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o VALOR DE O VALOR DA CIÊNCIA, DE POINCARÉ, CEM ANOS DEPOIS DE SUA PUBLICAÇÃO Ricardo Roberto Plaza Teixeira Doutor em Física Professor da Licenciatura em Física CEFET -SP Professor da da PUC-SP Alessandra Cristiane Matias Estudante do curso de Licenciatura em Física do CEFET -SP o livro O valor da ciência, escrito por Henri Poincaré, está completando cem anos em 2005. Ele apresenta discussões históricas, filosóficas, científicas e educacionais importantes para aqueles que querem compreender a ciência do século xx. Apresentamos neste artigo uma análise das três partes do livro, bem como rejlexões a respeito do trabalho de Poincaré e da sua importância nos dias de hoje. Palavras-chave: física; história da ciência; matemática; relatividade; relativismo. The book The value of science written by Henri Poincaré is making hundred years in 2005. lt presents historical, philosophical, scientific and educational discussions that are important to those who want to understand the science of the 20 th century. Wepresent in this article a analysis of the three parts of the book, and also rejlections about the work of Poincaré and its importance nowadays. Key-words: physics; history of science; mathematics; relativity; relativism. INTRODUÇÃO o ano de 1905 tem para a história da ciência imensa importância: este é o ano das grandes "descobertas" de Albert Einstein e desta forma é considerado como sendo o ano miraculoso ou ano mirabilis de Einstein. Em 2005, completamos 100 anos de tão grandiosas descobertas, sobretudo da sua Teoria da Relatividade Especial. Por isto, este ano de 2005 foi declarado pela UNESCO como sendo o Ano Mundial da Física e, pelo mundo, diversos eventos comemoraram a sua importância. Tais comemorações fazem pensar na importância de uma outra obra que também "comemora" neste ano de 2005 o seu centenário: O valor da ciência (La valeur de Ia science, seu título original em francês), de Remi Poincaré. Quem foi Remi Poincaré? Sinergia, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 27-35, jen.Zjun. 2005 Qual a importância de tal obra para a ciência daquela época? Quais as contribuições dos estudos de Poincaré para os trabalhos de Einstein e de outros cientistas da época? Estas são algumas perguntas que pretendemos responder neste artigo. UMA BREVE BIOGRAFIA DE POINCARÉ Poincaré foi um grande popularizador da ciência, por meio de obras como Ciência e hipótese, Ciência e método eO valor da ciência. Estes livros se preocupam com a fundamentação filosófica, matemática e empírica da ciência. Poincaré foi também um matemático de destaque e trouxe à ciência de sua época inúmeras contribuições.

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oVALOR DE O VALOR DA CIÊNCIA, DE POINCARÉ, CEM ANOS DEPOIS DESUA PUBLICAÇÃO

Ricardo Roberto Plaza TeixeiraDoutor em Física

Professor da Licenciatura em Física CEFET -SPProfessor da da PUC-SP

Alessandra Cristiane MatiasEstudante do curso de Licenciatura em Física do CEFET -SP

o livro O valor da ciência, escrito por Henri Poincaré, está completando cem anos em 2005.Ele apresenta discussões históricas, filosóficas, científicas e educacionais importantes paraaqueles que querem compreender a ciência do século xx. Apresentamos neste artigo umaanálise das três partes do livro, bem como rejlexões a respeito do trabalho de Poincaré e dasua importância nos dias de hoje.

Palavras-chave: física; história da ciência; matemática; relatividade; relativismo.

The book The value of science written by Henri Poincaré is making hundred years in 2005.lt presents historical, philosophical, scientific and educational discussions that are importantto those who want to understand the science of the 20th century. We present in this article aanalysis of the three parts of the book, and also rejlections about the work of Poincaré and itsimportance nowadays.

Key-words: physics; history of science; mathematics; relativity; relativism.

INTRODUÇÃO

o ano de 1905 tem para a história daciência imensa importância: este é o ano dasgrandes "descobertas" de Albert Einstein edesta forma é considerado como sendo o anomiraculoso ou ano mirabilis de Einstein. Em2005, completamos 100 anos de tãograndiosas descobertas, sobretudo da suaTeoria da Relatividade Especial. Por isto, esteano de 2005 foi declarado pela UNESCOcomo sendo o Ano Mundial da Física e, pelomundo, diversos eventos comemoraram a suaimportância.

