O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ENCRUZILHADA DO...
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O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ENCRUZILHADA DO
PROGRESSO DA CIÊNCIA COM A PROTEÇÃO DA VIDA
HUMANA: ANÁLISE DA DECISÃO DA ADI 3510
Sylvio Alarcon Bruno Rodriguez Caldas
Nelson Nery Junior
INTRODUÇÃO
A importância atualmente atribuída ao Poder Judiciário brasileiro não encontra
precedentes em nossa história. Não apenas o número de demandas aumenta
progressivamente ano a ano, mas também, e principalmente, as matérias
submetidas a julgamento perante as cortes têm transcendido o mero interesse
individual das partes, repercutindo em toda a sociedade. Esse fenômeno alcança
também o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Judiciário nacional, que
ultimamente tem sido defrontado com delicadas e polêmicas questões, de alta
relevância política e social e de grande impacto na opinião pública.
Nesse sentido, das muitas decisões suas que poderiam ser trazidas à baila,
destaca-se a proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3510/DF, da relatoria
do Ministro Ayres Britto, em que se questionou a compatibilidade do art. 5º da Lei
11.105/2005, a Lei de Biossegurança – que autoriza, sob certas condições e para
determinados fins, a pesquisa com células-tronco embrionárias –, com os arts. 1º, III
(dignidade da pessoa humana), e 5º, “caput” (inviolabilidade do direito à vida) da
Constituição Federal. O dispositivo legal foi alfim julgado constitucional pela estrita
margem de seis votos a cinco, demonstrando a polêmica que o julgamento causou
no seio do próprio Tribunal, mobilizando também a imprensa e o interesse público.
Desnecessário ressaltar a importância da decisão, especialmente em termos
científicos, mas também jurídicos. Quanto a estes, que interessam mais de perto à
presente análise, cumpre destacar que o Supremo foi instado a traçar os limites da
proteção ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana, manifestando-se acerca
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do início da vida e dos parâmetros de licitude para a manipulação científica de
materiais de origem humana. Para além de questões jurídicas, o Supremo Tribunal
Federal se viu às voltas com questões de ordem científica, com profundos
desdobramentos nos planos moral e religioso, que tiveram obrigatoriamente de ser
enfrentadas como antecedentes lógicos à formação da convicção fundamentada dos
julgadores.
Partindo dessas constatações, busca-se o exame analítico do conteúdo dos
votos dos Ministros, exarados no julgamento da ADI 3510/DF, destacando e
analisando as principais linhas argumentativas aventadas pelos magistrados, os
raciocínios e técnicas de interpretação e decisão adotadas, bem como a importância
e o conteúdo da intervenção dos “amici curiae” e sua influência relativamente ao
convencimento dos julgadores. A investigação pretende pôr em relevo, a partir desta
paradigmática e histórica decisão, o papel, assumido pelo Poder Judiciário em geral,
e pelo Supremo Tribunal Federal em particular, de espaço de discussão e decisão a
respeito de relevantes questões sociais, atuação que vai muito além da típica função
de “aplicar a lei ao caso concreto”. Esta tarefa, que tem sido assumida pelas cortes
judiciais das complexas sociedades democráticas contemporâneas, exige, como
consequência, renovadas reflexões sobre o tradicional arquétipo da separação dos
poderes. É neste contexto que o presente estudo, dentro dos limites de sua
proposta, insere-se.
2 O CONTROLE JUDICIAL DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LE IS COMO
GARANTIA DA SUPREMACIA DOS VALORES CONSTITUCIONAIS
O constitucionalismo, movimento político e jurídico de inspiração democrático-
liberal que floresceu na Europa nos séculos XVII e XVIII em reação ao absolutismo
monárquico, traz imanente a idéia de limitação do poder por meio da distribuição de
competências e do reconhecimento de direitos dos cidadãos1. Uma das mais
sensíveis modificações no cenário jurídico daí exsurgidas corresponde ao advento
das constituições escritas, compostas de comandos normativos determinantes da
1 Basta lembrar, neste passo, aquilo que propugnava o art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem a separação dos poderes determinada, não tem constituição”.
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organização fundamental do Estado, das formas de aquisição, exercício e perda do
poder político e dos direitos dos cidadãos2. Cuidavam-se de verdadeiras
normatizações jurídicas da política, criando-se um pretenso estatuto do poder, que,
dada a vulnerabilidade dos princípios e das regras que as compunham, não
poderiam ser deixadas ao alvedrio dos detentores desse poder, sob pena de não se
conseguir alcançar as finalidades a que se predispunham as constituições. Cuidou-
se, então, de estabelecer procedimentos especiais, mais gravosos, para a
modificação das normas constitucionais, nascendo, assim, as chamadas
constituiões rígidas3.
Como conseqüência da rigidez, os atos tendentes à modificação da
constituição devem observar os parâmetros e as formalidades fixados por ela
própria, sob pena de resultarem inválidos. Isto implica na necessidade de todos os
atos dos destinatários dos comandos normativos do texto constitucional guardarem
estrita conformidade com tais preceitos, em seus aspectos formal e material, sob
pena de a própria idéia de constituição restar esvaziada, dada a possibilidade de sua
modificação pelos procedimentos legiferantes ordinários, o que implicaria na
redução da constituição à condição das demais leis e, em última análise, do próprio
poder constituinte ao poder constituído.
A materialização dos preceitos constitucionais em um documento escrito,
somada à rigidez de que se revestem tais disposições, conformam um ambiente
propício ao surgimento de mecanismos de controle da conduta dos destinatários de
tais comandos. Em verdade, a existência desses instrumentos é exigência de
garantia da autoridade da própria constituição4.
Dessa forma, impõe-se a necessidade de o próprio sistema jurídico
estabelecer institutos e mecanismos destinados a aferir a compatibilidade das
condutas dos destinatários do texto constitucional com os seus comandos,
promovendo, destarte, a defesa da constituição e do Estado constitucional.
Denominam-se garantias da constituição5 os meios e institutos destinados a
2 Cf. LEAL, Roger Stiefelmann. O efeito vinculante na jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 13-15. 3 Ibid., p. 15-16. 4 Neste sentido, não obstante o constitucionalismo europeu do século XIX ter produzido constituições escritas e rígidas, a ausência de mecanismos eficientes de fiscalização da constitucionalidade contribuiu para a pouca efetividade da normatividade constitucional. 5 As garantias da constituição não se confundem com as garantias constitucionais, embora ambas se prestem à mesma finalidade – promover a efetividade das disposições constitucionais. As primeiras voltam-se à preservação da própria constituição. Estas, diferentemente, possuem alcance subjetivo,
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assegurar a observância, aplicação, estabilidade e conservação das normas
constitucionais6. Dentre os variados mecanismos destinados a essa finalidade,
importa destacar o controle da constitucionalidade das leis e atos normativos do
Estado, que atualmente constitui um dos mais relevantes instrumentos de controle
do cumprimento das normas constitucionais e de desenvolvimento e atualização da
própria constituição7.
Em linhas gerais, o controle de constitucionalidade consiste na verificação da
compatibilidade das leis e dos atos normativos com a constituição, em seus
requisitos formais e materiais, resultando da aferição de contrariedade entre o objeto
e o parâmetro de controle o reconhecimento da invalidade da espécie normativa
impugnada. Como se vê, a existência de mecanismos de controle de
constitucionalidade representa garantia da constituição porque visa impedir a
aplicação de normas jurídicas a ela contrárias, preservando seu status normativo.
Embora o controle de constitucionalidade possa ser exercido por órgãos
políticos – Legislativo e Executivo –, adquiriu maior relevância a fiscalização
exercida pelo Poder Judiciário, o chamado controle judicial de constitucionalidade,
ou jurisdição constitucional8. Nesse passo, dois modelos básicos de organização da
jurisdição constitucional se apresentam: o sistema difuso, de origem norte-
americana (Marbury v. Madison), pelo qual todos os juízes e tribunais são
competentes para realizar o controle de constitucionalidade das leis (cumulação da
jurisdição legal com a jurisdição constitucional); e o sistema concentrado, de origem
austríaca (Constituição austríaca de 1920), pelo qual apenas um órgão estatal, o
Tribunal Constitucional, é competente para realizar o controle de constitucionalidade
das leis (monopólio da jurisdição constitucional pelo Tribunal Constitucional).
Em sua configuração atual, o sistema brasileiro de controle judicial de consistindo na possibilidade de os cidadãos exigirem do Estado a proteção dos seus direitos e o reconhecimento dos meios processuais adequados a tal finalidade. A esse respeito, cf. Canotilho, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 888. Com terminologia diversa, aludindo à “garantia da constitucionalidade” para designar as da primeira espécie: MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1983. t. II. p. 306. 6 Canotilho. Direito constitucional... op. cit. p. 887-888. 7 Ibid. p, 889. 8 “Jurisdição constitucional” é uma expressão plurívoca, posto empregada nas mais diversas acepções. Numa acepção ampla, é empregada para designar toda atividade jurisdicional que interpreta e aplica a Constituição. Numa acepção restrita, é utilizada para indicar a atividade exercida pelos Tribunais Constitucionais, nos sistemas jurídicos que adotam o chamado controle concentrado de constitucionalidade. Fugindo dos extremos, neste trabalho adota-se a expressão jurisdição constitucional como sinônimo de controle judicial de constitucionalidade das leis e dos atos normativos.
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constitucionalidade das leis e atos normativos é apontado como exemplo de sistema
misto, em que convivem os dois modelos clássicos de controle judicial supra
descritos: o difuso e o concentrado.
Inicialmente, porém, o direito brasileiro acolheu o modelo difuso de controle
de constitucionalidade, inequivocamente por influência do judicial review dos
Estados Unidos. Com efeito, a introdução do controle judicial, sob a forma difusa,
deu-se com o advento da Constituição Republicana de 1891 (arts. 59, § 1º, “a” e “b”),
e manteve-se, com pequenas variações, nas Constituições de 1934, 1937 e 1946.
A Emenda Constitucional n. 16/1965 inaugurou, no direito brasileiro, a forma
concentrada de controle de constitucionalidade. A competência para exercer esta
fiscalização foi reservada ao Supremo Tribunal Federal, que seria provocado,
exclusivamente, pelo Procurador-Geral da República, mediante a “representação
contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa federal ou estadual”
(art. 110, I, “k”). Diversamente do controle difuso, apreciação da constitucionalidade
da norma jurídica contestada faz-se em abstrato – isto é, fora do âmbito de um caso
concreto cuja decisão dependa do juízo de constitucionalidade –, em um processo
objetivo, cuja decisão possui eficácia “erga omnes”.
A partir de então, passaram a conviver no direito brasileiro os dois modelos
clássicos de controle de constitucionalidade, compondo um “sistema misto” de
jurisdição constitucional.
