OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · Educação Física e Esporte da Universidade...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Autor: Erlice Morais Meira Rosa
Disciplina/Área: Educação Física
Escola de Implementação
do Projeto e sua localização:
Colégio Estadual Marechal Floriano Peixoto Ensino Fundamental e Médio.
Município da escola: Grandes Rios
Núcleo Regional de Educação: Ivaiporã
Resumo:
Este trabalho pretende refletir a necessidade histórica no contexto escolar, tendo em vista destacar as funções socialmente a ela atribuídas ao longo dos tempos e as consequentes limitações atuais da sua intervenção pedagógica. Partimos da pesquisa e compreensão sobre o processo histórico de constituição do ser social e das questões histórico-concretas das classes sociais, identificando as possibilidades de ação que ela possui para contribuir com a emancipação humana. Sondamos como a Educação Física é vista pelos integrantes da comunidade escolar, na medida em que propomos ultrapassar os limites da sua legitimidade na escola. Por meio de estratégias capazes de subsidiar a formação acadêmica, social e política dos indivíduos responsáveis pela educação, pretende-se chegar ao entendimento das relações pedagógicas voltadas à formação humana, conhecendo a necessidade histórica desta área na sociedade atual. Deste modo, mediar à formação com consciência de classe para os trabalhadores que constituem o sujeito revolucionário, eixo essencial para efetivação da sua autonomia.
Palavras-chave: Educação Física escolar; Legitimidade; Necessidade histórica; Emancipação humana.
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA
ERLICE MORAIS MEIRA ROSA
EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA
CONTEMPORÂNEA:
DA LEGITIMIDADE RUMO A NECESSIDADE
HISTÓRICA PARA ALCANÇAR A EMANCIPAÇÃO
HUMANA
Artigo apresentado à Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), Núcleo Regional de Ensino de Ivaiporã, como requisito parcial ao Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE).
Orientador: Prof. Me. Fernando
Pereira Cândido
Grandes Rios, dezembro de 2014.
EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA CONTEMPORÂNEA: DA LEGITIMIDADE RUMO A NECESSIDADE HISTÓRICA PARA
ALCANÇAR A EMANCIPAÇÃO HUMANA
Erlice Morais Meira Rosa1
Fernando Pereira Cândido2
Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem como querem, não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado (MARX).
Introdução
Este artigo resulta da pesquisa preparatória e implementação de um
curso de formação continuada para professores, alunos e demais membros da
comunidade escolar do Colégio Estadual Marechal Floriano Peixoto Ensino
Fundamental e Médio, no município de Grandes Rios, tratando da temática da
necessidade histórica da Educação Física na escola contemporânea.
Realizado no contexto do Programa de Desenvolvimento Estadual (PDE),
proposto pela SEED-PR. Partimos da consideração de um quadro depreciativo
da Educação Física na escola e da necessidade de romper com as estruturas
que vem delimitando a ação dos profissionais desta disciplina. O problema que
se colocou para nós, inicialmente foi buscar a sua legitimidade pedagógica no
ambiente escolar. Com o avanço da compreensão da história não só desta
disciplina, mas da educação como um todo, nos deparamos com um dilema: a
resolução dos problemas da Educação Física na escola passaria pela busca da
sua legitimidade ou pela compreensão da sua necessidade histórica? Estaria
na modificação do comportamento dos indivíduos responsáveis por esta
disciplina, na mudança na formação acadêmica, na explicação pela via do
talento individual dos professores, ou o caminho seria através de um resgate
histórico do ser social e da crítica à relação social chamada capital? Nossa
compreensão é que essa discussão deve ser feita para permitir uma reflexão
1 Especialista, professora da Rede Estadual do Estado do Paraná. 2 Mestre, professor do Departamento de Estudos do Movimento Humano, Centro de Educação Física e Esporte da Universidade Estadual de Londrina.
que possibilite práticas pedagógicas voltadas à superação do modelo
hegemônico de Escola e sociedade.
Identificamos que sua legalidade no contexto escolar foi estabelecida em
1937 pelo governo brasileiro ao efetivá-la nos parâmetros da lei, garantindo sua
permanência no universo escolar (CASTELLANI FILHO, 1988, p. 58). Isto,
porém, não garantiu a sua legitimidade, percebemos a falta de reconhecimento
por seus pares. Muito mais do que a sua determinação legislativa, esta
disciplina busca a sua valorização e sua identidade nos currículos escolares,
por meio de uma construção essencialmente democrática para conquistar a
sua legitimidade, ou melhor dizendo, a verificação de seu sentido social nos
universos escolares.
Porém, conforme constatamos nas respostas de um questionário de
sondagem para a questão cinco: Qual a influência pedagógica que você
acredita que a educação física possui no rendimento escolar dos alunos?
Apareceram as categorias: desenvolvimento motor; desenvolvimento afetivo;
formação integral; formação esportiva; formação para a saúde; meio para o
aprendizado; formação cidadã; autonomia/especificidade pedagógica; A
formação integral foi a categoria mais expressiva. Se estivéssemos trabalhando
no campo da legitimidade da educação física, que a opõe à questão da
legalidade, conforme se faz hegemonicamente na produção teórica sobre a
educação física escolar, poderíamos constatar que esta disciplina está
resolvendo seus problemas na escola, pois ela está sendo reconhecida pelos
indivíduos desta comunidade. Conforme Bracht (19923, apud MELLO, 2009, p.
