O SETOR SUCROENERGÉTICO E A TERCEIRIZAÇÃO DO … · Os serviços de corte, carregamento e...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE DIREITO DE RIBEIRÃO PRETO
BRUNO BALTIERI DARIO
O SETOR SUCROENERGÉTICO E A TERCEIRIZAÇÃO DO
CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE CANA-DE-
AÇÚCAR: ATIVIDADE FIM?
ORIENTADORA: PROFª DRª MARIA HEMÍLIA FONSECA
RIBEIRÃO PRETO
2014
BRUNO BALTIERI DARIO
O SETOR SUCROENERGÉTICO E A TERCEIRIZAÇÃO DO
CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE CANA-DE-
AÇÚCAR: ATIVIDADE FIM?
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade
de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel
em Direito.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Hemília Fonseca
RIBEIRÃO PRETO
2014
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
DARIO, Bruno Baltieri.
O setor sucroenergético e a terceirização do corte, carregamento e transporte de
cana-de-açúcar: atividade-fim? / Bruno Baltieri Dario – Ribeirão Preto, 2014.
122 p.; 30 cm.
Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Faculdade de Direito de Ribeirão
Preto – Universidade de São Paulo, 2014.
Orientadora: Professora Doutora Maria Hemília Fonseca.
1. Setor sucroenergético. 2. Terceirização. 3. Súmula 331 TST. 4. Corte,
carregamento e transporte. 5. Atividade-fim.
FOLHA DE APROVAÇÃO
Bruno Baltieri Dario
O setor sucroenergético e a terceirização do corte, carregamento e transporte de cana-de-açúcar:
atividade-fim?
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade
de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel
em Direito, sob orientação da Professora Doutora Maria
Hemília Fonseca.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
Professora Doutora Maria Hemília Fonseca
Instituição: Faculdade de Direito de Ribeirão Preto
Julgamento: Assinatura:
Prof. Dr.
Instituição:
Julgamento: Assinatura:
Prof. Dr.:
Instituição:
Julgamento: Assinatura:
Para Raquel, Peter, Eliana e Marina, minha
família, minha razão de ser.
AGRADECIMENTOS
Como ponto de partida, agradeço aos meus pais, Peter e Eliana, exemplos de vida, amor e
dedicação pela família e pelo trabalho, sem os quais eu nada seria.
Agradeço à minha família, em especial aos meus avós, exemplos de honestidade, que sempre
lutaram por uma vida melhor e me ensinaram o valor do trabalho.
Agradeço à minha namorada, Raquel Moraes Barros Chaddad, que sempre esteve ao meu lado,
me apoiando em todos os momentos. Sem você nada disso seria possível!
Agradeço aos meus queridos amigos de república, Fernando Oliveira, Henrique Nimer Chamas,
Jamil Gonçalves do Nascimento Junior, Júlio César Azevedo de Paula e Paulo Pereira de
Miranda Herschander, e aos agregados Eduardo Prigenzi Moura Sales, Igor Longo Fabiani e
Raphael Silva, que sempre me apoiaram e tornaram a vida universitária a melhor possível.
Agradeço à minha orientadora e amiga, Prof.ª Dr.ª Maria Hemília Fonseca, exemplo de
dedicação acadêmica. Obrigado pela paciência e pela confiança depositada e por toda a
orientação carinhosamente dispensada.
Agradeço aos queridos amigos e professores Flavia Trentini e Alexandre Chibebe Nicolella,
que me despertaram a paixão pelo Direito Agrário e que muito contribuíram para a minha
formação acadêmica.
Agradeço ao amigo e conterrâneo Prof. Dr. Jair Aparecido Cardoso, que muito carinhosamente
me recebeu em nossa querida faculdade e me mostrou a importância do Direito do Trabalho.
Agradeço ao Prof. Dr. Rogério Alessandre de Oliveira Castro, exemplo de profissional, sempre
empenhado na produção científica do Direito do Agronegócio, que muito contribuiu para a
realização deste trabalho.
Agradeço à Universidade de São Paulo, pela concessão da bolsa de iniciação científica que
resultou parte deste trabalho. Agradeço também aos demais docentes e funcionários da
Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, que se dedicam a cada dia pra o crescimento da nossa
querida faculdade.
Agradeço a todos que auxiliaram este estudo a se aproximar da realidade, sobretudo Raízen
Energia S.A., em especial a Herbert Abude Scheidl, Everton André Dela Torre e Vinicius
Soares Rocha, e São Martinho S.A., especialmente a Alexandre José Negrini Mattos e Luis
Guilherme Polizel Libardi.
Por fim, agradeço a todas as pessoas que, de alguma forma, contribuíram para a realização desse
trabalho.
“Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se
dispõe para a gente é no meio da travessia.”
João Guimarães Rosa
RESUMO
DARIO, Bruno Baltieri. O setor sucroenergético e a terceirização do corte, carregamento
e transporte de cana-de-açúcar: atividade-fim? 2014. 122f. Trabalho de Conclusão de Curso
– Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2014.
A terceirização de serviços especializados é uma realidade econômica mundial. No setor
sucroenergético, a terceirização ocorre em diversas etapas do processo produtivo, e proporciona
ganhos de eficiência, como a mitigação dos efeitos negativos das entressafras nas economias
locais. Os serviços de corte, carregamento e transporte (CCT) incluem-se nas atividades de
logística da usina e tradicionalmente são terceirizados, sobretudo após a proibição da queimada
de cana-de-açúcar, que implicou em elevados investimentos para a colheita mecanizada. No
Brasil, a terceirização é regulamentada pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que
permite, dentre outras hipóteses, a terceirização de serviços especializados que configurem
atividade-meio da empresa. Entretanto, alguns julgados da Justiça do Trabalho passaram a
proibir a terceirização do CCT, por entender que se tratam de atividades essenciais às usinas e,
portanto, configuram atividade-fim. Dessa forma, o objetivo deste estudo é verificar se as
atividades de corte, carregamento e transporte configuram atividade-fim da usina de cana-de-
açúcar. Como resultado, entende-se que o CCT não se configura atividade-fim da usina, e que
a proibição da terceirização, em casos especiais, gera uma assimetria concorrencial e viola os
preceitos constitucionais da legalidade, livre iniciativa, livre concorrência, neutralidade
concorrencial do Estado e favorecimento das empresas de pequeno porte.
Palavras-chaves: Setor sucroenergético. Terceirização; Súmula 331 TST; Corte, carregamento
e transporte; atividade-fim.
ABSTRACT
DARIO, Bruno Baltieri. 2014. 122f. The sugar and energy industry and the outsourcing of
the cutting, loading and transportation of the sugarcane: core activity?: Final Thesis –
Faculty of Law of Ribeirão Preto, University of Sao Paulo, Ribeirão Preto, 2014.
The outsourcing of specialized services is a global economic reality. In the sugar and energy
sector, outsourcing occurs at various stages of the productive process, and provides efficiency
gains, such as the mitigation of the negative effects of the intercrops in local economies. The
services of cutting, loading and transportation (CLT) are included in the logistic activities of
the sugarcane mill and are traditionally outsourced, especially after the ban on the burning of
sugarcane, which resulted in large investments for mechanized harvesting. In Brazil,
outsourcing is regulated by Precedent 331 of the Superior Labor Court, which allows, among
other situations, the outsourcing of specialized services that don't constitute the company's core
activity. However, some judgments of the Labor Justice began to prohibit the outsourcing of
CLT, understanding that these are essential activities to the sugarcane mills and, therefore,
constitute core activity. Thus, the aim of this study is to verify whether the activities of cutting,
loading and transportation constitute core activities of the sugarcane mill. As a result, it is
considered that the CLT does not configure core activity of the mill, and that the ban on
outsourcing, in special cases, generates a competitive asymmetry and violates the constitutional
principles of legality, free enterprise, free competition, competitive neutrality of the state and
favoring of small businesses.
Keywords: Sugar and energy sector; Outsourcing; Precedent 331 of the Superior Labor Court;
Cutting, loading and transportation; Core activity.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Brasil – exportação de mercadorias (% do valor dos sete produtos
principais sobre o valor total da exportação) ............................................ 26
Tabela 2 Evolução das quotas de produção de açúcar de usina, segundo unidades
da Federação – safra 1945/46 a 1976/47 ................................................... 28
Tabela 3 Distribuição espacial das usinas de açúcar (U) e destilarias de álcool (D)
no Brasil, segundo macrorregião e principais estados produtores – 1975
a 1985 ....................................................................................................... 30
Tabela 4 Produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool – Safra 2012/13 .................. 37
Tabela 5 Distribuição por Estado das unidades de processamento de cana-de-
açúcar ....................................................................................................... 41
Tabela 6 Produção de álcool no Brasil e vendas de carros a álcool, flex-fuel e a
gasolina no mercado nacional .................................................................. 44
Tabela 7 Tipo de unidade agroindustrial do SAG da cana-de-açúcar ...................... 46
Tabela 8 Arranjos institucionais na transação da cana-de-açúcar ........................... 49
Tabela 9 Cronograma de eliminação da queima da cana-de-açúcar no Estado de
São Paulo (Lei n. 11.241, de 19 de setembro de 2002 ............................... 85
Tabela 10 Cronograma de Eliminação da Queima da cana-de-açúcar no Estado de
São Paulo, (Protocolo Agroambiental, 2007) ........................................... 86
Tabela 11 Principais operadores logísticos que atuam no Brasil ............................... 89
Tabela 12 Exemplos de grandes operadores logísticos com atuação no setor
sucroenergético ........................................................................................ 95
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Produção e consumo de álcool (anidro e hidratado) no Brasil – 1985 a
1995 ......................................................................................................... 32
Gráfico 2 Evolução de recursos destinados ao crédito rural - 1975 a 2012 ............... 33
Gráfico 3 Produção de cana-de-açúcar por região – Safras 1980/81 a 2012/13 ........ 38
Gráfico 4 Produção de açúcar e álcool por região: Safra 2012/13 ............................ 39
Gráfico 5 Produção de cana-de-açúcar por estado: Safra 2012/13 ........................... 40
Gráfico 6 Produção de açúcar por estado: Safra 2012/13 ......................................... 40
Gráfico 7 Produção de álcool por estado: Safra 2012/13 .......................................... 42
Gráfico 8 Produção nacional de cana-de-açúcar: 1980/81 a 2012/13 ....................... 43
Gráfico 9 Produção nacional de açúcar e álcool: 1980/81 a 2012/13 ........................ 44
Gráfico 10 Recursos destinados a crédito rural x produção de cana-de-açúcar: 1980
a 2013 ....................................................................................................... 45
Gráfico 11 Produção de álcool: 1980/81 a 2012/13 .................................................... 46
Gráfico 12 Venda de automóveis por tipo de combustível: 1980 a 2013 .................... 47
Gráfico 13 Consumo de combustíveis líquidos: 1970/71 a 2012/13 ........................... 47
Gráfico 14 Produção nacional de cana-de-açúcar: 1980/81 a 2012/13 ....................... 84
Gráfico 15 Evolução da colheita da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo ............. 87
Gráfico 16 Índice de mecanização das usinas em terra própria nos principais estados
produtores de cana-de-açúcar no centro-sul (safra 2012/13) .................... 87
Gráfico 17 Índice de mecanização das usinas em terra própria nas principais cidades
produtoras de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo (safra 2012/13) ... 88
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Esquema da indução das formas de governança ....................................... 21
Figura 2 Sistema agroindustrial da cana-de-açúcar ................................................ 24
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 16
2 ANÁLISE ESTRUTURAL DO SETOR SUCROENERGÉTICO ................ 18
2.1 A NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL E A TEORIA DOS CUSTOS
DE TRANSAÇÃO ..................................................................................... 19
2.2 HISTÓRICO E ESTRUTURA DO SETOR SUCROENERGÉTICO ........ 22
2.2.1 Origens ......................................................................................... 25
2.2.2 Proálcool – instituições e organizações: 1975 – 1990 ................... 29
2.2.3 Desregulamentação e nova organização do setor 1990 – 2013 ..... 32
2.2.4 Organização industrial ................................................................. 27
2.2.5 Arranjos institucionais na transação produtor-processador .......... 47
2.2.6 Atividade de corte, carregamento e transporte .............................. 51
3 TERCEIRIZAÇÃO ........................................................................................... 53
3.1 CONCEITO ............................................................................................... 53
3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ........................................................................ 55
3.3 CRITÉRIOS DE LICITUDE E ILICITUDE .............................................. 60
3.3.1 Atividade-fim e atividade-meio .................................................... 62
3.3.2 Elementos da relação de emprego ................................................ 64
3.4 RESPONSABILIDADES NA TERCEIRIZAÇÃO ................................... 66
3.4.1 Responsabilidade direta e integral do tomador ............................. 67
3.4.2 Responsabilidade solidária entre tomador e prestador .................. 67
3.4.3 Responsabilidade subsidiária do tomador .................................... 69
3.4.4 Inexistência de responsabilidade do tomador ............................... 74
3.5 VANTAGENS E DESVANTAGENS ....................................................... 75
3.6 INSTRUMENTOS JURÍDICOS VIABILIZADORES DA
TERCEIRIZAÇÃO .................................................................................... 78
4 TERCEIRIZAÇÃO DAS ATIVIDADES DE CORTE,
CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR .............. 82
4.1 ATIVIDADE DE CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE NA
PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR ................................................... 82
4.2 RACIONALIDADE ECONÔMICA DA ESPECIALIZAÇÃO DA
ATIVIDADE DE CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE
CANA-DE-AÇÚCAR ................................................................................ 91
4.3 ATIVIDADE-FIM E ATIVIDADE-MEIO: PARÂMETROS DE
LICITUDE DA TERCEIRIZAÇÃO? ........................................................ 97
4.3.1 Legalidade .................................................................................... 98
4.3.2 Ordem econômica ........................................................................ 100
4.4 TERCEIRIZAÇÃO DO CORTE, CARREGAMENTO E
TRANSPORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR: ATIVIDADE-FIM? ............. 104
5 CONCLUSÃO .................................................................................................... 109
REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 111
16
1 INTRODUÇÃO
A contratação de serviços especializados é uma realidade em diversos setores da economia,
dentre eles encontra-se o setor sucroenergético. A especialização dos processos produtivos
proporciona ganhos de eficiência econômica e, consequentemente, incrementos de bem estar
social. A organização dos processos de produção em etapas possibilita que as empresas
coordenem suas atividades de modo a preservar e aprimorar especialidades e habilidades
acumuladas, decorrentes da especialização do trabalho, que acelera o processo de inovação
tecnológica (LCA, 2014, p.1).
No setor sucroenergético, a especialização proporciona ganhos de eficiência, tais como a
mitigação dos efeitos negativos das entressafras nas economias locais, mantendo o nível de
atividade econômica de forma mais regular em todos os meses do ano. Por sua vez, isto permite
o emprego permanente de mão de obra especializada, garantindo maior estabilidade das
relações de trabalho, ao diminuir a dependência de trabalho temporário. Isso diminui a dispensa
de milhares de trabalhadores em períodos de entressafra (LCA, 2014, p. 2).
As atividades de corte, carregamento e transporte de cana-de-açúcar demandam elevados
investimentos, sobretudo para a adequação às exigências da legislação ambiental. Isto porque
a proibição da queimada de cana-de-açúcar obrigou a mecanização da colheita de cana-de-
açúcar. Além disso, em razão do grande volume de material processado, o nível de eficiência
operacional torna-se bastante relevante para os custos operacionais, sobretudo na produção de
cana-de-açúcar, que sofre rápida degradação após o seu corte. Desse modo, ineficiências no
CCT são altamente prejudiciais (SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 106) transformando a
terceirização em uma viável alternativa.
Entretanto, a terceirização vem sendo questionada judicialmente, com fundamento na Súmula
331 do Tribunal Superior do Trabalho, que proíbe a terceirização de atividade-fim da empresa.
Na falta de parâmetros legais objetivos, a discussão dobre o conceito de atividade-fim e
atividade-meio tem causado grande incerteza aos agentes econômicos e criado riscos para a
atividade econômica.
17
Dessa forma, o presente trabalho tem o objetivo de verificar se o transporte de cana-de-açúcar
configura atividade-fim da usina e, portanto, não poderia ser terceirizado. Para tanto, está
estruturado em cinco capítulos, sendo o primeiro esta introdução. O segundo capítulo apresenta
o referencial teórico da Nova Economia Institucional e da Teoria dos Custos de Transação, para
melhor compreender os motivos que influenciam na organização de uma empresa. Além disso,
apresenta-se um panorama do setor sucroenergético, sua evolução e os contratos utilizados, bem
como a estrutura das atividades de corte, carregamento e transporte,
O terceiro capítulo tem como escopo a análise teórica da terceirização, com o estudo do seu
conceito, da evolução histórica do instituto, dos critérios utilizados como parâmetro de sua
licitude e ilicitude, das possíveis hipóteses de responsabilidade do tomador dos serviços, das
vantagens e desvantagens e dos instrumentos jurídicos capazes de viabilizar a terceirização,
equalizando os interesses da empresa e dos trabalhadores.
O quarto capítulo apresenta o estudo específico da terceirização da atividade de corte,
carregamento e transporte de cana-de-açúcar. Para isso, estuda-se a logística no setor
sucroenergético e a racionalidade econômica da especialização desses serviços. Além disso,
discute-se o enquadramento do corte, carregamento e transporte na atividade-fim da usina, bem
como se a aplicação desse critério viola os preceitos constitucionais da legalidade, livre
iniciativa, livre concorrência, neutralidade concorrencial do Estado e favorecimento da empresa
de pequeno porte. Por fim, o quinto capítulo apresenta as conclusões do trabalho.
18
2 ANÁLISE ESTRUTURAL DO SETOR SUCROENERGÉTICO
A utilização de contratos apresenta-se como importante instrumento de ligação entre os vários
agentes pertencentes à cadeia produtiva do etanol, e seu estudo torna-se de grande relevância
(CEPEA, 2012), uma vez que o cultivo da cana-de-açúcar é uma das atividades de maior
crescimento no país nos últimos anos. Dados da safra 2011/2012 mostram que o setor
sucroenergético no Brasil gerou 88 bilhões de reais, o equivalente a 2% do PIB (BIOSEV,
2013), sendo produzidas 35,95 milhões de toneladas de açúcar e 22,68 bilhões de litros de
etanol, representando 38% da produção mundial de etanol.
O contrato passa a ter maior importância na economia contemporânea, pois a empresa não pode
mais ser vista de forma isolada. A empresa é agente econômico que atua por meio de contratos.
Este pensamento é defendido na economia por Coase (1937), que a concebe como um feixe de
contratos; e, no direito, por Roppo (2001, p. 56), segundo o qual “os modernos complexos
produtivos não são tanto estoque de bens, mas feixe de relações contratuais”.
Nesse sentido, portanto, para a empresa, é necessário que se estabeleçam relações com terceiros
para adquirir insumos, distribuir produtos e associar-se para viabilizar a abertura de mercados,
o desenvolvimento e novas tecnologias. Esta ação recíproca (empresa – outros agentes)
interessa ao direito na medida em que dá à luz a contratos e, consequentemente, a relações
jurídicas (FORGIONI, 2011, p. 24).
As relações jurídicas contratuais são fundamentais para o desenvolvimento da organização, na
medida em que, segundo a teoria de Coase (1937), a empresa se configura como um conjunto
de contratos, e as relações entre as empresas resultam em um exame de custos de produção e
custos de transação. Desse modo, a depender dos custos, pode ser mais vantajoso adquirir um
insumo no mercado do que produzi-lo internamente (AMARAL, 2009).
19
As instituições1, incluindo as relações contratuais entre os agentes, e suas alterações são
especialmente importantes para a análise dos sistemas agroindustriais (SAG)2 em seus diversos
níveis. Williamson (1985) defende que formas eficientes de governança se desenvolvem dentro
dos limites impostos pelo ambiente institucional, pelos pressupostos comportamentais dos
indivíduos e pelas características das transações.
Desse modo, faz-se necessário o estudo sobre a Nova Economia Institucional e a Teoria dos
Custos de Transação, bem como a análise da evolução histórica das instituições dentro do
sistema agroindustrial da cana-de-açúcar no Brasil para melhor compreender a utilização das
modalidades contratuais na transação da matéria-prima. O contrato celebrado determinará de
quem será a obrigação de realizar as atividades de corte, carregamento e transporte (CCT).
2.1 A NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL E A ECONOMIA DOS CUSTOS DE
TRANSAÇÃO
O novo institucionalismo surge como reação aos pressupostos neoclássicos, ligados ao
tratamento dado à firma, ao consumidor e ao próprio processamento do equilíbrio do mercado
após um choque. A firma era vista como uma entidade otimizadora, totalmente indiferente à
sua estrutura interna e aos condicionantes do ambiente, exceto o preço. Os consumidores eram
vistos como seres capazes de escolher “racionalmente” entre grupos alternativos de bens.
Finalmente, a figura do auctioneer (“leiloeiro”) resolvia o problema do equilíbrio dos mercados
a custo zero (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 13).
Os pressupostos neoclássicos afastavam-se completamente da realidade empírica. Estudava-se
um sistema que existia na mente dos economistas, mas não o que havia na terra3 (COASE,
1991, p. 714). A análise não levava em conta a existência dos custos associados ao
funcionamento da economia, os denominados custos de transação, superestimando o papel dos
preços como alocador dos recursos e negligenciando os fatores institucionais
ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 14).
1 As instituições correspondem ao conjunto de restrições formais e informais que regulam a interação humana na
sociedade. O ambiente institucional é definido pelo conjunto das regras políticas, sociais e legais que estabelecem
as bases para produção, troca e distribuição, e as próprias regras do jogo social (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 160). 2 O SAG corresponde ao ciclo completo de produção, transformação e comercialização de um produto
agropecuário, englobando os seguimentos antes, dentro e depois da porteira da fazenda. 3 “What is studied is a system that lives in the minds of economists but noto n the Earth”
20
Os custos de transação são os custos ex-ante de preparar, negociar e salvaguardar um acordo
bem como os custos ex-post dos ajustamentos e adaptações que resultam, quando a execução
deum contrato é afetada por falhas, erros, omissões e alterações inesperadas. Em suma, são os
custos de conduzir o sistema econômico (WILLIAMSON, 1993 apud ZYLBERSZTAJN, 1995,
p. 14).
O objetivo da Nova Economia Institucional ou Economia dos Custos de Transação (ECT) é o
de estudar o custo das transações como o indutor dos modos alternativos de organização da
produção (governança), dentro de um arcabouço analítico institucional. A transação é a
operação onde são negociados direitos de propriedade, portanto, o objetivo da ECT é analisar
sistematicamente as relações entre a estrutura dos direitos de propriedade e instituições
(ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 14).
Com o enfoque dado às transações, os contratos assumem um papel de fundamental importância
na economia contemporânea. A empresa passa a ser vista como agente econômico que atua por
meio de contratos. A firma é vista como um “feixe de contratos” (COASE, 1937) e os modernos
complexos produtivos não são tanto estoque de bens, mas um complexo de relações contratuais
(ROPPO, 2001, p. 56).
As relações jurídicas contratuais são fundamentais para o desenvolvimento da organização, na
medida em que, segundo a teoria de Coase (1937), a empresa se configura como um conjunto
de contratos, e as relações entre as empresas resultam em um exame de custos de produção e
custos de transação. Desse modo, a depender dos custos, pode ser mais vantajoso adquirir um
insumo no mercado do que produzi-lo internamente (AMARAL, 2009).
O pressuposto fundamental da ECT é de que há custos na utilização do sistema de preços bem
como na condução de contratos intra firma. Assim sendo, para o funcionamento do sistema
econômico, são importantes não apenas os contratos efetuados via mercados, mas também
aqueles coordenados centralmente pelas firmas (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 16).
Outro pressuposto da ECT é a interferência das instituições nos custos de transação. As
transações ocorrem em um ambiente institucional estruturado e estas instituições não são
21
neutras, ou seja, interferem nos custos de transação. O ambiente institucional corresponde ao
conjunto de normas que afetam o processo de transferência dos direitos de propriedade, dentre
elas regras legais, sociais e políticas (ZYLBERSZTAJN, 1995, 16).
Além disso, dois pressupostos comportamentais são fundamentais para a compreensão da ECT:
Racionalidade limitada e Oportunismo. Os atores econômicos desejam ser racionais, mas
apenas conseguem sê-lo de forma limitada (SIMON, 1961).
Racionalidade limitada refere-se ao comportamento que pretende ser racional mas
consegue sê-lo apenas de forma limitada. Resulta da condição de competência
cognitiva limitada de receber, estocar, recuperar e processar a informação. Todos os
contratos complexos são inevitavelmente incompletos devido à racionalidade
limitada” (WILLIAMSON, 1993 apud ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 17).
