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IHMN Nº 70078272416 (Nº CNJ: 0192453-85.2018.8.21.7000) 2018/CÍVEL 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO COMINATÓRIA. REALIZAÇÃO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE MÉDICO OFTALMOLOGISTA POR OPTOMETRISTA. OCORRÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. 1. Ilegitimidade de parte Não se há falar em ilegitimidade da ré/apelante Ótica e Joalheria Mirim, eis que se trata de estabelecimento comercial onde as práticas proibidas na sentença são realizadas, além de ser o local onde os aparelhos apreendidos estão alocados. Ainda, a prática de anúncio em veículo de comunicação é aplicável ao estabelecimento comercial, pelo que não há falar em “ausência de qualquer ligação com os fatos narrados. Ademais, o nome Ótica e Joalheria Mirim é o nome fantasia da Empresa Carmem Zimmer e Filho Ltda. 2. Não podem os optometristas realizar diagnóstico de defeitos refrativos e prescrever lentes de grau, pois atividades privativas de médico, na forma dos arts. 38 e 39 do Decreto nº 20.931/1932 e 13 e 14 do Decreto nº 24.492/1934, ambos em vigor, consoante julgamento do STF na ADIn nº 533-2/MC. 3. A Portaria nº 397/2002 do Ministério do Trabalho e Emprego, que traz a Classificação Brasileira de Ocupações, dentre elas a de optometrista, não se sobrepõe aos Decretos emanados do Executivo. 4. Os vetos ao inciso I do caput e ao § 2º do art. 4º da Lei nº 12.842/2013 não afastam a conclusão de que a realização de diagnósticos nosológicos e a respectiva prescrição de lentes de grau encontram proibição nos termos dos Decretos nº 20.931/1932 e nº 24.492/1934.

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO COMINATÓRIA. REALIZAÇÃO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE MÉDICO OFTALMOLOGISTA POR OPTOMETRISTA. OCORRÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. 1. Ilegitimidade de parte – Não se há falar em ilegitimidade da ré/apelante Ótica e Joalheria Mirim, eis que se trata de estabelecimento comercial onde as práticas proibidas na sentença são realizadas, além de ser o local onde os aparelhos apreendidos estão alocados. Ainda, a prática de anúncio em veículo de comunicação é aplicável ao estabelecimento comercial, pelo que não há falar em “ausência de qualquer ligação com os fatos narrados. Ademais, o nome Ótica e Joalheria Mirim é o nome fantasia da Empresa Carmem Zimmer e Filho Ltda. 2. Não podem os optometristas realizar diagnóstico de defeitos refrativos e prescrever lentes de grau, pois atividades privativas de médico, na forma dos arts. 38 e 39 do Decreto nº 20.931/1932 e 13 e 14 do Decreto nº 24.492/1934, ambos em vigor, consoante julgamento do STF na ADIn nº 533-2/MC. 3. A Portaria nº 397/2002 do Ministério do Trabalho e Emprego, que traz a Classificação Brasileira de Ocupações, dentre elas a de optometrista, não se sobrepõe aos Decretos emanados do Executivo. 4. Os vetos ao inciso I do caput e ao § 2º do art. 4º da Lei nº 12.842/2013 não afastam a conclusão de que a realização de diagnósticos nosológicos e a respectiva prescrição de lentes de grau encontram proibição nos termos dos Decretos nº 20.931/1932 e nº 24.492/1934.

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5. A multa a ser aplicada em caso de descumprimento da decisão detém caráter coercitivo no sentido de que seja cumprido o comando jurisdicional, não merecendo afastamento ou minoração no caso. PRELIMINAR REJEITADA. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME.

APELAÇÃO CÍVEL

VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70078272416 (Nº CNJ: 0192453-85.2018.8.21.7000)

COMARCA DE SANTO ÂNGELO

ÓPTICA E JOALHERIA MIRIM LTDA

APELANTE

SÉRGIO LUÍS ZIMMER

APELANTE

BÉLLA VISTA CLÍNICA DE OPTOMETRIA

APELANTE

SOCIEDADE DE OFTALMOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL - SORIGS

APELADA

CONSELHO BRASILEIRO DE OFTALMOLOGIA - CBO

APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima

Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em

rejeitar a preliminar e desprover ao apelo.

Custas na forma da lei.

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Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes

Senhores DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA (PRESIDENTE) E DES.

MARCO AURÉLIO HEINZ.

Porto Alegre, 10 de outubro de 2018.

DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA,

Relatora.

R E L A T Ó R I O

DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (RELATORA)

Cuida-se de recurso de apelação interposto por ÓPTICA E

JOALHERIA MIRIM LTDA, SÉRGIO LUIS ZIMMER e BÉLLA VISTA

CLÍNICA DE OPTOMETRIA na ação cominatória que lhes move o

CONSELHO BRASILEIRO DE OFTALMOLOGIA - CBO e a SOCIEDADE

DE OFTALMOLOGIA DO RIO GRANDE DO SUL - SORIGS contra a

sentença que julgou procedente a demanda, nos seguintes termos (fls.

1347-1351):

ISSO POSTO, com fulcro no art. 487, inc. I, do NCPC, confirmo a decisão da fl. 329 e JULGO PROCEDENTE a pretensão deduzida pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia – CBO e pela Sociedade de Oftalmologia do Rio Grande do Sul – SORIGS na presente ação ajuizada contra a Óptica e Joalheria Mirim Ltda, Sergio Luis Zimmer e Bélla Vista Clínica de Optometria para condenar a parte ré a abster-se de realizar consultas, exames de refração, testes de visão e adaptação de lentes de contato, bem como utilizar os aparelhos médicos apreendidos e outros da mesma espécie, além de anunciar, em qualquer veículo de comunicação, a prática de consultas, exames ou testes de visão, sob pena de multa de R$ 1.000,00, por ato realizado.

