OS EFEITOS DA INTRANET NA COMUNICAÇÃO … · uma rede corporativa de comunicação via computador...

188
Henrique Vailati Neto OS EFEITOS DA INTRANET NA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL NO CONTEXTO DA COMPLEXIDADE: UM ESTUDO DE CASO PUC – PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO Programa de Estudos de Pós-Graduação em Administração São Paulo 2005

Transcript of OS EFEITOS DA INTRANET NA COMUNICAÇÃO … · uma rede corporativa de comunicação via computador...

Henrique Vailati Neto

OS EFEITOS DA INTRANET NA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL

NO CONTEXTO DA COMPLEXIDADE: UM ESTUDO DE CASO

PUC – PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Programa de Estudos de Pós-Graduação em Administração

São Paulo

2005

2

HENRIQUE VAILATI NETO

OS EFEITOS DA INTRODUÇÃO DA INTRANET NA COMUNICAÇÃO

ORGANIZACIONAL NO CONTEXTO DA COMPLEXIDADE: UM

ESTUDO DE CASO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE

em administração, sob a orientação do Prof. Dr.

Onésimo de Oliveira Cardoso.

PUC – PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Programa de Estudos Pós-Graduados em Administração

São Paulo

2005

3

BANCA EXAMINADORA

_________________________________

_________________________________

_________________________________

4

À minha esposa Maria Auxiliadora, companheira de

sempre e de tudo, que em sua grandeza de alma

abriu mão de si para que tivéssemos nossos sonhos

e pudéssemos realizá-los.

Aos meus filhos (pela ordem em que os ganhamos),

Henrique, Luiz, Ana Maria e Octávio, razão e orgulho

maior de tudo o que fizemos, principalmente, eles

próprios.

5

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Rosa e Henrique que apostaram em mim antes de mim, exemplos

definitivos de grandeza humana, inspiração maior e eterna.

Ao professor Dr. Onésimo de Oliveira Cardoso que com sabedoria e erudição fez

desta dissertação tardia uma tarefa profícua e prazerosa numa relação de

dignidade cordialíssima.

Ao Dr. Américo Fialdini Jr. instigador primeiro deste trabalho e que, mesmo

quando eu mesmo não acreditei, ele o fez e deu o amparo dos amigos.

A Rafael Abrão Possik Jr, amigo que nos apresentou a tecnologia da informação

com a gentileza e carinho com que distingue a todos que o cercam e que é sua

marca pessoal.

À Claudia Rizzo, amiga e colega que sempre acreditou mais em mim do que eu

mesmo e que sempre me socorreu com a paciência dos bons filhos.

6

À Elizabete e Heloisa que com sua dedicada ajuda me acudiram com a gentileza

que caracteriza as pessoas nobres e sem as quais tudo teria sido mais difícil e

penoso.

7

RESUMO

A proposta desta dissertação é identificar, analisar e refletir a utilização das

Tecnologias da Comunicação e Informação nos processos de comunicação

organizacional no âmbito da Teoria da Complexidade de modo a se buscar, ao

menos em latência, os corolários estruturais de inovações tecnológicas que, de

modo geral, ainda não foram analisadas na proporção e intensidade do caudal

geral das mudanças e dos esforços materiais nelas já gastos, sobretudo no que

se refere a aspectos da cultura organizacional. Para fundamentar nossas

hipóteses, nos apoiamos em um estudo de caso de implantação de uma intranet,

ou seja, de um portal corporativo.

Para tanto, nos valemos de alguns dos mais consistentes estudiosos do espaço

virtual, como Pierre Lévy e dos pensadores da Teoria da Complexidade enquanto

pano de fundo teórico que pudesse conferir às nossas reflexões a sustentação

metodológica suficiente para nos permitir pensar as organizações no difícil

enquadramento e dinâmica deste nosso momento de mutações e

imprevisibilidade.

Palavras-chave: comunicação, complexidade, espaço virtual, intranet

8

ABSTRACT

The proposal of this dissertation is to identify, to analyze and to reflect the use of

the Technologies of the Communication and Information in the processes of

organizational communication in the scope of the Theory of the Complexity in

order to search, to little in latency, the structural corollaries of technological

innovations that, in general way, had still not been analyzed in the ratio and

intensity of the general volume of the changes and the material efforts already

expensed in it, over all to what refers to aspects of the organizational culture. To

base our hypotheses, in we support them in a study of case of implantation of an

Intranet, or either, of a corporative vestibule.

For in such a way, in we are valid them the some of most consistent studious of

the virtual space, as Pierre Lévy and of the thinkers of the Theory of the

Complexity while cloth of deep theoretician who could confer to our reflections

the enough methodological sustentation in allowing to think the organizations in

the difficult framing and dynamics of this moment of mutations and

imprevisibility.

Words-key: communication, complexity, virtual space, Intranet

9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

Objetivo do trabalho 12

Hipótese 15

Relevância e interesses 19

Referências Teóricas 24

Procedimentos Metodológicos 28

Viabilidade da realização da pesquisa 32

Estrutura da dissertação 34

1- A HIPERMODERNIDADE: ESGOTAMENTO LÓGICO E

COMPLEXIDADE 36

1.1 Pós-modernidade e hipermodernidade: em busca de uma designação

apropriada. 36

1.2 A exaustão do Paradigma do Ocidente. 45

1.3 A gênese da Teoria da Complexidade 50

1.4 A chegada da Teoria da Complexidade nos estudos

organizacionais 57

2- VIRTUALIDADE, COMPLEXIDADE E COMUNICAÇÃO

ORGANIZACIONAL 65

10

2.1 O universo virtual e a complexidade 65

2.2 As organizações no mundo complexo: o caos e o êxtase gerenciais.71

2.3 A comunicação organizacional em sua medularidade estratégica. 84

2.4 As organizações em espaços virtuais: facilitações e dificultações

pelas TCI 98

3- ESTUDO DE CASO: OS EFEITOS DA INTRODUÇÃO DA INTRANET NA

COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL 113

3.1 A seleção do caso. 113

3.2 As principais questões da pesquisa. 115

3.3 A descrição do método: 116

3.3.1 Tipo de pesquisa. 116

3.3.2 O método de coleta dos dados. 117

3.4 O caso da Fundação F: 119

3.4.1 O histórico da organização 119

3.4.2 A pesquisa com os dirigentes. 127

3.4.3 A pesquisa com a administração média. 131

3.4.4 A pesquisa com os funcionários operacionais 133

3.4.6 A análise cruzada dos dados. 141

3.4.7 Análise final dos dados. 143

3.4.8 Aspectos particulares do estudo. 148

3.4.9 Contribuições organizacionais. 150

11

A TÍTULO DE CONCLUSÃO. 154

BIBLIOGRAFIA 162

ANEXO 1: Questionários da pesquisa. 174

ANEXO 2: Telas de navegação da intranet. 178

INTRODUÇÃO

12

OBJETIVO DO TRABALHO

Este estudo tem por objetivo identificar, analisar e refletir a utilização da Tecnologia da

Informação no processo de comunicação organizacional no âmbito das organizações

complexas o que, em nosso caso, concentramos numa intranet.

Tal proposta nasceu da intensa vivência do autor do processo de implantação e uso de

uma rede corporativa de comunicação via computador em uma instituição de ensino

superior e todo o largo espectro de situações e corolários que, desde seu nascedouro,

vislumbramos identificar e que nos revelou um campo de insuspeitadas conseqüências

no que tangia aos efeitos da Tecnologia da Informação não apenas na intermediação

das relações dentro das organizações, ou seja, na comunicação, que é nosso foco aqui,

mas, por conseqüência, também no âmbito total da cultura organizacional.

Cabem, aqui, as iniciais e necessárias ressalvas às resistências oriundas da nossa

formação no que se referia à inovação tecnológica e, principalmente, à posição oposta

ao conservadorismo tecnológico, o fetichismo informacional que tanto

comprometimentos ainda acarreta quer às organizações, quanto a seus estudos:

pudemos perceber, não sem um agradável susto inicial já que justificaria nosso esforço,

uma enorme discrepância proporcional entre a escassez de estudos das relações

humanas no espaço virtual e o caudaloso e contundente volume daqueles que se

debruçaram nos aspectos tecnológicos, financeiros, mercadológicos enfim, instrumentais

13

dessas novas tecnologias; pareceu-nos que a irreversível, ampla e vertiginosa chegada

das TCI às organizações paralisou pela ofuscação ou, no mínimo, surpreendeu à massa

dos estudiosos no que se referia a um instrumental teórico-analítico capaz de, em tão

curto espaço de tempo, assimilar e entender as linhas pelas quais poder-se-ia organizar

e interpretar tão vasta casuística: o filósofo e auto-designado engenheiro do

conhecimento, o francês Pierre Lévy, dentre os autores que nos guiaram na busca de

um norte para a nossa tarefa foi quem, de cima de sua reconhecida autoridade,

justificou nossas preocupações:

“A filosofia política e a epistemologia cristalizaram-se em épocas nas quais a informação e a comunicação estavam relativamente estáveis ou pareciam evoluir. (...) Tudo começou a mudar com a revolução industrial (...) a química, os avanços da impressão, a mecanografia, os novos meios de comunicação e os transportes, a iluminação elétrica transformaram a forma de viver dos europeus e desestabilizaram outros mundos. Os ruídos dos aplausos ao progresso cobriam as queixas dos perdedores e mascaravam o silêncio do pensar. Hoje em dia, ninguém mais acredita no progresso, e a metamorfose técnica do coletivo nunca foi tão evidente”.(Lévy 1993 7,9)

Assim, buscando o máximo de fidelidade ao impulso primeiro, resolvemos conduzir

nosso estudo para uma visão a menos possível centrada no mercado e suas variáveis

determinísticas tentando ver, de forma ampla, o como as atuais organizações operam

sua comunicação nesse novo espaço chamado de virtual que, se menos estudado do

que sua importância demandaria, não está em nada isento dos estigmas sutis,

inconscientes e pouco admitidos que marcam as técnicas e ciências enquanto ideologias

como assinala Habermas (Habermas, 1980) o que, sob um outro ângulo, poderia ser

chamado de um enfoque organizacional em contraponto com um enfoque tecnológico,

sempre consciente de que a implantação de pacotes de TCI pode representar níveis

14

diversos de importância nos processos de mudança nas organizações mas, por isso

mesmo, reafirmando a crença na importância científica do abordagem proposta

(Silveira,2001: 1)

Para tanto, procuramos corroboração e maior discernimento através do nosso estudo

de caso mesmo porque o tema, o fôlego do trabalho e o nosso direcionamento

metodológico nos distanciam de qualquer possibilidade de normatização, anelo maior de

todo esforço intelectual, hoje posto no limite das impossibilidades pelo universo real

marcado pela complexidade já que, “a complexidade, apresenta outra peculiaridade que

a faz diferente da complicação, ela revela sempre alguma coisa que nos

escapa”.(Genelot, 1998:26)

Mesmo cuidando de concentrar nosso foco, como recomenda a boa norma, temos

consciência dos riscos, desafios e tentações que incursões na área da complexidade

organizacional implicam, desafio que sempre parece indicar o caminho de realidades

inconciliáveis, mas que, também por isso, possuem o apelo positivo dos desafios e que

querem, em última instância:

“... transformar a experiência do executivo da empresa em consciência, no seio de uma civilização que dificilmente aprende a suspeitar das respostas simples... uma meditação auto-co-reorganizadora que nos pertence desde que não estejamos submetidos às aleatoriedades de uma misteriosa e cruel ‘ordem social espontânea’ e, se pretende conservar a razão construindo projetos individuais e coletivos, de forma inseparável.” (Genelot, 1998:133)

15

HIPÓTESE

Considerando as características das redes informacionais e dos ambientes por elas

criados:

“Uma estrutura que permite desconstrução e reconstrução contínua, suplantação do espaço e invalidação do tempo, e também, uma reorganização rápida e drástica das relações de poder” (Castells, 2000:498);

e dirigidos por um embricamento teórico-metodológico que à frente detalharemos,

estabelecemos como hipóteses para a condução de nosso estudo, que a implantação de

uma rede interna de computadores, em uma dada organização, geraria um espectro de

transformações que extrapolaria, numa medida insuspeitada - o nosso apelo está no

insuspeito, no que de não planejado teria ocorrido e não na medição das

transformações esperadas, o relativamente previsível horizonte para o qual o

instrumento teria sido criado: agilização pela “despapelização” da comunicação formal –

expressão utilizada pelos idealizadores do portal que, também, visaria a retirada de

formulários e memorandos em papel - diminuição dos custos operacionais, maior

acessibilidade, alcance e uniformização das comunicações internas. Assim, num

movimento auto-organizativo, a mediação eletrônica provocaria movimentos

dissonantes e, algumas vezes, antitéticos nas estruturas organizacionais: a exemplo,

superada a fase do “choque inovador” onde os usuários, receosos de serem preteridos

por outros colegas "menos anacrônicos", despertariam para as vantagens do “novo

instrumento”, passando, em alguns segmentos, a abrir sua correspondência eletrônica

com menor assiduidade e com mais vagar se comparada à correspondência pelo "vai-e-

16

vem" cuja existência atômica se faria, burocraticamente, mais consistente já que

concreta e menos “indeletável”.

Por outro lado, sendo uma ferramenta bem elaborada em termos de mapas de

navegação e de links, a intranet permitiria, ao todo do quadro funcional, enxergar um

claro e pormenorizado panorama da organização, de seu organograma, de sua

distribuição espacial, de forma a influenciar o processo de aculturação dos neófitos, que

não dependeriam tanto dos “favores e benesses” da intermediação humana formal ou

informal, de modo curiosamente contraditório já que, sua apresentação à arquitetura

organizacional, seria mais lenta pela utilização de um instrumento originalmente mais

formal: a escrita, ainda que eletrônica, implica em maior formalismo do que a velha

oralidade da “rádio-peão”, mesmo quando constatamos a oferta de uma ferramenta

virtual mais conversacional e amigável, no caso observado, o “comunicador”; em caso

contrário, a aceleração da comunicação no sistema aumentaria a estabilidade deste

como quer a Complexidade o que ensejaria a mudança na organização: será Edgar

Morin (Morin, 2001) que, dentre outros, retomando dos geneticistas o princípio de que

as organizações vão se reconstruindo à medida que funcionam, reconstrói a teoria dos

sistemas na medida em que os considera tanto mais como menos importantes do que a

soma das partes, já que qualidades emergentes retroalimentariam as partes gerando

um processo de auto-criação; assim, os ruídos, a desordem, provocando um

movimento, concorreriam para a construção da ordem.

17

Um dos aspectos de maior relevância são, pelo seu caráter mais estratégico, as

modificações constatadas nas relações de poder da organização que, a nosso ver,

também sofrem transformações qualitativas significativas: alguns dos altos executivos,

quer pelo seu estilo gerencial próprio, quer pelo “incômodo” do aprendizado técnico ou,

até mesmo, pela existência de uma secretaria pessoal de alta confiabilidade e eficiência,

acabam preterindo o uso da rede e se tornando leitores de e-mails impressos, com seus

corolários de um novo estilo linguagem, de um novo ritmo já que as operações de

comunicação formal são aumentadas por mais intermediações. Num outro sentido,

poder-se-ia, nessa atitude, ver uma confirmação forte de conservadorismo tecnológico o

que, nem sempre, poderá ser interpretado como um traço autoritário ipso facto; ainda

nessa direção, poderiam surgir reforços do autoritarismo pela melhor visualização do

todo e, portanto, demarcação dos estratos hierárquicos, facilmente perceptíveis nos

mapas de navegação, bem como no processo geralmente verticalizado de imposição da

inovação: fato razoavelmente corriqueiro, quer pela obtenção de novos instrumentos de

controle tais como a indicação de presença, quer pelo controle da presteza na operação

das estações de trabalho e que, poderíamos designar, como um reforço ou ferramenta

na direção da construção de uma burocracia digital, no sentido clássico de Weber:

estrutura organizacional envolvendo clara divisão de atividades integradas e

hierarquizadas (Weber, 1979).

Na linha mais conhecida e defendida pelos estudiosos do espaço virtual, a plasticidade,

a intemporalidade e um certo grau "histórico" de liberalidade que caracterizam as redes

18

e que, no caso, se converteria em certa “licença hierárquica”, poderiam permitir que,

alguns gerentes normalmente mais reservados se introduzissem, ainda que de forma

menos profunda, nas estruturas informais - que possuem mecanismos de defesa/ataque

contra aos níveis superiores - gerando, quiçá, uma maior possibilidade de diálogo

democratizante pela reciprocidade e conteúdos facilitados pelo meio eletrônico, o que

aumentaria seu potencial auto-organizante uma vez que ele depende de redes

informais de conectividade rica e aleatória já que, as formais, apenas alimentariam o

status quo: as redes virtuais, assim, seriam um poderoso fator de escape para

informalidade e de facilitação de diálogo entre níveis hierárquicos diferentes.

Prosseguindo, o conjunto de nossas hipóteses deságua na constatação de que as redes

informacionais geradoras de um espaço virtual marcado pela fluidez e, especialmente,

pela imprevisibilidade, atuando de forma visceral na comunicação organizacional, são

fatores de aceleração do irreversível caráter auto-organizativo enquanto forma

subversiva de comunicação institucional, mesmo quando cuidadosamente planejadas

para atender aos cânones organizacionais o que, em última instância, até mesmo

anulariam, pela integração poiética: Maturana, escolheu tal termo para indicar a idéia

de criação no sentido menos material, mais espiritual do gerar a si próprio; a existência

de duas lógicas peculiares e paralelas, ou tidas como tais, nas organizações: a lógica da

organização, que resiste ao novo pela limitação das incertezas, pela valorização do

planejamento e a lógica da inovação, que se impõe como forma inevitável de

sobrevivência no mercado imprevisível.

19

RELEVÂNCIAS E INTERESSES

Num momento histórico em que o totalitarismo da inovação se impõe numa ilimitada

sanha anacronizante que ameaça, não apenas, a sobrevivência de muitas organizações,

mas a própria sanidade civilizatória na medida em que, muito mais que consumidores

compulsivos, somos devorados pelo vórtice de um processo onde nossas referências

valorativas foram dizimadas; onde nossas radicais subvertidas nos fizeram produtos

mutantes de uma história que nos parece fracionada pela nossa incapacidade

epistemológica de nela nos acharmos, vítimas de forças desregradas e incontroláveis

operadas por um demiurgo insaciável por sacrifícios humanos. Assim, qualquer esforço

na busca de um sentido é obrigação ética indiscutível quer do intelectual quer,

sobretudo, do educador.

“Porque transformam os ritmos e modalidades da comunicação, as mutações das técnicas de transmissão e de tratamento das mensagens contribuem para redefinir as organizações. São lances decisivos”, metalances “, se podemos falar assim, no jogo da interpretação e da construção da realidade”.(Lèvy, 1993:25)

Mesmo que se aconselhe, numa deferência à elegância acadêmica, um tom menos

dramático, bem como cores mais suaves para o acima citado transe histórico que

vivemos isto seria, ao menos, um eufemismo tendencioso na medida em que, em todos

os quadrantes da vida, essa acentuação da hipermodernidade se faz agudamente

presente, na medida em que a antiga euforia desencadeada pelo dourado sonho de

progresso do Pós Segunda Guerra nos remeteu a um “presentismo delirante” como quer

20

Lipovetsky que, no limite menor de seus efeitos, nos atirou a uma noção de tempo

ímpar em toda a trajetória humana até aqui (Lipowetsky, Sébastien, 2004).

No epicentro desse tumulto mutacional se erguem, como senhoras dessa crise histórica

(se é que o conceito História ainda é passível de utilização tranqüila), as tecnologias da

comunicação e da informação que provocaram nas organizações, foco de nosso estudo,

toda uma revolução intestina que, mesmo para fins menos acadêmicos e mais

pragmáticos, ainda não se conseguiu suficiente calma e segurança metodológica para a

geração de um acervo crítico que pudesse apontar para um esboço, ainda que

rudimentar, de um modelo interpretativo: “Emerge, neste final de século XX, um

conhecimento por simulação que os epistemologistas ainda não inventariaram”. (Lèvy,

1993:7) Assim, há que se procurar organizar um grande e conjunto esforço para a

reapropriação humana da tecnologia e, por conseqüência, do próprio conhecimento das

mudanças já operadas e potenciais nas estruturas das organizações.

E, quando falamos em tecnologias da comunicação e informação, embora absurdo

possa parecer, é sempre importante lembrar que tal foi o impacto de sua chegada ao

nosso cotidiano, que perdemos a dimensão do simples comunicar primário entre seres

humanos sem esses tão familiarizados e, da mesma forma, imperiais recursos que, se

muitos benefícios trouxeram, outras tantas conseqüências insuspeitadas podem ter

provocado e cuja velocidade de adoção nos deve fazer profundamente reflexivos quanto

ao que chamaríamos de "assimilação".

21

“No que concerne às aparelhagens de comunicação e de pensamento, negligenciamos a dimensão de interioridade, de subjetividade coletiva, de ética e de sensibilidade que envolvem as decisões aparentemente mais técnicas.”(Lèvy,1999:106)

Ainda que bastante limitado face à grande e importância do tema, justificamos nosso

esforço no sentido de trazer alguma contribuição para o entendimento de algumas das

novas estruturas de comunicação, das transformações organizacionais no trato de um

novo tempo e de um novo espaço e de, principalmente, novas formas de interação

humanas geradas pelos multimeios ainda insuspeitadas e, por isso mesmo,

imprevisíveis: nunca é demais insistir que os arautos do ciberespaço só propagam as

vantagens e milagres de sua capacidade de alcance e transmissão, negligenciando seus

atores sociais, esquecendo as nuances do sistema interno e externo às organizações

que foi construído e os conflitos culturais que possam ter provocado; o deslumbramento

pelo progresso tecnológico conquistado ofuscou a dimensão humana pela sua

abordagem essencialmente tecnicista que, sempre termina, num otimismo irrealista,

inconseqüente e caro quando, sobretudo, nos referimos aos custos reais das novas

tecnologias em sociedades onde a subnutrição, a segurança e o analfabetismo

precedem, como realidade de sobrevivência, à exclusão digital que, confrontada com a

gravidade dos problemas precedentes, adquire foros de cegueira social:

“Hoje em dia, ninguém mais acredita no progresso, e a metamorfose técnica do coletivo humano nunca foi tão evidente. Não existe mais fundo sócio-técnico, mas sim a cena das mídias”.(Lèvy, 1993:7)

Sob o aspecto do interesse, numa dimensão mais pragmática e não menos importante

em nossa área de estudo, numerosas são as razões de se concentrar esforços sobre a

22

questão das tecnologias da comunicação e informação a começar, como há pouco

mencionamos, pelos seus custos sempre crescentes e pela anacronização sempre maior

que, também objeto de muitos estudos, parecem conduzir as organizações a um limite

perigoso de sobrevivência e de preocupações o que leva a se afirmar: ”Chegou-se ao

sistema de produção em que tudo é vulnerável, possível e

imprevisível”(Motta,1999:XIII). Em igual grandeza, os ganhos de produtividade dados

pela renovação das Tecnologias de Informação atingem sua exaustão pela incapacidade

de sua utilização plena e adequada. A sensação de impotência gerencial ante tais

determinismos, só não é maior, pela relativa inconsciência dos altos executivos do

quadro mais amplo de suas potenciais conseqüências, como os danos causados por

mudanças inopinadas na cultura organizacional e seus reflexos no próprio

gerenciamento estratégico: alterações nas relações de poder, elevação dos níveis de

ansiedade e frustração pela introdução de novas tecnologias e pelas dificuldades

inerentes ao seu uso, redesenhos e reengenharias organizacionais no limite desse

amplo espectro, apontam para o risco de se chegar a momentos de quase cegueira

gerencial que, de acordo com a capacidade de sobrevivência da organização, ou a

coloca em risco, ou a obriga a dolorosas e arriscadas cirurgias funcionais.

Nada é tão velado e ironicamente contraditório e, outras tantas vezes cínico, do que a

"indiscutível" crença nos modelos que colocam as pessoas como a principal vantagem

competitiva da organização, como conseqüência do seu comprometimento e

adaptabilidade; nessa concepção recuperadora da dimensão humana os empregados,

23

entendidos como ativos e não passivos nos processos produtivos, não apenas pouco

participam nos processos de inovação, sendo apenas treinados para operar a mudança;

bem como, no seio da própria inovação, são desconsiderados aspectos essenciais da

cultura organizacional ou seja, da "humanidade" da organização. Aqui, quando a

discussão assume sua característica essencialmente ideológica, já que se fala em,

efetivamente, de controle, a questão da "visão compartilhada", da "cultura do

comprometimento coletivo" mergulha numa esfera de mascarado diversionismo

gerencial, espaço limite pouco assinalado pelos estudos e sempre evitado na esfera da

práxis gerencial:

“Uma estrutura muito hierarquizada e rígida desencorajará as pessoas a assumir riscos e apresentar novas idéias. Uma estrutura muito liberal resulta em P & D sem foco e sem nenhuma aplicação comercial ou leva tanto tempo para ser desenvolvida que as oportunidades de mercado são perdidas”.(Mattos, Guimarães, 2005: 27).

Por isso, o direcionamento no sentido de se tentar a difícil mas inevitável leitura da

questão organizacional pela ótica da Complexidade que, como veremos insistentemente

a seguir, é corolário irrefutável de um tempo que exige, no mínimo, uma abordagem

renovada:

“... toda a teoria pregressa das organizações chega ao esgotamento, o que nos põe diante de uma profunda quebra de paradigma: mais do que classificarmos os ambientes como instáveis ou turbulentos, precisamos passar a assumir a idéia de que neles só é capaz de sobreviver uma empresa também instável, ou turbulenta”.(Bauer, 1999: 168)

Aliás, permitindo-se um fugaz desvio, nada é tão emblemático do desconforto das

teorias organizacionais ante o inusitado da realidade, do que o estupor e inveja gerados

pelo crescimento acelerado das organizações do Terceiro Setor que, ao arrepio de

24

grande parte do que a práxis organizacional fazia, deram uma desconcertante lição de

auto-poeisis e de sucesso mostrando um novo desenho organizacional de contornos

surpreendentemente revolucionários que, diga-se de passagem, parecem resistirem às

tentativas de sujeição aos ditames acadêmico-teorizantes tendo, é bem denotativo, se

transformado num dos grandes focos de estudo.

REFERÊNCIAS TEÓRICAS

Conforme já mencionado, a relativa novidade do tema e sua indiscutível complexidade,

nos obrigaram a um exercício de humildade e reconhecimento teórico-metodológico: se

citamos e citaremos copiosamente no decorrer de nosso trabalho autores que, a seguir

comentaremos, foi porque, num terreno para nós tão escorregadio porque

desafiadoramente novo, a busca da integralidade dos pareceres de "nossos guias" se

impôs, em inúmeras passagens, não apenas como um dever de honestidade inerente ao

nosso escopo, mas como demarcação de segurança na difícil tarefa de manter nosso

foco e não sermos seduzidos pela infinidade de apelos e atalhos que o tema suscita mas

que o bom método e nossas limitações pessoais desaconselham.

Mesmo que, à frente, retornemos às questões que envolvem as bases epistemológicas

da ciência da administração, para que possamos ligar os segmentos do discurso, é útil

lembrar que ela foi fruto da Revolução Industrial e de seus métodos, genuíno produto

das ciências da natureza e, mais especificamente, da engenharia de produção; assim,

fundou-se numa abordagem analítico-reducionista que, relativizando a dimensão

humana, gerou, pelo seu grande efeito residual, sérias dificuldades ao entendimento

25

das atuais mudanças em sua dimensão e velocidade: numa história em que a própria

natureza do devir começa a perder seu sentido tradicional de linearidade pela ruptura

de fios condutores que nos permitiam vislumbrar nela alguma relação de causalidade,

como tentar entender, com as velhas ferramentas numéricas, essa desconcertante

realidade?

Ou seja, o Paradigma do Ocidente como também é designado o Paradigma Cartesiano,

enfatizando a rigorosa observação dos fenômenos do mundo físico, numa abordagem

racionalista que, perseguindo regularidades, intenta a formulação de leis por um

conhecimento objetivo por se crer isento, desaguou, sob o aspecto epistemológico, na

dicotomia sujeito e objeto e, por conseguinte, na separação entre o conhecimento e seu

contexto, num divórcio hoje inaceitável mas que continua indesejavelmente presente

numa ciência social aplicada, a administração.

Cabe, aqui, um hiato obrigatório.

Na medida em que utilizaremos o conceito de paradigma de forma constante, cumpre

lembrar, que o mesmo foi criado pelo filósofo norte-americano das ciências Thomas

Khun (Khun, 1987) que afirma que determinadas épocas, pedaços da história, criam,

através de suas práticas sociais, pela sua experiência vivida, uma estrutura imaginária,

uma visão de mundo que irá permear, ainda que por oposição e de modos sutis e

indiretos, todos os aspectos da vida humana; será modelo, será o aceito como correto

26

e, quanto maior for sua longevidade, mais intenso e agudo será o processo de transição

para outro paradigma que, por sua vez, alterará todas as anteriores representações

mentais.

Para a superação desses impasses, resolvemos adotar a abordagem da Complexidade,

onde a ciência é caracterizada pela ênfase nas ciências sociais, na relatividade da

simultaneidade, na atenção aos sistemas abertos, nas situações de não-equilíbrio, de

auto-organização; onde o distanciamento entre sujeito e objeto se reduz drasticamente

o que enseja a valorização entre homem e natureza, relação avidamente desejada no

senso comum, mas imperceptivelmente negada pela adoção de posturas

epistemológicas anacrônicas e que, para nós, recupera a condição da administração de

ciência social aplicada.

Aqui, obrigados à humildade dos neófitos, cabe mais uma confissão de nossas

limitações: apesar da largueza e abrangência que a Complexidade oferece ao estudioso,

é evidente que, essa realidade sobre a qual nos debruçamos, imporia um pluralismo

metodológico que permitisse inúmeros arranjos discursivos e combinatórios mais

condizentes com o caráter aleatório do universo observado e que remeteria à adoção de

algumas poucas fontes consagradas para evitarmos mergulhar num caos de

imponderabilidade teórica muito peculiar aos ignorantes.

27

Para tanto, nos valemos de guias seguros nesse universo de instabilidade prevista e

procurada. Começamos nossa iniciação pelas obras de Edgar Morin (Morin,2001), pai e

grande didata da complexidade para, após o que, fazermos a entrada da Complexidade

nas organizações pelas mãos competentes de Ruben Bauer (Bauer, 1999) que nos

propiciou uma relação facilitada e intermediada, não apenas com os teóricos da

Complexidade como Edgar Morin, como de outros que oportunamente citaremos e que

também nos deram a abertura para chegarmos com a complexidade ao foco de nosso

estudo, o espaço virtual e a estrutura da organização:

“Uma estrutura que permite desconstrução e reconstrução contínua, suplantação do espaço e invalidação do tempo, e também, uma reorganização rápida e drástica das relações de poder” (Castells, 2000:498).

