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PREFEITURA DO MUNICPIO DE SO PAULO SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAO DIRETORIA DE ORIENTAO TCNICA

Orientaes Curriculares e Proposio de Expectativas de Aprendizagem para a Educao Infantil e Ensino Fundamental

Lngua Portuguesa

Para

Pessoa surda - LIBras

2008

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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

So Paulo (SP). Secretaria Municipal de Educao. Diretoria de Orientao Tcnica. Orientaes curriculares e proposio de expectativas de aprendizagem para Educao Infantil e Ensino Fundamental : Lngua Portuguesa para pessoa surda / Secretaria Municipal de Educao So Paulo : SME / DOT, 2008. 114 p. : il. Bibliografia 1.Educao Especial I. Programa de Orientaes Curriculares e Proposio de Expectativas de Aprendizagem CDD 371.9 Cdigo da Memria Tcnica: SME-DOT/Sa.016/08

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PREFEITURA DA CIDADE DE SO PAULO Gilberto Kassab Prefeito SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAO Alexandre Alves Schneider Secretrio Clia Regina Guidon Faltico Secretria Adjunta Waldeci Navarrete Pelissoni Chefe de Gabinete DIRETORES REGIONAIS DE EDUCAO Eliane Seraphim Abrantes, Elizabete dos Santos Manastarla, Ftima Elisabete Pereira Thimteo, Hatsue Ito, Isaias Pereira de Souza, Jos Waldir Gregio, Leila Barbosa Oliva, Leila Portella Ferreira, Marcello Rinaldi, Maria ngela Gianetti, Maria Antonieta Carneiro, Silvana Ribeiro de Faria, Sueli Chaves Eguchi. DIRETORIA DE ORIENTAO TCNICA Regina Clia Lico Suzuki (Diretora Coordenadora Geral do Programa) DIVISO DE ORIENTAO TCNICA EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS Romy Schinzare (Diretora) Antonio Gomes Jardim, Dbora Cristina Yo Ki, Leny ngela Zolli Juliani, Rosa Maria Laquimia de Souza. DIVISO DE ORIENTAO TCNICA ENSINO FUNDAMENTAL E MDIO Elenita Neli Beber (Diretora) Ailton Carlos Santos, Ana Maria Rodrigues Jordo Massa, Ione Aparecida Cardoso Oliveira, Marco Aurlio Canadas, Maria Virgnia Ortiz de Camargo, Rosa Maria Antunes de Barros. DIVISO DE ORIENTAO TCNICA EDUCAO INFANTIL Yara Maria Mattioli (Diretora) Ftima Bonifcio, Matilde Conceio Lescano Scandola, Patrcia Maria Takada. EDUCAO ESPECIAL Adriana Sapede Rodrigues, Mariluci Campos Colacio, Mnica Leone Garcia Federico, Silvana Lucena dos Santos Drago. CRCULO DE LEITURA Angela Maria da Silva Figueredo, Leika Watabe, Margareth Aparecida Ballesteros Buzinaro, Regina Celia dos Santos Camara, Rosanea Maria Mazzini Correa, Silvia Moretti Rosa Ferrari, Suzete de Souza Borelli. TECNOLOGIA DA INFORMAO E DA COMUNICAO Carlos Alberto Mendes de Lima, Denise Mortari Gomes Del Grandi, Lia Cristina Lotito Paraventi, Tidu Kagohara. PROJETOS ESPECIAIS / ASSESSORIA ESPECIAL Marisa Ricca Ximenes (assessora Tcnica) Rosana de Souza (Grupo de Educao para a Diversidade tnico-Racial). EQUIPE TCNICA DE APOIO DA SME/DOT Ana Lcia Dias Baldineti Oliveira, Celso Antonio Sereia, Delma Aparecida da Silva, Jarbas Mazzariello, Magda Giacchetto de villa, Maria Teresa Yae Kubota Ferrari, Rosa Peres Soares, Tnia Nardi de Pdua, Telma de Oliveira.

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ASSESSORIA e ELABORAO Maria Cristina da Cunha Pereira COLABORADORES Integrantes do Grupo Referncia: Adriana de Menezes Martins, Adriana Sapede Rodrigues, Ana Paula Boldorini Flrio, Dbora Caetano Kober, Eliana Carone de Souza, Helosa Ins de Oliveira, Isabel Cristina Vicentino, Marcia Cruz, Mrcia Lapietra Lobo, Maria Ins C. de Castro A. Rodrigues, Maria Izilda Riccetti Fernandes, Marli Caseiro, Marta Elis Dias, Silvana Lucena dos Santos Drago, Silvia Maria Estrela Loureno, Zuleide Cavallaro de Lino.

Professores das Escolas Municipais de Educao Especial que participaram da leitura crtica do documento apresentando sugestes: Adriana de Cssia Martins Rampazo, Adriana Gomes Maluf, Alice Marlene C. Regazzo, Ana Cludia dos Santos Camargo, Ana Claudia Fossati Mota, Ana Cristina Camano Passos, Ana Maria Reichert Zemann, Ana Paula Mari Takagui, Antnio Csar Alario Pires, Arlene de Oliveira Montovani, Bernadete Enoch Scofield Sena Lima, Carmen Martini Costa, Clia Ftima Utako Kayama Horie, Cerilde Ferronato, Claudia Regina Vieira, Dbora Rodrigues Moura, Denise Riguetto Rodrigues, Diona Barreto, Edina Ires Locatelli, gler Pereira Lima, Elaine Farnochi Mendona, Eliana Franco de Lima, Elisabete de Ftima Boccia, Elisabeth Ap. Andrade Silva Figueira, Elizabete Pasquariello, Elvira Calvetti Gonzalez, Elvira Maria Duarte de Oliveira, Iracema de Souza Fortes Maaz, Jlia Maria Garcia Pedroso, Ligia Dias Nogueira de Souza, Lourdes Nozaki, Luciana Marconi, Lucimar Bizio, Magaly de Lourdes S. M. Dedino, Marcellina Tallarico Vaiano, Mrcia Akiko Nakashima Rosa, Mrcia Ferreira de Oliveira, Mrcia Furquim, Maria Adriane da Silva Fonseca, Maria Aparecida Casado Pinto, Maria Ignez Lemos dos Santos, Maria Ins Leandro, Maria Jos Brumini Dellore, Maria Lucia Fassi Simardi, Maria Vilani Feitosa, Marly Hissako Kimura Kubo, Milena Galante, Mnica Aparecida Bevilacqua, Mnica Conforto Gargalaka, Mnica Royg, Neide Domingos Ferreira, Nilza Aparecida Pavan A. Marques, Palmira Barranqueiro Jung Santos, Raquel Josefa de S. Bernardes, Regina Alexandre Sarsano, Renata de Sousa Santos, Rita de Cssia Frias, Rosana Xavier Duarte A. Jaoube, Rosangela Guariglia DAgostino, Roseli Gonalves do Esprito Santo, Rosemeire Francisco T. de Souza, Sandra Regina Farah Azzi, Selma Regina Machado, Silvana A. S. Ferreira, Solange Aparecida Ribeiro, Sonia Maria Abizzu Sanches, Tnia Maria Guedes Russomano, Telma Regina Salles Silva, Vera Cristina Teixeira Rodrigues, Vera Lucia de Medeiros, Vera Lucia Turatti Valrio, Vivian de Andrade Torres Machado, Vivian Renate Valente.

CENTRO DE MULTIMEIOS Projeto Grfico Ana Rita da Costa, Conceio A. B. Carlos, Hilrio Alves Raimundo, Joseane Ferreira. EDITORAO, CTP, IMPRESSO E ACABAMENTO Art Printer

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Caros educadores e educadoras da Rede Municipal de So PauloEstamos apresentando a vocs o documento Orientaes Curriculares e Proposio de Expectativas de Aprendizagem para a Educao Infantil e Ensino Fundamental Lngua Portuguesa para Pessoa Surda, que faz parte do Programa de Orientao Curriculares da Secretaria Municipal de Educao. O programa tem como objetivos principais contribuir para a r eflexo e discusso sobre o que os estudantes precisam aprender, relativamente a cada uma das reas de conhecimento, e subsidiar as escolas para o processo de seleo e organizao de contedos. O presente documento foi organizado por especialistas da rea da surdez e coordenado pela Diretoria de Orientao Tcnica Educao Especial. Foi submetido anlise pelos professores das Escolas Municipais de Educao Especial EMEE, que apresentaram propostas de reformulao e sugestes. A presente verso o resultado da sistematizao dos trabalhos que vm sendo realizados nas EMEE nos ltimos anos e se caracteriza como proposta curricular indita que certamente contribuir tanto para a prtica pedaggica do professor como para melhor aprendizado dos alunos surdos. Esse processo de construo coletiva exigiu o envolvimento amplo de todos os educadores que atuam nas EMEE e das instncias dirigentes da Secretaria Municipal de Educao, como coordenadoras do debate e mediadoras das tomadas de deciso. Contamos com a participao de todos neste compromisso de oferecer cada vez mais um ensino de qualidade para as crianas e jovens da cidade de So Paulo.Alexandre Alves SchneiderSecretrio Municipal de Educao

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ORIENTAES CURRICULARES INTRODUO