A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 1, de 1969, não
introduziram modificações de nota nessa configuração.
O advento da Constituição Federal de 1988, por outro lado, provocou
verdadeira reviravolta no controle de constitucional do Brasil, dada a valorização e o
incremento dos mecanismos componentes da jurisdição constitucional concentrada.
A sistemática do controle difuso permaneceu inalterada: subsiste o poder de todos
os órgãos judiciais de controlar, incidentalmente, a constitucionalidade das leis,
afastando do caso concreto a(s) norma(s) reputada(s) inconstitucional(is), bem como
a competência do Senado para suspender a execução, no todo ou em parte, de lei
declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal
proferida no exercício do controle difuso (art. 52, X). Por outro lado, as inovações
introduzidas no âmbito do controle concentrado demonstram a preocupação do
legislador constituinte originário em consagrar meios diversos para fazer valer os
preceptivos constitucionais, ampliando-se as ações para acionar o Supremo Tribunal
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e o rol dos legitimados a propô-las.
Com efeito, a representação contra inconstitucionalidade e a representação
interventiva, ora denominadas ação direta de inconstitucionalidade (ADI genérica) e
ação direta de inconstitucional interventiva (ADI interventiva), dividem espaço com
ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI por omissão), da ação
declaratória de constitucionalidade (ADC)9 e da argüição de descumprimento de
preceito fundamental (ADPF). Com exceção da ADI interventiva, cuja legitimidade
ativa permanece restrita ao Procurador-Geral da República (art. 36, III, da CF), as
demais ações agora podem ser propostas por nove entes legitimados, nos termos
do art. 103 da Constituição Federal10.
É neste cenário que se situa o objeto de interesse desta análise. A ADI é o
instrumento que, por excelência, se presta a acionar o Supremo Tribunal Federal a
verificar a compatibilidade de leis e atos normativos com a Constituição Federal.
Uma vez instaurada a relação processual, por força da propositura da ADI, dá-se a
formação de um processo objetivo, diverso dos processos judiciais convencionais,
vez que na ADI não há lide, posto não haver conflito de interesses qualificado por
uma pretensão resistida. A finalidade da ação não é acionar o Supremo Tribunal
Federal para defender um direito subjetivo. O processo objetivo é unilateral, vez que
nele não há que se falar em partes, nem em interesse jurídico individual e
específico, tampouco em relação concreta a ser julgada. Estes elementos são
estranhos ao controle abstrato de constitucionalidade, em que os legitimados para
provocá-lo não postulam interesses subjetivos; sua pretensão consiste em
promover, em nome do interesse público de controle, a defesa da ordem
constitucional por meio da apreciação da validade de lei ou ato normativo em
abstrato, tendo como parâmetro a Constituição.11
9 Vale salientar que a ação declaratória de constitucionalidade foi introduzida na CF e incorporada à sistemática da jurisdição constitucional concentrada por meio da Emenda Constitucional n. 3, de 1993. 10 In verbis, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/2004: “Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I – o Presidente da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V – o Governo de Estado ou do Distrito Federal; VI – o Procurador-Geral da República; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII – partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”. Por força do disposto no art. 2º, I, da Lei n. 9.882/1999, que disciplinou o processo e o julgamento da ADPF, os legitimados para propor esta ação são os mesmos que os da ADI. 11 Cf. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 221-223; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de
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É precisamente o que se tem na ADI 3510. O postulante – Procurador-Geral
da República –, longe de buscar, perante o Supremo Tribunal Federal, a proteção de
um interesse individual, atua tendo em vista um interesse público, qual seja, a
garantia da Constituição Federal (mais precisamente, seus arts. 1º, III, e 5º, “caput”)
contra uma possível violação perpetrada por obra do Legislativo ordinário. Assim o
faz por que se convenceu de que o art. 5º da Lei de Biossegurança ofende, em tese,
dispositivos constitucionais. A apreciação da validade constitucionalidade do
dispositivo citado dá-se em abstrato, isto é, fora no âmbito de um caso concreto, em
que se discutiriam interesses subjetivos. As decisões proferidas pelo Supremo
Tribunal Federal, em sede de controle concentrado e abstrato de
constitucionalidade, alcançam todos os membros da comunidade – não apenas as
“partes” da ação –, ou seja, são dotadas de eficácia “erga omnes”, e também efeito
vinculante, nos termos do art. 102, § 2º, da Constituição Federal e do art. 28,
parágrafo único, da Lei n. 9.868/1999. Isto quer dizer que toda a comunidade estatal,
bem como os Poderes Executivo e Judiciário, devem guardar observância em
relação às decisões tomadas Supremo Tribunal Federal nas ADIs.
Vê-se, pois, que a decisão de mérito prolatada na ADI 3510 repercutirá,
também em termos jurídicos, sobre toda a sociedade, bem como em relação ao
Poder Judiciário e ao Poder Executivo, que não poderão contrariá-la em suas
atividades típicas, estejam ou não de acordo com o resultado do julgamento.
3 A ADI 3510-DF: VISÃO GERAL
Em 16 de maio de 2005, o então Procurador-Geral da República, Cláudio
Fonteles, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade (ADI) perante o Supremo
Tribunal Federal, com fundamento no art. 102, I, “a”, da Constituição Federal de
1988, buscando a declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, “caput” e
parágrafos, da Lei de Biossegurança, por ofensa aos preceitos constitucionais dos
arts. 1º, III, e 5º, “caput”.
constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 250-251 e 258; ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 42-43.
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O dispositivo legal impugnado, que constitui o objeto do controle da
constitucionalidade a ser exercido pelo Supremo Tribunal Federal, apresenta a
seguinte redação:
Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de
células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos
por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento,
atendidas as seguintes condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data de
publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação
desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da
data de congelamento.
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem
pesquisas ou terapia com células-tronco embrionárias humanas
deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos
respectivos comitês de ética em pesquisa.
§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere
este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº
9.434, de 4 de fevereiro de 1997.
De outro lado, o autor da ação direta sustentou que foram violados os
seguintes preceitos constitucionais pelo dispositivo legal supra transcrito,
constituindo, assim, o parâmetro do controle da constitucionalidade e, em
decorrência, da validade da norma legal:
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-
se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III – a dignidade da pessoa humana; [...].
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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, [...]. (grifo nosso)
Cabe ressaltar, neste ponto, que, embora o parâmetro de controle de
constitucionalidade assinalado pelo Procurador-Geral da República sejam os arts.
1º, III, e 5º, “caput”, as ações do controle concentrado de constitucionalidade
possuem, consoante jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, causa de
pedir aberta. Isto implica na possibilidade de os julgadores analisarem o pedido sob
fundamentos diversos dos invocados pelo autor da ação, podendo concluir, segundo
estes fundamentos diversos, pela constitucionalidade ou pela inconstitucionalidade
dos dispositivos normativos impugnados. Assim, se os julgadores considerarem que
a lei questionada viola certo preceito constitucional por razões que não aquelas
aduzidas pelo autor na petição inicial, não desimpedidos para declarar sua
inconstitucionalidade. Da mesma forma, se entenderem que a lei impugnada afronta
dispositivo constitucional diverso do apontado pelo autor da ação, a declaração da
inconstitucionalidade do diploma legal é a medida de rigor. No caso da ADI em
análise, portanto, a atividade fiscalizatória da constitucionalidade exercida pelos
Ministros não está limitada nem pelos motivos da inconstitucionalidade alegados
pelo Procurador-Geral, tampouco pelos dispositivos constitucionais indicados por ele
como parâmetro do controle.
Pois bem. A alegada inconstitucionalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança
decorreria, segundo o postulante, de a vida humana acontecer na, e a partir da,
fecundação, isto é, da união dos gametas feminino (óvulo) e masculino
(espermatozóide), originando o zigoto. Para comprovar essa tese, o autor trouxe à
colação vasta literatura médico-científica, sempre no sentido de que o momento
inicial da vida humana corresponde à fecundação, e de que o zigoto daí resultante é
muito mais do que simples apanhado de células, correspondendo já a ser humano
em formação.
Ademais, aduziu o autor a desnecessidade da utilização de células-tronco
embrionárias para fins de pesquisa e terapia, uma vez que o uso de células-tronco
adultas – encontradiças em todos os órgãos do corpo humano e em maior
quantidade na médula óssea (tutano do osso) e no cordão umbilical-placenta – pode
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se prestar à mesma finalidade, com perspectivas avanços até mais promissores que
as células-tronco embrionárias.
Por fim, salientou a sistemática da pesquisa científica com células-tronco
embrionárias humanas na Alemanha, disciplinada por duas leis específicas.
Postas essas premissas, sustentou o Procurador-Geral da República a ofensa
perpetrada pelo art. 5º e parágrafos da Lei de Biossegurança à inviolabilidade do
direito à vida, já que o embrião humano é vida humana; e à dignidade da pessoa
humana, eis que menoscaba a condição dos embriões humanos e os reduz à
condição de simples meios à satisfação dos desejos alheios.
No pedido, requereu o autor a declaração de inconstitucionalidade do art.
5º, “caput” e parágrafos, da Lei de Biossegurança. Solicitou, ainda, com
fundamento na parte final do § 1º do art. 9º da Lei n. 9.868/1999, a realização de
audiência pública sobre o tema, rolando as pessoas a que a Procuradoria-Geral da
República deseja ouvir e requerendo sua intimação pessoal.
Distribuída a ação em 31 de maio de 2005, designou-se como relator o Min.
Carlos Ayres Britto.
Com fundamento no § 2º do art. 7º da Lei n. 9.868/1999, admitiu-se o
ingresso no feito, na qualidade de amici curiae, das seguintes entidades: “Conectas
Direitos Humanos”, “Centro de Direitos Humanos – CDH”, “Movitae – Movimento em
Prol da Vida”, “Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero”,
“Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB”12. As mesmas entidades, por
meio de seus representantes, manifestaram-se oralmente na sessão plenária de
julgamento da ação. O conteúdo de cada sustentação será abordado no próximo
item.
Foi determinada pelo relator, com fundamento no § 1º do art. 9º da Lei n.
9.868/1999, a realização da primeira audiência pública da história do Supremo
Tribunal Federal, a fim de fornecer aos julgadores subsídios para a tomada de
decisão e possibilitar efetiva participação da sociedade civil no enfrentamento da
controvérsia constitucional de tal relevância. Em 20 de abril de 2007, manifestam-se
na audiência 22 (vinte e duas) autoridades da comunidade científica brasileira, 12 Com base no mesmo dispositivo legal, foi indeferida pelo Ministro relator a requisição do postulante Luiz Ghisolfi para participar da presente ADI na qualidade de amicus curiae, pois, embora seja relevante a matéria ventilada na ação (primeiro requisito para participação como amicus curiae), considerou-se que o postulante não apresentava a devida representatividade (segundo requisito). Mesmo assim, o Min. Ayres Britto recebeu a peça apresentada pelo postulante como memorial e ordenou sua juntada aos autos.