Tais comemorações fazem pensar naimportância de uma outra obra que também"comemora" neste ano de 2005 o seucentenário: O valor da ciência (La valeur deIa science, seu título original em francês), deRemi Poincaré. Quem foi Remi Poincaré?

Sinergia, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 27-35, jen.Zjun. 2005

Qual a importância de tal obra para a ciênciadaquela época? Quais as contribuições dosestudos de Poincaré para os trabalhos deEinstein e de outros cientistas da época? Estassão algumas perguntas que pretendemosresponder neste artigo.

UMA BREVE BIOGRAFIA DEPOINCARÉ

Poincaré foi um grande popularizadorda ciência, por meio de obras como Ciência ehipótese, Ciência e método e O valor daciência. Estes livros se preocupam com afundamentação filosófica, matemática eempírica da ciência. Poincaré foi também ummatemático de destaque e trouxe à ciência desua época inúmeras contribuições.

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Ricardo Roberto Plaza Teixeira/ Alessandra Cristiane Matiaso Valor de O valor da ciência, de Poinceré, cem anos depois de sua publicação

Jules Henri Poincaré nasceu em 29 de abril de1854, em Nancy, na França. Filho do médicoe professor universitário Leon Poincaré e deEugénie Launois, estudou no Liceu de Nancyde 1862 a 1872, onde se destacou comoestudante, vencendo inclusive umacompetição nacional de matemática.Proveniente de uma família influente, HenriPoincaré teve um primo, Raymond Poincaré,que foi presidente da França durante aPrimeira Guerra Mundial.' Desde jovem,Poincaré mostrou-se um admirador da músicae um leitor ávido.Também era dotado degrandes habilidades matemáticas e de umamemória invejável. Seu professor certa vez odescreveu como um "monstro damatemática". Em 1873 foi aceito na EscolaPolitécnica de Paris, onde se graduou em 1875e, em seguida, continuou seus estudos naEscola Nacional Superior de Minas.Defendendo tese sobre equações diferencias,doutorou-se em 1879 na Universidade deParis. Iniciou em 1879 sua carreira comoprofessor, lecionando na Universidade deCaen, e no ano de 1881 tomou-se professorda Universidade de Paris. Nesse ano, Poincarécasou-se com Pullain d' Andecy, com quemteve três filhas e um filho. Este último revelou-se um extraordinário aluno da EscolaPolitécnica. Em 1886 assumiu a presidênciada Sociedade Matemática da França e no anoseguinte - com apenas 32 anos de idade - foieleito membro da Academia de Ciências.

Em 1887, no aniversário do rei Oscar11,da Suécia, foi proposto um grande prêmioao vencedor de uma competição que consistiana resolução de alguns enigmas. Um deles eraa verificação da possibilidade em sedemonstrar matematicamente se o sistemasolar era ou não estável. Ninguém conseguiuresponder a essa questão, mas Poincaréganhou o prêmio por ter contribuído demaneira significativa para a matemática daépoca. A esse respeito ele afirmou que "aspequenas diferenças nas condições iniciais dequalquer fenômeno produzem grandes efeitosfinais"; isto é, influências pequenas em corposcomo cometas ou asteróides entrando no

sistema solar poderiam, num certo prazo,desestabilizá-lo completamente. A base dessaidéia relaciona-se com o que hoje conhecemospor Teoria do Caos. Assim, ao trabalhar como problema de três corpos - Sol, Terra e Lua- Poincaré assentou as bases para o estudodos denominados sistemas determinísticoscaóticos.

Dado seu envolvimento com aastronomia, publicou os três volumes de suaobra Novos métodos da mecânica celeste entre1892 e 1899, e em 1901 foi eleito presidenteda Sociedade Astronômica da França. Tomou-se professor de eletricidade teórica na EscolaSuperior dos Correios e Telégrafos em 1902.

