Personalidade e brincadeira de papéis sociais2 O drama como modo de agir propriamente humano 05 3 A...

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em diálogo com o educador

Achilles Delari Junior

Arquivos digitais

Personalidade e brincadeira de papéis sociais

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Delari Jr., Achilles. Personalidade e brincadeira de pa-péis sociais: em diálogo com o educador. In: Estação Mir – arquivos digitais, 2013. 37 p. Palavras-chave: Desenvolvimento da personalidade; Papéis sociais; Brincadeira; Vigotski. Artigo não indexado. Disponível em: www.estimir.net/delari_2020_per-brc-pps.pdf

Primeira versão concluída em 21 de dezembro de 2013. Versão atual concluída em 25 de abril de 2020.

Umuarama-PR.

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“Eis o principal. Na brincadeira Eis o humano.”

(Vygotski, s.data/1980, p. 277)

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Conteúdos 1 Introdução 04 2 O drama como modo de agir propriamente humano 05 3 A metáfora da dinâmica da personalidade como drama 09 4 A brincadeira de papéis e o desenvolvimento pré-escolar 12 5 a atuação do educador e a brincadeira de papéis da criança 15

a) O aprender brincando: seus limites e possibilidades 20

b) O brincar aprendendo: seus limites e possibilidades 20

c) O brincar organizando a vida: seus limites 21 e possibilidades

1a sugestão: criar ou ampliar o acervo 24 2a sugestão: organizar o acervo por categorias não 24 hierárquicas 3a sugestão: estabelecer regras coletivamente 24 4a sugestão: realizar uma observação diagnóstica 25 5a sugestão: intervir potencializando as brincadeiras 25

d) Forma e conteúdo da brincadeira na educação infantil 27

6 Resumo geral por tópicos 30 7 Duas sugestões de atividade semi-dirigida 32 8 Referências 34

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1 Introdução proximal” em língua portuguesa

Este texto é um convite ao diálogo sobre a contribuição da edu-

cação para o desenvolvimento integral da personalidade. “Uma grande imagem do desenvolvimento da personalidade: [é] um cami-nho para a liberdade. Renascimento do espinosismo na psicologia marxista” (Vygotsky, 1932/ 2010, p. 92-93). Contudo, no capitalismo, vivemos ainda no chamado “reino da necessidade”, não no “da liber-dade” (Engels apud Vygotsky, 1930/1994, p. 182). Ela não é pressu-posto da ação humana, mas conquista coletiva por atingir. Nem será ausência de regras, mas possibilidade de tomá-las como recurso para superar nossos limites, em cooperação com outras pessoas. Nós edu-cadores que desejamos contribuir para o desenvolvimento da perso-nalidade nessa direção, temos um desafio não só profissional, mas partilhado com toda a classe trabalhadora. Porém cabe especificar nosso tema e papel. Do geral ao específico, iremos da “dinâmica da personalidade como drama de papéis sociais” à “brincadeira de pa-péis sociais da criança pré-escolar”, como momento especial da pri-meira. Nesse percurso, assumiremos a perspectiva de L. S. Vigotski (1896-1934) e autores próximos ao seu trabalho criativo mais avan-çado, solicitando a apreciação crítica da leitora e do leitor.

Esse texto propõe:

o Destacar a importância da dinâmica da personalidade como “drama”.

o Situar a brincadeira de papéis sociais na gênese da persona-lidade.

o Abordar a atuação do educador na ampliação dos horizon-tes da brincadeira da criança e no desenvolvimento de sua personalidade.

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2 O “drama” como modo de agir proximal” em língua portuguesa

A palavra “drama” não é muito comum nos nossos textos mais

conhecidos em teoria pedagógica ou psicológica. No nosso cotidiano, nós a relacionamos com um gênero artístico que pode contrastar com a “comédia” ou a “tragédia”, por exemplo. Tais correlações não dei-xam de ter fundamento histórico. Seja na Antiguidade, quando Aris-tóteles (334-330a.n.e./1978) define que tanto tragédia quanto comédia são formas de drama, por serem ambas apresentadas como “ação”. Seja na Modernidade, quando Sanz de Robes (1949) define que o drama seria um gênero intermediário – entre os extremos da tragédia e da comédia – próximo da “vida como ela é”.

Porém, cabe destacarmos os significados principais dessa palavra

em trabalhos de Vigotski. E argumentar que ela tem lugar teórico es-tratégico na compreensão da gênese e dinâmica da “personalidade” – que é, para o autor, “o social em nós” (Vygotski, 1931/2000, p. 337).

propriamente humano

Algumas palavras russas para “educação” Quando lemos a palavra “educação” em edições brasileiras de Vigotski, ela pode estar traduzindo, pelo menos, três palavras russas diferentes:

1) “Obutchenie” [обучение], também se traduz por “instru-ção”, “ensino”, para alguns: “processo de ensino/aprendi-zagem”.

2) “Vospitanie” [воспитание], também se traduz como “for-mação”, como no alemão “bildung”: 1 educação, instrução, cultura. 2 formação. 3 organização.

3) “Prosvieshtchenie” [просвещение], também se traduz como “ilustração”, “esclarecimento”. Era do que tratava, na URSS, o NARKOMPROS – traduzido geralmente como “Comissariado do Povo para a Educação”.

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Isto para que nos apropriemos do conceito, não sempre presente em nossas reflexões sobre desenvolvimento e educação – “ensino” ou “formação”. Pelo menos, dois significados pudemos antes constatar (Delari Jr., 2011) para “drama” em vários textos do psicólogo bielor-russo: (1) o de “peça teatral”, mais coloquial; e (2) o de “modalidade especial de ação humana”, mais filosófico.

Lembremos algumas passagens, para ilustrar o gosto de Vigotski pela metáfora do drama como “peça teatral” ao tratar de diferentes assuntos, desde o estado crítico da psicologia, ao desenvolvimento da criança como sequência descontínua de vários “atos” cênicos. Por exemplo: (a) queixando-se ocorrido “na contemporânea expresso me-lhor pelo choro desesperado de um dos heróis de um drama de Tchekhov” (Vygotsky, 1931-33/1999, p. 198); (b) aludindo aos “atos do drama geral do desenvolvi- mento” (Vygotski, 1932-34/ 2006, p. 254); ou (c) apresentando “dentição”, “andar” e “linguagem infantil” como “atores principais e secundários desse drama [do desenvolvi-mento]” (Idem, p. 338)!

O que há de esclarecedor e instigante nessa metáfora de todo o desenvolvimento ontogenético como uma vibrante “peça teatral” é o destaque que se pretende dar ao fato de que não é “assistindo” a um só “ato” que compreenderemos o sentido de toda a “peça”. E também a noção de que os processos psíquicos apresentados como de que o psicologia pode ser “atores” sempre estão mudando sua posição na cena, ora estão em “primeiro plano” ora em “segundo plano”, ora seu papel entra em choque com o dos demais, ora estabelece com eles profunda aliança. Além disso, e mais importante, a cada novo “ato” (período) a dinâmica das relações pode mudar radicalmente do ponto de vista qualitativo, exigindo-nos desvelar outras relações ge-nético-causais.

Mas não basta dizer que processos psíquicos “contracenam” no drama do desenvolvimento de alguém. É fundamental assumir que tais processos são inseparáveis da vida de uma pessoa “concreta”, isto é, “síntese de muitas determinações” (Marx, 1859/1978, p. 116), a qual vivencia e encarna seu próprio “drama de papéis sociais” junto a outros seres humanos. Eis o segundo e mais profundo significado de “drama” na teoria de Vigotski, uma “modalidade de ação propri-amente humana”, ou seja, própria de nossa existência social.

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Dizemos tratar-se de uma “modalidade especial” de ação social,

pois nela estão presentes, de acordo com a reflexão de Vigotski (1929/1986; 1929/2000), duas características que não podem ser dedu-zidas diretamente da metáfora da “peça em vários atos”. (1) por o drama ser um ato de decisão humana sobre a condução de nosso des-tino histórico; (2) por ser ainda o choque entre diferentes papéis que cada pessoa vivencia/encarna. Tais traços constituem o caráter (in)tenso e dialeticamente conflitivo da ação social de decidirmos por um caminho vital ou outro em determinado contexto histórico-cultu-ral. Desde o mais corriqueiro até aquele no qual esteja envolvida uma situação de vida ou morte – “ser ou não ser”. Como se passa com Hamlet, no conhecido Ato III, cena I (Shakespeare, 1601/1990).

