Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP Fabio ... · Fabio Marques Ferreira Santos...
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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP
Fabio Marques Ferreira Santos
O limite cognitivo do poder humano judicante a um passo de um novo
paradigma cognitivo de justiça: poder cibernético judicante – o direito mediado
por inteligência artificial
Doutorado em Direito
São Paulo
2016
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Fabio Marques Ferreira Santos
O limite cognitivo do poder humano judicante a um passo de um novo paradigma
cognitivo de justiça: poder cibernético judicante – o direito mediado por inteligência
artificial
Tese apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, PUC-SP, como exigência
parcial para a obtenção do título de
DOUTOR em Direito Processual Civil,
sob a orientação do Professor Doutor
Cassio Scarpinella Bueno.
São Paulo
2016
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Dedico este trabalho à minha amada Mãe pelo incansável apoio incondicionado,
mesmo nos instantes em que o tempo a faz pestanejar, às minhas filhas, Brenda,
Julia, Thabata e Hannah Arendt porque me fazem transformar a dor e o sofrimento
em uma substância mágica e transformadora capaz de me inspirar a cada instante
existencial. Ao meu orientador por acreditar na proposta e abrir caminhos a algo
inusitado irrestritamente. Aos meus leais, fieis, dedicados e incansáveis auxiliares de
pesquisa, crítica e correção: Adriana Santos, Diego Rosas, Fernanda Grejo, Flora
Chrisbender, Oryon Melo e Vivian Catarina.
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AGRADECIMENTOS
À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Ao meu orientador
Ao Professor Dr. Cassio Scarpinella Bueno
Aos demais integrantes da Banca Examinadora:
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BANCA EXAMINADORA
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Aprovado em ____ de ___________ de 2016.
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SANTOS, Fabio Marques Ferreira. O limite cognitivo do poder humano judicante. A um passo de um novo paradigma cognitivo de Justiça: poder cibernético judiciante. O Direito mediado por Inteligência Artificial. Tese de Doutorado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, SP, Brasil, 2016.
RESUMO
O trabalho científico teve como objetivo a investigação do limite cognitivo do Estado/Juiz e suas condições como sistema (modelo de Justiça) operado pela inteligência humana, segundo os estudos de Kahneman, Slovic e Tversky, em Judgment under uncertainty: heuristic and biases, e os reflexos causados a um Direito e uma Justiça com déficit histórico de previsibilidade, certeza e segurança. Foi adotada a epistemologia kuhniana, sua metodologia e seus conceitos, apropriando-se deles como fluxo explicativo da dinâmica de evolução do Direito e da Justiça. Buscou consolidar um diálogo sem vencedores, flexibilizando as granularidades e as incomensurabilidades, entre as Filosofias, as Lógicas, as Ciências Cognitivas e os Direitos (Constitucional e Processual Civil). Os estudos teóricos pinçaram informações e dados, no sentido de demonstrar a falibilidade e a insuficiência do Estado/Juiz como mediador exclusivo do Direito para o alcance da Justiça e a potencial possibilidade de realizar essa equação entre o Direito e a Justiça por intermédio da tecnologia em Inteligência Artificial. Considera, ainda, o avanço, espécie de tecnologia da inteligência, e ao mesmo tempo tem-na como meio seguro e eficaz para a realização de funções mediante estrutura em programação. A pesquisa deu ênfase à previsão Constitucional dos dispositivos constitucionais, em específico ao encapsulado no inciso LXXVIII, do artigo 5º do laureado diploma que assegura “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Com base no permissivo Constitucional, simetricamente concentrou análise ao instituto de Direito Processual Civil, denominado Instauração de Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva, encampado pela lei 13.105/2015, com a precípua missão de uniformizar e dar concretização aos estatutos substantivos legais, cuja técnica processual internalizou por intermédio do novo novel processual, o denominado precedente judicial, o qual tem o condão de verticalizar as decisõesjudiciais, vinculando as decisões definitivas exaradas pelos Tribunais, tendo como lastro uma tese jurídica fundada em questão de Direito. Seu objetivo é de dar tratamento paritário aos casos análogos, maior celeridade aos processos, desafogamento do sistema judiciário e buscar, por este meio, a concretização do Estado Democrático de Direito idealizado na lei Constitucional. Dentre os valores maiores insculpidos na Carta Magna, estão a acessibilidade material, a previsibilidade, a segurança e a certeza de um tratamento isonômico do Direito ao alcance da Justiça Constitucional. Por essas razões e fundamentos, o trabalho cientifico conclui que é possível, considerando os dispositivos legais apontados, defender, dados os limites da pesquisa teórica, a Tese do desenvolvimento legal de uma plataforma digital processual programada em Inteligência Artificial, atuando no armazenamento de dados e informações, gerindo-os e decidindo casos cuja questão
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de Direito tenha precedentes fundados (compreensão interpretativa hermenêutica sobre o Direito consensualizado) nos termos adotados pela legislação pátria vigente. Por fim, a pesquisa ainda sinaliza no sentido de que, dada a evolução da tecnologia em Inteligência Artificial e todos os demais fatores e influências, há que considerar a tendência natural para que o Direito e Justiça não somente passem a ser decididos por inteligência não humana como a mutação irradiada pela técnica em tecnologia de Inteligência Artificial gere uma ruptura de conceitos, formas e estruturas em poucas décadas.
Palavras-chave: Limite cognitivo humano. Paradigma de Justiça. Judiciário. Direito mediado por Inteligência Artificial.
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SANTOS, Fabio Ferreira Marques. The cognitive limit of adjudicative human
power. One step of a new cognitive paradigm of Justice: judicial cyber power. The
Law mediated by Artificial Intelligence. Doctoral thesis. Program of Postgraduate
Studies in Law. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, SP, Brazil, 2016.
ABSTRACT
Scientific work aimed to investigate the cognitive limits of the State / Judge and
their conditions as a system (paradigm of Justice) operated by the human
intelligence, according to studies of Kahneman, Slovic and Tversky, in Judgment
under uncertainty: heuristic and biases, and effects caused to Law and Justice
with a historic deficit of predictability, certainty and security. It was adopted the
Kuhnian epistemology, methodology and concepts, appropriating them as an
explanatory flow of the dynamic of evolution of Law and Justice. It was sought to
consolidate a dialogue with no winners, bringing flexibility to the granularity and
incommensurability between Philosophies, Logics, Cognitive Sciences and Human
Rights (Constitutional and Civil Procedure).Theoretical studies gathered
information and data in order to demonstrate the fallibility and failure of the State /
Judge as an exclusive mediator of law to achieve justice and the potential
possibility of carrying out the equation between Law and Justice through the
Artificial Intelligence technology. These studies also evaluate such evolution as a
kind of intelligence technology and, at the same time, as a safe and effective
means to perform functions using programming structure. The research
emphasized the predictability of constitutional provisions, in particular the content
encapsulated in item LXXVIII of Article 5 of the laureate diploma stating that "it is
assured to everyone at judicial and administrative level, reasonable duration of the
process and the means to guarantee the speed of its proceedings." Based on
permissive Constitution, it focused symmetrically an analysis of the Constitutional
Procedural Law, named Establishment of Repetitive Demands Incident Resolution,
taken over by the Law 13,105 / 2015 with the sole mission to standardize and to
achieve the legal substantive statutes whose procedural technique has
internalized, through the new procedural standard, the so-called judicial precedent,
which has the power to vertically integrate judicial decisions, linking the final
decisions entered by the Courts, having as ballast a legal thesis founded in
question of Law. The objective is to give parity treatment to similar cases, greater
speed to processes, to unburden the judiciary system and therefore, to seek the
realization of the Democratic State of Law envisioned in the Constitution. Among
the most important values contemplated by the Constitution, there are namely
accessible material, predictability, safety and certainty of equal treatment of the
Law according to the Constitutional Justice. For these reasons and rationale, the
scientific work concludes that it is possible, taking into consideration the
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mentioned legal provisions, to defend, within the limits of theoretical research, the
Thesis of the legal development of a procedural digital platform conducted by
Artificial Intelligence, using data storage and information, managing them and
deciding cases whose question of Law has legitimate precedents (hermeneutic
interpretive understanding about consensual Law) in terms adopted by the current
Brazilian legislation. Finally, the research also shows that, in view of the evolution
of Artificial Intelligence technology, as well as other factors and influences, we
must consider the natural tendency for the Law and Justice to start being decided
by non-human intelligence and the changes brought about by the Artificial
Intelligence technology that will cause the break of concepts, forms and structures
in the next decades.
Key words: Human cognitive limit. Paradigm of Justice. Judiciary. Law mediated
by Artificial Intelligence.
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Como qualquer outra atividade social, a
pesquisa científica é conduzida por certas
condições biológicas, econômicas, culturais e
políticas mínimas, que variam relativamente
pouco de uma sociedade para outra. Por
exemplo, um pesquisador, por mais abstrato
que seja o problema com que se ocupa,
precisa ter saúde e um salário regular que lhe
permita concentrar-se em seu trabalho.
Precisa, também, ter livre acesso à informação,
sem excluir o livre intercâmbio de experiências
e opiniões com colegas nacionais e
estrangeiros. Também necessita de
liberdadeacadêmica para discorrer sobre o seu
tema e a maneira de tratá-lo, assim como de
liberdade para difundir o resultado de seu
trabalho (liberdade especialmentenecessária se
o resultado contradiz opiniões
preestabelecidas).
