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07/04/13 PEC dos empregados domésticos: como lidar com a nova rotina de trabalho - Revista Jus Navigandi - Doutrina e Peças jus.com.br/revista/texto/24110/a-pec-dos-empregados-domesticos/print 1/3 A PEC dos empregados domésticos. Como lidar com a nova rotina de trabalho dessa categoria http://jus.com.br/revista/texto/24110 Publicado em 04/2013 Letícia Ribeiro C. de Figueiredo (http://jus.com.br/revista/autor/leticia-ribeiro-c-de-figueiredo) Estamos em uma nova era e será preciso uma fase de transição para nos ajustarmos a essa nova realidade. Assim o ideal é evitar medidas bruscas e impensadas, que podem acabar saindo caro depois. Foi aprovada no dia 26 de março de 2013 pelo Senado Federal a Proposta de Emenda à Constituição ("PEC") nº. 66/2012. Essa PEC já vinha sendo amplamente divulgada pela possibilidade de estender aos empregados domésticos direitos já garantidos aos trabalhadores em geral. Conforme detalhado na planilha, abaixo, com a PEC, os empregados domésticos passaram a ter uma série de direitos adicionais que já eram assegurados aos demais trabalhadores urbanos e rurais. Um ponto extremamente importante a ser ressaltado é que nem todos os direitos trabalhistas adicionais dos empregados domésticos têm aplicação imediata. Várias questões - como o recolhimento do FGTS, adicional noturno e o pagamento de seguro- desemprego - ainda dependem de regulamentação. Dos direitos concedidos pela PEC, que têm aplicação imediata, os mais impactantes são, sem dúvida, a limitação da jornada de trabalho a até 8 horas diárias e 44 horas semanais, e pagamento de horas extras no valor mínimo de 50% acima da hora normal. Para os empregados que não trabalham aos sábados, é possível fazer acordo de compensação para que a jornada diária (de segunda a sexta- feira) seja de 8h48min, perfazendo uma jornada semana de 44 horas. Também é possível compensar eventual atraso, saída antecipada e horas excedentes laboradas. Aliada à limitação de jornada, também há a obrigação de concessão de intervalo para descanso e refeição de pelo menos 1 hora e máximo de 2 horas. Com isso, hábito que sempre foi comum para empregados domésticos de não fazer essa pausa formal para o almoço e descanso, passará a gerar a necessidade de pagamento de hora extra. Um pedido muito comum pelos empregados de chegar uma hora mais tarde ou sair uma hora mais cedo e abrir mão do horário de almoço não deve ser aceito pelos empregadores, porque inconsistente com as novas regras. Mesmo se o empregado declarar por escrito sua intenção, ele pode depois questioná-la em juízo. O pagamento de hora extra, embora devido, nas hipóteses previstas pela PEC, poderá trazer grande transtorno, justamente pela dificuldade de ser estabelecido um controle efetivo da jornada. Diferentemente de empresas, que possuem sistemas sofisticados de controle eletrônico de jornada e onde os empregados estão sob a constante supervisão direta do empregador, os empregados domésticos, na maioria das vezes, trabalham sozinhos em casa, sem controle direto por parte dos patrões. Um dos desafios impostos às família brasileiras, agora, será o de controlar, à distância, a efetiva jornada de trabalho dos seu empregados, para evitar o pagamento injusto de horas extras. Sobre essa questão do horário muito se tem falado sobre adoção de um livro de ponto (que é vendido em qualquer papelaria), no qual o empregado doméstico anotaria o horário de sua entrada e saída, além do intervalo para refeição e descanso. O grande problema dessa recomendação, porém, é que os patrões não terão efetivo controle da jornada e dificilmente poderão confirmar se as horas assinaladas estão corretas e refletem a realidade. Também vale destacar que, pelas regras da CLT, apenas empregadores que contam com mais de 10 (dez) empregados é que têm obrigação legal de manter controle escrito de jornada de trabalho (art. 74, 2º da CLT). No caso de empregadores com menos de dez empregados e que não instituiu anotação formal de horário de trabalho, o ônus de provar a prática de sobrejornada é do trabalhador , caso questionada em juízo. Nesse mesmo sentido é a Súmula 338 do TST, que impõe ao empregador o ônus de provar a jornada apenas quando ele conta com mais de 10 empregados. Pelas razões acima, há que se analisar com cautela, em cada caso, se a implantação de um livro de ponto será, de fato, a melhor alternativa. Em residências onde os patrões têm meios de fiscalizar os horários apontados no livro, essa é uma boa solução, especialmente Jus Navigandi http://jus.com.br

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07/04/13 PEC dos empregados domésticos: como lidar com a nova rotina de trabalho - Revista Jus Navigandi - Doutrina e Peças

jus.com.br/revista/texto/24110/a-pec-dos-empregados-domesticos/print 1/3

A PEC dos empregados domésticos.Como lidar com a nova rotina de trabalho dessa categoria

http://jus.com.br/revista/texto/24110

Publicado em 04/2013

Letícia Ribeiro C. de Figueiredo (http://jus.com.br/revista/autor/leticia-ribeiro-c-de-figueiredo)

Estamos em uma nova era e será preciso uma fase de transição para nos ajustarmos a essa nova

realidade. Assim o ideal é evitar medidas bruscas e impensadas, que podem acabar saindo caro depois.

