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PESQUISA COMO POSSIBILIDADE DIDÁTICA NA FORMAÇÃO INICIAL:
EXPERIÊNCIAS ESTÉTICAS RECONSTRUINDO IDENTIDADES
José Albio Moreira de Sales
Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Tânia Maria de Sousa França
Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Gardner de Andrade Arrais
Universidade Estadual do Ceará (UECE)
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo apresentar uma reflexão teórico-prática sobre as
experiências vivenciadas pelos discentes do curso de Pedagogia à distância de uma IES
estadual, durante a disciplina de arte-educação, tendo como base a pesquisa, enquanto
possibilidade didática ao articular saberes por meio da experiência estética, rompendo
com a dicotomia teoria e prática a partir da indagação: os alunos e alunas conhecem as
manifestações artístico-culturais do seu município? Tendo a pergunta como primazia para
a construção do conhecimento, o professor pesquisador da sua prática e considerando que
a formação inicial de professores deve favorecer, além de outros aspectos, o exercício da
pesquisa como princípio educativo e cotidiano é que os alunos desse curso tiveram como
problemática realizar um levantamento das manifestações do seu município nas áreas de
teatro, dança, música, literatura e patrimônio material e imaterial, caracterizando, assim,
uma pesquisa de campo do tipo exploratória. Esta pesquisa foi realizada de forma coletiva
em oito pólos. A metodologia que subsidiou esta reflexão apoiou-se na abordagem
qualitativa do tipo descritiva. Como instrumento de coleta de dados foi utilizada a
observação participante e a análise dos relatórios de pesquisa elaborados pelos alunos e
alunas de um único polo. O trabalho foi embasado em estudos de Demo (1996, 1997,
2004), Freire (1999), Pimenta e Lima (2004) e Anastasiou (2006). Dos resultados da
pesquisa destaca-se a descoberta e reconhecimento da arte e da cultura dos diversos
municípios; articulação dos vários saberes ministrados nas disciplinas de filosofia,
história da educação, diversidade cultural e arte-educação por meio da experiência
estética; reforço da identidade cultural de cada aluno/aluna com o seu município, além do
exercício da pesquisa coletiva e de evidenciar o papel didático da pesquisa no processo
de ensinar e aprender.
Palavras-chave: Formação inicial. Experiências estéticas. Professor pesquisador.
1 INTRODUÇÃO
A formação inicial de professores, no momento atual, tem adquirido grande
relevância em decorrência dos estudos que refletem sobre os vários saberes necessários à
formação docente. Acreditamos que além de outros aspectos a formação deve favorecer
o exercício da pesquisa como princípio educativo e cotidiano, como defende Demo (1997,
p.5) ao colocar que “o que melhor distingue a educação escolar de outros tipos e espaços
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 303249
educativos é o fazer-se e refazer-se na e pela pesquisa” e o professor ser pesquisador da
sua prática, ação que vai gerar o movimento reflexivo ação-reflexão-ação, pois como diz
Freire (1999) oportuniza sair da consciência ingênua para a curiosidade epistemológica.
Como afirma Almeida (2000) o cotidiano pode conservar ou transformar, mas
o que vai permitir essa passagem, ou seja, sair da cotidianidade, é ter a pergunta como
primazia para a construção do conhecimento (SOUSA, 2007). Corroborando com esta
reflexão Terzzi (2004, p. 31) expressa que “perguntas que dão o que fazer possibilitam o
surgimento de concepções, a tomada de consciência de contradições, a realização de
confrontos de diferentes opiniões, o incentivo à pesquisa e à ação”. Afirma, ainda, que
“elas se constituem um motor do saber, quando o aluno procura uma informação que
corresponde a uma real necessidade de explicação”.
