Obituário: um gênero emconstrução?

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FACULDADE UNIDA DE SUZANO - UNISUZ CURSO DE LETRAS MARIA CRISTINA S. V. CIMMINIELLO OBITUÁRIO: UM GÊNERO EM CONSTRUÇÃO? SUZANO 2010

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FACULDADE UNIDA DE SUZANO - UNISUZ CURSO DE LETRAS

MARIA CRISTINA S. V. CIMMINIELLO

OBITUÁRIO: UM GÊNERO EM CONSTRUÇÃO?

SUZANO 2010

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MARIA CRISTINA S. V. CIMMINIELLO

OBITUÁRIO: UM GÊNERO EM CONSTRUÇÃO?

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do titulo de licenciado em Letras, da Faculdade Unida de Suzano – Unisuz, sob orientação da Professora Dra. Alba Lúcia Romeiro Tambelli.

SUZANO 2010

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MARIA CRISTINA S. VEIGA CIMMINIELLO

OBITUÁRIO: UM GÊNERO EM CONSTRUÇÃO?

SUZANO, 09/12/2010

BANCA EXAMINADORA

_____________________________

ALBA LÚCIA ROMEIRO TAMBELLI

DRA. EM LINGUÍSTICA E SEMIÓTICA

FACULDADE UNIDA DE SUZANO - UNISUZ

_____________________________

PAULA BARBOSA PUDO

MESTRE

FACULDADE UNIDA DE SUZANO - UNISUZ

_____________________________

JANE GATTI

MESTRE

FACULDADE UNIDA DE SUZANO - UNISUZ

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Dedico esse trabalho as três pessoas amigas e responsáveis por me mostrarem como é bom estudar Letras.

A primeira é minha amiga Luciana Aparecida Shinabe de Rezende, que me convidou a voltar a estudar e me trouxe a Unisuz.

A segunda é minha professora e nossa coordenadora Jane Gatti, que me convenceu a estudar Letras.

A terceira é minha professora e orientadora Alba Lúcia Romeiro Tambelli, que me guiou e sempre me ouviu com paciência para sanar minhas dúvidas.

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AGRADECIMENTO

A Deus, que me permitiu ter condições físicas para realizar esse trabalho.

A meu marido Eduardo e meu filho Bruno, que souberam entender como era importante para

minha a realização pessoal esse estudo.

A minha mãe Guiomar, que concordou em abrir mão de vários dos nossos encontros aos

domingos para que eu pudesse estudar.

Aos meus professores, pelos ensinamentos e dedicação com que nos trataram durante o curso

de Letras.

Aos meus colegas de classe que foram, cada um a seu modo, muito importantes na minha

vida acadêmica

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“Como diz Bill McDonald, de certa maneira, os melhores obituários são aqueles que nos falam de pessoas sobre as quais nós nunca tínhamos ouvido falar, e nos deixam chateados por não termos tido a chance de conhecê-las”.

Matinas Suzuki Jr

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RESUMO

Em razão do nosso interesse sobre o assunto e com o objetivo de analisar sua origem e a estrutura usada pelo obituaristas daquele periódico, propusemos o estudo do obituário como mais uma opção de gênero para ser trabalhado em sala de aula. Para tanto, escolhemos como corpus do trabalho os textos publicados no jornal Folha de São Paulo, no período de 24 a 31 de outubro de 2007 e de 01 a 04 de novembro de 2007. Esse período foi escolhido porque em 24 de outubro foi publicado o primeiro obituário. Para realizar esse estudo utilizamos as teorias de Mikhail Bakhtin, e estudamos também o tipo textual, que muitas vezes é confundido com gênero. O tipo textual define se o texto é narrativo, descritivo, expositivo, ou argumentativo. Utilizamos para esse estudo as publicações de Luiz Antonio Marcuschi e Jane Quintiliano G. Silva, que ensinam como classificar um texto, quais os pontos que devem ser observados para definí-los. Findos esses itens, passamos ao estudo da viabilidade de utilização do texto obituário em sala de aula. Para isso os ensinamentos de Joaquim Dolz, Bernard Schneuwly, Michele Noverraz e Roxane Rojo foram muito importantes. Eles explicam a necessidade de variar os temas escolhidos para os alunos estudarem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs determinam que a diversidade textual que existe fora da escola deve ser utilizada para ampliar o conhecimento dos alunos. Analisamos os obituários, dividindo-os em duas partes título e texto. Os textos foram divididos em introdução, desenvolvimento e conclusão. Alcançamos nossos objetivos. Os obituários possuem uma estrutura estável que nos permite defini-los como relatos, e identificá-los como gênero do discurso jornalístico. Sua construção composicional é específica para o meio de comunicação em que estão inseridos. Foi possível determinar a estrutura dos obituários a partir de estudos sobre gêneros textuais. Para um aprofundamento do tema, estudos futuros poderão ser feitos no sentido de verificar se, para além de um gênero do discurso jornalístico, os obituários poderiam ser classificados como gêneros literários. Palavras Chave: obituário, gênero, texto, discurso jornalístico.

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 – Carta de despedida do Snoop.. 14

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 01 – Tipos textuais e gêneros textuais........ 15

QUADRO 02 – Sequências tipológicas........................ 16

QUADRO 03 – Aspectos tipológicos............................ 21

QUADRO 04 – Tipos textuais segundo Werlich........... 23

QUADRO 05 – Obituário do Times – anexo A............. 25

QUADRO 06 – Obituário do Times – anexo B............. 26

QUADRO 07 – Título dos obituários............................. 39

QUADRO 08 – Análise dos parágrafos introdutórios... 44

QUADRO 09 – Desenvolvimento do texto.................... 49

QUADRO 10 – Resumo das conclusões...................... 52

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................10

1 DISCURSO E TEXTO ............................................................................................12

1.1 Gêneros do Discurso...........................................................................................12

1.2 Gênero textual e ensino ......................................................................................18

1.3 Origem do obituário na mídia ..............................................................................24

2 TEXTO E CONTEXTO ...........................................................................................28

2.1 Tipos textuais ......................................................................................................28

2.2 A enunciação.......................................................................................................30

2.3 O sentido do texto ...............................................................................................32

2.4 Contexto.... ..........................................................................................................33

2.5 Estrutura do texto ................................................................................................34

2.5.1Título...................................................................................................................34

2.5.2 Parágrafo..........................................................................................................35

3 ANÁLISE DA ESTRUTURA DOS OBITUÁRIOS....................................................39

3.1 Titulo....................................................................................................................39

3.2 Texto......... ..........................................................................................................40

3.2.1 Análise das Introduções ...................................................................................41

3.2.2 Análise do desenvolvimento.............................................................................45

3.2.3 Análise das conclusões.....................................................................................49

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................53

REFERÊNCIAS.........................................................................................................57

ANEXOS........ ...........................................................................................................58

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INTRODUÇÃO O estudo do texto jornalístico obituário surgiu por sugestão da nossa

professora de Língua Portuguesa, Dra. Alba Lúcia R. Tambelli. Nós estudávamos os

textos publicados no jornal Folha de São Paulo e ela comentou sobre o obituário,

dizendo que seria um bom tema para o TCC.

Os obituários são textos publicados no caderno Cotidiano na coluna Mortes.

Nessa coluna são divulgados pequenos anúncios de pessoas falecidas, convites

para cerimônias religiosas e os serviços fúnebres do município.

Nossa professora explicou que era um tema novo e que os textos eram muito

bem feitos. Assim, com o objetivo de analisar sua origem e a estrutura usada pelo

obituarista daquele periódico, propusemos o estudo do obituário como mais uma

opção de gênero para ser trabalhado em sala de aula.

Para tanto, escolhemos como corpus do trabalho os textos publicados no

jornal Folha de São Paulo, no período de 24 a 27 de outubro de 2007, de 30 e 31 de

outubro, e de 01 a 04 de novembro de 2007. Esse período foi escolhido porque em

24 de outubro foi publicado o primeiro obituário no jornal Folha de São Paulo.

Objetivando definir se os obituários publicados têm uma estrutura estável, de

modo a ser considerado um gênero e a viabilidade de sua utilização nas salas de

aula, iniciamos nossa discussão teórica com o estudo sobre gêneros do discurso.

Para realizar esse estudo utilizamos primeiramente as teorias de Bakhtin

(2003), desenvolvidas em sua obra Estética da Criação Verbal e de Marcuschi (2005)

com o texto Gêneros Textuais: definição e funcionalidade.

A seguir passamos ao estudo da viabilidade de utilização do texto obituário

em sala de aula. Para isso os ensinamentos de Dolz, Schneuwly e Noverraz (2004)

e Rojo (2008) foram muito importantes, uma vez que apontavam a necessidade de

variar os temas escolhidos para os alunos estudarem. Nesse sentido, vão ao

encontro do que determinam os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs (1997),

para os quais a diversidade textual que existe fora da escola deve ser utilizada para

ampliar o conhecimento dos alunos.

Marcuschi (2005) faz-nos ver como seria positivo distribuir um jornal em uma

sala de aula e pedir aos alunos que escolham o texto que desejam estudar ou

conhecer.

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Em Origem do obituário na mídia, explicamos como surgiram essas

publicações. Os obituários são escritos há mais de 40 anos nos periódicos ingleses e

americanos. Esses povos celebram o morto. Eles têm uma visão diferente da nossa,

que cultiva a dor da perda. Para orientar-nos nessas explicações, utilizamos o Livro

das Vidas, de Suzuki (2008), cujo objetivo é mudar a visão mórbida dos obituários.

Estudar o obituário é também estudar a cultura de um povo. No Brasil, os

obituários começaram a ser publicados pelo jornal Folha de São Paulo em 24

outubro de 2007. Recentemente, em 14 de março de 2010, o jornal Estado de São

Paulo, renovando seu projeto de desenho, passou a publicar obituários em sua

coluna Falecimentos.

Os dois jornais basearam-se nas publicações de obituários do jornal New

York Times, jornal diário que dedica uma página inteira para essa matéria e no Livro

das Vidas, escrito por Matinas Suzuki.

Na segunda parte de nosso trabalho estudamos Texto e Contexto. O tipo

textual muitas vezes é confundido com gênero. O tipo textual define se o texto é

narrativo, descritivo, expositivo, ou argumentativo. Utilizamos para esse estudo as

publicações de Marcuschi (2005), Dolz, Schneuwly e Noverraz (2004) e Silva (1999),

que ensinam como classificar um texto, quais os pontos que devem ser observados

para definí-los.

Para estudar a enunciação, utilizamos os ensinamentos de Benveniste (1989)

e Koch (2003). Em seguida discorremos sobre O sentido do texto e o Contexto,

baseando-nos nos estudos de Koch.

A Estrutura do Texto nos levou a Marcuschi (2005) e Dolz, Noverraz e

Schneuwly (2004), e seguindo suas orientações dividimos o estudo dos obituários em

duas partes: Título e Parágrafo.

Para estudar a estrutura dos títulos e dos parágrafos escritos pelos

obituaristas, utilizamos também as orientações de Guimarães (2002) e Garcia (2006).

Cada povo tem uma forma de lidar com os personagens de sua história, com

seus antepassados. A publicação dos obituários é uma forma de homenagear

pessoas comuns, torná-los conhecidos, e também de pensar que valeria a pena tê-

los conhecidos.

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1 DISCURSO E TEXTO

1.1 Gêneros do Discurso Bakhtin (2003, p. 262) denomina gêneros do discurso os enunciados que

contenham conteúdo temático, estilo e construção composicional específicos em um

determinado campo da comunicação.

A diversidade dos gêneros do discurso baseia-se na atividade humana. Isso

nos mostra a existência da grande heterogeneidade desses gêneros (orais e

escritos). As réplicas do diálogo do cotidiano, o relato do dia-a-dia, a carta, o

comando militar lacônico padronizado, as manifestações publicístas, as

manifestações científicas e os gêneros literários, do provérbio ao romance, são

exemplos citados por Bakhtin para salientar a extrema heterogeneidade dos gêneros

do discurso.

Marcuschi (2005, p.19) esclarece que “[...] os gêneros contribuem para

ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia”. São eventos textuais

maleáveis, dinâmicos e plásticos. Surgem das necessidades e atividades

sócioculturais e na relação com inovações tecnológicas, fato comprovado se

considerarmos a quantidade de gêneros textuais existentes hoje em relação a

sociedades anteriores à comunicação escrita.

Os gêneros são estudados desde a Antiguidade. Os primeiros foram os

gêneros literários. Seu estudo foi feito observando-se suas características artístico-

literárias, a diferença entre elas no campo da literatura e não como em outros

enunciados que, embora diferentes, têm uma natureza verbal (linguística) comum

(BAKHTIN, 2003, p. 262).

As tecnologias ligadas à área de comunicação, a intensidade do uso dessas

tecnologias e suas interferências nas atividades comunicativas diárias, propiciaram o

surgimento de novos gêneros textuais (MARCUSCHI, 2005, p.20).

O rádio, a televisão, o jornal, a revista e a internet favoreceram o

aparecimento de formas discursivas novas, como editoriais, notícias, telefonemas,

vídeo-conferências, reportagens ao vivo, cartas eletrônicas (e-mails), entre outras.

O telefonema, por exemplo, reproduz uma conversação face a face; o e-mail

gera mensagens eletrônicas que têm nas cartas pessoais e no bilhete seus

antecessores.

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A heterogeneidade dos gêneros discursivos permite que eles sejam definidos

como gêneros discursivos primários (simples) e secundários (complexos). No

processo de formação dos gêneros secundários (romances, dramas, pesquisas

científicas de toda espécie, os grandes gêneros publicísticos, etc...), são

incorporados diversos gêneros primários (simples), que se formam nas condições da

comunicação discursiva imediata (BAKHTIN, 2003, p. 263).

Segundo Bakhtin, o estudo do enunciado e a diversidade de formas dos

gêneros dos enunciados são de enorme importância para quase todos os campos da

linguística e da filologia.

O desconhecimento da natureza do enunciado e a relação diferente com as peculiaridades de gênero do discurso em qualquer campo da investigação linguística redundam em formalismo e em uma abstração exagerada, deformam a historicidade da investigação, debilitam as relações da língua com a vida. Ora, a língua passa a integrar a vida através de enunciados concretos (que realizam); é igualmente através de enunciados concretos que a vida entra na língua. (BAKHTIN, 2003, p.264-265).