Neste mesmo ano de 1902 assumiu apresidência da Sociedade Francesa de Físicae publicou A ciência e a hipótese, obra decunho filosófico e científico que causou forteimpressão em Albert Einstein e seus amigosda "Academia Olímpia" (Akademie Olympia).Nas palavras de Solovine (aluno de Einstein eum dos três membros da Akademie,juntamente com o próprio Einstein e seu amigoHabicht): "este livro (A ciência e a hipótese)nos impressionou profundamente e mantevenosso interesse por semanas". SegundoRothman (2005), já em A ciência e a hipótese,de 1902, Poincaré escreveu com ousadia - querepetiria em O valor da ciência, de 1905 -considerações que seriam fundamentais paraa Teoria da Relatividade Restrita de Einstein:

1- Não há espaço absoluto, e concebemosapenas o movimento relativo. Ainda assim,na maioria dos casos, fatos mecânicos sãoenunciados como se houvesse um espaçoabsoluto ao qual podem ser dirigidos.2- Não há tempo absoluto. Quando dizemosque dois períodos [de tempo] são iguais, adeclaração não tem significado, e podemosatribuir um significado apenas pelaconvenção.3- Não apenas não temos uma intuição diretasobre a igualdade de dois períodos, como nãotemos sequer uma intuição direta sobre asimultaneidade de dois eventos que ocorremem dois locais diferentes.4- Finalmente, nossa própria geometriaeuclidiana não é uma espécie de convençãode linguagem?

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o Valor de O valor da ciência, de Poincaré, 100 anos depois de sua publicaçãoRicardo Roberto Plaza Teixeira/ Alessandra Cristiane Matias

Poincaré tornou-se professor deastronomia geral da Escola Politécnica em1904. Em 1905, como se disse, publicou Ovalor da ciência, sua segunda obra de caráterfilosófico. Em 1908 publicou Ciência emétodo, fechando sua trilogia de obras cujointeresse principal está centrado nafundamentação filosófica e na matemática daciência. No ano de 1911 publicou As ciênciase as humanidades, obra na qual defende acultura literária e a educação clássica.

Em 17 de julho de 1912, com apenas58 anos, depois de uma operação, faleceuPoincaré, que juntamente com Hilbert foiconsiderado um dos últimos grandesmatemáticos universalistas, pois dominavatoda a matemática de seu tempo. Com oestereótipo do matemático "sonhadordistraído", foi um teórico, como Einstein,mesmo estando bem informado de todas asexperiências dos fisicos experimentais.

o LIVRO O VALOR DA CIÊNCIA

o livro O valor da ciência é divididoem três partes e trata de assuntos referentes àmatemática, à fisica e à filosofia. Na primeiraparte, intitulada "As ciências matemáticas",Poincaré trata de alguns assuntos que dizemrespeito à intuição e à lógica na matemática,e às noções de tempo, de espaço e de suastrês dimensões. Na segunda parte ("as ciênciasfisicas"), são discutidas as inter-relações daanálise matemática e da fisica, a importânciada astronomia e suas contribuições para asoutras ciências, e a história da física-matemática e suas perspectivas para o futuro;aqui o autor parece "prever" as revoluçõescientíficas que iriam acontecer com osurgimento da Teoria da Relatividade e daFísica Quântica, Na terceira e última parte,Poincaré procura refletir sobre "O valorobjetivo da ciência", remetendo-se ao títulode seu livro; para isso trabalha as questõesreferentes à ciência e à realidade, e sobre comoa ciência pode ou não ser artificial.

Muitas questões importantes são

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abordadas e discutidas em O valor da ciência.Cada parte do livro, a seu modo, contribui demaneira significativa para váriosesclarecimentos sobre a ciência feita naquelaépoca. É um livro que, apesar de centenário,tem um caráter atual, pois se preocupa em"olhar para o futuro", antecipando-o. Poincaréclaramente antecipa alguns aspectos da "novafísica", a física do século xx. Duasimportantes novidades ele julgava que seriammuito necessárias: a substituição das leisdiferenciais por leis estatísticas e o surgimentode uma nova mecânica - ambas em perfeitoacordo com as duas teorias revolucionáriascitadas anteriormente. De certa forma, seguiao pensamento do poeta Fernando Pessoa, queafirmou certa vez: "Sinto-me nascido a cadamomento para a eterna novidade do mundo".A introdução do livro já orienta o leitor a