O oportunismo apresenta uma conotação ética comportamental dos indivíduos, que agem na
busca do seu auto-interesse, partindo de um princípio de jogo não cooperativo, onde a
informações que um agente possa ter sobre a realidade não acessível a outro agente pode
permitir que o primeiro desfrute de algum benefício. A simples possibilidade de que um
indivíduo aja dessa forma expõem os contratos a ações que demandam monitoramento, o que
agrega um custo na transação (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 17).
Para a ECT, os contratos são incompletos por natureza, em razão da racionalidade limitada, o
que não seria um problema se não fosse a característica comportamental esperada do
oportunismo. Ademais, as transações caracterizam-se por três elementos: frequência, risco e
especificidade dos ativos (ZYLBERSZTAJN, 1995, 21), que serão fundamentais na indução
das formas de governança.
22
Figura 1. Esquema da indução das formas de governança
Fonte: ZYLBERSZTAJN (2005)
A frequência na qual determinada transação ocorre é importante para determinar a possibilidade
de internalizar a determinada etapa produtiva sem perder eficiência relacionada à escala. O risco
afeta a divisão do ônus entre os participantes da transação. Por fim, o indutor mais importante
da forma de governança é a especificidade, uma vez que ativos mais especifico estão associados
a formas de dependência bilateral que implicará na estruturação de formas organizacionais
apropriadas. A existência de ativos específicos pode provocar a ação oportunista dos atores,
que podem lançar mão da dependência para obter quase-rendas apropriáveis
(ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 23).
Desse modo, são três fatores que induzem a escolha da forma de governança: ambiente
institucional, características da transação e pressupostos comportamentais. O ambiente
institucional é marcado pela tradição legal, existência de leis de proteção intelectual, tradições
de arbitragem para a solução de conflitos, aspectos culturais. (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 24)
Os pressupostos comportamentais indicam os motivos pelos quais o contrato firmado poderá
não conter as características desejadas após um determinado período, em razão do oportunismo
e da racionalidade limitada. Por fim, as características da transação, frequência, risco e
especificidade, são fatores preponderantes para a escolha da governança.
Esses são os principais fatores que interferem na escolha da forma de governança mais
adequada às condições reinantes. A forma de governança adotada deverá compatibilizar os
custos associados à estruturação dos contratos aos incentivos associados a cada arranjo
contratual e aos custos burocráticos associados. Feito esta introdução teórica, será estudada a
23
estrutura do sistema agroindustrial da cana-de-açúcar e a sua evolução histórica, a fim de
identificar e analisar os arranjos institucionais utilizados na transação produtor-processador.
2.2 HISTÓRICO E ESTRUTURA DO SETOR SUCROENERGÉTICO
O setor sucroenergético pode ser compreendido como um sistema agroindustrial, na medida em
que engloba todos os integrantes envolvidos na produção, processamento e marketing de um
produto específico (cana-de-açúcar). Inclui o suprimento das fazendas, as fazendas, operações
de estocagem, processamento, atacado e varejo envolvidos em um fluxo desde os insumos até
o consumidor final. O SAG também inclui as instituições que afetam e coordenam os estágios
sucessivos do fluxo do produto, tais como Governo, associações e mercados futuros
(GOLDENBEG, 1968 apud. NEVES; WAAK; MARINO, 1998, p.1).
Um sistema agroindustrial, para ser competitivo em preços finais ao consumidor, deve tentar
minimizar os custos de produção em cada etapa do fluxo de produtos, desde os insumos até o
consumidor final, passando pela produção, industrialização e distribuição, além dos custos
ligados às transações no fluxo de produtos (NEVES; WAAK; MARINO, 1998, p. 2). As
transações devem ser compreendidas como a “transferência de bens ou serviços por uma
interface tecnologicamente distinta” (FARINA; AZEVEDO; SAES, 1997).
Os custos ligados às transações correspondem aos de procurar para quem vender (ou de quem
comprar), investimentos em informações para conhecimento dos parceiros, todo o processo de
negociação, envolvendo tempo, capacidade gerencial, custos de escrita de contratos, entre
outros, que ocorrem antes de se efetuar a transação (NEVES; WAAK; MARINO, 1998, p.2).
A Figura 1 apresenta o SAG da cana-de-açúcar. Este trabalho tem objetivo de estudar os
contratos utilizados nas transações entre produtores e processadora para a obtenção de matéria-
prima, com enfoque no contrato de fornecimento, em sua modalidade especial, o contrato de
“fornecimento com CCT”.
24
Figura 2. Sistema agroindustrial da cana-de-açúcar
Fonte: NEVES; WACK (1998)
O fornecimento de cana-de-açúcar para a unidade de processamento abrange insumos
específicos, que não se encontra no mercado em quantidade e qualidade (especificidade)
requerida, com baixo custo. Desse modo, existe uma tendência à verticalização ou à quase-
integração. A verticalização pode ser entendida como a combinação de processos dentro das
fronteiras de uma mesma empresa, ou seja, sob um mesmo comando decisório, e envolvendo a
propriedade total dos ativos (WILLIAMSON, 1985). Nesse caso, a usina é proprietária de todos
os ativos, e responsável por toda a cadeia produtiva, desde o preparo da terra e plantio até o
corte e transporte da cana-de-açúcar para a unidade de processamento.
Por sua vez, a quase-integração, ou integração contratual, é um meio termo entre a
verticalização e o livre mercado. As partes conservam a independência jurídica, mas perdem a
independência econômica ao se vincularem por contratos.
25
Para entender e analisar os contratos utilizados na transação do insumo cana-de-açúcar entre
produtor e processadora, far-se-á necessário o estudo da evolução histórica do SAG da cana-
de-açúcar, identificando e analisando a influência de políticas públicas e modelos econômicos
nas estratégias utilizadas no setor.
2.2.1 Origens
A cana-de-açúcar é originária da Índia, alcançou a Pérsia e dali foi levada pelos conquistadores
árabes à costa do Mediterrâneo, com áreas introduzidas na Sicília e na Península Ibérica. Já em
1300, o açúcar produzido na Espanha era vendido em Bruges (Bélgica). A produção açucareira
foi dominante nas ilhas do Atlântico, e representou um ensaio do que viria a ser o
empreendimento implantado no Brasil (FAUSTO, 2012, p. 69).
Não se sabe a data em que a cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil pelos portugueses, mas
nas décadas de 1530 e 1540 a produção já estava estabelecida em bases sólidas. Em 1532,
Martin Afonso, em sua expedição, trouxe um perito em manufatura do açúcar, bem como
portugueses, italianos e flamengos com experiência na atividade açucareira na ilha da Madeira,
plantando-se e construindo-se engenhos em todas as capitanias, de São Vicente a Pernambuco
(FAUSTO, 2012, p. 69).
Os grandes centros açucareiros na colônia foram Pernambuco e Bahia, devido a fatores
climáticos, geográficos, políticos e econômicos. As duas capitanias encontravam-se em região
costeira, com solo de boa qualidade e um adequado regime de chuvas. Estavam localizadas
mais próximas dos centros importadores europeus e dos principais portos brasileiros, Salvador
e Recife, facilitando o escoamento da produção (FAUSTO, 2012, p. 69).
A instalação de um engenho era um empreendimento de alto custo. Eram necessárias grandes
áreas para a produção da cana-de-açúcar, equipamentos para processá-la, construções, escravos,
além de gado, pastagens, carros de transporte. No século XVI, a obtenção de crédito provinha
de investidores estrangeiros, italianos e flamengos, ou da própria metrópole. No século XVII,
as principais fontes vinham de instituições beneficentes e religiosas e comerciantes. Antes da
existência de Bancos no Brasil (1808), instituições como a Misericórdia, Ordem Terceira de
26
São Francisco e Convento de Santa Clara do Desterro financiavam a atividade produtiva por
meio de empréstimos a juros (FAUSTO, 2012, p. 70).
Os comerciantes tinham papel fundamental no financiamento dos senhores de engenho. As
contas eram acertadas no fim da safra, e muitas vezes os comerciantes aceitavam receber açúcar
em pagamento das dívidas, mas abaixo do valor de mercado. Os grandes centros importadores
eram Amsterdam, Londres, Hamburgo e Genova, além da Metrópole portuguesa (FAUSTO,
2012, p. 70).
Em razão do aumento da demanda na Europa e da ausência de concorrência, houve uma
conjuntura de expansão da produção açucareira entre 1570 e 1620. Por sua vez, três fatores
influenciaram negativamente a produção de cana-de-açúcar no século XVII: o início da Guerra
da Trina Anos na Europa (1618), as invasões holandesas na Bahia (1624-1625) e Pernambuco
(1630-1637), e a concorrência das Antilhas na década de 1630 (FAUSTO, 2012, p. 73-73).
Apesar desses fatores, o açúcar sempre foi o principal produto de exportação no período
colonial. Mesmo no auge do ciclo do ouro, em 1760, o açúcar representava 50% das exportações
e o ouro 46%. No século XIX, o açúcar perdeu espaço para o café, que se tornou o principal
produto de exportação do Brasil, e deslocou o polo dinâmico do país para o Centro-Sul.
Tabela 1. Brasil – exportação de mercadorias (% do valor dos sete produtos principais sobre o
valor total da exportação)
Decênio Café Açúcar Cacau Fumo Algodão Borracha Couros e
Peles
1821-1830 18,4 30,1 0,5 2,5 20,6 0,1 13,6
1831-1840 43,8 24,0 0,6 1,9 10,8 0,3 7,9
1841-1850 41,4 26,7 1,0 1,8 7,5 0,4 8,5
1851-1860 48,8 21,2 1,0 2,6 6,2 2,3 7,2
1861-1870 45,5 12,3 0,9 3,0 18,3 3,1 6,0
1871-1880 56,6 11,8 1,2 3,4 9,5 5,5 5,6
1881-1890 61,5 9,9 1,6 2,7 4,2 8,0 3,2
1891-1900 64,5 6,6 1,5 2,2 2,7 15,0 2,4
Fonte: Comércio Exterior do Brasil, n. 12-A, do Serviço de Estatística Econômica e Financeira do Ministério da
Fazenda, Hélio Shlittler Silva, Tendências e Características Gerais do Comércio Exterior no Século XIX”, Revista
de História Econômica Brasileira, ano 1, jun. 1953, p. 8 (apud, FAUSTO, 2012, p. 164)
27
Apesar de perder o posto de principal produto da economia brasileira, o açúcar começa a se
tornar um produto relevante na economia da Província de São Paulo (SZMRECSÁNYI, 1979).
Com a vinda da família real e a independência econômica em 1808, quando a abertura dos
portos foi decretada, a agricultura brasileira começou a receber incentivos para o seu
desenvolvimento. Datam desse período a criação do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (1812),
do Curso de Agronomia da Imperial Escola Agrícola da Bahia, primeiro curso da área de
ciências agrárias do Brasil, em 1877, e da Imperial Estação Agronômica de Campinas (1887),
originando posteriormente o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) em 1892.
Em 1857, Dom Pedro II elaborou um programa de modernização da produção de açúcar,
tornando possível a criação dos Engenhos Centrais. Em 1877 foi instalado o primeiro engenho
central na Província de São Paulo, iniciando-se um período de desenvolvimento da
agroindústria paulista, que recebiam incentivos do governo imperial, como a garantia de juros
sobre o capital investido. Esse período de desenvolvimento durou até 1890, quando se
encerraram os incentivos com a Proclamação da República, e tem-se o surgimento das usinas
(PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 72).
O fim dos engenhos centrais resultou no abandono da economia açucareira sob a perspectiva
nacional. Com a crise de 1929 e a superprodução de açúcar o Estado teve que intervir para
restabelecer o equilíbrio entre oferta e demanda, estimulando a produção de álcool em larga
escala e estabelecendo um sistema de quotas de produção, administrando os preços de açúcar e
álcool (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 72).
O Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) foi criado em 1933 para controlar a produção e
desenvolver pesquisas com a cana-de-açúcar. O Estado estabeleceu quotas máximas por
Unidade da Federação para a produção de açúcar, na tentativa de evitar nova superprodução. A
região Norte-Nordeste recebeu quota de 62,8% da produção, e a região Centro-Sul 37,2%
(SZMRECSÁNYI, 1979, p. 194). O Governo passou também a intervir diretamente nas
transações de compra e venda de cana-de-açúcar entre usineiros e fornecedores, estabelecendo
quotas de produção também para cada usina do país (MORAES, 1998, p. 35).
28
Após a II Guerra Mundial o Estado de São Paulo continuou aumentando sua área de canaviais,
o que forçou uma revisão das quotas de produção, como demonstrado pela Tabela 2. São Paulo
ainda se encontrava atrás de Pernambuco no tamanha de quota, mas em razão do grande
aumento percentual, diminuiu a diferença existente na década de 1930 (PEDROSO JÚNIOR,
2008, p. 73-74).
Tabela 2. Evolução das quotas de produção de açúcar de usina, segundo unidades da Federação
– safra 1945/46 a 1976/47
Unidade da
Federação Safra 1945/46 % Safra 1946/47 %
% de aumento
entre as safras
Alagoas 2.092.939 11,5 2.319.924 10,2 10,8
Bahia 1.021.255 5,6 1.168.962 5,1 14,5
Ceará 33.886 0,2 33.886 0,1 0,0
Espírito Santo 77.534 0,4 117.080 0,5 51,0
Goiás 71.600 0,4 71.600 0,3 0,0
Maranhão 32.773 0,2 34.620 0,2 5,6
Mato Grosso 77.844 0,4 83.318 0,4 7,0
Minas Gerais 938.132 5,1 1.376.560 6,0 46,7
Pará 18.794 0,1 20.380 0,1 8,4
Paraíba 372.140 2,0 640.312 2,8 72,1
Paraná 150.000 0,8 150.000 0,7 0,0
Pernambuco 6.079.159 33,4 6.490.529 28,5 6,8
Piauí 3.534 0,0 3.534 0,0 0,0
Rio de Janeiro 2.776.749 15,2 3.825.512 16,8 37,8
Rio Grande do
Norte 55.139 0,3 63.114 0,3 14,5
Santa Catarina 119.726 0,7 158.893 0,7 32,7
São Paulo 3.237.241 17,8 5.000.000 22 54,5
Sergipe 1.059.714 5,8 1.212.893 5,3 14,5
Total 18.218.159 100,0 22.771.117 100,0 25,0
Fonte: COUTINHO (1948, p. 20) apud SOARES (2000, p. 99)
29
Na década de 1950 a região Centro-Sul se consolidou como a grande região de expansão da
indústria canavieira, forçando o IAA a aumentar as quotas de produção das usinas dos Estados
não pertencentes às regiões Norte e Nordeste. (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 74). A hegemonia
da região se confirmou na em 1957 quando o IAA reparte proporcionalmente as quotas de
produção (MORAES, 1999).
O açúcar ganhou importância novamente na década de 1960, com o aumento do preço no
mercado internacional. Nesta década ocorre a divisão do país em duas regiões produtoras,
Norte-Nordeste e Centro-Sul, como forma de proteger a produção do Nordeste, que não
consegue concorrer com a produção do Centro-Sul (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 74).
Para manter o ritmo de crescimento, o Governo Federal desenvolveu diversos programas de
investimentos para incentivar à agroindústria canavieira: Programa Nacional de Melhoramento
da Cana-de-Açúcar (Planalsucar) em 1971; Programa de Racionalização da Indústria
Açucareira em 1971; e Programa de Apoio à Indústria Açucareira em 1973, que substituiu o
segundo programa de 1971 (SZMRECSÁNYI; MOREIRA, 1991).
Na década de 1970, a dependência do País em relação ao petróleo (79% era importado) causou
um desajuste na balança comercial (BAER, 2002). A principal medida do Governo foi a
elevação da produção de álcool em substituição à gasolina, que deu origem ao Programa
Nacional do Álcool (Proálcool) (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 75).
2.2.2 Proálcool – instituições e organizações: 1975 - 1990
Três fases marcaram esse período: 1975 a 1979, com a criação do Proálcool; 1980 a 1985, com
a acentuada expansão do programa; e por fim 1986 a 1995, com a crise do sistema (SHIKIDA,
1998).
O Programa Nacional do Álcool (Proálcool) surgiu durante a crise do petróleo de 1973, que se
deflagrou com o aumento do preço do petróleo em mais de 300% pelos membros da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), em protesto pelo apoio prestado
pelos Estados Unidos a Israel durante a Guerra do Yom Kippur. “O Programa nasceu
30
exclusivamente em função de um tipo específico de desequilíbrio externo, a saber, dos dois
choques de petróleo” (SHIKIDA, 1998, p. 34).
Nesse contexto de desequilíbrio, o governo militar implantou políticas públicas objetivando a
expansão da produção de álcool, como substituição de derivados de petróleo. O Proálcool foi
criado para fomentar a produção de etanol, diminuindo a dependência do país aos voláteis
preços internacionais do petróleo (BASTOS, 2013, p. 28).
Diversas organizações e agentes de natureza pública e privada se envolveram na formulação e
desenvolvimento do Proálcool, com destaque para os Ministérios da Indústria e Comércio
(MIC), das Minas e Energia (MME) e da Agricultura (MA), o Instituto do Açúcar e do Álcool
(IAA) e a Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo
(COPERSUCAR) (MORAES, 1998).
A COPERSUCAR surgiu em 1959 da fusão de duas cooperativas das regiões de Ribeirão Preto
e Piracicaba, e defendia a produção de álcool para a obtenção de segurança energética, e não o
considerando simplesmente como subproduto do açúcar (SCANDIFFIO, 2005, 31).
No período de 1975 a 1979, o principal objetivo foi a produção de álcool como alternativa
energética, adicionando álcool anidro à gasolina, minimizando-se a capacidade ociosa de
destilarias anexas às usinas (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 76)
Tabela 3. Distribuição espacial das usinas de açúcar (U) e destilarias de álcool (D) no Brasil,
segundo macrorregião e principais estados produtores – 1975 a 1985.
Ano São Paulo
Região
Centro-Sul Pernambuco
Região Norte-
Nordeste Brasil
U D U D U D U D U D
1975 79 - 123 - 36 - 86 - 209 -
1976 77 - 121 - 36 - 84 - 205 -
1977 77 69 121 99 36 21 85 29 206 128
1978 76 75 120 112 36 25 86 38 206 150
1979 76 78 120 118 36 25 86 52 206 170
1980 74 82 117 129 35 29 85 66 202 195
1981 73 85 116 134 35 27 86 67 202 201
31
1982 75 92 119 146 35 30 85 80 204 226
1983 73 127 117 220 34 27 83 88 200 308
1984 73 134 116 236 35 31 85 90 201 326
1985 71 142 113 257 35 35 84 100 197 357
Fonte: SHIKIDA (1998, p. 43)
Nos primeiros anos do Proálcool o número de usinas praticamente não se alterou, mas o número
de destilarias aumentou de 1977 a 1979, resultando na superação em 113,2% das metas
estabelecidas pelo programa, de atingir 3 bilhões de litros de álcool em 1979/1980 (SHIKIDA,
1998, p. 44).
No segundo momento, três fatores foram responsáveis pela expansão do Proálcool: aumento da
produção de álcool hidratado, em razão da expansão das destilarias independentes, voltadas
exclusivamente à produção de álcool; medida implementadas pelo Estado incentivando o uso
de veículos movidos a álcool, com a redução de alíquota do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) e da Taxa Rodoviária Única (atual Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores – IPVA); por fim o incentivo à produção de maquinários e equipamentos
relacionados à produção de álcool (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 77)
Esses fatores foram responsáveis pelo aumento de 210% no número de destilarias no Brasil
entre os anos de 1979 e 1985. Entretanto, mesmo com o grande aumento de álcool hidratado,
que passou de 323 milhões de litros em 1975/1976 para mais de 8,6 bilhões de litros em
1985/86, o período até o início de 1990 foi marcado pelo declínio do Proálcool (MORAES,
1999, p. 85). “Apesar do programa continuar existindo, na prática, seus incentivos diminuíram,
ao mesmo tempo, que aumentavam os questionamentos à sua continuidade” (BACCARIN,
2005, p. 66).
A redução dos investimentos públicos para o financiamento do Proálcool causou dificuldades
para se atingir a produção necessária para atender a demanda interna por álcool. Nos anos de
1986/89, 1988/89, 1989/90, 1993, 1994 e 1995 o consumo foi maior do que a produção,
havendo necessidade de importar o produto, acarretando o aumento de se preço em relação a
gasolina (LANZOTTI, 2000, p. 15).
32
Gráfico 1. Produção e consumo total de álcool (anidro e hidratado) no Brasil – 1985 a 1995
Fonte: SHIKIDA (1998)
O retrocesso influenciou diretamente na indústria automotiva. O ano de 1985 marcou o auge da
produção de veículos a álcool, que representavam 96% da venda. Cinco anos mais tarde, em
1990, apenas 11,6% dos veículos vendidos eram movidos a álcool. No início dos anos 90, o
novo governo eleito definiu uma política de racionalização da máquina do Estado e pôs fim aos
subsídios e extinguindo diversas instituições públicas, como o IAA e o Planalsucar (SHIKIDA,
1998).
O IAA foi extinto pela Medida Provisória n. 151, de 15 de março de 1990, e suas atribuições
foram transferidas para a Secretaria de Desenvolvimento Regional. Desse modo, o governo
iniciou uma fase de desregulamentação progressiva do sistema sucroalcooleiro (PEDROSO
JÚNIOR, 2008, p. 79.
2.2.3 Desregulamentação e nova organização do setor: 1990 - 2013
A extinção do IAA introduziu uma nova perspectiva para as ações do Governo, que deixou de
intervir diretamente, como fez durante as seis décadas anteriores, e passou a designar o padrão
de desenvolvimento que desejava para o setor (MORAES, 1999), influenciando diretamente os
recursos destinados ao crédito agrícola, que diminuíram durante a década de 1990, como mostra
o Gráfico 2.
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
1985/86 1986/87 1987/88 1988/89 1989/90 1990/91 1991/92 1992 1993 1994 1995
Mil
hõ
es d
e li
tro
s
Produção Total Consumo Total
33
Gráfico 2. Evolução de recursos destinados ao crédito rural - 1975 a 20124
Fonte: BACEN (2012)
A média de recursos aplicados entre os anos de 1975 e 1989 foi de R$ 114,67 bilhões. No
quadriênio 1990/1993, após o fim do IAA, a média foi de R$ 38,27 bilhões, atingindo um pico
no ano de 1994 de R$ 58,89 bilhões. Durante os anos de 1995/2002 a média anual aplicada no
crédito rural foi de R$ 35,24 bilhões de reais. No período de 2003/2012 a média foi de R$ 79,33
bilhões, representando um aumento de 2,25 vezes em relação ao último período (BACEN,
2012)
Após a desregulamentação do SAG da cana-de-açúcar, houve a tentativa de auto-regulação do
setor, através de acordo firmado entre a União das Indústrias Canavieira de São Paulo (ÚNICA)
e a Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (ORPLANA) (VIAN,
2003). Diversas incertezas surgiram no setor em razão da indefinição dos órgãos
governamentais, que eliminaram os mecanismos de controle existentes e não criaram novas
4 Valores constantes em reais, de acordo com o IGP-DI - Índice médio anual.
0
20.000.000.000
40.000.000.000
60.000.000.000
80.000.000.000
100.000.000.000
120.000.000.000
140.000.000.000
160.000.000.000
180.000.000.000
19
75
19
76
19
77
19
78
19
79
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
20
05
20
06
20
07
20
08
20
09
20
10
20
11
20
12
34
regras ou não estabeleceram controles de planejamentos da produção (PEDROSO JÚNIOR,
2008, p. 81).
As atribuições do IAA passaram inicialmente para a Secretaria de Desenvolvimento Regional
da Presidência da República. Posteriormente foram repassadas para o Conselho Interministerial
do Álcool (CIMA), comandado pelo Ministério da Indústria e Comércio. Entretanto, em 1999
as atribuições foram novamente alteradas, entregues ao Ministério da Agricultura. (VIAN,
2003). Essas trocas somente causaram incertezas no SAG da cana-de-açúcar.
O aumento da produção na década de 1990, mesmo com a diminuição do fomento
governamental, por meio de crédito, ocorreu por uma série de medidas. Uma das primeiras
medidas foi o fim da diretriz que mantinha o controle da produção de açúcar por novas
empresas, favorecendo as destilarias, principalmente as sediadas na região Centro-Sul
(PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 81).
A finalização do processo de desregulamentação do sistema sucroalcooleiro tem início com as
discussões referentes à liberação do preço do álcool carburante em janeiro de 1997 e se prolonga
até fevereiro de 1999, com a sua efetiva liberação (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 82).
Nesse momento, os interesses regionais não convergiam quanto à desregulamentação do setor.
