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inverno2018distrito federal
padê editorialcole-sã escrevivências
apoio:Fundo Elas de investimento social
oju oiyn,
padê editorial
cole-sã escrevivências n. 06
beatrizfernandes aqualtune
okan iná
oju oiyn, okan ináPoemas de Beatriz Fernandes Aqualtune
edição, diagramação, revisão: tatiana nascimento
ilustração da capa: Jean [email protected]
padê editorial é um coletivo editorial
que publica autoras negras y/ou lgbtqi+,fundado por tatiana nascimento y bárbara esmenia,
em brasília / DFwww.pade.lgbt
oju oiyn, okan iná foi feito no df, em agosto de 2018, como parte do projeto “Escreviventes: autopublicação artesanal de narrativas LBTs”, proposto pela padê e seleciona-do pelo Fundo Elas de Investimento Social em edital de 2018
tipografia: hero (capa), ogirema e chicago (miolo)
Aqualtune, Beatriz Fernandesoju oiyn, okan iná / Beatriz Fernandes Aqualtune. - 1a. ed. - Brasília (DF): padê editorial, 2018.
ISBN: 978-85-85346-07-2
1. poesia I. título.
sobre a cole-sã escrevivênciasinspirada no conceito de escrevivências de conceição evaristo, a cole-sã escrevivências, da padê editorial, é dedicada a textos de autorxs lgbtqi+ negrxs* estreantes, produzindo literatura contemporânea. são 50 títulos de livros cartoneros (com capa de papelão reutiliza-do!), escritos por autorxs sapatonas, travestis, mulheres y homens trans, gente não-binária, povo preto sexual-dissidente de um mon-te de lugares num brasil que insiste em nos matar, nos impedir de so-nhar, de falar com nossa própria voz. mas mesmo assim: aqui esta-mos, falamos, escrevemos. sonhamos! fazemos nossos próprios livros.
foi no blog de conceição que li “a nossa escrevivência não é para ador-mecer os da casa grande, e sim para incomodá-los em seus sonos injustos”. o racismo htcisnormativo, mola de funcionamento do sistema colonial que fez nossa banda do continente ser como é (es-cravocrata, lgbtqifóbica, espraiante de genocídio negro, indígena, de transfeminicídio, classista, desesperançosa, fundamentalista) tem entre suas principais ferramentas políticas de silenciamento: ten-ta nos roubar de nossas palavras, contaminar colonizando nossa ex-pressão/discurso/narrativas, quer despermitir que plantemos nosso próprio imaginário. difundir seus estereótipos sobre nós enquanto finge que não vê não ouve o que nós mesmxs temos a dizer sobre nós.
selecionar esses textos y autorxs tem a ver com uma fé no contar nossas próprias histórias. y histórias que curem nosso passado, alimentem nos-so presente, construam nosso futuro: além de incomodar sonos injus-tos, embalar os nossos sonhos de mundos, imaginários, afetos, existên-cias possíveis, plenas, autodeterminadas, autoafirmadas literariamente.
todos os livros publicados na cole-sã têm licença creative commons tipo “atribuição-não comercial-sem derivações”, o que significa que você pode compartilhar o material em qualquer suporte ou forma-to, desde que a autoria seja atribuída (“atribuição”) y desde que não seja feito uso lucrativo do material (“não comercial”). se você modi-ficar esse conteúdo, tampouco pode distribuí-lo (“sem derivações”).
