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    IntercomSociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaoXXXVIII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao Rio de Janeiro, RJ4 a 7/9/2015

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    O samba protagonista: a fora do gnero musical como mediao no programaEsquenta!

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    Filipe MONTEIRO LAGO2Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG

    Resumo

    Em pesquisa anterior, na qual estudamos os modos de representao da cultura popular noprograma televisivo Esquenta!, notamos que o programa confere ao samba um papelprivilegiado em relao a outros gneros musicais que ali tm lugar. A partir do que dizMartn-Barbero (1997), enxergamos o gnero musical como uma mediao e, a partir disso,o nosso esforo neste artigo encontrar quais temas so ancorados ao samba, de modo a

    justificar o seu protagonismo musical no Esquenta!. Buscamos, ademais, refletir sobre

    como a ideia de mediao pode ser rica para se pensar o conceito de gnero musical, aoponto que, na condio de categoria cultural, este desempenha um importante papel nosprocessos comunicacionais.

    Palavras-chave:gnero musical; mediao; cultura popular; samba;Esquenta!.

    Desde que o samba samba

    Vinicius de Moraes, em uma de suas composies mais famosas3, reconhece na

    Bahia o espao geogrfico de nascimento do samba. As razes desse gnero musical esto,

    de fato, associadas aos primeiros movimentos diaspricos de povos africanos em direo ao

    Brasil. A partir da, o samba se expande em territrio nacional e passa a ganhar sonoridades

    e variaes estticas especficas de acordo com as formas com que foi apropriado em

    diferentes cantos do pas. Desta forma, o gnero ganhou ramificaes em estados como

    Pernambuco, Minas Gerais e So Paulo, lugares onde exerceu grande influncia em ritmos

    populares regionais. O samba, entretanto, alcana uma dimenso outra a de elemento

    constitutivo da identidade nacional brasileira quando passa a ocupar os espaos urbanos

    cariocas. Foi no Rio de Janeiro que se estabeleceu a mais forte e reconhecida cena musical

    1 Trabalho apresentado no GP Comunicao, Msica e Entretenimento do XV Encontro dos Grupos de Pesquisa emComunicao, evento componente do XXXVIII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao.

    2Mestrando do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da Universidade Federal de Minas Gerais, graduado emJornalismo pela Universidade Federal de Ouro Preto, integrante do Grupo de Pesquisa em Imagem e Sociabilidade (GRIS)

    e do Grupo de Pesquisa em Mdia e Interaes Sociais (GIRO), email: [email protected].

    3Fazemos referncia cano Samba da Bno, assinada por Vinicius de Moraes e Baden Powell.

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    em torno do samba e deste lugar de fala que construmos nosso prembulo para tratar

    deste gnero musical.

    Na virada do sculo XIX para o sculo XX, a ento capital do Brasil foi palco de

    grandes mudanas econmicas e sociais. O fim da escravido ainda era um acontecimentorecente e grande parte da populao negra recm liberta se estabelecia nos centros urbanos,

    na mesma medida em que o desenvolvimento industrial crescia em velocidade elevada.

    Esse crescimento urbano desordenado e a desigual distribuio de renda incidiu na

    formao de vilas, cortios e favelas. Foi nesses espaos que o samba carioca se alicerou e,

    a partir dali, popularizou-se.

    A internacionalizao do samba e sua elevao enquanto smbolo nacional se deu,

    segundo Hermano Vianna (2004), em funo da busca de uma elite intelectual por destacarprticas culturais brasileiras na construo de uma identidade nacional. O momento

    decisivo neste esforo ocorreu, conforme diz o antroplogo, em 1926, durante um encontro

    apelidado de noitada de violo. Na ocasio, encontraram-se algumas personalidades, tais

    como: Gilberto Freyre, Srgio Buarque de Holanda, Pixinguinha, Donga e Patrcio Teixeira.

    De um lado representantes da intelectualidade e da arte erudita, todos provenientes de

    boas famlias brancas. Do outro lado, msicos negros ou mestios sados das camadas

    mais pobres do Rio de Janeiro (VIANNA, 2004, p. 20).

    Esse gnero musical forjado em meio a fortes embates e desigualdades sociais e

    raciais foi pouco a pouco ocupando outros espaos e ganhando projeo miditica. Grande

    parte dessa visibilidade atribuda ligao entre o samba e o carnaval, bem como ao

    momento em que o gnero passa a incorporar a programao musical das rdios e, em

    seguida, ocupar outras mdias como o cinema, a televiso e o teatro. Da ento, o samba

    passa a integrar outros estilos, sofrer diferentes apropriaes e absorver outros significados.

