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RIECK, F.E . & SOUZA, J.C. 108 CAPÍTULO 9 CONDIÇÕES DE CONSERVAÇÃO E PATOLOGIAS DOS BENS PÉTREOS DE MONUMENTOS HISTÓRICOS DA ZONA DA MATA PERNAMBUCANA Fernando Edgar Rieck 1 ; Júlio Cesar de Souza RESUMO O artigo trata, especificamente, da avaliação das condições de conservação e patologias dos bens integrados pétreos de monumentos históricos localizados em Jaboatão dos Guararapes, Recife e Olinda - áreas urbanas de grande concentração - situados na região da zona da mata (litorânea), estado de Pernambuco. Após visitação e levantamento “in loco” dos monumentos históricos são apresentadas as principais patologias encontradas, com a indicação dos processos de degradação atuantes sobre os bens integrados, considerando os fatores externos, que servirão de base para futura abordagem visando a sua conservação e/ou recuperação. O objeto de estudo compreende os bens integrados pétreos dos monumentos históricos, a saber: cantaria ornamental/estrutural e silhares, assim como materiais de revestimento e assentamento – argamassas. Através de realização de ensaios tecnológicos pode-se obter um relativo conhecimento das propriedades desses materiais que, associado aos fatores exógenos característicos do meio ambiente em que se encontram, permitem uma compreensão do processo de degradação dos mesmos e consequentemente, medidas corretivas e de preservação do patrimônio histórico. O artigo apresenta uma metodologia de pesquisa para avaliação das condições de conservação e identificação de patologias nos bens integrados pétreos dos monumentos históricos religiosos, compreendendo três etapas: a primeira corresponde aos trabalhos de campo; a segunda e terceira etapas, respectivamente, de análises laboratoriais e interpretação de dados. Enfim, a obtenção de dados técnico-científicos a partir dos estudos, avaliações e pesquisas realizados, permitirá procedimentos coincidentes às questões de manutenção e conservação e, ainda, evitar a aplicação de materiais inadequados, para que não ocorram os mais variados tipos de patologias em decorrência de degradações e alterabilidades, de bens integrados pétreos do acervo patrimonial cultural construído. 1 Mestrando PPGEMinas/UFPE. E-mail: [email protected]

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monumentos, apesar de belos, possuem problemas construtivos

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    CAPTULO 9

    CONDIES DE CONSERVAO E PATOLOGIAS DOS BENS PTREOS DE MONUMENTOS HISTRICOS DA ZONA DA MATA

    PERNAMBUCANA

    Fernando Edgar Rieck1; Jlio Cesar de Souza

    RESUMO

    O artigo trata, especificamente, da avaliao das condies de conservao e patologias dos bens integrados ptreos de monumentos histricos localizados em Jaboato dos Guararapes, Recife e Olinda - reas urbanas de grande concentrao - situados na regio da zona da mata (litornea), estado de Pernambuco.

    Aps visitao e levantamento in loco dos monumentos histricos so apresentadas as principais patologias encontradas, com a indicao dos processos de degradao atuantes sobre os bens integrados, considerando os fatores externos, que serviro de base para futura abordagem visando a sua conservao e/ou recuperao.

    O objeto de estudo compreende os bens integrados ptreos dos monumentos histricos, a saber: cantaria ornamental/estrutural e silhares, assim como materiais de revestimento e assentamento argamassas. Atravs de realizao de ensaios tecnolgicos pode-se obter um relativo conhecimento das propriedades desses materiais que, associado aos fatores exgenos caractersticos do meio ambiente em que se encontram, permitem uma compreenso do processo de degradao dos mesmos e consequentemente, medidas corretivas e de preservao do patrimnio histrico.

    O artigo apresenta uma metodologia de pesquisa para avaliao das condies de conservao e identificao de patologias nos bens integrados ptreos dos monumentos histricos religiosos, compreendendo trs etapas: a primeira corresponde aos trabalhos de campo; a segunda e terceira etapas, respectivamente, de anlises laboratoriais e interpretao de dados.

    Enfim, a obteno de dados tcnico-cientficos a partir dos estudos, avaliaes e pesquisas realizados, permitir procedimentos coincidentes s questes de manuteno e conservao e, ainda, evitar a aplicao de materiais inadequados, para que no ocorram os mais variados tipos de patologias em decorrncia de degradaes e alterabilidades, de bens integrados ptreos do acervo patrimonial cultural construdo.

