Oessencialsobre A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE...do ensino da medicina. O aparecimento dum novo método...

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA Guilherme Braga da Cruz O essencial sobre A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Guilherme Braga da Cruz

O essencial sobre

A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE

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NOTA EDITORIAL

O texto do presente Essencial sobre a Histó-ria da Universidade corresponde ao da lição pro-ferida por Guilherme Braga da Cruz no I CongressoNacional da Juventude Universitária Católica, rea-lizado em Lisboa, de 16 a 19 de Abril de 1953, pu-blicado, pela primeira vez, no vol. XXXII (1954) darevista Estudos, do Centro Académico de Demo-cracia Cristã, e incluído, posteriormente, no vol. IVdas Obras Esparsas, Coimbra, 1985, do autor.

Na presente publicação suprimiram-se as no-tas eruditas, bem como as referências circunstan-ciais ligadas à origem do texto.

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TRAÇOS GERAIS DUMA«HISTÓRIA INSTITUCIONAL»

DA UNIVERSIDADE

1. A Universidade como criação do espírito medieval;causas que contribuíram para a sua formação.

A Universidade é uma criação sublime do espí-rito medieval, ou melhor — e para sermos maisrigorosos — daquele novo espírito de que o mundomedievo se revestiu, depois de dobrado o ano mil.Nasceu na mesma época das Cruzadas e das gran-des catedrais românicas e góticas, e é obra, em boaparte, do mesmo ambiente histórico que elas.

A Idade Antiga teve, sem dúvida, as suas es-colas de ensino superior, e algumas delas ficaramfamosas para sempre, pelo brilho que atingiram.A Alta Idade Média, por seu turno, soube continuara tradição escolar do mundo romano, e, sob a égideda Igreja, nunca deixaram de florescer, então, al-

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tos centros de estudo, onde a teologia, o direito, amedicina e os outros ramos do saber eram minis-trados com vista à preparação dos estudiosos parao exercício das respectivas profissões. E, no en-tanto, nem a Idade Antiga nem a Alta Idade Mé-dia conheceram a Universidade tal como os homensdo século XII vieram a concebê-la.

O que está na base do movimento universitáriomedieval é a formação dum espírito de classe— mas de classe socialmente organizada, com ver-dadeira estrutura corporativa — entre os profissio-nais do estudo: os mestres e os discípulos. A Uni-versidade do século XII não é mais do que umaescola, que deixou de ter projecção puramente lo-cal, para passar a ter projecção ecuménica, e quefoi elevada à categoria de instituição, juridicamenteautónoma, pela formação do espírito corporativoentre aqueles que nela ensinam e aqueles que nelaaprendem. A expressão universitas, aliás, é utili-zada nesta época com o exclusivo significado decorporação: — A Universidade não é ainda, comohá-de ser mais tarde, o conjunto das escolas supe-riores — a universitas facultatum —, é simples-mente a corporação, ou seja, a instituição onde se

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encontram congregados, corporativamente, os mes-tres e os escolares — universitas magistrorum etscholarium.

O aparecimento, em pleno século XII, destas no-vas escolas de projecção universal e corporativa-mente organizadas está ligado a uma série de cau-sas, que impossível seria analisar aqui, dum modocompleto: — O progresso geral do saber, o rápidoincremento de certas disciplinas, como a teologiacientífica, o direito romano e o direito canónico, umnovo sentido da unidade da ciência e uma noçãomais rigorosa da hierarquia entre os vários ramosdo saber humano, o movimento europeu da forma-ção dos grandes centros urbanos, o sentimento desolidariedade profissional que inspira a formação dasgrandes corporações de artes e ofícios, tudo teveo seu contributo a dar para esse movimento uni-versitário que dominou a Europa do século XII edo século XIII.

Produto de tão diversos factores, a Universida-de medieval tinha que ser, forçosamente, uma ins-tituição rica de cambiantes, cheia de vida e depersonalidade, inconfundível com qualquer organi-zação escolar dos tempos anteriores, e inconfundí-

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vel, até, consigo mesma. Não há então, pode dizer--se, duas universidades iguais, nem na sua origem,nem na sua estrutura interna.

Isto significa, bem vistas as coisas, que só den-tro dum critério relativo ou aproximado se pode fa-zer uma classificação das universidades desta épo-ca quanto à origem ou quanto à sua organizaçãoinstitucional.

2. Diferentes tipos de Universidade quanto à sua ori-gem: a) Ex consuetudine; b) Ex secessione; c) Ex pri-vilegio.

Sob o ponto de vista da origem, é corrente aclassificação entre universidades ex consuetudinee ex privilegio — classificação que nós completa-remos com um terceiro termo, a que daremos onome de universidades ex secessione, isto é, for-madas por desmembramento ou secessão.

a) As primeiras universidades formaram-se es-pontaneamente, através dum característico processode crescimento e corporatização duma escola ouescolas locais, já existentes. Daí o dizer-se que são

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universidades de formação consuetudinária ou exconsuetudine. As duas mais antigas e mais famo-sas, deste tipo, são a de Paris e a de Bolonha, aque logo em seguida se juntaram as de Oxford, deMontpellier e de Orléans.

À fama das lições dum mestre local — comoGuillaume de Champeaux, em Paris, Irnério e Gra-ciano, em Bolonha — vinha juntar-se a especializa-ção da escola numa determinada disciplina: enquantoos estudos teológicos, por exemplo, floresciam, combrilho nunca visto, em Paris e Oxónia, Bolonha ilu-minava o mundo com uma nova ciência do direito,e Montpellier tornava-se o mais importante centrodo ensino da medicina. O aparecimento dum novométodo científico — como o método escolástico, noensino telógico da escola parisiense, ou o métododas glosas, no ensino jurídico das escolas bolonhe-sas — vinha, por vezes, completar o quadro, tornan-do essas escolas locais num centro de atracção dosestudiosos de toda a Europa civilizada.

Transformadas em escolas de projecção univer-sal, estas velhas escolas diocesanas, municipais oumonásticas iam tomando, a pouco e pouco, cons-ciência da sua importância e consciência da sua

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força. Um verdadeiro espírito corporativo nascia,entre aqueles que as frequentavam: mestres e es-tudantes congregavam-se como um corpo único, nadefesa de interesses comuns ou na reivindicaçãode regalias ambicionadas. E esse espírito subia aorubro, quando surgiam os inevitáveis conflitos deordem social, entre burgueses e escolares, a per-turbar a vida compassada das jovens cidades uni-versitárias, como repetidas vezes aconteceu emParis, em Oxford e em Bolonha.

Nesses momentos, mais do que nunca, saltavaà evidência que estas velhas escolas tinham per-dido todo o carácter local, que outrora haviam pos-suído, e não podiam continuar sujeitas à simplesautoridade dum bispo, dum município ou dum mos-teiro. Frequentadas agora por uns milhares de es-tudantes, das mais diversas nacionalidades, coloca-das ao serviço, já não dum simples município, dumconvento ou duma diocese, mas da comunidadecristã universal, só o supremo árbitro das naçõese chefe espiritual da Cristandade poderia dispor doprestígio suficiente para presidir aos seus destinose para estabelecer o justo equilíbrio no jogo deinteresses travado entre elas e as outras forças

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vivas da comunidade local ou nacional, que a cir-cundavam.

A intervenção da Santa Sé na vida destas no-vas corporações marca, por assim dizer, o momentoculminante do processo consuetudinário da sua for-mação. A partir desse momento, o carácter univer-sal da escola e a sua autonomia corporativa já nãosão, apenas, uma realidade de facto; são tambémuma realidade jurídica. É então que rigorosamenteexiste uma Universidade.

b) As universidades a que chamámos ex seces-sione são o produto duma separação ou secessão;constituem um verdadeiro desmembramento dumaoutra universidade já existente.

Para bem compreendermos este processo de for-mação de novas universidades, temos de explicarque a maior força da corporação universitáriamedieval residia na sua extrema pobreza de bensmateriais. Não havia edifícios escolares, e o mate-rial didáctico resumia-se, todo ele, nuns quantos li-vros, que os próprios estudantes pacientementecopiavam, para uso próprio. As aulas davam-se nosclaustros das sés e dos mosteiros, ou em modes-tas casas de aluguer, quando não sucedia de se

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darem na própria praça pública, como aconteceu,segundo a tradição, com as prelecções de Irnério,em Bolonha.

A Universidade medieval pôde, assim, gozarduma completa liberdade de movimentos. Quandoos incidentes de ordem social entre estudantes eburgueses impediam o regular funcionamento doscursos, a Universidade levantava arraiais e ia insta-lar-se noutro lugar — quase sempre, numa cidadepróxima.

Estas secessões terminavam, normalmente, peloregresso da corporação escolar à cidade donde ti-nha partido. Mas a verdade é que esse regressonem sempre se fez dum modo integral: — Por ve-zes, alguns mestres e escolares, que tinham acom-panhado a Universidade na sua peregrinação,recusavam-se a regressar com ela ao ponto departida, e ali ficavam, para todo o sempre, vivendoo mesmo espírito corporativo que antes viviam, earrogando-se as mesmas regalias universitárias queantes possuíam.

A primeira Universidade formada por este pro-cesso foi a de Cambridge, nascida duma secessãoda Universidade de Oxford, no ano de 1209, de-

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pois de graves incidentes que culminaram no as-sassinato de alguns escolares pelos burgueses deOxónia. E origem idêntica teve também a Univer-sidade de Pádua, fundada em 1222, por virtudeduma secessão ocorrida com a Universidade deBolonha.