Os gêneros discursivos refletem o estilo individual do falante (ou de quem

escreve). Porém, nem todos os gêneros são propícios ao reflexo individual. Por

exemplo, os gêneros da literatura de ficção têm como característica principal o estilo

individual. Já os documentos oficiais, de ordens militares, requerem uma forma

padronizada. (BAKHTIN, 2003, p. 265).

Bakhtin afirma que “na imensa maioria dos gêneros discursivos (exceto nos

artístico-literários), o estilo individual não faz parte do plano do enunciado [...]”

(BAKHTIN, 2003, p.266). Para ele a definição de estilo exige um estudo profundo da

natureza do enunciado e da diversidade de gêneros discursivos.

Marcuschi (2008, p.164) aborda a intergenericidade indagando “Como é que

se chega à denominação dos gêneros?”. Ele explica que “[...] as designações que

usamos para os gêneros não são uma invenção pessoal, mas uma denominação

histórica e socialmente constituída”(MARCUSCHI, 2008, p.164). Uma epígrafe, por

exemplo, pode ser constituída de um poema, uma frase, um conto breve, em muitos

casos apenas o local em que o texto aparece permite que determinemos com alguma

precisão de que gênero se trata.

Outro exemplo apresentado por Marcuschi (2008, p.164) é o texto que

apresentamos na próxima página, que foi publicado em jornais diários e periódicos

semanais por ocasião da despedida do autor do personagem Snoopy.

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Figura 1 – Carta de Despedida do Snoopy.

Do lado esquerdo temos uma carta de despedida. À direita, um quadrinho

com a figura do Snoopy pensativo diante de uma máquina de escrever antiga.

Marcuschi indaga “tratava-se de uma tirinha? Uma carta pessoal? Era o texto

produzido num interdiscurso, cujo espaço fora constituído por meio século no

contexto de uma tirinha de jornal ou uma história em quadrinho” (MARCUSCHI,

2008, p.164).

A linguagem literária evolui de acordo com a sua penetração em todos os

gêneros, em maior ou menor grau, com os novos procedimentos de gênero de

construção do todo discursivo, do seu acabamento, da inclusão do ouvinte ou

parceiro.

Não podemos defini-los mediante propriedades que lhes devam ser

necessárias e suficientes. Por exemplo, uma carta pessoal será sempre uma carta,

mesmo que o autor tenha esquecido de assiná-la. Um artigo de opinião pode ser

escrito em forma de um poema, que continuará sendo um artigo de opinião.

Ainda em relação aos gêneros podemos dizer que possuem intertextualidade

intergêneros (um gênero com a função de outro) e heterogeneidade tipológica (um

gênero com a presença de vários tipos).

Em cada campo da atividade humana é integral o repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo (BAKHTIN, 2003, p. 262).

“Os gêneros são, em última análise, o reflexo de estruturas sociais

recorrentes e típicas de cada cultura e todos os textos se manifestam num ou noutro

gênero textual.” (MARCUSCHI, 2005, p.32).

Marcuschi afirma que a comunicação verbal só é possível por algum gênero

textual. Essa visão segue uma noção de língua como atividade social, histórica e

cognitiva. Afirma o caráter de indeterminação e, ao mesmo tempo, de atividade

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constitutiva da língua. O autor usa a expressão tipo textual para designar a natureza

linguística de sua composição. A expressão gênero textual é usada para referir os

textos materializados que encontramos diariamente e que apresentam características

sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais e estilo.

O quadro abaixo, apresentando por Marcuschi (2005, p. 23), permite

visualizarmos essas definições:

TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS

1- constructos teóricos definidos por

propriedades linguísticas intrínsecas;

1- realizações linguísticas concretas definidas

por propriedades sóciocomunicativas;

2- constituem sequências linguísticas ou

sequências de enunciados no interior dos

gêneros e não são textos empíricos;

2- constituem textos empiricamente realizados

cumprindo funções em situações

comunicativas;

3- sua nomeação abrange um conjunto limitado

de categorias teóricas determinadas por

aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas,

tempo verbal;

3- sua nomeação abrange um conjunto aberto

e praticamente ilimitado de designações

concretas determinadas pelo canal, estilo,

conteúdo, composição e função;

4- designações teóricas dos tipos: narração,

argumentação, descrição, injunção e

exposição.

4- exemplos de gêneros: telefonema, sermão,

carta comercial, carta pessoal, romance,

bilhete, aula expositiva, reunião de condomínio,

horóscopo, receita culinária, bula de remédio,

lista de compras, cardápio, instruções de uso,

outdoor, inquérito policial, resenha, edital de

concurso, piada, conversação espontânea,

conferência, carta eletrônica, bate-papo virtual,

aulas virtuais, etc.

Quadro 1: Tipos Textuais e Gêneros Textuais.

As expressões “gênero textual”, “gênero discursivo” ou “gênero do discurso”,

segundo Marcuschi (2008, p.154), podem ser usadas intercambiavelmente, salvo

naqueles momentos em que se pretende identificar algum fenômeno específico.

Bakhtin explica que “O estilo integra a unidade do gênero do enunciado como seu

elemento” (BAKHTIN, 2003, p. 266).

Marcuschi (2005, p.24) define texto como “[...] uma entidade concreta

realizada materialmente e corporificada em algum gênero textual. Discurso é aquilo

que um texto produz ao se manifestar em alguma instância discursiva”.

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A expressão “domínio discursivo” é usada para designar uma esfera ou

instância de produção discursiva. Esses domínios propiciam o surgimento de

discursos bastante específicos como o discurso jurídico, o discurso jornalístico e o

discurso religioso.

Nos livros didáticos, a expressão “tipo de texto” é empregada de forma

equivocada, porque não designa um tipo e sim um “gênero de texto”.

Entre as características básicas dos tipos textuais está o fato de eles serem definidos por seus traços linguísticos predominantes. Por isso, um tipo textual é dado por um conjunto de traços que formam uma sequência e não um texto. (MARCUSCHI, 2005, p. 27).

Quando dizemos “a carta pessoal é um tipo de texto informal”, estamos

incorrendo em erro. A carta pessoal é um gênero textual assim como um editorial, um

obituário ou uma bula de remédio. Uma carta pode conter uma sequência narrativa,

uma argumentação e uma descrição.

Marcuschi (2008, p.p.156-157) nos apresenta uma carta pessoal, onde

observamos as sequências tipológicas subjacentes:

Sequências tipológicas

Gênero textual: carta pessoal

Descritiva Rio, 11/08/1991

Injuntiva Amiga A. P. Oi!

Descritiva Para ser mais preciso estou no meu quarto escrevendo na escrivaninha, com um

Micro System ligado na minha frente (bem alto, por sinal)

Expositiva Está ligado na Manchete FM – ou rádio dos funks – eu adoro funk, principalmente com passos marcados. Aqui no Rio é o ritmo do momento... e você, gosta? Gosto também de house e dance music, sou fascinado por discotecas! Sempre vou à K.I,

Narrativa ontem mesmo (sexta-feira) eu fui e cheguei quase quatro horas da madrugada.

Expositiva Dançar é muito bom, principalmente em uma discoteca legal. Aqui no condomínio

onde moro têm muitos jovens somos todos muito amigos e sempre vamos todos juntos. É muito maneiro!

Narrativa C. foi três vezes à K.I.,

Injuntiva pergunte só a ele como é!

Expositiva Está tocando agora o “Melo da Mina Sensual”, super demais! Aqui ouço também a Transamérica e RPC FM.

Injuntiva E você, quais rádios curte?

Expositiva Demorei um tempão pra responder, espero sinceramente que você não esteja

chateada comigo. Eu me amarrei de verdade em vocês aí, do Recife, principalmente na galera da ET, vocês são muito maneiros! Meu maior sonho é viajar, ficar um tempo por aí, conhecer legal vocês todos, sairmos juntos... Posso te dizer uma

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coisa? Adoro muito vocês!

Narrativa Agora, a minha rotina: segundas, quartas e sextas-feiras trabalho de 8:00 às 17:00h, em Botafogo. De lá vou para o T., minha aula vai de 18:30 às 10:40h (sic). Chego aqui em casa quinze para meia-noite. E às terças e quintas fico 050 em F. só de 8:00 às 12:30h. Vou para o T.; às 13:30 começa o meu curso de Francês (vou me formar ano que vem) e vai até 15:30h, 16:00h vou dar aula e fico até 17:30h. 17:40h às 18:30h faço natação (no T. também) e até 22:40h tenho aula. /........../ Ontem eu Simone fizemos três meses de namoro;

Injuntiva Você sabia que eu estava namorando?

Expositiva Ela mora aqui mesmo no ((ilegível)) (nome do condomínio). A gente se gosta muito,

às vezes eu acho que nunca vamos terminar depois eu acho que o namoro não vai durar muito, entende?

Argumentativa O problema é que ela é muito ciumenta, principalmente porque eu já fui afim da B.,

que mora aqui também. Nem posso falar com a garota que S. já fica com raiva /......../

Narrativa É acho que vou terminando

Injuntiva escreva!

Faz um favor? Diga pra M., A. P. e C. que esperem, não demoro a escrever Adoro vocês! Um beijão!

Narrativa Do amigo

P.P. 15:16h

Quadro 2: Sequências Tipológicas.

Existem também alguns gêneros que só são recebidos na forma oral apesar

de terem sido produzidos originalmente na forma escrita (MARCUSCHI, 2005, p.33).

As notícias são escritas e oralizadas pelo apresentador ou locutor. As orações

são escritas e seu uso nas atividades religiosas é sempre oral. Por isso se diz que

oramos e não que escrevemos a Deus (MARCUSCHI, 2005, p. 33).

Só uma concepção profunda da natureza do enunciado e das peculiaridades dos gêneros discursivos pode assegurar a solução correta dessa complexa questão metodológica. (BAKHTIN, 2003, p.269).

Marcuschi (2005, p.34) esclarece que, além da produção adequada do

gênero, o seu uso deve ser adequado. Contar piadas fora de lugar é um caso de

violação ou inadequação de normas sociais relativas aos gêneros textuais.

A adequação tipológica diz respeito à relação que deveria haver entre a

natureza da informação ou do conteúdo veiculado; o nível de linguagem (formal,

informal, dialetal, culto, etc...); o tipo de situação em que o gênero se situa (pública,

privada, corriqueira, solene, etc...); a relação entre os participantes (conhecidos,

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desconhecidos, nível social, formação, etc...); a natureza dos objetivos das atividades

desenvolvidas.

No obituário, objeto desse trabalho, são apresentados os fatos da vida

da pessoa falecida. Marcuschi (2005, p.35) destaca que “Gêneros textuais não são

fruto de invenções individuais, mas formas socialmente maturadas em práticas

comunicativas”.

Cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (BAKHTIN, 2003, p. 262).

1.2 Gênero textual e ensino

A disciplina de Língua Portuguesa, foi introduzida oficialmente no Brasil em

meados de 1838, quando se estudava gramática, retórica e lógica ou filosofia, o

estudo do Trivium, que se exercia em latim (ROJO, 2008, p.79).

[...] O ensino da língua e da literatura portuguesa sempre se pautou pelo ensino das línguas clássicas, sobretudo do latim. A gramática nacional era estudada a partir das categorias gramaticais da língua latina e explicada como sua transformação, enquanto a literatura nacional era apresentada segundo critérios fixos da retórica e da poética clássicas, dividida por gêneros [...] (RAZZINI apud ROJO, 2008, p.80).

A partir da década de 1960 e com a ditadura militar de 1964, houve uma

ampliação do acesso da população à escola pública, mudou também o perfil

econômico e cultural tanto de alunos como de professores. A escola pública deixou

de ser um privilégio dos filhos das elites: as camadas populares passaram a ter

assento nas salas de aula.

Rojo (2008, p.87) explica que nessa época no Brasil, houve um grande

crescimento na industrialização e na comunicação de massa. O ensino passou a ser

mais preocupado com a realidade prática, que enfatizava os gêneros que circulavam

na comunicação de massa e nas mídias.

Os materiais didáticos sofreram acentuadas mudanças. Os livros didáticos

substituíram obras como antologias, seletas e gramáticas. Desapareceram conceitos

referenciais, propostas, programas e materiais e surgem os textos da mídia de

grande circulação, em sala de aula.

[...] dava-se ênfase, então, apenas a textos jornalísticos e publicitários, praticamente ignorando-se os literários. Havia, ainda, destaque para textos não-verbais, charges e histórias em quadrinhos” (CLARE apud ROJO, 2008, p.88).

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Nas décadas de 1970 a 1990, surgiram outras mudanças nos programas e

currículos de língua, eles centralizaram-se em procedimentos de leitura e produção

de textos. No entanto, conforme salienta Rojo (2008, p.89), nas práticas de leitura e

produção, o texto entra menos como produtor de sentidos e mais como suporte de

análises gramaticais e também textuais “[...] como se o mero conhecimento de

estruturas e tipos textuais, regras e normas pudessem fazer circular o diálogo e os

sentidos”.

Uma “sequência didática” é um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito (DOLZ, NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2004, p. 97).

A finalidade da sequência didática é ajudar o aluno a dominar melhor um

gênero de texto, para que ele possa escrever e falar de maneira adequada em uma

determinada situação. Os gêneros que aparecem nos trabalhos escolares são as

narrativas de aventuras, as notícias do dia a dia, as receitas de cozinha, entre

outras. Assim é importante trabalhar com o aluno gêneros que ele não domina ou o

faz de maneira insuficiente, os dificilmente acessíveis e gêneros públicos e não

privados.

O aluno precisa aprender a resolver os problemas que vão surgindo à medida

que ele está elaborando um texto. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.104),

apresentam quatro níveis de abordagens para a produção de textos: a

representação da situação de comunicação; a elaboração dos conteúdos; o

planejamento do texto e a realização do texto.

Na representação da situação de comunicação, o aluno deverá aprender a

fazer uma imagem do destinatário do texto, da finalidade e da sua posição como

autor ou locutor.

Na elaboração dos conteúdos, o aluno deverá conhecer as técnicas para

elaborar, buscar ou criar conteúdos, entendendo que as técnicas diferem em função

das características de cada gênero.

