superior, sendo dominadas por um pequeno número de mecanismos padronizados que
são bem compreendidos pelos operadores envolvidos e pelo resto do mercado.
Não se pode discutir que a interligação não seja um critério relevante na avaliação do risco
sistémico de uma seguradora, cabe no entanto salientar que a interligação pode ser um
factor altamente significativo no desenvolvimento de algumas actividades, enquanto para
outras, a interligação é um factor pouco relevante.
2.1.3. Substituibilidade
O grau de substituibilidade de uma instituição de serviços financeiros deve ser avaliado,
considerando duas questões:
(i) A instituição possui alguma especificidade técnica, ou desempenha um papel
único no mercado, que seja difícil de a conseguir substituir em tempo útil por
um outro operador de mercado no curto prazo, caso a instituição esteja na
iminência de desaparecer?
(ii) São as competências que a instituição desenvolve no seu mercado, tão
singulares, ou únicas que outros operadores não possam intervir com
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capacidade suficiente para permitir que o mercado se ajuste e consiga alcançar
o equilíbrio concorrencial?
Por meio destes testes, verifica-se que a actividade seguradora é substituível, e portanto
sistemicamente não é considerada relevante através da análise por meio deste critério. Em
primeiro lugar, nenhuma seguradora detêm o monopólio em qualquer ramo de seguro,
nem existe uma instituição que desempenhe um papel central no mercado, actuando como
câmara de compensação ou actuando como intermediário na negociação de valores
mobiliários ao invés do que se verifica com as instituições de crédito e sociedades
financeiras. Em segundo lugar, a capacidade das seguradoras é substituível. As
seguradoras obtêm a sua capacidade de subscrição de novos negócios a partir de um
variado número de fontes, incluindo o capital externo. No entanto, podemos olhar para os
resseguradores como os derradeiros fornecedores da faculdade de garantirem às
seguradoras uma crescente capacidade para que estas possam de forma contínua,
assegurar e continuar a aceitar novos contratos em diferentes modalidades de seguro. Mas
a capacidade de substituição de um operador no mercado de resseguro, não constitui uma
tarefa árdua. Após a ocorrência de uma catástrofe natural, verifica-se que existe uma
redução na capacidade de resposta do ressegurador, ocorrendo em simultâneo um
incremento nos preços do resseguro que se vai manter por vários anos.
É óbvio que a recapitalização necessária da indústria após uma grande catástrofe não
ocorre da noite para o dia. No entanto também não existe o problema de um operador ser
substituído subitamente por outro. Em primeiro lugar, o critério colocado em relevo pelo
IAIS, demonstra aqui a sua relevância. Enquanto para algumas actividades bancárias seria
exigido de imediato um membro substituto, na realidade, esta urgência não se verifica na
indústria seguradora, sendo que o processo de liquidação de uma seguradora, não implica
que a perda da cobertura garantida ocorra no imediato.
Em segundo lugar, a indústria seguradora e de resseguro, é altamente diversificada por
meio das habituais medidas regulamentares presentes em cada país, e no mundo inteiro
para a actividade de resseguro, sendo que apenas um evento que possa desencadear um
efeito devastador sobre toda a indústria, consegue tornar impossível a contínua subscrição
de novos contratos de seguro. Devido à organização e estrutura do mercado segurador e
ressegurador, a substituibilidade, não é tão relevante para as seguradoras quanto para os
Bancos, onde os sistemas de compensação e de liquidação que ocorrem por exemplo no
mercado monetário interbancário desempenham um papel crítico.
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2.1.4. Tempo
A gestão das participações de sinistro, processa-se de uma forma mais lenta do que a
regularização das margin call, as garantias colaterais e de depósito que existem na
actividade bancária. Por exemplo, menos de metade das reclamações relativas ao evento
do World Trade Center, foram resolvidas dois anos após o evento. Isto é uma consequência
directa da natureza dos sinistros que se registam em larga escala, uma vez que em alguns
casos, o mesmo risco se encontra garantido por diversas apólices.
A falência de um Banco, e as consequentes dificuldades de funding que se sentem no
mercado monetário interbancário, podem provocar o colapso do sistema Bancário muito
rapidamente. Em contrapartida, a insolvência de uma Seguradora constitui um processo
mais ordenado. O ritmo mais lento de uma insolvência aumenta a necessidade de
"substituição", através da garantia do tempo necessário para que se possa restabelecer o
capital necessário e a capacidade da indústria. Podemos desta forma argumentar que as
insolvências na indústria Seguradora apresentam um menor risco sistémico, em
comparação com as falências Bancárias. No entanto, observa-se igualmente que as
dificuldades causadas pela divisão da AIG Financial Products, apresentou uma enorme e
imediata ameaça sistémica, devido em grande parte à política conduzida pelos decisores
governamentais dos EUA, o que conduz de novo para a necessidade de se considerar para
efeitos de análise ao risco sistémico a actividade desenvolvida, ao invés das instituições.
2.2. Factores que contribuem para a avaliação da importância sistémica
Cada um dos três factores seguintes, nível de alavancagem, liquidez e o nível de
combinação entre o activo e o passivo que compõe o Balanço de uma instituição, e nível de
complexidade, de forma independente não são fontes geradoras de risco sistémico, mas
devem ser considerados juntamente com o principal critério. Podemos considerar o nível
de alavancagem e de liquidez em conjunto, à semelhança das actividades de alavancagem
realizadas no mercado Bancário (por exemplo, o uso de financiamento por grosso para
aumentar a capacidade da instituição de crédito em relação à sua base de depósitos, por
meio do aumento do rácio de transformação), e uma inadequada gestão integrada da
liquidez para que uma instituição passe a ter uma exposição ao risco de falta de liquidez
no mercado por grosso, durante um determinado período de tempo.
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Mas para as Seguradoras tradicionais, o conceito de alavancagem é diferente daquele que
vigora no mercado Bancário e, portanto, a natureza do risco de liquidez é diferente. A
actividade Seguradora é auto financiada através da afluência dos Prémios que são
cobrados, sendo que a alavancagem não constitui uma parte do modelo de negócio do
Seguro, sendo que as Seguradoras não necessitam de recorrer ao efeito de alavancagem
para poderem funcionar. As Seguradoras têm que manter a liquidez adequada, à medida
que vão tendo a necessidade de proceder a pagamentos junto dos seus tomadores de
Seguro. Muitos desses pagamentos são sinistros já previstos, assim como o pagamento de
pensões, mas em alguns casos, os tomadores têm a capacidade de acelerar os pagamentos,
através de resgates antecipados dos contratos. Estes pagamentos são financiados, em
primeiro lugar, através de entradas de Prémios, e posteriormente através da alienação de
valores mobiliários detidos na sua carteira de investimentos. As Seguradoras não se
encontram dependentes do financiamento em larga escala, a fim atenderem aos resgates
dos seus tomadores, ou devido a qualquer outra necessidade operacional. Por conseguinte,
enquanto a liquidez é um tema relevante em todas as instituições financeiras, a natureza
do risco é muito díspar para diferentes actividades, assim como as métricas necessárias
para se poder medir este risco, e as medidas necessárias para a sua mitigação.
Finalmente, o FSB elege a complexidade como um factor contribuinte. A complexidade, por
si só não constitui uma questão relevante, excepto na medida em que as transacções intra-
grupo, podem vir a impedir uma insolvência ordenada, contribuindo para um
agravamento do risco sistémico. Para os Bancos, este é o particular caso quando as
operações intra-grupo também são desenvolvidas em diferentes geografias. Mas para um
grupo Segurador que não exerça actividades Bancárias, as operações intra-grupo são
usadas tendo em vista alcançar uma maior eficiência na gestão do capital, não devendo
com isso, interferir numa ordenada insolvência, assim como na regulação da entidade
global mais complexa, uma vez que o Balanço de cada Seguradora constitui uma entidade
regulada.
2.3. O processo de insolvência e de falência: a experiência da indústria
Seguradora
Enquanto as tentativas de regulamentação, visam limitar a possibilidade de insolvência e,
em particular as insolvências provocadas por meio de decisões de gestão imprudentes, as
insolvências das seguradoras, como tal, não devem ser consideradas como algo que deva
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ser evitado a qualquer custo. O desaparecimento de um operador, e o surgimento de novos
participantes no mercado constitui um elemento essencial, que deve estar presente nas
economias de mercado.
No entanto, a regulamentação constitui um factor importante na garantia da estabilidade
no mercado segurador, através da definição de regras ou de princípios, que evitem ou
mitiguem os efeitos das insolvências em circunstâncias que possam despoletar um colapso
sistémico, bem como prestar protecção aos direitos e garantias dos tomadores de seguro e
de outros beneficiários. A experiência da indústria de Seguros em casos de insolvência
contrasta com a do sector bancário. A insolvência por parte de Seguradoras, e a
descontinuidade de operações no mercado, tradicionalmente são conduzidas de uma
forma ordenada.
(i) Os sinistros são resolvidos de forma ordenada, uma vez que as Seguradoras
são obrigadas a deter reservas para fazer face aos sinistros participados pelos
seus segurados, bem como para os sinistros ocorridos, mas que ainda não
foram participados, sendo que um processo de insolvência acelerado é de todo
um cenário a evitar. A valorização das obrigações decorrentes dos contratos de
seguro em reembolso, em particular, no que diz respeito à avaliação das
reservas de perda, é inteiramente avaliada como parte do processo de
insolvência.
(ii) Uma intervenção antecipada por parte dos supervisores de mercado permite à
gestão da Seguradora trabalhar em estreita colaboração com o regulador, a fim
de se poder garantir a melhor forma de acção, que vise a protecção dos
tomadores de seguro, e que contemple a transferência da carteira de apólices
de Seguro para uma outra congénere, que apresente melhores condições de
Solvabilidade.
(iii) Assiste-se a uma baixa percentagem de apólices do ramo Vida que anulam por
falta de pagamento durante um processo de insolvência, em comparação com
os casos que se observam durante a execução de um Banco, (resgate maciço de
depósitos seja à ordem, ou a prazo), embora de forma ligeiramente superior
assente num pressuposto de continuidade. Para as Seguradoras do ramo Vida,
desde que as anulações estejam associadas a significativas penalizações para
os tomadores de seguro, o índice de anulações transversal a todas as
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responsabilidades da carteira do ramo Vida, durante uma insolvência, não
podem ser comparados com o processo de insolvência de um Banco. Deste
modo não se verifica um aumento imediato na necessidade de liquidez. Além
disso, a insolvência de uma carteira (fechada) de apólices do ramo Vida pode
constituir um bom negócio para algumas congéneres concorrentes.
(iv) O processo de recuperação de uma Seguradora pode estender-se por vários
anos, em alguns casos, muito antes da instauração do processo formal de
insolvência, desde que a maturidade dos seus passivos se possa estender
durante um período prolongado de tempo. A longevidade dos diferentes
passivos vai permitir a recuperação do valor dos activos mobiliários que
estejam vinculados a essas responsabilidades, que não podem servir como
garantia, ou penhor perante os credores, a não ser a favor dos beneficiários das
apólices, uma vez que constitui um património autónomo.
(v) A partir de uma perspectiva sistémica, é importante observar a estrutura
original da carteira da Seguradora. As Seguradoras denotam uma falta de
negociação em dois sentidos, uma vez que a maioria tem apenas um conjunto
de suportes de responsabilidades, os seus tomadores de Seguro, e apenas um
conjunto de activos, os seus investimentos. Assim, o risco de envolvimento,
colateral e de contraparte em espiral, por esta via não representam os
principais riscos em caso de insolvência.
A insolvência de uma Seguradora, ou de um Banco, não são perfeitamente comparáveis
uma vez que assentam em modelos de negócio diferenciados, através de mecanismos de
desdobramento quer de responsabilidades quer das suas consequências. A natureza
ordenada do desenrolar de uma insolvência de uma Seguradora, actualmente contribui
para a estabilidade do sistema financeiro. No entanto, observa-se que a natureza das
insolvências além fronteiras, é justificada após uma análise mais aprofundada, e
coordenada entre os reguladores a nível nacional e internacional.
Uma rigorosa regulamentação é imposta para que as reservas sejam suficientes para a
cobertura dos passivos. Em diversos regimes jurídicos, existem os chamados "bens
vinculados", que tem que corresponder às reservas em montante, e que devem ser
investidos de forma segura, de acordo com as regras de investimento mais ou menos
prescritivas. Além disso, existem requisitos de constituição de reservas significativos que
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visam garantir possíveis participações de sinistros, "incorridas, mas que ainda não foram
participados" (e não apenas "participados, mas ainda não liquidados”). Os sinistros dos
tomadores de seguro em geral, costumam ser motivo de tratamento privilegiado quando
se está perante um processo de insolvência de uma seguradora, através de uma ordenação
(tipificação) das situações que inspirem uma maior atenção, dada a natureza do sinistro,
ou através da definição de outros mecanismos de resolução.
Os Supervisores dispõem de poderes suficientes perante uma insolvência, que passam por
um recuo na licença atribuída, uma falência forçada, e a transferência da carteira de
apólices para uma ou um grupo de Seguradoras em separado, que dêem garantias de
estabilidade. Durante os procedimentos decorrentes de um processo de insolvência, os
Supervisores podem actuar como liquidatários, ou procederem a uma desintegração da
entidade em causa.
2.4. Conclusão sobre os critérios utilizados pelo FSB e o IAIS relativos ao risco
sistémico
Os critérios de risco sistémico apresentados pelo FSB e o IAIS, demonstram como o risco
sistémico reverte, não para as empresas, mas para as actividades em concreto dessas
empresas.
(i) A dimensão pode indiciar a presença de risco sistémico na instituição, quando
as suas exposições estão concentradas apenas numa única área. No entanto,
quando a dimensão é acompanhada pelo efeito de diversificação, pode
conduzir a uma redução do risco sistémico.
(ii) A interligação constitui um critério essencial na avaliação do risco sistémico.
No entanto, diversas actividades altamente interligadas, podem mostrar uma
velocidade de propagação, e consequentemente um diferenciado impacto e,
portanto, com implicações muito diferentes na avaliação do risco sistémico.
(iii) O risco de substituibilidade no sector segurador, depende em parte da
velocidade e do impacto financeiro do "evento de crise". Uma crise como a que
se presenciou no sector da Banca, a qual acelerou ao longo do tempo, não
concede o tempo suficiente para que o mercado se consiga recapitalizar. Em
contraste, um evento de uma grande Seguradora vai abrandando ao longo do
tempo, o que permite que o mercado possa recuperar ao longo do tempo.
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2.5. A limitação interventiva das autoridades públicas competentes e seus
efeitos
A experiência recente demonstrou, que a insolvência das instituições sistemicamente
relevantes pode exacerbar numa crise, se as suas consequências sobre o sector financeiro
como um todo não forem correctamente geridas. Os acontecimentos que acompanharam a
crise financeira do Fortis Bank, Lehman Brothers, e dos Bancos Islandeses, ilustram bem o
grau em que a ausência de um quadro de resolução adequado pode ser prejudicial para a
estabilidade financeira do sistema financeiro como um todo. De facto, na gestão da recente
crise, os Governos tenderam a circunscrever-se aos activos domésticos dos grupos que
operam internacionalmente, e a aplicar instrumentos de resolução de crises nacionais a
entidades individuais, em vez de procurarem uma solução ao nível do grupo, ou seja, para
o conglomerado financeiro. No entanto, a delimitação dos activos nacionais, poderá
complicar ao invés de facilitar, a resolução de um problema que afecta um grupo
transnacional. Em alguns casos, este tipo de medida resulta em perdas mais pesadas para
o grupo financeiro (conglomerado) como um todo. O incentivo para os Governos
aumentarem o nível de cooperação, e se absterem da delimitação dos activos domésticos
durante a crise transfronteiriça, foi amortecido através da necessidade em proteger os
interesses das partes interessadas a nível nacional, (em especial, os credores, os
contribuintes, e o sistema de garantia de depósitos). Esta barreira para a cooperação na
resolução da insolvência de um grupo transfronteiriço está limitada a um campo
estritamente nacional das Leis de insolvência. Se estas leis são nacionais, as autoridades
nacionais têm um interesse legítimo, e um forte interesse político, na protecção do
património nacional de um Banco que se encontre em dificuldades, com o objectivo de
proteger os seus depositantes, e maximizando os recursos disponíveis para os credores
dessa entidade.
2.6. A natureza do risco sistémico, e o processo dinâmico de acumulação de
riscos
Empiricamente observa-se de uma forma geral, de que os retornos obtidos pelos
investidores na indústria financeira, apresentam um desempenho mais elevado do que em
qualquer outro sector da economia. O indicador de desempenho mais comum seguido
pelos investidores, a fim de poderem basear as suas opções de investimento, é o return on
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equity12 (ROE). Olhando para além do desempenho das empresas em termos individuais,
destacam-se os níveis de rentabilidade característicos dos diferentes sectores da
economia. Comparações feitas antes da crise financeira, os dados tendem a revelar que o
retorno sobre o sector financeiro, foi geralmente mais elevado do que o observado noutros
sectores da economia. No entanto, essas comparações devem ser analisadas com alguma
precaução, uma vez que o sector financeiro não é homogéneo. Diferentes actividades e
linhas de negócio, geram retornos muito diferentes sobre o capital próprio. Mas, na
ausência de qualquer padrão de definição de sectores específicos, especialmente no que
diz respeito aos serviços da Banca de retalho, e de investimento, uma análise muito
detalhada sobre as empresas de serviços financeiros, o ROE demonstra alguma evidência.
Mesmo assim, no decorrer da crise que se viveu, esta tendência parece não ter sido
contrariada. Depois de um declínio acentuado que se verificou em 2008, a rentabilidade
dos serviços financeiros, e dos Bancos em particular, recuperou rapidamente em 2009,
devido principalmente à actualização da carteira de negociação, bem como pelas taxas de
juro historicamente baixas, que permitem realizar de forma contínua sucessivas operações
de arbitragem em diferentes mercados, e sobre diversos valores mobiliários.
As expressivas indemnizações que foram pagas aos traders, e às equipas de gestão
colocando de lado as questões éticas que possam ser suscitadas, e que geraram profundas
discussões a nível mundial, em parte constituem o reflexo associado à elevada
rentabilidade que o sector financeiro mundial apresenta. O ponto de ruptura nesta
questão, coloca-se através da legitimidade que os traders apresentam para terem sido
contemplados com elevados bónus, e em alguns casos, indemnizações milionárias (golden
parachutes) quando na realidade o total do rendimento passível de ser distribuído por
uma sociedade financeira em alguns não era significativo.
