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OS PRIMEIROS PASSOS NO ENSINO DE HISTÓRIA:

o uso de fontes

Silvana Calarga Ramos1

Fábio André Hahn2

Resumo: O presente artigo é resultado das atividades desenvolvidas durante o Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), ofertado pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná, com intervenção no Colégio Estadual Vicente Tomazini, na cidade de Francisco Alves. O objetivo é investigar o impacto do uso de fontes históricas em sala de aula com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental II, por entender que as fontes são um dos fundamentos da história enquanto ciência e precisa ser apreendido pelo aluno já nos primeiros anos do Ensino Fundamental II. Para tanto, utilizou-se de métodos diversificados para o trabalho com uma diversidade de fontes históricas (escritas, fotográficas, audiovisuais e orais) em sala de aula com a temática voltada ao processo de colonização do munícipio de Francisco Alves entre os anos de 1950 a 1973. A intenção foi fazer com que os alunos compreendessem como é constituído o processo de escrita da história e sua fundamentação científica. Dessa forma, o objetivo é estimular no aluno o despertar para a investigação científica, curiosidade e criatividade, melhorando sua capacidade de reflexão e análise da história. O resultado foi refletido no processo de aprendizagem dos alunos e diluído ao longo das atividades desenvolvidas, permitindo um avanço na sua qualidade formativa. Palavras-chave: Ensino de História. Aprendizagem. Fontes históricas.

1 Introdução

A escola tem a difícil tarefa de despertar o interesse do aluno pela

investigação, pelo estudo. Nesse caso, especificamente, que o aluno se interesse e

compreenda o papel da disciplina de História na escola, realize reflexões e aguce o

senso crítico sobre as informações que consome diariamente na sociedade em que

vive. Para tanto, o ensinar História deve considerar a experiência de vida do aluno,

mesmo os de pouca idade, tomando como base a comunidade em que vive, seu

relacionamento com as pessoas, familiares ou não, e as memórias e as lembranças

sobre sua localidade. Isso requer do professor a sensibilidade em buscar o sentido e

o significado para os conteúdos que ministra, superando a mera transmissão de

informações, como já apontou Selva Fonseca (1995).

1 Docente do Colégio Estadual Vicente Tomazini, do município de Francisco Alves, no Paraná. E-mail: [email protected].

2 Docente da Universidade Estadual do Paraná – Unespar. E-mail: [email protected].

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Nessa direção, para o processo de aprendizagem em História, é fundamental

que o professor diversifique seus métodos de ensino, crie situações de troca, de

estímulos na constituição de relações entre o conteúdo e as experiências vividas,

com a garantia de acesso aos alunos a novos conhecimentos e informações, de

confronto e comparações de opiniões, de apoio ao estudante na recriação de suas

explicações e de transformações de suas concepções históricas.

Mediante o exposto, este texto é resultado do trabalho desenvolvido no

Programa de Desenvolvimento Educacional ─ PDE, da Secretaria de Educação do

Estado do Paraná, entre os anos de 2016 e 2017. A proposta central do programa é,

a partir da experiência de docência, desenvolver e produzir material didático-

pedagógico e realizar sua consequente aplicação na escola, de modo a avaliar os

resultados atingidos. A presente proposta focou em produzir e testar materiais

direcionados ao 6º ano do Ensino Fundamental II, mais especificamente materiais

que envolvessem as fontes históricas em sala de aula, entendidas aqui como

princípio fundamental na formação do aluno para a compreensão do papel da

história na vida das pessoas.

A proposta é trabalhar com uma temática da história local (Cf. DCE, 2008),

que pode ser entendida como ponto de partida para o processo de ensino-

aprendizagem da disciplina de História, por possibilitar o trabalho mais próximo da

realidade dos alunos. Neste caso, portanto, será desenvolvido um trabalho a partir

das experiências com a temática da colonização do município de Francisco Alves,

no Paraná, entre os anos de 1950 e 1973. Dividido em três etapas, este artigo visa,

em um primeiro momento, tratar das fontes e do ensino de História; na sequência,

apresentar elementos sobre o perfil dos alunos investigados; e, por fim, apresentar

as experiências com a intervenção da proposta em sala de aula e fora dela, em que

os alunos participaram diretamente do estudo e da coleta da documentação,

avançando para além das informações e das instruções apresentadas

tradicionalmente nos livros didáticos.