    Nascem, por exemplo, o samba-rock, o samba-reggae, o pagode e, frente aos cclicos

    processos valorativos de diferenciao, o samba de raiz assume-se enquanto denominao

    pura do gnero.

    A partir do que diz Jason Mittel (2004) acerca do conceito, o gnero compreendido

    aqui como uma categoria cultural. Esse entendimento nos posiciona diante de uma chave

    profcua para pensar os processos de interao entre diversos dispositivos e a cultura.

    Durante a organizao de nosso aporte terico, julgamos de grande valia relacionar a

    perspectiva do autor norte-americano s contribuies de Jeder Janotti Junior (2003,2004),

    uma vez que nossa anlise se desenvolve em torno de um gnero musicale no televisivo,

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    por onde caminha a pesquisa de Mittel (2004). A reflexo de Janotti Junior se mostra

    indispensvel nessa anlise na medida que reconhece os aspectos comunicacionais e os

    processos de reconhecimento, sociabilidade e valorizao presentes nos gneros musicais.

    Diante disso, a anlise que propomos fazer neste artigo visa encontrar quais temasso comumente acionados a partir da associao com o samba no programa televisivo

    Esquenta!. Buscamos olhar para o papel de destaque atribudo a esse gnero no programa,

    visto que, ancorada a ele, est uma srie de mediaes (MARTN-BARBERO, 1997) que

    orienta o argumento doEsquenta!.

    Bateria arrebenta, todo mundo comenta

    Colocar um Esquenta! todo domingo no ar

    quase como colocar uma escola de samba na

    avenida.

    Regina Cas

    O programa Esquenta!, resultado de um projeto idealizado pela apresentadora

    Regina Cas em parceria com Hermano Vianna, exibido dominicalmente na faixa das 13

    horas da Rede Globo de Televiso. O Esquenta!foi ao ar pela primeira vez no segundo dia

    de 2011, compondo a grade de programao especial de vero daquele ano. Em virtude da

    boa aceitao de pblico e de ndices de audincia satisfatrios, o programa foi renovado

    para uma temporada ao longo do ano inteiro e assim se seguiu at o presente momento.

    Em cada emisso semanal, o Esquenta! apresenta um tema a ser debatido, que

    orienta no somente a discusso e a escolha de personalidades para compor a roda. Ele est

    presente no cenrio, no figurino de todos os componentes do programa e tambm no

    repertrio dos msicosaspecto de grande relevncia para a anlise aqui proposta.

    Ao longo de quase cinco anos de durao, o programa Esquenta! vem assumindo

    um carter experimental no qual se prope a fazer mudanas estruturais com mais

    frequncia do que outros programas do gnero. Dentre as mais perenes caractersticas do

    programa, podemos observar a permanncia do formato roda de conversa com um auditrio

    participativo; a presena de assistentes de palco composto por um grupo de coreografia

    infantil, um grupo de danarinas e o Bonde da Madrugada; a participao fixa de cinco

    cantores de samba Arlindo Cruz, Leandro Sapucahy, Mumuzinho, Pricles e Xande de

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    Pilares , dos comentaristas Al Youssef e Jos Marcelo Zacchi, de dos atores Douglas

    Silva e Luis Lobianco e da vlogger Luane Dias.

    Suas emisses, geralmente gravadas com um ms de antecedncia em relao ao

    dia de exibio, so filmadas por inteiro para que, em seguida, sejam editadas. O resultadodisso um material condensado com durao mdia de uma hora permeado por muitos

    cortes e transies abruptos. Esta dinmica de gravao abre espao para a utilizao do

    improviso em larga escala. Assim, ainda que o programa apresente um roteiro fixo que, por

    sua vez, agrupa os quadros e os momentos de fala dos entrevistados, Regina Cas e seus

    convidados no perdem a oportunidade de criar um samba a partir de cada palavra que ali

    dita.

    Ancorado no desafiador objetivo de unir o que o mundo separa, o programaEsquenta!, como Regina Cas faz questo de afirmar em diversas edies, prope-se a

    funcionar como espao propcio para o compartilhamento cultural, justificado em uma

    palavra simples e elucidativa: a mistura. Desta maneira, a construo discursiva do

    Esquenta!parte do pressuposto de que, ainda que faam parte de grupos culturais e sociais

    diferentes, as pessoasrepresentadas na figura de seus convidados, selecionados de acordo

    com a pertinncia sobre o tema da vez sempre podem compartilhar alguma experincia

    umas com as outras.