respeito da linha de raciocínio de Poincaré.Para ele, se a ciência tem como finalidademaior a busca da verdade, disto decorre umaobrigação ética: a busca pelo alívio dossofrimentos humanos. Isso nos remete aBertolt Brecht, que em uma passagem deGalileu Galilei afirma que o papel da ciência é"diminuir a canseira humana". Estes doisobjetivos apresentam-se, entretanto, em umatensão dialética: para buscar a verdade énecessário ser independente, enquanto paraagir precisamos estar unidos. A atividadeintelectual é bastante solitária, ao contrário dasações práticas que dela decorrem: "Eis porque", segundo Poincaré, "muitos de nós seamedrontam com a verdade; consideram-nacomo uma causa de fraqueza". Este é o carátercomplementar que apresentam a verdadecientífica e a verdade moral: "aqueles queamam uma não podem deixar de amar aoutra", e também "aqueles que têm medo deuma também terão medo da outra".

A MATEMÁTICA SEGUNDO O VALORDA CIÊNCIA

Poincaré foi um dos maioresmatemáticos de seu tempo. Uma de suaspreocupações, em O valor da ciência, é sobre

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o papel da matemática na construção doconhecimento científico sobre a natureza e ouniverso em que vivemos. Na primeira partedo livro, que tem justamente este foco - asciências matemáticas Poincaréconstantemente se remete a sua obra anterior,A ciencia e a hipotese, na qual já realizarareflexões sobre este tema.

Em primeiro lugar - pergunta-sePoincaré - por que a matemática? RetomandoGalileu - que afirmara que a-matemática é alinguagem da natureza -, Poincaré completaque esta linguagem permite a compreensãodas analogias íntimas das coisas que de outraforma ficariam incompreensíveis para nós.Mas há dois tipos de matemáticos: aqueles queseguem a lógica (os analistas) e aqueles queseguem a intuição (os geômetras), e ambostiveram um papel fundamental na história daciência. Por um lado, "a intuição não nos podedar o rigor, nem mesmo a certeza" - sendoaté mesmo enganosa, como acontece no casodas funções contínuas desprovidas dederivadas, exemplo este do próprio Poincaré.Mas, por outro lado, "a lógica inteiramentepura só nos levaria sempre a tautologias", nãopodendo criar coisas novas e não originandoqualquer ciência, idéia esta que está de certaforma em oposição ao programa de Russell eWhitehead, que visava a deduzir toda amatemática a partir da lógica; segundo afirmao próprio Bertrand Russell, em The principlesai mathematics, esta sua tese era "muitorecente entre os matemáticos e quaseuniversalmente negada pelos filósofos". Paraatingir as duas verdades buscadas peloscientistas - a verdade matemática e a verdadeexperimental - "a lógica não basta [...] e aintuição deve conservar seu papel comocomplemento". Para Poincaré, não somenteno trabalho de construção/invenção doconhecimento matemático, mas também noensino das ciências matemáticas, a intuiçãotem um papel fundamental para viabilizar queos jovens espíritos possam iniciar-se nainteligência da matemática, da mesma formaque, para compreender uma partida de xadrez,não basta saber a lógica das regras das marchas

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das peças para entender cada opção dentreinúmeros outros caminhos. Com ele concordaPiaget, que na fase pré-operatória consideraque a intuição está em pleno desenvolvimentolevado pela imaginação da criança, sem ocontrole da lógica. A lógica se realiza pelaanálise e como análise pressupõe divisão. Elapor si só não permite uma visão de conjuntonecessária para produzir e para aprendermatemática. Portanto se a lógica - que vai dogeral para o particular - é a única que podedar a certeza, a intuição - tanto a intuição donúmero puro quanto a intuição sensível- é oinstrumento da invenção, pois permite pormeio de analogias o caminho inverso. SegundoArnheim, estes dois estilos - racional eintuitivo - dependendo da época foram oracolaboradores, ora rivais. Portanto a suacomplementaridade caracterizava umconfronto que estava além das ciênciasmatemáticas e físicas, e não apenas dentrodestas. Para Eloísa Fagali: "No século XIX, adivisão romântica entre a intuição e o intelectogerou um conflito entre devotos da intuiçãoque encaravam com desdém as disciplinasintelectuais dos cientistas, com os adeptos darazão, que condenavam, como irracional, anatureza da intuição". Segundo Poincaré,essas duas estratégias para o conhecimentoseriam também complementares dentro damatemática.