A indústria processadora da região Norte-Nordeste defendia a manutenção das quotas de
produção de açúcar e álcool, pois a demanda regional era maior do que a oferta, o que garantia
a manutenção de preços adequados, desde que não houvesse concorrência em seu mercado com
outra região produtora (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 82). Isto, porque, o rendimento da
produção na região era inferior ao alcançado na região Centro-Sul, dependendo dos subsídios
para manter a produção e competir no mercado (BACCARIN, 2005).
As indústrias de processamento e os fornecedores da região Norte-Nordeste reivindicavam a
manutenção do tabelamento dos preços da cana-de-açúcar; a manutenção dos subsídios
agrícolas provenientes do Governo; e a regulação do Governo sobre a forma de comercialização
da cana-de-açúcar. A região Centro-Sul, ao contrário, defendia o fim das quotas de produção,
pois buscavam a abertura do mercado regional, já que a oferta era maior do que a demanda
35
regional poderia absorver. Todavia, não havia unanimidade sobre a completa
desregulamentação do setor (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 82).
Mesmo dentro da mesma região, os Estados possuíam opiniões diversas. As usinas dos Estados
de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e parte oeste do Estado de São Paulo queriam a
manutenção da regulamentação ou ao menos uma desregulamentação parcial com algumas
restrições, pois não conseguiriam competir com as usinas paulistas mais próximas dos centros
consumidores (MORAES, 1999).
Dentre os fornecedores de cana-de-açúcar do Estado de São Paulo também havia opiniões
divergentes. Os filiados da COPERSUCAR se sentiam prejudicados pelas distorções do sistema
de quotas e desejam a desregulamentação. Já os produtores de áreas mais afastadas do oeste
paulista, vinculados às destilarias produtoras de álcool hidratado, sofreriam uma maior
competição com a liberação dos mercados (MORAES, 1999).
Em razão das dificuldades que surgiam com a liberalização e a necessidade de fortalecer a
representação dos produtores em um novo ambiente institucional resultante da
desregulamentação, foi criada a União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (UNICA),
substituindo a Associação das Indústrias de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (AIAA).
Mesmo dentro da ÚNICA não havia consenso, alguns pregavam a liberação imediata, outros a
sua postergação, ou pelo menos, sua adoção com a manutenção de algumas regras (MORAES,
1999).
Apesar das divergências, a UNICA tendia à liberação dos preços e a desregulamentação
completa do sistema, o que levou diversas usinas à criação da Coligação das Entidades
Produtoras de Açúcar e Álcool (CEPAAL), com objetivo de unir opiniões dos vários estados
que se posicionavam contra a desregulamentação completa do sistema (MORAES, 1999).
A UNICA defendia a medidas governamentais que proporcionassem melhorias aos produtores
de álcool anidro, ao passo que à CEPAAL interessava o incentivo à produção do álcool
hidratado. O interesse da UNICA pautava-se em três motivos: a reserva legal de mercado do
álcool anidro, que garantia sua mistura na gasolina na proporção de 24%; a maior viabilidade
econômica do álcool anidro, pois seu poder energético é equivalente ao da gasolina; e a sintonia
36
do álcool anidro com a demanda mundial por um oxigenante não-poluente para adicionar a
gasolina em substituição ao chumbo, facilitando sua aceitação no mercado mundial pelos
demais agentes (MORAES, 1999).
Entretanto, a proposta defendida pela UNICA causaria a redução na produção total de álcool e
no número de unidades produtivas, pois muitas usinas construídas no período do Proálcool
produziam apenas álcool hidratado, daí a vinculação de diversas usinas à CEPAAL (MORAES,
1999). A CEPAAL, por sua vez, defendia a produção de álcool anidro apenas como regulador
de estoque, no caso de falta reduzir-se-ia sua proporção na gasolina e no caso de excesso de
produção aumentaria sua adição na gasolina (BACCARIN, 2005).
Em relação ao poder de decisão, foi criado em 1997 o Conselho Interministerial do Açúcar e
Álcool (CIMA), com o objetivo de articular os interesses de todos os ministérios envolvidos
com o sistema sucroalcooleiro em direção a um consenso sobre a desregulamentação. O CIMA
envolvia os Ministérios da Agricultura, da Fazenda, de Minas e Energia, Ciência e Tecnologia,
do Orçamento, do Transporte, do Desenvolvimento, Meio-Ambiente e das Relações Exteriores,
além da Casa Civil (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 86).
O CIMA era comporto pelo: Comitê Executivo, formado pelos dez ministros mais os secretários
executivos de cada ministério; Conselho Consultivo, formado por seis representantes dos
produtores de açúcar e álcool das duas regiões produtores (de diferentes Estados), por quatro
representantes dos fornecedores de cana, por quatro parlamentares da Câmara dos Deputados
de diversos partidos e regiões e por dois Senadores da República (Rio Grande do Norte e Mato
Grosso); Câmara Técnica, criada em 1999, com especialistas do setor sucroalcooleiro,
indicados por produtores de açúcar e álcool, por plantadores de cana, por entidade de classe dos
trabalhadores, com objetivo de dar suporte às medidas apresentadas ao CIMA (PEDROSO
JÚNIOR, 2008, p. 87).
O processo de decisão no CIMA cumpria as seguintes etapas: debate das questões na Câmara
Técnica, que, após analisá-las e discuti-las, as envia ao Comitê executivo, que analisava o
problema e discutia com o Comitê Consultivo, que levava uma posição ao CIMA, responsável
pela decisão final (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 87).
37
Desta forma, o novo ambiente institucional resultante do processo de desregulamentação na
década de 1990 proporcionou inserção de organizações e agentes que não participaram na
formulação e implantação do Proálcool nas décadas de 1970 e 1980 (PEDROSO JÚNIOR,
2008, p. 88). Os trabalhadores ligados diretamente ao setor sucroalcooleiro também passam a
atuar como agentes (MORAES, 1999).
Novos atores surgem no novo ambiente institucional, além dos já existentes: Agência Nacional
do Petróleo (ANP), como agente executor das políticas públicas referentes ao setor, além de ser
responsável pela manutenção dos estoques estratégicos do governo e pela fiscalização do setor
de combustíveis; montadoras, no desenvolvimento de veículos flex-fuel; consumidores,
exercendo seu papel de escolha sobre qual combustível deseja consumir (gasolina com álcool
anidro ou álcool hidratado); Ministério da Agricultura da Pecuária e do Abastecimento
(MAPA), atuando na formulação da política sucroalcooleira e em sua execução (PEDROSO
JÚNIOR, 2008, p. 88).
2.2.4 Organização industrial
A produção da cana-de-açúcar localiza-se preponderantemente em duas regiões: Centro-Sul e
Norte-Nordeste, mas o processo de desregulamentação concentrou a produção na primeira
região, ao contrário do período em que vigoravam as quotas de produção, quando o Estado de
Pernambuco destacava-se como o principal produtor de cana-de-açúcar do país (Tabela 1).
Atualmente a região Centro-Sul apresenta duas grandes vantagens: a produtividade decorrente
das características edafoclimáticas e tecnologia adotada; e localização mais próxima dos
maiores centros consumidores do País. (VIAN, 2003).
Tabela 4. Produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool – Safra 2012/13
Estados/Região Cana-de-açúcar
(mil toneladas)
Açúcar
(mil toneladas)
Álcool
(mil M³)
São Paulo 329.923 23.289 11.830
Goiás 52.727 1.875 3.148
Minas Gerais 51.759 3.418 1.571
Paraná 39.726 3.086 1.299
Mato Grosso do Sul 37.330 1.742 1.917
38
Alagoas 23.460 2.228 543
Mato Grosso 16.319 492 974
Pernambuco 13.574 1.221 274
Outros estados 23.660 896 1.670
Região Centro-Sul 532.758 34.097 21.362
Região Norte-Nordeste 55.720 4.149 1.865
Brasil 588.478 38.246 23.226
Fonte: UNICA (2013)
A Tabela 4 e os Gráficos 3 e 4 comprovam a grande disparidade existente entre as duas regiões.
A Região Centro-Sul é responsável pela produção de 90,53% da cana-de-açúcar no Brasil, além
de 89,15% do açúcar e 91,96% do álcool produzidos. Por sua vez, a Região Norte-Nordeste
produz 9,47% da cana-de-açúcar, 10,85% do açúcar e 8,04% do álcool. O Gráfico 3 mostra a
evolução da produção de cana-de-açúcar por região.
Gráfico 3. Produção de cana-de-açúcar por região – Safras 1980/81 a 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
Centro-Sul Norte-Nordeste
39
Gráfico 4. Produção de açúcar e álcool por região: Safra 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
Os cinco maiores produtores de cana-de-açúcar se encontram na Região Centro-Sul: São Paulo,
que produz mais da metade da cana-de-açúcar do País, Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato
Grosso do Sul. Os maiores produtores da Região Norte-Nordeste são os estados de Alagoas,
sexto maior produtor, e Pernambuco, que na década de 1940 era o maior estado produtor, hoje
ocupa a oitava colocação, atrás do estado de Mato Grosso. Os Gráficos 5, 6 e 7, representam a
produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool por estado no Brasil.
Gráfico 5. Produção de cana-de-açúcar por estado: Safra 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
São Paulo56%
Goiás 9%
Minas Gerais9%
Paraná7%
Mato Grosso do Sul6%
Alagoas4%
Mato Grosso 3%
Pernambuco2%
Outros Estados4%
92%
8%
álcool
Região Centro-Sul Região Norte-Nordeste
89%
11%
açúcar
Região Centro-Sul Região Norte-Nordeste
40
Gráfico 6. Produção de açúcar por estado: Safra 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
Gráfico 7. Produção de álcool por estado: Safra 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
As empresas processadoras de cana-de-açúcar podem ser classificadas em três tipos: usinas de
açúcar se destilaria anexa; usinas de açúcar com destilarias anexas; e destilarias autônomas.
São Paulo61%
Goiás 5%
Minas Gerais9%
Paraná8%
Mato Grosso do Sul
5%
Alagoas6%
Mato Grosso 1%
Pernambuco3%
Outros Estados2%
São Paulo51%
Goiás 14%
Minas Gerais7%
Paraná6%
Mato Grosso do Sul8%
Alagoas2%
Mato Grosso 4%
Pernambuco1%
Outros Estados7%
41
Tabela 5. Distribuição por Estado das unidades de processamento de cana-de-açúcar
Estados/Região
Usina de açúcar
sem destilaria
anexa
Usina de açúcar com
destilarias anexas
Destilarias
autônomas
Total de unidade
de processamento
n. % n. % n. % n. %
São Paulo 3 23,1 127 50,6 50 42,0 180 47,0
Minas Gerais 1 7,7 20 8,0 12 10,1 33 8,6
Paraná 0 0 22 8,8 11 9,2 33 8,6
Alagoas 4 30,8 18 7,2 3 2,5 25 6,5
Pernambuco 4 30,8 17 6,8 3 2,5 24 6,3
Goiás 0 0 12 4,8 10 8,4 22 5,7
Mato Grosso do Sul 0 0 7 2,8 4 3,4 11 2,9
Mato Grosso 0 0 5 2,0 6 5,0 11 2,9
Paraíba 1 7,7 2 0,8 6 5,0 9 2,3
Rio de Janeiro 0 0 6 2,4 1 0,8 7 1,8
Espírito Santo 0 0 2 0,8 4 3,4 6 1,6
Maranhão 0 0 1 0,4 3 2,5 4 1,0
Rio Grande do Norte 0 0 2 0,8 2 1,7 4 1,0
Sergipe 0 0 3 1,2 1 0,8 4 1,0
Bahia 0 0 2 0,8 1 0,8 3 0,8
Ceará 0 0 1 0,4 1 0,8 2 0,5
Amazonas 0 0 1 0,4 0 0 1 0,3
Pará 0 0 1 0,4 0 0 1 0,3
Piauí 0 0 1 0,4 0 0 1 0,3
Rondônia 0 0 1 0,4 0 0 1 0,3
Rio Grande do Sul 0 0 0 0 1 0,8 1 0,3
Total 13 100 251 100 119 100 383 100
Fonte: MAPA (2008) apud PEDROSO JÚNIOR (2008, p.93)
Observa-se que os três maiores estados em unidades de processamento de cana-de-açúcar são
da região Centro-Sul: São Paul (180), Minas Gerais e Paraná (33). No total por região, a Centro-
Sul apresenta 304 unidades (79,37%), enquanto a Norte-Nordeste apresenta apenas 79 unidades
(20,63%).
Importante também notar o reduzido número de usinas de açúcar sem destilaria anexa,
representando apenas 3,3% das unidades de processamento instaladas no País. Este cenário era
semelhante ao do período do Proálcool, quando muitas usinas instalaram torres de destilação
42
para produzir principalmente álcool hidratado. Durante a década de 1990 o processo se inverteu
em razão da desregulamentação e da contínua redução da demanda por álcool hidratado. Muitas
usinas deixaram de produzir álcool hidratado e passaram a produzir apenas açúcar. No século
XXI houve nova mudança em razão do aumento da demanda por álcool hidratado após o
surgimento do carro “flex-fluel” em 2003 (PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 94).
Gráfico 8. Produção nacional de cana-de-açúcar: 1980/81 a 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
Analisando o Gráfico 8, nota-se que o grande aumento da produção de cana-de-açúcar em
meados da década de 1980 deve-se ao aumento das vendas de veículos movidos a álcool, que
causou um aumento na demanda por álcool combustível. No período entre 1985 e 1993, a
produção de cana-de-açúcar se mante estável, em razão de certa estabilidade na venda de
veículos a álcool, mas também por uma ligeira queda na produção de açúcar, em razão do baixo
preço no mercado internacional.
A partir de 1995 a produção de cana-de-açúcar volta a crescer, puxada pelo aumento da
produção do açúcar, que respondia ao aumento do preço no mercado internacional, mais de
duas vezes maior que o período anterior. As oscilações de produção são respostas à queda do
preço do açúcar e a diminuição do valor do petróleo.
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
43
Gráfico 9. Produção nacional de açúcar e álcool: 1980/81 a 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
Ressalta-se que as grandezas do Gráfico 9 não são as mesmas, pois a produção de álcool
encontra-se em metros cúbicos e a de açúcar em toneladas, entretanto, o objetivo não é comparar
diretamente as produções, mas sim sobrepor os gráficos para avaliar as variações durante os
anos. Durante o período do Proálcool, nota-se um grande crescimento da produção de álcool,
principalmente em razão do aumento do consumo proporcionado pelo aumento de venda de
carros a álcool. Nota-se que o açúcar mantém uma estabilidade em sua produção. Durante a
década de 1990, a produção de álcool se mantém estável, resultado da estabilização da produção
(Gráfico 9), e da diminuição da demanda, em razão da abrupta queda no comércio de carros
movidos a álcool. Neste período, nota-se um grande crescimento da produção do açúcar.
A produção de álcool só volta a crescer em 2003, como o desenvolvimento de veículos flex-fuel
e a crescente demanda pelo combustível. No mesmo período a produção de açúcar disparou,
respondendo ao aumento dos preços no mercado internacional. Destaca-se que o aumento da
produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool coincidem com o aumento da de recursos
destinados ao crédito rural, a partir do ano 2000.
Álcool Áçucar
44
Gráfico 10. Recursos destinados a crédito rural x produção de cana-de-açúcar: 1980 a 20135
Fonte: BACEN (2013); UNICA (2013)
Tabela 6. Produção de álcool no Brasil e vendas de carros a álcool, flex-fuel e a gasolina no
mercado nacional6
Ano-
Safra
Álcool (mil M³) Veículos
Hidratado Anidro Total Álcool Flex-fuel Gasolina
1980/81 1.601 2.105 3.706 240.638 626.467
1981/82 2.787 1.453 4.240 136.241 344.467
1982/83 2.274 3.549 5.823 232.575 365.434
1983/84 5.395 2.469 7.864 579.328 78.618
1984/85 7.089 2.103 9.192 565.536 33.482
1985/86 8.633 3.196 11.829 645.551 28.655
1986/87 8.342 2.163 10.505 697.049 61.916
1987/88 9.476 1.982 11.458 458.683 31.190
1988/89 9.928 1.716 11.644 566.482 77.312
1989/90 10.468 1.453 11.921 399.529 260.821
1990/91 10.229 1.287 11.516 81.996 542.855
1991/92 10.735 1.987 12.722 150.982 546.258
1992/93 9.513 2.216 11.729 195.503 498.927
1993/94 8.770 2.523 11.293 264.235 796.598
5 A concessão de crédito rural se refere ao ano civil, e não ao ano-safra. 6 As vendas de carros se referem ao ano civil, e não ao ano-safra.
Crédito Rural Produção de cana-de-açúcar
45
1994/95 9.876 2.876 12.752 141.834 1.127.485
1995/96 9.602 3.009 12.611 40.706 1.557.974
1996/97 9.779 4.616 14.395 7.647 1.621.968
1997/98 9.732 5.683 15.415 1.120 1.801.688
1998/99 8.209 5.667 13.876 1.224 1.388.734
1999/00 6.871 6.112 12.983 10.947 1.122.229
2000/01 4.971 5.621 10.592 10.292 1.310.479
2001/02 5.071 6.465 11.536 18.335 1.412.420
2002/03 5.608 7.015 12.623 55.961 1.283.963
2003/04 5.861 8.896 14.757 36.380 48.178 1.152.463
2004/05 7.113 8.276 15.389 50.950 328.379 1.077.945
2005/06 7.754 8.067 15.821 32.357 812.104 697.004
2006/07 9.814 8.030 17.844 1.863 1.430.334 316.561
2007/08 14.333 8.193 22.526 107 2.003.090 245.660
2008/09 18.190 9.336 27.526 84 2.329.247 217.021
2009/10 18.626 7.065 25.691 70 2.652.298 221.709
2010/11 19.053 8.323 27.376 50 2.876.173 280.704
2011/12 14.101 8.581 22.682 51 2.848.071 376.998
2012/13 13.382 9.844 23.226 52 3.162.874 273.913
Fonte: UNICA (2013); ANFAVEA (2008)
Gráfico 11. Produção de álcool: 1980/81 a 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
46
Gráfico 12. Venda de automóveis por tipo de combustível: 1980 a 2013
Fonte: UNICA (2013); ANFAVEA (2008)
Pode-se observar nos Gráficos 11 e 12 que o grande aumento da produção de álcool ocorrido a
partir do ano de 2004 coincide com o início da produção dos veículos flex-fuel em 2003. No
ano de 2013, pela primeira vez na história do Brasil, a frota em circulação de veículos flex-fuel
superou a frota movida exclusivamente a gasolina. De acordo com o Sindipeças, 47% dos
veículos em circulação no País podem ser abastecidos com os dois combustíveis, contra 41%
de veículos movidos exclusivamente a gasolina (UDOP, 2013) Completam a lista 9% movidos
a diesel e apenas 3% movidos exclusivamente a álcool. O aumento da demanda por álcool
incentivou a construção de novas destilarias a partir de 2003, conforme a Tabela 6.
Tabela 7. Tipo de unidade agroindustrial do SAG da cana-de-açúcar
Tipo de unidade Safra 1990/91 Safra 2001/02 Safra 2008/09
n. % n. % n. %
Usina 30 8% 18 6% 13 3%
Usina com destilarias
anexas 168 43% 187 61% 251 66%
Destilaria autônoma 196 50% 101 33% 119 31%
Total 394 100% 306 100% 383 100%
Fonte: BACCARIN (2005) apud. PEDROSO JÚNIOR (2008, p. 95)
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2.500.000
3.000.000
3.500.000
Álcool Flex-fuel Gasolina
47
Verifica-se uma redução de 88 unidades de processamento entre os anos de 1990/91 e 2001/02,
sendo que as destilarias autônomas reduziram 95 unidades no mesmo período, o equivalente a
51,58%. A responsabilidade pela queda foi da diminuição do consumo de álcool combustível,
como se verá no Gráfico 13, em razão da diminuição de venda de carros a álcool, conforme
apresentado na tabela 5. Por sua vez, comparando o próximo intervalo de tempo, o número total
de unidade de processamento aumentou em 77, puxado pelo significativo aumento das
destilarias anexas, 64, o que representa 83,11% do aumento das unidades processadoras. Esse
segundo período é marcado pelo início de produção dos veículos flex-fuel em 2003.
Gráfico 13. Consumo de combustíveis líquidos: 1970/71 a 2012/13
Fonte: BRASIL (2013)
Apresentado o panorama sobre a atual organização do setor, passaremos ao estudo da estrutura
do SAG da cana de açúcar e dos arranjos institucionais utilizados na transação produtor-
processador.
2.2.5 Arranjos institucionais na transação produtor-processador
A transação de venda entre produtores e usinas ocorre por meio de contratos, sendo este um dos
pontos mais importantes e conflituosos do setor sucroenergético, onde notadamente as partes
não se comportam como parceiras, buscando relacionamentos estáveis e de longo prazo, com
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
Gasolina Álcool
48
divisão de riscos e margens. O que se observa, na maioria dos casos, é uma visão de curtíssimo
prazo, visando a resultado imediato (NEVES; WACK; MARINO, 1998, p. 10).
A cana-de-açúcar apresenta elevada especificidade locacional, uma vez que não será atrativa
para o processamento se estiver a mais de 50 quilômetros da usina, em razão dos altos custos
de transporte. Possui também especificidade temporal, pois precisa ser transportada
rapidamente para a usina após a colheita para não perder qualidade. Além disso, a usina possui
grande especificidade física para o esmagamento da cana, sendo impossível sua realocação para
outra atividade (NEVES; WACK; MARINO, 1998, p.11).
Em razão da especificidade, diversas formas são utilizadas na transação, exceto a venda no
mercado spot, ou seja, produtor procurando usinas interessadas em adquirir cana após a
queimada (NEVES; WACK; MARINO, 1998, p.11). Neves, Waack e Marino (1988, p.11)
identificaram três modelos organizacionais no fornecimento de cana-de-açúcar, diferenciando-
os pelo tipo contratual empregado: integração vertical, arrendamento e fornecimento.
Na integração vertical há apenas um comando decisório. A usina controla todo o sistema
produtivo, desde a posse da terra até a colheita e o transporte. No arrendamento, a usina continua
com o controle, mas não é proprietária do ativo, a terra. A usina arrenda a terra do proprietário
e continua responsável pelo plantio, colheita e transporte. Por fim o fornecimento, que se
caracteriza como quase-integração ou integração contratual, onde produtores especializados e
independentes plantam a cana-de-açúcar e a fornece à usina. Neste último modelo, ocorre uma
ligação contratual entre os agentes, pelo qual a usina pode se responsabilizar pela colheita e
pelo transporte.
Por sua vez, os estudos de Pedroso Júnior (2008) constataram seis arranjos institucionais na
transação da cana-de-açúcar em usinas da região Centro-Sul do Brasil. Quanto à origem da
matéria-prima, pode-se classificar em cana-de-açúcar própria e cana-de-açúcar de fornecedores.
Na primeira modalidade, encontram-se a parceria agrícola, o arrendamento e a produção em
área própria da usina; na segunda, a negociação à vista, o fornecimento sem CCT e o
fornecimento com CCT.
49
Tabela 8. Arranjos institucionais na transação da cana-de-açúcar
Cana-de-açúcar própria Cana-de-açúcar de terceiros
Produção em área própria Negociação à vista
Parceria Agrícola Fornecimento
Arrendamento Fornecimento com CCT
Fonte: PEDROSO JÚNIOR (2008, p. 99)
Essa tipologia serve para demarcar as diferentes intensidades da integração entre os agentes da
transação - produtor e usina - sendo que a modalidade “à vista” representa a estrutura de
governança com menos ou nenhuma integração, e a “produção em área própria” a integração
vertical completa (TRENTINI; SAES, 2010, p. 35). A integração vertical se verifica quando
uma única firma concentra todos os processos de produção, desde o insumo até a venda final
ao consumidor. Como consequência, ocorre a eliminação das trocas contratuais.
A produção em área própria é decorrente da verticalização. Neste arranjo a usina é proprietária
da terra e desenvolve todo o processo produtivo, desde o preparo da terra e plantio até a colheita,
internalizando completamente a produção de seu principal insumo.
A usina assume todos os custos, riscos financeiros e ambientais, valor imobilizado na terra,
equipamentos e mão-de-obra, mas por outro lado possui algumas importantes vantagens:
assegurar a oferta e gerenciar adequadamente a produção à indústria, reduzindo problemas de
estocagens e sazonalidade de entregas; possibilidade de economias em operações
agrícolas/industriais combinadas; controle interno do fluxo de informações entre a área agrícola
e industrial; fluxo tecnológico entre as fases industriais e agrícolas; facilitar as decisões que
exijam rápida adaptação; fuga dos riscos do mercado de cana-de-açúcar; redução das incertezas,
atenuando atitudes oportunistas; maior poder de negociação no restante necessário; aumento
das barreiras de entrada de novas empresas; e estar num negócio de boa rentabilidade (NEVES;
WACK; MARINO, 1998, p. 17).
