PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP ... Sarkis Braz… · BRAZ, M. S. (2013)...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Mariana Sarkis Braz Prevenção de luto complicado em cuidados paliativos: percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA SÃO PAULO 2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Mariana Sarkis Braz

Prevenção de luto complicado em cuidados paliativos:

percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

SÃO PAULO

2013

Mariana Sarkis Braz

Prevenção de luto complicado em cuidados paliativos:

percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, como exigência parcial para obtenção

do título de MESTRE em Psicologia Clínica,

sob a orientação da Profª. Dra. Maria Helena

Pereira Franco.

SÃO PAULO

2013

Banca Examinadora

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______________________________________________

______________________________________________

À minha mãe, Nadia Sarkis, minha base

segura, exemplo e inspiração de amor e

generosidade.

AGRADECIMENTOS

A concretização deste trabalho me alegra e me faz pensar não apenas nas pessoas que

compartilharam comigo este período, mas também naquelas que fizeram parte da minha

formação acadêmica, profissional e pessoal.

Agradeço principalmente:

À querida professora Maria Helena, pela confiança, incentivo, paciência e apoio. Por

compartilhar comigo seu saber admirável e me fazer sempre refletir sobre como fazer melhor

a minha psicologia. A realização deste trabalho certamente é um divisor de águas em termos

de conhecimento e amadurecimento. A nossa primeira entrevista e o seu “bem-vinda” é uma

lembrança que sempre me emociona.

Aos meus pais, Nadia e Sergio, eternos incentivadores do meu desenvolvimento pessoal e

profissional, sempre prontos para me ajudar e sempre por perto. A certeza de poder contar

com vocês a qualquer momento me transmite a certeza de que tudo é possível. Sergio,

obrigada por acreditar em mim, me amar, me respeitar nos meus desejos. Mãe, obrigada pelo

seu amor incondicional e irracional, pela compreensão e respeito pelo meu trabalho e escolha

do que quero fazer. Sei que você gostaria que eu trabalhasse com coisas mais fáceis, mas

também sei o quanto você me admira por isso.

Aos meus irmãos, Marcus e Fernanda, que são meus companheiros nesta vida. Obrigada pela

escuta generosa, trocas, amor e por acreditarem em mim. Marcus, irmão gêmeo, irmão de

alma. Fernanda, sempre protetora, carinhosa e preocupada. Ao meu cunhado Fabio, sempre

interessado nos meus projetos. Aos meus amores Julia e Manuela, que me proporcionam

momentos de pura alegria e ternura. Esses com certeza são os melhores momentos.

Aos meus tios, Lilian, Sandra, Álvaro e Nelson, mães e pais que a vida me deu e que sempre

participaram da minha formação e educação. Amo muito vocês. Aos meus primos e

priminhos, que sempre estão comigo e são como irmãos. Sempre muito bom compartilhar e

perpetuar com vocês os valores da nossa família.

Às queridas Wilma e Jacira, pelos cuidados, comidinhas gostosas e pela torcida.

Às amigas de infância, Luciana, Stefanie, Caroline e Flávia, pela amizade de mais de vinte

anos que não me faz esquecer quem eu sou e de onde eu vim.

Aos meus queridos e amados amigos baianos, que vivenciaram comigo esse período de

estudos. A energia de vocês que contagia e me faz querer sempre estar com vocês e me

considerar tão baiana quanto.

Aos meus colegas de faculdade, Andrea, Camila, Tatiane, Gabriela, Bruno, Joana, Margarete,

Gisela, Rosa e Ana Claudia, que iniciaram comigo essa empreitada de ser psicólogo e que me

fizeram viver bons e inesquecíveis momentos.

Aos meus amigos queridos da PUC-SP, Francisco, Rosane, Marta, Lenia, Deria, que

dividiram comigo esse período e fizeram deste mestrado um momento gostoso e motivador.

Às queridas colegas de profissão e amigas da Santa Casa de São Paulo, Rafaela, Nathalia,

Ana, Mariana, por sempre vibrarem com as minhas conquistas.

À Gleice Luz e ao Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer, pela primeira oportunidade

de ter contato direto com pacientes e essência do meu trabalho.

À Maria do Carmo, Fernanda, Suzy, Paty, Luane, Luciana, que no Hospital Aristides Maltez

me proporcionaram momentos ricos de conhecimento e vivência. Obrigada por confiarem no

meu trabalho e pelo incentivo até os dias de hoje. Me orgulho de poder ter sido estagiária

desse Serviço de Psicologia que não forma apenas profissionais, mas pessoas. Às minhas

grandes amigas de estágio, Aline, Fanny, Kátia e Taiana, que compartilharam comigo esse

início de crescimento profissional.

A Alexandre Amaral e Nina Vasconcelos, queridos mestres e eternas vozes internalizadas.

Obrigada pelo aprendizado, entrega de vocês como professores e pessoas humanas e pelo

movimento que vocês deram na minha vida. Tenho muitas saudades do Instituto Humanitas e

me sinto lisonjeada de ter sido aluna de vocês. Aos queridos colegas de formação, Isa, Priscila

e Anderson, pelos momentos de troca, desabafo e cumplicidade.

Ao Dr. Alze, pela oportunidade de estar trabalhando na equipe de cuidados paliativos do

Hospital Paulistano. Obrigada pelas trocas, aprendizado, confiança, incentivo e pela vivência

de momentos singulares.

Aos meus anjos da guarda na minha retomada em São Paulo: Sandra Mazutti, também pela

oportunidade do trabalho, por nunca ter esquecido de mim. Por plantar em mim, junto com o

Dr. Alze, a sementinha dos cuidados paliativos. Obrigada pela coordenadora generosa e

compreensiva que você é. Pela amiga querida e de todas as horas e pela pessoa humilde e

sábia que você é. Marcela Kitayama, supervisora, hoje querida amiga. Obrigada por acreditar

em mim mais do que eu mesma muitas vezes, pela escuta tranquila e pelo incentivo.

À Veronica Montanher e Flávia Campos, que compartilham comigo o dia a dia do trabalho.

Obrigada pela escuta, torcida e apoio.

À Ana Maria Magalhães, a quem admiro e me ensina a cada dia, pelo contágio de seu

entusiasmo, confiança e torcida.

À minha querida equipe de cuidados paliativos, que me dá certeza de que o fazer cuidados

paliativos é possível e gratificante. Carolina Paparelli, que no seu fazer enfermagem me

emociona com o trabalho que vai além da técnica. À Dra. Carolina, Dra. Silvia, Dr. Marcel,

Dra. Karen, por dividirem seus conhecimentos e acreditarem no meu trabalho. Tenho muito

orgulho de trabalhar com vocês e perceber o quanto sou privilegiada por conviver com

médicos humanos e responsivos. À Fernanda e Gabriela, assistentes sociais, pelos momentos

de troca e apoio. Tenho certeza de que muito do prazer que hoje sinto na minha profissão vem

por viver com vocês momentos únicos, emocionantes e que sempre nos ensinam.

A Dra. Daniele, Dr. José Fernando, Dra. Erika, Dra. Simone, Dra. Cidália e Fernanda

Marchezini, pelas conversas enriquecedoras, pela confiança, pelo incentivo e apoio.

Ao Dr. Daniel Forte, por nutrir a minha biblioteca virtual e pelo apoio.

Às professoras Mathilde Neder e Maria Julia Kovács, pela leitura cuidadosa e pelas

contribuições que me fizeram refletir e aperfeiçoar este trabalho. Nem nos meus melhores

pensamentos poderia pensar em uma banca examinadora com pessoas tão qualificadas e

admiradas.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo incentivo

através da bolsa de estudos concedida.

Agradeço aos participantes desta pesquisa. Sem eles essa construção não seria possível e nem

tão especial quanto foi. Obrigada pela entrega, confiança, disponibilidade e por me

confirmarem que a atuação em cuidados paliativos é possível e por compartilharem comigo da

sensação gratificante que é poder trabalhar nessa área.

BRAZ, M. S. (2013) TÍTULO. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica). Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

RESUMO

Os cuidados paliativos buscam qualidade de vida baseada principalmente na prevenção e no

alívio do sofrimento de pacientes que possuem doenças ameaçadoras de vida, englobando as

esferas de ordem física, psicossocial e espiritual. Além disso, estende-se ao pós-morte do

paciente, oferecendo suporte e apoio à família no processo de luto. O tema proporciona

discussões acerca de educação para morte e processo de morrer para os profissionais de saúde,

que têm uma formação em sua maioria voltada para a valorização do saber técnico em

detrimento de uma formação humanista, o que afasta o tema da morte como foco de

aprendizado. Esta pesquisa qualitativa teve como objetivo compreender e analisar a formação

dos profissionais em relação ao processo de morrer do paciente e as percepções daqueles em

relação às suas contribuições para a prevenção de luto complicado da unidade de cuidado. A

Teoria do Apego fundamentou teoricamente esta pesquisa, oferecendo respaldo para a análise.

Participaram voluntariamente desta pesquisa profissionais de saúde, que integram

formalmente equipes de cuidados paliativos. Foi utilizado um questionário auto-aplicativo

para obtenção de dados acadêmicos, profissionais e de cursos realizados e uma entrevista

semiestruturada, que permitiu compreender os seguintes tópicos: a escolha de trabalhar em

cuidados paliativos; as estratégias utilizadas (para si mesmo e para com a unidade de cuidado)

no dia a dia para lidar com a questão do processo de morrer e a percepção sobre a sua

contribuição para a prevenção de um luto complicado de paciente e família. Os resultados

confirmaram que a formação dos profissionais em relação ao processo de morrer é escassa.

Ademais, observou-se que os profissionais de saúde que trabalham em cuidados paliativos

possuem comportamentos de apego, os quais são identificados como naturais nesse contexto,

o que acaba por dificultar a percepção de que são importantes contribuições para a prevenção

de luto complicado da unidade de cuidado.

PALAVRAS-CHAVE: Cuidados paliativos. Unidade de cuidado. Luto complicado.

Profissionais de saúde.

BRAZ, M. S. (2013) TÍTULO. Dissertation (Master of Clinical Psychology Degree).

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

ABSTRACT

Palliative care seek quality of life based primarily on prevention and relief of suffering of

patients who have life threatening diseases, encompassing the areas of physical, psychosocial

and spiritual. Furthermore, extending the post-mortem patient, it offers support the family

support in the grieving process. The theme provides discussions of education for death and

dying process for health care professionals who are educated mostly geared towards the

enhancement of technical knowledge at the expense of a humanist education, which removes

the theme of death as the focus of learning. This qualitative study aimed to understand and

analyze the training of professionals in relation to dying patient and their perception regarding

their contributions to the prevention of complicated grief care unit. The Attachment Theory

grounded this research theoretically, providing support for the analysis. Health professionals

who integrate palliative care teams voluntarily participated in this research . A questionnaire

was used to obtain academic and professional data, besides courses taken. A semi-structured

interview allowed us to understand the following topics: the choice of working in palliative

care, the strategies used (by oneself and by the care unit) on a daily basis to deal with the

issue of the dying process and the perception of its contribution to the prevention of

complicated grief of patient and family. The results confirmed that the training of

professionals in relation to the dying process is scarce. Moreover, it was observed that health

professionals working in palliative care have attachment behaviors, identified as natural in

this context, and that ends up to make it harder to realize that those are important

contributions to prevent grief from becoming complicated in the care unit.

KEYWORDS: Palliative care. Care unit. Complicated grief. Health care professionals.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto

complicado............................................................................................................................ 37

Tabela 2 Fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para o

desenvolvimento do luto complicado................................................................................... 38

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

DELEtCC – Disseminating End-of-Life Education to Cancer Centers

DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

ENNEC – End-of-life Nursing Education Consortium

EPEC – The Education for Physicians on End-of-life Care

LELu – Laboratório de Estudos sobre o Luto

LEM – Laboratório de Estudos sobre a Morte

ONG – Organização não governamental

PCR – Parada cardiorrespiratória

PS – Pronto-socorro

PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UTI – Unidade de Terapia Intensiva

WHO - World Health Organization

]

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 14

1 OBJETIVO GERAL...................................................................................................... 16

1.1 Objetivos específicos............................................................................................ 16

2 CUIDADOS PALIATIVOS.............................................................................................. 17

2.1 Cuidados paliativos e Bioética: implicações na tomada de decisão..................... 20

2.2 Cuidados paliativos e comunicação...................................................................... 25

2.3 Decisão compartilhada e a teoria do apego........................................................... 30

3 O PROCESSO DE LUTO E SUAS IMPLICAÇÕES.................................................... 33

3.1 O fenômeno do processo de luto e suas dimensões.............................................. 34

3.2 Luto normal e luto complicado............................................................................. 35

3.3 Depressão, luto e luto complicado: semelhanças e diferenças............................. 40

3.4 A construção social da patologização da experiência do luto.............................. 42

3.5 Novas vertentes para o luto em relação a sua vivência......................................... 43

4 FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM RELAÇÃO AO

PROCESSO DE MORRER E DE MORTE....................................................................... 45

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................................... 50

5.1 Participantes.......................................................................................................... 50

5.2 Estratégias para obtenção de respostas dos participantes..................................... 51

5.3 Estratégias para compreensão das respostas dos participantes............................. 51

6 PROCEDIMENTOS ÉTICOS DA PESQUISA............................................................. 53

7 RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................................... 54

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 80

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 82

APÊNDICE A – DADOS ACADÊMICOS E PROFISSIONAIS 89

APÊNDICE B – ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA 90

APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO 91

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INTRODUÇÃO

A autora deste estudo é uma “soteropaulistana”, formou-se em Psicologia em 2009,

trabalha na área hospitalar desde 2007, teve a oportunidade de ter grandes mestres e soube

aproveitar as oportunidades. Nunca teve o sonho de ser psicóloga, mas assim como em todas

as suas vivências, co-construiu consigo e com o mundo a sua volta – leia-se pessoas, relações,

teorias e instituições – a dedicação e o amor pelo trabalho que faz.

Com formação em terapia familiar sistêmica, obteve a base e o entendimento de que

não existe o certo ou o errado, mas aquilo que funciona para cada indivíduo. Diante disso,

acredita em uma co-construção que ocorre a cada momento, com cada paciente, familiar ou

colega de equipe. Uma co-construção que permite reflexões sobre postura e comportamento

ético, profissional e pessoal.

Atualmente, trabalha em uma equipe de cuidados paliativos de um hospital particular

de São Paulo. Essa equipe é que a faz crer que é possível proporcionar e desenvolver uma

base segura para a unidade de cuidado e para os próprios membros que a compõe.

Rotineiramente são realizadas conferências familiares e são discutidos, em situações de

bastante emoção, objetivos de tratamento. Essa vivência e o cuidado que se tem para

conversar com os envolvidos sobre isso revela o quanto os comportamentos dos profissionais

podem contribuir para a prevenção do luto complicado – fato esse que pode ser confirmado

com as famílias nos atendimentos pós-óbito.

Esta pesquisa é resultado, principalmente, de experiências nas quais a autora teve de

ser assertiva, e às vezes nem tanto, para pontuar a importância de conversar com o paciente e

sua família sobre o tratamento instituído, e não apenas fazê-lo porque enquanto técnicos a

equipe entende o que é melhor. É preciso entender que em saúde trabalha-se com pessoas e

relações nutridas de significados. A autora acredita que quando o paciente e sua família

aceitam de coração o que está acontecendo, por meio de uma comunicação efetiva e afetiva,

de disponibilidade e paciência, o processo de luto conta com fatores protetores que podem ser

preventivos para o luto complicado.

O despreparo dos profissionais de saúde e as dificuldades pessoais diante da morte e

do processo de morrer retiram o direito do paciente e da família de expressar nesse momento

pensamentos, sentimentos, preferências, pendências que, por sua vez, estão diretamente

relacionados com o processo de luto (seja ele antecipatório ou pós-óbito do paciente). Sabe-se

que a educação para morte direcionada aos profissionais de saúde e, no caso, aos membros de

equipes multidisciplinares de cuidados paliativos, ocorre raramente. Dessa forma, é relevante

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e importante ter um olhar crítico em relação à formação desses profissionais, a fim de que

possam estar mais bem preparados para vivenciar e lidar todos os dias com o final de um

ciclo. Isso pode contribuir para uma melhor assistência ao paciente e à sua família no

processo de morrer, corroborando para a prevenção de lutos complicados.

Para fundamentar essa ideia, este estudo pauta-se nos estudos de Kovács (2003), que

fez uma revisão crítica sobre a formação dos profissionais de saúde (e ausência da preparação

para o processo de morte) e um levantamento detalhado sobre cursos que abordam o tema da

morte e do morrer, bem como na definição de cuidados paliativos desenvolvido pela World

Health Organization , contextualizando-a e associando-a aos argumentos de Saunders (1991),

representante principal do movimento hospice. Além disso, são utilizados os escritos de

Bowlby (1989, 1990) a respeito da teoria do apego, o modelo do processo dual de

enfrentamento do luto desenvolvido por Stroebe e Schut (1999), a concepção do luto como

um processo de construção de significado (GILLIES; NEIMEYER, 2006) e a questão da

manutenção de vínculos contínuos saudáveis (KLASS; WALTER, 2001).

16

1 OBJETIVO GERAL

O presente estudo pretende:

Compreender e analisar a formação dos profissionais que integram equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos acerca do processo de morrer do

paciente;

Compreender as percepções dos profissionais de saúde acerca de suas

contribuições para prevenção de luto complicado da unidade de cuidado.

1.1 Objetivos específicos

1. Investigar e analisar a formação dos profissionais de equipes multidisciplinares de

cuidados paliativos em relação aos processos de morrer e de luto;

2. Compreender e analisar a percepção que os profissionais de equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos possuem em relação à necessidade de

oferecer suporte e assistência à unidade de cuidado no processo de morrer do

paciente;

3. Identificar e analisar as estratégias utilizadas pelos profissionais de equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos em relação ao processo de morrer do

paciente;

4. Compreender e analisar a percepção que os profissionais de equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos possuem em relação à influência de sua

formação no processo de morrer do paciente e no luto de sua família.

17

2 CUIDADOS PALIATIVOS

Os cuidados paliativos tiveram origem no movimento hospice. A palavra hospice foi

usada em um primeiro momento para denominar os locais que abrigavam peregrinos e

viajantes, com o objetivo de lhes proporcionar conforto e cuidados. O Hospício do Porto de

Roma é considerado o hospice mais antigo (século V), onde Fabíola, que era discípula de São

Jerônimo, prestava cuidados a viajantes da Ásia, África e do Leste (CORTES, 1998). Tal

movimento tem como representante principal Cicely Saunders que fundou o St. Christopher´s

Hospice, em Londres, em 1967. A ideia de proporcionar cuidado e conforto é a base dos

cuidados paliativos, o qual estabelece uma nova forma de cuidar, baseando-se em dois

elementos fundamentais: o controle efetivo da dor e de outros sintomas decorrentes de

tratamentos de doenças em fase avançada e o cuidado que vai além da esfera física,

estendendo-se para dimensões psicológicas, sociais e espirituais do paciente e família

(MELO; CAPONERO, 2009). Tal linha de pensamento traduz o conceito de dor total,

formulado por Saunders em 1967, o qual acarreta um cuidar integral, que abrange as

dimensões citadas, assim como aspectos mentais e financeiros do paciente e da família

(SAUNDERS, 1991). Esse conceito vai determinar e dar o tom ao tratamento paliativo,

fornecendo um olhar não para o doente, mas para a pessoa, que tem uma história, uma

família, um trabalho, pontos de vista e significados de realidade, espiritualidade, desejos e

vontades, que devem ser respeitados, ideia essa que converge com o movimento da

humanização hospitalar. Dentre os objetivos dos cuidados paliativos, os cuidados com os

aspectos psicossociais apresentam-se como uma forma de minimizar a vulnerabilidade deste

momento, oferecendo suporte ao paciente, à família e à equipe, o que acaba por incentivar a

conexão entre os elementos dessa tríade para objetivos comuns e criação de significados

diante da situação atual (LOSCALZO, 2008). Por conseguinte, nos cuidados paliativos a

assistência é destinada ao paciente e à família, configurando-se como uma unidade de

cuidado.

A World Health Organization (WHO) (2004), em 2000, definiu os cuidados paliativos

enfocando uma qualidade de vida baseada principalmente na prevenção e no alívio do

sofrimento de pacientes que têm doenças ameaçadoras da vida, englobando as esferas de

ordem física, psicossocial e espiritual. Logo, os pressupostos que vão nortear essa dinâmica

afirmam a vida e encaram a morte como um processo natural. Sustentam não adiar nem

prolongar a morte, prover o alívio da dor e de outros sintomas, cuidando de forma integral do

indivíduo, oferecendo suporte para que os pacientes possam viver da forma mais ativa

18

possível e auxiliando cuidadores e família no processo de luto (SAUNDERS, 1991).

Sustentam o olhar para trás e observar, perceber, sentir aquilo que se construiu e o que não

pôde ser realizado. Proporciona o ressignificar de visões de vida, mundo e relações. A

apresentação dessa definição traz consigo não mais o objetivo de aceitar a morte, mas de

compreender o processo de morrer como o final de um ciclo. Assim, esses pressupostos que

vão nortear essa dinâmica afirmam a vida e encaram a morte como um processo natural.

