Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes...

185
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes Vitor Bezerra Redes sociais na participação democrática: desafios contemporâneos na efetivação dos direitos do e-cidadão Doutorado em Direito São Paulo 2016

Transcript of Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes...

Page 1: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC/SP

Eudes Vitor Bezerra

Redes sociais na participação democrática: desafios contemporâneos na

efetivação dos direitos do e-cidadão

Doutorado em Direito

São Paulo

2016

Page 2: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC/SP

Eudes Vitor Bezerra

Redes sociais na participação democrática: desafios contemporâneos na

efetivação dos direitos do e-cidadão

Doutorado em Direito

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Filosofia do Direito e do Estado sob orientação do Professor Doutor Alvaro Luiz Travassos De Azevedo Gonzaga.

São Paulo

2016

Page 3: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

BEZERRA, Eudes Vitor Redes sociais na participação democrática: desafios contemporâneos

na efetivação dos direitos do e-cidadão - Programa de Estudos Pós-

Graduados em Direito / Eudes Vitor Bezerra. São Paulo, 2016. 183 f. Orientador: Prof. Dr. Álvaro Luiz Travassos de Azevedo Gonzaga Tese (Doutorado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito, 2016.

1. Filosofia do Direito. 2. Manifestação. 3. Redes Sociais.

4. E-cidadão. 5. Democracia. 6. Participação popular. I. Bezerra, Eudes

Vitor. II. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Programa de

Estudos Pós-Graduados em Direito. III. Título.

Page 4: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

EUDES VITOR BEZERRA

Redes sociais na participação democrática: desafios contemporâneos na

efetivação dos direitos do e-cidadão

Tese apresentada à Banca Examinadora – da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Filosofia do Direito e do Estado sob orientação do Professor Doutor Alvaro Luiz Travassos De Azevedo Gonzaga.

São Paulo, 24 de outubro de 2016.

BANCA EXAMINADORA:

___________________________________________________________________

Presidente: Professor Doutor Alvaro Luiz Travassos De Azevedo Gonzaga

____________________________________________________________________

Membro: Professor (a) Doutor (a): ______________________________________

____________________________________________________________________

Membro: Professor (a) Doutor (a): ______________________________________

____________________________________________________________________

Membro: Professor (a) Doutor (a): ______________________________________

____________________________________________________________________

Membro: Professor (a) Doutor (a): ______________________________________

São Paulo

2016

Page 5: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a Claudia Maria da Silva Bezerra, minha esposa e

eterna namorada, companheira de todas as horas, que acompanhou a incansável

luta pela conclusão do meu doutoramento. Aos meus filhos João Vitor de Souza

Bezerra; Vitor Raphael Simões Bezerra e minha amada filha do coração Catarina

Silva Ribeiro. Vocês foram, são e serão os propulsores para o “amanhã” em minha

vida. Aproveito a oportunidade para pedir, profundas e sinceras, desculpas por todo

o tempo que lhes furtei, além de meu agradecimento pelo carinho e amor

incondicional de todos vocês.

Aos meus amados pais, José Vitor Bezerra e Nair Morais Bezerra, por todo

amor e apoio. Minha irmã Vanessa Morais Bezerra, exemplo vivo de dedicação e

esforço e devoção à educação/ensino superior.

Page 6: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

Agradeço a Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior

(CAPES) a bolsa de estudos concedida durante o período de abril de 2015 a

setembro de 2016.

Page 7: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a DEUS, o Grande Arquiteto do Universo...

Ao longo da vida tive Grandes Mestres, sendo certo que cada um deles

contribuiu direta ou indiretamente para o resultado desta pesquisa, assim, agradeço

a todos os Professores que contribuíram para o meu enriquecimento cultural ao

longo desse curso de Doutorado, em especial, ao meu Sublime Orientador

Professor Doutor ALVARO LUIZ TRAVASSOS DE AZEVEDO GONZAGA, pela

amizade, apoio, conversas e discussões no processo da elaboração desta tese. Pela

paciência e atenção, a você, Querido Mestre, serei para sempre grato – MUITO

OBRIGADO!!!

Agradeço, também, todos os Colegas de Doutorado da PUC/SP, bem como

todos os funcionários, em especial Sr. Rui de Oliveira Domingos e Sr. Rafael de

Araújo Santos.

Aos colegas de Coordenação e Gestão do Curso de Direito da Universidade

Nove de Julho - UNINOVE, por representarem o termo fraternidade: Clarice Moraes

Reis, Jean Eduardo Aguiar Caristina, Leandro André Francisco Lima, Sérgio

Henrique Ferreira e Terezinha de Oliveira Domingos. Agradeço, ainda, todas as

Bibliotecárias da UNINOVE, em especial, Taila Machado Guerra da Silva

Agradeço a todos os meus colegas de docência e faço na pessoa do

Professor e Amigo Doutor Marcelo Negri Soares, que muito me auxiliou na

conclusão desse trabalho, sempre com uma palavra amiga e excelentes sugestões.

Aos Professores e Amigos Anderson Nogueira Oliveira e Julio De Souza

Comparini, agradeço pelo auxilio e por dedicar parte de vossos tempos para ouvir,

sugerir e debater sobre os caminhos da elaboração da minha Tese.

Meu amigo, irmão e Doutorando Sérgio Pereira Braga, parceiro nessa

jornada. Meu amigo várias foram às horas de estudos, abdicação da família, amigos,

contudo, tudo ficou mais fácil com um irmão como você – obrigado por tudo!!! E

vamos juntos rumo ao Pós-Doutorado.

Page 8: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

RESUMO

A presente tese visa demonstrar como as redes sociais, como novo instrumento de

participação democrática, influenciaram as manifestações atuais, bem como quais

são os desafios contemporâneos para efetivação dos direitos do e-cidadão.

Propendemos apresentar como a participação popular vem ocorrendo por intermédio

de novas formas e utilizando novas ferramentas tais como as “redes sociais”. Para

tanto, numa análise histórica, comparativa e bibliográfica, trata-se a presente de tese

de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os

desafios contemporâneos para a efetivação dos direitos do e-cidadão e da

ciberdemocracia. Propondo, ao final, a inclusão da disciplina “Cidadania e redes

sociais” no ensino médio, por meio de alteração da Resolução SE 81 de 16-12-2011,

do Estado de São Paulo, bem como a votação, aprovação e sanção do PLS nº

129/2010, que valida as assinaturas digitais nos projetos de lei de iniciativa popular,

como forma de diminuir a exclusão digital e fortalecer a participação democrática

pelas redes sociais.

Palavras-chave: Filosofia do Direito. Manifestação. Redes Sociais. Democracia. E-

cidadão. Participação popular.

Page 9: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

ABSTRACT

This thesis aims to demonstrate how social networks as a new instrument of

democratic participation, influence current manifestations, events and what are the

current challenges for realization of the e-citizen rights. We intend to present as

public participation has taken place through new forms and using new tools such as

"social networks". Therefore, a historical, comparative and bibliographical analysis, it

is the thesis of this to understand the role of social networks in the context of change,

and which the contemporary challenges to the realization of the e-citizen rights and

Cyber Democracy. Proposing at the end, the inclusion of the subject "Citizenship and

social networks" in high school, through amendment of Resolution SE 81 of 16-12-

2011, the State of São Paulo, and the vote, approval and sanction of BS No

129/2010, which validates digital signatures in the popular initiative bills as a way to

reduce the digital exclusion and strengthen democratic participation through social

networks.

Keywords: Philosophy of Law. Manifestations. Social networks. Democracy. E-

citizen. Popular participation.

Page 10: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

LISTA DE ABREVIATURAS

ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

BYOD - Bring Your Own Device (Traga seu Próprio Dispositivo - Tradução

livre)

CF - Constituição Federal

CCJC - Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania

CCT Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e

Informática

CNJ - Conselho Nacional de Justiça

e.g. - exempli gratia

FIFA - Féderation Internationale de Football Associatino (Federal

International de Futebol)

MPF - Movimento Passe Livre

PJe - Processo Judicial eletrônico

PL - Projeto de Lei

PLS - Projeto de Lei do Senado

PUC/SP - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

SE - Secretaria da Educação

WI-FI - Wireless Fidelity

Page 11: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

1 MANIFESTAÇÃO, DEMOCRACIA E DES “ORDEM” .......................................... 15

1.1 Manifestações: Da comunicação à lógica ........................................................ 15

1.1.1 Manifestação: do pensamento a exteriorização ........................................ 19

1.1.2 Manifestação: A linguagem como instrumento para efetivação da

civilização ........................................................................................................... 22

1.2 Democracia ...................................................................................................... 23

1.2.1 Democracia na antiguidade ....................................................................... 24

1.2.2 Democracia na medievalidade .................................................................. 30

1.2.3 Democracia na modernidade .................................................................... 32

1.2.4 Democracia na contemporaneidade .......................................................... 36

1.2.5 A ciberdemocracia ..................................................................................... 40

1.3 Des “ordem” ..................................................................................................... 44

1.3.1 Ordenando uma ordem ............................................................................. 45

1.3.2 Desordem: ausência de ordem ou ordem em outra perspectiva ............... 50

2 DIREITO DE RESISTÊNCIA E DESOBEDIÊNCIA CIVIL ...................................... 56

2.1 Concepções bíblicas sobre o direito de resistência ......................................... 57

2.2 Direito de resistência na antiguidade ............................................................... 60

2.3 Direito de resistência na medievalidade .......................................................... 63

2.4 Direito de resistência no Renascimento: início da modernidade...................... 65

2.4.1 Direito de resistência no Antigo Regime: Thomas Hobbes e o absolutismo

........................................................................................................................... 66

2.4.2 Direito de resistência no Antigo Regime: John Locke ............................... 67

2.5 Direito de resistência: instrumento de aperfeiçoamento do Estado ................. 69

2.6 Direito de resistência e manifestação .............................................................. 72

2.7 Desobediência civil .......................................................................................... 75

2.7.1 Historicidade .............................................................................................. 75

2.7.2 Conceitos e características ....................................................................... 77

2.7.3 Desobediência civil no Brasil: alguns aspectos constitucionais ................. 80

Page 12: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

3 REDES SOCIAIS ................................................................................................... 85

3.1 Revolução tecnológica ..................................................................................... 85

3.2 Conceitos ......................................................................................................... 88

3.3 Evolução histórica das redes sociais ............................................................... 90

3.4 Liberdade de manifestação na “era da informática” ......................................... 93

3.5 Geração Z: as redes sociais como nova forma de manifestação..................... 94

4 ANÁLISE DE CASOS EM QUE AS REDES SOCIAIS TIVERAM SUMA

IMPORTÂNCIA NA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA CONTEMPORÂNEA ......... 97

4.1 Flash Mobs: manifestações sociais apolíticas pelas redes sociais .................. 97

4.2 Smart Mobs: manifestações políticas pelas redes sociais ............................... 98

4.3 Primavera Árabe de 2011: redes sociais como elemento de revolução

democrática no Oriente Médio ............................................................................. 100

4.4 Redes sociais e as jornadas de junho de 2013 no Brasil ............................... 102

4.4.1 Os Black Blocs ........................................................................................ 108

4.4.2 Depois das jornadas de junho de 2013 ................................................... 111

4.5 Rolezinhos: manifestação de inclusão social dos jovens da periferia ............ 117

5 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DO E-

CIDADÃO ................................................................................................................ 120

5.1 E-cidadão ....................................................................................................... 120

5.2 Convocações de manifestações pelas redes sociais: participação política como

expressão da democracia ou desordem? ............................................................ 123

5.3 Exclusão digital como obstáculo à cidadania virtual ...................................... 128

5.4 Necessidade de instrumentos efetivos de participação do cidadão e da ciberdemocracia................................................................................................... 132

5.4.1 Proposta de alteração da Resolução SE 81 de 16-12-2011, do Estado de São Paulo.............................................................................................................133

5.4.2 Aprovação do PLS nº 129/2010..............................................................138

CONCLUSÃO ......................................................................................................... 145

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 150

ANEXO.....................................................................................................................161

Page 13: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

11

INTRODUÇÃO

As redes sociais como instrumento de participação democrática é uma forte

tendência da contemporaneidade, contudo, vários são os desafios para a efetivação

dos direitos do e-cidadão (no presente trabalho, consideramos e-cidadão como

sendo um cidadão contemporâneo, preocupado com as questões políticas e sociais,

interligado com vários outros cidadãos por meio da rede mundial de computadores e

que utiliza as redes sociais para expor seu ponto de vista, realizar e organizar

manifestos, sem, contudo, abandonar as praças públicas).

Para definirmos o processo evolutivo do e-cidadão, serão abordadas, neste

trabalho, a questão do direito de resistência, bem como a questão da desobediência

civil, transmutadas para “linguagem das ruas”, por meio das manifestações, eis que

não é tema exclusivo da nossa época e nem do Brasil. Do mesmo modo,

abordaremos a democracia que permeou todos os tempos e sempre alicerceou os

principais avanços civilizatórios. Para justificar o desenrolar do direito de resistência

e a desobediência, temos como certo que tais institutos sempre andaram de mãos

dadas com a democracia.

Sabemos que nos dias atuais as informações, manifestos ocorrem de forma

instantânea, principalmente pelo uso das redes sociais, que nesta contextualização

desempenha um papel fundamental para o processo democrático. Evidentemente,

após a Revolução Industrial e todo avanço tecnológico, propagou-se o avanço em

diversas áreas sociais, inclusive na comunicação entre as pessoas o que viabilizou

uma nova forma de participação democrática.

Contudo, foi com a revolução tecnológica, pelos idos da década de 70 do

século passado, que, de fato, a participação democrática alcançou um patamar de

transnacionalidade, com forte contribuição do capitalismo. Os avanços foram

tamanhos que chegamos à globalização a qual possibilitou a informação em tempo

real, ou seja, a revolução tecnológica propiciou outro aspecto, a forma de exercício

do direito de resistência, da desobediência civil e principalmente da participação

democrática, porquanto rompeu barreiras e viabilizou uma transformação ímpar na

vida em sociedade.

Page 14: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

12

No Brasil, as manifestações de junho de 2013, denominadas “jornadas de

junho”, demonstraram o quanto a evolução tecnológica alavancou a participação

democrática, tendo em vista a velocidade e influência das redes sociais; todavia,

como toda mudança traz benefícios mas também deixa alguns gargalos, para nós, a

exclusão digital ganhou maior notoriedade.

Destarte, surgem algumas dúvidas, dentre tantas outras: 1) As “jornadas de

junho” de 2013 representaram um exercício da democracia ou apenas desordem?,

2) Qual o papel das redes sociais na participação democrática?, 3) Quais os

principais desafios contemporâneos na efetivação do e-cidadão?

Para responder a tais indagações, por meio do método hipotético-dedutivo e

com aporte na pesquisa dogmática e histórica, o presente trabalho busca

demonstrar que “a linguagem das ruas” (manifestações atuais) é fruto da evolução

do direito de resistência e da desobediência civil. Todavia, esse processo

participativo do cidadão ganhou novas formas e instrumentos, ou seja, as redes

sociais determinaram uma nova maneira de participação democrática, surgindo,

assim, o e-cidadão, ou seja, o cidadão que participa do processo democrático por

intermédio, também, das redes sociais e outras mídias digitais.

Desta feita, no primeiro capítulo, a abordagem será sobre manifestação,

democracia e desordem, com o escopo de entendermos o processo filosófico pelo

qual passamos como seres humanos nesses três aspectos. No que tange à

democracia, além da historicidade, traremos à baila a ciberdemocracia (a

ciberdemocracia refere-se às novas práticas de participação democrática/política

democrática que têm como ferramenta a internet, podendo ser denominada,

também, de democracia cibernética, democracia digital, democracia online e

democracia via redes sociais, todavia, na presente tese utilizaremos o termo

ciberdemocracia); abordaremos, também, a questão da des”ordem”, demostrando

outro viés sobre o termo.

No segundo capítulo, o direito de resistência e a desobediência civil serão os

institutos estudados. Num primeiro momento, esboçar-se-á o contexto histórico, com

intento de demonstrar que na infância dos povos já existiam formas de insurgência

em relação a atos considerados injustos. Posteriormente, o papel do direito de

resistência no aperfeiçoamento do Estado.

Page 15: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

13

Logo após, trataremos da relação do direito de resistência e das

manifestações, com objetivo de fortalecer o entendimento apresentado na presente

tese de que a redes sociais desempenham importante papel na participação

democrática, bem como demonstraremos que as manifestações visam, via de regra,

se insurgirem contra o abuso de poder e opressão. Em ato contínuo, abordaremos

como as redes sociais atuam nas novas formas de resistência.

Já no terceiro capítulo, a questão histórica, conceitos e o papel que as redes

sociais vêm desempenhando na sociedade atual serão o tema central, sendo que

abordar-se-ão, também, a revolução tecnológica, a liberdade de manifestação na era

da informática e as novas gerações que transitam nas redes sociais, em destaque, a

“Geração Z” (considera-se “Geração Z”, na tese em tela, as pessoas nascidas sob o

advento da internet e do boom tecnológico, ou seja, as pessoas que nasceram nas

décadas de 80 e 90 do século passado).

O quarto capítulo tem como finalidade analisar alguns casos em que as redes

sociais tiveram suma importância, tais como: “flashmobs”; “smartmobs”; primavera

Árabe; “rolezinhos” e as “jornadas de junho de 2013”, para, assim, comprovar que

redes sociais influenciaram as manifestações ocorridas, ou seja, são as redes

sociais o mais recente instrumento de participação democrática.

No quinto e último capítulo, traçaremos o perfil do e-cidadão e o importante

papel das redes sociais na efetivação dos seus direitos. Com fulcro em superar os

desafios existentes para a efetivação dos direitos do e-cidadão, propomos a

inclusão, no 2º ano do ensino médio, de uma disciplina denominada “Cidadania e

redes sociais” como forma de combater a exclusão digital; para tanto, traremos uma

proposta de alteração da Resolução SE 81 de 16-12-2011, do Estado de São Paulo.

Não obstante, aduzimos, no citado capítulo, que o Projeto de Lei do Senado -

PLS nº 129 de 2010, que atualmente se encontra na Câmara dos Deputados (PL

7005/2013) aguardando Parecer do Relator na Comissão de Constituição e Justiça e

de Cidadania (CCJC), deve ser relatado, aprovado e sancionado, para assim efetivar

os direitos do e-cidadão, uma vez que o PLS nº 129 tem como fito acrescentar os §§

3º e 4º ao art. 13 da Lei n° 9.709/1988, viabilizando a validação das assinaturas

eletrônicas dos eleitores para os fins da subscrição da iniciativa popular de lei

prevista no caput, ao passo, que sugerimos a criação de uma petição online

pleiteando o andamento do PL.

Page 16: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

14

Do exposto, concluiremos que as redes sociais desempenham papel

extremamente importante na participação democrática, contudo, as sugestões acima

buscam amenizar os desafios contemporâneos para a efetivação dos direitos do e-

cidadão que tem utilizado as redes sociais como forma de participação democrática;

no entanto, necessária se faz a efetiva democratização do acesso à rede mundial de

computadores, o que se dará por intermédio da inclusão digital.

Page 17: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

15

1 MANIFESTAÇÃO, DEMOCRACIA E DES“ORDEM”

Neste capítulo, primeiramente, analisamos o processo evolutivo da

comunicação para entendermos as manifestações atuais, posteriormente, tratamos

da democracia/ciberdemocracia e, por fim, da des”ordem” com o intento de

entendermos o processo filosófico pelo qual passamos como seres humanos, antes

de adentrarmos as questões envoltas ao direito de resistência e desobediência civil.

1.1 Manifestações: Da comunicação à lógica

Como um dos elementos do tripé supracitado, a manifestação desempenha

papel fundante no processo civilizatório da raça humana. Neste capítulo, trazemos à

baila apenas argumentos do processo intelectual realizado pelo homem, para

exteriorizar seus sentimentos, suas ideias, ou seja, não debruçamos, sobre as

manifestações atuais, seja no Brasil ou no Mundo, mas, tão somente no processo

intelectual que realizamos para exteriorizar nossos pensamentos/sentimentos.

A comunicação sempre foi primeira condição para o desenvolvimento da raça

humana, tendo em vista que desde os primórdios da humanidade a comunicação

viabilizou ao homem expressar sentimentos, relacionar-se, receber e transmitir

informações, compartilhar tirocínios, bem como manifestar ideias. Este é um ponto

de grande importância para a presente tese, uma vez que sem a comunicação não

teríamos alcançado tantos avanços.

É sabido por todos, também, que, antes de manifestar suas ideias por

intermédio da linguagem, a raça humana se comunicava por meio de sinais, gestos,

expressões faciais e outros, sendo certo que, com o passar do tempo e com o

aumento dos povos, se fez necessário o aprimoramento da comunicação entre os

indivíduos, surgindo, assim, a fala (linguagem – maneira de exprimir-se).

Sandra Lúcia Lopes Lima, em relação à fala, aduz:

A fala é um sistema de sons articulados, cujo significado é estabelecido pelo grupo. Para chegar a ela foi preciso que a espécie humana tivesse atingido um desenvolvimento biológico, a nível de tamanho de cérebro, que nenhuma outra espécie jamais conseguira. Isso permitiu a capacidade de simbolizar e de fazer representações mentais, indispensáveis para a criação

Page 18: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

16

da linguagem verbal. O uso da linguagem favoreceu os grupos que a desenvolveram no processo de seleção e conquistas culturais, responsáveis pela própria sobrevivência.1

Vários outros meios existiram para o processo civilizatório do homem, além da

comunicação, e.g., no período Paleolítico, também denominado como “Idade da

Pedra Lascada”, os homens criaram os utensílios de chifres de animais ou de rochas

com o intento de aprimorar a caça, bem como garantir a segurança do grupo.

Os historiadores chamaram o período inicial da vida humana de Idade da Pedra Lascada ou Paleolítico, um termo que significa ‘pedra antiga’. Mas o ser humano fez muito mais do que lascar pedra. Ele usou também o osso, fabricou ferramentas e armas eficientes, descobriu técnicas de caça e pesca, aprendeu a reconhecer vegetais comestíveis, produziu artes, construiu tendas etc. Por milhares de anos, pequenos grupos paleolíticos se espalharam por todos os continentes, lutando para suprir suas necessidades básicas de sobrevivência.2

Nesse período ocorreu, também, o desenvolvimento da pictografia3, as

atividades extrativas e outras, sendo que todas as rupturas que ocorreram foram

extremamente importantes para a civilização que chegamos hoje.

Sandra Lúcia Lopes Lima, assim escreve:

Os homens passaram a se fixar em determinados locais, de preferência próximos a rios, e a formarem agrupamentos maiores. A sedentarização foi o primeiro grande passo rumo à civilização. Passaram a construir habitações mais resistentes, a fabricar tecidos e objetos de cerâmica, a armazenar cereais e, posteriormente, a trocar excedentes.4

Com a evolução da comunicação, chegamos a um dado momento no qual

buscou-se organizar o pensamento e tal organização se deu por intermédio da

lógica.

A lógica surgiu com os gregos, e desde então se tornou um instrumento

utilizado para todos os empreendimentos humanos, principalmente no tocante à

linguagem, podemos dizer que foi a base para o homem construir os pilares da

civilização ocidental, e, após a sistematização do processo de comunicação, o

Estado se organizou politicamente, vindo, posteriormente, a elaborar um sistema

1 LIMA, Sandra Lúcia Lopes. História da comunicação. São Paulo: Ebart, 1989. p. 9. 2 RODRIGUE, Joelza Ester. História em documento: imagem e texto. São Paulo: FTD, 2002. p. 29. 3 Representação através dos desenhos pintados nas paredes das cavernas, na qual eram registradas figuras que representavam o natural do mundo, em especial sobre as caçadas praticadas pelos homens. 4 LIMA, Sandra Lúcia Lopes. Op. cit., p. 10.