Por outro lado, o próprio esquema de incentivos delineado por muitos Conselhos de
Administração de várias empresas, que incorporavam a perspectiva de elevadas
compensações futuras, foi um dos catalisadores que incentivou os traders a privilegiarem
nos seus planos estratégicos, uma estratégia assente fortemente em acções de curto prazo,
que posteriormente se vieram a revelar, como sendo potencialmente arriscadas, e
12 O ROE consiste na relação entre o resultado líquido da empresa, obtido num determinado exercício económico, e o seu capital próprio, traduzindo a taxa de retorno para os accionistas, e expressando a eficiência da empresa em gerar lucros sobre cada unidade monetária do seu capital próprio, ou seja, mostra como a empresa usa o dinheiro dos accionistas para gerar resultados. Uma empresa com um ROE elevado comparado com o das suas congéneres, pode através do reinvestimento dos resultados, conseguir uma taxa de crescimento muito mais elevada (até exponencial).
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perturbadoras com um forte impacto no normal funcionamento destas empresas, em
particular na confiança já alcançada junto dos diferentes stakeholders.
Após a reunião do G20 em Pittsburgh, em Setembro de 2009, foram adoptados vários
princípios com o objectivo de se conseguir controlar a matriz de compensações dos
gestores, com o objectivo de os conseguir envolver, e comprometer perante metas de
desempenho de médio a longo prazo, que passariam a ser obrigatórias por parte de cada
um dos países signatários deste acordo. O Reino Unido e a França em 2009, decidiram
adicionalmente, criar um imposto fiscal que passou a incidir sobre o bónus que
futuramente fossem pagos aos traders e aos gestores.
À primeira vista, as características da rentabilidade do sector financeiro justificam-se
através do papel económico que desempenham. Na verdade, o papel primal do sector
financeiro é o de cobrir, agregar e gerir os riscos que os agentes económicos de forma
individual demonstram não ter a suficiente capacidade para tomar sobre si. Por outras
palavras, o sector financeiro acumula riscos para garantir que o sistema económico
funcione perfeitamente. Temos assim os Bancos a administrar os riscos de mercado,
crédito, e a converterem riscos, uma vez que a maturidade dos seus empréstimos, é maior
do que a do seu refinanciamento, o que demonstra ser de uma importância vital para o
financiamento da economia. As Seguradoras através dos riscos que foram subscritos no
passado, gerem os potenciais riscos de perda dos seus Tomadores de Seguro,
independentemente da sua natureza, através das participações de sinistros, e das
provisões técnicas que regularmente têm que ser monitorizadas e ajustadas face aos
custos de contexto. Os lucros que os stakeholders das sociedades financeiras conseguem
obter acima do alcançado pelos stakeholders de empresas não financeiras durante os
períodos de crescimento, parecem em parte justificar-se, pelo facto destes lucros gerados,
servirem especialmente para recompensar os riscos incorridos pelos seus accionistas, por
via da exigência de um prémio de risco mais elevado, o que pode conduzir a graves riscos
económicos, no caso de se verificar um evento exógeno, e as sociedades financeiras terem
que posteriormente vir a suportar a factura motivada por um default de uma empresa, ou
por via de uma catástrofe natural.
Olhando mais profundamente, podia-se colocar a questão, se o nível de rentabilidade
obtido, exprimiria a influência ou não, de outros factores, tais como a falta de
concorrência, ou a assumpção de riscos demasiadamente excessivos.
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2.7. A gestão de risco na indústria financeira
Uma instituição que opere na indústria financeira, independentemente da sua actividade, é
obrigada a realizar de forma contínua uma monitorização da gestão dos seus riscos (risco
de crédito, de mercado, de taxa de juro de balanço, de liquidez e operacional), em que
incorre, uma vez que por via dos seus efeitos pode desencadear um efeito de alavancagem
sobre o mercado originando desta forma o surgimento de uma cadeia sistémica, com
efeitos de propagação sobre os diferentes players, com consequências previsíveis de
influenciarem o seu resultado operacional e financeiro.
2.7.1. Risco de crédito
O risco de crédito, resulta da possibilidade de ocorrência de perdas financeiras
decorrentes do incumprimento do cliente ou contraparte relativamente às obrigações
contratuais estabelecidas através da instituição de crédito no âmbito da sua actividade
creditícia, constitui o risco mais relevante a que se encontra exposta a actividade de um
Banco. Na generalidade dos Bancos tem sido prosseguida uma política de gestão
permanente das carteiras de crédito que privilegia a interacção entre as várias equipas
envolvidas na gestão de risco ao longo das sucessivas fases da vida do processo de crédito.
Para tal, tem vindo a verificar-se uma melhoria contínua ao nível:
(i) Da modelização do risco de crédito, com consequente diminuição do peso da
subjectividade na sua apreciação.
(ii) Dos procedimentos e circuitos de decisão, com destaque para a independência
da função de risco, delegação de poderes de acordo com níveis de rating13 e
adequação sistemática do pricing, maturidade e garantias dos clientes.
(iii) Dos sistemas de informação relacionados com a disponibilização das
diferentes variáveis inerentes à avaliação do risco de crédito de modo a
permitir a sua consulta a todos os intervenientes no processo de crédito.
(iv) Da independência do processo de formalização e execução das operações de
crédito face à estrutura de originação.
13 Termo utilizado para designar a classificação de uma empresa ou instituição em termos de risco de crédito, tendo em conta a sua situação económica e financeira.
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A implementação do vasto conjunto de iniciativas desenvolvidas ao longo dos últimos
anos, aliada à cobertura quase integral das posições creditícias por ratings internos,
permite que o processo de concessão de crédito por parte de instituições bancárias seja
assente na utilização abrangente de métricas de rendibilidade ajustada pelo risco. De
forma transversal à quase totalidade dos segmentos comerciais, os ratings internos são
incorporados directamente na definição dos poderes de crédito dos diferentes escalões de
decisão, sendo igualmente utilizados como suporte à diferenciação de pricing.
2.7.2. Risco de mercado
Por seu lado o risco de mercado representa genericamente a eventual perda resultante de
uma alteração adversa do valor de um instrumento financeiro, em consequência da
variação de taxas de juro, taxas de câmbio, preço dos valores mobiliários (e.g. acções) e no
preço das mercadorias.
O principal elemento de medição do risco de mercado consiste na estimação das perdas
potenciais sob condições adversas de mercado, para o qual é utilizada a metodologia Value
at Risk (VaR). Algumas instituições financeiras utilizam a simulação de Monte Carlo, com
um intervalo de confiança de 99% e um período de investimento de 10 dias para calcular o
VaR. As volatilidades e correlações são históricas, com base num período de observação de
1 ano, ou através de outras iniciativas como exercícios de back testing, que consistem na
comparação entre as perdas previstas no modelo e as perdas efectivas. Estes exercícios
permitem aferir a aderência do modelo à realidade, e assim melhorar a sua capacidade
preditiva. Como complemento ao VaR, têm também sido utilizados cenários extremos (de
stress testing) para avaliação das consequentes perdas potenciais. De forma a
complementar a mensuração do risco, procede-se ainda à análise da simulação de cenários
extremos a todos os factores de risco, tendo como base as variações mais e menos
positivas verificadas a 10 dias nos últimos 20 anos.
2.7.3. Risco de liquidez
O risco de liquidez, é o risco actual, ou futuro que deriva da incapacidade de uma
instituição poder solver as suas responsabilidades à medida que se vão vencendo, sem
incorrer em perdas substanciais. Os Bancos estão sujeitos a risco de liquidez por inerência
do seu negócio de emprestadores de longo prazo, e depositários de curto prazo. O ano de
2010 foi marcado pela crise do risco soberano na zona Euro. Esta crise reflectiu a
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desconfiança dos investidores relativamente à capacidade de algumas economias
manterem níveis de endividamento elevados num ambiente económico que, a partir da
crise do crédito subprime, passou a ser caracterizado por uma liquidez global menos
disponível e por critérios de financiamento muito mais restritivos. Passos importantes na
estabilização da zona Euro foram a actuação do BCE na aquisição de títulos de dívida das
economias da periferia, bem como o prolongamento das injecções de liquidez no sistema
financeiro. A gestão do risco de liquidez deve estar centralizada num comité, ou
departamento onde seja delineado anualmente um Plano Financeiro baseado no
orçamento aprovado. Com base nas necessidades de financiamento previstas, é
estabelecido um plano anual de emissões e securitização, devendo este plano ser
monitorizado regularmente, e revisto ao longo do ano sempre que necessário.
Monitorizar e controlar o risco de liquidez, reveste-se de uma importância fundamental
para qualquer instituição Bancária. O seu objectivo visa manter um nível satisfatório de
disponibilidades no curto prazo para fazer face às suas necessidades financeiras, bem
como assegurar o refinanciamento atempado da sua actividade corrente, optimizando o
custo e maturidade através do recurso a várias medidas como gaps de liquidez, e rácios de
liquidez. Efectuar igualmente stress-tests onde são consideradas necessidades adicionais
de financiamento, com base em cenários extremos mas plausíveis de forma a se poder
antecipar possíveis constrangimentos que afectem a liquidez da instituição.
Como fonte adicional de liquidez, algumas instituições mantêm na carteira títulos, valores
elevados de títulos elegíveis para redesconto, quer junto do Sistema de Bancos Centrais
Europeus quer no mercado de repos.
2.7.4. Risco operacional
O risco operacional representa a probabilidade de ocorrência de eventos com impactos
negativos, nos resultados, ou no capital, resultantes da inadequação ou deficiência de
procedimentos, sistemas de informação, comportamento das pessoas ou motivados por
acontecimentos externos, incluindo os riscos jurídicos. Desta forma, assumimos o risco
operacional como o cômputo dos seguintes riscos: operativo, de sistemas de informação,
de compliance e de reputação. A gestão do risco operacional é efectuada através da
aplicação de um conjunto de processos que visam assegurar a uniformização,
sistematização e recorrência das actividades de identificação, monitorização, controlo e
mitigação deste risco.
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O modelo de gestão de risco operacional encontra-se suportado por uma estrutura
organizacional exclusivamente dedicada ao seu desenho, acompanhamento e manutenção,
em estreita articulação e com a participação activa dos seguintes elementos:
(i) Representantes do risco operacional dos departamentos, sucursais e
subsidiárias integradas no perímetro da gestão do risco operacional. Aos quais
compete assegurar, nas suas unidades, a aplicação dos procedimentos
definidos e a gestão diária do risco operacional, em estreita articulação com a
área de risco operacional.
(ii) Departamento de compliance, nomeadamente a através de uma unidade de
gestão do sistema de controlo interno, pelo seu papel na garantia da
documentação dos processos, na identificação dos seus riscos específicos e dos
controlos implementados, na determinação do rigor do desenho dos controlos
e na identificação das acções de melhoria necessários para a sua plena eficácia,
sendo contínua a comunicação de, e para a gestão do risco operacional.
(iii) O departamento de auditoria interna, pelo seu papel no teste da eficácia da
gestão dos riscos e dos controlos, bem como na identificação, e avaliação da
implementação das acções de melhoria necessárias.
(iv) Gabinete de coordenação de segurança, pelo seu papel no âmbito da segurança
de informação, segurança física e de pessoas e da continuidade de negócio.
Os elementos subjacentes ao risco operacional que uma instituição Bancária se encontra
mais exposta basicamente dizem respeito a eventos relacionados com o risco de dano em
activo físico, fraude externa, fraude interna, interrupção do negócio e falhas de sistemas,
gestão de recursos humanos, e segurança no local de trabalho, execução, distribuição e
gestão de processos a clientes, produtos e práticas de negócio.
2.7.5. Risco de taxa de juro do Balanço
O risco de taxa de juro do Balanço, refere-se à exposição da situação financeira de um
Banco a movimentos adversos nas taxas de juro. Pode ser interpretado de dois modos
diferentes mas complementares, como o efeito sobre a margem financeira, ou como o
efeito sobre o valor do capital, decorrente de movimentos nas taxas de juro que afectam a
carteira Bancária da instituição. As variações nas taxas de juro de mercado, afectam a
margem financeira do Banco, através da alteração dos proveitos, e dos custos associados
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aos produtos de taxa de juro, e através da alteração do valor subjacente dos seus activos
passivos, e instrumentos fora de balanço.
No caso de uma instituição Bancária, Seguradora ou Fundo de Pensões, o risco de taxa de
juro advém essencialmente das obrigações a taxa fixa emitidas a longo prazo que não se
encontrem devidamente cobertas por swaps de taxas de juro ou para as quais não existam
activos (obrigações, e crédito a taxa fixa) que mitiguem a exposição a esse risco.
A exposição ao risco de taxa de juro da carteira de investimentos é calculada com base na
metodologia do Banco de Pagamentos Internacionais (BIS). Segundo este método, são
classificadas todas as rubricas do activo, do passivo e extra patrimoniais que sejam
sensíveis a oscilações das taxas de juro, e que não pertençam à carteira de negociação, por
escalões de refixação da taxa de juro. O modelo utilizado baseia-se numa aproximação ao
modelo de cálculo da duration, e consiste num cenário de stress testing correspondente a
uma deslocação paralela da curva de rendimentos (yield curve) de 200 pontos base, em
todos os escalões de taxa de juro (Instrução nº 19/2005 do Banco de Portugal).
As medidas de risco de taxa de juro quantificam, essencialmente, os efeitos das variações
das taxas de juro na situação líquida, e no resultado financeiro.
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3. O nível de concorrência na indústria financeira global
A literatura académica relativa à concorrência, abrange em grande parte a economia
industrial, a investigação sobre a concorrência nos serviços financeiros, é por este motivo
residual. Isto justifica-se em parte, porque o mercado relevante para analisar o nível de
concorrência em certas actividades financeiras tornou-se global (e.g. as actividades de
corporate, de investment banking, e a gestão de activos alternativos), e nenhum organismo
internacional, com a possível excepção da OCDE, consegue reunir e tratar a informação
existente sobre esta temática. O mesmo já não se pode dizer das actividades financeiras,
em que o mercado relevante é constituído pelo mercado nacional (e.g. Banca de retalho e a
indústria Seguradora). Como as actividades financeiras estão organizadas a nível global, o
pressuposto baseado na característica do mercado relevante, sugere que a concorrência é
insuficiente. Em particular, as condições de concorrência perfeita, que ponto de vista do
consumidor, é a situação ideal, porque são aquelas que garantem um preço mais baixo e
uma garantia de maior satisfação, não são cumpridas quando se verificam os seguintes
pressupostos:
(i) Atomicidade: existência de um elevado número de vendedores, e de
compradores, todos eles de importância e dimensão reduzidas, de tal forma
que, individualmente, nenhum deles tem capacidade para influenciar,
significativamente, nem o preço nem as quantidades oferecidas do bem.
(ii) Homogeneidade do produto: os bens oferecidos pelos diversos vendedores são
homogéneos, por isso, para o comprador é indiferente optar pelo bem do
produtor A ou B.
(iii) Transparência: todos os intervenientes no mercado têm acesso a toda a
informação disponível.
(iv) Perfeita Mobilidade (livre acesso ao mercado): não existem barreiras nem à
entrada nem à saída do mercado. Qualquer produtor pode passar a produzir
esse bem quando desejar, e deixar de o produzir da mesma forma.
Sempre que um dos pressupostos mencionados em cima não se verifique, o mercado é
considerado de concorrência imperfeita.
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No entanto, o que se verifica em alguns mercados, é precisamente o oposto.
(i) Em alguns mercados, os participantes podem ser poucos em número, mas
cinco instituições podem ser responsáveis por mais de 70% do mercado em
questão14.
(ii) Falta de homogeneidade nos produtos que são comercializados. Isto aplica-se
especialmente aos instrumentos derivados over the counter, uma vez que
apenas uma parte destes instrumentos são negociados em mercado
organizado.
(iii) Pressuposto de uma forte assimetria na informação entre os diferentes
participantes, bem como, o acesso a informação privilegiada (inside trading).
(iv) Barreiras à entrada, e à saída em determinados mercados, não sendo por isso
considerados como verdadeiramente livres, dado o custo de acesso a
actividades mais sofisticadas, uma vez que os recursos técnicos, e humanos
necessários para desenvolver por exemplo uma sala de trading são
manifestamente elevados.
O único critério de concorrência perfeita aparentemente satisfeito, prende-se com a
mobilidade dos factores de produção, o factor produtivo trabalho na actividade financeira
é muito móvel. A organização de determinadas actividades financeiras mais sofisticadas a
nível internacional, traz à mente as teorias de oligopólio natural, sendo que alguns dos
lucros gerados pelas actividades financeiras, correspondem a um comportamento do tipo
rent-seeking15. O motivo pelo qual os diferentes reguladores de mercado atribuem um peso
tão reduzido ao comportamento concorrencial dos stakeholders que actuam no mercado
financeiro, justifica-se pelo facto de a relação entre a concorrência e a estabilidade
financeira não se encontrar devidamente definida por não ser transparente, e pelo facto de
não existir uma relação directa, nem de causalidade, entre a posição dominante dos
stakeholders financeiros presentes num mercado, e o seu comportamento de risco.
14 Medido através do índice Ck, que representa um índice de concentração, onde o valor de Ck varia entre k/n, onde n é o número total de empresas (concentração mínima) e 1 (concentração máxima). A situação de concentração mínima verifica-se quando todas as empresas têm a mesma quota de mercado in Economia Industrial, Mc Graw-Hill, 2001. 15 Rent seeking é uma transferência de recursos, sem contrapartida, de uma outra pessoa ou pessoas, para o rent-seeker, como resultado de uma “decisão favorável de uma política pública”. O termo foi concebido por Anne Kreuger (1974). Exemplos de comportamentos rent-seeking incluem todas as formas de lobbying de indivíduos ou grupos nos impostos, na despesa pública e na regulação da actividade económica, que confira benefícios ou outra vantagem especial para os rent-seekers à custa dos contribuintes, dos consumidores ou outros indivíduos, com quem os rent-seekers estão em competição pelos recursos. Um exemplo de rent-seeking nas universidades, é um aluno procurar boas notas na base de copiar por outro aluno.
