PASCAL PAULUS -...
Transcript of PASCAL PAULUS -...
Projetos de Matemática na Voz do Operário da Ajuda
PASCAL PAULUS
1999
Momentos de Matemátca
Momentos de Matemática
Fichas técnica
© Pascal Paulus
1ª versão: 1999
2ª versão: 2017
Referenciar como:
Paulus, P. (1999). Momentos de Matemática. http://pascalpaulus.wee-
bly.com
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 2 62
Momentos de Matemática
Este caderno foi produzido para oferecer aos alunos do
3º e 4º ano de escolaridade da Voz do Operário, do ano
lectivo 1998 – 1999.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 3 62
Momentos de Matemática
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 4 62
Momentos de Matemática
Índice
Carta de abertura 6 ..............................................................................................
De Janeiro até a Páscoa. 8 ........................................................................................iniciou o segundo período.... 8 ..................................................................................Terça-feira, 26 de janeiro de 1999 9 ..............................................................................Terça-feira, 2 de Fevereiro de 1999 10 ..........................................................................Terça-feira, 9 de Fevereiro de 1999 18 ..........................................................................Terça-feira, 23 de Fevereiro de 1999 23 .......................................................................Terça-feira, 2 de Março de 1999 27 ...............................................................................Terça feira, 9 de Março de 1999 29 ...............................................................................Terça-feira, 16 de Março de 1999 33 .............................................................................Terça-feira 23 de março de 1999 37 ..............................................................................
Da Páscoa até ao acampamento 41 ...................................................................Terça-feira, 13 de abril de 1999 41 ................................................................................Terça feira, 20 de abril de 1999 44 ................................................................................Terça feira 27 de abril de 1999 47 .................................................................................Terça-feira, 4 de maio de 1999. 48 ................................................................................Terça-feira, 11 de Maio de 1999 52 ...............................................................................
Epílogo em Porto de Muge 58.............................................................................
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 5 62
Carta de abertura
Olá
Quando comecei a ir para a vossa sala, para vos ajudar no trabal-
ho com o computador, não sabia o que ia acontecer a seguir.
Felizmente, o computador decidiu ficar avariado durante um
tempo prolongado, o que nos deu a possibilidade de explorar de out-
ro modo um pouco do mundo da matemática.
A matemática é, antes de tudo, uma linguagem, feita por seres
pensantes. Aprender esta linguagem é um pouco como aprender a
falar uma segunda língua.
Para utilizar uma língua, é necessário, entre outras coisas, con-
hecer muitas palavras, saber como elas se escrevem... Quando se
sabe escrever uma língua, podem escrever-se histórias, em prosa, em
B.D. e eventualmente, em verso.
Um matemático que domine bem a linguagem matemática tam-
bém sabe, de certa forma não só escrever histórias, mas também uti-
lizar fórmulas para escrever poesia, e para descrever, de modos di-
versos, o que vê à sua volta.
Foi assim que os povos antigos, ainda muito antes de saberem
escrever, começaram a pensar sobre as coisas que viam, a contar os
animais, as estrelas, a descrever o fogo, a água, as plantas.
A linguagem matemática é uma das mais velhas do mundo.
Aparece com as primeiras palavras escritas, e é também uma das
mais vivas, porque todos os dias, há matemáticos que inventam no-
Momentos de Matemática
vas palavras para novas ideias que ainda não têm nome, e que es-
crevem estas novas palavras.
Na sala, nestas terça-feiras de Dezembro até Maio, caminhámos
nas pegadas deixadas por Babilónios e Gregos e, também, por al-
guns matemáticos renascentistas. Divertimo–nos bastante com as
nossas descobertas.
Em Porto de Muge, procuramos algumas pegadas matemáticas
mais antigas, a volta da estrela do Norte, de Marte, de Vénus e da
Lua e, mais recentemente, do relógio de Sol.
Espero que algum “bicho” tenha mexido dentro de ti, e que não te
largue mais. Ele chama-se curiosidade.
Utiliza–o para fazer perguntas, muitas perguntas. E não te con-
tentes com a primeira resposta.
Mesmo que ninguém saiba responder, haverás encontrarás sem-
pre alguém que queira procurar contigo pedaços de respostas.
Ofereço–te estes bocados de conversa, de trabalho em conjunto,
registado com o apoio da Julieta.
Deves encontrar nomes de colegas ao lado de frases que não
foram ditas por eles, mas por ti, ou por outro colega. Não te preocu-
pes com isso. Até podes emendar ou acrescentar bocados de conver-
sa de que te lembres e que eu não escrevi.
Espero que tenhas tanto prazer em reler as nossas conversas como
eu tive ao tentar escrevê-los. Um abraço,
Pascal Paulus, Carnaxide 1999
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 7 62
De Janeiro até a Páscoa.
Lembram-se de que, em Novembro de 1998, combinei com a Juli-
eta ir à vossa sala uma vez por semana para dar apoio ao trabalho
no computador, nomeadamente, para vos ensinar a fazer corre-
spondência por correio electrónico e a utilizar a Internet. Passei al-
gumas horas, até ao Natal, a trabalhar com os responsáveis indicados
pelas equipas de dia. Perceberam rapidamente como fazer, o que nos
libertou a descoberta de outros problemas. Começámos então a brin-
car com algumas situações matemáticas e quando...
....iniciou o segundo período....
...fiz uma provocação:
- Conhecem os números de granizo?
- Não.
- São números inventados por alguns matemáticos, a partir de duas
regras muito simples: Pensa num número. Se ele for par, divide-o
por 2. Se for ímpar, multiplica-o por 3 e junta 1. Volta a aplicar a
regra ao resultado obtido e continua. Os matemáticos pensam que
todos os números caem mais cedo ou mais tarde para uma série 4,
2, 1 que nunca mais acaba, mas ninguém tem a prova disso.
Poderíamos procurar séries entre 1 e 100.
Propus que procurassem se os números caem todos para 4, 2, 1, 4,
2, 1, ...
Momentos de Matemática
Num primeiro momento, o 3º ano investigou um número, o 4º
outro.
Fizemos uma grelha de registo:
Registaram 44, 96 e 54, que perdemos alguns dias depois, na con-
fusão das obras na escola, e na mudança de salas que isto implicou.
Depois, lançámo-nos na pesquisa, ao longo de várias semanas, e
da qual vos lembro alguns momentos.
Terça-feira, 26 de janeiro de 1999
A Catarina anunciou que tinha parado a série do nº 95 porque
“nunca mais dava.” Continuamos a construir a série com a turma.
Depois de muitos passos, encontramos o nº 91, que o Tiago disse já
ter feito. Agora é fácil: somamos os passos do 91 aos que já temos. Ao
todo dá 76 passos e subimos até 1456. Mesmo descobrindo mais
tarde que nos enganámos ao fazer as contas, é uma grande vitória: o
número cai, e percebemos que há séries escondidas em outras séries.
Entretanto observámos um dado de barro feito por Tânia Patrícia.
Comentei que o dado estava bem feito mas que as pintas estavam
colocadas incorrectamente. Propus-vos então: “Descubram a regra
para pôr as pintas nos dados”.
Fiz-vos ainda esta provocação: “Podemos ensinar o computador a
fazer séries de números de granizo. Para isso temos de lhe ensinar as
regras. Quais são?”
nº investigado nº de passos até primeiro 1 da série 4, 2, 1 nº mais alto encontrado.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 9 62
Momentos de Matemática
Após uma curta discussão, concordámos uns com os outros:
temos que dizer:
“Vê se o nº é par, se for divide-se por dois, se não foi multiplica-se
por 3 e junta 1.”
Agora, como dizer ao computador em linguagem matemática o
que é um nº par. Proponho que todos pensem nisto e noto a 2ª parte
do enunciado: (nº / 2; nº * 3 + 1).
Terça-feira, 2 de Fevereiro de 1999
Da discussão acerca do dado, a Julieta apontou:
Pascal: Então, descobriram alguma coisa sobre o dado?
Alguém: Descobri que as pintas estão sempre da mesma maneira.
Outro: Eu já sabia a regra.
Raquel: Eu não mas descobri, é 7.
Pascal: Queres dizer o quê?
Sara: As pintas de um e outro lado somam sempre 7.
Tiago: Os extremos dão sempre o mesmo número.
Pascal: Será que isto também é verdade para outras séries de
números?
(Experimentamos algumas séries, e dá:
8, 9, 10, 11, 12, 13 dá 21; 10, 11, 12, 13, 14, 15 dá 25;
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 dá 9; etc.).
Pascal: Então quem tentou e não descobriu?
Seis levantam o dedo;
Pascal: Quem tentou e descobriu?
Sete levantam o dedo. (Um aluno já sabia)
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 10 62
Momentos de Matemática
Pascal: Quem não tentou?
Oito alunos levantam o dedo.
Pascal: E dos que tentaram, quem precisou de ajuda?
Quatro alunos levantam o dedo.
Pascal: Agora vamos para o mais complicado. O que é um número
par?
