Ocorrência de desacato
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Gustavo Lima Carvalho
Belo Horizonte 2011
A ATUAO POLICIAL-MILITAR EM OCORRNCIAS DE
DESACATO E O ENVOLVIMENTO DE AUTORES
EMBRIAGADOS
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Gustavo Lima Carvalho
Monografia apresentada Academia de Polcia Militar de Minas Gerais, Centro de Ensino de Graduao, como requisito parcial para aprovao no Curso de Formao de Oficiais da Polcia Militar e para a obteno do ttulo de Bacharel em Cincias Militares com nfase em Defesa Social. Orientador: Professor Marcos Passagli
Belo Horizonte 2011
A ATUAO POLICIAL-MILITAR EM OCORRNCIAS DE
DESACATO E O ENVOLVIMENTO DE AUTORES
EMBRIAGADOS
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Dedico este trabalho a todos os bons policiais militares que trabalham pelo bem da sociedade.
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Agradeo a Deus, por ter me dado foras para vencer mais essa batalha. A meus pais, por todo apoio e confiana em mim e em meu trabalho. A meus irmos, por todo o apoio e carinho. A minha namorada, Edilaine, pela compreenso e apoio incondicional em todos os momentos. A meu orientador, Professor Marcos Passagli, pela importantssima contribuio, dedicao e profissionalismo dispensados durante a confeco deste trabalho. A meus amigos de turma, pelos bons momentos vividos durante esses trs anos de curso e pelos exemplos de amizade verdadeira. Meus sinceros agradecimentos.
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Alguns soldados tambm perguntaram a Joo Batista o que deveriam fazer, Ele respondeu: No maltratem ningum; no faam acusaes falsas, e fiquem contentes com o salrio de vocs.
Lucas 3:14
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RESUMO
O presente trabalho acadmico teve como foco analisar a atuao policial-militar em
ocorrncias de desacato e em especial aquelas que os autores do crime
apresentavam sinais de embriaguez, seja pelo consumo de bebidas alcolicas ou
pelo uso de substncias de efeitos anlogos. Quanto ao crime de desacato foi
desenvolvida uma linha de raciocnio, a partir de pesquisas bibliogrficas, que partiu
desde as bases histricas desse tipo penal at a sua aplicao na atividade policial
nos dias de hoje. Sobre a embriaguez inicialmente foram analisadas as bases
conceituais que tratam sobre esse estado transitrio em que o indivduo privado de
sua capacidade normal de entendimento, para que a posteriori fosse relacionada
evoluo histrica do tratamento penal da embriaguez. Essa temtica envolve, de
um lado o problema da violncia derivada do consumo abusivo de lcool ou outras
drogas, e a proteo do direito coletivo, em que uma fico jurdica criada para
resolver questes de segurana. Trata-se, portanto, da teoria da actio libera in
causa, em que o indivduo em um estado de no-imputabilidade pratica uma ao
punvel que se colocou voluntariamente com o fim de pratic-la, ou prevendo ou
devendo prever, que assim, a praticaria. Na pesquisa de campo, foram analisadas
as decises dos tribunais referente ao cometimento do crime de desacato por
autores embriagados e os registros de ocorrncias desse tipo penal na rea da 6
Companhia Especial, do 1 Batalho de Polcia Militar, no ano de 2010. Ao final da
pesquisa, foi possvel confirmar a hiptese de que a atuao policial-militar em
ocorrncias de desacato, envolvendo autores embriagados, no fornece elementos
necessrios ampla defesa e o contraditrio do conduzido em um possvel processo
penal, uma vez que no constavam no histrico da ocorrncia elementos indicativos
da presena da embriaguez.
Palavras-chave: atuao policial-militar; desacato; embriaguez; lcool; drogas de
efeitos anlogos.
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ABSTRACT
This academic work has focused on analyzing the military-police action in
occurrences of desacato and particularly those which the perpetrators showed signs
of intoxication, either by consumption of alcoholic beverages or use of substances
with similar effects. As for the crime of desacato has been developed a line of
reasoning, from literature searches, which departed from the historical basis of such
criminal to the police activity in your application today. About the inebriation were
initially analyzed the conceptual foundations that deal with this transitional state in
which the individual is deprived of its normal capacity of understanding, so that the
posteriorly was related to the historical evolution of the penal treatment of inebriation.
This subject involves on the one hand the problem of violence stemming from the
abuse of alcohol or other drugs, and protection of collective rights, which is a legal
fiction created to solve security issues. It is, therefore, the theory of action libera in
causa, in which the individual in a state of non-liability practice a punishable action in
which he stood voluntarily in order to practice it, or providing or has provided, so that
to practice. In field research, we analyzed the decisions of the courts for the
commission of the crime of desacato intoxicated authors and records of criminal
incidents of this kind in the area of the 6th Special Company, the 1st Military Police
Battalion, in 2010. At the end of the study, it was possible to confirm the hypothesis
that the military-police action in occurrences of desacato involving intoxicated
authors, does not provide the necessary elements of the adversarial legal defense
and conducted in a possible criminal proceedings, since it did not figure in history
occurrence of elements indicative of the presence of inebriation.
Keywords: military-police action, desacato, inebriation, alcohol, drugs with similar
effects.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
PMMG -
PM -
IPM -
CFO -
BPM -
CIA PM -
CIA ESP -
PMs -
REDS -
MP -
CP -
JECRIM -
STJ -
OAB -
ADIn -
TRF -
ACR -
DJU -
DIAO -
SIDS -
CINDS -
LCP -
j. -
Polcia Militar de Minas Gerais
Polcia Militar
Inqurito Policial Militar
Curso de Formao de Oficiais
Batalho de Polcia Militar
Companhia de Polcia Militar
Companhia Especial
Policiais Militares
Registro de Eventos de Defesa Social
Ministrio Pblico
Cdigo Penal
Juizado Especial Criminal
Superior Tribunal de Justia
Ordem dos Advogados do Brasil
Ao Direta de Inconstitucionalidade
Tribunal Regional Federal
Apelao Criminal
Dirio da Justia da Unio
Diretriz Integrada de Aes e Operaes
Sistema de Defesa Social
Centro Integrado de Informaes de Defesa Social
Lei de Contravenes Penais
Julgado em
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SUMRIO
1 INTRODUO ..........................................................................................
10
2 CARACTERIZAO DO OBJETO DE ESTUDO .................................... 12
2.1 Tema ......................................................................................................... 12
2.2 Delimitao do tema ................................................................................. 12
2.3 Justificativa ................................................................................................ 12
2.4 Objetivos ................................................................................................... 14
2.4.1 Objetivo Geral ........................................................................................... 14
2.4.2 Objetivos Especficos ................................................................................ 14
2.5 Problema ................................................................................................... 14
2.6 Hiptese .................................................................................................... 15
2.7 Variveis .................................................................................................... 15
2.7.1 Varivel independente .............................................................................. 15
2.7.2 Variveis dependentes ..............................................................................
15
3 METODOLOGIA ....................................................................................... 16
3.1 Mtodos de abordagem do tema .............................................................. 16
3.2 Mtodos de procedimentos ....................................................................... 17
3.3 Tipos de pesquisa ..................................................................................... 18
3.3.1 Quanto aos objetivos ................................................................................ 18
3.3.2 Quanto aos procedimentos tcnicos ......................................................... 18
3.3.3 Quanto forma de abordagem ................................................................. 19
3.3.4 Quanto tcnica de coleta de dados ........................................................ 19
3.4 Tcnicas de pesquisa ............................................................................... 19
3.5 Universo da pesquisa ................................................................................
20
4 A AUTORIDADE POLICIAL-MILITAR E A BASE CONSTITUCIONAL... 21
4.1 Os limites da autoridade do policial militar ................................................ 24
4.1.1 Aspectos gerais da Administrao Pblica ............................................... 25
4.2 Polcia Militar: definio e atividade .......................................................... 27
4.2.1 As origens histricas da Polcia Militar no Brasil ....................................... 31
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5 PARA UMA DEFINIO TERICA SOBRE O CRIME DE DESACATO. 34
5.1 A criminalizao do desacato e os impasses polticos ............................. 36
5.1.1 O crime de desacato definido com tipo penal aberto ................................ 38
5.2 Classificao doutrinria do crime de desacato ........................................ 39
5.2.1 O Bem jurdico tutelado ............................................................................. 41
5.2.2 Os sujeitos do crime de desacato ............................................................. 42
5.2.3 Os nexos de causalidade e funcional do desacato ................................... 43
5.2.4 Os elementos subjetivo e objetivo do tipo penal ....................................... 45
5.2.5 A consumao do desacato e a possibilidade de tentativa ...................... 48
5.3 O conflito aparente de normas entre o desacato e outros crimes mais
comuns na atividade policial-militar ..........................................................
48
6 A EMBRIAGUEZ E AS SUAS CONSEQUENCIAS PARA O DIREITO
PENAL ......................................................................................................
51
6.1 As classificaes da embriaguez............................................................... 56
6.1.1 A medio da dosagem de lcool no organismo ...................................... 58
6.1.2 As modalidades da embriaguez .............................................................. 61
6.2 A embriaguez e a responsabilidade penal: teoria da actio libera in
causa..........................................................................................................
63
6.2.1 Crticas teoria da actio libera in causa ................................................... 70
6.3 O crime de desacato e a embriaguez ....................................................... 72
6.3.1 Jurisprudncias .........................................................................................
73
7 O ATENDIMENTO DE OCORRNCIAS DE DESACATO COM BASE
NA DIRETRIZ INTEGRADA DE AES E OPERAES (DIAO) ..........
77
8 INTERPRETAO E ANLISE DE RESULTADOS ...............................
79
9 CONSIDERAES FINAIS ......................................................................
86
REFERNCIAS ......................................................................................... 90
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1 INTRODUO
A Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG) tem a misso constitucional da
manuteno da ordem pblica, por meio da execuo do policiamento ostensivo.
Cabem aos policiais militares intervirem em situaes-problema do dia-a-dia, agindo
de acordo com os princpios da administrao pblica, principalmente os da
legalidade e da moralidade.