Estas universidades, a contrastar com as de for-mação consuetudinária, oferecem a particularidadede ter a sua origem numa data certa. São univer-sidades fundadas, criadas ex novo; mas ainda, eapesar de tudo, fundadas sem uma intervençãoestranha, criadas pela própria iniciativa da corpo-ração escolar.

c) Em terceiro lugar, na ordem cronológica, apa-recem as universidades ex privilegio, ou seja,aquelas que surgiram do nada, por efeito da sim-ples deliberação dum soberano. Estas universida-des, apesar de cumuladas de privilégios pelos seusinstituidores, não tinham atrás de si, como as de-mais, o peso e o prestígio duma tradição; e, por issomesmo, careciam duma confirmação pontifícia paranão ficarem reduzidas a uma projecção puramentelocal. Só o papa as poderia elevar ao plano ecumé-nico das restantes, reconhecendo validade univer-

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sal aos graus académicos por elas outorgados, queé como quem diz, autorizando-as a conferir aosseus licenciados, à semelhança das universidadestradicionais, o famoso ius ubique docendi — odireito de ensinar em qualquer parte.

A mais antiga Universidade deste tipo foi a dePalência, em Espanha, fundada pelo rei Afon-so VIII de Castela, em 1212, mas que não logrousobreviver para além do século XIII, ofuscada pelaprojecção que entretanto alcançara Salamanca.Alguns anos depois, surgia a Universidade de Ná-poles, fundada em 1224 pelo imperador Frederico II,e, logo em seguida, a de Toulouse, criada peloconde local, em 1229, a pedido do próprio papa.E, daí em diante, a criação ex privilegio passavaa ser o caminho invariavelmente seguido, na for-mação de novos centros de ensino, de categoriauniversitária.

As universidades peninsulares pertencem todasa este tipo; e, se algumas delas ainda aparentamuma feição mista, por terem sido criadas sobre oalicerce duma escola eclesiástica local de certaprojecção, como Palência e Salamanca, outras háque são criadas totalmente ex novo — e, nesse nú-

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mero, está, sem dúvida, a Universidade portuguesa,que D. Dinis fundou em Lisboa, em 1 de Marçode 1290, e que logo o papa confirmou, por umabula de Agosto do mesmo ano. Na verdade, em-bora entre nós tenha havido, anteriormente, impor-tantes escolas episcopais e monásticas, e emboraa fundação da Universidade tenha resultado dumaconjugação de esforços de vários abades de mos-teiros e reitores de igrejas, o Estudo Geral dioni-siano não se apoia, concretamente, na tradição ouno prestígio de nenhuma dessas escolas: é umacriação inteiramente nova.

3. Completa autonomia institucional da Universidadeprimitiva (séculos XII e XIII).

Formadas espontaneamente, por desmembramen-to, ou por privilégio real e pontifício, as universi-dades do século XII e do século XIII apresentam,contudo, uma importante característica comum, eé essa que verdadeiramente interessa ao estudo queestamos a empreender: gozam de completa auto-nomia institucional.

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Essa autonomia traduz-se, antes de mais nada,numa independência absoluta, para efeitos jurídicose administrativos: — A Universidade é dotada depersonalidade própria, tem selo privativo, governa--se por si, organiza o ensino a seu contento, es-colhe livremente os seus mestres, e está fora daalçada da jurisdição ordinária, pois os seus mem-bros — sejam mestres ou discípulos — têm o pri-vilégio do foro eclesiástico, e, em certos casos,chega a criar-se para eles um foro especial: o cha-mado foro académico.

O governo da corporação universitária pode es-tar predominantemente na mão dos mestres, comosucede em Paris, ou na mão dos escolares, comosucede em Bolonha, e como sucede também naUniversidade portuguesa. Duma forma ou doutra,é um governo autónomo e livre, que não está nadependência de nenhum poder superior. Os reis eos papas interferem na vida da Universidade paralhe dar a existência, ou, pelo menos, para a cumu-lar de privilégios e regalias. Mas a sua intervençãofica por aí, ou estende-se, quando muito, ao exercí-cio duma discreta protecção e arbitragem, nos mo-mentos mais difíceis da vida da corporação. A Uni-

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versidade, numa palavra, é um verdadeiro Estadodentro do Estado.

Mas a autonomia institucional tem ainda um ou-tro aspecto, não menos importante. Além deindependência administrativa, significa também,e sobretudo, liberdade intelectual. Sem dúvida quea Universidade tem uma norma de vida: está colo-cada integralmente ao serviço da comunidade cristã,e, por via dela, ao serviço da Igreja de Roma. Masessa norma de vida não é o produto duma imposi-ção doutrinal; é o resultado da aceitação livre e unâ-nime dum mesmo ideal e duma mesma crença.A Universidade — melhor dizendo — tem a orien-tação doutrinal que livremente abraçou, e não estácolocada ao serviço duma política ou duma crençaparticularista.

4. Primeiras manifestações de declínio da autonomiauniversitária (séculos XIV e XV). Causas e efeitos.

Destes dois aspectos da autonomia institucionalda Universidade, o primeiro a abrir brecha, comoé natural, foi o da independência jurídica e admi-

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nistrativa da corporação. E a responsabilidade dissocabe, em grande parte, à própria Universidade: —Não se esqueça que foi ela, pela difusão das ideiasromanísticas, uma das principais obreiras do forta-lecimento do poder real, a que se assiste, em todaa Europa, desde o século XIII em diante. Sem dar--se conta, a Universidade, no fácil apoio dado aoneocesarismo, cavava a própria ruína da sua auto-nomia corporativa e preparava longinquamente oterreno para uma desgraça maior, que seria a con-sequência lógica daquela: a perda da sua indepen-dência doutrinal.

Os príncipes reinantes, no seu poder políticocrescente dos séculos XIV e XV, vão absorvendo, apouco e pouco, o governo da corporação universi-tária, e cerceando as regalias e liberdades que ti-nham sido inicialmente seu apanágio. E as novasuniversidades, que então surgem, apresentam logoab initio uma subordinação ao poder real que osséculos anteriores não conheceram. Os monarcascontinuam a ser generosos para a corporação esco-lar; mas essa generosidade é concebida, agora, emnovos termos: em vez de privilégios e liberdades,cumulam-na de rendimentos e de bens materiais;

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e o preço que exigem — senão por palavras, pelomenos por actos — é uma progressiva renúncia àsliberdades de outros tempos: — Arvoram-se o di-reito de nomear professores; interferem na admi-nistração universitária; tolhem aos mestres e esco-lares o direito de escolherem os reitores, colocandona reitoria uma alta personagem da sua confiança;e vão, por vezes, até ao ponto de se enquadrarem,eles próprios, na corporação universitária, investi-dos no novo cargo de protectores dos Estudos.

Esta progressiva perda de independência jurídi-ca e administrativa não tem, no entanto, nesta épo-ca, nenhum reflexo de maior na liberdade intelec-tual da corporação. Pode ter um ou outro reflexona sua liberdade política, na medida em que aUniversidade passa a ficar vinculada, mais estrei-tamente, aos interesses políticos nacionais — e oapoio dado pela Universidade de Paris ao rei Filipe--o-Belo, no seu conflito com o papa Bonifácio VIII,é bem um símbolo desse fenómeno; mas, no as-pecto doutrinal, a Universidade continua a ser li-vre e independente: não recebe directrizes do Es-tado, nem fazia mesmo sentido que recebesse, poiso Estado, nesta época, não tem ainda a veleidade

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de se arvorar em doutrinador. Pelo contrário, empontos de doutrina, é a Universidade que, repeti-das vezes, imprime directrizes ao Estado, gozandojunto dele duma influência e dum prestígio semprecrescentes.

5. A Reforma protestante utiliza a força política do Es-tado para oprimir a Universidade, transformando-anum organismo estadual, ao seviço da heresia (sé-culo XVI).

Mas a subordinação intelectual da Universidadeao poder político estava na sequência lógica dosacontecimentos, e tinha de produzir-se inevitavel-mente, mais tarde ou mais cedo, como resultado dasubordinação jurídica e administrativa, já verificada.Bastava, para tanto, que o Estado tomasse comoprópria uma doutrina nova, diferente daquela queaté aí servira, e diferente daquela que a Universi-dade sempre abraçara. E foi o que veio a aconte-cer sob a Reforma protestante.

A Reforma protestante, como se sabe, não foiobra dos homens de estudo, e, muito menos, dascorporações universitárias em que eles se achavam

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congregados. Foi antes o produto duma quebra deprestígio da Igreja de Roma junto das massas po-pulares, que um grupo de aventureiros políticossoube habilmente aproveitar, para fomentar nacio-nalismos nascentes e para estruturar em novos ali-cerces o poder absoluto dos príncipes.

A Universidade não gerou a Reforma, nem seprestou voluntariamente a servir os seus desígnios.Honra lhe seja! Não houve em toda a Europa— parece conveniente insistir bem nisto — uma úni-ca universidade que tenha aderido espontaneamenteao grito de revolta de Lutero. Colónia, Lovaina eParis tiveram mesmo a coragem de condenar ex-pressamente as suas doutrinas, antes ainda de aSanta Sé o ter feito.

Mas, se a Universidade não seguiu voluntaria-mente a Reforma, a verdade é que a Reforma nãopodia vencer sem o apoio da Universidade; e esseapoio, à falta de outro meio, ia conseguir-se pelaforça política do Estado: — Os príncipes alemães,que viam no movimento reformista uma excelenteoportunidade de aumentar o poderio e a riqueza doEstado, pelo golpe vibrado no prestígio e na riquezada Igreja, iam pôr ao serviço da heresia toda a

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força política de que dispunham. A tarefa a reali-zar, para a conquista dessa poderosa arma intelec-tual, que era a Universidade, tinha de consistir, porum lado, em impor a observância e difusão daheresia às escolas universitárias já existentes, e emfundar, por outro lado, novos centros de ensinosuperior, inteiramente colocados ao serviço da Igre-ja reformada.