A partir dessas ideias este trabalho tem como objetivo apresentar uma
reflexão teórico-prática sobre as experiências estéticas vivenciadas pelos discentes do
Curso de Pedagogia à distância de uma IES estadual, durante a disciplina de arte-
educação, tendo como base a pesquisa enquanto possibilidade didática ao articular
saberes, rompendo com a dicotomia teoria e prática, a partir da pergunta: os alunos e
alunas conhecem as manifestações artístico-culturais do seu município? Os discentes
tiveram esta questão como problemática e para resolvê-la realizaram um levantamento
das manifestações do seu município nas áreas de teatro, dança, música, literatura oral e
patrimônio material e imaterial, caracterizando uma pesquisa de campo do tipo
exploratória. Esta pesquisa foi realizada de forma coletiva em oito polos.
A metodologia que subsidiou esta reflexão apoiou-se na abordagem
qualitativa do tipo descritiva, que “consiste na descrição de situações, acontecimentos e
ações, ou seja, mostrar como é e como se manifesta determinado fenômeno” (POLAK, et
al, 2011, p.75) tendo como objeto um único polo por ter sido o local onde atuamos como
professora formadora. Os dados foram coletados a partir da observação participante
durante as aulas e da análise tanto dos relatórios de pesquisa elaborados pelos alunos e
alunas, durante as atividades postadas no ambiente Moodle, como do projeto pedagógico
do curso. O trabalho foi embasado em estudos de DEMO (1996, 1997, 2004), FREIRE
(1999), PIMENTA e LIMA (2004), ANASTASIOU (2006) dentre outros.
Apresentamos a seguir as referências que serviram de base para o trabalho.
Depois trazemos a descrição do processo de pesquisa mediado pela análise dos dados e
articulados com os referenciais teóricos. Ao final, evidenciamos os ecos da pesquisa
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 303250
encontrados nas falas dos alunos e traçamos as considerações finais, destacando os
resultados encontrados a partir da pergunta inicial.
2 EM BUSCA DE ELEMENTOS PARA A DISCUSSÃO
Inicialmente trazemos para este cenário o Projeto Político Pedagógico (PPP)
do Curso de Licenciatura em Pedagogia, na modalidade à distância, ao tratar das bases
filosóficas e pedagógicas, que afirmam buscar
[...] a formação de indivíduos capazes de se adaptar às diversas
situações do mundo globalizado pressupõe a existência de docentes que
se mantenham atualizados e tenham como preocupação básica despertar
e manter em seus alunos a curiosidade pelo saber, a disponibilidade para
mudar, o desafio de criar novas respostas às situações vivenciadas e de
tornar-se reflexivo. (UECE, 2008, p. 5)
O mesmo documento reforça, ainda, “a compreensão do trabalho pedagógico
como elemento integrador da teoria e prática”, favorecendo “o desenvolvimento das
capacidades intelectuais e a criatividade dos alunos”, estando pautada a sua matriz
curricular nos princípios da autonomia, historicidade, teoria-prática,
interdisciplinaridade, construção e da investigação, compreendido esse último “como
exercício sistemático, planejado e coletivo da reflexão sobre a prática pedagógica. Traduz
a capacidade do professor de conhecer e avaliar as relações sociais, políticas, econômicas,
culturais e pedagógicas que influem em seu trabalho”.
Ancorado nesse princípio trazemos a defesa feita por Anastasiou (2006, p. 98)
de que “o ensino com pesquisa oferece condições para que os estudantes adquiram maior
autonomia, assumam responsabilidades”, ideia já defendida por Demo (1996,1997,
2004), quando é incisivo no seu discurso da pesquisa como princípio científico e
educativo, educar pela pesquisa e pesquisar para saber pensar, transformando assim, esse
fazer num pensar cotidiano, ou seja, que o professor além de utilizar a pesquisa como
possibilidade didática adquira uma postura investigativa da e sobre a sua prática. Como
podemos perceber quando os alunos expressam:
As atividades que nos foi designada foram muito proveitosas, na qual
conhecer a cultura de nossa cidade me trouxe uma nova aprendizagem, no
primeiro momento fiquei me perguntando: será que nossa cidade tem todas
essas culturas? No entanto quando fui à pesquisa percebi as maravilhas de
nossa cidade, tem uma imensa riqueza e diversidade cultural (Aluno 7)
No entanto, diante do tema pesquisado nas atividades anteriores, descobri
coisas interessantes e surpreendentes, que dentro do meu próprio lugar de
origem não havia estudado e observado. (Aluno 18)
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 303251
Aspecto, também defendido por Pimenta e Lima (2004), ao afirmarem que o
próprio processo de ensino do professor pode se transformar em objeto de pesquisa,
resultando em construção de conhecimento no campo da Didática. Daí colocarmos a
pesquisa como possibilidade didática, porque ao problematizar e analisar sua prática,
professor e alunos estão produzindo novos conhecimentos, unindo teoria e prática e
transformando o ensino de mera transmissão para algo construtivo.