A atuao policial se mostra extremamente tcnica nas vrias ocorrncias atendidas
pelos integrantes da PMMG, os quais integram o Sistema de Defesa Social. Para
atuar nas ruas, o policial militar precisa ter conhecimento em diversas reas de
estudo, dentre elas: direito, criminologia, psicologia e tcnica policial.
necessrio compreender que, no atendimento s ocorrncias policiais, cada
situao mostra-se de maneira distinta, o que exige do agente de segurana pblica
preparo tcnico-cientfico. Assim, importante trazer ao conhecimento dos policiais
as informaes jurdicas mais relevantes, que dizem respeito s suas atividades,
desde o momento em que vo para as ruas at quando realizam a priso de um
agente de infrao penal.
A PMMG investe, atualmente, em uma formao profissional baseada no respeito
dignidade da pessoa humana e na participao comunitria por meio de
treinamentos prticos e de uma gama de disciplinas tericas, que possibilitam a
formao de um profissional preparado. No basta que os agentes de segurana
pblica estejam treinados somente nos campos da tcnica e ttica policiais,
necessrio, tambm, um aperfeioamento no campo das cincias jurdicas, a fim de
que pautem suas aes de acordo com o princpio da legalidade, nos moldes
determinados pelo Estado Democrtico de Direito, em que abusos contra esse
princpio implicam em um descompromisso no s com o Direito, mas com a prpria
democracia.
Chamado para muitas vezes intervir em situaes da ecloso de crimes ou
contravenes penais, o policial militar precisa ter o conhecimento das leis e de sua
aplicao. Possuir somente o entendimento gramatical do ordenamento jurdico no
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o suficiente para agir com excelncia, importante entender a aplicao, e mais
ainda, dominar a forma de agir em determinada situao, aliando a prtica teoria.
Nesse contexto, da aplicao multidisciplinar na atuao policial-militar, que se faz
necessrio o esclarecimento sobre a questo jurdico-doutrinria da atuao do
policial militar em ocorrncias de desacato, especialmente naquelas em que o autor
desse delito apresenta sintomas de embriaguez.
Relacionado a esse tema, o da importncia da matria jurdica e a sua aplicao na
atividade policial, temas como carreira jurdica, incluso do requisito de Bacharel em
Direito para admisso no Curso de Formao de Oficiais (CFO) e ciclo completo de
polcia passaram a se tornar comuns no cotidiano policial-militar e possivelmente
alteraro a forma do atendimento s ocorrncias policiais.
A interdisciplinaridade contribui para a formao de um profissional mais habilitado,
que por meio de conceitos adquiridos e discutidos em matrias diferentes age de
maneira mais completa e eficaz. nesse contexto que a relao entre a medicina, o
direito e as cincias forenses tornam-se to importantes na resoluo de ocorrncias
de desacato com autores que apresentam sua capacidade intelecto-volitiva
modificada pela ingesto de lcool ou substncias de efeitos anlogos.
Assim, so necessrios estudos aprofundados que esclaream as principais
divergncias e dvidas, com a finalidade de calcar a discusso e reflexo tericas de
temas tpicos da atividade policial para facilitar o dia-a-dia do PM. O importante
no focar somente na defesa dos direitos individuais, mas sim indicar ao policial
quais as melhores medidas a serem adotadas, segundo a doutrina e jurisprudncia,
de acordo com o caso concreto.
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2 CARACTERIZAO DO OBJETO DE ESTUDO
2.1 Tema
A atuao policial-militar em ocorrncias de desacato e o envolvimento de autores
embriagados.
2.2 Delimitao do tema
O presente estudo baseia-se na anlise das ocorrncias registradas no perodo dos
meses de janeiro a dezembro de 2010, na rea da 6 Companhia Especial (Cia Esp)
do 1 Batalho de Polcia Militar (BPM). Foram analisadas as ocorrncias de
desacato registradas na rea da referida companhia, em especial aquelas em que o
autor apresentava sinais de embriaguez, seja por uso de bebidas alcolicas ou pelo
uso de substncias que causam efeitos anlogos aos das bebidas.
Tal subrea apresenta duas caractersticas bastante peculiares que so a presena
de inmeros estabelecimentos de entretenimento que vendem bebidas alcolicas, e
o grande nmero de pessoas que ocupam um pequeno espao territorial. Um item
facilitador para esse estudo foi o fato da presena do Registro de Eventos de Defesa
Social (REDS), em que os dados so tratados a partir de um banco informatizado, o
que assegura uma maior confiabilidade no tratamento das informaes.
2.3 Justificativa
Para iniciar o estudo sobre o tema proposto necessrio verificar a importncia
desse assunto tanto para a Polcia Militar de Minas Gerais quanto para os
integrantes dela, dadas as novas demandas que a sociedade tem apresentado para
essa organizao. Dentre as vrias exigncias, destacam-se o respeito dignidade
da pessoa humana, o respeito aos princpios constitucionais e uma polcia orientada
para resultados, voltada para a garantia dos direitos das pessoas. necessrio,
portanto, expor os motivos de ordem terica e prtica que tornam esta pesquisa
importante.
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Dessa forma, a incluso da discusso terica, envolvendo basicamente as doutrinas
do direito e da medicina aplicadas na atividade policial, contribuir para o
clareamento da teoria e da resoluo de pontos obscuros sobre situaes em que
autores cometem o crime de desacato sob influncia de lcool ou substncias
anlogas. So temas como esse que surgem no dia-a-dia do policial militar e que
requerem dele conhecimento interdisciplinar para a resoluo de ocorrncias de
forma eficaz.
Atualmente, no contexto da atividade policial, no cabe ao PM agir por impulsos,
sem o devido conhecimento tcnico. Tal comportamento no pode ser aceito aos
integrantes de uma instituio que prima pela excelncia nos servios prestados.
Somente estar agindo corretamente aquele profissional de segurana pblica que
atua conforme o princpio da legalidade.
O crime de desacato aquele em que a vtima o funcionrio pblico, que age na
funo ou em razo dela. O autor o cidado que desrespeita o funcionrio nessa
mesma situao. Esse crime, em que o PM a vtima, pode tornar-se mais
complexo quando a autor apresenta sintomas de embriaguez e possivelmente
comportamento mais violento e maior resistncia s ordens da autoridade policial.
Assim, fundamental o estudo e anlise das ocorrncias de desacato a fim de se
estabelecer um padro no atendimento dessa natureza, a partir do tratamento dos
dados adquiridos pelos registros dos policiais militares.
Importante tambm analisar a doutrina e a jurisprudncia quanto ao tema
dispensado responsabilidade penal do brio. O que no se pode tratar o
indivduo que embriaga-se, mesmo que voluntariamente, e venha a cometer um
crime ou infrao com sua capacidade mental alterada de maneira igual aquele que
possui a capacidade mental inalterada. Atualmente, com o advento da Constituio
da Repblica de 1988, a responsabilizao penal objetiva foi excluda, o que
conferiu s leis penais brasileiras o carter da responsabilidade pessoal e subjetiva.
O policial militar possui o dever de agir conforme os preceitos legais vigentes no
Brasil. Cabe a ele observar o contexto da ocorrncia em que o autor apresenta
sinais de embriaguez e comete o crime de desacato. O relato dos fatos no histrico
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do Boletim de Ocorrncia dever conter as circunstncias em que se deu o crime e
as providncias adotadas, bem como a narrativa dos sintomas de embriaguez do
indivduo. Tais providncias possuem o carter garantista dos direitos do conduzido
e asseguraro a ampla defesa e contraditrio desse, em um possvel processo penal
em que ser acusado de um crime.
2.4 Objetivos
A formulao dos objetivos significa, segundo Marconi e Lakatos (2010), definir com
preciso o que se visa com o trabalho, sob os aspectos geral e especfico.
2.4.1 Objetivo Geral
Analisar a atuao policial-militar em ocorrncias de desacato, especialmente
naquelas em que os autores apresentavam sinais de embriaguez, seja pelo
consumo de bebidas alcolicas ou pelo uso de substncias de efeitos anlogos.
2.4.2 Objetivos Especficos
a) Verificar, pelas ocorrncias pesquisadas, os elementos caracterizadores do crime
de desacato inseridos nos histricos pelos policiais militares redatores, bem como a
relao desse tipo penal com a embriaguez dos autores;
b) Analisar as teorias doutrinrias e decises jurisprudenciais que tratam sobre o
cometimento de crimes por autores embriagados e a responsabilidade penal desses,
com enfoque para o cometimento do crime de desacato e o comprometimento da
capacidade intelecto-volitiva dos autores.
2.5 Problema
A atuao policial-militar em ocorrncias de desacato, envolvendo autores
embriagados, fornece elementos necessrios ampla defesa e o contraditrio do
conduzido em um possvel processo penal em que acusado desse crime?
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2.6 Hiptese
A atuao policial-militar em ocorrncias de desacato, envolvendo autores
embriagados, no fornece elementos necessrios ampla defesa e o contraditrio
do conduzido em um possvel processo penal em que acusado desse crime.
2.7 Variveis
Uma varivel pode ser considerada uma classificao ou medida, uma quantidade
que varia. Um estudo deve ter pelo menos duas variveis: independente e
dependente (MARCONI; LAKATOS, 2010).
2.7.1 Varivel independente
A atuao policial-militar.
2.7.2 Variveis dependentes
a) Ocorrncias de desacato.
b) Autores embriagados.
c) Elementos necessrios ampla defesa e o contraditrio.
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3 METODOLOGIA
A metodologia abrange todos os mtodos que sero utilizados direta e indiretamente
no processo de realizao da pesquisa.
Mtodo o conjunto das atividades sistemticas e racionais que, com maior segurana e economia, permite alcanar o objetivo conhecimentos vlidos e verdadeiros , traando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decises do cientista (MARCONI; LAKATOS, 2010, p.83).