Page 19: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

17

constitucional, para estabelecer direitos e deveres aos indivíduos de forma

ordenada, bem como criou uma administração guiada por regras lógicas,

características retiradas da civilização ocidental.

O pensamento lógico, considerado subjetivo, fundamenta-se na realidade

objetiva e se manifesta em todas as esferas da vida social, isto é, a lógica ofereceu à

civilização ocidental uma base para se estabelecer ordem e progresso.

A palavra “lógica” vem do grego “logos” e significa razão, uma maneira de

bem pensar segundo a cátedra de Fábio Ulhoa Coelho:

A lógica é uma maneira específica de pensar; melhor dizendo: de organizar o pensamento. Não é a única, nem é a mais apropriada para muitas das situações em que nos encontramos, mas tem a sua importância, principalmente no campo do direito. Os homens podem ter despertadas em sua consciência ideias isoladas, simples, como por exemplo, “choveu!”, “que desagradável essa atitude”, “estou com fome”, “o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos”. Na intimidade cerebral de cada um, essas ideias, despertadas por emoções, sensações, lembranças ou compreensão racional, surgem desvinculadas de quaisquer outras ideias. Não há pensamento propriamente dito, pois resulta de uma conjugação de ideias.5

Segundo Alaôr Caffé Alves, Aristóteles foi considerado o pai da lógica, o

primeiro pensador a sistematizá-la.

Antes de Aristóteles, a não ser a dialética de Platão, nada existe que mereça o nome de Lógica. Alguns autores consideram digna de menção a Lógica de Gotama, filósofo hindu. Mas esta, que não foi conhecida por Aristóteles; não constitui uma lógica científica. Assim, como ramo particular do saber, a Lógica é essencialmente uma criação do gênio grego. Aristóteles, o primeiro sistematizador da lógica, no Organon (nome dado por Diógenes Laércio), demostra que aproveitou as contribuições de seus predecessores: Parmênides, com sua teoria do ser, os Sofistas, com suas argumentações e opiniões; Demócrito que postulou a base do princípio de razão suficiente referente à causalidade; Sócrates, com seu método diretivo de perguntas denominado Maiêutica; e Platão com seu método dialético e classificação das ideias.6 (Grifos no original).

Aristóteles denominou sua lógica de “silogismo”, que significa ligação. Não

obstante, deu esse nome porque a lógica trata da ligação formal dos juízos feitos

pelo pensamento.

5 COELHO, Fábio Ulhoa. Roteiro de lógica jurídica. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 4. 6 ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5.ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. p. 146.

Page 20: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

18

Silogismo é uma forma de análise que procura decompor em partes os

argumentos e as proposições de um argumento e seus termos.

“Organon” foi a denominação dada ao conjunto de seus escritos silogísticos,

palavra grega que significa “instrumento”. A lógica, portanto, é um instrumento para

se pensar corretamente, ou seja, a ferramenta do bem pensar, da qual afirmamos

que somente podemos pensar e falar sobre algo, porque existe a correlação entre a

linguagem e a lógica.

O processo de comunicação da raça humana passou, passa e passará por

diversas e constantes transformações, pois é a comunicação o meio pelo qual se

realiza o desenvolvimento civilizatório da raça humana e isso é devido à capacidade

que o ser humano tem de se comunicar por meio da fala.

Aristóteles7 afirmou que o homem foi o único, dentre os demais animais, que

recebeu o dom da fala pela natureza:

Como costumamos dizer, a natureza nada sem um propósito, e o homem é o único entre os animais que tem o dom da fala. Na verdade, a simples voz pode indicar a dor e o prazer, e outros animais a possuem (sua natureza foi desenvolvida somente até o ponto de ter sensações do que é doloroso ou agradável e externá-las entre si), mas a fala tem a finalidade de indicar o conveniente e o nocivo, e portanto também o justo e o injusto; a característica específica do homem em comparação com os outros animais é que somente ele tem o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto e de outras qualidades morais, e é a comunidade de seres com tal sentimento que constitui a família e a cidade.

Exercer a linguagem é papel de suma importância na evolução da raça

humana, sendo certo que nos dias atuais a linguagem oriunda das ruas tem

impactado vários setores da nossa sociedade, em especial na política nacional.

Nessa linha de pensamento, temos que o processo de comunicação teve

grande avanço com advento da lógica, porquanto, quando organizamos melhor

nossas ideias, o resultado é uma comunicação mais coerente, ou seja, mais

racional.

Nos dias atuais nos comunicamos de forma diversa de outrora, uma vez que

avanços tecnológicos têm possibilitado, cada vez mais, o acesso à comunicação e

por consequência a manifestação dos nossos pensamentos, principalmente pelo uso

das redes sociais; todavia, o processo que realizamos em relação ao pensamento

7 ARISTÓTELES. Política. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. p. 1253a.

Page 21: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

19

ainda é o mesmo, ou seja, primeiro construímos um raciocínio e depois

exteriorizamos; assim, trazer a lume tal processo (do pensamento à exteriorização) é

de suma importância para a presente tese, mesmo sendo uma exteriorização por

intermédio da cibernética via redes sociais.

1.1.1 Manifestação: do pensamento à exteriorização

Inicialmente, cumpre salientar que o termo manifestação vem do latim

“manifestus”, “compreensível, claro, aparente, evidente”, formada por “manus”,

“mão”, mais “festus”, apanhado, agarrado, ou seja, manifestar representa algo que

exteriorizamos de forma compreensível para outrem ou até para nós mesmos.

Manifestação trata de uma ação humana que tem como fito revelar um

pensamento ou uma ideia, na qual o indivíduo se expressa publicamente, ou seja,

realizar um manifesto público por intermédio de um termo ou uma proposição.

Nesse diapasão, provar, demonstrar, defender ideias, apresentar razões é

argumentar, e, a argumentação ocorre por meio da manifestação que é a

exteriorização do pensamento.

Pensamento, por seu turno, é o produto do ato de pensar, conforme bem

ensina Alaôr Caffé Alves8:

Pensar é um ato que produz uma forma representativa bastante diferente da percepção e da imaginação. Aquele ato permite o acesso ao “sentido”, isto é, à significação das coisas e dos processos do mundo. O produto do ato de pensar é o pensamento, ou seja, um sentido normalmente considerado como “ideia” ou “conceito”, “preposição” e “raciocínio”.

Nessa esteira de raciocínio, é pertinente, então, explicar que antes da

manifestação (exteriorização do pensamento) realiza-se uma atividade mental, como

amplamente estudado pela lógica jurídica, ou seja, antes da exteriorização, de forma

até imperceptível, passamos pelo conceito do objeto/coisa, em ato contínuo

chegamos ao termo, quando relacionamos os termos, formamos um juízo que,

quando exteriorizado, denominamos proposição e, por derradeiro, quando

8 ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5 ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. p. 28.

Page 22: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

20

relacionamos dois ou mais juízos, chegamos ao raciocínio que tem como forma

exteriorizada a manifestação do pensamento. Vejamos o mencionado processo.

A primeira aferição, trata-se do Conceito9, é algo inteligível, ou seja, que diz

respeito à representação mental, geral e abstrata de um objeto ou conjunto de

objetos. Geralmente realizamos essa inferência10 por intermédio do conhecimento

geral que nos é passado no transcorrer da nossa vida, o que pode, por

consequência lógica, ter definições diferentes, tendo em vista a diversidade cultural.

O Termo (ou palavra11), por sua vez, é a expressão linguística (escrita ou

verbal) do conceito, ou seja, antes de manifestarmos qualquer coisa que seja nosso

subconsciente já realizou uma ilação.

Não obstante, não podemos olvidar que o “termo” ora esculpido não vincula

ao elemento logicamente indecomponível, que, para alguns pensadores, seria a

primeira operação do intelecto, eis que aqui usamos “termo” como expressão

gramatical do conceito, ou seja, sinônimo de “palavra”.

Nesse passo, uma vez definido “termo”, quando relacionamos, dentro de um

processo mental no qual afirmamos ou negamos a existência de relação entre

conceitos, chegamos a um processo que denominamos Juízo12, ou juízo de valor;

por realizarmos essa análise, estamos atribuindo um determinado predicado a um

determinado objeto (abstrato ou não).

O juízo, assim, encontra-se em nossa psique e quando decidimos

compartilhar a valorização dada com os demais indivíduos que compõem a

9 O conceito não se imagina, nem se percebe; ele é apenas inteligível, só se pode compreendê-lo. O conceito de justiça, por exemplo, não pode ser percebido ou imaginado; só pode ser pensado (compreendido) em seu sentido, como “algo” abstrato e universal que somente é possível entender-se como algo comum encarnado em todo e qualquer ato de justiça, por mais diferente que ele seja. In: ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5.ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. p. 28. 10 Inferir é raciocinar, isto é, retirar conclusões de conhecimentos anteriores. 11 É preciso, além disso, considerar os signos de linguagem pelos quais se expressam os conceitos. Esses signos (palavras), como já acima dissemos, têm também formas universalizadas que nos permitem referenciar coisas diversas e semelhantes sob a mesma designação linguística, como, por exemplo, a palavra “homem” aplicada para designar Pedro, Paulo, Maria, etc. In: ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5.ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. p. 28. 12 Julgar é afirmar ou negar um conceito (predicado) de outro conceito (sujeito), com a convicção da pertinência ou não dessa relação. Assim, se enunciarmos que “o caçador apanhou do leão” ou “a baleia não é um peixe” estaremos fazendo subliminarmente juízos (julgando) na medida em que aderimos ou estamos convictos (temos uma crença) a respeito da pertinência ou não dessas relações. In: ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5. ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. p. 98.

Page 23: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

21

sociedade na qual estamos inseridos, utilizamos a Proposição13, que é a expressão

linguística do juízo, ao passo que podemos aferir que o juízo não pode existir sem

sua expressão gramatical.

Dentro desse processo mental, até aqui explicitado, o que se visa, ao final, é a

formulação de um Raciocínio14, que nada mais é do que a organização mental que

nos permite chegar a uma conclusão por meio de proposições anteriores

(premissas), ou seja, é a forma como ordenamos nossos pensamentos, é uma

ordem intelectual.

Destarte, o raciocínio é fruto da nossa mente, sendo certo que depende de

um ato para que seja exteriorizado, e esse ato, essa ação denominamos de

manifestação que é a expressão linguística do raciocínio.

Este, via de regra, é o processo mental desde o conceito que damos aos

objetos até sua real exteriorização, que aqui chamamos de manifestação, isto é, a

manifestação é o meio pelo qual damos “vida” a nossas opiniões, nossos

pensamentos, nossos sentimentos, bem como a nosso pensamento racional.

Diante de tais argumentos, podemos sopesar que quantas boas ideias, boas

músicas, bons poemas, bons discursos, boas fórmulas não chegaram ao alcance de

todos, pois os pensadores, poetas, oradores, pesquisadores não exteriorizaram seus

pensamentos?

Outrossim, para muitos, o termo manifestação é sinônimo de protesto que, por

seu turno, etimologicamente, deriva do latim “protestari”, “declarar em público,

testemunhar, protestar”, formada por pro, “à frente”, mais testari, “testemunhar”, de

testis, “testemunha”.15

Todo e qualquer manifesto, protesto, seja escrito, falado ou por meio das

redes sociais, é um ato de exteriorização do pensamento humano que pode ser

desvinculado ou alienado a outra ideia.

13 As proposições são frases que podem ser consideradas verdadeiras ou falsas. 14 Raciocinar é inferir, é retirar conclusões de conhecimentos anteriores, assim, trata-se de uma operação intelectual pela qual o pensamento, a partir de uma ou mais proposições dadas anteriormente e relacionadas entre si, chega a uma conclusão que deriva das antecedentes. 15 Lista de palavras. Origem da palavra: site de etimologia. Disponível em: <http://origemdapalavra.com.br/site/pergunta/origem-de-protestar/>. Acesso em: 15 mar. 2016.

Page 24: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

22

Nesse contexto, entendemos que a exteriorização do pensamento humano é

uma ferramenta para a efetivação da civilização e, por consequência lógica, a

concretização da democracia.

1.1.2 Manifestação: A linguagem como instrumento para efetivação da

civilização

A linguagem foi, é e será o caminho a ser trilhado para alcançarmos a efetiva

civilização da raça humana que, podemos dizer, está em constante transformação.

Desde a antiguidade até os tempos atuais, a linguagem é o mecanismo

utilizado pelo homem para o aprimoramento de suas relações interpessoais.

Linguagem é o centro do ser humano.

A linguagem é, pois, o centro do ser humano, quando considerado no âmbito que só ela consegue preencher: o âmbito da convivência humana, o âmbito do entendimento, do consenso crescente tão indispensável à vida humana como o ar que respiramos. Realmente o homem é o ser que possui linguagem segundo a afirmação de Aristóteles. Tudo que é humano deve ser dito entre nós.16

Tendo em vista que a linguagem é o instrumento utilizado pelo homem em

suas relações, podemos então afirmar que ela pode ser utilizada como um

instrumento de defesa ou de ataque, por exemplo, ocorre nas atuais manifestações,

pois cada lado, por intermédio da linguagem, defende seu ponto de vista, ataca a ala

oposta, contra-ataca a outra e vice-versa.

No âmbito político e jurídico, tem a linguagem papel primeiro, sendo o meio

capaz de atingir o objetivo, porquanto, quando bem utilizada, o orador consegue

convencer seu auditório, desde que queira persuadir e o auditório ouvir, pouco

importando a validade do argumento.

Sobre o tema Chaim Perelman17 diz:

A eficácia da argumentação, o fato de exercer sobre o auditório uma influência de maior ou menor importância, depende não apenas do efeito dos argumentos isolados, mas também da totalidade do discurso, da interação entre argumentos entre si, dos argumentos que acodem

16 GADAMER, Hans Georg. Verdade e método II: complementos e índice. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. p. 182. 17 PERELMAN, Chaim. Lógica jurídica: nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 180.

Page 25: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

23

espontaneamente ao espírito de quem ouve o discurso. O efeito do discurso é condicionado notadamente pela ideia que o auditório faz do orador.

É a linguagem um dos principais meios de interação entre os indivíduos,

sendo, por consequência lógica, um dos principais instrumentos para a efetivação da

civilização da raça humana, tendo em vista que, por intermédio dela, o homem

consegue expressar suas ideias que influenciam o contexto social, político, no qual o

indivíduo está inserido.

Por meio da linguagem se configura a manifestação que desempenha papel

extremamente importante no desenvolvimento da humanidade, seja qual for sua

natureza (manifestação por signos, gestos, fala e outras formas).

Associada a tal assertiva, encontramos a democracia, que representa o

exercício da manifestação de pensamento.

O processo de comunicação viabilizou ao homem alcançar uma grande

ferramenta, denominada manifestação, exercida pela escrita e pela fala, seja qual for

o tempo ou meio de comunicação. Nos dias atuais, temos as redes sociais, como

grandes e importantes instrumentos para a evolução dos indivíduos.

Temos convicção que o processo de comunicação, que hoje tomou extensões

mundiais via redes sociais, corrobora, sem precedentes, com o implemento e

evolução do processo democrático, uma vez que democracia, como demonstramos

abaixo, é o governo do povo, que manifesta suas necessidades, suas vontades,

apolíticas ou políticas, sempre em nome do bem-comum para a comunidade à qual

se encontra vinculado.

1.2 Democracia

Ousamos dizer que a democracia teve, tem e terá extrema importância, seja

qual for o tempo ou lugar, pois é um dos pilares da convivência em sociedade,

porém, nunca antes, na história do Brasil, se utilizou tanto o termo democracia,

porquanto, tem sido empregado por todas as pessoas em todas as rodas, bem como

em todas as redes sociais, estruturando, assim, uma nova forma de participação

político-social e, principalmente, uma nova forma de participação democrática, por

intermédio do e-cidadão.

Page 26: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

24

Os políticos, em especial, têm dado à democracia novas definições, eis que

falar em democracia virou “coqueluche”18. Todos os argumentos e falácias se

justificam na busca pela efetivação da democracia, numa tentativa sem igual de

estabelecer a tão sonhada igualdade entre todos os homens, fruto de uma

desigualdade sem precedentes, o que motivou milhares de brasileiros a se

organizarem pelas redes sociais e irem às ruas se manifestarem pelos mais diversos

motivos e causas, ou seja, os manifestantes utilizaram as redes sociais para

exercitarem a democracia.

Nesse sentido, a democracia, por si só, fomentaria elementos para várias

teses, devido a sua diversidade de entendimento e facetas. Para não sermos

repetitivos e não olvidarmos dos preceitos fundantes para a presente tese,

falaremos, num contexto aberto, sobre democracia, a fim de entendermos sua

origem e contextualização atual e assim podermos, posteriormente, concluir se a

linguagem advinda das ruas, nas últimas manifestações ocorridas no Brasil (a partir

de junho de 2013 até as atuais) representaram ato de desordem, exercício da

democracia, movimentos não democráticos ou uma nova forma de participação

política, utilizando as rede sociais como mecanismo de efetivação da democracia.

1.2.1 Democracia na antiguidade

Qualquer livro, tese, dissertação, artigo cientifico ou outro meio de

ensino/aprendizagem que fala sobre democracia, quando traz a lume a historicidade,

argumenta que a democracia surge com os gregos.

Surge, com isso, uma indagação, qual motivo volve os gregos a serem

considerados díspares dos outros povos da sua época? Acreditamos que a distinção

e distanciamento entre os gregos e os demais povos assentam-se na forma de

pensar. Porquanto, enquanto os gregos buscavam, especialmente na razão,

encontrar as respostas para suas indagações, os demais povos se apoiavam em

Deus para obter respostas para as suas inquietudes. Nessa toada, os gregos

encontram na política, pautados na razão, a solução para suas dificuldades, e,

18 Coqueluche significa: Objeto da preferência e/ou do entusiasmo momentâneo.

Page 27: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

25

assim, criaram-se os primeiros sustentáculos de liberdade, desenvolvimento com

base na democracia, afastando-se, nesse contexto, dos outros povos.

Destarte, é importante entender o processo organizacional da civilização

grega. Sendo que as comunidades gentílicas individualizavam a agregação de

indivíduos por meio dos laços consanguíneos. Em idos do século VIII a.C, os grupos

passaram a ser mais intricados por meio de novas associações entre os genos,

surgindo, assim, alguns grupos, tais como a Fratria, as Tribos e os Demos, sendo

que estes grupos deram origem, posteriormente, às cidades-estados. Desse

enredo, mais tarde, as cidades-estados se transformaram em democracias,

enquanto outras se mantiveram oligárquicas.

Álvaro de Azevedo Gonzaga19, argumenta que as primeiras comunidades se

caracterizaram pela associação por consanguinidade:

No Período Homérico a civilização grega se organizava na forma de comunidades gentílicas que se caracterizavam pela associação de indivíduos através dos laços consanguíneos. Por volta do século VIII a.C, as comunidades passaram a ser mais complexas por meio de novas associações entre os genos, resultando em grupos como a Fratria, as Tribos e os Demos, que, mais tarde, deram origem às cidades-estados. Esse processo foi acompanhado de uma diferenciação de classes sociais que se protrai no tempo.

Resta evidente que, tendo surgido as comunidades pelos laços sanguíneos,

tal caraterística não eternizou, já que, com o passar dos tempos, surgiram outras

formas de associações mais intrincadas que deram origem às cidades-estados.

Essas formas de associações criaram grupos distintos dentro das cidades-

estados, formando as oligarquias, ao passo que algumas polis se transformaram em

oligarquias e outras em democracias.

Com o fortalecimento de certos grupos sociais, a maioria das cidades-estados da Grécia foi dominada, política e economicamente por esses grupos, formando assim, oligarquias. Algumas cidades-estados se transformaram em democracias, enquanto outras se mantiveram oligárquicas. Serão citados aqui os dois exemplos mais conhecidos, e talvez, os mais importantes, desses modelos de política: Esparta e Atenas.20

19 GONZAGA, Alvaro Luiz Travassos de Azevedo. O direito natural de Platão na República e sua positivação nas leis. 2011. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011. p. 18. Disponível em: <https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/ 5640/1/Alvaro%20Luiz%20Travassos%20de%20Azevedo%20Gonzaga.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2016. 20 Ibidem, p.18.

Page 28: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

26

As cidades-estados foram posteriormente transformadas em democracias,

sendo o “povo” composto apenas de pessoas com título (qualificação) de cidadão

ateniense, uma vez que escravos mestiços e mulheres não gozavam desse título.

Essa composição de pessoas, segundo Aristóteles, surge pelo simples fato de

o homem ser, por excelência, um animal social, conforme sua argumentação: “A

cidade é uma criação natural, e o homem é por natureza um animal social (...)”21.

A visão aristotélica aduz que, sendo o homem um ser social, seu próprio

instinto de sobrevivência fará com que ele se vincule a outros homens, surgindo a

convivência em sociedade.

A convivência em sociedade depende de uma organização, e, tal organização

na Grécia antiga se dava por meio de “constituição”.

Por “constituição” entendo a organização das várias autoridades, e em particular da autorizada suprema, que está acima de todas as outras. Mas é preciso deixar claro que em todos os casos, o corpo dos cidadãos é soberano; a constituição é a soma total da politeuma. Assim, nas constituições democráticas, o povo, ou demos, é soberano; nas oligárquicas, o é a minoria. E é isso que torna uma constituição diferente da outra: a composição do corpo de cidadãos. O mesmo critério pode ser aplicado às outras.22

Com a convivência estabelecida em sociedade, ou melhor, em cidades-

estados, surge também o termo cidadania; contudo, importa frisar que nem todos

eram cidadãos23, ou seja, a democracia na antiguidade galgou vários avanços,

entretanto era uma democracia excludente.

Alvaro de Azevedo Gonzaga afirma que somente homens, adultos e filhos de

pai e mãe atenienses poderiam ter direito político, eis que a democracia era

excludente:

Não devemos esquecer que a democracia de Clístenes, apesar de ter permitido o avanço econômico e político de Atenas, criando uma importante oposição com Esparta (que seria obscurecida durante muito tempo pela guerra com os persas) era excludente. Apenas homens, adultos e filhos de pai e mãe atenienses poderiam ter direito político, e esta era uma parcela mínima da população, deixando de fora os estrangeiros (metecos), mulheres e escravos.24

21 ARISTÓTELES. Política. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. p. 1253a. 22 ARISTÓTELES. Política: os pensadores. São Paulo: Nova Cultura. 1999. p. 221. 23 Na antiguidade nem todos eram considerados cidadãos, sendo excluídos os escravos, as mulheres, os menores e os estrangeiros. 24 GONZAGA, Alvaro Luiz Travassos de Azevedo. O direito natural de Platão na República e sua positivação nas leis.2011. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São

Page 29: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

27

Em que pese à exclusão realizada na antiguidade não devemos julgar tal

como “antidemocrática”, já que devemos levar em conta a diferença cultural de cada

tempo.

A democracia grega não pode ser comparada às concepções presentes, eis

que várias foram as modificações políticas, sociais e econômicas que conceberam

expectativas para o aprimoramento e perspectiva de vida de uma sociedade,

principalmente no que tange à politização da polis, ou seja, desde que surgiu a ideia

de convivência nas cidades-estados surgiu, também, a ideia de democracia;

contudo, isso não ocorre da mesma forma nos dias atuais.