Outro ponto de referência diz respeito à pesquisa coletiva, caracterizada pelo
“desenvolvimento de trabalho investigativo por um conjunto de pessoas em torno de um
mesmo objeto, compartilhando instrumentos e preocupações” (FARIAS et al. 2010, p.
11), favorecendo a troca de experiência, partilha de saberes, descobertas como afirma um
aluno:
O ato de pesquisar, principalmente em equipe, além de haver uma interação
maior do grupo e a troca de conhecimentos, nos proporciona reviver o
passado, compreendendo um saber histórico jamais vivenciado, que se
caracteriza pela diferença, pela arte e pela diversidade. (Aluno 18)
Entretanto, neste modo de fazer pesquisa Farias et al (2010) alerta para o
cuidado de garantir que as pessoas não apenas fiquem lado a lado, mas que desenvolvam
realmente um trabalho em conjunto, com espírito colaborativo, respeitando as diferenças
e sentindo-se parte do processo.
3 DESCREVENDO O PROCESSO DE PESQUISA
Tudo começou com uma reunião de planejamento dos professores formadores
(como são chamados os docentes que ministram as aulas presenciais) da disciplina Arte-
educação.
A pergunta que orientou a pesquisa foi: os alunos e alunas conhecem as
manifestações artístico-culturais do seu município? As reflexões teórico-práticas
aconteceram durante a reunião, ficando decidido que a atividade que nortearia toda a
disciplina seria uma pesquisa de campo coletiva, onde os alunos em grupo fariam um
levantamento das manifestações locais nas áreas: teatro, dança, música e literatura oral
(contador de histórias, repentistas, dentre outros), patrimônio material (construções
antigas, museus e outros), dividida em três atividades, a seguir discriminadas.
4 REGISTRAR ATRAVÉS DE UM TEXTO O RESULTADO ESCRITO DA SUA
PESQUISA
Nesta atividade os grupos foram convidados a escrever detalhadamente o que
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
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encontraram ao realizar o levantamento. Ao analisarmos os textos percebemos que cada
grupo procurou fazer o seu trabalho o mais completo possível, iniciando com a história
do município e depois relacionando as manifestações artístico-culturais, evidenciando a
diversidade. Uma das alunas afirmou: “nossa Cultura é bastante diversificada tendo cada
uma sua importância”. Este exercício causou alegria, resgate, descoberta, novos
conhecimentos e aprendizagens, como podemos perceber nas falas dos alunos:
A realização do levantamento das manifestações artísticas, principalmente
locais, foi uma experiência muito significativa. Por meio desse trabalho
descobrimos outras fontes e formas de arte, que até então, nem sabíamos que
existia em nossa localidade. (Aluno 1)
O trabalho desenvolvido nesta disciplina foi muito gratificante, pois
possibilitou resgatar, conhecer e aprender sobre culturas, costumes e o quanto
temos de riqueza artística em nossa cidade e no nosso país. (Aluno 15)
5 ENCAMINHAR ATRAVÉS DO AMBIENTE MOODLE O
MATERIAL PESQUISADO COMO: FOTOGRAFIAS, VÍDEOS, GRAVURAS,
ARTIGOS, ENTREVISTAS DENTRE OUTROS
Após o levantamento geral, os grupos foram convidados a adentrar numa
manifestação, realizando uma pesquisa mais específica e o resultado encaminhado para o
ambiente Moodle através de fotografias, vídeos, dentre outros, como está explicitado na
