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Política para o CRACK no Estado de São Paulo Apoiando individuos e famílias para uma vida sem drogas Ronaldo Laranjeira O Governo do Estado de São Paulo reconhece: que o consumo do Crack se transformou num problema de saúde pública de primeira ordem que medidas urgentes são necessárias para proteger os usuários e suas famílias dos efeitos dessa droga tão devastadora que a dependência de qualquer droga no geral, e a dependência do CRACK em particular, é uma doença crônica e que necessita um tratamento com múltiplos recursos e de longo prazo que além do tratamento a reinserção social de longo prazo é necessária que alguns modelos de tratamento, já testados nos últimos anos pela Secretaria Estadual da Saúde (SES), com o auxilio de algumas universidades, poderão ser ampliados para todo o estado de São Paulo que a participação do setor de auto-ajuda (Narcóticos Anônimos, Grupos de Familiares, Organizações Comunitárias e Religiosas) deveria fazer parte central na organização dessa resposta As bases da política para o CRACK: O uso do CRACK nas ruas não será mais tolerado Todo agente público, como políciais, assistentes sociais, agentes comunitários, deverão encaminhar o usuário de

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Política para o CRACK no Estado de São Paulo

Apoiando individuos e famílias para uma vida sem drogas

Ronaldo Laranjeira

O Governo do Estado de São Paulo reconhece:

que o consumo do Crack se transformou num problema de

saúde pública de primeira ordem

que medidas urgentes são necessárias para proteger os

usuários e suas famílias dos efeitos dessa droga tão

devastadora

que a dependência de qualquer droga no geral, e a

dependência do CRACK em particular, é uma doença crônica e

que necessita um tratamento com múltiplos recursos e de

longo prazo

que além do tratamento a reinserção social de longo prazo é

necessária

que alguns modelos de tratamento, já testados nos últimos

anos pela Secretaria Estadual da Saúde (SES), com o auxilio de

algumas universidades, poderão ser ampliados para todo o

estado de São Paulo

que a participação do setor de auto-ajuda (Narcóticos

Anônimos, Grupos de Familiares, Organizações Comunitárias e

Religiosas) deveria fazer parte central na organização dessa

resposta

As bases da política para o CRACK:

O uso do CRACK nas ruas não será mais tolerado

Todo agente público, como políciais, assistentes sociais,

agentes comunitários, deverão encaminhar o usuário de

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crack, imediatamente, para os serviços de saúde para iniciar

seu tratamento

Os usuários identificados deverão ser monitorados pelos

serviços de saúde para avaliar a adesão ao tratamento

As famílias deverão receber todo o apoio necessário para

ajudar os usuários do CRACK a permanecer em tratamento e

no longo processo de recuperação

O sistema de internação deverá se organizar para receber os

três tipos de internação previsto na Lei 10.216/2001

(voluntária, involuntária e compulsória)

Parcerias com a Comunidade Interessada

É compromisso fundamental que o sistema de tratamento

para os usuários de CRACK deverá estar aberto à influência e a

participação ativa da comunidade, em especial os familiares

Todos os níveis de tratamento deverão ter como prioridade a

ajuda às famílias de usuários

O Sistema de Tratamento, Reabilitação e Reinserção Social

É preciso investir significativamente na estrutura de serviços

para lidar com esse problema complexo

O sistema de tratamento, que visa a estabilização física e

mental do usuário deverá trabalhar em sintonia com o setor

de reinserção social, que visa uma vida sem drogas e a volta

da plenitude das atividades acadêmicas, profissionais e

familiares

O sistema formal de tratamento e reabilitação deverá

trabalhar em sintonia com o sistema informal de autoajuda

(Narcóticos Anônimos, Grupos de Familiares, Grupos

Comunitários e Religiosos)

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As escolas e os usuários mais jovens terão prioridade no

atendimento

Uma parceria entre o sistema de saúde e o sistema judiciário

deverá ocorrer para ajudar os usuários infratores, com o

objetivo de evitar recorrer às prisões

Vários tipos de serviços deverão estar disponíveis, de uma

forma regionalizada, a ponto de que num futuro próximo,

cada região de cerca de 1-2 milhões de habitantes tenha

acesso a todos os níveis de tratamento

Os tipos de serviços :