2 Ensino de História e o uso de fontes

Visando demonstrar a importância de trabalhar com o fundamento da história

como ciência com os alunos dos 6ºs anos, pode-se afirmar que um dos elementos

principais desse fundamento é o uso de fontes. De acordo com Flávia Caimi (2009),

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tanto a sociedade quanto os sistemas de ensino passaram por transformações e

continuam exigindo mudanças em razão das novas e complexas demandas

relacionadas à vasta diversidade cultural e à expansão das redes de informação,

tudo acrescido da exigência ─ emanada das políticas públicas ─ de qualidade de

ensino e de aprendizagem de todos os alunos e em todos os níveis. Esse processo

ajuda o professor a compreender um dos princípios básicos de sua profissão, mas

que, muitas vezes, passa despercebido: Como se ensina e como se aprende? A

partir dessa questão é que precisamos repensar o ensino de História, que saberes

históricos ensinar e aprender, assim como que métodos devemos utilizar que

instiguem os alunos a investigar, a refletir, a compreender e a intervir de forma mais

consciente em seu próprio processo de aprendizagem.

Segundo Caimi (2009, p. 65-66),

Estudos recentes sobre os processos do pensar e do aprender, em suas diversas vertentes, acentuam o papel ativo dos sujeitos/alunos em seus percursos de aprendizagem e o protagonismo do professor na promoção de situações educativas que favoreçam o desenvolvimento de habilidades de pensamento, traduzidas na construção de competências cognitivas para o “aprender a aprender", e que, ao mesmo tempo, possam educar os jovens com base nos valores contemporâneos. Em tal contexto, ganharam destaque, nos últimos anos, no âmbito das políticas educacionais públicas e também nas discussões acerca da história escolar, as preocupações efetivas com os resultados do trabalho pedagógico, ou seja, com a qualidade da aprendizagem dos estudantes. No que diz respeito às políticas educacionais, pode-se referir o Parecer CNE/CP 9/2001, que orienta as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena e estabelecer três indicativos de compromisso do professor com a problemática da aprendizagem, a saber: orientar e mediar o ensino para a aprendizagem dos alunos; comprometer-se com o sucesso da aprendizagem dos alunos; assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos.

Nessa direção, vale destacar que a preocupação com o “aprender” está posta

como elemento central, mas ainda pouco praticado nas escolas de forma efetiva,

escolas que, de certa forma, continuam atreladas na direção dos apontamentos e

das preocupações apontadas por Fábio Hahn e Adaiane Giovanni (2015, p. 431-

432):

Para discutir o ensino de História podemos, de forma exploratória, apontar algumas questões que podem ser relevantes para o momento histórico em que vivemos, mais especificamente três: primeiro, as novas tecnologias que têm marcado profundamente a

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mudança das relações sociais, o acesso à informação e apontado novos caminhos que podem e precisam repercutir no ensino, porém de forma qualificada, são uma realidade já presente; depois, o perfil dos estudantes, que mudou rapidamente nesta última década, em parte pelas transformações tecnológicas, mas também como resultado das alterações culturais, sociais e econômicas, que, de modo geral, têm impactado nossa sociedade; por fim, a verificação da falta de interesse e da dificuldade da aprendizagem dos alunos pelo estudo da História nas escolas, o que não é mais novidade e nem exclusividade desta área.

Todos esses elementos nos ajudam a pensar na escola e no ensino de

História que enfrenta esses desafios ainda timidamente, mas que não pode mais ser

remediado se de fato existir um projeto de futuro para o país. A situação atual do

ensino nas escolas passa por profundas dificuldades, resultando em baixa qualidade

formativa, especificamente de aprendizagem. Não é, portanto, possível ficar

esperando pelas políticas públicas. É preciso enfrentar a situação atual com novas

práticas de ensino nos mais diversos espaços de formação, evitando a total

destruição da instituição escolar como espaço de formação humana.

A partir do que destacaram os autores acima, percebe-se, para além da

questão da aprendizagem dos alunos, a preocupação com a formação do professor

e com o ensino de História de modo geral. A problemática atual centra a discussão

em vários âmbitos, relacionada tanto nas práticas pedagógicas, nos métodos e no

aperfeiçoamento de materiais didáticos, pois os estudos demonstram que, “[...] nos

últimos anos, a forma tradicional de ensino centrada na figura do professor como

transmissor do conhecimento histórico, a qual delegava ao aluno a posição de

receptor passivo dos conteúdos, passou a ser questionada” (CAIMI, 2006, p. 19).

Desse modo, é fundamental nos questionarmos: O que os nossos alunos estão

aprendendo e como estão aprendendo nas aulas de História? Repensar e discutir

sobre como ensinar História no início dos anos do Ensino Fundamental II,

especificamente nos 6ºs anos, passou a ser o nosso objetivo como possível

colaboração no processo mais amplo. Que fundamentos da história deverão ser

ensinados e aprendidos? Noções históricas básicas de temporalidade, de identidade

e de orientação? Inúmeras são as questões e que certamente são significativas para

a vivência do aluno, somadas a outras ações que possibilitem maior autonomia do

aluno para a vivência em sociedade.