redação da atividade. Um aluno na sua fala deixa claro como foi importante esse momento
ao colocar:
A atividade 2 foi muito bem pensada, pois através dela pudemos nos deter
melhor em um só tipo de arte, e eu particularmente me envolvi bastante com
a instituição que visitamos, que foi a “mãos de fada”, me surpreendi com tudo
que lá é produzido, e com a maneira como é produzido, como as pessoas se
envolvem pra fazer tudo com perfeição. (Aluno 2)
Ao apreciar a produção dos grupos que enviaram vídeos, inclusive postados
no Youtube, fotografias, slides em Power Point, pudemos perceber a seriedade e o prazer
como a atividade foi realizada e como o resultado de uma pesquisa pode ser organizado
de várias formas, como defende Taveira (2001, p. 111), ao assinalar que acredita “haver
muitas maneiras para organizar um material dessa natureza”, reforçando ainda mais a
autora diz que:
Não podemos perder de vista o fato de que o cotidiano é algo que se
tece diariamente, a partir de seu próprio movimento, o que vai exigir do
pesquisador desse rico espaço/tempo, a disposição para “jogar” com as
suas possibilidades, sempre provisórias e imprevisíveis, e que, por isso
mesmo, são infinitamente possíveis de explorar.
Outro ponto que merece destaque nesta atividade é a articulação com outros
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saberes seja de história, arte, filosofia, bem como de informática, ampliando assim os
conhecimentos dos alunos-professores-pesquisadores.
6 REDIGIR UM TEXTO AVALIANDO A EXPERIÊNCIA VIVENCIADA
Nesta etapa do processo, como solicitou a atividade, os alunos e alunas
escreveram um texto colocando a sua percepção sobre a pesquisa realizada. O resultado
da análise foi dividido em seis categorias: A pesquisa como possibilidade didática e de
formação; O prazer no exercício de pesquisar; Construção da identidade; O trabalho em
grupo, articulando saberes; Produzindo conhecimentos e aprendizagens. Vejamos o que
disseram os alunos sobre cada uma delas.
A pesquisa como possibilidade didática e de formação
Todas as falas evidenciaram a importância da pesquisa na formação docente
como expressa um aluno, ao colocar que durante o processo de pesquisa ficou evidente
que este tipo de atividade visa “fortalecer a nossa concepção da pesquisa como princípio
e competência que norteiam os processos de formação docente”. (Aluno 4). Outro aluno
reforça dizendo que “poder pesquisar e aprofundar os conhecimentos sobre o estudo da
Arte representou para nós, uma experiência acadêmica impar e de alto impacto positivo
na nossa formação cidadã”. (Aluno 6). Como afirma Demo (2004, p. 7) “a pesquisa não
é relevante apenas porque exercita os instrumentos de construção de conhecimento, mas
principalmente porque é oportunidade primorosa de educação, formação”.
A pesquisa como possibilidade didática pode ser percebida quando o aluno
18 expressa que “a pesquisa é uma forma de encontrar respostas para diversas situações.
Podendo assim formular novas ideias sobre determinados assuntos ou, aperfeiçoar
argumentos já existentes”. E reforça: “o recente estudo apresentou a importância de
inserir o hábito da pesquisa, destacando a mesma como um instrumento na construção
do conhecimento, que é essencial para a trajetória de nós universitários e educadores
que somos”.