Wittenberg, Erfurt, Basileia, entre as universida-des já existentes, foram as primeiras vítimas destaopressão intelectual, comandada pelo Estado, aoserviço da Igreja luterana, e pela Igreja luterana,ao serviço do Estado; Marburgo, Königsberg eIena, as primeiras que expressamente se fundarampara servir o luteranismo, e para servir, através dele,os desígnios dos príncipes alemães.

Numas e noutras, o processo de opressão erasempre o mesmo: extinção de todos os velhos pri-vilégios universitários, que porventura ainda existis-sem; subordinação administrativa total ao poder doEstado; exigência duma solene profissão de fé lu-terana a mestres e discípulos; censura prévia detodas as lições e conferências, que houvessem deser proferidas na Escola.

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O êxodo e a expulsão de professores e estudan-tes eram a consequência imediata que estas medi-das acarretavam. Wittenberg, por exemplo, apesarde ser a Universidade onde ensinava Lutero, esta-va reduzida, desde 1521, a umas escassas dezenasde alunos; Erfurt, em 1523, não contava mais dequinze; e Basileia, que em 1528 não tinha senãoum estudante matriculado, terminava por fecharinteiramente as portas, no ano imediato.

Mas, contra isto, encontrava o Estado um fácilremédio, na utilização dos bens que acabava deconfiscar às congregações religiosas: — Instalaçõesescolares sumptuosas, ricas bibliotecas, formadascom os livros dos mosteiros, pingues rendimentos,em favor das cátedras universitárias, profusão debolsas de estudo, em favor dos escolares, eis opreço fácil, com que o Estado protestante, novo--rico, comprava a liberdade intelectual das suasescolas superiores.

Estas novas regalias de ordem económica nãobastavam, porém, para apagar as tristes consequên-cias da subordinação intelectual e política da Escolaaos interesses do Estado e do luteranismo. E, du-rante mais dum século, a Universidade alemã vive

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um período de absoluta decadência, de que só há--de sair quando se tiver libertado do proselitismoreligioso dos primeiros tempos da Reforma.

6. Vida institucional da Universidade católica ao serviçoda Contra-Reforma (séculos XVI e XVII).

Nos países que permaneceram fiéis a Roma, oquadro é substancialmente diferente do que acaba-mos de descrever, pois o Estado continuou a sercatólico, como até então, e a Universidade pôde,livremente, seguir a orientação doutrinal que sem-pre seguiu.

É certo que a Universidade tinha perdido tam-bém, nos países católicos, aquela autonomia admi-nistrativa plena que tinha sido seu apanágio nostempos primitivos. Mas a sua independência inte-lectual, pelo menos de momento, não estava com-prometida. Os monarcas nomeavam professores,consideravam o reitorado lugar da sua confiança,reservavam-se o exclusivo de aprovar e reformaros estatutos, e intervinham, a cada passo, directa-mente, na administração interna das universidades.

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Mas não tinham necessidade de lhes impor, pelaforça, uma certa orientação doutrinal, pela razãosimples de que elas seguiam, espontaneamente,aquela mesma orientação doutrinal que era doagrado do Estado.

Houve, sem dúvida, uma ou outra vez, necessi-dade de reprimir abusos, e o Estado não hesitouem pôr a sua força política ao serviço dessa re-pressão. Mas o que importa acentuar é que, dife-rentemente do sucedido nos países protestantes,esta intervenção do Estado nunca teve o carácterduma intervenção doutrinal activa, mas apenas oduma discreta e indispensável acção repressiva,exercida em defesa e a contento da própria corpo-ração universitária. Por outras palavras: o Estadonão teve que sobrepor-se à Universidade, ditando--lhe, como nos países protestantes, as disciplinas aensinar e as disciplinas a banir, as posições dou-trinais a adoptar e as posições doutrinais a com-bater; teve apenas que ajudá-la a defender-se deabusivas intromissões de elementos isolados, quepunham em risco, com atitudes pessoais menosreflectidas, a unidade de pensamento da cor-poração.

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À parte esta acção repressiva, apenas há a assi-nalar, no domínio doutrinal, uma certa atitude de pru-dência, alicerçada nos esforços conjugados do Es-tado e da própria corporação universitária, quantoao recrutamento dos professores a quem se confia-vam as cátedras que mais de perto se prendiam como dogma católico. Essa atitude de prudência tevecomo expressão mais saliente a franca abertura dascátedras universitárias às congregações religiosas,designadamente à Companhia de Jesus — essa he-róica guarda-avançada da catolicidade —, a que umbom número de universidades europeias ficou de-vendo, nesta época, serviços inestimáveis.

Feitas embora estas reservas, pode afoitamenteafirmar-se que a Universidade dos países católicos,durante os séculos XVI e XVII, gozou duma autono-mia institucional que a Universidade protestante damesma época esteve longe de desfrutar. A inter-venção do Estado na sua vida jurídica e adminis-trativa, aliás sempre menor que nos países protes-tantes, não chegou a resvalar, como nestes, para ocaminho duma verdadeira opressão doutrinal. —A Universidade dos países católicos serviu, nestaépoca, o ideal da Contra-Reforma; mas serviu-o

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deliberadamente, nos mesmos termos em que, naIdade Média, por sua livre vontade, tinha servidoo ideal da cristandade indivisa. Não se esqueçaque é sob o signo da Contra-Reforma, livre e cons-cientemente ao serviço dela, que as universidadespeninsulares têm o seu período áureo, atingindo aprimazia intelectual do mundo. Coimbra, Salaman-ca, Valladolid e Alcalá, no século de quinhentos eno começo de seiscentos, comandam os estudosuniversitários, abrem novos rumos às ciências divi-nas e humanas, fazem nascer novas disciplinascientíficas e são o centro de atracção das atençõesde todo o mundo culto, na mesma época em queas universidades da Europa Central e do Norte,dominadas pela Reforma protestante, estagnavamna mais humilhante decadência.

7. As reformas universitárias do despotismo esclarecido,designadamente a Reforma Pombalina da Universidadede Coimbra (século XVIII). O ensino universitário comoensino do Estado ao serviço do Estado.

A data marcante, que imediatamente se segue,na vida institucional da Universidade é a das Re-

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formas do século XVIII, levadas a cabo pelo despo-tismo esclarecido, sob a inspiração do movimentoiluminista.

Desta vez, eram as universidades dos países ca-tólicos que iam sofrer o peso da opressão do Es-tado, de que as universidades protestantes já tinhamsido vítimas dois séculos antes. A filosofia dasLuzes, que dominou todo o século da RevoluçãoFrancesa, tomava, nos países de forte tradição ca-tólica, como é sabido, uma feição essencialmentepedagogista e reformista. Em vez de revolucioná-rio, anti-histórico e anti-religioso, como o iluminismodos enciclopedistas franceses, estoutro iluminismoera dominado pela ideia de reforma — sobretudo,reforma do ensino —, dentro duma orientaçãoonde se tentassem conciliar as ideias racionalistase utilitaristas do século com a fé católica tradi-cional.

Mas essa reforma do ensino, a que se aspirava,não era uma reforma que partisse de dentro parafora, que surgisse espontaneamente da própria Uni-versidade, como resultado normal duma evoluçãodas ideias; era uma reforma partida de fora — umareforma imposta despoticamente pelo Estado, na

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total omnipotência que lhe pertencia, segundo opensamento político da época.

E o Estado prestou-se facilmente a servir osideais deste iluminismo reformista. Chamou a si atarefa de realizar a reforma do ensino, dentro daorientação que o iluminismo lhe apontava, e dispostoa usar a plenitude da sua força política para levaressa tarefa até ao fim, ainda que fosse necessá-rio, para tanto, acabar com os últimos restos daautonomia institucional da Universidade.

Foi este o espírito que inspirou as reformas uni-versitárias de Maria Teresa de Áustria, e que igual-mente presidiu à Reforma Pombalina da Universi-dade de Coimbra.

Não nos recusaremos a reconhecer os benefí-cios que estas reformas trouxeram para o progressodo ensino de certas disciplinas, até aí inteiramentedescuradas. Mas, neste momento, em que estamosa tratar apenas da vida institucional da Universi-dade, o que interessa frisar é que elas vibraram ogolpe de morte na autonomia universitária. Quemqueira certificar-se disso, leia os Estatutos pombali-nos de 1772 e a correspondência travada, a propó-sito da execução dos mesmos, entre o omnipotente

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ministro D. José e o reformador-reitor D. Franciscode Lemos.

O Estado não se limita a interferir na vida admi-nistrativa da Universidade, como nos velhos tem-pos de D. João III. Não se contenta, mesmo, comuma intervenção doutrinal de carácter genérico,indicando à Universidade que disciplinas deve ensi-nar e que orientação geral deve seguir no seu en-sino. Organiza, para cada cadeira, um programaminucioso, apontando pari passu as matérias quedevem ser ensinadas e as matérias que deve evitar--se que o sejam, as correntes doutrinais que devemser perfilhadas como verídicas e as que devem serrejeitadas como falsas. Mais que isso: para evitarpossíveis desvios da linha traçada, manda adoptar,em cada cadeira, um compêndio pré-fabricado echega ao ponto de mandar introduzir «alterações,mudanças e supressões» — a linguagem é do pró-prio Marquês — em alguns compêndios adoptados,sem o menor respeito pelo pensamento do autor,de molde a adaptá-los ao espírito da reforma e apermitir a sua utilização no ensino universitário.