20), a legitimidade da educação física na escola diz respeito a encontrar
argumentos convincentes sobre a sua permanência na escola. “Esta
legitimação precisa integrar-se e apoiar-se discursivamente numa teoria da
Educação Física”. Temos que lembrar que a teoria dominante que guia a
Educação Física está no campo liberal, portanto, formar o homem
integralmente é um sinônimo de formar o cidadão. Entendemos que o cidadão
é um indivíduo cindido, a personificação do capital e em oposição radical ao
homem (Mello, 2009, p.155). A segunda categoria mais expressiva é a meio
para o aprendizado, que nos mostra a Educação Física como suporte para o
3 BRACHT, Valter. Educação Física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister,
1992.
desenvolvimento de outras capacidades ou dimensões do processo
pedagógico. Analisando esta categoria em confronto com a
autonomia/especificidade pedagógica, esta última é muito menos expressiva
que a primeira. Isso nos mostra que o conteúdo específico, a importância
histórica da educação física na formação humana é desconhecida. Essa visão
fragmentada, parcial do homem como cidadão está presente também na
indicação da relevância pedagógica da disciplina considerando o
desenvolvimento motor, a formação esportiva e a própria formação cidadã dos
alunos, categorias que aparecem com força nas respostas analisadas.
Porém, essa busca de respostas, considerando o indivíduo
isoladamente, conduziria a negação da construção histórica do ser social, pois
os indivíduos juntos constituem o sujeito histórico, e este é a classe e não a
singularidade. Essa relação indivíduo-singularidade é a chave para
compreender como está relacionado o individuo ao sujeito histórico, isso quer
dizer que no sujeito temos a individualidade da classe, que está muito além da
subjetividade dos indivíduos, mas parte destas para se constituir e atuar como
agentes capazes de superar as ações previstas para sua classe ou categoria
social, pois de acordo com a fala de Chasin (1988).
Este sujeito coletivo, dentro do qual atuam e realizam os seus objetivos os sujeitos individuais, esses sujeitos individuais o realizam na medida em que o fazem da perspectiva de certas classes. Aí então a objetividade é entendida como uma possibilidade de classe. É entendida como uma possibilidade de sujeito coletivo. E não como uma escolha do sujeito individual. Isso é um ponto decisivo. A objetividade não é o resultado da construção de um discurso rigoroso, mas a objetividade é o resultado de uma condição objetiva de possibilidade social que permite então a geração do discurso rigoroso. Dito de outro modo, a objetividade não é alcançada por um discurso de rigor, mas o discurso de rigor é constituído, possibilitado por uma possibilidade de classe (CHASIN, 1988, p. 4).
Verificamos que a necessidade atual da Educação Física supera a
legitimidade, e incide da sua necessidade histórica tendo como pressuposto a
captura dos momentos que constituem a realidade social, ou seja, percebemos
que seria fundamental esclarecer as possibilidades produzidas e recriadas pela
ação humana, que modificaram a macro estrutura, através de respostas a
questões humanas estabelecidas, que variaram suas conexões e o seu grau de
complexidade conforme o conhecimento, a linguagem, a sociabilidade e a
educação, compartilhados e oriundos da protoforma do ser social o trabalho, a
partir do pensamento exposto, e tendo em mente que buscamos a melhor
formação para nossos alunos, lutar por legitimidade da Educação Física na
escola é, ao mesmo tempo, permanecer em uma concepção de formação para
o mercado de trabalho. E restringir sua capacidade de ação a reprodução
social, por outro lado, a discussão da necessidade histórica da Educação
Física e da Escola nos remete a um projeto político de sociedade e de
formação humana, que conduz a emancipação e a libertação ideológica.
Compreendemos que todas as ações destinadas ao contexto escolar são previamente determinadas pelo modelo societário, não são naturalmente postas mas construídas socialmente, a transformação deverá vir da superação da contradição expressa por necessidades antagônicas das classes que a constituem, para construir um novo projeto histórico, não basta um desejo arbitrário mas é essencial resgatar possibilidades históricas contidas no socialmente existente (MELLO, 2009, p. 15).
Tendo em vista superar a desvalorização e a visão limitada sobre a
importância da Educação Física escolar, o caminho a ser percorrido então é a
busca da compreensão da sua necessidade histórica e não da sua
legitimidade. Considerando essa problemática, estabelecemos o objetivo de
conhecer e compreender os elementos que constituíram a formação do ser
humano e da sociedade que subsidiaram a construção da forma da Educação
e da Educação Física na atualidade.
Visando coletar dados da realidade e refletir essas questões com os
integrantes da nossa comunidade escolar, ofertamos um curso de formação
composto por duas temáticas desenvolvidas em dois encontros presenciais nas
instalações do nosso colégio, e outras dez temáticas desenvolvidas em
encontros virtuais realizadas na plataforma do ambiente moodle do Nead –UEL
(Núcleo de ensino a distancia da Universidade Estadual de Londrina). Cada
encontro visou promover o conhecimento e a reflexão sobre a história do
homem e da humanidade, da construção do ser social e da sociedade,
evidenciando os processos que permearam as práticas sociais da Educação e
da Educação Física que edificaram a escola contemporânea, podendo servir
como instrumentos essenciais à promoção de atividades pedagógicas que
conduzam à emancipação humana.