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expondo os mais variados entendimentos acerca da pesquisa com células-tronco
embrionárias, destacando sua situação atual, alternativas, riscos, resultados já
alcançados e perspectivas. Também esteve em debate questões como o momento
que marca o início da vida humana, a condição, proteção e destino dado ao embrião
congelado fruto de fertilização “in vitro”, entre outras. Como de praxe, todas as
manifestações foram transcritas e encaminhadas aos Ministros para consulta e
auxílio na formação de seu convencimento motivado.
Em 6 de fevereiro de 2008, o processo é incluído na pauta do Pleno do
Supremo Tribunal Federal, designando-se o seu julgamento para o dia 5 de março
de 2008. Aberta a sessão, manifestaram-se o Procurador-Geral da República,
Antônio Fernando de Souza, pugnando, na linha de seu antecessor, pela declaração
da inconstitucionalidade do preceito legal impugnado; o Advogado-Geral da União,
José Antônio Dias Toffoli, defendendo a constitucionalidade do dispositivo; e os
representantes do amici curiae previamente admitidos. Apresentaram seus votos o
relator, Ministro Ayres Britto, e a Ministra Ellen Gracie, ambos julgando improcedente
o pedido formulado na ADI 3510. O julgamento foi, então, interrompido pelo pedido
de visto do Min. Menezes Direito. A sessão de julgamento foi retomada em 28 de
maio de 2008, com o voto-visto do Ministro Menezes Direito, julgando parcialmente
procedente o pedido veiculado na ação direta, sendo acompanhado pelo Ministro
Ricardo Lewandowski. Em seguida, proferiram seus votos a Ministra Cármen Lúcia e
o Ministro Joaquim Barbosa, julgando improcedente o pedido. Na seqüência, os
Ministros Eros Grau e Cezar Peluso proferiram seus votos, julgando improcedente,
com ressalvas, o pedido formulado na ação dieta. O julgamento foi, então,
suspenso, para ser retomado no dia seguinte, 29 de maio de 2008. Nesta sessão,
proferido seu voto o Ministro Gilmar Mendes, julgando improcedente, também com
ressalvas, o pedido formulado na ADI 3510. Por fim, foi proclamado o resultado do
julgamento: o Tribunal, por maioria e nos termos do voto do relator, julgou
improcedente a ação direta, vencidos, parcialmente e em diferentes extensões, os
Ministros Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Gilmar
Mendes.
A ementa e a parte dispositiva do acórdão foram devidamente publicadas no
Diário da Justiça eletrônico e no Diário Oficial da União em 04 de junho de 2008.
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4 A PARTICIPAÇÃO DOS AMICI CURIAE
Entre as diversas inovações experimentadas pelo sistema concentrado de
controle judicial de constitucionalidade no direito brasileiro, desde o advento da
Constituição Federal de 1988, importa destacar a criação da figura do amicus curiae,
órgão ou entidade estranho ao processo, mas que tem a possibilidade de se
manifestar sobre as questões ventiladas nas ações do controle de
constitucionalidade. Essa figura possui suas origens no direito anglo-saxão, sendo
duas as possíveis formas de sua manifestação no processo: por consenso das
partes ou por determinação do julgador13.
O direito processual constitucional brasileiro adotou a segunda das formas
mencionadas. Como dispõe o § 2º do art. 7º da Lei n. 9.868/1999, que disciplinou o
processo e o julgamento da ADI e da ADC, “[o] relator, considerando a relevância da
matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível,
admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros
órgãos ou entidades”. A Lei n. 9.882/1999, que cuidou do processo e julgamento da
ADPF, contempla disposição semelhante em seu art. 6º, § 2º. Assim, os amici curiae
manifestam-se em sede de ADI, ADC e ADPF após o deferimento de seu pedido de
admissão pelo Ministro relator da ação. Podem apresentar razões, manifestações
por escrito, documentos, sustentação oral, memoriais, entre outros meios14.
Sua participação, porém, subordina-se a dois requisitos: “relevância da
matéria” ventilada na ação e “representatividade do postulante”. Cuidam-se estes, é
certo, de conceitos legais indeterminados, cuja concretização somente se dará no
âmbito de cada caso concreto, por ocasião da decisão do relator acerca da
admissão de entidade postulante. Constituem, por outro lado, pontos de partida para
tal concretização do texto normativo, de um lado, a importância e o significado, em
termos morais, jurídicos, econômicos, políticos e/ou sociais, da questão objeto da
ação, e de outro, a respeitabilidade, a capacidade e o reconhecimento científicos
das pessoas e entidades que postulam a participação como amici curiae15.
A figura do amicus curiae desempenha relevantíssimo papel no âmbito dos
sistemas concentrados de controle judicial de constitucionalidade, do ponto de vista
13 Cf. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada e legislação constitucional. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 896. 14 Cf. Ibid. p. 897. 15 Nesse sentido: Ibid.
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da legitimidade democrática da atividade desempenhada pelos tribunais
constitucionais. Isto porque, através deste instituto, oferece-se aos diferentes grupos
e segmentos sociais um canal direto de diálogo com o tribunal constitucional,
permitindo-lhes interferir direta e incisivamente na formação do entendimento dos
julgadores acerca de questões de seu interesse. Como as Constituições
contemporâneas incorporam diversos valores, materializados, sobretudo, em
princípios jurídicos, cuja interpretação e aplicação não raro revelam colisões entre
essas normas, é fundamental que, no dirimir de tais conflitos, através do
sopesamento, os julgadores estejam atentos às opiniões e aos interesses dos
diversos destinatários de tais normas.
Como predica Peter Häberle,
Uma Constituição, que estrutura não apenas o Estado em sentido estrito, mas também a própria esfera pública (Öffentlichkeit), dispondo sobre a organização da própria sociedade e, diretamente, sobre setores da vida privada, não pode tratar as forças sociais e privadas como meros objetos. Ela deve integrá-las ativamente enquanto sujeitos16.
Assim, nos processos que envolvam a interpretação e a aplicação da
constituição, especialmente em sede de controle de constitucionalidade, não pode o
julgador fechar-se para as forças sociais e a opinião pública, decidindo unicamente
segundo seus valores e crenças. Ao revés, deve procurar canalizar para si as idéias,
pensamentos e expectativas dos destinatários das normas constitucionais que
aplica, conferindo à interpretação da Constituição um “caráter multifacetado”17.
O instituto do amicus curiae cumpre, dentro de suas limitações, essa função
de canalizar, para os membros do Supremo Tribunal Federal, a opinião e os
reclamos das diversas forças sociais, acerca da interpretação das normas
constitucionais, criando um fórum de discussão pública acerca de questões da mais
alta relevância social. O diálogo assim estabelecido é ainda mais salutar em sede de
controle de constitucionalidade das leis porque nele está em causa
adequação/inadequação da atuação do Legislativo e da Administração Pública na
interpretação e concretização da Constituição. Compreender a posição da opinião
pública sobre a conformidade ou desconformidade com a Constituição de
16 Cf. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e procedimental da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editora, 1997, p. 33. 17 Cf. Ibid. p. 39-40.
653
determinado diploma legislativo ou ato administrativo, antes de proceder ao exame
de sua constitucionalidade, fortalece o regime democrático e o próprio Supremo
Tribunal Federal, conferindo alto grau de legitimidade às suas decisões.
No controle de constitucionalidade desencadeado pela ADI 3510, essa
pluralidade de forças sociais esteve bem representada na intervenção dos amici
curiae supra mencionados, que polarizam o debate em favor e contra a declaração
da inconstitucionalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança. Importante destacar
que, em geral, os Ministros do Supremo Tribunal Federal estão conscientes da
importância da participação dos amici curiae nos julgamentos das ações do controle
concentrado de constitucionalidade, sendo freqüente que lancem, em votos,
considerações sobre a legitimidade das decisões tomadas sob a intervenção dos
amici. Este dado evidencia que, no direito brasileiro, o instituto não é mera
prerrogativa formal, vazia, mas desempenha função relevante na formação do
convencimento motivado nas decisões do Supremo Tribunal Federal. Na ADI 3510,
o relator, Ministro Ayres Britto, justificou a admissão dos amici curiae assinalando
que tal medida “certamente contribuirá para o adensamento do teor de legitimidade
da decisão a ser proferida na presente ADIN. Estou a dizer: decisão colegiada tão
mais legítima quanto precedida da coleta de opinião dos mais respeitáveis membros
da comunidade científica brasileira, no tema”.
Com efeito, na presente ação, alinharam-se, de um lado, “Conectas Direitos
Humanos”, “CDH”, “Anis” e “Movitae”, defendendo a constitucionalidade do art. 5º da
Lei de Biossegurança.
A “Conectas” e o “CDH”, representados pelo advogado e professor Oscar
Vilhena Vieira, pugnaram pela constitucionalidade das pesquisas com células-tronco
humanas argumentando que um embrião não pode ser juridicamente equiparado a
uma pessoa. Destacou que a Lei de Biossegurança autoriza a pesquisa apenas com
embriões humanos inviáveis, isto é, que não tem a aptidão para um dia se tornar um
ser humano, e que, por conseguinte, deveriam servir às pesquisas com fins
terapêuticos, possibilitando a busca por soluções que preservem a vida e a
dignidade humanas daqueles que padecem de doenças. Também se destacou que
a Constituição Federal de 1988 nada dispôs a respeito do direito à vida antes do
nascimento, além de estabelecer a inviolabilidade desse direito aos brasileiros e
estrangeiros residentes no Brasil, ou seja, aos seres humanos já nascidos. Em
decorrência, não haveria que se objetar a incompatibilidade do art. 5º da Lei de
654
Biossegurança com os preceitos constitucionais consagradores da inviolabilidade do
direito à vida e da dignidade da pessoa humana.
