Oclusao Dentaria e Matigação

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CENTRO DE ESPECIALIZAO EM FONOAUDIOLOGIA CLNICA

CEFAC

MOTRICIDADE ORAL

OCLUSO DENTRIA E MASTIGAO A relao entre forma e funo

RITA DE CASSIA FERNANDES

Itaja 2001

CENTRO DE ESPECIALIZAO EM FONOAUDIOLOGIA CLNICA

CEFAC

MOTRICIDADE ORAL

OCLUSO DENTRIA E MASTIGAO A relao entre forma e funo

Monografia de concluso do curso de especializao em Motricidade Oral Orientadora: Mirian Goldenberg

Rita de Cassia Fernandes

Itaja 2001

RESUMO

A relao entre ocluso dentria e mastigao o foco central desta pesquisa. J que o desequilbrio na forma desestrutura a funo e vice-versa, ortodontistas e fonoaudilogos precisam trabalhar em conjunto com o objetivo maior de assegurar a permanncia do tratamento aplicado. Com o intuito de se realizar um paralelo entre a atuao desses profissionais, fez-se necessrio detalhar vrios aspectos referentes anatomia e fisiologia mastigatrias e sobre a etiologia da m ocluso e sua classificao. A monografia mostra como imprescindvel o conhecimento anatomofisiolgico de todo o sistema estomatogntico (tambm para a terapia miofuncional), pois no cabe ao fonoaudilogo conhecer apenas as partes moles, to pouco aos dentistas ter conhecimento somente sobre as partes duras. O estudo perseverante ao demonstrar o quanto importante a correta utilizao da terminologia odontolgica durante a comunicao oral e escrita. Para isso, esto expostos em todos os captulos, vrios termos e definies desta natureza que certamente auxiliaro na troca de informaes. No captulo: tipo de ocluso e padro mastigatrio, o leitor ter acesso a grande parte do que j foi escrito a esse respeito, sendo que no existe nenhuma publicao exclusiva sobre tal assunto, apenas alguns trechos contidos em textos. A pesquisa encerrada com uma minuciosa teraputica mastigatria, em que so descritas tambm uma avaliao miofuncional completa, como e quando iniciar a terapia (e seus limites), exames complementares (videofluoroscopia e eletromiografia) e encaminhamentos. Neste ponto os achados do estudo esto relacionados, dando um sentido especial a todos os captulos antecedentes.

ABSTRACT

The relation between dental occlusion and chew is the main focus of this research. Since the lack of equilibrium in the form disarranges the function and vice-versa, orthodontists and speech therapy need to work together with the biggest objective to ensure permanence of the applied treatment. In order to make a parallel between the performance of these professionals, became necessary to detail some referring aspects to the chewing anatomy and physiology, and on the etiology of the bad occlusion and its sorting. The monograph shows as the anatomophysiologic knowledge of all the stomachtologic system is essential, also for the miofunctional therapy, therefore it isnt right the speech therapy to know only the soft parts (muscles), neither the dentists to know only about the hard parts (structure). The study is firm when demonstrating how much it is important the correct use of the odontologic terminology during the verbal communication and writing. For this reason, some terms and definitions of this nature that certainly will assist in the exchange of information are displayed in all the chapters. In the chapter: type of occlusion and chew standard, the reader will have access to great part of what has been already written to this respect, granting that there isnt any exclusive publication about such subject, only some stretches contained in texts. The research is finished with a detailed therapeutical chew, where they are described also a full miofunctional evaluation, how and when to initiate the therapy (and its limits), examinations backing (videofluoroscopy and electromiogram) and

the following procedures. At this point the findings of the study are related to one another, giving a special sense to all the antecedent chapters.

Aos meus pais, Joo Edison e Maria Fernandes.

AGRADECIMENTOS

Ao meu marido Rgis Signor, por tanto amor, carinho, cumplicidade, incentivo e dedicao, sem o qual no seria possvel a realizao de qualquer trabalho. jornalista e amiga Thaise Rodrigues que, gentilmente reviu a monografia. fonoaudiloga Patrcia Junqueira que, mesmo sem saber, orientou meu interesse ao estudo mais aprofundado da funo mastigatria. Ao fonoaudilogo Francisco Pletsch pela disponibilidade e incentivo a turma dispensados. s colegas da turma de Motricidade Oral, por compartilharem seus conhecimentos e tambm pela boa convivncia. Mirian Goldenberg, por orientar a pesquisa.

SUMRIO

Introduo ----------------------------------------------------------------------------------------- 1 Discusso Terica ------------------------------------------------------------------------------- 3 Anatomia e Fisiologia da Mastigao ------------------------------------------------------- 3 Noes de Ocluso Dentria---------------------------------------------------------------- 21 Classificao para a M Ocluso Dentria ---------------------------------------------- 41 Etiologia das Ms Ocluses Dentrias---------------------------------------------------- 56 Tipo de Ocluso e Padro Mastigatrio -------------------------------------------------- 63 Consideraes Teraputicas ---------------------------------------------------------------- 69 Consideraes Finais ------------------------------------------------------------------------- 84 Referncias Bibliogrficas ------------------------------------------------------------------- 90

Introduo:

A atuao fonoaudiolgica vem se aperfeioando ultimamente. A profisso, que surgiu para preencher lacunas de outras profisses, est se fixando como cincia na rea da sade. Inmeras pesquisas tm sido realizadas em todos os campos da fonoaudiologia, e a motricidade oral uma das reas que vem crescendo e se diversificando em ritmo bastante acelerado. Cada vez mais, os fonoaudilogos tm buscado conhecimento tcnico-cientfico das alteraes miofuncionais. O que antes se resumia a uma atuao pouco fundamentada, agora possui bases slidas, e consequentemente, as intervenes tm obtido bons resultados. Dentre os estudos realizados em motricidade oral, a mastigao, uma das funes estomatognticas, tem sido objeto de pesquisa de vrios especialistas (ortodontistas, fisiologistas, mdicos, fonoaudilogos) e parece exercer fascnio. Talvez por ser a funo mais importante do sistema estomatogntico ou mais que isso, por envolver um dos maiores prazeres do ser humano: a satisfao em alimentar-se e a sensao agradvel que a mastigao proporciona. Assim, o distrbio desta funo pode prejudicar um aspecto extremamente relevante da vida do indivduo. E as alteraes dentrias e oclusais so alguns dos fatores causadores deste problema. O principal objetivo desta pesquisa terica verificar a relao entre as alteraes oclusais e a mastigao. O estudo detm-se inicialmente em aspectos da fonoaudiologia e da odontologia em separado, para depois estabelecer uma relao entre eles.

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So abordadas noes bsicas de ocluso dentria, bem como as classificaes para a m ocluso e sua etiologia. A fisiologia mastigatria est minuciosamente detalhada, para que a visualizao entre ambas possa ser facilitada posteriormente. A pesquisa destina-se especialmente a estudantes e fonoaudilogos recm-formados, pois, com o escasso tempo das faculdades em cumprir o contedo a ser abordado, a exposio de vrios aspectos, algumas vezes, passam desapercebidos. S o estudo capaz de suprir tais falhas acadmicas. Alm disso, o bom profissional aquele que estuda e pesquisa sempre. O trabalho procura mostrar como um correto diagnstico reflete um bom desenvolvimento teraputico. Para isso, necessrio um profundo conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema estomatogntico, sem o qual a avaliao e a terapia podero cair em um imenso vazio.

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Discusso Terica:

Anatomia e Fisiologia da Mastigao

Quando se pensa em anatomia e fisiologia da mastigao, a evoluo pela qual passou essa funo no pode ser esquecida. Em pocas mais primitivas, o uso do sistema mastigatrio era diferente do atual, pois, com os avanos tecnolgicos, os alimentos apresentam-se muito mais amolecidos e, alm disso, o homem de hoje no precisa utilizar seu aparelho mastigatrio como instrumento de defesa ou ataque. A tendncia que esse processo evolutivo nunca cesse, levando-se em considerao que, cada vez mais, tem-se feito menos uso da mastigao. Segundo Bianchini (1998), essa evoluo acarreta uma constante transformao anatomofisiolgica, aumentando as chances de que adaptaes ocorram em todo o sistema estomatogntico. Este sistema composto por uma srie de estruturas, tais como msculos, ossos, dentes, articulaes, glndulas, mucosas, vasos e nervos. Estas exercem funes em comum, tendo como caracterstica bsica a participao da mandbula (Douglas, 1998). As estruturas do sistema estomatogntico so divididas em passivas e ativas. Para o autor, as passivas ou estticas esto representadas pelos arcos steo-dentrios, maxila e mandbula, relacionados pela articulao tmporomandibular (ATM), alm do osso hiide e outros ossos do crnio. As estruturas ativas ou dinmicas esto representadas pela unidade neuromuscular, que proporciona mobilidade s partes estticas. Os msculos so estriados

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esquelticos e dividem-se em mastigatrios, supra e infra-hiideos, faciais, linguais e cervicais. Segundo Molina (1995), o sistema neuromuscular, que representa a parte ativa estomatogntica, composto pelos proprioceptores do periodonto, ATM, ligamentos, mucosa, regio perioral, cerebelo, crtex, mesencfalo, nervos V, VII, IX, XI, e os msculos da respirao, fonao, postura, deglutio e da mastigao. Esse sistema retroalimentado por informao reflexa em relao ao grau de presso, tipo de contatos oclusais, quantidade de dentes que esto em contato e dimenso vertical. O fenmeno ocorre atravs de terminaes nervosas que partem dos proprioceptores, especialmente periodontais e articulares. Aps recebida a informao, circuitos reflexos saem dos

proprioceptores pelo V par craniano, atingem sua poro sensitiva do mesencfalo e o ncleo espinhal, realizam sinapse e, em seguida, pode ser iniciada uma resposta motora a partir do ncleo motor do V par craniano no crebro mdio. O autor refere ainda que alguns circuitos neuromusculares atingem o tlamo e depois o crtex, para que sejam estabelecidos reflexos mais elaborados e obtidas respostas mais discriminadas. Posteriormente anlise e discriminao da informao que veio da periferia, um circuito nervoso descendente pode ser iniciado em reas mais altas do sistema nervoso (crtex), ou mais baixas (mesencfalo, tlamo), para ser finalizado em regies do sistema estomatogntico, como msculos da cabea, pescoo e mmica. As funes estomatognticas podem ser classificadas em clssicas e de adaptao. As funes clssicas so a mastigao, fonao, suco, respirao e deglutio, cujas finalidades esto especificamente relacionadas com a

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alimentao ou a respirao. As funes de adaptao so respostas do organismo frente a estmulos recebidos, podendo ser citadas: o beijo, bocejo, mordida, sorriso, fcies (Douglas, 1998). A mandbula participa de maneira fundamental nas funes

estomatognticas clssicas, e a sade da ATM primordial para que haja um bom funcionamento do sistema estomatogntico. Segundo o autor, a mandbula o nico osso mvel do crnio, unindo-se ao osso temporal pela ATM. Esta uma articulao dupla bilateral, que possui movimentos sincronizados entre as duas articulaes. Seus componentes so a cavidade condilar (osso temporal), eminncia articular do osso temporal, cndilo mandibular, disco articular, cpsula articular e ligamentos. Molina (1995) relata que esta articulao uma das mais especializadas e diferenciadas do corpo, devido realizao de movimentos complexos e a sua ntima relao com as funes estomatognticas. Segundo Bianchini (1998), o disco articular fica entre as superfcies articulares, e tem como funes auxiliar o contato destas nos movimentos da mandbula, controlando-os. O disco prende-se poro posterior da cpsula por meio do tecido retrodiscal, medialmente se prende ao cndilo e, lateralmente, atravs de ligamentos. Os ligamentos possuem importantes receptores mecnicos e nociceptivos (dor), sendo eles o ligamento estilomandibular, esfenomandibular, e tmporo-mandibular. Estes atuam como limitadores de movimento. De acordo com Molina (1995), a regio central do disco articular e as demais superfcies funcionais da ATM no possuem vasos e nervos, justificando a capacidade destas regies de resistir a presses menores. As diversas regies da ATM possuem capacidades diferentes de resistncia a presses.