Nessas circunstâncias, a compreensão de democracia arcaica está

completamente distante em comparação aos dias contemporâneos, o que em regra

se explica pelo fato de que o sistema democrático ateniense jamais atenderia ou

supriria as necessidades que hoje se fazem presentes, assim, tal argumento

simplesmente se sustenta pela equidistância entre o quanto populacional do hoje

comparado ao quanto da antiguidade.

Norberto Bobbio argumenta que, para os antigos, a visão de democracia era

diferente, porque pensavam em uma praça onde os cidadãos tomavam as decisões:

Para os antigos, a imagem de democracia era completamente diferente: falando de democracia eles pensavam em uma praça ou então em uma assembleia na qual os cidadãos eram chamados a tomar eles mesmos as decisões que lhes diziam respeito. 25

Nessa contextualização, é certo que, mesmo tão equidistante das concepções

atuais, temos de reconhecer que o berço da democracia se deu na antiguidade.

Ou seja, democracia, então, tem sua gênese na antiguidade, precisamente na

Grécia Antiga e tem como definição “governo do povo”, conforme salienta Hans

Kelsen26:

O significado original do termo “democracia”, cunhado pela teoria política da Grécia antiga, era de “governo do povo” (demos = povo, Kratein = governo). A essência do fenômeno político designado pelo termo era a participação

Paulo, São Paulo, 2011. p. 18. Disponível em: <https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/ 5640/1/Alvaro%20Luiz%20Travassos%20de%20Azevedo%20Gonzaga.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2016. 25 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de Janeiro: Elieser, 2000b. p.372. 26 KELSEN, Hans. A democracia. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 140.

Page 30: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

28

dos governados no governo, o princípio de liberdade no sentido de autodeterminação política; e foi com esse significado que o termo foi adotado pela teoria política da civilização ocidental.

A democracia não foi na antiguidade a única forma de governo ou a única

constituição, tendo em vista que a monarquia, a aristocracia e a politéia foram outras

constituições justas, segundo Aristóteles que assim aduziu:

Os nomes usuais para as constituições justas são: a) monarquia (quando um homem governa objetivando o bem comum); b) aristocracia (governo de mais de um, mas para poucos); c) politéia (governo exercido pela maioria dos cidadãos, para o bem de toda a comunidade)27.

Além de não ser a única forma de constituição, a democracia grega não era

plena, repisamos apenas que os cidadãos participavam do processo democrático,

isto é, boa parte da população não tinha direito de participar das decisões.

Contudo, mesmo não sendo a única forma de governo, entendemos ser a

democracia o melhor sistema, já que a Aristocracia, por exemplo, representava uma

forma de governo que optava apenas pelos melhores, ou seja, havia o “Governo dos

melhores”. Não obstante, oligarquia era o sistema de governo denominado “Governo

de poucos”, ou ainda, “Governo dos ricos”. Certamente, em ambas existe,

evidentemente, a exclusão dos menos favorecidos. Por isso, reafirmamos que,

mesmo não sendo a única forma de governo, entendemos ser a democracia o

melhor sistema.

A democracia viabilizou a participação popular (via cidadão) que, na

antiguidade, era o meio pelo qual se debatiam nas assembleias os rumos das polis,

e assim o faziam os cidadãos desprendidos de interesses, uma vez que buscavam o

bem-comum e a garantia dos direitos individuais.

Os direitos individuais, na Antiguidade Clássica, não são os mesmos se

comparados aos dias atuais, conforme aduz Acácio Vaz de Lima Filho:

É preciso salientar que na Antiguidade Clássica não conheceu os “direitos individuais”, como hoje os concebemos. E isto, pelo bom motivo de que, só com muito esforço, é possível falar de uma “esfera privada”, para esta época. Em função de inexistir, propriamente, uma “esfera privada”, não existia, nem na “Polis” nem na “Urbs”, uma “liberdade” contra ou em relação ao Estado.28

27 ARISTÓTELES. Política: os pensadores. São Paulo: Nova Cultura. 1999. p. 224. 28 LIMA FILHO, Acácio Vaz de. O poder na antiguidade: aspectos históricos e jurídicos. São Paulo:

Page 31: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

29

Destarte, foi a democracia grega o melhor sistema de governo da época,

sistema esse adotado, ressaltando as peculiaridades de cada tempo, por maioria

dos países na contemporaneidade.

Contudo, importa lembrar, que a democracia grega foi além de um sistema de

governo, porque representou, também, o desenvolvimento de ideais filosóficos. Em

outras palavras, a democracia grega em sua proeminência, num contexto social,

propiciou um sistema governamental e os ideais filosóficos.

É certo, então, que a democracia vai muito mais além do que uma simples

forma de governo, ela representa uma filosofia de vida e o sistema de governo

democrático que, distinto dos demais sistemas de governo, conforme supracitado, é

um instrumento para a concretização do bem-comum.

Do exposto, afirmamos que a democracia adotada na antiguidade pode ser

compreendida como um sistema governamental pautado em ideais filosóficos,

oriundo do poder absoluto e autônomo do cidadão, que livremente manifestava seus

argumentos sobre a cidade sem obter vantagem ou privilégio nas assembleias,

porquanto, buscava-se apenas o bem-comum, ou seja, o debate sobre a democracia

formou-se sob o símbolo da busca da universalidade do bem-comum.

Leslie Lipson29 argumenta que os gregos antigos, quando falavam em

democracia, expunham em comum três aspectos: 1) contexto social; 2) sistema

governamental; e, 3) ideais filosóficos. Para Leslie Lipson, as características

democráticas fundamentais, tal como nos foram oferecidas por Heródoto, Tucídides,

Platão e Aristóteles são:

Contexto social

Governo pelos pobres.

Exploração pelos ricos.

Abolição da escravidão da dívida e das qualificações de propriedade para exercício de cargos.

Oportunidade para o talento individual, independentemente da posição de família ou riqueza.

Sistema Governamental

Deliberação e decisão públicas, por todos os cidadãos, resultando em governo da maioria.

Ícone, 1999. p. 79. 29 LIPSON, Leslie. A civilização democrática. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1966, p. 51-52.

Page 32: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

30

Maioria de cargos preenchida indiscriminadamente.

Todos os funcionários são responsáveis, Júris compostos por grande número de cidadãos.

Ideais Filosóficos

Igualdade.

Igualdade (= liberdade) de expressão; tomada negativamente como domínio da ignorância.

Liberdade e versatilidade; encaradas negativamente como licença e desordem.

Obediência à autoridade da lei e dos funcionários públicos.

Participação constante em atividades cívicas.

De tal modo, a democracia grega pautava no governo em que todos os

cidadãos participavam; com valorização social do homem; e, principalmente, com

ideais filosóficos, dentre eles a busca, que persiste até os dias atuais, pela

igualdade/liberdade.

Outro aspecto que podemos extrair é a asseveração do uso da palavra, da

retórica, como forma de efetivação da universalidade do bem-comum, sem

olvidarmos, como já afirmado, com suas limitações em decorrência da época.

Desta feita, a democracia se concretiza quando se tem por finalidade criar um

ambiente político com fulcro em resguardar os direitos dos cidadãos contra o

absolutismo e/ou totalitarismo do Estado, ou seja, é um sistema que, segundo

entendimento dos antigos, se regula no poder do “demos” ou do povo.

Por falar em absolutismos, na Era Medieval, as concepções gregas de

igualdade/liberdade deram espaço à crendice e ao posicionamento dos senhores

feudais; vejamos:

1.2.2 Democracia na medievalidade

Não compartilhamos da visão de que a medievalidade foi um dilatado período

sem estudos filosóficos, a ponto de algumas pessoas se reportarem a tal época

como “idade das trevas” ou ainda “longa noite de mil anos”, no qual apenas houve

pestes, perseguições religiosas.

Page 33: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

31

Cláudio de Cicco e Alvaro de Azevedo Gonzaga30 asseveram que, tenha

ocorrido mazelas de toda a sorte, tais como a peste negra e diversas guerras, não

podemos ignorar as realizações desse período”.

Em referência à idade média, Maria Leonor Xavier31 afirma que:

A idade média não é uma época menor da história da filosofia. Para o reconhecermos, basta recordar algumas das grandes obras estruturantes do pensamento ocidental, entre as quais algumas medievais. Por exemplo: tanto A República, de Platão, quanto A Cidade de Deus, de Agostinho, nunca deixaram de constituir referências para a filosofia política e a filosofia da história; A Metafísica, de Aristóteles, tornou-se uma referência clássica do pensamento metafísico, e a Suma Teológica, de Tomás de Aquino, tornou-se uma enciclopédia filosófica de incontornável referência na posteridade; por sua vez, A Divina Comédia, de Dante, para além de ser um retrato de época e uma síntese das culturas antigas e medieval, não deixa de ser uma obra de referência do pensamento ocidental para a meditação sobre o destino do homem. Deste modo, não só é plausível considerar legados marcantes obras antigas a par de obras medievais, como é incontornável a presença da Idade Média em obras proeminentes da posteridade.

Importante lembrar que, na idade média preponderaram, primeiro, as

influências da Igreja e logo depois as do feudalismo, ou seja, a crendice e o

posicionamento dos senhores feudais dominaram a era medieval.

A única instituição que permaneceu organizada era a Igreja Católica, a qual empreendeu a conversão e civilização dos bárbaros e conseguiu reunir todas as nações germânicas sob o comando de Carlos, rei dos francos que foi aclamado imperador romano-cristão e sagrado pelo Papa em Roma, no Natal do ano 800. Infelizmente, morto Carlos Magno, seus filhos partilharam o imenso império que cobria toda a Europa Ocidental. Começou então, em meio aos ataques dos vikings do norte e sarracenos pelo sul, o período de sobrevivência chamado de feudalismo, em a descentralização política atingiu o máximo grau possível e cada senhor de terra era rei absoluto sobre seus vassalos e servos.32

As concepções absolutistas da época medieval não deram espaço para

expansão da democracia, tanto que os governantes somente eram considerados

bons se adotassem as Escrituras sagradas, ou seja, a participação popular

30 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 199. 31 XAVIER, Maria Leonor. Questões de Filosofia na Idade Média. Lisboa: Colibri, 2007. p.15. 32 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 200.

Page 34: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

32

(democracia) não era aceita, pois seria uma ameaça ao quanto proclamado por

Deus.33

Os gregos entendiam que era fundante a participação político-social do

cidadão, já o axioma medieval era o oposto. No entanto, o que de fato podemos

assegurar é que o legado do período medieval, no que tange à democracia, é muito

ínfimo ao ponto de não termos registros, entretanto, também, podemos assegurar

que as concepções da Idade Média não se ajustam à visão grega e nem à atual de

democracia.

Na verdade, o que se tem no período medieval, advinda das concepções

cristãs, é a constituição da liberdade interior do homem, o “encontro” do homem com

Deus, modificando brutalmente o diagnóstico sobre a questão da liberdade, a ponto

de termos um afastamento daquilo que, para os gregos, era sagrado, isto é, ocorreu

um afastamento do exercício da democracia.

Tal argumento sustenta-se pelo fato de a filosofia cristã ter como ênfase a

centralidade da “vida passiva” sobre a “vida ativa”, contrapondo o posicionamento

dos gregos que valorizavam o ato da palavra, da retórica como desenho de

realização da universalidade do bem-comum, o que ocorria com a participação do

cidadão.

1.2.3 Democracia na modernidade

O período denominado como “Modernidade”, “Idade Moderna” ou “Era

Moderna” tem início com o Renascimento, passando pelo Antigo Regime e pelo

Iluminismo e com término na Revolução Francesa de 1789.

Para analisar a evolução das instituições e do pensamento político da Idade Moderna, esse período foi subdividido em dois de nossa História mundial. A abertura dessa Idade se dá com o Renascimento, prolongando-se com o Antigo Regime e se finda na Revolução Francesa de 1978, quando inicia a Idade Contemporânea34.

33 A primeira questão que devemos abordar diz respeito ao que é, de fato, a filosofia medieval. Existe realmente um pensamento filosófico na Idade Média? Com efeito, a visão que, muitas vezes, temos desse vasto período histórico é sobremaneira negativa: idade das trevas, longa noite de mil anos, obscurantismo, pestes, perseguições religiosas, etc. Sendo a filosofia um tipo de conhecimento, cuja fecundidade não se coaduna com impedimentos ao livre exercício do pensamento, parece razoável indagar sobre a possibilidade de fazer filosofia no medievo. BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. p. 155. 34 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 205.

Page 35: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

33

As ideias advindas da Idade Moderna, as quais colocam o homem como um

ser autônomo, autossuficiente e universal, que desassocia a centralidade da “vida

passiva” sobre a “vida ativa” predominante da era medieval, deram sustentáculos

para o racionalismo, porquanto, com a modernidade, o homem passa a mover-se

pela confiança de que, por meio da razão, pode atuar sobre a natureza e a

sociedade.

Um dos clássicos da Idade Moderna, na sua fase inicial, foi Nicolau Maquiavel

(1469-1527). Ele sustentou o absolutismo e utilizou o termo Estado para representar

o que antes era denominado República.

Cláudio de Cicco e Alvaro de Azevedo Gonzaga35 argumentam que “O

Príncipe foi a cartilha de todos os reis absolutistas da época do autor e,

provavelmente, o livro de cabeceira dos ditadores contemporâneos”.

Contudo, Nicolau Maquiavel reconheceu que a luta contra liberdade não é

fácil, ao passo que recomenda ao Príncipe que quando for conquistar Estados

habituados a viver com suas próprias leis e em liberdade a melhor maneira para

preservar e conservar por intermédio de seus cidadãos36, ou seja, a liberdade não é

um ponto fácil de ser batida e somente existe liberdade onde às concepções

democráticas prevalecem.

O absolutismo de Nicolau Maquiavel não preponderou na modernidade e sim

a formação do Estado, ordem política, organização de nações, o liberalismo, uma

vez que a questão da liberdade foi um dos principais pontos da Idade Moderna.

No antigo regime, o quesito liberdade, defendido principalmente por John

Locke (1632-1704), deu margem à restruturação da democracia.

John Locke, de forma diversa de Thomas Hobbes, não possui uma visão

pessimista do estado de natureza tanto é verdade que afirma que o estado de

natureza confere ao indivíduo plenitude em relação à liberdade.

Embora o estado de natureza lhe dê tais direitos, sua fruição é muito incerta e constantemente sujeita a invasões porque, sendo os outros tão reis quanto ele, todos iguais a ele, e na sua maioria pouco observadores da

35 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 199. 36 MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Capítulo V. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/ adobeebook/principe.pdf>. Acesso em: 16 out. 2015.

Page 36: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

34

equidade e da justiça, o desfrute da propriedade que possui nessa condição é muito insegura e arriscada. Tais circunstâncias forçam o homem a abandonar uma condição que, embora livre, atemoriza e é cheia de perigos constantes. Não é, pois, sem razão que busca, de boa vontade, juntar-se com outros que estão já unidos, ou pretendem unir-se, para conservação recíproca da vida, da liberdade e dos bens a que chamo de “propriedade”. O maior e principal objetivo, portanto, dos homens se reunirem em comunidades, aceitando um governo comum, é a preservação da propriedade.37

Para John Locke, a propriedade é um termo lato que engloba terra, vida e

liberdade. No tocante à democracia, propriamente dita, John Locke apoia a

democracia representativa, argumentando que o legislativo tem o poder delegado

pelo povo, ou seja, tal democracia encontra-se adstrita ao poder dos representantes

eleitos pelo povo:

Em quarto lugar, o legislativo não pode transferir o poder de fazer leis para quaisquer outras mãos, pois, sendo apenas um poder delegado pelo povo, aqueles que o detêm não podem transferi-lo para outros. Somente o povo pode designar a forma de Estado, e o que se dá por meio de constituir o legislativo e indicar em que mãos ele estará. E, quando o povo tiver dito: “nós nos submeteremos e seremos governados pelas leis feitas por esses homens e sob tais formas” ninguém mais poderá dizer que outros homens farão leis para o povo; tampouco este pode ser submetido a lei alguma a não ser àquelas promulgadas pelos que foram escolhidos e autorizados por ele a fazer leis.38

John Locke apenas afirma que o poder emana do povo para o próprio povo e

o legislador não poder se fazer substituir sem autorização desse povo que o elegeu.

Vários outros grandes filósofos falaram sobre a liberdade e a democracia na

modernidade, tanto no Renascimento quanto no Antigo Regime; todavia, foi no

Iluminismo, no Século XVIII, que os direitos, até então, denominados naturais

transformaram em direitos do homem.

A Revolução Francesa (1789) foi um grande marco para o exercício da

democracia, foi essa revolução que motivou a derrocada da monarquia absoluta

(advinda do direito divino) para um governo laico. Todavia, importa lembrar que no

lapso temporal entre o final do século XVIII até a segunda metade do século XIX

ocorreram quatro revoluções na França (sendo a primeira denominada como

Revolução Francesa).

De certo modo, podemos considerar a Revolução Francesa como uma

espécie de “revolução industrial” que motivou uma profunda transformação

37 LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Martin Claret, 2011. p. 84. 38 LOCKE, John. Coleção os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 150.

Page 37: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

35

econômica, entretanto é mister advertir que essa transformação econômica ocorreu

paulatinamente e não somente com avanços, uma vez que alguns retrocessos se

deram.

Todavia, em que pese o moroso processo de desenvolvimento industrial

francês, as transformações econômicas marcaram a entrada da França no

capitalismo. O processo de desenvolvimento industrial que ocorreu, também, em

vários outros lugares e, em alguns, de forma mais célere que na França, sempre

provocou, no início, desemprego e precárias condições de vida para a classe

trabalhadora, porquanto os maiores interessados e beneficiados com o processo de

desenvolvimento industrial eram aqueles envoltos com a burguesia empresarial.

De tal modo, fica evidente que as concepções democráticas ligadas ao

liberalismo, encontravam-se adstritas aos ideais da burguesia empresarial, que não

se preocupava com os problemas sociais vividos pela classe trabalhadora, uma vez

que aqueles apenas visavam aos lucros, porque a forma de vida capitalista tem

como escopo a acumulação do capital tão somente.

Sem delongas, é sabido que aquilo que é favorável para a burguesia

empresarial, não é necessariamente favorável para classe trabalhadora e demais

grupos da sociedade.

Essa visão liberal voltada aos interesses burgueses, sem aplicação para a

questão social, não propiciou benefícios para os trabalhadores que abdicavam sua

força de trabalho em favor dos empresários.

Em outras palavras, os empresários estavam ficando cada vez mais ricos e,

por seu turno, os trabalhadores cada vez trabalhando mais e ganhado menos, o que

remonta à visão do soberano verso súdito, ou seja, com as condições de vida

malignalizada para os trabalhadores, quanto á “questão social” esquecida pelo

liberalismo burguês, alternativa não restou senão as revoltas populares, o propiciou

o surgimento de posicionamentos políticos como o “socialista” e, por consequência,

os sindicatos que tinham como fito lutar pelos direitos dos trabalhadores.

A Revolução Francesa, nesse caminho de transformações motivadas pela

procura de soluções para a questão social, foi apenas o ponto inicial, sendo que,

posteriormente, tivemos a Revolução Constitucionalista de 1832, depois a

Revolução Republicana de 1848 e, ainda, a Revolução Socialista de 1871.

Page 38: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

36

A luta de classes trouxe uma nova forma de participação democrática, na qual

os socialistas entendiam que o poder político do capitalismo, decorrente do poder

econômico, não sustentava um processo democrático, porquanto, segundo os

socialistas, o capitalismo retrata a exploração do homem pelo homem.

Joseph Schumpeter asseverou que:

Os próprios socialistas (com exceção de uns poucos grupos sindicalistas) afirmavam ser os únicos e verdadeiros democratas, os vendedores exclusivos da mercadoria autêntica, que jamais deveria ser confundida com a falsificação burguesa.39

Resta, então evidente que as manifestações populares chegaram a outro

patamar pós Revolução Francesa, que tinha como lema Liberté, Egalité, Fraternité

(Liberdade, Igualdade e Fraternidade). Assim, com a Revolução Francesa, tivemos o

fortalecimento da democracia, num contexto que passa pela democracia moderna,

democracia liberal e democracia social.

Ante o exposto, a democracia que teve sua base na Grécia antiga passou

pela idade média e moderna, se mantém firme na pós-modernidade e é utilizada em

quase todos os países. Ressalvadas as divergências, é a forma de governo que

melhor atende aos anseios políticos e sociais contemporâneos, motivo pelo qual tem

suportado até os dias atuais os ataques daqueles que não coadunam com esse

ideal. Suporta, pois, a nosso ver, um modelo organizacional estável que viabiliza ao

cidadão a participação direta ou indireta nos rumos da comunidade/sociedade na

qual ele está inserido.

Outrossim, todo esse esplêndido passado de lutas, avanços e retrocessos

viabilizaram um debate aberto nos dias atuais sobre democracia. Assim, a

democracia contemporânea, ainda em constante transformação, teve seus pilares

reforçados pelos erros e acertos, ou avanços e retrocessos do passado.

1.2.4 Democracia na contemporaneidade

(...) é pouco provável que um estado não liberal possa assegurar um correto funcionamento da democracia, e de outra parte é pouco provável que um estado não democrático seja capaz de garantir as liberdades fundamentais. A prova histórica desta interdependência está no fato de que o estado liberal e estado democrático, quando caem, caem juntos.40

39 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. p. 283. 40 BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz

Page 39: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

37

Conforme bem assevera Norberto Bobbio, democracia encontra-se,

intimamente, ligada à liberdade; à medida que seu exercício somente é possível num

Estado liberal que garanta os direitos humanos.

Vivemos nos dias atuais uma esquizofrenia no que tange ao estabelecimento

de um núcleo quando nos referimos à democracia, seja pela falta de conhecimento,

seja pelo uso inadequado da palavra, seja para defender interesses pessoais dos

políticos. Tanto que, para Joseph Schumpeter, a democracia é um método político

pautado num certo tipo de arranjo institucional. Ela não deve ser compreendida

como um fim em si mesmo.

A democracia é um método político, isto é, um certo tipo de arranjo institucional para chegar a uma decisão política (legislativa ou administrativa) e, por isso mesmo, incapaz de ser um fim em si mesmo, sem relação com as decisões que produzirá em determinadas condições históricas. E justamente este deve ser o ponto de partida para qualquer tentativa de definição. 41

Alguns defendem que, nas democracias contemporâneas, o que dever ser

observado é a democracia representativa, em que as deliberações são tomadas de

forma coletiva, embora não sejam tomadas diretamente pelos cidadãos, são por

representantes eleitos para desempenhar tal finalidade.

Outros defendem que democracia deve ocorrer diretamente, revivendo o

pensamento na íntegra dos gregos, ou seja, tem-se a ideia de “governo do povo”

(demos = povo, Kratein = governo), no qual o Estado não pode limitar a participação

popular.

Joseph Schumpeter, por seu turno, defende que “a democracia moderna

cresceu passo a passo com o capitalismo e foi dele consequência42.” Observa,

ainda, que para o processo democrático obter resultado positivo nas nações

modernas e industriais, deve observar quatro condições43.

A primeira condição refere-se à “qualidade do material humano” de elevado

atributo que chega ao gabinete e ao parlamento, o que implica a disponibilidade de

um qualificado e bom número de dirigentes que devem ser escolhidos dentre a

e Terra, 1986. p. 20-21. 41 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. p. 295. 42 Ibidem, 1961, p. 259. 43 Ibidem, 1961, p. 361-367.