No mesmo sentido, o “Movitae” e a “Anis”, representados pelo também
advogado e professor Luis Roberto Barroso, defenderam que as pesquisas com
células-tronco adultas não substituem as investigações com células-tronco
embrionárias, pois estas oferecem maior confiabilidade e menores riscos quanto aos
resultados, aduzindo também que as pesquisas com células-tronco embrionárias já
produzem resultados clínicos positivos. Sustentou, ademais, a irrelevância da
determinação do início da vida humana para o deslinde da questão ventilada na
ação, uma vez que a autorização legal para pesquisas com células-tronco somente
permite que estas sejam extraídas de embriões congelados há mais de três anos ou
inviáveis, que, de toda sorte, nunca serão implantados em um útero materno, não
podendo, em decorrência, ser considerados vida em potencial. Aduz que o
nascimento com vida marca o surgimento da pessoa humana, com capacidade
jurídica, e que, não obstante a lei civil resguarde os direitos do nascituro, este se
define como sendo o ser humano já concebido, em fase de desenvolvimento no
útero materno, mas ainda não nascido. Ora, os embriões congelados e conservados
em laboratório não são pessoas humanas, visto não terem nascido; não são,
tampouco, nascituros, visto não estarem alojados em útero materno. Assim, as
pesquisas com células-tronco embrionárias não afetam nem pessoas humanas nem
nascituros. Ademais, a lei impediria a “instrumentalização” do embrião, ao
determinar que sejam utilizados em pesquisas embriões inviáveis ou congelados há
mais de três anos, e ao vedar expressamente sua comercialização, a clonagem
humana e a engenharia genética. Por fim, aduz que a Lei de Biossegurança
emprestada proporcional, necessária e adequada proteção aos embriões humanos
fruto de fertilização “in vitro”, sendo fruto da atividade do Legislativo federal, órgão
de representação popular, não se podendo ignorar, também, a repercussão da
decisão sobre o futuro da medicina e o progresso da ciência no Brasil.
De outra banda, a “CNBB”, representada pelo advogado Ives Gandra Martins,
sustentou a inconstitucionalidade do dispositivo legal impugnado, embasada na
alegação de que o embrião “é um ser humano que, por força da lei natural,
continuará a crescer, amadurecer, envelhecer e morrer, segundo o ritmo de tempo
concedido a cada um”, asseverando ainda que “está cientificamente comprovado
que a vida começa com o zigoto. [...] Cientificamente, a vida começa com a
655
concepção” (grifos no original). Em decorrência, os embriões humanos são
merecedores de proteção do Estado, como forma de preservar seu direito inviolável
à vida e à dignidade. A circunstância de os embriões estarem “in vitro” ou já
implantados do útero materno é irrelevante, na medida em que a vida humana
começa com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, independentemente do
processo pelo qual se dá. Ademais, destacou a alternativa, plenamente viável e
aceitável, das pesquisas com células-tronco adultas, retiradas dos próprios
pacientes, que tem obtido resultados expressivos em centros de pesquisa de todo o
mundo. Por fim, reafirmou que o simples fato de os embriões humanos, mesmo
fecundados “in vitro” e congelados há mais de três anos, ou destinados ao descarte,
representarem um ser humano, exige o pleno respeito à sua integridade e dignidade,
devendo o Estado dispensar todos os meios para sua proteção.
5 OS POSICIONAMENTOS SUSTENTADOS PELOS MINISTROS
A questão debatida na ADI em estudo, indubitavelmente, é muito polêmica e
acarreta acaloradas discussões em toda a sociedade. Estas discussões, com efeito,
avultam a “importância do STF em resolver questões socialmente relevantes e
axiologicamente carregadas de valores fundamentalmente contrapostos”18. Em
outras palavras, questões como esta, repletas de valores basilares da sociedade nos
dois pólos da discussão, exigem uma atuação do STF de modo a resolver o
problema, garantindo a segurança à sociedade. A referida segurança, portanto, só
se concretiza com a decisão, que põe fim aos debates e as dúvidas sobre a questão,
estabelecendo um caminho tido como correto.
Esse sentimento, certamente, domina todas as ações de controle de
constitucionalidade. A ADI 3510, entretanto, adquiriu especial relevo. Os debates
sobre o assunto, até pela importância dos bens jurídicos debatidos, efervesciam no
seio na sociedade, dominando as conversas em todos os ambientes sociais. Este
ímpeto participativo da sociedade, obviamente, não poderia ser desconsiderado. A
questão, então, deveria ser resolvida e a resposta dada, ademais, teria que ser
18 Voto do Ministro Gilmar Mendes, cuja íntegra pode ser encontrada em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510GM.pdf>. Acesso em: 14-05-2010.
656
democrática, ou seja, a decisão, necessariamente, deveria considerar os interesses
da sociedade e precisaria, para isso, ouvir os mais diferentes grupos sociais.
Constatando esta necessidade, abriu-se audiência pública e possibilitou-se a
participação dos amigos da corte. Esta participação de grupos da sociedade e de
especialistas no assunto analisado teve o condão de esclarecer aos Ministros, sob
os mais diversos ângulos, os pontos debatidos. Estes esclarecimentos, pois, foram
fundamentais para que os nobres Ministros formassem a convicção e
fundamentação de suas decisões.
As decisões dos Ministros, cabe ressaltar, também se mostraram bastante
divididas, e no fim, o que se viu, foi um placar apertado, já que pelos menos cinco
Ministros fizeram restrições. Os principais argumentos e aspectos jurídicos
levantados pelos julgadores serão alvo do presente tópico.
Após o pronunciamento dos julgadores, percebeu-se uma nítida divisão de
opiniões que, sinteticamente, pode ser traduzida em duas correntes. A primeira,
cabe ressaltar, pode ser resumida pela opinião da Dr.ª Mayana Zatz, professora de
genética da USP, para quem:
Pesquisar células embrionárias obtidas de embriões congelados não é aborto. É muito importante que isso fique bem claro. No aborto, temos uma vida no útero que só será interrompida por intervenção humana, enquanto que, no embrião congelado, não há vida se não houver intervenção humana. É preciso haver intervenção humana para a formação do embrião, porque aquele casal não conseguiu ter um embrião por fertilização natural e também para inserir no útero. E esses embriões nunca serão inseridos no útero. É muito importante que se entenda a diferença.19
Sendo assim, esta corrente diferencia o experimento com embriões de aborto.
Ademais, tal corrente acredita que a utilização de embriões em pesquisas é a melhor
forma, e a mais digna, de utilização dos embriões inviáveis, haja vista que sendo
impróprios para a reprodução, seriam, fatalmente, descartados. Aderiram a esta
corrente os Ministros Ayres Britto, Ellen Gracie, Joaquim Barbosa, Celso de Mello,
Cármen Lúcia e Marco Aurélio.
A segunda corrente, por sua vez, pode ser resumida pela opinião da Drª
Lenise Aparecida Martins Garcia, professora do Departamento de Biologia Celular
da UnB:
19 Voto do Ministro relator Carlos Ayres Britto, cuja a íntegra pode ser encontrada em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510relator.pdf>. Acesso em: 14-05-2010.
657
Nosso grupo traz o embasamento científico para afirmarmos que a vida humana começa na fecundação, tal como está colocado na solicitação da Procuradoria. (...) Já estão definidas, aí, as características genéticas desse indivíduo; já está definido se é homem ou mulher nesse primeiro momento (...). Tudo já está definido, neste primeiro momento da fecundação. Já estão definidas eventuais doenças genéticas (...). Também já estarão aí as tendências herdadas: o dom para a música, pintura, poesia. Tudo já está ali na primeira célula formada. O zigoto de Mozart já tinha dom para a música e Drummond, para a poesia. Tudo já está lá. É um ser humano irrepetível.
Portanto, o principal argumento desta corrente é que a vida começa com a
fecundação. Sendo assim, afirma que o embrião já é um ser vivo pronto, com todas
as características geneticamente definidas. Diante disso, afirma que os embriões
devem ter juridicamente tutelada a sua vida e dignidade. Além disso, argumenta que
as pesquisas com células-tronco podem ser desenvolvidas com células adultas ou
retiradas de cordões umbilicais. Por fim, reitera que o artigo cuja
inconstitucionalidade foi arguida não tutela suficientemente o embrião, já que não
cria comitês de ética imparciais e deixa os embriões sujeitos a interesses do
mercado que guiam o progresso científico. A esta corrente, pelo menos
parcialmente, aderiram os Ministros Ricardo Lewandowski e Menezes Direito, que
julgaram a ADI parcialmente procedente; e Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Eros
Grau, que a julgaram improcedente, mas fizeram ressalvas.
Feitas estas considerações preliminares, passaremos agora a analisar os
principais argumentos sustentados pelos Ministros, neste interessante debate que
discutiu valores fundamentais da sociedade brasileira, tais como direito à vida e
dignidade da pessoa humana.
Inicialmente, os Ministros ressaltam a importância do desenvolvimento das
pesquisas com células-tronco, especialmente as embrionárias, haja vista o sua
maior capacidade de diferenciação. O desenvolvimento neste campo científico, cabe
ressaltar, segundo alguns cientistas, seria capaz de regenerar tecidos e curar
doenças genéticas, possibilitando uma vida melhor para milhões de pessoas que
sofrem com paralisia e a diabetes, por exemplo. Tendo em vista isso, destaca Celso
de Mello que a proibição de se desenvolver pesquisas nesta área condenaria
milhões de pessoas a desesperança20. Ainda sobre isso, o Ministro relator lembra
que, segundo a Revista Época publicada no dia 29/04/2007, existem cerca de 5 20 VOTO de Celso de Mello define posição pró-pesquisas do STF. Última Instância. Disponível em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51542.shtml>. Acesso em: 14-02-2010.
658
milhões de brasileiros que sofrem doenças genéticas. Ademais, baseado na mesma
fonte, acrescenta que o país conta com cerca de 10 a 15 milhões de diabéticos21.
Todas estas pessoas, além daquelas vítimas de acidentes, poderiam se beneficiar
das citadas pesquisas, adquirindo grande acréscimo na qualidade de vida. Esta real
possibilidade de revolução qualitativa na vida de milhões de pessoas22,
indubitavelmente, se reflete no imenso apoio popular as pesquisas, Ora, conforme
relatado pelo Ministro Marco Aurélio, pesquisa realizada pelo prestigiado Ibope
detectou que 95% (noventa e cinco por cento) dos brasileiros são a favor das
pesquisas23.
Evidencia-se, então, a grande relevância das citadas pesquisas, bem como o
desejo popular pelos seus resultados. No entanto, seriam os meios necessários para
atingir estes fins um consenso na população? A manipulação de embriões viola o
nosso direito? Estas questões particulares sobre o embrião, devido a sua
complexidade, serão avaliadas no sub-tópico que segue.
4.1 A questão dos embriões
Primeiramente, deve-se acrescentar que nunca houve, e ainda não há,
consenso quando se trata de definir o momento de início e do fim da vida.
Começaria ela com a fecundação? Ou seria necessário o desenvolvimento, mesmo
que inicial do sistema nervoso central? Tal questão, por ser polêmica, divide a
sociedade. Não obstante a isso, não precisa ser respondida para se obter um
posicionamento na questão em debate, já que o centro da discussão, como bem
frisa o Ministro Gilmar Mendes, não é determinar o início da vida, mas sim a postura
do Estado em relação aos embriões, principalmente quando em face das novas
tecnologias24. Portanto, a questão deveria definir qual é a tutela jurídica adequada
que se deve ter um embrião. Definido este primeiro critério, deveria responder se a
21 Voto do ministro relator. Op. cit. 22 Se levarmos em conta os números citados pelo relator, pelo menos 10% (dez por cento) da população nacional. Isto mesmo, se considerarmos que a população nacional é de cerca de 200 milhões de habitantes, e que destes, cerca de 5 milhões possuem doenças genéticas e outros 15 milhões possuem diabetes, desconsiderando os acidentados, teremos 20 milhões de pessoas que se beneficiariam das pesquisas. 23 Voto do ministro Marco Aurélio, que pode ser conferido na íntegra em <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510MA.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 24 Voto do Ministro Gilmar Mendes. Op. cit.