Ela tambm pode ser entendida como um conjunto detalhado e sequencial de
mtodos e tcnicas cientficas a serem executadas ao longo da pesquisa, de tal
modo que se consiga atingir os objetivos inicialmente propostos e, ao mesmo tempo,
atender aos critrios de menor custo, maior rapidez, maior eficcia e mais
confiabilidade de informao. (BARRETO; HONORATO, 1998).
Segundo Marconi e Lakatos (2010), os mtodos podem ser subdivididos em
mtodos de abordagem e mtodos de procedimentos.
3.1 Mtodos de abordagem do tema
O mtodo representa um procedimento racional e ordenado, constitudo por
instrumentos bsicos, que implica utilizar a reflexo e a experimentao, para
proceder ao longo do caminho e alcanar os objetivos preestabelecidos no
planejamento (GARCIA, 1998, p. 14). Para Marconi e Lakatos (2010) o mtodo se
caracteriza por uma abordagem mais ampla, em nvel de abstrao mais elevado,
dos fenmenos da natureza e da sociedade.
O mtodo de abordagem engloba o indutivo, o dedutivo, o hipottico-dedutivo e o
dialtico. Para o desenvolvimento deste estudo, ser utilizado o mtodo hipottico-
dedutivo, que se inicia pela percepo de uma lacuna nos conhecimentos acerca da
qual formulam-se hipteses, e pelo processo dedutivo testa-se a ocorrncia de
fenmenos abrangidos pela hiptese. Dessa maneira, o presente estudo objetivar
comprovar as expectativas defendidas na hiptese e, assim, chegar a uma
concluso do objeto de estudo proposto.
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3.2 Mtodos de procedimentos
Os mtodos de procedimentos so etapas concretas da investigao, com finalidade
restrita em termos de explicao geral dos fenmenos menos abstratos. Pressupe
uma atitude concreta em relao ao fenmeno e esto limitados a um domnio
particular (MARCONI; LAKATOS, 2010).
Neste trabalho o mtodo a ser utilizado ser o estruturalista. Para Marconi e Lakatos
(2010) um estudo que parte da investigao de um fenmeno concreto que eleva-
se a seguir ao nvel do abstrato, por intermdio da constituio de um modelo que
representa o objeto do estudo, retornando por fim ao concreto, dessa vez como uma
realidade estruturada e relacionada com a experincia do sujeito social.
Dessa forma, o mtodo estruturalista caminha do concreto para o abstrato e
posteriormente do abstrato para o concreto, dispondo, na segunda etapa, de um
modelo para analisar a realidade concreta dos diversos fenmenos. Esse mtodo
amolda-se ao assunto tratado neste projeto, pois, a partir da anlise da relao
concreta entre o desacato somado caracterstica da embriaguez, analisa-se, no
plano abstrato, a nova realidade encontrada e posteriormente, voltando para o plano
concreto, o comportamento dos envolvidos na situao.
Utilizando-se o mtodo estruturalista, no se analisam mais os elementos em si, mas as relaes que entre eles ocorrem, pois somente estas so constantes, ao passo que os elementos podem variar; dessa forma no existem fatos isolados passveis de conhecimento, pois a verdadeira significao resulta da relao entre eles (MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 93).
Tambm ser utilizado o mtodo estatstico, quando da utilizao de grficos que
representaro a quantidade e as correlaes das ocorrncias a serem analisadas.
Para Fachim (2001) esse mtodo fundamenta-se nos conjuntos de procedimentos
apoiados na teoria da amostragem o que, como tal, indispensvel no estudo de
certos aspectos da realidade social em que se pretenda medir o grau de correlao
entre dois ou mais fenmenos, utilizando populao e universo. Nesse mtodo
realiza a reduo de fenmenos sociolgicos, polticos ou econmicos a termos
quantitativos e a manipulao estatstica.
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3.3 Tipos de pesquisa
3.3.1 Quanto aos objetivos
Segundo Gil (2002), uma pesquisa, tendo em vista seus objetivos, pode ser
classificada da seguinte forma:
a) Pesquisa exploratria;
b) Pesquisa descritiva;
c) Pesquisa explicativa.
Para este estudo ser utilizada a pesquisa exploratria que visa a proporcionar
familiaridade com o problema, com vistas a torn-lo mais explcito, partindo, para
isso, do envolvimento bibliogrfico, que geralmente assume a forma de pesquisa
bibliogrfica.
3.3.2 Quanto aos procedimentos tcnicos
Segundo Gil (2002), uma pesquisa, quanto aos seus procedimentos tcnicos, pode
ser classificada da seguinte forma:
a) Pesquisa bibliogrfica;
b) Pesquisa documental;
c) Pesquisa experimental;
d) Levantamento;
e) Estudo de campo;
f) Estudo de caso;
g) Pesquisa-ao.
Para este estudo, quanto aos procedimentos tcnicos, ser utilizada a pesquisa
bibliogrfica, que desenvolvida com base em material j elaborado, constitudo
principalmente de livros e artigos cientficos. Para Marconi e Lakatos (2010) existem
tipos e fontes bibliogrficas nesse tipo de procedimento tcnico. No caso desse
estudo, a principal fonte a ser utilizada ser a publicao, que compreendem livros,
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teses, monografias, pesquisas, entre outros. Tambm sero utilizados a pesquisa
documental, quanto ao estudo das jurisprudncias que tratam sobre o tema
abordado neste estudo, e o levantamento de dados no que tange a anlise de
ocorrncias policiais.
3.3.3 Quanto forma de abordagem
A pesquisa realizada ter a natureza qualitativa e quantitativa, visto que essa
classificao se d pela previso da mensurao da quantidade de ocorrncias de
desacato ocorridas na 6 Cia Esp do 1 BPM, e aquela pela fundamentao terica
dos dados a serem analisados quanto s ocorrncias em que houve o envolvimento
de autores embriagados que cometeram o crime de desacato, observando em que
situaes particulares ocorreram as ocorrncias e a significao que elas tm com a
incidncia do fato.
3.3.4 Quanto tcnica de coleta de dados
A principal forma de coleta de dados a leitura (livros, revistas, jornais, entre
outros), que certamente utilizada em todos os tipos de pesquisa, chamada
pesquisa bibliogrfica. Existem basicamente dois tipos de dados:
a) Dados secundrios: dados que j se encontram disponveis, pois j foram objeto
de estudo e anlise (livros, teses, entre outros).
b) Dados primrios: dados que no sofreram estudo e anlise. Para colet-los pode-
se utilizar questionrio fechado e aberto, formulrio, entrevista, entre outros.
Para essa pesquisa sero utilizados como tcnica de coleta de dados o tipo
secundrio que compreende livros, teses, jornais, entre outros, e tambm o primrio
para a coleta das ocorrncias policiais a serem analisadas neste estudo.
3.4 Tcnicas de pesquisa
As tcnicas de pesquisa so, segundo Marconi e Lakatos (2010), um conjunto de
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preceitos ou processos de que se serve uma cincia ou arte; a habilidade para
usar esses preceitos ou normas.
Este estudo utilizar a tcnica de documentao indireta, documental e bibliogrfica,
conforme qualificao quanto aos procedimentos tcnicos anteriormente
apresentados para o estudo das circunstncias em que ocorrem as ocorrncias de
desacato e toda a relao com os aspectos da ingesto de bebidas alcolicas ou
uso de substncias de efeitos anlogos e das questes jurdicas em torno dessa
temtica.
3.5 Universo da pesquisa
A populao a ser analisada para este estudo da relao entre o crime de desacato
e autores embriagados ser o universo das 217 ocorrncias de desacato ocorridas
na rea da 6 Companhia Especial do 1 BPM no perodo de Janeiro a Dezembro de
2010.
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4 A AUTORIDADE POLICIAL-MILITAR E A BASE CONSTITUCIONAL
Autoridade pode ser assim definida, segundo o Dicionrio da Lngua Portuguesa
Houaiss:
s.f. 1 direito ou poder de ordenar, de decidir, de se fazer obedecer. 2 pessoa com esse direito ou poder 3 representante do poder pblico 4 influncia exercida por pessoa sobre outra; ascendncia 5 fora convincente 6 especialista respeitado em um assunto (HOUAISS, 2010, p. 78).
No contexto desse estudo tal definio que mais se amolda a que se refere
pessoa que possui o direito ou poder de ordenar, de decidir, de se fazer obedecer,
sendo essa autoridade o poder do Estado1 de policiar os diversos setores que
compem a sociedade, advertindo e cuidando por meio dos membros dos diversos
rgos que formam tal entidade.
necessrio estudo mais aprofundado quanto autoridade dos integrantes da
instituio policial-militar para, de maneira adequada, definir o ramo de atuao e a
legalidade da ao de tais integrantes.
Em nosso Pas, o sistema policial dos Estados est baseado na dicotomia2
Polcia Militar Polcia Civil, sendo a responsabilidade da Polcia Civil o exerccio da polcia judiciria comum: apurao dos fatos envolvendo o ilcito penal comum, consubstanciando-o no inqurito policial; j s Polcias Militares cabe o policiamento ostensivo, fardado, alm da misso mais ampla de preservao da ordem pblica e da segurana interna e, excepcionalmente, a polcia judiciria nos casos de infraes penais militares em mbito estadual (ASSIS, et.al, 2009, p. 18).
A Constituio da Repblica de 1988 (CR/88) destina um captulo especfico para
definir o exerccio dos diferentes rgos policiais que compem o sistema da
segurana pblica brasileira. Quis assim o legislador elencar as diferentes
atribuies e competncias de cada um desses rgos. O artigo mais importante
que trata sobre segurana pblica da CR/88 o artigo 144, ao estabelecer que a
segurana pblica dever do Estado, direito e responsabilidade de todos e ser
1 Aqui considerado com entidade abstrata com personalidade jurdica, pode ser entendido como
Estado pas. Conceito se difere dos estados-membros que compem a Repblica Federativa do Brasil (Traduo nossa). 2 Dicotomia pode ser entendida como a diviso em duas entidades distintas (Traduo nossa).
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exercida pela Polcia Federal, Polcia Rodoviria Federal, Polcia Ferroviria Federal,
polcias civis, polcias militares e corpos de bombeiros militares.