tatiana nascimento, organizadora
*75% dxs autorxs publicadxs se autodeclaram negrxs
contagem dos escritos
zero ou òdo. beatriz fernandes reflexo aqualtune prefácio (pedro ivo)ení ou um. mel (anina)éjì. atotô!étà. depois de vocêérin. oyá láàrun. calungaéfà. pote de barroéje. tarefa cumpridaéjo. eu água, você óleoésàn. RITUALéwà. depois do caosòkanlá. oração à idaéjilà. perolei-meétàlà. poema para uma extra-terrestreérinlá. balançoéedógun. (sacizeiro)érìndilógún. contando borboletasétàdílógún. menina Bahiaéjìdílógún. excitandoòkàndílógun. voz ancestralogún. sabe o que é?vinte-e-um. o gurivinte-e-dois. amor de orivinte-e-três. lamúri a morosavinte-e-quatro. o homem da baixa dos sapateirosvinte-e-cinco. suavinte-e-seis. esquizôvinte-e-sete. FEMIvinte-e-oito. baobávinte-e-nove. oju oiyn okan inátrinta ou ógbòn. eu
beatriz fernandes reflexo aqualtune
Lembro-me até hoje da primeira vez que tive contato com os escritos de Conceição Evaristo; no prefácio, eu acho, estava escrito “Cada mulher ne-gra tem uma forma de estar no mundo.”. Contudo, eu não sabia como eu estava no mundo. Muito tempo se passou, a vida me colocou numa sex-ta-feira, com amigas do slam, para coordenar e ajudá-las. Recitei, morta de vergonha. Depois fui conversar com as adolescentes que estavam ali, que, assim como eu, não pertenciam ao território entrequadras plano piloto, eram de regiões administrativas, RAs. Elas de Sobradinho e eu da Boca da Mata, quase Taguatinga, quase Samambaia. Eu, na divisa de não saber que forma eu estava no mundo. Conversando com meninas-mulheres negras, elas me perguntavam sobre escrita. Estava nervosa. Até que pensei em pagode e músicas românticas. Pensei em Amor. Minha forma de estar no mundo é com amor. Então aconselhei elas a escreverem do jeito que elas quiserem. Neste dia eu me percebi nas escritas. Me vi poeta. Do meu jeito com meia hora para ser pisciana, sou o aquário com as-cendência em escorpião. Latente, incubado, descompensado jeito de ser-água-quente-fervendo, cantiga de amor à luz da lua cheia. Preta, gorda, sapatão e macumbeira. Educadora que procura referências da pretagogia, estudante de psicologia, astrologia, medicina alternativa. Não nascida que vai renascer e sonha com isso em silêncio.Das três Marias irmãs, a minha avó, com a lida de mulher preta, me criou olhando sempre para o seu, procurando no divino forças para seguir com a vida diante a tantas merdas que o ser diaspórica enfrenta, o genocídio. Eu também sempre olho, guiada pela lua, faço pelos meus que se foram, que virão. Aqualtune porque eu escolhi não esquecer que carrego abebê e adaga. Caminho pelas águas e também sou Beatriz, filha de Ana Paula. Com sorriso separado, abro minha confusão, minha escrevivência. Há al-guns anos minha escritora preferida me abraçou, me abençoou e pediu benção para Oxum e me desejou a força de todas as mulheres negras para continuar. Esse livro é um pouco do fruto de um povo. Uma vida que ainda existe. Eu sobre nós. Tento fazer dos meus escritos;
Quilombos de afeto.Renascimentos.
Nascimentos. Eguns.
[formato de vagina que dá luz e vida]
“NYAME BIRIBI WO SOROna unidade está a força”
pedro ivo(escritor/poeta/educador brasiliense
afrodiaspórico sexual-dissidente)
quando recebi o convite da editora tatiana nascimento para prefaciar oju oiyn, okan iná, de beatriz aqualtune, um misto de alegria e medo invadiu meu peito. alegria por ter ficado com olho de mel – como diz a poeta – ao entrar em contato com tamanha competência estética e de conteúdo es-crevividos pela experiência, o que fez arder em mim a certeza de que a palavra preta carrega em si a força motora e transformadora do amor no mundo contra incontáveis práticas desumanas.
ao mesmo tempo, o medo também tomou meu coração: e se eu não tiver as palavras adequadas para dimensionar a grandeza desta obra? e se o importante significado que ela traz para o resgate ancestral negro e para a sua continuidade diaspórica pelo mundo acabar perdido em meio ao caos brancocapitalista em que vivemos? respirei fundo e, outra vez, me vali da poética sabedoria da autora: devo manter um coração de fogo [que brilha] para eternizar, palavra por palavra, sua máxima de que na unidade está a força.
assim o fiz.
posso dizer que fui atingido por esta obra logo de ínicio, quando me de-parei com o jogo estético-semântico bilíngue apresentado já na primeira página. demorei um pouco, confesso, até me dar conta de que não se trat-ava de um poema, mas sim do sumário do livro(!). quem é que faz poesia com o sumário do livro, gente? me encantei!