    Frente a essa proposta e da busca estratgica por uma organizao narrativa a partir

    de uma dinmica aberta de gravao, Regina Cas assume o papel central de conduzir os

    dilogos, as performances e outros momentos de fala construdos no programa. Diante

    disso, observa-se uma srie de interlocues entre pessoas variadas de lugares de fala

    diversos. Tais falas, entretanto, so bem posicionadas pela apresentadora, que intervm e,

    sutilmente, aponta os espaos para cada uma.

    Este posicionamento assumido por Regina Cas no exclusividade do Esquenta!,

    visto que a apresentadora j se articulava de maneira similar em programas anteriores,

    como o Central da Periferia, o Brasil Legale oMuvuca. O que singular no Esquenta!, a

    partir disso, a maneira peculiar com que tematiza prticas culturais. Ao contrrio do que

    se pode observar em projetos televisivos anteriores, Regina Cas convida grupos de pessoas

    celebridades ou noa uma arena, onde so estimulados a interagir entre si dialogar com

    outras pessoas de diferentes regies e cenas culturais.

    Conforme o imaginrio popular construdo em torno da figura de Regina Cas, a

    perspectiva a partir da qual se busca apresentar as prticas culturais pode ser observada em

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    todos os elementos do programa. O uso de cores e motivos festivos nos figurinos e cenrios

    conota a proposta de funcionar como um espao propcio para a fruio e a celebrao. Essa

    ideia, exposta desde o ttulo do programa, sugere que as interaes estabelecidas durante

    cada emisso sejam anlogas s de um aquecimento festivo. Uma comemorao dessanatureza no poderia ser representada por completo, seno com a presena proeminente da

    msica.

    Ao longo das trs emisses analisadas nesta pesquisa, observamos que a msica

    desempenha um papel fundamental na organizao do programa e na orientao do

    caminho por onde percorrem os debates ali engendrados. Visto que a ala musical do

    Esquenta! composta apenas por msicos que cantam samba e convidados sambistas so

    uma constante no programa, percebemos que esse gnero musical tende a ser convocado emdemasia, se comparado a outros.

    Diante do protagonismo que o samba desempenha frente aos demais estilos

    musicais, buscamos analisar a fora deste gnero enquanto mediao central no programa

    Esquenta!. Neste trabalho, pretendemos localizar quais temas so acionados a partir do

    gnero e problematizar os dissensos e conformidades que esta peculiaridade apresenta

    quando se ampara na promessa da mistura cultural.

    Ao organizar o corpus de anlise, procuramos localizar, na mais recente temporada

    concluda do programa, emisses que melhor representassem suas regularidades, ao passo

    que tambm trouxessem elementos significativos para localizar as mediaes regularmente

    atreladas ao samba. Assim, selecionamos as seguintes emisses do programa: 1) o

    Esquenta!especial de Pscoa, exibido no dia 20 de abril de 2014; 2) oEsquenta!especial

    sobre o trabalho, exibido no dia 04 de maio de 2014; 3) o Esquenta!especial sobre os anos

    vinte, exibido no dia 07 de setembro de 2014.

    Figuras de bombons, barras de chocolate e outros tipos de doce foram os principais

    adornos no cenrio e no figurino dos danarinos presentes na emisso especial sobre a

    Pscoa. O programa props abordar o feriado a partir das diferentes maneiras de

    comemor-lo. Desta maneira, os convidados da vez foram estimulados a compartilhar

    experincias e costumes familiares e regionais na celebrao da data comemorativa.

    O Esquenta! especial sobre o trabalho buscou fazer uma homenagem ao povo

    trabalhador brasileiro. Em meio a um cenrio composto por engrenagens em movimento, as

    celebridades convidadas e os integrantes do programa comentaram sobre a rotina nos

    empregos que tinham antes da fama. Em seguida, Regina Cas convocou o jornalista

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    Leonardo Sakamoto para problematizar a permanncia do trabalho escravo e infantil no

    Brasil. Aps intercalaes de atraes musicais, o debate seguiu abordando o valor do

    trabalho para o ser humano.

    Os convidados presentes no Esquenta! especial sobre os anos vinte foram a cantoraPitty, a jornalista Fernanda Gentil, o cantor Beto Barbosa e o grupo musicalBonde TNT. A

    aluso elegncia da moda da dcada de 1920 conduziu a ornamentao do programa, cuja

    plateia foi instruda a se vestir, segundo Cas, como se fosse para uma festa. Na ocasio,

    Regina Cas relaciona os movimentos vanguardistas da cultura dos anos vinte com o

    cenrio em que se encontram os movimentos culturais contemporneos.

    De que lado voc samba?