    1 Mestrando PPGEMinas/UFPE. E-mail: [email protected]

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    INTRODUO

    O patrimnio edificado, quanto aos seus materiais ptreos - bens integrados - engloba questes tcnicas e culturais, pela sua trajetria artstico-histrico-temporal, fatores preponderantes para o estudo dos mesmos.

    O estudo de bens integrados ptreos cantaria ornamental/estrutural e silhares, assim como materiais de revestimento e assentamento argamassas - de bens culturais, a partir de ensaios tecnolgicos permite um relativo conhecimento das propriedades desses materiais. Acrescentando-se a isso, avaliaes do comportamento das rochas, atrelado a solicitaes (resistncias fsico-mecnicas), aplicaes (usos/funes); fatores climticos (intemperismo fsico-qumico) e estudos de alterabilidade tambm devem ser desenvolvidos.

    Em funo do tempo de construo e exposio s intempries, o monumento histrico torna-se um objeto de estudo a cu aberto com dados e informaes relevantes e suficientes levantamento de detalhe, descrio e caracterizao de rochas - relativos aos elementos ptreos aplicados, no que diz respeito s patologias e alterabilidades dos mesmos. Assim, procedimentos e aes relacionados a mtodos conservativos, podem ser executados de tal maneira que encerre ou minimize o processo de degradao/deteriorizao de materiais ptreos, sempre constante, lento e gradual.

    As anlises e estudos referentes a conservao e patologias de materiais ptreos, a partir dos monumentos histricos existentes, considerando a cronologia de tempo, pertencem ao sculo XVIII (1700-1800) e localizam-se no estado de Pernambuco, regio da Zona da Mata (litornea), nos municpios de Jaboato dos Guararapes, Olinda e Recife.

    Cada monumento escolhido para estudo apresenta localizao urbana definida e diferenciada e tambm diferentes materiais ptreos empregados, fazendo-se o levantamento de dados especficos em funo de fatores endgenos e exgenos.

    Aps a escolha e identificao dos monumentos histricos, a metodologia de trabalho desenvolve-se nas seguintes etapas: levantamento fotogrfico dos tipos litolgicos empregados e suas patologias e, ainda, levantamento e identificao das reas de ocorrncia; precedida por amostragem de materiais existentes, estabelecendo suas caractersticas fsico-mecnicas, seguidos por ensaios laboratoriais de alterabilidade, para obteno de informaes sobre o estado de conservao das rochas aplicadas como bens integrados (estruturais/ornamentais) de monumentos histricos. Por fim, a partir dos estudos e da interpretao de dados laboratoriais composies mineralgicas, texturas, estruturas e alterabilidades variadas evitar a execuo/aplicao de materiais inadequados, para que no ocorram os mais variados tipos de patologias no acervo patrimonial cultural.

    A rocha, usada com fins ornamentais e estruturais, um recurso natural, no renovvel. No patrimnio cultural material edificado - o emprego de algumas tipologias merece ateno especial.

    O conhecimento, o uso correto e adequado dos materiais empregados de vital importncia nas aes de manuteno, conservao e de intervenes restaurativas nos bens culturais, assim como para futuros projetos e trabalhos desenvolvidos no mbito patrimonial histrico construdo.

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    No mbito global, mais especificamente na Europa, rochas granticas, carbonticas e arenticas so os litotipos mais usados nas edificaes histricas, seja de arquitetura religiosa ou civil.

    No Brasil, o patrimnio histrico construdo est presente em praticamente todas as regies, sendo que, em alguns estados h grande ocorrncia e reservas de rochas ornamentais, com destaque para Minas Gerais. Na regio Nordeste, Bahia, Pernambuco e Paraba na trajetria histrico-temporal do patrimnio construdo, a insero da rocha faz-se presente na composio de seus monumentos histricos pela grande incidncia de material ptreo, como arenitos e calcrios.