Centros de Atenção Psicosocial para Álcool e Drogas

(CAPS-AD) – No Estado de São Paulo temos cerca de 55

desses CAPS-AD, muitos deles atendendo um número

pequeno de pacientes. Alem disto, os CAPS AD ainda

encontram uma serie de dificuldades no atendimento dos

casos mais graves (dos quais o CRACK é o melhor exemplo):

a) falta de diretrizes claras de tratamento (intervenções

como condutas medicamentosas, intervenções

psicoterápicas, apoio ao familiar, variam enormemente de

um serviço para outro e mesmo de acordo com diferentes

profissionais no mesmo serviço); b) falta de um suporte as

demandas de saúde como um todo (apesar de dever contar

com um clínico geral em sua equipe, este geralmente não

tem o suporte para cuidados gerais dentro do CAPS e

dificuldades para encaminhamento aos demais recursos de

saúde; c) a estrutura de funcionamento não permite uma

contenção maior para o usuário que está inquieto, ou

mesmo agitado: mesmo trabalhando em regime aberto

grande parte dos casos responde bem a técnicas de

contenção verbal, aliadas por vezes à ajustes constantes na

medicação. Se o CAPS funciona apenas com consultas e

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grupos em horário marcado, sua função de hospitalização-

dia só é utilizada por aqueles que menos precisam:

pacientes estáveis, passando o dia no CAPS para almoçar

ou a espera de seu grupo terapêutico; d) no geral, os CAPS

AD não contam com o apoio das organizações de auto –

ajuda, desperdiçando a oportunidade de maximizar suas

ações pela parceria com grupos como os NA, etc.

Deveríamos otimizar esses centros existentes através da

criação de programas específicos para os usuários de

CRACK.

Programas ambulatorial para o CRACK:– No ano passado a

Secretaria Estadual da Saúde criou o primeiro Ambulatório

Médico de Especialidade (AME) de Psiquiatria, na Vila

Maria. Um dos setores desse AME criou um programa

ambulatórial para os usuários de CRACK. O diferencial

desse serviço é o atendimento estruturado especificamente

para essa população, com um programa de tratamento

desenvolvido por profissionais bem treinados, todos com

especialização em Dependência Química. Esse tipo de

ambulatório poderia ser reproduzido não somente nas

AMEs, mas em qualquer serviço ambulatorial com

estrutura para receber esses pacientes.

Hospitais Dia – A Santa Casa de São Paulo coordena já há

vários anos um hospital dia para dependentes químicos,

com grande sucesso na retenção e tratamento desses

pacientes. Em sua concepção, todo CAPS AD deveria

oferecer a hospitalização-dia, mas na prática estes serviços

não estão preparados para dar retaguarda a estes casos,

alem das mudanças nos CAPS AD mencionadas acima,

regiões sem CAPS poderiam se beneficiar de serviços

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específicos de Hospital dia, fornecendo também retaguarda

aos Ambulatórios do CRACK.

Prontos Socorros de Psiquiatria – O Estado de São Paulo

tem uma rede razoável de hospitais gerais que operam

setores de emergência com psiquiatras. Esses PS-

Psiquiatria deveriam ter um programa de atendimento aos

usuários do CRACK e um sistema de encaminhamento bem

definido após a emergência que levou o paciente ao

hospital

Moradias Assistidas – Após uma fase de estabilização sem

drogas muitos pacientes ou não têm mais casa para morar,

ou simplesmente suas famílias estão muito desgastadas

para recebe-los, por esses motivos vários países criaram

esses serviços onde o usuários poderá morar por um tempo

longo e se dedicar plenamente à tarefa de reabilitação

social. O Hospital São Paulo da UNIFESP opera já há cerca

de um ano uma moradia dessas e a experiência tem sido

muito boa. É um serviço que, bem organizado, possa ser de

baixo custo e alta efetividade.

Enfermarias Especializadas – O CRACK causa uma grande

instabilidade física e mental, dificultando muito a aderência

ao tratamento ambulatorial. Faz-se necessário a criação de

um bom número de enfermarias especializadas que tenha

o objetivo da estabilização do usuário, e prepara-lo para o

longo processo de recuperação ambulatorial. A SES fez

convênios recentes para o desenvolvimento dessas

enfermarias. Mais de 200 leitos foram criados para atender

a demanda crescente, e a experiência mostra que esse tipo

de serviço é necessário para essa população.