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3.1. Barreiras à entrada, à saída e à mobilidade na indústria financeira
Para Bain16 verificam-se barreiras à entrada na medida em que, no longo prazo, as
empresas instaladas possam fixar preços acima do custo médio mínimo, sem com isso
induzir a entrada de novas empresas no mercado. Stigler17, por outro lado, defende que as
barreiras à entrada podem ser definidas como custos que têm de ser incorridos por
empresas que desejem entrar no mercado, mas não pelas empresas que já se encontram
no mercado. Tanto a definição de Bain como a definição de Stigler têm os seus problemas.
Consideremos por exemplo o caso de um “monopólio natural”, entendido aqui como um
mercado em que uma empresa pode ser rentável ser for monopolista, mas se não tiver a
concorrência de uma segunda empresa (note-se, no entanto que esta não é a definição
mais comum de monopólio natural). No equilíbrio de longo prazo deste mercado, apenas
uma empresa estará activa, e esta, supostamente, fixará um preço superior ao mínimo do
custo médio. Por conseguinte, verificam-se barreiras à entrada segundo a definição de
Bain. No entanto, este equilíbrio é compatível com a hipótese de que a empresa instalada e
os potenciais entrantes tenham a mesma tecnologia, não se verificando, por conseguinte,
barreiras à entrada segundo a definição de Stigler.
Problemas de definição semelhantes encontram-se também quanto aos conceitos de
barreiras à saída, e de barreiras à mobilidade. Diz-se que se verificam barreiras à saída
quando uma empresa instalada tem de incorrer, directa ou indirectamente num custo para
sair do mercado. Por exemplo, a cessação de uma determinada operação (e.g.
desinvestimento numa filial) tem custos associados, sendo este um custo directo. Uma
empresa proprietária de capital físico não amortizado, e específico do negócio, que queira
sair do mercado, incorre num custo de oportunidade por não ser possível vender esse
capital, ou aplicá-lo em actividades alternativas, este é um custo indirecto.
O conceito de barreiras à mobilidade, finalmente, procura generalizar os conceitos de
barreiras à entrada e de barreiras à saída. A entrada num determinado segmento de um
determinado mercado, dá-se não somente por entrada de empresas completamente novas
mas também por empresas já instaladas noutros segmentos. Segundo R. Caves e M. Porter,
o que impede as empresas de livremente escolherem um segmento ou outro, é o facto de
possuírem activos cuja utilidade é específica do segmento em que se encontram. É
justamente a existência destes activos específicos que constitui as chamadas barreiras à
16 Joe Bain in Industrial Organization, New York, Wiley, 1968. 17 George Stigler, The Organization of Industry, Chicago: University of Chicago Press, 1983.
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mobilidade (assim, o conceito de barreiras à mobilidade aproxima-se da definição de
Stigler de barreiras à entrada)18.
3.2. Fixação do prémio de risco na actividade desenvolvida pelo sector
financeiro
Os retornos obtidos a partir dos investimentos realizados no passado, são proporcionais
aos riscos assumidos numa determinada actividade, através de uma contrapartida,
compreendida através do binómio risco vs retorno. O cash-flow libertado (dividendos,
cupões, direitos de subscrição) pelos diferentes valores mobiliários que constituem a
carteira de investimento dos diferentes accionistas, investidores, gestores e traders deve
assim permitir a cobertura dos potenciais prejuízos que podem vir a sofrer, no caso de o
risco se materializar. A rentabilidade das actividades financeiras, depende em larga
medida dos riscos incorridos.
Existem duas entidades que exercem uma influência no cálculo desses riscos:
(i) Os investidores, ou seja, o mercado, que em troca da dotação prevista pela
tomada de risco, geralmente na forma de dívida ou de capital próprio,
procuram uma compensação compatível com a estimativa dos riscos
envolvidos.
(ii) Os reguladores, que submetem os agentes financeiros às exigências
regulatórias, e prudenciais consoante os níveis estimados de risco.
3.3. Fixação por parte do mercado do Prémio de risco do sector financeiro
Existem pelo menos dois factores que sugerem que o mercado possa não estar a reflectir
correctamente o Prémio de risco no sector financeiro. Em primeiro lugar, a complexidade
das actividades financeiras coloca a grande maioria dos investidores numa desvantagem
face aos agentes financeiros de maior dimensão. Esta assimetria pode conduzir a uma
subestimação dos riscos assumidos por parte dos investidores, quando decidem entrar no
capital de uma determinada sociedade (accionistas), ou tomar parte numa emissão de
dívida (credores) de uma determinada instituição, ou sociedade financeira e, portanto,
exigirem um Prémio de risco menor, incrementando deste modo a rentabilidade da
instituição financeira. Constitui o principal papel das agências de rating, a elaboração de
18 Richard E. Caves e Michael E. Porter, “From entry barriers to mobility barriers: conjectural decisions and contrived deterrence to new competition”, Quarterly Journal of Economics 91 (1977), 241-267.
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informação financeira relativa a essa sociedade, de forma a esclarecer os investidores,
tanto quanto possível, para que as suas decisões sejam tomadas em consciência. No
entanto, os métodos das agências de rating não tiveram, e continuam a não reflectir
convenientemente todos os riscos, atribuindo em particular, uma importância insuficiente
ao risco de liquidez. Além disso, os investidores podem ser levados a subestimar os riscos
assumidos nas instituições financeiras, se acreditarem, que estas instituições são
demasiadamente “too big to fail”, e por esta via possam vir a beneficiar de algum tipo de
garantia implícita prestada por parte das autoridades governamentais do país de origem.
3.4. Fixação do Prémio de risco por parte dos reguladores para o sector
financeiro
A prestação de serviços financeiros, é suportada na teoria de que não pode existir uma
arbitragem regulatória, ou seja, não podem haver “almoços grátis", não sendo permitido
aos diferentes players que operam no mercado obterem um lucro certo e sustentável a
partir de uma estratégia de custo zero. Por outras palavras, para uma única actividade não
podem existir duas medidas de risco inerentes, correspondendo a dois níveis possíveis de
rentabilidade. Se uma actividade gera retornos excepcionais, em parte devido à
predisposição de um agente ser mais avesso ao risco (menos prudente), isso terá que se
verificar de forma pontual, caso contrário, os agentes financeiros irão rapidamente
replicar esse mecanismo, e o retorno tenderá a diminuir, com as previsíveis consequências
e impactos. Actualmente a arbitragem regulatória, devido às imperfeições na supervisão,
carecem de uma harmonização internacional, uma vez que não abrangem todos os agentes
financeiros. Como tal, as instituições financeiras são capazes de realizar actividades que
devido ao Prémio de risco, por meio de uma estratégia menos prudente, tanto em termos
de capital, como de liquidez, são capazes de gerar maiores retornos.
Compreender a origem do risco sistémico, presume um interesse no incentivo que conduz
as instituições financeiras a acumularem riscos em determinados segmentos. Além da
identificação das instituições que podem conduzir à propagação de uma crise sistémica,
devemos conseguir identificar os comportamentos, estratégias e modelos de negócio que
são susceptíveis de causar uma crise sistémica. Uma crise sistémica não é accionada
apenas pela simples acumulação de riscos no sector financeiro, o papel dos desequilíbrios
macroeconómicos globais, pode revelar-se tão ou mais importante. Mas a tendência da
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indústria financeira no processo de acumulação de riscos, enfraquece, e torna-a vulnerável
ao aparecimento de uma crise sistémica.
O trabalho em identificar a espiral do risco sistémico, consiste em destacar, actividade por
actividade, as diferentes formas de incentivo que podem conduzir os diferentes
stakeholders financeiros a acumular de forma racional os riscos sem qualquer tipo de
constrangimento legal. Estes incentivos podem ser procedentes dos próprios investidores,
que manifestando uma incorrecta percepção sobre os riscos incorridos, não exigem o
adequado Prémio de risco. Sendo que a existência de qualquer medida que reduza a
perspectiva do mercado de que as instituições financeiras são demasiado grandes para
falir, automaticamente contribui para o incremento do incentivo para que o investidor seja
capaz de melhor gerir os riscos apresentados pelas instituições financeiras a que se
encontra exposto, e cujas perdas terá que ter capacidade de suportar em caso de default.
Estes incentivos podem derivar igualmente a partir da própria estrutura da actividade
financeira, que pode inferir ou não, numa relação causal automática entre as posições de
rent-seeking de certos participantes no mercado, e do seu comportamento perante o risco.
Verifica-se ainda que os erros cometidos por parte dos reguladores relativos à fixação do
Prémio de risco inerente à actividade financeira, pode contribuir para que os agentes
continuem a acumular esses riscos. Nesse caso, deve existir uma identificação exacta das
actividades financeiras cujos riscos não se encontram devidamente cobertos, o que
significa que eles geram um retorno em excesso de regulamentação. Existem duas
potenciais causas decorrentes desta desvalorização dos riscos:
(i) As falhas de regulamentação a um nível micro-prudencial, que deixam
oportunidades de arbitragem regulamentar, e que habilitam os participantes
do mercado a evitar assumir todos os riscos ligados à sua negociação. Isso
pode envolver a arbitragem regulamentar entre as áreas regulamentadas, e
não regulamentadas de supervisão. A gestão alternativa não regulamentada de
activos como os hedge funds, constitui um exemplo de arbitragem regulatória
em relação às actividades do mercado Bancário, e das actividades tradicionais
de gestão de activos. Pode também envolver a arbitragem regulatória dentro
de um único aspecto da supervisão das actividades financeiras, sendo o caso
das operações de crédito, em particular.
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(ii) Observam-se igualmente limitações intrínsecas ao nível da regulamentação
micro-prudencial, que não medem com a devida precisão o risco sistémico. As
ferramentas micro-prudenciais não têm em devida conta os acontecimentos
extraordinários, como o risco sistémico. Este é o caso do Value at Risk (VaR),
que é utilizado para avaliar os riscos de mercado.
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4. Identificação de actividades potencialmente sistémicas
4.1. A organização das actividades de crédito
A actividade de crédito encontra-se no coração da indústria Bancária. A concessão de
empréstimos presume um nível de alavancagem, expresso através do loan/ deposit ratio,
que mede o crédito concedido, tendo por base os depósitos aceites, ou seja, é um rácio de
transformação que mede o grau de dependência do Banco face aos fundos emprestados, o
que vai condicionar a detenção de activos com maturidades mais longas em relação aos
passivos, que se reflecte no risco de liquidez, que em certas situações justifica o acesso aos
mecanismos de refinanciamento previstos pelo Banco Central.
Duas tendências paralelas marcaram a mudança de paradigma na concessão da actividade
de crédito ao longo das duas últimas décadas:
(i) O desenvolvimento de modelos de organização de crédito rivais, por um lado, o
modelo tradicional de intermediação Bancária, em que os empréstimos são
concedidos por um Banco comercial, que os detém até ao seu vencimento, em
parte graças aos depósitos dos seus clientes, por outro lado, o modelo de
securitização em que os empréstimos concedidos por um intermediário
Bancário são vendidos a investidores, sob a forma de títulos de dívida, ou de
uma carteira de empréstimos. É nos Estados Unidos, que este último modelo se
encontra mais desenvolvido, onde cerca de dois terços dos empréstimos à
habitação se encontram securitizados. Este modelo diversifica as fontes de
financiamento, mas ao mesmo tempo, aumenta os custos devido ao seu
elevado grau de complexidade, porque a dívida mobiliária geralmente é
estruturada, ou seja, dividida em parcelas de acordo com o risco incorrido, e o
retorno a ser oferecido.
(ii) A crescente vaga observada na actividade de crédito que se encontra fora do
alcance da supervisão bancária, para além da vasta gama de sociedades
jurídicas previstas para a constituição de um Banco, as actividades de crédito
têm sido desenvolvidas por grupos não Bancários fora do âmbito
regulamentar19. Este sistema é descrito como sendo um sistema Bancário
19 No seio da mesma sociedade pelo recurso à figura geral da coligação de sociedades (art. 481.º e sgs. do Código das Sociedades Comerciais), formando-se “conglomerados financeiros”. Trata-se de grupos de empresas que prestam diversos serviços financeiros entrelaçados (“allfinance”, “allfinanz”) nos três sectores, o sector da Banca, o sector da Bolsa e o sector dos Seguros, sujeitos ao mesmo e único controlo, não raro uma holding ou Sociedade de Gestão de Participações Sociais (S.G.P.S.) que não é nem instituição de crédito ou sociedade financeira nem
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sombra das sociedades que possuem nas suas carteiras risco de liquidez, e de
maturidade, decorrentes das suas responsabilidades, mas privados do acesso
ao refinanciamento do Banco Central, ao contrário dos Bancos tradicionais (e.g.
veículos de investimento estruturado, SPV’s, Banca de investimento, fundos
mútuos, entre outros). Este sistema Bancário sombra, tem crescido de forma
particularmente expressiva nos Estados Unidos.
4.1.1. Nível concorrencial
Os Bancos de crédito tradicionais, estão sobretudo organizados a nível nacional, e
portanto, sujeitos a uma adequada monitorização por parte dos seus concorrentes locais.
Para o mercado interno europeu, existe também um procedimento de controlo adaptado
aos grupos que desenvolvem as actividades de crédito em mais do que um país da UE. O
FSB faz notar que em alguns países, em especial nos Estados Unidos e Reino Unido, a crise
aumentou a concentração Bancária principalmente nas actividades de crédito.
O nível de concorrência no sector Bancário comercial na generalidade dos países europeus
depende de muitos factores. Apesar da existência de um grande número de operadores,
com uma rede comercial agressiva em todo o país, e com a chegada dos Bancos que
operam por intermédio de plataformas on-line, em teoria devia haver um estímulo
concorrencial, mas o seu impacto não pode esconder a persistente concentração, sendo
que em alguns casos, os cinco principais grupos Bancários continuam a injectar mais de
80% dos empréstimos na economia. Devido a questões de qualidade, e das assimetrias
existentes na procura por parte dos consumidores de serviços financeiros dos diferentes
países, é difícil obter conclusões definitivas a partir dos estudos realizados pela Comissão
Europeia relativos aos encargos e às comissões bancárias cobrados em ambiente
concorrencial. Os dados disponíveis sobre a evolução dos preços dos serviços financeiros
às famílias desde 2000, no entanto, indicam que estes estão a aumentar, mas abaixo da
inflação, as despesas das famílias em serviços financeiros caíram de 0,67% do consumo
em 2000 para 0,53% em 2008.
Um exemplo relevante para aplicação destas ideias é dado pelo sector Bancário português.
A partir de 1984, o sector tem sido progressivamente aberto à iniciativa privada. No
entanto, continua a ser um sector altamente regulado pelo Governo, e pelo Banco de empresa de investimento ou Companhia de Seguros. Fenómeno este a colocar problemas delicados de controlo consolidado, coordenação de regulação/ supervisão e até regulação/supervisão integrada. In Banca, Bolsa e Seguros, Direito Europeu e Português, 2ª Edição, Revista e Aumentada, João Calvão da Silva, Novembro 2007 Almedina.
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Portugal. Uma das consequências das medidas de regulação, incluindo os limites de
crédito, foi (ou tem sido) a alta margem de intermediação do sector. Segundo a opinião de
muitos especialistas, actualmente encontramo-nos numa situação de overbanking e
overbranching, uma vez que o número de habitantes por dependência Bancária em
Portugal é superior ao da maioria dos países europeus, mas este não é um argumento
relevante, a não ser que se assuma que os restantes países se encontram no óptimo social.
Através dos dados conhecidos sobre o sector Bancário, atribuem alguma razão de ser à
política de dificultar (e, em certo sentido, tributar) a entrada no sector. De facto, a partir de
uma situação de equilíbrio com livre entrada, um decréscimo do número de empresas
aumenta o nível de bem-estar. Logo, a livre entrada está associada a uma entrada em
excesso de operadores que se mantêm enquanto o lucro de mercado for maior do que
zero. Assim, as barreiras à entrada podem em certas situações implicar uma melhoria de
bem-estar20.
Proceder à realização de um estudo à margem de intermediação financeira (e.g. gap entre
a remuneração do crédito concedido e o custo dos recursos afectos) de todos os Bancos,
revela-se uma tarefa complicada. Vale lembrar que a margem de lucro de um Banco não
pode ser definida tão facilmente como a de uma empresa normal, em parte, porque os
procedimentos Bancários para a transformação de maturidades exigem um cálculo exacto
do custo dos recursos, e por outro lado, porque esta margem não deve pagar apenas as
despesas gerais de funcionamento do Banco, mas também a cobertura de risco, antes de
qualquer contribuição para os lucros. Em particular, torna-se imperativo que os Bancos
avaliem o custo do risco de uma forma justa. Em períodos de abrandamento económico, o
agravamento do risco pode conduzir a um aumento justificado na margem bruta Bancária.
No entanto, a fixação elevada do custo dos empréstimos pode também restringir o
financiamento da economia.
4.1.2. Fixação do Prémio de risco
As actividades de crédito encontram-se expostas a vários riscos, como anteriormente já foi
desenvolvido no ponto 2.7 (e.g. risco de crédito, de mercado, de liquidez, operacional e de
taxa de juro do Balanço), mas condicionadas com base em regras padrão, excepto no que
diz respeito à gestão do risco de liquidez. Em particular, o risco de crédito, que resulta da
possibilidade de ocorrência de perdas financeiras decorrentes do incumprimento do 20 Cfr. Carl-Christian von Weiszäcker, “The welfare analysis of entry barriers”, Bell Journal of Economics 11 (1980), 399-420.
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cliente ou contraparte relativamente às obrigações contratuais estabelecidas através da
instituição de crédito no âmbito da sua actividade creditícia, constitui o risco mais
relevante a que se encontra exposta a actividade de um Banco. A sua gestão e controlo são
suportados pela utilização de um robusto sistema de identificação, avaliação e
quantificação de risco, sendo coberto através de um conjunto de requisitos:
(i) Pilar I, requisitos mínimos de capital, que gozam de um grau razoável de
harmonização internacional. O nível destes requisitos é de taxa fixa, se o Banco
aplicar as normas de Basileia I, ou ponderados de acordo com o perfil de risco
de contraparte se o Banco aplicar as normas de Basileia II. O risco de
concentração também é abrangido pelas regras relativas aos grandes riscos, a
exposição de um Banco a uma única contraparte não pode ultrapassar um
determinado limite. Para os Bancos sujeitos a regulamentações de Basileia II,
outros riscos tais como de taxa de juro, concentração geográfica, e o controle
interno, podem ser cobertos por meio de outros requisitos.