Mario Bunge
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14
1 ASPECTOS PROPEDÊUTICOS FUNDAMENTAIS DO CONHECIMENTO ......... 29
1.1 A formação estrutural do conhecimento .............................................................. 29
2 A IMPORTÂNCIA DA EPISTEMOLOGIA DE THOMAS KUHN NO
DESENVOLVIMENTO DA CIÊNCIA DO DIREITO E DA JUSTIÇA ......................... 45
2.1 Aspecto dinâmico da ruptura paradigmática e sua contribuição para um novo
conceito de Direito e de Justiça ................................................................................. 45
3 O MOVIMENTO DE RUPTURA COMO PROGRESSO DA CIÊNCIA EM THOMAS
KUHN ........................................................................................................................ 68
3.1 A contribuição da ruptura da ciência no estabelecimento da nova ordem do
Direito e da Justiça para o enfrentamento de uma nova Era .................................... 68
4 AS RELAÇÕES DINÂMICAS DA EPISTEMOLOGIA DA CIÊNCIA EM THOMAS
KUHN, SUA LÓGICA E SEUS CRITÉRIOS PARA O DESENVOLVIMENTO
CIENTÍFICO .............................................................................................................. 82
4.1 As propriedades dinâmicas da ciência a partir de Thomas Kuhn e sua
contribuição para a explicação do desenvolvimento paradigmático do Direito e da
Justiça ....................................................................................................................... 82
5 AS ESCOLAS DAS PSICOLOGIAS .................................................................... 102
5.1 Estruturas psicológicas propostas para a explicação do funcionamento da mente
humana ................................................................................................................... 102
6 O SISTEMA COGNITIVO DE DECIDIBILIDADE ................................................. 118
6.1 Aspectos relevantes a respeito do sistema cognitivo humano e as influências a
respeito de sua percepção no ato de decidir ........................................................... 118
7 O SISTEMA NEUROLÓGICO HUMANO ............................................................. 138
7.1 A dinâmica do cérebro humano e sua importante contribuição para o rompimento
de limites ................................................................................................................. 138
8 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL ............................................................................... 147
8.1 Aspectos estruturais e dinâmicos do sistema da Inteligência Artificial .............. 147
8.2 A Inteligência Artificial como “meio” adequado e útil para a mediação do Direito e
da Justiça ................................................................................................................ 185
9 ASPECTOS ESTRUTURAIS DA VERDADE ....................................................... 214
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9.1 O estatuto da verdade, seu tratamento histórico jurídico na validação do Direito e
da Justiça e as lógicas relacionadas ....................................................................... 214
10 O ESTADO CONSTITUCIONAL E OS “MEIOS” PARA A CONQUISTA DOS
DIREITOS E DAS GARANTIAS FUNDAMENTAIS ................................................ 239
10.1 Aspectos de base de um projeto do Estado Democrático de Direito para um
Estado Constitucional .............................................................................................. 239
10.2 O inevitável destino do uso da tecnologia como “meio” para a concretização do
Projeto do Estado Democrático de Direito .............................................................. 249
11 CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DO ATUAL PARADIGMA (DE/DA)
JUSTIÇA ................................................................................................................. 275
11.1 Uma Justiça com natureza judiciária ............................................................... 275
12 PROCESSO CIVIL E SEUS ASPECTOS RELEVANTES SEMPRE
IMANENTES .......................................................................................................... 301
12.1 Aspectos principiológicos do processo ............................................................ 301
12.2 A relevância Constitucional processual ........................................................... 306
13 PROCESSO CIVIL E SEU NOVO-REFORMADO ESTATUTO ......................... 311
13.1 Os aspectos desde a estrutura ao novo-reformado CPC ................................ 311
13.2 Uma teoria procedimental simplificada para a resolução dos conflitos ........... 320
13.3 O papel do Estado/Juiz no novo-reformado CPC na ponderação dos
valores ....................................................................................................... 325
14 ASPECTOS GERAIS PARA UM MODELO ESTRUTURAL PROCESSUAL
TECNOLÓGICO ...................................................................................................... 334
14.1 A verdadeira função do conhecer para a devida programação ....................... 334
14.2 As súmulas, a jurisprudência e os precedentes, seus papéis sistêmicos
processuais embrionários de linguagens tecnológicas ........................................... 343
14.3 O desembarque da IIRDR (Instauração de Incidente de Resolução de Demanda
Repetitiva) no sistema processual e suas perspectivas no cenário processual
brasileiro .................................................................................................................. 358
14.4 O Processo Civil enquanto instrumentalidade com características
tecnologizadas e sua eficaz utilidade ...................................................................... 369
15 O LIMITE COGNITIVO DO PODER JUDICANTE ............................................. 390
15.1 Uma anomalia da natureza humana ............................................................... 390
16 CONSIDERAÇÕES GERAIS A RESPEITO DA PRIMEIRA REFORMA DO
PODER JUDICIÁRIO .............................................................................................. 445
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16.1 Os motivos históricos do sistema operacional judicante e a centelha da
tecnologização proposta entre os pontos e contrapontos da reforma ..................... 445
17 A EXISTÊNCIA DE UMA RELAÇÃO PARADOXAL NA CONCEPÇÃO DE
JUSTIÇA ................................................................................................................. 466
17.1 Por uma redefinição de Justiça, uma alquimia fundida a partir da cultura, do
homem e da linguagem para a edificação de um plano Constitucional social
concreto .................................................................................................................. 466
18 CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DE UM NOVO PARADIGMA DE
JUSTIÇA ................................................................................................................ 487
18.1 A epistemologia das decisões mediadas por um sistema tecnológico orientado a
partir de uma Inteligência Artificial ........................................................................... 487
19 ASPECTOS MACROCOGNITIVOS ................................................................... 516
19.1 A relação profusora da Inteligência Artificial com as ciências físicas, neurofísica,
neuroquímica e seus impactos no futuro do destino do Direito e da Justiça ........... 516
CONCLUSÃO ......................................................................................................... 564
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 568
ANEXO A – PERCEPÇÃO DO BRASILEIRO SOBRE A JUSTIÇA (SIPS) ........... 589
ANEXO B – PESQUISA SOBRE O JUDICIÁRIO: VISÃO DO JUIZ ...................... 605
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INTRODUÇÃO
O trabalho de pesquisa é algo envolvente, é uma via tomada por escolha e
não por opção. Sabe-se que o mais importante dela será trazer ao mundo
acadêmico uma inovação e, se possível, buscar edificar ideais de originalidade.
Aquela ou esses são o maior desafio em tempos em que o homem pós-
moderno vive a consumir um estoque intelectual de que não foi contribuinte, e, por
vezes injustificadamente, esse comportamento o mantém no amorfo espaço da
conservação.
Vive-se em uma época definida como pós-modernidade, na qual a
efemeridade dos objetos e das ideias se tornam fugazes e sem propósitos, em que
os trabalhos logo que apresentados se perdem no esquecimento ou na
desimportância de sua real importância, além de não encontrar solo fecundo para o
incansável aprimoramento.
Isso exige do pesquisador um compromisso de vida pelo comprometimento,
pela dedicação à manutenção de fazer com que suas ideias e suas ações
sobrevivam no tempo, pela ação, rompendo as dificuldades e os obstáculos que
impedem os homens de se emanciparem.
O trabalho vem mesclado por conhecimentos advindos de outras ciências que
não somente a do Direito, posição proposital e vital, cujo objetivo é a de oportunizar
uma fertilização indutiva materialmente diferente na construção não somente do
Direito mas do Processo Civil como ramificação especializada daquele. Essa
concepção já era um ideário concretista no âmbito processual, como ilustra o trecho
da exposição de motivos do CPC de 1939:
[...] durante a reunião do Congresso de Direito Judiciário, e na presença de Vossa Excelência, de declarar que já era tempo que o Direito, e particularmente o Direito judiciário, se beneficiasse da renovação das outras disciplinas do espírito, servindo se, na investigação da verdade.
Como se constata, o Processo Civil é uma daquelas áreas que esbanjam
riqueza estética e material (uma obra de arte, porém com peculiaridades e critérios
próprios) atinentes com sua dogmática.
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É um contribuinte forte e essencial quando se trata de instrumentalização –
para a obtenção de um resultado material do Direito, ele é representante de uma
categorização das regras para a organização de resultados materiais do Direito para
a obtenção da Justiça. Simplesmente, uma tecnologia em linguagem técnica jurídica
desenvolvida pelo ator humano, para mediar a relação entre a espécie humana e
suas relações sociais com o mundo.
No entanto, sua responsabilidade na concretização da Justiça material deve
ser delimitada, como bem justificada é, nas exposições de motivo do CPC de 1973,
cujo texto é plenamente atual no contexto vigente.1É, portanto, na estrutura do
sistema processual que habita a peça central operacional da Justiça, o Estado/Juiz,
responsável por mediar o Direito, dando ao sistema organicidade e coesão para sua
efetiva funcionalidade. Isso significa que essa peça central operacional
responsabiliza-se, em maior parte, em sua precípua e suprema missão, pela não
fragmentação do sistema do Poder Judiciário.
É cediço que, no processo, acontecem a entrega do bem da vida e a
resolução dos conflitos, a partir da aplicação dedutiva da norma objetiva ao caso
concreto, de sua complexidade em conceitos e de sua estrutura procedimental,
operada pelo ator humano judicante, o Juiz.