Catarina: Temos de ensinar o computador a contar de dois em dois.
Raquel: Depende, se começar em 0.
Catarina: Se começar em 0 não, se começar em 2.
Pascal: Portanto (e escrevo no quadro, em duas colunas): 2, 4, 6, 8,
10, 12, 14, 16, 18, 20, 22, 24, 26, 28, 30, 32, 34, 36, 38, ...
João: Não podes escrever todos os números.
Pascal: Porquê?
Coro: Porque vai para o infinito!
Pascal: Muito bem! Já agora, quantos números ímpares é que há?
Coro: Infinito!
Pascal: E os números ímpares e pares juntos?
Coro: Infinito!
Pascal: E há mais números pares do que ímpares? Ou é igual?
Alguns dizem igual, outros dizem que não: “Há mais ímpares
porque começa com 1 e os pares com 2.” Outros contestam: “o nº 0 é
par.”
Pascal: Depois voltamos a isto . 1
E depois não voltamos a falar disso! Não deu tempo. Mas, há pouco tempo descobri que os matemáticas não 1
estão totalmente de acordo sobre se 0 é par ou não. Alguns consideram que 0 nem é par, nem é ímpar. O que não escrevi aqui é que falámos de Cantor para descobrir que há tanto números pares, como ímpares, como inteiros, e, por mais estranho que parece, como números racionais...
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 11 62
Momentos de Matemática
Portanto, não podemos escrever todos os números pares.
Mas olhem bem para as colunas que escrevi e lembrem-se
que os matemáticos procuram regras, como no dado. Não
vêem nenhuma regra aqui?
Tiago: Os números repetem-se?
Outros: O quê?
Tiago: Há sempre 0, 2, 4, 6, 8, 0, 2, 4, 6, 8.
Raquel: As unidades repetem-se.
Pascal: E onde vemos esta série de repetições, numa grelha que
conhecem? (aponto para a tabuada).
Alguém: Na tabuada do 2.
André: A multiplicação por 2 só dá números pares.
Bernardo: Por três não, há pares e ímpares.
Pascal: Depois havemos de falar dos outros.
Mas ouviram o que André disse: a multiplicação por 2 dá
só números pares. Que nome damos aos números que são o
resultado da multiplicação?
Margarida, Tiago, Raquel, Sara: (depois de alguma hesitação) Múlti-
plos.
Pascal: Sim, múltiplos. Então podemos dizer que “vê se o número
é par” = “vê se o número é múltiplo de 2”. Mas isto ainda
são palavras a mais. Temos de tentar dizer em linguagem
matemática o que é um múltiplo de 2.
Pascal: Qual é a operação inversa da multiplicação?
André (Depois de alguma hesitação) A divisão.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 12 62
Momentos de Matemática
Pascal: E o que acontece quando dividimos um múltiplo de dois
por 2? Qual é o resultado?
André: Temos um número inteiro.
Pascal: Sim, mas, no algoritmo, ficamos com resto ou não?
Sara: É resto 0.
Pascal: Já agora, que restos é que podemos ter quando dividimos
por 2?
Alguém: 0, 1, 2.
Tiago: 2 não porque então é 0.
Pascal: Depois podemos falar sobre o resto de outras divisões. Mas
já agora, quantos restos diferentes é que eu tenho quando
divido por 3?
Alguém: 0, 1, 2
Pascal: Agora, voltando ao nosso problema. Quando é que o
número é par?
Um: Quando acaba num nº par.
Outro: Quando se pode dividir por 2
Vários: Quando o resto é 0
Pascal: Portanto: “vê se o nº é par” = “vê se o número é múltiplo
de 2” = “número / 2 tem resto 0” = “resto (número / 2) =
0”.
Conseguimos resolver o problema.Quando pergunto se alguém já
pensou em outras séries, diz a
Catarina: Eu tenho: se for par +2, se for ímpar, - 3
Raquel e Sara: Sobem e descem, mas não sabemos se caem nos mes-
mos números.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 13 62
Momentos de Matemática
Tentamos a partir de 31: 31, 28, 30, 32, 34, 36, ...
Bernardo: Agora é sempre mais 2. É sempre par.
Eu: E se começarmos por um número par?
Raquel: Vai sempre aumentando.
Eu: Qual é a diferença entre estas regras e as regras dos
números de granizo?
Raquel: um é de divisão, outro é de vezes.
As regras matemáticas, existem em todo lado. É uma propriedade
da linguagem matemática. É divertido tentar descobrir a lógica es-
condida. A tabuada, por exemplo, também “esconde” regras. Faze-
mos uma primeira série de observações.
Sara: Há sempre uma linha horizontal e uma vertical que são
iguais
Eu: Porquê?
Catarina: Porque ali (na vertical) está sempre 1,2,3, etc, e na horizon-
tal também
Eu: Então vamos ver duas tabelas, uma com linhas horizontais
e verticais iguais, e outra onde isto não é o caso.
✕ 2 3 4 5
2 4 6 8 10
3 6 9 12 15
4 8 12 16 20
5 10 15 20 25
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 14 62
Momentos de Matemática
Parece que, até ver, a Catarina tem razão.
Raquel: Na tabela do 9 tira-se 1, 18 tira-se 2, 27 tira-se 3 (isto é, o
número que se tira, está na tabela do 10 ao lado). Só que
não sei explicar . 2
Pascal: Nunca tinha reparado! Na tabela do 9, o número que se
tira, é o algarismo da dezena ao lado.
Marta: Quando se faz algumas contas de vezes, se trocarmos esses
números, dá a mesma coisa.
Pascal: É às vezes ou sempre?
Vários: Sempre.
Proponho alguns exercícios no geoplano: trabalhar a partir do
prego no canto superior esquerdo e contar sempre pregos a partir
deste prego “1”.
Utilizando esta regra, procuramos um rectângulo que apanha 24
pregos. Quatro grupos fazem 1 rectângulo, 1 grupo faz vários rectân-
gulos. São vários a explicar a diferença entre os rectângulos,
mostrando que uns estão em pé e outros deitado. uns na vertical e
outros na horizontal.
✕ 6 7 8 9
2 12 14 16 18
3 18 21 24 27
5 30 35 40 45
Para perceberes melhor o que a Raquel quis dizer, e para perceberes algumas coisas mais à frente, é melhor 2
procurares ter “uma tabuada” à mão ou consultar a página 20.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 15 62
Momentos de Matemática
Pascal: Construam agora todos os rectângulos que apanhem 12
pregos.
Os grupos põem se ao trabalho. Descobrem rapidamente que um
rectângulo implica outro. Como uns grupos começam com 6 x 2 e
outros com 3 x 4, todos acabam por fazer quatro figuras. Quando
insisto na construção de mais rectângulos que apanhem 12 pregos,
alguns ficam na dúvida. A tabuada é chamada como testemunha
para mostrar que não há mais do que 4 rectângulos.
Pascal: E quantos rectângulos conseguem fazer com 16 pregos?
Bernardo: Um é o 2 x 8.
André: Outro é 8 x 2.
Patrícia: Posso também fazer um que é 4 x 4. É igual na vertical e na
horizontal.
Rui: Mas é quadrado....
Bernardo: (baixinho) É um rectângulo que é igual deitado e em pé.
Pascal: Pois, Rui, mas como o Bernardo disse, o quadrado é um
rectângulo que é igual na vertical e na horizontal.
Peço-lhes agora que procuram rectângulos que apanhem 21 pregos.
Só encontram 2 rectângulos.
Pascal: Então, na tabuada não há mais vezes 21?
Portanto, há um que são 3 linhas de 7 pregos e outro que
são 7 linhas de 3 pregos.
Será que os rectângulos aparecem sempre em par, um hori-
zontal para um vertical?
Catarina: Não.
Vários: Sim.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 16 62
Momentos de Matemática
Raquel: Porque dá sempre para pôr de duas maneiras.
Pascal: Há números que aparecem 5 vezes?
Raquel: Há! O zero aparece muitas vezes.
Pascal: Mas o zero é especial, não conta, já explico porquê.
E há números que só aparecem uma vez?
Todos apontam rapidamente o 1 e o 100.
Pascal: Não há mais? E já agora: quantos números diferentes há na
tabuada?
Vários: 100
Sara: Não, há números que se repetem.
Levantamos hipóteses:
André, Sara, Teresa, Marta, Rui: 50 números;
Catarina: 20 números;
Raquel: 40 números.
Montam quadrados, sempre a partir do prego 1. Começam com o
quadrado mais pequeno que podem fazer. Depois constroem o
quadrado directamente superior. E a seguir. E a seguir... Surge algo
parecido com:
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 17 62
Momentos de Matemática
Isto foi mais ou menos o que Pitágoras fez. Utilizando pedras em
vez de pregos, foi observando qual era a regra para fazer novos
quadrados. E começou a contar as pedras que ia juntando. Fazemos a
mesma coisa: contar os pregos que se acrescentam para formar um
novo quadrado. E pouco a pouco descobrimos:
1
1 + 3 = 4
1 + 3 + 5 = 9
1 + 3 + 5 + 7 = 16
1 + 3 + 5 + 7 + 9 = 25
1 + 3 + 5 + 7 + 9 + 11 = 36
...