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Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, no valor de R$ 2.000,00, para os advogados de cada autor, nos termos do art. 85, §8º, do Código de Processo Civil, considerando a natureza da ação, o tempo de tramitação do feito (há mais de 10 anos), além do trabalho realizado pelos profissionais.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, leiloem-se os bens apreendidos, devendo o montante apurado ser revertido ao Tesouro do Estado, conforme determina o art. 38 do Decreto nº 20.931/32.

Remeta-se cópia dos autos ao Ministério Público, Promotoria Criminal.

Oficie-se à Vigilância Sanitária Municipal.

Em suas razões recursais (fls. 1355-1387), sustentam,

preliminarmente, a ilegitimidade passiva da Óptica e Joalheria Mirim, eis que

não realiza nenhuma das práticas proibidas pela sentença, tratando-se de

estabelecimento comercial que não possui qualquer ligação com os fatos

narrados. No mérito, discorrem sobre a capacitação técnica do réu Sérgio,

destacando que está apto ao exercício de optometrista. Explicam a profissão

e esclarecem que a ausência de plena regularização legal não impede o seu

exercício, nos termos da Carta Constitucional. Salientam que o profissional

optometrista atua na área da saúde não médica, sendo o profissional

responsável pelos cuidados primários e secundários do sistema visual, não

utilizando qualquer método invasivo ao olho humano e, tampouco,

prescrevendo medicação. Referem que o réu Sérgio não exerce nenhuma

atividade ilegal, uma vez que é profissional autorizado a realizar exames de

refração. Afirmam que os Decretos nº 20.931/32 e nº 24.492/34 estão em

desacordo com as normas constitucionais, que garantem ao cidadão o

direito de exercício de sua profissão. Argumentam que a decisão impugnada

deixou de considerar o disposto na Lei nº 12.842/2013, que dispõe sobre o

exercício da medicina e as atividades privativas do médico, destacando que

não está elencada a atividade de realizar ato refrativo. Asseveram que a

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indicação de lentes de grau não é ato privativo de médico, consoante

jurisprudência colacionada ao recurso. Sustentam que os equipamentos

apreendidos não são de uso exclusivo dos médicos oftalmologistas,

conforme laudo pericial que acompanha os autos, ressaltando que a perícia

judicial não merece crédito eis que não foi realizada nos equipamentos

apreendidos, conforme pactuado em audiência. Por fim, referem que a multa

por descumprimento se mostra exorbitante e desarrazoada, postulando o

seu afastamento ou a sua redução, nos termos do art. 814 c/c art. 537, §1º,

do Código de Processo Civil. Postulam o provimento do apelo para acolher a

preliminar e reformar a sentença impugnada.

Os recorridos, devidamente intimados, não apresentaram

contrarrazões (fl. 1393).

Após, subiram os autos à consideração desta Corte, tendo sido

inicialmente distribuídos para a Décima Sétima Câmara Cível, sob relatoria

da Desembargadora Liége Puricelli Pires (fl. 1394), que, contudo, declinou

da competência, determinando a redistribuição dos autos (fls. 1395-1396).

Assim, o feito foi redistribuído a esta Vigésima Primeira Câmara Cível, por

sorteio, sob minha relatoria (fl. 1397v).

O representante do Ministério Público no segundo grau de

jurisdição opinou pelo conhecimento, rejeição da preliminar e desprovimento

do recurso (fls. 1398-1402).

Vieram-me os autos conclusos em 17.08.2018 (fl. 1403).

Registro terem sido cumpridas as formalidades dos arts.

931 e 934 do Código de Processo Civil, considerando a adoção do

sistema informatizado.

É o relatório.

V O T O S

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DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (RELATORA)

Colegas.

Por atendimento aos requisitos intrínsecos e extrínsecos de

admissibilidade, conheço do apelo.

Inicialmente, consigno que os apelados arguiram em seus

memoriais entregues em meu gabinete a intempestividade da interposição

do recurso de apelação.

Contudo, a arguição parte de premissa equivocada, uma vez

que alega ter sido o recurso protocolado em 26.03.2018, enquanto que na

verdade o recurso foi enviado por meio dos Correios em 23.03.2018,

conforme se verifica do carimbo aposto à folha 1355v.

Dessa forma, tendo em vista que a Nota de Expediente n.º

106/2018, a qual deu ciência às partes acerca do conteúdo da sentença, foi

disponibilizada no Diário da Justiça Eletrônico em 01.03.2018 (fl. 1352), o

primeiro dia do prazo recursal a que dispunha a parte foi 05.03.2018, e o

último dia do prazo foi 23.03.2018, justamente o dia em que postado o

recurso.

Assim, não se há falar em intempestividade.

Superado o juízo de admissibilidade, convém fazer breve

resumo do caso antes de proceder à análise do mérito.

Trata-se de ação cominatória ajuizada pelo Conselho Brasileiro

de Oftalmologia - CBO e pela Sociedade de Oftalmologia do Rio Grande do

Sul – SORIGS em face de Óptica e Joalheria Mirim LTDA, Sérgio Luis

Zimmer e Bella Vista Clínica de Optometria, postulando a condenação dos

réus para que se abstenham da prática de adaptar lentes e realizar exames,

bem como não façam anúncios publicitários nesse sentido, tampouco que

utilizem os equipamentos de uso exclusivo dos médicos oftalmologistas. Ao

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cabo, postularam a definitividade da medida liminar, com a venda dos bens

apreendidos em sede liminar em leilão e a reversão do produto em favor do

Tesouro Nacional.