Nessa direção, a utilização de fontes históricas em sala de aula não tem o

propósito de fazer com que os alunos analisem as fontes históricas como um

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historiador profissional, mas propor uma aproximação com o trabalho do historiador

na investigação científica, despertando a curiosidade, a criatividade e a capacidade

de reflexão e análise desde o início dos seus estudos no Ensino Fundamental II.

Peter Burke (1992), quando trata do surgimento da Escola dos Annales, em

1929, aponta para uma das principais contribuições ocorridas naquele momento: o

alargamento da noção de fontes históricas. Isso possibilitou a ampliação do seu

significado dentro do campo da História enquanto disciplina, passando a ser

incluídas diversas tipologias anteriormente rejeitas como prova, por exemplo:

pinturas, fotografias, filmes, móveis, roupas, músicas, entre outras. Antes do

movimento da Escola dos Annales, os historiadores utilizavam, em suas pesquisas,

mais especificamente fontes escritas e com cunho de oficialidade, em geral

produzidas pelo próprio Estado em suas esferas administrativas.

Assim, portanto, para além da ampliação da noção de fonte histórica, outros

importantes elementos foram repensados, como a chamada história-problema, em

oposição ao registro puro das informações, a noção de fato histórico e a integração

da interdisciplinaridade, dando sobrevida para a área (Cf. BURKE, 1992; REIS,

2000). A inovação no entendimento de fonte histórica proposta pela Escola dos

Annales expandiu o universo das pesquisas históricas, aumentando as

possibilidades do trabalho do professor em sala de aula. É nessa direção que

investigamos o processo de colonização do município de Francisco Alves com os

alunos, de modo que eles percebam como as fontes fundamentam a constituição da

história, mas de uma maneira que também seja lúdica.

Pensar nas mudanças provocadas durante o século XX, especialmente no

campo teórico e metodológico da história, permite entendermos as principais

contribuições para a nossa área de conhecimento. Ocorreu, no entanto, que essas

grandes mudanças por muito tempo não foram refletidas no ensino de História. O

primeiro passo é repensarmos e praticarmos os fundamentos da história em sala de

aula, evitando questionamentos sobre qual o sentido da história, que somente

aparece quando não se compreende a formação das narrativas sobre a escrita da

história. É evidente que os alunos do 6º ano podem não compreender tudo isso, mas

os princípios precisam ser trabalhados de forma lúdica, de modo que a introdução

do assunto "fonte história" e sua problematização estejam no centro do ensino de

História e possa favorecer a autonomia dos alunos para aprender, para refletir

criticamente e para formar uma consciência histórica.

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3 O diagnóstico dos alunos

Elisabete Moraes (2013) destaca a importância de o professor de História

despertar no aluno o sentido de pertencimento ao mundo em que vive com a

importância de fazer e de compreender a história. Jaime Pinsky e Carla Pinsky

apontam nessa mesma direção. Segundo eles:

[...] cada estudante precisa se perceber, de fato, como sujeito histórico, e isso só se consegue quando ele se dá conta dos esforços que nossos antepassados fizeram para chegarmos ao estágio civilizatório no qual nos encontramos. Entretanto, estas questões poderão ser operacionalizadas se o professor conhecer o universo social e cultural do aluno. Para isso, torna-se necessário trabalhar com a história pessoal do aluno, relacionando o passado com o presente a fim de que a história tenha sentido para o aprendiz. Este precisa perceber-se como ser social e suas escolhas podem fazer diferença na construção de sua própria história. Segundo os mesmos autores referidos, quanto mais o aluno sentir a História como algo próximo dele, mais terá vontade de interagir com ela, não como uma coisa externa, distante, mas como uma prática que ele se sentirá qualificado a exercer. O verdadeiro potencial transformador da História é a oportunidade que ela oferece de praticar a “inclusão histórica” (2010, p. 28).

Nesse sentido, é preciso buscar na história do aluno suas experiências de

vida. Assim, suas relações socioculturais, seus ambientes geográficos, seus saberes

e suas vivências devem ser considerados. A realidade dos alunos pode apresentar

valiosas possibilidades de investigação, ofertando ao professor maneiras prazerosas

de ensinar e de aprender, conforme acima destacaram Jaime Pinsky e Carla Pinsky.

Com a intenção de levar os alunos a se reconhecerem como sujeitos da

história, aplicamos um questionário diagnóstico para compreendermos seu perfil,

suas características e seus conhecimentos de História, cumprindo o objetivo de levar

os alunos a realizar uma reflexão sobre a importância de estudar o passado, as

maneiras como se produz e reproduz a História, o que são fontes históricas, entre

outras questões. Foram investigados 30 alunos e nenhum deles soube responder o

que são fontes históricas, quais são elas e para que servem. Esse foi um primeiro

item que impulsionou a pesquisa e o desenvolvimento do material.