Comunidades Terapêuticas – Existe uma parte dos usuários

de CRACK que necessitam a permanência mais prolongada

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num ambiente protegido e estruturado. As CTs podem ser

uma boa alternativa, desde que tenham um programa

específico para o CRACK e estrutura compatível para esse

tipo de assistência.

Serviços de Reabilitação e Reinserção Social – existem

inúmeras iniciativas na sociedade que poderiam ajudar no

processo de recuperação dos usuários de CRACK. Como

exemplo: a) um programa específico nas escolas regulares

do estado para absorver um jovem com esse tipo de

experiência; b) programas de esportes específicos nos

serviços estaduais; c) programas específicos nas escolas

técnicas do estado; d) programas específicos de trabalhos

comunitários com algum tipo de ajuda financeira e de

treinamento.

A Estrutura de Organização dos Serviços deverá ser regional

e acompanhar de perto os serviços de Saúde Mental. Está

sendo proposta uma reorganização da estrutura de

atendimento ao doente mental no Estado de São Paulo, e os

serviços para o CRACK deveriam estar vinculados a essa nova

lógica de serviços. Um componente fundamental é que deva

existir uma regionalização e um organismo que gerencie toda

a rede assistencial. Como esses serviços necessitam de um

alto nível de especialização, as Universidades terão um papel

estratégico no apoio técnico e no gerenciamento das grandes

regiões. O anexo I mostra a proposta da nova rede de

assistencial à saúde mental.

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ANEXO I

Proposta de uma Política Efetiva de Saúde Mental

para o Estado de São Paulo

As doenças mentais são muito prevalentes e contribuem para alta morbidade,

incapacitação e mortalidade precoces. Nos países em desenvolvimento, a defasagem no

tratamento (proporção dos que necessitam e não recebem) chega a 75%, sendo que na

América Latina esta taxa é ainda maior (Figura 1).

Figura 1 – Resumo da Assistência em Saúde Mental em países desenvolvidos

Estudos epidemiológicos e dados da Secretaria de Estado da Saúde (SES) indicam que

milhares de cidadãos com transtornos mentais e do comportamento não encontram a

assistência necessária no Sistema Único de Saúde (SUS) em nosso Estado, o que aumenta,

significativamente, o impacto dessas doenças no indivíduo, nas famílias e em toda a sociedade,

resultando em elevados custos médico-sociais e econômicos. A maior demanda hoje é por

atendimento especializado efetivo aos transtornos mentais de alta prevalência, os quais, em

geral, têm bom potencial de resposta terapêutica. São eles: o primeiro episódio psicótico, as

depressões, o transtorno afetivo bipolar, os transtornos ansiosos, somatoformes e

alimentares, e o abuso e a dependência de álcool e outras substâncias. Por exemplo, a falta de

programas efetivos de prevenção para os transtornos do humor, faz com que mais de 10.000

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Autorizações de Internação Hospitalar (AIHs) sejam emitidas anualmente para depressão

bipolar e mania no Estado, muitas das quais poderiam ser evitadas.

Em parte isso se deve ao modelo assistencial vigente, preconizado pelo Ministério da

Saúde, que prioriza a desospitalização e a reabilitação psicossocial nos Centros de Atenção

Psicossocial (CAPS) (Figura 2), sendo notável a ausência de recursos fundamentais para a

prevenção e a assistência integral aos doentes mentais1. Entretanto, uma recente avaliação do

Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo concluiu que, devido a falhas na

assistência, sem retaguarda clínica e psiquiátrica, e com precária articulação com os recursos

comunitários, “os CAPS se revelam incapazes de assumir as funções para os quais foram

criados”2.

Figura 2 - Modelo de Assistência em Saúde Mental preconizado pela CORSAM-MS.

A concentração de recursos na reabilitação dos pacientes com transtornos mentais

crônicos, em detrimento de uma política mais abrangente e com forte componente

preventivo, não se justifica. De fato, os equipamentos sociais são importantes para os

pacientes com transtornos mentais e suas famílias, mas devem ser objeto de políticas

intersetoriais, sendo fundamental que a maior parte das verbas do SUS seja utilizada em Ações

de Saúde. Assim, moradias assistidas, CeCos (Centros de Convivência), oficinas

profissionalizantes e Instituições de Defesa dos Direitos Humanos, deveriam ser custeados em

grande parte pelas pastas de Habitação, Educação, Trabalho, Justiça, Cultura e Bem-Estar

Social.