Na década de 1990, a medicina experimentava o boom do avanço tecnológico

(máquinas de ventilação mecânica mais modernas, equipamentos de exames mais precisos,

novas medicações e drogas vasoativas) que propiciou diagnósticos precoces e,

principalmente, medidas de suporte de vida avançadas capazes de aumentar a sobrevida dos

pacientes. Esse contexto acabou por fomentar ainda mais nas equipes médicas o desejo de

cura dos pacientes, muitas vezes já fora das possibilidades terapêuticas curativas, mas ainda

assim submetidos a medidas invasivas de suporte de vida. Nesse sentindo, podemos nos

questionar sobre quem estava (e está) a serviço de quem: a tecnologia a serviço da medicina

ou a medicina a serviço da tecnologia? O que se observa muitas vezes é a segunda opção, pois

o médico confunde a possibilidade de agir, proveniente da técnica, com o dever de agir,

contextualizado por um sistema de valores que justificam todo um processo (FLORIANI;

SCHRAMM, 2008).

Logo, os cuidados paliativos eram a última escolha, instalados como conduta depois

de inúmeras tentativas de cura e prolongamento da vida, utilizados somente quando o paciente

estava na fase final da vida – os verbos estão no passado, porém esse ainda é um pensamento

presente e compartilhado por médicos e instituições, o que demonstra a inadequada utilização

desse tipo de tratamento visto ao que ele se propõe nos dias atuais. Tal inadequação, contudo,

muitas vezes é confirmada no exercício da prática diária, em que as equipes de cuidados

paliativos são solicitadas para avaliar e acompanhar o paciente já em fase final de vida. É

frequente e errôneo o pensamento de que cuidados paliativos são destinados apenas àqueles

pacientes em fase de terminalidade. Desmistificar essa ideia é obrigação dos profissionais da

área de saúde, de forma a não restringir os cuidados paliativos ao momento da morte, uma vez

que não atuam apenas na instalação dos sintomas estressantes e desconfortos, mas

principalmente na prevenção de tais eventos. Essa é uma possibilidade de agir na educação da

sociedade profissional e leiga.

Com base na definição da WHO para cuidados paliativos (2004), focados no alívio e

na prevenção de dor para uma boa qualidade de vida para o paciente e sua família, observa-se

que esses se fazem necessários logo na detecção da doença, juntamente com o tratamento

19

curativo (modificador da doença), e não apenas no final de vida (MELO; CAPONERO, 2009;

LANKEN et al., 2007). Dessa forma, desde o início do tratamento curativo, o paciente e sua

família passam a ter contato com a equipe de cuidados paliativos e à medida que a doença

crônica progressiva evolui e o tratamento curativo perde sua eficácia em controlá-la ou

modificá-la, os cuidados paliativos se tornam mais necessários, até figurarem como

exclusivos em virtude do quadro de incurabilidade (MACIEL, 2008; LANKEN et al., 2007).

Esse funcionamento propicia a construção de um vínculo de confiança entre a tríade paciente-

família-equipe, o que facilita e contribui para a articulação e o desenvolvimento de planos

estratégicos de assistência integral e contínua. Além disso, tal funcionamento causa um menor

sentimento de ruptura para o paciente e sua família quando passa do tratamento curativo

apenas para o paliativo, auxiliando na aceitação dessa nova conduta:

Para os pacientes, os membros da família e o time de cuidadores da saúde, a

Medicina de cuidados paliativos com sua perspectiva da pessoa como um todo é fio

de conexão altamente necessário de um sistema de cuidados da saúde altamente

técnico e fragmentado (LOSCALZO, 2008, p. 482, tradução da autora).

Vale ressaltar que esse modelo de funcionamento de cuidados paliativos não termina

com a morte do paciente. Ele se estende ao pós-morte, oferecendo suporte e apoio à família

no processo de luto (WHO, 2004; LANKEN et al., 2007), o qual corresponde a uma resposta

decorrente do rompimento de um vínculo (FRANCO, 2004).

Por conseguinte, a autora do presente estudo pontua que a forma como foi descrito

acima o funcionamento dos cuidados paliativos tem um caráter didático. No dia a dia,

observa-se que isso não é possível em razão de questões econômicas e da escassez de mão de

obra especializada, o que impede que uma equipe de cuidados paliativos acompanhe todos os

pacientes com doença crônica progressiva, ameaçadora e limitante da vida. Ocorre que a

equipe de cuidados paliativos entra no cenário quando já não há uma proposta de modificação

ou estabilização da doença, ou seja, quando o tratamento será conduzido em uma linha de um

cuidado paliativo mais exclusivo, no sentido de priorização de medidas de conforto. Nessa

perspectiva, serão discutidos e recomendados pela equipe objetivos de tratamento que visem o

conforto e as limitações terapêuticas para o paciente. A autora não ignora que, a depender de

contexto e da instituição, as limitações terapêuticas também podem ocorrer por causa da falta

de recursos, materiais, entre outros aspectos. Esta pesquisa, mais especificamente, trata de

discussões de cuidados paliativos e limitações terapêuticas elucidando o caráter fútil ou de

baixo ou nenhum resultado que determinadas condutas podem ter frente aos objetivos

propostos, como será discutido mais adiante.

20

Além disso, o exercício da prática mostra que os limiares entre um tratamento curativo

e um tratamento exclusivamente paliativo não obedecem à passagem de uma régua. O que

comumente se vê é um processo de transição para paciente, família e equipes. O próprio

cuidado paliativo exclusivo é bastante discutido e não há um consenso quanto à terapêutica:

alguns acreditam que o paciente deva receber apenas analgesia e retirada de sonda de

alimentação. Outros acreditam que o paciente deva receber medicação para controle de

sintomas, alimentação (via oral ou por sonda) e antibiótico. Contudo, não se está falando

apenas de medidas terapêuticas. A autora acredita que não há um consenso justamente porque

se particulariza o tratamento paliativo não de acordo com o diagnóstico e suas comorbidades,

mas de acordo com as preferências e os desejos do paciente e/ou família. Dessa forma,

sempre se tem diferentes cenários.

2.1 Cuidados paliativos e Bioética: implicações na tomada de decisão

Abordar cuidados paliativos e discutir sobre objetivos de tratamento para o paciente

que está internado no hospital é abordar e tratar de temas delicados como a morte e o morrer.

De acordo com Silva, Dias e Vitorino (2010), nessa fase é comum que a família experimente

sentimentos de impotência, ansiedade, angústia e tristeza. Nesse cenário, surgem outros

assuntos, tornando complexo todo o processo de tomada de decisão: comunicação, bioética e

limitação terapêutica, favorecendo a ideia de boa morte, que preconiza, além do

favorecimento de medidas de conforto, em vez de medidas invasivas de suporte de vida

avançado, uma morte sem dor, com os desejos do paciente respeitados (formal ou

informalmente); morte em casa, cercado da família e amigos, com pendências resolvidas e

uma boa relação entre a tríade paciente-família-equipe de saúde (EMANUEL; EMANUEL,

1998).

Dessa forma, paciente, cuidador familiar (família) e equipe são personagens de um

enredo que se emaranha na questão sobre a morte e o morrer, tendo como pano de fundo a

limitação terapêutica com objetivo de tratamento de conforto versus a obstinação terapêutica:

“Qual é o estado real deste paciente? A manutenção da vida garante qualidade de vida? O

avanço tecnológico deve ser utilizado indiscriminadamente?” (ZAHER, 2010, p. 176). O

Código de Ética Médica (2010) no Capítulo V, que trata da relação com pacientes e

familiares, tem em destaque, no artigo 31, a autonomia do paciente. De acordo com esse

artigo, é vedado desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir

21

livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de

iminente risco de morte. Isso é de suma importância para a tomada de decisões em cuidados

paliativos e fio condutor desse novo modelo de decisão compartilhada entre paciente-família-

médico, como a autora discutirá mais adiante.

Além disso, no artigo 41, o Código legisla que é vedado ao médico abreviar a vida do

paciente, ainda que seja a pedido dele ou de seu representante legal; em parágrafo único

pontua que nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os

cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou

obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua

impossibilidade, a de seu representante legal. Esse parágrafo traz à tona uma especificidade

relevante e usual dos cuidados paliativos inserida no contexto de tomada de decisões e que vai

agir sobre o impacto emocional do cuidador familiar: o fato de o paciente não estar apto para

tomar decisões por si (uma vez que está com as funções cognitivas prejudicadas em razão de

condições clínicas ‒ em coma ou com rebaixamento do nível de consciência). Logo, esse

cuidador assume o papel de substituto na discussão sobre o delineamento e objetivos de

tratamento, devendo guiar-se no sentido de respeitar os desejos, valores e preferências do

paciente, os quais são difíceis de acessar quando o paciente não está com suas funções

cognitivas preservadas (CARLET, 2004).

Ainda em relação ao Código de Ética Médica (2010), o qual cita as terapêuticas

obstinadas, entende-se por obstinação terapêutica a defesa da vida acima de qualquer coisa,

utilizando-se de forma persistente e continuada das mais diversas medidas invasivas de

suporte de vida, para pacientes com doenças avançadas, prolongando a manutenção dos sinais

vitais e consequente retardo da morte, caracterizando-se como um quadro de futilidade

médica, já que tais medidas apresentam-se com pouca ou nenhuma utilidade operacional

(SCHNEIDERMAN; JECKER; JONSEN, 1990). Por conseguinte, a futilidade deve ser

analisada não só pela sua ineficiência frente aos objetivos propostos, mas também pelos seus

possíveis danos. Vale acrescentar, contudo, que alguns autores pontuam a relatividade da

futilidade médica em muitos casos, frente à dificuldade de fechar prognóstico dos pacientes e

sobre o que seria qualidade de vida para eles. Além disso, deve-se destacar conflitos de

interesses entre as partes envolvidas que se agravam, principalmente, entre esferas de poder

de decisão, como a Medicina e o Direito (AMERICAN MEDICAL ASSOCIATION, 1999).

Com base nesses aspectos, a equipe de saúde deve levar em consideração os quatro

princípios básicos da ética médica, que constituem o que se denomina de principialismo: não

maleficência, beneficência, justiça e autonomia, os quais são guiados pela virtude da

22

prudência (SILVA; DIAS; VITORINO, 2010). De acordo com o Conselho Nacional de

Saúde, por meio da Resolução nº 196/96, a não maleficência defende que a ação do médico

sempre deve causar o menor prejuízo à saúde do paciente. A beneficência compromete-se

com o máximo de benefícios e o mínimo de riscos e danos. A justiça baseia-se em tratar o

paciente com base no que é moralmente correto e adequado. Logo, os recursos devem ser

distribuídos de forma equilibrada, objetivando alcançar com eficácia o maior número de

pessoas assistidas. Por fim, a autonomia, que prega o respeito às decisões tomadas pelo

indivíduo capacitado (CENTRO DE BIOÉTICA DO CONSELHO REGIONAL DE

MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO). Esses princípios não estão dispostos em uma

condição hierárquica, por isso ponderar cada um deles de acordo com a especificidade de

cada paciente, família e equipe é o mais adequado, o que caracteriza a decisão dos cuidados

paliativos como algo complexo, difícil para equipe e unidade de cuidado, carregado de

emoções em um momento que lhes exige razão.

Segre (2008) realiza uma importante discussão acerca dos princípios citados,

pontuando, antes de tudo, que a construção do princípio é precedida de uma tendência. Em

relação à beneficência e não maleficência, considera como uma diferenciação que ocorre no

sentido de tentar delimitar formalmente as responsabilidades e que depende de interpretações.

Além disso, acredita que ambos os princípios são resultado “do medo que se tem de assumir a

implementação dos próprios objetivos” (SEGRE, 2008, p. 36). A respeito da autonomia,

discorre sobre o caráter abstrato e subjetivo, não apenas racional, que ela pode ter. Por essa

razão, refere desistir de tentar conceituá-la, defini-la ou limitá-la para fins de estudo. Conclui

que a autonomia e a sua busca tão somente podem resultar da percepção da própria pessoa de

que há mais um caminho a seguir. A justiça, por sua vez, é percebida por Segre (2008) como

mais decorrente de uma moral social, da lei, do que da individualidade da pessoa.

Esse contexto de tomada de decisão em relação aos objetivos de tratamento gera

discussões interessantes no que diz respeito à autonomia do paciente na prática: quando foi

que o ser humano perdeu o direito sobre sua própria vida e o que fazer dela para ter de ter

formalizado e na bioética algo que lhe dê o direito sobre si mesmo? Aprofundando ainda mais

a legalização de um direito, que por si só é singular, único e dotado de significado específico

para cada um, pode-se citar a resolução do Código de Ética Médica 1995/12, a chamada

diretriz antecipada de vontade, que dá o direito ao paciente de escolher o que quer que seja e

não seja feito com ele na sua fase final de vida (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA,

2012).

23

Com base no que foi apresentado, questiona-se mais uma vez: o paciente tem essa

autonomia descrita pela interlocução da ética com a vida?

Dentre esse emaranhado de perguntas, com inúmeras respostas e relativizações, a

autora pontua que a diretriz antecipada de vontade traz consigo a possibilidade de o ser

humano assumir uma nova postura diante de sua vida e escolhas, o que traz traz impactos de

ordem política e econômica se se pensar em serviços de saúde e indústria farmacêutica, por

exemplo. Abre-se a discussão para que as pessoas possam falar abertamente sobre o morrer,

sem medo ou com caráter de morbidez. Logo, existe a possibilidade de uma mudança na

comunicação entre equipe e unidade de cuidado, de forma a se estabelecer uma relação

dialógica preocupada com o que foi apreendido e com a valorização das emoções, para que

assim o ser humano possa fazer suas escolhas e exercer sua autonomia (FRANCO, 2002a). A

autora deste estudo acredita em uma mudança antropológica do homem em relação à vida (já

que quando falamos de morte, falamos do que vivemos), na possibilidade de aproximar as

pessoas da sua própria finitude, tornando esse desconhecido momento de rompimento de

vínculo como algo mais natural, o que pode ser percebido como um fator de proteção para um

possível luto complicado.

Na perspectiva dessa discussão surgem, ainda, no âmbito da Bioética, motes como

eutanásia, distanásia e ortotanásia. A primeira, que provém do grego e tem significado de boa

morte ou morte digna, pode ser entendida como “o emprego ou abstenção de procedimentos

que permitem apressar ou provocar o óbito de um doente incurável, a fim de livrá-lo dos

extremos sofrimentos que o assaltam” (LEPARGNEUR, 1999, p. 43). Discute-se que a

eutanásia pode apresentar-se de distintas formas, em relação ao ato em si, como apresentado

em Zum Problem der Euthanasie, obra considerada um clássico de Neukamp (1937):

Eutanásia ativa: ato deliberado de provocar a morte do paciente, sem sofrimento.

Tem como base fins humanitários.

Eutanásia passiva: quando a morte é provocada em razão da omissão em se iniciar

uma ação médica que garantiria a perpetuação da sobrevida.

Eutanásia de duplo efeito: quando a morte é acelerada como consequência de

ações médicas que não visam ao êxito letal, mas sim ao alívio do sofrimento do

paciente (por exemplo, emprego de uma dose de benzodiazepínico para minimizar

a ansiedade e a angústia, gerando, secundariamente, depressão respiratória e

óbito).

24

A distanásia, por sua vez, é entendida como o prolongamento da vida, de forma

sofrida e inútil, por meio de procedimentos e intervenções que visam ao distanciamento da

morte (PESSINI, 2009). Essa perspectiva, converge com o avanço da tecnologia e da ciência,

a qual busca a cura a qualquer custo, isto é, a quantidade da vida, colocando em segundo

plano o paciente e sua história (idem, ibidem). Já a ortotanásia engloba a morte natural, no

tempo certo, sem antecipar ou prolongar a vida, respeitando o bem-estar geral do paciente,

garantindo-lhe dignidade no processo de morte. Converge com a ideia de cuidados paliativos

uma vez que proporciona condições e qualidade de vida na fase final, permitindo alívio do

sofrimento (físico, social, psicológico e espiritual) e proximidade de familiares e amigos junto

ao paciente. Em ambas as concepções, a morte não é percebida como uma doença a ser

curada, mas como o fim do ciclo vital (REIRIZ et al., 2006). Argumenta-se que a ortotanásia

é considerada a terceira via entre a eutanásia e distanásia, já que proporciona ao paciente

condições necessárias e importantes para a compreensão de sua finitude e preparação para

partir em paz (idem, ibidem). A discussão fica acerca de se os cuidados paliativos não seriam

um acelerar a morte, ou seja, se seriam uma prática de eutanásia, principalmente em razão do

uso da sedação paliativa. Para tanto, faz-se necessário pensar e discutir sobre os objetivos de

cada um: considera-se que a eutanásia ativa tem como finalidade exclusiva a morte. Os

cuidados paliativos, com atuação no final de vida do paciente, visam ao alívio do sofrimento

por meio da sedação paliativa quando todas as outras medidas de analgesia foram refratárias.

Observa-se que a intenção dos atos e os respectivos resultados são diferentes (EUROPEAN

ASSOCIATION OF PALLIATIVE CARE TASK FORCE, 2003).

No que tange à questão da sedação paliativa, vale destacar que devem existir critérios

para a administração da mesma e que não há uma medida específica da quantidade de

medicação a ser administrada. A quantidade utilizada será de acordo com a necessidade e grau

de dor e/ou desconforto do paciente. Argumenta-se que não é essa conduta que abreviará a

vida do paciente. Na realidade, pontua-se que essa é apenas uma escolha de como será o final

de vida: mais ou menos sofrido. Moritz (2011, p. 108) reafirma que a sedação paliativa é

procedimento justificável do ponto de vista ético-legal. No entanto, faz-se necessário

que sejam estabelecidos os critérios sobre as dosagens de medicamentos, bem como

os de sua correta aplicação. A sedação paliativa devidamente protocolizada

fundamenta a conduta dos médicos para salvaguardar a dignidade humana de seu

paciente no sentido de evitar um final de vida com insuportáveis sofrimentos. Os

pacientes devem ser mantidos sob vigilância contínua, para reavaliação de suas

necessidades.

A autora desta pesquisa elucida ainda, mais especificamente, uma discussão que surge

no dia a dia a respeito da diferença entre eutanásia passiva e tomada de decisão de limitações

25

terapêuticas: a não implementação ou utilização de determinadas condutas são pautadas,

como já citado anteriormente, no seu caráter fútil. O objetivo não é a morte do paciente, e sim

em não prolongar a vida de uma forma sofrida. Seguindo essa linha de pensamento, no que

diz respeito ao aspecto legal da ortotanásia, Torre (2011, p. 171) afirma, com base em

conceitos do sistema penal, que para a conduta do médico ser caracterizada como um

homicídio, por exemplo, é necessário que primeiramente haja “a possibilidade material de

evitar o resultado”. De acordo com o autor, o médico que suspender ou limitar procedimentos

que apenas prolongam a vida de um doente, já que a situação não será modificada e é

irreversível, não pode ser considerado como o causador da morte, ou seja, sua ação não pode

ser enquadrada no tipo de homicídio. Ele argumenta que as ações de suspensão e limitações

diante de um resultado sem possibilidade de modificação são caracterizadas como omissão de

assistência inútil e não eutanásia passiva ou eutanásia ativa. Para o autor, a omissão não é

considerada relevante para o direito penal e destaca novamente o caráter irreversível de

modificação da doença e inevitabilidade da morte.

2.2 Cuidados paliativos e comunicação

A discussão apresentada descortina um cenário que contém elementos referentes à

abordagem de cuidados paliativos e discussão de objetivos de tratamento e limitações

terapêuticas para o paciente internado em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), enfermaria ou

pronto-socorro (PS) com a unidade de cuidado. Antes iniciar esta discussão, contudo, faz-se

importante elucidar que no Brasil, no exercício prático diário, apesar de o paciente ter seu

direito à autonomia (quando suas funções cognitivas estão preservadas), muitas vezes, ele não

é consultado, de forma clara e transparente, sobre as condutas e preferências de tratamento.

Tal decisão é transferida à família e a seus representantes – enfatiza-se que neste estudo a rede

familiar é considerada aquela que não compreende apenas os membros consanguíneos ou

reconhecidos por lei, mas também aquelas pessoas com quem o paciente tem relação mais

estreita, como amigos e vizinhos, por exemplo (SOUZA, 2012). Tal fato acontece porque,

muitas vezes, o paciente já não goza de funções cognitivas satisfatórias para a tomada de

decisão ou por uma dificuldade da equipe e da família em tratar de tal questão com o paciente

que está consciente. Além disso, a literatura e os estudos sobre comunicação em cuidados

paliativos abarcam, em sua grande maioria, questões de satisfação da família em relação à

26

comunicação de más notícias, sendo sempre abordada a importância das conferências

familiares, que será discutida mais adiante.