Page 40: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

38

população, preferencialmente aqueles que estiverem preparados e disponíveis para

a aptidão política. A segunda tem como foco limitar a abrangência efetiva da decisão

política, impondo restrições automáticas à atmosfera política, limitando, assim, a

máquina política.

Como terceira condição, Joseph Schumpeter estabelece o respeito à

necessidade de se ter à disposição uma burocracia bem treinada, de tradição,

dotada de força e de boa posição, para conduzir e ensinar os políticos que

encabeçam os ministérios. A quarta condição, por sua vez, trata do autocontrole

democrático, é o “autocontrole democrático”, no qual o método democrático só pode

funcionar se todos os grupos estiverem dispostos a aceitar as medidas

governamentais pautadas nas leis.

Nesse contexto, podemos concluir que, para Joseph Schumpeter, a

democracia é um método político, pautado num acordo institucional que visa a obter

decisões políticas. Tais decisões são realizadas por aqueles que adquiriram o poder

de decisão por meio dos votos da população, numa disputa competitiva, ou seja,

ocorre uma competição pelo voto livre para se estabelecer o governo aprovado pelo

povo.

Todavia, importa mencionar que a concepção supra, quando mal interpretada

pode acarretar uma confusão, e acreditamos que tal dissociação de pensamento, daí

porque falamos em “esquizofrenia”, ocorre em decorrência de má interpretação do

texto constitucional.

Nossa Constituição Federal de 1988 traz essa dubiedade em seu artigo 1º44,

quando determina que nossa República constitui-se em Estado Democrático e no

parágrafo único, do citado artigo, determina que “todo poder emana do povo, que o

exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta

Constituição”.

Ora, acreditamos que apenas estamos diante de um erro de hermenêutica,

44 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Page 41: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

39

uma vez que a democracia contemporânea, em especial a brasileira, é um sistema

em que as decisões são tomadas por intermédio dos representantes eleitos,

escolhidos pela população por meio do voto, contudo, em alguns casos, a própria

Constituição permite a participação popular, sem retirar a validade da democracia

representativa.

Nessa toada, Norberto Bobbio argumenta:

Enquanto hoje a eleição é a regra e a participação direta a exceção, antigamente a regra era a participação direita, e a eleição, a exceção. Poderíamos também dizer da seguinte maneira: a democracia de hoje é uma democracia representativa às vezes complementada por formas de participação popular direta; a democracia dos antigos era uma democracia direta, às vezes corrigida pela eleição de algumas magistraturas.45

Creditamos essa confusão à democratização da informação e o amplo acesso

às redes sociais que, às vezes, vêm destoadas de argumentos seguros que

viabilizem maior entendimento.

Não podemos, entretanto, olvidar que a democracia contemporânea se

produz, se arranja e se propaga por meio dos veículos de comunicação, perfazendo,

assim, a internet; as redes sociais e as mídias de massa têm um fundamental papel

político no processo democrático atual.

César Steffen, sobre o tema, elucida:

A democracia contemporânea é um sistema onde a decisão é tomada por representantes eleitos, escolhidos pela população através do voto. A democracia contemporânea se dá, se faz e se promove pela e através da midiatização devido à necessidade da ampla audiência que os processos e as redes midiáticas alcançam, tendo então o campo midiático um fundamental papel político nos processos democráticos. A mídia busca audiência para si, a política gera e usa essa audiência para construir seus efeitos, os especialistas auxiliam ou conduzem estas ações e fazeres dos atores político, a mídia pauta o processo e é pautada pela política, numa ampla conexão e cruzamento que faz as visibilidades da política e, assim, constrói as lógicas, formatos e processos da democracia contemporânea.46

Destarte, a democracia contemporânea apresenta como núcleo um

experimento de estabilização da relação, necessária, entre cidadãos e instituições,

45 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de Janeiro: Elieser, 2000b. p. 374. 46 STEFFEN, César. Midiocracia: uma nova face das democracias contemporâneas. 2010. Tese (Doutorado em Comunicação Social) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. p. 107.

Page 42: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

40

ao passo que busca, restabelecer a conexão entre o povo e seus representantes,

com fulcro em convalidar o próprio processo democrático.

A constituição da democracia contemporânea ocorre pautada em elementos

que implicam a descaracterização do poder absoluto, seja de quem for.

Caroline Ferri, sobre o tema, relata que as teorias democráticas atuais

despersonificam a concepção de soberano, uma vez que faz uso do povo como

elemento central na formulação do poder:

As teorias democráticas contemporâneas se constituem a partir dos elementos que pressupõem a despersonificação do soberano e o consequente vazio do poder. Tais teorias, ao fazerem uso do povo como elemento central na constituição do poder, mitigam o conceito de liberdade enquanto participação popular (característico da antiguidade) em prol da liberdade individual (que inclui a própria escolha de não participar) como forma de mascarar o próprio paradoxo da soberania, mantendo assim viva a ideia de que na democracia o poder pertence ao povo.47

Ante todo o exposto, podemos concluir que a democracia contemporânea

exige um cidadão ativo que se envolva no campo da política via discussões,

debates, plebiscitos e referendos, isto é, por intermédio de instrumentos informais e

formais e, nesse contexto, entra a figura do e-cidadão, pois existe uma máxima que

sendo ausente o cidadão/e-cidadão no processo de constituição e desenvolvimento

da democracia, ela submerge em validade, alimentando meramente sua base

formal, o que não pode e não deve ocorrer.

1.2.5 A ciberdemocracia

Conforme acima esculpido, o que se busca é um cidadão/e-cidadão antenado

que contribua para a efetivação da democracia contemporânea, ao passo que a

esse cidadão/e-cidadão se exige que seja ativo no debate político, via debates e

discussões, plebiscitos e referendos, criando-se, assim, a ciberdemocracia.

47 FERRI, Caroline. A (in) compreensão do paradoxo da soberania popular na democracia contemporânea. 2012. Tese (doutorado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2012. p. 47

Page 43: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

41

Nessa contextualização, a figura do e-cidadão torna-se imprescindível para a

efetivação do processo democrático, tendo as redes sociais importante papel nesse

feito.

Paulo Bonavides aduz que “no século XX a evolução não foi outra senão esta:

o estreitamento das possibilidades de participação efetiva do povo no processo

decisório.”48

Conforme é exposto no Capítulo 3 da presente tese, os avanços tecnológicos

foram e são de extrema importância para a concretização da democracia dos dias

atuais, avanços esses viabilizados pela revolução tecnológica.

Norberto Bobbio, quando traz à baila a democracia do futuro, já relatava a

importância da ciberdemocracia, em que pese ter utilizado o termo “meios

eletrônicos”:

Com relação às duas diferenças fundamentais entre democracia dos antigos e democracia dos modernos, sobre as quais falei até agora, pode-se timidamente prever que a democracia do futuro goza do mesmo juízo de valor positivo da democracia dos modernos, embora, retornando em parte, através da ampliação dos espaços da democracia direta, tornada possível com a difusão dos meios eletrônicos, à democracia dos antigos.49

Dessa feita, ciberdemocracia, via a democratização do acesso à internet e as

redes sociais, contribuiu, sem precedentes, para a criação de novas formas de

interação entre os membros da sociedade. A ciberdemocracia contribuiu, também,

para a interação do e-cidadão com o Estado.

Representa a ciberdemocracia uma nova forma de democracia que podemos

denominar como democracia cibernética, democracia digital, democracia online ou,

até mesmo, democracia via redes sociais, sendo que sua estruturação se dá via

rede mundial de computadores, num enredo transnacional, indo além das nossas

fronteiras territoriais, tanto que, quando dos manifestos ocorridos no Brasil, por

exemplo, a “jornada de junho” de 2013, simultaneamente ocorreram manifestos de

brasileiros espalhados pelos quatro cantos do mundo.

Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Cesar Leandro de Almeida Rabelo,

sobre o tema, aduzem:

Democracia digital[3] também chamada de “democracia eletrônica”, “e-democracy” [4], “democracia virtual”, “ciberdemocracia”, “teledemocracia” dentre outras nomenclaturas vem se constituindo ao redor de algumas

48 BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 478. 49 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de Janeiro: Elieser, 2000b. p. 382.

Page 44: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

42

expressões-chave tais como: “internet”, “esfera pública”, “democracia”, “novas tecnologias”, “mundo digital” e “recursos web”. Referem-se às novas práticas para a política democrática, que emergem da uma nova infraestrutura tecnológica eletrônica proporcionada por computadores em rede e por um número grande de dispositivos de comunicação e de organização, armazenamento e oferta de dados e informações online.50

Entendemos que a ciberdemocracia oportuniza ampla participação

democrática por parte do e-cidadão que exercita a democracia por meio das

manifestações online, principalmente pelas redes sociais, influenciando,

efetivamente, nos atos do governo, contudo, o e-cidadão, se faz ouvir, também, nas

ruas.

Percebemos com o advento da cibernética, a fomentação de debates públicos

online, nos quais a participação é aberta a todos que têm acesso à internet,

oportunidade na qual podem expressar suas opiniões a respeito do assunto em

questão. Nesse ínterim, fica evidente a disparidade das mídias convencionais, tais

como jornais impressos, rádio, televisão, tendo em vista a ausência de qualquer

forma de censura precedente.

Outro fator evolutivo, advindo da ciberdemocracia, é a polarização instantânea

da liberdade de expressão frente à imediata circulação dos manifestos nas redes

sociais, e isso restou evidente nas últimas manifestações no Brasil, nas quais os

participantes, fazendo uso, por exemplo, de um celular com acesso à internet, de

dentro dos protestos, propagavam rapidamente os acontecimentos, assim, qualquer

pessoa, em qualquer lugar do mundo, bastando apenas o acessar a internet, teve

conhecimento dos acontecimentos de forma instantânea, fato ocorrido, também, na

Primavera Árabe em 2011.

Num certo ponto, essa nova forma de participação democrática chamada

ciberdemocracia nos faz retomar as percepções gregas, ou seja, trata-se de uma

forma de democracia direta como defendida pelos antigos, contudo, realizada uma

análise análoga, o e-cidadão tem, via redes sociais, a possibilidade de participar

diretamente do processo decisório, já que os manifestos impactam nos rumos

legislativos e decisórios do nosso país, demonstrando, assim, que a ciberdemocracia

50 VIEGAS, Cláudia Mara de Almeida Rabelo; RABELO, Cesar Leandro de Almeida. A Participação da Sociedade Brasileira nas decisões do Governo a luz da Democracia Digital. Disponível em: <http://ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10708&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 20 ago. 2016.

Page 45: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

43

é uma excelente ferramenta a favor da democracia participativa, divergindo, assim,

da concepção grega.

Os governantes, atentos às novas tendências envoltas na ciberdemocracia,

de pronto entenderam o ocorrido. O Brasil se antecipou em vários aspectos, por

exemplo, o Tribunal Superior Eleitoral -TSE, sem soma de dúvidas, deu um grande

passo rumo à ciberdemocracia, por meio da urna eletrônica, que viabilizou o voto

eletrônico, que completará, nesse ano, 20 anos da sua primeira utilização, ou seja,

foi sem dúvidas uma grande percepção:

Em cinco meses, durante as eleições municipais de 1996, o projeto foi concluído. A urna eletrônica, criada pelo TSE, foi então licitada para fabricação. O objetivo era adquirir urnas capazes de registrar o voto de um terço do eleitorado, à época, próximo a 100 milhões de eleitores. As urnas adquiridas foram utilizadas em todo o estado do Rio de Janeiro, nas demais capitais dos estados e nos municípios com mais de 200 mil eleitores, totalizando 57 cidades no país.

Sob a presidência do Ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, em 1996 foi iniciada a primeira votação eletrônica do Brasil. Nesse ano, um terço do eleitorado votou nas urnas eletrônicas.51

A democratização digital provocou, em várias esferas do Estado, a

necessidade de construir mecanismos para tornar o Governo, também, digital. O

TSE, acima mencionado, tem em seu portal eletrônico um link denominado

“transparência”52.

Outras instituições fazem uso do mesmo instrumento, no qual disponibilizam,

via site, questões atinentes ao interesse público, reforçando a democratização

digital, isto é, fomentam a ciberdemocracia em prol do e-cidadão, como ocorre na

Câmara dos Deputados, que, além da “transparência”53, tem um portal denominado

“E-democracia”54, disponível, também nas redes sociais (Facebook55; Youtube56;

Flickr57; e, Twitter58) além de várias “comunidades”.59

51TRUBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Informatização do voto. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleicoes/biometria-e-urna-eletronica/eleicoes>. Acesso em: 20 ago. 2016. 52TRUBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Transparência. Disponível em: <http://www.tse.jus.br /transparencia>. Acesso em: 20 ago. 2016. 53PORTAL DA CAMARA DOS DEPUTADOS. Transparência. Disponível em: <http://www2.camara. leg.br/transparencia>. Acesso em: 20 ago. 2016. 54PORTAL DA CAMARA DOS DEPUTADOS. E-democracia. Disponível em: <http://edemocracia. camara.gov.br/>. Acesso em: 20 ago. 2016. 55FACEBOOK. E-democracia. Disponível em: <https://www.facebook.com/e-Democracia-14961415 5088732//>. Acesso em: 20 ago. 2016. 56YOUTUBE. E-democracia. Disponível em: <https://www.youtube.com/user/edemocraciacd//>. Acesso em 20 ago. 2016. 57 FLICKR. E-democracia. Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/edemocracia/>. Acesso em:

Page 46: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

44

O Senado Federal, também, tem instrumento semelhante, denominado de

“e-cidadania”60. A Presidência da República, igualmente, disponibiliza aos e-

cidadãos vários meios de acesso, seja via portal ou redes sociais.61

Em todos os portais e redes sociais, há a possibilidade de participação do e-

cidadão brasileiro por meio de enquetes, bate-papos, acesso às informações e

viabilidade de propostas de leis.

Todavia, não são somete flores, com o perdão do trocadilho, uma vez que a

exclusão digital é uma realidade que torna a ciberdemocracia, em parte, excludente,

assemelhando-se, mais uma vez, à concepção de democracia dos antigos e, além

disso, infelizmente, parcela significativa da população não tem interesse por

questões políticas e sociais, bem como não tem interesse pelo denominado “bem-

comum” do bom andamento do Brasil.

Não podemos olvidar, também, que, além dos gargalos acima mencionados,

temos que lembrar que a des”ordem” sempre foi associada aos idealistas que

propuseram, em qualquer tempo, a ruptura de um estado tirano, a ruptura de um

regime absolutista ou totalitário. Contudo, entender a des”ordem”, é ir além do muro

invisível que criamos sobre a ordem; entender a desordem é entender que nem

todos pensamos iguais, que a divergência faz parte de um processo evolutivo,

denominado civilização, ao passo que a des”ordem”, ou como defenderemos abaixo

a ordem vista por outro viés foi, é e será necessária para evolução da raça humana,

principalmente na era da ciberdemocracia.

1.3 Des “ordem”

As manifestações, consideradas ordeiras, recebem grande apoio da

população, independentemente da época. Nunca foi aceito o uso da força como

20 ago. 2016. 58 TWITTER. E-democracia. Disponível em: < https://twitter.com/Edemocracia>. Acesso em: 20 ago. 2016. 59PORTAL DA CAMARA DOS DEPUTADOS. E-democracia. Disponível em: <http://edemocracia. camara.gov.br/comunidades#.V7jwtMVZ7rd>. Acesso em: 20 ago. 2016. 60 SENADO FEDERAL. E-cidadania. Disponível em: http://www12.senado.leg.br/ecidadania. Acesso em: 20 ago. 2016. 61 PORTAL DA LEGISLAÇÃO. E-cidadania. Disponível em: <http://www2.planalto.gov.br/>. Acesso em: 20 ago. 2016.

Page 47: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

45

forma de convencimento, e nos dias atuais não é diferente. Vivemos numa geração

que não tolera abusos, ou seja, desde tempos mais arcaicos, até os dias atuais, a

raça humana acredita que o convencimento deve ocorrer pelo argumento, pela

persuasão, tal afirmativa encontra respaldo na liberdade de expressão e no princípio

da legalidade, uma vez que não somos obrigados a fazer ou deixar de fazer alguma

coisa senão em virtude da lei62.

A des“ordem”, por seu turno, pressupõe a não observância de uma dada

ordem pública. Segundo Nathaly Campitelli Roque, ordem pública pode ser mais

bem apreendida ao se considerar o direito como produto cultural, resultante das

influências do contexto sócio-político-econômico-histórico.63

É importante frisar que não abordaremos questões atinentes aos fatos atuais,

pois tais fatos serão esmiuçados em momento oportuno, entretanto, mister se faz

trazer à baila uma visão diferente sobre desordem, vejamos:

1.3.1 Ordenando uma ordem

Somos os únicos seres racionais, ou seja, o ser humano é o único que

desenvolveu o raciocínio, que, conforme acima esculpido, é a forma como

ordenamos nossos pensamentos, isto é, uma ordem intelectual.

Dessa forma, a ordem encontra-se em quase tudo, seja na organização das

ideias, das coisas, dos seres, do universo.

Entretanto, se fôssemos olhar a origem do termo, poderíamos afirmar que

Ordem64 vem do Latim ORDO, “arranjo de elementos feito conforme certos critérios”,

62 Constituição Federal, artigo 5º, inciso II – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. 63 ROQUE, Nathaly Campitelli. A ordem pública e seu regime jurídico do direito processual civil as questões de ordem pública. Revista dos Tribunais | vol. 908/2011 | p. 263 - 291 | Jun / 2011, p. 268. A Autora ainda afirma que: “A ideia de “ordem” é questão que remonta ao início do conhecimento humano, presente desde a fase do conhecimento mitológico, sendo incorporado à filosofia então nascente. Foi tema dos pensadores pré-socráticos, de Platão, Aristóteles, Cícero, Santo Agostinho, São Tomás de Aquino; dos pensadores renascentistas e iluministas, especialmente no pensamento de Emanuel Kant, sendo ainda questão dos pensadores modernos e pós-modernos (Morin, Luhmann, Habermas dentre outros). Já a ideia moderna de “público” decorre especialmente da contribuição romana, baseada no conceito de autoritas, e, embora abandonado na medievalidade, reaparece com os pensadores políticos do Renascimento e do Iluminismo. 64 Lista De Palavras. Origem da palavra: site de etimologia. Disponível em:<http:// origemdapalavra.com.br/site/pergunta/origem-de-ordem/>. Acesso em: 17 mar. 2016.

Page 48: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

46

“exigência de disposição regrada de elementos, comando”, relacionado ao verbo

ORDIRI, “ordenar”.

De acordo com o Dicionário Brasileiro Globo, ordem é:

ORDEM (ó), s. f. Disposição metódica; arranjo das coisas classificadas segundo certas relações, conveniências, utilidades ou qualidades respectivas; qualidade daquele que é ordenado, metódico: é um funcionário que tem ordem; regularidade; tranquilidade; resultante de submissão às leis; conveniente disposição dos meios para conseguir fins; natureza; classe; categoria; artista de primeira ordem; mandado de autoridade superior; ato de mandar; prescrição imperativa; lei; boa administração; modo; jeito; maneira; sociedade (congregação) religiosa; classe ou hierarquia dos cidadãos; sacramento da igreja, (sacerdócio); classe de honra instituída por um soberano ou pelo governo para compensar o mérito pessoal: a Ordem do Cruzeiro; insígnia dessa classe; (arquit.) cada um dos sistemas clássicos de dispor as partes principais de um edifício: ordem jônica; publicação de leis; regulamento militar; (hist. nat.) divisão da classificação dos seres, intermediaria à classe e à família; ordem do dia: expediente prefixado dos trabalhos de cada dia ou de uma sessão. (Do lat. ordine).65

Já, segundo o Martim Pierre (dicionário jurídico), temos uma divisão de

ordem:

ORDEM CIVIL – Conjunto de leis e princípios que regem os interesses provados. ORDEM DO DIA – (Verb, Pol.) Relação do que será discutido no plenário naquele dia. ORDEM JURÍDICA – (Loc. Jurídica) É uma forma de ordem social mais ampla que o ordenamento jurídico porque é constituído por todos os controles sociais (direito, moral, educação, etc.).66

Não obstante, pautados no senso comum, podemos dizer que “ordem” é uma

condição em que tudo se encontra em um determinado espaço, conforme

determinados padrões previamente estabelecidos, seja pela natureza ou pelo

homem; contudo, levado a cabo, o termo “ordem” é de uma abstração sem

mensuração.

Nesse diapasão, imagine-se adentrando em um dado estabelecimento

comercial, e.g., um hipermercado, em que todos os mantimentos e utensílios

encontram-se empilhados, ao passo que do lado esquerdo encontram-se os

alimentos não perecíveis, no meio os alimentos perecíveis e no lado direito os

produtos de limpeza, eletrodomésticos e demais itens que compõem o

65 FERNANDES, Francisco. Dicionário Brasileiro Globo. 44.ed. São Paulo: Globo, 1996. p. 442. 66 PIERRE, Martim. Dicionário Jurídico 2015: terminologia juridical e forense, brocados latinos. 7 ed. Niterói, RJ: Impetus, 2015. p. 267.

Page 49: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

47

estabelecimento. Todavia, indo a um concorrente, verificamos disposição totalmente

oposta, assim indago, qual ordem está correta?

Ora, o fato de um hipermercado dispor seus itens de forma diversa de outro

lhe garante o título de desordenado?

Veja, numa simples situação chegamos a um dilema, ou seja, em que

consiste a ordem? Como dizer qual ordem é correta? Assim, caso não tenhamos

uma noção sobre um padrão pré-estabelecido, em que estaremos pensando,

quando formos justificar qual a ordem dever ser observada.

Destarte, não existe certo ou errado, mas tão somente uma análise sobre a

organização ou disposição das coisas, sendo que tal organização/disposição só terá

eficácia quando o fito for alcançado.

Goffredo Telles Junior67 argumenta que a ordem advém de uma disposição,

vejamos:

Toda ordem, evidentemente, é uma disposição. Mas não é uma disposição qualquer. É uma certa disposição, uma disposição conveniente de coisas, sendo que a disposição só pode ser considerada conveniente quando alcança o fim em razão do qual ela é dada às coisas.

Os livros de uma biblioteca estão em ordem quando se acham dispostos de maneira a possibilitar o encontro de qualquer deles, no momento em que for procurado. Esta possibilidade é o fim para cuja consecução os livros são dispostos desta ou daquela maneira. Se tal fim é atingido, a disposição dos livros é conveniente, e os livros estão em ordem, o mesmo acontece com quaisquer cousas colocadas em ordem, ou seja, em disposição conveniente.

Qual seria a disposição correta? Ora, cada um organiza sua coisa, sua vida,

seu jeito de ser, conforme suas necessidades e pretensões. Entretanto sempre

buscamos determinar que nossa “ordem” deve prevalecer sobre as demais, isso é

devido ao egocentrismo, uma vez que o individualismo tem tomado cada vez mais

parte de nossas vidas, o “eu” sempre em primeiro lugar e a questão do que é ou não

“ordem” não é diferente.

Sabemos que ordem pressupõe a diversidade de coisas, ao passo que um

único objeto, um único corpo nunca será ordeiro ou desordeiro, nesse sentido,

continua Goffredo Telles Junior:68

É obvio que toda ordem requer coisas múltiplas, seres necessariamente

67 TELLES Júnior, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 3-4. 68 Ibidem, p. 5.

Page 50: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

48

distintos uns dos outros (embora possam ser iguais uns aos outros). Não pode haver ordem onde não haja multiplicidade de coisas, multiplicidade de seres; onde não haja coisas ou seres distintos para ordenar, isto é, para relacionar uns com os outros e colocar em seus devidos lugares. “Não há ordem sem distinção”, disse Santo Thomaz de Aquino.