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Fonte: Dados da pesquisa, 2016

Como os alunos apresentaram certa dificuldade, tivemos que orientá-los a

responder com suas próprias palavras, porém, para responder a determinadas

questões, os alunos tiveram ajuda de seus familiares.

Quanto ao resultado do diagnóstico, somado com as conversas com os

alunos, observou-se que o perfil social, cultural e econômico dos alunos

pesquisados revelou que, em sua grande maioria, são filhos de trabalhadores rurais,

alguns filhos de trabalhadores volantes (boias-frias), sem emprego fixo e,

consequentemente, sem renda fixa.

No município, a partir das informações coletadas pelos alunos junto aos seus

familiares, ficou revelado que o processo de transformação tecnológica impactou a

agricultura e reduziu significativamente a quantidade de empregos, forçando, com

isso, muitas famílias a migrarem do campo em direção às pequenas cidades, em

busca de melhores condições de vida. As pequenas propriedades foram vendidas e

o crescimento dos grandes produtores se expandiu rapidamente em todo o

município. A desigualdade na distribuição de renda ficou mais evidente, como

também é comum em outros municípios do Paraná. Muitos trabalhadores do campo

foram forçados a se adaptarem a novas atividades de trabalho, nas indústrias locais

e na construção civil.

Mediante o exposto, realizamos uma discussão entre as profissões que

tiveram destaque em diferentes setores da sociedade e em diferentes períodos,

abordando as transformações no mundo do trabalho e acontecimentos vividos na

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cidade de Francisco Alves, como uma forma de estimular o debate e a reflexão com

base em elementos do seu cotidiano.

O diagnóstico realizado também revelou que alguns alunos vieram de outras

cidades e de outros estados3, assim como alunos da zona rural, mesclados com os

da zona urbana, em busca de empregos em empresas cooperativas da região. Os

dados coletados revelaram uma turma com perfil bastante diversificado, e esses

alunos revelaram, no questionário, sua história como algo sem importância,

principalmente no que se refere às questões sobre os familiares, as profissões e o

significado do nome do município. De início, os alunos tiveram dificuldades de

relacionar essas informações com a história local. O diagnóstico foi uma forma de

estimular os alunos a pensarem sobre si mesmos e sobre elementos presentes na

história do município em que vivem, procurando despertar, aos poucos, a

importância do estudo da história para a compreensão de uma sociedade.

Como forma de divulgar as informações coletadas e sem expor os alunos,

realizamos a socialização das informações por meio de um painel, que ficou em

exposição no mural da escola. O painel foi composto com detalhes coletados e que

serviriam de norte para as próximas etapas da atividade de intervenção na escola

junto aos alunos, valorizando elementos culturais, sociais e econômicos do processo

histórico presente na história de seus familiares e que se confundem com a própria

história do município.

4 A intervenção

A intervenção pedagógica realizada com os alunos do 6º ano foi norteada

pelo material didático produzido para esse fim. O tema que fundamentou a

discussão foi o processo de ocupação e colonização do atual município de Francisco

Alves/PR. Todo material foi planejado pensando na exploração das diferentes fontes

históricas locais como uma ferramenta pedagógica importante para a

problematização da identidade de uma comunidade. Os resultados da intervenção

serão apresentados em quatro etapas, sendo que, nas duas primeiras,

apresentaremos o trabalho com as fontes históricas relacionadas à história do aluno

3 Eram 22 os alunos que nasceram em Francisco Alves e seus pais vieram dos seguintes estados: São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e Mato Grosso. Outros 5 chegaram recentemente do estado de Alagoas, mais 1 de Palotina/PR e 2 de Iporã/PR.

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e de seus familiares e, nas duas últimas, sobre as fontes históricas relacionadas ao

município de Francisco Alves.

Na primeira etapa, o trabalho foi constituído por atividades de leitura e

interpretação de textos, abordando o que é história e quais são os seus sentidos. A

proposta foi fazer os alunos questionarem quem faz parte da história e quem

escreve a história. Com essa atividade realizada em sala de aula, foi possível

conhecer melhor os alunos, explorando a importância de nos compreendermos

como sujeitos do processo histórico, mesmo percebendo a dificuldade desse

trabalho com alunos do 6º ano. Com as atividades desenvolvidas em sala de aula,

foi possível contrastar algumas visões construídas na história, como, por exemplo,

os grandes heróis. Essa forma de pensar a história deixou de lado a subjetividade

das pessoas mais simples e enaltecendo sobremaneira determinadas figuras

políticas, em especial. As chamadas "minorias" dentro do sistema passaram a gozar

de maior visibilidade, como é o caso das mulheres, dos operários, dos negros, dos

índios, entre tantos outros.