Deferido o pedido antecipatório de tutela (fl. 329 e verso), os

requeridos interpuseram agravo de instrumento (fls. 339-372), que restou

desprovido (fls. 600-606).

Apresentada contestação (fls. 377-407), sobreveio a sentença

de procedência (fls. 777-781).

Irresignados, os réus interpuseram recurso de apelação (nº

70015568611/fls. 792-818).

A Nona Câmara Cível deste Tribunal de Justiça deu parcial

provimento ao recurso para acolher a preliminar de cerceamento de defesa e

desconstituir a decisão impugnada, com a seguinte ementa (fls. 878-888):

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA. OPTOMETRISTA. REALIZAÇÃO DE ATIVIDADE PRIVATIVA DE MÉDICO. ILEGITIMIDADE DE PARTE. JULGAMENTO ANTECIPADO. CERCEAMENTO DE DEFESA.

1. Da ilegitimidade de parte - Não há falar em ilegitimidade

da ré/apelante Carmem Zimmer e Filho Ltda. É que, sendo

a ação movida em desfavor de Sérgio Luis Zimmer, Bella

Vista Clínica de Optometria e Óptica e Joalheria Mirim

Ltda., a ela responderam Bella Vista Clínica de Optometria,

Carmem Zimmer e Filho Ltda. e Sérgio Luis Zimmer, este

na condição de co-réu e representante das pessoas jurídicas

co-rés. Daí que se entende que o nome Ótica e Joalheria

Mirim seja o nome fantasia da empresa Carmem Zimmer e

Filho Ltda.

2. Da nulidade da sentença por cerceamento de defesa – Para o completo esclarecimento da controvérsia, tendo em vista a questão técnica submetida à apreciação judicial – atividade efetivamente desenvolvida pelo optometrista -, imprescindível, para se atingir as conclusões e determinações da

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sentença, a realização das provas pericial e testemunhal postuladas pelos demandados. Não se trata, pois, de matéria exclusivamente de direito, havendo questões fáticas importantes a serem esclarecidas. Necessidade de averiguar se os réus efetivamente ultrapassaram os limites da sua profissão e avançaram na área médica, bem como saber se os equipamentos apreendidos e de utilização vedada aos demandados são, de fato, exclusivos do uso médico. À UNANIMIDADE, REJEITARAM A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DE PARTE, E, POR MAIORIA, ACOLHERAM A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA, DESCONSTITUINDO-A. VENCIDA A RELATORA.

Opostos embargos de declaração (fls. 891-897), estes

restaram rejeitados (fls. 900-902).

Com o trânsito em julgado (fl. 904), os autos retornaram ao

juízo de origem, sendo realizada audiência de instrução e julgamento, em

que convencionada a realização de perícia com médico oftalmologista e

técnico em optometria (fl. 915).

As partes apresentaram quesitos (fls. 915-922; 925-927; 1088-

1090 e 1091-1092), sobrevindo os laudos periciais das fls. 1057-1058 e

1094-1097.

Com a oitiva de testemunhas via carta precatória (fls.1281-

1282; 1297-1299 e 1310) e apresentação de razões finais (fls. 1317-1345),

sobreveio a sentença impugnada, que julgou procedente a demanda, nos

termos alhures referido (fls.1347-1351).

Pois bem.

Feita a análise dos fatos, passo ao exame da preliminar de

ilegitimidade passiva da Óptica e Joalheria Mirim, e o faço para rejeitá-la.

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A sentença recorrida condenou os requeridos a se absterem de

realizar consultas, exames de refração, testes de visão e adaptação de

lentes de contato, bem como de utilizarem os aparelhos médicos

apreendidos e outros da mesma espécie. Além disso, os proibiu de anunciar,

em qualquer veículo de comunicação, a prática de consultas, exames ou

testes de visão.

Não obstante a Óptica e Joalheria Mirim não pratique

diretamente as atividades elencadas na sentença, trata-se de

estabelecimento comercial onde tais práticas são realizadas, consoante

receita da fl. 78 dos autos, além de ser o local onde os aparelhos

apreendidos estão alocados, conforme auto de arrolamento, lacre e busca e

apreensão da fl. 332v.

Ademais, as propagandas da Óptica e Joalheria Mirim,

veiculadas no jornal Mensageiro, se encontram logo abaixo das reportagens

acerca da optometria e seus benefícios, realizadas com o Sr. Sérgio Zimmer,

o que induz o consumidor a procurar o profissional naquele endereço (fls.

75, 77), estabelecendo relação direta entre a reportagem e a Empresa.

Ainda, a prática de anúncio em veículo de comunicação é

aplicável ao estabelecimento comercial, pelo que não há falar em “ausência

de qualquer ligação com os fatos narrados”.

Por fim, e não menos importante, insta transcrever trecho do

voto que proferi neste processo ainda à época em que integrava a Nona

Câmara Cível (Apelação Cível nº 70015568611), relativo à questão

correlata, em que afastei a preliminar de ilegitimidade passiva da ré Carmem

Zimmer e Filho LTDA (fls. 878-888):

De início, destaco que não há falar em ilegitimidade da apelante Carmem Zimmer e Filho Ltda., como acentuado pelos autores em suas contra-razões recursais. É que, sendo a ação

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movida em desfavor de Sérgio Luis Zimmer, Bella Vista Clínica de Optometria e Óptica e Joalheria Mirim Ltda., a ela responderam Bella Vista Clínica de Optometria, Carmem Zimmer e Filho Ltda. e Sérgio Luis Zimmer, este na condição de co-réu e representante das pessoas jurídicas co-rés. Daí que se entende que o nome Ótica e Joalheria Mirim seja o nome fantasia da empresa Carmem Zimmer e Filho Ltda.