Portanto, para descobrir o próximo número quadrado, basta so-
mar o próximo número ímpar.
Para continuar a nossa investigação, proponho: - descobrir quantos números diferentes há na tabuada; - descobrir se a soma seguida de números ímpares é sempre um
número quadrado; - descobrir se há números que se repetem mais de 4 vezes.
Terça-feira, 9 de Fevereiro de 1999
No momento de apresentação de descobertas, vemos que o maior
número quadrado controlado é o número 1156, soma de 1+...+67. É a
Sara que apresenta este controle. Descobre-se com algum apoio das
máquinas calculadoras que é um número quadrado porque é a mul-
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 18 62
Momentos de Matemática
tiplicação de 34 por si próprio. Fazemos algumas experiências com
outros números até a Margarida e o Tiago formularem o que já
pressentiam: o número quadrado é sempre o resultado de um
número multiplicado por si próprio.
Escrevemos a conclusão: Fazer um número quadrado = multi-
plicar um número pelo mesmo número.
Eu explico que se pode escrever isto de outra maneira: 82 = 64, ou
102 = 100 ou 152 = 225, e que podemos ler esta forma de escrever
como “número multiplicado por si próprio”, “número elevado a
dois”, “número elevado a segunda potência”, ou ainda “número ao
quadrado”.
Descobrimos na mesma altura que os números quadrados são
alternadamente pares e ímpares; constatamos que cada número ím-
par dá um número quadrado ímpar, e que cada número par dá um
número quadrado par como resultado.
Depois pergunto: “Quem descobriu quantos números diferentes
existem na tabuada?” Só há duas respostas: Sara com 40, Sofia com
42.
Controlamos então em conjunto qual destas respostas é correcta.
Primeiro vamos à procura dos números que só aparecem uma vez.
Marcamos estes números na tabuada (ver página seguinte) o que
provoca rapidamente uma observação: - Os números que aparecem só uma vez são 1 e 100 - Não, são mais! - Todos eles são números numa só linha. - Todos eles são números quadrados.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 19 62
Momentos de Matemática
- Ainda percebemos que são 6 ao todo.
Logo a seguir procuramos todos os números que aparecem 3
vezes. São 4 e também são quadrados, mas aparecem mais de uma
vez na tabuada, em outros sítios. Depois começamos a contar os
números que aparecem 4 vezes. Aparecem sempre duas vezes por
cima da linha dos quadrados, e duas vezes por baixo da linha dos
quadrados.
- Claro, são os rectângulos do geoplano. Para cada rectângulo hori-
zontal há um vertical.
Contámos 9 números que aparecem 4 vezes. Aqui descobrimos
que a Sara contou a partir da tabela da sala, que tinha uma gralha, e
que a Sofia contou a partir duma grelha correctamente preenchida.
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 nº de vezes na tabela:
2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 6 nºs 1 vez
3 6 9 12 15 18 21 24 27 30
4 8 12 16 20 24 28 32 36 40 4 nºs 3 vezes
5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
6 12 18 24 30 36 42 48 54 60 9 nºs 4 vezes
7 14 21 28 35 42 49 56 63 70
8 16 24 32 40 48 56 64 72 80 23 nºs 2 vezes
9 18 27 36 45 54 63 72 81 90
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 42 ao todo
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 20 62
Momentos de Matemática
Ainda contámos 23 números que só aparecem 2 vezes. Ao todo
dão 42 números diferentes. Vamos controlar quem esteve mais perto
quando levantámos hipóteses.
Entretanto há mais descobertas: A Sara diz que há mais números
pares do que ímpares na tabela. Encontramos rapidamente a expli-
cação: - Na coluna do dois há só números pares. - Na coluna do oito também. - Nas colunas que começam com números pares há só números
pares. - Nas colunas que começam com números ímpares, há um número
ímpar e depois um número par.
Há portanto mais resultados pares.
Descobrimos:
p x p = p
i x p = p
i x i = i
(2/3 resultados são pares)
Comparamos:
p + p = p
p + i = i
i + i = p
(2/3 resultados são pares, mas não a
partir das mesmas combinações)
Apresento uma folha com a tabela iónica, solicitando comentários
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 21 62
Momentos de Matemática
acerca dela.
Bernardo: São letras Gregas?
Raquel: Só se os Gregos também utilizam algumas letras iguais às
nossas.
Tiago: É a tabuada em letras?
Alguém: Não, porque não é como a tabuada. Falta uma parte.
Raquel: Eu não sei explicar, mas na tabuada também é assim. Se a
gente dobrar a tabuada, também é assim.
Eu: Aliás, a Sara tinha ainda descoberto uma coisa.
Α Β Γ Δ Ε F Ζ Η Θ Ι
Α Β Γ Δ Ε F Ζ Η Θ Ι Α
Δ F Η Ι ΙΒ ΙΔ ΙF ΙΗ Κ Β
Θ ΙΒ ΙΕ ΙΗ ΚΑ ΚΔ ΚΖ Λ Γ
ΙF Κ ΚΔ ΚΗ ΛΒ ΛF Μ Δ
ΚΕ Λ ΛΕ Μ ΜΕ Ν Ε
ΛF ΜΒ ΜΗ ΝΔ Ξ F
ΜΘ ΝF ΞΓ Ο Ζ
ΞΔ ΟΒ Π Η
ΠΑ q Θ
(Ρ Σ Τ Υ Φ Χ Ψ Ω Λ) Ρ Ι
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 22 62
Momentos de Matemática
Sara: Quando se conta lá em baixo tem se 90 90, e depois 80 81
80, e depois 70 72 72 70 e é sempre assim . 3
Raquel: Pois, é a mesma coisa dos dois lados.
Eu: Dos dois lados de quê?
Raquel: Dos dois lados dos números quadrados. Deve ser uma
tabela, mas eles trocaram os números pelas letras.
Combinamos as seguintes tarefas para fazer até o próximo mo-
mento em conjunto (que será depois das férias de Carnaval):
1. Descobrir se são ou não letras gregas.
2. Verificar se os Gregos tinham algumas letras iguais às nossas.
3. Procurar uma prova para saber se a tabela é a tabuada ou não.
Terça-feira, 23 de Fevereiro de 1999
A Julieta conta que discutiram a escolha do nome para este tempo
de trabalho que fazemos em conjunto, para incluir no Plano semanal.
Concordámos referir a este tempo como de «momentos de investi-
gação em matemática».
De seguida retomamos a tabela iónica.
Pergunto se descobriram alguma coisa.
Sara: São letras gregas.
Eu: E as letras representam o quê?
Alguém: Eu penso que são números, porque falamos de matemática.
Eu: Mas como é que temos a certeza?
Marta: A primeira fila repete o que está escrito por cima.
Para perceber o que a Sara descobriu, é melhor voltar a observar a tabuada na página 20.3
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 23 62
Momentos de Matemática
Sara: Se A é um, então B é dois e assim de seguida.
Eu: Está bem, mas como podemos saber se é isto?
Vão fazendo sucessivas descobertas. - B ✕ B = Δ - Mas também pode ser B + B = Δ - I ✕ Δ = M, então M é quarenta. - Temos mais vezes o M? Sim, na linha do Η e do Ε. - E que números seriam estes? - São o oito e o cinco! Dá! Dá quarenta. - Até I são os números de um até dez. A primeira linha é ✕ um! - Eu descobri: B ✕ Δ = Η que é oito e dois ✕ quatro também dá oito. - Γ ✕ Γ é Θ, isto é nove. Que nove esquisito! - É nove, é, porque está lá em cima antes do I que é o dez!
A partir daí confirmam todos os números quadrados, enquanto
vou montando uma tabela de referência para fixar a equivalência dos
números gregos com os nossos números com algarismos árabes, que
no fim do controle da tabuada iónica tem este aspecto:
Α Ι Ρ 1 10 100
Β Κ 2 20 200
Γ Λ 3 30 300
Δ Μ 4 40 400
Ε Ν 5 50 500
F Ξ 6 60 600
Ζ Ο 7 70 700
Η Π 8 80 800
Θ q 9 90 900
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 24 62
Momentos de Matemática
Continuam a chover descobertas. A excitação é geral. Alguns es-
tão deitados em cima das mesas a discutir com os outros as suas de-
scobertas. - P é cem, é I ✕ I - Aquela letra esquisita, Ξ, é sessenta. Também há Ξ Δ, que é
sessenta e quatro. - Quarenta e quatro não é Δ Δ, mas M Δ. - Um quarto de hora mais tarde, toda a tabela está controlada e
confirmada. Pergunto eu: - Então como é que escrevo onze? - IA. - E como é que lêem este número: IB? - Vários dizem “doze”. - E este: BI?