    Em Recife, a Baslica do Carmo, Igreja de So Pedro dos Clrigos, assim como a Igreja de Nossa Senhora da Piedade e de Nossa Senhora dos Prazeres em Jaboato dos Guararapes e, ainda, em Olinda o mosteiro de So Bento, Igreja do Amparo e do Rosrio todas apresentam um amplo emprego de arenito em seus bens integrados. J o emprego de calcrio destaca-se em Olinda, nas Igrejas de Nossa Senhora das Graas, Carmo e de Santa Thereza.

    Figura 1 - Igreja de So Pedro dos Clrigos Recife/PE. Acervo: Fernando Edgar Rieck.

    Figura 2 - Igreja de Nossa Senhora do Carmo Olinda/PE

    Em Pernambuco, nos municpios de Jaboato dos Guararapes, Olinda e Recife a escolha dos monumentos ptreos, para avaliao do estado de conservao e patologias associadas, foi definida em funo dos seguintes fatores, responsveis pela degradao de seus bens integrados: a localizao do bem cultural, considerando sua localizao e entorno - transformao da paisagem urbano-arquitetnica, poluio e condies climticas; e tipologia(s) de rocha utilizada(s): produto local ou de outra origem com suas caractersticas mineralgicas, qumicas e petrofsicas, em funo da gnese e processos intempricos.

    Considerando a evoluo dos estudos em centros de pesquisas no Brasil, voltados para a rea de caracterizao tecnolgica de rochas com aplicao industrial, os mesmos ainda encontram-se dispersos. O desenvolvimento de pesquisas envolvendo relaes entre a alterabilidade das rochas e os perfis e condies da cadeia produtiva e suas aplicaes finais so recentes, do mesmo modo que o grau de alterabilidade dos materiais empregados nos monumentos histricos atrelado caracterizao tecnolgica e intemperismo.

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    Na esfera internacional, aes, estudos e pesquisas tm sido desenvolvidos por equipes multidisciplinares, envolvendo especialistas das mais variadas reas de atuao, atravs de intercmbios internacionais de pesquisa, com a adoo de procedimentos direcionados para a rea de caracterizao tecnolgica e metodologias de conservao com o intuito de cessar a degradao/deteriorizao dos materiais ptreos nos monumentos histricos. Entre as instituies envolvidas com esses estudos e pesquisas destacam-se em Portugal, o Instituto Superior Tcnico (Lisboa) e o Departamento de Cincias da Terra da Universidade do Minho (Braga); na Itlia, o Instituto per la Conservazione e la Valorizzazone dei Beni Culturali (Florena); na Frana, o Institute National de Recherches Agronomiques (Versailles) e o Laboratoire de Recherches ds Monuments Historiques (Marne) e na Espanha, o Departamento de Qumica Ambiental e Geoqumica IRNA/CSIC (Salamanca), Instituto de Cincia dos Materiais ICM/CSIC (Sevilha) e os Departamento de Geologia, Qumica Inorgnica, Estatstica e Matemtica Aplicada da Universidade de Salamanca (Salamanca).

    A partir do estudo integrado de todos esses parmetros podem-se determinar as caractersticas da rocha fatores internos e, tambem, ambientais fatores externos, para que, futuramente, em aes direcionadas ao patrimnio edificado obtenham-se resultados favorveis no uso racional de materiais construtivos semelhantes, incrementando as aes e polticas de conservao, visto que as rochas, degradam-se em um processo lento, constante e gradual, determinados por fatores endgenos e fatores exgenos.

    A QUESTO DOS BENS INTEGRADOS NO ACERVO PATRIMONIAL CULTURAL CONSTRUDO

    Os bens integrados sempre existiram. Objetos pertencentes s edificaes de arquitetura civil, religiosa e militar de construes seculares ficaram merc dos processos patolgicos endgenos e exgenos - por muito tempo, mesmo com a multidisciplinaridade de tcnicos envolvidos no assunto.

    At o incio da dcada de 80 - sc. XX - o Patrimnio Cultural, era dividido em duas categorias de bens culturais: os bens imveis e os bens mveis. Pela prpria formao semntica, o conceito de ambas est definido; a primeira categoria, bens imveis, de natureza irremovvel, presos ao contexto no qual esto inseridos, locados, compreendendo o acervo arquitetnico, urbanstico e natural; a segunda, por deduo, o oposto; podem ser movidos, levados ou transferidos de um local para outro sem problemas.