De acordo com Forte (2009), muitas vezes o profissional de saúde não sabe como

abordar o paciente e a família sobre cuidados paliativos, ou teme fazê-lo, o que torna clara a

importância da comunicação e suas respectivas estratégias nesse momento. A capacidade de

se comunicar é entendida como uma habilidade do indivíduo em compreender as

circunstâncias e expressar de forma apropriada suas intenções (MORITA; TEI; INOUE,

2003). Trata-se de um processo que abrange a percepção, compreensão e transmissão de

mensagens por parte de cada sujeito envolvido. Tal processo pode ser expresso por meio de

signos verbais, escritos, gestos, sons, expressões, postura corporal que revelam pensamentos e

sentimentos (ARAÚJO, 2009). Por conseguinte, constitui-se como algo objetivo e expresso

concomitantemente a um processo subjetivo em que coexistem (e se complementam) as

linguagens verbal e não verbal. Na abordagem de cuidados paliativos inseridos no contexto de

tomada de decisões, o médico deve atentar não somente a dar informações técnicas e

objetivas, mas também ao seu tom de voz, ritmo do discurso, postura corporal, proximidade

física. Sua atenção também deve estar voltada para as formas de comunicação verbal e não

verbal utilizadas pela unidade de cuidado, pois isso propicia a percepção e compreensão de

medos, fantasias, angústias e sentimentos (SILVA, 2003), permitindo-o ser responsivo às

necessidades das pessoas, desenvolvendo, por sua vez, uma base segura com essa unidade de

cuidado. Logo, a comunicação tem influência direta no modo como a família sente e vivencia

o momento da hospitalização, e a depender de como a comunicação é desenvolvida, gera

menor ou maior sobrecarga sobre a família, o que acaba por reverberar, posteriormente, além

de outros fatores, na sua decisão em relação à aceitação de cuidados paliativos.

Um estudo realizado nos Estados Unidos, denominado SUPPORT (CONNORS et al.,

1995), foi um dos primeiros a chamar a atenção para a questão da comunicação. Tal pesquisa

entrevistou mais de 9.000 pacientes internados em hospitais universitários, com doenças

graves e avançadas, com o objetivo de avaliar preferências e comunicação entre médicos e

pacientes. Os resultados demonstraram que apenas 39% dos pacientes discutiram sobre o

prognóstico com seus médicos. Dentre os pacientes que não tiveram oportunidade de discutir

esse aspecto, 44% afirmaram que gostariam de tê-lo feito. Em relação à reanimação em caso

de parada cardiorrespiratória (PCR), 37% dos pacientes relataram ter discutido sobre tal

conduta com seus médicos; dos que não discutiram, 41% gostariam de tê-lo realizado. Por

fim, verificou-se que somente 47% dos médicos sabiam das preferências dos seus pacientes

27

em caso de PCR. Com base nesse estudo, muitas pesquisas sobre comunicação começaram a

ser realizadas na área médica, principalmente no que se refere a UTIs e cuidados paliativos.

Um estudo prospectivo realizado com 164 famílias de pacientes internados na UTI,

com o objetivo de correlacionar os níveis de satisfação da família com a percepção sobre a

forma como recebeu informações da equipe de saúde e com a assistência que o paciente

recebeu durante sua internação na UTI constatou que informações insuficientes determinaram

o descontentamento. A acessibilidade aos médicos foi verificada como determinante principal

de insatisfação, sendo associada a conflitos que dizem respeito a prognósticos. Logo,

constatou-se que a satisfação da rede familiar e sua compreensão acerca da UTI podem

melhorar com uma maior acessibilidade aos médicos e à equipe de saúde (FUMIS;

NISHIMOTO; DEHEINZELIN, 2008). Faz-se necessário acrescentar que o fato de a equipe

ser mais acessível às famílias, em relação as suas necessidades, emoções e dúvidas, contribui

para o desenvolvimento e a construção de um vínculo de confiança (SILVA, 2001) e base

segura.

A American Thoracic Society, com objetivos educacionais e prescritivos, desenvolveu

um estatuto a fim de auxiliar os profissionais de saúde na prática dos cuidados paliativos à

pacientes com doenças respiratórias e doenças críticas (LANKEN et al., 2007). Entre as

descrições feitas encontram-se as Competências de Comunicação e Relacionamento que o

profissional de saúde deve ter, desenvolver e se ater ao conversar e lidar com a família, com o

paciente e com a equipe: capacidade de se comunicar com empatia (CURTIS; WHITE, 2008)

e compaixão; capacidade para orientar a família durante as horas finais do paciente;

capacidade para ajudar a família durante o período de pesar e luto; capacidade para identificar

os valores do paciente, objetivos de vida e preferências em relação ao morrer; capacidade para

identificar as necessidades psicossociais e espirituais dos pacientes e familiares e recursos

para atender a essas necessidades; habilidade para trabalhar eficazmente em equipe

interdisciplinar; capacidade para aplicar a tomada de decisões éticas e legais em situações de

retenção ou retirada de suporte de vida avançado; usar o modelo de tomada de decisão

compartilhada com a família e outros representantes para pacientes sem capacidade de

decisão completa (CARLET et al., 2004).

Vale apresentar, da mesma forma, o Protocolo de SPIKES (BAILE et al., 2000), o

qual também vem sendo utilizado em larga escala como guia de orientação para a

comunicação de más notícias. Ressalta-se que apesar de ser um protocolo, o ato de

comunicar-se deve ser particularizado para cada unidade de cuidado e não ser rígido

(CURTIS; WHITE, 2008) convergindo para a necessidade e importância de construção de

28

vínculo de confiança e empatia nas situações de tomadas de decisões. Baile et al. (2000)

descreveram de forma didática seis etapas a serem cumpridas. A primeira etapa (Setting Up)

refere-se à preparação do médico e ao espaço físico para a reunião com a unidade de cuidado.

O segundo passo (Perception) preconiza a verificação da compreensão da unidade de cuidado

sobre o estado de saúde do paciente. A terceira etapa (Invitation) propõe entender o quanto a

unidade de cuidado quer saber sobre o quadro de saúde do paciente. O quarto passo

(Knowledge) é a transmissão da informação, sendo necessário atenção no sentido de utilizar

frases introdutórias que indiquem más notícias, não utilizar palavras técnicas em excesso e

checar a compreensão das pessoas. O quinto passo (Emotions) refere-se a responder

empaticamente às reações da unidade de cuidado. E por fim, a última etapa (Strategy and

Summary) revela o plano terapêutico para o paciente.

Abordar a rede familiar sobre cuidados paliativos e discutir objetivos de tratamento e

limitações terapêuticas para o paciente internado na UTI, enfermaria ou pronto-socorro faz

parte do novo tipo de relação que os médicos vêm estabelecendo com essa rede: a decisão

compartilhada. Diferentemente da relação paternalista, na qual o médico é o dono da verdade

e é quem decide sobre as condutas a serem seguidas sem atentar para opinião, desejos e

vontades de paciente e da família, o modelo de decisão compartilhada ou deliberativa sugere

uma conversa e discussão entre médico e família, de forma a levantar as opções terapêuticas

disponíveis e suas consequências em relação a valores e preferências do paciente e família,

buscando-se um consenso sobre o que é melhor para o paciente (CONNORS et al., 1995).

Além desses dois tipos de relações estabelecidas entre médico, paciente e família, vale

destacar a existência das relações denominadas de informativa e interpretativa: na primeira, o

paciente é visto como um cliente da assistência à saúde e o médico como especialista técnico,

o qual informará sobre riscos e benefícios de cada tratamento, cabendo ao paciente e ou à

família a decisão; já na segunda o médico tem papel de conselheiro, interpreta valores e

preferências de pacientes e famílias frente aos riscos e benefícios de possíveis tratamentos

propostos (FORTE, 2009).

Em cuidados paliativos, mais especificamente, muitos estudos têm sugerido que as

conferências familiares (relação deliberativa) são a melhor forma de abordar e conversar com

a família sobre objetivos de tratamento e limitações terapêuticas, pois promovem um

compartilhamento da carga de decisão e suporte à família (CARLET et al., 2004), buscando-

se sempre um consenso entre familiares e equipe. Tais conferências configuram-se como um

espaço aberto para escuta da família, sendo possível conhecer e compreender seus

pensamentos, sentimentos, medos, angústias e, a partir disso, responder a tais necessidades,

29

além de ajudar a promover o enfrentamento da situação – o que reverbera em segurança da

rede familiar em relação aos cuidados com o paciente e com a equipe. O processo de tomada

de decisão sobre preferências de tratamento em final de vida é complicado pelas emoções da

rede familiar levando em conta a natureza complexa da doença versus capacidade médica de

sustentar a vida (tecnologia). Faz-se necessário, portanto, que o profissional de saúde fale não

apenas do que será descontinuado ou retirado, mas principalmente, que informe sobre o que

será continuado, priorizando conforto e qualidade de vida do paciente (LANKEN et al.,

2007). Ressalta-se, não obstante, que muitas vezes a rede familiar deixa a cargo da equipe a

decisão sobre objetivos de tratamento e limitações terapêuticas, uma vez que não tem

condição emocional para decisões dessa magnitude. Nessa última circunstância, fica claro e

evidente que se estabeleceu uma base segura entre equipe e família.

Um estudo realizado a partir de conferências familiares sobre decisões de final de vida

para pacientes internados na UTI teve como objetivo medir o grau de satisfação das famílias

(HEYLAND et al., 2003). Para tanto, as conferências foram gravadas, medindo-se o tempo

que os familiares falavam e que o médico falava. Observou-se que as famílias saíam mais

satisfeitas das conferências nas quais o médico falava menos e escutava mais, provavelmente

porque conseguiam compreender melhor as opções de condutas disponíveis e satisfazer suas

necessidades. O grau de satisfação também acabou por se estender para a habilidade de

comunicação do médico.

Por conseguinte, a comunicação do médico para com a família deve ser clara,

empática, cortês, de compaixão e respeito – tais fatores estão associados ao nível de satisfação

das famílias em relação ao atendimento hospitalar para pacientes que morreram na UTI

(HEYLAND, 2003; PINHEIRO et al., 2010). Apesar da existência de protocolos para

comunicação de más notícias, é importante que a comunicação seja individualizada,

personalizada e adaptada para cada família (CURTIS; WHITE, 2008), considerando-se

cultura, religião, valores e a noção de que cada caso é um caso. O médico deve estar atento ao

que a família quer saber, como quer saber e o que é mais importante para ela no momento

(MEYER, 2004). Por fim, o médico deve atentar para seus comportamentos não verbais e ter

uma postura que valorize os sentimentos do familiar (BACK; ARNOLD, 2005), já que isso

promove uma maior abertura ao diálogo, estendendo-se para além do lógico e racional

(condutas), sendo mais empático à difícil situação em que se encontra a rede familiar. Uma

comunicação de más notícias comprometida, ou seja, em que o médico usa uma linguagem

técnica, não acessível, que não escuta a família e não valoriza seus sentimentos, por exemplo,

pode gerar estresse, ressentimentos e conflitos entre médico e família (HEYLAND, 2003),

30

este último, ocorrendo em até 48% dos casos (CARLET et al., 2004). Nesse sentido, destaca-

se que todos os fatores citados sobre comportamentos, habilidades e postura do médico

também contribuem para o estabelecimento do vínculo de confiança e para a construção de

uma base segura entre a díade família-equipe (SILVA, 2001).

A tomada de decisão da unidade de cuidado sobre objetivos de tratamento e limitações

terapêuticas ainda conta com outras variáveis. O estresse, a depressão e a ansiedade dos

cuidadores influenciam na sua habilidade de tomar decisões (CURTIS; WHITE, 2008;

POCHARD et al., 2001). Estudos relatam que a colaboração interdisciplinar entre os

membros da equipe está associada a um decréscimo dos sintomas da ansiedade e depressão

dos familiares, sendo um componente importante na comunicação com a família (CURTIS;

WHITE, 2008).

Novamente observa-se que a responsividade da equipe às emoções e necessidades da

família contribui para a construção de uma base segura que propicia um menor sentimento de

insegurança. Aspectos como tipo de doença, tempo que o paciente já vem enfermo e está

internado em hospital e UTI, cultura, religião, ciclo vital do paciente também são variáveis

pertinentes e que influenciam na tomada de decisão da família. Finalmente, vale ressaltar, que

independente da aceitação de cuidados paliativos e limitações terapêuticas estabelecidas, a

família deve ser abordada novamente sobre essa questão (CARLET et al., 2004; CURTIS;

WHITE, 2008), pois sua opinião pode variar de acordo com o prognóstico e evolução do

paciente. Pode-se observar tanto pacientes e/ou famílias que posteriormente aceitam o

tratamento, priorizam o conforto e as limitações terapêuticas, como aqueles que ficam em

dúvida se essas foram as melhores escolhas após as terem aceitado – esse modelo de decisão

compartilhada abre o discurso e permite novas configurações e revisitações, não sendo nada

estático.

2.3 Decisão compartilhada e a teoria do apego

Ainda nesse panorama da decisão compartilhada, pode-se discutir o apego adulto,

conceituado na teoria do apego de John Bowlby. De acordo com esse autor, na primeira

infância o comportamento de apego caracteriza-se pelas ações da pessoa em alcançar ou

manter a proximidade com um indivíduo específico e considerado como mais apto para lidar

com o mundo (BOWLBY, 1989). Logo, tenta-se buscar e usar esse indivíduo como uma

referência de base segura para explorar o desconhecido e como refúgio de segurança nos

31

momentos de medo (MAIN, 2001). Vale enfatizar que a criança está apegada ao seu cuidador,

mas esse não está de forma recíproca apegado a ela, isso porque o fim primário dessa relação

é atender às necessidade da criança. O apego adulto, por sua vez, é definido como a tendência

do indivíduo em fazer esforços importantes a fim de procurar, manter proximidade e contato

com uma pessoa ou pessoas específicas, que ofereçam potencial subjetivo para segurança

física e/ou psicológica (SPERLING; BERMAN, 1994) – diferentemente do apego de infância,

esse tipo de apego envolve maior reciprocidade. Essa tendência do adulto, de acordo com

Bowlby (1990), é regulada pelo que ele denomina de modelos operativos internos, que se

configuram como representações das experiências da infância relacionadas à percepção do

ambiente, de si mesmo e do outro. Esses modelos não são estáticos e imutáveis e podem ser

modificados e transformados a partir das experiências vividas; são construídos e se traduzem

em algumas crenças e práticas consequentes delas. Neles, o indivíduo conta para si mesmo

quais ferramentas e habilidades possui para lidar com as coisas da vida. Por conseguinte,

acabam por guiar o comportamento da pessoa em relação às pessoas e situações.

No contexto de compartilhamento de decisão sobre cuidados paliativos e objetivos de

tratamento e limitações terapêuticas para o paciente, os membros da rede familiar sentem-se

com sua segurança ameaçada, já que percebem esse momento como uma possibilidade de

morte iminente. Em razão das peculiaridades de estresse desse período, o apego adulto dessas

pessoas será ativado e a forma como ele se apresentará e se configurará vai variar de acordo

com o modelo operativo interno de cada um, correlacionado ao contexto das relações e pela

interação entre os indivíduos (SPERLING; BERMAN, 1994). Logo, pode-se pensar que

indivíduos com apego seguro, os quais tiveram suas necessidades atendidas na infância, se

sentido seguros e sabendo que tinham uma figura que fornecia proteção e segurança

(AINSWORTH, 1991), tornaram-se pessoas com um nível de organização maior, primordial

para a situação de tomada de decisão. Além disso, pode-se pensar que tais pessoas terão uma

tendência a serem mais empáticas e abertas às discussões com a equipe sobre a melhor

conduta a ser seguida em relação ao paciente. No caso de pessoas com o apego inseguro

ambivalente, ou seja, aquelas com um padrão de apego inseguro, caracterizado por situações

em que suas necessidades foram atendidas em alguns momentos, mas em outros não, o que

pode ter provocado falta de confiança em relação aos cuidadores, cuidados, disponibilidade e

responsividade (AINSWORTH, 1991), pode-se pensar em uma tendência à ambivalência em

relação às discussões com a equipe quanto aos cuidados paliativos. Em outras palavras, essas

pessoas apresentam-se mais desorganizadas, oscilando em relação à confiança na equipe,

procurando-a e escutando-a em alguns momentos, mas em outros afastando-se. Já para

32

aqueles com um padrão de apego inseguro evitativo, os quais não tiveram suas necessidades

atendidas na infância, tornando-se, muitas vezes, adultos autossuficientes (AINSWORTH,

1991), pode-se pensar em uma tendência a uma relação mais distante com a equipe. Esses não

estão claramente abertos às discussões sobre condutas, preferindo resolver por si mesmos as

questões em pauta. Por fim, para os indivíduos que têm apego desorganizado, os quais

tiveram experiências negativas durante o seu desenvolvimento na infância (fatores de risco,

como abuso ou maus-tratos, entre outros) (AINSWORTH, 1991) e que, na vida adulta, em

situações de estresse vivenciam um conflito sem conseguir manter a estratégia adequada para

lidar com a situação que os assusta (MAIN, 2001), pode-se pensar que eles têm um alto grau

de desorganização, incompatível com a situação de tomada de decisão, havendo uma

tendência a se mostrarem perdidos e sem referências da melhor conduta a ser tomada em

relação ao paciente.

33

3 O PROCESSO DE LUTO E SUAS IMPLICAÇÕES

Houve um tempo em que o nosso poder perante a morte era muito

pequeno. E por isso os homens e mulheres dedicavam-se a ouvir a sua

voz e podiam tornar-se sábios na arte de viver.

(ALVES, 1991)

A autora do presente estudo considera que definir, conceituar e discutir o luto é uma

tarefa difícil que exige explorar diversos âmbitos: a própria definição de luto e as discussões

acerca disso; o fenômeno do processo de luto e suas dimensões; os fatores de risco e proteção

para o desenvolvimento do luto complicado; a construção social que vem patologizando a

experiência do luto e a sua inserção no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos

Mentais, 5ª edição – DSM-V (2013); e as novas vertentes para o luto em relação a sua

vivência. Faz-se relevante sempre considerar tais questões em relação a um contexto

sociocultural e espiritual, uma vez que vão contribuir para a construção do significado da

experiência do rompimento de vínculo significativo.

Para discutir as definições de luto, a autora utilizou as discussões da literatura,

incluindo autores como Stroebe et al. (2008), cuja obra apresenta os termos bereavement,

grief e mourning. Compreende-se que o primeiro termo refere-se a uma situação objetiva de

perda de alguém significativo por morte e à própria vivência do processo de luto, sendo algo

mais amplo. Nesse sentido, discute-se como definir quando alguém é significante. O termo

bereavement está associado a um intenso sofrimento (distresss) para a maioria das pessoas.

Grief, por sua vez, é definido como uma reação emocional negativa e primária, no nível

afetivo, decorrente da morte de alguém que é significativo; tal reação envolve as esferas

cognitiva, social, cultural, bem como manifestações físicas. Os sintomas e comportamentos

devem ser considerados de acordo com a personalidade e cultura da pessoa, e podem ser

diferentes de uma cultura para a outra – o que é aceitável e considerado moralmente correto

em um grupo pode não ser considerado da mesma forma em outro grupo cultural. O termo

grief refere-se a uma reação normal e natural. Trazendo essa expressão para o português, a

autora o compreende como o pesar. Mourning é definido como uma expressão pública do

grief (pesar), que no entendimento da pesquisadora seria o luto em si. Envolve expressões

sociais, rituais de uma sociedade ou cultura (muitas vezes de cunho religioso). Contudo, nas

discussões acadêmicas, a autora teve o entendimento que grief e mourning representam a

34

mesma coisa (percebe-se como uma tradução equivocada do que Freud escreveu em “Luto e

Melancolía” [1917]): o processo de luto do indivíduo consigo mesmo, menos amplo que o

bereavement, ou seja, o que se vive e o que se expressa, respectivamente. De acordo com

Parkes (1998), a ansiedade da separação constitui-se como a dor do grief (luto), pois está

relacionada com o pesar e com a experiência que está sendo vivida.

3.1 O fenômeno do processo de luto e suas dimensões

De acordo com Bowlby (1990), o luto é a resposta à ruptura de um vínculo

significativo, no qual havia um investimento afetivo entre o enlutado e o ente que se foi,

elucidando que a dimensão do luto seja proporcional ao grau de apego, considerando-se

fatores relacionados a perda e seus significados. De forma semelhante, Parkes (1998)

conceitua o luto como uma categoria de respostas biopsicossociais que são esperadas quando

há uma perda significativa e rompimento de um vínculo. Diante desse cenário, o enlutado

vivencia uma série de mudanças relacionadas ao meio social, familiar, econômico, entre

outras, de maneira particular e singular, as quais vão estar associadas a como o enlutado

experienciou o processo (de doença, separação conjugal, mudanças geográficas etc.).

Desde a década de 1980 a conceituação do luto tem sido revisada, transcendendo a

esfera afetivo-emocional, mais comumente reconhecida. Observa-se o desenvolvimento de

uma maior consciência relacionada a questões sociais, acarretando modos particulares de

morrer, como morte por fome, por exemplo. Além do âmbito afetivo-emocional, o processo

de luto é composto por domínios que compreendem o cognitivo, o físico, o espiritual e o

social, os quais podem apresentar reações comuns ao luto, a saber (PARKES, 1998):

Domínio emocional: tristeza, ansiedade, medo, choque, raiva, solidão, alívio,

irritabilidade, culpa, negação, entre outros.

Domínio cognitivo: desconcentração, confusão, desorganização, intelectualização e

negação.

Domínio físico: alterações no sono, apetite e peso; choro, exaustão, perda da libido,

dispneia, boca seca, mudanças no funcionamento gastrointestinal.

Domínio espiritual: raiva de Deus, sonhos, perda ou aumento da fé.

35

Domínio social: isolamento, perda da identidade, falta de interação com o meio.