Há forte relação de Vigotski com o teatro

Desde seu interesse precoce por “Hamlet” de Shakespeare (1564-1616), que culmina com a autoria de monografia para a Faculdade Histórico-Filológica (“Letras”) da Universidade Shaniávski (Veresov, 1999; Vigodskaia e Lifanova, 1996/1999a; 1996/ 1999b; 1996/1999c; 1996/1999d; Vigotski, 1916/ 1999). À atenção para conceitos do dramaturgo Stanis-lávski (1863-1938), em seus últimos escritos (Vigotski, 1934; 1934/ 2001). Também tomando pistas da arte para a ciência, sem igualá-las, notemos que Stanislávski (1938/2008a; 1938/2008b) vê a representação de um “papel” como dialética (oposição e fusão) entre “vivência” e “personificação”:

(1) A “vivência” – “переживание” [perejivanie] – é uma forma de “experiência”, gerada pela prática social, em que se produz uma unidade afetivo-cognitiva es-pecialmente intensa frente a algo ou alguém: uma obra de arte; uma pessoa amada; uma adversidade ou celebração; um pensamento ou ato nossos...

(2) A “personificação” – “воплощение” [voploshshenie] – também é traduzível por “incorporação” ou “en-carnação”. Com o verbo correlato teríamos, por exemplo: “Ela personifica a saúde”, tal como: “Ela é a saúde em pessoa”.

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A história da cultura ocidental gera os dois significados princi-pais para a palavra “drama” constatados em diferentes obras de Vi-gotski. A professora de literatura grega, Claire Nancy (2003) atesta tanto que “drama” era uma forma especial de ação (diferente da “poïèsis”, atividade criadora; e da “prâxis”, atividade orientada a um fim), quanto que, por sua peculiaridade, acabou se tornando sinô-nimo de “teatro”. Atenhamo-nos apenas ao que há de “especial” nesta ação, tal como presente em algumas cenas clássicas, isso pode nos ajudar a entender melhor a dinâmica da personalidade para Vi-gotski e a importância da “brincadeira de papéis sociais” no seu de-senvolvimento.

A noção de drama em Vigotski, como situação de decisão vital que envolve intenso conflito (a qual retomaremos na seção “3”), já estava presente na antiga literatura grega. Lembremos que Aga-mêmnon, líder supremo dos guerreiros helênicos, sem condições cli-máticas para ordenar a partida de seus barcos para a guerra, consulta o oráculo. Este lhe diz que só haverá vento se sua filha Efigênia for sacrificada por suas mãos. Ele precisa decidir: (a) se a ânsia de todos, inclusive Agamêmnon, não fosse por guerrear, a escolha não seria dramática; (b) se ele não amasse tanto sua filha, também não seria.

Há um grande impasse, mas o rei sacrifica a filha, com muito pe-sar e ciente de possíveis consequências fatais deste ato. Num salto da Antiguidade à Renascença, vemos Hamlet em situação não idêntica, mas similar. O herói se queixa das “injustiças dos mais fortes, os maus-tratos dos tolos” e cogita “obter sossego com um punhal”. Mas hesita e as opções se chocam: de um lado, a morte é apenas sono; de outro, ninguém sabe “os sonhos que poderá trazer o sono da morte” (Shakespeare 1601/1990, p. 74). Veremos que tais figuras literárias re-fletem e refratam a dinâmica real de nossa personalidade.

Não vemos a “arte” como cópia da “vida”, nem o contrário. Sua relação é dinâmica e assimétrica. Não teremos arte sem estarmos vi-vos para criá-la ou apreciá-la. Mas ela pode nos permitir “exceder” a vida sem “deixá-la”. Nossas vidas não são antes escritas, por nós ou por outrem, para então atuarmos. Nelas a autoria e o exercício de nossos papéis se entrelaçam e nos escapam, pois são sociais. A metá-fora da personalidade como “drama” será, a seguir, uma via figurada para chegar mais perto de quem literalmente somos.

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3 A metáfora da dinâmica da personalidade proximal” em língua portuguesa

Como dissemos de início, o modo programático de Vigotski con-

ceber o desenvolvimento da personalidade, em anotações de 1932, momento já avançado de seu trabalho criativo, é “um caminho para a liberdade”. Se é “caminho para”, não a temos de saída. Se é para “a liberdade” não é numa visão individualista, mas comunal. Empres-tando palavras de um ativista russo, assumimos que “a liberdade é antes de tudo um fato social. A liberdade do próximo estende a mi-nha ao infinito” (Bakunin, s.data/2005, p. 24). Ninguém poderá ser plenamente livre numa sociedade em que os demais estejam aprisio-nados por um modo de produção baseado na expropriação de seu trabalho.

como “drama”

Dois conceitos sobre a função da arte em nossas vidas.

Estamos utilizando a noção de “drama” como modo de agir bastante peculiar, do qual tomamos consciência com exem-plos de formas literárias, teatrais, artísticas. Sendo assim, vale destacar, pelo menos, dois conceitos importantes quanto às relações entre “arte” e “vida”, as quais não são simétricas:

(1) O de que a arte não é algo que apenas dá “um colo-

rido a mais” à vida: “A arte não é um mero comple-mento da vida, mas o resultado daquilo que excede a vida no ser humano” (Vigotski, 1924/2003b, p. 233)

(2) O de que a arte não é uma forma de linguagem que “reproduz” a vida: “Na arte, a realidade está sempre tão modificada que não é possível fazer uma trans-ferência direta do significado dos fenômenos da arte para os da vida” (Vigotski, 1924/2003b, p. 228).

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Por isso Engels fala do “salto” (por nós ainda não dado) “do reino da necessidade para a esfera da liberdade” (apud Vygotsky, 1930/1994, p. 182). E ver o “desenvolvimento da personalidade” na perspectiva de Vigotski se torna um enorme desafio. Como educar de modo a contribuir para o desenvolvimento “integral” da persona-lidade de nossos alunos, mesmo no mundo atual? Como assegurar, a eles e a nós, meios para resistirmos, mesmo em relações sociais que tendem a formar personalidades “aprisionadas” – subservientes, fa-talistas e/ou acomodadas? O conceito de drama, como ato de decidir em meio ao conflito, poderia ajudar? Disto buscaremos tratar nesta seção e seguintes.

Nessa busca, admitamos que Vigotski, mesmo passando toda a carreira em psicologia, de 1924 a 1934, sob regime de Iosif Stálin (1858- 1953), que não promoveu muita “liberdade”, não publicou questões como as nossas, em tal período, até onde tivemos acesso. Supunha-se viver numa sociedade socialista e o “reino da necessi-dade” viria sendo deixado para trás. Por isso, a noção de educação “para a liberdade” insinuada por Vigotski (1924/2003a) é mais “sovi-ética” que “escolanovista” ou “revolucionária”, no sentido atual de algo “por fazer, sem sabermos quando”. Lá a Revolução já fora feita! Não se queria a velha liberdade “burguesa”, nem uma libertação “in-surgente” contra o regime.

Por tais razões, avanços de Vigotski podem nos aparentar serem “recuos” hoje. Para ele, por exemplo: (a) uma ação livre é aquela da qual conhecemos as causas – e talvez desejássemos nós mesmos cau-sar nossos atos; (b) um pensamento livre é aquele que aborda o real além do que as sensações apresentam – e talvez preferíssemos tam-bém poder transformar a realidade; (c) somos livres quando imagi-namos saídas novas para a vida que temos – e, novamente, talvez quiséssemos efetivar o imaginado para nos sentirmos livres; (d) por fim, ação livre é um “ato volitivo” (eleição, escolha) entre caminhos postos – e talvez almejássemos criar caminhos ainda não existentes, por nos sentirmos presos à escassez de opções possíveis. Dizemos se-rem aparentemente “recuos” ao campo da liberdade pessoal, pois dada a coerção que o “capitalismo tardio” (Mandel, 1972/ 1982) nos impõe, com sua economia perversa e o sistema jurídico que a avaliza, os mais inquietos poderíamos considerar muito pouco: conhecer as causas disso; abstrair conceitos sobre o que vemos; imaginar saídas não antes presentes; e, por fim, decidir dentro do rol de opções reais

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– limitadas pelo sistema vigente. Porém, ignorar as causas de nossas ações no contexto histórico e social, ficar presos à fixidez das aparên-cias empíricas, não imaginar saídas para além de ilusões e não exercer o ato de decidir: também não produz liberdade, tudo se torna fatali-dade. Isso parece “pouco”, por soar ser só “para cada um”, mas para ser minimamente atingido exige sério esforço coletivo.

