Os Tambores de Sao Luis

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Sinopse: O negro na sua luta, nas suas revoltas, e na sua redeno. Obra das mais bem trabalhadas, original no seu tema e no seu processo tcnico e que representa o ponto culminante da produo do autor, na concatenao aliciante da narrativa, na modelar limpidez da escrita e na densa atmosfera de suspense e paixo. Embora se passe numa nica noite, que compe uma parbola perfeita entre o seu comeo e o seu imprevisto desfecho, o livro abarca todo um largo perodo de vida brasileira entre 1838 e 1915, com seus clrigos, seus polticos, seus escritores, seus tipos populares. E tudo isso a se desenrolar com o fundo sonoro dos tambores rituais vindo da casa das negras-minas, tocados ao longo da grande noite pela nostalgia, a f, a revolta e o jbilo dos antigos escravos. Partindo de um episdio imprevisto, o encontro de dois homens mortos, um negro com uma facada nas costas, e um branco assassinado por uma paulada dentro de um bar, numa velha noite de 1915, o autor imaginou cruzar duas linhas narrativas, de modo que ambas se fundissem, numa perfeita harmonia de planos, fluindo feio do barco que desliza pela superfcie do lago, tangido pela aragem matinal. Mais de quatrocentos personagens do movimento ao romance, numa linha de interesse crescente. Trecho do estudo: MARANTELLO: Imagens do Maranho segundo Josu Montello Ncia Lopes Noleto Sousa Tambores de So Lus expressa a sociedade aristocrtica e opressora do sculo XIX, caracterizando-se por um sistema de relaes onde perpassa a noo de pessoa (senhor) exercendo domnio sobre a coisa (escravo) com o diferencial de que esta camada dominante transposta para os romances com grande saudosismo, atravs de um tom memorial que os exalta, como quando faz referncia ao enterro de Sousndrade (1985, p.604): Lembrava-se bem de seu enterro, com o atade envolto na bandeira do Estado idealizada pelo prprio Sousndrade, com as listras branca, vermelha e negra, simbolizando a fuso das raas na formao do povo brasileiro, e mais a estrela branca sobre campo azul, representativa da unidade autnoma do Maranho. Muita gente, na tarde de sol. frente do cortejo, a carreta negra com frisos doirados, levando o esquife. Esta sociedade aristocrtica tambm encontra-se representada em Noite Sobre Alcntara, onde Montello mostra a decadncia da lavoura alcantarense em contraponto a um anterior perodo de prosperidade e o conseqente empobrecimento dessa sociedade que dela subsistia. Expressa tambm a importncia dada aquisio de ttulos no Imprio, a valorizao destes frente sociedade, uma sociedade regida por uma relao de apadrinhamento de poder econmico transformado em uma espcie de poder poltico. Tal valorizao encontra-se presente na passagem abaixo (1984, p.26): O senhor j soube que o General Deodoro fez comigo, major? Proclamou a Repblica! E l se foi meu ttulo por guas abaixo! Logo agora, quando eu j estava na bica para ser agraciado! Agora me diga: quem que me restitui as inmeras intenes que eu tive com o Imperador, passando-lhe telegramas, mandando-lhes presentes, comunicando-lhe minhas obras de caridade? Quem? Esta s a mim acontece! Seu Deodoro no poderia esperar mais uns dias? Que lhe custava esperar? E para que a Repblica? Ou ento, se a repblica era mesmo inevitvel, que esperasse a assinatura do meu decreto! Mas no: foi tudo a toque de caixa, e eu que fique aqui a ver navios! Como que vou me apresentar aos meus conterrneos?. Assim, transparece obra de Montello um Maranho aristocrtico que de toda a opulncia vivida se esvaece, uma sociedade que erigida em um lusitanismo escravocrata e opressora. Em suas obras encontramos citados grandes nomes, entre estes, Gonalves Dias, Odorico Mendes, Sotero