Numa palavra: o Estado arvorou-se em doutri-nador; considerou-se a si próprio o primeiro dos

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mestres, e entendeu que devia ser despótico noensino, como era despótico na política. A Univer-sidade, que começara por ser, na Idade Média, umEstado dentro do Estado, acabava sendo um orga-nismo estadual, exclusivamente ao serviço dosideais ético-políticos do próprio Estado.

8. Da Revolução Francesa aos nossos dias: crise ins-titucional da Universidade.

As nefastas consequências desta abusiva intro-missão do Estado na vida da Universidade haviamde ser uma das características fundamentais da his-tória universitária, desde a Revolução Francesa atéaos nossos dias.

A Revolução teve, sem dúvida, larguíssimas con-sequências, quanto à orientação do ensino, sobre-tudo no sentido da sua laicização. Mas, na históriainstitucional da Universidade, é um simples episó-dio, perfeitamente enquadrado no espírito do século,dentro da orientação posta em movimento pelo des-potismo esclarecido. A ideia de que o ensino uni-versitário é um ensino do Estado, ao serviço do

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Estado, é uma herança que a Revolução recebe doiluminismo e que transmite intacta à Era napoleó-nica, que vai dar-lhe realização plena com o mons-truoso organismo da chamada Universidade im-perial, cujo modelo vários Estados europeus seapressam a copiar.

Desde então até hoje, em todos os países quereceberam a influência da Revolução Francesa oudas águias napoleónicas, nunca mais o Estado lar-gou mão do ensino universitário; e nunca maisdeixou de aceitar, como um dogma, que ele deveestar subordinado, não apenas à sua fiscalizaçãoadministrativa, mas à sua própria fiscalizaçãodoutrinal.

O Estado liberal do século XIX, neste aspecto,foi discípulo fiel do despotismo esclarecido e do im-perialismo napoleónico. Recordemos só, a título deexemplo, que a vitória liberal se inaugura, entre nós,com a demissão colectiva de 46 lentes da Univer-sidade de Coimbra, pois o Estado continua a en-tender, como no tempo de Pombal, que o ensinouniversitário tem de estar doutrinalmente ao seuserviço.

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A Universidade reagiu, como pôde, contra esta su-bordinação; mas, à força de reagir inutilmente, foi-aaceitando, a pouco e pouco, como um facto con-sumado. E essa foi, por certo, para a vida universi-tária, a consequência mais desastrosa da orientaçãopolítica seguida pelo Estado, desde o século XVIII

até hoje: — Generalizou-se o pensamento de que oEstado, reclamando todos os direitos, deve arcarcom todas as responsabilidades do êxito ou do in-sucesso do ensino universitário (e o mesmo pode-ria dizer-se, mutatis mutandis, dos outros ramos doensino). O desleixo do Estado em não fornecer, emnão impor, em não fiscalizar, tornou-se, na boca demuitos, a explicação para todas as deficiências doensino, ou a fácil desculpa para encobrir o desleixopróprio. Como se a principal reforma da Universi-dade não tivesse de partir de dentro — não tivessede partir de todos nós, professores e estudantes,que tantas vezes procuramos esconder as respon-sabilidades que, nessa tarefa, nos cabem.

Urge colocar novamente, e com toda a agudeza,o problema. Os tempos já não permitem, evidente-mente, um regresso total à antiga autonomia uni-versitária. Mas é necessário marcar os justos limi-

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tes em que deve enquadrar-se a intervenção doEstado na vida da Universidade, e restabelecer,para além deles, a vida institucional e o espíritocorporativo, que a fizeram grande noutras eras, eque hão-de garantir a sua grandeza nos séculosvindouros.

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OS «FINS DA UNIVERSIDADE»AO LONGO DA HISTÓRIA

9. A missão da Universidade medieval: a) Ensino dosconhecimentos indispensáveis para o exercício dasaltas profissões; b) Formação dos quadros científicosdas disciplinas cultivadas; papel exercido, a esse res-peito, pela escolástica; c) Hierarquização dos conhe-cimentos humanos, dentro de um conceito unitário daciência.

a) Entre os fins da Universidade medieval, aque-le que mais avulta e mais ligado lhe há-de ficar,pelos séculos fora, até aos nossos dias, é o da pre-paração dos escolares para o exercício das pro-fissões.

Não se trata, de resto, duma inovação, pois játinha sido essa a missão específica das escolas quea Igreja sustentou, desde os começos da IdadeMédia. Se alguma coisa de novo há a assinalar

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neste aspecto, é apenas o facto de algumas pro-fissões terem tomado, no século XII, uma importân-cia até aí insuspeitada, o que obrigou a dar aoensino de certas disciplinas, nas novas escolas uni-versitárias, um relevo que elas nunca tinham tidonas escolas da Alta Idade Média. Estas escolaspreparavam, quase exclusivamente, para as profis-sões eclesiásticas, ao passo que as Universidades,sem esquecer a preparação para essas profissões,têm de preparar igualmente, e em avultado número,os legistas, os canonistas, os médicos e os outrosprofissionais que a sociedade da época requer.

b) Não se limita, porém, a Universidade medievaa fornecer esta preparação profissional dentro dumespírito rotineiro de pura transmissão de ciênciafeita. A Escola toma, então, plena consciência deque um dos seus fins deve ser o de realizar umesforço colectivo para o progresso do saber e,sobretudo, para a formação dos quadros científicosdas disciplinas ensinadas. E aqui, sim, que estamosem face de alguma coisa nova, que só a títuloexcepcional se pode encontrar nas escolas dos tem-pos anteriores. Dir-se-ia que os homens de estudo

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foram dominados por um espírito de ordem e dearrumação científica até então desconhecido. Aovelho espírito casuístico, que tinha caracterizado atradição escolar da Antiguidade e da Alta IdadeMédia, ia sobrepor-se, agora, o espírito de síntese,a preocupação dos conceitos, dos grandes princí-pios, das grandes construções teóricas. E era aessa luz que se estudavam os problemas concre-tos, dentro dum perfeito enquadramento sistemáticoe dum rigoroso encadeamento lógico. Quer dizer:a missão da Universidade medieval, dentro destenovo espírito que a domina, não é apenas ensinaros escolares a resolver os problemas que a profis-são há-de suscitar-lhes; é também, e sobretudo,ensinar-lhes a justa colocação e hierarquizaçãodesses problemas no quadro unitário da ciência quecultivam.

O chamado «método escolástico» foi, sem dú-vida, o mais importante dos instrumentos postos aoserviço deste novo ideal, que caracteriza as univer-sidades da Idade Média. Foi sob o seu impulso quea filosofia se orientou para mais altos rumos e quea teologia se elevou à categoria duma verdadeira

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ciência. E foi com apoio nele — embora, cronolo-gicamente, só um pouco mais tarde — que os ju-risconsultos da escola bartolista conseguiram lan-çar as bases da ciência jurídica moderna.

c) Mas este espírito de síntese não se manifes-tava apenas dentro de cada ciência isoladamente;dominava as próprias ciências, no seu conjunto.A Universidade, por outras palavras, não se con-tentava em hierarquizar problemas e sistematizarconhecimentos, dentro de cada uma das discipli-nas que faziam parte do seu ensino; procuravaestabelecer a ligação das próprias ciências, umasem relação às outras; hierarquizá-las entre si, den-tro duma visão harmónica e unitária do saberhumano.

Encarada sob este aspecto, a Universidade me-dieval foi a expressão duma universitas scien-tiarum — duma escola, síntese de escolas; dumaciência, síntese de ciências — como no aspecto ins-titucional conseguia ser a expressão perfeita dumauniversitas magistrorum et scholarium.

Na base desta hierarquização científica das disci-plinas universitárias estavam as disciplinas prepara-

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tórias, que constituíam o trivium e o quatrivium,e que recebiam, no seu conjunto, a denominaçãode artes liberais. A elas se seguiam as ciênciaspropriamente ditas, objecto das várias Faculdades,numa síntese destinada a conhecer os problemasdo homem na ordem dos seres criados — objectoda filosofia e da medicina —, os problemas dohomem nas suas relações com os outros homens— objecto do direito — e, no cume da escala, osproblemas do homem e da natureza nas suas rela-ções com Deus — objecto da teologia.

Só à luz desta síntese se compreende que umadisciplina puramente empírica, como a medicina,tenha adquirido, logo nesta época, categoria uni-versitária, ao lado de disciplinas essencialmen-te especulativas, como a teologia e o direito. Dapreocupação de conhecer o homem como criatu-ra, no seu duplo aspecto de matéria e movimento,nasceram a anatomia e a fisiologia; e, à sombradelas, se geraram e desenvolveram, a pouco e pou-co, os demais ramos da medicina, como ciênciacom um lugar próprio, no quadro das disciplinasuniversitárias.

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10. O Humanismo abre novos horizontes à missão daUniversidade (séculos XV e XVI): a) Integração de no-vas disciplinas no ensino universitário; b) Desenvol-vimento do espírito crítico e rejuvenescimento dasdisciplinas tradicionais.

O Humanismo quatrocentista veio rasgar novoshorizontes à missão da Universidade. O crescenteinteresse dos eruditos pelo conhecimento da Anti-guidade clássica — característica fundamental doHumanismo — foi dominado por uma ideia, que jánão era nova, porque provinha, justamente, da An-tiguidade grega e latina: cultivar as artes pelas ar-tes; buscar a cultura literária e científica como purodiletantismo intelectual, independentemente do pro-veito imediato duma melhor preparação para oexercício das profissões.

a) A generalização dessa ideia veio dar um incre-mento notável a determinadas disciplinas, que, an-tes disso, não eram praticamente objecto de aten-ção por parte dos estudiosos, como a história, afilologia, a crítica literária, etc.; e havia de ter, comoúltima e benéfica consequência, o alargamento dosquadros universitários ao ensino dessas disciplinas.