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A cpsula envolve toda a articulao e composta por tecido conjuntivo denso. A articulao sinovial, pois produz o lquido sinovial, que nutriente e lubrificante. revestida por fibrocartilagem, que tem grande capacidade de reparao, j que, devido ao funcionamento da ATM, ocorrem modificaes em suas superfcies articulares (Bianchini, 1998). Os movimentos da mandbula so decorrentes do deslizamento do cndilo dentro da cavidade condilar. A movimentao dos cndilos varia de acordo com a conformao anatmica da ATM. Existem variados tipos de formato da articulao, que do lugar s caractersticas funcionais. Assim, os animais que se alimentam predominantemente de capim possuem uma cavidade condilar ampla e mais plana, possibilitando deslizamento lateral do cndilo (translao lateral) e facilitando, portanto, a ingesto desse tipo de alimento. Os carnvoros a possuem profunda e estreita, resultando em movimento de rotao do cndilo, o que facilita o corte e separao da carne mastigada. Os roedores possuem a cavidade alongada e estreitada no sentido ntero-posterior, favorecendo o movimento nesse sentido (translao ntero-posterior). Os humanos combinam

caractersticas de todas as articulaes comentadas, pois a cavidade condilar ampla ntero-posterior e lateralmente, e relativamente profunda, conferindo propriedades funcionais maiores. As caractersticas morfolgicas e funcionais da ATM humana so definidas por volta dos 7 aos 10 anos de idade (Douglas, 1998). O autor considera que a ATM apresenta dois movimentos principais: translao (deslocamento do cndilo ao longo da cavidade condilar,

acompanhada pelo disco articular) e rotao (ocorre giro do cndilo em torno do seu prprio eixo).

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importante salientar que, quando existe uma desordem na ATM, o padro mastigatrio pode ser afetado. O lado de trabalho muscular durante a mastigao torna-se, principalmente, o lado da articulao mais prejudicada, pois os movimentos de rotao e translao do cndilo sero menos traumticos que no lado de balanceio (Felcio, 1994); (Molina, 1995). Okeson (1992) observa um quadro repetitivo na mastigao de pessoas com alterao na ATM. As mordidas so bem mais reduzidas, ocorrem mais vagarosamente e possuem um trajeto irregular. Parece existir uma relao entre esse trajeto repetido e o movimento problemtico do cndilo, onde o distrbio se situa. Para poder entender o funcionamento do sistema estomatogntico, tornase fundamental a definio bsica dos componentes musculares deste complexo sistema. De acordo com Fehrenbach & Herring (1998), um msculo tem a capacidade de se encurtar sob o comando do sistema nervoso, determinando o movimento de ossos e estruturas moles. Os msculos apresentam duas extremidades inseridas a essas estruturas, que so representadas pelo ponto fixo (origem) e ponto mvel (insero). A origem do msculo est inserida estrutura que no se desloca durante o movimento, enquanto a insero a sua extremidade fixa estrutura que se desloca durante o movimento. Geralmente, a insero vai de encontro origem quando ele se contrai, sendo este movimento denominado de ao muscular. Os msculos possuem inervao especfica. Macedo (1998) refere que essas definies de origem e insero musculares so meramente didticas, pois, ao realizar uma disseco dessas reas, verifica-se que as fibras musculares no tm suas origens e inseres de maneira to definida.

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Sero

citados

os

principais

msculos

integrantes

do

sistema

estomatogntico, com nfase nos da mastigao. Estes compreendem os msculos mastigatrios (temporal, masster, pterigideo lateral, pterigideo medial e ventre anterior do digstrico), os supra-hiideos, os infra-hiideos, o bucinador, os msculos da lngua e a musculatura da mmica (Bianchini, 1998). Cabe ressaltar que os mastigatrios esto relacionados exclusivamente realizao dos movimentos mandibulares. Os msculos da mastigao agem de forma sincrnica durante a realizao dos movimentos mandibulares, sendo que alguns contraem-se enquanto outros relaxam para que sejam efetuados os movimentos. Dentre estes, destacam-se os levantadores e abaixadores da mandbula. Os msculos levantadores so o masster, o temporal e o pterigideo medial. O masster potente, curto e largo. Sua principal funo a de levantador da mandbula, mas tambm pode contribuir no movimento de protruso e lateralidade mandibular. palpvel devido a sua superficialidade. Apresenta dois feixes musculares principais, sendo um superficial e outro profundo, que comportam-se diferentemente. Quando no fechamento da mandbula, por exemplo, o feixe superficial trabalha mais no incio deste movimento, enquanto o outro fica encarregado do agarramento terminal. A inervao motora provm do nervo masseterino, ramo do V par craniano (trigmio) (Macedo, 1998); (Douglas 1998, 1999). Segundo Fehrenbach & Herring (1998), o masster pode hipertrofiar-se em pessoas que possuem hbitos de ranger ou cerrar os dentes. O msculo temporal apresenta uma ampla rea de origem na linha temporal dos ossos frontal e parietal, tendo uma nica insero na mandbula.

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Possui trs feixes: anterior, mdio e posterior, que podem ser classificados, de acordo com a sua orientao, em vertical, oblquo e horizontal (Macedo, 1998). Douglas (1999) refere que este msculo, alm de exercer sua funo de levantador, age tambm na abertura mxima da mandbula, devido contrao de seus feixes anteriores, e na retrao, pela contrao dos posteriores, alm de participar no deslocamento contralateral. O temporal primordial na determinao do tnus muscular na posio postural da mandbula. Sua inervao provm de ramos do trigmio. Bianchini (1998) coloca a importncia do temporal como auxiliar na estabilidade no movimento de fechamento da mandbula. O pterigideo medial um auxiliar do masster, agindo em conjunto na protruso e lateralidade da mandbula com a boca fechada. Sua inervao provm do trigmio (V par) (Douglas, 1999). A musculatura depressora da mandbula est representada pelo msculo pterigideo lateral e pelos supra-hiideos (principalmente o ventre anterior do digstrico, gnio-hiideo e milo-hiideo) (Douglas, 1999). O pterigideo lateral , para Macedo (1998), um msculo

predominantemente abaixador da mandbula, atuando tambm nos movimentos de propulso e lateralidade. Possui dois feixes, superior e inferior, antagnicos funcionalmente. Bianchini (1998) relata que o feixe superior age

predominantemente na estabilizao do movimento de fechamento bucal. O inferior age na abertura mandibular ao tracionar o cndilo para frente, para baixo e para dentro. Segundo a autora, a lateralizao da mandbula conseguida atravs da contrao do pterigideo lateral do lado oposto ao movimento mandibular, auxiliado pelo pterigideo medial e feixe anterior do temporal desse mesmo lado.

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Desse modo, ao lateralizar a mandbula para o lado esquerdo, haver contrao dos msculos citados apenas do lado direito. A propulso mandibular conseguida atravs da ao dos pterigideos laterais, mediais e feixes anteriores do temporal. Os supra-hiideos esto situados acima do osso hiide. Estes msculos so classificados conforme sua situao, posterior ou anterior ao osso. Assim, o grupo anterior dos supra-hiideos inclui o ventre anterior do digstrico, o milohiideo e o gnio-hiideo. Fazem parte do grupo posterior, o ventre posterior do digstrico e o msculo estilo-hiideo (Fehrenbach & Herring, 1998). Para Douglas (1999), o ventre anterior do digstrico basicamente abaixador, mas tambm est relacionado ao movimento de retropulso da mandbula. importante salientar que, na abertura da boca, quem inicia o movimento o pterigideo lateral, seguido pelo digstrico. O gnio-hiideo, alm de retropropulsor da mandbula, puxa o hiide para cima, reduzindo o assoalho da boca e facilitando a deglutio. O msculo milohideo tambm tem certa importncia na deglutio (Douglas, 1999). Os msculos supra e infra-hiideos, como ressalta Macedo (1998), tm importncia na manuteno da postura cervical, na manuteno da

permeabilidade das vias areas superiores e na fixao do osso hiide. Participam dos movimentos de abertura e fechamento mandibulares, na deglutio e fono-articulao. Os infra-hiideos (situados abaixo do osso hiide) esto representados pelos msculos: omo-hiideo, esterno-hiideo, esterno-tireideo e tireo-hiideo. Esta musculatura, unida ao grupo posterior dos supra-hiideos, fixa o osso hiide para que os supra-hiideos (grupo anterior) possam desempenhar seu papel

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(elevao do hiide e da laringe na deglutio, depresso da mandbula quando o hiide est fixo) (Fehrenbach & Herring, 1998). No processo mastigatrio, de grande importncia, como refere Bianchini (1998), a participao da lngua, dos bucinadores e de alguns msculos da mmica facial no direcionamento da comida para a face oclusal dos dentes posteriores, determinando a eficcia do golpe mastigatrio. Os msculos linguais so divididos em extrnsecos e intrnsecos. A lngua consiste em duas metades iguais, separadas por um septo, profundamente situado. Na superfcie, este septo corresponde ao sulco mediano. A lngua apresenta movimentos complexos, resultado da ao combinada de seus msculos (Fehrenbach & Herring, 1998). Macedo (1998) relata a importncia da lngua como fundamental para todo o sistema estomatogntico. Ela apoia-se no osso hiide, na mandbula, no palato e na apfise estilide atravs de sua musculatura extrnseca (estiloglosso, hioglosso, palatoglosso, condroglosso), podendo, desse modo, assumir variadas formas e realizar diversos movimentos. Os msculos extrnsecos tm a funo de apoio na base para que a musculatura intrnseca (longitudinal superior, transverso, vertical, longitudinal inferior) possa deslocar-se. Segundo Okeson (1992), a lngua tem funo preponderante para o paladar, alm de distribuir o alimento na cavidade bucal e auxiliar na diviso deste em pequenas partculas. Aps a deglutio, ajuda na limpeza oral retirando resduos alimentares que ficam aderidos nessa regio. O bucinador forma a parede lateral da cavidade bucal. Para Fehrenbach & Herring (1998), o bucinador puxa lateral e posteriormente a comissura labial, permitindo que a bochecha seja comprimida contra os dentes, como ocorre