Desenvolvimento
Desde os primórdios da educação ela procurou satisfazer as necessidades de um modelo hegemônico, sua prática foi estabelecida a partir da busca de um modelo estipulado de homem, tendo em vista alcançar resultados previstos para cada segmento social. Essa inserção era considerada natural atendendo as expectativas pré determinadas de liderança, religiosa, utilitária (de saúde e de combate) entre outras tantas, tendo em vista o ordenamento social estabelecido previamente (OLIVEIRA, 1987, p. 63).
Conhecendo as determinações societárias do modelo escolar, uma
discussão acerca da disciplina de Educação Física na escola contemporânea
será mais explicativa buscando sua legitimidade ou investigando a sua
necessidade histórica? Para compreender a necessidade de qualquer disciplina
que constitui a formação do homem em cada momento da história, é essencial
compreender, primeiro, o homem enquanto um ser social.
Reconhecer a natureza do ser social é o ponto de partida para a
compreensão da estrutura atual de organização da vida social, pois a
humanidade como um todo é constituída por um movimento que pressupõe a
interligação da objetividade com a subjetividade e, além de um todo genérico, o
ser social só poderá ser conhecido pela mediação das categorias da
singularidade, da universalidade e da particularidade que as articulam em
menor ou maior grau.
Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou pelo que se queira. Mas eles mesmos começam a se distinguir dos animais tão logo começam a produzir seus meios de vida, passo que é condicionado por sua organização corporal. Ao produzir seus meios de vida, os homens produzem, indiretamente, sua própria vida material (MARX; ENGELS, 2007, apud MELLO, 2009, p. 48).
Os homens se diferenciam dos animais primeiramente porque
trabalham. A partir do trabalho apresentam a capacidade de pensar e refletir ,
a intencionalidade da ação humana consolidou a construção da história da
humanidade a partir de relações projetadas distantes da satisfação do mero
instinto animal. A existência humana, por isso, compreende a satisfação das
necessidades essenciais à sua vida, mas também de outras necessidades
advindas da satisfação destas.
Conforme Marx e Engels (2007 apud MELLO, 2009) existem três
momentos constituintes da história que pressupõem a ação humana: a
produção dos meios para satisfazer as suas necessidades de comer, beber,
morar e vestir, ou seja, de manutenção da própria vida; essa ação de satisfazê-
la e a busca de instrumentos utilizados para esse fim conduz a outras novas
necessidades. E essa ação permanente, uma capacidade exclusiva dos
homens, os eleva a um novo patamar, pois ao produzir meios de preservar a
sua vida a partir da natureza, interage com outros homens e com o meio
ambiente, o que permite a reformulação de si mesmo e dos outros, ou seja, os
conduz a criação de novos homens, novas formas de ação e reação com vistas
a satisfação das novas necessidades, dando origem ao mundo social.
A evolução permanente das atividades humanas pode ser observada,
além da razão, a partir da práxis social. As ideias são estabelecidas partindo da
prática social e não na ordem inversa, essas relações permeiam a
interdependência das categorias que constituem a objetividade e a
subjetividade do ser social, esse movimento que é a força motriz da evolução
da história, da religião, da filosofia e toda a forma de teoria (MARX; ENGELS,
2007, apud MELLO, 2009, p. 53).
Portanto, é necessário conhecer seu funcionamento articulado com seu
eixo fundante, o “trabalho”, observar cada objeto – a Educação Física escolar
no nosso caso - na sua interdependência desde a sua gênese à sua função
social, buscar meios capazes de permitir ir além da sua aparência histórica
socialmente reconhecida, sob uma ótica pré-determinada que atua na
reprodução do ser social atual, que atende e mantém impregnadas as
necessidades do sistema capitalista e não da história humana.
Desse modo objeto e objetividade e sujeito e subjetividade são tomadas como resultado real da atividade humana que implica conhecimento e ação. Fica claro, assim que a relação gnosiológica entre sujeito e objeto é apenas um momento de uma relação mais ampla, que é a criação da realidade social como totalidade (TONET, 2005 apud MELLO, 2009, p. 49).
A relação aqui pretendida expressa a necessidade do sujeito conhecer
o objeto de estudo em sua totalidade e vice-versa, compreender que esta
relação de conhecimento também pode elencar informações que mascarem a
realidade, bem sendo que essa relação é recíproca, e subjetividade e a
objetividade estão interligadas e uma não existe sem a outra. Variam de
posições de acordo com o momento da realidade social em que estão
expressas, que além de ser uma relação gnosiológica também é uma relação
ontológica.
Fica evidenciada a necessidade do sujeito conhecer o objeto na
perspectiva ontológica de constituição do próprio objeto nas respostas dadas
pelos participantes da formação continuada, especificamente na questão
número nove: Existe diferença da prática pedagógica das aulas de
Educação Física e as demais disciplinas do currículo? Quais? A maior
parte dos respondentes não reconhece diferença entre a prática pedagógica da
educação física e das demais disciplinas escolares, uma vez que todas
estariam voltadas ao mesmo objetivo na formação educacional, expressas na
categoria disciplinas com o mesmo objetivo. Questionamos: que formação é
esta? Qual o projeto de homem a ser formado pela escola para todos? Será
que ela se volta à formação do homem emancipado, ou está centrada na
formação do cidadão4? Os entrevistados que reconhecem a diferença nesta
prática indicam a relação teoria e prática para justificar a diferença, no entanto,
em sentidos opostos. A categoria prioridade na prática mostra uma concepção
crítica a respeito da desconsideração da reflexão teórica, em função da prática.