Ainda nesta categoria os alunos evidenciam a pesquisa como um espaço de
reflexão crítica, contribuindo para uma conscientização, ou seja, ação-reflexão-ação,
como pode-se perceber na fala a seguir:
Conhecer as variadas modalidades de expressão artística nos trouxe um
conhecimento maior também de como ensinar e usar arte na educação, pois
ela tem ainda a função de desenvolver as potencialidades pessoais de cada
um, contribuindo para a formação da consciência crítica do indivíduo, de sua
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EdUECE - Livro 303254
visão de mundo, seu lugar e seu papel na sociedade, inserido em sua cultura
e sentindo-se parte dela. (Aluno 15)
Demo (1996, p. 37) apresenta a pesquisa como diálogo, expressão que
legitima a fala dos alunos, na medida em que ele diz que “pesquisa poderia ser: diálogo
inteligente com a realidade, tomando-o como processo e atitude, e como integrante do
cotidiano”, porque defende o mesmo autor: “um ser social emancipado nunca entra no
diálogo para somente escutar e seguir, mas para demarcar espaço próprio, a partir do qual
compreende o do outro e com ele se compõe ou se defronta”.
O prazer no exercício de pesquisar
Nesta categoria queremos mostrar como os alunos perceberam o exercício de
pesquisar. Pelas falas ficou explícito que os alunos gostaram de realizar a atividade, pois
a classificaram como válida e proveitosa, embora o aluno 16 tenha falado do sentimento
inicial de dificuldade ao pensar na realização da pesquisa, mas ele mesmo coloca que logo
se dissipou ao descobrir “como a cidade é rica com tantas expressões de variadas
vertentes”. Vejamos o que disseram:
Portanto a experiência foi bastante válida, já que pela pesquisa realizada se
teve a oportunidade do conhecimento das diversas manifestações culturais,
teatro, dança, suscitando o orgulho da nossa gente, fato que despertou nos
alunos a consciência da necessidade de um trabalho de divulgação de forma
a propagar a nossa riqueza cultural, valorizar as nossas raízes e estimular
novos talentos. (Aluno 13).
A experiência de pesquisar sobre nossas manifestações culturais locais foi
bastante vantajosa e significativa, pois possibilitou-nos a oportunidade de
estarmos mais próximos do que nos é próprio. (Aluno 17).
Reconstrução de identidade
A cultura é a identidade de um povo, ao desconhecê-la as pessoas perdem
suas raízes, sua identidade. Esse exercício de pesquisar as manifestações locais permitiu
esse conhecimento, logo oportunizou a reconstrução da identidade e isso tem como
consequência a valorização da cultura local e deixa fluir o sentimento de pertencimento
àquela história, àquele local, àquelas manifestações, especialmente porque essa pesquisa,
como disse o aluno 1, não favoreceu apenas “a experiência de estudarmos a diversidade
artística local, como também de convivermos com ela e vivenciá-la diretamente em nosso
cotidiano”. Vejamos o que disse o mesmo aluno sobre a valorização, às raízes:
A vivência com essa metodologia de trabalho, nos fez reconhecer melhor as
nossas próprias expressões artísticas, valorizando as nossas raízes e as
produções que vêm do seio da nossa terra. Muitas vezes, deixamos de lado
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tudo o que é fruto da nossa gente, e passamos a buscar e valorizar ainda mais,
aquilo que vem de fora.
Outros alunos evidenciaram esse mesmo sentimento ao expressarem:
Foi maravilhoso saber um pouco da história das nossas construções antigas,
das casas, das igrejas, das nossas tão faladas e conhecidas pontes, ou seja,
saber um pouco mais da nossa própria história. (Aluno 5).
Fazendo levantamento das manifestações locais da minha cidade, fiz uma
linda viagem resgatando memórias da minha infância. Tive surpresas
incríveis ao descobrir trabalhos maravilhosos que até então estavam fora do
meu conhecimento. [...] Fiquei emocionada ao lembrar dos Reisados! Como
esses momentos festivos eram divertidos e engraçados! Eu, na época, morria
de medo do careta! Outros personagens exóticos e engraçados faziam a festa.
O bumba meu boi era a maior atração. (Aluno 9).