(ii) Pilar II, os requisitos mínimos de capital são estabelecidos pelo regulador de
mercado. Até ao momento, não existem regras coerentes a nível internacional
sobre o risco de liquidez, no entanto, algumas entidades reguladoras
adoptaram medidas restritivas para controlar o risco de liquidez dos Bancos.
Face às particularidades inerentes aos diferentes segmentos de clientes que compõem
uma instituição de crédito, a nível interno são desenvolvidos, e implementados diversos
sistemas internos de notação, e de parâmetros de risco, quer para empresas, quer para
particulares. Conforme previsto na nova regulamentação sobre requisitos mínimos de
capital (Basileia II), e seguindo as melhores práticas de gestão de risco, a validação dos
sistemas internos de notação de risco é efectuada de uma forma periódica, através do
exercício de validação interna dos diversos modelos de rating para os principais portfolios
de crédito de forma a confirmar a robustez, e a adesão destes modelos no exercício de
aferição do risco de crédito. No que concerne aos modelos de rating para carteiras de
empresas, são adoptadas abordagens distintas em função da dimensão, e do sector de
actividade dos clientes. São ainda utilizados modelos específicos adaptados a operações de
crédito de project finance, acquisition finance e financiamentos à construção.
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As operações de securitização de empréstimos podem constituir uma arbitragem
regulatória longe da intermediação Bancária tradicional. Por meio da securitização, a
intermediação Bancária pode ser realizada em óptimas condições financeiras, e este é, um
entre os vários benefícios tradicionais da securitização, sendo ainda de destacar para a
melhor avaliação dos riscos, a segmentação de compradores, e uma maior socialização nos
potenciais riscos incorridos. Algum deste benefício é devido aos regulamentos micro-
prudenciais para um risco subjacente equivalente, os valores mobiliários emitidos por
meio de securitização requerem menos capital e liquidez do que um empréstimo bancário
tradicional. A arbitragem regulatória que os Bancos realizam nesta base, é ainda mais clara
quando eles próprios subscrevem os valores mobiliários emitidos, que são registados na
carteira de negociação, enquanto os empréstimos tradicionais são inseridos na carteira
Bancária. Neste exemplo, as operações de securitização geram uma espécie de retorno em
excesso de regulamentação.
Assim sendo, uma operação de titularização de créditos envolve converter uma carteira de
créditos de características homogéneas, num veículo de investimento desconsolidado, e
refinanciado de forma independente, mas expondo o Banco originário a uma liquidez
residual, e risco de crédito cujo custo em termos de capital prudencial é menor do que se
os empréstimos permanecessem no Balanço da instituição. Existem duas formas de
arbitragem regulatória associadas a este tipo operação.
1. Titularização directa: operação que consiste na transferência de uma carteira de
empréstimos, para um determinado veículo independente do financiamento da
titularização de créditos.
Supondo que um Banco tem em carteira 10.000 milhões de € em empréstimos com
um prazo de emissão a 10 anos, e com uma notação de rating avaliada entre BBB+
e BB-, ponderadas a 100% de acordo com a abordagem avançada de Basileia II.
Se o Banco mantiver este portfolio registado no Balanço:
- Terá de alocar um capital Tier One igual a 4% dos activos ponderados
pelo risco, ou seja, 400 milhões de €.
- Vai refinanciar os empréstimos a 10 anos com recursos de médio e longo
prazo, que são mais caros do que o refinanciamento de curto prazo, de
modo a não prejudicar a sua relação de transformação.
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Se o Banco optar por transferir essa carteira para um veículo de titularização
(fundo de empréstimos titularizado ou SPV):
- Terá que alocar uma quantidade muito menor de capital Tier One, igual a
40 milhões de €, se as garantias dadas aos investidores (liquidez, reforço
de empréstimos) forem ponderados a 10%.
- Deixará de assumir os custos directos de refinanciamento, uma vez que
como o veículo se refinancia de forma independente, e de forma mais
barata no mercado, por exemplo, através da emissão a curto prazo de papel
comercial não existem limites no rácio de transformação.
Através do mecanismo de securitização da carteira de empréstimos, o Banco economizou
€ 36 milhões em capital, e todos os custos relacionados com a carteira de refinanciamento.
Se o fundo obtém o seu refinanciamento de forma totalmente independente, do ponto de
vista do Banco, essas sinergias de capital, e liquidez serão parcialmente justificadas por
meio de uma transferência real. Mas se a liquidez do veículo, que evita os limites de
transformação é parte da responsabilidade do Banco, existe uma arbitragem regulatória
gerando um lucro igual ao resultado do veículo de gestão dos activos e passivos, que é
superior ao que o Banco teria feito em termos contabilísticos.
2. Titularização indirecta: operação que consiste na transferência de uma carteira de
empréstimos para um veículo de titularização, em parte financiados pelo Banco de
origem através da sua carteira de negociação. Supondo que o mesmo Banco
transfere a mesma carteira no valor de 100 milhões de € para um veículo de
titularização, e compra 10 milhões de € em ABS21 para financiar a operação. Se o
Banco entrar com esses títulos na sua carteira de negociação:
- Neste cenário terá de alocar um capital Tier One calculado de acordo com
o VaR (risco de mercado), ou seja, 3 a 4 vezes menos capital do que para o
risco de crédito, o que significa menos de 10 milhões € de capital.
- Irá obter refinanciamento de curto prazo em melhores condições
financeiras mediante a assinatura de acordos de recompra sobre os
contratos pendentes, (o horizonte temporal para a liquidação potencial da
21 Um asset backed security, constitui uma garantia cujo valor e rendimentos pagos são procedentes ou garantidos através de um colateral específico ou de um conjunto de activos subjacentes.
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posição, é fixado em 10 dias úteis pelo regulador Bancário, e não no
horizonte temporal dos empréstimos).
Por meio deste mecanismo, o Banco afastou-se das normais exigências regulamentares
que incidem sobre uma operação de crédito (poupou recursos na ordem dos 30 milhões
de € em custos de capital e de refinanciamento), ao passo que os riscos não foram
transferidos. Esta arbitragem regulatória é amplificada através de todo o sistema
Bancário, quando os títulos são comprados pelo Banco não originário, mas por um outro
Banco, esta operação constitui a securitização indirecta.
4.1.3. Risco sistémico na actividade de crédito
A intermediação Bancária tradicional não parece apresentar um elevado risco sistémico,
partindo do pressuposto de que existe um efectivo sistema de gestão do risco de liquidez.
O preço dos principais riscos associados à tradicional intermediação Bancária (crédito e
taxa de juro) não oferece possibilidades de arbitragem regulatória que conduziriam à
acumulação de risco sistémico. Isso não significa porém, que as actividades de crédito não
possam ser responsáveis por uma crise. Erros de gestão podem conduzir um Banco a
entrar num processo de insolvência. Do mesmo modo, uma desaceleração
macroeconómica pode colocar todas as actividades de crédito em sérias dificuldades. Mas
enquanto este risco se encontra rigorosamente monitorizado, e aplicado pelos Bancos sob
o controlo dos supervisores de mercado, o quadro prudencial em torno das actividades de
crédito não conduz a um comportamento de risco superior ao risco medido pelas normas
regulamentares. Por outro lado, na ausência de liquidez consistente, e de regras de
transformação e de gestão de risco, as actividades de crédito apresentam uma fragilidade
sistémica, conforme se observou em várias instituições financeiras que tiveram problemas
durante a recente crise devido à má gestão destes riscos.
As operações de securitização de empréstimos como alternativa subestimada à
intermediação Bancária, parecem representar um maior risco sistémico. O maior retorno
obtido na titularização de créditos constitui uma fonte de acumulação de créditos de risco
que as normas prudenciais não consideram de forma adequada. Esta tendência sistémica é
ainda mais notável à medida que uma parcela significativa do risco automaticamente
permanece concentrada dentro do sistema Bancário, em vez de ser transferido para os
investidores. Os Bancos subscrevem unidades de titularização por meio de negociação
(registo por conta própria), ou tomam o controlo das unidades adquiridas por
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investidores para suportarem a liquidez. Além disso, para proteger a sua reputação (risco
reputacional), os Bancos são frequentemente obrigados a recomprar as unidades de
titularização aos investidores em veículos que não fazem parte do seu perímetro de
consolidação para os quais transferiram os seus empréstimos. A recente crise do subprime
realçou esta espiral, que conduziu muitos Bancos a terem que recomprar os créditos
titularizados, e com isso voltar a inscreve-los no seu Balanço, operação que teve reflexos
nos seus rácios prudenciais, consumindo recursos de capital necessários para cobrir essa
exposição.
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4.2. A actividade Seguradora
4.2.1. A organização da actividade seguradora
O negócio da actividade Seguradora consiste em transferir o risco de um indivíduo para
um grupo de segurados (mutualização do risco), onde este agrupamento de riscos é
particularmente eficaz, uma vez que se baseia numa grande população de indivíduos,
permitindo uma diversificação suficiente entre os diferentes indivíduos, os tipos de risco e
a área geográfica. A actividade da indústria Seguradora encontra-se dividida em dois
grandes ramos, as operações inerentes ao ramo Vida, e as do ramo não Vida, que na
generalidade das congéneres são desenvolvidas em termos jurídicos, e operacionais em
separado, por via de imposições regulamentares.
Assim podemos interpretar o Seguro como o mecanismo de compensação dos efeitos do
acaso pela mutualidade científica organizada (Chaufon), ou a operação pela qual uma das
partes (o segurado) obtém mediante certa remuneração (Prémio) paga à outra parte
(Segurador), a promessa de uma indemnização para si, ou para terceiros, no caso de se
realizar um risco (Marcelo Caetano).
A primeira destas definições destaca o carácter aleatório do risco, e a natureza mutualista
do Seguro. A segunda tem um cariz predominantemente jurídico, colocando o ênfase na
relação contratual, e integra os elementos principais de um contrato de seguro: o risco, o
Prémio e a indemnização. Como contrapartida do Prémio pago à Seguradora, o tomador
(ou o segurado), têm o direito, conforme os casos a uma indemnização para si próprio
quando sofre determinados prejuízos materiais em consequência de um sinistro (seguros
de incêndio), ou que a companhia pague as devidas indemnizações a terceiros a quem
causou prejuízos (seguros de responsabilidade civil). A receber um capital contratado,
como compensação económica por lesões corporais (nos seguros de acidentes pessoais,
por exemplo), ou a receber uma renda vitalícia ou pensão por invalidez em certas
circunstâncias (seguros de vida).
O Decreto-Lei nº 94B/98, de 17 de Abril transpõe para a ordem jurídica interna o
conteúdo da Directiva n.º 2005/68/CE, do Parlamento Europeu, e do Conselho, de 16 de
Novembro de 2005, relativa ao Resseguro, e ao reforço da tutela dos direitos dos
tomadores de Seguro, segurados, beneficiários ou terceiros lesados na relação com as
empresas de Seguro.
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Este diploma vem proceder à alteração do regime de acesso, e exercício da actividade
seguradora e Resseguradora, tendo em vista efectuar a transposição de uma directiva
comunitária relativa ao Resseguro. A adopção de um regime harmonizado em matéria de
acesso, e de exercício da actividade de Resseguro vem permitir o reconhecimento mútuo
das autorizações baseado num sistema de autorização única, válida em toda a União
Europeia, e a aplicação do princípio da supervisão pelo Estado membro de origem. Em
termos genéricos, será aplicável às empresas de Resseguro, com as devidas adaptações, o
regime previsto para as empresas de Seguro directo.
Em paralelo, são reforçados os princípios em matéria de conduta de mercado e
introduzidos alguns ajustamentos em matéria de sistema de governo, em linha com as
recomendações do Fundo Monetário Internacional no âmbito do Financial Sector
Assessment Program realizado em 2006. Entre estas alterações, destacam-se as exigências
de qualificação adequada e idoneidade aos directores de topo, de elaboração e
monitorização de um código de conduta ética, de instituição de uma função específica de
responsável pela gestão das reclamações dos clientes e, finalmente, a exigência de
definição de uma política de prevenção, detecção e reporte de situações de fraude nos
Seguros. Ainda em matéria de conduta de mercado, e à semelhança do já previsto para os
Fundos de Pensões abertos, introduz-se a figura do provedor do cliente, ao qual competirá
apreciar as reclamações que lhe sejam apresentadas pelos clientes das empresas de
Seguro.
A Directiva 2002/92/CE estabelece as normas relativas ao acesso da actividade de
mediação de Seguros, ou de Resseguro, e ao seu exercício por pessoas singulares ou
colectivas estabelecidas num Estado-Membro, ou que nele pretendam estabelecer-se. No
seguimento da aprovação e publicação desta directiva foi transposto para o ordenamento
jurídico nacional o Decreto-Lei nº 144/2006 de 31 de Julho, que procedeu à transposição
da Directiva nº 2002/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de Dezembro,
relativa à mediação de Seguros, que visa, por um lado, a coordenação das disposições
nacionais relativas aos requisitos profissionais, e ao registo das pessoas que nos diversos
Estados membros exercem a actividade de mediação de Seguros ou de Resseguro, tendo
em vista a realização do mercado único no sector e, por outro lado, o reforço da protecção
dos consumidores neste domínio.
Tendo presente este enquadramento, a Norma Regulamentar 17/2006 do ISP, pretende
consagrar soluções, que dentro dos limites dos princípios, e das regras do Decreto-Lei nº
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144/2006, de 31 de Julho, melhor correspondam aos objectivos de profissionalização, de
aumento da transparência, de melhoria da eficiência da supervisão, e, sobretudo, de
valorização da mediação de Seguros e de Resseguros enquanto actividade de relevância
crucial para o bom funcionamento do mercado segurador. De salientar ainda que a Norma
Regulamentar visa introduzir soluções que imponham os menores ónus possíveis aos
operadores, e incrementar a desmaterialização de procedimentos, através do recurso às
novas tecnologias de informação e comunicação.
Assim, o exercício da actividade depende de uma autorização única, válida para todo o
território comunitário, em regime de estabelecimento de sucursais ou de livre prestação
de serviços, através do designado passaporte europeu. A referida autorização compete à
autoridade de controlo e supervisão do Estado-membro, no caso português compete ao
Instituto de Seguros de Portugal, organismo com autonomia administrativa e financeira,
sujeito à tutela e superintendência do Ministro das Finanças, onde estiver localizada a sede
da companhia que a solicita, competindo, também, àquela autoridade o controlo das
respectivas garantias financeiras, o chamado controlo prudencial.
As entidades que podem exercer a actividade seguradora, são as sociedades anónimas,
mútuas de seguros, sucursais de seguradoras com sede em território de outros estados-
membros, e as sucursais de seguradoras com sede fora do território da União Europeia.
As regras de acesso ao exercício da actividade, definidas no Decreto-Lei 94-B/98, obrigam
as Seguradoras a constituir várias garantias financeiras, nomeadamente provisões
técnicas, margens de solvência, fundos de garantia, visando a defesa dos interesses
abrangidos pela actividade Seguradora. São o garante da estabilidade financeira das
Seguradoras, estabilidade essa de que os Segurados são os principais beneficiários. Da
obrigatoriedade na constituição das provisões técnicas resulta uma capacidade financeira
que torna as Seguradoras um investimento atractivo para os grupos económicos.
Os montantes das provisões técnicas devem, em qualquer momento, ser suficientes para
permitir à Seguradora cumprir, na medida do razoavelmente previsível, os compromissos
decorrentes dos contratos de Seguro, quer em relação ao exercício da actividade no
território da Comunidade Europeia, quer fora dele. São várias as provisões técnicas
exigidas, nomeadamente, as provisão para Prémios não Adquiridos, provisão para riscos
em curso, provisão matemática no ramo Vida, provisão para envelhecimento (para os
seguros de doença), provisão para sinistros, provisão para participação nos resultados,
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provisão para desvios de sinistralidade, entre outros. Das provisões técnicas apenas se
indicam as mais importantes, que são a Provisão para Prémios não Adquiridos e a
Provisão para Sinistros.
(i) Provisão para Prémios não Adquiridos: os Prémios cobrados pelas
Seguradoras respeitam muitas vezes a períodos de risco que se estendem para
além do final do ano em que são emitidos. Na óptica contabilística da
especialização do exercício, há que constituir no final de cada ano uma
provisão para o Prémio correspondente ao período não decorrido. O somatório
destes prémios ascende normalmente a valores que representam entre 30% e
40% dos Prémios do exercício. Esta percentagem não é constante, pois
depende de como se distribuem os riscos ao longo do ano, uma maior
incidência de Apólices com vencimento em 1 de Janeiro, determina uma menor
provisão e, ao contrário, se os vencimentos ocorrerem na sua maioria no final
do ano, a provisão representará uma maior parcela dos Prémios. Só a variação
deste montante afecta a conta de ganhos e perdas de cada ano.
(ii) Provisão para sinistros: os sinistros participados dão imediatamente lugar à
constituição de uma provisão que deverá corresponder à estimativa do seu
custo final. A soma destas provisões ascende, no final de cada ano, a uma
percentagem significativa dos Prémios processados mas, também neste caso,
só a sua variação afecta a conta de ganhos e perdas. Na provisão para sinistros
está também incluída a respeitante a sinistros ocorridos e não participados
(IBNR, Incurred But Not Reported).
Quando um sinistro é participado, e aberto o respectivo processo, não é possível
determinar com rigor qual será o seu custo final. Neste caso, virão a ocorrer
reajustamentos, indesejáveis quando relativos a processos abertos em anos anteriores,
pois subvertem o principio da especialização do exercício.
As Seguradoras a operar em Portugal devem dispor de uma margem de solvência
suficiente em relação ao conjunto das suas actividades, margem essa que corresponde ao
seu património livre de toda, e qualquer obrigação previsível, e deduzido dos elementos
incorpóreos. Através deste cálculo, é determinado um valor que depende essencialmente
do volume de Prémios retidos (método dos Prémios) ou do valor médio dos sinistros
(método dos sinistros), qual dos dois tenha o resultado mais elevado. O valor assim obtido
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tem de estar coberto por capitais próprios, e a proporção entre eles dá a medida de solidez
da Seguradora.
As Seguradoras com sede em Portugal, e as sucursais de empresas de Seguros com sede
fora do território da Comunidade Europeia devem, desde que são autorizadas, dispor e
manter um fundo de garantia que faz parte integrante da margem de solvência, e que
corresponde a um terço do seu valor, não podendo, no entanto ser inferior a determinados
limites legalmente impostos, quer para o ramo Vida, quer para o ramo não Vida.