página após página, me vi completamente dentro do mundo de beatriz – repleto de elementos identitários, culturais, ancestrais negros sexu-al-dissidentes. esse mundo retratado não era somente o da poeta, mas surpreendentemente o meu também!
ubuntu.
e se eu pude ser contemplado em suas palavras, provavelmente outr@s também possam ser, então por que não tornar esta a oportunidade per-feita para uma proposta de negr-ação sobre aquilo que nos foi neg-ado?
beatriz fernandes aqualtune
reescrever linhas de um itan, reconhecer a sacralidade que há em mim e você.
a poesia de negr-ação de oju oiyn, okan iná é literatura que transcende qualquer conceitê europê colonizê que nunca vai saber o que é sentar na porta da calunga e contemplar vida e morte com a indescritível paz de Nanã Burukê. é palavra preta de um povo que tem olhos de mel e coração de fogo; que tem respeito pela água quando vem e que tem medo quando ela falta também, mas não perde a esperança [e por isso é feliz].
é com este misto de medo-crença-esperança-alegria-fervor-amor que esta obra me atravessa; e não só me atravessa, me afeta. se me afeta, gera a-f-e-t-i-v-i-d-a-d-e: em mim/comigo/com outr@s – ainda que o racismo se arti-cule constante e insistentemente para que esta afetividade não possa ser/existir como direito no meu/no seu/no nosso negro corpo.
beatriz aqualtune parece nos dizer que palavrear em poesia é recuperar o direito a amar-afetar, tornando-se una com o mundo sem precisar deixar/renegar seu (entre)lugar: de lésbica, de negra, de poeta macumbeira da periferia.
eu desaguo para fazer da vida mais que sobrevivência.
cá estou eu nessa unidade com a autora, nessa irmandade sensível sobre o ser-amor contra o desamor, aprendendo que a gente ser o que a gente é, sem medo e em unidade, é do que o mundo [individual e coletivo], de fato, precisa. talvez este seja o maior dom que hoje recebo após a leitura da obra de beatriz.
às/aos leitor@s deste livro, desejo que despertem os oju oiyn marejados que me acometeram pela sensibilidade da poeta; desejo também um okan iná incandescente para perceber que toda sensibilidade é combustível de luta e base para o amor que transcende...
à bia, desejo que tenha confiança e esperança – pela irmandade – e peço as bênçãos de OlorunMawuZambiNyame sobre esta jornada que inicia.
NYAME BIRIBI WO SORO NA MA MENSA KA
axé!ago/18
oju oiyn, okan iná
mel(anina), dendê y poesia.habituada com o ad-verso.ser estrada. abre-caminho. pular a porteira à en-cruz-ilhada do meu eu.o espiritual de mim mesclado com o material dos dizeres.quilombo de possibilidades...
ení ou um.
beatriz fernandes aqualtune
I
Silêncio!
O atotô produzidopelo serrar dos meus lábios
é o desaguar dos meus olhos em comando de rum, rumpi e le.
Felicidade transbordando em toque de ijexá.
Quando o adjá toca, entra por dentro, em sincronia com
o meu coração.
Aprendo, assim, cada dia mais,
que corpo é só corpo.
O axé é um sussurro diário; “você não está sozinha”.
ejí.
oju oiyn, okan iná
II
Ela se mostra a me observar em cada andar que, antes, era interpretado por mimcomo andanças solitárias da vida. No meu hábito de corujar, me calo, observo e sinto, me sinto abraçada, yê yê ô!
No des-compreender dos dias me re-conectando nesta pequena-grande-África.
De passo em passo, ao bater os olhos, me vi ojú orô e não mais lótus, que floresce da lama.
Fico em cima da água,que carrega e leva,para longe, todo mal que há.
A força que me carrega é o que vem de muito antes penetrante como ilá me faz caminhar.
