Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

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UNIVERSO SÍGNICODA PIRATARIA:

Falso? Verdadeiro!

Clotilde PerezEneus Trindade

Jôse FogaçaLeandro Leonardo Batista

(Organizadores)

Alexandre Las Casas • Alhen Rubens • André Luiz Peruzzo •

Andrea Meneghel • Bibiana Stholer Sabença Almeida • Bruno

Pompeu Marques Filho • Carolina Boari Caraciola • Cinira Baader

• Clotilde Perez • Dorinho Bastos • Eneus Trindade Barreto

Filho • Gabriela Ayer • Gino Giacomini Filho • Hélio Silva • Janiene

Santos • Jeferson Hugo Pacheco de Rezende • Jôse Fogaça • José

Palandi Junior • Lawrence Koo • Leandro Leonardo Batista

• Livia Souza • Marcos Hiller • Maria Cecília Andreucci Cury •

Nicolás Llano • Paulo Roberto Monteiro de Araújo • Raquel de

Castro Dantas Cavalcante • Sergio Bairon • Silvio Koiti Sato

• Thais Novais de Curtis • Wesley Moreira Pinheiro

São Paulo– 2013 –

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© Clotilde Perez; Eneus Trindade; Jôse Fogaça e Leandro Leonardo Batista (orgs.), 1ªed., 2013.

INMOD Instituto da ModaAlameda dos Jurupis 943, 13º and.Moema – São Paulo – SP – BrasilCEP 04088-906www.institutodamoda.org.br

Direção editorial: Clotilde PerezCapa: Luiz Basile / Casa Desenho

Diagramação: Tarlei E. de Oliveira

Todos os direitos reservados.Proibida reprodução total ou parcial.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Clotilde Perez, Eneus Trindade, Leandro Leonardo Batista e JôseFogaça (Organizadores)

Vários autores. Universo sígnico da pirataria : Falso? Verdadeiro!São Paulo: Editora Imod, 2013.

16x23cm 363 p.ISBN 978-85-87963-66-6

1. Comunicação. 2. Consumo. 3. Cultura. 4. Signo.5. Comércio

CDD 306.309

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Sumário

Prefácio – Falso de Verdade ............................................................... 9Massimo Canevacci

GESC3, um Grupo que Pesquisa e Faz ............................................ 13Clotilde Perez; Eneus Trindade e Leandro Leonardo Batista

Colaboradores ................................................................................. 23

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na PesquisaFotoetnográfica .......................................................................... 31Eneus Trindade e Clotilde Perez

A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria .................................... 41Paulo Roberto Monteiro de Araujo

La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea:Motivaciones para la Busqueda, Compra e Uso de las MarcasFalsificadas ................................................................................. 53Clotilde Perez; Eneus Trindade e Sérgio Bairon

Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação ... 79Lawrence Chung Koo

Imitação na Propaganda Comercial ................................................. 91Gino Giacomini Filho

O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um NovosParadigma de Consumo ........................................................... 125Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos 155Thaís Novais de Curtis

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Contrafação e seus Museus: Espaços de Apologia ou Crítica aoConsumo Pirata? ...................................................................... 167Eneus Trindade; Livia Souza e Nicolás Llano

Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo ............................... 189Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

Tepito, Cidade do México – DF: A Versão Mexicana daRegião da 25 de Março Paulistana e suas Adjacências ............... 217Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações –Resultados de Pesquisa Coletiva Realizada pelos Integrantesdo GESC3 ................................................................................ 227Jôse Fogaça; Silvio Koiti Sato; Clotilde Perez; Alhen Damasceno;

Cecília Cury; Lawrence Koo; Cinira Baader eRaquel Cardoso

Glossário Pirata

Apresentação ................................................................................. 255Alhen Rubens Damasceno e Cinira Baader

Adaptação ..................................................................................... 257Jôse Fogaça

Análogo ........................................................................................ 259Hélio Silva

Autêntico ...................................................................................... 263Lívia Souza

Autoria .......................................................................................... 267Bibiana Stohler Sabença de Almeida

Avatar: Nome Masculino, Mitologia Hindu .................................. 271José Palandi Junior

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Clonagem ..................................................................................... 275Eneus Trindade

Contrafação .................................................................................. 279André Peruzzo

Cópia ............................................................................................ 283Bruno Pompeu Marques Filho

Copyright e Copyleft .................................................................... 287Silvio Kioti Sato

Creative Commons ....................................................................... 293Bruno Pompeu Marques Filho

Duplo ........................................................................................... 295Bibiana Stholer Sabença de Almeida

Fair Use ........................................................................................ 299Bruno Pompeu Marques Filho

Falsificação .................................................................................... 301Lívia Souza

Fantasia ......................................................................................... 305Andrea Meneghel

Genérico ....................................................................................... 311Jôse Fogaça

Genuíno ....................................................................................... 315Eneus Trindade

Imitação ........................................................................................ 317Clotilde Perez e Sergio Bairon

Kitsch ........................................................................................... 323Janiene Santos

Knockoff ....................................................................................... 327Jôse Fogaça

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Original ........................................................................................ 331Bruno Pompeu Marques Filho

Paródia .......................................................................................... 335Clotilde Perez

Pirataria Moderna ......................................................................... 337Alhen Damasceno

Plágio ............................................................................................ 341Leandro Batista

Réplica .......................................................................................... 345Gabriela Ayer

Reprodução .................................................................................. 347Marcos Hiller

Screener ........................................................................................ 349Alhen Damasceno

Simulacro...................................................................................... 353Bruno Pompeu Marques Filho

A linguagem cotidiana no campo pirata: novos aprendizados ........ 355

Paraquedas .................................................................................... 355

Camelô ......................................................................................... 356

Loja .............................................................................................. 356

Galeria .......................................................................................... 357

Olheiro ......................................................................................... 357

Puxador ........................................................................................ 357

Homem da escada ........................................................................ 357

Rapa ............................................................................................. 358

Vendedor de perfume ................................................................... 358

Réplica / Réplica de primeira linha ............................................... 359

Cópia / Réplica de segunda linha .................................................. 359

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Prefácio

Falso de Verdade

MASSIMO CANEVACCI

A tecnologia e, ainda mais a cultura digital, está expandindo um tipo

de sensibilidade estética e de práticas domésticas ou pós-industriais, com

forte criatividade subjetiva (multividual) onde a diferença dicotômica

clássica entre o que é falso e o que é verdadeiro tem um sentido

questionável e nunca mais igual como foi no contexto analógico. Claro,

as falsificações de obras e de pessoas pertencem a muitas culturas humanas

e na “ocidental” ainda mais. O pirata é pirata e na visão piratesca eu tenho

o direito de me apossar dos bens materiais dos outros. Só que agora a

distinção entre bem material e imaterial está cada vez mais sutil e é quase

impossível dividi-la. Simetricamente, as práticas além do dualismo falso/

verdadeiro, se difundem por meio de uma sensibilidade operacional

material/imaterial. Por isso os piratas mais “autênticos”, isto é falso, são

aqueles que praticam a hackeragem, inventam partidos fantasmas,

replicam infinitos e mutáveis produtos culturais.

Na minha experiência na China, onde morei por seis meses ensinando e

pesquisando na Universidade de Nanjing, foi fundamental entender o

que significava o falso. Um techno-canibalismo devora a verdade ou

mesmo a origem de cada produto. A China conseguiu dar em

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Massimo Canevacci

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pouquíssimo tempo um salto organizado, diria quase sistêmico, a tudo

isso, unificando reprodução material e imaterial, além das lojas “oficiais”.

Nos mais diversos territórios se expandem lojinhas, bancas e banquinhas,

carrinhos, simples tapetes, ambulantes: uma infinita microfísica de

verdadeira falsificação incontrolável, cujos custos de reprodução são

aproximadamente zero e os preços de venda sem possibilidade de

concorrência com produtos similares de outras partes do mundo. A China

interpreta melhor aquilo que a glocalização oferece graças ao modo tempo-

espaço acelerados com a tecnologia digital. As mercadorias chinesas

exportadas em quase todos os cantos do planeta tinham a clara visão de

que estes produtos pareciam verdadeiros, é como se fossem verdadeiros,

talvez até sejam verdadeiros: todavia, também se são falsos, todo o mundo

gosta de comprar por tal ambigüidade. Elas muitas vezes são produzidas

na China sob licença das grandes marcas, é suficiente modificar uma letra

(de Armani à Amani ou YSL vira YSJ) para evitar improváveis causas,

mesmo que o produto seja de todo igual ou verossímil. Um fluxo de

mercadoria fake sai das fábricas gêmeas ou subfábricas paralelas, sem que

sejam necessárias operações de camuflagem. Por isso, os direitos autorais

(copyright) estão em crise não só nos produtos intelectuais, mas também

nos produtos materiais, ou melhor, esta distinção não dá mais o sentido

do que está acontecendo na contemporaneidade. São dimensões cruzadas;

esta distinção entre material e imaterial não funciona mais, é um dualismo

lógico, intelectual e produtivo e que está em crise; que tenta defender

um passado certamente alterado. Estamos vivendo uma fase na qual todos

nós podemos criar coisas, objetos, histórias, imagens, seja lá o que for e

replicar sem que tenhamos o dever de pedir permissão a alguém: e já

funciona é a impressora 3D!

Se refletirmos melhor sobre o que está acontecendo, parece que esta

distinção entre verdadeiro e falso é modernista. Existe uma visão artística

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Prefácio – Falso de Verdade

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sobre este assunto que o autor Orson Welles elaborou no final da sua

vida criativa. Por isso, eu chamarei esta mistura falso/verdadeiro de fake

em homenagem ao filme dele ForFake – Verdades e Mentiras (F for Fake)

– onde ele apresenta a profunda superfície e a tenuidade dessas coisas.

Ocopy-left não é só um slogan de uma esquerda pirata, é a prática que

qualquer pessoa dotada de instrumentos, agora ao alcance das mãos,

realiza na vida cotidiana. Uma vez que a autenticidade do produto é cada

vez menor, o valor ambíguo que tal conceito sempre comportou entra

em crise ou evoca um arcaico modelo restaurativo. Em antropologia, a

autenticidade juntamente com a pureza e a origem foram questionadas

há muito tempo, estão em discussão nas criatividades culturais e nas

identidades individuais. Tudo é resultado de misturas híbridas e mutações

sincréticas: uma vez que alguém – estilista de moda ou engenheiro de

software – invente um produto, este se torna público porque de novo a

distinção clássica público/privado é obsoleta. As coisas vêm selecionadas,

dissecadas, engolidas, regurgitadas, montadas e recicladas como se fossem

deliciosas partes de um corpo inimigo feito prisioneiro e cozinhado, ainda

cheio das virtudes que trazia consigo e cujo objetivo final será o de ser

devorado e absorvido pela famosa iniciativa local.

Fake é o verdadeiro-falso, o falso que é verdadeiro, uma mistura semiótica

e fetichista que dissolve as distinções dualistas tradicionais baseadas na

certeza da verdade e do direito. Um processo que a arte há muito pratica

em ambígua aliança com o mito. A arte nunca é realista e nem reproduz

a realidade. Em certo sentido, o fake pratica uma obra de arte estendida

aos produtos materiais e imateriais, ao consumo performático, à

comunicação digital. E assim, o Fake está se tornando algo mais e alterado,

uma visão de mundo com uma sua filosofia e com tantas práticas

relacionadas.

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Massimo Canevacci

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O livro curado por Clotilde Perez, Eneus Trinidade, Jôse Fogaça e

Leandro Leonardo Batista, professores e pesquisadores do GESC3 –

Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo,

da ECA USP, navega felizmente nesta perspectiva glocal, onde marketing,

mercadoria, publicidade, ideação, produção e consumo são focalizados

numa metodologia plural que desafia cada singular disciplina

“disciplinada”. E nesse sentido, trata-se de uma abordagem atual e

comprometida com as implicações múltiplas que a temática instala,

oferecendo aos leitores tensões e caminhos para o aprofundamento da

pesquisa na área. Provavelmente, precisamos imaginar uma interpretação

diversa ou outramimese e é nesse sentido que os autores de “Universo

Sígnico da Pirataria: Falso? Verdadeiro!”, direcionam suas reflexões. O

fake não é simples imitação, é uma visão mais complexa, onde a seleção

mimética, como anunciado no inicio, é ela mesma antropofágica e

sincrética: cada multivíduo aprendeu a criar através de miméticas parciais

sempre verdadeiras porque são falsas. Falsas? Fake....

Fake em São Paulo/Roma, Junho de 2013.

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GESC3, um Grupo que Pesquisa e Faz

CLOTILDE PEREZENEUS TRINDADE

LEANDRO LEONARDO BATISTA

O GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura

e Consumo, certificado pelo CNPq e pela USP desde 2007, reúne o tra-

balho de investigação de vários pesquisadores, professores, pós-graduandos

e alunos de Iniciação Científica da ECA USP e de diversas outras entidades

de ensino e pesquisa parceiras. Trata-se de um grupo multidisciplinar,

envolvendo áreas como a Comunicação, a Antropologia, a Psicologia, a

Filosofia, a Arquitetura, o Design, a Moda, a Administração, a Economia,

entre outras. Busca refletir a respeito dos fenômenos comunicacionais,

midiáticos, mercadológicos e culturais e seus reflexos na sociedade

contemporânea, particularmente, nas manifestações do consumo. Nesse

sentido, o GESC3 tem contribuído com publicações científicas sob a forma

de livros, capítulos de livros e artigos, mas também por meio da realização

e da participação em seminários e congressos de Comunicação, Semiótica,

Publicidade, Consumo, Antropologia, Marketing e áreas afins (Congresso

Mundial de Semiótica, Congresso AISV – Semiótica Visual, Global

Branding, Intercom, Intercom regionais, Anpad, Ibercom, Comunicom,

Compós, Siep, Alaic, Imagens da Cultura/Cultura das Imagens, Cultura

Visual, Cultura Pirata, Encontro de Mídia, Pró-Pesp PP, Relaip, entre

outros). Seus membros ministram aulas em cursos de extensão e especia-

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista

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lização em São Paulo e em várias instituições no país (na PUC SP, na ECA

e FEA-USP, FIA, IED, FAAP e FGV). Também foram criados dois cursos

de Especialização pelos líderes do GESC3, que são ofertados na ECA USP;

o curso de Pesquisa de Mercado, já na sua 9ª. edição, coordenado pela

Profa. Dra. Clotilde Perez em conjunto com o Prof. Dr. Leandro Batista

e o curso de especialização em Estética e Gestão da Moda, na 2a. edição,

coordenado pelo Prof. Dr. Eneus Trindade, em conjunto com a Profa.

Dra. Clotilde Perez. Seus pesquisadores também são demandados para

entrevistas destinadas à imprensa escrita, audiovisual e digital, além de

serem convidados para palestras em Universidades, ONGs e empresas no

Brasil e no exterior.

Foi no GESC3 que surge a vontade de criar uma entidade que reunisse

os pesquisadores em publicidade que se encontravam dispersos no país e

que, muitas vezes, não tinham proveitosa interlocução em seus estados

de origem, indo ao encontro dos mesmos desejos nutridos há anos pelos

pesquisadores do GT de Publicidade e Propaganda da Intercom, em

especial nas duas gestões do Prof. Dr. Jean Charles Zozzoli, UFAL e na

atual gestão da Profa. Dra. Maria Lilia Dias de Castro, UFSM. Foi assim

que em 2010 foi criada a ABP2 – Associação Brasileira dos Pesquisadores

em Publicidade, atualmente com mais de 180 filiados. A entidade,

juntamente com o GESC3 e a ECA USP, além de vários outros parceiros,

organiza anualmente o encontro de seus pesquisadores, intitulado Pró-

Pesq PP, que finalizou recentemente sua quarta edição, com pleno êxito.

Desde a primeira edição do Propesq PP, o evento contou com o apoio

do CRP – Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo

e do PPGCOM – Programa de Pós-Graduação em Comunicação da ECA

USP, além do financiamento da Pró-reitoria de Cultura e Extensão da

USP, do curso de Especialização em Pesquisa de Mercado, da Capes e,

em especial, da FAPESP.

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GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz

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O GESC3 mantém atividades conjuntas com grupos de estudo locais e

internacionais, como o MARCO (PUC SP) liderado pelo Prof. Dr.

Alexandre Las Casas, com o CEDIPP (ECA USP), liderado pelo Prof.

Dr. Sergio Bairon, com o GENN (ECA USP), liderado pelo Prof. Dr.

Paulo Nassar; com o grupo de estudos liderado pela Profa. Dra. Nilda

Jacks da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, além das parcerias

internacionais em ensino e pesquisa com a Universidade Católica Portu-

guesa, Núcleo de Estudos da Marca, liderado pelo Prof. Dr. Paulo Len-

castre, com a Universidad de Múrcia, Espanha, por meio do Grupo de

Estudos em Comunicación y Información, liderado pelo Prof. Dr. Pedro

Hellin, com a Pontifícia Universidade Católica do Chile, por meio da

coordenação da Profa. Dra. Paulina Goméz, com a Universidade de

Sevilla, por meio do grupo de pesquisa liderado pelo Prof. Dr. Fernando

Contreras, com a Universidad Complutense de Madrid, por meio do

grupo Corporate Excelente, liderado pelo Prof. Dr. Juan Benavides, com

o Prof. Dr. Massimo Canevacci, da Universidade La Sapienza de Roma

e do IEA – USP.

Além da página dos grupos de pesquisa vinculada à plataforma Lattes do

CNP (http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=

0067609LVC6FNW), o GESC3 mantém um perfil no Facebook (https:/

/www.facebook.com/groups/396462983712353/?fref=ts) para fomentar

o diálogo e o compartilhamento de ideias, temas, teorias, metodologias

e autores.

O GESC3, por meio de seus líderes, criou e edita semestralmente a revista

Signos do Consumo (classificada no qualis B3) desde 2009, cumprindo

com seu compromisso de registrar e promover o acesso ao conhecimento

na área da Comunicação e nas suas interfaces com as demais Ciências

Sociais Aplicadas, Humanas e Artes.

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista

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As linhas de pesquisa do GESC3 estão reunidas em cinco eixos centrais:

a) Antropossemiótica: discussões teórico-metodológicas; b) Estética e

ética da publicidade e do consumo; c) Estudos de tendências; d) Publi-

cidade e semiótica das expressividades da marca; e) Semiótica e rituais

de consumo e f) Criatividade e brasilidade. Essas linhas de investigação

abrigam várias pesquisas que congregam diferentes pesquisadores (de Ini-

ciação Científica a pós-doutorados) em arranjos orgânicos, organizados

a partir das afinidades temáticas. São as seguintes as principais pesquisas:

1) A produção de sentido na recepção da publicidade e nas práticas de

consumo de alimentos na cidade de São Paulo (financiamento CNPq,

concluído em 2011).

2) Cerveja, Publicidade, Regulação e Consumo: o olhar da comunicação

sobre as marcas de cervejas contemporâneas e suas implicações na vida

social de adolescentes. (financiamento CNPq e concluirá em 12/

2013)

4) Personas do Consumo (pesquisa coletiva)

5) Jovem e consumo cultural em tempos de convergência (projeto

financiado pelo CNPq em parceria com UFRGS)

6) Criatividade empreendedora e brasilidade (Financiamento FAPESP,

ECA-USP)

7) Tendências de Comportamento e Consumo (em parceria com o

Instituto Ipsos)

Com isso entendemos que estamos trilhando um caminho sólido que

busca integrar a pesquisa no cotidiano de nosso estar/ser universidade,

fundamentando nossa prática docente e nossas atividades na comunidade.

O GESC3 é assim um grupo de pesquisadores que pensa e faz.

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GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz

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É com a perspectiva empreendedora, que nos move para o fazer científico,

que apresentamos mais um produto, desta vez, fruto de pesquisa coletiva

dos membros do GESC3, intitulado Universo Sígnico da Pirataria: Falso?

Verdadeiro! Este trabalho condensa as contribuições dos integrantes e

convidados do GESC3 em investigação conduzida entre os anos de 2010

a 2011 sobre a perspectiva do falso como verdadeiro na construção das

percepções estéticas, das condutas éticas e das generalizações correspon-

dentes às dimensões simbólicas que constituiem o universo de sentidos

do consumo de mercadorias de marcas pirateadas.

Com este horizonte, o capítulo 1 inicia a obra trazendo a reflexãoteórico-

metodológica sobre a opção do grupo pelo método etnográfico, privile-

giado pela Antropologia Visual. A discussão neste momento é metodo-

lógicae busca a sustentação epistemológica da concepção dos trabalhos

coletivos realizados em campos distintos que se referem às contribuições

dos organizadores da obra e coordenadores da pesquisa no que diz respeito

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica, que

aponta os fundamentos epistemológicos dos estudos empíricos que se

seguirão nos resultados apresentados nos capítulos 7, 8, 9, 10 e 11.

O segundo capítulo A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria de autoria

de Paulo Roberto Monteiro de Araújo, que nos faz pensar a legitimidade

do desejo sobre as coisas e como ela se projeto numa conduta ética de

consumo, este princípio é regido por um querer, desejo, que torna legí-

timo o consumo por um bem, na perspectiva da ética do bem-estar e que

o produto pirata parece ser um artífício de acesso. Na sequência o capítulo

3, A antecedência do simulacro na sociedade contemporânea: as motivações

para a busca, compra e uso de produtos e marcas falsificadas de autoria dos

Pesquisadores Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon, aprofunda

reflexões sobre a dimensão cultural de que os produtos copiados,

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Leandro L. Batista

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replicados, falsificados, tem o seu consumo numa expectativa legítima

de colocarem o seu comprador em conjunção com a narrativa do bem-

estar, não sendo este consumo visto sob a perspectiva legal, da propiedade

da marca, mas o sentimento que mobiliza um mercado fantástico de pro-

dutos a partir da ensígnia da piratiaria, lançando a questão que moveu a

condução da pesquisa, a saber: quais ritualidades de consumo estão em

jogo nas lógicas comunicacionais e de interação das marcas originais para

com asmarcas pirateadas na construção de sentidos entre vendendores e

consumidores de produtos de marcas pirateadas? A questão longe de ser

respondida, busca aguçar a curiosidade do leitor, por meio dos capítulos

subsequentes, na construção de caminhos para a compreensão do falso

como verdadeiro que constitui o universo de sentidos do consumo pirata.

Nesse sentido, o capítulo 4Uma Visão Milenar da Piratariade autoria de

Lawrence Chung Koo, mostra na percepção de um chinês, residente no

Brasil, como o ideário confucionista compreende o papel pedagógicoda

cópia, nos presenteando com um olhar diferenciado, oriental, outros

sentidos possíveis da pirataria.

Já o capítulo 5 Imitação na Propaganda Comercialde Gino Giacomini

Filho nos permite mergulhar no fenômeno da pirataria para outras

dimensões que vão além do produto e que chegam às manifestações da

imitação no contexto da comunicação mercadológica, a publicidade. O

capítulo seis traz para a realidade da obra o ponto de vista do sistema

captitalista sob a ótica de O marketing da pirataria: legalidade e ilegalidade

em um novo paradigma de consumo, de Alexandre Las Casas e Wesley

Moreira Pinheiro, porém, o texto traduz também a partir do conflito

entre a legalidade e ilegalidade do consumo pirata, a aspiração do

consumo da mercadoria falsa, como elemento que satisfaz as necessidades

de um grande público dos consumidores, desejosos por ingressar no

fascinante mundo de consumo, cujos preço praticados pelas marcas

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originais segregam esse grande público, ao mesmo tempo que o faz desejar

as marcas em suas expressividades de contatos com os públicos na vida e

povoando o imaginário social coletivo.

A crítica social sobre os processos que envolvem o consumo pirata

também são alvo da reflexão de Thais Novais de Curtis que nos oferece

o texto do 7º. Capítulo, Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos

Falsos Produtos.

O primeiro desses resultados, capítulo 8, Contrafação e seus museus: espaços

de apologia ou crítica do consumo pirata? Paradoxos da hipermodernidade e

sua estética, de autoria de Eneus Trindade,Lívia Souza e Silva, Nicolás Llano

Linares, o trabalhobusca mostrar no paradoxo do hiperconsumo como o

espaço do museu da Pirataria em Paris se configura como um elogia à

pirataria, ao mesmo tempo que tem em seu horizonte a perspectiva crítica

e educativa para seus visitantes contra a produção pirata. Em complemento

a essa percepção, o espaço do museu se reverte num local revelador de uma

taxionomia das manifestações do produto e das marcas piratas.

Josê Fogaça e Silvio Sato, no capítulo 9, abordaram no texto Luxo Pirata,

Desejo Autêntico, Uso Legítimo, as tensões e soluções engendradas durante

a construção e negociação de sentidos inerentes às relações de produção

e consumo de produtos e serviços piratas. Com uma visão mais largada

e profunda, os autores apresentam caminhos mais consequentes para o

entendimento desta manifestação social tão característica da sociedade

pós-moderna.

Já Jefferson Hugo Pacheco Rezende, apresenta no capítulo 10, um estudo

empírico realizado na região metropolitana da cidade do México, DF a

contribuição intulada Tepito, Cidade do México-DF: A versão mexicana

da região da 25 de Março paulistana e suas adjacências.

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Por fim, a obra chega ao seu clímax com a apresentação no capítulo 10

do texto construído por “muitas mãos” Em campo pirata: olhares, registro

e interpretações, possibilitando ao leitor a conexão dos pressupostos da

pesquisa em antoplogia visual, fotoetnográfica, na interface com a

comunicação como tradução de um conhecimentosensível, visual das

realidades estudadas em campo. Contudo, cabe ressaltar que o trabalho

vai além dos sentidos das expressões visuais apreendidas no contexto do

campo realizado na rua 25 de março em São Paulo, local privilegiado do

comércio da pirata brasileiro, trazendo contribuições advindas de um

processo etnográfico das relações entre vendedores e consumidores no

contexto comercial da temática em pauta.

Mas se o capítulo anterior poderia significar o fim da obra, o trabalho

coletivo mostra-se vivo e aberto a desdobramentos, presenteando os

leitores com três produtos que aguçam ainda mais o questionamento so-

bre o tema da pirataria: o primeiro deles, refere-se a umglossário (realizado

por 32 autores) que busca delinera um horizonte determinologias do

universo sígnico do consumo pirata, cujas reflexões trazem novos aportes

e questões para aqueles que se interessam pela temática. O segundo põe

em evidência a riqueza e a criatividade da linguagem ordinária utilizada

nos contextos de produção e consumo pirata, por meio da organização

de um pequeno glossário de termos – um convite à imersão no universo

de sentidos imaginativos e carregados de sentido. E por último, mas não

menso importante, o Publicitário e Professor de Arte Publicitária do

Curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicações e Artes

da USP, Dorinho Bastos, nos presenteia com uma imagem síntese O

mapa da pirataria, trazendo pelo princípio teórico-metodológico da

expressão visual, sensível, algo que explica, traz conhecimento sobre a

realidade vivida, como aqui tetamos articular nesta obra sobreos sentidos

do consumo pirata. Este então foi o nosso ponto de vistapara este trabalho

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GESC3, Um Grupo que Pesquisa e Faz

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e que operou num pressuposto de valorização de que o que move os

indivíduos a consumirem produtos pirateados é o desejo legítimo de

querer o melhor para se, associado a uma ideia de ter algo belo, que

vislumbra um lugar de sentido sematizado pela noção de qualidade no

consumo e de asperiação social, que alimenta uma lógica de existência

que se fundamenta na experiência no consumo do falso-verdadeiro, sendo

este aspecto uma das manifestações anarquicas do mundo capitalista que

trabalha com a lógica da midiatização das marcas para a contrução de

um universo de consumo aspiracional que se coloca como objeto

privilegiado no contexto da comunicação em vias de midiatização.

Tenham uma ótima leitura!

CLOTILDE PEREZ

ENEUS TRINDADE

LEANDRO LEONARDO BATISTA

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Page 23: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

23

Colaboradores

ALEXANDRE LAS CASAS

Doutor em Administração pela FGV. Administrador. Professor

titular de Marketing da PUC SP, junto ao Programa de Estudos

Pós-graduados em Administração. [email protected]

ALHEN RUBENS

Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA

USP. Publicitário formado pela Universidade Federal do Ceará.

Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]

ANDRÉ LUIZ PERUZZO

Graduando em Publicidade pela ECA USP. Bolsista do CNPq –

Iniciação Científica, junto ao GESC3 – Grupo de Estudos Semió-

ticos em Comunicação, Cultura e Consumo.

[email protected]

ANDREA MENEGHEL

Mestre em Administração pela PUC SP, com graduação na mesma

área. Pesquisadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo.

[email protected]

Page 24: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

24

BIBIANA STHOLER SABENÇA DE ALMEIDA

Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA USP.

[email protected]

BRUNO POMPEU

Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA

USP. Publicitário formada pela ECA USP. Professor no IED.

Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]

CAROLINA BOARI CARACIOLA

Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia

Universidade Católica (PUC). Mestre em Educação, Arte e Histó-

ria da Cultura, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com a

dissertação “A arte na publicidade de uma marca de luxo”. Pós Gra-

duação em Comunicação com o Mercado pela ESPM. Graduação

em Propaganda e Marketing (ESPM) e Direito (FMU).

CINIRA BAADER

Graduada em Comunicação Social (Publicidade e Propaganda)

pela Universidade Regional de Blumenau (SC). Mestranda do

Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da

Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo

(SP). [email protected]

Page 25: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

25

CLOTILDE PEREZ

Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP. Pós-

doutora em Comunicação pela Universidade de Murcia, Espanha.

Doutora em Comunicação e Semiótica e Mestre em Administração

pela PUC SP. Professora da ECA USP. Professora na PUC SP.

Semioticista. Líder do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected],

[email protected]

DORINHO BASTOS

Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Braz Cubas.

Mestrado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comuni-

cações e Artes da Universidade de São Paulo e doutorado em

Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. É

professor no curso de Publicidade da Escola de Comunicações e

Artes da Universidade de São Paulo e Sócio Diretor do Estúdio K

Arquitetura e Comunicação Visual S C Ltda. Chartunista.

[email protected]

ENEUS TRINDADE BARRETO FILHO

Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP. Pós-

doutor pela Universidade Aberta, Portugal. Doutor e Mestre em

Ciências da Comunicação pela ECA USP. Professor da ECA USP.

Vice-líder do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]

Page 26: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

26

GABRIELA AYER

Mestre em Administração de Marketing pela PUC SP. Adminis-

tradora. Pesquisadora junto ao GESC3 – Grupo de Estudos Semió-

ticos em Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]

GINO GIACOMINI FILHO

Possui graduação em Publicidade e Propaganda pela Universidade

de São Paulo, mestrado em Ciências da Comunicação pela Uni-

versidade de São Paulo, doutorado e Livre-docência em Publici-

dade pela USP. Atualmente é professor da graduação em Comu-

nicação Social e do Programa de Mestrado em Comunicação da

Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), e docente

da graduação em Comunicação Social da Universidade de São

Paulo. [email protected]

HÉLIO SILVA

Mestrando do Programa de Pós-Graduação da Escola de Comu-

nicação e Artes – ECA; Redator publicitário com mais de 25 anos

de experiência no desenvolvimento de campanhas para clientes de

variados segmentos de negócios; Membro do GESC3 – Grupo de

Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.

[email protected] e [email protected]

JANIENE SANTOS

Mestre e doutoranda em Ciências da Comunicação pela ECA USP.

Professora e Coordenadora do Istituto Europeodi Design. Pesqui-

sadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comuni-

cação, Cultura e Consumo.

[email protected] ou [email protected]

Page 27: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

27

JEFERSON HUGO PACHECO DE REZENDE

Mestrando em Geografia pela USP. Possui graduação em Geografia

pela Universidade de São Paulo (2007). Atualmente é Técnico em

Geoprocessamento da Prefeitura Municipal de Guarulhos. Tem

experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia

Humana. [email protected]

JÔSE FOGAÇA

Doutoranda em Ciências da Comunicação pela ECA USP, Mestre

em Sociologia pela Unicamp, Cientista Social pela FFLCH USP.

Professora do Curso de Pós-Graduação em Pesquisa de Mercado

da ECA USP. [email protected]

JOSÉ PALANDI JUNIOR

Doutor em Comunicação e Semiótica e Mestre em Administração

de Marketing pela PUC SP. Professor na PUC SP e na Universi-

dade Mackenzie. [email protected]

LAWRENCE KOO

Pós-doutorando na ECA USP. Possui graduação em Engenharia

Mecânica pelo ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Mes-

trado e Doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Administração

pela FGV/CEAG. Pesquisador do GESC3 – Grupo de Estudos

Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.

[email protected]

Page 28: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

28

LEANDRO LEONARDO BATISTA

Doutor e Mestre em Comunicação pela Universidade da Carolina

do Norte, EUA. Professor da ECA USP, junto ao PPGCom e a

graduação em Publicidade. Pesquisador do GESC3 – Grupo de

Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo.

[email protected]

LIVIA SOUZA

Mestre e doutoranda em Ciências da Comunicação pela USP –

Universidade de São Paulo. Especialista em Cinema, Vídeo e

Fotografia pela Universidade Anhembi-Morumbi. Graduada em

Publicidade e Propaganda pela Universidade de São Paulo. É

pesquisadora do GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo. [email protected]

MARCOS HILLER

Mestrando em Comunicação e Práticas do Consumo pela Escola

Superior de Propaganda e Marketing e responsável por todo

processo de comunicação digital do Programa. Coordenador do

MBA em Branding da Trevisan Escola de Negócios. Possui gra-

duação em Marketing pela ESPM, possui especializações em

marketing de serviços pela FAAP e em gestão de marcas pela

Universidade Anhembi Morumbi.

MARIA CECÍLIA ANDREUCCI CURY

Doutoranda em Ciências da Comunicação na Universidade de São

Paulo, Cecília Andreucci é mestre em Comunicação e Práticas de

Consumo pela ESPM-SP e professora do MBA em marketing da

FGV. [email protected]

Page 29: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

29

NICOLÁS LLANO

Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA

USP. Membro do GESC3 – Grupos de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo da ECA USP. [email protected]

PAULO ROBERTO MONTEIRO DE ARAÚJO

Doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas

(2003). Atualmente é professor do Programa de Pós-Graduação

Stricto Senso em Educação, Arte e História da Cultura na Uni-

versidade Presbiteriana Mackenzie. Atua principalmente nas

seguintes áreas: Cultura Contemporânea, Arte, Ética e Filosofia

Política. Pesquisador do GESC3 – Grupos de Estudos Semióticos

em Comunicação, Cultura e Consumo da ECA USP.

[email protected]

RAQUEL DE CASTRO DANTAS CAVALCANTE

Publicitária formada pela Escola de Comunicações e Artes da Uni-

versidade de São Paulo. Membro do GESC3 – Grupos de Estudos

Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo da ECA

USP.

SERGIO BAIRON

Livre-docente em Ciências da Comunicação pela ECA USP.

Doutor em Ciências pela FFLCH – USP. Historiador e Cientista

Social. Professor do PPGCOM ECA USP e da graduação em

Publicidade. Líder do CEDIPP – Centro de Estudos em Comu-

nicação e Produção Partilhada do Conhecimento.

[email protected] e [email protected]

Page 30: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Colaboradores

30

SILVIO KOITI SATO

Doutorando e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola

de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA

USP). Publicitário pela ESPM-SP e especialista em Administração

de Empresas pela EAESP/FGV-SP. Docente nos cursos de gra-

duação e pós-graduação da FAAP e do IED. Pesquisador do GESC3

– Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Con-

sumo. [email protected]

THAIS NOVAIS DE CURTIS

Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo. Possui graduação em Comunicação Social

com habilitação em Publicidade e Propaganda pela Fundação Esco-

la de Comércio Álvares Penteado e graduação em Secretariado

Executivo Trilíngue pela FECAP. Atua como professora auxiliar

do curso de Comunicação Social da FECAP.

WESLEY MOREIRA PINHEIRO

Mestrando em Administração de Empresas pela PUC SP. Pesqui-

sador do núcleo de Marketing e Comunicação (MARCO) da PUC

SP e do Grupo de Pesquisa Opinião Pública, Marketing Político

e Comportamento Eleitoral da UFMG.

[email protected]

Page 31: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

31

Sobre o Olhar na Antropologia Visual ena Pesquisa Fotoetnográfica

ENEUS TRINDADECLOTILDE PEREZ

Buscamos eleger um método de investigação que fosse pertinente ao

nosso objeto – consumo da pirataria – ao mesmo tempo em que per-

mitisse um diálogo proveitoso com os demais métodos de pesquisa já

praticados pelos diferentes pesquisadores do GESC3, com privilégio para

o método semiótico de Peirce (1977) expresso na Teoria Geral dos Signos,

as várias vertentes de análise do discurso (AD), as distintas metodologias

e técnicas qualitativas (grupos de discussão, entrevistas em profundidade

etc.) entre outros. Com esse paradigma foi quase que inevitável nos valer

da pesquisa etnográfica de forma privilegiada, uma vez que, é um método

em constante diálogo com outras regionalidades científicas e teorias

(CANEVACCI, 2008, 2013), ainda que muitos antropólogos acreditem no

seu uso restrito a este campo do saber científico (a Antropologia), aspecto

este com o qual, evidentemente, não concordamos.

Para construir um corpus de reflexão e que também servisse de uma espécie

de guia, uma vez estávamos trabalhando com um grande número de

pesquisadores, construímos um percurso para subsidiar o trabalho de

campo, a partir das reflexões de Ribeiro (2003) que nos possibilita iden-

tificar os caminhos básicos da pesquisa em Antropologia, de Achutti

Page 32: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Eneus Trindade e Clotilde Perez

32

(2004) que permite compreender a dimensão estética de um conheci-

mento sensível dado pela visualidade da fotoetnografia e de Pétonnet

(1982) que nos propõe o percurso do olhar flutuante, aberto às

percepções espontâneas que emanam do contexto de investigação.

Em Ribeiro (2003, pp. 89-91) temos de forma bastante didática, as

dimensões de construção do saber antropológico:

1º Etnografia – Aqui se dá a coleta de material para a escrita das culturas.

São consideradas as posturas do pesquisador em campo e os materiais e

técnicas para as observações e descrições que constituem os produtos da

ação de pesquisa etnográfica.

2º Etnologia – Reflexão sobre o contexto cultural investigado a partir

dos dados etnográficos. Aqui são operadas as relações e as conexões que

constituemos elementos estruturantes e os significados das culturas.

3º – O saber antropológico constituído, isto é, as correlações interdisci-

plinares e transversais a partir dos aspectos culturais observados e anali-

sados na etapa etnológica.

Fonte: RIBEIRO, 2003

ETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAETNOGRAFIAObserObserObserObserObservação evação evação evação evação edescriçãodescriçãodescriçãodescriçãodescrição

ETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAETNOLOGIAAnáliseAnáliseAnáliseAnáliseAnálise

ANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIAANTROPOLOGIACULCULCULCULCULTURALTURALTURALTURALTURALSínteseSínteseSínteseSínteseSínteseVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holísticaVisão global e holística

Page 33: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica

33

O trabalho de campo segundo Ribeiro (2003, p. 61-117) envolve uma

série de etapas, às quais passamos a seguir:

A abordagem em campo e o aceite da presença do pesquisador: trata-

se do primeiro contato com os informantes, momento no qual são escla-

recidos os objetivos da pesquisa, princípios e finalidades. Também é nesse

instante em que o pesquisador avalia a aceitação de sua presença no

campo. Certamente, dada a natureza da nossa investigação, este será um

momento delicado que seguirá em um bom termo se construído um

diálogo direto e de confiança mútua.

A coleta da autorização para os usos de imagem e para realização da

entrevista: além da concordância em participar da pesquisa, o informante

deve concordar com o uso de sua imagem – fotográfica ou em filme, para

que seja possível seguirmos com a pesquisa. Também dada a natureza de

nosso objeto este não será um item fácil de ser atendido.

As observações: seguiremos os preceitos estabelecidos no item a seguir in-

titulado “O exercício do olhar na antropologia visual e na fotoetnografia”.

As notas de campo: todo o trabalho no terreno/campo deve ser registrado

em texto. As notas de campo são um registro fundamental que além de

auxiliar na recuperação de informações, serve como apoio à analise dos

resultados e eventual retomada da pesquisa no futuro.

Os diários de campo: mais extenso do que as notas, o diário de campo é

um registro muito mais detalhado de todas as atividades, sentimentos,

pensamentos e ações tomadas pelo pesquisador durante todo o processo

de investigação no terreno.

Entrevistas em campo: as entrevistas de campo seguirão o roteiro mínimo

estabelecido.

Page 34: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Eneus Trindade e Clotilde Perez

34

O exercício do olhar na antropologia visual e nafotoetnografia

Após, as essências contribuições de Ribeiro para a compreensão da cons-

trução do saber em antropologia, cabe o resgate dos trabalhos de Achutti

(2004) e Pétonnet (1982) para esta pesquisa. E com eles o aprofunda-

mento para a compreensão de um subcampo da antropologia que dialoga

com a Comunicação que se refere à Antropologia Visual. Este ramo da

antropologia busca em seus pressupostos a escrita visual dos fenômenos

das culturas que, durante muito tempo, foi um procedimento comple-

mentar ao tradicional trabalho etnográfico por meio dos trabalhos em

filmes etnográficos e do uso da fotografia em campo. Essa caracerização

histórica da disciplina da antropologia visual, que não é o foco de nossa

discussão neste momento e pode ser melhor percebida em trabalhos

como o de Riberio (in RIBEIRO e BAIRON, 2007, p. 13-21), Jay Ruby

(2005, p. 159-170) e em Achutti (2004, p. 77-87), que fazem um per-

curso esclarecedor de resgate da memória de tais experiências para

justamente legitimar os propósitos e horizontes de atuação desse subcam-

po da antropologia na atualidade.

O aspecto histórico do surgimento de novas formas de registro, no tra-

balho de campo/terreno, para além do uso do signo verbal na antropo-

logia, é um reflexo do que ocorria em paralelo com a vida ordinária, no

cotidiano dos centros urbanos industriais, desde os séculos XVIII e XIX.

Esse cenário foi marcado pelo surgimento de novas formas de comu-

nicação que passam a operar por meio de mensagens visuais, sonoras e

verbais, sobretudo, o fascínio criado pelo cinema e pelas promessas da

publicidade, na perspectiva de construção e consolidação, já nos anos 70,

de uma cultura massificada pelo consumo material que também é sim-

bólico. Tal processo de ploriferação de linguagens visuais, especifica-

Page 35: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica

35

mente, passa a funcionar como um conjunto de mensagens-guia de con-

dutas, de expressões estéticas na vida cotidiana e de consumo nas socie-

dades, vistas a partir deste ângulo como sociedades de consumo.

É nesta perpespectiva, que buscamos a possibilidade de ter na fotografia

o exercício de um olhar etnográfico para o estudo do consumo na pira-

taria. Hoje a fotografia na antropologia para o trabalho antropológico,

assim como o filme, passa a ser visto como linguagem autônoma capaz

de dizer pelo que se pode ver e mostrar, sentidos que tocam o sensível e

permitem uma forma de conhecer que associa estética e produção do

conhecimento sobre as culturas.

Para Achutti (2004) as fotografias resultantes de um processo etnográfico,

por ele denominado de fotoetnografia, não é um conjunto isolado de

fotos, sendo antes de tudo um conjunto coeso e coerente em linguagem

fotográfica, constituído de enquadramentos, descrições espaciais do obje-

to estudado, pontos de vista que indicam uma interpretação sobre as

significações e sentidos oferecidos pelas imagens. Assim como o texto

verbal etnográfico, que transcreve de forma clara os fragmentos de reali-

dade e os encadeamentos específicos necessários para os trabalhos de

análises e de interpretações antropológicas, buscando evitar descrições

excessivas de detalhes que possam prejudicar as análises. (ACHUTTI, 2004,

p. 95-97).

Os tipos de olhares e o registro fotoetnográfico

Nesse sentido, cabe então uma breve reflexão sobre o papel do olhar na

fotoetnografia, pautado, como sugere o trabalho de Pétonnet (1982)

sobre a dimensão metodológica da observação flutuante, que busca despir

o olhar do pesquisador de pré-concepções, visando levantar percepções

Page 36: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Eneus Trindade e Clotilde Perez

36

para além do senso comum, a partir dos significados espontâneos que

emanam do contexto investigado, a exemplo da experiência de observação

flutuante de Pétonnet (1982, p. 37-47) no Cemitério Père-Lachaise em

Paris, que demonstra, por meio de uma narrativa construída de registros

e impressões operados em campo, como um conjunto de signos incomuns

ao universo que tange a um cemitério. Assim, é dado ao Père-Lachaise

uma conotação não necessariamente ligada à morte e à religiosidade, mas

sim à recreação e ao turismo. É com um olhar semelhante a este que

buscamos o exercício do olhar metodológico para o fenômeno da pirataria

em São Paulo.

A partir do exposto teríamos então três dimensões do olhar a considerar:

o olhar metodológico, já mencionado, que em campo, aponta para o

apoio do pesquisador em pilares da antropologia visual imbuído na rea-

lização da observação flutuante, tentando assim vivenciar com atenção a

cultura, um modo de perceber em desapego aos supostos paradigmas

axiomáticos de quem julga por olhares estereotipados; o olhar subjetivo

que independentemente de ser ou não o primeiro contato de um pes-

quisador com o terreno, é misterque este sujeito traga consigo, para o

campo, uma série de conceitos culturais adquiridos em sua práxis social

que podem tanto constituir uma antítese, e portanto estranhamento,

assim como constituir tese, indicando um olhar viciado que dificulta a

percepção dos hábitos culturais e suas inter-relações; e por último, o olhar

para o objeto de estudo que consiste em:

a) Olhar nas suas dimensõescontextualizantes

b) Olhar na identificação de ações e situações

c) Olhar para os detalhes

d) O olhar para o semelhante

e) Oolhar para o dispare ou diferente.

Page 37: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica

37

A partir desse conjunto de olhares que se interpõem sobre um mesmo

olhar de um grupo de investigadores é que o exercício da nossa equipe

se deu na concepção da compreensão do consumo Pirata. Por fim,

discute-se na complementação ao trabalho fotoetnográfico o uso das

entrevistas, das notas de campo e de possíveis cruzamentos teóricos frente

aos dados registrados.

Entrevistas: O roteiro das entrevistas com vendedores econsumidores

Para subsidiar as diferentes equipes que estavam no campo, propusemos

um roteiro breve para ser seguido com flexibilidade, nas diferentes situa-

ções do processo de consumo. Os dois focos centrais na presente in-

vestigação eram o vendedor e o consumidor de produtos piratas. For-

necedores, intermediários, influenciadores e outros atores não foram foco

da pesquisa.

Breve roteiro para entrevistas vendedores:

– Informações identitárias: nome, idade, escolaridade, região onde mora

etc.

– História de vida (breve relato)

– O que vende? (o que? Para que? O que vende mais?)

– Quem compra? (perfil idade, sexo, freqüência...)

– Como promove os produtos? (alto-falante, faz performance, cartaz...)

– Como é a rotina? (onde compra, quando, como paga o fornecedor etc.)

Page 38: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Eneus Trindade e Clotilde Perez

38

Breve roteiro para entrevistas com os consumidores:

– Informações identitárias: nome, idade, escolaridade, região onde mora

etc.

– História de vida (breve relato)

– O que compra e por quê?

– Para quem? Uso próprio? Família? Presente?

– Frequência de compra e uso.

– Tem preferência de marca?

– Critérios de escolha. O que define a compra?

A descrição dos dados

Uma vez coletados os dados. Instaura-se a necessidade da descrição dos

dados, na perspectiva da construção de uma síntese exaustiva que buscasse

dar conta das notas de campo, fotografias, transcrições de entrevistas. Essa

etapa correspondeu a uma sistematização que buscou respeitar a cultura

observada tal como ela se apresentou, considerandoos relatórios dos

integrantes das equipes, que buscaram esclarecer o que foi visto nos tipos

de olhares, que se somaram a uma lista/sumário das fotos, com a data e

descrição do percurso realizado em campo e CD com as fotos; relatos

verbais sobre as imagens quanto aos tipos de olhares (oolhar nas suas

dimensões contextualizantes; na identificação de ações e situações; o olhar

para os detalhes; o olhar para o semelhante; o olhar para o dispare ou

diferente); transcrição das entrevistas realçando o contexto da entrevista,

o que é comum entre os entrevistados, a situação observada em cada entre-

vista, seus detalhes, suas semelhanças com outros entrevistados e suas

diferenças; bem como as observações sobre as imagens e nas entrevistas

referentes aos hibridismos culturais (CANCLINI, 1996) eos rituais de

Page 39: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Sobre o Olhar na Antropologia Visual e na Pesquisa Fotoetnográfica

39

compra, posse e uso (MCCRAKEN, 2003), pois tais aspectos em sua

totalidade permitem dimensionar a magnitude dos processos intercul-

turais e construção de significados dos objetos de consumo pirateados

no tecido social da vida cotidiana.

Assim, as descrições possibilitaram a construção de uma primeira reflexão

etnológica rumo ao saber antropológico constituído, que no nosso caso,

permitiu a compreensão da complexa relação do falso – verdadeiro do

Universo Sígnico da Pirataria.

Referências bibliográficas

ACHUTTI, L. E. R. (2004) Fotoetnografia. Porto Alegre: Ed. UFRGS/TomoEditorial.

CANCLÌNI, N. G. (1996) Culturas Híbridas. Poderes Oblíquos. Estratégiaspara entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp.

McCRACKEN, G. (2003) Cultura e consumo. Novas abordagens ao carátersimbólico dos bens e das atividades de consumo. Rio de Janeiro. Ed.Mauad. Trad. Fernanda Eugênio. Coleção Cultura e Consumo coor-denada por Everardo Rocha.

PÉTONNET, C. (1982) L’observation flottante. L’exemple d’un cimetièreparisien.L’Homme.Paris: v. 22. n. 4. 1982. p. 37-47.

RIBEIRO, J. S. (2003) Métodos e técnicas de investigação em Antropologia. Lisboa:Universidade Aberta.

. & Bairon, S. (orgs.) (2007) Antropologia Visual e hipermedia.Porto: Edições Afrontamento.

RUBY, J. (2005) “The last 20 years of visual anthropology – a critical review”.Visual Studies, v. 20. n. 2. p. 159-170.

Page 40: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Eneus Trindade e Clotilde Perez

40

TRINDADE, E. (2008a) Por uma fotoetnografia da publicidade: aspectos dacultura e do consumo alimentar no Brasil e em Portugal. Porto: Uni-versidade Aberta de Portugal/Laboratório de Antropologia Visual. Rela-tório final de Pós-Doutorado.

. (2008b) Recepção publicitária e práticas de consumo. RevistaFronteiras. Estudos Midiáticos. São Leopoldo. Unisinos. v. X. n.11. p.73-80.

Page 41: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

41

A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

PAULO ROBERTO MONTEIRO DE ARAUJO

A questão da autoria na Modernidade pode ser compreendida em uma

dimensão estética a partir do Romantismo Alemão: reconhecimento da

genialidade daquele que elabora uma determinada obra de Arte. Deste

modo, a discussão sobre a autoria se vincula ao processo de reconhe-

cimento da subjetividade, compreendida como identidade singular que

apreende aquilo que os outros não conseguem captar: seja na esfera cog-

nitiva, seja na esfera sensível da percepção.

A ideia de genialidade artística revela na história da cultura ocidental um

novo patamar no que se refere às práticas sociais. O Romantismo Alemão

marca uma diferença com outros períodos históricos do ocidente. Na

Idade Média não havia ainda o conceito de autonomia artística ou algo

do gênero. O artista em sua elaboração não era conduzido por si mesmo,

como sujeito, mas por Deus, o verdadeiro criador da obra. O artista era

um instrumento do divino em seu processo de elaboração artístico.

Podemos dizer que até o final da Renascença, o artista não era autônomo

em seu próprio fazer artístico. Somente com o advento do movimento

Romântico Alemão é que o conceito de sujeito ganha status de reco-

nhecimento. Com o desenvolvimento de um vocabulário de valor refe-

rente aos significados de autonomia, de sujeito e de identidade, o artista

Page 42: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Paulo Roberto Monteiro de Araujo

42

passa a ser aquele que detém a determinação da obra, ou seja, ele tem o

direito sobre a sua criação.

Como salienta Hegel (1986), em sua Filosofia do Direito, as qualidades

do espírito (compreendido como razão) quando se concretizam em uma

exterioridade (sensível), como é o caso da invenção de algum instrumento,

da criação uma escultura artística ou algo do gênero, ocorre uma espécie

de assimilação, por parte dessas qualidades do espírito, do aspecto externo

da coisa, isto é, da sua aparência (Schein). É como se acontecesse uma

espécie de coisificação das qualidades internas do espírito, ou seja, da razão

que se torna algo palpável à nossa dimensão sensível. Sendo assim, estando

no estado da aparência da coisa, as qualidades do espírito tendem a ser

negociadas por aqueles que as possuem, no caso, os artistas.

Deste modo, coloca-se em questão, por exemplo, se um artista tem

juridicamente posse da obra de arte que ele produziu. Portanto, se ele

tem realmente direito de dispor de algo que lhe é interno (como aptidão,

conhecimento, disposição) como algo externo (como coisa – a obra), de

forma que possa negociá-lo. Para Hegel (1995) fica claro que o artista

como sujeito que produziu um quadro, ou outro produto qualquer que

esteja na esfera da produção do espírito (razão), tem o direito de negociá-

lo como se fosse uma coisa. Não há em termos ontológicos uma modifi-

cação real do conceito interno das qualidadesdo espírito.

Quando se trata da negociação dessas qualidades do espírito (razão) no

plano externo, o que acontece é uma tomada de posse pela pessoa, como

sujeito (o artista) daquilo que é interno a si mesmo, por meio da exterio-

rização das suas obras, que surgem como coisas potencialmente negociá-

veis. A negociação é somente o modo pelo qual se exterioriza o caráter

da posse dessa capacidade criativa do espírito (razão). Só se pode fazer

um contrato ou negócio a partir daquilo que se tem posse. Hegel no §

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A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

43

41 da sua Filosofia do Direito salienta que a pessoa como sujeito tem o

direito que exteriorizar a sua posse interna dos seus produtos ao

transplantá-los para o mundo das coisas negociáveis. Está aí o caráter

exterior das qualidades do espírito. Deste modo, o artista como sujeito

de suas capacidades espirituais internas tem o direito de propriedade de

suas obras como exteriorização de tais capacidades. Daí para a cultura

ocidental a pirataria é um crime, pois significa roubar a propriedade

alheia, isto é, roubar a capacidade daquele que possui a genialidade de

elaborar uma obra de arte. Hegel (1986) faz parte desse movimento de

construção de um vocabulário de valor que reconhece o direito do artista,

como aquele que expressa as qualidades internas da razão, sob a forma

de coisas externas na dimensão da arte.

A construção de um Vocabulário de Valor tem como objetivo formar

um conjunto de significados referenciais que são internalizados entre

aqueles que pertencem a uma mesma comunidade linguística. Tal comu-

nidade pode ser compreendida também como sendo a mesma comuni-

dade cultural, em que seus membros participam de semelhantes signi-

ficados, vinculados a um determinado vocabulário de valor. A partir da

elaboração de um vocabulário de valor podemos compreender a formação

de novos desejos, no sentido de realização como Pessoa. Sendo assim, a

construção de um vocabulário de valor significa que o artista é reco-

nhecido em sua dimensão humana e, por isso mesmo deve ser preserva-

do o direito de proprietário de sua obra como expressão de sua identidade

humana.

No entanto, cabe lembrar que há uma diferença entre aquilo que o filó-

sofo canadense Charles Taylor (1997) diz sobre a elaboração de um

vocabulário de valor, em que o outro deve, por exemplo, ser reconhecido

em suas obras, como artista, e a realização dos desejos na esfera das coisas,

mesmo sendo essas obras de arte. A realização dos desejos nas coisas tem

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Paulo Roberto Monteiro de Araujo

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a ver com a utilidade e satisfação das pessoas, não das suas dignidades

humanas (é disso que trata um vocabulário de valor). É neste aspecto que

podemos nos voltar para compreender a relação entre o Consumo e a

Pirataria.

O consumo como ocorre no já conhecido Sistema Capitalista está voltado

para o ato de “devorar” as novidades por ele produzidas. Lembrando ainda

Hegel (1986) em sua Filosofia do Direito, a partir da relação imediata

com o mundo, apessoa se limita ao desejo de tomar posse dos objetos

que surgem ao seu redor, embora esse tomar posse seja o primeiro ato de

construção do conceito de liberdade. No Capitalismo, esse tomar posse

não significa propriamente o se ganhar como pessoa consciente da sua

liberdade, mas dos seus desejos imediatos cujas premissas estão no

desenvolvimento de um hiperconsumo já apontado por Lipovetsky em

obras como O Império do efêmero (ver a segunda parte dessa obra A sedução

das coisas. Companhia das Letras, p.184).

O Capitalismo para manter a sua dinâmica precisa permanecer em altos

níveis de consumo. Deste modo, cada vez mais as pessoas precisam

internalizar o referencial significativo do “ato de devorar novidades”. O

problema está na sofisticação cada vez maior dos objetos oferecidos para

serem consumidos como Bolsas Gucci, Jeans Diesel, Perfumes Prada, etc.

Neste sentido, surge o problema da autoria. Se na história do ocidente,

como analisamos acima, tivemos a elaboração do conceito de sujeito cujas

qualidades espirituais se tornaram reconhecidas por meio de um voca-

bulário de valor, hoje vemos que tal vocabulário não tem mais o mesmo

significado em seu fundamento. O reconhecimento daquele como sujeito

que elabora determinada obra não está mais na pauta das preocupações

da cultura do consumo. A autoria é o que menos importa, no sentido de

reconhecer o seu autor em sua dignidade humana. O que importa é o

que tal autor significa para a manutenção da marca. Não é por acaso que,

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A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

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no mundo da moda, diversos estilistas considerados talentosos perderam

as suas autorias, viraram marcas para conglomerados financeiros (os esti-

listas tornaram-se seus funcionários). Sendo assim a discussão em relação

à pirataria não está mais no âmbito do respeito ao autor de alguma obra,

seja ela artística ou não. O que importa é a capacidade que o trabalho do

criador tem de manter a marca no mercado em um alto grau de consumo.

Daí o motivo de se combater a pirataria não está simplesmente no respeito

ao autor, mas na conservação do valor da mercadoria, não naquele sentido

relativo ao trabalho que Marx concebeu em o Capital. Manter o valor

no capitalismo avançado é manter o fetiche da própria mercadoria, prin-

cipalmente quando se trata das mercadorias de luxo. É o caso do mercado

de bolsas femininas; ter uma bolsa Louis Vuitton virou sinônimo de

status, por mais que milhares de mulheres andem com tais bolsas pelos

corredores dos Shoppings Centers. Exibir uma bolsa Louis Vuitton signi-

fica expressar a sua capacidade de consumo, pois é tal capacidade que lhe

confere uma “dignidade” social.