Nesse diapasão, a ordem depende da existência múltipla de coisas ou seres,

sendo que, quando não há multiplicidade, não há ordem. Assim, Goffredo Telles

Junior traz a lume que a “ordem compreende multiplicidade e unidade. E como, em

todas as ordens, a multiplicidade dos seres se submete à unidade do conjunto, toda

ordem implica dominação da unidade sobre o múltiplo”.69

Contudo, não é tão simples assim definir ordem. Edgar Morin70 aduz que a

ordem é composta de diversos níveis, sendo o primeiro nível voltado aos fenômenos

naturais, biológicos e sociais, vejamos:

Portanto, a definição de ordem comporta diversos níveis. O primeiro nível seria o dos fenômenos que aparecem na natureza física, biológica e social: a ordem se manifesta sob a forma de constância, de estabilidade, de regularidade e de repetição.

No segundo nível, o autor aduz que a determinação, a coação, a causalidade

e a necessidade levam à obediência no tocante às leis, que estas norteiam os

governados, ou seja, a obediência às leis encontra-se como núcleo do segundo

nível:

Depois, chegamos num segundo nível que seria o da natureza da ordem: a determinação, a coação, a causalidade e a necessidade que fazem os fenômenos obedecer às leis que os governam. Isso nos leva a um terceiro nível, mais profundo, no qual a ordem significa coerência, coerência lógica, possibilidade de deduzir ou de induzir, e, portanto, de prever. A ordem nos revela um universo assimilável pela mente que, correlativamente, encontra na ordem o fundamento de suas verdades lógicas71.

Edgar Morin elucida, no terceiro nível, que a consonância entre a ordem da

mente e a ordem do mundo propicia a racionalidade, sendo, então, a racionalidade o

caminho para se estabelecer e manter a ordem, bem como viabiliza ao homem

tornar-se senhor e dono da natureza:

69 TELLES Júnior, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 5. 70 MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. p. 207. 71 Ibidem, 2005, p. 208.

Page 51: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

49

Nesse terceiro nível, um nível profundo, a ordem se identifica com a racionalidade, concebida como harmonia entre a ordem da mente e a ordem do mundo. Podemos dizer, de algum modo, que há um pentágono de racionalidade no qual a ordem é um elemento-chave. O pentágono de racionalidade é constituído por cinco noções: ordem, determinismo, objetividade, causalidade e, finalmente, controle. O conhecimento das leis da natureza permite anunciar e controlar os fenômenos: com isso, encontramos a idéia fundamental de uma ciência cuja missão é tornar o homem senhor e dono da natureza, pela mente e pela ação.

O autor acredita que a ordem é o elemento-chave do pentágono de

racionalidade e expõe que a teologia, a mágica, a política lhe dão origem, todavia,

reconhece que a noção de ordem não é um simples conceito, porquanto envereda

pela metafisica e guarda traços da teologia:

Percebemos que esse pentágono de racionalidade fundamenta a idéia de ordem e se fundamenta nela. O curioso é que ele tem origem teológica, mágica e política. Whitehead disse o seguinte: “A ordem do universo é um conceito derivado da crença religiosa, na racionalidade do Deus, que pôs em movimento um universo perfeito para demonstrar sua onisciência”. E, ele acrescentou: “A crença na redução dessa ordem numa fórmula matemática deriva da visão pitagórica de que o mistério do universo é revelado através dos números”. Portanto, Whitehead colocou a origem teológica e mágica da idéia de ordem. Podemos acrescentar a ela uma origem política: a idéia de ordem universal desenvolveu-se no Ocidente no momento da soberania das monarquias de direito divino. Não quero anunciar aqui um determinismo sociológico estúpido que deduziria a idéia de ordem física da ordem política do monarca absoluto. A minha sugestão é que existe um indício, um fundo político da ordem monárquica, da ordem social por trás da idéia de ordem física. Não digo que a idéia de ordem física seja uma “superestrutura ideológica” de ordem política. Acho que a ordem política foi um meio de formação favorável para a ordem física. (...) De qualquer modo, acabamos de ver que a noção de ordem não é simples, que ela esconde embasamentos metafísicos e que esses guardam traços teológicos.72

O primeiro nível tange à ordem social que, para a presente tese, é tema caro;

contudo, os demais níveis viabilizam uma melhor análise para o entendimento da

ordem, ao passo que não podemos analisar os níveis isoladamente, como não

podemos analisar a ordem, ou seja, são vários aspectos que, juntos, concretizam

uma base firme para o entendimento da ordem e, por consequência lógica, para

desvendarmos a desordem.

Assim, o entendimento da ordem, que no contexto acima é algo que viabiliza

a previsibilidade, isto é, o comando, é de suma importância para entender a

72 MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. p. 209.

Page 52: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

50

desordem, e, por consequência lógica, acarreta a aflição da incerteza diante do

incoercível, do imprevisível e do indeterminável.

Todavia, temos, também, que nos permitir analisar a desordem de um outro

ângulo, ou seja, uma ordem inversa à outra ordem. Assim, em alguns aspectos, a

desordem apenas existe, porque contraria o nosso ideal de ordem.

1.3.2 Desordem: ausência de ordem ou ordem em outra perspectiva

É muito comum utilizarmos a palavra desordem como sendo contraditória à

palavra ordem. Utilizamos tal contradição para referirmo-nos à ausência de uma

dada ordem que existe em um determinado lugar, ou seja, ocorreu em algum

momento o ajustamento sobre o que e como seria a ordem e, quando de sua

ausência, estaríamos num cenário de desordem, isto é, há coisas ou partes que

correspondem a um todo que deveriam estar organizadas em um determinado lugar

ou de uma maneira dada e não estão, porque alguma conduta humana ou fenômeno

natural contribuiu para sua desorganização.

Tal concepção de contrariedade não é de agora, tendo em vista que, na

antiguidade, os gregos denominaram o Universo de cosmos e não de caos.

A Filosofia ensina que o Universo é A DIVERSIDADE DAS COISAS HARMONIOSAMENTE ORDENADAS, DENTRO DA UNIDADE DO TODO. (sic) Os gregos chamavam o Universo de cosmos, palavra que significa ordem; não caos, palavra que significa ausência de ordem.73

Assim, poderíamos dizer que a desordem só existe, quando é estabelecido

um padrão de ordem; no entanto, como na ordem, a desordem também pode ser

classificada em níveis diferentes.

Edgar Morin argumenta que o primeiro nível, o fenômeno da desordem, é um

conceito-mala, uma vez que conglomeram irregularidades, as inconstâncias, as

instabilidades, as agitações, as dispersões, as colisões, os acidentes que podem

perturbar as regulações organizacionais:

73 TELLES JÚNIOR, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 6.

Page 53: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

51

Tomemos a noção de desordem. Ela também comporta diversos níveis. Num primeiro nível do fenômeno, a desordem é um conceito-mala que engloba as irregularidades, as inconstâncias, as instabilidades, as agitações, as dispersões, as colisões, os acidentes — que se produzem tanto nos níveis i das partículas microfísicas, quanto no nível das galáxias bem como no nível dos automóveis, pois, cheguei do aeroporto de Genebra num táxi que bateu num outro carro. A desordem também contém desvios que podem perturbar as regulações organizacionais e, mais amplamente, ela diz respeito a qualquer fenômeno que acarrete ou constitua a desorganização, a desintegração, a morte. Enfim, onde há atividade de informação e de comunicação, a desordem é o barulho que parasita a mensagem, é o erro. Isso para o primeiro nível empírico de definição da desordem.74

Já no segundo nível, a eventualidade e o acaso são postos por Edgar Morin

como sendo o núcleo de todas as desordens, na qual a eventualidade e acaso

podem receber uma definição, sendo certo que tais elementos encontram-se

adstritos ao desconhecido, vejamos:

Posteriormente, há um segundo nível no qual aparece o ingrediente comum a todas essas desordens: a eventualidade e o acaso. A eventualidade e o acaso podem ser definidos. O matemático Chaitin mostrou que o acaso podia ser definido se comparado a um computador. Deriva do acaso toda sequência que não pode ser concebida a partir de um algoritmo e que necessita, então, ser descrita na sua totalidade. Thom usou o mesmo sentido para definir o acaso no seu artigo, no qual ele declarava guerra ao acaso: "O que não pode ser estimulado por nenhum mecanismo, nem deduzido por nenhum formalismo.75

Nesse contexto, o acaso é o eixo do terceiro nível, sendo que o autor o

responsabiliza como o vilão da desordem, uma vez que o acaso é irresponsável,

incoerente, ou seja, o acaso torna-se um contraponto à ordem, já que esta permite

uma previsibilidade e aquele, como dito, pressupõe o desconhecido, vejamos:

Nesse caminho, chegamos ao terceiro nível, onde o acaso nos priva da lei e do princípio para conceber um fenômeno. A partir de então, mergulhamos nas profundezas obscuras que, para alguns como Thom, são obscurantistas. Efetivamente, o acaso insulta a coerência e a causalidade; desafia o pentágono da racionalidade que acabei de definir. Ele aparece como irracionalidade, incoerência, demência, portador de destruição, portador da morte. E, já que a ordem é aquilo que permite a previsão, isto é, o domínio, a desordem é aquilo que traz a angústia da incerteza diante do incontrolável, do imprevisível, do indeterminável. Mesmo quando conseguimos dizer "No fundo, o acaso é só o encontro de séries deterministas", ainda assim a desordem e a incerteza aparecem nesse encontro. Se um vaso de flores, por motivos determinados, cai na cabeça de um transeunte que passa sob a janela de onde despenca o vaso de flor por motivos conhecidos, mesmo assim, trata-se de um acidente. Isso desorganiza a vida do indivíduo que, em vez de ir para o trabalho, irá para o

74 MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. p. 209. 75 Ibidem, p. 210.

Page 54: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

52

hospital. A racionalização a posteriori que explica o acidente não elimina o acidente, isto é, seu caráter desorganizador, incerto e aleatório, numa existência organizada e na ordem urbana.76

Nessa esteira de pensamento, tudo que sai do seu eixo natural, tudo que

causa uma agitação desproporcional, tudo que perturbar as regulações

organizacionais causa um caos, ou seja, causa a desordem, motivada, via de regra,

pelo acaso.

Com efeito, a convivência em sociedade requer que cada indivíduo, que

compõe a sociedade, para atingir uma harmonia mínima para viver em paz, deve

abrir mão do individualismo em relação à ordem, para chegar a uma ordem comum.

Para tanto, os indivíduos que vivem em sociedade criam normas que têm o condão

de estabelecer um regramento mínimo para convivência, ou seja, estabelecem e

conceituam o que é ordem.

E essa imposição de como devemos viver em sociedade não é uma coisa dos

dias atuais, vejamos, por exemplo, quando Deus entregou os Dez Mandamentos,

antes falou sobre como propunha abençoar os filhos de Israel e advertiu-os a

respeito dos limites a serem respeitados, para, posteriormente, entregar os Dez

Mandamentos a fim de que o povo obedecesse, ou seja, foram estabelecidas dez

ordens que deveriam ser obedecidas, e, quando não observadas, geravam o caos,

isto é, a desordem, assim, toda vez que ocorresse o não cumprimento dos

mandamentos, estaríamos diante da ruptura da ordem.

Não obstante, temos uma concepção sobre desordem que, para a presente

tese, é de extrema importância, porquanto a desordem pode ser vista de um outro

ângulo, no qual deixamos a visão de desobediência em relação à ordem, para

olharmos a desordem como sendo uma ordem contrária a outra ordem.

Sobre o tema Goffredo Tellles Júnior77 salienta:

O problema da existência da desordem só pode ser resolvido se for colocado em seus devidos termos. Em verdade, ele não passa de um pseudoproblema. É um problema fundado num equívoco. A desordem não é o contrário da ordem, como se costuma pensar. Ela é, isto sim, uma ordem contrária a outra ordem.

76 Ibidem, p. 211. 77 TELLES JÚNIOR, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 7.

Page 55: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

53

Goffredo Tellles Júnior afirma que foi Henri Bergson quem revelou a

verdadeira natureza da desordem, acredita aquele que este revelou que a questão

da desordem é apresentada com base em uma falsidade, uma vez que acredita que

a desordem na verdade é uma ordem não querida, ou ainda, uma ordem que

desagrada, prejudica e daí por diante, contudo, assegura que, na verdade, a

desordem é sempre uma ordem:

Bergson foi quem revelou a natureza verdadeira da desordem. Foi ele quem demonstrou a falsidade com que a questão da desordem é geralmente apresentada (Henri Bergson, A Evolução Criadora, Capítulo III; O Pensamento e o Movente, II e III). Desordem, disse ele, é o nome dado à ordem não desejada, não querida, não procurada. É o nome da ordem que desagrada, desgosta, decepciona, prejudica, infelicita, desola. Mas a desordem é sempre uma ordem, eis o que precisa ficar bem claro.78

Sustenta, ainda, que Henri Bergson demonstrou que tudo quanto o ser

humano chama de desordem, é sempre ordem, pois acreditava que a desordem

como contraponto à ordem, ou seja, a desordem como ausência de ordem seria algo

impossível, tendo em vista que a desordem, na verdade, representa uma ordem que

infelicita ou desola:

Bergson demonstrou que tudo quanto o ser humano chama de desordem é sempre ordem. Diz o filosofo que a desordem tida como ausência de ordem é impossível, por ser intrinsecamente contraditória. Ela há de ser, forçosamente, não a ausência, mas a presença de uma ordem, embora esta ordem desagrade, prejudique, infelicite. Na realidade, a ausência de uma certa ordem não é desordem, mas a presença de outra ordem.79

Na nossa compreensão, esta última percepção sobre desordem é a que

melhor define o sentimento dos dias atuais vistos nas principais manifestações no

Brasil, seja online, via redes sociais ou nas ruas, o que observamos não é desordem

e sim uma ordem que desagrada, que infelicita e prejudica. Essa concepção,

geralmente, é dada por aqueles que, de alguma forma, detêm o poder político em

suas mãos.

Não podemos confundir desordem com violência, pois a desordem, nesse

contexto, apenas expressa a contrariedade em relação a determinado ponto de vista

considerado correto pelo senso comum, ou seja, no mundo das ideias, já a violência,

78 TELLES JÚNIOR, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 10. 79 Ibidem, p. 10

Page 56: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

54

apenas para efeito de distinção, seria o uso da força física, da intimidação, da

coação psíquica ou moral, o que não pode e não deve ocorrer.

Diante de todo o exposto, resta evidente que o processo de comunicação foi,

é e será de suma importância para a evolução da humanidade. No início, foi a

possibilidade de comunicação, de manifestação de ideias, de troca de informações

que viabilizou ao homem conviver em grupo para melhor se defender e melhor

evoluir, posteriormente, conseguimos entender a estrutura do bem pensar, com o

uso da lógica, e, nos dias contemporâneos, utilizamos as redes sociais para

proliferar nossas ideias, nossos pensamentos, nossos manifestos e sempre, via de

regra, em nome da democracia ou em busca de sua efetivação.

Destarte, a democracia foi uma conquista da raça humana, por meio da

capacidade de comunicação, que, tendo a necessidade de conviver em grupo, teve

de estabelecer padrões para que essa convivência ocorresse de forma harmônica.

Surge, assim, a democracia – governo do povo – como mecanismo para a evolução

paritária dos cidadãos, respeitando as percepções de cidadão de cada tempo, até o

surgimento do e-cidadão, ou seja, o cidadão que, além das ruas, faz uso das redes

sociais, da internet para participar, ativa ou passivamente, do processo evolutivo da

democracia. Como ocorre em qualquer transformação ou em qualquer processo

evolutivo, temos sempre mais de uma ótica, mais de uma expectativa, e, com o

processo democrático não foi diferente, já que para alguns os idealistas não passam

de anarquistas que, na verdade, operam a desordem.

Nesse contexto, a desordem vem desde a infância dos povos lado-a-lado com

o processo de evolução da democracia, ao passo que quando se uniram em

sociedade os homens estabelecerem algumas regras (seja advinda da divindade ou

do senso comum dos homens), surgindo a desordem quando da não observância

dessas regras.

Pelos relatos históricos da humanidade, em vários momentos, prevaleceu o

caos, a guerra (Hobbes acredita que o homem em seu estado natural sem a direção

de um Estado civil, torna algoz do próprio homem – o homem é lobo do próprio

homem), em outros casos, vivenciamos o efetivo direito de manifesto, contudo,

pisoteado pelo tirano, governante, ou qualquer pessoa que estava no poder que,

para se manter no poder, atribuiu a justas manifestações a realização de ato

desordeiro, tão somente, para defender interesses particulares.

Page 57: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

55

Não defendemos o não cumprimento das ordens, todavia as ordens impostas

pelos tiranos, pelos totalitários ou apenas para agradar anseios particulares podem

ser combatidas e tal ato de resistência ou desobediência civil não pode, de pronto,

serem qualificados como desordem.

Na verdade, desordem é um termo criado para refutar aquilo que afronta o

que consideramos como ordem, sem, contudo, darmos ao outro a possibilidade da

divergência, da não concordância, e isso ocorre desde sempre, sendo atemporal.

Assim, a des"ordem” é na verdade uma ordem em outra perspectiva, onde o

des“ordeiro” busca não somente convalidar seu ponto de vista sobre determinada

“ordem”, previamente estabelecida por/para conveniência de quem a constituiu,

sendo imputado a quem pensa contrariamente o “título” de desordeiro, quando na

verdade, apenas, expõe sua forma de pensar em disparidade com a do outro.

Nessa contextualização, no berço da humanidade, o ato de contrariar uma

ordem considerada injusta, em decorrência da não existência de respeito aos

direitos humanos, era em pequena monta, entretanto já existia e recebeu o nome de

direito de resistência, o que, com o passar do tempo, fora denominado

desobediência civil e, posteriormente, para nós, manifestações, principalmente por

meio das redes sociais.

Ou seja, a des“ordem” é fictícia na maioria das vezes, tendo em vista que

figura como mecanismos de defesa dos que se consideram ordeiro, é assim, uma

tentativa de invalidação do direito de resistência, da desobediência civil e das

manifestações.

Dessa feita, analisaremos, abaixo, o direito de resistência e a desobediência

civil, para, posteriormente, entrarmos nas atuais formas de manifestação, que, na

contemporaneidade, tem as redes sociais como grande aliada para propagação, de

forma instantânea e com alcances antes inimagináveis, da divergência em relação a

todas e quaisquer questões, mas principalmente aquelas que já eram objeto de

resistências na antiguidade, ou seja, forma política de modo de governar e as

exclusões das classes sociais.

Page 58: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

56

2 DIREITO DE RESISTÊNCIA E DESOBEDIÊNCIA CIVIL

A busca pela liberdade e igualdade é atemporal e sempre esteou os ideais

envoltos no direito de resistência e mais recentemente a desobediência civil.

A questão do direito de resistência e da desobediência civil, no presente

trabalho, transmutadas para “linguagem das ruas” por meio das manifestações,

ressalvada as especificidades de cada época e local, não são temas exclusivos da

contemporaneidade e nem do Brasil, ou seja, direito de resistência e desobediência

civil permearam por todos os tempos e sempre alicerceçaram os principais avanços

civilizatórios.

Na antiguidade Zenão de Eléia, quando capturado e torturado em praça

pública, por se voltar contra um tirano, se manteve fiel aos seus companheiros de

insurreição e não os delatou, e tal ato, que, na concepção do tirano, serviria para

amedrontar seus inimigos, motivou o espírito de liberdade da população, o que

acarretou a derrocada do tirano.

Na Antiguidade, viveu um homem de nome Zenão, nascido em Eléia. Os registros disponíveis da narrativa de sua morte fazem crer que ele foi um homem dotado de grande força moral. Tendo participado da organização de uma conspiração contra um tirano, foi capturado e submetido a tortura em praça pública, para que delatasse os seus companheiros de insurreição. Como não o fez, acabou sendo morto. Mas o espetáculo de sua tortura, montado para atemorizar os inimigos do tirano, produziu o efeito inverso. Segundo as crônicas, a extraordinária lealdade e força demonstrada por Zenão, perante a violência brutal que sofria, teriam despertado na população a consciência da necessidade de se libertar do tirano, seguindo-se, então, a sua deposição.80

O contraditório, a refutação, ou melhor dizendo, a resistência é peça fundante

para o desenvolvimento humano, no exemplo de Zenão, o povo voltou-se contra o

Tirano e a consequência foi a derrocada deste.

Na tese em tela, o direito de resistência, bem como a questão da

desobediência civil serão transmutados para “linguagem das ruas” por meio das

manifestações, entretanto é necessário, antes de adentramos na questão das

últimas manifestações ocorridas no Brasil (jornada de junho de 2013), debruçarmos

80 COELHO, Fábio Ulhoa. Roteiro de lógica jurídica. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1.

Page 59: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

57

sobre o direito de resistência e a desobediência civil num contexto histórico, uma vez

que tais temas permearam por todos os tempos.

2.1 Concepções bíblicas sobre o direito de resistência

Segundo afirma Acácio Vaz de Lima Filho81, para os estudiosos do Poder, na

infância dos povos, as manifestações religiosas eram demasiadamente importantes.

O Direito de resistência sucede desde a antiguidade e nos manda a uma

reflexão bíblica a respeito do assunto. Oportuno mencionar que aqui trataremos a

bíblia num enredo apenas histórico, ou seja, não daremos um contexto de

religiosidade.

Em “Gênesis”, primeiro livro bíblico, tem-se a primeira desobediência82, na

qual Deus fala para Adão que ele pode comer os frutos de qualquer árvore do jardim

exceto os frutos da árvore do conhecimento. Contudo, Adão comeu o fruto dado por

Eva que foi aconselhada pela serpente83.

Adão e sua mulher resistiram ao ordenamento emanado por Deus, por

acreditarem que nenhuma consequência prejudicial lhes seria atribuída.

Como em toda e qualquer ordem, temos de analisar se ela foi derivada por

quem de direito e se produziu os efeitos esperados, ora, Deus disse que se do fruto

81 LIMA FILHO, Acácio Vaz de. O poder na Antiguidade: aspectos históricos e jurídicos. São Paulo: Ícone, 1999. p. 19. 82 E ordenou o Senhor Deus ao homem, dizendo: De toda a árvore do jardim comerás livremente, Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás. Gênesis 2:16-17. 83 Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo que o SENHOR Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda a árvore do jardim? E disse a mulher à serpente: Do fruto das árvores do jardim comeremos, Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais. Então a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal. E viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela. Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais. BÍBLIA SAGRADA. Gênesis 3:1-7. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/gn/3>. Acesso em: 18 maio 2016.

Page 60: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

58

Adão comesse, certo seria sua morte, contudo, não foi o que aconteceu, entretanto

foram eles expulsos do jardim do Éden.84

Algumas indagações poderiam ser formuladas a partir de tal passagem, no

intuito de saber se a expulsão do casal do jardim do Éden foi um ato injusto,

arbitrário, porque não dizer, sem fundamento jurídico, ou seja: Se Ele não queria que

isso acontecesse, por que colocou a tal árvore no meio do Jardim – e não fora dos

muros do Paraíso? Teria Deus cometido “omissão administrativa, porque, além de

colocar a árvore em lugar errado não a cercou com avisos, barreiras, deixando de

adotar os mínimos requisitos de segurança e expondo todos que passavam ao

perigo? Teria Deus cometido indução ao crime”: chamou a atenção de Adão e Eva

para o exato local onde se encontrava?