dos Reis, Sousndrade, Joo Francisco Lisboa, Assim como mdicos, bispos, padres, presidentes de provncia, professores, desembargadores, etc. o Maranho narrado por entre becos e ruas famosas, como a Rua dos Afogados, Rua do Oiteiro, Rua do Passeio, Rua do Mocambo, Rua Grande. a So Lus de beiral no telhado, de ruas longas e estreitas. So os Largos, o do Carmo, o do Santiago, o do Desterro, at mesmo o Cemitrio do Gavio em suas obras lembrado. Lembra ainda o Portinho, a Praia do Caju e o Cais da Sagrao, as matracas do Caminho Grande, do Anil e da Maioba por cima das cantigas de bumba-meu-boi. O Liceu Maranhense tambm ganha uma ateno especial. um passado/presente que nestas obras se constitui.Um passado que Montello traz com o uso da memria, de forma a faz-lo presente. na construo deste passado/presente que Montello ergue sua representao sobre o Maranho. Para tanto, trabalha espaos distintos, desde So Lus, a Alcntara, at s fazendas do interior. Neste

universo, tem-se representado sobre um imenso saudosismo a poca de grande prosperidade maranhense de at meados do sculo XIX e, em contraponto a esta, um Maranho decadente que tenta reerguer-se j no sculo XX composto por uma sociedade que se v incipiente, impossibilitada de exibir-se com a riqueza de outrora. De aristocrtica, opulenta e opressora, torna-se esta sociedade melanclica. A Alcntara de tantos sobrades e fachadas torna-se propcia a assombraes, j que entre os vazios das ruas restam apenas os fantasmas dos antigos bares e escravos. Tem-se assim, trabalhada a saga da aristocracia maranhense envolta da idia de decadncia que perpassa o contexto de Noite Sobre Alcntara. Montello lembra ainda o vazio da Praia Grande, que mostra as transformaes sofridas pela cidade, estas transformaes do espao lembrada em Cais da Sagrao do um significado histria, pois a memria recompondo a paisagem de So Lus. A saga maranhense construda sobre a viso de mundo de Montello, no se limita decadncia da aristocracia maranhense, mas tambm dedica-se construo do imaginrio sobre o negro em sua luta contra a opresso desta aristocracia encontrado em Tambores de So Lus. Assim, lembram-se os instrumentos repressores, o feitor, a chibata, a palmatria e ainda as proibies de festas e fandangos, at mesmo a forca na Praa da Alegria. A opresso versus luta pela liberdade, expressa a escravido no Marantello. Neste imaginrio, a dependncia da aristocracia maranhense em relao ao trabalho escravo no se esconde, tendo projetado nas linhas destes romances toda a sua runa aps a abolio. So as fazendas empobrecidas transformadas em taperas com antigos bares e viscondes a desfalecer-se ao no suportar desfazer-se de seus ltimos bens. No podemos deixar de ressaltar tambm as inmeras referncias que Montello dedica a Donana Jansen que transpostas para seus livros cercadas pelas lendas que at o presente envolvem sua pessoa neste Maranho. Tal representao construda em torno desta comerciante e latifundiria deixa transparecer a sociedade aristocrtica e cruel que se impunha. Montello encontra-se ainda atrelado literatura tradicional, como pudemos demonstrar no decorrer deste trabalho, portador da ideologia da decadncia, constri o enredo de Noite Sobre Alcntara. Traz tambm consigo outras vises que estar norteando sua viso de mundo, a exemplo de Meireles e Viveiros, seja na forma de ver o Maranho, a sociedade aristocrtica nele presente, seja em suas contextualizaes, elitizaes e dicotomias. Utilizando-se de todo o seu saudosismo romntico, Montello constri imagens deste Maranho, de opulento a decadente. Sobrevive o Maranho entre reerguimentos e falncias, glrias e runas. Fica ento a memria como expresso de um desejo de retorno ao passado de glrias, efemrides e feitos hericos.