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Não se julgue, porém, que foi tarefa simples con-vencer a Universidade a dar-lhes guarida. As hu-manidades começaram por ter acolhimento emescolas independentes, expressamente fundadaspara o seu estudo, ou em estabelecimentos anexosàs universidades, como os famosos colégios univer-sitários, e só daí transitaram para a própria Uni-versidade, depois de vencida uma resistência que,por vezes, durou dezenas de anos. É que a ideiaque estava na base destas novas disciplinas — odiletantismo intelectual, o estudo das artes pelasartes — não conseguiu dominar a Universidade,senão a título muito excepcional. E, por isso mes-mo, as novas disciplinas cultivadas pelo Huma-nismo só acabavam por encontrar aí aceitaçãoquando a corporação universitária terminava porconvencer-se da enorme importância que elas,afinal, possuíam, para uma melhor aprendizagemdas disciplinas tradicionais e para o progresso des-tas mesmas disciplinas.

Nesta elevação das humanidades à categoria dedisciplinas universitárias, tiveram um papel impor-tantíssimo a desempenhar as universidades jovens,como Florença, Lovaina, Alcalá e Tübingen, que

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lhes abriram as suas portas de par em par, e que,por vezes, foram fundadas ex professo para lhesdar acolhimento. Estas novas escolas, porque nãotinham atrás de si, como as demais, o peso e aresponsabilidade duma tradição gloriosa, podiamarriscar tudo por tudo, e colocar a sua juventude— digamos assim — ao serviço duma experiênciaa que as velhas universidades não ousariam subme-ter-se de ânimo leve. Os êxitos rapidamente porelas alcançados serviam de exemplo e incentivo àsuniversidades tradicionais e acabavam por vencer,mais tarde ou mais cedo, a resistência inicialmenteoferecida por estas ao ensino das humanidades.

b) Não foi este, porém, o único benefício que aUniversidade colheu do movimento da Renascen-ça. A criação de novas disciplinas científicas foiacompanhada, nestes recuados tempos do século XV

e do século XVI, da formação dum vigoroso espíri-to crítico, que deu aos homens de estudo uminconformismo com a ciência feita e uma ânsia derenovação doutrinal altamente benéficas para oprogresso científico. Sob a influência desse espíri-to crítico e com o apoio das novas disciplinas hu-manistas, as velhas ciências de tradição universi-

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tária foram objecto dum completo rejuvenescimen-to, quando não sucedeu serem objecto duma verda-deira revolução. Sem o Humanismo, por exemplo,não teria sido possível a grande renovação filosó-fica e teológica operada na Península, durante oséculo XVI, nem teria podido formar-se a famosaescola cujaciana, que rasgou horizontes inteira-mente novos e imprevistos ao progresso da ciênciajurídica. A própria medicina recebe então um im-pulso decisivo, com o progresso verificado nos es-tudos anatómicos, a que o culto pela arte clássicaviera dar um novo interesse.

11. Os fins da Universidade na Era da Reforma e daContra-Reforma (séculos XVI e XVII).

A evolução da Universidade, dentro da linhaascencional que acabamos de descrever, é brusca-mente interceptada, nos começos do século XVI,pela Reforma de Lutero. Colocada exclusivamen-te ao serviço dum fim político e religioso, a Uni-versidade dos países reformados entra, desde logo,em franco declínio literário e científico, porque toda

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a organização do ensino passa a ser dominada poraquele objectivo, e as disciplinas que não têm, parao efeito, um papel concreto a desempenhar sãovotadas a um progressivo abandono, quando nãosão expressamente banidas do ensino universitário.As próprias disciplinas formativas, deixando de sercultivadas livremente, para receberem o selo obri-gatório duma certa orientação doutrinal, entram emcompleta decadência, obrigando os espíritos cultosda Renascença a identificar o luteranismo com aruína das letras: «UBICUMQUE REGNAT LUTHERA-NISMUS IBI LITTERARUM EST INTERITUS», diziaErasmo, numa expressiva e perfeita síntese destequadro desolador.

A Universidade da Contra-Reforma ressentiu-semuito menos deste defeito; mas não conseguiu fu-gir de todo a ele. Pode dizer-se que a decadêncialiterária e científica não a atingiu, enquanto ela, aoserviço do ideal católico, se manteve numa posi-ção francamente ofensiva, fornecendo directrizes àprópria Contra-Reforma, com os ensinamentos dassuas escolas filosóficas e teológicas, sem aguardar,passivamente, que a Contra-Reforma lhe imprimissedirectrizes a ela. Convém acentuar, na verdade, que

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a Contra-Reforma católica, ao contrário da Refor-ma protestante, não foi um movimento imposto àUniversidade de fora para dentro, mas um movi-mento que nasceu, em grande parte, da própria re-novação que os estudos filosóficos e teológicos, soba acção benéfica do Humanismo, atingiram nas uni-versidades dos países católicos, desde os começosdo século XVI. Quer dizer: se a Reforma foi umacausa de ruína das letras, a Contra-Reforma foi,em grande parte, um produto do brilho que asmesmas letras, noutros países, atingiram.

A decadência literária e científica só mais tar-de, no decurso do século XVII, havia de atingir aUniversidade dos países católicos, quando ela, poruma errada compreensão das coisas, abandonou aposição de vanguarda, que tinha mantido no sé-culo anterior, e se retraiu para uma posição pura-mente defensiva. Em vez de continuar a servir aContra-Reforma duma maneira activa, cultivandolargamente as ciências humanas e divinas, comvista a um constante rejuvenescimento do idealcatólico, a Universidade fechou-se sobre si mesma,limitando-se a defender o dogma católico das in-vestidas estranhas, e deixou-se dominar pelo espec-

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tro da heterodoxia, repelindo energicamente todasas suspeitas tentativas de renovação doutrinal oude inovação científica.

12. A Universidade alarga o seu campo de acção ao en-sino das ciências da natureza e à investigação cien-tífica (séculos XVII e XVIII).

É este retraimento que explica, em grande par-te, à resistência oferecida pelas universidades aoensino das ciências da natureza, cujos progressosatingiram, nesta época, grandes proporções, nosmeios científicos extra-universitários. Na Itália,onde a subordinação administrativa e intelectual daUniversidade ao poder do Estado não era tão acen-tuada, as ciências físicas foram acolhidas no ensi-no universitário, logo desde fins do século XV. Mas,nos demais países da Europa, o ensino científico iatardar dezenas de anos a conquistar a Universida-de, porque esta, colocada ao serviço da Reformaprotestante ou ao serviço da Contra-Reforma ca-tólica, não encontrava nenhuma utilidade imediatanesse ensino, para o preenchimento dos fins que

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se propunha. E a isso acrescia que essas novasdisciplinas, numa fase de pura formação, não con-tinham ainda a ordenação sistemática suficientepara poder figurar ao lado de outras disciplinasuniversitárias, de quadros científicos perfeitamentedelineados.

O ensino científico, por isso mesmo — e à se-melhança do que aconteceu, por ocasião da Renas-cença, com o ensino literário —, ia ser acolhido,primeiro, nas Academias e Colégios de recente fun-dação, só daí transitando para a Universidade pro-priamente dita, quando foi vencida a dupla dificul-dade acabada de apontar, isto é, quando começoua declinar, na Universidade, o proselitismo religiosoe quando essas disciplinas, já devidamente reduzi-das a um sistema de conhecimentos, conseguiramocupar o lugar competente, na escala hierárquicados vários ramos do saber humano.

Tal como aconteceu com a introdução das hu-manidades no ensino universitário, coube a duasuniversidades jovens, no decurso do século XVII, aingrata missão de servir de campo experimental aoensino das ciências da natureza, dando assim oexemplo às universidades tradicionais, que se man-

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tinham, a esse respeito, em atitude de prudenteexpectativa. Queremos referir-nos às Universida-des de Leyden (nos Países Baixos) e de Edimbur-go (na Escócia), fundadas nos últimos anos doséculo XVI. Diferentemente das universidades atéentão criadas nos países protestantes, Leyden eEdimburgo nascem mais para servir a ciência doque para servir a Reforma. Embora não estejam,no seu começo, de todo libertas do fanatismo reli-gioso, não se lhes torna difícil libertar-se progres-sivamente dele, e abrem francamente as portas,durante o século XVII, ao ensino científico, paredesmeias com o ensino das disciplinas universitáriastradicionais. E o seu exemplo, em face dos brilhan-tes frutos obtidos, não tardaria a ser imitado pelasvelhas universidades.

Não bastava, porém, alargar a missão da Uni-versidade ao ensino das ciências da natureza; eranecessário incluir também a investigação cientí-fica entre os fins específicos da actividade univer-sitária. E, aqui, o obstáculo a vencer era, sem dú-vida, de maior vulto, pois tratava-se duma formade actividade inteiramente nova. Ao dar acolhimen-to ao ensino das humanidades, primeiro, e ao en-

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sino das ciências da natureza, mais tarde, a Uni-versidade alargou o seu campo de acção, mas sem-pre dentro da sua missão específica tradicional: amissão de ensinar — a missão de transmitir aos es-colares as aquisições definitivas da ciência. A livreinvestigação — embora fosse, por vezes, objecto decuriosidade intelectual de algum professor, isola-damente — não tinha que ser objecto da activida-de universitária como tal, pois a Universidade nãotinha que ocupar-se de tarefas de resultado du-vidoso ou de problemática utilidade social.