SUMRIOPARTE 1 PARTE 2

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1. Ponto de Partida ......................................................................................................................................................................... 14 1.1 Ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos ................................................................................................................. 14 1.2 Ensino da Lngua Portuguesa como segunda lngua para alunos surdos .......................................................................... 17 1.3 Princpios bsicos do ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos ............................................................................ 21 1.4 Orientaes didticas gerais ................................................................................................................................................... 22 2. Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa Escrita por alunos surdos na Educao Infantil........................ 26 2.1 A escrita do prprio nome........................................................................................................................................................ 31 2.2 Outras escritas infantis ............................................................................................................................................................... 33 3. Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa Escrita por alunos surdos do Ensino Fundamental Ciclo I .... 38 3.1 Objetivos do ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos no Ensino Fundamental Ciclo I ................................. 39 3.2 Critrios para a seleo das Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no Ensino Fundamental ciclo I ........................................................................................................................................................ 42 3.3 Gneros textuais propostos para o ciclo I .............................................................................................................................. 43 3.4 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa para cada ano do Ensino Fundamental Ciclo I .................. 48 3.4.1 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 1 ano do Ensino Fundamental - Ciclo I .. 48 3.4.2 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 2 ano do Ensino Fundamental - Ciclo I .. 53 3.4.3 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 3 ano do Ensino Fundamental - Ciclo I .. 56 3.4.4 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 4 ano do Ensino Fundamental - Ciclo I .. 60 3.4.5 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 5 ano do Ensino Fundamental - Ciclo I .. 65 4. Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa Escrita por alunos surdos do Ensino Fundamental Ciclo II .... 72 4.1 Objetivos do ensino da Lngua Portuguesa no Ensino Fundamental Ciclo II .................................................................. 72 4.2 Critrios para a seleo das Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no Ensino Fundamental ciclo II ......................................................................................................................................................... 74 4.3 Gneros textuais propostos para o ciclo II ............................................................................................................................. 75 4.4 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa para cada ano do Ensino Fundamental Ciclo II ................. 78 4.4.1 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 1 ano do Ensino Fundamental - Ciclo II .. 78 4.4.2 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 2 ano do Ensino Fundamental - Ciclo II .. 82 4.4.3 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 3 ano do Ensino Fundamental - Ciclo II .. 88 4.4.4 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 4 ano do Ensino Fundamental - Ciclo II .. 94 5. Orientaes Metodolgicas e Didticas para a Implementao das Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa para alunos surdos ......................................................................................................................................................................... 102 5.1 Orientaes para a organizao das Expectativas de Aprendizagem ....................................................................... 102 5.2 Ler e produzir textos: consideraes gerais......................................................................................................................... 104 5.2.1 Atividades de leitura ............................................................................................................................................................ 105 5.2.2 Atividades de produo de textos .................................................................................................................................... 106 5.3 Como articular o estudo dos gneros s expectativas referentes ao sistema de escrita alfabtica e aos padres de escrita......................................................................................................................................................................... 107 5.4 Modalidades organizativas para abordagem dos contedos de Lngua Portuguesa .................................................. 107 5.5 Avaliao da Lngua Portuguesa ......................................................................................................................................... 108

PARTE 3

PARTE 4

PARTE 5

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................................................................... 112

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INTRODUO

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IntroduoO estabelecimento de orientaes e expectativas de aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos tem de considerar que, diferentemente das crianas ouvintes, que aprendem a lngua majoritria em casa, na interao com a famlia, a maior parte das surdas chega escola sem uma lngua adquirida. Filhas de pais ouvintes, elas so geralmente expostas lngua majoritria na modalidade oral, da qual, na melhor das hipteses, tm acesso a apenas alguns fragmentos. Reconhecendo que, por terem perda auditiva, as pessoas surdas compreendem e interagem com o mundo por meio de experincias visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Lngua Brasileira de Sinais LIBRAS -, o Decreto Federal n 5626, de 22 de dezembro de 2005, estabelece que os alunos surdos sejam submetidos a uma educao bilnge, na qual a Lngua Brasileira de Sinais a primeira lngua e a Lngua Portuguesa, na modalidade escrita, a segunda. Considerada segunda lngua, esperado que o aprendizado da Lngua Portuguesa pelos alunos surdos se d mais tarde do que para os ouvintes, uma vez que, por virem de famlias ouvintes, chegam geralmente escola sem a Lngua Brasileira de Sinais, sua primeira lngua. A Lngua Brasileira de Sinais uma lngua visual-espacial, com gramtica prpria, que preenche as mesmas funes que a Lngua Portuguesa falada para os ouvintes. Deve ser, portanto, adquirida nainteraocomusuriosfluentesdamesma,osquais,envolvendo as crianas surdas em prticas discursivas e interpretando os enunciados produzidos por elas, insiram-nas no funcionamento desta

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lngua. Ela vai ter papel fundamental no aprendizado da Lngua Portuguesa, uma vez que possibilitar, entre outras coisas, conhecimento de mundo e de lngua com base nos quais os alunos surdos podero atribuir sentido ao que lem e escrevem.

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1. PONTO DE PARTIDAUma vez que os alunos surdos vo, na maioria das vezes, ter acesso Lngua Portuguesa na escola, faz-se importante tecer algumas consideraes sobre como tem se caracterizado o ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos em nosso pas.

1.1 Ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdosDiferentemente das crianas ouvintes, que aprendem a Lngua Portuguesa em casa, na interao com os familiares, a maior parte das crianas surdas vai aprend-la na escola. Por no terem acesso linguagem oral, geralmente as crianas surdas so privadas de situaes que as crianas ouvintes vivenciam diariamente e que respondem pela aquisio incidental do seu conhecimento, tais como conversas com a famlia e contao de histria, entre outras. Em decorrncia disso, geralmente as crianas surdas chegam escola com pouco ou nenhum conhecimento da Lngua Portuguesa. At dcada de 80, no Brasil, o objetivo das escolas para surdos era oralizar os alunos. Assim, o ensino tinha como meta o uso da Lngua Portuguesa na modalidade oral. Visando ao aprendizado da Lngua Portuguesa oral, o professor procedia exposio dos alunos surdos a palavras e prosseguia com a utilizao destas palavras em estruturas frasais, primeiramente simples e depois cada vez mais longas e morfossintaticamente mais complexas. Por meio de exerccios de substituio e de repetio, esperava-se que os alunos memorizassem as estruturas frasais trabalhadas e as usassem. A mesma forma de trabalho era usada no ensino da modalidade escrita da Lngua Portuguesa. O professor selecionava palavras que contivessem as slabas que ele queria focalizar e estas eram trabalhadas primeiramente na forma oral, geralmentecomapoiodoconcreto,edepoisporescrito,comapoiodefiguras. Aps a aquisio de algumas palavras escritas, o professor propunha atividades que envolvessem a produo de frases, geralmente com base em estruturas frasais j trabalhadas.

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Submetidos ao ensino sistemtico e padronizado da lngua, embora muitos alunos surdos chegassem a utilizar estruturas frasais gramaticalmente corretas, tratava-se, na maioria dos casos, de frases estereotipadas, usadas de forma mecnica e em contextos bastante previsveis. Quando utilizadas fora do contexto, observava-se, na maior parte das vezes, desorganizao morfossinttica acentuada,frasesdesestruturadas,nasquaisfaltavamelementosdeligao,flexes etc. Era como se a lngua tivesse sido aprendida mecanicamente, de fora para dentro,semumareflexosobreoseufuncionamento. Asdificuldadesnacompreensodaleitura,assimcomoasdeproduoda escrita, eram to freqentemente observadas que muitas pessoas passaram a atribu-las surdez. Como conseqncia, os surdos foram considerados pessoas que,pornoouvirem,noentendemoquelemeapresentamdificuldades acentuadas no uso da lngua majoritria. Esta forma de ensino, que d nfase ao cdigo da lngua, predominou at recentemente tambm nas aulas de lnguas estrangeiras. Martins-Cestaro (1999) apresenta uma retrospectiva das metodologias comumente empregadas no ensino do francs como lngua estrangeira. Nela fica evidente que, at a dcada de 80, se dava nfase ao cdigo da lngua. Com algumas variaes, todas as metodologias tinham como objetivo que os alunos dominassem a morfologia e a sintaxe da lngua. Para isso, submetia-se os alunos ao ensino gradual de estruturas frasais, por meio de exerccios estruturais. Os alunos repetiam as estruturas apresentadas na sala de aula, visando memorizao e uso. O professor controlava e dirigia o comportamento lingstico dos alunos. Com base nos princpios da teoria comportamental de Skinner, a aquisio de uma lngua era considerada um processo mecnico de formao de hbitos, rotinas e automatismos. Assim como ocorria com os alunos surdos, a passagem dos exerccios de utilizao dos modelos dirigidos pelo professor ao uso espontneo pelos aprendizes de lngua estrangeira raramente acontecia (Martins-Cestaro). Nos ltimos anos, a exemplo do que ocorre no ensino da Lngua Portuguesa para alunos ouvintes, observam-se tentativas de mudana na concepo de lngua tambm no ensino de alunos surdos ou de lnguas estrangeiras. Em vez de cdigo, a lngua tem sido concebida como atividade discursiva. Nestaconcepo,produzirlinguagemsignificaproduzirdiscurso.Odiscurso, quando produzido, manifesta-se lingisticamente por meio do texto, considerado produto da atividade discursiva.

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Como atividade discursiva, o objetivo no ensino da Lngua Portuguesa deve ser a habilidade de compreender e produzir textos e no palavras e frases. A tarefa do professor no corrigir o aluno visando adequao morfossinttica, mas ser interlocutor ou mediador entre o texto e a aprendizagem que vai se concretizando nas atividades em sala de aula. Sua preocupao deve ser a de inserir os alunos em atividades discursivas, como dilogos e textos, e no vocbulos isolados, para que eles possam se constituir como leitores, que atribuem sentido ao que lem, e como escritores, que produzem diferentes gneros e tipos textuais. A prioridade do professor deve ser inicialmente o uso da lngua pelo aluno e no s o conhecimento das regras. A gramtica trabalhada no com o objetivo de que os alunos memorizem as regras, mas como ferramenta para que compreendam o funcionamento da lngua. Uma vez que entendam o funcionamento da Lngua Portuguesa, o professor poder sistematizar a gramtica, o que dever se dar sempre com base no texto. Geraldi (1993, 1996), ao se referir ao ensino da Lngua Portuguesa, destaca que ele deveria centrar-se em trs prticas: na leitura de texto, na produo de textos e na anlise lingstica. Para o autor, as trs prticas esto interligadas na unidade textual, ora objeto de leitura, ora resultado da atividade produtiva do aluno. A prtica de anlise lingstica, inclui, segundo Geraldi, tanto o trabalho sobre questes tradicionais da gramtica quanto sobre questes amplas a propsito do texto, o que dever ser feito com base nas produes dos alunos. O objetivo da anlise lingstica a reviso do texto pelo aluno. O foco no uso da lngua deu origem, no ensino de lnguas estrangeiras, ao mtodo comunicativo, que tem como objetivo ensinar o aluno a se comunicar. Para isto, os exerccios formais e repetitivos deram lugar aos exerccios de comunicao real ou simulada, mais interativos. Utiliza-se a prtica de conceituao, levando o aluno a descobrir, por si s, as regras de funcionamento da lngua atravsdareflexoedaelaboraodehipteses,oqueexigeumamaiorparticipao do aprendiz no processo de aprendizagem. Assim como no ensino de lngua estrangeira, tambm no ensino da Lngua Portuguesa para os alunos surdos, a meta o uso da lngua e no a repetio e memorizao de estruturas gramaticais. Visando o uso da Lngua Portuguesa, os alunos surdos devem ser expostos tanto a leitura como a produo de diferentes gneros e tipos textuais. Estas prticas, no entanto, devem ser vivenciadas primeiramente na Lngua Brasileira de Sinais, a sua primeira lngua. Para isto, a escola deve propiciar a aquisio da Lngua Brasileira de Sinais pelos alunos para que, com base nela, constituam seu conhecimento de Lngua Portuguesa.