659
tutela legalmente representada no art. 5º da Lei de Biossegurança protegia
suficientemente os embriões, abarcando todo o conceito do critério definido em
debates.
Para alguns Ministros, cabe ressaltar, a vida é um processo evolutivo, ou,
como bem definiu o relator: uma metamorfose. Sendo assim, da mesma forma que o
lagarto não é crisálida e esta não é borboleta, o embrião não é feto e este não é ser
humano. Este ponto de vista, ademais, segundo o relator, é reforçado pelo fato de a
tutela jurídica ser distinta em cada fase da vida. Exemplifica o raciocínio afirmando
que o cadáver é tutelado em nosso direito penal, no entanto, não com a mesma
amplitude com que se protege uma pessoa viva. O aborto, por sua vez, protege a
vida intra-uterina. No entanto, a pena prevista para esse tipo penal é inferior a
referente à homicídio. Destaca, ainda, que o aborto não tutela o embrião congelado,
mas somente aquele que se desenvolve no interior do útero materno, haja vista que
o tipo penal não faz referência à placa de Petri. Por fim, considera, como bem fez a
Dr.ª Mayana Zatz que a pesquisa com embriões congelados não se equipara ao
aborto, haja vista que nesta conduta, o embrião se desenvolve no útero materno e
consistirá em vida se não for interrompido por uma ação humana. No que tange aos
embriões congelados, porém, a situação é radicalmente inversa. O embrião não se
desenvolverá se não houver uma atitude de caráter positivo.25 Essa linha
argumentativa, cabe ressaltar, também permeia os votos dos Ministros Joaquim
Barbosa26 e Marco Aurélio27. O último, com efeito, acrescenta que, devido ao
raciocínio da professora da USP, não se pode tutelar, da mesma forma, a vida intra-
uterina e a extra-uterina. No que tange a primeira, avulta, ainda existe a
possibilidade de aborto terapêutico e em caso de estupro. Sendo assim, a proteção
do embrião deve ser ainda menor28.
Esta argumentação supracitada, contudo, é rebatida, brilhantemente, pelo
Ministro Peluso que corrige o equívoco técnico da argumentação exposta. Afirma o
nobre julgador que não convém afirmar que a pena cominada no tipo penal não
possibilita avaliar se existe um valor menor da vida extra-uterina em relação à intra-
uterina, já que as penas não são estabelecidas apenas segundo o valor do bem 25 Voto do Ministro relator. Op. cit. 26 Voto do Ministro Joaquim Barbosa, cuja íntegra se encontra disponível em: <http://www.lrbarroso.com.br/pt/casos/celulastronco/votos/joaquim_barbosa.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 27 Voto do Ministro Marco Aurélio. Op.cit. 28 Ibid.
660
jurídico, mas sim, e principalmente, segundo a reprovabilidade de cada conduta
típica29. Portanto, a quantidade das penas previstas nos tipos penais não tem o
condão de valorar a diferença entre os bens jurídicos, mas somente de atribuir maior
censura a uma conduta em detrimento da outra.
Além da tutela jurisdicional prestada pelo direito penal, outro argumento
utilizado no debate se deu, justamente, com a tentativa de definir o momento de
início da vida. Este ponto, cabe ressaltar novamente, está longe de apresentar um
consenso. Como bem destacou o Ministro Marco Aurélio, existem várias correntes
no que tange ao início da vida. Sendo assim, existem os que consideram que a vida
começa com a: concepção; ligação do feto à parede do útero materno; formação das
características individuais do feto; percepção pela mãe dos primeiros movimentos; e
por fim, com o nascimento30. Essas diversas correntes, com efeito, também se
dividiram nos votos dos Ministros, cujas principais posições passaremos a expor nas
próximas linhas.
O Ministro Menezes Direito foi o único a afirmar, com veemência, que o
embrião é indivíduo desde a fecundação e, por isso, deve ter a sua dignidade
preservada, haja vista que ela não se perde com o congelamento31. Sendo assim,
seu posicionamento se coaduna com o da CNBB, para quem o “embrião é um ser
humano, que, por força da lei natural, continuará a crescer, amadurecer, envelhecer
e morrer, segundo o ritmo de tempo concedido a cada um”32. O nobre Ministro
adiciona que “se para salvar uma vida sacrificamos uma outra, ficará sem salvação o
homem. É necessário fazer o bem a partir do bem e não a partir do mal”33.
Diferente, porém, é o posicionamento dos outros julgadores. Ellen Gracie, por
exemplo, afirma que antes de 14 dias de vida não há diferenciação celular e
portanto, não existe, se quer o embrião, mas apenas um organismo pré-embrionário
que, poderia, sim, ser submetido a pesquisas34. Já o Ministro Ayres Britto defende o
ponto de vista de que como nossa legislação define a morte cerebral como fim da
29 Voto do Ministro Cezar Peluso, cuja íntegra se encontra disponível em:<http://www.lrbarroso.com.br/pt/casos/celulastronco/votos/cezar_peluso.pdf>. Acesso em: 14-05-2010. 30 Voto do Ministro Marco...Op.cit. 31 HENRIQUES, Andréia; RIBEIRO, Danielle. Após três horas, Menezes Direito afirma que ação é parcialmente procedente. Última Instância. Disponível em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51469.shtml>. Acesso em: 14-05-2010. 32 Voto do Ministro Cezar Peluso.Op. cit. 33 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit. 34 Voto da Ministra Ellen Gracie, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510EG.pdf>. Acesso em: 14/05/2010.
661
vida, o início da mesma se daria com o início das atividades cerebrais. Sendo assim,
para o relator, o embrião não seria um ser vivo, posto que não possui cérebro35. Este
argumento, contudo, foi refutado, mais uma vez, por Cezar Peluso. O atual
presidente da Corte afirmou que a morte cerebral não corresponde à morte
biológica, que se dá com o fim de todas as atividades vitais, mas apenas a uma
ficção jurídica que permite o aproveitamento de órgãos para transplante e doação,
com o manifesto propósito de salvar vidas ao invés de manter outra em estado
vegetativo. Além disso, se posiciona no sentido de considerar o início da vida se dá
com a fixação do óvulo fecundado na parede do útero materno. Portanto, segundo a
linha de raciocínio deste Ministro, a realização de pesquisas com embriões
congelados não interrompe o curso da vida, já que esta sequer se iniciou no embrião
congelado36.Posicionamento semelhante ao de Peluso é defendido por Eros Grau.
Para ele, o embrião faz parte do gênero humano e, por isso, deve ter reconhecido o
direito constitucional à vida e à dignidade. Contudo, frisa o Ministro, vida é
movimento, o que não se configura nos embriões congelados. Portanto, conclui, só
existe vida quando o embrião está no útero materno. Logo, os embriões congelados
não possuem vida e muito menos dignidade37.
A verdade é que o embrião deve ser protegido, mas a sua produção
excessiva leva a três possibilidades: congelamento perpétuo, descarte e pesquisa.
As duas primeiras possibilidades, com efeito, não são nobres. Manter os embriões
congelados ou descartá-los, na verdade, seria mais indigno e repulsivo que destiná-
los a pesquisas benéficas à humanidade38. Sendo assim, repara-se um enorme
caráter ético na aprovação das pesquisas, já que estas possibilitam que embriões
inviáveis, que jamais seriam utilizados sirvam à humanidade. Logo, o melhor juízo é
aquele que reconhece os direitos aos embriões, mas também percebe que no outro
pólo da discussão existe o direito a vida de milhões de pessoas (crianças, adultos e
idosos) que possuem a esperança de obter um tratamento para as suas doenças,
ainda sem cura39.
Evidencia-se, então, a necessidade de se desenvolver as pesquisas. Por
outro lado, avulta-se o dever de impor balizar ao desenvolvimento científico. Um 35 Voto do Ministro relator. Op. cit. 36 Voto do Ministro Cezar Peluso. Op.cit. 37 Voto do Ministro Eros Grau, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510EGrau.pdf>. Acesso em: 14/05/2010. 38 Voto do Ministro Cezar Peluso.Op.cit. 39 Voto do Ministro Joaquim Barbosa.Op.cit.
662
estudo mais aprofundado sobre as possibilidades de pesquisa, com efeito, será feito
no próximo tópico.
4.2 Os limites que devem ser impostos pelo art. 5º da Lei de Biossegurança
A Constituição estabelece no art. 218 o compromisso do Estado de promover
e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.
Este incentivo, contudo, não pode sobrepor valores fundamentais da sociedade, tais
como o direito à vida e a dignidade da pessoa humana. Sendo assim, há de se
ressaltar a necessidade de se estabelecer limites ao progresso, de modo a balizar,
pela ética, as condutas e possibilidades dos cientistas.
No que tange a Lei de Biossegurança, o mesmo artigo que prevê a
possibilidade de pesquisas com células embrionárias é o responsável por delimitar
os limites de atuação. O artigo em questão é o 5º que submete a pesquisa a 3
condições: o embrião deve ser inviável; deve haver consentimento dos genitores; a
doação para pesquisas deve ser gratuita.
Primeiramente, então, há de se considerar a viabilidade do embrião. Ora,
segundo os médicos a viabilidade de um embrião congelado a mais de três anos é
praticamente nula. Ademais, este prazo é razoável, já que possibilita os genitores
optarem pela implantação ou não do embrião. Em outras palavras, um casal infértil
resolve congelar 10 embriões. Então, terá três anos para implantar quantos
embriões quiser, concretizando o direito do planejamento familiar,
constitucionalmente garantido. Após este período, então, os embriões já serão
impróprios à fecundação, posto que inviáveis. Nesta situação, há três opções, o
descarte, congelamento eterno e a pesquisa. Diante deste cenário, a Ministra Ellen
Gracie acredita que a lei é razoável ao permitir a pesquisa, pois estes pré-
embriões40 não teriam destino diverso do descarte41. A Ministra Cármen Lúcia, por
sua vez, afirma que a restrição aos embriões inviáveis como objeto de pesquisa é,
40 Vale lembrar que a ministra segue a filosofia de que o organismo só é embrião quando possui diferenciação celular, fato que ocorre com 14 dias. 41 Voto da Ministra Ellen Gracie. Op.cit.
663
justamente, o fator que garante a não violação do direito à vida na presente
questão42.