Porém, uma vez mais questionamos, qual a especificidade da disciplina
Educação Física numa perspectiva de formação integral: o artístico, o
intelectual, o afetivo, ou o físico?
O outro grupo de respostas que reconhece a diferença entre as práticas
pedagógicas indica uma positividade da Educação Física por ser mais rica para
a síntese teoria/prática do que outras disciplinas. Essas respostas nos levaram
à categoria melhor relação teoria/prática. Por último, a categoria emancipação
humana está entre as respostas que identificam similaridade nas práticas
pedagógicas, com uma expressividade pequena no número de respostas nos
indica, porém, que dois participantes deste curso conseguem relacionar o papel
da escola à emancipação humana. Dito de outra forma, relacionam a Educação
Física e demais disciplinas à superação radical da sociedade capitalista.
A esta realidade social existem muitos momentos que fazem parte de
sua evolução e da sua distinção, ou seja, do seu delineamento tais como a
socialidade (o trabalho é sempre um ato social, de natureza social), a
linguagem (em meio a toda atividade social implica comunicação), educação (o
4 Além de Mello (2009), nos baseamos nos escritos de Ivo Tonet e seus
apontamentos a respeito da educação para a cidadania para tecer as considerações posteriores sobre cidadania e formação cidadã.
homem aprende tudo o que faz, o trabalho implica teleologia, intencionalidade
prévia e pressupõe a existência de alternativas) e conhecimento (processo de
aquisição de habilidades, comportamentos e valores),enfim, tudo o que permita
ao individuo tornar-se apto a viver em sociedade, sendo que estes podem
ainda variar conforme a complexidade das estruturas da sociedade que exigem
atividades além da produção de bens materiais (CHASIN, 1988).
Portanto, esses momentos são permanentemente reelaborados, cada
uma com uma natureza e uma função própria na reprodução do ser social,
apresentando três características permanentes na sua relação com o trabalho:
uma dependência ontológica, uma autonomia relativa e uma determinação
recíproca (TONET, 2009).
No desenvolvimento histórico, com a divisão do trabalho mediante a
propriedade privada dos meios de produção, se configura a proposta educativa
contrária à busca da formação igualitária, ou seja, é distinta, tendo em vista
atender a posições diferentes de inserção social, confirmando que esta atuação
não foi posta naturalmente, mas foi estipulada socialmente pelos homens e
correspondem a interesses objetivamente postos de determinadas categorias
ou grupos sociais, direcionadas a manutenção de cada classe socialmente
existente (TONET, 2009, p. 5).
De acordo com Frigotto na ótica burguesa, “todos os indivíduos são
livres, se todos no mercado de trabalho de trocas podem vender e comprar o
que querem”, portanto, a desigualdade é culpa do indivíduo. Ou seja, se
existem aqueles que têm capital é porque se esforçaram mais, trabalharam
mais, sacrificaram o lazer e pouparam para investir” (FRIGOTTO, 1993, p. 61).
Cada indivíduo pode ser o dono dos meios de produção, tendo o direito ao que
produziu, a sociedade seria estratificada a partir dos méritos específicos, para
tanto a escolaridade poderia ser considerada critério essencial de qualificação
para o sucesso, de modo natural, já que é igualmente ofertada a todos.
Porém a natureza do capital implica em uma relação indissolúvel entre
desigualdade real e igualdade formal, conforme Tonet (2009, p. 12) “uma vez
que a educação é subordinada aos imperativos da reprodução do capital, e
uma vez que ele é a matriz da desigualdade social, seria totalmente absurdo
esperar que ele pudesse proporcionar a todos igualdade de acesso a ela.”
(TONET, 2009, p. 5).
Portanto, verifica-se que a escola tem colaborado com o
mascaramento da real situação de desemprego, a educação especializada
deve ficar restrita a determinados ambientes, determinadas funções em centros
de treinamento mantendo a estrutura econômica atual. Porém, entendemos
que o papel da escola deve ser a formação geral, a apropriação dos
conhecimentos historicamente produzidos pelo homem, instrumentalizando s
classe para que possam argumentar e interferir no processo, tornando-se um
espaço de lutas sociais e políticas na defesa do saber da classe. “Sendo assim,
a educação, em seu sentido estrito, é o resultado das necessidades sociais
surgidas em determinada sociedade. Esta exige determinados comportamentos
e habilidades que precisam ser apreendidas” (MELLO, 2009, p. 99).
Constatamos através do questionário de sondagem, essa conformação
da comunidade escolar com as possibilidades ofertadas no contexto escolar,
nas respostas para a questão número oito: Haveria alguma diferença se as
aulas de Educação Física fossem retiradas do contexto escolar?