Segundo a “lei genética geral do desenvolvimento cultural”

(Vygotski, 1931/2000, p. 150): “toda função aparece em cena duas ve-zes, em dois planos” (idem): primeiro entre pessoas e então na rela-ção da pessoa consigo mesma de. Isso também com o desenvolvi-mento de toda a personalidade: “síntese de funções psíquicas”. O “caminho para a liberdade” na aquisição social das potências de co-nhecer, abstrair, ima- ginar e decidir por um modo de agir que pro-duza algo novo, não é igual em distintas sociedades. Em tese, é dife-rente buscar liberdade numa sociedade que edifica o socialismo ou noutra em que ainda há antagonismo de classes. Contudo, em dife-rentes contextos, há uma luta que é própria de todo ser humano: “O drama realmente está repleto de luta interna impossível nos sistemas

Não há só exemplos literários e fictícios do drama da personalidade humana.

Em estudo com trabalhadoras ligadas à luta pela terra, uma entrevistada disse que, ainda criança, foi consultada pelos pais sobre aderir ou não à luta. Havia duas opções: (a) ir para a zona rural com seus pais; ou (b) ficar na cidade com outros familiares. Mas seu desejo era continuar na cidade e junto com os pais. “Ela é consultada sobre a adesão e cogita não concordar, mas não suporta não acompanhar a família e então adere” (Melo, 2001, p. 141- 142). Isto ilustra a limitação histó-rica da liberdade de escolha de alguém. E eleger dentre op-ções nas quais igualmente haverá perda realiza a essência dramática desse ato.

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orgânicos: a dinâmica da personalidade é o drama” (Vigotski, 1929/2000, p. 35).

Vigotski dá o exemplo fictício de “um juiz que julga a própria esposa”. Simbolizando um conflito ausente em outros seres: não é “desequilibração” do organismo (p.e. em Piaget), nem é “luta por so-brevivência, onde vence o mais adaptado” (p.e. em Darwin). O “juiz” vivencia um impasse: (a) “como pessoa simpatizo, como juiz con-deno”; (b) “sei que ela é má, mas eu a amo”; (c) “simpatizo, mas con-deno, o que vencerá?” (Vigotski, 1929/2000, p. 37). Esta modalidade de conflito, tal como em “Agamêmnon” e “Hamlet”, só há no hu-mano. Podemos deduzir que ela esteja presente em diferentes cultu-ras e sociedades. No socialismo ou no capitalismo os “dramas” te-riam formas e conteúdos diferentes, mas sempre haveria “luta inte-rior” na dinâmica da personalidade, no “caminho para a liberdade” trilhado em cada cultura e/ou modo de produção. Na seção seguinte, pensaremos sobre como a brincadeira da criança pode ser passo im-portante nesse caminho sempre em aberto, posto que histórico.

4 A brincadeira de papéis e o roximal” em língua portuguesa

Começamos por dizer de uma concepção muito peculiar do que

venha a ser o desenvolvimento da personalidade e partimos então para a ênfase numa modalidade de ação humana que é paradigmá-tica para a compreensão da dinâmica da personalidade. Assumimos que as condições históricas tanto para tal desenvolvimento quanto para tal modo de agir se modificam em diferentes épocas e em dife-rentes culturas e modos de produção. Porém, constante para o ser humano seria desenvolver-se, tanto quanto viver momentos (in)ten-sos de decisão ao longo de sua vida – atos formadores de sentidos. E como destes assuntos passaremos a falar da brincadeira de papéis so-ciais da criança? Que ligações poderemos fazer, agora, entre tal brin-cadeira e o que foi dito antes?

Não temos, aqui, o propósito de apresentar o que Vigotski fala sobre diferentes períodos do desenvolvimento humano e assim da

desenvolvimento pré-escolar

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consciência e da personalidade (para tanto, veja-se Vygotski, s.data/2006; 1932-34/2006; 1933-34/2006a; 1936-34-/2006b). Mas ve-mos que, para o autor, o curso geral do desenvolvimento rumará para uma maior autonomia por parte da pessoa, se as relações sociais que ela vive assim possibilitarem. De modo que, para Vigotski, as rela-ções com os outros não são, por lei alguma, impedimento de nossa liberdade, mas uma condição fundamental para que ela surja. Um ponto fundamental de relação entre brincadeira e desenvolvimento, como “caminho”, é que sua essência é promover o surgimento da imaginação como neoformação principal que se consolida ao final da da idade pré-escolar (por volta de 3 a 6 anos). E imaginar contribui para a liberdade.

Pode soar contrário ao costumeiro, mas diremos que a criança “virá a imaginar porque passa a brincar”, e não que “brincará por ser, de antemão, imaginativa”. Ocorre que a perspectiva que nos inspira concebe os processos mentais sempre surgindo nas/das relações soci-ais e não movidos por forças originadas apenas dos nossos genes. E na ligação da brincadeira com o surgimento da imaginação está tam-bém seu vínculo com o devir da liberdade da criança no interior do mundo social do qual ela própria “é parte” (Vygotski, 1933-34/2006a, p. 382). Em carta para Elkonin, Vigotski fala que a estrutura da brin-cadeira, em suas relações interfuncionais, resume-se em dois aspec-tos: “o eficiente [relativo à ação] e semântico [relativo ao significado], dos quais emanam a abstração e a arbitrariedade = liberdade” (s/data/1980, p. 276).

Tais conceitos, tão condensados na carta ao colega, são encontra-dos de modo mais desdobrado em texto que deriva de anotações ta-quigráficas de uma conferência proferida em 1933 (Vigotski, 1933/2008). É interessante notar que as linhas de desenvolvimento da potência de abstrair e da potência de arbitrar, para o autor teriam ori-gem em diferentes mudanças qualitativas geradas pela brincadeira. Daremos exemplos em seguida, mas antes tracemos as linhas gerais. Uma mudança vai do predomínio do objeto sobre o sentido ao do sentido sobre o objeto (objeto/sentido →sentido/objeto). Outra vai do predomínio da ação sobre o sentido ao do sentido sobre a ação (ação/sentido→sentido/ação). A primeira leva ao “caminho para o pensamento abstrato”, a segunda leva ao “caminho para a vontade” (Idem, p. 33).

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Quando Vigotski afirma que na brincadeira da criança passa a haver predomínio sentido/objeto, refere-se a que as coisas com que a criança brinca podem ganhar sentidos bem diferentes dos que têm fora da brincadeira. Como quando “faz de conta” que umas tampi-nhas plásticas de garrafas “pet” sejam salgadinhos; e que uma tampa de caixa de sapatos seja uma bandeja retangular... Não por isso ela esquecerá que tais objetos mantém seu sentido usual, nem tentará mastigar e engolir as tampinhas! Mas aprende a por em segundo plano o sentido usual e o modo convencional de usar tais objetos. Para guiar-se pelo sentido que fazem numa brincadeira, por exemplo, de ser garçom/garçonete numa festa. Assim, nessa nascente plastici-dade de atos de significação produzidos pela criança para o mesmo objeto, o psicólogo vê o impulso para o desenvolvimento do “pensa-mento abstrato” [abstração].