Assim, nos termos do acima referidos, a Óptica e Joalheria

Mirim pertence ao Sr. Sérgio Zimmer, do que se confirma a sua legitimidade

para figurar no polo passivo da demanda.

Pelo exposto, rejeito a preliminar e passo ao exame do

mérito.

Primeiramente, destaco que é incontroverso nos autos que o

réu Sérgio é graduado em optometria, tendo concluído o curso superior de

tecnólogo em optometria pela Universidade Luterana do Brasil – ULBRA (fl.

408).

Segundo disposto na Portaria nº 397/2002 do Ministério do

Trabalho e Emprego - MTE, que trata da Classificação Brasileira de

Ocupações, são atividades dos optometristas:

A- REALIZAR EXAMES OPTOMÉTRICOS

1. Fazer anamnese; 2. Medir acuidade visual; 3. Analisar estruturas externas e internas do olho; 4. Mensurar estruturas externas e internas do olho; 5. Medir córnea (queratonometria, paquimetria e topografia); 6. Avaliar fundo do olho (oftomoscopia); 7. Medir pressão intraocular (tonometria); 8. Identificar deficiências e anomalias visuais; 9. Encaminhar casos patológicos a médicos; 10. Realizar testes motores e sensoriais; 11. Realizar exames complementares; 12. Prescrever compensação óptica; 14. Recomendar auxílios ópticos; 15. Realizar perícias optométricas em auxílios ópticos.

B - ADAPTAR LENTES DE CONTATO.

1. Fazer avaliação lacrimal; 2. Definir tipo de lente; 3. Calcular parâmetros das lentes; 4. Selecionar lentes de teste; 5.

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Colocar lentes de teste no olho; 6. Combinar uso de lentes (sobre-refração); 7. Avaliar teste; 8. Retocar lentes de contato; 9. Recomendar produtos de assepsia; 10. Executar revisões de controle.

C - CONFECCIONAR LENTES

1. Interpretar ordem de serviço; 2. Fundir materiais orgânicos e minerais; 3. Escolher materiais orgânicos e minerais; 4. Separar insumos e ferramentas; 5. Projetar lentes (curvas, espessura, prismas); 6. Blocar materiais orgânicos e minerais; 7. Usinar materiais orgânicos e minerais; 8. Dar acabamento às lentes; 9. Adicionar tratamento as lentes (endurecimento, anti-reflexo, coloração, hidratação e filtros); 10. Aferir lentes; 11. Retificar lentes.

(omissis)

F - PROMOVER EDUCAÇÃO EM SAÚDE VISUAL

1. Assessorar órgãos públicos na promoção da saúde visual; 2. Ministrar palestras e cursos; 3. Promover campanhas de saúde visual; 4. Promover a reeducação visual; 5. Formar grupos multiplicadores de educação em saúde visual.

G - VENDER PRODUTOS E SERVIÇOS ÓPTICOS E OPTOMÉTRICOS.

1. Detectar necessidades do cliente; 2. Interpretar prescrição; 3. Assistir cliente na escolha de armações e óculos solares; 4. Indicar tipos de lentes; 5. Coletar medidas complementares; 6. Aviar prescrições de especialistas; 7. Ajustar óculos em rosto de cliente; 8. Consertar auxílios ópticos.

H - GERENCIAR ESTABELECIMENTO

1. Organizar local de trabalho; 2. Gerir recursos humanos; 3. Preparar ordem de serviço; 4. Gerenciar compras e vendas; 5. Controlar estoque de mercadorias e materiais; 6. Controlar estoque de mercadorias e materiais; 6. Controlar qualidade de produtos e serviços; 7. Administrar finanças; 8. Providenciar manutenção do estabelecimento.

Y. COMUNICAR-SE

1. Manter registros de cliente; 2. Enviar ordem de serviço a laboratório; 3. Orientar cliente sobre o uso e conservação de auxílios ópticos; 4. Orientar família do cliente; 5. Emitir laudos e pareceres; 6. Orientar a ergonomia da visão; 7. Solicitar exames e pareceres de outros especialistas.

No entanto, o cerne da controvérsia diz com o exercício de

atividades que extrapolam a profissão de optometrista, com a prática de

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condutas exclusivas de médicos oftalmologistas, não tendo relevância para a

presente demanda a regulamentação da profissão no Brasil, tampouco a

qualificação do profissional que exerce a atividade.

Assim, não há falar em ofensa ao Princípio Constitucional do

livre exercício profissional, previsto no artigo 5º, inciso XIII, da Carta Magna1,

uma vez que a liberdade profissional deve ser compatibilizada com o

ordenamento jurídico vigente, bem como com as qualificações necessárias

para o exercício da profissão.

Não se está defendendo, portanto, a proibição do exercício da

profissão, como fazem crer as razões recursais, mas propondo a

harmonização do disposto na Portaria nº 397/2002 do Ministério do Trabalho

e Emprego, acima transcrita, com o que dispõem os Decretos nº

20.931/1932 e nº 24.492/1934 (Exercício da Medicina) e a Lei nº

12.842/2013 (Lei do Ato Médico).