Por conseguinte, tal processo constitui-se como uma experiência subjetiva, ou seja,

dotada de significado, inserida em uma cultura e multideterminada (FRANCO, 2010). Falar

em múltiplos fatores que constituem o desenvolvimento desse processo e contribuem para que

ele ocorra é identificar o significado e ou função de determinada pessoa, animal ou coisa; o

tipo de relação e vínculo estabelecido; em caso de morte, a idade e o tipo de morte (naturais

ou esperadas, acidentais ou inesperadas e suicídios), se existe o corpo e se foi possível realizar

os rituais funerários significativos para a família; crises vitais do enlutado; como foi a

vivência durante o processo de rompimento (em caso de morte, separações conjugais ou

conflitos familiares, por exemplo); se recebeu apoio efetivo e afetivo; se existe algum recurso

espiritual (FRANCO, 2002b). Enfim, são variáveis que podem influenciar na forma como

esse luto será vivido e administrado e, por consequência, contribuir tanto para o

desenvolvimento do luto normal ou complicado.

3.2 Luto normal e luto complicado

A intenção neste estudo de discorrer e diferenciar um processo de luto normal de um

processo de luto complicado não está calcada na construção de um pensamento patológico

para o luto (como a autora argumentará no subitem 3.4 adiante), mas na importância de se

estar atento às pessoas enlutadas por morte em relação às suas organizações psíquicas,

cognitivas, sociais, entre outras, principalmente para a prevenção de desorganizações dessas

ordens, e não somente quando já estão instaladas. Por conseguinte, o levantamento dos

fatores de risco e proteção para o desenvolvimento do luto complicado, além de uma

avaliação clínica, faz-se relevante para uma visão integrada do indivíduo inserido no contexto,

se antevendo ao luto complicado, proporcionando intervenções precoces, bem como o

encaminhamento a serviços especializados, planejamento e desenvolvimento de ações

preventivas (SOUZA; MOURA; PEDROSO, 2010). Além disso, Bromberg (2000) e Ruschel

(2006) pontuam que a evolução do luto complicado pode vir a desencadear alterações no

bem-estar de saúde. Disso se destaca a relevância do tema e a necessidade da avaliação

psicológica como ferramenta de prevenção para as pessoas enlutadas. Rando et al. (2012)

seguem a mesma linha de raciocínio e confirmam o que vem sendo discutido neste estudo:

10% a 20% dos casos de luto não segue o curso normal de acomodação da perda, o que acaba

por criar desordens que merecem avaliação clínica (PRIGERSON, 2004).

36

Rando et al. (2012) discutem também que a existência de complicações no processo de luto

pode resultar em crescente morbidade física e mental, além de mortalidade. Afirmam que o

luto complicado é complicado e que não há apenas uma forma desse tipo de luto. Logo, o luto

complicado não pode ser reduzido a uma síndrome ou desordem. Eles acreditam que o

reconhecimento do luto dentro de uma categoria é útil, em uma categorização que reconheça

que entre o normal e o patológico há uma área cinza de sintomas e problemas que merecem

atenção clínica.

O luto normal, segundo Ruschel (2006), é o processo pelo qual o indivíduo

compreende e aceita a perda do ente querido, adaptando-se à condição de viver sem aquela

pessoa. Evidentemente, esse tipo de luto permite que o enlutado fique triste, chore, sinta

saudades. A questão não é não sentir a perda, mas como é ela é sentida e administrada. De

acordo com Stroebe et al. (2008), o normal grief pode ser definido como uma reação

emocional à situação de perda de alguém significativo, de acordo com as normas esperadas –

construídas culturalmente – (citadas anteriormente, nas repercussões do processo de luto nas

diversas dimensões), circunstâncias e implicações da morte.

Kovács (2010b), com base em Bowlby, ressalta que no luto saudável o indivíduo

aceita a modificação do mundo externo em virtude da perda definitiva do ente querido, assim

como a modificação das representações internas, reorganizando os vínculos que

permaneceram. Já o complicated grief não pode ser definido como algo homogêneo, pois

varia de uma cultura para a outra. De acordo com Franco (2002b), o luto complicado

caracteriza-se quando a pessoa experimenta uma desorganização prolongada que a impede de

não retomar suas atividades com a qualidade anterior a perda. Worden (1998) destaca

manifestações que podem estar presentes no processo do luto complicado: expressão de

sentimentos intensos que persistem mesmo muito tempo após a perda; somatizações

frequentes; mudanças radicais no estilo de vida que tendem ao isolamento; episódios

depressivos, baixa autoestima e impulso autodestrutivo. Nesse sentido, vale questionar quais

seriam os fatores de proteção e de risco para o desenvolvimento do luto complicado,

pontuando que os primeiros não isentam e não blindam o indivíduo de viver e sentir a morte

de um ente querido, porém podem auxiliar no sentido de tornar essa vivência um processo

razoável e saudável. Ressalta-se que os fatores de risco e proteção devem estar alinhados e

compreendidos a partir do contexto, da cultura, personalidade, função e do significado que o

indivíduo narra para si mesmo sobre tal acontecimento. Logo, eles podem variar de acordo

com as variáveis citadas, ou seja, um mesmo fator pode ser considerado de risco ou de

proteção. Além disso, mesmo que seja identificado um fator de risco ou proteção não significa

37

que ele necessariamente vai ter efeito no processo de luto, e sim que há uma possibilidade de

ser protetor ou complicador.

A relevância de tal indagação tem como base não só a prevenção do luto complicado,

mas também de transtornos psicológicos, alterações endócrinas e neuroendócrinas e alterações

psicofisiológicas (sono, apetite, nível de cortisol, mudanças comportamentais em relação ao

padrão anterior) que podem ser decorrentes daquele. Na Tabela 1, apresentada a seguir, estão

elencados os fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto complicado; já na

Tabela 2 estão relacionados os fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para

o desenvolvimento do luto complicado – tais proposições sugerem padrões, não certezas.

Novamente, ressalta-se que esses fatores podem variar de acordo com cultura, contexto,

personalidade e significado que o enlutado confere ao acontecimento.

Tabela 1 – Fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto complicado

FATOR POR QUÊ?

Apego seguro Pessoas demonstram maior organização e capacidade para integrar as (novas)

informações; tendem a ativar a resiliência.

Qualidade do vínculo Uma relação sem conflitos e sem pendências tem um potencial complicador menor.

Tipo de apoio (como é

percebido pelo

enlutado; avaliação

subjetiva)

Adequado, necessário, suficiente (FRANCO, 2002b) e comunicação entre membros

satisfatória. Configura-se como um apoio saudável e continente.

Realização de rituais Importante para o processo de separação e despedida; auxilia no fechamento do ciclo

(FRANCO, 2002b).

Luto antecipatório Permite despedidas, resolução de pendências, início da construção de novos

significados, identidades, relações (GILLIES; NEIMEYER, 2006).

Tipo de morte Morte por doença crônica, sem sofrimento, por exemplo, situação na qual as pessoas

tiveram tempo de se despedir do ente querido, de resolver questões e pendências.

Luto reconhecido pelo

enlutado e pela

sociedade

Valoriza a própria dor e a dor do outro, é empático. Importante decodificar o

significado do luto para cada um, ou seja, tornar um código comum entre o enlutado

e quem o rodeia, para que possa ter seu luto reconhecido. Permite que a pessoa viva

o processo de luto, ora orientada pela perda, ora para a reparação (modelo do

processo dual) (STROEBE; SCHUT, 1999) e a manutenção de um vínculo saudável

(KLASS; WALTER, 2001) sem necessariamente haver um rompimento definitivo.

38

Tabela 2 – Fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para o

desenvolvimento do luto complicado FATOR POR QUÊ?

Apego inseguro Pessoas mais desorganizadas e com contradições, sem encorajamento para

avaliar as situações e identificar que estratégia deve ser ativada. Como

consequência, acabam por repetir padrões comportamentais fracassados.

Qualidade do vínculo Relação com conflitos e pendências ou relação de dependência entre o

enlutado e o ente querido (BROMBERG, 2000) têm potencial complicador

maior.

Ciclo vital Morte de crianças e jovens (FRANCO, 2002b).

Tipo de apoio (como é

percebido pelo enlutado;

avaliação subjetiva)

Inadequado, abusivo, insuficiente (WORDEN, 1998; BROMBERG, 2000);

comunicação entre membros comprometida.

Tipo de morte

Morte repentina (PARKES, 1998; BROMBERG, 2000; FRANCO, 2002b),

violenta (PARKES, 1998; FRANCO, 2002b); doença aguda; suicídio

(PARKES, 1998; BROMBERG, 2000). Não permite despedidas, ajustes na

relação. Muitas vezes pensa-se no sofrimento da pessoa. Pode variar de acordo

com significado, por exemplo, o homicídio de um menino de 18 anos que

morava em um bairro violento e perigoso: caracteriza-se por uma morte

repentina e violenta, porém coerente com algo que podia acontecer nessa

realidade (isso relativiza o repentino).

Não localização do corpo Não há a possibilidade de realizar rituais que gostaria; dificulta a aceitação da

morte do ente querido.

Manutenção do vínculo de

forma idolatrada

Enlutado mantém vinculação com quem morreu com idolatria. Não vive o

processo dual de perda e reparação. Pode haver dificuldade para retomar

atividades anteriores com a mesma qualidade, de construir novos significados

a partir da nova configuração.

Condições prévias da

personalidade e saúde mental

do enlutado

Rígido, dificuldade de adaptação a condições novas, transtorno psiquiátrico

(depressão, por exemplo) podem ser fatores complicadores.

História de vida Enlutado que tem na sua história de vida perdas múltiplas e sucessivas

(WORDEN, 1998; BROMBERG, 2000).

Luto antecipatório Afastamento do ente querido com possibilidade de morte iminente, não

permitindo expressar sentimentos, resolver pendências; pode gerar culpa no

enlutado após a morte da pessoa.

Pessoa que morreu e

respectivo significado

Morte do cônjuge (BROMBERG, 2000). De acordo com Holmes e Rahe

(1967), em cujo estudo pontuaram eventos considerados estressores

(considerando as mudanças que ocorrem e os respectivos reajustes sociais), a

morte do cônjuge está em primeiro lugar como um evento estressor (100

pontos). A morte de um ente próximo está em quinto lugar (63 pontos). Isso

significa que tais rompimentos de vínculo podem ser fatores complicadores.

Luto não reconhecido ou não

franqueado pelo enlutado e

pela sociedade

Não há valorização da própria dor ou da dor do outro, havendo uma quebra de

empatia. Não permite que a pessoa viva o seu processo de luto. Quando o

enlutado é quem não reconhece o seu luto, ele está se defendendo disso.

A questão de gênero também entra nesse aspecto quando, por exemplo, existe

a convenção social de que o homem não pode chorar, o que impede uma maior

expressão de sentimentos por parte dele.

39

A resiliência também pode ser considerada um fator de proteção para o

desenvolvimento do luto complicado, pensando-a, principalmente, não só como uma

expressão de ação após a morte de um ente querido, mas antes disso. Nesse sentido, é

importante contextualizar a situação, as pessoas envolvidas, utilizando a resiliência como uma

estratégia: capacidade de se perceber, a partir das habilidades, a fim de criar alternativas

possíveis – depende da personalidade do enlutado, do seu senso de competência e se foi

desenvolvido um apego seguro. A flexibilidade e a criatividade são características importantes

na resiliência.

Além disso, uma observação crítica das tabelas apresentadas (tabelas 1 e 2) permite

vislumbrar uma sistematização dos fatores (complicadores ou protetores) que mostra-se como

de grande valia para o desenvolvimento da avaliação e discussão psicológica não só quando

há o rompimento de um vínculo significativo, mas também na sua iminência, pensando mais

uma vez no caráter preventivo do fenômeno do luto complicado.

Na continuidade da discussão a respeito do luto complicado, Parkes (1998) pontua que

esse apresenta reações diferentes daquelas consideradas “esperadas” (de acordo com normas

socioculturais de cada comunidade) ou quando estão ausentes. Esse autor identifica três

formas de luto complicado:

Luto crônico – manifestação das reações do luto em um período de tempo

prolongado e severo. Nessa situação, o enlutado sente-se incapaz de viver sem o

ente querido e não utiliza suas habilidades e competências. Indivíduo normalmente

se mantém em um aspecto do luto, podendo transformar tal situação em um estilo

de vida. Esse tipo de luto pode causar incômodo no meio familiar ou os familiares

podem manter essa condição colocando a pessoa como “a enlutada da família”.

Luto inibido – ausência de sintomas esperados no luto normal, não havendo uma

expressão pública de respostas emocionais relacionadas à perda (decisão

consciente e inconsciente).

Luto adiado – inibição das reações imediatas à morte, as quais são provocadas

mais adiante por situações que não teriam força para isso.

Observa-se, pois, que o processo de luto e a sua vivência permitem e exigem do

enlutado uma reconstrução da identidade e uma nova construção de significado, o que está

diretamente relacionado ao seu mundo presumido (sua construção no mundo), ou seja, há uma

ruptura de uma condição de segurança que vai exigir uma resposta adaptativa que o indivíduo

não gosta de ter. Isso coloca em cheque as competências e capacidades que ele tem para lidar

40

com o mundo (mundo presumido). A autora observa que a depender de como o indivíduo

responde (de acordo com o significado de tal perda) à situação de morte do ente querido, ele

pode ter um processo de luto normal ou complicado. Em uma situação como essa, de

desorganização inicial, a pessoa pode tentar ir em busca do conhecido, da homeostase, do

familiar. À medida que as tentativas são frustradas, já que não haverá reencontro ou volta da

configuração anterior, ela pode começar a dizer a si mesma que tal situação é maior do que

ela, de que não é capaz. Nesse momento, o indivíduo pode começar a adoecer.

Indicadores sobre a evolução do processo do luto são discutidos na literatura

(CASELLATO et al., 2009), o que pode facilitar a identificação do luto normal ou

complicado. Observa-se a diminuição da frequência e da intensidade de “ataques” de emoções

dolorosas; o processo de viver a perda e a restauração (modelo do processo dual [STROEBE;

SHUT, 1999]) – se o indivíduo está oscilando entre as duas esferas, se está mais na perda ou

mais na restauração; se está em uma condição de apresentar-se como “ser a dor” ou se está em

um processo de “ter a dor” (sente a dor na perda, porém retoma suas atividades anteriores com

qualidade semelhante) (ATTIG, 2001) e por fim, a própria condição do indivíduo no mundo e

sua relação com o morto – ou seja, se o ente querido vai deixando de ter um espaço menos

“central” na vida do enlutado ao mesmo tempo que esse consegue estabelecer a manutenção

de um vínculo saudável com a pessoa perdida.

3.3 Depressão, luto e luto complicado: semelhanças e diferenças

A depressão, de acordo com Del Porto (1999), pode se apresentar de três formas:

sintoma, síndrome e doença. Na primeira opção, a depressão surge em diversos quadros

clínicos, como estresse pós-traumático, alcoolismo, entre outros. Pode ainda ser resultado de

situações estressantes ou circunstâncias sociais ou econômicas adversas. Na síndrome, a

depressão inclui alterações de humor, cognitivas, psicomotoras, vegetativas e

neuroendócrinas. Como doença, pode aparecer como transtorno depressivo maior, distimia,

depressão integrante do transtorno bipolar tipos I e II, entre outros. A autora tratará aqui do

transtorno depressivo maior.

De acordo com o DSM, 4ª edição – DSM-IV (1995), para que o transtorno depressivo

maior seja identificado, o indivíduo tem que apresentar durante pelo menos um período de

duas semanas humor deprimido ou perda de interesse ou prazer, associados com mais quatro

sintomas da lista de nove ou mais três sintomas, caso os dois primeiros estejam presentes.

Observando o DSM-IV e a lista dos nove sintomas, pode-se notar que no caso do processo de

41

luto, o enlutado pode apresentar sintomas semelhantes (pensando que o luto não tem um

tempo determinado para cessar, se é que cessa), como humor deprimido e falta de interesse

por determinadas atividades, perda ou ganho de peso significativo, assim como aumento ou

perda de apetite, insônia ou hipersonia, fadiga ou perda de energia e dificuldade de

concentração. Destaca-se ainda que esse transtorno causa sofrimento clinicamente

significativo ou prejuízo ao funcionamento social ou ocupacional. Pode-se perceber que

muitos dos sintomas descritos podem ser identificados em pessoas enlutadas, principalmente a

tristeza, como discutiremos mais adiante. Logo, o “diagnóstico diferencial” não é algo fácil e

simples. Em primeiro lugar, é importante enfatizar que o luto complicado não se desenvolve

para a depressão. O que se pode ter é a presença do luto complicado concomitante a um

episódio de depressão. Pessoas com histórico de depressão anterior à perda (ou até mesmo

ansiedade) podem estar mais propensas a desenvolver depressão com o rompimento do

vínculo significativo (terreno favorável para isso). Para tal diferenciação, é preciso não apenas

atentar aos critérios do DSM-IV, mas também realizar uma avaliação clínica, ou seja, olhar

para o fator gerador (morte da pessoa), investigando como se deu a morte, o papel da pessoa

na vida do enlutado, o significado que esse dá para o evento, identificando, inclusive, os

fatores de risco para o luto complicado. Salienta-se que fatores de risco para o luto

complicado também podem ser observados em pessoas com depressão. Logo, é importante

observar se o fator gerador tem força suficiente para desencadear determinada reação no

indivíduo – nessa linha de raciocínio entram questões quanto ao gênero, construções culturais.

Assim como existem reações esperadas no luto, a depressão não pode ser um constructo

social?

Em relação à tristeza, que está presente no processo de luto normal, no complicado e

na depressão, é preciso fazer algumas considerações. Um estudo que abordou a função da

tristeza (FREED; MANN, 2007) levanta uma questão importante: qual é a função da tristeza

para o indivíduo? É um processo adaptativo presente no luto ou é até mesmo uma forma de

enfrentamento da perda? Se for adaptativo, quais as ações dos mecanismos psicossociais e

neurobiológicos? Novamente, como foi citado anteriormente, é preciso olhar para o sujeito,

no seu contexto, com o seu significado para a tristeza apresentada. Além disso, avaliar a

sintomatologia e a fenomenologia da tristeza. Na perspectiva do processo de luto, a tristeza é

um dos focos possíveis, pensando em uma construção cultural de que todos que perderam um

ente querido ficam ou tem de estar tristes. Mas o luto pode ter outras representações, como a

raiva ou agressividade, por exemplo. Logo, a análise da tristeza deve ser feita de forma

singular e única, assim como o processo de luto. Esse aspecto é importante, pois se ela for

42

identificada como uma resposta ao luto (normal ou complicado), deve ter um espaço para ser

expressa e trabalhada (FREED; MANN, 2007), por exemplo, com psicoterapia. Caso a

tristeza seja identificada como um sintoma de uma depressão, outras medidas, além da

psicoterapia, podem ser tomadas, de acordo com a necessidade, como o uso de medicações. É

importante desmistificar o tratamento farmacológico, pois muitas vezes ele se faz necessário

(em conjunto com um processo psicoterapêutico). O antidepressivo em casos de luto

complicado não surtirá o efeito esperado, uma vez que que as alterações neuroendócrinas são

distintas do que se observa em uma depressão.

3.4 A construção social da patologização da experiência do luto

O pesar, de acordo com Franco (2002b), constitui-se como um conjunto de

pensamentos e sentimentos relacionados à perda e que são vivenciados internamente (no

íntimo) pelo indivíduo. O luto, por sua vez, caracteriza-se pela exposição pública do pesar, ou

seja, a vivência no contexto sociocultural. Adentrar nessa questão contextual da sociedade e

da cultura é poder discutir sobre a questão da adequação, ou seja, dentro de um grupo familiar

ou grupo social, inseridos em uma cultura, dotados de crenças e valores, pode-se ter acesso a

como os membros do grupo lidam com crises, o que é esperado (comportamentos), a sua

duração. Constitui-se um processo que é vivido no individual e que extravasa e se expressa no

âmbito sociocultural.

Nesse sentido, pode-se citar DaMatta (1981), que no livro A casa e a rua diferencia os

espaços públicos e privados, considerando a rua como um lugar do anonimato e da

impessoalidade. A casa é considerada como o local onde as relações íntimas se desenvolvem,

com a presença da cordialidade – o autor também fala da importância dos rituais para cada

grupo social, de acordo com o significado para cada um, que, como foi citado anteriormente,

pode ser considerado um fator de proteção para um luto complicado. A autora relaciona essa

visão de DaMatta sobre os espaços com os processos do pesar e do luto: a casa como o pesar e

a rua como o luto. Considerando essa linha de raciocínio, percebe-se o quanto tem sido difícil

separar esses dois domínios (a casa da rua, o pesar do luto) e o quanto o espaço público

(contexto sociocultural) tem influenciado de forma negativa, muitas vezes, no processo do

luto das pessoas, visto, por exemplo, a inclusão do luto no DSM-V como transtorno do luto

prolongado. Tal classificação baseia-se na duração e intensidade do luto, negligenciando

outros aspectos desse processo, que não têm efeito apenas na esfera afetiva (como já foi

mostrado anteriormente). Por conseguinte, a classificação do luto como uma patologia

43

desqualifica e desvaloriza as outras dimensões do luto e o próprio contexto, tentando-se um

enquadramento de comportamentos considerados normais e patológicos na vivência desse

processo – mostra-se muito pouco culturalmente sensível. É como se estivessem sendo

criadas normas de como viver o processo de luto. Tal fato remete a autora a Foucault (1987),

que no livro Vigiar e punir discorre sobre o panoptismo, que é uma espécie de prisão, com

arquitetura específica, que permite vigilância contínua dos indivíduos, com o objetivo de

disciplinar. Há um controle social e pressão para que o luto seja vivenciado de determinada

forma e que dure determinado período. Pensando essa ideia na esfera do luto, observa-se que

as singularidades, particularidades e variáveis são negligenciadas.