Com o mesmo interesse, fomos buscar o auxílio do já citado Pierre Lèvy, auto-

denominado engenheiro do conhecimento e filósofo que, em seu notável esforço em

construir uma antropologia do ciberespaço, fornece ao estudioso, linhas medulares na

condução de suas observações desses “novos instrumentos” de conhecimento, de

comunicação e, portanto, de gestão.

E, ainda na menção dos nossos “maiores guias“ e, em se tratando de complexidade e

organização, recorremos a Dominique Genelot (Genelot, 1998) que, com incrível

propriedade e clarividência, aborda a questão da estratégica importância das

tecnologias de comunicação e informação na complexificação organizacional nos

propiciando, dessa forma, o embricamento teórico final que nos conduzirá à análise do

caso proposto:

28

“O mundo atual sendo caracterizado pela complexidade, não está surpreendendo que as apostas de poder sejam deslocadas para o controle do sistema nervoso das organizações complexas: a informação e a comunicação” (Genelot, 1998: 164)

Finalizando, no intuito de termos o máximo de atualidade, brasilidade e, portanto,

adequação no enfoque de nosso problema, efetuamos uma varredura cuidadosa nos

estudos publicados dos Anais da ENANPAD dos últimos anos que, ainda que

tangencialmente, pudessem trazer alguma contribuição ao nosso esforço de discreta

ousadia, bem como a uma bibliografia de apoio que, pelo riscos já apontados, tivemos

ou que limitar ou que usar de forma extremamente módica porque cuidadosa.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Optamos por uma abordagem qualitativa para a condução de nosso trabalho mesmo

porque, concordando com o nosso orientador, é extremamente falacioso para as

epistemologias do nosso tempo, falar de diferenças entre qualitativo e quantitativo.

Objetivando entender o processo de implantação de um portal corporativo (intranet) em

uma organização de ensino superior e seus efeitos sobre a comunicação interna, nos

seus aspectos de complexidade, a partir da ótica de seus principais atores e que, para

nosso objeto de estudo, serão selecionados por amostragens dos diversos cortes

hierárquicos da organização de forma a servirem de indicadores confiáveis, dos diversos

segmentos estratégicos para a compreensão do caso em foco.

Sempre que possível, pelas limitações de privacidade e, evidentemente, de acesso à

comunicação, nos serviremos da documentação eletrônica produzida e aberta no

29

sistema que, por seu lado, também constitui importante material de análise, quer pelas

suas características, quer pela especificidade de seus conteúdos, quer pela maior

incidência de usos específicos entre determinados setores e ferramentas; tais recursos

metodológicos se justificam pelas especificidades inerentes aos embricamentos naturais

entre as estruturas organizacionais e o espaço virtual que, muitas vezes, parecem

ocupar esferas diversas que, é sempre bom que se destaque, extrapolam de muito

aqueles aspectos meramente ferramentais que sempre mereceram destaque na atenção

dos estudiosos: buscar na análise desse documental os indicadores das transformações

suspeitadas se é tarefa minuciosa e delicada, é aspecto importante na análise do

processo de comunicação da organização informatizada.

A opção pelo estudo de caso, como fulcro de nosso estudo, resultou de um conjunto de

fatores que tem seu núcleo essencial, é sempre útil insistir, na relativa insipiência dos

trabalhos de análise crítica da comunicação pela intermediação eletrônica nas

organizações: assim, graças aos recursos empíricos do método, poderemos extrair da

contemporaneidade do fenômeno observado elementos que nos permitam correlações

deste com o espaço externo que o compreende de forma a suportar subsídios teórico-

analíticos e indícios para novos procedimentos e processos organizacionais, num limite

mais consciente e, até mesmo, mais pragmático e, evidentemente, mais eficiente.

“O método do estudo de caso implica, segundo Anguierra (1987:21), ‘o exame intensivo e em profundidade de diversos aspectos de um mesmo fenômeno’. É um exame de um fenômeno específico, como um programa, um evento, uma pessoa, um processo, uma instituição, um grupo social. Um caso pode ser selecionado por ser intrinsecamente

30

interessante e o estudamos para obter a máxima compreensão do fenômeno” (Serrano,1998:80)

Conforme assinalado, a opção pelo estudo de caso nos colocou diante de um largo

espectro de autores com abordagens metodológicas próprias para a condução do

trabalho: cabe lembrar que o método, nascido em Harvard na década de vinte do século

passado, tem sido importante ferramenta nos estudos organizacionais entre outras,

pelas possibilidades de trabalhar um método capaz de enfrentar a velocidade, a

variedade e a complexidade dos objetos estudados. Para tanto, fizemos nossa escolha

recair sobre o protocolo de Robert K. Yin (Yin, 2001) que destaca que este método é

uma das estratégias de pesquisa utilizáveis nos estudos organizacionais por propiciar

pesquisas de eventos da vida real, como os processos administrativos, através de

observações diretas e por entrevistas, com a possibilidade de expandir e generalizar

teorias. Para tanto, recomenda nosso autor, no atendimento correto ao método e se

evitando evidências equivocadas, a investigação acurada e o rigorismo na escolha de

critérios, bem como a utilização de diversas fontes de evidências, alinhamento destas,

uso de uma abordagem lógica de replicação, fixação de medidas operacionais

adequadas para os conceitos utilizados e a delimitação dos campos nos quais as

conclusões podem ser aplicadas em forma de generalizações.

É bom destacar que, o caráter qualitativo de nossa escolha para a pesquisa, fará com

que utilizemos dados estatísticos sem estar trabalhando com modelos estatísticos logo,

os minimizará transformando-os, apenas, em ferramentas de apoio, de indicação e

31

confirmação dos grandes contornos e das potencialidades percebidas nas entrevistas e

nas análises documentais.

Cumpre, também, assinalar o caráter exploratório de nosso trabalho que se quer propor

como subsidiário de outros estudos. Nesse sentido, citamos Perrien, Chéron e Zins

(Chéron, Zins, 1983) que afirmam o caráter exploratório de uma pesquisa quando os

resultados obtidos não são, necessariamente, um fim em si mesmos e podem ter como

objetivo a formulação de um problema para a investigação mais exata ou para a criação

de hipóteses que levantem novos horizontes, lembradas as limitações da obra e do

trabalhador. Do mesmo modo, este tipo de pesquisa, permitindo a utilização de

ferramentas menos padronizadas, oferece uma maior flexibilidade o que atende às

diretrizes teóricas que buscamos imprimir às nossas reflexões que, sabemos, não

poderão produzir hipóteses muito precisas ou operacionalizáveis mas que, insistimos,

poderão ensejar procedimentos mais organizados (Gil, 1989: 45).

Pela adoção desses critérios, estabelecemos as seguintes etapas: elaboração do

construto, visando fixar limites coerentes com os conceitos utilizados; pesquisa

secundária, no sentido de coleta das informações públicas, concernentes à implantação

e operação do sistema de comunicação pré e pós-operação do portal corporativo; etapa

das entrevistas por amostragem com os diferentes segmentos da organização, não

apenas para validação das informações já obtidas, mas para a totalização dos dados

necessários; por fim, a análise e conclusão dos resultados observados e suas possíveis

32

generalizações graças ao conhecimento do processo como um todo pela relação

complexa entre as partes:

“A idéia de inter-relação remete para os tipos e as formas de ligação entre os elementos ou indivíduos, entre elementos e indivíduos e o todo. A idéia do sistema remete para a unidade complexa do todo inter-relacionado, para suas características e propriedades fenomênicas. A idéia de organização remete para a disposição das partes num, e em um, e por todo.” (Morin,1997:102)

VIABILIDADE DA REALIZAÇÃO DA PESQUISA

A viabilidade desta pesquisa é conseqüência do fato de termos uma intensa vivência

profissional, de trinta anos, na organização estudada que, doravante, designaremos

como Fundação F, onde ocupamos diversas funções a começar pela docência chegando

a níveis gerenciais. Dessa forma, enquanto agente e paciente em quase todos os

meandros e mudanças operadas nos processos administrativos, pudemos observar de

maneira crítica e, agora, de forma sistemática, os efeitos provocados pelo ingresso das

tecnologias de comunicação e informação (que passaremos a designar pela sigla TCI)

na cultura da organização. Se, por um lado, essa profunda e exaustiva vivência, nos

propiciou um acesso irrestrito a todo o universo de informações e a quase todo o

conjunto histórico de etapas e reações a elas, também fomos obrigados a um enorme

esforço intelectual para conseguirmos a necessária distância para uma releitura crítica e

subjetivamente consciente de todo o repertório acumulado de forma que não fossem

comprometidos os resultados finais por uma cripto-ideologia funcional do autor. Com

idêntica preocupação, recorremos a "abordagens indiretas” em algumas circunstâncias

para que informações, oriundas de entrevistas, não fossem contaminadas por

33

preocupações de caráter político-funcional na medida que, lembramos, em quase todos

os processos de modernização, a adoção do novo sistema, acontece de forma

verticalizada, gerando resistências, “incomodações” e acomodações dolorosas de efeitos

prolongados: sobretudo por que, na Fundação F, a dinâmica dos fatos em questão,

colidiu com estruturas bastante cristalizadas e que foram sendo modificadas por um

processo de arrumação cuidadosa e diplomática do quadro funcional que, é importante

frisar, conta com um número evidentemente grande de docentes de inúmeras áreas do

conhecimento que, por si só, já oferecem um universo de especificidades bastante

dicotômico: se temos, na população mencionada, professores de administração,

engenharia e economia relativamente afeitos com os processos da inovação

organizacional, por outro, encontraremos profissionais das áreas de artes, comunicação

e direito, onde a lógica da inovação caminha por atalhos aparentemente diversos

daqueles rotineiros à lógica de mercado e, portanto, gerando reações também

diferentes.

A tudo isso, há que se acrescentar um fator catalisador de ruídos, bloqueios e desastres

nos canais de comunicação e do desenvolvimento dos processos organizacionais em

foco, a chegada dos profissionais técnicos das diversas áreas "da inovação", nem todos

com conhecimento da cultura acadêmica e suas “perigosas singularidades” para a

sanidade e sobrevivências profissionais desses neófitos normalmente ungidos por uma

"superioridade técnica" somada a uma tradicional insensibilidade organizacional .

34

ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO

No Capítulo 1, justificaremos, introdutoriamente, a adoção do termo Hipermodernidade

como necessidade de caracterização deste momento ímpar que vivemos; como um pano

de fundo para, a partir das restrições lógicas que os Antigos Paradigmas derivados do

Paradigma Cartesiano provocaram, justificar a necessidade de nos pautarmos pela

Complexidade.

Para tanto, faremos considerações medulares sobre essa teoria, suas conseqüências

epistemológicas e como que as mesmas permitem aos estudos organizacionais um

equivalente valor positivo de enfrentamento das dificuldades de entendermos e

viabilizarmos a gerência e a compreensão das organizações contemporâneas.

No Capítulo 2, falaremos do advento do espaço virtual como o "novo mundo " do final

do século XX e fator de transformações profundas; trataremos de alguns aspectos

essenciais da comunicação organizacional como fator introdutório e nevrálgico para

desaguar em nosso foco, a saber, a chegada de todo o incrível equipamento

transformador das TCI e a geração do espaço virtual dentro do universo organizacional,

suas características, possibilidades, e seus corolários mais importantes nos processos

organizacionais, marcadamente, nos mecanismos de comunicação e nas alterações

humanas dele decorrentes.

35

No Capítulo 3, chegamos ao estudo do caso onde tentaremos utilizar a carga conceitual

acumulada e o ferramental metodológico escolhido para a perseguição das hipóteses

levantadas tendo, como campo empírico, nossa vivência profissional e intelectual na

Fundação F.

Por fim, a reverência ao método, muito mais do que ao estilo, nos obriga a confessar

nossa incapacidade de conferir ao discurso um caráter menos redundante e adjetivado

do que gostaríamos ou imaginamos precisar, uma vez que, a necessidade de nos fazer

claros, somada ao entusiasmo juvenilmente extemporâneo, nos fizeram correr os riscos

da deselegância e da prolixidade para nos manter no conforto do tom alcançado como

seguro a nos fazer entender e a nos satisfazer, num assumido descuido científico, mas

que sacrificamos pelo prazer da identidade plena com o trabalho.

CAPÍTULO 1 – A HIPERMODENIDADE: ESGOTAMENTO LÓGICO E

COMPLEXIDADE

36

1.1 Pós-modernidade e hipermodernidade: em busca de uma designação

apropriada.

Esclarecendo possíveis vícios benignos e distorções não comprometedoras na essência

de nosso trabalho vimos, aqui, esclarecer que tais idiossincrasias podem ser atribuídas

às influências que nossa origem intelectual exerce sobre nosso modo de enxergar as

ciências do homem: historiador de formação, há mais de três décadas gentilmente

recebido no universo da administração, nem sempre conseguimos, ou nem sempre

tentamos, nos separar de algumas boas manias adquiridas na nossa primeira formação

acadêmica e que acabam por nos dar um certo “sotaque estrangeiro” pelo qual pedimos

escusas.

Assim, também, justificamos a nossa, e de grande parte da humanidade, necessidade

didática de procurar reduzir o tempo passado a módulos lógicos que, à semelhança de

modelos rudimentares e autoritários, consigam nos fazer entender melhor nossas vidas

pela reunião de semelhanças e diferenças nas épocas e entre as épocas da história:

bom, foi o tempo da singeleza positivista em que nos conformávamos e confortávamos

com a “boa divisão”, Idade Antiga, Média, Moderna e Contemporânea, nas quais o

homem, em sua trajetória no tempo, parecia maravilhosamente domesticado pela nossa

compreensão; onde tudo tinha seu lugar e as coisas haviam acontecido numa ordenada

dialética; onde o mundo civilizado do ocidente reduzia tudo ao seu padrão que, por sua

37

vez, encharcado de coerência, a tudo dava sentido e explicava, em tudo estabelecia

nexos e fornecia comparações.

No sentido de enquadrar nosso objeto de estudo no seu contexto tal como o pensamos,

justificamos o caminho que segue.

Se a Segunda Guerra Mundial trouxe algum incômodo a essa ordem temporal, ele ficou

abafado, por um certo período, pelos ecos ufanistas da vitória aliada; a acidez e os

impactos do último conflito mundial parecem não terem sido assimilados criticamente

“ex abrupto” pela imediata Guerra Fria entre as duas potências hegemônicas e suas

imperiais políticas, que obcecaram as décadas dos cinqüenta, sessenta e setenta,

transformando-as numa espécie de cortina de fumaça de estupor ideológico dualista-

bipolar-maniqueista e totalitarista; apesar de tudo e de tanto, apesar do holocausto e de

Hiroshima, percebia-se ou buscava-se a “fortiori” uma continuidade, uma causalidade,

mesmo porque, não há como negar que os citados eventos tinham tido sua geração no

útero conturbado do início do século XX e, de uma certa maneira, representariam o

apogeu de um movimento civilizatório que teria seu termo coletivo insinuado e

visualizado pelos conflitos sociais na década dos sessenta que, ante o débâcle do

Império Soviético, se amiudaram fazendo com que o milênio se encerrasse bem antes

que o assinalado nos calendários.

Por isso, olhando para trás, parece não ter havido dificuldades insuperáveis para

autores como Arnold Toynbee (Toynbee, 1976) de, numa atitude discretamente ousada,

38

introduzir na análise histórica a denominação de Pós-Modernismo para caracterizar um

tempo que contrasta com o modernismo iniciado no século XV e que perdurou até a

metade do século passado. O Pós-Moderno seria marcado por um ritmo de mudanças

tecnológicas que, de muito, ultrapassaram às aquelas ocorridas nas esferas espiritual,

moral, política e ideológica. A Pós-Modernidade já antecipava esse vazio filosófico e o

esboroar das grandes ideologias, ainda hoje, insistentemente moribundas e deletérias

enquanto espectros de mundos perdidos a querer sobreviver e, em parte, atreladas às

suas radicais iluministas-industrialistas e seus corolários antitéticos, ou seja, a

fundamentos filosóficos que remontam aos albores do século XVIII. Assim, chegamos a

um tempo que assistiria ao advento dos computadores e das comunicações à distância

em todos os quadrantes da vida; à transição das economias centradas na produção

industrial e serviços para, outra, ancorada na informação, na tecnologia e no

consumismo, onde os fordismos e os taylorismos seriam varridos pelas necessidades de

organizações descentralizadas, flexíveis e com liberdade de comunicação interna; mas o

mundo Pós-Moderno, apesar de tudo, ainda sacralizava conceitos da modernidade

ainda, insistimos, era moderno por sua crença no progresso e não se dava conta de que

tentava entender o muito novo com as ferramentas mentais do proporcionalmente

muito antigo:

“A razão Kantiana, a ‘razão das luzes’ do século XVIII fora movida por um sonho magnífico: a afirmação do homem enquanto medida e limite de todas as coisas, negador de qualquer deus metafísico, sujeito autônomo e autodeterminado, construtor histórico de seu próprio destino; tal afirmação permitiria concretizar o passo maior da humanidade: a transição do reino da necessidade para o reino da liberdade. E, como o seu maior instrumento, o progresso” (Bauer, 1999:28).

39

O pós-modernismo é, como todas as divisões cronológicas, resistente a delimitações

rigorosas. Grosso modo, na área das ciências sociais, ele tem sido utilizado para narrar

um clima social marcado por mudanças sociais e organizacionais e um conjunto de

abordagens filosóficas para o estudo da organização e de outras áreas, incluindo a

atenção na natureza construída das pessoas e da realidade, enfatizando a linguagem

enquanto sistema de distinções no processo de construção; criticando as grandes

narrativas e os sistemas teóricos gerais tais quais o marxismo e o funcionalismo;

enfatizando aspectos como a relação poder-conhecimento, o papel nas comunicações de

massas na dominação assumindo, assim, uma função crítica aos fundamentos e ideais

utópicos que marcam o modernismo (Alvesson, Deetz, 1999).

Mas foi o desmoronar do sonho soviético em simultaneidade com o fim do sonho de

Jefferson catalisados pelo esvaziamento do cartesianismo que, dentre uma miríade de

indicadores, foram alguns dos sinais da mudança: a mesma incapacidade de se justificar

a manutenção do Muro de Berlim, permitiu o destruir da Carta das Nações Unidas e da

Declaração dos Direitos do Homem após os eventos de 11 de setembro de 2001.

As transformações técnicas que desencadearam a modernidade e que fundamentaram a

Primeira Revolução Industrial já avisavam de uma profunda modificação dos ritmos da

história, provocando a anulação do mundo agrícola, a promoção hegemônica dos

espaços urbanos, a criação de um novo imaginário de tempo e espaço pelos novos

meios de transportes e da organização do trabalho; bem como pelo revolucionário

40

pragmatismo que se conferiu às ciências ora atreladas à produção tecnológica e ao

lucro.

Pois bem, este retorno ao Moderno, apesar de aparentemente mal alocado no texto,

nos afigurou necessário para que pudéssemos, didaticamente, relembrar como, etapa a

etapa, os ritmos se aceleraram, as transformações se agudizaram a um tal ponto que

levaram os historiadores a buscarem, na tentativa de melhores definições, termos mais

e mais arrojados que pudessem atender à sua incapacidade de abarcar dinâmicas tão

diversas e imprevisíveis, que permitissem alguma forma de abordagem para o

entendimento dessa sucessão de humanidades de difícil decifração, que se organizou

rapidamente em conformações sócio-culturais híbridas, mutantes e mutáveis, muito

opacas à penetração de nossos frágeis óculos de análise: é interessante como no Pós-

Moderno já se afigurava uma certa incapacidade semântica de definir o que acontecia

enquanto evidente corolário do próprio esgotamento epistemológico subjacente.

Nada é tão pós-moderno ou quase hipermoderno do que a Teoria da Relatividade

Restringida completada, depois, pela da Relatividade Generalizada nas quais, Albert

Einstein, fragilizando a exatidão das matemáticas, na contra-mão do "bom senso", refaz

as concepções de tempo e de espaço, de um espaço que se curva sob o efeito do

magnetismo dos corpos celestes... Na mesma direção, Kurt Gödel, lógico polonês,

publica um estudo cujo título já revela um caráter científico-carbonário, “O incompleto

sistema axiomático que contem a teoria dos números” ou, o Teorema do Incompleto

41

que afirma que todas as formulações axiomáticas da Teoria dos Números incluem

propostas indecisas o que, de outra forma, significa a falência da Lógica Formal.

O Pós Modernismo, utilizado apesar de suas limitações, já que nasceu para batizar uma

tendência arquitetônica, nos permitiria, no “reino da administração” (governado pela lei

de mercado que impõe a sobrevivência sempre à frente de qualquer tentativa teorizante

de entendimento das mudanças), assistir ao nascer das organizações enxutas, dos

toyotismos, das reengenharias, de estruturas que, se não mais genuinamente

cartesianas que, se já haviam abandonado as pranchetas e migrado para as estações

gráficas, ainda se mostravam umbilicalmente ligadas a modelos anteriores e todos seus

desdobramentos lógicos mas que, ainda, tinham ritmos e seqüências que não

assinalavam rupturas, que mantinham uma certa e antiga linearidade. O Pós Moderno,

dentre tantas marcas, foi um período onde, ainda, poderíamos falar de mudanças onde,

ainda, falava-se com um certo ar de ousadia, em quebra de paradigmas, expressão que

se tornou num vício odioso, porque vício e vazio, no linguajar dos “consultores”.

Mas foi, a partir dos anos setenta, que a noção de pós-modernidade se estadeou como

qualificador da cultura das sociedades desenvolvidas e acabou ganhando os espaços

jornalísticos e popularescos:

“O neologismo pós-moderno tinha um mérito: salientar uma mudança de direção, uma reorganização em profundidade do modo de funcionamento social e cultural das sociedades democráticas avançadas”... “Ao mesmo tempo, porém, a expressão pós-moderno era ambígua, desajeitada, para não dizer vaga”.(Lipovetsky, 2004: 52).

42

É, também, um momento marcado pelo esgotamento daquele legalismo da ciência

tradicional onde todas as “leis maiores e universais”, uma vez descobertas, nos

conferiam a condição de observadores dominadores da natureza que, continuaria,

estranha a nós, ameaçada e ameaçadora.

Foi, exatamente, por essa ambigüidade assinalada pelo polêmico pensador francês, que

dele tomamos o termo Hipermodernidade para designar esse pedaço de história que

parece desafiar nossa capacidade de designação que, tal qual o mais resistente dos

pagãos, não se submete à pia batismal e que, por tudo isso, sintetiza a incontornável

incapacidade de definirmos o nosso tempo ou deixá-lo de fazer, razão pela qual a

adoção do termo foi feita sem maiores preocupações de embasamento histórico-

filosófico.

Cabem, aqui, algumas digressões necessárias.

Se decidirmos nomear nossa história, a partir dos anos oitenta do século passado, como

o “mundo da globalização”, certamente estaremos desconsiderando que, a “aldeia

global” de McLuhan (MacLuhan, 1970), onde o poder dois meios de comunicação a

todos faria um gigantesco padrão cultural, parece que não aconteceu como se

prognosticava: se o mundo econômico-financeiro foi definitivamente globalizado; se,

apesar das resistências agora arquitetadas em blocos, a economia da humanidade

transformou-se quase numa única e intrincada trama na qual todos os fios irradiam os

43

efeitos das periferias mais remotas e o poder dos centros hegemônicos aparecem

incontestáveis; se a interligação via satélite e toda a parafernália a ela ligada nos

levaram à beira de nos sentirmos verdadeiros cidadãos do orbe, não há como ignorar,

mesmo que os míopes recalcitrantes insistam, que as nacionalidades resistem

bravamente que, na Itália da Comunidade Européia, ainda se fale em Liga Lombarda;

que os chechenos aterrorizam o mundo pela sua luta nacional tanto como os bascos

que não se querem espanhóis e que a própria Espanha não conseguiu deixar de ser,

ainda, uma ficção de cunho político. Como aceitarmos a globalização, conceito

autoritário e descaracterizante, num mundo onde milhões de seres humanos vivem,

com ou sem internet via satélite, seus referenciais tribais e onde as nações disputam

palmos sangrentos de chão?

No encalço do sentido perdido, o ser humano ameaçado por essa mundialização

anuladora das individualidades e numa espécie de contra-mão do previsto, voltou-se

para suas raízes mais profundas: a cada arranco de internacionalismo, ele lança um

contra-ataque de recuperação de suas singularidades, de seus regionalismos mesmo

que machucados pelas determinações mercadológicas, como o do sertanejo

conspurcado pelo country, ou de repentistas descaracterizados por instrumentos

eletrônicos.

O simplismo do "pós-moderno globalizante", ainda que de forma imperceptível, nos

incomodava quando, educadores que somos, chamávamos a atenção de nossos alunos

44

para a necessidade de se sobreviver gerencialmente pela ativação de um mecanismo

intelectual de localização antropológica que designamos com um certo pedantismo,

como o “diálogo das grandezas díspares” e que se faz necessário em cada movimento

de análise de realidade, em cada ensaio de tomada de decisão, que nos obriga ao difícil

malabarismo de confrontos constantes para compreendermos a convivência vital das

pequenas singularidades da nossa cultura organizacional com dados de realidades

geograficamente distantes mas absolutamente presentes: do mau humor de nossa

secretária, às conseqüências para o nosso produto da mão-de-obra semi-escrava da

Tailândia, da festa de amigo-secreto, à teleconferência com Amsterdã dentro da mesma

sala.

Nesse mesmo esforço de suprimir o vazio de nosso referencial teórico, não podemos

olvidar aquela que, talvez, se coloca como uma das mais sérias determinantes dessa

incapacidade enunciadora e paradigmática, a da coexistência de temporalidades

opostas, do hipernovo com o ultra-antigo: hoje ainda vivemos o “tempo da muito longa

duração” de Fernand Braudel (Braudel, 1972), um tempo que se aproxima do limite da

imobilidade, o tempo que rege o universo das religiosidades do Talmud-Torá, dos

Evangelhos, do Corão; uma temporalidade presente ao mais íntimo da vida de parcelas

imensas da humanidade. Da mesma forma, vivemos a realidade do tempo dos circuitos

impressos, da milionésima parcela do segundo, do nanossegundo, tão presentes em

nossas vidas quanto aquele tempo anterior dos séculos e que nos obriga à imperceptível

45

e fantástica tarefa de saber das ameaças da Jihad Islâmica pela internet, de encararmos

essa lógica dos extremos.

Voltemos a Lipovetsky:

“Essa época terminou. Hipercapitalismo, hiperclasse, hiperpotência, hipertexto, - o que mais não é hiper? O que mais expõe uma modernidade elevada à potência superlativa? Ao clima de epílogo segue-se uma sensação de fuga para adiante, de modernização desenfreada, feita de mercantilização proliferativa, de desregulamentação econômica, de ímpeto técnico-científico, cujos efeitos são tão carregados de perigos quanto de promessas”.(Lipovetsky, 2004: 52).

É nesse paroxismo civilizatório, é para essa necessidade de se encontrar uma lógica

para os extremos, uma lógica urgentista que justificamos, até pelas enormes limitações

ditadas pelo ilimitado, a adequação da Complexidade enquanto orientação histórico-

filosófica capaz de enfrentar esse hiper-diferente de uma civilização em êxtase,

momentaneamente adequada e suficiente. Quando Lipovetsky aponta a transição de

uma modernidade negadora para uma supermodernidade integradora e capaz de

reintegrar as lógicas do passado com as lógicas de mercado, não estaria ele dizendo da

capacidade auto-poética desse hipertempo, de um tempo que, talvez como todos os

outros, se auto-organiza sempre de uma forma imprevista?

1.2 A exaustão do paradigma do ocidente

Tecido o pano de fundo, que se quis minimamente filosófico-histórico, faz-se necessária

uma inserção mais pontual na questão metodológica no sentido de podermos dar

coerência à adoção da Teoria Complexidade enquanto ferramenta que nos viabilizou o

trato mais coerente de nosso estudo.

46

Creio que podemos relembrar, sem riscos da condenação por excesso, que poucas áreas

dos estudos humanos foram tão comprometidas pelas influências cartesianas e sua

incrível capacidade residual quanto a dos estudos e práticas organizacionais: nós que

tivemos nossa origem nos segmentos mais assumidos das humanidades e mais

resistentes a pragmatismos sentimos, mais agudamente, as marcas cartesianas das

origens da administração; evidentemente, as necessidades derivadas das imposições de

sobrevivência no mercado fizeram com que o administrador, a duríssimas penas,

conseguisse exorcizar o engenheiro de produção que, de muitas formas, ainda hoje

assombra sua profissão como, outrora, assombrava seu emprego e a quem não se pode

negar uma imprescindível contribuição mas, em hipótese alguma, subserviência já que,

ele próprio, o engenheiro, se humanizou apesar de custos que não nos compete aqui

lembrar.

Por mais que um poderoso e já consolidado caudal de estudos tenha conseguido

consolidar a independência das ciências das organizações enquanto um nó congregador

de um conjunto específico de conhecimentos, ainda assim, é notório como o “conjunto

das exatas” se faz presente, como um pacote de ferramentas válidas, com um evidente

destaque no concerto das chamadas “disciplinas sérias” quando, por exemplo,

discutimos os currículos de ensino de administração: nesses momentos, nos sentimos

reféns de um muito antigo espaço epistemológico, de anacronismo imperial e sufocante;

mesmo verificando, com um olhar mais atento e crítico, o conjunto de programas e

47

trabalhos oferecidos e apresentados nos níveis de pós-graduação, confirma-se essa

resistência pelo, proporcionalmente menor, interesse pelos temas que envolvem a

essência humanística das organizações. Nosso primeiro e já antigo choque, nesse

sentido, disse respeito a um certo desdém às questões referentes à cultura

organizacional; pareceu-nos, num primeiro momento, que as vicissitudes de um

mercado selvático e concorrencial, nos haviam condenado a um positivismo eternizado

pelo inerente utilitarismo a ele associado.

Se a Revolução Industrial teve o condão de trazer as ciências para perto da tecnologia,

de transformar as divindades dos laboratórios em seres produtivos, levando as ciências

teóricas a serem ciências tecnológicas, já de há muito se insinuava, nas entrelinhas das

ciências de vanguarda, uma tendência acalentada em outras áreas do saber, a da

ciência ética, uma ciência não mais entronada na intangibilidade celeste daqueles que

ditam os determinismos, mas uma ciência que se humanizou pelo retorno do incerto,

pela volta do acaso, de volta à subjetividade.