Neste sentido:

APELAÇÃO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. EXAMES, DIAGNÓSTICO E PRESCRIÇÃO DE FÓRMULAS ÓPTICAS. PORTARIA Nº 397/2002 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL GRADUADO EM OPTOMETRIA. DECRETOS 20.931/1932 E 20.492/1934. ATOS PRIVATIVOS DO MÉDICO. Nos termos dos Decretos 20.931/1932 e 20.492/1934, é vedado aos profissionais da optometria a realização de exames, a emissão de diagnósticos e a prescrição do uso de lentes corretivas, atos privativos dos médicos. A Portaria nº 397/2002 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao autorizar os profissionais da optometria a realizarem exames e consultas, bem como prescreverem a utilização de óculos e lentes, extrapolou os limites da legislação de regência, no caso, das disposições dos Decretos

1 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se

aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XIII - e livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

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nº 20.931/1932 e n º 20.492/1934. Julgados do STJ e do TJRS. Os Decretos que emanam do Poder Executivo têm força de lei, enquanto que as Portarias restringem-se a atos administrativos internos de caráter ordinatório que à lei não se equiparam. Essa conclusão não visa a vedar o exercício da profissão ou trabalho desenvolvido pelo optometrista, tampouco instituir reserva de mercado ou monopólio da saúde em favor dos médicos, mas limitar o exercício profissional, de modo a impedir a prática de ato médico por quem não tem habilitação para tanto. Os argumentos relativos à redução dos custos sociais e à carência de médicos oftalmologistas no mercado não se prestam a relativizar o alcance das normas que regulamentam as atividades profissionais, sobretudo quando a discussão envolve a proteção da saúde pública. LIMITAÇÃO DO COMANDO DA SENTENÇA. PROIBIÇÃO DA PRÁTICA ILEGAL DA MEDICINA QUE DECORRE DA LEI. Deve ser limitado o comando sentencial, quanto aos apelantes optometristas, à vedação da realização de exames de refração, sobre-refração, bem como da indicação do uso de órteses e próteses oftalmológicas sem a prévia prescrição de médico habilitado. Isso porque a função proibitiva da prática ilegal da medicina já é desempenhada pela lei. MULTA DIÁRIA. CABIMENTO. Ao juiz é facultado estimular o cumprimento de ordem judicial mediante a fixação de astreintes, cujo objetivo é justamente dar efetividade às suas determinações, não sendo exigíveis caso a parte cumpra o que foi determinado. Caso em que as circunstâncias concretas autorizam a fixação de multa diária caso não comprovada a solução dos problemas apontados no prazo assinalado pelo juízo. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70072404668, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 27/04/2017) (grifos meus).

Até porque, segundo a jurisprudência desta Corte sobre o

tema, “os Decretos que emanam do Poder Executivo têm força de lei,

enquanto que as Portarias restringem-se a atos administrativos internos de

caráter ordinatório que à lei não se equiparam”:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. EXAMES, DIAGNÓSTICO E PRESCRIÇÃO DE FÓRMULAS ÓPTICAS. PORTARIA Nº 397/2002 DO MINISTÉRIO

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DO TRABALHO E EMPREGO. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL GRADUADO EM OPTOMETRIA. DECRETOS 20.931/1932 E 20.492/1934. ATOS PRIVATIVOS DO MÉDICO. Nos termos dos Decretos 20.931/1932 e 20.492/1934, é vedado aos profissionais da optometria a realização de exames, a emissão de diagnósticos e a prescrição do uso de lentes corretivas, atos privativos dos médicos. A Portaria nº 397/2002 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao autorizar os profissionais da optometria a realizarem exames e consultas, bem como prescreverem a utilização de óculos e lentes, extrapolou os limites da legislação de regência, no caso, das disposições dos Decretos nº 20.931/1932 e n º 20.492/1934. Precedentes do STJ e do TJRS. Os Decretos que emanam do Poder Executivo tem força de lei, enquanto que as Portarias restringem-se a atos administrativos internos de caráter ordinatório que à lei não se equiparam. Essa conclusão não visa vedar o exercício da profissão ou trabalho desenvolvido pelo optometrista, bem como instituir reserva de mercado ou monopólio da saúde em favor dos médicos, mas apenas limitar o exercício profissional, de modo a impedir a prática de ato médico por quem não tem habilitação para tanto. Os argumentos relativos à redução dos custos sociais e à carência de médicos oftalmologistas no mercado não se prestam a relativizar o alcance das normas que regulamentam as atividades profissionais, sobretudo quando a discussão envolve a proteção da saúde pública. RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. (Apelação Cível Nº 70055320162, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 29/09/2014)

No caso dos autos, inconteste que o autor Sérgio realizava

diagnósticos nosológicos e a respectiva prescrição de lentes de grau,

conforme se comprova pela prescrição da fl. 78, contrariando o disposto nos

Decretos nº 20.931/1932 e nº 24.492/1934:

Decreto n.º 20.931/32:

Art. 38 É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas, optometristas e ortopedistas a instalação de consultórios para atender clientes, devendo o material aí encontrado ser apreendido e remetido para depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimento da Procuradoria dos leitos da Saúde Pública e a quem a autoridade competente

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oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial será recolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias.

Art. 39 É vedado às casas de ótica confeccionar e vender lentes de grau sem prescrição médica, bem como instalar consultórios médicos nas dependências dos seus estabelecimentos.

Decreto nº 24.492/34:

Art. 13 É expressamente proibido ao proprietário, sócio gerente, ótico prático e demais empregados do estabelecimento, escolher ou permitir escolher, indicar ou aconselhar o uso de lentes de grau, sob pena de processo por exercício ilegal da medicina, além das outras penalidades previstas em lei.