Alguns dizem vinte e um, mas outros duvidam. Não, também é
doze. Porque vinte e um é KA.
Eu: ou AK. Vêem, os gregos tinham uma letra para cada unidade,
e outra para cada dezena! Dizem vinte mais um, ou um mais
vinte, tanto faz, dá sempre vinte e um.
E agora, como é que escrevo cento e um?
Alguém: É PA, ... ou AP.
Catarina: Não falta o zero.
Coro: Mas eles não tinham zero!
Eu: Pois não, e na maneira como eles escreviam os números, nem
precisavam do zero. E já agora, como é que escreviam duzen-
tos e cinco?
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 25 62
Momentos de Matemática
Há dúvidas: será que repetem o símbolo do cem? A Sara lembra
que trouxe um livro com o alfabeto grego. Rapidamente completa-
mos a grelha, e até constatamos que há três letras intrusas, das quais
duas já temos (vinham na tabela) e a última letra descobrimo-la
através de um livro com alguma informação sobre sistemas numéri-
cos.
E depois conto: “Os gregos não precisavam de zero no sistema de
contagem deles. Consideravam um disparate haver um símbolo para
algo que não existe, razão pela qual não ficam com aquela descoberta
do povo babilónico. Os Babilónios que desenvolveram um sistema
sexagesimal para o cálculo do tempo e dos arcos (conceitos que con-
heciam por estudarem as órbitas dos planetas) perceberam que podi-
am utilizar um conjunto de símbolos que eram sempre os mesmos
para cada ordem. Herdámos deste povo a nossa divisão de horas em
minutos, e de linhas curvas em graus de arco. Os gregos não re-
tomam o zero, mas outra civilização mais a Este, os Hindus, uti-
lizam-no na sua representação dos números. O Al-Khowarizmi,
grande matemático árabe, fala do zero nos seus livros de matemática.
Muito mais tarde, já por volta do ano 1000, o monge Gerbert desco-
bre o trabalho de Al-Khowarizmi durante uma viagem a Espanha, na
altura terra dos Mouros, mas não consegue mostrar a importância
dele. Duzentos anos mais tarde, o Fibonacci alerta para a existência
do zero no seu livro de contas, o liber abaci. Mesmo assim, ainda vai
demorar quase 400 anos até que as pessoas comecem a utilizar o zero
com as contas árabes, que costumamos chamar o algoritmo árabe.”
Depois deste aparte, fizemos um ponto da situação:
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 26 62
Momentos de Matemática
Terça-feira, 2 de Março de 1999
Alguns grupos entusiasmaram-se a escrever sistemas de numer-
ação próprios, enquanto um grupo continua a volta dos números de
granizo. Combinámos mais uma semana para preparar o sistema
inventado, ou para preparar mais números de granizo.
Depois discutimos a propósito da nova grelha entregue da última
vez (e que apresento como “casa dos números”)
Eu: Descobertas?
Marta: A diagonal é capicua.
Sara: Há somas da primeira e da segunda linha (vertical e hori-
zontal).
O que já fizemos:
números de granizo tabuada números gregos
descobrir a fórmula para o computador
procurar as regras na tabuada
ouvir a história do zéro
ver números quadrados
comparar a tabuada com a tabela iónica
O que nos propomos fazer:
refazer a grelha com os números já descobertos
descobrir outras regras, nos dominós e na nova
grelha que entrego. (ver página seguinte
inventar um sistema de numeração próprio.
descobrir outras regras para fazer séries de granizo
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 27 62
Momentos de Matemática
Raquel: É uma tabela de mais.
André: Na diagonal é sempre +11.
Eu: Como é que se pode dizer isso também?
Tiago, Diogo, Sara: São múltiplos.
Eu: Podem descobrir mais múltiplos? Haverá alguma regra?
Começa então uma hora de trabalho e de grandes discussões em
pequenos grupos. Ao longo desta hora descobrem as diagonais dos
múltiplos de 9 (Diogo), as verticais dos múltiplos de 5 (Sara apoiada
pela Marta), as verticais com os múltiplos do 2 que se encontram
coluna sim, coluna não (Tiago). Depois descobrem que os múltiplos
de três também se encontram em “diagonais” paralelas à diagonal do
9. É muito mais complicado descobrir os saltos do 6 (um grupo de
rapazes) e do 7 (Raquel, Margarida e Marta com alguma hesitação).
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
10 11 12 13 14 15 16 17 18 19
20 21 22 23 24 25 26 27 28 29
30 31 32 33 34 35 36 37 38 39
40 41 42 43 44 45 46 47 48 49
50 51 52 53 54 55 56 57 58 59
60 61 62 63 64 65 66 67 68 69
70 71 72 73 74 75 76 77 78 79
80 81 82 83 84 85 86 87 88 89
90 91 92 93 94 95 96 97 98 99
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 28 62
Momentos de Matemática
Com algum trabalho descobrimos a relação entre os números
múltiplos nesta tabela e as deslocações das peças de xadrez: 9, 3, 11
como os bispos, 2 e 5 e 10 como as torres, e estes juntos como a rain-
ha e o rei. Os múltiplos de 4, 6, 7, e 8 obedecem aos saltos de cavalo,
embora nem sempre em todas as direcções.
Organizamos o trabalho para a próxima semana, a partir dos in-
teresses de cada um e das investigações em curso:
Terça feira, 9 de Março de 1999
Não todos preparam o trabalho, mas decidimos avançar com
quem tem o trabalho pronto.
Peço, primeiro, a quem inventou numerações próprias que as
copie para um cartaz, e a quem trabalhou números de granizo, que
apontem igualmente num cartaz as suas descobertas.
Grupo Investigação Tarefa
Catarina, Joana (grupo D)
Outra numeração
calcular 43 x 22
Raquel, Margarida (grupo A)
Outra numeração
calcular 1250 ÷ 50
Marta, Miguel, Teresa, Ana Rita, Fernando (grupo C)
Outra numeração
calcular 120 + 50
André, Tiago, Bernardo (grupo B)
Outra numeração
calcular 120 x 35
Diogo, Rui, Tiago, João (grupo E)
Outra numeração
calcular 230 + 147 + 322 - 494
Sara, Patrícia, Diana, Sofia (grupo F)
Números de granizo
Refazer a tabela de descobertas, incluindo nº 99 e 44.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 29 62
Momentos de Matemática
Os alunos que realizaram as con-
tas, apresentam depois o seu ex-
ercício para os outros verem.
O grupo A apresenta logo o problema e o algo-
ritmo, pelo que os outros percebem que se trata de
uma divisão. Com a tabela de conversão, apercebe-
se também que o cabelo é o símbolo “menos” e os
lábios “multiplicar por”, enquanto que a divisão é
representada pelo olho.
O grupo C dá mais luta:
A Ana só apresenta o problema e a solução, pelo que se discute: - Na tabela dela não há nenhum candeeiro, portanto, é um sinal. - Aquela cara estranha também é um sinal. - O candeeiro, pelo sítio onde está, penso que é o “igual”. - Então com a ajuda da tabela, o que é que isto dá? - Cento e vinte mais cinquenta igual a cento e setenta. - Em grego, isto seria PK mais N igual PO.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 30 62
Momentos de Matemática
O grupo B apresenta as contas com os nomes de cada símbolo por
baixo. Percebemos pelo algoritmo que se trata de uma multiplicação
e a descodificação é rápida. A leitura dos números é que põe alguns
problemas.
Eles propõem:
O que dá: “Outu-autogogó-atla visa julha-ce-
bolitmo gual orsim-autogogó-atla-atla.”
Só que se traduzíssemos isto em números
pronunciados em português, ler-se-ia um-
dois-zero vez três-cinco igual quatro-dois-
zero-zero.
Isto abre a discussão para perceber quantos
nomes diferentes é que temos para definir
números. São mais do que 10, embora não
muito mais. Vamos à raiz das palavras para as
dezenas e as centenas.
Explico: “Os sistemas que inventaram são
fáceis, porque eles permitam montar o algo-
ritmo e recorrer ao lápis e ao papel para calcular o resultado. Des-
cubram uma forma para procurar o resultado de ΡΠ dividido por
ΚΔ e também para multiplicar CXIX por XXIX sem recorrer ao nosso
sistema de representação de números.” Acordamos que poderá ser
uma tarefa de pesquisa até a próxima semana.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 31 62
Momentos de Matemática
O grupo dos números de granizo tinha en-
tretanto construído a tabela reproduzida
aqui.
Há quem pergunte porque é que 95 não tem
o número mais alto. Sara explica que ao
“fazer o número” com lápis e papel encon-
trou, depois de 32 passos, o número 47 do
qual o Pascal tinha descoberto com o com-
putador que leva 106 passos para cair.
O Tiago quer saber porque é que alguns
números caem mais depressa do que outros.
Alguns alunos pensam que isto tem a ver
com os números estarem mais perto ou mais
longe do 1.
Uma observação mais atenta mostra que
isso não é verdade: os números mais perto do 1 não caem sempre
mais rapidamente. Controlamos isto depressa com o próprio 47 e
com o 80.