O primeiro passo, portanto, foi a identificação das diferentes narrativas

históricas em revistas e jornais, antes de entrarmos em questões práticas

específicas do tema proposto. A atividade desenvolvida em grupo teve o intuito de

fazer com que os alunos identificassem três fatos históricos que revelassem esse

processo de mudança. Realizada a atividade, todos integraram uma roda de

conversa sobre o que haviam pesquisado e discutido. Dando continuidade à

atividade e buscando um paralelo com questões locais, solicitamos aos alunos que

trouxessem para a escola diferentes materiais e objetos, como: documentos

escritos, materiais de trabalho, brinquedos, álbuns, entre outros. A proposta foi fazer

com que todos praticassem a produção de uma narrativa histórica a partir do que

haviam levado para a escola. Desse modo procuramos seguir os apontamentos de

Carlo Ginzburg (1989; 2007), que alerta que a narrativa dos acontecimentos e seus

personagens deve ser fundamentada em provas, ou seja, em marcas do passado

que não podem ser tramados pelo historiador. Essa primeira experiência com os

alunos permitiu, portanto, que avançássemos de forma mais segura em nossa

estratégia de ensino-aprendizagem.

Na segunda etapa tratamos com os alunos sobre o que são fontes históricas

e sobre o trabalho do historiador. Para cumprir esse propósito, propusemos aos

alunos que eles desenvolvessem a narrativa oral e escrita. Para tanto, sorteamos

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um aluno para fazer a sua narrativa a partir de um álbum de fotografias. Os alunos

foram estimulados a produzir as histórias e a compartilhar com a turma, a partir das

fontes que haviam trazido para a escola (álbum de fotografias, documentos variados,

brinquedos e objetos). A atividade permitiu mostrar aos alunos o que são fontes

históricas e se exercitarem na escrita da história, de modo que compreendessem a

complexidade e a responsabilidade ao escrever a história, como pode ser observado

nas imagens abaixo.

Atividade de produção de histórias realizadas pelos alunos com utilização de fontes históricas

Fonte: Arquivo da autora, 2017

A investigação sempre é uma etapa cuidadosa e que precisa ser muito

coerente com os fatos, pois muitos elementos estão envolvidos. Para compreender o

trabalho do historiador é preciso antes compreender a natureza do conhecimento

histórico. Como o passado, por definição, é aquilo que “já passou”, é impossível

saber o que as pessoas pensavam e como viam o mundo. Segue-se, portanto, que o

historiador só tem indícios sobre esse passado, indícios representados por vestígios

materiais deixados por ele e que possibilitam a montagem do quebra-cabeças.

Para além dessa atividade inicial desenvolvida na segunda etapa, avançamos

para a construção de uma árvore genealógica, entendida aqui como representação

gráfica dos nossos antepassados (pais, avós, bisavós, etc.). A atividade foi

encaminhada da seguinte forma. Cada aluno teve que elaborar a árvore genealógica

de sua família (com informações como mudanças de casa ou de cidade,

casamentos, nascimento e morte de pessoas, empregos, período de dificuldades,

etc.) e escrevesse essas informações em uma folha avulsa. Com a referida atividade

realizada, montamos um livro reunindo a história familiar de todos os alunos da

classe. Esse livro foi lido e analisado considerando as diferenças e as semelhanças

presentes nas histórias. A partir dessa atividade foram feitos os seguintes

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questionamentos: Para realizar a pesquisa sobre a história de sua família, que

fontes históricas você utilizou? É importante conhecer a história da sociedade em

que vivemos? Qual o motivo dessa importância? Escreva a conclusão do grupo no

caderno e conte para a turma.

Seguindo o planejamento da atividade e procurando estimular os alunos na

reflexão sobre a escrita da história, levamos para a sala de aula um objeto muito

presente no cotidiano das famílias durante o processo de colonização: o ferro de

passar roupa à brasa. A partir do objeto lançamos os seguintes questionamentos:

Vocês conhecem esse objeto? Para que serve? Existe algum objeto atualmente que

substitui a função do objeto que vocês estão observando? Esse objeto pode ser

considerado uma fonte histórica?

Como resultado dessa etapa ficou claro que, no procedimento de construção

da consciência histórica, é imprescindível que o professor ofereça atividades e

questionamentos que promovam a participação dos alunos na construção do

conhecimento, garantindo a eles o entendimento sobre como se dá a produção do

conhecimento, ou seja, como é produzido a partir do trabalho de um pesquisador

que tem como objeto de estudo as ações e as relações humanas praticadas no

tempo, bem como os sentidos que os sujeitos lhe deram, de modo consciente ou

não. O historiador segue um método de pesquisa para problematizar o passado e

buscar, por meio dos vestígios no tempo, respostas às suas indagações. A partir

disso, é produzida a narrativa histórica, cujo desafio é contemplar a diversidade das

experiências políticas, sociais, econômicas e culturais. Conforme está destacado

nas DCE, “Entender tais aspectos possibilita que os alunos valorizem e contribuam

para a preservação de documentos, dos lugares de memória, dos acervos privados

e públicos de fotografias de documentos escritos e audiovisuais [...]” (DCE, 2008, p.