A verticalização possui algumas desvantagens, entretanto, quais sejam: elevados investimentos
necessários (imobilização); diferentes requerimentos administrativos nas etapas de produção e
industrialização; perdas das vantagens advindas da especialização; problemas de
monitoramento e incentivos à produtividade do corpo de funcionários; inserção de custos
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burocráticos e dificuldade no controle; aumento na alavancagem operacional; redução na
flexibilidade das atividades; redução na flexibilidade de troca de parceiros; e altas barreiras à
saída do negócio (NEVES; WACK; MARINO, 1998, p. 17).
A parceria rural é um contrato agrário típico, prevista no Estatuto da Terra (BRASIL, 1964) e
em seu Regulamento (BRASIL, 1966), que dá origem a uma sociedade entre proprietário da
terra e empresa processadora, garantindo a parceria na produção de cana-de-açúcar. O
proprietário é denominado “Parceiro-Proprietário” e a empresa processadora “Parceira
Agrícola”. O prazo do contrato é de cinco anos-safra, com possibilidade de prorrogação por
mais um ano no caso de viabilidade de um novo corte. O pagamento ocorre por porcentagem
da produção. A cana-de-açúcar é precificada pela verificação do ATR e seu valor estipulado
pelo CONSECANA. Entretanto, é comum haver a estipulação da quantidade de ATR por
tonelada de cana-de-açúcar entregue no momento da celebração do contrato de parceria. O
pagamento é parcelado e é comum a previsão de multas para o descumprimento de cláusulas
(PEDROSO JÚNIOR, 2008, p. 100).
O arrendamento também é contrário agrário típico previsto no Estatuto da Terra (BRASIL,
1964) e em seu Regulamento (BRASIL, 1966). Assemelha-se a um contrato de aluguel, pois o
arrendatário paga um valor fixo pelo uso da propriedade, determinado pelo tamanho da área e
qualidade da terra. O prazo também é cinco anos-safra, com possibilidade de prorrogação por
mais um ano no caso de viabilidade de um novo corte. Também pode haver estipulação de
penalidade por descumprimento de cláusulas contratuais.
O produtor fica praticamente isento de riscos, mas em contrapartida tem uma rentabilidade
menor. Os riscos são os de não receber o valor combinado e a degradação da terra pelo mau
uso. Sua única obrigação é entregar a terra como combinado. A usina, por sua vez, deve manter
a terra no mesmo padrão de fertilidade, explorar a cultura de acordo com normas estabelecidas
em contrato, pagar em dia e por último devolver a terra nos padrões estabelecidos. A usina
possui total controle sobre a matéria-prima, sem ter que investir em imobilização de capital
através de terra (NEVES; WACK; MARINO, 1998, p. 15).
Quanto à cana-de-açúcar proveniente de terceiros, a compra e venda à vista não se difere da
compra e venda tradicional: a empresa processadora paga o valor à vista, e o proprietário da
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cana-de-açúcar se obriga a entregá-la em tempo e forma convencionados. A estipulação do
valor segue a regra do CONSECANA, pela quantidade de ATR presente na cana-de-açúcar
entregue.
Por fim, o contrato de fornecimento é o segundo modelo contratual mais utilizado pelas usinas
no sistema agroindustrial da cana-de-açúcar, atrás apenas do contrato de parceria, e integra os
chamados contratos atípicos em razão da falta de previsão legal. Os dados foram obtidos pela
realização de pesquisa empírica, com as usinas associadas à ÚNICA, através de aplicação de
questionário, com objetivo inicial de verificar os tipos contratuais existentes nas relações entre
produtores de cana-de-açúcar e as usinas produtoras de etanol (TRENTINI, 2013).
Essa modalidade contratual se divide em fornecimento e “fornecimento com CCT”. Ambos
possuem as mesmas características, exceto quando a obrigação da empresa processadora em
realizar as atividades de corte, carregamento e transporte da cana-de-açúcar no segundo. O
gasto com essa atividade costuma ser abatido do montante devido ao fornecedor. O contrato de
fornecimento garante a entrega de determinada quantidade de cana-de-açúcar pelo fornecedor
para a usina, que se obriga a pagar pela quantidade entregue. O prazo convencionalmente
estipulado é de cinco anos-safra, com possibilidade de prorrogação por mais um ano no caso de
viabilidade de um novo corte. O preço será o apurado ao final do ano-safra pela metodologia
do CONSECANA, ou seja, com base na quantidade de ATR. Pode haver estipulação de
penalidade por descumprimento de cláusulas contratuais.
A modalidade contratual utilizada na transação entre produtor-processador será determinante
para se verificar quem realizará a atividade de corte, carregamento e transporte: usina ou
produtor rural, conforme será estudado a seguir.
2.2.6 Atividade de corte, carregamento e transporte
Como analisado, seis arranjos institucionais são encontrados na transação da cana-de-açúcar
em usinas da região Centro-Sul do Brasil. Quanto à origem da matéria-prima, pode-se
classificar em cana-de-açúcar própria e cana-de-açúcar de fornecedores. Na primeira
modalidade, encontram-se a parceria agrícola, o arrendamento e a produção em área própria da
usina; na segunda, a negociação à vista, o fornecimento sem CCT e o fornecimento com CCT.
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A modalidade contratual utilizada determina diretamente a responsabilidade da usina em
desenvolver as atividades de corte, carregamento e transporte (CCT). Nas modalidades
classificadas como cana própria, em regra, a usina responsabiliza-se pelas atividades de CCT.
Já nas modalidades classificadas como cana-de-açúcar de fornecedores, dependerá do contrato
celebrado.
No contrato de fornecimento, a responsabilidade pela atividade de CCT é do produtor rural.
Dessa maneira, o produtor rural é responsável pelo plantio, tratos culturais, colheita (corte e
carregamento) e transporte da cana-de-açúcar até a usina. Em razão dos elevados custos para a
mecanização da colheita de cana-de-açúcar, essa modalidade contratual é utilizada por grandes
produtores ou por cooperativas de produtores. A vantagem desse modelo contratual é que não
serão descontados os custos da atividade de CCT realizada pela usina, o que aumenta a receita
do produtor.
Por outro lado, encontra-se o contrato de fornecimento com CCT, em que o produtor rural se
responsabiliza pelo plantio e pelos tratos culturais, enquanto a usina é responsável pela
atividade de CCT. Dessa forma, a usina descontará o custo das atividades de CCT do valor
devido ao produtor pela cana-de-açúcar entregue.
Na realização da atividade de CCT, a usina tem duas opções: internalizar ou terceirizar. A
escolha dependerá dos custos necessários para a usina realizar a atividade. Em razão de ganhos
de escala e da necessidade de eficiência, pode ser mais vantajoso para a usina terceirizar o
serviço de CCT. Entretanto, algumas decisões da Justiça do Trabalho entendem que a atividade
de corte, carregamento e transporte não pode ser terceirizada, por configurar atividade-fim da
usina. Dessa maneira, no capítulo 3 desse trabalho será realizado um estudo teórico sobre a
terceirização, enquanto no capítulo 4 será estudada, especificamente, a terceirização do corte,
carregamento e transporte no setor sucroenergético.
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3 TERCEIRIZAÇÃO
A terceirização é uma realidade mundial em diversos setores da economia, dentre eles o
sucroenergético. A empresa optará por essa prática após estudar os custos para produzir
internamente o bem ou serviço e os custos para contratá-los no mercado. No Brasil, o
regulamento da terceirização ocorre pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que
permite a terceirização, dentre outras hipóteses, das atividades especializadas que não se
configurem atividade-fim da empresa.
Entretanto, ainda não se pacificou o conceito de atividade-fim, nem pelos tribunais nem pela
doutrina. Dessa forma, busca-se nesse capítulo o estudo teórico da terceirização, discorrendo
sobre o seu conceito, evolução histórica, critérios de licitude e ilicitude, responsabilidade da
tomadora de serviços, vantagens e desvantagens e instrumentos jurídicos viabilizadores da
terceirização.
3.1 CONCEITO
O vocábulo terceirização é utilizado para designar uma moderna técnica de administração de
empresas que visa ao fomento da competitividade empresarial através da distribuição de
atividades acessórias a empresas especializadas nessas atividades, a fim de que possam
concentrar-se no planejamento, na organização, no controle, na coordenação e na direção da
atividade principal (CASTRO, 2000, p. 79).
Diversas são as terminologias adotadas para denominar a contratação de terceiro pela empresa
para a prestação de serviços ligados a sua atividade-meio: terceirização, subcontratação,
terciarização, filialização, reconcentração, desverticalização, exteriorização do emprego,
focalização, parceria (MARTINS, 2010, p. 190); colocação de mão de obra, intermediação de
mão de obra, contratação de serviço ou contratação de trabalhador por interposta pessoa
(CASSAR, 2013, p. 479).
A denominação terceirização decorre da palavra latina tertius (MARTINS, 2010, p. 190), o
terceiro em uma disputa que inicialmente era travada entre dois (HOUAISS, 2013). O sentido
terceiro não é utilizado em sua acepção jurídica, como aquele que é estranho a certa relação
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jurídica entre duas ou mais partes, mas no sentido da administração de empresas, com o intuito
de realçar a descentralização empresarial de atividades para outrem, um terceiro à empresa
(DELGADO, 2009, p. 407).
A terceirização pode ser entendida como a transferência de certas atividades periféricas do
tomador de serviços, passando a ser exercidas por empresas distintas e especializadas
(GARCIA, 2013, p. 349). Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do
tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam
fixados com uma entidade interveniente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face
da contratação de força de trabalho no mercado capitalista (DELGADO, 2009, p. 407)
A relação trilateral é formada entre trabalhador, intermediador de mão de obra e o tomador de
serviços, caracterizada pela não coincidência do empregador real com o formal (CASSAR,
2013, p. 480). A relação é triangular pois o empregado da empresa prestadora presta serviços
ao tomador. A relação de emprego, o contrato de trabalho, existe entre o empregado e a empresa
prestadora de serviços (empregador). O vínculo entre tomador e a empresa prestadora decorre
de contrato de natureza civil ou comercial, cujo objetivo é a prestação do serviço empresarial
(GARCIA, 2013, p. 349).
O modelo trilateral de relação socioeconômica e jurídica que surge com o processo terceirizante
é distinto do modelo empregatício, que se funda em relação de caráter essencialmente bilateral
(DELGADO, 2009, p. 407), ou seja, tem como sujeitos apenas o empregado e o empregador,
que também é o tomador do serviço prestado. (GARCIA, 2013, p. 350).
A terceirização é um fenômeno verificado com grande frequência nos dias atuais, como forma
de diminuição de custos, prestação e serviços com maior eficiência, produtividade e
competitividade, que são objetivos intensamente buscados em tempos de globalização
(GARCIA, 2013, p. 350).
O objetivo principal da terceirização não é apenas a redução de custos, mas também trazer
maior agilidade, flexibilidade e competitividade à empresa. Esta pretende com a terceirização
a transformação de seus custos fixos em variáveis, possibilitando o melhor aproveitamento do
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processo produtivo, com a transferência de numerário para a aplicação em tecnologia ou no seu
desenvolvimento, e também em novos produtos (MARTINS, 1997, p. 22).
Num mundo que tende para a especialização em todas as áreas, gera a terceirização novos
empregos e novas empresas, desverticalizando-as, para que possam exercer apenas a atividade
em que se aprimoraram, delegando a terceiros a execução dos serviços em que não se
especializaram. (MARTINS, 1997, p. 15).
Entretanto, há quem entenda que essa dissociação entre relação econômica de trabalho (firmada
com a empresa tomadora) e relação jurídica empregatícia (firmada com a empresa terceirizante)
traz graves desajustes em contraponto aos clássicos objetivos tutelares e redistributivos que
sempre caracterizaram o Direito do Trabalho ao longo de sua história (DELGADO, 2009)
Por se chocar com a estrutura teórica e normativa original do Direito do Trabalho, esse novo
modelo sofre restrições da doutrina e jurisprudência justrabalhista, que nele tendem a enxergar
uma modalidade excetiva de contratação de força do trabalho (DELGADO, 2009). Dessa
forma, o sistema jurídico estabelece limites à terceirização. No âmbito trabalhistas, as restrições
são impostas visando a tutelar as garantias inerentes à relação de emprego, de forma a preservar
o valor constitucional do trabalho (arts 1º, IV, e170, caput, da CF), em respeito ao princípio
magno da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III) (GARCIA, 2013, p. 350).
No Brasil, ainda não se encontra norma geral que regulamente a terceirização. Como será
analisado a seguir, coube, quase que exclusivamente, ao Poder Judiciário determinar os limites
e os parâmetros da terceirização. Observam-se, apenas, algumas normas, que tratam sobre
temas específicos, insuficientes para regulamentar essa prática.
3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A evolução normativa e jurisprudencial da terceirização apresenta-se como consequência da
evolução histórica dos modelos de produção, que transformaram a terceirização em uma prática
cada vez mais utilizada. Esse fenômeno surge com a eclosão do modelo de produção toyotista
em meados do século XX.
56
O toyotismo substituiu o modelo de produção fordista, pautado pela organização horizontal da
empresa, que se responsabilizava por todas as fases do processo de produção. A especialização
do trabalhador ocorria nas linhas de montagem automatizadas, retratadas por Charles Chaplin
no filme “Tempos Modernos. Nesse sistema, cada operário realizava uma simples operação,
pequena parte do sistema produtivo. Henry Ford implantou esse sistema no ano de 1914, e teve
seu ápice no pós-guerra, entre os anos de 1945 e 1968. A Ford, empresa automobilística de sua
propriedade, verticalizava toda a sua produção, incluindo plantação de seringueiras, fábricas de
vidros e siderúrgica.
Com o declínio do “Estado de Bem-Estar Social” e a consolidação dos ideais neoliberais, há o
fortalecimento do modelo de produção toyotista. “O modelo toyotista de produção impõe às
empresas uma concentração maior na sua atividade-fim e torna a estrutura mais enxuta, com a
desconcentração dos serviços não essenciais” (CARELLI, 2001, p. 6). As empresas se
horizontalizaram, concentrando seus esforços em suas atividades-fim e formando uma rede
integrada de empresas em sua órbita, responsáveis pelas atividades acessórias.
A contratação de mão-de-obra para o desempenho da atividade meio do empreendimento ocorre
pela terceirização (MIRAGLIA, 2008, p. 67), que acarreta na descentralização das atividades
realizadas pela empresa. O fenômeno da terceirização tem se tornado mais frequente na medida
em que as empresas crescem e na mesma proporção que crescem as suas complexidades
(CARDOSO, 2002, p. 125).
No Brasil, a noção da terceirização foi trazida por multinacionais na década de cinquenta, pelo
interesse que tinham em se preocupar apenas com a essência do seu negócio. (MARTINS, 1997,
p.15). A indústria automobilística é exemplo de terceirização, ao contratar a prestação de
serviços de terceiros para a produção de componentes do automóvel, reunindo peças fabricadas
por aqueles e procedendo à montagem final do veículo. (MARTINS, 1997, p. 16)
Durante as décadas de 60 e 70 esse movimento foi intensificado, quando o legislador se
preocupou em regular o tema. Quatro Decretos-lei foram editados no final das décadas de 1960:
Decretos-lei n. 1.212 e n. 1.216 de 1966, que regulavam os serviços bancários prestados por
empresas interpostas; Decreto-lei 756/1968, que regulava o funcionamento das agências de
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colocação ou intermediação de mão-de-obra; e Decreto-lei 1.034/1969, que obrigava a adoção
de medidas de segurança para o funcionamento de instituições bancárias.
Todas as legislações tratavam exclusivamente de um setor, o bancário. Os demais setores
apoiavam-se no princípio de Direito Civil, que permite ao particular realizar tudo aquilo que a
lei não proíbe (MIRAGLIA, 2008, p. 143).
Na Administração Pública, a terceirização foi regulada inicialmente pelo Decreto-lei n.
200/1967, que permitia a descentralização das atividades meramente executivas. Por sua vez, a
Lei n. 5.645/1970 enumerou as atividades que poderiam ser executadas por empresas
interpostas, conforme parágrafo único do artigo 3º:
As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação
de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de
execução indireta, mediante contrato, de acordo com o artigo 10, § 7º, do
Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967. (Revogado pela Lei n.
9.527/1997)
No setor privado, a Lei n. 6.019/1974 tratava sobre o contrato de trabalho temporário, e a Lei
n. 7.102/1983 regulamentava a terceirização dos serviços de vigilância bancária e transporte de
valores. Além disso, as Leis n. 8.863/1994 e 9.017/1995 autorizaram a terceirização de
vigilância patrimonial para pessoas físicas ou jurídicas e para o transporte de carga.
Nota-se que as regulamentações legais sobre a terceirização são esparsas e ineficientes no atual
cenário brasileiro, pois não tratam o fenômeno de forma global, e sim de um modo simplista,
que exclui a maior parte das modalidades terceirizantes presentes modernamente (MIRAGLIA,
2008, p. 145). Os projetos de lei apresentados no Congresso Nacional não obtiveram êxito,
competindo, por conseguinte, ao Poder Judiciário desempenhar o papel do Poder Legislativo e
estabelecer os limites da terceirização.
Tais circunstâncias induziram à realização de esforço hermenêutico dos tribunais do trabalho,
na busca da compreensão da natureza do instituto da terceirização e no encontro da ordem
jurídica aplicável (DELGADO, 2009). Desta maneira, as súmulas do Tribunal Superior do
Trabalho passaram a exercer papal fundamental no controle da terceirização, destacando-se o
58
seu papel de nortear a aplicação e a interpretação do direito, na medida em que representa a
jurisprudência reiterada do Tribunal (MIRAGLIA, 2008, p. 146).
A primeira súmula editada pelo Tribunal Superior do Trabalho sobre terceirização foi a de
número 239, no ano de 1985, que determinava: “é bancário o empregado de empresa de
processamento de dados que presta serviço a banco integrante do mesmo grupo econômico”. O
objetivo desta disposição era coibir as fraudes existentes no setor financeiro. Muitos bancos
constituíam empresas de processamento de dados para prestarem serviços para eles, como
forma de não submissão à legislação especial dos bancários, que previa jornada reduzida das os
empregados. Os empregados da empresa prestadora de serviços não se submetiam a esta norma,
incidindo as regras gerais de duração do trabalho, de 8 horas diárias e 44 semanais
(MIRAGLIA, 2008, p. 147). A consequência desse modelo era a constatação de formação de
grupo econômico e a responsabilidade solidária pelos créditos trabalhistas dos empregados.
No ano seguinte, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 256/1986, que foi revista
posteriormente pela Súmula 331. A Súmula 256 aplicou uma grande restrição às hipóteses de
terceirização, ao dispor que: “salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância,
previstos nas Leis 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20/06/1983, é ilegal a contratação de
trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o
tomador dos serviços”. Dessa forma, a terceirização passou a ser verdadeira exceção, permitida
somente nos casos de trabalho temporário e de vigilância. Em todos os demais casos ela era
considerada ilegal, inclusive nas hipóteses de conservação e limpeza, pacificadas como
modalidade de terceirização lícita (MIRAGLIA, 2008, p. 148).
A Súmula 256 gerou uma situação anacrônica, pois não englobava as hipóteses de terceirização
na Administração Pública. A Constituição Federal de 1988 previu no artigo 37, II e § 2º, a
expressa vedação da admissão de trabalhadores por entes estatais sem concurso público. Dessa
forma, a aplicação da referida súmula não encontrava respaldo constitucional. Entretanto, esse
verbete só foi substituído em dezembro de 1993, pela Súmula 331, que apresenta atualmente a
seguinte redação:
Súmula nº 331 do TST: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.
LEGALIDADE I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é
ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo
59
no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II - A
contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera
vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta
ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego
com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de
20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços
especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a
pessoalidade e a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações
trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária
do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja
participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem
subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua
conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de
21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações
contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida
responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A
responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas
decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Buscou-se, com a Súmula 331, responder às críticas feitas ao texto da Súmula 256 (DELGADO,
2009). Dessa forma, incorporou-se as hipóteses de terceirização do Decreto-lei n. 200/67 e da
Lei n. 5.645/70 (conservação e limpeza e atividades-meio) e vedou-se o reconhecimento do
vínculo com a Administração Pública, em razão da proibição constitucional de contratar
servidores sem o devido concurso público (item II).
O item I da súmula proibiu a interposição de mão-de-obra, com o objetivo de evitar a
marchandage o trabalho, proibida pela Constituição Federal de 1988. A marchandage pode ser
entendida como a “existência de mero intermediário que, sem assumir os riscos da atividade
econômica, interpõe-se entre o trabalhador e a empresa contratante” (CASTRO, 2000, p. 139).
O item III permitiu a terceirização dos serviços de limpeza e conservação, antes proibidos pela
Súmula 256. Além disso, ampliou as hipóteses de terceirização licita aos serviços
especializados que configuram atividade-meio da empresa, desde que inexistente a
60
pessoalidade e a subordinação direta. Por sua vez, o item IV trata da responsabilidade da
empresa tomadora de serviços7.
Entretanto, o critério apresentado no item III da Súmula 331 (atividade-fim e atividade-meio)
ainda não foi pacificamente uniformizado pela doutrina e pela jurisprudência, sendo
responsável por grande parte dos conflitos trabalhistas referentes à terceirização. A seguir serão
analisados os critérios para determinação da licitude ou ilicitude da terceirização,
3.3 CRITÉRIOS DE LICITUDE E ILICITUDE
Não existe lei que regule a terceirização no Brasil. Dessa forma, não há lei que proíba a
contratação de serviços por terceiros (MARTINS, 1997, p. 135). A própria Constituição Federal
de 1988, no artigo 170, garante o princípio da livre iniciativa. Diversos projetos de lei foram
criados ao longo das últimas décadas, mas nenhum deles logrou êxito. Dessa forma, coube aos
tribunais decidir sobre quais seriam as hipóteses lícitas de terceirização.
A Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho surgiu em uma tentativa de suprir a lacuna
deixada pelo Poder Legislativo. Entretanto, não se deve delegar a uma súmula (criação
jurisprudencial de um Tribunal Superior) o papel regulador que deve ser desempenhado pela
lei (MIRAGLIA, 2008, p. 117).
Entretanto, na inércia legislativa, a Súmula 331 permitiu a terceirização em um maior número
de situações, se comparada com a Súmula 256, que combatia a terceirização e reconhecia a
relação de emprego diretamente com a tomadora na maioria dos casos (SILVA, 2009, p. 163)
Dessa forma, depreende-se que a terceirização legal ou lícita é a que observa os preceitos legais
relativos aos direitos dos trabalhadores, não pretendendo fraudá-los, distanciando-se da
existência da relação de emprego. A terceirização ilegal ou ilícita é a que se refere a locação
permanente de mão-de-obra, que pode dar ensejo a fraudes e a prejuízos em relação aos
trabalhadores.
7 Ver item 3.4, p. 66
61
Sérgio Pinto Martins (1997, p. 137) apresenta alguns requisitos para determinar a licitude da
terceirização:
a) idoneidade econômica da terceirizada; b) assunção de riscos pela
terceirizada; c) especialização nos serviços a serem prestados; d) os serviços
devem ser dirigidos pela própria empresa terceirizada; e) utilização do serviço
principalmente em relação à atividade-meio da empresa que terceiriza
serviços, evitando-se a terceirização da atividade-fim; f) necessidade de
extraordinária e temporária de serviços.
Na formação de uma relação de empregos se fazem necessários graus intensos de subordinação,
pessoalidade e habitualidade. Já na terceirização esses requisitos devem ocorrer em graus
moderados (SILVA, 2009, p. 159).
Enquanto no contrato de trabalho o empregado está subordinado ao empregador, na
terceirização o prestador de serviços segue algumas ordens e orientações de padronização e de
método por parte do tomador. O empregado é contrato de modo personalíssimo. O prestador de
serviços pode ser alterado, mas desde que se mantenham as características contratadas e desde
que todos sejam da confiança e da responsabilidade do empreendimento contratado (SILVA,
2009, p. 160).
Se o trabalhador terceirizado trabalhar no mesmo local, fazendo os mesmos serviços, no mesmo
horário de trabalho, prestado serviços com exclusividade ao suposto terceirizador, sendo que a
empresa terceirizada nem mesmo tem estabelecimento próprio, não se pode pensar,
evidentemente, em terceirização, mas em contrato de trabalho. Se o empregador tem por
objetivo unicamente reduzir despesas e encargos sociais ou até os salários de seus funcionários,
fazendo terceirização ilegal, inexistirá a terceirização, pois vedado o leasing de mão-de-obra.