Por conseguinte, observa-se que há uma tendência em patologizar o luto, percebendo-

o como um estado, e não como um processo, como destaca Parkes (1998, p. 23):

Parte da dificuldade de colocar o luto entre as categorias de doenças descritas deriva

do fato de ele ser um processo e não um estado. Não é um conjunto de sintomas que

tem início depois de uma perda e depois gradualmente se desvanece. Envolve uma

sucessão de quadro clínicos que se mesclam e se substituem.

O risco está em medicalizar a tristeza, não a reconhecendo como uma reação

emocional que pode acontecer e ser vivida quando da morte de um ente querido, isto é, a

tristeza é desqualificada, sendo percebida socialmente como algo ruim e que não deve ser

sentida. Logo, é importante ter uma visão mais crítica e detalhada sobre essa ideia simplista

diante de um fenômeno complexo e determinado por uma série de fatores.

Nesta discussão, faz-se relevante diferenciar tristeza de depressão. Como apresentou-

se anteriormente, a primeira pode ser considerada uma reação natural comum (esfera afetiva)

do processo de luto. A depressão, por sua vez, constitui-se como um transtorno que agrega

sinais e sintomas associados a uma patologia os quais, em seu conjunto, definem um

diagnóstico. A autora entende que a tristeza pode estar presente em um quadro de depressão,

porém em uma configuração de um sintoma, apresentando-se como um humor deprimido ou

desânimo, por exemplo.

3.5 Novas vertentes para o luto em relação a sua vivência

Com base nessas revisões sobre o processo de luto, entende-se hoje que, segundo o

modelo de processo dual (STROEBE; SCHUT, 1999), o luto deve ser vivido e orientado pela

perda e ao mesmo tempo orientado pela reparação, ou seja, concomitante à vivência da perda,

em que o enlutado lembre da pessoa, olhe fotos e roupas, retome suas atividades, retorne aos

44

ambientes em que circulava, em um processo de construção de significados (GILLIES;

NEIMEYER, 2006), em que há revisão da própria identidade, das relações pessoais e com o

falecido e até de crenças e valores (FRANCO, 2010). Logo, não é preciso romper o vínculo

definitivo com o ente que se foi, retirando objetos e lembranças; é possível ter um vínculo

contínuo saudável, por meio do qual pode revisitar retratos, recordações, músicas e situações

(KLASS; WALTER, 2001). Tal situação configura-se diferente de um processo de luto em

que o indivíduo cultua e vive como se o ente ainda estivesse vivo. Compreende-se que essas

vertentes propiciam a vivência do luto de forma individual e singular, contribuindo para a sua

não patologização.

A discussão a respeito da vivência do luto no contexto dos cuidados paliativos, mais

especificamente, traz consigo particularidades importantes: o luto antecipatório da equipe e

unidade de cuidado. O luto antecipatório permite que a pessoa viva e experimente a perda sem

ela ter ocorrido efetivamente. Nesse sentindo, propicia ao enlutado a possibilidade de refletir e

elaborar questões e escolhas da vida que têm um significado. Logo, permite as despedidas, a

resolução de pendências, o início da construção de novos significados, identidades e relações

(GILLIES; NEIMEYER, 2006). Conforme salienta Hudson et al. (2012), consonante com o

contexto e vivência dos cuidados paliativos, há uma exigência atual de diretrizes relacionadas

ao luto e suporte psicossocial nessa área em relação a orientação e educação sobre o luto para

a unidade de cuidado: alega-se que familiares que estejam física e emocionalmente bem têm

menos chances de ficarem hospitalizados, o que influencia no aspecto econômico do sistema

de saúde, e têm mais condições de cuidar dos entes doentes, sendo, pois, mais eficientes no

controle de sintomas quando o paciente está em acompanhamento domiciliar. Além disso,

familiares cuidadores tendem a ter prejuízos financeiros e a ficarem isolados, por isso a

importância do suporte psicossocial. O acompanhamento pós-óbito previsto nas diretrizes,

mais especificamente, prevê o planejamento de um plano de cuidados para os familiares e

atenção ao processo de luto. Isso possibilita que as pessoas, mesmo distantes da equipe de

saúde, possam autogerenciar as suas vivências e reconstruções. De acordo com Hudson et al.

(2012), garantir que as necessidades dos familiares sejam devidamente avaliadas está entre os

dez marcadores de qualidade de fim de vida.

45

4 FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM RELAÇÃO AO PROCESSO

DE MORRER E DE MORTE

Discutir a respeito de cuidados paliativos e luto é também abordar a questão do final

de vida de forma mais específica – atualmente se fala de cuidados paliativos e cuidados em

final de vida. Mas de que maneira dissertar sobre um dos maiores tabus da humanidade,

quando se valoriza o humano ativo, em vida, em transformação? Como sabiamente diz

Rubem Alves, falar de morte é falar de vida. Logo, de forma clara e não obscura, a autora

discutirá sobre a morte e o processo de morrer e o profissional de saúde diante disso – bem

como a influência dessa relação na assistência à unidade de cuidado, que é o foco deste

estudo. A autora não negligencia e compreende que o preparo do profissional em situações de

final de vida é importante para ele enquanto pessoa e na sua atuação associada aos seus

valores e crenças, levando em consideração, por exemplo, as doenças que podem decorrer da

atividade laboral, como burnout, quadros de depressão, ansiedade e dependência química.

Sabe-se que nos dias atuais, a morte, que no século XIX era considerada bela e um

sublime repouso, tal qual uma possibilidade de significar um reencontro com o ser amado, é

percebida como um fracasso, que deve ser escondida, ocorrendo, na maioria das vezes, em

instituições de saúde. Kovács (2010a, p. 39) afirma que

pacientes terminais incomodam os vivos e principalmente os profissionais de saúde

pelas suas atitudes, seja de revolta, de dor, ou de exigências, seja porque se viram

para a parede, dão as costas à vida, desistem de viver, ou melhor, de morrer aos

poucos.

Observa-se que o significado da morte e como ela é percebida, é um construto

sociocultural, político e por que não, econômico? Isso quer dizer que envolve leis, valores,

recursos humanos e dinheiro. A morte é igual para todos, mas a forma como ela ocorre não.

Mais do que isso, a morte, que é um processo, pode ser vivenciada de diferentes formas a

depender da classe social, poder aquisitivo, personalidade e tantas outras variáveis. Por

conseguinte, está-se falando de fatores extrínsecos e intrínsecos. Em relação às questões

internas, estudo realizado por Forte (2011), com médicos intensivistas das onze UTIs do

Hospital das Clínicas de São Paulo (HC-FMUSP) investigou as associações entre

características dos médicos e a variabilidade de condutas em fim de vida em UTI. Para tanto,

foram apresentados dois casos clínicos, nos quais os médicos eram solicitados a dizer o que

fariam e por que, sendo investigados também seus valores. Os resultados demonstraram que

idade, interesse e educação em cuidados paliativos estão relacionados à variabilidade de

46

condutas no final de vida. Constatou-se que 44% dos médicos agem de forma diferente

daquilo em que realmente acreditam, utilizando mais de suporte avançado de vida do que

julgam necessário, com receio de problemas de ordem legal. Nesse sentido, pode-se

questionar o quanto os profissionais de saúde estão preparados e orientados para lidar com a

morte, com o processo de morrer e as decorrências do mesmo no seu dia a dia, e o quanto, em

suas formações, foram munidos de conhecimento e experiência para lidar com tais situações.

Esses questionamentos convergem com indagações relacionadas aos processos de educação e

à necessidade de tal conhecimento. Afinal, educação para a morte beneficiará quem? Quais

instituições da vida? Qual é a sua importância e influência na vivência de doenças,

tratamentos e hospitalizações?

O espectro alcançado (e que vem alcançando) pelos cuidados paliativos e cuidados em

final de vida compeliu a necessidade de diretrizes que guiem os cuidados. No Brasil, mais

especificamente, um fato alarmou a sociedade, confirmando mais uma vez a necessidade

desses tipos de sistematizações. Pesquisa realizada pela consultoria Economist Intelligence

Unit e publicada pela revista The Economist, em 2010, coloca o Brasil em 38º lugar em um

ranking de 40 países quando o assunto é qualidade de morte. O país fica à frente apenas da

Uganda e da Índia, ou seja, somos comparados a países que têm poucos recursos (The

Economist, 2010). O Reino Unido, por sua vez, que tem uma cultura bastante forte em relação

aos cuidados paliativos, está em primeiro lugar no ranking. O que está faltando então?

Políticas públicas e, consequentemente, educação em cuidados paliativos e final de vida,

acredita a autora; isto é, compreender o que é uma morte humanizada, digna, sem sofrimento

a partir do outro, por isso a importância de ouvir a unidade de cuidado (PINHEIRO et al.,

2010). No que tange ainda às diretrizes, principalmente àquelas relacionadas a suporte

psicossocial e de luto (citadas anteriormente), não existe nada formalizado como o melhor

modelo a seguir, porém há uma crescente atenção relacionada a esses aspectos. A exemplo

disso, pode-se verificar as diretrizes de suporte psicossocial e de luto para cuidadores

familiares de paciente em cuidados paliativos desenvolvidas por um grupo de pesquisadores

australianos, que contaram com um criterioso método de investigação, incluindo o processo

Delphi, análise de especialistas do mundo inteiro, entre outros. Ao todo são vinte diretrizes,

sendo dez diretamente relacionadas à preparação para a morte e ao suporte no processo de

luto (antecipatório e pós-óbito) (HUDSON et al., 2012). A elaboração de tal documento é

mais uma confirmação da necessidade ascendente de preparo dos profissionais de saúde em

relação ao processo de morrer do paciente.

47

No que tange à formação dos profissionais de saúde em relação ao processo de morrer,

Kovács (2003) pontua, principalmente na área médica e da enfermagem, uma maior

valorização do saber técnico em relação à formação humanista, o que afasta o tema da morte

como foco de aprendizado. Outros estudos confirmam isso. Pesquisa realizada no Rio de

Janeiro (LIMA; BUYS, 2008) analisou a opinião de alunos dos últimos períodos dos cursos

de Enfermagem, Medicina e Psicologia com relação ao preparo deles para lidar com a morte e

a participação da formação nesse manejo. Além disso, avaliaram-se as grades curriculares e a

presença do assunto nas disciplinas. Constatou-se que o tema da morte é pouco abordado na

formação desses profissionais e que a graduação contribui de forma escassa para o preparo na

morte e morrer do indivíduo. O levantamento da literatura científica dos últimos cinco anos

sobre o tema da morte na formação da Enfermagem também foi objeto de pesquisa

(SANTOS; BUENO, 2011). Os resultados demonstraram que os discentes não são preparados

para lidar com a morte do seu dia a dia. Outro estudo que converge para o que tem sido

apresentado realizou um monitoramento da formação acadêmica do aluno do curso de

Enfermagem da Universidade Federal do Maranhão (GURGEL; MOCHEL; MIRANDA,

2010). Constatou-se que existe uma formação voltada para o tema da morte, porém é

considerada insuficiente, sendo necessário um aperfeiçoamento na prática profissional. Tal

pesquisa apresentou um argumento interessante: o afastamento acadêmico da tanatologia pode

ser reforçador de práticas supersticiosas e obstinadas. Essa análise pode ser associada ao que

Forte (2011) traz quando verifica que a variabilidade de condutas em final de vida em relação

a suporte avançado de vida está relacionada à educação em cuidados paliativos. Essa visão

elucida a importância de se ter conhecimento sobre futilidade terapêutica e práticas

obstinadas.

No encontro dos resultados citados previamente, estudo realizado com profissionais

que atuam em UTI, para avaliar o preparo e formação quanto aos cuidados paliativos

(MACHADO; PESSINI; HOSSNE, 2007), revelou que se faz urgente a inserção desse tema

nas grades curriculares, o que permitirá e auxiliará reflexões sobre questões de final de vida e

bioéticas para a melhor tomada de decisão sobre objetivos de tratamento e limitações

terapêuticas frente a pacientes com doenças/condição crônica progressiva e limitantes da vida.

Em relação à Psicologia, esta se aproximou da temática da morte ao ser inserida no

trabalho em hospitais, postos médicos, escolas, organizações, emergências e situações de

catástrofes que têm atingido os seres humanos (KOVÁCS, 2003).

Atualmente, ainda segundo Kovács (2003), existem alguns cursos no Brasil e no

exterior direcionados a psicólogos, assim como alguns laboratórios de estudos e pesquisas

48

sobre morte e luto, como por exemplo o Laboratório de Estudos sobre o Luto (LELu), na

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e o Laboratório de Estudos sobre a

Morte (LEM), na Universidade de São Paulo. Ainda de acordo com essa autora (KOVÁCS,

2005; KOVÁCS, 2008), a educação para morte direcionada a profissionais de saúde deve

contemplar os seguintes aspectos:

Sensibilização para que o aluno atente para sentimentos e pensamentos

relacionados a temas abordados no curso.

Variedade de abordagens teóricas que tratem do tema da morte.

Reflexão sobre a prática profissional, associando aspectos cognitivos e

afetivos, na busca de significados individual e coletivo.

Em relação aos cuidados paliativos, mais especificamente, são escassos os estudos

sobre educação para morte direcionados aos profissionais que compõem a equipe. Kovács

(2003) afirma que em relação aos trabalhos na área de Psicologia ocorre o mesmo. Em razão

disso, em 2000, já escrevera sobre o trabalho do psicólogo em cuidados paliativos, baseando-

se no trabalho profissional em hospitais, com pacientes gravemente enfermos e próximos da

morte, pontuando como um dos principais objetivos de trabalho a facilitação no processo de

comunicação. Faz-se importante pontuar que uma equipe preparada para o processo de morrer

do paciente constitui-se como um fator de proteção para um luto complicado da unidade de

cuidado.

Outros estudos demonstram a preocupação atual com a melhoria da educação em

relação aos cuidados paliativos e em final de vida. Uma revisão realizada por Block (2002)

identifica as abordagens que podem ser utilizadas para melhorar as deficiências reconhecidas

na educação formal e informal: desenvolvimento de líderes em cuidados paliativos, melhora

dos currículos, criação de padrões e processos de certificação de competências, criação e

melhora dos recursos educacionais para educação em final de vida, desenvolvimento do corpo

docente, novos espaços para educação, melhora dos livros-texto e bolsas de estudo para

cuidados paliativos.

Para finalizar, um artigo traz um levantamento de projetos que têm se desenvolvido

com o intuito de melhorar a aplicação dos princípios dos cuidados paliativos e cuidados em

final de vida (GRANT et al., 2009):

End-of-life Nursing Education Consortium (ENNEC): iniciativa nacional de

educação que visa melhorar o cuidado de final de vida nos Estados Unidos.

49

The Education for Physicians on End-of-life Care (EPEC): designado para a

prática dos médicos, no sentido do desenvolvimento de competências necessárias para um

manejo efetivo no cuidado de final de vida.

Disseminating End-of-Life Education to Cancer Centers (DELEtCC): projeto

educativo para melhorar os cuidados paliativos e os cuidados de final de vida, treinando

equipes interdisciplinares de centros de câncer.

50

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para compreender a complexidade da construção dos significados e as percepções dos

profissionais de saúde, as relações com o contexto no qual se produzem, valores e crenças, foi

utilizado o método qualitativo nesta pesquisa. Embora o instrumento básico tenha sido a

entrevista semiestruturada, ressalta-se que a pesquisadora não se limitou a ela, já que em

diversos momentos houve uma co-construção de novos questionamentos, que surgiram a

partir da resposta do participante, a qual acabava por perpassar pela experiência da autora na

área. Como aponta Minayo (1994, p. 21), a pesquisa qualitativa “trabalha com o universo de

significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço

mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à

operacionalização de variáveis”.

5.1 Participantes

A amostra por conveniência foi utilizada para a escolha dos participantes da pesquisa e

foi constituída por profissionais da área de saúde que integram formalmente equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos.

O critério de exclusão foi o profissional não integrar formalmente equipes

multidisciplinares de cuidados paliativos. Vale ressaltar que não foram entrevistados

profissionais que estivessem trabalhando na equipe da autora desta pesquisa, em atenção ao

cuidado de não enviesar o estudo. O acesso aos entrevistados foi feito por meio da rede de

contatos profissionais da autora. Elucida-se que encontrar pessoas que integrem equipes de

cuidados paliativos não é uma tarefa fácil, visto que tais equipes ainda são escassas e muitas

vezes não são formalmente constituídas, ou seja, muitos profissionais não são exclusivos das

equipes e acabam por formar um apoio. Disso decorreu a dificuldade de entrevistar

profissionais de certas especialidades. O intuito de entrevistar apenas pessoas que integrassem

formalmente equipes de cuidados paliativos teve o objetivo de observar e perceber a

particularidade de quem trabalha e vivencia esse dia a dia.

51

5.2 Estratégias para obtenção de respostas dos participantes

De início, utilizou-se como instrumento um questionário autoaplicativo (Apêndice A)

referente a dados acadêmicos, profissionais e principais cursos realizados pelo profissional.

A seguir, a fim de apreender a complexidade do nosso objeto de estudo, realizou-se

uma entrevista semiestruturada (Apêndice B), registrada em gravação sonora, que permitiu

“enumerar de forma mais abrangente possível as questões que o pesquisador quer abordar no

campo, a partir de suas hipóteses ou pressupostos, advindos, obviamente, da definição do

objeto de investigação” (MINAYO, 1994, p. 121). A pergunta disparadora da entrevista

solicitou que o profissional relatasse o histórico de sua formação e sua trajetória profissional

(incluindo entrada na equipe de cuidados paliativos), acreditando que essa questão inicial

poderia proporcionar ao participante o contato com suas percepções acerca do seu trabalho

nos cuidados paliativos e com o processo de morrer do paciente e a importância disso para a

prevenção do luto complicado da unidade de cuidado. A partir disso, os tópicos em pauta ao

longo da entrevista foram: formação profissional e cursos realizados, principalmente em

relação ao processo de morrer; a escolha por trabalhar em cuidados paliativos; as estratégias

utilizadas (em relação a si mesmo e para com a unidade de cuidado) no dia a dia para lidar

com a questão do processo de morrer e a percepção sobre sua contribuição para prevenção de

luto complicado da unidade de cuidado.

Deve-se enfatizar que a entrevista semiestruturada não foi seguida de forma rígida e

que serviu apenas como um fio condutor, o que proporcionou maior liberdade para

entrevistador e participante.

5.3 Estratégias para compreensão das respostas dos participantes

A análise das respostas passou pelas seguintes etapas: transcrição das entrevistas, que

foi produzida de forma fidedigna e literal, com o intuito de poder compreender a construção

dos raciocínios e percepção das emoções. Além disso, é importante frisar que houve sigilo

completo quanto ao nome dos entrevistados, cidades e instituições de ensino e trabalho,

utilizando-se de iniciais correlacionadas à profissão de cada um. A seguir, foi realizada pré-

análise, seguida da categorização a partir de nove temáticas pré-estabelecidas, advindas da

literatura e experiência da autora nesse campo de atuação. Não obstante, a pesquisadora não

52

se limitou a essas temáticas, na medida em que permitiu que pudessem surgir categorias

emergentes:

Formação, trajetória acadêmica profissional, entrada da equipe de cuidados

paliativos

Conferências familiares

Atuação da especialidade nos cuidados paliativos

Atuação e contribuições da especialidade no processo de morrer

Percepção sobre a influência de sua atuação no processo de morrer do paciente em

relação à unidade de cuidados

Compreensão sobre o luto

Estratégias criadas e utilizadas no dia a dia

Significado de boa morte

Histórias pessoais relacionadas ao tema de cuidados paliativos

Posteriormente foram feitos o tratamento e a interpretação dos resultados. Foi utilizada

a análise de conteúdo, que se constitui como “[...] um conjunto de técnicas de análise das

comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo

das mensagens” (BARDIN, 2002, p. 38). Tais procedimentos permitiram conhecer o

significado das palavras dos profissionais de saúde e extrair os significados presentes na

comunicação.

53

6 PROCEDIMENTOS ÉTICOS DA PESQUISA

Os participantes foram convidados e lhes foram esclarecidos objetivos da pesquisa,

procedimentos, riscos e benefícios envolvidos, bem como aspectos relacionados à gravação da

entrevista e sua posterior transcrição, a fim de garantir a fidedignidade do conteúdo fornecido.

A participação foi voluntária, bem como o sigilo em relação às suas identidades. Foi também

informado ao participante o direito de interromper a participação na pesquisa. Todos

receberam um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Apêndice C), mediante

a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo (PUC/SP) (CAAE 01402912.5.0000.5482).

Após o encerramento de cada entrevista, foi oferecido ao participante um espaço

psicoterapêutico, caso necessário. Apenas um participante sentiu necessidade, sendo

amparado conforme acordado.