Considerando que a identidade se forma nas diferentes relações estabelecidas,
é importante perceber como o exercício de pesquisar as diversas manifestações, permitiu
aos alunos fazerem relações desde as memórias da infância até os monumentos existentes
na cidade, reconstruindo a identidade, porque, como afirma Martins (2007, p. 202), “sua
construção ocorre na medida em que o indivíduo – seja ele criança, jovem ou adulto –
tem a possibilidade de se ver como uma pessoa que participa de um grupo com
características próprias, que procura neste grupo uma identidade enquanto ser social”.
O trabalho em grupo
Bonals (2003, p.13), afirma que “o trabalho em grupo, em determinadas
condições, incrementa a qualidade das aprendizagens e favorece a aquisição de
conhecimentos de alunos e de alunas, através da interação entre eles”. Podemos perceber
essa afirmativa se concretizar quando o aluno 1 diz que
[…] a proposta de trabalharmos em equipes, favoreceu ainda mais o espírito
de união da turma, já que todos tinham um mesmo objetivo em comum,
facilitando assim, a concretização da pesquisa e do levantamento das
informações coletadas”.
Outra fala também corrobora com essa ideia:
A experiência vivenciada neste trabalho em equipe foi maravilhosa, pois
tivemos além da oportunidade de passarmos mais um pouco tempo juntos e
nos conhecermos melhor, ainda aprendemos mais sobre o patrimônio cultural
de nossa cidade, que muitas vezes, nós nascemos e moramos a vida toda, mas
não conhecemos a nossa cidade. (Aluno 5).
Produzindo conhecimentos e aprendizagens
O que é o conhecimento? Com esta pergunta iniciamos a reflexão dessa
categoria. Segundo Luchesi (1992) o conhecimento é a elucidação da realidade e ele
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EdUECE - Livro 303256
acontece de forma direta e indireta, mas sempre através da interação do sujeito com o
objeto a ser conhecido. No caso desta pesquisa o conhecimento aconteceu de forma direta,
porque os alunos foram a campo numa aproximação com a realidade, como falou o aluno
3:
Percebi que acabamos elaborando uma pesquisa de campo, que se apresentou
como uma possibilidade de aproximação com a realidade (conhecer e
estudar) envolveu a combinação da busca pela realização do trabalho com o
conhecimento da nossa realidade através de observações, levantamentos de
material documental, entre outros. Acredito que o campo tornou-se um palco
de manifestações e interações entre nós pesquisadores e grupos estudados,
propiciando a criação de novos conhecimentos. (Aluno 3)
Diante dessa aproximação muitas aprendizagens foram geradas, muitos
conhecimentos produzidos:
Esse trabalho em cada um de seus momentos propostos nos proporcionou um
novo conhecimento, acerca do patrimônio histórico, artístico e cultural
presente em nossa cidade. Patrimônios esses, que muitas vezes, até passaram
despercebidos aos nossos olhos, que só através dessa pesquisa e análise mais
aprofundada é que foram redescobertos, mostrando a grande riqueza de
detalhes, que compõe o nosso conjunto de bens artísticos e culturais. (Aluno
1).
Dentro do trabalho realizado podemos perceber que existem várias formas de
conhecer a cultura de uma localidade sem a necessidade de recursos
econômicos. (Aluno 14).
Para mim foi bastante significativo me aprofundar na cultura e no
conhecimento da história das pessoas ilustres de minha terra, quando sempre
ouvi falar, mas nunca dei a devida importância para conhecer a fundo. Hoje
sei que o meu município é uma terra de grandes historiadores, que um dia
aqui habitaram e de artistas que muitas vezes não tem seus talentos
reconhecidos, mas que não desistem de seus ideais. (Aluno 3).
Articulando saberes
A ação de articular é uma habilidade que se faz presente na medida em que o
conhecimento vai sendo produzido e novas aprendizagens surgem. Como ficaram
evidenciados na categoria anterior, o exercício da pesquisa gerou vários conhecimentos e
não somente informações. Podemos dizer, neste momento, que também os alunos foram
capazes de articular esses conhecimentos, fazendo relações não somente com outras áreas
do conhecimento, outros saberes, mas também com o momento contemporâneo,
relacionando o local com o global, como fica claro nas seguintes falas.