O caminho seguido, porém, para vencer este obs-táculo foi ainda o mesmo que se utilizara, com êxito,para vencer a resistência da Universidade ao en-sino das disciplinas humanistas e das ciências danatureza: — Depois dum período preparatório, emque a livre investigação domina os estabelecimen-tos extra-universitários, designadamente as acade-mias científicas, aparece uma universidade jovem— no caso concreto, a Universidade de Göttingen,fundada nos começos do século XVIII — a apresen-tar, arrogantemente, como primeiro dos seus ob-jectivos, conciliar a investigação científica com oensino. O seu exemplo começa logo, a pouco e

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pouco, a ser imitado pelas restantes; e a investiga-ção científica acaba por ocupar, em todas as uni-versidades dos tempos modernos, um dos principaislugares, na lista dos fins que a actividade universi-tária se propõe.

13. Sob o signo do utilitarismo: a Universidade peran-te a Revolução Francesa e o Estado liberal do sé-culo XIX. Progressiva laicização do ensino univer-sitário e suas consequências.

No entanto, o século XVIII — o mesmo século XVIII

que acabava de beneficiar a Universidade, alargan-do o seu campo de acção à investigação cientí-fica — ia mutilá-la gravemente, roubando-lhe, sobo signo do racionalismo e do utilitarismo, a mais no-bre das funções que, desde a Idade Média, lhecompetiam: a missão de realizar a síntese das ciên-cias, de estabelecer a sua interdependência, e, so-bretudo, de as hierarquizar umas em relação às ou-tras, dentro duma visão unitária do saber humano.

Por influência das ideias iluministas, primeiro, epor influência directa da Revolução Francesa, logo

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em seguida, opera-se uma verdadeira inversão devalores, dentro da Universidade, passando a ocupara primazia aquelas disciplinas que têm utilidadeprática imediata para o progresso material e eco-nómico, e relegando-se para um plano secundárioas disciplinas puramente especulativas e formativas.A teologia e a filosofia, ou deixam de todo de sercultivadas nas escolas superiores, ou então, quandopermanecem, passam a ter aí um valor puramentesimbólico, deixando de representar o fecho da abó-bada, a verdadeira síntese de todas as demais dis-ciplinas universitárias, para ficarem colocadas empé de igualdade com elas, ou de todo apagadas pelaprojecção agora dada ao seu ensino.

O racionalismo e o individualismo, a que as ciên-cias jurídicas ficam então submetidas, e o materia-lismo, que começa a dominar as ciências médicase as ciências naturais, vêm completar o quadro dadesagregação das disciplinas universitárias, que há--de consumar-se no século XIX, sob a égide do Es-tado liberal, agnóstico e laicizante: — A Univer-sidade deixa de formar homens, para passarpuramente a criar técnicos; deixa de ser a univer-sitas scientiarum de outros tempos, para passar a

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ser, simplesmente, um amontoado desconexo de cur-sos superiores especializados.

As disciplinas que só atingiram nível superiordepois desta fragmentação do ensino universitário— como a engenharia, a agronomia, as ciências po-líticas e económicas, etc. — foram encontrar aíuma barreira intransponível, para a aquisição de ver-dadeira categoria de disciplinas universitárias. Pas-saram a ser ensinadas em escolas superiores; e es-tas, por deliberação soberana do Estado, foramintegradas à força na Universidade, ao lado dasFaculdades tradicionalmente existentes. Mas aUniversidade não se encontrava já em condiçõesde poder absorvê-las, como tinha absorvido, nou-tro tempo, as disciplinas humanistas e as ciênciasda natureza, pois a sua missão de hierarquizar erelacionar os conhecimentos humanos, dentro dumavisão total e unitária da ciência, tinha passado àhistória. Simples soma aritmética de escolas supe-riores, a Universidade dos nossos dias assistiu im-passível à integração, no seu seio, dessas novasescolas, vendo nelas, simplesmente, outros tantoscursos especializados, que vieram acrescentar-seaos cursos já existentes.

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Esta desarticulação do ensino universitário, sobcujo domínio continuamos a viver, corre o risco deassumir proporções alarmantes: os jovens diploma-dos saem da Universidade apetrechados duma so-ma de conhecimentos invejável; mas, em compensa-ção, entram na vida de olhos inteiramente vendados,quanto ao importante problema de saber o justo lu-gar que esses conhecimentos técnicos ocupam nahierarquia dos vários ramos da ciência. A Univer-sidade dos nossos dias, para ser digna do seu nomee fiel às suas tradições, tem de voltar a pôr emprimeiro lugar este objectivo, mesmo que, paratanto, seja necessário aligeirar a preparação de or-dem técnica que lhe incumbe dar aos estudantes.

As Universidades católicas são chamadas a de-sempenhar, neste domínio, um papel preponderan-te. E foi esse, aliás, o pensamento fundamental quepresidiu à sua criação, desde o século XIX, e quetem levado a Igreja, como Mãe solícita, a mul-tiplicá-las por todo o orbe. A elas compete realizara síntese das ciências e a sua hierarquização, den-tro do único critério possível de verdade — o quefaz convergi-las a todas em Deus, fonte da sabe-doria infinita —, dando assim o exemplo às univer-

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sidades oficiais, enquanto estas, por força da inér-cia, por cobardia intelectual, ou por demasiada su-bordinação ao pensamento agnóstico do Estado, nãoquiserem ou não puderem reassumir a missão his-tórica, que, durante séculos e tão nobremente, nestedomínio, desempenharam.

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COMO ENCAROU HISTORICAMENTEA UNIVERSIDADE AS SUAS

«RESPONSABILIDADES SOCIAIS»

14. Como desempenhou a Universidade a sua missãosocial de colocar a cultura superior ao seviço dacomunidade: a) Na Idade Média; b) Desde a Renas-cença; c) Desde o século XVIII.

A Idade Antiga não chegou a tomar consciênciadas responsabilidades que impendem sobre os ho-mens de estudo. Não se contesta que alguns ho-mens, isoladamente, tenham conseguido aperceber--se dessas responsabilidades, e tenham procurado,cada um por si, assumi-las dignamente, pondo o seusaber ao serviço da sociedade em que viveram.Mas o que não houve foi uma consciência colec-tiva dos gravíssimos deveres de ordem social queimpendem sobre os profissionais do estudo. O cultodas artes pelas artes, sem um rumo definido, sem

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um objectivo social a preencher, foi a nota carac-terística que dominou as escolas particulares e ofi-ciais da Antiguidade grega e romana.

a) Na Alta Idade Média, o estudo das letras edas artes passa a ter um objectivo bem determi-nado: servir a Igreja, através duma melhor prepa-ração para o exercício das profissões eclesiásticas.Surge assim, pela primeira vez, um determinadosentido social, na actividade da gente de estudo,na medida em que servir a Igreja representa já, decerto modo, servir a Sociedade. Mas só no sé-culo XII é que esse sentido social há-de amadure-cer plenamente, quando os espíritos cultos se com-penetram de que a sua actividade, até para melhorserviço da Igreja, deve ser orientada num planomais vasto, colocando-se ao serviço integral dacomunidade cristã, ou seja, servindo essa comuni-dade em todos os sectores que possam interessarà plena realização do homo christianus, no domí-nio individual, no domínio social e no domínio so-brenatural.

Dizer quais foram as causas que contribuírampara a formação desta consciência colectiva sobreos deveres sociais da gente de estudo, seria repe-

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tir o que atrás dissemos sobre a origem da Uni-versidade, tão estreitamente ligados os dois factosse encontram entre si. Pode, de facto, afirmar-seque a Universidade não é mais do que uma expres-são desta nova consciência social que se apode-rou das grandes escolas do século XII.

Repare-se, porém, que a Universidade medieval,nesta importante tarefa de colocar a cultura supe-rior ao serviço da comunidade, não faz qualquerdestrinça entre comunidade nacional e comunidadeinternacional. A comunidade que ela serve é, sim-plesmente, a comunidade cristã, e, só através dacomunidade cristã universal, ela serve também asdiferentes comunidades nacionais, na medida emque estas são uma fiel reprodução daquela.

Isto significa que as disciplinas de puro interessenacional não podem aspirar, de modo algum, nestaépoca, a ter categoria universitária. Seria absurdopensar em que uma universidade medieval seocupasse, por exemplo, do estudo da língua pátriaou do ensino do direito nacional. As disciplinas quea Universidade ensina são apenas as que possuemvalor universal, o que equivale a dizer que o ensi-no universitário é igual em toda a parte: — Entre

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um licenciado de Coimbra ou de Salamanca e umlicenciado de Bolonha ou de Oxónia, pode haverdiferenças no grau dos conhecimentos adquiridos,mas não haverá qualquer diferença de formação in-telectual, porque a orientação dos cursos que se-guiram é exactamente a mesma. Só dentro destequadro, aliás, é possível compreender o famoso iusubique docendi, que a Universidade outorgava aosseus licenciados, e que é a expressão mais com-pleta do carácter ecuménico do ensino universitá-rio medieval.

b) Esta plena identificação entre os valores cul-turais de cada país e os da comunidade cristã uni-versal havia de quebrar-se, porém, a partir do Re-nascimento e, sobretudo, a partir da Reformaprotestante. A Universidade continua consciente dasua missão de colocar a cultura superior ao servi-ço da comunidade; mas existe agora, dentro dela,sob esse aspecto, um verdadeiro desdobramento deactividades: continua a servir a cultura ecuménica,na medida em que continua dedicada ao estudo eao ensino das disciplinas de valor universal; mas,na parte mais nobre da sua tarefa, ou seja, noestudo e ensino das disciplinas do espírito, encontra-

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-se impossibilitada de realizar uma obra de interesseuniversal, porque a unidade da cultura cristã tinhadeixado de existir: — Desde este momento, a Uni-versidade, ou serve, simplesmente, a cultura parti-cularista duma Nação — como é o caso das univer-sidades protestantes —, ou serve uma cultura que,embora de carácter supernacional, já não tem a uni-versalidade que até então possuíra — como é ocaso das universidades dos países católicos.