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Atribuir o atendimento de casos agudos aos pronto-socorros esbarra no fato de que,

mesmo aqueles que dispõem de equipes especializadas, ficam rapidamente lotados, além de

impossibilitados de encaminhar os pacientes que precisam de internação. Mais de 40% dos

pedidos de internação não são atendidos no município de São Paulo, por falta de leitos

psiquiátricos. Pela mesma razão, muitos doentes mentais estão trancados em casa, milhares

de “moradores de rua” sofrem psicose, depressão, alcoolismo ou abusam de outras

substâncias, como o crack, sem atendimento específico e falta de atendimento para milhares

de doentes mentais graves do sistema prisional. Paradoxalmente, os Serviços Residenciais

Terapêuticos são reservados somente para os egressos de hospitalizações prolongadas e há

controvérsia sobre a proibição de asilos para doentes mentais crônicos na Lei 10.216.

Levando em conta o preconizado pelo o Artigo 2º da Lei 10.216: “São direitos da

pessoa portadora de transtorno mental... ter acesso ao melhor tratamento do sistema de

saúde consentâneo às suas necessidades” e as informações acima, docentes de Psiquiatria das

quatro faculdades de Medicina do município de São Paulo, juntamente com membros do

Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP) e do Ministério Público

Estadual, formularam uma proposta para a assistência aos pacientes psiquiátricos no Estado

de São Paulo e a submetem agora à consideração da Secretaria de Estado da Saúde.

“Saúde Mental de Qualidade: uma Prioridade do Estado 2011-2015” Os seguintes princípios fundamentais deverão ser obedecidos3,4:

1. Respeito aos direitos humanos, principalmente de crianças e adolescentes

portadores de transtornos mentais e de comportamento, e o combate ao estigma;

2. Fortalecimento contínuo do mandato político de alto nível;

3. Promoção do acesso às medidas de controle social, promoção, prevenção e

assistência baseadas nas melhores evidências científicas disponíveis;

4. Integração no processo da política assistencial de Saúde Mental de vínculos com os

programas de referência para tratamento dos portadores da Síndrome de

Imunodeficiência Adquirida, de vítimas de violência, entre outros a definir.

Coordenação de Saúde Mental da SES-SP

Para melhorar Política de Atenção à Saúde Mental no Estado, é necessário fortalecer

o embasamento das ações da Coordenadoria de Saúde Mental (COSAM) por meio da criação

de um Comitê de Especialistas (CESM) representando as Universidades, outras Secretarias de

Estado e demais Instituições relacionadas com a Saúde Mental. O CESM não deverá se

sobrepor às tarefas da Câmara Técnica de Saúde Mental (CTSM), órgão que dá suporte ao

Conselho Estadual de Saúde (CES), garantindo as prerrogativas de participação e

representatividade do SUS (Figura 3).

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Figura 3 – Gestão da Saúde Mental no Estado de São Paulo

O CESM funcionará como uma instância consultiva, trazendo para a COSAM o

conhecimento científico mais recente na área e as experiências acumuladas nos serviços

universitários e na rede de saúde mental. O CESM assumirá as seguintes tarefas:

1. Obter um levantamento de dados para a criação de um mapa dos recursos

existentes em cada departamento regional de saúde (DRS), incluindo as unidades

universitárias, centros de referência e serviços de saúde públicos e conveniados,

bem como os dados numéricos da assistência prestada nesses serviços, sua estrutura

física, recursos humanos, etc., e seus representantes;

2. Sugerir um modelo assistencial auditável, viável, justo e humanitário para atender

os pacientes com quadros agudos e prevenirr a cronificação, priorizando a

prevenção secundária efetiva e a prevenção primária possível, ajustando-o à

realidade de cada região do Estado;

3. Sugerir a criação de núcleos acadêmico-assistenciais regionalizados (NAARs) em

pelo menos 6 macro regiões constituídas por DRSs afins, com a função de coordenar

a aplicação das políticas de saúde mental (o modelo assistencial) nos seus

respectivos territórios, com a finalidade de produzir treinamento e capacitação de

recursos humanos, respeitadas as peculiaridades locais;