Destaca-se que, em razão do princípio da primazia da realidade na relação havida entre as
partes, prevalece a realidade dos fatos sobre a forma empregada. Dessa forma, pouco importa
o nomen juris utilizado ou a roupagem dada a situação, mas sim as condições de fato, estado
evidenciada a relação de emprego se forem observados os requisitos constantes do artigo 3º da
CLT (MARTINS, 1997, p. 139).
62
Não se pode, porém, generalizar as situações, afirmando que sempre haverá fraude ou
simulação na terceirização, mas sim que a fraude e a simulação deverão ser provadas. Nos
próximos itens serão analisados critérios para determinar a licitude da terceirização.
3.3.1 Atividade-fim e atividade-meio
Entende-se por atividade-meio a atividade desempenhada pela empresa, que não coincida com
seus fins principais. Já a atividade-fim é aquela em que a empresa é especializada (MARTINS,
1997, p. 119). Os exemplos clássicos de atividade-meio seriam os serviços de limpeza e de
vigilância, que poderiam ser terceirizados, em razão da permissão da Súmula 331 do Tribunal
Superior do Trabalho. Entretanto, uma empresa de limpeza não poderia terceirizar esse serviço,
por configurar a sua especialidade.
Jair Aparecido Cardoso (2002, p. 126), para o melhor entendimento da atividade-fim e
atividade-meio, apresenta o exemplo das empresas de confecção, que tenham como objetivo
social a indústria e o comércio de roupas. Para desenvolver sua atividade-fim, é necessário um
parque industrial com oficina de máquina, contando com profissionais de costura. Esta
atividade não poderá ser terceirizada.
Supondo que por motivos econômicos a empresa decida por terceirizar, poderá fazê-la de duas
maneiras: contrata uma empresa que preste serviço de costura ou contratar costureiras que
trabalhem em casa. Em ambos os casos haverá desrespeito à Súmula 331, pois estaria
terceirizando atividade-fim. No segundo caso, não haverá distinção entre o trabalho realizado
no domicílio do empregado, desde que presente a relação de emprego, nos termos do artigo 6°
da CLT (CARDOSO, 2002, p. 127).
De outro modo, a empresa de confecção poderia optar por montar a sua oficina de costura
própria, devendo contratar as costureiras como empregadas. Nessa situação, o empregador
poderia optar por contratar mecânico de máquinas como empregado, havendo pessoalidade,
subordinação e remuneração salarial, ou terceirizar esse serviço. Isto, porque, a atividade de
manutenção das máquinas não se configura como atividade-fim do empregador (CARDOSO,
2002, p. 127).
63
Entretanto, contrariamente ao entendimento sumulado pelo TST, parte da doutrina e da
jurisprudência têm manifestado ser impreciso o critério diferenciador da terceirização fundado
na atividade-fim, uma que vez que preexiste, em qualquer processo produtivo, atividade-fim
específica (SANTOS, 2008, p. 167).
O entendimento enfeixa o que há de mais moderno diante do emaranhado de interligações e
conexões no processo industrial moderno. Estando a terceirização inserida nas etapas regulares
do processo de produção, pouco importa de se trata de atividade-fim ou de atividade-meio da
empresa. O que realmente importa é que haja postos de trabalho e oportunidade de empregos
dentro desse processo produtivo (VIDAL NETO, 1992, p. 23).
Para Robortella (1994, p. 265), a proibição da subcontratação na atividade-fim, admitindo-se
só na atividade-meio, não se figura aceitável, porque muitas vezes é difícil ou mesmo
impossível fazer essa distinção. Inexistindo fraude, a empresa pode terceirizar ou subcontratar
determinado ciclo do processo produtivo que, pela evolução da tecnologia, se tenha tonado
desinteressante técnica e economicamente, mesmo que componha sua atividade-fim.
Entretanto, restringir a terceirização à atividade-meio, mesmo se lícita, desvirtua o princípio da
livre iniciativa previsto no artigo 170 da Constituição Federal.
Em alguns casos, há delegação de atividade-fim sem questionamento, como a indústria
automobilística. Rodrigo Coimbra Santos (2008, p. 169) entende que este é um exemplo de
delegação de serviços de atividade-fim, decorrente de novas técnicas de produção e de
tecnologia, que não é considerada ilícita:
As montadoras adquirem de outros fabricantes inúmeras peças e acessórios
tais como volante de direção, bancos, faróis etc. Se o objetivo principal dessas
empresas é a fabricação de veículos, e se um veículo não pode trafegar sem
volante, bancos e faróis, a indústria automobilística está terceirizando etapas
de produção ligadas à sua atividade-fim, mas este procedimento não tem sido
considerado ilegal (MARTINS, 1997, p. 120).
Em razão da insuficiência do critério de atividade-fim, defende-se que que o critério distintivo
da ilicitude deveria ser a comprovação da inexistência ou existência dos elementos
64
caracterizadores da relação de emprego, observados no caso concreto (NASCIMENTO, 2003,
p. 516).
3.3.2 Elementos da relação de emprego
O critério adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho para a conceber como lícita a
terceirização é o da atividade-fim/atividade-meio. Entretanto, esse critério tem se manifestado
insuficiente e impreciso. Surge assim um critério, ainda doutrinário, para se verificar a licitude
da terceirização: a existência de elementos da relação de emprego. Dessa forma, caberia, em
cada caso, a verificação se os empregadores da prestadora de serviços trabalham, de fato,
subordinados ao poder de comando da empresa tomador (SÜSSEKIND, 1997, p. 283). Nessa
hipótese haveria ilicitude na terceirização.
A apuração da ilicitude, ou não, da terceirização, deveria preocupar-se não com “o que” está
sendo terceirizado, mas “como” está sendo terceirizado. Dessa maneira, para Santos (2008, p.
171) só seria ilícita a terceirização quando comprovada a existência dos elementos
característicos da relação de emprego em cada caso concreto. Apesar de minoritárias, existem
decisões nesse sentido:
BRASIL. TRT – 3ª Região – 2ª T. TERCEIRIZAÇÃO. POSSIBILIDADE.
ATIVIDADE ESSENCIAL E FIM. MOTOQUEIROS. ENTREGA DE
PRODUTOS.
É comum confundir-se uma atividade essencial do empreendimento com sua
atividade-fim. O fato de determinadas atividades serem essenciais à realização
dos objetivos do empregador, não permite a conclusão de que essas sejam fim.
A ilicitude pode estar não em terceirizar, mas em como fazê-lo. (Rec. Ord.
8751/02 – Rel. Juiz Paulo Maurício Ribeiro Pires. 05.10.2002)
Os elementos necessários para configurar a relação de emprego estão contidos nos artigos 2º e
3º da CLT (BRASIL, 1943):
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que,
assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a
prestação pessoal de serviço.
65
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de
natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante
salário.
Dessa maneira, será considerado empregado o trabalhador que preencher, simultaneamente,
cinco requisitos: prestação de serviços por pessoa física, com pessoalidade, de forma não
eventual, subordinada e com onerosidade (GARCIA, 2013, p. 143). Na formação de uma
relação de emprego se fazem necessários graus intensos de subordinação, pessoalidade e
habitualidade. Já na terceirização esses requisitos devem ocorrer em graus moderados (SILVA,
2009, p. 159).
A pessoalidade significa a prestação dos serviços pelo próprio trabalhador, sem que seja
substituído frequentemente por terceiros (GARCIA, 2013, p. 143). Ao contrário da
terceirização, em que se contrata um serviço, o contrato de emprego é intuitu personae. Por sua
vez, a habitualidade diz respeito à continuidade da prestação de serviços ligados às atividades
normais do empregador.
Por fim, a subordinação é o principal requisito para a verificação da relação de emprego. A
prestação de serviços é dirigida pelo empregador, que exercer o poder de direção. O empregado
deve seguir as suas determinações e orientações, estabelecidas dentro dos limites legais
(GARCIA, 2013, p. 144). Trata-se, portanto, de subordinação jurídica.
Deste modo, para essa teoria, não se comprovando os elementos essenciais da relação de
emprego, não seria possível se falar em fraude à legislação trabalhista, devendo ser considerada
lícita a terceirização, independentemente da atividade do tomador de serviços.
BRASIL. TRT – 2ª Região – 1ª T – Ementa: TERCEIRIZAÇÃO.
ATIVIDADE-FIM DA EMPRESA. AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA A
CONFIGURAÇÃO DA RELAÇÃO DE EMPREGO. INEXISTÊNCIA DE
FRAUDE.
Não constitui fraude aos princípios tutelares do Direito do Trabalho a
constituição de microempresa por ex-empregado da Reclamada para prestar
os mesmos serviços realizados durante a relação de emprego, desde que não
66
estejam presentes os requisitos da subordinação jurídica e da pessoalidade.
(Rec. Ord. 08325/00 – Rel. Juíza Maria do Céo de Avelar. 30.04.2001).
É o que ocorre, por exemplo, na construção civil, nos serviços de telefonia e na indústria
automobilística. Nesses casos, de acordo com Vólia Bomfim Cassar (2013, p. 485), é
considerada lícita a terceirização de serviços especializados, diretamente relacionados com a
atividade-fim do empregador, desse que não presentes a pessoalidade e a subordinação entre
trabalhador e tomador:
“Na indústria automobilística é comum a necessidade de contratação de
empresas especializadas para a colocação, durante a produção e montagem
dos veículos, de rádio, ar-condicionado, blindagem e demais acessórios. Estes
são instalados e ajustados junto do processo de montagem dos veículos. Daí
por que os trabalhadores terceirizados executam seus serviços junto com os
empregados da indústria automobilística, dentro do mesmo pátio industrial,
respeitando a mesma estrutura dinâmica de produção. Essa terceirização só
pode ocorrer se não houver pessoalidade e subordinação entre o trabalhador e
o tomador (indústria automobilística)” (CASSAR, 2013, p. 485).
Independentemente do critério utilizado para a verificação da licitude ou ilicitude da
terceirização, certo é que o beneficiário da atividade laboral não pode se escusar da
responsabilidade pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas do prestador de serviços.
Dessa forma, encontram-se quatro hipóteses defendidas pela doutrina e pela jurisprudência, que
serão analisadas a seguir: responsabilidade direta e integral do tomador; responsabilidade
solidária entre o tomador e o prestador; responsabilidade subsidiária do tomador; e inexistência
de responsabilidade do tomador.
3.4 RESPONSABILIDADES NA TERCEIRIZAÇÃO
No direito do trabalho jamais o beneficiário da atividade laboral pode ficar fora da
responsabilidade (SILVA, 2009, p. 165). Dessa forma, a prestação de serviços trabalhistas para
a tomadora podem gerar quatro hipóteses atinentes à responsabilidade laboral: a)
responsabilidade direta e total do tomador; b) responsabilidade solidária entre tomador e
67
prestador; c) responsabilidade subsidiária do tomador; d) inexistência de responsabilidade do
tomador dos serviços terceirizados (SANTOS, 2008, p. 155).
Quando a terceirização for ilícita, a Súmula 331 do TST prevê a formação de vínculo
empregatício com o tomador de serviços, havendo responsabilização solidária do prestador nos
casos de fraudes à legislação trabalhista, aplicando-se o artigo 9º da CLT.
Já nos casos em que a terceirização for lícita, haverá responsabilidade subsidiária do tomador
de serviços, quando houver inadimplemento das obrigações trabalhistas. Para tanto, o tomador
deve participar da relação processual e constar no título executivo judicial (SANTOS, 2008, p.
156).
3.4.1 Responsabilidade direta e integral do tomador
Essa teoria era aplicada antes da edição da Súmula 331 do TST, incidindo a Orientação
Jurisprudencial 321 da SDI-1 do TST. Nessa hipótese, a terceirização somente seria aplicável
ao trabalho temporário e aos serviços de vigilância. Nos demais casos, haveria ilicitude da
terceirização e, como consequência, a responsabilidade pelas obrigações trabalhistas seria
exclusiva do tomador de serviços.
A responsabilidade direta e integral do tomador ainda é aplicada nos casos envolvendo
cooperativas e trabalho. Entretanto, mesmo havendo desvirtuamento do objeto de contratação,
não se deve responsabilizar solidariamente a cooperativa, pois isto implicaria responsabilizar
os próprios trabalhadores cooperativados, visto o caráter de organização associativa (CAMINO,
2003, p. 244).
3.4.2 Responsabilidade solidária entre o tomador e o prestador
De acordo com o artigo 264 do Código Civil, haverá solidariedade quando, na mesma
obrigação, concorrer mais de um credor ou mais de um devedor, cada um com direito, ou
obrigação, à dívida toda. Define Pontes de Miranda (1954, p. 321):
68
“(...) a solidariedade ativa, cada credor tem o crédito e a pretensão quanto ao
todo da prestação, mas o devedor, que paga a um, libera-se. Na solidariedade
passiva, cada devedor tem de prestar a totalidade, mas o credor só há de
receber uma vez a prestação.”
A solidariedade se caracteriza, portanto, pela multiplicidade de credores e/ou devedores. Cada
credor tem direito à totalidade da prestação, como se fosse credor único, enquanto cada devedor
é obrigado pela dívida toda, como se fosse único devedor (GONÇALVES, 2011, p. 129).
A solidariedade tem caráter excepcional, não podendo ser presumida. Pode resultar somente de
lei ou da vontade das partes, conforme artigo 265 do Código Civil. Dessa forma, se não houver
expressa no título constitutivo da obrigação ou se não constar em lei, a obrigação não será
solidária, pois esta não se presume (GONÇALVES, 2011, p. 134).
A responsabilidade solidária pode ser ativa ou passiva. A solidariedade ativa ocorre na
multiplicidade de credores com direito à prestação. Por sua vez, na responsabilidade passiva,
que importa para fins de responsabilidade pelas obrigações trabalhistas, ocorre multiplicidade
de devedores. Dessa forma, o credor poderá cobrar a dívida inteira de qualquer deles.
Internamente, este devedor está obrigado somente à sua quota-parte, tendo direito de regresso
contra os demais devedores.
Na solidariedade passiva, cada um dos devedores está obrigado à prestação na sua integralidade,
totum et totaliter, como se em verdade houvesse contraído, sozinho, a obrigação inteira
(NONATO, 1959, p. 168). Dessa forma, unificam-se os devedores, possibilitando ao credor,
para maior segurança do crédito, exigir e receber de qualquer deles o adimplemento, parcial ou
total, da dívida comum (DINIZ, 2002, p. 164).
Assim sendo, na responsabilidade solidária por créditos trabalhistas, o trabalhador poderá
acionar o prestador ou o tomador de serviços, facilitando a satisfação de seus créditos, conforma
explica Rodrigo Coimbra Santos (2008, p. 159):
“Na hipótese de responsabilidade solidária pelos créditos trabalhistas em
relação ao prestador e ao tomador de serviço, significa que o trabalhador
poderá direcionar a execução do que foi estabelecido em sentença contra a
69
empresa prestadora de serviços ou contra a empresa tomadora dos serviços,
de acordo com a sua escolha, podendo ainda cobrar parte de um e parte de
outro ou toda dívida de um só. Note-se a relevância desse tipo de
responsabilidade e quanto ela facilita em termos de satisfação do crédito por
parte do credor. Por isso, a solidariedade tem caráter excepcional e não pode
ser presumida no Direito pátrio”.
O Tribunal Superior do Trabalho reconhece lícita a terceirização de algumas atividades,
conforme se depreende da Súmula 331: trabalho temporário; serviços de vigilância, transporte
de valores e seguranças; serviços de conservação e limpeza; serviços especializados ligados à
atividade-meio do tomador; serviços públicos. Além desses, cooperativas de trabalho.
Nas hipóteses de terceirização ilícita, haverá o reconhecimento de vínculo de emprego
diretamente com o tomador de serviços e responsabilidade solidária da empresa prestadora de
serviços. (DELGADO, 1999, p. 128). Isso poderá ocorrer em duas situações: a) quando
estiverem presentes os elementos caracterizadores da relação de emprego, especialmente
pessoalidade e subordinação diretas, em relação ao tomador de serviços; b) quando o trabalhado
prestado pertença à atividade-fim da empresa tomadora (SANTOS, 2008, p. 161-162).
A ocorrência dessas duas hipóteses não acarreta a responsabilidade subsidiária da tomadora,
mas responsabilidade solidária, em razão do reconhecimento do vínculo empregatício.
Entretanto, muitos defendem que deveria haver uma alteração legislativa ou jurisprudencial
sumulada, no sentido de tornar solidária a responsabilidade pelas obrigações trabalhistas,
mesmo nos casos em que a terceirização for lícita. Atualmente, para essa situação, a
responsabilidade é subsidiária do tomador, conforme será analisado no próximo tópico.
3.4.3 Responsabilidade subsidiária do tomador
Ao contrário da responsabilidade solidária, a subsidiária reforça a responsabilidade principal,
sendo exigível somente “quando o devedor principal não cumpra nem possa cumprir a
obrigação a que se encontra adstrito” (COSTA, 2001, p. 833). Ela foi inserida no âmbito da
terceirização pela Súmula 331 do TST, que no inciso IV determina que o inadimplemento das
obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do
70
tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação
processual e conste também do título executivo judicial.
São três os pressupostos para a configuração da responsabilidade subsidiária: licitude da
terceirização; inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do prestador de serviços;
participação da tomadora no processo trabalhista (SANTOS, 2008, p. 186-188). No caso se
terceirização lícita, não haverá o reconhecimento de vínculo com a tomadora, inexistindo,
consequentemente, a responsabilidade solidária. Neste caso, não cumpridas as obrigações
trabalhistas pela prestadora, a tomadora poderá ser executada pelo trabalhador, de modo
subsidiário, garantindo o adimplemento do débito trabalhista.
Destaca-se que o trabalhador só poderá cobrar seus direitos do tomador de serviços se este
participou do processo e consta na decisão judicial que deferiu ao trabalhador os direitos
pleiteados (SANTOS, 2008, p. 189). A não participação na fase processual inviabiliza a sua
responsabilização, sob pena de violação da garantia constitucional da ampla defesa.
A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços justifica-se pela existência de duas
modalidades de culpa: culpa in eligendo e culpa in vigilando. A culpa in eligendo configura-se
pela má escolha da pessoa que praticou o ato. Dessa forma, a empresa tomadora é
responsabilizada pela má escolha ao contratar a empresa prestadora de serviços. Por sua vez, a
culpa in vigilando implica na responsabilidade daquele que descuidou da obrigação de vigiar a
conduta de outrem (SANTOS, 2008, p. 192). Ambas as modalidades são utilizadas como
fundamento para a responsabilização subsidiária:
BRASIL. TST – 3ª T. AG. DE INST. DESPROVIDO. CONTRATAÇÃO
POR EMPRESA INTERPOSTA. ENUNCIADO N. 331, IV, DO TST.
Afirmando o Regional a responsabilidade subsidiária da segunda Reclamada,
ao fundamento de que incorrera em culpa in eligendo, na escolha da prestadora
de serviços, está correto o despacho que negou seguimento ao recurso de
revista por invocação da Súmula/TST n. 331, IV. Ag. inst. Desprovido. Ag.
de inst. (Recurso de Revista 37541/2002-900-01-00. Rel. Min. Carlos Alberto
Reis de Paula. 28.10.2004).
71
BRASIL. TST. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA.
INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA. RESPONSABILIDADE DA
TOMADORA DOS SERVIÇOS. VERBAS PERSONALÍSSIMAS E DE
CARÁTER PUNITIVO.
A responsabilidade subsidiária da CEMIG acha-se materializada na esteira da
culpa in vigilando, que está associada à concepção de inobservância do dever
da empresa tomadora de zelar pela higidez dos direitos trabalhistas devidos
aos empregados da empresa prestadora, independentemente da verificação de
fraude na terceirização ou de eventual inidoneidade econômico-financeira.
Dessa forma, a condenação subsidiária do tomador de serviços abrange todas
as verbas devidas pelo devedor principal, incluindo-se as multas, isso porque,
tal como ocorre com as demais verbas, são devidas e, razão da culpa in
vigilando, motivo pelo qual não há cogitar de limitação da responsabilidade.
Recurso conhecido e provido. (Rec. de Rev. 102/2003-015-03-00.9. Rel. Min.
Barros Levenhagn. 30.04.2004.
Em contrapartida, Orlando Gomes (2000, p. 287) afirma que na responsabilidade decorrente da
culpa in vigilando e in eligendo não apresenta-se verdadeira culpa, pois não poderia haver
responsabilidade pelo fato de outrem derivada de culpa, na medida em que esta é inerente a
quem comete ao ato ilícito. Dessa forma, a responsabilização por culpa só seria decorrente de
fato próprio. Nesse sentido, os tribunais franceses utilizavam a expressão “presunção de
responsabilidade (MAZEAUD; MAZEAUD, 1961, p. 103).
Desta maneira, evidenciando-se a insuficiência da culpa para a configuração da
responsabilidade, deslocou-se o seu fundamento para a ideia do risco, na chamada
responsabilidade objetiva. Surgiram, assim, diversas concepções dessa teoria, importando para
o presente estudo as modalidades do risco-proveito e do risco criado.
Pela modalidade do risco-proveito, é responsável aquele que tira proveito da atividade danosa,
pois se entende que quem tem o proveito deve correr o risco. Desse modo, o tomador de serviço
deve responder pelas obrigações trabalhistas inadimplidas pelo prestador aos seus empregados,
pois se beneficiou do trabalho prestado (SANTOS, 2008, p. 196).
BRASIL – TST – 4ª T - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE
REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ARTIGO 460 DO CPC.
72
A causa petendi e as pretensões deduzidas em juízo decorrem da relação
jurídica de trabalho havida entre o prestador de serviços e os beneficiários
mediatos e imediatos do serviço prestado, no caso, fornecedora e tomadora da
mão-de-obra. Não há, portanto, demanda entre as reclamadas no polo passivo
da lide, mas responsabilidade objetiva (nexo causal entre o trabalho prestado
pelo empregado e o beneficiário do trabalho prestado) das reclamadas em face
do esforço físico despendido pelo trabalhador, e entre elas responsabilidade
sucessiva e de ordem subjetiva, pois o contrato de trabalho é o acordo tácito
ou expresso correspondente à relação de emprego na concepção
individualista, e o terceiro, é o beneficiário de trabalho alheio por interposta
pessoa, motivo pelo qual não pode eximir-se de responder por dívidas da
empresa intermediadora de mão-de-obra, ainda que de forma licitamente
contratada, pelos créditos decorrentes do contrato de trabalho com o
trabalhador como forma de burlar a incidência das normas cogentes do Direito
do Trabalho, de cunho eminentemente intervencionista.
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. A decisão regional que se coaduna
com súmula de jurisprudência desta Corte, "in casu", o Enunciado nº 331, IV,
não comporta reexame por via de recurso de revista, a teor do que dispõe o
art. 896, § 4º da CLT. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. (Ag.
de inst. Conhecido e desprovido – Recurso de Revista 3160/2000-244-01-40.
– Rel. Juiz convocado Vieira de Mello Filho. 17.12.2004).
Por sua vez, a teoria do risco criado amplia o conceito do risco-proveito, pois aumenta os
encargos do agente e os diminui em relação às vítimas. Ele parte do pressuposto que as vítimas
não possuem meios de proba que o dano resultou de uma vantagem ou de um benefício obtido
pelo causador. Dessa maneira, o dever de reparar não tem como pressuposto a vantagem do
agente, tal qual ocorre na teoria do risco-proveito. Portanto, importa a atividade em si, e não o
seu resultado (SANTOS, 2008, p. 197-198). Em vista disso, “cada vez que uma pessoa, por sua
atividade, cria um risco para outrem, deveria responder por suas consequências danosas”
(PEREIRA, 1999, p. 285).
Desse modo, com base na teoria do risco, a jurisprudência trabalhista passou a utilizar o
parágrafo único do artigo 927 do Código Civil como fundamento para a responsabilidade
subsidiária do tomador de serviços na terceirização. Dispõe o parágrafo que haverá obrigação
de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a
73
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para
os direitos de outrem. Essa teoria foi utilizada como fundamento para a responsabilidade
subsidiária de empresa tomadora na terceirização:
BRASIL – TRT – 4ª Região – 2ª T. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.
À luz do disposto no art. 927 do novo Código Civil, a responsabilidade do
tomador dos serviços decorre de forma independente de eventual culpa pela
má escolha da empresa ou entidade contratada para a prestação dos serviços,
impondo-se a condenação subsidiária do tomador quando constatado o fato de
que se beneficiou da prestação de serviços do obreiro (Súmula nº 331, IV, do
C. TST), exceto quanto à penalidade do art. 467 da CLT, que é de exclusiva
responsabilidade do real empregador. Recurso parcialmente provido (Rec.
Ord. 0009500-37.2003.5.04.0103 – Rel. Juiz João Ghisleni Filho. D.j.