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1.2 Ensino da Lngua Portuguesa como segunda lngua para alunos surdosO reconhecimento de que a lngua de sinais possibilita o desenvolvimento do surdo em todos os seus aspectos cognitivo, scio-afetivo-emocional e lingstico somado reivindicao de comunidades de surdos quanto ao direito de usar a lngua de sinais, tem levado, nos ltimos anos, muitas instituies a adotarem um modelo bilnge na educao de surdos. Neste modelo, a primeira lngua a de Sinais, que dar o arcabouo para a aprendizagem da segunda lngua, o Portugus, no caso dos surdos brasileiros. Para ensinar uma segunda lngua aos alunos surdos deve-se considerar que, diferentemente dos ouvintes, eles no dispem, na maior parte das vezes, de uma lngua quando chegam escola, uma vez que as famlias, na maioria ouvintes, fazem uso da modalidade oral da Lngua Portuguesa, inacessvel criana surda. Alm disso, geralmente no conhecem a lngua de sinais. Diante deste cenrio, na escola que, geralmente, as crianas surdas vo ter oportunidade de adquirir a Lngua Brasileira de Sinais, bem como de aprender a Lngua Portuguesa, na modalidade escrita. Sendo a segunda lngua, esperado que o aprendizado da Lngua Portuguesa seja intermediado pela Lngua Brasileira de Sinais. A importncia da lngua de sinais para o aprendizado da lngua majoritria pelas crianas surdas apontada por Svartholm (1998), para quem traduzir textos e mensagens escritas de diferentes tipos a lngua de sinais uma base importante para a aprendizagem da lngua escrita. Segundo Svartholm (1998), a nica forma de assegurar que os textos se tornemsignificativosparaosalunossurdosinterpret-losnalnguadesinais,em um processo semelhante ao observado na aquisio de uma primeira lngua. A pesquisadora prope que, no trabalho com a segunda lngua, a ateno deva estar voltada para a apresentao s crianas surdas do mximo de textos possveis, por meio de narraes repetidas e tradues na lngua de sinais, parando apenas quando for necessrio dar explicaes e fazer comparaes entre as duas lnguas.

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O professor deve ser capaz no apenas de fazer tradues apropriadas de textos e de partes de textos na lngua de sinais e vice-versa, mas tambm de explicar e esclarecer para as crianas aspectos sobre a construo dos textos. Para a autora, tais explicaes deveriam ser dadas numa perspectiva contrastiva, na qual as diferenas e as semelhanas entre a lngua de sinais e a lngua majoritria seriam elucidadas. A meta esclarecer o contedo nos textos e mostrarcomoosignificadoexpressonasduaslnguas.Paraisto,lembraSvartholm, nada mais inadequado do que trabalhar com palavras isoladas. Ao se referir educao de surdos na Sucia, Svartholm (2003) destaca a importncia de ler para as crianas surdas desde a idade pr-escolar. Pode-se contar uma histria na lngua de sinais e mostrar a escrita e as imagens para que as crianas relacionem o contedo ao escrito, ainda que no sejam capazes de ler sozinhas. Quando comeam a ler, as crianas lem o texto junto com seus professores e explicam seus contedos na lngua de sinais. A autora ressalta que os textos lidos no so adaptados, mas fazem parte de livros comuns para crianas: contos de fadas, histrias e outros tipos de textos prprios para crianas. Tambm Tovar (2000) enfatiza a importncia da leitura como principal fonte de informao para a criana surda adquirir a lngua majoritria. Para o autor, isso pode ser conseguido lendo-se para ela contos, escrevendo-lhe bilhetes e cartes, lendo com ela, consultando anncios, rtulos, etiquetas e livros na sua presena, fazendo-a ver a utilidade da escrita nas atividades da vida diria, tais como compras e passeios. A nfase, portanto, deve estar em ler, no em ensinar a ler. As explicaes sobre a gramtica e sobre o funcionamento discursivo devem se reduzir, no incio, somente aos casos em que a criana solicitar, e deixar a sistematizao para mais adiante, quando a criana j tiver mais conhecimento sobre a lngua. Svartholm (1998) destaca o interesse como fator que deve ser considerado no aprendizado da escrita. Ela prope que a criana surda pr-escolar seja exposta literatura infantil e a outras formas normais de uso da linguagem escrita, tais como escrever lista de compras ou cartas e cartes postais para amigos e parentes. Assim como Svartholm, tambm Pereira (2005) enfatiza a importncia de os alunos surdos lerem muito, at mais do que os ouvintes, j que a leitura se constitui como a principal fonte para o desenvolvimento do conhecimento da Lngua Portuguesa. Inicialmente, e sempre que possvel, a atividade de leitura deve ser feita junto com o professor, ao qual caber explicar ao aluno o contedo do texto na Lngua Brasileira de Sinais, bem como responder questes sobre o funcionamento da Lngua Portuguesa escrita, quando o aluno solicitar.

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A meta da leitura para os alunos surdos, como para crianas ouvintes e aprendizes de lnguas estrangeiras, deve ser a compreenso, o que significa trabalhar com textos e no com vocbulos isolados. Por falta de conhecimento da Lngua Portuguesa, comum que os alunos surdos se prendam compreenso dos vocbulos, o que geralmente observado tambm nos aprendizes de lngua estrangeira. Fulgncio e Liberato (2001) observam que, para a compreenso da leitura, oqueinteressanoaidentificaodosignificadoisoladodecadapalavra, massimadepreensodocontedoedasignificaodapalavranaquelecontexto. Sem a montagem de um sentido coerente para o texto, o leitor torna-se altamente dependente das informaes presentes no texto. Segundo as autoras, para depender menos das informaes presentes no texto, o leitor precisa contar com seu conhecimento prvio. o conhecimento anterior sobre a lngua e sobre o mundo que permite ao leitor, medida que vai montando o sentido do texto, fazer previses e inferncias, bem como reduzir o nmero de palavras viveisemcadacontextoepreverosignificado,prescindindodadecodificao de cada elemento individual do texto. A importncia do conhecimento prvio para o leitor surdo apontada por Lane,HoffmeistereBahan(1996),osquaisafirmamque,paraleralmdonvel dedecodificao,osalunossurdosdevemcontar,comoosouvintes,comum conjunto de conhecimentos, que envolve tanto conhecimento da lngua na qual o texto apresentado, como tambm conhecimento de mundo. Tal conjuntoajudaosalunosacriaremexpectativasehiptesessobreossignificados dos textos. Permite, ainda, lembrar o que leram, um processo que ajudado pela integrao de informao nova aquilo que j sabem. Para os mesmos autores, o conhecimento que as crianas trazem para os textos inclui histrias que so passadas atravs das geraes, assim como acontecimentos do dia-a-dia, regras e valores culturais. Ao discutir a compreenso da leitura por alunos ouvintes, Sol (1998) lembra que tarefa do professor mobilizar conhecimento prvio para que os alunos tenham condies de entender o que lem. Cabe a ele ensinar tambm os alunos a fazerem uso deste conhecimento. Para a mesma autora, a interpretao do leitor depende em grande parte do objetivo estabelecido para a leitura. Assim, os objetivos da leitura so elementos que devem ser levados em conta quando se trata de ensinar as crianas a ler e a compreender. A autora destaca a importncia de se ensinar as crianas a ler com diferentes objetivos para obter uma informao, para seguir instrues, para aprender, por prazer, entre outros - para que, com o tempo, elas mesmas sejam capazes de se colocar objetivos de leitura que lhes interessem e que sejam adequados situao.

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Sol faz referncia motivao como mais um elemento que interfere na compreenso do texto. Ressalta que, para que uma pessoa possa se envolver em uma atividade de leitura necessrio que se sinta capaz de ler, de compreender o texto que tem nas mos de forma autnoma ou contando com a ajuda de uma pessoa mais experiente, caso contrrio, o que poderia ser um prazer pode se transformar em um srio nus e provocar o desnimo, o abandono e a desmotivao. A autora lembra que uma atividade pode ser motivadora se o contedo estiver ligado aos interesses da pessoa que tem que ler e se a tarefa corresponde a um objetivo. Em relao ao papel do professor no processo de compreenso do texto pelos alunos, Sol (1998) lembra que cabe a ele: incentivar o aluno a ler, ajudando-o a descobrir as diversas utilidades da leitura em situaes que promovamsuaaprendizagemsignificativa;proporcionarosrecursosnecessriospara queoalunopossaenfrentarcomsegurana,confianaeinteresseaatividade deleitura;etransform-loemleitorativo,isto,emalgumquesabeporquel e que assume sua responsabilidade ante a leitura, fazendo uso de seus conhecimentos, experincias e levantando expectativas e questionamentos. Como o professor j conhece o texto, ele pode servir de orientador para as predies sobre o desenvolvimento do tema, fornecendo ao aluno as pistas necessrias. Cabe ao professor, tambm, uma anlise cuidadosa do vocabulrio dotextoafimdedeterminarquepalavras,provavelmentedesconhecidaspelo aluno, podem ser inferidas a partir do contexto, quais no so e quais precisam deumadefiniotambmcontextualizada. EmboraFulgncio,LiberatoeSolserefiramaalunosouvintes,osmesmos procedimentos devem ser tomados no ensino da Lngua Portuguesa aos alunos surdos. O professor deve mobilizar conhecimento prvio e orientar os alunos a usarem tais conhecimentos na compreenso da leitura e na produo da escrita. Cabe ao professor, tambm, ensinar os alunos a ler com diferentes objetivos para que se tornem leitores autnomos. Alm disso, o professor deve motivar os alunos surdos a ler e, para isto, deve selecionar textos interessantes e que possam ser entendidos pelos alunos. Lane, Hoffmeister e Bahan (1996) enfatizam a importncia dos textos como fonte de conhecimento e lembram que, quanto mais se l, maior a amplitude e a profundidade do que se pode entender. Criticam os materiais de leitura de baixo nvel apresentados aos alunos surdos, os quais contribuem em grande parteparaasdificuldadesqueessesapresentam. A atribuio de material empobrecido para os alunos surdos lerem decorre, principalmente, da imagem que o professor tem do seu aluno. Muitos professo-

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res resistem ou mesmo se negam a dar livros para que os alunos surdos leiam, afirmandoqueestestmmuitadificuldadeequenogostamdeler.Poroutro lado,pornoteremacessoamateriaisescritosricosediversificados,osalunos surdosvotendocadavezmaisdificuldadeparaleresetornamcompletamente desinteressados pela leitura. Conseqentemente, no gostam de escrever e muitos se sentem incapacitados para faz-lo.