54

7 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na apresentação deste capítulo, como citado anteriormente, a autora discorreu sobre as

temáticas utilizadas na categorização de forma livre, relacionando-as umas com as outras,

sendo coerente com a complexidade do objetivo do estudo proposto, além de possibilitar e

proporcionar reflexões e questionamentos.

De início, a avaliação sistemática da formação dos profissionais e cursos realizados,

permitiu observar o seguinte:

Assistente social: conclusão do curso superior em 1978; especialização em Saúde

Pública e em Serviço Social comunitário/psiquiátrico; mestrado em andamento;

histórico profissional em instituições hospitalares.

Enfermeira: conclusão do curso superior em 2010; antes da formação superior era

técnica de enfermagem; histórico profissional em instituições hospitalares.

Farmacêutica clínica: conclusão do curso superior em 2004; especialização em

farmácia clínica e hospitalar; pós-graduação em farmacologia clínica; curso de

oncologia pediátrica; curso de atuação farmacêutica com foco no paciente;

histórico profissional em duas drogarias e três instituições hospitalares.

Fonoaudióloga: conclusão do curso superior em 1992; aprimoramento em

fonoaudiologia hospitalar; especialização em cuidados paliativos no exterior;

formação em cuidados paliativos no Brasil; docente em curso de especialização de

motricidade oral; histórico profissional em instituições hospitalares.

Médica: conclusão do curso superior em 1997; pneumologista, com doutorado na

área; especialização em cuidados paliativos no exterior; curso de docência em

cuidados paliativos; preceptora em pronto-socorro oncológico; histórico

profissional em instituições hospitalares.

Musicoterapeuta: conclusão do curso superior em psicologia em 1996; mestre em

musicoterapia; especialização em luto; sócia de uma organização não

governamental (ONG) direcionada a cuidados paliativos; docente de cursos de

cuidados paliativos na ONG; histórico profissional em instituições hospitalares e

atendimento clínico ambulatorial.

Psicóloga: conclusão do curso superior em 1997; especialização em psicologia

hospitalar; pós-graduação em psicologia hospitalar; mestre em gerontologia; curso

sobre educação para a morte; docente em curso de cuidados paliativos.

55

Com base no que foi apresentado, pode-se destacar algumas considerações,

relacionando-as com a trajetória profissional e ingresso dos participantes em equipes de

cuidados paliativos, como de discutirá mais adiante.

Os entrevistados foram unânimes em revelar que na graduação não tiveram ou tiveram

muito pouca informação sobre cuidados paliativos e processo de morrer do paciente, como

pode-se observar nas transcrições apresentadas a seguir, havendo privilégio para a abordagem

tecnicista, o que converge para o que foi constatado na literatura.

(...) porque sempre na minha prática eu atuei muito com crianças em terminalidade (...) mas

a fonoaudiologia não te dá essa formação... você aprende técnica: técnica pra reabilitar a

voz... técnica pra reabilitar a linguagem... técnica pra reabilitar a disfagia (...) Nunca tive...

nada... nada... porque nós somos clínicos... a nossa formação é reabilitação...(...)

(F., fonoaudióloga)

(...) fiquei um ano como enfermeira... na UTI... e aí... ia se implantar aqui no E1... os

cuidados paliativos... né... que eu não tinha nem... assim... tinha tido uma aula apenas de

cuidados paliativos... durante a graduação... tinha uma ideia do que era... mas não tinha

nenhum contato mais profundo com... com cuidados paliativos...

(E., enfermeira)

(...) na graduação eu não tive nenhuma abordagem de cuidados paliativos... e sobre morte...

morrer... também não... minha graduação foi muito tecnicista... muito voltada pra indústria

farmacêutica... né...até a minha pós-graduação... eu também não tive muito... essa

abordagem assim... na parte morrer...

(FA., farmacêutica clínica )

Se eu tive foi muito pouco... foi pouco né... foi pouco porque... não abordava esses temas

especificamente... na psiquiatria alguma coisa de luto complicado (...) mas assim... mais

especificamente na graduação... pouquíssimo (...) depois na residência... nada... nada... eu

me lembro de situações dificílimas na enfermaria de pneumo...

(ME., médica)

Na minha formação eu não tive NADA...NADA (...) o fracasso na faculdade não era muito

abordado... né... e a morte como vista como um fracasso... menos ainda... na especialização

56

de Psicologia Hospitalar... eu vi... os paciente morriam... né... mas eu também eu não tive

nenhuma aula durante a especialização muito específica sobre isso...

(P., psicóloga)

Em relação a educação e cursos sobre cuidados paliativos e o processo de morrer do

paciente, a musicoterapeuta revelou que na ONG, da qual é sócia-fundadora e docente,

existem cursos voltados para essas temáticas que surgiram da necessidade e demanda,

principalmente dos recém-formados, que não sabem como fazer cuidados paliativos.

Todos os profissionais iniciaram suas atividades em unidade gerais e o contato com

pacientes graves e em fase de final de vida foi o que acabou conduzindo-os para os cuidados

paliativos. Essa questão ilustra o que foi discutido na introdução, quando se argumentou sobre

a prática dos cuidados paliativos no Brasil: na maioria das vezes iniciado em um processo de

final de vida do paciente e não concomitante ao diagnóstico e no curso na doença. Isso

também é demonstrado e confirmado por Azoulay et al. (2012), os quais destacaram que na

Europa os cuidado paliativos são realizados em sua maioria na UTI, ou seja, com pacientes

graves e em risco de vida, visto que não há muitos especialistas que praticam cuidados

paliativos (dentro e fora da UTI). Inseridos nesse contexto de pacientes gravemente enfermos,

verificou-se na presente pesquisa que alguns dos participantes já praticavam cuidados

paliativos, porém sem identificar a prática como tal. Eles relataram que o contato com demais

colegas da área de saúde foi o que os auxiliou na identificação da sua prática como sendo de

cuidados paliativos, como se pode constatar por meio das transcrições que seguem:

Nessa minha entrada nos hospitais que eu fui tendo na minha vida... aquilo me angustiava

muito... né... lidar com a morte... crianças que eram irreversível (...) atendi muitos anos em

homecare (...) e eu levava músicos pra ir tocar comigo porque era uma forma de trabalhar a

linguagem... de provocar um bem-estar... de ter uma qualidade de vida (...) e aí em 2007

quando eu fui fazer o curso no exterior... eu falava (...) tem nome o que eu faço... eu não sou

uma louca (...)

(F., fonoaudióloga)

(...) o meu primeiro contato com cuidados paliativos foi quando eu trabalhei na FA1 ...que eu

trabalhava com oncologia pediátrica... então... né... esse contato... né... do... com cuidados

paliativos... né... com pacientes muito próximo ao momento final de vida...era muito

frequente... né... por conta do perfil do paciente oncológico (...)

57

(FA., farmacêutica clínica)

(...) eu me formei em 1978... então tem muito tempo que eu convivo com as situações de

terminalidade... (...) mais especificamente 1996... isso ficou mais concreto... eu me transferi

pra AS2... e aí já cheguei com o firme propósito de melhorar... as minhas habilidades... no

manejo com a crise provocada pela finitude humana (...) nós participamos da organização de

um primeiro projeto piloto de cuidados paliativos...

(AS., assistente social)

(...) por questão de... de organização... do estágio (...) logo de cara eu comecei a acompanhar

pacientes com um avanço do câncer... e que evoluíam pra fase final de vida (...) num outro

momento profissional (...) recebi um pedido pra atender uma paciente oncológica que tinha

acabado de ser transferida pra unidade de cuidados paliativos de lá (...) e todos os pedidos

de interconsulta do cuidado paliativo acabavam sendo respondidos por mim (...) aí eu

descobri o cuidado paliativo (...)

(P., psicóloga)

(...) a minha pós era em pneumo... com pacientes bastante graves... com sintomas às vezes

refratários também... e a gente precisava paliar né... eu nem sabia que existia isso (...) e aí de

repente meu universo abriu (...) eu encontrei um colega que já tinha feito oncologia (...) e aí

ele falou... ah... mas o modo que você pensa tem tudo a ver com cuidado paliativo...

(ME., médica)

(...) então quando eu tava na graduação e fui fazer o estágio no MU1... já foi uma área que

chamou a atenção (cuidado paliativo)... por ver as crianças... eh... morrerem (...) quando eu

fui pro MU3 eu fiquei na equipe de UTI e semi-intensiva da pediatria... e aí inevitavelmente a

gente lidava com... com crianças muito... muito graves... e o olhar de cuidado paliativo

também surgiu (...)

(MU., musicoterapeuta)

Apesar de apenas a fonoaudióloga e a médica possuírem especialização em cuidados

paliativos, e a psicóloga e musicoterapeuta terem feito cursos específicos sobre o processo de

morte e morrer, pode-se perceber que os profissionais de forma geral têm buscado se

aprimorar, por meio de leituras e cursos complementares relacionados aos cuidados paliativos

58

e sua área de atuação. Foi identificado na pesquisa, que a motivação para tal aprimoramento

está calcada na percepção de necessidade de aprofundamento, que é exigida a partir da

oportunidade de trabalho e da consequente vivência, experiência e contato com outros

profissionais. Destaca-se que o sentimento de satisfação e contentamento em buscar

conhecimento e trabalhar na área não tem apenas a vivência dos cuidados paliativos como

fonte propulsora, sendo necessária uma identificação do profissional com esse tipo de trabalho

e com o perfil do paciente.

(...) ia implantar aqui no E1...os cuidados paliativos (...) eu fui convidada (...) comecei a ler

alguns artigos também sobre cuidados paliativos... tem um outro livro também que eu li (...)

voltado pra enfermagem (...) e a experiência do dia a dia que eu tenho tido aqui no setor...

né... na verdade (...) pretendo... me aprofundar mais... pretendo me especializar... fazer

cursos de especialização (...)

(E., enfermeira)

(...) acho que veio (motivação) (...) do exercício profissional... da minha convivência com

essa situação... e da observação das dificuldades do abandono... isso me chamava muita

atenção... o abandono que os pacientes ficavam numa fase importante da vida... (...) acho que

foi a vivência no exercício da minha profissão que fez crescer o... em mim o desejo de fazer

alguma coisa pra mudar essa situação...

(AS., assistente social)

(...) aí eu fui procurar saber [o que eram cuidados paliativos] (...) e aí eu prestei o concurso

dos cuidados paliativos (...) e acabei indo fazer um curso no exterior (sobre cuidados

paliativos) ... e no fim tinha a ver com oncologia... e me apaixonei por onco também... e

cuidado clínico em onco (...) e aí eu tô aqui na emergência por causa disso... e fazendo os

dois (...) Eu adoro (...) é onde eu descanso... eu falo... porque é trabalho num controle clínico

de sintomas...

(ME., médica)

(...) quando eu cheguei aqui no FA2... eh... na verdade não estava definido que eu viesse pra

esse andar... que é característico mais dos pacientes em cuidados (paliativos) (...) eu gosto de

trabalhar em cuidados paliativos... embora aqui no FA2 não tenha sido uma coisa... assim

“ah... eu escolhi...” (...) Eu sinto uma necessidade... de aprofundamento nessa área... porque

59

têm muitas coisas que eu fico meio indecisa... algumas abordagens (...) que muitas vezes não

são muito bem aceitas (...)

(FA., farmacêutica clínica)

A partir dos trechos das entrevistas apresentadas, pode-se destacar que apenas a

farmacêutica clínica, que relata não ter escolhido efetivamente trabalhar em cuidados

paliativos, traz a necessidade de estudar por ter dúvidas de como realizar o seu trabalho, além

de essa ser uma forma de conseguir se inserir na equipe – ao longo da entrevista evidenciou-

se que essa profissional tinha conflitos relacionados à filosofia e prática dos cuidados

paliativos. Os demais demonstraram identificação e empatia com o universo dos cuidados

paliativos, o que pode estar relacionado, entre outros fatores, com crenças e valores.

No emaranhado em que se constitui a prática dos cuidados paliativos, os entrevistados

foram unânimes ao considerar a comunicação como ponto importante para o desenvolvimento

e manejo do trabalho, no sentido de ser mais humano e não somente técnico. Isso inclui a

realização de conferências familiares e a necessidade, muitas vezes, de mais de uma

conferência. Verificou-se que tais conferências são realizadas como uma estratégia de

comunicação, no sentido de se estabelecer acordos relacionados ao tratamento e prover

esclarecimentos. Por conseguinte, tal constatação vai de encontro ao que foi explanado na

introdução deste estudo. Apesar disso, foi identificado que essas reuniões não fazem parte do

dia a dia de todos os profissionais, devido à falta de condições de trabalho, outras

responsabilidades e à dificuldade de contexto e de habilidade:

(...) eu nunca participei duma conferência familiar (...) mas eu acredito que quando você vai

dar uma notícia envolvendo a morte... né... ou a possibilidade da morte de um familiar... ou a

conduta médica mudando (...) cê precisa ser muito humano (...) não ser tão técnico (...) existe

uma área da farmácia que tá crescendo (...) que é a atenção farmacêutica (...) voltada...

justamente pra essa parte... como conseguir entender a condição do paciente... ter uma

comunicação adequada com ele (...)

(FA., farmacêutica clínica)

(...) bom, a gente faz reunião familiar... geralmente primeiro pra abordar (...) cuidados

paliativos... e conforme esse paciente vai evoluindo... a gente vai sentindo a necessidade de

fazer ou não mais reuniões (...) Eu acho que a reunião é fundamental (...) é importante a

participação de todos... da equipe mesmo (...) cada um contribui dentro da sua... eh profissão

60

(...) cada um vai (...) poder oferecer o cuidado melhor... tanto pra ele (familiar) quanto pro

paciente... né...que tá... já... numa fase final de vida...

(E., enfermeira)

(...) o protocolo do programa de cuidados paliativos tem... prevê isso (conferência familiar)

na fase inicial (...) eu não participo desse trabalho... a partir do momento que eu manifestei

uma preocupação maior com a questão da espiritualidade eu fiquei com um grupo de

voluntários... (...) então... eh... muitas vezes o jeito de dar a notícia foi muito ruim na nossa

experiência e a equipe de cuidados paliativos tem que depois... eh... conseguir trabalhar com

a pessoa pra que ela consiga elaborar aquilo (...)

(AS., assistente social)

A assistente social continuou, citando a necessidade de abertura de outros espaços para

poder conversar com as famílias:

(...) nós criamos muitos espaços... uma reunião que a gente chama de familiares ou

cuidadores que são familiares e cuidadores de diferentes pacientes... que vão pro serviço pra

serem cuidados naquele momento pela psicologia e pelo serviço social... é uma reunião... que

aí é uma reunião com todos os familiares de um mesmo paciente... aí nós vamos entender a

dinâmica familiar...

(AS., assistente social)

A psicóloga também trouxe a sua percepção:

(...) reunião de família é fundamental... têm equipes que infelizmente não têm pernas pra que

isso aconteça...não têm tempo (...) às vezes as conversas têm que ser refeitas... porque a cada

momento as necessidades vão mudando (...) têm coisas que são decisões médicas... mas têm

coisas que podem ser compartilhadas (...) isso tem a ver com aquilo que eu disse que é da

comunicação... né... isso faz com que as coisas fiquem alinhadas (...)

(P., psicóloga)

A médica relatou realizar poucas conferências familiares atualmente em razão do

contexto de emergência em que atua e também no hospice, no qual os pacientes normalmente

já chegam com objetivos de tratamento bem definidos. Apesar disso, relatou sua opinião:

61

(...) eu acho que... tem modelo que funciona... e tem modelo que às vezes não... depende da

família... sei lá... às vezes cê colocar oito irmãos que se dão mal... numa conferência dessa...

pode ser desastroso... como pode ser muito bom... depende do momento deles... acho que tem

muita coisa... aí... que não... não sou contra... mas acho que é difícil ...muitas vezes... deve ser

difícil...

(ME., médica)

O discurso da médica traz à tona um ponto importante, discutido em relação ao

aprendizado da comunicação, elucidando nas entrelinhas a importância de se particularizar a

forma de se comunicar de acordo com o contexto familiar. A literatura, da mesma forma, traz

técnicas de comunicação, porém argumenta-se a necessidade de individualizar as conversas

como discutido na Introdução.

A musicoterapeuta, por sua vez, apesar de não citar propriamente conferências

familiares, referiu realizar reuniões com as famílias, mas com a finalidade de auxiliar paciente

e familiares a se comunicarem entre si, o que coloca em destaque, mais uma vez, o trabalho e

assistência à unidade de cuidado.

(...) às vezes eu convoco a família... pra determinados períodos... assim tipo ...ah... não vai

estar todo mundo à noite... tal... não adianta você falar ...então... vamos fazer reunião

familiar... e aí a gente convoca a família... pra poder falar... conversar... compartilhar o que

tá sendo difícil... e isso que aproxima a família (...)

(MU., musicoterapeuta)

Vale ressaltar que em todos os discursos apresentados anteriormente, no que concerne

à comunicação, evidenciou-se a preocupação com a unidade de cuidado e a prestação de

assistência e inclusão da mesma no tratamento. A autora analisa que tal fato contribui para o

desenvolvimento de uma base segura para paciente e família.

Acrescenta-se que a comunicação, assim como a atenção à unidade de cuidado, foram

elementos sempre presentes e recorrentes nos discursos, independente do tema tratado, o que

pode sugerir novas conclusões e reflexões mais adiante.

Seguindo a linha de discussão do que foi apresentado nas entrevistas, é importante

contemplar e considerar o que os participantes explicitaram sobre a contribuição e atuação da

sua profissão nos cuidados paliativos e o que difere de outras especialidades. Independente da

62

prática profissional específica de cada um, foram identificados determinados aspectos, os

quais compõem e podem ser reconhecidos nos pressupostos dos cuidados paliativos: trabalhar

e perceber o paciente com respeito e considerando-o de forma integral, em todas as suas

dimensões e necessidades, e contemplando seu grupo familiar. Tal percepção pode ser

entendida como norteador e referência para a prática de cada um.

(...) eu acho que os cuidados paliativos é um movimento muito recente na fono (...) a fono se

estruturou na técnica... criou... talvez... é mudar esse conceito... do fazer... (mudar para um

conceito) De respeito... de cumplicidade (...) ser altruísta... se colocar no lugar do outro (...)

mas a família se sente parte do processo... né... acho que a família tem que tá junto... no

processo (...) SEMPRE eu peço pra família participar do processo (...)

(F., fonoaudióloga)

(...) o que eu destaco em cuidados paliativos... é... a possibilidade do conhecimento que a

gente tem daquele paciente como um todo... né... a história de vida daquele paciente (...) e...

em cuidados paliativos você consegue estender isso... é... justamente por ter mais contato

com a família... por conversar... é com os familiares... por... pelo cuidado ser integral

mesmo... não só pro paciente como pra família (...)

(E., enfermeira)

(...) eu acho que só é diferente pelas dificuldades que nós temos de lidar com esse tema... mas

quem não gostaria... em qualquer tratamento... mesmo curativo... de ser confortado... de ser

visto de uma forma global (...) e fundamentalmente eu acho que a gente tem um papel muito

importante no grupo familiar (...) que o grupo familiar todo precisa ser apoiado... aliás... um

princípio do cuidados paliativos que a família é unidade de tratamento...

(AS., assistente social)

(...) eu acho que o cuidado paliativo integra (...) ele valida a biografia da pessoa (...) é um

outro jeito (...) de fazer cuidado em saúde...que você olha pra todas as necessidades (...) e

não só da pessoa ...mas da unidade de cuidados (...) o que um psicólogo precisa... ele precisa

encarar a proposta de atendimento como um encontro (...) entre... o psicólogo e o paciente...

o psicólogo e a família (...) e tentar nortear e acompanhar com acolhimento... com apoio...

com orientação (...) pra que aquilo seja menos sofrido (...)

(P., psicóloga)

63

(...) então eu faço questão sempre de ter um diálogo bem aberto com respeito a isso... sem

que ficar com muitos pudores (...) e o que a gente puder ajudar (...) com remédio... com

tratamentos específicos com cuidados... controle de sintoma né... com dúvidas (...) prevenindo

as ansiedades... né... mantendo ele mais estável (...) então dado isso (...) eu acho que passam

mais leve... né... e a gente também (...)

(ME., médica)

As descrições das atuações de trabalho demonstraram, pois, uma preocupação com a

pessoa que está doente, e não apenas com a doença. Há uma valorização da rede de apoio,

valores, desejos e biografia. Percebe-se claramente que os profissionais extrapolam para além

de sua técnica de trabalho, estando atentos para o todo do paciente. A autora observa que tais

comportamentos são caracterizados como de apego seguro, pois acabam por gerar

acolhimento, consistência e continência às necessidades da unidade de cuidado. A

farmacêutica clínica diferiu dos demais nesse aspecto, já que ao falar de sua atuação

apresentou preocupação, principalmente com o fazer técnico, de como alinhar as prescrições

de acordo com o perfil do paciente em cuidados paliativos.

(...) então... como é que vou dizer... é um olhar diferente pra prescrição... é um olhar

diferente pros tratamentos instituídos... mas muitas vezes o meu contato com a equipe é bem

mínimo... porque essas adequações de prescrição o próprio médico especialista já faz...