Dentro deste quadro, o ius ubique docendi daUniversidade medieval deixa de ter qualquer sen-tido, e desaparece no número das instituições ob-soletas, pois o ensino universitário é agora profun-damente diferente, dum país católico para um paísprotestante, ou dum país luterano para um paíscalvinista ou anglicano.

À Universidade cabe, porém, ainda, nesta épo-ca, o grande mérito de ter remediado, na medidado possível, o desentendimento entre as Nações davelha Europa, que forçosamente tinha de produzir--se, como consequência deste brusco ruir da suaunidade cultural. Foi essa, pode dizer-se, na vira-gem da história a que estamos a referir-nos, a maispesada das suas responsabilidades perante a comu-

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nidade internacional. E a Universidade soube en-frentá-la corajosamente, lançando as bases dumanova disciplina de transcendente importância: o di-reito internacional público. Quer a Universidadecatólica, primeiro, quer a Universidade protestante,depois, não se pouparam a esforços, no sentido deprestar à comunidade internacional esse serviço deque ela carecia então, acima de qualquer outro.

c) Durante o século XVIII, a evolução que setinha iniciado com a Renascença e com a Refor-ma acaba de consumar-se. Por influência do ilumi-nismo e do utilitarismo, expressos nas reformas dodespotismo esclarecido e nas reformas nascidas daRevolução Francesa, a Universidade passa a seruma instituição puramente nacional. Só serve acomunidade internacional na medida em que estudae divulga certas disciplinas de interesse comum atodas as nações; em tudo o resto, está exclusiva-mente ao serviço dos valores culturais de cadanação. Até essa data, embora tendo perdido o seucarácter de instituição ecuménica, a Universidadeainda tinha conservado, pelo menos nos paísescatólicos, um certo carácter supernacional. Mas,

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agora, perde inteiramente esta índole, nos própriospaíses católicos.

Os reflexos desastrosos que esta nova orienta-ção há-de ter para as relações culturais entre ospovos, saltam à vista, agravados ainda com o pro-gressivo abandono do latim como língua científi-ca: — Noutro tempo, os homens de estudo serviamum mesmo ideal e uma mesma cultura, e enten-diam-se numa língua comum. No advento do sé-culo XIX, passam a viver fechados no pequenomundo da cultura do seu país, e desconhecem, asmais das vezes, o labor científico que se desenvolveno país vizinho. Quando querem reagir contra esteisolamento, vêem-se obrigados a estudar os idiomasestrangeiros e a adaptar o seu espírito à compreen-são duma cultura estranha, quantas vezes profunda-mente diversa da sua. Como, porém, se lhes tornaimpossível aprender todos os idiomas e interpretardevidamente todas as culturas, deixam-se seduzirfacilmente por aquelas que melhor conseguem estu-dar e entender; e lançam-se, depois, numa perigosaidolatria dos valores culturais assimilados, como se,para além deles, não houvesse outros, igualmentedignos de ser estudados e compreendidos.

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Estes homens, que assim quiseram, na melhor dasintenções, lançar-se em voos mais largos, ultrapas-sando os limites do meio cultural e científico emque viviam, prestaram, por via de regra, no decursodo século XIX e nas primeiras décadas do nossoséculo, o pior serviço que podiam prestar à culturado seu país, maculando-a com elementos estranhos,ou submetendo-a, à força, a uma zona de influên-cia cultural estrangeira absolutamente contrária àssuas tradições.

Só nos nossos dias, com o rápido progresso dascomunicações internacionais, e com as enormes faci-lidades conquistadas para o conhecimento da activi-dade cultural desenvolvida, em cada momento, nospaíses estrangeiros, começam os homens de estudodos diferentes países a ficar em condições de me-lhor se conhecerem e de melhor se compreenderemuns aos outros. A Universidade do século XX, numapalavra, tem ao seu dispor outros meios, de que nãodispôs a Universidade do século passado, para colo-car a cultura superior ao serviço da comunidadeuniversal, sem prejudicar, como aquela prejudicou,a tradição cultural das diferentes comunidades na-cionais. Assim ela saiba e queira fazê-lo.

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15. Como desempenhou a Universidade a sua missãosocial de colocar a cultura superior ao alcance detodos os homens, sem distinção de condições sociaise económicas: a acção histórica dos colégios univer-sitários.

Um outro aspecto existe, das responsabilidadessociais da Universidade, que ela soube encarar coma necessária largueza de vistas, enquanto forçasestranhas a não vieram impedir de o fazer: tornara cultura superior acessível a todos os homens, semdistinção de classes sociais e económicas.

O acesso à cultura tinha sido, durante toda aAntiguidade, o exclusivo dum reduzido número deprivilegiados. Foi a Igreja, ao proclamar a igualdadeabsoluta de todos os homens perante Deus, e aoabrir as dignidades eclesiásticas aos indivíduos detodas as classes sociais, que rasgou, neste domí-nio, como em tantos outros, novos horizontes àhumanidade. Nas escolas eclesiásticas, desde ocomeço da Idade Média, encontravam guarida eensino gratuito todos aqueles — pobres ou ricos,nobres ou humildes — que pretendiam dedicar-seà carreira eclesiástica, ou que, simplesmente, de-

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sejavam cultivar o seu espírito, e subir, por essa via,na escala social.

As universidades, nascidas sob a égide da Igreja— ou pura continuação, até, por vezes, duma es-cola eclesiástica — não podiam adoptar atitudediferente desta. Não bastava, no entanto, que o en-sino universitário fosse plenamente gratuito, comoera, e que as portas da Universidade estivessemfranqueadas a todos os homens sem distinção declasses, para poder dizer-se que esse ensino eraacessível a todos. Se o ensino elementar e médioestava espalhado por toda a parte onde houvesseuma catedral, um mosteiro, ou uma simples igrejaparoquial, o ensino superior estava concentrado emmeia dúzia de lugares, ao longo da Europa, inaces-síveis, muitas vezes, àqueles que desejavam pro-curá-los, pelas elevadas somas que necessário eradespender para aí se deslocarem, e para se susten-tarem durante o largo período de duração dos es-tudos.

Acorreram a remediar estes inconvenientes osesforços conjugados da Universidade, da Igreja, dosmonarcas, e até dos generosos Mecenas, que vi-ram aí uma excelente oportunidade de exercitar a

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caridade cristã: — Os monarcas deram o seu con-tributo para a solução do problema, não só com aconcessão de bolsas de estudo aos escolares do seupaís, que buscavam as universidades estrangeiras,como, sobretudo, através da fundação de nume-rosas universidades nos seus reinos. Não foi me-nor, porém, a contribuição prestada pela generosi-dade da Igreja — dos seus dignitários, dos seusbeneficiados, das suas ordens religiosas — e a pró-pria generosidade dos particulares, com a fundação,em largo número, dos famosos colégios universitá-rios. De facto, estes colégios, durante os primei-ros séculos da sua existência, foram instituiçõesquase exclusivamente destinadas a albergar estu-dantes pobres, dando-lhes uma possibilidade deseguir os estudos superiores, que, de outro modo,não teriam.

O Colégio dos Dezoito, criado em 1180, peloCabido de Notre-Dame, junto do Hospital de San-ta Maria de Paris, foi a primeira fundação destegénero, logo seguida de numerosas outras, tantonessa cidade como nas demais cidades universitá-rias europeias. Só em Paris, no século XIV, esta-vam criados mais de trinta colégios, onde algumas

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centenas de estudantes, das mais diversas pro-cedências, recebiam gratuitamente agasalho e sus-tento.

Estes colégios universitários vieram a ser, maistarde, verdadeiros centros de ensino, que colabo-ravam activamente na obra cultural da Universi-dade; e, em alguns lados, como em Oxford e emCambridge, acabaram por absorver em si a própriaUniversidade. Mas nunca abandonaram de todo asua primitiva função assistencial, colaborando sem-pre na tarefa de tornar o ensino universitário aces-sível às classes desprotegidas.

A Revolução Francesa e os Estados liberais queela gerou acabaram, por toda a parte, como siste-ma dos colégios, nas universidades do continenteeuropeu, argumentando com o seu carácter confes-sional e com a necessidade de laicizar o ensino.O inevitável resultado não tardou a produzir-se: oacesso à cultura superior passou a ser um exclu-sivo dos indivíduos economicamente privilegiados;e nunca a gente humilde encontrou, como desdeentão, tão cerradas às suas aspirações culturais asportas da Universidade.

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16. Como desempenhou a Universidade a sua missãosocial de servir a verdade e impedir a difusão doerro.

O dever de difundir a verdade e de impedir adifusão do erro constitui, para as elites intelectuais,uma responsabilidade social não menos grave queas já apontadas. Soube a Universidade tomar ple-na consciência desse dever e desempenhar-se delecabalmente?

Pode afirmar-se que sim, na medida em queteve liberdade para o fazer. Conforme vimos, aotratar da vida institucional da Universidade nostempos passados, a actividade universitária foi de-crescendo progressivamente de autonomia e de li-berdade intelectual, ao longo dos séculos. Hou-ve períodos da História, em que a Universidadenão fez mais do que servir ideais ético-políticosdum grupo social ou dum Estado. Nesses períodos,limitou-se a servir a verdade ou a servir o erro,consoante aquela ou este lhe foram superiormen-te impostos.

Mas, nos períodos em que a Universidade pôdegozar de plena liberdade de movimentos, ela sim-

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bolizou, quase sempre, a voz do bom senso, da mo-deração e do equilíbrio, na luta das ideias e dascorrentes doutrinais. Como órgão colectivo, supe-rior às contingências do tempo e do espaço, coma responsabilidade duma linha de pensamentohomogénea, a ligar o passado ao futuro, a Univer-sidade não podia servir, de ânimo leve, qualquerinovação doutrinal irresponsável, formulada pelo pri-meiro pensador que se lhe deparava no caminho.