4. Definição e proposição de programas prioritários em Saúde Mental (atenção aos

usuários de crack, identificação precoce do primeiro surto psicótico, saúde mental

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da criança e do adolescente, atenção a vitimas da violência e vitimas de catástrofes,

por exemplo), além do desenvolvimento de novas tecnologias de acordo com a

necessidade (CAISM e AME Psiquiatria, por exemplo);

5. Delineamento dos programas de formação, aperfeiçoamento e educação

continuada dos recursos humanos para as necessidades diagnosticadas na Rede;

6. Definição de conteúdo de campanhas de sensibilização da sociedade para os

programas prioritários;

7. Manutenção de uma interface pró-ativa com setores externos à Saúde como o Poder Judiciário, o Ministério Publico, a Educação, Bem Estar Social, etc., além das demais áreas estratégicas da própria SES (Saúde da Mulher, Infantil, Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos de Saúde (CCTIES), Programas das DST-AIDS, etc.).

Um modelo para o Sistema de Saúde Mental no Estado de São Paulo

De modo geral, a divisão dos serviços hoje se dá pela distribuição no território e grau de especificidade dos recursos investidos. As ações são pouco precisas e os serviços tentam resolver tudo, mas o resultado é insatisfatório, com baixa efetividade e de forma desordenada e redundante. No novo modelo, as necessidades do paciente definem onde ele deve receber os cuidados - o paciente não fica restrito ao seu serviço de origem, mas tem acesso ao que necessite no nível de atenção em que este existir. A Figura 4 delineia esse novo modelo que será coordenado, supervisionado e avaliado pelos NAARs + DRSs:

Figura 4 – Modelo Assistencial para a Saúde Mental no Estado de São Paulo

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As ações desenvolvidas nesses níveis de atenção devem levar em conta os seguintes princípios básicos:

1. Otimização do que existe: os transtornos mentais comuns (TMCs) são multicausais e uma diversificação dos tratamentos baseada em evidências científicas é necessária para a constituição de boas práticas assistenciais;

2. Ampliação do modelo atual: os CAPS, não serão o centro ou o coordenador da assistência e sim, um dos recursos integrados na rede;

3. Orientação acadêmica dos NAARs: estruturas acadêmicas e assistenciais integradas com gestores da Rede regional representando as respectivas DRSs e demais instituições especializadas em saúde mental das macrorregiões serão também responsáveis pela avaliação da necessidade, do processo e dos resultados dos treinamentos a serem oferecidos;

4. Articulação dos níveis de atenção: incluindo as intervenções descritas a seguir e novas tecnologias, de acordo com a necessidade regional.

Atenção Básica (AB) ou Primária Para que os serviços de cuidados primários (UBS/PSF) possam dar assistência

psiquiátrica às pessoas com os transtornos mentais mais prevalentes e de menor

complexidade, será necessário capacitar os médicos de família e generalistas para diagnosticar

e tratar os transtornos mentais comuns e dar atendimento inicial às crises através de

programas de educação continuada balizados por diretrizes de atendimento aos transtornos

mentais com especificações das condutas básicas e também das competências e fluxos de

encaminhamento na rede assistencial. Devem-se evitar as formas de capacitação

convencionais, que se mostraram pouco efetivas, distantes da prática diária, não garantindo o

engajamento dos profissionais e não oferecendo continuidade de supervisão ou orientação

para o encaminhamento dos casos mais graves. Como alternativa, pode-se criar mais NASFs.

No novo modelo, diretrizes de cuidados psiquiátricos para os principais transtornos

em seus diferentes níveis de atendimento terão como referência as Diretrizes da Associação

Médica Brasileira/Conselho Federal de Medicina, que fomentam a discussão contínua dos

padrões de tratamento e de encaminhamento; envolvem cobrança de competências;

estimulam práticas baseadas em evidências e possibilitam o uso de indicadores de processo e

de resultados para informação dos profissionais sobre seu desempenho5. Cada um dos NAARs

cuidará da implementação e monitoramentos dessa rede de AB.