Eu mostro o que acontece com 66 e 76. Enquanto 66 só se divide
uma vez, e depois começa a subir, o 76 pode se dividir duas vezes. O
Tiago diz logo que isto tem a ver com as dezenas que se pode dividir
ou não.
O relâmpago que se fez na cabeça dele era muito forte. Os outros
precisam de mais explicações: 66 : 2 é 60:2 + 6:2 o que dá 30 + 3. No
caso de 76 : 2 é 70 : 2 + 6 : 2 o que dá 35 + 3 ou 38.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 32 62
nº passos + alto
34 14 52
40 9 40
48 12 48
56 20 56
62 110
76 35 592
89 44 592
95 137
96 13 96
97 20 292
99 26 448
Momentos de Matemática
A explicação leva ainda o Tiago a dizer: depois também depende
da unidade, se a divisão dá um número ímpar ou se dá um número
par.
Terça-feira, 16 de Março de 1999
Como se estava a esgotar a nossa paciência com o computador
sempre avariado, decidi introduzir os números de granizo feitos pe-
los alunos no meu computador durante o fim de semana, e fotocopiei
o resultado para toda a turma. Revemos os números que já estavam
na grelha, e percebemos que há vários erros para corrigir.
nº passos + altoCorrecções
passos + alto
34 14 52
40 9 40
48 12 48
56 20 56
62 110 9232
76 35 592 23 88
89 44 592 33 304
95 137 106 9232
96 13 96
97 20 292 119 9232
99 26 448
100 25 100 26 100
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 33 62
Momentos de Matemática
O cálculo em numeração romana e em numeração grega não des-
pertou grande interesse, pelo que deixámos cair . 4
Entretanto apresento a grelha seguinte:
e pergunto quantos quadrados ela contém.
A primeira resposta aponta para 64. Alguns alunos argumentam
que como é um quadrado de 8 x 8 o que dá 64, então são 64 quadra-
dos.
Perante a minha insistência, de repente a Raquel disse: - Não, são 65, com o quadrado grande.
Eu continuo a insistir que há mais, pelo que a Sara propõe a
própria folha. Quando os outros olham para ela, ela retoma: - A própria folha não, que não é quadrada.
O Bernardo descobre que há quadrados que formam novos
quadrados.
Poderão sempre retomar esta investigação ao reler o texto. Isto também é valido para outras propostas que não 4
continuamos a desenvolver na sala.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 34 62
Momentos de Matemática
O Tiago diz: - Então são 81. - Porquê?
O Tiago não responde, mas a Sara avança: - 81
e a Catarina: - 77. - Porquê? Pergunto eu de novo.
Ninguém sabe. Depois, a Sara diz que de 4 quadrados são ao todo
16, porque são 4 x 4 quadrados. - Tens a certeza de que não são mais?
Ela e outros ficam baralhados. Proponho voltar ao trabalho como
os matemáticos fazem: vamos procurar regras.
Construí com eles a tabela seguinte no quadro:
Quadrados de 1 unidade ➔ 64
Quadrados de 4 unidades ➔
Quadrados de 9 unidades ➔
Quadrados de 16 unidades ➔
Quadrados de 25 unidades ➔
Quadrados de 36 unidades ➔
Quadrados de 49 unidades ➔
Quadrados de 64 unidades ➔ 1
De seguida procuramos quantos quadrados de 49 unidades há.
Com alguma dificuldade descobrimos que são 4: dois a partir da
primeira linha, que se sobrepõem. Estes dois repetem-se na linha
seguir.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 35 62
Momentos de Matemática
De seguida vamos à caça de todos os quadrados de 36 unidades.
Algumas canetas de feltro ajudam a marcar o que já foi contado. De-
pois de algum tempo, o Tiago, a Raquel, a Margarida, o Bernardo, o
André e a Sara avançam como a hipótese: 9.
Os outros chegam à mesma conclusão, depois de vermos em con-
junto o «deslizar» dos quadrados.
Agora, já há novas hipóteses: - Será que o próxima será de 16 quadrados? - Porquê? - Porque de um lado sobe, do outro desce. - Então vamos controlar.
Enquanto a Julieta e eu ajudamos os alunos que têm mais dúvidas
para ver o «deslizo» dos quadrados dentro do quadrado grande, al-
guns já anteciparam outros conjuntos. Ficámos convencidos de que
temos uma série de números quadrados ao contrário. O quadro
completo é:
Quadrados de 1 unidade ➔ 64
Quadrados de 4 unidades ➔ 49
Quadrados de 9 unidades ➔ 36
Quadrados de 16 unidades ➔ 25
Quadrados de 25 unidades ➔ 16
Quadrados de 36 unidades ➔ 9
Quadrados de 49 unidades ➔ 4
Quadrados de 64 unidades ➔ 1
Total ➔ 204
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 36 62
Momentos de Matemática
Terça-feira 23 de março de 1999
Hoje pegamos de novo na tabuada. Lembram-se de quantos
números diferentes há na tabuada?
Depois de alguma hesitação, o André avança: – não são 42?
Os outros, embora hesitantes, confirmam. Temos de voltar a con-
struir a nossa lista. Eu pergunto que tipo de figuras é que as multi-
plicações faziam no geoplano:
- Os números quadrados são quadrados!
- Os outros são números rectangulares
- Há dois rectângulos de cada número
- Há dois, ou 4, mas há sempre um par.
- Bom, então gostava de saber se podem ainda mostrar as multipli-
cações com outro material: o material Cuisenaire. Lembram-se
deste material?
- Penso que o utilizamos quando estávamos no 1º ano.
- Então, vão pensar como podem fazer rectângulos de 24 unidades,
isto é com uma superfície de 24 unidades
Apresentam várias propostas do tipo:
, ou ainda .
Depois de algum tempo temos assim 4 réguas de 5 ladeada de
duas de 2, duas colunas de 6 réguas de 2, mas de repente também
começam a se apresentar três réguas de 8, 4 réguas de 6, 12 réguas de
dois.
Aproveito para parar e observar o que descobrimos.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 37 62
Momentos de Matemática
- Vamos introduzir duas regras novas: - os rectângulos só podem ter réguas de uma só cor; - em cada linha só pode haver uma régua.
- Podem fazer um conjunto de rectângulos e quadrados diferentes,
mas sempre só um por grupo. - Como, Pascal? - Combinam entre vocês. - Podemos ir a procura dos números na tabuada? - Claro.
O trabalho é de difícil arranque. Depois de algum tempo, surgem
vários rectângulos, e aparecem também os quadrados 4, 9, 81 e 100.
Aparecem igualmente alguns números representados por blocos de
valor 1, em filas. Mostro, com o apoio do geoplano, que não se trata
de um rectângulo, mas de uma fila de unidades (no geoplano é mais
visível que se trata de uma linha de pregos, não tendo a superfície de
um rectângulo.)
De seguida juntamos os pares de rectângulos que estão na mesa.
Registamos 2 pares de rectângulo 24, 18 e 1 par de rectângulos 15,
20, 21, 14, 50.
Há um rectângulo 24 que não tem par: o rectângulo feito por 12
peças 2. - Porquê? - Para ele ter par deveríamos ter réguas 12. Só há até 10.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 38 62
Momentos de Matemática
- Reparem que agora têm rectângulos parecidos com os que fize-
mos com o geoplano.
Podem se cobrir dois a dois: . - Tentem agora fazer os rectângulos que eu proponho.
Quando proponho um rectângulo 41, alguns vão à procura, out-
ros olham para a tabuada, ainda outros ficam parados. Mas como
insisto, todos os alunos se põem a tentar. No fim de algum tempo,
toda a gente está de acordo: não se pode fazer rectângulo 41. Pro-
ponho outros, como o 17, o 13, o 3, o 7 e o 2. - Há rectângulos que não se podem fazer. - Com os números ímpares não se pode fazer. - Então tenta fazer o 63. - Não, pode-se fazer com alguns números ímpares, e com todos os
números pares. - Com todos os números pares? - Com o dois não.
De seguido mostro que todos os pares de rectângulos podem ser
representados por uma cruz. 24 fica assim com uma régua 8 cruzada
com uma régua 3 e também com uma régua 6 cruzada de uma régua
4. Isto significa também que podemos trocar a régua 4 por uma cruz
2 x 2: .
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 39 62
Momentos de Matemática
Fazemos a decomposição do 24:
4 x 6 para 2 x 2 x 6 ( ) e depois para 2 x 2 x 3 x 2 ( ).
e 3 x 8 em 3 x 2 x 4( ) e depois para 3 x 2 x 2 x 2 ( ).
- Portanto, seja como for que começamos, 24 = 3 x 2 x 2 x 2, uma
torre de um 3 e três dois, o que escrevemos 31 x 23 . Podemos ver
o que acontece com 12: é 3 x 4 ou 3 x 2 x 2, ou então 6 x 2 ou 3 x 2
x 2: sempre vai dar 12 = 3 x 2 x 2, ou uma torre de um 3 e dois 2,
seja 31 x 22.