Resta evidente, que se Deus tivesse entre nós, isto é, no mundo

contemporâneo, provavelmente estaria interpondo recursos, apelos, rogatórias,

precatórias, mandados de segurança e liminares, uma vez que teria de explicar em

inúmeras audiências sua decisão de expulsar Adão e Eva do Paraíso, apenas por

transgredir uma lei arbitrária, sem nenhum fundamento jurídico: não comer o fruto do

Bem e do Mal.

Como diria Brás Cubas, personagem de Machado de Assis85, “natureza é às

vezes um imenso escárnio”, isto é, por que a árvore do Bem e do Mal estava no

meio do Jardim se não era para consumir seus frutos? Se não era para consumir

seus frutos por que a árvore Bem e do Mal estava no meio do Jardim? Adão e Eva,

certamente, reconheceram a ordem como inválida, pois impertinente, Deus colocou

a árvore no meio do Jardim e proibiu o consumo dos frutos.

Se fôssemos normatizar tal assunto, poderíamos nos apoiar no

posicionamento de André Luiz Freire86 sobre “existência (pertinência) e validade das

normas jurídicas:

84 O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a terra de que fora tomado. BÍBLIA SAGRADA. Gênesis 3:23. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/gn/3>. Acesso em: 18 maio 2016 85 O pior é que era coxa. Uns olhos tão lúcidos, uma boca tão fresca, uma compostura tão senhoril; e coxa! Esse contraste faria suspeitar que a natureza é às vezes um imenso escárnio. Por que bonita, se coxa? por que coxa, se bonita? Tal era a pergunta que eu vinha fazendo a mim mesmo ao voltar para casa, de noite, sem atinar com a solução do enigma. ASSIS, Machado. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 44. 86 FREIRE, André Luiz. Manutenção e retirada dos contratos administrativos inválidos. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 33.

Page 61: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

59

Caso se procure ser fiel aos termos adotados na lógica (deôntica) formal, de fato, validade significará relação de pertinência com o sistema. As proposições são válidas ou inválidas, conforme pertençam ou não ao ordenamento jurídico. Norma jurídica válida é norma jurídica existente; norma inválida não é norma jurídica, é norma que não faz parte do ordenamento jurídico.

Após a desobediência de Adão e Eva, falaremos, agora, da “resistência à

idolatria”, tema que é tratado no Livro de Daniel87, na passagem em que Sadraque,

Mesaque e Abednego se voltam contra a ordem advinda do Rei Nabucodonosor e

não se curvam diante da estátua de ouro colocada na planície de Dura, província da

Babilônia. Tal manifestação diante da estátua se revela uma não aceitação ao que

foi imposto pelo rei e assim o fizeram por julgarem a lei injusta e por não idolatrarem

outros deuses.

No livro de Jonas88, o direito de resistência se materializa na passagem em

que Jonas se recusa a obedecer ao Senhor que determinou que ele fosse para

Nínive. O argumento utilizado por Jonas para desobedecer ao mando foi que Nínive,

87 O rei Nabucodonosor fez uma estátua de ouro, cuja altura era de sessenta côvados, e a sua largura de seis côvados; levantou-a no campo de Dura, na província de babilônia. Então o rei Nabucodonosor mandou reunir os príncipes, os prefeitos, os governadores, os conselheiros, os tesoureiros, os juízes, os capitães, e todos os oficiais das províncias, para que viessem à consagração da estátua que o rei Nabucodonosor tinha levantado. (...) Há uns homens judeus, os quais constituíste sobre os negócios da província de babilônia: Sadraque, Mesaque e Abednego; estes homens, ó rei, não fizeram caso de ti; a teus deuses não servem, nem adoram a estátua de ouro que levantaste. Então Nabucodonosor, com ira e furor, mandou trazer a Sadraque, Mesaque e Abednego. E trouxeram a estes homens perante o rei. Falou Nabucodonosor, e lhes disse: É de propósito, ó Sadraque, Mesaque e Abednego, que vós não servis a meus deuses nem adorais a estátua de ouro que levantei? Agora, pois, se estais prontos, quando ouvirdes o som da buzina, da flauta, da harpa, da sambuca, do saltério, da gaita de foles, e de toda a espécie de música, para vos prostrardes e adorardes a estátua que fiz, bom é; mas, se não a adorardes, sereis lançados, na mesma hora, dentro da fornalha de fogo ardente. E quem é o Deus que vos poderá livrar das minhas mãos? Responderam Sadraque, Mesaque e Abednego, e disseram ao rei Nabucodonosor: Não necessitamos de te responder sobre este negócio. Eis que o nosso Deus, a quem nós servimos, é que nos pode livrar; ele nos livrará da fornalha de fogo ardente, e da tua mão, ó rei. BÍBLIA SAGRADA. Daniel 3:1-23. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/dn/3>. Acesso em: 18 maio 2016 (grifamos) 88 E veio a palavra do SENHOR a Jonas, filho de Amitai, dizendo: Levanta-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela, porque a sua malícia subiu até a minha presença. Porém, Jonas se levantou para fugir da presença do Senhor para Társis. E descendo a Jope, achou um navio que ia para Társis; pagou, pois, a sua passagem, e desceu para dentro dele, para ir com eles para Társis, para longe da presença do Senhor. BÍBLIA SAGRADA. Jonas 1:1-3. Disponível: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/jn/1>. Acesso em: 18 maio 2016.

Page 62: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

60

capital de Assíria, representava um dos maiores e mais encarniçados inimigos de

Israel e por isso não iria até lá, tomando ele direção contrária89.

Além do velho testamento, acima esculpido, o direito de resistência, também,

pode ser encontrado no novo testamento. Em sua Epístola aos Romanos, Paulo,

que era um dos mais obedientes, se negou a acatar uma ordem que acreditava

injusta, atitude essa que significou uma verdadeira aclamação ao direito de resistir,

porquanto, Paulo queria mostrar aos judeu-cristãos de Roma que nenhuma lei pode

salvar, por melhor que fosse, uma vez que, segundo o apóstolo, somente Deus é o

caminho e salvação.90

Na visão do pregador, a lei nem sempre era justa e por isso a sua aceitação

plena, sem refutação, sem manifestação contrária, não garantiria a salvação mais

tão somente demonstraria obediência às leis do homem, que nem sempre seguiam

as leis de Deus.

Superada a reflexão bíblica, veremos a seguir que o caminho histórico do

direito de resistência que se inicia na antiguidade, passa pela Idade Média, chega à

modernidade e se faz extremamente presente nos dias atuais, assim, podemos

avalizar que tais “resistências”, exteriorizadas pelas manifestações, de fato,

alteraram os rumos políticos, econômicos, do processo civilizatório da humanidade.

2.2 Direito de resistência na antiguidade

O direito de resistência na antiguidade é dotado de características díspares

daquelas com que hoje deparamos, tanto que o Código de Hamurabi, há cerca de

89 É dessa passagem que surje o conto do Leviatã, no qual Jonas tenta fugir mais não consegue, pelo contrário, é forçado a encontrar-se consigo mesmo e com Deus; a experiência é feita dentro de uma angústia mortal, figurada pelo mar e pelo ventre do peixe. Daí o contexto que o Leviatã significaria o Monstro, mais o monstro necessário, posteriormente parafraseado por Hobbes na ideia de constituição do Estado, no qual era considerado, pelo absolutismo um mal, mais um mal necessário. 90 Ora, nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz, para que toda a boca esteja fechada e todo o mundo seja condenável diante de Deus. Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado. Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus, tendo o testemunho da lei e dos profetas; Isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que crêem; porque não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; Sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus. BÍBLIA SAGRADA. Romanos 3:19-24. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/rm/3>. Acesso em: 18 maio 2016

Page 63: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

61

dois mil anos antes de cristo, já previa a rebelião contra aquele governante que não

respeitasse os mandamentos e as leis, sendo que, no referido diploma, eram

invocadas as divindades para condená-ló a uma rebelião que não conseguisse

dominar.91

Convalidando o argumento supra, Arthur Machado Paupério92 aduz que o

direito de resistência encontra suas manifestações na Antiguidade.

Já Sócrates, considerado o pai da filosofia, foi um grande protagonista do

direito de resistência. Como bem destaca Martin Luther King, “até certo ponto, a

liberdade acadêmica é hoje uma realidade porque Sócrates praticou a

desobediência civil”.93

O que Martin Luther King nos indica, portanto, é que um dos atos inaugurais

mais marcantes do que depois se intitulou “desobediência civil” foi o ato de um

filósofo, e assim um ato de desobediência ligado às ideias, ao pensamento.

Trata-se, pois, antes de tudo, de uma questão de liberdade de pensamento e

de expressão. Retomemos o texto da Apologia de Sócrates, de Platão, no qual é

possível vislumbrar o posicionamento de resistência do filósofo, que, nem mesmo

ameaçado de morte pelo Tribunal, admite se curvar e deixar de fazer aquilo que a

razão, no caso, a razão divinamente inspirada, exortava-o a fazer:

Mas, se me absolvêsseis, não cedendo a Anito, se me dissésseis: Sócrates, agora não damos crédito a Anito, mas te absolveremos, contanto que não te ocupes mais dessas tais pesquisas e de filosofar, porque, se fores apanhado ainda a fazer isso, morrerás; se, pois, me absolvêsseis sob tal condição, eu vos diria: - Cidadãos atenienses, eu vos respeito e vos amo, mas obedecerei aos deuses em vez de obedecer a vós, e enquanto eu respirar e estiver na posse de minhas faculdades, não deixarei de filosofar e de vos exortar ou de instruir cada um, quem quer que seja que vier à minha presença, dizendo-lhe, como é meu costume: - Ótimo homem, tu que és cidadão de Atenas, da cidade maior e mais famosa pelo saber e pelo poder, não te envergonhas de fazer caso das riquezas, para guardares quanto mais puderes e da glória e das honrarias, e, depois, não fazer caso e nada te importares de sabedoria, da verdade e da alma, para tê-la cada vez melhor? E, se algum de vós protestar e prometer cuidar, não o deixarei já, nem irei embora, mas o interrogarei e o examinarei e o convencerei, e, em qualquer momento que pareça que não possui virtude, convencido de que a possuo, o reprovarei, porque faz pouquíssimo caso das coisas de

91 PAUPERIO, Arthur Machado. Teoria Democratica da Resistencia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. p. 28. 92PAUPÉRIO, Arthur Machado. Teoria democrática da resistência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. 93 KING, Martin Luther. “Letter from Birmingham Jail”. In: Herbert Storing What Country Have I? Political Writings by Black Americans. New York: St Martin’s Press, 1970. p. 117.

Page 64: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

62

grandíssima importância e grande caso das parvoíces. E isso o farei com quem quer que seja que me apareça, seja jovem ou velho, forasteiro ou cidadão, tanto mais com os cidadãos quanto mais me sejam vizinhos por nascimento. Isso justamente é o que me manda o deus, e vós o sabeis, e creio que nenhum bem maior tendes na cidade, maior que este meu serviço do deus. Por toda parte eu vou persuadindo a todos, jovens e velhos, a não se preocuparem exclusivamente, e nem tão ardentemente, com o corpo e com as riquezas, como devem preocupar-se com a alma, para que ela seja quanto possível melhor, e vou dizendo que a virtude não nasce da riqueza, mas da virtude vem, aos homens, as riquezas e todos os outros bens, tanto públicos como privados. Se, falando assim, eu corrompo os jovens, tais raciocínios são prejudiciais; mas se alguém disser que digo outras coisas que não essas, não diz a verdade. Por isso vos direi, cidadãos atenienses, que secundado Anito ou não, absolvendo-me ou não, não farei outra coisa, nem que tenha de morrer muitas vezes.94

Com efeito, Sócrates, mesmo tendo conhecimento da ameaça de morte

afirmou que respeitava e amava os Cidadãos atenienses, mas obedeceria aos

deuses em vez de obedecer aos atenienses, afirmando, ainda, que enquanto

respirar e em posse de suas faculdades, não deixaria de filosofar.

Em Roma, o direito de resistência também se fez presente. Os plebeus, por

mais que trabalhassem e produzissem, eram excluídos de todas as prerrogativas da

cidadania romana, não tendo direito algum; desamparados, inclusive, pela Lei das

XII Tábuas, não podendo participar do culto aos deuses protetores de Roma, não

podiam sepultar seus mortos no mesmo local que os patrícios, o casamento entre

plebeus e patrícios era proibido dentre outras vedações. Com isso, o

descontentamento dos plebeus foi crescendo a ponto de eles se reunirem em

assembleias próprias (concilia plebis) para tomarem as decisões (plebiscita).95

Como não tinham seus direitos protegidos na Lei das XII Tábuas, os plebeus,

em forma de manifesto, ou seja, resistindo à lei injusta, retiraram-se da cidade e

acamparam no Monte Albano, deixando, assim, os patrícios com fome, pois eram os

plebeus que plantavam e colhiam os alimentos de toda comunidade.

Os direitos resguardados na Lei das XII Tábuas – Diz a lenda que, descontentes e insatisfeitos por não terem seus direitos resguardados na recém-promulgada Lei das XII Tábuas, todos os plebeus de Roma se retiraram da cidade, indo acampar no topo de uma das colinas vizinhas (o Monte Albano). Lá em cima montaram suas barracas e se negaram a retornar às suas atividades no comércio, na artesania e na agricultura

94 PLATÃO. Apologia de Sócrates, precedido de Êutifron (Sobre a piedade), e seguido de Críton (Sobre o dever). Porto Alegre: L&PM, 2011. p. 88-90. 95 ROLIM, Luiz Antonio. Instituições de Direito Romano. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 63.

Page 65: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

63

enquanto seus direitos não fossem explicitamente contemplados na nova lei. Dizem alguns que eles pretendiam, mesmo, fundar uma outra cidade à parte. No início, tal fato não preocupou os patrícios, mas tão logo os alimentos começaram a escassear, eles passaram a sentir a ausência dos plebeus “grevistas”, uma vez que estes eram os únicos que sabiam plantar e colher os alimentos necessários a toda a comunidade. Com a fome batendo às suas portas, os patrícios resolveram atender às reinvindicações da classe plebeia. Foi então formada uma outra comissão de magistrados extraordinários e este segundo decenvirato – agora integrado por alguns plebeus – apresentou, um ano depois, mais duas tábuas, reconhecendo, desta feita, alguns dos direitos da classe plebeia.96

O direito de resistência foi utilizado e galgou bons frutos aos plebeus que aos

poucos foram conquistando seus direitos.

Fica evidente que o direito de resistência, mesmo em tempos que o respeito

aos direitos individuais era tão ínfimo, viabilizou avanços para a composição que

temos hoje, por isso entendemos que o hoje só pode ser para o amanhã se pautar

no ontem, isto é, a historicidade é um propulsor para dias melhores, pois

aproveitamos os bons exemplos e descartamos os não tão bons, como ocorreu na

medievalidade quando predominaram crendices e as concepções feudais, porém,

certamente, de onde conseguimos extrair ótimos referenciais, conforme o

entendimento supra.

2.3 Direito de resistência na medievalidade

Consoante esculpido no item 1.2.2, “na idade média preponderaram primeiro

as influências da Igreja e logo depois as do feudalismo, ou seja, a crendice e o

posicionamento dos senhores feudais dominaram a era medieval”.

Conforme Celso Lafer, foi Santo Tomás de Aquino, baseado no direito natural,

o primeiro grande teórico do direito de resistência. Segundo Celso Lafer97, a teoria

Tomista potencializa um direito de resistência, quando contempla uma reação, um

direito de revolução contra um regime tirano que ultrapasse o terreno da

reciprocidade existente entre governantes e governados e que desequilibre esta

relação.

96 ROLIM, Luiz Antonio. Instituições de Direito Romano. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 65. 97 LAFER, Celso. A Reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.188.

Page 66: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

64

Para Maria Garcia98, algumas análises da obra de Santo Tomás de Aquino

entendem que ele reconhecia o direito de resistência partindo do pressuposto de que

o levante contra o tirano não chegava a constituir sedição, mas a resistência ou a

repressão da sedição.

Cláudio de Cicco e Alvaro de Azevedo Gonzaga, quando falam sobre o

pensamento político medieval, conforme o posicionamento de São Tomás de

Aquino, reconhecem a possibilidade do direito de revolução dos súditos contra

monarcas:

A maior expressão do pensamento político medieval é São Tomás de Aquino, dominicano italiano (1225-1274), que escreveu do governo dos príncipes, obra em que, seguindo Aristóteles e Santo Agostinho, considera a monarquia a melhor forma de governo, mas não a monarquia absoluta dos Césares romanos e sim uma monarquia limitada pelo poder da Igreja, das cortes dos nobres, das universidades e das corporações de artes e ofícios, que reuniam os artesãos nas cidades europeias. É a chamada monarquia temperada. Chegava a admitir o direito de revolução dos súditos contra monarcas com tendências absolutistas ou anticatólicas. 99 (Grifos nossos).

O reconhecimento do direito de resistência, nesse contexto, apenas atendia

aos interesses da Igreja, isto é, era garantido aos cidadãos se insurgirem contra as

ordens do soberano que contrariassem os preceitos religiosos.

Importa frisar que, na era medieval, a resistência contra os governos tiranos

foi enorme, tendo gerado um antagonismo, ou seja, o dever de obedecer ao

soberano vinha ao mesmo tempo com a necessidade de resistir à tirania deste.

Assim, a questão da resistência deve ser vista além de um direito, porquanto,

era tida como uma obrigação para o cidadão, quando da violação do ordenamento

jurídico pelo soberano. No pensamento político da Idade Média, o direito de

resistência pode ser considerado como um direito natural de cada cidadão que podia

exercê-lo contra ordens injustas do monarca tirano.

Com efeito, a resistência na medievalidade deve ser vista como instrumento

para reestabelecimento da ordem jurídica, violada pelo soberano tirano.

Do exposto, cada tempo contribuiu sem igual para o pensamento atual. Na

verdade, as revoltas ou divergências, em regra, continuam as mesmas (com suas

98 GARCIA, Maria. Desobediência civil, direito fundamental. São Paulo: RT, 1994. p. 140. 99 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 200.

Page 67: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

65

devidas ressalvas), o que de fato mudou foram os instrumentos, ou seja, na

antiguidade, os teatros e praças; na idade média, a arte teve grande destaque. Até

pouco tempo atrás o uso dos megafones e carros de som era o grande trunfo, já,

hoje, as redes sociais desempenham papel de extrema importância. Entretanto,

temos de passar, antes de falarmos sobre os dias atuais, pelo direito de resistência

na modernidade.

2.4 Direito de resistência no Renascimento: início da modernidade

Conforme mencionado no item 1.2.3. (Democracia na modernidade), a

modernidade tem marco inicial com o Renascimento, passando pelo Antigo Regime

e pelo Iluminismo e com término na Revolução Francesa de 1789.

No tocante ao Renascimento, Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um dos

principais pensadores, tendo como principal obra O Príncipe (escrito em 1505 e

publicado em 1515).

Nicolau Maquiavel teve como foco, em sua obra O Príncipe, estabelecer um

prontuário para conservação no poder a qualquer custo, ao passo que jamais

defenderia o direito de resistência. Todavia, no Capítulo IX – De principatu civili –

(Do Principado Civil), reconhece que um cidadão comum pode tornar-se príncipe

com o favor de seus concidadãos (denominado principado civil), bem como

reconhece que em toda cidade existem duas tendências diversas: 1) o povo não

quer ser oprimido pelos poderosos; 2) os poderosos desejam governar e oprimir o

povo. Desse antagonismo, surgem três efeitos nas cidades: 1) ou principado; 2) ou

liberdade; 3) ou desordem.

Porque em toda cidade se encontram estas duas tendências diversas e isso resulta do fato de que o povo não quer ser mandado nem oprimido pelos poderosos e estes desejam governar e oprimir o povo: é destes dois anseios diversos que nasce nas cidades um dos três efeitos: ou principado, ou liberdade, ou desordem100.

Mesmo no renascentismo é noticiado o direito de resistência, e, em

conformidade com a presente tese, o exercício de tal direito gerou e gera dúvidas

sobre os resultados alcançados com as resistências, ou seja, a resistência propicia a

100 MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/ adobeebook/principe.pdf>. Acesso em: 16 out. 2015.

Page 68: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

66

liberdade (democracia) ou apenas a desordem? Não foi e nem é tarefa fácil

estabelecer as consequências do exercício do direito de resistência, uma vez que

ora são frutíferas, ora nem tanto.

Contudo, o exercício do direito de resistência viabilizou em todos os tempos o

contraditório, o pensar diferente e isso, sem dúvida alguma, propicia liberdade, mas

sabemos que liberdade sem limites causaria o caos. Assim, surge, pós-concepções

renascentistas, a necessidade de se firmar um pacto, ou seja, um contrato social e

isso surge no “Antigo Regime”.

2.4.1 Direito de resistência no Antigo Regime: Thomas Hobbes e o absolutismo

O absolutismo ganha força no antigo regime, período no qual alguns

defendiam que a realeza deveria ter poder absoluto, podendo fazer o que quisesse.

Thomas Hobbes (1588-1679), conhecido como o teórico do poder soberano,

desenvolveu sua teoria sobre o estado com fulcro no estado de natureza, com o

escopo primeiro de sugerir o refinamento do governo civil.

Para tanto, dispensou o elevado esforço teórico para convencer as

autoridades competentes de que esse arranjo do poder é necessário e fundamental,

para que se possam encaminhar as condições exigidas pelo progresso sócio-

econômico.

O teórico acreditava que deveria obter suas forças com base na riqueza e

prosperidade dos membros individuais da comunidade, para, assim, conseguir

saúde do povo por meio da justiça e das leis e contra a guerra civil.

Com isso é evidente que, durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de inspirar respeito a todos, eles estão naquela condição a que se chama guerra; e uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens.101

Chegamos a dois pontos: 1) a questão central de Thomas Hobbes que é a

defesa do estado absolutista; 2) Thomas reconhece a existência da resistência.

101 HOBBES, Thomas. Coleção os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 104.

Page 69: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

67

Contudo, Thomas Hobbes sustenta a ideia de que é melhor aos indivíduos

renunciarem a sua liberdade e direitos naturais em favor do soberano, para, com

isso, viverem em uma comunidade política “segura”, do que num estado de natureza

com total insegurança, até mesmo em relação ao máximo patrimônio do indivíduo,

sua vida.

Contrapondo o pensamento hobbesiano, com ideais liberais e que

sustentaram os direitos e garantias individuas que temos hoje, John Locke, foi, sem

sombra de dúvidas, um dos principais apoiadores do direito de resistência.

2.4.2 Direito de resistência no Antigo Regime: John Locke

Nas linhas que antecedem, apontamos a existência do direito de resistência

na antiguidade, na medievalidade e no início da modernidade, cuja uma visão era

mais absolutista (Renascimento); agora, trataremos de uma visão mais liberal sobre

tal instituto.

É necessário um olhar histórico sobre o direito de resistência, verificando

como os indivíduos manifestavam sua contrariedade em relação àquelas leis que

consideravam injustas. John Locke (1632-1704) é considerado como um dos

grandes filósofos adstritos ao direito de resistência.

Sustenta o filósofo que os indivíduos têm direitos naturais viventes antes

mesmo da instituição do estado civil, já que o Estado foi criado exatamente para

assegurá-los.

Para John Locke, o direito de resistência pode ser exercido, quando a lei

terminar a lei (porquanto começa a tirania); quando a lei for transgredida (se causar

prejuízos a terceiros); quando ocorrer abuso de autoridade (autoridade que excede

os limites da lei).