O cartesianismo, fundamento do racionalismo moderno, afirmou serem as leis do

pensamento determinadas pelas leis do mundo físico e, além do rigorismo de uma

indiscutível causalidade, vinculou a verdade científica como decorrência dos

procedimentos matemáticos da metodologia analítico-dedutiva.

48

A partir do momento indeterminado mas, vital e concreto, em que as ciências, com todo

seu auto-atribuído poder racional passaram a dominar o mundo, começaram a justificar

as vitórias da burguesia, a ampliar o poderio do corpo humano para dimensões jamais

imaginadas e, sobretudo, a gerar lucros astronômicos, sua chegada aos píncaros

olímpicos foi rápida: não foi por acaso que Comte, procurando aquilo que todos

esperavam, enunciou os fundamentos de uma “física social” aliás, já antecipada por

Condorcet – filósofo e matemático francês - em sua intenção de erigir uma “matemática

social”; a possibilidade de se atender ao maior anseio da civilização ocidental, ou seja,

dominar os mecanismos da conduta humana tal qual se sujeitara a força do vapor: a

partir de então, a “supremacia das ciências exatas” não pararia de permear todos os

quadrantes da vida, fazendo com que a subjetividade, essência mesma do humano,

fosse aviltada pela busca cega da objetividade normativa, tanto mais viciosa quanto

inconsciente na pesquisa científica.

Mas, tão logo acabaram de fumegar as cinzas da Alemanha do Terceiro Reich,

Horkheimer e Adorno declaram seu desencanto quanto às possibilidades de redenção

humana pela via da razão kantiana, submetida ao esforço capitalista de geração de

riquezas e de autoperpetuação, não deixando ao indivíduo senão a submissão ao

sistema que narcotiza as consciências (Guerreiro Ramos, 1989). Habermas, herdeiro dos

frankfurtianos, será o autor de um roteiro explicativo dessas relações entre ciência,

tecnologia e progresso como instrumentos funcionalmente vitais à vitória de um sistema

49

de dominação fundamentado na noção de conforto derivado do domínio da natureza e

do aumento da produtividade, ou seja, temos técnica e ciência como ideologia.

Bem difícil, senão impossível, seria avaliar a importância civilizatória que a obra de

Descartes teve para o ocidente e, por corolário, para o que se chamou de Era Industrial.

Daí designação de Paradigma do Ocidente. O alcance, a profundidade e a fixidez

ontológicos desse discurso não podem ser mensurados. Só suspeitamos a importância

dessa grande determinação quando sentimos o vazio, a imponderabilidade a que o

homem foi atirado quando as referências do “velho padrão” se desfizeram: em diversos

momentos críticos da história contemporânea notamos, como ainda acontece, crises

lógicas agônicas decorrentes dessa falência paradigmátic a atingir parcelas maiores das

populações que, seviciadas pela impactação da cultura de massas e pela inconsistência

de políticas educacionais inócuas, se situam numa condição mais ampla de exclusão.

Apesar do desvio, não resistimos à tentação de uma reflexão: a de atribuir à falência

não percebida da lógica cartesiana, parte do renascimento místico que se constata, de

forma mais intensa, nas periferias pobres do mundo e que dispensa qualquer e nos

reconcilia em parte com nosso tema, a mística da tecnofascinaçãp:

“... um lado, em uma cultura do sof ware que permite conectar a razão instrumental e paixão pessoal e, de outro, em uma multiplicidade de paradoxos densos” pois ela alia a fascinação tecnológica ao realismo convidativo e se traduz em formas desconcertantes: a convivência da opulência comunicacional com o enfraquecimento do público, a maior disponibilidade de informação com a palpável deterioração da educação formal, a multiplicação infinita de signos em uma sociedade de padece o maior déficit simbólico.(“Martín-Barbero, 2001:28)”.

t

50

Retornando para concluir. Assim, a hipermodernidade foi, menos do que a pá de cal no

universo cartesiano e em toda a segurança que dele derivava, um esforço, foi uma das

possibilidades insinuadas de equacionamento de mundo em transe que vivemos e que,

se apenas um novo rótulo, já revela uma potencialidade de entendimento.

1.3 A gênese da Teoria da complexidade

“A palavra complexidade só pode exprimir o nosso embaraço, a nossa confusão, a nossa incapacidade de definir de maneira simples, de nomear de maneira clara, de pôr ordem em nossas idéias”.(Morin, 1990:7)

A história da Complexidade remonta às pesquisas desenvolvidas no Biological Computer

Laboratory na Universidade Illinois, fundado em 1956, por Heins von Foerster com

quem trabalhou, entre outros, Humberto Maturana sobre temas como causalidade

circular, auto-referência e o papel organizador do acaso, num hibridismo científico entre

biologia e cibernética: à dinâmica operacional dos sistemas auto-organizadores, veio

somar-se a descoberta do “programa genético” e dos mecanismos de autoconstrução

dos organismos. Para tal entendimento, utilizou-se o conceitual da teoria da

comunicação, programa, código, informação, mensagem etc, numa transdisciplinaridade

tão desconcertante quanto o neonato paradigma:

“É primeiramente a física, a química e a termodinâmica, acompanhadas pela matemática, que descobrem, ou redescobrem que os movimentos espontâneos da matéria não a conduzem à indiferenciação: em certas circunstâncias, tudo se passa como se a matéria fosse capaz de se auto-organizar”(Serva, 1992:27)

51

Mas será com as pesquisas de Jacques Monod, na investigação de uma cibernética

microscópica, que se desembocará numa vertente epistemológica revolucionária na

medida em que ela enfatizará o papel do acaso como marca inicial de uma nova teoria

evolucionista o que reitera e consagra a auto-organização, auto-poiesi, a ordem ou

complexidade pelo ruído.

Pela própria etimologia do nome, evidencia-se o abandono ao simples das abordagens

mutiladoras, no dizer de Morin e que, findam, por produzirem mais confusão (Morin,

1996); nesta era da Hipermodernidade, o real não se renderá ao “simplório

matemático”; de há muito a capacidade de cálculo, elevada à enésima pelos ábacos

eletrônicos, mostrou sua impotência ou, ao menos, sua inadequação em insistir dominar

o real com o qual, doravante, há que se dialogar.

A obra de Morin constituiu-se num grande esforço transdisciplinar entre ciência e

filosofia, num embricamento, no difícil mutualismo entre a fenomenologia, a dialética e

a teoria dos sistemas: em essência, é crença inabalável na capacidade libertária do ser

humano, que se fundamentaria no potencial de auto-organização dos organismos frente

a perturbações aleatórias; crença na sobrevivência pela transformação auto-

preservadora; “A organização não pode ser reduzida à ordem, embora comporte e

produza a ordem.” (Morin,1996: 73)

Passa-se a ver a ordem enquanto um fator dinâmico, interativo e que, portanto, escapa

do alcance do conservantismo, numa posição ideologicamente dicotômica do conceito

52

precedente de ordem: aqui, abrimos espaço para destacarmos um dos mais fortes

traços do transe paradigmático assinalado pela Teoria da Complexidade e que é passível

de constatação em parte nos seus autores. Mesmo em nossas limitações de iniciante

ousamos apontar uma laivo “neo-renascentista” de fé sublimada na humanidade: é

instigante como Ylia Prigogine, Prêmio Nobel de química, trabalhando a Teoria das

Estruturas Dissipativas, busca restabelecer a ligação, a “nova aliança” entre cultura

científica e cultura humanística, forçando a transposição de um espaço abissal que

separava o mundo da matéria, cientificamente superior pois exato, do mundo inexato

dos humanistas, da instabilidade e do indeterminismo agora, valorizados por essa

imensa brecha, transitará um diálogo aproximativo secularmente bloqueado.

É quando submetidos a intenso ruído (perturbações, erros), afirma-se na Complexidade,

que os sistemas complexos se recriam, se autocriam. Será Varella (Varella, 1983) que

designará por auto-poiesis a lógica funcional interna dos sistemas autoprodutores e

assinalará que, acima de todos os sistemas complexos, temos o homem enquanto

capacidade autônoma de conduzir a sua própria preservação e desenvolvimento e de,

portanto, criar a si próprio não importando quão adversos possam parecer os ruídos e

as estruturas por eles gerados.

Ainda enquanto defesa indireta da ímpar capacidade auto-poietica do “sistema

complexo homem”, aparece o conceito de even o ou acontecimento onde o Pensamento

Complexo, abandonando qualquer pretensão determinística, ressaltará o improvável, o

t

53

singular, o aleatório, ou seja, o essencialmente humano já que histórico, já que real e

que, até então, não encontrava espaço na ortodoxia das “ciências sérias” mas que,

sistemas complexos viabilizariam, processariam e superariam ao arrepio da

normatividade cartesiana, já que fenômenos únicos e irreversíveis, não faziam parte de

seu objeto de estudo: entender o irreversível e o único é buscar entender o homem

que, nesse sentido, é anticientífico por representar uma negação intrínseca à harmonia

da mecânica newtoniana.

Assim, numa certa medida, a Complexidade seria o esboço de uma ciência do devir, não

no sentido da ciência histórica tradicional, mas de uma ciência da evolução humana

enquanto sistema complexo em seu processo de enfrentamento e superação dos ruídos

ou dos eventos enfim, de perpetuação por autoconstrução, de criação de uma ordem

qualitativamente diferente. Será, retomando, Prigogine, na Física Quântica que, ao falar

de ordem por flutuação, de assimetria temporal, de evolução por bifurcações,

inaugurará o reino das turbulências, o domínio da instabilidade: bifurcação é o ponto

crítico a partir do qual um estado novo se faz possível e o diagrama dessas bifurcações

é a história desse sistema, de sistemas que se fazem marcados pela superação do

ruído; a partir daí, concluirá, o estado de um sistema não pode ser deduzido de sua

estrutura sendo que, sua única explicação, está na sua genética, na sua história.

Num outro sentido, a associação da denominação de sistemas complexos aos sistemas

de resposta não linear, ou seja, de respostas não proporcionais ao estímulo aplicado,

54

remetendo ao imprevisível, anulando o tradicional conforto da causalidade, a segurança

conferida pela solidez do empirismo, constituir-se-á na aceitação e na complicada

convivência com a incerteza já que assevera, em última instância, que a desordem é o

móvel para a construção da ordem, ou seja, um paradigma de paradoxos.

Nesse contexto nada geométrico de ordem e desordem, de sistema e ruídos, de história

e incerteza, a Complexidade contesta o reducionismo que afirmava a compreensão do

todo pela descrição das partes, já que, sistema, exprime o todo enquanto fenômeno,

enquanto unidade complexa, bem como interdependência entre o todo e as partes;

supera o holismo simplificador que avilta o complexo pela valorização do todo em

detrimento das partes; supera, enfim, o hierarquismo que, de forma semelhante, dá

supremacia ao todo, já que a complexidade enfatiza a existência infinita de sistemas

englobando sistemas, onde a partes também correspondem a interações entre unidades

complexas.

Há que se mencionar que, antes mesmo da abordagem da Complexidade, a Teoria dos

Sistemas antecipava de forma indireta, não apenas a integração entre as ciências, mas

também, aceitava a existência interna de um sistema em outro e a organicidade deles, o

que conduziu à idéia de sistema aberto enquanto um conjunto interdependente de

partes, em constante reciprocidade e aberto ao exterior num todo cinérgico voltado à

obtenção de objetivos pré-estabelecidos.Tais conceitos, por muito importantes tanto

55

para a compreensão das bases da Complexidade o seriam, muito mais, para o

entendimento das organizações complexas num mundo complexo.

Ainda que de forma canhestra e descosida, trouxemos o viés da Complexidade apenas

para o atendimento de nossas específicas necessidades o que, também significa, para a

subseqüente condução do discurso para a confluência com os estudos organizacionais

que é, insistimos, um dos últimos e resistentes redutos do “cartesianismo de resultados”

o que, conforme foi sendo pouco resultante, facilitou aos estudiosos o diálogo com a

“realidade organizacional” no sentido de sensibilizá-la para a Complexidade enquanto

não apenas um exotismo teórico, mas como uma abordagem revolucionária às práticas

organizacionais, sobretudo, quando se verifica a falência dos modelos incrementais,

gradualistas e, portanto, incapazes de encarar uma mudança descontínua e acelerada.

Falar da Complexidade e não mencionar a sua irmã siamesa a Teoria do Caos, se é

solução de continuidade a toda a construção da arquitetura científica contemporânea, é

também, em nosso caso, risco de um tratamento leviano mas irrecusável que, mesmo

justificado pelo nosso escopo, será sempre aviltante ante à importância do movimento.

Coube à Teoria do Caos como resultante de um denso e extenso processo de

desbravamento dos alicerces do método científico e da ortodoxia deste, entre muitos

novos postulados, inverter a noção de imprevisibilidade, conferindo-lhe um sentido

intrínseco e não mais a vendo como uma decorrência de nossas limitações

56

epistemológicas: a imprevisibilidade passa a ser aceita como tal, por si mesma; o acaso

puro, aquilo que não é aparentemente aleatório não estão mais à espera que

desenvolvamos competências para os sujeitarmos às normas, não serão mais filhos de

nossa incompetência científica.

Outro conceito que nasce com os estudos do Caos, é o de caos determinístico, o que

demonstra bem essa marca fronteiriça da teoria: é um esforço de superação do conceito

de um caos simultaneamente representativo de ordem, porque matematicamente

descritível, e de desordem, porque ainda impossível de determinação; se o atrator

fractal é o delimitador do espaço de possibilidades para a ocorrência de um fenômeno,

enquanto elas são as formas de um todo em movimento e não uma coleção de partes,

elas compõem uma compreensão qualitativa do fenômeno analisado; tais modelos tem

sido utilizados com freqüência nas aplicações financeiras, campo onde a ótica utilitarista

e os riscos concretos dispensam qualquer comentário sobre “modismos intelectuais”.

1.4 A chegada do paradigma da complexidade nos estudos organizacionais

Para podermos chegar ao muito novo, nunca é demais lembrar de onde partimos assim,

e voltando nosso foco aos estudos organizacionais, lembramos que foi Frederic Winslow

57

Taylor que fez a transposição “analogística” dos conceitos das ciências naturais para a

teoria das organizações: “A melhor administração é uma ciência, que repousa sobre os

fundamentos de leis, regras e princípios claramente definidos” (Taylor,apud

Freedman,1992).

Mas, foi uma realidade instável, arrítmica e imersa numa complexificação globalizante

que permitiu que a lógica pluralista da Complexidade se insinuasse como uma nova e

inusitada alternativa às velhas e congestionadas vias em que, teimosamente, insistíamos

não adotar:

“Parece que quanto mais nos tornamos receptivos às mudanças superficiais, mais cegos ficamos para o potencial de verdadeiras mudanças, mudanças de essência, de fundo”.(Bauer, 1999: 9).

Já em 1981, o sociólogo e estudioso das organizações Alberto Guerreiro Ramos

(Guerreiro Ramos,1992) profeticamente apontava as limitações da teoria organizacional

como uma espécie de antevisão das dificuldades que, até mesmo antes disso, atingiriam

as organizações:

“A teoria organizacional existente já não pode mais esconder o seu paroquialismo e ela é paroquial porque focaliza os temas organizacionais mais do ponto de vista de critérios inerentes a um tipo de sociedade em que o mercado desempenha um papel de padrão e força abrangentes e integrativos. Torna-se muda, quando desafiada por temas organizacionais comuns a todas as sociedades. Além disso, é paroquial porque se alimenta da fantasia da localização simples, isto é, da ignorância da interligação interdependência das coisas no universo; lida com as coisas como se as coisas estivessem confinadas em seções mecânicas do espaço e do tempo”.(Guerreiro Ramos, 1989: 198)

Um dos primeiros a perceber as potencialidades da utilização da Complexidade no

estudo das organizações foi Gareth Morgan (Gareth,1996) que propôs o uso das

imagens, no esforço do conhecimento das organizações, como de fluxo em

58

transformação, para o que se valeu do conceito de auto-poiese de Varella: a

organização, enquanto sistema autoprodutor, é parte de seu ambiente externo com o

qual interage dilatando os seus limites e alterando os seus traços de identidade; assim,

propugna a adoção de modelos circulares de interação no sentido de entender essas

relações da organização com o seu exterior, agora muito menos externo, pela utilização

da lógica da causalidade mútua; como o sistema se confunde, enquanto parte, com o

ambiente, autonomia e dependência se esvaziam de seu caráter antitético e a

complexidade assume o paradoxo da circularidade recursiva; na mesma direção, há que

se fazer menção a Maruyana (Maruyana in Bauer, 1999) quando, se referindo à

causalidade circular, supera a linearidade da noção de causa e feito no sentido de que

causas são retroalimentadas por efeitos, donde as conformações passam a ser sistemas

cujos produtos são necessários à sua própria produção.

Chamlat e Seguin-Bernard (Chamlat & Seguin-Bernard, 1987), acreditam que a adoção

da complexidade seria uma via de reedificação da teoria organizacional, classificando-a

em dois paradigmas: o funcionalista, que cuidaria da integração, do consenso e da

ordem e o crítico que trataria de mudança e desordem mas, sempre atentos, para as

noções de ambigüidade, incerteza que, definitivamente, acreditam eles, se impõem a

todo o fenômeno organizacional.

Em quase todos os quadrantes dos estudos organizacionais flexibilidade, criatividade,

vêm superando o simplismo mecanicista das antigas noções de eficiência e começam a

59

impor uma mentalidade organicista que, com bastante gradualismo, está ultrapassando

a pecha dos modismos inconseqüentes já que, enquanto enunciador de uma visão

científica de mundo, ele de muito extravasa os míopes limites dos fazedores de moda na

administração, ou seja, dos “consultores bem palestrantes” ainda que, num primeiro

instante, o Paradigma forneceu-lhes material de subsistência pela impactação gerada

pelos seus princípios.

Segundo Serva (Serva, 1992), apenas pelo foco auto-referencial é que, doravante, será

possível o entendimento das organizações em sua clausura organizacional, em sua

crescente complexidade.

A luta contra o anacronismo, nessa nova visão organizacional deve, mais do que aceitar,

provocar uma involuntária indeterminação no sistema; será, na fronteira do caos,

(Bauer,1999) que a organização produzirá, de um lado, o equilíbrio necessário à sua

rotina, de outro, o desequilíbrio vital à inovação; será a convivência espontânea com os

sistemas caóticos que, em confronto mortal com o planejamento e o controle, passarão

a determinar a sobrevida das organizações segundo essa nova ótica.

“As organizações tem necessidade de ordem e de desordem. Num universo onde os sistemas sofrem o aumento da desordem e tendem a desintegrar-se, a sua organização permite reprimir, captar e utilizar a desordem.” (Morin, 2001: 129)

E será, o mesmo Morin (Morin,1996) que acusará à burocracia, à obcecação de

controles, bloqueios e engarrafamentos, fenômenos parasitários e paralisantes da

dinâmica vital auto-poietica, justificadores da lógica da Complexidade pela sua

60

incondicional tolerância à desordem: conceitos, ainda hoje, de difícil penetração no

universo gerencial, onde a idéia de ordem está profunda e inconscientemente

entranhada no conceito de hierarquia e esta, ao de poder, gerando a dificuldade, na

práxis organizacional, de se pensar em hierarquia entrelaçada, acaso organizacional e

outros “paradoxos” da Complexidade que, mais do que provocar mudanças, têm

explicado as transformações ocorridas na essência das estruturas de poder

organizacionais que, rebeldes às antigas teorias, transformaram-se ao seu arrepio.

Morgan (Morgan, 1996), falando do princípio da mínima especificação crítica –

prescrevendo que se deve buscar o mínimo essencial para o desenvolvimento de

determinada organização – coloca a compreensão de que todo o controle, até o

aprendizado auto-organizante, é um ato político e a delegação é parte indissociável da

auto-poiese; e o poder, nessas condições, só pode existir enquanto derivação da

autoridade, ou seja, o poder delegado, consentido, o que, por sua vez, reabre sob uma

ótica renovada, a antiqüíssima questão da horizontalização e verticalização do poder nas

organizações.

Como traço emblemático das dificuldades gerenciais de aceitar essa realidade

complexificante, temos as políticas norteadoras dos departamentos de recursos

humanos, filhos preteridos da gestão, onde predominam, grosso modo, forças

padronizantes e despersonalizantes que reduzem diversidade e variedade,

normalmente, a fatores mercadológicos de divulgação de uma imagem “politicamente

61

correta” e que, enquanto variante, nos proibimos de prosseguir mas que não perde seu

valor indicativo para o tema.

Ainda Bauer (Bauer,1996) em sua “abordagem caótica”, traz uma interessante análise

de outro polêmico binômio, generalização X especialização que, desde os primórdios da

Revolução Industrial, tem tido um dos mais ortodoxos tratamentos afinal, “tudo é

especialização” ou, nem tanto: a partir da aceitação de que a auto-construção

organizacional assenta-se, também, na obtenção da variedade, da pluralidade

enquanto matérias-primas essenciais à flexibilidade, a presença da redundância surge

numa intensidade nunca antes admitida nos domínios da eficiência uma vez que, é ela

que a propicia: pelo treinamento de funcionários em tarefas que não as especificamente

suas, é que se constrói o potencial de enfrentamento do imprevisto; pela multiplicidade

de indivíduos e visões diferentes de situações organizacionais complexas é que se

armazenam as soluções inovadoras; em tais casos, a especialização estrita é fator de

esterilização dos potenciais de reação da organização ao novo, fazendo com que as

partes sejam, no máximo, somadas e esvaziando-se toda a capacidade sinérgica. Aliás,

essa multifuncionalidade é, também, outro dos fatores mais subterrâneos e menos

confessados de resistência das estruturas conservadoras de poder.

A título de comentário, quase compulsivo do acima afirmado e já que é muito difícil

silenciar o educador, lembramos o quão resistente é a noção de que o mundo é,

apenas, dos grandes especialistas: emblematicamente encontramos, nas estruturas

62

curriculares do ensino superior de administração, um grande número de instituições

que, ao arrepio mesmo da orientação dada pelo Conselho Federal de Administração

para a reforma curricular de 1995, se valendo da “cultura do especialista-mecanicista”

subjacente, criam especializações em seus programas de graduação, para uma faixa

etária e objetivos pedagógicos discutíveis, para vender modernidade; e, do outro lado,

Bauer (Bauer,1999), ao falar da organização auto-poietica, frisa a importância dela

investir em estoques de conhecimentos genéricos e habilidades diversificadas.

Também de caráter desconcertante dentro dos ajustes provocados pela Complexidade

nos estudos organizacionais, é a afirmação de que ambientes e sistemas fazem-se

reciprocamente. Tomando por outro ângulo, a Teoria da Causalidade Circular, retira do

ambiente o papel hegemônico e determinístico de transformação que, por sua vez, se

torna um prolongamento externo da organização; assim, quem geraria a organização

seria a própria identidade dela que, por sua vez, só poderia ser conservada nesse

mutualismo dinâmico; tal dinamismo que, doravante, gera um impasse novo uma vez

que identidade sempre se constituiu em mecanismo imobilizante, já que ligada a um

passado de êxitos, presa “ao que deu certo”. Tal revalorização da identidade reforça, a

fortiori, por sua vez, a importância que a cultura organizacional readquire no novo

"paradigma" ao reiterar que o que a organização necessita para se autoconstruir está

nela mesma, está no seu conhecimento de si e que é produto de regularidades

observadas pela experimentação de forma cumulativa e validada com as estruturas de

referência consagradas e cujas representações do ambiente externo lhe conferem

63

significado; nesse difícil e sutil mecanismo de contrapesos entre tradição e renovação e

que aparece como outro inicial paradoxo, reside o potencial de sobrevivência da maior

parte das modernas organizações que balançam, perigosamente, entre as ameaças de

reengenharias modernizantes e descacterizadoras de suas culturas e o imobilismo

comatoso do tradicionalismo que vitimou muitas corporações sólidas.

Ainda que os últimos tempos tenham sido marcados por muitas iniciativas e estudos nas

áreas da aprendizagem e, de forma correlata, da cultura da organização e de forma

significativa nas iniciativas das universidades corporativas, nos perguntamos o quanto

tais ações poderiam estar marcadas pelos produtos da consciência da Complexidade e o

quanto, num espaço muito menos audacioso, haja vista conteúdos e grades curriculares

das referidas universidades corporativas, não seriam programas mais sofisticados de

treinamento e que não facilitariam o "desejado" movimento auto-renovador nos quais a

verticalidade da ação impediria com que as ondas da realidade interagissem com o

maior número de observadores (Wheatley, 1992); lembrando que, se falamos de cultura

organizacional, inferimos o processo de conhecimento enquanto resultante do trânsito

coletivo dos dados da organização o que, ante os novos recursos, é um de nossos

focos:

“Para que um sistema funcione, as informações não são suficientes, é necessário que elas levem uma sensação compartilhada. A consciência da finalidade é indispensável, tanto para elementos de base como sobre a totalidade”.(Genelot, 1998: 183).

Nunca é demais lembrar que a pouca linearidade destes tópicos, de descosida

apresentação da Complexidade, foi resultante não apenas do atendimento às nossas

64

necessidades específicas no trabalho, tanto quanto, é forçoso declarar, da própria

dimensão do paradigma para a qual não tivemos nem a pretensão, nem a competência

de uma síntese mais coesa e coerente, fazendo-nos, o mais possível, próximos de

nossos guias na “letra da lei” o que, no entanto, não impediu de incentivar um certo

arrojo:

“Vai-se tentar aqui um discurso multidimensional não totalitário, teórico, mas não doutrinal (a doutrina é teoria fechada, auto-suficiente, logo insuficiente) aberto para a incerteza e a ultrapassagem; não ideal/idealista, sabendo que a coisa nunca será encerrada no conceito, e que o mundo nunca será aprisionado no discurso”.(Morin, 2001: 73).

65

CAPÍTULO 2- VIRTUALIDADE, COMPLEXIDADE E COMUNICAÇÃO

ORGANIZACIONAL:

2.1 O Universo virtual e a complexidade

Para podermos dar conta da tarefa de pensar a comunicação feita através dos

multimeios e das conseqüências disto, há que buscarmos subsídios para, ainda que

sempre de forma ampla, compreender as novas realidades criadas pela convivência

simbiótica com as TCI.

Falar em universo virtual é uma outra forma hiperbólica e didaticamente necessária de

se tratar de um aspecto deste momento histórico que já se chamou de Segunda

Revolução Industrial e que seria marcada pelo advento das TCI e de seu espraiamento a

todas as esferas da vida humana o que, também, permitiria falarmos em uma

"sociedade informacional"; sociedade onde tanto a vida pública quanto a vida privada

estariam cobertas por alguma forma de inteligência artificial (Schaff, 1996) e onde a

totalidade de relações sociais que formam os sistemas de vida foram atingidas e

modificadas.

A radicalidade dessas transformações é tão aguda que enseja reflexões outrora

passíveis de serem taxadas de insanas mas, agora, merecedoras de atenção: avalia-se a

possibilidade do aparecimento de uma sociedade sem a classe trabalhadora pela plena

66

automação da linha de produção o que demoliria quase que a totalidade das teorias

políticas remanescentes dos escombros da modernidade gerando reações que, por si só,

já denotariam uma das singularidades deste tempo ímpar:

"Contudo, isto se deve exclusivamente às características conservadoras do nosso pensamento, quando não - para piorar as coisas - ao mecanismo da cognitive dissonance, um mecanismo que torna a mente humana impermeável às verdades novas nos casos de conflito entre a ideologia que se defendeu até aqui e os fatos que a refutam, conflito que não pode ser resolvido recorrendo-se a argumentos racionais”.(Schaff, 1996: 42, 43)

À citada postura de negação apriorística é sempre necessário se colocar sua antítese

hoje mais freqüente e não menos danosa, a "tirania do novo", tão paralizante e nociva

quanto a anterior já que ela obriga a mudanças de origem exógena à organização e à

própria existência privada, devendo ser assinalada como outra marca da nova história

também ela de efeitos pouco avaliados pela sua extensão, custos materiais e humanos.

Da mesma forma e voltando-nos um pouco mais para o nosso foco, mas ainda tratando

de grandes traços da questão, lembraríamos que essa reformulação social criada pela

inteligência artificial gerou uma nova estrutura social pela posse da informação no seu

sentido lato, que não deixa de ser o novo meio de produção e, portanto, fonte de

poder: neste ponto, parece que a sensibilidade tanto da academia, quanto do mercado,

já percebeu aí, de há muito, o núcleo de uma massa crítica de essencial importância,

conferindo-lhe atenção e cuidado mas, da mesma forma, é interessante, ainda que

inoportuno, notar como a "questão ideológica" dessa nova arrumação social limita e

compromete as análises no que se referem ao universo organizacional.

67

Reações, de toda a origem a essa "nova ordem" devem ser entendidas quando se

percebe que conceitos, milenarmente humanos e estáveis, foram subvertidos; as noções

de tempo e espaço, parâmetros que nortearam a essência do devir humano, que

tiranizaram e desafiaram milênios de trabalho passam, quase que por um estranho

encantamento, a ter outras dimensões e a determinarem o ser humano também de

forma diversa:

“Recortam-se o espaço-tempo clássico apenas aqui e ali, escapando a seus lugares comuns realistas: ubiqüidade, simultaneidade, distribuição irradiada ou massivamente paralela. A virtualização submete a narrativa clássica a uma prova rude: unidade de tempo sem unidade de lugar... A sincronização substitui a unidade de lugar, e a interconexão, a unidade de tempo. Mas, novamente, nem por isso o virtual é imaginário" (Morin, 1996: 21)

Nesse mundo virtualizado se opera, bem mais do que a decantada e discutível

globalização anunciada nos anos sessenta, o advento de uma cultura que migra pela

rede e que se faz total mas não-presente, que está conosco mas está muito longe ou

nem se sabendo onde: tudo isso é minimamente assustador para nós, herdeiros dos

horrores de um já longínquo Holocausto, submetidos ao contato com jovens que

conversam numa língua que não é a sua , com outros jovens que, também, não falam

em sua língua nativa e que, tanto uns quanto outros, desconhecem o espaço geográfico

não mais tão significativo, pois relativizado, onde está seu interlocutor. Assim, nasceu,

em nós "mais velhos", a necessidade de desenvolvermos uma habilidade intelectual

presente nas novas gerações, a de intercambiar as diferenças, de fazê-las dialogar

apesar de antiqüíssimas discrepâncias e antagonismos

(temporais/espaciais/ideológicos...), de se compor não mais um novo todo, uma nova

68

unidade, mas uma infinidade de todos tão diversificados quanto, talvez, cada indivíduo

que se perceba como tal:

“A multiplicação contemporânea dos espaços faz de nós nômades de um novo estilo: em vez de seguirmos linhas de errância e de migração dentro de uma extensão dada, saltamos de uma rede a outra, de um sistema de proximidade ao seguinte. Os espaços se metamorfoseiam e se bifurcam a nossos pés, forçando-nos à heterogênese."(Morin, 1996: 23)

Se os poucos acima mencionados corolários desse universo virtual já seriam mais que

suficientes para exaurirem as possibilidades epistemológicas de outros paradigmas

menos flexíveis que o da Complexidade solicitamos, ainda uma vez mais, espaço para

uma pequena, mas emblemática reflexão a respeito desse ser humano nascido sob o

signo informacional e designado por geração y. Tais indivíduos seriam marcados por

uma completa integração com a inteligência artificial, desde o processo de socialização

primária, através de jogos e vídeos, até à própria alfabetização. Assim, quando falamos

em organizações complexas, quando nos debruçamos sobre as possibilidades da

comunicação, não há como deixarmos de lado as questões concernentes aos agentes

dos processos.