Art. 144 A segurana pblica, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, exercida para a preservao da ordem pblica e da incolumidade das pessoas e do patrimnio, atravs dos seguintes rgos: I polcia federal; II polcia rodoviria federal; III polcia ferroviria federal; IV polcias civis; V polcias militares e corpos de bombeiros. [...] 5 s polcias militares cabem a polcia ostensiva de preservao da ordem pblica; aos corpos de bombeiros militares, alm das atribuies definidas em lei, incumbe a execuo de atividades de defesa civil. 6 As polcias militares e corpos de bombeiros militares, foras auxiliares e reserva do Exrcito, subordinam-se, juntamente com as polcias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territrios (BRASIL, 1988).
Quanto ao papel especfico das polcias militares, conforme 5 do mesmo artigo,
cabe polcia militar, principalmente, o papel ostensivo de prevenir a prtica de
infraes penais, com a finalidade de preservar a ordem pblica. De maneira
secundria cabe a elas o papel de polcia judiciria militar, quando da apurao dos
crimes militares cometidos, em tese, pelos militares dos Estados, por meio da
instaurao de Inquritos Policiais Militares (IPMs).
Para analisar a base constitucional da Polcia Militar tambm necessrio
mencionar a Constituio Estadual do Estado de Minas Gerais, uma vez que cabe
aos estados-membros a organizao das polcias militares. Assim como a
importncia do Artigo 144 da Constituio da Repblica para a definio das
atribuies das polcias, em geral, o Artigo 142 da Constituio Estadual tambm
define tais elementos de maneira complementar:
Art. 142 A Polcia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar, foras pblicas estaduais, so rgos permanentes, organizados com base na hierarquia e na disciplina militares e comandados, preferencialmente, por oficial da ativa do ltimo posto, competindo: I Polcia Militar, a polcia ostensiva de preveno criminal, de segurana, de trnsito urbano e rodovirio, de florestas e de mananciais e as atividades
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relacionadas com a preservao e restaurao da ordem pblica, alm da garantia do exerccio do poder de polcia dos rgos e entidades pblicos, especialmente das reas fazendria, sanitria, de proteo ambiental, de uso e ocupao do solo e de patrimnio cultural; II ao Corpo de Bombeiros Militar, a coordenao e a execuo de aes de defesa civil, a preveno e combate a incndio, percias de incndio, busca e salvamento e estabelecimento de normas relativas segurana das pessoas e de seus bens contra incndio ou qualquer tipo de catstrofe; (Inciso regulamentado pela Lei Complementar n 54, de 13/12/1999.) III Polcia Militar e ao Corpo de Bombeiros Militar, a funo de polcia judiciria militar, nos termos da lei federal. 1 A Polcia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar so foras auxiliares e reservas do Exrcito. 2 Por deciso fundamentada do Governador do Estado, o comando da Polcia Militar ou do Corpo de Bombeiros Militar poder ser exercido por oficial da reserva que tenha ocupado, durante o servio ativo e em carter efetivo, cargo privativo do ltimo posto da corporao (BRASIL, 1988).
O referido artigo da Constituio Estadual especifica a atribuio e a competncia da
Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG). Esse artigo se mostra mais especfico em
relao ao artigo da CR/88, que tambm trata das competncias das polcias, ao
mencionar que a organizao das foras pblicas estaduais se d com base na
hierarquia e disciplina militares. H tambm, de maneira exemplificativa, no inciso I
desse mesmo artigo, a atribuio de Instituio garantidora do poder de polcia dos
demais rgos e entidades pblicos.
Segundo lvaro Lazzarini a autoridade policial-militar tambm se define quando:
A competncia ampla da Polcia Militar na preservao da ordem pblica engloba, inclusive, a competncia especfica dos demais rgos policiais, no caso da falncia operacional deles [...] pois a Polcia Militar a verdadeira fora pblica da sociedade. Bem por isso as Polcias Militares constituem rgos de preservao da ordem pblica e, especificamente, da segurana pblica (LAZZARINI, 1996, p. 61).
Ainda, segundo Assis, et.al, (2009) a no aceitao da autoridade policial militar, ou
a tentativa de coloc-la em um plano inferior, decorre to somente da falta de
conhecimento legal e filosfico, da dificuldade de alguns em fazer interpretao, e da
falta de convvio com o Direito Administrativo.
Dessa maneira, as ordens advindas dos integrantes das instituies policiais,
previstas no ordenamento jurdico, apresentam amparo legal e possuem carter
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obrigatrio de cumprimento, sendo que a Polcia Militar a exteriorizao da
atividade do Estado e dotada de autoridade.
4.1 Os limites da autoridade do policial militar
A condio inicial para que a autoridade, concretizada pela ordem do policial
competente, seja legal, a atuao adequada do agente. A lei deve estabelecer
cada funo pblica com as respectivas competncias e atribuies de cada rgo.
A Polcia Militar tem como atividade o policiamento ostensivo fardado de
preservao da ordem pblica. Ao possuir competncia prevista na CR/88,
consequentemente possuem os integrantes dela autoridade policial correspondente
misso constitucional da ordem pblica.
O Estado surge com a formao de grupos humanos formados em razo de necessidades vrias como autoproteo. Ocorre que, para a formao desse ente abstrato, cada indivduo cedeu parte de sua liberdade natural, ou seja, o indivduo isolado possua plena liberdade, enquanto que o indivduo no seio do grupo j no mais desfrutava de ampla liberdade (ASSIS, et.al, 2009, p. 22).
Os ensinamentos de Assis, et. al, (2009) esto ligados ao chamado pacto de
convivncia pacfica, no qual os indivduos pertencentes ao grupo devem,
obrigatoriamente, sujeitarem-se s regras estipuladas. Para que essas regras sejam
cumpridas, faz-se necessrio um grupo com poder de fiscalizao sobre os demais
em nome do Estado.
A formulao e a vigncia de leis e normas referentes segurana pblica so
necessrias para a prpria existncia humana, ao possibilitar o ideal convvio social3.
O homem por si s um ser social, pois busca a unio a outros da mesma espcie
para sobreviver, sendo um animal racional que vive em companhia de outros
devidamente organizados por leis e regras.
Verifica-se em termos concretos que no h a possibilidade, hoje, de indivduos que
no vivam em sociedade, e muito menos sociedade sem regulamentos que visam a
3 O termo social provm do latim socius, que quer dizer parceiro, scio (traduo nossa).
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proteger tanto as pessoas quanto a prpria comunidade em que vive.
Depois de verificada a necessidade da existncia de normas que regrem a conduta humana, o que verificvel desde a origem do homem, observa-se, no Ordenamento Jurdico Brasileiro, a existncia de vrios compndios que tratam de direitos e deveres individuais, desde a Constituio Federal at as regulamentaes internas de cada rgo Pblico, conjunto normativo que no deixou de observar a busca na preservao da segurana pblica (COSTA, 2007, p. 10).
importante mencionar que o simples fato da conferncia do poder ao membro do
rgo representante do Estado no permite que ele cometa atos sem o amparo
legal. Cabe a ele agir conforme os princpios da administrao pblica, dentre eles
legalidade, moralidade, eficincia, impessoalidade e publicidade. Somente assim as
ordens da autoridade competente tero carter de obrigatoriedade.
4.1.1 Aspectos gerais da Administrao Pblica
Administrar, segundo Costa (2007), no sentido latu senso gerar interesses,
segundo a lei, a moral e a finalidade dos bens entregues guarda e conservao
alheias, sendo seu fim o bem comum da coletividade administradora.
A Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, no c a p u t d o artigo
37, elenca os chamados princpios basilares que regem a Administrao Pblica,
que so a legalidade, a moralidade, a impessoalidade, a publicidade e a eficincia.
A Administrao Pblica, tanto a direta como a indireta de quaisquer dos Poderes da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, obedecer aos princpios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficincia (BRASIL, 1988).
Para Hely Lopes Meirelles (1994) definem-se os referidos princpios da Administrao
Pblica:
Legalidade A legalidade, como princpio de administrao (CF, art. 37, caput), significa que o administrador pblico est, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e s exigncias do bem comum, e deles no se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato invlido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. Moralidade A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto
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da validade de todo ato da Administrao Pblica (CF, artigo 37, caput). No se trata da moral comum, mas sim de uma moral jurdica, entendida como o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administrao. Impessoalidade e finalidade o princpio da Impessoalidade, referido na Constituio de 1988 (art. 37, caput), nada mais que o clssico princpio da finalidade, o qual impe ao administrador pblico que s pratique o ato para o fim legal [...] Esse princpio tambm deve ser entendido para excluir a promoo pessoal de autoridades ou servidores pblicos sobre suas realizaes administrativas (CF, art. 37, 1). A finalidade ter sempre um objetivo certo e inafastvel de qualquer ato administrativo: o interesse pblico. Publicidade Publicidade a divulgao oficial do ato para conhecimento pblico e incio de seus efeitos externos. Da por que as leis, atos e contratos administrativos exigem publicidade para adquirirem validade universal, isto , perante as partes e terceiros. A publicidade no elemento formativo do ato; requisito de eficcia e moralidade (MEIRELLES, 1994, p. 82-8).
Quanto ao Princpio da Eficincia, Costa (2007) descreve que esse princpio abrange
no s a produtividade do exercente do cargo ou da funo. No sentido mais amplo
visto para atingir os aspectos quantitativos e qualitativos do servio e para avaliar o
rendimento efetivo do custo operacional e da sua real utilidade para os administrados
e para a Administrao. Os administradores pblicos so detentores de poderes e
deveres, inclusive o dever de eficincia, que significa realizar atribuies com
presteza, perfeio e realizar a boa administrao.
Porm, no so apenas esses os princpios a serem observados. Pode-se tomar
como exemplo a Constituio do Estado de So Paulo, que, no seu artigo 111,
ampliou esse rol, acrescentado os princpios da razoabilidade, finalidade, motivao
e do interesse pblico, como de observncia obrigatria pela Administrao Pblica.
Artigo 111 - A administrao pblica direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecer aos princpios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivao e interesse pblico (SO PAULO, 1989).