Quando Vigotski afirma que na brincadeira da criança passa a haver predomínio sentido/ação, refere-se a que atos “cênicos” da cri-ança ao brincar podem ser abreviados comparados aos atos que si-mulam. Como quando faz de conta que, sentada numa poltrona, está pilotando um avião, e com os dedos aperta “teclas” que não estão ali, faz o movimento de ligar um “fone” inexistente e fala com a base, ou aciona um “dispositivo” invisível do piloto automático e se retira. Não por isso pensará que cai do avião ao sair da poltrona, nem que pousará de fato noutro local. Mas aprende a por em segundo plano toda destreza técnica que não domina, seus gestos simbolizam o co-mando do voo, não substituem. Para guiar-se pelo sentido que eles fazem na brincadeira: de missão de piloto de caça, talvez. Assim, nessa nascente plasticidade de atos de significação produzidos pela criança para seu próprio movimento, o psicólogo vê impulso para o desenvolvimento da “vontade” [arbitrariedade].

Claro que tais modalidades de avanço nas relações “sen-tido/objeto” e “sentido/ação” se fundem na brincadeira de papéis so-ciais, não sempre há ação sem objetos, e rara é a significação de obje-tos sem agir com eles. Tampouco “abstrair” e “arbitrar” estão em “ga-vetas” separadas: (a) para escolher ser melhor servir ou não “senho-ras esnobes” na “festa”, optando pelo “papel profissional” ou pelo “papel de não se submeter”, cabe abstrair as regras mais caras a se-guir – para manter a altivez ou o emprego. (b) para obedecer a um comando de bombardear um alvo civil, “seguir o superior” ou “os tratados de guerra”, também cabe abstrair o imediato e firmar

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critérios. Brincar é mais “dramatização” divertida, com muitas inver-sões de papéis compondo o enredo, do que drama (in)tenso. Mas o gérmen deste também já está presente. Não é casual que Vigotski re-pita: no drama “Ecce homo” (1929/2000, p. 39) e “na brincadeira Ecce homo” (s/data/1980, p. 277). Em ambos: “Eis o humano”!

5 A atuação do educador e a brincadeira proximal” em língua portuguesa

Nas seções anteriores delineamos o desenvolvimento da perso-

nalidade como processo “dramático” – repleto de importantes deci-sões vitais – cujos ganhos e perdas não se apagam da memória facil-mente. Processo que, ao longo de nossa existência histórica, se a

de papéis da criança

A brincadeira é inalienável da vida.

Nenhuma brincadeira se passa em uma “redoma de cristal” alheia a vida de sociedade com todas vertentes conservadoras ou insurgentes. Com suas desigualdades de gênero, etnia, ge-ração e seu antagonismo feroz entre classes sociais. Com suas lutas milenares por uma emancipação radical até o momento ainda não conquistada. Toda brincadeira tem, ao menos, dois componentes indispensáveis: “regras” e “situação imaginária” – ambos de origem social. Com “regras” sociais implícitas e “si-tuação imaginária” explícita, há brincadeira de papéis ou “jogo protagonizado” (Elkonin, 1978/1980). Com “regras” explícitas e “situação imaginária” implícita, há o que em Leontiev (1944/1989) está como “jogo”, stricto sensu, p.e. o xadrez, sua situação imaginária implícita seria a de uma “guerra”. E nota-se que tanto as situações imaginárias quanto as regras para a brincadeira não podem ter outra fonte que não a existência so-cial em suas múltiplas determinações, em suas contradições constitutivas.

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sociedade possibilita, tende para uma crescente capacidade de agir-mos livremente frente aos outros e ao mundo. Não por fugirmos às regras da cultura, mas justo por obtermos maior domínio sobre elas e tornarmo-nos aptos a discutir sua pertinência para a ampliação da liberdade de todos, que é o mesmo que ampliação da nossa própria. Ligado intimamente a este longo processo de desenvolvimento está o surgimento da brincadeira de papéis sociais pela criança, que re-presenta (não é cópia de) papéis dos dramas de adultos, abrindo “ca-minho para a liberdade” mediante nexos interfuncionais que consti-tuem a “imaginação” como neoformação.

Como aludimos antes, Vigotski estimava a chamada “idade pré- escolar” como um período relativo, em média, ao intervalo entre três e seis anos de vida – a “neoformação guia” define a idade psicológica para o autor (1932-34/2006). Nenhum estudioso do desenvolvimento, seja Freud, Piaget ou Gesell, assume que um período psicológico coincida com datas de um calendário. Tampouco assumem que seja inevitável que todas as fases aconteçam sempre para todas as crian-ças, embora, nesse caso, tendam a entender que “algo ruim” isso po-derá causar e não apenas “algo diferente”. Portanto, muito menos Vi-gotski assume estrita relação entre o que chama de “idade psicoló-gica” e “idade cronológica”. Já que na perspectiva teórica deste autor há uma fusão dialética entre as linhas de desenvolvimento biológico e cultural. A criança de três a seis anos no Brasil de hoje (quantos Brasis temos?) não é a mesma da URSS do início do século XX. São culturas diferentes, modos de produção opostos.

Notemos, portanto, que nós mesmos, em diferentes atos perti-nentes ao exercício e à autoria do nosso papel social de professores, também podemos viver colisões “dramáticas”. Por um lado, sem compreensão dos fundamentos teóricos clássicos de nosso ofício não podemos proceder com criticidade. Por outro, não desejamos que cri-anças concretas (multideterminadas) caibam, a todo custo, numa te-oria que as concebeu de modo geral num passado distante. De um lado, Vigotski concebe a brincadeira como uma atividade humana que pode abrir uma nova etapa do desenvolvimento da personali-dade, como “caminho para a liberdade”. De outro, não poderia haver também, em brincadeiras, aspectos ideológicos que gerem “aliena-ção”, como investiga o professor Rodrigo Lima Nunes (comunicação pessoal, agosto de 2013)? Nossa decisão é por tomar posição, abrindo-nos à crítica, e mantendo a tensão.

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Assim, em meio às várias decisões que nos cabe tomar, na cons-tante luta que segue sendo o ato de educar, assumiremos o conceito geral de “educador” de Vigotski, entendido no quadro de uma edu-cação soviética, que não é a que temos hoje em nosso país. Mas que, pelo contraste com nossa realidade, opõe-se às correntes neoliberais hegemônicas em educação. Tanto no que diz respeito a seu pragma-tismo – para o qual devemos ensinar aos alunos apenas técnicas para obter “informações” por “conta própria” (usar um computador em rede; consultar numa biblioteca física; saber se portar num museu; entrevistar quem domine o assunto de sua pesquisa, etc.). Quanto no que diz respeito a seu cientificismo – para o qual devemos ensinar conteúdos científicos como formas racionais neutras (sem historici-dade, ou seja, sem menção à luta de classes e sem considerar a mate-rialidade vivencial e afetiva como constitutiva do conhecimento).

Para Vigotski, o papel do professor soviético é de grande distin-ção, como é grande para nós hoje a dificuldade de fazer cumprir a função primordial da escola: socializar o conhecimento crítico fruto do trabalho humano, mas pouco acessível aos filhos dos trabalhado-res. O autor, já em 1924, na União Soviética, entende caber à educação tarefa mais profunda que na sociedade capitalista, dizendo que “edu-car significa organizar a vida” (Vigotski, 1924/ 2003a, p.220). A vida não pode seguir espontaneamente, sem que se a organize, sem que nos apropriemos de método para lidar criticamente com as contradi-ções da realidade da qual fazemos parte. Cabia a toda aquela socie-dade a organização da vida para a. consolidação do socialismo e, no limite, do comunismo: “reino da liberdade”. Mas se diferentes “meios sociais” organizam a vida (a família, o. grupo de pioneiros, o partido comunista, etc.), a escola soviética não deixa de ser meio social privi-legiado entre os demais.

Em 1926, Vigotski adensa a concepção de professor como “orga-nizador do meio social educativo” (1926/1991, p. 159). Temos acordo sobre “o professor dever ensinar”. Se o essencial ainda não houve no Brasil, mantemos essa tautologia. Mas Vigotski não nega o essencial – eleva-o... O professor não pode organizar “toda” a vida social de seus alunos, é específico da educação escolar garantir o domínio da “arma da crítica” (Marx, 1843/2010, p. 151). Mas tal arma, na socie-dade soviética está em função da vida social que ela impulsiona. E a vida ultrapassa a crítica por ser práxis, critério de verdade do pensa-mento (Marx, 1845/ 1978). Assim, tal professor não é um “auxiliar”

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ou “animador”, pois organiza e conduz, com base científica, relações sociais educativas: (a) dos alunos com outros; (b) dos alunos com res-ponsáveis por acervos, laboratórios, etc.; (c) dos alunos com a equipe pedagógica; (d) dos alunos, principalmente, com as aulas intransferí-veis que ministra – de modo planejado, rigoroso e profundo; etc.