14.07.2004).
Por fim, apresenta-se um terceiro fundamento para a responsabilidade subsidiária do tomador
de serviços na terceirização de trabalho, reunindo os fundamentos da culpa in vigilando e in
eligendo e do risco criado pela atividade empresarial. Tanto a vertente da culpa, quanto a do
risco, coexistem como configurações jurídicas da responsabilidade subsidiária do tomador de
serviços na terceirização (SANTOS, 2008, p. 201). Dessa forma, alguns julgados posicionam-
se no sentido de que a responsabilidade na terceirização se funda na culpa (responsabilidade
subjetiva) e no risco (responsabilidade objetiva).
BRASIL – TRT – 3ª Região – 2ª T - RESPONSABILIDADE. Toda a
atividade lesiva a um interesse patrimonial ou moral gera a necessidade de
reparação, de restabelecimento do equilíbrio violado, fato gerador da
responsabilidade civil. Embora considerada a "grande vedete do Direito
Civil", ela se estende a outros ramos da ciência jurídica, inclusive ao Direito
do Trabalho. A função da responsabilidade é servir como sanção, a qual se
funda na culpa (responsabilidade subjetiva) e no risco (responsabilidade
objetiva), traduzindo essa última "uma reformulação da teoria da
responsabilidade civil dentro de um processo de humanização". Outra
tendência diz respeito à extensão da responsabilidade que se amplia no tocante
ao número de pessoas responsáveis pelos danos, admitindo-se a
responsabilidade direta por fato próprio e indireta por fatos de terceiros,
74
fundada na ideia da culpa presumida ("in eligendo" e "in vigilando"). A
reformulação da teoria da responsabilidade civil encaixa-se como uma luva na
hipótese da terceirização. O tomador dos serviços responderá, na falta de
previsão legal ou contratual, subsidiariamente, pelo inadimplemento das
obrigações sociais a cargo da empresa prestadora de serviços; trata-se de uma
responsabilidade indireta, fundada na ideia de culpa presumida ("in eligendo")
ou seja, na má escolha do fornecedor da mão-de-obra e também no risco, já
que o evento, isto é, a inadimplência da prestadora de serviços, decorreu do
exercício de uma atividade que se reverteu em proveito do tomador. (Rec. ord.
20151/99 – Rel. Juíza Alice Monteiro de Barros. Data publicação 17.05.2000).
Posto isso, compreende-se que o principal efeito da responsabilidade subsidiária é a
incumbência do tomador de serviços responder pelo cumprimento das obrigações trabalhistas
inadimplidas pelo prestador, após a verificação da inexistência ou insuficiência de bens deste
para solver a dívida (SANTOS, 2008, p. 203).
Observa-se, portanto, que, independentemente da modalidade de responsabilidade, o tomador
de serviços, como beneficiário direto da atividade laboral, deverá responder, de algum modo,
pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas do prestador de serviços. Uma corrente
minoritária, que não encontra respaldo legal e jurisprudencial, defende a inexistência de
responsabilidade do tomador de serviços, como será analisado a seguir.
3.4.4 Inexistência de responsabilidade do tomador
A finalidade da terceirização, sob o ponto de vista jurídico, é isentar o tomador de serviços de
qualquer responsabilidade trabalhista, seja subsidiária, seja o reconhecimento de vínculo
empregatício (SANTOS, 2008, p. 220). Entretanto, esse não é o entendimento do Tribunal
Superior do Trabalho, que reconhece a responsabilização do tomador na Súmula 331.
O regramento da terceirização ocorre exclusivamente pelo entendimento jurisprudencial
sumulado, visto a inexistência de legislação que discipline tal prática. Dessa forma, Mauro
César Martins de Souza (2001, p. 21-22) defende que a responsabilização do tomador por
inadimplemento de obrigações do prestador apresenta-se em contradição à lei e ao contrato de
trabalho:
75
“[responsabilização do tomador por inadimplemento de obrigações do
prestador apresenta-se em] flagrante e ostensiva violação da lei e do
contrato de trabalho, não sendo justo que, numa contratação envolvendo duas
pessoas jurídicas, uma pratique infração contratual e locupletamento ilícito e
a outra seja responsabilizada a pagar pelo descaso e irresponsabilidade da
infratora e seus dirigentes”.
Este é um entendimento minoritário na doutrina e não encontra suporte na jurisprudência do
Tribunal Superior do Trabalho. Entendemos, também, não ser a melhor opção, pois apresentaria
uma flexibilização extrema, destituindo a obrigação do beneficiário pela prestação laboral,
diminuído a proteção do trabalhador. Por sua vez, há a necessidade de regulamentação
legislativa sobre o instituto, implementado seus requisitos e parâmetros.
3.5 VANTAGENS E DESVANTAGENS
A terceirização é um fenômeno típico da era pós-industrial, ditado pela necessidade de
competição empresarial, de melhoria de produtividade, de redução de custos, de especialização
e muitos outros fatores (AQUINO, 1999, p. 194). Trata-se, portanto, de um processo de gestão
de uma técnica de organização empresarial. Há quem defenda que a terceirização se apresenta
como uma tendência de modernização das relações empresariais que, se corretamente utilizada,
terá muito mais vantagens do que desvantagens (MARTINS, 1997, p. 41).
A empresa moderna se configura como um conjunto de contratos, e as relações entre as
empresas resultam em um exame de custos de produção e custos de transação (COASE, 1937).
Nesse sentido, observa-se uma tendência à verticalização das empresas, que desempenham
somente as atividades de sua especialidade, visando a melhorar o seu desempenho. Cada vez
menos as empresas verticalizam todo o processo produtivo. Verificou-se a necessidade de
delegar tarefas para terceiros, como forma de gerenciamento da empresa (MARTINS, 1997, p.
41).
Sérgio Pinto Martins (1997, p. 42) apresenta uma das principais vantagens que a especialização
da produção proporciona: menor capital investido, menor mobilização de capital em atividades
secundárias e melhor execução do serviço.
76
“Uma das vantagens do sistema é que a empresa não precisará de tanto capital
para operar, ou poderá destinar o seu capital para atividades mais ligadas ao
próprio empreendimento e não a atividades secundárias. As pequenas
empresas não só se multiplicaram no passar dos anos, mas também se
especializaram em determinado serviço, que não é feito com a mesma
perfeição em uma grande empresa, sendo inclusive mais barato. As pequenas
empresas representam, em muitos países do mundo, o efetivo emprego do
trabalhador, pois são numerosas, sendo que hoje muitos governos têm uma
política a elas direcionadas, visando o seu desenvolvimento, pois são elas que
pagam a maioria dos tributos”.
Ao se concentrar em uma única atividade, a empresa se direciona para um único escopo,
viabilizando ganhos de escala, verificada quando o aumento do tamanho da unidade operacional
para produzir ou distribuir um único produto reduz o custo unitário de produção ou distribuição
(CHANDLER, 1990)
Dessa forma, a principal vantagem sob a perspectiva administrativa seria a melhor qualidade
do produto ou serviço, melhorando também a produtividade. Viabiliza também um melhor
controle sobre a qualidade dentro da empresa. Além disso, gera desburocratização na estrutura
organização da empresa, simplificando a sua estrutura empresarial (MARTINS, 1997, p. 42).
Utilizando-se da terceirização, a empresa será capaz de convergir seus recursos e esforços em
sua área de especialização, aperfeiçoando a sua qualidade e a sua competitividade no mercado,
com o aprimoramento do seu produto (MARTINS, 1997, p. 42). Já a prestadora de serviços
também conseguirá se especializar, aprimorando os serviços prestados, possibilitando a
contratação de pessoal mais apropriado para a função e a redução de custos na escala de compra
de insumos e maquinário, oferecendo, assim, produtos melhores com menores preços (SILVA,
2009, p. 166).
Não menos importante, encontra-se a redução de custos, principalmente dos custos fixos. Dessa
forma, possibilita-se um ganho de eficiência da empresa, que gera economia de escala, elimina
desperdícios, transforma os custos fixos em variáveis e aumenta o lucro (MARTINS, 1997, p.
43).
77
Observa-se também uma ampliação de postos de trabalho, pois muitos prestadores de serviço
conseguem manter empregado diversos trabalhadores que, de outra forma, já teriam sido
dispensados com o fechamento ou redução dos quadros do tomador de serviços (SILVA, 2009,
p. 166). Além disso, Sérgio Pinto Martins (1997, p. 44) aponta outras vantagens para o
trabalhador:
“Implementação do sonho de adquirir e trabalhar no seu próprio negócio,
deixando de ser empregado para ser patrão; independência na prestação dos
serviços, que não tinha quando era empregado, e estava sujeito a ordens de
serviço; maior motivação para produzir, pois o negócio é seu; desenvolve no
trabalhador o seu lado empreendedor, de produzir alguma coisa por sua
própria conta”.
Como consequência da terceirização, haverá uma diminuição do espaço ocupado na empresa e
consequentemente, uma melhoria das condições de trabalho e ambientais, melhorando
condições de segurança e de saúde do trabalhador. Dessa forma, o menor número de pessoas
no mesmo local poderá resultar na diminuição de acidentes de trabalho, contribuindo para a
proteção do próprio trabalhador (MARTINS, 1997, p. 43).
Observa-se, portanto, que a terceirização pode propiciar inúmeras vantagens, tanto para a
empresa quanto para o trabalhador. Dessa forma, ela não deve ser vista como um mal em si. A
terceirização não deve ser entendida como um sinônimo de precarização. Entretanto, não se
pode permitir que esse modelo resulte em abusos ou fraudes à lei trabalhista.
Como contraponto, a terceirização também apresenta desvantagens. Desse modo, muitas das
empresas prestadoras são pequenas e mal estruturadas e a simples rescisão de um contrato pode
representar o seu fechamento. Não é exagero dizer que nesses casos a empresa é o próprio o
contrato (SILVA, 2009, p. 166). Destaca-se, entretanto, que em alguns casos, como no setor de
logística, as empresas prestadoras de serviço são maiores, mais organizadas, e com ambiente
de trabalho melhor do que a tomadora. Não são todos os casos de terceirização em que ex-
funcionários da empresa são demitidos e passam a prestar serviços.
78
Entretanto, não se pode negar que a ideia inicial da terceirização aplicada tão-somente às
atividades meio das empresas tornou-se mecanismo fraudulento para encobrir situações fáticas
de emprego, com o objetivo único de desonerar o empregador dos encargos trabalhistas
(MIRAGLIA, 2008, p. 114).
Dessa forma, a contratação de empresa inadequada para realização dos serviços, que não tem
competência e idoneidade financeira, pode acarretar diversos problemas futuros,
principalmente de cunho trabalhista (MARTINS, 1997, p. 45). O não cumprimento das
obrigações trabalhistas pela prestadora gera responsabilidade subsidiária da tomadora8. Serão
devidas, da mesma forma, as verbas trabalhistas, contribuições previdenciárias e FGTS.
Outra desvantagem apontada seria de que a terceirização implicaria na eliminação de categorias
profissionais estanques e definidas e, via de consequência, a perda da referência sindical do
trabalhador, que não mais consegue identificara a categoria à qual pertence (MIRAGLIA, 2008,
p. 114). Ocorre que as contribuições que deixam de ser recolhidas ao sindicato dos
trabalhadores passam a ser dividas ao sindicato dos empregadores, mas serão destinadas a uma
agremiação. Trata-se, portanto, de mera realocação de mão-de-obra e de recursos (MARTINS,
1997, p. 45).
3.6 INSTRUMENTOS JURÍDICOS VIABILIZADORES DA TERCEIRIZAÇÃO
A terceirização é uma realidade mundial, e não deve ser simplesmente desprezada pelo direito.
A melhor solução seria, conforme Sérgio Pinto Martins (1997, p. 141), a sua regulamentação
legal, que trouxesse os seus requisitos mínimos, como forma de evitar fraudes:
Na prática, o que tem se verificado é que as empresas terceirizadas continuam
existindo e o serviço persiste sendo prestado, sendo preferível que houvesse
uma regulamentação, de preferência mínima, para evitar fraudes. Com um
projeto assim seriam exigidos requisitos mínimos para a criação de tais
empresas, principalmente requerendo suporte econômico, capital mínimo e
idoneidade, para que não fossem criadas empresas de papel.
8 Ver item 3.4.3, p. 69.
79
Não se pode exigir que a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho abranja todas as
possibilidades e formas de terceirização. Esse é o papel da lei. Entretanto, não se pode permitir
que a ausência da lei se transforme em meio para a precarização dos direitos trabalhistas. Deve-
se coibir que a ausência legal justifique a mitigação dos direitos dos trabalhadores terceirizados
(MIRAGLIA, 2008, p. 181).
Observa-se, portanto, a necessidade do controle civilizatório da terceirização (DELGADO,
1999, p. 389). Para tanto, criou-se mecanismos jurídico-ratificadores da terceirização
trabalhista, com o objetivo de viabilizar a prática, promovendo, de tal modo, a inserção
socioeconômica do obreiro, ao lhe garantir cidadania e dignidade (MIRAGLIA, 2008, p. 1983).
Os mecanismos são os seguintes:
“a) isonomia salarial entre trabalhadores terceirizados e trabalhadores da
empresa contratante da mesma categoria; b) responsabilização da tomadora
pelos créditos trabalhistas dos trabalhadores terceirizados; c) vinculação
sindical dos trabalhadores terceirizados ao sindicato da categoria dos
trabalhadores permanentes da empresa contratante; d) igualdade de condições
laborais, quanto à saúde e segurança no ambiente de trabalho, entre todos os
trabalhadores, terceirizados ou não, que trabalhem numa determinada
empresa”.
É fundamental que haja isonomia salarial entre os trabalhadores permanentes e os trabalhadores
terceirizados que pertençam a mesma categoria. Por salário deve ser entendido todas as parcelas
que integram a remuneração do trabalhador (MIRAGLIA, 2008, p. 184).
Esse mecanismo decorre do artigo 12 da Lei n. 6.019/1974, que estabelece a isonomia salarial
entre o trabalhador temporário e o obreiro efetivo da empresa tomadora. Como a Súmula 331
não aborda esse tema, essa disposição pode ser aplicada por analogia aos trabalhadores
terceirizados. Caso se permita o tratamento não igualitário, contrariar-se-ia as garantias
constitucionais da não discriminação (artigo 5º, I e XLI) e da ampla proteção do salário (artigo
7º, VI, VII e X). Nesse sentido, Maurício Godinho Delgado (1999, p. 389):
“(...) a fórmula terceirizante, se não acompanhada do remédio jurídico da
comunicação remuneratória, transforma-se em mero veículo da discriminação
80
e aviltamento do valor da força do trabalho, rebaixando drasticamente o já
modesto padrão civilizatório alcançado no mercado de trabalho do país.
Reduzir a terceirização a um simples mecanismo de tangenciamento da
aplicação da legislação é suprimir o que pode haver de tecnologicamente
válido em tal forma de gestão trabalhista, colocando-a como essência do
Direito do Trabalho, enquanto ramo jurídico finalisticamente dirigido ao
aperfeiçoamento das relações de trabalho na sociedade contemporânea.”
Esse mecanismo deve ser aplicado em todas as espécies de terceirização, incluindo as lícitas,
pois não se admite que pessoas com a mesma capacidade laborativa, ocupantes da mesma
categoria e que trabalham na mesma empresa sofram restrições com o objetivo único de redução
de custos e aumento dos lucros.
Quanto à responsabilidade do tomador pelos créditos trabalhistas dos trabalhadores
terceirizados, a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho traz a responsabilidade
subsidiária nos casos de inadimplemento da empresa terceira. Por outro lado, verifica-se a
responsabilidade solidária nos casos de terceirização ilícita, em que há o reconhecimento do
vínculo diretamente com a empresa tomadora.
Entretanto, alguns autores defendem que mesmo nos casos de terceirização lícita deveria ser
aplicada a responsabilidade solidária da tomadora, fundamentando na formação de grupo
econômico entre empresa tomadora e prestadora, nos termos do artigo 2º da CLT (MAIOR,
2004).
Outra questão bastante controvertida na terceirização é a representação sindical dos
trabalhadores terceirizados. Os sindicatos foram criados para defender os interesses de uma
classe trabalhadora, e sua classificação parte da noção de categoria econômica e profissional.
Dessa forma, os empregados contratados diretamente pela tomadora estarão atrelados ao
sindicato da atividade preponderante de seu empregador (MATSUURA, 2013, p. 88).
Entretanto, há um questionamento quanto ao enquadramento dos trabalhadores terceirizados,
se deveriam ser representados pelo sindicato atrelado à atividade da empresa ou por um
sindicato dos trabalhadores terceirizados.
81
O fracionamento da empresa acaba enfraquecendo o poder dos sindicatos. Dessa forma, para
Delgado (2009), a filiação a um sindicato representativo dos trabalhadores terceirizados é um
contrassenso, em razão da pluralidade de formações profissionais e interesses envolvidos:
“A ideia de formação de um sindicato de trabalhadores terceirizados, os quais
servem a dezenas de diferentes tomadores de serviços, integrantes estes de
segmentos econômicos extremamente dispares, é simplesmente um
contrassenso. Sindicato é unidade, é agregação de seres com interesses
comuns, convergentes, unívocos. Entretanto, se o sindicato constitui-se de
trabalhadores com diferentes formações profissionais, distintos interesses
profissionais, materiais e culturais, diversificadas vinculações com tomadores
de serviços – os quais, por sua vez, têm natureza absolutamente desigual –, tal
entidade não se harmoniza, em qualquer ponto nuclear, com a ideia matriz e
essencial de sindicato”.
Dessa forma, a melhor solução seria o enquadramento do trabalhador terceirizado no sindicado
das empresas tomadoras, considerando-se que este é mais forte e possui maior poder de
negociação perante a empresa. Os sindicatos só conseguirão lutar pelas mudanças necessárias
se houver o resgate da consciência dos trabalhadores (MIRAGLIA, 2008, p. 204).
Por fim, óbvio parece ser a necessidade de se reconhecer a igualdade de condições laborais,
precipuamente saúde e segurança no ambiente de trabalho. Na prática, isso não é o que ocorre,
como instituição financeira que não incluiu os trabalhadores terceirizados em campanha contra
a dengue (MIRAGLIA, 2008, p. 205). Além disso, os trabalhadores terceirizados não participa
das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAS) e não possuem representação
sindical no local em que labora (MAIOR, 2004, p. 55). Dessa forma, defende-se a
responsabilidade solidária da empresa tomadora pelas questões relacionadas à saúde e à
segurança do trabalhador (HAZAN, 2004, p. 287).
82
4 TERCEIRIZAÇÃO DAS ATIVIDADES DE CORTE,
CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR
A atividade de corte, carregamento e transporte (CCT) exige um elevado investimento,
sobretudo pela necessidade de mecanização após a proibição de queima da cana-de-açúcar,
sendo responsável por 47% dos custos de produção do etanol (CERRI, 2008). Além disso, a
atividade exige um alto nível de eficiência, pois, após a colheita, a cana-de-açúcar apresenta
gradativa perda do teor de sacarose. Dessa forma, a terceirização mostrou-se uma viável
alternativa para o setor. Dessa forma, nesse capítulo será analisada a organização e a
racionalidade econômica da especificação do CCT, bem como se essa atividade configura-se
atividade-fim da usina.
4.1 ATIVIDADE DE CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE NA PRODUÇÃO DE
CANA-DE-AÇÚCAR
Diversos foram os fatores que transformaram o Brasil no maior produtor mundial de cana-de-
açúcar do mundo, responsável por 25% da produção mundial de açúcar e 20% da produção
mundial de etanol: políticas públicas de fomento; desregulamentação, competição e livre
mercado; forte expansão da demanda para diversificar a matriz energética (carros flex e
biomassa) (LCA, 2014, p. 20). Dados da safra de 2013 apontam que a produção do setor
sucroalcooleiro equivale a 43,35 bilhões de dólares, representando 2% do Produto Interno Bruto
do Brasil (NEVES; TROMBIN, 2014, p. 7).
Um dos fatores principais dessa expansão foi a mecanização do corte da cana-de-açúcar, que
representa importante inovação no processo produtivo da atividade canavieira (LCA, 2014, p.
21). Essa prática proporciona diversos benefícios, tais quais a intensificação do ritmo de
produção agroindustrial, a redução dos custos de produção e a intensificação do uso de mão de
obra qualidade e especializada (RAMÃO; SCHNEIDER; SHIKIDA, 2007).
A atividade de CCT incorpora a maior parte dos custos envolvidos na produção de cana-de-
açúcar e concentra as principais complexidades de manejo da lavoura e das relações entre as
firmas. A operação corresponde a 47% dos custos de produção do etanol (CERRI, 2008). Dentre
os custos do CCT, 51% correspondem ao corte mecanizado, 13% ao carregamento (transbordo)
83
e 36% ao transporte (ASSOVALE, 2009). Os investimentos para a mecanização são elevados,
e o retorno do capital é a longo prazo. Desse modo, diversas usinas preferem terceirizar essa
parte da cadeia produtiva, evitando a imobilização do capital.
As operações de colheita e entrega da cana-de-açúcar plantada pelo fornecedor, até a entrega
na esteira da usina, se dão de acordo com a seguinte cronologia: ao se atingir o ponto ótimo de
maturação, é realizado o procedimento de corte. O corte pode ser mecânico ou manual. E, sendo
mecânico, precedido ou não de queima da palha da cana-de-açúcar (TRENTINI; SAES, 2010,
p. 35).
O primeiro corte é feito, geralmente, 12 ou 18 meses após o plantio, quando se colhe a chamada
“cana planta”. Os demais cortes, quando se colhe a chamada “cana soca”, são feitos uma vez
por ano, ao longo dos quatro anos consecutivos, com redução do grau do rendimento (NEVES;
CONEJERO, 2010, p. 21). A colheita pelo método tradicional ocorre com a queima do canavial
e o corte manual da cana-de-açúcar. Entretanto, esse sistema tem sido gradativamente
substituído pelo corte mecanizado, em razão da proibição da queima de cana-de-açúcar.
Após o corte, a cana-de-açúcar é “enleirada” no canavial para imediato carregamento em
máquinas até os caminhões. Nos casos em que as operações são mecanizadas, o carregamento
é substituído pelo “transbordo”, operação pela qual as máquinas próprias recebem a cana-de-
açúcar picada das colhedoras e transbordam o produto da colheita para caminhões específicos.
Nesses caminhões, diferentes para a cana-de-açúcar picada (colheita mecanizada) e para a cana-
de-açúcar inteira (colheita mecânica), é que a produção segue para a usina, até serem entregues
na “esteira”, onde se inicia o processo de industrialização com a lavagem, moagem, cozimento,
até chegar ao produto final. O transporte deve ser realizado o mais rapidamente possível, para
evitar perdas de sacarose (TRENTINI; SAES, 2010, p. 36).
Desse modo, constata-se que o CCT apresenta diversas operações que demandam complexa
organização empresarial e uso intensivo de tecnologia, exigindo consideráveis investimentos,
que só proporcionam ganhos com economia de escala. Esse é outro importante motivo que
induz os agentes a celebrar contratos de transação, em diferentes níveis de integração.
84
Com o aprimoramento das relações entre as empresas, as contratações de serviços logísticos
deixaram de ser simples alocação de equipamentos e mão-de-obra e passaram a ser de contração
de resultado ao invés de recursos (SOLS; NOWICK; VERMA, 2007). Dessa forma, a
complexidade das atividades demandou no mercado o desenvolvimento de empresas
qualificadas para a prestação de serviços logísticos (SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 104).
A terceirização das atividades logísticas, dentre elas a de CCT, é uma realidade no Brasil, e está
presente em praticamente todos os segmentos, como automobilístico, bebidas, papel e celulose,
eletroeletrônicos, petroquímico, higiene e limpeza e alimentício (SCHEIDL; SIMON, 2012, p.
105). Por sua vez, o setor sucroenergético apresenta um grande potencial de demanda, em razão
do grande crescimento de produção, conforme se verifica no Gráfico 14.
Gráfico 14. Produção nacional de cana-de-açúcar: 1980/81 a 2012/13
Fonte: UNICA (2013)
O aumento da produção de cana-de-açúcar e do processamento de seus derivados (Gráfico 9)
exige um investimento cada vez maior das usinas nas atividades de CCT, o que transforma a
terceirização e uma alternativa atrativa em termos econômicos (SCHEIDL; SIMON, 2012, p.
105). A mecanização proporciona a intensificação do ritmo de produção agroindustrial, ao
mesmo tempo em que reduz os custos de produção e a dependência de mão de obra com baixa
especialização (RAMÃO; SCHNEIDER; SHIKIDA, 2007).