Nos capítulos 11,111 e IV de O valorda ciencia, Poincaré discute o tempo, o espaçoe as três dimensões espaciais. A discussão emmuitos momentos é bastante matematizada, ea sua leitura não flui tão facilmente como norestante do livro.

Quanto ao tempo, o autor começa portentar definir o conceito de simultaneidade -quando é que dois fatos são simultâneos? -,exatamente o caminho que será feito porEinstein na argumentação a respeito de suaTeoria da Relatividade: "Dois fatos devem serconsiderados simultâneos quando a ordem desua sucessão pode ser invertida à vontade".Um dos exemplos para esta discussão utiliza-se da queda de dois raios em pontos diferentesdo espaço - um dos exemplos da predileção

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de Einstein também. Então o problema dasimultaneidade se reduz ao problema daanterioridade, que não é trivial quando os doiseventos acontecem a grandes distâncias umdo outro. E como se define a anterioridade?Poincaré responde: "é pela causa que se defineo tempo". Da relatividade da simultaneidade- um problema qualitativo - para a relatividadeda duração - um problema quantitativo - ocaminho de Poincaré continua sendo o mesmode Einstein: "Quando digo que de meio-dia àuma hora passou o mesmo tempo que de duashoras às três horas, que sentido tem estaafirmação?" Como Einstein, Poincaré chegaà conclusão de que "a luz tem uma velocidadeconstante, e, em particular, que sua velocidadeé a mesma em todas as direções".

Poincaré, assim sendo, também sequestionava sobre "coisas com que só ascrianças se preocupavam", nas palavras deEinstein, e pôde concluir sobre o tempo: "Nãotemos a intuição direta da simultaneidade, nema da igualdade de duas durações. Se cremoster essa intuição, é uma ilusão. Nós acompensamos com o auxílio de algumas regrasque aplicamos quase sempre sem perceber [...]e poderíamos resumi-Ias dizendo: 'Asimultaneidade de dois eventos, ou a ordemde sua sucessão e a igualdade de duasdurações, devem ser definidas de tal modo queo enunciado das leis naturais seja tão simplesquanto possível".

No que diz respeito ao espaço, o focoda argumentação de Poincaré está nadiscussão sobre o seu caráter euclidiano ounão-euclidiano: "Assim, perguntar quegeometria convém adotar é perguntar a quelinha convém dar o nome de reta". Poincaréjá se preocupava com questões - como ageometria existente nas proximidades decorpos dotados de grande massa - que sóseriam esclarecidas com a Teoria daRelatividade Geral, dez anos depois:"Podemos nós imaginar um mundo ondehouvesse objetos notáveis que adotassem maisou menos a forma das retas não-euclidianas,e corpos naturais notáveis que sofressemfreqüentemente movimentos mais ou menos

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semelhantes aos movimentos não-euclidianos?"

Quanto ao número de dimensões doespaço, com o desenvolvimento da pesquisamatemática acerca de "geometriasalternativas", muitos já se preocupavam nofinal do século XIX com possíveis dimensõesque ultrapassassem as três do espaçoeuclidiano usual. O livro de ficção científica,mas também de crítica social Planolândia: umromance de muitas dimensões, escrito porEdwin Abbott e publicado pela primeira vezem 1884, permite compreender como essaquestão era uma preocupação disseminada naépoca. Segundo Poincaré, "não podemosadmitir, ao mesmo tempo, que é impossívelimaginar o espaço de quatro dimensões e quea experiência nos demonstra que o espaço temtrês dimensões", visto que "tudo o quepodemos dizer é que a experiência nosinformou que é cômodo atribuir ao espaço trêsdimensões" .

Sobre a importância do sistema de re-ferência para a determinação do movimentohá uma passagem belíssima de Poincaré quetambém remete a Einstein: "Estou sentado emmeu quarto, um objeto está em repouso so-bre minha mesa; não me movo durante umsegundo, ninguém toca o objeto; sou tentadoa dizer que o ponto A que esse objeto ocupa-va no início daquele segundo é idêntico aoponto B que ele ocupa no fim; de modo al-gum: do ponto A ao ponto B há 30quilômetros, pois o objeto foi arrastado pelomovimento da Terra".