Mesmo com o advento da Lei 13.105/15, que trouxe a lume o novo Código de
Processo Civil, ainda assim espelha um sistema parametrizado em regras e
procedimentos para o desenvolvimento de um sistema que, ao final, objetiva
proporcionar a entrega do bem da vida mediante “um resultado prático material
previsto pelo Direito”, por intermédio da prestação jurisdicional, mediada pela
inteligência humana.
A prestação jurisdicional, atualmente – em que pesem os meios alternativos
para a resolução de conflitos, tais como arbitragem, mediação, conciliação, dentre
outras formas existentes ou embrionárias – não afastam do Poder Judiciário a
responsabilidade maior ao julgar, enfim, por decidir as questões que lhes são
apresentadas, além do seu papel de sentinela da constitucionalidade, moldada
segundo as regras da organização judiciária.
1 Não se cuide que a reforma processual baste, de per si, para resolver, como que por encanto, todos os problemas da administração da justiça. O melhor sistema processual estará fadado a completo malogro, se não for aplicado por um excelente corpo de juízes. É que entre o processo civil e a organização judiciária deve haver um perfeito equilíbrio.
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O Poder Judiciário e sua organização almejam, por esse viés, alcançar a
estabilidade do sistema judiciário, como ideário Constitucional reprisado nas
exposições de motivo dos CPC’s de 1939, 1973 e 2015, em uma espécie de mantra
ideológico do Poder Judiciário assentado no solo hermenêutico da interpretação.
Esse órgão, porém, criado historicamente como instrumento de orientação,
pacificação e resolução de conflitos, com escopo voltado para os interesses da
Justiça, tem, no tempo, se revelado consoante interesses do próprio Estado e de
pessoas, enquanto propósitos, divorciados dos fins colimados pelos valores maiores
da própria Justiça.
Melhor explicando, o interesse da Justiça não é o mesmo das pessoas; se
isso acontece, não há Justiça, restam somente interesses, como já orientava a
exposição de motivos do CPC de 1973: “A aspiração de cada uma das partes é a de
ter razão; a finalidade do processo é a de dar razão a quem efetivamente a tem.”
Infere-se, portanto, dessa assertiva que ninguém, nem mesmo o Estado, está acima
da lei.
Destaca-se disso que o ato de julgar ou decidir secularmente se tem
apresentado como exclusivo, reservado a um homem que, legitimado pelo Estado,
atribui-lhe a responsabilidade, depois de investido no cargo de Juiz, de operar como
peça maior e central do Poder Judiciário. Isso é evidente, porque é dado a esse ator
o poder de tomar as decisões jurisdicionais, o que já era verbalizado desde 1939,
por Francisco Campos na exposição de motivos daquele CPC.2
2 O primeiro traço de relevo na reforma do processo haveria, pois, de ser a função que se atribue ao juiz. A direção do processo deve caber ao juiz; e este não compete apenas o papel de zelar pela observância formal das regras processuais por parte dos litigantes, mas o de intervir no processo de maneira, que este atinja, pelos meios adequados, o objetivo de investigação dos fatos e descoberta da verdade. Daí a largueza com que lhe são conferidos poderes, que o processo antigo, cingido pelo rigor de princípios privatísticos, hesitava em lhe reconhecer. Quer na direção do processo, quer na formação do material submetido a julgamento, a regra que prevalece, embora temperada e compensada como manda a prudência, é a de que o juiz ordenará quanto for necessário ao conhecimento da verdade.
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E complementa Francisco Campos:
Prevaleceu-se o Código, nesse ponto, dos benefícios que trouxe ao moderno direito processual a chamada concepção publicista do processo. Foi o mérito dessa doutrina, a propósito da qual deve ser lembrado o nome de Giuseppe Chiovenda, o ter destacado com nitidez a finalidade do processo, que é a atuação da vontade da lei num caso determinado. Tal concepção nos dá, a um tempo, não só o caráter público do Direito processual, como a verdadeira perspectiva sob que devemos considerar a cena judiciária em que avulta a figura do julgador. O juiz é o Estado administrando a justiça; não é um registro passivo e mecânico de fatos, em relação aos quais não o anima nenhum interesse de natureza vital. Não lhe pode ser indiferente o interesse da justiça. Este é o interesse da comunidade, do povo, do Estado, e é no juiz que um tal interesse se representa e personifica.
Esse ato de exclusividade ante o Estado Democrático de Direito é
contestável, ao menos em tese. Sendo a exclusividade uma das formas de exclusão
de opção ou opções da pluralidade de Direitos, seria ela a demonstração de uma
tirania democrática do Direito.
Tal afirmação, todavia, não se sustenta plenamente, na medida em que o
sistema reconhece e autoriza outras formas legítimas para a busca de resolução de
conflitos, inclusive as já mencionadas, sem afastar, todavia, do Poder Judiciário, sua
responsabilidade por garantir legitimidade aos Direitos e às Garantias Fundamentais,
principalmente quando violados pelas outras vias para a obtenção da Justiça.
Todavia, o judiciário representa a última instância e o mecanismo
monopolístico constitucionalmente reconhecido e legitimado dentro do Estado
Democrático de Direito como órgão aplicador ou fiscalizador da ameaça ou lesão do
Direito, a quem se reservam a vigilância e a consequente lida corretivas pelas
ameaças e lesões de Direito praticadas pelo próprio Poder Judiciário, por práticas
ativas ou omissivas do seu operador Estado/Juiz, ainda que no exercício regular de
suas atribuições e funções judicantes.
Em que pese a existência de meios alternativos para a resolução de conflitos
em que o homem participa como mediador, em que pese ser o Estado/Juiz um
signatário maior do controle central do Poder Judiciário, ainda que órgãos ou meios
possam vigiar suas ações, em ambos os contextos, não se afastam do risco da
ameaça e/ou da lesão de Direito, aliás, do próprio Direito quando manuseado por
sua condição humana de falibilidade.
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Isso se verifica porque o Direito é mediado pelo homem para o alcance da
Justiça. Suas condições cognitivas refletem-se simetricamente em última instância
nos problemas estruturais e materiais do Direito que, criado a partir da participação
direta e indireta do próprio homem, ao participar ele, quando do processo de
reconstrução e aplicação, prejudica os interesses da própria Justiça.
A Justiça, embora idealizada para acontecer por intermédio da jurisdição que
é monopólio do Estado, que a exerce de forma soberana por intermédio de um de
seus poderes, o Poder Judiciário, faz-se representada pela figura paternalista do
Estado/Juiz que passa a ser objeto de análise frente a uma nova estrutura de
conhecimento, dada a ausência de resolução das anomalias da imprevisibilidade, da
morosidade e da inefetividade da Justiça material ideologicamente prevista e
prometida pelo diploma Constitucional, pelo atual paradigma.
A questão que se propõe, dada a responsabilidade encampada pelo Poder
Judiciário, está em torno do limite cognitivo do poder humano judicante, uma vez
que, sendo o ato de julgar uma atribuição outorgada pelo Estado, é inquestionável
serem de responsabilidade extensiva do Estado os atos praticados pelo operador do
sistema Judiciário que lhe é subordinado.
Nem sempre, no entanto, os danos causados por esse mediador do Direito
têm o interesse do seu usuário em obter o Direito de reparação; isso significa dizer
que o que o jurisdicionado almeja, na verdade, é sua pretensão primária e o mais
importante, é o de obter o direito de ter o Direito.
Além disso, a questão de fundo, quanto ao limite cognitivo pontuado que será
examinado em pormenores no discorrer da Tese, envolve o conhecimento como um
todo. Causa o desalojamento do Direito e da Justiça, pela demasiada demora,
incerteza e insegurança no âmago do sistema judiciário, fruto de um conflito
ideológico travado no campo hermêutico de interpretação, ao qual a realidade social
dos novos tempos não permite mais assistir.
Aventa-se, assim, a hipótese de não serem o pensar e a inteligência, dentre
outras faculdades intelectivas, prerrogativas de propriedade da espécie humana,
dadas as novas formas organizacionais de vida, de problemas, de trabalho, que
exigem soluções claras para problemas bem definidos.3
3 Como esclarece Honoré: “Os especialistas consideram que o cérebro opera com dois modos de pensamento. Em seu livro Hare Brain, Tortoise Mind – Why Intelligence Increases When You Think Less [Cérebro de lebre, mente de tartaruga – Por que a inteligência aumenta quando pensamos
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Assim, passa a ser plenamente defensável a existência de tais faculdades em
outras formas de inteligência, passando a não ser de exclusividade da espécie
humana para determinados fins, principalmente nos aspectos em que a
tecnologização da ação humana possa contribuir para o avanço da própria espécie.
Dessa forma, em estando resguardados os Direitos e as Garantias
Fundamentais previstos na Constituição Federal, em oportunidade ao regime
Democrático de Direito, reconhecer uma nova epistemologia cognitiva responsável
por decidir, dado o nível de avanço das tecnologias que marcam o novo século,
torna-se coerente afirmar que o Direito possa ser mediado por uma Inteligência
Artificial.
Para isso, o estudo desce artesianamente, filtrando os aspectos da
Constituição Federal de modo a certificar da compatibilidade desse “meio” como
tecnologia em inteligência não humana, apta ao pleno funcionamento no âmbito de
uma informática decisória ou de julgamento.