1.3 Princpios bsicos do ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdosO ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos deve levar em considerao que: Asurdezdificulta,masnoimpedeoaprendizadodaLnguaPortuguesa pelos alunos surdos. Asdificuldadesqueosalunossurdosgeralmenteapresentamnaescrita no decorrem da surdez, mas do pouco conhecimento que tm da Lngua Portuguesa. ALnguaPortuguesasegundalnguaparaosalunossurdos,e,porisso, requer a aquisio da Lngua Brasileira de Sinais, sua primeira lngua. OaprendizadodaLnguaPortuguesacomosegundalnguaumdireito do aluno surdo, garantido pelo Decreto Federal n 5626, de 22 de dezembro de 2005. OensinodaLnguaPortuguesanaescoladevecontemplaramodalidade escrita que, por ser acessvel viso, considerada fonte necessria para que o aluno surdo possa constituir seu conhecimento sobre a Lngua Portuguesa. OprocessodeaprendizadodaLnguaPortuguesapelosalunossurdos mais demorado e no chega necessariamente aos mesmos resultados.

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1.4 Orientaes didticas geraisO Projeto Pedaggico da escola para surdos deve possibilitar o acesso ao mundo pela viso, o que inclui a Lngua Brasileira de Sinais, a Lngua Portuguesa na modalidade escrita, o uso de imagens e de outros recursos visuais. A Lngua Brasileira de Sinais tem, para as pessoas surdas, a mesma funo que a Lngua Portuguesa na modalidade oral tem para as ouvintes e ela, portanto, que vai possibilitar s crianas surdas atingirem os objetivos propostos pela escola, incluindo o aprendizado da Lngua Portuguesa na modalidade escrita. Numa educao bilnge, como proposta pelo Decreto Federal n 5626, de 22 de dezembro de 2005, a Lngua Portuguesa considerada a segunda lngua dosalunossurdos,oquesignificaqueseuaprendizadovaisebasearnashabilidades lingsticas adquiridas na Lngua Brasileira de Sinais: na leitura que elas vo fazer suas hipteses sobre o funcionamento da Lngua Portuguesa. As hipteses elaboradas visualmente sero testadas medida que as crianas surdas tenham acesso as atividades que envolvam a escrita. Primeiramente, elas devem aprender que aquilo que expresso na lngua de sinais pode s-lo na Lngua Portuguesa escrita. Para isto, o professor deve introduzir recursos didticos, como escrever em Lngua Portuguesa aquilo que as crianas surdas expressam na Lngua Brasileira de Sinais. Nestas situaes, o professor deve mostrar s crianas que se trata de duas lnguas e, assim que as crianas demonstrarem interesse, deve comear a apontar diferenas de funcionamento da Lngua Portuguesa, baseando-se no conhecimento que as crianas j tm da lngua de sinais. Na medida em que vo ampliando seu conhecimento da escrita, as crianas surdas vo aprimorando as suas hipteses, as quais no sofrem a interferncia dos sons. Fernandes (2003) observou que as crianas surdas, quando aprendem a escrever, apresentam trocas de letras, espelhamento, formao depalavrasporassociao,enfimtodososfenmenosobservadosnaescrita de crianas ouvintes. No entanto, a pesquisadora no observou, em seus dados, substituies de s por z, to comuns na escrita de crianas ouvintes no incio do processo de escrita. Para que as crianas surdas aprendam a Lngua Portuguesa escrita, fundamental que tenham acesso visual a ela, o que significa que a leitura no

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pode se restringir apresentao, na lngua de sinais, do contedo do texto escrito. A criana surda precisa ler, pois , por meio da leitura que ir aprender a estrutura e a gramtica da Lngua Portuguesa. Para isso, o professor deve propor atividades dirias de leitura, envolvendo diferentes gneros e tipos textuais. O fato de aprenderem a Lngua Portuguesa na escola traz uma outra questo para os alunos surdos: no possvel esperar que o processo caminhe no mesmo ritmo. Em outras palavras, no se deve esperar dos alunos surdos o mesmo desempenho que o esperado em alunos ouvintes do segundo ano do Ensino Fundamental, por exemplo, que j tm conhecimento de mundo e de lngua que lhes permitem atribuir sentido a pequenos textos lidos e a produzir textos com sentido. No caso dos alunos surdos, o acesso restrito Lngua Portuguesa compromete a ampliao do conhecimento de mundo e, obviamente, de lngua, o que vai provocar um atraso no processo. O ensino de Lngua Portuguesa, tanto para os alunos ouvintes quanto para os surdos, deve se dar num espao em que as prticas de uso da linguagem sejam compreendidas em sua dimenso histrica e em que a necessidade de anlise e sistematizao terica dos conhecimentos lingsticos decorra dessas mesmas prticas. Entretanto, as prticas de linguagem que ocorrem no espao escolar diferem das demais porque devem, necessariamente,tomaralinguagemcomoobjetodereflexo,demaneiraexplcitae organizada, de modo a construir, progressivamente, categorias explicativas de seu funcionamento que permitiro, tambm aos estudantes surdos, o desenvolvimento da competncia discursiva para ler e escrever nas diversas situaes de interao (So Paulo, 2007).

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PARTE 2

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2. EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM DA LNGUA PORTUGUESA ESCRITA POR ALUNOS SURDOS NA EDUCAO INFANTIL 1Ao iniciar o processo de escolarizao, a maior parte das crianas surdas no dispem de uma lngua. Assim, a Educao Infantil deve propiciar condies para que elas adquiram a Lngua Brasileira de Sinais, com base na qual constituiro sua relao com a Lngua Portuguesa na modalidade escrita. A criana surda deve ser orientada, desde pequena, a prestar muita ateno ao rosto do interlocutor, a observar suas expresses faciais e corporais, gestos e sinais, bem como a acompanhar com o olhar determinado objeto ou pessoa indicada pelo interlocutor e retornar ao contato de olho. Quando maior, espera-se que se comunique com as outras crianas e com adultos usando a lngua de sinais com diferentes propsitos: para pedir algo, para se referir atividade que realiza ou que deseja realizar, para se referir a objetos e pessoas presentesnoseuambienteeparaoqueestfazendoouplanejafazer.Nofinal daEducaoInfantil,porvoltados5;0anosdeidade,espera-sequeacriana surda narre, na Lngua Brasileira de Sinais, histrias conhecidas, fatos acontecidos ou que vo acontecer. Ainda por meio da Lngua Brasileira de Sinais, espera-se que as crianas surdas participem de outras situaes comunicativas, como conversas informais que envolvam um ou mais interlocutor, o que requer que prestem ateno aos colegas, assumindo o seu turno e respeitando o turno do outro, assim como de situaes de conversas formais que envolvam planejamento, como relato para adultos ou colegas mais velhos sobre algo que foi aprendido, dando a sua opinio, concordando ou discordando da opinio dos outros, formulando hipteses sobre um assunto ou elaborando perguntas.

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A elaborao deste documento teve como ponto de partida as Orientaes Curriculares propostas para a Educao Infantil, na medida em que se entende que o processo educacional dos alunos surdos deve ser o mais semelhante possvel ao das crianas ouvintes. Com base no documento original, foram realizadas as adaptaesnecessrias,considerando-seasespecificidadesdosalunossurdos.

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Visando o aprendizado da Lngua Portuguesa, os alunos surdos devem ser expostos desde cedo a situaes que envolvam a leitura. O objetivo no que leiam, mas que desenvolvam comportamentos leitores, uma vez que a leitura se constitui como o recurso mais eficaz para o aprendizado da Lngua Portuguesa. As crianas surdas, assim como as ouvintes, devem ter contato direto com os livros para folhe-los e explor-los por conta prpria. Para alcanar este objetivo, recomenda-se a organizao de cantos de leitura, de espaos na biblioteca ou na sala, onde as crianas possam estar com os livros por alguns momentos e, melhor ainda, escolher algum para levar emprestado. O contato direto com o livro possibilita no s a construo de procedimentos de manuseio desses materiais e de hbitos, como tambm permite s crianas explorar possibilidades de leitura, ainda que elas no saibam ler convencionalmente: as imagens, por exemplo, informam e ajudam a antecipar muito do que ser explicitado por meio das palavras escritas. O professor pode organizar momentos de leitura, nos quais todos lem, inclusive o professor 2. Nestes momentos, as crianas escolhem um livro de sua preferncia e, por alguns minutos, o lem sem que sejam interrompidos. Em se tratando de livros conhecidos, algumas crianas podem apresentar, na Lngua Brasileira de Sinais, nomeao de figuras ou mesmo narrativa de trechos memorizados. Podem-se organizar atividades de leitura em diferentes espaos, como em parques, debaixo da sombra de uma rvore, no cho da sala, delimitadas pelo espao de um tapete, por colchonetes, esteiras ou almofadas, por um crculo de cadeiras etc. O importante que as crianas surdas possam visualizar o livro. O professor deve preocupar-se em oferecer livros adequados idade e que despertem interesse nas crianas. Deve tambm dar oportunidade para as crianas contarem, na lngua de sinais, o que leram e trocarem os livros com os colegas. Macchi e Veinberg (2005) mencionam duas maneiras de trabalhar a leitura antesqueascrianasaprendamadecodificar.Soelas:contarelerhistrias. Segundo as autoras, contar histrias permite que as crianas completem os traos dos personagens que no esto vista. Como a imagem no est presente, este lugar preenchido pela imaginao do espectador e do narrador. Ler histrias, por sua vez, conta com outras qualidades:Para saber mais sobre o trabalho com leitura, o leitor pode consultar os trabalhos de Manzini e colaboradores (2005),edePereira(2002),cujosdadosconstamnabibliografia.