Transformando o banzo em xirê, por um caminho que eu não sei o que é, mas peço agô para entrar.Agô!
beatriz fernandes aqualtune
depois de você, o samba continuou
com pesarmas foi aos poucos
se reajustandoa cuíca voltou
os passos acelerama vida sempre segue
porque meu descaminhoé não continuar
o sorriso que vem do peitoé verdadeiro
sou inteira e sóem minha vida
não falta tempero sou alho, cebola,
cominho e coentrosou pimenta do meu reino,
só que depois de você me faltou o dendê.
étà.
oju oiyn, okan iná
oyá muié preta , oyá lá ela rodopiou e chegou num outro canto do mundo junto com os mortos. oyá ela tecendo lençóis de cobrircorpopretocom seus chifres de búfalo. y tendo que além de animalizadaaguentar patri(amada)cía pedir para ela exibir sorriso e rebolar a bunda na festa da carne. cuida de 7 filhos e tem 7 vidas em um dia. oyá ela, que mal tem casa pois todo dia (ela faz tudo sempre igual) passa 3vezes7 horas fora de casa, pois tem três empregos. oyá lá o céu de oyótrovejando, a justiça não se fez diaspórica,o tecido de ontem era pra hoje,foi bem na quarta e sua cria foi póstuma(r)ser levada por odoyá.
érin.
beatriz fernandes aqualtune
me sento na porta de entrada
da calunga
observo as mortes e os passarás que ela traz
em Nanã busco força aprendo que o molde
do barro pode ser re.moldado
quando quebronão renasço
apenas nasçosou outra
me concentro deixo o vento guiar.
sei que sou fruto da criação.
àrun.
oju oiyn, okan iná
A água doce de Oxum quando seca fica como o deserto inóspita infértilindesejável.
Não queira desafetos com filhas das águas, elas comandam este planeta que, além de terra, é água.não queria mais ainda,desamor.
Ciclos de vida,passam por várias mortes,a secura faz parte.
Jaz aqui o seu pote de barro seco e vazio.Não sobrou mel, nem vida. Você secou minhas lágrimas.
éfà.
beatriz fernandes aqualtune
o mergulho na inexistênciaé uma vontade latente que se camufla em gritos, altos-contidos. os dedos que querem cravar as unhase rasgar tudo que feresão os mesmo que afagam, não carinhosamente, a garganta, que arranha e quer gritarmas está presa,em
paredes do contrato social.
o mergulho se dá em partes dissonantes, o pensar é complexo demais para não ser concreto.
[suspiro de tarefa cumprida]
atrito de moléculas cantando em sincronia latente- vai lá, tentelatente- vai lá, tente voz que diz pra continuar,
mas eu só queria poder gritar.
as horas são poucas para tantos afazeres,os afazeres são maiores que o meu eu, tão grande e tão pouco,tão tudo, tão nada,intenso pulsante, carne-negra-fervente, que pede calma.
éje.
oju oiyn, okan iná
eu, água, você, óleo,
nós, faísca.
quente. aperto. afago. gozo. desejo. despejo.
triste caso;
peças com uma metragem perfeita para se encaixarem, se esfregarem.
minha cabeça em seu colo, sua mão na minha bunda, meu descontentamento com a tua
militância nossa descrença que não pode ser mais do que já é,
você é óleo, eu sou água,
mais que escrito, está na forma de ser
essência.
por enquanto eu deságuo, você queima (um).
tu me incendeia ou eu te apago.
éjo.
beatriz fernandes aqualtune
R I T U A L uma pessoa preta trançando a outra
a mão cuidadosa no ori, realizando o ato ancestral.
uma mecha de cabelo dividida em três, uma sobe e vai para um lado,
enquanto as outras se reposicionam,todas elas juntas, ora separadas,
esperando a vez da outra.sabem o que é estar nos lados, no meio,
na frente de frente, no fronte por um povo. dependendo do entrelaçar
muda a forma do trançar,mas a origem é a mesma,
remetente a profusão de um povo continental,
que ornamentado tem o seu poder.como um pássaro africano
que sabe o que é resgate, o ritual da trança é voltar para trás,
buscar o que foi perdido.num trançado recuperamos
a força que está no topo da cabeça, a mais primordial conexão com o (seu) divino.