Haveria, assim, o acolhimento e o reconhecimento no sistema jurídico de
mais um meio alternativo para a informação, a orientação e a resolução de conflitos,
concebendo ao jurisdicionado a oportunidade de recorrer ao Poder Cibernético
Judicante. É esse um dos cernes da Tese, considerando-se opção, desde que não
venha a colidir com os Direitos e as Garantias Fundamentais.
É uma das formas de reconhecimento e de concretização material do regime
Democrático de Direito o reconhecimento da pluralidade e das diversidades, a
outorga da Justiça ao jurisdicionado, diferente da forma como se considera
classicamente o Poder Judiciário dado somente por intermédio de uma Justiça
Judiciária cujo operador é o Estado/Juiz.
Assim, a Justiça mediada por uma Inteligência Artificial representaria mais um
meio alternativo para a informação, a simulação e a orientação de Direitos bem
como para a resolução de conflitos: o propósito de um Poder Judicante Cibernético
como um dos canais do Estado na operação de aplicação do Direito.
menos], o psicólogo britânico Guy Claxton refere-se a eles como Pensamento Rápido e Pensamento Devagar. O Pensamento Rápido e Pensamento Devagar. O Pensamento Rápido é racional, analítico, linear e lógico. É o que fazemos quando estamos sob pressão, ante o tique-taque do relógio; é a maneira como os computadores pensam e também a maneira como funcionam nossos ambientes modernos de trabalho; graças a ele, podemos obter soluções claras para problemas bem definidos (HONORÉ, Carl. Devagar; tradução Clóvis Marques. 7. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 142-143).”
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Isso representaria mais uma forma alternativa na resolução de conflitos bem
como o reconhecimento do avanço da tecnologia como partícipe inafastável de uma
nova realidade social, em que as regras previstas na lei e a conduta humana, ambas
devidamente categorizadas, possam algoritmicamente ser mediadas por um sistema
tecnológico.
A tecnologização da Justiça, por intermédio da Inteligência Artificial (IA), em
decorrência do seu caráter de cientificidade de realização geraria a entrega de uma
participação neutra e imparcial específica, reconhecida pelos representantes da
comunidade jurídica.Passaria a ser uma realidade crível e possível no campo da
efetividade material do Direito, ainda que seu conceito como um fenômeno mutável
passasse por um processo de reconceituação. Se convencionado e aprovado pela
comunidade científica das ciências jurídicas, passaria a ser legítimo e legal,
internalizando-se ao sistema judiciário.
A base cibernética contribuiria para a integração, a uniformização e a
padronização exigidas pelas demandas, principalmente as de massas, conforme se
extrai da exposição de motivos do CPC de 2015 “Com os mesmos objetivos, criou-
se, com inspiração no direito alemão, o já referido Instauração de Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas (IIRDR), que consiste na identificação de
processos que contenham a mesma questão de direito[...]”.
A acessibilidade e a previsibilidade quanto ao resultado do Direito na
concretização da Justiça passariam a ter uma reconfiguração mais efetiva e estável
por intermédio de integração, uniformização e padronização de informações e de
dados, minimizando, dessa forma, o risco de se conviver com decisões díspares e
conflitantes.
Sinaliza essa ferramenta técnica processual, do Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas (IIRDR) como instituto processual incorporado ao sistema
processual para o alcance da Justiça, a partir de 2016 quando vigente, na
preocupação do próprio sistema judiciário por sua fragmentação, diante da
probabilidade de que as decisões conflitantes geram pela ausência de integração,
unificação e uniformização.
Essa falha sistêmica jurídica causa inevitavelmente o descrédito e
consequente afastamento do Poder Judiciário que estaria a insistir na Justiça
ideologicamente formal. Aliás, é bem verdade que qualquer sistema, quando uma de
suas peças é insuficiente ou não compatível para os seus fins, no caso do sistema
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judiciário, o ordenamento passa a conviver com uma real ausência de efetividade
material, o que aparece alardeado nos CPC’s de 1939, 1973 e 2015.
Nessa perspectiva, sendo o Direito e a Justiça formas secularmente
conhecidas e reconhecidas, desde os períodos mais remotos, como modelos,
paradigmas de transição, legalmente implementados pelo Estado e legitimamente
aceitos pela sociedade, atualmente, dada a excessiva procura, aliada à
complexidade advinda em decorrência da densidade demográfica, esse sistema,
operacionalizado pelo Estado/Juiz, tem-se mostrado ineficaz.
Destarte, a existência de um padrão reconhecido, independentemente do
seguimento ou da natureza, representa um pressuposto que permite prever que, em
algum momento, haverá uma ruptura como modelo anterior, dadas as condições do
não atendimento à manifestação das necessidades existentes causadas pelo atual
modelo. Por isso, do questionamento à Justiça judiciária quanto à probabilidade de
ruptura desse modelo e o surgimento de um novo paradigma, em que a
tecnologização possa aquilatar e participar como elemento central.
Operar na ponderação da aplicação do Direito como mediadora e, com isso,
demonstrar como o apanágio dessa mudança e a identificação de que esse
processo de ruptura não está acontecendo aleatoriamente representa, em concreto,
uma fratura incomensurável não radical e ao mesmo tempo multidisciplinar da
realidade existente, em contraste com uma outra, que exige uma estratégia material
diferente para o enfrentamento de um novo mundo.
A Inteligência Artificial, nesse contexto, representa uma tecnologia em
inteligência nutrida de técnicas multifacetadass, tanto quanto representaram e
representam a oralidade humana e a escrita, com a distinção de que a inteligência
humana da descoberta criou a IA. E essa, para os fins da presente pesquisa, não se
limita como um simples meio alternativo de tecnologia em si, mas como meio cuja
linguagem tem utilidade eficaz inclusive na mutação do Direito Processual em sua
evolução.
Aliás, o Estado detém base científica ao compreender que o novo modelo tem
fundamento, a partir de uma demanda de insatisfação reprimida refletida
estatisticamente no atual descrédito do Poder Judiciário, em decorrência do tipo de
Justiça proporcionada ao jurisdicionado, que vem transformando a Constituição
Federal em mera etiqueta ideológica da Justiça.
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Por isso, do clássico A estrutura das revoluções científicas, de autoria de
Thomas Kuhn, é extraído que o conhecimento – e tudo por ele gerado em algum
momento – pode sofrer mudanças significativas, inclusive dentro dos processos
previamente definidos e estabelecidos pelo conhecimento desenvolvido em
determinado tempo e espaço.
O dinamismo é um aspecto da ciência merecedor de tratamento exordial na
presente Tese, como pressuposto do estabelecimento da base cognitiva científica
para compreensão da concepção de paradigma, que se perfaz no seio da
comunidade científica, a partir da percepção que ela faz com relação ao mundo que
a circunda.
Na ciência do Direito, esse fenômeno não parece diferente, uma vez que é
evidente a presença de modelo dada a mutabilidade com que o comportamento da
sociedade se desloca de tempos em tempos de “insight”. Ela ocorre na
concatenação de novos conceitos para a sedimentação dos anteriores.
Atualmente, o que se tem como definido é um paradigma de Justiça judiciária
(denominação reticulada para os limites do presente estudo), contendo todo um
histórico, uma infraestrutura e uma estrutura de conhecimento que a tornam única,
exclusiva e responsável pela entrega da prestação jurisdicional estatal, em que o
Estado/Juiz é o central operador.
É um sistema físico-químico/orgânico que, pela limitação cognitiva comum ao
gênero humano em que o homem/Juiz é espécie, apresenta problemas na acepção
maior de Justiça e de seus atributos, como já sinalizado.
Sob esse aspecto, os pesquisadores da ciência do Direito debruçam-se para
denunciar que o modelo ofertado para a entrega da Justiça, além de questionável, é
superável, dada sua ineficiência material.4
4 Para Goldstein, “A prova e o paradoxo de Kurt Godel..., Em ciência [...] O novo somente nasce com dificuldade, é vítima da resistência, diante de um cenário proporcionado pela expectativa. Inicialmente, apenas o previsto ou o que conhecemos é que nos permitimos experimentar, mesmo que mais tarde a anomalia identificada seja observada e reconhecida (GOLDSTEIN, Rebecca. Incompletude: a prova e o paradoxo de Kurt Gödel; tradução Ivo Korytowski. São Paulo: Companhia das Letras, 2008).”
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O modelo operado pelo “Estado/Juiz” a partir de uma atribuição realizada pelo
Estado, órgão que organiza, distribui e delega suas funções a seus subordinados,
tem permitido ao longo de sua experiência prática experimentar problemas das mais
diversas naturezas, dentre elas a impossibilidade da garantia da neutralidade e da
imparcialidade nas decisões, e a morosidade na concretização da Justiça.
Isso se dá porque o sistema de operacionalização da lei e da distribuição da
Justiça é mediado pelo Estado/Juiz na aplicação da lei às questões que lhe são
subordinadas. A questão tem destacado atenção pela fragilidade com que a
intelectualidade humana é limitada e pela facilidade com que suas faculdades são
influenciáveis.
Nesse processo, o Estado/Juiz, a partir de métodos lógicos, hermenêuticos,
epistemológicos e sistematizados realiza os processos de decodificação,
interpretação e reconstrução do Direito para a aplicação aos casos concretos. No
entanto, o resultado quase sempre é tomado de aceitação duvidosa, pois alguns
princípios, dentre eles os da imparcialidade e da neutralidade, são postulados
geradores de um dilema incontornável, quando os dogmas da certeza e da
previsibilidade são convocados a prestar contas.