Art. 14 O estabelecimento de venda de lentes de grau só poderá fornecer lentes de grau mediante apresentação da fórmula ótica de médico, cujo diploma se ache devidamente registrado na repartição competente.

Art. 15 Ao estabelecimento de venda de lentes de grau só é permitido, independente da receita médica, substituir por lentes de grau idêntico aquelas que forem apresentadas danificadas, vender vidros protetores sem grau, executar concertos nas armações das lentes e substituir as armações quando necessário.

De se registrar que o Decreto nº 99.678/1990, que revogou os

dispositivos dos Decretos nº 20.931/1932 e nº 24.492/1934, foi suspenso

pelo STF quando do julgamento da ADIn nº 533-2/MC por vício de

inconstitucionalidade formal, razão por que os dois últimos permanecem em

vigor.

E quanto à Lei nº 12.842/13 (Lei do Ato médico), registre-se

que não implicou em qualquer revogação aos citados decretos, não se

podendo extrair conclusão neste sentido de forma tácita, valendo aplicar-se

o art. 2º e seu § 1º e, especialmente, o § 2º, Decreto-Lei nº 4.657/42, Lei de

Introdução às normas do Direito Brasileiro.

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Além de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter sinalizado

entendimento nesse sentido no julgamento do Agravo em Recurso Especial

nº 1.330.431 / MS, datado de 03/08/2018, a jurisprudência desta Corte

Estadual compartilha desse posicionamento:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OPTOMETRISTA. LEI Nº 12.842/13. ARTIGOS 38, 39 E 41, DECRETO Nº 20.931/32, E ARTIGOS 13 E 14, DECRETO Nº 24.492/34. NÃO RECEPÇÃO. ART. 5º, XIII, CF/88. OMISSÕES. INEXISTÊNCIA. A Lei nº 12.842/13 não revogou, nem implicitamente os artigos 38, 39 e 41, Decreto nº 20.931/32, e artigos 13 e 14, Decreto nº 24.492/34, que não se mostram incompatíveis com o art. 5º, XIII, CF/88, o que resulta claramente definido no julgado embargado. (Embargos de Declaração Nº 70077837102, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em 20/06/2018)

“De ressaltar, ainda, que os vetos presidenciais aos incisos I, VIII e IX do art. 4º da Lei nº 12.842/2013, que dispõe sobre o ato médico e o exercício da medicina, em nada alteram o entendimento aqui exposto.

Primeiro, porque as vedações contidas nos Decretos nº 20.931/1932 e n º 20.492/1934 permanecem vigentes.

Segundo, pela ausência de previsão em lei, sem seu sentido formal, que autorize os profissionais da optometria a realizarem exames de olhos e a prescreverem o uso de órteses e próteses oftalmológicas.

Diante de tal panorama normativo e da adstrição do Poder Judiciário ao princípio da legalidade, tenho que a discussão sobre os limites de atuação profissional dos optometristas deve ser melhor aprofundada no âmbito do Poder Legislativo, oportunizando-se o debate entre os vários setores da sociedade interessados no assunto.

Finalmente, tenho que os argumentos relativos à redução dos custos sociais não se prestam a relativizar o alcance das normas que regulamentam as atividades profissionais, sobretudo quando a discussão envolve a proteção da saúde pública.

No caso, cabe ao Poder Executivo instituir políticas públicas visando à formação de mais médicos oftalmologistas, integrando-os ao Sistema Único de Saúde.”

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(Apelação Cível Nº 70072404668, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 27/04/2017)

Assim, não há falar em revogação tácita por incompatibilidade

dos Decretos nº 20.931/1932 e nº 24.492/1934 pela Lei nº 12.842/2013,

razão por que é caso de manutenção da procedência da demanda no

sentido de que os requeridos se abstenham de ofertar a prestação de

quaisquer serviços que sejam privativos da atividade médica, incluindo a

realização de diagnósticos nosológicos e a respectiva prescrição de lentes

de grau.

Importa salientar que o fato de a Lei nº 12.842/2013, em seu

artigo 4º e incisos, não elencar como atividade privativa do médico

oftalmologista a prescrição de óculos e lentes não confere aos optometristas

tal prerrogativa, não podendo a Lei ser interpretada de forma extensiva.

Os apelantes sustentam, sem razão, que o veto ao projeto da

Lei do Ato Médico, que afastou a redação original do inciso IX, §5º, do art.

4º, teria o condão de sucumbir a vigência dos Decretos referidos e conferir

aos optometristas a possibilidade de prescrever óculos e lentes.

Transcreve-se a redação original:

Art. 4º - São atividades privativas do médico:

(...)

§5º - Excetuam-se do rol de atividades privativas do médico:

(...)

IX – prescrição de órteses e próteses oftalmológicas;

Sem razão os recorrentes, eis que o que o veto fez foi apenas

excluir do projeto a previsão de prescrição de órteses e próteses

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oftalmológicas como atividade privativa do médico, mas não a alçou como

prerrogativa dos optométricos.

Ademais, os fatos foram praticados em 2004, conforme

prescrição da fl. 78, muito tempo antes da edição da Lei nº 12.842/2013.

A corroborar a tese de que a realização de diagnósticos

nosológicos e a prescrição de lentes de grau deve ser feita exclusivamente

por médicos oftalmologistas, está a análise pericial realizada às fls. 1057-

1058.