Complementa Rodrigo Suzuki Cintra que o direito de resistência ocorre, de

acordo com os ensinamentos de John Locke102 nos quatros últimos capítulos do seu

102 A doutrina do direito de resistência do povo contra o abuso de poder dos governantes é, ao lado da teoria da propriedade e da tolerância religiosa, um dos temas mais originais e influentes de toda a filosofia lockeana. Sua essência pode ser encontrada no fato de que os homens têm certos direitos naturais existentes antes mesmo da instituição do governo civil, que surge justamente para melhor garanti-los. O direito de resistência dos homens, em geral, aparece quando o governo se mostra

Page 70: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

68

segundo tratado sobre o Governo, no exercício do direito de rebelião como sendo

um exercício do direito à revolução.

Onde a lei termina, começa a tirania, se a lei for transgredida para prejuízo de outrem; e quem tiver autoridade e exceder o poder que a lei lhe confere, e fizer uso da força que tem sob seu comando para impor ao súdito aquilo que a lei não permite, deixa assim de ser magistrado e, agindo sem autoridade, pode ser combatido, como qualquer outro homem que viole pela força o direito de outrem... Podem, então, as ordens de um príncipe sofrer oposição? Pode-se opor resistência a ele sempre que alguém se sinta prejudicado...103

Hannah Arendt104, citando os ensinamentos de John Locke, demonstra que a

evolução do direito de resistência encontra-se vinculada à ideia de que o poder que

foi proporcionado pelo indivíduo à sociedade não pode retornar ao indivíduo, eis que

permanece com a sociedade enquanto ela existir. E assim se posiciona:

É a verdade uma nova versão da antiga potestas in populo, com consequência de que, ao contrário das teorias anteriores sobre o direito à resistência, onde o povo só podia agir “quando estivesse preso por correntes”, ele agora tinha direito, ainda, conforme Locke, de “impedir” o acorrentamento.

O contrato social, do qual são signatários os indivíduos e a sociedade, implica

na existência de consentimento, ainda que não expresso, porquanto todos nascem

dentro de uma determinada sociedade, aderem e conferem consentimentos às

regras daquela sociedade, num contrato social ali estabelecido.

Toda vez que os autores responsáveis pela regulamentação das regras desse

contrato social não acolhem os anseios da sociedade, gera para alguns ou vários

indivíduos o direito de não concordar com um posicionamento arbitrário ou injusto,

sendo o direito de manifestação a válvula de escape no tocante ao exercício da

liberdade.

Arthur Machado Paupério, analisando o direito de resistência em John Locke,

observa: “o povo é, assim, soberano, pois não abdicou de todos os direitos que lhe

incapaz de atender ao direito de propriedade (entendida em lato sensu) do povo. CINTRA, Rodrigo Suzuki. Locke e o direito de resistência. Disponível em: <http://www.mackenzie. br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/artigos_2009/Rodrigo_Suzuki2.pdf. Acesso em: 19 jan. 2016 103 LOCKE, John. Coleção os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 152. 104 ARENDT, Hannah. Crises da república. São Paulo: Perspectiva, 1973. p. 78.

Page 71: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

69

são inerentes em favor de uma pessoa ou assembleia. Pelo contrato social, não de

despojou do poder, cujo o exercício apenas delegou”.105

John Locke foi, sem dúvida, um dos grandes nomes do direito de resistência e

do liberalismo. Ele coloca o indivíduo como detentor de poder sobre si mesmo,

sendo que o homem deve agir em prol do bem-comum para a sociedade, tendo o

direito de resistir contra o ato injusto, bem como contra a autoridade que comete

abusos.

Nessa toada, temos o direito de resistência, consoante o pensamento

lockeano, como um instrumento em favor da sociedade e como um instrumento para

o aperfeiçoamento do Estado.

2.5 Direito de resistência: instrumento de aperfeiçoamento do Estado

Na segunda metade do século XVI, a questão do direito de resistência ao

poder político voltou a tomar um lugar de destaque no debate público. Após um

período de concessões às ideias dos reformadores por parte da realeza francesa, a

década de 1540 foi marcada pelo início de duras perseguições.

Ínfima foi a resistência contra as perseguições num primeiro momento. Elas

foram respondidas com preces e resignações, conforme as orientações mais

ortodoxas dos primeiros líderes reformadores. No entanto, com o aumento das

perseguições em vários lugares da Europa, inclusive na França, alguns teólogos

luteranos começam a reconhecer a possibilidade de rebelião.

É certo que um dos argumentos mais difundidos desses teólogos

fundamentava-se num princípio de direito privado, segundo o qual e, em certas

circunstâncias, era legítimo repelir com violência força injusta, conforme

anteriormente exposto no item Direito de resistência na medievalidade. Assim,

defendiam que se o governante procedesse injustamente pela força, contrariando a

vontade divina e causando um dano irreparável, ele perdia a condição de magistrado

105 PAUPÉRIO, Arthur Machado. Teoria democrática da resistência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. p. 59.

Page 72: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

70

supremo e passava a ser um cidadão comum, podendo ser castigado, ou seja, era

permitido voltar-se contra o governante que não observasse as escrituras divinas.

João Calvino106 também passou a admitir a desobediência às ordens iníquas

das autoridades. Para defender o direito de resistência, ele sustentava-se no

contexto de que o poder político está necessariamente condicionado aos objetivos

estabelecidos pela vontade divina.

Nessas circunstâncias, se um governante desrespeitasse as condições

impostas por Deus ao exercício de seu poder, ele passava a ser um usurpador, e os

magistrados inferiores podiam resistir aos seus comandos, desde que fosse de

maneira grupal e estivesse previsto no ordenamento jurídico da comunidade política.

Norberto Bobbio107 argumenta que a importância de Locke na construção do

Instituto da resistência ganha enorme relevo se somado ao fato de ter sido um dos

principais mentores da estrutura estatal-burguesa, sempre enfatizando a liberdade e

a propriedade como valores máximos a serem postos contra o Estado.

Resta claro que, para Bobbio, no momento da passagem da sociedade civil,

os indivíduos cederam uma parcela de sua liberdade a um poder centralizado, que

teria a função de garantir um tranquilo uso da propriedade108 privada.

A razão pela qual as pessoas abandonam a liberdade natural e se refugiam

na sociedade civil consiste em compartilhar com todas as outras pessoas o desejo

de unirem-se para manter um estado de segurança, que conserve o direito natural

de propriedade que possuem. Assim, o consentimento dá legitimidade ao governo e

gera um grau de reciprocidade entre este e o povo, surgindo daí um contrato.

Assim sendo, se o governante não cumpre a função estabelecida pelo

contrato, os indivíduos estão livres da obrigação de obedecer às leis, podendo opor-

se às medidas governamentais, demonstrando, de pronto, que, com o passar dos

tempos, a forma de governar foi se aperfeiçoando e, muito desse aperfeiçoamento

se deve à resistência advinda do povo para com os governos injustos.

106 CALVINO, João. Instituição da religião cristã, IV, 20. In: Sobre a autoridade secular. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 126. 107 BOBBIO, Norberto. Locke e o direito natural. 2.ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1998. p. 239-246. 108 Conforme já salientado, a propriedade para Locke é termo lato, ou seja, engloba entre outros direitos a vida do próprio indivíduo.

Page 73: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

71

O reconhecimento do direito de resistência se tornou um arrebatador

instrumento diante de condutas opressivas. Mas, sua possibilidade de atuação era

precária, pois exigia como principal requisito a expressão da vontade da maioria.

Maria Helena Diniz109 argumenta que surge o direito de resistência, quando

acontece a opressão irremediável

Quando houver abuso de poder para exercer opressão irremediável, surge o direito de resistência, que no sentido amplo, reconhece aos cidadãos, em certas condições, a recusa à obediência, a oposição às normas injustas, a resistência, a opressão e a revolução. Tal direito concretiza-se pela repulsa a preceitos constitucionais discordantes da noção popular de justiça; à violação do governante da ideia de direito de que procede o poder, cujas prerrogativas exercem, e pela vontade de estabelecer uma nova ordem jurídica, ante a falta de eco da ordem vigente na consciência jurídica dos membros da coletividade.

Norberto Bobbio argumenta que o direito de resistência ocorreu de forma

gradativa, contribuindo para o processo de constitucionalização:

Estado liberal e (posteriormente) democrático, que se instaurou progressivamente ao longo de todo o arco do século passado, foi caracterizado por um processo de acolhimento e regulamentação das várias exigências provenientes da burguesia em ascensão, no sentido de conter e delimitar o poder tradicional. Dado que tais exigências tinham sido feitas em nome ou sob a espécie do direito à resistência ou à revolução, o processo que deu lugar ao Estado liberal e democrático pode ser corretamente chamado de processo de constitucionalização do direito de resistência e de revolução.110

Maria Garcia, por seu turno, aduz que o direito é um instrumento político para

o aperfeiçoamento do Estado, porquanto, segunda-feira a autora, não havia ruptura

completa das instituições:

O direito de resistência apresentava-se com um “instrumento político” para o aperfeiçoamento do Estado, uma vez que não havia ruptura completa das instituições, mas tão somente a formação de novo poder legislativo ou, em outros termos, em Locke, o direito de resistência que, pela primeira vez, assume a forma de um requisito de cidadania, representava o método excepcional de modificações políticas, quando os processos institucionais

se mostravam insuficientes. 111

Nessa toada, podemos evidenciar que o direito de resistência retira o poder

do legislativo e devolve ao povo que tem o direito de instituir um novo legislativo,

109 DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 102. 110 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 147-148. 111 GARCIA, Maria. Desobediência civil, direito fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 143.

Page 74: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

72

demonstrando, sem delongas, que a resistência civil opera como instrumento político

e transformador, ou seja, atua como mecanismo de aperfeiçoamento do Estado.

Diante do exposto, percebemos que o direito de resistência age como

limitador do abuso de poder por parte do Estado ou daqueles que o governa, motivo

pelo qual entendemos que o direito de resistência é um instrumento de

aperfeiçoamento do Estado, porquanto viabiliza ao cidadão o integral exercício dos

direitos civis, sociais e políticos.

Assim, temos que o direito de resistência é o direito que se dispõe aos

cidadãos, em dadas condições, para repelir obediência às normas e ordens injustas,

bem como repelir a opressão, sendo certo que esse direito é um direito secundário

que tem como objetivo proteger um direito primário, como é o caso da liberdade, da

vida, da dignidade da pessoa humana.

Do exposto, o direito de resistência foi o embrião para o que hoje

denominamos de direito de manifestação, porquanto, o que observamos nas

manifestações atuais é, tão somente, a luta pela proteção dos direitos primários, isto

é, os manifestos visam proteger as liberdades, a vida, a propriedade, a dignidade da

pessoa humana e demais direitos primários, denominados, pela maioria, como

direitos fundamentais.

2.6 Direito de resistência e manifestação

Para Maria Helena Diniz112, o direito de resistência é uma forma diversificada

de manifestação contra o abuso de poder que exerce opressão irremediável.

Nessa toada, importante mencionar que nossa Constituição Federal não

reconhece, expressamente, o direito de resistência à opressão, mas permite o

reconhecimento de direitos e garantias decorrentes do regime por ela adotado, nos

termos do Art. 5º, § 2º.

Ressalta-se, por oportuno que, em que pese nossa Constituição Federal

consagrar a soberania popular, bem como a participação direta e indireta no

112 DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 87.

Page 75: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

73

exercício do poder, os cidadãos se encontram cada vez mais excluídos do processo

de elaboração das leis.

Imprescindível se faz ressaltar que o direito de resistência possui diversas

conceituações, sendo considerado, inclusive, um direito atípico e que escapa ao

ordenamento jurídico, pois não constava da respectiva tipologia ou, de outra forma, é

um direito fundamental que não se encontra constitucionalmente registrado por meio

de sua especificação.113

Nesse sentido, entendemos que a resistência à opressão, expressada por

meio da desobediência civil, ou seja, por manifestações, constitui uma forma legítima

de participação direta do cidadão no exercício do poder, quando os processos

institucionais se mostram insuficientes.

Desse modo, podemos dizer que o direito de resistência, bem como a

desobediência civil podem ser reconhecidos como expressão de direito fundamental,

porquanto está de acordo com o regime democrático, fundamentado na cidadania

(Art. 1º, II, da Constituição Federal), bem como o exercício do poder conforme

parágrafo único do citado artigo, “Todo poder emana do povo que o exerce por meio

de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, sendo,

então, o direito de manifestação uma efetivação do exercício do poder de forma

direta.

Assim sendo, falar sobre direito de resistência e desobediência civil, seria o

mesmo que estabelecer um paralelo entre a democracia e a desordem,

especificamente no tocante ao direito de manifestação que, a nosso ver, seria uma

forma de exercício direto do poder, conforme consagrado em nossa Constituição

Federal.

Bobbio conceitua e nos adverte sobre sua complexidade jurídica, afirmando

que juridicamente, o direito de resistência é um direito secundário, do mesmo modo

como são normas secundárias as que servem para proteger as normas primárias114

Surge, então, uma grande indagação: Seria o direito constitucional de

manifestação, num cenário atual, a consagração do direito de resistência e

desobediência civil como uma nova forma de participação política?

113 GOUVEIA, Jorge B. Os direitos fundamentais atípicos. Madrid: Notícias, 1995. p. 40. 114 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 95.

Page 76: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

74

A nosso ver sim, porém, necessário se faz analisar a existência, ou não, de

limites no exercício do direito de manifestação, para, assim, estabelecermos se a

linguagem das ruas traduz democracia pura ou camuflada, ou, tão somente, um

estado de desordem por falta de controle do poder ou por manipulação de siglas,

partidos ou minorias que utilizam do direito de resistência e da desobediência civil

para desconstituir o poder estatal, de forma disfarçada.

Somos partidários de que a linguagem das ruas é de suma importância para a

efetivação da democracia, para a consagração do direito de resistência, todavia, o

excesso retira o foco do debate, coloca a desobediência civil como impasse de

convivência em sociedade o que ofusca a discussão sobre a aceitação ou não de

normas, atos, considerados injustos.

Nessa toada, temos que o direito de manifestação (linguagem das ruas), para

se legitimar, deve contar com o assentimento de seus autores e isso ocorre a partir

da conexão entre soberania popular (que exige entendimento mútuo) e os direitos

humanos (que permitem o agir orientado pelo interesse privado) e, portanto, a

dicotomia pública e privada. Ou seja, direito de resistência e desobediência civil são

atualmente reproduzidos, consagrados, por intermédio das várias manifestações que

ocorrem por todo o Brasil.

Por derradeiro, podemos concluir que o direito de resistência, visto em todos

os momentos da humanidade, como demonstrado na reflexão bíblica, se consagra

por intermédio do exercício do direito de manifestação, na qual a não aceitação, por

parte da população, a leis, atos, decretos e decisões impostas pelos governantes,

que, à luz do olhar dos resistentes, são considerados injustos. Nesse sentido, tal

direito é eticamente aceitável e justificável, desde que não se estabeleça um estado

de desordem, que possam ocorrer manifestações populares, porquanto, quando a

manifestação é realizada dentro do razoável, consagra o direito de resistência e

desobediência civil.

Como forma efetiva do direito de resistência, surge a desobediência civil,

dando ao cidadão ou a um grupo social a possibilidade de questionar, respaldado

por preceitos constitucionais.

Page 77: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

75

2.7 Desobediência civil

A desobediência civil surge como uma forma de reformulação do direito de

resistência, sendo certo que o novo instituto nasce no final do século XIX e início do

XX, com esteio na ideia anárquica e libertária de Henry David Thoreau (1817-1862),

o qual sustentou que o direito de resistência evolui para a classe da desobediência

civil, que deu às classes minoritárias a possibilidade, quando oprimidas, de

enfrentarem o governo na busca de melhores condições.

Assim, figura a desobediência civil como evolução do direito de resistência.

Todavia, algumas características o diferem daquela, tanto que, para a maioria dos

doutrinadores o protesto individual ou coletivo deve ocorrer de forma não violenta.

Não visualizamos a desobediência civil apenas como meio de defesa das minorias,

acreditamos que todo e qualquer ato ou ordem injusta podem ser combatidos pelo

exercício da desobediência civil que, nesse contexto, assume papel fundante para o

manifesto democrático.

Nos atuais dias, a desobediência civil tem se propagado de forma até então

não vista na história dos povos, e essa propagação ganhou força por meio das redes

sociais que desempenham papel de suma importância nessa nova forma de

participação popular.

Assim sendo, a desobediência civil deve ser vista como direito básico,

contudo, aberto, dos cidadãos, o melhor dizendo, dos e-cidadãos. Nessa toada,

importa trazer a lume um pouco da historicidade e dos conceitos da desobediência

civil para, assim, entendermos o sentido das vozes advindas das ruas nas últimas

manifestações no Brasil e no mundo.

2.7.1 Historicidade

A desobediência civil é tida como uma forma evolutiva do direito de

resistência, utilizando, para tanto, as preciosas contribuições dos três clássicos

desobedientes Henry David Thoreau, Mohandas Karamachad Gandhi e Martin

Luther King.

Page 78: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

76

No final do século XIX e início do XX, houve uma reformulação do direito de

resistência, no qual o direito de resistência evoluiu para a categoria de

desobediência civil, tendo em Henry David Thoreau, poeta e pensador americano,

seu maior teórico.

Henry David Thoreau aduz que por intermédio da desobediência civil a

minoria, quando oprimida, tinha a possibilidade de afrontar o governo na busca de

melhores condições. Segundo ele, o critério da maioria, no qual assenta a

democracia, deve ser refutado em razão de não necessariamente identificar o senso

de justiça. O motivo pelo qual se permite a maioria governar encontra-se justamente

na força física.

Para Henry David Thoreau 115:

A razão prática por que se permite que uma maioria governe, e continue a fazê-lo por um longo tempo, quando o poder finalmente se coloca nas mãos do povo, não é de que esta maioria esteja provavelmente certa, nem a de que isto pareça mais justo para a minoria, mas sim a de que a maioria é fisicamente mais forte.

O pensamento de Henry David Thoreau acabou por entusiasmar aquele que

seria o principal responsável pela independência da Índia e um fervoroso defensor

da desobediência civil: Mohandas Karamachad Gandhi.

A sugestão adotada por Gandhi, diferentemente de Henry David Thoreau,

previa a desobediência civil como uma ação coletiva, que ganhou relevo e tendia ao

sucesso, se realizada por um número expressivo de pessoas. Para ele, somente a

não violência, ahimsa, poderia ser uma política profícua na conquista das mudanças

necessárias em um mundo moldado sob a cultura da pouca tolerância e arbítrio116.

Celso Lafer117 argumenta que se conserva de ambos:

Em síntese, creio que se pode dizer que a desobediência civil no século XX, conserva de Thoreau o caráter predominantemente não-violento da resistência individual à opressão e à justiça, e de Gandhi a dimensão de uma ação de grupo, que se exprime através de uma resistência coletiva, afirmada eticamente através da convergência entre meios e fins.

115 THOREAU, Henry David. A desobediência civil. Porto Alegre: L&PM, 1999. p. 8. 116 LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 200. 117 Ibidem, p. 200-201.

Page 79: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

77

Outro emissário da desobediência civil foi o pastor americano Martin Luther

King que se valeu das técnicas de não violência em favor da luta pelos direitos da

população negra dos Estados Unidos nas décadas de 50 e 60, época de intensa

segregação racial em hospitais, escolas e restaurantes.

Para Martin Luther King, o terreno do judiciário, exclusivamente, se fazia

insuficiente. Era necessária a construção de uma organização civil. Encontrou em

Henry David Thoreau e Mohandas Karamachad Gandhi a chave para montar um

movimento de resistência não violenta. Ele considerava que a desobediência civil

realizada em massa corresponde ao mais alto nível de protesto não violento.

Portanto, com Henry David Thoreau, Mohandas Karamachad Gandhi e Martin

Luther King, os três grandes nomes da desobediência, é que o direito de resistência

evolui para a desobediência civil. Destarte, temos que o primeiro destacava a

desobediência civil como mecanismo mais eficaz aos indivíduos e às minorias. Os

dois últimos depositavam, na maioria e na ação coletiva, a sua utilização. Todos,

porém, acreditavam que o exercício da desobediência civil deveria ocorrer de

maneira não violenta, bem como que tal exercício era um instrumento de

transformação social de base não arbitrária.

Devemos, então, entender que a desobediência civil deve ser vista como um

mecanismo indireto no qual o cidadão, de forma individual ou em coletividade,

resiste ao injusto, resiste à opressão sem, contudo, usar violência, participando,

dessa forma, efetivamente da construção de uma sociedade constituída por iguais

de forma justa e fraterna, que tem como escopo a busca da concretização do

princípio da humanidade.

2.7.2 Conceitos e características

Vários são os doutrinadores que debruçam sobre a desobediência civil. É

certo que a maioria utiliza o legado deixado por Henry David Thoreau, Mohandas

Karamachad Gandhi e Martin Luther King para estabelecer seus conceitos sobre o

assunto.

Page 80: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

78

É sabido, que a desobediência civil surge com os preceitos extraídos do

direito de resistência, então, podemos dizer que a desobediência civil é a evolução

do direito de resistência.

Todavia, a centralidade da maioria dos conceitos é a justa contraposição,

realizada por uma ação ou omissão do cidadão, de forma individual ou em coletivo,

contra ordens e atos eivados em vícios, ou seja, atos ou ordem emanada por quem

de direito, contudo, sem observar os preceitos basilares de um estado democrático

de direito.

Nessa toada, é oportuno trazer à baila o que aduz John Rawls118, em sua

obra, “Uma Teoria da Justiça”, em que define a desobediência civil:

Como um ato político, não violento, consciente e, apesar disto, político contrário à lei, praticado com o intuito de promover uma modificação na lei ou práticas do governo.

Por sua vez, Jürgen Habermas119, argumenta que desobediência civil decorre

de atos de transgressão simbólica não-violenta contra decisões impositivas e

ilegítimas no entender dos protestantes:

Decorre de atos de transgressão simbólica não-violenta que “se auto interpretam como expressão do protesto contra decisões impositivas as quais são ilegítimas no entender dos atores, apesar de terem surgido legalmente à luz de princípio constitucionais vigentes”. Tais atos têm como alvo dois destinatários: Os mandatários políticos e suas decisões que mereçam revisão em face da crítica pública, bem como o sentido de justiça da maioria da sociedade (no sentido preconizado por John Rawls).

José Joaquim Gomes Canotilho120 argumenta que a desobediência civil é um

direito de qualquer cidadão que pode protestar individual ou coletivamente contra

uma grave injustiça.

Direito de qualquer cidadão, individual ou coletivamente, de forma pública e não violenta, com fundamento em imperativos ético-políticos, poder realizar os pressupostos de uma norma de proibição, com a finalidade de protestar, de forma adequada e proporcional, contra uma grave injustiça (Dreier). Trata-se, assim, de dar guarida constitucional ao “direito à indignação”,

118 RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. Brasília: Universidade de Brasília, 1981. p. 274. 119 HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003b. v. II, p. 117. 120 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 238.

Page 81: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

79

procurando-se convencer a opinião pública de que ‘uma lei, uma política’ ou medidas de uma política’ são ilegítimas tornando-se a contestação pública destas plenamente justificada.