Tem-se, então, prejudicada a credibilidade do Direito e da Justiça, cuja
expectativa de alcance se dá a partir da concretização material do Direito.Tal fato,
episodicamente, não acontece como proposto na Carta Constitucional de forma
plena e sem previsibilidade de que isso venha a acontecer, na medida em que a
base cognitiva vê-se impossibilitada de realizá-la, diante das intermináveis
contradições ideológicas realizadas pelo operador do Direito quando da entrega da
Justiça.
Isso acontece porque a estrutura do conhecimento humano, pressuposto vital
ao exercício de um poder denominado “Justiça judiciária”, é falível, em decorrência
de sua limitação cognitiva.
Observa-se que um dos maiores riscos ofertados ao Poder Judiciário na
operacionalização do Direito para o alcance da Justiça é reservado ao risco do
sistema cognitivo humano (e que é a peça operacional central do sistema judiciário),
face à imprevisibilidade de seus sentidos, “os conectores” do seu eu, e o eu do
mundo, que, se não se estabelecer de forma clara e objetiva, turvará sua percepção
frente à realidade assistida, causando-lhe falhas, erros e equívocos em suas
decisões.
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Dessa forma, uma vez disponível, o Direito, como regra vigente para sua
aplicação, ou melhor, como conhecimento válido e legítimo para orientar a
sociedade como regra de conduta aceitável, passa por um processo de reconstrução
quando de sua convocação para atender à determinada ocorrência no mundo
prático-social.
No entanto, o conhecimento do Direito para sua aplicação passa a ser
contaminado pela intervenção do homem e por seus aspectos ideológicos, isto é, o
Direito começa, em si, a ser desvirtuado por fatores diversos que influenciam seu
operador quando de sua reconstrução, não terminando o ciclo, nem sempre, em seu
início, que é a lei, disso se extrai a injustiça.
Nesse cenário, a Justiça passa a não acontecer por ausência de elementos
essenciais ou para alguns de pressupostos essenciais válidos ao cumprimento de
seus fins. É perceptível que, se o modelo existente de Justiçaé é eficaz ou não, tem
em si, anterior à sua estruturação, um conhecimento que lhe dá a estatura de poder
(regra de conduta), a fim de legitimá-lo como tal, outorgando-lhe poder e
reconhecimento da decisão, pois esteve dentro da moldura proporcionada pela lei,
portanto, Justiça é a aplicação de um Direito vinculado por uma lei.
A estrutura do conhecimento da norma é ponto inconteste, salvo mudanças
da estrutura diante do não atendimento em decorrência da evolução da sociedade a
que se destina, o que é diferente do conhecimento exercitado pelo homem quando
da aplicação do conjunto normativo disponível para aplicabilidade.
O modelo do Direito moderno representa a postura da força para a
manutenção da ordem sobre o caos, porém não o nega, ao contrário, data o fim do
ciclo com o advento da emancipação do homem, da ciência e da tecnologia como
modelo da pós-modernidade, pois, frente a uma logicidade e a uma racionalidade
distintas, o sistema judiciário mediado pelo Estado/juiz tem-se revelado incompatível
com as necessidades e as exigências da vida pós-moderna.5Em um novo momento
5 É nesse ponto elementar que a passagem de Boaventura Santos fornece oxigênio intelectual a tal propósito, senão vejamos: “A ordem que se buscava era, desde o início e simultaneamente, a ordem da natureza e a ordem da sociedade. Enquanto a tensão entre regular e a emancipação foi protagonista no paradigma da modernidade, a ordem foi sempre concebida numa tensão dialética com a solidariedade, tensão que seria superada mediante uma nova síntese: a ideia da “boa ordem”. Desaparecida a tensão, a ideia de boa ordem daria lugar a ideia de ordem tout court. Ao direito moderno foi atribuída a tarefa de assegurar a ordem exigida pelo capitalismo, cujo desenvolvimento ocorrera num clima de caos social que era, em parte, obra sua. O direito moderno passou, assim, a constituir um racionalizador de segunda ordem da vida social, um substituto da conscientização da sociedade, o ersatz que mais se aproximava – pelo menos no momento da plena cientificização da sociedade que só poderia ser fruto da própria ciência moderna – para desempenhar essa função, o
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histórico, dados os avanços das ciências, a pesquisa encontra nesse solo elementos
que demarcam as trincas e as rachaduras do modelo moderno, abrindo, assim,
espaço para um novo paradigma encampado por uma nova estrutura cognitiva de
gestão para a aplicação do Direito em todo seu sistema operacional, exigidos pela
pós-modernidade.
Essa fenda gerada no sistema operacional do Poder Judiciário é tributária da
insuficiência da estrutura psicológica do homem como homo sapiens e sua fácil
influenciabilidade quando das tomadas de decisões, por fatores dos mais diversos,
tais como pessoalidade, subjetividade, econômico, políticos, dentre outros que o
exponham a aspectos valorativos ou morais.
A realidade perceptiva do homem o torna um “ser” de limitações de sua
própria realidade e do mundo em que vive. E isso é objeto de estudo científico da
obra Judgment under uncertainty: Heuristics and biases, de Kahneman, Slovic e
Tversky (Julgamento sob incerteza: bases e heurísticas), tradução pessoal, que
embasa cientificamente a questão enfrentada quando o dilema da probabilidade
cognitiva enfrenta o desconhecido pântano da representatividade proporcionada
pelos sentidos e o risco dos resultados, quase sempre obtidos pela intuição
perceptiva.
Portanto, o limite cognitivo do poder humano judicante representa um dos
maiores problemas do Judiciário diante da nova era secular, cuja marca se baseia
no avanço da tecnologia e com ela na tecnologizaçãodas ações humanas em todos
os sentidos e em todas as formas pelas machine’s sapiens.
Sendo o operador da Justiça uma peça central do sistema do Poder
Judiciário, poderá o representante supremo e ícone identidário da Justiça ser um
paradigma? Como todo paradigma, em dadas circunstâncias sua ruptura representa
uma condição natural do ciclo.
direito moderno teve de se submeter a racionalidade cognitivo-instrumental da ciência moderna e tornar-se ele próprio científico. A cientificização do direito moderno envolveu também sua estatização, já que a prevalência política da ordemsobre o caos foi atribuída ao Estado Moderno, pelo menos transitoriamente, enquanto a ciência e a tecnologia não pudessem assegurar por si mesmas (SANTOS, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência.
8. ed. São Paulo: Cortez, 2013, p. 119)”.
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Torna-se insurgente um novo modelo operacional gerido por um sistema
cibernético parametrizado pela Inteligência Artificial conteudista de uma gramática,
da sintaxe e uma semântica estabelecidas segundo a natureza da nova linguagem
e, por consequência, um novo padrão de Justiça. Para Giere “Uma Revisão de Giere
da Ciência sem Leis e Perspectivismo Científico (2009)”, seja inevitável.6
O homem, valendo-se da ciência, tem descoberto e reconhecido a
possibilidade de sua complexidade estar sendo aos poucos desvendada. Nesse
processo científico, tem observado que a tecnologia e as máquinas que ela produz
são seus aliados.
Não que essa nova forma cognitiva ou instrumental o substitua
definitivamente, mas talvez ela possa adiantar o andar da viagem rumo ao futuro,
inclusive na concretização da Justiça em uma era demarcada pela transumanidade.
Sendo ela um produto social essencial, tal status somente poderá ser pleno
quando cada cidadão puder desfrutar, a qualquer hora do dia e da noite, de um
acesso a consultar e a obter uma resposta, simulada ou concreta, a seus Direitos, a
obter uma Justiça rápida que, ao ser concedida, não esteja sob a influência da
pessoalidade ou da subjetividade humana.
É nessa cruzada entre o sistema da Justiça judiciária e a condição de seu
maior representante, “o Estado/Juiz”, que demandado por seus assemelhados
excessivamente, a níveis subumanos, trabalhando em condições hostis, quase que
como uma máquina, por sua própria condição humana, enfrenta e encontra na sua
própria limitação a impossibilidade de fazer a entrega da Justiça da pós-
modernidade.
Por isso, o insight de um sistema que se afasta da inteligência humana como
mediadora do Direito e passa para um Direito mediado por uma Inteligência Artificial
mostra-se factível. Tal mudança representa um desenvolvimento positivo que a
história registra a partir da presença inafastável da tecnologia e da mutação causada
com o seu advento.
6 O comportamento do lógico, matemático e cientista é a parte mais difícil do campo do comportamento humano e, possivelmente, o fenômeno mais sutil e complexo já submetido a uma análise lógica, matemática, ou científica, mas porque ainda não foi bem analisado não se deve concluir que se trata de um tipo diferente de campo, que será abordado apenas com um tipo diferente de análise.
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Trata-se de um divisor de águas, aqui considerado como estímulo do
progresso histórico, como verbaliza Max Horkheimer (2002, p. 183), em trecho da
obra Eclipse da Razão:
Cada vez mais na história, as ideias se desfizeram dos seus cueiros e lutaram contra os sistemas sociais que as incomodavam. A causa, em ampla escala, é o fato de que o espírito, a linguagem e todos os domínios da mente sempre colocam em jogo, necessariamente, aspirações universais. Até mesmo os grupos dominantes, que pretendem antes de tudo defender os seus interesses particulares, devem acentuar motivos universais na religião, na moralidade e na ciência. Dão assim origem à contradição entre o existente e ideologia, uma contradição que estimula o progresso histórico.