    Enquanto arquitetos estavam voltados para os bens imveis, muselogos e historiadores de arte detinham-se nos bens mveis; estes, com uma vasta gama de objetos, diretamente proporcional ao campo de conhecimento necessrio ao tcnico responsvel, que, muitas vezes, recorria, e ainda recorre a especialistas das mais diversas reas.

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    A instituio responsvel pela organizao e proteo de bens culturais, no mbito federal, IPHAN Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, quando deu renicio aos trabalhos de inventrio de bens mveis e imveis, deteu-se no trabalho organizado pelo IPAC/BA, rgo estadual, que rege sobre o patrimnio cultural baiano. A partir disso, observa-se que objetos ligados arquitetura interior, tinham um grau de relevncia nada significativo por parte de arquitetos; os mesmos objetos, muitas vezes, tinham importncia muito maior que a prpria arquitetura. Objetos como retbulos, forros, pinturas, lavabos, cercaduras, arcos, com o emprego dos mais variados materiais, tcnicas e tipos, todos fixados, de alguma forma, a arquitetura, ao bem imvel.

    Mesmo integrados, fixados arquitetura, e por estarem ligados s demais artes, poucos arquitetos se detiveram a eles, exceto aqueles, com formao artstica mais completa, onde Lcio Costa destaca-se; sendo, ele, o ponto de partida para tais discusses e questionamentos acerca do assunto relativo aos bens integrados de monumentos histricos.

    Com isso, estes bens, a priori, possuam uma categoria, uma classe parte; que, por definio, no se enquadra nem na categoria de bem imvel e, muito menos na de bem mvel, porm, participando de ambas.

    Ento, pela prpria situao, os mesmos foram denominados de bens integrados fazendo parte desta categoria todos aqueles objetos que se encontram vinculados superfcie construda, seja interna ou externamente, e que, dela, s podem ser removidos com planejamento e cuidado, por tcnicos habilitados para tal ao.

    Figura 3* - Lavabo em rocha calcrea; sacristia - Igreja de Nossa Senhora de Nazar Cabo de Santo Agostinho/PE.

    *Acervo: Fernando Edgar Rieck.

    Figura 4* - Portada Central em arenito; frontispcio - Igreja de Nossa Senhora do Amparo Olinda/PE.

    Figura 5* - Arcada em arenito; claustro Igreja e Convento de Santo Antnio Igarassu/PE.

    Presentes nos edifcios religiosos, civis e militares, no trabalho em questo, os bens integrados, estudados, investigados, pertencem queles de arquitetura religiosa, onde h maior incidncia, perante os demais. Os bens integrados apresentam-se em diferentes tipos de suporte, no apenas os executados em materiais rochosos, mas tambm em madeira e metal.

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    Os monumentos histricos de arquitetura religiosa espalhados pelo pas contm rico acervo de bens integrados, mostrando, no que diz respito ao patrimnio construdo, a evoluo das artes no Brasil Antigo. Como exemplos de belos conjuntos: as Igrejas de So Bento e de Nossa Senhora da Glria, no Rio de Janeiro; da Igreja de Nossa Senhora das Correntes, em Penedo, Alagoas; Convento Franciscano, em Joo Pessoa, entre tantos outros. No estado de Pernambuco, enfatizando exemplos relacionados a bens integrados ptreos podem ser citados: a Igreja de So Pedro dos Clrigos e Baslica do Carmo, no Recife; Convento Franciscano, Igreja do Carmo e Seminrio das Graas, em Olinda; a Igreja de Nossa Senhora da Piedade e de Nossa Senhora dos Prazeres, em Jaboato dos Guararapes e, ainda a Igreja e Convento de Santo Antnio em Igarassu.

    Figura 6* - Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres Jaboato dos Guararapes/PE.

    *Acervo: Fernando Edgar Rieck.

    Figura 7* - Igreja de Nossa Senhora das Neves/Convento Franciscano - Olinda/PE.

    Figura 8* - Igreja e Convento de Santo Antnio Igarassu/PE.