Ações de promoção de saúde mental e prevenção

Duas linhas de promoção de Saúde Mental merecem destaque: fortalecimento de

habilidades individuais para lidar com demandas estressantes e o fortalecimento de laços

sociais protetores na comunidade. Na prevenção, iniciativas com comprovado impacto

incluem, por exemplo, as visando restrição ao acesso às bebidas alcoólicas, em especial aos

menores de idade, que devem merecer um programa prioritário da SES.

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Atenção Secundária (AS) e Terciária (AT)

Atendimento Ambulatorial

Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) - cerca de 250 CAPS concentram grande parte dos recursos humanos em saúde mental no Estado. A melhoria do seu funcionamento depende de diretrizes que especifiquem o perfil de paciente (com transtorno mental grave) atendido, uniformizem uma lista mínima de intervenções a serem oferecidas e colaborem para criar indicadores de funcionamento para avaliação do desempenho das unidades segundo o estudo que foi realizado pelo CREMESP.

Ambulatórios Gerais de Psiquiatria - com equipe de saúde mental organizada de acordo com as demandas existentes em cada local e que façam a distribuição gratuita dos medicamentos prescritos. O atendimento ambulatorial é eficaz no tratamento e controle das doenças mentais e quando combinado com a dispensação de medicamentos mostra uma elevada taxa de resposta terapêutica com baixo custo (desde que sigam protocolos terapêuticos racionais).

Ambulatório Médico Especializado em Psiquiatria (AME Psiquiatria) com programas de atendimento a clientela específica [cerca de 2,5% da população atendida em serviços ambulatoriais, segundo estudos ingleses administrados por equipe multiprofissional completa6. Oferecem atendimento mais intensivo que o Ambulatório Geral tanto em duração como frequência de atendimento, sendo um serviço intermediário entre o Ambulatório Geral e a internação. O AME Psiquiatria preenche a lacuna de prevenção especializada do atual sistema baseado na atenção básica e nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

Atendimento hospitalar

Dois dos maiores problemas da assistência em Saúde Mental são a falta de leitos para internação psiquiátrica e o precário atendimento das urgências psiquiátricas. O ideal seria que todo grande serviço de urgências, municipal ou regional, tivesse um psiquiatra de plantão e leitos de observação preparados para acolher o paciente por 48 horas (tempo para resolução de demandas urgentes sem necessidade de internação). Hoje esses serviços não tem espaço para um PS de Psiquiatria. Uma alternativa pode ser a criação de CAISMs de porte pequeno a médio (10 leitos de observação no OS; 30 a 50 leitos em duas enfermarias), em regiões estratégicas, para atender urgências e internações no mesmo edifício, otimizando recursos humanos pois a equipe do pronto socorro pode dar cobertura à enfermaria de psiquiatria no período noturno e nos finais de semana.

Unidades de Emergência Psiquiátrica em pronto-socorros gerais específicas para atendimentos às emergências psiquiátricas, abertas em tempo integral, com leitos para acolher pacientes em crise, em curtíssima permanência (até 24 horas).

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Equipes de Psiquiatria no Samu treinados para o atendimento de saúde mental - o primeiro

atendimento à urgência psiquiátrica, em casa ou mesmo na rua, pode ser decisivo para a

evolução do caso. Freqüentemente, pacientes são levados pela Polícia aos serviços de

urgência, algemados ou amarrados, agitados e por vezes feridos. Eles tendem a ser internados,

pois sua agitação impede o manejo e início de medicação. Moradores de rua em crise, com

transtorno psicótico ou abuso de álcool e outras drogas, também terão com estas equipes de

socorristas a possibilidade de abordagens mais adequadas que, aliadas a internações breves e

acompanhamento subsequente nos CAPS, podem mudar significativamente o prognóstico,

garantindo seu tratamento.

Centro de Atenção Integral em Saúde Mental (CAISM) - são serviços que atuam tanto na atenção secundária como na terciária, pois contemplam atendimento completo em todos os níveis de complexidade (ambulatório, pronto socorro, CAPS, AME, hospital dia e hospital para internação em tempo integral). Os CAISMs são ideais para algumas regiões e localidades e podem ser centros de excelência no atendimento psiquiátrico.