A actividade Seguradora difere dos outros sectores de actividade económica na medida em
que o seu ciclo produtivo se encontra invertido, uma vez que o Prémio de seguro é
cobrado de forma antecipada pela companhia de Seguros antes da prestação do serviço, ou
seja, da concretização do risco seguro, garantindo a necessária solidez financeira da
Seguradora, para que seja capaz de honrar os compromissos que foram assumidos no
passado perante os Tomadores de Seguro.
Além do mais, a actividade Seguradora desempenha um papel importante como factor de
estabilidade económico e social em todas as economias, seja no sistema financeiro por via
da captação e gestão segura das poupanças das famílias a médio e longo prazo, seja a nível
social, pelo apoio e protecção que garante às pessoas e bens, valores que contribuem para
o desenvolvimento pessoal e empresarial de um país.
Outra particularidade inerente à actividade Seguradora assenta no princípio da
mutualidade, que constitui uma das principais características da actividade Seguradora,
onde se garante através de um contributo individual, a distribuição equitativa por uma
comunidade de indivíduos, das consequências da verificação de um risco que possa afectar
um elemento daquela comunidade, ajudando-o a fazer face aos respectivos prejuízos. Para
o bom funcionamento deste princípio, é necessário que os riscos assumidos pela
Seguradora sejam semelhantes entre si, ou seja, estarem perante riscos homogéneos, e que
o contributo de cada elemento da comunidade seja igualmente semelhante. Às
comunidades assim constituídas damos o nome de comunidades de riscos. Estas
comunidades são constituídas pelos diversos ramos ou modalidades de seguro explorados
pelas Seguradoras, como o ramo Vida, o ramo acidentes, ou o ramo automóvel, e devem
ser economicamente autónomos, no sentido de que os Prémios recebidos por cada ramo
devem ser suficientes para pagar as necessárias indemnizações em caso de sinistro.
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A mutualidade faz dos Seguros uma forma privilegiada de solidariedade humana, na
medida em que o conjunto dos tomadores e segurados de um determinado ramo,
compartilham do facto de um dos seus elementos ser atingido pelo risco contra o qual
tenha sido efectuado o seguro.
Os diferentes Seguros eram tradicionalmente agrupados em Seguros de coisas e de
pessoas, mas a existente diversidade de Seguros veio obrigar a uma classificação mais
detalhada e sistemática dos vários ramos e modalidades conforme descrito no Decreto-Lei
nº 94-B/98, de 17 de Abril.
Por outro lado a actividade de Resseguro, e de Co-Seguro, permite que as empresas de
Seguro reduzam a sua exposição ao próprio risco da sua actividade, o que faz com que
determinadas actividades económicas sejam passíveis de serem seguráveis (e.g. grandes
riscos industriais ou catástrofes naturais). Por muito elevadas que fossem as importâncias
recebidas como Prémios por esses seguros, e mesmo que durante anos seguidos não se
registassem sinistros, que permitiriam àquela seguradora a constituição de fortes
reservas, logo que se manifestasse um sinistro de certa importância, nem Prémios, nem
reservas seriam suficientes para fazer face à indemnização que teria que ser paga. Daqui a
necessidade de divisão dos riscos. Esta divisão dos riscos entre Seguradoras constitui a
operação do Resseguro, em que a Seguradora, cedente, transfere uma parte do risco para
outra, a Resseguradora. O Resseguro pode ser efectuado relativamente a cada risco
subscrito, Resseguro facultativo, ou através de contratos, os tratados de resseguro, em que
uma Resseguradora se compromete a aceitar, de forma automática, uma parte dos riscos
subscritos pela cedente. Os tratados de Resseguro podem ainda classificar-se de
proporcionais, nos casos em que a Resseguradora aceita uma parte do risco, e recebe a
parte proporcional do Prémio respectivo, e de não proporcionais, em que mediante um
Prémio calculado sobre toda a carteira, a Resseguradora responderá pelo valor dos
sinistros que exceda a retenção da cedente. Os tratados de Resseguro constituem uma
protecção face à ocorrência de grandes sinistros, mas podem também ser contratados
relativamente à acumulação de um significativo número de sinistros em resultado do
mesmo evento (protecção da retenção). Resumindo todos estes conceitos, há apenas uma
Seguradora responsável perante o Tomador, não sabendo este da existência do
Ressegurador, não havendo qualquer responsabilidade do Ressegurador perante o
tomador original. O Resseguro é o seguro que a Seguradora directa faz das
responsabilidades assumidas perante os tomadores, é assim o seguro do seguro. É um
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contrato de indemnização pois tem como objectivo proteger a Seguradora contra a
diminuição do seu património em virtude do pagamento das indemnizações pelos riscos
que assume, sendo que a maior parte das normas do Resseguro são de ordem contratual.
Os contratos de Resseguro podem ser:
(i) Facultativos, quando dizem respeito a um determinado contrato, ou a vários
contratos individualizados.
(ii) Obrigatórios, respeitam à generalidade dos contratos de Seguro de
determinado ramo ou ramos, sem necessidade de acordo caso a caso.
Os contratos obrigatórios são designados como "tratados" e podem ser:
(i) Proporcionais, quando a cedente (a Seguradora) e o Ressegurador repartem a
soma segura, o Prémio e as indemnizações, de acordo com percentagens
previamente estabelecidas.
(ii) Não proporcionais, quando há uma partilha de responsabilidade com base na
indemnização, e não no capital seguro.
Por outro lado, as operações de co-Seguro encontram-se previstas no Decreto-Lei nº 94-
B/98, de 17 de Abril. A divisão dos riscos que é o objectivo do Resseguro, pode também
resultar de iniciativa do Segurado, sempre que este o distribua por mais do que uma
Seguradora, o co-Seguro. O contrato de co-Seguro é titulado por uma única Apólice,
emitida pela Seguradora leader, e o risco assumido por várias co-Seguradoras, que o
subscrevem, e em que cada uma responde apenas pela parte do capital Seguro assumido. É
também à Seguradora leader que compete fixar as condições do Seguro, cobrar os
respectivos Prémios, e regular os sinistros. Pode ser convencionado entre as co-
Seguradoras, o pagamento à seguradora leader de uma taxa de gestão. Nos contratos em
co-Seguro titulados por Apólice uniforme, é obrigatória a inclusão de cláusula
expressamente aprovada para o efeito pelo Instituto de Seguros de Portugal (Norma do
ISP nº 11/94, de 8 de Setembro), sendo admitido em todos os ramos de Seguro. O co-
Seguro pode existir por vontade dos Tomadores ou das Seguradoras que, mediante um
contrato cujo risco é demasiado grave ou com capitais muito elevados, não estão dispostas
a assumi-lo sozinhas procurando, por isso, outras congéneres que o queiram aceitar em
conjunto.
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O momento entre a subscrição do risco, e a sua ocorrência pode ser longo, por exemplo, no
caso dos seguros de Vida e nos seguros patrimoniais (e.g. edifícios, responsabilidade civil,
acidentes).
4.2.2. Nível de concorrência
Em geral, a actividade Seguradora apresenta uma dinâmica concorrencial tanto a nível
nacional como internacional. Tal como no sector Bancário, uma análise concorrencial da
actividade comercial tem que ser realizada num âmbito nacional, enquanto as actividades
grossistas, ou seja, de Resseguro, devem ser analisadas mais num âmbito internacional
devido à sua vocação geográfica, e ao tipo de responsabilidades que são assumidas.
No caso português, nos últimos anos, a indústria seguradora tem conseguido demonstrar
uma boa dinâmica concorrencial, ao mesmo tempo que demonstra solidez e estabilidade,
tanto no número de companhias que operam no mercado, assim como no número de
colaboradores, e na dimensão dos seus canais de distribuição (mediadores, agentes e
corretores). Não obstante os recentes acontecimentos vividos a nível internacional, a crise
do subprime e mais recentemente a crise da dívida soberana dos países do Euro,
constituem factores de perturbação, com um previsível impacto no mercado português
tanto em termos de emissão de Prémios de Seguro, assim como na carteira de
investimentos das Seguradoras. No contexto nacional, acresce ainda para o facto de ter
sido implementado o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC), que vai sendo executado
através dos diferentes upgrades que este documento vai conhecendo, que irá concerteza
ser também mais um elemento a agravar o desempenho sobre este sector, por via das
medidas recessivas implementadas, e da abolição de muitos dos benefícios fiscais
existentes.
Enquadrando em termos quantitativos o mercado Segurador nacional, temos que nos
seguros de Vida, o maior grupo segurador, o Grupo Caixa Seguros detém uma quota de
mercado de 37,2% do mercado, enquanto os dois players seguintes, a Ocidental Vida
(Grupo Millennium BCP-Ageas), e o Grupo Espírito Santo detêm respectivamente 14,2% e
13% do mercado, sendo que as 5 maiores Seguradoras detêm em conjunto 81,4% do
mercado, e as 10 primeiras 91,1%. A estrutura do canal de distribuição neste segmento, é
realizada principalmente através da rede de distribuição Bancária (+86%), sendo o peso
das redes tradicionais de mediação de Seguro bastante marginal (3%). Nos seguros de
ramos reais (não Vida), as cinco maiores empresas dividem entre si, cerca de 51% do
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mercado, sendo que para os 10 primeiros estão concentrados 78,4% dos Prémios
emitidos. Ao contrário do observado para o ramo vida, a estrutura dos canais de
distribuição passa por uma maior diversificação de opções, podendo os tomadores de
Seguro, optar por entre Mediadores (agentes e corretores 55%), o canal de Bancassurance
(14%) e de venda directa (2,7%). Nos seguros de ramos reais, verifica-se uma maior
mobilidade nas Apólices subscritas, podendo o tomador de Seguro optar por uma
congénere que ofereça um Prémio mais baixo, ou uma gama coberturas mais abrangentes,
o que não descarta porém a hipótese de desenvolvimento de um esquema de fidelização
sobre os Tomadores de Seguro. Certos segmentos, quando se trata de seguros obrigatórios
(e.g. responsabilidade civil profissional, para médicos e auditores) podem ser menos
competitivos, aumentando a importância relativa dos Segurados em questão, mesmo que
as empresas sejam de dimensão reduzida.
A actividade Resseguradora é uma actividade global, a concorrência é bastante intensa
entre os dois líderes, a Munich Re e a Swiss Re, que dominam de forma expressiva o sector
(em torno de £ 30 biliões em Prémios emitidos por cada um, em comparação com os £ 18
biliões do número três, a Berkshire Hathaway, e cerca de £ 10 biliões para os dois
seguintes, Hannover Re e a SCOR). Os Resseguradores de dimensão mais reduzida
contribuem ainda assim para a promoção de uma saudável concorrência internacional.
Além disso, o ciclo de catástrofes naturais ou de outros riscos (e.g. terrorismo) podem
debilitar as posições comerciais existentes. Dito isto, a concentração de riscos deve ser
examinada com cuidado, pois as situações podem variar muito entre as diferentes
entidades. Se, por exemplo, uma Seguradora relevante depender exclusivamente de um ou
dois Resseguradores, a sua importância seria muito maior do que apenas a leitura da sua
quota de mercado global.
4.2.3. Fixação do prémio de risco
As Seguradoras assumem riscos de responsabilidade específicos, mas com um risco de
liquidez limitado. O modelo de negócio específico, utilizado para a actividade Seguradora
implica que a rentabilidade das Seguradoras, só seja conhecida num momento futuro.
Também irá depender de acontecimentos aleatórios, que exigem a constituição de
provisões técnicas correspondentes a obrigações da Seguradora para com os seus
Segurados. Além disso, para absorver as perdas de acontecimentos imprevistos, o
regulador impõe determinados requisitos de adequação de capital. As Seguradoras, por
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conseguinte, assumem um risco de Solvência específico sobre os seus passivos, o que
corresponde ao risco de subestimação dos compromissos assumidos para com os
Segurados (insuficiência de provisões técnicas), e o risco de ser incapaz de lidar com
contingências (reservas de capital insuficientes). O financiamento da indústria Seguradora
baseia-se nos rendimentos previsíveis de longo prazo, que geralmente fornecem uma
almofada quando se verificam crises de liquidez.
As Seguradoras ao adoptarem uma estratégia de investimento baseada no longo prazo,
podem vir a desempenhar um papel contra cíclico no sector financeiro. Devido ao volume
de investimentos que realizam, na proporção das provisões constituídas, e dado o ciclo de
exploração ser longo, as Seguradoras constituem-se como sendo uns dos maiores
investidores institucionais. A carteira de activos detidos para negociação por conta
própria por parte das Seguradoras europeias (excluindo as apólices em unidades de conta,
cujo risco é suportado pelos subscritores) ascendeu a € 6 triliões em 2009, com cerca de
55% da carteira a ser composta por Obrigações. As Seguradoras também são importantes
players no mercado de derivados. No entanto, dado o período de exploração das
Seguradoras, isso significa que a sua estratégia de investimento é essencialmente focada
no longo prazo, o que traduz que as reafectações que ocorrem dentro das suas carteiras
diversificadas estão marcadas por uma inércia distinta. Indiferentes às mudanças que
possam ocorrer no mercado de curto prazo, as seguradoras teoricamente, funcionam
como amortecedores, encontrando-se menos propensas a sentir os movimentos súbitos do
mercado à medida que diversificam a sua carteira de activos. Assim, em teoria, pela
natureza da sua actividade, isto significa que complementam a posição dos Bancos, e são
contra cíclicas. Isso não significa no entanto, que as Seguradoras se encontrem totalmente
protegidas dos choques exógenos, mas devido à sua própria natureza, do seu modelo de
negócio não têm incentivo a tomarem posições especulativas mais arriscadas.
Para além do conjunto de riscos que foram enunciados no ponto 2.7 complementarmente
a indústria Seguradora encontra-se exposta a um conjunto adicional de riscos, como sejam
o risco de subscrição, o risco de crédito, o risco de mercado que engloba diversas
submodalidades de risco (risco de taxa de juro, risco accionista, risco imobiliário, risco de
spread, risco cambial e risco de concentração), risco operacional e por fim o risco de
liquidez.
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Por risco de subscrição22 entende-se o risco que emerge da subscrição dos contratos de
seguro que cada Companhia de Seguros realiza, bem como a todas as coberturas que estes
oferecem, tendo em conta a natureza e particularidade de cada tipo de negócio seguro.
Uma vez que cada Companhia tem condições específicas de tarifa e diferentes critérios de
subscrição, torna-se evidente que este tipo de risco tenha um grau de importância variado,
na medida em que duas situações idênticas podem resultar em duas análises distintas.
Este risco oferece diferentes elementos de risco que se baseiam na volatilidade, nos
fenómenos catastróficos, na incerteza de nível e a incerteza de tendências, encontrando-se
a incerteza de nível associada à estimação incorrecta dos pressupostos considerados para
os anos futuros. A incerteza de tendência tem que ver com a dificuldade de avaliar de
forma correcta a futura direcção dos pressupostos assumidos. Na volatilidade do risco
estão representadas as flutuações dos cash flows futuros em torno de um valor estatístico
médio, sendo que, no caso de se assistirem a eventos extremos (catastróficos), poderão
existir elevados desvios positivos do valor estatístico médio. Assim, o risco catastrófico
está associado às perdas resultantes de acontecimentos extremos ou com carácter
irregular.
O risco de subscrição pode ser subdividido em:
(i) Risco de reserva (reserve risk), que consiste no risco associado aos pagamentos
a efectuar por sinistros relativos às coberturas subscritas. Se por um lado há
uma necessidade de garantir que o nível global de provisões técnicas reflicta o
verdadeiro valor esperado das perdas totais, de forma a evitar que o valor dos
pagamentos futuros com sinistros seja subestimado, por outro, é necessário ter
em conta que devido à natureza estocástica dos cash-flows futuros, os cash-
flows reais irão flutuar em torno do valor estatístico médio.
(ii) Risco de Prémio (Premium Risk), quando é emitida uma Apólice de seguro,
esta, automaticamente, traz associado o risco de que o volume de prémios
pagos não seja suficiente para cobrir os custos dos eventuais sinistros,
acrescidos de todas as despesas inerentes ao contrato subscrito, sendo neste
contexto que surge o Risco de Prémio, ou seja, este risco está associado aos
22 in Projecto de Solvência II, Modelação do risco de subscrição numa Companhia de Seguros não Vida, Marta Marina dos Santos Delgado, Dissertação apresentada no âmbito do Mestrado em Matemática e Aplicações - Actuariado, Estatística e Investigação Operacional na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Orientador: Professor Doutor Rui Manuel Rodrigues Cardoso. Lisboa, 11 de Fevereiro de 2011.
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pagamentos a efectuar com futuros sinistros no âmbito dos contratos
existentes, renovações e ainda possíveis novos negócios, desde que realizados
dentro do horizonte temporal considerado.
Dentro destes dois tipos de riscos apresentados, estão incluídos os eventos catastróficos
que, de maneira a que os mesmos possam ser quantificados, são usualmente definidos
diversos cenários. Estes cenários têm em conta as características específicas do mercado e
podem ser definidos pelo supervisor local. São exemplo destes cenários os eventos
meteorológicos e geológicos, acidentes industriais, ataques terroristas, falência dos
resseguradores, etc.
O risco de crédito advém da incapacidade ou falta de vontade por parte de segurados,
resseguradores, corretores ou qualquer outra entidade emissora, em cumprir a totalidade
das suas obrigações contratuais. De acordo com o enunciado em J.P. Morgan (1997), este
risco pode ser medido através da análise de quatro factores:
(i) Qualidade actual do crédito da contraparte, medido através da sua notação de
risco, rating.
(ii) Matriz de probabilidades de transição de rating, isto é, da possibilidade de num
dado horizonte temporal a contraparte mudar de classe de rating.
(iii) Taxa de recuperação de crédito em caso de ocorrência de incumprimento.
(iv) Taxas de actualização do activo sem risco e credit spreads exigidos para o
horizonte de pagamento dos cash flows.
Este risco encontra-se subdividido em várias categorias, risco directo de incumprimento,
risco de redução de mitigação, risco de crédito indirecto, risco de regularização ou de
liquidação, risco soberano, risco de concentração e risco de contraparte. O risco de
incumprimento dos resseguradores é contudo, a principal componente do risco de crédito,
na medida em que em caso de falência dos mesmos, a Seguradora poderá sofrer grandes
perdas financeiras.