    O USO DA ROCHA NOS MONUMENTOS HISTRICOS DE PERNAMBUCO E O CLIMA LOCAL A INFLUNCIA NA DEGRADAO/ALTERAO E SUAS PATOLOGIAS

    A partir do uso da rocha, relacionado aos fatores endgenos e exgenos, consideraes tcnico-cientficas podem ser emitidas; j que, como dito anteriormente, o monumento histrico, em funo do tempo de construo e exposio s intempries, sempre ser uma fonte de informaes, dados e estudos relativos a patologias e alteraes das rochas empregadas, contribuindo, assim, para aes voltadas aos mtodos conservativos e, em ltima instncia, intervenes restaurativas.

    Na cidade, considerando a localizao de um monumento, que, somada evoluo urbano-arquitetnica (transformao espacial no decorrer dos sculos), os processos de degradao, alterabilidade e patologias da rocha, so mais intensos que na rea rural (monumentos isolados); onde, de certa forma, encontram-se protegidos, ao menos, de fatores exgenos relacionados poluio ambiental, de grande ocorrncia em centros urbanos.

    Como exemplos, causadores de patologias diversas, tm-se: a emisso de gases por indstrias e veculos automotores; vibraes/trepidaes, devidas ao trfego intenso e constante, em vias

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    ampliadas ou criadas (morfologia urbana); a verticalizao, diminuindo a iluminao natural e ventilao (conforto ambiental/ambiente construdo); todos inimigos das rochas aplicadas aos bens integrados de monumentos histricos.

    As patologias associadas ao uso da rocha, nos monumentos histricos, apresentam-se sob vrios aspectos, mas, ocorrem em funo dos agentes degradadores dos materiais ptreos. Estresses internos e externos incidem nas rochas empregadas no patrimnio construdo. No caso dos monumentos histricos pernambucanos, objetos de estudo, considerando os fatores responsveis pela degradao das rochas endgenos e exgenos as patologias encontradas so: crostas negras, eflorescncias salinas, e acumulaes biolgicas (microorganismos), todas provocadas por agentes qumicos; esfoliaes, fissuras, pitting, presena de vegetao, alveolizao e perdas/lacunas, causadas pelos agentes fsicos.

    Figura 9** - Eflorescncia salina, argamassa de revestimento e silhar; Convento de Santo Antnio Recife/PE.

    Figura 10** - Esfoliao e pitting, cercadura de

    janela; Igreja de Nossa Senhora da Piedade

    Jaboato dos Guararapes/PE.

    Figura 11 **- Crosta negra, cunhal; Igreja de Nossa Senhora da Piedade Jaboato dos Guararapes/PE.

    Figura 12* - Presena de vegetao e crosta negra, torre sineira; Igreja de Nossa Senhora das Neves/Conv. Franciscano Olinda/PE.

    Figura 13** - Fissura e crosta negra, cercadura de portada; Igreja de Nossa Senhora da Piedade Jaboato dos Guararapes/PE.

    *Acervo: Fernando Edgar Rieck **Acervo: Jlio Csar de Souza.

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    No estado de Pernambuco, de clima quente e mido, o processo de degradao das rochas sedimentares arenitos e calcrios - aplicadas nos monumentos mais intenso, a partir dos fatores que influenciam no intemperismo (fator exgeno). Em funo do clima local, os processos de alteraes das rochas ocorrem, predominantemente, por um dos agentes do intemperismo: o qumico. Outro fator de influncia, que acelera a degradao das rochas a presena de microorganismos (processos biolgicos cidos/ biodeteriorao), atrelados temperatura (acelera a reao qumica) e umidade, ambas elevadas. E, ainda, os tipos de rochas e seus minerais constituintes, classificadas de acordo com a composio mineralgica, outro importante fator no processo de degradao de materiais ptreos (fatores endgenos).

    Na regio Nordeste do Brasil, mesmo com a incidncia de outros tipos litolgicos, os principais tipos de rochas aplicadas nos monumentos de arquitetura religiosa so os arenitos e os calcrios, pela abundncia de seus macios rochosos e pela facilidade de cantaria. O arenito ocorre na costa brasileira, principalmente no Nordeste Pernambuco e Alagoas, enquanto que o calcrio destaca-se na Paraba e Sergipe. Outros tipos de rochas aplicadas nas edificaes locais tm sua origem no exterior; exemplo da pedra lioz, que na poca do Brasil-Colnia vinha como lastro de navio; os mesmos, ao retornar para a Europa, voltavam carregados de matrias-primas diversas. A incidncia desta rocha, de origem metamrfica, d-se nos pases de Portugal e Frana.