    Iniciamos nossa reflexo resgatando a relevncia dos estudos culturais na

    reconfigurao do modo de enxergar a cultura e por pens-la dentro de uma vasta situao

    comunicacional. Interessados inicialmente em compreender as culturas vivas, as prticas e

    as instituies culturais e suas relaes com a sociedade e as transformaes sociais

    (GOMES, 2004, p. 103), os estudos culturais surgem numa Inglaterra de fortes

    transformaes sociais. O aumento significativo do consumo de bens e produtos miditicos

    pela classe operria chamou a ateno de alguns estudiosos cujo esforo instaurou uma

    nova maneira de se pensar a cultura. Ao conceituar cultura como um modo integral de vida

    perspectiva de fundamental relevncia para se pensar as interaes no programa

    Esquenta!, Raymond Williams oferece subsdios para outras matrizes conceituais.

    Na Amrica Latina, os estudos culturais adquirem outros contornos e encontram em

    Jess Martn-Barbero a referncia de maior relevncia. No movimento de ampliar o olhar

    em relao aos meios e buscar compreender as tramas comunicacionais como mediaes,

    Martn-Barbero (1997) prope uma chave de entendimento em que a cultura, a

    comunicao e a poltica como linhas que, por estarem em constante atravessamento,

    constituem uma trama capaz de mediar os diversos processos comunicacionais.

    Martn-Barbero no apresenta uma definio clara para o conceito de mediao,

    mas a compreende como um processo, inscrito no terreno da cultura, atravs do qual so

    associadas outras mediaes, formas simblicas, representaes e sentidos. Por meio de sua

    reflexo em torno das mediaes, o autor procura enxergar as relaes entre as matrizes

    culturais, lgicas de produo, formatos industriais e as competncias de consumo presentes

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    dos processos comunicacionais. Dessa forma, mediao passa a referir-se a um conceito

    relevante para se pensar os diversos cruzamentos comunicacionais e que possibilita, assim,

    encontrar as interaes estabelecidas entre os processos de produo e recepo da

    comunicao.Sob a gide proposta por Martn-Barbero para pensar as mediaes, nossa anlise se

    volta para o samba, entendido aqui como gnero musical protagonista no programa

    Esquenta!. possvel pensar a fora do gnero como mediao, a partir do entendimento de

    Martn-Barbero, que o compreende, antes de tudo, como uma estratgia de

    comunicabilidade. A noo de gnero comumente evocada para se referir organizao e

    tipificao de uma srie de produtos miditicos. Essa perspectiva problematizada pelo

    terico norte-americano Jason Mittel que tambm parte dos estudos culturais paradesenvolver sua reflexo em torno do conceito. Segundo o autor, o gnero deve ser

    entendido como um processo comunicativo que organiza nossas experincias miditicas em

    categorias que interagem com conceitos como valor cultural, provvel audincia e funo

    social (MITTEL, 2004). O gnero, nesse sentido, deixa de assumir uma funo meramente

    textual. luz da perspectiva de Mittel, considera-se a relevncia do gnero enquanto uma

    categoria cultural.

    Por compreender os gneros como produtos culturais constitudos por prticas

    miditicas e sujeito a mudanas e redefinies contnuas (MITTEL, 2004, p. 1), o autor

    aponta a necessidade em delinear uma conceituao e uma metodologia para analis-los. O

    autor, assim, aponta trs elementos para compreender a constituio do gnero, a saber:

    definio, interpretao e avaliao. A chave metolgica para se pensar o gnero est,

    Mittel no entrelaamento entre essas trs instncias. Para o autor,

    as prticas culturais de definio, interpretao e avaliao so as trsprimordiais maneiras com que o gnero circula e se torna culturalmentemanifesto, assim, essas prticas devem ser os objetos de estudo centrais da

    anlise de gnero (MITTEL, 2004, p. 16).

    A partir do que diz Mittel possvel compreender que noo de gnero esto

    atreladas vlidas contribuies para a anlise empreendida neste trabalho. Para que tratemos

    da potencialidade mediadora do samba, preciso ir mais alm e buscar amparo em

    propostas tericas para a compreenso do que gnero musical. Buscando olhar para a

    fora da delimitao de gnero na organizao de sentidos que atravessam as obras

    musicais, Jeder Janotti Junior (2003), dialgico com Mittel quando afirma que os

    gneros no so demarcados somente pela forma ou estilo de um texto musical em

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    sentido estrito e, sim, pela percepo de suas formas e estilos pela audincia atravs das

    performances pressupostas pelos gneros (JANOTTI JUNIOR, 2003, p. 37).