Apareceram as categorias formar o cidadão; aptidão física; formação integral;
meio para a aprendizagem; conteúdo curricular; perda do campo de trabalho;
falta de legitimidade; formação para a saúde; emancipação humana; A maior
incidência de respostas foi à categoria formação integral, que está relacionada
a formação do cidadão. Este não é um sujeito integral de verdade. A segunda
categoria que mais apareceu foi meio para a aprendizagem, demonstrando que
a Educação Física é utilizada na escola com fins exteriores à disciplina e à
própria escola, que buscam a satisfação do mercado de trabalho. Comprova-se
que o conteúdo específico da área não importa, e sim o tipo de formação que
ela proporciona, a formação cidadã. O cidadão está em oposição radical ao
homem, porque este é um ser social que faz história: ele trabalha, coloca
finalidades e busca os meios, ele é um ser de atividade consciente. Porém,
essa atividade só é possível socialmente, coletivamente. O cidadão, por outro
lado, se coloca no plano do indivíduo isolado, ele está em oposição constante
aos outros indivíduos que lhe representam uma ameaça. Ser um cidadão é
respeitar as leis capitalistas que protegem a propriedade privada e por isso
colocam um homem contra outro homem, um é o proprietário dos meios de
produção, o outro é o dono da força de trabalho.
A categoria emancipação humana aparece em apenas uma resposta,
mas demonstra a preocupação com os determinantes específicos desta
disciplina e a possibilidade de se efetivar práticas que permitam o
fortalecimento de sujeitos históricos, considerando sua libertação real.
Considerando que o homem aprende a ser homem e, portanto, a
conviver em sociedade, os seus saberes, de modo elaborado, compõe um
conjunto que deve ser generalizado pois é produto da história da humanidade,
ou seja, constituem a gênese da ciência da arte e de outros produtos da
complexidade do pensar e do agir humano característicos do indivíduo social.
[...] o ser social é a síntese dos atos singulares dos indivíduos em tendências, forças etc. genéricas. Neste contexto, a substância concreta que distingue uma individualidade das demais, bem como da totalidade social, é dada pela qualidade, pela direção etc. da cadeia de decisões alternativas que adota ao longo da vida. É a qualidade das relações que estabelece com o mundo que caracteriza a substancialidade de cada indivíduo singular (LESSA, 2002 apud MELLO, 2009, p. 100, grifo do autor).
Os conhecimentos que deveriam ser transpostos como patrimônio
humano, ou seja, produto do ser social, esse movimento se constrói a partir de
causalidade e teleologia, portanto específicos do homem, contendo sua gênese
no trabalho, mas que não pode ser confundida com ele, pois reúne a infusão de
todos os determinantes da realidade social. Na relação homem x natureza,
para realizar o trabalho tanto as ações são projetadas como também seus
resultados; no ato educativo, relação homem x homem, ainda que haja a
projeção, a idealização, seu resultado é imprevisível, pois encontra as
condições de variabilidade, produto das ações humanas que dele participam
podendo tomar rumos diferenciados jamais estipulados em sua totalidade
devido as individualidades reunidas.
Dessa forma, o processo educativo faz parte da reprodução social, tanto no sentido da construção das individualidades quanto no sentido de constituição do gênero humano. Esse processo, em conformidade com Lukács, possui a sua essência em influenciar os homens para que estes estejam aptos a atuarem frente às novas alternativas que encontrarão durante suas vidas. Essa atuação, para que se reproduzam às relações sociais, devem ser aquelas esperadas, ou seja, é necessário que os homens “reajam no modo socialmente desejado”. Entretanto, argumenta o autor que “este propósito se realiza sempre – em parte – e isto contribui para manter a continuidade na transformação da reprodução do ser social; mas ele a longo prazo fracassa” (MELLO, 2009, p. 101).
Deste modo verificamos que a mudança é possível, mas este é um
processo lento. Não se descarta a importância de compreender o que as
gerações passadas produziram, mas permitir o ir além, considerando e
vencendo as contradições postas que impulsionam o ato educativo, mas
tornando-as passiveis de objetivação para a emancipação humana real,
visando à adequação das ações, tendo em vista sanar as novas necessidades
postas e a superação das mesmas transpondo a mera reprodução social.
Considerando de fato as individualidades e, por conseguinte, as oportunidades
destinadas a cada indivíduo:
A unidade da espécie humana parece ser praticamente inexistente não em virtude das diferenças de cor da pele, da forma dos olhos ou de quaisquer outros traços exteriores, mas sim das enormes diferenças e condições do modo de vida, da riqueza da atividade material e mental, do nível de desenvolvimento das formas e aptidões intelectuais (LEONTIEV, 2004 apud MELLO, 2009, p. 102).
Essa diferença de oportunidades aparece como natural, porém
verificando a origem ontológica das relações humanas, constatamos que essas
diferenças estruturais são produtos do capitalismo que leva à acumulação por
uns e a exploração de outros.
A essa possibilidade de superação torna-se essencial a aquisição de
outros saberes acumulados pela história da humanidade que foram negados
pelos processos educacionais considerados não essenciais à existência
humana, pois não compõem os saberes relacionados à manutenção do capital.