No planejamento do texto, o aluno deverá estruturar seu texto de acordo com

a finalidade que deseja atingir ou do destinatário do texto.

Na realização do texto, o aluno deverá escolher os meios de linguagem mais

adequados para escrever seu texto, utilizar vocabulário correto, variar os tempos

verbais, servir-se de organizadores textuais para estruturar o texto.

Page 21: Obituário: um gênero emconstrução?

20

Outro ponto importante destacado pelos autores é que o professor deve variar

as atividades e os exercícios. Executar trabalhos em grupo, propondo aos alunos

atividades diversificadas, dando a eles a possibilidade de ter acesso às noções e

aos instrumentos, aumentando suas chances de sucesso.

Ao executar esse trabalho, de acordo com os autores, os professores devem

utilizar atividades de observação e de análise de textos, que podem ser feitas

comparando vários textos ou parte deles. Propor tarefas simplificadas de produção

de textos, exercício que permite aos alunos descartarem certos problemas de

linguagem que eles devem gerenciar simultaneamente, permitindo-lhes se

concentrarem num aspecto preciso da elaboração de um texto. Auxiliar os alunos a

utilizarem uma linguagem comum, poder falar dos textos, comentá-los, criticá-los,

melhorá-los, quer se trate de seus próprios textos ou de outrem. Realizando esse

trabalho os alunos aprendem a falar sobre o gênero abordado. Adquirem um

vocabulário, uma linguagem técnica, que será comum à classe e ao professor.

Assim numerosos alunos fazendo o mesmo trabalho sobre os mesmos gêneros,

construiriam progressivamente conhecimentos sobre o gênero.

A sequência é finalizada com uma produção final que permite ao aluno por

em prática o que aprendeu e permite ao professor realizar uma avaliação somativa.

Essa avaliação é baseada em critérios elaborados ao longo da sequência realizada.

Ela orienta os professores para uma atitude responsável, humanista e profissional.

Marcuschi (2008, p.206) indaga se diante da multiplicidade de gêneros

existentes, existe um gênero ideal para utilizar-se em sala de aula. Segundo ele, os

próprios Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs (BRASIL, 1997) têm grande

dificuldade quando chegam a este ponto. Aparentemente existem gêneros

adequados para a leitura e outros para a produção. Uma observação atenta e

qualificada dos gêneros textuais presentes nos manuais de ensino, revela que

utilizamos sempre os mesmos. Os demais figuram apenas para distração dos

alunos.

[...] a distribuição da produção discursiva em gêneros tem como correlato a própria organização da sociedade, o que nos faz pensar no estudo sócio-histórico dos gêneros textuais como uma das maneiras de entender o próprio funcionamento social da língua [...] (MARCUSCHI, 2008, p.208).

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 120) explicam que se deve encarar a

aprendizagem como um conjunto de aprendizagens específicas de gêneros textuais

Page 22: Obituário: um gênero emconstrução?

21

variados. Ter o domínio do processo de escrita de um texto narrativo não significa

que se têm o domínio do processo de escrita de um texto explicativo.

Cada gênero de texto necessita de um ensino adaptado, pois apresenta

características distintas: os tempos verbais, por exemplo, não são os mesmos

quando se relata uma experiência vivida ou quando se escrevem instruções para a

fabricação de um objeto.

Em compensação, os gêneros podem ser agrupados em função de certo

número de regularidades linguísticas e de transferências possíveis.

De acordo com os autores, para serem inseridos na tradição didática da

escola, é preciso que os grupamentos:

1-correspondam às grandes finalidades sociais atribuídas ao ensino, cobrindo os domínios essenciais de comunicação escrita e oral em nossa sociedade; 2- retomem, de maneira flexível, certas distinções tipológicas, da maneira como já funcionam em vários manuais, planejamentos e currículos; 3- sejam relativamente homogêneos quanto às capacidades de linguagem implicadas no domínio dos gêneros agrupados (DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY, 2004, p.120).

Com base nesses critérios, os autores nos apresentam um quadro com os

Aspectos Tipológicos:

DOMINIOS SOCIAIS DE

COMUNICAÇÃO

CAPACIDADES DE

LINGUAGEM DOMINANTES

EXEMPLOS DE GÊNEROS

ORAIS E ESCRITOS

Cultura literária funcional NARRAR

Mimeses da ação através da criação de intriga

Conto maravilhoso Fábula Lenda Narrativa de aventura Narrativa de enigma Narrativa de ficção científica Novela fantástica Conto parodiado

Documentação e memorização de ações

humanas

RELATAR

Representação pelo discurso de experiências vividas,

situadas no tempo.

Relato de experiência vivida Relato de viagem Testemunho Curriculum vitae Noticia - Reportagem Crônica esportiva Ensaio biográfico

Discussão de problemas sociais controversos

ARGUMENTAR

Sustentação, refutação e negociação de tomadas de

posição

Texto de opinião Diálogo argumentativo Carta ao leitor Carta de reclamação Deliberação informal Debate regrado Discurso de defesa (adv.) Discurso de acusação (adv.)

Page 23: Obituário: um gênero emconstrução?

22

Transmissão e construção de saberes

EXPOR

Apresentação textual de diferentes formas dos saberes

Seminário Conferência Artigo ou verbete de enciclopédia Entrevista de especialista Tomada de notas Resumo de textos “expositivos” ou explicativos Relatório Científico Relato de experiência científica

Instruções e prescrições

DESCREVER AÇÕES

Regulação mútua de comportamentos

Instruções de montagem Receita Regulamento Regras de jogo Instruções de uso Instruções

Quadro 3: Aspectos Tipológicos. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs encontramos:

Ensinar a escrever textos torna-se uma tarefa muito difícil fora do convívio com textos verdadeiros, com leitores e escritores verdadeiros e com situações de comunicação que os tornem necessários. Fora da escola escrevem-se textos dirigidos a interlocutores de fato. Todo texto pertence a um determinado gênero, com uma forma própria, que se pode aprender. Quando entram na escola, os textos que circulam socialmente cumprem um papel modelizador, servindo como fonte de referência, repertório textual, suporte da atividade intertextual. A diversidade textual que existe fora da escola pode e deve estar a serviço da expansão do conhecimento letrado do aluno (BRASIL, 1997, p.28).

Werlich (apud Marcuschi, 2005, p.p.27-28), propõe uma matriz de critérios,

partindo de estruturas linguísticas típicas dos enunciados, que formam a base do

texto. Ele utiliza a base temática do texto, representada pelo título ou pelo início do

texto como adequada à formulação da tipologia. Na próxima página, apresentamos o

quadro de bases temáticas de Werlich.

Page 24: Obituário: um gênero emconstrução?

23

Bases temáticas Exemplos Traços linguísticos

1- Descritiva “Sobre a mesa havia milhares de vidros”

Este tipo de enunciado textual tem uma estrutura simples com um verbo estático no presente ou imperfeito, um complemento e uma indicação circunstancial de lugar.

3- Expositiva

(a) ““ Uma parte do cérebro é o córtex. ””

(b) ““ O cérebro tem 10 milhões de neurônios. ””

Em (a) temos uma base textual denominada de exposição sintética pelo processo da composição. Aparece um sujeito, um predicado (no presente) e um complemento com um grupo nominal. Trata-se de um enunciado de identificação de fenômenos. Em (b) temos uma base textual denominada exposição analítica pelo processo de decomposição. Também é uma estrutura com um sujeito, um verbo da família do veto ter (ou verbos como: “contém”, “ consiste ”, ““compreende””) e um complemento que estabelece com o sujeito uma relação parte-todo. Trata-se de um enunciado de ligação de fenômenos.

4- Argumentativa ““ A obsessão com a

durabilidade nas Artes não é permanente.””

Tem-se aqui uma forma verbal com o verbo ser no presente e um complemento (que no caso é um adjetivo). Trata-se de um enunciado de atribuição de qualidade.

5- Injuntiva ““ pare””, ““seja razoável! ””

Vem representada por um verbo no imperativo. Estes são os enunciados incitadores à ação. Estes textos podem sofrer certas modificações significativas na forma e assumir, por exemplo, a configuração mais longa onde o imperativo é substituído por um ““deve””. Por exemplo; ““Todos os brasileiros na idade de 18 anos do sexo masculino devem comparecer ao exército para alistarem-se.””

Quadro 4- Tipos textuais segundo Werlich.

Page 25: Obituário: um gênero emconstrução?

24

Com base nessa classificação, Marcuschi (2005, p.29) argumenta que a

sequência temporal é um elemento central na organização de textos narrativos. Nos

textos descritivos predominam as sequências de localização. Nos textos expositivos

predominam as sequências analíticas ou então explicitamente explicativas. Os

textos argumentativos apresentam sequências contrastivas explícitas e os textos

injuntivos apresentam o predomínio de sequências imperativas.

Comparando as duas tabelas, observamos que Dolz, Noverraz e Schneuwly

(2004) classificam como “relatar” a representação pelo discurso de experiências

vividas, situadas no tempo, colocação que Werlich (apud Marcuschi, 2005) faz em

“narrativa” como tipo de enunciado textual que tem um verbo de mudança no

passado, um circunstancial de tempo e lugar.

Os obituários publicados no jornal Folha de São Paulo podem fazer parte dos

gêneros que devem ser estudados. Eles relatam uma experiência vivida. São

pequenas biografias que contam um pouco da vida das pessoas. Possuem uma

narrativa solta, rica em detalhes, simbolismo e contada como uma história real.

Em uma sala de aula, podemos levar os alunos a produzirem ou analisarem

eventos linguísticos os mais diversos, tanto escritos como orais, identificando as

características de gênero em cada um.

Veja-se como seria produtivo pôr na mão do aluno um jornal diário ou uma revista semanal com a seguinte tarefa: “identifique os gêneros textuais aqui presentes e diga quais são as suas características centrais em termos de conteúdo, composição, estilo, nível linguístico e propósitos”. É evidente que essa tarefa pode ser reformulada de muitas maneiras, de acordo com os interesses de cada situação de ensino. Mas é de se esperar que por mais modesta que seja a análise, ela será sempre muito promissora (MARCUSCHI, 2005, p.35).

Estudar o obituário é também estudar história. É prestar uma homenagem aos

que se foram e deixaram exemplos que merecem ser seguidos. Histórias que devem

ser contadas para que todos possamos conhecer pessoas que viveram ao nosso

lado e que, provavelmente, jamais conheceríamos. (SUZUKI, 2008, p. 291)

1.3 Origem do obituário na mídia Os obituários começaram a ser publicados, pelo jornal Folha de São Paulo,

em 24 de outubro de 2007, assinados pelo jornalista Willian Vieira.

Page 26: Obituário: um gênero emconstrução?

25

Diferente das reportagens sobre as mortes ocorridas por assassinato ou

acidentes de trânsito, os obituários são leituras agradáveis, relatadas com estilo e

sensibilidade.

O Brasil, um país de tradição católica, a notícia de morte é vista pelo lado do

luto, da dor e do silêncio. É mais um período de dor do que de celebração.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra existe uma celebração e os mortos são

lembrados o máximo possível.

Suzuki explica que a seção de obituários do New York Times é “uma

cerimônia de adeus diária, de bom jornalismo e uma das campeãs de leitura do

jornal mais influente do mundo” (SUZUKI, 2008, p.289).

Nos quadros a seguir, transcrevemos dois pequenos trechos de publicações

do New York Times.

Fizemos a transcrição em inglês e a traduzimos para melhor compreensão.

O texto escrito por Barbara Graustark foi publicado no Times do dia 18 de

setembro de 2006, na página A-27, anexo A. O texto escrito por Douglas Martin, foi

publicado no Times de 1 de maio de 2008, na página C-14, anexo B.

The New York Times OBITUARIES Monday, september 18, 2006

New York Times OBITUÀRIOS Segunda feira, 18 de setembro de 2006

Sergio Savarese, 48, Shaper of Contemporary Furniture

Sergio Savarese, 48 anos, Criador de Mobília Contemporânea

By Barbara Graustark Por Barbara Graustark

Sergio Savarese, a designer known for lyrial shapes and a founder of the furniture store Dialógica, died on Friday in a small-plane crash in Moffat Country, Colo., that also took the life of his flying companion., Ivan Luini, according to their familes. Mr. Savarese was 48 and lived in Manhattan and Southampton, N.Y.[…].

Sergio Savarese, um designer conhecido por formas líricas e o fundador da loja de móveis Dialogica, morreu na sexta-feira, num pequeno acidente aéreo em Mofat Country, Colorado, que também tirou a vida de seu companheiro de vôo, Ivan Luini, de acordo com suas famílias. Savarese tinha 48 anos, e vivia em Manhattan e Southampton, New York.[...]

Quadro 5 - Obituário do New York Times – anexo A.

Page 27: Obituário: um gênero emconstrução?

26

The New York Times OBITUARIES Thursday, may 1, 2008

New York Times OBITUÀRIOS Terça feira, 1 de maio de 2008

Yossi Harel, Who, Defying British, Took Jwes to Palestine, Dies at 90

Yossi Harel, que, desafiando os ingleses, levou judeus à Palestina, morre aos 90 anos

By Douglas Martin Por Douglas Martin

Yossi Harel, Who renamed the rickety ship He commanded Exodus 1947 and sailed it to legend as a symbol of the righteousness of the mission by Jews to settle Palestine in the face of British opposition, died Saturday at his home in Tel Aviv. He was 90. His death of a heart attack and burial were widely reported in the Israeli news media.[…]

Yossi Harel, que rebatizou o frágil navio que comandava como Exodus, em 1947, e o transformou numa lenda como um símbolo da justiça da missão pelos judeus para estabilizar a Palestina, contrariando a oposição britânica, morreu no sábado em sua casa em Tel Aviv. Ele tinha 90 anos. Sua morte por um ataque cardíaco e sepultamento foram amplamente divulgados na mídia israelense.[...]

Quadro 6 - Obituário do New York Times – Anexo B.