Apontaríamos uma única questão sobre essa geração y suficiente para abrir, ao menos,

uma grande linha de conjecturas: será que essa íntima e intensa convivência com o

texto informacional, o hipertexto, não estaria, ou mesmo já teria, provocado o

nascimento de, quiçá, uma "lógica nova" ou, ao menos, uma corruptela das antigas

condutas de pensamento e, por conseqüência, expressão? O texto linear antigo “, da

esquerda para a direita, de cima para baixo, obrigava a um tipo de raciocínio e de sua

69

adequada comunicação. Agora, a relação do leitor com o hipertexto é fragmentada, é

não linear pelas possibilidades inigualavelmente amplas (mas previamente limitadas) de

interação com o mesmo; essa não-linearidade nos remete à essência mesma do modo

de ser do entendimento, surge a possibilidade de uma nova hermenêutica, sua

navegação caleidoscópica e instantânea permitiria uma visão do todo mas do todo de

cada um ou sempre do todo de seu desenhista? Essa coexistência teórica do macro e do

micro no hipertexto, essa polifonia das interfaces, sua multiplicidade de encaixes das

escalas faz ressaltar sua característica fractal, uma estrutura reticular que enseja a

construção de redes dentro de redes ad infinitum em tese sem qualquer centralização.

Se como quer Lévy (Lévy, 1998) o hipertexto está repleto de condições que possibilitam

a valorização da inconsciência; se Vannevar Bush (criador do analisador Diferencial,

1930) (Bairon,1995: 138) partia do pressuposto de que o raciocínio humano não

funciona por hierarquias de palavras classificadas em organogramas conceituais mas por

variadas associações que percorreriam uma complexa rede de trilhas desconexas de

representações, não estaria o hipertexto, a hipermídia ou multimídia interativa, como se

queira, provocando uma revolução subterrânea e silenciosamente expressiva no modo

de como as pessoas estariam se comunicando ou deixando de conseguí-lo? Não estaria

a artificialidade da leitura, que sempre foi um fator de dificultação da comunicação entre

os mais e os menos letrados, ganhando conotações efetivas de complexidade? Ainda

uma vez, necessitaríamos de um viés da qualidade e da flexibilidade da Teoria do Caos

para podermos encaminhar tais perguntas a um "horizonte equacionador" e que foge

aos nossos limites aqui.

70

E finalizando, dentro das limitações propostas, e pela magnitude do quadro compósito e

inextricável virtualização/complexidade, trazemos a questão profundamente complexa,

pois ideológica e apaixonante, das potencialidades redentoras/apocalípticas das atuais

técnicas de comunicação que, se para alguns, poderiam significar uma redefinição

antropológica da humanidade ao permitir que, nações inteiras, se integrassem aos

coletivos inteligentes a partir da queda completa dos mecanismos de restrição e acesso

às informações e à comunicação; considerando, por conseqüência, que a rapidez dessa

transformação teria enfraquecido, pela burla inconsciente, a própria essência do poder

estatal, o controle e, portanto, estabelecendo a semente de uma possível nova ordem

mundial. Para outra linha de interpretações não menos possíveis mas, certamente,

menos estimulante pelo seu amargo conservadorismo pessimista, surgem perguntas

sobre as limitações e conseqüências da exclusão digital; aparecem notícias sobre as

muito sofisticadas e eficientes formas de invasão e controle da privacidade; retoma-se a

desconfiança do que se disponibiliza na rede, de quem disponibiliza e para que o faz. E,

quando os Estados Unidos reconhecem assustados que um grupo de jovens , com PCs

quase domésticos e parcos, usaram a rede para operar o desastre de 11 de setembro,

quer seja, quer não seja verdadeiro, a partir daí, a rede não mais será igual pois, longe

do que pensávamos, já era muito diferente e, complexificante e uma nova ordem

poderá surgir do apocalipse ou ele mesmo ser a nova ordem.

71

E é nesse muito mais amplo e inseguro panorama que se deve, não apenas, repensar a

trajetória das organizações mas de sua essencial matéria-prima, o ser humano, agora

muito mais do que renovado, transmutado e transmutador.

2.2 As organizações no mundo complexo: o caos e o êxtase

gerenciais

A chegada da visão da Complexidade aos estudos organizacionais, como vimos em 1.4,

foi a inevitável conseqüência da necessidade de se encarar um mercado onde as antigas

fórmulas, de há muito, ou tinham se mostrado ineficazes vitimando os míopes ou os

conservadores (se é que há diferenças entre eles), ou já vinham sendo substituídas por

"soluções reformadas" sem que se tivesse alguma sinalização lógica inovadora que as

pudesse aglutinar em torno de um eixo teórico mínimo: essa é a sensação (palavra

assumidamente pouco científica na fase pré-complexidade) que fica para o estudante

que, num primeiro momento, se debruça sobre a história recente da administração.

Historicamente, a gênese dos grandes paradigmas teóricos acontece nos limites

extremos de crises epistemológicas e, nesses estertores caóticos de vazios lógicos, a

chegada de uma nova e ansiadamente eficaz referência, gera todo o encantamento

peculiar às soluções salvacionistas: as ciências das organizações, por menos que

possam estar ligadas às práticas administrativas, tem um dever de produtividade quase

singular no universo das ciências sociais já que tem, diante delas, acionistas, balanços e

72

resultados a encarar. Agora, ultrapassada a fase onde uma saraivada de modismos

efêmeros assinalava a exaustão do antigo, assistimos à outra que parece ainda não

encerrada de encantamento pelo novo; de um êxtase que, por enquanto, não parece

vencer os limites da academia, dos escritos científicos e, se tanto, do luzir fugaz dos

consultores e se estabelecer como uma diretriz concreta à práxis gerencial enquanto

encaminhamento para o sucesso nos negócios: medo dos riscos de se assumir a radical

inovação e abandonar as "fórmulas de sucesso?”.

Dificuldades no diálogo entre a academia e o mercado, entre a vertigem das idéias e a

necessidade de chão para a práxis diária? Cremos que as duas e ainda outras mais

razões:

"Muitas das melhores idéias fracassaram porque as organizações tendiam a aplicá-las como uma camada de tinta por cima da "forma tradicional de fazer as coisas"- sem conseguir provocar os efeitos transformadores desejados. O relacionamento superficial com essas idéias e seu subseqüente "fracasso" provocaram cinismo entre os executivos." (Pascale,2004: 40)

Será o mesmo supracitado Pascal que, reforçando nossas afirmações sobre as crises

paradigmáticas que ainda comprometem as mudanças organizacionais, tratando das

"resistências às mudanças", assinala como uma das causas essenciais as permanências

da "engenharia social", herdeira da lógica mecanicista newtoniana, contaminando a

teoria microeconômica, desconhecem que os sistemas sociais e, portanto, as

organizações. São fenômenos de complexidade organizada, que não se submetem à

verticalidade da antigas ciências da natureza; sendo as regras que definem a vida

princípios de baixo para cima, demonstrativos da reciprocidade dos agentes, da

73

autonomia dos indivíduos ante o poder padronizador da sociedade. Daí, o efeito

devastador da imprevisibilidade (sobre o antigo paradigma) e o de solução miraculosa

de seu antípoda (o novo paradigma) (Pascal, 2004).

Não é de se estranhar a perplexidade inerente a sistemas que "se auto-organizam”,

que conjugam ordem e desordem, onde a pouca possibilidade de decisão pode ser um

dado freqüente e, onde a "saída lógica" pode estar na coexistência de lógicas de

natureza diferente, a dialogicidade definida por Morin e citado por Genelot como fulcro

de uma das mais essenciais dificuldades gerenciais contemporâneas: a coexistência da

lógica do lucro com a lógica ambiental; da lógica dos enxugamentos com a empresa

cidadã, da lógica das estratégias de venda com a lógica dos direitos do consumidor.

Lógicas onde a velha linearidade parece que se perdeu na sinuosidade dos

descaminhos, na circularidade e recursividade características do hipertexto que, mesmo

que de forma inconsciente, é uma fiel e, provavelmente revolucionária, representação

das novas realidades que, ao menos num primeiro instante, parece a melhor forma de

representá-las.

Dessa forma, evidencia-se que a obsessão pelo planejamento e pelo controle (núcleos

ideológicos tradicionais da ação gerencial e que se projetam na racionalidade

instrumental que tem marcado profundamente as práticas e as teorias administrativas),

ficou mortalmente comprometida por uma concepção que nos leva perto de concluir a

pouca ou, quiçá, nenhuma gerenciabilidade das realidades complexas. É esse ponto que

74

leva a assinalar a passagem de uma visão planificadora da estratégia gerencial para

uma visão da pró condução gerencial onde a complexidade, passando a ser aceita, faz

com que a condução das mudanças torne-se o processo de desenvolvimento da

autonomia consciente, de antecipação de um futuro almejado e construído, através de

práticas mais flexíveis e interativas que, inúmeras vezes, ficaram, apenas, como letra

morta nos discursos tencocrático-integracionistas e cripto-centralizadores das

corporações. Agora, o gerenciamento estratégico, reunindo estratégia e operações,

deixa aos operadores o gerenciamento do cotidiano e suas micro-decisões; estratégia e

operações se imbricam num mutualismo co-evolutivo e numa realidade que aceita a

incerteza não como anomalia e onde a organização deve ser preparada para antecipar

as mudanças numa reatividade estratégica lastreada num sólido conhecimento sobre os

valores e as vocações da organização (Genelot, 1998).

Sem dúvida e muito lentamente, começa a ser notado esse movimento centrípeta do

poder nas organizações, pelas necessidades ditadas pelo mercado, de um intenso

diálogo entre os centros e as periferias das organizações: aqui e ali encontramos fatos

comprobatórios desse fenômeno que desgasta os papéis, as resistências e a significação

mesmas das antigas elites enquanto núcleo decisório por excelência e, sobretudo, de

um movimento pendular destas entre a perplexidade e o êxtase ante o

desconcertantemente inusitado: há que se aceitar que o sucesso organizacional

depende de lideranças situacionais, de focos transitórios de residência da autoridade;

que a sobrevivência repousa no construir de uma consciência estratégica que exige a

75

maior riqueza e variedade possíveis de pontos de vista para se obter a suficiente

abertura prospectiva capaz de abarcar a intrincada sutileza das variáveis e, a partir

delas, formular cenários.

Fugir de tais verdades é nos condenar à ingovernabilidade, é, doravante, o risco de

descontrole completo dos sistemas; é a insistência burra em querer rotinizar o

imprevisível. É querer se pensar as organizações como organismos ou completamente

fechados e imunes ao ambiente ou completamente a ele submetidas: na teoria da

autopoiesis, Maturana e Varela apresentam as organizações como seres vivos, auto-

referentes e autônomos que, em uma relação sistêmica e mutua se geram com o

ambiente cuja meta final é sua própria perpetuação (Maturana e Varela, 1995). Será o

perigo de não se conseguir entender que o caráter das mudanças de hoje nos impõe

um planejamento mutilado ou, melhor dizendo, renovado, onde as alterações deverão

ser feitas antes de termos condições de apreendermos seu total sentido e, daí, onde o

risco será uma inevitável variável constante:

"Não há um modelo único como pré-condição para a eficácia da mudança. O êxito depende menos da coerência de um modelo e mais da simultaneidade de perspectivas. Portanto, ser eficaz não é escravizar-se a um modelo, e sim construir na crítica e na experiência das variações”.(Motta, 1999: XVII)

Passar a ver as organizações como seres vivos na sua nova e libertária condição, tentar

formas heterodoxas de se buscar modelos de sistematização para a compreensão das

estruturas organizacionais como, por exemplo, o uso de metáforas magistralmente feito

por alguns estudiosos e que, de uma outra forma, demonstra a inequívoca necessidade

de revisão completa e visceral não apenas dos conceitos, mas das formas de expressão

76

da complexidade real: "o uso de metáforas implica um modo de pensar e uma forma

de ver que permeia a maneira pela qual entendemos nosso mundo em geral"

(Morgan,1996: 16). E será o referido Morgan que, de forma magistral mostrará que tais

metáforas (até há muito pouco tempo vistas como formas pouco sérias de tratamento)

nos permitirão uma compreensão melhor da realidade ainda que, doravante, sempre de

forma incompleta e enviesada.

Desse modo metafórico de se enxergar, a visão mecanicista da organização-máquina

revela as relações organizacionais focadas entre objetivos, estruturas e eficiência, com

unidade verticalizada de comando, com necessária especialização e racionalização do

trabalho no encalço dos objetivos traçados de tal modo que ambiente, relações

interpessoais e interesses pessoais são preteridos valorizando, quase que

exclusivamente, o ambiente externo. Tal mecanicidade, hora destruída pela realidade de

uma dinâmica complexa não linear, que confundia complicado com complexo, baseava-

se no pressuposto de que as organizações poderiam ser entendidas em suas parte:

agora, entendidas como organismos vivos, as organizações são aceitas como complexos

de mutualidades incessantes que, atuando sobre o ambiente externo, provocam

alterações num contínuo de equilibração e desequilibração despedindo a teoria e a

práxis organizacionais do universo de tranqüilidade e de segurança do controle e da

previsibilidade e onde os conceitos de lucro e resultados perderam algo do seu caráter

de sagrada intocabilidade: haja vista, enquanto indicador emblemático comparativo, a

enorme valorização que ganhou a aprendizagem organizacional e que demonstra a

77

aceitação implícita dessa nova concepção onde os agentes, vivos e não peças, devem

ser incentivados à liberdade iluminada por aquilo que apreenderam na construção da

auto-organização que, insistimos, essência vital das organizações é corolário da

capacidade de aprender e de provocar a aprendizagem da organização e determinante

de sua sobrevivência; apreender que, em síntese, é capacidade de se transformar pelo

apreendido e de ser agente de transformação: essa "empresa que aprende" não pode

ser entendida de forma mecanicista e fragmentada uma vez, que tal abordagem,

comprometeria a essência mesma do processo de aprendizagem que pressupõe

organicidade, recursividade e flexibilidade constantes; que obriga à aceitação da

ambigüidade na definição de tarefas, nas comunicações abertas e constantes, na

multiplicidade de procedimentos e na descentralização de controles; tais organizações

desafiam os mais consumados critérios de hierarquização já que sistemas englobando

sistemas que englobam sistemas só podem ser vistos por óticas semelhantes em

abertura e flexibilidade à da Teoria Complexidade que pressupõe uma infindável teia de

relacionamentos e recorrências, onde os “fractais não são uma coleção de partes: eles

são as formas do todo em movimento” (Bauer,1999: 111). A impossibilidade de se

utilizar equações de natureza linear, ou seja, a impossibilidade de determinação, fez

com que a Teoria do Caos, graças às possibilidades dos computadores e sua

desconcertante capacidade de processamento, aceitasse sucessivas combinações de

resultados possíveis: assim surge o atrator fractal enquanto a delimitação de um espaço

de possibilidades para um referido fenômeno (Bauer, 110).

78

Cremos ser cabível e útil relembrar que a crise do paradigma cartesiano, estendida aos

estudos organizacionais, teve o condão de lembrar sua condição de ciências sociais bem

como, pelo desvendar de horizontes muito mais amplos, ensejar a recuperação de áreas

de estudo que, ou por pouca adaptação aos modelos matemáticos, ou por quaisquer

outros preconceitos epistemológicos, se encontravam preteridas. Assim o foi com a

antropologia e alguns de seus corolários como o dos estudos da cultura organizacional

que, nessa nova dimensão da organização complexa, ganham importância inequívoca:

"A Antropologia das Organizações para a qual convidamos cada um a contribuir é uma Antropologia Adisciplinar. Ela quer ser uma síntese dos conhecimentos fundamentais que temos sobre a humanidade ou, para falar como Marcel Mauss, ela remete à "totalidade das ciências que consideram o homem como ser vivo, consciente e sociável"(1968,p.285). Uma tal Antropologia repousa, de um lado, sobre certa abertura disciplinar e, de outro, sobre o retorno de dimensões centrais freqüentemente esquecidas pelo mundo da gestão." (Chanlat, 2000: 63)

Nessa nova dimensão de se ver as organizações, aparece um novo conjunto de

conceitos que constituem a linha de frente das tentativas de entender as relações entre

os ambientes simbólicos das organizações e os ambientes sociais que lhes são externos,

ou seja, de buscar o entendimento da completude organizacional. Assim são os

conceitos de cultura de Davos e cultura de negócios: a primeira (criação de Peter Berger

e Samuel Huntington), seria um paralelismo do processo de globalização econômico

difundindo valores, lógicas gerenciais e modos de se fazerem os negócios que são

operados e contaminam as elites; a cultura de negócios, complementar a de Davos

pode ser entendida como um a série de fluxos culturais - imagens, valores, símbolos e

significados - que permeiam o universo das organizações globalizadas e que se

fundamentaria numa "lógica pragmática" na qual independe a origem, o agente ou o

79

tipo do conhecimento, aparecendo uma libertária multidisciplinaridade mas que, num

eterno e muito compreensível retorno, na busca da racionalidade, reforça a tentativa de

representação numérica da realidade e, até por isso, demonstra o inusitado de nosso

tempo (Barbosa, 2001).

Nessa mesma linha de se ver a organização orgânica, descentralizada, auto-construível,

a Escola Cultural (Mintzberg, 2000: 194), bastante sintonizada com as concepções

expostas, centra sua concepção de estratégia sobre a importância da cultura da

organização enquanto o fator de junção de um conjunto de indivíduos numa entidade

integrada e tanto mais integrada quanto mais descentralizado for o poder. Assim, nesse

viés, a estratégia seria um processo ancorado na força social da cultura que será a

responsável pela estabilidade estratégica: cultura entendida enquanto o que é único a

respeito de uma maneira pela qual uma organização faz todas as coisas e que a

diferencia das outras. Se tal concepção foi o "segredo" tão grandemente valorizado das

empresas japonesas dos anos oitenta, tais concepções ficavam limitadas pelos não tão

amplos horizontes da motivação. O que nos interessa, nesta nossa jornada de

rastreamento dos modos de tratar a complexidade na administração como forma de

gerir os tempos da hipermodernidade, é buscar os sinais pelos quais, mesmo que com

outros nomes, o novo foi sendo inserido no universo administrativo. Assim, ainda

segundo Mintzberg, a grande arrancada da escola cultural de administração estratégica

aconteceria pela entrada da escola de aprendizado que defende que as estratégias

80

emergem quando as pessoas, individualmente ou em grupo, aprendem a respeito de

uma situação tanto quanto a capacidade de sua organização de lidar com ela.

De qualquer maneira, importa essa valorização de um aprendizado organizacional

predominantemente coletivo, compartilhado. Aqui entram os pensadores da

complexidade acrescentando a pedra de toque diferenciadora ao conferir à importância

da cultura um fator escamoteado e ideologicamente antagônico, a liberdade essencial

do grupo para construir uma estratégia de mudança, não de manutenção e nunca de

conservantismo, onde apareceria a concepção (muito mais ampla) de Lévy dd novo

espaço antropológico o espaço do saber criado pela renovação do laço social por

intermédio do conhecimento e o da inteligência coletiva propriamente dita:

"A capacidade de formar e reformar rapidamente coletivos inteligentes irá se tornar a arma decisiva dos núcleos regionais de conhecimentos específicos (savoir-faire) em competição em um espaço econômico mundializado... que se dará o surgimento e a redefinição de identidades definidas. "Lévy, 1998: 22)

Em igual proporção, a História, componente vital de identidade dos seres humanos e de

seus grupos ficava, nas organizações, confinada a uma tarefa sepulcral de fazer o relato

dos maiores feitos e seus reverenciáveis protagonistas, numa dimensão negadora da

própria historicidade enquanto oposição passado-presente socialmente construída e

consciente disso. O tempo dos gestores, impregnado de imediatismo e com horizontes

míopes fazia da memória uma espécie de folclore de hapy hour e freio da inovação.

Hoje, graças à valorização da cultura organizacional enquanto um dos fatores de

catalisação da organização auto-poietica que pressupõe uma auto-referência enquanto

sistema de referência, que necessita de uma identidade fundamentada numa ética,

81

aparece outra recuperação emblemática pois recoloca, pela sua revalorização, o homem

como fim e não como instrumento, fazendo com que, responsabilidade social, deixe de

ser móvel promocional e se torne em obrigatoriedade indiscutível no conjunto dos itens

da missão e num passado alavancador da mudança enquanto lembrança do potencial

realizador do grupo e não mais como realidade a ser conservada. Por fim, numa

abordagem mais ampla e tradicional, constata-se que a natureza mesma destes nossos

tempos reforça o princípio de que os sistemas humanos só poderão ser entendidos nos

limites de suas histórias.

Gerir a mudança surpreendente é abrir espaço a atitudes tradicionalmente proibidas nas

esferas da gestão séria, é admitir o sonho e o imaginário, a emoção, a criatividade e o

sentimento como parceiros de uma ordem-desordem, eles que, na medula do

pensamento conservador, eram veículos da revolução, da subversão eram, no mínimo,

demonstrações feminino-pueris que deveriam ficar circunscritas aos limites das

confraternizações de final de ano, das despedidas e momentos dramáticos e que, em

hipótese alguma, teriam assento nos níveis estratégicos da empresa que, no limite da

tolerância do chamado de sério, seriam aceitas nas oficinas de criação dos

departamentos de propaganda ou nos momentos de relaxamento dos treinamentos. E,

nessa nova perspectiva, aparece a criatividade enquanto pré-condição a outra qualidade

heterodoxa na organização tradicional, a liberdade e, ambas, essenciais à sobrevivência

da organização que aceita a imprevisibilidade e a desordem bem como sabe que todos

os processos de criação da ordem são, também, de criação da desordem:

82

"A liberdade é um desenvolvimento da aptidão auto-organizacional... A inventividade, a criatividade, a liberdade deixam de ser excluídas do campo da ciência; deixam de ser atribuídas a um deus ex machina e até ao deus Acaso.(Morin,1996: 304, 305) ,

A instabilidade e o desequilíbrio, passando a ser aceitos como variáveis constantes,

obrigam as organizações a se acostumarem com a precariedade, com o efêmero e o

ambíguo; fazem com que esse distanciamento ininterrupto entre empresas e mercado

obriguem às primeiras a aceitarem que a sobrevivência decorrerá de sua capacidade de

ser, também, instáveis sem que tal característica, ora benigna, gere medo, conflito e

tudo aquilo que possa destruir outro capital revalorizado pelo "mundo instável", a

solidariedade e a unidade que devem ser fatores determinantes da capacidade de

reação da organização submetida, que está, à imprevisibilidade tal como acontece aos

fenômenos caóticos no mundo físico já que a matéria-prima com que se trabalha e que

opera, é a mais instável, é a mais sujeita à volatilidade, é o ser humano. Faz-se

obrigatório que a cultura da organização converta a instabilidade e os atributos ao seu

enfrentamento (o arbítrio, a criatividade, a agressividade próativa, aprendizagem

constante pela experiência e a sua incorporação estrutural, diálogo franco, alta

diversidade, compartilhamento de visões, equilíbrio de poder, flexibilidade hierárquica,

coragem para ser livre), em dados inerentes a uma práxis que conduza à auto-

organização, fazendo com que os indivíduos se acostumem com o caos e se incomodem

com a ordem:

"É na” fronteira do caos “, que uma organização pode simultaneamente produzir a rotina necessária à emergência da instabilidade necessária à condução eficiente de suas atividades para a mudança”.(Bauer, 1999: 175)

83

Segundo a auto-poiesis tudo o que a organização necessita para se auto-organizar já

nela deve estar contido, o que nos faz retornar à questão do conhecimento

organizacional enquanto produto de sua própria cultura, um constructo feito a partir das

regularidades assinaladas por experiências, num processo de sedimentação cumulativa

e referendado pelas estruturas cristalizadas de referência; tais acervos compõem

representações externas que conferem significação coletiva à organização enquanto,

também, uma ação coletiva e criativa da própria realidade na qual jamais se poderá

olvidar a dimensão de poder:

"A cultura organizacional é concebida como um conjunto de valores e pressupostos básicos expressos em elementos simbólicos, que em sua capacidade de ordenar atribuir significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como elemento de comunicação e consenso, como ocultam e instrumentalizam as relações de dominação." (Fleury, 1982: 22)

Tal visão compartilhada permitirá a definição de problemas na medida em que de um

conhecimento concreto e não abstrato e onde a informação tenha, necessariamente,

sentido interno e externo ao sistema: será a circulação compartilhada dos dados pela

organização que os transformará em informação pela ação indispensável da linguagem

enquanto fator óbvio do mutualismo o que, permitindo a autodescrição (identidade)

cria, espontaneamente, a auto-poiesis. Essa é uma das razões primordiais pelas quais

nos propusemos a estudar os efeitos potencialmente autopoieticos das TCI nas

organizações enquanto poderosíssimas ferramentas de geração de informações, de

transformação e alcance de novas linguagens (Bauer, 1999).

84

2.3 A comunicação organizacional em sua medularidade estratégica

Lembrada a importância devida à comunicação não apenas no contexto das

organizações mas, por correspondência necessária, no contexto de nosso estudo,

convém nos determos sobre ela o suficiente para gerarmos fundamentação às

necessidades de encaminhamento do nosso estudo de caso, tendo sempre em vista

essa dimensão da complexidade que confere às comunicações superlatividades novas

que derivam da importância que elas tem enquanto um dos principais fatores de

catalisação da organização autopoietica já que interativamente.

"É a comunicação que ocorre dentro da organização e a comunicação entre ela e seu ambiente que definem e determinam as condições da sua existência e a direção de seu movimento”.(KROHLIING, 2003: 69).

A importância da comunicação nos estudos organizacionais será enfatizada pelo

nascimento da cibernética por N. Wiener que destacou a comunicação como fonte de

controle na medida que pode transformar a organização em organismo, ou seja, um

sistema integrado controlado em seu comportamento pelo dirigismo e controle das

informações que, por sua vez, controlam as ações enquanto matéria-prima para a

tomada de decisões gerenciais. Hoje, mesmo as ainda muito mecanicistas abordagens,

não ignoram a importância vital de canais de comunicação e linguagens não só como

forma instrumental de expressar as mudanças mas, também, no sentido de viabilizarem

os desafios para o enfrentamento do novo complexo já que o potencial auto-

organizativo de uma organização está em suas redes informais de comunicação

enquanto fonte de geração da massa crítica de informações necessárias ao aprendizado

85

coletivo que dará ao sistema capacidade de sobrevivência em cenários onde, como já

assinalado, o tático e o estratégico se confundem; cenários nos quais não se sabe quais

conteúdos dos repertórios acumulados serão úteis, e onde as organizações são produtos

não de pessoas mas de suas interações. Dessa forma, a comunicação passou a ser vista

como um dos fundamentos de formação da organização, fazendo-a ser o que é. Foi

nesse sentido e com essa premência que os estudos de comunicação empresarial

passaram a ter a responsabilidade de fundamentar as práticas de comunicação que

sustentarão estratégias de negócios o que, por conseqüência, explodiu os limites

acanhados dos modelos de comunicação matemáticos, sistêmicos e cibernéticos

fundamentados no caráter instrumental de uma comunicação verticalizada e autoritária

que, hoje de forma inusitada, ficam, como veremos adiante, ainda mais comprometidos

pelo caráter libertário da comunicação virtual com sua infinitas possibilidades técnicas e

da mudança radical operada pelo enfoque não mais centrado na produção mas no

consumidor, ampliando seu espectro de ação enquanto ferramenta estratégica de

gestão capaz de operar no núcleo vital da organização:

"O conceito de comunicação empresarial tornou-se tão esvaziado que o melhor caminho é destruir sua gramática e pensar e repensar a comunicação e informação como instrumentos de gestão que criam e desenvolvem uma cultura organizacional, na qual todos se sintam envolvidos e, de alguma forma, participantes de um processo democrático no seio da organização”.(Genelot, 1998: 164)

É muito interessante e eloqüente a observação, mesmo que de forma empiricamente

tosca, de como as organizações notoriamente preocupadas com a mudança, procuram

assumir um compromisso com uma coerência comunicacional pela explicitação, para

todos os seus públicos, não apenas de sua missão, o que poderia ser mera decorrência

86

da busca de certificações de propósitos discutíveis, mas de suas responsabilidades

sociais, de partícipes de construtoras de sentidos e da formas da realidade social

subjacente o que, de modo especial e, sujeito a múltiplas intenções, aparece na imagem

da empresa cidadã, dos Serviços de Atendimento ao Consumido e de outros corolários

dessa indiscutível premência de diálogo constante com uma realidade que se

mundializou em rede, que exige que nos preocupemos com o universo simbólico que

envolve nossas vidas e as empresas, do seu clima interno, até ao extremo cuidado com

suas relações institucionais. Quer para se mudar, quer para se manter uma cultura,

subentende-se a necessidade de que normas, valores e concepções sejam conhecidos e

intercambiados dentro da organização de forma tangível e, para tanto, a inevitável

sincronização entre o processo de comunicação e essa cultura que se apresentará,

representará e, eventualmente, se transformará. Em tal perspectiva a comunicação e os

sistemas que a organize são essenciais para o processo de mudança: para Fleury o

mapeamento do sistema de comunicações, sistema este pensado tanto nos meios,

instrumentos, veículos, como na relação entre quem se comunica, é fundamental para a

apreensão deste universo simbólico, e a modernidade organizacional, em seus melhores

modelos, pressuporia a introdução de novos canais de comunicação como ferramentas

efetivas de atuação sobre a cultura organizacional (Fleury, 1996).

r

Ora, a situação deriva perpetuamente sob o efeito das mudanças no ambiente e de um processo ininterrupto de interpretação coletiva das mudanças em questão. Identidade, composição e objetivos das organizações são portanto periodicamente redefinidos, o que implica uma revisão dos captadores e das informações pertinentes que eles devem recolher, assim como dos mecanismos de regulagem que orientam as diferentes partes da organização rumo a seus objetivos. É nessa metamorfose paralela da organização e de seu ambiente que se baseia o poder instituinte da comunicação (Lévy, 1993: 22,23)

87

Será com Genelot (Genelot, 1998) que surgirá a unificação entre os conceitos de

estratégia e de comunicação organizacionais que, destacando a necessidade de uma

abordagem complexa para se entender o incerto, faz a transposição da visão

planificadora da estratégia para a do gerenciamento estratégico e, como conseqüência,

para uma reatividade estratégica enquanto gerenciamento na complexidade das

organizações mesmo porque, para Genelot, o que caracteriza a complexidade, é algo

que não se gerencia e que decorrerá do compartilhamento pelo grupo de uma visão

estratégica, de um processo sempre derivado de uma construção coletiva, de uma

determinada visão e futuro, de uma consciência estratégica que deve decorrer de canais

democráticos de comunicação plena, e de produção de significados onde tais processos

devem ocorrer distantes de quaisquer coações e de distorções: há substancial

concordância de que a comunicação em sua forma tradicional é um mecanismo de

bloqueio das mudanças uma vez que atrofia a aprendizagem e as relações dialógicas.