Além destas atribuições, cabe-lhe atuar na organização geral da

ação do coletivo de professores, pois sua tarefa não é a de um “pro-fissional liberal”. Embora os professores que Vigotski concebe devam ser intelectuais munidos pelo Estado Soviético, com recursos sufici-entes para o exercício de seu papel de “organizadores”, e tais condi-ções nem sempre tenhamos, senão com acirradas e prolongadas lutas, mantenhamos tal concepção como guia de nosso diálogo. Não como utopia, ou como chamado a “sacrifício pela causa”, mas como um sis-tema conceitual que esteja “mais adiante que o [nosso] desenvolvi-mento” (Vigotski, 1933-34/2001 p. 322). Como um ato de mediação simbólica que “organiza” nossa reflexão sobre as relações entre

A Para Vigotski, a educação com/para a “liberdade” não é “escolanovista”, é soviética:

“Como a educação é um processo inalienável na vida do ser humano, a educação livre não significa rejeitar a restrição. [...] Se o ser humano renuncia à educação, então começará a ser educado pela rua, pelos móveis e pelas coisas. Por esse motivo, a educação livre deve ser entendida [...] dentro dos limites que pode ter essa liberdade no plano geral da educação e no meio social. [...] Devemos organizar a vida na escola de tal forma que seja benefício para a criança avançar com o grupo, assim como é bom que ela aceite as regras do jogo; a divergência com o grupo, portanto, deixaria sua vida sem sentido, pois ela se sen-tiria como se tivesse sido excluída do jogo. A vida assim como o jogo, tem de exigir uma constante tensão das forças, na ale-gria permanente da atividade combinada” (Vigotski, 1924/2003a, p. 221-222).

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“brincadeira de papéis sociais da criança” (que ocorre em diferentes relações, mesmo sem atuação intencional de adultos) e “educação como relação social organizada por um intelectual especialmente pre-parado” (que é sempre intencional, em seus distintos modos de efe-tivar-se no espaço escolar).

Tendo em vista a trabalhosa e essencial tarefa do professor como intelectual organizador do meio social educativo escolar, comenta- remos, para fins didáticos, três formas de relacionar brincadeira e educação infantil: (a) “a concepção do aprender brincando: seus limi-tes e possibilidades”; (b) “a concepção do brincar aprendendo: seus limites e possibilidades; e (c) “a concepção do brincar organizando a vida: seus limites e possibilidades”. “Fins didáticos”, no sentido de organização do nosso pensamento sobre práticas possíveis. No ato pedagógico efetivo se encontrarão mútuas influências entre estas ati-tudes, formas intermediárias de organização, ou inovações de que não temos notícia. Perpassando estas formas “tipificadas”, concluire-mos dialogando sobre: (d) “relações entre ‘forma e conteúdo’ da brin-cadeira no espaço da educação infantil”. Buscando pensar uma elei-ção criteriosa de atos significativos que venham a potencializar brin-cadeiras de papéis sociais.

Toda brincadeira possui conteúdo semântico

Para as três modalidades tipificadas de relação entre a ativi-dade de brincar (de “faz de conta” ou com regras explícitas: “jogo”) e a atividade estudar, há conteúdos que não se aprende “fazendo de conta” ou “jogando”. “Vamos brincar de Hemisfé-rio Sul. Eu sou a África, você a América do Sul, quem será a Oceania?” – seria comum ouvir isso? Na brincadeira de papéis, geralmente, são significadas ações humanas – como “age” um continente? No jogo (brincadeira com regras explícitas), por sua vez, deve haver vencedores: talvez se proponha jogar “me-mória” com mapas de países, sendo uma cor para cada conti-nente, com seus nomes lidos pelo professor? Quem aprende menos perde? Não há relação imediata entre linguagem con-ceitual e brincadeira. Seria interessante um trabalho organiza-tivo de “tradução” entre elas, mas não uma transposição direta.

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(a) “A concepção do aprender brincando: seus limites e possibilida-des”.

Talvez a primeira imagem que nos venha à mente quando, em educação, propomo-nos relacionar a brincadeira e a educação é no-ção, não muito crítica, de que “a melhor maneira de a criança apren-der é brincando”. Ouve- se tal formulação repetir-se algumas vezes nos grandes meios de comunicação de massas, no senso comum tam-bém, mas não necessariamente em todas as suas esferas. Pois também se diz, por senso comum, entre os mais velhos, que “para aprender é preciso estudar” (sem se queixar de que o ensino seja ruim). Além disso, tal noção pode ter impacto sobre tendências pedagógicas acrí-ticas. Há um ideal aí suposto, de que a melhor forma de se obter o desejado seria sem fazer qualquer esforço. E assim, “aprender brin-cando” seria ótimo, pois a brincadeira “por natureza” não exige es-forço e aprender “seria mais fácil”.

Podemos perceber algo equivocado em duas premissas. Pri-meiro, em que o melhor que podemos obter na vida seja o que não dá trabalho conquistar – pegar qualquer grão de areia e pô-lo em lugar especial como um diamante. No capitalismo é falso que basta nos es-forçarmos para obter o que precisamos, pois nosso trabalho é expro-priado. Porém, nada de precioso a humanidade produz sem árduo e demorado trabalho de muitos. No todo da sociedade, não vale a re-gra: “menor esforço para resultado mais desejado”. Segundo, em que a brincadeira não exige esforço. Ao contrário, Vigotski (1933/2008) in-dica que crianças podem deixar de satisfazer desejos imediatos para cumprir uma regra (implícita ou explícita) da brincadeira. Se brinca que a água limpa e fresca num copo é “álcool” de uma pequena usina, onde “trabalham” seus bonequinhos, e tem sede, poderá não bebê- la e buscar outra – fazendo esforço extra.

(b) “A concepção do brincar aprendendo: seus limites e possibilida-des”.

Educadores mais críticos, possivelmente ao perceber que, no in-terior da brincadeira e do jogo, não haveria condições para contem-plar o ensino e aprendizagem de conteúdos escolares, parecem ter assumido a antítese: se aprender não pode ser sempre “divertido”,

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brincar deve ser sempre “instrutivo”. Assim, o mote deixaria de ser “aprender brincando”, mas “brincar como ‘instrumento’ para apren-der”, o que tem sua expressão máxima nos chamados “jogos pedagó-gicos”. Tais jogos sofreram críticas, por sua vez, por criarem divisões artificiais para seus usuários, como faz o mercado editorial: “livros para crianças pré-escolares (só imagens)”; “livros para crianças de 7 anos” (frases e imagens); “para crianças de 10 anos”; “para adoles-centes”; “para adultos”, etc.

Como se fosse impossível uma criança pequena ouvir uma fábula e imaginar personagens, cenas... Ou ler para ela um conto clássico, sabendo que poderia atribuir significados, dos quais dá conta com seu desenvolvimento, e avançar. Também com “jogos pedagógicos” visou-se a “fatias de mercado”, sobretudo por idades. Mas em que ajudam “jogos pedagógicos” mesmo que tomemos os “para mais ve-lhos” e ensinemos os menores a ir com eles até onde puderem com nossa mediação? Talvez se tornem “material didático”, se tiverem conteúdo científico. Mas como brincadeira, mostrarão dificuldades da concepção anterior. Brincar não sempre se subordina ao conteúdo científico e vice versa. Há quebra- cabeças de “continentes” em que o mapa de cada país é uma peça. E se uma criança preferir que o espaço vazio para a África seja um “lago” e peças de países sejam “barcos”? Será brincadeira, sem conteúdo escolar. Presa às regras do fabricante, haverá “conteúdos”, não brincadeira. (c) “A concepção do brincar organizando a vida: seus limites e possi-bilidades”.