- Acabamos a última intervenção antes das férias da Páscoa, fazen-
do um ponto da situação:
- Trabalhamos com o geoplano e o xadrez para descobrir quadra-
dos e descobrir também números quadrados e rectangulares.
- Trabalhamos com as réguas números rectangulares e quadrados,
para os transformar em torres.
- Vamos depois da Páscoa ver o que acontece com outros números
quando fazemos torres. E quais são os números que não estão na
tabuada. Que tipos de números são? Há mais do que um tipo?
- Vamos também voltar ao geoplano, e trabalhar quadrados e
partes de quadrados.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 40 62
Da Páscoa até ao acampamento
Terça-feira, 13 de abril de 1999
Começamos por lembrar o que já fizemos:
Margarida: Fizemos trocas.
Raquel: Contas de vezes, pondo cruzinhas.
Sara, Catarina: Contamos quadrados, no xadrez.
Raquel: Descobrimos números quadrados nos quadrados que con-
tamos.
Margarida: Fizemos números de granizo.
Eu: Já montei a fórmula no computador. Ensinarei na próxima
semana o grupo responsável como se pode fazer um gráfi-
co a partir dos números de granizo.
Margarida: Trabalhamos também com a tabuada de Pitágoras.
Eu: Então vamos lá ver. O que escrevo no quadro está certo?
(Escrevo: 1 + 2 = 3).
Coro: Sim
Eu: e isto: 4 + 5 + 6 = 7 + 8
(depois de um curto momento):
Raquel, Sara, André, Tiago, Margarida: Está certo
Eu: Conseguem escrever a próxima fila? Começará por que
número?
Tiago: Por 9
Eu: Tentem escrever então.
Rapidamente, escrevem a lista 9 +10 + 11 + 12 = 13 + 14 + 15 e ve-
Momentos de Matemática
rificam o resultado, desta vez com máquina calculadora.
Eu: Conseguem escrever a próxima linha?
Vários escrevem logo, alguns depois de pensar um pouco e de
verificar, como diz o Rui, que os números são sempre seguidos.
A lista 16 → 20 = 21 → 24 cresce e é controlada. Ainda se faz a
lista que começa com 25. Quando pergunto com que tipo de número
começa cada fila, tenho logo vários que respondem: números
quadrados.
Eu: Porquê? Perante a incapacidade que mostram para responder,
avanço com mais sugestões: “lembram-se como é que Pitágo-
ras contava os números quadrados?” - Com pedras. - E depois, como é que ele contava? - Contava as pedras que juntava. - Sim, e qual era a serie. - 1 + 3 + 5 + 7 etc. - Agora, contem quantos números há em cada fila.
Faz se um “clique” na cabeça de muitos. Efectivamente, as filas
são conjuntos de elementos, neste caso números. Cada conjunto tem
mais dois elementos do que o anterior. Como se começa com 3, cada
cardinal de conjunto é ímpar. A soma dos cardinais corresponde à
soma das pedras (ou dos pregos) de Pitágoras.
Mudamos de assunto. Voltamos para as torres com as barras.
Representamos o número 48 em cruz: verde escuro ✕ castanho.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 42 62
Momentos de Matemática
Representamos também 36 (2 maneiras: azul ✕ cor de rosa e
verde escuro ✕ verde escuro) e 18 (duas maneiras: azul ✕ vermelho e
verde escuro ✕ verde claro).
Depois construímos algumas torres de apoio: 4 = 22, 6 = 21 ✕ 31, 9
= 32.
Em seguida proponho que substituam as barras por torres com o
mesmo valor.
Pouco a pouco, crescem estas torres nas mesas de cada grupo:
48 = 8 ✕ 21 ✕ 31 = 4 ✕ 2 ✕ 21 ✕ 31 = 22 ✕ 2 ✕ 21 ✕ 31 = 24 ✕ 31
Da mesma forma crescem (depois de palpites sobre que números
aparecerão na torre):
18 = 21 ✕ 32
36 = 22 ✕ 32
Um rápido olhar pelas réguas faz afirmar os alunos que não há
torre 2, 3, 5, 7 nem torre 1, entre os primeiros dez números. Há torre
4, 6, 8, 9, 10.
Depois invertemos a situação. A partir de uma torre definida,
adivinhamos o número.
Construímos o 64, o 18, o 35 e o 25 desta forma.
Existe ainda uma grande discussão com a Catarina e com a Mar-
garida sobre a torre 2 ✕ 2 ✕ 2 ✕ 2 ✕ 2 ✕ 2 ✕ 2 ou 27, que não é 14 mas
8 ✕ 8 ✕ 2.
Algum trabalho de pesquisa para a próxima semana: completar
uma tabela com as decomposições dos números da tabuada, a partir
do modelo iniciado:
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 43 62
Momentos de Matemática
Terça feira, 20 de abril de 1999
A tabela está completa.
Corrigimos algumas coisas: 100 está como 10 x 10, 81 está como 9
x 9, 42 como 7 x 6.
Fazemos as correcções em conjunto, exemplificando com as
réguas.
nº torre nº torre nº torre
1 18 21 ✕ 32 48 24 ✕ 31
2 20 49
3 21 50
4 22 24 54
5 25 52 56
6 21 ✕ 31 27 60
7 28 63
8 23 30 64 26
9 32 32 70
10 35 51 ✕ 71 72
12 36 22 ✕ 32 80
14 40 81
15 42 90
16 45 100
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 44 62
Momentos de Matemática
Pergunto que números entram nas torres: - 2, 3, 5, 7, não há outros. - São os números que não podemos mudar em torre. - Eles têm um nome: são números primos.
Risos. - E como em todas as famílias grandes, não se sabe bem onde
acabam os primos, nem se acabam. Pensam neste momento que é
uma série infinita de números.
Continuamos a lista. Os alunos não têm muitas dúvidas até 20.
Depois é mais complicado. Quando pergunto se 1.356.687 é primo, a
Catarina diz logo: - É, porque acaba em 7. - Tens a certeza que os números que acabam em 7 são primos? - Tiago já abana a cabeça. 27 acaba em 7 e não é primo. - Portanto não é por acabar em 7, nem por ser número ímpar. Ago-
ra há um número diferente dos outros. - É o 2, é par, disse a Sara. - E porque é que não há outros números primos pares? - Porque depois todos eles podem ser 2 x outro número. E isto para
sempre, disse a Raquel. - Para já podemos dizer aqui que todos os números da tabuada
podem ser escritos como torres com 2, 3, 5, 7, excluindo estes.
Ainda analisamos “a tabela de Eratóstenes” , mais conhecido
como “crivo de Eratóstenes” prometendo que ainda voltaremos a
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 45 62
Momentos de Matemática
falar dos números primos . 5
Eratóstenes, como a maior parte dos Gregos de seu tempo, achava
que 1 não era um número completo, por não mudar nada quando se
multiplica por ele. Assim, 1 fica excluído do jogo. Depois considerava
o 2 e riscava todos os seus múltiplos. De seguida, pegava no 3, o
próximo número não riscado e riscava todos os seus múltiplos ainda
não riscados. Continuava assim com o 5, depois com o 7. Os números
não riscados que sobram são números primos.
Abandonamos os números aqui para trabalhar áreas com o geo-
plano, isto é, unidades definidas como os quadrados entre 4 pregos.
Fazemos figuras de 6 unidades. Dois a dois, começam com o óbvio:
rectângulos. Depois vêm planificações do cubo, cruzes, “pistolas”, e
a Sara e o João aventuram-se em triângulos de meia unidade, para
fazer umas casinhas de 6 unidades.
Crivo de Eratóstenes
1 2 3 4 5 6
7 8 9 10 11 12
13 14 15 16 17 18
19 20 21 22 23 24
25 26 27 28 29 30
31 32 33 34 35 36
37 38 39 40 41 42
Mais uma promessa que não cumpri. Entretanto, os números primos são números fascinantes. Os matemáticos 5
gostam quase tanto deles, como de números como pi. Encontrarão informações sobre eles nos cadernos da Gradiva Junior, ou na internet, numa página que se chama “ask Dr. Math”. Para isso, terão primeiro que melho-rar o vosso inglês, claro.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 46 62
Momentos de Matemática
Ao todo surgem umas 30 figuras diferentes.
Quando pensamos em triângulos com áreas de 3 unidades, as
coisas complicam-se. Um dos triângulos de difícil verificação é um
triângulo inscrito num quadrado de 9 unidades. Verificamos que a
metade do quadrado são 4,5 unidades, e que o triângulo que falta
tirar àquela metade é metade dum rectângulo de 3 unidades, ou 1,5
unidade. Ora 4,5 menos 1,5 igual 3 unidades. A proposta era da Inês
e do João e discutida com todos.
O trabalho entusiasma de tal forma que
acabamos o tempo sem nos apercebermos.