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durante a mastigao. Bianchini (1998) relata que este msculo preponderante para o processo mastigatrio, pois ele responsvel pela retirada de alimento da regio de vestbulo bucal, posteriorizando-o na face oclusal dos dentes. A incompetncia do bucinador permite a sobra de alimento na regio do vestbulo durante a mastigao. Dentre a musculatura da mmica, destacam-se, como msculos

proeminentes da funo mastigatria, o j citado bucinador e o orbicular do lbios. Macedo (1998) descreve que as fibras do msculo orbicular da boca envolvem toda a superfcie dos lbios, oferecendo-lhes forma. Essas fibras, tanto do lbio superior quanto do inferior, se encontram nas comissuras labiais, entrelaando-se com as dos bucinadores. De acordo com Fehrenbach & Herring (1998), o orbicular fecha a boca e, ao se contrair fortemente, comprime os lbios. O beb, ao nascer, apresenta certas funes estomatognticas natas, como a suco, deglutio primria e respirao. A mastigao aparece mais tarde, de forma adquirida, e precisa ser aprendida. Para isso, so necessrios treinamento, formao de novas associaes sinpticas, participao do crtex cerebral, ncleos da base e cerebelo. Inicialmente, a mastigao caracterizada como uma atividade instavl, mas, como a associao de estmulos bastante frequente, esta funo logo se estabiliza, de tal modo que se realiza de forma automtica subconsciente, sem um envolvimento maior do crtex cerebral (Douglas, 1999). medida que a influncia cortical vai sendo reduzida, a mastigao passa de um fase aprendida para uma fase reflexa, onde os msculos e ATMs so bastante adaptativos. Nesta fase, provvel que os movimentos e posies mandibulares dependam mais dos proprioceptores articulares e periodontais do que dos dentes (Molina, 1995).

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Felcio (1994) considera a possibilidade da mastigao desenvolver-se a partir da suco. importante que a criana receba manipulaes na cavidade oral, como a introduo de objetos e alimentos de diversas texturas na boca, para que haja uma preparao mastigatria. Segundo a autora, a mastigao infantil caracterizada por movimentos mandibulares em charneira, passando a apresentar movimentos de rotao por volta dos 3 anos de idade. Os primeiros movimentos mastigatrios so descoordenados, como ocorre com a aprendizagem de qualquer fenmeno motor. Primeiro se fixam os mais simples, para depois serem realizados os mais complexos. Com o

amadurecimento do sistema estomatogntico e o desenvolvimento da dentio total, so estabelecidos padres de reflexos aprendidos guiados. Ocorre tambm a informao dos proprioceptores (periodontais, articulares, linguais, periorais e os receptores de tato e presso da mucosa oral) ao sistema nervoso central sobre o que est na boca, direcionando a fora, a velocidade e o aprendizado da mastigao. Em seguida, surgem modificaes menores, que aperfeioam este processo. (Douglas, 1999); (Molina, 1995). Conforme Douglas (1998, 1999), a mastigao a funo de maior relevncia do sistema estomatogntico, sendo considerada a fase inicial do processo digestivo que comea na boca. Para Felcio (1994), esta funo est relacionada ao prprio desenvolvimento do sistema, sendo um estmulo para sua continuidade e para a preservao da sade dos msculos, articulaes e periodonto na idade adulta. Junqueira (1999) relata que, se o beb precisa sugar para desenvolver suas estruturas orais, posteriormente ele necessitar mastigar para que haja prosseguimento neste desenvolvimento e amadurecimento.

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O conceito de mastigao refere-se degradao dos alimentos, transformando-os em partculas cada vez menores, devido moagem e triturao. O bolo alimentar formado pela unio das micropartculas alimentares atravs da ao da saliva (Douglas, 1999). No entender de Okeson (1992), o ato de mastigar alimentos, onde a quebra deste em pequenos pedaos tem por finalidade facilitar a deglutio. O autor discorre sobre a sensao de prazer que esta funo proporciona, a qual envolve sentidos como paladar, tato e olfato. Quando o estmago est saciado, h um estmulo que bloqueia a sensao agradvel de alimentar-se. A mastigao representa um processo complexo e dinmico, onde participam aferncias nervosas que exercem controle sincrnico sobre a musculatura mastigatria, facial e lingual, nas fases de abertura da boca, fechamento da boca e ocluso. A mandbula descreve um ciclo regulado por um hipottico centro mastigatrio de atividade rtmica, controlado por estmulos de origem perifrica, a saber: periodonto, mucosa bucal, proprioceptores musculares e articulares, e sob a influncia reguladora dos centros superiores, sistemas piramidal e extrapiramidal (Douglas, 1999). Okeson (1992) explica que o movimento completo da mastigao pode ser dividido em uma fase de abertura e uma fase de fechamento da mandbula. Na fase de abertura, a mandbula cai em torno de 16 a 18 mm, em seguida deslocase lateralmente de 5 a 6 mm da linha mdia, quando o movimento de fechamento iniciado. No incio da fase de fechamento, o alimento amassado e o movimento lateral da mandbula reduzido para 3 a 4 mm. Conforme continua o fechamento, a comida retida entre os dentes e passa por um processo de triturao. Neste ponto, a mandbula volta para a posio de intercuspidao. Nas

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etapas finais, a triturao do bolo alimentar fica restrito aos dentes de trs e pouco movimento anterior ocorre. Deve-se frisar que o movimento de lateralidade da mandbula varia de acordo com o estgio da mastigao e com a consistncia alimentar. Inicialmente, quando a comida introduzida na cavidade oral, o deslocamento lateral maior e vai diminuindo medida que o alimento vai sendo mastigado. Com relao consistncia, quanto mais duro for o alimento, maior ter de ser o deslocamento lateral. No ciclo mastigatrio (sequncia de aes mecnicas que resultam na desintegrao do alimento) so descritas trs etapas, a saber: inciso, triturao e pulverizao (Douglas, 1999). O autor descreve que a inciso ocorre quando a mandbula se eleva em protruso e segura o alimento entre as bordas incisais, ficando os incisivos em posio de topo. Intensifica-se a contrao da musculatura elevadora, ocasionando o corte do alimento. A mandbula retroposiciona-se. Os bucinadores e a lngua posteriorizam o alimento para a face oclusal dos dentes pr-molares e molares. Ocorre bastante secreo salivar. Esta etapa equivale de 5 a 10% do tempo total do ciclo mastigatrio. A etapa seguinte a da triturao, onde o alimento quebrado em pequenas partculas por degradao mecnica. Ocorre principalmente nos prmolares, pois estes dentes possuem uma maior presso intercuspideana, necessria para triturar partculas maiores, que oferecem mais resistncia. Esta fase a mais duradoura do ciclo, levando de 65 a 70% do tempo total (Douglas, 1999).

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Finalizando, o autor refere que o alimento passa por um processo de moagem, onde as pequenas partculas so transformadas em elementos bastante reduzidos, perdendo totalmente a resistncia inicial. Esta etapa chamada de pulverizao e toma 25-30% do tempo do ciclo. Ocorre predominantemente nos molares. As duas etapas finais no podem ser separadas, j que a utilizao dos dentes pr-molares e molares se alternam. Durante o ciclo, especialmente nas duas primeiras etapas, ocorre grande secreo salivar, que ajuda na mastigao e, consequentemente, na formao do bolo alimentar, alm de conferir ao bactericida aos alimentos que so colocados na boca. Nestas fases, ocorre um forte trabalho muscular, relacionado principalmente com os movimentos de abertura e fechamento bucal. Vale ressaltar que, quando a boca abre, ocorre a contrao isotnica dos msculos abaixadores da mandbula e o relaxamento dos levantadores. Quando a boca fecha, ocorre o contrrio: h contrao isotnica dos levantadores e relaxamento da musculatura abaixadora da mandbula (Douglas, 1999). Bianchini (1998) refere que, de acordo com o tipo de alimento que est sendo mastigado, vo ocorrendo degluties reflexas medida que parte do alimento j pulverizado vai sendo posteriorizado e toca os pilares anteriores da faringe, desencadeando o reflexo da deglutio, enquanto o restante do alimento ainda est sendo preparado . Todas as etapas do ciclo mastigatrio dependem da sade dos dentes e da ATM, da atuao neuromuscular e do comando neural. Os movimentos realizados durante a mastigao so possveis graas ATM. Estes esto relacionados a abertura, fechamento, lateralidade, protruso, retruso e movimentos rotatrios.

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O ato mastigatrio representa, conforme Douglas (1999), estgios sequentes integrantes do ciclo da mastigao. Possui trs fases: fase de abertura da boca, fase de fechamento da boca (estas duas j comentadas) e fase oclusal. Nesta ltima, h contato e intercuspidao dos dentes em ocluso cntrica, criando foras interoclusais pela contrao isomtrica da musculatura elevadora da mandbula. fundamental para a mastigao, pois origina a presso interoclusal, quebrando o alimento entre os dentes. Esta fase denominada tambm golpe mastigatrio. O incio do ato mastigatrio , de acordo com Felcio (1994), dependente da vontade do indivduo. O impulso parte dos centros nervosos superiores, por meio do tracto crtico bulbar, formando um ciclo automtico que possibilita a atuao consciente, ou seja, poder ser interrompido ou modificado a qualquer momento. Okeson (1992) salienta que a mastigao uma atividade automtica e praticamente involuntria, mas, se for preciso, ela pode ter controle volitivo. A funo mastigatria importante para o crescimento dento-facial, pois age como estmulo para o nascimento dos dentes e aumento das arcadas dentrias. Uma mastigao adequada estimula alternadamente as vrias estruturas do sistema estomatogntico (Bianchini, 1998). Para a mastigao ser considerada equilibrada, a distribuio do alimento na cavidade bucal deve ser ora do lado direito, ora do esquerdo. Na bilateral alternada, deve existir tambm uniformidade das foras nos tecidos de suporte dentais, estabilizando o periodonto, harmonizando a ocluso e tornando a atividade muscular sincrnica. Esse padro mastigatrio o ideal e, geralmente, ocorre quando existe integridade antomo-funcional dos componentes do sistema estomatogntico (Douglas, 1999).