Os princpios inerentes Administrao Pblica so aqueles expostos no art. 37 da
Constituio Federal, sendo que alguns deles foram positivados de forma
expressa, outros de forma implcita ou tcita. Esses princpios se completam e no
se excluem, no so jamais eliminados do ordenamento jurdico, fornecendo as
diretrizes e condutas situadas no pice do sistema.
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4.2 Polcia Militar: definio e atividade
Polcia pode ser assim definida, de acordo com Jos Cretella Jnior:
Conjugando-se os elementos que, obrigatoriamente, devem estar presentes na estruturao conceitual o Estado, detentor nico do poder de polcia, tranqilidade pblica, condio indispensvel para que os agrupamentos humanos progridam, as restries jurdicas liberdade, necessrias para que a ao abusiva de um no cause embaraos ao de outro possvel atingir-se a seguinte definio jurdica de polcia: conjunto de poderes coercitivos exercidos pelo Estado sobre as atividades do cidado mediante restries legais impostas a essas atividades, quando abusivas, a fim de assegurar a ordem pblica (CRETELLA JNIOR, 1998, p. 165, grifo nosso).
Da definio de polcia, o referido autor menciona a figura do Estado, que a fonte
da prpria polcia, uma vez que o exerccio do poder de polcia indelegvel e no
possui natureza particular, no podendo o Estado terceirizar o poder de polcia.
Elenca tambm a relao entre o direito individual, o coletivo e a atividade policial,
ao evitar aes abusivas que causem danos ao outro.
Ao retornar ao conceito filosfico do tema tem-se que a atividade policial surgiu
juntamente com a prpria humanidade e a verdadeira necessidade de proteger os
bens que possuam, prevalecendo aquele que possua mais fora. Porm, o
conceito de polcia est relacionado prpria figura do Estado, que avoca para si a
exclusividade do uso da fora mantenedora da ordem pblica e pacificadora de
conflitos entre as pessoas.
J ao poder de fiscalizar e coordenar as aes das pessoas define-se como o poder
de polcia dos diversos rgos que compem o Estado, ao fazer com que elas se
amoldem s regras previstas.
Considera-se poder de polcia atividade da administrao pblica que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prtica de ato ou absteno de fato, em razo de interesse pblico concernente segurana, higiene [...] dependentes de concesso ou autorizao do Poder Pblico, tranqilidade pblica ou ao respeito propriedade e aos direitos individuais ou coletivos (BRASIL, 1966).
Para Meirelles (1994), o Poder de Polcia a faculdade que a Administrao Pblica
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possui para condicionar e restringir o uso, o gozo de bens, de atividades e de
direitos individuais, em benefcio da coletividade ou do prprio Estado. Refere-se,
ainda, ao mecanismo de frenagem para conter os abusos do direito individual
relacionados ao interesse pblico.
Verifica-se que h a necessidade de se limitar os direitos individuais pelas leis, para
que haja a vida pacfica em sociedade. No existe, portanto, a possibilidade de
todas as pessoas exercerem a todo o momento os seus direitos individuais sem que
haja embates entre elas.
Poder de Polcia a faculdade discricionria da Administrao de limitar as liberdades individuais em prol do interesse pblico. Adita que a coexistncia da liberdade individual e o Poder de Polcia repousam na conciliao entre a necessidade de respeitar essa liberdade e a de assegurar a ordem social (CRETELLA JNIOR, 1998, p. 195).
Dessa maneira, expe Costa (2007) que o Poder de Polcia foi institudo aos
integrantes da Administrao Pblica para evitarem excessos no exerccio dos
direitos individuais das pessoas. H que se observar as condies gerais do ato
pblico para que sejam validados os atos de polcia4, quais sejam: competncia,
finalidade, forma, motivo e objeto.
Competncia Para a prtica do ato administrativo a competncia a condio primeira de sua validade. Nenhum ato - discricionrio ou vinculado pode ser realizado validamente sem que o agente disponha de poder legal para pratic-lo. Entende-se por competncia administrativa o poder atribudo ao agente da Administrao para o desempenho especfico de suas funes. Finalidade Outro requisito necessrio ao ato administrativo a finalidade, ou seja, o objetivo de interesse pblico a atingir. A finalidade do ato administrativo aquela que a lei indica explcita ou implicitamente. No cabe ao administrador escolher outra, ou substituir a indicada na norma administrativa, ainda que ambas colimem fins pblicos. Forma Todo ato administrativo , em princpio formal. E compreende-se essa exigncia, pela necessidade que tem o ato administrativo de ser contrasteado com a lei e aferido, freqentemente, pela prpria Administrao e at pelo Judicirio, para verificao da validade. Motivo O motivo ou causa a situao de direito ou de fato que determina ou autoriza a realizao do ato administrativo [...] Tratando-se de motivo vinculado pela Lei, o agente da Administrao, ao praticar o ato, fica
4 Atos de polcia relacionam-se aos atos praticados por agentes de segurana pblica (Traduo
nossa).
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na obrigao de justificar a existncia do motivo, sem o qu o ato ser invlido ou, pelo menos, invalidvel, por ausncia da motivao. Objeto Todo ato administrativo tem por objeto a criao, modificao ou comprovao de situaes jurdicas concernentes a pessoas, coisas ou atividades sujeitas ao do Poder Pblico. Nesse sentido, o objeto identifica-se com o contedo do ato, atravs do qual a Administrao manifesta seu poder e sua vontade [...] (MEIRELLES, 1994, p. 135-7).
Como forma de relacionar, Cretella Jnior (1998) define Polcia e poder de polcia
como sendo aquele algo concreto, um conjunto de atividades coercitivas exercidas
na prtica dentro de um grupo social, j aquele seria uma faculdade que o Estado
possui, atravs da Polcia, que a fora organizadora de limitar as atividades
nefastas dos cidados. Para esse autor, o poder de polcia legitima a ao da polcia
e sua prpria existncia.
Numa expresso maior, que abrigasse as designaes que estamos esclarecendo, diramos: em virtude do poder de polcia o poder da polcia empregado pela polcia a fim de assegurar o bem-estar pblico ameaado [...] Se a polcia uma atividade ou aparelhamento, o poder de polcia o princpio jurdico que informa essa atividade, justificando a ao policial nos Estados de Direito (CRETELLA JNIOR, 1998, p. 229).
O poder de polcia anteriormente definido no deve ser confundido com o poder de
policiamento exercido pela fora de segurana pblica. O primeiro exercido pelos
diversos rgos integrantes do Estado, que em diversas situaes necessitam do
apoio da Polcia Militar para que esse poder seja assegurado, j o segundo
realizado pelos policiais que integram as instituies militares estaduais.
A Polcia Militar existe para preservar a Ordem Pblica que segundo Assis et.al,
(2009), o estado de organizao em que a sociedade deve seguir, com a liberdade
necessria para qualquer um progredir em suas aspiraes. Ainda, segundo De
Plcido e Silva (2007), define-se Ordem Pblica:
a situao e o estado de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas precpuas atribuies e os cidados as respeitam e acatam, sem constrangimento ou protesto. Ordem Pblica no se trata apenas da manuteno material da ordem na rua, mas tambm da manuteno de certa ordem moral (SILVA5 apud COSTA, 2007, p. 30, grifo nosso).
5 SILVA, De Plcido e. Dicionrio Jurdico. 12. ed. So Paulo: Forense, 1996.
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Para Hely Lopes Meirelles (1994), define-se Ordem Pblica da seguinte forma:
Ordem Pblica a situao de tranqilidade e normalidade que o Estado assegura ou deve assegurar s instituies e a todos os membros da sociedade, consoante s normas jurdicas legalmente estabelecidas [...] visa garantir o exerccio dos direitos individuais, manter a estabilidade das instituies e assegurar o regular funcionamento dos servios pblicos, como impedir os danos sociais [...] O conceito de Ordem Pblica no se restringe apenas estabilidade das instituies, pois abrange e protege tambm os direitos individuais e a conduta ilcita de todo cidado, para a coexistncia pacfica na comunidade (MEIRELLES, 1994, p. 156, grifo nosso).
Aps a definio de Ordem Pblica que se chega verdadeira razo da existncia
das organizaes policiais-militares: preservao da Ordem Pblica. E elas,
investidas do Poder de Polcia conferido pelo Estado, realizam as diversas
atividades inerentes atividade policial-militar, ao fiscalizar o trnsito urbano e rural,
bem como o policiamento em jogos esportivos, entre outros, com a finalidade de
prevenir a ocorrncia de ilcitos penais e reprimir, atravs da priso em flagrante,
crimes e contravenes penais ocorridos.
Assim, trata-se a Polcia Militar de um rgo da administrao direta do Estado
responsvel pela segurana pblica, limitada pela imposio das leis e regulamentos
previstos no Ordenamento Jurdico Brasileiro. Cabe, tambm, a ela, preservar a
ordem pblica, mesmo que em detrimento dos direitos individuais, no momento em
que algumas liberdades individuais sero restringidas em benefcio da coletividade,
agindo por meio de seus agentes (militares estaduais).
Corroborando as atribuies da Polcia Militar j mencionadas, Costa (2007) melhor
especifica o dispositivo constitucional presente na 1 parte do 5 do artigo 144 da
CR/88, ao mencionar o artigo 3 do Decreto-Lei Federal n 667/1969, que trata das
Polcias Militares do Brasil, mais precisamente da competncia dessas:
Institudas para a manuteno da ordem pblica e segurana interna nos Estados, nos Territrios e no Distrito Federal, compete s Polcias Militares, no mbito de suas respectivas jurisdies: a) Executar com exclusividade, ressalvadas as misses peculiares das Foras Armadas, o policiamento ostensivo, fardado, planejado pela autoridade competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manuteno da Ordem Pblica e o exerccio dos poderes constitudos;
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b) Atuar de maneira preventiva, como fora de dissuaso, em locais ou reas especficas, onde se presuma ser possvel a perturbao da ordem; c) Atuar de maneira repressiva, em caso de perturbao da ordem, precedendo o eventual emprego das Foras Armadas; d) Atender a convocao, inclusive mobilizao, do Governo Federal em caso de guerra externa ou para prevenir ou reprimir grave perturbao da ordem ou ameaa de sua irrupo, subordinando-se Fora Terrestre para emprego em suas atribuies especficas de polcia militar e como participante da Defesa Territorial; e) Alm dos casos previstos na letra anterior, a Polcia Militar poder ser convocada, em seu conjunto, a fim de assegurar Corporao o nvel necessrio de adestramento e disciplina ou ainda para garantir o cumprimento das disposies deste Decreto-Lei, na forma que dispuser o regulamento especfico (COSTA, 2007, p. 53).