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1-olivroconstituiofocodaateno; 2 - as crianas vo acompanhando, pelas imagens, a leitura feita pelos adultos e vo parando para contar os detalhes que completam a narrao. As imagens atuam, portanto, como complementares informao da histria. Macchi e Veinberg (2005) ressaltam que, no caso das crianas surdas, ao contar uma histria, o narrador cria um cenrio no ar. Os personagens so localizados no espao e a narrativa se desenvolve levando em conta o contexto. O narrador encena a narrao que est contando, faz com que seus receptores percebam as caractersticas dos personagens a partir da sua narrativa. Isto significaqueonarradordeumahistriadeveusarfluentementealnguadesinais: os sinais, o espao, a expresso corporal e facial, a sintaxe e todos os elementos que compem a lngua de sinais. Na leitura de uma histria na lngua de sinais, o leitor deve respeitar o texto escrito e traduzi-lo para a lngua de sinais. Como em qualquer situao de leitura para crianas pequenas, o leitor poder incluir comentrios, ampliar a informao etc (Macchi e Veinberg, 2005). Alm dos livros de histria, as crianas surdas devem ter acesso a outros materiais escritos, como revistas em quadrinhos, receitas culinrias e regras de jogo. O professor dever interpretar o contedo dos textos na lngua de sinais, sempre se preocupando em se reportar ao texto escrito para que as crianas percebam que o que est sendo sinalizado se refere ao que est escrito. Macchi e Veinberg apresentam quinze princpios propostos por Schleper (1992) para facilitar o processo de leitura para crianas surdas. So eles3: 1. o leitor surdo traduz a histria usando lngua de sinais. Os sinais, os desenhos e as expresses faciais comunicam o significado da histria. Os leitores indicam palavras especficas na histria. 2. o leitor surdo mantm as duas lnguas visveis as histrias so relatadas na lngua de sinais e simultaneamente os leitores surdos fazem referncia ao texto escrito. O livro fica aberto. 3. o leitor surdo no se restringe ao texto ao ler a histria, ele expande a informao, isto , acrescenta detalhes ao que acontece no livro.

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Os princpios foram traduzidos do espanhol.

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4. o leitor surdo conta a histria expandindo e vai reduzindo a quantidade de expanses medida que repete a histria. Isto significa que a leitura se realiza num contnuo, que vai do contar histria para ler histria. 5. importante seguir a pista da criana medida que a leitura da histria avana, importante perceber o interesse da criana e responder a ele, como, por exemplo, apontar palavras correspondentes a sinais especficos. 6. o leitor surdo torna explcito o que est implcito a informao ampliada. Ainda que algumas vezes certas palavras no figurem no texto, o leitor pode explicar o conceito. 7. o leitor surdo muda a localizao do sinal, podendo realiz-lo sobre a criana ou sobre o livro modifica-se a localizao do sinal para adapt-la ao campo visual da criana. Segundo Schleper, pode-se soletrar sobre a pgina para relacionar uma palavra especfica do texto ao sinal soletrado. Desta forma, o sinal fica visvel para o receptor, junto com a palavra ou com a imagem a qual faz referncia. 8. o leitor surdo varia o estilo de produo dos sinais para adaptar-se histria os sinais so aumentados, so mais pesados ou mais leves, menores etc. Este aspecto comparvel mudana na voz ou na entonao que se utiliza ao ler histrias oralmente. 9. as situaes que aparecem no livro se relacionam com situaes da vida real da criana o leitor relaciona conceitos que aparecem na histria com o mundo da criana. 10. o leitor surdo usa estratgias para chamar a ateno comum que, durante o processo de leitura, a criana olhe para o leitor e depois para a pgina. O leitor deve continuar sinalizando sem forar a criana a olhar para ele. Deve deixar que a criana olhe para a pgina se algo chama a sua ateno, mas, se o leitor deseja explicar alguma coisa, pode tocar suavemente o brao da criana para que ela olhe e continuar a leitura. As crianas surdas sabem usar a viso perifrica. Por isso, ainda que estejam olhando para a pgina, podem entender o que o leitor est sinalizando dentro do seu campo visual. Elas podem usar esta vantagem para compreender toda a histria sem perder os detalhes. 11. o leitor surdo usa contato direto de olho para enfatizar um ponto, deste modo traz a criana para dentro da histria. importante levar em considerao que, quando se trabalha com um grupo de

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crianas, o contato de olho deve fluir de uma criana para outra. Se o leitor faz contato direto com uma criana, esta poder sentir-se intimidada. No entanto, o leitor pode fazer contato com uma criana em especial, se quiser. 12. o leitor surdo dramatiza para ampliar os conceitos s vezes, o simples uso da lngua de sinais no suficiente e necessrio dramatizar parte da histria. Se a criana est perdendo interesse, talvez no esteja entendendo a histria. A dramatizao aumenta o entusiasmo. 13. o leitor surdo usa variao na lngua de sinais para frases ou palavras repetidas em diferentes contextos mesmo que algumas palavras se repitam no texto, o leitor surdo pode utilizar diferentes sinais conforme o contexto em que se encontre a palavra. As crianas se do conta, ento, de que se podem usar diferentes sinais para uma mesma palavra. 14. o leitor surdo cria um ambiente positivo para que as crianas surdas aprendam a ler no focaliza os erros das crianas e nem as correes. 15. o leitor surdo espera que a criana se converta em leitor importante no forar a criana a ler s para fins acadmicos, e sim oferecer-lhe um ambiente de leitura ameno e de acordo com os seus interesses. Deve-se estimular a criana a aprender a ler, associando a histria na lngua de sinais com o texto escrito, e assegurar-se de que ela entenda. Ainda que no se espere que, na Educao Infantil, as crianas surdas escrevam, elas devem ser inseridas desde cedo em atividades que envolvam a escrita. O professor faz o papel de escriba, escrevendo na Lngua Portuguesa o que as crianas contam na Lngua Brasileira de Sinais. Depois de confeccionado o texto, o professor pode, por exemplo, sinalizar alguns vocbulos e pedir que as crianas os localizem no texto ou solicitar a leituradealgumasfrases,destacandopalavrassignificativasparaascrianas (Manzini e colaboradores, 2005). Alm das atividades de escrita coletiva, as crianas surdas devem ser expostas as atividades dirias de escrita, como elaborao de calendrio, de lista dos nomes dos alunos, de relatos de finais de semana e de outras situaes vivenciadas.

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2.1 A escrita do nome prprioA escrita do nome prprio uma das mais importantes conquistas da criana que entra no mundo das letras, seja ela ouvinte ou surda. Todos sabem que importante trabalhar com o nome prprio da criana na Educao Infantil. Os motivos so muitos: o nome verdadeiro porque ele representa uma pessoa e a identidade da criana. Para ela, muito significativo trabalhar com seu nome porque esse conjunto de letras diz algo sobre ela: sua identidade. Nomes tmfunosocialclaramentedefinida:identificaraspessoas,marcarseuspertences etc. Segundo Ana Teberosky (2001), os nomes tm para as crianas o sentido de um texto completo. Como destacam as Orientaes Curriculares da Educao Infantil (So Paulo, 2007), para a criana que est refletindo sobre o sistema alfabtico, o nome fonte de informao das mais seguras: uma palavra estvel, no tem plural, no tem gnero, sempre que voc tiver que escrever seu nome, vai usar aquelas letras, daquela forma. Como se refere a um nico objeto, que a prpria pessoa, a criana, ao ler os nomes, no vai confundir ou ficar indecisa entre as possveis interpretaes que outras palavras podem ter. A escrita do nome prprio ajuda a criana a compreender como a escrita funciona porque tem um modelo para pensar: ela comea por imitar o nome, quase que desenhando tal como v numa filipeta ou como faz espontaneamente. Aos poucos a criana passa a observar algumas regularidades, por exemplo, ela nota que as letras sempre se repetem quando vai copiar seu nome. Tambm nota, com o tempo, que h uma ordem: as letras sempre se repetem e aparecem daquele mesmo jeito. Sempre aparece o M, depois sempre o A, depois o R, o I e o A novamente, no caso de Maria. Por fim, ela tambm vai percebendo, ao ler a lista de nomes da sala, que as letras ou trechos de seu nome aparecem tambm em outros nomes. Esse saber lhe permite continuar pensando sobre a escrita e escrevendo outras coisas a partir da.

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Expectativas em relao escrita dos nomes pelas crianas surdasEducaoInfantilII(3:0a5;11anos)-Ascrianassurdaspodemaprendera identificaraescritadonomeprprioeareconhec-loemtextosrecorrentesnocotidiano, tais como convites para festas de aniversrio, roteiro de atividades do dia, comunicados aos pais e listas variadas. Elas podem reconhecer e nomear as letras iniciais de seu nome, inicialmente no alfabeto digital. Depois que aprenderam a digitar o seu nome, as crianas surdas podem relacionar as letras digitadas com a forma escrita. A meta, nesse momento, que as crianas surdas reconheam a semelhanagrficaentreainicialdeseunomeeasiniciaisdosnomesdoscolegas quetambmpossuemamesmaletra;arrisquem-seaescreveronomenassituaes em que assinar se faz necessrio (na produo de desenhos, por exemplo). NofinaldaEducaoInfantil,espera-sequeascrianassurdaspossamprogressivamente conquistar a escrita do nome prprio com total autonomia e ler e escrever os nomes de seus colegas. Podem aprender a identificar palavras conhecidas em textos escritos pelo professor e localizar palavras num texto que sabem de memria, como letras de msicas conhecidas, parlendas, receitas e outros textos bastante trabalhados.

Orientaes didticasDada a importncia do nome prprio como um fator significativo para a construo da prpria identidade, orienta-se que as crianas surdas, assim como as ouvintes, tenham contato progressivo com a escrita do nome e aprendamagraf-lonomomentoenasituaoemqueissosefizernecessrio. Ao ensinar a escrita do nome estamos tambm ensinando a funo social da escrita. Escrever o nome o melhor modo de aprend-lo, afinal, s se aprende a escrever escrevendo. As crianas devem ter contato com a escrita do nome prprio desde o incio da Educao Infantil, pois ali j existem os seus objetos, seus pertences que devem ser nomeados, de preferncia ao lado de suas fotos. Quando comeam a fazer suas primeiras produes em papel, o professor pode solicitar que as crianas escrevam seus nomes, mesmo que no saibam faz-lo sozinhas. Nessecaso,afilipetadenomesrecursoimprescindvel4. O professor pode auxiliar as crianas pequenas colocando-se como escriba para anotar o nome da criana no canto da folha na qual ela desenha, por exemplo: ao fazer isso, ele mostra crianacomoseescrevee,aomesmotempo,dsignificadoquelamarcaque onomedacriana,oqueaidentificaemostraaautoriadaqueledesenho.4

As Orientaes curriculares para a Educao Infantil (2007) ressaltam a importncia do professor ter, na sala, umquadrodepregascomfilipetascomosnomesdetodasascrianasdaturma.Segundoomesmodocumento,deve-seescrevercomletrabasto,sempredemesmotamanhoparaqueotamanhodafilipetavarie em funo do nome, dando s crianas uma importante pista sobre a organizao da escrita.