O embrião utilizado na pesquisa, então, deve ser inviável a reprodução, posto
que congelado por mais de três anos. Diante desse cenário, como bem afirmou Ellen
Gracie, só existem três possibilidades: congelamento, descarte ou pesquisa. As
duas primeiras possibilidades, cabe ressaltar, são praticamente sinônimas no caso
em tela, haja vista que o esquecimento do embrião congelado, basicamente, é um
descarte. Portanto, o embrião, inapto à procriação será descartado ou objeto de
pesquisas. Frente a este cenário, o Ministro Marco Aurélio trouxe, em seu voto, a
opinião do biólogo David Battimore, ganhador de um prêmio Nobel, que afirmou que
“a discussão é sem sentido, já que os embriões serão destruídos de qualquer modo.
A questão é saber se serão destruídos fazendo o bem a outras pessoas ou não”43.
Evidencia-se, pois, a maior nobreza em destinar os embriões à pesquisa, haja vista
a maior utilidade que os embriões podem ter neste fim. Esta finalidade mais nobre,
com efeito, é chamada pela Ministra Ellen Gracie de princípio utilitarista e consiste
no principal argumento de Cármen Lúcia.
Segundo esta ministra, a utilização de células-tronco embrionárias para
pesquisa voltada a tratamentos de saúde não agride a dignidade humana. Pelo
contrário, a valoriza, já que o destino destes embriões seria o lixo. Lembra a
julgadora que o princípio da dignidade da pessoa humana é o princípio fundante do
ordenamento jurídico pátrio, ou seja, serve de base para todo o sistema jurídico e
político do Brasil. Com efeito, este princípio dispõe que a espécie humana deve ser
respeitada em sua dignidade. Esta dignidade, frisa a Ministra, atinge toda a
humanidade, abarcando, portanto, os embriões e os mortos. Sendo assim, os
embriões devem ter a sua dignidade respeitada. Ocorre que os embriões não
aproveitados no procedimento de implantação seriam destinados ao lixo, tratamento
este, indubitavelmente indigno. A pesquisa, todavia, consiste, justamente, na
possibilidade de transformar o embrião na vida futura de alguém. Ora, ressalta a
Ministra, a biomedicina deve se comprometer com a libertação do ser humano e se
não houvesse a possibilidade de pesquisar e transformar para melhor, o homem
seria um escravo de sua própria prisão (física, psíquica e mental). Portanto, a
42 Voto da Ministra Cármen Lúcia, cuja íntegra se encontra disponível em:< http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510CL.pdf>. Acesso em: 14/05/2010. 43 Voto do Ministro Marco Aurélio. Op.cit.
664
legislação, segundo esta Excelência, não contraria o princípio da dignidade da
pessoa humana e tampouco viola o direito à vida. Pelo contrário, a pesquisa “torna
parte da existência humana o que vida não seria, dispondo para os que esperam
pelo tratamento a possibilidade real de uma nova realidade de vida”44.
Sentido semelhante evidencia-se no voto do Ministro Ayres Britto, para quem
a possibilidade do desenvolvimento científico na seara em debate:
Longe do desprezo ou desrespeito aos congelados embriões “in vitro”, significa apreço e reverência a criaturas humanas que sofrem e se desesperam nas ânsias de um infortúnio que muitas vezes lhes parece maior que a ciência dos homens e a própria vontade de Deus45.
Superado a imposição legislativa a respeito da inviabilidade dos embriões, há
de se tecer um breve comentário a respeito da necessidade de autorização dos
genitores. Para o relator o consentimento dos genitores revela que o casal não tem
intenção de converter o embrião em vida humana, estando, portanto, sujeito ao
descarte ou a pesquisa46. A escolha dentre estas opções, como bem frisa Joaquim
Barbosa é conferida aos genitores. Trata-se, portanto, de uma faculdade e não uma
imposição legal. Sendo assim, os genitores poderão tomar a decisão de acordo com
as suas crenças e valores. Logo, segundo o Ministro, a lei concilia os valores
pessoais, incluindo os religiosos e a liberdade47. O referido consentimento,
acrescenta o Ministro Direito deve ser prévio e expresso48. Ademais, acrescenta
Lewandowski, deve ser precedido de informações precisas e leais no que tange às
consequências que sofrerá o embrião, bem como esclarecedora no que diz respeito
às outras alternativas49.
A última restrição legislativa, por fim, refere-se gratuidade das doações dos
embriões. Em outras palavras, os genitores ao permitirem que o embrião inviável
seja alvo de pesquisa não podem receber e nem exigir nenhuma contraprestação
financeira. Sendo assim, a doação é de caráter humanitário e tem o condão de
auxiliar o desenvolvimento de uma técnica científica que pode revolucionar a
qualidade de vida de milhões de pessoas. Proíbe-se, portanto, o comércio de 44 Voto da Ministra Cármen Lúcia. Op.cit. 45 Voto do Ministro relator. Op.cit. 46 Voto do Ministro relator. Op. cit. 47 Voto do Ministro Joaquim Barbosa. Op.cit. 48 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit. 49 LEWANDOWSKI segue Direito e vota parcialmente contra pesquisas. Última Instância. Disponível em:< http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/51492.shtml>. Acesso em: 14-05-2010.
665
embriões que, indubitavelmente, significaria uma ofensa à dignidade humana. Como
bem disse a Ministra Cármen Lúcia, o embrião é parte da humanidade e portanto
tocado pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Logo, a comercialização
destes organismos significaria grave afronta a Constituição e a moral social e,
portanto, foi taxativamente vedada pelo dispositivo legal.
Finalmente, após analisar as balizas legalmente impostas ao desenvolvimento
de pesquisas com células-tronco embrionárias no Brasil, há de se comparar as
previsões nos ordenamentos estrangeiros. Ao realizar esta tarefa, o Ministro
Joaquim Barbosa constatou que todos os países impõem três condições: as
pesquisas devem visar o bem comum; só podem ser utilizados embriões
excedentes, isto é, não podem ser produzidos embriões para este fim; e, finalmente,
deve haver consentimento expresso dos genitores. Estas condições, anotou o
Ministro, são satisfatoriamente preenchidas pelo ordenamento pátrio, e, portanto, a
lei deve ser considerada constitucional 50.
A conclusão obtida por Joaquim Barbosa, contudo, não foi a mesma obtida
por outros julgadores que consideram que a lei nacional deveria estabelecer balizas
mais rígidas para nortear as presentes pesquisas. Estas posições, que consideraram
que os limites estabelecidos são insuficientes serão mais bem estudadas no próximo
tópico.
4.3 Das críticas quanto a constitucionalidade
A ADI em análise, conforme relatado no decorrer do trabalho, foi marcada por
um grande debate nas tribunas do STF. As discussões acaloradas, somadas a
polêmica do tema em estudo, com efeito, não conseguiu atingir um consenso nos
votos dos Ministros, fato que se evidencia no apertado placar final, com 6 votos pela
improcedência da ação contra 5 votos críticos. O presente artigo, até então, contudo,
pautou sua exposição, principalmente, pelos argumentos proferidos pelo lado
vencedor. Diante disso, urge a necessidade de focar um pouco mais, no presente
momento, nos argumentos proferidos pelo lado vencido.
50 Voto do Ministro Joaquim Barbosa. Op.cit.
666
Sendo assim, primeiramente, deve-se citar a crítica do Ministro Lewandowski
que criticou a técnica legislativa do questionado dispositivo legal. Para este julgador,
a técnica adotada deixa dúvidas no que tange aos limites impostos ao
desenvolvimento científico51.
O Ministro Gilmar Mendes, por sua vez, não criticou a clareza do dispositivo
legal, mas a deficiente proteção conferida pelas balizas impostas. O Excelentíssimo
julgador, afirmou em seu voto que o avanço científico não deve ser barrado,
entretanto, deve ser limitado por uma barreira ética, qual seja, o princípio da
responsabilidade. Para este Ministro, porém, os limites estabelecidos não são
suficientes para garantir a proteção desejada aos bens jurídicos envolvidos. Esta
falha, ressalta o julgador, tem o seu ponto de partida com a pouca regulamentação
da questão em exame. Ora, trata-se de um assunto que envolve direitos
fundamentais e, portanto, a redação deveria tutelar os bens jurídicos de forma mais
ampla e segura, ou seja, a tutela deveria ser proporcional à grandeza dos valores
envolvidos. Evidencia a sua argumentação citando a legislação de outros países
sobre o mesmo assunto. Para ele52, a legislação estrangeira é mais rigorosa, já que
a regulamentação pátria é extremamente sucinta e, por isso, incapaz de abordar
aspectos essenciais ao tema. Neste ponto, cabe ressaltar, compara a legislação
pátria com a lei espanhola que carrega 90 artigos sobre a temática debatida no
trabalho53.
A falta de regulamentação, pela insuficiência de texto, ademais, se evidencia
com a não criação, pela Lei de Biossegurança, dos citados comitês de ética. Além
disso, critica a falta de cláusula de subsidiariedade, constante na legislação externa.
Ora, argumenta, o avanço das pesquisas com células-tronco adultas pode dispensar
a utilização de embriões humanos. Sendo assim, antes deveria haver uma cláusula
de subsidiariedade que garantisse a não utilização de embriões em caso de haver
outros métodos menos gravosos54.
Não obstante as críticas e deficiências apresentadas, o Ministro Gilmar
Mendes acredita que a ausência do art. 5º da Lei nº 11.105/05 seria ainda mais
maléfica para a ordem jurídica e social, haja vista que criaria um vácuo normativo a
respeito do tema. Diante disso, considera a ação improcedente, mas fixa
51 LEWANDOWSKI. Op.cit. 52 Diferentemente do que ocorre com o Ministro Joaquim Barbosa. 53 Voto do Ministro Gilmar Mendes. Op.cit. 54 Ibid.
667
interpretação em consonância com o princípio da responsabilidade e da
proporcionalidade de modo a impedir proteção deficiente55.
A maior quantidade de críticas, todavia, se deu em relação a falta de previsão
legal no que tange a fiscalização das pesquisas. Segundo a Ministra Cármen Lúcia,
o art. 225, §1º, II da Carta da República, que outorga ao Poder Público o dever de
“fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético”
requer maior severidade no controle das instituições de pesquisa e dos serviços de
saúde que as realizem56. A mesma linha, cabe ressaltar, é seguida pelo Ministro
Eros Grau que atenta para o risco de concentrar a fiscalização e aprovação das
pesquisas em comitês de ética vinculados às própria instituições pesquisadoras.
Exige, então, a participação do Ministério da Saúde nestes processos
fiscalizatórios57. Cezar Peluso, ademais, segue o mesmo raciocínio, reclamando por
uma fiscalização estatal que submeta as pesquisas ao Ministério da Saúde,
Conselho Nacional de Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária58.