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Felcio (1994) explica que a mastigao deve ser bilateral alternada porque, no lado de balanceio, a ATM, juntamente com movimentos de lateralidade, estimula o crescimento da hemi-mandbula desse lado e, no lado oposto (lado de trabalho muscular), ser estimulado o crescimento da hemimaxila, devido ao da fora mastigatria neste lado. Assim sendo, em caso de mastigao unilateral esquerda, por exemplo, haver um desenvolvimento pstero-anterior da mandbula do lado direito e um desenvolvimento para fora e para frente da maxila do lado esquerdo. Jabur (1998) relata que pessoas com mastigao unilateral de longa durao podem ter um crescimento assimtrico da face. Um estudo citado por Douglas (1999) relata que, em situao de normalidade, apenas 10% das pessoas possuem, como padro mastigatrio, o bilateral simultneo (mastigam dos dois lados ao mesmo tempo), 15% possuem uma mastigao exclusivamente unilateral (direita ou esquerda), e o restante, representados por 75%, possuem a mastigao bilateral alternada (adequada). Segundo Okeson (1992), apesar de a maioria da populao, em condies normais, possuir o padro considerado correto (bilateral alternado), 78% dessas pessoas tem um lado de preferncia, onde a mastigao ocorre mais vezes. O lado preferencial , em grande parte dos casos, o que tem maior nmero de dentes se tocando no deslize lateral. Entretanto, h controvrsias em relao aos autores, no que diz respeito ao contato de dentes durante a mastigao. Alguns estudos sugerem que os dentes, na verdade, no se contatam durante o ato mastigatrio e que o simples toque dental seria um dos mecanismos desencadeadores do reflexo de deglutio. O autor acredita no contato dental,

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salientando que, medida que o alimento vai sendo triturado, os dentes passam a encostar-se e, um pouco antes da deglutio, o toque ocorre a cada mordida. Segundo Douglas (1999), a mastigao unilateral pode trazer vrios malefcios, pois so estimuladas apenas as estruturas no lado de trabalho (onde o alimento est sendo mastigado). Isso faz com que, no lado inativo, no haja o desgaste fisiolgico das cspides dentrias, possibilitando o aparecimento de interferncias oclusais prejudiciais e da placa bacteriana. As causas mais comuns desta alterao so: problemas na ATM, ausncia de dentes, doenas periodontais, cries, interferncias oclusais, mordida cruzada posterior e contatos prematuros. Felcio (1994) considera que o consumo de alimentos secos e mais consistentes ajudam no desgaste natural da dentio, evitando que alterao oclusal por falta de uso seja a causa de mastigao unilateral. De acordo com Planas (1994), em sua Lei sobre a mnima dimenso vertical, partindo de uma posio mandibular em ocluso para o movimento de deslizamento durante a mastigao, se o aumento da dimenso vertical for o mesmo para lado direito e o esquerdo, pode-se assegurar que o indivduo possui uma mastigao bilateral alternada. Se h aumento da dimenso vertical em um dos lados apenas, a mastigao ocorrer no lado onde o aumento for menor (mastigao unilateral). Jabur (1998) tem observado que indivduos que possuem mordida cruzada posterior unilateral tm preferncia mastigatria no lado do cruzamento, devido dimenso vertical diminuda neste lado. As foras geradas durante a mastigao unilateral so muito mais fortes no lado de trabalho. comum encontrar, nestes casos, o masster mais forte e encurtado, enquanto que, no lado de balanceio,

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esse msculo torna-se mais fraco e estirado pela falta de uso. Tal situao pode ocasionar assimetria facial e desordens na ATM. A mastigao unilateral pode funcionar como um mecanismo de adaptao para que haja um mnimo de trauma para o periodonto, dentes e articulaes (Molina, 1995). Douglas (1999) acredita que, quando se mastiga de um lado s, a mandbula desce seguindo o sentido do lado passivo. Aps isso, a mandbula cruza a linha mdia para o lado de trabalho, elevando-se novamente na fase do fechamento, at atingir a intercuspidao mxima. A eficincia mastigatria analisada de acordo com o autor,

considerando-se o grau de triturao e moagem ao qual so submetidos os alimentos, aps um determinado nmero de golpes mastigatrios. a razo entre o trabalho mecnico til e a energia gasta para realiz-lo (verificada atravs do consumo de oxignio). Esta medio um tanto complexa, mas costuma ser realizada pedindo-se ao indivduo que mastigue determinada quantidade de alimento durante, por exemplo, vinte vezes (20 golpes mastigatrios), sem engolir nada. A seguir, o contedo da boca deve ser cuspido para ser analisado atravs de sua passagem por uma peneira especial, que retm as partculas maiores. Assim, o rendimento mastigatrio verificado por meio de porcentagem, sendo considerado como eficiente um rendimento igual ou superior a 78%. Os indivduos com boa eficincia mastigatria reduzem os alimentos a partculas finas e pequenas, antes que seja desencadeado o reflexo da deglutio. O limiar de deglutio referente ao grau de moagem das partculas alimentares at que atinjam o ponto certo para que o bolo alimentar possa ser

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engolido. Os indivduos com mastigao ineficiente podem deglutir partculas maiores prematuramente (Douglas, 1999). Para Barbosa (1997), as pessoas com m ocluso comum no possuem alterao na eficincia mastigatria da forma que se supe. Esta a principal razo pelo qual os ortodontistas no realizam testes de mastigao na rotina clnica. Proffit e Ackerman (1996) salientam que os ortodontistas do pouca ateno mastigao, acreditando que, como a consistncia da alimentao atual muito amolecida, o efeito mastigatrio torna-se praticamente irrelevante. Segundo os autores, aproximadamente 25% das pessoas com alterao dentofacial relatam dificuldades para comer. E, como no existem testes eficientes para avaliar o aspecto mastigatrio, fica difcil verificar o grau de dificuldade que o paciente possui. Mas, se a funo est diminuda, razovel acreditar que a teraputica ortodntica possa melhor-la.

Noes de Ocluso Dentria

Para iniciar a discusso sobre a ocluso dental, faz-se necessrio uma breve definio em relao ao rgo dentrio. Segundo Kohler (1992), os dentes correspondem a uma massa dura de colorao esbranquiada e tecido calcificado, situados na cavidade bucal e dispostos em fileiras sobre os maxilares. A erupo dentria um fenmeno resultante de diversas causas, fazendo com que haja a migrao do dente do interior dos maxilares para a cavidade bucal. o movimento em direo ao plano oclusal, quando ele ainda no est

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completamente formado (a coroa e parte da raiz j se encontram formadas antes de seu aparecimento na cavidade bucal). Paralelamente ao surgimento do dente at seu posicionamento definitivo na arcada, edifica-se a raiz, configura-se a loja alveolar para receb-la, bem como se organiza o ligamento alveolodental (Ferreira,1998). As modificaes ocorridas nos dentes, desde a sua formao at a erupo e ocluso nas arcadas, esto relacionadas, de acordo com o autor, edificao e ao crescimento da face. O rgo do esmalte tem como funo o modelamento da coroa e da raiz, e a produo de esmalte (funo amelogentica), restrita coroa. Os dentes possuem funes de relevncia na mastigao, uma vez que preparam os alimentos para serem deglutidos, e na fonao, pois a pronncia dos fonemas dentais, requerem o apoio da lngua ou do lbio na superfcie da arcada dentria (Kohler,1992). Segundo o autor, os dentes ficam fixados nos alvolos pelo ligamento periodontal e recebem nomes especficos de acordo com a funo que exercem, a situao, a forma da coroa e o nmero de razes. Sendo assim encontram-se os incisivos, caninos, pr-molares e molares. Os incisivos tm a coroa com forma cuneiforme e sua funo de cortar os alimentos. Os caninos rasgam o alimento, ou seja, fazem a dilacerao graas a sua forma de lana (lanceolada). Os prmolares participam da perfurao e iniciam a funo dos molares que a de triturao. Os dentes so compostos pelos seguintes tecidos: esmalte ( o tecido mais duro do corpo, porm frgil, pois possui uma taxa muito alta de sais minerais), dentina (forma o corpo do dente, a coroa e a raiz, possui um teor de dureza e

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elasticidade semelhante ao osso), cemento (recobre a raiz dentria; pode ser reabsorvido quando ocorrem alteraes no ligamento periodontal) e polpa (ocupa toda a cavidade central e constituda por tecido conjuntivo, no qual passam vasos sanguneos, linfticos e inervao dos dentes) (Kohler,1992). De acordo com Douglas (1999), so ainda funes do cemento: providenciar o ponto de ancoragem das fibras do periodonto e manter controle sobre a largura e espao do ligamento periodontal. Quanto polpa, suas funes so a de nutrir-se e nutrir a dentina, formao da dentina secundria, transmisso ao crtex de impulsos sensoriais de presso e dor (sensitiva), e funo defensiva, atravs da qual pode proteger e reparar sua integridade tissular. Para Molina (1995), o periodonto uma unidade biolgica e funcionalmente bem definida, possuindo adaptao para aguentar e se acomodar s presses mastigatrias. O termo ligamento periodontal no histologicamente adequado, sendo mais sensato ser referido como membrana periodontal, j que os constituintes desta no so to densos e longos para constiturem um ligamento. Na coroa existem diversas faces (lados dos dentes), que so a face oclusal (quando os dentes esto em ocluso cntrica, as faces oclusais esto em contato), face mesial ( a face lateral do dente que est mais prxima da linha mediana), face distal (est mais afastada da linha mediana), face vestibular (est voltada para o vestbulo bucal), face lingual (oposta face vestibular, voltada para o interior da cavidade bucal) e face cervical (oposta face oclusal, podendo ser representada por um plano de seco que passa rente ao colo do dente) Kohler (1992). Durante a fase de crescimento, as medidas dos dimetros dos dentes, as dimenses dos arcos dentrios e da mandbula e maxila so modificadas de

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diferentes modos. Desta forma, o dimetro dos dentes permanece o mesmo, mas a circunferncia dos arcos diminui, enquanto o comprimento do osso da mandbula e maxila aumenta. Dentre as medidas relacionadas s dimenses do arco, so consideradas a largura, a profundidade e a circunferncia (permetro do arco). A ltima a mais importante, e sua medida realizada a partir da superfcie distal do segundo molar decduo ao redor do contorno do arco sobre os pontos de contato e bordas incisais, em uma curva suave superfcie distal do segundo molar decduo do outro arco (Burdi & Moyers, 1991). Durante a vida, existem trs fases de dentio, que so a decdua, a mista e a ltima fase permanente. No entender de Feres (1992), os dentes decduos comeam a erupcionar por volta dos seis meses de idade e a dentio estar completa quando existirem vinte dentes na boca, sendo dez na arcada superior e dez na inferior. Nesta fase, no existem os pr molares. So, portanto, quatro incisivos, sendo dois centrais e dois laterais, dois caninos e quatro molares em cada arco dentrio. J a definitiva composta por trinta e dois dentes, dezesseis superiores e dezesseis inferiores (quatro incisivos, dois caninos, quatro prmolares e seis molares em cada arcada dentria). A fase mista corresponde, de acordo com Burdi & Moyers (1991), ao perodo em que existem dentes decduos e permanentes ao mesmo tempo na cavidade bucal. Os autores salientam que, ao nascimento, os processos alveolares esto cobertos pelos abaulamentos gengivais, que logo se segmentam para revelar os locais onde os dentes devero desenvolver-se. Quando esses abaulamentos esto em contato, o arco inferior posterior ao superior, mas essa diferena vai sendo reduzida at os 21 meses .