(FA., farmacêutica clínica)

Vale ressaltar que a farmácia clínica é uma atuação recente do farmacêutico. Ela teve

início na década de 1960, após a insatisfação de estudantes e professores de Farmácia da

Universidade de São Francisco, nos Estados Unidos, com a condição do farmacêutico ser

considerado apenas como um vendedor de medicamentos (PEREIRA; FREITAS, 2008) ou

um técnico de produção (VIEIRA, 2007) depois do avanço tecnológico da indústria

farmacêutica. Esse movimento chamado de “farmácia clínica” tinha como objetivo aproximar

o farmacêutico do paciente e da equipe de saúde, permitindo o desenvolvimento de atividades

relacionadas à farmacoterapia (MENEZES, 2000), ou seja, o medicamento seria utilizado

como um meio para alcançar um resultado, fosse ele curativo, paliativo ou preventivo

(VIEIRA, 2007).

64

A Sociedade Europeia de Farmácia Clínica, com base na definição da WHO (1994),

descreve a farmácia clínica como “uma especialidade da área da saúde, que descreve a

atividade e o serviço do farmacêutico clínico para desenvolver e promover o uso racional e

apropriado dos medicamentos e seus derivados”. Observa-se que o objetivo do trabalho não

estava mais focalizado no medicamento, mas na preocupação em minimizar os riscos

inerentes ao uso de produtos farmacêuticos (VIEIRA, 2007). Assim, avalia-se entre outras

coisas, interações medicamentosas e os efeitos que podem causar no paciente, permitindo

realizar reconciliação medicamentosa. Observa-se, pois, que é um trabalho voltado para a

análise de farmacoterapia e que acaba por deixar o profissional próximo apenas da equipe de

saúde e distante do paciente (PEREIRA; FREITAS, 2008). Essas informações condizem com

o que foi dito anteriormente pela entrevistada FA (farmacêutica clínica), que acaba por ficar

focada nas prescrições e na análise das interações das medicações.

Por conta disso, concomitante ao movimento da farmácia clínica, na década de 1970,

alguns autores decidiram por redefinir o papel do farmacêutico, estendendo seu campo de

atuação. Surgiu então o conceito atenção farmacêutica (PEREIRA; FREITAS, 2008), citado

pela entrevistada desta pesquisa (FA), como um campo que aproxima o profissional da

farmácia do paciente e que elucida a importância da comunicação. A atenção farmacêutica é

uma prática desenvolvida no âmbito da Assistência Farmacêutica, inserida no trabalho de

equipe, e engloba atitudes, comportamentos, valores éticos, habilidades, os quais são

utilizados na prevenção de doenças e promoção e recuperação de saúde. Pressupõe uma

interação entre profissional e usuário, visando de forma geral melhor qualidade de vida do

paciente. Vale ressaltar, que nesta interação faz-se importante respeitar as particularidades

biológicas, psíquicas e sociais de cada um, com uma visão integral do indivíduo

(CONSENSO BRASILEIRO DE ATENÇÃO FARMACÊUTICA, 2002). Destaca-se que a

atenção farmacêutica não exclui o trabalho da farmácia clínica, na medida em que o

conhecimento da farmacoterapia é fundamental para uma prática completa e de qualidade, que

permita avaliar os resultados clínico-laboratoriais dos pacientes (PEREIRA; FREITAS,

2008).

A autora acredita que a dificuldade da farmacêutica clínica entrevistada em se inserir

e ser aceita na equipe provém do quão recente é essa atuação do profissional farmacêutico e

quanto os demais membros da equipe desconhecem o trabalho realizado.

A pesquisadora ainda discute o que foi citado anteriormente a respeito das formas de

atuação narradas pelos profissionais no que tange a sair da zona de conforto do seu

conhecimento tecnicista, argumentando que eles revelaram a existência de um trabalho

65

multidisciplinar, e quem sabe interdisciplinar, na medida em que o médico, por exemplo, se

preocupa com a ansiedade do paciente por falta de informação. Assim, constatou-se que os

entrevistados se percebem como membros inseridos em uma equipe multidisciplinar. Falam

de si sempre inseridos em uma equipe, como se pode notar pelas transcrições que seguem:

(...) casos de AVC... extenso... paciente com gastrostomia... idoso... na idade avançada... cê

sabe que é cuidados paliativos... tá certo? Eh... qual é o meu sentido... né... nesse processo...

eu sempre digo pra família... alicerçado junto com a equipe médica... tá... que eu converso

sempre antes com a equipe médica.

(F., fonoaudióloga)

(...) quando tem uma reunião (de equipe) ... você conhece as pessoas e consegue perceber que

elas têm uma capacitação... pra atuar com aquele perfil de paciente... todos os profissionais

ficam mais seguros em abordar... em tirar uma dúvida... em... em dividir qualquer coisa (...)

essa troca ela é importante sim... por que muitas vezes... eh... tratamentos (...) condutas

podem ser modificadas...

(FA., farmacêutica clínica)

(...) e a partir daí que nós estruturamos um programa de cuidados paliativos (...) hoje o setor

de oncologia atende em média cem pacientes em cuidados paliativos... expandiu... e aí o

hospital contratou assistentes sociais... psicólogos... médicos... enfermeiros... e se constituiu

uma equipe própria pra lidar com atenção na fase final da vida em oncologia (...)

(AS., assistente social)

(...) dentro do cuidado paliativo...psicólogo não é... subserviente ao médico como às vezes em

outros modelos da psicologia (...) no cuidado paliativo a comunicação e o trabalho em

equipe tem que ser ali... de igual pra igual... né... o psicólogo identificando sintomas que

trazem sofrimento... e que o sintoma psíquico pode exacerbar o sintoma físico... né... e

comunicar isso com o médico... e vice-versa (...)

(P., psicóloga)

(...) mas existem momentos que eu fico muito triste também... e aí... nesses momentos... eu

tenho que correr pros meus colegas amigos... que fazem o que eu faço... que entendem o que

é... ((riso))... pra poder compartilhar... pra poder me cuidar ...pra poder entender qual foi o

66

meu papel... o que foi feito... é onde que eu me despeço... né... como que eu posso finalizar...

a minha história... com determinado paciente (...)

(MU., musicoterapeuta)

Verifica-se, portanto, que o trabalho em equipe possui significados e funções, como

promover trocas, tanto de informações para respaldo de atuação técnica, como de sentimentos

e sensações em momentos difíceis. Ademais, os entrevistados demonstraram que existe um

trabalho em conjunto, seja para controle de sintomas, seja para a estruturação e

desenvolvimento do serviço. Essas vivências revelam que a própria equipe representa uma

base segura para os membros que a compõe.

Percorrendo o que foi discutido sobre as atuações e o trabalho em equipe em cuidados

paliativos, verifica-se novamente que o tema da morte se mostra presente. Investigou-se, pois,

a atuação dos profissionais mais especificamente nesse momento, conforme expresso nos

relatos seguintes:

(...) os meus pacientes em terminalidade (...) eu não vou fazer exercício (...) pra reabilitá-lo...

eu vou promover o conforto... então eu sempre trabalho muito com a equipe (...) eu tenho

muita coisa para usar com o meu paciente... né... pra melhorar a comunicação (...) o paciente

tem o livre-arbítrio... ele tem a opção de escolha... do que ele quer (...) e se você faz isso em

vida (...) na hora da terminalidade é muito mais ameno...tudo fica claro.

(F., fonoaudióloga)

(...) esse trabalho do psicólogo na (...) fase final de vida e luto (...) a equipe... junto com o

psicólogo... tem que tá alinhada na comunicação e na boa assistência (...) às vezes você tem

que... emprestar a sua voz pro paciente que não tá conseguindo falar (...) porque no fim de

vida... (...) as pendências têm que ser resolvidas (...) o sofrimento faz parte... eh... o que a

gente conseguir diminuir melhor... né... mas exterminar o sofrimento do outro ninguém

consegue (...)

(P., psicóloga)

A fonoaudióloga e a psicóloga destacaram a possibilidade de dar voz ao paciente na

fase final da vida, isto é, auxiliá-lo para que possa se comunicar no que concerne aos seus

desejos, medos e fantasias, incluindo-o nesse processo quando for seu desejo. A

musicoterapeuta, da mesma forma, trouxe a preocupação em escutar o paciente, assim como

67

favorecer a expressão de seus pensamentos e sentimentos por meio da música, o que pode ser

caracterizado como um trabalho de elaboração de luto antecipatório da unidade de cuidado

(GILLIES; NEIMEYER, 2006), como pode ser observado na seguinte transcrição:

(...) a grande estratégia é ouvir com cuidado (...). com perguntas que sejam mais... é...

relativas a processo de final de vida (...) encorajar o paciente a resgatar a história dele com

essa família (...) vem como um recurso (a música)... que às vezes é fundamental... pra

pacientes que não conseguem falar (...) e aí na dedicatória dessas canções... eles falam tudo

que não conseguem falar (...) mas fica aquela coisa do registro do afeto... do amor... e isso

acaba sendo muito importante... pra as famílias...

(MU., musicoterapeuta)

Verifica-se ainda que, assim como a psicóloga, a enfermeira trouxe em seu discurso,

apresentado a seguir, além de outras considerações, a presença do sofrimento da família como

algo que é natural e presente no momento de perda de um ente querido:

(...) na fase final (...) a família não quer que o paciente sofra (...) como parte da equipe... eu

tenho que tá atenta realmente se esse paciente não está sofrendo né... estar observando se as

medidas que estão sendo feitas pro conforto estão sendo suficientes (...) eu acho que eles

(familiares) ficam mais (...) tranquilos mesmo... sofrem... claro... porque é uma perda né...

não tem jeito de não sofrer... mas acaba sendo mais tranquilo...

(E., enfermeira)

A assistente social e a médica também trouxeram as suas percepções, relatadas a

seguir, que, analisadas juntamente com as demais apresentadas anteriormente, demonstram

que na fase final de vida do paciente o esforço e as atividades em equipe para manter o

conforto e para assistir à unidade de cuidado, da mesma forma, configuram-se como

comportamentos de apego seguro que acabam por contribuir para o desenvolvimento de uma

base segura para paciente, família e equipe:

(...) eu acho que é (...) um compartilhar com outros profissionais (...) a função é muito mais

de acolhimento daquela dor (...) de compartilhar com a família (...) é um momento de muito

desespero... muitas vezes (...) mesmo quando há aceitação da morte e ela tá acontecendo em

68

condições mais tranquilas (...) e com todas as pessoas da equipe nós podemos representar um

apoio muito grande pra família (...)

(AS., assistente social)

(...) cabe a mim e à equipe toda eu acho... deixar pra ele (paciente) um ponto (...) de

dignidade... de ele saber que ele pode contar com pessoas nas inseguranças que ele tiver...

né... num momento que fisicamente as coisas não tiveram boas também (...) pra cada hora

tem um profissional... mais específico que também pode ser designado pra isso (...) cada um

dentro de sua especialidade (...) acaba se entrelaçando com o outro (...)

(ME., médica)

A farmacêutica clínica, por sua vez, destacou que a sua relação com o paciente e com

a família na fase final de vida está relacionada ao uso da medicação utilizada para fins de

conforto para a unidade de cuidado (paciente desconfortável e família ansiosa ou angustiada

por ver o desconforto do paciente ou por ter de esperar o momento da morte), não incluindo e

percebendo a sua participação e contribuição efetiva nesse processo, o que é evidenciado na

transcrição seguinte:

(...) nessa hora (...) é quando o paciente entra naquele processo de sedação de conforto (...)

acho que essa (...) última abordagem com o paciente acaba sendo (...) muito relacionado ao

medicamento... não ao farmacêutico (...) porque vai ser... eh... alívio... né... de muitos

sintomas... né... alívio pra família... porque a família não vai presenciar umas reações do

paciente... que possam trazer desconforto.

(FA., farmacêutica clínica)

A autora acredita que essa percepção possa estar relacionada com a dificuldade de

inserção do farmacêutico clínico nas equipes de modo geral (como citado anteriormente) e

também, de forma mais específica, com o conflito religioso e filosófico de vida que essa

profissional possui em relação ao uso de medicações em casos de sedação paliativa.

Vale ressaltar que nessa discussão sobre atuações e contribuições dos profissionais na

fase final de vida do paciente, três entrevistadas (médica, assistente social e psicóloga)

destacaram a necessidade de haver disponibilidade e envolvimento, porém com limite, como

se pode observar nos relatos a seguir. Tal fato foi identificado como estratégia de

69

enfrentamento, a qual contribui para a saúde mental e física dos profissionais, assim como

prevenção de burnout.

(...) mas eu não fico mais... né ...indo lá ...nem buscando mais coisas... que é uma forma de

me proteger (...) é muito envolvimento... não é que eu não me envolva agora... lógico... a

gente se emociona... abraça... chora (...) mas tem que ter uma coisa que não te desgaste

tanto... né ...assim... preencher também a vida lá fora com coisas boas... fazer outras

atividades...

(ME., médica)

(...) eu acho que é uma diferença fundamental entre se envolver e se misturar... eu não posso

perder a minha capacidade de intervenção profissional... mas sentir compaixão...

solidariedade... sofrer... fazer o luto... chorar a hora que morre... eu faço isso hoje com muito

mais tranquilidade e acho que isso... é isso que me ajuda a não desistir...

(AS., assistente social)

Tá continente (na fase final de vida)... ahn... acho que... ser um interlocutor da família...

paciente (...) mas deixando sempre o limite (...) da disponibilidade integral... há uns anos

atrás... eu dizia... morrer de madrugada me liga... eu tenho que tá perto o tempo todo... não...

cê tem que fazer o trabalho direitinho... né... no momento que tem que fazer (...) orientar a

equipe (...)

(P., psicóloga)

A autora pontua, a partir de sua vivência em cuidados paliativos, que o

reconhecimento do limite é importante, porém não é um comportamento fácil de se

desenvolver em virtude do vínculo que se estabelece com a unidade de cuidado e do valor do

cuidado paliativo de se estar disponível e atento às necessidades do paciente e da família.

Outros comportamentos citados pelos demais profissionais também podem ser

caracterizados como estratégias que auxiliam no enfrentamento na fase final de vida do

paciente: o próprio trabalho em equipe e a valorização do trabalho pelo outro (colega); ter

empatia pela situação da unidade de cuidado, que acaba por auxiliar na aceitação da situação

de perda; valores de família em relação à finitude; conhecimento e estudos; psicoterapia;

realização de atividade física e religião. As transcrições a seguir evidenciam esses aspectos:

70

(...) eu penso muito na minha religião... não tem como... eh... eu ((emoção na voz)) peço

ajuda por aquela pessoa... pra aquela pessoa que tá recebendo aquele tratamento... por

aquela pessoa... por aquela família... eu penso nele... né... e na família... pra que eles sejam

amparados de alguma forma... não só aqui... mas como espiritualmente (...)

(FA., farmacêutica clínica)

(...) a estratégia que eu uso... eu procuro... éh... pensar no sofrimento daquele paciente (...)

porque vê aquele paciente naquela condição de vida... sem qualidade nenhuma... né... e vê

que a cada dia que se passa... ele tá sofrendo mais... faz a gente (...) aceitar melhor o

processo de morrer...

(E., enfermeira)

(...) acho que a partir do momento que eu... me defini como profissional que iria fazer (...)

pra atenção a pessoas na fase final da vida... e claro... evidentemente eu busquei me formar...

participei de congressos... fui estudar muito... ih... ih aí é claro que a formação foi uma busca

minha... né... hoje eu tô no mestrado (...)

(AS, assistente social)

(...) tinha um processo na terapia de pensar minha própria finitude (...) a comunicação entre

equipe (...) compartilhar (...) e conhecer qual que é o meu limite... diante daquele caso (...)

nos reunir pra discutir um pouco sobre as dificuldades da tarefa assistencial (...) pra mim a

maior estratégia de sobrevivência é o amor que eu tenho pelo trabalho (...) que você tem um

valor... que o médico te valoriza... que você tem uma importância (...)

(P., psicóloga)

(...) é eu preciso correr pro um abraço amigo... pra ((riso))... me ajudar... que são os mais

difíceis pra mim... mas é muito gratificante....

(MU., musicoterapeuta)

Enriquecendo esta discussão em relação às reações da unidade de cuidado diante da

morte do paciente, a psicóloga evidencia dois aspectos importantes: o processo de luto e a

necessidade de prevenção do luto complicado e a questão da medicalização do luto, a qual foi

abordada na Introdução. Em seu discurso, ela confirma o que a autora apresentou sobre

71

identificar o que é uma tristeza relacionada a um luto ou a uma depressão e a partir disso

discutir em equipe sobre formas de tratamento:

(...) a gente fala do luto da família... ah... a família... temos que prevenir luto complicado...

paciente na fase final de vida é a pessoa mais ENLUTADA (...) aí vem um médico querer dá

antidepressivo (...) e o psicólogo acho que ele tem essa tarefa de tradutor...sabe? Isso não é

uma depressão... isso é um luto... como é que lida com luto? E vê sinais de luto da família...

sinais de luto complicado... eh... eu faço telefonema de condolências (...) já dá pra avaliar... a

necessidade de um possível encaminhamento...

(P., psicóloga)

Nesse contexto sobre a questão do luto, os entrevistados foram questionados sobre

suas compreensões e entendimentos a respeito do que é um processo de luto:

Eh... eu acho que é um choro que vem... mas tem um equilíbrio... é... não é aquela coisa...

caótica (...) que eu acho que isso que é o luto saudável... né...

(A., fonoaudióloga)

Luto... eu entendo como um... eh... um processo que acontece depois que a pessoa vai a óbito

(...) que envolve muitos sentimentos... sentimentos de perda... eh... de tristeza... que é um

processo mesmo... que ele tem que passar... e que todo mundo passa sempre que perde

alguma coisa...

(E., enfermeira)

(...) luto é o rompimento de um vínculo... né... que existiu entre pessoas que tinham uma

relação... e aí... eh ...quando essa... quando uma pessoa morre... essa relação... não existe

mais com uma pessoa viva... né... existe como história... existe com as fantasias... do que essa

pessoa tá vivendo no pós-morte...

(MU., musicoterapeuta)

72

Não é um luto sem dor... evidentemente... né... acho que dor sempre estará presente quando

acontece perda... mas eu entendo que depois de um momento... de um sofrimento mais

intenso... a família consegue continuar sua trajetória... retoma suas atividades e guarda

dentro do coração a saudade pelo que partiu... mas ela consegue continuar vivendo...

(AS., assistente social)

(...) é um conceito muito particular mesmo... que é aquele período... né... ou a pessoa...ou

uma família que vai se deparar com a ausência (...) daquele ente que partiu... que vai

readaptar a sua vida (...) às vezes já tinha rotinas estabelecidas... de cuidados com aquela

pessoa... né... e aí agora... já ela não está mais ali... então a sua vida muda... né... então você

tem que readequar suas rotina... seus horários... sua casa...

(FA., farmacêutica clínica)

(...) Mas acho que é assim... tem que chorar mesmo... tem que se enfiar na caverna um

tempo... tem que achar que o mundo não é justo... tem que ficar com raiva de Deus... pra

depois ressurgir de uma maneira diferente... com entendimento (...) e o que sobra são as boas

lembranças... né eventualmente quem morre vira santo (...) ou talvez numa visão mais

realista (...) mas uma coisa gostosa...

(ME., médica)

A partir da análise dos discursos, pode-se observar que os profissionais compreendem

o luto normal como decorrente da ruptura de um vínculo e muitas vezes acompanhado do

sentimento de tristeza, que é entendido como algo natural e adequado ao contexto. Além

disso, surgiu a questão da necessidade e possibilidade de reconstrução da vida. Tais

conclusões podem ser entendidas à luz do modelo do processo dual, que permite a

compreensão de que ao mesmo tempo que não há uma linearidade no processo de luto há a

possibilidade de construções de significados no processo de oscilação entre as tarefas voltadas

pela perda e aquelas voltadas para a restauração (STROEBE; SCHUT, 1999).

Adentrando mais especificamente no objeto de estudo desta pesquisa, entre todos os

entrevistados a psicóloga foi a única que citou especifica e espontaneamente a temática do

luto sem ter de ser questionada efetivamente sobre isso quando falado sobre fase final de vida.

A assistente social e a musicoterapeuta verbalizaram momentos e situações de despedida e

resolução de pendências presentes no luto antecipatório (GILLIES; NEIMEYER, 2006),

porém sem explicitarem que se tratava de um processo de luto.

73

(...) percebemos a importância que podia ter a história oral... que acabou gerando um projeto

(...) a família começa a fazer uma conversa em torno daquilo e que acho que o processo de

construção do livrinho com a história da vida é o que é interessante... é o que vai permitindo

a gente fazer as costuras... né... ou ajudando nesse processo... os rompimentos... as rupturas

que foram ficando pra trás e que têm impacto até hoje (...) E resolver algumas pendências

(...)

(AS., assistente social)

(...) então... o uso de canção com paciente em fase final de vida... acaba sendo um recurso

que acolhe... e que promove comunicação... promove troca de afeto... aquela coisa de... ah...

eu queria tanto pedir desculpas pro meu marido... porque isso... isso... aquilo... e dizer que eu

o amo... porque eu não disse aquilo... mas eu não consigo... porque se eu falar (...)