Foi aprovada no dia 26 de março de 2013 pelo Senado Federal a Proposta de Emenda à Constituição ("PEC") nº. 66/2012. Essa

PEC já vinha sendo amplamente divulgada pela possibilidade de estender aos empregados domésticos direitos já garantidos aos

trabalhadores em geral.

Conforme detalhado na planilha, abaixo, com a PEC, os empregados domésticos passaram a ter uma série de direitos adicionais

que já eram assegurados aos demais trabalhadores urbanos e rurais.

Um ponto extremamente importante a ser ressaltado é que nem todos os direitos trabalhistas adicionais dos empregados

domésticos têm aplicação imediata. Várias questões - como o recolhimento do FGTS, adicional noturno e o pagamento de seguro-

desemprego - ainda dependem de regulamentação.

Dos direitos concedidos pela PEC, que têm aplicação imediata, os mais impactantes são, sem dúvida, a limitação da jornada de

trabalho a até 8 horas diárias e 44 horas semanais, e pagamento de horas extras no valor mínimo de 50% acima da hora normal. Para os

empregados que não trabalham aos sábados, é possível fazer acordo de compensação para que a jornada diária (de segunda a sexta-

feira) seja de 8h48min, perfazendo uma jornada semana de 44 horas. Também é possível compensar eventual atraso, saída antecipada e

horas excedentes laboradas.

Aliada à limitação de jornada, também há a obrigação de concessão de intervalo para descanso e refeição de pelo menos 1 hora e

máximo de 2 horas. Com isso, hábito que sempre foi comum para empregados domésticos de não fazer essa pausa formal para o almoço e

descanso, passará a gerar a necessidade de pagamento de hora extra. Um pedido muito comum pelos empregados de chegar uma hora

mais tarde ou sair uma hora mais cedo e abrir mão do horário de almoço não deve ser aceito pelos empregadores, porque inconsistente

com as novas regras. Mesmo se o empregado declarar por escrito sua intenção, ele pode depois questioná-la em juízo.

O pagamento de hora extra, embora devido, nas hipóteses previstas pela PEC, poderá trazer grande transtorno, justamente pela

dificuldade de ser estabelecido um controle efetivo da jornada. Diferentemente de empresas, que possuem sistemas sofisticados de

controle eletrônico de jornada e onde os empregados estão sob a constante supervisão direta do empregador, os empregados domésticos,

na maioria das vezes, trabalham sozinhos em casa, sem controle direto por parte dos patrões. Um dos desafios impostos às família

brasileiras, agora, será o de controlar, à distância, a efetiva jornada de trabalho dos seu empregados, para evitar o pagamento injusto de

horas extras.

Sobre essa questão do horário muito se tem falado sobre adoção de um livro de ponto (que é vendido em qualquer papelaria), no

qual o empregado doméstico anotaria o horário de sua entrada e saída, além do intervalo para refeição e descanso. O grande problema

dessa recomendação, porém, é que os patrões não terão efetivo controle da jornada e dificilmente poderão confirmar se as horas

assinaladas estão corretas e refletem a realidade.

Também vale destacar que, pelas regras da CLT, apenas empregadores que contam com mais de 10 (dez) empregados é que têm

obrigação legal de manter controle escrito de jornada de trabalho (art. 74, 2º da CLT). No caso de empregadores com menos de dez

empregados e que não instituiu anotação formal de horário de trabalho, o ônus de provar a prática de sobrejornada é do trabalhador, caso

questionada em juízo. Nesse mesmo sentido é a Súmula 338 do TST, que impõe ao empregador o ônus de provar a jornada apenas

quando ele conta com mais de 10 empregados.

Pelas razões acima, há que se analisar com cautela, em cada caso, se a implantação de um livro de ponto será, de fato, a melhor

alternativa. Em residências onde os patrões têm meios de fiscalizar os horários apontados no livro, essa é uma boa solução, especialmente

Jus Navigandi

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no caso de um conflito futuro que dependa de prova da jornada de trabalho praticada. Porém, nas residências em que os patrões passam

todo o dia fora, e não possuem meios de fiscalizar os horários apontados no livro, adotar o livro pode acabar gerando uma prova incorreta,

injusta e contrária aos empregadores. Nesse casos, como o ônus de provar a prática de sobrejornada é do empregado, não manter um

livro de ponto pode ser a melhor alternativa.