Os quesitos elaborados pelos autores às fls. 925-927,

buscavam atrelar a existência de doenças que poderiam ou não alterar a

situação dos pacientes na indicação de lentes de grau, e foram assim

respondidos no laudo médico pericial das fls. 1057-1058:

8. Informe o Sr. Perito se o uso de corticoides é potencialmente lesivo ao olho.

Resposta: sim, o uso indiscriminado de colírios de corticoide pode levar a catarata, glaucoma e afinamento tecidual, principalmente.

9. Informe o Sr. Perito se a maioria dos glaucomas é assintomático até que ocorra a perda da metade das fibras neuronais do nervo óptico.

Resposta: sim, por isso a importância do exame oftalmológico a fim de detecção precoce, porque o paciente só percebe a doença quando ela está avançada e o dano instalado não retrocede.

10. Informe o Sr. Perito se existem casos em que é essencial o uso de ciclopegia farmacológica para diagnóstico correto das ametropias (hipermetropia ou miopia).

Resposta: Sim, especialmente nas crianças e nos adultos com acomodação acentuada.

Por fim, quanto ao argumento da apelante sobre a importância

da atividade para o desenvolvimento social e a qualidade de vida da

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população, observo que não se pode relativizar o alcance das normas que

regulamentam as atividades profissionais, sobretudo quando a discussão

envolve a proteção da saúde pública2.

Assim, não pairam dúvidas acerca da necessidade de

manutenção da decisão impugnada.

Dos Equipamentos Apreendidos

A decisão impugnada condenou os ora requeridos a abster-se

de utilizar os aparelhos médicos apreendidos e outros da mesma espécie,

determinando, ainda, o leilão dos bens apreendidos e a reversão dos valores

obtidos em favor do Tesouro do Estado.

Foram apreendidos os seguintes equipamentos (fl. 332v.):

- Tabelas optotipos;

-Cadeira oftalmológica “APRAMED” e aparelhos médicos;

-Coluna pantográfica com saída para oftalmo e retino; conjunto

de refração APRAMED;

-Projetor de optotipos “xenônio”;

-Tabelas de leitura para perto.

Em suas razões recursais, os recorrentes sustentam que os

equipamentos apreendidos não são de uso exclusivo dos médicos

oftalmologistas, conforme laudo pericial já acostado aos autos (fls. 1094-

1096), postulando a sua devolução ao réu Sérgio.

Sem razão os recorrentes.

2 Apelação Cível Nº 70060910270, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em 27/11/2014.

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Não obstante a conclusão do laudo pericial das fls. 1094-1096,

concluí que os equipamentos apreendidos são de uso exclusivo dos médicos

oftalmologistas, conforme permite o art. 436 do CPC/2015 do CPC/2015,

que ora transcrevo:

Art. 436. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos

E concluo isso com base no Agravo em Recurso Especial

nº 1211696 SC/20173, cujo trecho ora transcrevo:

Na espécie, constata-se que a Corte de origem, após exarar fundamentação consentânea com a jurisprudência desta Corte quanto ao direito do exercício da profissão de optometria em consultório por quem formado na profissão, tendo direito a, atendidos os requisitos, obter a expedição de alvará de funcionamento, explicou que o caso em tela diz respeito à legalidade do ato praticado pela autoridade sanitária que, após vistoria, negou o alvará por haver constatado que o profissional utilizava as dependência de seu estabelecimento para outras atividades, privativas de médico oftalmologista, conforme parecer que reproduziu no bojo do voto condutor (fls. 149-158), no qual são descritas várias situações que vão além da possibilidade da mera prescrição de lentes de contato.

Confira-se excerto do acórdão a seguir (fls. 157/159):

Dito isto, não há como acolher a pretensão do autor, considerando a legalidade do ato praticado pela autoridade sanitária, pois observa-se do parecer administrativo que o alvará foi negado por haver constatado, mediante vistoria, que o profissional utilizava as dependências de seu estabelecimento para outras atividades, privativas de médico oftalmologista, o que é vedado. Confira-se:

"[...] a planta física compõe-se de duas salas: uma recepção e outra destinada à consulta, com equipamentos utilizados por oftalmologistas nas consultas, quais sejam: Tonômetro de

3 STJ, AREsp 1211696/SC, rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j. 27/04/2018).

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Pálpebra, equipamento que permite medir-se a pressão intra-ocular, sendo fundamental para o diagnóstico de glaucoma; Oftalmoscópio, aparelho utilizado para a observação das estruturas oculares, mais especificamente na fundoscopia ou oftalmoscopia (observação de fundo de olho) e é fundamental no diagnóstico de doenças como glaucoma, catarata, além de lesões e tumores na retina; Refrator de Greens, aparelho utilizado para diagnóstico de patologias oculares refrativas (miopia, hipermetropia, astigmatismo e presbiopia) e sua correção; também é utilizado para avaliar evolução ou recuperação de doenças oculares, resultados de tratamentos medicamentosos ou cirúrgicos; Auto Refrator, aparelho que possui as mesmas funções do refrator, diferenciando-se pelo fato de ser computadorizado; Retinoscópio, aparelho que serve para avaliar o comportamento da frente de onda emitida pelo retinoscópio e refletida pela retina do olhos humano. Os resultados dos exames vão detectar a existência da necessidade de compensação visual (erros refrativos)- mipia, hipermetropia e astigmatismo; Lâmpada de Fenda, aparelho utilizado para os diagnósticos de patologias oculares que envolvem todo o globo ocular inclusive seus anexos, como catarata, conjuntivites, auxiliar no diagnóstico de doenças refrativas oculares (miopia, astigmatismo e hipermetropia), podendo ser utilizado para o diagnóstico de doenças de fundo de olho, e também utilizado para realizar certos exames complementares como medida de pressão intra-ocular, dentre outros". (fls. 36/40).