Muito embora essas inovações tenham partido,um bom número de vezes, de um ou outro dos seusmestres, a Universidade como tal, isto é, como corpocolectivo, conservou-se sempre, perante elas, numaatitude de prudente expectativa. Não se fechou aoprogresso, e acabou por assimilar as novas corren-tes doutrinais ou científicas, quando chegou aconvencer-se da sua veracidade, nos mesmos ter-mos em que abertamente as condenou, quandochegou a convencer-se do seu carácter errado.Mas, antes de as aceitar ou condenar, dedicou-sedemoradamente ao seu estudo, mantendo para comelas a necessária reserva, ou evitando mesmo o seuensino, quando lhe pareceu que ele poderia levara aceitá-las como verdades conquistadas, na fase

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em que não passavam ainda do domínio das hipó-teses por confirmar.

Este sentido das responsabilidades, perante o gra-ve problema social de servir a verdade, valeu-lhe,não poucas vezes, ao longo da história, a acusa-ção de retrógrada, pois sempre houve insensatos,em todos os tempos, a proclamar que o dever daUniversidade é ter as suas portas abertas, semquaisquer reservas, a todas as doutrinas inovadoras.

Superior a essas acusações, procurou ela, sem-pre que não foi vítima da opressão do Estado oudos grupos sociais, seguir firmemente o seu cami-nho, consciente de que nada pode sobrelevar emimportância, na escala dos seus deveres de ordemsocial, o dever de servir a verdade e de a defen-der das investidas que o erro e as forças do malpermanentemente lançam contra ela.

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ÍNDICE

Nota editorial .............................................. 3

Traços gerais duma «história institucional»da Universidade ................................... 5

Os «fins da Universidade» ao longo da his-tória ....................................................... 35

Como encarou historicamente a Universidadeas suas «responsabilidades sociais» ...... 55

Colecção Essencial

1. IRENE LISBOAPaula Morão

2. ANTERO DE QUENTALAna Maria A. Martins

3. A FORMAÇÃO DA NACIONALIDADEJosé Mattoso

4. A CONDIÇÃO FEMININAMaria Antónia Palla

5. A CULTURA MEDIEVAL PORTUGUESA (SÉCS. XI A XIV)José Mattoso

6. OS ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA CULTURAPORTUGUESAJorge Dias

7. JOSEFA D’ÓBIDOSVítor Serrão

8. MÁRIO DE SÁ-CARNEIROClara Rocha

9. FERNANDO PESSOAMaria José de Lancastre

10. GIL VICENTEStephen Reckert

11. O CORSO E A PIRATARIAAna Maria P. Ferreira

12. OS «BEBÉS-PROVETA»Clara Pinto Correia

13. CAROLINA MICHAËLIS DE VASCONCELOSMaria Assunção Pinto Correia

14. O CANCROJosé Conde

15. A CONSTITUIÇÃO PORTUGUESAJorge Miranda

16. O CORAÇÃOFernando de Pádua

17. CESÁRIO VERDEJoel Serrão

18. ALCEU E SAFOAlbano Martins

19. O ROMANCEIRO TRADICIONALJ. David Pinto-Correia

20. O TRATADO DE WINDSORLuís Adão da Fonseca

21. OS DOZE DE INGLATERRAA. de Magalhães Basto

22. VITORINO NEMÉSIODavid Mourão-Ferreira

23. O LITORAL PORTUGUÊSIlídio Alves de Araújo

24. OS PROVÉRBIOS MEDIEVAIS PORTUGUESESJosé Mattoso

25. A ARQUITECTURA BARROCA EM PORTUGALPaulo Varela Gomes

26. EUGÉNIO DE ANDRADELuís Miguel Nava

27. NUNO GONÇALVESDagoberto Markl

28. METAFÍSICAAntónio Marques

29. CRISTÓVÃO COLOMBO E OS PORTUGUESESAvelino Teixeira da Mota

30. JORGE DE SENAJorge Fazenda Lourenço

31. BARTOLOMEU DIASLuís Adão da Fonseca

32. JAIME CORTESÃOJosé Manuel Garcia

33. JOSÉ SARAMAGOMaria Alzira Seixo

34. ANDRÉ FALCÃO DE RESENDEAmérico da Costa Ramalho

35. DROGAS E DROGADOSAureliano da Fonseca

36. PORTUGAL E A LIBERDADE DOS MARESAna Maria Pereira Ferreira

37. A TEORIA DA RELATIVIDADEAntónio Brotas

38. FERNANDO LOPES GRAÇAMário Vieira de Carvalho

39. RAMALHO ORTIGÃOMaria João L. Ortigão de Oliveira

40. FIDELINO DE FIGUEIREDOA. Soares Amora

41. A HISTÓRIA DAS MATEMÁTICAS EM PORTUGALJ. Tiago de Oliveira

42. CAMILOJoão Bigotte Chorão

43. JAIME BATALHA REISMaria José Marinho

44. FRANCISCO DE LACERDAJ. Bettencourt da Câmara

45. A IMPRENSA EM PORTUGALJoão L. de Moraes Rocha

46. RAÚL BRANDÃOA. M. B. Machado Pires

47. TEIXEIRA DE PASCOAESMaria das Graças Moreira de Sá

48. A MÚSICA PORTUGUESA PARA CANTO E PIANOJosé Bettencourt da Câmara

49. SANTO ANTÓNIO DE LISBOAMaria de Lourdes Sirgado Ganho

50. TOMAZ DE FIGUEIREDOJoão Bigotte Chorão

51/52. EÇA DE QUEIRÓSCarlos Reis

53. GUERRA JUNQUEIROAntónio Cândido Franco

54. JOSÉ RÉGIOEugénio Lisboa

55. ANTÓNIO NOBREJosé Carlos Seabra Pereira

56. ALMEIDA GARRETTOfélia Paiva Monteiro

57. A MÚSICA TRADICIONAL PORTUGUESAJosé Bettencourt da Câmara

58. SAÚL DIAS/JÚLIOIsabel Vaz Ponce de Leão

59. DELFIM SANTOSMaria de Lourdes Sirgado Ganho

60. FIALHO DE ALMEIDAAntónio Cândido Franco

61. SAMPAIO (BRUNO)Joaquim Domingues

62. O CANCIONEIRO NARRATIVO TRADICIONALCarlos Nogueira

63. MARTINHO DE MENDONÇALuís Manuel A. V. Bernardo

64. OLIVEIRA MARTINSGuilherme d’Oliveira Martins

65. MIGUEL TORGAIsabel Vaz Ponce de Leão

66. ALMADA NEGREIROSJosé-Augusto França

67. EDUARDO LOURENÇOMiguel Real

68. D. ANTÓNIO FERREIRA GOMESArnaldo de Pinho

69. MOUZINHO DA SILVEIRAA. do Carmo Reis

70. O TEATRO LUSO-BRASILEIRODuarte Ivo Cruz

71. A LITERATURA DE CORDEL PORTUGUESACarlos Nogueira

72. SÍLVIO LIMACarlos Leone

73. WENCESLAU DE MORAESAna Paula Laborinho

74. AMADEO DE SOUZA-CARDOSOJosé-Augusto França

75. ADOLFO CASAIS MONTEIROCarlos Leone

76. JAIME SALAZAR SAMPAIODuarte Ivo Cruz

77. ESTRANGEIRADOS NO SÉCULO XXCarlos Leone

78. FILOSOFIA POLÍTICA MEDIEVALPaulo Ferreira da Cunha

79. RAFAEL BORDALO PINHEIROJosé-Augusto França

80. D. JOÃO DA CÂMARALuiz Francisco Rebello

81. FRANCISCO DE HOLANDAMaria de Lourdes Sirgado Ganho

82. FILOSOFIA POLÍTICA MODERNAPaulo Ferreira da Cunha

83. AGOSTINHO DA SILVARomana Valente Pinho

84. FILOSOFIA POLÍTICA DA ANTIGUIDADE CLÁSSICAPaulo Ferreira da Cunha

85. O ROMANCE HISTÓRICORogério Miguel Puga

86. FILOSOFIA POLÍTICA LIBERAL E SOCIALPaulo Ferreira da Cunha

87. FILOSOFIA POLÍTICA ROMÂNTICAPaulo Ferreira da Cunha

88. FERNANDO GILPaulo Tunhas

89. ANTÓNIO DE NAVARROMartim de Gouveia e Sousa

90. EUDORO DE SOUSALuís Lóia

91. BERNARDIM RIBEIROAntónio Cândido Franco

92. COLUMBANO BORDALO PINHEIROJosé-Augusto França

93. AVERRÓISCatarina Belo

94. ANTÓNIO PEDROJosé-Augusto França

95. SOTTOMAYOR CARDIACarlos Leone

96. CAMILO PESSANHAPaulo Franchetti

97. ANTÓNIO JOSÉ BRANDÃOAna Paula Loureiro de Sousa

98. DEMOCRACIACarlos Leone

99. A ÓPERA EM PORTUGALManuel Ivo Cruz

Composto e impressona

Imprensa Nacional-Casa da Moedacom uma tiragem de 800 exemplares.

Orientação gráfica do Departamento Editorial da INCM.

Acabou de imprimir-seem Março de dois mil e oito.

ED. 1015282ISBN 978-972-27-1655-0

DEP. LEGAL N.o 272 374/08

103103

AHISTÓRIADAUNIVERSIDADE

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Guilherme Braga da Cruz

O essencial sobre

A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE

9 7 8 9 7 2 2 7 1 6 5 5 0

ISBN 978-972-27-1655-0

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