O risco de rercado é definido como sendo a probabilidade de ocorrência de perdas
resultantes da volatilidade do preço dos activos e dos passivos, pelo que depende
fortemente das taxas de juro e de câmbio em vigor, assim como do factor de concentração.
Os activos devem ser suficientemente diversificados a nível geográfico, de forma a poder
garantir que as responsabilidades assumidas na celebração dos contratos de seguro sejam
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satisfeitas. É relevante a existência de uma reflexão prévia dos investimentos feitos com o
intuito de minimizar o risco e maximizar a rendibilidade dos mesmos. Contudo, é um risco
que só pode ser devidamente quantificado se tanto o valor de mercado dos activos como o
valor das responsabilidades for medido adequadamente. Devido à ausência de um
mercado real para as responsabilidades de uma Seguradora, é usual recorrer-se à
aproximação do valor de mercado das responsabilidades da mesma, através de técnicas de
mercado (fair value23).
No nº 5 do Artigo 105º da Directiva 2009/138/CE encontram-se definidas as principais
componentes do Risco de Mercado:
(i) Risco de taxa de Juro, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do
activo e do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações na estrutura
temporal das taxas de juro ou na volatilidade das taxas de juro. Neste contexto
e uma vez que as seguradoras, que se encontram entre os maiores subscritores
de títulos de dívida soberana, encontram-se expostas ao risco de taxa de juro,
quer em termos de uma queda permanente nas taxas de juro, o que diminui os
retornos esperados dos segurados, ou inversamente de uma alta repentina
(bond crash), o que pode conduzir a elevadas perdas de capital. Em
determinadas condições de mercado, pode verificar-se um círculo vicioso em
que, para honrar os compromissos assumidos perante os seus segurados, as
seguradoras têm que liquidar as suas carteiras de activos com prejuízo, e lutar
para cobrir as margin calls, espalhando a desconfiança entre os segurados e
com este efeito acelerarem o resgate de apólices. Em algumas modalidades
pode ter-se verificado uma subestimação colectiva do risco, como sucedeu nos
Estados Unidos, quando as seguradoras vendiam os CDS associados a
operações de crédito hipotecário, o que conduziu a que as seguradoras
tivessem registado avultadas perdas durante a crise financeira. A
complexidade dos pacotes financeiros associados às apólices garantidas,
evidenciou que algumas seguradoras não foram capazes de determinar com o
rigor necessário as suas próprias necessidades de cobertura. Para oferecer as
23 Fair value ou fair price é uma palavra anglo-saxónica que significa em português justo valor. É uma expressão utilizada em finanças e economia para descrever uma situação em que o preço teórico de um activo ou passivo é igual ao preço de uma avaliação racional e desinteressada em que duas partes detendo igual conhecimento sobre o activo ou passivo aceitariam transacciona-lo ou liquida-lo, respectivamente.
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garantias associadas a este tipo de apólices, as seguradoras precisam de se
proteger a elas próprias, o que pode ser muito caro, ou mesmo impossível,
quando os mercados financeiros estão sob pressão.
(ii) Risco accionista, visa capturar as perdas resultantes da queda do nível dos
preços de mercado das acções, bem como de variações na sua volatilidade;
(iii) Risco Imobiliário, visa capturar as perdas resultantes da queda do nível dos
preços de mercado dos imóveis.
(iv) Risco de spread, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do activo
e do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações no nível da
volatilidade dos spreads de crédito ao longo da estrutura temporal das taxas de
juro sem risco.
(v) Risco cambial, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do activo e
do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações no nível ou na
volatilidade das taxas de câmbio.
(vi) Risco de concentração, visa capturar os riscos adicionais decorrentes quer da
insuficiente diversificação da carteira de activos, quer de uma importante
exposição ao risco de incumprimento por parte de um único emitente de
valores mobiliários ou de um grupo de emitentes coligados.
O risco operacional foi inicialmente definido em termos complementares, ao nível do
sector bancário, como abrangendo todos os riscos à excepção dos riscos de mercado, de
crédito e de subscrição. Nele estão incluídos os riscos legais, não contemplando os riscos
resultantes de decisões estratégicas e o risco reputacional. Está associado a todo o tipo de
falhas humanas como os actos fraudulentos e, ou a erros, aos processos quando
incorrectamente definidos e, ou executados, aos erros nos sistemas informáticos utilizados
pelas Seguradoras (perdas de informação e falhas técnicas), e aos factores externos (actos
fraudulentos por parte de segurados ou terceiros e actos terroristas). Apesar das muitas
falências que se verificaram no sector Segurador estarem associadas ao risco operacional,
são poucas as seguradoras que tentam quantificar e incorporar nos seus modelos internos
este tipo de risco, pois para além de implicar uma correlação com os restantes riscos, é
extremamente difícil quantificar essa mesma correlação.
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Ainda assim, quando incluído nos modelos internos das Companhias de Seguros, devem
ser tidos em consideração alguns aspectos, enunciados na Circular nº 7/2009 de 23 de
Abril do ISP:
(i) Realização de um levantamento dos processos internos da empresa de seguros,
assim como dos riscos e controlos associados e respectiva sistematização.
(ii) Registo dos eventos ocorridos que estejam relacionados com riscos
operacionais, atribuindo-lhes as perdas associadas.
(iii) Implementação de um sistema de alertas que, com base nos níveis de
tolerância ao risco e outros limites predefinidos, permita uma intervenção
oportuna e eficaz no sentido de corrigir potenciais situações de risco.
O risco de liquidez analisa todo o processo de perdas resultantes de situações onde não
existam activos líquidos para cumprir com as obrigações assumidas pela Companhia de
Seguros perante os seus segurados. É um risco que está fortemente relacionado com a
indústria financeira, e no caso particular da indústria Seguradora é considerado como a
“exposição a perdas”. Por exemplo, em casos em que os activos líquidos que usualmente
suportam as responsabilidades das apólices sejam insuficientes para satisfazer os cash
flows necessários para dar resposta às obrigações para com os segurados, aquando do
vencimento das mesmas. Quando uma empresa tem que vender antecipada ou
inesperadamente os seus activos por um valor muito baixo com vista a satisfazer os seus
compromissos, significa que está a enfrentar uma situação de falta de liquidez. Assim,
considera-se que o perfil de liquidez de uma empresa é função dos seus activos e
responsabilidades.
Na Europa, o regime prudencial de Solvência I, constituiu uma tentativa imperfeita da
tarifação dos riscos associados à actividade seguradora. Este regime de governo exige
capital suficiente para se poder constituírem provisões matemáticas numa determinada
percentagem para os seguros de Vida (1% para as unidades de conta em que o risco é
suportado pelos tomadores de Seguro, de 4% para as Apólices em euros), e uma
percentagem dos Prémios (16%) para os Seguros do ramo não Vida, existindo uma óbvia
subtarifação para estes últimos contratos. O modelo de negócio da actividade Seguradora
consiste em praticar uma política tarifária de acordo com os riscos através de uma
inversão do ciclo produtivo, exigindo aos stakeholders prudência, sendo que esta
subvalorização prudencial não conduziu a uma excessiva tomada de risco nesta fase. Por
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outro lado a Directiva sobre Solvência II, contempla um completo regime prudencial a fim
se incluírem todos os riscos específicos da actividade seguradora.
4.2.4. Solvência II, a configuração de um novo quadro regulamentar prudencial
Europeu
Decorrente do papel económico e social que a actividade Seguradora desempenha nos
diferentes Estados membros da CE, foram dados passos no sentido de se promover um
processo de harmonização comunitário onde estejam contemplados os direitos e as
garantias dos Segurados.
A actividade seguradora (ramo não Vida) a nível europeu foi inicialmente regida pela
antiga directiva 73/239/CEE aprovada em 1973, onde a maior preocupação dos
Seguradores na altura residia na margem mínima de Solvência. Posteriormente em 1988
houve lugar à aprovação da 2ª Directiva (88/357/CEE), e a 3ª Directiva a ser aprovada em
1992. Em 2002 foi aprovada a primeira Directiva de Solvência I, que passou a ser
obrigatória a partir de 2004, e por fim em 2009 é publicada a Directiva de Solvência II com
a sua obrigatoriedade de implementação a decorrer já em 2012.
A simples transferência para o sector Segurador de medidas de implementação detalhadas
tiradas de Basileia III, iria impor uma solução para um problema inexistente e seria, na
melhor das hipóteses, ineficaz e, no pior dos cenários, onerosa e perturbadora. Em última
instância, uma reacção regulamentar excessiva produziria um impacto negativo sobre os
consumidores e sobre a economia, pois levaria ao aumento nos preços dos produtos de
Seguro e tornaria a indústria Seguradora menos atractiva para os investidores.
Solvência II, irá permitir uma análise global da situação das Seguradoras e, pela primeira
vez, estabelecer um conjunto de requisitos mais sofisticados de solvência com base numa
avaliação do risco económico. A Directiva de Solvência II irá oferecer um novo quadro
prudencial para o sector Segurador, usando uma abordagem baseada em três pilares
semelhante à de Basileia II para os Bancos:
(i) O primeiro pilar relacionado com os requisitos quantitativos de capital
necessários para o cálculo das provisões técnicas, do qual existem dois:
Solvency capital required (SCR), que constitui o principal indicador de solvência
uma vez que no seu cálculo integra todos os riscos quantificáveis a que a
empresa de Seguros se encontra exposta. Realiza uma aproximação ao capital
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necessário para suster um choque correspondente ao Value at Risk de 99,5%
(evento 1/ 200 anos) para o horizonte temporal a 1 ano. Passa a ter em linha
de conta os efeitos das técnicas de mitigação de riscos e, quando se revele
apropriado, observa os efeitos de diversificação entre os diferentes riscos
existentes, assente numa fórmula padrão europeia aprovada pela autoridade
de supervisão competente.
Minimum Capital Required (MCR) representa o nível de fundos próprios a
partir do qual o risco de insolvência é considerado excessivo, desencadeando
posteriormente acções extremas por parte da autoridade de supervisão.
Apresenta uma grande simplicidade e objectividade no seu cálculo (fórmula
linear, sujeita a corredor entre 25% e 45% do SCR) onde a actuação do
supervisor passa a ser proporcional em função do deficit identificado.
(ii) O segundo pilar diz respeito aos requisitos qualitativos, ao sistema de
governação (fit and proper, sistema de gestão de riscos, sistema de controlo
interno e funções chave), auto avaliação do risco e da Solvência (ORSA),
requisito de capital adicional (capital add-on) e o processo de supervisão.
(iii) O terceiro pilar assenta nas questões relativas à transparência, reporte e
divulgação de informação, ou seja, questões inerentes à disciplina de mercado.
O estudo de impacto quantitativo, designado doravante por QIS (Quantitative Impact
Study), surgiu por iniciativa da Comissão Europeia tendo por base dois grandes
objectivos24:
(i) Recolha dos elementos necessários para a elaboração de um estudo de impacto
quantitativo, cujas conclusões serão apresentadas pela Comissão ao
Parlamento Europeu em Julho de 2007, de acordo com o último roadmap,
juntamente com a framework directive. Este estudo analisará as consequências
da nova legislação ao nível micro económico, e de estabilidade financeira,
Seguradoras e autoridades de supervisão, mercado Segurador e consumidores.
(ii) Avaliar a aplicabilidade das metodologias propostas nos pareceres técnicos
emitidos pelo CEIOPS em resposta às call for advices solicitadas pela Comissão.
24 Fonte, Associação Portuguesa de Seguradores.
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O QIS será composto por um conjunto de testes (alguns deles de repetição) de diferentes
níveis de sofisticação estando estes fortemente influenciados pelo roadmap definido e
pelos desenvolvimentos técnicos realizados ao nível do pilar I. O CEIOPS optou por
desenvolver um teste preliminar, designado por preparatory field study, que pretendeu
compreender a capacidade de resposta das Seguradoras do ramo Vida e recolher
informação para o desenvolvimento de testes futuros.
Os QIS, surgem da necessidade de ser avaliada em termos quantitativos, o impacto que a
introdução de novos métodos para o cálculo dos requisitos de capital irá causar, assim
como recolher elementos quantitativos necessários para suportar a Directiva
2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Novembro de 2009.
Este trabalho teve o seu inicio em 2005 através de um estudo preliminar, o preparatory
field study, e teve a sua continuidade através dos Estudos de Impacto Quantitativo (QIS 1,
QIS 2, QIS 3, QIS 4 e QIS 4 bis) que presentemente já se encontram cumpridos por parte
das diversas Seguradoras intervenientes. Recentemente em 2010, foi realizado um novo
exercício neste âmbito, o QIS 5, do qual foram conhecidos recentemente os seus
resultados.
O objectivo inerente à realização destes estudos passa por encontrar as melhores opções
de avaliação das provisões técnicas, e o cálculo dos requisitos de capital propostos para o
novo modelo de solvência dos ramos Vida e não Vida da actividade Seguradora. O QIS é
certamente um dos grandes desafios do projecto Solvência II, estando o seu sucesso
fortemente relacionado com o empenho e participação do mercado Segurador. Apesar do
carácter facultativo que assume, a participação é fortemente incentivada, não havendo
qualquer limitação para a participação de empresas que apresentem menor dimensão e,
ou grau de sofisticação, sendo que a informação disponibilizada pelas empresas
participantes no contexto do QIS não poderá ser utilizada para objectivos de supervisão
por parte dos supervisores nacionais.
O contacto nesta fase com questões e metodologias defendidas, que poderão muito
provavelmente vir a ser utilizadas futuramente, dotará as Seguradoras participantes das
ferramentas, e do conhecimento que lhes permitirá a obtenção de uma consciencialização
atempada assim como de uma postura mais competitiva e pró-activa. Permitirá ainda a
participação do sector Segurador na edificação das recomendações técnicas feitas à
Comissão Europeia, tendo em conta o diálogo entre Seguradoras e entidades de supervisão
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que decorrerá sobre a natureza prática da abordagem recomendada e das metodologias
utilizadas.
4.2.5. Os riscos decorrentes da arbitragem regulatória
Os Riscos de arbitragem regulatória no sector segurador, podem em parte ser explicados
devido a lacunas a nível internacional, em resultado da ausência de regras de
harmonização. A regulamentação prudencial que rege a actividade seguradora não é
padronizada a nível internacional. A entrada em vigor do projecto de Solvência II pode, em
teoria, conduzir a uma arbitragem entre os regulamentos europeus e os existentes noutras
geografias. Uma apreciação rigorosa da equivalência dos níveis de supervisão será
portanto um ponto essencial. Os riscos de arbitragem regulatória são mais significativos
no Resseguro, actividade abrangida por uma directiva europeia desde 2005. Neste sector
de B2B25, a localização geográfica do operador é relativamente insignificante com muitos
dos Resseguradores a estarem localizados nas ilhas Bermudas (paraísos fiscais).
Os riscos inerentes a certas actividades próximas da actividade Seguradora são mal
compreendidos nos regulamentos micro-prudenciais. Em particular, a venda das garantias
financeiras pode alternar entre a regulamentação bancária e a regulamentação seguradora
(caso da carteira de CDS da AIG). Estas actividades são frequentemente realizadas nos
Estados Unidos por empresas sujeitas a pouca ou nenhuma regulamentação, como as
seguradoras especializadas na comercialização de garantias.
4.2.6. A actividade Seguradora e o possível risco sistémico associado
A natureza da actividade Seguradora devido às suas especificidades não pode ser descrita
como sendo meramente sistémica. Embora as Seguradoras possam revelar uma
importância sistémica segundo os critérios do FMI-BIS-FSB, e ajudar a difundir uma crise
com efeitos sistémicos, as características intrínsecas da sua actividade, limitam a
acumulação de riscos não abrangidos por regulamentação prudencial adequada. Por
exemplo, após os ataques ao World Trade Center em 2001, o sector experimentou um
choque nas suas responsabilidades, devido às indemnizações que foram pagas, e no
conjunto dos activos detidos devido, à crise dos mercados financeiros que se seguiu, sem
causar com isso qualquer interrupção na prestação dos serviços financeiros. As
indemnizações e os reembolsos foram sendo progressivamente pagos durante um longo
25 Business to Business.
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período (apenas 40% dos montantes foram efectivamente pagos em 2004), permitindo
aos Resseguradores visados pela catástrofe recomporem-se.
Em particular, podemos verificar que as Seguradoras encontram-se menos expostas ao
risco de contágio sistémico. Comparado com os Bancos, a insolvência de uma Seguradora é
menos provável de provocar a insolvência de uma outra Seguradora. O risco de contágio
pode, portanto, só se materializar através de ligações indirectas, por exemplo, se a falência
de uma Seguradora provocar danos reputacionais em todo o sector, ou se um
Ressegurador entrar em processo de insolvência. O risco de uma corrida para resgatar as
Apólices também é limitado, em contraste com o sector Bancário no qual os indivíduos
podem fechar as suas contas a qualquer momento, os Segurados só podem anular e
resgatar as suas Apólices antecipadamente em casos muito específicos.
O baixo nível de substituibilidade de algumas partes na indústria Seguradora, contudo
nunca exigiu grande atenção. Isto é o que se verifica em particular, com a actividade
Resseguradora. Embora a concorrência seja forte neste mercado, não podemos descartar a
possibilidade de que a insolvência de um dos principais players do mercado Ressegurador
possa causar sérios problemas para as companhias de seguros. Isto deve ser devidamente
analisado no seu contexto, embora, como apenas actualmente uma pequena percentagem
dos compromissos se encontram ressegurados (5,6% para não Vida e 2,4% para a Vida), e
como se encontra previsto em Solvência II as Seguradoras futuramente terão que
diversificar as suas fontes de Resseguro. Além disso, a suficiência das Resseguradoras no
decorrer dos desastres ocorridos no passado foi restabelecida num curto espaço de anos.
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4.3. Operações no mercado de capitais
Analisando a organização das actividades presentes no mercado, estas exigem um estudo
acerca da organização dos próprios mercados e da organização dos participantes nestes
mercados. Na presente análise pode-se distinguir entre:
(i) Mercados organizados, onde ocorrem as transacções multilaterais que
envolvem instrumentos financeiros padronizados, e
(ii) Mercados over the counter, em que as operações bilaterais envolvendo
instrumentos financeiros geralmente feitos à medida têm lugar. Na União
Europeia, os mercados organizados incluem os mercados regulamentados
(RM), que detêm o monopólio sobre a admissão de valores mobiliários para
negociação, e sistemas de negociação multilateral (MTS), que consistem em
plataformas para negociação de títulos, que podem ou não ter sido admitidos
num mercado regulamentado, mas que são alternativas para os sistemas de
mercado regulamentado.