ésàn.
oju oiyn, okan iná
às vezes só temos forçapara abraçar aquele cansaçoacolhedor que nos tira o chão, o teto e o verso. a vontade é pegar o primeiro barco e fugir,atravessar o oceano chegar no mar de só ser.
não mais lidar com esses olhos que me olham,mas não me podem alcançar. na distância do ser, percebo a disparidade,da pele que eu carrego, do ori que me guia,da gargalhada que está comigona hora da agonia. então finalmente não sou só brado,há silêncio em mim. coração que fala tanto,quer tanto, se arrisca tanto,se cansa do mesmo jeito,com um tanto.
no entanto, todo verbo que envolva o sentir é abraçado e tido como certo.
eu, que estou na linha do nada, almejando e correndo na ponta dos pés para o tudo,aprendi que o equilíbrio não é estático.quem o tem dessa forma é cheio de privilégio,comodismo para quem
éwà.
beatriz fernandes aqualtune
não precisa se mover para ter.
vivo montanhas russas, não tento organizar a bagunça,apenas a vivo. feliz é quem acompanha, toda essa loucura. minha queda d’água é alta,e a alma profunda.
mesmo cansada sei, que assim como a demora do almoço de Domingo, a comida vem.primeiro chega o cheiro,depois a barriga cheia.no fim tudo se tranquiliza depois do caos.
oju oiyn, okan iná
quando eu chegar e a lua de prata alumiá meus pensamentos, vou respirar teu ar cheio de água, denso. subirei as suas ladeiras e re-quebrarei pelo pelô. repousarei depois da longa viagem e minhas pálpebras não vão à batalha do dormir como aqui. sem lutar,sonharei. pois estarei em terra firme, morada. no outro dia, cedi- nho, vou sair quase junto ao raiar do dia, irei para qualquer praia. mam, barra ou da sereia. ao colocar meus pés na areia, pedirei pri-meiro a bênção e a permissão, depois mergulharei na imensidão. com o sal dessa água, serei lavada, levada. abençoada e, enfim, deixarei e entregarei para a dona das cabeças tudo o que me tira o sono, acelera meu coração e faz meus pensamentos perturbados irradiarem energia. vou nadar. vou cantar e meu canto não vai ser para nenhuma moça encantar. quero silêncio em mim. não aceito mais ser tema de coco do depois, não aceito mais ser pouco, não aceito ser escondida.
òkanlá.
beatriz fernandes aqualtune
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vere
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éjìlá.
oju oiyn, okan iná
Ela é di,outro mundo.tem o céu [azul]na cabeça,se abre como for e florao sorrir.meu prazeré entrar na nave delapara viajar nas ideias que só ela tem.
étàlà.
beatriz fernandes aqualtune
balanço, balança com o vento faz a curva do tempo
e sopra em meu cabelo que se perde em sensações
do momento, a calma existe.
balanço, balança com o vento faz a curva do mundo,
tira todos os meus medos logo, logo eu me lembro
dos olhos da menina dá vontade de seguir
balanço balança com o vento faz a curva do mundo,
chega em meu coração,me aquece por inteiro,
é como um colo um aconchego, quando estou junto a ti
é que eu fico mais certadesse nosso balanço,
de tudo que eu vivi.
érinlá.
oju oiyn, okan iná
(sacizeiro)
menino sacizeiro corre-corre o dia inteiro mas ao contrário de saci tem duas pernas, bem ligeiras. eles falaram “relaxa, você não tem cara de estrangeira.” contudo, eu olho para o menino e me sinto uma estranha no ninho.ele não me reconhece e eu tento o reconhecer, engolindo a secoo medo de mais uma vez o sistema nos interromper.somos um povo estrangeiro um para o outro.o menino sacizeiro não sabe que ele e eu somos da mesma substância melanina-preta.vindos de um povo feito pelo sol, af(ri)ka. eu sei que, além do que me falaram sobre o meninoem luas cheias, sua pele reflete azul. mais que correr, o menino voa, caçando como Erinlé.