Não há aqui menos dificuldade que nas visões anteriores, mas tentemos dar um passo adiante. Sendo um papel da escola proporci-onar o domínio de mediações simbólicas e técnicas que impulsionem a gênese da personalidade da criança, vale discernir as relações soci-ais mais aptas a promover tal impulso em cada momento de sua vida. A metáfora de Vigotski mais conhecida quanto ao impulso das rela-ções sociais ao desenvolvimento humano é a “zona blijaishego razvi-tiia” [зона ближаищего развития] (Vigotski, 1934, p. 218, 220 e 221), ou ZBR. Em português: “zona de desenvolvimento proximal, pró-ximo, imediato ou iminente” (conforme o tradutor). Literalmente, é “a zona do desenvolvimento mais próximo de todos”, não pode ser

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distante. Ela emerge, e se consolida num futuro muitíssimo próximo, na nossa relação com pessoas mais experientes.

Porém, se a relação social que gera “zona de desenvolvimento proximal” na idade escolar é o “ensino”, a “instrução”, ou o “pro-cesso ensino-aprendizagem” (Vigotski, 1933- 34/2001); o que a gera na idade pré-escolar é a “brincadeira” (Vigotski, 1933/2008), não o “ensino” ou “instrução”. Isto faz diferença. Pois a partir da “idade escolar”, o papel da escola de socializar conhecimento crítico coinci-dirá plenamente com o de promover o avanço do desenvolvimento integral da criança, gerando ZBR. Mas, na educação infantil, na “idade pré-escolar”, a função da escola se “duplica”: (a) ensinar con-teúdos sobre a realidade como é de fato: contraditória; e (b) propor-cionar as melhores condições para que a criança brinque e avance em seu desenvolvimento integral. Quando a relação que dá maior im-pulso ontogenético é o ensino, isso não exclui outras relações. Quando a brincadeira dá o impulso principal, outras coisas impor-tantes também se deve aprender.

Nosso entendimento, a ser submetido à crítica da leitora e do lei-tor, é o de que a brincadeira não chega a ser tão importante que tudo se deva aprender brincando. Nem tão sem importância que se trans-forme em simples ferramenta didática na qual a sua potência especí-fica de levar adiante o desenvolvimento se perca. Pensamos que uma forma menos simplificada de olhar as relações entre educação e brin-cadeira seja a de vê- la como modo de “organizar a vida”. Porque é com o mundo social, do qual nunca deixou de fazer parte ativamente, que a criança dialoga ao brincar. Tomando como base material os “dramas de papéis sociais” dos adultos, para criar a estrutura semân-tica geral de suas brincadeiras, a criança descola-se das sensações imediatas como principal critério para se relacionar com o mundo – para viver.

Não mais lhe bastará saber de coisas, pessoas e relações apenas: como são; de que cor; que tamanho; onde estão; com que se parecem; etc. Importará saber ainda o que significam: para que servem, quais apartes as formam; como são classificadas; como se tornaram o que são agora; que virão a ser no futuro... A transição para o predomínio do sentido, surgida com a brincadeira, é primordial para tal salto de qualidade no modo da criança organizar sua vida: como a entende e como a conduz, ao mesmo tempo. Isso não significa que tudo seja só brincar, que não precise realismo dando suporte à imaginação. Nem

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que a brincadeira seja fechada a um “mundo infantil” (que não há), e um educador não deva atuar na organização desta modalidade de relação social.

Garantindo condições para que se dê até com mais potência: su-gerindo, instigando, participando, sem a instrumentalizar ou tirar sua especificidade.

Quanto aos aspectos essenciais do ensino, propriamente dito, du-

rante a idade pré-escolar não nos coube o papel social de falar aqui. Mas, pelo já assumido antes, fica acordado que não defenderemos um currículo para crianças nesse período cujo conteúdo nem a forma sejam exclusivamente a brincadeira. Teremos diversos conteúdos que não serão acessíveis se não forem ensinados num gênero discursivo mais “sério” por adulto preparado, que gere confiança e clareza de o conhecimento ser correto. Digamos que uma criança more em bar-raco de ocupação urbana e questione: “por que outras pessoas têm casa?”. Há ciência para explicar, mentir não é recomendado. Expli-quemos de forma abreviada, mas realista e não mítica ou ideológica. Como isto não é para este momento, vamos a algumas pistas para a

A brincadeira como “conteúdo curricular”?

Temos notícia de que, em alguns estados brasileiros, pode-se vir a considerar a brincadeira como “conteúdo curricular” da educação infantil, ao menos durante o período aproximado ao que Vigotski chama de “idade pré-escolar”. Tal opção teria du-pla consequência: (1) por um lado, admite que a principal força motriz do desenvolvimento nesse momento da vida é a brinca-deira, que gera a imaginação, e conduz ao desenvolvimento da vontade [arbitrariedade] e do pensamento abstrato [abstração] – abrindo “caminho para a liberdade”; (2) por outro, torna-se difícil definir o “conteúdo” de uma atividade pedagógica (in-tencionalmente dirigida) como sendo a “brincadeira”, que é uma “forma” de relação social, com modos peculiares de signi-ficar a realidade. Fica a pergunta: “quais os conteúdos simbóli-cos dessa forma de relação social na escola?”.

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atuação do professor potencializando a organização vital que a brin-cadeira pode promover.

Poremos à sua avaliação cinco sugestões simples de se efetivar, das quais algumas podem ser descartadas conforme de cada realidade, assim como haverá ideias geniais de autoria de vocês que serão fun-damentais. É importante haver uma lógica na organização e ligação das sugestões em conjunto, que não sejam itens isolados a escolher por sorteio para cada dia. Para nós, uma primeira sugestão é criar ou ampliar, na sala, um espaço para um acervo de brinquedos e livros, tão diversificado quanto possível: sejam comprados ou de doações; industriais ou artesanais; jogos de tabuleiro; “jogos didáticos” (po-dem servir para brincar); carrinhos; bonecas e bonecos; móveis, ele-trodomésticos e ferramentas em miniatura; conjuntos com animaizi-nhos, dinossauros, soldadinhos; fantasias e máscaras podem fazer parte... Assim como vários livros, com ilustrações ou sem, para se leia para/com as crianças...

Tais materiais podem ser comprados, ou fruto de doações, e vá-rios deles fabricados com sucata (com as crianças ou não), com carto-lina e papelão pintado ou não. O importante será que possam cum-prir a função de “pivô” e dar suporte material para a produção de sentido (social, por definição). A segunda sugestão, a partir da nossa experiência, é de que é válido organizar por categorias os brinquedos no espaço disponível, seja em estantes, ou caixas de papelão encapa-das com papel de presente (mostrando zelo e carinho para com o que é para todos). Essas categorias não precisam ser técnicas nem hierár-quicas, mas é aconselhável que se escreva seu nome em cartões visí-veis sob os quais o material categorizado fique, para que possa voltar ao lugar após seu uso. Sob orientação do professor que lê, a criança poderá observar que aquelas “letras” têm função e pode até pergun-tar o que está escrito.

Esta organização não precisa ser imutável, mas ter alguma dura-bilidade para que o ato de ter acesso ao acervo de recursos para a brincadeira vá permitindo à criança uma organização mental coe-rente ao fazê-lo, entendendo também que as coisas não estão ali sem cuidado, nem por acaso. Disso se origina uma terceira sugestão que é a de o professor organizar numa roda de conversa, uma discussão inicial sobre as mínimas regras necessárias para o uso do acervo. Como a quantidade de brinquedos que se pode pegar por vez, antes de devolver para pegar outros, sobre em que situações se poderia

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coletivamente usar todos, sobre (ao menos tentar) devolvê-los no lu-gar em que estavam, e outras medidas para todos terem mais liber-dade. Tal acordo pode ser periodicamente retomado, e feito um car-taz com símbolos desenhados que façam lembrar cada regra, a qual também pode estar lá escrita, para que o professor leia para as crian-ças e ele mesmo se lembre.