A proposta para a semana seguinte é con-
struir os triângulos mais esquisitos que con-
seguirem – mas que ocupam sempre áreas
de 3, 4 ou 5 unidades.
Terça feira 27 de abril de 1999
Uma semana decorrida, quando pergunto, com o geoplano com a
figura na mão, como resolvemos o problema de João e da Inês, a
Raquel diz: “Então é simples. Tens um quadrado de 9. O triângulo é
metade. É 4,5. E depois tens a metade da outra parte que é metade
dum rectângulo que é 1,5. Portanto
dá 3.”
O trabalho de hoje resume-se a
fazer figuras e a procurar a área. Há
uma proposta, ilustrada pela figura
ao lado, que fica para calcular.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 47 62
Momentos de Matemática
Terça-feira, 4 de maio de 1999.
Esqueci me de levar os elásticos para a sala, e por isso proponho
que façam mais umas brincadeiras com números.
Começamos por lembrar quantos «algarismos» tinham os Gregos.
Sara: Tinham 9.
Bernardo: Não, tinham nove para as unidades, nove para as centenas
e 9 para as dezenas.
Raquel: São 27!
Eu: E já agora, quantos «algarismos» é que conhecemos dos
Romanos?
Sara: Então, é o I, o II,
Tiago: o III.
Raquel: o V
André: o IV também.
Catarina: o VII
Sara: o VIII
João: falta o VI
Miguel: há a cruz também, o X
Margarida: e o C, o D.
Tiago: o L
Eu: mais nenhum?
Vários: o M.
Eu: então, os Romanos tinham «algarismos» I, V, X, L, C, D, M.
São sete. E quantos algarismos é que nós utilizamos?
Tiago: nove, não dez!
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 48 62
Momentos de Matemática
Catarina: Dez? Ah, sim, com o zero.
Eu: Já agora, que sistema é mais fácil para escrever números? O
Romano ou o Grego?.
Raquel: No Grego escreve se com menos algarismos.
É fácil ilustrar o que a Raquel diz, no quadro: para 108, os
gregos utilizam dois algarismos, os romanos cinco. E arran-
jamos logo mais exemplos.
Eu: Porque será que nós utilizamos um sistema com dez algar-
ismos, e não com 27, ou com 7 ou com outro número qual-
quer?
...
Eu: Então, que ajuda temos para contar, se não temos máquinas
nem lápis e papel?
Marta: Os dedos. Ah! Temos dez dedos.
Raquel: Não foi o Pascal que contou a história dos Índios?
Tiago: Contavam grupos de 20, diziam “um Índio” . 6
Eu: Exactamente. Agora, na história da matemática, houve al-
guém que se lembrou que talvez se pudesse fazer sistemas
para contar com menos algarismos.
Imagina que só temos os algarismos 0 1 2 3. Isto quer dizer,
que somos um povo que só tem 4 dedos nas mãos. Como é
que escrevemos os números com este sistema?
Quando queremos ler os números, é complicado: 10 é quatro, 23 é
onze, 100 é desaseis.
Carl Sagan, Isaac Asimov, e muitos outros divulgadores de ciências têm histórias como estas e muitas outras. 6
Algumas são bem interessantes.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 49 62
Momentos de Matemática
Temos de recorrer ao quadro, e fazer uma grelha, onde pomos
unidades, grupo de quatro, quatro grupos de quatro (para perceber,
que 10 é um grupo de quatro e zero unidades e 21 são dois grupos de
quatro e uma unidade, portanto nove). No quadro aparece:
Eu: Agora um pequeno desafio para vocês: vamos contar num
sistema que só tem três algarismos. Cada um vai tentar es-
crever os números até dez.
Todos começam a trabalhar e
discutem em pequenos grupos.
Alguns param depois de 0 1 2 10,
depois apercebem–se que só es-
creveram 4 números. A Catarina
fica baralhada por causa do 0, que
também é contado.
É preciso recorrer a vários instrumentos de apoio e ilustramos e
contamos com réguas, tampas e material MAB. As tentativas são
transpostos para grelhas de contagem, e depois fica no quadro:
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 50 62
Momentos de Matemática
Com este trabalho feito, proponho uma
grelha só com dois algarismos: são os
números binários. O Tiago observa logo
que não é possível escrever números
com menos do que dois algarismos. Eu
respondo que aquela ideia levou algum tempo para ser provada
matematicamente.
Continuamos a comparar na grelha os números que queremos
formar.
– Quando temos dois algarismos, contamos em grupinhos de dois,
quando temos 3 algarismos, em grupinhos de 3; 4 em grupinhos
de 4. E quando temos dez?
Vários: São grupinhos de 10.
Eu: Têm a certeza?
Marta e Margarida: Não, espera, ...
Sara: Ele está a querer enganar. É, é!
Proponho que imaginem um planeta onde vivem extra – ter-
restres que têm doze dedos. Como será que eles contam?
0 1 2
10 11 12
20 21 22
100 101 102
110 111 112
120
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 51 62
Momentos de Matemática
Não tiveram muitas dúvidas:
eles devem contar em grupos de
doze. Acrescentamos os símbo-
los X e Y aos nossos algarismos
e peço que escrevem os números
até doze. Fazem isto sózinhos
ou a pares.
Em seguida, procuramos escrever todos juntos os números de 12
em doze. Erro geral quando chegamos a cento e vinte. Escrevemos
primeiro 100 (que é neste caso doze vez doze, ou 102) em vez de X0
(que é neste caso dez grupos de doze e nenhuma unidade)
Quando já no fim pergunto o que vêem de especial, o Miguel diz
que na última fila, acabam todos em zero, isto é os múltiplos de 12
acabam todos em 0; controlamos com os outros sistemas, e descob-
rimos que os múltiplos do número que indica o número de algaris-
mos acabam sempre em 0.
Terça-feira, 11 de Maio de 1999
Quando chego à escola, a Julieta avisa que este semana está a ser
organizada pelas equipas de trabalho. A equipa do dia constrói o
plano de trabalho que vai ser proposto, e vem me perguntar o que
podemos fazer hoje: explico que podemos continuar o trabalho de
geoplano, ou então que podemos acabar o trabalho dos números da
semana passada.
É o que propõem à turma, e o que é aceite.
Pergunto o que se lembram do trabalho da semana passada.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 52 62
Momentos de Matemática
Catarina: Fizemos aquilo dos números dos extra – terrestres.
Sara: Contamos em grupinhos de números, por exemplo em
grupos de 3,
Tiago: Contamos como os ET’s
Eu: Então e quando contamos só com dois algarismos, o que
aconteceu com os números pares?
...
Faço uma grelha:
Raquel: Ah! Já sei. Os números pares ficaram de um lado, os
números ímpares do outro.
Eu: Então, agora vamos ver como é que parece a tabuada,
quando só há dois algarismos:
(construímos esta tabela juntos)
0 1
10 11
100 101
110 111
1000 1001
1010 1011
1100 1101
1110 1111
10000
x 0 1 10
0 0 0 0
1 0 1 10
10 0 10 100
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 53 62
Momentos de Matemática
Eu: Agora, podem vocês construir a tabuada quando só há 3
algarismos.
Todos se lançam neste trabalho, em pequenos grupos. Uma pe-
quena cábula com os números, tipo casa dos números, ajuda a trans-
posição. Depois discutimos o resultado:
Eu: Já que ganharam prática, podem agora construir a tabuada
para os ET’s que só têm uma mão. Qual será o sistema que
utilizam?
Catarina: Com quatro algarismos.
Raquel: Não, com cinco algarismos.
Vemos com mais atenção. São cinco algarismos, mas quatro é o
último número escrito com um só algarismo.
Voltam a trabalhar em pequenos grupos, vão mostrando e dis-
cutindo resultados.
Depois faz-se um ponto da situação e preencho a grelha 5 ✕ 5.
Para cada linha horizontal que escrevo, copio logo a respectiva linha
vertical, o que faz dizer a Catarina: “Ah! Assim é mais fácil!”
Eu: Posso sempre fazer isso?
Sara: Podes! Espera! Penso que podes!
Tiago: Podes! Podes!
x 0 1 2 10
0 0 0 0 0
1 0 1 2 10
2 0 2 11 20
10 0 10 20 100
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 54 62
Momentos de Matemática
Eu: Porquê?
Sara: Porque quando há uma linha assim, há outra assim (mostra
com os braços as linhas verticais e horizontais).
Margarida: Podes dobrar a tabuada.
Raquel: Sim, é como a gente já fez!
Eu: Quando?
Bruno: Com aquela tabuada que o Pascal trouxe.
Raquel: Aquela com as letras gregas.
Eu: Pronto, muito bem. Agora tenho duas propostas. Uma mais
fácil e outra mais difícil. Construir a tabuada para 6 algar-
ismos é a fácil, construir a tabuada para os extra – terrestres
com 12 dedos é a outra.
A maior parte dos alunos pega na segunda proposta, e começam
as discussões em pequenos grupos. Além disso, há muitas perguntas:
Catarina: Então, 16 é 14?