éedógun.
beatriz fernandes aqualtune
no caos do concretoeu que passarinha sou
voei com você.no alto dos prédios fiz ninhos
e senti um aconchego inexplicável,o mundo para com o seu abraço.
o ir e vir, rápido, das pessoas-passantes não me tocava.pois ligada a ti
só o nosso tato que era fato, todo o resto metáfora.
o meu cantar virou risada e as borboletas que eu contava
eram pensando em como é bom estar com você.
respiro em noite de desatino, todos os perigos do suspiro,
quase grito de prazer. a perna, a pele, o toque, você.
meio brisa, deixa a adrenalina ativa, peito bate forte na chegada,
no bom dia, e quem dirá na despedida. me dá mais onda que sativa,
não é das verdinhas mas é a pretinha.
a estrada, os trilhos do trem, o voar, o andar e o te esperar,
nenhuma dessas viagens são maiores que a de estar com você
érìndilógún.
oju oiyn, okan iná
sou muito mereço cativar
o que me cativa; risos frouxos
e a forma que o nariz fica ao gargalhar.
sou traço de poemaem linha viva.
e é em tu, menina Bahia,
que eu sinto a paz de ser.
étàdílógún.
beatriz fernandes aqualtune
me apaixoneipor você
sempre estar
recitando reecitandoexcitando
andoendoandoendoandoendoindo
em movimento por dentro
bem dentro do que está para explodir
[a minha vontade de entrar em você]
éjìdílogún.
oju oiyn, okan iná
para fugir de mandinga não precisa de muito, as veiz não pre-cisa nem de patuá. a cantiga é o cuidado, que deve ser entoado alto como canção. a distração tem ritmo de samba. nos leva para um encruzilhada e entramos na rua da dezandança. é pre-ciso escutar as mestras e os mestres. e com maestria no saber, permitir quem no seu ori pode encostar, quem no seu corpo pode tocar, quem as suas lágrimas pode secar e quem o seu sorriso pode encantar. com a gente, que tem essa pele reluz-ente e preta, os ancestrais sempre falam, do arrepiar ao calar.
òkàndílogún.
beatriz fernandes aqualtune
sabe
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ficar
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ma,
mel
odia
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mid
os p
ara
quem
dia
riam
ente
só
tem
ouv
idos
par
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oju oiyn, okan iná
ogu(m)ri oguriri.enquanto joga biloca, assunta tudo com seus olhos.é o melhorna rua e no projeto da escola.era para ele ser da ciência, a sua mãe sempre diz, ele tem destino de doutor. mas a professora branca também riquando na aula de biologia falam que macaca é a mãe do guri. ainda disposto a guerrear e a ocupar seu posto,na fantasia do mérito.muito prático sabe bem o que é fração, pois é cada vez menor a existência dos de menorali da região,que não voltam para jogar bola depois das visitas dos senhor.o guri é carismático, conquistou a galera lá de cima e lá de baixo.seu corpo ginga enquanto corre sua pele preta tinta fica aindamais linda quando o suor desce.
vinte-e-um.
beatriz fernandes aqualtune
tão bom em tudo que faz, ao brincar de mímica,
foi pra linha de frente, perto de onde aviãozinho
é gente.ouviu-se só os barulhos
o guri guerreou de frente como os seus,
que tinham também a pele preta tinta mas a mente maquinaria fria,
na mira dos tio todo o seu futuro currículo foi esquecido em meia volta.
agora a sua mãe,que nem música podia ouvir,
degustava a loucuraao escutar uma oração
em versão rap,para do guri lembrar.
o guri, só não era da capadócia,
seus traços não eram os mesmos do santo que lutou com o dragão.
ele tinha nome, era da forja e da própria espada de Ogum,
foi-se um guerreiro, salve Jorge.
oju oiyn, okan iná
Tudo conspira pra fechar o tempoÉ tempestade esse afetoÉ a junção de todos os erros(e acertos) Dois corpos pretos(se amando)DeságuaÉ pouso E refrigérioEsse som qual eu esperoCantar enquanto houver paixãoé profundoé arrepio na peleágua doce no peitoé vento de manhã
Epahey!Iê iôMe bagunçou a tempestadeBanhei em fonte de amor.
Dois olhares que se cruzam, duas almas que se juntam,
fazendo estrondo e um alvoroço dentro de si.