4.2.1 As origens histricas da Polcia Militar no Brasil
Historicamente, a polcia surgiu no Brasil por volta de 1808 pela real necessidade de
se prover a segurana e tranqilidade pblicas, uma vez que houve um aumento
considervel da populao e de contrabando de mercadorias em algumas partes do
territrio brasileiro. O modelo a ser implementado no Brasil foi o de Portugal, que se
mostrava eficiente e vantajoso para Lisboa e para toda a Corte Portuguesa,
chamada Guarda Real. A ideia inicial do Prncipe Regente, D. Joo VI, era a de
criar uma Diviso da Guarda Real da Polcia de Portugal no Brasil, mais
precisamente no Rio de Janeiro.
Por suas especificidades urbanas, dinmica social e proximidade com o centro do poder, a cidade do Rio de Janeiro constituiu o locus privilegiado para as anlises sobre a polcia no Brasil. A Intendncia Geral da Polcia da Corte e do Estado do Brasil foi criado em 1808, da mesma forma e com a mesma jurisdio que tinha a de Portugal. Os planos de atuao, regulamentos e uniformes seriam os mesmos adotados em Lisboa (COTTA, 2006, p. 40).
Essa Guarda de Polcia teria autonomia total para prender criminosos e manter a
ordem e seria organizada militarmente. O Comandante dessa Guarda seria
subordinado ao Comandante das Armas da Corte e ao Intendente Geral de Polcia,
ou seja, dupla subordinao.
Outros pontos a serem observados dizem respeito conjuntura vivida pelo pas
nessa poca: a chegada da famlia real portuguesa, o crescimento populacional, o
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crescimento dos negcios, a transformao do Rio de Janeiro em Capital do Reino
de Portugal e do Brasil e o crescimento do trfico e contrabando de mercadorias.
Havia o cuidado na escolha dos integrantes dessa Guarda de Polcia, para que
fossem os melhores pertencentes aos Regimentos de Infantaria e Cavalaria do
Brasil e que possussem boa conduta, moralidade e robustez.
Com a instalao da Corte portuguesa no Rio de Janeiro, em 1808, pretendiam-se organizar os espaos da cidade e disciplinar os costumes da sua populao segundo o paradigma da civilizao europia. Nesse sentido, a Intendncia Geral de Polcia teria assumido o papel de agente civilizador. [...] Uma vez que a Intendncia possua um carter eminentemente administrativo, utilizou como fora de interveno a Guarda Real de Polcia (COTTA, 2006, p. 41).
FIGURA 1 - Integrantes da Diviso da Guarda Real da Polcia de Portugal no Brasil Fonte: http://br.images.search.yahoo.com. Acesso em: 15 ago. 2011
Assim, aos moldes de Portugal, h a incluso de militares nas foras policiais do
Brasil, o que pode ser entendido como o surgimento de uma polcia com resqucios
militares, e no somente polcia. Tal assertiva prevalece at os dias atuais, em se
tratando das foras pblicas de segurana no Brasil. Esse carter militar atribudo
polcia advm da criao de um corpo militar responsvel exclusivamente pela
proteo dos vices-reis, intitulada a Guarda dos Vices-Reis.
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Das caractersticas iniciais da formao da Polcia Militar no Brasil tem-se que a
ideia aqui estabelecida foi a de uma polcia como instrumento de controle social,
atravs do uso da fora e que defenderia os interesses da Colnia e posteriormente
da Repblica, mas tambm os indivduos e a comunidade, de modo a manter a
segurana e tranqilidade pblicas.
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5 PARA UMA DEFINIO TERICA SOBRE O CRIME DE DESACATO
Torna-se importante para a definio terica a respeito do crime de desacato,
tipificado no artigo 331 do Cdigo Penal Brasileiro, Decreto-Lei N 2.848 de 1940,
delito esse presente no captulo que trata dos crimes praticados por particular contra
a administrao em geral, a importncia da figura do funcionrio pblico6, sendo
esse instrumento da vontade e atuao do Estado perante a sociedade.
Para os efeitos desse estudo defini-se funcionrio pblico no artigo 327 do CP:
Artigo 327 - Considera-se funcionrio pblico, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remunerao, exerce cargo, emprego ou funo pblica. 1 - Equipara-se a funcionrio pblico quem exerce cargo, emprego ou funo em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de servio contratada ou conveniada para a execuo de atividade tpica da Administrao Pblica (BRASIL, 1940).
Tal assertiva, o da importncia da figura do funcionrio pblico, se atribui ao fato de
que uma afronta ou violncia a essas pessoas, no cumprimento das atribuies
competentes a elas, redundaria em afronta ao prprio Estado.7 Observa-se a
vontade do legislador em ampliar o alcance desse tipo penal, e o consequente
cuidado com o funcionrio pblico, ao mencionar que o desacato ocorreria em
propter officium8, seno tambm extra officium9, desde que a ofensa seja propter
officium (CALHAU, 2004).
importante frisar, no entanto, que exerccio da funo diz respeito prtica de qualquer ato a ela correspondente, independente do local onde ele levado a efeito. Assim, como adverte Noronha, um juiz de direito ou um delegado de polcia no so ofendidos apenas no frum ou na delegacia, mas tambm, por exemplo, em imvel, onde aquele se acha em diligncia [...] No preciso que o agente esteja no exerccio da funo para que se possa configurar o desacato, bastando que a conduta ofensiva seja praticada em razo dela (HUNGRIA
10 apud GRECO, 2009, p. 247).
6 A terminologia mais aceita hoje, entre os estudiosos do Direito Administrativo, agente pblico,
porm, na matria penal, a denominao funcionrio pblico est correta (Artigo 327, CP) (Traduo nossa). 7 Entidade abstrata com personalidade jurdica (Traduo nossa).
8 [...] em razo do cargo (Traduo nossa).
9 [...] fora do ofcio (Traduo nossa).
10 HUNGRIA, Nelson. Comentrios ao Cdigo Penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
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Desacato pode ser assim definido:
s.m. 1. Falta de respeito (d. autoridade) contrrio de respeito. 2. No tratar com respeito. 3. No dar importncia a; desconsiderar (HOUAISS, 2009, p. 221).
Dessa forma, a lei penal dispensou especial proteo pessoa representante do
Estado nas diversas funes tpicas, inclusive o policial militar, denominado militar
estadual, que age em razo da funo durante o servio policial ou em razo dele.
Se no observasse tal cuidado, o legislador no teria criado um tipo penal especfico
para qualificar a injria proferida ao funcionrio pblico.
Artigo 331 Desacatar funcionrio pblico no exerccio da funo ou em razo dela: Pena deteno de 06 (seis) meses a 02 (dois) anos, ou multa (BRASIL, 1940).
O ncleo desacatar dever ser entendido como faltar com o devido respeito,
afrontar, menosprezar. O desacato se consuma por qualquer palavra ou ato que
redunde em vexame, humilhao ou desprestgio ao funcionrio pblico. Define-se
tambm pela grosseira ou falta de acatamento, atravs de palavras injuriosas,
difamatrias ou caluniosas, agresso fsica, ameaa, entre outros (HUNGRIA, 1978).
Noronha (1995) relata que a origem do crime de desacato remonta da Roma antiga
quando as ofensas proferidas a certos grupos de pessoas, como os magistrados,
eram qualificadas por penas maiores ou at mesmo com gravssimas sanes. Llio
Braga Calhau, em sua obra Desacato, tambm cita a origem do crime de desacato:
Los orgenes de la figura del desacato se encuentran em la calificacin que reciban las injurias por el echo de estar dirigidas contra una categora especial de personas y en una ocasin determinada. El principio del derecho romano era simplemente el de que la injuria es ms grave cuando es inferida al magistrado (SOLER
11 apud CALHAU, 2004, p. 22).
12
11
SOLER, Sebastian. Derecho penal argentino. Buenos Aires: Tipogrfica Argentina, 1951. 12
As origens da figura do desacato se encontra na classificao que recebiam as injrias pelo fato de serem dirigidas contra uma categoria especial de pessoas em uma ocasio determinada. O princpio do direito romano era simplesmente de que a injria mais grave quando dirigida ao magistrado (Traduo nossa).
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Como resqucios, tanto do Direito Romano antigo, quanto da Idade Mdia em que
injrias tambm eram qualificadas quando proferidas a sacerdotes, o Estado
Brasileiro, hoje, resolveu, de maneira semelhante, punir as pessoas que ofendam os
seus funcionrios que estejam no exerccio da funo ou em razo dela.
Com efeito, os funcionrios pblicos nada mais so do que instrumentos da vontade soberana e da atuao do Estado. Para desincumbir-se de sua misso, devem eles, pois, estar protegidos de possveis afrontas ou violncias. Assim, a tutela do acatamento autoridade , em ltima anlise, garantia da ordem jurdica e do equilbrio das atividades coexistentes (FERREIRA
13 apud CALHAU, 2004, p. 23).
Relembra Monteiro (1962) que ao punir o desacato est se defendendo o princpio
da legalidade, porm, considerando que o funcionrio pblico aja dentro da
legalidade. Se ele, ao efetuar uma priso de uma pessoa pelo crime de desacato,
no observar a previso legal, poder ser responsabilizado criminalmente por abuso
de autoridade, administrativamente pelo rgo que pertence, e ainda ser
processado pelo Ministrio Pblico (MP) por improbidade administrativa.