Unidades Psiquiátricas em Hospitais Gerais destinadas a internações de pacientes agudos, a priori de curta permanência, para pacientes sem intercorrências, ou para pacientes com intercorrências clínicas ou cirúrgicas que necessitem de internação em hospitais gerais. Em determinados hospitais, essas unidades podem ser dedicadas a patologias afins (psicoses, transtornos do humor, geriátricas, etc.), conforme a demanda e as habilidades dos serviços instalados.

Hospitais Especializados em Psiquiatria - para atender pacientes que necessitem cuidados intensivos cujo tratamento não é possível ser feito em serviços de menor complexidade. Leitos Psiquiátricos de Longa Permanência - destinados a pacientes com comprometimento de sua autonomia para as atividades básicas da vida diária e que não possuem apoio familiar. Estes serviços devem ser financiados também com verbas da Assistência Social.

Residências Terapêuticas - uma prioridade nos programas de Saúde Mental. Recente “censo

dos moradores de hospital psiquiátrico” encontrou 6.349 pacientes de longa permanência (>1

ano), sendo que 65% destes estavam internados há mais de 10 anos e 26% não tinham

informações sobre os familiares7. Deveriam acolher também os egressos de internações

recentes em situação de rua com transtorno mental grave (50% da amostra), sendo, para isso,

necessário alterar a Portaria que criou tais serviços.

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“A integração dos serviços é prioridade da política assistencial de transição, hierarquizando os atendimentos de acordo com cada caso e

viabilizando a rede regionalizada (Figura 5)”.

Figura 5 – Integração dos Níveis de Atenção à Saúde Mental

Recursos humanos: treinamento e capacitação A médio e longo prazo será necessário valorizar o ensino da Psiquiatria nos currículos

de graduação, incluindo-a entre as “grandes áreas da Medicina”. Da mesma forma, os

enfermeiros, psicólogos e demais profissionais de Saúde Mental deverão receber informações

atualizadas e treinamento específico em técnicas de intervenção de eficácia comprovada

cientificamente. Avalia-se que cerca de 3% do currículo nas faculdades de Medicina são

dedicados a temas de saúde mental (psicologia médica e psiquiatria) e cerca de 7% das

faculdades de enfermagem8. A formação de gestores em saúde mental e de enfermeiros

especializados é uma ação muito importante a ser desenvolvida após a implantação do sistema

assistencial.

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Os sistemas de informação, como o DATASUS, são a principal fonte para monitorar o sistema

de saúde mental, mas deve ser aprimorado e priorizado. Os direitos humanos determinam

que haja fiscalização e atualização contínuas.

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Cronograma

Ação Período Responsável

Curto Prazo

1, 2 e 3 1º /03 a 1º/04 COSAM + CES + CTSM + CESM

Médio Prazo

4, 5 e 6 2/04 a 2/07 COSAM + CESM + NAARs

Longo Prazo

7 A partir de 3/07 COSAM + CESM + NAARs

Referências Bibliográficas

1. Ministério da Saúde (MS). Portaria 469, de 06/04/2001. Brasília, DF. 2001

2. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP). Avaliação

dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Estado de São Paulo.

Coordenação Institucional de Mauro Gomes Aranha de Lima. São Paulo,

2010.104 p.

3. World Health Organization (WHO). Mental health policy, plans and

programmes. Mental health policy and service guidance package. Geneva:

WHO, 2005.

4. Funk M, Drew N, Freeman M, Faydi E. Mental Health and Development:

Targeting people with mental health conditions as a vulnerable group. Geneva:

Who Health Organization and Mental Health and Poverty Project; 2010.

5. Jatene FB e colaboradores. Projeto Diretrizes. Associação Médica Brasileira, São

Paulo e Conselho Federal de Medicina, Brasília – DF. Volume II. 2003.

6. Kessler RC, Demler O, Frank RG, et al. Prevalence and treatment of mental

disorders, 1990 to 2003. N. Engl. J. Med. 352 (24): 2515-2523, 2005.

7. Secretaria de Estado da Saúde (SES). IV Conferência Nacional de Saúde Mental

– Intersetorial (IV CNSM-I ...Censo Psicossocial dos Moradores dos Hospitais

Psiquiátricos do Estado de São Paulo .... de Estado da Saúde do Estado de São

Paulo, 2008. 170p. Brasil.

http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/censo.pdf