Eu: Sim. Porque é um grupo de doze e zero unidades (10) mais
4 unidades, portanto 10 + 4.
Catarina: Posso também fazer 16 – 2.
Sara e Margarida: então vinte é 18?
Eu: Sim.
André: Então quatorze é 12!
Bruno: Como é que se escreve vinte e dois? É 20?
Eu: Pensa, Vinte e dois é um grupo de doze mais dez.
Raquel: Então é 10 + X
Eu: Sim, é 1X
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 55 62
Momentos de Matemática
Depois de algum tempo, voltamos a ver o que já foi construído. A
Catarina que se entusiasmou e se lançou freneticamente nas contas,
já tem a tabuada meia preenchida (até seis vez doze). Mas muitos
outros também têm linha completas preenchidas.
Pegamos nos múltiplos de doze. É fácil. Volta a haver alguma hes-
itação para X0 e Y0.
Escrevemos os números quadrados: 4 e 9 não são problema, 14
(42) também não. Há uma discussão mais acesa por causa de 52: é 21
ou 23? O sistema da Catarina (tirar 2) dá 23. Mas raciocinamos que o
resultado são dois grupos de doze (doze mais doze são vinte e qua-
tro, portanto 10 + 10 = 20) mais uma unidade, portanto 20 + 1 = 21.
Da mesma forma controlamos 62 e 72. Pouco a pouco aparece a
tabela reproduzida na página seguinte. Olhamos com atenção as
várias tabuadas que construímos e fazemos alguns comentários.
Marta: acabam sempre em 100
Bruno: o último número da primeira linha é sempre 10.
Catarina: podemos dobrá-los todos.
Eu: Pois. Todos são simétricos.
Tiago: há sempre quadrados.
Eu: Sim, há sempre quadrados embora a forma como estão es-
critos dependa do sistema utilizado. Vejam o que a Marta
disse há um bocado: todos eles acabam em 100, ou seja 10 X
10, ou seja 102. Mas isto pode querer dizer dois2, três2, qua-
tro2, cinco2, ... dez2, doze2, sessenta2, como no caso dos Ba-
bilónios.
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 56 62
Momentos de Matemática
Acabamos este trabalho, referindo que se pode pedir ao com-
putador que faça contas com a máquina calculadora no sistema com
2, 8, 10 ou 16 algarismos, porque são bases frequentemente utilizados
na programação dos computadores.
✕ 1 2 3 4 5 6 7 8 9 X Y 10
1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 X Y 10
2 2 4 6 8 X 10 12 14 16 18 1X 20
3 3 6 9 10 13 16 19 20 23 26 29 30
4 4 8 10 14 18 20 24 28 30 24 28 40
5 5 X 13 18 21 26 2Y 34 39 42 47 50
6 6 10 16 20 26 30 36 40 46 50 56 60
7 7 12 19 24 2Y 36 41 48 53 5X 65 70
8 8 14 20 28 34 40 48 54 60 68 74 80
9 9 16 23 30 39 46 53 60 69 76 83 90
X X 18 26 24 42 50 5X 68 76 84 92 X0
Y Y 1X 29 28 47 56 65 74 83 92 X1 Y0
10 10 20 30 40 50 60 70 80 90 X0 Y0 100
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 57 62
Epílogo em Porto de Muge
É claro que a investigação que iniciamos nem acaba aqui, nem foi
muito longe no trabalho desenvolvido. Parámos com as áreas, onde
ainda vos queria ter mostrado como os quadrados aparecem quando
se calcula os lados dum triângulo rectangular. Foi também Pitágoras
que nos mostrou tal fenómeno. Mas podes fazer num geoplano, ou
em papel quadriculado: desenhe um triângulo rectângulo, e construa
um quadrado a partir de cada um dos lados. Depois, compara as
áreas dos quadrados construídos sobre os lados que tocam o ângulo
recto, com a área do quadrado sobre o terceiro lado (que recebeu o
nome de hipotenusa!) Já viste? Experimente com triângulos rectân-
gulos de dimensões diferentes!
As investigações que se podem fazer sobre a linguagem
matemática são praticamente ilimitadas. Mas tivemos que acabar
aqui as nossas conversas e as nossas experiências porque entretanto
começamos a preparar o acampamento em Porto de Muge.
Deste acampamento, que foi registado num álbum próprio, só
realço aqui a montagem do relógio de Sol e a nossa conversa sobre os
planetas e a nossa pequena observação do céu.
A observação do movimento da Terra, do Sol, da Lua e dos astros
tem uma história que se confunde com a própria história da
matemática. Os sábios dos povos antigos de quem falamos ao longo
destas semanas utilizavam as suas observações para organizar o
tempo e o espaço.
Podiam assim dividir a vida em fatias:
Momentos de Matemática
• de ano (tempo que a terra demora para dar uma volta completa
ao sol - ou tempo que vai de um solstício de verão até o próximo
solstício de verão);
• de um mês (tempo de um “sapatu” (sabath - sábado) ou festa de
Lua Cheia – e dia de festa em que não se trabalha – e até a próx-
ima festa);
• do tempo que vai do levantar do sol até ao pôr do sol (dia), mais
tarde transformado em tempo de volta completa do sol em redor
do relógio de sombras (ou relógio de Sol) para evitar horas longas
no verão e horas curtas no inverno)
• e finalmente tempo de divisão do mês, introduzindo outras festas
“sapatu” na altura da Lua Nova e dos Quartos. A partir daí foi
possível dividir o tempo entre dois “sapatu”, contando as voltas
do sol em redor do relógio de sombras. Às vezes deu 8 voltas, às
vezes 7.
Quando os matemáticos antigos se aperceberam desta dificul-
dade, resolveram adaptar o mês a 4 períodos de 7 dias desviando se
assim um pouco da realidade. Sete dias correspondia a 7 astros
visíveis sem instrumentos e com um comportamento diferente dos
outros. O Sol, a Lua e mais cinco pontos brilhantes não andavam
sempre da mesma forma no céu, mas de dia para dia andavam para
frente ou para trás em comparação com os outros astros. Eles
“vagueavam” no céu, cada um era um astro errante, ou, em latim,
planeta. Por isso, os povos antigos deram–lhes estatuto de deuses:
Sol - Sun - Sunday
Lua - Lune - Lundi - Moon - Monday (Moon’s day)
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 59 62
Momentos de Matemática
Marte (Tiw) - Mardi - Martes - Tuesday (Tiw’s day)
Mercúrio (Wodan) - Mercredi - Miercoles - Wednesday (Woden’s
day)
Jupiter (Thor) - Jeudi - Jueves - Thursday (Thor’s day)
Venus (Frica) - Vendredi - Viernes - Friday (Frica’s day)
Saturno (Saturn) - Samedi - Saturday (Saturn’s day)
Isto também significa que o “sapatu” não era um dia definido do
grupo de sete dias. Só mais tarde é que o dia de descanso foi atribuí-
do a um dia fixo da semana, quando surgem as religiões que só re-
conhecem um deus em vez de vários: primeiro os hebreus, depois os
cristãos e depois os muçulmanas.
O relógio de sombras, finalmente, permitia organizar o espaço de
tempo dentro de um dia, além de ter dado a possibilidade a alguns
cientistas gregos para calcular o perímetro da terra e perceber que a
terra tinha que ser redonda.
Nós, no acampamento, percebemos que o sol chega ao sul e ao
seu ponto mais alto em Porto de Muge, não ao meio dia, mas sim às
13 horas e 30 minutos. A nossa hora chamada de hora de Verão ante-
cipa o sol.
E assim a nossa aventura acabou.
Mas podes continuar outra. - Procura o Diabo dos Números, no livro de Hans Enzenberger,
(ASA) ou faz as tuas perguntas ao Albert Jacquard lendo o seu
livrinho “O que é ser inteligente?” (Terramar). - E, em todo lado:
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 60 62
Momentos de Matemática
- Procura os matemáticos babilónicos, hindu e chineses. - Procura também Pitágoras, Arquimedes, Eratóstenes. - Procura Al-Khowarizmi na corte Árabe. - Ou dá um salto para tempos mais modernas, procura Isaac New-
ton depois de uma visita a Galilei Galileo. - Procura um destes verdadeiros matemáticos criativos do nosso
século, dos quais Albert Einstein é um dos muito conhecidos.
E, de aqui alguns anos, deslumbra-te com Hubert Reeves, com
Carl Sagan ou com os outros divulgadores de ciência e de matemáti-
ca.
Mas sobretudo, - pergunta, - questiona, - explora, - pensa de várias maneiras num problema!
Lembra-te que só o que não conhecemos parece estranho, esquisi-
to e perigoso.
Quando pensamos e estudamos sobre as coisas, elas continuam
estranhas, às vezes esquisitas, mas deixam de ser perigosas, para se
tornarem encantadoras.
Diverte-te!
Lisboa, Junho de 1999
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 61 62
Momentos de Matemática
Projetos de matemática na Voz do Operário da Ajuda Página de 62 62