São eles as artes, a cultura corporal, entre outros relegados a segundo plano
no contexto escolar por não serem instrumentos diretos da produção
capitalista, mas estes são constituintes dos movimentos teleológicos
individuais, capazes de elucidar alternativas que poderão subsidiar a
transposição da mais alta complexidade do pensamento humano. A Educação
Física, no âmbito escolar, trata pedagogicamente formas de atividades
expressivas corporais como: jogo, esporte, dança e ginástica, formas estas que
configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura
corporal (COLETIVO DE AUTORES, 2009). Nesta perspectiva, a evolução do
movimento se dá paralelamente ao surgimento das novas necessidades
essenciais da condição humana, que ocorreram como meio de viabilizar a
caça, a pesca, a criação de habitações, enfim, da ação projetada diante das
barreiras naturais, as quais destacamos, são necessidades históricas e não
naturais.
Na segunda questão do questionário aplicado os cursistas
manifestaram sua compreensão sobre: O que é Educação Física? As
categorias encontradas foram: atividade física; saúde; disciplina escolar;
aptidão física; formação integral; cultura corporal; área profissional;
ciência/estudo do movimento. Entre estas, as categorias mais expressivas
foram atividade física e disciplina escolar. A terceira categoria mais expressiva
foi a saúde. Com este resultado podemos ver a compreensão de que a
Educação Física é uma disciplina escolar que relaciona a atividade física e a
saúde, nos remetendo à fundamentação predominante desta área que vem da
biologia. Relacionando esta compreensão ao seu entendimento enquanto
ciência/estudo do movimento humano podemos afirmar que as práticas
higienistas que a legitimaram no passado continuam existindo. Quanto à
categoria formação integral ela no mostra uma compreensão da disciplina que
relaciona a formação física à intelectual, todavia ainda numa perspectiva
dualista que não entende o ser social na sua totalidade. Ainda se pensa em
um corpo saudável como suporte para o desenvolvimento intelectual, ou, em
intervir no cognitivo por meio das práticas corporais. A categoria aptidão física
teve pouca expressividade, em conformidade com Mello (2009) que mostra a
perda da especificidade do conteúdo da área nas discussões científicas dos
autores desta disciplina. O que temos de mais avançado na discussão
pedagógica sobre a Educação Física, representado pela cultura corporal,
também apareceu nas repostas indicando os aspectos históricos, sociais,
lúdicos e de compreensão das práticas desta disciplina.
Na antiguidade encontramos o primeiro modelo que enfatizava os
exercícios físicos com fins de preparação para a guerra, bem como da estética
que iria constituir um modelo de homem ideal. Acreditava-se neste período que
o corpo era o receptáculo da alma, onde a formação integral do ser humano
era fundamentada na ginástica, na música (poesia, tradições) e na gramática.
Uma ênfase excessiva no espírito determinou alguns retrocessos à
educação física durante a Idade Média. Surgem as punições voltadas ao corpo,
as diferenças sociais entre os senhores feudais e os seus servos era atribuída
a uma divisão natural pré-determinada por Deus, onde os prazeres humanos
eram considerados uma afronta ao dogma determinado pela Igreja católica.
Com o final da Idade Média foram instituídos os sistemas nacionais de
ensino, em meados do século XIX, buscando romper com o antigo regime e
objetivando transformar os antigos “súditos em cidadãos” (SAVIANI, 2009, p. 5-
6). Estes objetivos generalizados tornaram real o sonho da educação escolar
pra todos, sendo que até então era voltada exclusivamente aos integrantes dos
poderes hegemônicos. Este ideário solidificou a necessidade de instituições
educacionais, sanitárias e habitacionais e em meio a esse contexto histórico
nasceu a instituição Escola.
A Educação Física, em seu início, além de valorizada por suas bases científicas e de ter suma importância enquanto higienizadora em um momento em que a sociedade era produtora de enfermidades, contribuía então para a formação do caráter, disciplinando a vontade, pois era necessário apaziguar os ânimos, formando o cidadão cada vez mais responsável por si e pela manutenção da ordem social. Isto contribuiu também com os movimentos de formação dos Estados Nacionais, capitaneados pela burguesia (MELLO, 2009, p. 123).
No espaço previsto para a aquisição de determinados valores e
conhecimentos necessários à manutenção desta nova ordem social surgem os
métodos ginásticos, criados para a aquisição do vigor físico e adestramento
militar e cívico. Inspirado por esta tendência o Brasil institui a Educação Física
como disciplina, associada às atividades militares, portanto conduzida e
orientada pelos próprios oficiais do exército ofertada apenas para os alunos do
gênero masculino. Porém, a fragilização da saúde feminina conduziu a sua
expansão e passa a ser ofertada também às alunas, com vistas a atender a
fins de profilaxia e a preparação para a maternidade. A Educação Física
compreendia funções higiênicas, tendo em vista melhorar os níveis de saúde
da população em geral (SAVIANI, 2009).
Com a implantação do Estado Novo (1937 a 1945) sua função utilitária
foi também empregada na orientação com o cuidado da raça brasileira, visava
à eugenia, em um projeto de purificação biológica dos homens, da ampliação
do vigor físico, tendo em vista a ampliação da produtividade (CASTELLANI
FILHO,1988, p. 56). Diferente do higienismo, esta corrente era especialmente
discriminatória porque considerava negros e índios como inferiores, excluindo
as pessoas com deficiências das aulas de Educação Física. Estas visões foram
balizadas atendendo expectativas do poder hegemônico, até a chegada ao
Brasil do método Esportivo Generalizado, que propunha a ascensão por meio
de resultados esportivos do país buscando sua elevação em meio às potencias
esportivas de primeiro mundo (Idem, Ibidem).