Escrever um obituário é um trabalho jornalístico que exige que se entrevistem

amigos e parentes daquele que morreu. A pesquisa precisa ser tão meticulosa

quanto possível. Não se apresenta o morto como um santo ou um monstro. É

preciso ser realista, às vezes picante, sem ser injusto ou cruel. Os melhores amigos

do morto serão capazes de fechar o jornal e dizer “esse era o Abner que conheci em

vida”.

O Times londrino formatou o obituário clássico. Sua inspiração era o verbete

de enciclopédia.

Em 1986 o jornal Independent fez o que foi chamado de “revolução dos

obituários de Londres”. A pequena mudança introduzida pelo editor literário James

Fergusson foi assinar regularmente as matérias da página. Do ponto de vista

estilístico, a assinatura representou uma quebra de patrimônio e uma libertação. Os

obituários da Independent passaram a ser menos convencionais, mais opinativos e

literários.

Outros jornais londrinos como o Telegraf e o Guardian, também dedicam

espaços diários para os obituários.

A revista The Economist publicou em 1994 a matéria “Vida depois da morte”.

Seu editor Bill Emmot declarou que a revista estava abstrata demais, precisando de

um pouco de “humanidade”. Assim introduziu a página de obituários como uma

maneira de “trazer gente – ainda que morta – para a revista”. (SUZUKI, 2008,

p.307).

Page 28: Obituário: um gênero emconstrução?

27

O obituário do Economist, um texto anônimo, tornou-se um dos clássicos do

gênero.

Como as fábulas, os obituários ensejam uma lição moral para os que ficam, seja a vida do biografado boa ou má. Os melhores obituaristas desempenham o papel de pequenos deuses ao dar o sopro de novas vidas, pelo curto espaço da leitura de suas peças, àqueles que acabaram de morrer. Quando um obituarista acerta a mão, chega a dar imortalidade a certas coisas que, sem ele, seriam singelamente irrelevantes. (SUZUKI, 2008, 310).

Em nosso país, dois jornais dedicam-se à publicação de um obituário por dia.

Algumas revistas destacam como acontecimentos da semana a morte de pessoas

do meio artístico, político ou literário. Estamos longe de fazer as publicações como

as apresentadas pelos periódicos londrinos e americanos.

O objetivo dessas publicações é mudar a visão mórbida do obituário,

mostrando uma boa história humana, próxima e bem narrada.

Assim como o jornal Estado de São Paulo entendeu ser importante essa

publicação e a fez quando estava apresentando o novo desenho do jornal, é

possível que outros editores concordem que vale a pena mostrar ao grande público

pessoas que foram importantes na vida de alguém e mereceriam tornarem-se

conhecidas por todos os leitores.

O Livro das Vidas, organizado pelo jornalista Matinas Suzuki Jr. e publicado

em 2008, faz parte da coleção Jornalismo Literário, publicada pela editora

Companhia das Letras e apresenta ao leitor brasileiro uma pequena amostra de

como escrever obituários. O livro reúne uma coletânea de textos publicados na

seção de obituários do New York Times.

Page 29: Obituário: um gênero emconstrução?

28

2 TEXTO E CONTEXTO 2.1 Tipos textuais

Um texto pode trazer na sua configuração vários tipos textuais como a

narração, a descrição, a dissertação, a argumentação e a injunção (Silva, 1999,

p.101). Podemos completar essa definição com a posição de Marcuschi (2008,

p.154), quando ele nos explica que “tipo textual designa uma espécie de construção

teórica, definida pela natureza linguística de sua composição (aspectos lexicais,

sintáticos, tempos verbais, relações lógicas e estilo)”.

Silva (1999, p. 101) explica que a narração é usada para apresentar fatos,

acontecimentos; a descrição – dizer como é o objeto descrito; a dissertação /

argumentação – explicar, avaliar, comentar, conceituar, expor ideias, pontos de

vista, para dá-la a conhecer, para fazer saber, associando-se à análise e a

interpretação; injunção – é incitar a realização de uma ação por parte do

interlocutor, orientando-o e aconselhando-o a como fazê-la.

Na constituição do texto, esses modos assumem uma função específica. Por

exemplo: as sequências narrativas não se inscrevem da mesma maneira na

constituição do sermão, do texto jornalístico, do conto de fadas, das notícias

fúnebres.

Pode-se dizer que “tipo textual” figura como uma noção que se define pela determinação das relações internas da organização estrutural do discurso concretizado no texto, as quais se dimensionam a luz do projeto discursivo do locutor (SILVA, 1999, p.102).

Em textos como o sermão, a tese acadêmica, as peças jurídicas, o discurso

publicitário, etc., a construção argumentativa pode se dar por meio da narração,

descrição, injunção ou dissertação, cuja finalidade é cumprir o enunciado do

discurso: provar, evidenciar, ilustrar, etc.

Ao contar um determinado fato visando aconselhar um interlocutor, podemos

apresentar depoimentos, relatos, testemunhos, que vêm a ser uma inserção de

gêneros primários, de modo a persuadi-lo e convencê-lo, conquistando sua adesão

ao que está sendo dito.

Existem textos cuja organização estrutural se sobrepõem aos outros também

presentes na sua configuração.

Silva (1999, p.102) cita como exemplo o romance, o conto, as fábulas, as

parábolas, nos quais predominam a narração.

Page 30: Obituário: um gênero emconstrução?

29

Nas fábulas e nas parábolas a narração é estrategicamente usada como um

modo enunciativo para argumentar.

Todo discurso oculta um tipo de argumentação que se projeta em grau maior

ou menor, conforme o projeto discursivo do leitor. A autora cita como exemplo as

propagandas, no gênero publicitário; o editorial, as reportagens, as matérias

opinativas em geral, no jornalístico; os processos judiciários com as peças de

acusação e defesa, no jurídico; o sermão e os salmos no discurso religioso.

Para se determinar a estrutura de um texto, a autora apresenta alguns

exemplos, dividindo as estruturas em categorias. No conto de fadas, na fábula e nos

romances, que são textos narrativos, ela explica que o texto é composto das

seguintes categorias: situação inicial, complicação / clímax, resolução, situação final,

alguns seguidos da moral da história.

No sermão, no editorial, nas teses acadêmicas, estão presentes a dissertação

/ argumentação, que se organizam esquematicamente por estas categorias: tese

(problematização), o conjunto dos argumentos (argumentação ou justificativa

propriamente dita) e a conclusão (solução do problema). Os conectores e

pressupostos são de fundamental importância para esse estudo.

Silva (1999, p.101) complementa que “[...] tipos textuais ou modos de

organização discursivos – narrativo, descritivo, injuntivo, dissertativo / argumentativo

– possuem uma função estrutural e estruturante na organização interna do texto.”

As expressões “gênero discursivo” e “tipo textual” apresentam realidades

distintas do funcionamento do discurso, o que não impede que haja entre elas uma

relação de entrecruzamento, para pensar e caracterizar como se manifesta o

discurso no texto. Silva nos ensina que “o funcionamento a que se prestam as

noções de gênero discursivo e tipo textual, como categorias de análise, em trabalhos

que se propõem um estudo de tipificação de textos, não devem ser vistos como uma

solução pronta e acabada”.

Seguindo a orientação de Silva (1999) devemos explicitar que princípios

teórico-metodológicos nos orientam na escolha de uma ou outra categoria, de sorte

que possamos saber o que estamos tomando como ponto de observação ou que

dimensões do funcionamento da linguagem se está contemplando.

A estrutura do gênero textual está ligada ao suporte midiático que o

apresenta. Esse suporte é um “lócus físico ou virtual, com formato específico que

Page 31: Obituário: um gênero emconstrução?

30

serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto”

(MARCUSCHI, 2008, p.174).

A função básica do suporte é fixar o texto e assim torná-lo acessível para fins

comunicativos, tem um formato específico e é convencionalizado.

No nosso trabalho, estamos analisando o obituário publicado no jornal diário

Folha de São Paulo. O jornal é considerado por Marcuschi (2008, p.179) “um

suporte com muitos gêneros”. Estes gêneros são típicos e possuem características

próprias.

O obituário é tratado como gênero do jornalismo literário, que por sua vez, faz

parte do domínio discursivo jornalístico. Como dissemos anteriormente, no item 1.1

Gêneros do Discurso (p. 16), o domínio discursivo designa uma esfera ou instância

de produção discursiva, que propicia o surgimento de discursos bastante

específicos.

2.2 A enunciação

De acordo com Benveniste (1989, p. 81), entende-se por emprego das

formas, as condições sintáticas nas quais as formas podem ou devem aparecer.

Essas regras são ligadas a regras de formação, de maneira que possam estabelecer

uma correlação entre as variações morfológicas e os signos.

No entender do autor, as condições de emprego das formas não são idênticas

às condições de emprego da língua. Toda descrição exige o emprego das formas, e

esse fato resulta num grande número de modelos, tão variados quanto os tipos

linguísticos dos quais eles precedem.

O emprego da língua é diferente. Trata-se de um mecanismo total e constante

que afeta a língua inteira. A enunciação, conforme Benveniste, é colocar em

funcionamento a língua por um ato individual de utilização.

A enunciação é o ato de produzir um enunciado e não o texto do enunciado.

Este ato é o fato do locutor que mobiliza a língua por sua conta. Essa relação

determina os caracteres linguísticos da enunciação.

A acentuação da relação discursiva com o parceiro caracteriza a enunciação.

É necessário que existam duas figuras uma origem, a outra fim. É a estrutura do

Page 32: Obituário: um gênero emconstrução?

31

diálogo. Duas figuras na posição de parceiras são alternativamente protagonistas da

enunciação.

Benveniste argumenta que pode haver diálogo fora da enunciação, quando

existe uma disputa verbal praticada por diferentes povos, ou enunciação sem

diálogo, representando pelo monólogo.

[...] Cada enunciação é um ato que serve o propósito direto de unir o ouvinte ao locutor por algum laço de sentimento, social ou de outro tipo. Uma vez mais, a linguagem, nesta função, manifesta-se-nos, não como um instrumento de reflexão mas como um modo de ação. (MALINOWSKI apud BENVENISTE, 1989, p.90).

Em Koch (2003, p.13), encontramos que “A concepção de sujeito da

linguagem varia de acordo com a concepção de língua que se adote.”

Para a autora entender a língua como representação do pensamento

corresponde à concepção de sujeito dono de sua vontade e de suas ações. É o

sujeito visto como um ego que cria uma representação mental e quer que esta seja

captada pelo interlocutor da maneira como foi mentalizada.

Este ego não deve ser entendido como alguém isolado em seu mundo, e sim

como um sujeito essencialmente histórico e social, com habilidade para interagir em

sociedade que detém o domínio de suas ações.

Koch (2003, p. 13) explica que “a concepção de língua como estrutura,

correspondente a de sujeito determinado, assujeitado pelo sistema [...]”. Ela

apresenta três posições clássicas relacionadas com o sujeito: à consciência

individual no uso da linguagem, o assujeitamento e a concepção de língua como

lugar de interação.

A autora deixa claro que “o sujeito da enunciação é responsável pelo sentido”.

A língua é utilizada pelos indivíduos como se fosse um instrumento, esta a

disposição deles. Compreender um enunciado é entender o pensamento que o

falante pretendia veicular.

Assujeitado é o indivíduo que não é dono de seu discurso. Ele ocupa o papel

de locutor, diz e faz o que se exige que diga e faça na posição em que ocupa. Os

enunciados não têm origem e os sentidos que carregam são consequências dos

discursos a que pertenceram e pertencem. A fonte de sentido é a formação

discursiva a qual o enunciado pertence.

A concepção de língua como lugar de interação surge no caráter ativo dos sujeitos defendendo a posição em que participam ativamente da definição da situação na qual se encontram e são atores na atualização das

Page 33: Obituário: um gênero emconstrução?

32

imagens e das representações, sem as quais a comunicação não poderia existir (KOCH, 2003, p.15).

2.3 O sentido do texto

Koch (2003, p. 16) explica que o conceito de texto depende do conhecimento

que temos de língua e sujeito.

Se observarmos a língua como representação do pensamento e de sujeito

como dono de suas ações e de seu dizer, o texto será visto como um produto do

pensamento, cabendo ao leitor apenas ouvir o autor.

Se tratarmos a língua como instrumento de comunicação e de sujeito como

(pré)determinado pelo sistema, o texto será visto como o produto da codificação do

autor ou emissor, a ser decodificado pelo ouvinte.

Quando se concebe a língua como interacional, o texto passa a ser

considerado o próprio lugar da intenção e os interlocutores como sujeitos ativos que

nele se constroem e são construídos.

Koch (2003, p. 17) afirma que, adotando-se a concepção de língua, sujeito e

texto, a compreensão é uma atividade interativa altamente complexa de produção de

sentido, realizada com base nos elementos linguísticos presentes na superfície

textual e na sua forma de organização.

Assim, o sentido de um texto é construído na interação texto-sujeito e não

algo que pré-exista a essa interação. A coerência refere-se ao modo como os

elementos presentes na superfície textual constituem uma configuração veiculadora

de sentidos.

Para esclarecer as questões relativas ao sujeito, ao texto e à produção textual

de sentidos, Koch (2003, p. 19) parte de uma concepção sociointeracional de

linguagem, vista como lugar de “inter-ação” entre sujeitos sociais, empenhados em

uma atividade sociocomunicativa.

Produtor e interpretador do texto são estrategistas, na medida em que

mobilizam uma série de estratégias com vistas à produção do sentido.

De acordo com Koch, nesse “jogo da linguagem”, destacam-se o

produtor/planejador, o texto e o leitor/ouvinte.

O produtor/planejador viabiliza seu projeto de dizer, recorrendo a estratégias

de organização textual e orienta o interlocutor para a construção dos sentidos,

utilizando sinalizações textuais como indícios, marcas ou pistas.

Page 34: Obituário: um gênero emconstrução?

33

Entre as diversas possibilidades de formulação que a língua oferece, o

produtor organiza o texto de forma a estabelecer limites quanto às leituras possíveis.

O leitor/ouvinte procede à construção dos sentidos de acordo com a forma

linguística como ele foi construído, com as sinalizações oferecidas e a mobilização

do contexto relevante a interpretação.

2.4 Contexto

Koch (2003, p.21) explica que “as concepções de contexto variam não só no

tempo, como de um autor a outro [...]”, e muitas vezes, eles não se dão conta desse

fato.