4).

Na terceira etapa propusemos um processo de investigação sobre as fontes

históricas (escritas, orais, imagéticas) que pudessem ajudar a escrever a história do

município de Francisco Alves.

A proposta de investigação sobre o munícipio está direcionada ao campo da

história local, fundamental para um trabalho inicial com alunos no ensino de História,

por possibilitar refletir sobre um passado presente nos espaços de convivência que

lhe são comuns (escola, comunidade, trabalho, lazer, Igreja). Nesse sentido, o

entendimento de como ensinar história deve estar direcionado para a orientação de

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problemas da vida prática, priorizando a reflexão histórica e não o acúmulo de

informações (MEC, 2010, p. 23).

Como componente essencial para estimular o diálogo entre os diferentes

saberes, a história local pode ser vista como uma estratégia pedagógica. Trata-se de

uma forma de abordar temáticas que apresentam proposições articuladas com os

interesses do aluno, facilitando um estimulo cognitivo. Como estratégia de

aprendizagem, a história local pode garantir uma melhor apropriação do

conhecimento histórico baseado em recortes selecionados do conteúdo, recortes

que serão integrados no conjunto do conhecimento (SCHMIDT, CAINELLI, 2004,

p.111-114).

A atividade foi iniciada com a exposição do mapa político do Brasil em um

primeiro momento, levando ao conhecimento dos alunos os estados que constituem

o país e, na sequência, foi utilizado o mapa do estado do Paraná com a divisão do

território em municípios, de modo que os alunos pudessem visualizar o espaço e o

conjunto de informações.

Em seguida organizamos a turma em círculo e os alunos foram instigados a

falarem sobre que informações eles tinham sobre o município de Francisco Alves.

Anotamos todas as informações dos alunos em um papel e, logo em seguida,

distribuímos uma ficha para cada aluno, com os seguintes questionamentos: Onde

podemos encontrar documentos que nos ajudem a escrever a história do município

de Francisco Alves? Que fontes históricas podemos utilizar para escrever a história

do município? Qual é a relação entre a história do município e a história do Paraná?

Para estimular a reflexão, exibimos o filme de Eliane Caffé intitulado “Narradores de

Javé”, que trata, entre outras questões, da história de uma pequena cidade.

A partir das questões propostas anteriormente para a reflexão e com apoio

das discussões presentes no filme de Eliane Caffé, apresentamos uma tarefa para

eles. A tarefa era que “desvendassem” a história do município de Francisco Alves a

partir de alguns indícios. É claro que não esperávamos resultados fantásticos, mas

qualquer pequena iniciativa já seria uma grande conquista. Os alunos foram

organizados em equipes, orientados a procurar em casa, com a ajuda de seus

familiares, fotografias recentes e antigas de seus familiares (avós, tios, pais...),

desde fotos e informações sobre quando vieram morar em Francisco Alves e outras

da atualidade. Organizar as fotos por data, anotando o ano, a lápis, no verso de

cada foto. Seguindo o caminho apontado por Ana Maria Mauad (1996), com

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pequenas adaptações ao contexto dos alunos, procuramos estimular a reflexão

sobre o que viam nas fotos e como relacionar isso ao contexto em estudo. O

envolvimento da família foi fundamental, pois possibilitou a coleta de fontes e ajudou

os alunos a entenderem determinados aspectos da história do município.

Investigação sobre Francisco Alves a partir das fontes documentais na Prefeitura Municipal

Fonte: Arquivo da autora, 2017

Segundo Bóris Kossoy,

[...] o mundo tornou-se de certa forma “familiar” após o advento da fotografia; o homem passou a ter um conhecimento mais preciso e amplo de outras realidades que lhe eram, até aquele momento, transmitidas unicamente pela tradição escrita, verbal e pictórica [...] as fotografias não são meras ilustrações ao buscaram sua própria história estabelecendo vínculos de comunicação com a família e quando deixaram transparecer o “senso de pertencimento” (KOSSOY, 1989, p. 98-100).

Essa atividade possibilitou refletir sobre o momento histórico em que foram

produzidas as fontes, quem as produziu e em quais circunstâncias. Esses são

elementos fundamentais para a compreensão das intencionalidades do autor.

Na quarta etapa desenvolvemos atividades de pesquisa, de análise e de

reflexão sobre fontes referentes à história local, mais especificamente com

fotografias sobre a colonização do município, depoimentos de moradores e recortes

de jornais cedidos pelo acervo da Fazenda Barra Dourada.