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A erupo da dentadura decdua ocorre em sequncia, seguindo a ordem relatada por Kohler (1992): incisivos centrais inferiores, incisivos centrais superiores, incisivos laterais superiores, incisivos laterais inferiores, primeiros molares superiores e inferiores, caninos superiores e inferiores, segundos molares superiores e inferiores. Conforme aparecem os dentes, a musculatura aprende a realizar os movimentos oclusais funcionais necessrios. Segundo o autor, podem existir diastemas generalizados entre os dentes decduos anteriores, sendo que os espaos mais amplos denominados primatas, geralmente, ocorrem entre o canino e o incisivo lateral na arcada superior e entre o canino e o primeiro molar, na inferior. Apesar de grande parte dos autores considerar estes diastemas como consequncias de crescimento dos maxilares para a obteno de mais espao para acomodao dos dentes permanentes, estudos recentes como o de Moyers (1991), no aceitam tal afirmativa. Atravs de uma srie de medidas do permetro do arco decduo, percebeu-se que h pouca mudana na dimenso deste permetro at a poca de apario dos incisivos. O plano terminal (poro posterior final) na dentio decdua , segundo Ferreira (1998), Kohler (1992) e Moyers (1991), do tipo reto, tendo em vista que os molares inferiores so maiores (distncia entre a face mesial e a distal) que os superiores. Quando a face distal dos segundos molares no termina em um mesmo plano vertical, existir um degrau que pode ser, fora dos padres de normalidade, do tipo mesial ou distal. Isto deve-se a alguns fatores como hbitos inadequados de suco, processos cariosos entre dois dentes (interproximais) e desequilbrios no padro esqueletal. A importncia do plano terminal deve-se, no entender dos autores, ao posicionamento do primeiro molar permanente,

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determinando que este dente, ao erupcionar, tome contato com uma relao topoa-topo. O correto contato entre os primeiros molares superiores (chave de ocluso) s acontecer, em razo do deslizamento dos planos cuspdeos, depois da esfoliao dos segundos molares decduos. Como a dimenso mesiodistal dos molares decduos maior que a dos correspondentes permanentes (pr molares), na queda daqueles permanece um espao, denominado espao livre de Nance. Este faz com que os molares tenham uma boa acomodao no arco dentrio. Isso ocorre, pois a migrao mesial do primeiro molar inferior permanente (1,7mm) maior que a do primeiro molar superior (0,9mm) ( Ferreira, 1998). O autor explica que, na dentio decdua, tambm existe uma chave de ocluso que estabelecida entre os segundos molares. Estes dentes so morfologicamente bastante parecidos com os primeiros molares permanentes. Portanto, na ocluso central dos decduos, a cspide msio-vestibular do

segundo molar superior oclui com o sulco vestibular do segundo molar decduo inferior, e a cspide mesiolingual do segundo molar superior oclui na fssula do seu homlogo inferior. O estudo das relaes oclusais de cada dente decduo permite referir que, de um modo geral, estes dentes possuem uma inclinao axial bem reduzida, quase vertical, tanto no sentido mesiodistal como no vestibulolingual . Na poca compreendida entre a erupo dos incisivos inferiores e a dos molares decduos, os proprioceptores, o ncleo mesenceflico do V par craniano, a formao reticular e o crtex esto frequentemente criando novos circuitos de informao para que a posio da mandbula, dos dentes e da ATM esteja

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adequadamente adaptada. A relao cntrica instvel, mas pode ser reproduzida, bem como as posies assumidas pela mandbula. Estas posies mudam constantemente devido ao crescimento ntero-posterior e lateral, sendo que posies adaptativas podem ser estabelecidas em seguida erupo dos caninos. Em consequncia, pode ser encontrada interferncia oclusal

ocasionando mordidas cruzadas uni ou bilaterais, unida a uma alterao da funo muscular (Molina, 1995). Os dentes que mais apresentam interferncias oclusais na dentio decdua so os caninos. O autor refere que estes dentes comumente conduzem a um deslizamento mandibular lateral e anterior. Se, unido a esse fator, existir pouco overjet (sobressalincia) e pouco overbite (sobremordida) poder ser estimulado um padro classe III desfavorvel. Quanto ausncia congnita de dentes decduos, verifica-se, de acordo com Burdi & Moyers (1991), que menos de 1% de crianas apresentam este tipo de problema. As ausncias mais comuns so de incisivos laterais superiores, incisivos centrais superiores e primeiro molar, nesta ordem. O trmino da dentio decdua referida por Kohler (1992) quando os segundos molares entram em ocluso, aproximadamente vinte e quatro a trinta meses aps o nascimento da criana. Nesta poca, os proprioceptores periodontais esto em constante mudana de circuitos neuromusculares, para que sejam estabelecidos movimentos e posies mandibulares com mais estabilidade. Isso ocorre, segundo Molina (1995), seguindo-se o princpio neuromuscular de realizar a funo da maneira mais estvel possvel com o menor gasto energtico. Os molares possuem uma ampla rea de contato em

vista de sua funo de triturao dos alimentos. As arcadas dentrias

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apresentam-se, nesta fase, em formato ovide ou semi-circular, podendo ou no haver diastemas entre os dentes (Kohler, 1992). A dentio decdua normal permite ao profissional de odontologia maior segurana em relao a um adequado desenvolvimento da permanente. Para Burdi & Moyers (1991), devem ser observados alguns sinais na dentio decdua, para que seja considerado um padro de normalidade: espaos primatas, dentes anteriores separados, sobremordida e sobressalincia pouco profundas, plano terminal reto, relao canina e molar em classe I, inclinao quase vertical dos dentes anteriores e arco de formato ovide. O incio da fase da dentio mista ocorre, como referem os autores, com a erupo dos primeiros molares permanentes, sendo estes dentes considerados fundamentais para o estabelecimento de uma ocluso definitiva dentro da normalidade. Os dentes permanentes, ento, so classificados em duas categorias: sucessores (substituem os decduos que existiam na arcada, sendo eles os incisivos, caninos e pr-molares) e os adicionais (erupcionam alm dos segundos molares decduos; so o primeiro, segundo e terceiro molares). Existem dois aspectos fundamentais neste perodo do ponto de vista clnico, que so a utilizao do permetro do arco e as modificaes na adaptao de uma fase para outra. Este perodo de transio da dentio torna-se ideal para grande parte das intervnes ortodnticas, j que o processo alveolar uma das reas de adaptao mais ativas do crescimento sseo nesta poca. Existem trs aplicaes para o permetro do arco: alinhamento dos incisivos permanentes, pois eles nascem com certo apinhamento; espao para os caninos e pr-molares; e ajuste de ocluso molar (os primeiros molares permanentes que a princpio nascem topo-a-topo tm que se transformar numa

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relao classe I, para que possa ser estabelecida uma ocluso normal). O primeiro molar permanente normalmente atinge uma relao classe I por alguns fatores: um deslocamento mesial tardio, aps a queda do segundo molar decduo; crescimento maior da mandbula para frente do que da maxila; ou a unio dos dois aspectos. A importncia desse fato pode ser explicada atravs de um exemplo: se uma criana apresenta um plano terminal reto na dentio decdua, uma leve classe II esqueltica facial e um espao do permetro do arco insuficiente para que haja o deslocamento mesial tardio dos primeiros molares permanentes, existir alta possibilidade de a ocluso tornar-se do tipo classe II, ao final da dentio mista. Por isso existe grande vantagem na obteno de uma relao molar classe I antes da queda dos segundos molares decduos, pois poder ser utilizado todo o permetro do arco para alinhamento dos dentes e nenhum depender dos ajustes molares (Burdi & Moyers, 1991). Bianchini (1998) ressalta que, na fase mista, geralmente ocorre certa instabilidade das funes estomatognticas, pois, em decorrncia das perdas dentrias, que deixam espaos livres, pode acontecer um desequilbrio na mastigao bilateral. Alm disso, bastante comum a lngua ser colocada nos espaos desdentados gerando certa presso lingual. Durante esta fase de transio de uma dentio para outra, ocorrem vrias modificaes nos maxilares, j que, de 20 dentes da primeira dentio, aparecero 32 definitivos. Segundo Ferreira (1998), o aumento da arcada se faz, principalmente, pelo crescimento sseo da regio distal dos segundos molares decduos. Kohler (1992) verifica que, nesta fase, existem grandes chances de se instalar situaes anmalas no complexo dento-sseo-msculo-esqueletal, como consequncia de discrepncias de posicionamento. Estas podem ocorrer em

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relao aos dentes e parte ssea, s bases sseas entre si, ao muscular como matriz funcional determinante do crescimento sseo, ao de hbitos nocivos e ao desequilbrio de funes de respirao, deglutio e fonao. Verificam-se, na fase mista, grandes modificaes na arquitetura do dente e seu alvolo, com a reabsoro das paredes do osso, do ligamento alvolo dental e da raiz do decduo. A formao da raiz recebe o nome de rizognese e a reabsoro radcula de rizlize (Ferreira, 1998). A sobremordida (trespasse vertical dos incisivos) e a sobressalincia (trespasse horizontal dos incisivos) sofrem importantes mudanas no decorrer das denties decdua e mista. Para Burdi & Moyers (1991), a sobremordida diminui um pouco e a sobressalincia fica quase nula na dentio decdua, enquanto que, no incio da fase mista at o trmino da dentio definitiva, existe uma variao, onde a mdia de trespasse vertical aumenta ligeiramente e depois diminui. A sobremordida tem relao com alguns nmeros de dimenses faciais verticais, como a altura do ramo mandibular, levando-se em conta que a sobressalincia geralmente um reflexo da relao esqueltica ntero-posterior, e portanto sensvel disfuno da musculatura labial e lingual. Com a queda do ltimo dente decduo, encerra-se o perodo da dentio mista e inicia-se a fase da dentio permanente, que, como supe Kohler (1992), acontece por volta dos doze/treze anos de idade. Nesta poca, ainda no existem os terceiros molares, que esto em processo de formao. De acordo com o autor, a sequncia de erupo dos dentes permanentes segue a seguinte cronologia na arcada superior : primeiro molar (seis anos), incisivo central superior (7 anos), incisivo lateral superior (8 anos), primeiro prmolar (dez anos), segundo pr-molar (onze anos), canino (onze anos e cinco