Essa comunicação democrática, pois fundamentada no diálogo e que tem que permitir

os mesmos direitos, sobretudo, de questionamento, reabilita o receptor em sua

capacidade de gerar sentido e desenvolver procedimentos de interpretação já que,

segundo o autor, o significado da comunicação é dado, em última instância, pelo

receptor em cujo universo simbólico e social acontece a essencialidade da comunicação

e, consequentemente, se comunitária, não mais privilégio dos ditames tecnocráticos de

especialistas e de sua visão míope pois instrumental: enquanto processo de

mutualismos e mediações, ela envolve e representa a troca entre fatores e entidades

88

extremamente heterogêneos pois materiais e humanos, tecnológicos e comportamentais

e que exigem a flexibilidade dos fluidos e a constante consciência da dinâmica dos

seres vivos, o que torna jurássicas quaisquer permanências das antigas concepções

administrativas e de conteúdos positivistas que se insinuam sempre, mesmo que de

forma residual, pela enorme poder de controle que os novos arsenais tecnológicos das

T.C.I. forneceram nos últimos tempos e se renovam com o seu crescimento vertiginoso

de alcance e capacidade, haja vista os roteadores que, operando em terabytes, são

capazes de transportarem os dados da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos em

pouco mais de três segundos:

“... a organização, a empresa não podem ser outras realidades além daquelas cujos modelos são construídos pelos atores. Não é, em si bom, verdadeiro, nem o melhor modelo; em compensação os múltiplos projetos, animados por aqueles que representam ou podem representar a empresa, que ajudou a construir por sua ação, podem construir ricas, inteligíveis e comunicativas representações... expediente difícil de assumir por aqueles que estão acostumados a “raciocinar’” através de longas cadeias de pensamentos bastantes simples... deduzindo uns dos outros."(GENELOT, 1998: 3,4)

Neste mundo marcado e muito preocupado com a mudança, cabe lembrar que parece

não haver dúvida da importância da relação entre comunicação e mudança nas

organizações, relação de caráter imbricativo, simbiótico e de difícil separação e que

constitui, por si só, fulcro vital para a compreensão de parcelas essenciais de nossa

realidade; quer a mudança verticalizada, autoritária, redundante e suicida por não

democrática e não auto-poietica, quanto àquelas concepções que vêem a empresa

enquanto um espaço primário de relações humanas:

"As organizações empresariais são micro-sociedades em que a comunicação é considerada como elemento estruturante (Bourdieu, 1989) da dinâmica organizacional, tendo aí um papel integrativo. Nessa visão o foco é no caráter social e contextual da

89

interação (não mais no caráter técnico) na influência recíproca dos agentes em interação significativa”.(Reis, 2001: 7).

No início dos anos noventa, Linstead destacava a necessidade de se estudar a

desconstrução das práticas discursivas na vida organizacional, assinalando o

desenvolvimento de uma etnografia desconstutiva para se estudar as tensões entre

organização e desorganização; preocupação que se baseava na perspectiva de que as

organizações são continuamente emergentes, constituídas e constituintes, produzidas e

consumidas por sujeitos que, enquanto são as organizações, são eles próprios trilhas e

lugares de intertextualidade. Tais iniciativas, à época em que apareceram, ainda que

marcadas por um viés muito arrojado e distante da práxis gerencial, já apontavam para

um movimento que, açulado pelos ritmos das mudanças, se faz presente nas atuais

preocupações dos estudos das organizações, não apenas enfatizando a importância da

comunicação, mas conferindo-lhe dimensões novas (Mumby, 2001).

Se hoje existe unanimidade na literatura especializada mais conservadora sobre a

importância instrumental das comunicações nas iniciativas de negociação e nos

processos de mudança onde, quanto maior for a capacidade de comunicação, mais

efetiva será a mudança almejada enquanto um corolário natural, da mesma forma,

parece que a teoria que deveria justificar essa correlação ainda é pouco consistente,

quer talvez porque veja a questão apenas pelo viés da teoria da comunicação, quer

talvez porque o faça pelo viés da Teoria das Organizações, sem que se consiga uma

abordagem integradora das duas áreas de estudos que tratam seus objetos enquanto

fatores distintos. Com essa preocupação metodológica Maria do Carmo S. Reis nos

90

oferece uma preciosa reflexão sobre as relações comunicação organizacional e

mudança:

“No (micro) ambiente organizacional onde a mudança transformacional está sendo implementada, estruturas são promovidas, impostas e negociadas. Nesse sentido as iniciativas de comunicação corporativas podem ser vistas como estruturas que provém visibilidade (intencional ou não) ao padrão corporativo de negociação. Elas são circunstâncias no sentido Giddensiano. Elas são encontros e episódios em que algumas ações e discursos são tecidos com a voz corporativa. Apesar de serem estruturas, elas são não apenas o veículo ou manifestação da comunicação (Watzlawick & Beavin, 1967), mas um elemento integral de troca significativa”.(Reis, 2003: 9, 10).

Em uma de suas conclusões, a supracitada autora afirma que a comunicação e a

mudança organizacional estratégica têm uma inter-relação de natureza imbricativa que

pressupõe interseção e não apenas conexão, o que se denota tanto quer na mútua

constituição dos processos, quer na sua mútua expressão (Reis: 2003, 12). O que ganha

uma magnitude ímpar quando remontamos as organizações ou os segmentos

organizacionais num contexto que têm tratar com a incerteza, com a complexidade e

com tecnologias que não facilitam e, até mesmo, impedem a rotinização; assim, mesmo

que exista uma comunicação sistematizada e formalizada, não se terá segurança de

solução da problemática enfrentada nessa área, já que a complexidade crescente torna,

igualmente complexas, as tradicionais barreiras que a comunicação enfrenta,

possibilidades que aparecem pelas combinações multiplicadoras de meios de

comunicação e das conseqüências dessas combinações nas estruturas essenciais das

organizações: o conviver dos “vai-e-vem”, com os comunicadores eletrônicos via redes

corporativas ou não; as inusitadas combinações entre as linguagens das mensagens dos

murais informais e toscos e a ampla gama de recursos e informações transportados

pelas infovias:

91

Porque transformam os ritmos e as modalidades da comunicação, as mutações técnicas de transmissão e de tratamento das mensagens contribuem para redefinir as organizações. São lances e "metalances", se podemos falar assim, no jogo da interpretação e da construção da realidade (Lévy, 1993: 23)

Ainda no caminho proposto de se obter a fundamentação mínima necessária para

subsidiar nossos esforços de análise, devemos abordar alguns aspectos elementares da

comunicação dentro das organizações, acrescentaremos de modo essencial, aqueles

mais relevantes em nosso caso: barreiras mecânicas ou físicas - aparelhos, ruídos,

equipamentos etc - muito valorizadas nas antigas abordagens tecnicizantes típicas de

concepções onde os meios de comunicação, assim como outras ferramentas, seriam a

solução para que os objetivos para os quais eles foram criados fossem alcançados;

barreiras semânticas produzidas pelo uso inadequado de linguagens desconhecidas ou

pouco conhecidas pelos receptores: estas, de mais difícil percepção pelos antigos

gestores mecanicistas e que, com o despertar para a gestão na complexidade,

ganharam a importância devida; as barreiras psicológicas compostas, entre outros, por

estereótipos, preconceitos e que têm vida e poder de morte na cultura organizacional e

que, com o já mencionado crescimento das preocupações que gravitam a questão,

também mereceram especial atenção; as barreiras administrativas/burocráticas

decorrentes do modo como as organizações atuam e processam suas informações e

que, muitas vezes, são "pioradas" pelos excessos ferramentais - estas "antigas

conhecidas" da comunicação, tendo ganhado, como já mencionamos, nova dimensão

pelo seu envolvimento no universo informacional; o excesso de informações igualmente

e superiormente produzido pelo advento das TCI que tornaram o caudal de informações

sufocante, provocando um novo tipo de alienação, a "ignorância pelo excesso" de

92

informações não elaboradas, inúteis, destituídas de sensação e, portanto, apenas ruído;

as barreiras geradas pelas comunicações incompletas e parciais, produtos da

confluência de um complexo de fatores muitos dos quais já apontados e que podem

apresentar sempre novas e mais intrincadas composições sobretudo quando acelerados

pela nova velocidade e por eventuais dificuldades técnicas das TCI. Ainda merecem

lembrança aspectos como as dificuldades produzidas na comunicação pelos "dialetos

intra-grupais" característicos das estruturas informais, cuja importância cresce com as

carências de comunicação dos canais formais e que ganharam proporções, sofisticação

e alcance inusitados nesse novo contexto tecnológico; as limitações da "audição

seletiva" enquanto formas subjetivas de censura que podem ser incentivadas ou

atrofiadas por algumas características da organização. Por fim, a credibilidade das

fontes e as pressões do tempo que catalisam e são catalisadas pelo encontro compósito

de outros obstáculos à comunicação de várias barreiras citadas ou não. (Konssch,

2003: 74, 75, 76).

Voltando a mencionar a nova e poderosa onda de estudos preocupada com uma nova

forma de riqueza, o capital intelectual, concentrada na Gestão do Conhecimento e que

tem como um dos cernes nevrálgicos a comunicação, lembramos quando o Centro

Organizacional da Complexidade da IBM (CYNEFIN) assinalou um novo movimento na

gestão do conhecimento. Tal corrente inovou por sua proposta de tratar o

conhecimento não mais apenas como um objeto mas como um fluxo, um fluido

conversacional de onde as decisões decorreriam da observação e do diálogo. De acordo

com esse modelo, o fluxo do conhecimento interno à organização depende do

93

reconhecimento de padrões de comunicação e interação nas práticas organizacionais.

Tal modelo preocupou-se em gerir variadas formas de transmissão e conteúdos, ou

seja, de comunicação: tanto aquela focada no ensino de baixo nível de abstração pelas

intranets, o que é discutível, quanto aquela abstração mais sofisticada e baseada em

simulações e jogos, bem como o aprendizado espontâneo fundamentado na

informalidade e na abstração. Se na ótica dos pensadores da complexidade tal

abordagem não apresenta, efetivamente, grande novidade, é significativo, de qualquer

forma, como os "gigantes do mercado" não se descuidaram do assunto, isto porque, só

mais recentemente, foi que a gestão do conhecimento e as reflexões que dela nasceram

saíram da academia confirmando em definitivo a importância das comunicações nesse

novo universo dos estudos e das práticas organizacionais (Kujawski, 2005).

Ainda que de forma simplista, gerir para gerar essa nova riqueza, o conhecimento, hoje

aceito como o principal fator de produtividade e de competitividade é, num primeiro

mas essencial e difícil esforço comunicacional, construir uma linguagem que é algo além

de coordenar comportamentos é, segundo Varela e Maturana (Maturana e Varela,

1995), uma coordenação de coordenações de comportamento, ou uma comunicação a

respeito de uma comunicação e que permite aos homens efetuar distinções de

distinções no sentido de apurar noções compartilhadas da realidade; dessa forma a

linguagem comum, sempre dificultada pelas distorções da crescente especialização, é

uma história de mutualismos de orientações que deram certo dentro de um grupo o que

vai permitir que, a partir de um substrato comum, se conserve e se crie conhecimento

pela capacidade de descrever e reinventar em conjunto a realidade fazendo com que o

94

conhecimento latente nesse grupo se torne patente; será o domínio de uma linguagem

e a eficiência dele derivada que conferirão a sinergia ao grupo/sistema para efetivar

esse potencial de troca de informações pessoais, "não-estruturadas", não padronizadas

dos bancos de dados, gerando conhecimento a partir das regularidades observadas pela

experiência, um dos fatores importantes de gestação da auto-poiesis.

Confirmando e finalizando essa correlação conhecimento/comunicação, lembramos

Nonaka (Nonaka e Takeuchi, 1997) para quem as condições necessárias para se colocar

a organização em condições de produzir conhecimento passam pelo que chama de

Método SECI - socialização, externalisação, combinação, internalização - e, sobretudo,

pela emergência de um ba, conceito japonês que significa um espaço físico, virtual ou

mental dentro do qual o conhecimento é gerado, partilhado e utilizado e que,

diferentemente de muitos, questiona a gerenciabilidade do conhecimento bem como o

reduz à ação humana o que nos permite voltar e concluir com Genelot: o essencial no

processo de comunicação se dá sempre no universo simbólico e social do receptor,

construído por meio de atividades cognitivas, do ambiente social e das estruturas

organizacionais e cujo significado, em última instância, é conferido pelo receptor. E se a

gerenciabilidade do conhecimento pode ser questionada, numa medida mais ampla e

necessária, é adequado lembrar Drucker (Drucker, 1994: 142) quando se refere que o

nosso pouco domínio sobre o comportamento econômico do conhecimento nos

impossibilita de ter uma teoria econômica sobre ele e muito menos usar as existentes.

95

Na continuidade de cobrir teoricamente as áreas que constituíram o cerne de nosso

estudo de caso, focalizamos algumas das questões que envolvem comunicação e poder

dentro das organizações. Numa certa arqueologia do tema, recuperamos os trabalhos

de Michel Foucault que, desde a década de setenta, brilhantemente dava ao tema

enfoques inusitados e que, sobretudo em nossos dias, ganharam desconcertante

atualidade. Os trabalhos de Foucault foram usados pelos estudos em comunicação

organizacional como uma forma de se examinar as organizações enquanto locais de

poderes disciplinares e das micropráticas disciplinares; neste viés, o poder não é uma

imposição verticalizada, não emana de uma única fonte de dominação, nascendo em

vários locais e de inúmeras formas funcionais. Tais controles, naturalmente encontrados

nos trabalhos em equipes, nascem de um engajamento intenso, do autoconhecimento e

da observação, designados por Foucault como panopticismo: um poder produzido pela

prática cotidiana de um discurso que constrói membros parecidos de uma equipe, que

gera a homogeneização. É uma forma de poder que não coíbe, não impede, produz

identidades, cria conhecimentos e possibilidades para a geração de determinados

comportamentos; assim, poder e conhecimento e, conseqüentemente, comunicação,

estão intrinsecamente interligados no que o autor chama de poder do

regime/conhecimento.(Foucault, 1998). Bastaria que, num muito singelo esforço

retrospectivo, olhássemos tudo o que se tem feito nas últimas décadas nas áreas

genericamente chamadas de treinamento para que o panóptico de Foucault justifique a

importância a ele dada enquanto constantes e caros programas de conversões às

culturas organizacionais; da mesma forma, se observamos as possibilidades que as TCI

96

adicionaram a essas multifacetadas formas de poder, enquanto verdadeira mutação na

comunicação, verificaremos que elas tiveram uma importância fundamental naquelas

que deveriam ser as novas formas organizacionais; teriam ajudado a plasmar o seu

caráter mais flexível e horizontalizado de um modo mais silencioso e, assim, menos

perceptível de seus novos e mais eficientes controles: essas novas formas de poder

estariam, numa etapa subseqüente a esta, que pensamos ser um dos desafios a que

gostaríamos de nos dedicar em outros trabalhos e que, certamente, ofereceriam amplas

possibilidades de pesquisa a colegas mais competentes.

Nas novas perspectivas de análise nascidas da visão de Foucault quanto a essa relação

comunicação/poder organizacional, em sua tarefa diária de integração, a comunicação

surge como um mecanismo no qual esses grupos representam o seu próprio poder que,

dessa forma, se retroalimenta; um poder que existe como produto de um sistema de

intersubjetividade do significado criado pela equipe em suas práticas de comunicação.

Se tais interpretações contêm uma certa dose de excesso no sentido da enfatização do

aspecto comunicacional, por outro, nos dão os elementos necessários para

confirmarmos o acerto de nossas preocupações uma vez que não há como negar a

importância essencial e crescente das comunicações no seu relacionamento constitutivo

com a identidade, poder e organização, extrapolando enormemente suas primitivas

funções informativas de decisões, rotinas e mudanças: de certa maneira, a implantação

de mudanças, uma das tradicionais tarefas da comunicação organizacional, é o núcleo

vital de residência das ações do poder. Ainda de acordo com essa visão de poder, seria

97

ele permeador das relações, produzindo as pessoas, gravitando ao redor da produção e

transformação e manutenção de significados. Nesse sentido, há que se estudar,

segundo o autor, o quanto as práticas de comunicação constroem identidades,

experiências e maneiras de conhecimentos que possam servir para outros interesses

bem como gerar novas formas de conhecimento. Do mesmo modo, se as organizações

são reconceitualizadas como lugares discursivos de formação de identidades e criação

de significados, as possibilidades para a sua compreensão ficam expandidas, podendo

ser entendidas como comunidades de comunicação nas quais o desafio dos estudiosos

será tentar compreender como certos discursos se articulam e criam sistemas de

significado de poder; locais habitados por numerosas e simultâneas posições

discursivas, onde as subjetividades serão disciplinadas, os processos serão normatizados

e os regimes de poder instituídos. E será nesse sentido de comunidades de

comunicação que o espaço virtual, insistimos, operou a mutação que Lévy prenuncia e

anuncia como o fulcro da mutação civilizatória que vivemos:

Não percebe que sua maneira de pensar, comunicar-se com seus semelhantes, e mesmo acreditar em Deus(como veremos mais adiante neste livro) são condicionadas por processos materiais... hoje, cada vez mais concebemos o social, os seres vivos ou os processos cognitivos através de uma matriz de leitura informática (Lévy, 1993: 10).

98

2.4 As organizações em espaços virtuais: facilitações e dificultações pelas

TCI

Mesmo correndo o risco de abrir, em nossa dissertação, por descuido ou ignorância,

alguns flancos metodológicos desprotegidos, não pudemos deixar de dedicar, nesta

seção, espaço para algumas constatações e outras poucas reflexões sobre o como e o

quanto a atual complexidade das organizações é resultante da entrada das TCI (apesar

de tardio e redundante, é confortável lembrar que, por tecnologia da comunicação e da

informação entende-se um vasto conjunto de instrumentos utilizados para o tratamento

da informação, computadores, programas, redes de comunicação eletrônicas, redes

digitais de serviços, tecnologias de telecomunicações, protocolos de transmissão etc) e

do que se convencionou designar de ambiente virtual, sobretudo por ser nesse espaço

onde acontece o nosso caso e por ser, essa mesma virtualidade, irrecusável porém

arriscada, o espaço da maioria das aventuras e desventuras na busca de entendimento

desse nosso singular tempo: e nunca será demasiado lembrar que, por hora, se

encontra no espaço virtual o enigma desafiador dos limites da inovação e das pouco

estudadas conseqüências dela.

Nossa civilização e, por corolário óbvio, todas as organizações humanas, foram, a partir

da segunda metade do século XX, vítimas de uma das mais violentamente demolidoras

e profundas invasões, a chegada das TCI que, num primeiro momento, vieram em apoio

às linhas de produção logo se estendendo aos setores de marketing e, em seguida, se

99

infiltrando em todos os mais recônditos redutos de nossas privacidades. Falar dos

atributos essenciais dessas novas tecnologias, ainda que tautologia necessária, tem

sido, em toda a grande maioria da literatura que gravita o tema, uma espécie de

panegírico mais ou menos declarado aos seus poderes messiânicos, quando o epicentro

da questão, desfocado pelos novos recursos oferecidos, reside na mudança

paradigmática que surge do uso das TCI, sobretudo, nas possibilidades derivadas da

descentralização organizacional, pela democratização de acesso aos bancos de dados,

pelas possibilidades panópticas e palinódicas de comunicação e outras tantas qualidades

que escapam daquelas usualmente apontadas como a velocidade, a capacidade de

memória: ou seja, na questão comportamental da comunicação humana, lócus onde o

administrador sempre será de um conservadorismo oposto à sua incrível facilidade de

aceitação de novos instrumentos o que, portanto, deve nos preocupar enquanto foco

não completamente estudado de problemas criados pelo imediatismo do lucro e da

concorrência. Nada aparentemente mais natural e, portanto, aceito do que as

incomodações, as desacomodações e mesmo as violências operadas pela implantação

verticalizada nas organizações de sistemas, muitas vezes, exatamente na contramão da

almejada flexibilidade/democratizante/descentralizadora dos novos modelos que

poderiam ser criados na matriz cibernética: é bem possível que, em muitas dessas

"empresas modernas", só exista papel nos banheiros mas, também, não é improvável

que tais sanitários sejam divididos, hierarquicamente, em áreas diferenciadas

simbolizando os status de estruturas rígidas e autoritárias, apontando, quiçá, para

aquilo que anteriormente designamos como uma nova burocracia digital, em toda a sua

100

capacidade eletrônica de controle e hierarquização diferenciadas e dissimuladas o que,

caso procedente, esperamos ser uma doença infantil dessa transição paradigmática dos

modelos administrativos mas a que, insistimos em convidar, se voltem com mais

cuidado nossos olhos: a convivência com o muito novo e ofuscante das novas

tecnologias pode nos impedir de ver como velhas estruturas se escondem e sobrevivem,

numa espécie de espaço paralelo, mantendo estilos administrativos aparentemente

incompatíveis com as novas realidades e que, muitas vezes, podem ser a causa do

malogro ou da não esperada eficiência da inovação tecnológica e onde o potencial de

interatividade da multimídia é anulado pela incomunicabilidade entre os níveis

hierárquicos rígidos.

Ainda que muito mencionado até aqui, é importante retomar um conceito base na

precisão própria dos cânones: segundo Lévy (Lévy, 1996), a virtualidade é uma

dimensão compreendida como o que existe em potência e não em ato, resultante do

uso das TCI mas que as ultrapassam amplamente e tendo como características básicas

a superação das barreiras do tempo e do espaço e o que se convencionou chamar de

efeito moebius ou seja, a possibilidade de se passar do interior para o exterior, do

público para o privado, do objetivo para o subjetivo enfim, possibilidades de permear

limites anteriormente fixados e fixadores. Virtual que não se opõe ao real mas ao atual

enquanto nó de tendências, complexo problemático e dinâmico que segue uma

situação, acontecimento, entidade ou objeto que, de seu lado, carregam e produzem

sua virtualidade, uma elevação à potência da entidade considerada:

101

"Assim, a virtualização da empresa consiste sobretudo em fazer das coordenadas espaço-temporais de trabalho um problema sempre repensado e não uma solução estável. O centro de gravidade da organização não é mais um conjunto de departamentos, de postos de trabalhos e de livros de ponto, mas um processo de coordenação que redistribui sempre diferentemente as coordenadas espaço-temporais de coletividade de trabalho e de cada um de seus membros em função de diversas exigências."(Lévy, 1996: 18)

Nada tão desconcertante e inspirador quanto o que se pode tirar de afirmações como as

acima citadas que indicam, em todo o purismo do filósofo, aquilo que é a essência da

questão, quando fazemos as correlações desse universo virtual com suas manifestações

concretas na vida intestina das organizações, onde instrumentos e idéias, numa

convivência caótica do cotidiano, ganham imprevistas dimensões e desobedecem aos

desejos de nossos devaneios ideológicos colocando, sem que nos demos conta, em risco

nossas próprias identidades. Se não, vejamos: as redes enquanto estruturas abertas

capazes de se expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam

comunicar-se, ou seja, desde que compartilhem os mesmo códigos de comunicação

(Casttels, 2000: 498), tanto são capazes de revelar quanto de omitir, de informar

quanto de desinformar, de descentralizar quanto de centralizar uma vez que não se

pode perder a dimensão de que, nesta Sociedade da Informação, o domínio do

conhecimento e, evidentemente, das redes, será a forma de controle, sobretudo

porque estas, permitindo construção e desconstrução contínuas, suplantação do espaço

e invalidação do tempo, permitem a reorganização rápida e drástica das relações de

poder o que não é desconhecido quer pelos seus arquitetos e, muito menos, pelos seus

proprietários mas de cujos efeitos finais nem ao menos se perguntam:

102

"Aproximamo-nos de uma mutação espantosa no conhecimento: este está cada vez menos preparado para ser refletido e discutido pelos espíritos humanos, e cada vez mais preparado para ser incorporado nas memórias." ( Morin, 2001: 18)

Do mesmo modo, as boas intenções no sentido de se buscar nas TCI o que de melhor

possam oferecer na construção do "novo paradigma organizacional-virtual", morrerão

no desconhecimento de que o espaço virtual é mediado e compreendido pela cultura,

como um processo social de modo a nos fazer voltar à velha questão da cultura

organizacional enquanto um dos núcleos da transformação e não tão servilmente sujeita

ao mecanicismo instrumentalista dos adoradores das tecnologias; a simples perda da

dimensão do computador enquanto mero meio de comunicação, enquanto extensão

humana possibilitadora de múltiplas interfaces, tem desfocado a questão central

cultura/comunicação, comprometendo no nascedouro possibilidades efetivas de

construção da organização auto-poietica enquanto gerada e geradora de conhecimento

em circularidade, conhecimento organizador; enquanto uma leitura e reescrita

conscientes do mundo fundamentadas em uma ação consciente ético-crítica (Freire,

2001); local onde o espaço virtual seja, essencialmente, um novo espaço de interação

humana e de multivocalidade, jamais o domínio de máquinas pensantes, onde a

inovação aconteça a partir de uma nova concepção do ambiente de trabalho e da

organização social da produção e não como mera substituição de procedimentos

técnicos que escapam ao controle humano em suas conseqüências totais pois

universalizadas, descontextualizadas e desenraizadas de identidades culturais: o meio

gerador da inteligência coletiva de Lévy.

103

O uso pleno dos potenciais do espaço virtual, como tanto tem se anunciado, propiciaria

uma revolução estratégica e gerencial nas organizações se um volume cada vez maior

de informações criadas pelos partícipes da rede se combinasse, em tempo real,

formando-se em um sistema flexível, sobretudo quando se aceita que toda a estratégia,

como toda a teoria, é uma simplificação que necessariamente distorce a realidade e

que, estratégias e teorias, não são realidades mas, apenas, abstrações ou

representações da realidade nas mentes das pessoas e , em tese, mais dúcteis do que

as realidades concretas apesar da dureza ideológica que as defende e a seus outros

interesses. (Mintzberg, 2000: 22).

Nesta busca de um pano de fundo que, muito mais do que alicerçar nossa dissertação

teve a intenção de nos conferir conhecimento em áreas onde nossa ignorância era ainda

mais aguda, sempre que possível, nos obrigamos a uma parada reflexiva pela sensação

incômoda do equilibrar à beira do abismo e pelo prazer intelectual da aventura: se

ficamos honestamente seduzidos pelo poder democratizante do espaço virtual de Lévy,

capaz não apenas de criar a inteligência coletiva universal fundamentadora de uma

também mundial democracia; se nos extasiamos com um efetivamente poderoso

ferramental eletrônico capaz de viabilizar o entendimento e a gestão da complexidade,

por outro, ainda que da forma pouco simétrica e metodologicamente descuidada, não

podemos perder a dimensão do usuário das tecnologias, assoberbado e tiranizado pelos

ditames de sua introdução autoritária, realidade, infelizmente, mais presente do que os

benefícios oníricos anunciados pelos nossos guias intelectuais mas que, algumas vezes,

104

em paralelo a esse entusiasmo de desbravadores, mantém o contato com as pedras do

chão:

"O ciberespaço: nômade urbanístico, gênio informático, pontes e calçadas líqüidas do Espaço do saber. Ele traz consigo maneiras de perceber, sentir, lembrar-se, trabalhar, jogar e estar junto. É uma arquitetura do interior, um sistema inacabado dos equipamentos coletivos da inteligência, uma estonteante cidade de tetos de signos”.

Aqui se assinala a aresta inevitável do contraponto na essência do discurso do mesmo

pensador:

"No que concerne às aparelhagens de comunicação e de pensamento, negligenciamos a dimensão da interioridade, de subjetividade coletiva, de ética e de sensibilidade que envolve as decisões aparentemente mais técnicas”.(Lévy, 1998: 105, 106).

Na busca vital de se evitar a obsolescência, a “tecnoangústia” faz com que se perca a

dimensão mesma do processo de mudança exitoso onde a dimensão estratégica

norteadora do movimento inovador, deve delegar parte das inovações como parte de

um processo permanente de comunicação das visões da mudança e estabelecendo

novos métodos na cultura (Kotter, 1997). Se a grande parte das ações estratégicas que

assistem às mudanças contempla aspectos inerentes à insatisfação pessoal,

insegurança, desânimo e suas conseqüências na produtividade, de outro lado, não se

observam as mesmas preocupações com os efeitos sobre o clima e a cultura

organizacionais o que fica, mais do que patente, na análise das inúmeras ações de

comunicação que precedem, informam e mantêm as mudanças e cujo escopo primeiro é

o de implementar/impor e atenuar os impactos causados e cuja confirmação se

consubstancia no caráter inócuo ou na inexistência paralela de mudanças

administrativas qualitativamente consistentes. É usual, corriqueiro e de um fatalismo

105

inaceitável, se aceitar a violação cultural criada pela inovação como um dado de

modernidade irrecusável, sobretudo quando, ao menos em tese, todos aceitam a

importância do clima e da cultura das organizações para sua sobrevivência, o que se

agrava quando a inovação é operada no cerne mesmo de difusão da cultura, na

comunicação, sem que se queira perscrutar a extensão das transformações

provocadas:

Vivemos hoje uma redistribuição da configuração do saber que se havia estabilizado no século XVII com a generalização da impressão. Ao desfazer e refazer as ecologias cognitivas, as tecnologias intelectuais contribuem para fazer derivar as fundações culturais que comandam nossa apreensão do real (Lévy, 1993: 10).