(MU., musicoterapeuta)

Os entrevistados, em razão da falta de espontaneidade em discorrer sobre o luto (com

exceção da psicóloga), foram indagados de forma direta, a partir de explanações da

pesquisadora, sobre como percebem a influência de sua atuação no processo de luto da

unidade de cuidado, no sentido de contribuição para prevenção de luto complicado:

(...) eu tenho que dá voz pra esse paciente (...) uma forma de esse paciente poder dizer o que

ele tá sentido (...) né... eh... eu tenho que falar sobre a morte... eu não posso me isentar disso

(...) então quando cê vai mexer... na morte... você mexe com a cultura... dependendo da

cultura que o teu trabalho vai tá inserido (...) você vai ter um tipo de abordagem (...) acho

que quando as coisas são muito mal resolvidas... durante todo o processo e eu não resolvo...

o luto vai ser complicadíssimo (...) Tem que ter uma fala linear... tem que tá presente (...)

(F., fonoaudióloga)

A fonoaudióloga concluiu confirmando a percepção trazida pela autora, a partir do

discurso dela, de que a depender da postura do profissional e da equipe, há uma influência

positiva no processo de luto da unidade de cuidado, o que pode ser compreendido como fator

de proteção para o luto complicado. A assistente social compartilhou da mesma percepção da

fonoaudióloga e enfatizou situações em que o apoio é fundamental. Como exemplo, contou o

episódio de uma mãe que queria batizar um bebê que estava próximo da morte e a equipe se

movimentou para que isso se tornasse possível:

74

(...) nove horas nós batizamos a criança (...) doze horas aproximadamente depois... a criança

entra na agonia final... quando ela morre (...) a mãe pega o corpinho (...) acaricia seu filho e

fala assim: “Meu filho... sua mãe te colocou nos braços de Cristo”... então... eu fiquei

pensando se eu não tivesse feito isso... como que essa mãe ficaria? Isso ajuda ou não o luto?

Eu acompanhei essa mãe um tempo depois (...) ela falou pra mim: “AS. eu tô bem”... Ela

disse: “Pode ficar tranquila que eu tô seguindo a minha vida...” Então... eu acho que assim...

estar junto... apoiar... é fundamental (...)

(AS., assistente social)

As atuações citadas por estas duas profissionais podem ser caracterizadas como

comportamentos de apego, os quais já foram citados: escuta, acolhimento, apoio, preocupação

com o que é importante para o outro (conforto, alívio de sintomas ou resolução de alguma

pendência), os quais podem contribuir para a construção de uma base segura. Esse aspecto

também pode ser observado e identificado nas entrevistas com os demais profissionais:

(...) acho que a equipe ajuda muito o paciente e a família... quando escuta sem julgamento... e

quando respeita (...) quando vai junto... encontrando o que eles têm de melhor (...) nesse luto

antecipatório... a ajudar eles enxergarem o que eles têm de forte (...) ajudar o paciente a

entender... que a vida dele fez sentido... ajudar a família a fazer sentido... naquela despedida

(...) acho que tem muito a ver com isso... com respeitar... escutar e trazer importância do

significado...

(MU., musicoterapeuta)

Acho que é muito positivo...e no telefonema de luto de condolências eu tenho recebido esse

retorno... “Olha eu jamais imaginei que receber uma assistência de qualidade dessa do

cuidado paliativo todo” (...) às vezes a família e o paciente precisam ser orientados (...)

informados de uma forma um pouco menos técnica... né... do que que tá acontecendo naquela

fase (...) eu acho que contribui muito pra dá essa escuta (...) dá voz pra família... dá voz pro

paciente... oferecer a continência... acolher sofrimento (...)

(P., psicóloga)

A médica, da mesma forma, argumentou sobre o apoio como aspecto importante e que

a sua atuação e a da equipe no processo de luto dependerá do tipo de família, assim como dos

75

valores dos familiares. Ao final, confirmou que os comportamentos citados a seguir

contribuem positivamente para o processo de luto da unidade de cuidado:

Eu acho que é importante ele se sentir apoiado... pode ser esse modelo... pode ser outro...

depende da família com a qual você tá conversando (...) então... o fato de a gente se colocar à

disposição... enfim... de tudo que pode tá no entorno dessa família... né cada profissional na

sua área... acho que é uma coisa que é muito legal pra eles...

(ME., médica)

A farmacêutica clínica evidenciou, ainda, que a aceitação da família pode estar

diretamente relacionada ao fato de não perceber o sofrimento do paciente no processo de

morrer e que isso pode auxiliar no processo do luto, como se pode observar no relato que

segue. A autora pontua que o controle de sintomas e a atenção ao sofrimento do paciente

também são considerados comportamentos de apego que acabam por gerar uma base segura e

podem ser entendidos como fator de proteção para luto complicado.

(...) eu acho que impacta bastante... porque a partir do momento que ele (o familiar) não

presencia tanto sofrimento... ele acaba aceitando um pouco mais essa separação (...) envolve

muita a crença de cada um (...) a experiência mesmo de cada família (...) conforme a sua

aceitação (...) dessa separação... você reage... é isso que vai caracterizar esse período de luto

(...) muitas pessoas (...) ficam revoltadas... né... então... se for de uma maneira mais suave...

acredito que seja mais tranquilo...

(FA., farmacêutica clínica)

Ao explorar o que foi apresentado anteriormente, a autora destaca a comunicação

(conferências familiares, escuta, favorecimento de expressão de sentimentos, acolhimento),

mais uma vez presente como uma questão relevante, como um fator de proteção para o luto

complicado, quando se apresenta clara, coesa, coerente e responsiva às necessidades da

unidade de cuidado. Além disso, foi destacado por alguns entrevistados (fonoaudióloga,

médica e farmacêutica clínica) o respeito à diversidade cultural, às crenças e aos valores e

como esses aspectos também guiam as atuações dos profissionais, assim como influem no

processo de luto. Tal constatação vai de encontro ao que foi abordado na Introdução, no

sentido de observar e perceber os fatores de risco e proteção para o luto complicado de acordo

com o contexto, cultura e significado que é dado.

76

Tomando como base o que foi discutido sobre as percepções dos profissionais a

respeito da suas contribuições para o processo de luto da unidade de cuidado, a autora

constatou que a atuação e os comportamentos dos profissionais não têm como atenção

primária o luto, ou seja, o trabalho não é guiado visando à prevenção do luto complicado. A

autora compreende que a atenção e o trabalho do luto da unidade de cuidado é uma parte dos

cuidados paliativos, que fica mais evidente na fase final de vida do paciente – apesar de o luto

antecipatório não necessariamente estar presente apenas nessa fase. Os valores e pressupostos

dos cuidados paliativos determinam comportamentos e formas de atuação (apoio, escuta,

disponibilidade, orientação, entre outros) que inevitavelmente acabam por serem

compreendidos como fatores de proteção para o luto complicado. Nesse período de processo

de morte, a psicóloga, a assistente social e a musicoterapeuta mostraram ter um planejamento

de tratamento mais focado na elaboração do luto, quando paciente e família permitem e

desejam. Os demais profissionais demonstram perceber e apresentar comportamentos de

apego (muitos advindos naturalmente do trabalho que desenvolvem em cuidados paliativos)

que são importantes para prevenção do luto complicado. O fato de serem atuações e posturas

rotineiras, não apenas em fase final de vida do paciente, pode dificultar a percepção da

dimensão e importância que esses comportamentos podem promover para um processo de

luto normal e adaptativo para além da esfera hospitalar. Essa questão pode ser entendida uma

vez que se constata que os profissionais tiveram pouca ou nenhuma base nas suas graduações

e formações sobre a morte e o morrer.

Diante deste trabalho com o processo de luto da unidade de cuidado, faz-se relevante

elucidar o acompanhamento pós-óbito que a psicóloga entrevistada (P.) realiza com os

familiares, o qual é previsto nos cuidados paliativos (WHO, 2004; LANKEN et al., 2007) e

que tem sido um serviço crescente nessas unidades. Isso comprova que a temática do luto e

suas repercussões têm alcançado mais (e devida) importância dentro de um sistema de saúde

imediatista e preocupado com o aqui e agora. Vale lembrar que essa atenção ao luto da família

pode ser compreendida como uma ferramenta importante para identificação de fatores de

risco e proteção para o luto complicado e consequente encaminhamento precoce para serviços

especializados quando necessário. Ressalta-se que ainda não há na literatura uma diretriz

específica que guie esse tipo de acompanhamento, apesar da crescente produção de pesquisas

sobre o tema.

Ao final das entrevistas, os profissionais foram indagados sobre o que consideravam

ser uma boa morte para si e para o outro. As respostas estão elencadas a seguir:

77

Eh... eu tá com minha família... eu ter o acolhimento... eu ser respeitada na minha vontade.

Mas eu tenho que falar sobre... a morte... eu acho... que a gente tem que começar a falar

sobre a morte... desde pequeno (...)

(F., fonoaudióloga)

É estranho... pra mim boa morte é... a... é a velhinha do Titanic ((riso))... que morreu bem

velhinha (...) quentinha... em cima de uma cama... né... e sem sofrimento (...) associo a boa

morte com o não sofrimento... com não deixar a pessoa ter medo (...) quando você consegue

passar pro paciente... que é possível que ele morra sem dor... sem desconforto respiratório...

sabe... perto das pessoas que ele ama... tendo resolvido... algumas coisas eu acho que essa é

a boa morte...

(E., enfermeira)

(...) é uma coisa muito subjetiva (...) muito individual (...) eu sei que enquanto eu tiver aqui eu

tenho que fazer a coisa da melhor forma possível... né... se eu conseguir fazer isso e me

realizar... eu tenho certeza que eu tenho muita chance de ter uma boa morte (...) comecei a

me preocupar agora com a questão da espiritualidade (...) no sentido da busca do sentido da

própria vida... se cada paciente que nós atendemos... puder compreender o sentido da sua

existência... ele vai morrer bem... eu acredito...

(AS., assistente social)

(...) quem tem o privilégio de morrer dormindo ((risos))...acho que a melhor morte (...) uma

morte em que...eh...óbvio...que eu teja livre de qualquer invasão (...) uma morte consequência

de uma vida bem vivida... que o tempo que foi possível eu vivi...eu preenchi essas páginas do

livro (...) porque eu percebo que as pessoas... podem ter o melhor cuidado paliativo do

mundo... tá... mas as que morrem com maior sofrimento existencial... são aquelas que voltam

as páginas do livro da história de vida e as páginas tão em branco... isso eu não quero... de

JEITO nenhum pra minha vida...

(P., psicóloga)

Uma boa morte para mim é uma morte... em primeiro lugar com sintomas bem cuidados...

né... físicos e psiquiátricos (...) e uma morte que a pessoa sinta (...) que a história dela fez

sentido... que ela tá finalizando aquele capítulo... do jeito dela (...) uma morte digna... né...

78

em que a pessoa é respeitada até seu último suspiro (...) estar espiritualmente em paz (...)

socialmente... que os amigos possam fazer parte dessa história...

(MU., musicoterapeuta)

Boa morte (...) ((pausa)) considero que... eu... eu não fico muito à vontade com essa questão

da morte por medicamento... a... a morte de uma maneira natural... sem intervenção de

medicamentos... pra mim é uma boa morte... quando tem intervenção de medicamentos... mas

aí é bem pouco... não... não tanto profissional que tá falando... é minha parte pessoal e minha

crença religiosa ...

(FA., farmacêutica clínica)

Com base nos discursos apresentados, pode-se observar que a compreensão sobre o

que é uma boa morte é algo subjetivo e individual, e não há mudança de significado quando

se fala de si ou do outro. Identificou-se que os fatores citados como importantes para se ter

uma boa morte, como estar com a família, ter acolhimento, respeito aos desejos e resolução de

pendências, são caracterizados como comportamentos ou provenientes de comportamentos de

apego, que acabam por gerar uma base segura. Mais do que isso, são comportamentos que os

próprios entrevistados revelaram ter em suas atuações. Tais constatações podem sugerir que

os profissionais que trabalham em cuidados paliativos estão desenvolvendo um movimento

mais próximo para com o processo de morrer, na medida em que demonstram e percebem a

importância de “estar com o outro”. Essa dinâmica de proximidade com esse processo

corrobora com os achados na literatura, como citado na Introdução, que destacam a existência

de abordagens educacionais voltadas não apenas para cuidados paliativos, mas também para

cuidados em final de vida. A autora desta pesquisa pontua que o culto ao avanço tecnológico

e à globalização acabam por desqualificar e minimizar o significado “de estar com o outro”,

função essa compartilhada por familiares e pela equipe, o que acaba por gerar nas famílias,

muitas vezes, a agudização do sentimento de impotência frente à vida. Não obstante, não se

deve esquecer que o conforto físico, psicossocial e espiritual também é proveniente dessa

proximidade com o outro, com aquele que fornece atenção, amor e segurança. Esse percurso,

juntamente com a diretriz antecipada de vontade, vai na contramão do que se observa na

atualidade, quando o processo de morrer acaba por ter seu desfecho, na sua maioria, em

hospitais, com os pacientes escondidos, isolados, com dispositivos de suporte de vida – a

chamada morte invertida (KOVÁCS, 2010a). Com base no que vem sendo apresentado na

realidade hospitalar, a autora deste estudo também reflete sobre a consigna de que uma boa

79

morte é aquela que ocorre sem sofrimento e com controle de sintomas, sem procedimentos

invasivos, como citado pela maioria dos entrevistados. Nesse sentido, o que se discute não é

somente o que seria qualidade de vida para o paciente, mas principalmente qualidade no

processo de morrer, o que acaba por incluir a discussão sobre objetivos e condutas de

tratamento.

Ademais, um aspecto que chamou a atenção foi que alguns entrevistados extrapolaram

o momento da boa morte vislumbrando as vivências e experiências de vida, ou seja, que uma

boa morte também é calcada por uma vida construída por significados e realizações. Tal

constatação confirma o luto como um processo dotado de significados que foram construídos

ao longo de uma vida, nas relações.

80

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desta pesquisa permitiu concluir e evidenciar que as formações dos

profissionais de saúde ainda são calcadas em um saber técnico e que há muito pouco ou nada

sobre como lidar com o processo de morrer de quem se cuida. Não obstante, observou-se que

os profissionais que trabalham em cuidados paliativos, devido aos pressupostos do mesmo e

de uma vivência de fazer cuidados paliativos em final de vida, foram buscar aprender, por

necessidade de aprofundamento, sobre como cuidar da unidade de cuidado integralmente,

estando atentos às necessidades de cada um, o que acaba por perpassar o saber técnico. Disso

florescem comportamentos que são caracterizados como de apego, que resultam no

desenvolvimento de uma base segura e que podem ser compreendidos como fatores de

proteção para um luto complicado da unidade de cuidado. Estes comportamentos, frutos da

prática dos cuidados paliativos, são identificados e percebidos como de rotina e naturais neste

contexto, o que pode dificultar a percepção dos profissionais sobre a dimensão e influência

positiva e adaptativa destes para a prevenção de luto complicado. Isto pode ser entendido pela

falta de conhecimento sobre o processo de morrer e processo de luto, por isso a importância

da educação dos profissionais em relação a estes assuntos. A autora compreende que a

percepção dos membros da equipe sobre a influência de suas ações no processo de luto pode

contribuir para a busca de aprimoramento e qualificação diante do processo de morrer do

paciente.

Este estudo também permitiu identificar que os profissionais que trabalham em

cuidados paliativos se utilizam de estratégias de enfrentamento, a saber: o trabalho em equipe

e valorização do seu trabalho pelo outro (colega); ter empatia com a situação da unidade de

cuidado, que acaba por auxiliar na aceitação da situação de perda; valores de família em

relação à finitude; o conhecimento e estudos; psicoterapia; realização de atividade física e

religião.

Ressalta-se que os participantes foram questionados sobre experiências pessoais em

cuidados paliativos, porém estas informações não foram utilizadas. A autora considerou que a

esta pesquisa dava margem para pensar sobre o processo de luto dos profissionais (na vida

pessoal e laboral), porém não adentrou nesse universo para não se desviar dos objetivos do

estudo.

Por conseguinte, a partir da discussão sobre cuidados paliativos e o seu fazer, foi

compreendido pela autora que esta especialidade está crescendo e se desenvolvendo. Logo,

muitas questões e aspectos não estão bem definidos, como por exemplo, protocolos de

81

sedação paliativa e acompanhamento pós-óbito. A autora pontua que os protocolos devem ser

guias de melhores práticas, porém sempre individualizados de acordo com o paciente e

família. Nesse contexto de desenvolvimento de práticas, é importante frisar a relevância de

realização de pesquisas que possam servir de arcabouço teórico e prático para a educação e

formação dos profissionais de saúde.

Por fim, o presente estudo permitiu que a autora pudesse pensar em investigar a

questão do acompanhamento pós-óbito como fator de proteção para luto complicado, na

medida em que pode ser utilizado como ferramenta de identificação de fatores de risco e

proteção para luto complicado. Além disso, tal acompanhamento pode acabar por evidenciar o

quanto os profissionais de saúde, através de seus comportamentos de apego, podem ser

considerados fatores de proteção para luto complicado.

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Conflitos bioéticos do viver e do morrer. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 2011, p.

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VIEIRA, F. S. Possibilidades de contribuição do farmacêutico para a promoção da saúde.

Ciênc. Saúde Coletiva, v. 12, n. 1, p. 213-220, 2007.

WORDEN, W. Terapia do luto: um manual para o profissional de saúde mental. 2 ed. Porto

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World Health Organization, 2004.

______. The role of the pharmacist in the health care system. Geneva: WHO, 1994. 24 p.

(Report of a WHO Meeting).

ZAHER, V. L. Questões éticas dentro de uma unidade de terapia intensiva cardiológica. In:

RIBEIRO, A. L. A.; GAGLIANI, M. L. Psicologia e cardiologia: um desafio que deu certo.

São Paulo: Atheneu, 2010.

89

APÊNDICE A

DADOS ACADÊMICOS E PROFISSIONAIS

NOME:________________________________________________________________

IDADE:_________PROFISSÃO:___________________________________________

ANO DE CONCLUSÃO DA GRADUAÇÃO:________________________________

ESPECIALIZAÇÃO/RESIDÊNCIA:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

PÓS-GRADUAÇÃO:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

MESTRADO:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

DOUTORADO:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

CURSOS COMPLEMENTARES:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

HISTÓRICO PROFISSIONAL:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________

90

APÊNDICE B

ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA

1. Trajetória acadêmica e profissional.

2. Entrada na equipe de cuidados paliativos:

- O que motivou?

- O que acha do trabalho? Diferenças com outras áreas.

- Como se sente?

3. O que pensa sobre as conferências familiares? Benefícios? Prejuízos? E em relação às

decisões de objetivos de tratamento e limitação terapêutica?

4. O que acha sobre a atuação da sua especialidade no cuidado ao paciente em cuidado

paliativo? Quais contribuições para o paciente e família?

5. Sua atuação no processo de morrer.

6.Contribuições de sua especialidade no processo de morrer e outras contribuições.

Atuação muda?

8. Estratégias criadas e utilizadas no dia-a-dia.

9. Qual a percepção sobre a influencia de sua atuação no processo de morrer do paciente em

relação a unidade de cuidados?

10. O que entende sobre luto?

11. O que seria uma boa morte para si mesmo. E para o outro?

12.Experiência pessoal em cuidado paliativo e/ou processo de morrer. Provocou mudanças na

sua atuação?

91

APÊNDICE C

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,.......................................................................................................,RG:.........................conco

rdo em participar voluntariamente da pesquisa “Prevenção de luto complicado em cuidados

paliativos: percepção dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo”,

cujo objetivo é compreender e analisar a formação dos profissionais de uma equipe

multidisciplinar de cuidados paliativos acerca do processo de morte do paciente e a sua

percepção sobre a importância de tal preparo para auxiliar a vivência e processo de luto dessa

unidade de cuidado, realizada pela psicóloga Mariana Sarkis Braz referente ao Mestrado em

Psicologia Clínica na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.

A presente pesquisa não utilizará nenhum procedimento invasivo que ofereça danos à

saúde física ou psíquica dos sujeitos de pesquisa. De acordo com a Resolução196/96, que

afirma que todas as pesquisas com seres humanos oferecem algum grau de risco, a presente

pesquisa não cria qualquer risco excepcional para o sujeito entrevistado, ou seja, o método

não provoca riscos maiores do que os encontrados no cotidiano dos sujeitos. Trata-se de uma

pesquisa de risco mínimo, segundo a classificação do Conselho Federal de Psicologia (CFP)

(CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2000). Caso necessário, a pesquisadora poderá

ser encontrada pelo endereço eletrônico [email protected] ou pelo telefone (011)

78810166.

Por meio deste, aceito ser entrevistada e autorizo a gravação da entrevista em áudio.

Sei que as informações obtidas serão utilizadas com ética na elaboração de trabalhos

científicos e poderão ser utilizadas para publicação em meios acadêmicos e científicos. Será

garantida a confidencialidade das informações fornecidas por mim, e meu nome não será

divulgado nos documentos pertencentes a esse estudo.

Estou ciente de que sou livre para interromper minha participação neste estudo em

qualquer momento, sem ser prejudicada, como também para recusar a dar resposta à qualquer

questão durante a entrevista.

92

Declaro que os objetivos e detalhes desse estudo foram-me completamente explicados,

conforme seu texto descritivo.

Desse modo, concordo em participar do estudo e colaborar com a pesquisa.

Nome da Participante:...........................................................................................

Assinatura da Participante:....................................................................................

São Paulo, ______de _______________de __________.

Pesquisadora:

Mariana Sarkis Braz

Contato: (11) 78810166/ 983620234

RG:44344286-1