A manutenção dessa suposta “dignidade” social dos compradores das

marcas, faz com que haja o combate àquilo que se mostra como sendo o

mesmo de algo que possui marca. O que eu quero dizer é que o produto

pirata ao imitar o produto original, busca minar as bases da idealização

valorativa do que é marca sem afetar a sua aparente determinação de ser

original. Por mais que a imitação pirata seja vulgar, a aparência de coisa

permanece em seu caráter perceptivo na esfera do consumo (em seu signi-

ficado social amplo – as pessoas ainda reconhecem a marca no produto

não original), cuja estrutura lógica é a realização de desejos em sua ime-

diata sensibilidade. Cabe lembrar que o imediato sensível do desejo não

tem em si mesmo o caráter critico para fazer supostas diferenciações do

que é original ou não. Daí pouco importa para o sensível imediato dos

desejos qual o material que a pirataria usa para fabricar as suas imitações.

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Paulo Roberto Monteiro de Araujo

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A pirataria barateia a realização do desejo de um amplo grupo social que

procura realizar desejos não por simples imitação do modo de vida dos

compradores de marcas caras, mas sim de consumir algo fora do seu âm-

bito de consumo cotidiano. O problema da pirataria para as marcas,

incluindo principalmente as de luxo, está em sua difusão para aqueles

que não sustentam a sua idealização valorativa original. A pirataria ao

democratizar o desejo de consumir marcas, contraditoriamente elimina

tal desejo, pois acaba com o fetiche da marca, do seu suposto status social.

A pirataria é combatida, como salientamos anteriormente não por uma

questão de reconhecimento dos seus autores, mas pela manutenção do

desejo de consumir algo que aparentemente não está ao alcance de todos.

Cidades como São Paulo que detém mais de 70% do mercado de luxo

brasileiro, em que boa parte da sua população não pode consumir marcas

que lhe dão status, criam referenciais significativas de desejos, mesmo para

aqueles que não podem consumir objetos de luxo.

Contraditoriamente tais referenciais criados pelas marcas de luxo geram

cada vez mais a concepção do fabricar aquilo que é do outro, para oferecer

ao mercado como sendo aparentemente igual. A pirataria significa a

tentativa de democratizar o consumo, ou mais do que o simples consumo,

o consumo como status social. É claro que o consumo por status não é

uma novidade na história recente do consumo, mas o que é novidade é

o fato das pessoas terem como referencia a ideia de participar do espetá-

culo que as marcas se tornaram. Não quero fazer aqui nenhuma referencia

a ideia de espetáculo do GuyDebord (1997), mas sim a ideia de alguém

se tornar sujeito por meio do outro que não é ninguém. Neste aspecto o

pensamento de Heidegger é fundamental.

Se tornar sujeito por meio dos objetos é o modo encontrado em nosso

cotidiano de consumo para nos tirar da tarefa de nos tornarmos nós

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A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

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mesmos. Não havendo mais referenciais valorativos culturais, éticos e

políticos, a vontade individual como subjetividade se encontra naufragada

existencialmente. Daí a despreocupação ou a não ocupação conosco, com

a nossa existência humana. É neste aspecto da não ocupação com a

existência, que as marcas elaboram as suas linguagens, no sentido de dar

alguma determinação significativa à indigência existencial da nossa

contemporaneidade. Não se trata de uma simples acusação moralizante

em relação às marcas e as suas linguagens voltadas para a manutenção do

alto consumo, mas sim de compreender o que funda ou dá origem aos

novos formatos de consumo e a preocupação em combater a imitação

no que se refere aos produtos de luxo.

A contradição daqueles que querem ser sujeitos através dos objetos de

consumo oferecidos pelas marcas é se tornarem piratas; pois pegam algo

que não são originalmente deles para imitar algo que não é originalmente

de ninguém. O status de se ter uma bolsa Louis Vuitton é uma forma

metafórica de piratear o significado de sujeito, elaborado culturalmente

pelo ocidente. Ser sujeito, então, é participar do que chamei do espetáculo

das marcas. Tal espetáculo se determina por meio não mais da linguagem

publicitária com a sua triunfante sofisticação imagética, mas sim da inven-

ção de um modo de ser cuja determinação está no agraciar que os objetos

trazem para corpo compreendido agora como o lugar que deve refletir o

que nós somos, sujeitos. Daí a cueca Calvin Klein, os jeans da Diesel, os

casacos da Burberry. Sendo assim Prada, Gucci, Dior, entre outras se

tornam uma espécie de nome de família que o corpo consome como

sujeito, sem ser. O corpo como lugar que reflete o consumo de marcas

para se tornar sujeito traz em si o problema do desejo. Cabe lembrar aqui

do livro de Harry G. Frankfurt (1997) intitulado The importance ofwhat

we care about, cuja preocupação se vincula à problemática do desejo.

Frankfurt em um dos textos que compõe o referido livro Liberdade da

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Paulo Roberto Monteiro de Araujo

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vontade e concepção de pessoa (Freedom of the will and the conceptof a

person) analisa a questão relacionada aquilo que ele chama de um desejo

de primeira ordem (instintivo – em seu sentido passivo) e de uma segunda

ordem (vontade – em um sentido ativo).

Para Frankfurt, alguém que se limita aos desejos sem questioná-los, per-

manecendo em uma simples escolha de querer ou não realizá-los, estaria

nisso que salientamos acima de primeira ordem. Alguém que permanece

nesse estádio de desejo, Frankfurt diz que não poderia ser considerado co-

mo pessoa, pois mesmo havendo algum tipo de racionalidade em suas deci-

sões, não há uma avaliação sobre o próprio desejo, isto é, uma avaliação

sobre o que move o seu desejo. Já em um desejo de segunda ordem há uma

preocupação com o que move um determinado tipo de desejo, por isso

nesta segunda ordem aparece o conceito de vontade (volition). Deste mo-

do, um desejo de segunda ordem pode se tornar uma vontade de segunda

ordem, cujo cerne é a preocupação ou o cuidado com os conflitos que exis-

tem nos desejos. Eis o motivo de Frankfurt dizer que para uma pessoa ser

considerada humana ela precisa ter o discernimento do seu próprio desejo

como algo que se sabe como desejo naquilo pretende ser qualitativamente.

Apesar da tese forte de Frankfurt de chamar aqueles que permanecem

em desejos que ignoram os seus conflitos desejantes de wantons (que em

uma tradução imediata poderia ser dito em português como aqueles de

desejos indeterminados ou sem conflitos), tal termo pode nos ajudar a

compreender a estrutura do desejo na esfera do mercado de bens de luxo,

por exemplo. Digo isto não para concordar com as teses de Frankfurt

sobre o conceito de agente humano em contraponto a passividade dos

wantons, mas para compreender que, o quê está em jogo nas marcas é a

sua dimensão de realização de algo que em nossa temporalidade pós-

moderna não comporta mais: a ideia de sujeito moderno concentrado

em seu ato pensante sobre si e sobre o mundo. Este algo que chamei

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A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

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atenção refere-se à realização do corpo que quer ser não mais por meio

da sua autoexibição, mas através de algo que lhe traga uma marca para

ser mostrada no espaço público. Daí as bolsas Louis Vuitton serem tão

usadas, sejam originais ou não, pois apesar dessas terem virado algo

comum nos mais diferentes espaços, elas garantem uma marca ao corpo

daquelas(es) que as usam. Os objetos com o grife das marcam dão ao

corpo uma qualidade que não é mais intrínseco a ele mesmo. A contra-

dição de nossa época que valoriza a forma física é fazer com que tal valor

perca a sua importância quando se trata do uso das marcas. O objeto não

é mais o complemento do corpo, mas a expressão dele, da sua capacidade

de realizar o desejo que ele quer através de algo que lhe qualifica perante

os outros. É a marca que qualifica o corpo, que lhe confere uma forma

de reconhecimento do outro no espaço da convivência.

A estrutura do desejo que se realiza através das marcas se funda nessa

dimensão de garantir ao corpo algo que lhe dê distinção no espaço pú-

blico, sem ter que dá satisfação seja ao seu intelecto seja à sua existência

humana. A preocupação aqui não é fazer nenhum juízo moral ou político

sobre esse modo de ser do desejo em nossos dias, mas mostrar a neces-

sidade de interpreta-lo como forma de compreender os motivos que

fazem as marcas se preocuparem cada vez mais com a proteção de seus

produtos frente à Pirataria. Tal preocupação se encontra na necessidade

mesma de garantir esse algo, que salientamos acima, para o corpo como

forma de realização de si através de outra coisa que não ele próprio. As

marcas oferecem tal algo para os corpos e, por isso mesmo, não interessa

a elas verem profanados seus produtos pela pirataria.

Deste modo, a pirataria é o elemento corrosivo desse modelo de desejo

que se construiu em nossa era do hiperconsumo, principalmente, em sua

versão de luxo. Quanto mais os produtos de marcas de luxo vão se sofis-

ticando e ganhando status de coisas hiperespeciais para os corpos, maior

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Paulo Roberto Monteiro de Araujo

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a necessidade de se combater a pirataria. Temos assim a formação de um

mapa da nossa vida cultural pós-moderna cujo cerne está no modo como

o desejo se estruturou em nosso capitalismo atual. As marcas reconhecem

a estrutura desse desejo e sabem da sua importância para a manutenção

do consumo em níveis elevados. Daí os elos entre corpo, desejo, marca e

o contraponto destes, a pirataria. Sendo a pirataria o elemento corrosivo

das marcas ele pode ser o motor para alavancar uma discussão sobre a

estrutura do próprio desejo que se formou em nossa era.

É claro que as práticas da pirataria é uma forma de geração de capital em

que o respeito à autoria do outro não é considerado, no entanto o que

tais práticas nos dizem, pelo menos no nível do pensamento conceitual,

é que existe a busca pela diferenciação dos desejos daqueles que podem

consumir objetos especiais frente aos outros que não o podem fazer. Mas

não é só isso. O problema não está simplesmente no desejo de buscar a

diferenciação de classe social, essa busca já é evidente em nossa história

sócio-político-cultural, mas sim pela busca de algo que dê aos corpos uma

qualidade que está fora deles mesmos. Assim o desejo de alguém que pode

consumir marcas de luxo não está mais no corpo como elemento fun-

dador das vontades, mas sim no objeto fabricado em condições especiais,

isto é, não massificado.

O objeto passa ter valor intrínseco para a realização do desejo, pois é ele

que dá o tom e o vetor tanto para mim (para minha estrutura interna,

isto é, psíquica e existencial) como para a minha importância frente ao

outro sem que se precise provar qualquer tipo de qualidade pessoal:

cultura, formação educacional, caráter, sensibilidade, consciência política,

etc. O objeto fundado na marca faz uma espécie de milagre para a nossa

realização desejante de ser. A nossa identidade não precisa mais ser

desenvolvida ao longo da nossa vida pessoal, do nosso esforço de com-

preendermos o que estamos elaborando para nós mesmos. Não preci-

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A Questão do Consumo, Desejo e Pirataria

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samos mais fazer um interpretação daquilo que somos ou queremos ser.

O objeto nos lança fora daquilo que falamos acima, a partir de Heidegger,

sobre a necessidade existencial que temos de nos ocuparmos de nós

mesmos.

Para finalizar, cabe dizer mais uma vez que na presente análise sobre a

relação consumo e pirataria não elaboramos nenhum discurso contra o

desejo estruturado nas marcas ou ainda reducionismos conceituais a

respeito de tal desejo. A nossa pretensão foi fazer uma hermenêutica do

desejo no horizonte do consumo das marcas e o conflito destas em relação

à pirataria.

Referências bibliográficas

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La Centralidade del Simulacro en la SociedadContemporánea: Motivaciones para la Busqueda,

Compra e Uso de las Marcas Falsificadas1

CLOTILDE PEREZENEUS TRINDADE

SÉRGIO BAIRON

Introducción

La comprensión de cómo manejar las múltiples posibilidades de simu-

lación de materiales reales en las señales diarias de las relaciones de

consumo es una preocupación creciente en el contexto de la búsqueda

dela diferenciación asediado en la certeza de un mercado cada vezmás

difícil de ser distinto. La estrategia de falsificación es histórica, presen-

tado fenómenos de la piratería, de las copias de los más variados tipos,

las imitaciones, las réplicas de productos y marcas que se vuelcan a

las calles y se presentan enlas relaciones de consumo de cualquier ciudad

en cualquiera de los países capitalistas.

En el campo de la comunicación, las discusiones son amplias y variadas y

están relacionadas con la pérdida de negocio (en este caso en relación con

1. Texto originalmente escrito em espanhol para o XI Congresso Latino-Americanode Investigadores da Comunicação. Montevidéu. Universidad de Montevideo. 2012.Gt. Publicidade e Propaganda.

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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el departamento legal y las leyes de derechos de autor y propiedad inte-

lectual), la dilución de las inversiones (perspectivas financieras), la medi-

ción de las ganancias mal habidas (el subrayado es economía), empo-

brecido visual (estética), el engaño y el crimen (la policía y cuestio-

nes morales).

Sin embargo, nosotros creemos que hay caminos positivos atravesados

por imitación, según lo informado por Giacomini (2011, p. 217) “los

conceptos de estándares de mensajería, repetir la información, la

reintroducción de las situaciones de la vida y el consumo ...”, y reflexiones

sobre la naturaleza del ejercicio de la imitación humana en el aprendi-

zaje y el desarrollo.

De la comprensión del simulacro de Jean Baudrillard (1991) basada en la

certeza de que en la sociedad contemporánea ya no es un tiempo nece-

sariamente la existencia de la cosa representada, pero sólo la repre-

sentación – de ahí la prioridad del simulacro – trató de problematizar el

diálogo con investigadores que ayudan a la comprensión en profundidad

de la materia en diferentes regionalidades científicos.

En línea con la noción de precedencia del simulacro, Rocha (2005) en

su estudio del consumo nos llama la atención a las “representaciones de

consumo”, lo que sería el sentido común y la visión de los médios de la

cultura de masas, que tienden a clasificar el consumo de un sesgo

moralista, sobre todo como una actividad hedonista y responsable por

muchos males sociales, incluyendo lo que habría dado lugar a poca aten-

ción a esta área de estudio dentro de las ciencias sociales. Más reciente-

mente, el consumo también se le asigna el uso de los recursos naturales

en exceso de los problemas ambientales y diversas, al “calentamiento

global”. Sinembargo, como vimos en Miller (2002) no hay placer en la

rutina de compras de supermercado, por ejemplo. Mientras que otros

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La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...

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hábitos de consumo también están asociados con el placer de los otros,

como los presentes. Para Miller (2002), sin embargo, la actividad más

importante en la experiencia de compra, y llevar a casa lo que compra

(objeto del deseo), es la economía. Este factor es un tema muy debatido

y pone siempre a la vanguardia de las actitudes de compra. Es importante

destacar que la noción de la economía varía mucho de un consumidor a

otro. Por un lado, la economía puede significar sólo precios bajos,

mientras que otro puede pensar que la compra de un producto más caro,

pero es mejor que se estará ahorrando una vez que la durabilidad es la

derecha.

Por lo tanto, los compradores no necesitan tener ningún conocimiento

tomado de fuera de la experiencia de las compras. No hay necesidad de

recordar ninguna información de precios de entender y sentir que están

ahorrando. En este sentido, el hecho de que comprar un producto que

no es necesaria, pero que está en liquidación o en una promoción de

precio interesante puede ser caracterizado como una economía. Así se

ahorrará el gasto. Todo lo que necesita es tomar una decisión al

seleccionar y justificar que la elección por sí mismos cómo la economía

“era realmente una necesidad”. La cuestión de la economía se acerca al

enfoque del estudio del consumo como los precios bajos de los productos

piratas son la principal motivación que viene a la mente para justificar la

compra, sin embargo, la complejidad de las motivaciones es mucho

mayor, como veremos más adelante.

En otra dirección reflexiva, que está trayendo a las consideraciones acerca

de la copia en la perspectiva oriental. Esta inversión se justifica, pues

nunca se habló tanto de copias como en los últimos años y la profusión

de los medios de comunicación se relaciona con el fuerte crecimiento de

China en el ámbito internacional, no sólo el crecimiento económico,

sino simbólico, el crecimiento tal vez incluso más fuerte. Como principio

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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confussionista, la copia es la etapa inicial de la innovación para los

chinos. En consecuencia, creemos que tiene que copiar, repetir, imitar, a

continuación, aumentar el poder y así crear lo nuevo. Curso en contra

de la perspectiva occidental-capitalista que aumenta la propiedad y el

copyright (que incluye la propiedadintelectual) la creencia y la práctica

de la copia como la etapa inaugural de la innovación ha sacudido las

estructuras de comercialización y mental del occidente.

Después de la inmersión de más de seis meses en China, Canevacci (2011,

p. 19), en referencia al consumo en ese país, dice “... la falsificación ya

no es lo contrario de lo real o auténtica, es la hola que acelera el cambio

de estilos de vida y se propaga a una simple verdad sobre el estado

de cosas: falso es el verdadero-falso, una mezcla sincrética que disuelve las

distinciones dualistas clásico”. Lo que emerge es una integración de la

entonces “verdadero-falsodimensiones” en favor de otra “cosa”, mixta

y sincrético que el autor llama una falsificación: la disolución de las

fronteras. Y a medida que los productos chinos son en la vida cotidia-

na los mercados capitalistas occidentalesno hay manera de ocultar el

abrumador poder de los simulacros que perturban la lógica de la autoría

occidental.

Está claro que el último punto de vista, que aquí se presenta a principios

de las reflexiones de Canevacci (2011) es menos evidente en la investi-

gación científica y la comercialización, cuando nos referimos a la piratería,

la imitación. La inmersión antropológica, etnográfica en el universo del

consumo de estos productos y marcas, y la búsqueda de la comprensión

de las motivaciones humanas a la adhesión (compra, uso, posesión entre

otros rituales de consumo) la falsificación de productos y marcas es

siempre marginal. Pero en nuestra percepción esta és una explicación

simple del fenómeno.

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La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...

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Otra forma en que el tema estimula la reflexión es la relación entre la

estética y el consumo. La historicidad imbuida dentro del concepto de

la estética siempre ha estado involucrado en la concepción de sentido

común, y todo indica que los caminos de innovadoras ideas estéticas están

llegando, cada vez más, tal vez en homenaje al mantenimiento de las

tradiciones de sentido de la estética vanguardista común. Los fenómenos

de la reproducción están directamente relacionados con la relación entre

el sentido común y la estética. El kitsch es un fenómeno que siempre se

correlaciona con las reflexiones sobre la estética y el sentido común.

Baudrillard (2008, p. 141) afirma que “kitsch opone a la estética de la

belleza y originalidad de su estética de la simulación” en este sentido se

abre el punto de contacto entre el kitsch y el cliché, los lugares comunes

del habla cotidiana.

De otro modo el kitsch tambien puede ser comprendido como una

busqueda a la aspiración de la belleza. En este sentido la estética kitsch

se queda más próxima de las considerasiones de Canevacci (2011) sobre

lo “verdadero-falsodimensiones” a otra cosa: la copia, imitación en

productos falsificados.

Benjamin (1985) afirmó que la reproducción de obras de arte pierde su

aura, es decir, pierde su propia autenticidad, con la excepción de la

reproducción de la fotografía y el cine en el que la reproducibilidad es

inherente en estos tipos de (re) producción de arte, por lo tanto

admisible. Benjamin creó un aura de antagonismo entre el arte y el arte de

masas, permitiendo que el segundo tipo de arte, una posición progresista,

y explicó que el arte del aura había sido relegado al abandono. Al lado de

la industria cultural, el kitsch se basa en nuestros medios de comunicación

escritos diarios a través de las telenovelas, música, publicidad, moda. Por

otra parte, el kitsch es detectable en las estrategias de globalización como

una forma de “democratizar” la economía y la cultura y en ese sentido,

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podría ser más apropiado referirnos a la pasteurización. Las grabaciones de

re-éxitos de una época, con nuevas interpretaciones y ritmos musicales

pueden ser consideradas kitsch, así como fusiones de estilos, épocas y

ritmos que, cuando pierden sus características originales a través de fusiones

y aglutinaciones, contribuen a formar el kitsch. En el curso de la moda,

especialmente las prendas de vestir, está buscando la inspiración del pasado

para dictar las direcciones futuras, que calificó de “noticias” que formaba

parte de la temporada. Muchas nuevas colecciones se acompañan de

referencias a “vintage” y “retro” o “relectura”. La cultura de masas, inmersa

en la industria de la cultura puede convertirse en arquetipos los

estereotipos, las normas de la moda estandartizando a través de la repetición

de estos modelos para ser consumidos masivamente por la sociedad. De

este modo, el kitsch se podría definir como una panacea a la psicosocial

sustituir la auténtica naturaleza del objeto en un intento para tratar de

resolver una frustración social y psicológica de los individuos-

consumidores. ¿Quién no quiere tener un Picasso en su salón?Incluso

unaalmohadilla puede tener el mismo efecto. El hecho es que es un solo

intento y nunca una solución, sí, para resolver un problema psicosocial

más. Parece que esto no es lo que realmente importa quién hace uso del

kitsch. Lo importante es “mirar” y encontrar una respuesta viable a la

tensión, aunque la superficie. De este modo, el kitsch puede ser una manera

de ocultar, disfrazar, ocultar una alternativa a la frustración (el deseo

permanente y la satisfacción siempre parcial), Pérez (2004). Sin embargo,

el kitsch también tiene su lado positivo en la sociedad. Puede ser la solución

ideal a un problema social. Todas las transformaciones en los nuevos

productos y productos de embalaje son una manera completamente sana

con la reconstrucción simbólica de las dimensiones sociales nuevas.

Aquí se abren las discusiones sobre el reciclaje, la reutilización y la trans-

formación no es sólo un punto de vista económico y ambiental (reducción

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en el uso de materiales y residuos), sino también simbólica: una nueva

satisfacción simbólica y el crecimiento – la semiosis nuevo, pero ahora

tal vez, ilimitada (PEIRCE, 1977). En este sentido, sostiene Moles (2001,

p. 28-9) “kitsch es más una dirección que un objectivo”, y añade “hay

algo kitsch en la parte inferior de cada uno de nosotros” y por lo tanto

nos libera de juicio del gusto y su necesidad de explicaciones. Todavia,

la estética kitsch tambien posibilita cuestiones sobre procesos de sentido

de juicio de gusto en dos modos distintos: lo que podremos considerar

como kitsch de malo gusto y de bueno gusto.

La idea de que el evento popular como kitsch ya no existe como un

camino que todos llevamos dentro, también puede referirse a las

reflexiones de De Certeau (1997) en el lenguaje ordinario. Una de las

características más problemáticas del lenguaje ordinario haría que el

superlativo de la repetición de un acontecimiento frecuente. Su abandono

de la improvisación es condenado a la incredulidad por el cientificismo.

Sin embargo, debemos entender que esta caída es la falta de significado,

esta imposibilidad de apropiación de sentido, esta erosiva repetición,

”ocultar” su mayor fascinación. El consumo diario es la materialización de

esta descripción de la fascinación. Estamos haciendo todos los días, y sólo

más tarde esposible se dar cuenta de una pequeña parte de estas

acciones. En cierto modo, lo es ahora, que la experiencia estética actúa

para mantener la apertura a la reinterpretación continua. Una relectura

de la noción de signo semiótico se aplica al contexto cultural del consumo

y puede representar una forma muy interesante de la comprensión.

Muy rentables son las reflexiones de Peirce (1977) sobre temas de verda-

dero signo y el signo degenerado desde que las relaciones de impresión

diferentes en su capacidad de generar interpretantes posible. El término

“degenerado” se hace referencia a su significado en la geometría (Santaella,

1992, p. 82). En señal genuina o un símbolo, siempre hay tres dimen-

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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siones involucradas: signo, objeto y el interpretante. Las ideas típicas

asociadas a ella son: la terceridad, la cognición, el aprendizaje, la ley, la

generalización, el hábito, el crecimiento y la complejidad, entre otros.

Esta es la tierra de la semiosis infinita, ilimitada continuidad y evolución

del pensamiento. En este tipo de señal es, sin embargo, otros, como el

índice y el icono, que difiere de la naturaleza representativa del símbolo.

Cada uno de estos tipos de señal se considera como tener variaciones

sutiles, que son la degeneración interna. Así, cada una de ellas se clasifica

como una genuina naturaleza paralelo a dicho otro degenerado.

Mientras que el símbolo se corresponde con la idea de signo auténtico,

el índice se corresponde con la idea de la señal desde el degenerado. No

hay señales que es un índice, no es necesariamente involucrados dos

(signo-objeto), salvo que el tercero (intérprete) existe o no. Un signo

degenerado en lo más mínimo es un índice, que es un signo de su objeto,

cuya importancia se debe al hecho de que él tenía una relación genuina

con ese objeto, sin tener en cuenta el interpretante. Este es el caso, por

ejemplo, la exclamación “¡Eh!” Como indicativo de peligro inminente,

o un golpe en la puerta como un indicio de una visita (PEIRCE, 1977,

p.28). Las ideas asociadas con ella son las típicas: la alteridad, la acción,

la individualidad, la realidad existente, la contigüidad, otro atracón ... Esta

señal, a su vez, también tiene la degeneración interna.

El icono se corresponde con la idea de la señal dos veces degeneran. En

ella sólo hay un conjunto de elementos (el signo – en primer lugar),

mientras que los otros dos elementos (objeto – interpretante y el segundo

a tercero), planteó como posibles. En este sentido, un signo degenerado

en un grado más alto es un icono, que es un signo cuya virtud debe ser

significativa si, y sólo su calidad. Las ideas típicas asociadas con ella son

los de: primeridad, el sentimiento, la similitud, la individualidad, la opor-

tunidad, el azar, la libertad, entre otros. Una señal de que es un icono

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La Centralidade del Simulacro en la Sociedad Contemporánea: ...

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que ya tiene en sí misma el mayor grado posible de degeneración, sin

variaciones en el índice o como un símbolo.

En este sentido, las relaciones de similitud que hacen ver algo parecido a

algo que es a su vez deriva de los signos degenerados, ya que estas relacio-

nes son igualmente anclado en las cualidades de estos signos. La profusión

de signos en el universo delconsumo conectados sólo por sutiles relaciones

cualitativas son la esencia del uso de la producción-compra-venta de pro-

ductos piratas y marcas. En muchas situaciones similitud imitación de

productos viene dado por la forma o diseño, y el otro en tantos colores,

además de las aproximaciones de la semántica visual signos marcarios el

universo del lujo: Luis Viton (Louis Vuiton) Lacouste (Lacoste), Tomy

( Tommy), Doelce Gabbana (Dolce Gabbana) y muchos otros.

Como hemos visto, parece que lo único que justifica la existencia de las

sentencias y jurídico-moral (aumento de la producción y las reflexiones

publicidad en vehículos comerciales y académicos), con respecto a la copia

de la llamada o la piratería, se basa en nociones capitalista moderna

occidental y la autoría, y la copia hasta su tarjeta de identificación. En

las ciencias sociales, antropología, especialmente, perotambién en la

psicología y la semiótica, los procesos de imitación, copia, etc. Enfoque

es absolutamente natural y lo que resulta afectado es el efecto de sentido

generado y construido en el interpretadoras mentes de estas simulaciones.

El papel de la publicidad e de la moda en los cambios delconsumo

Baudrillard (1991) afirma que es ingenuo pensar que el discurso del

consumo y la búsqueda de una felicidad proporcionada sólo por los

objetos materiales es la explicacion totalizante para el fenómeno. Para el

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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autor, el proceso de consumo se puede analizar desde dos aspectos

principalmente: 1) Como un proceso de significación y de comunicación

(el consumo funciona aquí como un sistema de intercambio y un

equivalente en la lengua), 2) Cómo proceso de diferenciación de clasi-

ficación y social.

Siguiendo este pensamiento, el objeto, la cosa en sí, no se consume (busca,

compra, uso, almacenamiento ...) sobre la base de su valor de uso. Los

objetos actúan como signos que distinguen las personas socialmente. Por

lo tanto, las zapatillas que sirvem para proteger los pies mientras se ejecuta

como un elemento de comodidad, prestigio y diferenciación social.

Dentro de todo tipo de otros objetos pueden reemplazar el zapato como

un elemento significativo de prestigio, por ejemplo. Siguiendo esta lógica,

los objetos ya no están atados a una función específica o necesita

claramente definido. Siguiendo esta lógica, el consumo se utiliza como

un lenguaje como comunicación. Esto no quiere decir que los objetos

no tienen utilidad funcional, sino para entender que en la sociedad

contemporánea con el propósito de consumo no sólo en sí mismo (a que

se refiere Baudrillard, 1991). En este sentido, el movimiento, compra,

venta, propiedad de los bienes y objetos, signos y diferenciado a

ladisposición hoy en día es nuestra lengua y nuestro código, a través del

cual la sociedad fragmentada y compleja, se comunica, interactúa.

Para Baudrillard (1991) que el significado se pone facilitado por la

publicidad y la comunicación, que no transmite imágenes de vez en

cuando, pero los modos de relación y la percepción de que imponer

cambios en las estructuras familiares tradicionales y el grupo. Según él,

la publicidad se transforma el objeto en el evento, la construcción de ésta,

como tal, a través de la eliminación de sus características objetivas. Es un

objeto de la pseudo-caso de que se convertirá en el caso real de la vida

cotidiana mediante la unión al consumidor a su discurso.

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Aún en las formas de comunicación, Rocha (1995) afirma que para

entender la cultura contemporánea que se necesita para dar a conocer

los contenidos transmitidos por los medios de comunicación. Según el

autor, el mundo dentro de la industria cultural es fascinante. Hay miles

de mensajes que llegan e interactuar con la gente, creando una formidable

máquina de la sociedad imaginaria. Rocha (1995) afirma que en este

mundo interior de la comunicación puede unir a las diferentes cosas que

no serían posibles en la vida real, puede crear un hechizo que une a las

cosas por lo que el éxito y los cigarrillos, la ecología y la vivienda, que

data y pasta de dientes, omás recientemente, el tránsito, seguro de auto

y de la vida más agradable. Por lo tanto, el consumo de estos productos

se asocia con un placer muy gratificante, una clasificación entre los grupos,

castas, tribus y por lo tanto diferenciar entre estos diferentes grupos de

consumidores.

En sus teorías sobre la cultura de consumo, Featherstone (1995) reconoce

que la expansión capitalista dio lugar a una vasta acumulación de la cultura

material en forma de bienes o la adquisición y el consumo local, lo que

hizo necesaria la creaciónde nuevos mercados y “educar” a los consu-

midores a ser nuevas audiencias, tanto sea necesario utilizar mecanismos

más fuertes de la seducción y la manipulación. Sin embargo, para el autor,

otra empresa ha utilizado tanto para marcar los productos como las

relaciones sociales actuales. No sería una economía de prestigio y posición

social, en el que los bienes escasos, que requieren una mayor inversión

en tiempo y dinero, se utilizan para que el individuo que pertenece a las

características de transferencia de ustedes y propiedades, la formación de

hábitos y de las identidades. Las preferencias y estilos de vida identifican

a juicio de la persona de gusto, haceindolo susceptible de clasificar y

ordenarse. Por esta razón, las clases sociales más bajas buscan los

productos adquiridos por las clases altas, que siempre buscan nuevos

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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productos, objetos de deseo y de la moda con el fin de restablecer la

distancia social original, produciendo una búsqueda sin fin.

Feartherstone (1995) también cree que la imaginería de la cultura de

consumo que se celebra a través de un mundo de sueños, imágenes y

placeres, que son objetivados y se mide por los grandes centros de

consumo, tales como centros comerciales, grandes almacenes y los par-

ques temáticos, lugares que producen estos placeres estéticos y físicos,

donde están expuestos a la abundancia y el lujo a un montón de

glamour. En este escenario, los medios de comunicación y la publicidad

celebran que la vida debía ser vivida: “la vida es ahora” como dice la

Campaña de tarjetas de la marca Visa de crédito), los placeres de ser

sentimiento experimentado y bueno para ser fieltro, y que esto es todo

lo posible a través del consumo.

Sin embargo, el gran aporte de Featherstone (1995) consiste en relacionar

la cultura de los consumidores con el postmodernismo, que de acuerdo

a los cambios promovidos autor que pueden ser entendidas en términos

de campos artísticos, intelectuales, académicos y también en el ámbito

cultural que implican los modos de producción, consumo y circulación

de bienes y servicios y los cambios en las prácticas cotidianas y

experiencias general.

Para Di Nallo (1999), en la sociedad contemporánea estas nuevas

prácticas y experiencias,agregado para aumentar las posibilidades y la

reducción paralela de la regulación social, el sujeto experimenta una

condición sin precedentes de autonomía. Para la autora,previamente

sujeto que pertenece a un grupo de referencia, basado en la posicióndentro

del modelo de estratificación social, un hecho que influyó en su estilo

de vida ysu comportamiento de consumo constante y consistente. Sin

embargo, esto no se aplica em la sociedad moderna, en la que los

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consumidores son muy variados dentro de un hombre y no el sujeto

contemporáneo, el tema de la identidad cambiante y contradictorio, el

tema para que el nuevo descubrimiento se convierte en una necesidad. Por

lo tanto, una persona que está tomando los hábitos de consumo,

relacionado con un estilo de vida puede tomar ciertas futuro comple-

tamente diferente e incluso contradictoria.Hoy en día, la gente quiere

sentirse diferente, desean mostrarse como única. La lata nuevo se desea

y, sobre todo, se valora.

En este nuevo contexto, el consumidor de la patina (MCCRAKEN, 2003),

que le da importancia al ciclo de vida de la tradición y el poder de los

objetos más de la familia de las generaciones, y se convierte en “moda”. De

acuerdo con Lipovetsky (1989) la “moda” es un dispositivo para generar

el juicio social y estético que se conecta con el placer de ver y ser

visto. También es un sistema de regulación y la presión social, los cambios

tienen un carácter vergonzoso, van acompañadas de la obligación de

cambiar de adopción. Debe ser un entorno social determinado, sin

perjuicio de las sanciones (la risa, la desaprobación, etc.). En caso de no

aprobación. Por otra parte, la “moda” se extiende aún más por el deseo

de las personas que se parecen a los que se consideran superiores y, sobre

todo, con ella, el individuo gana el derecho de mostrar un gusto personal,

de innovar, ser originales despertar el deseo de nuevas necesidades, nuevos

bienes y servicios, la reorganización de producción y consumo de

masas. El culto de “moda” los productos despadroniza, la oportunidad

de ampliar las opciones, promueve la renovación acelerada de los bienes,

ya que hoy es “de moda” probablemente no será de seis meses a partir de

ahora.

Otro autor también señala que los cambios culturales con el fin de

dilucidar el comportamiento de losconsumidorespós-modernos es

Campbell (2000). El autor presenta la idea de que hubiera sido una

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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revolución en el comportamiento del consumidor antes de la Revolución

Industrial. Contrariamente a la impresión común, Campbell (2000)

muestra que las industrias relacionadas con la Revolución Industrial

fueron para producir más bienes de consumo que el capital y dominó la

producción de bienes para el consumo de artículos de lujo, es decir, los

elementos que no eran necesarios. Para el autor, de hecho, fue el aumento

de la demanda de los consumidores que se inició el crecimiento

económico y la acción se justifica en la adopción de nuevos valores

culturales, lo que permitió el aumento del consumo. Según Campbell

(2000) los cambios en los hábitos de consumo y los procesos se basaron

en nuevos valores y actitudes éticas y morales que a su vez estimuló un

cambio de hedonismo, el ascetismo, dando lugar a nuevos sentimientos

y el gusto por la lectura, para el romance, el ocio por la producción

cultural en general. Aunque en un principio ha habido una oposición

moral, estos nuevos valores para justificar los beneficios del lujo y el

consumo. La gente viene a ver de esta forma una manera de expresar su

esencia individual y estimular el amor por la familia.

En vista de Campbell (2000) las personas están fuertemente influenciadas

por las emociones que se encuentran dentro de sí mismos. Es decir, los

individuos usan sus poderes imaginativos y creativos para la construcción

de imágenes mentales que consumen el placer intrínseco que ofrecen,

una práctica que el autor describe cómo soñar despierto o fantasear. En

este hedonismo moderno y libre ilusoria-, el individuo es un artista de

imaginación, alguien que toma imágenes de la memoria y se apropia de

estas formas muy agradable. Estas sensaciones placenteras alterar

radicalmente el diseño del lugar de placer y el consumo en la vida real

del individuo. En este sentido, un nuevo producto, conocido por los

consumidores, puede generar la imaginación de diferentes, por lo que es

una ocasión para crear mundos de fantasía posibles. La actividad central

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del consumo se convierte, por tanto, no la selección y compra del

producto, pero la búsqueda del placer proporciona mercancía

imaginativa.

Esta sería la razón por la cual muchos consumidores se preguntan frente

a las ventanas con una determinada pieza de ropa, o preguntándose qué

tan bien una caída de móvil en la decoración del hogar. Por lo tanto, cada

producto nuevo disponible es la posibilidad de alcanzar un sueño que el

consumidor tiene en su imaginación, sin embargo, como en la realidad

de los placeres que no son tan reales como la idealizada, cada compra lleva

a la desilusión y la búsqueda frenética del otro producto que puede

satisfacer sus deseos.

Para Campbell (2000), sólo así se puede entender la insaciabilidad del

consumidor posmoderno. En este sentido, la publicidad es el motor que

hace que esta insaciabilidad púlsar, como ella misma dice que la

supervivencia y dispersión (“La solución de la innovación definitiva a los

problemas”), por lo que días más tarde muestra el nuevo, totalmente

esquiva.

Finalmente, en una manera general, los autores presentan la actividad de

consumo como unla práctica impregnada de significados diversos y

distintos en el espacio y un tiempo diferentes, que son creadas y recreadas

por los individuos de acuerdo a las categorías y los contextos culturales en

que viven. Por lo tanto, es necesario pensar en el uso como una actividad

gobernada no sólo por la variable de carácter económico, sino también

simbólicamente. Esta perspectiva es aún más intensa cuando nos referimos

a los productos piratas del consumo. También debido a esta complejidad

es que entendemos la urgencia de la investigación de los consumidores

mirando a la investigación empírica, sin la cual puede ser empalidecidos

y carente de la vitalidad que las relaciones de este tipo de consumo.

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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Como hemos visto, existen diversos enfoques y componentes utilizados

para tratar de explicar el consumo y la influencia que la publicidad puede

tener en estas relaciones. En sólo un pequeño número de las obras

analizadas son diversas explicaciones y teorías destinadas a las posibles

razones para los comportamientos y las actitudes de los consumidores. No

es el lugar para discutir lo que las teorías son más correcto, si no es más

correcta que otra, pero estas explicaciones absorberlos y utilizarlos como

soporte teórico para tratar de entender el comportamiento de las personas

que formaban parte de la investigación empírica. Todo el material ante-

rior es de gran valor para ayudar a comprender los fenómenos típicos de

las corrientes en la sociedad de consumo en que vivimos, y, posterior-

mente, para confrontarlos con los acontecimientos y las costumbres

observadas en el trabajo de campo que se propone llevar a cabo y detalle

a continuación.

La inmersión en el “real”: consideraciones metodológicas

En el presente estudio se adoptó la perspectiva de la interpretación porque

críamos ser la más adecuada para la aproximación etnográfica que hemos

utilizado. En esta investigación, cualitativo y exploratorio, a través de

entrevistas en profundidad y observación participante se llevó a cabo una

investigación sobre el universo del consumo de productos falsificados o

pirateados. Las entrevistas en profundidad se llevaron a cabo con los

consumidores y vendedores de productos falsificados y de marcas en los

espacios de comercialización en las calles, galerías y tiendas en la ciudad

de Sao Paulo, Río de Janeiro, Brasilia y Ciudad de México, además de la

observación de la observación y los participantes de los diferentes rituales

de consumo de estos productos y marcas en diferentes momentos de los

años 2010 y 2011. Estas encuestas son parte del proyecto de investigación

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“Verdadero y Falso: El consumo de la piratería” Levada a cabo por El

Grupo de Estudios Semióticos en Comunicación, Cultura y Consumo

– GESC3, de la Universidad de São Paulo.Es importante aclarar que en

este momento haremos una presentación sintesis de nuestra metodologia

de trabajo empírico.

La realización de entrevistas con los consumidores se vio impulsado por

una línea abierta, que incluye los principales temas, más allá de la

caracterización inicial de la parte demandada: 1) ¿Se consumía ya (o si

usted está consumiendo) algún tipo de producto pirata? 2) ¿Con qué

frecuencia consume este tipo de producto? 3) ¿Qué tipos de productos

piratas son más consumidos? 4) ¿ Cual es la intención de compra? 5)

¿Quien consume el producto pirata y no el original, si tuviera las con-

diciones para la compra financiera sólo productos originales? 7) ¿La gente

hace comentarios a otras personas manifestando queestán usando un

producto pirata? 8) O la gente tiene miedo de dejar que descubran que

está usando un producto pirateado o falsificado? En esta secuencia de

comandos a los entrevistadores tenían libertad para adaptar las preguntas

de acuerdo a las necesidades y la situación de consumo de presentified

durante la entrevista.

El tratamiento e interpretación de los datos fue realizada mediante la

combinación de hechos ysituaciones, y en ese sentido, los fotoetnografias

de gran ayuda, estableciendo así un conjunto de relaciones que ayudaron

a describir el análisis de grupo, y las similitudes y diferencias en el informe

comportamientos identificados, así como la conciliación de las respuestas

y los comportamientos observados.

De acuerdo con Barbosa (2003) permite el uso de la etnografía para

estudiar el comportamiento de un grupo en el “interior” y busca el

conocimiento del punto de vista de otro. La propósito de utilizar una

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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aproximación de este método en este estudio es la posibilidad de crear

un contacto sinérgico con los consumidores de productos piratas,

interactuar con ellos y buscar una interpretación que nos pueda ayudar,

a pesar de toda la complejidad, para describir su comportamiento de

consumo densamente. Describir significa densamente revelan los valores

que están detrás de los actos cometidos por estos individuos, a

continuación, establecer una correspondencia y tal vez incluso una

jerarquía de estructuras significativas en términos de actitudes que se

producen, perciben e interpretan (GEERTZ, 1978).

Las limitaciones del método son debidos al hecho de que a pesar de ser

una condición fundamental para una descripción densa del grupo, es

todavía una interpretación subjetiva aspecto polémico para los que creen

en la idealización de rigor científico en disciplinas sociales. Por último,

otra limitación de la etnografía es acerca de los intentos degeneralización

de los resultados de la investigación. La especificidad no puede ser

considerado como genérico, sobre todo cuando se trata de algo tan

complejo como el consumo y un mayor consumo de productos

piratas. Tal como señala Geertz (1978, p.35), “cualquier persona puede

alcanzar la generalidad que surge de la delicadeza de sus distinciones no,

la amplitud de sus generalizaciones.”

Los resultados, que aquí seron discutidos en sus aspectos generales de la

encuesta, muestran una comprensión de los matices que explican las

diferentes posibilidades de simulación y sus poderes de significado en las

relaciones sociales cotidianas. También apuntan a la complejidad de las

motivaciones a la búsqueda, compra, uso y posesión de productos

falsificados y marcas, poniendo “en jaque” los vínculos financieros sólo

como una explicación de estos movimientos y comportamientos.

Además, era posible entender el papel de la publicidad en estas relaciones

que en realidad no es una prioridad dentro de la compleja red de

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relaciones e influencias. Por lo tanto, comenzamos el análisis de la

información.

La sistematización de los resultados

Basándose en las reflexiones teóricas interdisciplinario de Baudrillard

(1991, 2008), Moles (2001), Benjamín (1985), Canevacci (2008, 2011),

Peirce (1977), además de discutir la centralidad del consumo en la vida

contemporánea por médio de Lipovetsky (2005), Featherstone

(1995), Geertz (1978) y los métodos cualitativos basados en la inmersión

en las entrevistas etnográficas, las photoethnografias, que era posible

construir una comprensión más profunda de las relaciones que están

involucrados en el consumo de los piratas, que ha permitido a la

comprensión sistemática de las raíces en el que se basan en las

motivaciones de consumo y el papel de la publicidad en cuestión.

Tomamos nota de que las motivaciones son muy variadas y el consumo

de los piratas son muy variables. Por lo tanto, para que estén mejor

presente y asimilarlas, se agruparon en: a) la aprobación del espacio, b)

la forma obligatoria, c) la estética, d) el precio y el sentio de economia e

e) flexibilidad. Vamos a la comprensión de cada una de esas dimensiones.

La aprobación del espacio: mucha gente compra productos falsificados

sin tener la menor idea de que, de hecho, son cada vez copias, imitaciones,

signos degenerados que mantienen similitudes cualitativas con el “origi-

nal”. Frases como “Si estás aquí es porque está de moda”, gritó uno de

los entrevistados, ya que revelan la capacidad del lugar de la legiti-

midad. El área de compras de la escena es la aprobación, el lugar de venta

representa la importancia del objeto material como el portador de esas

capacidades que dan a la posición distintiva.

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Clotilde Perez, Eneus Trindade e Sérgio Bairon

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El imperativo de la moda: La legitimidad de la zona se sigue el imperativo

de la moda y está de moda es porque es bueno. A través de la aquisición

y el uso objeto de burla de que lo que está en juego no es realmente una

simulación, pero el verdadero poder que tiene el objeto de poner a la gente

en la multitud de la moda, que en esencia representa la amplia aceptación

social y para el reconocimiento. El movimiento de “moda” no es la razón

por la simulación. Aquí destacamos el papel de los medios de

comunicación en la materialización de la moda. Las telenovelas se

destacaron en esta perspectiva, en este caso, la adhesión de los productos

y marcas por parte de personas de proyección de gran evidencia midiática

y la identificación de las masas con estas. Al mismo tiempo, también el

papel de la publicidad ha puesto en destaque una vez que pone de

manifiesto las preferencias, opciones y nuevos.

La estética: la belleza y el gusto son determinantes independientes de la

elección de la naturaleza “original” o “copia” del producto / marca. ”Me

voy a comprar porque es muy hermosa”, afirma uno de los entrevistados.

“Me encanta la combinación de color rosa con rojo”, el comprador de

una camisa rosa con el logotipo de Diesel en rojo (imitación). Lo que

estaba en cuestión fue no comprar una camisa que imitaba la casa de moda

italiana Diesel, pero el sabor, la manifestación estética “es hermoso”.

El precio y el sentido de la economía: la accesibilidad (entendida aquí

en las perspectivas financieras) es, sin duda, una gran motivación para la

compra de productos piratas imitados. Al unísono se puede ver la

satisfacción y la sensación de poder que está en la base de la compra.

Compra de energía (incluyendo el pago) es, sin duda, una alegría extraor-

dinaria, sobre todo teniendo en cuenta que la sociedad post-moderna se

basa en el paradigma de consumo. Absolutamente coherente con las

reflexiones de Miller (1992) sobre la economía y la sensación de placer

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que se dio, está claro que la compra de productos y marcas que le permiten

ser la satisfacción económica y abarca la situación de la compra de un

aura especial.

Para los consumidores, aunque el consumo de la piratería también sirve

como una forma de protesta contra los altos precios cobrados por los

productos originales, es, sobre todo, visto como una ventaja, al menos

en el corto plazo.

Flexibilidad: es la satisfacción de las personas famosas mujeres con

respecto a las múltiples posibilidades de adquirir el producto. Los

vendedores siempre están abiertos a ofrece a sus clientes y “hacer todo lo

posible” para evitar perder la venta. Es la actitud habitual de buscar el

producto con otro proveedor si no está ya disponible en este mo-

mento. Asimismo, el orden es una práctica de rutina. “Espere un rato voy

a ententar con mi amigo, él tiene marrón” (hablando de un vendedor a

la pregunta que el cliente percibe la ausencia de un color entre los

productos en exhibición). Ciertamente, la conveniencia. La flexibilidad

también se manifiesta en diferentes formas de pago. Más evidente en los

mercados populares, la mediación de dinero a cambio / compra se susti-

tuye por otras formas de pago tales como el intercambio de productos,

vales de transporte, pase de autobús, o otros recursos que se convierten

en medios monetarios.

En esta perspectiva, tanto la flexibilidad necesaria para conseguir lo que

quieres que se tenga que buscar a través de múltiples ventas ofrece también

asociado a la opción de pago flexible crea un contexto muy favorable para

las relaciones de consumo que tienen lugar en los mercados populares.

Así que cuando se analiza la influencia de la publicidad en las relaciones

de consumo es pirata notorio su influencia indirecta, a través de su papel

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decisivo en la construcción de universos compartidos de sabor, sin

embargo, no es tan directa que la publicidad fomenta el consumo de los

productos piratas. Las comunicaciones de marketing tradicionales, en los

que podemos incluir anuncios en diferentes medios (revistas, periódicos,

TV, Internet, etc.) Son marginales en el mercado pirata. Sin embargo,

la fuerza de la comunicación “boca-a-boca”, y grupos de influencia es

decisiva. También es evidente poder simbólico de la televisión en la

construcción de universo referencial de personas. Aquí destacamos

fuertemente la influencia de la telenovela popular para el consumo. La

imitación de ídolos y de las celebridades es un comportamiento percibido.

Consideraciones finales

Despues de este percurso teórico-empírico nos quedo más evidente que

el consumo de las falsificaciones es certamiente,una de las facetas más

complejas dentre las múltiplas posibilidades del consumo contempo-

ráneo. Sin embargo la más grande contribución está en la constatación

de que la busqueda, la compra, el uso y posesión de los productos

falsificados sufren fuertes influencias culturales alcanzadas por los médios

principalmente en los sectores de lamoda, de belleza y de tecnología y

por las intensas relaciones sociales involucradas en este proceso, como la

gran flexibilidad durante la compra, la comodidad y conveniencia de los

procesos de compra e venta, que apuntam para las posibilidades de la

adehesión, la resistencia y la negociación, como percibe Hall (2003) ao

estudiar los sentidos das práticas de apropiación culturales en las culturas

populares.

Frente a este aspecto tenemos que asegurar que la explicación monetária

de bajo precio non puede ser la explicación única del consumo pirata.

Hay en este fenómeno la busqueda de inclusión social por las acciones

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de consumo, añadido de una actualización permanente frente al deseo

de estar en conjunción con los valores post-modernos de que habla

Feathestone. ¿Pero, hasta que punto esto es legitimo y beneficioso para

la evolución social del mundo capitalista actual? ¿Um otro modo de

organización se manifesta en la sociedad por medio del consumo? Aún

no tenemos las respuestas para estas cuestiones, pero nuestro trabajo

empeza a ponerlas en discusión.

Como también percibimos um valor sentido estético lleno de jucio de

gustoen sentido comum que posibilita una sensación legitima en términos

simbólicos sobre la compra, uso y posesión de los productos falsificados,

que no tiene en muchos casos, nada que ver con las cuestiones de

similitud de estes productos/marcas con sus originales. Cuando hay esta

preocupación con la semejanza el valor de las marcas originales y de su

universo comunicativo se transfiere para los productos piratas. En este

sentido la comunicación funcciona como estimulante indirecto ao deseo

de consumo de los productos falsificados. Creemos entonces que el

camino es seguir las investigaciones buscando comprender los sentidos

do “verdadero-falso dimensiones” de los productos falsificados como

Canevacci ha puesto. Aquí hemos hecho una primera mirada sobre este

tema que configura su importancia social.

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79

Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia,Aprendizagem, Inovação

LAWRENCE CHUNG KOO

Queremos descrever por meio deste capítulo os conceitos orientais

sobre o que significa cópia, eles são derivados principalmente das raízes

chinesas e muitas vezes são interpretados de forma equivocadas para aque-

les que possuem cultura primordialmente ocidental.

Um dos problemas mais relevantes na sociedade de consumo é a violação

das patentes, pirataria e práticas similares, segundo a visão de muitos, prin-

cipalmente economistas e gestores, que calculam as perdas financeiras

decorrentes de tais infrações. O que queremos endereçar neste capítulo

é resultado parcial da pesquisa sobre Pirataria conduzida pelo Grupo de

Pesquisa GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação,

Cultura e Consumo, que abordou o tema exaustivamente e por meio de

abordagens interdisciplinares.

Aproximação: como eu aprendi a caligrafia

Quando fui “alfabetizado” na China, uma das minhas tarefas diárias

consistia em escrever os caracteres chineses, que é uma operação altamente

complicada para um menino de seis anos. Imaginemos que eu teria que

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Lawrence Chung Koo

80

escrever algo como uma palavra “cavalo” em ideograma chinês, que tem

o seguinte aspecto . Certamente era algo muito difícil para uma

criança colocar os traços exatamente no espacejamento dentro da estética

requerida. Uma das técnicas mais utilizadas era colocar um papel vegetal

ou similar, sobre o livro texto (já era impresso e encadernado para essa

finalidade) onde reproduzíamos a letra no papel translúcido seguindo a

sequência ordenada de traços previamente determinada, inúmeras vezes,

até que a mecânica da sequência e o desenho resultante fossem inter-

nalizados. As figuras deixadas no papel vegetal eram um desenho piorado

do livro texto, mas o processo nos treinava para a obtenção das nossas

habilidades reforçando a mecânica necessária para escrever. Depois desse

treinamento, começamos a escrever sem a “cola”. A partir desse momento,

nós começamos a desenvolver a nossa própria caligrafia. Alguns dos alunos

conseguiam ter escritos que demonstravam claramente a sua persona-

lidade e a beleza artística nos textos, que na cultura chinesa é considerada

obra de arte.

O labutar nas tarefas escolares, quando é criado a disciplina e a diligência,

faz parte da cultura confucionista da China, onde valoriza-se o respeito,

a honra, o resultado pelo trabalho e a educação, portanto, praticar manus-

critos copiando ideogramas para aprender é parte dos conceitos básicos

do povo chinês.

Inegavelmente, essa atividade sistemática de repetição faz parte da

dinâmica do processo de aprendizagem do oriente. Somos instados a

primeiro imitar para depois criar. Para a cultura chinesa, essa cópia faz

parte do processo natural de aprendizagem, e as primeiras impressões vem

dos modelos de referência, portanto, sempre queremos usar as melhores

caligrafias, de pessoas famosas, pois quanto melhor forem os modelos na

fase de iniciação, com mais qualidade e rapidez obteremos na nossa

formação.

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Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação

81

Cabe aqui elaborarmos mais detalhadamente o que entendemos por

modelos de referência. Um modelo é necessariamente associado a um

conceito abstrato, ele é materializado por meio de uma representação,

por exemplo, um logo, uma cor, contudo ele carrega uma ideia de

excelência, algo especial, são valores intangíveis mas são representáveis.

O que atribui o valor ao modelo não está necessariamente no que vemos,

mas no que não vemos. Quando esse modelo se torna líder na nossa

mente, ele se transforma em referência para nós. Todos querem copiar o

modelo de referência, mas no início nós copiamos a representação, e

quando copiamos exaustivamente várias representações, um dia, com-

preenderemos melhor o intangível, se exercitarmos corretamente o que

compreendemos podemos nos tornar em um novo modelo de referência,

porque agora já podemos ser diferentes. Copiamos para ser diferentes e

não ser igual. Aliás, o sonho de toda marca é ser a marca de referência,

portanto ela está intrinsecamente se candidatando para ser copiada,

ironicamente isso passa a ser o seu maior problema, a partir desse mo-

mento ela passa a não permitir que seja copiada, é o paradoxo da cópia.

Diferenciando os vários aspectos da Pirataria

No nosso grupo de estudos listamos várias palavras chave que compõe o

repertório das áreas que vivenciam, estudam ou problematizam a pirataria.

Conceitos como falso, cópia, réplica, genérico etc., são exemplos que

integram o glossário da pesquisa, que foi formado com o objetivo de

compartilhar de um vocabulário comum entre todos os pesquisadores.

Gostaria ressaltar o conceito”cópia” dentre desse cenário. Ela diferencia

do falso, ou réplica. Quando nos deparamos com um produto falsificado,

que em geral carrega uma marca famosa, cara, muitas vezes do mercado

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Lawrence Chung Koo

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de luxo, conhecida e valorizada pelo consumidor, como por exemplo,

canetas Mont Blanc, e nos deparamos com outro produto que estampa

a marca, mas que não é fabricado ou licenciado pela empresa detentora

da marca, estamos diante do conceito clássico de pirataria. Há aqui

nitidamente a usurpação do valor da marca construído ao longo de anos

e com altos investimentos por parte da detentora da marca MontBlanc.

Queremos nos ater principalmente nos âmbitos da perspectiva da cópia,

seja ela a cópia de um produto físico, como a cópia de um processo de

fabricação, ou mesmo a cópia de um comportamento.

Cópia ou Imitação?Na cultural oriental, a cópia é parte do conceito de

imitação, que em tese é positivo e deve ser plenamente exercitado.

Podemos resgatar esta ideia desde tempos bíblicos e nas culturas gregas,

chinesas etc.. Queremos introduzir a prática de aprendizagem por meio

do discipulado, praticado pela cultura helenista, judaica, chinesa

etc.(KAUNG, 1976). O aprendiz deve absorver o conhecimento do seu

mestre por meio da convivência e adquirir com o tempo a sua forma de

agir. Por exemplo, para aprender a ser um sapateiro, ele deve saber como

criar o gado, como abater o animal, a forma de curtir o couro, assim por

diante, até o momento de cortar o couro e, finalmente, confeccionar o

sapato e levá-lo até o mercado e comercializar. Para tanto, ele se muda

para a casa do seu mestre, imitando-o em todos os aspectos da sua vida

até ser formado. A partir desse momento ele deixa de ser um aprendiz

para ser um profissional. Como um profissional ele pode criar, inovar e

produzir artigos diferentes do seu mestre inserindo a sua própria perso-

nalidade. A partir desse momento os produtos gerados não serão mais

cópias, e sim originais, pois a imitação do processo de produção passou

a ser agregada à própria pessoa, integrante da essência do novo profis-

sional. Podemos diferenciar que, em geral, copiar é um ato mais mecâ-

nico, e imitar é tentar ser o modelo a que se quer perseguir. Portanto, no

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Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação

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Oriente, a imitação é um passo necessário para se criar e, culturalmente

apreciado e bem-vindo.

Relembrando o histórico dos produtos japoneses

Para aqueles que vivenciaram a invasão dos japoneses, desta vez, não por

meio do bombardeio a Pearl Harbor, mas da diversidade de produtos

baratos, de qualidade questionável, produzidos sem muito cuidado...,

experimentou a construção da fama de que o Japão era uma nação que

produzia artigos “copiados” e ruins. Ao olharmos para esse cenário não

podemos esquecer que em primeiro lugar, o Japão tomou a decisão de

copiar das outras nações várias práticas que eram consideradas interessan-

tes, adaptando para suas condições, por exemplo, nos esportes, com

destaque para o baseball, que passou a ser um dos principais esportes

nacionais (CHRISTENSEN, 1996). Constatamos que ao fazer isso, os

japoneses conseguiram não apenas ampliar seus conhecimentos sobre

diversos produtos, mas também praticar o que hoje chamamos de enge-

nharia reversa, com ganhos sobre todo o ciclo de produção.

Atualmente, as gerações X e Y, que não vivenciaram esses momentos da

história do Japão, reconhecem os produtos japoneses como sendo de alta

qualidade, inovadores e criativos.

Revolução Industrial Japonesa

Devemos relatar que essa mudança da qualidade dos produtos japoneses

não aconteceu por acaso, ela aconteceu de forma planejada desde a Era

Meiji,1 quando o Imperador Meiji entendeu que para sair do papel

1. Era Meiji http://pt.wikipedia.org/wiki/Era_Meiji

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Lawrence Chung Koo

84

subalterno em que o país se encontrava, como um importador de quase

todos os tipos de produtos manufaturados, haveria a necessidade do

fortalecimento da indústria local. Foram contratados mais de três mil

estrangeiros para que fosse possível treinar e transferir know-how para a

economia local, em especial, para a área industrial.

Podemos afirmar que desde aquela época, começou o processo de

aprendizagem por meio de imitação dos modelos industriais ocidentais

e, aperfeiçoamento dos mesmos, evitando os erros que identificavam na

transferência de conhecimento. Esse movimento datado antes do século

20, segundo o artigo publicado na The North American Review em 1900,

então pelo primeiro ministro do Japão (OKUMA, 1900 ?), já nos indicava

o processo de aprendizagem e do planejamento estratégico do Japão.

O modelo foi desenvolvido inicialmente com reprodução industrial de

produtos simples, com uso de fósforo, evoluindo para produtos tecnoló-

gicos e de infraestrutura, sendo que hoje o Japão constitui-se em um dos

países com forte presença em siderurgia, sem ser produtor de minério

de ferro. De acordo com NOSOTRO,3 o Japão observou e emprestou as

melhores tecnologias da Europa, porém conseguiu evitar seus erros, sendo

portanto, mais eficiente. Começou-se com o aprendizado em copiar,

imitar, produzir, aperfeiçoar, pesquisar, inovar e, atualmente, em liderar

e, com isso, também ser copiado.

2. NOSOTRO, R., The Industrial Revolution in Europe and Japan, Compare the

process the of industrialization in Europe and Asia with a focus on England and Japan.Disponível em: <http://www.hyperhistory.net/apwh/essays/comp/cw21industrial-revolution-europe-japan.htm>

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Uma Visão Milenar da Pirataria: Cópia, Aprendizagem, Inovação

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Modernização na China

Analisando o processo de modernização da China, temos que comparar

as duas “Chinas” que para muitos pode passar despercebida, a China

propriamente dita e Taiwan. Em seu artigo Tzeng (2005), relata com

bastante clareza o que ocorreu historicamente em termos de desenvolvi-

mento, como pode ser observado na figura 1, a seguir.

Lembremos que embora a China seja um país comunista, o direcio-

namento econômico dado pelo Partido Comunista não foi sempre o

mesmo: esteve sob duas abordagens culturais diferentes. Durante a

condução do Mao Tse Tung, houve uma rejeição à orientação educa-

cional e cultural de Confúcio que descrevemos anteriormente de forma

resumida.

Fig 1. Mudança cultural concebida pelo Deng Xiaoping (TZENG, 2005)

Comparando com o que ocorreu em Taiwan sob regime de Kuomintang

(KMT) ou China Nacionalista que ao identificar que o regime do Mao

estava deixando a cultura milenar para trás, apressou em enfatizar os

valores, em primeiro lugar para efeito de preservação da história, e em

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Lawrence Chung Koo

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segundo lugar, como forma de aprendizagem e alavancagem tecnológica

e modernização. Sem dúvida, esse movimento foi totalmente acertado,

pois embora Taiwan não tenha um papel político tão relevante quanto a

China Continental, as suas indústrias de alta tecnologia são reconhecidas

mundialmente. O país tem um dos melhores índices de IDH (não é

classificado, mas é contabilizado em 0,932 o que equivale a 8o. lugar no

mundo).

Fig 2. Estratégia de Chiang Kai-Shek para renascimento cultural (TZENG, 2005). Umaanálise sobre o que aconteceu com as indústrias em Taiwan também mostra os

resultados coerentes com as abordagens que relatamos anteriormente. Citemos algunsexemplos a seguir.

Como exemplo desse “acerto”, podemos citar a Acer Computer Com-

pany, que se especializou em usar a tecnologia da IBM PC, começando

a produzir o PC XT, e alguns anos depois ela foi capaz de lançar PC 386

com chips da Intel antes da própria IBM. Hoje é uma indústria total-

mente consolidada e considerada inovadora. Outro exemplo que pode-

mos citar é o de United Microelectronics Company (UMC) que é uma

empresa de semicondutores que iniciou as suas operações com a tecno-

logia transferida de RCA, que mais tarde se tornou a primeira empresa

de Taiwan a licenciar a tecnologia de semicondutor para todo o Ocidente.

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Como contra-exemplo, temos a Vanguard International Semiconductor

Corporation (VIS) também de Taiwan, fundada em 1994. O objetivo

era ser uma referência no negócio de chip DRAM (Dynamic Random

Access Memory) com um orçamento inicial de 200 milhões de dólares.

Diferentemente dos casos anteriores, preferiu-se contratar engenheiros

taiwaneses de alto calibre dos EUA para desenvolver a tecnologia em vez

de transferir ou comprar tecnologiaestrangeira. Resumindo a história, em

2001 já acumulava um prejuízo de mais de 6 milhões de dólares e,

finalmente, encerrou as suas atividades em 2004.

Assim como o histórico de desenvolvimento de Taiwan, estamos assisti-

mos a China seguindo os mesmos passos. Ainda consideramos no

Ocidente os produtos chineses como cópias de baixa qualidade, mas ao

mesmo tempo já conseguimos adquirir alguns artigos de grande sofis-

ticação e de ótimo nível de acabamento e desempenho, com preços

bastante competitivos. São sinais claros do processo natural de aperfei-

çoamento de uma nação, que por meio da cópia chega ao aperfeiçoa-

mento, à inovação eà liderança. Como que já pontuamos anteriormente,

o êxito do sucesso não é fruto somente do processo de aprendizagem por

meio de cópia, imitação e inovação, ela tem que ser vista dentro da

perspectiva de toda uma cultura que premia trabalho, diligência, disci-

plina e persistência. Evidentemente há muitos que aproveitam da cultura

de cópia para lucrar sem esforço, mas ao olharmos para os conceitos de

valor predominante da sociedade inegavelmente a média é positiva.

Considerações finais

Queremos demonstrar que a cópia é um fator primordial para desen-

volvimento humano, dentro de parâmetros estratégicos, pode e deve ser

praticado. Entendemos que a inovação pode ser em decorrência da

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Lawrence Chung Koo

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imitação, que nada mais é do que utilizar as descobertas do passado e

aperfeiçoá-las. Não entramos aqui com outros componentes para justifi-

car a práticas desleais de pirataria, apenas queremos demonstrar que a

prática da cópia quando se está dentro de um plano de desenvolvimento,

de forma acordada, constitui-se em procedimento necessário para cresci-

mento de um país.

Realçamos o caráter estratégico da prática, ela se consolida após décadas

desde o início da cópia, muitas vezes não conseguimos ver esse resultado

de imediato mas, ao longo do tempo perceberemos que os resultados não

são obtidos na forma de produto final, o mais importante é a absorção

dos processos de desenvolvimento, de onde foram tiradas as lições das

experiências dos pioneiros, evita-se os erros cometidos e aprende-se a

cultura e costumes das fontes ao que se copia. Por sua vez, o produto desse

desenvolvimento fará parte da riqueza da humanidade, que confere nessa

aprendizagem à perpetuidade do conjunto do conhecimento. Portanto,

o aprender pela cópia foi, é e será uma das práticasdo desenvolver do ser

humano.

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Imitação na Propaganda Comercial

GINO GIACOMINI FILHO

Introdução

A imitação, enquanto atividade de aprendizagem, reprodução de um

fenômeno natural ou repetição natural de práticas sociais foi e sempre

será fundamental para as pessoas. Está impregnada na cultura e valores

de forma que é impossível encontrar algo que seja absolutamente original

ou que não contenha traços imitativos. A imitação é parte estrutural da

comunicação expressando-se, por exemplo, por meio da redundância,

além de que a própria indústria da comunicação reproduz modelos que

se tornam acessíveis e replicados na forma de informação, entretenimento

e persuasão.

Porém, faz parte também da natureza humana e das organizações a imi-

tação depreciativa, em que obras e direitos são imitados causando danos

a outrem, caso da esfera da comunicação em que tantos trabalhos têm

seus conteúdos imitados fazendo com que a difusão massiva de itens

copiados traga danos a consumidores e organizações.

Modelos teóricos recentes alocam a imitação dolosa e a pirataria como

temas das novas responsabilidades sociais organizacionais, uma vez que

tais práticas implicam danos em várias esferas, como o concorrencial,

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Gino Giacomini Filho

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autoral e consumerista (SOARES, 2004; ASTOUS GARGOURI, 2001;

BONEBEAU, 2004).

2. Propaganda comercial: práticas imitativas

Barreto (1982) afirmava que a criatividade na propaganda é precedida

por várias atividades que lhe dão suporte e a fazem canalizar para a ela-

boração de uma peça publicitária:

Desta forma, a criatividade em marketing – envolve, depende e

se relaciona com pesquisa técnica, pesquisa de mercado, admi-

nistração, disponibilidades financeiras e operacionais etc – ante-

cede à criatividade em Propaganda (sendo esta, como se sabe, tão-

só segmento do Marketing, como um todo) (p. 113).

Essa realidade não mudou. Dessa forma, um fator a verificar para que

um anúncio seja analisado do ponto de vista imitativo é o fluxo do

trabalho de marketing e pesquisa que o antecedeu, pois é consenso que

uma peça publicitária e a própria ação de publicidade é caudatária de um

esforço de marketing. A criação publicitária é um produto coletivo e de

co-autoria, bastando voltar a fazer tal percurso para certificar se a peça

publicitária reuniu os elementos que a construíram no plano da cria-

tividade de marketing e no próprio trabalho processual que envolve a

elaboração de uma peça publicitária.

Bertomeu (2002), baseando-se na rotina profissional de uma agência de

propaganda, também sustenta que a criação de um anúncio publicitário

é precedida por algumas etapas, dentre elas o planejamento de marketing

(oferece informações mercadológicas do anunciante/marca para a criação

publicitária) e o briefing de criação (trabalho de planejamento da propa-

ganda e informações específicas). Para esta construção criativa, são envol-

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Imitação na Propaganda Comercial

93

vidos diversos profissionais: atendimento (faz a ponte entre agência e

anunciante), planejamento (elabora o plano e o briefing), de forma que

esses documentos têm a participação da agência e do anunciante, que

oferecem assim as bases estratégicas para os anúncios:

Sendo assim, todos esses profissionais citados definem o conteúdo

do documento que irá também direcionar todas as outras ativi-

dades que farão parte da campanha de propaganda. Enquanto a

criação cria a mensagem, o mídia é responsável pela reserva de

espaços e futura veiculação da mensagem. O profissional de pes-

quisa alimenta com informações atualizadas todo o grupo e o

atendimento aprovará com o cliente essa mesma propaganda,

sempre direcionado pelo “foco” definido por todos os profissio-

nais, inclusive, o cliente, no documento chamado briefing de

criação (BERTOMEU, 2002, p. 31).

Portanto, a condução criativa de um anúncio é um trabalho de co-criação,

que envolve também o anunciante: “O trabalho de criação na propaganda

é em equipe [...] É um trabalho que envolve a parceria dos publicitários

entre si e do cliente [...]” (BERTOMEU, 2002, p. 50). Completa o autor:

“Quando se cria uma campanha, o fato de o cliente tê-la aprovado, coloca-

o como co-autor [...]” (p. 51).

Mas, atualmente, é possível agregar a essa co-autoria o próprio consu-

midor. A internet possibilitou que o consumidor influenciasse a criação

de valor, desdobrando e propagando a criação de valor por toda a cadeia

(PRAHALAD RAMASWAMY, 2002). Porém, a responsabilidade continua

sendo dos que fazem a propaganda em termos de relações comerciais,

ou seja, anunciante, agência e veículos de comunicação. De forma mais

específica, cabem aos criativos da publicidade (profissionais da criação)

a elaboração estética da peça publicitária.

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Gino Giacomini Filho

94

Existem obras bibliográficas em propaganda cujos autores também tive-

ram experiência profissional em publicidade; suas palavras são represen-

tativas do fazer publicitário. Nesse sentido, é pertinente confirmar que,

de uma forma geral, tratam a “idéia” como fator essencial na criação

publicitária:

A indústria cria produtos basicamente iguais. As lâmpadas acen-

dem, os óleos lubrificam, os desodorantes desodorizam. Em

milhões de casos, o que vai destacar um produto dos outros são

... boas idéias – expressas em marketing criativo, em propaganda

criativa. (BARRETO, 1982, p. 104)

A não ser que sua campanha seja construída em torno de uma

grande idéia, ela redundará em fracasso (OGILVY, 1976, p. 91)

De certa maneira o layoutman precisa transmitir o subjetivo de

modo concreto. E o subjetivo é infinito. Jamais a imagem (e difi-

cilmente a palavra) consegue expressar de fato uma única idéia.

O que se comunica dessa idéia, através de palavras e/ou traços, é

sempre uma das diferentes e várias maneiras de se representar essa

idéia (LADEIRA, 1997, p. 58).

A Criação é a essência da agência, como vimos. Sua função é criar

idéias para serem transformadas em slogans, temas publicitários,

anúncios para jornais e revistas, comerciais de rádio, televisão e

cinema, cartazes e outras mensagens publicitárias (SAMPAIO, 2003,

p. 66).

Esses e outros autores publicitários enfatizam a importância da “idéia”

no processo criativo, porém destacam-na como insumo e não como o

anúncio ou expressão tangível.

De forma similar, Read (1981) argumentava que, no campo da arte, a

idéia não pode ser imitada ou copiada, visto ser uma ocorrência mental

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Imitação na Propaganda Comercial

95

que não oferece observação objetiva. Somente a expressão da idéia pode

ser imitada.

Seria o caso da propaganda, exemplificando-se com um anúncio que usa

frases e foto para expressar a idéia de segurança na alimentação de uma

criança. Na tentativa de estender esse ponto de vista para o campo publi-

citário, pode-se estabelecer que a idéia de segurança na alimentação de

uma criança foi concebida no planejamento mercadológico que, via

briefing de criação, passou para a agência de publicidade empregá-la no

anúncio usando para isso foto de criança no colo da mãe e um slogan.

Um anúncio imitativo poderia usar foto semelhante para uma peça publi-

citária de automóvel e expressar a idéia de vida em família, assim como

um concorrente do setor alimentício infantil poderia usar fotos e título

diferenciados para expressar segurança na alimentação de uma criança.

Neste exemplo, a manifestação mental dessa idéia surgiu de forma

particular no universo cognitivo de seu criador de forma que esse indi-

víduo irá traduzi-la para o mundo exterior usando determinados suportes

ou elementos estéticos. Porém, esse indivíduo criativo fez uma tradução.

É inviável considerar a idéia como referência para atestar trabalhos simi-

lares uma vez que as idéias estão à disposição de todas as mentes. Porém,

a aplicação de uma idéia oferecerá contextos únicos ou especiais passíveis

de observação e avaliação por pessoas e entidades.

Talvez esses sejam também motivos para que a Lei dos Direitos Autorais

não proteja as idéias, mas as obras delas resultantes. Proteger idéias seria

algo inviável dado não somente à natureza humana, mas também a multi-

plicidade de suportes, conteúdos, tecnologias disponíveis ainda por vie-

rem, caso dos meios virtuais.

Adler (2002) mostra que a internet apresenta condições e contextos

inovadores para a propaganda atual em que um anúncio é “clicado” por

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96

bilhões de pessoas individualmente ou em comunidades virtuais. A

audiência global de uma peça publicitária pode acarretar sua reprodução

em escala internacional, o que faz aumentar a responsabilidade daqueles

que fazem propaganda e, na mesma proporção, o risco de imitações trans-

continentais que, antes, pouco eram percebidas no trade publicitário.

Cappo (2003) entende que os trabalhos das agências de publicidade em

meados do século XX mantinham diferenciações e bom grau de cria-

tividade, sendo até possível caracterizar diante de um anúncio a sua agên-

cia de origem, quase que formando uma marca distintiva. Porém,

atualmente: “Uma análise dos comerciais de diferentes países mostra que

as idéias criativas são habitualmente copiadas ou adotadas” (p. 82).

Baudrillard (2000) também se mostra desencantado com a mesmice na

propaganda, como os anúncios na área de moda e varejo, talvez fazendo

com que a sociedade e os agentes de comunicação já não sejam sensíveis

em demarcar o que é inovação ou imitação nessa área.

Segundo Castro (2008): “Os produtos promocionais marcam-se por um

conjunto de características comuns e constituidoras que possibilitam a

formulação de uma gramática da produção promocional televisual” den-

tre elas o “movimento de repetição e inovação”, ou seja, “A publicidade

tenta trazer o novo sem abdicar do mesmo: ela se situa no limiar entre aquilo

que é inédito, diferente, novo e aquilo que dela se espera, o procedimento

previsível” (p. 43-44).

É evidente que ao lado dos anúncios mais ousados, até mesmo

inovadores, em alguns casos, convive uma imensa maré de lugares-

comuns, banalidades como a de colocar um atleta para vender

vitamina, um aparente dentista para divulgar certa pasta dental,

um bem-sucedido empresário para recomendar determinada

corretora de valores. (CITELLI, 1998, p. 43).

Page 97: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Imitação na Propaganda Comercial

97

Nesta mesma linha, Carvalho aponta que um dos recursos discursivos

da publicidade é trabalhar com “fórmulas fixas”, que seriam chavões, fra-

ses feitas, caso de “Todos os caminhos levam a Visa [Roma]” (2007, p.

88); a partir deles, o anúncio apenas se completa com informações

adicionais sobre a marca ou produto. A fórmula fixa funciona como um

chassi que pode acomodar diferentes carrocerias de automóveis. Assim,

frases feitas como “negócio da China”, “são as águas de março fechando

o verão”; “faça o maior cartaz”; “é pelas partes que se conhece o todo”

podem receber os elementos substitutos necessários para finalizar o con-

teúdo de um anúncio publicitário (CARVALHO, 2007, p. 86-89). Por isso

são frequentes as coincidências em anúncios publicitários.

Iasbeck (2002) ressalta que os slogans são “frases de efeito”, porém nem

todas “frases de efeito” são slogans. Pois enquanto as primeiras podem estar

no texto com outras frases, os segundos aparecem de forma isoladamente

marcante. Menciona o autor que o slogan é um tipo de clichê e que pode

se revestir de sentidos emocionais e coercitivos, caso do slogan utilizado

pela Varig no início dos anos 1990: “Acima de tudo, você” (p. 75).

Iasbeck mostra na sua obra muitos slogans publicitários, sendo possível

detectar no seu livro slogans semelhantes entre si, caso de Abuse e Use

[lojas C&A] (p.70) e Use e Abuse [Mate Leão] (p. 75) ou então Ter é poder

[IOB] (p. 64) e Ter é Poder [Diners] (p. 68). Também foi possível

encontrar na obra de Iasbeck slogans semelhantes a outros encontrados

em fontes diversas, caso de Experimente [Colgate Menta] (p.70) com

Experimenta [slogan utilizado pela cerveja Schincariol alguns anos depois]

e Acima de tudo, você [Varig] (p. 70 e 75) com Acima de tudo, você [Cosil

alguns anos depois].

O publicitário Thomas Roth (2003), da agência Lua Nova (São Paulo)

menciona que muitas agências e anunciantes copiam ou reproduzem tra-

Page 98: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Gino Giacomini Filho

98

balhos sem permissão de quem os criou. O publicitário Daniel Funes

(2004), redator da SNBB Novaagência, admite que há na indústria da

propaganda muitos casos de cópias de trabalhos, considerando algo

“rasteiro e covarde”, o que teria feito o publicitário desenvolver técnicas

para evitar ser plagiado pelos colegas.

Talvez, um estímulo para a imitação na publicidade decorra da suposição

de que a peça imitada tenha sido veiculada para target diferente do que

foi a peça imitadora, analogamente ao procedimento de comercialização

de produtos piratas que se destinam a público diverso daquele que o faz

a marca original.

Segundo Carrascoza (2008), o profissional da propaganda serve-se de

conhecimentos e experiências passadas para oferecer uma solução

publicitária ao anunciante; de outro lado, terá que usar discurso com-

patível com os signos do seu target a fim de possibilitar o intento da per-

suasão. Portanto, o texto publicitário é um subproduto de elementos

linguísticos anteriores. Para o autor, muitos profissionais da propaganda

ficam maculados como plagiador injustamente, até porque boa parte do

trabalho de: “[...] criação resulta de um processo de associação de idéias

e as coincidências são comuns, já que vários publicitários podem chegar

às mesmas soluções [...]” (CARRASCOZA, 2003, p. 98).

Pode-se dizer que não é raro que profissionais recebam orientação para

considerar trabalhos alheios como referência na elaboração de anúncios

e campanhas, caso da sugestão de Ladeira: “Ao criar uma campanha de

lançamento, é aconselhável verificar outras campanhas veiculadas nesse

período, principalmente de produtos similares” (1997, p. 83).

Uma exemplificação desse compartilhamento de recursos ocorre com o

acesso a bancos de materiais de comunicação, caso de bancos de fotos,

Page 99: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Imitação na Propaganda Comercial

99

bancos de logos, bancos de sons, bancos de áudio, bancos de imagens,

bancos de textos, bancos de slogans, bancos de ideias e até bancos de

anúncios.

Telles (2007) entrevistou 30 profissionais que trabalhavam em agências

de propaganda nos setores de criação, atendimento, mídia, produção e

planejamento. Apurou que a imitação de idéias publicitárias é vista tanto

como negativa (roubo de idéia) como positiva (reconhecimento de uma

boa idéia). Esse sentimento positivo está associado à vaidade do publici-

tário, uma vez que a imitação de sua idéia inflaria seu ego e reforçaria

sua auto-estima. A autora menciona o depoimento de um dos publicitá-

rios neste sentido:

[...] Eu já tive plágio de conceitos mecânicos para produção gráfica

e, até certo modo, é gratificante. Se alguém achou que aquilo era

viável e legal, que iria funcionar para outras coisas, quer dizer que

o sistema que eu criei naquele momento era adequado. Se você

pensar bem, se copiaram, é porque a idéia era boa. (E14, homem,

30 anos, profissional de produção de agência brasileira de médio

porte). (p. 73).

Segundo os entrevistados por Telles, há dois tipos de cópia: a proposital,

praticada intencionalmente e que mostra descaso para com a criação

alheia, e a coincidente, que é involuntária e, por isso, desculpável, uma

vez que é razoável não se conhecer tudo que foi publicado ou criado.

Os sentimentos negativos podem ser ilustrados com dois depoimentos:

[...] Eu sinto uma sensação de impotência, até mesmo revolta, ao

perceber que o mercado pratica cada vez mais atitudes que vão

contra o que eu aprendi em propaganda. (E25, homem, 51 anos,

profissional de atendimento de agência brasileira de pequeno porte).

Page 100: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Gino Giacomini Filho

100

[...] Fico possessa, porque eu odeio injustiça. Se você não está

conseguindo, vai discutir, vai procurar ajuda, vai dividir, mas não

precisa tomar os louros para você. (E2, mulher, 36 anos, profissional

de mídia de agência brasileira). (p. 74)

Preocupado em sinalizar um comportamento ético para o setor, David

Ogilvy, fundador e publicitário da agência Ogilvy & Matter enunciou

seus onze mandamentos para quem quisesse trabalhar em sua agência; o

11º mandamento foi dedicado à imitação:

Não seja um copiador: [...] Se você já teve a felicidade de criar

uma grande campanha de publicidade, verá logo outra agência

roubá-la. É irritante, mas não deve deixá-lo preocupado; ninguém

constrói uma marca imitando a do vizinho. Imitação pode ser “a

forma mais sincera de plagiarismo”, e é também a indicação de

um indivíduo interior (OGILVY, 1976, p. 99).

Talvez o trabalho mais expressivo acerca da imitação publicitária esteja

sendo realizado por Joe la Pompe. Além de ser autor do livro Noveau?

Le meilleus de la production et reproduction publicitaire (Paris: CBNews/

Telemaque, 2008), mantém um website com informações, discussões e

ocorrência de práticas imitativas na publicidade mundial

(www.joelapompe.net). Joe la Pompe é o pseudônimo de um publicitário

de expressão na França e no seu site afirma que seu website é livre, fixado

na França e não afiliado a empresas ou organizações. O site está dedicado

a obter idéias publicitárias similares e reunia em 31/8/2010 muitos anún-

cios considerados similares, caso de 709 só na categoria de impressos e

mídia exterior.

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Imitação na Propaganda Comercial

101

3. Ações normativas contra a imitação publicitária

Para Delener (2000), a imitação, no escopo comercial, tem o único pro-

pósito de fraudar as pessoas. A imitação de conteúdos publicitários envol-

ve interesses individuais e coletivos, comerciais e autorais, traz consequên-

cias morais e econômicas. São razões para que incidam normas jurídicas,

corporativas e institucionais sobre esse tema. A publicidade, por ser obra

técnica de caráter estético, é protegida legalmente “na medida em que

não seja banal, ou seja, que estampe uma qualidade criativa do autor, que

vai além da comunicação de um fato comum” (PEREIRA, 2001, p. 37).

Existem muitas normas legais que incidem de forma correlata ou indireta

na imitação publicitária, caso da Constituição Brasileira (artigos 5º e 216),

Código Comercial Brasileiro (artigo 207), Lei 9.279 (1996) sobre

propriedade industrial, Lei de Direitos Autorais (9.610, 12/01/1998),

Lei de Propriedade Industrial – LPI – 9.279 (14/05/1996), além de deci-

sões do Poder Judiciário, jurisprudências e acórdãos que são importantes

sinalizadores para os níveis aceitáveis de imitação na publicidade.

Ainda quanto às normas, de incidência mais direta pode ser citada a Lei

4.680 (18/06/1965) que, ao incorporar o Código de Ética dos Profis-

sionais de Propaganda (1957), dá valor ao item 17 do Código em que

“O plágio ou a simples imitação de outra propaganda é prática condenada

e vedada ao profissional”. O Decreto 57.690 (01/02/1966) estipula no

artigo 17 que à agência de propaganda, ao veículo de divulgação e ao

publicitário não é permitido “reproduzir temas publicitários, axiomas,

marcas, músicas, ilustrações, enredos de rádio, televisão e cinema, salvo

consentimento prévio de seus proprietários ou autores” (item “I”, “c”).

No plano privado, podem ser destacadas as normas do Conselho Execu-

tivo das Normas-Padrão (CENP), Associação Brasileira de Propaganda

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102

(ABP) e Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária

(Conar).

O CENP1 é uma entidade de direito privado que cuida do relacionamen-

to comercial entre anunciantes, agências de publicidade e veículos de

comunicação, frente à Lei 4.680/65 e aos decretos 57.690/66 e 4.563/

02. Concede certificação de qualidade para agências, algo que as diferencia

no mercado e na pretensão de serviços. Editou as Normas-Padrão da

Atividade Publicitária (2002), parâmetro qualitativo para os negócios do

setor publicitário. As Normas-Padrão prevêem no item 3.7: “Como

estímulo e incentivo à criatividade, presume-se que as ideias, peças, planos

e campanhas de publicidade desenvolvidos pertençam à Agência que os

criou, observada a legislação sobre o direito autoral”.

A ABP – Associação Brasileira de Propaganda – é uma entidade civil

fundada em 16 de julho de 1937 que congrega publicitários, agências,

veículos e várias entidades publicitárias. Desempenha, dentre outros, o

papel de Entidade Depositária da Criação de Propaganda desde 2003

(regras atuais revisadas em 2004). Protege campanhas, peças, obras, temas

e conceitos publicitários de agências de propaganda certificadas no

CENP. Esta reserva de direito é garantida por até um ano, pois a ABP

acolhe trabalhos que estão em licitação ou esperando por veiculação. Caso

apareça trabalho semelhante, a ABP encaminhará, conforme solicitação,

material ao Conar ou Poder Judiciário.2

1. CENP. Conselho Executivo das Normas-Padrão. Site. Disp. em www.cenp.com.br.Acesso em 28/12/2009.

2. ABP. Associação Brasileira de Propaganda. Site. Disponível em:http://www.abp.com.br/entidadedepositaria/resolucao.asp. Acesso em 04/04/2010.

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Imitação na Propaganda Comercial

103

Existem institutos que cuidam do registro autoral. O ISWC (Interna-

tional Standard Musical Work Code) cadastra dados como nome da

música, duração, criadores, tipo, linguagem e o número ISWC (http://

www.iswc.org). O ISAN (International Standard Audiovisual Number)

possibilita a identificação de obras audiovisuais, filmes, documentários,

programas de TV e anúncios publicitários (www.isan.org). No Brasil, a

ABRAMUS é reconhecida pela ISAN e possui registros de obras na área

da Teatro/Dança, Artes Visuais, Música e Audiovisual

(www.abramus.org.br).

Importante papel também cabe às entidades de autorregulamentação do

setor. Cabe destacar que a prática da autorregulamentação publicitária

possui raízes internacionais. Talvez a pioneira seja a ICC – International

Chamber of Commerce – organização fundada em 1919 que, desde 1937,

institui normas no campo do marketing e da propaganda comercial. Com

sede em Paris, França, editou em 2006 o Consolidated ICC Code of

Advertising and Marketing Communication Practice, guia escrito que

contém normas de autorregulamentação para o setor (ICC, 2006).

Seu artigo 16 é dedicado à comunicação imitativa prevendo que a comu-

nicação de marketing não deve imitar outras, caso de induzir o consumi-

dor a erro ou confusão, por exemplo por meio de um layout geral, texto,

slogan, tratamento visual, musica ou efeitos sonoros. O artigo também

condena a apropriação de elementos estéticos utilizados em outros países

e continentes sem respeitar um razoável período de tempo (ICC, 2006).

O Conar – Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária –

é uma entidade representativa do campo ético publicitário no Brasil e

adota as diretrizes do Código da ICC. Trata-se de uma entidade civil sem

fins lucrativos, fundada em 1980, que reúne representantes de agências,

veículos, anunciantes e até consumidores com a atribuição, dentre outras,

Page 104: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Gino Giacomini Filho

104

de julgar anúncios à luz de seu Código Brasileiro de Autorregulamentação

Publicitária. Seu site também informa que, desde a sua criação, foram

instaurados mais de sete mil processos éticos.3 O Código condena a imi-

tação e plágio, notadamente quando infringem direitos autorais e quando

“[...] configure uma confusão proposital com qualquer peça de criação

anterior” (art. 42).

A relevância do Conar pode ser atestada por ser o órgão constantemente

consultado pela justiça no caso de embate ético no campo publicitário.

Casos como o do chiclete Den-Den, Sand Lake e Tabaco Stop tiveram o

Conar como mediador, papel esse reconhecido pelos tribunais e suas

decisões observadas pela justiça (SCHNEIDER, 2005).

Porém, o Conar não tem suas decisões sempre acolhidas pelo poder

judiciário, caso do litígio entre as escolas de idiomas Just in Time Asses

em Idiomas e a CNA Cultural envolvendo acusação de plágio em

campanhas publicitárias (TRIBUNAL, 2009). Esse caso mostrou também

que Conar e o Poder Judiciário possuem entendimento por vezes diverso

do que seja uma obra publicitária imitativa.

O Conar julga litígios publicitários por meio de seu Comitê de Ética

estabelecendo Representações em que todos os envolvidos podem se ma-

nifestar para que seja definida uma decisão do órgão. Como a imitação

publicitária é um dos objetos de julgamento do Conar, o conteúdo dessas

Representações pode oferecer indicadores qualitativos e quantitativos

envolvendo práticas imitativas realizados no mercado publicitário

brasileiro.

3. CONAR. Uma breve história do Conar. Disponível em: http://www.conar.org.br.Acesso em 3 jun 2010.

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Imitação na Propaganda Comercial

105

No período de março a junho de 2010, foi consultado o banco de dados

do Conar (www.conar.org.br) com o propósito de encontrar decisões

sobre casos de anúncios publicitários envolvidos com imitação publi-

citária. A amostra correspondeu às decisões publicadas no período de

2001 a 2009, abrangência de anos esta contemplada na seção “Conar em

Números, disponível no site do Conar (http://www.conar.org.br/) em

2010, ano em que esta pesquisa fez o levantamento.

Foram consideradas somente as decisões que tiveram como despacho a

sustação ou alteração nas categorias “Originalidade”, “Direitos Autorais”

e “Propaganda Comparativa”; assim apurou-se que o Conar apresentou

50 Representações em que anunciantes foram advertidos por fazerem uso

imitativo de peças publicitárias. Estipulou-se três categorias a serem

quantificadas:

1. Direitos envolvidos. Correspondem aos conteúdos relatados em cada

Representação que apontam afronta a direitos de âmbito autoral, con-

correncial e consumerista (consumidor).

2. Setor. Aponta em quantas Representações o litígio envolveu anun-

ciantes e um mesmo setor de atividade econômica.

3) Elementos estéticos imitados. Identificou nas Representações quais ele-

mentos estéticos das peças envolveram-se com a imitação.

O critério adotado levou em conta o conteúdo da Representação e não

apenas a categoria de enquadramento escolhida pelo Conar. Assim foi

possível detectar em algumas representações o enquadramento em duas

ou mais categorias de direitos envolvidos. Desta forma se, por exemplo,

o conteúdo da Representação aponta infração aos direitos autorais e relata

também danos ao concorrente, o enquadramento também se deu tanto

no direito autoral como concorrencial; ou se mereceu das entidades

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Gino Giacomini Filho

106

envolvidas comentários sobre prejuízos ou confusão para o consumidor,

há também o enquadramento no direito consumerista. Os resultados

estão no Quadro 3.

Quadro 3 – Decisões do Conar quanto a práticas imitativas

Número da Direitos Setor Elementos estéticos

Representação (1) (2) imitados (3)

1. Autoral 2. Conc. 3. Cons A T I C S

08/01 x — x

11/06 x x — x

17/04 x x x

18/03 x x x x

30/03 x x x x

32/07 x x x x

043/05 x x x x

48/04 x x x x

51/01 x x x x

60/03 x x x x

66/04 x x x x

76/04-79/04 x x x x

84/05 x x x x

92/01 rec. ord. x x x x

96/03 x x x x

101/04 x x x

124/03 x x x

135/03 x x x x

141/03 x x x

143/04 x x x x

147/03 x — x

155/04 x x x

156/01rec. ord. x x x x

167/06 x x x x

168/06 x — x

172/09 x x x

175/04 x x x

178/06 x x x x

192/04 x x x

197/07 x x x x

Page 107: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Imitação na Propaganda Comercial

107

Número da Direitos Setor Elementos estéticos

Representação (1) (2) imitados (3)

1. Autoral 2. Conc. 3. Cons A T I C S

198/03 x x x

200/01 x — x

206/07 x x x x x

207/02 x x x x x

209/06 x x x x

211/01 x x x

217/06 x x x x

222/04 x x x

231/07 x x x

237/06 x x x

242/01 x x x x

248/04 x x x x

258/09 x x x x

265/05 x — x

301/07 x x x

317/06 x x x x

323/05 x x x x

323/07 x x x x x

367/08 x x x

430/08 x — x

Representações 50 12 20 43 3 8 5 17 17

% 100% 24% 40% 86% 6% 16% 10% 34% 34%

(1) Direitos envolvidos: correspondem aos direitos de âmbito 1. Autoral, 2. Concorrenciale 3. Consumerista. (2) Anunciantes que atuam num mesmo setor de atividade econômica(3) Elementos estéticos imitados: correspondem aos elementos das peças, ou seja,Assinatura (A), Texto/Título (T), Imagem (I), Conjunto (C) e o Slogan/Tema (S). O elementoSlogan pode compor quaisquer dos demais elementos.

Quanto aos direitos envolvidos, a análise verificou os direitos correspon-

dentes ao âmbito Autoral, Concorrencial e Consumerista. Apuraram-se

os seguintes dados: 100% das decisões envolveram direito autoral, 24%

direitos concorrenciais e 40% direitos do consumidor. Portanto, parece

que as práticas imitativas na comunicação promocional atingem plena-

mente os direitos autorais; esse enquadramento é natural se for levado

em conta que a imitação ocorre, fundamentalmente, de uma obra inte-

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Gino Giacomini Filho

108

lectual protegida. Porém, não deixa de ser interessante perceber que o

segundo tipo de dano mais apontado refere-se a direitos dos consumi-

dores, de certa forma mostrando que a imitação publicitária precisa ser

considerada e regulamentada em termos consumeristas. Embora os direi-

tos concorrenciais fossem pouco evocados, é importante considerar que,

implicitamente, estariam contemplados nos dois anteriores, já que se

apossar de trabalhos (direito autoral) e confundir consumidores configu-

ram-se como formas de concorrência desleal.

Do total das 50 Representações, 43 (ou 86%) dos litígios envolveram

anunciantes de um mesmo setor de atuação, o que confirma parcialmente

o entendimento geral de que a imitação publicitária ganha relevância

quando participa de esforços de marketing pela disputa de mercados e

consumidores.

Considerando os elementos estéticos das peças promocionais, das 50

decisões, 17 (34%) se relacionaram ao conjunto estético e o mesmo valor

para o composto slogan/tema. 8 (16%) apresentaram imitação nos ele-

mentos textuais (texto/título), enquanto imagem ficou com 5 ocorrências

(10%) e assinatura com 3 aparições (6%). Esses dados mostram que a

imitação publicitária normalmente ocorre no conjunto, e não apenas em

uma parte. Porém, cabe destaque ao composto slogan/tema, frase sucinta

e marcante que diferencia o anunciante cuja imitação pode provocar

sensível dano autoral, concorrencial e consumerista.

4. A visão de especialistas em publicidade

Com o propósito de obter e registrar o entendimento sobre práticas imi-

tativas no plano social, mercadológico e publicitário, foram realizadas

entrevistas com quatro especialistas em publicidade.

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Imitação na Propaganda Comercial

109

O depoimento ou avaliação de especialistas ajudam no entendimento e

na elaboração de parâmetros a fim de se considerar aspectos imitativos

na comunicação (ABREU, 1968; CORREA, 2004; VEGA, 2011).

Em 2011 foram contatados quatro especialistas com a finalidade de apon-

tar aspectos que incidem na avaliação qualitativa e quantitativa da imi-

tação, especialmente na publicidade. O formulário de pesquisa dava aos

especialistas opções para escolherem a forma de identificação de seus

nomes e associação com as respostas. A pedido de dois entrevistados, as

respostas não foram associadas aos especialistas, sendo que o especialista

do Clube de Criação de São Paulo também solicitou para não ter seu

nome mencionado. Portanto, decidiu-se por não associar as respostas a

nenhum entrevistado.

O especialista Edney G. Narchi é formado em Direito e ocupa o cargo

de vice-presidente do Conar – Conselho Nacional de Autorregulamen-

tação Publicitária, entidade que aprecia e julga processos envolvendo

conduta ética do setor publicitário no Brasil, considerando assim a mais

importante instância ética da publicidade brasileira desde 1978, quando

foi efetivado.

O especialista João Vicente Cegato Bertomeu é autor dos livros Criação

na Propaganda Impressa (Futura, 2002) e Criação em Filmes Publicitários

(Cengage Learning, 2010), doutor em Comunicação e Semiótica pela

PUC-SP e docente Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP onde

atua nas linhas de pesquisa Processo de criação nas mídias e Design de

comunicação.

Outro especialista é um dos dirigentes do Clube de Criação de São Paulo

(CCSP), entidade que existe desde 1975. O CCSP edita o Anuário do

Clube de Criação desde 1976, anuário que é referência nacional para o

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Gino Giacomini Filho

110

setor da criação publicitária brasileira; esses fatores e a relevância que o

CCSP tem no mercado publicitário, o tornam a entidade de criação

publicitária mais importante do Brasil.

O especialista José de Sá é doutor em Comunicação Social pela Uni-

versidade Metodista de São Paulo, docente em 2011 da disciplina Ética

da Comunicação na Universidade Municipal de São Caetano do Sul,

instituição que abriga o Mestrado em Comunicação recomendado pela

CAPES.

4.1 Questões, respostas e comentários

1. Organizações e pessoas podem imitar marcas, produtos, pro-

cedimentos de concorrentes e até colegas de seu campo profissional.

Atribua um grau de relevância para a imitação não autorizada

ou ilegal dentro de um mesmo setor (0-nada grave a 10-

gravíssimo):

Os quatro especialistas atribuíram nota de forma que os quesitos tiveram

a seguinte média:

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Imitação na Propaganda Comercial

111

5,5 imitação em jornalismo (uso de fotos, matérias jornalísticas etc)

6,2 imitação de programas (programas de TV, filmes, novelas queimitam outros)

6,5 imitação de produtos (tênis, medicamentos, combustíveis etc)

7,5 imitação de marcas (imitação de marcas famosas, marcas líderesetc.)

6,7 imitação de arte (música, quadros artísticos etc)

6,7 imitação de propaganda comercial (slogans, anúncios etc)

8,2 imitação de trabalhos acadêmicos (trabalhos de pesquisadores,professores ou alunos)

8,7 imitação de idéias comerciais (ex-funcionários que repassamsegredos comerciais ou os utilizam em negócios próprios).

Depreende-se que, para os especialistas, a imitação não autorizada de

propaganda comercial ocupa lugar relevante. Se considerarmos os

extremos – 5,5 para a imitação em jornalismo e 8,7 para imitação de idéias

comerciais – a propaganda ficaria bem próxima da mediana (7,1), caracte-

rizando assim uma posição intermediária; porém se considerarmos a

amplitude total do intervalo considerado, essa importância cresce subs-

tancialmente, o que equivale dizer que, para os especialistas a imitação

publicitária não autorizada é algo grave.

2. No geral, em que grau você considera os anúncios publicitários

parecidos entre si (Muito parecidos: 0; Muito diferentes: 10)? Exis-

tem setores de atividades econômicas ou tipo de anunciantes em

que a semelhança é maior?

Três especialistas apontaram resposta, que alcançou a média de 6,3. Os

setores varejista e imobiliário foram apontados por dois especialistas,

havendo uma menção para operadoras de celulares, investimento, bancos,

cerveja e automóveis.

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Gino Giacomini Filho

112

Os especialistas consideram que os anúncios publicitários são parecidos

entre si, porém não em grande escala, além do que alguns setores

apresentam esse quadro de forma mais acentuada, caso de imóveis e

varejo.

AS QUESTÕES AGORA TRATAM DA IMITAÇÃO ENTRE

ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS de anunciantes diferentes, caso do

exemplo abaixo.

3. Você vê problema um anúncio imitar outro? Se sim, qual ou quais

os problemas que gerariam?

Os quatro especialistas responderam “Sim”.

O problema mais apontado foi confusão, citado pelos quatro especialistas.

Os direitos autorais foram apontados por dois especialistas, vindo a seguir

apropriação indébita e falta de criatividade.

Assim, os especialistas unanimemente consideram que o maior problema

gerado pela peça publicitária é a confusão, confusão esta que alguns deles

mencionaram em termos de recepção junto aos públicos de interesse e

consumidores. Também o problema autoral é ressaltado, podendo a

apropriação indébita indicada por um especialista somar-se a este fator,

dando-lhe ainda mais relevância. Num patamar inferior ficou a falta de

criatividade.

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Imitação na Propaganda Comercial

113

4. Expresse sua avaliação em temos de graus de concordância (0-

Discordância total a 10-Concordância total). Anúncios que se

assemelham a outros:

Os quatro especialistas indicaram resposta obtendo os quesitos a seguinte

média:

6,2 contribuem com o empobrecimento do repertório cultural daspessoas que os vêem.

9,5 colaboram com a mesmice na publicidade.

9,5 contribuem com a falta de diferenciação de produtos e marcas.

8,5 revelam desrespeito ao consumidor.

9,5 sinalizam que aquele anúncio não é criativo.

7,5 revelam que não existe preocupação do anunciante quanto àqualidade da propaganda.

7,2 mostram que o anunciante quer mais imitar o concorrente doque prestigiar a sua própria marca.

6,0 mostram que a publicidade é algo decadente.

Para os especialistas, a semelhança entre anúncios, quase em termos

absoluto colabora com a mesmice na publicidade, contribui com a falta

de diferenciação de produtos e marcas e sinaliza que aquele anúncio não

é criativo. Num patamar elevado também revela desrespeito ao

consumidor.

Assim, a imitação dentre anúncios os indiferencia, trazendo impactos para

o setor como um todo e para os elementos (marcas, produtos) ali inse-

ridos, revelando-se um potencial problema no âmbito de marketing e

vendas. Como boa parte dos anúncios é voltada para o público em geral,

tal indiferenciação pode significar desrespeito ao consumidor.

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Gino Giacomini Filho

114

5. Quando um anúncio publicitário é imitado por outro, pode trazer

danos (considerar múltiplas opções):

Os quatro especialistas apontaram danos “aos seus criadores, ou seja,

publicitários e equipe que o criou” e “ao anunciante, ou seja, a empresa

para a qual foi criado o anúncio”; três apontaram “ao consumidor que

foi alvo da propaganda” e dois “à sociedade em geral”. Um especialista

mencionou na categoria “outros” que um anúncio pode trazer danos aos

alunos dos cursos de Publicidade.

De certa forma, os especialistas consideram que a imitação de um anúncio

traz danos maiores na esfera do direito autoral ou criação intelectual,

embora tal dano possa alcançar também relevância no plano econômico

ao gerar prejuízos financeiros à equipe e profissionais que idealizaram o

trabalho. Também apontam danos a quem pagou pelo trabalho

(anunciante), neste caso possivelmente trazendo prejuízos de ordem

econômica, mercadológica e concorrencial. O dano ao consumidor

também tem destaque, talvez por gerar confusão e isso repercutir nas suas

decisões de consumo.

6. A imitação dentre anúncios publicitários pode impactar direitos

dos consumidores ou interferir nas decisões de consumo? Como?

“Sim” foi a resposta dos quatro especialistas.

Três apontaram que tal possibilidade leva o consumidor à confusão,

notadamente quanto a marcas e produtos. Houve menção também a

aspectos do Código de Defesa do Consumidor relacionados à clareza e

correção da informação publicitária.

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Imitação na Propaganda Comercial

115

Portanto, no entendimento dos especialistas, a imitação dentre anúncios

publicitários impacta o consumerismo, principalmente ao levar o

consumidor à confusão em relação a marcas e produtos anunciados.

7. Um anúncio que imita outro pode confundir o consumidor?

Como?

Os quatro especialistas responderam que sim.

Dois remeteram à questão anterior (questão 6), enquanto os outros apon-

taram que a confusão pode prejudicar a associação da campanha com o

anunciante, levar o consumidor a se enganar quanto a um produto e dei-

xar o comprador insatisfeito.

Assim como na questão 6, a imitação publicitária pode ser vista como

fenômeno que provoca confusão ao consumidor, quer em termos de

reconhecimento do anunciante ou quanto ao conteúdo/marcas/produtos

anunciados, podendo assim causar insatisfação.

8. No Brasil, já foram publicados anúncios que imitavam outros para

induzir consumidores a comprar produtos concorrentes ou acre-

ditar em informações que, na verdade, foram copiadas de outros

anúncios. Levando em conta casos como esses e outros que ocorre-

ram, você é favorável à existência de uma legislação que penalize

a imitação publicitária com potencial de dano aos consumidores?

Se sim, em que sentido?

Três especialistas indicaram resposta, sendo todas “Sim”.

Um ressaltou que tal legislação já existe no campo da propriedade inte-

lectual e consumerista, enquanto dois sugeriram criar leis para este pro-

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Gino Giacomini Filho

116

pósito, salientando-se que desses dois, um apontou esforços do Conar

nesse sentido.

Metade dos especialistas é favorável ao estabelecimento de uma legislação

específica sobre a imitação publicitária com potencial de dano aos

consumidores.

9. A amplitude de veiculação de um anúncio deve agravar a

penalização de uma prática imitativa? (Ou seja, quanto mais

ampla for a divulgação, maior deve ser a penalização)

Três dos quatro especialistas apontaram “Sim”.

Nesse caso, a penalização de uma prática imitativa publicitária seria

proporcional à amplitude de veiculação do anúncio, ou seja, quanto maior

for o alcance (audiência, tiragem, extensão geográfica ou midiática) da

peça publicitário, maior seria a penalização no caso de gerar danos.

10. A exclusividade de uso de uma solução criativa de um anúncio

deve prescrever depois de um certo tempo? Se sim, em quanto

tempo? Deveria ser permitido que qualquer outro anunciante

utilizasse essa solução criativa se pagasse pelos respectivos

direitos? Algum comentário?

Dois especialistas apontaram “Sim” e dois assinalaram “Não”. Dos que

indicaram “Sim”, um mencionou que depende do tempo de veiculação

da mensagem e outro que essa prescrição deve ser em, no máximo, um

ano. Quanto à consulta se deveria ser permitido que qualquer outro anun-

ciante utilizasse essa solução criativa se pagasse pelos respectivos direitos,

igualmente dois disseram “Sim” e dois “Não”. No primeiro caso, bastaria

o interessado adquirir os direitos na forma da lei. No segundo caso seria

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Imitação na Propaganda Comercial

117

melhor cada anunciante ter sua própria voz e a solução criativa deveria

ser usada por período determinado.

Os especialistas se mostraram bastante divididos quanto ao uso de uma

solução criativa na publicidade e também quanto a um período de

prescrição, ficando então essa questão sem uma resposta mais definida.

11. Para julgar que um anúncio publicitário é imitação de outro,

que perfil de pessoas são aptas a fazer tal avaliação (considerar

múltiplas opções)?

Três especialistas apontaram resposta para este quesito.

Os três assinalaram que “especialistas” seriam pessoas com perfil mais

indicado para julgar se um anúncio é imitação de outro, com destaque

para peritos em criação publicitária, juristas, sociólogos, jornalistas e pes-

quisadores. Dois indicaram “profissionais da publicidade”. Consumidor

/ público em geral obteve uma indicação.

Embora o consumidor possa merecer lugar de destaque enquanto pú-

blico-alvo da propaganda e sofrer impactos consumeristas diante da imi-

tação publicitária, os especialistas consideram que pesquisas com

consumidores seriam menos relevantes do que consulta a especialistas no

que se refere ao julgamento de práticas imitativas da propaganda. Esse

resultado respalda a opção deste trabalho de pesquisa ao escolher

especialistas para contribuir com aspectos técnicos sobre a imitação

publicitária, embora outros perfis de especialistas e até pesquisas com

consumidores pudessem também oferecer significativa contribuição.

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Gino Giacomini Filho

118

12. Um anúncio publicitário tem que ser totalmente igual a outro

para ser considerado imitação ou plágio? Se não, qual seria esse

critério quantitativo?

“Não” foi a resposta dos quatro.

O conceito publicitário foi mencionado por dois especialistas.

A presença de elementos relevantes ou de fácil identificação da peça

original, além de aspectos estéticos e textuais foram citados.

Segundo os especialistas, se parte de um anúncio for igual a outro é

suficiente para ser considerado imitação ou plágio. Esse teor pode

simplesmente denotar o conceito utilizado, ou algo que poderá ser visua-

lizado em elementos estéticos destacados.

13. O que pode ser feito para que os publicitários não imitem

anúncios criados por outros? Dê uma nota para a importância

(0-Irrelevante a 10-Importantíssimo) para as ações abaixo:

Este quesito não obteve dos especialistas um tratamento uniforme, pois

dois indicaram para todos os quesitos uma nota de 0 a 10, enquanto dois

assinalaram apenas suas opções. Portanto, a média se refere a apenas dois

especialistas, à qual será acrescentada a indicação de opção dos demais.

“toda criação publicitária deve ser depositada em banco de dadospara prévia consulta”: 1,0

“a legislação deve ser mais completa ou rigorosa com essa questão”:7,5 e mais uma indicação de um especialista.

“os publicitários devem ter melhor formação ética”: 10 e mais umaindicação de um especialista.

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Imitação na Propaganda Comercial

119

“os publicitários devem se aplicar melhor em ter idéias inovadoras”:9,5 e mais uma indicação de um especialista.

“entidades profissionais ligadas à publicidade devem fiscalizar maisas práticas imitativas”: 7,5 e mais uma indicação de um especialista.

A inibição de práticas publicitárias imitativas, na visão dos especialistas,

decorreria de uma postura dos próprios profissionais em adquirir uma

formação ética mais aprimorada e se empenhar em idéias inovadoras. A

intervenção legal ou corporativa parece não ser tão relevante, embora fosse

apontada como uma possibilidade construtiva. Os especialistas não

consideram o depósito de criações publicitárias em bancos de dados como

algo relevante para inibir a imitação de anúncios.

14. Comentários que julgue pertinente:

Apenas um especialista se manifestou; fez comentário no sentido de se

evidenciar casos de práticas imitativas na propaganda com o intuito de

despertar mais o senso ético e legal da profissão publicitária.

5. Comentários e considerações finais

A imitação publicitária é um tema amplo e heterogêneo, lida com muitas

variáveis qualitativas e valorativas que impedem uma sistematização

conclusiva.

Existe e afeta aspectos concorrenciais, autorais e consumeristas, o que

indica tratar-se de assunto que precisa melhor e mais estudado.

Indicadores importantes dessa relevância e complexidade foram retratados

pelas opiniões e posições dos especialistas entrevistados.

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Gino Giacomini Filho

120

Consideraram que os anúncios publicitários são parecidos entre si,

notadamente nos setores de imóveis e varejo, avaliando tal assunto como

relevante. Para eles, a prática imitativa ilegal na publicidade afeta os

direitos intelectuais, direitos concorrencial e até os direitos dos

consumidores.

Os especialistas em publicidade entrevistados apontaram que a inter-

venção legal ou corporativa parece não ser tão relevante, embora fosse

apontada como uma possibilidade construtiva. Consideram que a for-

mação ética mais aprimorada e o empenho em idéias inovadoras são mais

relevantes para diminuir a imitação no setor. Ficaram divididos quanto

ao estabelecimento de uma caducidade para a reserva de direito autoral

para uma peça publicitária, porém em sua maioria considerou que, quanto

maior a extensão ou audiência de uma peça publicitária, maior deve ser

a reparação decorrente do dano.

As entrevistas com os quatro especialistas trouxe elementos específicos

para a abordagem da imitação publicitária. Reconhecem que um anúncio

não precisa ser 100% igual a outro para ser considerado uma imitação,

porém não indicaram um critério quantitativo para os casos em que essa

imitação é parcial.

Segundo eles, a semelhança entre anúncios colabora com a mesmice na

publicidade, contribui com a falta de diferenciação de produtos e marcas,

sinaliza que aquele anúncio não é criativo e revela desrespeito ao

consumidor.

Ficou marcante a preocupação deles com o impacto que a imitação

publicitária pode trazer ao consumidor. No anúncio mostrado como

exemplo, o fator que mais pesou na análise foi a possível confusão gerada

ao consumidor, ou seja, foram unânimes em ressaltar que a imitação

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Imitação na Propaganda Comercial

121

dentre anúncios publicitários pode impactar direitos dos consumidores

ou interferir nas decisões de consumo, chegando em sua maioria a

recomendar que houvesse legislação mais apropriada nesse sentido.

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Imitação na Propaganda Comercial

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125

O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade emum Novos Paradigma de Consumo

ALEXANDRE LUZZI LAS CASASWESLEY MOREIRA PINHEIRO

A evolução da pirataria no processo de consumo de produtos

A pirataria é uma forma mercadológica de cópia de produtos, que vai

contra aos interesses econômicos das empresas legalmente estabelecidas

e, em conformidade aos princípios jurídicos e tributários do país. É uma

prática ilegal, porém tem forte adesão de consumo no mundo, especial-

mente no Brasil – tornando-o um dos principais países afetados por esse

tipo de ilegalidade.

Podemos observar que a pirataria nasce a partir da revolução industrial.

As primeiras máquinas têxteis foram patenteadas na Inglaterra, porém

não demorou muito para que cópias dessas máquinas fossem fabricadas

nos Estados Unidos, sem o pagamento devido dos direitos patenteados

aos Ingleses. Mesmo dentro desse contexto não se pode afirmar que a

invenção da pirataria é norte-americana. Podemos então sugerir que a

pirataria nasce por motivos econômicos, e esses motivos ainda refletem

nos dias atuais: a carência de desenvolvimento de máquinas e produtos,

barateando os custos, dentre eles – o fiscal.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

126

Lessig (2004) aponta que os principais setores da mídia de massa – filmes,

música, rádio e TV a cabo – tem ligação em sua origem com a pirataria.

• Filmes: Hollywood foi criada para que os criadores e diretores fugissem

para um Estado onde não houvesse o controle de patentes do inter-

ventor do cinema, Thomas Edison.

• Música: os direitos autorais não deixavam claro o que seria efetiva-

mente considerado como “apresentação pública” e, isso permitiu que

cantores reproduzissem músicas sem pagar os direitos autorais.

• Rádio: nos Estados Unidos quando uma estação de rádio tocava uma

música no ar, isso constitui uma “apresentação pública” do trabalho

do compositor, mas o artista ficava de fora desse ganho.

• TV à Cabo: Quando os empreendedores do cabo começaram a

fornecer às comunidades, muitos deles não pagavam às redes de TV

pelo conteúdo redistribuído.

Podemos perceber que a negação dos direitos autorais atravessa os séculos,

mas o marketing se firma como ferramenta aliada ao processo de pirataria

só nos anos 80 – a partir do momento em que algumas indústrias passam

a copiar ilegalmente modelos e logotipos de marcas famosas, proporcio-

nando ao consumidor, baixo custo – suprindo a elevada procura por

marcas famosas, cujo produto original tem alta precificação. Essa prática

tornou-se muito popular no Brasil e, passadas três décadas, ainda é uma

prática muito comum, fortalecida pelos comerciantes informais como

os camelôs. Apesar de frequentemente a pirataria ser relacionada dire-

tamente com o mercado informal, ou mercado negro, é possível encontrar

pequenas empresas que se apropriam da identidade visual de uma marca

conhecida para alavancar a sua própria marca.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

127

Figura-1 – Logomarcas semelhantes.

A figura 1 ilustra a comparação entre duas identidades visuais: Armani

Exchance (ao lado esquerdo) do estilista Giorgio Armani e, a brasileira

Empório Alex (ao lado direito). Ambas trabalham com moda jovem e

suas interfaces visuais (logomarca, sites, banners) têm muita semelhança.

Não cabe nesse capítulo a discussão sobre plágio ou a intervenção jurídica

sobre a falsificação e a pirataria. Neste momento estamos observando as

similaridades da apropriação visual de uma marca em função da outra.

O Empório Alex usa da aproximação visual da sua marca com a da grife

italiana para causar um efeito de proximidade ao consumidor. Sob a lente

do marketing é possível compreender que o consumidor se sentirá mais

seguro com a segunda marca, em função da primeira. Pagará um preço

menor para ter um produto que necessariamente não se assemelha a

qualidade da versão copiada. Essa é uma prática comum e facilmente

reconhecida na rua ou na Internet.

É necessário levar em consideração que a pirataria está associada a eventos

ligados à cópia. Por exemplo, algumas das ferramentas que possibilitaram

a popularização da pirataria foram a criação dos gravadores de fita cassete

(K7) e os aparelhos de vídeo cassete (VHS). A partir do momento em

que a cópia tornou-se um hábito doméstico, foi fundamental para que o

consumidor assumisse a naturalidade de adquirir uma cópia, pois ele

assumia essa prática em casa, seja de uma fita K7 para um amigo ou uma

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

128

fita de VHS para um parente. Assim propagou-se a desses produtos piratas

na década de 80. O que não aconteceu com o disco de vinil (LP), pois

não havia dispositivos caseiros de cópia.

As pessoas aderem à compra de produtos copiados basicamente por três

motivos:

1 – Custo: preço muito baixo, quando comparado ao produto original.

2 – Comodidade: filmes, álbuns musicais, programas de computador,

recém lançados.

3 – Cultura: hábito de fazer rotineiramente cópias em casa e repassar para

amigos e parentes.

Esses três indicadores certamente proporcionaram uma forma de marke-

ting para o mercado da pirataria, pois por meio deles tornou-se sustentável

o mercado das falsificações. E são esses mesmos indicadores que pro-

porcionaram a popularidade da pirataria ao longo das décadas.

A pirataria teve a sua promoção impulsionada pela criação do CD e DVD.

Por meio de gravadores caseiros, em computadores domésticos, era pos-

sível fazer dezenas de cópias em uma velocidade muito superior ao pro-

cesso de cópia de K7 e VHS. Isso tornou a pirataria mais viral no meio

da mídia do entretenimento. Nesse mesmo período iniciava a avalanche

de cópias piratas de programas de computadores, incluindo o sistema ope-

racional da Microsoft – o Windows – que se tornou o sistema operacional

de computador doméstico e empresarial mais utilizado no mundo.

Até esse momento da história da pirataria é possível identificar como a

sua ligação com o consumidor se dá por meio do marketing. A cultura

da cópia caseira, o compartilhamento dessas cópias entre pessoas conhe-

cidas, e o entendimento que essa ação era para promover e não para

destruir a indústria, fizeram com que ao mesmo tempo, empresas de

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

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softwares particulares crescessem e a indústria fonográfica encolhesse.

Ampliando a sua atuação de forma diversificada a pirataria se fez presente

não só nos produtos ligados à tecnologia digital, mas em todos os tipos

como esportivos, vestuários, acessórios, perfumes e, brinquedos.

O setor da indústria mais afetado na década de 90 foi o setor fonográfico.

A popularização dos computadores e a chegada da Internet em residências

possibilitaram o nascimento de um novo padrão de consumo, o do com-

partilhamento. Se esse valor já existia desde a década de 80 com as cópias

caseiras de K7 e VHS, ele foi ampliado de forma exponencial com a che-

gada da rede mundial de computadores. Ficou cada vez mais fácil adquirir

e compartilhar músicas. Não era mais necessário comprar um CD pirata

que custava três vezes menos do que o original, pois pela Internet, por meio

de arquivo eletrônico chamado MP3, não custaria nada. Apenas o valor do

tempo de acesso, que não era percebido pelo consumidor.

Sites de compartilhamento de arquivos como o Napster, criaram uma

rede mundial de pessoas que dividiam o seu acervo musical umas com as

outras. Isso pulverizou até mesmo o mercado de pirataria tradicional, a

barraquinha do camelô que vendia CD. Até mesmo esse indivíduo foi

prejudicado.

Naquele momento havia uma mudança no padrão de consumo de música,

percebido por poucas empresas, dentre elas a APPLE, que no início do

século XXI, no ápice da crise da pirataria digital de música, criou o iTunes,

uma loja virtual para compra de músicas, separadas ou na forma de álbum

digital. Havia um momento em que o marketing precisava entender a

mudança no padrão de consumo e como isso afetaria o processo de venda,

pois também afetava o processo tradicional de pirataria de CDs.

A tecnologia digital influenciou novos padrões de consumo e também

de pirataria. A Internet e as redes sociais (Orkut, Twitter, Youtube,

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

130

Facebook, entre outras) ampliaram as formas de divulgação e promoção.

O marketing está cada vez mais presente nessas ações promocionais das

cópias, incluindo aquelas que propositalmente nasceram como piratas

para promover um produto legal.

Os novos rumos da pirataria e, seus diversos produtos como música, fil-

mes, softwares, roupas, acessórios, remédios, tendem a caminhar junto

com a evolução da tecnologia. Em muitos casos o marketing torna-se um

agente pró e contra a pirataria, dependendo da situação, como veremos

nos tópicos seguintes.

O Marketing na indústria da pirataria

A pirataria inicialmente pode levar a crença de que o perfil dos consu-

midores dos produtos falsificados está ligado às classes sociais de baixa

renda, não obstante essa é uma visão equivocada. Há consumo de pro-

dutos piratas em praças como a Rua 25 de Março em São Paulo por

diversas classes sociais, da A à E. Nesse sentido, o que difere é a forma

como o consumidor se relaciona com o produto pirata.

A pirataria, mesmo com o prejuízo que ela causa, amplia o conhecimento

das marcas, assim há chances de um consumidor da classe C – que compra

uma bolsa falsificada – vir a comprar a versão original em uma loja esta-

belecida regularmente, mediante as facilidades de parcelamento e de cré-

dito existentes no mercado. Nesse sentido a pirataria pode ser vista como

um agente promotor da marca (KLINE, 2012). Não há comercial da Louis

Vuitton na TV aberta, porém as ruas servem como passarela para

consumidores de várias classes sociais conhecerem a marca. Um dia po-

dem vir a comprar o produto original.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

131

É importante ressaltar que dentro do mercado de produtos piratas há uma

classificação de qualidade. São os produtos de primeira e segunda linha,

classificados pelos ambulantes e comerciantes informais. O mesmo

produto está presente em faixas diferentes de preço. O próprio

comerciante quando busca o produto de origem da China ou do Paraguai

acredita na qualidade daquilo que adquire para revender e, mesmo tendo

ciência de que o produto é uma falsificação, busca comprar a imitação

de primeira linha. Essa crença na qualidade é como um código de honra

entre os vendedores, que passam para o consumidor esse valor, fazendo-

o também acreditar que está comprando um produto de qualidade

comparável ao original (MACHADO, 2008).

As falsificações mais baratas, são mais simples, com qualidade inferior,

por isso as chamam de produtos de segunda linha, dentro do mercado

da pirataria. Produtos com melhor acabamento, mais próximos do

original, são mais caros, porém oferecem maior qualidade e durabilidade,

denominados primeira linha. O consumidor percebe esse valor, quando

a precificação não se impõe com relação ao custo-benefício, assim o

consumidor opta pelo mais caro, devido à suposta qualidade e, a

similaridade com o produto original.

Esse é o ponto central para a observação de marketing. Notar que mesmo

dentro da pirataria há segmentação e posicionamento. Observar o valor

agregado e a percepção do consumidor quanto a isso, e certamente poderá

aproximar o consumidor do produto original. Porém é um erro afirmar

que o comprador de produto pirata é um ex-comprador ou futuro

consumidor de produtos originais.

A percepção da proximidade do produto pirata com o original se dá

inicialmente pelo seu aspecto exterior por meio da reprodução da

embalagem, marca e, formatos do produto. É uma percepção individual

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

132

e, o que pode ser definido como legal ou ilegal no mercado, pode não

ser percebido pelo consumidor (TRINDADE, 2008). O que favorece a

pirataria é a possibilidade de vivenciar o prestígio de usufruir de uma

marca famosa, pagando baixo valor de precificação.

Diferentemente da pirataria de filmes ou de música, a pirataria de pro-

dutos como roupas, acessórios, e brinquedos, acontece por motivo de

status social. As marcas consumidas são famosas no mundo e, com alta

precificação. A pirataria nesse sentido torna-se uma alternativa para o con-

sumo de marcas caras. Isso não significa que somente os indivíduos de

baixa renda consomem o produto falsificado. Há distinção dos cenários

de consumo e o marketing precisa estar atento para esses fenômenos

sócio-culturais.

O indivíduo de classe com renda alta compra o produto pirata em dias e

horários alternativos, normalmente fora dos chamados momentos de

picos, como finais de semana e datas festivas. Isso para que seus pares não

o vejam comprando um produto ilegal (TRINDADE, 2008). O risco da

associação da ideia de consumir algo falso faz o indivíduo correr o risco

de ser repelido por seus pares sociais.

Uma pesquisa realizada por Trindade (2008) na cidade do Rio de Janeiro

– nas zonas Oeste e Sul – com consumidores de produtos piratas, apontou

comportamentos distintos sobre os consumidores e a sua posição social.

Indivíduos das classes A e B compravam produtos falsificados de primeira

linha com a finalidade de utilizá-los na academia, escola ou faculdade.

Em eventos mais sofisticados utilizavam produtos originais. Indivíduos

de classes de baixa renda consumiam as duas categorias de produtos pira-

tas, primeira e segunda linha, para dois momentos distintos: produtos

de primeira linha em ocasiões solenes e especiais e, os de segunda linha

no dia a dia.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

133

Podemos observar que nesse contexto aplica-se o efeito trickle-down. O

indivíduo de classe de alta renda, que consome produtos originais man-

tém uma posição social garantida e, passa a transitar pelo universo das

falsificações sem que haja alto risco de rejeição social. As classes C e D,

com menos recursos financeiros, encontram na falsificação um meio de

aquisição de marcas caras, para poder se aproximar dos indivíduos de

classes de rendas mais altas (TRINDADE, 2008).

O marketing pode usufruir dessas percepções ligadas ao status social e

promover o uso dos produtos originais como forma de sustentabilidade

da posição na sociedade. A pirataria na perspectiva do consumo apresenta

elementos de comportamento para as estratégias de marketing das

empresas de produtos originais. Não adianta apenas esperar a ação efetiva

por meio dos órgãos governamentais no combate à pirataria. O marketing

pode e deve exercer a sua função no sentido de resgatar o consumidor

das barraquinhas de camelô, para os corredores dos shoppings. Mesmo

com as exorbitantes diferenças de preços é possível atacar a pirataria e,

para isso é preciso conhecer bem o cenário do mundo das falsificações.

É preciso entender o que efetivamente o consumidor busca e espera desses

produtos.

A pirataria de software

Possivelmente a primeira forma de pirataria digital mais conhecida pelo

consumidor é a de programas de computadores. Este tipo de pirataria

ocorre por meio de cópia, download na Internet, ou distribuição de

software com direitos autorais protegidos sem autorização do fabricante.

A pirataria de software teve a sua popularização junto com o crescimento

do uso de computadores domésticos. Nos anos 90 o sistema operacional

da Microsoft – Windows – foi o programa de computador mais pirateado

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

134

do mundo. Isso ocorreu pela necessidade de sistema operacional em todo

microcomputador, conhecido como PC, cuja venda do dispositivo físico

não contemplava o armazenamento de sistema operacional e pacotes de

programas como editores de textos, planilhas ou, banco de dados. O

único sistema operacional oferecido no mercado para a instalação em

computadores PC era o Windows, criando um monopólio do setor.

Sistemas operacionais gratuitos como o Linux eram rudimentares,

apresentavam alto grau de dificuldade de usabilidade e, requeria conheci-

mentos técnicos avançados, inviabilizando a utilização por parte de um

usuário doméstico comum. Como computador e programas eram ven-

didos separadamente, o usuário optava por comprar o componente físico

e, com a cumplicidade das lojas, instalavam irregularmente o sistema

operacional.

Esse foi um mercado que avançou muito, principalmente porque a pira-

taria era oferecida como um serviço de bonificação para o cliente. O clien-

te comprava e a loja instalava. Em muitos casos o consumidor nem tinha

noção de que estava comprando um computador com sistema operacional

pirata.

Muito próxima a realidade da pirataria de software é a de jogos eletrô-

nicos. Os jogos tanto para computadores, quanto para dispositivos pró-

prios como Xbox ou Playstation, sofreram a competição de cópias piratas,

devido à facilidade de reprodução e distribuição das falsificações. Para a

indústria de jogos eletrônicos esse foi um fator decisivo para impulsionar

o marketing de relacionamento, com o objetivo de ampliar o contato com

os jogadores/consumidores e torná-lo mais duradouro e profundo para

não perdê-lo para a pirataria (KRÜGER; MOSER, 2005).

Com relação aos problemas causados pela pirataria de software, Casali

et al. (2005) apontam quatro consequências:

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

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1 – diminuição de pesquisa e desenvolvimento por parte da indústria;

2 – elevação dos preços dos softwares;

3 – perda de arrecadação de impostos;

4 – ausência de associação da pirataria com o crime.

O ponto central desse processo de popularização dos programas de com-

putadores piratas é o consumidor. Diferentemente de outros casos como

os de falsificação de roupas, perfumes ou acessórios, o consumidor de

programas piratas de computadores não tem noção exata se está ou não

adquirindo algo irregular.

Com relação à pirataria de software o consumidor apresenta algumas

características com relação a sua percepção do produto, que o leva a

comprar a versão falsificada.

– O produto mantém a qualidade técnica similar ao original, apesar de

não possuir suporte técnico;

– O preço é muito inferior ao do original;

– Facilidade na aquisição pela Internet;

– Ausência da percepção sobre punição;

– Não sabe diferenciar um programa original de um pirateado.

Para minimizar os impactos da pirataria no mercado de programas de

computadores, empresas como Microsoft e Adobe têm distribuído no

mercado versões mais simples de seus principais programas. O consu-

midor pode comprar uma versão básica e com o tempo migrar para uma

versão mais completa, ou adquirir os pacotes que contemplam vários pro-

gramas. São estratégias que visam minimizar os impactos da pirataria de

software e ampliar o consumo legal.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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Os chamados softwares livres, ou programas gratuitos de computadores

como o Linux, por exemplo, evoluíram, e por meio de parcerias gover-

namentais têm ajudado a diminuir o preço para a população adquirir o

seu computador. Um caso interessante é do microcomputador Positivo.

Ele pode ser encontrado em lojas de departamentos e hipermercados com

preços populares, e crédito facilitado. Esse é um caminho que o marketing

pode auxiliar no combate à pirataria de softwares, promovendo parceria

com a indústria de computadores, facilitando a aquisição de programas

originais por funcionários e parentes de empresas regularizadas, que uti-

lizam softwares legais. Por meio do marketing é possível demonstrar para

os consumidores os benefícios da aquisição de um programa original.

Do mesmo modo é possível destacar os riscos que o indivíduo corre por

ter um programa pirata. Um dos maiores problemas do programa

pirateado é a falta de segurança. Muitas vezes o indivíduo efetua o

download pela Internet e instala outros programas para romper o “lacre

virtual” do software original. Normalmente esses programas, sem que o

usuário perceba, instalam vírus de computador e, alguns deles extraem

informações sigilosas como senhas e dados de contas bancárias, correndo

o risco de o usuário ser assaltado virtualmente. O lado negativo da pira-

taria de software pode e deve ser explorado nas campanhas de marketing

como fortalecimento dos produtos originais.

A pirataria na música e as implicações ao Marketing

A indústria fonográfica possivelmente é a que mais sofreu com a pirataria

no mundo ao logo das últimas décadas, pois nesse caso específico houve

uma mudança no padrão de consumo, com o apoio da rede mundial de

computadores. Até meados da década de 90 somente o CD pirata era o

problema da indústria da música no mundo, mas a Internet possibilitou

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

137

a criação de um novo formato de música, o MP3. Esse tipo de arquivo

proporcionou o compartilhamento de músicas por meio de sites de

armazenamento de arquivos. Uploads e downloads de MP3 mudaram o

padrão de consumo de música no mundo.

A velocidade com a qual se proliferavam os arquivos pirateados dificultou

qualquer tentativa de banir esse comportamento de consumo. No final

da década de 90 o Napster criou uma eficiente rede de distribuição musi-

cal. A inovação permitia a transferência ou download, de arquivos

musicais de um computador para outro. Esse movimento de compartilha-

mento dos arquivos de músicas popularizou a pirataria virtual (BARROS,

2008). Depois do Napster, muitos outros sistemas virtuais de compar-

tilhamento apareceram como KaZaa, eMule ou LimeWire, tornando

impossível impedir a quebra do paradigma de consumo da música. Para

o consumidor isso significou apenas comodidade, para indústria um re-

projeto.

Essa mudança no padrão de consumo possibilitou ao indivíduo obter a

aprovação de seus pares para esse tipo de comportamento. O individuo

não entende que o compartilhamento de músicas seja ilegal ou imoral, é

apenas um novo sistema de aquisição.

Enquanto a indústria tradicional da música continuou orientando o

consumo de CD e, batalhava na justiça para proibir a utilização se sistemas

de compartilhamento de arquivos pela Internet, a APPLE conseguiu

popularizar a sua loja virtual o iTunes, principal fonte de comércio de

música digital do mundo, nos dias atuais. O quadro 1 evidencia o impacto

da pirataria digital na indústria fonográfica nos últimos anos.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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Quadro 1: Certificação das vendas de CDs Nacionais

Antes de 01 de jan/2004 Até de dez/2005

Ouro 100.000 Ouro 50.000

Platina 250.000 Platina 125.000

Platina Duplo 500.000 Platina Duplo 250.000

Platina Triplo 750.000 Platina Triplo 375.000

Diamante 1.000.000 Diamante 500.000

Até 31 de dez/2009 A partir de 01 de jan/2010

Ouro 50.000 Ouro 40.000

Platina 100.000 Platina 80.000

Platina Duplo 200.000 Platina Duplo 160.000

Platina Triplo 300.000 Platina Triplo 240.000

Diamante 500.000 Diamante 300.000

Fonte: Associação Brasileira dos Produtores de Disco (ABPD)

O quadro 1 representa o impacto da pirataria na indústria fonográfica

tradicional entre os anos de 2004 e 2010. Em menos de uma década a

quantidade necessária para certificar um CD como ouro, platina ou

diamante, caiu em média 70%. Ou seja, atualmente basta vender um

terço da quantia necessária de discos de 2004 na categoria diamante para

obter a mesma certificação hoje. Essa revisão na métrica de certificação

de vendas pode ser alterada nos próximos anos, diminuindo ainda mais

a quantidade mínima necessária para obter algum grau de certificação.

Para minimizar o impacto na queda das vendas de CDs podemos pensar

em um marketing mais cuidadoso e segmentado, com estratégia de

divulgação de nichos. As pessoas de alguns segmentos são naturalmente

propensas a consumir CDs compatíveis ao seu nicho, porém essa

segmentação exigiria um departamento de marketing formado por

profissionais altamente especializados no tipo de música relacionado ao

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

139

público consumidor (BARROS, 2008). É uma medida paliativa, que

dificilmente se sustenta ao longo dos anos.

Na realidade é necessário pensar na mudança do mercado. Atualmente

os álbuns musicais são lançados com a função de promover shows. Como

as vendas são cada vez mais baixas em função da pirataria digital, o

mercado de entretenimento do showbizz passou a ser o foco das estratégias

dos cantores, bandas e afins. Assim o marketing caminha nesse sentido.

A questão da pirataria na música não é pura e simplesmente de âmbito

jurídico, mas de padrão cultural. As pessoas entendem que compartilhar

música não é crime. Elas estão até dispostas a comprar uma música virtual

pelo iTunes, mas não na mesma proporção de décadas atrás. Talvez

compre por lealdade ao artista, mas o que ela simplesmente quer ouvir

despretensiosamente buscará por meio dos recursos gratuitos da Internet.

Então o caminho do marketing no segmento de música é promover a

canção para fortalecer as ações de apresentação em festivais e turnês –

regional, nacional ou mundial. Parcerias com outras marcas e empresas

também são bem-vindas.

Livro Digital: um novo paradigma de consumo?

A cópia impressa ou digital sem a devida autorização do autor ou de seu

representante é crime, porém não é de hoje que a cópia de livros é um

problema para as editoras, principalmente no meio acadêmico.

Mais uma vez a Internet proporcionou um aumento na pirataria. As

cópias digitalizadas de muitos livros são facilmente encontradas pela rede

mundial de computadores. Em 2005 para combater a pirataria de livros

foi criada a Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR), cujo

primeiro acordo com as copiadoras foi estabelecer a permissão da

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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reprodução de 10% do conteúdo de cada obra. De acordo com a ABDR

o mercado editorial perde mais de um bilhão de Reais por ano no Brasil,

contabilizando bilhões de cópias ilegais, principalmente pelos estudantes

do ensino superior (MOURA, 2011). Ainda segundo a ABRD 30% do

material pirateado são acessados pela internet.

O mercado de publicações de livros apresenta um tipo de pirataria muito

próximo da pirataria de música. De modo semelhante ao que aconteceu

com as vendas de músicas digitais, o mercado de livros tende também a

fragmentar os seus conteúdos. Para incentivar o consumo a estratégia de

marketing foi concebida em função de atrair o consumidor para a compra

de partes de livros, somente as quais o interessam. Isso faz com que o

consumo seja segmentado e amplie as vendas online. As editoras têm

ampliados os investimentos em livros customizados (MOURA, 2011).

Algumas Instituições Privadas de Ensino Superior têm aderido a esse novo

cenário, incentivando a compra de capítulos de livros. Além de baratear

o preço de uma obra, amplia o consumo, pois o estudante pode comprar

10 capítulos de livros diferentes, de obras as quais nem compraria se não

fosse por essa perspectiva.

Essa é uma alternativa muito semelhante à estratégia da Apple com o

iTunes. De forma análoga às mudanças no padrão de consumo de música

digital é possível identificar que o consumo de livro segue o mesmo

caminho. É preciso também levar em consideração que as novas gerações

aprenderam a ler por meio de dispositivos eletrônicos, logo a leitura

impressa não tem mais tanta importância na cadeia de valores dos jovens.

Isso significa que a leitura tende a ser cada vez mais virtual, por meio de

tablets, computadores, celulares e aparelhos de TV. É um novo padrão

de consumo. Ainda não é tão radical quanto o caso da música, mas é

crescente e dificilmente as editoras conseguirão reverter esse processo.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

141

A alternativa da customização de obras deve inibir o crescimento da

pirataria de livros técnicos e acadêmicos, pois o estudante opta pela sua

necessidade dentro da sua possibilidade econômica. O marketing tem

dentro dessa alternativa um grande aliado para as ações de comunicação

e promoção: volume de conteúdo mais objetivo e preço mais baixo.

Essa mudança no padrão de consumo de livros afeta também os autores

das publicações. Não será mais preciso escrever capítulos de livros apenas

para atingir um número adequado de páginas para terminar uma obra.

Livro do tipo “organizado” que reúne uma série de autores, em forma

de artigos, passa a ser totalmente fragmentado para a venda online,

possibilitando ao consumidor a seleção da parte que mais o interessa.

É uma guerra que não está perdida, mas é necessário o entendimento da

mudança na forma de aquisição e consumo e, as editoras que não se

adequarem a esses novos padrões, certamente terão um destino muito

próximo ao da Kodak.

A indústria farmacêutica e os remédios falsificados

Possivelmente essa é a modalidade que oferece maior risco para a

população, a pirataria de remédios. São cada vez mais freqüentes as

notícias de roubo de cargas, roubo dentro de hospitais e, vendas

clandestinas de medicamentos. A pirataria cresce no mercado brasileiro

e a falta de informação adequada e a facilidade de compra pela Internet

são razões para esse crescimento.

A Internet facilitou as vendas de medicamentos controlados. Essa

modalidade de compra fácil movimenta milhões de reais. Produtos

originais contrabandeados e falsificados se misturam nesse mercado. Por

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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mais fácil que seja a aquisição, o cliente não tem garantias da procedência

e da qualidade. Isso o torna refém de produtos que podem até levá-lo à

morte. Essa é a brecha que a falsificação e a pirataria proporcionam e, o

ataque do marketing é fundamental para inibir o comércio ilegal.

Campanhas de conscientização do alto risco que esses produtos têm em

conseqüência negativa à saúde devem ser exploradas. Mesmo para o

indivíduo que compra o produto de procedência desconhecida por não

ter uma receita médica, precisa ter a consciência de que sua vida está em

risco.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) informa que os

produtos mais pirateados e contrabandeados são aqueles que possuem

maior valor agregado e consequentemente são mais caros, além dos

remédios para a disfunção erétil (MACHADO, 2011; Valor Econômico,

2012). A fama Viagra alavancou as vendas desse tipo de medicamento

contrabandeado ou falsificado, por motivos econômicos e culturais. Os

consumidores de remédios de disfunção erétil estão em faixa-etária

variada, de jovens de 18 anos a senhores de 80. Vale ressaltar que muitos

dos consumidores adquirem o produto irregular pela a facilidade de

compra sem receita médica.

O desafio do marketing ao combate específico dessa modalidade de

pirataria está ligado às ações da indústria farmacêutica em prol de

conscientização dos males que o remédio pirateado pode causar; o esforço

com relação as organizações médicas como CRM em movimentos para

inibir esse tipo de consumo, por meio de campanhas; e por meio do

Estado, que deve agir com mais freqüência nas campanhas de conscien-

tização dos riscos desse consumo. A principal característica que o

marketing precisa observar nesse cenário é que o consumo se dá por conta

da facilidade de aquisição sem a formalidade da receita médica. O

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

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consumidor busca essa comodidade, esquece os riscos, seja por motivo

de automedicação, indicação por pessoa de seu círculo social, ou mesmo

por fantasia, como é o caso dos remédios de disfunção erétil, consumido

por muitos jovens que não possuem deficiência em sua capacidade sexual.

Outros vilões que movimentam esse mercado ilegal são os emagrecedores

e anabolizantes. O Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP)

pontuou que esses produtos são encontrados em locais irregulares, como

feiras, camelôs e internet, mas também podem ser encontrados em

farmácias, drogarias e lojas. Para sensibilizar a população com relação ao

risco que ela corre consumindo esses produtos de forma irregular, o

governo federal por meio da ANVISA criou em 2009 a campanha

“Medicamento verdadeiro” (Valor Econômico, 2012).

Deve haver uma sinergia entre a indústria farmacêutica e o poder público

em prol de campanhas intensivas de conscientização do consumo regular

de medicamentos. O marketing deve contribuir com a formatação dessas

campanhas, com pesquisas junto ao público consumidor para entender

as suas necessidades e, estudar ações que visem baratear os produtos e

ampliar as facilidades de vendas regulares em estabelecimentos legais.

Pirataria um mal necessário

A distribuição ilegal de cópias de produtos, programas de computadores,

filmes e músicas, causa prejuízo para a indústria formal, porém há casos

em que a pirataria fortalece as vendas de um produto e o torna um sucesso.

Lessig (2004, p.59) aponta que “muitas formas de pirataria são úteis e

produtivas, seja para produzirem conteúdo novo ou para criarem novas

formas de negócios. Nada na nossa tradição ou em qualquer outra jamais

negou toda a pirataria nesse sentido da palavra”.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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O primeiro exemplo clássico é o do sistema operacional Windows da

Microsoft. Ele foi pirateado no mundo inteiro, porém isso o tornou o

principal programa de computador utilizado por pessoas, pequenas,

micro e grandes empresas. A pirataria de software possibilitou a empresa

de Bill Gates à consolidação como monopólio de sistema operacional para

microcomputador PC, durante duas décadas. Tentativas de emplacar sis-

temas operacionais gratuitos perdiam força devido a dependência cada

vez maior do indivíduo ao programa da Microsoft. Com o seu posicio-

namento definido e consolidado a empresa então passa a combater a

pirataria, como forma de oficializar um mercado que já era dela. Seus

sistemas, servidores e programas tiveram na pirataria uma alavanca para

a sua consolidação. “Quando os chineses ‘pirateiam’ o Windows, isso

torna a China dependente da Microsoft. A Microsoft perde o valor do

software tomado. Mas ele ganha usuários que estarão acostumados a

viverem no mundo da Microsoft” (LESSIG, 2004, p.59).

O filme Tropa de Elite é outro exemplo de produto que foi beneficiado

diretamente com a pirataria. O filme tinha previsão de lançamento nas

salas de cinema em novembro de 2007, mas foi foco da pirataria meses

antes da sua estreia. A cópia ilegal rapidamente se espalhou pelas bancas

de camelô pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e outras muitas

cidades, e pela Internet em diversos sites de download (TORRES; SARAIVA;

PAZ, 2008).

O que poderia ser uma catástrofe tornando-o filme conhecido e desgas-

tado em sua estreia revelou-se uma potente arma de promoção. A distri-

buição ilegal não afetou o desempenho do filme, pelo contrário, tornou

um dos filmes mais assistidos do ano, superando grandes produções de

Hollywood. O marketing promocional do filme se deu por conta da dis-

tribuição ilegal e toda a repercussão que teve entre as pessoas que tiveram

acesso a essas cópias (TORRES; SARAIVA; PAZ, 2008).

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

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O compartilhamento pela Internet é uma forma que proporciona a livre

circulação de informação, porém a indústria cultural entende que a rede

mundial de computadores ajuda apenas a promover a pirataria.

É preciso observar as oportunidades dentro do conceito de distribuição

da pirataria em função de uma promoção mais ampla, com menos custos

e com apelo popular garantido. Nessa linha é possível apontar para os

supostos “vazamentos” de músicas pouco antes do lançamento oficial de

um álbum. A cantora Madonna utiliza esse artifício desde 2000. No

período próximo ao lançamento de um álbum, inesperadamente algumas

músicas aparecem na Internet. Com isso as pessoas conhecem o trabalho

e dão um indicativo se será ou não, aceito no mercado consumidor. Se a

resposta for negativa, ou seja, houver rejeição por parte do público, então

haverá tempo para mudanças na edição das canções e nas estratégias de

marketing para a divulgação. O maior resultado dessas ações pode ser visto

pelo fato de seus últimos 4 álbuns terem estreado como número um em

vendas, já no primeiro dia. Em seu último álbum MDNA (2012) foi

utilizado mais uma vez esse recurso, possibilitando que as pessoas

conhecessem meses antes o seu novo trabalho e assim iniciassem um buzz

marketing pelas redes sociais na Internet. Com isso o álbum estreou em

primeiro lugar de vendas em mais de 40 países, incluindo os principais

mercados consumidores como Estados Unidos, Japão e Inglaterra.

É possível perceber que há algumas ações de marketing que são travestidas

de pirataria e ações de pirataria que acabam beneficiando o marketing.

Assim a observação dos rumos que o mercado consumidor toma com

relação a utilização dos mecanismos de distribuição de arquivos, prin-

cipalmente pela Internet, pode ser aliada das estratégias de marketing.

Isso não significa que a pirataria deve ser encorajada.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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A pirataria nas redes sociais

A popularização da Internet e a evolução das ferramentas digitais levaram

o indivíduo para um tipo de vida paralela, onde tudo é possível: estudar,

trabalhar, fazer compras e, se relacionar. Com a população cada vez mais

conectada fatalmente nichos de contatos e relacionamentos seriam cria-

dos. E assim foi. Desde 2004 com o surgimento da primeira rede de rela-

cionamento efetivamente popular no mundo, o Orkut, a forma com a

qual estabelecemos o nosso elo na sociedade virtual tem se intensificado.

Milhões de pessoas conectadas por meio de páginas da Internet, nas for-

mas de Blogs, microblogs e, sites de relacionamentos. Com uma

população cada vez mais frequente e atuante na Internet, o avanço da

pirataria digital seria inevitável. E foi.

Todas as ferramentas criadas para o compartilhamento de as mídias sociais

fomentaram o aumento do consumo dos produtos piratas, livros,

softwares, músicas, filmes entre outros, formando assim a pirataria digital

(CASALI, 2005).

As ferramentas mais conhecidas de proliferação da pirataria pela Internet

são:

Sites de compartilhamento: são páginas na Internet que disponibilizam

acesso em servidores para que o usuário faça download e upload. Um dos

sites mais conhecidos de compartilhamento de arquivos é o MegaUpload,

que foi fechado pelo governo dos Estados Unidos, por meio da polêmica

lei anti-pirataria conhecida como SOPA. Porém ainda há muitos sites

semelhantes como o 4shared e RapidShare espalhados pelo mundo, prin-

cipalmente em países como a China. É por meio desse tipo de ferramenta

que são armazenados e descarregados, programas de computadores, mú-

sicas em formato MP3 e filmes.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

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Blogs: é uma página pessoal, fácil de ser utilizada e frequentemente usada

com fins de promover assuntos de nicho, como Música, Cinema e

Informática. Por meio dos blogs a proliferação de links de arquivos arma-

zenados nos sites de compartilhamento toma proporções exponenciais.

Mesmo com o fechamento de um blog, nada impede que dez outros no

mesmo segmento, com as mesmas intenções de promover a pirataria

sejam criados, quase que em tempo real. Os tipos mais comuns de pro-

moção a pirataria por meio de blogs são música, filmes e programas de

computadores.

Sistemas de Compartilhamento: diferentemente dos sites de compar-

tilhamento, essa ferramenta é um programa instalado no computador do

usuário ao qual compartilha arquivos com todos os outros usuários do

mesmo sistema. Os arquivos ficam localmente no computador de cada

usuário, diferentemente dos sites de compartilhamento que armazenam

os arquivos em servidores. O Napster, a famosa ferramenta de compar-

tilhamento de arquivos foi a pioneira na distribuição de arquivos piratea-

dos e uma das principais agentes pela mudança dos rumos que a indústria

fonográfica sofreu ao longo deste século. Atualmente há ferramentas

conhecidas como o Bittorrent e Limeware.

Mídias sociais: Twitter, Orkut, Facebook, entre outras, são as mídias

digitais que mais agravam a distribuição de links para downloads de arqui-

vos piratas (músicas, filmes ou softwares). É também por meio dessas mí-

dias que outros agentes piratas divulgam seus produtos falsificados (roupas,

assessórios, brinquedos) para a venda online, inclusive medicamentos.

O maior problema da proliferação da pirataria por meio das redes sociais

na Internet é a forma como o indivíduo entende o produto que está con-

sumindo. Raramente ele entende como pirata, nocivo, ilegal ou imoral.

É uma oportunidade rápida e barata, apenas.

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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Em um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal de Minas

Gerais (UFMG) sobre o comportamento dos consumidores de produtos

piratas, foi constatado que “comparando a pirataria virtual com a eventual

perda de vidas, o jovem reduz o dano de suas ações” (SAUERBRONN et

al., 2010, p.18). Com relação à pirataria de música, por exemplo “os

jovens minimizam o impacto econômico de suas ações baseados no fato

de que artistas consagrados já acumularam fortunas e não sofrerão

impacto se alguém baixar o CD na internet (‘A Madonna já está muito

rica. Além disso, ela ganha dinheiro mesmo é no show! Ela já nem trata mais

com gravadora, trata com firma de shows.’). Esse pensamento reforça a ideia

de que o padrão de consumo mudou, a forma com a qual o consumidor

se relaciona com o consumo não é mais a mesma, então de nada adianta

pensar que as redes sociais são vilãs, que promovem a pirataria. Apesar

de ser um canal de comunicação e promoção, é por meio do ser humano

e do seu entendimento de certo e errado que a pirataria avança pela

Internet. E mais uma vez cabe ao marketing um esforço de entendimento

sobre como obter oportunidades dentro dessas mudanças de consumo.

Marketing contra a pirataria

A prefeitura de São Paulo informou que no período entre dezembro de

2010 e março de 2012 foram apreendidos mais de 58 milhões de produtos

piratas. Em 2011 a Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro

(Fecomércio-RJ) apresentou uma pesquisa nacional, feita em mil domi-

cílios de 70 cidades, em nove regiões metropolitanas. O objetivo era des-

vendar o perfil do consumidor de produto pirata no Brasil. Vejamos

alguns dados dessa pesquisa:

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

149

• 52% dos entrevistados compraram algum produto pirata em 2011.

• 96% dos entrevistados que compraram o fizeram por causa do preço.

• 57% dos consumidores das classes A/B compraram algum tipo de

produto pirata, contra 52% na classe C e 44% nas classes D e E.

• 80% dos entrevistados acreditam que a pirataria prejudica artistas e

fabricantes.

A pirataria se apresenta em um primeiro momento como uma concor-

rente tradicional de mercado, pois seus produtos falsificados disputarão

consumidores com as empresas donas das patentes das marcas originais

(RYNGELBLUM, 2005). Mesmo com a aparente vantagem do posiciona-

mento dos produtos piratas enquanto preço é possível ter as ferramentas

de marketing como apoio aos esforços de combate à pirataria. Vimos que

há questões sociais e culturais envolvidas no processo de compra de pro-

dutos de marcas famosas, e fazer um esforço para que o cliente perceba o

valor agregado de um produto original pode pesar na decisão na hora da

compra.

É possível que haja um desânimo com relação à concorrência entre pro-

duto pirata e produto original, por questões econômicas ligadas à re-

muneração de direito autoral, carga tributária, ou mesmo estrutura admi-

nistrativa da empresa. Elementos que não incidem sobre o mercado das

cópias. Para que a indústria possa concorrer com a pirataria é preciso pen-

sar em ações focadas e posicionadas nos diversos tipos de pirataria. Cada

mercado pirateado exigirá uma forma específica de atuação do marketing.

Na música, por exemplo, a estratégia é focar nas apresentações ao vivo,

nas parcerias com marcas; aos produtos de marcas famosas, é preciso tra-

balhar a noção de valor agregado ao cliente como, qualidade, bom aten-

dimento, formas de parcelamento, garantias e afins. Não há receita

estratégica, mas há necessidade de um esforço para atuar contra a pirataria

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Alexandre Luzzi Las Casas e Wesley Moreira Pinheiro

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de modo a encará-la como um problema nicho, não como um problema

globalizado. Os diversos tipos de piratarias abordados neste capítulo

mostram o quanto segmentado o mercado ilegal.

A concorrência desleal dificulta a estratégia empresarial, pois a situação

torna-se mais complexa. Não basta uma análise competitiva tradicional

para resolver os problemas com a pirataria quando o produto concorre

com a sua cópia. O consumidor precisa conhecer as diferenças entre um

produto e outro. Há também a necessidade incondicional de políticas

de preços mais flexíveis e de reformas tributárias eficientes.

Aproximação de preços, pelo menos para os títulos e modelos mais

visados, a veiculação das possíveis diferenças de desempenho, de

rentabilidade, de durabilidade e outras características de qualidade

que um produto contrafeito deixasse de apresentar, a promoção

de serviços complementares ao usuário-consumidor no pós-venda,

que pudessem atrair por seu apelo, são algumas ações que via-de-

regra não são experimentadas (RYNGELBLUM, p. 13, 2005).

Um bom exemplo de combate a pirataria mediante aos novos padrões

de consumo é o caso dos serviços online para a distribuição de filmes.

Empresas como Netflix, Netmovies, Sky e Apple disponibilizam

ferramentas para que o consumidor possa assistir seus filmes preferidos

por meio de aparelhos de TV, celular ou computador, utilizando a

Internet. Com preços competitivos essa estratégia de ataque à pirataria

de DVD de filme, apresentações musicais e documentários vem

conquistando rapidamente a adesão do consumidor, que não quer

comprar o filme em forma física. Assim ele evita de fazer download

ilegalmente e volta para o consumo formal. As empresas têm percebido

uma oportunidade viável nesse sentido. Outras empresas que aderiram

a essa perspectiva foi o comércio eletrônico Submarino e o portal Terra.

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O Marketing da Pirataria: Legalidade e Ilegalidade em um novo ...

151

O marketing pode contribuir em ações de combate ou estratégias de

adaptação quando um padrão de consumo tenha se estabelecido,

mudando as regras de aquisição de um produto, não obstante é

importante ter a consciência que essas medidas são pontuais e visam

minimizar os impactos nocivos da pirataria no mercado formal. Não há

como pensar a extinção da pirataria sem políticas públicas e reforma

tributária, porém enquanto o Estado não consegue atacar de forma

eficiente e definitiva, cabe ao marketing fazer a sua parte.

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155

Da Falsa Produção de Consumo ao Consumodos Falsos Produtos1

THAÍS NOVAIS DE CURTIS

“Se você não tem, falsifique! É baixa demais?Ponha um salto bem alto, mas pratique o passo!”

VICTORIA BECKHAM

“O inimigo do autor não é a pirataria, é a obscuridade”TIM O’REILLY

Em uma matéria apresentada pela televisão brasileira, em 15/08/2010,

sobre o prejuízo que os produtos falsificados trazem ao bolso do consu-

midor, revelando esquemas de pirataria desde fábricas até camelôs, é

curioso notar o discurso do ambulante para convencer um consumidor

sobre a originalidade de seu produto. Ele transforma uma furadeira sem

marca em uma das líderes de mercado:

“É original, mas não da Bosch. A máquina é original, qualidade

boa. Ela é furadeira e parafusadeira”, diz o vendedor. “Eu tenho

o selinho aqui, dá pra colocar o selinho nela”, continua ele. “Você

1. Trabalho originalmente apresentado apresentado no DT 2 – Publicidade e

Propaganda do XVI Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste realizadode 12 a 14 de maio de 2011.

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Thaís Novais de Curtis

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pode levar e colocar lá. Vem tudo branco e é só colocar nela aí”,

concluiu.

Esse é um cenário cada vez mais comum no cotidiano dos mercados de

produtos falsificados. Por um lado, vendedores de produtos piratas que

desejam convencer seu público sobre as qualidades daquilo que estão ven-

dendo. Por outro, consumidores ávidos por satisfazer seus desejos, na

direção que a publicidade sempre se propôs, alimentando-os com as mais

diversas promessas do mundo do marketing.

De forma resumida, buscaremos explicitar como a falsificação leva

consigo o emblema da nova classe média, apresentando-se não somente

como comportamento social, mas também como uma força social, sendo

que alguns estudiosos já consideram a falsificação e sua comercialização

como uma estratégia de marketing.

Uma primeira linha de raciocínio é buscar superar a falsa dicotomia entre

o consumo do que é necessário e o consumo de supérfluos. Falsa dico-

tomia porque jamais saberemos ao certo onde passa a linha divisória entre

uma coisa e outra. As necessidades são muitas, mas são sobretudo

diferentes. O que é necessário para um, nem sempre o é para outro. Mais

ainda, o que é definido como necessário por uma cultura, pode ser

simplesmente supérfluo em outra. Basta pensar na cultura dos monges

tibetanos para verificar que a meditação é tão necessária quanto a alimen-

tação, sendo que a quase totalidade do que os ocidentais consomem não

seria mais que supérfluo para eles. Mesmo quando se fala em necessidades

básicas, das quais ninguém, supostamente, poderia abrir mão, vê-se o

quanto elas diferem de uma cultura a outra. O que é supérfluo, portanto,

varia na mesma proporção da ideia que se faz do que é necessário para

cada um. Tais conceitos parecem decorrer, portanto, do campo da

cultura, visto que cada cultura desenha os hábitos e costumes dos

indivíduos.

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Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos

157

Isso nos leva a uma segunda linha de raciocínio, que busca entender o

consumo não apenas no interior dessa dicotomia entre o necessário e o

supérfluo, mas no campo de outra dinâmica, onde se vincula a questão

da aquisição de bens com as várias estratégias de produção de desejo. De

fato, a discussão sobre o que é necessário ou supérfluo para a vida de

alguém decorre diretamente das ações de aquisição de bens, da dificuldade

ou facilidade em se adquirir alguma coisa, do preço e esforço que se deve

fazer para isso, e, portanto se vale ou não a pena tal sacrifício ou vaidade.

Mas quando se pensa do lado da produção do desejo, percebe-se que os

indivíduos encontram-se dentro de uma rede mais complexa, que envolve

uma série de agentes que suscitam, instigam, fomentam seus desejos.

Aqui, o consumo deixa de ser entendido simplesmente como um ato de

consumir, e passa a ser visto como aquilo mesmo que é produzido, inven-

tado dentro de cada um.

Essa perspectiva se tornou mais clara desde que nos entendemos no inte-

rior de uma sociedade na qual a produção de bens materiais vem cedendo

lugar a uma produção de bens cada vez mais imateriais. O trabalho no

mundo contemporâneo produz bens imateriais, e é esse imaterial que é

consumido, que é desejado, e não apenas o produto físico que lhe serve

de suporte. Por isso o produto falso também é desejado, já que não é o

produto físico que se deseja, mas sua imaterialidade.

Consumo no olhar da economia

Juliet Schor, em seu livro Born to Buy (2004), nos mostra que o olhar da

economia sobre o consumo sempre esteve apoiado nos estudos sobre a

parte de renda e riqueza que é gasta pelos consumidores. Mas a natureza

mesma do consumo, o que motiva os indivíduos a consumir, o sentido

cultural desse ato, como as pessoas decidem quais produtos consumir, o

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Thaís Novais de Curtis

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papel da publicidade e do marketing, a compra por impulso e o compor-

tamento de consumo compulsivo são algumas das questões que parecem

ausentes dos estudos de economia. Ou seja, os estudos sobre o rendimento

dos indivíduos pareceu satisfazer os economistas mais do que a forma

como aplicam esse rendimento, a maneira como decidem consumir.

Outro aspecto que parece ter distanciado os economistas de tais análises

é o fato do consumo ser entendido como exercido por agentes indepen-

dentes, sem a influência de outros indivíduos, portanto sem uma visão

de interdependência nas decisões individuais. As preferências de cada um

seriam independentes daquelas de outros atores. Ou seja, não há um papel

social inscrito nas decisões individuais de consumo, segundo os econo-

mistas clássicos. Outro aspecto é a crença na existência de qualidades

inerentes a produtos e serviços, e como isso atende a necessidades práticas.

Disso decorre a visão utilitarista do consumo, sem referência às qualidades

culturais, simbólicas e sociais daquilo que se consome.

Mas o economista John Kenneth Galbraith parece destoar dessas posi-

ções, e isso fica claro em seu livro The Affluent Society (1958). Nesse texto,

Galbraith levanta três aspectos que definiriam um novo raciocínio sobre

o consumo: a) a produção cria o desejo de consumo; b) a relação entre

consumo e utilidade torna-se fraca e até mesmo negativa; c) as pressões

estruturais para o aumento de consumo privado acabam desalojando a

provisão de bens públicos. Em relação ao primeiro aspecto, fica claro que

Galbraith ataca a ideia de que as empresas têm melhor desempenho con-

forme entendam como satisfazer o desejo dos consumidores. Ele reverte

essa posição, entendendo que a sociedade já teria chegado num ponto

em que suas necessidades básicas estariam relativamente satisfeitas, e que

o aumento do consumo agora se faz pela criação do desejo de consumo

via o esforço de ações de venda e marketing das corporações. Carros mais

elegantes, roupas mais sofisticadas, entretenimentos mais elaborados, são

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Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos

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apenas alguns dentre os vários exemplos de que o consumo está cada vez

mais ligado a valores culturais que, por sua vez, são diretamente produ-

zidos pelas ações de publicidade das empresas. Então a produção não se

limita mais, ou não pode mais ser entendida como uma fonte que supre

as necessidades de bem estar dos indivíduos. A relação entre consumo e

bem-estar parece ter sido quebrada.

Mas nos anosidor não leva em conta sua incapacidade de escapar do

consumo como modo de vida. Quando Bourdieu, por exemplo, com seu

conceito de capital cultural aponta que não há consumo de nenhum

produto, serviço ou atividade que não esteja implicado num código de

classe social, que caracteriza justamente o regime possível de consumo

de cada indivíduo, ele reforça que não se pode escapar das posições de

sua classe social do mesmo modo que não se pode recusar ser parte do

sistema de consumo.

Consumo e trabalho imaterial

Vamos explicar melhor o que vem a ser o trabalho imaterial.

Num trabalho de pesquisa intitulado Le Bassin de Travail Immatériel dans

la Métropole Parisienne,2 desenvolvido no início dos anos 1990 e publi-

cado em 1996 por Toni Negri, Maurizio Lazzarato e Antonella Corsani,

consolida-se um conjunto significativo de conceitos sobre o trabalho

imaterial. Nessa pesquisa, ainda no começo desse debate nos anos de

1990, os autores afirmam que o trabalho imaterial seria aquele que pro-

duz, por exemplo, os programas de televisão, a moda, a transformação

das cidades, as mercadorias que consumimos, os jornais e revistas que

lemos. Mais fundamentalmente, ele produz a maneira de ver e sentir, de

morar, de vestir, de pensar e de consumir das pessoas. Ele produz as for-

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mas de vida e as subjetividades de nossas sociedades. Essa produção de

formas de vida e de subjetividade se tornaram os novos setores de

acumulação capitalista:

“A produção de subjetividade deve se tornar então, simultanea-

mente, o conteúdo do trabalho e o resultado da atividade do traba-

lho imaterial. A definição do trabalho imaterial, como trabalho

que produz o conteúdo cultural e informacional da mercadoria,

começa, portanto a se expressar numa nova articulação, que tem

como pivô ‘a produção de subjetividade’. Há, portanto uma

relação específica entre o conteúdo do trabalho imaterial e o

conteúdo do produto imaterial.” (COSANI, 1996, p. 42).

Negri, Lazzarato e Corsani (1996, p.82) entendem que o trabalho ima-

terial se encontra no cruzamento de uma nova relação produção/consu-

mo, do qual ele é a interface. O trabalho imaterial ativaria e reorganizaria

a relação produção/consumo, já que ele dá forma às necessidades, ao

imaginário, aos gostos do consumidor, ele os materializa, e esses produtos

tornam-se por sua vez produtores de necessidades, de imaginários, de

gostos. Os autores notam que não se trata aqui de necessidades fisioló-

gicas, mas “de gostos (moda), de operações intelectuais (produção de soft-

wares), de maneiras de ver (as imagens), de viver (transformação do terri-

tório), de pensar (jornalismo), de morar (a arquitetura), etc.” (p. 82-83).

A ideia de ‘consumo pelo consumo’ teria então se tornado o motor da

nova produção do ‘excesso’ capitalista. Seria pelo consumo que se produ-

ziria o próprio consumo, sua própria expansão. É consumindo o imaterial,

que simbolizam as mais variadas formas de vida, que se alimenta a necessi-

2. Corsani A., Lazzarato M., Negri A. Le bassin de travail immatériel (BTI) dans lamétropole parisienne. L’Harmattan, Paris, 1996.

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dade de se consumir mais, e portanto sua produção. O ‘consumo pelo

consumo’ cria uma reestruturação/inovação contínua dos produtos, das

profissões e das formas de organização que parecem desde então se

autoproduzir. O produto, o consumidor e o trabalho imaterial estão con-

tinuamente em vias de se fazer, evoluem sem cessar.

Essa discussão sobre a produção do desejo (ou da subjetividade) na socie-

dade neocapitalista, se traduz portanto como invenção de gostos, de

formas de imaginar, de pensar e viver. Essa produção de subjetividade

seria, simultaneamente, a produção de novas formas de consumo, que

se diferenciam do consumo de simples bens materiais. Essa produção de

consumo, ao produzir o que será consumido na forma da comunicação,

da moda, dos estilos de vida, etc., acaba por realimentar a própria produ-

ção, no sentido de que ela deve realizar as novas necessidades do consumo.

A ênfase aqui está na imaterialidade dos produtos, e portanto na sua

associação com a própria subjetividade que consome (não é o corpo que

come, que veste, que passeia, mas sim a subjetividade, o desejo).

O capitalismo inventa o falso

Há um termo cunhado em economia, chamado de ‘paradoxo da pirataria’

(ANDERSON, 2009) baseado no dilema que fundamenta a economia da

moda. A moda é um dos setores possíveis de se analisar como a era moderna

do consumo se molda na democratização do acesso aos bens mercantis.

Diferenciar-se em seu grupo, ou até mesmo destacar-se através dos signos

é uma pretensão também dos consumidores menos privilegiados. Os

comportamentos e aspirações individualistas se manifestam mesmo em

obediência à moda ou estilos de vida, importando para o indivíduo não

ser inferiorizado.

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Thaís Novais de Curtis

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Existe uma noção de que as réplicas podem auxiliar nas vendas dos itens

originais de consumo. A indústria da moda opera com itens de estação,

peças sazonais que são substituídas de tempos em tempos sem uma

justificativa funcional de que aquele item esteja defasado, atua apenas na

sua diferenciação visual para justificar tal troca. A solução que o mercado

encontra para as diferenciações entre os modelos de estações se baseia

justamente na estratégia da ‘obsolescência induzida’. Réplicas dos modelos

da estação são espalhadas pelo mercado de massa, justificando assim, que

os consumidores mais exigentes requisitem por modelos novos e exclusivos

que os diferenciem dos outros consumidores. Dessa forma, tanto o item

original quanto sua réplica possuem segmentos definidos, um fortalecendo

o mercado do outro. Ainda assim, o preço do autêntico determina o preço

do falso, pois o prestígio e o alcance do original na sociedade determinam

a demanda e o valor pelo item replicado, gerando inclusive mercados de

alta, média e baixa qualidade dentre os próprios falsificados.

Ao obter um produto falso de grife, o consumidor não está apenas

interessado na posse física daquele item, ele não substitui o original, mas

preenche uma lacuna no desejo de possuir o verdadeiro e o que ele pode

trazer com sua reprodução de imagem como status, reputação, inclusão,

etc. Toda essa imaterialidade alcança a percepção do consumidor ao optar

por determinada escolha: original x falso.

“Na imprensa ocidental, a pirataria chinesa é considerada crime.

Mas na China, produtos pirateados não passam de outro produto

a outro preço, uma forma de segmentação em versões imposta pelo

mercado. Comprar ou não uma bolsa Louis Vuitton pirateada não

é uma decisão moral, mas uma decisão baseada em qualidade,

status social e redução de riscos. Se as pessoas tiverem o dinheiro,

preferirão comprar o original, porque, em geral, é a melhor versão.

Mas a maioria das pessoas só pode pagar pelas versões pirateadas.”

(ANDERSON, 2009, p. 207)

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Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos

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O mercado de massas produz a demanda pelo mercado de réplicas, já

que não possui renda suficiente para consumir o original, e esse desejo

está relacionado com a imagem e a representação daquele objeto pela

pessoa. Cria-se um mercado de evidências falsas, no qual os produtos são

uma coisa, e o status que os acompanha outra, por vezes mais importante.

No aspecto psicológico, o indivíduo acredita que consumindo um

produto de luxo, embora falsificado, representará outra imagem de si

próprio perante os outros, desde que o fato de ser falsificado seja omitido.

Mesmo o item falso, muitas vezes, carrega consigo a logomarca do ori-

ginal, distribuindo sem custos o nome da marca. Os fabricantes autênticos

do produto diriam que poderiam fazer o mesmo sem necessidade de

intermediários, no entanto, é de se pensar que o alcance também vai por

outros caminhos, atingindo parcela de consumidores antes ignorada.

Considerando também que o indivíduo não pagante de hoje, ou

consumidor de réplicas, podem vir a tornar-se um consumidor pagante

do item original amanhã.

Conclusão

Juntamente com a ‘civilização do desejo’ que foi construída ao longo da

segunda metade do século XX, as marcas foram adquirindo representações

diferentes na mente dos consumidores. O que antes era caracterizado

apenas como um símbolo de representação gráfica ou visual para expressar

um nome, hoje assumiu uma posição dinâmica de relações que envolvem

desde o produtor, aquilo que é produzido e quem o consome, criando

um campo de valores para todos os envolvidos. Para Lipovetsky (2007),

o que caracteriza o consumidor da atual ‘civilização do desejo’ é que:

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Thaís Novais de Curtis

164

“O hiperconsumidor não está mais apenas ávido de bem-estar

material, ele aparece como um solicitante exponencial de conforto

psíquico, de harmonia interior e de desabrochamento subjetivo,

demonstrados pelo florescimento das técnicas derivadas do

desenvolvimento pessoal bem como pelo sucesso das sabedorias

orientais, das novas espiritualidades, dos guias da felicidade e da

sabedoria.” (p. 15).

A maneira de se desenvolver uma marca vem transformando as estratégias

de marketing e de comunicação, inventando novos instrumentos com

vista à conquista de mercados. Passamos de uma economia centrada na

oferta a uma economia centrada na procura. Contudo, os valores intan-

gíveis de uma marca abrem um campo de consumo que modifica a produ-

ção de desejo na sociedade, desejos que expressam sua subjetividade. En-

tendemos aqui por subjetividade tudo aquilo de ordem imaterial que é

parte de um indivíduo, como suas crenças, seus valores morais e religiosos,

sua conduta ética, mas também seu imaginário, suas fantasias, sonhos,

os elementos que servem a sua capacidade criativa etc. Quando mencio-

namos especificamente o desejo de consumo, falamos então de uma parte

dessa subjetividade que se expressa. Esse consumo pode ser tanto de bens

materiais quanto de bens imateriais. Mas o que estamos buscando aqui

é mostrar que mesmo quando se trata de bens materiais, é seu aspecto

imaterial que é desejado, em muitos casos.

Acontece que o mercado de falsificações age de modo a garantir a opor-

tunidade de grande parte dos consumidores satisfazerem seus desejos de

representação social e satisfação pessoal. No entanto, envoltos por tais

estratégias, os consumidores já não conseguem distinguir entre aquilo

que são levados a querer e o que realmente querem.

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Da Falsa Produção de Consumo ao Consumo dos Falsos Produtos

165

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Contrafação e seus Museus: Espaços de Apologia ouCrítica ao Consumo Pirata?

ENEUS TRINDADELIVIA SOUZA

NICOLÁS LLANO

Introdução

Este trabalho nasce no seio das discussões do Grupo de Estudos Semió-

ticos em Comunicação, Consumo e Cultura (GESC³) do CNPq/USP,

sobre consumo e pirataria. Dentre os vários aspectos do consumo pirata,

encontramos algumas experiências interessantes compreendidas como

museus da pirataria ou museus da contrafação, como são chamados, que

comunicam mensagens de sentido paradoxal: a crítica e a possibilidade

de educação contra tal fenômeno do consumo; e o de se revelar como

um espaço de exaltação à pirataria.

Nesse sentido, este texto busca a reflexão sobre este aspecto do mundo

do consumo contemporâneo e traz alguns subsídios, a partir do pensa-

mento atual de Lipovetsky (2004 e 2007), ao passo que também funda-

menta sua discussão a partir dos casos do Tilleke & Gibbins Museum of

Counterfeit Goods da Tailândia, do Museo del Falso em Salerno-Itália e,

com maior profundidade, da visita feita ao Musée de La Contrefaçon de

Paris, como formas paradoxais de comunicar sentidos e valores da pira-

taria no contexto atual.

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Para tanto, consideramos que o ponto de partida para esta reflexão se dá

justamente a partir da pesquisa das acepções do termo “Contrafação”.

Em inúmeros idomas notamos que a contrafação está relacionada à repro-

dução, à imitação, à falsificação, de qualquer espécie de bens industriais:

seja de um produto, de uma assinatura ou de uma patente, por exem-

plo. Para tornar mais claro tal argumento, podemos buscar mais detalhes

a respeito do termo contrafação, a partir do ponto de vista etimológico.

A ação de contrafacere em latim em sua declinação na ação substantivada

contrafactìo, ónis: “confrontação”, gera a acepção de imitação ilícita da

obra de outro. O termo ao ser incorporado na língua francesa converte-

se na expressão contrefaçon e desde a sua incorporação a essa língua, per-

siste a ideia do termo como algo relacionado a todo tipo de produção

por cópia ou imitação, de maneira fraudulenta, não se restringindo a mer-

cadorias, podendo assim aplicar-se a “qualquer ato ou coisa”.

Juridicamente, ainda, a contrafação relaciona-se atualmente à violação

da propriedade intelectual, direitos de autor, propriedade industrial e pa-

tentes. Segundo a Lei dos Direitos Autorais (Lei 9.610/98, Art. 5, do

inciso VII1), temos: “contrafação – a reprodução não autorizada”.

É correto, portanto, trabalharmos a contrafação como um termo guarda-

chuva, seja a partir de sua definição nos dicionários das várias línguas,

sua construção etimológica, ou a definição legal. É como se este termo

se referisse a um gênero, dentro do qual se encontram outros conceitos

específicos, como pirataria, falsificação ou paródia, por exemplo, como

iremos identificar a partir das categorias elaboradas por Giacomini Filho

(2011). Podemos classificar como contrafação, dessa forma, desde as

falsificações de documentos e moedas, até as obras de artes em geral,

1. http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=148431

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roupas, remédios, produtos eletrônicos e softwares, bem como a utilização

não-autorizada de logomarcas e produção intelectual.

No que diz respeito aos registros acadêmicos sobre este assunto, identi-

ficamos a partir das buscas com as palavras-chave “conftrecaçon”,

“counterfeit” e “contrefación”, algumas centenas de produções científicas

em inglês, espanhol e francês. São livros, artigos indexados em bases de

dados que tratam basicamente da contrafação no setor farmacêutico, na

área da biogenética, na área do Direito (no campo das patentes, dos

direitos autorais violados por plágios, falsidade ideológica, de cópias

falsificadas, usos indevidos de marcas e de produtos entre outras ocor-

rências), da falsificação ou plágio de obras impressas e de obras de arte,

não cabendo aqui mencionar esses trabalhos.

Mas no que se refere aos termos museus e contrefação, percebemos que

existe um número considerável de artigos que tratam das cópias e falsi-

ficações de documentos históricos e de obras de arte, mas só um desses

trabalhos registra uma discussão semelhante a nossa, todavia restrita a

descrever o Museo del Falso em Salerno, Itália. Trata-se do artigo de Laura

Colby (1994, p. 44-47), publicado na Revista Museum International de

Paris, sobre o qual faremos comentários mais a diante.

A partir desta constatação, de que o consumo cotidiano manifesta-se per-

meado por uma série de produtos “contrafeitos”, popularmente conheci-

dos como piratas, percebemos a configuração de três espaços sui generis que

se referem aos museus de contrafação, objeto de discussão deste artigo.

Tais lugares como falamos no início deste artigo, configuram-se como

pontos de retaliação à pirataria e possibilitam uma forma de educar o

consumidor quanto aos tipos de contrafação, bem como espaços de

denúncia para o reconhecimento da obra contrafeita, buscando evitar este

tipo de consumo. Por outro lado, ao se intitularem como museus, estes

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espaços criam um lugar de apresentação e exaltação ao produto contra-

feito. Isso demonstra o sentimento paradoxal que está no íntimo do sen-

timento do consumo de toda produção pirata: é um produto que parece

com o original e funciona como tal, além de ser mais barato. Todavia, se

o produto original fosse mais barato, todos o comprariam.

Desse modo, fica explícita uma correlação entre a aura da marca original

que se transfere para o seu correlato pirata, o que justifica uma observação

sobre o fenômeno dos museus da contrafação.

Museus da contrafação e categorias estéticas do contrafeito

Para tentar explicar estas manifestações, somos obrigados a retomaro

assunto da definição legal da contrafação e seu marco histórico no âmbito

da regulamentação da proteção à propriedade intelectual e industrial que

remonta ao século XIX. Trata-se da atuação da UNIFAB – União dos

Fabricantes, criada na França em 1872, que inicialmente atendia aos inte-

resses de empresas da indústria farmacêutica, justamente com a missão

de atuar no desenvolvimento de tratados internacionais a esse respeito

na proteção de patentes para a produçaõ de medicamentos.

Nesse sentido, em 1883, a UNIFAB participou da elaboração da União

Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial e, em 1891,

do Acordo de Madri, relativo ao Registro Internacional de Marcas de

Comércio. Em 1951, a UNIFAB criou o Museu da Contrafação, em Paris

(Musée de La Contrefaçon)2, que visitamos em julho de 2010 e a partir

do qual identificamos exemplos de manifestações e categorias de produtos

e marcas contrafeitos, que discutiremos mais a diante.

2. http://www.unifab.com/en/our-association/history.html

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O Musée de La Contrefaçon (Museu da Contrafação) de Paris foi criado

com a função didática de ensinar aos seus visitantes sobre a contrafação

e suas modalidades. O espaço do museu dispõe de um grande número

de itens originais e falsificados, tais como estátuas de bronze de Rodin,

perfumes, softwares e tudo que represente um caso emblemático de

processos de falsificação.

Além de mostrar as peças falsificadas e seus respectivos originais, ensi-

nando aos visitantes como diferenciá-las, o museu também tem a missão

de mostrar o grande impacto negativo da contrafação na economia

internacional, e a importância de se respeitar a propriedade intelectual

de itens como obras de arte, marcas e softwares. E ainda, esclarece as

possíveis sanções legais que existem para os indivíduos envolvidos nos

processos de produção e distribuição de itens contrafeitos, e como elas

podem ser aplicadas, no caso da legislação francesa.

Outros dois museus dedicados à contrafação localizam-se respectivamente

em Bangkok, Tailândia e em Salerno, Itália. O Tilleke & Gibbins Museum

of Counterfeit Goods foi criado em 1989 pelo Tilleke & Gibbins, o maior

escritório de advocacia do país, especializado justamente em Propriedade

Intelectual.3 Assim como o Museu da Contrafação de Paris, o museu de

Bangkok tem expostas mais de 3.500 mercadorias contrafeitas, com o

objetivo de mostrar aos visitantes as diferenças quanto à qualidade em

relação aos produtos originais. Além disso, há também aqui um im-

portante caráter educativo, ao mostrar os prejuízos econômicos e sociais

causados pela produção em massa destes itens falsificados.

3. http://www.tillekeandgibbins.com/firm/community/museum

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Já o Museo del Falso, nasce em 1991, a partir do interesse acadêmico e

finaceiro do Prof. Dr. Salvatore Castillo, coordenador do Centro Studi

sul Falso da Universidade de Salerno, Itália, que com proposta semelhante

aos dois museus anteriormente citados, mantem o referido espaço, por

meio de trabalhos de sua empresa de consultoria, que também está ligada

ao seu centro de estudos sobre contrafação, bem como estabelece parceiras

da Universidade com a Prefeitura local. Neste museu são organizadas

várias exposições temporárias que mostram a pirataria e a falsificação de

vários setores produtivos da vida comercial, o artigo que descreve tal

museu deu destaque à exposição intitulada “Falso food” (alimentos

falsificados), ver (COLBY, 1994, p. 44-47).

Não se tem registros de outros espaços semelhantes, mas sabe-se que

outros museus se dedicam a exposições sobre obras artísticas verdadeiras

e falsificadas. Contudo, os espaços aqui citados, parecem ser os registros

de museus mais contundentes da produção comercial contrafeita ou pirata

no mundo ocidental.

Quanto a estes exemplos de museus da contrafação, há que se observar

alguns fenômenos característicos da hipermodernidade, conforme

teorizou Gilles Lipovetsky (2004).

A partir do final da década de 1970, assiste-se ao surgimento, sobretudo

no âmbito acadêmico, do conceito de pós-modernidade. A princípio liga-

do ao discurso arquitetônico, tal conceito passou a designar “ora o abalo

dos alicerces absolutos da racionalidade (...), ora a poderosa dinâmica de

individualização e de pluralização de nossas sociedades” (LIPOVETSKY,

2004, p. 51).

Para o autor, a pós-modernidade configura-se, na verdade, como um pe-

ríodo de transição, que nos encaminhou à sociedade que agora viven-

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ciamos, a sociedade hipermoderna. Este atual estágio da modernidade

caracteriza-se, sobretudo, por ser a era do hiper, do que é levado ao

extremo, que é encabeçada pelo hiperconsumo.

Cada domínio apresenta uma vertente excrescente, desmesurada,

‘sem limites’. Prova disso é a tecnologia e suas transformações verti-

ginosas nos referenciais sobre a morte, a alimentação ou a procria-

ção mostram-nos também as imagens do corpo no hiper-realismo

pornô; a televisão e seus espetáculos que encenam a transparência

total; a galáxia Internet e seu dilúvio de fluxos numéricos (...); o

turismo e suas multidões em férias; as aglomerações urbanas e suas

megalópoles superpovoadas (...). (LIPOVETSKY, 2004, p. 55).

Outra característica é o fato de ser a era do paradoxo. Aspectos paradoxais

aplicam-se a diferentes esferas da hipermodernidade: a relação com o

tempo, com o passado, com o futuro, a formação da personalidade etc.

“É com os traços de um composto paradoxal de frivolidade e ansiedade,

de euforia e vulnerabilidade, que se desenha a modernidade do segundo

tipo” (LIPOVETSKY, 2004, p. 65).

Quanto à relação do indivíduo com o tempo, esta é tomada justamente

pelo paradoxo e pelos extremos, característicos da hipermodernidade. Ao

contrário do carpe diem que pregava a era moderna, em um clima de tran-

quilidade e descontração quanto ao futuro, hoje “a hipermodernidade

indica menos o foco no instante que o declínio do presentismo em face

de um futuro que se tornou incerto e precário” (LIPOVETSKY, 2004, p.

71). Com foco no futuro, mas de maneira preocupada, estamos o tempo

todo vivendo intensamente o presente, sempre em ritmo de urgência, e

prevendo e prevenindo: exemplos disso são o culto à saúde, a prevenção,

a longevidade. Por outro lado, vivemos uma era de celebração e recorda-

ção do passado:

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Celebrando até o menos objeto do passado, invocando as obri-

gações da memória, remobilizando as tradições religiosas, a hiper-

modernidade não é estruturada por um presente absoluto; ela o é

por um presente paradoxal, um presente que não pára de exumar

e ‘redescobrir’ o passado. (LIPOVETSKY, 2004, p. 85).

Assim, em tempos de hiperconsumo e hipermodernidade, paradoxalmen-

te vemos a vivência intensa da antecipação do futuro, e o resgate saturado

do passado:

Logo não existirá mais nenhuma atividade, nenhum objeto, ne-

nhuma localidade, que não tenha a honra de uma instituição

museal. Do museu da crêpe ao da sardinha, do museu do Elvis ao

dos Beatles, a sociedade moderna é contemporânea do tudo-

patrimônio-histórico e do todo-comemorativo. (LIPOVETSKY,

2004, p. 86).

Voltando nosso foco aos museus da contrafação, notamos que estes

museus se encaixam muito bem nesta última afirmação de Lipovetsky.

Tudo é digno de ter um museu, de ser resgatado como patrimônio

histórico, de ser celebrado, a exemplo dos museus de Paris e de Bangkok,

com suas milhares de réplicas, imitações e falsificações, envoltas pelo

superficial objetivo didático.

Dizemos superficial, pois, por trás da declaração de que estes museus exis-

tem para educar, paradoxalmente – e aqui entramos em outra caracte-

rística da hipermodernidade – estas instituições prestam-se, em tempos

de hiperconsumo, ao hiper encantamento por parte do público. A partir

da experiência da visita ao Museu da Contrafação de Paris, pudemos

perceber exatamente este movimento: se por um lado estes museus

trazem, de fato, um fundo didático, com o objetivo aparente de ensinar

sobre a contrafação e suas modalidades, alertando aos visitantes desde os

problemas relativos à qualidade, até os graves problemas sociais e

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econômicos gerados pela indústria da falsificação, por outro lado, eles

podem também funcionar como uma espécie de apologia. A exibição

destes produtos, por vezes tão semelhantes aos originais, produz exata-

mente uma experiência de encantamento.

Tal paradoxo vem, justamente, do fato que nós, indivíduos hipermoder-

nos, estamos imersos em um estado constante de aflição, como quem

agoniza, em constante medo, aqui particularmente em relação não sim-

plesmente à pirataria, mas ao que o museu nos mostra como sendo seus

maiores desdobramentos: a desobediência legal aos direitos do autor e

suas correspondentes sanções, e a relação da contrafação com o finan-

ciamento de organizações criminosas. Contudo, paralelamente a isso,

imersos também em um deslumbramento com a hiperrealidade, ficamos

em êxtase ao contemplar mercadorias contrafeitas, por vezes tão perfei-

tamente semelhantes às originais, em seus menores detalhes e a preços

mais acessíveis que os originais.

A partir da reflexão apresentada sobre os paradoxos que apresenta o

museu, e com o objetivo de fazer do relatório de visita ao Musée de la

Contrefaçon de Paris uma fonte de pesquisa para estudos sobre consumo,

marcas, bens culturais e processos de imitação industriais-culturais, esta

segunda parte do artigo visa classificar os materiais expostos no museu a

partir das tipologias ligadas à imitação, identificadas por Gino Giacomini

Filho (2011, p. 216-238).

O uso das tipologias determinadas pelo autor: falsificação, pirataria, plá-

gio, knockoff, adaptação e paródia, parte da justificativa de que estas não são

exclusivas do plano estético publicitário – já que as mesmas particulari-

dades operativas podem se encontrar tanto em diferentes dimensões da

indústria cultural quanto em uma variedade de gêneros de discursivos –,

e que em um processo complexo como a imitação as distintas tipologias

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permitem entender a variedade não só de processos industriais de con-

sumo, mas as diversas produções de sentido simbólicas dos consumidores

e suas relações com as marcas e produtos.

Antes de iniciar a classificação de acordo com a tipologia, vale à a pena

introduzir a arquitetura do museu: vários salões que abrigam diferentes

vitrines com uma variedade produtos compartilham a distribuição do

espaço com informações escritas (banners, citações, placas com textos

impressos) e telas de computador (material digital). O percurso inicia sob

uma placa com uma citação de Jean-Jacques Rousseau sobre a arte do

falso: “Le faux est susceptible d’une infinité des combinaisons, mais la vérité

n’a qu’une manière d’être”.4 Tal afimação por si só já justifica o argumento

levantado neste artigo sobre a possibilidade de exaltação ao consumo pira-

ta e mostra os paradoxos vividos na experiência estética de visita o espaço

que busca educar contra a contrafação e que, ao mesmo tempo, investe

de certa aura admirável a apresentação do produto pirata, sobretudo as

contrefações de boas qualidades em relação aos seus originais. A partir

do exposto, iniciamos nossa apresentação das categorias de contrafação

e seus exemplos registrados no museu de Paris, para perecebermos as

nuanças de qualidades dos produtos contrafeitos nas manifestações dos

tipos de contrafação.

Falsificação

A falsificação implica a cópia ilícita de um direito marcário, de

forma que o bem imitador torna-se idêntico ou indistinto do

4. “O falso é susceptível de uma infinidade de combinações, mas na verdade não é maisque um jeito de ser”. Tradução nossa. ARRUMAR TRADUÇÃO, O CORRETO É

QUE A VERDADE, AO CONTRÁRIO DO FALSO, TEM UMA ÚNICAMANEIRA DE EXISTIR, a tradução seria então: “O falso é suscetível de umainfinidade de combinações, mas a verdade tem uma única maneira de ser”

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original desrespeitando os respectivos direitos (BIAN e MOUTI-

NHO, 2009). Dois dos elementos essenciais na falsificação comer-

cial são a existência da fraude e a não autorização do fabricante

(STREHLAU, 2004). (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 225).

Se analisarmos de forma mais detalhada os produtos falsificados que se

encontram na exposição usando a classificação feita por Chaudhry e

Walsh (1996) e resenhada no artigo de Giacomini Filho (2011, p. 225),

encontramos: produtos falsificados completamente, o que tem muita

similitude, inclusive o uso da mesma marca do original; produtos dupli-

cados do original mas com marcas diferentes; reproduções que não são

completamente exatas; imitações que se afastam do original e não criam

o mesmo ethos do original, ou seja que não são convincentes como

falsificação.

Em relação aos produtos falsificados que usam as marcas dos originais,

os brincos, broches, chaveiros e bolsas da marca Chanel (Figura 1. e 2.)

FIGURA 1 FIGURA 2

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178

são um exemplo perfeito para ilustrar a primeira classificação; os produtos

duplicados com marcas diferentes constituem uma parte importante da

mostra do museu, a exemplo, dos aparelhos para barbear BIC e BIC

sensitive (Figura 3. e 4.). Neste caso, podemos notar que os aparelhos são

bicolores (branco e amarelo) e na falsificação são monocromáticos

(amarelo). Já na linha BIC sensitive, ocorre o contrário. Existe a BIC versus

a BIG, mas a mascote não tem a caneta em seu traçado. Neste tipo de

falsificação também encontramos bens culturais como pinturas e obras

de arte, como por exemplo uma falsificação do quadro de Henri Matisse

Les poissons rouges (Figura 5.).

De forma geral, as reproduções dos

produtos apresentados na exposição

não são copias exatas dos originais:

existem modificações nas emba-

lagens, nos nomes dos produtos, nas

cores tanto do produto ou das emba-

lagens ou simplesmente proporções

que mudam do original para o pro-

duto falsificado. Para ilustrar este fe-

nômeno, observemos o caso da bate-

deira da marca Moulinex (Figura 6.).

FIGURA 5

FIGURA 3 FIGURA 4

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Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...

179

Percebemos que o design é diferente

tanto no lugar de por a mão quanto

nas colheres, no original o lugar de

por a mão é liso e as colheres são

ovais e no falsificado não, além

desses detalhes, no original os

desenhos são mais delicados do que

na falsificação.

Entramos no último elemento que faz parte da classificação das falsifi-

cações: aquelas imitações mal feitas que não conseguem convencer o

consumidor, exemplificadas no museu a partir das meias da marca Nike

(Figura 7.). A embalagem do pro-

duto falso é bem diferente da do

produto original, não possuindo o

nome da marca, nem referência ao

tamanho da meia, o layout é bem

díspar e o logo Nike é significativa-

mente grosseiro na meia; outro caso

deste tipo de falsificação são os óculos da marca Ray Ban (Figura 8.). Neste

produto percebemos que a imitação dos

óculos é bem diferente do original, a arma-

ção é mais curvilínea na parte de cima, e

notamos também que o material da contra-

fação é mais opaco. Finalmente o estojo é

totalmente diferente e a própria assinatura

também recebe outro tratamento tanto na

cor quanto nos detalhes.

FIGURA 6

FIGURA 7

FIGURA 8

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Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano

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Existem muitos produtos que permitem entender como diferentes

características de cada tipo de falsificação são misturados num produto

só. Um exemplo desta mistura é o Perfume Flower by Kenzo (Figura 9.).

Podemos aqui identificar várias mo-

dificações entre o verdadeiro perfu-

me e o falso. O nome do falso é

Flower by Sellion, a flor gravada na

tampa do falso está murcha e a do

verdadeiro está cheia de vida, o ta-

manho da haste da flor também é

facilmente percebido e as informa-

ções das embalagens são diferentes.

Resumindo, a falsificação é um pro-

cesso de imitação ilícita que pretende

apropriar-se dos atributos tangíveis

de produtos que estão estabelecidos

e que são reconhecidos no mercado, com o objetivo de aproveitar

comercialmente o valor marcário dos outros em seu benefício.

Pirataria

A pirataria não é só o resultado de um processo de imitação comercial tan-

gível: ela envolve outras fases além da sua reprodução, “refere-se à reprodu-

ção e comercialização ilegal e em larga escala de obras legitimamente

criadas, envolvendo produtores, estabelecimentos comerciais, autoridades

governamentais, fisco e receptadores” (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 227).

No Museu da Contrafação de Paris podem-se encontrar documentação

e informação sobre os processos que fazem parte da pirataria, suas con-

FIGURA 9

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sequências e punições. Tanto fotografias que documentam a produção,

como usinas de fabricação de produtos falsos de couro, quanto imagens

de apreensões de mercadoria falsa (couro e óculos) fazem parte da exi-

bição. Embora todos os produtos apresentados façam parte de algum dos

processos que constituem a pirataria, o museu também sublinha sua

importância por meio de textos informativos e banners sobre este

fenômeno e sua ligação com os direitos autorais. Eis uma alusão explicita

à pirataria, encontrada no museu:

“De julho a agosto de 2006, 8,3 milhões de CD e DVD foram apreen-

didos na China. 3.000 lojas foram fechadas e mais de 9.000 pequenos

estabelecimentos foram punidos (Jornal Les êchos, agosto de 2006).”5

Plágio

Normalmente associado à falta de crédito ou permissão da propriedade

intelectual, o plágio, como explicam Pereira (2001) e Giacomini Filho

(2011) também

(...) pode estar contido em falsificações, pirataria e imitações

trazendo prejuízos a diferentes entidades que idealizaram origi-

nalmente as obras, caso de uma empresa que tem sua marca ou

propaganda plagiada por concorrente, trazendo confusão ao

consumidor. (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 228).

O plágio está representado em todos os exemplos apresentados no museu,

já que as marcas são entidades legalmente constituídas e estas imitações

violam seus direitos de copyright (à cópia ou direito de reprodução). Ao

usar o nome ou identidade corporativa de uma marca estabelecida no

5. Museu da Contrafação, banner informativo “Droits d’auteur et piratage”.

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mercado (legalmente e simbolicamente), está se cometendo um delito,

pois sua produção, distribuição e venda estão sendo desenvolvidos sem

autorização oficial das empresas fabricantes dos produtos originais.

Knockoff

Segundo Giacomini Filho, pautado em Carvalho (2006) o knockoff é um

“Conjunto marca/produto alusivo a outro já estabelecido no mercado

ou uma expressão promocional que arremeda outra já publicada, knockoffs

são itens ligeiramente diferentes do original, mas não são vendidos como

artigos genuínos” (GIACOMINI FILHO, p. 2011, 229).

Neste caso específico, o imitador toma algumas características ou

símbolos distintivos de produtos ou marcas reconhecidas (logomarcas,

embalagens, cores, formas, figuras, tipografias, entre outros) e os aplica

a um produto com um nome diferente. Este produto pode-se caracterizar

como um híbrido, pois mesmo que utilize algumas características iden-

titárias alheias, sua imagem também é constituída a partir de elementos

próprios.

Existem quatro grandes objetivos ou conseqüências ligadas aos knockoffs:

1. serem tomados como originais pelos consumidores que desco-

nhecem o verdadeiro original; 2. satisfazer seus consumidores, pois

embora conheçam o original, julgam ter na imitação um benefício

superior; 3. induzir seus compradores ao erro uma vez que as simi-

laridades acarretam confusão da imitação com o original; prejudi-

car o concorrente ou detentores dos direitos do bem original

(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 230).

Para exemplificar este elemento da tipologia nos elementos presentes no

museu, apresentamos dois casos: o primeiro, O Casa Café (Figura 10)

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se utiliza de um layout visual que se

aproxima bastante do produto Nescafé,

apesar de modificar a cor da caneca, a cor

do rótulo, o vidro que armazena o

produto e a tampa. Essas modificações

sutis em sua composição podem levar a

uma dúvida no consumidor que já está

acostumado com o Nescafé e gerar uma

compra errada.

O segundo caso trata-se do Molho

de pimenta Tabasco (Figura 11): o

molho de pimenta possui a sua

falsificação com o nome de Tabaro,

e aqui podemos notar a semelhança

no layout dos produtos, sendo que

o verdadeiro tem uma disposição

mais equilibrada. No produto, porém, a cor do molho falso é bem mais

escura, bem como o lacre.

Adaptação

As adaptações são ações que podem incluir diferentes tipos de processos

como adequações, transcrições, transmutações, reproduções, traduções

e transplantes de conteúdo. Normalmente, as adaptações partem de uma

obra original que serve como referência para inovar e criar uma nova obra.

No caso dos produtos apresentados no percurso do museu, cabe entender

a adaptação no sentido dado por Schnaars (1997), que “(...) emprega o

FIGURA 11

FIGURA 10

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Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano

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termo adaptações criativas para designar formas inovadoras de copia, pois

melhoram o modelo original ou fazem adaptações para novos contextos”

(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).

Os produtos culturais e artísticos não dependem somente da obra, mas

também do contexto da leitura e da recepção que faz o autor, e as adapta-

ções podem ser celebradas como obras originais ou como leituras

inovadoras, como pode-se encontrar na indústria musical (MILLER, 2004,

p.25). Na nossa visita não encontramos casos que exemplificassem clara-

mente este elemento da tipologia, talvez porque não queiram fazer do

ato da imitação industrial uma apologia da criatividade das indústrias num

espaço didático, paradoxo que foi discutido anteriormente no artigo.

Paródia

Este conteúdo estético imita, de uma forma irônica e evidente, obra

alheia. Jonshon e Spilger (2000) conceituam a paródia como um tipo

de sátira caracterizada por imitação que ironiza um trabalho em particular

ou estilo de um determinado autor. Assim como acontece com a adapta-

ção, não existem produtos no museu que funcionem como exemplos des-

te elemento da tipologia. As imitações, de modo geral, tentam ser o mais

semelhantes com as marcas originais para aproveitar as construções

simbólicas e seu posicionamento no mercado. Fazer uma paródia de uma

marca reconhecida seria apagar alguns dos significados reconhecidos pelo

público em virtude de criar novos, ou seja, construir e posicionar uma

marca desde zero no mercado.

No entanto, isto não significa que não existam marcas que realizam paró-

dias e que apresentem as cinco características definidas por Johnson e

Spilger (2000) e comentadas por (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 232). É o

caso de Abreacombi & Fecha em relação à marca original Abercrombie &

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Contrafação e seus museus: espaços de apologia ou crítica ...

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Fitch. Usando a fonética da marca original, a adaptação junta um ele-

mento característico da vida cultural e econômica do país (o veículo popu-

lar kombi) e faz um jogo de palavras para criar uma identidade juvenil,

humorística e descontraída.

Considerações finais

O passeio pelas manifestações das categorias criadas por Giacomini Filho

(2011), associadas às manifestações encontradas no Museé da La

Contrefaçon de Paris, juntamente com às reflexões do consumo

hipermoderno dada por Lipovetsky, nos auxiliam a repensar a força e o

sentido estético do consumo pirata, sobretudo no seu aspecto fetichista

como aponta Canevacci (2005), pois mostra novos caminhos para os

sentidos do consumo, desvinculado de um valor ou enaltecimento à

propriedade e autoria, sugerindo inclusive o declínio de valores

fundamentais ao sistema capitalista. Nesse sentido, em que medidas

podemos afirmar que estamos vivendo uma ruptura das mentalidades em

efetivo em relação ao sistema capitalista moderno que se pautava no

direito à propriedade, à privativatização dos espaços? Ou tal processo se

dá numa contiguidade das transformações do sitema capitalista na sua

versão contemporânea, demarcada pelas mudanças nas formas de inte-

ração social, sobredeterminadas em parte, pela grande influência das mu-

danças tecnológicas e suas lógicas de participação e inclusão?

Essas perguntas demandam novos artigos e que aqui não encontram

resposta. Mas certamente, o paradoxo apontado pelo fenômeno do consu-

mo pirata e seus museus são reveladores de transformações e sentidos que

aqui buscamos pontuar como nossa contribuição, ao entendimento

estético do consumo pirata em suas manifestações de produtos, marcas

e da publicidade.

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Eneus Trindade, Livia Souza e Nicolás Liano

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

JÔSE FOGAÇASILVIO KOITI SATO

Foto reprodução da internet: http://customizando.net/bolsas-de-grifes-customizadas/Crédito da Foto no site: Loja Tua

Introdução

Os estudos desenvolvidos pelo GESC3 procuram dar luz a aspectos

aparentemente contraditórios da contrafação, entendida como um movi-

mento que, por um lado, é produto do desenvolvimento capitalista e do

cenário contemporâneo e, de outro, põe em questão o sistema de mercado

vigente, uma vez que apresenta alternativas para a democratização do con-

sumo. Como as marcas se posicionam frente a esse movimento e em que

medida a pirataria afeta a performance da indústria formal são perguntas

presentes nas discussões que originaram este livro.

As macroanálises e interpretações do “espírito do tempo” sem dúvida nos

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

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guiam nesse desbravar do universo e dos significados da contrafação,

mostrando que afirmações de senso comum – por exemplo, as que

colocam o preço como central na escolha por produtos contrafeitos –

não são suficientes para explicar o sucesso do fenômeno. Mas o estudo

não estaria completo sem que entendêssemos as manifestações empíricas

do fenômeno entre os próprios consumidores. Era necessário entender

o contexto que emoldura a escolha por uma imitação ou cópia e pergun-

tar: o valor da marca, expresso em preços proibitivos para a maior parte

dos consumidores no mercado formal, é o motor para a compra de um

produto falsificado ou é exatamente o desapego ou desinteresse pela

autenticidade de marca que leva a tal aquisição? Em outras palavras, seria

o “desejo autêntico” pela marca e seus significados o que aquece o mer-

cado pirata, fato que reverberaria na indústria formal, ou seria um “desejo

simulacro”, advindo do impulso de não desperdiçar as oportunidades de

bons negócios oferecidas no universo da contrafação? Por fim, estas dife-

rentes categorias de desejo e consumo estão relacionadas com diferenças

de nível socioeconômico dos consumidores?

Este capítulo perpassa tais questionamentos, iniciando por uma visão

geral do contexto em que estão inseridos o mercado de luxo e o mercado

pirata, visão que embasa a análise dos resultados obtidos em contatos

diretos com atores desse mercado: uma consumidora e uma vendedora

de produtos contrafeitos.

Consumo contemporâneo

Estamos expostos a grandes transformações atualmente, cercados por

mudanças que ocorrem rapidamente em diferentes esferas da vida coti-

diana. Modelos sociais, econômicos, políticos e culturais consagrados

parecem não funcionar mais, pelo menos não da mesma forma, e abrem

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espaço para um mundo mais fragmentado e globalizado, marcado, sobre-

tudo, pelo excesso de informações, produtos e serviços, meios de comu-

nicação e trabalho. Este ambiente, de acordo com Lipovetsky (1989), é

caracterizado por traços como a elevação do nível de vida, a abundância

de mercadorias e dos serviços, culto aos objetos e aos lazeres e a moral

hedonista e materialista. É uma sociedade focada na expansão das neces-

sidades, na obsolescência, na sedução e na diversificação das mercadorias.

A Sociedade de Consumo é um ambiente em que os objetos, serviços e

bens materiais são multiplicados, e as relações dos indivíduos são mais

com objetos do que com outras pessoas: “o conjunto e suas relações sociais

já não é tanto o laço com os seus semelhantes quanto (...) a recepção e

manipulação de bens e de mensagens” (BAUDRILLARD, 2008: 13).

As múltiplas escolhas feitas no consumo diário dos bens passam a ter um

papel cada vez mais importante na formação da identidade dos indi-

víduos. É preciso lidar com alterações em certezas e conceitos culturais

anteriormente sedimentados (de raça, sexualidade, gênero, classe social

etc.) e que sempre nos auxiliaram no processo de identificação e projeção

de nossa identidade cultural (HALL, 2000).

O homem contemporâneo se constrói ao redor da imagem que ele projeta

para os outros neste consumo simbólico, entendido como o processo pelo

qual as pessoas atribuem significados aos produtos e objetos, além dos

que, acredita-se, sejam inerentes a eles. O consumo, portanto, é um pro-

cesso de organização, formação e exposição da identidade por meio de

bens materiais que simbolizam um estilo de vida, um gosto.

Podemos dizer, portanto, que os bens de consumo têm uma significação

que vai além do seu valor comercial, existe uma ampliação na habilidade

em carregar e comunicar significado cultural na sociedade contemporânea:

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O sistema de design e produção que cria os bens de consumo é

uma empreitada inteiramente cultural. Os bens de consumo nos

quais o consumidor desperdiça tempo, atenção e renda são

carregados de significação cultural. Os consumidores utilizam esse

significado com propósitos totalmente culturais. Usam os

significados dos bens de consumo para expressar categorias e

princípios culturais, cultivar ideias, criar e sustentar estilos de vida,

construir noções de si e criar (e sobreviver a) mudanças sociais.

(MCCRACKEN, 2003:11)

Além de McCracken (2003), também Douglas & Isherwood (2009), são

autores que discutem a questão do consumo e seus significados. Têm em

comum o fato de tratar os bens para além do utilitarismo, abrindo novas

possibilidades de compreensão e desvendando que estes possuem uma

capacidade: a de produzir sentidos, definindo estilos de vida, identidades,

direitos e um papel: o de mediar as relações sociais.

Douglas & Isherwood, em O Mundo dos Bens (2009), assumem o

consumo nos termos de sua realidade cultural e coletiva, tendo como

função dar sentido ao fluxo incompleto dos acontecimentos. Os bens são

a “parte visível da cultura”, os “acessórios rituais” do processo ritual de

consumo. (DOUGLAS & ISHERWOOD, 2009:112-114). Segundo estes

autores, o ritual de consumo tem por finalidade primária classificar pes-

soas e eventos; os bens materiais de servirem como “marcadores das linhas

nas relações sociais”, de comunicarem a posição social a que se pertence

ou aquela que se deseja pertencer: “podem ser usados como cercas ou

como pontes” (Ibid.: 36).

Por tudo isso, a definição puramente econômica do que é um consumidor

deixou de ser suficiente: o pilar central da teoria do consumidor contem-

porâneo é que ele faz escolhas não somente pelos ganhos de utilidade,

mas também pelo significado simbólico destas escolhas, que é transferido

do bem e da marca consumidos para o consumidor.

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Tal transferência de significado é uma importante chave no processo de

consumo, uma vez que é nesse movimento que a cultura se cria.

Conforme McCracken (2003), a função comunicadora dos bens não se

esgota em ser um mero emissor de mensagens; eles são um sistema de

construção da cultura, marcado por uma característica definidora: a

qualidade móvel do significado. O autor afirma que o significado está

“ininterruptamente fluindo das e em direção às suas diversas localizações

no mundo social, com a ajuda de esforços individuais e coletivos de desig-

ners, produtores, publicitários e consumidores.” (Ibid.: 99). Neste esque-

ma, a publicidade e o sistema de moda constituem meios através dos quais

o significado é investido no “código objeto” – eles movem o significado

do mundo culturalmente constituído para os bens de consumo –,

enquanto os rituais de consumo o transferem destes para o consumidor

(Ibid.:113 e 120).

Aqui se define nosso entendimento sobre consumo, fruto e criador de

cultura, que movimenta um sistema complexo de signos para além da

materialidade.

Existe um tipo de consumo, no qual o significado emocional dos bens

possui importância e características especiais, com carga simbólica

inequívoca e formas de transferência e rituais de consumo característicos:

o consumo do luxo.

Luxo, luxos

Os significados do luxo estão associados ao universo do prazer, da osten-

tação e da exuberância. De acordo com Lipovestky e Roux (2005: 115),

luxo não tem origem na palavra lux (luz), como seria conveniente, poético

e adequado numa visão positiva sobre este tipo de consumo. Mas, por

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outro lado, a palavra tem associação com a luxúria, o que traz um viés

crítico em relação ao fenômeno do luxo. O uso dessa palavra, com o

sentido que conhecemos hoje, vem do século XVII, associando o con-

sumo ao que é considerado supérfluo, por mero prazer. Por outro lado,

historicamente, o consumo do luxo sempre marcou uma posição social

por parte dos grupos dominantes. Tecidos, metais, especiarias e cores

foram utilizados como uma maneira de estabelecer diferenciação social

e expressar estrutura de poder.

De acordo com Passarelli (2010), o luxo atual passa a ser construído a

partir da Revolução Industrial, com a ascensão da burguesia e o desen-

volvimento da produção em massa. O autor destaca o contraste entre o

caráter semiartesanal da produção do setor do luxo (mais próximo de pro-

cessos produtivos pré-capitalistas), sem a preocupação com a escala produ-

tiva, que marca este período.

Beleza, desejo, prazer, raridade, qualidade, tradição e refinamento são

palavras que ajudam a definir o que é um produto de luxo:

“Um produto de luxo é um conjunto: um objeto (produto ou

serviço), mais um conjunto de representações: imagens, conceitos,

sensações, que são associadas a ele pelo consumidor e, portanto,

que o consumidor compra com o objeto e pelos quais está disposto

a pagar um preço superior ao que aceitaria pagar por um objeto

ou um serviço de características funcionais equivalentes, mas sem

essas representações associadas. (LIPOVESTKY; ROUX, 2005: 127)

Podemos dizer que o consumo do luxo gira em torno da sedução, da emo-

ção, do prazer e da estética. Sedução ao extremar a relação fetichizada

entre mercadoria e consumidor, que corteja e enxerga o bem como um

objeto de desejo. Trata-se de uma relação emocional em função do envol-

vimento existente neste tipo de consumo, injustificável com o uso de

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argumentação meramente racional. O prazer está relacionado ao hedo-

nismo, à gratificação e recompensa individual (e também social) atribuída

a uma determinada aquisição. Finalmente, a relação estética se dá pela

concretização, no plano sensível, de uma série de valores e significados

relacionados a um determinado bem, que se materializa com sua

aquisição.

O consumo do luxo estabelece a ponte para o grupo com o qual se almeja

ser reconhecido e é também a cerca para a distinção dos demais, que

ficaram fora dele. Envolve, sobretudo, o reconhecimento do consumidor,

que a partir da aquisição e uso do bem passa a compartilhar valores que

o integram ao grupo que reconhece a legitimidade destes produtos a partir

de uma identidade consagrada.

A legitimidade traz consigo a ideia daquilo que é aceito pela lei, tradição

e pelo savoir faire. Essa consagração passa normalmente por questões

técnicas e funcionais como a qualidade dos produtos, matérias primas

nobres e seus métodos de execução, normalmente de tradição artesanal.

Nesse sentido, o luxo dialoga com a dimensão do tempo (é preciso um

certo período para ser legitimado, não pode ter surgido ontem) e com o

espaço (a execução é feita de uma certa maneira, num certo lugar de

origem).

Já a identidade pode ser caracterizada como algo que é único, singular e

que mostra que algo é fiel a si mesmo. A identidade é uma medida que

traz a segurança e a confiança associadas, características muito bem-vindas

em tempos de grande instabilidade para o consumidor pós-moderno.

“Identidade é a permanência sob as mudanças, as rupturas, a inovação,

portanto, a invariância sob as variações. Identidade é o que torna uma

descontinuidade contínua, é o que conecta o desconectado. É o que

integra a ética a estética.” (LIPOVESTKY; ROUX, 2005: 142)

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A legitimidade e a identidade de um bem de luxo são simbolizadas pelas

marcas de luxo. Em tempos de produtos com ciclos cada vez mais curtos

(muda-se tudo a cada temporada) e de bens cada vez mais comoditizados,

a relação é construída sobre as marcas, que nesse setor são, muitas vezes,

centenárias, com uma herança narrativa muito valiosa, enriquecida por

modernas técnicas de gestão de marketing, comunicação e branding,

como veremos a seguir.

Marcas de luxo

Marca pode ser definida atualmente como “uma conexão simbólica e

afetiva estabelecida entre uma organização, sua oferta material, intangível

e aspiracional e as pessoas para as quais se destina” (PEREZ, 2004, p. 10).

Nesse entendimento de marca, a ideia do vínculo e da relação é ressaltada,

num diálogo sempre em evolução.

O objetivo da marca do ponto de vista da gestão da empresa é criar vín-

culos e relações baseadas em novos significados, que deixam de ser somen-

te concretos para serem emocionais e baseados em crenças da marca, a

fim de tornar cada vez mais forte a lealdade à marca.

Podemos dizer que atualmente o consumidor não deseja comprar um

produto que não o insira numa atmosfera atraente para ele mesmo e aos

outros. Como nos evidenciou Baudrillard (1996), o homem está inserido

em um sistema de significações que o leva a buscar satisfações simbólicas

e não apenas funcionais, estabelecendo com as marcas uma relação aspira-

cional e emocional. Assim, marcas ultrapassam produtos e serviços, e as

investigações das tendências de comportamento e consumo, por meio

de novas metodologias quase sempre qualitativas, podem fornecer argu-

mentos convincentes para as estratégias marcárias, que assim passam a

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refletir os valores imateriais almejados pelos consumidores da sociedade

contemporânea.

As marcas ganham novos significados, e não existem mais somente para

designar propostas de consumo concretas e tangíveis. Elas simbolizam

novos estilos de vida, comportamentos, opiniões, visões de mundo, valo-

res, interesses e traços de personalidade e convidam o indivíduo a uma

relação de compartilhamento e interação com esses significados.

As marcas de luxo, como comentamos anteriormente, possuem muitas

vezes histórias centenárias, com um longo e contínuo trabalho de gestão

que constrói uma rede de associações poderosa na mente dos

consumidores:

A pujança de marcas como Hermès, Baccarat e Cartier pode ser

percebida pelo seu perfil robusto: fortemente posicionado no

psiquismo dos consumidores. São marcas vencedoras de um

conjunto de batalhas comerciais travadas nos últimos séculos.

Criaram raízes profundas no imaginário do consumidor e, na

maioria das vezes, mostram-se menos sujeitas a modismos.

(PASSARELLI, 2010: 56)

O consumo das marcas de luxo mudou ao longo do tempo: novos merca-

dos consumidores trouxeram novas estratégias e subcategorias (semiluxo,

novo luxo, luxo verdadeiro, mastige, prestige, premium, etc) que refletem

conflitos e dilemas centrais do setor, relacionados principalmente aos pla-

nos de expansão econômica que possibilitem crescimento das marcas e

ampliação de seus públicos, mas que garantam a manutenção da aura de

tradição e exclusividade aos quais os produtos estão associados. Ou seja,

a expansão dos produtos de luxo para outros extratos da pirâmide socio-

econômica pode representar um grande risco para as marcas: “a popula-

rização de um bem pode representar risco de o consumidor tradicional

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decepcionar-se com o posicionamento da marca, o que, consequentemen-

te, deterioraria o prestigio dela” (Ibid.: 47).

Por outro lado, é preciso evidenciar que é com muita clareza que se

visualiza o consumo de luxo pelos níveis socioeconômicos mais altos da

nossa sociedade, mas sabe-se que este não se restringe, hoje em dia, a essa

pequena parcela da população.

Segundo Lipovetsky e Roux (2005), é errôneo até mesmo pensar que os

homens primitivos estavam destinados a uma condição miserável sem

luxo, como é também equivocada a ideia de que os luxos não estão pre-

sentes nas camadas menos favorecidas da população. Remetendo à tradi-

cional regra sociológica da reciprocidade, explicam que o princípio do

luxo está no “espírito de dispêndio” e não na fabricação e consumo de

bens com preço elevado, sendo estes a consequência e expressão do pri-

meiro (LIPOVESTKY; ROUX, 2005, p.22).

Neste ponto, os autores nos apresentam a noção do luxo “estilhaçado”,

fruto da democratização de massa que tornou o fenômeno plural: hoje

nos deparamos com muitos luxos, luxos acessíveis, luxos em diferentes

graus, não mais apenas um ou “o” luxo de exceção e exclusivo (Ibid.: 15),

sendo então que mesmo marcas que tradicionalmente comercializam pro-

dutos a preços muito elevados, tornam-se uma realidade para as diferen-

tes camadas sociais, chegando até estas em forma de produtos secundários

(o lenço ou pequeno acessório Louis Vuitton, por exemplo), possibili-

tando o sentimento de pertença ao que seria o seleto grupo de compra-

dores da marca e partilhando, por mínimo que seja, de sua herança e

história.

Entendemos que os produtos pirateados também se colocam nesta posi-

ção, carregando signos e atribuindo sentido ao seu consumo, podendo

assim ser também considerados como estilhaços de luxo.

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Ainda segundo Lipovetsky e Roux (2005), o luxo começa a ser demo-

cratizado pela propagação do kitsch, das cópias e dos similares, “produtos

que compensam sua impessoalidade pela redundância, as ornamentações

sobrecarregadas, a proliferação de acréscimos, os excessos expressivos”,

característicos da burguesia. (Ibid: 45) Esse movimento é reforçado pela

proliferação dos grandes magazines que conseguem baixar os preços dos

produtos de luxo proporcionando e incentivando de forma espetaculosa

o acesso de muitos ao que antes era restrito às elites.

Baudrillard já nos colocava tal discussão em sua obra A Sociedade de

Consumo (2008), enfatizando que, equivalente ao clichê no discurso, o

kitsch surge como categoria cultural, definindo-se pela sobreposição e

abundância de signos distintivos, mas de forma desarmônica e amontoa-

da, vulgarizando-os e retirando deles, assim, o poder de distinção. A

expansão do kitsch tem estreita relação com a mobilidade social que

caracteriza a sociedade de consumo: aqueles que ascendem às camadas

sociais superiores buscam também suas referências culturais, mas se dão

por satisfeitos ao se revestirem e manifestarem os signos dessa cultura,

ainda que não a tenham incorporado de fato.

Baudrillard evidencia que essa apropriação dos signos pela população que

ascende socialmente provoca uma reação das classes superiores:

“O acesso de camadas mais numerosas a esta ou aquela categoria

de signos obriga as classes superiores a distanciar-se por meio de

outros signos em número restrito (quer pela origem, como os

objetos antigos autênticos, os quadros, quer sistematicamente

limitado, como as edições de luxo, os carros fora de série)”

(BAUDRILLARD, 2008: 141).

Por esta ótica, Baudrillard entende que o kitsch acaba por revalorizar o

objeto raro, pensamento que vai ao encontro da teoria do Trickle-Down

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proposta por Simmel1 e reformulada posteriormente por McCracken

(2003), e que está no cerne de formulações importantes sobre o tema da

contrafação, como o “paradoxo da pirataria” citado por Anderson (2009),

como se verá mais adiante.

Os conceitos de luxo estilhaçado e de kitsch são importantes para a

discussão do consumo pirata. Nossa posição é a de que, embora poten-

cialmente kitsch, o contexto de uso de produtos pirata é algo valorizado

e há certa racionalização e cuidado para que o consumo não se configure

como tal. Em outras palavras, entende-se que há um gradiente que vai

do pequeno estilhaço de luxo, possível de ser consumido e ostentado por

qualquer um sem causar dúvidas ou críticas alheias, passa por um limite

dos luxos possíveis e cabíveis em cada contexto e chega até o kitsch, em

que a exacerbação do luxo estaria em dissonância com o contexto e

circunstâncias de vida do consumidor, denunciando a falsidade do objeto

e a falta de legitimidade de seu uso.

Luxo pirata: um mergulho na realidade

A pirataria de produtos e marcas de luxo tem como locus privilegiado de

produção a China. É importante alertar que, embora principie por alterar

este quadro, a pirataria na China possui características singulares. Con-

forme descrito por Chris Anderson (2009), ela se estende a praticamente

todos os setores no país e possui significados distintos do que encontramos

no Ocidente, em função de seus sistemas legais e também da influência

confuciana que enaltece o ato de copiar como uma forma de respeito ao

autor do objeto original e também como parte da educação.

1. Em 1904 Georg Simmel definiu sua teoria do Trickle-Down no artigo “Fashion”,International Quarterly, 10, 130-155.

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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Na imprensa ocidental, a pirataria chinesa é considerada crime.

Mas na China, produtos pirateados não passam de outro produto

a outro preço, uma forma de segmentação em versões imposta pelo

mercado. Comprar ou não uma bolsa Louis Vuitton pirateada não

é uma decisão moral, mas uma decisão baseada em qualidade,

status social e redução de riscos. Se as pessoas tiverem o dinheiro,

preferirão comprar o original, porque, em geral, é a melhor versão.

Mas a maioria das pessoas só pode pagar pelas versões pirateadas.

(Ibid.: 206)

Segundo o autor, a pirataria na China não destruiu o mercado, mas ao

contrário o preparou para os novos consumidores da classe média emer-

gente e, ao mesmo tempo, beneficiou o mercado de luxo legítimo chinês,

um dos maiores do mundo. (Ibid.: 208)

Neste ponto, o autor nos apresenta o “paradoxo da pirataria”, baseado

na ideia de que as imitações podem ajudar o produto original, princi-

palmente na indústria da moda – o produto pirata massificaria o produto/

modelo anteriormente exclusivo e limitado, o que provocaria uma obso-

lescência mais rápida e contribuiria para que os consumidores tradicionais

das marcas deixassem de gostar do modelo e o substituíssem por um

modelo mais novo, saindo em busca novamente de algo exclusivo e novo.

Aqui retomamos a questão do consumo de luxo por diferentes classes so-

ciais, uma vez que é ponto pacífico que a pirataria possibilita que pessoas

com menor poder aquisitivo tenham acesso a modelos de luxo.

O fato é que estamos diante de uma realidade que não corrobora com-

pletamente a ideia de que o consumo do luxo pirata se dá prioritariamente

pelas camadas menos favorecidas da população. O fato do preço mais

baixo viabilizar a aquisição de determinado produto (desejado no original)

não é suficiente para explicar a motivação para a compra de um produto

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

202

pirata, sendo que então não se pode estabelecer como consequência lógica

que os produtos piratas, especialmente os de luxo, são comprados prin-

cipalmente por pessoas de nível social mais baixo. No Brasil, vemos

inclusive uma tendência que se afasta de tal afirmação: as classes AB con-

somem mais pirataria que as CDE2 e tudo indica que é o consumo de

luxo que está pesando na balança das classes mais altas.

Para além dos grandes números e da constatação de insuficiência do preço

como explicação única para a compra de contrafação, fomos entender

de forma mais aprofundada as motivações que sustentam o fenômeno,

realizando um exercício de cunho exploratório que visou dar caminhos

para as questões que se colocaram no início deste trabalho.

Neste estudo foram realizadas entrevistas em profundidade com uma

consumidora3 e uma vendedora4 de produtos contrafeitos, bem como

tivemos oportunidade de analisar os produtos comprados pela consumi-

dora em viagens para Hong Kong e aqueles que então estavam sendo

oferecidos pela vendedora, numa abordagem de fotoetnografia. A seleção

das entrevistadas possibilitou que tivéssemos por um lado um parâmetro

2. Conforme dados de pesquisa realizada pela Ipsos e Fecomércio em 2011, o consumo

de produtos contrafeitos é declarado por 57% dos brasileiros das classes AB, 52% daclasse C e 44% das classes DE. O consumo de CDs e DVDs é feito por 8 de cada 10indíviduos e o consumo pirata ultrapassou, pela primeira vez, a metade da população

atingindo 52%, o equivalente a 74,3 milhões de brasileiros – um acréscimo de 6 milhõesde brasileiros em 12 meses.

3. Entrevista realizada em 17/09/2011 com I.V., 44 anos, paulistana, separada,executiva da área de cosméticos, com longa carreira em empresas multinacionais de

consumo e vivência profissional e acadêmica no exterior. As fotos utilizadas neste artigoforam feitas na mesma data, na residência da entrevistada.

4. Entrevista realizada em 12/05/2012 com A.P.V.H., 35 anos, paulistana, casada.Fotos feitas na mesma data e retiradas do Facebook da vendedora.

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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do mercado de mais alto luxo, pela visão de uma consumidora de nível

social elevado e, por outro lado, do mercado mais popular, pelo olhar da

vendedora com sua clientela menos abastada, proporcionando impor-

tantes pistas para a análise com base em diferenças socioeconômicas.

Os relatos: o que nos dizem os atores do comércio pirata?

A consumidora entrevistada afirma nunca ter comprado produtos piratas

no Brasil em função da baixa qualidade. Sua motivação de compra em

Hong Kong foi a promessa de que os produtos piratas seriam manu-

faturados nas mesmas fábricas que produzem a marca original: “O que

me atraiu em Hong Kong foi saber que o produto tinha a possibilidade

de ter uma melhor qualidade, que vem da fábrica. Eles dizem que é pro-

duzida uma quantidade a mais e essa é que vai pro mercado informal pra

venda principalmente para turista. O que me falaram é que eles vendem

o excedente de fábrica.” O conflito ao lidar com uma prática ilegal e vista

de forma culturalmente negativa no Brasil foi amenizada de certa forma

na compra realizada no exterior: “Me parece que eu comprei algo mais

legalizado, é diferente de saber que foi feito numa loja de fundo de quintal,

com trabalho escravo.”

Apesar de ter comprado bolsas, relógios e joias, existem limites no tipo de

produto a ser comprado no mercado pirata: “Sapato eu não compraria em

hipótese nenhuma, tenho medo que afete a minha saúde. Cosméticos ja-

mais, uma sombra, imagina, um produto pro olho. Da Chanel, eu comprei

um batom original, paguei 60 dólares só no batom e fiquei muito feliz!”

Os limites da compra de piratas aparecem também na circunstância de

uso. No caso de uso pessoal, este consumo parece mais aceitável do que

numa ocasião para presentear: “Fiquei bem à vontade pra comprar,

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

204

porque [a compra] era pra mim. Não teria coragem de dar de presente

porque teoricamente não é original, eu prefiro dar uma marca mais sim-

ples, mas uma bolsa original.”

A consumidora também faz uma diferença entre o consumo de produtos

piratas populares e os mais sofisticados, de melhor qualidade. Existem,

portanto, diferentes níveis de produtos, de acordo com a qualidade e a

semelhança com o produto e marca originais, o que reflete também no

preço das mercadorias. Em Hong Kong, ela não fez compras em ruas

populares – preferiu agendar horários com vendedores que atendem em

salas comerciais ou que se locomovem até o hotel no qual o cliente está

hospedado. Ao falar sobre a compra de um relógio (figuras 1 e 2),

comenta: “Esse aqui, que é a imitação do Cartier, eu paguei 120 dólares.

Um relógio destes custa 15 mil dólares. E quando você segura, vê que é

um relógio que tem peso, não é igual a um de plástico, porque existem

imitações ruins também lá em Hong Kong.”

Figuras 1 e 2: Relógio “Cartier” (frente e verso)

Os vendedores de artigos piratas de luxo não comercializam todas as

marcas. “São as marcas que realmente são bem caras que ele tem: Hermès,

Cartier... Eu comprei essa pulseira Hermès (figuras 3 e 4). Essa eu paguei

80 dólares. Não é uma coisa de 10 reais de qualquer forma. Lá em Hong

Kong, que eu vi, tem a Ladies Street, em que você compra relógio por

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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até 10 dólares. É uma feira enorme, que vende tanto produtos chineses

como porta guardanapos, como as marcas. Aí tem Calvin Klein, Diesel,

Armani, as marcas mais comerciais.”

Figura 3 e 4: Pulseira “Hermès” (frente e verso)

O foco da entrevistada antes da viagem era comprar uma bolsa Hermès,

marca criada em 1837 e representante do chamado “luxo verdadeiro”:

“Meu sonho de consumo é a Hermès, estava disposta a pagar mais. Eu

pensei, se for caro prefiro comprar uma só. Quando eu cheguei lá, a bolsa

[Hermès] que eu queria não tinha qualidade.” A expectativa e a exigência

da consumidora em relação a uma bolsa falsificada dessa marca se mostrou

muito alta: “As outras [bolsas] são industrializadas, e a Hermès é feita à

mão. Se é um excesso [de produção de bolsas originais], só daria pra ter

uma ou duas. De longe, dava pra ver que não era uma bolsa Hermès.

Não era feia, a variedade, a cor, mas faltou um não sei o quê, a cereja do

bolo, não comprei.”

Podemos refletir se “a cereja do bolo” a que a consumidora se refere (e

que não foi encontrada na bolsa pirata) seria a chamada experiência

sensorial e emocional que acompanha o processo total da compra, seja a

partir da escolha da loja, a preparação para a ida ao local (a loja da marca)

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e sobretudo o desembolso de uma soma considerável na aquisição de um

produto supérfluo. “Quando você olha a Hermès [pirata], você vê que

não é uma Hermès original, pelo padrão de qualidade, acabamento. Não

fica igual nunca. Até porque uma Hermès custa 30 mil reais, né? Que

ela venda uma por 150 dólares, não dá pra chegar perto do padrão.”

Como não encontrou a marca que desejava, a entrevistada passou a olhar

outros modelos e marcas e acabou comprando sete bolsas e diversas

carteiras e nécessaires. No caso das outras marcas que foram adquiridas

(Chanel, Marc Jacobs, Louis Vuitton), cujas expectativas eram menores,

ela acabou consumindo sem restrições: “Eu já não senti essa diferença

com a Louis Vuitton, todas que ela tinha eram lindas, bem acabadas.”

Uma faceta interessante nos rituais de consumo dos produtos pirateados

é que o consumo não se dá somente pela aquisição dos produtos, mas

também pelas evidências falsas que comprovem que o produto não é uma

imitação, como recibos de venda, garantias e etiquetas, que podem

inclusive ser comercializados sem o produto, para dar a um objeto

ordinário o status da marca de luxo.

A preocupação com tais evidências falsas, apontadas por Chris Anderson

(2009), se concretizam no depoimento e nos produtos comprados: “Ela

(a vendedora) tem a preocupação de colocar tudo nos saquinhos das

respectivas marcas.” Os produtos vêm acompanhados por outros itens

que “comprovam” sua origem – e que se tornam mais importantes de

acordo com a posição da marca na hierarquia do luxo. No caso da bolsa

Chanel (figuras 5 e 6), um dos itens mais caros adquiridos pela compra-

dora, o conjunto de evidências tem direito até a um cartão de autenti-

cidade com um número da bolsa (figuras 6 e 7). Além disso, folhetos que

explicam o processo de produção da marca e história de tradição (figura

8), com o seguinte título: “Chanel: uma mulher, um nome, uma lenda.”,

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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reforçando os aspectos de legitimidade e tradição fortemente associados

às marcas de luxo, em conjunto com uma identidade caracterizada por

elementos de estilo essenciais à marca Chanel: logotipo, símbolo,

correntes, matelassê, etc.

Figuras 5 e 6: Bolsa “Chanel”

Figuras 7 e 8: Certificado de “autenticidade”

Figura 9: Interior de folheto que acompanha bolsa “Chanel”

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

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Além disso, os modelos mais recentes são mais caros que os das coleções

passadas, seguindo a lógica do mercado de moda. Os vendedores fazem

promoções para que os produtos antigos sejam comprados rapidamente.

Finalmente, o apelo do consumo e das marcas numa situação diferente

da vivida em seu país de origem, longe do contexto cultural e social

cotidiano, parece muito forte, quase irresistível: “O estímulo é tão grande

pra comprar coisas das grandes grifes por preços acessíveis que você não

resiste. Você vê todo mundo comprando, dá vontade de comprar. Você

se sente dominado pelo bichinho de querer comprar uma grife.”

Esse desejo parece mais forte do que o risco associado a uma compra ilegal,

que é assumido, mesmo com receio: “Dá um pouco de medo. Não dão

nota fiscal. Como eu estava sozinha, fiquei com medo, você pode ser

assaltada, o produto não é de boa qualidade, meio Paraguai. “Dá um

medinho. Mas a mulher, pra consumir, faz qualquer negócio.”

Figura 10: carteiras compradas na China

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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Se, por um lado, a consumidora em questão bem representa as consu-

midoras de nível socioeconômico mais elevado, a entrevista com a ven-

dedora nos dá uma posição diferente, uma vez que sua clientela é consti-

tuída por mulheres e homens de classe média e média/baixa: são

empregados do comércio, funcionários do serviço público em geral,

gerentes e donos de lojas, manicures, cabeleireiros e seus clientes.

Seu trabalho se constitui em comprar bijuterias, cintos, lenços, carteiras,

relógios e bolsas na Rua 25 de Março, conhecida via de comércio popular

em São Paulo e revendê-los na capital e em uma cidade do interior do

estado. As compras são feitas semanalmente e ela mantém na sua rota

algumas lojas em que é freguesa assídua, nas quais consegue inclusive tro-

car peças que apresentem defeito. “Os chineses – ou coreanos, sei lá – se

você fica comprando direto com eles, se dá defeito eles trocam”.

A maioria dos seus produtos não é de marca, inclusive boa parte das bolsas

que vende é um tipo de produto que ela denomina de “normal” e nós

podemos chamar de genérico: são aquelas inspiradas nas tendências e

estilo encontrados nas coleções de marcas conhecidas, mas que não pre-

tendem ser idênticas aos modelos lançados por essas empresas e nem

levam qualquer marca. A vendedora cita as nacionais Arezzo e Schutz

como principais fontes das tendências, mas entre os modelos que ela tinha

para vender, há uma bolsa inspirada na Birkin da Hermès, mas não é assim

reconhecida por ela, talvez pelo fato de que as marcas nacionais já tenham

fartado suas vitrines com as chamadas “releituras” do tradicional modelo.

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

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Figura 11: Exemplos de bolsas sem marca

É entre bolsas e relógios que encontramos os produtos com marca, em

duas categorias distintas: réplica e cópia. Segundo a vendedora, a principal

diferença entre elas é a qualidade do material, sendo as cópias bem

inferiores às réplicas e, por esse motivo, afirma que não mais comercializa

esse tipo de produto. A réplica é “igualzinha a que está no mercado, eles

copiam tudo, tem até nome nos botõezinhos, a alça é reforçada, por den-

tro tudo forrado com o nome, é um pouco mais cara, mas vai durar”.

As réplicas comercializadas por essa vendedora não chegam a custar 10%

do valor da original para a consumidora final e são geralmente das marcas

Louis Vuitton, Victor Hugo e Michel Kors, certamente marcas “mais

comerciais”, conforme esclareceu nossa consumidora classe alta.

A vendedora tem conhecimento de que há um segmento diferenciado

daquele que ela trabalha, ao analisar marcas de mais alto luxo: “Agora

entrou essa Hermès, é uma das bolsas mais caras que tem, antes eram só

as estrelas de Holywood que usavam essas, agora já tem lá [na Rua 25 de

Março], só que essas são bem caras pra comprar, eu não trouxe nenhuma,

porque para comprar está uns R$ 200, eu teria que vender por R$ 500,

ninguém paga, porque R$ 500 você compra uma bolsa da Arezzo, da

Corello, da Schutz, da Capodarte, e de couro!”

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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Isso poderia nos indicar que há um limite de gasto aceito para comprar

artigos não originais ou que, ao mesmo preço, a preferência se daria por

um produto original, ainda que de marca menos prestigiosa (neste caso

as nacionais) a um produto falsificado de marca com maior prestígio (as

importadas). Mas, ao ouvir mais atentamente a vendedora, entendemos

que a régua não está colocada no preço, mas no próprio luxo.

Em outras palavras, o que ocorre é que estas consumidoras de classe mais

baixa nem sempre se sentem a vontade para ostentar um nível de luxo

que não se encaixa no seu contexto social e de vida. “Elas falam: não tem

cabimento, quem vai me ver com uma bolsa dessas sabe que não tenho

condições de comprar a original”.

Aqui o luxo se tornaria kitsch, ultrapassando o limite - subjetivo, pois

estabelecido pelo senso de cada um – do que seria o aceitável naquele

gradiente que estabelece o que estaria em conformidade com a situação

social (ou imagem criada) de cada consumidora.

Sendo assim, apenas pequena parcela das freguesas desta vendedora

compra as réplicas, aquela parcela que “tem condições de ter a bolsa

original, e as pessoas não vão achar que é falsificada. Estas podem usar

porque só quem entende muito vai dizer que não é [original]”.

Figura 12: Exemplo de réplicas - Bolsa e relógios “Michel Kors”,carteiras “Louis Vuitton” e “Hermès”

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

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Figura 13: Réplicas “Chanel” e “Hermès”, oferecidas pelo Facebook da vendedora.

Considerações finais

Ao final deste percurso, foi possível dar encaminhamento aos questio-

namentos inicialmente colocados, em especial entender possíveis dife-

renças nas atitudes de consumidores de distintos níveis socioeconômicos.5

Entendemos que, embora seja a pirataria uma alternativa e uma forma

de democratização do consumo na sociedade contemporânea, ela está

inserida no mesmo sistema que transfere os significados do universo cul-

turalmente constituído para o produto e deste para o consumidor, tendo,

5. Assumir a busca por estas diferenças evidencia nossa postura analítica, a qual considerao contexto social, econômico e, consequentemente cultural, como fatores de influência

no comportamento dos consumidores em geral e especificamente no que tange àaquisição de produtos contrafeitos. Entretanto, nosso entendimento não desconsiderao que é assinalado por Featherstone: que “o processo de decodificação do significado e

uso dos bens pelos indivíduos são complexos e problemáticos”. (FEATHERSTONE, 1995:123) e que não podemos imaginar que haja uniformidade absoluta do consumo (e deseu significado) dentro de uma determinada classe social. O que pretendemos, neste

estudo de cunho exploratório e inicial, é levantar a questão sobre a contextualizaçãosocioeconômica do uso do bem adquirido, indicando possíveis caminhos de reflexão eaprofundamento a partir das evidências encontradas.

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Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

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potencialmente, a mesma capacidade comunicativa dos produtos origi-

nais, uma vez que carrega os mesmos signos divulgados pelos vetores

“oficiais” – publicidade e moda.

Entretanto, aqui se abre uma discussão para o contexto socioeconômico

e de disponibilidade de renda, que, não obstante possa impactar o aspecto

cultural e do gosto,6 por si só recoloca a questão do preço em um novo

quadro.

O que se vê é que o preço (baixo) do produto pirata é motivador relevante

para aqueles que almejam obter o bem de luxo e poderiam adquiri-lo no

mercado formal. Para estes, há a vantagem em ter o mesmo produto, sem

prejuízo em qualidade, na forma contrafeita. Aqui o preço representa uma

vantagem que pode ser aproveitada, sem que o fato de ter realizado uma

“compra esperta” prejudique o potencial comunicativo do bem adquiri-

do, uma vez que, nesse contexto, o fato não será do conhecimento dos

demais.

De forma distinta, para aqueles que não têm condições de adquirir as

marcas de luxo originais, o que importa não é o preço baixo do produto

falsificado, mas sim o preço (alto) do produto no original, que servirá

como balizador da credibilidade que o uso do produto pirata irá transmitir

aos demais. Sendo evidente que o original custa muito mais do que o

6. A discussão da influência do nível econômico sobre o padrão cultural e sobre o gostoestético é bastante densa e não cabe ser discutida neste trabalho. Sobre o tema, ver por

exemplo CALDAS, W. A Utopia do Gosto, São Paulo: Brasiliense, 2009 e FOGAÇA, J.“O Consumo, o Gosto, a Ponte e a Cerca: um estudo exploratório sobre gosto ereferências estéticas em propagandas dirigidas à baixa renda” in III Pró-Pesq PP –

Encontro Nacional de Pesquisadores em Publicidade e Propaganda (2012: São Paulo,SP) – Deve haver mais pesquisa na publicidade porque é assim que se conquista a realbeleza. Organizado por Eneus Trindade e Clotilde Perez. São Paulo: Schoba, 2013.

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Jôse Fogaça e Silvio Koiti Sato

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seu portador pode pagar, os signos do produto pirata perdem sua

legitimidade, pois não estabelecem um lastro com a realidade social e

cultural deste e o consumo perderá assim o sentido pretendido de ser a

ponte ou a cerca que gera o pertencimento ao grupo e se tornará kitsch.

Em ambos os casos, está presente o que chamamos de “desejo autêntico”,

baseado no valor da marca original e no reconhecimento deste, mas

apenas para aqueles que podem saciar seu desejo no mercado formal é

permitido usufruir, sem perda comunicativa dos significados expressos

pela marca, de uma “compra esperta” a preços mais baixos.

Não obstante haja frequentemente o impulso para aproveitar as

oportunidades de bons negócios oferecidos pelo mercado pirata (ao que

denominamos “desejo simulacro”), o uso dos produtos adquiridos parece

sempre merecer uma reflexão sobre o que ele vai comunicar, sobre o que

vai dizer de seu portador, e nessa reflexão pesam os contextos social e

econômico do consumidor, pois embora os signos estejam sendo trans-

feridos a partir de um objeto não autêntico, o significado a ser comuni-

cado e o sentido pretendido são sempre legítimos.

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217

Tepito, Cidade do México – DF:

A Versão Mexicana da Região da 25 de MarçoPaulistana e suas Adjacências

JEFFERSON HUGO PACHECO DE REZENDE

São Paulo e Cidade do México são consideradas por muitos pesqui-

sadores como as duas principais metrópoles latino americanas, seja por

seus gigantismos, seja por seus posicionamentos estratégicos do ponto

de vista econômico ou pelas similaridades em seus processos sócio-

organizativos, sobretudo se observarmos as duas urbes a partir do e finais

da década de 80, quando ambas as conurbações iniciam sua inserção no

movimento da globalização e aos poucos vão migrando sua base produtiva

baseada em uma economia indústria para uma base amparada no modelo

econômico-financeiro.

Se pensarmos nos milhões de habitantes que vivem na Grande São Paulo

(RMSP) e na Grande Cidade do México (RMCM), enxergaremos aí uma

das possibilidades de aproximação dentro de uma ótica analítica que

possibilite esboçar um quadro comparativo entre as duas metrópoles,

contudo, ao ampliarmos um pouco mais nosso olhar, perceberemos que

as semelhanças entre elas vai muito além do volume populacional e a

quantidade de riqueza que cada uma destas aglomerações urbanas gera

internamente para seu país e as contribuições que cada uma delas oferece

à economia internacional, seja no mercado formal ou informal.

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Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

218

Assim como toda cidade latino-americana, São Paulo e Cidade do México

experimentam o melhor e o pior da dualidade que os países em transição

econômica enfrentam. Considerados países emergentes, ambos atraves-

saram a década de 1990 do século XX compartilhando problemas e espe-

lhando a pujança econômica que alguns extratos de suas respectivas

sociedades alcançavam. Ambas as metrópoles concentram cerca de 40%

da produção do PIB,e expõem em suas ruas as disparidades sociais que

tal fenômeno potencializa, basta caminhar por suas ruas e avenidas.

Habituado a frequentar com certa regularidade a região central da capital

paulistana, e como habitante e consumidor local, sempre busquei a região

da Rua 25 de Março para consumir produtos de apelo popular a um preço

acessível, pois graças à concentração de atacadistas e varejistas esta região

oferece produtos populares à preços bastante atrativos. Conjugado a esta

oferta de produtos a região da 25 de Março também é um dos polos de

concentração e comercialização de artigos piratas, embora não seja o único

polo paulistano de comercio de pirataria, mas talvez se não for o principal,

certamente é o que oferece maior variedade de produtos e preços. O que

passarei à relatar daqui em diante é uma mescla das experiências empíricas

que tive quando das diversas visitas à capital mexicana, (com a peculiar

observação de um estrangeiro) associada a algumas referências utilizadas

como base bibliográfica quanto participei do grupo de pesquisa sobre a

Requalificação Urbana do Centro Histórico da Cidade do México, dirigido

pela Dra. Patrícia Olivera Martinez da Facultad de Filosofía y Letras (FfyL)

da Universidad Nacional Autónoma de Mexico – UNAM, em 2010.

Ainda estudante de graduação, eis que em outubro de 2006 visito a

Cidade do México pela primeira vez, por ocasião de um congresso do

qual participaria na semana seguinte à minha chegada. Após ser

conduzido por um grupo de amigos também estudantes e todos mexi-

canos por diversas áreas da capital: C.U., Polanco, Insurgentes Sur, Zona

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Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...

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Rosa e la Condesa, todos bairros (localmente chamados de Colonias),

ao cair da tarde fui levado ao Centro histórico, para visitar a Catedral e o

Zócalo, (a principal praça do país – palco de manifestações políticas e

sociais mexicanas – como as que acompanharia ainda nesta mesma viagem

dias depois , quando da posse do atual presidente Felipe Calderón). Após

um empolgante jantar em um Sanborns instalado na casa de los Azulejos

(edifício emblemático do período colonial com sua atual fachada datada

de 1737), decidimos ir apreciar as apresentações de mariachis em uma

outra zona cêntrica chamada Garibaldi.

Como estávamos a passeio, e os meninos queriam mostrar tudo o que

podiam para mim, deixamos o carro em estacionamento perto dali e

seguimos caminhando até Garibaldi, que na verdade não era muito longe

dali, contudo para me mostrarem um pouco mais da cidade, meus amigos

resolveram fazer um caminho “distinto” e um “pouco mais longo” que

o habitual...

Ao passo que íamos caminhando e entrando nas ruas com edifícios his-

tóricos cada vez menos preservados e gradualmente mais movimentadas,

me deparava com os pensamentos (atrelados à minha condição de estran-

geiro) de que tal quadro urbano era comum às diferentes cidades latinas

e que São Paulo também era assim em seu centro. Seguimos caminhando

e começamos a ter que desviar das barracas e lonas estendidas no chão

que expunham produtos e brinquedos, e neste momento tive a ligeira

impressão que estava caminhando pelas travessas da 25 de Março, ou

sendo um pouco mais imaginativo, pelo calçadão da calle Florida, no

microcentro de Buenos Aires, Argentina.

Passavam das 22 horas de um sábado frio do outono mexicano, e o

comércio popular informal fervilhava como se fossem 10 da manhã de

uma quarta-feira. Ao passo que caminhávamos pessoas se aproximam

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Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

220

expondo produtos supostamente originais a preços quase inacreditáveis,

como por exemplo um indivíduo que se aproximou e abrindo sua jaqueta

me mostrou um relógio esportivo da marca Puma, que supostamente era

original ao custo de MXN 250,00 (pesos mexicanos), o que daria aproxi-

madamente à cotação da época uns USD 20,00 (dólares estaduniden-

ses)... E assim os produtos eram oferecidos de bolsas femininas (réplicas

de marcas famosas e desejadas como Prada, Louis Vuitton e Gucci) à car-

tazes com fotos de softwares e cuecas das marcas Calvin Klein e D&G.

Homens, mulheres e muitas vezes garotos nitidamente ainda na adoles-

cência eram os comerciantes daquela região seja nas barracas montadas

na forma de tiangues (a mesma forma organizativa observada nas feiras

livres brasileiras) e nas lonas que dividiam o corredor formado pelos

tiangues em dois por onde os transeuntes passavam. Os produtos expostos

nestas lonas iam de artigos de cozinha à utensílios domésticos, passando

por produtos têxteis (meias e roupas íntimas femininas) e óculos ( igual-

mente réplicas de produtos originais comercializados formalmente e a

preços surpreendentemente maiores no chamado Circuito Superior da

economia).

Como nosso destino final eram as apresentações dos mariachis em praça

Pública, retomamos a rota para lá e aos poucos fomos nos distanciando

de Tepito, que até este momento eu nem sabia que existia e tão pouco

que tivesse essa denominação. Quando por fim chegamos à Garibaldi,

comentei com uma de minhas amigas, que aquele lugar por onde passa-

mos se parecia muito com uma área de São Paulo, onde o comercio po-

pular dividia o espaço com a comercialização de artigos piratas e produtos

“da China”... Ela só sorriu e me disse: “Tepito está internacional enton-

ces... el bairro bravo, llegó al sur...”, e trocou de assunto voltando a

comentar sobre amenidades à cerca da Cidade do México.

Page 221: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...

221

Dias depois, saindo da biblioteca central já no campus da UNAM, cruzei

com um pesquisador que já havia estado em nosso departamento

realizando seu intercâmbio, e conversando sobre minhas primeiras

impressões mexicanas, ele me pergunta o que já havia conhecido e entre

os diversos lugares citei Tepito, onde observei uma mudança em sua

expressão facial que denotou espanto, que se intensificou quando lhe

comentei que a tal visita havia ocorrido numa noite de sábado. Neste

momento este conhecido me explicou que Tepito (para mim a versão

mexicana da região da 25 de Março) era uma região tida como a mais

perigosa da capital mexicana, e que segundo ele a presença do comércio

informal facilitava a ação de delinquentes, trombadinhas e até traficantes

que se misturavam às massas consumidoras e aos ambulantes para

concretarem suas práticas criminosas.

A princípio me espantei com a informação, pois de fato essa primeira

impressão não me remetera a uma situação de perigo eminente como ele

afirmava, senão apenas a uma zona que conjugava o comércio informal

e a venda de produtos supostamente furtados porém de marcas

prestigiadas, igualmente ocorre na já referida região da 25 de Março em

São Paulo.

Cerca de 1 mês e meio depois retornava eu ao Brasil, justo às barbas do

natal, e havia decidido realizar minhas compras natalinas na região central

paulistana, e agora depois de quase dois meses, embora minha visita aqui

tenha sido vespertina, voltei a me deparar com a mesma situação viven-

ciada meses antes em Tepito, porém desta vez espremido entre as massas

consumidoras que entravam e saiam desesperadamente das lojas com suas

sacolas abarrotadas de “lembrancinhas de fim de ano”.

Os anos se passaram e voltei algumas vezes mais à Cidade do México,

embora sempre fosse passear, ou resolver alguma coisa nas proximidades

Page 222: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

222

do Zócalo e da Casa de los Azulejos, não regressara até então à Tepito. Mas

em fins de 2009, 3 anos depois de chegar à capital mexicana pela primeira

vez, me fixei ali para realizar parte da pesquisa que desenvolvo através

de um intercâmbio de 6 meses, onde o consumo de produtos do segui-

mento prime em São Paulo e na Cidade do México são os objetos de

estudo. Contudo o intercâmbio previa atividades de pesquisa junto a um

grupo de estudos já operante na instituição que me acolhera. Então, iniciei

formalmente minhas atividades junto ao grupo da Dra. Patrícia Olivera,

como já mencionado anteriormente.

Embora a pesquisa dirigida pela Dra. Patrícia O. inicialmente fosse orien-

tada para o estudo das políticas públicas que poderiam ser empregadas

no processo de requalificação do centro histórico da Cidade do México,

ela me orientou a analisar os processos de consumo tanto de produtos

quanto do espaço, e esta então seria minha contribuição para o grupo.

Ainda que Tepito não fosse o centro de nossa área de estudo, era uma

região lindeira que seguramente produziria impactos na área principal,

seja pelas atividades praticadas ali ou por sua fama de “barrio bravo”.

Pesquisando sobre a formação da região central da capital mexicana, veio

o primeiro baque que um pesquisador brasileiro, com cabeça de pesqui-

sador brasileiro podia ter: ora, vivemos num país que nasce como país

há pouco mais de 500 anos, e nossas cidades, sobretudo São Paulo, ainda

nem têm essa idade e muitos dos processos que explicam suas atuais

realidades socioeconômicas se não são contemporâneos, têm suas raízes

em poucos décadas atrás, raramente esses fatos possuem idade superior a

100 anos.

Já a Cidade do México por sua própria história sócio-organizativa é

secular, e já tinha suas raízes atuais fincadas desde a época pré-colombiana.

E Tepito não foge a esta regra.

Page 223: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Luxo Pirata, Desejo Autêntico, Uso Legítimo

223

Com base em bibliografia específica constata-se que já no período pré-

hispânico, quando a atual Cidade do México ainda levava o nome de

Tenochtitlan, Tepito (Tecualhtepiton, em seu nome mexica) se configu-

rava em um ponto fronteiriço ao norte, com a cidade de Tlatelolco até que

está foi dominada pelos índios mexicas e conurbada à Tenochtitlan, e já

desde essa época a principal atividade desenvolvida pelo habitantes de

Tepito eram as trocas comerciais com habitantes de outros povoados.

No período colonial, já parte oficial da capital mexicana, Tepito se

configura em um dos parcelamentos habitacionais de administração

indígena mais prósperos e ricos da municipalidade, chegando a ser um

dos credores da municipalidade. É ali também que se cria um posto de

impostos para ingressar mercadorias na praça principal da municipalidade

com a criação da chamada Garita de Tepito.

Os anos passaram e as funções urbanas de Tepito sempre oscilaram entre

a residencial e a comercial. Se em princípios do século XX se instalaram

ali operários e artesãos,sobretudo sapateiros, nos tempos da globalização

Tepito também se globalizou e passou a se parecer cada vez mais com

outras zonas de comércio popular e de produtos piratas recorrentes nas

principais cidades latino americanas.

Durante o tempo de residência na Cidade do México, tive oportunidade

de voltar algumas vezes a Tepito, só, ou acompanhado por locais e

estrangeiros. E as experiências eram sempre similares, bem como as

observações dos companheiros de incursão. A diferença era que visitar a

zona durante o dia além de ser mais recomendável e segura, permitia

observar uma outra similaridade entre a zona de comércio popular

paulistana e a mexicana: a presença de atacadistas.

Também na versão mexicana, o comércio ilegal de artigos contrabandea-

dos, furtados e sobretudo os piratas, que são sem sombra de dúvida os

Page 224: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

224

mais abundantes, convivem lado a lado com os comerciantes que

revendem produtos legais (embora grande parte seja produzida no oriente,

sobretudo na China e na Índia). A organização espacial é a mesma obser-

vada em São Paulo: no interior dos galpões e salões comerciais, encon-

tram-se os praticantes do comércio formal, onde é possível se conseguir

nota fiscal e até mesmo garantia dos produtos comprados, já em suas

calçadas estão os tiangues ou as lonas postas ao solo, e os tepiteños que

caminhando entre os transeuntes expõe e oferecem seus produtos que

podem variar de cd’s em formato MP3 ou discografia completas (vendidas

por 5 pesos no atacado e a 10 pesos no varejo), brinquedos (estes muitas

vezes de procedência oriental), remédios e bebidas alcoólicas (quase sem-

pre adulteradas), jóias e perfumes tanto piratas como artigos introduzidos

no país de formal ilegal ou contrabandeada ( no caso dos originais), até

mesmo DVD (convencionais ou em Blue Ray ao custo de 45 pesos, apro-

ximadamente US$ 3,60) tanto convencionais, quanto lançamentos que

muitas vezes ainda nem estrearam nas telas mexicanas, bem como os de

apelo pornográfico.

Um mercado no qual os comerciantes de Tepito estão se tornando refe-

rência entre os consumidores desta classe de filmagens, ali é possível

encontrar gravações supostamente feitas em móteis baratos da capital sem

que os hóspedes fossem notificados à filmagens de pornografia infantil

feitas em paraísos caribenhos como Cancún e Isla Mujeres.

O mais impressionante nesta última visita à Tepito, foi ao sermos reco-

nhecidos como “forasteiros” por um ambulante local que comercializava

relógios da marca Louis Vuitton, a oferta de títulos de graduação mestrado

e doutorado emitidos pela UNAM e pelo IPN – Instituto Politécnico

Nacional, segundo ele poupando assim anos de vida dura nos bancos da

Universidade.

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Tepito, Cidade do México-DF: A Versão Mexicana da Região da 25 de Março ...

225

Neste sentido Tepito, vai além e deixa para trás seu par paulistano. Con-

tudo as diferenças entre uma zona comercial e outra parecem ser tão

poucas que muitas vezes se esquece que estamos em Tepito e quase

buscamos pela Ladeira Porto Geral. Contudo assim como a região da

rua 25 de Março a região mexicana gera números impressionantes por

conta de suas atividades comerciais.

De acordo com dados da Procuradoria Geral da República (México), a

nível nacional atualmente a economia ilegal é responsável por 20% do

PIB mexicano, sendo que o comércio ilegal gera perdas da ordem de

US$12,5 bilhões anuais, o mais irônico é que Tepito se localiza somente

a umas poucas quadras da sede da Procuradoria Geral da República,e é

justo em Tepito que se vendem 7 de cada um dos 10 produtos piratas

que se consomem no México.

Representações Espaciais de Tepito:

Mapa Comercial da Zona de Tepito:Diferenciação dos usos comerciais na Zona de Tepito

Page 226: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Jefferson Hugo Pacheco de Rezende

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Referências bibliográficas

ARÉCHIGA CÓRDOBA, Ernesto.Tepito: del antiguo barrio de indios alarrabal. 1868-1929, historia de una urbanización inacabada. México:Ediciones Uníos, 2003.

TOMAS, François. “Estrategias socioespaciales y construcción / destrucciónde la identidad urbana: apuntes a partir del caso de Tepito” en Identidadesurbanas, Tamayo, Sergio y Wildner, Kathrin (coordenadores). México:Universidad Autónoma Metropolitana, 2005.

Webgrafia

http://www.barriodetepito.com.mx – visitado em 15-09-2011.

http://www.jornada.unam.mx/2007/02/27/index.php?section=opinion&article=016a2pol visitado em 15-09-2011.

http://letraslibres.com/revista/convivio/bienvenidos-tepito?page=full – visitadoem 16-09-2011.

Page 227: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

227

Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

Resultados de Pesquisa Coletiva Realizada pelos Integrantes doGESC3

JÔSE FOGAÇA, SILVIO K. SATO, CLOTILDE PEREZ, ALHEN DAMASCENO,CECÍLIA CURY, LAWRENCE KOO, CINIRA BAADER, RAQUEL CARDOSO

Participaram da pesquisa de campo os seguintes integrantes do GESC3:

Bruno Pompeu, Silvio Sato, Cinira Baader, Alhen Rubens, Raquel Car-

doso, Maria Cecília Cury, Lawrence Koo, Janiene Santos, Clotilde Perez,

Eneus Trindade, Andrea Meneghel, Gabriela Ayer e Jefferson Rezende. O

presente texto é decorrente da conciliação dos resultados da vasta pesquisa

teórica e empírica empreendidas pelo grupo. Explicita o esforço de

congregar os distintos relatórios anteriormente produzidos pelas duplas de

trabalho de campo, com a reflexão teórica aportada pelos textos dos autores

lidos e também pelas palestras e discussões promovidas pelo GESC3.

Até aqui já se sabe que o GESC3 proporcionou ampla e profunda dis-

cussão sobre o tema da contrafação – aqui sendo utilizado o termo pirata

com maior recorrência –, mergulhando no estudo de suas diferentes

facetas, de seus variados conceitos, buscando entender os elementos moti-

vadores e os seus sentidos na cultura. Junto a esse trabalho teórico, o

Grupo desenvolveu uma pesquisa empírica de base etnográfica que possi-

bilitou o contato direto com os atores do comércio pirata: consumidores,

vendedores, transeuntes e trabalhadores que movimentam esse mercado

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

228

e que deram voz, ilustraram, auxiliaram na interpretação ou ainda algumas

vezes, puseram a baixo as hipóteses iniciais levantadas durante nossas

reuniões e leituras.

O universo de pesquisa

Considerada o maior centro comercial da América Latina, a rua 25 de

Março em São Paulo é um ícone do comércio popular etambém um

grande centro de venda de produtos importados e contrafeitos.Originou-

se com as lojas atacadistas de tecidos, implantadas pelos imigrantes sírios

e libaneses, que faziam promoções de suas mercadorias a preços muito

baixos após as constantes enchentes que ocorriam no local, dando início

à tradição de ofertas e promoções nas lojas locais.

Nos anos 80 a rua25 de Marçodiversificou sua variedade de produtos com

a chegada dos comerciantes de artigos de época (Carnaval, Páscoa, Natal

etc.) e, na mesma década, instalaram-se no local comerciantes deoutras

etnias, majoritariamente coreanos e chineses, que trouxeram os “impor-

tados” para a região, principalmente para a galeria Pajé.1

Figura 1: foto da Rua 25 de Março, São Paulo-SPFonte: GESC3 2011

1. Conforme Estadão.com.br: http://economia.estadao.com.br/especiais/a-torre-de-babel-do-consumo%2c119411.htm

Page 229: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

229

A rua costuma receber uma média de 400 mil frequentadores diários,

chegando a 1 milhão quando próximo de festas como Natal. Eles buscam

os mais variados produtos em suas 350 lojas e 3000 estandes em

shoppings, galerias e prédios que se concentram em seu entorno, além

dos 2000 ambulantesespalhados pelas calçadas.2

Figura 2: mapa dos principais centros de comprasno entorno da rua 25de março, São Paulo-SP

Fonte: reprodução da Internet Google Maps

Além do centro comercial em São Paulo, nosso maior foco de investi-

gação, a pesquisa estendeu-se também para outro importante pólo na

Capital Federal, a Feira dos Importados em Brasília, a região da rua

Uruguaiana no Rio de Janeiro, mais conhecida como Saara e para a feira

do bairro de Tepito na Cidade do México.

Em atividade desde 1997, atualmente a Feira dos Importados de Brasília

conta com 1990 boxes e 96 quiosques, ocupados por 1.758 permis-

2. Conforme Guia da 25 de Março: http://www.guiada25.com.br/historia_da_25demarco.asp

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

230

sionários que comercializam produtos alimentares e não alimentares,

nacionais e importados, eletro-eletrônicos, móveis, roupas, artigos para

o lar, som automotivo, informática, além de serviços.3

Figura 3: Feira dos Importados – BrasíliaFonte: Foto reprodução da Internet

http://www.feiradosimportados.com.br

A Feira de Tepito na Cidade do México é muito tradicional e antiga e

costuma funcionar dia e noite. A organização espacial é a seguinte: no

interior dos galpões e salões comerciais, encontram-se os praticantes do

comércio formal, onde é possível se conseguir nota fiscal e até mesmo

garantia dos produtos comprados, já em suas calçadas estão os “tiangues”

– as barracas – ou as lonas postas ao solo, e os tepiteños que caminhando

entre os transeuntes expõem e oferecem seus produtos originais e

contrafeitos.

3. Conforme site Fonte: http://www.feiradosimportados.com.br/, acesso em abril 2013

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

231

Figura 4: Feira de Tepito – Cidade do MéxicoFonte: Foto reprodução da Internethttp://www.barriodetepito.com.mx

Outro locus da pesquisa de campo foi a região da Saara, no Rio de Janeiro.

As ruas do que é hoje a Saara foram urbanizadas ainda no século XVIII,

décadas antes da chegada da corte portuguesa no Brasil. A principal rua

da região, a conhecidarua da Alfândega, é também a mais antiga. Ela

existia já no século XVII, com o nome de Caminho do Capueruçu.

Figura 5: Mapa da Saara – Rio de Janeiro.Fonte: www.comprenasaara.com.br

Como era bem próximo ao porto,4 este local também serviu como abrigo

aos inúmeros imigrantes sírios, libaneses, judeus, gregos, turcos, espa-

nhóis, portugueses e argentinos, que chegaram ao Brasil no final do século

XIX e início do século XX. Alguns deles, fugidos da primeira guerra

4. Conforme site www.comprenasaara.com.br

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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mundial, descobriram no Brasil um país de paz, com perspectivas me-

lhores para o futuro e muitos deles encontraram no comércio seu sustento

e possibilidade de cidadania.

Começaram a trabalhar para sustentar suas famílias, tradicionalmente nu-

merosas. Inicialmente, trabalhavam como mascates, que eram os vende-

dores ambulantes que carregavam maletas onde era encontrado “de um

tudo”, e que comercializavam suas mercadorias nas ruas, no modelo

“porta a porta”.

Com o desenvolvimento de suas atividades, os mascates foram se estabe-

lecendo em lojas que funcionavam no andar térreo de sobrados, onde a

parte superior era utilizada como residência.

O comércio na região da Saara funcionava muito antes da fundação da

Sociedade, que teve como principal objetivo, aumentar a voz ativa dos

comerciantes locais junto ao poder público. Este fato ocorreu no então

governo de Carlos Lacerda, que no intuito de remodelar o centro,

construiria uma “Via Diagonal” que ligaria a Central do Brasil à Lapa,

desabrigando todos os moradores daquela região.A necessidade de pro-

testar contra a reforma, fez com que os comerciantes se unissem na forma-

ção de uma sociedade, que reunindo mais força, pudesse ser melhor

ouvida pelas autoridades e por sugestão do próprio governador, foi

fundada a SAARA.

A Saara – A SOCIEDADE DE AMIGOS DAS ADJACÊNCIAS DA

RUA DA ALFÂNDEGA é uma associação formada em 19625 pelos

comerciantes de uma das mais antigas e dinâmicas áreas comerciais do

Rio de Janeiro, tornou-se de tal maneira popular que passou a identificar

todo o trecho do centro do Rio circundado pelas ruas dos Andradas,

5, Conforme site www.saarario.com.br

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

233

Buenos Aires, Alfândega e Praça da República.Na Saara, região de comér-

cio popular a céu aberto, é possível encontraruma ampla variedade de

mercadorias. Composta por 1200 estabelecimentos comerciais, distri-

buídos em suas 11 ruas, abrange inúmeros ramos de atividade: confecções,

cama, mesa e banho, brinquedos, ferragens, jóias, bijuterias etc...

Figura 6: Região da Saara, Rio de Janeiro.Fonte: foto Clotilde Perez

Para o GESC3, foi importante conhecer um pouco da história da região,

pois, na primeira impressão, todos imaginavam que o nome Saara era

decorrente da analogia com o deserto africano, uma vez que o calor é

imenso! Ledo equívoco histórico, mas perfeitamente possível como ficção

e metáfora vivida.

Sobre o método de coleta de dados

A pesquisa foi conduzida utilizando-se o método qualitativo com abor-

dagem fotoetnográfica (ACHUTTI, 2004) e baseada em entrevistas via

roteiro semi-estruturado, realizadas com vendedores epotenciais com-

pradoresnos centros comerciais selecionados e descritos acima.

O campo foi realizado nos meses de março e abril de 2011, setembro de

2011 e julho de 2012, pelos pesquisadores do GESC3, organizados em

duplas ou trios, em diferentes dias da semana.

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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Foram realizadas 12 entrevistas com compradores em São Paulo, 2 no

Rio de Janeiroe 8 com vendedores, sendo 6 em São Paulo e 2 em Brasília.

Devido à situação da entrevista (abordagem em ponto de fluxo e dentro

das lojas/boxes ou próximo às barracas de rua), a duração de cada uma

foi de, em média, 15 minutos, durante os quais foram mapeados os

seguintes aspectos:

– Breve histórico sobre o consumidor/vendedor

– Freqüência de visita à rua 25 de Março/ tempo de atuação

– O que busca / costuma comprar / vender

– Onde compra / origem dos produtos

– Para quem compra/vende

– O que busca nos produtos (atributos), quais critérios de escolha

As entrevistas foram gravadas e, ao final, foi solicitada uma fotografiada(o)

entrevistada(o).

O processo da entrevista: experiências no campo pirata

Figura 7: interdição do Shopping 25 de marçoFonte: GESC3 2011

Os pesquisadores não tiveram uma recepção muito amistosa ao chegar

ao local das entrevistas. Uma das duplas tinha inicialmente a Galeria Pajé

e o Shopping 25 como territórios de campo, porém, devido justamente

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

235

a uma ação contra pirataria realizada dias antes pela Guarda Civil Metro-

politana de São Paulo, ambos os estabelecimentos estavam inativos e

fechados. Optou-se por alterar o local das entrevistas para outra galeria

na mesma rua 25 de Março, que se mantinha em funcionamento.

Já no novo terreno, os pesquisadores não foram bem aceitos, tendo sido

chamados pela administração da galeria e advertidos sobre a proibição

de realizarem entrevistas no local. Após as devidas explicações, que

incluíam tratar-se de pesquisa de cunho acadêmico, e tendo havido um

compromisso de concluir rapidamente a sua missão, os pesquisadores

puderam terminar ali o seu trabalho.

Outra dupla de entrevistadores não teve tanta sorte, provavelmente por

estar à procura de ouvir vendedores, o que tornava a situação mais

“suspeita” aos olhos dos lojistas e seguranças.Estes pesquisadores, após

realizarem uma primeira entrevista na Galeria 960, foram abordados pelo

segurança e, após as explicações de praxe sobre do que se tratava a pesquisa,

o teor acadêmico etc., ouviram como respostaque, independente do que

fosseo trabalho, deveriam se retirar imediatamente, ao que acataram e

tiveram de procurar novacolocação.

Da mesma forma, embora estivessem em espaço aberto e público, os

pesquisadores que se colocaram na rua 25 de Março para entrevistar

transeuntes foram recebidos com bastante desconfiança. Ao buscarem um

lugar para iniciar as abordagens, foram interpretados como sendo fiscais

ou algo do gênero, causando imediato afastamento dos camelôs que

atuavam nas calçadas.

Após algum tempo e algumas conversas buscando maior aproximação,

os pesquisadores encontraram um espaço que não era tão próximo das

barracas dos camelôs, mas que ainda assim estavaem meio ao fluxo das

pessoas que passavam por elas.

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

236

A abordagem aos potenciais compradores, embora concorresse com a

grande movimentação da rua, com as abordagens dos vendedores e com

a pressa cotidiana das pessoas, foi exitosa após os pesquisadores compreen-

derem a importância de incluir, na breve explicação sobre o trabalho que

estava sendo realizado, grande ênfase ao seu cunho acadêmico. Os

transeuntes se solidarizavam mais rapidamente ao entender que ajudavam

estudantes e pesquisadores em seu trabalho para a Universidade.

Descrição dos resultados

• O ponto de vista dos consumidores

Foram entrevistados 3 homens e 9 mulheres, de 19 a 60 anos de idade,

advindos de diferentes regiões da cidade e de fora de São Paulo, com

diversos níveis de escolaridade e ocupações. Pode-se ilustrar a diversidade

da amostra mencionando a presença, por um lado, de um pedreiro de

56 anos que nunca estudou e, de outro lado, uma advogada com especia-

lização, ou uma estudante de moda de 19 anos. Tal diversidade retrata o

público heterogêneo que frequenta essa área e que é adepta desse tipo de

comércio, conforme já mostraram outros estudos realizados sobre a região

e o tema.6

De forma geral, a frequência de nossa amostra à Rua 25 de Março é alta,

em média 2 a 3 vezes por mês e os produtos buscados são bastante varia-

dos: bolsas, eletrônicos (celular, aparelho de som), utensílios domésticos,

6. Ver Estadão.com.br: http://economia.estadao.com.br/especiais/a-torre-de-babel-do-

consumo%2c119411.htm e Estudo Fecomércio-Rio/Ipsos, 2011: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/977400-mais-da-metade-da-populacao-consome-piratas-classes-ab-lideram.shtml

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

237

relógios, óculos, material para artesanato, bijuterias, produtos de beleza,

CDs, DVDs, pendrives. Mas as compras não se resumem ao planejado: a

visita objetiva olhar as novidades, aproveitar as oportunidades, seja nas

barracas de rua, seja nas galerias ou “shoppings”.

Os espaços fechados como as galerias são preferidos por uma suposta

segurança e para fugir da aglomeração das ruas. “Eu não compro nas

barraquinhas porque fica muito lotado, dá trombada”. É também ali onde

se costumam comprar os eletroeletrônicos como celulares e aparelhos de

som, os relógios e os óculos. Foram citadas as galerias Pajé e o Shopping

25 para a compra desses produtos. E estas lojas costumam entregar um

importante elemento para algumas categorias – a garantia – que varia de

acordo com o tipo de produto: 30 dias para relógios e aparelhos de som,

3 meses para o celular. A garantia é registrada no cartão comercial (cartão

de visita) da loja (figura 8), carimbado e assinado pela pessoa que vendeu

o produto. Uma das entrevistadas estava à procura de pendrives e planejava

comprar em uma loja por causa desse benefício:

No camelô não dá porque ele vai jurar que você não comprou

dele. Já comprei dez DVDs e quando cheguei em casa tinham dois

pornôs e os outros... Nenhum era o que estava escrito. Nunca mais

eu compro no camelô por causa disso. Na embalagem era uma

coisa... Passei um vexame com a família toda.

A experiência ser exitosa ou não é o que define a recompra:

O celular, eu quero comprar Nokia porque é bom, já tive um e

não tive problema(...) eu comprei aqui e não deu problema. Pode

ser parecido com Nokia, não precisa ser original.

Já tinha comprado o mesmo modelo [aparelho de som] para a

cunhada de Fortaleza, ela ligou de lá e pediu outro.

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

238

CD eu não compro, mas meu filho sempre pede. Eu digo que

não porque comprei e não valeu a pena porque não funcionou.

Falo pra ele pedir para o pai, eu não dei sorte.

Percebe-se que, enquanto as lojas são destinadas às compras mais plane-

jadas, as barracas da rua são a expressão da compra por impulso. Uma

consumidora resumiu que, ao passar pelas barracas da rua, você “compra

tudo que você não veio aqui pra comprar” (mulher, 47 anos, trabalha

com artesanato).

Nessas barracas são compradas bolsas, adesivos (de parede), bijuterias,

cintos, acessórios em geral, ou seja, artigos que não necessitam de garantia

e que podem ser testados no local.

Eu trago minhas amigas de Fortaleza...abre o zíper [das bolsas, para

testar], vê se não desfaz...

A compra é feita, em geral, para si e para a família, mas pode também ser

um presente para alguém. Foram citados como presentes: bijuterias,

brinquedos, bolsas, calçados, utilidades domésticas, pelúcias. Observa-

se,entretanto, certa restrição a alguns produtos, claramente identificados

como piratas e muito baratos, como os CDs e DVDs.

CD eu não levo de presente, compro 2 por 5 reais, vão falar: tá pobre tá?

Tem tanto presente baratinho por aí.

E o que buscam nos produtos comprados? Quais são os critérios de

escolha?

Neste ponto verificou-se uma distinção entre os consumidores dos dois

locais pesquisados: os frequentadores da rua não mencionaram buscar por

marcas, ao contrário, declaram buscar qualidade e modelos que viram na

TV, na Internet ou com outros amigos e não se importar com as marcas.

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

239

Não escolho marca, [vou] mais pela cor e beleza, você não quer

ela [uma bolsa] para sempre, você usa e depois quer outro modelo,

tudo muda, então é mais pela aparência que pela marca.

Você sabe que aqui nada é legítimo, você compra pelo modelo e

preço, você compra consciente de que aquilo não é legítimo, não

tem problema. Você olha e sabe que a etiqueta foram eles que

colaram. Relógio é a mesma coisa, paga 10, 15 reais, sem se preo-

cupar com a marca. Eles [sobrinhos que moram fora de São Paulo]

mandam as fotos dos relógios pela Internet.

Já as consumidoras da galeria estavam mais preocupadas em encontrar de-

terminadas marcas: Louis Vuitton, Victor Hugo, Gucci, Chanel, princi-

palmente em réplicas de óculos e bolsas. E, também nestes casos, o prin-

cipal critério para decisão da compra é a qualidade, seguidapelo modelo.7

Muitas vezes é necessária uma intervenção para adequar a marca escolhida

ao modelo oferecido, indicando que é possível realizar combinações entre

essas características.

Se você quiser, você pede uma etiqueta e ele troca na hora, põe

outra. Uma sobrinha queria uma bolsa D&G, tem que ser aquela

lá – Dolce e Gabanna. A pessoa quer ostentar aquela etiqueta. Aí

você pede pro coreano e troca. Normal, eles tiram com o alica-

tinho e prendem outra.

No caso da compra de celulares, os entrevistados também declaram não

ter uma marca pré-definida, buscando bom funcionamento e qualidade.

7. Sem dúvida também aqui o fator preço ou custo-benefício entra com forte peso na

decisão de compra, porém esse critério já está intrínseco à escolha da área comercialeleita na ocasião: ir à 25 de Março para comprar algo já implica em buscar preços maisbaixos que os encontrados nos shoppings ou lojas de bairros.

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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Ao término das entrevistas, os pesquisadores solicitaram fazer uma foto-

grafia dos entrevistados, para ilustrar o estudo. Apenas um deles se recu-

sou; todos os demais posaram para esse momento, o que indica não ser

esse ato de compra razão de constrangimento, muito menos entendido

como algo ilegal.

Figura 9: compradores na região da rua 25 de Março em São PauloFoto: GESC3 2011

• O ponto de vista dos vendedores

Foram entrevistados 2 homens, proprietários de lojas que começaram na

rua como camelô e puxador, e 6 mulheres, todas na função de vendedoras.

Chama a atenção que a maior parte declara ter 17 anos, é menor de idade,

portanto. É importante deixarmos claro que nem sempre a declaração

de “menor” idade é compatível com a aparência, no entanto, é com-

preensível dado limiar legal/ilegal com que trabalham cotidianamente.

Os produtos comercializados pelos entrevistados são bastante variados:

perfumes, loções e cremes, camisetas, bermudas, óculos de sol e de grau,

relógios, lenços e bolsas. As principais marcas são:

• Camisas e bermudas: Lacoste, Ferrari, Oakley, Tommy Hilfiger,

EckoUnltd, Armani, Adidas, Nike,EckoUnltd. Preços a partir de R$ 7,50

no atacado e R$ 10 no varejo.

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

241

• Relógios: Champion, Michael Kors, Dolce&Gabbana, Puma, Chanel,

Armani, Tommy Hilfiger, Adidas, Nike, Bulgari, Swatch, Guess. Preços

a partir de R$ 35.

• Perfumes: Joop, Armani, Ralph Lauren, Pólo, Ferrari. Preços a partir

de R$ 40.

• Bolsas: Victor Hugo, Louis Vuitton, Armani, Dolce&Gabbana,

Chanel, Prada e Tommy Hilfiger. Preços a partir de R$30, chegando a

R$ 500.

• Óculos: Prada, Ray Ban, Vogue, Dolce&Gabbana, Chanel, Gucci,

Carrera, Montblanc, Caile, Oakley, Sky Wear, Bulgari, Fendi, Puma,

Yves Saint Laurent, Dior, XY, Gucci, Armani. Preços a partir de R $35.

Figura 10: Camiseta “Lacoste” comercializada naregião da Saara, Rio de JaneiroFonte: foto Clotilde Perez, 2012.

Os preços das bolsas são os que mais variam, pois dependem da qualidade

do produto. Pudemos identificar pelo menos três diferentes tipos de

produtos: imitação, réplica de primeira qualidade e réplica de segunda

qualidade. A réplica de primeira qualidade é aquela que, segundo as

vendedoras, são idênticas à original, têm o mesmo material (couro em

geral) e apresentam a mesma qualidade de produção. Já as de segunda

linha não são tão fieis ao modelo copiado e algumas vezes usam material

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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de qualidade bem inferior. As imitações, mais baratas, são facilmente

distinguíveis das originais tanto pelo material (imitação de couro, por

exemplo) quanto pela forma de confecção (mais mal acabadas). Há ainda

variações na forma de apresentação do símbolo ou logotipo da marca

(figuras 11 e 12).

Figura 11: Símbolo Nike com distorções.Fonte: Foto Clotilde Perez, Saara, Rio de Janeiro, 2012

Segundo as vendedoras tanto de São Paulo, Rio de Janeiro como de Brasí-

lia, para as consumidoras de bolsas a marca é muito importante. Diferen-

temente do que se ouviu para outros tipos de produtos, as bolsas são pro-

curadas primeiramente pela marca e, em seguida, buscam modelos de

sua preferência.

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

243

Para a compra de óculos, relatam as vendedoras, os consumidores esco-

lhem em primeiro lugar o modelo que cai bem e combina com seu rosto,

depois verificam a marca. Pode-se dizer que o mesmo ocorre com os reló-

gios. Embora houvesse, na época das entrevistas, uma busca por relógios

Champions e Michel Kors, em geral os relógios são itens de compra por

impulso. Disse uma vendedora: “geralmente o pessoal não vem comprar

exatamente relógio. Vem comprar mais bolsa, camiseta, e acaba vendo relógio

e acaba... chamando atenção. Relógio não é um produto procurado, é um

produto achado, entendeu?”.

A publicidade das lojas é feita na própria rua em que se encontra a loja,

através de um funcionário que fica nas calçadas atraindo os potenciais

compradores um a um (os puxadores), entregando cartões e panfletos

ou ainda por meio de cartazes que atraem pela contundência e reiterada

exposição.

Figura 12: Camisetas de várias marcas com distorçõesde símbolo e logotipo. Rua 25 de Março, 2011.

Fonte: Foto Clotilde Perez

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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Figura 13 Figura 14: Loja de rua na SaaraRio de Janeiro.

Fonte: Clotilde Perez

Os puxadores têm um papel que vai além de atrair os consumidores. Eles

são responsáveis também por encaminhar (“puxar”) os potenciais

compradores para determinadas lojas, recebendo assim uma comissão

caso a venda seja efetivada. O trabalho realizado pelos puxadores é de

especial interesse para os vendedores que possuem seus locais de venda

com difícil acesso.

Quanto à origem dos produtos, as confecções (bermudas e camisetas) são

compradas semanalmente pelo lojista no bairro do Brás, importante polo

produtor de roupas em São Paulo e os demais produtos são adquiridos

em importadoras ou em fornecedores que visitam as lojas, com alta

frequência, sempre mais que duas vezes por semana.

O público alvo, na maior parte dos relatos, é formado por jovens, homens

e mulheres e, no caso das bolsas, destacam-se as mulheres adultas mais

velhas – as senhoras.

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

245

Figura 15: Produtos em lojas de São PauloFotos: GESC3 2011

Figura 16: bolsa “ Dior” vendida em galeria de São PauloFotos: GESC3 2011

Figuras 17 e 18: embalagem e réplica de primeira linhade bolsa Louis Vuitton em São Paulo

Fotos: GESC3 2011

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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Figuras 19 e 20: bolsa da marca Louis Vuitton e fachadade loja na Feira dos Importados – Brasília

Fotos: GESC3 2011

Figuras 21 e 22: óculos esporte e óculos de grauna Feira dos Importados – Brasília

Fotos: GESC3 2011

Breve olhar sobre o comércio pirata no México

A experiência de campo na Cidade do México se deu de forma mais

espontânea, incidental até, uma vez que foi realizada antes da estruturação

da pesquisa e do roteiro das entrevistas, baseando-se principalmente na

observação e apoiada no registro fotográfico.

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

247

Na feira de Tepito, a exemplo do que ocorre no Brasil, misturam-se pro-

dutos vendidos legalmente (em geral dentro de lojas no pavilhão da feira)

a produtos pirateados e, aqui bastante evidente, produtos originais contra-

bandeados ou advindos de furto. Por funcionar também à noite, a visita

ao local do comércio tem uma aura de perigo também para quem está a

visitar ou pretende fazer uma compra.

Os produtos são discretamente mostrados ao potencial comprador, estan-

do por vezes escondidos sob o casaco ou jaqueta ou apenas em fotos

demonstrativas das mais variadas mercadorias (bolsas Prada, Louis

Vuitton e Gucci, cuecas Calvin Klein e D&G, softwares etc.). Entre os

produtos mais inusitados estava a oferta, por um ambulante local que

comercializava também relógios da marca Louis Vuitton, de títulos de

graduação mestrado e doutorado emitidos pela UNAM e pelo IPN – Ins-

tituto Politécnico Nacional, segundo ele poupando assim anos de vida

dura nos bancos da Universidade.

Fato interessante é que, assim como no Brasil, aqueles que comerciali-

zavam os produtos neste centro mexicano eram também muitas vezes

garotos na adolescência, fato que hipoteticamente pode estar relacionado

à impossibilidade de imputação criminal destes, poupando assim proble-

mas aos donos do negócio com as prisões indesejadas dos seus vendedores.

Principais aprendizados

1. O preço como primeiro fator de atração: consenso

É sabido que a motivação primeira para a compra de produtos pira-

teados é o preço mais atrativo destes em comparação com os originais.

A comparação com os preços dos shoppings ou lojas de bairros foi

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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sempre mencionada, também em nosso estudo, como atrativo para

estarem ali em busca de determinado produto. A motivação é a de

uma compra “esperta”, de aproveitar uma oportunidade de aquisição

de produto similar ao original a um custo mais baixo.

2. Qualidade: que seja eterno enquanto dure... a moda

Ser similar é obviamente ter a mesma aparência que o original, mas a

similaridade buscada envolve também outra característica, a qua-

lidade. Entretanto, nem sempre a expectativa é a de que o produto

tenha o mesmo nível de qualidade que o original (o que acontece em

alguns casos de busca de bolsas de marcas de luxo), mas em geral

anseia-se que o produto tenha “qualidade na medida” para garantir

sua durabilidade até que seja substituído por outro. E a velocidade

com que os produtos tornam-se obsoletos é reconhecida e levada em

conta nessa equação.

A gente tem que olhar se vale a pena, se vai durar um pouco (...)

se tem boa durabilidade. Quando chegam novos modelos você

quer comprar, trocar. (...) Tem coisas que você quer que dure,

por exemplo, eletrodomésticos você quer que dure, não compraria

aqui. Sapato você quer que dure, tem que ser melhor.

O conceito de durabilidade é então relativizado: é preciso durar até

que o modelo novo chegue. O círculo virtuoso do fastfashion – a

produção rápida dos modelos recém-lançados – alimenta e justifica

a compra de produtos copiados.

3. A instituição de “la garantia soy yo”

Ainda que a expectativa da durabilidade não seja alta, esta tem que

ser minimamente garantida para alguns produtos, em especial os

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

249

eletrônicos. Não há aqui uma empresa ou instituição avalizando o

bom funcionamento dos produtos. A garantia é dada pessoalmente,

através de uma assinatura, da palavra do vendedor ou dono do esta-

belecimento, criando uma relação de pessoalidade e de confiança

distinta das encontradas entre as marcas e seus consumidores.

4. Há piratas mais piratas que outros

A velocidade do ciclo de vida da moda justifica a compra de réplicas

ou cópias de roupas e acessórios. Já instituída pelo fastfashion das

grandes redes como C&A, Renner, Zara, entre outras, a compra esper-

ta (a preço baixo com qualidade suficiente/mínima) de uma peça que

terá vida curta e será substituída em breve é uma prática vista com

bons olhos e que desculpabiliza a aquisição de pirateados. A compra

é percebida como resultado de uma oportunidade de mercado. Essas

peças podem inclusive serem dadas de presente, não há embaraço nem

constrangimento nisso.

Por outro lado,há menos simpatia pela aquisição de produtos

pirateados motivada apenas pelo preço baixo, implicando muitas vezes

em um mau negócio, devido a não garantia de bom funcionamento,

como a de reproduções não autorizadas de DVDs ou CDs. Produtos

como esse não se destinam a presentear outros e há maior resistência

em declarar esse tipo de compra.

5. É bonito e está na moda...

Durante o trabalho de campo foi possível comprovar que boa parte

das aquisições de produtos piratas não está vinculada a qualquer ação

ilegal. O produto de preço acessível, é bonito e está na moda... Essas

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Fogaça, Sato, Perez, Damascendo, Cury, Koo, Baader e Cardoso

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foram as razões que reiteradas vezes pudemos ouvir de diferentes

compradores. Não estavam, genuinamente, agredindo qualquer

marca, ao contrário “é bonito e está na moda”. Aqui chama a atenção

também o fato de que o lugar (Rua 25 de março, Saara, Feira de

Brasília ou mesmo Tepito) endossa e eleva a condição de “moda” o

que está ali ofertado: se está aqui é porque está na moda... (ER, 32 anos,

diarista, Rua 25 de Março, figura 23).

Figura 23: compradora da camiseta Diesel:É bonita e se está aqui é porque está na moda...

Fonte: foto Clotilde Perez

Além destes aprendizados que levantam questões importantes para serem

aprofundadas em novos estudos, a realização da pesquisa possibilitou a

retroalimentação do glossário, trazendo inclusive ao conhecimento do

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Em Campo Pirata: Olhares, Registros e Interpretações

251

Grupo novos termos usados cotidianamente pelos diferentes atores do

comércio pirata. Os termos populares podem ser vistos no segundo item

do Glossário intitulado “a linguagem cotidiana no campo pirata: novos

aprendizados”.

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Apresentação

ALHEN RUBENS DAMASCENOCINIRA BAADER

A proposta do desenvolvimento do glossário da pesquisa se deu espe-

cialmente pela necessidade de contextualização da temática por nós esco-

lhida para investigação – consumo e pirataria – em toda sua diversidade

e riqueza de termos, definições e significações.

A escolha dos termos (formais e coloquiais) colocados na composição do

glossário se deu a partir de diversas reuniões e trocas de experiências entre

os participantes do grupo, inicialmente discutindo sobre a temática da

pesquisa com base nos estudos teóricos desenvolvidos e, em um segundo

momento, já com base nos relatos das experiências vivenciadas em campo

pelos pesquisadores.

A partir dessas discussões, chegamos à estruturação de vários termos que

orientaram nossos estudos teóricos e também nos ajudaram a conhecer

melhor o universo da pirataria e tudo o que estaria a se mostrar para nós

nas imersões em campo.

Interessante observar que, com a vivência da pesquisa nas ruas, pudemos

constatar uma rede associativa de novos significados atrelados aos vocá-

bulos já existentes e jargões usados no cotidiano dos vendedores e consu-

midores dos produtos. Essas expressões idiomáticas e gírias foram também

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Glossário Pirata

256

incorporadas ao glossário para uma melhor apreciação da realidade que

nos foi mostrada e vivenciada quando estávamos em campo. Tais

expressões se fazem mostrar de fácil reconhecimento por uma parcela

considerável da população que vê nos produtos pirateados uma forma

de inserção no mundo do consumo, principalmente o consumo das

marcas de luxo, em que a aquisição de produtos piratas se mostra como

uma prática comum e rotineira.

Contamos assim com o total de mais de 30 termos na composição do

glossário da pesquisa, selecionados a partir das leituras para o estudo do

tema e experiências compartilhadas na pesquisa de campo. Ao integrar

todos os textos para a formulação do glossário, procuramos criar um

padrão de formato para a apresentação de cada termo. Propusemos então

a seguinte formatação:

• Definição: texto referente à definição do termo em si.

• Contextualização: texto referente à contextualização do termo em

diferentes temáticas e, especialmente, no contexto da pirataria.

• Referências: indicação das referências de pesquisa de cada termo.

A seguir, relacionamos os termos que nos foram pertinentes no desen-

volvimento da pesquisa, no sentido de um maior conhecimento e dife-

renciação entre as diversas modalidades e sentidos que o universo sígnico

da pirataria nos apresenta.

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257

Adaptação

JÔSE FOGAÇA

Definição

Nas definições encontradas em dicionários, adaptação é a ação ou efeito

de adaptar-se, e pode ser aplicada em diferentes contextos. No teatro, no

cinema ou na literatura por exemplo, peças, filmes e livros são adaptados,

algumas vezes visando um melhor entendimento ou maior acessibilidade

de seu conteúdo. É o ato de fazer algo combinar ou harmonizar com a

finalidade ou o resultado esperado, numa mudança de contextos.

Contextualização

Assinalam a ideia de adaptação a existência de uma obra (ou produto)

anterior – que vai passar por uma ação transformadora em termos de

suporte midiático ou da época – e a forma como será transformada -

envolvendo um ato criativo ou inovador.

Giacomini Filho (2011, p. 233), ao analisar as diferentes formas de

imitação na propaganda, definea adaptação como “conteúdos estéti-

cos apropriados de outros contextos deforma a caracterizar uma

intertextualidade”.

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Glossário Pirata

258

Nas palavras do autor, adaptação é a “codificação de umconteúdo original

para outro suporte midiático, caso de um filme realizadoa partir de um

livro, de uma peça teatral transformada em obra literária, ouum seriado

de TV produzido a partir de um filme (BALOGH, 2004). (...) Nesse con-

texto, um anúncio publicitário pode imitar outro transmutando parte

do conteúdo deum trabalho artístico (pintura, peça cinematográfica, obra

literáriaetc) ou de outro anúncio” (GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).

É importante ressaltar o elemento de inovação contido nas adaptações,

que pode inclusive melhorar o modelo original (cf. SCHNAARS, 1997

apud GIACOMINI FILHO, 2011, p. 231).

Na área da publicidade, a adaptação tem sido bastante utilizada e pode

envolver a retomada de uma ideia pelo mesmo anunciante (caso da ree-

dição ouremake), uma nova versão do mesmo anúncio (readequação ou

reelaboração), a repetição de um padrão de anúncio (reprodução),ou ain-

da a importação de uma obra conhecida ou discurso transplantado do

contexto original para o anúncio (o ready-made), sendo que o conteúdo

apropriado acaba por se constituir em estereótipo ou elemento kitsch

(idem, p. 231 e 233).

Referências bibliográficas

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da LínguaPortuguesa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1995.

GIACOMINI FILHO, G. Tipologias de imitação estética na propaganda. InMATRIZes. Ano 4 – nº 2 jan./jun. 2011 – São Paulo, p. 216-238.

http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=adapta%E7%E3o(acesso em junho 2013)

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259

Análogo

HÉLIO SILVA

Definição

Expressão originária do grego analogon (análogos) que traduz um certo

sentido de similaridade, proporção ou razão. Trata-se de algo que guarda

analogia, ou seja, semelhança com outra coisa. Pode-se dizer, ainda, algo

comparável, correspondente, simétrico, conveniente, similar que, no

entanto, preserva aspectos de diferenciação.

Contextualização

O análogo sugere um conceito complexo, pois se refere a objetos que não

são idênticos, porém também não se apresentam completamente dife-

rentes. Fundamentalmente, a sua expressão depende de comparações que

vão estabelecer as condições de conformidade, semelhanças, coincidências

ou diversidades. A tensão permanente entre essas forças, de certo modo,

vem questionar a própria ideia de identidade única dos objetos, uma vez

que esta (identidade) somente se manifesta nas suas semelhanças.

Foucault (1999) contribui para o entendimento do conceito de análogo

ao indicar as principais figuras cujas articulações promovem efeitos de

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Glossário Pirata

260

semelhança e que são denominados pelo autor como “quatro similitudes”

(1999, p. 23). Na visão do autor, há a similitude por conveniência (conve-

nientia) em que apenas pontos vizinhos dos objetos se tocam ou se mistu-

ram, tornando difícil dizer onde termina uma e começa o outro. Outra

figura é a emulação (aemulatio) que remete a uma espécie de semelhança

à distância de objetos separados no espaço, sem nenhum contato, algo

como um reflexo no espelho. Também há a simpatia1 que promove uma

assimilação tão intensa que pode levar os objetos a se tornarem idênticos.

Ou, pelo menos, serem percebidos dessa maneira.

Finalmente, Foucault aborda a analogia, derivação do análogo, como uma

forma de similitude que se superpõe à conveniência e à emulação pois

sugere e encaminha ajustamentos, junturas e encadeamentos. Foucault

(1999, p. 30) afirma que “por ela (analogia) todas as figuras do mundo

podem se aproximar”. Baseada mais nas relações do que em semelhanças

reais, a analogia é “um espaço de irradiação” (FOUCAULT, 1999, p.31),

que executa similitudes invisíveis, sutis e irresistíveis.

Extrapolando agora a nossa visão do campo filosófico para o cotidiano

contemporâneo, vamos observar que a coisa análoga (objeto, ideia, racio-

cínio, etc) encerra uma tensão latente que tanto destaca as simetrias, igual-

dades e proporções, quanto faz lembrar as diferenças. Nesse contexto, o

análogo alimenta operações de sentido sofisticadas que, mais do que

traduzir semelhanças e similitudes, vão se conectar com a ideia de simu-

lacro (BAUDRILLARD, 1991; DELEUZE, 1974) para anular diferenças,

1. No livro As Palavras e as Coisas, Foucault desenvolve o conceito das quatro similitudesapresentando-as na seguinte ordem: conveniência, emulação, analogia e simpatia. Porém,

para o melhor encaminhamento das idéias desenvolvidas neste texto, fizemos a opçãopor inverter a ordem das duas últimas. Ou seja, primeiro falamos da simpatia e, porúltimo, da analogia.

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Glossário Pirata

261

contestar modelos e promover representações aceitáveis, mesmo que não

originais.

Nas palavras de Deleuze, “o simulacro não é uma cópia degradada, ele

encerra uma potência que nega tanto o original como a cópia, tanto o

modelo como a reprodução” (DELEUZE, 1974, p.267-8).

Referências bibliográficas

BAUDRILLARD, Jean. 1991. Simulacros e simulação. Lisboa: Relógio d’Agua.

DELEUZE, Gilles. Platão e o simulacro. In: Lógica do Sentido. São Paulo:Perspectiva, 1974.

FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas. Uma arqueologia das ciênciashumanas. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

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Autêntico

LÍVIA SOUZA

Definição

Diz-se de um produto autêntico quando este é, de fato, produzido pelo

autor (pessoa física, artista, corporação) a quem se lhe atribui. Nesse

sentido, um quadro ao qual se atribui a autoria de Matisse, por exemplo,

é dito autêntico quando se verifica que a autoria é, de fato, deste autor.

Do mesmo modo, um perfume que se intitula ser da marca Chanel, ou

um software Microsoft Office, são considerados autênticos caso seja

verificada sua genuinidade. Isto pode se estender para além da questão

da autoria em si, indicando também a comprovação da origem de um

determinado objeto. Por exemplo, uma porcelana Ming, denominação

que engloba época e local de fabricação. Na linguagem cotidiana, utili-

zamos o adjetivo autêntico para qualificar o indivíduo espontâneo, ou

seja, que não apresenta aos outros uma imagem diferente do que ele real-

mente é. Juridicamente, o adjetivo aplica-se a qualificar os profissionais

(tabeliães e magistrados) competentes a autenticar documentos e cópias,

comprovando assim sua veracidade. Ainda nessa seara, autêntico é aquilo

a que se pode dar fé, ou seja, que é legítimo, legalmente verificado. Pode-

mos, portanto, listar como sinônimos: fidedigno, legítimo, verídico,

verdadeiro.

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Glossário Pirata

264

Contextualização

O adjetivo tem origem na palavra grega authentikós, que exprime aquilo

que é principal, primordial, que consiste num poder absoluto. A termi-

nologia deriva, por sua vez, do termo authéntés, que significa o senhor

absoluto. Desse modo, o autêntico está relacionado a um poder legiti-

mador e verdadeiro.

O tema da autenticidade tomou diferentes contornos no campo da

filosofia. O filósofo alemão Martin Heidegger publicou, em 1927, a obra

“Ser e Tempo”, um marco na filosofia existencialista ocidental do século

XX, e ali teorizou sobre os conceitos de autenticidade e inautenticidade

ligados à constituição da identidade do indivíduo frente aos demais.

Dita de maneira quase que superficial, no limite desta breve definição

de glossário, a autenticidade em Heidegger é um dos pilares da sua

definição sobre o homem, a que chama Dasein, ou pre-sença, ser-no-

mundo: em alemão, dasein significa a existência. Além de ser-no-mundo,

que traz o sentido da presença na espacialidade, o Dasein é também ser-

com-outro: ser-no-mundo implica, impreterivelmente, ser alguém com

outro e para outro.

Nessa existência na vida cotidiana, ser-no-mundo e ser-com-outros, o

indivíduo acaba por ser absorvido pela automatização de seus atos, em

uma existência superficial, ou inautêntica: “Na maioria das vezes e antes

de tudo, a pre-sença é absorvida por seu mundo” (HEIDEGGER, 1993:

164), tomando para si uma existência que não lhe corresponde. É dessa

situação de inautenticidade que o indivíduo, a partir de sua angústia, deve

buscar sua existência autêntica, ou seja, o seu verdadeiro ser, passo

fundamental para sua liberdade.

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Glossário Pirata

265

Nessa mesma perspectiva, porém trazendo a discussão para um tema

contemporâneo, podemos mencionar o trabalho de Fidalgo (2009), “O

celular de Heidegger – comunicação ubíqua e distância existencial”. A

partir da visão de Heidegger quanto à constituição da identidade do

indivíduo no mundo e perante os outros, Fidalgo debate as possibilidades

do papel dos telefones celulares na constituição dessa identidade: seria

um elemento identitário essencial, ou fator de alienação, ou, portanto,

inautenticidade existencial?

Fidalgo discute, então, ambas as vertentes. Por um lado, o celular pode ser

visto sim como um aparelho a serviço da existência inautêntica, esti-

mulando o chamado falatório, que, para Heidegger, é a troca superficial no

diálogo entre os indivíduos sobre determinado assunto, sem que haja a

compreensão profunda e completa do tema, apenas bastando o entendi-

mento do que é dito. Por outro lado, se focarmos em situações específicas,

o celular hoje é parte fundamental de diversos tipos de relações sociais, e

tem seu papel no processo de identificação pessoal. Ele pode servir inclusive

à constituição de identidades autênticas em situações específicas, como,

por exemplo, em uma relação amorosa, cumprindo o papel das cartas de

amor de dois séculos atrás, como relembra Fidalgo (op. cit., 94).

O autor conclui, afinal, que as reações ao uso do celular podem natu-

ralmente pertencer a qualquer uma das vias, a eufórica ou a apocalíptica,

e a teorização heideggeriana quanto à questão da autenticidade, inauten-

ticidade e formação da identidade individual frente ao mundo e aos outros

serve para a análise deste fenômeno.

Após esta passagem por diversas formas de compreender a questão da

autenticidade, devemos voltar ao autêntico em sua ligação com o

consumo.

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Glossário Pirata

266

Nas conceituações do autêntico vistas aqui, desde a concepção em sua

origem grega, até suas implicações na filosofia, o autêntico está profun-

damente relacionado a algo que é senhor de si mesmo.

Ao dizermos de um produto que ele é o autêntico, além da informação

de que ele é o original e não o falsificado, trazemos também uma carga

simbólica que está ligada à constituição da própria identidade marcária.

As marcas mais visadas pela pirataria são aquelas que têm grande presença

no mercado, são marcas consagradas e largamente conhecidas do

consumidor.

A partir dessa perspectiva, ao afirmarmos que determinado produto é

autêntico, estamos o envolvendo em um campo simbólico que diz

respeito também à sua própria identidade enquanto marca original e

genuína, que tem o poder legitimador de ser senhora de si mesma.

Referências bibliográficas

FIDALGO, António. O celular de Heidegger – comunicação ubíqua e distânciaexistencial. In: Revista MATRIZes, ano 3 – n. 1, ago / dez 2009. P. 81 –98.

HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Petrópolis: Vozes,1993.

HOUAISS A., VILLAR M. de S., FRANCO, F. M. de. Dicionário Houaiss dalíngua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php – Acesso em 09/05/2012.

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267

Autoria

BIBIANA STOHLER SABENÇA DE ALMEIDA

De uma forma geral, autoria está vinculada a uma obra, cuja elaboração

foi concebida por seu criador, o autor. Existe, aí, um sentido de

pertencimentono plano material, ou seja, a obra (o objeto em si)

pertencente a um autor (o idealizador do objeto). Ela está ligada a ele

por sua arquitetura (planejamento) e construção (execução). Quando a

obra, por exemplo, é elaborada por vários autores, dizemos então que se

trata de uma obra de construção coletiva, enriquecida pelo conjunto de

perspectivas diferentes.

Vejamos também o sentido de autoria no dicionário. Dessa forma, autoria

significa: “1. Qualidade de autor; lavra.”(Minidicionário Luft. 2ª Edição.

Editora Scipione. São Paulo, SP. 1991). Para explorarmos melhor sua

significação, precisamos conhecer o significado das palavras “autor” e

“lavra” (Minidicionário Luft, 1991):

Autor: “1. Criador de uma coisa. 2. A causa principal; o agente.

3. O que propõe demanda judicial. 4. Indivíduo que escreve obra

ou científica.”

Lavra: “1. Ação ou efeito de lavrar. 2. Terreno do qual se extrai

ouro e diamante. 3. Produção; elaboração; autoria.”

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Glossário Pirata

268

A palavra lavra vem do verbo lavrar, que quer dizer (Minidicionário Luft,

1991):

“1. Preparar a terra para o plantio; amanhar. 2. Fazer ornatos ou

lavores em. 3. Cinzelar; lapidar. 4. Exarar, redigir (atas, escritura,

documentos, etc.). 5. Explorar (minas). 6. Propagar-se; alastrar-

se; grassar.”

O temos aqui é que o significado de autoria é derivado do criador (o autor)

e da ação ou de seu efeito, sua produção (a lavra). Assim, a palavra autoria

é uma qualidade do autor, aquele que concebe a obra, e de sua lavra, o

fruto de sua produção, ou seja, a própria obra.

Contextualização

Nas artes, podemos observar a questão da autoria nas obras de Chiquinha

Gonzaga. Em 1913, Chiquinha inicia a luta pelos direitos autorais no

Brasil. Ao visitar a cidade de Berlim na Alemanha, a maestrina entrou

numa loja de música e encontrou partituras com suas músicas, cuja

reprodução fora realizada sem sua autorização.

Ao voltar para o Brasil, descobre que Fred Figner, diretor da Casa Edison

no Rio de Janeiro, concedeu tal autorização. O empresário editava

partituras e fazia gravações de discos para o mercado nacional, desde 1902.

Não só Chiquinha, mas também outros artistas da época sofreram com

as reproduções indevidas. Isso também acontecia com as composições

para o teatro. Chiquinha começou a polemizar o assunto por meio da

mídia, principalmente, aos veículos jornal e rádio. Após sua insistência

na questão, conseguiu receber indenização em dinheiro.

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Glossário Pirata

269

Em 1916, a discussão ganha força e vai ao Congresso Nacional, que

aprova a primeira lei sobre propriedade artística e literária no país. Em

1917, os autores teatrais fundam a Sociedade Brasileira de Autores

Teatrais (SBAT). Essa sociedade garante todos os direitos aos autores

teatrais e compositores musicais. Chiquinha foi sócia fundadora e patrona

da SBAT.

No século XX, surge a primeira lei, que discorre sobre a temática no Brasil,

conhecida por Lei 9.610, aprovada em 19 de fevereiro em 1998:

“Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei aos nacionais ou

pessoas domiciliadas em país que assegure aos brasileiros ou

pessoas domiciliadas no Brasil a reciprocidade na proteção aos

direitos autorais ou equivalentes.”

Com relação ao direito de uso, a lei protege em casos de publicação,

transmissão ou emissão, retransmissão, distribuição, comunicação ao

público, reprodução, contrafação (reprodução não autorizada), obra,

fonograma, editor, produtor, radiodifusão e artistas intérpretes ou

executantes.

Quanto aos aspectos gerais, a lei discorrerá sobre as obras intelectuais no

que tange à proteção, autoria, registro, direitos do autor, direitos morais

do autor, direitos patrimoniais e sua duração, limitações dos direitos

autorais, transferência dos direitos do autor, utilização de obras inte-

lectuais e dos fonogramas, edição, comunicação ao público, utilização

da obra de artes plásticas, utilização da obra fotográfica, utilização de

fonograma, utilização da obra audiovisual, utilização de bases de dados,

utilização de obra coletiva, direitos conexos, direitos dos artistas intér-

pretes e executantes, direitos dos produtores fonográficos, direitos dos

produtores de radiodifusão, duração dos direitos conexos, associações de

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Glossário Pirata

270

titulares de direitos de autor e conexos, sanções às violações dos direitos

autorais, ações civis, prescrição da ação e disposições finais.

Referências bibliográficas

Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione, 1991.

http://www.casadoautorbrasileiro.com.br/sbat

http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/5198.html

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271

Avatar: Nome Masculino, Mitologia Hindu

JOSÉ PALANDI JUNIOR

Para muitos a palavra AVATAR é um neologismo, criado pelos jogos

veiculados na rede mundial de computadores. No entanto, ela temorigem

na antiga mitologia Hindu.

AVATAR é empregado no sentido de transformação, metamorfose.A

palavra AVATAR tem sua origem em uma das 23 línguas oficiais da Índia,

o sânscrito Avatãra ou Avatãr, e tem como significado “Aquele que

descende de Deus”, ou simplesmente encarnação. AVATAR no hinduís-

mo é a encarnação do deus Vishnu na terra.

Vishnu é o segundo deus da tríade Hindu, e sua função é garantir a con-

servação do universo, sendo a tríade formada por:

Brahma, o criador

Vishnu, o protetor

Shiva, o destruidor

A Vishnu são atribuídos dez encarnações ou avatares.

Os AVATARES de Vishnu são deuses que se encarnam somente para

fazer o bem do universo, onde são conhecidos como:

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Glossário Pirata

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1º - Mataya, na forma de peixe

2º - Kurma, na forma de tartaruga

3º - Varâha, na forma de javali

4º - Nara-Simha, na forma de homem

5º - Vamana, na forma de anão

6º - Parasourâma

7º - Rama-Chandra

8º - Balarâma

9º - Krishna

10º - Kalki

No antigo Brahmanismo, modificado e atualmente chamada de

Hinduísmo, o próprio Buda era reconhecido como um AVATAR de

Vishnu.

Na Cibercultura a palavra AVATAR designa a aparência que assume um

internauta em ambiente virtual, com objetivo de ser reconhecido por

outros internautas. O AVATAR é uma figura imagética criada pelo

usuária da rede internacional de computadores, sendo assim, um

pseudónimo no navegador. Muitos jogos na internet utilizam a expressão

AVATAR, como exemplo o ambiente do Second Life, onde uma das

primeiras tarefas do jogador é criar seu próprio AVATAR.A palavra

AVATAR na informática tem praticamente o mesmo valor que para o

Hinduísmo, sendo uma criatura que representa um

operador, o original. Desta forma uma AVATAR

é um substituto do original.

A industria cinematográfica tem produzido vários

filmes explorando a figura do AVATAR, onde o

filme de mesmo nome escrito e dirigido por James

Cameron lançado em 2009 foi responsável pela

VISHNU, divindade Hindu

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Glossário Pirata

273

popularidade do termo. Outros filmes exploraram a figura do AVATAR,

como Surrogates (Substitutos – estrelado por Gruce Willis e diretor

Jonathan Mostow) também tem como roteiro a ficção científica baseada

no AVATAR, que aqui é denominado substituto. O filme Matrix (

protagonizado por Keanu Reeves e dirigido pelos irmãoes Wachowski)

também baseou-se em AVATARES.

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Clonagem

ENEUS TRINDADE

Definição:

Conceito originário nas Ciências Biológicas que diz respeito às ações

ou possibilidades (naturais ou artificiais) de reprodução assexuada de

organismos vivos, plantas e animais. O resultado desse processo seria um

clone, cuja origem etimológica da palavra vem do grego, dada pelo termo

klon, que designa a idéia de broto, ou seja, alguma coisa (ser vivo) que

deu origem a outro, idêntico, por meio de reprodução assexuada.

Contextualização:

A recuperação do termo grego no campo das Ciências Biológicas acontece

em 1903, quando o botânico norte-americano Herbert J. Webber decide

denominar por clone os resultados de experimentos com um conjunto

de células, moléculas ou organismos geneticamente iguais às de uma célula

matriz que lhe serviu de origem.

Existem processos naturais e artificiais de clonagem. As clonagens naturais

ocorrem em alguns organismos unicelulares que realizam sua reprodução

pelo método da bipartição. Além deles, alguns mamíferos como o tatu

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Glossário Pirata

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podem produzir um clone por meio da poliembrionia. Algo semelhante

ao caso humano, em que os clones naturais são os gêmeos univitelinos,

ou seja, são seres que compartilham do mesmo material genético (DNA),

sendo originados da divisão do óvulo fecundado.

Já a clonagem artificial possui várias técnicas. Uma delas possibilita clonar

um animal a partir de óvulos não fecundados, processo conhecido desde

o século XIX e praticado pelos agricultores que obtinham clones de plan-

tas. Uma planta matriz origina dezenas de novas plantas geneticamente

idênticas. A clonagem artificial pode advir de células de embriões e de

células adultas, como foi o caso da ovelha Dolly.

A clonagem instiga várias discussões sobre suas possibilidades nos avanços

das Ciências Biológicas e Médicas, mas também se insere em um contexto

de debates de ordem ética e religiosa. Entre as principais vantagens da

clonagem estão: a preservação de animais em extinção; o desenvolvimento

de animais imunes a algumas doenças que são contagiosas; clonagem de

células humanas para tratamento de doenças. Já as desvantagens, dizem

respeito às questões éticas e religiosas no que se refere aos limites da ciência

e da indústria biológica para o comércio da vida.

Conexão com o Tema:

Mas o termo clonagem não ficou restrito às Ciências Biológicas. E após

a divulgação na imprensa do fenômeno Dolly em 1997, as palavras clone

e clonagem começaram a ser popularizadas, designando os processos de

reprodução tecnológica ligados a à espionagem industrial ou a à cópia

de produtos originais, que geram os produtos piratas.

As palavras clone e clonagem, com seus sentidos biológicos, se tornam

metáforas da reprodução técnica, da cópia. Tanto em um caso como no

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outro residem questões éticas sobre o limite da técnica. Neste caso, o

limite técnico industrial, como ficam os direitos à autoria, a à criação e a

à inovação? Qual o limite para que a criatura não possa superar o criador?

E por que não poderia? Quais os riscos disso? Essas são questões que

devem alimentar não só as áreas biológicas, mas também devem nutrir o

mundo dos negócios e das indústrias na reorientação de seus papéis

sociais, pois as possibilidades técnicas são amplas e o velho sentido de

propriedade parece estar cedendo lugar para outros valores. O clone não

é cópia. Ele é um outro e, como outro, tem seu estatuto identitário. A

clonagem põe em crise e em discussão ética os limites do que é autêntico,

do que seria a propriedade sobre o produto clonado. Em que medida ele

pode ser reduzido ao sentido de cópia? E em que medida esse clone mer-

cadoria não reflete um anseio de igualdade da sociedade, que sempre foi

desigual, considerando-se que o direito à propriedade torna o mundo

excludente e cria sistemas de preservação que beneficiam os autores/pro-

dutores. A clonagem, nesse sentido, surge para beneficiar a expectativa

dos usuários que não podem possuir o produto matriz. A tecnologia e a

biologia obrigam o mundo a pensar uma nova ética.

Referências bibliográficas

PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem: fatos & mitos. São Paulo:

Moderna, 2002.

http://www.brasilescola.com/biologia/clonagem.htm Acessado em 24 de

janeiro de 2010.

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Contrafação

ANDRÉ PERUZZO

Definição

Nas discussões sobre propriedade intelectual, entende-se como o ato

ou efeito de contrafazer, na acepção estrita de reproduzir, imitar ou

arremedar o trabalho ou a obra de outrem por meio da falsificação.

Destaca-se sua relação de sinonímia com os vocábulos “simulação” e

“fingimento”, que acentua a intenção do contrafator de fazer passar a

imitação pelo original em uma tentativa de “ocultar ou esconder a

contrafação sob o manto do disfarce ou da camuflagem” (GARCIA,

2004, p. 65). Por essa perspectiva, o conceito é frequentemente utilizado

para salientar um ato de exploração ilícita do valor superior do objeto

contrafeito, uma vez que uma simples reprodução não representa,

necessariamente, um prejuízo ou ofensa ao seu autor ou inventor. Em

termos jurídicos, a Lei dos Direitos Autorais (Lei nº9.610/98, Art. 5, do

inciso VII) define a contrafação como a reprodução de uma obra não

autorizada pelo seu autor.

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Contextualização

Em relação à apreciação de uma possível contrafação, Garcia (2004)

destaca que a análise entre o objeto protegido por patente e o objeto

incriminado deve ser realizada segundo duas regras fundamentais: para

haver contrafação, é necessário que os meios essenciais constitutivos da

invenção ou obra sejam reproduzidos e que a apreciação considere as

semelhanças entre os objetos, e não suas diferenças, pois essas últimas não

excluem ou destroem a reprodução ilícita de qualquer semelhança essen-

cial. O autor também aponta que, assim que constatada, a lei pode punir

a contrafação mesmo que essa não acarrete prejuízo, pois a própria con-

corrência desleal e o descrédito do produto legítimo pelo infrator já

constituem um dano ao inventor ou autor.

Observa-se que a contrafação pode ser encontrada em diversas mani-

festações do contemporâneo, tais como: na reprodução ilícita de cédulas

e moedas nacionais; na confecção ou adulteração de documentos; por

meio da imitação de bens de consumo, como relógios ou até mesmo de

medicamentos; na reprodução de obras artísticas renomadas, que são

vendidas como originais em leilões especializados; entre muitos outros

casos. Por conseguinte, a Coalizão Internacional Anticontrafação, a maior

organização sem fins lucrativos dedicada à proteção da propriedade

intelectual e à contenção da contrafação, estimou em 2007 que as vendas

de reproduções não autorizadas correspondiam de 5 a 7% do comércio

mundial, o que equivaleria a 600 bilhões de dólares anuais. A tendência

era que esses valores crescessem devido à constante demanda de consu-

midores em busca de produtos com menores preços e ao aumento da

acessibilidade às ofertas de mercadorias falsificadas por meio do cres-

cimento do número de usuários da Internet e da tecnologia mobile, que

permitem que qualquer um compre um produto falsificado vendido em

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Glossário Pirata

281

outro lugar do mundo. Refletindo essa expectativa, a Câmera Interna-

cional do Comércio apontou em 2011 que, até 2015, a contrafação e a

pirataria trarão danos sociais de até $1,7 trilhão.

Referências bibliográficas

CÂMARA INTERNACIONAL DO COMÉRCIO. Investigations. Disponívelem: <http://www.icc-ccs.org/icc/cib/investigation-services>. Acesso em:21 jun. 2013.

COALIZÃO INTERNACIONAL ANTICONTRAFRAÇÃO. Press Releases.Disponível em: < http://www.iacc.org/>. Acesso em: 21 jun. 2013.

GARCIA, Balmes Vega. Contrafação de Patentes: violação de direitos depropriedade industrial com ênfase na área químico-farmacêutica. 1. ed.São Paulo: LTr, 2004.

HOUAISS, Antonio. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa[intranet]. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

TRINDADE, Eneus; SOUZA, Lívia Silva de; LINARES, Nicolás Llano.Museus da contrafação: crítica ou apologia ao consumo pirata?. In:Seminário Internacional de pesquisa - consumo: afetividades e vínculos, 2.,2012, São Paulo.

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283

Cópia

BRUNO POMPEU MARQUES FILHO

Definição:

Termo de significados próximos, porém variados, “cópia” pode ser defi-

nido de maneira simplificada como a reprodução fiel de qualquer tipo

de material. De qualquer obra – texto, música, pintura, fotografia, filme,

objeto, produto, tanto faz – pode-se fazer cópias, bastando que haja, para

tanto, um mecanismo, que seja humano ou técnico.

Contextualização:

A palavra “cópia”, no Ocidente, remete diretamente ao momento em

que primeiro, na evolução social humana, se concretizou a reprodução,

não exatamente de objetos (como potes de barro ou lanças de metal),

mas de signos comunicacionais. Vai longe o tempo em que membros da

igreja católica passavam horas dedicados ao trabalho de copiar o texto

sagrado, promovendo a reprodução da Bíblia e, consequentemente, o

alastramento do cristianismo. Também com relação à música, o termo

cópia serve para designar as pessoas que, até recentemente, cumpriam a

função de copiar partituras, para serem distribuídas entre os músicos de

uma orquestra ou de um conjunto. A essa profissão – regulamentada e

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até relativamente prestigiada, pelo seu caráter árduo e artesanal – dá-se o

nome de “copista”.

Quando do surgimento dos mecanismos técnicos de reprodução – a

imprensa dos tipos móveis, por exemplo –, a noção de cópia passou a

incorporar um componente de fidedignidade até então muito pouco

perceptível. Enquanto as cópias dos livros e dos demais materiais escritos

eram feitas à mão, por copistas, ainda não havia a clara pressuposição de

similitude entre o texto original e as suas cópias. Com a criação da impren-

sa (e de outros mecanismos equivalentes), essa passou a ser a característica

mais marcante da cópia: a capacidade de se reproduzir fidedignamente

o original. Em outras palavras, estava criada a ideia de registro. Daí que,

até hoje, sejam feitas cópias de documentos e de outros materiais consi-

derados relevantes, como forma de registrar e compartilhar esses materiais.

Com o avanço da tecnologia, mais especificamente com o advento dos

computadores e da linguagem digital, a diferença entre o original e a cópia

deixou de existir. A partir de um mecanismo eletrônico relativamente

simples – hoje resumido ao corriqueiro “Ctrl + C” –, qualquer conteúdo

digital pode ser perfeitamente reproduzido, sem que se possa mais

distingui-lo de sua matriz. Isso fez com que os sentidos da palavra “cópia”

ficassem ainda mais complexos e paradoxais. Por um lado, os compu-

tadores pessoais, com suas impressoras, seus scanners e seus gravadores

de CDs e DVDs, trouxeram ao âmbito doméstico a capacidade de se

reproduzir materiais protegidos legalmente. Foi assim que músicas, livros

e filmes passaram a ser copiados indistintamente e trocados anarquica-

mente pela internet. Era a pirataria chegando às mãos de todo o mundo

e, a princípio, as cópias desse tipo, de grandes novidade tecnológica, pas-

saram a ser vistas como algo negativo, quase delito. Mas, hoje, por outro

lado, se há ainda algum resquício de sentido negativo na palavra “cópia”

– na certa baseado na comparação entre a reprodução e o seu “original”

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ou nas perdas financeiras que as cópias possam acarretar aos autores –,

com a popularização do digital esse sentido tende ao desaparecimento,

dando espaço a um significado dos mais nobres e valorizados. O termo

“cópia de segurança”, por exemplo, evidencia bem isso. Copiar arquivos,

hoje em dia, é uma forma de prevenção, está ligado à preservação dos

trabalhos e dos materiais valiosos, tem a ver com o compartilhamento e

a liberdade, está mais para o coletivo, para o massivo, para o democrático,

do que para o individual, para o elitista ou para o hermético.

Como qualquer palavra, como qualquer signo, “cópia” é também um

termo que tem seu significado alterado ao longo do tempo. Novas cama-

das de significação vão se sobrepondo às já existentes, enquanto outras

perdem sua capacidade de gerar sentido. De uma atividade regulamentada

ligada à igreja católica, passando pela crítica sociológica da indústria

cultural, a palavra “cópia” assume hoje uma miríade de sentidos, todos

eles muito próximos, mas com distinções relevantes entre si. De modo

geral, “cópia” pode ser considerada a reprodução fidedigna de algum

objeto. Entretanto, algumas diferenças sutis entre as suas acepções

merecem ser esclarecidas:

1. A cópia pode ser institucionalizada, legal, prevista e esperada. Um livro,

por exemplo, é lançado com uma certa quantidade de cópias. Nesse caso,

a palavra pode ser usada como sinônimo de “exemplar”. Jornais, revistas,

CDs – produtos editoriais, de uma forma geral – seguem o mesmo princí-

pio. “O disco daquele artista chegou ao mercado com vinte mil cópias”.

2. Pode-se também pensar em cópia como uma reprodução não

institucionalizada, mas plenamente aceita na sociedade. Documentos

pessoais são copiados, para fins burocráticos, assim como pequenos

trechos de livros podem ser também copiados, por estudantes, por

exemplo. Nesses casos, a palavra “cópia” pode substituir o termo popular

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Glossário Pirata

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“xerox”, ou o seu correspondente, “fotocópia”. Há, inclusive, o termo

“cópia autenticada” para designar esse mesmo tipo de cópia, porém ava-

lizada pela estrutura cartorária típica de nosso país. “Tira uma cópia do

seu RG e leva na secretaria”.

3. Por outro lado, a palavra “cópia” pode também entender alguma

reprodução menos desejada ou aceita. Um livro que seja reproduzido na

sua integridade, por exemplo, representa uma cópia que pode ser consi-

derada ilegal. No universo da pirataria, as cópias são os produtos falsifi-

cados, porém de qualidade inferior, que evidenciem de alguma maneira

seu aspecto de contrafação. Em uma escala comparativa, a cópia está em

um patamar abaixo das réplicas, por exemplo. “Tenho em casa uma cópia

de um Picasso”. “Pelo preço, este seu relógio só pode ser cópia”.

De um modo geral, percebe-se que a palavra “cópia”, na língua portu-

guesa, traz consigo uma certa ambiguidade entre o previsível e o inespera-

do, entre o proibido e o institucional, entre o corriqueiro e o recriminável.

Referências:

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da sua reprodutibilidade

técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa. 8a ed.

São Paulo: Paz e Terra, 2011. p. 239-283.

BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de

Gutemberg à internet. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.

SANTAELLA, Lucia. Linguagens líquidas na era da mobilidade. São

Paulo: Paulus, 2007.

. Cultura das mídias. São Paulo: Experimento, 1996.

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287

Copyright e Copyleft

SILVIO KIOTI SATO

Definição:

Copyright, de acordo com o United States Copyright Office, é uma forma

de proteção proporcionada pela lei dos Estados Unidos para o autor de

trabalhos de autoria originais, incluindo literatura, música e outros tra-

balhos intelectuais, como softwares. Somente o proprietário da obra pode

autorizar reproduções, cópias, adaptações do trabalho, exibições públicas

do trabalho, entre outros direitos.

Como o próprio nome já diz, copyright refere-se ao direito à cópia ou

direito de reprodução, diferindo, portanto, do direito autoral. O copyright

protege a obra e a possibilidade de se poder copiar um patrimônio per-

tencente a alguém. O copyright de uma obra tem prazo de validade: para

obras criadas a partir de 1978, a duração dos direitos é de 70 anos após a

morte do autor.

Já copyleft é o nome de um conjunto de licenças criadas para que se pos-

sam utilizar softwares de forma livre, permitindo a alteração e redistribui-

ção do software, preservando a liberdade para novas mudanças e

distribuições.

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Contextualização:

A ideia da licença copyleft surgiu em 1984, quando Richard Stallman

criou o projeto GNU (sigla de “GNU is Not Unix”) para construir um

sistema de software completo, de propósito geral, mas completamente

livre. Segundo Barahona, Pascual e Robles (2003), Stallman se preocupou

desde o início com a liberdade que os usuários do seu software teriam,

além da liberdade das pessoas que recebessem seu software dos usuários

originais. Foi então que surgiu a Licença Pública Geral do GNU (GPL),

provavelmente a primeira licença de software que garantia que um progra-

ma fosse livre – uma licença alternativa às leis de copyright de softwares

existentes na época nos Estados Unidos. A GPL foi chamada de copyleft

e atualmente é o nome de uma grande família de licenças de software livre.

A posição de Stallman é que a legislação de direitos de softwares nos

Estados Unidos gerava um “monopólio de software” e não estimulava a

colaboração e o aprimoramento dos programas lançados, lançando a ideia

do “software livre”:

“My work on free software is motivated by an idealistic goal:

spreading freedom and cooperation. I want to encourage free

software to spread, replacing proprietary software which forbids

cooperation, and thus make our society better. That’s the basic

reason why the GNU General Public License is written the way

it is – as a copyleft.” (STALLMAN, 2002)

A GPL inverteu as regras do copyright, nas quais existe a garantia da

remuneração ao proprietário do software. O copyright é o direito sobre a

cópia, isto é, a preservação dos direitos de quem criou e registrou

determinada criação. No copyleft, existe a garantia de que qualquer um

possa ter acesso livre ao software, impedindo o registro futuro por parte

de alguém pela legislação de copyright.

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Glossário Pirata

289

O termo copyleft surge em oposição ao termo em inglês copyright com o

trocadilho em inglês entre right (direita) e left (esquerda). Além disso, a

palavra left também significa o passado do verbo to leave (deixar). Neste

sentido, copyleft poderia ser traduzido como “deixamos copiar” ou “cópia

permitida”.

O trocadilho se estende também à frase que tradicionalmente acompanha

o termo copyright: all rights reserved (todos os direitos reservados). No caso

de copyleft, a frase foi transformada em “all rights reversed” (todos os direi-

tos invertidos/revertidos).

A oposição entre os termos copyright e copyleft é reforçada também pelos

símbolos utilizados para representar os termos: nos dois casos são utili-

zadas composições de círculos envolvendo a letra C, sendo a posição da

letra invertida para o copyleft (figuras 1 e 2).

Figura 1: Figura 2:Símbolo do “copyright” Símbolo do “copyleft”

É possível associar o surgimento do copyleft com a cibercultura, decorrente

do surgimento e uso das tecnologias de informação e comunicação

(TIC’s). De acordo com Lemos (2004): as TIC’s criaram um ambiente

favorável para trocas sociais por meio do compartilhamento de idéias,

arquivos, músicas, filmes, etc. Tudo isso de forma cada vez mais ampla,

rápida e dinâmica. Trata-se de um momento de novas interações, que

permitem (ou exigem?) a convivência entre o copyright e o copyleft, entre

a cultura centralizadora e a cultura aberta e colaborativa: “o princípio

emergente dessa cultura contemporânea é o que estamos chamando de

copyleft, uma cultura diversa, em colaboração e planetária que vai, pouco

a pouco, construir um contraponto à cultura copyright, da indústria

cultural dos mass media.” (LEMOS, 2004, p. 8)

Page 290: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

290

É interessante verificar que a tensão e a oposição entre o copyright e o

copyleft trazem também a discussão sobre a oposição entre capitalismo e

comunismo, o que pode ser visto na declaração de Bill Gates da Microsoft,

em entrevista realizada em 2005:

“Das economias do mundo, hoje em dia mais pessoas acreditam

na propriedade intelectual do que nunca. Há menos comunistas

no mundo hoje do que no passado. Mas existe um novo tipo de

comunista moderno que quer se livrar do incentivo para músicos

e cineastas e desenvolvedores de software sob vários pretextos.”

(GATES, apud ANDERSON, 2009, p. 229)

Esta oposição é reforçada por Sodenbergh (2002), para quem o copyright

foi inventado para e pelo capitalismo. Portanto, a oposição ao copyright

é a oposição ao capitalismo e, por isso, a teoria marxista acaba sendo o

ponto de partida natural quando se desafia o copyright. O software livre

traz uma questão anterior que é a maneira de lidar com um modelo de

contradições inerentes ao capitalismo na sociedade da informação. Nunes

(2007) também reforça o uso dos termos copyright e copyleft como a mar-

cação de uma posição política.

Atualmente, a convivência entre os modelos de copyright e copyleft provoca

tensões e debates não só relacionados à indústria do software, mas em toda

a produção de informação no ambiente das TIC’s: música, artigos, livros,

etc. Vários aspectos estão envolvidos no debate, sobretudo a dúvida sobre

qual é o modelo econômico que viabilize e incentive a produção cultural

e o desenvolvimento intelectual num ambiente de economia capitalista,

mas que quer cada vez mais produtos livres e gratuitos.

Page 291: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

291

Referências bibliográficas

ANDERSON, Chris. Free: grátis: o futuro dos preços. Rio de Janeiro: Elsevier,2009.

BARAHONA, J. G.; PASCUAL, J. S.; ROBLES, G. Introducción al softwarelibre. Fundació per la Universitat Oberta de Catalunya, 2003. Disponívelem http://cv.uoc.edu/~fcaulas/20041/90.783/portada_Into.pdf.Consultado em fevereiro de 2010.

CAMPOS, A. O que é software livre. BR-Linux. Florianópolis, março de 2006.Disponível em <http://br-linux.org/linux/faq-softwarelivre>.Consultado em fevereiro de 2010.

LEMOS, A. Cibercultura, Cultura e Identidade. Em direção a uma “CulturaCopyleft”? Contemporânea: Revista de Comunicação e Cultura. UFBA,Salvador, vol.2, no. 2, 2004.

NUNES, M.F.M. Novas tecnologias da comunicação e a função-autor na sociedadecontemporânea. Rastros – Revista do Núcleo de Estudos de Comuni-cação. Ano VIII, no. 8, p.71-81, outubro de 2007.

SODERBERG, J. Copyleft vs. Copyright: a marxism critique. First Monday, v.7,n.3, Mar 2002. Disponível em: http://firstmonday.org/htbin/cgiwrap/bin/ojs/index.php/fm/article/view/938/860

STALLMAN, R. Free software, Free Society: Selected Essays of Richard M.Stallman. Boston, Massachussetts: GNU Press, 2002.

. Copyleft: Pragmatic Idealism. Disponível em: http://www.gnu.org/philosophy/pragmatic.html

Circular 1: Copyright Basics. United States Copyright Office – Library ofCongress. Julho de 2008. Disponível em: http://www.copyright.gov/circs/circ1.pdf

Entenda o que é o conceito “copyleft”. Folha de S.Paulo. São Paulo, fevereiro de2003. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u12307.shtml

http://www.gnu.org/copyleft/copyleft.pt-br.html. Consultado em fevereiro de2010.

Page 292: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

292

http://www.creativecommons.org.br/index.php?option=com_frontpage&Itemid=1. Consultado em fevereiro de 2010.

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http://pt.wikipedia.org/wiki/Copyleft. Consultado em fevereiro de 2010.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_autoral. Consultado em fevereiro de2010.

Page 293: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

293

Creative Commons

BRUNO POMPEU MARQUES FILHO

Definição:

Trata-se de uma organização sem fins lucrativos que desenvolve e ofe-

rece gratuitamente licenças jurídicas de direitos autorais para obras de

várias naturezas, fornecendo proteção aos seus autores e ao mesmo tempo

fomentando o compartilhamento da criatividade e do conhecimento.

Contextualização:

O Creative Commons surgiu como um grupo organizado em 2001, na

Califórnia, nos Estados Unidos, a partir da percepção de que as leis de

direitos autorais eram rígidas demais e pouco adequadas ao contexto em

que se vive – marcado pelo digital, pela conectividade, pela facilidade de

se produzir, capturar, armazenar, editar e propagar signos.

Diante disso, muito inspirado nos coletivos de software livre, o grupo

passou a desenvolver licenças de direitos autorais que pudessem de alguma

forma regulamentar a produção e sobretudo o compartilhamento de obras

de vários formatos – som, imagem, vídeo, texto, dados etc. Todas as

licenças que o Creative Commons disponibiliza são gratuitas, extrema-

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Glossário Pirata

294

mente simplificadas e procuram não só proteger os autores, mas também

estimulam o compartilhamento daquilo que é produzido e licenciado.

Para ter acesso a uma das licenças, basta entrar no site do grupo e res-

ponder a algumas poucas e rápidas perguntas, que servem apenas para

selecionar o tipo mais adequado de licença. Em poucos minutos o usuário

consegue licenciar sua obra, nas bases que lhe forem mais convenientes.

Na medida em que tudo o que se produz (obra de qualquer natureza) é

objeto das leis de direitos autorais, que variam de país para país mas que

quase sempre garantem ao autor o direito pleno sobre sua produção, as

licenças do Creative Commons são de certa forma revolucionárias, porque

se pretendem internacionais e, mais ainda, porque estão baseadas no livre

compartilhamento.

Há licenças de vários tipos: umas mais rígidas, que obrigam, por exemplo,

os que da obra se aproveitarem a citar a fonte, não editarem seu conteúdo

e não a utilizarem com fins comerciais; e há as mais livres, que liberam

totalmente o uso, a edição e a propagação da obra – ou de parte dela.

Vale comentar que o Creative Commons acaba funcionando também

como uma rede colaborativa na internet, na medida em que fornece um

poderoso sistema de busca nas bases de obras licenciadas, conectando os

autores que já se servem das suas licenças e ao mesmo tempo fomentando

a adesão dos que procuram obras de uso livre.

No Brasil, o Creative Commons é administrado pelo Centro de

Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.

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295

Duplo

BIBIANA STHOLER SABENÇA DE ALMEIDA

No senso comum, duplo possui um sentido de mais um igual, dois,

dobro ou algo adicional, um plus. Denotativamente, duplo significa

(Minidicionário Luft, 1991):

“1. Multiplicativo de dois; 2. Formado de duas partes iguais; 3.

Quantidade duas vezes maior que outra, dobro; 4. Pessoa ou coisa

muito semelhante a outra.”

No feminino, dupla quer dizer: “1. Grupo de dois; 2. Conjunto de dois

elementos.” (Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione.

1991). Já o verbo duplicar (Minidicionário Luft, 1991):

“1. Multiplicar por dois; dobrar. 2. Redobrar; multiplicar;

intensificar; 3. Tornar-se outro tanto maior. Duplicação (sub);

Duplicado (adj); Duplicador (sub e adj).”

Dessa forma, o sentido de duplo evoca uma parte, mas, uma parte seme-

lhante, mesmo que haja a matemática do dobro, da duplicação ou do

conjunto, sugerindo mais partes.No universo biológico, podemos utilizar

o termo “clone” para designar um descendente de células, cuja origem

se deu na célula-mãe. Temos aí dois seres geneticamente iguais.

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Glossário Pirata

296

Contextualização:

Na literatura, a primeira materialização de duplo foi eternizada na obra

“O Duplo” (1845) do escritor russo Fiódor Dostoiévski. No conto, o

autor narra a história de Iákov Pietróvitch Goliádkin, um alto funcionário

de repartição pública, com mania de perseguição por parte de seus ini-

migos (tormenta criada por ele mesmo). Numa noite gélida e sombria

de novembro, depara-se com um senhor fisicamente igual a ele (seu

homônimo). Chocado com tal visão, volta correndo para sua casa e acre-

dita que tudo fora um pesadelo. No dia seguinte, já no trabalho, seu chefe

apresenta-lhe um senhor humilde e recém-chegado à cidade, o senhor

Iákov Pietróvitch Goliádkin, de mesmo nome e sobrenome iguais ao seu.

Logo, este senhor (Goliádkin 2) se apropria de sua identidade e torna-se

seu pior inimigo.

Outra aparição de duplo foi em 2002, na obra O Homem duplicado do

escritor português José Saramago. No romance, o autor conta a trajetória

de dois homens fisicamente iguais: Tertuliano Máximo Afonso, um pro-

fessor de história e António Claro, um ator de cinema. Eles não possuem

relação de parentesco. No entanto, nasceram nos mesmos dia e ano, com

apenas 1 minuto de diferença. Isso assegura o primeiro nascido ser o origi-

nal e o segundo, a cópia.

Já o duplo na animação, pode ser encontrado em um episódio de Os

Simpsons, “Double, Double, Boy in Trouble” (2008). Bart Simpson

encontra seu duplo no banheiro de uma festa e troca de lugar com ele. Tra-

ta-se de Simon Woosterfields, um garoto rico, herdeiro de uma rede de

hotéis. Ele é seu duplo milionário. O título do episódio faz alusão à peça

MacBeth de Shakespeare. São as preces ditas por três bruxas ao revelar a pro-

fecia: “Double, double, toil and trouble”. No caso do desenho, quer dizer

que há um duplo correspondente ao garoto (Bart) e por isso, o problema.

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Glossário Pirata

297

O duplo no cinema está presente em “O Grande Truque” (The Prestige),

com Hugh Jackman, Cristian Bale e Scarlet Johansson. A direção é de

Christopher Nolan (2006). Trata-se da história de dois mágicos amigos

que se tornam rivais e disputam um amor. Um deles tem o duplo que

toma o lugar do original e se sacrifica por ele.

Há também o “Duplo Amor” (Two Lovers), um filme com Joaquim

Phoenix, Gwyneth Paltrow e Vinessa Shaw. A direção é de James Gray

(2009). A trama tem como personagem principal Leonard,que vive uma

vida dupla entre dois amores.

Referências bibliográficas

Minidicionário Luft. 2ª Edição. São Paulo: Editora Scipione, 1991.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Clone

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Page 299: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

299

Fair Use

BRUNO POMPEU MARQUES FILHO

Definição:

Dispositivo legal do sistema jurídico norte-americano, que serve como

relativização das leis de direitos autorais. Sua tradução (uso justo, uso

honesto) faz perceber que se trata de uma lei ambígua, mas que faz reduzir

a rigidez das leis de direitos autorais dos Estados Unidos. Pela lógica do

fair use, dependendo de alguns fatores, a cópia de obras legalmente

protegidas deixa de ser uma violação à lei de direitos autorais.

Contextualização:

A lei norte-americana determina que o autor tem total direito sobre suas

obras produzidas, de modo que a reprodução dessa obra (ou de parte dela)

é proibida e pode ser considerada crime. Entretanto, em algumas situa-

ções, essa reprodução pode ser justificada no princípio básico da common-

law, que favorece o coletivo em detrimento do individual (sem que este

último se prejudique).

Assim, de acordo com o fair use, uma obra de qualquer natureza pode

ter partes reproduzidas, observando-se quatro questões:

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Glossário Pirata

300

1. O fim e o tipo do uso que vai se dar à cópia – costuma-se considerar

fair use as reproduções usadas com fins educativos, de crítica, discussão

etc. Por exemplo, trechos de obras literárias reproduzidas em sala de

aula, frases de um livro reproduzidas em uma resenha crítica etc.;

2. A natureza do trabalho copiado – normalmente as cópias de obras

ficcionais enquadram-se menos no fair use do que as de obras docu-

mentais. O uso de fotografias de grandes acontecimentos, por exem-

plo, tende a ser mais aceito do que a reprodução de fotografias de

moda;

3. A quantidade do que foi copiado com relação ao todo – quanto menos

representativa do todo for a parte copiada, maior é a chance de sua

reprodução ser considerada fair use. Atualmente, já se consideram

fatores qualitativos e não apenas quantitativos, de modo que um

trecho de um livro, por menor que seja, se representar algo extrema-

mente relevante na obra completa, pode não se enquadrar no fair use;

4. O efeito da cópia nos interesses do autor – se a reprodução de um

trecho de uma obra comprometer mercadologicamente a exploração

da obra pelo seu autor, dificilmente vai ser considerada fair use. A

reprodução de artigos de revista, por exemplo, em um site, imedia-

tamente após o seu lançamento, ainda que com fins de crítica e discus-

são, pode prejudicar as vendas dessa revista. Nesse caso, o fair use não

se configura.

No Brasil, não há dispositivos legais semelhantes ao fair use, de modo

que oficialmente a lei acaba sendo mais rigorosa. Entretanto, a própria

lei de direitos autorais (9.610/98) traz em seu texto algumas situações

específicas, em que é permitida a reprodução de partes de obras prote-

gidas. O uso de trechos de obras literárias para fins educativos, por exem-

plo, é protegido pela dita lei, assim como a reprodução de qualquer tipo

de obraque se faça individualmente, para uso doméstico.

Page 301: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

301

Falsificação

LÍVIA SOUZA

Definição

Entendemos por falsificação o ato de falsificar, o que, por sua vez, pode

ter como objetos diferentes categorias, como, por exemplo, alimentos,

medicamentos, assinaturas, obras de arte e outros. A falsificação está

sempre ligada a uma atividade fraudulenta e, portanto, envolve infrações

legais. A falsificação está relacionada, assim, a um tipo fraudulento de

imitação, e ocorre quando determinado objeto ou coisa, por meio de uma

aparência que leve ou pretenda levar ao engano, tenta se passar pelo objeto

verdadeiro, de autoria ou procedência legitimadas. O termo aparece,

muitas vezes, como sinônimo de contrafação.

Contextualização

Por ser aplicável a diferentes esferas, a falsificação tem, na legislação

brasileira, sua representação em diversas categorias.

Primeiramente, o Código Penal Brasileiro (Decreto-lei n. 2.848, de

1.940) descreve e prevê penalidades para diversas modalidades de falsi-

ficação ou adulteração de documentos. Assim, no Art. 297, temos: “Falsi-

ficar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento

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Glossário Pirata

302

público verdadeiro”. Analogamente, no Art. 298, temos: “Falsificar, no

todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular

verdadeiro”. Temos, em ambos os casos, portanto, a falsificação em

oposição ao documento verdadeiro, seja a falsificação efetuada no

documento todo ou em apenas uma parte.

Também em outras esferas, como no Código de Trânsito Brasileiro (Lei

n. 9.503, de 1.997, Art. 234) e no Código Eleitoral (Lei n. 4.737, de

1.965, Art. 348), está prevista a mesma tipologia do crime de falsificação

de documentos, mas aqui aplicado aos documentos específicos destas área.

Além da falsificação de documentos, existem leis que tipificam a falsi-

ficação de diversos tipos de produtos.

Uma dessas leis é a Lei n. 9.279, de 1.996, que dispõe sobre a propriedade

industrial. Nesse sentido, ela se aplica à concessão de patentes, à concessão

de registros de marca, à repressão às falsas indicações geográficas, bem

como à concorrência desleal, no caso de determinado produto ou marca

levantar informações falsas a respeito do concorrente, prejudicando-o,

ou ainda, utilizar o invólucro ou recipiente que induza o consumidor ao

erro ao adquirir determinado produto.

Aqui, portanto, temos algo que se aproxima mais dos temas trabalhados

neste livro, ou seja, a pirataria do ponto de vista do consumo.

Podemos mencionar também a Lei n. 9.677, de 1.998, que se aplica à

falsificação de medicamentos e alimentos.Ela trata, para tanto, do que

chama de “falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância

ou produtos alimentícios”, bem como de “falsificação, corrupção,

adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou

medicinais”.

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Glossário Pirata

303

Em âmbito internacional, foi justamente a falsificação de medicamentos

o objeto da primeira forma de mobilização no sentido de regulamentar

a proteção à propriedade industrial e intelectual, no século XIX.

Trata-se da atuação da UNIFAB – União dos Fabricantes, criada na

França em 1872, que inicialmente atendia aos interesses de empresas da

indústria farmacêutica, justamente com a missão de atuar no desenvol-

vimento de tratados internacionais a esse respeito na proteção de patentes

para a produção de medicamentos.

Nesse sentido, em 1883, a UNIFAB participou da elaboração da União

Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial e, em 1891,

do Acordo de Madri, relativo ao Registro Internacional de Marcas de

Comércio. Em 1951, a UNIFAB criou o Museu da Contrafação, em Paris

(Musée de La Contrefaçon), com objetivo didático quanto às diversas

categorias de contrafação, e suas implicações à economia internacional.

Diante de todas as diferentes aplicações do termo falsificação, torna-se

necessário, ainda, aproximá-lo mais da questão do consumo, a partir das

“Tipologias de imitação estética na propaganda”, artigo publicado por

Giacomini Filho (2011).

O autor enumera e diferencia seis diferentes modalidades da imitação

estética em publicidade: falsificação, pirataria, plágio, knockoff, adaptação

e paródia, baseado em pesquisa teórica (GIACOMINI FILHO, 2011: 225).

Particularmente a respeito da falsificação, Giacomini Filho esclarece, com

base em Bian e Moutinho (2009): “cópia ilícita de um direito marcário,

de forma que o bem imitador torna-se idêntico ou indistinto do original

desrespeitando os respectivos direitos”. De modo geral, a falsificação,

caracterizada como um tipo de contrafação, trata-se de um processo de

imitação de um produto original estabelecido no mercado, com o intuito

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Glossário Pirata

304

de comercializá-lo como se fosse o original, tornando-se mais atrativo

devido a um preço menor. O processo, assim, é ilícito, e traz danos

autorais ao produto original e sua marca.

Referências bibliográficas

GIACOMINI FILHO, Gino. Tipologias de imitação estética na propaganda. In:Revista MATRIZes. Ano 4. v.2, jan/jun, 2011. p. 216-238.

HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S.; FRANCO, F. M. de. Dicionário Houaissda língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php – Acesso em 09/05/2012.

Lei n. 9.279, de 1.996Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm– Acesso em 09/05/2012.

Lei n. 9.677, de 1.998Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9677.htm– Acesso em 09/05/2012.

Código Penal BrasileiroDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm – Acesso em 09/05/2012.

Código de Trânsito BrasileiroDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503.htm– Acesso em 09/05/2012.

Código EleitoralDisponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4737.htm– Acesso em 09/05/2012.

Site da Unifab – Union des Fabricants (União dos Fabricantes)Disponível em: http://www.unifab.com/ – Acesso em 09/05/2012.

Page 305: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

305

Fantasia

ANDREA MENEGHEL

Definição:

Fantasia é algo que não tem existência real, que pertence somente à

imaginação, é algo idealizado, uma ficção. É uma imaginação criativa

caracterizada, na maioria das vezes, pelo exagero e pela extravagância,

tornando a fantasia inacreditável.

Na maioria das vezes a fantasia está associada ao impossível, ou seja, a

um objeto ou situação considerado impossível de se obter ou de se tornar

real. No entanto, essa afirmação não é correta uma vez que a fantasia pode

ser possível de se tornar real, como no caso de um indivíduo que idealiza

(fantasia) uma determinada situação que pode ser factível ou não.

Contextualização:

O substantivo fantasia tem origem na palavra grega phantasía, que

significa “imaginação criadora”, “o que é irreal”, “criação do que não existe

na natureza” (CUNHA, 1982). Originou-se provavelmente no folclore e

nos mitos e romances épicos, onde era utilizada para dar forma aos cená-

rios e às personagens, muitas vezes dotadas de poderes ou forças sobre-

naturais, caracterizando assim, o aspecto fantástico dessas históricas.

Page 306: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

306

O Carnaval é uma das formas mais comuns de entendermos a fantasia

no Brasil. Durante os festejos e desfiles, a fantasia se manifesta de maneira

muito marcante no vestuário, utilizado pelos carnavalescos como repre-

sentação de uma figura ou personagem de uma história ou como um

elemento que represente parte do tema do samba enredo. Nesse contexto,

a vestimenta, chamada de fantasia, tem como objetivo fazer com que

alguém pareça ser algo que de fato não é.

A fantasia em forma de roupa normalmente representa seres do passado,

do futuro, com poderes mágicos ou está associada a uma ideia de com-

portamento ou personalidade que se deseja transmitir.

Algumas empresas, também pensando em uma ideia ou imagem que

desejam transmitir, adotam um nome fantasia que é uma nomenclatura

diferente da razão social, que relaciona o produto ou serviço oferecido

pela empresa ao nome empresarial. Para simplificar o entendimento, a

razão social é como o nome de uma pessoa e o nome fantasia é como o

apelido.

O nome fantasia não é registrado ou protegido como a marca. Para que

a empresa tenha proteção, o nome fantasia precisa ser devidamente regis-

trado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), tornando-

se a marca do produto ou serviço oferecido pela empresa.

A fantasia está presente na vida de todos. Já na infância, a criança faz uso

da fantasia para atribuir significado às coisas e construir a sua visão de

mundo, sendo utilizada também para auxiliar no entendimento e ame-

nizar situações indesejáveis ou dolorosas, como a perda de um ente queri-

do. Basta observar uma criança durante suas brincadeiras para constatar

a forte presença da fantasia em sua vida: são dragões, princesas, castelos,

naves espaciais, animais dotados de fala, entre tantas outras criações da

imaginação infantil.

Page 307: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

307

Presente também na vida adulta, de acordo com Freud, a fantasia é uti-

lizada pelo indivíduo como forma de satisfazer algum desejo.

Freud parte da ideia de que a pessoa feliz nunca fantasia, somente

aquela insatisfeita. Sendo a correção de uma realidade insatisfa-

tória, a fantasia representa, como o sonho, a realização de um

desejo. São os desejos insatisfeitos que constituem as forças

motivadoras das fantasias, por isso Freud utiliza frequentemente

a expressão fantasia de desejo. (JORGE, 2010, p. 46)

Assim, os desejos motivam as fantasias que são criadas pelos indivíduos

durante toda a vida, inicialmente para construir suas concepções sobre o

mundo, depois para amenizar desejos frustrados ou reprimidos. Por meio

das fantasias, o indivíduo é capaz de inventar ou evocar imagens fictícias

e manifestar sua livre interpretação e entendimento sobre as coisas, o que

torna a fantasia intimamente relacionada à criação artística.

É no campo das artes que provavelmente a fantasia se manifesta com

maior liberdade, onde a criatividade do artista nos leva a experimentar

sensações e vivenciar experiências improváveis em nossa vida cotidiana.

Por meio da fantasia o artista liberta-se do usual, do conhecido, do já

experimentado, e cria algo novo, com sua própria leitura e entendimento,

como afirma Jeha:

A fantasia é mais que mera representação do produto, isto é, do

mundo como o conhecemos, ou de uma teoria de conhecimento

do mundo. Podemos abordar a fantasia como um tipo especial

de mimese: uma representação do processo de criação ontológica,

pela qual mundos possíveis e impossíveis adquirem existência.

(JEHA, 2001, p. 125)

Na literatura e no cinema, de modo geral, o termo ficção especulativa é

mais utilizado devido à grande dificuldade em separar os gêneros fantasia,

ficção científica e horror.

Page 308: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

308

Nesses campos a fantasia pode estar presente somente na ação de uma

determinada personagem, como o caso de Mary Poppins, ou em todo

um contexto fantasioso onde exista relação entre personagens também

fantasiosos como Super-homem e Lanterna Verde, super-heróis membros

da Liga da Justiça. A fantasia também pode acontecer em um universo

ou mundo inexistente, totalmente inventado e regido por outras regras,

ondea magia e as ações impossíveis ou irreais estão presentes como nos

livros e filmes Senhor dos Anéis, Crônicas de Nárnia e Alice no País das

Maravilhas.

De modo geral, a fantasia é uma possibilidade de vivenciar uma expe-

riência que se sabe não fazer parte da realidade. É uma aproximação do

fantástico com o real.

Referências bibliográficas

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da línguaportuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial. <http://www.inpi.gov.br>

JEHA, Julio. A Semiose da Fantasia Literária. Signótica – Revista do Programade Pós-Graduação em Letras e Linguística da Universidade Federal deGoiás. V.13, n.1,p.117-136, jan./dez. 2001. Disponível em:<https://www.revistas.ufg.br/index.php/sig/article/viewFile/7295/5162>. Consultado em junho de 2012.

JORGE, Marco Antonio Coutinho. Fundamentos da Psicanálise de Freud àLacan, vl. 2 – a clínica da fantasia. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.

Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Consultado emjunho de 2012.

Page 309: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

309

NASIO, Juan-David. A fantasia: O prazer de ler Lacan. Rio de Janeiro: Zahar,2007.

<http://pt.wikipedia.org/wiki/Fantasia_%28psicologia%29>. Consultado emjunho de 2012.

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311

Genérico

JÔSE FOGAÇA

Definição

No senso comum o termo genérico designa aquilo que é inspirado em

algo de marca ou já bastante conhecido, mas constitui uma cópia e,

portanto, não possui a marca original.

Contextualização

O termo surge no universo farmacêutico, num movimento originário dos

Estados Unidos e que se constituiu fortemente no Brasil. Em 1999 a Lei

nº 9.787 estabeleceu a comercialização do medicamento genérico no país,

o qual contém os mesmos princípios ativos, concentração, forma

farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica de

um produto de referência ou inovador. Após a comprovação em testes

específicos sobre a eficácia, segurança e qualidade do medicamento

genérico, este é considerado intercambiável com o de referência.

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Glossário Pirata

312

A ANVISA – Agência Nacional de

Vigilância Sanitária– descreve as três

diferentes categorias de medicamentos

que concorrem no mercado brasileiro:

Medicamento de marca ou referên-

cia: É o produto inovador, cuja eficá-

cia, segurança e qualidade foram com-

provadas cientificamente por ocasião do registro. É geralmente o primeiro

remédio que surgiu para curar determinada doença e sua marca é bem

conhecida. Ex: Aspirina.

Medicamento genérico: É um remédio intercambiável com o produto

de marca ou inovador. Isto é, pode ser trocado por estepois tem rigoro-

samente as mesmas características e efeitos sobre o organismo do paciente.

A garantia é dada pelo Ministério da Saúde que exige testes de bioequi-

valência farmacêutica para aprovar os genéricos. Testes de bioequivalência

servem para comprovar se dois produtos de idêntica forma farmacêutica,

contendo idêntica composição, qualitativa e quantitativa, de princípio

ativo, são absorvidos em igual quantidade e na mesma velocidade pelo

organismo de quem os toma. Os genéricos podem ser trocados pelos me-

dicamentos de marca quando o médico não se opuser à substituição.

Medicamento similar: Contém o mesmo princípio ativo, apresenta a

mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posolo-

gia e indicação terapêutica do medicamento de referência, mas não são

bioequivalentes. Sendo assim, não podem substituir os remédios de marca

na receitapois, apesar de terem qualidade assegurada pelo Ministério da

Saúde, não passaram por análises capazes de atestar se seus efeitos no pa-

ciente são exatamente iguais aos dos medicamentos de referência nos que-

sitos quantidade absorvida e velocidade de absorção.

Fonte: http://portal.anvisa.gov.br

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Glossário Pirata

313

O produto genérico é geralmente produzido após a expiração ou renúncia

da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade e tem um

mercado em expansão no Brasil, tendo alcançado 26% de marketshare

em volume em 2012, segundo o IMS Health.

Com a grande divulgação desse tipo de medicamento e com a prescrição

compulsória do princípio ativo pelos médicos da rede pública, o termo

genérico se popularizou e passou a significar a opção por um produto

mais barato com a mesma qualidade, extrapolando o mercado de

medicamentos.

Assim, fora do contexto dos medicamentos, o uso do termo genérico se

expandiu para diversas áreas, em especial para o mercado de moda de luxo,

sendo utilizado nos casos em que se quer designar uma imitação de mode-

lo de marca famosa, que pode não apresentar marca alguma ou levar outra

marca menos famosa (em geral uma marca local) que produziu o modelo

de forma idêntica ou adaptada.

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Glossário Pirata

314

Referências bibliográficas

http://www.progenericos.org.br/ (acesso em junho de 2013)

http://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2013/02/18/venda-de-genericos-tem-o-menor-crescimento-desde-2001.htm(acesso em junhode 2013)

http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/Anvisa/Inicio/Medicamentos/Assunto+de+Interesse/Medicamentos+genericos(acessoem junho de 2013)

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315

Genuíno

ENEUS TRINDADE

Definição:

O termo genuíno designa a qualidade daquilo que conserva suas carac-

terísticas próprias ou naturais e não é falso, nem é uma imitação. Trata-

se de algo autêntico, puro, em que não se verificam hibridismos.

Contextualização:

Para a semiótica de Charles SandersPeirce, o sentido de genuíno é um

atributo relevante para qualificação das relações de sentidos. O conceito

de signo genuíno, para o autor, refere-se ao aspecto de semioses que acon-

teceriam dentro de relações triádicas que levam a processos de interpre-

tações da terceiridade junto aos processos cognitivos dos intérpretes. Só

interpretações da terceiridade, abstratas e, portanto, simbólicas, são passí-

veis de serem genuínas (PIMENTA, 2005, p. 54).

“O mundo dos fatos contém somente aquilo que é, e não tudo

aquilo que é possível de qualquer descrição. Daí, ele não pode

conter uma tríade genuína. Mas, embora não possa conter a tríade

genuína, o mundo dos fatos pode ser governado por tríades genuí-

nas” (PEIRCE, 1: 478).

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Glossário Pirata

316

Percebe-se, a partir do exposto, que aquilo que guarda relações de inter-

pretações por signos em semelhanças ou de natureza indiciais geram

semioses que se constituiriam em signos degenerados.

Conexão com o Tema:

Nesse sentido, se formos pensar a produção de sentido ou semiose da

mercadoria pirata, podemos considerar que a sua performance é de um

signo degenerado, pois só o genuíno consegue se articular plenamente

de forma simbólica, gerando o interpretante argumentativo. A merca-

doria pirata geraria interpretantes remáticos ou dicendes em relação ao

produto autêntico. Por outro lado, o estar no mundo das mercadorias

piratas é governado por tríades genuínas, daí a sensação de satisfação que

advém desse tipo de consumo.

Referências bibliográficas

PEIRCE, Charles Sanders. (1931-1958). Collected Papers. 8 vols. Cambridge:Harvard University Press (citação traduzida por Francisco Pimenta).

PIMENTA, Francisco José Paoliello. (2005). Produções multicódigos e o con-ceito de signo genuíno em Peirce. Revista Comum. Rio de Janeiro: v. 10,n. 24. p. 58- 68.

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317

Imitação

CLOTILDE PEREZ E SERGIO BAIRON

Definição:

O conceito de imitação tem forte conexão com reprodução (cópia

fiel, traduzir com fidelidade) o mais exato possível. Pode se conectar ainda

com a repetição de um determinado fenômeno a partir de suas peculia-

ridades, expressões, gestos, fala, fisionomia, vestimenta (quando pessoa).

Conferir aparência semelhante a...

Chega a ter conotação penal: contravenção por meio da reprodução e/

ou propagação com o intuito de confundir, ludibriar (intencionalidade).

Conotação neutra: em conformidade...

Contextualização:

Ao longo da história da estética, o termo imitação derivado do latim

imitatio (imitari, da mesma raiz de imago, “imagem”) foi utilizado como

sinônimo do termo grego mimesis (do verbo mimeisthai e de mimos,

“mímica”, “imitação”, “arte”, “mimese”). Apesar das suas diversas

metamorfoses semânticas, que vão desde uma cópia irrefletida da natureza

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Glossário Pirata

318

à representação do universal, passando pela reprodução dos modelos

clássicos, pela seleção ideal, pela duplicação realista ou pelo simulacro

ilusionista, entre outras, existe entre elas um forte elemento comum: a

imitação supõe a apresentação de qualquer coisa num plano-outro-

mediato que se diferencia daquele plano-mesmo-imediato em que a coisa

é apresentada. Deste modo, torna-se menos redutora e insuficiente a

tradução verbal do conceito de imitação que, geralmente, se expressa

como reprodução mais ou menos imperfeita de um original conhecido,

seja a natureza, a sociedade e a sua vivência, um homem, uma obra mo-

numental do passado, as ruínas, o design, uma ideia etc.

A teoria da imitação foi utilizada pelos pitagóricos de forma a explicitar a

relação existente entre as coisas e o universo referencial dos números. Este

termo encontra-se, também, nos escritos hipocráticos designando a neces-

sidade da arte (e da medicina) acompanhar a natureza num esforço iden-

titário incompleto (observações igualmente registradas em Heráclito).

Segundo os Pitagóricos, todas as coisas imitavam a proporção, a ordem e

a medida presentes nas entidades numéricas, seu fundamento. Em sentido

idêntico, Platão (1987) descreve a relação entre as coisas sensíveis e as ideias

por meio do termo participação. Mas usa também o termo imitação para

expressar esta inferioridade ontognoseológica da dimensão sensível

relativamente à dimensão inteligível. A pintura, tal como a poesia, são

atividades circunscritas a “fazedores de imagens”, porque os artistas “criam”

fantasmas que se afastam triplamente da realidade e da verdade. Visto que

não imitam as coisas reais que existem na natureza, mas as obras dos

artífices, são imitadores da aparência da realidade (conhecendo por eikasia

– ilusão – as imagens ou cópias das cópias das coisas naturais e reais – os

eikones – que são espelhados nas suas pinturas e poemas). Devem ser assim,

afastados de uma cidade que se deseja racional e não irascível. O autêntico

criador/artista para Platão (1987), no livro X da República é o artífice divino

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Glossário Pirata

319

que cria o original (eidos – ex: a ideia de cama – a cama real). Sobre esse

aspecto Platão faz a distinção entre três espécies de camas: uma que existe

na natureza das coisas e que foi criada por Deus, uma que é obra do

marceneiro, e uma terceira cama, a do pintor. A de Deus é a cama real, o

artesão que fabrica o objeto cama é o artífice, aquele que é capaz de repro-

duzir a cama divina numa cama particular, que tem uso, utilidade. E a cama

do artista, qual é? Platão define a cama do artista como imitação. Por isso,

na República, a cidade ideal de Platão, não haveria artistas, seres produtores

de “imitação do real”. Esta qualidade de imitador é o que Sócrates afirma

nesta explicação: “Há três artes que correspondem a cada objeto: a do uso,

a da fabricação e a da imitação.”

Aristóteles, na Poética, reabilita a imitação, libertando-a do seu estatuto

metafísico. Torna-a o fundamento da poética (poesia, épica e tragédia,

comédia, poesia ditirâmbica), da pintura, da música (flauta e lira) e de

todas as artes fazedoras de imagens, visto que são, em geral, modos de

imitação que se diversificam de acordo com os meios e as coisas que

representam ou intencionam representar. Desse modo, o que singulariza

a poesia não é o verso, mas a sua possibilidade de imitar aquilo que é

segundo as leis do verossímil, da semelhança... A legislação que preside à

imitação (verossimilhança) exerce-se, também, quando o artista completa

as imagens das coisas inacabadas ou favorece por meio dos mais belos

modelos (representação do universal), aquilo que na realidade pode causar

desprazer. Nesse sentido, o ato de imitar revela, mais uma vez, a não coin-

cidência ou identificação entre a representação e aquilo que é represen-

tado, caso contrário, o termo imitação se esvaziaria de sentido.

Em traços gerais, a tradição (neo)platônica reinterpreta o termo imitação

como representação de um original ou modelo ideal superior à natureza,

facultado pelo intelecto de seus intérpretes. Esta acepção influenciou a

atividade e a reflexão estética desde a Antiguidade até a Idade Moderna.

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Glossário Pirata

320

No Renascimento, a imitação é, sobretudo, estudo e invenção. O artista

permanece fiel à natureza, reproduzindo-a com precisão, mas esta ativi-

dade imitativa reclama inovação técnica e não uma absoluta repetição

simplesmente passiva das formas.

A negação de uma imitação repetitiva e passiva da natureza foi vivificada,

de um modo descontínuo, no decurso dos séculos seguintes. Diderot é

um paradigma desta descontinuidade presente no século XVIII. Consi-

derava ser a arte ou o lugar de uma imitação menos imperfeita do Sol da

Natureza ou o “pretexto” para uma imitação progressiva, seletiva, inven-

tiva e transpositiva da realidade natural e mesmo social e humana, pois

não só duplicava, como também corrigia e reinventava tecnicamente a

natureza ou a sociedade, desenhando os contornos do Sol nascente-não

decalcado-da Arte. Neste último sentido, o artista menos súbdito da ins-

tância natural, deveria imitá-la segundo um modelo ideal por si construí-

do, abstraído e não circunscrito a características ou elementos singulares

e particulares naturais, aplicando-se os mesmos procedimentos à repre-

sentação da realidade social. Esta obra transpositiva se efetivaria com a

observação, a experiência, o talento, o tato (a sensibilidade) e a reflexão.

Recusava, no entanto, todos os artistas que desprezavam o princípio da

imitação em nome da maneira, da ficção e da alegoria.

Mas os infortúnios da imitação anunciam-se com o surgimento do

Romantismo: a arte e a natureza são, gradualmente, compreendidas como

forças inventivas e criadoras. O princípio da arte reside na atividade

criativa e criadora do artista que se assemelha à criatividade natural. Fun-

dada neste princípio subjetivo, a estética romântica liberta as obras de

arte da obediência cega e necessária a um exterior-objetivo, muitas vezes,

superior e anterior, considerando que estas são símbolos, organismos que

valem por si e que se formam a partir de uma coerência interna onde o

conteúdo, o referente é a própria obra: trata-se da queda definitiva do

Page 321: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

Glossário Pirata

321

princípio da imitação como elemento exclusivo de compreensão de todas

as propriedades de uma obra de arte.

No século XX, a temática da imitação foi objeto de reflexão com o intuito

de clarificar conceitos como o de figuração e de representação em geral,

etc., continuando perdido o seu valor estético inicial.

Assim, notamos que a imitação sugere relacionar-se com os fenômenos

burlescos e caricaturais, onde a reprodução não é fiel, mas sempre parcial,

manifestando a ênfase nas particularidades/especificidades. A imitação

não vislumbra a perfeição ou a totalidade. Daí a conexão sígnica com o

arremedo, o que intensifica as associações com a reprodução deficiente,

malfeita...

Para Baudrillard (2001: 67), “o Real não está apenas morto (como Deus

está); ele pura e simplesmente desapareceu.” E quais são os riscos de

abandonar o real? O temor platônico pela ilusão e pela imitação está

presente nos críticos contemporâneos do virtual. Persiste a ideia, por

exemplo, de que o virtual é enganador e que só o real é o divino.

Genette (1979: 182) entende que a ‘imitação’ é sempre uma paródia por

acumulação e acentuação de traços específicos. A imitação – que equivale

ao conceito de simulação enunciado por Baudrillard – é considerada por

Genette como paródia, por ser esta re-apresentação do discurso primeiro,

do texto autêntico.

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Glossário Pirata

322

Referências bibliográficas

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Trad.: Maria João da CostaPereira. Lisboa: Relogio d’Agua, 1991.

. A ilusão vital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

DIDEROT, Denis. OeuvresEsthétiques; Paris: Garnier, 1976.

ECO, Humberto e outros, História da Beleza, Lisboa: Difel, 2004.

GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa. Ensaio de método. Lisboa: Arcádia,1979.

PLATÃO, República, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987.

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323

Kitsch

JANIENE SANTOS

Definição:

No seu significado comum, Kitsch pode ser definido pela ausência de

estilo, percebida na reinterpretação grotesca e distorcida de expressi-

vidades culturais bem como produtos cuja lógica de produção e consumo

está na necessidade de status e pertencimento.

Contextualização:

Para Moles (1971), Kitsch é um conceito universal e que corresponde,

acima de tudo, a uma época de gênese estética e a um “estilo marcado

pela ausência de estilo”. ( Ibid., p. 10). Realizando um resgate histórico

do termo utilizado para também (e não apenas) expressar mau gosto artís-

tico, descobre-se que a palavra Kitsch aparece no vocabulário dos artistas

e colecionadores de arte em Munique, em torno de 1860 e 1870 (a partir

de kitschen, “atravancar”, e de verkitschen, “trapacear”, vender outra coisa

no lugar do objeto combinado), o que nos remete ao sentido pejorativo

utilizado até a contemporaneidade, na qual o conceito recebe novas utili-

zações e contextos, como o da pirataria, fenômeno transversal a diversos

segmentos do consumo.

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Glossário Pirata

324

Assim, no objeto Kitsch, signo do consumo pós-moderno, cuja função

pragmática é extrapolada pelo anseio de pertencimento, a negação do

autêntico, cópia e artificialidade tornam-se apenas algumas das marcações

atribuídas ao termo, e que são perceptíveis nas artes, na literatura e na

música, no design e produtos de uso cotidiano: de souvenirs, miniaturas

e outros adornos decorativos a eletrônicos e objetos de uso pessoal, como

roupas e acessórios.

A noção do estilo Kitsch se populariza na década de 1930 com os conceitos

de Theodor Adorno (1903-1969), Hermann Broch (1886-1951) e

Clement Greenberg (1909-1994), que o localizam na ideia de oposição

à inovação da arte moderna e a vanguarda. Firmando o conceito marxista

de “falsa consciência”, Adorno associa-o à indústria cultural e da produção

de massa.

Os produtos kitsch da sociedade industrial eram confeccionados, em geral,

a partir de novos materiais que simulavam outros, como a douração em

tinta para imitar o bronze, estabelecendo a dinâmica de utilizar matéria-

prima de qualidade inferior e acessível, alterando a constituição do projeto

original.

Para Lipovetsky (2005), o termo Kitsch pode ser associado ao momento

do surgimento do semi-luxo e do falso luxo. A idade moderna é contem-

porânea da separação entre o autêntico e sem preço e a imitação demo-

cratizada dos modelos. O autor coloca a manifestação do estilo e arte de

viver da burguesia como a primeira forma de democratização do luxo,

que coincide com a difusão social das cópias e dos “ersatz”, do neo-antigo

e de artigos que compensam sua impessoalidade pela redundância, as

ornamentações excessivas. “Na segunda metade do século XIX erguem-

se magazines voltados para o consumo da classe média que permitiu a

fomentação do Kitsch” (Ibid., p. 45). É nesse momento que o conceito

ganha pertinência ao universo da pirataria.

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Justificamos em Baudrillard (2007, p. 140), o sentido contemporâneo

atribuído ao termo: “O Kitsch revaloriza evidentemente o objeto raro,

precioso e único ( cuja produção pode também tornar-se industrial ). O

kitsch e o objeto autêntico organizam por si só o mundo do consumo,

segundo a lógica de um material distintivo hoje sempre móvel e em

expansão.” E ainda:

“A estética da simulação encontra-se profundamente associada

com a função socialmente assinalada ao kitsch de traduzir a aspi-

ração, a antecipação social de classe, a filiação mágica à cultura,

às formas, aos costumes e aos sinais da classe superior – estética

da aculturação que desemboca na subcultura do objeto.” (Ibid.,

p. 141)

Essa estética, assim, permite a utilização do termo no sentido de mau-

gosto e brega, em virtude da ornamentação rebuscada ou da distorção

de caracterísitcas em relação ao objeto representado (como por exemplo,

os souvenirs turísticos, miniaturas do real ). Faz-se importante também

citar aqueles produtos piratas (que ganham detalhes e alterações

projetuais resultantes da falta de qualidade e desatenção) que apenas reme-

tem a determinado produto, marca e contexto, constituindo, na realidade,

um novo item, derivado da distorção do original, descaracterizando a

cópia fiel mas reforçando a tentativa de parecer com o autêntico, caracte-

rística esta, no entanto, latente no conceito do Kitsch.

Além disso, existem situações de utilização do termo Kitsch que não se

pautam no “estilo marcado pela ausência de estilo” (MOLES, 1971) mas

apenas na simulação, como é o caso do trabalho do fotógrafo David

LaChapelle (classificado paradoxalmente como “propositalmente Kitsch

/brega” e cool ).

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Glossário Pirata

326

Referências bibliográficas

BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 2007.

LIPOVETSKY, G; ROUX, E. O luxo eterno – Da idade do sagrado ao tempodas marcas. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

MOLES, A. A. O Kitsch. A arte da felicidade. São Paulo: Editora Perspectiva,1975.

www.itaucultural.org.br

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327

Knockoff

JÔSE FOGAÇA

Definição

Entre os diversos significados do termo knockoff na língua inglesa, está

aquele em que designa a produção de uma cópia de algo, ou a imitação

sem permissão. É nesse sentido que este termo interessa no contexto do

universo da pirataria.

Contextualização

É comum encontrarmos produtos com design ou nome que arremedam

a algum produto muito conhecido no mercado: os knockoffs. São produtos

que lembram de alguma maneira outros já lançados e com boa reputação.

Um exemplo disso é o “HiPhone”, um telefone com características pare-

cidas com as do telefone da Apple, o

iPhone, não só no nome, mas também no

design e em seu conteúdo.

Fonte: http://www.compredachina.com/super-hiphone-5-dual-chip-wi-fi-2-cameras-desbloqueado-

com-tv-p4592/ (acesso em junho 2013)

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Glossário Pirata

328

Giacomini Filho (2011), ao realizar a tipologização de imitações estéticas

na publicidade, caracteriza oknockoffcomo uma categoria não exclusiva

da publicidade e que constitui um tipo muito específico de imitação, que

não se destina, como a princípio se pode supor ao considerar a sua defi-

nição no senso comum, a fazer-se passar pelo original ou induzir seu con-

sumidor a esse erro. Diferente disso, o knockoffvale-se da similaridade com

o original para ser associado a este, mas possui itens que o diferenciam

do seu similar.

O knockoff pode ser considerado um conjunto marca-produto

alusivo a outro já estabelecido no mercado ou uma expressão

promocional que arremeda outra já publicada, caso de Nide, ao

invés de Nike, ou Shel, ao invés de Shell. (...) são itens ligeiramente

diferentes do original, mas não são vendidos como artigos genuí-

nos (cf. BAMOSSY e SCAMMON, 1985; CARVALHO, 2006).

(GIACOMINI FILHO, 2011, p. 220 e 229)

Dessa forma, embora apresente similaridades com outros bens, o knockoff

não é idêntico ao original e possui propriedades próprias, o que impede

que seja tomado como original ou que induza os consumidores ao erro

e, sob este ponto de vista, não se configura como ameaça comercial ao

original, uma vez que sua aquisição se dá por escolha, uma escolha que

considera um benefício superior na imitação. (idem, p. 230)

Na maior parte das vezes o que ocorre é a cópia de um produto ou marca

líder e, em geral, esta não se importa com a imitação, desde que não seja

ofensiva ou agressiva (KOTLER e KELLER, 2006, p. 356, apud GIACOMINI

FILHO, 2011). Neste ponto vale lembrar o fato que é bastante claro no

mercado de luxo da moda, da imitação possuir um efeito benéfico à marca

original, pois ao massificar o produto ou modelo anteriormente exclusivo

e limitado, acelera sua obsolescência e, consequentemente, a inovação e

a busca por novidades da marca (ver ANDERSON, 2009).

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Glossário Pirata

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Trazendo a categoria para o campo da publicidade, Giacomini Filho

(2011, p.230) identifica dois contextos para o knockoff:quando uma

composição publicitaria citaa marca-produto ou quando se vale de expres-

sões retiradas de outras peças promocionais, o que pode ser ilustrado por

casos de pequenos anunciantes que se utilizam de canções de outros anun-

ciantes já estabelecidos, alocando ali a sua marca.

Referências bibliográficas

ANDERSON, C. Free: grátis: o futuro dos preços. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.

GIACOMINI FILHO, G. Tipologias de imitação estética na propaganda. InMATRIZes. Ano 4 – nº 2 jan./jun. 2011 – São Paulo, p. 216-238.

MACMILLAN. English Dictionary for advanced learners. Oxford: MacmillanPublishers Limited, 2007.

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331

Original

BRUNO POMPEU MARQUES FILHO

Definição

A rigor, o significado da palavra “original”, como seu radical faz supor,

tem a ver com a noção de “origem”. Por essa perspectiva, a palavra

“original”, na sua condição de adjetivo, seria usada, sempre de maneira

complementada (original de algum lugar), para designar aquele objeto

ou aquela pessoa originários de algum lugar ou de algum ponto específico.

A palavra serviria para indicar o início de alguma coisa, o momento do

surgimento de algo, a criação. Por exemplo: “essas flores, tão lindas, são

originais do oriente”; ou: “o poeta fez uma rima totalmente original”.

Quem concorda com essa visão é Stephen Nachmanovitch, violinista e

educador norteamericano, dedicado aos estudos sobre a criatividade. Em

seu livro Ser criativo (1993), o autor afirma: “Ser original não significa

ser diferente de tudo o que já se fez no passado ou está se fazendo no

presente: significa agir de acordo com a origem, com o próprio centro”

(p. 162). Na visão do estudioso, como se nota, a noção de original está

muito mais para a de autêntico, do que para a de diferente.

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Glossário Pirata

332

Contextualização

Entretanto, ao menos na língua portuguesa, outros significados são

possíveis de se encontrar neste vocábulo – “original”. A ideia do diferente,

do novo e do inédito são, sim, também associadas à palavra “original”.

Quando se usa, então, esta palavra, nesses sentidos, usa-se como um

adjetivo, sem necessidade de complementação, quase sempre fazendo

denotar a característica de algo ou de alguém que se revela diferente da

maioria, nunca visto antes, desvinculado de padrões ou normas etc. Por

exemplo: “nunca tinha visto uma fantasia tão original”; ou: “tive um

aluno que, de tão original, só apresentava trabalhos surpreendentes”; ou

ainda: “a ideia apresentada naquele congresso era absolutamente original”.

Por outro lado, quando na condição de substantivo, a palavra ganha novos

contornos. Porque original é o nome que se dá ao manuscrito, do qual

depois se fazem livros; porque original é a pintura do artista, que depois vai

ser reproduzida por aí; porque original é tudo aquilo que se relaciona com

a sua origem criativa, com o seu momento de feitura ou elaboração. Ou

seja: “original” é tambémaquele objeto único de que depoissão feitas

cópias. Walter Benjamin, indefectível quando o assunto é a cópia ou a

reprodução de algo, em seu clássico texto “A obra de arte na era da sua

reprodutibilidade técnica”, afirma que “o hic et nunc do original constitui

o que se chama sua autenticidade” (2011, p. 246). É, mais uma vez, a

originalidade e a autenticidade caminhando juntas. Portanto, mesmo

novamente empregada como adjetivo, a palavra “original” também pode

ser usada para denotar aquele objeto que não é cópia, aquele objeto que é

legítimo, verdadeiro, autêntico. Por exemplo: “este CD aqui na banca,

senhor, é pirata ou original?”; ou: “eu jamais compraria uma bolsa original,

tendo cópias tão perfeitas e tão mais baratas por aí”; ou ainda: “ponha um

relógio original ao lado da sua cópia e não se consegue encontrar diferença”.

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Glossário Pirata

333

Referências bibliográficas

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da sua reprodutibilidade técnica.In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa. 8. ed. São Paulo:Paz e Terra, 2011. p. 239-283.

HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo:Objetiva, 2007.

NACHMANOVITCH, Stephen. Ser criativo: o poder da improvisação na vidae na arte. 2. ed. São Paulo: Summus, 1993.

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335

Paródia

CLOTILDE PEREZ

O termo parodiar nos remete à ideia de imitação, arremedo e de contra-

fazer. No entanto, acrescenta, subtrai, transforma, não é mera repetição...

Porque o intuito primeiro não é ser exatamente igual (como em muitas

situações de imitação de personagens ou mesmo de produtos e marcas).

A paródia deixa evidenciar a aproximação, em muitas situações exagera um

traço mais marcante (como os humoristas que parodiam celebridades ou

ainda as infinitas paródias de músicas que se tornaram absolutamente

populares em sites como o Youtube, por exemplo) em tantas outras situa-

ções, subtrai ou transforma aspectos menos relevantes, como os textos pu-

blicitários construídos a partir de clássicas citações científicas ou artísticas.

Contextualização

O termo paródia é utilizado por Linda Hutcheon, em seu livro A Teoria

da Paródia (1985), para designar a recriação de uma obra, modificação

de um texto já existente, por exemplo, podendo ter um caráter irônico,

cômico ou humorístico. Pode ser a simples re-apresentação de um mesmo

discurso, seja ele verbal ou visual construído com tom geral que permite

conectar sem dúvidas à origem, do mesmo modo que evidencia pequenas

adaptações.

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Glossário Pirata

336

A paródia não quer confundir, geralmente quer homenagear a referência,

ou pelo menos, lembra-la, por isso que na sua essência sempre será possível

identificar o locusde onde vem a criação. Portanto, guarda bons níveis

de parecença com a origem.

É também entendida como um processo de intertextualidade, com a

finalidade de desconstruir e reconstruir uma ideia, ou seja, aportar nova

interpretação.

Referências bibliográficas

HUTCHEON, Linda. Uma teoria da paródia. Lisboa: Edições 70, 1985

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337

Pirataria Moderna

ALHEN DAMASCENO

Pirataria ou pirataria moderna, como alguns denominam, é a prática

de vender ou distribuir produtos sem a expressa autorização dos proprie-

tários de uma marca ou produto. A pirataria é considerada crime contra

o direito autoral e a pena para este delito pode chegar a quatro anos de

reclusão e multa.

Os principais produtos pirateados no Brasil são roupas, calçados, bolsas,

óculos, utensílios domésticos, remédios, livros, softwares e CDs. A pira-

taria é considerada por muitos especialistas como “o crime do século

XXI”. Há uma série de referências que associam a pirataria ao narcotráfico

e também aos grandes grupos organizados e máfias internacionais.

Além de poder frustrar o consumidor nos quesitos qualidade, durabi-

lidade e eficiência, a pirataria de certos produtos, como remédios, óculos

de sol e bebidas, por exemplo, pode representar sérios danos à saúde do

consumidor.

Pirataria moderna se refere a cópia, venda ou distribuição de material

sem o pagamento dos direitos autorais, refere-se também à reprodução

e à comercialização ilegal e em larga escala de obras legitimamente criadas,

de marca e ainda de propriedade intelectual e de indústria – portanto,

quer pela cópia de uma obra anterior (falsificação), quer pelo uso indevido

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Glossário Pirata

338

de marca ou imagem, com infração deliberada à legislação que protege a

propriedade artística, intelectual, comercial e/ou industrial.

No Brasil, o comércio, a exposição à venda, ou a distribuição de pirataria

é um crime. A Lei 10.695, de 1.o de Julho de 2003 altera partes do

Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 acrescentando ao artigo

184, §4º, que ressalva que a criação de uma cópia pelo copista para uso

próprio e sem intuito de lucro, do material com direitos autorais, não

constitui crime.

Como o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 184, parágrafos 1,2 e 3

determina que deve haver o intuito de lucro (direto ou indireto), não

comete pirataria aquele que compra ou faz download de arquivos para

uso privado. E o parágrafo quarto acrescentado pela Lei n° 10.695 ao

artigo 184 do Código Penal Brasileiro, autoriza expressamente a cópia

integral de obras intelectuais, ficando dispensada, pois, a “expressa auto-

rização do titular”.

No Brasil a pirataria fere a licença de copyright e contra ela existe a Lei

Anti-pirataria (10.695 de 01/07/2003 do Código de Processo Penal), que

pune os responsáveis e dependendo dos casos a pena pode chegar a 4

(quatro) anos de reclusão de pena, e multa. Apesar disso, a pirataria é mui-

to praticada no Brasil sendo responsável pela geração de um grande núme-

ro de empregos informais. A Polícia Federal do Brasil mantém operações

permanentes para coibir as diversas modalidades de pirataria.

De acordo com Giacomini (2011) “a pirataria contém ingredientes da

falsificação, caso da imitação ilícita de produtos. Porém, retrata também

a distribuição, venda e fluxo ilegal desses produtos no mercado, o que

inclui a propaganda nesse caso” (GIACOMINI, 2011, p. 227).

Warez, termo derivado da língua inglesa, segunda metade da palavra

software no plural. Primariamente se refere ao comércio ilegal (pirataria)

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Glossário Pirata

339

de produtos com direitos autorais. Este termo geralmente se refere à

disponibilização por meio de grupos organizados, fazendo uso das redes

peer-to-peer (entre pares, é uma arquitetura de sistemas distribuídos carac-

terizada pela descentralização das funções na rede, onde cada nodo realiza

tanto funções de servidor quanto de cliente), de compartilhamento de

arquivos entre amigos ou entre grandes grupos de pessoas com interesses

similares. De acordo com o Dicionário Tecnologia e Inovação do

SEBRAE, Warez são softwares distribuídos ilegalmente através da

Internet. O “Z” é proposital, servindo para indicar algo que é ilegal. Pode

ser usado também em outros termos como Gamez (jogos pirateados),

Romz (jogos de videogame que rodam no PC através de emuladores, mas

também ilegais), etc.

Usualmente não se refere ao comércio de software falsificado. Este termo

foi inicialmente cunhado por membros de grupos de usuários de com-

putador do meio alternativo ou clandestino, mas se tornou um termo de

uso comum pela comunidade da internet e da mídia. O termo pirataria

é utilizado por estes círculos para se referir ao uso não autorizado de

propriedade intelectual.

Screener (termo em inglês derivado de screen – tela) é o nome que se dá,

na indústria cinematográfica, a uma cópia de um filme em vídeo ou

DVD, enviada antes do lançamento nos cinemas, aos críticos, jurados

de prêmios, lojas de vídeo (para o gerente e empregados), e outros pro-

fissionais da indústria do cinema, incluindo produtores e distribuidores.

Normalmente, cada cópia “screener” é enviada com marcas distintivas,

o que permite as cópias serem rastreadas até a fonte - o que não impede

sejam fontes de pirataria. No Brasil, o termo Screener é usado para designar

os filmes copiados diretamente da tela do cinema, com gravadores. O

filme geralmente é convertido para formatos de padrão AVI (DivX ou

XviD), e possui uma qualidade de imagem e som inferior aos originais

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Glossário Pirata

340

em DVD ou VHS – além de registrar no conteúdo situações típicas de

cinema, tais como pessoas tossindo ou passando diante da tela. Estas

cópias são ilegais, muitas vezes distribuídas por compartilhamento de

arquivos na internet, ou até mesmo objeto de pirataria. O termo deriva

da cópia original, que era enviada a ser ilegalmente copiada – chegando

ao mercado antes mesmo do lançamento oficial de alguns filmes.

Referências bibliográficas

GIACOMIINI, Gino. Matrizes: Revista do Programa de Pós-Graduação emCiências da Comunicação da Universidade de São Paulo – Ano 4, nº2 (jan/jun. 2011), São Paulo: ECA/USP, 2011.

MELO & LEITÃO, Herbat dos Santos, Leonardo Costa (org.). DicionárioTecnologia e Inovação. Fortaleza: SEBRAE, 2010.

Lei 10.695, de 1 de Julho de 2003

Decreto nº 5.244, de 2004

Decreto de 13 de março de 2001

http://pt.wikipedia.org/wiki/Screener

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pirataria_moderna

http://pt.wikipedia.org/wiki/Warez

Page 341: Perez, Trindade, Fogaça, Batista. Universo_signico_da_pirataria

341

Plágio

LEANDRO BATISTA

Definição

Plagiar é usurpar, roubar a essência criativa de uma obra. No plágio de

uma obra, em alguns casos, os plagiadores, desde que não descobertos,

terão o aproveitamento econômico do crime. Já em outros, como os

estudantes, também se não descobertos, poderão ter o seu aproveitamento

material, ou seja, a nota pretendida. No entanto, esquecem do que deveria

ser verdadeiramente importante nesse processo: a criação de espírito, a

informação e o conhecimento por trás do simples ato de “pensar”.

A origem etimológica da palavra demonstra a conotação de má intenção

no ato de plagiar; o termo tem origem do latim plagiu que significa oblí-

quo, indirecto, astucioso. O plágio é considerado antiético (ou mesmo

imoral) em várias culturas, e é qualificado como crime de violação de

direito autoral em vários países.

Plágio não é a mesma coisa que paródia. Na paródia, há uma intenção

clara de homenagem, crítica ou de sátira, não existe a intenção de enganar

o leitor ou o espectador quanto à identidade do autor da obra.

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Glossário Pirata

342

Contextualização:

O Conceito de Plágio Criativo: segundo Gabriel Perissé o plágio criativo

ocorre quando “roubamos’ da seara alheia (de autores conhecidos ou não)

algo que pode tornar o nosso trabalho mais fértil e promissor. Mais ainda:

devemos ser tão bons ladrões que ninguém perceba que fizemos com o

alheio algo melhor. O plágio criativo perfeito é quando o roubo é seguido

de “assassinato”, e nem precisamos citar a vítima, cuja alma absorvemos

e cujo corpo escondemos dentro do nosso próprio texto”.

O plágio criativo é uma imitação inteligente de versos e metáforas, de

idéias e frases, de resultados e conclusões de outros autores. Esse processo

criativo é utilizadíssimo pelos grandes escritores, que são ao mesmo tempo

grandes leitores e descobriram o óbvio: nada existe de novo sob o sol...

Frase que o autor do Eclesiastes deve ter copiado de algum outro escritor

(PERISSÉ, G, 2003, p. 78)

A tentação do plágio: Para expiação do pecado capital do mundo do

conhecimento que é o plágio, um primeiro passo pode ser a simples

confissão. Nos livramos da culpa do plágio citando a fonte de uma

informação ou argumento.

Quando um autor perde a capacidade de resistir ao mal o plágio se con-

suma. O ato de plagiar é então considerado um crime hediondo. Em seu

julgamento o réu será acusado de premeditação, falta de escrúpulos, deso-

nestidade, falta de ética profissional. Aos poucos os argumentos conde-

natórios resvalarão para o campo da moral. No comportamento anterior

do réu serão buscados indícios de vileza, vulgaridade e lascívia. Com tão

pungente peça acusatória o veredicto final só poderá ser a condenação

ao ostracismo intelectual.

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Glossário Pirata

343

É claro que a defesa poderá sempre alegar que o crime foi passional,

argumentando que o acusado não resistiu a um impulso irracional de

apropriação indevida da criação alheia e agiu por amor, não por inveja

ou cobiça.

Se um texto é uma espécie de filho que colocamos no mundo, a moral nos

ensina que o melhor é que não seja fruto de um incesto. O plágio é um in-

cesto que realizamos com um irmão ou irmã de ofício, que nos seduziu atra-

vés do seu texto. A atração por plagiar é como um desejo incestuoso do qual

nos afastamos se resignando à imperfeição do nosso próprio texto.

Quer seja o plágio considerado como um vulgar crime motivado pela falta

de ética, ou como um ato passional, e até mesmo um incesto, no mundo

das letras não conseguimos evitar um sentimento misto de repulsa e

compaixão pelo criminoso plagiário, considerado mais uma pobre vítima

de uma tentação demoníaca.

Ao autor considerado pelos pares como sério, consistente e inovador pode

ser relevada uma falta até grave em sua vida privada. Dificilmente, porém,

lhe será concedido o perdão por um plágio comprovado e às vezes apenas

presumido.

Podemos, então, concluir que uma interdição tão severa como a que paira

sobre o ato de plagiar só pode mesmo ser explicada pela existência de um

desejo de transgressão que tenha a mesma intensidade (in PRAXEDES,

2009).

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Glossário Pirata

344

Referências bibliográficas

PERISSÉ, Gabriel. O conceito de plágio criativo. Revista Técnica FIPEP –Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa, São Paulo, vol. 3, n. ½, , p. 73/88, jan/dez/2003.

PRAXEDES, Walter. Revista Espaço Acadêmico (on line) O intelectual semqualidades. Revista Espaço Acadêmico (UEM), v. n.100, p. 23-26, 2009.

http://www.infoseg.gov.br/arquivos/o-plagio-e-crime

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pl%C3%A1gio

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345

Réplica

GABRIELA AYER

Réplica é um exemplar que não é original; imitação. Cópia fiel confec-

cionada de um objeto, imagem ou criatura real, normalmente de obra

de arte.

É possível conseguir réplicas de praticamente todo o tipo de obras de arte,

como escultura, pinturas, inscrições, livros antigos, moedas, armas,

molduras, etc. Normalmente, se faz réplicas de trabalhos de arte conhe-

cidos e apreciados por todo o mundo, de grandes mestres como

Michelangelo, Van Gogh, Rembrandt, Picasso, Da Vinci, Rodin, entre

outros.

Podem-se considerar dois tipos de réplicas:

• De alta qualidade para substituição dos originais duma forma perfeita.

Busca-se a máxima fidelidade ao original, com atenção a todos os

detalhes como materiais, colorações e técnicas. Deve-se ter atenção que,

sob o ponto de vista estrutural, haja forma de distinguir a réplica do

original.

• Comerciais, que embora de boa qualidade, não reproduzem em abso-

luto o original. Não carecem do rigor técnico de reprodução precisa

da obra. Por vezes fazem-se adaptações de ordem prática a fim de trans-

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Glossário Pirata

346

formarem as réplicas em objetos de uso decorativo, assim, podem ser

confeccionadas em outro material que não o do originalou mesmo em

técnica diferente (gravuras de uma pintura, por exemplo) para viabilizar

a tiragem em grande número. Muitas vezes são feitas em dimensão

reduzida, ou seja, são também miniaturas.

Contextualização

Mas existem museus, institutos e fundações de artistas que fazem réplicas,

de obras de arte utilizando as formas originais, ou seja, as mesmas que o

artista usou, como “tiragens pós morte”, que são documentadas (inclusive

com marcas na própria obra) e só podem ser realizadas se houver um

documento com autorização do artista. Estas tiragens só são feitas de:

gravuras (litogravura, xilogravura, silk, etc.), esculturas em metal, e de

obras de arte contemporânea que existem como projeto (podendo assim

ser executadas sem a presença do artista).

A construção de réplicas é usada com várias finalidades:

SEGURANÇA – Substituição de originais por réplicas fiéis a fim de reduzir

os riscos de roubo ou vandalismo. Pode ser exposta no Museu detentor

da obra original ou emprestada para exposições em outros locais.

CONSERVAÇÃO – Substituição das obras expostas em áreas externas a fim

de evitar a degradação física das originais, muitas vezes por causa das

condições climáticas.

Outro uso de réplicas, ligado à conservação, refere-se a obras interativas,

obras de arte que foram produzidas para serem manipuladas. Neste caso

é permitido que o público toque as réplicas, preservando dessa forma as

peças originais.

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Glossário Pirata

347

Isso não é muito comum e existem várias discussões a esse respeito até

porque em algumas obras a reprodução é impossível, como o caso de telas,

nas quais a pincelada é a assinatura do artista, e por melhor que seja a

réplica sempre estará muito distante do original.

DIFUSÃO – Para disseminar a cultura e o conhecimento das artes, ou da

obra específica.

Costuma-se fazer réplicas de obras de arte para atividades de arte-educação

para pessoas com deficiência visual, por exemplo. Permitindo que essas

pessoas conheçam a obra através do tato.

Referências bibliográficas

BELOTO, Carlos. Ementa da Oficina de Mosaico e Réplicas (2007/ 2008).Instituto de Artes e Ofícios da Universidade Autônoma de Lisboa.

LAVEZZO, Ariane (restauradora do Museu de Arte Contemporânea daUniversidade de São Paulo – MAC USP). Entrevistada por Gabriela Ayerde Oliveira. São Paulo, Brasil: 19 jan. 2010.

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349

Reprodução

MARCOS HILLER

Definição

Reprodução é um conceito amplo que está vinculado a: 1) ato ou efeito

de reproduzir-se (produzir de novo); 2) imitação de quadro, fotografia,

gravura, etc. (exemplo: indivíduo comprou uma reprodução do Van

Gogh); 2.1) imitação fiel, cópia de obra de arte que tem sua divulgação

autorizada pelo autor; 2.2) estampa feita mecanicamente a partir de um

original (como acontece nas lojas dos inúmeros museus mundo afora);

3) traduzir com fidelidade, imitar, copiar 4) inserir em jornal ou revista

trecho extraído de outra publicação

Reprodução também conecta-se ao ato de copiar um ou mais exemplares

de uma obra literária, artística ou científica. Já em Biologia, reprodução

refere-se à função através da qual os seres vivos produzem descendentes,

dando seguimento à sua espécie, sem qualquer conotação de cópia no

sentido negativo, mas sim de continuidade.

Segundo Walter Benjamin (1996, p. 165) “na reprodução pelas mãos

do homem, o original não sofre abalos em sua autoridade, conservando-

se intacto. Com os meios de reprodução técnica, há uma interferência

direta no núcleo do original”. O filósofo instala a interferência da técnica

no processo de perda da aura da originalidade.

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Glossário Pirata

350

Contextualização

Abreu (1968) lembra que na esfera da comunicação a reprodução é ine-

rente a atividade comunicacional. No caso da reprodução musical, tanto

em termos de interpretação como sonorização, há nessa atividade artística

e comercial a divulgação e difusão licita das obras criadas. (GIACOMINI,

2011, p. 218).

No entanto, o outro lado da reprodução está na apropriação de obras e

direitos de forma a trazer danos a outrem. E a duplicação, copia, ou repro-

dução que envolve, por exemplo, plagio de trabalhos escolares, falsificação

de documentos e comercialização de ideias profissionais.

Referências bibliográficas

BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política. Cap. “A obra de arte naera de sua reprodutividade técnica”. São Paulo: Brasiliense, 1996, p. 165-196.

FILHO, Plínio Martins. Artigo “Direitos autorais na Internet”. Ci. Inf., Brasília,v. 27, n. 2, p. 183-188, maio/ago. 1998.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_autoral

http://pt.wikipedia.org/wiki/Reprodu%C3%A7%C3%A3o

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351

Screener

ALHEN DAMASCENO

Termo em inglês derivado de screen – tela. É o nome que se dá, na

indústria cinematográfica, a uma cópia de um filme em vídeo ou DVD,

enviada antes do lançamento nos cinemas, aos críticos, jurados de

prêmios, lojas de vídeo (para o gerente e empregados), e outros

profissionais da indústria do cinema, incluindo produtores e distri-

buidores. Normalmente, cada cópia “screener” é enviada com marcas

distintivas, o que permite as cópias serem rastreadas até a fonte - o que

não impede sejam fontes de pirataria.

No Brasil, o termo Screener é usado para designar os filmes copiados

diretamente da tela do cinema, com gravadores. O filme geralmente é

convertido para formatos de padrão AVI (DivX ou XviD), e possui uma

qualidade de imagem e som inferior aos originais em DVD ou VHS –

além de registrar no conteúdo situações típicas de cinema, tais como

pessoas tossindo ou passando diante da tela. Estas cópias são ilegais,

muitas vezes distribuídas por compartilhamento de arquivos na internet,

ou até mesmo objeto de pirataria. O termo deriva da cópia original, que

era enviada a ser ilegalmente copiada – chegando ao mercado antes

mesmo do lançamento oficial de alguns filmes.

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Glossário Pirata

352

Warez

Termo derivado da língua inglesa, segunda metade da palavra software

“ware”, no plural. Primariamente se refere ao comércio ilegal (pirataria)

de produtos com direitos autorais evidentes. Este termo geralmente se

refere à disponibilização por meio de grupos organizados, fazendo uso

das redes peer-to-peer (entre pares, é uma arquitetura de sistemas

distribuídos caracterizada pela descentralização das funções na rede, onde

cada nodo realiza tanto funções de servidor quanto de cliente), de

compartilhamento de arquivos entre amigos ou entre grandes grupos de

pessoas com interesses similares. De acordo com o Dicionário Tecnologia

e Inovação do SEBRAE, Warez são softwares distribuídos ilegalmente

através da Internet. O “Z” é proposital, servindo para indicar algo que é

ilegal. Pode ser usado também em outros termos como Gamez (jogos

pirateados), Romz (jogos de videogame que rodam no PC através de

emuladores, mas também ilegais), etc.

Referências bibliográficas

GIACOMIINI, Gino. MATRIZes: Revista do Programa de Pós-Graduação emCiências da Comunicação da Universidade de São Paulo – Ano 4, nº 2(jan/jun. 2011), São Paulo: ECA/USP, 2011.

MELO & LEITÃO, Herbat dos Santos, Leonardo Costa (org.). DicionárioTecnologia e Inovação. Fortaleza: SEBRAE, 2010.

Lei 10.695, de 1o de julho de 2003

Decreto nº 5.244, de 2004

Decreto de 13 de março de 2001

http://pt.wikipedia.org/wiki/Screener

http://pt.wikipedia.org/wiki/Warez

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353

Simulacro

BRUNO POMPEU

Definição:

“Simulacro” quer dizer simplesmente representação, semelhança,

parecença ou imitação. Só que, até mesmo no dicionário, já se encontra

um tom crítico nas definições. Porque, segundo o Houaiss, “simulacro”

é também a cópia malfeita ou grosseira e o arremedo.

Contextualização:

Pensando em uma acepção mais profunda e chegada à filosofia, não se

pode deixar de citar Jean Baudrillard, autor do famoso Simulacros e

simulação (1991). Não é o primeiro livro em que o autor se dedica à

questão do simulacro. Mas é nessa obra que Baudrillard dá ao termo

contornos mais contemporâneos e questionadores. Partindo da idéia mais

aceita de que o simulacro seria a representação de alguma coisa – de

alguma situação, de algum lugar, por exemplo –, o autor desenvolve seu

raciocínio no sentido de mostrar como, hoje, já não se tem mais neces-

sariamente a existência dessa coisa representada. É o que ele chama de

“precessão do simulacro”. Ou seja: cada vez mais o simulacro vem

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Glossário Pirata

354

antecedendo a realidade. E por que não se poderia dizer, talvez, que o

simulacro, na contemporaneidade, vem prescindindo do real?

Outro autor que merece destaque é o espanhol Eduardo Subirats. Seu

livro A cultura como espetáculo (1989) também aborda a questão do

simulacro, só que a partir de um ponto de vista mais crítico e em um

tom muito mais inconformado. Para o autor, o simulacro está direta-

mente ligado à alienação. Ao considerar a televisão uma das formas de

espetáculo mais fortes do nosso tempo, por exemplo, Subirats nos mostra

o seu poder (da televisão) de criar uma nova dimensão do real, que

substitui a experiência real e a vivência subjetiva. A partir das imagens

espetaculares produzidas pela TV, pela computação gráfica etc., teria mais

importância o simulacro do que a realidade. Só existe o simulacro. O que

deve existir, para existir, deve estar no simulacro. O que está fora do

simulacro não existe.

Protestaremos em vão que esses olhos do mundo que são as telas da

mídia nos usurpam, dia a dia, um pedaço da nossa visão, pois o

simulacro midial é universal e, diante do reino absoluto da sua

irrealidade, nossa existência e nossa experiência particulares se diluem

como a nulidade de um átomo na infinitude do cosmos. (SUBIRATS,

1989: 73).

Referências bibliográficas

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Trad. Maria João Pereira.Lisboa: Relógio d’água, 1991.

HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo:Objetiva, 2007.

SUBIRATS, Eduardo. A cultura como espetáculo. Trad. Eduardo Brandão. SãoPaulo: Nobel, 1989.

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355

A linguagem cotidiana no campo pirata:novos aprendizados

O trabalho de campo nos centros de consumo pirata nos trouxe impor-

tante conhecimento acerca de novos termos utilizados no dia a dia dessas

relações. Trata-se de um repertório metafórico e rico na potência de sen-

tido que é compartilhado pelas pessoas nos centros visitados, configu-

rando-se como um código próprio, mas que não alija ao contrário está

em diálogo. Vejamos os mais recorrentes e significativos.

Paraquedas: refere-se ao vendedor que usa um pano estendido no chão,

com cordas amarradas às quatro pontas, que podem ser puxadas

quando aparece a fiscalização;

Figura 1: paraquedas:exposição no paraquedaspara venda de controleremoto: facilidade e rapidezde locomoção.

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Glossário Pirata

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Camelô: pessoa que vende seus produtos na rua, em barracas desmon-

táveis, em suportes móveis ou mesmo nas calçadas. Pode vender

os artigos mais variados.

Figura 2: camelôs na Rua 25 de Março em São PauloFonte: Foto acervo GESC3

Loja: estabelecimento que tem as portas voltadas para a rua e que geral-

mente vendem produtos menos populares. Em muitos casos tam-

bém fazem uso do espaço público – calçada – para expor seus

produtos e ofertas.

Figura 3: Loja com utilização de expositores nacalçada. Saara, Rio de Janeiro

Fonte: foto Clotilde Perez

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Glossário Pirata

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Galeria: imenso estabelecimento (às vezes com vários andares), com

portas para a rua, cujos corredores são forrados de “boxes” menores,

geralmente comandados por chineses ou coreanos;

Olheiro: pessoa que fica (geralmente nas esquinas) verificando se a

fiscalização está se aproximando e tem a função de avisar os demais;

Puxador: pessoa que fica na calçada, falando com os que passam por ali,

tentando levá-los para as lojas de dentro das galerias. Ganham

comissão por pessoa levada e que compre algo na loja;

Homem da escada: pessoa que fica na calçada, no alto de uma escada

típica daquelas utilizadas na construção civil, olhando para dentro

da loja para fiscalizar furtos (substitui uma câmera, por exemplo);

Figura 4: Homem da escada.Saara, Rio de Janeiro.

Fonte: foto Clotilde Perez

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Rapa: qualquer tipo de fiscalização ou representante das diferentes

instâncias do Governo (Guarda Civil Metropolitana, Polícia

Federal etc.);

Vendedor de perfume: vendem seus produtos em carrinhos de mão

(como os de pedreiro), cada um embalado separadamente em uma

bandeja de isopor (como utilizados nos açougues e supermercados

para embalar carnes).

Figura 5: Carrinho demão utilizado paratransporte e venda deperfumes. Rua 25 deMarço, São Paulo.Foto: Clotilde Perez

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Réplica / Réplica de primeira linha: produto pirata, de qualidade similar

ao original, às vezes feito pela mesma fábrica que produz os

originais, sendo bastante difícil distingui-lo destes. Muitas vezes

apresenta etiquetas similares ou mesmo as próprias originais.

Figura 6: Camiseta Lacoste com logotipo bordado, símbolo e etiquetasFonte: acervo GESC3

Cópia / Réplica de segunda linha: produto pirata, de qualidade inferior,

facilmente reconhecido como tal. O material (por exemplo, couro

sintético em vez de couro de boi) e os detalhes (zíper de bolsas,

estampas mal impressas, fechos etc.), além dos símbolos e logotipos

estão mal apresentados e, por isso, são visivelmente diferentes e cla-

ramente inferiores que os originais.

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Figura 7: copia de calça da marca Versace com utilizaçãode logotipo e símbolos distorcidos

Fonte: acervo GESC3

Figura 8: cópia de segunda linha: simulação do logotipo da grife Dolce &Gabbana – troca da letra “G” pela “C”.

Fonte: acervo GESC3

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