Essa interveniência das TCI não apenas naquilo que Lévy chama de ecologias cognitivas

mas, como ele mesmo previne, nos processos de subjetivação individuais e coletivos

gera toda uma gama de novidade que extrapola de muito os limites das inovações

técnicas no bojo das quais o efetivamente novo viaja tal qual um clandestino

responsável pelo motim organizacional; as mudanças técnicas, por si mesmas, na

medida em que atingem a comunidade cognitiva, implicam em renovações analógicas e

classificatórias que, olvidadas, são causas de sérias disfunções organizacionais. É

bastante comum o divórcio entre a cultura organizacional e seus valores da prática

organizacional no afã de modernização, incorporando novos sistemas muitas vezes no

encalço de uma melhor imagem de mercado e maior legitimidade: sistemas impostos

"top down" passam a conviver de forma inadequada com formas de controle

conservadoras baseadas no cumprimento rigoroso de normas e de estrita vigilância que,

no mínimo, mais do que anacrônicas, são visceralmente opostas à liberdade dos

espaços virtuais dispendiosos e equivocadamente introduzidos (Protil, 2003). É de

106

causar incontrolável curiosidade o dado revelado nos idos de 1999 de que 90 % das

grandes empresas brasileiras já possuíam um Sistema Integrado de Gestão Empresarial:

considerada a época em questão, o universo mental que caracterizava as elites

gerenciais bem como o caráter integrador dessa ferramenta de gestão, como teriam

sido os efeitos disfuncionais de tal surto de modernidade tecnológica e da conseqüente

adaptação às novas lógicas processuais do sistema?

De toda a forma, mesmo quando se trata da questão humana na introdução das TCI,

fica muito patente que a esfera das disfunções fica restrita às questões de

implementação, manutenção e motivação para a mudança sem que se tenha vislumbre,

ao menos no grosso das experiências, de análises mais demoradas ou menos

epidérmicas dos efeitos dessas ferramentas informacionais numa incômoda e

persistentemente postura mecanicista:

Nesse sentido o modelo de Scott Morton (1991) ilustra as dimensões a serem consideradas ao se pensar o uso da Tecnologia da Informação. O papel da gestão na mudança implica administrar os elementos fundamentais: estratégia, estrutura, tecnologia, indivíduos e processo, de forma a obter sinergia para enfrentar a turbulência ambiental e alcançar os objetivos organizacionais (Zanela, Soares, 1999: 5).

Se a complexificação inevitável das novas conecções informacionais tornará o ambiente

organizacional mais instável, as dificuldades gerenciais nascidas dos obstáculos de

compreensão desse ambiente obrigarão a movimentos de descentralização e de

desburocratização cujo horizonte final necessário deveria ser a organização flexível e

que, de seu lado, não se submete às táticas de treinamento e doutrinação que

precedem e tem acompanhado os processos de inovação informacional que, em si, não

107

produzem diferencial competitivo mas são, seguramente, incômodos em vários graus de

profundidade e de intensidade no clima e na cultura organizacionais. Tais alterações

começaram a ocupar a atenção dos estudiosos, no final da década de 90, sob a

designação pomposa de mudança de paradigma (Silveira, 2001: 2) o que acabou por

agasalhar uma série de concepções, muitas vezes, muito pouco transformadoras dos

fundamentos básicos do campo de conhecimento, das regras do jogo que caracterizam

tais mudanças mas que se constituem em bordões de amparo para uma série de

reformas de conteúdo técnico/financeiro, de caráter imediatista e conteúdos éticos

inexistentes quando se pensa nas questões pertinentes ao trabalho e ao consumidor

grosso modo: fala-se em um novo desenho e estratégias organizacionais diferenciadas;

fala-se em novos parâmetros para a customização dinâmica de produtos e serviços;

assinala-se, com encanto, o surgimento do encontro virtual com o consumidor e em

comunidades eletrônicas de consumidores; mencionam-se os ganhos das cadeias

virtuais de suprimentos onde, apesar de tudo, não conseguimos detectar o caráter

qualitativo das alterações paradigmáticas, o que fica mais claro, quando se trata do

incentivo ao conhecimento que pressupõe ações tipicamente restritas ao âmbito da

criação técnica e bastante distantes da amplitude do espaço virtual de Lévy, vislumbra-

se uma preocupação com mudanças não rupturistas, observa-se o cuidado com a

descontinuidade como se pudéssemos confinar, na estreiteza dos espaços burocráticos,

mudanças tão medulares (Steil e Barcia, 99: 6, 7).

108

Os novos arranjos estruturais operados nas organizações oriundos da eliminação das

barreiras espaço-temporais tem sido fontes de incontáveis ilações sobre as novas

formas de gerenciamento e de interações organizacionais; o confronto de algumas

fórmulas inovadoras exitosas com a grande maioria conservadora pareceu criar um

silêncio constrangedor que, vez por outra, foi rompido por discretos ruídos advindos das

antigas estruturas sendo devoradas vorazmente pela antropofagia tecnológica: é

sempre muito interessante, para nós, estrangeiros da academia, notar o brilho de inveja

e medo nos olhos das gerências das áreas financeiras, mais resistentes às mudanças,

quando se descreve a fluidez estrutural de uma Microsoft com suas possibilidades de

trabalho doméstico, com sua revoltante liberalidade hierárquica e, sobretudo, com seu

modo impudicamente natural de produzir e assimilar a inovação tecnológica.

Retomando e completando em outro um aspecto já mencionado, a interoperabilidade

informacional, criando imprevisíveis teias comunicacionais isentas de restrições

hierárquicas ou, ao menos, de difícil sujeição a elas, podendo operar com níveis

praticamente nulos de intermediações, estaria em rota de colisão inevitável com todas

as formas burocratizadas de poder até mesmo as mais discretas onde a média gerência

quase se confunde com a linha na tentativa de interpretar e comunicar os níveis opostos

da organização: nada tão rápido, cheio de atalhos encurtadores, fluido, adaptável e

potencialmente informalizante quanto a navegação na rede. Tal processo inevitável de

desfibramento do poder em sua essência nos obriga, uma vez mais, a voltarmos aquela

que é, efetivamente, a questão central não apenas das mudanças paradigmáticas mas,

109

também, é apontada como a saída para que se mantenham controles nessa organização

de natureza indômita: passa-se da preocupação nos investimentos às práticas voltadas

à socialização enquanto instrumentos de um processo de habilitação comportamental

para que se consiga comprometimento, lealdade e internalização das normas

organizacionais, tudo isso de forma não explícita (Steil, Barcia, 99: 11). Esta visão pueril

seria o esboço da nova face do poder se a tarefa de moldar materiais fluídos e forças

desconhecidas, como os gerados em espaços virtuais, fosse tão simples.

De outra forma, essa ênfase no desenvolvimento de valores diretivos da vida

organizacional virtualizada, dada sua natureza pouco explícita, tem sido apontada como

mais adequada para o controle da inovação e da produtividade dos trabalhadores do

conhecimento o que, de nossa parte, sugerimos ser outra das manifestações do que

chamamos de burocracia digital que, sem grandes luzes para prosseguir, diríamos a

forma sofisticada e perigosa de utilização das TCI para fins de controle uma vez que

lidam com potencialidades desconhecidas e desmesuradas; já que as formas mais

explícitas de utilização dos controles informacionais revelaram sua potencialidade para

enrijecer a cadeia escalar, fortalecer os níveis hierárquicos, a centralização e o

formalismo, ou seja, reconfigurações do poder burocrático hora fortalecido pela

sofisticação e alcance das TCI.

Mas se as turbulências e mutações, instalando a complexidade na vida das

organizações, obrigam como fórmula redentora a adoção do gerenciamento estratégico

110

enquanto construção coletiva de pessoas engajadas e não simples decisão tecnocrática

(Genelot, 1998), como manter o entulho autoritário mal disfarçado por remendos

tecnológicos sem gerar monstrengos organizacionais? Ou melhor, haveriam condições

para o advento da ruptura conceitual necessária à criação desse gerenciamento, já que

o gerenciamento estratégico marca uma oposição frontal à idéia de uma autoridade

central que pensa, decide e determina? Como fazer nascer, pelo fórceps dos

tecnocratas, um sistema complexo de interações integrador de centro e periferias,

quando a preocupação central ainda persiste em ser o controle, elemento de

esterilização da consciência estratégica, cerne forma do gerenciamento na

complexidade? Complexidade tão irrecusável quanto a explosão dos modelos de

gerenciamento que não dão conta dela, quanto a incapacidade de nossos sistemas de

representação.

Uma das linhas interpretativas para o entendimento desse apelo aflito, e nem sempre

adequado, das empresas à solução tecnológica seria a situação incômoda que elas

viveriam, segundo Genelot (Genelot, 1998), já que concentrariam a complexidade por

estarem na confluência entre o econômico, o técnico e o social, cada um deles com

níveis altos de complexidade que se potencializa no encontro final. Desse modo e por

muitas outras razões, as TCI estarão, por muito tempo, no centro das questões

organizacionais já que, a um só tempo, artífices, produtos e caminhos para

complexidade, razões pelas quais aqui nos quisemos e aqui conduzimos este segmento

final que deverá conduzir à nossa pesquisa.

111

Em nosso primarismo intelectual dentro do tema, não conseguimos evitar um misto de

estupor e desencanto quando, após Morin, Lévy, Genelot, vasculhando a literatura

produzida sobre o universo organizacional e as TCI, encontramos um volume

proporcionalmente inaceitável de trabalhos que desconsideram a teia incrivelmente sutil

e complexa das relações operadas nas organizações em espaços virtuais e que são

designadas genericamente por teorias deterministas, segundo as quais, as tecnologias

determinariam a modelagem da sociedade com níveis pequenos de influência dela,

como se a tecnologia possuísse vida própria e autônoma. Discursos mecanicistas e de

um racionalismo positivista defendem o tratamento da informação como um produto,

constante, previsível e estável, capaz de manter e viver em estruturas rígidas. Mesmo

quando consideramos as redes corporativas, as intranets, que nascem mais modeladas

pelas estruturas das organizações, dificilmente poderíamos ter segurança quanto aos

limites de sua influência: se desenhadas e implantadas de forma inadequada

provocarão, num primeiro momento, a hipertrofia dos canais informais que, numa etapa

imediata, se valerão da própria rede para alterar suas configurações e/ou

administradores indesejáveis; se desenhadas dentro do perfil estrutural da organização,

serão rapidamente assimiladas, agilizando e diminuindo rotinas e deixando sua enorme

capacidade de produzir informação à mercê dos anseios organizacionais cujos limites e

direções constituem nosso maior desafio mas que temos certeza, por tudo o que

anotamos e constatamos de inusitado em nosso tempo, são imprevisíveis:

Quanto valeria um pensamento que nunca fosse transformado pelo seu objeto? Talvez escutando as coisas, os sonhos que as precedem, os delicados mecanismos que as animam, as utopias que elas trazem atrás de si, possamos aproximar-nos ao mesmo

112

tempo dos seres que as produzem, usam e trocam, tecendo assim o coletivo misto, impuro, sujeito-objeto que forma o meio e a cognição de possibilidade de toda a comunicação e todo pensamento (Lévy, 1999:11).

Conscientes e preocupados com as questões acima levantadas no que se refere aos

novos desafios apresentados pala comunicação organizacional na fluidez imprevisível do

espaço virtual, conduzimos nosso estudo de caso com o propósito declarado e constante

de conseguirmos obter alguns indícios que pudessem dar sustentabilidade teórica a

outros estudos e, por que não, a algumas de nossas indagações.

113

CAPÍTULO 3 – ESTUDO DE CASO: OS EFEITOS DA INTRODUÇÃO DA INTRANET

NA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL

Aqui, chegando ao núcleo almejado deste nosso esforço, nos propomos a descrever e

analisar da forma mais detida possível o estudo de caso escolhido a partir dos dados

coletados nas pesquisas, submetidos às análises pertinentes e direcionadas pelas nossas

hipóteses na busca de alcançar algumas variáveis constantes de entendimento.

3.1 A seleção do caso

Como ponto de partida liminar em estudos dessa natureza, a escolha do caso deu-se

pelas amplas possibilidades de acesso aos dados concernentes ao universo pesquisado

em todas as dimensões possíveis de serem levantadas e analisadas no campo de estudo

proposto de modo a permitir fundamentação segura para a averiguação das hipóteses

oferecidas. Sobretudo pelo conhecimento detalhado e longo, tanto da cultura da

organização em foco, quanto do seu clima no momento da implantação do portal

corporativo e pela vivência muito próxima e atenta de todas as etapas do processo o

que conferiu segurança à riqueza dos dados obtidos.

De outra forma, as características da organização enfocada, quer pela diversidade

humana e cultural, quer pela existência de profissionais com preparo técnico de uma

parte, confrontado ao relativo despreparo de outros tantos, ofereceram as condições

114

que permitiram que se observasse níveis distintos de reações quando da introdução de

rotinas mediatizadas pelas TCI: desde o choque existencial e funcional de intelectuais e

trabalhadores operacionais despreparados e impermeáveis às mudanças, até outros nas

mesmas categorias que, apesar de ávidos por inovações, ofereciam "pareceres técnicos"

que criavam outros tipos de resistências. Finalmente, a existência de estruturas

hierárquicas muito cristalizadas e um certo conservadorismo anteriores às inovações

permitiriam observações de fenômenos reativos que poderiam fornecer parâmetros para

algumas generalizações profícuas quanto aos fatos escolhidos para a observação e

permitir ao analista possíveis explanações concorrentes para eventos semelhantes (Yin,

2002: 23); da mesma forma, estudos de casos ensejam descrever fenômenos, levantar

novas hipóteses e generalizações sobres eles, bem como destacar a importância desses

fenômenos para um determinado campo de estudos o que constituiu o móvel primeiro

de nosso trabalho.

O objetivo deste estudo é circunscrever e determinar as linhas essenciais de

transformações provocadas nas comunicações organizacionais pela intermediação das

TCI numa tentativa de se ver as organizações no viés da complexidade: afastadas as

abordagens tecnicizantes que privilegiam os aspectos materiais da tecnologia

empregada, focamos nossas atenções nos efeitos que os novos padrões de

comunicação produziram nas estruturas de comunicação e, por corolário, nas relações

humanas dentro da organização estudada tendo como horizonte teórico as

115

possibilidades de "desarranjos autopoieticos" que a criação de um espaço ou, ao menos,

de vias virtuais poderiam gerar.

3.2 As principais questões da pesquisa

As grandes perguntas do nosso caso gravitam a questão da comunicação na Fundação F

pela intermediação das TCI dentro do portal corporativo, a saber.

Quais foram os acréscimos de riqueza, alcance e eficiência que a comunicação, hora

feita pela máquina, teria obtido?

Quais foram as mudanças nas relações de poder dentro da organização que esse "novos

meios" teriam propiciado?

De que forma o formalismo e o informalismo das estruturas organizacionais foram

alterados por essa intermediação informacional no processo de comunicação?

Teriam ocorrido incomodações imperceptíveis ou, pelo menos, não denunciadas capazes

de se constituírem em elementos catalisadores de ações auto-organizatórias?

De que forma as novas modalidades de comunicação acentuaram a eficiência das

antigas estruturas e seus instrumentos de controle?

116

Por essas indagações buscaremos fechar o foco de nossa pesquisa delimitando nossa

área de atuação.

3.3 A descrição do método

3.3.1 Tipo de pesquisa

Consideradas as especificidades do caso em foco, optamos por utilizar a pesquisa

exploratória como a mais adequada, cujo escopo central é desenvolver, esclarecer,

elucidar ou detalhar fenômenos, conceitos ou idéias com a intenção de se comprovar

hipóteses ou trabalhá-las para posteriores estudos. Sobretudo porque estas oferecem

maior flexibilidade, permitindo a utilização de ferramentas menos padronizadas, menos

quantitativas às diretrizes teóricas que buscamos conferir à nossa reflexão (Gil, 1989:

44): apesar de até fazermos menção a alguns dados estatísticos, ficará evidente que,

conforme já advertido na introdução, desconsideramos a divisão ortodoxa entre

quantitativo e qualitativo no que se refere a métodos.

Da mesma forma, a escolha da pesquisa exploratória vem ao encontro de outra

característica marcante do tema proposto: sua relativamente pouca exploração, o que,

per si, faz com que hipóteses precisas e operacionalizáveis sejam mais dificultosas; tais

pesquisas permitem aos estudiosos generalizações que tornem mais claros os contornos

117

do problema estudado e que permitam posteriores investigações com procedimentos

mais organizados (Gil, 1989: 45): nunca será demais ressaltar a falta comparativa de

estudos no que se refere aos efeitos humanos da comunicação informatizada.

3.3.2. O método de coleta de dados

Para que pudéssemos extrair da pesquisa a maior riqueza possível de informações

pertinentes às hipóteses iniciais, optamos por trabalhar no levantamento dos dados com

uma amostra combinada de estratificação e acessibilidade, a saber, aquela que divide o

universo da pesquisa em subgrupos com características específicas e opera sem rigor

estatístico, permitindo ao estudioso selecionar os elementos da amostra de acordo com

o acesso que a eles conseguiu (Gil, 1989: 95).

Assim, foi aplicada uma divisão percentual do universo total da pesquisa que

compreende 323 funcionários da Fundação F, sendo 72 % classificados como

administrativos operacionais, 20 % como administração intermediária e 8 % como

direção, com o que abrangeremos os atores sociais do caso enfocado.

Considerando-se que adotamos a estratificação por amostra, dividiremos a pesquisa em

três amostras de 20 % do universo total, compreendendo, então, 53 entrevistados da

área administrativa operacional, 15 que classificamos como administração intermediária

118

e mais 5 dirigentes fechando, portanto, o total necessário para o bom atendimento das

condições estabelecidas pelo método adotado.

Enquanto parte do corpo diretivo e para evitar que a pesquisa pudesse assumir um

caráter de fiscalização ou intimidação para o uso da intranet, fizemos questão de

esclarecer seu objetivo acadêmico mesmo que, quiçá, alguns tenham dado às suas

respostas discretos matizes político-funcionais o que, no contexto geral, pelo

cruzamento e análise da coerência interna, demonstrou-se insignificante e apenas

encontrável no nível mais operacional.

A coleta dos dados foi efetuada através de questionários que foram enviados por via

eletrônica no próprio ambiente objeto do estudo, para os funcionários participantes da

amostra sendo que, para aqueles do grupo por nós denominado de administrativo

operacional, aplicou-se um questionário fechado com 6 perguntas de múltipla escolha;

para os restantes, aplicaram-se questionários abertos com 6 questões para o grupo da

administração intermediária e 4 questões para o grupo de dirigentes (anexo 1).

Há que se explicar que os questionários foram aplicados entre os dias 01/4/05 e

15/4/05. Após a coleta dos dados, foi efetuada a análise detalhada das respostas

buscando a comprovação ou negação das hipóteses colocadas no início do estudo e que

nortearam nossas conclusões.

119

3.4 O caso da Fundação F

3.4.1 Histórico da organização

A Fundação F, organização objeto de nosso estudo, foi criada por uma dotação

testamentária que se concretizou com a morte de seu idealizador em 1947. A partir de

então, seus curadores e diretores executivos têm, como líderes, membros de uma

mesma família profundamente ligada ao fundador e, sobretudo, a seus ideais, o que de

certa forma confere, até determinado momento de sua história, um caráter quase

familiar à organização.

No cumprimento das determinações testamentárias, a fundação concentrou-se, num

primeiro estágio, nos campos das artes, sobretudo, das artes plásticas, buscando

recursos para a construção de um prédio que pudesse alojar o acervo do doador, marco

inicial de um museu ao qual deveriam ser acrescentadas uma escola de artes e uma

orquestra filarmônica: a relevância de tais traços atávicos se destacará na medida que

estes têm, até os dias de hoje, marcante influência na cultura organizacional.

Por ousadia e risco da família supracitada o projeto inicial, objeto de inúmeras tentativas

de expropriação dos poderes públicos, foi ganhando novos contornos: a carência de

vagas no ensino superior, a semente educacional que sempre esteve presente no

projeto inicial, as perspectivas de se obter fontes de renda pelo atendimento qualificado

120

das carências do mercado educacional e, sobretudo, uma declarada e forte vontade de

serviço social, fizeram com que os diretores da fundação implementassem, a partir da

segunda metade dos anos sessenta, a criação de cursos superiores que, num ritimo

bastante acelerado, chegaram, neste momento, a compor um rico conjunto universitário

com faculdades de: administração, artes plásticas, arquitetura, direito, economia,

engenharia, comunicação, relações internacionais, tecnologia da informação e um setor

de pós-graduação correlato a todos esses cursos; a esse conjunto acadêmico

acrescentou-se um colégio.

Hoje, a fundação congrega perto de doze mil alunos, setecentos professores e

seiscentos funcionários distribuídos por quatro campi, perto de uma dezena de

empresas terceirizadas prestando serviços e com uma infra-estrutura material e didática

de completa modernidade: computadores individuais nos laboratórios, ligados em rede

interna e na internet, sistema wireless em todos os espaços do campus central,

projetores de multimídia em todas as salas, sistemas para teleconferências para

unificação de todos os campi, ferramentas que demonstram uma clara intenção

modernizante nesta última fase da sua gestão.

E é sobre a atual gestão que necessitamos nos deter um pouco mais para que

possamos precisar mais claramente as ações de planejamento e gerenciais que

desenvolveram os processos de modernização em questão. Tendo assumido, no início

121

dos anos noventa, após uma conturbada intervenção do poder público, a atual diretoria,

ainda que renovada em parte, manteve o vínculo familiar inicial.

Após um período relativamente curto de reordenação dos pressupostos gerenciais

originais, seguiu-se uma fase de efetiva profissionalização dos quadros gerenciais e

funcionais sem, contudo, inserções traumáticas na cultura da organização: a ação de

consultores externos, dentro de um novo planejamento estratégico, permitiu que se

vislumbrassem e efetivassem mudanças por acomodação onde os níveis de conflitos e

os traumas puderam ser reduzidos a proporções toleráveis; novas gerências e setores

de apoio criados, preenchendo vazios organizacionais, permitiram que atividades novas

pudessem ser assumidas e que setores sobrecarregados redimensionassem seu pessoal

e melhorassem seu desempenho. Evidentemente, quando falamos em processo de

modernização com índices tolerantes de sofrimentos organizacionais nos referimos,

comparativamente, àquelas reengenharias cruentas que caracterizam grande parte dos

processos de retomada modernizante para superar fases de estagnação.

Foi assim que, no final do ano de 2001, foram contratados os serviços para que se

desenhassem e se colocassem no ar o portal corporativo e o portal institucional da

fundação que, em conjunto, representaram emblematicamente essa nova onda

modernizante na organização: como objetivos propostos, estavam a agilização das

comunicações entre todos os setores da organização pela "despapelização" e pela

possibilidade de se operá-las em horários e distâncias dilatadas, a ampliação dos

122

serviços prestados e o conseqüente aumento da visibilidade da organização. Para tanto,

contratou-se um gestor que, ex-aluno e profundo conhecedor tanto da tecnologia

proposta, quanto da cultura da organização, preocupou-se num detido levantamento

das rotinas para que, num primeiro instante, os índices de rejeição fossem baixos e a

utilização das ferramentas criadas fosse a maior possível: o que, por si só, demonstra o

cuidado em se preservar a cultura da organização. Finalizando, neste ano de 2005,

estão sendo implementadas as versões 2 desses portais.

Na seqüência do protocolo adotado, falaremos dos pormenores que demonstrarão a

validade da escolha do nosso caso e de sua conseqüente relevância para os estudos

organizacionais em termos de contribuições para o melhor conhecimento dos

mecanismos comunicacionais em espaços virtuais.

Para que possamos melhor situar o caso, há que se estabelecer algumas das condições

estruturais do cenário em que o mesmo ocorreu e que podem esclarecer aspectos

essenciais da política de modernização em que esteve contido para que tenhamos o

melhor domínio do cenário em que efetuamos a pesquisa.

Assim, consolidada a nova diretoria executiva da Fundação F, seguiu-se um período de

saneamento financeiro, sobretudo pela correção de mensalidades defasadas, quer por

contingências legais, quer por orientações das diretorias anteriores. Superada tal fase,

foi possível se implementar uma nova política de modernização com as necessárias

123

dotações orçamentárias para efetivá-la. Para tanto, buscou-se atualização para o parque

informacional obedecendo a uma estratégia de dupla ação: reequipar e equipar os

setores administrativos para, num momento imediatamente posterior, se começar a

informatização didático-pedagógica, mais custosa e mais lenta. Fato muito importante a

ser assinalado e denotador da ideologia que conduziu tal processo é o de que a direção

da Fundação F, no momento inicial de planejamento das mudanças não se mostrava,

quer receosa das inovações a ser implementadas, quer servilizada pela “ditadura

informacional” de modo que, o móvel do processo, foi a busca de instrumentos que

atendessem necessidades sem se colocarem como objetivos mesmos da mudança ou,

como muito aconteceu à época, como símbolos de status tecnológicos. Com tal

embricamento, o processo de inovação informacional, apesar de haver derivado de uma

ação verticalizada, teve um início menos traumático já que orientado mais para o

atendimento de necessidades funcionais muitas das quais prementes: os computadores

e os sistemas informatizados foram, nessa fase pioneira, anelados e disputados como

anseios antigos e que ora se faziam possíveis e não tiveram a feição de instrumentos de

reengenharia e anacronização de pessoas.

Há que se fazer notar que, numa fase posterior que coincidiu com uma segunda onda

de modernização, quando o nível de sofisticação tecnológica e o alcance das mudanças

aumentaram, as costumeiras resistências apareceram nos moldes tradicionalmente já

estudados e que fogem neste momento de nosso foco mas que a elas seremos

obrigados a retornar.

124

Contratado em finais de 2002, o portal corporativo da Fundação F foi implantado na

primeira metade de 2002, agora, com declarados objetivos de modernização “top

down”: agilização e racionalização de rotinas funcionais, sobretudo na comunicação

escrita; dinamização e racionalização nas tomadas de decisões; redução da

correspondência “atômica” ou, segundo palavras dos dirigentes da própria organização,

a “despapelização” dos processos; potencialidade de unificação dos vários sistemas em

uso na organização que permitisse efetiva interconectividade e interoperabilidade entre

eles; uma muito rica oferta de informações e serviços aos usuários, dentre os quais,

destacamos, a possibilidade de uma rede mais eficiente de comunicação pessoal.

Para o desenvolvimento, manutenção e atualização do portal a Diretoria Executiva da

Fundação F e sua Gestão da Informação contrataram uma empresa que, diversamente

da maioria, possuía uma concepção teórica consistente sob o aspecto organizacional o

que contribuiu, ainda mais, para conferir bons resultados estratégicos ao sistema criado

por um processo de customização dinâmica. A empresa contratada (Inspirit Tecnologia

e Sistemas) tinha, por sua vez, uma visão bastante ímpar no cenário informacional, haja

vista, sua concepção de organização digital, cujos pontos essenciais, a título de

esclarecimento, são: globalização, mundo digital, aprimoramento, vontade estratégica,

integração perfeita, conversa em rede, relevância da comunicação estruturada,

valorização do homem e excelência e que constituem o núcleo orientador de sua

arquitetura de sistemas operacionais.

125

Para que se alcançassem tais objetivos, o desenho da intranet da Fundação F ganhou,

numa descrição sucinta, além de um tratamento artístico de muito boa qualidade no

qual cores e disposições, além de facilitar a leitura e a navegação, são marcadamente

de bom gosto, uma estrutura que permitiu que as rotinas fossem digitalmente

replicadas e potencialmente ampliadas, numa composição bastante rica de telas, num

total de 988 possibilidades: acesso aos dados de alunos e professores, evidentemente

com níveis diversos de acesso às informações; mapa da intranet possibilitando não

apenas a visualização e bom uso da ferramenta mas, também, uma visualização da

organização como um todo; acessos aos serviços e informações de todos os setores –

biblioteca, segurança, R.H., compras etc; espaços para informações úteis e para o

reforço do planejamento estratégico da organização pela palavra da alta direção;

ferramentas de pesquisa como o acesso para o EBSCO; ampliação e facilitação das

possibilidades de comunicação pessoal informal pelo uso do “comunicador” que, além

de assinalar a presença do provável interlocutor, garante a privacidade pelo não registro

no sistema das informações e que, pressupusemos, trouxesse reforços às estruturas

informais da organização e, no aspecto gerencial, a possibilidade de decisões on line

pela existência de assinaturas e protocolos eletrônicos: segundo Palloff e Pratt, a chave

para a configuração e elaboração do desenho de um ambiente virtual é a facilidade e

simplicidade que permitem aos usuários esquecerem-se dos aspectos técnicos para se

envolverem e participarem dos conteúdos (Palloff e Pratt in Okada, 2002).

126

Apesar de havermos abstraído, por razões metodológicas, a intranet do seu paralelo

digital, a internet, convém mostrar, tanto a aceitação como a eficiência dessas

ferramentas no contexto analisado, fornecendo alguns dados comprobatórios disso: em

2001 o portal havia recebido 300 mil visitas e que se transformaram em 2.350.000

visitas/mês/média em 2004 assinalando, apenas em dezembro, clímax do ano

acadêmico, 5 milhões de visitas e, no caso da intranet, 16 mil e-mails de execução de

tarefas nesse mesmo ano.

A incorporação desses instrumentos à vida organizacional deu-se de forma

relativamente natural e incrivelmente rápida fazendo com que os pedidos de mais

computadores, bem como de melhoria dos existentes, demonstrassem uma nova

necessidade, sobretudo se notarmos o fato de que as referidas máquinas perderam sua

característica inicial de máquinas sofisticadas de escrever para se tornarem,

efetivamente, tecnologia de informação e comunicação. No mesmo sentido, os fluxos de

memorandos escritos e de vai-e-vem, foram reduzidos a proporções irrisórias,

restringindo-se, tão somente, às entregas de correspondências externas. Hoje se

constata um uso funcionário/dia de 4 horas on line e uma veemente cobrança sobre

aqueles que não estão se ligando à rede que, nos primeiros tempos, era cobrada

apenas pelas altas gerências.

127

3.4.2 A pesquisa com os dirigentes

Para que lográssemos uma amostragem a mais significativa possível do estrato

organizacional composto pelos diretores, procuramos localizar as singularidades mais

marcantes em termos de circunscrever a diversidade que marca a Fundação F no

referente ao foco de nosso estudo: entre os pesquisados, tivemos desde aqueles que

protagonizaram as frentes avançadas da modernização até outros que, ainda hoje, só

lêem sua correspondência eletrônica, vez por outra, para cumprir estritamente seu

expediente diário, fatos que se estabeleceram com clareza, quer pelo tempo

demandado para as respostas às nossas questões, quer pelo domínio do tema e das

reflexões sobre ele; outro fato relevante do processo analisado é que, dentre todos os

solicitados, apenas um deixou de responder às questões o que, por informações

buscadas fora da rede, ocorreu pelo não hábito de uso da mesma uma vez que,

cientificado da pesquisa após o fechamento da coleta dos dados, manifestou interesse

em opinar e conhecê-la.