Dentre os autores citados por Koch, destacamos o trabalho de Hymes, o

esquema SPEAKING, matriz de traços etnográficos que permitem caracterizar o

contexto:

O S significa: cenário, lugar; o P participantes: falante, ouvinte; o E fins, propósitos, resultados; o A sequência de atos: forma da mensagem, forma do conteúdo; o K código; o I instrumentais: canal/formas de fala; o N normas: normas de interação/normas de interpretação; o G gêneros. (HYMES apud KOCH, 2003, p.22).

O leitor/ouvinte espera sempre um texto dotado de sentido e procura construir

uma representação coerente primeiro de seu conhecimento de mundo.

Os produtores de textos deixam implícitas informações que consideram

redundantes por pressupor que o interlocutor possui determinados conhecimentos

contextuais, situacionais ou enciclopédicos.

Os significados que devem ser tornados explícitos dependem do uso que o

produtor do texto faz dos fatores contextuais. Os produtores do texto, objetivando a

produção de sentidos, utilizam múltiplos recursos além de simples palavras.

Dentre os autores apresentados por Koch, destacamos:

[...] Dascal & Weizman ao analisar textos jornalísticos, mencionam as aspas, a seleção lexical, certas questões retóricas, o uso de dadas formas de tratamento e assim por diante como pistas importantes para captação do sentido pelo produtor do texto. (KOCH, 2003, p.32-33).

De acordo com Koch, tratando-se de jornais é importante observar-se a

diagramação, a localização do texto na página, o tipo de letra, travessões, entre

outros.

Page 35: Obituário: um gênero emconstrução?

34

2.5 Estrutura do texto

Marcuschi (2005, p.27) explica que os traços linguísticos predominantes em

um texto é que vão defini-lo. A coesão textual está na habilidade de organizar as

sequências tipológicas como uma armação de base. Quando se diz que um texto é

narrativo, descritivo ou argumentativo, estamos determinando o predomínio de uma

sequência de base.

O autor apresenta a sugestão de Werlich (apud Marcuschi, 2005, p. 27), na

qual ele considera que os meios adequados para a formulação da tipologia são o

título ou o início do texto. No quadro 4, apresentado no primeiro capítulo, (p. 23),

mostramos as bases temáticas textuais definidas por Werlich.

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.120) consideram que cada gênero

textual tem características próprias, porém não são estanques uns em relação aos

outros.

Com base na sugestão de Werlich, iniciaremos o estudo dos obituários pelos

títulos.

Analisaremos dez obituários publicados no jornal Folha de São Paulo nos dias

24 a 27 de outubro de 2007, 30 de outubro de 2007 a 04 de novembro de 2007.

2.5.1 Título

Guimarães (2002, p.50) considera o título como fator estratégico da

articulação do texto. Ele pode substituir a leitura da sinopse, auxiliar na elaboração

de trabalho de indexação, resumo e tradução e funcionar como roteiro na sequência

do texto didático.

Segundo a autora, o título, no discurso jornalístico, apresenta os aspectos

mais importantes, figurando em primeiro lugar. Para Guimarães, o título funciona

“[...] como o lembrete de uma informação conhecida, remetendo a um elemento

anterior, não enunciado no texto, mas presente no espírito do leitor.” (GUIMARÃES,

2002, p.51).

Nas obras literárias, o título pode apresentar-se de forma justa e harmônica

ou ser elucidado dentro do texto, à medida que o leitor o vai desvendando.

Guimarães exemplifica com o romance Enseada Amena, do escritor

português Augusto Abelaira, no qual o título “se explica no desenrolar da obra,

Page 36: Obituário: um gênero emconstrução?

35

reunindo uma série de significações conotativas, que desembocam na ideia da

identificação de ‘Lisboa’ como a de ‘Enseada amena’.”(GUIMARÃES, 2002, p.52).

No romance Doramundo de Geraldo Ferraz, o titulo que une dois nomes

Teodora e Raimundo, “encerra ao mesmo tempo, um sentido de amor redentor, num

quadro de conflitos humanos, a que se sobrepõe uma fascinante história de amor.”

(GUIMARÃES, 2002, p.52).

2.5.2 Parágrafo

Garcia (2006, p.219) explica que um parágrafo padrão é uma unidade de

composição, constituída por um ou mais de um período, que contém uma ideia

central, a que se agregam outras secundárias, relacionadas pelo sentido e

decorrentes dela. Como existem vários processos de desenvolvimento de ideias,

encontraremos tipos diferentes de construção de parágrafos. Os parágrafos podem

ser escritos de acordo com a natureza do assunto e sua complexidade, do gênero

de composição, do propósito do autor e da espécie de leitor a quem se destine o

texto. “O parágrafo facilita ao escritor a tarefa de isolar e depois ajustar

convenientemente as idéias principais de sua composição”. (GARCIA, 2006, p.220).

O tamanho do parágrafo dependerá da extensão do assunto.

Geralmente, o parágrafo padrão possui uma estrutura comum e eficaz.

Consta de duas ou três partes: a introdução, representada por um ou dois períodos

curtos iniciais; o desenvolvimento, que é a explanação da ideia inicial e a conclusão.

“[...] o tópico frasal constitui um meio muito eficaz de expor ou explanar idéias. Enunciando logo de saída a ideia-nucleo, o tópico frasal garante de antemão a objetividade, a coerência e a unidade do parágrafo, definindo-lhe o propósito e evitando digressões impertinentes”.(GARCIA, 2006, p.223).

Garcia destaca algumas das feições do tópico frasal: declaração inicial,

definição, divisão.

Na declaração inicial, o autor afirma ou nega alguma coisa e em seguida

justifica ou fundamenta a afirmação, apresentando argumentos, fatos ou evidências.

Ele exemplifica com um trecho de Dez anos de Gustavo Corção:

Vivemos numa época de ímpetos. A Vontade, divinizada, afirma sua preponderância, para desencadear ou encadear; o delírio fascista ou o torpor marxista são expressões pouco diferentes do mesmo império da vontade. À realidade substituiu-se o dinamismo; à inteligência substituiu-se o gesto e o grito; e na mesma linha desse dinamismo estão os amadores de imprecações e os amadores de mordaças [...]. (GARCIA, 2006, p.224).

Page 37: Obituário: um gênero emconstrução?

36

A definição é o tópico frasal usado nos textos didáticos. Ela pode ser

denotativa, didática ou científica. O autor mostra como exemplo um trecho de

Augusto Magne do livro Princípios elementares de literatura:

Estilo é a expressão literária de ideias ou sentimentos. Resulta de um conjunto de dotes externos ou internos, que se fundem num todo harmônico e se manifestam por modalidades de expressão a que se dá o nome de figuras. (GARCIA, 2006, p. 225).

A divisão também é de uso quase que exclusivamente didático, dadas as

suas características de objetividade e clareza. Consiste em apresentar o tópico

frasal sob a forma de divisão ou discriminação das ideias a serem desenvolvidas. O

exemplo de Garcia é um trecho de Lógica Menor de Jacques Maritain:

O silogismo divide-se em silogismo simples e silogismo composto (isto é, feito de vários silogismos explícita ou implicitamente formulados). Distinguem-se quatro espécies de silogismos compostos: [...]. (GARCIA, 2006, p.225).

Outros modos de iniciar o parágrafo são a alusão histórica e a omissão de

dados identificadores num texto narrativo.

A alusão histórica é um recurso usado por oradores e por cronistas, que

aproveitam incidentes do cotidiano como assunto. Esse tipo de parágrafo desperta a

curiosidade do leitor. No exemplo de Garcia, um trecho da obra Nova floresta,

“Curiosidade” do padre Manuel Bernardes:

Orando uma vez Demóstenes em Atenas sobre matérias de importância, e advertido que o auditório estava pouco atento, introduziu com destreza o conto ou a fábula de um caminhante que alquilara [alugara] um jumento e, para se defender do descampado da força da calma [calor], se assentara à sombra dele, e o almocreve [condutor ou proprietário de bestas de carga para aluguel] o demandara para maior paga, alegando que lhe alugara a besta mas não a sombra dela. (GARCIA, 2006, p. 226).

O parágrafo apresentado é uma introdução ao capítulo onde o Autor condena

o vício da curiosidade.

A omissão de dados identificadores num texto narrativo é uma forma de

manter a atenção do leitor suspensa durante um determinado tempo. Essa técnica

consiste em omitir os detalhes necessários a identificar o personagem e apreender

a verdadeira intenção do autor.

Para exemplificar esse tipo de parágrafo, Garcia nos apresenta um trecho de

Fala, amendoeira de Carlos Drumond de Andrade:

Vai chegar dentro de poucos dias. Grande e boticelesca figura, mas passará despercebida. Não terá fotógrafos à espera, no Galeão. Ninguém, por mais afoito que seja, saberá prestar-lhe essa homenagem epitelial e difusa, que tanto assustou Ava Gardner. Estará um pouco por toda parte, e não estará

Page 38: Obituário: um gênero emconstrução?

37

em lugar nenhum. Tem uma varinha mágica, mas as coisas por aqui não se deixam comover facilmente, ou, na sua rebeldia se comovem por conta própria, em horas indevidas, de sorte que não devemos esperar pelas consequências diretas do seu sortilégio. (GARCIA, 2006, p. 227).

Para melhor analisar os obituários, incluiremos as definições de parágrafos de

descrição e de narração, seguindo as explicações de Garcia (2006, p.246).

Conforme Garcia, descrição é a apresentação verbal de um objeto, ser, coisa

ou paisagem, por meio de seus aspectos mais característicos. A finalidade da

descrição literária é transmitir a impressão que a coisa vista desperta em nossa

mente por intermédio dos sentidos. É preciso mostrar as relações entre as suas

partes para melhor compreender seu conjunto. É importante saber observar, ter

imaginação e dispor de recursos de expressão.

Na descrição é importante o ponto de vista do autor. Não se trata da posição

física do observador e sim na sua atitude, na sua predisposição afetiva em face da

descrição que será feita. Ao contrário da pintura, a descrição vai apresentando o

objeto progressivamente, de tal forma que o leitor possa combinar suas impressões

isoladas para formar uma imagem unificada. No retrato de uma personagem, pode-

se começar por uma apreciação sumária, seguindo-se depois os traços fisionômicos,

com o cuidado dessa descrição não se assemelhar a uma aula de anatomia.

Na narração, Garcia (2006, p.254) explica que seu objetivo é o fato, ou seja,

qualquer acontecimento de que o homem participe direta ou indiretamente.

O relato de um episódio deve conter todos ou alguns dos seguintes

elementos:

- o quê: o fato, a ação (enredo);

- quem: personagens (protagonista e antagonista);

- como: o modo como se desenrolou o fato ou ação;

- quando: a época, o momento em que ocorreu o fato;

- onde: o lugar da ocorrência;

- porquê: a causa, razão ou motivo;

- por isso: resultado ou consequência.

Esses são os ingredientes de uma narrativa, embora nem sempre todos

estejam presentes. A ordem dos fatos ou acontecimentos normalmente é a

cronológica. Para despertar mais o interesse do leitor, o autor pode inverter essa

ordem, como acontece nos romances policiais.

Page 39: Obituário: um gênero emconstrução?

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Dentre as variedades de narração apresentadas por Garcia, destacamos o

perfil:

Variedade de biografia, dela se distinguindo não apenas por ser em geral mais curta, mas também por ser interpretativa e levemente irônica e humorística. [...] Ao contrário da biografia, o perfil não tem qualquer propósito didático: é uma narrativa livre, ligeira, brejeira, em que se procura sublinhar os traços mais característicos da pessoa, com malícia às vezes, com simpatia quase sempre. (GARCIA, 2006, p. 259-260).

Com base nas teorias apresentadas, passaremos a análise da estrutura dos

obituários. Faremos primeiro a análise dos títulos e posteriormente dos parágrafos.

Todos os obituários foram escritos pelo jornalista Willian Vieira e publicados

no caderno Cotidiano do jornal Folha de São Paulo.

No quadro 7 apresentamos as datas, o número das páginas em que foram

publicados e os títulos dos obituários que serão analisados. As cópias do jornal

estão anexadas ao final do trabalho.

Page 40: Obituário: um gênero emconstrução?

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3 ANÁLISE DA ESTRUTURA DOS OBITUÁRIOS

3.1 Título

Os títulos dos obituários demonstram a preocupação do jornalista em

destacar a passagem mais representativa da vida da pessoa que morreu e assim

chamar a atenção do leitor.

O texto está sempre de acordo com o título porque, se assim não fosse,

ficaria a sensação de que o autor mentiu.

No quadro abaixo, apresentamos os títulos os obituários que estamos

estudando:

DATA PÁGINA DA

PUBLICAÇÃO ANEXO TITULO

24/10/2007 C4 C Marco Maia, estilista carioca

25/10/2007 C10 D Miguel Idalgo, primeiro patrão de Lula

26/10/2007 C4 E Mário Sayeg, pioneiro da gerontologia

27/10/2007 C8 F Antonio Mendonça, pastor protestante

30/10/2007 C4 G Elisabete Hart, a eterna voz do Oscar

31/10/2007 C2 H Hélio Cherubini, o legista obstetra

01/11/2007 C6 I José Carlos da Fonseca, um ruralista

02/11/2007 C4 J José Correa, o maior devedor do BB

03/11/2007 C4 K Eduarda Delascio, mulher do médico

04/11/2007 C4 L Gratagliano, o pracinha

Quadro 7 -Títulos dos Obituários.

No primeiro título, “Marco Maia, estilista carioca”, observamos que o autor do

texto destacou a profissão e o local aonde vivia a pessoa sobre quem ele escreve.

No segundo título, “Miguel Idalgo, primeiro patrão de Lula”, somos informados

da relação de Miguel Idalgo com o Presidente da República, mas é necessário ler a

matéria para sabermos quando ocorreu esse fato.

No terceiro título, “Mário Sayeg, pioneiro da gerontologia”, o autor trabalha a

curiosidade do leitor, subentendida na pergunta “O que é gerontologia?”.

No quarto título, “Antonio Mendonça, pastor protestante”, a informação

passada ao leitor é clara. Dificilmente alguém não saberá dizer o que faz um pastor

protestante.

Page 41: Obituário: um gênero emconstrução?