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2.2 Outras escritas infantis importante que as crianas surdas experimentem vrios usos da escrita. O professor faz o papel de escriba, escrevendo em Lngua Portuguesa o que as crianas relatam na lngua de sinais.

Expectativas em relao escrita de crianas surdas na Educao InfantilEducaoInfantilII(3;0a5;11anos)Ascrianassurdaspodemproduzir seus prprios textos (bilhetes, listas etc.), ainda que no convencionalmente. Elaspodemaprenderalocalizarumnomeespecficonumalistadepalavrasdo mesmo campo semntico (ingrediente de uma receita, peas do jogo etc.), a procurar informaes em imagens de livros e enciclopdias sobre assuntos relacionados a plantas, corpo humano, animais, entre outros.

Orientaes didticasMuitas das possibilidades de aprender que foram apontadas neste livro podem ser desenvolvidas por meio de projetos didticos, que seriam formas de organizar o tempo de modo a articular propsitos didticos e comunicativos, tornando as situaes de aprendizagem correspondentes s que so vivenciadas fora da escola Os projetos podem sugerir aprendizagens articuladas e contextualizadas, no entanto, no se pode garanti-las: os processos de aprendizagem, sempre internos aos sujeitos, no so plenamente controlveis. Mesmo assim, cabe ao professor criar intencionalmente situaes que atuem como recursos para as crianas aprenderem. Acombinaodepropsitosdidticosesociaiseadefiniodeumeixo predominante ou articulador, so escolhas que diferenciam os projetos entre si, mesmoquandoaidiadoprodutofinalamesma.

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Existem muitas possibilidades de objetivos comunicativos que podem ser compartilhados com as crianas surdas na Educao Infantil. O importante, ao estabelecerumaescolha,considerarnosomenteoprodutofinalouodesempenho das crianas, mas, principalmente, os propsitos sociais da comunicao e o sentido que aquilo tem para as crianas. Pode-se compartilhar em grupo, por exemplo: DVD de histrias contadas pelas crianas na Lngua Brasileira de Sinais paraveremcasaoupresentearalgum; DVDdebrincadeiras(comregrasexplicadasnaLnguaBrasileiradeSinais e imagens ilustrativas das brincadeiras). Alm do desenvolvimento que o trabalho propicia para as crianas, pode colaborar para enriquecer o acervodematerialvisualdaescola; Livrosdereescritadoscontosclssicosfavoritosparacomporumabibliotecadeproduesdascrianas; Jornal ou cartaz que torne pblica as notcias, os anncios e demais assuntos de interesse do cotidiano de uma instituio ou de uma turma decrianas; Panfletos e folhetos informativos necessrios orientao das pessoas em geral sobre uma campanha que o grupo de crianas est empreendendo; Livros de receitas para divulgar as comidas favoritas do grupo ou para ajudar as famlias no preparo de alguns dos lanches que as crianas podemfazeremcasacomaajudadospaisoudosirmosmaisvelhos; Regrasdejogosqueascrianasconfeccionamequevodisponibilizar aoutrospblicos; Instruesparaconfeccionarbrinquedosqueascrianasfizerameque vo disponibilizar para outras pessoas. Diferente de outras formas de trabalho, os projetos de produo-interpretao investem mais no ensino de prticas sociais reais do que nos temas propriamente falando: em um projeto de contos de fadas, por exemplo, no se aprende apenas sobre os personagens e os temas das histrias, mas tambm a ler, apreciar, recontar e outras prticas ligadas aos usos reais da Lngua Portuguesa. Alm disso, os projetos tambm contribuem para aprimorar

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as relaes em grupo e a organizao de um trabalho cada vez mais autnomo, livre do controle do professor. Com isso se aprende, desde criana, como possvel compartilhar desejos, idias, gostos etc., em projetos que se tornam realidade por meio de esforos coletivos.

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3. EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM DA LNGUA PORTUGUESA POR ALUNOS SURDOS DO ENSINO FUNDAMENTAL CICLO I5Ao ingressar no Ensino Fundamental, espera-se que o aluno surdo que freqentou a Educao Infantil j tenha adquirido a Lngua Brasileira de Sinais e a use em diferentes situaes comunicativas, na interao com adultos e colegas surdos. esperado tambm que ele seja capaz de relatar, na Lngua Brasileira de Sinais, um acontecimento vivenciado, uma histria que lhe foi contada, ou uma histria com base nas imagens. Em relao Lngua Portuguesa, espera-se que os alunos surdos j leiam e escrevam seu nome, os nomes dos colegas e palavras com as quais estejam mais familiarizados. Pode acontecer (e acontece freqentemente) de alunos surdos entrarem no Ensino Fundamental j adolescentes sem terem contato prvio com a lngua de sinais nem com a lngua escrita, e apresentarem apenas uma linguagem desenvolvida com os familiares. Nestes casos, Macchi e Veinberg (2005) sugerem que o professor pesquise qual a forma que estes alunos empregam para se comunicar no seu ncleo social primrio. Esta pesquisa dar ao docente um ponto de partida para seu trabalho na sala de aula, j que ter de abordar a comunicao a partir do sistema usado pelo aluno e conduzi-lo para a lngua de sinais e para a lngua majoritria escrita simultaneamente. Macchi e Veinberg ressaltam que, desde o incio, o aluno deve estar em contato com textos que expressem idias com as quais possa identificar-se e que encontre mensagens dirigidas a diferentes leitores. Estes textos deveriam ser reais, isto , textos completos extrados de materiais pensados para jovens. Segundo as mesmas autoras, quando um aluno mais velho chega escola, o caminho estratgico semelhante ao planejado para crianas pequenas, ainda que o texto deva ser escolhido de acordo com o interesse do aluno.

5 A elaborao das Orientaes e Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos teve como ponto de partida as Orientaes Curriculares, propostas para os ciclos I e II, do ensino fundamental. O documento original sofreu adaptaes que levaram em conta as especificidades dos alunos surdos.

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3.1 Objetivos do ensino da Lngua Portuguesa para alunos surdos no Ensino Fundamental ciclo IO estabelecimento de objetivos para a Lngua Portuguesa para alunos surdos no Ensino Fundamental no pode desconsiderar que, diferentemente dos alunos ouvintes, os surdos chegam escola sem conhecimento da Lngua Portuguesa no qual possam se basear na constituio da leitura e da escrita. Nesse sentido, pode-se afirmar que, para a maior parte dos alunos surdos que entram no Ensino Fundamental, aprender a ler e a escrever significaaprenderumalngua. Neste contexto, objetivo do Ensino Fundamental propiciar condies para que os alunos surdos desenvolvam seu conhecimento da Lngua Portuguesa. Considerando-se que a escrita visual e, portanto, mais acessvel aos surdos do que a oralidade, a constituio do conhecimento da Lngua Portuguesa vai se dar por meio da leitura. lendo que os alunos surdos vo ter oportunidade de ter acesso aos sistemas morfossinttico-semntico e pragmtico da Lngua Portuguesa, assim como o grafmico. Visando possibilitar aos alunos surdos o aprendizado da Lngua Portuguesa escrita, a escola deve promover um trabalho intensivo de leitura. Nas atividades de leitura, os alunos surdos devem ser apresentados ao maior nmero possvel de textos e o professor dever ser capaz tanto de interpret-los na lngua de sinais como tambm de explicar e explicitar caractersticas dos textos para os alunos. Agindo desta forma, o professor possibilitar ao aluno surdo atribuir sentido ao que est lendo, ao mesmo tempo em que o acesso ao texto escrito lhe possibilitar se familiarizar com a Lngua Portuguesa. pela via visual que os alunos surdos podero constituir suas hipteses sobre como funciona a Lngua Portuguesa. Desde o incio do Ensino Fundamental, os alunos surdos devem ter acesso a materiais escritos de diferentes gneros e tipos textuais para que ampliem seu conhecimento lingstico e textual de forma a poderem compreender e produzir textos na Lngua Portuguesa. A nfase no discurso e no em palavras isoladas e na atribuio de sentidoenonadecodificaosemcompreenso,caracterizaaconcepode

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lngua como prtica social, a qual privilegia a natureza funcional e interativa e no o aspecto formal e estrutural da lngua (Marcuschi, 2002). Segundo Marcuschi, o discurso se manifesta por meio de diferentes gneros textuais, eventos lingsticos que se caracterizam muito mais por suas funes comunicativas do que por suas peculiaridades lingsticas e estruturais. Nessa perspectiva, entendem-se os gneros textuais como um produto coletivo dos diversos usos da linguagem, e que se realizam de diversos modos, de acordo com as necessidades comunicativas do dia-a-dia da comunidade. H gneros eminentemente orais, escritos, informais e formais. Marcuschi(2002)afirmaque,nosltimosdoissculos,asnovastecnologias, em especial as ligadas rea da comunicao, propiciaram o surgimento de novos gneros textuais. O autor ressalta que no so propriamente as tecnologias que originam os gneros e sim a intensidade dos usos dessas tecnologias, e suas interferncias nas atividades comunicativas dirias. Como exemplos de gneros textuais, o autor cita: bilhetes, convites, cheques, cartes diversos (postal, agradecimento, apresentao, natal, aniversrio, outros), cartas, receitas culinrias, bula de remdio, artigos de jornal e revista, entrevistas, verbetes de dicionrios e de enciclopdias, charges, propagandas, publicidades, quadrinhos,msicas,poemas,resumos,resenhas,ensaioscientficos,crnicas,contos, livros em geral, mensagens de e-mail, entre outros. Vale lembrar, no entanto, que, sendo os gneros textuais fenmenos scio-histricos e culturalmente sensveis, no h como fazer uma lista fechada deles. Marcuschi (2002) destaca que o trabalho com gneros textuais uma extraordinria oportunidade de se lidar com a lngua em seus diversos usos no d ia-a-dia,poisnadadoquefizermoslingisticamenteestarforadealgumgnero. Na expresso dos gneros textuais, um ou mais tipos textuais podem ser usados. Marcuschi (2002) define tipo textual como expresso usada para designar umaespciedeseqnciateoricamentedefinidapelanaturezalingsticadesua composio (aspectos lexicais, sintticos, tempos verbais, relaes lgicas etc). Autores como Kaufman, Rodriguez (1995), Marcuschi (2002), Salles, colab., (2004), entre outros, apresentam variao nos tipos textuais, mas, em geral, eles mencionam a narrao, a descrio e a argumentao. Segundo Scheneuwly e Dolz (2004), so cinco as capacidades dominantes de linguagem presentes nos tipos textuais: narrar, relatar, argumentar, expor e descrever. Uma vez que os alunos surdos partilham os mesmos contextos scio-histricos dos ouvintes, tm as mesmas necessidades comunicativas e tambm