Em meio aos anos 80 do século XX inicia-se o debate que buscava
superar a visão limitada que deslocava seu foco da biologia, da
psicomotricidade e da aptidão física na Educação Física. Iniciam inúmeras
constatações de que sua função sempre foi utilitária e que sua atuação
colaborava com a manutenção das estruturas sociais impostas pelo sistema
capitalista (BRACHT, 1999).
Este pensamento permanece na atualidade, pois através do
questionário de sondagem nas respostas da terceira questão: o que você
entende sobre a Educação Física? Destacamos como categoria mais
expressiva a atividade física, seguida pelas categorias saúde, aptidão física e
esporte. Podemos confirmar nestas categorias a fundamentação de base
biológica como a mais influente, junto ao seu conteúdo hegemônico, o esporte.
Outros conteúdos específicos foram citados, como jogo e luta, porém de forma
menos expressiva, o que reflete uma limitação na compreensão da área na sua
totalidade, ou na perspectiva da cultura corporal. As categorias cultura corporal
de movimento e formação para a cidadania indicam os fundamentos teóricos-
políticos dos participantes que influenciam nas suas concepções sobre a
disciplina e a formação humana. Quando se fala em formação para a
cidadania, está se preparando o indivíduo para se inserir no sistema, sem
questioná-lo ou, questionando-o em relação aos defeitos periféricos sem tocar
na natureza desta sociedade, portanto partindo de uma concepção política
liberal ou socialdemocrata. A cultura corporal de movimento se constitui a partir
de teorias nesse espectro teórico-político5.
Esse espectro de alienação histórica presente na sociedade se reflete
no processo escolar, bem como, aparece remodelado nas Diretrizes
Curriculares Estaduais do Paraná. Pois, quando partimos de teorias de
conhecimento diferentes podemos apresentar diversas e contraditórias
compreensões do homem, da sociedade e da educação atual. Essas
contradições além de reduzir a uma visão superficial, fragmenta e separa os
5 Confrontar capítulo 1 de Mello (2009).
fatos que constituíram a evolução dos processos de humanização, não
possibilita uma visão ontológica do homem, mas sim recortes históricos que
isolados não traduzem os determinantes postos pela realidade social,
mascarando as possibilidades do devir humano.
As diretrizes curriculares nasceram das críticas às políticas educacionais
de 1990, consideram o esvaziamento dos conteúdos das disciplinas e
apresentam a proposta do currículo disciplinar na tentativa de resgatar
importância do conhecimento científico. Porém, apesar de se diferenciar dos
Parâmetros Curriculares Nacionais pela discussão sobre a importância dos
conteúdos curriculares para a formação dos alunos, a proposta das Diretrizes
Curriculares Estaduais do Paraná - Educação Física (PARANÁ, 2008) quanto
aos encaminhamentos metodológicos, os elementos articuladores e à forma de
avaliação aproxima-se do documento criticado e apresenta princípios de
formação semelhantes, ou seja, respondem às demandas educacionais
resultantes do reordenamento do sistema capitalista (GILIOLI, 2013, p.144).
Segundo Gilioli (idem, ibidem):
Portanto a organização do processo pedagógico deve considerar as especificidades e conhecimentos que constituem a totalidade de um objeto considerando a diversidade de eixos da sua constituição apreendidas e sedimentadas encaminhando criativamente a solução de múltiplos problemas a partir de múltiplas possibilidades na produção e na socialização dos saberes necessários à práxis humana emancipatória.
Os interesses objetivados pela educação são também atribuídos à
Educação Física. Portanto, não podemos desvincular sua prática da direção da
educação em geral, pois busca atender as expectativas a ela atribuídas nesse
universo. A sua legalidade ou a sua legitimidade estão vinculadas à sua
necessidade histórica que tem como ponto de partida a forma de produzir a
existência e sua correspondente visão política. Para analisar a necessidade
histórica da Educação Física, colaborando com a emancipação humana,
devemos considerar além da atividade prática dos homens, a reunião de
intelectuais que tenham a opção política e a capacidade técnica voltada aos
interesses dos trabalhadores, tendo em vista a educação voltada à formação
integral do ser humano, e não ao mercado. É preciso buscar estratégias que
permeiem uma escola que atenda a sistematização, formalização do saber
produzido coletivamente ao longo dos tempos em conhecimentos científicos e
técnicos a serem apropriados pela classe trabalhadora enquanto sujeitos de
classe.
Conclusão
Concluímos que atendendo aos determinantes deste modelo societário,
a Educação Física tem se preocupado com a instrumentalização dos
indivíduos, considerando as necessidades hegemônicas da atual forma social.
Acreditamos, na perspectiva da emancipação humana, que devemos
contemplar ações coletivas que conduzam à formação integral e possam
instrumentalizar os indivíduos tratados como sujeitos constituintes de uma
classe social fundamental, generalizando expectativas, ampliando as
possibilidades de ações, pensamentos e reações capazes de promover a
revolução deste modelo societário como um todo.