Todo afeto é sincero,quando há mergulho,
de peito aberto, me encontro em transe
a mais pura conexão, contigo sou sol, vento, água
e paixão.
ye ye ô faceiro encanto
epahey me diz um tanto
que essa história foi vivida com orgulho e sem temor
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vinte-e-dois.
beatriz fernandes aqualtune
arengueira no melhor sentido sou quando fuxico toda a sua vida
no mais profundo dela (minha mão dentro de você)quero tricotar nossas linhas
uma na outra com um ponto y
com nó que pode ser desfeitoem um puxão só
(nossas pernas num desemaranhar)pois nas repetições
lamúri a morosas gosto do perigo,
do doce que vira malagueta (gosto de buceta)
me arrisco no gesto de tecer minha xota na sua.
vinte-e-três.
oju oiyn, okan iná
ele era um homem cheio de feridas e eu passei por ele todos os dias
ele era louco e cheio de chagasele era louco e cheio de sagas
passei por ele vários dias mal olhei a sua perna ferida
todo dia bem na mesma esquina eu só passava e dava bom dia
eu nunca quis saber da sua vida até que um dia lá ele não estava
toda vez que lá eu passava um silêncio imenso fazia
ele estava ferido, não tinha moradia não vi sua cara, não sei da sua vida.
estava sempre coberta de palha,por isso que eu nunca o via.
vinte-e-quatro.
beatriz fernandes aqualtune
sua corpura tem poesia tatuada mal sabe que as curvas possuem versos quais minha mão pousa com maestria
meu olho repousa sob a sua escritanão consegue desviar o olhar
da arte viva que tem o meu encaixe fotográfo cada movimentodo olho que fecha ao sorrir
a diastema que se abre e o remexer do pescoço
com a malemolência de r&bnum mecanismo de encanto eu, que também sou de ar, viro água sólida em liquidez
em promoção sou grátisderretida e na sua.
vinte-e-cinco.
oju oiyn, okan iná
sentimento esquizofrênico com doses de falta de ar homeopáticas e sem alopáticospara resolver esses emaranhados de situações destoantes.distopia para meu sonhoonde tudo é tão frágil,a realidade fatídica não é nada tátil.somos um tanto esúsobrevivendo como humanosenquanto deuses das chagascom uma latente sensaçãode não ter odoyá para curar.um povo forte por ser frágil.afrofuturismo com prazo diáriopois o dia seguinte é quase um abismodo não saber, não ser.a que horas eu vou morrer?eu morro a cada quinze minutos.a impotência contém meu ódioe por dentro eu sou violenta.causando feridas em mim.
vinte-e-seis.
beatriz fernandes aqualtune
“ser não-violento somente com quem é não-violento com você”
era meu mantra, Malcolm X disse pelas lei áureas de Maca
contudo os meus murros não são nada além de autocalejar.
meu grito é contido. meu corpo rasga. por uma liberdade jamais alcançada.
eu bato e eles riem, num cinismo com tom de ironia,
como se fosse autochibatada,bati neles-me bati.
procuro entender, procuro a base mas tudo tem rastro de sangue.eles sequestram o meu reflexo,
esmurrando meu próprio espelho,eu me quebro.
blackoutum preto morre, uma família acaba
a nossa liberdade é utópica.a cada suspiro e roda de xirê
eu sei que eles não conseguiram mesmo em ruínas não estamos destruídos.
oju oiyn, okan iná
no solo tem axé mas mas só posso encostar no chão,
para fugir de bala,a vida torna-se, a cada 15 minutos,
um axexê.eu quero matar o mundo
eu quero acabar com tudo, romper e cessar o luto,
ser amor e falar de amor, só que me sinto semente que não germina
sou quase rebento, travada pela dor.
de forma incessante minha mente grita
um trecho como um soul “o barco da volta,
o barco da volta, foi afogado.”
meus escritos na pele são distópicos ou diaspóricos?
os adinkras me lembram de reinos;NYAME BIRIBI WO SORO,
na unidade está a força.
beatriz fernandes aqualtune
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vinte-e-sete.
oju oiyn, okan iná
o baobá cresce por muito tempo como uma árvore qualquer. quando o crescimento das outras árvores estagna, ele continua crescendo até se tornar o que dele conhecemos. o mágico e o bonito não é ser o maior, é enxergar as possibilidades de crescimento, apesar do tempo e das adversidades, pois o universo é um caldeirão de possibilidades. do baobá tudo é possibilidade, tudo é reaproveitado. o baobá armazena muita água para sobreviver, eu deságuo para fazer da vida mais que sobrevivência
vinte-e-oito.