Enfim, para Poincaré o tempo e o es-paço são conceitos construídos conjuntamentee sem precedência de um em relação ao ou-tro. É com fina ironia que afirma: "não possocompreender que se diga que a idéia de tem-po é posterior logicamente à de espaço, por-que só podemos imaginá-Io sob a forma deuma reta; é o mesmo que dizer que o tempo éposterior logicamente à agricultura, porque érepresentado geralmente armado de uma foi-ce".

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A ASTRONOMIA E A FÍSICASEGUNDO O VALOR DA CIÊNCIA

Poincaré inicia a segunda parte de seulivro salientando a importância das inter-relações entre a análise matemática e a física.Inicia com a repetição da pergunta: para queserve a matemática? Poincaré rechaçainicialmente aquelas pessoas "práticas", paraas quais esta pergunta significaria "comoganhar dinheiro com a matemática". Eresponde a estas pessoas primeiro com umaoutra pergunta - "para que serve acumulartantas riquezas?" - e em seguida com umaprovocação - "e por causa da vida perdem-seas razões para viver".

A matemática é a única língua com aqual o físico pode falar. Tudo que pode sermedido pode ser compreendido: "todas as leisprovêm da experiência, mas para enunciá-Iasé preciso uma língua especial (a matemática)".Mas, além de permitir o estudo da natureza,ela tem outros dois objetivos: um objetivofilosófico - "ajudar o filósofo a aprofundar asnoções de número, espaço e tempo" - e umobjetivo estético - já que nela se encontram"fruições análogas às proporcionadas pelapintura e pela música".

Para Poincaré, a matemática não deveser uma simples fornecedora de fórmulas paraa física, e isso permite-nos pensar na realidadede hoje do ensino de física e na formadesarticulada e descontextualizada como amatemática é apresentada aos alunos. Mas amatemática merece ser cultivada nela mesma- inclusive nas teorias que ainda não têm umaaplicação direta na física. Aqui é apresentadoo prazer que a matemática pode provocar emquem a estuda - fato este desconhecido pormais da metade dos brasileiros, que associamatemática a sofrimento, de acordo com aspesquisas sobre educação matemáticaexistentes.

O capítulo VI, sobre astronomia, é umdos mais bonitos do livro. É tambémimportante, pois permite refletirmos sobre opapel fundamental do estudo e do ensino daastronomia. Poincaré aborda a questão por

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que se deve estudar astronomia e aimportância desta ciência para as demaisciências: "a astronomia é útil porque nos elevaacima de nós mesmos; é útil porque é grande;é útil porque é bela" e não somente pela suaaplicabilidade. No Brasil, o ensino deastronomia na educação básica é em muitoscasos inexistente e em outros casos apenasoptativo, sendo mais freqüentementetrabalhado na disciplina de geografia do quena de física, denunciando a timidez com queos professores de física ainda encaram estedesafio de ensinar astronomia de formaorgânica em seus cursos.

Historicamente foi a astronomia quenos ensinou que há leis científicas que sãoinelutáveis, foi ela que permitiu a construçãode espíritos capazes de compreender de fatoa natureza: "Foi Newton que nos mostrou queuma lei é apenas uma relação necessária entreo estado presente do mundo e seu estadoimediatamente posterior. Todas as outras leisdescobertas depois não são outra coisa: emsuma são equações diferenciais; mas foi aastronomia que nos forneceu primeiro omodelo". Conhecendo as leis e os segredosda natureza, podemos comandá-Ia, e não,como na antiguidade, solicitá-Ia: "Não sedomina a natureza senão [lhe] obedecendo".A astronomia também nos ensinou a não nosassustarmos com os grandes números e, aocontemplar o infinitamente grande, tornamo-nos aptos a compreender o infinitamentepequeno. Como a astronomia nasceu daastrologia, que era o ganha-pão de Kepler,Ticho Brahe e outros, a humanidade e a ciênciaem geral paradoxalmente devem muito àastrologia!