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
85
O processamento do volume de matéria-prima necessário para atender a essa demanda requer
considerável alocação de mão de obra, equipamentos e serviços, além de uma gestão eficiente
que garanta a execução das atividades envolvidas. Para a operação logística agrícola,
responsável pelo CCT, este crescimento do volume processado resulta em um aumento da
utilização de colhedoras, tratores, caixas de transporte, caminhões e implementos, além de
outros veículos de apoio, como caminhão-comboio, caminhão-pipa e caminhão-oficina
(SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 105).
Além disso, as alterações na legislação ambiental que foram realizadas desde o final da década
de 1990, a qual conta com a proibição da queima de cana-de-açúcar de acordo com o
cronograma progressivo (SÃO PAULO, 2002) e com o Protocolo Ambiental, firmado em 2007,
conforme se observa nas tabelas 9 e 10, são fatores que contribuem para a adoção da colheita
mecanizada.
Tabela 9. Cronograma de eliminação da queima da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo (Lei
n. 11.241, de 19 de setembro de 2002.
Ano Área mecanizável onde não se pode efetuar a queima de cana
Porcentagem de eliminação
1º Ano (2002) 20% da queima eliminada
5º Ano (2005) 30% da queima eliminada
10º Ano (2011) 50% da queima eliminada
15º Ano (2016) 80% da queima eliminada
20º Ano (2021) Eliminação total da queima
Ano
Área não mecanizável, declividade superior a 12º e/ou queima
menor de 150 ha
Percentagem de eliminação
1º Ano (2011) 10% da queima eliminada
5º Ano (2016) 20% da queima eliminada
10º Ano (2021) 30% da queima eliminada
15º Ano (2026) 50% da queima eliminada
20º Ano (2031) Eliminação total da queima
Fonte: IEA (2007)
86
Tabela 10. Cronograma de Eliminação da Queima da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo,
(Protocolo Agroambiental, 2007)
Ano Área mecanizável onde não se pode efetuar a queima de cana
Percentagem de eliminação
2010 70% da queima eliminada
2014 Eliminação total da queima
Ano
Área não mecanizável, declividade superior a 12% e/ou da queima
menor de 150 há
Percentagem de eliminação
2010 30% da queima eliminada
2017 Eliminação total da queima
Fonte: IEA (2007)
A proibição de queimada da palha dificulta o corte manual da cana-de-açúcar, induzindo, assim,
a colheita mecanizada. O Protocolo Ambiental do Estado de São Paulo, firmado em 2007,
antecipa os prazos para eliminação da prática da queima da cana-de-açúcar, de 2021 para 2014,
nas áreas em que é possível a colheita mecanizada, e de 2031 para 2017 nas áreas em que não
é possível a mecanização.
Dados do Instituto de Economia Agrícola do Estado de São Paulo (IEA, 2008) demonstram a
incorporação dos padrões ambientais, pois já em 2007 o índice de mecanização das lavouras de
cana-de-açúcar nos Estado de São Paulo foi de 40,7%, tendo chegado a 67% em algumas
regiões, como a de Orlândia. O Gráfico 15 apresenta a evolução da colheita mecanizada de
cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. Na última safra, a colheita mecanizada já era
responsável por 83,7% do total, enquanto a colheita com a queima da cana-de-açúcar
correspondia a somente 16,3%.
87
Gráfico 15. Evolução da colheita da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo
Fonte: SÃO PAULO (2014)
Os gráficos 16 e 17 apresentam os índices de mecanização da colheita de cana-de-açúcar nas
terras próprias das usinas, nos principais estados do centro-sul e nas principais cidades
produtoras de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. Observa-se uma elevada taxa de
mecanização nas usinas dos cinco estados com maior produção de cana-de-açúcar no centro-
sul, igual ou superior a 87% das áreas colhidas na safra 2012/13.
Gráfico 16. Índice de mecanização das usinas em terra própria nos principais estados produtores
de cana-de-açúcar no centro-sul (safra 2012/13).
Fonte: NOVACANA (2013)
1,11
1,76 1,92
2,27
2,63
3,13
3,38
4,03
2,13 2,03 2
1,8 2,1
1,67
1,280,78
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
2006/07 2007/08 2008/09 2009/10 2010/11 2011/12 2012/13 2013/14
Áre
a (m
ilhõ
es
de
he
ctar
es)
Cana crua Cana queima
95%90%
87% 87% 87%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Minas Gerais São Paulo
88
Por sua vez, no Estado de São Paulo houve a antecipação da proibição da queimada de cana-
de-açúcar, após a edição do Protocolo Ambiental de 2007. O Gráfico 17 apresenta as taxas de
mecanização das usinas em área próprias nas principais cidades produtoras do estado.
Gráfico 17. Índice de mecanização das usinas em terra própria nas principais cidades produtoras
de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo (safra 2012/13).
Fonte: NOVACANA (2013)
Há, portanto, a necessidade de elevados investimentos nos serviços de logística, sobretudo na
atividade de CCT, para a adequação às exigências da legislação ambiental. Além disso, em
razão do grande volume de material processado, o nível de eficiência operacional torna-se
bastante relevante para os custos operacionais, sobretudo na produção de cana-de-açúcar, que
sofre rápida degradação após o seu corte. Desse modo, ineficiências no CCT são altamente
prejudiciais (SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 106), transformando a terceirização em uma viável
alternativa.
Dessa forma, a terceirização é uma alternativa viável, possibilitando à usina direcionar seus
esforços e investimentos nas atividades de sua especialidade, ou seja, na produção de açúcar,
álcool e bioenergia. A bioenergia tornou-se uma realidade nos últimos anos e apresenta-se como
um negócio rentável, mas demanda um alto investimento para proporcionar a cogeração de
energia em larga escala. Assim sendo, a imobilização do capital em setores secundários, como
o transporte, poderia inviabilizar o desenvolvimento e o crescimento dessas atividades.
94%91% 90%
84% 83%78%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Ribeirão Preto Assis Araçatuba São José do RioPreto
São Carlos Piracicaba
89
A terceirização dos serviços de logística, que incluem, de modo geral, transporte,
movimentação e armazenagem, é uma realidade em diversos setores da economia brasileira
(SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 107). A tabela abaixo apresenta os principais operadores
logísticos que atuam no Brasil, seus principais clientes e o respectivo faturamento bruto anual.
A sua análise aponta que a terceirização nem sempre poderá ser sinônima de precarização, pois
esses operadores logísticos apresentam estruturas suficientes para respeitar e cumprir as
obrigações trabalhistas.
Tabela 11. Principais operadores logísticos que atuam no Brasil
Operador logístico Principais clientes Receita bruta anual
(milhões de R$)
Abrange Ambev, Johnson & Johnson, Votorantim NF
ALL Cosan, Votorantim, Bunge 2.800,0
Ceva Fiat, GM, Philips 518,0
Gafor Basf, FEMSA 420,0
JadLog Submarino, Saraiva, Hering 60,0
Julio Simões Usiminas, Vale, VolksWagen 1.300,0
Log-In Michelin, Vale 505,5
Martin-Brower McDonald’s, AppleBee’s, Ráscal 896,6
Mclane Natura, Procter&Gamble, Samsung NF
MRS CSN, CSP, Vale 3.400,0
Penske Ford, HP, Sharp 216,0
Ultracargo Brasken, Ipiranga, Petrobrás 335,0
Vix Coca-Cola, Honda, Mercedes-Benz 590,0
Wilson, Sons Cenibra, CSN 607,2
Fonte: TECNOLOGÍSTICA (2009) apud. SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 107
Diversos são os motivos para terceirizar os serviços de logísticas, inclusive o CCT: retorno
sobre investimentos, maior produtividade de equipes que atuam na atividade-fim da empresa,
flexibilidade, questões trabalhistas, redução de custos, questões gerenciais e políticas, serviços
especializados, atualização tecnológica constante a maturidade em si dos operadores logísticos
(SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 108).
90
A decisão sobre terceirizar ou não implica na escolha sobre custos e controle operacional. Dessa
forma, a empresa pode optar por verticalizar a operação, ou seja, fazê-la internamente, ou
desverticalizar, contratando a operação. A priori, a verticalização para ser a opção mais lógica,
na medida em que elimina a margem do fornecedor e eventuais tributações e garante o controle
sobre a operação, o que gera flexibilidade e agilidade. Entretanto, esses argumentos nem sempre
se concretizam (SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 108). Isto, porque, os operadores de logística
possuem eficiência operacional superior, são capazes de explorar melhor os fatores de
especialização da mão de obra e ganhos de escala, além de que as operações próprias, por não
possuírem referência externa para comparação, correm mais riscos de migrarem para uma
situação de acomodação e perda de eficiência com o tempo (FLEURY; WANKE;
FIGUEIREDO, 2000).
Além disso, o sucesso da experiência no mercado é outro fator de motivação para a
terceirização. Scheidl e Simon (2012, p. 108) apresentam um estudo realizado pela Georgia
University of Technology, em que a avaliação do processo de terceirização é bastante positiva,
tanto pelas empresas quanto pelos operadores de logística. Das 772 empresas participantes, as
avaliações do resultado de processos de terceirização classificadas como “extremamente bem
sucedida” e “bem sucedida” foram de 89% para os clientes e 96% para os operadores de
logística.
O papel da logística, que inclui o CCT, tem sofrido uma alteração, em razão de sua dependência
para a vantagem competitiva das empresas. São três os fatores que o explicam: a) em razão da
crescente necessidade de responder rapidamente às demandas de atendimento ao cliente, a
logística proporciona uma melhoria nesse processo; b) as atividades logísticas envolvem grande
disponibilização de capital; c) a função logística pode ser o facilitador-chave na integração da
cadeia de suprimentos, tendo a Gestão de Cadeia de Suprimentos assumido uma importância
estratégica (SCHEIDL; SIMON, 2012, p. 108).
Scheidl e Simon (2012) desenvolveram uma pesquisa na Cosan Açúcar e Álcool S/A, com o
objetivo de verificar se os benefícios apontados dela bibliografia são, realmente, indutores do
processo de terceirização. O resultado aponta que 69% dos itens identificados na bibliografia
foram considerados pela empresa no processo de terceirização. Os motivadores apontados
foram: desenvolver vantagem competitiva; promover bons serviços, melhorando o atendimento
91
ao processo industrial de moagem; possibilitar o foco no core business, ou seja, o maior foco
na produção agrícola e na produção de açúcar, etanol e energia; direcionar investimentos para
aquisição de ativos de produção; minimizar riscos trabalhistas; reduzir custos; maturidade dos
operadores de logística; eficiência operacional superior; e sucesso do processo em outros
segmentos.
4.2 A RACIONALIDADE ECONÔMICA DA ESPECIALIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE
CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR
A especialização dos processos produtivos proporciona ganhos de eficiência econômica e,
consequentemente, incrementos de bem estar social. A organização dos processos de produção
em etapas possibilita que as empresas coordenem suas atividades de modo a preservar e
aprimorar especialidades e habilidades acumuladas, decorrentes da especialização do trabalho,
que acelera o processo de inovação tecnológica (LCA, 2014, p.1).
Além de inovação tecnológica, a especialização do trabalho gera mudanças no processo de
gestão, alterando formas de organização das tarefas, utilização de equipamentos e instrumentos
específicos para prestar determinados serviços. Esses fatores propiciam o aumento de
eficiência, pois promovem o aperfeiçoamento contínuo e a otimização da alocação de insumos
na economia (LCA, 2014, p.1).
Desse modo, compreende-se que a especialização do trabalho gera incrementos de
produtividade, na medida em que o indivíduo torna-se especialista em determinada etapa do
processo produtivo (SMITH, 2008). A subdivisão das etapas de produção em estágios menores,
em tamanho e complexidade, geraria incrementos na produtividade do trabalho (SMITH, 2008).
Nesse sentido, a rotina resultante da especialização do trabalho enseja aos trabalhadores o
desenvolvimento e o aprimoramento de suas habilidades na execução de atividades, alcançando
conhecimento por meio da experiência (NELSON; WINTER, 1982).
No setor sucroenergético, a especialização proporciona ganhos de eficiência, tais como a
mitigação dos efeitos negativos das entressafras nas economias locais, mantendo o nível de
atividade econômica de forma mais regular em todos os meses do ano. Por sua vez, isto permite
92
o emprego permanente de mão de obra especializada, garantindo maior estabilidade das
relações de trabalho, ao diminuir a dependência de trabalho temporário. Isso diminui a dispensa
de milhares de trabalhadores em períodos de entressafra (LCA, 2014, p. 2).
A eficiência e a inovação são fatores indutores do arranjo organizacional de uma empresa, na
busca da expansão de mercado, principalmente no atual cenário de competitividade nos
mercados de bens e serviços. O crescimento de mercado possibilita a criação de mais postos
de trabalho formal. Por sua vez, a especialização proporciona ganhos de inovação e de
eficiência, induzindo novos arranjos organizacionais (LCA, 2014, p. 4).
Os arranjos organizacionais adotados pela empresa serão resultado do estudo dos custos de
transação, possibilitando a ela escolher por produzir internamente ou contratar um serviço
especializado. Desse modo, a depender dos custos, pode ser mais vantajoso adquirir um insumo
no mercado do que produzi-lo internamente (AMARAL, 2009).
Os custos de transação decorrem de três fatores: ambiente institucional, características da
transação e pressupostos comportamentais (ZYLBERSZTAJN, 1995). O ambiente institucional
é marcado pela tradição legal, existência de leis de proteção intelectual, tradições de arbitragem
para a solução de conflitos, aspectos culturais. (ZYLBERSZTAJN, 1995, p. 24) Os
pressupostos comportamentais indicam os motivos pelos quais o contrato firmado poderá não
conter as características desejadas após um determinado período, em razão do oportunismo e
da racionalidade limitada. Por fim, as características da transação, frequência, risco e
especificidade, são fatores preponderantes para a escolha da governança.
Para a Teoria dos Custos de Transação, a especialidade gera uma estrutura organizacional mais
eficiente. Assim, ao simplificar e reduzir as áreas de atuação, a empresa pode convergir seus
esforços para suas atividades principais (LCA, 2014, p. 5). A verticalização das atividades pela
empresa pode gerar deseconomia de escala, ou seja, as empresas de grande porte podem se
tornar ineficientes (WILLIAMSON, 1985).
Apesar dos benefícios econômicos gerados pela especialização dos serviços, no Brasil, discute-
se a conceituação de atividade-fim e atividade-meio como parâmetros de licitude da
terceirização. Entretanto, sob o ponto de vista econômico, tal separação não faz sentido, em
93
razão da dinâmica das atividades econômicas, que alteram constantemente as atividades meio
e fim de uma empresa (LCA, 2014, p. 14). Essa tentativa de enquadramento das operações em
atividade-fim e atividade-meio acaba gerando insegurança aos agentes econômicos.
Essa insegurança é gerada pela falta de critérios objetivos estabelecidos em lei e pela
consequente falta de uniformidade jurisprudencial. Dessa forma, a definição fica a critério
subjetivo do julgador, resultando em insegurança jurídica e assimetrias concorrenciais. Em
cidades próximas, encontram-se empresas concorrentes submetidas a critérios distintos.
Em Ribeirão Preto, por exemplo, o Ministério Público do Trabalho arquivou o Inquérito Civil
n. 000640.2011.15.006/1-80, por entender que o corte, carregamento e transporte de cana-de-
açúcar em colheita mecanizada caracterizam-se como prestação de serviços na atividade-meio
da usina. Por sua vez, a 2ª Vara do Trabalho de Araraquara, no processo 0000994-
89.2013.5.15.0079-ACP, decidiu pela proibição da terceirização dessas atividades, por serem
essenciais à produção de açúcar e álcool, configurando, portanto, atividade-fim:
“Uma usina de açúcar e álcool necessita, para o desenvolvimento de sua
atividade-fim, cultivar plantações de cana-de-açúcar, em terras próprias ou
arrendadas, como acontece no Estado de São Paulo há décadas. O setor
sucroalcooleiro sempre funcionou assim. [...] É dizer, dadas as peculiaridades
do processo produtivo de açúcar e álcool, não há como dissociar as atividades
de plantio, colheita, carregamento e inclusive transporte de cana-de-açúcar, da
atividade de fabricação dos produtos industrializados.”
Além das implicações concorrenciais9, a proibição de terceirizar serviços especializados,
obrigando que as usinas internalizem atividades secundárias, resulta em perda de eficiência
produtiva. Dessa maneira, reduz-se os ganhos de economia de escala e escopo, advindas da
especialização, bem como o ritmo de inovação tecnológica. Como resultado da perda de
eficiência, pode se ter a redução da qualidade e o aumento de preço dos bens e serviços (LCA,
2014, p. 15).
9 Ver item 4.3.2, p. 100.
94
A escala é relacionada a volume, grandes quantidades, e escopo a utilização de poucas matérias-
primas para atender vários mercados (BERTONCELLO, 2010, p. 26). As economias de escala
e escopo são responsáveis por reduções no preço unitário do bem e pela alocação eficiente dos
recursos (CARVALHO JÚNIOR; RUIZ, 2008, p. 109).
Os conceitos de escala e escopo devem ser analisados conjuntamente, na medida em que a
economia de escala é verificada quando o aumento do tamanho da unidade operacional para
produzir ou distribuir um único produto reduz o custo unitário de produção ou distribuição
(CHANDLER, 1990). Dessa forma, a verticalização de todo o processo de produção não
proporciona um ganho real de escala, pois pode gerar ineficiência (WILLIAMSON, 1985).
A eficiência pode ser verificada na prestação de serviços agrícolas para as mais variadas
culturas. A sazonalidade da cultura implica, na maioria dos casos, a dispensa dos trabalhadores
na entressafra, e a paralização dos serviços. Com a especialização em diversas fases da
produção, de diversas culturas, o ofertante de serviço aproveita a entressafra de uma cultura
para atuar em outra, mantendo o nível de atividade economia de forma mais regular em todos
os meses do ano (LCA, 2014, p. 23).
Como exemplo, o Grupo Gafor e o Grupo Julio Simões prestam serviços especializados para a
indústria de cana-de-açúcar e para as indústrias de papel e celulose (JORNAL DA CANA,
2009), mantendo a atividade durante todo o ano e evitando a dispensa de trabalhadores. Isso
garante aos trabalhadores maior capacitação e maior estabilidade das relações de trabalho
(LCA, 2014, p. 23). A Tabela 12 apresenta alguns grandes operadores logísticos que atuam no
setor sucroenergético. Observa-se que muitos prestam serviços para outros setores, como papel
e celulose e citricultura.
95
Tabela 12. Exemplos de grandes operadores logísticos com atuação no setor sucroenergético
Operador
es
Logísticos
Fases de produção da cana-de-açúcar Outras
áreas de
atuação
Principais
clientes Preparo
do Solo Plantio
Tratos
Culturais
Colheita /
Transbordo Transporte
AQCES X X
Papel e
celulose;
citricultura
Raízen; Fibria
Binotto
S/A X X
Papel e
celulose
ETH
Bioenergia
Gafor
Logística X X X X X
Papel e
celulose
Raízen;
Clealco; ETH
Bioenergia
Julio
Simões
Logística
X X Papel e
celulose Raízen
Luft Agro X X X X -
ETH
Bioenergia;
Louis Dreyfus;
São Matinho;
Tropical
Bioenergia
Ritmo
Logística X X -
Raízen; ETH
Bioenergia;
Santelisa Vale;
Louis Dreyfus;
Bunge
Fonte: LCA (2014)
Por sua vez, a ineficiência pode resultar em aumento de preços e, consequentemente, na redução
da competitividade dos produtos nacionais no comércio mundial, reforçado pelo fato da
terceirização ser um fenômeno amplamente difundido nas economias (LCA, 2014, p. 15). Isso
contraria todas as políticas públicas voltadas para o setor, desde a criação do Proálcool (1975),
que apresentava como principal objetivo a diminuição da dependência doméstica de
combustíveis derivados do petróleo, sobretudo após as crises de 1973 e 1979.
Dessa forma, a proibição da terceirização da atividade de corte, carregamento e transporte
poderá causar diversos impactos negativos para a economia (LCA, 2014):
96
a) redução de oportunidades de emprego em regiões com menor
dinamismo econômico;
b) aumento de custos de produção em decorrência da internalização das
atividades, não havendo os ganhos de escala provenientes da
especialização.
c) redução do ritmo de inovação tecnológica e menor difusão do
conhecimento, que poderiam ser aproveitadas em outras empresas e
setores da economia;
d) produtos e serviços de menor qualidade e preços mais elevados;
e) ameaça de perda de competitividade da economia brasileira no
mercado internacional, uma vez que as principais economias do mundo
estão se beneficiando da terceirização.
Os efeitos negativos não seriam gerados somente para a usina, mas também para outros agentes
econômicos e para os consumidores (LCA, 2014, p. 24), que sofreriam com o aumento dos
preços. Os próprios trabalhadores seriam prejudicados, pois esta decisão afetaria a estabilidade
dos postos de trabalho, na medida em que a atividade econômica teria seu escopo de atuação
reduzido e vinculado aos efeitos sazonais próprios de uma única região e de uma única cultura
agrícola (LCA, 2014, p. 24).
Além disso, os operadores logísticos sofreriam um elevado impacto negativo, em razão dos
investimentos de longo prazo realizados na aquisição de equipamentos e capacitação
profissional (LCA, 2014, p. 24). O Grupo Grafor previa o investimento de R$ 80 milhões nos
contratos celebrados com a Raízen, enquanto o Grupo Julio Simões estimava um faturamento
anual de R$ 550 milhões com os contratos de CCT celebrados (JORNAL DA CANA, 2009).
Por fim, a decisão da 2ª Vara do Trabalho de Araraquara gera assimetrias concorrenciais ao
proibir a Raízen, em caráter pontual e específico, de terceirizar as atividades de CCT. Segundo
informações da empresa, nos autos n. 0000994-89.2013.5.15.0079, p. 44, seriam necessários
mais de R$ 70 milhões para a aquisição de equipamentos utilizados na atividade de CCT.
97
A internalização dessas atividades, antes contratadas no mercado, teriam um impacto negativo
sobre a produtividade da empresa, gerando, por consequência, perda de competitividade. Além
do mais, ao alcançar somente um agente do setor, cria assimetrias concorrenciais entre as
empresas do setor sucroenergético (LCA, 2014, p. 25).
Dessa forma, a perda de eficiência gerada pela internalização dessas atividades contraria as
políticas públicas voltadas para o setor energético brasileiro, no sentido de diversificar a matriz
energética com a cogeração de eletricidade através do bagaço da cana-de-açúcar. Isso pode
afetar a segurança energética e o princípio da modicidade da tarifa. Além disso, coloca-se em
risco a posição do país no mercado internacional de açúcar e álcool (LCA, 2014, p. 25).
4.3 ATIVIDADE-FIM E ATIVIDADE-MEIO: PARÂMETROS DE LICITUDE DA
TERCEIRIZAÇÃO?
No Brasil, a regulamentação da terceirização é feita pela Súmula 331 do Tribunal Superior do
Trabalho, que, dentre outras hipóteses, permite a terceirização de serviços especializados
ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação
direta. Entretanto, ainda não se pacificou o conceito de atividade-fim e atividade-meio,
parâmetros para a verificação de licitude ou ilicitude da terceirização.
A aplicação desse critério adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho gera dois
questionamentos de ordem constitucional. O primeiro diz respeito ao princípio da legalidade:
seria válido uma súmula proibir uma prática que a lei não proíbe? O segundo diz respeito à
aplicação prática do critério em razão dos princípios da ordem econômica: como não há lei
geral que traga parâmetros objetivos de licitude da terceirização, e como o critério trazido pela
Súmula 331 é insuficiente, ocorrem casos, em regiões próximas, em que empresas concorrentes
recebem decisões contrárias, ou seja, uma é proibida e de terceirizar e a outra não. Dessa forma,
as decisões geram assimetrias concorrenciais para empresas dentro de um mercado relevante.
Desse modo, o objetivo desse item é verificar se a aplicação dos conceitos de atividade-fim e
atividade-meio, como parâmetros de licitude da terceirização, encontram sustentação legal e
constitucional.
98
4.3.1 Legalidade
A distinção entre atividade-meio e atividade-fim, como critérios de licitude da terceirização, é
uma construção essencialmente jurisprudencial, na medida em que não há lei que a autorize.
Dessa forma, a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho criou uma distinção sem
fundamento legal, extrapolando a sua competência. Nesse sentido explica Flávio Amaral Garcia
(2010, p. 99):
“Não se conhece exemplo mais significativo do ativismo normativo do que o
Enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que, repita-se à exaustão,
substituindo-se ao legislador, fixou um marco normativo para as
terceirizações que não encontra fundamento em nenhum diploma legal.”
Dessa forma, além de violar os princípios da ordem econômica, a construção jurisprudencial da
Justiça do Trabalho viola expressamente o princípio da legalidade, previsto no artigo 5º, II, da
Constituição Federal de 1988: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei”.