Crítica mais contundente, porém é a do Ministro Menezes Direito. Sedento por
controle a estas atividades, reclama pela participação da ANVISA que segundo o
Ministro, deve realizar fiscalização nos estabelecimentos e cadastro nos embriões.
Tamanha precaução, segundo o Ministro, se justifica pelo risco de ocorrência de
experiências genéticas, incluindo clonagem humana59. Preocupação semelhante,
com efeito, contém o Ministro Eros Grau que temendo atitudes eugênicas, defende,
em sua argumentação, a proibição da seleção genética. Ademais, o último Ministro,
critica a falta de limitação de embriões a serem produzidos por ciclo. Ora, a elevada
produção de embriões aumenta o número de excedentes, o que favorece as
pesquisas, mas contraria a intenção do legislador. Conforme exposto até então, a lei
tem o fulcro de possibilitar a realização de pesquisas com aqueles embriões
excedentes, que pelo decorrer do tempo já se tornaram inviável a implantação.
Trata-se, portanto, de utilizar estes embriões, que seriam descartados, em um fim
mais digno, em uma ação humanitária, concretizado o que a Ministra Ellen Gracie
denominou de princípio utilitarista. Ocorre que a ausência de limitação na
fecundação de embriões, possibilita a burla da lei, já que permite aos cientistas
55 Ibid. 56 Voto da Ministra Cármen Lúcia. Op.cit. 57 Voto do Ministro Eros Grau. Op.cit. 58 Voto do Ministro Cezar Peluso. Op.cit. 59 HENRIQUES; RIBEIRO. Op. cit.
668
congelarem 10, 20, 30 embriões de uma única vez. Sendo assim, o que deveria ser
aproveitamento do excedente passaria a ser produção para fins de pesquisa, o que
foi legalmente proibido. Eros Grau, então, evidencia os interesses políticos e
econômicos que permeiam esta pesquisa60. Estes interesses, segundo este nobre
julgador, colocam em risco o bloco de constitucionalidade e deixam vidas à mercê
do inescrupuloso mercado. Diante disso, faz a pertinente crítica e propõe a fixação
do limite máximo de 4 embriões por ciclo61.
6 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E A FUNÇÃO POLÍ TICA DO
JUDICIÁRIO
Primeiramente, deve-se constatar que, desde sempre, os filósofos, cientistas
políticos e juristas se questionam a respeito do impacto do político nos problemas
concretos da normatividade do Estado62. Diante de tal quadro, a constitucionalista
portuguesa Cristina Queiroz afirma com precisão que “por detrás de cada fórmula
jurídica esconde-se uma decisão política”63. Ora, a imposição de condutas através de
normas é um ato de poder, e, todo ato de poder é político64. Evidencia-se, portanto,
uma relação de interdependência entre o direito e o poder político65. Esta relação, com
efeito, inicia-se com a própria constituição do direito e do poder político. Ora, como
bem afirma Habermas, o direito constitui o poder político e este constitui o direito66.
Em outras palavras, a criação deste, se dá pelo sistema legislativo (político), que
objetiva conferir um tratamento racional às questões políticas. A criação daquele, por
outro lado, se dá pelo direito, haja vista que é a norma que estrutura o legislativo,
conferindo-lhe competência normativa. Dessa forma, observa-se que o direito cria o
sistema político e, este, por sua vez, é responsável por criar normas, isto é, o direito67.
60 Argumento também defendido pelo Ministro Ricardo Lewandowski. 61 Voto do Ministro Eros Grau. Op. cit. 62 Cf. QUEIROZ, Cristina M.M. Os actos políticos no Estado de Direito: o problema do controle jurídico do poder. Coimbra: Almedina, 1990. p. 11. 63 Ibid. p. 200 64 LEITE, Glauco Salomão. A “politização” da jurisdição constitucional: uma análise sob a perspectiva da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann, in Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 16, n. 64, p. 151-185, jul./set. 2008. p. 159 65 NEVES. Entre Têmis e Leviatã: uma relação difícil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 89. 66 Cf. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre factilidade e validade. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. V.1. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. p. 211. 67 Ibid. p. 212-213.
669
Essa relação, vale acrescentar, adquire relevo ainda maior quando o assunto é
Constituição, já que a Lei Maior é responsável por fundar uma ordem jurídica nova,
definindo a estrutura do Estado. Diante disso, não restam dúvidas quanto à força
política da Carta Magna, haja vista que ela estrutura o próprio Poder estatal,
repartindo-o (por exemplo, em Executivo, Legislativo e Judiciário) e delimitando as
esferas de atuação de cada uma de suas divisões.
Atualmente, porém, com a superação do Estado liberal e com o advento do
Estado Social e Democrático de Direito, as Constituições contemporâneas não tem se
limitado a instituir o Estado através de sua mera divisão política. Pelo contrário,
hodiernamente há uma preocupação global em definir, no texto constitucional, uma
ordem dos direitos dos cidadãos. Dessa maneira, é traçado na Constituição um plano
ou projeto de Estado-modelo que indica, através de normas programáticas68,
preceitos que visam dirigir a sociedade a um fim. Devido a isso, as Leis Maiores com
estas características têm sido classificadas pela doutrina como constituições
dirigentes, haja vista que não se limitam a estruturar o Estado, dividindo os seus
poderes e atribuições, mas também estabelecem um objetivo de sociedade a se
buscar. Em outras palavras, a Constituição, quando dirigente, estabelece um projeto
de Estado a ser alcançado, considerando, na elaboração do supracitado modelo, os
princípios e valores de uma determinada sociedade, em um determinado espaço de
tempo, e, então, cria compromissos69 através de normas programáticas, ou seja,
normas “que impõem uma atividade e dirigem materialmente a concretização
constitucional”70, com o fulcro de atingir os objetivos constantes no plano almejado.
Sendo assim, o ordenamento jurídico deixa de ser um mero regulador de
68 Neste ponto, é importante salientar que o conceito de norma programática adotado no presente texto refere-se à obra de Canotilho. Para este autor, as normas programáticas são aquelas que estabelecem um programa de direção política, ou seja, dirigem o Estado para a concretização de um compromisso político definido. Sendo assim, o seu conceito difere muito do adotado por José Afonso da Silva que utiliza a mesma expressão para definir as normas que necessitam de regulamentação legislativa para ter efetividade. Para maiores detalhes dos conceitos adotados, ver: CANOTILHO, J.J. Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Limitada, 1982; SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. 69 Cf. CANOTILHO. Constituição... op.cit. p. 141. 70 CANOTILHO. Direito Constitucional... op. cit. p. 1176. Ainda neste assunto, há de se destacar a distinta posição adotada por Manoel Gonçalves Ferreira Filho que considera que a Constituição brasileira não é dirigente, mas sim “Total”, haja vista que estabelece em um mesmo texto a Constituição política, a Constituição social e a Constituição econômica. Para maiores informações sobre o assunto conferir FERREIRA FILHO. Aspectos do direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 74.
670
conflitos intersubjetivos e passa a ser um elemento de transformação social71.
Confirmando o exposto, afirma Peter Häberle: “Constituição é a ordem jurídica
fundamental de um Estado e de uma sociedade. Não é apenas a limitação do poder
estatal, mas também a limitação do poder social e a própria autorização do poder
estatal”72. Dessa maneira, estes preceitos constantes nas normas programáticas
caracterizam-se por conterem decisões políticas fundamentais e, por esse motivo,
vinculam todas as autoridades às suas disposições e princípios73. Portanto, os atos de
todas as autoridades devem obedecer ao previsto no texto constitucional. Tal
obediência, com efeito, deve ser tanto no aspecto formal (procedimental) quanto no
material (conformidade do conteúdo dos atos com os dispositivos constitucionais)74.
A extrema relevância da Lei Suprema, contudo, deve ser garantida. Ora,
exatamente para garantir a superioridade e eficácia do texto constitucional é que
existe o controle de constitucionalidade. Tal atividade, faz mister acrescentar se
caracteriza por ter natureza híbrida, haja vista seu papel político e jurídico. Com efeito,
a jurisdição constitucional é política, na medida em que possui um objeto político, qual
seja, a Constituição. Em contrapartida, também possui natureza jurídica, pois sua
atuação não se dá por métodos políticos, mas exclusivamente jurídicos75.
Ademais, é justamente no “exercício da jurisdição constitucional que se verifica
um maior atrito entre os sistemas jurídico e político”76. Esse maior atrito, com efeito,
se verifica, principalmente, na relação existente entre o controle de
constitucionalidade e a democracia. A este respeito, Barruffini esclarece que a
legitimidade do controle de constitucionalidade encontra-se na idéia de
complementariedade entre Democracia e Estado de Direito, já que a democracia se
pauta na soberania popular e, portanto, consubstancia-se no governo da maioria. O
Estado de Direito, por sua vez, pauta-se na supremacia das normas jurídicas, entre as
quais se destacam as normas constitucionais. Estas, entretanto, estabelecem a
proteção aos direitos fundamentais e ao controle jurisdicional do poder estatal e, por
71 LEITE. Op. cit. p. 158 72 Cf. HÄBERLE, Peter. Jurisdição Constitucional como força política. In. TAVARES, André Ramos (coord). Justiça Constitucional: pressupostos teóricos e análises concretas. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p.66. 73 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 138-139. 74 Cf. CANOTILHO. Direito Constitucional...Op. cit. p. 246. 75 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 166. 76 LEITE. Op. cit. p. 177.
671
isso, tutelam, também, os interesses das minorias77. Não obstante a opinião do nobre
autor sobre a democracia, há de se considerar que, atualmente, tal conceito evoluiu.
Sendo assim, a sociedade democrática não se caracteriza por seguir a mera vontade
da maioria, mas sim, por garantir o respeito e participação de todos os grupos e
classes sociais. Dessa forma, a jurisdição constitucional não se encontra entre a
democracia e o Estado de Direito, mas atua como forma de garantir os valores
democráticos, defendendo o pluralismo de nossa sociedade78. Nota-se, então, que a
jurisdição constitucional apresenta-se de forma bem mais ampla e importante do que
a apresentada pelo autor, já que se trata de um instrumento de legitimação dos
valores democráticos, tutelados, invariavelmente, por todas as constituições
dirigentes.