No caso dos empregados domésticos que dormem no endereço de trabalho (como, por exemplo, babás), o cuidado por parte do

empregador deverá ser ainda maior. Para evitar a necessidade de pagamento de horas extras, o ideal é observar a jornada máxima

permitida por dia e não solicitar serviços após o fim do período laboral. Se a empregada doméstica for solicitada a prestar serviços após a

jornada (ex. servir jantar), o empregador, ao final do mês, deverá remunerar as horas excedentes. É importante ressaltar que a legislação

limita a prática de horas extras em até 2 horas por dia, de modo que a jornada diária não exceda 10 horas de trabalho

Para calcular o valor de uma hora extra, o salário mensal deve ser dividido por 220 e o resultado (valor pela hora de trabalho)

multiplicado por 50%. Para agravar o cenário acima, é preciso lembrar, ainda, que caso o serviço seja realizado entre às 10 da noite e as 5

horas da manhã, também será devido adicional noturno (no valor de 20% da hora de trabalho).

Diante de todas as mudanças acima, sem dúvida, é recomendável que os contratos de trabalho com os empregados domésticos

sejam formalizados por escrito, com uma cláusula clara sobre a jornada de trabalho diária/semanal, seguindo os parâmetros acima, ainda

que não haja controle de horário. É recomendável, ainda, que qualquer acordo para compensação de jornada- seja para compensar os

sábados, seja para compensar eventuais atrasos, saídas antecipadas e/ou horas extras laboradas - seja regulado por meio do contrato ou

acordo para compensação de jornada. Feito isso, é preciso aguardar a regulamentação dos direitos ainda pendentes, para se definir a

melhor forma de solucionar as questões que inevitavelmente surgirão.

Com a PEC, o custo do empregado doméstico ficará inevitavelmente mais caro e essa é uma realidade que os empregadores terão

que lidar, especialmente se mantiverem os empregados atuais, contratados com um salário que não previa a realidade de hoje. Para

acomodar esses custos adicionais, as famílias podem optar por dispensar os empregados atuais e contratar novos trabalhadores, sob

novas condições, considerando os direitos adicionais que hoje são garantidos. De qualquer maneira, já ressaltamos, de antemão, que não

é possível reduzir o salário dos atuais empregados domésticos, que já trabalham nas residências, sob a justificativa de compensar os

novos encargos adicionais. Da mesma forma, não é juridicamente sustentável a dispensa e recontratação do empregado, por outro

membro da família, com salário inferior ou passar a descontar do salário a parte do INSS que deveria ser suportada pelo empregado mas

que, até então, eram custeadas pelo empregador. Todas essa manobras para evitar a aplicação da lei serão nulas, conforme artigo 9º da

CLT.

Estamos em uma nova era e será preciso uma fase de transição para nos ajustarmos a essa nova realidade. Assim o ideal é evitar

medidas bruscas e impensadas, que podem acabar saindo caro depois. Os desdobramentos práticos das novas regras só virão com o

tempo, na medida em que as questões controversas forem sendo debatidas e definidas na Justiça do Trabalho.

A título didático, preparamos a planilha, abaixo, com resumo dos direitos estendidos aos empregados domésticos pela PEC

66/2012.

Novos direitos dos empregados domésticos de aplicação imediata

Garantia de salário, nunca inferior ao mínimoProteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção

Jornada de trabalho de até oito horas diárias e 44 semanaisHora extra de, no mínimo, 50% acima da hora normalRedução dos riscos

inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança

Reconhecimento dos acordos coletivos de trabalhoProibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão

por motivo de sexo, idade, cor ou estado civilProibição de qualquer discriminação do trabalhador deficiente

Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e de qualquer trabalho e a menores de 16 anos, exceto

aprendizes (14 anos).

Novos direitos dos empregados domésticos que precisam de regulamentação

Proteção contra dispensa arbitrária ou sem justa causa

Seguro-desemprego

FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço)

Adicional por trabalho noturno

Salário-família

Assistência gratuita a dependentes até cinco anos em creches e pré-escolas

Seguro contra acidentes de trabalho.

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

FIGUEIREDO, Letícia Ribeiro C. de. A PEC dos empregados domésticos. Como lidar com a nova rotina de trabalho dessa categoria. Jus Navigandi,

Teresina, ano 18 (/revista/edicoes/2013), n. 3566 (/revista/edicoes/2013/4/6), 6 (/revista/edicoes/2013/4/6) abr. (/revista/edicoes/2013/4) 2013

(/revista/edicoes/2013) . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24110>. Acesso em: 7 abr. 2013.

Letícia Ribeiro C. de Figueiredo (http://jus.com.br/revista/autor/leticia-ribeiro-c-de-figueiredo)

Advogada do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados