PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E ... · FICHA CATALOGRÁFICA (Elaborada por Diule...

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Orientador: Prof. Dr. Alecsandro José Prudêncio Ratts GOIÂNIA 2011 UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU ANTROPOLOGIA SOCIAL LINHA DE PESQUISA: Corpo, representações e marcadores sociais da diferença KATIANNE DE SOUSA ALMEIDA PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E SEXUALIDADE NO BIG BROTHER BRASIL 10

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Orientador: Prof. Dr. Alecsandro José Prudêncio Ratts

GOIÂNIA

2011

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU

ANTROPOLOGIA SOCIAL

LINHA DE PESQUISA:

Corpo, representações e marcadores sociais da diferença

KATIANNE DE SOUSA ALMEIDA

PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO

E SEXUALIDADE NO BIG BROTHER BRASIL 10

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU

SENSU

ANTROPOLOGIA SOCIAL

Katianne de Sousa Almeida

PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E SEXUALIDADE NO BIG BROTHER BRASIL 10

Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Antropologia Social.

Linha de Pesquisa: Corpo, representações e marcadores sociais da diferença

Orientador: Prof. Dr. Alecsandro José Prudêncio Ratts

GOIÂNIA

2011

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FICHA CATALOGRÁFICA

(Elaborada por Diule Queiroz CRB 2491)

Almeida, Katianne de Sousa

C364p Personagens emolduradas: os discursos de gênero e sexualidade no Big

Brother Brasil 10 / Katianne de Sousa Almeida. - - Goiânia: UFG /

Faculdade de Ciências Sociais, 2011.

163f. ; 29 cm.

Orientador: Alecsandro José Prudêncio Ratts

Dissertação – Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Ciências

Sociais, Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu / Antropologia Social,

2011.

1.Big Brother Brasil 2.Discurso 3.Gênero e Sexualidade I. Ratts,

Alecsandro José Prudêncio. II. Universidade Federal de Goiás, Faculdade

de Ciências Sociais. III. Personagens emolduradas: os discursos de gênero

e sexualidade no Big Brother Brasil. IV. Título

CDU 392:654.197

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social - PGAS

Aluna: KATIANNE DE SOUSA ALMEIDA

Número da matrícula: 2009247

Linha de Pesquisa: Corpo, representações e marcadores sociais da diferença

Título da dissertação:

PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E SEXUALIDADE NO BIG BROTHER BRASIL 10

Orientador: Prof. Dr. ALECSANDRO JOSÉ PRUDÊNCIO RATTS

A Dissertação foi aprovada em sessão pública, realizada na Faculdade de

Ciências Sociais - Campus II da UFG, em 16 de Setembro de 2011 , às 09 horas, com a seguinte Banca Examinadora:

Nome / Instituição: Assinatura:

Prof. Dr. Alecsandro José Prudêncio Ratts – PPGAS/UFG

_____________________

Prof. Dr. Camilo Albuquerque de Braz – PPGAS/UFG

_____________________

Prof. Dr. Arivaldo de Lima Alves – UNEB/Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural

_____________________

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À Hermínia Sabino de Sousa (in

memoriam)

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AGRADECIMENTOS

Enfim, chegou-se ao final de uma jornada e não poderiam faltar os

eternos agradecimentos, pois o que está escrito está eternizado, Neste caminho da

pós stricto sensu, quero agradecer desde o princípio, mesmo àquele bem remoto

que foi à primeira reunião de apresentação dos professores do Mestrado, por

participar de uma turma só de alunas. Na verdade, eu estava enlouquecidamente

feliz naquela reunião e tive vontade de abraçar a todas e todos, como uma

demonstração de afeto e troca de energia positiva. Foi muito bom estar com vocês,

colegas Aline, Tetê, Margarida, Karine (in memoriam), Rosana, Juliana e Iolene. Eu

tinha muitas expectativas e alegrava-me pela entrada em um programa pioneiro que,

com toda certeza, faríamos história. Agradeço, portanto, à nossa coordenadora, na

época, Professora Selma que tanto se empenhou em aprender muito com a

burocracia da PRPPG, em nos ensinar Antropologia e as teorias pós-colonialistas;

as professoras Maria Luíza, Cyntia, e aos professores Luiz, Camilo, Eliane e Alex,

que me levaram pelos caminhos das questões de gênero e sexualidade.

Quero agradecer também aos meus grandes incentivadores à minha

paixão acadêmica, meu amigo e também colega de trabalho João Pecin, grande

palmeirense, e ao Nicolas, coordenador das Comissões Temáticas da Assembleia

Legislativa do Estado de Goiás. Admiro e prezo muito tudo o que fizeram por mim

nesta jornada. Também, não poderia esquecer a minha amiga de trabalho Leila que

tanto me cativou quando eu mais precisei de afeto e esperança na tragédia que

aconteceu comigo no ano de 2009.

Às amigas e amigos, o que eu poderia dizer? Que bom que faço parte de

suas vidas e vocês fazem parte da minha! Aprendi a compartilhar momentos

extremamente importantes e enriquecedores com Marcelo e Fátima; os admiro

intelectualmente e, lógico, pessoalmente. E para “azamygas” Mylanne, Mayara,

Laura, Darlen, Alynne, Mateus, Marcus, Daruska, Lucas, Juliana, Thainara, Nayara,

Eduardo, Ulli e Weverton, compenso todas as minhas desculpas e momentos de

“castigo” que dediquei à minha dissertação com este agradecimento e fico feliz por

vocês terem me adotado e me feito tão feliz nos nossos momentos no chorinho,

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bares, Relíquia, Disel, Total Flex e tantos outros espaços de Goiânia. Tenho outro

amigo em especial, Vinícius de Sousa Cardoso: a você meu sincero – muito

obrigada – por sempre me “salvar” quando pareço tão perdida.

Por fim, com toda certeza, agradeço à minha mãe Emília, ao meu pai

Antônio, ao meu irmão Lucas, à minha cunhada Ana e à minha sobrinha Cecília que

aguentaram meus momentos de mau humor, intolerância e pouco tempo para ajudar

nos afazeres domésticos e por todos os momentos felizes, divertidos e de superação

que me proporcionaram. Amo vocês! E quero deixar, por último, uma frase do livro O

Pequeno Príncipe, que mostra que este trabalho é um pouco de minha vida e de um

futuro que foi desejado há longos anos: esta dissertação é a minha rosa, a rosa de

meu planeta...

“Foi o tempo que dedicaste a tua rosa que a fez tão importante.”

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“Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a

nossa própria substância.” Simone de Beauvoir

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RESUMO

Abrir os olhos e ver. Não há nada mais incrível que o ato de enxergar as inúmeras

possibilidades que estão diante dos nossos olhos: as imagens. Elas são mais que

uma junção de cores e formas; produzem significado e, logicamente, símbolos. E

desta produção de imagens pode-se fazer alguns questionamentos, como, o que

elas querem representar? O interesse dessa dissertação permeou a análise do

discurso das imagens transmitidas pelo programa de televisão Big Brother Brasil

(BBB) em sua décima edição, ocorrida no ano de 2010. Ao iniciar a pesquisa, a

questão que eu, telespectadora/antropóloga, levava comigo era: como se

reproduziam os discursos da feminilidade, da masculinidade e da

homossexualidade? Sobretudo, como se reproduzia o modelo central – as

referências hegemônicas? Essas referências pareciam subjugar, desvalorizar e

limitar as existências plurais de masculinidade, feminilidade e homossexualidade.

Ao final, percebi que os dados do campo não mostravam apenas os pressupostos

da normatividade e os sujeitos não estavam completamente emoldurados; haviam

deslocamentos. Sabendo que nada é simples no campo do gênero e da

sexualidade, houveram diversas tensões. A diversidade proposta pelo programa teve

o seu limite. Ao se propor desnaturalizar o BBB, pretendo compreender como um

produto audiovisual assistido pelos mais variados grupos sociais pode influenciar,

sedimentar ou colocar em reflexão as convenções formais quanto ao gênero e

quanto à sexualidade.

Palavras-chave: Big Brother Brasil; Discurso; Gênero e Sexualidade.

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ABSTRACT

Open your eyes and see. There is nothing more incredible than the act of visualizing

the innumerous possibilities that are before our eyes: images, they are more than a

combination of colors and forms, they produce meanings and, logically, symbols.

From this production of images some questions can be raised, such as, what do they

want to represent? This dissertation focuses the images transmitted on the television

program Big Brother Brazil (BBB) in its tenth edition, which took place in 2010. When

I started the research, the question that I, a television spectator and anthropologist,

raised were: how are the discourses of femininity, masculinity and homosexuality

reproduced? Above all, how the central model was reproduced – hegemonic

references? These references seem to subordinate, devalue and limit the plural

existences of masculinity, femininity and homosexuality. Finally, I perceived that the

fieldwork data did not only show the assumptions of normativity and the subjects

were not completely framed, there were dislocations. Knowing that nothing is simple

in the field of gender and sexuality, there were several tensions. The diversity

proposed by the program had its limits. In proposing to denaturalize the BBB, I aimed

to understand how an audiovisual product watched by the most varied social groups

can influence, sediment or make one reflect on the formal conventions about gender

and sexuality.

Key words: Big Brother Brazil; discourse; gender and sexuality.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Os candidatos selecionados para participarem do BBB 10. ..................... 55

Figura 2 - Reportagem da Veja "Big Brother no Computador" .................................. 57

Figura 3 - Posicionamento das câmeras na casa/cenário do BBB 10 ....................... 58

Figura 4 - Planta da casa/cenário do BBB 10 ............................................................ 58

Figura 5 - Início do vídeo da charge .......................................................................... 73

Figura 6 - Final do vídeo da charge ........................................................................... 74

Figura 7 – Anamara ................................................................................................... 81

Figura 8 - Angélica e/ou Morango ............................................................................. 85

Figura 9 – Fernanda .................................................................................................. 88

Figura 10 - Fernanda é chamada de "enigma irresistível" por Bial. .......................... 90

Figura 11 – Tessália .................................................................................................. 92

Figura 12 - Marcelo Dourado ..................................................................................... 95

Figura 13 -"Quem diabos é esse sujeito?", pergunta Bial ao falar de Dourado. ........ 99

Figura 14 – Eliéser .................................................................................................. 102

Figura 15 – Sérgio ................................................................................................... 106

Figura 16 – Dicésar ................................................................................................. 109

Figura 17 - Dimmy Kieer.......................................................................................... 109

Figura 18 - Eliéser "ataca" de Britney Spears ......................................................... 119

Figura 19 - Eliéser usando saia ............................................................................... 120

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Participantes do BBB 10 .......................................................................... 49

Tabela 2 – “Líderes” do BBB 10 ................................................................................ 51

Tabela 3 - Os acontecimentos da semana no BBB 10 .............................................. 62

Tabela 4 - A sequência de participantes “eliminados” do BBB 10 ............................. 66

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SUMÁRIO

O QUE TEM DE BIG NESSE BROTHER BRASIL? O EU, O OBJETO E A

PESQUISA ................................................................................................................ 14

O EU - O CAMINHO .................................................................................................. 14

O OBJETO - BBB: DO ENTRETENIMENTO AOS QUESTIONAMENTOS............... 22

A PESQUISA - NO MEIO DO CAMINHO NÃO TINHA SOMENTE UMA PEDRA,

MAS VÁRIAS... ......................................................................................................... 30

Assistindo à TV e construindo uma pesquisa ...................................................... 37

A dissertação ........................................................................................................... 41

CAPÍTULO 1 - O QUE É O BIG BROTHER BRASIL? ............................................. 43

1.1 QUEM É QUEM NO BIG BROTHER BRASIL ................................................... 46

1.1.1 O Big Boss ..................................................................................................... 46

1.1.2 O apresentador .............................................................................................. 47

1.1.3 Os participantes ............................................................................................ 48

1.1.3.1 “Líder” ........................................................................................................... 51

1.1.3.2 “Anjo/monstro” .............................................................................................. 52

1.1.4 O público ........................................................................................................ 52

1.2 O PROCESSO DE INSCRIÇÃO E SELEÇÃO DO BBB 10 ............................... 53

1.3 O ESPAÇO (CASA/CENÁRIO) .......................................................................... 58

1.4 A DINÂMICA DO JOGO .................................................................................... 60

1.4.1 A estréia ......................................................................................................... 63

1.4.2 A prova da “liderança” ................................................................................. 64

1.4.3 As “eliminações”........................................................................................... 65

1.4.4 A prova da comida ........................................................................................ 66

1.4.5 A prova do “anjo”.......................................................................................... 67

1.4.6 O dia da votação e a formação do “paredão” ............................................. 67

1.4.7 Algumas interferências ................................................................................. 69

1.4.8 A grande final ................................................................................................ 71

CAPÍTULO 2 – PESSOAS, PERSONAGENS E TRAJETÓRIAS ............................ 76

2.1 ANAMARA ......................................................................................................... 80

2.2 ANGÉLICA......................................................................................................... 85

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2.3 FERNANDA ....................................................................................................... 88

2.4 TESSÁLIA.......................................................................................................... 92

2.5 DOURADO ........................................................................................................ 95

2.6 ELIÉSER.......................................................................................................... 102

2.7 SÉRGIO ........................................................................................................... 105

2.8 DICÉSAR/ DIMMY KIEER ............................................................................... 109

CAPÍTULO 3 - LINEARIDADES E DESLOCAMENTOS ........................................ 114

3.1 AS FACETAS DE ELIÉSER ............................................................................ 117

3.2 NOVAS CORES E ANTIGAS FORMAS DE SE VER ...................................... 122

3.2.1 Homo ou bissexualidade? As diversas relações afetivas de Sérgio ...... 124

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 128

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 133

GLOSSÁRIO ........................................................................................................... 141

ANEXOS ................................................................................................................. 143

ANEXO A – BIG BROTHER AO REDOR DO MUNDO .......................................... 144

ANEXO B – BBB E O ENVOLVIMENTO DOS TELESPECTADORES.................. 155

ANEXO C – ALGUNS DADOS SOBRE A AUDIÊNCIA DO BBB 10 ..................... 159

ANEXO D – O TRIÂNGULO: ELIÉSER, CLÁUDIA E ANGÉLICA......................... 161

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O que tem de Big nesse Brother Brasil? O eu, o objeto e a pesquisa

O EU - O CAMINHO

Você não sabe.

O quanto eu caminhei. Pra chegar até aqui.

(Música “A estrada” – Interpretada pelo

grupo musical Cidade Negra).

Abrir os olhos e ver. Não há nada mais incrível que o ato de enxergar1 as

inúmeras possibilidades que estão diante aos nossos olhos: as imagens. E estas

são muito mais que uma junção de cores, formas, movimento ou estática. A elas,

atribuímos significados, sentidos, e logicamente, simbologias.

O interesse em debruçar-me diante dos estudos das imagens

acompanha-me desde a graduação, quando iniciei uma pesquisa dentro do Grupo

de Estudos de Relações Interétnicas (GERI), vinculado ao Departamento de

Antropologia da Universidade de Brasília. A pesquisa intitulava-se “Dando „Vida‟ aos

Museus: o Papel da Contextualização das Coleções Etnográficas”. O interesse era

demonstrar como o material visual – da coleção etnográfica da Universidade de

Brasília, resguardada na Casa da Cultura da América Latina (CAL) – tinha a

capacidade de exprimir a concepção étnica de pessoa humana, a categorização

social, material e outras mensagens referentes à ordem cósmica, tornando as

manifestações simbólicas e estéticas centrais para a compreensão da vida em

sociedade.

1 Numa perspectiva hegemônica daqueles que enxergam, pode-se dizer que esta é uma abordagem

“vidente-cêntrica”.

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A imagem é um produto envolvido pela estética e pela performance; ela

também é uma forma de se perceber as experiências sociais: pensá-la aliada ao

fazer antropológico é buscar interpretações das representações simbólicas.

A imagem permite a elucidação de comunicações não verbais tais como um olhar, um sentimento, um sistema de atitudes, assim como mensagens de expressões corporais, faciais, movimentos e significados de relações espaciais entre pessoas e padrões de comportamento através do tempo. Imagens retratam a história visual de uma sociedade, documentam situações, estilos de vida, gestos, atores sociais e rituais, e aprofundam a compreensão da cultura material, sua iconografia e suas transformações ao longo do tempo. Mais ainda, a análise de registros imagéticos tem permitido a reconstituição da história cultural de alguns grupos sociais, bem como um melhor entendimento dos processos de mudança social. (GEARY APUD BITTENCOURT, 2001, p. 199-200).

O segundo momento em que tive envolvimento com a análise de imagens

não foi mais relacionado aos estudos de relações interétnicas, mas aos estudos

urbanos. Na especialização em História Cultural, realizada na Universidade Federal

de Goiás, fiz uma pesquisa denominada “A Revitalização da Avenida Goiás:

Símbolos e Dinâmicas”, em que explorei as várias dimensões do campo das

relações entre o urbanismo e as práticas sociais, especificamente os processos de

revitalização urbana, em particular, a implementação do Projeto de Requalificação

da Avenida Goiás de 2003.

A problematização do espaço da cidade referido apoiou-se na utilização

de fotografias como instrumental metodológico. Houveram reflexões quanto às

imagens pesquisadas em acervos históricos2 tanto da época da construção da

Avenida, quanto nas contínuas modificações materiais e imateriais, além das

fotografias feitas na época da pesquisa de campo tentando identificar as simbologias

carregadas nessas imagens.

Conforme Pesavento (1999), a força de uma imagem se mede pelo seu

poder de provocar uma reação, uma resposta. A fotografia traz um momento que

tem uma materialidade e uma historicidade de produção. A imagem tem uma

capacidade mobilizadora que se ancora na dimensão simbólica do seu contexto

social, além de também ter a capacidade de evocar sentidos, vivências e valores.

2 Acervo da Secretaria Municipal de Planejamento da cidade de Goiânia.

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No mestrado em Antropologia Social, também na Universidade Federal de

Goiás, ainda existiam perguntas em minha mente que estavam associadas às

imagens e que também precisavam ser respondidas sobre a realidade que me

cercava. Estes questionamentos envolviam a relação entre mídia, gênero e

sexualidade, advindos de um programa de televisão3 denominado Big Brother Brasil

(BBB). Ora, o que se propõe agora não é o enfrentamento de imagens estáticas,

como eu vinha trabalhando desde 2004 na graduação e na especialização, mas de

imagens em movimento. Mas nem tudo mudou; continuo a interpretar, pelo viés das

abordagens antropológicas, um objeto que faz parte da minha cultura. Para Oliven

(2002), quando se aborda um objeto dentro da própria cultura é um desafio para o

pesquisador questionar seus pressupostos que são muitas vezes aceitos como fatos

inquestionáveis pela maioria da população e, inclusive, por muitos pesquisadores

(p.11).

A decisão de estudar um programa de televisão logicamente envolvia

duas paixões: os estudos urbanos e os estudos de imagens. Além disso, uma

curiosidade imensa envolvia-me, ou seja, queria aventurar-me em temáticas que

nunca sequer tinha feito qualquer interseção como gênero e sexualidade. E

confesso que também era (ou ainda sou?)4 uma aficionada pelo Big Brother Brasil

acompanhando-o desde o seu início, em 2002.

A escolha em fazer interseções com temáticas nunca antes exploradas,

ou seja, gênero, deveu-se a um incômodo pessoal em perceber que a maioria dos

artigos, monografias ou dissertações sobre o programa Big Brother Brasil, apenas

focava-se na obsessão ao ato de ver a privacidade alheia, além do confronto, que

3 De acordo com Machado & Vélez (2007), podemos definir o programa de televisão como qualquer

série sintagmática (sequência de imagens e sons eletrônicos) que possa ser tomada como uma singularidade distintiva em relação às outras séries sintagmáticas da televisão. Pode ser uma peça única, como um telefilme ou um especial; uma série ou minissérie apresentada em capítulos; um horário reservado para um gênero específico (seriado, telejornal, talk show, etc.), que se prolonga durante anos, sem previsão de finalização; ou até mesmo a programação inteira, no caso de emissoras ou redes “segmentadas” ou especializadas, que não apresentam variação de blocos.

4 Essa confusão entre era ou ainda sou se dá pelo fato de que, após envolver-me em profundidade

com o programa, pois uma coisa era assisti-lo outra foi estudá-lo, senti certa repulsa quando vi tantos discursos misóginos e sexistas. Sendo assim, como ainda estava envolvida na escrita desta dissertação não consegui assistir a 11º (décima primeira) edição do Big Brother Brasil, ocorrida no ano de 2011.

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parece ser o novo “vício” da atualidade5, entre a realidade e a ficção, como enfoca

Andacht (2003):

Contempla-se o contínuo e, em parte, inesperado vazamento de humores corporais de uma dúzia ou mais de pessoas. Lágrimas, sêmen, gritos, suspiros, sussurros, o sangue que se acumula nas bochechas, o rito de dor após um acidente doméstico ou um jogo que não deu certo, a melancolia que um rosto belo e juvenil, ou a microcoreografia de um lábio que perde a calma ante as câmaras são a dominante na tela. Toda essa evidência acumulada é uma situação inédita na programação de TV. Por isso, na minha pesquisa comparada do BB regional, no Río de La Plata e no Brasil, cheguei à conclusão de que o verdadeiro protagonista do formato é a „transpiração sígnica ou a exalação indicial‟. (p. 151).

O interesse de Almeida (2003) também foi de adentrar na particularidade

das pessoas confinadas na casa, analisando a interatividade e a cordialidade que

para elas marcaram a convivência dos participantes do primeiro programa, ou seja,

em 20026.

Diante da grande audiência do programa no Brasil e no exterior, é possível dizer que o formato interessou a muitos telespectadores, que quiseram ver na intimidade, a vida privada dos confinados, ou pelo menos, o espetáculo não ensaiado da convivência de um grupo de pessoas. Como só estudamos aquilo que nos espanta e geralmente o que nos move é o mesmo que nos comove, o interesse do público me levou até o Big Brother Brasil. Por isso, me detive naquilo que o espectador viu, ou usando termo do programa, „espiou‟ (p. 90).

Na abordagem de Minerbo (2007), o enfoque está na espetacularização

de pessoas anônimas vivendo em reclusão. Para o autor, o reality show é um

“espetáculo” e, ao mesmo tempo, é “de verdade”. Em suas palavras:

Os participantes do BBB são pessoas comuns lutando por ascensão social e, nesse sentido, são „de verdade‟. Mas há uma dimensão de representação, já que se trata de um jogo em que eles representam pessoas comuns lutando por ascensão social (p. 155).

5 Considero novo “vício” da atualidade, pois há um esforço atual dos intelectuais em compreender as

mudanças sofridas no cotidiano a partir da emergência das novas potencialidades digitais e midiáticas, demonstrando que o ato de ver está expandido. A esse respeito, ver Lévi (1999), Costa (2002), Castells (1999) e Moraes (2001). 6 Todas as referências quanto a estrutura do programa serão feitas no Capítulo 1.

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Além de trazer uma crítica à palavra reality, em seu texto há o enfoque ao

processo de competição, pois o BBB também7 é um jogo, em que os participantes

estão envolvidos, o que ele denomina como gladiadura.

O programa se estrutura em torno de um suspense e da participação do público, que vota semanalmente em quem será excluído, ou melhor, em quem irá para o „paredão‟. Para que o público possa votar, a atuação dos participantes no dia-a-dia do programa é decisiva. Aparentemente, estão apenas conversando, namorando, fazendo ginástica, indo a festas. Mas nós (e eles) sabemos que estão se digladiando para eliminar os outros e vencer (p. 153).

Tal análise, acredito ser bastante limitadora, pois enfatiza em demasia um

lado perverso da competição, como se o interesse primordial de todos os

participantes fosse a “eliminação” dos outros, sendo que, muitas vezes, pôde-se

perceber que alguns deixam de lado o foco da conquista do prêmio para vivenciar

outras histórias e experiências8.

Para dar conta destas outras histórias e experiências, faz-se importante

trazer uma nova abordagem para os estudos a respeito dos reality shows, a

interseção com gênero e sexualidade. Conforme Hamburger (2005), a televisão

desempenha o papel de “integrador nacional”, articulando pressão governamental

com forças de mercado, incluindo a força criativa de um grupo específico de

profissionais. E a consequência é esse produto nacional inusitado, misto do que de

mais comercial e lucrativo a indústria cultural foi capaz de produzir, e é reconhecida

como palco de movimentação de “tipos ideais” de homem, mulher, pai, mãe, filho,

filha e família brasileiras.

Falar sobre homens, mulheres e como eles são construídos e vistos em

programas de televisão é adentrar-se nos estudos de gênero.

Tudo está atravessado pelo gênero: as identidades subjetivas, o simbólico, as instituições (todas, sem exceção), o político (a “política” e as “políticas”),

7 Digo também, pois um dos meus argumentos é ir além do senso comum e mostrar que as pessoas

estão ali não somente para ganhar 1,5 milhões de reais (valor do prêmio atual), mas para compartilhar suas visões de mundo, suas perspectivas de sucesso pessoal e vivenciarem experiências inéditas. 8 Por exemplo, no Capítulo 3, ressaltarei o discurso do brother Eliéser em que disse que se sua

namorada Cláudia (Cacau) não quisesse um relacionamento romântico com ele, o mesmo preferiria sair da casa e desistir da competição.

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19

a filosofia, as teorias sociais, as artes, a literatura, as ciências, as religiões, as relações (afetos, sentimentos, emoções) e as leituras que fazemos do mundo social e da “Natureza” (GONÇALVES, 2010).

Nesta pesquisa gênero é uma categoria analítica, em que a proposta é

teorizar sobre como são os discursos produzidos das masculinidades e feminilidades

dentro da décima edição do Big Brother Brasil, tentando interpretá-los e

compreendê-los. A partir disso, temos que:

O gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos e é uma forma primária de dar significado às relações de poder. Gênero implica quatro elementos inter-relacionados: o simbólico; o normativo; a organização social e a identidade subjetiva (SCOTT, 1990, p. 86).

Esse termo, para as Ciências Sociais, refere-se às construções culturais

de masculinidades e feminilidades. As relações de gênero são determinadas pela

cultura e pela história, construindo valores e comportamentos, sendo, portanto, algo

que exclui, ou melhor, não toma como princípio norteador os referenciais das

diferenças biológicas existentes nos corpos de homens e mulheres. Ou seja, fala-se

de masculinidades e feminilidades independentes das genitálias ou outros

referenciais corporais.

Gênero feminino (feminidade) e gênero masculino (masculinidade) não são, em última instância, considerados como exclusividade dos corpos sexuados masculinos e femininos, respectivamente. A percepção popular pode unir irredutivelmente, sexo, gênero e sexualidade, mas trata-se de uma união assimétrica e não de uma condição fixa ou permanente (ROBERTSON, 1999 apud LACOMBE, 2007, p. 222-223).

Para que meu argumento fique mais claro, cito a pesquisa de Lacombe

(2007) que propõe apresentar modos de construções de masculinidades que têm

como suporte corpos de mulheres e não de homens.

O fato de explicitar a possibilidade de uma masculinidade de mulheres implica previamente desconsiderar a masculinidade como incindível da estrutura biológica do homem e desenhá-la como uma ficção que se constrói performática e socialmente. (...) Numa tentativa de desobrigar a masculinidade de habitar só o corpo do homem, historicizando-a, desconstruindo-a e levantando a questão de ser uma categoria teórica mais do que uma concepção da natureza (p. 215).

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20

Após estas considerações sobre gênero, falta agora deixar claro que

sexualidade também é uma das categorias de análise, pois considero relevante

constatar como gênero e sexualidade se organizam e inter-relacionam no âmbito de

relações mais amplas. Entretanto, quero frisar que gênero e sexualidade não se

confundem.

El género afecta al funcionamiento del sistema sexual, y éste ha poseído siempre manifestaciones de género específicas. Pero aunque el sexo y el género están relacionados, no son la misma cosa, y constituyen la base de dos áreas distintas de la práctica social. En contraste con las opiniones que expresé en "The Traffic in Women", afirmo ahora que es absolutamente esencial analizar separadamente género y sexualidad si se desean reflejar con mayor fidelidad sus existencias sociales distintas. Esto se opone a gran parte del pensamiento feminista actual, que trata la sexualidad como simple derivación del género. Por ejemplo, la ideología feminista lesbiana ha analizado la opresión sobre las lesbianas, principalmente en términos de opresión de la mujer. Sin embargo, las lesbianas son también oprimidas en su calidad de homosexuales y pervertidas, debido a la estratificación sexual, no de géneros. Aunque quizá les duela a muchas de ellas pensar sobre ello, el hecho es que las lesbianas han compartido muchos de los rasgos sociológicos y muchos de los castigos sociales con los varones gay, los sadomasoquistas, los travestidos y las prostitutas (RUBIN, 1989, p. 184).

A abordagem que faço nesta pesquisa quanto à sexualidade compartilha

com a perspectiva foucaultiana (1978) que não trata a mesma como algo vinculado à

biologia ou mesmo a reduz a suas práticas ou costumes, mas que traz a idéia dos

dispositivos de sexualidade. Por dispositivo, Foucault entende:

Através deste termo tento demarcar, em primeiro lugar, um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre estes elementos (p. 244).

Logo, trazer a categoria sexualidade como interseção aos estudos das

mídias é admitir que ela organiza e dá significado às experiências coletivas, sendo,

portanto, um interessante viés na observação quanto a linearidades e

deslocamentos dos comportamentos9 e formatos das vivências dos participantes do

BBB.

9 Temas dos Capítulos 2 e 3.

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Outro ponto importante que gostaria de ressaltar, a favor da minha

pesquisa, é que as outras análises feitas do BBB “restringem-se” 10, em sua maioria,

a reflexões de comunicólogos e psicólogos11. Encontrei apenas uma breve tentativa

em debruçar-se para a questão feita pela antropóloga Esther Hamburger. Contudo, é

importante frisar que seu artigo faz parte de uma revista de comunicação12. Quero

dizer com isso que talvez esteja o tema à margem das observações dos

antropólogos. Faço esta afirmação com base nos discursos realizados em

congressos que têm como público principal antropólogos, como: Reunião Equatorial

de Antropologia (REA), Reunião Brasileira de Antropologia (RBA), Reunião de

Antropologia do Mercosul (RAM) e Reunião da ANPOCS13, assim como o resumo do

Grupo de Trabalho (GT) – Antropologia e Comunicação – na REA, em que as

antropólogas Silvia Garcia Nogueira e Isabel Siqueira Travancas afirmaram que “os

meios de comunicação de massa não têm sido objeto de reflexão sistemática por

parte dos antropólogos latino-americanos”.

Conforme Almeida (2003), existe um mau olhado dos intelectuais para

aqueles que estudam ou estão envolvidos com os meios de comunicação, como se

a televisão fosse a superficialidade em movimento incessante que só contribui para

a irreflexão. Quando um intelectual propõe-se a estudá-la, restringe-se apenas às

queixas. Diferentemente do pensamento destes intelectuais referidos por Almeida,

acredito que o reality show é um produto televisivo que elucida as diversas

representações da sociedade brasileira, sendo, assim, um objeto antropológico por

excelência.

10

Digo restringir no sentido de conter dentro de certos limites, ou seja, a análise sobre o BBB está restrita pelo fato de a maioria dos pesquisadores que se interessam pelo programa ora serem comunicólogos ora serem psicólogos. Sendo que os meios de comunicação apresentam aspectos múltiplos que demandam tanto interesses por economistas, cientistas políticos, antropólogos, sociólogos, historiadores, ou seja, uma gama diversa de pesquisadores, pois há uma infinidade de abordagens que podem ser tomadas diante das perspectivas amplas que se abrem em torno do fenômeno das mídias.

11

Cito como exemplo as análises dos comunicólogos Miranda (2007), Campanella (2007), Curvello (2002), Kilp (2005), Feldman (2005) e de psicólogos Millan (2006), Minerbo (2007) e Silva (2008).

12

HAMBURGER, Esther. Formatos da intimidade. São Paulo, 2002. p. 82-6. Comunicação & Educação. Revista do Curso de Gestão de Processos Comunicacionais, São Paulo, v. 8, p. 82-6, maio/ago. 2002.

13

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais.

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Para ilustrar esse mau olhado, na pesquisa de Borges L. (2008), há

também considerações a esse respeito:

Apesar do enorme sucesso, Bucci (1996) assinala que a telenovela no Brasil não é uma unanimidade. Alguns ainda a olham com desconfiança e menosprezo e certos intelectuais a consideram um bem cultural menor e um produto alienante. Essa desqualificação é vista pelo autor como pouco produtiva, pois desconsidera que “falar de televisão é falar do Brasil” (BUCCI, 1996, p. 25). O autor nomeia essa postura de neo-elitista, afirmando que a excelência da televisão brasileira consiste justamente na razão pela qual ela vem sendo contestada: “o melodrama de fato é um sucesso, o telejornalismo é emocional, a publicidade lança novidades” (BUCCI, 1996, p. 27). Para aqueles/as que se interessam pelo país, a televisão, particularmente a telenovela, pode ser uma excelente vitrine de nossas contradições. (BORGES L., 2008, p. 58).

Com todas essas paixões, curiosidades e enfrentamentos, escrevo esta

dissertação que pretende dissecar, não na totalidade, pois seria um projeto

impossível, a lógica da produção14 do programa BBB em sua décima edição15,

ocorrida no ano de 2010. E, assim, ser mais uma estudante de antropologia a

enfrentar uma temática que é considerada banal pela academia.

O OBJETO - BBB: DO ENTRETENIMENTO AOS QUESTIONAMENTOS

Se pudesse escolher.

Entre o bem e o mal, ser ou não ser? Se querer é poder.

Tem que ir até o final. Se quiser vencer.

(Música “Vida Real” Interpretada por RPM)16

.

14

Os discursos emitidos por aqueles que são os responsáveis em fabricar, editar e transmitir as imagens e conteúdos a respeito do BBB.

15

Na verdade eu não estudarei o programa BBB, mas, sim a edição de 2010, ou seja, o BBB 10. Faço esta ressalva, pois conforme Machado & Vélez (2007) há distinções entre um programa e uma edição específica de programa.

16 Esta música é o tema do BBB desde o seu início.

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23

O papel que as imagens desempenham na vida social é uma das

preocupações dessa dissertação. Entretanto, falar de imagens em geral é como se

falássemos do infinito, pois abarca uma imensidade de objetos empíricos e reflexões

teóricas. Portanto, as imagens aqui tratadas serão aquelas transmitidas por um

aparelho denominado televisão.

Contudo, não basta também informar de onde estão partindo estas

imagens. Afinal, o que interessa é compreender o que elas querem dizer, interpretar

e representar. O meu desejo nesta pesquisa busca por um entendimento

antropológico do mundo, dos fatos sociais. Neste momento, focaliza as imagens

transmitidas por um programa – o Big Brother Brasil, transmitido pela Rede Globo de

Televisão17. Uma das principais razões que me remete à reflexão de um programa

de televisão é saber que vivemos em um mundo constantemente influenciado e

construído pelos meios de comunicação, em que o visual tem papel primordial.

O fato de a televisão brasileira aparecer como exemplo de teses, em certo sentido opostas na literatura estrangeira e brasileira, aumenta o interesse da discussão, reforçando a idéia de que sua especificidade convida à reflexão teórica. As conclusões conflitantes podem ser consideradas como evidência das limitações dos enfoques adotados, que não conseguem explicar os significados inusitados, imprevistos e não planejados que esses programas vieram a ter na sociedade brasileira (HAMBURGER, 2005, p.26).

A partir de tudo o que foi citado, dada a influência e a carga de

envolvimento dos programas de televisão na vida das pessoas, em especial, da

sociedade brasileira, fiquei instigada a transformar minha prática de lazer e

entretenimento em um tema de pesquisa.

Ora, digo transformar a prática, porque sempre fui uma telespectadora de

novelas, seriados, programas de auditório, programas de música, enfim, tudo o que

cercava a programação dos principais canais abertos da televisão brasileira; apenas

17

Conforme o portal da internet “Memória Globo” - a Rede Globo de Televisão é uma rede de televisão brasileira, que foi fundada em 26 de abril de 1965, pelo jornalista Roberto Marinho. Atualmente, sua rede é a maior de toda a América Latina e a terceira maior do mundo, assistida por 140 (cento e quarenta) milhões de pessoas diariamente. A empresa faz parte do grupo empresarial Organizações Globo (http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/).

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atualmente assisto a canais pagos18. Contudo, minha experiência maior está em

prontificar-me diante da telinha para assistir aos canais abertos, e o BBB não estaria

fora disso, ou seja, desde 2002 acompanho a saga de alguns anônimos que ao final

de um jogo, apenas um ganha o prêmio, que no início era de R$ 500 mil reais,

porém, atualmente é de R$ 1, 5 milhões de reais.

No entanto, quero salientar que para mim o Big Brother Brasil (BBB)

mostrava-se um espaço que ia além da competição por um prêmio19, mas que

difundia hábitos de consumo, de relações interpessoais, e o que mais me chamou a

atenção foram os discursos normativos que indicavam “padrões” de feminilidades e

masculinidades, “como se pertencer a um determinado sexo colocasse os sujeitos

em determinadas posições fixas, tornando suas ações previsíveis” (BELELI, 2005, p.

5). Assim sendo, estranhava-me o fato de ser previsível ao ver na produção das

imagens do programa que a maioria dos brothers fosse vinculada à racionalidade, à

competitividade e à praticidade que a maioria das sisters tivesse suas referências

comportamentais ligadas à afetividade, ou seja, à sobreposição dos sentimentos à

razão e seus corpos sexualizados e vendáveis (ou ofertáveis). Ora, afirmo essa

sexualização e oferta dos corpos femininos pelo motivo de todas as edições do BBB

terem pelo menos uma sister que posou nua para uma revista masculina, de grande

circulação nacional, como a Playboy.

O Big Brother Brasil é um programa televisivo denominado reality show. O

formato deste programa sugere que tem como fundamento o real, em que os

acontecimentos nele relatados são frutos da realidade e aqueles que compõem o

programa não fazem parte de um enredo ficcional, como acontece nas novelas

(outro formato de programa televisivo).

Renato20

se mantém atualizado a respeito dos desdobramentos das histórias de novela, mas prefere os reality shows. Para ele as novelas perderam a verossimilhança, representam um mundo de fantasia, não condinzente com sua expectativa de ver “a vida real” representada na televisão. Ele associa a “vida real” a programas jornalísticos que reportam

18

Por canais pagos, entende-se os canais que são visualizados somente por um pagamento mensal de uma assinatura a empresas que fornecem serviço de televisão por assinatura, ou também chamado TV paga. Como exemplo, temos a NET, Embratel,Sky.

19 O que já explicitei em tópico anterior.

20 Sujeito da pesquisa de Hamburger, 2005.

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casos de violência ocorridos em situações urbanas similares às suas (HAMBURGER, 2005, p. 69).

Para Borges R., (2008) em todas as formas de mídia, principalmente nos

jornais, no cinema, no rádio e na televisão, costuma-se empregar uma diferenciação

entre o ficcional e o real. Nos jornais, a predominância seria do real; no cinema, do

ficcional; no rádio, do real, etc. E a televisão é uma mistura entre esses dois campos,

destacando-se as novelas para o campo do ficcional e o jornalismo para o campo do

real. E, provavelmente, o que une o real e o ficcional seriam os reality shows. O

ficcional dentro dos reality shows é que a realidade não é absoluta, ela é sempre

discursiva.

Desta forma, Borges R. (2008) considera que:

Dirigir o nosso olhar à leitura dos programas de TV é operacionalizar, sempre, no campo do dito que implica um não-dito. Um não-dito que para a linguagem é nuclear, onde questões como efeito de realidade, verdade e objetividade são sempre postas, tentando eliminar os processos de negociação da notícia e de outros relatos enquanto discursos. O peso dessa relação se reflete na tentativa diária do jornalismo de agenciar as suas narrativas de tal modo que sejam particularizadas e legitimadas a partir de uma dada organização de enunciados considerados “verdadeiros” e “reais”. Os profissionais da comunicação aprendem a ver a linguagem como a serva das significações (provisórias), mas ela não o é. Se o escritor for designado como o profissional da insegurança, podemos, da mesma maneira, assim definir os profissionais da mídia, articuladores de textos, visto que o que se produz, a despeito da intenção programática dos veículos de comunicação, é também resultado do que nos ultrapassa e engloba (p.58-59).

Segundo Umberto Eco (2006), a TV, em seus primórdios, tentava a todo

custo esconder seus significantes, demonstrar que era uma lente que mostrava a

máxima expressão da verdade. Todos os equipamentos, como câmeras, microfones,

e tudo que denunciava a construção da realidade que a TV faz nunca deveriam ser

vistos pelos telespectadores. Era a Paleo TV. Já a Neo TV, pelo contrário, torna

públicos seus discursos, a fim de legitimá-los. Porém, há duas características que

diferenciam a televisão de qualquer outro discurso midiático. A primeira delas é a

transmissão ao vivo. Não há qualquer discurso que se assemelhe mais à realidade,

pois imita não somente nossa noção de espaço, mas também nossa noção de

tempo. A segunda é a grade de programação. A televisão cria um padrão de

repetição de signos (de segunda-feira à sexta-feira, aos sábados, aos domingos,

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enfim, todos os dias) que se torna uma estrutura em nossas mentes, criando um

hábito que nos envolve.

O impacto da televisão em nós está em sua capacidade de criação de um

laço social. Nossas famílias, religiões e espaço escolar não direcionam nossos

valores e comportamentos como no passado. As mídias, principalmente a TV,

cumprem esse papel. A narrativa televisiva é grande parte de nossa narrativa como

sociedade. Na televisão, a busca do real está no simbólico e no imaginário, ou seja,

na representação.

No entanto, faz-se a seguinte ressalva: as imagens em tempo real,

exibidas pelo reality show, oferecem um registro poderoso das ações temporais e

acontecimentos reais, concretos e materiais, mas o que é capturado tem seus

limites. Essas imagens são manipuladas eletronicamente, o que acaba por revelar

um caráter fortemente ideológico. Os registros são, portanto, representações do

mundo real. Suas interpretações são as mais variadas possíveis, pois cada indivíduo

e cada grupo social têm sua leitura do mundo e isso irá refletir na forma de produzir,

ver e receber as imagens veiculadas pelo programa Big Brother21 Brasil (BBB).

Conforme Guedes (1996), o conceito de ideologia pode ser escorregadio

e inútil para alguns. Entretanto, acredito que o tratamento feito por Stuart Hall,

baseado nas leituras de Gramsci, tenha certo sentido aqui. Hall, em sua discussão

quanto à ideologia relacionada aos estudos das mídias, as entende como um

fenômeno discursivo, avaliada em termos da articulação de diferentes elementos (p.

39), sendo estes além dos explicitados por Marx e Engels em Ideologia Alemã, ou

seja, “a posição de classe e os fatores materiais são necessários, mas não

suficientes como pontos de partida para a análise de qualquer formação ideológica”

(p.38).

Com relação aos meios de comunicação, Hall argumenta que estes formam a principal instituição ideológica do capitalismo contemporâneo, isto é, os

21

A expressão Big Brother foi criada pelo escritor britânico George Orwell em seu livro 1984, lançado em 1949. Esta obra realiza uma crítica às perversões realizadas pelos regimes totalitários tanto fascistas quanto comunistas. O autor desenvolveu uma ficção baseada num mundo extremamente conservador e vigilante, ou seja, os cidadãos eram observados vinte e quatro horas por dia por câmeras (as chamadas teletelas), e tinham todos os aspectos de sua vida (relacionamentos, dinheiro, conversas e a linguagem) submetidos à vontade do Grande Irmão (um líder não-personificado do governo).

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sistemas de comunicação formam o principal espaço, no qual o consenso dominante é forjado. Assim, para Hall, os sistemas de comunicação são o principal domínio simbólico através do qual a fabricação de consenso é forjada. Os meios de comunicação operam através da produção de códigos hegemônicos que cimentam o social. Os códigos que representam o real são coletados desde o limitado campo dos discursos dominantes até uma restrita série de explicações sociais. Os códigos preferenciais alcançam seu efeito ideológico aparecendo como naturais. (...) A mídia parece, portanto, refletir a realidade enquanto na verdade está construindo esta realidade (p.39-40).

Para Durham (1984), a análise das ideologias é um dos temas centrais da

Sociologia e da Ciência Política, entretanto para a Antropologia há certa dificuldade

em abordagem deste conceito. Acredita-se que pelo fato do conceito ser inicialmente

atrelado a um reducionismo marxista, em que a ideologia é “uma representação do

mundo a partir do ponto de vista da classe dominante, que detém os meios de

produção e, segundo, a idéia de que esta representação do mundo é

necessariamente distorcida porque representa os interesses da classe dominante”

(GUEDES, 1996, p.36).

Com efeito, presa a um trabalho de campo no qual ação e representação aparecem indissoluvelmente ligadas, numa certa concepção de prática significante, a Antropologia não desenvolveu nenhuma tendência a opor formalmente „condições reais de existência‟ às representações, nem perceber estas como manifestações distorcidas daquelas. Dentro da orientação antropológica, é impossível relegar o universo simbólico, em sua totalidade, à instância da superestrutura, uma vez que ele é indissociável de qualquer prática social, inclusive a produção material, e é instrumento fundamental para sua decifração (DURHAM, 1984, p. 75).

A aproximação da Antropologia ao conceito de ideologia foi por meio da

perspectiva de Gramsci. Isto se deveu pelo fato de o mesmo ter preocupado mais

profundamente com os fenômenos culturais. Os fenômenos culturais são abordados

através de uma multiplicidade de termos e conceitos como visão de mundo, filosofia,

religião, senso comum, bom senso, cujas conotações e limites são imprecisos (p.

81).

O que se pergunta, face à ideologia, não é se são falsas ou verdadeiras, ou sequer que deformações apresentam em relação às condições reais de existência, mas qual sua eficácia política, seu poder de mobilização e seu grau de correspondência com as potencialidades de organização e capacidade de confronto das classes fundamentais – sua organicidade. (...) Toda a questão da ideologia propriamente dita, como da cultura, da religião, da filosofia e do senso comum, está voltada para o reconhecimento da importância das idéias, das concepções, das representações para a construção de normas de ação, isto é, implicitamente pelos menos, na vinculação da conduta com o universo simbólico. É isso que aproxima a

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visão gramsciana de ideologia de uma concepção antropológica de cultura: essa vinculação das idéias, representações e categorias com o vivido humano, sua existência nas próprias práticas sociais, sua relação com normas de conduta. E é por isso que muitos dos trechos de Gramsci apresentam inegável sabor antropológico (p. 81-82).

Ainda sob a análise de Durham (1984), qualquer que seja a concepção

que se tenha do conceito de ideologia, todas elas possuem em comum pelo menos

a admissão de que os fenômenos ideológicos dizem respeito ao universo simbólico.

E a dimensão simbólica constitutiva da ação humana pode ser verbalizada no

discurso, cristalizada no mito, no rito, no dogma ou incorporada aos objetos, aos

gestos, à postura corporal e está sempre presente em qualquer prática social.

Tentando trazer esta análise de Hall e Durham para o objeto de pesquisa

aqui proposto, podemos dizer que a representação (ou imagens) de um grupo

diversificado, particularmente no campo da sexualidade, pode ser vista como

forjando uma articulação entre o discurso da diversidade sexual (pois, o BBB 10

constituiu-se de três integrantes homossexuais) e/ou da “pluralidade de identidades”

com o discurso da normatividade, com elementos conservadores ligados a

expressões lineares de masculinidades, feminilidades, machismos, sexismos e

outras intolerâncias a deslocamentos de gênero e sexualidade.

Seguindo a perspectiva de Foucault (1986) quanto ao interesse em

indagar sobre o sujeito e grupos sociais, parti do seu conceito de discurso que

concebe a linguagem, as significações construídas, os sentidos como atos muito

concretos. “Os enunciados de um discurso são sempre históricos e como tal devem

ser analisados: são sempre um acontecimento, que nem a língua nem o sentido

podem esgotar inteiramente” (p.32).

E tudo está imerso em relações de poder e saber, que se implicam mutuamente, ou seja, enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e ver constituem práticas sociais por definição permanentemente presas, amarradas às relações de poder, que as supõem e as atualizam. Nesse sentido, o discurso ultrapassa a simples referência a coisas, existe para além da mera utilização de letras, palavras e frases, não pode ser entendido como um fenômeno de mera expressão de algo: apresenta regularidades intrínsecas a si mesmo, através das quais é possível definir uma rede conceitual que lhe é própria. As regras de formação dos conceitos não residem na mentalidade nem na consciência dos indivíduos, pelo contrário, elas estão no próprio discurso e se impõem a todos aqueles que falam ou tentam falar dentro de um determinado campo (p. 70).

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Conforme Laclau (apud HUYSEN & HOLANDA, 1991), cada ato social

tem um significado e é constituído na forma de sequências discursivas. Logo, as

práticas sociais se constituem discursivamente. Para Laclau, a sociedade seria

assim entendida “como um vasto tecido argumentativo no qual a humanidade

constrói sua própria realidade” (p. 146).

O interesse da Antropologia, ao fazer referência ao discurso, é tentar

relacionar as práticas e o fazer (comportamento dos sujeitos) com o que se fala do

sujeito, porém, essa divisão não pode ser encarada como uma diferenciação binária;

é apenas uma forma de aproximar dois atos concretos: o falar e o fazer.

Essas considerações iniciais podem trazer certa ambivalência quanto ao

conteúdo deste programa de TV, sendo este aspecto o que realmente importa para

o desenvolvimento da análise que se propõe a posteriori. Tendo como base as

imagens veiculadas pelo canal Globo e pelas notícias inscritas no sítio oficial 22 do

programa, tratarei de alguns aspectos que mais me instigaram diante ao slogan da

sua chamada23, para que os telespectadores acompanhassem o desenrolar do

programa: o BBB da diversidade. Ora, quero salientar que as construções dos

discursos do BBB 10 não apenas produziram deslocamentos das normas vigentes

ao evocar as formas plurais de se viver a sexualidade (com a tribo dos “coloridos”24)

e também a fluidez de gênero (sendo o brother Eliéser considerado um “tipo peculiar

de hétero”), mas, muitas vezes, reforçaram concepções tradicionais e muitas vezes,

trouxeram estereótipos negativos de gays25, mulheres e homens.

22

http://bbb.globo.com/BBB10

23 Chamada do BBB 10 no intervalo da novela Viver a Vida em 12 de janeiro de 2010: “É hoje, é esta

noite, é daqui a pouco, é pra já, é dez. É o Big Brother Brasil 10 que estréia com um timaço de gatos, gatas e outros mimos. (http://www.youtube.com/watch?v=l9rd0nr-t5s&NR=1).

24 A Tribo dos Coloridos é formada pelo estudante Sérgio, o maquiador Dicésar e a jornalista

Angélica. Homossexuais assumidos defendem com inteligência e alto-astral suas convicções (http://bbb.globo.com/BBB10/).

25 O termo gay nesta dissertação foi usado como categoria êmica, sabe-se que a utilização desta

palavra pode universalizar experiências diversas. Entretanto, preferiu-se a utilização deste termo a homossexuais masculinos, drag queen e lésbica, porque os sujeitos não reivindicaram suas identidades particulares ou próprias, mas se viram como gays, e, além disso, eles foram tomados pela produção do programa como um conjunto uniforme, os coloridos.

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Todavia, antes de enveredar para o objeto de pesquisa quero expressar o

caminho da mesma.

A PESQUISA - NO MEIO DO CAMINHO NÃO TINHA SOMENTE UMA PEDRA, MAS VÁRIAS...

No meio do caminho tinha uma pedra Tinha uma pedra no meio do caminho

Tinha uma pedra No meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento Na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho Tinha uma pedra

Tinha uma pedra no meio do caminho No meio do caminho tinha uma pedra.

(No meio do caminho - Carlos Drummond de Andrade)

Na abordagem antropológica dos fenômenos culturais, parte-se das

práticas sociais concretas e das representações formuladas pelos grupos para se

investigar o modo como os sistemas simbólicos são elaborados. Ora, a ação e a

representação estão indissoluvelmente ligadas. Como elucidou Durham (1984), a

Antropologia não desenvolveu nenhuma tendência a opor formalmente condições

reais de existência às representações, nem perceber estas como manifestações

distorcidas daquelas. Assim sendo, ter como princípio a realização de interpretações

sobre as representações é um recurso teórico e metodológico fundamental para a

decifração da prática social.

Como já nos colocava Durkheim (1970), em seu artigo “Representações

Individuais e Representações Coletivas”, as representações coletivas são a trama da

vida social. O que se deve salientar nas abordagens do autor é sua ênfase na

primazia do pensamento social em relação ao pensamento individual. A vida

representativa tal como a vida coletiva só podia existir no todo formado por reunião

de indivíduos. Quanto às representações coletivas, Durkheim afirma que elas:

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(...) são exteriores com relação às individuais, é porque não derivam dos indivíduos considerados isoladamente, mas de sua cooperação, o que é bastante diferente. Naturalmente na elaboração do resultado comum, cada qual traz a sua quota-parte; mas os sentimentos privados apenas se tornam sociais pela sua combinação, sob a ação de forças sui generis, que a associação desenvolve; em conseqüência dessas combinações e das alterações mútuas que delas decorrem, eles se transformam em outra coisa (p.39).

Entretanto, este conceito tem o seu valor não somente para as Ciências

Sociais, mas também para a Psicologia26. Nesta matriz disciplinar, Moscovici propõe

que a realidade é constituída através dos fenômenos da representação, bem como

pelos sujeitos sociais, reformulando assim o conceito durkheimiano. A

representação, portanto, não reflete, pura e simplesmente, a realidade, sendo antes

uma construção desta que ultrapassa cada indivíduo e que é exterior a cada

indivíduo. (LEAL, 2003, p. 10).

Por fim, a perspectiva que melhor se encaixa nesta dissertação é trazida

por Jodelet (2001). Ela afirma que uma representação social é uma forma de

conhecimento.

As representações sociais são consideradas como uma forma de construção social da realidade cuja mediação atravessa e constitui as práticas através das quais se expressam. Para Denise Jodelet, um pressuposto fundamental do estudo das representações sociais é o da interrelação de uma correspondência entre as formas de organização e de comunicação sociais e das modalidades de pensamento social, vistas sob o ângulo de suas categorias, de suas operações e de sua lógica. Assim, quer seja no rumor das conversas que fundamentam o senso comum, na literatura, no discurso científico, em tudo que é impresso ou falado, podemos encontrar representações sociais que instituem o mundo em suas clivagens valorativas, nos recortes significativos que definem as categorias de percepção, análise e definição do social (SWAIN, 2001, p. 13).

O estudo das representações sociais diz respeito ao entendimento de

como os indivíduos se percebem na relação com a sociedade mais ampla, como se

sentem frente à realidade.

No caso aqui proposto, a interpretação das representações tinha como

princípio, isto é, o projeto da dissertação, partir de uma análise da recepção da

décima edição do BBB. Na proposta, tinha-se em mente fazer uma observação

26

Não me proponho a fazer um tratado sobre o conceito de representação para a Psicologia, desta forma, dialoguei com textos que faziam menção ao termo – representações sociais – associado com pesquisas antropológicas. Sendo assim, justifico o uso do apud neste item.

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direta da conduta de um grupo familiar no momento da transmissão do programa.

Além da observação participante, os discursos seriam obtidos por meio de

entrevistas orientadas por um questionário, além de uma análise conjunta dos

comentários de outras pessoas que acompanhavam a décima edição por meio dos

blogs e do sítio oficial do BBB.

Importava-se em adotar a perspectiva da observação participante, por ter

o cotidiano como um lugar privilegiado para a análise do processo de recepção. A

etnografia da recepção se mostrou importante inicialmente, pela influência que a

leitura de Hamburger (2005) tinha feito para tornar o BBB meu objeto de pesquisa.

Na leitura de sua obra, percebeu-se que a televisão é um instrumento divulgador de

informações e imagens. Sendo que estas informações assim como as imagens

influenciam e estimulam, positiva ou negativamente, comportamentos coletivos e

individuais. Além disso, suas considerações mostravam o quanto seria relevante

haver estudos de recepção:

A chamada “etnografia da recepção” da televisão seria uma alternativa capaz de fornecer uma descrição compreensiva sobre o que os telespectadores vêem em determinados programas. A observação participante em contextos de recepção seria capaz de ir além do que espectadores falam ou escrevem quando perguntados, permitindo a abordagem de como a TV, ou determinados programas, se insere no cotidiano das pessoas que assistem. Estudiosos enfatizam a importância dessa prática etnográfica em pequenos grupos, em famílias ou individualmente. Também sugerem que a pesquisa não deve se limitar a questionários e outras técnicas quantificáveis, devendo envolver a observação de campo e a imersão do pesquisador no universo pesquisado (p. 17).

Foi por meio desta sugestão que veio a ideia de fazer o grupo focal de

análise: a família. Mesmo que a família contemporânea tenha passado por

mudanças em muitas dimensões, sejam elas intergeracionais e de intimidade, ela

continua tendo uma grande repercussão para o desenvolvimento da personalidade

da pessoa (PETRINI et al, 2009, p.1).

A abordagem relacional entende a família como relação social com

referência simbólica e intencional que conecta sujeitos sociais na medida em que

atualiza ou gera um vínculo entre eles (DONATI, 2008 apud PETRINI et al, 2009, p.

2).

Conforme consideram os autores acima, nessa proposta inicial de

pesquisa, a família foi considerada como qualquer convivência entre indivíduos sob

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a mesma unidade habitacional, sem outras especificações além da existência de

algum tipo de afetividade que os conectem.

Afinal de contas, o critério domiciliar que identifica a família com o conjunto de pessoas que compartilham uma unidade habitacional, utilizado pelo IBGE, também é encontrado nos programas governamentais que envolvem a família, bem como em diversos estudos de caráter científico (idem, p. 8).

Entretanto, não foi possível utilizar a observação direta da conduta de um

grupo familiar no momento da transmissão da décima edição do BBB, como um

espaço privilegiado para a análise do processo de recepção. Desde o mês de

novembro de 2009, foram feitas várias abordagens a dois grupos familiares para

organizar a melhor forma de uma “intrusa” participar do cotidiano de uma família em

seu momento de lazer que é o assistir à televisão.

Contudo, nos primeiros dias de janeiro de 2010, próximo ao início do

programa (dia 12 de janeiro de 2010), os dois grupos familiares27 esquivaram-se de

minhas visitas, sendo que um deles teve como justificativa férias e distanciamento,

portanto, da residência, e, o outro, porque sentia uma certa desconfiança em ter uma

pessoa em sua casa ouvindo sua torcida aclamada com palavrões diante o

desenrolar do programa, além de receber uma visita um tanto quanto tarde, já que o

programa iniciava-se por volta das vinte e duas horas e, algumas vezes, terminava à

meia-noite.

A minha busca – ao final trágica! – em ter uma digna observação

participante, com a “coleta de um bom material, isto é, dados etnográficos para que

permitissem um diálogo mais intenso e mais profícuo com as teorias conhecidas,

pois daí certamente nasceria novas teorias” (DAMATTA, 1978, p. 26), acabou antes

de começar, pois houve a indiferença e medo do informante com a pesquisadora;

não aconteceu, portanto, a necessária empatia correndo lado a lado para a obtenção

dos dados.

27

Foram escolhidos dois grupos familiares, mais por uma questão de conseguir acompanhar cronologicamente os discursos de cada um ao longo dos três meses. Ao propor dois grupos seria também uma forma de evitar a permanência em demasia em apenas uma residência. Apesar de ter em mente que poderia haver um problema de representatividade nesta amostra tão pequena para a interpretação dos dados, o que seria sanado com o acompanhamento das discussões dos blogs e seus intermináveis comentários (às vezes, com mais de 200 posts) de diversas pessoas que se interessavam pelo programa e gostavam de acompanhar as discussões a respeito do que acontecia no cotidiano dos participantes do BBB.

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E com isso quero simplesmente dizer que talvez, mas do que qualquer outra matéria devotada ao estudo do Homem, a Antropologia é aquela onde necessariamente se estabelece uma ponte entre dois universos (ou subuniversos) de significação, e tal ponte ou mediação é realizada com um mínimo de aparato institucional ou de instrumentos de mediação. Vale dizer, de modo artesanal e paciente, dependendo essencialmente de humores, temperamentos, fobias e todos os outros ingredientes das pessoas e do contato humano (p. 27).

No entanto, mesmo a partir do sentimento de fracasso diante uma

antropologia tradicional, não desisti do meu objeto e da minha pesquisa; apenas

reformulei algumas ideias. O mesmo tendo acontecido com Parreiras (2008):

Iniciei esta pesquisa com intenções mais amplas: fazer uma etnografia de locais GLS na internet, tais como, blogs, flogs (fotologs – diários de fotos), homepages e programas de relacionamento. (...) Mas, o intento inicial logo se mostrou inviável devido à infinidade de sites relacionados em tal classificação. Ao colocar, por exemplo, a palavra GLS em uma ferramenta de busca (www.google.com.br) apareceram cerca de 11 milhões e 200 mil entradas. Devido à enorme quantidade de entradas para a palavra, descartei qualquer seleção através de ferramentas de busca. No início desta investigação havia deixado claro meu interesse por um programa de relacionamentos (chamado por alguns especialistas em internet de programas de redes sociasi) que vinha sendo bastante utilizado pelos internautas brasileiros: O Orkut (www.orkut.com). É importante, entretanto, ressaltar que o próprio Orkut e as conversas com seus usuários acabaram me conduzindo a outros sites e locais intitulados GLS, entre os quais eu destacaria o site Mix Brasil (www.mixbrasil.com.br) – utilizado como fonte de informações, notícias e eventos – e os sites de encontros Disponível.com (www.disponivel.com) e Man Hunt (www.manhunt.net). Devido ao surgimento de situações inesperadas – e aqui cabe bem o apontamento de Malinowski (1990) a respeito dos imponderáveis que surgem durante a pesquisa de campo – optei por concentrar a observação em algumas comunidades “Gays, Lésbicas e Bi” do Orkut e, posteriormente, em apenas uma destas comunidades: a Eper (p. 4).

Mesmo já tendo alguns imponderáveis ocorridos durante a minha

pesquisa, outros também aconteceram após a Qualificação em 2010. Houveram

vários questionamentos quanto a alguns posicionamentos teóricos, por exemplo, a

respeito da teoria de gênero. Inicialmente, considerei que havia apenas reafirmações

de convenções formais de gênero, como a manutenção das sisters vinculadas ao

mercado do sexo, ou seja, as expectativas que existiam da participação das

mulheres no BBB e os consequentes convites para posarem nua na revista Playboy,

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a fragilidade e a pureza28, o enfoque na afetividade e a sobreposição dos

sentimentos à razão29. E os brothers, considerei que a produção do programa

somente os identificava com os elementos ligados à racionalidade, à negação de ser

feminino, de não ser dócil, dependente ou submisso, além do discurso da essência

masculina ligada ao trabalho, à produção e à praticidade.

No entanto, em muitas apresentações de dados quanto ao objeto de

pesquisa, a banca da Qualificação30 verificou que não existiam apenas formulações

e reformulações de um perfil31, mas possíveis deslocamentos; no caso de Tessália

por sobrepor a racionalidade aos sentimentos, quando propôs aliar-se

estrategicamente a Dourado para manter-se na casa32; quanto aos homens, Eliéser

em suas performances ao vestir-se com elementos considerados femininos, ao

chorar e expressar seus sentimentos amorosos por Cláudia (Cacau)33.

O interessante é que o processo de compreensão do objeto de pesquisa

após o exame de Qualificação ocorreu não somente comigo, mas também tive o

contato, por meio de leituras sugeridas, com outra experiência em que isso também

ocorreu como a de Borges L. (2008):

Ao iniciar a trajetória de construção desta tese, acreditava que o foco do meu objeto de pesquisa incidia sobre o fenômeno da invisibilidade lésbica. Por mais que as análises e o meu material atestassem para uma profunda alteração simbólica e do lugar de gays e lésbicas nas sociedades contemporâneas, especialmente ocorridas desde a última década do século XX, continuei por algum tempo sem conseguir “enxergar” o que o meu material de campo me contava. Informada por textos que enfatizavam a omissão e a invisibilidade do tema lesbianidade em diversos campos de

28

Perfil (neste caso perfil é o resumo feito pela edição do programa das características pessoais e/ou da biografia) de Fernanda – tímida e religiosa, a cirurgiã dentista afirma que não tem intenção de ficar com ninguém durante sua passagem no BBB e que sua maior companhia no programa será a Bíblia. 29

Perfil de Lia (Eliane) – E não só nas festas ela promete agitar o jogo. “Vou tentar domar um pouco meu gênio, sou impaciente”, confessa. “Sou marrenta, sou emotiva, sou chorosa, mas não aguento frescura. Nem em mulher, nem em homem. Em homem, então, pelo amor de Deus!”, ressalta a paulista de personalidade forte. 30

Agradeço aos comentários da professora Eliane Gonçalves e Roberto Cunha Alves de Lima no exame de Qualificação que me permitiram pensar para além das linearidades, ou seja, os deslocamentos que existiam nos dados da pesquisa. 31

Neste caso, perfil ou essência faz parte de uma abordagem de interpretação do outro, por meio de estereótipos - estes talvez sejam, antes de qualquer coisa, uma forma de simplificarmos a representação do outro, ou seja, um recurso do cotidiano. Com o auxílio de Nunan (2003), o conceito de estereótipo pode ser entendido como “um comportamento funcional e adaptativo, pois com frequência é uma forma de simplificar e agilizar nossa visão de mundo, julgando pessoas ou situações em termos de categorias” (p. 61). 32

Sobre esses deslocamentos de gênero, maiores detalhes no Capítulo 2. 33

Sobre esse deslocamento de gênero, maiores detalhes no Capítulo 3.

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produção de conhecimento, inclusive a mídia, insistia em focalizar o aspecto da invisibilidade. Tive que empreender o difícil movimento de afastamento do objeto para poder entender que este não era o fulcro do interesse e conseguir abordá-lo com um outro olhar e, assim, reformular as perguntas de pesquisa (p. 136).

Além disso, também foi percebido que a maioria das minhas análises

cercava-se de material sobre a produção do programa e não da recepção ao

mesmo. O que me fez mudar mais uma vez de foco, ou seja, decidi que deveria

diminuir o meu número de arquivos analisados, pois a pesquisa seria bastante difícil

com tantas informações do programa (assistindo todos os dias), dos blogs, do sítio

oficial, além de colher todas essas informações quando fosse partir para a análise

dos mesmos seria inconcebível dentro do prazo de um ano, pois se sabe que o

mestrado tem duração de dois anos, sendo que no primeiro ano fiz os meus contatos

iniciais com a teoria e o objeto de pesquisa e, no segundo, seria a efetiva análise

dos dados. Logo, os arquivos escolhidos que estão nesta dissertação são as

anotações a respeito das imagens colhidas da décima edição do BBB em meu diário

de campo, além das notícias do sítio oficial (http://bbb.globo.com/BBB10).

Ao final de tudo, escolhi não apenas tratar de gênero34, mas também a

respeito da sexualidade. O BBB 10 foi considerado o BBB da diversidade, pois tinha

a maior quantidade de gays em uma edição. O que o diferenciava das outras

edições, mesmo que o diretor do programa Boninho tenha afirmado que em todas as

edições existiram participantes homossexuais.

Já está confirmado que o BBB10 terá ao menos um gay, uma lésbica e uma drag queen. Mas o diretor Boninho fez questão de deixar claro que os homossexuais não são exclusividade do BBB6 e do BBB10. Acontece que muitos deles não se assumiram. Perguntado sobre os gays desta edição, o diretor afirmou: “tivemos em todos, mas alguns ficaram no armário!” O homossexual mais famoso do BBB é Jean Willis, que assumiu e venceu o BBB5. Além dele, apenas André (BBB1) e o médico Marcelo (BBB8) contaram que eram gays. Já quem são os outros da lista, fica a cargo do público especular… (http://contigo.abril.com.br/).

34 A intenção inicial era falar sobre as concepções de feminilidades e de masculinidade em todas as edições realizadas do programa desde 2002 até 2010, tendo um último capítulo falando sobre os casais (conforme o dicionário Aurélio – par composto por homem e mulher) heterossexuais que se formaram. As análises teriam como acervo: as anotações feitas no diário de campo da décima edição do programa, além do blog oficial do BBB 10 – www.bbb.globo.com, juntamente com os comentários dos telespectadores dentro de outros blogs escolhidos, tais como: De Cara para Lua – http://decarapralua.zip.net – Blog da torcida - www.bbb.globo.com, Patrícia Kogut - http://oglobo.globo.com/cultura/kogut e Tevescópio - http://tevescopio.blogger.com.br.

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Sendo assim, a análise restringiu-se a uma edição e com duas

interseções: gênero e sexualidade; além do acervo de pesquisa também ter-se

reduzido para as anotações do diário de campo e das notícias veiculadas pelo sítio

oficial do programa, portanto, dados associados à produção. O que se coloca como

possível continuidade a respeito deste objeto, talvez seja tudo o que eu descrevi e

que não pude realizar.

Nenhuma pesquisa é totalmente controlável, com início, meio e fim previsíveis. A pesquisa é um processo em que é impossível prever todas as etapas. O pesquisador está sempre em tensão porque sabe que seu conhecimento é parcial e limitado – o “possível” para ele (GOLDENBERG, 2004, p.14).

No próximo tópico, demonstro como construí a pesquisa, mesclando os

atos de ver, lazer (entretenimento), realização do diário de campo e a posterior

análise dos dados, ou seja, os questionamentos.

Assistindo à TV e construindo uma pesquisa

Mesmo sendo pesquisadora da sociedade ou acadêmica das Ciências

Sociais que se encontra num nicho restrito da sociedade brasileira, não me coloco à

parte do que é vivido pela maioria da população brasileira, ou seja, também assisto à

televisão.

Os programas de televisão são produtos culturais com um alcance

considerável. Segundo dados do IBGE35, em 2008, no Brasil, 95,1% dos domicílios

particulares permanentes possuíam televisão, seja ela a cores ou preto e branco.

Isso quer dizer que, dos aproximadamente 56 milhões de domicílios particulares

permanentes, quase 53 milhões possuem o aparelho de TV. Podemos perceber,

segundo os dados do IBGE, que, dentre os bens duráveis e serviços, a televisão

ocupa o terceiro lugar, atrás apenas da iluminação como serviço, porém, quanto a

35

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2008.

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bem durável, ela ocupa o segundo lugar, atrás apenas do fogão e ganhando até

mesmo da geladeira. Conclui-se, portanto, que a presença desse equipamento

eletrônico é algo quase “fundamental” no ambiente doméstico.

Diferentemente de países europeus, como a França, no Brasil, assistir televisão é um hábito presente no dia-a-dia e uma das referências mais constantes nas abordagens sobre um país atravessado por tensões e contradições. Segundo Eugênio Bucci (1996,p.16) “foi a televisão que forneceu ao brasileiro sua auto-imagem a partir dos anos 70. Não foi o cinema, a literatura, não foi a imprensa, nem o futebol, nem a religião, foi a TV” (BORGES, L., 2008, p.54).

Em acordo com as colocações de Hamburger (2005) e Borges L. (2008),

ao afirmarem que a telenovela é, sem dúvida, parte do cotidiano do povo brasileiro

faço um adendo: quero afirmar que o Big Brother Brasil também o faz (vide notícias

da audiência de alguns momentos do programa no Anexo C). E, portanto, instiga

igualmente discussões e comentários sobre os temas que desenvolve. Na época em

que acontece o programa, constantemente se ouvem comentários, seja em locais de

trabalho, filas de bancos, transporte público, conversas de bares, atualmente nos

trending topics do twitter, em praticamente todos os espaços de convivência social

da sociedade brasileira há discussões de telespectadoras/es que acompanham,

torcem36 e se envolvem37 com as personagens e suas histórias.

Os telespectadores experimentam a sensação de pertencer a uma certa comunidade imaginária. Telespectadores tomam os personagens e tramas de novela como modelos de comportamento, tipos ideais de comportamento, que compartilham com os outros brasileiros telespectadores (HAMBURGER, 2005, p. 144).

Mesmo que a citação acima tenha como referência o objeto de análise –

as novelas – gênero ficcional de narrativa televisiva que não é o mesmo do Big

Brother Brasil – gênero lúdico (Borges, R., 2008). Em observação nas ruas, filas,

dentro de transporte público, enfim em alguns espaços em que há agrupamentos

humanos, durante a época de exibição do último percebeu-se que ocorria a mesma

experimentação de sensações entre os telespectadores de novelas e do BBB.

36

Para que um participante ora seja eliminado ora fique no jogo. E esta torcida pode ser feita apenas no âmbito da fala, mas também envolve ações como ligações para o programa ou votos pela internet. 37

O envolvimento de algumas pessoas é tamanho que têm suas vidas ameaçadas ao se colocar a favor ou contra um participante, ou causa, ou grupo. Ver notícia em Anexo B.

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É importante frisar, neste momento, portanto, que pelo fato de gostar de

assistir televisão, via-me38 também como uma telespectadora que acompanhava,

torcia e se envolvia com as/os personagens e suas histórias. Sendo assim,

precisava ter todos aqueles cuidados que pesquisadores próximos ao objeto de

pesquisa precisam ter, como bem corrobora Velho (2008):

Não só o grau de familiaridade varia, não é igual a conhecimento, mas pode constituir-se em impedimento se não for relativizado e objeto de reflexão sistemática. Posso estar acostumado, como já disse, com uma certa paisagem social onde a disposição dos atores me é familiar, a hierarquia e a distribuição de poder permitem-me fixar, grosso modo, os indivíduos em categorias mais amplas. No entanto, isto não significa que eu compreenda a lógica de suas relações. O meu conhecimento pode estar seriamente comprometido pela rotina, hábitos, estereótipos. Logo, posso ter um mapa, mas não compreendo necessariamente os princípios e mecanismos que o organizam. O processo de descoberta e análise do que é familiar pode sem dúvida, envolver dificuldades diferentes do que em relação ao que é exótico (p. 128).

Seguindo os pressupostos de Geertz (1989), o texto etnográfico é

construído enquanto uma descrição densa das condições socialmente estabelecidas

da comunicação humana através de códigos culturais. O etnógrafo, deste modo,

inscreve o discurso social, e sua releitura antropológica empresta sentido às teorias

nativas.

Haja vista essa ressalva e tendo como premissa que a narrativa televisiva

é em grande parte a nossa narrativa como sociedade; concebe-se que, na televisão,

38

Coloco o verbo aqui no passado, pois desde o intenso trabalho de campo, com as primeiras análises tendo como interseção gênero e sexualidade e o posterior envolvimento militante em relação aos direitos relacionados para estas questões, não consegui deixar-me envolver pelas novelas, além disso, no início deste ano pela angústia da escrita e leitura de autores para a dissertação também não consegui acompanhar o BBB 11. E, atualmente, o meu apego aos meios de comunicação reserva-se a um canal da TV paga, Discovery Home and Health que fala sobre moda e o acompanhamento de sítios de relacionamento como o Facebook e Twitter. Talvez, essa parte do meu diário de campo assemelha-se ao desconforto de Malinowski, escrito em seu diário de campo (1997) sobre como após algum tempo de convívio há momentos em que queremos nos afastar e nos distanciar para sempre dos nossos colaboradores. “Durante todo aquele dia, senti saudades da civilização. Pensei nos amigos de Melbourne. À noite, no bote, pensamento agradavelmente ambicioso: eu certamente serei um eminente estudioso polonês. Essa será minha última aventura etnológica. Depois disso, dedicar-me-ei à sociologia construtiva: metodologia, economia política etc., e na Polônia posso concretizar minhas ambições melhor do que em qualquer outro lugar. Forte contraste entre meus sonhos com uma vida civilizada e minha vida com os selvagens (MALINOWSKI, 1997, p. 190, grifos meus).

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a busca do real está no simbólico e no imaginário, ou seja, como coloquei

anteriormente na esfera da representação.

Os programas de televisão vendem moda, música e outros produtos.

Nessa pesquisa, considero que os outros produtos são os comportamentos. E esses

comportamentos insistem afirmar, na maior parte dos casos, linearidades entre sexo,

gênero e desejo. Contudo, as linearidades não são absolutas, existem as margens,

os deslocamentos e, talvez, possíveis transgressões. Assim como Beleli (2007)

afirma em sua pesquisa que as imagens remetem a múltiplas interpretações, ou

seja, ora reificam, ora desestabilizam ordens estabelecidas, quero também nessa

pesquisa identificar como os editores do BBB 10 pensam a, e privilegiam formas de,

utilização dessas imagens.

Para compreender como essas imagens foram tratadas como fonte,

esclareço, como foi expresso em item anterior, que o material analisado nesta

dissertação está composto pelas cenas veiculadas pela décima edição do programa

Big Brother Brasil, exibidas pelo Canal Globo, televisão aberta, nos meses de

Janeiro a Abril de 2010, associadas às notícias do sítio oficial do programa

(http://bbb.globo.com/BBB10) e a outros veículos de comunicação que interagem

com as cenas do BBB, como outras notícias que circularam na internet,

contextualizando algumas análises que serão feitas nos próximos capítulos. Como

exemplifica Borges L. (2008), “mídias que também concorrem pela atenção do

telespectador para a história que está sendo desenvolvida na tela” (p.59).

Para se investigar os códigos do programa – a produção – e fazer uma

leitura crítica das imagens, atentei-me, ao realizar a etnografia do BBB 10, para

alguns procedimentos metodológicos, tais como: o olhar, o ouvir e o escrever.

Inicialmente, há de se ponderar sobre as considerações de Cardoso de

Oliveira (2000) para a disciplinarização do olhar e do ouvir. Quer se dizer como

disciplinarização o ato de ter como base a matriz disciplinar construída pela

antropologia – para uma percepção “eficaz”. E, ao final, quando o pesquisador vai

para o ato da escrita, está aí o momento do pensamento exercitar-se de forma mais

cabal, como produtor de um discurso voltado para a construção de uma teoria social.

A maneira de olhar para o programa de televisão – Big Brother Brasil – foi

previamente alterada pelo próprio modo de visualizá-lo, ou seja, devidamente

sensibilizado pelas interseções das teorias de gênero e sexualidade. Além dessas

teorias, pré-estruturarem o olhar e sofisticarem a capacidade de observação, o ouvir

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participa deste instrumental para o desenvolvimento do trabalho antropológico. O

ouvir estruturado é capaz de eliminar todos os ruídos que pareçam insignificantes

para a interpretação do objeto, ou seja, estes ruídos são elementos que, porventura,

não fazem sentido no corpus teórico, ao qual, o pesquisador fora treinado.

Os meus dias de campo alternaram-se entre assistir ao BBB e outros

programas de televisão, anotar dados e fazer leituras sobre os meios de

comunicação, principalmente Thompson (1998), Eco (2006), Hamburger (2005),

sobre imagens Pesavento (1999), Burke (2004); sobre o Big Brother Brasil, Almeida

(2003) e Cruz (2007); sobre gênero e sexualidade, Rubin (1989), Scott (1990), Vale

de Almeida (1995), Butler (2003), Lacombe (2007), Louro (1997, 2008, 2010),

Foucault (1990, 2004), sobre discurso Foucault (1986 e 2010). Houveram outros

estudos que me auxiliaram bastante por também proporem a interpretação dos

meios de comunicação pela interseção desses com gênero e sexualidade, como os

de Beleli (2005 e 2007) e Borges, L. (2008). Toda essa bibliografia me fez perceber

que a apreciação desta temática não é nada banal ou desprovida de substância

empírica. A pesquisadora, ao transformar dados, que nunca são óbvios ou

autoexplicáveis, em categoria analítica, realiza uma importante contribuição para a

construção do conhecimento e interpretação dos sujeitos nas Ciências Sociais.

A dissertação

Depois desta Introdução em que falo sobre meus interesses,

envolvimentos, distanciamentos e questionamentos quanto ao BBB e os discursos

quanto a gênero e sexualidade; quero falar brevemente como se desenvolvem os

capítulos que se seguem. No Capítulo 1, falo sobre a estrutura do programa e

algumas especificidades encontradas no BBB 10, como a seleção dos participantes,

a formação das tribos e a dinâmica do jogo. O Capítulo 2 apresenta a trajetória de

algumas sisters e brothers do BBB 10, em que a partir de suas vivências e

performances percebo-os como sujeitos concretos e passíveis de enfrentamento e

interpretações. No Capítulo 3, exemplifico os desdobramentos de algumas

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42

experiências vividas, citadas no Capítulo 2, que puderam levar-me a pensar que os

discursos trazidos pelo objeto de pesquisa não correspondiam à minha hipótese

inicial. Eles traziam muito mais elementos que, porventura, não trazem respostas

prontas e acabadas.

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43

CAPÍTULO 1 - O QUE É O BIG BROTHER BRASIL?

Por meio das contribuições das dissertações de Almeida (2003) e Cruz

(2007), da página oficial do BBB na internet, algumas outras notícias de jornais on

line e do meu caderno de campo, expresso abaixo o processo histórico de

nascimento e atual sucesso dos reality shows e como se deu a evolução do

programa no Brasil.

Em 1999, o interesse pela vida de pessoas anônimas foi transformado

num reality show por meio da produtora de televisão holandesa chamada TV

Endemol. A ideia partiu do executivo-sócio – John de Mol – da empresa Endemol39,

que tinha o interesse em dar visibilidade, por meio de câmeras ligadas vinte e quatro

horas por dia, à convivência de pessoas anônimas, isto é, comuns, dentro de uma

mesma casa e/ou cenário40.

A partir de 2000, o Big Brother começou a ser exportado para a Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Suíça, Suécia e Bélgica. Atualmente, o programa já conquistou 19 países. Em todos eles, o Big Brother é um sucesso. A partir do começo de 2002, essa febre mundial chega ao Brasil. Transmitido pela Rede Globo, pelo Multishow e pelo Pay Per View, tem duração de nove semanas (CRUZ, 2007, p. 8).

Atualizando os dados de Cruz (2007) na tabela do Anexo A, demonstro

que, partindo do formato da televisão holandesa, existem, atualmente, quarenta e

cinco (45) versões do Big Brother pelo mundo. A maioria dessas versões são

edições nacionais, mas em alguns formatos agregaram-se vários países, como os

da África, dos Bálcãs, Pacífico41 e Escandinávia. No ano de 2011, no Brasil, foi ao ar

a décima-primeira edição, sendo que, atualmente, no sítio oficial do BBB 12, já

existem movimentações da produção para a próxima edição do programa. A

39 A Endemol é resultado da fusão das produtoras de Joop Van Ende e de Johh de Mol. 40

Digo casa e/ou cenário, pois a casa é montada única e exclusivamente para a realização do programa. Após o programa, ela não mais funciona como residência para pessoas, ficando na expectativa por uma nova produção de um novo BBB. Assim sendo, é também um cenário, pois tem como função ser um espaço onde a narrativa do Big Brother se passa. Além disso, simula a arquitetura de uma casa ou residência, para a convivência de um grupo de pessoas. 41

Filmado na Colômbia, esta é uma versão pan-regional com participantes do Chile, Equador e Peru.

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44

manchete da página informa que a seletiva regional encontra-se encerrada, ou seja,

houve uma inovação na seleção para o próximo BBB, no qual as inscrições

acontecerão em duas etapas diferentes: seletiva regional e seletiva nacional.

Continuando sobre o programa original, idealizado por John de Mol, cerca

de quinze pessoas não conhecidas pelo público geral (os telespectadores) assim

como entre elas (os participantes), foram confinadas em uma casa composta por

além de móveis, eletrodomésticos, comida, etc., além de câmeras espalhadas por

todos os cômodos da casa. O confinamento teve a duração de quase três meses e

os integrantes do programa não tinham qualquer acesso a nenhum tipo de mídia ou

informação externa. Na verdade, esse programa também era um jogo, em que o

participante competia por prêmios e atenção do público. Aquele que mais agradasse

ao público receberia a maior recompensa em dinheiro e fama.

Cinco mulheres e quatro homens com idade entre 20 e 44 anos dividem uma casa totalmente isolada do mundo exterior, num subúrbio de Amsterdã, e vigiada 24 horas por dia por duas dúzias de câmeras e 59 microfones espalhados em todos os cantos. O mestre-de-cerimônias Rolf Wouters, alçado instantaneamente a celebridade nacional, convida os espectadores a escolher os que menos lhes agradam. A cada duas semanas, um deles é eliminado do jogo. O último que sobrar terá direito a um prêmio equivalente a 120 000 dólares. Dentro da casa, é proibido ouvir rádio, ler jornais, ver televisão, falar ao telefone ou escutar música e até mesmo usar relógios. O único contato com o mundo exterior é intermediado por uma voz feminina que passa instruções – e carraspanas, se houver quebra de normas (Acervo digital da Veja – edição 1616 – 13/10/1999, p. 64).

A Rede Globo de Televisão, canal 0242, comprou os direitos do Big

Brother no ano 2000, mas não investiu imediatamente na produção da versão

brasileira. Enquanto isso, o empresário-apresentador Silvio Santos, dono da

emissora de televisão SBT, canal 9, lançou em 2001 o programa Casa dos Artistas

que tinha o mesmo formato do Big Brother, apenas com algumas superficiais

modificações, como o sistema de votação e, o fato de reunir participantes famosos

(como o roqueiro Supla, o ator Alexandre Frota e a modelo Mari Alexandre em sua

primeira versão), talvez seja a diferença mais plausível para o formato do programa

Casa dos Artistas em diferença ao Big Brother. Ela rendeu muito ao SBT, tornando-

se um fenômeno de audiência, desbancando o Fantástico e o Domingão do Faustão

42 Número do canal em Goiás.

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45

(no dia em que foi ao ar) e depois novelas e telejornais da Globo, derrubando o seu

monopólio quanto ao topo das audiências.

Essa disputa por audiência rendeu pela primeira vez ao SBT mais de 33

pontos, o que quer dizer, mais de 33 milhões de telespectadores, foi parar na

Justiça, pois representantes da Rede Globo alegaram que a emissora SBT estaria

realizando plágio, como expressa a reportagem da revista VEJA:

O programa do SBT, Casa dos Artistas, é uma gincana em que doze pessoas conhecidas, como o ator Alexandre Frota, o roqueiro Supla e a modelo Mari Alexandre, convivem numa mansão cheia de câmeras. Até aí, muito interessante. O problema é que o Casa dos Artistas é semelhante ao show holandês Big Brother, cujos direitos no Brasil pertencem a Globo desde agosto passado. Durante a semana, os ânimos se acirraram. A mando de seu vice-presidente, Roberto Irineu Marinho, a emissora carioca divulgou uma nota reclamando de pirataria. O SBT rebateu com um comunicado irônico, no qual acusa a Globo de ter ambições monopolistas. “Não satisfeito em derrotar o índice de audiência da TV Globo durante todo o domingo, o SBT cometeu a leviandade, sem pedir as desculpas devidas a esse polar de moralidade e correção que é a TV Globo”, diz o texto divulgado pelo SBT, antes da apontar a avassaladora dominação exercida pela Rede Globo nos meios de comunicação brasileiros. Houve, paralelamente, uma batalha jurídica. Programado para exibição todos os dias, às 21 horas o Casa dos Artistas foi ao ar normalmente por dois dias. Já na quarta-feira 31 não pôde ser veiculado, por causa de uma liminar que previa multa de 200 000 reais por dia em caso de descumprimento. Segundo o despacho do juiz, havia bons indícios de que se tratava de um caso de plágio. Os advogados de Silvio Santos apresentaram sua contestação no dia seguinte. (Acervo digital da Veja – edição 1725 – 7/11/2001, p. 98).

Como reação, a emissora de TV Rede Globo, resolveu investir na

produção do programa Big Brother e, em 2002, foi ao ar a primeira edição. Nesta,

foram convidadas doze pessoas anônimas para passar um período de confinamento

que durou três meses. O prêmio ao vencedor foi de quinhentos mil reais.

O reality show global é um fenômeno de audiência. Pacotes de pay-per-view são oferecidos pela televisão por assinatura e pela internet, proporcionando uma cobertura de 24 horas das câmeras da casa. A audiência do programa mantém-se alta desde sua primeira edição, o que se deve em grande parte às inserções (spots) ao longo da programação da Rede Globo, especialmente no horário nobre; a ação de marketing é complementada por matérias de capa em jornais dirigidos às classes C e D, em revistas de fofocas e na divulgação dos “brothers” e “sisters” em revistas de fotos eróticas, conforme previsto em contrato (BORGES, R., 2008, p.267).

O Big Brother Brasil, durante a sua exibição, nos meses de janeiro a

março, tem transmissão diária na Rede Globo, Canal 12, além de também ser

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exibido em pay-per-view no canal por assinatura Premiere Shows e com flashes no

canal pago Multishow. O pay-per-view dá a possibilidade de o telespectador assistir

ao programa 24 horas por dia e custa, pelo trimestre, em média R$ 130,00 nas

empresas de TV por assinatura Sky, Net e TVA.

1.1 QUEM É QUEM NO BIG BROTHER BRASIL

O Big Brother Brasil não é composto apenas pelos participantes, sejam

eles os brothers ou as sisters, existem outros integrantes de bastidores que definem

a organização, o desenvolvimento e os rumos do programa. E, além disso, há o

público que escolhe os seus “preferidos”, os “heróis” e os “vilões”.

1.1.1 O Big Boss

Em inglês boss significa chefe, assim sendo big boss seria o grande

chefe, ou o chefão, ou mesmo o “poderoso chefão”. O “poderoso chefão” do

programa Big Brother Brasil chama-se José Bonifácio Brasil de Oliveira, mais

conhecido como Boninho, diretor e criador de programas de televisão para a Rede

Globo.

Boninho é paulista, nascido em 4 de novembro de 1961, e é o

responsável por toda a estrutura em que se desenvolve o BBB, desde a sua criação,

ou seja, no processo de classificação dos candidatos de cada edição, até mesmo na

parte do desenvolvimento do programa, auxiliando a equipe para a escolha das

cenas que vão ao ar tanto no canal aberto da Globo, 12, tanto no canal pago,

Multishow.

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47

1.1.2 O apresentador

O jornalista Pedro Bial é natural do Rio de Janeiro e nasceu em 29 de

março de 1958. Em 1980, era correspondente internacional da Rede Globo e ficou

conhecido por suas reportagens de cunho político, como a cobertura de eventos

importantes tais como a Guerra do Golfo, o Colapso da União Soviética e a queda

do Muro de Berlim. A partir de 1990 além de jornalista era apresentador do

programa Fantástico, tendo saído definitivamente do programa em 200743.

Com o bom desempenho, que teve ao ser apresentador do Fantástico,

Pedro Bial foi convidado para apresentar o Big Brother Brasil em 2002 com a atriz

Marisa Orth. Infelizmente, a atriz não demonstrou competência como apresentadora

e, para a maioria dos telespectadores, não apresentava “química” com o jornalista44.

Desde então, Pedro Bial apresenta sozinho o BBB e é uma espécie de narrador,

moderador, torcedor e psicólogo dos participantes.

Pedro Bial desempenha a função de moderador e facilitador. Com seu estilo bastante descontraído, tornou-se um dos elementos decisivos para a aceitação do programa junto ao público. Seu comando, ao mesmo tempo seguro e cordial, é fundamental para o funcionamento do jogo. Lhe cabe o controle do tempo de execução das tarefas da prova do líder, da prova para conquista das estalecas e do anjo. É sua responsabilidade averiguar o cumprimento das regras do programa (CRUZ, 2007, p. 12).

Sendo assim, percebe-se que juntamente com Boninho, Pedro Bial

também é responsável pela edição do programa e os rumos do mesmo.

43

http://pt.wikipedia.org 44 Da Folha Online. “Troféu Santa Clara: Mariza Orth no BBB 1 foi o maior fiasco do ano”. Disponível

em < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u26420.shtml > Acesso em 20 de agosto de 2011.

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1.1.3 Os participantes

O programa consiste no confinamento de um número variável de

participantes. No BBB 1, foram 12, já no BBB 3, 14, no BBB 7, 16, no BBB 9, 18 e no

BBB 10, 17 participantes. Eles são escolhidos pela produção do programa, mas têm

a liberdade de querer entrar na casa/cenário ou não, assim como desistir no meio do

programa.

Todos os participantes estarão dentro da casa do Big Brother por livre e espontânea vontade. Ninguém é obrigado a nada. Se, a qualquer momento, um dos participantes quiser desistir do jogo, poderá deixar a casa. Mas, uma vez fora dela, não poderá voltar. Dependendo do momento em que ocorrer a desistência, podem haver participantes substitutos (Regras do jogo encontradas no sítio oficial do programa – http://bbb.globo.com).

Em todas as edições, ocorreram apenas duas desistências; na primeira foi

o caso do brother Dilson que desistiu do programa na segunda semana45. E, na

segunda, foi o brother Leonardo que ao ficar no confinamento dentro do

confinamento (quarto branco) não suportou a pressão e apertou o botão vermelho

da sirene, sendo desclassificado da tarefa. Consequentemente, “eliminado”46. Além

dessas duas desistências, tem o caso da sister Marielza que saiu da casa/cenário

por causa de problemas de saúde. Ela sofreu um AVC, foi encaminhada ao hospital

e, como não havia uma previsão do seu retorno ao programa, foi substituída por

outro participante47.

Na décima edição, esta que é o nosso objeto de estudo, primeiro

entraram na casa 15 participantes, sendo oito mulheres e sete homens48. Esses

participantes foram inicialmente divididos em cinco tribos de três integrantes:

Sarados (Eliane, Carlos, Cláudia), Cabeças (Elenita, Tessália, Alex), Ligados (Ana

Marcela, Anamara, Michel) e Coloridos (Angélica, Dicésar e Sérgio).

45 http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_participantes_do_Big_Brother_Brasil#cite_note-194 46 http://www.abril.com.br 47 http://www.abril.com.br 48

Dentre estes homens está Dicésar, que também é a drag queen Dimmy Kieer, como o programa proibiu que ele ficasse montado o tempo todo, ou seja, fazendo sua performance de gênero, o coloquei dentro da estatística dos homens.

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49

Na estréia, cinco ex-participantes retornaram à casa/cenário como

padrinhos e madrinhas das tribos: Joseane Oliveira, do BBB 3, era madrinha dos

Belos; Marcelo Dourado, do BBB 4, era padrinho dos Sarados; Rafael Valente, do

BBB 6, era padrinho dos Cabeças; Fani Pacheco, do BBB 7, era madrinha dos

“Coloridos” e, Natália Casassola, do BBB 8, era madrinha dos Ligados.

No dia da estréia, houve uma prova de resistência que dava direito ao

padrinho ou madrinha da tribo vencedora retornar como participante e primeiro

“líder” da temporada do BBB 10. A vencedora da competição foi Fernanda,

garantindo então a participação de Joseane, já que esta era sua madrinha. Ela, por

sua vez, teria de escolher entre Rafael e Marcelo Dourado (padrinhos), pois deveria

entrar uma mulher e um homem para fechar o grupo de participantes do BBB 10.

Marcelo Dourado foi o escolhido de Joseane (padrinho dos Sarados).

Abaixo, está uma tabela com os nomes, idades, profissões e naturalidade

dos participantes do BBB 10. Percebe-se que quanto à regionalidade não há tanta

diversidade. A maioria faz parte do eixo Rio – São Paulo; em segundo lugar, a

região Sul, em terceiro, a região Nordeste e, por último, a região Centro-Oeste.

Nome completo Idade com que competiu

Idade atual

Profissão Naturalidade Eliminação

Alex Fernandes Vilanova 36 37 Advogado São Paulo 4º

Ana Angélica Martins

Marques (Morango)

24 25 Jornalista Minas

Gerais

Ana Marcela Santos

Pereira Alves

25 26 Estudante Pernambuco 2º

Anamara Cristiane de

Brito Barreira

25 26 Policial Militar Bahia 12º

Carlos Eduardo de

Nascimento Parga (Cadu)

24 25 Personal Trainer Rio de

Janeiro

Final

Cláudia Livia Colucci

(Cacau)

28 29 Empresária São Paulo 8º

Dicésar Ferreira dos

Santos

44 45 Maquiador/drag

queen

Paraná 13º

Elenita Gonçalves

Rodrigues (Lena)

30 31 Professora Distrito

Federal

Eliane Kheireddine (Lia) 28 29 Dançarina São Paulo 14º

Eliéser José Ambrósio 25 26 Engenheiro

Agrônomo

Paraná 9º

Fernanda Helena 28 29 Dentista São Paulo Final

Tabela 1 - Participantes do BBB 10

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Cardoso

Joseane Procasco

Guntzell de Oliveira

(Jose)

28 29 Modelo Rio Grande

do Sul

Marcelo Pereira Dourado 39 40 Lutador Rio Grande

do Sul

Vencedor

Michel Turtchin 30 31 Publicitário São Paulo 10º

Sérgio Luis de Ramos

Franceschini (Serginho)

20 21 Estudante São Paulo 11º

Tessália Serighelli de

Castro

22 23 Publicitária Paraná 3º

Uilliam Cardoso Carvalho 23 24 Dançarino Bahia 5º

Ao longo dos dias de confinamento, os participantes podem assumir

papéis diferentes dentro da casa/cenário. Nos tópicos abaixo, descrevo os principais

papéis sociais que podem ser desempenhados pelos participantes: “líder” e

“anjo/monstro”. Falo em papéis sociais, pois o participante assume uma determinada

posição social dentro do jogo e, consequentemente, há um comportamento próprio

para o desempenho desses papéis. Nesse caso – próprio –, significa estar de

acordo com as expectativas esperadas desse papel.

Ser “líder” ou “anjo/monstro” é ter que negociar papéis sociais,

identidades e visibilidades, pois esta posição não existe durante todos os momentos

de vivência na casa/cenário. O participante pode ser “líder” ou “anjo/monstro”,

somente se conseguir ganhar uma prova para isso. Portanto, os participantes que

têm essa função precisam negociar entre ter uma posição importante no jogo e ser

um participante. Essa negociação é de extrema relevância para aqueles que não

fazem essa negociação adequadamente, de acordo com a crítica do grupo, ao

perderem a posição são questionados quanto ao “poder ter subido ou não pela

cabeça”. Sobre a negociação de papéis sociais, Gilberto Velho (1994), aponta que “o

repertório de papéis sociais não só não está situado em um único plano, mas a sua

própria existência está condicionada a essas múltiplas realidades” (p. 29).

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1.1.3.1 “Líder”

O “líder” é o participante que ganha a prova da liderança, realizada, na

maioria das vezes, numa quinta-feira. O privilégio em ser “líder” está em ser

“imunizado”, ou seja, ele consegue garantir mais uma semana de permanência na

casa/cenário, o que é, portanto um direito. Como obrigação, o “líder” tem que indicar

em aberto um participante a sair do jogo. Esta é só uma indicação, pois o

participante irá disputar com outro (escolhido entre a indicação feita no

“confessionário” pela maioria dos outros participantes) a permanência na

casa/cenário, seja por votação pela internet, mensagem de texto via celular, ou

ligações. Outro benefício em ser “líder”, está em ter ao seu dispor um quarto próprio

com regalias, isto é, bebidas alcoólicas, doces, uma sessão de cinema, etc.

No BBB 10, as mulheres foram “líderes” cinco vezes (Joseane, na

primeira semana; Lia na terceira semana; Fernanda na oitava, nona e décima-

primeira semanas) e os homens dez vezes (Sérgio na primeira semana49, Cadu na

segunda, quarta, nona, décima e décima primeira semanas; Michel na quarta e

sétima semanas; Eliéser quinta e sexta semanas).

Tabela 2 – “Líderes” do BBB 10

Sem 1 Sem 2 S.

3 Sem 4 Sem 5 Sem 6 Sem 7 Sem 8 Sem 9 Sem 10 Sem 11

Dia 1 Dia 3 Dia 25 Dia 27 Dia 67 Dia 69 Dia 74 Dia 75 Dia 76

“líder” Jose Sérgio Cadu Lia Cadu Michel Eliéser Eliéser Michel Fernanda Fernanda Cadu Cadu Fernanda Cadu

49

Na primeira, quarta, décima e décima-primeira semanas houveram dois “líderes”, o que as torna diferentes das outras semanas.

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1.1.3.2 “Anjo/monstro”

O “anjo” é escolhido por meio de uma prova que ocorre normalmente no

sábado, mas também pode acontecer nas sextas-feiras. O “anjo” não ganha a

“imunidade”, sua função é conceder a “imunidade” a outro participante do BBB aos

domingos na formação do “paredão”. A concessão desta “imunidade” é materializada

pela doação de um colar. A única regalia concedida ao “anjo” é poder receber uma

carta da família, o que para a maioria dos participantes significa um momento de

muita alegria, celebrada com muito choro.

No BBB 7, houve uma mudança na dinâmica do jogo, ou seja, podia-se

vetar a “imunidade” concedida pelo “anjo”. O veto ocorria da seguinte maneira:

depois de anunciado o destinatário do colar da “imunidade”, ocorria um sorteio e a

pessoa sorteada, entre os participantes, podia optar por vetar ou não a transferência

do colar. Caso ocorresse o veto, somente o “líder” possuiria “imunidade” e todos os

outros participantes poderiam receber votos para serem “eliminados” da

casa/cenário.

A partir do BBB 8, o “anjo” não tinha um caráter apenas amigável, ou seja,

dar a “imunidade”, mas um caráter que poderia causar algumas inimizades, o

“monstro”. A função do “monstro” seria a indicação de um ou mais participantes para

cumprir tarefas nada agradáveis e algumas vezes humilhantes. Muitas destas

tarefas eram consideradas verdadeiros castigos que geraram brigas, intrigas e

inimizades; transformando a dinâmica do jogo, mais uma vez.

1.1.4 O público

Não há informações concretas sobre qual é o público do Big Brother

Brasil, ou seja, a sua idade, o seu gênero, a sua espacialidade, a sua profissão. No

entanto, em algumas notícias de jornais online posso delinear que a maioria do

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público é jovem. Como expressa a jornalista Mônica Bergamo do jornal Folha de São

Paulo:

Para os adolescentes, Dourado é o favorito ao prêmio de R$ 1,5 milhão. Segundo a coluna de Mônica Bergamo no jornal “Folha de S. Paulo”, o lutador ganhou uma enquete feita entre os usuários da rede social Habbo Hotel.Dos 61.888 internautas que responderam à enquete, 43% querem que Dourado vença o programa. Em segundo lugar vem Cadu, com 22% dos votos. Na enquete do Abril.com, Dourado também é o favorito, com 61% dos votos. Mas em segundo lugar está Dicésar, com 19%, seguido por Cadu, que tem 11% da preferência do público (http://contigo.abril.com.br).

Além da jornalista Mônica Bergamo, a jornalista Patrícia Kogut também

afirma que a maioria do público do BBB é jovem. Entretanto, há variações ano a

ano.

O perfil dos votantes do “BBB” vem variando ano a ano. A garotada que há três edições mostrou seu poder apoiando Rafinha nas redes sociais já não reina. Existem pesquisas qualitativas provando que a internet hoje é de todas as idades. Além disso, o Twitter perdeu a força ali. A transexual Ariadna tinha o apoio do pessoal do microblog. Mesmo assim, não só acabou eliminada, como o público não permitiu sua volta a casa. Já a bissexual Diana foi salva do paredão duas vezes, o que mostraria que o recado via SMS, internet e telefone não é tão conservador. Ou então, vai ver a audiência apenas achou Ariadna desinteressante (http://oglobo.globo.com/cultura/kogut).

Mesmo que a notícia fale dos votantes do BBB, considero que aqueles

que votam, em sua maioria, são os que acompanham dia a dia a vida dos

participantes.

1.2 O PROCESSO DE INSCRIÇÃO E SELEÇÃO DO BBB 10

As inscrições para o BBB 10 foram abertas em 31 de julho de 2009 e

foram encerradas em 31 de outubro de 2009. Foram 327 mil inscritos e, conforme o

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54

blog da produção50, apresentou um recorde de inscrições diante das edições

anteriores.

É interessante pensar sobre essa quantidade expressiva de inscrições,

pois mesmo que haja a possibilidade de o candidato ganhar o prêmio máximo de 1,5

milhões de reais, ou a fama, ou um contrato profissional, estamos falando de um

confinamento, ou seja, uma economia dos direitos suspensos. Conforme Foucault

(2010b), a reclusão, a interdição de domicílio são penas físicas, se referem

diretamente ao corpo. Este se encontra em posição de instrumento ou de

intermediário e é colocado num sistema de coação e de privação, de obrigações e

de interdições (p.16). Ele é privado da liberdade de ir e vir (direito assegurado pela

Constituição de 1988 a todo cidadão brasileiro) e coagido a seguir regras com risco

de ser “eliminado”, ou melhor, desclassificado do jogo. Os participantes são

obrigados a participar das provas, a se expor vinte e quatro horas por dia diante das

câmeras. E são-lhes interditados o direito de conviver com outros que não sejam os

participantes.

A respeito novamente das inscrições para aqueles que se interessavam

em participar do BBB 10, continuavam a ser realizadas ou pelos correios ou pelo

sítio (www.bbb.globo.com). Entretanto, o processo de seleção apresentou algumas

novidades diante aos anos anteriores, tais como:

a) Não haveria mais perfis na Plataforma 8P51;

b) Os perfis eram visíveis somente para a produção e não mais para o

restante dos internautas;

c) Não haveria mais notas da produção nos perfis ou qualquer outro selo

de qualificação dos candidatos;

d) E a interatividade não seria mais por meio dos comentários nos perfis

ou nas fotos, mas por meio de brincadeiras, dicas, esclarecimentos de

dúvidas, etc.

50

http://bbb.globo.com/platb/diariodaproducao/2009/11/01/

51

A plataforma 8P era um sítio da internet, ou melhor, um fotolog (diário de fotos) com o perfil de cada candidato do BBB e havia interatividade entre eles.

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55

Os candidatos ao BBB 10 precisavam preencher seus dados cadastrais

nos campos apropriados, responder a um questionário, dar o aceite aos termos do

regulamento52 e anexar seu vídeo e slideshow de fotos. Ao fazer a inscrição pelos

correios, o candidato era obrigado a enviar fotos anexadas ao seu questionário.

Segundo o regulamento, era necessário anexar uma foto 5x7 atualizada, com data e

colorida. O material enviado, tanto pelos correios como pela internet, deveria ter um

único vídeo de até cinco minutos. Além desses cinco minutos, o candidato podia

anexar um slideshow com no máximo vinte fotos.

No dia 05 de Janeiro de 2010, no blog da produção, apareceram,

finalmente, os quinze candidatos selecionados e com uma novidade: dois

integrantes-surpresa que seriam conhecidos pelo telespectador somente na terça-

feira dia 12 de Janeiro.

Esta edição teve pela primeira vez mais mulheres que homens, pelo

menos nos primeiros dias de convívio. Desde o início de janeiro, os candidatos

selecionados ficaram confinados em um hotel sem nenhum contato com meios de

52

Pode-se encontrar o regulamento do BBB 10 no sítio: http://bbb.globo.com/BBB10/0,,GEH1261-17076,00.html. Acesso em julho de 2011.

Figura 1 - Os candidatos selecionados para participarem do BBB 10.

Da esquerda para direita: Alex, Ana Marcela, Ana Mara, Angélica, Carlos (Cadu), Cláudia (Cacau), Dicésar (Dimmy Kieer – performance), Elenita, Eliane (Lia), Eliéser, Fernanda, Michel, Sérgio, Tessália, Uilliam.

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comunicação, tais como TV, jornal, telefone, internet para garantir o suspense que

envolve a apresentação dos mesmos no dia da estréia.

De agosto a dezembro a produção do programa procurou em várias capitais – Belém, Brasília, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo, além do Rio de Janeiro – pessoas interessadas em participar da décima edição do Big Brother Brasil. Elas precisaram disputar com um total de 370 mil inscritos uma vaga na casa espiada por 55 câmeras e ouvida através de 75 microfones. “É trabalhoso chegar à seleção final, mas me divirto muito. Criamos um grupo com um perfil especial para comemorar a décima edição. Mas podem ficar tranquilos porque teremos favoritos para todos”, brinca Boninho. Muitas outras novidades foram preparadas para celebrar a décima edição (http://bbb.globo.com).

Como uma das novidades para a celebração da décima edição, os

produtores resolveram que o prêmio para os três finalistas seria maior do que das

edições anteriores. O vencedor da disputa levou para casa R$ 1,5 milhão, livre de

impostos, o segundo colocado, R$ 150 mil, e o terceiro, R$ 50 mil. Além desses

prêmios, houve outros que foram conquistados por meio de provas nos quase três

meses de confinamento. De 2005 até o ano passado, os prêmios eram,

respectivamente, de R$ 1 milhão, R$ 100 mil e R$ 30 mil reais.

Nesta edição, a presença das mídias online fizeram bastante diferença: foi

o Big Brother da internet. Nas primeiras edições do BBB, cerca de 70% dos vídeos

de inscrição chegavam pelo correio, e só 30% pela web. A proporção inverteu-se

drasticamente, dos 327 mil inscritos no programa em 2010, só 15 000 (menos de

4%) mandaram vídeos pelo correio – os outros 385 000 usaram a internet. Dois

participantes, Sérgio Franceschini (conhecido no YouTube como Sr. Orgastic) e

Tessália Serighelli (a Twittess), foram indicados ao Boninho, diretor do programa,

através do Twitter53.

Na reportagem “Big Brother no computador”, o repórter Bruno Meier da

Veja escreveu que o reality show da Globo trazia celebridades da internet, e a

emissora buscava, portanto, estratégias para conquistar os espectadores por meio

das redes sociais. Segue a reportagem:

53

Reportagem da Veja “Big Brother Brasil: reality show chega à 11º edição. Disponível em http://veja.abril.com.br

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Essa aproximação de famosos do mundo das redes sociais para a

televisão significa uma estratégia de manutenção dos altos índices de audiência

deste programa, pois uniria dois universos – a televisão e a internet – e assim

conjugaria o interesse daqueles que já acompanhavam estas pessoas em outros

espaços como o Twitter, Fotolog, Orkut, Youtube a assisti-los no BBB. Mantendo o

vínculo dos espectadores com estes famosos. O que talvez, assemelharia, neste

ponto, o Big Brother Brasil com a Casa dos Artistas, em que para este último o que

mais chamava a atenção era ver a intimidade e como se relacionavam as pessoas

famosas. E como eu já disse, o que levou pela primeira vez o SBT a atingir altos

picos de audiência e superar a audiência da Rede Globo.

Figura 2 - Reportagem da Veja "Big Brother no Computador" Edição 2148 de 16 de janeiro de 2010.

Fonte: http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx?edicao=2148&pg=216

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1.3 O ESPAÇO (CASA/CENÁRIO)

Figura 3 - Posicionamento das câmeras na casa/cenário do BBB 10

Figura 4 - Planta da casa/cenário do BBB 10

A casa/cenário do BBB 10 abrigou, na verdade, duas casas. A casa 1

teve dois quartos. Um, com cinco camas de solteiro e uma de casal e foi chamado

de “quarto tattoo”. Sua decoração teve como inspiração as tatuagens. Os tapetes,

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lençóis e almofadas seguem a mesma linha e as cores usadas são o azul, o rosa, o

amarelo e o laranja, sempre vibrantes. O outro quarto é o do “líder” que tem como

diferencial um frigobar e uma banheira de hidromassagem. Uma coroa de acrílico

com iluminação interna na porta sinaliza que aquele é o quarto do “líder”, dando

maior visibilidade a esse papel social desempenhado por um dos participantes.

A casa 2 é denominada “puxadinho”. O espaço não possui divisórias, ou

seja, tem todos os ambientes como: sala, quarto, cozinha e banheiro integrados. O

estilo usado na decoração foi denominado retrô, pois refere-se aos anos de 1950,

1960 e 1970. Azulejos antigos foram usados na decoração, dominada por tons de

salmão. Havia duas camas de casal e uma de solteiro.

A cozinha foi decorada com folhas de jornais com matérias já publicadas

sobre as edições anteriores do BBB. O banheiro possuía além dos chuveiros uma

banheira coletiva. A “despensa luxo” tinha como decoração imagens de limões nas

paredes. Este espaço era reservado para os mantimentos e também para as roupas

das festas, além de servir de ambiente para algumas surpresas que ocorreram ao

longo do BBB 10.

O “confessionário” era preto e a poltrona, onde se “confessava” os votos

ou o ânimo do dia, era prateada. Para Freitas (2007), o preto tem a associação

material a coisas escondidas e como associação afetiva a tristeza, a angústia, a dor,

intriga e renúncia. O “confessionário” é uma sala especial e apenas um participante

de cada vez pode entrar lá, onde são feitas as votações individuais, conversas com

os psicólogos e com a direção do programa.

A área externa era composta pela varanda, piscina, jardim, cantinho,

academia, garagem, quarto surpresa. A varanda tinha como entretenimento para os

participantes uma mesa de sinuca e a academia. A academia era um ambiente

fechado com ar refrigerado.

A garagem tinha a função abrigar os carros que faziam parte ora como

prêmio para alguma prova de liderança ou para outras provas e/ou atividades dos

participantes. Além de fazerem parte do merchandising do programa, em que a Fiat

é uma das patrocinadoras.

O quarto surpresa foi mobiliado por camas de casal e de solteiro, sua

decoração modificou-se dependendo da sua utilidade. Em um dos momentos ele

teve sua decoração predominantemente na cor verde e em outro momento tornou-se

o quarto branco. O quarto surpresa teve a função de ser o confinamento dentro do

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confinamento, ou seja, alguns participantes são obrigados a passar determinada

quantidade de tempo num quarto, eles eram isolados do restante do grupo, sem

poder tomar banho, suas refeições eram colocadas à disposição num determinado

momento e não podiam sair deste ambiente, com risco de serem “eliminados”, caso

saíssem.

Num primeiro momento, quando o quarto teve a cor verde o brother

Dicésar e a sister Cláudia (Cacau) foram indicados pelo brother Marcelo Dourado,

por meio de uma mensagem do big fone, para ficarem isolados no quarto surpresa,

mas ao final ganharam a oportunidade de passarem um dia do carnaval em

Salvador. Num segundo momento, quando a sister Angélica atendeu o big fone

recebeu a mensagem dizendo que ela deveria imediatamente ir para o quarto

branco com mais dois participantes, ela escolheu o brother Sérgio e a sister Cláudia

(Cacau). Os três integrantes do quarto surpresa, neste momento chamado de quarto

branco, pois a pintura e a mobília era toda branca, participaram, sem saber, de uma

votação aberta ao público do BBB por meio de sms, telefone e internet para que

fosse decidido quem seria “imune” na votação de “eliminação” feita no domingo.

Além disso, os outros participantes do BBB deveriam também decidir se queriam um

ou dois integrantes do quarto branco no “paredão”.

1.4 A DINÂMICA DO JOGO

Os estudos de Foucault (2010b) tiveram como lócus de pesquisa as

prisões, as penitências. Mesmo diante a um espaço específico pretendo aqui fazer

uma aproximação de sua perspectiva para a análise da dinâmica do jogo do Big

Brother Brasil. De uma forma ou de outra também ressalto a relevância que é dada

ao corpo. O formato do programa, em que os principais momentos serão discutidos

a seguir, assim como a edição do mesmo investe, marca, dirige e sujeita os corpos

dos participantes a trabalhos, obrigam-no a cerimônias e exigem-lhe sinais (p. 29).

Contudo, não quero negar as margens de possibilidades que existem mesmo dentro

do confinamento, como fazer ou não sexo, escapar de algumas regras, etc.

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Há também uma construção de um saber sobre esses corpos que vai

muito mais além de suas funcionalidades biológicas, há expectativas de

comportamentos e a utilização destes corpos para fins econômicos. Esses corpos

são ao mesmo tempo corpos produtivos (produzem verdades) e submissos (às

prescrições sociais e às regras específicas do programa). Essa sujeição dá-se pelo

contrato cheio de concessões de imagens, direitos sobre a intervenção na

privacidade, a obediência de regras específicas do BBB, entre outras e outros. A

todos esses fatores pode-se dizer que estamos diante a uma microfísica do poder,

em que os efeitos da dominação são atribuídos a manobras, táticas, técnicas que

mantém uma relação sempre tensa, sempre em atividade. Todas essas tensões e

atividades foram separadas em tópicos para exemplificar alguns detalhes.

Na página oficial do BBB 10 há um espaço específico para expor, ao

público, as regras a que os participantes são submetidos e alguns detalhes a

respeito do funcionamento do programa. Por exemplo, pela necessidade em se

adequar à indicação etária o Big Brother Brasil sempre se inicia após as 21h30. Às

segundas, terças, quintas, sextas e sábados, o programa se inicia por volta das

22h10, com término variando entre 22h40 e 23h15, dependendo do dia. Às quartas,

devido às transmissões de jogos de futebol, o BBB começa às 21h30. Aos

domingos, o horário também se diferencia, desta vez devido à revista

eletrônica Fantástico. O programa somente começa após o término do Fantástico. O

início se dá após as 23h, normalmente entre 23h10 e 23h25, terminando entre

00h05 e 00h20.

Aos dezessete participantes do programa é proposto conviver diariamente

uns com os outros em um ambiente fechado e composto por duas casas. Eles são

vigiados por câmeras 24 horas por dia e são proibidos de fazer ligações telefônicas,

enviar e receber correspondências (por carta ou e-mail), assistir televisão, ouvir rádio

ou ler jornais e revistas. O único contato externo existente é com o apresentador

Pedro Bial, por meio de uma televisão. Na verdade, algumas vezes são convidadas

personalidades públicas, como atores da própria Rede Globo, cantores,

apresentadores, etc. Durante todo o confinamento, os participantes são

responsáveis por preparar suas próprias refeições, lavar a louça e as roupas.

Cada dia da semana representa um momento importante na vida de cada

participante, seja pela importância em ser o “líder”, ou receber uma mensagem por

meio de carta escrita da família, quando o participante ganha a prova do “anjo”, por

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exemplo. Abaixo está uma tabela demonstrando o que, na maioria das vezes,

aconteceu a cada dia da semana no Big Brother Brasil 10.

Tabela 3 - Os acontecimentos da semana no BBB 10

Dias da Semana Acontecimentos

Segunda-Feira Durante o dia ocorriam as compras da semana no minimercado

instalado no jardim.

Um jogo ou brincadeira ao vivo (à noite) era proposto pelo

apresentador Pedro Bial.

Terça-Feira Dia de “eliminação” do programa.

Quarta-Feira Festa temática.

Quinta-Feira Prova do “líder”.

Sexta-Feira Prova do “anjo” e Big Fone.

Sábado O “anjo” da semana ganha uma carta de parentes e à noite

acontece uma festa temática ou show com uma banda.

Domingo Prova da Comida

Formação do “paredão”. O “anjo” indica quem ele “imuniza”, o

“líder” indica quem vai para o “paredão” e os outros participantes

indicam no “confessionário” outro participante ao “paredão”.

Fiz a ressalva sobre a maioria das vezes, porque houve semanas em que

promoveu-se mais de um “paredão” e, portanto, “eliminação”; o que transforma

consideravelmente a dinâmica e os ânimos na casa/cenário, já que a “eliminação”

significa não mais participar da concorrência por 1,5 milhões de reais.

Como cada momento indicado pela tabela acima tem suas

especificidades desenvolvi em subtópicos para que fique mais claro como é a

dinâmica do jogo.

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1.4.1 A estréia

A estréia do programa foi ao ar no dia 12 de Janeiro, ao vivo, no Canal

12, disponível na TV aberta, Globo. As primeiras cenas foram recaptulações de

edições anteriores que mostraram uma sequência de todos os finais dos Big Brother

Brasil, ou seja, o ápice em que se conhece o grande vencedor. E depois a entrada

com cada um dos participantes do BBB 10 com o repórter Vinícius Valverde54

perguntando como eles estavam se sentindo ao entrarem na casa/cenário. A estréia

é marcada por edições das imagens durante todo o dia na casa/cenário, as primeiras

impressões, as primeiras conversas, os primeiros desentendimentos, também.

As cenas ao vivo, foram à noite, por volta das 22 horas, todos os

participantes estavam na sala. As imagens foram divididas ora com perguntas para

os participantes ao vivo ora com os vídeos gravados pela produção do programa

mostrando a entrega de uma chave que significava fazer parte do novo BBB. Nesta

edição de imagens, cada candidato falou sobre sua profissão, personalidade,

sentimentos, afinidades, entre outras coisas.

As perguntas feitas pelo apresentador Pedro Bial fizeram parte de um

jogo denominado inicialmente “ping-pong”, pois o brother ou a sister deveriam

responder resumidamente, em uma frase ou palavra, o que viesse a cabeça quando

perguntado. Mas, devido a algumas perguntas deixarem os participantes

constrangidos, o jogo denominou-se “pingando fogo”.

A estréia foi marcada também pela primeira prova do “líder”, esta teve

como proposta ser uma prova de resistência. Contudo, antes da prova os

participantes foram divididos em cinco tribos (cabeças, ligados, belos, sarados,

coloridos) cada uma contendo três participantes.

Para ganhar a prova o participante deveria resistir por mais tempo

segurando em uma corda em cima de um rolo. No entanto, o participante apenas

ganharia a prova e a “imunidade”, assim como toda a sua tribo, mas a liderança iria

para um ex-bbb, ou seja, o seu padrinho ou madrinha da tribo.

54 Vinícius Valverde é o repórter do quadro “De olho no Big Brother Brasil” da TV Globo desde o BBB 6. Este quadro constitui-se de pequenas enquetes feitas a pessoas em diversos lugares, principalmente no Rio de Janeiro sobre o Big Brother Brasil.

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Nesta prova a vencedora foi Fernanda55, da tribo dos belos, o que

possibilitou a entrada definitiva de Joseane (madrinha) no BBB 10. Joseane pode

então escolher, sendo esta a regra do jogo da primeira prova, um dos padrinhos

(sexo oposto) para também entrar no BBB 10. Joseane escolheu Marcelo Dourado

(padrinho dos sarados).

1.4.2 A prova da “liderança”

A prova da “liderança” ocorria com mais frequência nas quintas-feiras em

que por meio de testes de lógica, ou sorte, ou resistência os participantes do BBB

concorriam ao maior status no jogo: ser “líder”. A liderança dava alguns privilégios,

como o estabelecimento em uma suíte com guloseimas, bebidas alcoólicas e uma

sessão de filme. Além disso, conquistar a liderança significava ter a “imunidade”

durante uma semana, ou seja, não ser votado pelo grupo. A função do “líder” era

indicar em aberto um participante para ir ao “paredão”.

Sobre as provas para a conquista da liderança quero destacar aquelas

que foram de resistência. O destaque se faz devido aos momentos de suplício

vividos. Por suplício Foucault (2010b) compreende como sendo uma pena corporal,

dolorosa (p.35). O suplício no caso do BBB não tem ligação com a criminalidade ou

a condenação penal, mas as provas de resistência têm como fundamento o

estabelecimento de uma penitência. Os suplícios aqui não correlacionam ao tipo de

crime cometido, mas ao prêmio que se quer conquistar, enfrenta-se a dor, a

mutilação dos corpos.

Houve cinco provas de resistência, a primeira foi na estréia, em que os

participantes tiveram que andar sobre um rolo giratório e em algumas vezes caia

água. A duração desta prova foi além de 14 horas, em que Fernanda, da tribo dos

belos, conquistou a liderança para Joseane, que era sua madrinha.

55 Fernanda resistiu por mais de 14 horas para conseguir ganhar a primeira prova de resistência.

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Na segunda prova de resistência, os participantes ainda encontravam-se

divididos em tribos. Os brothers tiveram que permanecer dentro de casinhas

podendo sentar e levantar apenas ao toque de um sinal. A duração da prova foi

quase 19 horas e a conquista da liderança foi para Lia.

Na terceira prova de resistência os bbbs56 vestiram-se de esponjas e

tiveram que rebolar, ou melhor, simular que estavam lavando pratos cenográficos.

Ao som do funk do esfregão com os dois pés dentro de um caixote. A duração da

prova foi de quase 19 horas e a conquista da liderança foi para Eliéser.

Na quarta prova, o público escolheu, por meio de votação via internet, o

que deveria acontecer aos brothers enquanto estavam no ambiente junto com os

carros. A prova consistia-se em enfrentar sol, chuva, frio e calor. Sua duração foi de

quase 13 horas e consagrou a liderança de Cadu.

Nesta quarta prova que começou por volta das 23 horas do dia 18 de

março de 2010 os bbbs enfrentaram desde às 18 horas outras resistências físicas e

psicológicas, pois foram proibidos de comer e dormir, somente podiam beber água.

Na quinta prova de resistência Cadu, Fernanda, Dicésar, Dourado e Lia

disputaram a liderança e também um apartamento no valor de R$ 220 mil reais.

Eles tiveram que segurar com as duas mãos uma grande chave apertando um botão

vermelho. Quem deixasse a luz piscar era “eliminado”. A prova teve duração de 2h e

20 minutos em que Fernanda conquistou a liderança e também o apartamento.

1.4.3 As “eliminações”

O jogo é formulado para que ao final “sobrem” apenas três participantes

para que o público escolha o grande vencedor, ou seja, o primeiro lugar, que leva o

prêmio máximo de 1,5 milhões de reais, o segundo e terceiro lugares. Para que isso

56

Há uma diferença entre BBB e bbbs. No primeiro caso é a sigla de Big Brother Brasil e no segundo caso são os participantes do BBB.

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aconteça, normalmente a cada semana um participante deixa a casa/cenário por

meio de votação (internet, sms e ligações).

As “eliminações” ocorrem, normalmente, às terças-feiras. O dia da

semana em que se considera o início de cada semana no BBB. A palavra

“normalmente” foi usada para deixar claro, que em alguns momentos do jogo

ocorreram duas “eliminações” do programa, portanto, em dois dias da semana.

Tabela 4 - A sequência de participantes “eliminados” do BBB 10

“Elimi-nados”

Joseane 61% dos votos

Ana Marcela 40% dos votos

Tessália 78% dos votos

Alex 56% dos votos

Uilliam 58% dos votos

Elenita 52% dos votos

Angélica 55% dos votos

Cláudia 62% dos votos

Eliéser 59% dos votos

Michel 63% dos votos

Sérgio 53% dos votos

Anamara 57% dos votos

Dicésar 58% dos votos

Lia 51% dos votos

Cadu 11% dos votos

Fernanda 29% dos votos

Na quarta semana saíram do jogo Uilliam (07/02 /2010 – domingo) e Alex

(09/02/2010 – terça-feira). Na décima semana saíram do jogo Sérgio (21/03/2010 –

domingo) e Anamara (23/03/2010 – terça-feira). Na décima primeira semana saíram

Dicésar (27/03/2010 – sábado), Eliane (28/03/2010 – domingo) e esta também foi a

última semana do BBB, ou seja, em que se escolheu na terça, dia 30/03/2010, os 1º

(Dourado), 2º (Fernanda) e 3º (Cadu) lugares.

1.4.4 A prova da comida

A prova da comida consiste-se em um jogo em que os participantes são

divididos em dois grupos por meio de sorteio. Aqueles que vencem a prova ganham

uma quantidade maior de estalecas, a moeda do BBB, e ficam na casa de luxo.

Aqueles que perdem a prova ganham mais ou menos a metade das estalecas dos

vencedores e ficam no puxadinho.

A moeda de troca no BBB é a estaleca. Todos os concorrentes começam o jogo com a mesma quantidade de estalecas, depositada em sua conta pessoal, e recebem um cartão magnético para sacar o dinheiro no caixa eletrônico da casa, instalado no confessionário. Ao longo da competição, eles conquistam mais estalecas em tarefas individuais ou coletivas e fazem

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compras em um mercadinho montado no jardim da casa, sempre às segundas-feiras. Os bbbs não podem emprestar ou doar seu dinheiro, mesmo quando são eliminados do jogo. E as estalecas são válidas apenas dentro da casa, não sendo convertidas em reais após a saída do participante. Os bbbs também estão sujeitos a perder estalecas. Eles podem ser punidos com a redução de saldo caso deixem de cumprir alguma das regras do jogo (bbb.globo.com).

As estalecas são trocadas por alimentos, produtos de limpeza, higiene

pessoal, passeios, almoços especiais na segunda-feira no minimercado do BBB.

1.4.5 A prova do “anjo”

A prova do “anjo” acontece às sextas-feiras. Consiste numa prova em que

inicialmente há um sorteio para saber qual dos bbbs irá participar. Normalmente são

escolhidas seis pessoas para disputar a prova. O “anjo” tem como função escolher

uma pessoa para ficar “imune”, ou seja, não ser votada na formação do “paredão”

que ocorre aos domingos. Aquele que ganha a prova recebe um colar que significa

no jogo o colar da “benção”, em que esta é dada a outra pessoa. Entretanto, o “anjo”

também tem a função de escolher um ou dois bbbs para cumprirem algum castigo,

neste caso ele também é denominado “monstro”. Como prêmio o “anjo” ganha uma

carta de familiares o que é considerado um momento de força e traz muitas

lágrimas.

1.4.6 O dia da votação e a formação do “paredão”

A formação do “paredão” ocorre, na maioria das vezes, aos domingos. O

“líder” indica em aberto um participante a ser “eliminado” do programa e os outros

bbbs, um a um, indicam o segundo candidato à “eliminação” no “confessionário”. O

“confessionário”, como já foi dito, é um espaço isolado em que cada participante

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indica seu voto em sigilo, além de, em outros momentos, conversar com psicólogos

e a direção do programa sobre alguma necessidade por produtos higiênicos, algum

auxílio médico.

Em História da Sexualidade I: A vontade de saber, Foucault (1990)

também fala sobre confissões. No “confessionário”, os participantes do BBB

confessam, na hora da votação, seus desafetos, os seus medos (quando indicam

alguém que pode vir a ser seu maior concorrente ao prêmio), as suas insatisfações.

Logo, a confissão torna a coisa notória e manifesta. Na confissão há uma produção

de verdade e todas as formas possíveis de coerção são utilizadas para obtê-la. No

caso do “confessionário” o ambiente todo negro, como uma estratégia de opressão,

é uma forma de coagir o participante e levá-lo a dizer “a verdade”.

Os ocidentais são levados a confessar tudo, expor seus prazeres, uma obrigação já internalizada. A confissão estabelece uma relação de poder onde aquele que confessa se expõe, produz um discurso sobre si, enquanto aquele que ouve interpreta o discurso, redime, condena, domina (p.59).

Às vezes, há a formação de um “paredão” triplo, ou seja, três participantes

disputam a preferência do público para continuar no BBB. O “paredão” triplo pode

ser formado quando há alguma indicação feita por meio do big fone. Conforme

especificou Almeida (2003), a expressão “paredão” foi o nome dado ao dia da

“eliminação” de um concorrente, que acontece às terças-feiras. O termo foi cunhado

pelo participante do primeiro BBB, Adriano, adotado pelos demais e pelo próprio

apresentador, Pedro Bial. Trata-se de um trocadilho entre o dia da “eliminação” de

um participante e o “paredão” de fuzilamento.

A formação do “paredão” é repetida todas as semanas até o final do

programa. As “eliminações”, normalmente, ocorrem nas terças-feiras, sendo assim, o

público tem de domingo a terça-feira para realizar a votação seja por sms, internet

ou ligações. O programa de “eliminação” é composto por imagens editadas de cada

participante que está enfrentando o “paredão” e como suas ações desencadearam

sua participação no mesmo. Além disso, há uma charge feita por Maurício Ricardo

que satiriza algum momento importante da semana. Os participantes do “paredão”

são acompanhados pelos telespectadores por marcadores de batimento cardíaco

para demonstrar o quanto este evento causa certo estresse aos participantes.

As “eliminações” são acompanhadas ao vivo no canal aberto, Globo, e

também por um público que fica em um auditório junto com o apresentador Pedro

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Bial. O público é formado por mais ou menos dez parentes de cada integrante do

“paredão” e o restante por telespectadores que tem afinidade com os mesmos.

Antes de indicar aquele que foi escolhido pelo público para sair do jogo, o

apresentador faz alguns comentários que servem como informações extras sobre

como melhorar o desempenho no jogo para os que vão ficar e o que fez aquele

participante sair.

A saída do participante é feita por um corredor que liga o estúdio à

casa/cenário e o mesmo é recebido pelos familiares e pelo apresentador. Após uma

breve conversa sobre se há algum arrependimento ou algo que gostaria de ter feito

o apresentador encaminha o “eliminado” para um espaço pelo qual ele entra em

contato com os telespectadores do BBB em um chat no sítio oficial da Globo.

1.4.7 Algumas interferências

Como interferência quero relacionar alguns acontecimentos que mudaram

a rotina da tabela 3, além de outros que promoviam algumas mudanças nos

comportamentos dos participantes, como as falas do apresentador Pedro Bial, as

cartas dos familiares e a participação do público nas votações tanto para

“eliminação” quanto em algumas outras gincanas.

Desde 2008, BBB 8, foi implantado o big fone que toca às sextas-feiras e

qualquer participante pode atendê-lo. Ao atender ao telefone o participante ouve

uma ordem que deve ser seguida, se isso não acontecer há risco do participante ir

ao “paredão”. O big fone pode dar uma notícia boa como a “imunidade” da pessoa

que atendeu, ou o direito de “imunizar” outra pessoa, ou até uma promoção como o

direito de ir ao Carnaval. Uma notícia ruim seria colocar alguém no “paredão” ou ser

“emparedado”. Na maioria das vezes, a pessoa que atende ao big fone não pode

revelar a ordem que lhe foi dada sob pena de ir ao “paredão”.

Em 2009, BBB 9, apareceu mais um espaço na casa/cenário denominado

“quarto branco”, onde os participantes podem ser mandados por meio do big fone

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como punição ou não. No BBB 10 este quarto foi denominado quarto surpresa e teve

duas funções, na primeira Marcelo Dourado atendeu ao big fone e indicou Dicésar e

Cláudia (Cacau) para irem ao quarto, como surpresa eles puderam viajar para

Salvador para curtir o Carnaval. Em outro momento Angélica (Morango) atendeu ao

big fone e precisou escolher dois outros bbbs– Cláudia (Cacau) e Sérgio - para irem

com ela para o quarto branco, que é o confinamento dentro do confinamento. Este

fato promoveu várias intrigas que fizeram Angélica ser indicada ao “paredão” e

consequentemente sair da casa/cenário.

Outra intervenção são os comentários do apresentador Pedro Bial. Ele

tem como função agitar o grupo, quando percebe que o relacionamento, as intrigas e

as amizades estão “muito serenas”. A tensão no espaço interno da casa/cenário é

fundamental para que o programa torne-se atrativo. Ele é o árbitro do jogo. Quando

o comportamento de um determinado participante não está de acordo com as

regras, cabe ao moderador intervir e “puxar” as orelhas dos brothers quando se faz

necessário (CRUZ, 2007, p. 13).

No BBB 10 houve outras interferências como o “poder supremo”. Este deu

o direito a Marcelo Dourado, que foi escolhido pelo público do programa por votação,

a mudar o voto do “líder”, do “anjo”, do big fone ou da maioria dos bbbs. Marcelo

Dourado usou o poder supremo para sair do “paredão”.

Além dessas interferências já citadas, temos as cartas que são entregues

àqueles que conquistam a prova do “anjo”. De acordo com a produção do programa

as cartas são produzidas pelos familiares e entregues antes do programa começar,

neste caso em Janeiro, para que não contenha nenhuma “dica” ao participante e

mude o “ritmo” do jogo, pois conforme as regras do programa são proibidas

interferências externas. Contudo, houve pela primeira vez na história do BBB uma

carta que foi entregue ao “líder”. Fernanda ao conquistar a liderança recebeu uma

carta escrita por familiares que conforme a mesma disse “foram dicas explícitas”

sobre seu comportamento no BBB. Abaixo transcrevo elementos importantes da

carta:

Fernanda lê em voz alta as mensagens da família, que incentivam sua permanência na casa. "Você está se saindo melhor que imaginávamos. Sua simplicidade e humildade estão conquistando todos aqui fora", diz a carta assinada pela mãe, que prossegue com uma recomendação: "Você está no caminho certo. Esquece o mundo aqui fora um pouquinho". A mensagem da irmã, além das congratulações, contém conselho semelhante: "Lembre do seu sonho e se doe a essa oportunidade: você conseguiu isso na melhor

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época da sua vida – solteira e começando sua profissão. Esquece o mundo aqui fora". A sister faz uma pausa ao ler a palavra "solteira", mas continua a leitura. Outro trecho deixa a dentista ainda mais intrigada: "Viva intensamente essa oportunidade surreal e não se esqueça que você é solteira e mostre o diabinho que tem dentro de você". Agora no Quarto do Líder, Sérgio e Eliéser provam as guloseimas e vêem as fotos de Fernanda. A sister conta sobre a carta que recebeu e mostra a palavra "solteira". O estudante pergunta: “Mentira! É uma dica?”, indaga. A dentista responde: “É uma dica explícita”, assume (http://bbb.globo.com/BBB10).

Percebe-se que Fernanda e os outros colegas do confinamento

entenderam que a carta simbolizava uma indicação sobre o comportamento da sister

e que se ele fosse modificado sua imagem poderia melhorar o que

consequentemente possibilitaria uma melhor afeição do público e, assim, a

possibilidade de chegar à final do jogo.

Abaixo transcrevo as consequências da carta:

Depois que uma recatada Fernanda recebeu uma carta da família, com a palavra "solteira” escrita diversas vezes em letras maiúsculas, e começou a mostrar durante as festas a “diabinha” que existia dentro dela, o termo “Caps Lock” ganhou novo significado. Deixou de ser apenas o nome da tecla do computador que se aperta para escrever apenas em maiúsculas, para ser sinônimo de solteirice, ou de animação máxima (http://bbb.globo.com/BBB10 em 30/03/2010, grifos meus).

Fernanda no início “limitou-se” a ser uma mulher recatada, reservada e

tímida por diversas razões como possuir um namorado evangélico e o que seus pais

pensariam de suas ações na casa/cenário. Contudo, após a carta percebeu que os

limites que ela estava se impondo, na verdade, em vez de beneficiá-la estava a

prejudicando. O que a levou a reorganizar o seu pensamento de si e sua postura. No

próximo Capítulo falo a respeito dessas mudanças.

1.4.8 A grande final

A final é um grande evento no Big Brother Brasil, uma cantora ou cantor é

convidado para realizar um show, pois se quer celebrar a vitória daqueles que

conseguiram chegar até o último dia de confinamento. Além do show, nesta edição,

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da cantora Ivete Sangalo, o auditório fica repleto de convidados, tais como familiares

dos três finalistas, assim como telespectadores do BBB. Além disso, todos os outros

participantes que foram “eliminados” também ocupam o auditório e assistem a todo o

programa que teve duração de duas horas, iniciando-se às 22 horas e finalizando a

meia-noite.

O programa, no canal aberto, foi ao ar ao vivo e começou com cenas

editadas da entrada dos brothers na casa/cenário. As primeiras cenas tiveram como

foco os participantes “coloridos”, com a seguinte fala de Dicésar ao realizar um

brinde: “Quem é homem grita, quem é mulher grita, quem é biba grita...”. Além do

selinho entre Dicésar e Sérgio e algumas imagens de Angélica (Morango) com

Cláudia (Cacau). Essas imagens serviram de introdução para o discurso do

apresentador Pedro Bial que será transcrito a seguir:

O que leva a cada pessoa a desejar estar no Big Brother Brasil? O público, nós, abusamos do direito de julgar. Há a super exposição. Há o desejo legítimo de se mostrar, de dizer: “Olha eu aqui, eu existo”. E mais eu não quero ser só conhecido, quero ser reconhecido. A percepção aqui fora é que este é o grupo mais plural da história do BBB, exemplo de diversidade, de pluralidade. No entanto, quem vence no final é a singularidade. Só um indivíduo é campeão (dados do caderno de campo em 30/03/2010).

As associações entre imagens e palavras utilizadas pela edição do

programa acrescenta, ou melhor, dá ênfase aos discursos nativos (principalmente

dos participantes Dicésar, Sergio, Angélica e Elenita) que consideraram este o BBB

da diversidade57. Estas associações tentaram incorporar nas mentalidades dos

telespectadores que mesmo diante a um final em que importa somente o grande

ganhador, o único, o campeão, pois se trata de um jogo, não se reduz a isso. Há que

importar-se pelas misturas de outras representações que o programa ofereceu como

a exposição dos corpos, os julgamentos morais, a discussões sobre a visibilidade de

grupos minoritários.

No caso das imagens do brinde, do beijo e da convivência entre

heterossexuais e homossexuais exprimiram um discurso relacionado a um sistema

de atitudes por meio do qual o grupo, tribo dos “coloridos”, se definiu e construiu

57 Em todas as vezes que for relacionada esta questão da diversidade, tenha-se em mente a diversidade sexual, pois como já foi colocado anteriormente não houve uma diversidade regional nem tão pouco racial, já que no programa só existia um participante negro.

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assim a identidade do programa. Como bem observa Foucault (2010) o discurso é

aquilo pelo que se luta, o poder do qual nós queremos nos apoderar:

Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o poder. Nisto não há nada de espantoso, visto que o discurso – como a psicanálise nos mostrou – não é simplesmente aquilo que manifesta (ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é o objeto do desejo; e visto que – isto a história não cessa de nos ensinar – o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nós queremos apoderar (p. 10).

Para reforçar a representação do BBB como a edição que propôs a

diversidade sexual como aquilo que a diferenciava das outras, houve mais algumas

imagens que também contribuíram para a afirmação deste slogan, como a charge do

humorista Maurício Ricardo.

Figura 5 - Início do vídeo da charge

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

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Figura 6 - Final do vídeo da charge

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

A seguir cito a música que acompanhou o vídeo da charge:

O BBB foi um arco-íris de alegria. Que mentira, nós brigamos todo dia! Teve gatas bem saradas. Pena que todas surtadas. Era só carência. Bobo de quem não quis! Mas quando o bicho pegava era muito bom. Altas cenas no edredom! Atrevidas e quentes. Com um arco-íris para experimentar. Foi o uó ter que superar. Tentações diferentes! Toda cor é assim: Tem gente legal e gente vazia. Toda cor pode sim: Conviver com respeito e harmonia. Eô, eô, eô.

De acordo com Novaes (2005) assim como os textos, há uma riqueza

informativa da imagem.

Se um dos objetivos mais caros à Antropologia sempre foi o de contribuir para uma melhor comunicação intercultural, o uso de imagens, muito mais que o de palavras, contribui para essa meta, ao permitir captar e transmitir o que não é imediatamente transmissível no plano lingüístico (p. 110).

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As imagens, tais como os textos, são artefatos culturais. Sendo assim,

utilizo as duas fontes para melhor compreender a dinâmica das relações vividas,

editadas e narradas do BBB 10. Concordo com a autora quando expressa que as

imagens não falam por si só, mas expressam e dialogam constantemente com

modos “típicos” da sociedade que a produz. Neste caso, vejamos como os

homossexuais na figura 05 são representados: por meio de estereótipos. Sérgio e

Dicésar mostrando trejeitos e afetações, enquanto Angélica veste uma blusa gola

pólo indicando certa masculinização. Para Burke (2004) o estereótipo pode não ser

completamente falso, mas frequentemente exagera alguns traços da realidade e

omite outros (p. 155).

No entanto, a produção do programa final não teve como foco apenas a

exacerbação da diversidade sexual, mas outros tópicos como a síntese da

trajetória58 de Carlos (Cadu), Fernanda e Marcelo Dourado, isto é, os três finalistas.

Foram feitas também oito listas com imagens destaques que a produção

considerou como síntese da décima edição. Estas listas foram: a) top pérolas

(bobagens ditas), b) top dramalhão (lágrimas e momentos de fragilidade dos

participantes), c) top micos (acontecimentos engraçados), d) top bafão (discussões e

brigas), e) “coloridos” (os melhores momentos de Dicésar, Sérgio e Angélica na

casa/cenário), f) top calientes (as brincadeiras apimentadas relacionadas a sexo), g)

top chega (manias irritantes), top delícia (ênfase no corpo das mulheres,

principalmente de suas imagens com o uso de biquínis e no banheiro).

58 As trajetórias serão comentadas no próximo Capítulo.

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CAPÍTULO 2 – PESSOAS, PERSONAGENS E TRAJETÓRIAS

Alex, Ana Marcela, Anamara, Angélica, Cadu, Cláudia, Dicésar, Dourado,

Elenita, Eliéser, Fernanda, Joseane, Lia, Michel, Sérgio, Tessália e Uilliam. Essas

pessoas e/ou personagens já foram apresentados em momentos anteriores nesta

dissertação, contudo, talvez não foram apresentados adequadamente. Este Capítulo

propõe-se a problematizar as trajetórias não de todas e todos os bbbs acima, tive

que fazer algumas escolhas relacionadas às categorias de interesse desta pesquisa

– gênero e sexualidade. Para melhor trabalhar os argumentos sobre linearidades e

deslocamentos escolhi falar de oito participantes, são elas: Anamara, Angélica,

Fernanda e Tessália e são eles Dourado, Eliéser, Sérgio e Dicésar.

Foi a partir delas e deles (como pessoas ou como personagens?), de

seus discursos, de suas vivências, de suas performances59 que pude percebê-las

(os) como sujeitos concretos e passíveis de enfrentamento e interpretações. A

interrogação apresentada faz-se a respeito de algumas considerações que

diferenciam os sujeitos dos reality shows e das novelas. Sabe-se que em relação à

transmissão das imagens referentes aos primeiros sujeitos, os mesmos não estão

diante a uma realidade “pura”. “Os reality shows se consagram por mostrarem, de

forma simulada, uma realidade”. (BORGES, R., 2008, p. 267). Contudo, não estão

também subordinados a scripts, ou seja, a roteiros que expressam a criação de uma

vida totalmente fictícia, criada apenas com o propósito de ilustrar uma história

inventada – como nas novelas.

Diante destas duas diferenciações há pelo senso comum uma

constatação que no Big Brother Brasil tem-se pessoas e nas novelas tem-se

personagens e é exatamente aqui que quero propor uma análise terminológica e

salientar que até mesmo a noção de pessoa não é natural, ou seja, livre de

flutuações e de elaborações.

59

Os atos rituais, narrativos e lúdicos são, como disse Bauman (1986) performances (VALE DE ALMEIDA, 1995, p. 191).

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Mauss (2003) ao fazer uma elaboração da noção de pessoa através de

algumas culturas percebeu que esta categoria do espírito humano não é inata:

Ela lentamente surgiu e cresceu ao longo dos séculos e através de numerosas vicissitudes, de tal modo que ela ainda é, mesmo hoje, flutuante, delicada, preciosa, e passível de maior elaboração. É a ideia de “pessoa”, a ideia do “Eu”. Todos a consideram natural, bem definida no fundo da sua própria consciência, perfeitamente equipada no fundo da moral que dela se deduz. Trata-se de substituir essa visão ingênua de sua história e de seu atual valor por uma visão mais precisa (p. 369).

Quando Mauss fez uma aproximação entre a categoria pessoa com

persona, ele percebeu que para os latinos (história romana) ela é um fato

fundamental do direito e assim tornou-se sinônimo da verdadeira natureza do

indivíduo. Ora, isso quer dizer que tal categoria tentava paralelamente afastar-se da

concepção de personagem artificial, máscara e papel de comédia e de tragédia,

representando o embuste, a hipocrisia (p. 389).

O sentido original da palavra persona é dúbio, se por um lado concebe-se

que a palavra tenha origem latina, Mauss demonstra que na verdade foi inventada

pelos etruscos.

Tudo indica que o sentido original da palavra fosse exclusivamente “máscara”. Naturalmente, a explicação dos etimologistas latinos – persona

vindo de personare, a máscara pela (per) qual ressoa a voz (do ator) – foi inventada logo em seguida. Na verdade, a palavra não parece ser exatamente de origem latina, mas sim etrusca, com outros nomes em na (Porsenna, Caecina etc). Meillet e Ernout (Dictionnaire Etymologique) comparam-na à palavra mal transmitida farsu, e Benveniste disse-me que

ela pode vir de um empréstimo tomado pelos etruscos do grego óσωѵ (perso) (p. 385).

No entanto, ao conceber a pessoa como fato moral, a palavra óσωѵ

que tinha claramente o sentido de máscara pode também significar o que cada um é

e quer ser, seu caráter. Ora, ora, tudo, ao final depende realmente do contexto.

Pode-se estender “a palavra óσωѵ a natureza nua do indivíduo, arrancada toda

a máscara, conservando-se, em contraposição, o sentido do artifício: o sentido do

que é a intimidade dessa pessoa e o sentido do que é personagem” (p. 390).

Temos que em nossa sociedade ocidental o conceito que a humanidade

criou a seu respeito tende algumas vezes a separar o papel do indivíduo cumprido

em dramas e o senso da individualidade espiritual e corporal. E mesmo assim, essa

separação é arbitrária e sofre flutuações.

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A noção de pessoa haveria de sofrer ainda uma outra transformação para tornar-se o que ela se tornou há menos de um século e meio, a categoria do Eu. Longe de ser a ideia primordial, inata, claramente inscrita desde Adão no mais fundo de nosso ser, eis que ela continua, até quase o nosso tempo, lentamente a edificar-se, a clarificar-se, a especificar-se, a identificar-se com o conhecimento de si, com a consciência psicológica (p. 394).

De acordo com o dicionário Aurélio temos uma aproximação entre os dois

termos – pessoa e personagem:

Pessoa: [Do lat. persona.] 1.Homem ou mulher. 2.V. personagem 5.Filos. Cada ser humano considerado na sua individualidade física ou espiritual, portador de qualidades que se atribuem exclusivamente à espécie humana, quais sejam, a racionalidade, a consciência de si, a capacidade de agir conforme fins determinados e o discernimento de valores. 6.Jur. Ser ao qual se atribuem direitos e obrigações.

Personagem: [Do fr. personnage.] 1.Pessoa notável, eminente, importante; personalidade, pessoa. 2.Cada um dos papéis que figuram numa peça teatral ou filme, e que devem ser encarnados por um ator ou uma atriz; figura dramática. 3.P. ext. Cada uma das pessoas que figuram em uma narrativa, romance, poema ou acontecimento.

A partir desta introdução etimológica e semântica das palavras pessoa e

personagem farei uma abordagem dos perfis dos brothers e das sisters obtidos tanto

nas imagens dos programas de estréia e final, assim como do sítio oficial do BBB 10.

Para chegar nesta abordagem sobre os perfis dos bbbs, que sob o meu ponto de

vista é uma construção narrativa trarei, principalmente, as reflexões de Benjamin

(1983), Bourdieu (1996) e Foucault (2010), demonstrando que a produção ao falar

de pessoas comuns, ou seja, não eram atores, talvez não usariam máscaras e

igualmente não seriam figuras do drama, são ao final também sujeitos inventados,

criados narrativamente, ou seja não houve a transmissão dos sujeitos “puros em si”.

De acordo com Benjamin (1983) a narrativa sobre os sujeitos não está

interessada em transmitir o “puro em si” daqueles que estão sendo narrados. A

narrativa tem como princípio mergulhar na vida do narrador para em seguida retirar-

se dele. São, assim, os filtros do que se quer manter como memória, ou melhor, as

coisas que se quer partilhar coletivamente.

De acordo com Bourdieu (1996), o indivíduo deve ser tratado de uma

forma relacional, isto é, a sua relação com instituições, por exemplo, com outras

referências, com posições ocupadas no campo. Ele também já atentava sobre os

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riscos da sacralização dos indivíduos em trajetórias de vida, ou seja, este alertava

quanto à necessidade de demonstrar que tudo é relacional dentro do campo60, neste

caso o campo discursivo, o campo institucional.

Se o indivíduo age ou joga (considerando que estamos falando de uma

competição por 1,5 milhões de reais) segundo sua posição social neste espaço

delimitado, para os bbbs é importante estarem disponíveis para o que der e vier, ou

seja, todos são solteiros, amistosos, tolerantes, dispostos a se relacionarem

afetivamente com alguém na casa/cenário, além de não terem medo de exporem

suas personalidades, intimidades e corpos. Querem tanto o dinheiro quanto a fama e

preocupam-se em serem autênticos, que quer dizer terem uma personalidade exata,

fiel e verdadeira, desta forma, tentando essencializar-se.

Pensando sobre o campo discursivo e tendo como apoio o pensamento

de Foucault (1986) que indica que a sociedade, por meio de suas regras, controla o

discurso, para que este não seja falado de qualquer modo, farei a exposição de

como foi abordada a imagem e a trajetória dos bbbs escolhidos.

Essas trajetórias serão abordadas tendo como perspectiva as análises de

Suely Kofes (2001). Para a autora o que é importante ao analisar trajetórias não é o

“realmente vivido”, mas tratar a imagem que se oferece das pessoas em questão. Se

os escritos dizem a verdade ou não, não é isto que importa. Conforme Bourdieu

(1996) a ideia de história de vida, de forma científica, deve romper com a totalidade

da vida do indivíduo, pois o relato coerente e total é uma ilusão.

Produzir uma história de vida, tratar a vida como uma história, isto é, como o relato coerente de uma sequência de acontecimentos com significado e direção, talvez seja conformar-se com uma ilusão retórica, uma representação comum da existência que toda uma tradição literária não deixou e não deixa de reforçar. (...) O real é descontínuo, formado de elementos justapostos sem razão, todos eles únicos e tanto mais difíceis de serem apreendidos porque surgem de modo incessantemente imprevisto, fora de propósito, aleatório (p. 185).

Foucault (2010) em seu pensamento indica que os discursos sempre

controlam e demarcam corpos e situações.

60

A noção de campo representa para Bourdieu um espaço social de dominação e de conflitos. Cada campo tem certa autonomia e possui suas próprias regras de organização e de hierarquia social. Como num jogo de xadrez, o indivíduo age ou joga segundo sua posição social neste espaço delimitado.

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A produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que têm por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade (p.09).

No caso dos bbbs, o discurso inicial de seus perfis marca seus objetivos

quanto à participação no programa, as principais características que acarretariam na

conquista do prêmio, as características que contribuiriam ou não com o convívio com

pessoas desconhecidas e uma possível disposição a se relacionar com alguém

afetivamente.

Como nos adverte Rosenthal (1996) existe uma disputa de prioridades

entre o texto, neste caso o que foi escrito nos perfis, a seleção de imagens que

mostraram as características de cada bbb e a trajetória deles escrita após cada

“eliminação”. A trajetória de vida61, como nos coloca Bourdieu e Rosenthal, é um

processo e se transforma, ou seja, não há como atomizar o indivíduo, pois ele vive e

se expressa, ou melhor, narra de forma relacional.

Neste caso, os sujeitos aqui se expressam em relação a sua participação

em um programa em que há a superexposição da intimidade e que também há uma

disputa por dinheiro e visibilidade, ou seja, a fama.

Seguem abaixo, portanto, os perfis de Anamara, Angélica, Fernanda e

Tessália. Em seguida os de Dourado, Eliéser, Sérgio e Dicésar.

2.1 ANAMARA

61

Como eu utilizo o conceito de trajetória de vida de Bourdieu, substitui o termo história de vida. Na verdade, em seu texto, Rosenthal utiliza a nomenclatura história de vida, mas como ela não utiliza essa categoria de forma linear, enfocando também na questão relacional e não atomiza, isto é, essencializa o indivíduo, pude fazer uma aproximação entre estes autores.

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Figura 7 – Anamara

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Anamara Cristiane de Brito Barreira, baiana, mas atualmente mora em

Petrolina, Pernambuco. Com 25 anos e estado civil solteira, Anamara era soldado da

polícia militar. Anamara era um exemplo de corpo definido e com formas

“avantajadas”, com seus 1,62 m e 57 kg. Seu esporte é vôlei e tem mania de olhar-

se no espelho. Para Anamara ser um Big Brother é “ser abençoada”.

Na estréia Anamara foi mostrada usando farda dizendo o lema da polícia

militar: “pronta para proteger o cidadão mesmo com o sacrifício da própria vida”. E

como ela disse, quando chega o final de semana, é bem diferente, “o melhor lugar

para ir é a ilha, onde se pode usar pouca roupa”. Neste momento, a imagem mostra

Anamara em cima de uma lancha de biquíni sendo desejada por vários homens ao

seu redor. Após a apresentação de Anamara, a imagem voltou-se para a

casa/cenário e o apresentador Pedro Bial perguntou a ela: - Você gosta de bater em

homem com farda? Ela: - Depende da situação, mas confesso que adoro apanhar.

A soldado da Polícia Militar Anamara, de 25 anos, acredita que sua profissão será um de seus maiores trunfos dentro da casa. “Fiquei presa tantas vezes no curso de formação de policial que estou levando o confinamento na boa. E acho que também terei facilidade nas provas de resistência”. Mas a baiana de Juazeiro, que mora na vizinha Petrolina, em Pernambuco, aposta que seus dias de PM fazem parte do passado. “Estou de férias e quando acabarem tenho certeza que ainda vou estar na casa. Mas a polícia vai ficar para trás”. Anamara não esconde a vontade de arrumar um amor dentro da casa, mas deixa claro que não pretende ir para debaixo do edredom com alguém. “Só penso na possibilidade de ter um relacionamento lá, mas antes de ser BBB sou telespectadora. Sei o que o brasileiro gosta. A massa que vota não gosta de ver participante indo pra debaixo do edredom. O público gosta de romance, coisa meiga”. Quanto ao jogo, Anamara garante não ter criado nenhuma estratégia em relação à convivência com o grupo. “Lá dentro vale tudo, menos passar por cima das pessoas. Eu só não suporto picuinha. Se não gosto de alguém, falo na cara”. A baiana garante que não leva desaforo pra casa. “Se for pra arrumar confusão vamos que vamos. Vou mostrar o que a baiana tem”. Anamara diz que algumas coisas

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podem atrapalhá-la quanto ao convívio com os outros dentro da casa. “Sou autoritária, às vezes falo como se tivesse ditando as regras. Nunca levo desaforo pra casa. Comigo é bateu, levou”.Fama ou dinheiro? Fama, com ela o dinheiro vem. Lutarei pra sair do programa com ambos: famosa e milionária. Anamara diz que com toda certeza se envolveria com alguém dentro da casa. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1,5 milhão, caso vença o programa? Comprarei uma casa para mim e outra para a minha mãe. Montarei uma instituição no bairro que a minha mãe mora atualmente e investirei o restante em imóveis (http://bbb.globo.com/BBB10 em 25/01/2010, grifos meus).

Ao final, quando Anamara foi “eliminada” do programa, houve a produção

de um texto, da produção e postado no sítio:

Lembre a trajetória de Anamara

Baiana de Juazeiro, Anamara entrou na casa mais vigiada do Brasil alertando: “Se não gosto de alguém, falo na cara”. E ela cumpriu a promessa. “Até o final eu voto em você”, disse a Dourado, após ser chamada de “falsa” e “cínica” pelo gaúcho. “Você é lunática, complexada”, disparou para Elenita numa discussão durante o Mercadinho. Já com Alex e Eliéser, o desentendimento foi por economia de óleo de cozinha. Anamara também se estranhou com Sérgio, que a eliminou da Prova do Líder antes que ela conseguisse ouvir uma mensagem gravada pela mãe. A baiana falou tanto na casa que chegou a incomodar alguns brothers. “Ela fala demais”, afirmou Cláudia certa vez. “Quem fala muito, se contradiz”, opinou Eliéser sobre a baiana. Durante sua passagem pelo BBB, Anamara promoveu uma verdadeira patrulha sensual com os rapazes da casa, rebolando e exibindo suas curvas. Seu principal alvo, sem dúvida, foi Cadu. “Quero um amigo gostoso e solteiro como você”, a baiana disse ao carioca certa vez. Em outra ocasião, afirmou que Cadu tirava a sua concentração. Apesar dos flertes, Anamara entrou e saiu solteira da casa mais vigiada do Brasil, talvez por ser muito exigente: “Deus me fez tão perfeita, o homem tem que merecer”, foram suas palavras durante um papo com Tessália. Anamara, inclusive, já confessou o desejo de mostrar toda sua sensualidade em ensaios fotográficos para o público masculino: “Pagando bem, que mal tem?”, questionou sobre posar nua. Em suas últimas horas de confinamento, Anamara se aproximou de Dicésar e Fernanda, numa rivalidade declarada com o grupo formado por Cadu, Lia e Dourado. A baiana não gostou de ser chamada de gananciosa pelo líder Cadu e de ser apontada pelos três, em uma brincadeira realizada ontem, como a pessoa que não merecia ganhar o BBB 10. (http://bbb.globo.com/BBB10 em 23/03/2010, grifos meus).

O exemplo de feminilidade aqui exposto no perfil de Anamara é a

expressão de subjetividades e sentimentos, a preocupação exacerbada com o

corpo, o que talvez seja um elemento que perpassa a preocupação de praticamente

todos os bbbs. Nesta edição houve apenas um sujeito que fugiu ao padrão magro e

corpo definido – a sister Elenita, talvez uma tentativa do programa em não manter

um padrão de corpos, contudo houve tensões a respeito do seu corpo e uma

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discussão exaltada entre Lia e ela sobre a última ser complexada diante a tantos

corpos malhados dentro da casa.

Voltando às expressões de linearidades das feminilidades e

masculinidades hegemônicas temos que:

As emoções e a sua expressão são tidas como pertencendo ao mundo do feminino. A esse mundo de emoções ao mesmo tempo fraco e potencialmente perigoso. Aos homens resta a bravata e a manutenção da honra e do prestígio, que assentam antes de tudo o mais, na capacidade de serem (e se fazem) homens – uma categoria moral. Mas a esta visão folk tem-se oposto muitas vezes visões letradas ocidentais sobre o que são as emoções. Curiosamente, não são muito antagônicas, pois tem visto as emoções como a antítese da razão. O ocidente pós-iluminista tem, para mais, igualado a razão à masculinidade e a emoção à feminilidade de forma quase taxativa (VALE DE ALMEIDA, 1995, p. 220).

Contudo, observa-se na trajetória de Anamara a vivência de feminilidade

no plural, há, portanto feminilidades. Se, por um lado vemos a exacerbação de

expressões quanto a subjetividades e sentimentos, tentando provar que mulheres

são dominadas por uma “talvez” irracionalidade sentimental, há a presença de outros

discursos que enfocam a margem de uma agência feminina, quando se mostra que

Anamara fez escolhas estratégicas dentro do programa e em sua vida fora da

casa/cenário. Ela desistiu de um concurso público (carreira militar) para investir em

outras carreiras dentro de programas de televisão, aproveitando a oportunidade da

visibilidade que o BBB acarreta. Algumas vezes, a sister declarou a vontade de abrir

um negócio, no caso seria um motel.

Existe, conforme Brandão (2010) uma afirmação de linearidade quanto à

representação feminina, as imagens têm se organizado em torno de dois extremos:

o da voracidade sexual, da lascívia da mulher e da assexualidade da mulher

respeitável. Este entendimento da relação entre sexualidade e gênero em torno de

binarismos é essencial para a percepção das reiterações, mas também das

tentativas do assujeitamento aos padrões socialmente aceitos.

Anamara assume um desejo que talvez fosse “impróprio” a uma “mulher

de respeito” de querer posa nua. Mas para ela o que é relativo ao seu corpo é a sua

decisão. Há aqui uma afirmação de uma autonomia feminina. A crença em uma

passividade feminina tenta desestimular a possibilidade das mulheres apresentarem

múltiplas feminilidades que aí incluem a autonomia de seus corpos e a agência,

também.

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Sobre este aspecto, gostaria de enfocar a última parte do texto sobre a

sua trajetória que a deixou chateada “a baiana não gostou de ser chamada de

gananciosa”. Abaixo faço o contexto em que ocorreu as declarações:

Começa a brincadeira. Bial pergunta: "Quem você não quer que ganhe o Big Brother Brasil do outro grupo e o motivo?", diz. Cadu é o primeiro a responder que é Anamara: "Acho que ela só pensa em dinheiro agora. A ganância cega o homem", dispara. (http://bbb.globo.com/BBB10 em 22/03/2010).

Anamara rebate com Fernanda a afirmação de Cadu:

Enquanto se banham na ducha do jardim e cuidam dos cabelos, Anamara e Fernanda conversam sobre o jogo. “Eu jogo, mas jogo limpo”, afirma a baiana. “Tô há 77 dias aqui e não tenho sentimento de amor por ninguém aqui”, a baiana volta a falar sobre as críticas que recebeu ontem. “Você falou sentimento”, lembra Fernanda. “Mesmo que eu não tenha sentimento nenhum (pelos brothers), e daí?”, questiona Anamara. Pouco depois, a baiana diz sobre as críticas de que seria gananciosa: “É pra dar risada”. A emparedada também repete que tem dois discursos preparados para logo mais: “Se eu sair vou dizer uma coisa quando estiver ali. Se ficar, vou dizer outra coisa pro Cadu quando ele passar por aquela porta”, avisa. (http://bbb.globo.com/BBB10 em 23/03/2010).

No texto da trajetória e das outras notícias que elucidam o contexto em

que ocorreu a crítica, temos aqui uma espécie de punição quando há uma violação

das supostas fronteiras de gênero. Face a um modelo de feminilidade que restringe

sua autonomia e suas vontades, quando Anamara transgride o estereótipo da

passividade e sobreposição dos sentimentos a uma razão estrategista ela foi taxada

de gananciosa e, portanto, não merecedora de ser a campeã do BBB 10, ora, seu

comportamento não deveria ser aprovado pelo público.

Os grupos sociais que ocupam as posições centrais “normais” (de gênero, de sexualidade, de raça, de classe, de religião, etc.) têm possibilidade não apenas de representar a si mesmos, mas também de representar os outros. Eles falam por si e também falam pelos “outros” (e sobre os outros); apresentam como padrão sua própria estética, sua ética ou sua ciência e arrogam-se o direito de representar (pela negação ou pela subordinação) as manifestações dos demais grupos (LOURO, 2010, p. 16).

Os discursos de Anamara ao expor sua intenção em ganhar o prêmio e

que isto estaria acima de qualquer sentimento de coleguismo com os outros

participantes poderiam representar um desafio às definições normativas de uma

feminilidade única.

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2.2 ANGÉLICA

Figura 8 - Angélica e/ou Morango

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Ana Angélica Martins Marques, mineira, atualmente mora em Uberlândia

– Minas Gerais. Com 24 anos, Angélica é jornalista e o seu estado civil é solteira.

Altura: 1,72 m e 67 kg. Seu esporte é musculação e sua mania é verificar portas e

gás antes de dormir. Para Angélica ser um Big Brother é “ser audacioso, apostar

tudo, imagem, privacidade, futuro em algo que é um jogo da vida real. Com certeza

vale a pena quando se tem objetivo”. Em sua foto coloquei seu nome como Angélica

e/ou Morango, porque adotou seu apelido na casa/cenário e todos assim a

chamavam.

No programa de estréia a atenção a sua vida foi quanto a sua

sexualidade, ou melhor, a sua homossexualidade. “Quando eu era pequena os meus

esportes eram mais de meninos, nunca gostei de brincar de boneca. A minha mãe

sabe desde quando eu comecei a ficar com mulheres. Tem muita gente que diz: -

você gosta de mulher porque não foi pra cama comigo e eu fico rindo disso”. Pedro

Bial fez referência a sua sexualidade também:

Bial: Você disse que prefere garotas, você não abre exceções?

Angélica: Já abri exceções. Aos 16 anos tive meu primeiro namorado e também já tive outros. Mas não me sentia completamente feliz. Há oito anos que me relaciono somente com mulheres e, especificamente, de mulheres que gostam de mulheres (http://bbb.globo.com/BBB10 em 12/01/2010).

No sítio do BBB 10 produziu-se o perfil de Angélica, lançando suas

principais características e desejos.

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Independente. É essa a imagem que Angélica acredita passar às pessoas mais próximas. Desde os 18 anos, a mineira de Uberlândia mora sozinha e trabalha para conquistar o que deseja. Angélica tem como hobbies escrever contos, ler, ouvir música e cantar bem alto. Seu maior receio dentro da casa é passar por arrogante, mas ela avisa: “Eu tenho personalidade forte, mas não quero que confundam com grosseria”. A jornalista já fez de tudo um pouco: foi narradora de carro de serenata, onde ganhava R$ 1 por mensagem vendida (e lembra que ficou feliz quando ganhou um aumento para R$ 1,50). Também trabalhou como atriz, emprestou a voz para gravação de secretária eletrônica de celulares e investiu na própria carreira. Homossexual assumida, seu último relacionamento durou um ano e oito meses, e terminou quando ela se mudou para São Paulo para voltar a morar com pai. “Namorar à distância é difícil, nós éramos muito ciumentas e fazíamos tudo juntas. Quando a vida mudou completamente, isso fez falta”, explica a mineira. Angélica abomina a falsidade e diz que a convivência na casa pode ser bem melhor se cada um respeitar o outro: “Uma das coisas que todos podem esperar de mim é o respeito. Não me irrito fácil, não sou barraqueira”, defende-se. A sister diz que entra na casa como é aqui fora e acredita que terá a oportunidade de conversar com as pessoas sobre a homossexualidade: “O mundo seria diferente, de uma forma geral, se as pessoas assumissem suas posições na vida”, pontua. Fama ou dinheiro? Fama traz dinheiro. Eu sempre trabalhei para conseguir dinheiro para fazer as coisas que eu quero. Você se envolveria com alguém na casa? Sim. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1, 5 milhão, caso vença o programa? Adquirir um apartamento, mobiliar de um jeito bacana, viajar e usar uma boa parte para realizar alguns desejos de amigos e da família. Em um ou dois anos, eu faria uma encomenda á cegonha. Quero muito ser mãe. (http://bbb.globo.com/BBB10 em 15/01/2010, grifos meus)

No dia em que Angélica saiu do programa construiu-se uma narrativa da

sua participação no BBB 10.

Relembre a trajetória de Angélica

Homossexual assumida, Angélica fez parte da Tribo dos Coloridos junto com Sérgio e Dicésar, no início do programa. Discreta, a sister se soltou na festa Minuano. Na balada seguinte, Angélica também chamou a atenção, mas por outro motivo. A jornalista chamou Dourado para conversar em um canto isolado e contou que estava interessada em alguém da casa. Sem citar nomes, a mineira pediu conselhos e ainda disse: “Tô pedindo justamente o seu conselho porque você é menos emotivo”. Bastaram alguns dias, porém, para Dourado passar de conselheiro amoroso a adversário. A sister discordou de uma declaração do lutador, após Lia voltar do Paredão em que Elenita foi eliminada. Na época, o gaúcho declarou que a dançarina era sua aliada e a jornalista não gostou da afirmação. Foi o estopim para Angélica ir até o Puxadinho e revelar a Dicésar, Eliéser e Cláudia o teor da conversa dos brothers da Casa Luxo, que, segundo ela, já estariam combinando votos para a formação do Paredão seguinte. Dourado soube da conversa e foi tirar satisfações com a jornalista, que disparou: “Pra mim você não está nem mais na casa”. Como resposta, ela foi chamada inúmeras vezes de fofoqueira pelo lutador. No dia seguinte, Angélica atendeu o Big Fone e foi mandada para o Quarto Branco. A mineira escolheu Sérgio e Cláudia para acompanhá-la. Sem saber, no domingo, os brothers que permaneceram na casa tiveram que

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escolher em mandar um ou dois dos confinados para o Paredão. Eles optaram por mandar apenas um: Angélica. (http://bbb.globo.com/BBB10 em 23/02/2010, grifos meus)

Quanto ao perfil de Angélica, acho importante ressaltar as falas dela no

programa de estréia “tem muita gente que diz: você só gosta de mulher, porque

nunca foi pra cama comigo” e a pergunta de Bial sobre exceções.

A possibilidade de haver uma sexualidade específica e exclusivamente feminina parece ter sempre baralhado os observadores. As suas descrições revelam a dificuldade em conciliar a crença no princípio da passividade feminina e a possibilidade de as mulheres se poderem envolver em práticas sexuais na ausência do que é entendido como a sua condição indispensável, o falo (BRANDÃO, 2010, p. 308).

A não submissão à heteronormatividade tem uma dificuldade em ser

compreendida no caso dos relacionamentos entre mulheres. Tendo como padrão o

exercício da sexualidade feminina ligada à reprodução e à dependência do falo, as

relações sexuais entre lésbicas acarretam numa percepção que falta alguma coisa

“você nunca transou comigo” ou então que pode vir a ter uma reflexão futura diante

a essa mesma falta “você não abre exceções?”. Essa transgressão à superação do

falo pode ser um desafio à dominação masculina, em que se coloca uma satisfação

da libido feminina para além da visão falocêntrica.

Para Swain (2004) ao se falar de mulheres lésbicas inclui-se uma

discussão tanto de gênero quanto de sexualidade. Sobre sexualidade há um

rompimento quanto à heteronormatividade e seus arranjos sociais baseados em

modelos patriarcais, além da heterossexualidade obrigatória, voltada para a

reprodução. E quanto a gênero, a autora defende que a lesbianidade desafia o

falocentrismo, o androcentrismo e subverte a categoria mulher por “desarrumar” a

identidade feminina.

Falei anteriormente sobre transgressão, mas voltando ao seu oposto: a

norma, no discurso de Angélica (programa de estréia) há “uma ideia bastante

difundida no final do século XIX e início do século XX quanto à percepção da lésbica

como invertida, uma pessoa que nasceu com alma e mente masculina, mas estava

aprisionada em um corpo feminino” (BORGES, L., 2008, p. 47). Mesmo estando

longe deste período, não houve significativas mudanças quanto a esse pensamento.

Na exposição do discurso de Angélica sobre sua infância “quando eu era pequena

os meus esportes eram mais de meninos, nunca gostei de brincar de boneca”,

temos, como ressalta Borges, L. (2008) uma concepção essencialista da

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sexualidade e alia-se ao problema da falta da relação com o falo “a visão de que as

lésbicas são masculinizadas, reproduzem o modelo heterossexual e são infelizes”

(p.47).

Rich (2010) nos alerta que há uma ordem instituída socialmente que

demanda que todas as pessoas tenham uma definição única e exclusiva na direção

da sexualidade, sendo que a orientação sexual dirigida a um homem é algo tido

como inevitável, a heterossexualidade, portanto, é a única forma aceitável de

sexualidade. Nesse sentido, qualquer variação desta norma é vista como desvio,

como problema, como sinal de anormalidade. A heterossexualidade, por outro lado,

é vista como natural e normal.

Não quero dizer que a edição do perfil de Angélica ao trazer algumas

imagens de sexualidades desviantes, neste caso lésbica = mulher masculina e falas

do narrador ao perguntá-la se ela não mudaria de opinião em outro momento, como

se houvesse a necessidade em se amadurecer o seu entendimento quanto a sua

sexualidade, são somente formas de desqualificar sexualidades não normativas.

Entendo que a ideia de selecionar uma lésbica para participar do programa é

também tornar visível outras direções de vivências de práticas sexuais, além de uma

tentativa de chamar mais atenção do público para o programa.

2.3 FERNANDA

Figura 9 – Fernanda

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

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Fernanda Helena Cardoso, 28 anos, solteira, nasceu no interior paulista e

mora em São José dos Campos. Ela tem 1,67 m de altura e 56 kg e é dentista. Seus

esportes são corrida e pilates e seu hobby é surfar, além disso, é importante frisar

que como bagagem cada bbb podia levar um livro de sua preferência, Fernanda

levou a Bíblia. Para Fernanda ser um Big Brother é “se arriscar por estar sendo

julgado pelo Brasil pelo que você é. BBB = exposição, mas tem que ter coragem!”.

No programa de estréia mostrou sua vaidade e seu trabalho como

dentista. Além de falar sobre sua profissão, houve imagens de Fernanda com biquíni

e na piscina. Bial disse a Fernanda, neste primeiro programa: “cada um de nós tem

na cabeça um anjinho e um diabinho, e você a gente só vê o anjinho e quando é que

seu diabinho aparece? Fernanda responde: “Eu vou tentar fazer que ele não

apareça, eu gosto muito do anjinho!”. Bial retruca: “Mas nós não somos uma coisa

só, a cabeça da gente funciona justamente porque consegue lidar com ideias

opostas ao mesmo tempo sem dar pane, então onde está seu diabinho Fernanda?

“Eu não sei uma hora vocês vão dizer: está aí o diabinho, mas não sei que horas

isso pode ocorrer”, diz a sister. Bial novamente pergunta: “Mas você não se lembra

de alguma coisa que te tirou do centro?” Fernanda responde: “Não, ah, somente em

situações de trânsito” Bial finaliza: “É esta situação você não passará por aí”.

Abaixo transcrevo o perfil de Fernanda em que se colocam suas principais

características e os interesses em participar do Big Brother Brasil:

Tímida e religiosa, porém baladeira. Esse é o perfil de Fernanda, de 28 anos. Nascida em São José dos Campos (SP), a cirurgiã dentista afirma que não tem intenção de ficar com ninguém durante sua passagem no BBB e que sua maior companhia no programa será a Bíblia. Mas a jovem não dispensa também uma boa balada com amigos. Fernanda admite que está nervosa com a expectativa de estar na casa mais vigiada do Brasil. Mas garante que já tem uma estratégia de jogo: “Vou tentar sempre votar em quem eu acho que vai sair. Independente de gostar ou não da pessoa. Faço amizade muito fácil, mas meus amigos de verdade estão aqui fora. Lá todos estão cientes que é um jogo”. A dentista acredita que vai ter mais facilidade em se aproximar mais dos rapazes da casa: “Por incrível que pareça me sinto mais à vontade com homem. Mulher é mais difícil de se aproximar. Homem está sempre aberto às amizades femininas”. Se algum rapaz tentar passar dos limites, no entanto, Fernanda garante que vai tirar de letra: “Sei levar muito bem porque sou dentista. Às vezes fico sozinha com pacientes e eles jogam charme. Mas eu sei lidar com isso sem deixar o cara sem graça”. Cheia de planos para quando sair da casa, se levar o prêmio a paulista pretende comprar um carro, colocar silicone e aproveitar a fama instantânea pra ganhar dinheiro. “Sou bem realista em relação ao BBB. Se rolar algum trabalho, vou adorar. Sou muito vaidosa. Mas pretendo ganhar dinheiro pra fazer especializações na minha área”. Fama ou dinheiro?

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Dinheiro. Você se envolveria com alguém na casa? Acho que não. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1, 5 milhão, caso vença o programa?1) Carro (R$ 80.000), 2) Silicone (R$ 8.000), 3) Fins religiosos (R$ 150.000), 4) Especialização (R$ 40.000), 5) Clínica + investimentos. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 15/01/2010, grifos meus).

Como era uma das finalistas houve outras imagens e referências quanto a

sua trajetória. O vídeo final de Fernanda mostrou sua superação nas provas de

resistência e como ela teve seus comportamentos modificados após o recebimento

de uma carta, foi de “santinha” para “diabinha”, e que deu a ela o apelido Fê, Fê

Caps Lock.

Figura 10 - Fernanda é chamada de "enigma irresistível" por Bial.

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Abaixo exponho o texto da trajetória de Fernanda, mostrando algumas

tensões entre ela e as outras sisters e a mudança de comportamento de Fernanda

após a carta.

Relembre a trajetória de Fernanda

Paulista de São José dos Campos, Fernanda se apresentou como tímida, religiosa e fechada para relacionamentos na casa ao entrar no BBB 10. A aparente tranquilidade da sister foi tema de um comentário de Pedro Bial logo na estreia do programa: “Quando o seu diabinho aparece?”, o apresentador lhe perguntou, para ouvi-la responder que se esforçaria em não mostrá-lo. Em vez disso, a sister preferiu exibir garra em suas primeiras horas de confinamento. Ela resistiu por mais de 14 horas e venceu a prova de resistência que permitiu à ex-BBB e madrinha da tribo dos Belos, Joseane, retornar ao jogo e ser a primeira líder do Big Brother Brasil 10. A pedido do público, Fernanda foi imunizada pela vitória na prova. Apaixonada por um rapaz para quem telefonou de dentro da casa, Fernanda se surpreendeu, algumas semanas após o contato, ao receber uma carta da família com a palavra „solteira‟ destacada. “É uma dica explícita”, ela disse a Sérgio. Depois do recado, Fernanda ganhou de Bial o apelido de Fefê Caps Lock e passou a se soltar mais nas festas, transformando a relação com Sérgio numa divertida amizade colorida, com direito a selinhos na pista de dança e a uma declaração do estudante de que viraria heterossexual para namorá-la.

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A dentista foi o pivô de algumas das principais crises de ciúmes na casa. Michel, por exemplo, precisou dar satisfações à namorada Tessália: “Ela é só minha amiga”, disse sobre Fernanda. A paulista confessou ao publicitário que ele fazia o seu tipo, mas isso não chegou a gerar discussões entre Tessália e ela. Já com Lia, o assunto foi mais sério: depois de chorar e admitir ter ciúmes de Cadu com a sister, Lia chamou Fernanda e falou sobre seus sentimentos. A dentista se disse acostumada com esse tipo de situação, mas em papo com Anamara, provocou Lia: “Dá vontade de ficar com ele amanhã”, afirmou sobre Cadu. Por duas vezes, Fernanda foi vítima do Castigo do Monstro. Na primeira, precisou coaxar como sapo numa lagoa cenográfica, ao lado de Michel. A tarefa abalou a sister emocionalmente e a levou às lágrimas. Na segunda vez, houve novo choro da sister, mas por conta da justificativa de Elenita, ao escolher Cadu e ela para interpretarem palhaços bate-bola. “Vocês paqueram o dia inteiro”, disse a brasiliense, apesar de, na época, Fernanda e Cadu se dizerem comprometidos com pessoas de fora da casa. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 30/03/2010, grifos meus).

É muito interessante como os discursos são organizados, porque em

alguns momentos eles se mostram contraditórios. Ao compararmos as trajetórias de

Anamara e Fernanda vemos que as duas, em formatos diferentes, buscaram

demonstrar feminilidades não normativas ao longo de suas trajetórias no BBB 10.

Contudo, somente a primeira teve a exposição de sua agência “demonizada”, ou

seja, tida como anormal, o que influenciou bastante na sua “eliminação” do

programa, logo, uma punição. Anamara inicialmente foi vista apenas como a

“boazuda da casa”, mas depois demonstrou sua garra, temperamento forte e

determinação a não ser somente “uma linda bunda na TV”, mas uma mulher em

busca de um milhão e meio de reais.

Em relação a Fernanda, desde o início do programa, o apresentador e

narrador Pedro Bial a incentivava a não ser apenas recatada, tímida, ou seja

extremamente “certinha”. Para, além disso, sua imagem, para o público, era positiva,

porque sempre ganhava as provas de resistência, mostrando que ela era, como

disse a moldura do programa “uma frágil guerreira”. Essa sua garra e disposição em

enfrentar os limites do corpo, não diminuíram, ao falar do discurso do programa, ou

melhor, não colocaram em dúvida sua feminilidade. Aqui se coloca um

questionamento: o que torna alguns desvios como aceitáveis e outros não?

Fernanda de tímida, recatada e religiosa transformou-se, após uma carta,

em Fê-fê Caps Lock, ou seja, ficou muito mais “solta” e disposta a se relacionar com

alguém na casa e “exalava” sensualidade nas festas. Retomando as afirmações

sobre trajetórias de vida, como já disse, não há como atomizar o indivíduo, ele vive

e se expressa, ou melhor, narra de forma relacional. Fernanda ao receber “uma dica

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explícita” dizendo que estava solteira e precisava se entregar mais à experiência de

estar no Big Brother Brasil remodelou sua posição no programa.

Se, de acordo com Rosenthal (1996) a ordem de uma trajetória de vida é

ocasionada pelas experiências, Fernanda modelou seu caminho conforme o

conceito que tinha de si, inicialmente devia ser tímida e recatada, pois estava

namorando um evangélico e depois ao saber que estava solteira, percebeu que

podia “ser mais desembaraçada”.

A noção do Eu, como foi esclarecido pelas contribuições de Mauss (2003)

tem influência com a forma que o indivíduo se relaciona com a religião, com seus

costumes, com a estrutura social, com a mentalidade social, com seus direitos, com

a cultura, etc. Alberti (1991) afirma que o indivíduo não tem uma posição linear, o

sujeito é passível de metamorfoses.

2.4 TESSÁLIA

Figura 11 – Tessália

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Tessália Serighelli de Castro, 22 anos, solteira, paranaense, mora em

Curitiba. É publicitária e tem como hobby fotografia, mas também trabalha com isso.

Tessália já foi modelo e tem 1,72 m de altura e 53 kg. Para ela ser Big Brother é

“lutar com garra e determinação e aproveitar as oportunidades, estar sempre pronto

para os desafios e ser grato por cada novo dia”.

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As primeiras imagens de Tessália encaixam bastante na tribo a qual ela

participou no BBB 10 – tribo dos cabeças. Mostraram seus livros, seu vício pela

internet e dispositivos móveis e também mostrou suas fotos sensuais como modelo.

Além disso, Tessália tem um diferencial diante os outros bbbs, é a única que tem

uma filha.

Segue suas características principais contidas no sítio quanto a seu perfil:

Para tentar conquistar o público da décima edição do Big Brother Brasil, a paranaense Tessália Serighelli de Castro, de 22 anos, pretende ser verdadeira e mostrar-se como realmente é. Natural de Curitiba, a publicitária é do signo de Áries. Já morou em Brasília e em São Paulo antes de voltar para a capital do Paraná. Mãe de Valentina, de quatro anos, Tessália admite que sentirá falta da filha: "A Valetina vai ficar com minha mãe. Estou tentando não pensar muito nisso, senão não vou ficar focada no jogo". A publicitária mantém uma personagem virtual em um microblog: "Ela é bem diferente de mim e tem toda uma personalidade focada para a internet. As pessoas que me seguem devem estar curiosas para saber como sou de verdade". Tessália diz ser uma mulher batalhadora: “Vou até o fim quando quero alguma coisa”. Ela confessa que não gosta de teimosia e de pessoas que não querem aceitar quando estão erradas: "Me irrito muito com gente que tem dificuldade em entender as coisas. Você fala, explica e a pessoa não entende". o mesmo tempo em que é sua maior qualidade, ela considera a sinceridade seu pior defeito. A paranaense tem como meta conhecer bem os outros participantes para depois decidir sua tática: "Vou buscar ser sincera e, para mim, o principal fator de sorte dentro da casa é o relacionamento. Saber como as pessoas pensam e a partir daí montar minha estratégia". Fama ou dinheiro? Sucesso pessoal, felicidade. Você se envolveria com alguém na casa? Quem sabe ? O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1, 5 milhão, caso vença o programa? Investir, viajar e gastar. Quero fazer durar para sempre e usar da melhor maneira possível (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 15/01/2010, grifos meus).

Sobre a trajetória de Tessália, a produção do programa fez uma narrativa

de sua participação:

Relembre o perfil de Tessália na casa

Terceira eliminada do BBB 10, antes do programa Tessália ganhou fama com um perfil que mantém na internet. Ela integrava a tribo dos Cabeças, da qual também fazem parte Alex e Elenita. Tessália foi a escolha da líder Lia, e disputou o Paredão com Anamara (Ligados), que foi emparedada pelo Big Fone, e Alex, o mais votado pela casa. Nos primeiros dias de confinamento, Tessália formou um quarteto com os inseparáveis Sérgio, Lia e Michel. Ela chegou a afirmar que o estudante de moda, homossexual assumido, seria a única pessoa com quem ficaria na casa, mas acabou cedendo às investidas do publicitário. O romance com Michel, com quem protagonizou cenas quentes debaixo do edredom, abalou a relação do grupo, causando um distanciamento entre Lia e Tessália que culminou em sua indicação do Paredão. Muito entusiasmada com as partidas de xadrez, dama, gamão e ludo, Tessália também jogou fora dos tabuleiros. Suas articulações e estratégias se tornaram uma marca registrada e foram tema de muitas conversas. "Foi meu lado mau que entrou na casa", disparou em conversa com o namorado Michel. "Ninguém aqui é bom", sentenciou em papo com Sérgio. Certa vez, pediu a Dourado

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para convidá-la quando quisesse fazer esquemas. Ao saber, através de um telespectador, que Dicésar votara nela no primeiro Paredão, a sister sugeriu uma berlinda entre o maquiador e Fernanda, a fim de tirar o brother da casa. Sobre a dentista, aliás, Tessália foi taxativa: "não gosto dela", disse. As atitudes da sister na casa foram alvo de diversas críticas. "Ela é muito calculista", "é a grande decepção do BBB 10", Lia afirmou após romper a amizade com a sister. "Ela está sendo dissimulada", avaliou Cláudia. O romance com Michel também rendeu comentários. Sérgio afirmou que o publicitário foi precipitado ao ficar com a curitibana, já que o brother tinha uma namorada fora da casa. Para Dicésar, Michel era o boneco de Tessália. A sister confessou que não se relaciona muito bem com mulheres e que a única com quem se identificava na casa era Angélica. Com a mineira, inclusive, Tessália e Michel protagonizaram um beijo triplo durante a festa Minuano (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 02/02/2010, grifos meus).

Tessália, no texto sobre sua trajetória, foi apresentada como uma mulher

que queria dominar, como se vê na frase “Para Dicésar, Michel era o boneco de

Tessália”, e ter o controle de seu destino no BBB 10. Ao falar para Dourado que

queria participar dos esquemas dele na casa, mostrou-se disposta a sobrepor a

racionalidade diante das suas construções afetivas edificadas na casa/cenário. Esse

comportamento de Tessália, como mesmo dito pelo texto de sua trajetória transcrita

acima foi alvo de críticas, o que influenciou sua indicação e posterior “eliminação”,

logo, mais uma sister que ao não estar de acordo com os parâmetros culturais de

comportamento feminino foi punida.

Essa punição se dá pelo fato que a admissão de uma flutuação na

identidade de gênero, ao pensar equivocadamente que há uma identidade “típica”

masculina ligada à racionalidade e feminina ligada à subjetividade, é considerada

uma alteração essencial, uma alteração que atinge a “essência” do sujeito (LOURO,

2010, p.12).

Penso que Tessália, talvez seja um exemplo de mulher emancipada,

como protagonista de agência. Ela não se sentiu incomodada com as câmeras ao

“participar de cenas quentes no edredom” e se manteve com um posicionamento no

jogo sempre ativa e nunca passiva. Ela ao integrar a tribo dos cabeças e de ser

“entusiasmada com as partidas de xadrez, dama, gamão e ludo” sustentou-se como

ser superior e dotado de racionalidade. Uma das vezes, ao ganhar de Elenita,

doutora em lingüística, Tessália se gabou dizendo “ganhei da doutora”.

A trajetória de Tessália demonstra que ser ativa, dominadora, estrategista

e racional não são características inerentes ao homem. É, antes de tudo, uma

construção. A sua trajetória altera os padrões de feminilidade, desestabilizando os

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referenciais masculinos que circunscrevem uma ligação intrínseca aos corpos de

homens, é uma expressão de margem às molduras que cercam as identidades

femininas.

2.5 DOURADO

Figura 12 - Marcelo Dourado

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Marcelo Pereira Dourado tem 37 anos, é lutador e personal trainer.

Natural de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, contudo mora no Rio de Janeiro.

Dourado é um ex-bbb, participou do Big Brother Brasil 4, entrou no BBB 10 pela

escolha de outra ex-bbb Joseane que era madrinha da tribo dos belos, tribo que

ganhou a primeira prova de liderança. Marcelo Dourado é solteiro e tem 1,80 m de

altura e 80 kg. Seus esportes favoritos são lutas em geral e acredita ter muitas

manias.

No programa de estréia não houve imagens, pois não estava garantida

sua participação no programa, que foi feita apenas no segundo dia, como já foi dito

por uma prova. Mas as imagens do programa final, já que estava entre os três

finalistas, enfocaram sua postura como um homem rústico, de modos pouco

educados (“arrotava” à mesa) e intransigência com os assuntos quanto à

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homossexualidade. Além disso, as imagens mostraram sua trajetória como um

excluído no início e após chorar mostrando que se sentia isolado, sozinho e que os

outros não o aceitavam por ser um ex-bbb. A partir disso, o olhar do público diante a

ele mudou e assim ele tornou-se um dos favoritos para ganhar o prêmio.

Quais os traços de sua personalidade que podem ajudar o convívio dentro da casa? Bom humor, solidariedade, fácil convivência, saber ouvir e ajudar nas tarefas. Fama ou dinheiro? Dinheiro + fama = legal; Fama - dinheiro = não. Esta é a décima edição do Big Brother Brasil. É mais fácil ou mais difícil ganhar o jogo? Pela experiência de vida e de outra edição, considero minhas chances maiores. Não por ser a décima. O número não diz nada. Você se envolveria com alguém na casa? Se for bonita, gostosa, não encher o saco e se eu estiver no clima. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1,5 milhão, caso vença o programa? Investir, viajar e aproveitar (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 20/01/2010, grifos meus).

Sobre o perfil de Dourado, sua masculinidade está pautada pelo

imperativo da razão, mesmo que ele tenha chorado uma vez. A emoção ainda é uma

marca que acompanha imagens de mulheres. Há ainda no seu perfil a exposição a

uma masculinidade que evoca o macho conquistador, marcando a

heterossexualidade como modelo das relações amorosas. As referências ao

conquistador reafirmam convenções que estimulam masculinidades marcadas pelo

“desejo inato de fazer sexo todo o tempo” (BELELI, 2007, p. 204).

Segue abaixo a trajetória de Dourado após ter ganhado o prêmio e o

status de vencedor do Big Brother Brasil 10:

Relembre a trajetória de Dourado

Algumas polêmicas marcaram a estadia de Dourado na casa mais vigiada do Brasil. Com Dicésar, ele viveu uma relação conturbada, repleta de aproximações e desentendimentos. Certa vez, em conversa com Eliane, o maquiador chamou Dourado de „homofóbico‟. Com outro homossexual da casa, Sérgio, Dourado se estranhou e se disse incomodado com papos do estudante sobre sexualidade na mesa de jantar. Sérgio declarou que Dourado ofendeu a sexualidade dele, mas os dois se entenderam pouco tempo depois. Já com Angélica, as relações foram rompidas. Após insinuar para Dourado que ele teria “dois pesos e duas medidas” e contar sobre o papo para alguns brothers, a sister se tornou desafeto do gaúcho, que afirmou não querer mais olhar na cara dela. O sentimento, pelo menos, foi recíproco. “Pra mim você não está nem mais na casa”, Angélica disse a Dourado. Com Anamara, a briga aconteceu após ele receber o voto dela no confessionário, numa semana em que baiana comentou que ele não era sua opção. Dourado chamou a sister de “cínica” e “hipócrita” e a ouviu dizer que votaria nele até o final do programa. A última semana de Dourado na casa mais vigiada do Brasil foi intensa. Na terça-feira passada, após a eliminação de Anamara, houve novo desentendimento com Dicésar. “O Brasil vai fazer você calar a boca”, o maquiador disse, bastante alterado, enquanto Dourado vibrava com a permanência de Lia. O lutador devolveu a provocação, chamando

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Dicésar de “puxa-saco e mentiroso”. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 30/03/2010, grifos meus).

Relembrando os estudos de Mead (2000), em 1930, a autora articulava

questões relacionadas à relatividade e universalidade dentro das relações humanas.

Margaret Mead inaugurou um conjunto de assuntos que chamamos, habitualmente

de “construção cultural de gênero” e tem seu ponto de partida na constatação inicial

de que “mulher” e “homem” são entidades diferentes, preenchidas com conteúdos

variáveis, através das sociedades (SEGATO, 1998, p. 5).

Mead afirma que os objetos dos discursos não são dados no mundo, mas

são constituídos, negociados, reformados em cada sociedade. Quer se dizer que, a

sociedade brasileira em questão impôs ao homem a negação de ser mulher, de não

ser dócil, dependente ou submisso.

O perfil de Dourado o coloca como uma referência à masculinidade

hegemônica. Para Badinter (1993) esta concepção de masculinidade consiste na

exaltação da imagem do homem como ser competitivo e desprovido de toda e

qualquer subjetividade. A masculinidade hegemônica se caracteriza por uma posição

de autoridade cultural e liderança. Entretanto, este modelo não é totalmente

dominante, uma vez que outras formas de masculinidades persistem ao lado dele, é

o que será demonstrado quanto à masculinidade apresentada por Eliéser, a de

Sérgio e a de Dicésar.

A masculinidade representa um conjunto de atributos, valores, funções e

condutas que se espera que um homem tenha em determinada cultura, contudo,

quero ressaltar que esta é uma identidade esperada, mas que pode ser transgredida

ao ser visualizada e vivida em corpos de mulheres e de homens também.

O fato de explicitar a possibilidade de uma masculinidade de mulheres implica previamente desconsiderar a masculinidade como incindível da estrutura biológica do homem e desenhá-la como uma ficção que se constrói performática e socialmente (LACOMBE, 2007, p.215).

Voltando a Dourado temos não uma masculinidade que transgride, mas

que reitera. Chamado de troglodita, bruto, tinha como mania “arrotar” à mesa e

cuspir toda hora no chão. Além de achar inconvenientes as outras expressões de

masculinidades como a de Eliéser, ao rebolar nas festas e intransigente com as

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sexualidades alternativas ao modelo heterossexual, como as de Dicésar, Sérgio e

Angélica.

A sua trajetória e perfil reforça, portanto, o modelo hegemônico que se

estrutura por meio dos eixos da heterossexualidade e da dominação. Os recortes

discursivos feitos por meio dos negritos constroem uma naturalização de papéis. O

discurso da “essência” masculina ligada ao sexo, à objetividade, à dominação. Este

discurso advém da aprendizagem social em que os indivíduos são ensinados desde

cedo as atitudes e comportamentos partilhados por sua comunidade, incluindo estes

estereótipos citados anteriormente. Esta seria uma “forma natural” de se pensar o

sujeito masculino e a partir daí haver tantos embates, conflitos e tensões.

A respeito destas tensões, abaixo apresento uma parte do que foi

colocado na trajetória de Dicésar em que expõe o seu relacionamento com Dourado:

De bom relacionamento a brigas com Dourado

No início do confinamento, Dicésar se aproximou de Dourado e comentou que quebrou certos paradigmas em relação ao gaúcho e à sua primeira participação do programa. "Os brutos também amam. A gente não imagina que ele é tão atencioso. A gente, que não conhece, faz uma ideia errada das pessoas", refletiu o maquiador, ao ver o lutador preparando almoço. Apesar do bom relacionamento inicial, a dupla se estranhou em diversos episódios. Dicésar apontou manifestações machistas do lutador, atendeu ao Big Fone e o algemou a Anamara e discutiu asperamente com o lutador após mandá-lo para o Paredão. Após voltar do último Paredão, com Sérgio, a relação entre Dicésar e Dourado ficou ainda mais difícil, principalmente depois da eliminação de Anamara. Revoltado com o fato do gaúcho gritar com a baiana, antes dela deixar a casa, Dicésar disparou:“O Brasil vai calar a sua boca”. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 27/03/2010, grifos meus).

No último dia do programa, ou seja, no dia em que se decidiu quem seria

o campeão houve a apresentação da trajetória de Dourado e sua relação com os

outros participantes do BBB. Ele foi considerado “o estrangeiro”, pois era um ex-bbb,

era um estrangeiro entre os novatos que não aceitaram a ideia de dar uma nova

chance para aqueles que já tinham participado de outras edições. Além disso, um

estrangeiro entre o grupo que parecia mais tolerante com a diversidade sexual e ele

não, as imagens mostraram seus embates com Sérgio: “Ser homossexual não é

uma atrocidade, mas eu não gosto de ficar ouvindo: - „Pô o negão beijava todo

mundo na boca‟. Ou sobre um monte de homem se pegando. E se eu tiver que falar

de vale-tudo, sangue vocês também não vão gostar”. Com Dicésar, Dourado disse

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“Eu tenho medo, pois na primeira oportunidade ele vai mandar as três bichas para o

paredão” e com os “coloridos” em geral ao dizer “orgulho hétero é isso aí...”

Figura 13 -"Quem diabos é esse sujeito?", pergunta Bial ao falar de Dourado.

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Na apresentação do capítulo final da novela mexicana: La Fuerza Del

Destino. Utilizando-se dos participantes da décima edição, a produção do BBB fez

uma história fictícia envolvendo drama, solidão, dúvidas, intrigas, paixões,

desilusões e algumas insinuações. Quanto às insinuações, neste último capítulo, a

intolerância de Dourado com Dicésar foi considerada uma forma de amor, na

verdade Dourado estava apaixonado por Dicésar, ou melhor, por Dimmy (o apelido

de Dicésar e o primeiro nome de sua personagem enquanto drag queen).

Ao final deste tópico quero transcrever uma parte do discurso de Pedro

Bial para informar que Marcelo Dourado foi escolhido como o campeão da décima

edição:

Vamos lá, se Dourado é homofóbico, no Big Brother Brasil ele não foi, não, caps lock, não foi. Se Dourado é homofóbico como suspeitam alguns, ele foi um Bruce Wayne jogado numa caverna de morcegos e teve que lidar com sua fobia. Se teve que usar capa e máscara de Batman, não sei, mas no comportamento de Dourado há muito que ser apontado como falta de educação, no sentido de falta de modos, rudeza, talvez mesmo uma certa grosseria, até calculada, difícil dizer também, mas de comportamento homofóbico francamente não dá pra acusar o brutamonte, o cabrón. Tem mulheres que nutrem um sentimento maternal por Dourado, algumas dizem que ele não teve mãe. Parte da pegada, do sex appeal vem daí, só que hello, garotas! A mãe que ele teve é a mãe que ele teve. Teve não! Tem! E tem homens que exaltam Dourado porque ele seria um cabrón, machão, hum... Também não é por aí, não é mané nada disso. O charme do cara é que ele sempre foi justamente um perdedor, ou pelo menos essa imagem que fez e cultua dele mesmo, ou fazia e cultuava, maktub, estava escrito o

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Big Brother Brasil dez é seu Marcelo Dourado (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 30/03/2010).

Para Pedro Bial e para a produção do programa, Marcelo Dourado não foi

homofóbico, entretanto para a AGBLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays,

Bissexuais, Travestis e Transexuais) houve falas, comportamentos e ações

homofóbicas por parte de Dourado, vindo a público manifestar-se contra as suas

declarações por meio de uma carta repúdio.

Tendo como suporte o estudo feito por Junqueira (2007) entende-se que

homofobia é um neologismo cunhado pelo psicólogo clínico George Weinberg

(1972), que agrupou dois radicais gregos όμός (semelhante) e φόβος (medo) – para

definir sentimentos negativos em relação a homossexuais e às homossexualidades.

Com esse sentido, o termo costuma ser empregado quase que exclusivamente em referência a conjuntos de emoções negativas (tais como aversão, desprezo, ódio, desconfiança, desconforto ou medo) em relação a pessoas homossexuais ou assim identificadas. Essas emoções, em alguns casos, seriam a tradução do receio (inconsciente e “doentio”) de a própria pessoa homofóbica ser homossexual (ou de que os outros pensem que ela seja). Assim, seriam indícios (ou “sintomas”) de homofobia o ato de se evitarem homossexuais e situações associáveis ao universo homossexual, bem como a repulsa às relações afetivas e sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Essa repulsa, por sua vez, poderia se traduzir em um ódio generalizado às pessoas homossexuais ou vistas como homossexuais. Para além disso, a noção de homofobia pode ser estendida para se referir a situações de preconceito, discriminação e violência contra pessoas (homossexuais ou não) cujas performances e ou expressões de gênero (gostos, estilos, comportamentos etc.) não se enquadram nos modelos hegemônicos postos por tais normas. Ela, inclusive, diz respeito a valores, mecanismos de exclusão, disposições e estruturas hierarquizantes, relações de poder, sistemas de crenças e de representação, padrões relacionais e identitários, todos eles voltados a naturalizar, impor, sancionar e legitimar uma única sequência sexo-gênero-sexualidade, centrada na heterossexualidade e rigorosamente regulada pelas normas de gênero (JUNQUEIRA, 2007, p. 4 e 9).

Ao analisar a maioria das falas e ações de Dourado, percebo nele um

receio em desestabilizar a sua compreensão quanto à virilidade, acreditando que

esta tem um caráter hegemônico e dominador. Nas notícias abaixo retiradas do sítio

do BBB 10, Dourado mostra-se intransigente quanto às expressões de sexualidade

não hegemônica:

Notícia 1: Dourado, que está à mesa, resolve se levantar por causa do assunto

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Durante almoço na Casa Luxo, Sérgio e Lia falam sobre as baladas GLS do Rio de Janeiro e de São Paulo que já frequentaram. Em certo momento, os dois discordam ao definir se uma balada é gay ou alternativa. Depois de alguns minutos, Dourado, que também está à mesa, levanta e comenta: "Vou começar a falar de vale-tudo também. Estou enjoado", diz o brother com um riso no rosto. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 10/02/2010). Notícia 2: Dourado sobre Angélica: 'Ela é a única pessoa aqui que eu tenho nojo' "Ela é a única pessoa aqui que eu tenho nojo. Não quero dar nem bom dia para ela. Ela é podre. Ela não tem comprometimento com ninguém. Ela colocou a Cacau no Quarto Branco porque ela quer dar uns "grudes" nela", dispara o professor de educação física. "O meu negócio com ela não é mais jogo. É pessoal. Independentemente da opção sexual dela, ela é abusada. Queria ir para o Paredão com ela para ver quem iria sair. Eu jogo de uma maneira limpa", continua Dourado. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 20/02/2010). Notícia 3: Dourado sobre Dicésar: 'Independente da opção sexual dele, tem que ser homem' Dourado discute mais uma vez com Dicésar e se aproxima da mesa de sinuca. "Apesar de ser veado, você tem de tomar atitude de homem", diz o lutador. Dicésar rebate: "Você se faz de vítima". O lutador repete, irritado: "Seja homem! Seja homem!" (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 08/03/2010).

A naturalização da heterossexualidade categorizou as variações sexuais

como anormais. Ser um homem “normal” é ser um heterossexual, por isso o repúdio

de Dourado às falas e comportamentos dos “coloridos”. Ao levantar-se da mesa, ao

ter nojo de Angélica e ao provocar Dicésar para compactuar com a sua forma de

viver a masculinidade, Dourado estaria mostrando o seu escudo protetor para se

defender do medo em manifestar atributos femininos, o medo de ser desejado por

outros homens, o medo da intimidade, a inveja e consequente menosprezo às

mulheres (VALE DE ALMEIDA, 1995).

Entre os homens, a masculinidade assenta fortemente nos aspectos especificamente sexuais. E divisões internas entre os homens estabelecem-se analogamente às divisões entre homens e mulheres. A masculinidade é frágil, em termos sexuais nada se pode mostrar de concreto (de visível, de mais observável que o discurso verbal), pelo que tanto o medo como a forma de agressão mais comum se fazem na linguagem da homossexualidade, enquanto categoria passiva (p. 68).

Este escudo demonstra que a masculinidade hegemônica está sempre

em tensão com as outras masculinidades, indicando que a mesma é frágil, deve ser

constantemente vigiada e controlada para se manter legítima diante às outras.

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2.6 ELIÉSER

Figura 14 – Eliéser

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Eliéser José Ambrósio, paranaense, mora em Goioerê, cidade também

paranaense. Solteiro, 25 anos, tem 1,88 m e 88 kg. Foi Mr. Maringá com 18 anos, é

modelo e também agrônomo. No programa de estréia mostrou imagens do pai não

aprovando a carreira de modelo do filho, pois para um filho de agricultor não seria

“adequado” ser modelo, já que poderiam duvidar da sexualidade do garoto. Seu

esporte favorito é voleibol e tem a mania de roer unhas. Para Eliéser, ser um Big

Brother é “ser uma pessoa autêntica, que não tem medo de expor sua

personalidade, seu corpo; é ter atitude e encarar qualquer desafio, vivendo cada

minuto como se fosse o último de nossas vidas”.

Ao observar os comentários do programa de estréia e ter o conhecimento

do que aconteceu ao longo de todo o período do mesmo é interessante pensar em

algumas profetizações, não sob o âmbito religioso, mas como um anúncio

antecipado dos acontecimentos. Bial ao perguntar, no primeiro programa, a Eliéser

se quando ele estava na carreira de modelo tinha alguma fantasia com mulheres

bissexuais, ele afirmou que nunca se relacionou, mesmo sabendo que “no meio”

tinha muitas e também não sabia se tinha tal desejo. Acontece que Eliéser ao longo

do programa relacionou-se afetivamente com Cláudia e esta também era desejada

por Angélica. Houve cenas em que dormiram os três no quarto do “líder” com roupas

íntimas e aconteceram jogos de sedução62.

62

Notícias no Anexo D.

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O paranaense Eliéser, 25 anos, entra na casa do Big Brother Brasil 10 com pinta de galã, sotaque caipira e fala mansa. O engenheiro agrônomo viveu até os quatorze anos na cidade de São Jorge do Ivaí, a cerca de 400 quilômetros de Curitiba. De lá, mudou-se para Maringá, onde começou a jogar voleibol. Foi como atleta que conseguiu bolsas de estudo, já que o pai é agricultor e a mãe, cabeleireira. “Comecei a jogar voleibol, estudar, fazer faculdade de agronomia”, conta. Muito unido à família, o paranaense é filho único e tem uma forte ligação com os pais. Se for o vencedor, já disse que vai comprar uma casa para eles. “O medo que tenho é perder os meus pais. Tenho o apoio deles”, reconhece. Solteiro, ele confessa ter ficado deprimido com término do último relacionamento. No entanto, garante que está recuperado e pronto para novas aventuras amorosas. “Debaixo do edredom, vale tudo”, brinca. Engenheiro agrônomo, Eliéser faz trabalhos como modelo, mas sua intenção é fazer um curso de teatro. Sem nenhuma modéstia, ele afirma que pode fazer sucesso entre as mulheres na casa. “O fato de eu ser atraente pode gerar inveja.” Por outro lado, ele se define mesmo como uma pessoa eclética, diferenciada. “Uma hora sou sério, na outra, brincalhão. Às vezes, sou descontraído, palhaço. Essa mistura, esse equilíbrio podem me ajudar lá dentro”, diz Fama ou dinheiro? Dinheiro, pois preciso comprar a casa para meus pais. Você se envolveria com alguém na casa? Com certeza, afinal nunca se escolhe, às vezes somos escolhidos. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1,5 milhão, caso vença o programa? Primeiro vou comprar uma casa para os meus pais, ajudar minha avó. O restante eu vou investir em imóveis e na minha área profissional (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 18/01/2010, grifos meus).

Ao observar o perfil de Eliéser podemos encontrar nuances que servem a

uma problematização do modelo binário: “isso é coisa de mulher” versus “isso é

coisa de homem”. Ao utilizar o gênero como categoria de análise proponho a

implosão dos essencialismos que fixam modelos de masculinidades baseados em

atributos decorrentes de características inatas e naturais. Ao falar de suas emoções,

“confessa ter ficado deprimido”, sua masculinidade não está pautada somente no

imperativo da razão.

Encontramos também abaixo, em sua trajetória, mais elementos que

deslocam a ideia da expressão de emoções vinculadas somente a corpos de

mulheres:

Ainda no início do confinamento, o engenheiro agrônomo engatou um romance com Cláudia. De acordo com Eliéser, a empresária chamou sua atenção no momento que entrou na casa. Sempre fazendo companhia um para o outro, eles se aproximaram durante a primeira semana e, na Festa Eagle-Eye Cherry, protagonizaram o primeiro beijo . “Não consigo olhar para você sem te beijar”, disse Eliéser. O casal então recém formado passou por algumas turbulências, discussões e crises de ciúme, mas logo se acertou e manteve um relacionamento cúmplice na casa. Um dos marcos foi o Castigo do Monstro, quando Fernanda escolheu Cláudia e

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Eliéser para se vestirem de branco e infernizarem os brothers da casa toda vez que tocasse o sinal. O engenheiro foi um dos personagens principais do episódio do famoso Bolinho da Confusão. O barraco começou quando Anamara sugeriu fritar bolinhos de soja para o almoço e Alex, que cozinhava também, chama a atenção da sister para economizar óleo de cozinha. O engenheiro se irritou com a postura da baiana, dando início a uma discussão que os colocou aos berros. A briga teve o segundo round, quando Elenita entrou na discussão e chama Eliéser de pavão e o engenheiro rebate: “E você é feia dos dois lados". Não foi apenas com a baiana e com a doutora em linguística que o paranaense se desentendeu. Ao ser chamado por Lia para conversar, ele descobriu os motivos que ela teria para votar nele. Eliéser ficou visivelmente abalado com as críticas recebidas e se alterou quando a dançarina questionou a sinceridade dos sentimentos dele por Cláudia. A briga tirou os brothers do sério e mobilizou toda a casa para tentar apaziguar o bate-boca. Uma semana após a confusão, na qual ele afirmou que gostaria de enfrentar Lia num Paredão, ele foi imunizado pelo anjo conquistado por Cláudia, o que garantiu sua estada no jogo por mais uma semana. O brother, que foi criticado por Dourado ao aceitar o colar, afirmou no dia que o que sentia pela empresária dentro da casa era algo muito real. Segundo ele, “nada mais justo do que aceitar, aceito de coração, independente do que as pessoas pensam ou da opinião do Dourado". A atitude foi uma das consequências da sister ter sido indicada pelo lutador para enfrentar o Paredão e ter sido posteriormente eliminada. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 09/03/2010, grifos meus).

Eliéser foi um personagem ambíguo dentro da casa/cenário, pois sua

performance flutuava de um modelo normativo de masculinidade, um galã,

conquistador e corpo definido por musculação, para outro que escapava da moldura.

Ao afirmar “debaixo do edredom, vale tudo”, Eliéser declarava sua

virilidade e com isso seu perfil tentava emoldurá-lo a um “corpo marcado pela

masculinidade hegemônica” (BRAZ, 2010, p. 18). Mas, por outro lado, ele

atravessava a moldura ao dizer que “ficou deprimido com o término do último

relacionamento” e que é “uma pessoa eclética e diferenciada”. Além de outras

performances em sua trajetória na casa/cenário, ao vestir-se com elementos

considerados femininos, saias e tops, sutiã, por exemplo, ao dançar com mais

“liberdade corporal”, isto é, gesticulando muito, “rebolando” muito. E, por fim, ao

colocar em segundo plano a disputa pelo prêmio, ao afirmar que preferia sair da

casa a ser ignorado por Cláudia (seu par romântico).

Eliéser, talvez, foi um exemplo entre os brothers de uma apresentação da

masculinidade não unívoca, linear, de uma masculinidade dinâmica. Entretanto, essa

ambiguidade não foi concebida de maneira tranquila entre seus próprios colegas de

confinamento e pela edição do programa. Ele foi taxado como “tipo peculiar de

hétero” por Pedro Bial e Cláudia teve um momento que perguntou a Dicésar, “já que

ele entendia do assunto”, se o namorado era gay; além de censurar o brother

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quando ele imitou a Britney Spears numa festa ao dizer “me mata de orgulho”, de

forma irônica. A vigilância é um fator de manutenção das linearidades como

expressa Braz (2010) “Para alguns, por aumentar o preconceito, a feminilidade

parece politicamente incorreta nos homens. Para outros, deve ser cuidadosamente

policiada (p. 24).

Tendo como base os pressupostos de Butler (2003) a coerência ou a

estabilidade do que é relativo ao homem ou a mulher constitui como um limite às

possibilidades de gênero no interior do sistema de gênero binário oposicional (p. 45).

No qual o termo masculino precisa necessariamente diferenciar-se do termo

feminino. Essas restrições são o que a perspectiva queer quer implodir.

Por queer entende-se:

A expressão inglesa queer, que pode ser traduzida, inicialmente, por estranho ou esquisito, é, também, a forma pejorativa de se referir a um sujeito não-heterossexual (seria o equivalente, em português, a viado, bicha, sapatão). Repetido como xingamento ao longo dos anos, queer serviu para marcar uma posição marginalizada e execrada. No entanto, virando a mesa e revertendo o jogo, alguns ativistas assumiram o termo, orgulhosa e afirmativamente, buscando marcar uma posição que, paradoxalmente, não se pretende fixar. Talvez fosse melhor dizer buscando uma disposição, um jeito de estar e de ser. Mais do que uma nova posição de sujeito ou um lugar social estabelecido, queer indica um movimento, uma inclinação. Supõe a não-acomodação, admite a ambiguidade, o trânsito, o estar-entre. Portanto, mais do que uma identidade, queer sinaliza uma disposição ou um modo de ser e de viver (LOURO, 2009, p. 33).

Se a categoria gênero não se limita aos binarismos, Eliéser não é um

homem peculiar é apenas uma expressão de possibilidades, em que o corpo não

acata completamente as normas que impõem sua materialização.

2.7 SÉRGIO

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Figura 15 – Sérgio

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Sérgio Luis de Ramos Franceschini, 20 anos, solteiro, paulista e morador

de São Paulo, capital. Sérgio é estudante de moda, tem 1,79 m de altura e 72 kg.

Para ele, ser um Big Brother é “saber respeitar, saber compreender, ser amigo,

sorrir, sonhar e se divertir”.

No primeiro dia do programa, Sérgio foi apresentado tendo como fundo a

música de Lady Gaga, ele estava em seu quarto se arrumando “todo garoto tem que

se maquiar independente da opção sexual”. O estudante tem orgulho de ter o fotolog

mais visitado do Brasil. Além disso, Sérgio não tem problemas em casa quanto à

aceitação de sua sexualidade “ele é o que é e eu não queria que ele fosse

diferente”, confessa o pai. Sobre preconceito e intolerância, Sérgio afirmou “se

alguém tiver algum preconceito comigo na casa eu vou conversar com essa pessoa

e se ela não entender fica a critério dela”.

Abaixo está a construção narrativa de Sérgio:

No que depender do estudante de Moda Sérgio Barros, a décima edição do Big Brother Brasil será "arrasante". Gay assumido, baladeiro, alternativo – "não sou emo", frisa –, o paulista de 20 anos entra na disputa pelo prêmio milionário para mostrar que todo mundo é igual e ninguém deve ter vergonha do que é. Coragem para fugir dos padrões e encarar as críticas alheias realmente não falta ao brother: ele gosta de se maquiar, usa chapinha no cabelo, veste-se mesclando as últimas tendências de moda com seu toque pessoal, tem cinco piercings e adora posar para fotos com seu visual excêntrico. Foram as fotos que tornaram Sérgio uma celebridade na internet, onde ficou conhecido como o Sr. Orgastic, nome derivado de uma festa que costumava frequentar. "Não é um personagem, é um complemento do meu nome. As pessoas confundem, mas Sérgio e Orgastic são a mesma pessoa", explica. Morador do Morumbi, em São Paulo, Sérgio foi uma criança brincalhona na escola e sempre se sentiu diferente em relação às outras crianças. A descoberta sexual se deu no fim da adolescência. E o apoio da família veio em seguida, inclusive do irmão, "dez anos mais velho, advogado, bombado, professor de Aikido, o oposto de mim", descreve. Sérgio está solteiro e disposto a ficar com alguém na casa, desde que encontre um

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brother ou uma sister ("não é porque vou beijar uma garota que vou estar me contradizendo") que goste dele pelo que é. Mas garante que não é de atacar e prefere conhecer bem as pessoas com quem se relaciona. Não faria sexo na casa: "É uma coisa muito íntima". Fama ou dinheiro? Dinheiro Você se envolveria com alguém na casa? Se eu gostasse e nos déssemos bem, com certeza. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1,5 milhão, caso vença o programa? Guardar uma boa parte para abrir um negócio, montar uma associação contra o preconceito e viajar (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 18/01/2010, grifos meus).

Na descrição de sua trajetória, no dia em que foi “eliminado”, há a

repetição de concepções tradicionais que vinculam homossexuais masculinos à

preocupação demasiada com o seu visual e dos outros, Sérgio agregava várias

características que mantinham essa ideia: estudante de moda e foi considerado “o

consultor dos homens na casa”. Como, no Capítulo 1 demonstrei que a escolha dos

participantes não é aleatória, aqui, ao falar de Sérgio, concluo que a escolha dos

participantes que compunham a tribo dos “coloridos” afirmou uma “emolduração” de

um grupo que é muito diverso.

Relembre a participação de Sérgio no jogo

Caçula da nave BBB, Sérgio foi um dos integrantes da Tribo dos Coloridos no início do programa, assim como Dicésar. Fazendo charme e levemente tímido durante o dia, o paulista marcou sua passagem no BBB pela animação na pista de dança durante as festas e por sua preocupação constante com o visual, seja descolorindo os pêlos, caprichando na maquiagem ou fazendo chapinha. O estudante também foi consultor dos homens da casa quando o assunto era penteado. Sérgio alisou e cortou as madeixas de Eliéser, Cadu e Michel. No início, Sérgio se aproximou de Lia, Dicésar, Angélica e Tessália, mas com o passar do tempo criou fortes laços de amizade com o publicitário Michel, ao ponto de chorar com a eliminação do amigo. A dupla conversou muito durante o programa e trocou pontos de vista sobre o jogo ao longo de muitas madrugadas em claro. Durante grande parte do confinamento, o estudante evitou bater de frente com os brothers e foi apontado como desligado no jogo. Os participantes perceberam uma mudança na sua postura depois que foi indicado por Angélica para entrar no Quarto Branco, junto com a própria jornalista e Cláudia. Ele criticou Dourado, por suposta postura machista, chamou Dicésar de falso, ao saber que o maquiador votou nele para o Paredão, e até falou mal de Lia. Em episódios engraçados, o estudante protagonizou momentos desinibidos na piscina, tirando totalmente a sunga. Ele também deu selinhos em Dicésar e em várias sisters durante festas da casa e brincou de jogo de sedução com Cláudia, Eliéser e Angélica, no Quarto do Líder. Já nos últimos dias, Sérgio e Fernanda trocaram olhares, declarações e carinhos, deixando o resto dos brothers curiosos quanto a uma possível bissexualidade do estudante (http:// bbb.globo.com/BBB10 em 21/03/2010, grifos meus).

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Em vários momentos no BBB 10, as imagens dos “coloridos”, ou melhor,

dos gays, esteve marcada por estereótipos. Sérgio e Dicésar foram considerados os

gays afeminados e Angélica a lésbica masculinizada. Mas esta foi sua imagem

inicial, ao passar dos dias Angélica ficou mais vaidosa e se arrumava nas festas,

entretanto, a imagem como lésbica masculinizada esteve presente, principalmente,

nas charges de Maurício Ricardo.

Os produtores do BBB 10 não foram somente repetidores da imagem que

se tem dos gays pelo senso comum, eles são na verdade mediadores, pois as

imagens editadas e transmitidas são intermediadas pelas concepções dos agentes

de comunicação do que eles percebem do contexto social vivido. Eles são

importantes na difusão de ideias, gostos, comportamentos, além de realizarem uma

influência na “mercantilização de formas simbólicas” (Thompson, 1998).

Não quero dizer que não foi válido, ou melhor, não foi importante a

visibilidade das sexualidades não normativas e as experiências de vida trazida pelas

falas dos “coloridos”. Não estou aqui discutindo a inclusão das sexualidades

marginalizadas, pois ela, no caso, foi feita. A atenção aqui proposta é quanto ao

formato, a escolha daqueles que representaram essas sexualidades marginalizadas.

Essa organização midiática unifica modos de ser, na maioria das vezes, marcando as diferenças e a distância entre o “nós” e os “outros”. A questão aqui não é se os “diferentes” são ou não incluídos, pois a inclusão parece estar sendo feita, mas como as imagens são editadas de forma a não

desestabilizar o status quo recorrendo a um modo de ser gaylésbica (BELELI, 2007, p. 118).

Quanto a isso percebemos como foi expresso no perfil de Sérgio: “no que

depender do estudante de Moda Sérgio Barros, a décima edição do Big Brother

Brasil será „arrasante‟”, um entendimento que gay adora uma festa e está sempre

pronto para uma diversão: “gay assumido, baladeiro, alternativo”. Contudo, é

importante frisar que as primeiras imagens de Sérgio em sua casa constatam uma

transgressão à masculinidade hegemônica ao afirmar “todo garoto tem que se

maquiar, independente da opção sexual” (Fala de Sérgio, caderno de campo em

12/01/2010). Este seria, então, um esforço dos agentes de comunicação em

apresentar imagens que não se reduzem às masculinidades únicas ou absolutas,

como se existisse somente uma forma de vivê-la.

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2.8 DICÉSAR/ DIMMY KIEER

Figura 16 – Dicésar

Figura 17 - Dimmy Kieer

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

Dicésar Ferreira dos Santos, paranaense, atualmente mora em São

Paulo. Com 44 anos, solteiro, 1,72 m de altura, 75 kg, Dicésar é maquiador, drag

queen e ator. Seu esporte é a natação e a mania é de desenhar e maquiar. Para

Dicésar, ser um Big Brother é “ser um amigo e irmão de verdade, conviver com

pessoas que você nunca viu, mas levar delas o melhor possível e aprender com

elas. Ensinar algo bom pra estas pessoas e aprender também com elas. Se dar por

inteiro. E ser realmente você. Respeitar e convier com as pessoas aceitando seus

defeitos, qualidades e virtudes”.

No programa de estréia, a imagem de Dicésar iniciou-se como a de Alex

mostrando a sua profissão. Entretanto, Dicésar tem duas profissões: uma durante o

dia – maquiador, e outra durante a noite – drag queen. As imagens também

mostraram seu closet com as roupas e perucas. Dicésar vestiu-se e mostrou a sua

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performance como drag. “Tirou a maquiagem, acabou o show eu volto a ser

Dicésar”, enfatiza o brother.

Se para muitos o pôr-do-sol indica o fim do dia, para o maquiador Dicésar, de 44 anos, a jornada de trabalho ainda está na metade. Durante o dia, ele trabalha entre pinceis e cosméticos para embelezar suas clientes. Quando a noite chega, dedica seu talento para o próprio rosto e se transforma em Dimmy Kieer, uma drag queen que brilha em palcos de boates por todo o Brasil. Já são 18 anos vivendo a “dupla jornada”. Nascido no interior do Paraná e criado em Londrina, aos 22 anos Dicésar foi morar em São Paulo, depois de ganhar uma bolsa de estudos. Na capital paulista, morou em um pensionato e enfrentou grandes dificuldades. “Já passei por dias em que tinha dinheiro para comer de dia, mas não para comer de noite”. Antes de ser maquiador e drag queen, Dicésar trabalhou como vitrinista de loja. Hoje, ele acredita que exerce a arte de encantar as pessoas. “Como drag, acabo sendo um pouco de cupido, de psicólogo e de várias outras coisas”, conta o paranaense, que se diz fascinado por subir em palcos. Apesar do perfil pouco ortodoxo, Dicésar é bastante ligado à família e tem a mãe como melhor amiga. “Ela foi a primeira a me aplaudir em tudo”, relata, acrescentando que um dos motivos por ter se interessado em participar do Big Brother Brasil é tentar reunir familiares que não vê há muito tempo. “Foi cada um para um canto tentar a vida. Há 22 anos não vejo meu irmão. Quero reunir todo mundo de novo”, justifica. Apesar de todo apego familiar, Dicésar crê que a pessoa de quem mais vai sentir falta é Dimmy, seu alter-ego drag. “Sinto muita falta da minha personagem. Não vou poder levar minha maleta de maquiagem e sem ela não dá. A Dimmy já tem uma cara pronta”, confessa o brother, que não tem medo do preconceito que poderá sofrer na casa. “Nesses 22 anos de São Paulo, aprendi tudo na marra”. Quais são os traços da sua personalidade que podem atrapalhar o convívio dentro da casa?A minha sinceridade vai incomodar. Muitas vezes falo o que não posso, mas quando estou vestido de Dimmy sou ainda pior. Ela se esparrama. Fama ou dinheiro? Prefiro dinheiro com fama. O dinheiro bem administrado trás a fama.Se você se apaixonar na casa, abrirá mão da disputa pelo prêmio? Não pretendo me envolver com ninguém da casa. É lógico que não vou deixar de reparar nos homens bonitos, mas não vai passar disso. O que você vai fazer com o prêmio de R$ 1, 5 milhão, caso vença o programa? Pretendo comprar uma casa em Londrina e outra na praia para minha mãe poder descansar. Vou procurar o meu irmão que está sumido e reunir a minha família novamente. Todo mundo junto. Vivendo junto (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 16/01/2010, grifos meus).

No dia de sua “eliminação”, colocou-se no sítio a sua trajetória durante o

programa:

Relembre a trajetória de Dicésar

Nascido no interior do Paraná e criado em Londrina, Dicésar foi um dos integrantes da Tribo dos Coloridos no início do programa. O maquiador, que divide sua rotina profissional como drag queen em São Paulo, trouxe um pouco da sua trajetória de vida para os brothers e participou de discussões sobre homossexualidade e preconceito. Durante a festa Niely Gold, ele chamou a atenção dos confinados quando se transformou em sua personagem da noite, Dimmy Kieer, com direito a vestido, peruca e enchimento. Antes de cada balada na casa, Dicésar também costumava maquiar as sisters, aproveitando sua experiência profissional com os pincéis. Ainda no primeiro dia da casa, Dicésar declarou para o apresentador Pedro Bial: “Ser drag é a arte de divertir as

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pessoas, é a arte de se maquiar, é um personagem”. E não foi à toa: o maquiador incrementou o vocabulário da nave BBB, com expressões como “Não faz a Louca”, “Bafônico” e “Todo trabalhado no glitter”, entre outras tiradas que divertiram os brothers. Junto com Anamara e Alex, Dicésar foi ainda um dos mais participativos nas cozinhas da casa, preparando almoços elogiados tanto no Puxadinho quanto na Casa Luxo. Entre os brothers, Dicésar se aproximou mais dos outros integrantes dos Coloridos, Sérgio e Angélica, e do publicitário Michel. Com Sérgio, criou uma relação de cumplicidade tanto nas festas quanto nas discussões na casa, apesar de ter votado no estudante mais de uma vez para o Paredão. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 27/03/2010, grifos meus).

No início deste capítulo, abordei a relação entre pessoa e personagem e

como suas construções terminológicas podem ser aproximadas. A configuração de

uma drag queen, por exemplo, de acordo com a pesquisa de Chidiac e Oltramari

(2004) também confirma que existem situações em que personagem e sujeito que a

compõem se confundem.

Os sujeitos que interpretam as drags exemplificam a complexidade da sexualidade humana, incluindo, aí, as relações de gênero. Elas são manifestações recentes e inovadoras dentro da chamada identidade queer; possuem características masculinas e se constituem femininas. Mesmo quando estão vestidos de forma masculina, ainda assim, por vezes, são chamados pelos nomes de suas personagens. Esses sujeitos se apropriam de características comuns a mulheres, fazendo caricaturas daquilo que consideram mais marcante. Expressam, por diferentes meios, suas identificações com esse gênero, por meio das formas do corpo, da maquiagem utilizada e pela linguagem específica. A relação da drag com o sujeito que a interpreta se dá, na opinião do entrevistado, com certa autonomia, em que ambos, drag e sujeito, podem ter características até opostas, se levados em consideração aspectos físicos e comportamentais. Por possuírem seu próprio nome e espaço de socialização, as drags atuam como personagens, desempenhando seu papel social de maneira quase independente do sujeito. Contudo, percebeu-se, em algumas situações discursivas, que isto nem sempre se apresenta, e que ator e personagem se interligam e se sobrepõem. O limite entre essas duas identidades (ator e personagem) é aqui percebido como uma fronteira flutuante, e não como algo cristalizado ou fixo (p. 476-477).

Dicésar não se diferencia das demais identidades já colocadas neste

trabalho, quer-se dizer com isso que em todas as análises existiram articulações

entre gênero e sexualidade. As identidades, conforme as abordagens de Hall (2000),

não podem ser tomada como algo fixo ou intrínseco ao ser, mas como uma

construção social.

A identidade é realmente algo formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato, existente na consciência no momento do nascimento. (...) Assim, em vez de falar da identidade como uma coisa acabada, deveríamos falar de identificação, e vê-la como um processo em andamento. (...) O/a falante individual não pode, nunca fixar o significado de sua identidade (HALL, 1997, p. 42-45).

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A noção de uma identidade originária e unificada é uma premissa

bastante criticada. Hall (2000) acredita que existe na atualidade uma nova forma de

enxergar a identidade, fazendo não um abandono ou abolição, mas uma

reconceptualização do sujeito. Entrar no discurso de uma identidade idêntica é uma

forma de camuflar a diferença e a exclusão que constrói os locais que são o meio de

construção da identidade.

Dicésar, algumas vezes, foi chamado por seus colegas de confinamento,

por Dimmy – que é seu apelido e também o nome inicial de sua personagem, Dimmy

Kieer. Em outros momentos, colocava os sapatos das sisters e fazia uma

performance, ora desfilava, ora cantava, ora se auto-imitava fazendo referência as

suas atuações nas boates em que trabalhava em São Paulo. Dicésar fazia menção a

si como homem e também como menina/moça/mulher. Isto dependia de como se

estabeleciam as relações com alguns comportamentos masculinos que ele não

sentia vontade em compartilhar com os outros brothers da casa/cenário. Como

exemplo, segue a notícia abaixo:

O clima de brincadeira impera na Festa Minuano. Os brothers continuam tentando derrubar uns aos outros em meio à espuma, no chão ensaboado. O professor de dança Uilliam (Ligados) tenta derrubar o maquiador Dicésar

(Coloridos), que não gosta. Dicésar pega uma almofada e taca em Uilliam. O baiano, então, se aproxima e o abraça, tentando se desculpar. "Tem que parar com isso. Você é homem e eu sou uma menina", brinca, mais calmo. (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 31/01/2010).

Para Chidiac e Oltramari (2004), as drag queens fazem uma explícita

manifestação do gênero feminino em suas personagens, mas no cotidiano mantêm-

se masculinos. Contudo, a vivência destes sujeitos não pode ser tomada de forma

tão dicotômica: de dia homens e à noite mulheres, suas identidades

metamorfoseiam-se.

A partir desta metamorfose, considero mais adequado partir da

contribuição de Butler (2003) para falar sobre a categoria gênero. Para a autora,

gênero está relacionado a uma identidade instável e não como uma substância dos

corpos, é uma temporalidade social constituída a partir da repetição estilizada de

atos. Para entender a forma como Dicésar se compreendia e se relacionava com os

outros, principalmente quando precisava diferenciar-se dos comportamentos que

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não correspondiam ou não assemelhavam-se com sua masculinidade, é preciso

superar a dicotomia tradicional masculino/feminino e sua correspondência a corpos

de homens e mulheres.

A “coerência” e a “continuidade” da “pessoa” não são características lógicas ou analíticas da condição de pessoa, mas, ao contrário, normas de inteligibilidade socialmente instituídas e mantidas. Em sendo a “identidade” asseguradas por conceitos estabilizadores de sexo, gênero e sexualidade, a própria noção de “pessoa” se veria questionada pela emergência cultural daqueles seres cujo gênero é “incoerente” ou “descontínuo”, os quais parecem ser pessoas, mas não se conformam às normas de gênero da inteligibilidade cultural pelas quais as pessoas são definidas. Gênero “inteligíveis” são aqueles que, em certo sentido, instituem e mantêm relações de coerência e continuidade entre sexo, gênero, prática sexual e desejo. Em outras palavras, os espectros de descontinuidade e incoerência, eles próprios só são concebíveis em relação a normas existentes de continuidade e coerência, são constantemente proibidos e produzidos pelas próprias leis que buscam estabelecer linhas causais ou expressivas de ligação entre o sexo biológico, o gênero culturalmente constituído e a “expressão” ou “efeito” de ambos na manifestação do desejo sexual por meio da prática sexual (p. 38).

Mesmo que em seu perfil houvesse dito: “tirou a maquiagem, acabou o

show eu volto a ser Dicésar”, sua intenção era participar do BBB performatizado

como Dimmy Kieer, o que não foi autorizado pela produção do programa. Não

permitiram nem que ele levasse sua peruca, sua maquiagem e suas roupas com

elementos considerados femininos.

Os sujeitos, quando montados de drag, unem, em um único corpo, características físicas e psicológicas de ambos os gêneros, sendo e estando masculinos e femininos ao mesmo tempo, em um jogo de composição de gêneros que questiona a rigidez do conceito de identidade (CHIDIAC e OLTRAMARI, 2004, p.474).

Para o programa, era imprescindível regular o corpo de Dicésar. Seria

inteligível considerá-lo como algo que flutuasse na fronteira do masculino/feminino.

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CAPÍTULO 3 - LINEARIDADES E DESLOCAMENTOS

Não se é tão livre quanto se deseja, quanto se quer, quanto se julga,

talvez quanto se vive. (Marguerite Yourcenar).

Quando comecei o trabalho de campo, a questão que levava comigo era

a seguinte: como se reproduziam os discursos, na décima edição do BBB

transmitidas no canal aberto e pelo sítio oficial do programa na internet, da

feminilidade, da masculinidade e da homossexualidade? Sobretudo, como se

reproduzia o modelo central de feminilidade, masculinidade e homossexualidade –

as referências hegemônicas? Enquanto que ao se observar o cotidiano das pessoas

percebe-se a existência de várias masculinidades, feminilidades e

homossexualidades.

O conceito aqui de hegemonia tem como perspectiva a aproximação dos

estudos de Gramsci com a teoria de gênero realizada por Vale de Almeida (1995):

O conceito de hegemonia tomado de empréstimo de Gramsci que, obviamente, não o utilizou para analisar o gênero, mas sim as relações de classe na Itália sua contemporânea. Significa ascendência social alcançada para lá das disputas de poder, na organização da vida privada e dos processos culturais. A hegemonia não é imposta pela força das armas; embora não exclua a força, não é através desta que se atinge a hegemonia. E tão pouco significa a obliteração de alternativas. Como dizia João Pina-Cabral (em comunicação oral), a hegemonia é uma forma de dominação em que o dominado participa na sua dominação, a hegemonia sendo como um foco que, ao iluminar uma certa zona, deixa as outras zonas na semi-escuridão. No campo do gênero, trata-se da capacidade de impor uma definição específica, sobre outros tipos de masculinidade, o que significa que o modelo exaltado corresponde, na realidade, a muitos poucos homens. O conceito permite uma concepção mais dinâmica de masculinidade, entendida assim como estrutura de relações sociais, em que várias masculinidades não-hegemônicas subsistem, ainda que reprimidas e auto-reprimidas por esse consenso e senso comum hegemônico, sustentado pelos significados simbólicos incorporados (p. 155).

Contudo, após uma interpretação mais aprofundada quanto aos dados do

campo, compreendi que o significado de ser homem, mulher e homossexual no BBB

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10 não seguia apenas os pressupostos da normatividade, como passividade,

virilidade e afetação, respectivamente. Mas, reafirmo que há de se considerar que há

na sociedade “envolvente” um senso comum hegemônico que reprime e subordina

as feminilidades, masculinidades e sexualidades não-hegemônicas.

Tendo como base as estratégias usadas por Beleli (2007) para relacionar

os estudos de gênero com as propagandas publicitárias, quando analisei os textos e

as imagens produzidas no BBB 10 percebi que as referências às sisters apontavam

que as qualidades percebidas como “naturais” – sensibilidade, importância a família,

algumas vezes ao recato, outras ao sexo – eram enfatizadas para determinar o que

as diferenciava dos brothers. Com isso trago a contribuição de Vale de Almeida

(1995) em que ser homem é para a larguíssima maioria das pessoas não ser mulher

e ser mulher é não ser homem, em que esses agem e se comportam de

determinadas maneiras.

No Capítulo 2, foram ressaltadas algumas construções discursivas de

uma feminilidade, masculinidade e homossexualidade hegemônica. No caso, uma

expectativa do que supostamente é relacionado ao aceitável, por exemplo, a noção

de homem relacionado a praticidade, objetividade, profissionalismo e domínio sobre

qualquer subjetividade ou sentimentalismos. Encontra-se, a partir desta perspectiva

a ilusão da linearidade de gênero.

Para Vale de Almeida (1995) agir de acordo com os desejos e

sentimentos seria, pois, não ser livre. A identidade masculina está conectada ao

autocontrole, uma forma de dominação sobre a vida emocional. E o ser homem para

o senso comum é fundamentalmente não ser mulher, sujeito relacionado a

expressividade dos sentimentos. Além disso, “não é suposto exprimirem livremente

sentimentos e emoções que ponham em causa a imagem de força e auto-suficiência

masculinas” (p. 213).

Quanto a essa linearidade, utilizo nesta dissertação outra palavra, a

moldura que é uma cerca, um limite em que os personagens são submetidos. Essas

molduras tentam manter as identidades fixas e o equilíbrio estabelecido pelo status

quo. E neste caso, Guacira L. Louro (1997) identifica como papéis sexuais:

Papéis seriam, basicamente, padrões ou regras arbitrárias que uma sociedade estabelece para seus membros e que definem seus comportamentos, suas roupas, seus modos de se relacionar ou de se comportar... Através do aprendizado de papéis, cada um (a) deveria

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conhecer o que é considerado adequado (e inadequado) para um homem ou para uma mulher numa determinada sociedade e responder a essas expectativas (p. 24).

Os papéis são normatizações, esperando sempre que o homem seja

prático, objetivo e ligado ao mundo do trabalho, rejeitando a feminilidade no homem,

ou seja, a entrega aos sentimentos, às subjetividades, como se fosse uma imitação

da mulher, algo anti-natural. Esses padrões e normas impostos aos corpos de

homens e mulheres fazem parte de um processo diário e constante de enraizamento

na vida social, indicando, no fim, que essas ações sejam vistas como algo já dado,

ou seja, natural, uma essência do sujeito.

O “essencialismo” é o ponto de vista que tenta explicar as propriedades de um todo complexo por referência a uma suposta verdade ou essência interior. Essa abordagem reduz a complexidade do mundo à suposta simplicidade imaginada de suas partes constituintes e procura explicar os indivíduos como produtos automáticos de impulsos internos (WEEKS, 2010, p. 43).

Esse essencialismo adquire evidência por meio de uma enunciação

repetida da tradição cultivada. A seguir mostrarei como os discursos são vigilantes

para se manter os essencialismos. Mas os corpos mesmo disciplinados tentam-se

libertar-se das molduras.

Neste Capítulo, apresento apenas duas experiências masculinas do BBB

10, pois elas trazem elementos que enriquecem o que foi dito sobre as suas

trajetórias, contidas no Capítulo 2. Estes elementos serão lidos e interpretados à luz

da consolidação do entendimento de que gênero e sexualidade são construídos por

meio de inúmeras aprendizagens e práticas.

De alguma forma, os discursos aqui expostos, retirados do sítio do BBB

10, envolvem não somente referenciais aos escolhidos deste Capítulo que são

Eliéser e Sérgio, mas falam de suas relações com as(os) outras(os) bbbs

destacados na pesquisa, como Tessália, Fernanda, Dicésar e Dourado.

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3.1 AS FACETAS DE ELIÉSER

No Capítulo 2 apresentei alguns dados empíricos sobre como Eliéser foi

concebido como um “tipo peculiar de hétero”, nas apresentações ambíguas de sua

masculinidade (talvez não tão ambígua assim, pois se faz necessário compreender

que às masculinidades abarcam múltiplas formas de apresentação). Neste Capítulo,

quero expor outros dados empíricos para que se torne mais claro o que chamou

atenção quanto à trajetória de Eliéser no BBB 10.

Notícia 01

O casal Cláudia e Eliéser está deitado juntinho no Puxadinho e conversa sobre Caco, o sapo de pelúcia do paranaense. A empresária promove um verdadeiro interrogatório. Quer saber se Eliéser conversa com Caco, como fala, o que fala, entre outras coisas. O engenheiro agrônomo conta que fala com Caco e garante que o sapo o responde. Eliéser diz ainda que eventualmente carrega o sapo com ele no carro. Cláudia ri da situação. “Tô achando diferente”, ela se explica. Eliéser revela ainda que Caco enfeita a cama dele, em sua casa (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em

08022010).

A primeira notícia esboça um estranhamento de Cláudia diante a relação

de Eliéser com um sapo de pelúcia. Há aqui um “choque” a uma verdade que

constrói a masculinidade e a vida adulta, isto é, homens adultos não “devem” se

identificar com pelúcias, tanto por ser um brinquedo, objeto relacionado ao mundo

infantil, e por ser frágil e delicado, correspondendo também à esfera do feminino.

Na notícia 02 há um embate entre Cláudia e Eliéser sobre o que seriam

atitudes “tipicamente” de homem e de mulher. A exploração desta dicotomia

fundamental limita a compreensão da multiplicidade em que se desenvolvem as

relações humanas.

Notícia 02

Depois de mais de dez minutos malhando sem trocar nenhuma palavra, Eliéser finalmente procura falar com Cláudia. Ele começa explicando o que o deixou irritado e lembra o momento na cadeira da varanda, quando a sister se afastou logo que ele encostou a perna nela. Cláudia se irrita e tenta explicar que estava com dor naquele momento, mas para ele, ela ignorou sua atitude. Os dois se mantém irredutíveis em suas posturas e o bate boca fica pesado. "Se eu não olho para você é uma patada. Você me

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chamou de chata. Eu levantei e fui sentar em outro lugar. Eu com dor e você querendo dizer que eu não olhei para a sua cara", grita Cláudia. "Eu me senti ofendido", responde Eliéser. O tom fica cada vez mais alto entre os dois e Eliéser se levanta e ameaça sair. "Você acha que isso é atitude de homem. Falar e sair aindando", fala Cláudia. O engenheiro responde: "Então faz a sua atitude de mulher?" "Se você está chateado porque eu não olhei pra você. Você que me chama de chata só porque eu não olhei pra você. Você tem problema! Até agora você não veio saber como eu estou", grita Cláudia. Batendo a mão no chão, Eliéser grita: "Não interessa o dinheiro pra mim. Eu interpretei que você virou as costas pra mim. Eu to errado e ponto final." O papo continua agitado e eles não se entendem sobre a atitude de Cláudia. Até que numa atitude de raiva Eliéser diz que não consegue ficar sem ela na casa. "Só digo uma coisa, eu não consigo ficar sem você aqui. Se for pra ficar sem você eu vou embora, me manda para o Paredão". Depois disso, ele sai chorando e deixa a sister pensativa

(Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 30012010).

Há vários elementos desta conversa acima que sugerem uma

instabilidade do sujeito, demonstrando que todas as posturas são construídas em

contextos, logo é difícil pensar numa fixação, ou de um suposto “comportamento

típico” masculino. Por exemplo, temos o discurso dicotômico que separa homens de

mulheres e tentam essencializar-se. Há também uma disputa de poder, quando

Eliéser grita, é a sua tentativa de impor-se e subjugar sua namorada às suas

verdades, mas ao final do fragmento, há a desestabilização de uma postura firme,

forte e viril quando Eliéser chora. Enfim, onde está a linearidade de tudo isso?

As notícias 02 e 03 têm em comum a demonstração dos sentimentos de

Eliéser por Cláudia. Na notícia 03, especificamente, vemos que seus colegas de

confinamento Michel, Sérgio e Dicésar o ridicularizam “ele vai ficar uó, vai chorar

muito” e também zombam de sua postura no jogo “é um menino, não sabe lidar bem

com as coisas”.

Como os homens e as mulheres vivem na História, e como também ao longo das suas vidas mudam as conjunturas que as orientam, e os interesses em causa, a masculinidade hegemônica não se mantém sempre igual, nem se reproduz ad eternum. Há conjunturas de contestações e de negociação, quer da parte de homem cuja vivência masculina se afasta da norma, quer da parte das mulheres (VALE DE ALMEIDA, 1995, p. 243).

Há aqui uma tentativa de regulação da postura masculina de Eliéser, em

que se acredita no gênero como uma substância, o indivíduo como uma totalidade

coerente. Ora, se Eliéser é um homem maduro que entrou num jogo para ganhar 1,5

milhões de reais, deveria saber lidar com as tensões, os desentendimentos, as

frustrações e não se deixar abater. Na medida em que isso não aconteceu, sua

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forma de lidar não correspondeu às expectativas, ele foi reduzido a um menino, ou

seja, infantilizado.

Notícia 03

Dicésar, Sérgio e Michel estão no Quarto Tattoo e conversam sobre o desentendimento entre Cláudia e Eliéser. Sérgio e Dicésar pedem que o publicitário conte detalhes do atrito, presenciado por ele. Instantes depois, o trio especula sobre como ficará Eliéser caso Cláudia saia da casa hoje. “Ele vai ficar uó, vai chorar muito”, diz Dicésar. “Ele vai pedir pra sair”, opina Michel. “Você acha?”, pergunta Dicésar, ouvindo o colega dizer que isso é possível. “É um anjo de menino”, diz o maquiador. “Mas é um menino. Não sabe lidar bem com as coisas”, opina Michel. Em seguida, o trio deixa o

cômodo (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 02032010).

A sua construção como homem, portanto, foi considerada incompleta, não

se pode esperar dele que seja um “homem de verdade”, ou seja, a correspondência

a uma masculinidade hegemônica, porque ele ainda é um menino, uma criança,

ainda precisa amadurecer, isto é, aprender a se comportar.

As notícias 04 e 05 ilustram o controle e a vigilância aplicada a um corpo

que tenta desviar-se, mesmo que seja por meio de uma brincadeira ou uma

encenação, de um modelo prescrito, unívoco, linear.

Notícia 04

Mesmo com a roupa do Castigo do Monstro, Eliéser dá um jeito de se divertir com os figurinos da Festa "Rádio Claro". O brother usa saia rosa, peruca e um bustiê e recebe elogios de Dicésar: "Que sorte a sua namorada, hein?".O engenheiro vira atração na pista de dança, enquanto imita os trejeitos de Britney Spears ao som de "Toxic". Cláudia grita: "Me

mata de orgulho!" (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 06022010).

Figura 18 - Eliéser "ataca" de Britney Spears

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

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As falas de Cláudia “me mata de orgulho” e “olha que supermásculo”

sugerem uma incompreensão à multiplicidade de expressões de gênero que são

moldáveis dependendo do contexto e dos momentos.

Notícia 05

O papo sério entre Cláudia (Sarados) e Lia (Sarados) é interrompido por Eliéser (Belos), que aparece correndo de saia na grama. "Faz a Cacau", provoca Lia, ao ver o modelo. "Ele é uma criança mesmo, né?", completa. Enquanto isso, o paranaense dá voltinhas na grama e tenta imitar as curvas de Cláudia. Dicésar (Coloridos) se empolga ao ver Eliéser de sainha e tenta completar o visual. Amarra uma blusa como se fosse um top . "Ser mulher é difícil', brinca o maquiador". Eliéser fica animado e começa a dançar agora com uma camiseta amarada na cabeça. "Faz a louca da rave", brinca Dicésar. Observando calada, até então, a performance do paranaense, Cláudia comenta: "olha que supermásculo" (Fonte:

http://bbb.globo.com/BBB10 em 08022010).

Figura 19 - Eliéser usando saia

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

A masculinidade apresentada por Eliéser desloca-se dos limites da

moldura da normatização. Ao expressar suas subjetividades, ele provoca uma

desilusão quanto ao “comportamento esperado” de uma masculinidade

essencialmente viril que abomina referências à feminilidade. Quando Cláudia o vê

vestido de mulher, rebolando nas festas, que conversa com um bichinho de pelúcia,

ela diante a todas essas situações confessa em um dia a Dicésar que desconfia da

sua heterossexualidade e o chama de gay.

Deitada no Puxadinho com Dicésar (Coloridos), Cláudia (Sarados) confessa: "Acho que ele (Eliéser) é gay". Dicésar diz que não acredita nisso e pergunta o motivo para desconfiança. "Sei lá, o jeito que ele dança". O maquiador fala que os homens modernos são diferentes. "Eles estão ligados em músicas, vídeoclipes, em Madonna, Lady Gaga. Ele é descolado". A empresária conta que Eliéser (Belos) é bem diferente dos homens com quem costuma se relacionar. "Sempre namorei com caras machões". Durante a conversa, Eliéser entra no quarto e Cláudia diz: "Eu

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disse para o Dimmy que achava que você fosse bissexual". Supreso, o paranaense pergunta: "O que é bissexual?". Eliéser nega e deita na cama com Dicésar e Cláudia. "Eu fiquei ofendido com o que você disse". Cláudia e Dicésar diz que não tem motivos para ele ficar ofendido. Cláudia tenta contornar a situação. "Na verdade eu disse que você parecia ter tendência, não que você fosse gay". Dicésar desmente: "Mentira, você disse que ele era gay". Os dois começam a rir e o engenheiro agrônomo sai do Puxadinho. Dicésar fala para Cláudia ir atrás de Eliéser, mas ela não vai. Ela ri e diz que o maquiador entregou ela. "Eu tenho direito a ter minhas

dúvidas" (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 24012010).

Além dela, o apresentador Pedro Bial nomeia o brother como um “tipo

peculiar de hétero”. Eliéser foi lido desta forma, porque não correspondia ao modelo

socialmente dominante e, assim, houve discursos que o constrangeram pelo seu

comportamento desviante.

Estas percepções quanto a masculinidades que vão além dos

estereótipos são desvalorizadas, porque está arraigado no senso comum que só

existe uma forma de ser homem e que todo mundo devia se guiar pelo padrão.

A diferenciação entre os sexos pressupõe a definição do que são características que formam a identidade do masculino e do feminino. Não apenas as mulheres aprendem a ser femininas e submissas, e são controladas nisto, mas também os homens são vigiados na manutenção de sua masculinidade. O controle social sobre os papéis sexuais não afeta apenas as mulheres, mas também se faz sentir sobre os homens (TORRÃO FILHO, 2005, p. 139).

Para Butler (2003), as pessoas são aquilo que sua suposta identidade

define que elas sejam. Porém, as mesmas limitações impostas pela matriz

heterossexual convertem-se em possibilidades de transgressão dessas fronteiras.

Os discursos tanto por meio dos textos do sítio como as imagens editadas

do BBB 10 mostram que a maioria das masculinidades era demonstrada como uma

essência inscrita na natureza dos homens. Há no imaginário social que a produção

das imagens feitas pelas mídias não fogem deste pressuposto que há certo

consenso limitador com relação à existência de um modelo, ou uma moldura que

enquadra os homens e os leva a buscar alcançar a masculinidade hegemônica que

é heterossexual, dominante, branca, racional e forte.

Ao homem é imperativo distanciar-se do oposto – mulheres e gays,

tornando o feminino o aspecto central a ser rejeitado, sob pena de ser (mal) tratado

como tal (núcleo da homofobia) (TONELI, 2006, p. 101).

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Em relação aos homens, a dominação produz homofobia para que, com ameaças, os homens se calquem sobre os esquemas ditos “normais” da virilidade. Mesmo sendo um homem, um grande homem, todo homem está também submetido às hierarquias masculinas. Nesse duplo poder, aparecem homem que têm poder sobre homens e sobre mulheres, estruturando-se, assim, as hierarquias masculinas (id., p. 102).

Conforme os estudos de gênero, há que se compreender as

masculinidades no plural. Entretanto, até que ponto essa pluralidade tem condições

de desafiar as forças exercidas pelo ideal e totalizante modelo hegemônico? Pude

considerar que Eliéser e Michel (por meio de sua amizade com Sérgio e a influência

que este proporcionou a sua concepção de vaidade) demonstraram masculinidades

cambiantes que se construíram por meio das relações sociais, mas seus

comportamentos foram punidos por meio de chacotas e zombarias.

Quanto à amizade de Michel e Sérgio, ele (Bial) indaga: “Por falar em amor quando uma grande amizade se transforma em...”, brinca. O estudante responde: “Toda grande amizade tem amor quando é verdadeira”, declara. Bial quer saber de Michel: “Como você percebe como alguém está apaixonado por você?”, pergunta. O publicitário fica sem jeito: “- Sempre fui meio tosco pra isso não vou saber responder”, diz. (Fonte:

http://bbb.globo.com/BBB10 em 09 032010).

Sobre as relações afetivas de Sérgio comentarei no item a seguir.

3.2 NOVAS CORES E ANTIGAS FORMAS DE SE VER

Se, por um lado, temos a tribo dos coloridos, composta por Dicésar,

Sérgio e Angélica que tenta apresentar uma desestabilização da relação sexo –

gênero – desejo, há por outro lado a tomada de falas e imagens em que se reiteram

normas para as também sexualidades deslocadas. Como, por exemplo, a prática

sexual não convencional entre mulheres necessariamente as masculiniza, a exemplo

da apresentação de Angélica no primeiro dia do programa “Quando eu era pequena

os meus esportes eram mais de meninos, nunca gostei de brincar de boneca” (Fala

de Angélica, anotações do caderno de campo em 12/01/2010).

As imagens de Dicésar usando salto alto, desfilando e “gesticulando

muito” mãos e braços, Sérgio maquiando-se, reafirmaram o discurso que “todo”

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homossexual é efeminado. Os comportamentos de Dicésar e Sérgio foram tomados

como “bichices”, essa categoria nativa indicava que eles “demasiadamente”

movimentavam seus corpos de maneira delicada e os apresentavam por meios de

cuidados com a pele, o uso de maquiagem e cosméticos para cabelos, referências

tidas como “próprias” da feminilidade.

No entanto, mesmo diante a tantas linearidades, é importante destacar

que houve nesta edição um diferencial diante das outras: os gays, os coloridos. Ora,

de certa forma essa “novidade” de expressão de sexualidades alternativas afirma a

existência de práticas sexuais não reconhecidas no modelo hegemônico e que estão

demandando visibilidades e aceitações.

Essa visibilidade inédita foi contestada por Boninho que afirmou em

entrevista que em todas as edições houve a presença de homossexuais, mas que

eles “saíram do armário” apenas na primeira, quinta, sexta e oitava edições.

É inegável o lugar ocupado pelos meios de comunicação na difusão dos

corpos e das sexualidades na contemporaneidade.

Com o advento dos meios de comunicação, as estratégias de produção dos corpos e das “sexualidades” atingem mais rapidamente, e de forma mais eficiente, os corpos. Através da imaginação, ativada pela circulação incessante de imagens e textos, o simbólico se encarrega de proliferar, produzir e incitar a sexualidade (BORGES, L., 2008, p. 137).

Se visibilidade relaciona-se com o termo exposição, temos que o reality

show é um meio de se mostrar personagens talvez “pouco” familiarizados pela

maioria da população brasileira, trazendo à tona uma vontade dos grupos

marginalizados ocuparem espaços privilegiados, como o das mídias. No caso

descrito e analisado por esta dissertação, o grupo que demandava visibilidade e

familiarização é o das pessoas que têm relações afetivo-sexuais com outras do

mesmo sexo.

Todavia, dialogando com as percepções de Borges, L. (2008) essa

visibilidade das marginalidades, trazendo-as para o centro, não significa provocar

uma desorganização das normas e dos modelos hegemônicos. Nas análises feitas

tanto na discussão das trajetórias de Anamara, Angélica, Fernanda e Tessália; como

as de Dourado, Eliéser, Sérgio e Dicésar ainda se evidencia um discurso binário,

essencialista e universal.

Aqui se pode trazer um questionamento sobre esta postura: mas o que se

quer das mídias? Ou, neste caso, de um programa de televisão? Que ele seja palco

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de reformulações de um pensamento social sobre determinada questão? A eles

podemos incluir tamanha agência? Penso que a visibilidade pode ser um meio, mas

não necessariamente um fim.

3.2.1 Homo ou bissexualidade? As diversas relações afetivas de Sérgio

Sérgio, ou melhor, Serginho – a maneira como todos o chamavam,

tornou-se, assim como Eliéser, um personagem ambíguo, mas no caso do primeiro

estabeleceu-se uma dúvida no âmbito da expressão e vivência de sua sexualidade.

Na primeira notícia capta-se elementos que envolvem tanto gênero

quanto sexualidade e corporidade.

E Tessália, da Tribo dos Cabeças, ganha mais carinho. Dessa vez, Alex, também da Tribo dos Cabeças, faz cafuné e massagens na publicitária, que está deitada no futton. Ela já disse, mais de uma vez, que quer dormir. Michel, da Tribo dos Ligados, e Dourado, da Tribo dos Sarados, só observa. Mas os comentários de Tessália são para Sérgio, da Tribo dos Coloridos. "O cara manda bem. Se ele fosse hetero, eu pegava", diz. Logo em seguida, Sérgio, que está na piscina, chama a paranaense, que levanta e deixa Alex sozinho.O trio masculino, então, brinca que Tessália já está falando como Sérgio. Mais cedo, no Jogo da Verdade, o estudante já havia dito que Tessália é uma mulher interessante (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 15/01/2010).

Ao Tessália afirmar “o cara manda bem. Se ele fosse hétero, eu pegava”

evidencia uma masculinidade não heterossexual sob um ponto de vista positivo,

“manda bem”. Contudo, os corpos encontram-se limitados ao que se espera como

possível, que seria ela como mulher heterossexual poder se relacionar somente com

um homem que também seja heterossexual. Ao dizer “eu pegava”, Tessália

demonstra sua posição como mulher não submissa, indicando suas escolhas e

desejos.

Na segunda notícia temos uma colocação às claras sobre a vigilância

quanto à sexualidade:

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Ao falar com os brothers, Bial brinca com Sérgio: "Vou colocar Serginho na berlinda agora porque botam dúvidas sobre a sexualidade dele. Fernanda, você que deixou o 'serginho do Serginho' alerta, o que você acha?", diz o apresentador. Fernanda responde, entre gargalhadas: "Já falei que mato ele se ele não for gay". Depois, ela emenda: "Eu espero que ele seja gay". O apresentador põe em cheque a opinião da sister: "Então, você acha que ele não é gay?". Todos os brothers riem. Bial fala com Cadu e quer a opinião do brother sobre a sexualidade de Sérgio. “É malandro. Tá aí com essa cara, mas não engana ninguém. Tá se aproveitando de todas as meninas. Já viu todas peladas”, o carioca diz. “Dormiu de conchinha com as meninas, dorme pelado”, Dourado lembra. O apresentador pede agora que Cláudia, “que namora um tipo peculiar de hetero”, dê a sua opinião. “Também desconfio que ele seja bi, bissexual. Ele dorme com todas as meninas, aperta o bumbum, perna”, a empresária diz (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em

25022010).

Quando Bial diz “vou colocar Serginho na berlinda agora, porque botam

dúvidas sobre a sexualidade dele”, inicia-se um pequeno interrogatório aos outros

bbbs (Cláudia, Dourado e Cadu) sobre como eles compreendem a vivência da

sexualidade de Serginho. Ora, as respostas a essas perguntas mostram que há uma

vigilância para que a pessoa assuma uma única postura. Por exemplo, se ele entrou

na casacenário se auto-identificando como gay, ele precisa permanecer assim até o

final sem se desviar, ou seja, para o “senso comum” é difícil compreender uma

fluidez, dinamicidade ou alterações identitárias, como é expresso por Hall (2000).

Para eles, essa dinamicidade é “malandragem”.

Existe uma contradição entre essa forma de lidar feita pelo senso comum

e o mundo vivido, pois quanto a este último é complicado admitir que exista uma

identidade sexual absoluta, ou uma identidade intrínseca, ou seja, quer se dizer que,

uma vez que se assume gay há que se condicionar o sujeito a viver apenas

experiências homoafetivas?

Para Louro (2010), o desafio maior talvez seja admitir que as fronteiras

sexuais e de gênero vêm sendo constantemente atravessadas e, o que é ainda mais

complicado admitir, que o lugar social no qual alguns sujeitos vivem é exatamente a

fronteira. A posição de ambiguidade entre as identidades de gênero e/ou sexuais é o

lugar que alguns escolheram para viver.

Diante desses posicionamentos quanto a uma suposta identidade sexual,

há o perigo em trazer à tona a noção de uma essência, como está dita na fala de

Sérgio abaixo:

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Os brothers curtem churrasco feito por Dourado do lado externo da casa e aproveitam para bater papo. Eles conversam sobre laços afetivos com pessoas fora da casa e afirmam que têm amigos de muito tempo. Fernanda, por exemplo, conta que tem uma amiga há 15 anos e Anamara diz que tem amigas desde os 12 anos de idade. Enquanto o lutador se ocupa das carnes na grelha, a dentista, a baiana e Sérgio aproveitam para bater-papo sobre sexualidade. O estudante, então, revela: “Posso ser gay e gostar de uma garota‟. E explica: “A minha essência é gay, mas eu posso ficar com uma garota”. Sérgio continua e revela: “Meus amigos gays só se apaixonam por homens ou por gays”. Anamara não deixa passar a oportunidade e questiona: “Mas, e a Fernanda?”. Ele conta: “Mas com a Fernanda é diferente”. A dentista observa com um leve sorriso no rosto (Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10 em 21/03/10)

“É estranho pensar em essências, porque os corpos não são naturais,

eles são construídos em um processo minucioso, sutil, sempre inacabado” (LOURO,

2008, p. 18). Diante dessa construção infindável a pergunta que se coloca é: somos

capazes de lidar com esta fluidez? Talvez os produtores do BBB 10 e os próprios

sujeitos deste reality ainda não. Eles constantemente censuraram e constrangeram o

“não-lugar” de Serginho, assim como dos outros brothers e das sisters. Seguem as

notícias abaixo:

A dançarina Lia se junta ao trio Michel, Sérgio e Dicésar na varanda e a conversa fica mais animada. Lia brinca que Sergio é ordinário. “Ele é hetero, safado. Meus pais devem tá querendo te pegar”. Michel entra no papo e opina também: “Ele é bissexual”. Sérgio acha graça: “Obrigado”. Continuando o papo sobre sexualidade, Lia revela que se fosse homem gostaria de ficar com a cantora Ivete Sangalo. “Acho ela linda” (Fonte:

http://bbb.globo.com/BBB10 em 08032010).

Após falar um pouco sobre sua ex-namorada, Sérgio resolve fazer uma pergunta direta para a dentista Fernanda. "Fernanda, como é o seu beijo?", quer saber. "Meu beijo? Meu beijo é bom", responde a dentista, meio sem graça. Anamara resolve amenizar o clima e faz uma paródia com a música "Rebolation", do grupo baiano Parangolé. "O meu beijo é bom, bom, o meu beijo é bom, bom, bom", diz. Logo depois, eles resolvem falar sobre a sexualidade de Sérgio. "Serginho, você não se decidiu ainda. Acho que você gostava das coisas de meninas e por isso quis ver como seria ser homossexual, mas ainda tem um fiozinho de homem", opina Anamara (http://bbb.globo.com/BBB10, em 11/03/10).

Para Louro (2010), as classificações binárias dos gêneros e da

sexualidade não mais dão conta das possibilidades de práticas e das identidades.

Isso não significa que os sujeitos transitem livremente entre esses territórios.

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Talvez seja um exagero ver a trajetória de Serginho como alguém que

“lutou bravamente” para se definir como homossexual e sentiu-se ofendido por o

declararem com bissexual. Na verdade, Serginho não estava preocupado ou

interessado em discutir sua sexualidade. Os outros, os “vigilantes” é que sentiam-se

incomodados com o seu trânsito ou intimidadeproximidade com as sisters, talvez

por identificarem essas características como possíveis somente aos homens

heterossexuais ou aos bissexuais. Mas diante a estes últimos também existem

ressalvas. Aliás, não foram somente os brothers e o apresentador que sentiram-se

incomodados ao se observar as falas “ele é malandro” “se aproveita das meninas”,

ao pensarem que talvez Serginho fosse hétero, as sisters sentiam-se “enganadas”

ou sofrendo algum “abuso”. Por exemplo, temos a frase de Fernanda “se ele não for

gay, eu mato ele”.

Esta visão dos brothers, sisters e produção do programa consideram o

sexo como algo perigoso, perturbador e que necessariamente precisa ser regulado e

controlado. Como escreveu Foucault (2004), o sexo descontrolado do homem é a

imagem daquilo que Adão havia sido em relação a Deus: um rebelde. Mas, será que

Serginho era um rebelde? Talvez, não. Na maioria das vezes, ele “levantava a

bandeira” da identidade homossexual, mas em outros ele desejava romper o

discurso ou os discursos de verdade construído(s) para si e apenas viver as

experiências que estavam diante dele.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao aproximar meu estudo com os de Fischer (2001) concordo que os

meios de comunicação, no caso aqui analisado o programa de televisão e sítios de

notícias do BBB, mostram-se como lócus privilegiado de informação, de “educação”

das pessoas, ao que a autora chamou de dispositivo pedagógico da mídia, pois, por

meio das diversas estratégias de linguagem as mídias fazem a mediação da

produção e da circulação de uma série de “verdades” e, no caso do interesse desta

pesquisa, “verdades” sobre homens, mulheres e gays.

A atenção dada aos discursos enunciados dentro do BBB 10 quanto à

produção dos sujeitos, no caso dos sujeitos mulher, gay e homem nas suas múltiplas

formas de aparição, foi importante para se questionar um determinado modo de

compreensão do que seria uma identidade de gênero e também quanto às

expressões de sexualidades normativas e dissidentes ora como algo indesejável,

inadequado, ora como estratégia de divulgação para se assistir ao programa. Então,

lançou-se como questão: como as categorias gênero e sexualidade atuariam nas

relações sociais vividas num reality show?

Quando expus as formas de expressões das linearidades e

deslocamentos tanto de gênero quanto a respeito da sexualidade foi para relativizar

os modos pelos quais a produção do programa compreendeu cada trajetória dos

participantes do BBB 10, demonstrando que mesmo quando se explora a exposição

da diversidade sexual e de gênero há exclusões, punições e tentativas de

reiterações, ou seja, concepções de normatividade.

A importância em se evidenciar esses discursos segue a mesma

preocupação de Beleli (2005, 2007, 2009), Rial (2005), Borges L (2008) e

Hamburger (2005) sobre as mídias. Esta pesquisa diferenciou-se destas autoras

quanto ao objeto escolhido, não houve o interesse pelas mídias impressas ou as

novelas, mas por um reality show, o Big Brother Brasil. Entretanto, há possíveis

aproximações com estes trabalhos, como a ideia principal em pensar quais eram as

formas de feminilidade, masculinidade e homossexualidade reforçadas, imaginadas

e polemizadas. No caso específico do BBB, como se dava a construção dos sujeitos

ao se editar as suas intimidades?

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Nas performances e nos discursos acerca de personagens como os de

Fernanda, Dourado, Sérgio e Dicésar, houve a exposição de algumas molduras, isto

é, estereótipos, que os reduziram a “santinha” x “diabinha” (modelo dicotômico),

bruto e espalhafatosos, respectivamente. Outros escaparam dos modelos tidos

como eternos e universais e serviram como indicações que os meios de

comunicação não apenas são veículos de reiterações ou apresentam os sujeitos de

forma unívoca, mas que mesmo dentro de uma edição que utiliza recortes em que

se privilegia as referências do status quo há uma margem de visibilidade para os

deslocamentos, transgressões e fluidez dos sujeitos, como se observou nas

trajetórias de Anamara, Tessália, Eliéser. Podemos colocar no quadro das margens

todos os “coloridos” (Angélia, Dicésar, Serginho), pois foi a partir deles que se

questionou a “heterossexualidade compulsória” (Rich, 2010).

Há, então, o estabelecimento de articulações entre comportamentos que

ora reiteravam e ora desarticulavam as prescrições. Tanto aqueles apresentados

acima como “emoldurados” também, em alguns momentos, demonstraram

questionamentos a um perfil, a uma lógica linear. O contrário também ocorreu,

aqueles que indicavam deslocamentos também produziram normatizações.

Por exemplo, os chamados coloridos, os quais a produção do programa

tentava indicar uma diversidade de cores, uma metáfora à promoção da diversidade

de experiências sexuais, foram enquadrados; ora Dicésar e Serginho foram tidos

como afetados, espalhafatosos e Angélica a lésbica masculinizada. Dentro de um

quadro de imagens que comentava sobre a vaidade dos bbbs no sítio do programa

na internet, a foto de Angélica estava com a seguinte legenda: “até Angélica se

rendeu a maquiagem”. O que se deve deixar claro diante a essas imagens

limitadoras é que a homossexualidade não é uma categoria universal ou uma

identidade sexual fixa (Gamson, 2002). Logo, o BBB da diversidade teve o seu

limite, teve o seu enquadramento.

Para Fischer (2001), nas mídias de nossos dias, os modos como se

constroem representações da afetividade, do corpo, da sexualidade de todas as

faixas de idade e de todas as condições sociais indicam uma tensão entre as

concepções trazidas pelas inúmeras conquistas das lutas dos movimentos sociais

(dissidências) e as concepções universalistas (cristalizações). Se há uma íntima

ligação entre poder e subjetividade (Foucault, 1990) não há uma incoerência em

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afirmar tais tensões. Se os corpos são disciplinados, não é de qualquer modo que se

fala sobre as subjetividades.

Em uma sociedade como a nossa, conhecemos, é certo, procedimentos de exclusão. O mais evidente, o mais familiar também, é a interdição. Sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. (...) Notaria apenas que, em nossos dias, as regiões onde a grade é mais cerrada, onde os buracos negros se multiplicam, são as regiões da sexualidade e as da política: como se o discurso, longe de ser esse elemento transparente ou neutro no qual a sexualidade se desarma e a política se pacifica fosse um dos lugares onde elas exercem, de modo privilegiado, alguns de seus mais temíveis poderes. Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o atingem revelam logo, rapidamente sua ligação com o desejo e com o poder. Nisto não há nada de espantoso, visto que o discurso não é simplesmente aquilo que manifesta (ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é o objeto do desejo; e visto que – isto a história não cessa de nos ensinar – o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar (FOUCAULT, 2010, p.10).

No entanto, mesmo que se fale das subjetividades por meio de

estereótipos ou modelos binários, sabemos que o sujeito diante da dinamicidade de

sua vivência não se fixa a essa estrutura padronizada, ele escapa, ele sai das

molduras e no caso do BBB 10 percebeu-se que isso aconteceu. Apenas é

importante frisar que quando as fugas ocorreram, a maioria delas foi punida. No

caso, a punição que existia no programa era por meio de constrangimento e/ou

“eliminação”. Os deslocamentos dos sujeitos eram considerados como

dissimulações e falsidades, o que era um critério de votação ao “paredão”, no

“confessionário” ou pelo “líder”.

Ao não se identificar uma “autenticidade” nas “verdades” ou ações dos

sujeitos deslocados, principalmente falando de Dicésar que foi, inúmeras vezes,

taxado de falso, abre-se precedência para se duvidar do próprio caráter daquele que

subverte ou não se condiciona aos modelos binários. As generalizações incorretas

que usam esse pressuposto da “autenticidade”, de certa forma “sufocam” o sujeito

não permitindo que o mesmo seja tratado em sua completude, negando-lhe o direito

de ser quem ele é ou almeja ser.

No caso de Eliéser, suas atuações desorganizaram a masculinidade

heterossexual hegemônica, promovendo o conhecimento que existem outras

masculinidades que integram a demonstração de sentimentos, a exposição do corpo

com gesticulações, a utilização de adereços tidos como restritamente femininos à

heterossexualidade. Por apresentar estas ambiguidades, o que na verdade não seria

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uma ambiguidade, mas flutuações de um sujeito que não age ou vive num

continuum, seu personagem foi interpretado no formato de zombaria, considerado

um “banana”, metáfora ligada a um homem fraco e bobo, também “um tipo peculiar

de hétero”, além de “estabanado” e “sem noção”.

Com toda a fluidez das identidades, dos discursos e das performances,

um homem não pode ser um “homem fraco”. Quanto a Serginho e Dicésar, um

homem gay tem que ser um homem “firme”, autêntico, jamais falso. A partir desta

prescrição, coloca-se como evidente a frase de Dourado a Dicésar “independente da

sua opção sexual, seja homem” como uma a tentativa de regulação dos corpos.

As concepções quanto às feminilidades de Tessália e Anamara seguiram

nesta mesma linha, ao apresentarem atuações dissidentes. Por exemplo, a primeira

ao se colocar como estrategista, foi concebida por Lia como perigosa e dissimulada

e assim foi indicada ao “paredão”. Quanto a Anamara, ao colocar a objetividade

(ganhar o prêmio) como um valor acima dos sentimentos (a construção das

amizades dentro do programa) foi concebida como gananciosa e também indicada

ao “paredão”. Todas essas dissidências tendem a ser punidas, porque atributos

considerados masculinos (objetividade, racionalidade e não expressão de

sentimentos) não são positivos ao serem encontrados em mulheres. E quanto a

Eliéser, por exemplo, ocorre o contrário, atributos considerados femininos (o seu

jeito de dançar, o uso de um vestuário com referências femininas, a expressão de

seus sentimentos por Cláudia) desqualificam homens que os possuem.

A natureza explica a essência de cada sexo, e perverter esta distribuição de atributos é perverter a própria natureza, sempre sábia em suas decisões. Neste domínio do binário, as práticas e comportamentos sexuais e afetivos que não obedecem esta distinção dual serão tomados, como desvio, perversão (TORRÃO FILHO, 2005, p. 144).

E Fernanda? Ela foi a única que não foi punida. Aliás, desejou-se que sua

trajetória não seguisse apenas o caminho de uma “moça”, na verdade, de uma

“santinha”. A carta entregue a ela, ao conquistar a liderança, a convenceu a se

“soltar mais”, o que trouxe o seu lado “diabinha”. Talvez a aceitação de sua fuga, ou

escape à sua moldura inicial, foi aceita porque ainda a manteve num modelo binário,

também aceito socialmente. No cotidiano aceita-se a sentença “dama na rua e puta

na cama”. Ora, Fernanda transitou entre essas definições: era dama, meiga, cheia

de bons modos nas suas relações diárias com os bbbs, mas nas festas sensualizava

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e paquerava os brothers. Quanto à atuação de Fernanda, vemos a prescrição de um

enunciado que remete a um modo de construir a mulher entre a sedução e a

submissão (menina, meiga, delicada, vaidosa).

Mesmo apresentando divergências entre as assimilações das trajetórias

destas sisters, temos que todas elas estavam constituindo-se e sendo constituídas

diariamente. Então, será que podemos falar em linearidades? Em produção de um

discurso hegemônico? Mesmo que haja tantos enquadramentos por parte dos meios

de comunicação, os discursos nos confundem, a complexidade é tamanha que

sempre há margens, há espaços.

Diversas posições e formas de subjetividade podem ser entendidas como efeitos de um campo enunciativo. Ou seja, quando analisamos nos produtos televisivos as regularidades, as frequências, a distribuição dos diferentes elementos das enunciações, a respeito dos vários grupos de mulheres, estamos entendendo que naquele lugar específico há, mais do que indivíduos concretos a falarem, sujeitos sendo constituídos e constituindo-se, uma vez que, como escreve Foucault, o sujeito dos enunciados é um “lugar determinado e vazio”, que pode ser ocupado efetivamente por indivíduos diferentes (FISCHER, 2001, p.596).

A proposta inicial desta pesquisa, ao trazer à tona os modos como se deu

a visualização das sisters, dos brothers e dos coloridos, era para problematizar os

discursos acerca de gênero e sexualidade e demonstrar como se reduziam as

masculinidades, feminilidades e homossexualidades a estereótipos, normas e

expectativas do status quo. Todavia, ao longo da pesquisa percebi que deveria

atentar-me para o que saltava à moldura, trazendo novas interpretações sobre os

meios de comunicação, em que há a inclusão de múltiplos e complexos cruzamentos

entre as linearidades e os deslocamentos. Mesmo diante das punições, não há

como impedir as vivências das diferenças e das subversões.

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SWAIN, Tania N.“Feminismo e recortes do tempo presente: mulheres em revistas „femininas‟. São Paulo em Perspectiva, v. 15, n. 3, p. 67-81,2001.

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THOMPSON, John B. Ideologia e Cultura Moderna. Petrópolis: Vozes, 1998.

TONELI, Maria Juracy Filgueiras. Homofobia em contextos jovens urbanos: contribuições dos estudos de gênero. Psic, São Paulo, v. 7, n. 2, dez. 2006 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-73142006000200005&lng=pt&nrm=iso>. acessos em abril de 2011.

TORRÃO FILHO, Amílcar. Uma questão de gênero: onde o masculino e o feminino se cruzam. Cadernos Pagu, Campinas, n.24, jan./jun. 2005, p. 127-15.

VALE DE ALMEIDA, Miguel. Senhores de Si. Uma Interpretação Antropológica da Masculinidade. Lisboa: Fim de Século. 1995.

VELHO, Gilberto. Individualismo e cultura: notas para uma antropologia da sociedade contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

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139

WEEKS, Jeffrey. “O corpo e a sexualidade”. In: LOURO, G. O Corpo Educado – pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

Sítios: BLOG DA PRODUÇÃO. Os selecionados. Disponível em < http://bbb.globo.com/platb/diariodaproducao/2010/01/05/videos-o-que-dizem-os-selecionados/> Acesso em julho de 2011. CONDE, Aline. BBB 10: Eliéser e sua mãe viraram alvo da fúria da torcida de Dourado. Disponível em <http://extra.globo.com/tv-e-lazer/bbb/bbb-10-elieser-sua-mae-viraram-alvo-da-furia-da-torcida-de-dourado-378448.html > Acesso em julho de 2011. DA FOLHA ON LINE. "BBB10" registra sua maior audiência com eliminação de Angélica. Disponível em < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u698305.shtml> Acesso em julho de 2011. EDITORIAL DO BBB10. “Conheça melhor as tribos do BBB 10”. Disponível em <http://bbb.globo.com/BBB10/Noticias/0,,MUL1449409-17402,00-CONHECA+MELHOR+AS+TRIBOS+DO+BBB.htm > Acesso em 10 de julho de 2011. EDITORIAL DO BBB10. “Retrospectiva: divisão dos brothers em tribos, uma das novidades do BBB 10”. Disponível em <http://bbb.globo.com/BBB10/Noticias/0,,MUL1544311-17402,00- FAMOSIDADES. “BBB 10”: Ibope é alto, mas não satisfaz Boninho . Disponível em< http://entretenimento.br.msn.com/bbb/noticias-artigo.aspx?cp-documentid=23252707 > Acesso em julho de 2011. Final do "BBB 10" registra recorde de audiência. Disponível em < http://natelinha.uol.com.br/2010/03/30/not_30164.php > Acesso em julho de 2011. de 2011. http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/ http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx?edicao=2148&pg=216 http://contigo.abril.com.br.

KOGUT, Patrícia. O público do 'BBB' é conservador?Disponível em < http://oglobo.globo.com/cultura/kogut/posts/2011/02/28/critica-publico-do-bbb-conservador-365753.asp > acesso em julho de 2011.

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140

LISTA DOS PARTICIPANTES DO BBB. Disponível em < http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_participantes_do_Big_Brother_Brasil#cite_note-194> Acesso em julho de 2011.

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GLOSSÁRIO

Blog (contração do termo inglês Web log, diário da Web) entende-se por um diário

virtual cuja estrutura permite a atualização rápida a partir de acréscimos dos

chamados artigos, ou posts. Eles têm como foco a temática proposta do blog,

podendo ser escritos por um número variável de pessoas, ou por apenas uma. Um

blog típico combina texto, imagens e links (hiperligações, ou seja, novos textos em

outras páginas da internet). A capacidade de leitores deixarem comentários de forma

a interagir com o autor e outros leitores é uma parte importante de muitos blogs.

(Fonte: http://pt.wikipedia.org).

Brothers: termo usado pelo programa para designar os homens.

Caps Lock: item do teclado de um computador que torna as palavras digitadas em formato maiúsculo. Chat: bate papo na internet.

Estaleca: a moeda do Big Brother Brasil

Posts: comentários de pessoas que lêem os blogs

Reality show: é um tipo de programa que constrói uma realidade, onde o sistema de

crença substitui o real por outro real construído dentro da televisão. (Cruz, 2007).

Selinho: beijo rápido com apenas o toque dos lábios.

Sisters: termo usado pelo programa para designar as mulheres.

Slideshow: é uma coletânea de fotos realizada num programa específico para

tratamento de fotos realizadas por meio de um computador.

Slogan: é um recurso dos meios de comunicação para fácil memorização e também

tem a função de ser um atrativo diferencial diante aos vários bombardeios

informacionais de numerosas fontes da mídia. (Fonte:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Slogan).

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Sms: Serviço de mensagens curtas (em inglês: Short Message Service, SMS) é um

serviço disponível em telefones celulares que permite o envio de mensagens curtas

(até 255 caracteres) conhecidas popularmente como mensagens de texto. (Fonte:

(http://pt.wikipedia.org).

Trending Topics ou TTs são uma lista em tempo real dos nomes mais postados no

twitter (em português – tuíter) pelo mundo todo. Valem para essa lista as hashtags

(#) e nomes próprios (Fonte: http://pt.wikipedia.org).

Twitter: é uma rede social e servidor para microblogging, que permite

aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos (em textos

de até 140 caracteres, conhecidos como "tweets"). (Fonte: (http://pt.wikipedia.org).

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ANEXOS

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ANEXO A – Big Brother ao redor do mundo

Região Nome Local

Website oficial Canal Vencedores

África[1]

Big Brother Africa M-Net DStv(em directo)

Edição 1, 2003: Cherise

Makubale (Zâmbia)

Edição 2, 2007: Richard Dyle

Bezuidenhout(Tanzânia)

Edição 3, 2008: Ricardo Ferreira

Venancio, "Ricco" (Angola)

Edição 4, 2009: Kevin

Chuwang (Nigéria)

Big Brother Africa:

All-Stars

DStv(em directo), M-

Net

Edição 5, 2010: Uti

Nwachukwu (Nigéria)

África do Sul

Big Brother South

Africa M-Net

Edição 1, 2001: Ferdinand Rabie

Edição 2, 2002: Richard Cawood

Celebrity Big Brother M-Net Edição 1, 2002: Bill Flynn

Albania Big Brother

Web oficial

Top-Channel

DigitalAlb (em dircto)

Edição 1, 2008: Arbër Çepani

Edição 2, 2009: Qetsor Ferunaj

Edição 3, 2010: Jetmir Salaj

Edição 4, 2011: Próxima edição

Alemanha [2] Big Brother

Website oficial

RTL

RTL II

Tele 5

Edição 1, 2000: John Milz

Edição 2, 2000: Alida Kurras

Edição 3, 2001: Karina Schreiber

Edição 4, 2003: Jan Geilhufe

Edição 5, 2004-05: Sascha Sirtl

Edição 6, 2005-06: Michael Knopf

Edição 7, 2007: Michael Carstensen

Edição 8, 2008: Isi Kaufmann

Edição 9, 2008-09: Daniel Schöller

Edição 10, 2010: Timo Grätsch

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Edição 11, 2011: Próxima edição

Argentina[3]

Gran Hermano

Big Brother

Website oficial

Telefe

Canal 4 (Uruguai)

Edição 1, 2001: Marcelo Corazza

Edição 2, 2001: Roberto Parra

Edição 3, 2002-03: Viviana Colmenero

Edição 4, 2007: Marianela Mirra

Edição 5, 2007: Esteban Morais

Edição 6, 2011: Próxima edição

Gran hermano

famosos Telefe Edição 1, 2007: Diego Leonardi

Austrália

Big Brother Australia

Website oficial

Network Ten

TV 2 (Nova Zelândia)

Edição 1, 2001: Ben Williams

Edição 2, 2002: Peter Corbett

Edição 3, 2003: Regina Bird

Edição 4, 2004: Trevor Butler

Edição 5, 2005: Greg Mathew[4]

Edição 6, 2006: Jamie Brooksby

Edição 7, 2007: Aleisha Lee Cowcher

Edição 8, 2008:[5] Terri Munro

Celebrity Big Brother Network Ten Edição 1, 2002: Dylan Lewis

Bélgica

Big Brother Bélgica Kanaal Twee

Edição 1, 2000: Steven Spillebeen

Edição 2, 2001: Ellen Dufour

Edição 3, 2002: Kelly Vandevenne

Edição 4, 2003: Kristof van Camp

Edição 5, 2006: Kirsten Janssens

Edição 6, 2007: Diana Ferrante

Big Brother VIPs

Website oficial

VTM (2001)

Kanaal Twee

Edição 1, 2001: Sam Gooris

Edição 2, 2006: Pim Symoens

Big Brother All Stars Kanaal Twee Edição 1, 2003: Heidi Zutterman

Brasil Big Brother Brasil

Website oficial

Rede Globo

Multishow

Edição 1, 2002: Kléber de Paula

(BamBam)

Edição 2, 2002: Rodrigo Leonel Fraga

(Cowboy)

Edição 3, 2003: Dhomini Ferreira

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Edição 4, 2004: Cida da Silva

Edição 5, 2005: Jean Wyllys

Edição 6, 2006: Mara Viana

Edição 7, 2007: Diego Gasques

(Alemão)

Edição 8, 2008: Rafael Ribeiro

Medeiros (Rafinha)

Edição 9, 2009: Maximiliano Porto

(Max)

Edição 10, 2010: Marcelo Dourado

(Dourado)

Edição 11, 2011: Maria Helena Melilo

Bulgária

Big Brother

Website oficial NTV

Edição 1, 2004-05: Zdravko Vasilev

Edição 2, 2005: Miroslav Atanasov

Edição 3, 2006: Lyubov Stancheva

Edição 4, 2008: Georgi Georgiev

Alurkov

Big Brother Family NTV Edição 5, 2010: Eli & Vesselin

Kouzmovi

VIP Brother

Website oficial NTV

Edição 1, 2006: Konstantin Slavov

Edição 2, 2007: Hristina Stefanova

Edição 3, 2009: Deyan Slavchev

Canadá[6]

Loft Story Website oficial

TQS

Edição 1, 2003: Julie Lemay & Samuel

Tissot

Edição 2, 2006: Mathieu Baron &

Stéphanie Bélanger

Edição 3, 2006: Jean-Philippe Anwar

& Kim Rusk

Edição 4, 2007: Mathieu Surprenant

Edição 5, 2008: Charles-Éric Boncoeur

Loft Story: La

Revanche TQS Edição 6, 2009: Sébastien Tremblay

Big Brother V Edição 7, 2010: Vincent Durand Dubé

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147

Colômbia Gran Hermano Colombia

Caracol TV Edição 1, 2003: Mónica Tejón

Croácia

Big Brother

Website oficial RTL Televizija

Edição 1, 2004: Saša Tkalčević

Edição 2, 2005: Hamdija Seferović

Edição 3, 2006: Danijel Rimanić

Edição 4, 2007: Vedran Lovrenčić

Edição 5, 2008: Krešimir Duvančić

Celebrity Big Brother RTL Televizija Edição 1, 2008: Danijela Dvornik

Dinamarca

Big Brother Danmark TV Danmark

Edição 1, 2001: Jill Liv Nielsen

Edição 2, 2001: Carsten B. Berthelsen

Edição 3, 2003: Johnni Madsen

Big Brother VIP TV Danmark Edição 1, 2003: Thomas Bickham

Big Brother Reality

All Stars TV Danmark

Edição 1, 2004: Jill Liv Nielsen (Big

Brother)

Equador

Gran Hermano

Equador

Big Brother

Ecuavisa Edição 1, 2003: David Burbano

Escandinávia[7]

Big Brother

Website oficial

Website oficial

Kanal5 (Suécia)

TVN (Norway)

Edição 1, 2005: Britt

Goodwin (Noruega)

Edição 2, 2006: Jessica

Lindgren (Suécia)

Eslováquia Big Brother Súboj TV Markíza Edição 1, 2005: Richard Tkáč

Eslovênia

Big Brother

Website oficial Kanal A

Edição 1, 2007: Andrej Novak

Edição 2, 2008: Naske Mehić

Big Brother Slavinh (Celebridades)

POP TV Edição 1, 2010: Edição actual

Espanha

Gran Hermano

España

Website oficial

Telecinco

Edição 1, 2000: Ismael Beiro

Edição 2, 2001: Sabrina Mahi

Edição 3, 2002: Javito García

Edição 4, 2002-03: Pedro Oliva

Edição 5, 2003-04: Nuria Yáñez

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148

Edição 6, 2004: Juan José Rocamora

Edição 7, 2005-06: Pepe Herrero

Edição 8, 2006: Naiala Melo

Edição 9, 2007: Judit

Edição 10, 2008-09: Iván Madrazo

Edição 11, 2009-10: Ángel Muñoz

Edição 12, 2010-11: Edição atual

Gran Hermano VIP

Website oficial Telecinco

Edição 1, 2004: Marlene Mourreau

Edição 2, 2005: Ivonne Armand

Gran Hermano: El

Reencuentro Telecinco

Edição 1, 2010: José Herrero, "Pepe"

& Raquel López

Estados Unidos

Big Brother

Website oficial

CBS

Global (Canadá)

Edição 1, 2000: Eddie McGee

Edição 2, 2001: Will Kirby

Edição 3, 2002: Lisa Donahue

Edição 4, 2003: Jun Song

Edição 5, 2004: Drew Daniel

Edição 6, 2005: Maggie Ausburn

Edição 7, 2007: Dick Donato

Edição 8, 2007: Adam Jasinski

Edição 9, 2008: Dan Gheesling

Edição 10, 2009: Jordan Lloyd

Edição 11, 2010: Hayden Moss

Edição 12, 2011: Próxima edição

Big Brother: All-Stars Website oficial

CBS Global (Canadá)

Edição 7, 2006:[8] Mike "Boogie"

Malin

Filipinas

Pinoy Big Brother

Website oficial ABS-CBN

Edição 1, 2005: Nene Tamayo

Edição 2, 2007: Bea Saw

Edição 3, 2009-2010: Melissa

Cantiveros

Pinoy Big Brother:

Celebrity Edition

Website oficial

ABS-CBN Edição 1, 2006: Keanna Reeves

Edição 2, 2007-2008: Ruben Gonzaga

Pinoy Big Brother:

Teen Edition ABS-CBN

Edição 1, 2006: Kim Chiu

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149

Website oficial Edição 2, 2008: Ejay Falcon Edição 3,

2010: James Reid

Finlândia Big Brother Suomi

Website oficial SubTV

Edição 1, 2005: Perttu Sirviö

Edição 2, 2006: Sari Nygren

Edição 3, 2007: Sauli Koskinen

Edição 4, 2008: Anniina Mustajärvi

Edição 5, 2009: Aso Alanso

Edição 6, 2010: Edição atual

França[6]

Loft Story M6 (2001-2002)

TF1

Edição 1, 2001: Christophe Mercy &

Loana Petrucciani

Edição 2, 2002: Karine Delgado &

Thomas Saillofest

Secret Story

TF1

CanalSat(em directo)

Edição 1, 2007: Marjorie, Cyril e

Jhoanna Bluteau (" Les triplets")

Edição 2, 2008: Matthias Pohl

Edição 3, 2009: Emilie Nefnaf

Edição 4, 2010: Benoit Dubois

Grécia[9]

Big Brother

ANT1 (Edição 1-4)

Alpha TV

Edição 1, 2001: Giorgos Triantafyllidis

Edição 2, 2002: Alexandros Moskhos

Edição 5, 2010: Edição atual

The Wall ANT1 Edição 3, 2003: Thodores Jspógloy

Big Mother ANT1 Edição 4, 2005: Nikos Papadopoulos

Holanda

Big Brother

Website oficial

Veronica (1999-2000)

Yorin (2001-2002)

Talpa

Edição 1, 1999: Bart Spring in 't Veld

Edição 2, 2000: Bianca Hagenbeek

Edição 3, 2001: Sandy Boots

Edição 4, 2002: Jeanette Godefroy

Edição 5, 2005: Joost Hoebink

Edição 6, 2006: Jeroen Visser

Big Brother VIPs

Hotel Big Brother

Website oficial

Veronica (2000)

Talpa

Edição 1, 2000: Sem vencedor

Edição 2, 2006: Sem vencedor

Page 152: PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E ... · FICHA CATALOGRÁFICA (Elaborada por Diule Queiroz CRB 2491) Almeida, Katianne de Sousa C364p Personagens emolduradas: os

150

Hungria

Big Brother

Nagy Testvér TV2

Edição 1, 2002: Éva Párkányi

Edição 2, 2003: Zsófi Horváth

Big Brother VIP TV2 Edição 1, 2003: Ganxsta Zolee

Índia

Bigg Boss

Website oficial

Website oficial

SET(Edição 1)

Colors TV(Edição 2-

presente)

Edição 1, 2006-07: Rahul Roy

Edição 2, 2008: Ashutosh Kaushik

Ediçao 3, 2009: Vindu Dara

Singh Edição 4, 2010: Edição atual

Israel

Big Brother

האח הגדול

Channel 2 - Keshet

HOT( em directo)

Edição 1, 2008: Shifra Korenfeld

Edição 2, 2009-10: Eliraz Sadeh

Big Brother VIP

VIP הגדול האח

Channel 2 - Keshet

HOT( em directo) Edição 1, 2009: Dudi Melitz

Itália Grande Fratello

Website oficial Canale 5

Edição 1, 2000: Cristina Plevani

Edição 2, 2001: Flavio Montrucchio

Edição 3, 2003: Floriana Secondi

Edição 4, 2004: Serena Garitta

Edição 5, 2004: Jonathan Kashanian

Edição 6, 2006: Augusto De Megni

Edição 7, 2007: Milo Coretti

Edição 8, 2008: Mario Ferretti

Edição 9, 2009: Ferdi Berisa

Edição 10, 2010: Mauro Marin

Edição 11, 2010-11: Edição atual

México

Big Brother México

Website oficial Televisa

Edição 1, 2002: Rocío Cárdenas

Edição 2, 2003: Silvia Irabien

Edição 3, 2005: Evelyn Nieto

Big Brother VIP Televisa

Edição 1, 2002: Galilea Montijo

Edição 2, 2003: Omar Chaparro

Edição 3.1, 2004: Eduardo

Videgaray[10]

Edição 3.2, 2004: Roxanna

Castellanos[10]

Edição 4, 2005: Sasha Sökol

Page 153: PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E ... · FICHA CATALOGRÁFICA (Elaborada por Diule Queiroz CRB 2491) Almeida, Katianne de Sousa C364p Personagens emolduradas: os

151

Nigéria Big Brother Nigeria Website oficial

M-Net Edição 1, 2006: Katung Aduwak

Noruega

Big Brother Norge

Website oficial TVN

Edição 1, 2001: Lars Joakim Ringom

Edição 2, 2002: Veronica Agnes Roso

Edição 3, 2003: Eva Lill Baukhol

Big Brother: Tilbake I

Huset TVN Edição 1, 2001: Leena Brekke

Oriente Médio

Big Brother

يس رئ ال

(The Boss)

MBC Edição 1, 2004: Não continuada[11]

Pacífico[12]

Gran Hermano del

Pacífico

Website oficial

Telesistema

(Ecuador)

RedTV (Chile)

ATV (Peru)

Edição 1, 2005: Juan Sebastián

López(Equador)

Polônia

Big Brother

Wielki Brat

TVN (2001-2002)

TV4

Edição 1, 2001: Janusz Dzięcioł

Edição 2, 2001: Marzena Wieczorek

Edição 3, 2002: Piotr Borucki

Edição 4, 2007: Jola Rutowicz

Edição 5, 2008: Janusz Strączek

Big Brother VIP TV4 Edição 5, 2008: Jarek Jakimowicz

Big Brother : Ty

Wybierasz TV4

Edição 1, 2001: Małgorzata Maier &

Sebastian Florek

Edição 2, 2002: Barbara Knap & Jakub

Jankowski

Portugal

Big Brother

O Grande Irmão TVI

Edição 1, 2000: Zé Maria

Edição 2, 2001: Henrique Guimarães

Edição 3, 2001: Catarina Eufémia

Edição 4, 2003: Nando Geraldes

Big Brother Famosos TVI Edição 1, 2002: Ricardo Vieira Edição

2, 2002: Vítor Norte

Secret Story - Casa dos Segredos

TVI TVI Direct (directo)

Edição 1, 2010: António David

Queirós

Edição 2,2011 : Próxima Edição

Page 154: PERSONAGENS EMOLDURADAS: OS DISCURSOS DE GÊNERO E ... · FICHA CATALOGRÁFICA (Elaborada por Diule Queiroz CRB 2491) Almeida, Katianne de Sousa C364p Personagens emolduradas: os

152

Reino Unido[13]

Big Brother Website oficial

Channel 4

S4C (Gales) E4

Edição 1, 2000: Craig Phillips

Edição 2, 2001: Brian Dowling

Edição 3, 2002: Kate Lawler

Edição 4, 2003: Cameron Stout

Edição 5, 2004: Nadia Almada

Edição 6, 2005: Anthony Hutton

Edição 7, 2006: Pete Bennett

Edição 8, 2007: Brian Belo

Edição 9, 2008: Rachel Rice

Edição 10, 2009: Sophie Reade

Edição 11, 2010: Josie Gibson

Celebrity Big Brother

BBC One (2001)[14]

Channel 4

S4C (Gales)

E4

Edição 1, 2001: Jack Dee

Edição 2, 2002: Mark Owen

Edição 3, 2005: Bez Berry

Edição 4, 2006: Chantelle Houghton[15]

Edição 5, 2007: Shilpa Shetty

Edição 6, 2009: Ulrika Jonsson

Edição 7, 2010: Alex Reid

Teen Big Brother

Website oficial

Channel 4

S4C (Gales)

E4 Edição 1, 2003: Paul Brennan

Big Brother Panto Channel 4

S4C (Gales) Edição 1, 2004-05: Sem vencedor

Big Brother: Celebrity

Hijack E4 Edição 1, 2008: John Loughton

República Checa

Big Brother

Velký Bratr

Website oficial

TV NOVA Edição 1, 2005: David Šín

Romênia Big Brother

Fratele Cel Mare PrimaTV

Edição 1, 2003: Soso Joi

Edição 2, 2004: Iustin Popovici

Rússia

большой брат

(Big Brother)

Website oficial

TNT Edição 1, 2005: Anastasia Yagaylova

Estados Unidos (Versão

da Second Life)

Big Brother Second

Life World Wide Web Edição 1, 2006: Madlen Flint

Sérvia[16]

Veliki brat

Website oficial

Pink BH (Bósnia e Herzegovina)

Pink M (Montenegro)

B92 (Sérvia)

Edição 1, 2006: Ivan Ljuba

Edição 2, 2007: Não continuada

Edição 3, 2009: Vladimir Arsić

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Edição 4, 2011: Próxima edição

Veliki Brat VIP

Pink BiH

Pink M

B92

Edição 1, 2007: Saša Ćurčić

Edição 2, 2008: Mimi Đurović

Edição 3, 2009: Miki Đuričić

Edição 4, 2010: Milan Marić

Veliki Brat Proba B92 Edição 1, 2006: Jelena Provči &

Marko Miljković

Suécia

Big Brother Sverige

Website oficial Kanal5

Edição 1, 2000: Angelica Freij

Edição 2, 2002: Ulrica Andersson

Edição 3, 2003: Danne Sörensen

Edição 4, 2004: Carolina Gynning

Big Brother Stjärnveckan

Kanal5 Edição 1, 2002: Anki Lundberg

(Baren)

Suíça Big Brother Schweiz TV3 Edição 1, 2000: Daniela Kanton

Edição 2, 2001: Christian Ponleitner

Suriname Big Brother Suriname Canal Tele Edição 1, 2011: Edição Atual

Tailândia Big Brother Thailand

Website oficial iTV

Edição 1, 2005: Nipon Perktim

Edição 2, 2006: Arisa Sonthirod

Referências da tabela

1. Versão pan-regional com pessoas

de Angola, Botswana, Gana, Quênia, Malawi, Namíbia, Nigéria, África do

Sul, Tanzânia, Uganda, Zâmbiae Zimbábue. O programa é transmitido para toda África pela TV via

satélite DStv(através dos seus canais AfricaMagic, M-Net y DStv 37) e também disponível em

televisões de canais livres nos países dos participantes: BTV (Botsuana), MetroTV (Gana), Rede de

Televisão do Quênia (Quênia), TVMalawi (Malawi), NBC (Namíbia), Channel10 (Tanzânia),

WBS (Uganda) e ZNBC (Zâmbia). Na Nigéria, o show é transmitido por uma rede de televisões locais,

incluindo MINAJ, ODTV, ESTV, RSTV, ITV, EBS, AKTV, BCOS, OGTV, PRTV, Bayelsa TV DBS CRTV,

ABS, BCA, Umuahia, Taraba TV e NTA Ilorin.

2. Big Brother Alemanha é emitido também na Áustria e Suíça pela RTL II. Audiências destes países

também podem votar.

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3. Também transmitido no Uruguai. Desde a segunda edição, telespectadores do Uruguai também podem

votar. Gran Hermano Argentina não possue participantes deste país.

4. Greg Mathew teve de dividir o prémio com o gémeo, David, porque entraram na casa como uma pessoa

só, chamada Logan. Foram ambos declarados vencedores conjuntos.

5. http://www.bigbrother.com.au/day085-news-lasthurrah.htm

6. a b Versões no Canadá e França tiveram dois vencedores, um homem e uma mulher.

7. Co-produzido com Noruega e Suécia.

8. Big Brother: All Stars is considered a regular Edição by CBS

9. Também emitido em Chipre.

10. a b Eduardo foi o primeiro vencedor de duas emissões em uma - Big Brother VIP 3. Big Brother VIP 3 foi

dividido em duas edições diferentes, com diferentes concorrentes e distintos vencedores em cada um.

11. Versão pan-regional com concorrentes do Bahrain, Egito, Iraque, Jordânia, Kuwait, Líbano, Omã, Arábia

Saudita, Somália, Síria e Tunísia. Foi filmado na Ilha Amwaj no Bahrain e emitido para todo o Oriente

Médio. Interrompido após 10 dias por protestos religiosos.

12. Filmado na Colômbia, esta é uma versão pan-regional com participantes do Chile, Equador e Peru.

13. Também emitido na Irlanda. Audiências da Irlanda podiam votar.

14. The first UK Celebrity Big Brother was a collaboration between Channel 4 and the BBC's

charity telethon Comic Relief. Money raised from the series was donated to the charity.

15. Chantelle was not a celebrity, having originally applied to be on the ordinary show. She entered the

house with a task: to make her celebrity mates believe that she was a celebrity. She pretended to be a

member of a fictitious all-girl band. When asked to rank themselves in order of celebrity, she came third

last, thus succeeding the task and earning the right to remain in the house.

16. Filmado na Sérvia, com concorrentes maioritariamente sérvios e alguns da Bósnia e

Herzegovina e Montenegro. Desenvolvido pelo detentor de licença local Endemol, Emotion.

Fonte: http://pt.wikipedia.org

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ANEXO B – BBB e o envolvimento dos telespectadores

Primeira Notícia

BBB 10: Eliéser e sua mãe viraram alvo da fúria da torcida de Dourado

O alvoroço na internet em comunidades e perfis que apoiam Marcelo

Dourado deixa claro que o lutador conquistou mesmo uma legião de fãs. Só que

alguns fanáticos não perdoam quem cruza o caminho do gaúcho rumo ao prêmio de

R$ 1,5 milhão do "Big Brother Brasil" e direcionaram a Eliéser toda sua fúria. O

engenheiro nem imagina que ele e sua família têm sido alvo de ameaças de morte.

- Desde que Eliéser mandou Dourado para o “paredão” (na semana

passada), meu Orkut e o do meu filho passaram a ser atacados. Juraram-nos de

morte, xingaram, falaram coisas horríveis. Fiquei tão nervosa que passei mal, queria

tirar meu filho do programa, mas desistimos - conta Maria Aparecida Ambrósio, mãe

de Eli: - Dourado virou um mito para essas pessoas.

Parte dos agressores se intitula membro da comunidade Máfia do

Dourado (apesar de a comunidade deixar claro que é contra este tipo de postura),

segundo Maria Aparecida, que desistiu de prestar queixa e apenas denunciou os

fanáticos ao site. A mãe de Eliéser também lembra que, na internet, a torcida do

lutador tem ensinado uma trapaça para os votos a favor de Dourado se

multiplicarem.

- Não acho que seja a família dele, ou amigos, ou que Dourado mesmo

saiba disso. São pessoas de baixo calão - considera Cida.

O pai de Dourado, Marco Antônio, ficou surpreso com a agressividade da

torcida:

- Repudio esse tipo de atitude. É muito primário. A vida me mostrou que

violência não leva a nada, só a ódio. Somos uma torcida de amor.

Mas, de olho no programa, Marco aproveita para alfinetar Dourado:

- Ele está atacando meu filho e tem atitudes covardes. Tem que pagar o

preço, mas no jogo. Que vá ao paredão e seja eliminado. Nada de violência.

Veja abaixo as mensagens mais brandas deixadas no "Orkut" da mãe de

Eliéser:

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Fonte:http://extra.globo.com

Segunda Notícia

BBB: Jornalistas viram alvo de ameaças de torcedores de Marcelo Dourado

Um grupo de torcedores de Marcelo Dourado, participante da décima

edição do reality show global Big Brother Brasil, está preocupando alguns jornalistas

e blogueiros que se posicionaram contra atitudes do lutador, que vem sendo

criticado por declarações consideradas homofóbicas.

Dizendo-se membros da chamada "Máfia Dourada", torcida que conta

com site e comunidade em sites de relacionamentos, alguns internautas chegaram a

ameaçar de morte quem, na visão deles, está prejudicando seu “mestre”, forma

como se referem a Dourado.

O G Online conversou com a blogueira Susan Mello e o escritor e

jornalista Jean Wyllys, vencedor da quinta edição do Big

Brother Brasil, que relatam serem vítimas dessas

ameaças virtuais. Ambos demonstram preocupação com

a reação extremada que o participante vem despertando

em muitas pessoas fora da casa. Para eles, o

preconceito desses radicais é muito maior do que aquele

que alguns acreditam que o lutador tenha.

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"As pessoas estão perdendo a medida da coisa”

Jean Wyllys relata que as ameaças começaram após a publicação de dois artigos

em que analisa o papel de Dourado dentro do jogo e os motivos do lutador se

configurar como o favorito a ganhar o prêmio de R$ 1,5 milhão. Em um dos artigos,

chamado "As Cores da Casa", Jean diz que “Dourado tornou-se o porta-voz da

ordem heterossexual que se sente ameaçada pela presença dos „coloridos‟ e dos

que simpatizam com eles”. Em outro artigo, chamado "Autoridade Dourada e

Fascista", Jean discorre sobre como esta edição do BBB teria suscitado o desejo da

maioria por autoridades perversas.

“A partir daí comecei a sofrer ameaças de gente dizendo que ia me matar

e que era para eu parar de falar mal do „mestre‟ deles”, diz Jean. Apreensivo, relata

que pela primeira vez, desde que lançou o blog, há três anos, teve de aplicar a

moderação nos comentários. “As pessoas estão perdendo a medida da coisa”,

avalia.

Jean salienta, entretanto, que não se pode culpar os idealizadores da

chamada "Máfia Dourada" pelas ameaças, pois

nada comprova que sejam eles que as estejam

fazendo, “mas torcedores de Dourado estão

ameaçando sistematicamente e assinando como

se fizessem parte da Máfia”, afirma.

"Se eu te encontro, te encho de tiro”

Já Susan Mello, que está à frente do blog De

Cara Pra a Lua, conta que chegou a "comprar a ideia" de que Dourado vinha para

este BBB como uma pessoa “regenerada”, diferente do que aconteceu no BBB 4,

edição da qual ele também participou e que lhe gerou uma fama de "bad boy".

“Comecei a questionar a postura de Dourado a partir da declaração que ele fez

sobre homem hétero não pegar aids”. Susan diz que, depois disso “a torcida dele

veio para cima”.

A jornalista conta que chegou a receber um e-mail dizendo: “Se eu

soubesse onde você mora, eu ia aí te encher de porrada”. Outro dizia: “Se eu te

encontro, te encho de tiro”.

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Tanto Susan como Jean concordam com a tese de que muitas pessoas,

de todas as idades e classes sociais, viram em Dourado um canal para expressar o

preconceito. “Com a presença dele na casa, as pessoas passaram a se sentir livres

para dizer que não gostam de homossexuais”, arrisca Susan.

Fonte: http://gonline.uol.com.br

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ANEXO C – Alguns dados sobre a Audiência do BBB 10

Sabe-se que a audiência televisiva é um termo aplicado para definir a

quantidade de pessoas que assistem a determinado canal de televisão. No Brasil, a

medição de audiência é feita pelo IBOPE, uma instituição privada.

Abaixo serão demonstradas notícias que indicam o programa BBB como

tendo um dos maiores índices de audiência da TV Brasileira diante os outros

programas do mesmo horário:

Primeira Notícia

“BBB 10”: Ibope é alto, mas não satisfaz Boninho

SÃO PAULO – Mesmo registrando 30 pontos na média, contra os nove

dos principais concorrentes – Record e SBT – o exigente Boninho, diretor do reality

global “Big Brother Brasil”, não se satisfez com os números do Ibope na estreia da

décima edição da atração, que aconteceu na terça-feira (12).

"Se comparado com a audiência de outros canais, é um ótimo resultado.

Além disso, a TV mudou, o número de televisores ligados caiu, a concorrência

aumentou. Mas, estou acostumado a dar mais e não me satisfaço com isso", disse,

em entrevista à “Folha de S. Paulo”, logo após a grande estréia do “BBB 10”.

Comparado a outros anos de estreias do reality, a décima edição foi

mesmo fraca. Segundo dados apurados pelo Ibope no estado de São Paulo, a

primeira versão do programa somou 48 pontos de média na audiência. As edições

anteriores, oitava e nova, alcançaram 37.

Na entrevista, Boninho tenta esclarecer a queda de números: "No „BBB 7‟,

do Alemão, que foi super bem, chegamos a dar 45. Mas havia mais aparelhos

ligados, a Record „não existia‟ e a novela nos entregava com 60 pontos. Na estreia

[do “BBB 10”] a novela entregou com 28”.

O desempenho da décima edição é a segunda pior na história do “BBB”,

que só perde para a segunda, com 28 pontos de audiência registrados. Mesmo

assim, a atração é lucrativa para a emissora levando em consideração a parte

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comercial. Somente na estréia do dia 12, o reality fechou merchandisings com seis

empresas diferentes.

Fonte: Famosidades (http://entretenimento.br.msn.com).

Segunda Notícia

"BBB10" registra sua maior audiência com eliminação de Angélica da Folha Online Além de marcar o recorde de votação de todas as edições do "Big Brother

Brasil", a eliminação da jornalista Angélica rendeu também ao programa a maior

audiência nesta edição do reality show.

Segundo dados consolidados do Ibope, o programa de ontem marcou

média de 34 pontos e teve 55% de share (porcentagem de televisores ligados em

programação televisiva que estavam sintonizados no canal).Cada ponto equivale a

cerca de 60 mil residências na Grande São Paulo.

O paredão que trazia Angélica, Dicésar e Dourado na disputa para

permaneceram no programa recebeu mais de 77 milhões de votos. O número

superou o recorde anterior do programa, de 75 milhões na final do "BBB8", entre

Gyselle e Rafinha.

Angélica deixou o reality show após receber 55% dos votos.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada

Terceira Notícia

Final do "BBB 10" registra recorde de audiência

Na noite desta terça (30), foi ao ar, depois de três meses, a final do "Big

Brother Brasil", que consagrou Marcelo Dourado como grande vencedor, com 60%

dos votos. O lutador leva para a casa o prêmio de R$ 1,5 milhão.

Em termos de audiência, no ar das 22h17 às 00h00, o "BBB 10" atingiu

uma média prévia de 40 pontos com pico de 43,5 e share de 60,8%. No horário,

Record ficou em segundo com 9 e SBT em terceiro com 4 pontos.

Fonte: http://natelinha.uol.com.br

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ANEXO D – O triângulo: Eliéser, Cláudia e Angélica

NOTÍCIA 1 em 17 de fevereiro às 01h55min.

Sérgio fica com calores com simulação de strip-tease de Cláudia Empresária finge que tira a roupa para o estudante e Eliéser. No Quarto do Líder, a empresária Cláudia simula um strip-tease para Eliéser, que está deitado na cama. O estudante Sérgio, também presente no quarto, brinca com a performance da sister. "Nossa, Eli. Eu que não sou hetero já fiquei com calores. Imagina você", diz.

NOTÍCIA 2 em 17 de fevereiro às 02h06min. Sérgio sobre dança de Eliéser: 'Fiquei meio tenso' Brincadeira de strip-tease continua no Quarto do Líder

Após a apresentação de strip-tease de Cláudia, Sérgio se anima: "Vou querer Cacau

(Cláudia) e Morango (Angélica)" e anuncia: "Boa noite, Big Brother Brasil! Aqui será

a primeira cena de swing, a troca de casais. Cacau e Eliéser, Morango e Orgastic".

Luzes apagadas. O jogo de sedução começa com Sérgio e Angélica. "Vamos tirar a

roupa sexy", sugere a jornalista. O estudante começa, então, a tirar a roupa e

rebolar em cima de Angélica. "Vai todo mundo ficar pelado debaixo do cobertor

hoje", diz Sérgio, animado com a brincadeira.

Depois da dança sensual de Sérgio, é a vez de Angélica fazer a sua apresentação.

A jornalista tira a blusa e venda os olhos de Sérgio com a vestimenta. A jornalista

rebola em cima do brother. Eliéser e Cláudia, que assistem da cama, aplaudem. O

engenheiro agrônomo se empolga, levanta da cama e promove um show de

sensualidade. Ele tira a bermuda, fica somente de cueca, coloca um roupão e

começa a apresentação para Sérgio, que diz: "Se concentra Sérgio! Tô com medo!",

ri. O paranaense extrapola na sedução com o estudante e chama a atenção de

Cláudia: "Não conhecia esse seu lado", diz a empresária. Chega a vez de Cláudia

ser seduzida por Eliéser. Ele a beija no pescoço, a abraça com o roupão e finge que

vai tirar a cueca. Sérgio e Angélica assistem tudo da cama. Eliéser vai para cima de

Angélica na cama. "O Eli (Eliéser) foi o mais babado. Fiquei meio tenso com ele

abrindo o roupão na minha frente", entrega Sérgio. "O Serginho (Sérgio) ficou frapê",

diz Cláudia.

NOTÍCIA 3 em 17 de fevereiro às 02h 21min.

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Angélica e Cláudia ficam só com roupas íntimas no Quarto do Líder

Sisters dançam uma para a outra, e se apresentam para Sérgio e Eliéser

A sedução no Quarto do Líder esquenta. Eliéser e Sérgio, deitados na cama,

estalam os dedos e cantam a música tema da Pantera Cor de Rosa,

enquanto Angélica fica só de calcinha e sutiã. "Tem que fazer (strip-tease) para nós

três juntos", diz Cláudia, que já havia feito sua apresentação, assim como Eliéser. A

jornalista sobe na cama e começa a apresentação. O primeiro a ser seduzido é

Sérgio, que repete inúmeras vezes: "Eu sou gay". Depois é a vez de Angélica

seduzir Cláudia. "Olha a Cláudia arrepiada", diz Eliéser, antes de sugerir que a

empresária "pipocou". Angélica, então, sobe em cima de Eliéser, joga o cabelo em

sua cara e deixa o brother louco: "Cheguei a respirar fundo", revela o engenheiro

agrônomo.

Após a apresentação de Angélica, ela, Eliéser e Sérgio entram debaixo do edredom

para ver a performance de Cláudia, a última a fazer o strip-tease. A empresária

começa a rebolar na cama, ainda ao som da Pantera Cor de Rosa. O primeiro a ser

seduzido e apreciar de perto o strip de Cláudia é Sérgio. Depois é a vez de Angélica

e por último, Eliéser.

No fim, Cláudia desabafa: "Sensual leve. Não ficou vulgar o de ninguém", avalia a

empresária, sobre as apresentações no Quarto do Líder.

Após as apresentações de strip-tease, os papos continuam quentes. Angélica

questiona Eliéser sobre possíveis aventuras dele: "Eli, você já foi gogoboy? Já

dançou em boate?", questiona. O paranaense responde que não. "E você já saiu

com homem?", pergunta Cláudia, antes de receber uma resposta também negativa.

Os brothers seguem com a farra, agora, debaixo do edredom. Eles fazem uma

cabana e iniciam mais uma brincadeira de sedução. "Eu vou passar a mão em

você", diz Sérgio para Cláudia. "O babado tá forte, eu vou sair", despista a

empresária.

"Nós somos os Bbbs mais sexies do mundo", diz o estudante.

Fonte: http://bbb.globo.com/BBB10

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