Por ser o homem uma peça, como todas as demais, orgânicas ou não,
inanimadas ou não, que compõem o sistema biofísico ou bioquímico, sua
substituição ou seu reposicionamento são “fatos” reais a serem considerados,
portanto,críveis e possíveis, ainda que não o sejam neste instante.7
No cenário em questão, a Justiça tornar-se-á um produto de acesso também
pela via de um sistema digital, em que o controle dos casos e das decisões
passariam a ser realizadas por uma organização categorial por intermédio de
algoritmos, geradores de uma sistematização capaz de integrar, uniformizar e
padronizar as questões tratadas por temas, naturezas, espécies, tipos ou
procedimentos, em uma plataforma institucional digital processual desenvolvida por
intermédio de uma linguagem de programação em matrizes semânticas.
Abastecida, administrada e fiscalizada pela espécie humana, isenta-a
somente do ato de ponderação de aplicação das regras aos fatos formalizados, a
partir dos critérios previamente predefinidos para inserção do sistema.
O acesso da sociedade à consulta de seus Direitos e Garantias passaria a ser
realizado por intermédio de terminais eletrônicos interligados e integrados às bases
legais de um sistema maior, que permitirá – por meio de uma Inteligência Artificial e
de uma linguagem eletrônica – entregar a cada cidadão o direito de conhecer seus
Direitos, antes mesmo de buscar no Estado uma participação ativa para a resolução 7 Como bem ilustrado por Braga (SDP), “As máquinas não fazem extrapolações, induções, deduções ou pressuposições. É necessário treiná-las, programá-las, simular as redes neurais do nosso cérebro, gerar artificialmente os modelos de processamento da linguagem e do conhecimento que possuímos. Eis o desafio desta tarefa de ensinar as máquinas (BRAGA, Daniela. Máquinas falantes: novos paradigmas da língua e da linguística. Disponível em: . Acesso em: 19 abr. 2013).”
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de seus conflitos, que também disponibilizaria facultativamente que o caso fosse
mediado pela Justiça Cibernética.
As decisões das questões conflituosas ficariam aos cuidados de profissionais
que gozassem da capacidade postulatória, a partir de sua certificação ao órgão
representativo e de sua capacitação para operacionalização do sistema junto ao
Poder Cibernético Judicante, inteligência essa capaz de gerir um sistema de
mediação de regras, pois nutriria autonomia e independência em sua
metodologização de funcionamento.
A proposta supera a ficção ou a alucinação futurista de impressionar com
suposições, parafraseando Penrose, é a capacidade de pensar observada no
homem que o fez superar suas limitações e sobrepor-se às demais criaturas, ao
menos em tese (se o inverso acontecesse), o faria inferior às demais criaturas? Se
isso for provado, o “pensar”e a “inteligência” não poderão ser atributos exclusivos do
homem, mas, ao contrário, atributos da cognição de que o homem, como um
sistema bioquímico ou biofísico, em algum momento se apropriou.
Nada impede, portanto, que outras espécies de sistemas possuam a
faculdade do “pensar” e da “inteligência”, pois se esses são atributos essenciais ao
desenvolvimento do homem, não sendo esses atributos condicionantes exclusivos
da espécie humana, as demais formas de vida, sejam humanas ou não, não
estariam impedidas de utilizá-las.
Portanto, o rompimento com as formas clássicas do Direito do Processual não
visa apagar a memória do conhecimento produzido, mas, ao contrário, demonstra
que a produção permite que novas competências e habilidades possam ser
produzidas, a partir de novos paradigmas, os quais rompem com o totalitarismo
dedutivista não mais aplicáveis à realidade social vigente como consequência
natural ao modelo em estágio de superação (ruptura).
Com isso, avaliza o ponto de vista indutivista do cientista/pesquisador no
rompimento com as tradições e com isso produzindo a evolução da cultura social e
das ciências que esse vê como fruto e frutificador.
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1 ASPECTOS PROPEDÊUTICOS FUNDAMENTAIS DO CONHECIMENTO
1.1 A formação estrutural do conhecimento
A estrutura do conhecimento como um sistema é dialeticamente construída
pelo exercício prático do próprio conhecimento, é uma relação de constituinte e
constituído, um processo que também é histórico e que se faz como na história, de
uma relação constante, em que se cria e se faz criar. 8
Atualmente, a produção do conhecimento advém das denominadas Big
Science e Small Science, as quais representam uma forma distribuída e integrativa
de realizar-se com maior celeridade e eficiência a produção do conhecimento
promovida pela participação ativa dos órgãos, governamentais ou não, no processo
de mudanças nas ciências após a segunda guerra mundial.
Nesse processo, as ciências norteiam-se para uma melhor compreensão,
explicação e aplicação, tanto no campo teórico como no prático, em prol da
formação do conhecimento da espécie humana e com isso contribuindo para o
progresso científico das ciências aplicadas.
Estruturalmente, o conhecimento é representado por uma multiplicidade de
elementos responsáveis por dar-lhe requisitos para, assim, torná-lo apto não
somente a essa condição de conhecimento, ou seja, contendo pressupostos tais
como sistematização, cientificidade, dentre outros atributos que lhe concebe tal
estatura.
Por isso, na engenharia da razão e na dialeticidade do espaço, o
conhecimento é convocado a responder e a justificar suas respostas cognitivas, em
uma espécie de prestação de contas dele próprio, de modo a justificá-lo
explicativamente, em uma espécie de desafio do conhecimento consigo mesmo.
8 Segundo Sanvito, “O conhecimento do mundo animal depende de um longo processo de maturação, adquirido através de mecanismos evolutivos e da decantação das experiências face aos problemas do dia a dia. Uma estratégia particular pode transformar uma circunstância adversa em uma condição favorável. Se o comportamento adquirido através do conhecimento biológico é bem-sucedido, sua reaplicabilidade é mantida. A inteligência biológica é sobretudo seletiva. A atenção seletiva é um aspecto fundamental de nossa atividade mental e as criaturas vivas demonstram sinais claros de seletividade (SANVITO, Wilson Luiz. Inteligência biológica versus inteligência artificial. In: Scielo. Arq Neuropsiquiatr, n. 53, 1995, p. 365. Disponível em: . Acesso em: 06 dez. 2015).”
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Isso se dá tanto no processo empírico, com a utilização de método, como sem
a utilização de uma estrutura metodológica, estendendo-se essa dinâmica ao
conhecimento prático ou teórico alhures já mencionado. Em quaisquer desses
aspectos, o conhecimento encontra seus desafios em busca de atender à sua
supremacia, para impor-se como conhecimento.
Por isso, a estruturação em seu processo de constituição é decisiva e
legitimamente cobrável. Segundo Abrantes (1994, p. 48), “Além disso, é bastante
evidente o fato de que não apenas o conhecimento científico, mas também o senso
comum consistem de estruturas cognitivas, de redes que articulam os conceitos
referentes a cada domínio da realidade”.9
Já o era; mas, na contemporaneidade, o conhecimento passou a ser mais
decisivo a cada dia: isso o eleva à categoria de elemento essencial da vida em
sociedade, mormente como agente de produção, qualificação e quantificação,
sinalizando para uma participação decisiva cada vez maior em todos os ambientes,
e quiçá e não menos relevante na orla do Direito e da Justiça, diante da necessidade
de se produzir técnicas processuais (tecnologia em inteligência) capazes de cumprir
com os ideais e as metas de pacificação dos conflitos sociais.
Uma questão importante que se destaca para ser avaliada nesse processo é
a racionalidade do indivíduo em aceitar na mesma velocidade as adequações e as
adaptações decorrentes da transitoriedade e da simultaneidade que isso representa
dentro e fora da sua vida e dos que se correlacionam com ele, considerando todo o
processo desenvolvido na pós-modernidade.
9 E complementa Abrantes: “A noção de conceito desempenha papéis importantes em várias áreas do saber. Nosso ponto de partida aqui foi a Psicologia, porém a Lógica e a Filosofia da Ciência compareceram como domínios onde a noção ocorre. A esses se pode acrescentar em primeiro lugar o dos estudos da linguagem de forma científica – a linguística (especialmente, é claro a Semântica) –, e filosófica – A Filosofia da Linguagem. Na antropologia também se estudam os conceitos, tendo a própria E. Rosh começado suas pesquisas com experimentos antropológicos. A Inteligência Artificial – tanto a tradicional quanto o conexionismo – propõe modelos computacionais de conceitos, enquanto a Neurociência – mais precisamente, a Neuropsicologia e a Neurolinguistica – procura, entre outras coisas, estabelecer relações entre o conhecimento conceitual e a estrutura e o funcionamento do sistema nervoso. A partir dessa constatação, se pode postular um princípio do seguinte teor: “O estudo dos conceitos deve ser multidisciplinar” (ABRANTES, Paulo (Org). Epistemologia e cognição. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1994, p. 54).”
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As mutabilidades do conhecimento serão inevitáveis diante de um novo
mundo que se revela, impactando inclusive todas as formas de conhecimento
cientifico ou não em seus respectivos vetores, inclusive no âmbito da ciência
processualística cuja estrutura tem exigido em seu cotidiano condições maior
eficiência e eficácia na gestão de dados, informações e decisões.10
A mudança de modelo significa uma revolução na estrutura do conhecimento,
a altercação da base científica sinaliza para uma nova conexão entre o homem e
mundo que o cerca. Uma distinta engenharia parece ser percebida como
instrumento capaz de atender à compreensão e ao funcionamento de uma realidade
ainda não enfrentada, o que demonstra que uma nova forma de técnica cognitiva se
apresenta.