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meses), segundo molar (doze anos). J para a arcada inferior a ordem um pouco diferente: primeiro molar (seis anos), incisivo central (seis anos e cinco meses), incisivo lateral (sete anos e cinco meses), canino (nove anos e cinco meses), primeiro pr-molar (dez anos), segundo pr-molar (dez anos e oito meses) e segundo molar (doze anos). Para Burdi & Moyers (1991), os dentes permanentes no comeam a erupcionar at que a coroa esteja completa. So necessrios de 2 a 5 anos para que os dentes posteriores cheguem at a crista alveolar, e de 12 a 20 meses para que alcancem a ocluso. A partir disso, em geral, as razes so completamente formadas em poucos meses. O aparecimento do dente na cavidade oral denominado poca de erupo. A erupo em poucos meses chega metade da coroa, mas o irrompimento a partir de ento segue em um ritmo mais lento. Os autores referem que a sobremordida e sobressalincia diminuem durante a segunda dcada de vida, bem como o permetro do arco dentrio. As variaes nas relaes sagitais das denties podem ter mais relao com o crescimento dos maxilares do que com problemas dentrios, como por exemplo , o desenvolvimento dos terceiros molares. Estas alteraes oclusais posteriores ocorrem devido tendncia de inclinao mesial, ao pequeno desgaste interproximal e ao contnuo crescimento mandibular. Agora, parte-se mais especificamente para a definio de ocluso dentria que , no entender de Douglas (1999), a oposio das arcadas dentrias e as foras determinadas pelos dentes pela elevao da mandbula. Qualquer movimento mandibular, em que os dentes fiquem em contato, corresponde a uma relao oclusal, motivo pelo qual deve ser analisada dinamicamente,

considerando a existncia da infinidade destas relaes. (Manns & Rocabado,

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1998; Molina, 1995). Molina (1995) relata que, durante muito tempo, este dinamismo no foi considerado. O termo ocluso implicava em um

relacionamento esttico dos maxilares nas posies de fechamento e abertura bucal. O verdadeiro conceito de ocluso deve levar em conta as relaes estticas e dinmicas com maxila, a harmonia de todos os movimentos e posies mandibulares, e o funcionamento do sistema neuromuscular. Com a erupo dos primeiros molares decduos, estabelece-se a primeira relao oclusal tridimensional. Segundo Burdi & Moyers (1991), a ocluso dos decduos posteriores ocorre de tal forma que um canino inferior posiciona-se frente do seu homlogo superior. Barbosa (1997) considera que uma porcentagem significativa de pessoas sofre de alteraes que esto relacionadas com a ocluso dentria e/ou com problemas funcionais do sistema mastigatrio. A ocluso ideal descrita por Douglas (1999) como uma perfeita

adaptao estvel entre as arcadas. Os contatos devem ocorrer simultaneamente entre todos os dentes quando esto apostos. No deve existir interferncias mandibulares, mas uma distribuio equivalente das foras oclusais nas zonas de trabalho, e que a resultante destas siga de preferncia uma direo axial. Deve haver uma situao harmnica e integridade morfo-funcional com a ATM e com todo o restante do sistema estomatogntico, bem como com o sistema neuromuscular da mandbula. Ferreira (1998) considera que a ocluso ideal no existe e nunca existir, pois seria necessrio que o indivduo tivesse uma herana pura, vivesse em um ambiente perfeito, livre de qualquer risco de sofrer acidentes, doenas ou interferncia que, por ventura, viessem modificar o padro auxolgico inerente da

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ocluso. O autor salienta ainda que ocluso normal no significa ideal, que o termo normal refere-se a mais usual. Burdi & Moyers (1991) concordam com tal afirmativa, ressaltando que consideram normal uma boca com a presena de todos os dentes ocluindo de forma estvel, saudvel e agradavelmente, com variaes na posio dental dentro de limites mensurveis. mister esperar ao final da teraputica ortodntica, uma ocluso que no seja nem normal to pouco ideal, mas que possa ser estvel na face de um determinado indivduo. Uma ocluso estvel depende da resultante das foras que agem sobre os dentes e o equilbrio destas serve para manter esta estabilidade. Alm disso, o equilbrio de todo o sistema estomatogntico pode ser considerado em termos de estabilidade oclusal (Molina, 1995; Moyers & Carlson, 1993). Storey (1991) considera significativo para a terapia ortodntica a magnitude e a direo das foras oclusais na mastigao, e a contribuio destas para a movimentao ou a estabilidade dentria. Entretanto, questiona se estas podem realmente mover os dentes, salientando que os poucos estudos realizados a esse respeito falharam, j que as foras ou so continuamente interrompidas, ou tm um componente contnuo significativo. Em um estudo experimental, no publicado, o autor deduziu que, quando os dentes apresentam estabilidade, as foras mastigatrias no so capazes de mov-los, mas, em certas disfunes como o bruxismo, elas podem ser responsveis por mobilidade dental. A fora aplicada aos dentes pode ser determinada atravs de dinammetros eletrnicos. Para Douglas (1999), os valores podem variar, sendo que nos molares chegam atingir 90kg, por causa dos msculos levantadores que tm maior funcionamento perto do ngulo da mandbula. Portanto as foras exercidas nas regies anteriores da mandbula so menores.

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As foras musculares exercidas so maiores nos molares e menores nos incisivos, mas tambm variam de pessoa para pessoa ou em determinadas raas. Os esquims possuem a maior fora mastigatria registrada entre o homem moderno. Isso comprova a relao desta com a alimentao. A fora aplicada sobre os dentes de pessoas que se alimentam de pastosos bem menor do que aquela utilizada por quem tem por hbito comer alimentos consistentes e fibrosos, devido s modificaes fsicas introduzidas na fibra periodontal (Douglas, 1999; Okeson, 1992). importante comentar que a maioria das foras produzidas nos dentes durante a mastigao so, de acordo com Oyen (1993), reabsorvidas primeiramente pelo prprio alimento e, posteriormente, pelos tecidos moles e duros que constituem o complexo: dentes membrana periodontal alvolo. A relao entre ocluso e padro alimentar discutida por vrios autores. Existem alguns relatos que consideram que, no passado, havia um menor predomnio de alteraes oclusais devido aos alimentos consumidos serem predominantemente mais duros que atualmente. Com o passar dos tempos, a correria do dia-a-dia e a procura por maior praticidade, fizeram com que a populao buscasse formas alternativas de consumo, tudo em busca de economia de tempo. A alimentao logo se modernizou tambm, as papinhas prontas, a batata frita e a comidinha congelada tornaram-se rotina para a maioria das pessoas. possvel acreditar que quem tem pouca fora mastigatria por ingerir alimentos mais moles, tem maiores probabilidades de possuir uma alterao oclusal, ou seja, ter algum problema por fazer menos uso da musculatura mastigatria. Para Marchesan(1998), isto no to evidente, j que existem muitas referncias de que os problemas oclusais so antiqussimos e parecidos com os de hoje. Ento, se a alimentao era mais consistente, no

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deveria haver tantas alteraes oclusais. A autora questiona se na realidade o fator alimentar tem relao com a ocluso e a tipologia facial. Burdi & Moyers (1991) salientam que os povos que introduzem em suas dietas alimentos speros e duros como, por exemplo, os montanheses gregos, tm uma grande extenso de desgaste nas superfcies dos dentes. Isto faz com que a mandbula, na fase da dentio decdua, assuma uma posio anterior em relao maxila, pois o crescimento mandibular maior que o maxilar nesta fase. Em consequncia, as crianas montanhesas, por volta dos 5/6 anos de idade, possuem uma relao incisiva topo-a-topo com um definido degrau mesioterminal. Sob tais condies, os incisivos permanentes erupcionam com menor sobremordida e os primeiros molares permanentes erupcionam imediatamente, numa firme neutrocluso. As crianas que no possuem o desgaste oclusal natural se acomodam a uma retrao temporria funcional mandibular durante o fechamento, levando em conta que o crescimento maior da mandbula produz interferncias oclusais naturais, geralmente na regio dos caninos. Em geral, os homens tm mais fora na mordida do que as mulheres. Em uma pesquisa, foi descoberto que nas mulheres esta varia de 35,8 a 44,9 kg enquanto que nos homens vai de 53,6 a 64,4 kg. A fora mxima que j pde ser registrada foi de 443 kg (975 libras) (Okeson,1992). Os indivduos que utilizam prtese dentria ou possuem doenas bucais apresentam, como relata Douglas (1998), uma menor fora mastigatria, j que consomem predominantemente alimentos mais amolecidos. Os desdentados, total ou parcialmente, alm de possurem limitao de fora, chegam at ficar desnutridos, pois a falta dos dentes dificulta a mastigao, levando-os diminuio da prpria ingesto alimentar.

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Molina (1995) refere que a doena periodontal, as foras disfuncionais da musculatura, hbitos como bruxismo, alteraes na posio dos dentes e anatomia dental e mobilidade aumentada, podem levar a um padro desequilibrado de foras que agem sobre os dentes. Este desequilbrio pode resultar em ocluso traumtica, pois as foras podem estar alm do limite adaptativo dos componentes do aparelho oclusal. A presso exercida sobre os dentes corresponde, segundo o estudo de Douglas (1999), fora aplicada de acordo com a rea oclusal funcional. Assim, a presso tem relao direta com a primeira e relao contrria com a rea oclusal (P=F/A). Quando exercida a mesma fora em dentes de diferentes reas, a presso ser muito maior no dente menor, mas no se pode esquecer que a fora aplicada em dentes com reas reduzidas tem que ser menor para compensar o seu tamanho inferior. Com relao s estruturas de suporte dentais, possvel verificar que tecidos sseos no toleram foras de presso, quer dizer, se for exercida fora no osso, este ser reabsorvido. Os dentes esto sempre recebendo foras oclusais, ento o ligamento periodontal que vai ajudar a control-las. Esse ligamento formado por tecido conjuntivo colagenoso que prende o dente no alvolo sseo, ficando entre a raiz e o osso alveolar. Os tecidos sseos no suportam presso, mas a tenso um estmulo para formao de osso. Portanto, o ligamento periodontal pode converter uma fora nociva (presso) em uma fora aceitvel (tenso), sendo considerado como um regulador natural de presso, que absorve as foras de ocluso no osso (Okeson, 1992). Graf, citado por Douglas (1998), descobriu que, em um adulto normal, o tempo de contato dentrio em um perodo de 24 horas de 17,5 minutos, com

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uma mdia de 0,3 segundo por contato dentrio. Esta descrio tem importncia para as funes periodontais, pois se as foras aplicadas durante a mastigao tiverem direo axial e distribuirem-se uniformemente nas fibras do periodonto, estaro contribuindo para a estabilidade da insero do dente. O estudo de Pameijer, tambm citado pelo autor, demostrou que em 71% de golpes mastigatrios, em um total de 959, realizados por adultos normais, houve contatos dentrios, e destes, em 61%, houve intercuspidao mxima. Quando existe um desgaste seletivo das cspides, ocorre uma diminuio importante da durao dos contatos dentrios durante a mastigao e, consequentemente, do tempo de atuao das foras interoclusais. Disto deve-se a relevncia dos receptores periodontais no controle das foras mastigatrias. Douglas (1999) descreve que em condies de normalidade, ou seja, com a presena de todos os dentes na boca, a rea oclusal funcional que equivale a 48,4 mm2, corresponde a aproximadamente 10% da rea oclusal anatmica (489 mm2). A rea funcional oclusal seria, por exemplo, a rea triturante utilizada na mastigao. Quando esta rea est reduzida, h uma diminuio da rea

mastigatria til, levando insuficincia mastigatria por causa oclusiva. A trajetria habitual de fechamento da mandbula corresponde ao movimento de fechar e abrir a boca lenta e automaticamente, sendo realizado pelo indivduo com sua cabea e pescoo erguidos. Tal trajetria finaliza oclusalmente, como discorre Manns & Rocabado (1998), na posio muscular de contato, que coincide com a posio mandibular quando os dentes esto em intercuspidao mxima ou posio intercuspideana (MIC). MIC corresponde relao fisiolgica dos dentes, quando esto realizando funes