Para Carla Pinsky (2005, p. 7), “[...] fontes históricas são todos os materiais,

dos quais os historiadores se apropriam por meio de abordagens específicas,

métodos diferentes e técnicas variadas para tecerem seus discursos históricos”.

Para a autora, o repertório de fontes que podem ser exploradas pelos historiadores é

grande e variado, mas alerta para o cuidado com a autenticidade, a autoria, a

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datação, entre outros elementos. Cada tipologia de fontes tem uma metodologia de

análise específica e apropriada para aquele material. No caso da presente proposta,

foram escolhidas fotografias, depoimentos e jornais, materiais a respeito dos quais

Pinsky (2005, p. 64) afirma que é preciso investigar as condições em que cada

documento foi produzido, o seu propósito, para quem foi produzido, contextualizando

o documento a ser analisado.

Pensando nessas questões, organizamos os alunos em duplas para fazerem

o estudo das fontes já coletadas previamente sobre o município de Francisco Alves

e, logo em seguida, apresentarmos o conjunto de documentos do arquivo da

Fazenda Barra Dourada. Prosseguindo com os encaminhamentos, apresentamos

várias fotografias e recortes de jornais aos alunos para que eles lessem e

estudassem essas fontes. Para além disso, como tarefa, deveriam entrevistar ao

menos um morador da cidade que tivesse migrado para essa região durante o

processo de colonização. Como já imaginávamos que essa última seria uma tarefa

mais difícil, especialmente pela pouca maturidade dos alunos para esse tipo de

encaminhamento, convidamos alguns moradores para realizarem seus depoimentos

de forma coletiva para todos os alunos da turma. A atividade despertou muito

interesse por parte dos alunos e a repercussão foi fantástica. Eles se sentiram

estimulados a continuar as atividades propostas com maior empolgação, pois

observaram um elemento que pode parecer muito simples em um primeiro momento,

mas muito profundo para quem ainda está despertando para a vida: a história está

em cada um de nós e não se restringe aos livros didáticos, como eles estão mais

acostumados a pensar.

Entrevista com moradores do município de Francisco Alves

Fonte: Arquivo da autora, 2017.

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Após a realização dos depoimentos, realizamos uma roda de conversa para

tratarmos sobre o que haviam compreendido e que mudanças identificaram com

base nos depoimentos e comparativo com a realidade deles hoje. Na conversa

surgiram questões abordadas, como: a transformação do espaço geográfico, o

aumento da população, a quantidade de famílias que moravam na zona urbana e

rural, os produtos produzidos na época e os instrumentos utilizados na agricultura.

Quanto às fotografias, distribuímos as fotografias relacionadas ao referido

período e cada grupo se incumbiu de pesquisar um tema que seria na sequência

socializado com toda a turma. Realizada essa etapa, programamos uma visita ao

arquivo da Fazenda Barra Dourada, no município de Francisco Alves, e junto do

inventariante, Rildo Aloísio, selecionamos fotografias retratando o período da

colonização para análise dos alunos, seguindo roteiro de questionamentos que já

havia sido trabalhado nas aulas teóricas e tendo por referencial a autora Ana Maria

Mauad (1996). Os alunos realizaram comparativos entre as festas da época e as

festas atuais, as roupas utilizadas, explorando as características comparativamente.

As fotografias do acervo tratavam de diversos temas, entre eles: profissões,

desmatamento, festas, bailes, desfiles tradicionais, meios de transporte, entre outros

temas. As imagens foram exploradas pelos alunos, despertando curiosidade em

observar aspectos do passado preservado nessas representações.

Para além das fotografias, também foram explorados os jornais da época,

preservados no arquivo da Fazenda Barra Dourada, de Francisco Alves, referente

ao período de 1954 a 1973. Para a análise e interpretação, seguimos a mesma

estratégia do trabalho com as fotografias, explorando sempre os elementos que

permitiam o comparativo com o contexto atual do município ou que fizesse um

paralelo com as demais fontes já exploradas (depoimentos e fotografias). Nessa

atividade, os alunos realizaram a leitura, a interpretação e responderam a alguns

questionamentos propostos como forma de roteiro de análise.

Os jornais foram analisados levando em consideração o contexto de

produção, suas intencionalidades e seus discursos. Essa consideração ao contexto

faz os alunos exercitarem a crítica às fontes, identificando os limites e as conexões

possíveis. Realizada essa etapa que havia sido planejada no material didático-

pedagógico, os alunos produziram suas narrativas históricas apresentadas para a

comunidade escolar, acrescidas de objetos antigos que trouxeram para exposição. A

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avaliação dos alunos ocorreu em um processo contínuo, com ênfase no

desempenho das análises, das reflexões, da participação e das produções de suas

narrativas, o que revelou uma compreensão mais clara sobre o papel da fonte

histórica na escrita da história.