beatriz fernandes aqualtune
OJU de longe é muito distorcidoeu preciso ver tudo, bem de perto,
poros, pólens em câmera macro fornecida por um par
que me deixa OIYN.derretida e doce com textura
de quem vê e acha que mel não gruda.OKAN se tudo vibra, tudo é ritmo
sigo os passos do meu músculo bombe a dor, por onde ir o andar.
INÁ, com o calor imaculado queima tudo e não deixa rastro,
tudo dentro e fora, seguem. desce a correnteza da vida com
a certeza de não ter certeza olho de mel, coração de fogo [que brilha].
vinte-e-nove.
oju oiyn, okan iná
eu era material escorregadio como líquido quente, mais pre-cisamente água, bem quente. dedilhada pelos dedos, passa-va sempre fluindo em direção a uma incógnita, encontro de rios ou encontro com o mar? encontro? ou água engolida pelo vento, seria encontro? ou lama, onde os nossos corpos seriam esculturas do princípio? encontro? por muitas vezes achei que era à seca que eu ia. sem encontros. então aprendi mais sobre as águas, aprendi mais sobre eu. é que nesse papo de rio são francisco, não houve mais um em minha água. percorri quase o país inteiro para me descobrir inteira, desembocar em mim. nos tantos encontros e desencontros, com sentimentos que causavam redemoinhos no cachear da cabeça e gotejos na face, habitava em mim a certeza de que eu havia sido guiada como a lua mas quando cheia de mim, me vi lua, percebi que eu me guio. continuo com uma rota que nunca para, com um teor apurado à vivência de histórias inusitadas, hoje sei que eu me amo. e todos os limites que o brilho da amarelo da vida me deu com um abraço solitário, preenchido por resiliência em quedas d’água no rosto, foram para o meu melhor.
todos os escritos desde livro são dos anosdois mil e dezesseis ao dezoito, desde quando me percebi amor.
trinta ou
ógbòn.
títulos da padê editorial:
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escura.noite, kati soutosal a gosto, esteban rodriguesparagrafia 44, lélia de castro44 sentímentos, cleudes pessoacartas para NegraLua, débora ritaoju oiyn, okan iná, beatriz fernandes aqualtuneágua viva, piera schnaiderdesculpa por ainda escrever poemas de amor, julianna motterflores em coração cerrado, tati carollia saudade é mulher, fernanda fernandes munizdelírios de (re)xistência, geise gênesistrans|bordô, lara ferreirain-quietudes, vandia lealcoração no asfalto, márcia cabralser y estar en otros matices, rocío bravo shuñaolindeza, maryellen cruzconcha, sabrina leonardipiroclastos, lázaroafro latina, formigaalumbramento marginal, bianca chiomadeve haver haveres para que a gente siga existindo, laila oliveiraEP, preto téotinkuy, jade bittencourtno âmago, enzo irokosapa profana, raíssa éris grimmsou travestis: estudando a cisgeneridade como uma possibilidade decolonial, viviane vergueiroamar devagarinho..., bruno santanaa piada que vocês não vão contar, kuma françaguarda-versos: palavras que não pude calar, adriele do carmobricolagem travesti, maria léo ararunanotas de um interior circuntante e outros afetos, calila das mercêscartas para ninguém, diana salu764 – da barragem pra cá, raquel prosa et. al.meus versos e inversos, augusto liras
olho de imbondeiro, lohana káritacantos de proteção, resistência e dengo: cada pétala é um ser, babosa maresia e karina das oliveirascrônicas coyote, márcia marci et. al.fragmentos_, juliana tolentinovagamente, daniel britouma natureza secreta, luci universoecdise, lídia rodriguescaos – recortes de um peito negro, victória salesdiversas maneiras de amar, victor alejandrocomer do próprio coração pra viver na própria pele, capitú
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cole-sã Odara
percursos estéticos: abordagens originais sobre o teatro do oprimido, bárbara santos
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