Ao pesquisar sobre o município, adentramos na micro-história, ou seja,
aquela história ligada diretamente a nós, às nossas relações cotidianas, ao
espaço físico onde vivemos e convivemos e sua relação com a macro-história.
Sempre gostei de realizar esse tipo de pesquisa local, e com essa atividade
não foi diferente, pois tenho certa paixão por História e acredito que esse tipo
de atividade proporciona uma sensação muito boa, pois me sinto como
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EdUECE - Livro 303257
participante da história ao entender que o local onde eu vivo participou
também ativamente na construção da história do Brasil. Isso é sensacional.
(Aluno 10).
Vivenciar essa prática de pesquisa foi um momento muito importante e
construtivo, pois me senti dentro da história. Não uma história distante de
mim, mas uma história onde eu também sou sujeito. Sempre gostei de realizar
esse tipo de pesquisa local, e com essa atividade não foi diferente. (Aluno 11).
7 ECOS DA PESQUISA
Como ecos da pesquisa podemos enumerar alguns posicionamentos dos
alunos:
No inicio desta disciplina, pensava em arte como aquela que se fazia apenas
em telas: desenhos, pinturas, enfim. Más, durante as aulas pude compreender
que a arte vai além das telas e que esta possui uma infinidade de
possibilidades que podem ser experimentadas na escola, em casa,
enfim.(Aluno 16).
Essa pesquisa nos oportunizou uma construção, desconstrução e
reconstrução das experiências vividas buscando mudanças na forma como
compreender a si mesmo e aos outros, por esse motivo, tornou-se um
instrumento de formação de consciência e alargamento daquilo que faz do
educador um investigador crítico numa perspectiva emancipatória. (Aluno 4).
A escola com sua missão formadora deveria através da proposta pedagógica
lançar um olhar mais atento ao acervo do município, no sentido de realizar
um trabalho voltado para a valorização da cultura local. (Aluno 13).
A escola tem um papel muito importante hoje para a arte, pois ela se insere
na educação, possuindo características diversas, desenvolvendo atividades de
aprendizagem artística e estética objetivando o relacionamento das pessoas,
mesmo em com suas diferenças. (Aluno 15).
Diante dessa experiência vivida, vale ressaltar a importância de colocarmos
a pesquisa como prática pedagógica em nossa sala de aula, contribuindo
assim para o investimento numa educação de qualidade, e uma melhor
aprendizagem de forma diferenciada para os nossos educandos. (Aluno 18).
A população de nossa cidade precisa valorizar o que temos de melhor,
portanto, fazer a pesquisa nos mostrou algo novo que não conhecia no meu
município, o quanto nossa cidade precisa ser valorizada porque assim como
eu muitas pessoas não conhece as riquezas que essa cidade tem. (Aluno 7).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partimos da pergunta inicial feita pelos professores na reunião de
planejamento: os alunos e alunas conhecem as manifestações artístico-culturais do seu
município? Ficou evidente com a pesquisa que os alunos não conheciam as
manifestações. Alguns conheciam em parte, mas não havia uma valorização da cultura
local. Desta forma destacamos como resultado da pesquisa a descoberta e reconhecimento
da arte e da cultura do município, favorecendo a reconstrução das identidades de cada
aluno/aluna ao se sentirem pertencentes à cultura daquela comunidade. Consideramos
esse aspecto um ponto forte.
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 303258
Destacamos ainda como resultados dessa ação de pesquisar: a articulação dos
vários saberes ministrados nas disciplinas de filosofia, história da educação, diversidade
cultural e arte-educação, além do exercício da pesquisa coletiva, que permitiu uma maior
aproximação entre os alunos e a troca de saberes, evidenciando o papel didático da
pesquisa no processo de ensinar e aprender.
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