5 Considerações finais

Avaliar os resultados sempre é uma tarefa difícil. Certamente a pergunta que

fica nesse momento é a mesma aventada no início do texto: Ocorreu aprendizagem?

A resposta não é objetivo e nem temos métricas para demonstrar aqui o quanto

cada aluno aprendeu de fato. Os resultados mais consistentes poderão ser

avaliados apenas a longo prazo, no decorrer da caminhada escolar do aluno. É,

entretanto, possível apontar alguns avanços nesse processo de ensino-

aprendizagem.

O primeiro grande desafio foi trabalhar, de forma mais detalhada, a questão

das fontes históricas com alunos do 6º ano. Nesse caso, sempre podemos

considerar os pontos positivos e negativos de toda a intervenção. Entre os pontos

positivos está a receptividade, que é própria da faixa etária, o que permitiu explorar

as diferentes questões que envolvem o conteúdo, em especial nesse caso, em que a

fonte histórica é o fundamento da aprendizagem em História. Por outro lado, existem

as dificuldades, especialmente pela faixa etária e pela dificuldade de compreender

determinadas questões mais complexa e que envolvem primeiramente experiência

de vida, o que, para esses alunos, ainda é um estágio inicial.

Para demonstrar os ganhos de aprendizagem dos alunos ocorridos no

decorrer do desenvolvimento das atividades, apontaremos alguns itens.

Inicialmente ficou claro que é fundamental nesse processo de ensino o uso de

várias fontes históricas, reafirmando a importância de o docente buscar uso de

métodos diversificados no intuito de levar os alunos a compreender o espaço onde

vivem. Ajudar os alunos a compreenderem que eles também são sujeitos da história

é tarefa árdua e não ocorre de uma hora para a outra, mas entendemos que isso se

efetivou ao longo do processo.

Quanto ao envolvimento dos alunos, ficou claro que a parte teórica não pode

nunca ser o todo, portanto a diferença no processo de aprendizagem verificada é a

participação direta do aluno. Na experiência realizada, os alunos trouxeram um

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riquíssimo material de casa, como fotografias e outros objetos que os remetem à

história, oportunizando o despertar do gosto pela investigação e o fascínio pela

construção do conhecimento, partindo de sua realidade mais próxima.

No decorrer de cada etapa foi possível acompanhar as mudanças da

compreensão dos alunos sobre o que é a fonte histórica e sua importância na

construção do conhecimento, afastando a simplicidade que, muitas vezes, leva a

interpretações equivocadas em torno de fatos sem fundamento. A fonte precisa ser

investigada em sua procedência, de modo que a interpretação também seja segura.

Além disso, os alunos compreenderam que os suportes são variados e necessitam

de cuidados específicos. A fotografia não é simplesmente uma imagem, assim como

os jornais. Todas essas fontes necessitam de método de análise e estão repletas de

intencionalidades que, em geral, não são observadas.

Por fim, "nem tudo foram flores", como se diz metaforicamente para

mencionar as dificuldades. Encontrar a melhor estratégia de ensino para cada

realidade não é simples nem rápido. Exige pesquisa e testes. Assim, portanto, nem

tudo o que foi planejado inicialmente saiu como esperávamos. A complexidade de

alguns documentos para a faixa etária do 6º ano apresentou algumas dificuldades

que precisavam ser adaptadas ao longo das atividades de modo a obtermos

resultados mais satisfatórios. Mesmo assim, no entanto, algumas atividades geraram

resultados para muito além do que imaginávamos, como foi o caso das entrevistas.

Ouvir a experiência pessoal das pessoas que viveram determinado momento

histórico, suas dificuldades e conquistas ao longo de décadas passadas, isso

aproxima a experiência vivida daqueles que ainda não a tem, mas podem imaginá-la

com maior realismo e aprender com elas.

Despertar o entusiasmo do aluno em aprender história sempre é desafiante. É

na sua entrada no Ensino Fundamental II que os alunos vivenciam, pela primeira vez

na vida escolar, as disciplinas sendo distribuídas a vários professores. É então que a

atuação do professor faz toda a diferença na caminhada do aluno na disciplina de

História. A compreensão dos elementos fundantes faz com que a matéria seja muito

mais interessante e empolgante. O perfil dos estudantes mudou muito na última

década, o que aponta na direção de mudanças também no processo de ensino, com

novas estratégias para o envolvimento dos alunos. Já é tomada como fato a

necessidade de práticas pedagógicas que proponham ultrapassar a mera

reprodução e repetição do conhecimento. O desafio é buscar uma metodologia de

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ensino cuja proposta esteja ancorada com o aprender e a aprendizagem focada em

questionamentos, pesquisas, informações de fontes que possam ser extraídas do

cotidiano, despertando maior interesse.

REFERÊNCIAS

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