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sofrem interferncia das tecnologias nas atividades comunicativas dirias, de se esperar que faam uso dos mesmos gneros textuais. Os gneros textuais expressos pelos ouvintes oralmente, como recado, entrevistas, debates, conversas, regras de jogos, exposio, por exemplo, devem ser ensinados s crianas surdas na Lngua Brasileira de Sinais. A vivncia com diferentes gneros textuais, na Lngua Brasileira de Sinais propiciar aos alunos surdos elementos para que possam entender e posteriormente us-los na Lngua Portuguesa. Alm do uso de diferentes gneros e, conseqentemente, de tipos textuais, oprofessordevepossibilitarcondiesparaqueosalunossurdosreflitamsobre ofuncionamentodaLnguaPortuguesa.Talreflexodevetercomoobjetivoa compreenso e a produo de discursos na Lngua Portuguesa e no a memorizao de regras sem compreenso. Visando ao aprendizado da Lngua Portuguesa na modalidade escrita, a escola dever organizar um conjunto de atividades que, progressivamente, assegure ao estudante surdo: 1. Utilizar a linguagem escrita na leitura e na produo de textos escritos de modo a atender s mltiplas demandas sociais e a responder a diferentes propsitos comunicativos e expressivos. 2. Utilizar a linguagem escrita para estruturar a experincia e explicar a realidade: a. sabendo como proceder para ter acesso s informaes contidas nos textos, compreend-las e fazer uso delas, reconstruindo o modo peloqualseorganizamemsistemascoerentes; b. sendo capaz de operar sobre o contedo representacional dos textos, identificando aspectos relevantes, organizando notas, esquemas etc. 3. Analisar criticamente os diferentes discursos, inclusive o prprio, desenvolvendo a capacidade de avaliao dos textos: a. contrapondosuainterpretaodarealidadeadiferentesopinies; b. inferindoaspossveisintenesdoautormarcadasnotexto;

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c. identificando e repensando juzos de valor tanto scio-ideolgicos (preconceituosos ou no), quanto histrico-culturais (inclusive estticos)associadosalinguagemealngua; d. reafirmando sua identidade pessoal e social. 4. Refletir sobre o funcionamento da Lngua Portuguesa.

3.2 Critrios para seleo das Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no Ensino Fundamental ciclo IPara atingir os objetivos propostos para a aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos, a escola deve lhes assegurar a apropriao do sistema alfabtico, o que se dar por meio da viso. Deve tambm introduzi-los na cultura escrita, isto , criar as condies para que possam conviver com as diferentes manifestaes da escrita na sociedade e, progressivamente, ampliar suas possibilidades de participao nas prticas sociais que envolvemaleituraeaproduodetextos.Odesafio,portanto,alfabetizarem um contexto de letramento. Assim como se prope para os alunos ouvintes, tanto os saberes sobre o sistema de escrita como aqueles sobre a linguagem escrita devem ser ensinados esistematizadosparaosalunossurdos.Nosuficienteaexposiodosestudantes aos textos para que aprendam como o sistema de escrita funciona ou para que aprendam a escrever textos expressivos ajustados s expectativas do contexto de produo. preciso planejar uma diversidade de situaes que permitam, em diferentes momentos, dirigir os esforos para a aprendizagem do sistema de escrita alfabtica e, to logo estejam alfabetizados, para a aprendizagem dos padresdaescrita(ortografia,concordncia,pontuao,acentuaoetc.),bem como para a aprendizagem da linguagem escrita (organizao estrutural dos enunciados, emprego das palavras, recursos estilsticos etc.). No entanto, assim

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como se prope para os alunos ouvintes, as atividades voltadas para a aprendizagem da gramtica devem partir dos textos dos alunos (Geraldi, 1993, 1996). Considerando que os modos de utilizao da linguagem variam nas diferentes esferas da atividade humana, nas expectativas de aprendizagem para os alunos surdos, assim como as propostas para os alunos ouvintes, foram selecionados gneros de textos de uso social mais freqente, cujo grau de complexidade os torna acessveis s potencialidades lingsticas dos estudantes surdos do Ciclo I. Para introduzir os alunos surdos na Lngua Portuguesa escrita, optou-se, como sugerido nas Orientaes Curriculares para os ouvintes (So Paulo, 2007), por assegurar que pudessem vivenciar a diversidade das prticas de linguagem presentes nas seguintes esferas de circulao de textos: a cotidiana, para sensibilizar o aluno surdo para as prticas de linguagem presentes em seu dia-a-dia como forma de aproxim-lo progressivamentedasquecaracterizamosusospblicosdalinguagem; a escolar, por se entender que as prticas de linguagem envolvidas no estudo dos diferentes contedos do currculo escolar podem ser aprendidasdesdequesejamobjetodeensinosistemtico; a jornalstica, para atualizar os alunos em relao aos temas que mobilizam a sociedade como um todo, de modo a poder ampliar as formas departicipaonodebatesocial; a literria, cujos textos de fico se apresentam apreciao e fruio esttica.

3.3 Gneros textuais propostos para o ciclo IO quadro abaixo apresenta os gneros textuais propostos para a aprendizagem da Lngua Portuguesa na modalidade escrita em cada uma das esferas de circulao privilegiadas:

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Gneros textuais propostos para alunos surdos no ciclo I Lngua PortuguesaEsfera de circulao Gneros selecionados para cada ano do Ciclo I 1 2 3 4 5 Roteiro e mapa localizao/ descrio de itinerrio. Regras/ instruo carta e-mail. Artigo de divulgao cientfica para crianas, verbete de curiosidades, verbete de enciclopdia virtual. Entrevista, notcia, comentrio de notcia, reportagem, propaganda. Lenda/Mito, literatura infanto-juvenil, fbula. Carta/e-mail, Regra de jogos relato de Bilhete, lista, Receita, lista, e brincadeiras, acontecimento receita, bilhete, relato receita, bilhete, cotidiano, relato de acontecimento relato de regras/instruo, acontecimento roteiro e mapa acontecimento cotidiano, cotidiano. regras de jogos cotidiano, localizao/ descrio de e brincadeiras. carta/e-mail. itinerrio. Verbete de enciclopdia Diagrama, Verbete de infantil, verbete de enciclopdia explicao, curiosidades, Explicao, explicao, verbete de infantil, verbete verbete de de curiosidades, curiosidades, verbete de curiosidade. artigo de artigo de enciclopdia divulgao infantil. divulgao cientfica, cientficapara crianas. diagrama. Legenda, Notcia, Manchete, notcia, legenda, manchete, Notcia, comentrio legenda, manchete, notcia, de notcias, legenda. comentrio de comentrio de entrevista, notcias. notcias. reportagem. Literatura Conto de infantil, conto Conto repetio, Fbula, conto tradicional, tradicional, conto tradicional, conto de literatura tradicional, literatura infantil, repetio1, infantil. literatura lenda e mito. Conto infantil, fbula. acumulativo2. Adivinhas, Poema para Cantigas parlenda, crianas, Parlenda, infantis, cantigas parlenda, cantigas parlenda, infantis, adivinhas, infantis. adivinhas. poemas para letras de msicas, crianas. poemas.

Cotidiana

Lngua Portuguesa na modalidade escrita

Escolar

Jornalstica

Literria (prosa)

Literria (verso)

Poema, letras de msicas.

Uma comparao com os gneros propostos para os alunos ouvintes (vide quadro abaixo) permite observar que, com exceo dos gneros eminentemente orais, como recado, exposio oral, que, para os alunos surdos, sero expressos na Lngua Brasileira de Sinais, todos os outros esto contemplados nas expectativas de aprendizagem para alunos surdos. No entanto, considerando-se que os alunos surdos, quando entram no Ensino Fundamental, esto iniciando a constituio de seu conhecimento sobre a

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Lngua Portuguesa escrita, no se espera que os mesmos gneros textuais sejam propostos para os mesmos anos que para os alunos ouvintes. Espera-se, contudo,que,aofinaldoEnsinoFundamental,osalunossurdostenhamtidocontato com todos os gneros textuais propostos no quadro. Gneros textuais propostos para alunos ouvintes no ciclo I Lngua PortuguesaEsfera de circulao Gneros selecionados em cada ano do Ciclo I 1 2 3 4 5 Roteiro/ mapa de localizao/ descrio de itinerrio, regras de jogos, carta/ e-mail. Artigo de divulgao cientfica para crianas, exposio oral, verbete de enciclopdia, verbete de enciclopdia virtual. Notcia/ relato de acontecimento cotidiano, reportagem, entrevista. Lenda e mito, fbula, conto tradicional, literatura infanto-juvenil. Carta e-mail, Receita, regras Regras de relato de de jogos, jogos, bilhete, experincias bilhete, lista, carta/e-mail, vividas, regras carta. receita. de jogos, roteiro/ mapa de localizao. Verbete de Verbete de enciclopdia enciclopdia Verbete de infantil/ infantil/ curiosidades/ exposio oral, explicao, explicao, verbete de verbete de verbete de enciclopdia curiosidades, enciclopdia virtual, artigo artigo de infantil, de divulgao divulgao diagrama. cientficapara cientficapara crianas. crianas. Manchete/ Notcia/ comentrio notcia televisiva e de notcia, Entrevista,notcia, reportagem. manchete, radiofnica, entrevista, legenda, reportagem. notcia. Conto tradicional, Conto Fbula, lenda, conto de tradicional, mito, conto repetio, fbula, lenda, tradicional, conto literatura literatura infantoacumulativo, infantil. juvenil. literatura infantil. Cantiga/regras de cirandas e Poema para brincadeiras crianas, cantadas, poema poema para Poema narrativo, narrativo, crianas, poema, cano. cantiga parlenda, tradicional, trava-lngua, cano adivinha, trova.

Cotidiana

Bilhete/ recado, receita, lista, carta.

Escolar Modalidade escrita / oral

Diagrama/ explicao, verbete de curiosidades, verbete de enciclopdia infantil.

Legenda, comentrio de notcia, Jornalstica manchete, notcia. Conto repetio, conto acumulativo, conto tradicional, literatura infantil. Parlendas, regras de jogos/ brincadeiras, trava-lngua, adivinha, trova.

Literria (prosa)

Literria (verso)

Poema, cordel, cano.