    Dessa forma, a proposta do autor que olhemos para os gneros levando em conta

    as relaes econmicas de produo e consumo, os processos de valorizao em que estinscrito, o gosto e a experincia da audincia, que, segundo Janotti, no deve ser reduzida a

    sensaes, tampouco assumida como uma entidade abstrata, cuja posse pertence a um

    determinado grupo o autor destaca a noo de brasilidade como exemplo (JANOTTI

    JUNIOR, 2004, p. 199).

    Para que seja possvel operacionalizar a analise pretendida neste artigo, destacamos

    o que diz Denise Jodelet (2001)em relao ao conceito de representao, a partir do qual

    buscaremos encontrar os principais sentidos associados ao samba no programa Esquenta!de modo a conferir destaque a esse gnero. A autora diz que a criao de representaes

    ocorre da busca pelo conhecimento e pela compreenso do mundo nossa volta. As

    representaes so, dessa forma uma profcua maneira de dar sentido e definio ao mais

    variados momentos que vivemos na realidade cotidiana. Quando essas experincias do dia a

    dia passam a ser representadas, podemos compreender que essas experincias so mediadas

    pelas representaes. Assim, possvel propor junto a elas elos de identidade e

    desenvolver posicionamentos frente ao objeto representado relacionando-o com a realidade

    que o originou e sobre a qual diz.

    Diante dessa fundamentao terica, buscamos em nossa anlise encontrar as

    mediaes associadas ao samba no programa Esquenta!. Compreendemos esse gnero

    musical como uma importante mediao, frente ao espao de destaque atribudo a ele no

    programa televisivo em voga. Voltamos nossa ateno para as interaes entre Regina

    Cas, seus convidados e os demais integrantes do programa articuladas de modo a conferir

    diferentes sentidos ao samba. A partir da, buscamos refletir acerca do seguinte problema:

    quais so as principais mediaes associadas ao samba de modo a conferir protagonismo a

    este gnero musical no programa Esquenta!e como esta escolha preferente pode dizer da

    concepo vigente de cultura popular brasileira?

    Voc samba de que lado?

    Fizemos, no incio deste artigo, uma breve apresentao dos caminhos percorridos

    pelo samba e as circunstncias que o elevaram a elemento constitutivo do plano de

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    identidade nacional. Essa carga de sentido permanece atual e se mostra de grande

    relevncia dentre os lugares construdos para o samba no Esquenta!. Isso pode ser

    observado na fala de abertura de Regina Cas durante a emisso especial sobre a Pscoa. A

    apresentadora explica o surgimento do chocolate narrando hbitos culturais da civilizaoasteca. Quando faz referncia celebrao feita pelos astecas para cultuar Quetzalcatl, o

    deus do cacau, Regina Cas prope uma associao ao gnero musical em voga: essa festa

    era tipo a roda de samba deles. S que em vez de churrasquinho e de cerveja, eles

    comemoravam com chocolate (CAS, 2014).

    Nessa fala e em outras que apresentaremos neste trabalho, Cas prope uma

    aproximao entre duas culturas diversas por meio de prticas culturais eminentes. Ao

    buscar associar uma celebrao popular de uma antiga sociedade estrangeira a celebraestipicamente nacionais, a apresentadora recorre de imediato roda de samba, presente em

    diversos bairros cariocas e rara, todavia, em outras tantas cidades brasileiras.

    Dentre os convidados presentes nesta mesma emisso do programa, estava a

    Comunidade Eslava de So Paulo. Diante do afinco em traar paralelos entre a cultura de

    l com a cultura de c, Regina Cas apresenta diversos hbitos e tradies culturais de

    famlias de diferentes localidades. Na ocasio em questo, a apresentadora explica os

    hbitos particulares de quem celebra a pscoa no Leste Europeu e, portanto, convoca uma

    das integrantes do grupo convidado para um dilogo. Ao dirigir-se russa Irina, Cas

    sugere uma relao de similaridade entre o povo russo e o povo brasileiro.

    Regina Cas: todo mundo diz que o povo russo parece muito com o povobrasileiro. animado, gosta de festa, de danar, de pular, de se divertir.Concorda, Irina, que a gente parecido, o brasileiro e o russo?Irina:na dana, sim.Regina Cas:a Irina me confidenciou uma coisa.Irina:adoro samba! A primeira vez que escutei samba foi na Rssia. Samba deJaneiro!(Esquenta!especial de Pscoa, 2014)

    Logo em seguida, todos os integrantes do programa tentam lembrar qual seria a

    msica a qual Irina faz referncia. A convidada Glria Maria comea a cantarolar junto com

    a russa, at que Arlindo Cruz, Pricles, Xande de Pilares e Mumuzinho improvisam uma

    letra de samba em meio a laialaispara que Irina entre na roda.