40

No quinto título, “Elizabeth Hart, a eterna voz do Oscar”, o autor leva o leitor a

lembrar-se da festa do Oscar. Na entrega do prêmio, comenta-se o evento em si e

não as pessoas que fazem a tradução dos que os apresentadores e premiados

dizem sobre o prêmio. Os tradutores precisam ter conhecimento e experiência

suficientes para que possamos compreender as piadas, que, quando mal

interpretadas, perdem totalmente a graça e a transmissão perde o brilho.

No sexto título, “Hélio Cherubini, o legista obstetra”, o autor trabalha

novamente a curiosidade do leitor. Podemos considerar como paradoxo a frase “o

legista obstetra”, porque encontramos dois pontos opostos: o legista lida com a

morte e o obstetra com a vida.

No sétimo título, “José Carlos da Fonseca, um ruralista”, é um tiíulo simples,

porém quando lemos o texto, percebemos que foi omitida a palavra Militante, que se

houvesse sido destacada no título, traria de imediato a certeza de que estava se

falando de uma pessoa ligada a um movimento político.

No oitavo título, “José Correa, o maior devedor do BB”, embora pareça que o

autor estava mostrando um lado negativo do caráter da pessoa sobre quem estava

escrevendo, a matéria relata bem, porque ele foi considerado o maio devedor do BB

e o que o levou a obter esse título.

No nono título, “Eduarda Delascio, mulher do médico”, é importante observar

que o autor usou a conjunção “do” e não a preposição “de”, para identificar a pessoa

de quem ele fala. Novamente é preciso ler-se o texto para entender o título.

No décimo título, “Gratagliano, o pracinha”, o autor nos apresenta um

brasileiro descendente de italianos que lutou na guerra. Pracinha era o termo que

designava os soldados brasileiros que foram convocados para lutar na Itália.

3.2 Texto O obituário é um texto publicado no jornal Folha de São Paulo, no caderno

Cotidiano. Esse caderno reserva um espaço denominado Mortes, no qual são

destacados os obituários, os nomes de pessoas falecidas, cerimônias religiosas,

ecumênicas, e a indicação de serviços para anúncios fúnebres.

Quem determina o tamanho da coluna é o diagramador. Assim, a quantidade

de parágrafos do obituário é determinada pelo espaço que o obituarista terá para

Page 42: Obituário: um gênero emconstrução?

41

escrever o texto e não pela quantidade de informações que ele possui sobre a

pessoa que faleceu.

O obituário será do tamanho necessário para manter o alinhamento junto às

outras informações fúnebres do caderno.

Essas informações nos foram passadas pelo jornalista Estêvão Bertoni, que

atualmente é o obituarista do jornal, conforme e-mail enviado em 25 de outubro de

2010, anexo M do nosso trabalho.

Analisaremos os obituários publicados no período de 24 a 27 de outubro de

2007 e 30 de outubro a 04 de novembro de 2007, dividindo-os em três partes:

introdução, desenvolvimento e conclusão. Usaremos o termo homenageado para

não repetir o nome da pessoa sobre quem o texto foi escrito. Os textos estão

anexados ao trabalho em ordem de data de publicação, assim os parágrafos

destacados poderão ser facilmente localizados.

3.2.1 Análise das Introduções

Nesses primeiros obituários analisados, os parágrafos iniciais demonstram

que houve uma marcação temporal. Não consideramos esses parágrafos como

alusão histórica, como orienta Garcia (2006, p. 226) porque são épocas vividas

pelos homenageados e não datas ou tempos distantes de suas vidas. Os obituários

serão indicados pelo número em que será anexado ao trabalho.

Grifaremos os verbos, e separaremos as orações utilizando colchetes para

melhor visualização da analise.

No texto do anexo C, o primeiro parágrafo possui dois períodos:

[Ao criticar o desfile de verão da marca Santa Ephigênia, no ano passado,] [a consultora Gloria Kalil sentiu falta do humor,] [“um dos elementos que sempre estiveram presentes” nas roupas da marca.] [Desde segunda feira, a tarefa ficará mais difícil com a morte do estilista Marco Maia, aos 51 anos, no Rio de Janeiro.]

O primeiro período é composto de três orações, sendo a primeira oração “Ao

criticar o desfile de verão da marca Santa Ephigênia, no ano passado [...]” oração

subordinada adverbial temporal reduzida de infinitivo.

O segundo período “Desde segunda feira, a tarefa ficará mais difícil [...]” é um

período simples e se inicia com uma marcação temporal “desde segunda feira”,

também classificado como adjunto adverbial de tempo.

No anexo D o primeiro parágrafo possui apenas um período composto:

Page 43: Obituário: um gênero emconstrução?

42

[Quando Miguel Serrano Idalgo carimbou a carteira daquele Pernambucano obstinado,] [que aos 15 anos lhe batia na porta] [pedindo um emprego,] [não imaginava] [que este pudesse deixar sua empresa] [para ir tão longe na carreira e na vida.]

A oração “Quando Miguel Serrano Idalgo carimbou a carteira daquele

Pernambucano obstinado [...]” é uma oração subordinada adverbial temporal,

introduzida pela conjunção subordinativa temporal “quando”.

No anexo E o primeiro parágrafo também possui apenas um período

composto:

[Nos idos dos anos 1960, quando poucos atentavam para a velhice como caso de saúde pública,] [o pesquisador Mário Antonio Sayeg introduzia o termo “terceira idade”,] [para reafirmar] [que o envelhecimento merecia um outro olhar, mais preciso.]

A oração “Nos idos dos anos 1960, quando poucos atentavam para a velhice

como um caso de saúde pública” é uma oração subordinada adverbial temporal,

marcada pela conjunção subordinativa quando. “Nos idos dos anos 1960” é um

adjunto adverbial de tempo, inserido na oração adverbial temporal.

No anexo I, encontramos no primeiro parágrafo dois períodos compostos:

[Houve um tempo] [em que os políticos usavam chapéu] [e eram mais honestos,] [pensava José Carlos da Fonseca] [Todos os fins de semana [– ninguém sabe por que só nesses dias –] ele punha o seu na cabeça e saía para passear.]

No primeiro período temos uma oração principal construída com o verbo

haver indicando tempo “Houve um tempo”, seguida de um oração subordinada

adjetiva restritiva “em que os políticos usavam chapéu”. Esse parágrafo indica

também a visão de mundo do homenageado.

No anexo L o primeiro parágrafo possui um período composto por oito

orações:

[Quando Vicente Gratagliano entrou naquele navio com os outros pracinhas] [pensou] [que iria para a Bahia] [fazer exercícios militares] [– e nem imaginava] [que passaria 14 dias vomitando,] [ao atravessar o Atlântico com a Força Expedicionária Brasileira] [rumo à guerra.]

A oração “Quando Vicente Gratagliano entrou naquele navio [...]” é uma

oração adverbial temporal introduzida pela conjunção subordinativa “quando”.

No primeiro parágrafo do anexo F encontramos:

Não havia contradição em ser pastor e pesquisador do protestantismo e defender o ecumenismo na visão do professor Antonio Gouvêa Mendonça. Apesar dos atritos com a Igreja, ele estudou o neopentecostalismo, a teologia da libertação e escreveu livros críticos, que são referência até hoje.

Page 44: Obituário: um gênero emconstrução?

43

Nesse relato fica bem caracterizado que o homenageado tinha uma visão

pessoal sobre religião. Mesmo tendo problemas com a Igreja, ele era fiel a suas

convicções pessoais e crítico ao estudar os temas ligados à religião.

No anexo G, o autor identifica a homenageada por uma característica física: a

voz. A voz que marcou por duas décadas a um evento da televisão e provavelmente,

a vida das pessoas amantes do cinema.

Quem viu a entrega do Oscar pela TV Globo nas décadas de 1980 e 1990 tem na memória a voz de Maria Elisabete Figueiredo Hart. Sem mostrar o rosto, a intérprete virou sinônimo do evento na televisão brasileira.

No texto do anexo H, o autor apresenta o homenageado com um hábito e não

com o nome. Ele faz o que Garcia (2006, p. 227) chama de omissão do nome.

Apesar de fazê-lo em um texto curto, ele procura despertar a curiosidade do leitor

para que este se interesse pela leitura.

Durante mais de vinte anos ele entrou na sala de aula com o rosto sério e os slides debaixo do braço – com fotos de cadáveres que ele costumava “deixar a meia cova para estudar”.

Nos anexos J e K, o autor inicia o texto com o nome dos homenageados.

No primeiro parágrafo do anexo h, o autor explica como era a vida do

homenageado:

José Arlindo Passos Correa tinha uma vida pacata e uma bela casa em Votuporanga, interior de São Paulo, com a mulher e os dois filhos. Era um cidadão no mínimo perspicaz, dono de empresas e fazendas – mas que ficou conhecido mesmo em todo o país como o maior devedor de crédito agrícola da história do Banco do Brasil.

O mesmo procedimento o autor usa no anexo K, porém não da detalhes

pessoais da homenageada como fez no texto anterior e sim traz uma característica

da sua personalidade:

Eduarda Delascio foi daquelas mulheres que vivem abnegadas a vida de outrem – ela, à sombra do marido, o diretor clínico da Casa Maternal da Infância, professor da Unifesp por 30 anos e autor de mais de dez livros, Domingos Delascio.

Finalizando esta primeira seção, apresentamos no quadro a seguir os textos e

o item principal da análise de cada um:

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TITULO PARÁGRAFO DE INTRODUÇÃO ANÁLISE

Marco Maia, estilista

carioca – anexo C Ao criticar o desfile de verão da marca Santa Ephigênia, no ano passado [...]

Marcação temporal – oração subordinada adverbial temporal reduzida de infinitivo.

Miguel Idalgo, primeiro

patrão de Lula – anexo

D

Quando Miguel Serrano Idalgo carimbou a carteira daquele Pernambucano obstinado [...]

Marcação temporal – oração subordinada adverbial temporal. (Introduzida pela conjunção subordinativa temporal quando)..

Mário Sayeg, pioneiro

da gerontologia –

anexo E

Nos idos dos anos 1960, quando poucos atentavam para a velhice [...]

Marcação temporal – “Nos idos dos anos 1960” - oração adverbial temporal, marcada pela conjunção quando.

Antonio Mendonça,

pastor protestante –

anexo F

Não havia contradição em ser pastor e pesquisador do protestantismo e defender o ecumenismo na visão do professor Antonio Gouvêa Mendonça

Convicção religiosa e crítica – “não havia contradição”.

Elisabete Hart, a eterna

voz do Oscar – anexo

G

Quem viu a entrega do Oscar pela TV Globo nas décadas de 1980 e 1990 tem na memória a voz de Maria Elisabete Figueiredo Hart

Identificação do homenageado por característica física: a voz.

Hélio Cherubini, o

legista obstetra –

anexo H

Durante mais de vinte anos ele entrou na sala de aula com o rosto sério e os slides debaixo do braço – com fotos de cadáveres que ele [...]

Omissão do nome – desperta a curiosidade do leitor.

José Carlos da

Fonseca, um ruralista –

anexo I

Houve um tempo em que os políticos usavam chapéu e eram mais honestos, pensava José Carlos da Fonseca.

Marcação temporal – “Houve um tempo” –oração adverbial temporal.

José Correa, o maior

devedor do BB – anexo

J

José Arlindo Passos Correa tinha uma vida pacata e uma bela casa em Votuporanga, interior de São Paulo, com a mulher e os dois filhos.

Identificação do homenageado no inicio do primeiro parágrafo.

Eduarda Delascio,

mulher do médico-

anexo K

Eduarda Delascio foi daquelas mulheres que vivem abnegadas a vida de outrem[...]

Identificação da homenageada no início do parágrafo.

Gratagliano, o

pracinha- anexo L Quando Vicente Gratagliano entrou naquele navio com outros pracinhas[...]

Marcação temporal – oração subordinada adverbial temporal.(introduzida pela conjunção subordinativa temporal quando).

Quadro 8 - Análise dos parágrafos introdutórios.

Page 46: Obituário: um gênero emconstrução?

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3.2.2 Análise do desenvolvimento Nesta análise mostraremos as informações que os obituários nos trazem

sobre a vida e sentimentos dos homenageados. Os textos seguirão a ordem dos

anexos.

Nos textos que apresentaremos existem informações sobre a personalidade,

modo de vida, sucessos alcançados, paixões, opiniões políticas.

No anexo C o obituarista nos conta a história de Marco Maia:

Um dos criadores da grife, em 1995, ao lado do sócio Luciano Canale, Maia apostava na ousadia e na graça para causar impacto. Habitué do Fashion Rio, o estilista buscava temas variados: sua última coleção de inverno baseava-se na moda dos anos 40 e 60 e na sua mãe, Carlinda. Em junho, inspirou-se na vinda da família real portuguesa para o Brasil (1808).

Nesse texto o autor explica como era a vida profissional do homenageado.

Nesse obituário não existe destaque para a família. A mãe é mencionada como

inspiração para criação da última coleção criada por ele.

No anexo D encontramos a história de Miguel Serrano Idalgo:

Idalgo era dono da Fábrica de Parafusos Marte, em São Paulo, quando contratou Luiz Inácio da Silva como Office-boy. Em quatro anos, o garoto dobrou o salário e tornou-se torneiro mecânico – profissão que o levaria a outras metalúrgicas e ao movimento sindical. Idalgo acompanhou essa ascensão. Ele guardava ainda aquele livro grosso, com o primeiro registro profissional que Lula assinara na vida. E sempre votou em “Luiz”. Não que Idalgo fosse de esquerda – seu pai, espanhol de Andaluzia que veio ser colono em uma fazenda de café em Piracicaba, era adepto do franquismo. Ele mesmo votara em Getúlio Vargas, em Eurico Gaspar Dutra, em Jânio Quadros. Mas desde que se ex-empregado se aventurou na política, eram dele todos os seus votos. Quando Lula ganhou a eleição, em 2002 e foi até a fábrica Marte – hoje dirigida pelo filho de Idalgo – visitar os antigos funcionários, o patrão sabia que um ciclo estava se fechando.