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Uma comparao entre os dois quadros permite observar, tambm, que os gneros vo se repetindo, sendo acrescidos outros. O princpio subjacente, tanto no quadro proposto para alunos ouvintes como para os surdos, o de que um gnero selecionado para ser aprofundado em projetos ou em seqncia didtica, foi trabalhado em atividades permanentes ou ocasionais no ano anterior. Visando auxiliar o professor, os gneros textuais que sero objeto de aprofundamento aparecem, nos quadros, na primeira linha de cada esfera. Pode-se observar que o mesmo gnero aparece no ano anterior, nas outras linhas dos quadros. Como j foi referido nas Orientaes e Expectativas de Aprendizagem da Lngua Brasileira de Sinais, os alunos surdos vo ter acesso ao contedo das disciplinas, incluindo a Lngua Portuguesa, por meio da Lngua Brasileira de Sinais. Assim sendo, a introduo aos gneros textuais que sero trabalhados deve ser feita na lngua de sinais. Desta forma, os alunos podero vivenciar o uso de um determinado gnero textual primeiramente na lngua de sinais, o que contribuir certamente para melhor compreenso e uso do mesmo na Lngua Portuguesa. Alm disso, a Lngua Brasileira de Sinais dever ser usada nos projetos ou seqncias didticas, visando proporcionar ao aluno surdo a realizao de atividades que contribuam para o aprendizado dos gneros que esto sendo objeto de aprofundamento. Visando ilustrar a articulao entre o trabalho realizado na Lngua Brasileira de Sinais e na Lngua Portuguesa, apresentado abaixo o quadro com os gneros textuais propostos para serem trabalhados na Lngua Brasileira de Sinais.

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Quadro dos gneros textuais propostos para alunos surdos Lngua Brasileira de SinaisEsfera de circulao Gneros selecionados para cada ano do Ciclo I 1 2 3 5 Roteiro e mapa de localizao, descrio de itinerrio, regras de jogos. Exposio, verbete de curiosidades, verbete de enciclopdia infantil, verbete de dicionrio de LIBRAS, artigo de divulgao cientfica. Notcia, entrevista, reportagem.

4 Relato de Conversa, experincias Conversa, Relato, receita, recado, vividas, roteiro relato, recado, regras de receita, e mapa de Cotidiana regra de jogos jogos, roteiro instruo, localizao, e brincadeiras, e mapa de regras de jogos regras de jogos, instruo. localizao. e brincadeiras. descrio de itinerrio. Explicao, Exposio, verbete de Explicao, verbete de Explicao, curiosidades, curiosidades, verbete de verbete de verbete de verbete de curiosidades, curiosidades, enciclopdia verbete de verbete de enciclopdia Escolar infantil, verbete infantil, verbete enciclopdia enciclopdia infantil, de dicionrio de de dicionrio de infantil, LIBRAS, artigo explicao de explicao de LIBRAS, artigo diagrama. de divulgao de divulgao diagrama . cientfica. cientfica. Manchete, Manchete, Legenda, legenda, Manchete, legenda, notcia, notcia, notcia, Jornalstica legenda, entrevista, comentrio notcia. comentrio de de notcia, reportagem. notcias. entrevista. Conto Conto tradicional, tradicional, Conto conto de conto de tradicional, Conto Literria repetio, repetio, fbula, tradicional, (prosa) conto conto literatura fbula, lenda. acumulativo, acumulativo, infantil. literatura literatura infantil. infantil. Adivinha, Adivinha, Adivinha, Adivinha, trava-dedos, trava-dedos, Literria trava-dedos, trava-dedos, poesia para poesia para (verso) poesia em poesia em crianas em crianas em lngua de sinais. lngua de sinais. lngua de sinais. lngua de sinais.

Lngua Brasileira de Sinais

Conto tradicional, fbula, lenda, mito.

Adivinha, trava-dedos, poesia em lngua de sinais.

Como se pode observar, os mesmos gneros textuais propostos para alunos ouvintes na Lngua Portuguesa aparecem no quadro dos gneros textuais a serem trabalhados na Lngua Brasileira de Sinais. Como j foi referido anteriormente, a lngua de sinais tem, para os alunos surdos, a mesma funo que a Lngua Portuguesa na modalidade oral para os

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alunos ouvintes. No entanto, cabe chamar a ateno para o fato de que os alunos ouvintes usam a Lngua Portuguesa quando chegam escola, enquantoqueossurdos,filhosdepaisouvintes,geralmentevoaprenderalnguade sinais na escola. Espera-se, contudo, que, ao chegar no Ensino Fundamental, os alunos surdos j tenham adquirido a Lngua Brasileira de Sinais. Se isto no acontecer, necessrio que os professores avaliem em que ponto o aluno est e da planejem o trabalho com gneros textuais. No se deve esquecer que um gnero textual deve ser trabalhado inicialmente na lngua de sinais, depois na Lngua Portuguesa, em atividades permanentes ou ocasionais, e s ento ser objeto de aprofundamento em projetos ou em seqncia didtica. Para mais informaes sobre o trabalho com a Lngua Brasileira de Sinais, consultar as Orientaes Curriculares Proposies de Expectativas de Aprendizagem da Lngua Brasileira de Sinais (So Paulo, 2008) Tanto os objetivos quanto as expectativas de aprendizagem apresentadas neste livro so metas de desenvolvimento que se alargam e se aprofundam, progressivamente, conforme as possibilidades e necessidades dos alunos surdos. A cada ano do ciclo so exploradas basicamente as mesmas expectativas de aprendizagem, mas em graus de complexidade crescente. Em outras palavras, as expectativas recebem formulao, mas se reportam s mesmas competncias e habilidades dos anos anteriores. Os gneros textuais tambm aumentam ao longo do Ensino Fundamental, visando ampliar o universo dos alunos surdos.

3.4 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa para cada ano do Ensino fundamental Ciclo I3.4.1 Expectativas de Aprendizagem da Lngua Portuguesa por alunos surdos no 1 ano do Ensino Fundamental Ciclo I

No primeiro ano do Ensino Fundamental, o aluno surdo est comeando a ter contato com a Lngua Portuguesa escrita e, assim, a nfase deve ser

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colocada na leitura, uma vez que por meio da leitura que ele poder no s elaborar suas hipteses sobre a escrita, como constituir seu conhecimento de Lngua Portuguesa. O professor deve inserir os alunos surdos em atividades dirias de leitura, envolvendo diferentes portadores de textos. O contedo dos textos deve ser interpretado na Lngua Brasileira de Sinais, mas o aluno surdo deve ter acesso ao texto escrito e s imagens, medida que o professor interpreta, pois desta forma que poder se familiarizar com a Lngua Portuguesa. Antes de comear a leitura, o professor deve introduzir o texto, relacionando-o com o conhecimento prvio que o aluno j dispe. No decorrer da leitura, poder comentar alguma passagem. No entanto, no devem ser feitas muitas pausas, o que poder provocar o desinteresse dos alunos. A rotina diria pode se transformar em uma boa situao de aprendizagem da leitura e da escrita, pois envolve a produo de textos pelo professor e a leitura dos mesmos pelos alunos6. A rotina diria pode incluir lista das atividades do dia, lista dos alunos presentes, ausentes, dos ajudantes do dia, assim como relatodeacontecimentoscotidianos(finaisdesemana,festas,entreoutros). Nos relatos de acontecimentos cotidianos, os alunos contam, na Lngua BrasileiradeSinais,oquefizerameoprofessorescreve,naLnguaPortuguesa, fazendo, assim, papel de escriba. Os alunos podem tambm desenhar o que fizerame,comaajudadoprofessor,escreverumpequenotexto.Noseespera que os alunos surdos escrevam textos de autoria no primeiro ano, uma vez que, para isto, necessitam de conhecimento da Lngua Portuguesa escrita, do que no dispem ainda. Assim, todas as atividades de escrita no primeiro ano so coletivas e se caracterizam pela produo dos alunos na Lngua Brasileira de Sinais, e a escrita dos mesmos na Lngua Portuguesa, feito pelo professor. Desta forma, os alunos surdos vo ampliar seu conhecimento de Lngua Portuguesa, alm de perceberem semelhanas e diferenas entre as duas lnguas: a Brasileira de Sinais e a Portuguesa. A escrita coletiva, da qual o professor foi escriba, pode se tornar um texto queserlidopelosalunos.Oprofessorpodesolicitarqueosalunosidentifiquem, notexto,palavrascorrespondentesaossinaisqueelefizer.Estetextopodeainda servir de base para a produo dos primeiros textos pelos alunos.7OleitorpoderencontrarmaisinformaesnolivroTodaForaao1anocontemplandoasespecificidadesdosalunossurdos(2006),cujosdadosseencontramnabibliografia. 7 Para conhecer mais sobre as possibilidades de trabalho com escrita no incio do processo escolar, o leitor podeconsultarostrabalhosdeManziniecolaboradores(2005)edePereira(2005;2006),cujosdadosseencontramnabibliografia.6

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Por meio da leitura do professor e da sua prpria, o aluno surdo vai aprender, desde o primeiro ano, que se pode ler para cumprir diferentes propsitos, como ler para saber mais, ler para se divertir, ler para se desenvolver, ler para se emocionar.

Quadro-sntese dos gneros indicados para o 1 ano Gneros freqentados em atividades permanentes ou ocasionais Gneros selecionados para estudo e aprofundamento em seqncias didticas ou projetos Lista, bilhete, receita, relato de acontecimento do cotidiano, explicao, manchete, legenda, notcia, conto tradicional, parlenda e cantigas infantis. Bilhete, receita, explicao, notcia e cantigas infantis.

QUADRO 1 - ESFERA COTIDIANAGneros freqentados em atividades permanentes ou ocasionais Gneros selecionados para estudo e aprofundamento em seqncias didticas ou projetos Lista, bilhete, receita e relato de acontecimento do cotidiano. Expectativas de aprendizagem Leitura Ler, com a ajuda do professor, bilhetes enviados pela escola para os pais e vice-versa. Relacionar o bilhete situao comunicativa e ao suporte em que circula originalmente. Recuperar informaes explcitas. Produo escrita Ditar, na Lngua Brasileira de Sinais, bilhetes para que o professor escreva na Lngua Portuguesa. Anlise e reflexo sobre a lngua e a linguagem Identificar,comauxliodoprofessorepormeiodaLngua Brasileira de Sinais, possveis elementos constitutivos da organizao interna do bilhete: data, horrio, nome do destinatrio, frmula de entrada, corpo de texto, frmula de despedida e indicao de remetente.

Modalidade escrita

Esfera cotidiana Gneros focalizados em seqncias didticas/projetos: Bilhete

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QUADRO 2 - ESFERA ESCOLARGneros freqentados em atividades permanentes ou ocasionais Gneros selecionados