    Uma outra, e muito recorrente, maneira de atrelar ao samba a ideia de forte elemento

    da identidade nacional por meio da associao com artistas que so valorizados pela

    crtica especializada. Na emisso especial sobre os anos vinte, o samba-enredo Paulicia

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    Desvairada4 convocado logo aps Regina Cas explicar a importncia cultural da semana

    de arte moderna, representada na ocasio pela pintura Abaporude Tarsila do Amaral. Essa

    noo tambm pode ser percebida na emisso especial sobre o trabalho, enquanto Regina

    Cas e o comentarista Al Youseff comentam o carter vanguardista das obras do cantorTom Z.

    Tom Z um dos maiores cantores, compositores e experimentadores da msica no

    Brasil. Eu quero muito barulho no Esquenta!pra ele! (CAS, 2014). Aps uma salva de

    aplausos da plateia, a relevncia dada ao cantor busca amparo de valor cultural no samba.

    Al Youseff faz referncia ao lbum Estudando o Samba, lanado em 1976pelo cantor e

    desprezado pela crtica nacional e valorizado pela crtica internacional.

    Al Youseff:No meio dos anos 80, o David Byrne, que um msico famoso,veio ao Rio de Janeiro, encontrou esse disco Estudando o Samba e ficoucompletamente encantado. David Byrne pegou esse disco e lanou Tom Z nosEUA. Foi um sucesso incrvel de pblico e de crtica e o Tom Z voltou cenacom tudo e arrebentou. Isso maravilhoso!(Esquenta!especial sobre o trabalho, 2014)

    A segunda regularidade que observamos no programaEsquenta! a constante ideia

    de pensar o samba como gnero autorizado a ambientar, narrar e representar as atividades e

    prticas cotidianas do povo brasileiro. Podemos perceber a fora desse valor na inaugurao

    do quadroBatendo o Ponto, que prope convidar, a cada edio, trabalhadores de variadasprofisses para relatar experincias da rotina. A emisso sobre o trabalho, foram convidadas

    Creuza e Dorotia, duas atendentes de estaes de pedgios rodovirios. Aps as duas

    mulheres apresentarem suas tarefas dirias e compartilharem casos cmicos que presenciam

    durante o horrio de trabalho, Regina pede que Mumuzinho cante a msica T Combinado,

    justificando que Creuza e Dorotia so fs do sambista e o escutam durante o servio.

    O programa faz uso do samba enquanto representao de prticas dirias com mais

    veemncia em outro momento da emisso sobre o trabalho. O samba aparece comofechamento da fala do jornalista Leonardo Sakamoto, que debateu sobre os regimes de

    trabalho desiguais e a desvalorizao de determinadas categorias de trabalhadores em

    detrimento de outras. O jornalista diz que gostaria de ver trabalhadores explorados e

    tomados como invisveis, a exemplo dos garis, sendo tratados como qualquer outro

    profissional. Diante disso, Regina Cas mostra o grupo de garis, que acompanha toda a

    4O samba-enredo do Grmio Recreativo Escola de Samba Estcio de S foi composto para o carnaval de1992 em homenagem aos 70 anos do modernismo.

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    gravao do programa em uma estrutura de camarote ali construda, enquanto Arlindo Cruz

    e Xande de Pilares cantam a msicaMeu Nome Trabalho5.

    Talvez por sua histria de origem e o seu estabelecimento nos bairros perifricos

    cariocas permanecerem como forte referncia para se pensar o samba, no programaEsquenta! esse sentido evocado como forma de tematizar o gnero musical. Ao longo das

    emisses analisadas e, sobretudo na emisso especial de Pscoa, o samba atravessado pelo

    sentido de pertencimento ao espao social de origem.

    A partir disso, observamos que comum que tanto a fala da apresentadora

    quanto as falas dos demais sejam construdas de modo a afirmar esse pertencimento ou, de

    alguma forma, problematizar algum tipo de negao a ele. Quando esse sentido atravessa o

    samba no programa Esquenta!, ao gnero musical atribuda a ideia de pertencimentoquase inaltervel, para o qual o deslocamento uma ameaa. Acerca desse aspecto, Regina

    Cas destaca uma das composies do Grupo Bom Gosto. A letra da msica Nega Boy,

    segundo a apresentadora, fala dessa nega que nega as origens e s quer saber de Leblon,

    Ipanema, Temaki e Cinema (CAS, 2014).