O primeiro aspecto que nos chama a atenção nesse texto é a quantidade de

informações que ele traz. Diferente do texto anterior escrito em um parágrafo, nesse

o autor obteve mais liberdade para escrever, provavelmente pelo espaço permitido

pela diagramação do jornal, como explicamos anteriormente.

Nesse texto, o autor relata o que significou a ascensão política de Luiz Inácio

da Silva na vida do homenageado, que abandonou suas convicções políticas desde

que o ex-empregado ingressou na política.

No anexo E, o autor relata a história de Mário Antonio Sayeg, um pioneiro no

estudo do envelhecimento humano:

Cardiologista de formação, migrou para a gerontologia, ciência que estuda o envelhecimento e que, para Sayeg, fora relegada. Pesquisou assim por 40

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46

anos na Ensp (Escola Nacional de Saúde Pública), da Fundação Oswaldo Cruz. Lá, em 1993, formou a primeira turma da especialização em envelhecimento e saúde do idoso e criou o Núcleo de Saúde do Idoso. Seu livro “Caminhos do Envelhecer”, de 1994, virou um clássico do tema – que ele defendeu na elaboração do Estatuto do Idoso.

Nesse texto, escrito em um parágrafo, o autor explica o que significava para o

homenageado o estudo do envelhecimento humano. Sayeg deixou a profissão de

cardiologista para estudar gerontologia, ensinar especialização em envelhecimento e

saúde do idoso e escrever um livro sobre o mesmo tema. A família, com exceção da

esposa mencionada na conclusão, não é descrita nesse obituário.

No anexo F, o autor relata a história de Antonio Gouveia de Mendonça:

Mendonça tornou-se conhecido por seus estudos em sociologia do protestantismo e história social no fim dos anos 1970, quando ajudou a criar a pós-graduação em ciências naturais da Universidade Metodista de São Paulo. Lá, lecionou por mais de 20 anos e tornou-se professor emérito. Dos seus três livros, “O Celeste Porvir: a Inserção do Protestantismo no Brasil” era o mais conhecido e teve duas edições esgotadas em português. Ele nasceu em uma família de pastores – convertidos do catolicismo no século 19, os Gouvêa ajudaram a fundar a terceira Igreja Presbiteriana do Brasil. E passou a infância em Arealva, interior de São Paulo, até que uma tia o trouxe para estudar na Capital.

Nesse obituário, o autor nos mostra que a importância da religião para o

homenageado não era só defender uma ideologia mas sim conhecer e divulgar a

história do protestantismo. A família só é mencionada quando ele cita que uma tia o

trouxe para São Paulo e que nasceu em uma família de pastores. Não existe

indicação de esposa e filhos.

No anexo G, o autor nos traz a história de Maria Elisabete Figueiredo Hart,

uma voz que encantou muitos brasileiros fãs de cinema:

Por mais de 15 anos ela recebeu elogios por sua pronúncia e entonação, e críticas, por traduzir cada detalhe da cerimônia, inclusive as piadas. Aos poucos tornou-se mais sintética. Dizem os críticos mais ácidos que, com o passar dos anos, dava para ouvir o som local do teatro onde acontece o Oscar. Nascida no Rio de Janeiro, Hart foi para os Estados Unidos viver com o marido, onde ficou por dez anos. Tinha orgulho de ter aprendido inglês não na escola, mas na vida. Sua voz ecoou pela primeira vez em 1981, quando narrou, ao vivo, o casamento do príncipe Charles com a princesa Diana. Já em 1983 virou intérprete do Oscar na Globo – onde participou também da primeira transmissão simultânea de uma guerra, a do Golfo em 1991, traduzindo direto da CNN.

A homenageada morou nos Estados Unidos, motivo que a levou a aprender

inglês e trabalhar como tradutora na TV Globo. Além das cerimônias do Oscar, o

autor relata sua participação em outros eventos da emissora que precisavam de

Page 48: Obituário: um gênero emconstrução?

47

tradução simultânea. Nesse obituário, as informações sobre a família estão na

conclusão.

No anexo H, o autor relata a história de Hélio Cherubini:

Material precioso, que o professor e médico legista Hélio Cherubini escondia em casa, não se sabe onde. À família, sobravam histórias sobre os crimes, que ele contava com naturalidade, sempre que estivessem reunidos. Professor de medicina legal entre 1970 e 1992 em São José do Rio Preto (SP), Cherubini cuidava tanto dos mortos quanto dos vivos. Um dos fundadores do pronto socorro municipal, do qual foi diretor por quatro anos, foi ainda chefe de obstetrícia e diretor clínico da Santa Casa de Misericórdia da cidade. Obstetra desde 1951, virou médico-legista anos depois – função que exerceu em paralelo com a obstetrícia. Adorava dizer que cuidava sozinho dos mortos “da barranca do rio em Santa Fé do Sul.

Quando o obituarista escreveu esse texto, ele não identificou o homenageado

na introdução e sim no segundo parágrafo. O autor descreve a paixão dele pela

função de médico-legista, embora ele tenha começado a exercer a medicina como

obstetra.

No anexo I, o autor nos mostra a história de José Carlos da Fonseca:

“Política não é profissão”, dizia o admirador de Carlos Lacerda. Advogado de São José do Calçado (ES), fez carreira como repórter nos anos 1950. Foi deputado estadual em 1966 e duas vezes federal apoiando a ditadura, em 1970 pela Arena e em 1982 pelo PDS. Foi também um dos 65 deputados a votar contra a emenda Dante de Oliveira, que previa eleições diretas em 1984. “Militante ruralista” na Câmara, dirigiu o Instituto Brasileiro do Café, foi vice-governador do Espírito Santo e ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho).

Nesse texto, o autor nos mostra que o homenageado tem uma visão bastante

pessoal sobre política, embora tivesse exercido a função de deputado estadual e

deputado federal, não via a política como profissão. No primeiro parágrafo o autor

destaca que ele era advogado e fez carreira como repórter para depois candidatar-

se a um cargo público, permanecendo um bom tempo trabalhando em institutos

governamentais.

No anexo J, o obituarista nos traz a história de José Arlindo Passos Gouveia:

Quando uma revista publicou um perfil pouco elogioso sobre ele, em 1999, sua dívida com o banco era de R$ 300 milhões – valor que hoje, atualizado, pode passar de R$ 500 milhões e que, somado a outras dívidas com o Fisco pode chegar a R$ 1 bilhão. Que ele nunca pagou – julgava injustos os juros cobrados. Tampouco foi punido pelos mais de 300 processos contra suas empresas – tinha tantos credores que uns tentam tomar dos outros algum naco de seus bens.

Page 49: Obituário: um gênero emconstrução?

48

Por isso é provável que o maior deles, o BB, nunca veja a cor do dinheiro devido, por ser o último da fila de espera. Se seus bens fossem vendidos, seria preciso pagar os impostos atrasados, depois dívidas trabalhistas e, se sobrasse algo, iria para banco.

A história contada nesse obituário é curiosa: homenagear alguém que é

sabidamente o maior devedor do Banco do Brasil, porém, lendo o texto somos

informados de que ele achava os juros bancários injustos e que não foi condenado a

pagar nenhum dos processos movidos contra suas empresas. Os credores brigam

entre si e as dívidas não são saldadas.

No anexo K, o autor nos relata a história de Eduarda Delascio:

Filha de poloneses, ela passou a infância em uma colônia alemã em São Leopoldo (RS) – só falava alemão até vir para São Paulo, nos anos 1940. Nadadora profissional, costumava competir na represa Billings, quando, na água, foi tomada por uma crise de apendicite. Contam os filhos que, operada às pressas por Domingos Delascio, ela caiu de amores pelo jovem médico e, visitada por ele com freqüência, “insistia em não ficar boa”.

Nesse texto o obituarista descreve a vida da homenageada enquanto solteira,

informa que ela tem filhos e como conheceu o marido. Embora seja demonstrado

que ela era uma pessoa determinada em conseguir seus objetivos, na conclusão

ficamos sabendo que ela abandou sua vida para viver a do marido e dos filhos.

No anexo L, o autor nos mostra a história de Vicente Gratagliano:

O palmeirense nascido no Brás passou a infância jogando bola, indo pouco à escola e trabalhando como engraxate. Era vendedor de peixes quando foi chamado pelo Exército, em 1944 e partiu para a Itália no primeiro pelotão da primeira companhia do primeiro batalhão do sexto regimento. “Todos morriam de medo, mas ao mesmo tempo a gente tentava mostrar valentia diante dos companheiros, para não parecer fraco”, dizia sempre que encontrava ouvidos pródigos. Cada médico do hospital, nos últimos meses, sabia de suas histórias com detalhes. A preferida era a da medalha – quando foi premiado por ter matado dois alemães em uma engenhosa emboscada no meio da neve. Mas ele não se orgulhava dos tiros e preferia não fazer as contas que quantas “vidas inimigas” tirara da guerra. Orgulhava-se, porém, do amor por uma italiana, que até hoje azeda a memória da família. Voltou para o Brasil e foi feirante até 1977. Desde então dedicava-se a fazer casinhas de papelão para as crianças do bairro.

Nesse texto, o autor nos conta como era a vida do homenageado até ser

convocado pelo Exército. Seus medos, remorsos, o amor por uma italiana, a

profissão que passou a exercer quando retornou ao Brasil. Não é mencionada a

família, nem do que ele morreu.

Finalizamos esta seção, com o quadro que apresentamos na próxima página,

mostrando as qualidades de cada homenageado:

Page 50: Obituário: um gênero emconstrução?

49

TITULO ATIVIDADE PROFISSIONAL CARACTERÍSTICA

PESSOAL

Marco Maia, estilista carioca

– anexo C Estilista Apostava na ousadia.

Miguel Idalgo, primeiro patrão

de Lula – anexo D

Empresário – admirava Luiz

Inácio da Silva Sempre votou em “Luiz”.

Mário Sayeg, pioneiro da

gerontologia – anexo E

Cardiologista – especializou-

se em envelhecimento

Formou a primeira turma da especialização em envelhecimento e saúde do idoso.

Antonio Mendonça, pastor

protestante – anexo F Professor e pastor

Tornou-se conhecido por seus estudos em sociologia do protestantismo.

Elisabete Hart, a eterna voz

do Oscar – anexo G Tradutora e intérprete

Tinha orgulho de ter aprendido inglês não na escola, mas na vida.

Hélio Cherubini, o legista

obstetra – anexo H Obstetra e legista

Adorava dizer que cuidava sozinho dos mortos “da barranca do rio em Santa Fé do Sul”.

José Carlos da Fonseca, um

ruralista – anexo I Advogado, repórter, deputado

Visão de mundo: “Política não é profissão.

José Correa, o maior devedor

do BB – anexo J

Empresário – informado na

introdução

Julgava injustos os juros cobrados.

Eduarda Delascio, mulher do

médico- anexo K

Enfermeira – dona de casa –

informado na conclusão

Abandonou a carreira para dedicar-se à do marido – informado na conclusão.

Gratagliano, o pracinha-

anexo L Feirante

Não se orgulhava dos tiros e preferia não fazer as contas que quantas “vidas inimigas” tirara da guerra.

Quadro 9 - Desenvolvimento do texto.

3.2.3 Análise das conclusões

Nas conclusões, o obituarista quase sempre escreve a idade e a causa da

morte do homenageado. Em alguns o texto é bem simples em outros ele apresenta

alguns detalhes de hábito ou qualidades do homenageado, e apresenta

informações sobre familiares.

Na conclusão do anexo C encontramos:

Fumante, Maia morreu de enfisema pulmonar.

Neste texto, somos informados de que o homenageado era fumante e a

causa de sua morte foi enfisema pulmonar. A citação fumante, no início da frase,

leva a crer que o autor quer chamar atenção para o mal que faz o cigarro.

Page 51: Obituário: um gênero emconstrução?

50

Na conclusão do anexo D, o autor indica algumas características da

personalidade e da vida do homenageado, além da causa morte.

Idalgo foi um homem forte, que mesmo aos 90 anos ia três vezes ao baile dançar tango, samba e boleto com sua mulher – que morreu há cerca de cinco meses. Foi quando ele desistiu da vida, segundo a família. Ele deixou dois filhos e quatro netos, ao morrer na terça-feira, no hospital, de parada cardíaca.

Como características físicas, ele descreve homem forte, 90 anos;

personalidade gostava de dançar, ia três vezes ao baile com a mulher; sobre a

família: era viúvo, tinha dois filhos e quatro netos. Causa da morte: parada cardíaca.

Segundo a família ele desistiu de viver após a morte da esposa.

Na conclusão do anexo E, o autor nos traz a palavra da viúva, a causa da

morte e a idade do homenageado, a indicação da realização de um projeto criado

por ele e a cidade onde ele faleceu.

Em dezembro, o curso de saúde para idosos à distância – ideia sua – começará. Para a esposa, fim ideal à carreira de quem “dedicou aos idosos toda a vida”. Ele morreu de infecção pulmonar na terça, aos 82 anos, no Rio.

Na causa da morte: infecção pulmonar; idade: 82 anos; elogio da esposa “fim

ideal à carreira de quem ‘dedicou aos idosos toda a vida’;” projeto do homenageado:

curso de saúde para idosos à distância.

Na conclusão do anexo F, o autor relata quando o homenageado tornou-se pastor:

Até os 45 anos for gerente de seguradora, quando tornou-se(sic) pastor e passou a estudar a história do protestantismo no Brasil. Para os colegas, sua morte deixará um vazio no estudo crítico sobre a religião protestante o ecumenismo. Ele morreu no último sábado, aos 85 anos, de câncer.

Nesse texto, o autor mostra também a idade do homenageado - 85 anos, a

causa morte – câncer e a opinião dos colegas sobre o estudo crítico sobre a religião

realizado por ele.

Na conclusão do anexo G, o autor inicia o texto mostrando como era formada

a família, as paixões da homenageada, depois ele indica a causa morte, a idade e a

cidade onde ela morreu.

Hart tinha dois filhos, três netos e duas paixões: o samba da Mangueira, que a levou para o sambódromo por seguidos 13 anos, e o futebol do Flamengo, que acompanhava no Maracanã. Ela morreu ontem de câncer, aos 64 anos, no Rio.

Page 52: Obituário: um gênero emconstrução?