A distinção entre o conhecimento e o indivíduo é um fator a ser considerado,
como dois corpos distintos que coexistem, que marcam os corpos, embora haja uma
simbiose entre eles, as naturezas são diversas. Disso, exsurge a necessidade de
compreender a racionalidade, a logicidade e seus critérios. A atenção focada, do
homem pelo saber “a priori”, revela-se essencial aos propósitos subjacentes do
conhecimento.
10 Para Lévy: “A massa de informações armazenadas cresce em um ritmo cada vez mais rápido. Os conhecimentos e habilidades da esfera tecnocientífica e das que dela dependem evoluem cada vez mais rápido. Disto decorre que, em certas áreas, a separação entre a memória pessoal e o saber não é mais parcial; as duas entidades tendem a estar quase que totalmente dissociadas. Na civilização da escrita, o texto, o livro, a teoria permanecia, no horizonte do conhecimento, polos de identificação possível. Por trás da atividade crítica, havia ainda uma estabilidade e unicidade possíveis, as da teoria verdadeira, da explicação correta. Hoje, está cada vez mais difícil para um indivíduo cogitar sua identificação, mesmo que parcial, com uma teoria. As explicações sistemáticas e os textos clássicos em que elas se encarnam parecem-nos hoje excessivamente fixos dentro de uma ecologia cognitiva na qual o conhecimento se encontra em metamorfose permanente. As teorias, com suas normas de verdade e com a atividade crítica que as acompanha, cedem terreno aos modelos, com suas normas de eficiência e o julgamento de pertinência que preside sua avaliação. O modelo não se encontra mais inscrito no papel, este suporte inerte, mas roda em um computador. É desta forma que os modelos são continuamente corrigidos e aperfeiçoados ao longo das simulações. Um modelo raramente é definitivo. Um modelo digital normalmente não é nem “verdadeiro” nem “falso”, nem mesmo “testável”, em um sentido estrito. Ele apenas será mais ou menos útil, mais ou menos eficaz ou pertinente em relação a este ou aquele objetivo específico. Fatores muito distantes da ideia de verdade podem intervir na avaliação de um modelo: a facilidade de simulação, a velocidade de realização e modificação, as conexões possíveis com programas de visualizações, de auxílio à decisão ou ao ensino (LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática; tradução Carlos Irineu da Costa. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2011, p. 121).”
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Sua percepção tem o levado a insights revolucionários registrados na seara
natural da história das humanidades. A mudança de significados ou a descoberta de
equívocos demonstram que o conhecimento em sua concepção clássica é transitório
e que tal fenômeno está intimamente conectado com a filosofia da ciência como
forma de melhor detalhar e explicar a dinâmica do conhecimento científico, sua
importância e sua relação com a espécie humana.
A pluralidade de conhecimentos e a interdisciplinaridade mudam os critérios
existentes nos processos teóricos metódicos da criação e da integração das
diferentes formas existentes de conhecimentos, que se alteram e altercam com uma
velocidade incomensurável, entre a capacidade de perceber e ser percebido. Disso
se extrai um dos problemas da pós-modernidade.
A mudança da base cognitiva nunca se renovou em tão pouco tempo. Há
poucos séculos, a estrutura científica de um conhecimento demandava em torno de
uma geração para renovar-se; atualmente o tempo encurtou para um quinto. Esse
comportamento gerou mudanças nos métodos de ensino e aprendizado, no
comportamento dos homens que ensinam e dos que buscam o ensinamento. Tal
mudança de paradigma estabeleceu um niilismo em decorrência da velocidade
sobre o conhecimento e suas formas, estigmatizado-o ao princípio da complexidade.
As diferentes formas de conhecimentos são de mundos científicos distintos,
os quais fazem surgir uma visão global que com ela tem fundindo novos horizontes,
novas perspectivas e novas oportunidades, como bem ilustra Minayo (2010, p.19):
“[...] do conceito da sociedade do conhecimento, grupos e pessoas estão sob a mira
de um desafio: ou experimentam voos de águia ou se contentam com o
conservadorismo que corrói a energia das instituições.”
Todavia, a irracionalidade proporcionada pelas novas formas “diversidades de
conhecimentos” e a implacável “velocidade” são bem ilustradas pela mesma autora
apud Bourdieu (2010, p. 22).11
11 “[...] conceitos usualmente empregados para a construção do conhecimento e por uma teorização sobre a prática são isentas de interesses, de preconceitos e de incursões subjetivas. Conforme adverte Bourdieu, ‘o privilégio presente em toda atividade teórica pressupõe um corte epistemológico e um corte social e ambos governam sutilmente essa realidade, portanto, qualquer investigador deve pôr em questão pressupostos inerentes a sua qualidade de observador externo que importa para o objeto, os princípios de sua relação com a realidade, incluindo-se aí as próprias relevâncias’ (MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12 ed. São Paulo: Hucitec, 2010, p. 157).”
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O distanciamento pelo desinteresse na participação do processo de
construção e de compreensão da real importância do conhecimento são sintomas da
ausência de estímulos proporcionada pelo próprio objeto do conhecimento tornado
transitório e fugaz, uma espécie de alienação causada pela incompreensibilidade
irracional.
A desilusão é causada pela própria estrutura em que o conhecimento se
encontra para ser obtido, aliada a seu tempo útil de efemeridade existencial do
mundo transitório. As multiplicidades de opções, a transitoriedade e a
simultaneidade geram desestímulo em sua obtenção, dada a sensação de
inatingibilidade diante da dimensão enfrentada ou da dificuldade encontrada em
conciliar a utilidade fundamental do corpo invisível do conhecimento e a sua
complexidade anunciada.
Semelhante racionalidade irracional é produto da contemporaneidade, que
passa, porém, a ser advertida por ser geradora do embrutecimento do espírito que
decorre do empobrecimento da intelectualidade do homem pós-moderno, rendido
por um caleidoscópio ilusório psicologicamente criado por essa atmosfera.
É preciso participar ativamente, contextualizando e racionalizando os
conhecimentos de modo a torná-los ferramentas úteis ao desenvolvimento positivo
do homem em seu processo de emancipação, sob pena de tornar-se submetido à
regulamentação externa, sem que possa ter a efetiva compreensão necessária do
que é.
É vital que, com o auxílio dessa multiplicidade de conhecimentos, o homem
possa forjar novas ferramentas para desafiar os novos desafios que por certo
surgirão, de modo a vencê-los. Para isso, é preciso unificar os conhecimentos.12
12 Como esclarece Sanvito: “O princípio da complexidade impede (no momento) uma teoria unificadora do conhecimento e não permite exorcizar essa instância da contradição, da incerteza, do irracional. De acordo com os teoremas de Godel, um sistema formalizado complexo (axiomatizado) não pode ser validado por si mesmo. Isto significa que um sistema lógico, de certa complexidade, não consegue escapar de suas contradições ocultas. Aqui nos deparamos com o problema da autorreferência, que é um paradoxo clássico do pensamento grego, que geralmente se refere a ele como o “paradoxo cretense” (citado por Sanvito). Conta-se que o cretense Epimênides certa ocasião afirmou: “Todos os cretenses são mentirosos” e criou um problema aparentemente insolúvel. Esse impasse pode ocorrer nos paradoxos que dependem do uso de conceitos cujo âmbito de referência inclui o próprio conceito. Neste modelo cretense, a simples colocação – “O que eu estou afirmando não é verdade” gera uma contradição extrínseca: se a afirmativa é verdadeira, está demonstrada que é falsa; se é falsa, devemos entender que contém uma verdade. Já Tarski (citado por Bronowski) deu ênfase ao problema da linguagem; um sistema semântico não tem capacidade de explicar totalmente a si próprio. A linguagem simbólica é empregada para descrever partes do mundo, encontrando muitas dificuldades para descrever partes dela mesma. A elaboração de uma metalinguagem poderia remover este obstáculo? Não é a opinião de Morin, para que as linguagens formalizadas não podem
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A partir das ciências, os conhecimentos práticos e teóricos dividem o mesmo
espaço em seus aspectos objetivo e subjetivo. Para compreender sua história, ou
melhor, compreender a cartografia (mapa) da história e seus fenômenos (o que
representa uma gravura decisiva na compreensão da formação dos conhecimentos),
é necessário um esforço pessoal do indivíduo que se propõe a realizá-lo, além do
enfrentamento das adversidades proporcionadas pelo desconhecido.
Esse processo encontra obstáculos em duas variáveis: se, por um lado, a
limitação cognitiva do indivíduo é algo plausível, do ponto de vista biológico é
considerável como padrão da normalidade, ou seja, o homem é um “Ser” insuficiente
e, por isso, falível, mas que cultiva o germe gerativo do conhecimento denominado
descoberta que quase sempre o socorre de iminente fatalidade.13
Assim, a completude dos conceitos e das metodologias rende-se a uma
hipossuficiência da realidade ao próprio conhecimento que se funde a partir de um
fluxo de pensamento demarcado por uma realidade lógica e não lógica da espécie
humana como forma de inteligência.