Neste tipo de Constituição, cabe afirmar, os três poderes constituídos têm o
poder-dever de transformar o plano normatizado em realidade, fazendo o Estado
evoluir no sentido do norte constitucionalmente estabelecido. Ocorre que o objetivo a
ser alcançado pode exigir a participação ativa e simultânea de mais de um órgão
constitucional. Neste caso, deve-se ressaltar a importância de cada poder agir
conforme a competência delimitada. Ora, evidentemente, todos os órgãos
constitucionais possuem suas atividades vinculadas ao texto constitucional. Esta
vinculação, conforme afirmado anteriormente, se dá tanto na esfera ativa quanto na
esfera passiva. Dessa maneira, não obstante o fato dos três poderes terem o dever de
concretizar as normas constitucionais, eles também tem o dever de agir nos limites de
sua competência. Portanto, apesar de a tarefa constitucional abranger mais de um
órgão, ocorre, muitas vezes, de o privilégio da concretização, em um ponto específico,
ser exclusivo a um poder79. Observa-se, assim, que, embora seja importante a
concretização dos fins do Estado, também é importante a observância dos meios
estabelecidos, já que tenciona-se impedir, como princípio democrático, a
concentração de poderes em um só órgão. Logo, quando um poder age, mesmo que
de forma a concretizar valores constitucionais, interferindo na competência de outro
órgão, ele atua de forma abusiva, pondo em risco os valores democráticos inerentes
ao Estado Social. 77 Cf. BARRUFFINI, José Carlos Tosetti. O controle de constitucionalidade e a jurisdição constitucional. Franca: 2007. (Tese de Livre-docência em Direito Constitucional). Departamento de Direito Público da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da Universidade Estadual Paulista. p. 95. 78 Cf. HÄBERLE. Jurisdição... Op.cit. p. 62. 79 Cf. CANOTILHO. Constituição... Op.cit. p. 179.
672
Essa problemática, contudo, inegavelmente, adquire grandes dimensões
quando o assunto é jurisdição constitucional. A aplicação deste instituto, como bem
demonstrado até aqui, não é somente jurídica, mas também política. Este viés político,
cabe ressaltar, se acentua em países cujo grau de fruição de direitos fundamentais é
insatisfatório, como o Brasil, haja vista a própria pressão social sobre a jurisdição
constitucional como forma de efetivar os direitos previstos na Lei Suprema. Trata-se
de uma reivindicação, inclusive nos meios acadêmicos, de atuação mais ativa do
Judiciário, de modo a diminuir o fosso entre a realidade fática e a realidade
normativa80. Essa atuação, contudo, deve ser limitada, sob pena de transformar o
Judiciário em uma nova Casa legislativa. Ora, a excessiva “politização” da jurisdição
constitucional pode levar a um “governo de juízes”, o que acarretaria no
questionamento a respeito de sua legitimidade democrática81.
Do mesmo modo, a problemática também ocorre com a interpretação da
Constituição. Com efeito, as constituições dirigentes modificaram, radicalmente, a
função do Judiciário que, deixa de ser mero aplicador da lei em resolução de conflitos
intersubjetivos e passa a ser instrumento político de transformação social,
trabalhando, diariamente, com novos direitos, como por exemplo, os direitos
coletivos82. Ora, as constituições dirigentes, como afirmado anteriormente,
estabelecem uma ligação com a atividade de direção política e, normalmente, se
manifestam através de conceitos legais indeterminados. Tais expressões, por serem
amplas e gerais, atribuem grande margem a interpretação, que será variável de
acordo com a evolução da sociedade a respeito do conceito em questão. Entretanto,
esta interpretação não pode representar, como muitas vezes ocorre, uma criação de
direito, função particular e inerente ao Legislativo83.
Verifica-se, portanto, que a Carta da República funda a ordem estatal,
estruturando os poderes e tutelando os direitos e garantias fundamentais. Esta
divisão, com efeito, delimita a esfera de ação, competência, de cada poder constituído
de modo a não permitir a excessiva concentração de poder em um único órgão.
Possibilita-se, assim, uma maior fruição dos princípios democráticos. Como
decorrência disso, deve-se criticar os apelos ao ativismo judicial. Esta prática, com
efeito, defende que os magistrados transpassem os limites legais e constitucionais, ou
80 Cf. LEITE. Op. cit. p. 161. 81 Ibid. p. 162-163. 82 Cf. LEITE. Op. cit. p. 159. 83 Cf. QUEIROZ. Op. cit. p. 148-149 e 168.
673
seja, permite que o Judiciário realize atos da esfera do Legislativo. Ora, há de se
ressaltar que, antes de qualquer coisa, os juízes são seres humanos. Sendo assim,
possibilitar que eles desconsiderem as leis democraticamente elaboradas segundo os
valores de uma sociedade, permite a imposição de crenças e preconceitos pessoais
nas decisões84. Em outras palavras, o ativismo judicial resulta na “politização da
justiça”, ou seja, a tomada de decisões segundo critérios políticos85. Trata-se, pois, de
uma manifestação de poder arbitrária do julgador, o que contraria o Estado
Democrático de Direito86.
Este problema, ademais, se agrava quando o órgão julgador em questão é o
Supremo Tribunal Federal. Ora, este órgão é justamente o responsável por proteger a
coerência do ordenamento jurídico e a supremacia da Constituição87. Dessa forma, a
Suprema Corte possui a responsabilidade de vigiar a manutenção da Constituição a
começar pelos “procedimentos e normas organizacionais dos quais depende a
eficácia legitimativa do processo democrático”88. Em outras palavras, o STF, como
protetor e defensor dos dispositivos constitucionais deve ser o primeiro a atentar para
os seus dispositivos, entre os quais, se incluem as normas que delimitam a esfera de
competência atinente a cada poder constituído. Esta competência, no entanto, mudou
com a evolução do constitucionalismo. Ora, o Judiciário como um poder constituído
possui o dever de concretizar o plano constitucional. Este dever, com efeito, fez com
que a atuação política deste poder aumentasse exponencialmente. Verifica-se, então,
um processo de judicialização da política, que se configura com a sobrecarga de
questões políticas a competência do Judiciário.
Dessa forma, destaca-se que, com a evolução do constitucionalismo,
principalmente com o advento das constituições dirigentes, o Judiciário deixou de ser
um mero aplicador do texto legal, passando a desempenhar um papel de
transformação do Estado rumo a um plano constitucionalmente positivado. Esta
atuação, no entanto, deve ser limitada conforme o preceituado na Carta da República,
haja vista que ultrapassar estas balizas significa exercer um poder arbitrário, ilegal, e
portanto, contrário ao Estado Democrático de Direito. O cuidado para não ultrapassar
estes limites, com efeito, deve ser ainda maior no âmbito da jurisdição constitucional,
84 Cf. HABERMAS. Op.cit. p. 266. 85 NEVES. Op.cit. p. 235. 86 Ibid. p.95 87 Cf. HABERMAS. Op.cit. p. 299 e 302. 88 Ibid. 327.
674
já que, conforme o exposto, é justamente o controle de constitucionalidade que
possibilita uma maior atuação do Judiciário na esfera política.
Na decisão da ADI 3510, diversamente de outras decisões de alta relevância
jurídica e política julgadas recentemente, o Supremo Tribunal Federal não excedeu os
limites da atividade jurisdicional traçados pela Constituição Federal, não incorrendo no
funesto ativismo judicial. Os julgadores ativeram-se, essencialmente, à verificação da
compatibilidade do art. 5º da Lei de Biossegurança com os preceitos constitucionais
do art. 1º, III, e 5º, caput, nos estritos moldes do controle de constitucionalidade,
apresentando votos bem fundamentados, de modo a sustentar as várias orientações
defendidas por cada Ministro, sob entendimentos e interpretações plurais. Entretanto,
data venia, há de se ressalvar a postura adotada pelo Ministro Eros Grau, que, em
seu voto, decidiu a questão estabelecendo termos aditivos, isto é, impondo novas
condições para a aplicação do art. 5º não previstas na Lei de Biossegurança, o que
caracteriza atividade criativa, típica do Poder Legislativo. Não obstante a pertinência
das condições e interpretações postas pelo Ministro, não é papel do Judiciário exercer
essa atividade criativa, já que lhe é constitucionalmente vedado estabelecer normas
gerais e abstratas.
Quanto à fundamentação da decisão, pode-se afirmar que, em geral, a
argumentação tecida pelos Ministros foi coerente com as decisões proferidas em cada
voto. Entretanto, algumas ressalvas merecem ser destacadas. Os Ministros Gilmar
Mendes, Eros Grau e Cármen Lúcia, por exemplo, constataram a insuficiência da
proteção conferida pelo art. 5º da Lei de Biossegurança aos embriões fecundados “in
vitro”, principalmente no que tange à fiscalização do emprego de tais materiais.
Todavia, ignoraram tal problemática e julgaram improcedente o pedido de declaração
de inconstitucionalidade do dispositivo. Tal postura revela uma grande contradição
dos julgadores com o entendimento geral do Supremo Tribunal Federal na matéria, já
que sempre se enalteceu a importância dos bens jurídicos ali envolvidos. Sendo
assim, detectada e apontada a falha da lei, a mesma não poderia ser ignorada.
Percebe-se, então, que a grande repercussão popular e a cobertura dada pela mídia
ao caso podem ter pressionado alguns dos Ministros que, ao que parece, não
conseguiram imprimir em seus votos a postura vigorosa que gostariam de adotar.
A Lei de Biossegurança, por certo, está longe da perfeição, merecendo maior
atenção por parte do legislador e do intérprete/aplicador do direito. O objeto da Lei e
os propósitos a que se destina são de grande relevância, podendo afetar quase 10%
675
da população brasileira. Ademais, cerca de 95% dos brasileiros manifestaram apoio
às pesquisas com células-tronco embrionárias, que a Lei de Biossegurança veio
regulamentar, demonstrando a grande legitimidade de que goza este diploma legal,
que se coaduna com os valores e interesses de toda a sociedade. No entanto, um
assunto tão importante, e com tanto respaldo social, merecia um maior cuidado do
Legislador, que deveria ter se valido de uma técnica legislativa que garantisse maior
proteção aos bens jurídicos envolvidos, a começar pela fiscalização dos empregos
dos embriões humanos fecundados “in vitro”. As disposições legais, no que tange a
este ponto, são muito vagas e pouco precisas, gerando ambigüidades e incertezas na
interpretação da matéria. Há, nesse sentido, a necessidade de criação de comitês de
fiscalização ligados ao Estado, não às instituições de pesquisa, como forma de
garantir sua imparcialidade e isenção. Da igual maneira, destaca-se a necessidade de
previsões legais que limitem o número de embriões formados por ciclo, tal como
sugeriu o Ministro Eros Grau em seu voto. Como dito, embora se sustente que
estabelecer tais limitações em decisões judiciais aditivas não seja a forma mais
adequada democraticamente de exercício da jurisdição constitucional, trata-se de uma
real necessidade, como forma de garantir que as pesquisas não se submetam aos
interesses do mercado. Vale dizer, os embriões pesquisados devem ser unicamente
os excedentes do processo de fecundação “in vitro” com fins reprodutivos, e não os
resultantes de uma produção em larga escala, com o único e exclusivo fim de produzir
material para pesquisa.
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