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No anexo H, o autor conclui o texto mostrando como era a família do

homenageado, a idade e causa da morte:

Cherubini tinha três filhas, sete netos e dois genros – ambos legistas. Ele morreu sábado no hospital, de broncopneumonia, aos 82 anos.

No anexo I, encontramos além da família, da causa morte, da idade e do local

onde o homenageado faleceu, traços da sua personalidade:

Aposentado desde 1993, só fazia o que gostava. Advogava, ouvia ópera, escrevia poemas. Tinha três filhos e quatro netos. Morreu sexta no hospital, de câncer, em Brasília, aos 76 anos.

No anexo J, o autor relata que o homenageado era cardíaco e foi socorrido pela família. A idade e a causa da morte. Ele não descreve a família como nos textos anteriores:

Cardíaco, Correa sentiu dores no peito na última terça e foi levado pela família para um hospital em São José do Rio Preto. Morreu de infarto, aos 58 anos.

No anexo K o autor relata como era formada a família da homenageada e o que ela fazia para auxiliar o marido. Traz também as manifestações de carinho recebidas pela família, a idade e a causa da morte.

Desde então viveu a vida dele, dos três filhos e seis netos. Cantora lírica, abandonou a carreira para dedicar-se à do marido, que mantinha uma enfermeira gratuita. Eduarda cuidava dos pacientes e dos presépios de Natal. Quando ele recebia alunos em casa, para consultas que varavam a noite em sua biblioteca, ela lhes servia cafés e strudels. Cem telegramas desses ex-alunos lamentaram sua morte domingo, no hospital, por complicações de uma pneumonia. Tinha 92 anos.

Diferente dos textos anteriores, nesse obituário o autor deixa claras as opções

que a homenageada fez para atender a família, deixando de fazer o que gostava

para viver em função do marido, dos filhos e netos.

No anexo L, último de nossa análise, o autor cita as palavras ditas pelo

homenageado no momento da morte. Informa onde ele morreu, a idade e não indica

a causa da morte:

Quando delirava, já internado na UTI, reclamava do tamanho da trincheira em que havia sido colocado – “não vai caber os outros soldados”, balbuciava. Morreu pensando na guerra, no hospital em São Paulo, aos 88 anos.

Finalizamos esta seção com o quadro apresentado na próxima página,

resumindo alguns dados constantes nos textos das conclusões, para mostrar a

similaridade entre eles:

Page 53: Obituário: um gênero emconstrução?

52

TITULO IDADE FAMILIARES

CITADOS

LOCAL DO

FALECIMENTO

CAUSA DA

MORTE

Marco Maia, estilista

carioca – anexo C

Informado na introdução – 51 anos

Mãe – informado no

desenvolvimento

Informado na introdução – Rio

de Janeiro

Enfisema

pulmonar

Miguel Idalgo,

primeiro patrão de

Lula – anexo D

Em torno dos 90 anos

Filhos e netos.

Provavelmente São Paulo – informado no 2º parágrafo

Parada cardíaca

Mário Sayeg, pioneiro

da gerontologia –

anexo E

82 anos Esposa. Rio de Janeiro Infecção pulmonar

Antonio Mendonça,

pastor protestante –

anexo F

85 anos Tia – informado

no desenvolvimento.

Provavelmente São Paulo –

informado no 5º parágrafo

Câncer

Elisabete Hart, a

eterna voz do Oscar

– anexo G

64 anos Filhos e netos. Rio de Janeiro Câncer

Hélio Cherubini, o

legista obstetra –

anexo H

82 anos Filhas, netos e genros.

Provavelmente São Paulo – informado no 5º parágrafo

Broncopneumoni

a

José Carlos da

Fonseca, um

ruralista – anexo I

76 anos Filhos e netos. Brasília Câncer

José Correa, o maior

devedor do BB –

anexo J

58 anos Família. São José do Rio Preto

Infarto

Eduarda Delascio,

mulher do médico-

anexo K

92 anos Marido, filhos e

netos.

Provavelmente São Paulo – informado no 3º parágrafo

Pneumonia

Gratagliano, o

pracinha- anexo L 88 anos

Família – informado no

desenvolvimento. São Paulo

Não informado

no texto

Quadro 10 - Resumo das conclusões

Observamos nos obituários analisados que o autor dos textos relata a vida

das pessoas homenageadas de forma semelhante. As informações de nome, idade,

dos familiares, atividade profissional, característica pessoal, local de falecimento e

causa da morte, estão em todos eles, embora não exista uma pré-determinação do

parágrafo em que serão escritos.

Page 54: Obituário: um gênero emconstrução?

53

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciar o estudo dos obituários publicados no jornal Folha de São Paulo,

não imaginávamos o prazer que seria trabalhar com esses textos.

Os obituários não são simples textos publicados em jornal. São uma

homenagem prestada aqueles que se foram. Pessoas comuns que, se não atingiram

o estrelato em vida, deixaram exemplos a ser seguidos.

Iniciamos nossos estudos buscando saber se os obituários eram um tipo de

gênero do discurso e como era sua estrutura.

Os textos que estudamos têm conteúdo temático, estilo e construção

específica para o meio de comunicação a que se destinam. Como são publicados

em jornal, obedecem a uma diagramação pré-estabelecida diariamente. Assim

temos textos longos e curtos, porém de estrutura semelhante.

Para bem avaliar a estrutura do obituário, nos baseamos nas definições de

gênero defendidas por Bakhtin (2003) e Marcuschi (2005). Os textos são dinâmicos,

trazem características das pessoas que morreram sem transformá-los em santos ou

demônios. A preocupação do obituarista é contar uma história real, que passe a

imagem correta do homenageado. Assim, lendo o obituário, de uma pessoa que

conhecemos, podemos reconhecê-lo no texto.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs (1997), nos permitem

apresentar aos alunos textos que existem fora da escola e que servem para ampliar-

lhes o conhecimento. Os obituários são relatos de experiências vividas.

Minibiografias que nos ensinam a buscar características pessoais ao descrever

alguém.

Dos teóricos que nós estudamos, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) e

Werlich (apud Marcuschi, 2005), verificamos que eles dão denominações diferentes

para textos como os obituários. A representação de experiências vividas situadas

no tempo são denominadas relatos por Dolz, Noverraz e Schneuwly. Para Werlich,

essa representação é classificada como narrativa.

A enunciação, o sentido do texto e o contexto, nos levaram a concluir que o

obituário além de ser escrito para o leitor do jornal Folha de São Paulo, é escrito

para pessoas que gostariam de prestar uma homenagem a um amigo ou a algum

parente. Alguém que gostaria que fosse lembrado por um detalhe especial em sua

vida. Nos textos analisados encontramos a vida de um gerontologista, de um

Page 55: Obituário: um gênero emconstrução?

54

pracinha, de uma voz especial, de um religioso convicto e de outros profissionais

que fizeram diferença nos locais onde viveram.

Para estudar a estrutura do texto, dividimos os obituários em duas partes: o

título e o conteúdo.

Os títulos foram analisados de acordo com a definição dada pelo obituarista.

Esses profissionais definem a titulação, procurando destacar a passagem mais

representativa da vida da pessoa e também para chamar a atenção do leitor. Essa

informação nos foi passada por um dos obituaristas que nós consultamos e cujo e-

mail está anexado a este trabalho.

O leitor que se vê diante de um texto com o título Miguel Idalgo, primeiro

patrão de Lula, ele vai querer saber de quem estão falando. Com o título Mário

Sayeg, pioneiro da gerontologia, fica a indagação “o que é gerontologia?”. O leitor

precisará ler o obituário para entender que gerontologia é o estudo da velhice.

Ou ainda o título José Correa o maior devedor do Banco do Brasil, de

imediato se pensa “como homenagear um devedor do Banco do Brasil”. Lendo o

texto percebemos que valia a pena saber quem era José Correa e porque se tornou

um grande devedor. O título de Gratagliano,o pracinha, nos atrai porque pracinha é

uma palavra em desuso há muitos anos.

Para analisarmos o conteúdo dos obituários, nós os dividimos em três partes:

introdução, desenvolvimento e conclusão.

No parágrafo de introdução verificamos que cinco dos textos estudados

iniciam com uma marcação temporal. Esses casos são determinados ora pelo

adjunto adverbial de tempo quando, ora por uma oração adverbial temporal.

Em outros dois obituários o autor inicia com o nome do homenageado, José

Arlindo Passos Correa e Eduarda Delascio.

No obituário de Hélio Cherubini, o autor omite o nome do homenageado no

primeiro parágrafo.

No texto escrito para Maria Elisabete Figueiredo Hart, o obituarista destaca no

primeiro parágrafo a voz da homenageada e no obituário de Antonio Gouveia

Mendonça, sua convicção religiosa.

No desenvolvimento do texto, o obituarista relata a vida profissional, as

características pessoais, destacando sempre um detalhe marcante da vida dos

homenageados.

Page 56: Obituário: um gênero emconstrução?

55

Por exemplo, quando ele esclarece como Miguel Serrano Idalgo passou a agir

após seu ex-funcionário ter sido eleito Presidente da República ou quando relata a

importância do trabalho do médico Mário Antonio Sayeg no estudo do

envelhecimento humano.

Em cada texto conseguimos visualizar o homem ou a mulher que realizou

uma tarefa que merece ser conhecida por todos. Principalmente porque são

atividades do dia a dia de pessoas que podem nos servir de exemplo e de incentivo

para nossas realizações pessoais.

Na conclusão dos textos, o obituarista informa a idade, os familiares deixados,

o local de falecimento e a causa da morte.

Assim, diante do estudo realizado concluímos que esses obituários têm uma

estrutura estável que nos permite defini-los como relatos, conforme nos ensinam

Dolz, Schneuwly e Noverraz, e identificá-los como gênero do discurso jornalístico, de

acordo com a definição de Bakhtin.

São textos que contém conteúdo temático, apresentam a vida de pessoas

comuns, que ficam conhecidas a partir da publicação dos obituários; possuem estilo

próprio, são relatos que nos apresentam experiências vividas em um determinado

tempo.

E sua construção composicional é específica para o meio de comunicação em

que estão inseridos, possuem título, introdução, desenvolvimento e conclusão

obedecendo sempre a diagramação da página em que são publicados.

Os títulos sempre trazem um detalhe da vida do homenageado; na

introdução encontramos em vários deles a predominância da marcação temporal; no

desenvolvimento do texto fatos relevantes ou curiosos que mostram como viveram;

na conclusão encontramos sempre a causa da morte.

Acreditamos que na medida em que os obituaristas conseguissem um espaço

maior por parte do setor de diagramação do jornal, eles nos dariam mais detalhes da

vida das pessoas sobre quem escreveram. Por exemplo, no obituário de Eduarda

Delascio consta que cem telegramas de ex-alunos lamentavam sua morte.

Podemos imaginar que deveria haver muitas histórias envolvendo os alunos,

ela e o marido. Histórias que trariam mais informações sobre a mulher que se anulou

para viver a vida do marido.

Foi possível determinar a estrutura dos obituários a partir de estudos sobre

gêneros textuais. Para um aprofundamento do tema, estudos futuros poderão ser

Page 57: Obituário: um gênero emconstrução?

56

feitos no sentido de verificar se, para além de um gênero do discurso jornalístico, os

obituários poderiam ser classificados como gêneros literários.

Page 58: Obituário: um gênero emconstrução?

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REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. BENVENISTE, Émile. Problemas de linguística geral II . São Paulo: Pontes, 1989. BRASIL.MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997. DOLZ, Joaquim, NOVERRAZ, Michele, SCHNEUWLY, Bernard. Sequências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento IN: ROJO, Roxane. CORDEIRO, Glaís Sales (Org.). Gêneros orais e escritos na escola . São Paulo: Mercado de Letras, 2004. GARCIA, Othon M. Comunicação em prosa moderna . 25. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2006. GUIMARÃES, Elisa. A articulação do texto . 8. ed. São Paulo: Ática, 2002. KOCH, Ingedore G. Villaça. Desvendando os segredos do texto . 2. ed. São Paulo: Cortez, 2003. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: definição e funcionalidade IN: DIONISIO, Ângela Paiva, MACHADO, Anna Rachel, BEZERRA, Maria Auxiliadora (Org.). Gêneros Textuais e Ensino . 4. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão . São Paulo: Parábola Editorial, 2008. ROJO, Roxane. Gêneros do discurso/texto como objetivo de ensino de línguas: um retorno ao Trivium? IN: SIGNORINI, Inês (Org.). [Re]Discutir texto, gênero e discurso . São Paulo: Parábola Editorial, 2008. SILVA, Jane Quintiliano G. Gênero discursivo e tipo textual IN: DECAT, Maria Beatriz Nascimento, BITTENCOURT, Vanda de Oliveira (Org.). Scripta Linguística e Filologia . Vol. 2, n.4, Revista da Pragrem. Belo Horizonte: PUC Minas, 1999. SUZUKI, Matinas. O Livro das Vidas . São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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ANEXOS

ANEXO A – New York Times, 18 de set. 2006, p. A-27……………… 59

ANEXO B – New York Times, 01 de mai. 2008, p. C-14…………….. 60

ANEXO C – Folha de São Paulo, 24 de out. 2007, Cotidiano, p. C4.. 61

ANEXO D – Folha de São Paulo, 25 de out. 2007, Cotidiano, p. C10 62

ANEXO E – Folha de São Paulo, 26 de out. 2007, Cotidiano, p. C4.. 63

ANEXO F – Folha de São Paulo, 27 de out. 2007, Cotidiano, p. C8.. 64

ANEXO G – Folha de São Paulo, 30 de out. 2007, Cotidiano, p. C4.. 65

ANEXO H – Folha de São Paulo, 31 de out. 2007, Cotidiano, p. C2.. 66

ANEXO I – Folha de São Paulo, 01 de nov. 2007, Cotidiano, p. C6. 67

ANEXO J – Folha de São Paulo, 02 de nov. 2007, Cotidiano, p. C4. 68

ANEXO K – Folha de São Paulo, 03 de nov. 2007, Cotidiano, p. C4. 69

ANEXO L – Folha de São Paulo, 04 de nov. 2007, Cotidiano, p. C4. 70

ANEXO M – Obituário Folha de S. Paulo, e-mail de 25 de out. 2010. 71

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