José Afonso da Silva (2012, p. 83) explica que esse é um dos dispositivos mais importantes do
direito constitucional, pois garante a liberdade de ação e a relaciona com a legalidade. É um
princípio estruturante do Estado Democrático de Direito. Dessa forma, a liberdade só pode
sofrer restrições por normas jurídicas provenientes o Poder Legislativo:
“Esse dispositivo é um dos mais importantes do direito constitucional
brasileiro, porque, além de conter a previsão da liberdade de ação
(liberdade-base das demais), confere fundamento jurídico às liberdades
individuais e correlaciona liberdade e legalidade. Dele se extrai a ideia
de que a liberdade, em qualquer de suas formas, só pode sofrer
restrições por normas jurídicas perceptivas (que impõem uma conduta
positiva) ou proibitivas (que impõem uma abstenção), provenientes do
Poder Legislativo e elaboradas segundo o procedimento estabelecido na
Constituição. Quer dizer: a liberdade só pode ser condicionada por um
sistema de legalidade legítimo”.
99
Dessa forma, todos possuem a liberdade para fazer ou não fazer aquilo que bem entenderem,
salvo se houver lei em contrário. A extensão do sentido da palavra lei é restrito, ou seja, somente
os atos emanados do Poder Legislativo, respeitando-se o processo estabelecido pela
Constituição Federal (SILVA, 2012, p. 84).
Como visto, não há lei, proveniente do Poder Legislativo, e elaborada segundo o procedimento
previsto na Constituição Federal de 1988, que proíba a terceirização, nem que imponha os
conceitos de atividade-fim e atividade-meio como parâmetros de sua licitude. Desse modo, a
Súmula 331 apresenta verdadeiro conteúdo normativo legal, pois apresenta caráter geral e
abstrato, aplicado com verdadeira força de lei.
Além do critério fixado para considerar lícita a terceirização (atividade-meio) não encontrar
fundamento em lei, a própria jurisprudência trabalhista não é unânime em conceituar o que
seriam atividade-fim e atividade-meio da empresa. Nesse sentido João Pedro Ferraz dos Passos
(2013, p. 117).
“A diferença entre atividade-fim e atividade-meio nem sempre é clara, por
isso os processos sobre esse tema são julgados a partir da análise de cada caso
concreto, o que dificulta não só o julgamento das demandas, mas também a
ação das empresas no tocante à consciência do que pode e do que não pode
ser alvo de contratação terceirizadas.”
Dessa forma, a interpretação conferida pela Justiça do Trabalho afeta diretamente a produção,
comercialização e exportação dos produtos derivados da cana-de-açúcar. Tal interpretação não
encontra fundamento legal, pois não há lei (formal e material) que regule de modo geral a
terceirização, não havendo embasamento para os critérios da atividade-meio e atividade-fim
como parâmetros de licitude da terceirização.
O princípio da legalidade apresenta fundamental importância para o exercício da atividade
econômica, pois permite aos empresários estabelecer parâmetros para o cálculo dos custos de
produção, e consequentemente, organizar toda sua atividade produtiva, conforme explica Fábio
Ulhoa Coelho (2012, p. 857):
100
“Vê-se então, que o princípio da legalidade cumpre a função de nortear os
cálculos dos empresários, na organização de sua empresa privada, em especial
na fixação dos preços dos produtos e serviços oferecido ao mercado. Sabendo
que não poderá ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei, e conhecendo o conteúdo das leis em vigor incidentes sobre a
atividade econômica que explora, o empresário está em condições de proceder
os cálculos necessários para a obtenção de lucro na comercialização de
produtos ou prestação de serviços”.
Além disso, a insegurança jurídica gerada pela falta de uniformização jurisprudencial sobre o
entendimento do conceito de atividade-fim e atividade-meio gera assimetrias concorrenciais,
na medida em que empresas atuantes no mesmo mercado relevante recebem tratamento
distintos. Dessa forma, viola os princípios constitucionais da ordem econômica, como livre
iniciativa e livre concorrência. Não obstante, também desrespeita o princípio do tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte, previsto no artigo 170, IX, da Constituição
Federal de 1988.
4.3.2 Ordem econômica
A ordem econômica apresenta como fundamentos a valorização do trabalho e a livre iniciativa,
com o objetivo de assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observando os princípios elencados nos incisos do artigo 170 da Constituição Federal de 1988.
Destaca-se que, “na valorização do trabalho humano, o trabalho é valorizado como base do
processo produtivo, aliado, nesses termos, à livre iniciativa” (FERRAZ JUNIOR, 2004, p. 3).
A livre inciativa, além de fundamento da ordem econômica, juntamente com os calores sociais
do trabalho, é um fundamento da República Federativa do Brasil, conforme artigo 1º, IV, da
Constituição Federal de 1988. Eros Roberto Graus (2007, p. 204) apresenta alguns sentidos que
ela contempla:
“a) liberdade de comércio e indústria (não ingerência do Estado no domínio
econômico):
a.1) faculdade de criar e explorar uma atividade econômica a título
privado – liberdade pública;
101
a.2) não sujeição a qualquer restrição estatal senão em virtude de
lei – liberdade pública;
b) liberdade de concorrência:
b.1) faculdade de conquistar a clientela, desde que não através de
concorrência desleal – liberdade privada;
b.2) proibição de formas de atuação que deteriam a concorrência –
liberdade privada;
b.3) neutralidade do Estado diante do fenômeno concorrencial, em
igualdade de condições dos concorrentes – liberdade pública”. (grifo
nosso)
Dessa forma, afirmar a livre iniciativa como fundamento é reconhecer na liberdade um dos
fatores estruturais da ordem, é afirmar a autonomia empreendedora do homem na configuração
da atividade econômica (FERRAZ JÚNIOR, 1989). A livre iniciativa deve ser compreendida
como um modo qualificado de agir. Por sua vez, o Estado, como agente normativo e regulador
da atividade econômica, exerce suas funções na forma lei, como determina o caput do artigo
174 da Constituição Federal de 1988.
Desse modo, o poder regulamentar do Estado deve ser exercido mediante lei. Assim, lei autoriza
o Estado a intervir para regular a atividade econômica, mas “não pode, ela própria, fomentar
abusos, ao desigualar concorrentes em condições de igualdade, criando situações e privilégio
de uns sobre outros, nem contrariar os objetivos constitucionais corporificados em princípios.
Isso não seria regular, mas introduzir uma forma anti-concorrencial” (FERRAZ JUNIOR, 2014,
p. 10)
Na aplicação da lei, o juiz deve atender aos fins sociais que ela se destina e às exigências do
bem comum, nos termos do artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(BRASIL, 1942). Dessa forma, as decisões judiciais apresentam uma menor discricionariedade
do que as decisões legislativas. A jurisprudência como fonte de direito encontra limite na
racionalidade do comando legal e constitucional, como forma de impedir o seu indevido
exercício arbitrário (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 15).
A imposição de obrigação não prevista em lei, por força de sentença trabalhista, em um caso
específico, como a contratação direta de empregados que atuam na atividade de corte,
102
carregamento e transporte, traz implicações diretas para a livre iniciativa e para os princípios
que norteiam a valorização do trabalho humano (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 6). A Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal apresentou entendimento nesse sentido, de que a proibição
genérica de terceirização interfere no princípio fundamental de livre iniciativa:
“A proibição genérica de terceirização calcada em interpretação
jurisprudencial do que seria atividade-fim pode interferir no direito
fundamental de livre iniciativa, criando, em possível ofensa direta ao art.5º,
inciso II, da CRFB, obrigação não fundada em lei capaz de esvaziar a
liberdade do empreendedor de organizar sua atividade empresarial de forma
lícita e da maneira que entenda ser mais eficiente” (STF – Emb. Decl. No Ag.
Reg. no Recurso Extraordinário com Agravo 713.211 – MG. Relator Ministro
Luiz Fux, Primeira Turma – d.j. 01/04/214)
As decisões de proibição da terceirização com base nas distinções atividade-meio e atividade-
fim apresentam distorções concorrenciais, na medida de em que a terceirização representa o
exercício de liberdade na estruturação e na gestão empresarial. Envolve, nesse sentido, “análise
de custo, juízo de oportunidade e percepção das exigências de especialização das tarefas
econômicas” (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 7).
O planejamento da organização empresarial está submetido à livre iniciativa, pois se insere na
atividade gerencial, que se localiza o interesse difuso da concorrência, sujeito às normas
constitucionais, legais e regulamentares pertinentes (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 16). Dessa
forma, uma distinção entre atividade-meio e atividade-fim não pode obrigar nem limitar a
capacidade competitiva de uma empresa, nem cercear sua livre iniciativa.
Isto porque o Estado deve respeitar o princípio da neutralidade concorrencial, que exige
razoabilidade e isonomia em sua atuação regulatória. A razoabilidade deve ser pautada pelo
interesse público na atuação estatal. Dessa forma, o Estado deve ser neutro perante concorrentes
que atuem, em igualdade de condições, no livre mercado (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 18):
“Esse princípio define-se, em primeiro lugar, pela atuação imparcial do
interesse comum em face dos agentes concorrentes com seus interesses
provados num mercado livre ou pela não interferência estatal, no sentido de
103
que não deve ser criadora de privilégios na concorrência entre concorrentes
em um mercado relevante”.
O princípio da neutralidade concorrencial garante a igualdade de oportunidades para os agentes
econômicos. Dessa forma, em razão do artigo 170 da Constituição Federal, o Estado não pode
privilegiar concorrentes, desequilibrando a igualdade concorrencial, princípio de justiça
aplicado à concorrência (FERRAZ JUNIOR, 2014, p. 19).
Tércio Sampaio Ferraz Junior (2014, p. 19-20) apresenta duas características do princípio da
neutralidade do Estado perante a livre concorrência: uma primeira de que a normatização do
princípio da livre iniciativa não pode esvaziar o seu sentido. Deve ser fundada, portanto, na
equalização de chances entre partes desiguais, evitando inviabilizar a atividade econômica de
determinado grupo em face de outros; a segunda de que a medida normativa não pode prejudicar
certos concorrentes contra outros, afastando-os do mercado ou retirando-lhes ou
enfraquecendo-lhes a possibilidade de competir.
Deve-se questionar, portanto, se uma decisão judicial deve subsistir, caso seus efeitos
provoquem uma desigualdade entre concorrentes, afetando a livre iniciativa, ao criar um ônus
excessivo para uns em face de uma desoneração para outros. Ademais, a assimetria de mercado
criada pela decisão, com desdobramentos negativos para o ambiente concorrencial, viola o
princípio da neutralidade concorrencial do Estado.
Além disso, o artigo 170 da Constituição Federal de 1988, ao elencar os princípios que regem
a ordem econômica, apresenta um interesse social ao estabelecer o favorecimento das empresas
de pequeno porte. A terceirização gera uma desconcentração do capital, promovendo empresas
de menor porte, que recebem um tratamento especial por parte da Constituição Federal.
A empresas de pequeno porte apresentam uma função relevante, na medida em que possuem
um maior potencial na geração de empregos e a maior quantidade de empresas ofertando
produtos e serviços beneficiam os consumidores, conforme o entendimento do Supremo
Tribunal Federal:
“O conjunto desses dispositivos constitucionais corporifica o chamado
princípio do tratamento favorecido para microempresas e empresas de
104
pequeno porte, o qual, para além de razões jurídicas, está fundado em questões
econômicas e sociais ligadas à necessidade de se conferirem condições justas
e igualitárias de competição para essas empresas. Segundo dados estatísticos
públicos e privados, 97,5% (noventa e sete e meio por cento) das empresas
registradas em nosso país são microempresas ou empresas de pequeno porte.
Essas empresas geram 57% dos empregos formais e respondem por 26% da
massa salarial total do Brasil” (STF – RE 627.543-RS, Relator Ministro Dias
Toffoli, d.j. 17/06/2011).
Dessa maneira, para Tércio Sampaio Ferraz Junior (2014, p. 26), exigir a integração vertical
das atividades de corte, carregamento e transporte, como se fossem sua atividade-fim),
desfavorece a empresa de pequeno porte e produz efeitos inversos à busca de pleno emprego e
à diminuição das desigualdades.
Isto posto, observa-se, inicialmente, a violação da prerrogativa constitucional conferida ao
Poder Legislativo para editar normas gerais. A Súmula 331 extrapola a sua função interpretativa
e cria obrigação não exigida em lei, violando o princípio constitucional da legalidade, Além
disso, a proibição cria um ônus excessivo para um agente econômico em face de uma
desoneração para outros, desequilibrando a concorrência. Essa decisão fere, portanto diversos
princípios concorrências atinentes à ordem econômica, como a livre iniciativa, livre
concorrência, neutralidade concorrencial do Estado e razoabilidade.
Além disso, mesmo que se entenda que a aplicação da Súmula 331 do Tribunal Superior do
Trabalho, ao restringir a terceirização à atividade-meio da empresa, não viola os princípios
constitucionais da livre iniciativa, livre concorrência, neutralidade concorrencial do Estado,
valorização da pequena empresa e da legalidade, cabe analisar se as atividades de corte,
carregamento e transporte de cana-de-açúcar se enquadram no conceito de atividade-fim da
usina.
4.4 TERCEIRIZAÇÃO DO CORTE, CARREGAMENTO E TRANSPORTE E CANA-DE-
AÇÚCAR: ATIVIDADE-FIM?
No Brasil, a terceirização é regulamentada pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho,
que considera ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o
105
vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvos nos casos de: trabalho temporário;
serviços de vigilância, de conservação e de limpeza, bem como os serviços especializados
ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação
direta.
Destaca-se que a Súmula 331 não fornece qualquer elemento para conceituar atividade-meio
do tomador. Como analisado, esse critério se mostrou insuficiente para regulamentar a licitude
da terceirização, gerando divergências doutrinárias e jurisprudenciais. O critério da atividade-
fim e da atividade-meio mostrou-se impreciso, uma que vez que preexiste, em qualquer
processo produtivo, atividade-fim específica (SANTOS, 2008, p. 167).
O Ministro João Oreste Dalazen, à época em que presidia o Tribunal Superior do Trabalho,
reconheceu a insuficiência do critério da atividade-fim para determinação da licitude da
terceirização, afirmando que esta é uma das principais fontes de problemas causados pela
terceirização:
“A definição de atividade-fim como determinante da regularidade do
procedimento de terceirização constitui questão tormentosa e atormentadora,
tanto para a doutrina, quanto para a jurisprudência. Essa, aliás, a fonte mais
aguda dos inúmeros problemas causados pelo fenômeno da terceirização no
universo das relações de trabalho” (TST-SS-4641-89.2012.5.00.0000, Relator
Ministro Presidente João Oreste Dalazen, d.j. 17/05/2012).
Homero Batista Mateus da Silva (2009, p. 162) apresenta alguns exemplos conflitantes na
jurisprudência sobre a configuração e atividade-fim e atividade-meio: compensação noturna de
cheques; procedimento de solda, pintura e da colocação de vidros e pneus no veículo; serviços
de servente, secretaria, merendeira e fiscalização em uma escola.
A dificuldade enfrentada em definir o que seria a atividade-fim e a atividade-meio do tomador
de serviços fez com que parte da doutrina abandonasse tais critérios, defendendo a licitude da
terceirização em ambas as hipóteses. Nesse sentido, Ophir Cavalcanti Júnior (1993, p. 111)
defende que “o que importa é aferir, em cada caso, a existência de legalidade ou ilegalidade na
relação, independentemente de ser realizada em atividade-meio ou atividade-fim da empresa
contratante”.
106
Na mesma percepção, Luiz Carlos Amorim Robortella (1994, p. 264) defende a terceirização
de qualquer etapa do ciclo produtivo, desde que presentes a especialização da atividade, a
direção da atividade pelo prestador e sua idoneidade econômica:
“O que caracteriza esses contratos é a especialização do trabalho, a direção da
atividade pelo prestador e sua idoneidade econômica. Presentes esses
pressupostos, pouco importa se realize o trabalho no estabelecimento da
empresa tomadora, se trate de atividade-fim ou atividade-meio. (...)
Inexistindo fraude, a empresa pode terceirizar ou subcontratar determinador
ciclo do processo produtivo que, pela evolução da tecnologia, se tenha tornado
desinteressante técnica e economicamente, mesmo que componha sua
atividade-fim”.
Observa-se, desta forma, que há uma tendência doutrinária e jurisprudencial em afastar a
definição de atividade-meio e atividade-fim para se verificar a licitude da terceirização. Ela
seria possível, portanto, na ausência do intuito de fraude aos direitos trabalhistas.
Por sua vez, parte da jurisprudência trabalhista entende que ainda não se encontrou um critério
melhor, defendo a proibição de terceirizar a atividade-fim do empreendimento. Entretanto, a
definição de atividade-meio e atividade-fim não é apresentada de forma satisfatória, gerando
insegurança jurídica aos operadores econômicos.
Messias Pereira Donato (2008, p. 304) observa ser comum encontrar na jurisprudência a
compreensão da Súmula 331 no sentido de proibir a terceirização em atividades essenciais da
empresa, entendidas como atividades-fim. Todavia, a Súmula 331 não insere o vocábulo
essencial em seu texto. Da mesma forma, não menciona atividades normais e atividades
principais. A atividade-meio seria um instrumento, que tem como horizonte a atividade
principal (DONATO, 2008, p. 304):
“Toda atividade voltada para a consecução dos objetivos empresariais ou se
gradua em termos de necessidade ou é essencial. A graduação em si não retira
à atividade necessária ou essencial a característica de atividade que visa ao
107
alcance da finalidade do empreendimento. O essencial tem a conotação de
fundamental, mas não de principal”.
Entretanto, a sentença proferida pela 2ª Vara do Trabalho de Araraquara, no processo 0000994-
89.2013.5.15.0079-ACP, que decidiu pela proibição da terceirização das atividades de...
apresenta a fundamentação de essencialidade das atividades e, portanto, configuração de
atividade-fim:
“De outra banda, serviços sem os quais a atividade econômica a que se
propõem a empresa não se realiza, ou não sem completa, são serviços
inerentes ao seu objeto social e, por isso, nesses casos não se permite a
terceirização, pois implicaria, em última instância, na diminuição
injustificável de direitos trabalhistas dos prestadores de serviços, em relação
aos empegados diretos da empresa, desconsiderando-se que todos empregam
sua chamada força de trabalho em prol do mesmo objeto, motivo pelo qual
essa terceirização acabaria por afrontar o princípio da igualdade, desaguando
em ofensa ao valor social do trabalho e ao princípio-guia da dignidade da
pessoa humana. (...)
Uma usina de açúcar e álcool necessita, para o desenvolvimento de sua
atividade-fim, cultivar plantações de cana-de-açúcar, em terras próprias ou
arrendadas, como acontece no Estado de São Paulo há décadas. O setor
sucroalcooleiro sempre funcionou assim” (grifo nosso).
As atividades de plantio, tratos culturais, corte, carregamento e transporte seguramente são
essenciais para a produção de açúcar, álcool e bioenergia. Entretanto, desse modo, como todo
o fornecimento de matéria-prima e insumos, incluindo o seu transporte, é essencial para todos
os setores, não poderiam mais ser terceirizados. Pensando dessa maneira, o transporte de álcool
para o posto de gasolina é essencial, bem como o transporte de açúcar para uma indústria de
chocolates ou de refrigerantes. Caso se entenda que os serviços essenciais não poderão ser
terceirizados, todas essas atividades deverão ser realizadas diretamente pela indústria
compradora de insumos e matéria-prima.
Deve-se destacar que a Súmula 331 não apresenta a essencialidade como requisito de ilicitude
da terceirização. O essencial tem o significado de fundamental, mas não de principal. A
108
atividade-fim, trazida pela súmula, refere-se à atividade principal da empresa, ou seja, o seu
objetivo final de produção.
A atividade-fim de uma usina de cana-de-açúcar não é o plantio, corte, carregamento e
transporte de cana-de-açúcar. Essas são atividades essenciais, mas não principais. Além disso,
atividade-fim de uma usina não é transportar cana-de-açúcar, mas sim produzir açúcar, álcool,
bioenergia e outros derivados.
Dessa forma, a decisão que se pauta na essencialidade do serviço para proibir a terceirização de
determinada atividade viola a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que não apresenta
esse critério como definidor de sua licitude. Apesar das inúmeras críticas que se faz ao critério
da atividade-fim, mesmo que ele fosse aplicado, a atividade de corte, carregamento e transporte
de cana-de-açúcar poderia ser terceirizada, pois não se configura atividade-fim da usina, e sim
atividade-meio, por ser instrumento viabilizador do desenvolvimento de sua atividade principal.
Conclui-se, portanto, incialmente, que o critério da atividade-fim da empresa mostrou-se
insuficiente para regulamentar a terceirização e o seu uso, da maneira em que as decisões da
Justiça do Trabalho estão aplicando, provoca assimetrias concorrenciais, violando os preceitos
constitucionais da livre iniciativa, livre concorrência, neutralidade concorrencial do Estado e
do tratamento favorecido à empresa de pequeno porte. Além disso, discute-se a validade desse
critério em face do princípio da legalidade, base do Estado Democrático de Direito. Por fim,
entende-se que, mesmo com a aplicação do critério da atividade-fim, os serviços de corte,
carregamento e transporte poderiam ser terceirizados, por serem atividades especializadas,
instrumentais ao desenvolvimento da atividade-fim da usina, de produzir açúcar, álcool e
bioenergia.
109
5 CONCLUSÃO
No Brasil, a regulamentação da terceirização ocorre pela Súmula 331 do Tribunal Superior do
Trabalho, que a permite, dentre outras hipóteses, para serviços especializados que configurem
atividade-meio da empresa. Esse critério, como analisado, apresentou-se insuficiente para
resolver a questão, gerando cada vez mais disputas judiciais sobre a licitude ou ilicitude da
terceirização.
A terceirização apresenta diversas vantagens econômicas para empresa, como ... Entretanto, é
inegável que, em muitos casos, a terceirização é utilizada exclusivamente para a redução de
custos, com o consequente desrespeito dos direitos trabalhistas.
Apesar de ser considerada uma técnica moderna de organização empresarial, o trabalhador não
pode sofrer com a violação de seus direitos. Dessa forma, é necessária uma melhor
regulamentação da matéria, com a edição de uma lei geral e abstrata, que traga requisitos
objetivos para a configuração da licitude da terceirização.
A doutrina reconhece a dificuldade em se conceituar atividade-fim e atividade-meio da
empresa. Dessa forma, apresenta como critério de licitude da terceirização a inexistência dos
elementos caracterizadores da relação de emprego. Por esse critério, não importa qual atividade
estaria sendo terceirizada, mas somente se existem ou não os seguintes elementos: prestação de
serviços por pessoa física, com pessoalidade, de forma não eventual, subordinada e com
onerosidade Na formação de uma relação de emprego se fazem necessários graus intensos de
subordinação, pessoalidade e habitualidade. Já na terceirização esses requisitos devem ocorrer
em graus moderados,
Entretanto, a Justiça do Trabalho mantém a aplicação do critério da atividade-fim como
parâmetro de ilicitude da terceirização. Desse modo, o trabalho discutiu se o corte,
carregamento e transporte configurariam atividade-fim da usina. Entendeu-se que não. Essas
atividades são essenciais, mas não fins da empresa. Destaca-se que a Súmula 331 não traz a
expressão essencial. Dessa forma, ela permite a terceirização de atividade-meio especializada.
Como demonstrado, a atividade de CCT é altamente especializada e não é atividade principal
110
da usina, mas sim uma atividade secundária importante para atingir o seu objetivo final:
produção de açúcar, álcool e bioenergia,
A aplicação do critério da atividade-fim é contraditória também na jurisprudência trabalhista.
Dessa forma, uma decisão judicial, ao proibir um agente específico de terceirizar suas
atividades, somente em uma região, permite, em sentido negativo (não se proíbe nem se obriga
a omissão), a outro agente uma vantagem anticompetitiva, que fere a livre iniciativa e a livre
concorrência. Além disso, a decisão, no exercício da competência judicante, fere a reserva legal,
ao criar restrição não prevista em lei, e o princípio da neutralidade concorrencial do Estado.
Por fim, uma jurisprudência que, contrariamente aos princípios constitucionais, exige a
integração vertical dessas atividades, desfavorece as empresas de pequeno porte e produz
efeitos inversos à busca de pleno emprego e à diminuição das desigualdades.
Conclui-se, portanto, que as atividades de corte, carregamento e transporte podem ser
terceirizadas, pois não configuram atividade-fim da usina, estando em conformidade com a
Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho. Por fim, conclama-se ao Poder Legislativo a
necessidade de uma lei que regulamente a terceirização, reduzindo/minimizando a insegurança
jurídica que atinge os agentes econômicos.
111
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