Os mercados organizados de negociação de acções, constituem o modelo primitivo de
negociação. São caracterizados por uma elevada liquidez, um grande número de
participantes, grande transparência nos preços e nos volumes negociados, e um bom nível
de segurança nas transacções que são realizadas, devido em parte às sólidas infra-
estruturas de mercado. Durante a crise, o mercado accionista nunca parou de funcionar
permanecendo como o mercado mais líquido. É por isso que sofreram os efeitos
decorrentes da falta de liquidez nos outros mercados (e.g. títulos de dívida), porque os
investidores trocaram os riscos de incumprimento do emitente, obtendo a cobertura
através de acções desses mesmos emitentes. Os mercados OTC, conheceram um
crescimento exponencial nos últimos 20 anos, mercado esse que abrange uma série de
operações bilaterais que não são muito transparentes em termos de volume, preço ou
número de investidores. São operações que costumam atender a uma necessidade
específica de um agente económico que procura algum tipo de protecção contra a
volatilidade do mercado, onde se incluem os riscos de taxa de juro e do risco cambial.
As operações OTC podem incidir igualmente sobre produtos padronizados, tais como as
acções que são negociadas nas redes de retalho de um Banco, que não se encontram
sujeitas às mesmas regras que as aplicadas a RM e MTS. A liquidez das operações OTC é
geralmente fornecida pelos market maker (criadores de mercado) ou pelos traders, que
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em determinado momento vão actuar como contraparte na execução das ordens de
compra e de venda dos seus Clientes.
4.3.1. A organização das actividades no mercado de capitais
Os Bancos de Investimento neste contexto, são os principais agentes condutores das
actividades desenvolvidas neste mercado num sentido estrito do termo, apesar de outras
instituições financeiras (Bancos Comerciais, Seguradoras, Sociedades Gestoras, Fundos,
entre outros) também participarem no seu desenvolvimento.
As actividades do mercado de capitais abrangem um vasto leque de serviços:
(i) A negociação que abrange a compra e a venda de diversos valores mobiliários
de tesouraria e de derivados destinados a gerar uma margem entre os preços
de compra e de venda, designado como spread, este constitui o negócio
tradicional do trader que realiza as operações de arbitragem.
(ii) Operações de market making (operações de liquidez), que compreende as
posições tomadas voluntariamente pelos operadores para poderem oferecer
preços em volumes significativos, mas variáveis. Beneficiam do spread ao qual
a contraparte negoceia com eles e, em particular, através de todas as ordens de
compra e de venda, que fornecem uma avaliação constante das suas posições,
que variam de acordo com a tendência estimada do mercado. Esta actividade,
muitas vezes resulta numa concentração muito elevada em apenas alguns
participantes.
(iii) As vendas, que abrangem todos os serviços financeiros prestados aos clientes
(soluções de financiamento, emissão de acções e de obrigações, processos de
gestão de risco e derivados). Também está sujeita a uma actividade separada,
caso a relação com o cliente exija um serviço de excelência, e um clima de
confiança, assim como competência para prestar serviços de consultoria, o
conhecimento da política de fluxos de caixa e dos investidores das empresas, e
uma adaptação dos produtos do mercado às necessidades dos diferentes
clientes.
(iv) O proprietary trading, que abrange as actividades em que os traders investem o
capital do Banco, a fim de gerarem mais-valias através de uma correcta
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previsão das mudanças no mercado, através da tomada de posições na
presumível tendência do mercado.
As fronteiras entre estas actividades não se encontram totalmente definidas. A actividade
de trading é muitas vezes essencial, no sentido de servir como complemento a outro tipo
de actividades financeiras. As actividades de market making, e de trading constituem
actividades inseparáveis, à medida que o número de contrapartes e de transacções
representa um número crescente de oportunidades para gestão de posições de um Fundo.
Além disso, para atender às necessidades dos seus clientes, os Bancos devem garantir que
existe uma contraparte às suas posições (de trading) e de gestão de riscos.
4.3.2. Nível de concorrência
A organização das actividades no mercado de capitais por natureza é oligopolista, uma vez
que não respeita as condições ideais de concorrência em diversos aspectos.
(i) Inexistência de um número significativo de participantes, uma vez que poucos
demonstram ter capacidade para atingir uma dimensão crítica, e com isso
oferecer uma gama completa de actividades de mercado, dispondo de todos os
derivados e instrumentos monetários de que os clientes podem precisar, e
possuir os recursos tecnológicos mais eficientes. A recente crise tem conduzido
a que algumas dessas empresas reduzam as suas actividades de mercado,
contribuindo assim para um maior fortalecimento das posições dos seus
concorrentes. As actividades no mercado estão a tornar-se um pouco mais
concentradas devido em parte, à especialização em determinados segmentos
de mercado, tais como CDS, ou os derivados sobre acções.
(ii) O desenvolvimento destas actividades apresenta um conjunto elevado de
barreiras à entrada neste mercado, uma vez serem necessários recursos
humanos altamente especializados, e de infra-estruturas que se traduzem em
investimentos e despesas operacionais que representam um insuportável
custo de entrada, e que nem todos são capazes de suportar. Na verdade, as
salas de negociação requerem recursos em número considerável, IT,
comunicações e instalações, bem como uma monitorização do risco e
ferramentas de controlo e de reporte. Exigem igualmente técnicos
especializados, capacidade de inovação, recursos dedicados ao
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desenvolvimento da base de clientes, e na estruturação, e montagem de
produtos que estejam adaptados às suas necessidades comerciais e de
mercado.
(iii) Os produtos nem sempre são homogéneos, uma vez que a abordagem
executada à medida, no mercado de operações OTC, em oposição a uma
normalização dos mercados organizados, reduz a consistência dos produtos
comercializados. Esta falta de homogeneidade limita e cria um trade off (custo
de oportunidade), para a devida adaptação dos contratos às necessidades
específicas de cada cliente, o que em parte também se justifica devido às
margens de venda serem substancialmente superiores.
(iv) A transparência nem sempre se encontra garantida, especialmente nas
operações OTC. Na negociação directa, os requisitos de confidencialidade e
também a complexidade das operações OTC, diminuem a transparência dos
preços e volumes comercializados, em simultâneo tanto para o regulador,
como para o restante mercado. Esta opacidade revela ser especialmente
problemática para as entidades públicas ou privadas que compõem a base
subjacente a estes contratos.
Os factores produtivos apresentam uma elevada mobilidade, daí a necessidade de uma
abordagem internacional no que diz respeito à remuneração dos traders. Os principais
Bancos Comerciais e de Investimento, afirmam que alguns dos seus lucros são realizados
através da inovação financeira, e sob o princípio do “primeiro a chegar, primeiro a servir-
se”, mas na ausência de qualquer sistema de patentes para proteger os novos produtos
desenvolvidos, as empresas procuram defender-se contra o chamado "escoamento
industrial", oferecendo aos seus empregados níveis de remuneração muito elevados.
É interessante verificar que a procura dos clientes por operações do tipo OTC continua a
ser expressiva. Os clientes empresariais e institucionais, preferem os mercados OTC, onde
os contratos celebrados com um Banco reputado encontram-se vinculados ao sigilo
profissional, e prestam ainda adicionalmente ao mercado, serviços de gestão de risco de
forma a satisfazer as suas necessidades específicas de cobertura de risco, as quais nos
contratos padrão não estão adaptados nem contemplados a servirem esse tipo de
necessidade específica.
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As normas contabilísticas também incentivam o recurso por parte das empresas a este
tipo de operações. E, olhando para além das suas necessidades de cobertura, as
instituições financeiras utilizam os produtos OTC nas operações de compra e de venda por
conta própria. A ausência de normas mínimas aplicáveis à colateralidade dos contratos é
tanto mais provável que conduza a riscos de contraparte em mais de metade de todas as
transacções OTC que parecem não exigir qualquer tipo de garantia financeira.
O mercado de CDS26 ilustra a natural actividade do mercado em direcção ao oligopólio. O
mercado de CDS, constitui um dos mercados mais recentes de operações OTC, e é
dominado apenas por alguns grandes players a nível global. O mercado de CDS tem-se
desenvolvido em grande escala nos últimos 10 anos, sendo actualmente dominado por
cinco CIB’s27 internacionais que actuam como dealers primários através dos quais todas as
transacções são executadas.
4.3.3. Fixação do preço de risco
O custo do capital referente às actividades desenvolvidas no mercado de capitais, é
complicado e incoerente, expondo o trader a três riscos distintos em termos de
regulamentação micro-prudencial:
(i) O risco de mercado, que representa a perda potencial do trader em caso de
queda do valor da sua posição, os compradores temem uma queda no mercado,
por outro lado os vendedores um aumento.
(ii) O risco de contraparte, que representa a perda potencial do trader em caso de
incumprimento da contraparte, antes da sua maturidade (vencimento).
(iii) O risco operacional, que abrange todos os demais riscos associados a erros
humanos (confirmação incorrecta de uma operação, fraudes, entre outros),
falha informática, e até mesmo a eclosão de conflitos civis.
26 Um credit default swap, é um instrumento financeiro negociado por investidores no mercado de renda fixa (obrigações) para especular ou fazer hedging (cobertura), caso uma empresa entre em incumprimento na sua dívida (risco de crédito). Um CDS envolve duas contrapartes, um comprador de protecção na entidade de referência, e um vendedor de protecção na entidade de referência. O risco introduzido pelo CDS é o risco de contraparte sobre o vendedor do CDS, ou seja, o comprador fica com o risco de que o vendedor não cumpra as suas obrigações, em caso de falência da entidade de referência. No caso de uma empresa estar na impossibilidade de reembolsar uma dívida emitida por ela (obrigações), o vendedor de um CDS compromete-se a reembolsar o comprador desse CDS, ou seja, quanto mais elevado é o risco de falência, mais alta é a cotação dos CDS para essa entidade. 27 Corporate and Investment Banking.
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Podemos igualmente verificar as seguintes diferenças nas principais normas prudenciais:
(i) Para os participantes que não se encontram abrangidos pela regulamentação
de Basileia II, (Bancos colados a Basileia I, e os operadores de mercado não
regulamentado, tais como os hedge funds), não existem regras sobre o ajuste
dos requisitos de adequação de capital específico em relação aos riscos
incorridos nas actividades de mercado. Estas são determinadas de forma
independente, quer por parte dos participantes com base na sua própria
análise, e os retornos esperados pelos seus accionistas, ou por meio de
restrições regulamentares. Em 1996 na reforma realizada relativa ao risco de
mercado, por exemplo, os órgãos reguladores dos EUA aplicaram requisitos
prudenciais adicionais aos Bancos sujeitos ao regime de Basileia I. Na prática,
aqueles que não se encontram sujeitos à regulamentação de Basileia II, em
geral usam como indicador o VaR28 para calcular os riscos de mercado e alocar
o devido capital tendo em vista a sua cobertura. Em termos de riscos
operacionais não abrangidos pelo acordo de Basileia I, os reguladores não têm
implementado qualquer tipo de medidas similares.
(ii) Para os Bancos sujeitos à regulamentação de Basileia II, os requisitos de
adequação específicos de capital são definidos para os riscos de mercado, de
contraparte e operacional, aplicando o método padrão, ou um método
avançado de medição com base em modelos internos de risco. Aqui,
consideramos a abordagem avançada. Os riscos de mercado, são medidos
através do modelo VaR, que determina a perda máxima que um investidor
pode suportar, dentro de um determinado período de tempo e de acordo com
uma dada probabilidade, em caso de situações adversas de mercado. O risco de
contraparte é medido através do cálculo da exposição máxima ligada à posição
no mercado, e criando cenários de perda em caso de incumprimento por parte
da contraparte, como sendo o risco de crédito. O risco operacional, é calculado
com base numa série histórica de perdas associadas a erros humanos
ocorridos dentro da instituição e falhas materiais.
28 Value at Risk é uma medida, que traduz a maior perda potencial esperada para um activo ou carteira, num determinado horizonte de tempo (holding period) e dada uma probabilidade de ocorrência (nível de confiança). O VaR deve ser sempre associado a uma moeda (valor monetário), um intervalo de tempo e a uma probabilidade com que a perda será percebida.
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As actividades de mercado encontram-se geralmente subestimadas ao nível do capital, em
parte devido a dois factores de origem,
(i) Micro prudencial, onde os requisitos prudenciais aplicáveis aos Bancos
regulados, conduzem de forma imediata a uma maior alocação de capital para
operações de crédito do que propriamente para as actividades de mercado.
Esta harmonização relativa aos requisitos prudenciais das actividades de
mercado não é suportada na teoria do capital óptimo necessária para cobrir
estas actividades, mas reflecte as preocupações expressas durante as
negociações de Basileia II, para evitar penalizar em excesso as actividades de
mercado, as quais anteriormente nunca tinham sido sujeitas a qualquer
requisito específico.
(ii) Macro prudencial, onde a principal ferramenta de avaliação de risco de
mercado assenta no VaR, a qual apresenta várias limitações intrínsecas, o que
significa logo à partida que não possa ser usada para medir todos os riscos que
podem surgir decorrentes das actividades do mercado. Em particular, o VaR
não identifica os riscos extremos, podendo calcular os riscos de perdas dentro
de um intervalo de confiança de 99%, mas não calcula os riscos de perdas
extremas que podem materializar-se nos outros 1%, o que pode desencadear
uma crise sistêmica.
4.3.4. O VaR como modelo de projecção de perdas potenciais
O Value at Risk, é definido como a perda potencial máxima, na sequência de uma evolução
desfavorável no preço dos activos negociados no mercado dentro de um período de tempo
específico, através de um determinado intervalo de confiança. O VaR constitui portanto,
uma medida agregada dos riscos de mercado, aos quais um conjunto de probabilidades se
encontra associadas.
Por exemplo, se o VaR a 10 dias for de 5 milhões € com um intervalo de confiança de 99%,
isso significa que em 99 vezes em 100 possíveis, a sociedade não vai perder mais do que 5
milhões € durante 10 dias consecutivos. O VaR pode ser calculado como um valor
agregado para uma instituição, ou para uma determinada categoria de risco presente em
cada instituição (VaR de renda fixa, VaR de capital, entre outros). Estes diferentes tipos de
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VaR, são todos expressos através da combinação de diferentes medidas do nível de risco
assumido pelos vários agentes nas suas operações de mercado.
Os supervisores Bancários calculam os requisitos de capital para cobrir os riscos de
mercado dos Bancos, suportado num VaR a 10 dias calculado de acordo com o seu modelo
interno, assumindo a prévia aprovação por parte do regulador, e validado através de
frequentes fiscalizações sobre a adequação desse mesmo modelo. Em termos de regras
prudenciais, os requisitos prudenciais de mercado são iguais ao VaR multiplicado por um
coeficiente fixado pelo órgão regulador (de 1 a 6) em função da solidez do modelo interno.
Estes requisitos prudenciais do mercado, são então multiplicados por um coeficiente fixo
de 12,5 para obter um ponderador para o risco de mercado dos activos. O Banco deve, em
seguida, cobrir 4% do risco ponderado destes activos através do Capital Tier One.
Exemplo: Para um activo com um valor nominal de 100 milhões €, e que apresente uma
volatilidade diária de 1%, o VaR é de 7,5 M € (99 vezes em 100, o Banco não irá perder
mais de 7,5 M € durante mais de 10 dias nas suas actividades de mercado). O regulador
aplica um coeficiente de 4. O Banco deve assim deter € 15 M (= 7,5 x 4 x 12,5 x 0,04), em
capital Tier I, para a cobertura dos riscos de mercado que incidam em concreto sobre
essas actividades.
4.3.5. Métodos comummente utilizados para o cálculo do VaR de um portfólio
(i) O VaR paramétrico, é o método mais fácil de usar, mas depende de três
pressupostos, ou seja, o comportamento estatístico do portfólio tem que seguir
uma distribuição normal (curva de Gauss), no que diz respeito aos retornos
dos preços de mercado, independência temporal nas mudanças do valor de
uma carteira, e uma relação linear entre o valor da carteira e a rendibilidade
dos capitais próprios, sendo este método inadequado para o cálculo do VaR das
opções.
(ii) O VaR histórico, que calcula a distribuição de perdas possíveis de acordo com a
hipótese de incerteza de que as mudanças futuras nos mercados serão
semelhantes às mudanças ocorridas no passado. Este é o método mais
utilizado pelos Bancos, e pode ser aplicado a todos os instrumentos.
(iii) Monte Carlo VaR, que é baseado numa simulação em grande escala
(geralmente 10.000 vezes), de possíveis desenvolvimentos futuros nos
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factores de risco (por exemplo, os retornos da carteira de acções), associados a
uma determinada posição detida no mercado, a fim de se poder estabelecer
uma distribuição de ganhos e perdas, a partir da qual se possa inferir um risco
máximo de perdas para um determinado intervalo de confiança.
4.3.6. Problemas na avaliação de riscos associados ao VaR
O VaR não mede o risco de perdas extremas. Por definição, o VaR mede a perda potencial
máxima dentro de um intervalo de confiança, por exemplo 99%, mas não dá qualquer
informação sobre o risco de perda que se possa vir a materializar na parte excedente, os
outros 1%. Possíveis cenários de mercado nestes 1% dos casos são desconhecidos e,
portanto, não abrangidos pelo capital necessário para absorver potenciais perdas. Este
limite é tanto mais problemático, uma vez que não se pode afirmar com total certeza que o
intervalo de confiança não abrangido pelo VaR verdadeiramente se encontre limitado a
1%, a área de perdas extremas dentro deste intervalo de confiança de 1%, pode assim
corresponder à principal área onde se concentre o maior risco para a instituição.
Os Bancos realizam os stress test para tentar identificar os cenários de mercado
correspondentes a esses riscos de perdas extremas, mas os cenários traçados
permanecem imperfeitos. Além disso, o VaR de um portfólio pode ser subestimado.