    De origem sedimentar, arenitos e calcrios so empregados tanto com funo estrutural quanto ornamental nos monumentos ptreos pernambucanos. Devido alta porosidade e baixa dureza, e sua tendncia de diminuio da resistncia ao intemperismo com o passar do tempo, provavelmente, a rocha calcria gradualmente substituda pelo arenito, de maior dureza, mas tambm muito porosa, principalmente nas fachadas dos conjuntos arquitetnicos religiosos; mais expostas e, claro, suscetveis aos fatores endgenos responsveis pela degradao/deteriorao de materiais rochosos.

    Em Olinda, a aplicao de materiais ptreos em seus edifcios religiosos apresenta, provavelmente, dois perodos construtivos, a partir do emprego das tipologias de maior ocorrncia e datao de construo dos mesmos. No perodo mais remoto, a rocha aplicada em maior profuso foi o calcrio de procedncia local, usado tanto estruturalmente quanto artisticamente. Pertencem a este perodo as Igrejas do Carmo e de Santa Thereza e o Seminrio de Nossa Senhora das Graas que, apresenta, ainda, altares em cantaria (calcrio). No segundo perodo o emprego do arenito foi bem maior nas fachadas, arcos, portadas, presumivelmente, por ser mais resistente (mas, tambm, com alta porosidade); como exemplo a Igreja e Mosteiro de So Bento.

    Em Recife, o emprego do arenito, dentre os monumentos mais expressivos, ocorre na Igreja do Rosrio dos Homens Pretos, de So Pedro dos Clrigos (prtico central de extrema exuberncia), Matriz de Santo Antnio, Baslica do Carmo (todas no centro da cidade) e, em Jaboato dos Guararapes na Igreja de Nossa Senhora da Piedade (praia) e de Nossa Senhora dos Prazeres (Monte dos Guararapes).

    A pedra lioz, em Recife, encontra-se na fachada da Matriz da Boa Vista, aplicada em blocos aparelhados, esculpidos, prontos, vindos de Portugal; tambm foi empregada na fachada da Igreja do Corpo Santo (demolida); outro exemplo de aplicao da pedra lioz est nas portadas e janelas das fachadas das Igrejas da Ordem Terceira dos Carmelitas e Franciscanos. O Lioz

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    uma rocha de origem metamrfica, com dureza e porosidade mdia, apresenta cor bege claro, rosa e cinza, com utilizao na cantaria decorativa, esculturas, fachadas e pisos.

    METODOLOGIA DE TRABALHO PARA AVALIAO DO ESTADO DE CONSER-VAO E PATOLOGIAS ASSOCIADAS AOS BENS INTEGRADOS DO PATRIMNIO CONSTRUDO

    A metodologia de pesquisa, para avaliao das condies de conservao e identificao de patologias, nos bens integrados ptreos dos monumentos histricos religiosos, compreende trs etapas de desenvolvimento: a primeira corresponde aos trabalhos de campo; a segunda e terceira etapas, respectivamente, de anlises laboratoriais e interpretao de dados. O resultado das etapas de pesquisa visa a elaborao de diagnsticos, a partir de abordagem cientfica, relacionando o estudo das caractersticas prprias dos materiais aplicados aos fatores externos, avaliando-se as interaes existentes e os problemas decorrentes da ao do intemperismo fisico-qumico sobre os mesmos.

    1 etapa - Levantamento de campo: O levantamento de campo compreende o registro fotogrfico e identificao dos tipos litolgicos aplicados, com as patologias que possam ocorrer, dentre as quais: alterao cromtica, alveolizao, degradao diferenciada, crosta negra, desagregao, esfoliao, fissura, perda ou lacuna, pitting, presena de microorganismos ou vegetao, grafitismo; localizao de reas de ocorrncia dos materiais ptreos empregados nos monumentos e coleta de amostras para posterior anlise e estudo laboratorial.

    Tipos de amostras coletadas a partir dos materiais ptreos dos monumentos histricos:

    ! Material microbiolgico microorganismos (fungos, algas, lquens);

    ! Eflorescncias, a partir da cristalizao de sais nos poros dos materiais;

    ! Argamassa de revestimento e assentamento externos e internos;

    ! Rochas e Silhares, empregados nos bens integrados externos e internos.