    Grupo Bom Gosto:Qu que deu nessa nega que nega a raizQue no samba na palma da mo

    Me falaram que essa nega s quer sombra e gua frescaS quer gringo e voar de avio

    Mete marra no asfalto, d piti, fala altoE na praia arruma confusoS Leblon, Ipanema, temaki e cinema

    E agora desce at o choImagina s se eu caso com elaEu j tinha quatro filhos e cinco pensoOh nega, lalaiaQuem te viu e quem te v lalaiaT bolado pra valer

    Foi s Deus te dar poderPra tu mostrar quem voc(Esquenta! especial de Pscoa, 2014)

    Essa noo de pertencimento ainda destacada por Regina Cas ao destacar a

    importncia em manter as origens. A apresentadora diz que seus convidados e colegas de

    palco na emisso sobre a Pscoa so suburbanos assumidos. Regina Cas pergunta a cada

    um deles, ento, de onde vieram como modo de reforar esse pertencimento. O surfista

    Pedro Scooby logo fala: Eu sou Curicica na veia! (SCOOBY, 2014). A apresentadora

    pergunta ainda jornalista Glria Maria o local onde cresceu no Rio de Janeiro. Quando

    5A msica assinada por Arlindo Cruz narra os apuros de um homem em busca de emprego enquanto descrevesuas experincias profissionais anteriores.

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    Glria Maria responde que foi criada entre Oswaldo Cruz e Madureira, a plateia se acaba

    em palmas e o cantor Arlindo Cruz aproveita a deixa para relacionar o tema a um grande

    sucesso de sua autoria, a msicaMeu Lugar.

    Arlindo Cruz:O meu lugar caminho de Ogum e IansL tem samba at de manhUma ginga em cada andarO meu lugar

    cercado de luta e suorEsperana num mundo melhorE cerveja pra comemorarO meu lugarTem seus mitos e Seres de Luz

    bem perto de Osvaldo Cruz,Cascadura, Vaz Lobo e Iraj

    O meu lugar sorriso paz e prazerO seu nome doce dizer

    Madureira, l lai, Madureira, l laiGlria Maria: (aps ter sambado enquanto Arlindo Cruz cantava) eu fui criadana casa da minha av Alzira, que morreu com 104 anos, ento as minhaslembranas eram aquelas ruas comunitrias. Todo mundo vendo televiso numacasa s, subindo na rvore, pegando baba-de-boi no p. A minha av fazia rodade samba no quintal, ento as minhas lembranas at 10,12 anos so essas. Raizessuburbanas de verdade.(Esquenta! especial de Pscoa, 2014)

    Essa associao entre o samba e a noo de pertencimento cara ao programa

    Esquenta!, uma vez que a discusso centro-periferia o eixo de um esforo conjunto de

    pesquisa entre Regina Cas e Hermano Vianna durante anos de parceria. Nessa emisso

    analisada, quando a Glria Maria e os demais convidados param de sambar, Regina Cas

    junto ao comentarista Jos Marcelo Zacchi debatem essa questo e comparam o significado

    de subrbio no Brasil ao de outros pases.

    De todos os sentidos associados ao samba, o que talvez seja o mais importante para

    os fins desta anlise o da mistura. A busca por funcionar como um espao de confluncia

    de diversas prticas culturais o objetivo central doEsquenta!. Por isso, h o incentivo de

    que essas prticas interajam entre si e busquem pontos de encontro. Quando assiste ao

    programa, por exemplo, no estranho que a audincia se depare com cantores de

    universos completamente diferentes interagindo entre si.

    Conforme abordamos anteriormente, a mescla que o programa se predispe a fazer

    est intimamente ligada ao mote central doEsquenta!, cujo argumento se baseia na ideia de

    que cada emisso funcione como uma celebrao em que diferentes prticas culturais tem

    espao para se misturarem. Vemos portanto cantores de rap em dueto com cantores de

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    arrocha, assim como cantores de MPB junto com bandas pernambucanas de forr-brega. No

    Esquenta!, a mistura um valor que pode estabelecer relaes entre os mais diversos

    gneros musicais. No podemos ignorar, todavia, que, dentre os demais gneros, o samba

    ocupa o indubitvel lugar de protagonista.