Nossa quarta sugestão é de haver uma “observação diagnóstica” ativa, pelo professor, do uso “não dirigido” do acervo. Um pouco an-tes de iniciar sugestões “dirigidas”, para ampliar a experiência da cri-ança. Pois esta é fonte de recursos para imaginar (Vigotski, 1930/2009). “Diagnosticar” não é “rotular” as crianças: “essa é mais criativa, ou menos”; “essa trabalha em grupo, outra é centrada em si”; “essa é desatenta, aquela focada”... Não é isso, mas conhecer re-lações sociais, de modo qualitativo: como se dá sua breve história; quais os passos das crianças na brincadeira, quais os “atos” da “peça”. Sobretudo, “de quê brincam”, quais indícios há de sua vida social além da escola. O processo é ativo, pois observar é agir, mas também por não ser preciso “se ausentar” do observado: crianças po-dem nos chamar a atuar, ou pedir medição em conflito que surja. Tal observação crítica pode ajudar a organizar atividades “dirigidas”.

Esse processo de “conhecer atravessando” a realidade (sentido ancestral de “diagnose”), não se resume aos primeiros encontros até propormos brincadeiras planejadas. Ele continua por todo ano letivo e é recurso para avaliação. Uma ideia seria termos um diário para registrar o que houve de mais significativo, se houver tempo de tra-balho disponível, após as aulas – de preferência. Não durante, pois talvez quebre o ritmo das relações pedagógicas. Assim, nossa quinta sugestão é quanto à potencialização das brincadeiras das crianças mediante atuação do professor em sua organização. O que entende-mos poder se dar, pelo menos, de duas maneiras: (1) sugerindo novas possibilidades dentro de brincadeira já iniciada para a qual fomos “convidados” a atuar ou “nos convidamos” (não está descartado); (2) iniciando com chamado coletivo a participar de uma brincadeira de papéis, cujo “roteiro básico” nós escrevemos e pode ser “rescrito” por toda a “companhia” na própria atuação.

Num planejamento com atividades para crianças pré-escolares, o tempo reservado à brincadeira, em tese, é momento para atender uma necessidade vital. A de aprofundarem sua integração com a re-alidade social da qual já fazem parte, numa “tensão das forças, na

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alegria permanente da atividade combinada” (Vigotski, 1924/2003a, p. 222).

Assim, é provável que o acervo de objetos para brincar seja fre-quentado voluntariamente. Orientaríamos: “Hoje, vocês aproveita-rão parte do tempo pegando brinquedos que precisarem para brincar do que escolherem”. Mesmo que alguns brinquem sozinhos, e/ou não fiquem num só lugar, diferentes “cenas” ganhariam forma, em espa-ços definidos. Faríamos trabalho “itinerante”: passar por grupos, ele-ger situações para entrar em “atividade combinada” – podendo mi-grar entre eles. Pode-se tanto “dar apoio” ao faz de conta, dizendo à “professora” ou “professor” (de “escolinha”) que nós, alunos nova-tos, podemos ajudar na sala. Ou “complicar” a situação, dizendo: “não entendi professora/professor, explique outra vez?”.

Há tantas formas de “dar apoio” ou “complicar”, quantos forem os conteúdos possíveis da brincadeira – presentes de fato na vida so-cial, ou apenas em obras de ficção, fábulas, mitos, etc. Se crianças es-tão brincando “de casinha”, podemos chegar, sem sermos convida-dos, como um “carteiro” com uma encomenda para alguém que more na casa. Essa encomenda pode estar numa caixa real, e com isso se solicitar um empenho para haver soluções que deem seguimento ao faz de conta: quem enviou? Vamos mandar algo em retribuição? Mas outra situação seria a de preparar uma proposta na qual digamos: “Hoje vamos brincar de ‘posto de saúde’, como pode ser?”; ou “Hoje vamos brincar de ‘posto de saúde’, vou dizer como vai ser, mas vocês podem ajudar...”. Tanto no primeiro tipo de abordagem quanto na segunda não é preciso haver qualquer “espontaneísmo” – atitude de educar pautando-se apenas no que se imagina ser o desejo “espontâ-neo” das crianças.

Há muitas coisas que para imaginar é preciso ter grande experi-ência no assunto, e o professor tem condições de comunicar sua ex-periência às crianças, dando-lhes suporte à ação na brincadeira. Não fosse preciso experiência para imaginar, diríamos a alguém que nunca trabalhou em construção civil: “Você não tem casa, faça a sua, use a imaginação”... Poderia até usá-la para fazer um desenho figu-rativo dela, mas não conseguiria morar dentro disso. Mesmo na ação pedagógica de solicitar das crianças o esforço de desenvolver seu ato de decidir (ato volitivo), sobre os rumos da brincadeira, não as pode-mos deixar sozinhas. Noções talvez ainda vagas ou abreviadas que, em sua idade, tenham de um “posto de saúde” podem ficar mais

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nítidas e desdobradas com narrativas, imagens, filmes e, no limite, uma visita a um deles. Se as regras da escola permitirem e a secretaria de saúde não se opuser. Seria “estranho” brincar de posto de saúde (unidade básica de saúde)? Mas brincar de médico liberal que atende em casa é “normal”?

Independente dos temas que definamos para propor uma brinca-deira de papéis que envolva todas as crianças, nossa ênfase é para que a experiência potencializa o faz de conta. Daniil Elkonin (1978/1980) trabalhou com crianças que visitaram um zoológico e de-pois, voluntariamente, brincaram de agir como as pessoas que traba-lhavam lá. Concluindo esta parte, não há porque nos preocuparmos por nossa intervenção “interditar” a imaginação das crianças. Ao contrário, temos o papel de contribuir para “abrir caminhos” para o avanço de sua imaginação e seus modos de significar e organizar a vida. Trazendo para sua apreciação diferentes signos da experiência humana, ao mesmo tempo solicitando delas, em seu desenvolvi-mento “bem próximo”, a responsabilidade por “fazer escolhas”, “to-mar decisões”, realizar “atos volitivos” (Vygotski, 1931/2000) – pró-prios do “drama” humano, por toda a vida.

(d) “Relações entre ‘forma e conteúdo’ da brincadeira no espaço da educação infantil”.

Pelo que acabamos de dizer, assumimos a concepção de que, mesmo considerando a brincadeira um “conteúdo”, ela sempre terá seu conteúdo específico, sua semântica, ou seja: colocará sentidos so-ciais em jogo. Estes não surgem no/do vazio e trazem marcas das lu-tas sociais nas quais estão inseridos. Toda brincadeira é um ato de significar a realidade. Sendo ela contraditória, com confrontos, alian-ças, diferenças e desigualdades, os sentidos que a criança lhe atribui, mesmo não sendo o dos adultos, trarão algo de fidedigno. Processos de significação são atos de produzir sentidos mediante sistemas de “signos” (palavras, silêncios, desenhos, imagens, gestos...). Com Bakhtin [Voloshínov] (1929/1992), focamos dois aspectos dos “sig-nos”: “refletem e refratam a realidade”; e “são arena da luta de clas-ses”.

A brincadeira, como linguagem, traz em si contradições que constituem a realidade humana como “é” e “pode ser” (a reflete). Mas

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também, transforma tais contradições, não as domina totalmente, não pode “filmar” sua essência histórica, significa-a sob certo ângulo (a refrata). Além disso, a luta de classes estabelece um embate vivo quanto ao quais sentidos prevalecerão. Para um operário sindicali-zado, a palavra “greve” pode não ter o mesmo sentido que para um proprietário de fábrica – apesar da forma externa “igual”. As manei-ras de as classes compreenderem os signos, atribuindo-lhes “juízo de valor” (Bakhtin, 1974/2000, p. 401), propagadas à sociedade, continu-arão em luta: no noticiário televisivo ou no panfleto grevista. Crian-ças brincariam de “fazer greve”? De “lutar por direitos”? De “demitir lideranças e jogar polícia contra grevistas”? Só investigando para sa-ber... Porém nenhuma lei psicológica o impede, se tiverem experiên-cia dos fatos e estes lhes disserem respeito.