O primeiro ponto que salta aos olhos na análise das respostas deste nível mais alto da

hierarquia organizacional é, talvez como uma discreta reação ao processo verticalizado,

a desconfiança quanto ao real barateamento de custos com a adoção do portal: há que

se considerar que, a maioria dos diretores consultados em nosso estudo, são gestores

pedagógicos que não tem acesso total a certos custos operacionais, ou seja, afora o

indiscutível aspecto “pedagógico-ecológico”, a "despapelização" seria uma realidade de

128

custos concretos desconhecidos ou, ao menos, não seguros mas informalmente tidos e

divulgados como tal.

Se o caráter ferramental-positivo do portal foi unanimemente aceito enquanto agilidade,

uniformização de padrão de informação, o que era de se esperar em virtude do cuidado

do desenho inicial, as questões envolvendo a comunicação receberam respostas

controvertidas e bastante interessantes numa leitura atenta e crítica já que, como

voltaremos a ver, provavelmente pelo uso mecânico da ferramenta, os consultados

pouco se detiveram sobre a questão: pelo grau de conhecimento, tanto da mídia

analisada quanto da cultura da organização, as respostas ficaram mais para o evasivo e

genérico do que para o conclusivo em quaisquer dos possíveis sentidos.

Ficou claro que o uso do portal corporativo não chegou ao grau que os diretores

acreditam que fosse o ideal e cujas causas atribuiram a vários fatores:

- falta de divulgação do portal para que tivesse um uso mais intenso e adequado.

- falta de hábito do uso do portal provavelmente pela manutenção de outros canais

de comunicação.

- falta de planejamento por causa de “alguns detalhes técnicos” que deveriam ser

mais adaptados, e que, por sua vez, não foram explicitados.

Mas, quando encontramos respostas que afiançam a simplificação do padrão de

comunicação, a facilitação em se vislumbrar o quadro funcional geral, a necessidade de

129

se ampliar a cultura do uso da ferramenta, a descomplicação da comunicação entre

níveis hierárquicos diversos, percebemos que as questões lançadas, obrigando à

reflexão, provocaram a certeza de que "coisas novas" ocorreram, muitas vezes, apesar

dos entrevistados e que estariam exigindo mais uso, mais cuidado; enfim, parece que

se deram conta das “possibilidades inexploradas” do portal corporativo.

Ao se perguntar se a nova forma de comunicação teria trazido algum efeito

democratizante às comunicações, foi interessante constatar que, se alguns

entrevistados, mencionando a concorrência da rede externa, estariam falando de um

meio mais rico e seguramente mais livre, outro, que buscou muito cuidado em suas

respostas, pede mais regras, insinua mais formalismo numa não manifesta alusão a

certa liberdade da rede, ou seja, não se tem a dimensão plena do controle ou não sobre

o veículo. Ainda no sentido do diálogo mais democrático, retomamos a resposta que

afirma que a "comunicação ascendente" também ficou mais rápida e acessível:

certamente em alusão às limitações para se conseguir respostas rápidas para questões

pontuais - aqui chamadas de técnicas - antes feitas através de memorandos escritos ou

de telefones congestionados e com horários delimitados. É interessante como a

declarada acessibilidade maior não é percebida e pensada pela maioria como uma

possibilidade de flexibilização das estruturas hierárquicas já que, os mais atentos à

questão, a perceberam e que a maioria desconhece os níveis técnicos de fiscalização e

controle da rede permanecendo uma espécie de censura imponderável.

130

No contraponto, encontramos, desde respostas que minimizam a capacidade do portal,

como outras que lhe atribuem um valor que justificaria mudanças na cultura

organizacional para o melhor aproveitamento da ferramenta, ou seja, menosprezando o

valor da cultura em detrimento dos serviços do novo meio.

Assim, se lembrarmos o nível dos atores consultados nesse segmento da pesquisa, e

seu significativo índice de contradições e de “silêncios”, mesmo que se considere um

certo descaso por ferramenta tão elementar, fica evidente um certo grau de mal

disfarçada surpresa pela constatação, na maior parte dos entrevistados, da ausência de

reflexão sobre tão importante reforma implementada em seus ambientes de trabalho,

sobretudo para quem ocupa tão elevada e estratégica posição, o que confirma a

importância do tema escolhido. Na seqüência de nossa pesquisa, surgiu um dado que

poderia relativizar muito essa aparente desatenção dos diretores para com o uso e as

conseqüências da comunicação informacional corporativa: quando constatamos que nos

níveis operacionais o uso do portal é mais intenso e consciente, aflorou a possibilidade

de que o corpo diretivo, contando certamente com uma equipe de apoio eficiente e

integrada às novas mídias, só as usaria de forma pontual para a "correspondência

superior", deixando aos secretários e assistentes a operação do "atacado" da

comunicação funcional; da mesma forma, se havia alguma dificuldade na comunicação

com o estrato mais elevado, esta dificuldade estaria restrita, tal como foi mencionado, a

problemas pontuais, “técnicos”, mesmo porque, uma das marcas da cultura analisada, é

a fluidez e facilidade comparativas de contato nos níveis hierárquicos mais elevados daí

131

a menor sensibilidade da maioria dos diretores para tais avanços que não os atingiria:

uma das marcas da atual Diretoria Executiva da Fundação F, desde sua chegada, foi a

facilidade, agilidade e objetividade da comunicação entre os diretores pedagógicos e os

Mantenedores que se destacam, ainda mais, se comparadas às de outras similares.

3.4.3 A pesquisa com a média administração

Tal como havíamos anunciado, a pesquisa com os níveis gerenciais médios, mesmo se

antevendo um óbvio viés característico da cultura organizacional, revelou dados

surpreendentemente mais reflexivos e críticos do que os da diretoria o que confirma,

mais e mais, o insuspeitado universo que gravita a realidade virtual, conforme

penetramos nos grupos que a vivem de forma mais intensa em sua realidade de

trabalho. Tais posturas são, contundentemente, constatadas quando analisamos as

respostas de gestores mais envolvidos com o portal mesmo que sem haver tido

qualquer participação em sua elaboração: a consciência e a sensibilidade para as

possibilidades da ferramenta e a percepção total do processo revelaram a extensão

verdadeira das mudanças operadas, principalmente, por que o grau de escolaridade

desses funcionários é, ao menos, superior o que, em tese, os tornaria mais imunes aos

modismos e ao encantamento tecnológicos.

Se foi praticamente unânime a crença na rapidez e segurança da nova mídia, também

se apontou que o nível de sigilo, sendo menor, conduz a informalidade para a rede

132

externa: isso confirma a vocação das intranets como "instrumento mais limpo" de

trabalho já que imunes aos ataques de vírus e spams. A rapidez e o barateamento

foram inferidos pela diminuição das interferências e distorções provocadas pela

intermediação de secretários e assessores, o que criou um maior direcionamento da

informação sendo uma das causas do crescente uso do meio que, segundo alguns, só

não é maior pela limitação de habilitados e de certos níveis ainda privilegiados de

informação, o que não tivemos como avaliar o que seria, exatamente.

Por outro lado, fica eloqüentemente declarado que o processo de decisão foi melhorado

e a produtividade aumentada pelo maior controle e contato sobre e com os setores,

bem como pelo aumento da possibilidade de cobrança, graças aos protocolos

eletrônicos e à possibilidade de se verificar presenças on line e, se identificar o

momento preciso das respostas e pela diminuição das possibilidades de "equívocos"

mesmo quando considerados os "perigos do excesso de sumarismo" que a limitação dos

espaços poderia criar.

Já a possibilidade de visualização do todo organizacional pelas telas de navegação e

pela própria ordenação das mesmas, permitiu que se sugerisse usar o portal para

programas de integração, já que a maioria aceitou a crescente democratização da

informação e a aproximação entre os setores: quanto à essa questão surgiu uma linha

de argumentação extremamente interessante e que se refere à extinção de "feudos", de

"núcleos de poder individuais" criados pelo "engavetamento de informações", ora

133

tornadas comunitárias; foram referidos a revelação , desde os acervos de biblioteca e

almoxarifado, até comunicados do R.H. e calendários de aniversariantes, numa evidente

alteração de traços de cultura apesar de que, também nesse nível, não ser verbalizado

ou não ficar claro o grau das mudanças operadas mesmo quando alguns, mais

exaltados, pedissem a proibição do uso da internet em serviço para obrigar a todos à

utilização da intranet: talvez a alusão ao uso menor feito pelos níveis mais altos da

hierarquia o que é notório pela declaração da maior facilidade de utilização pelos

funcionários mais operacionais.

3.4.4 A pesquisa com os funcionários operacionais

Neste momento da pesquisa tivemos uma agradável e eloqüente surpresa: tendo

enviado as questões a todos os funcionários operacionais por via eletrônica e a deixada

aberta até que tivéssemos a amostragem necessária, tal quantidade foi logo conseguida

e um grande número de pessoas solicitou que reabríssemos, a posteriori, a possibilidade

de resposta uma vez que queriam contribuir para a melhoria ou manutenção do portal o

que revelou interesse, não pela pesquisa em si mas, também, pelo instrumento

estudado visto que é essa população que compõe a grande massa dos usuários.

De igual maneira, tanto a consistência quanto a coerência das respostas endossam

tendências já anteriormente vislumbradas o que comentaremos a seguir, questão a

134

questão, sobretudo por que estaremos lidando com uma população mais estratégica

para a caracterização de nossas hipóteses.

GRÁFICO 1

INTERNET AGILIZOU A COMUNICAÇÃO

91%

9% 0%

SIMNÃONÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

Quando analisamos as respostas à questão de número 1 (vide anexo à página 177), é

indiscutível a opinião de que a intranet agilizou as comunicações, principalmente quando

lembramos que uma parte dos entrevistados, não vivenciando a implantação do portal,

poderia estar entre a parcela que respondeu negativamente à questão (vide gráfico1).

Outra consideração a ser feita quanto a este item e que corrobora a afirmação anterior,

é a que aponta para a inexistência de respostas não sei o que, efetivamente, confirma

nossas suspeitas quanto à unanimidade dos entrevistados no que se refere à rapidez

nas comunicações.

Na questão de número 2, o barateamento dos custos, de certa forma, confirma-se a

“desconfiança” de que a informatização das comunicações possa, por si só, diminuir

custos do que, sob um prisma bastante objetivo neste caso, poucos têm informações, se

135

é que elas foram levantadas, já que o escopo principal da ação não visava

barateamento, mas modernização e eficácia: é notório que, num nível funcional, onde

tais informações dificilmente poderiam ser obtidas, 47% dos entrevistados disseram sim

(vide gráfico 2), nunca esquecendo de termos sempre que considerar as influências do

conjunto de crenças que gravitam os fetiches informacionais.

GRÁFICO 2

BARATEOU CUSTOS DE COMUNICAÇÃO

47%

4%

49% SIM

NÃO

NÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

Chegando a um dos fulcros de nossas preocupações, o processo de comunicação,

verificamos a constatação da continuidade eloqüente das transformações já apontadas.

Quando se perguntou sobre o aumento de acesso às informações, 79% das respostas

apontaram o sim (gráfico 3), numa proporção que não apenas deixou dúvidas quanto à

constatação da mudança mas, também, na confirmação das suspeitas anteriores de que

uma parcela discordante de 9%, poderia não ter vivido a transição de processos.

136

GRÁFICO 3

AUMENTOU ACESSO ÀS INFORMAÇÕES

79%

12%9%

SIM

NÃO

NÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

A pergunta que trata da maior uniformização da informação pede um comentário

metodologicamente óbvio ou, quiçá, outra pergunta: o que exatamente buscávamos

saber nesta questão um tanto vaga para o leigo? De fato, após havermos encaminhado

o questionário, nos demos conta de que, para uma parcela dos entrevistados, talvez a

palavra uniformização pudesse ter conteúdo menos claro. Seria, uniformização, apenas

padronização de formulários, limitação e ordenação de possibilidades de comunicação?

O fato é que a questão, pelos comentários que recebemos a posteriori, acabou dando

ao termo sentido de clareza, facilidade de entendimento, descomplicação na

comunicação, o que ficou, novamente, comprovado pela manutenção dos percentuais

das respostas (gráfico 4): 66% de sim, 11% de não; já os 23% de não sei indicam uma

incógnita que se confirma, na pergunta seguinte, por extrapolar a hipótese por nós

apontada dos 10% de neófitos que não teriam vivido a transição de sistemas.

137

GRÁFICO 4

INFORMAÇÃO FICOU MAIS UNIFORME

66%11%

23%

SIM

NÃO

NÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

Nessa mesma linha comprobatória, 56% responderam que a assiduidade na abertura

dos e-mails se manteve no tempo assim como o número dos que desconheciam a

informação (gráfico 5), confirmando a aceitação pelo uso do instrumento analisado,

sobretudo, por se tratar de um segmento funcional que depende muito da manutenção

dos fluxos de comunicação, quer para ter respostas às suas demandas, quer para

prestar o serviço demandado a ele. O que nos chamou a atenção neste quesito foi o

percentual de desconhecimento em 28% quando confrontado com os anteriores, já que

aponta uma certa dissonância em relação aos percentuais de satisfação com a inovação:

se o acesso à informação aumentou significativamente, seria evidente que a abertura da

correspondência deveria ocorrer na mesma proporção, dada a relação intrínseca entre

as ações; se a comunicação melhorou tão significativamente, como ela não estaria

igualmente sendo aberta... Tal incongruência se confirmou quando do percentual

apontado para a pergunta que envolvia o modo de leitura da correspondência na qual, o

expressivo percentual de 88% dos entrevistados (gráfico 6), disseram que a leitura é

138

feita na tela confirmando que o volume de informação aumentou e a quase totalidade

dos usuários lê sua correspondência pela via eletrônica. Isso nos levou à hipótese de

que os setores operacionais, premidos por "tarefas a cumprir", ansiariam por uma

velocidade ainda maior na abertura das mensagens, apesar dos 91% de respostas

positivas à primeira questão que fala de agilização.

Outra inferência, pelos dados analisados, é a de que o novo meio não permitiu, pela

suas potencialidades, alternativas de permanência ou retorno às velhas ferramentas

operacionais, impondo-se ou sendo imposto como o meio consagrado e totalitário.

GRÁFICO 5

ASSIDUIDADE DE ABERTURA DE EMAILS16%

56%

28%

SIM

NÃO

NÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

139

GRÁFICO 6

LEITURA DE EMAILS

88%

12%LEITURA NA TELA

LEITURA DE IMPRESSÃO

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

Mesmo sendo, indubitavelmente, um meio de natureza propositadamente instrumental e

confirmando nossas hipóteses, aparecem 88% dos entrevistados afirmando que as

relações interpessoais foram facilitadas, contra apenas os costumeiros 12% de

discordantes (gráfico 7), o que confirma o desconhecido potencial transformador de

culturas do espaço virtual ou, da mesma forma, da sua capacidade de sugestionar e,

por isso mesmo, provocar mudanças imprevistas.

GRÁFICO 7

FACILITAÇÃO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS

88%

12% RELAÇÕES MAIS FÁCEIS

RELAÇÕES MAIS DIFÍCEIS

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

140

Na mesma linha da questão anterior, 59 % dos entrevistados confirmaram que o portal

facilitou a adaptação dos novos funcionários, ou seja, de alguma forma, quer pela

facilidade de comunicação, quer pela visualização do todo organizacional, quer por

outros fatores já citados ou, certamente, insuspeitados, a crença nos poderes

integradores do espaço virtual se consubstancia e, não temos dúvidas, pela constância

dos índices estatísticos, consagrar-se-ia quanto mais buscássemos indicadores para

tanto, sobretudo pelo fato de que os pesquisados, efetivamente, não possuem dados

objetivos para tais afirmações (gráfico 8).

GRÁFICO 8

MELHORA DO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS

59%

9%

32%

SIMNÃONÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

Finalizando esta parte de nosso estudo, aparece mais um indicador senão controvertido

de opiniões, ao menos de explicação discutível: após o que já foi analisado em termos

positivos de ganhos na introdução da intranet na Fundação F, surgem 61% de

consultados (gráfico 9) afirmando que os processos administrativos se tornaram mais

trabalhosos ou complexos o que nos leva a crer, ou num momentâneo esquecimento

141

das "maravilhas da modernidade" face às lembranças das dificuldades e ameaças de

reengenharia de sua vivência no cotidiano, ou a manifestação de algumas idiossincrasias

relativas ao desenho e introdução verticalizados do sistema, mesmo quando sabemos

que ele buscou um cuidadoso estudo das essências vitais das antigas rotinas para evitar

soluções de continuidade nos processos.

GRÁFICO 9

PROCESSOS ADMINISTRATIVOS MAIS COMPLEXOS

61%9%

30%

SIM

NÃO

NÃO SEI

Pesquisa realizada no período de 01/04/05 a 30/04/05 na Fundação F

3.4.6 Análise cruzada dos dados

Apesar de já havermos feito, no transcurso deste estudo de caso, uma série de

correlações entre os dados obtidos, para não perdermos o momento da reflexão

voltamos, aqui, para fecharmos todas as possibilidades, num necessário arremate

metodológico.

Quando confrontamos as "percepções" sobre as possibilidades de diminuição de custos

pela implantação do portal corporativo, é interessante constatar a disparidade não

142

apenas de avaliação de prioridades buscadas pelo processo, o que não seria de se

estranhar como, também, a disparidade de avaliação da realidade mais concreta dos

fatos: efetivamente, a questão dos custos, não foi parte das principais metas do projeto

uma vez que ele visava a modernidade em padrões focados em eficácia; mas a simples

eliminação de um elemento material de forte simbolismo burocrático, o papel, não

apenas polarizou um movimento "politicamente correto", mas confirmou uma realidade

que, ainda que verdadeira, fugiria ao controle dos muitos que a aceitaram como efetiva.

Confrontadas com atenção as respostas dos três diferentes níveis funcionais, fica

evidenciada a eficácia da intranet enquanto poderosa ferramenta de trabalho para

todos, enquanto que seu poder transformador como nova forma de comunicação não é

tão claro para os níveis superiores da hierarquia funcional que, é importante que se

ressalte, na totalidade dos consultados, viveu a mudança dos processos.

Denotativa dessa maior percepção da realidade da ferramenta analisada pela "linha" e

pelos mais próximos dela, é a expressada pela certeza de que foram alteradas as

relações interpessoais, quer pela afirmação explícita à essa pergunta, quer pelo desejo

de que mais pessoas seja habilitadas na rede, mesmo que, também neste aspecto, seja

muito forte a crença derivada do "poder positivo da mudança pela mudança".

Apesar de, como em qualquer portal corporativo, haverem controles, os diversos setores

os citam de modo muito discreto mas, ainda assim, positivo, quando o identificam como

143

instrumentos de segurança e não de censura e controle: foram, consciente ou

inconscientemente, omitidos pela totalidade dos pesquisados a existência presumida de

inúmeros relatórios de freqüência de uso, presença etc.

Por fim, é também necessário se destacar, a menção feita pelo setor operacional quanto

ao aumento de trabalho nos processos administrativos e que, nem mesmo se insinua

nos demais níveis consultados, quando se retoma a análise do conjunto da pesquisa, se

confirma o êxito do portal enquanto ferramenta de promoção de eficácia: aumentando a

rapidez da comunicação, avolumando seu fluxo, melhorando o seu padrão e

uniformidade, o "trabalho a mais", poder-se-ia entender como o aumento efetivo da

produção e não por um retrabalho resultante de uma complexificação anti-racional.

3.4.7 Análise final dos dados

Na análise mais restrita do caso estudado, algumas conclusões já nos permitiram

entrever possibilidades de, mais adiante, no fechamento da dissertação, fazer confluir

nossos pressupostos teóricos com os dados concretos obtidos na análise deste caso.

Assim foi que, de forma bastante conclusiva, ficou claro que, desde a arquitetura, até a

implantação de um espaço virtual de comunicação organizacional, as dimensões novas

por ele criadas, seus principais efeitos e, sobretudo, seus desdobramentos humanos,

não apenas ficam ofuscados para seus atores pelos poder imagético da modernidade

144

pressuposta e implantada como, também, se olvida a importância de tais modificações

na cultura organizacional já que, mudança tecnológica e mudança de clima ou de

estruturas informais, aparecem como universos paralelos e distantes: nos despertou

especial cuidado o fato de que, uma das ferramentas de informalidade designada no

portal como comunicador, olvidada propositadamente nas questões oferecidas, não foi

objeto de nenhuma menção: tal espaço que, por vocação manifesta, seria uma sala de

bate-papo, sem quaisquer controles, acabou por se transformar num mecanismo de

verificação de presenças uma vez que indicadores assinalam se o interlocutor buscado

se encontraria ligado na rede e que, num movimento previsível mas muito amplo e

forte, tem sido utilizado como "índice de adesão às mudanças" pela rádio peão que fez

questão de se colocar no ar para comentar a pesquisa:

“Cada um em sua escala, os atores da comunicação ou os elementos de uma mensagem constroem e remodelam universos de sentido. Chamaremos estes mundos de significação de hipertextos”.(Lévy, 1997: 25)

A reclamação por mais espaço e mais habilitações na rede é um fator que aponta em

direção oposta àquela mencionada pelo setor acima citado de limitar e controlar o meio:

parece que a intranet, para a parcela maior da média administração, se estadeia como

uma ferramenta que atende aos anseios pessoais e profissionais e que, numa latência

insuspeitada e instigante permite um novo universo de relações e conexões:

“A era de relações requer, por sua vez, uma nova ecologia cognitiva, traduzida na criação de novos ambientes de aprendizagem que privilegiem a circulação de informações... Uma nova ecologia cognitiva significa uma nova relação com a cognição, com o conhecimento, com os outros, uma nova dinâmica nos processos de construção do saber, que esclareça a existência de relações entre diferentes organismos, que indique que tudo que existe, coexiste e que nada existe fora de suas conexões e relações”. (Moraes, 1997: 27)

145

Analisando o efeito da multiplicidade e riqueza das telas do portal e das informações

nelas contidas, a possibilidade de visão do todo organizacional, conferiu aos estratos

operacionais uma segurança de conhecimento que, ainda que menor do que a acusada,

nasceu dessa dimensão panorâmica agora obtida a que somaríamos, enquanto parcela

olvidada, a "ilusão mágica" da modernidade tecnológica informacional e sua

insuspeitada capacidade de atrofiar o senso crítico: isso fica muito nítido na dificuldade

dos usuários de perceber que, junto com o fascínio e as facilidades, existem tarefas

exaustivas e severos controles. Em contraste com liberdades jamais imaginadas, podem

haver mecanismos constantes e intangíveis de dominação.

Também confirmando esse embotamento de consciência, a clara e aceita simplificação

do padrão de comunicação formal como fator chave de modificações, ou é desconhecida

ou sufocada pela dinâmica dos fatos, haja vista que se mencionam todas as "novas

facilidades" mas se olvidam, liminarmente, outras tão importantes conseqüências: seria

de se imaginar que, os níveis mais esclarecidos, devessem ter dado um pouco mais de

atenção para a "silenciosamente eloqüente" revolução que se operava nos canais

institucionais de comunicação e que, os níveis operacionais, apesar de mais atingidos

pelo concreto das mudanças, se dessem conta da imensidão de novas possibilidades de

trabalho e vida oferecidas.

Há que se mencionar, recorrentemente, a sensibilidade de um segmento da

administração intermediária que, entrevendo o potencial de mudança contido na

146

intranet, numa indisfarçável e honesta postura autoritária, pede mais controles na

administração do portal: tal apelo veio de um setor que usa intensamente o meio

analisado e, assim, nos fornece rico subsídio para reforçar nossas crenças nas

possibilidades inimaginadas do espaço virtual.

Por fim, após uma releitura muito detida das aparentes contradições encontradas, dos

silêncios inexplicados, das ignorâncias insuspeitadas, surgiu aquela que nos pareceu a

maior descoberta do nosso estudo e que, como tudo o que é evidente, deixávamos

passar quase desapercebida. Um dos traços mais marcantes da estrutura organizacional

da Fundação F e que se cristalizou num longo processo de cinqüenta anos, foi um mal

disfarçado isolacionismo entre unidades acadêmicas, departamentos, institutos e outras

formações administrativas, provocado por um crescimento alheio a planos estratégicos

que atendeu, ou às necessidades de sobrevivência, ou a projetos isolados mal cosidos à

administração central da Mantenedora. Tal arquipélago organizacional, evidentemente,

consagrou feudos e seus respectivos senhores que foram definindo fronteiras pela mais

secular das formas, o poder que derivava da importância político-financeira dos serviços

prestados pelo seu setor. Nesse contexto acontecia, em igual proporção, uma

comunicação nos mais antigos padrões burocráticos da "papelocracia" que, aqui, era

represada, ali, fluía mais célere sem nenhum problema, não fosse o fato de que o

mundo exterior já havia transitado para os info-meios. Assim, por mais democrática que

pudesse ter sido a implantação do portal corporativo, essa abertura da comunicação

para o todo da organização trouxe, em seu âmago, a pouco definida sensação de

invasão que apenas um dos gerentes pesquisados acusou. Daí, o que poderia parecer

147

reação à verticalidade do processo foi, opostamente, reação à abertura democrática das

comunicações e, por extensão, dos espaços organizacionais a todos os "habilitados"

que, na maioria dos casos, não eram "agregados da gleba" e que passaram a transitar

com uma insuportável impudência, se comunicando direto com os "chefes", sabendo de

aniversários e "eventos particulares". Tais constatações demandariam estudos

posteriores no sentido de se circunscrever e entender as grandes linhas de alterações

provocadas na cultura da organização por esse processo de "desenfeudização"

comunicacional que, em essência, seria o desdobrar necessário deste estudo.

Será que as novas modalidades de "informalismo eletrônico" acelerarão, ainda mais,

pela sua sofisticação crescente e, conseqüente complexidade de símbolos e códigos, os

diferentes níveis hierárquicos? Será que as "novas estruturas informais" estabelecerão

barreiras mais resistentes porque mais constantes e elaboradas?

“... as futuras equipes de arquitetos cognitivos não irão construir novas cidades em campo aberto para indivíduos sem história e sem passado... Estes arquitetos deverão partir de modos de interação em vigor nas organizações os quais diferem de acordo com os locais e as culturas” (Lévy, 1997: 53).

Concluindo, a análise final nos permite afirmar que o constructo atingiu aos desígnios

iniciais uma vez que nos permitirá, não apenas um conhecimento mais efetivo da

organização analisada, bem como o encaminhamento teórico no sentido de

corroborarmos algumas das hipóteses inicialmente oferecidas e subsidiarmos indicações

para outros trabalhos conforme acima apontado.

148

3.4.8 Aspectos particulares do estudo

O caso por nós escolhido apresentou particularidades que, afora o conhecimento por

nós adquirido numa longa e atenta vivência da organização e que nos permitiu extrair o

máximo dele, revelou peculiaridades que permitirão ao estudioso ilações e indicações

para futuras generalizações de fundamento teórico.

Seria de se estranhar que numa organização voltada à educação e à cultura, a inovação

chegasse pela porta administrativa antes do que pela didático-pedagógica. No entanto,

quando lembramos da situação das entidades particulares de ensino e de suas

dificuldades de sobrevivência financeira enquanto prestadoras de serviços educacionais

de qualidade no Brasil, teremos clara a necessidade das mesmas de manterem

estruturas administrativas enxutas, eficazes e, portanto, modernas. Na mesma linha de

explicação, apareceram as seculares e até ideológicas resistências, declaradas ou não,

dos docentes quanto às crenças na modernidade instrumental em contraponto à

"solidez da erudição acadêmica": o fato é que, na maior parte das instituições

educacionais a modernidade entrou pela "porta de serviço", entrou de macacão e não

de avental branco, a não ser naquelas de vocação flagrantemente tecnológica: no caso

da Fundação f, por ocasião das mudanças analisadas, um dos elementos de

manutenção de estagnação, a escassez de recursos, não existia, o que deu ao caso

outro fator de singularidade por que fez com que os instrumentos informacionais

aparecessem em todo o dispendioso esplendor das tecnologias de ponta.

149

A "convivência eletrônica" de núcleos de trabalhadores do conhecimento e de

funcionários operacionais de díspares áreas, permitiu que o nosso estudo desfrutasse de

uma diversidade rara, quer em termos das universidades tradicionais, sobretudo as

públicas, quer mesmo das particulares que, em raríssimos casos, possuem ateliês,

teatro, museu e todo um conjunto de atividades culturais estranhas aos espaços

acadêmicos. Há que se fazer uma correção: de fato a Fundação F, não é uma

universidade, mas um conjunto de faculdades isoladas que foram sendo agregadas

juntamente com núcleos, institutos e departamentos, constituindo uma unidade ímpar

que se mostrou um interessante espaço de comunicação exatamente pelas condições

advindas da diversidade .

A forma como foi projetada a arquitetura do portal institucional da Fundação F e sua

subseqüente implantação, também obedeceram a um processo diferenciado: após

tentativas de se trazer "alienígenas informacionais" e de se conhecer aquilo que a

muitos chamaram de os "aventureiros da inovação", optou-se, mesmo que com um

custo bastante superior, por se criar, com parcerias externas limitadas, um

departamento próprio que desenvolvesse as ferramentas necessárias a partir das rotinas

internas de comunicação mais consagradas e de necessidades cuidadosamente

detectadas. Assim, mesmo que se tenha identificado alguma sensibilidade pela

verticalidade necessária ao processo, diferentemente do que a história da

informatização exaustivamente já contou, não se constataram os "massacres funcionais"

150

de adaptação das organizações aos "sistemas comprados" talvez pela lembrança de

experiências anteriores na aquisição de outros sistemas.

Outro importante aspecto do caso em questão e um dos traços medulares da cultura da

organização em foco, a saber, a existência dos "feudos organizacionais" apontados em

3.5.5 que, dada sua capacidade de resistência e sofisticação conferidas pelo padrão

intelectual dos seus atores sociais, faz com que este caso, também por isto, seja

singular.

3.4.9 Contribuições organizacionais

Ainda que reunindo um conjunto de recorrências já que destacamos anteriormente

alguns desses fatos, cumpre enfatizar e acrescentar algumas das possíveis contribuições

que este trabalho acredita ter deixado para o cotidiano das organizações.