A mecânica celeste permitiu tambémque desconfiássemos das aparências, mas deuma forma superior à proposta por Platão:"No dia em que Copérnico provou que o quese pensava ser mais estável estava emmovimento, que o que se pensava ser móvelera fixo, mostrou-nos quão enganadorespodiam ser os raciocínios infantis que provêmdiretamente dos dados imediatos de nossossentidos; é verdade que suas idéias não

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triunfaram sem dificuldade, mas, depois dessetriunfo, não há mais preconceito inveteradoque não sejamos capazes de abalar". Comonas palavras de Carlos Drummond deAndrade, em seu poema "Eclipse": "Pra quemsabe ver, a noite é clara". De forma tambémpoética, Poincaré divaga que, se vivêssemosem um planeta com um céu sempre nebulosoe privado de astros, este próprio planeta seriapara nós ininteligível! Para alguns a ciênciadeve sempre se preocupar com as aplicaçõespráticas. Para Poincaré esta é uma meia-verdade, já que estas aplicações práticas - asmáquinas e a indústria -, ao nos livrarem daspreocupações materiais, nos dão prazer paracontemplar a natureza, e a astronomia estáeivada desse espírito de contemplação.

Poincaré, neste sentido, criticouAugusto Comte, que haveria dito que seriainútil procurar conhecer a composição do Sol,pois, ao conhecermos as substâncias de outrosastros que não a Terra, concluímos que as leisda nossa química são universais, ou seja, sãoleis gerais da natureza, e não caprichos casuaiscontingentes ao nosso planeta.

Os capítulos VII, VII e IX nos dãouma visão geral dos caminhos e descaminhosda física: sua história e seu passado, a crisevivida na época e as perspectivas a respeitodo que permaneceria ainda de pé em meio àsruínas, seu futuro e sua utilidade. Poincaréantevê a revolução que estava por vir e queresultaria no aparecimento da mecânicaquântica e da Teoria da Relatividade. Noprimeiro caso, ressaltando a importância deuma visão probabilística sobre o mundomicroscópico, no qual a lei física não seriadada apenas por uma equação diferencial, mastambém assumiria o caráter de uma leiestatística. Quanto à relatividade, Poincaréafirma que "talvez também devamos construirtoda uma mecânica nova que apenasentrevemos, onde, crescendo a inércia com avelocidade, a velocidade da luz se tomaria umlimite intransponível" (sic).

Poincaré observa que as crises e asrevoluções na ciência não significam umanegação simples do trabalho de nossos

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antepassados, mas sim a sua superação;segundo ele, os quadros não se quebram, poissão elásticos, mas se ampliam. Desta formaPoincaré reflete e conjectura sobre o futurode alguns dos princípios da física: aconservação da energia (princípio de Mayer);a conservação da massa (princípio deLavoisier); a segunda lei da termodinâmica(princípio de Carnot); o princípio darelatividade; a terceira lei de Newton (a lei daação e da reação); o princípio da mínima ação.

o VALOR OBJETIVO DA CIÊNCIA

Nesta terceira e última parte do livro,Poincaré preocupa-se com questionamentosde cunho filosófico que se iniciam com apergunta que é o título do capítulo X: a ciênciaé artificial? E ainda: como a ciência nos éapresentada? O que ela verdadeiramente é?Ela não seria apenas um conjunto de regrasformais? Ela está em busca de verdades? Qualsua proximidade com a realidade?

Seu interlocutor - ao qual secontrapõe - é o senhor Le Roy, um filósofo eescritor importante da época, autor de umadoutrina filosófica denominada de"nominalismo" e que hoje poderíamos chamarde "relativismo". Para Le Roy "não hárealidade senão em nossas impressões fugidiase mutantes, e mesmo essa realidade se esvaiassim que a tocamos". Segundo sua filosofia"antiintectualista": "a ciência é feita deconvenções, e é unicamente a essacircunstância que deve sua aparente certeza;os fatos científicos e, afortiori, as leis sãoobra artificial do cientista; a ciência, portanto,nada pode nos ensinar sobre a verdade, sópode nos servir como regra de ação". Assimsendo, a inteligência automaticamentedeformaria tudo que tocasse com o seuinstrumento fundamental, o discurso, e osfatos na verdade seriam criados peloscientistas!