estomatognticas, como a mastigao e deglutio. importante ressaltar, que

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na posio intercuspidiana (em cntrica), os dentes molares e pr-molares (posteriores) tm por funo realizar um freio vertical dos movimentos mandibulares de fechamento, impedindo, deste modo, que esta funo seja realizada pelos dentes anteriores (ocluso mutuamente protegida). Para isso, os dentes de trs devem requerer um padro de ocluso com contatos mltiplos, bilaterais, simtricos e simultneos. Para os autores, a ocluso mutuamente protegida ocorre tambm em excntrica, onde os dentes anteriores protegem os posteriores. Nos movimentos mandibulares contactantes excntricos a partir da posio intercuspideana, os dentes anteriores tm por funo direcionar a mandbula para estas posies, desocluindo os posteriores. Essa guia dentria anterior ocasiona uma diminuio da atividade eletromiogrfica da musculatura elevadora da mandbula,

minimizando o efeito patolgico que as foras produzidas por esses msculos, nestas posies excntricas, podem causar ao sistema estomatogntico. Okeson (1992) explica o mecanismo de ocluso mutuamente protegida de forma um pouco mais simplista: os dentes posteriores possuem um bom funcionamento para suportarem foras exercidas durante o fechamento da boca, sendo que esta boa aceitao deve-se ao posicionamento destes na arcada. Os dentes anteriores, ao contrrio, possuem um posicionamento que favorece o suporte das foras dos movimentos mandibulares excntricos. Esta condio oclusal, em que os dentes posteriores contatam ligeiramente com mais fora que os anteriores em relao cntrica, denominada proteo mtua. O espao de inocluso fisiolgica , de acordo com Douglas (1999), a distncia entre as arcadas dentrias quando a mandbula est em sua posio postural habitual, sendo que este espao pode variar de 1 a 3 mm. Okeson (1992)

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considera que o espao de inocluso vai de 2 a 4 mm abaixo da posio intercuspidal, podendo variar de acordo com a posio da cabea. Ferreira

(1998) salienta que a inocluso fisiolgica esttica corresponde a uma posio fisiolgica da mandbula em que ela se separa do maxilar por uma distncia mnima, dependente da contrao muscular necessria para resistir a fora da gravidade. Este espao relaciona-se ao tipo de face e ocluso dentria e quanto menor o espao, ser mais frequente a contrao dos massteres durante a deglutio. A ausncia da inocluso e consequente contrao muscular pode gerar hbitos parafuncionais como bruxismo e alterao na ATM (Bianchini, 1998). Quando os dentes entram em ocluso cntrica este espao desaparece, e segundo Douglas (1999), possvel verificar as tenses da mandbula nesta posio com o gnatotensimetro de Posselt. Existem tambm as posies oclusais excntricas, que esto relacionadas ao deslizamento em ocluso (lateralidade ou protruso), regidas por interferncias cuspdicas. O autor acredita que a posio oclusal da mandbula determinada pela erupo dos dentes, pelo comeo da intercuspidao e pela existncia da maturao neuromuscular. A posio ideal possibilita um mximo contato oclusal e um mnimo de tenso nas razes e ATM. A situao de homeostase oclusal atingida quando existe uma situao de equilbrio entre osso, msculo e dente. Douglas (1999) refere que equivale soma das foras dinmicas que atuam sobre o dente, sendo estas controladas pelo sistema proprioceptivo da boca. Esta afirmao vai de encontro ao estudo de Moyers & Carlson (1993), pois consideram que a homeostase depende de

elaborados mecanismos sensoriais de feedback da ATM, da membrana periodontal e o restante do sistema mastigatrio.

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Outros aspectos relevantes para a homeostase oclusal correspondem s tendncias naturais de deslocamento mesial dos dentes, participao da musculatura, ao componente anterior da fora, ao crescimento craniofacial e ao crescimento e remodelamento do osso alveolar (Moyers & Carlson, 1993). Os autores acreditam na fundamental importncia dos mecanismos neuromusculares e fatores de crescimento sseo para as relaes oclusais. Estas relaes so atualmente consideradas instveis, j que as adaptaes oclusais devem ocorrer constantemente para acomodar possveis alteraes do esqueleto craniofacial e da neuromusculatura. correto supor que talvez a melhor ocluso seja a que mais facilmente se adapta s funes em transformao. Pensando assim so considerados os mecanismos adaptativos como necessrios e acredita-se que h um tipo de regenerao do sistema oclusal que auxilia na manuteno da homeostase oclusal. Qualquer teraputica sem homeostase funcional est destinada ao fracasso clnico (Burdi & Moyers, 1991).

Classificao para a M Ocluso Dentria

Classificar uma m ocluso orden-la em classes de anomalias similares, levando em considerao o tipo e forma do desvio, grau e natureza, tendo em mente a ocluso normal (Petrelli,1992). No estudo da ocluso dentria, o conceito de normalidade associado ao termo mais frequente e admite variaes, pois verifica-se que um desvio em torno da mdia caracteriza a maior parte das ocluses existentes (Ferreira, 1998).

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Segundo Molina (1989), uma dentio equilibrada mantida por mecanismos de adaptao articulares, musculares, periodontais e dentais, que so ajustes fisiolgicos praticamente no percebidos pelo indivduo e que ocorrem durante toda sua vida. J que para o entendimento do patolgico faz-se necessrio ter a concepo de normalidade, sero explicitadas antes das classificaes de Angle, Lisher, Moyers, Simon e Acckerman-Proffit, as chaves de ocluso normal. s seis chaves de ocluso normal propostas por Angle (1907) e Andrews (1972) foram acrescidas quatro chaves, referidas no estudo de Ferreira (1998). So elas: configurao dos arcos dentais; equilbrio dos dentes; guias de ocluso dinmica e harmonia facial, pois estas so essencias ao sucesso do tratamento ortodntico, se o objetivo for atingir uma ocluso normal. A primeira das dez chaves de ocluso a relao molar, ou chave de molar de Angle, em que a cspide mesiovestibular do primeiro molar superior oclui no sulco mesiovestibular do seu homlogo inferior. Alm disso, para que haja uma ocluso normal deve existir o contato vertente distal da cspide distovestibular do primeiro molar superior permanente com a superfcie mesial da cspide mesiovestibular do segundo molar inferior permanente. A chave dois a angulao mesiodistal dos dentes, e significa que as pores gengivais dos longos eixos de todas as coroas ficam mais distais que as pores incisais. Esta angulao o resultado da atuao de foras provenientes da musculatura mastigatria. Alm desse fator, as estruturas contrteis que seguem a deglutio e os planos inclinados cuspdeos exercem efeito no posicionamento mesiodistal do longo eixo dos dentes, criando um componente da mesializao, favorecendo a movimentao dentria neste sentido.

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A inclinao vestibulolingual representa a chave trs. Os dentes permanentes no so implantados perpendicularmente nos processos alveolares como os de leite, mas seguem a direo dos raios de uma esfera, na qual o centro est a trs milmetros para trs do ponto antropomtrico nsio. A inclinao axial dos dentes tem ntima relao com o torque, representado por uma fora de toro. No arco superior, a raiz dos incisivos centrais esto bastante inclinadas na direo palatina. Esta inclinao menor nos incisivos laterais e caninos, chegando quase a anular-se nos pr-molares e molares. No arco inferior, os incisivos centrais e laterais tm inclinao lingual, que mais reduzida nos caninos. O primeiro pr-molar implantado verticalmente e, a partir do segundo pr-molar, o longo eixo radicular inclina-se vestibularmente, aumentando medida em que o arco distalizado. A inclinao vestibulolingual tem um plano de resistncia em relao aos esforos funcionais que se manifestam sobre o sistema mastigador, no qual se obtm um adequado equilbrio de suas partes. A chave quatro referente s reas de contato interproximal rgidas. Significa que no devem haver espaos entre os dentes e, se por qualquer razo (cries, m posio dental), as reas de contato forem destrudas, ocorrer uma ruptura no equilbrio entre os dentes contguos, ocasionando traumas para o lado das estruturas de suporte dental. Os dentes se contatam por meio de suas faces proximais. Assim sendo, a face distal de um dente est em contato com a mesial do seguinte, com exceo dos incisivos centrais que se tocam pelas faces mesiais, e os ltimos molares que tm suas faces distais livres. O local da rea de contato depende de cada dente. Os incisivos se tocam prximo borda incisal, os caninos, pr-molares e molares, possuem sua rea de contato no tero oclusal do dente, deslocada em sentido oclusocervical.

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A conformao dos arcos dentais corresponde chave cinco. A forma do arco decduo semicircular, sofrendo mudanas aps a erupo do primeiro molar permanente. Quanto configurao do arco permanente, existem diferentes relatos entre os autores que o consideram elptico, parablico, em V, em U, circular, em lira, em elipse, e outros formatos so citados na literatura. A chave seis titulada como ausncia de rotaes dentais. A perfeita ordenao dos dentes nos arcos s possvel se no ocorrerem rotaes nos dentes, pois estas alteram a harmonia dos arcos, modificando suas dimenses, ocasionando um inadequado encaixe entre os antagonistas. A chave sete refere-se curva de Spee. Esta curva corresponde linha que une o pice das cspides vestibulares dos dentes superiores. Seu ponto inferior fica em correspondncia com a cspide mesiovestibular do primeiro molar permanente. Em razo da direo dos dentes decduos ser quase perpendicular a um plano que toca as bordas incisais e oclusais, estes no formam curva de Spee. A curva de compensao dependente do caminho realizado pelo cndilo, que se adapta configurao anatmica da fossa glenide, relacionando-se forma e ao tamanho das cspides dentais e inclinao axial da dentio permanente. Durante os movimentos mandibulares, os dentes estabelecem algum tipo de contato por um perodo de tempo prolongado. A curva de Spee compensa as trajetrias condilar, molar e incisiva durante estes movimentos. A intercuspidao dental melhora quando a curva de Spee suave. Se os dentes fossem implantados perpendicularmente, a resistncia oferecida durante a mastigao exerceria presses no favorveis estabilidade do conjunto.