Observa-se nitidamente a inteno do legislador brasileiro em destacar a injria
sofrida por funcionrio pblico pela criao de um tipo penal especfico para esse
crime, qualificando-a com uma pena mais gravosa em relao ao crime de injria
previsto no artigo 140 do Cdigo Penal Brasileiro (CP).
Artigo 140 Injuriar algum ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena Deteno de 1 (um) a 6 (seis) meses ou multa (BRASIL, 1940).
Para Calhau (2004) o desacato parecido com o crime de injria, a diferena o
sujeito passivo desse, que pode ser qualquer pessoa, e naquele algum que est
investido em um ofcio pblico, representante da longa manus da Administrao.
5.1 A criminalizao do desacato e os impasses polticos
Uma das maiores crticas quanto criminalizao do desacato a utilizao desse
13
FERREIRA, Ivette Senise. Desacato. In: Enciclopdia Saraiva do Direito. So Paulo: Saraiva, v. 23, 1979.
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tipo penal como ferramenta arbitrria por funcionrios do Estado contra inimigos
polticos, reprteres, entre outros. Para Calhau (2004), a criminalizao abusiva do
desacato passa a ser instrumento de arbtrio do Estado contra a liberdade de
expresso.
Da liberdade de expresso e difuso dos pensamentos, idias e opinies nasce consequentemente o direito crtica poltica e administrativa, entendida como direito a ser exercido pelos cidados como funo fiscalizadora da obra dos organismos de governo [...] Nesse contexto, a criminalizao do desacato deve ocorrer em um ponto de equilbrio, de forma que preserve os interesses da Administrao Pblica (e consequentemente da honra dos seus funcionrios), mas que, ao mesmo tempo, no coba da forma indevida e excessiva a liberdade de expresso (e o conseqente direito fiscalizatrio da crtica aos atos de Estado) dos cidados (CALHAU, 1994, p. 24).
No so raros os casos em que o crime de desacato utilizado de maneira
arbitrria, principalmente por pases absolutistas para controlarem opositores. Assim,
o delito de desacato deve se resumir s condutas que realmente ultrapassem esse
ponto de equilbrio nas situaes em que a honra dos funcionrios pblicos no
exerccio da funo seja desrespeitada.
Corroborando essa temtica Vizcaya14 (1993, apud Calhau, 2004) cita que a real
necessidade de se proteger o crime de desacato deve limitar-se ao regular o
funcionamento da Administrao, visto que na maioria das vezes a ao do autor
desse delito no trar perigo a esse funcionamento, porm, naquelas situaes em
que se perceba um anormal funcionamento do servio pblico, h que se falar em
desacato.
A criminalizao do desacato no pode ser um cheque em branco dado ao Poder Legislativo, dando-lhe poderes quase ilimitados para se caracterizar o delito de desacato, devendo se resumir as condutas necessrias, respeitando-se o princpio do Direito Penal como ultima ratio
15 (CALHAU,
1994, p. 25).
H uma tendncia observada em alguns pases, como o Chile e Costa Rica, da
14
VIZCAYA, Maite Alvarez. Breves consideraciones sobre la regulacin del delito de desacato em el Proyecto de Ley Orgnica del Cdigo Penal de 1992. [S.l. s.n]. 1992. 15
A expresso do latim Ultima ratio pode ser traduzido para a lngua portuguesa como ltima razo, ou no sentido de ser o direito penal a ltima instncia do controle social (Traduo nossa).
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descriminalizao do crime de desacato e delitos de opinio. Em contrapartida,
Cuba, Nicargua e Egito so acusados por rgos internacionais de Direitos
Humanos de abusos contra pessoas que criticaram atos do Estado com penas
longas de at 20 (vinte) anos ou mais, como o caso de Cuba. J no caso do Egito,
os casos abusivos esto relacionados a desacatos contra a religio islmica
(CALHAU, 2004).
5.1.1 O crime de desacato definido como tipo penal aberto
O crime de desacato, considerado tipo penal aberto, definido assim por possuir
formas vagas de conduta, abertas ou lacunosas. Gomes (2003) critica essa
caracterstica ao dizer que os tipos penais abertos esto em permanente debate
com a garantia da lex certa16 e que, quando h excesso nessa abertura, o princpio
da legalidade seria agredido.
Outro crtico quanto a caracterstica aberta ou abrangente do tipo penal de desacato,
Ferrajoli17 (2002, apud Calhau, 2004). Ele diz que para a ao delituosa ser
regulada pelo sistema penal no suficiente que esteja regulada por regras de
comportamento.
Comportamentos como o ato obsceno ou o desacato, por exemplo, correspondem a figuras delituosas, por assim dizer, em branco, cuja identificao judicial, devido indeterminao de suas definies legais, remete inevitavelmente, muito mais do que a provas, a discricionrias valoraes do juiz, que de fato esvaziam tanto o princpio formalista da legalidade quanto o emprico da fatualidade do desvio punvel (FERRAJOLI apud CALHAU, 2004, p. 28-9).
Ainda segundo esse mesmo autor, o objeto de conhecimento e de tratamento penal
no apenas o delito enquanto formalmente previsto na lei, mas o desvio criminal
enquanto em si mesmo imoral ou anti-social e, para alm dele, a pessoa do
delinquente, de cuja maldade ou anti-sociabilidade, o delito visto como uma
manifestao contingente, suficiente, mas nem sempre necessria para justificar a
punio.
16
A expresso do latim lex certa pode ser traduzida para a lngua portuguesa como lei certa, ou legalidade (Traduo nossa). 17
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razo Teoria geral do garantismo. Trad. Ana Paula Zomer. et. al. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
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No plano das tcnicas jurdicas, estas representaes se refletem em uma desvalorizao do papel da lei como critrio exclusivo e exaustivo de definio dos fatos desviados. A tcnica mais difundida a previso de figuras elsticas e indeterminadas, idneas para conotar, em termos vagos ou valorativos, modelos globais de desvio como a obscenidade, o desacato, a propaganda ou a associao subversiva, a associao de tipo mafioso, a ofensa moral familiar e similares em vez de indicar univocamente
18 tipos de delitos empiricamente determinveis (FERRAJOLI
apud CALHAU, 2004, p. 29).
Portanto, o que se observa nas decises dos Tribunais, nos casos de crimes de
desacato, que os Juzes analisam o caso concreto para a aplicao da pena,
inclusive observando a questo da embriaguez e o cometimento desse delito.
Para Beltro (1988), em todo o caso do cometimento do crime de desacato preciso
que a inteno de ofensa ao funcionrio pblico seja direta e clara. Situaes em
que o autor apresenta-se embriagado, com ira ou raiva podem faz-lo pronunciar
palavras sem a inteno real de injuriar, e todo esse contexto, das condies
especficas das pessoas, ser analisado pelo Tribunal.
Em suma, v-se que o tipo penal de desacato numa tica garantista por demais aberto, permitindo a existncia de um espao discricionrio muito grande para a deciso do Poder Judicirio (e tambm previamente da Polcia e do Ministrio Pblico), e violando de forma reflexa o princpio da legalidade
19 do Direito Penal que exige certeza e clareza na sua deciso
(CALHAU, 1994, p. 31).
5.2 Classificao doutrinria do crime de desacato
O crime de desacato considerado, por fora da Lei N 9.099/95, Juizados
Especiais Criminais (JECRIM), crime de menor potencial ofensivo, a partir da
vigncia da Lei 10.259/01 que trata dos Juizados Especiais Criminais Federais e que
alterou o entendimento dessa categoria de crimes.
Na redao da Lei N 9099/95, artigo 61, so crimes de menor potencial ofensivo:
18
Univocamente pode ser entendido no contexto como delitos de um s significado (Traduo nossa). 19
Elenca o referido autor da citao o Princpio da Legalidade que no caso da caracterstica aberta do crime de desacato violado de forma reflexa no sentido de que as normas, de forma mais ou menos intensa, encontram fundamento no texto maior. Assim, natural que essa "ofensa reflexa" venha a atingir a estrutura constitucional, ainda que em segundo plano (Traduo nossa).
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Consideram-se infraes de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenes penais e os crimes a que a lei comine pena mxima no superior a um ano, excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial (BRASIL, 1955).
Aps a vigncia da Lei 10.259/01, e observados os princpios da igualdade e da
proporcionalidade, o entendimento que passou a vigorar era o de que o conceito do
crime de menor potencial ofensivo teria sido ampliado e a aplicao tambm caberia
na justia estadual (CALHAU, 2004).
Elenca o artigo 2, pargrafo nico, da Lei N 10.259/01:
Consideram-se as infraes de menor potencial ofensivo, para efeitos desta Lei, os crimes de a que a lei comine pena mxima no superior a dois anos, ou multa (BRASIL, 2001).
A maior discusso quanto mudana nesse procedimento, da aplicao do artigo 2
da Lei 10.259/01, se d pelo fato de ser esse dispositivo legal referente ao Juizado
Especial Criminal Federal e que no teria reflexo nos juizados estaduais.
Para Silva (2002) o discrimen20 estaria em que crimes de mesmo potencial ofensivo,
no mbito da Justia Federal, seriam processados e apenados na forma da Lei que
regula os Juizados Especiais, com todos os benefcios que o seu procedimento
propicia em favor do processado, enquanto que nos Juizados Especiais dos Estados
seriam da competncia da Justia Criminal comum, cujo procedimento mais
prejudicial ao acusado.
No caso do desacato (cuja pena no passa de dois anos), no h nenhuma razo adequada para ser considerado de menor potencial ofensivo, se da competncia federal, e, de outro lado, crime comum, se da competncia da Justia Estadual. O mesmo fato no pode ser valorado pelo legislador como de pequeno potencial ofensivo ou no, conforme a justia competente para o caso. Em outras palavras: o fato de ser competente essa ou aqueloutra justia no suficiente para justificar tratamento diferenciador (GOMES
21
apud CALHAU, 2004, p. 36).
20
A expresso do latim discrimen pode ser traduzida para a lngua portuguesa como deixar de ser crime (Traduo nossa). 21
GOMES, Luiz Flvio. Juizados criminais: crimes at dois anos. Disponvel em: . Acesso em: 03 maio 2002.