Tomando em linha de conta que as correlações existentes entre os retornos sobre o
capital, em tempos de baixa volatilidade conduzem a uma diminuição do VaR. Essas
correlações são, todavia, incertas e tendem a aumentar em tempos de crise, condicionando
o efeito por via da diversificação. É justamente durante uma crise sistémica que o VaR de
uma carteira sofre um significativo incremento, uma vez que o retorno sobre o capital
torna-se rigorosamente correlacionado, ilustrando o facto de que o VaR não reflecte a
presença deste risco numa situação normal.
Além disso, e o mais importante, o risco de falta de liquidez no mercado não se encontra
devidamente avaliado devido ao seu tratamento contabilístico favorável. O risco de falta
de liquidez no mercado diz respeito ao súbito desaparecimento da liquidez dos
instrumentos financeiros, conduzindo as entidades que os detêm em carteira, a uma
perigosa espiral de perdas e dificuldades de refinanciamento, uma vez que as suas
posições se tornaram ilíquidas, uma instituição financeira pode ser incapaz de conseguir
fazer cumprir com as suas obrigações de curto prazo, sem fechar as suas posições com
uma perda e, potencialmente, prejudicar as suas condições de refinanciamento, esta
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deterioração pode forçar a instituição a fechar as suas posições em condições de mercado
desfavoráveis tendo em vista reduzir as suas necessidades de refinanciamento. Esta
escassez de liquidez descrita num determinado mercado, afecta todos os seus
participantes, e devido às extremas relações mútuas de dependência que se estabelecem
no mercado que são sintomáticas pode despoletar um choque sistémico.
4.3.7. A liquidez dos instrumentos financeiros
As regras prudenciais encontram-se baseadas através de um quadro contabilístico
referente às actividades financeiras. No entanto, as normas de contabilidade apresentam
uma definição muito ampla de liquidez dos instrumentos financeiros, considerando que
qualquer instrumento financeiro é líquido, se for transaccionável, isto é, da possibilidade
de ser negociado, mesmo apenas como uma contraparte. Neste caso falamos de liquidez
através da negociação, podendo consequentemente ser reconhecido pelo seu valor de
mercado. A liquidez dos instrumentos financeiros não depende portanto de uma análise
das suas características intrínsecas, número de investidores, da sua transparência,
padronização, ou volume de emissão, etc.
A divisão da carteira de negociação em três níveis, demonstra a ampla definição
contabilística que o termo liquidez pode ter. As normas contabilísticas estabelecem três
níveis de reconhecimento da carteira de negociação, dependendo do método de avaliação
utilizado. Este método está directamente dependente da existência de um preço de
mercado para os instrumentos financeiros:
(i) O nível 1 da carteira corresponde aos instrumentos cujo preço (não ajustado),
é cotado num mercado para um determinado instrumento de características
semelhantes.
(ii) O nível 2, corresponde aos instrumentos cujo fair value, é estabelecido com
base na informação de outros preços cotados indicados para o nível 1, e que
pode ser observado directa ou indirectamente, com base em informações
obtidas a partir dos preços.
(iii) O nível 3, corresponde aos instrumentos cujo fair value, é estabelecido com
base na informação que não pode ser observada no mercado. Por outras
palavras, apenas os instrumentos classificados no nível 1, são negociados num
mercado autenticamente apropriado, a fim de poderem garantir a devida
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liquidez dos instrumentos negociados, através de uma adequada transparência
no preço. No nível 2, e no nível 3, os instrumentos, cujo valor não possa ser
directamente observado num mercado verdadeiramente activo, mas é
derivado a partir de um modelo, não oferece essa garantia de liquidez.
O resultado deste tratamento contabilístico, pressupõe que a liquidez permanente dos
instrumentos de negociação, é vaga nos requisitos prudenciais. Como os instrumentos de
negociação são considerados líquidos e negociáveis, em qualquer momento, estes podem
ser refinanciados no curto prazo sem quaisquer requisitos de compatibilidade. O risco de
falta de liquidez é, portanto, subestimado, devido à fraca liquidez de alguns activos na
carteira de negociação que devem parcialmente, estar ligados a taxas de refinanciamento
de longo prazo, impondo os custos de incompatibilidade sobre a entidade que os detém.
4.3.8. O papel das agências de rating na avaliação do risco de mercado e de
liquidez
As agências de rating tiveram uma responsabilidade directa na subavaliação dos riscos de
mercado e de liquidez, que não foram devidamente incorporados nas suas análises. A crise
propagou-se através do sector financeiro, devido à desvalorização repentina dos títulos
que se tornaram ilíquidos. Obviamente que a avaliação do risco de liquidez e de mercado, é
essencialmente da responsabilidade dos auditores e reguladores, mas os métodos das
agências de rating têm-se demonstrado insuficientes em considerar alguns factores tais
como a correlação entre as insolvências. Além disso, esta metodologia tem
insuficientemente consignado o declínio nas condições de mercado nos ratings, bem como
no ajustamento desses ratings à medida que a crise se desenvolvia, sendo que o papel das
agências de rating deve permanecer como o de avaliar o risco de insolvência de um
emitente, ou de produtos financeiros, a fim de proporcionar aos investidores informações
mais fidedignas para melhor compreenderem as condições do mercado, e os seus
parâmetros.
A nível europeu, o Regulamento CE 1060/2009 de 17 de Novembro 2010, estabelece um
sistema de identificação e de controlo, que melhora significativamente as regras de
transparência, nomeadamente no que respeita à identificação específica de produtos
estruturados, a governação e a prevenção de conflitos de interesse dentro das agências de
rating.
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4.3.9. As actividades do mercado de capitais e o risco sistémico
As deficiências identificadas na regulamentação das actividades de mercado ofereceram
incentivos para a acumulação de riscos, em particular, o risco de liquidez. O cálculo dos
requisitos de capital para estas actividades não teve em conta os riscos decorrentes de
perdas extremas. O risco de liquidez no mercado de activos não foi convenientemente
fixado na medida em que depende de tratamento contabilístico favorável. Essas falhas na
regulação criaram incentivos para que os agentes financeiros tivessem acumulado riscos
de natureza sistémica, expondo rapidamente todo o sector financeiro a perdas que
resultaram numa onda de desconfiança, conduzindo a uma rápida sucessão de
insolvências. De facto, a recente crise nasceu da acumulação de posições no mercado que
se tornaram ilíquidas de um dia para o outro, o que para a maioria dos agentes financeiros
representava quantidades consideráveis. Este é especialmente o caso das unidades de
titularização (UT’s) acções de titularização (ABS, CDO, CLOC, etc.) e de outros activos
tóxicos, cuja liquidez subitamente desabou. Uma avaliação efectuada em profundidade a
nível internacional, é essencial tanto para um cálculo mais preciso dos riscos causados
pela grande concentração de participantes sobre os diversos tipos de mercados
financeiros, como para revelar a existência de rendimentos que revelem uma alocação
ineficiente dos recursos existentes na economia.
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5. Autoridades europeias que supervisionam o mercado financeiro
Entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro, as Directivas Comunitárias que criam três
entidades europeias de supervisão financeira, que estavam em estudo, e sob proposta da
Comissão desde o final de 2009 sendo elas,
(i) A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia, criada
através do Regulamento (UE) n.º 1093/2010),
(ii) Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma
(criada através do Regulamento (UE) n.º 1094/2010) e a,
(iii) Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (criada através
do Regulamento (UE) n.º 1095/2010).
Este Comité, com sede em Frankfurt (criado através do Regulamento (UE) n.º 1092/2010
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Novembro de 2010, relativo à supervisão
macro prudencial do sistema financeiro na União Europeia), é parte integrante do Sistema
Europeu de Supervisão Financeira (SESF), que tem por objectivo garantir a supervisão do
sistema financeiro da União. O objectivo passa por identificar rapidamente os riscos
sistémicos, e assim conseguir que os Estados-membros actuem em conjunto com maior
eficácia nas situações de emergência, e na resolução de eventuais situações de desacordo
entre autoridades de supervisão.
O novo CERS será responsável pela supervisão macro prudencial do sistema financeiro na
União Europeia (UE), com o objectivo de prevenir, ou atenuar os riscos sistémicos, e
ajudar à estabilidade financeira na UE decorrente das evoluções no sistema financeiro,
tendo em conta a evolução macroeconómica. Pretende-se desta forma, evitar períodos de
crises financeiras generalizadas.
Entre outras atribuições, o CERS, em colaboração com as autoridades europeias de
supervisão, terá de definir um conjunto comum de indicadores quantitativos e qualitativos
através de novos painéis de riscos, para identificação e medição do risco sistémico.
O CERS será presidido nos primeiros cinco anos de existência deste Comité, pelo
Presidente do Banco Central Europeu (Regulamento (UE) n.º 1096/2010 do Conselho, de
17 de Novembro de 2010, que confere ao Banco Central Europeu atribuições específicas
no que se refere ao funcionamento do Comité Europeu do Risco Sistémico).
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5.1. Sistema Europeu de Supervisão Financeira
Este Sistema Europeu compreende:
A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia).
A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões
Complementares de Reforma).
A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores
Mobiliários e dos Mercados).
O Comité Conjunto das Autoridades Europeias de Supervisão (Comité Conjunto).
As autoridades competentes ou de supervisão dos Estados-membros especificadas
nos actos da União.
Estas Autoridades Europeias de Supervisão substituem o Comité das Autoridades
Europeias de Supervisão Bancária, o Comité das Autoridades Europeias de Supervisão dos
Seguros e Pensões Complementares de Reforma, e o Comité das Autoridades de
Regulamentação dos Mercados Europeus de Valores Mobiliários, criados em 2009, e
assumem todas as atribuições e competências desses comités.
5.2. Autoridade Europeia de Supervisão
Esta autoridade bancária europeia tem poderes para investigar alegações de aplicação
incorrecta, ou insuficiente de obrigações decorrentes da legislação da União por parte das
autoridades nacionais nas suas práticas de supervisão, após o que apresentará uma
recomendação. Vai, portanto, fiscalizar as entidades de supervisão nacionais. Se uma
autoridade nacional competente não seguir a recomendação, a Comissão poderá emitir um
parecer formal que exija à autoridade nacional que adopte as medidas necessárias e em
falta. Para poder ultrapassar as situações excepcionais de inacção persistente por parte de
uma autoridade competente, esta autoridade europeia pode ainda adoptar decisões
dirigidas a instituições financeiras individuais. Essa competência é no entanto limitada às
circunstâncias excepcionais em que uma autoridade competente não dê cumprimento ao
parecer formal que lhe seja dirigido, e em que exista legislação da União directamente
aplicável às instituições financeiras por força de regulamentos da União em vigor, ou a
adoptar futuramente. Terá ainda a possibilidade de requerer às autoridades nacionais de
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supervisão a adopção de medidas específicas para dar resposta a uma situação de
emergência.
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6. Conclusão
Dada a complexidade do sistema financeiro global, é irrealista esperar que uma única
medida carácter preventivo dirigida ao risco sistémico seja suficiente. A subavaliação de
liquidez em tempos de crise, por sua vez pode conduzir a uma série de distorções, como
seja o facto de os banqueiros assumirem riscos em demasia tanto nos seus financiamentos
como nas decisões de investimento que tomam, e mais em geral, no excesso de
empréstimos concedidos. É sabido que os mercados financeiros apresentam um
comportamento iminentemente pro-cíclico, ou seja, as restrições de financiamento
endógeno são menos restritivas em momentos de expansão económica e contrariamente,
como no actual momento que vivemos tendem a apertar, ou mesmo a serem inexistentes.,
conduzindo este fenómeno a produzir um efeito de amplificação no mercado financeiro,
caso se verifiquem fortes choques negativos.
O sistema financeiro tornou-se consideravelmente mais complexo ao longo das últimas
duas décadas com clara distinção entre as operações realizadas pelos Bancos, hedge funds,
Seguradoras, e os diferentes intermediários que actuam no mercado de capitais, graças em
parte à inovação financeira e da desregulamentação. Embora estas mudanças são sejam
consequência inevitável da prosperidade e crescimento económico que se tem observado,
são no entanto acompanhadas por certas consequências, incluindo a formação do risco
sistémico.
Assim sendo, podemos observar que decorrente do risco de crédito, a falta de liquidez dos
activos Bancários, juntamente com o facto de os Bancos não estarem estruturados para
suportar perdas súbitas, e em grandes volumes (ao contrário dos hedge funds), torna este
um sector potencialmente gerador de risco sistémico. Por outro lado, na ausência de
liquidez consistente, e de regras de transformação, e de gestão de risco, as actividades de
crédito apresentam uma fragilidade sistémica, sendo que se observou que várias
instituições financeiras tiveram problemas durante a recente crise devido à má gestão
destes riscos.
Por outro lado, a própria natureza da actividade Seguradora devido às suas
especificidades não pode ser descrita como sendo meramente sistémica. A nível macro-
prudencial e com base nos critérios para a identificação de riscos sistémicos elaborados
pelo Financial Stability Board (FSB) e da International Association of Insurance Supervisors
(IAIS), o modelo de negócio (core business) das Seguradoras como actividade principal não
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gera um risco sistémico directo para a economia. Os Seguros representam um risco de
contágio muito mais reduzido, uma substituibilidade mais elevada e uma vulnerabilidade
financeira mais baixa que a Banca. A posição financeira dos Seguradores degradasse a um
ritmo muito mais lento do que a dos Bancos, e o enquadramento regulamentar dos
Seguros impõe dois níveis de requisitos de fundos próprios, com o intuito de assegurar a
detecção preventiva de problemas financeiros, e a aplicação de medidas progressivas de
correcção pela gestão e pelos supervisores. Mesmo quando uma Seguradora está em
dificuldades, é muito mais fácil a resolução dos problemas, dado que os Seguradores
cobrem potenciais futuros sinistros com activos suficientes (provisões técnicas). No
entanto, certos Seguradores poderão exercer um número de actividades além da principal
susceptível de relevância sistémica (e.g. operações sobre derivados ou empréstimo de
valores). A estes casos pode aplicar-se a regulamentação micro-prudencial. Na sua
qualidade de grande investidor institucional, o sector Segurador, no seu conjunto, pode
transmitir ou, como ficou demonstrado durante a actual crise, absorver os choques ou
riscos sistémicos gerados por outras áreas do sector financeiro.
Em particular, podemos verificar que as seguradoras encontram-se menos expostas ao
risco de contágio sistémico. Comparado com os Bancos, a insolvência de uma companhia
de seguros é menos provável de provocar a insolvência de uma outra Seguradora. O risco
de contágio pode, portanto, só se materializar através de ligações indirectas, por exemplo,
se a falência de uma Seguradora provocar danos reputacionais em todo o sector, ou se um
Ressegurador entrar em processo de insolvência. O risco de uma corrida para resgatar as
Apólices também é limitado, em contraste com o sector Bancário no qual os indivíduos
podem fechar as suas contas a qualquer momento, os segurados só podem anular e
resgatar as suas Apólices antecipadamente, e em casos muito específicos.
As deficiências identificadas na regulamentação das actividades de mercado
nomeadamente de capitais, ofereceram incentivos para a acumulação de riscos, em
particular, o risco de liquidez. O cálculo dos requisitos de capital para estas actividades
não teve em conta os riscos decorrentes de perdas extremas. O risco de liquidez no
mercado de activos não foi convenientemente fixado na medida em que depende de
tratamento contabilístico favorável. Essas falhas na regulação criaram incentivos para que
os agentes financeiros tivessem acumulado riscos de natureza sistémica, expondo
rapidamente todo o sector financeiro a perdas que resultaram numa onda de
desconfiança, conduzindo a uma rápida sucessão de insolvências. De facto, a recente crise
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nasceu da acumulação de posições no mercado que se tornaram ilíquidas de um dia para o
outro, o que para a maioria dos agentes financeiros representava quantidades
consideráveis. Este é especialmente o caso das unidades de titularização (UT’s) acções de
titularização (ABS, CDO, CLOC, etc.) e de outros activos tóxicos, cuja liquidez subitamente
desabou. Uma avaliação efectuada em profundidade a nível internacional, é essencial tanto
para um cálculo mais preciso dos riscos causados pela grande concentração de
participantes sobre os diversos tipos de mercados financeiros, como para revelar a
existência de rendimentos que revelem uma alocação ineficiente dos recursos existentes
na economia.
Enquanto o risco excessivo, foi suportado por práticas de empréstimos excessivamente
agressivos, a regulamentação pro-cíclica, neste âmbito decorrente das políticas
governamentais, podem ter contribuído para os recentes problemas no mercado
imobiliário dos EUA. Enquanto o comportamento humano é acoplado com a livre
iniciativa, não é realista esperar que as falhas de mercado, e fraudes nunca sejam
completamente eliminadas do nosso mercado de capitais. A melhor esperança para evitar
algumas das consequências mais perturbadoras provenientes destas crises, passa por
desenvolver métodos que consigam monitorizar, mitigar, antecipar e medir os impactos
decorrentes de exposições sistémicas.
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7. Bibliografia citada
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BAIN, Joe, “Industrial Organization”, New York, Wiley, 1968
CABRAL, Luís, “Economia Industrial”, Mc Graw-Hill, 2001
CARVALHO, J. Eduardo, “Produtividade”, Quimera Editores, 2004
CAVES, Richard E.; PORTER, Michael E.; “From entry barriers to mobility barriers:
conjectural decisions and contrived deterrence to new competition”, Quarterly Journal of
Economics 91 (1977), 241-267
DE MELO, António Moreira Barbosa, “Direito Constitucional e Administrativo da Banca,
Bolsa e dos Seguros – Apontamento geral para guia de estudos dos alunos”, Março, 2011
DELGADO, Marta Marina dos Santos, “Projecto de Solvência II, Modelação do risco de
subscrição numa Companhia de Seguros não Vida”, Tese de Mestrado em Matemática e
Aplicações - Actuariado, Estatística e Investigação Operacional na Faculdade de Ciências e
Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, Fevereiro de 2011
KORINEK, Anton, “Systemic Risk-Taking: Accelerator Effects, Externalities, and Regulatory
Responses”, University of Maryland, October 2008
LEPETIT, Jean-François, “Report on Systemic Risk”, Abril, 2010
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Almedina, 2007
STANLEY, Steven L. Schwarczy, “Systemic Risks”, Research Paper nº 163, March 2008
STIGLER, George, “The Organization of Industry”, Chicago, University of Chicago Press,
1983
WEISZÄCKER, Carl-Christian von, “The welfare analysis of entry barriers”, Bell Journal of
Economics 11 (1980), 399-420