Na sociedade capitalista, as manifestações dessas atividades às quais chamamos de cultura corporal – pois são os sentidos e significados construídos pelo ser social historicamente – estão relacionadas com a lógica dessa sociedade, ou seja, tendencialmente todas as atividades se tornam mercadorias. Desde aquelas para manutenção da saúde, a arte, as esportivas e lúdicas, acrescentando aquelas que surgem para ajudar a compensar os problemas de saúde causados pela forma de organização do processo de trabalho (MELLO, 2009, p. 84).
Para resistir a esta tendência é necessário a formação política do
professor de Educação Física orientada na luta pela superação radical do
capital, considerando a economia como o momento determinante. Deve-se
ampliar as possibilidades de interação com os educandos em outra direção e
com outra lógica, possibilitando a apropriação e a crítica dos conhecimentos
produzidos historicamente pela área, desmistificando os valores a esta
disciplina atribuídos e inculcados até a atualidade por meio de práticas pré-
determinadas que não expressam os interesses históricos da classe
trabalhadora. Isto poderá permitir a resignificação de cada elemento da cultura
corporal, destacando seu caráter de constituinte da realidade social que poderá
ser um elo necessário à emancipação real destes alunos e não a perspectiva
imposta pelo modelo hegemônico, assumindo seu papel enquanto sujeito de
classe.
A oferta das aulas de Educação Física atende a moral do sistema
capitalista, pois constatamos as seguintes categorias nas respostas
encontradas no questionário de sondagem, para a questão quatro: como ela
[Educação Física] acontece na sua escola? Encontramos as categorias:
forma teórico-prática; forma prática; habilidade/desenvolvimento motor;
reconhecimento pedagógico; conformidade às políticas educacionais;
abrangência dos conteúdos específicos; competição/cooperação; formação
cidadã. Os participantes percebem a Educação Física desenvolvida de forma
teórico-prática ou de forma prática na mesma proporção, porém, a categoria
forma prática normalmente estava associada a uma dimensão mais ampla,
indicando os conteúdos desta disciplina, não com o sentido de somente
atender ao rendimento atlético-esportivo. Em relação ao objeto de estudo desta
intervenção no PDE – a necessidade histórica da educação física na escola
contemporânea –, a categoria reconhecimento pedagógico nos dá uma
perspectiva diferenciada em relação ao que suspeitávamos inicialmente, de
que a Educação Física não teria legitimidade no interior da Escola. Esta foi a
categoria mais expressiva nesta questão, indicando um reconhecimento
positivo desta disciplina entendida de forma pedagógica, responsável,
democrática e formativa em sentido amplo dos alunos6. Ela se torna ainda mais
relevante se a relacionamos à categoria conformidade às políticas
educacionais e à categoria abrangência dos conteúdos específicos, que
mostram o entendimento de que esta disciplina responde às determinações da
legislação educacional nacional e estadual, dando conta das diversas
manifestações da cultura corporal. Na perspectiva que desenvolvemos o
raciocínio para essa pesquisa temos que lembrar que legitimidade pedagógica
é diferente de necessidade histórica, ao mesmo tempo em que se relacionam.
Esta legitimidade pedagógica nas respostas nos remetem ao que diz Mello
(2009), sobre a necessidade histórica da Educação Física na Escola moderna.
A autora explica que a Educação Física entra nos currículos escolares para
conformar física, moral e ideologicamente o trabalhador às necessidades do
capital como instrumento da corrente médico-higienista em atendimento à
burguesia. Nesse sentido, verificamos na questão anterior o reconhecimento de
sua importância porque ela é um fator de saúde, relacionada à atividade física
6 É importante lembrar que o público alvo não era composto exclusivamente, nem na
maioria por professores de educação física, composto por pedagogos, professores de outras disciplinas, funcionários da escola, alunos e pais de alunos.
e ao esporte. Assim, pessoas formadas nos parâmetros do capitalismo irão
legitimar o que é correto segundo a moral dominante nesta sociedade.
Propor a emancipação humana, portanto, é estabelecer condições de
desvelar a compreensão do mundo com a distribuição igualitária de formação
capaz da promoção da reflexão, contestação e organização coletiva na busca
de satisfação da necessidade de todos na sociedade.
E à medida que a sociedade se transforma, modifica-se também a
forma da educação que, “não é um produto natural, mas o resultado do
processo histórico em que os homens, a partir do seu trabalho, constroem a si
mesmos, a sociedade em que vivem e todas as suas contradições” (MELLO,
2009, p. 15).
Compreendemos que todas as ações destinadas ao contexto escolar são previamente determinadas pelo modelo societário, não são naturalmente postas, mas construídas socialmente, a transformação deverá vir da superação da contradição expressa por necessidades antagônicas das classes que a constituem, para construir um novo projeto histórico, não basta um desejo arbitrário, mas é essencial resgatar possibilidades históricas contidas no socialmente existente (MELLO, 2009, p. 15).
Buscaremos essa compreensão, pois ao perceber que a sociabilidade
atual é construção humana e, portanto, pode ser reconstruída, damos um
passo na direção da revolução social radical, para que sejam consideradas as
necessidades da classe que constitui a maioria dos seres humanos, a classe
trabalhadora. Libertar-se dessa forma social é conceber, uma sociedade
igualitária, na qual será necessária uma escola livre e autônoma que não
atenda mais a lógica do sistema capitalista, mas a um modelo social de
trabalho associado.
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