    Figura 01: Pitty toca pandeiro durante a gravao doEsquenta!especial sobre os anos vinte

    Localizamos essa vontade de mistura mediada pelo samba quando se prope

    associar a cantora Pitty a esse gnero musical (figura 01). Em certo momento da emisso

    especial sobre os anos vinte, o quadro da gravao fechado exclusivamente na roqueira,

    enquanto ela improvisa uma batucada de pandeiro ao vivo. Olha a Pitty no pandeiro a,

    gente!, diz Arlindo Cruz antes que a plateia bata palmas. Em seguida, Al Youssef prope

    relaes entre a cantora e o samba. A Pitty roqueira e tal, mas ela tem uma longa histria

    de samba tambm. Ela foi, durante muitos anos, madrinha do bloco do Baixo Augusta l de

    So Paulo (YOUSSEF, 2014).

    O convite mistura feito de fato nos minutos que se seguiram. Regina Cas fez

    um comentrio sobre o talento da cantora Cssia Eller e pergunta se Pitty enxergava a

    cantora como um dolo. Aps dizer que gostava muito de Eller, Pitty convidada por

    Xande de Pilares a cantar O Segundo Sol. A msica ganha novos arranjos noEsquenta! e

    cantada pela dupla com o ritmo de samba.

    Ao fim dessa anlise, a reflexo proposta neste trabalho nos mostra importantes

    possibilidades de compreenso e nos leva a alguns caminhos para que seja possvel

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    compreender o que o protagonismo do samba pode dizer sobre o Esquenta! e ao modo

    como a cultura popular brasileira entendida no programa.

    O pas do swing o pas da contradio

    Quando buscamos encontrar e analisar as principais mediaes que, associadas ao

    samba, conferiam-lhe o papel de protagonista no programa Esquenta!,buscamos entender

    como o destaque dado a esse gnero musical em detrimento de outros, pode revelar as

    dinmicas do programa, bem como a ideia de cultura popular brasileira.

    possvel inferir que o programa Esquenta!nos posiciona diante da proposta de

    apresentar diferentes prticas culturais em um terreno comum. Diante do argumento tudojunto e misturado, por meio dessa dinmica, o Esquenta!busca que produes culturais

    diversas interajam entre si. O Esquenta!, dessa forma, busca creditar a elas visibilidade

    miditica e valorizao. O que questionamos ao fim deste trabalho o cumprimento da

    proposta de mistura cultural levantada pelo programa diante de um notvel protagonismo

    do samba frente a outros gneros.

    A ideia defendida por Regina Cas de unir o que o mundo separa louvvel. Sua

    execuo, entretanto, pe vista as fragilidades de um programa que se firma em

    contradies e concepes estereotpicas para construir seu argumento. Se observarmos

    com mais cautela, possvel perceber certa semelhana entre os encontros propostos no

    programaEsquenta! e a noitada de violo de 1926, a qual fizemos referncia no incio

    deste trabalho. Ao procurar aproximar diferentes realidades socioculturais, tal como fizeram

    Gilberto Freyre e Srgio Buarque de Holanda quando convidaram Pixinguinha, Donga e

    Patrcio Teixeira para juntos pensarem em um sentido para a cultura popular brasileira,

    Cas acaba por reafirmar as diferenas e destacar algumas ideias j estabelecidas do que a

    cultura brasileira e a identidade nacional.

    Analisar a fora do samba enquanto mediao no programa nos posiciona diante da

    percepo construda no Esquenta!em torno do gnero, dos processos de valorizao que

    nele incidem, bem como nas expectativas criadas a partir dos sentidos a ele atrelados.

    Assim, ainda que funcione como um espao inclusivo aos diferentes produtos culturais, h

    no programa a incorporao dessas prticas ideia particular de cultura em que oEsquenta!

    se ampara. A partir das mediaes que o programa associa ao samba, possvel

    compreender em qual definio de cultura popular brasileira o Esquenta!se estabelece. O

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    programa entende cultura como um terreno comum onde as interaes e representaes so

    estabelecidas. Nesse espao de interaes, entretanto, a proposta de mistura de estilos tende

    a ser aglutinada pelo samba, que , indubitavelmente, protagonista na mediao de

    diferentes prticas e valores sociais.

    REFERNCIAS

    GOMES, Itnia. Efeito e Recepo.Rio de Janeiro, E-papers: 2004.

    JANOTTI JUNIOR, Jeder. Procura da Batida Perfeita: a importncia do gnero musical para aanlise da msica popular massiva. Revista Eco-Ps . Rio de Janeiro: Ps-Graduao emComunicao e Cultura da Escola de Comunicao/ UFRJ, v.6, n.2, 2003 p. 31-46.

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    MARTN-BARBERO, Jess. Dos meios s mediaes:Comunicao, cultura e hegemonia. Rio deJaneiro: Ed. UFRJ, 1997.

    MITTEL, Jason. Genres and Television. London, New York: Routledge, 2004.

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