    2 etapa Anlise laboratorial: A anlise laboratorial compreende a avaliao das amostras coletadas no trabalho de campo. A partir das amostras coletadas (bens integrados rochas e silhares - e argamassas), com a identificao das mesmas, anlises mais especficas devem ser executadas, como: caracterizao mineralgica e anlise qumica; capacidade de absoro de gua; anlise da porosidade; absoro de gua por capilaridade; medio das propriedades mecnicas; anlise qumica e ensaios de produtos de tratamento (hidrofugantes) com estudo da influncia sobre as caractersticas petrofsicas dos materiais. Ainda, anlises e avaliaes de microorganismos e eflorescncias coletadas sobre os diferentes tipos de materiais ptreos empregados nos monumentos.

    3 etapa Interpretao dos resultados: A etapa final, de interpretao dos resultados das anlises e ensaios, permite estabelecer correlaes para realizar avaliaes das condies de conservao e degradao dos materiais. As caractersticas petrogrficas (mineralgicas, de texturas, estruturais) e ndices fsicos das rochas podem ser utilizados para determinar qual relao h entre os agentes de alterao e a suscetibilidade dos materiais empregados. A partir das anlises microbiolgicas so identificados os microorganismos presentes nos materiais e assim avaliar o grau de biodeteriorao e sua influncia no processo de

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    degradao do material. A identificao dos traos e caractersticas mineralgicas e qumicas da argamassa de revestimento; identificao petrogrfica dos materiais ptreos; identificao da constituio mineralgica e qumica dos biscoitos e esmaltes das peas cermicas; avaliao do grau de deteriorizao fsica dos monumentos rochas, argamassas e cermicas (silhares) e avaliao geral do estado de conservao/degradao dos monumentos so determinados nessa etapa.

    CONCLUSES

    Os bens integrados so todos aqueles objetos que se encontram vinculados superfcie construda, seja interna ou externamente, e que dela s podem ser removidos com planejamento e cuidado, por tcnicos habilitados para tal ao.

    Os principais litotipos aplicados aos bens integrados dos monumentos histricos religiosos da zona da mata Pernambucana so o calcrio e arenito. A evoluo histrico-construtiva dos monumentos indica que houve uma aplicao inicial de material carbontico (Olinda) e que, com o passar do tempo, o mesmo foi gradualmente sendo substitudo por litotipos arenticos; onde sua aplicao, alm de Olinda, teve grande profuso em Recife. A pedra Lioz, de origem metamrfica, vinda de Portugal, tambm foi empregada em monumentos histricos pernambucanos, com nfase em Recife.

    Os processos de degradao das rochas so influenciados por fatores endgenos e exgenos. Os fatores endgenos mais significativos so aqueles relacionados constituio mineralgica da rocha e suas caractersticas petrofsicas (porosidade, absoro e microfisssuramento). J os fatores externos que mais afetam o desempenho dos materiais ptreos em edificaes esto relacionados ao meio ambiente (clima), presena de microorganismos patolgicos e transformao espacial urbano-arquitetnica do entorno.

    A metodologia em desenvolvimento no PPGEMinas/CTG/UFPE prev a realizao da anlise dos bens integrados ptreos de monumentos histricos na zona da mata Pernambucana, com a execuo de trs etapas de trabalho: Levantamento de campo, realizao de anlises e ensaios tecnolgicos, e anlise de resultados com estabelecimento de correlaes entre os fatores endgenos e exgenos envolvidos no processo de degradao desses materiais; contribuindo, cientificamente, para aes de conservao, manuteno e, como ltimo recurso, restaurao, voltadas ao Patrimnio Cultural Material Brasileiro.

    O conhecimento dessas relaes ser de grande importncia tanto na questo de conservar e/ou intervir para restaurao do patrimnio histrico construdo, como tambm para gerar conhecimento sobre os processos de degradao das rochas em ambientes semelhantes. Aliado ao conhecimento dos fatores internos responsveis pela degradao das rochas pode-se estabelecer critrios para seleo de materiais ptreos mais adequados as aplicaes previstas, inclusive para edificaes contemporneas de carter residencial e comercial.

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