Isso se dá por sua precariedade. Porque, além da limitação em
equipotencialidade, dada sua condição, humana, mesmo em seu ativismo na busca
do conhecimento pelo conhecimento, nas últimas décadas o condicionante
comportamental vem arrefecendo, dada uma nova cartografia social que se destaca,
em que o homem moderno luta contra o vazio, biotipo bem retratado por Rojas
(1996, p. 21):
constituir uma metalinguagem em relação a nossa linguagem (SANVITO, Wilson Luiz. Inteligência biológica versus inteligência artificial. In: Scielo. Arq Neuropsiquiatr, n. 53, 1995, p. 363. Disponível em: . Acesso em: 06 dez. 2015).”
13 Segundo Sanvito: “A nossa maneira de pensar está intimamente ligada ao contexto das situações; de modo geral, não analisamos a coisa em si, mas a relação entre elas. Por exemplo, quando lido com o substantivo “maçã”, a minha representação mental pode ser diversa dependendo do contexto; pode significar o fruto proibido de que fala o Gênesis, o fruto envenenado da fábula da Branca de Neve, a maçã de Newton com a conotação da lei da gravidade, a fruta propriamente dita para saborear, a natureza morta do pintor A ou B, e assim por diante. A IA tentou superar essas dificuldades através de estratégias para atingir uma representação dos conhecimentos (SANVITO, Wilson Luiz. Inteligência biológica versus inteligência artificial. In: Scielo. Arq Neuropsiquiatr, n. 53, 1995, p. 365. Disponível em: . Acesso em: 06 dez. 2015).”
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Um ser humano hedonista, permissivo, consumista e centrado no relativismo tem pela frente um prognóstico ruim. Padece de uma espécie de ‘melancolia’ new look: instrumento de experiências apáticas. Vive na condição de objeto, manipulado, dirigido e tiranizado por estímulos deslumbrantes, mas que não o gratificam, não o fazem mais feliz. Sua paisagem interior está coberta por uma mistura de frieza impassível, de neutralidade sem compromisso e, ao mesmo tempo, de curiosidade e tolerância ilimitada. Este é o chamado homem cool, que não se preocupa com a justiça nem com os velhos temas dos existencialistas (Soren Kierkegaard, Martin Heidegger, Jean-Paul Sartre, Albert Camus), nem com os problemas sociais ou com os grandes temas do pensamento (a liberdade, a verdade, o sofrimento).
A realidade naturalmente se encontra dentro de um processo marcado por
etapas, por especificidades, por reflexões, por análises, por avaliações e por uma
integração de todo o processo na emissão de posições conclusivas, em que o
conhecimento precisa completar-se para compreender e responder a todas as
etapas do processo taxonômico da realidade que se faz presente e que se
apresenta.
Esse ciclo compete à natureza do conhecimento científico, é uma busca
incessante do acabado, mas sempre provisório, do conhecimento científico, em que
confluem conhecimento humano para a construção do conhecimento tecnológico.
Esse processo é entremeado pela linguagem psicologizada humana e pela
linguagem padronizada tecnológica.14
A consciência constitui-se na história, é histórica em sua formação, embora
paire sobre ela o enigma de sua natureza, porém não enfrentada dado o escopo da
pesquisa. Fornece registros (direta e indiretamente) às estruturas complexas das
faculdades cognitivas, o que Abrantes (1994, p. 184) denomina de “protótipos e
esquemas” dados a forma estática da percepção da espécie humana e os
14 Cita Minayo: “Regras universais e padrões rígidos permitindo uma linguagem comum divulgada e conhecida no mundo inteiro, atualização e críticas permanentes fizeram da ciência a “crença” mais respeitável a partir da modernidade. A força da ciência, que se tornou um fator produtivo de elevada potência na contemporaneidade, levou o filósofo Popper (1973) a dar ênfase em suas análises à lógica externa da comunidade científica, utilizando, para isso a expressão o Terceiro Mundo, uma espécie de classe ou casta, com sua economia e lógica próprias, embora permeadas por conflitos e contradições como qualquer outra criação e instituição humana. O certo é que o campo científico tem suas regras, para conferir o grau de cientificidade ao que é produzido e reproduzido dentro e fora dele, suas atividades conciliam sempre em duas direções: numa, ela loca suas teorias, métodos, princípios e estabelece resultados. Noutra, inventa, ratifica seus cenários, abandona certas vias e orienta-se por novas rotas. Ao se enveredar nesse terceiro mundo, os cientistas aceitam as condições instituídas e no mesmo tempo o condão de historicidade e provisoriedade peculiar do universo em que decidiram investir sua vida (MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12 ed. São Paulo: Hucitec, 2010, p. 36).”
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“esquemas previamente armazenados na memória”. Isso significa que memória seria
nada mais e nada menos que “protótipos e esquemas” de uma estrutura cognitiva.
Parafraseando Guriev, no processo de construção do conhecimento, a
consciência do indivíduo acontece a partir do espaço que ocupa, portanto, a
consciência histórica é um fenômeno da própria história e do tempo em que ela se
faz existir. Registre-se como uma fenda no raciocínio desenvolvido de que, no
âmbito da estrutura cognitiva das inteligências, o que há de comum entre a espécie
humana e a não humana denominada máquina é o processamento de informações.
Para Marx, parafraseando-o, é a relação do indivíduo na construção da
história e a história construindo o indivíduo. Esse contexto enfrenta os problemas da
subjetividade e da pessoalidade na edificação interna e externa das ideologias para
cada momento da história do homem e do conhecimento que produz. Ceticamente
ou em uma visão radicalizada, em última instância nada seria real, portanto, apenas
um sonho em ordem subsequente de circunstancialidade.
O conhecimento como substância é vital ao preenchimento do conceito de
verdade, portanto pode afirmar-se como inexistente, se não fosse a justificação e a
relação de satisfação quando da condição de suficiência da própria justificação. A
verdade, assim, é uma convenção a que adere determinada comunidade e seus
interesses comuns afins.
Nessas condições, o conhecimento nunca está pronto e acabado, uma vez
que, além de ser convencional, o processo de justificação e satisfação é provisório.
O conhecimento, assim dizendo, é dinamicamente alimentado pela incessante e
laboriosa pesquisa, abastecida por uma fonte de busca inesgotável.
Às vezes inusitado, o homem se vê circundado pela árdua atividade da
pesquisa e suas adversidades que lhe criam um cisma ao tentar reconhecer ou
simplesmente aproximar-se da realidade com mais exatidão possível, por vezes
dominado diante do limite cognitivo em todos os seus aspectos.
Os problemas e as dificuldades também giram em torno dos paradigmas
estabelecidos os quais habitam a comodidade e o parasitismo dos conceitos e das
práticas já superadas, mas que a percepção não captou.15As velhas verdades
15 Observa Abrantes: “Outras teses de Kuhn são revisitadas, como as relativas à aprendizagem de um paradigma através de “problemas e soluções-padrão”, num período de Ciência “normal”; ou da resistência dos cientistas a novos paradigmas. A aprendizagem é considerada um processo cognitivo envolvendo modificações nos pesos das ligações sinápticas dos homens ou outros animais, em
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passam a não mais se sustentar, pois isso se caracteriza quando nem as
justificativas nem as satisfações atendem mais como pressupostos de validação do
conhecimento: esvaziado esse, a verdade deixa de ser “existir”. No mundo das
ciências jurídicas, em especial da processualística, Francisco Campos, na
exposição de motivos do CPC de 1939, já reconhecia a necessidade de mudanças
dos paradigmas da ciência processual para o alcance dos objetivos ideológicos de
acesso, previsibilidade e brevidade ao atendimento dos serviços da Justiça.
[...] durante a reunião do Congresso de Direito Judiciário, e na presença de Vossa Excelência, de declarar que, já era tempo que o direito, e particularmente o direito judiciário, se beneficiasse da renovação das outras disciplinas do espírito, servindo se, na investigação da verdade.
São as pesquisas sobre o conhecimento e os problemas sociais, diante da
ausência daquele em padrão cognitivo superior para atender aos problemas
vigentes. São indicadores fortes que se originam dentro da dinâmica da história
social e que evidenciam o conhecimento enquanto corpo estrutural fundamental para
a compreensão das realidades e da propositura de mudanças. Para que elas
aconteçam, a percepção sináptica da cognição humana dá-se por intermédio do
peso expansivo do conhecimento em uma espécie de insight.
A miscigenação das ciências vem nas últimas décadas revelando problemas
na base cognitiva, uma vez que a limitação humana interfere diretamente no
ilimitado contexto das ciências, advinda da complexidade das realidades e dos
vocabulários que buscam justificar a compreensão daquelas.
Esse fato tem demonstrado certo embrutecimento da razão cognitiva do
indivíduo, que passa a ser vitimizado pelo método adestrador do condicionamento.
Por outro lado, na medida em que o crescimento demográfico e a massificação dos
Estados começaram a tornar-se um fato real, comprovável estatisticamente, esse
homem das “massas” desconhece suas próprias condições, limitado ao simples
obedecer, ante a ausência de recursos cognitivos e suficientes que possam dar-lhe
voz, as suas opiniões e conhecimentos.
Todavia, o Estado começou a observar que o crescimento populacional
tornou-se a cada dia um risco maior, responsável pela formação de um
analogia com o que ocorre durante o “treinamento” de redes neurais artificiais (ABRANTES, Paulo (Org). Epistemologia e cognição. Brasília: Ed. Univer