Em primeiro lugar, aparece a importância crescente que a atenção dos gestores deve

consagrar aos efeitos da utilização dos multimeios nos processos de comunicação

organizacional, quando os meios são alterados de forma verticalizada: ressaltando-se a

importância estratégica da comunicação sobre a cultura e o clima das organizações

lembramos, não apenas da possibilidade de os produtos esperados não serem

alcançados mas a ocorrência de efeitos inesperados e de conseqüências imprevisíveis

que podem elevar os custos materiais e humanos a níveis perigosos uma vez que,

151

subvertendo o planejamento inicial, correm o risco de tornarem o processo

incontrolável. Tal imprevisibilidade seria decorrência do natural caráter autopoietico do

espaço virtual e que, sempre é importante lembrar, dada sua fluidez e dinâmica

desconcertantes, é marcadamente desconhecido e surpreendente: falamos aqui da

"inconseqüência mecânica" de se acreditar que o virtual em si apenas agiliza, racionaliza

e barateia o processo de comunicação sem nenhum cuidado maior de se pensar e

verificar de forma mais detida os efeitos sobre as relações de poder, sobre as estruturas

informais, sobre o processo de cooperação e seu oposto, a geração de conflitos. Seria

ousadia necessária e , até mesmo aceitável na humildade de nosso escopo, lembrar às

gerências de que, ante riscos desconhecidos, valeria muito reunir os atores sociais para

refletirem os efeitos sobre si e sobre o corpo funcional dessas verdadeiras mutações

comunicacionais que, se muito pensadas e discutidas em outras áreas do conhecimento

e das atividades humanas aparecem, na administração, como meras reformulações

técnicas de efeitos humanos anódinos.

Ainda como corolário da afirmação anterior, ou seja, da importância de se atentar para

as mudanças nos processos de comunicação organizacional, de se cuidar dos mesmos

não apenas enquanto uma “modernidade irrecusável” e, por isso mesmo, de se

implantá-los de forma verticalizada, queremos lembrar que, se efetivamente grande

parte das ações de mudança depende de uma visão estratégica, voluntarista e limitada

a um grupo menor, de outro , sobretudo quando essas ações atingirão o total absoluto

da organização, é extremamente importante que se tenha consciência que esse

152

irrefutável e, talvez, necessário traço autoritário de mudança será, forçosamente,

amplificado pelo uso já que seu objetivo final é a própria voz da organização, uma vez

que é ação sobre seu sistema nervoso central no sentido de torná-lo mais dinâmico,

mais sensível, mais atento aos sinais e, também, menos domesticado.

Fica, assim, evidente que as transformações provocadas terão efeitos visíveis e,

aparentemente, ordenados e comportados: todos falarão com todos de modo uniforme,

rápido, esteticamente mais bonito pela beleza digital de uma modernidade externa que

a feiura e o anacronismo dos memorandos e dos PABX de há muito deixaram de trás;

mas é admirável como pouco se deu conta e, insistimos, se avaliou, os efeitos

subterrâneos da infiltração virtual nas estruturas das organizações. Será que tudo e

todos que vivem fora dos espaços organizacionais foram atingidos mas apenas a

organização sobreviveu incólume às "conseqüências outras" da virtualização? Para o

universo organizacional parece que, comparativamente, tudo o que os multimeios

trouxeram foi, tão somente, produtividade e lucros apesar dos pesados investimentos e

da efetivas reengenharias efetuadas.

Finalizando e repetindo, pensamos que, passada a fase eufórica do advento do milagre

informacional, mesmo que a fantástica sucessão do hipermoderno engenho seja infinita,

devamos olhar para o milagre e avaliar o que ele tem de conteúdo humano, cremos que

cabe aos estudiosos da organização a calma e a responsabilidade de dar ao espaço

153

informacional um contorno mais real porque mais distante do brilho ofuscante das

revoluções tecnológicas que têm paralisado suas vítimas.

154

A TÍTULO DE CONCLUSÃO

Queremos nos valer, deste momento derradeiro para, não apenas retomarmos

sucintamente algumas conclusões já apresentadas, mas para apresentar reflexões que,

apesar das limitações desta dissertação, nos sentimos obrigados a fazer enquanto

contribuição a um tema que, seguramente, concentrará trabalhos mais alentados e do

qual, confessamos, não gostaríamos de nos despedir sem aproveitarmos todo o espaço

possível que, prevenimos, será menos concludente e mais devaneio, mais indicativo.

Se num primeiro momento nosso contacto com as TCI se fez no incômodo de substituir

memorandos escritos, como sempre escrevemos, por uma tecnologia imposta e de

decifração desagradável; logo a seguir, superadas as dificuldades técnicas, começamos

a nos dar conta que um novo modo se impunha às comunicações sem que a

organização suspeitasse das mudanças, sem que se encontrassem estudos que nos

falassem algo além de relações mecanicistas e óbvias apesar de toda a plasticidade e

potencial contidos nessas novas ferramentas de intermediação. Assim, nos demos conta

de uma série de corolários que, se não se confirmaram cabalmente, se mostram como

hipóteses seguras para encaminhar nossas desconfianças enquanto propostas de

trabalhos.

Assim, se no contexto das organizações contemporâneas a comunicação se mostrava

cada vez mais essencial para a sua sobrevivência, se nesse mesmo tempo a inovação

155

apresentava situações inusitadas e surpreendentes com a acentuação de ritmos e

simultaneidade de novas tecnologias, a integração de tudo isso pelo espaço virtual

potencializou, efetivamente, realidades organizacionais que, mesmo quando nos

detemos em observar eventos mais restritos, como o que fizemos enfocando um portal

corporativo, revelam horizontes que obrigam o estudioso a preocupações jamais

enfrentadas, o que levaria, forçosamente, a buscar novas luzes epistemológicas e que,

para nós, aproximaram, irrefutavelmente, os estudos das organizações da Teoria da

Complexidade pela sua natural vocação de tratar e viabilizar essas novas realidades

excessivas para outras lógicas menos afeitas à imprevisibilidade.

A comunicação implementada e geneticamente modificada pelos info-meios revelou agir

sobre a organização enquanto fator de complexificação, enquanto sistema, alterando,

radicalmente, as relações entre os indivíduos e os indivíduos com o todo. É assim, que

mesmo eventos informacionais naturalmente limitados como uma intranet,

demonstraram potencial transformador muito além daqueles imaginados pelos mais

cuidadosos arquitetos da inovação e muito menos percebidos pelos usuários mesmo os

mais atentos: se de há muito os estudiosos têm se voltado para as relações humanas

com a tecnologia, hoje, estabeleceu-se a certeza de que tais estudos necessitam de

profunda revisão, tão profunda quanto a abissal diferença de essência das novas

tecnologias com relação a aquelas que fizeram os "milagres" da Revolução Industrial; na

mesma proporção, fica a distância entre os estudos das TCI nas relações

organizacionais e seus precedentes mais imediatos agora sempre mais afastados pelas

rupturas constantes criadas pela essência mesmas das inovações. Há que se considerar

156

um conjunto novo de variáveis de agravamento nesse processo de inconsciência

tecnológica: dada a rapidez de anacronização, escassez de tempo de adaptação dos

usuários para fazer retornar os investimentos e fazer produzir a aquisição, considerada a

sempre por nós mencionada sedução pelo novo, as possibilidades de pensarmos os

efeitos sobre nós dessas inovações ficam, cada vez mais, confinadas à pequenez das

“vantagens competitivas” e cada vez mais limitadas pela “pequenez das máquinas”.

No sentido dessa outra ótica, há que se tentar enxergar a organização em rede, onde o

conhecimento passa, mais e mais, a se constituir em forma de controle, onde a

inovação impositiva e constante cria estruturas que se tornam, quase que

espontaneamente, cada vez mais abertas, menos hierarquizadas e mais centradas nos

processos; onde o próprio poder que incrementa a inovação tanto pode se reorganizar

nessa nova dinâmica quanto se desequilibrar na descentralização involuntária sempre

potencial da rede que tem a possibilidade de cultivar individualidades, que pode permitir

a libertação do sistema pela sua incontável capacidade de gerar atalhos, de criar em sua

completa fluidez, espaços singulares de descontrole. A digitalização da comunicação

potencializa a reconstrução da realidade já reconstruída pela comunicação criando novas

e surpreendentes realidades que podem, quase sempre, escapar dos próprios gestores

das transformações obrigando a todo um repensar das estratégias de gestão da

inovação; realidades onde as previsões serão trocadas pelos potenciais e nas quais as

estruturas serão redesenhadas a partir das identidades produzidas pelos

relacionamentos nascidos pela troca das informações: essas informações transmutadas

157

pela mediação informacional trazem uma das causas, um dos gatilhos provocadores dos

movimentos autopoieticos que se tornarão mais constantes na realidade organizacional

sobrevivente.

Mesmo que o acima afirmado possa assumir um proposital tom de “profecia

organizacional escatológica”, tal exagero didático nasce da certeza de que, a partir do

pouco que pudemos efetivamente constatar em nosso caso, nos silêncios das grandes

redes todos sabemos desconfiar mudanças essenciais em nossa humanidade e, aceitá-

las como viscerais, é o primeiro movimento para entender seu alcance e, quiçá,

compreender seus efeitos, já que temos que entender a realidade recriada pela mágica

muito concreta do espaço virtual, pela comunicação hipertextual: é cada vez mais

estranho, senão assustador, observar os estudiosos das organizações se emocionarem e

surpreenderem com o mundo metamorfoseado pela rede externa, e não se tocarem em

igual ou semelhante proporção com o que estaria ocorrendo nas estruturas mesmas das

organizações.

Quando se constata o "efeito complexificante" do hipertexto ou, genericamente, da

geração e dos espaços virtuais dentro dos quadrantes da organização, lembramos que a

complexidade é “tolerante”; de fato, predisposta à “desordem autocriativa” que, se de

um lado, a adapta a enfrentar os distúrbios do mundo exterior, por outro, pode gerar

um desequilíbrio interno desintegrador e mortal quando não entendida. Tal dilema

encontraria uma de suas saídas na busca da solidariedade vivida enquanto catalisador

158

do único equilíbrio que sobreviveria à complexidade: temos aí, por vias transversas, a

recuperação dos valores da cultura organizacional agora conquistada e mantida por

"novos meios", meios capazes de criar espaço informais e relacionais inimaginados;

capazes de armazenar dados de nossas memórias coletivas em escalas jamais pensadas

estabelecendo correlações infinitas. Pensar essas culturas renascidas e compiladas em

bits e ainda capazes de estabilizar a instabilidade essencial de nossos tempos é outro

dos desafios que parecem que serão a nossa forma definitiva de viver a normalidade e

onde a incerteza não será mais anomalia. Se tivemos uma muito longa ditadura da

tecnologia sobre a humanidade em todos os espaços da vida profissional, a organização

e a própria vida em redes e sua conseqüências permitiram que pudéssemos ultrapassar

a iconoclastia dos humanistas em relação às técnicas que, agora TCI, apareceriam como

aliadas, como instrumentos de promoção e respeito do homem: eis a possibilidade

oposta que as redes oferecem como potenciais autopoieticos de sobrevivência e que nos

faz oscilar entre as utopias da inovação e as lamúrias apocalípticas das metástases de

uma tecnologia desumanizada.

Como será a convivência que as possíveis camadas de interfaces digitais terão com os

nossos acervos escritos, imagéticos e orais nos contextos dos grupos e compondo

nossos elencos valorativos?

A única certeza que se pode vislumbrar é que todos os compósitos nos trarão novas

tradições, novos referenciais que acentuarão esse nosso surpreendente devir. Se

séculos de escrita nos fizeram entender o mundo como se fosse uma página que nasce,

159

pelo menos para o ocidente, de cima para baixo, da esquerda para a direita, que se

organiza em parágrafos, pontos e vírgulas, como será esse mesmo mundo olhado pela

miscelânea de mídias em convivência complexa? Como será o mundo do hipertexto?

Mais ainda, como estarão sendo lidas, entendidas e gerenciadas as organizações com

suas necessidades aritméticas e contábeis por essa nova linguagem?

E quando tocamos no “lado negro”, nunca poder-se-á perder a óbvia dimensão de que

as mesmíssimas TCI tem podido e poderão continuar a serem configuradas para

endurecerem a cadeia escalar, para acentuar as diferenças hierárquicas, o centralismo,

o formalismo, o verticalismo dos modelos lineares e impositivos. Aliás, no caso estudado

dos portais corporativos, muitos exemplos conhecidos apontam declaradamente para

esse intuito. A grande questão que se colocou, fazendo com que as TCI perdessem essa

bipolaridade elementar das ferramentas - para o bem ou para o mal - é que tais

instrumentos parecem que trariam em si o germe da indomabilidade, pareceriam que,

mesmo quando sujeitos a rígidos padrões de controle, são capazes de permitirem

subterfúgios, vias paralelas, subversão dos padrões originais: quando se fala em

segurança digital, em propriedade digital, em organização digital, surge sempre aos

nossos olhos a figurinha de um garoto míope burlando e brincando com os tesouros dos

bancos, com os segredos das potências, caminhando sorrateiramente pelos corredores

privativos das grandes corporações, quanto mais se pensa no Big Brother mais

aparecem as possibilidades de “Davis cibernéticos”. De qualquer maneira, ainda assim,

queremos relembrar uma outra vertente de possíveis estudos que, de maneira alguma

160

poderá ser afastada neste nosso espaço de justo, necessário e libertado refletir: as por

nós designadas renascidas burocracias digitais que, se na contra-mão de tanto e de

tudo que já se fez e falou em termos das modernas organizações, por inúmeras razões,

tem sido objeto de ensaios, investidas e pesados investimentos, já que controles são

elementos atávicos, medulares pois ideológicos de toda uma cultura gerencial de muito

longa duração e, face a tudo o que se sabe e já foi dito aqui das TCI, jamais dispuseram

de ferramentas tão eficazes...

Antes que nos imputem leviandade novelística, antes que nos acusem de estarmos

usando um estereótipo estético cinematográfico, perguntamos: ante a fluidez e às

possibilidades das redes não seriam estas o espaço natural de uma civilização de

invasores? Não seriam elas o húmus de uma criatividade de fronteiras amplas,

irregulares e indisciplinável? Não estaria nesse paradoxo intrínseco das relações entre

"instrumentos desobedientes" e senhores autoritário-burocráticos a razão de sistemas

sociais cada vez menos domináveis, cada vez menos capazes de produzir a auto-

organização viabilizadora de saídas?

O que nos avalizou e incentivou tais reflexões sobre as questões pertinentes às relações

mais especificamente entre comunicação e mudança foi, insistimos, a constatação de

que as mesmas são analisadas por padrões um tanto rígidos e estanques, quer pelos

estudiosos da comunicação que se restringem à sua área, quer pelos estudos

organizacionais que, também pelo seu lado, pouco se esforçam nessa travessia inter-

161

disciplinar tão importante para que sinais, ao menos, nos apontem novas frentes de

pesquisas: algo mais tem se escrito sobre comunicação organizacional sem que, no

entanto, com raras exceções, tenha-se conseguido um novo instrumental teórico-

conceitual que desse conta dessa enorme demanda e volume de diálogo que as TCI

geraram nas organizações: as novas dimensões técnicas das redes potencializaram a

ação articulada de públicos em escala mundial e de diversidade imprevisível. Nos parece

que essa "terra de ninguém", que esse vácuo de interesse exista, menos pela ausência

de estudiosos que aventurassem fazer o casamento entre essas áreas do conhecimento,

do que pela ousadia epistemológica indispensável que deveria conduzir tais estudos.

Insistimos, é mera percepção de um iniciante encantado pelos primeiros passos num

deslumbrante cenário de novidades o que, conseqüentemente, nos permite a

inconseqüência, assim como parece muito difícil se falar em conseqüência, ordem e

outros conceitos respeitáveis quando a subversão se tornou a versão, quando todos os

limites se dissolveram e quando a única coisa que nos parece mais fundamental do que

nunca e mais tão necessária como sempre é o resgate, de sob os escombros de uma

sucata tecnológica de última geração, da humanidade olvidada.

162

BIBLIOGRAFIA

• ALVESSON, Mats e Deetz, Stanley. Teoria Crítica e Abordagens Pós-Modernas

para Estudos Organizacionais. In Clegg, Stewart R., Hardy, Cynthia, Nord, Walter

R. Handbook de Estudos Organizacionais. São Paulo: Editora Atlas, 1999.

• AMBRON, Susann e HOOPER, Kristina. Interactive Multimedia. Washington:

Microsft Press, Redmond, 1988.

• BAIRON, Sério. Multimídia. São Paulo: Global, 1995.

• BALESTRIN, Alsones; Fayard, Pierre. Redes Organizacionais Como Espaço

de Criação de Conhecimento. Atibaia – SP: ENANPAD, 2003.

• BAPTISTA, R. D. Jan/Fev, 1999. A Comunicação Empresarial na Introdução de

Novas Tecnologias. Revista da ESPM. São Paulo, 06 : 51-54.

• BAUER, Ruben. Gestão da Mudança: Caos e Complexidade nas

Organizações. 1ª edição, São Paulo: Atlas S. A, 1999.

• BLOCK, P. Gerentes Poderosos, A Arte de Emanar Poder. São Paulo: Mac

Graw, Hill, 1990.

163

• BRAUDEL, Fernand. História e Ciências Sociais. Editorial Presença: Lisboa,

1972.

• CALDAS, Miguel; Fachin, Roberto; Fischer, Tânia, Handbook de Estudos

Organizacionais: Ações e Análise Organizacionais. 1ª edição, São Paulo:

Editora Atlas S. A, 2004.

• CALVINO, Ítalo. Seis Propostas para o Novo Milênio. São Paulo: Companhia

das Letras, 1990.

• CASTELLS, Mannuel. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

• CHANLAT, Jean-François. Ciências Sociais e Management. São Paulo: Editora

Atlas, 2000.

• ________, & Seguin – Bernard, F. (org). L’Analyse Dês Organisacions, Une

Antologie Socioloque. Québec: Profontaine, 1987.

• WEBER, Max. Max Weber: sociologia. Organizador: CONH, Gabriel, São Paulo:

Ed. Ática, 1991.

164

• DAMIANI, Wagner Bronze. Times Virtuais de Trabalho Via Internet. Foz do

Iguaçu – PR: ENANPAD, 1999.

• DEMIN, Willian. Qualidade: A Revolução da Administração. Rio de Janeiro:

Qualitymark, 1992.

• DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.

• DINSMORE, Paul. Estrutura Gerenciais Rígidas Tendem a Desaparecer. In

Administrador Profissional, São Paulo: Jornal do Conselho Regional de

Administração, fevereiro e março, 1997.

• DORNELAS, Jairo Simião; Hoppen, Norberto. Inovações ligadas ao processo

de gestão participativa e ao uso de sistemas de apoio à decisão em

grupo, na direção de novas formas de estruturas organizacionais. Foz do

Iguaçu – PR: ENANPAD, 1999.

• DOWBOR, Ladslau e Ianni, Octavio e Rezende Paulo e Silva, Hélio (orgs).

Desafios da Comunicação. São Paulo: Vozes, 2000.

• DRUCKER, Peter. Os anos 90 e a Virada do Século, Pioneira, São Paulo: 1994.

165

• _______. O Gerente Eficaz. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.

• _______. A Sociedade Pós-Capitalista. São Paulo: Pioneira, 1993.

• ETZIONI, Amitai. Organizações Complexas. São Paulo: Atlas, 1986.

• FILHO, José Rodrigues. Análise do Uso da Internet na Gestão do

Conhecimento Através da teoria da Estruturação: Uma Experiência no

SERPRO. Atibaia – SP: ENANPAD, 2003.

• FLEURY, M.T.L. O desvendar a cultura de uma organização - uma discussão

metodológica. In: FLEURY, M.t.l. E FISHER, R.M. (orgs.) Cultura e poder nas

organizações. São Paulo: Atlas, 1989.

• FREEDMAN, Daud H. Is Manegement Still a Science? In: Harward Business

Review, v.70, N.G, pag.26-38, Nov. Dec. 1992.

• FREIRE, A . M. (org.). A pedagogia da libertação em Paulo Freire. São

Paulo: Editora UNESP, 2001.

• FREITAS, Henrique M. R. A Informação como Ferramenta Gerencial. Porto

Alegre: Ed. Ortiz, 1993.

166

• FURUYAMA, Francis. A Confiança Ainda é Fundamental: As Corporações Virtuais

Podem Substituir Relacionamentos entre Pessoais de Carne e Osso? In Exame,

São Paulo, abril - março 1997.

• GARETH, Morgan. Imagens da Organização. 1ª edição, São Paulo: Atlas,

1996.

• GENELOT, Dominique. Manager dans la Complexité: Reflexions à L’ usage

des dirigeants. 2ª edição, Paris: Insep Éditions, 1998.

• GIL, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 2ª edição,

Editora Atlas S.A. 1989.

• GUERREIRO, Ramos Alberto. A nova Ciência das Organizações: Uma

Reconceituação da Riqueza da Nações. 2ª edição. Rio de Janeiro: FGV-

Fundação Getúlio Vargas, 1989.

• HABERMAS, J. A Crise de Legitimação no Capitalismo. Rio de Janeiro:

Tempo Brasileiro, 1980.

167

• JABLIN, M. Frederic, PUTNAM, Linda L., The New Handbook of

Organizational Communication. Sage Publications, Thousand Oaks, 2001.

• JUNIOR, F. T; Oliveira, F. C. Influência da tecnologia da Informação na

Cultura Organizacional: um estudo de caso. Atibaia – SP: ENANPAD, 2003.

• KOTTER, J. P. Liderando mudança. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1997.

• KONSSCH, Margarida Maria Krohling, Planejamento de Relações Públicas na

Comunicação Integrada. São Paulo: Summus Editorial, 2003.

• KUJAWSKI, Guilherme. Realidades Virtuais, Riscos Reais. In WOODY, Thomaz J.,

Gestão Empresarial: comportamento organizacional. São Paulo: Editora

Atlas, 2005.

• LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência: O futuro do pensamento na

era da informática. 1ª edição, Rio de Janeiro: Editora 34, 1993.

• _______. A inteligência Coletiva: Por uma antropologia de ciberespaço -

São Paulo: Edições Loyola, 1998.

• _______. O que é o Virtual? 1ª edição, São Paulo: Editora 34, 1996.

168

• LIPOVETSKY, Gilles; Charles Sébastian. Os Tempos Hipermodernos. Editora

São Paulo: Barcelona, 2004.

• MC LUHAN, Marshal. Os meios com extensões do Homem. 5ª edição, Cultrix:

São Paulo, 1995.

• MACHADO, Arlindo. Máquina e Imaginário. São Paulo: EDUSP, 1993.

• MARTIN, Barbero, Jesus. O Medo da Mídia. Política, Televisão e novos Modos de

Representação. In Dowbor, Ladislau (Et. Al). Desafios da Comunicação.

Editora Vozes: Petrópolis, 2001.

• MATTOS, João Roberto Loureiro de, e GUIMARÃES, Leonam dos Santos. Gestão

da Tecnologia e Inovação, uma abordagem prática. São Paulo: Editora

Saraiva, 2005.

• MATURANA, H.R e VARELA, J.F. De máquinas e seres vivos. Campinas:

Editorial Psy, 1995.

• _____. Autopoiesis and Cognition The realization of Living. Dordrecht:

Reidel, 1980.

169

• MELO, Marlene C. O. L. Gerentes do setor público e provado face a face

com a adoção de novas tecnologias nas organizacionais: Uma análise e

preposições. Foz do Iguaçu – PR: ENANPAD, 1999.

• MINTZBERG, Henry; Ahlstrand, Bruce; Lampel, Joseph, Safári de Estratégia:

Um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Tradução de Nivaldo

Montigelle Jr. Porto Alegre: Bookmann, 2000.

• MORGAN, Gareth. Imagens da Organização. São Paulo: Atlas, 1996.

• MORAES, M.C. O Paradigma Educacional Emergente. Campinas, Papirus,

1997.

• MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento Complexo. 3 ª edição, Lisboa:

Instituto Piaget, 2001.

• ________. Os sete saberes necessários à educação no futuro, São Paulo:

Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000.

• ________. Ciência com consciência, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.

170

• MOTTA, Paulo Roberto. Transformação Organizacional: A teoria e a

Prática de Inovar. Rio de Janeiro: Qualitymark Editora, 1999.

• NEGROPONTE, N. A Vida Digital. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

• NONAKA, i.; Takeuchi, H. Criação de conhecimento na empresa. Rio de

Janeiro: Campus, 1997

• OKADA, Alexandra Lilaváti Pereira. A Construção do Conhecimento como

Rede de Significados em Ambientes de Aprendizagem. São Paulo:

Pontifícia Universidade Católica, 2002.

• OLIVEIRA, Silvio Luiz de. Sociologia das Organizações. São Paulo: Pioneira,

1999.

• PASCAL, Richard. Você está pronto para a complexidade? In HSM

Management. N. 46, setembro-outubro, São Paulo, 2004.

• PERRIEN, J; Chéron, E; Zins, M. Recherche em Marketing: Méthodes e

Decisión. Québec: Gaetan Morin Éditeur, 1983.

171

• PITASSI, Cláudio; Dias, Rogério de Matos. Redes Estratégicas Virtuais um

estudo de caso do portal Covisint GM-FIAT WWP. Atiabaia – SP: ENANPAD,

2003.

• PROTIL, Roberto Marx. Mudança Organizacional frente a Novas

Tecnologias: Em estudo de Caso em uma Cooperativa Agroindustrial.

Atibaia – SP: ENANPAD, 2003.

• REIS, M.C.S. Comunicação e mudança organizacional: da redução

conceitual às lições empíricas. Atibaia - SP: ENANPAD, 2003.

• SCHAFF, Adam. A Sociedade Informática. 1ª edição. São Paulo: Editora

Brasiliense, 1990.

• SERRANO, G. P. Investigacion Cualitativa. Retos e Interrogantes. Madrid:

La Muralla, 1998.

• SILVEIRA, M.A. P. Os Sistemas de Informações e as Novas formas

Organizacionais. Campinas - SP: ENANPAD, 2001.

• SERVA, Mauricio. O Paradigma da Complexidade e a Análise Organizacional, IN:

Revista de Administração de Empresas. Abril/Junho, 1992.

172

• STEIL, A. V., Bergamini; C. W. Aspectos das Organizações Virtuais. Foz do

Iguaçu – PR: ENANPAD, 1999.

• TOYNBEE, Arnold. Estudos de História Contemporânea: A civilização

Posta à Prova. O Mundo e o Ocidente. São Paulo: Editora Nacional, 1976.

• VERITÁ, Toni. Na Maravilhosa Desordem. In: Aristarco. O Novo Mundo

das Imagens Eletrônicas, Ed. 70, Lisboa, 1990.

• WOOD, Thomaz Jr. Gestão Empresarial: comportamento organizacional.

São Paulo: Ed. Atlas, 2005.

• ZARIFAN, Philipe. Trabalho e Comunicação nas Indústrias Automatizadas.

São Paulo: SEADE, 1992.

• ZANELA, A. C.; Macadar, M. A.; Soares, R.O. Mudança Organizacional

Provocada pela Utilização de Sistemas Integrados de Gestão

Empresarial. Foz do Iguaçu – PR: ENANPAD, 1999.

• WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. Tradução de Waltendir Dutra. Rio de

Janeiro: Editora Zahar, 1979.

173

• _________. Economia e Sociedade. Brasília: Editora UNB, 1998.

• WHEATLEY, Margarte J. Liderança e a Nova Ciência: Aprendendo

Organização com um Universo Ordenado. São Paulo: Cultrix, 1999.

• WURMAN, Richard S. A sociedade da Informação. São Paulo: Cultura, 1991.

• YIN, Robert K., Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. 2ª edição, Porto

Alegre: Bookman, 2001.

• YOSSEF, Antonio Nicolau. Informática e Sociedade. São Paulo: Ática, 1995.

174

ANEXO I

QUESTIONÁRIOS DA PESQUISA

175

QUESTIONÁRIO DIRETORES

1- Qual a sua percepção sobre a implantação da intranet na Fundação com relação aos seguintes pontos:

a) Agilização da Comunicação

b) Barateamento dos fluxos de comunicação

c) Aumento do acesso às informações diversas para todos os níveis hierárquicos da Fundação

d) Uniformização das informações gerais

2- Na sua opinião após o impacto inicial da implantação da intranet, os usuários diminuíram sua assiduidade na abertura de seus e-mails?

3- Você acredita que após o início da intranet houve uma mudança nas relações entre os diversos setores dentro da Fundação, no sentido de que a comunicação entre hierarquias diferentes ficou facilitada?

4- Você gostaria de apontar mais alguma observação relevante sobre a implantação da intranet na Fundação?

176

QUESTIONÁRIO GERENTES

1- Qual a sua percepção sobre a implantação da intranet na Fundação com relação aos seguintes pontos:

a) Agilização da Comunicação

b) Barateamento dos fluxos de comunicação

c) Aumento do acesso às informações diversas para todos os níveis hierárquicos da Fundação

d) Uniformização das informações gerais

2- Na sua opinião após o impacto inicial da implantação da intranet, os usuários diminuíram sua assiduidade na abertura de seus e-mails?

3- Você acredita que após o início da intranet houve uma mudança nas relações entre os diversos setores dentro da Fundação, no sentido de que a comunicação entre hierarquias diferentes ficou facilitada?

4- Você percebeu alguma mudança no sentido de melhoria ou não do processo de adaptação dos novos funcionários após a implantação da intranet, ou seja, ela facilitou o aprendizado e conhecimento da estrutura?

5- Na sua percepção os usuários da intranet:

a) lêem os e-mails na tela

b) imprimem para ler no papel

6- Após a introdução da intranet:

a) As relações se tornaram mais formais

b) As relações se tornaram menos formais

c) Não houve nenhuma alteração

177

QUESTIONÁRIO FUNCIONÁRIOS

1- Você acha que a implantação da intranet na Fundação: a) Agilizou a Comunicação?

sim não não sei

b) Barateou os fluxos de comunicação?

sim não não sei

c) Aumentou o acesso às informações diversas para todos os níveis hierárquicos da Fundação?

sim não não sei

d) Houve uma uniformização das informações gerais?

sim não não sei

2- Na sua opinião após o impacto inicial da implantação da intranet, os usuários diminuíram sua assiduidade na abertura de seus e-mails?

sim não não sei

3- Você percebeu alguma mudança no sentido de melhoria ou não do processo de adaptação dos novos funcionários após a implantação da intranet, ou seja, ela facilitou o aprendizado e conhecimento da estrutura?

sim não não sei

4- Na sua percepção os usuários da intranet:

a) lêem os e-mails na tela

b) imprimem para ler no papel

5- Após a introdução da intranet:

a) As relações se tornaram mais fáceis

b) As relações se tornaram mais difíceis

6- Você acha que a intranet tornou os processos administrativos mais trabalhosos?

sim não não sei

178

ANEXO II

TELAS DE NAVEGAÇÃO DA INTRANET

179

180

181

182

183

184

185

186

187

188