Poincaré se contrapõe, afirmando queou a ciência será intelectualista ou não existirá!Assim sendo, o cientista não cria o fato bruto

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Ricardo Roberto Plaza Teixeira/ Alessandra Cristiane Matiaso Valor de O valor da ciência, de Poincaré, cem anos depois de sua publicação

(que está fora da ciência), mas sim o fatocientífico: "Qual a diferença entre o enunciadode um fato bruto e o enunciado de um fatocientifico? [...] O fato cientifico é apenas ofato bruto traduzido para uma linguagem maiscômoda. [...] Não pode haver nem ciência semfato cientifico, nem fato científico sem fatobruto, já que o primeiro é apenas a traduçãodo segundo. [...] Tudo o que o cientista crianum fato é a linguagem na qual ele o enuncia.[...] Os fatos são fatos, e sé acontece seremconformes a uma predição, não é por efeitode nossa livre atividade". A ciência,diferentemente de um jogo como o gamão,não é feita de convenções arbitrárias, mas deregras que funcionam, ao passo que as leiscontrárias não teriam funcionado: "A ciênciaprevê, e é porque prevê que pode ser útil, eservir de regra de ação [...] O cientista seengana com menos freqüência do que umprofeta que fizesse predições ao acaso".

A ciência nos faz conhecer averdadeira natureza das coisas? Para Poincaré,a ciência avança por aproximações sucessivas:"toda lei particular será sempre apenasaproximada e provável [... e] poderá sersubstituída por uma outra, mais aproximada emais provável". Há, para ele, um caráteruniversal na ciência: "só pela ciência e pelaarte as civilizações têm valor". Deste pontode vista, "a ciência pela ciência" é uma fórmulatão válida quanto "a vida pela vida" e "afelicidade pela felicidade". O que viabiliza abusca pela verdade é a existência de uma"objetividade", visto que o mundo no qualvivemos é comum a nós e a outros serespensantes, e o que há de objetivo, idêntico ecomum neste mundo, para todos os espíritos,pode ser transmitido por meio de um discursoem comum sem o qual não haveriaobjetividade.

CONCLUSÕES

Poincaré destaca em seu livro aimportância epistemológica da astronomia ea relevância de seu ensino. A mecânica celeste

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permitiu tirar o homem do centro do universoe ir, além disso, na refutação aofundamentalismo religioso daqueles quetentam fazer uma leitura literal de textosreligiosos como a Bíblia: "Os antigosacreditavam que tudo era feito para o homem,e é preciso crer que esta ilusão é bem tenaz,jáque é preciso combatê-ia incessantemente.Contudo, precisamos desvencilharmo-nosdela; caso contrário, seremos apenas eternosmíopes, incapazes de ver a verdade". À antigaafirmação de que "Deus criou o homem a suasemelhança", não seria melhor perguntar senão teria sido o homem quem criou Deus asua semelhança? A revolução, propiciada pelamecânica celeste de Kepler, Bruno, Galileu eNewton, permitiu com certeza queposteriormente outras revoluções científicaspudessem aparecer: a evolução de Darwin, arelatividade de Einstein, a fisica quântica deBohr e Heisenberg, a cosmologia de Hubblee Gamow.

Poincaré parece também, neste livropublicado em 1905 (assim comoanteriormente em A ciência e a hipótese,publicado em 1902), antecipar os doispostulados da Teoria da Relatividade - ageneralização do princípio da relatividade etambém o princípio da constância davelocidade da luz e prever inclusive as suasconseqüências: a relatividade dasimultaneidade, do tempo, do espaço e dainércia, bem como a importância degeometrias não-euclidianas para a descriçãodo universo relativístico. Poincaré de certaforma merece ser tratado como um co-descobridor da relatividade ou, pelo menos,um dos ombros de gigantes (juntamente comLorentz) que permitiriam a Einstein enxergarmais longe.

Finalmente, Poincaré se contrapõe aorelativismo como filosofia da ciência,relativismo este que neste início do século XXIvolta a ficar em moda por meio de correntesde pensamento vinculadas direta ouindiretamente ao pós-modernismo. Portantoé bastante atual e pedagógico ler Poincaré.

Sinergia, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 27-35, jan.jjun. 2005

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o Valor de O valor da ciência, de Potnceré, cem anos depois de sua publicação

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Ricardo Roberto Plaza Teixeira/ Alessandra Cristiane Matias

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http://www.educ.fc.ul.ptFaculdade de Ciências - Universidade deLisboa. Data de acesso: 19/02/2005

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