Consta, ainda, no parecer, que "[...] resta claro que o solicitante utiliza as dependências de seu estabelecimento para outras atividades que não aquelas autorizadas pelos Decretos 20.931/1932 e 24.429/1934, que se restringem à venda e confecção de lentes corretivas de grau ou de contato, mediante prescrição elaborada por profissional graduado em medicina" (fl. 38).

No mesmo sentido, algumas conclusões do laudo pericial, que,

ainda que tenha feito um esforço para atrelar os equipamentos a diversas

atividades, concluiu que são, na verdade, utilizadas por médicos

oftalmologistas, conforme transcreve-se:

17.Informe o Sr. Perito para que se utiliza a caixa de lentes e armação de provas.

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Resposta: a caixa de lentes e a armação de provas podem ser utilizadas para realizar o exame de refração no qual se pode verificar o grau de dificuldade visual do indivíduo.

18.Informe o Sr. Perito se a cadeira e a coluna pantográfica são de utilidade no exame de refração.

Resposta: Uma cadeira e uma coluna pantográfica refratora podem ser utilizadas para o exame de refração

Assim, concluo que os materiais objeto da apreensão e

lacre são instrumentos de realização de atos médicos, de uso proibido

aos optometristas.

E, neste sentido, possível a venda dos bens apreendidos com

a reversão dos valores aos cofres públicos, consoante prescreve o art. 38 do

Decreto n. 20.931/32:

É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas, optometristas e ortopedistas a instalação de consultórios para atender clientes, devendo o material aí encontrado ser apreendido e remetido para o depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimento da Procuradoria dos leitos da Saúde Pública e a quem a autoridade competente oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial será recolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias.

No mesmo sentido, jurisprudência desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO COMINATÓRIA. CAUTELAR INOMINADA. OPTOMETRIA. PRÁTICA DE ATOS PRIVATIVOS DE MÉDICO OFTALMOLOGISTA. ENTENDIMENTO DO STJ. É vedado aos optometristas a realização de exames e consultas optométricas, bem como prescreverem a utilização de lentes corretivas, pois atos privativos de médicos, nos termos dos Decretos 20.931/1932 e 20.492/1934. Portaria 397 do Ministério do Trabalho e Emprego que foi além do que previsto na legislação de regência. Ilegalidade. Viável a aplicação no caso concreto do art. 38 do Decreto n. 20.931/32 que dispõe sobre a venda judicial

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dos equipamentos lacrados e apreendidos, revertendo-se o produto da alienação em favor do Tesouro. Hipótese de perdimento legal. Multa inibitória arbitrada na origem mantida. Art. 461, § 3º, do CPC. Ônus sucumbenciais invertidos. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DOS RÉUS E PROVERAM O DOS AUTORES. (Apelação Cível Nº 70030291553, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 21/07/2010)

Assim, desprovido o apelo no tópico.

Da Multa Aplicada

Quanto à multa fixada no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), por

ato realizado, também entendo pela manutenção de sua incidência em caso

de descumprimento da decisão, sendo descabida sua minoração.

A cominação da penalidade por descumprimento da

determinação judicial tem como base o poder geral de cautela do Magistrado

e tem como objetivo impor uma penalidade ao infrator e uma compensação

a vítima. Em outras palavras, busca obrigar o réu ao cumprimento específico

da determinação judicial.

Nesse sentido:

APELAÇÃO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. EXAMES, DIAGNÓSTICO E PRESCRIÇÃO DE FÓRMULAS ÓPTICAS. PORTARIA Nº 397/2002 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. LIMITES DE ATUAÇÃO DO PROFISSIONAL GRADUADO EM OPTOMETRIA. DECRETOS 20.931/1932 E 20.492/1934. ATOS PRIVATIVOS DO MÉDICO. [...] MULTA DIÁRIA. CABIMENTO. Ao juiz é facultado estimular o cumprimento de ordem judicial mediante a fixação de astreintes, cujo objetivo é justamente dar efetividade às suas determinações, não sendo exigíveis caso a parte cumpra o que foi determinado. Caso em que as circunstâncias concretas autorizam a fixação de multa diária caso não comprovada a solução dos problemas apontados no prazo

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assinalado pelo juízo. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70072404668, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 27/04/2017)

Dos honorários advocatícios recursais

Diante do desprovimento do apelo dos recorrentes, e à luz do

que prevê o art. 85, § 11, do CPC/2015, entendo por majorar a verba

honorária sucumbencial fixada na sentença impugnada para R$ 2.500,00

(dois mil e quinhentos reais), o que corresponde a cerca de 13% sobre o

valor da causa (R$ 20.000,00 – fl. 03)

DISPOSITIVO

Diante do exposto, VOTO (a) por rejeitar a preliminar de

ilegitimidade passiva; (b) por desprover ao apelo e (c) por, com base no

disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015, majorar os honorários

advocatícios sucumbenciais devidos pelos recorrentes aos

procuradores dos autores para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos

reais).

É o voto.

DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA (PRESIDENTE) - De acordo com a Relatora.

DES. MARCO AURÉLIO HEINZ - De acordo com a Relatora.

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DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70078272416,

Comarca de Santo Ângelo: "À UNANIMIDADE, REJEITARAM A PRELIMINAR E DESPROVERAM

AO APELO."

Julgadora de 1º Grau: MARTA MARTINS MOREIRA