Não há qualquer obrigação, por “Lei” ou coerção de pessoas mais ilustradas/tituladas, de que assumamos uma “pedagogia crítica” ou uma “visão política socialista”, para cumprirmos nosso papel como educadores. A ninguém cabe induzir a leitora e o leitor a “seguirem” uma única interpretação teórica, linha política e/ou projeto para a so-ciedade. Sempre assumimos uma posição teórica e política, sabendo qual é ou não. Porém, o que não é possível é sermos “críticos” ou “socialistas” sem defendermos a classe trabalhadora, ou não tê-la como sujeito privilegiado da luta por transformação social radical. Nem é possível assumir concepção essencialmente “vigotskiana” da gênese da personalidade, se não for crítica. Nesta perspectiva não há neutralidade.

Uma crítica sem opção pelos trabalhadores é falaciosa, pois pelo trabalho são produzidos todos os bens materiais próprios da cultura, sejam técnicos e/ou simbólicos. Dos quais todos precisamos, mas nem sempre nos apropriamos. A perspectiva de Vigotski sem crítica seria psicologismo. Bastaria desenvolver funções psíquicas superiores de alunos de “todas as classes sociais”, como fosse “natural” haver clas-ses. Mais importante que “desenvolver funções” é a “pessoa que se desenvolve”. Para Vigotski (1930/1991) não importa a memória que alguém vem a ter, a atenção, o pensamento conceitual, mas que uso real que faz destas funções. Quais propósitos elas efetivam? Tal “uso” envolve a totalidade sistêmica e semântica de sua consciência e sua personalidade, posta em jogo em relações sociais concretas – i.e.: sín-tese de múltiplas determinações materiais, dentre as quais a reali-dade econômica.

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O “caminho para a liberdade”, em máxima potência, não é pos-sível sem o fim das classes sociais, que só será meta de trabalhadores não da burguesia. Mas, a organização da luta por transformação so-cial não está, exclusiva nem prioritariamente, sob a direção dos edu-cadores. Contribuímos educando. Mostrando às crianças, mesmo pe-quenas, a realidade como ela é, repleta de contradições, sem falsea-mento. Abrindo caminhos para a compreensão de tal realidade, com detalhes, pela relação social mais apta a gerar ZBR na idade: a brin-cadeira. Não se anulam: (a) trazer o máximo de detalhes sobre a rea-lidade (sem saturação que atrapalhe a compreensão e/ou lembrança); e (b) abrir espaços para imaginar e recriar o que apresentamos.

Pois “imaginar” é uma ponte para o “pensamento abstrato” (que vai além das aparências) e a “ação voluntária” (que nega a subservi-ência ao “prêmio” e à “punição”). Porém, não sugerimos desenvolver “funções” deslocadas de seu conteúdo significativo, para tornar al-guém “mais humanizado” de modo neutro, alheio à “história da luta de classes” (Engels, 1883/2003, p. 10). Ou olvidando que também há realidades ruins que somente nós humanos produzimos (Delari Jr., 2013). Trabalhando com “o objeto do pensamento abstrato” e “as con-sequências de nossa ação voluntária” para a coletividade, as duas conquistas favorecerão lutas futuras. Pelo dizer epicurista: “Os que virão também são nossos”.

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7 Resumo geral por tópicos proximal” em língua portuguesa

Ao longo do texto, destacamos que: o Desde o início, optamos por nos pautar na perspectiva de L. S.

Vigotski. o Vigotski, desde 1932, fala do desenvolvimento da personali-

dade como “caminho para liberdade” – renascimento do espi-nosismo no marxismo.

o A liberdade humana é uma conquista histórica, não um pres-suposto.

o Trata-se de liberdade não apenas pessoal, mas para toda cole-tividade.

o Não se pensa que a liberdade dos outros limita a nossa, mas a amplia.

o Em diferentes sociedades tal caminho se dá de modo distinto ou oposto.

o A dinâmica da personalidade é a de um “drama” de papéis sociais.

o “Drama”, nesse caso, é uma modalidade específica da ação hu-mana.

o Tal especificidade reside na efetivação do ato de uma decisão vital

o (in)tensa, pois implica arcar com perda em qualquer opção to-mada.

o De todos os períodos de desenvolvimento da personalidade, só tratamos da “idade pré-escolar”, que Vigotski estima ser en-tre três e seis anos.

o A idade pré-escolar terá como neoformação principal a imagi-nação, que surge das relações sociais desse período não é seu pressuposto.

o A brincadeira é uma modalidade de relação social que impul-siona a gênese da imaginação.

o Com a brincadeira passa a haver o predomínio de sentido so-bre objeto e do sentido sobre ação, este levando à “vontade”, aquele à “abstração”.

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o Ação voluntária e pensamento abstrato são “caminho para a liberdade”.

o O desenvolvimento humano é histórico e cultural. A criança “pré-escolar” soviética do anos 1920 e 1930 não é a mesma dos “Brasis” atuais.

o Vivemos o drama de nos pautar em teorias que tratam o ser humano em geral como histórico e atuar com realidade histó-rica diferente daquela de quem as propôs.

o Optamos por Vigotski juto porque sua proposta contrasta com a realidade atual.

o Vigotski se choca com propostas neoliberais para a educação, tanto pragmatistas quanto cientificistas. Para ele “educar é or-ganizar a vida”.

o Vigotski vê o educador como um intelectual organizador do meio social educativo. O que implica domínio, intencionali-dade e diretividade.

o Fizemos cinco sugestões organizadoras: criar o acervo; orga-nizá-lo por categorias; discutir regras; observar criticamente; intervir na brincadeira.

o Enfatizamos que os conteúdos da brincadeira não são neutros do ponto de vista de classe social e dos valores dados à eman-cipação humana.

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8 Duas sugestões de atividade semi-dirigida

8.1 Brincar de “cidade ideal”

Comecemos: “Hoje vamos brincar de cidade ideal”; “a cidade ideal é a que tem tudo que mais gostamos”; “o que precisa ter na nossa cidade ideal?”. Trazemos uma lista e consultamos as crianças: “Precisa ter ruas? Casas? Moradores? Bosque? Escola? Fábrica? Bom-beiros? Hospital? Farmácia? Mercado? Padaria? Prefeitura? Banco?” (ou outras opções nossas). Conferimos o que é mais bem-vindo e pe-dimos sugestões das crianças: “Que mais deve ter em nossa cidade ideal?” Com a lista pronta veremos se tudo cabe na sala, o que pode-ria estar no mesmo espaço, com duas ou mais funções... Podemos criar quarteirões com um contorno de fita crepe sobre o chão, as ruas estarão entre eles. Nos quarteirões haverá “locais” para os itens da lista, com casas de família ou repúblicas. Não precisamos paredes al-tas, podem ser como baixos biombos de papelão de até 20 cm, só um contorno... Dentro dos locais, irão brinquedos escolhidos para as vá-rias funções. Poderíamos ter algum “trabalho” específico na cidade, mas não o de prefeito, nem de professor ou professora... Coordenar o planejamento da cidade, ajudar a construí-la e depois interferir nas relações que surgirem é nossa tarefa. Obs.: Há uma canção de Chico Buarque de Holanda, chamada “Cidade Ideal”, do álbum “Os Saltim-bancos” – podemos ouvi-la antes de brincar.

8.2 Brincar de “TV Popular”

Comecemos: “Hoje vamos brincar de TV Popular”; “Esta é a TV” (caixa bem grande de papelão, ou duas bem grandes unidas, com corte na frente, no formato de tela, de modo que as crianças atrás dela pareçam estar na imagem); “vocês vão preparar apresentações”; “os programas serão ‘ao vivo’”; “podem ser: programa de cantores; reci-tar um verso; contar piadas; noticiário sobre problemas e qualidades da cidade; filmes, que já viram ou criarem; entrevistas com pessoas da cidade: operários, cientistas, artistas” (ou outras opções nossas e sugestões das crianças). “Enquanto uns apresentam, outros

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assistem”. Pode haver cadeiras para assistir, ou sentarem-se con-forme a mobília disponível na sala. Cada programa pode ter apresen-tador com fichas para chamar os convidados. Nas fichas pode- se de-senhar imagens que ajudem a lembrar quais os convidados. Atenta-remos para os modos de comunicação imaginados e personificados, quando “fazem de conta” serem para um público ausente.

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