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Portanto, o entendimento mais correto, inclusive para o Superior Tribunal de Justia
(STJ)22, de que a Lei 10.259/01, que institui os Juizados Especiais Criminais na
Justia Federal, ampliou o rol de delitos23 de menor potencial ofensivo.
5.2.1 O Bem jurdico tutelado
Define-se um bem jurdico a partir de duas condies elementares: importncia
social e necessidade de proteo pelo Direito Penal (PUIG24 apud CALHAU, 2004,
p. 38).
[...] as mais relevantes funes do bem jurdico penal so quatro: 1 funo de garantia ou de limitar o direito de punir do Estado; 2 funo teleolgica ou interpretativa; 3 funo individualizadora e; 4 funo sistemtica. Prado lembra ainda que a funo limitadora opera uma restrio na tarefa prpria do legislador, a funo teleolgica-sistemtica busca reduzir a seus devidos limites a matria de proibio e a funo individualizadora diz respeito mensurao da pena/gravidade da leso ao bem jurdico (PRADO
25 apud CALHAU, 2004, p. 38).
Para Capez (2008), o objeto jurdico protegido no caso do crime de desacato o
prestgio e a dignidade da Administrao Pblica, imprescindveis para o
desempenho regular da atividade administrativa. Greco(2011) corrobora essa
assertiva ao mencionar que a Administrao Pblica o bem juridicamente
protegido por esse tipo penal e o objeto material o funcionrio pblico desacatado
no exerccio da funo ou em razo dela.
O bem jurdico protegido no desacato o interesse em se assegurar o normal
funcionamento do Estado, protegendo o prestgio do exerccio da funo pblica. A
proteo refere-se mais funo pblica do que prpria pessoa do funcionrio.
(CALHAU, 2004, p.39).
O bem jurdico no desacato o normal funcionamento da Administrao Pblica, tutelando-se, destarte, o prestgio dos funcionrios pblicos perante a comunidade [...] (PRADO apud CALHAU, 2004, p. 39).
22
Habeas Corpus 22.881/RS, 5 Turma, publicado DJ de 25/05/03. 23
Compreendendo-se crimes e contravenes penais (Traduo nossa). 24
PUIGG, Santiago Mir. El derecho penal en el estado social y democrtico de derecho. Barcelona: Ariel, 1994. 25
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, v. 4.
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5.2.2 Os sujeitos do crime de desacato
Quanto ao sujeito ativo trata-se de crime comum, ou seja, qualquer um pode
cometer esse crime. Existe discusso quanto possibilidade do cometimento do
referido crime por outro funcionrio pblico. Segundo Calhau (2004) existem trs
entendimentos sobre o assunto: 1 De que no h possibilidade, a no ser que o
funcionrio pblico esteja despido da qualidade de funcionrio pblico ou fora da
funo; 2 S poderia cometer se fosse superior hierrquico ou de posio idntica
em relao ao funcionrio pblico ofendido; 3 Poderia ser em qualquer situao,
independente da relao funcional.
Para Fragoso26 (1986, apud Greco, 2011) o sujeito do crime pode ser qualquer um,
independente de ser ou no funcionrio pblico, superior ou no do ofendido, no
vigorando o princpio inter pares non fit injuria27.
Entendemos, permissa venia28
, que a razo se encontra com Fragoso. Isso porque, como cedio, o funcionrio pblico protegido de forma mediata, pois o que est em questo a Administrao Pblica em si. Quando um funcionrio desacata outro funcionrio, ele, na verdade, despe-se dessa qualidade e atua como um particular. Simplesmente pelo fato de ser um superior hierrquico no pode ofender a Administrao Pblica, ali representada pelo seu funcionrio, no importando o tipo de funo que exera, bem como a sua hierarquia, comparativamente ao agente (GRECO, 2011, p. 939, grifo nosso).
Corrobora com essas justificativas, dos dois autores anteriores, Calhau (2004), ao
mencionar que a proteo da norma de desacato dirigida de maneira direta
Administrao Pblica e reflexa ao funcionrio. O sujeito ativo, desde que preencha
as exigncias do tipo, pode ser, inclusive o funcionrio pblico. Da mesma forma,
Jesus (1995) menciona que o funcionrio pblico que desacata o outro despe-se
dessa qualidade e equipara-se ao particular. Sendo o bem jurdico o prestgio da
funo pblica, no h que se falar em apenas conduta praticada por particular.
26
FRAGOSO, Heleno Cludio. Lies de Direito Penal: parte geral. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985. 202 p. 27
[...] Entre partes no h injria (Traduo nossa). 28
[...] com o devido consentimento (Traduo nossa).
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O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Lei N 8.906, trazia em seu
artigo 7 2, que o advogado no cometeria crimes de injria, difamao ou
desacato no exerccio de suas funes, em juzo ou fora dele, sem prejuzo das
sanes disciplinares da OAB. Porm, a parte que mencionava o no cometimento
do crime de desacato foi considerado inconstitucional por uma ao direta de
inconstitucionalidade (ADIn n 1.127-8) (CALHAU, 2004).
Quanto ao sujeito passivo do crime, ensina Capez (2008), que o Estado o sujeito
passivo primrio e funcionrio pblico desacatado o secundrio. H certa dvida
quanto equiparao do funcionrio pblico presente no 1 do artigo 327 do CP:
Artigo 327 [...] 1 - Equipara-se a funcionrio pblico quem exerce cargo, emprego ou funo em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de servio contratada ou conveniada para a execuo de atividade tpica da Administrao Pblica (BRASIL, 1940).
H na doutrina duas correntes, uma restritiva, defendida por Mirabete (2000) e Jesus
(1995), de que a equiparao daqueles que exercem cargo, emprego ou funo em
atividade paraestatal tem em vista os efeitos penais apenas com relao ao sujeito
ativo do crime, e no para ser considerado sujeito passivo. J a corrente extensiva
defendida por Calhau (2004) que considera que o CP no diferencia no artigo 327 a
figura do funcionrio pblico comum e do funcionrio ad hoc, e que o bem jurdico
principal a ser protegido a administrao pblica, mais ainda que a do funcionrio
pblico.
5.2.3 Os nexos de causalidade e funcional do desacato
O nexo causal definido como a ligao entre a conduta praticada pelo agente e o
resultado quisto. Se no h esse vnculo ou ligao, o resultado no pode ser
atribudo ao agente. Concomitantemente, porm, h a figura do nexo funcional:
Ainda para a configurao do delito se faz necessrio o nexo funcional, ou seja, que a ofensa seja proferida no exerccio da funo ou que seja perpetrada em razo dela. Esse nexo funcional pode se apresentar de duas formas: ocasional ou casual. Ser ocasional se a ofensa ocorre quando esteja o funcionrio a exercer funes de seu cargo, ou de carter casual,
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quando, embora presente, o ofendido no esteja a desempenhar ato de ofcio, mas a ofensa se d em razo do exerccio de sua funo pblica (CALHAU, 2004, p. 45).
Dessa forma, h que se levar em conta onde e em que situaes foram proferidas
as ofensas ao funcionrio pblico para se definir qual o tipo de nexo funcional do
fato. Quanto ao nexo funcional casual, em que o ofendido no esteja
desempenhando a funo, necessrio que o agente conhea essa caracterstica
para que haja o crime.
Para Capez (2008) imprescindvel que o ato ou palavra ofensiva sejam realizados
na presena do funcionrio, ou que o mesmo tome cincia direta da ofensa, como
por exemplo, quando o funcionrio est prximo no momento da ofensa. Caso
contrrio ser outro crime, como ameaa ou injria agravada, de acordo com o
artigo 141, II do CP:
Art. 141 - As penas cominadas neste Captulo aumentam-se de um tero, se qualquer dos crimes cometido: I - contra o Presidente da Repblica, ou contra chefe de governo estrangeiro; II - contra funcionrio pblico, em razo de suas funes; III - na presena de vrias pessoas, ou por meio que facilite a divulgao da calnia, da difamao ou da injria [...] (BRASIL, 1940).
No mesmo sentido Hungria29 (1958, apud Greco, 2009) afirma que se faz necessria
a presena do funcionrio, no exigindo que a ofensa seja proferida face a face,
bastando que possa escut-la ou perceb-la. No desacato a ofensa in litteris30, ou
por via telefnica, ou pela imprensa; resumindo, na ausncia do funcionrio. Nesses
casos, segundo esse mesmo autor, podero configurar-se os crimes de injria,
difamao, calnia e ameaa.
Para que se configure o crime de desacato necessria a presena do funcionrio pblico no local em que proferidas as ofensas, inexistindo a respectiva tipificao quando referidos doestos ocorrem por meio de telefone. Procedentes (TRF, 1 Reg., RCCR 2001.30.00.001828-2/AC, Rel. Cndido Ribeiro, DJ 2/5/2003, p.65).
29
HUNGRIA, Nelson. Comentrios ao Cdigo Penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. 30
Pode ser traduzida, a referida expresso do latim, para em letras, escrita (Traduo nossa).
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O funcionrio pblico no precisa estar diretamente frente do agente, pode ele
estar separado por uma divisria ou um grupo de pessoas, bastando que veja ou
oua a ofensa. (CALHAU, 2004, p. 49).
5.2.4 Os elementos subjetivo e objetivo do tipo penal
O dolo o elemento subjetivo pelo tipo penal que prev o crime de desacato, sendo
assim, no h possibilidade de natureza culposa (GRECO, 2011, p. 939). Para
Capez (2008), o dolo a vontade livre e consciente do agente de desacatar o
funcionrio pblico.
O dolo deve abranger o conhecimento da qualidade de funcionrio pblico, bem como de que este se encontra no exerccio da funo, ou que a ofensa irrogada em razo dela. Caso o agente incida em erro, poder responder por outro crime: injria, difamao, calnia, leso corporal, etc. Prevalece na doutrina o entendimento no sentido da existncia do fim especial de ofender ou desprestigiar a funo exercida pelo funcionrio pblico (C