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A chave oito relativa as guias de ocluso dinmica. Para que haja uma ocluso normal, alguns quesitos precisam ser estabelecidos: as resultantes das foras oclusais devem seguir uma direo axial; deve haver estabilidade mandibular; no pode existir interferncia nos dentes posteriores no lado de trabalho nos movimentos de lateralidade (para isso, necessita existir desocluso no lado de balanceio nos movimentos de lateralidade; desocluso dos dentes posteriores em movimento protrusivo; guia incisal em harmonia com os movimentos bordejantes e espao funcional livre correto). No lado de trabalho, as relaes de contato entre dentes superiores e inferiores podem ser: funo de grupo ( quando, no lado de trabalho, todas as cspides vestibulares superiores e inferiores se tocam, de canino a molar, distribuindo foras laterais a este grupo de dentes) e guia canino (quando atravs do canino h uma desocluso de todos os dentes em excurses laterais). A chave nove o equilbrio dental. Qualquer tratamento, mesmo o puramente esttico, deve levar em considerao as foras funcionais provenientes dos dentes, ligamentos, msculos mastigadores e da mmica, da lngua, do palato e da faringe. A falta de equilbrio entre estes fatores ocasiona a perda da ocluso normal. Alguns aspectos devem ser levados em conta para o estabelecimento do equilbrio dental. So eles: a pequena mobilidade do dente, a necessidade de que o eixo geomtrico e o funcional dos dentes estejam coincidentes, e a teoria adotada pelo profissional. Os fatores mecnicos responsveis pelo equilbrio dental so: foras motoras (provenientes da ao da musculatura da mastigao); foras resistentes e resistncia passiva (reveladas pelos prprios dentes, que se opem ao deslocamento vertical e mesiodistal; pelo alvolo que se ope ao aprofundamento

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do dente; e pela musculatura labioglossogeniana); elementos que distribuem as foras motoras (as foras que atuam sobre os dentes o fazem seguindo vrias direes, sendo que os planos inclinados das cspides que dividem a fora, assim os choques so melhor suportados e a triturao dos alimentos mais perfeita); coxim-elstico (graas a este coxim, representado pelo ligamento alveolodental, os choques que os dentes recebem so amortecidos). Agora, preciso entender como ocorre o equilbrio dental nos sentidos vestibulolingual, mesiodistal e vertical. Vrios quesitos asseguram o equilbrio vestibulolingual, agindo de forma diversa nos dentes anteriores e posteriores, no seu estado esttico e dinmico (durante a mastigao). Nos dentes posteriores, o equilbrio obtido no estado esttico pela dupla ao da musculatura jugo-lingual. No dinmico, o esforo realizado na mastigao produzido de acordo com o prprio eixo do dente. Alm disso, intervm os planos inclinados que, estabelecendo o equilbrio, impedem a ruptura. Com relao aos dentes anteriores, a ao da musculatura lbio-lingual realiza o equilbrio esttico e dinmico. O equilbrio das foras no segue o eixo do dente. Neste caso, a componente horizontal bem superior vertical, e o equilbrio pode romper no sentido vestibular, se no existir a oposio da musculatura labial. Os lbios tambm se opem ruptura do equilbrio durante a fonao, como na pronncia dos fonemas linguais. O aspecto primordial para a manuteno do equilbrio mesiodistal conseguido atravs do apoio dos dentes proximais, em que um dente est encostado no outro. Quando a queda dos decduos ocorre de forma natural, rapidamente o sucessor ocupa o espao vago, com o objetivo de evitar o equilbrio mesiodistal. Quando a queda acontece antes do tempo previsto, o

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desequilbrio total. O mesmo dito com respeito aos permanentes, pois, quando ocorre perda de um ou mais dentes no arco, ocorre a mesializao dos que o tocavam antes. Dois fatores so contribuintes para o equilbrio vertical: a fora mastigatria (impede que o dente saia do alvolo, entretanto ela ocorre intermitentemente, a cada deglutio, onde exercida presso sobre os dentes) e o ligamento alveolodental (evita o aprofundamneto do dente no alvolo, decompondo as foras que agem nos dentes em tenso parede alveolar). A chave dez a harmonia facial. A harmonia das linhas faciais e o equilbrio entre suas partes, incluindo os dentes, imprescindvel para se atingir uma ocluso normal. Angle refere que ao ortodontista cabe moldar a forma facial mediante a ocluso, conferindo ares de escultor a esse profissional. Para classificar uma m ocluso, no basta analisar a relao do primeiro molar permanente separadamente. Devero ser cuidadosamente observados o perfil esqueltico, a relao dos caninos, a relao incisal e a relao da dentio do paciente com suas bases sseas. A classificao realizada por motivos tradicionais, para facilidade de referncia e autocomunicao e para que exista a possibilidade de comparao (Moyers, 1991). Segundo o autor, de todas as propostas de classificao inventadas at hoje, a de Angle e a de Simon so as mais utilizadas, sendo a primeira integralmente, e a segunda usada em sua totalidade por poucos clnicos. O sistema de Angle (1907) baseado nas relaes ntero-posteriores entre mandbula e maxila. Essa teoria baseada na estabilidade do primeiro molar permanente na arcada dentria. Moyers (1991) relata que estudos cefalomtricos no confirmam tal hiptese.

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Durante muito tempo, de acordo com o autor, esta relao dos primeiros molares permanentes levou os clnicos a pensarem somente em posio de dentes, esquecendo-se do prprio esqueleto facial. O desempenho anormal da musculatura e as alteraes no crescimento sseo eram postos de lado e, at hoje, existe uma forte tendncia em centrar ateno demasiada ao

posicionamento dental. A relao do primeiro molar muda durante as diversas fases da dentio. O sistema de Angle no considera as discrepncias num plano vertical ou lateral. A melhor maneira de utilizar este sistema usar os grupos para classificar as relaes esquelticas. Por exemplo, uma relao molar de classe II pode originar em diferentes aspectos, cada um pedindo uma estratgia no tratamento, enquanto o padro esqueltico da classe II tem mais chances de ser bem compreendido, pois controla a ocluso e seu tratamento. Vale lembrar que atualmente os clnicos usam o sistema de Angle de forma diversa da originalmente apresentada, j que as bases da classificao no so mais os molares e sim as relaes esquelticas. Apesar de algumas crticas, a classificao de Angle a mais tradicional, mais prtica, mais popular e, como j comentado, mais usada at os presentes dias (Moyers, 1991). As classes de m ocluso foram divididas em I, II e III. Na classe I, h uma relao ntero-posterior normal, evidenciada pela chave de molar. preciso lembrar que a cspide mesiovestibular do primeiro molar superior permanente deve ocluir no sulco mesiovestibular do homlogo inferior. As anomalias encontradas so apenas de posio dentria, onde os problemas oclusais so geralmente de apinhamentos, diastemas, ms posies dentrias individuais, mordida aberta, mordida profunda, mordida cruzada e biprotruso. Nos casos de mordida aberta ou biprotruso, o perfil facial pode ser

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convexo, mas frequente encontrar, em pacientes classe I, um perfil facial reto e equilbrio na musculatura mastigatria, peribucal e lingual (Ferreira, 1998). So classificadas como classe II de Angle as ms ocluses, onde a cspide distovestibular do primeiro molar permanente superior oclui com o sulco mesiovestibular do primeiro molar inferior. A ocluso dos outros dentes tambm segue esta relao distal, em que os inferiores esto em posio posterior em relao aos superiores (Petrelli, 1992). comum apresentarem desequilbrio na musculatura facial pacientes classe II em decorrncia da

sobressalincia aumentada. O perfil facial geralmente convexo (Ferreira, 1998). Na classe II, diviso 1, a chave de molar est em classe II, mas os incisivos superiores esto vestibularizados. O j citado desequilbrio muscular pode apresentar-se com o lbio inferior hipertnico e o superior hipotnico. A arcada superior pode estar atrsica, a lngua no toca o palato quando em repouso, ficando assentada no assoalho bucal. Na deglutio, existe alterao na musculatura do mento e uma adaptao da lngua, que pode projetar-se anteriormente, favorecendo a lingualizao de pr-molares e molares superiores, e gerando, em alguns casos, mordidas cruzadas. Pode ser encontrado, associado a esta m ocluso, algum hbito vicioso como suco digital ou de chupeta, alm de ser comum este tipo de ocluso em respiradores bucais. tambm frequente a presena de mordida aberta (Petrelli, 1992). Existe a possibilidade de se encontrar mordida profunda na classe II, diviso 1, j que o contato oclusal dos incisivos est alterado pelo trespasse horizontal. E os incisivos tendem a extruir, aprofundando a mordida. Ms posies dentais individuais tambm so encontradas (Ferreira, 1998).

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A classe II, diviso 2, apresenta a chave de molar em classe II, mas os incisivos centrais superiores esto lingualizados ou verticalizados, e os incisivos laterais esto vestibularizados. Em certos casos, pode-se encontrar todos os incisivos superiores lingualizados, bem como os caninos superiores

vestibularizados. Os perfis faciais mais comuns so o reto e o levemente convexo, associados a uma atividade muscular normal ou ligeiramente alterada. possvel encontrar mordida profunda anterior, principalmente se no houver contato entre incisivos. A arcada superior raramente atrsica, sendo maior que o normal na regio intercaninos (Petrelli, 1992). Segundo Moyers (1991), quando a distocluso ocorre somente de um lado da arcada dentria, utilizado o termo subdiviso, que pode ser direita ou esquerda, de acordo com o lado afetado pela m ocluso. As ms ocluses em que h uma relao anterior da mandbula em relao maxila so enquadradas na classe III. O sulco mesiovestibular do primeiro molar permanente inferior oclui anteriormente cspide mesiovestibular do primeiro molar permanente superior. A classe III pode estar associada a uma hiperplasia mandibular, sendo que, geralmente, existe mordida cruzada anterior, com os incisivos inferiores lingualizados (Petrelli, 1992). De acordo com Ferreira (1998), o perfil facial , em geral, cncavo e a musculatura encontra-se em desequilbrio. Podem ser encontrados problemas de falta ou excesso de espao no arco, mordidas abertas ou profundas e ms posies dentais individuais. Caso somente um dos lados esteja em classe III, tambm empregado o termo subdiviso. Lisher (1911) fez uma classificao onde considerada a posio individual dos dentes. acrescentado o sufixo verso a uma palavra que define a alterao do dente em relao a sua posio normal. So utilizados os

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seguintes termos: mesioverso (significa que o dente est mesializado em relao sua posio normal); distoverso (distal posio normal); linguoverso (lingual posio normal); labioverso (o dente est vestibularizado em relao ao normal); infraverso (a face oclusal do dente est abaixo do plano oclusal); supraverso (acima do plano oclusal); axiverso (alterao da inclinao do longo eixo dental); transverso (o dente est em posio trocada no arco com outro dente); giroverso (rotao do dente em torno do seu eixo) e perverso (impactao do dente, por falta de espao no arco). Estes termos podem ser combinados para denominar um dente que possui mais de uma alterao. Por exemplo, inframesioverso, axiogiroverso, mesiolinguosupraverso, e outras combinaes so possveis. A classificao de Lisher (1911) considera tambm as variaes verticais de grupos de dentes (sobremordida profunda e mordida aberta) e as variaes transversais (mordida cruzada). A sobremordida profunda refere-se ao trespasse exagerado dos incisivos no sentido vertical. A mordida aberta o termo utilizado quando existe ausncia localizada de ocluso enquanto os dentes restantes esto ocluidos; mais comum na parte anterior da boca. J a mordida cruzada representa uma relao vestibulolingual anormal dos dentes. O cruzamento mais encontrado aquele visto quando as cspides vestibulares de alguns dos dentes posteriores do arco superior ocluem lingualmente com as cspides vestibulares dos inferiores. Quando um ou mais dentes superiores esto em mordida cruzada, na direo da linha mdia, denomina-se mordida cruzada lingual. Quando as cspides linguais dos dentes maxilares posteriores ocluem completa e vestibularment