Maria Garcia121, conceituando a desobediência civil, elucida tratar-se de uma

resistência ou contraposição do cidadão em fase do ato de autoridade ofensivo à

ordem constitucional:

...forma particular de resistência ou contraposição, ativa ou passiva do cidadão, à lei ou ato de autoridade, quando ofensivos à ordem constitucional ou aos direitos e garantias fundamentais, objetivando a proteção das prerrogativas inerentes à cidadania, pela sua revogação ou anulação.

Desobediência civil é, então, um direito posto a favor do cidadão, por meio de

uma ação ou de uma omissão, que exerce de maneira individual ou em coletivo

contra ordens e atos contaminados, isto é, atos ou ordem emanada por quem de

direito, contudo, sem observar os preceitos básicos de um estado democrático de

direito e desde que causem graves injustiças, preferencialmente, realizados sem o

uso da violência, para, assim, angariar o apoio popular.

No que tange às características, podemos dizer que a desobediência civil

deve apresentar: a) forma de resistência voltada contra ato ou ordem pública, b)

manifestação de forma individual ou coletiva de preferência sem o uso da violenta; c)

demonstração, de forma efetiva, da injustiça da lei, ou da ordem do ato

governamental; d) objetivo de transformar a questão jurídica e/ou política do Estado,

não sendo mais do que uma contribuição ao sistema político ou uma proposta para o

aperfeiçoamento jurídico.

Assim, a desobediência civil propõe a negação de uma parte da ordem

jurídica, ao pedir a reforma ou a revogação de um ato ou uma ordem oficial mediante

ações individualizadas ou coletivas de mobilização pública junto aos órgãos de

decisão do Estado.

Ante o exposto, a desobediência civil busca, por meio dos protestos, opor

resistência ao ato ou à ordem que não é justa, ou seja, busca-se o aperfeiçoamento

estatal, para, assim, poderem os indivíduos viver de forma harmônica.

121 GARCIA, Maria. Desobediência civil, direito fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 293.

Page 82: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

80

2.7.3 Desobediência civil no Brasil: alguns aspectos constitucionais

Acreditamos que a desobediência civil, no comando constitucional brasileiro,

decorre da cláusula constitucional aberta, que admite outros direitos e garantias, e

dos princípios do regime adotado, consoante os termos descritos o artigo 5º, §2º da

Constituição Federal de 1988, uma vez que se liga aos princípios da

proporcionalidade e da solidariedade, os quais permitem manifestos contra atos ou

ordens que violem esses princípios de ordem pública e garantidos num estado

democrático de direito.

Encontra-se presente em nossa Constituição Brasileira, de forma implícita, um

direito de resistir à opressão que decorre da maneira como se constitui o poder. O

exercício do direito de resistência e da desobediência civil não tem como objetivo a

agitação da ordem vigente, ao contrário, tenta ser um instrumento de modificação

dessa ordem pelos mecanismos que esta estabelece, ainda que em uma fronteira

muito próxima da ilegalidade.

Podemos considerar a desobediência civil, tendo em vista ser uma forma de

evolução do direito de resistência, como um direito de caráter determinantemente

político, pois com a participação dos cidadãos e a influência da soberania popular

nos processos decisórios e de formação das vontades pública e estatal, não é um

Direito novo que se busca, mas sim a efetiva implementação dos ditames do Direito

que já existem.122

No momento contemporâneo, as redes sociais têm difundido o sentimento de

que podemos, enquanto membros da sociedade, nos posicionar de forma contrária

ao ato ou à ordem arbitraria ou ao que figure na contramão dos anseios sociais. Tal

assertiva somente se sustenta a partir da visão do e-cidadão que, de forma

instantânea, toma conhecimento dos atos ou ordens injustas (na visão de quem

protesta) que se insurge, via de regra por meio das redes sociais, contra esses atos.

Nessa toada, desobedecer ou resistir a uma lei injusta é não mais do que

reconhecer o próprio poder de vinculação. Mas é também reconstruir o próprio poder

das instituições quando acusa seus vícios e injustiças, de forma que, para

122 MONTEIRO, Maurício Gentil. O direito de resistência na ordem jurídica constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 86.

Page 83: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

81

manterem-se vivas e legitimadas, terão de proceder pela inclusão dos valores

publicamente discutidos.

Os governantes não foram tão cobrados por seus atos e pelo andamento do

Brasil. Isso só ganhou proporções enormes, porque as pessoas encontram-se

“ligadas”, “conectadas” por intermédio das redes sociais, ao passo que, quando se

coloca em cheque a constitucionalidade de um comando instrucional, por exemplo,

não fica mais restrito às comissões, aos proponentes de uma ADIN, ADPF ou

qualquer que seja o mecanismo jurídico. Hoje, a transparência faz parte do nosso

dia a dia e os e-cidadãos encontraram na internet, nas redes sociais, uma arma para

impugnar a arbitrariedade, o abuso de poder e principalmente a corrupção.

Agora, quando se coloca em dúvida a constitucionalidade de uma lei, pela

desobediência civil, incita-se um debate, faz começar a discussão em torno de

valores que devem estar presentes para a consideração dessa constitucionalidade,

num nível muito abrangente, viabilizado pelas redes sociais, o que demonstra o

quanto é importante o seu papel na participação democrática, eis que viabiliza ao e-

cidadão mecanismos até outrora inexistentes.

Nos dizeres de Hannah Arendt123, a desobediência civil aparece quando um

número significativo de cidadãos se convence de que os canais normais para

mudanças já não funcionam e de que as queixas não serão ouvidas nem terão

qualquer efeito, ou então, pelo contrário, de que o governo está em vias de efetuar

mudanças, de se envolver e persistir em modos de agir, cuja legalidade e

constitucionalidade estão expostas a graves dúvidas.

Não se apresenta a desobediência civil como um mero organismo de ruptura,

mas antes, como um instrumento alternativo do exercício da cidadania, elemento

essencial para a participação e conservação da sociedade democrática, e isso tem

ocorrido no Brasil, de forma lato, principalmente, pela utilização da cibernética.

Assim, a desobediência civil é uma forma de cidadania ativa, que veicula a

capacidade de desobedecer às leis e às práticas injustas, que se justifica com maior

razão, no momento em que as instituições, criadas pela modernidade, se mostraram

ineficazes para desempenhar um controle sobre o poder arbitrário e sobre as leis

injustas.

123 ARENDT, Hannah. Crises da república. São Paulo: Perspectiva, 1973. p. 79.

Page 84: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

82

Temos, então, que as atuais manifestações, ocorridas no Brasil, representam,

em sua maioria, o exercício do direito de resistência e da desobediência civil, sendo

que todo e qualquer protesto tem como finalidade expor o inconformismo em relação

a uma dada situação, seja a não concordância com o atual governo ou apoio a ele.

Mas, até que ponto a desobediência civil pode ser considerada um ato de

participação política, ou seja, o cidadão que manifesta sua opinião se voltando

contra o ato/norma que ele considere injusto/a contribui efetivamente para o

aperfeiçoamento do sistema político?

Maria Garcia124, descrevendo sobre o pensamento de Hannah Arendt, aduz

que o verdadeiro conteúdo da liberdade não são as conquistas de igualdade, direito

de reunião, de petição, ou as liberdades que associamos aos governos

constitucionais. Isso constitui produto da libertação, mas não se confunde com o

conteúdo da liberdade, que significa participação nas coisas públicas ou admissão

ao mundo político.

Em junho de 2013, observamos centenas de milhares de brasileiros saírem às

ruas com o intento de protestar, num primeiro momento, contra os aumentos nas

tarifas dos transportes públicos (fato ocorrido em diversos Estados, Rio Grande do

Norte – Natal, São Paulo – Capital, e após para outras capitais), entretanto, tais

manifestos só ocorreram por vivermos sob a égide do comando constitucional,

decorrente da cláusula constitucional aberta, que admite outros direitos e garantias,

e dos princípios do regime adotado, consoante os termos descritos o artigo 5º, §2º

da Constituição Federal de 1988, bem como pela propagação possibilitada pelas

redes sociais.

Verifica-se que a população que apoiou tais manifestações, de forma

implícita, exerceu o que denominamos de desobediência civil, porquanto voltou-se

contra uma determinação estatal (num primeiro momento, contra os aumentos nas

tarifas dos transportes públicos).

Surgiu, com essas manifestações a figura do e-cidadão, ou seja, o cidadão

antenado, vinculado às redes sociais, mas que também vai às ruas expor seu ponto

de vista.

124 GARCIA, Maria. Desobediência civil: direito fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 241.

Page 85: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

83

Nesse contexto de amplitude nacional, as manifestações receberam amplo

apoio da população, que foi convocada, reafirmando, principalmente por intermédio

das redes sociais, sendo que em 20 de junho de 2013, os protestos aconteceram

nas principais capitais, bem como em outras 120 cidades, reunindo cerca de 1,4

milhão de pessoas.125

No citado período (junho de 2013), durante as manifestações, acompanhamos

o surgimento dos Black Blocs126 que marcaram as manifestações com atos de

vandalismos e enfrentamento à polícia.

Com a situação fora de controle, por conta da interferência dos Black Blocs, a

população que, antes apoiava as manifestações e foram às ruas protestar contra a

violência e abusos cometidos pelo Estado (via polícia), começaram a refutar tais

atos, que, para muitos, não representava o exercício da democracia, mas somente

atos de violência e vandalismos, com isso, o apoio, anteriormente dado, foi

diminuindo.

Sobre o assunto, vejamos os comentários de José Murilo de Carvalho:

Todos assistimos, bestializados, a essa explosão coletiva de insatisfação. A perplexidade atingiu em cheio o mundo político, em especial o Partido dos Trabalhadores, que nunca deixou de se autopromover como responsável por um governo popular. Congresso e Executivo apressaram-se em declarar que estavam atentos ao clamor das massas e em propor reformas e iniciativas, algumas delas mais de seu próprio interesse do que do interesse das ruas, como foi o caso das propostas feitas pela presidente de

convocação de constituintes, plebiscitos e referendos. 127

Temos de lembrar que um dos primeiros resultados dessas manifestações foi

a redução, por parte dos Estados/Municípios, dos aumentos nas tarifas dos

transportes públicos.

Assim sendo, resta evidente que a desobediência civil pode ser considerada

um ato de participação política, tendo em vista o impacto causado no mundo político

pelas últimas manifestações, em especial as de 2013, acima mencionadas no Brasil.

125 VILLELA. Gustavo. Fatos históricos: junho de 2013. Disponível em: <http://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/o-brasil-foi-as-ruas-em-junho-de-2013-12500090#ix zz45AUXI4GN>. Acesso em: 10 jun. 2016. 126 Os black blocs, via de regra, utilizavam vestimentas negras e máscaras, e suas participações nas manifestações ficaram marcadas pelos atos de vandalismo e pelas batalhas com a polícia. 127 CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 19.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015. p. 8.

Page 86: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

84

Diante de tal cenário, podemos asseverar que a participação popular é uma

das principais características da democracia atual, bem como do constitucionalismo

moderno, que ocorre, também, e a largos passos, por meio das redes sociais.

Desse modo, a desobediência civil que é um meio que permite ao cidadão/e-

cidadão bem como à sociedade intervirem diretamente nas instituições públicas e no

âmbito político pátrio, exercida por meio das manifestações, pode e deve ser

considerada um mecanismo de mudança social, uma vez que a participação popular,

cada vez mais, impacta no cenário político brasileiro, principalmente com o advento

das redes sociais.

Page 87: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

85

3 REDES SOCIAIS

Neste capítulo, analisa o papel das redes sociais no contexto de mudança.

Expomos brevemente a revolução tecnológica, passando pela historicidade e os

principais conceitos, e, principalmente o papel que as redes sociais vêm

desempenhando na sociedade atual, especialmente no tocante às novas formas de

manifestações, uma vez que, “nunca antes na história desse país”, as redes sociais

galgaram tantas transformações e impactaram diretamente nos meios políticos.

3.1 Revolução tecnológica

Antes de adentramos às redes sociais, propriamente ditas, é importante

falarmos sobre o marco que revolucionou o mundo contemporâneo, ou seja, a

revolução tecnológica. Antes ainda, e por oportuno, importa lembrar que, antes

mesmo de falar em tecnologia, tivemos vários outros aspectos de suma importância

para o desenvolvimento civilizatório da humanidade, dentre eles, salientamos o

processo de comunicação, conforme mencionado no item 1.1.1 (Manifestação: Da

comunicação à lógica), que foi condição primeira para o desenvolvimento da raça

humana.

Tal assertiva se justifica tendo em vista que, por meio da comunicação, nós

humanos conseguimos expressar nossos sentimentos, nos relacionarmos,

recebermos e transmitirmos informações, compartilharmos conhecimentos, bem

como manifestarmos nossas ideias.

Na infância dos povos, a comunicação era extremamente precária, sendo que

a raça humana se comunicava por meio de sinais, gestos, expressões faciais e

outros. A fala foi o primeiro grande avanço do processo de comunicação, sendo

certo que o uso da linguagem favoreceu os grupos que a desenvolveram no

processo de seleção e conquistas culturais, responsáveis pela própria

sobrevivência128.

128 LIMA, Sandra Lúcia Lopes. História da comunicação. São Paulo: Ebart, 1989. p. 9.

Page 88: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

86

Com o passar dos tempos, o homem foi se aperfeiçoando e consigo trouxe a

necessidade de aprimorar as formas de comunicação, e esse processo foi árduo,

uma vez que a democratização da comunicação é fato dos dias atuais.

As primeiras civilizações, estabeleceram uma codificação para transmitir e

receber conhecimentos na agricultura, aritmética. Nem todos tinham acessos a

esses conhecimentos129. Na antiguidade, os escribas130 eram os únicos possuidores

desses códigos. Com a advento do cristianismo, os códigos ficaram restritos aos

membros da Igreja. Na burguesia, a evolução da comunicação ficou voltada aos

homens das classes mais endinheiradas.

Esses paradigmas somente foram superados com a revolução industrial,

porquanto ocorre a necessidade de desenvolvimento da população por meio da

educação para a adaptação às novas tecnologias.

Assim, adentramos na revolução tecnológica:

O processo de comunicação, então, evoluiu passando pelos signos, sons;

indo para a palavra escrita; após, para a tipografia móvel; publicação em massa; e-

mail e para as famosas redes sociais.

129 Conforme mencionado no Item 1.2.1 – Na antiguidade nem todos eram considerados cidadãos, sendo excluídos os escravos, as mulheres, os menores e os estrangeiros, o mesmo aconteceu em relação à transmissão de conhecimentos, nem todos tinham acesso, o que, diga-se de passagem, ocorre até os dias atuais, contudo em menor escala, frente aos avanços tecnológicos que possibilitaram a democratização do acesso a informação. 130 Dicionário Bíblico: Escritor. Antes do cativeiro empregava-se esta palavra para significar a pessoa que tinha certos cargos no exército (Jz 5.14 – 2 Rs 25.19 – Is 33.18 – Jr 52.25) – e também se chamava escriba o secretário do rei, constituindo este emprego, junto das pessoas reais, uma alta posição (2 Sm 20.25 – 1 Rs 4.3 – 2 Rs 12.10). Na história judaica dos tempos mais modernos os escribas são os intérpretes ou copistas da lei. Esdras é descrito como ‘escriba versado na lei de Moisés’ (Ed 7.6) – e proclamavam os escribas os seus direitos, dizendo: ‘Somos sábios, e a lei do Senhor está conosco’ (Jr 8.8). Quando o povo começou a falar o aramaico, a língua hebraica lhes era familiar. Eram eles de profissão os estudantes da Lei, escrita ou oral, e no tempo de Jesus tinham de tal forma obscurecido a primeira com as suas explicações e adições que foram acusados pelo Divino Mestre de transgredir os mandamentos de Deus por causa da sua tradição, e de ensinar ‘doutrinas que são preceitos de homens’ (Mt 15.1 a 9 – Mc 7.7). A maior parte das vezes eles são mencionados juntamente com os fariseus, certamente pelo fato de mostrarem a mesma atitude para com a lei e o mesmo formalismo na vida religiosa (Mt 5.20 – 12.38 – etc.). Mas, embora os escribas possam, na maior parte das vezes, ter sido fariseus, não pertenciam todos eles àquela seita (*veja Mc 2.16 – Lc 5.30 – At 23.9). A sua influência é manifesta pelas suas estreitas relações com os principais sacerdotes e anciãos (Mt 16.21 – 20.18 – 26.3 – Mc 10.33 – 14.53 – At 6.12). Os ensinamentos de Jesus eram de tal modo opostos ao formalismo dos escribas, que não admira a sua hostilidade para com o nosso Salvador (Lc 5.30 – 6.7, etc.) – e essa hostilidade continuou a manifestar-se contra os apóstolos (At 4.5 – 6.12). – Disponível em: <http://biblia.com.br/dicionario-biblico/e/escriba/>. Acesso em: 11 mar. 2016.

Page 89: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

87

Foi no Século XX, por volta da década de 70, que se deu o grande marco da

revolução tecnológica. Vejamos algumas datas importantes para entendermos a

evolução tecnológica131:

1965 - Lançados os primeiros satélites de comunicação. Inaugurada uma nova era na transmissão de dados eletrônicos. 1972 - Os discos laser são lançados revolucionando a indústria fonográfica. 1977 - Lançado nos Estados Unidos o primeiro telefone celular. 1990 - Lançamento do primeiro navegador de hipertexto para a Internet. Somente no ano seguinte o programa foi disponibilizado. 1999 - A Internet cresce no mundo todo em velocidade impressionante. Os arquivos de MP3 começam a ser usados e transmitidos pelas ondas da Internet. 2007 - A Apple lança seu primeiro Iphone. Tem início a Era dos Smartphones (híbrido de telefone celular e computador pessoal).

Todos esses acontecimentos possibilitaram uma amplitude nos meios de

informação, sendo que a revolução tecnológica excedeu limites antes inimagináveis

no que tange à democratização do processo de comunicação.

Aníbal Sierralta Ríos132 argumenta:

Para o direito e a democracia, a forma e a dimensão dos meios de informação são significativas não somente por sua estrutura empresarial, mas também pelos diferentes e diversos interesses que defendem e pelas formas como podem interferir na sociedade para impor esses interesses, afetando, assim, a cultura dos povos e também manipulando a história.

De fato, a revolução tecnológica mudou expressivamente os padrões culturais

relacionados à comunicação, mudando, também, a forma como as pessoas

manifestam suas insatisfações, pois voltam-se contra o injusto, insurgem-se com a

norma arbitraria.

Desse modo, o processo de comunicação que no embrião da civilização era

adstrito aos signos, sons, alcançou o advento da palavra escrita, desenvolvendo-se,

mais ainda, com a chegada da tipografia móvel, prosseguiu para a comunicação de

massa (jornais, rádios, televisão) e progrediu, como nunca, com a revolução

tecnológica, que podemos considerar o marco inicial para o surgimento, posterior,

131 SUA PESQUISA PONTO COM. Tecnologia e história da tecnologia. Disponível em: <http:/ /www.suapesquisa.com/tecnologia/>. Acesso em: 11 mar. 2016. 132 RIOS, Aníbal Sierralta. A revolução tecnológica dos meios de comunicação e os desafios do direito e da democracia. Revista Meritum, v. 7, n. 1, p. 305-353, jan./jun. 2012.

Page 90: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

88

das redes sociais, e, por consequência lógica, foi o marco, também, para as novas

formas de manifestações e criação do e-cidadão.

3.2 Conceitos

O convívio em sociedade fez com que o homem evoluísse em relação à

comunicação social, fato esse primordial, porquanto o indivíduo necessitava realizar

relações de interação com outros indivíduos. Manifestamente, com o avanço da

tecnologia, toda comunicação com um grupo da sociedade foi facilitada, conforme

acima explicitado.

Mais, as pessoas desenvolvem a capacidade de se comunicar e interagir

umas com outras, toda vez que ocorre o avanço tecnológico, hoje, por exemplo, já

não é casual o uso de cartas, telegramas e ligações via o sistema de telefonia. A

primeira ligação ou o primeiro “alô”, via telefone celular133, era sonho de várias

pessoas, já nos dias atuais diz o brocardo popular que: “Em terra de WhatsApp

ligação é prova de amor”134, ou seja, os avanços tecnológicos transformam a forma

como nos relacionamos, como nos comunicamos e também como nos manifestamos

e participamos do processo democrático na era digital.

Tanto é verdade que, com o advento da internet, houve reconhecida

aceleração no processo de comunicação, de modo que novas ferramentas de

comunicação sempre apresentam grande destaque e crescimento na rede mundial

de computadores135, desde os primeiros meios, como o próprio correio eletrônico (e-

133 A primeira cidade brasileira a contar com telefonia móvel celular foi o Rio de Janeiro, em 1990. Posteriormente, em 1991, o sistema foi implantado também em Brasília e, depois disso, em Campo Grande, Belo Horizonte, Goiânia e São Paulo. Em novembro de 1993, a Telesp Celular lançou o primeiro sistema digital de telefonia celular e em 1997, foi inaugurada em Brasília a primeira operadora da banda B (concorrentes privadas ao monopólio estatal que existia até então): a Americel. A entrada de operadoras na banda B foi o pontapé inicial na abertura do mercado de telefonia móvel, possibilitada pela Lei Mínima (Lei nº 9.295, de 16 de julho de 1996). Disponível em: <GUIA DO CELULAR. História do celular no Brasil. Disponível em: <http://www.guiadocelular.com/2011/10/ historia-do-telefone-celular-no-brasil.html>. Acesso em 01 de set.de 2016. 134 Realmente não há dúvidas de que a internet e a tecnologia melhoraram as nossas vidas. Mas elas também pioraram. Quanto mais utilizamos os avanços da informática e nos habituamos ao processamento rápido da velocidade, mais nos robotizamos. Tornamo-nos as próprias máquinas. E os relacionamentos humanos são os que mais têm sofrido com essa transformação, principalmente as relações amorosas quando estão em seu início. BEDONE, Rebeca. Em terra de whatsapp ligação é prova de amor. Disponível em: <http://www.revistabula.com/5323-em-terra-de-whatsapp-ligacao-e-prova-de-amor/>. Acesso em: 11 mar. 2016. 135 CARVALHO NETO, Frederico da Costa. Novas Ferramentas e Privacidade. Florianópolis: FUNJAB, 2013. p. 233-249.

Page 91: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

89

mail). Ademais, com o advento das redes sociais, essas relações entre diferentes

pessoas tornaram-se mais comuns.

Impende ressaltar que existem outros instrumentos que podem ser

confundidos com redes sociais, por tais motivos, as pesquisadoras norte-americanas

Danahet Boyde e Nicole Ellison definem as Redes Sociais (Social Network Sites),

como:

(...) serviços baseados na web que permitem ao indivíduo construir um perfil público ou semi-público dentro de um sistema pré-formatado, onde se desenvolve uma lista de conexões com outros usuários, com os quais se compartilham informações e onde é possível ver e percorrer as listas de conexões desses outros usuários dentro do sistema. (Tradução livre). 136

As denominadas redes sociais digitais motivam uma interação social para

dentro do ambiente virtual. Nesse sentido, podemos defini-las como um conjunto de

sistemas digitais, utilizados por indivíduos de maneira não centralizada, o que

permite uma significante interação interpessoal, já que compartilham ideias,

divergências, fotos, vídeos, dentre outros conteúdos.

Mas, existem pesquisadores que realizam uma explicação mais extensiva do

que seriam “redes sociais”, pois, para estes, a definição seria apenas para qualquer

“site” que permite partilhar dados e informações, sendo estas de caráter geral ou

específico, das mais diversas formas (textos, arquivos, imagens fotos, vídeos).

Nesse sentido, segundo Danilo Doneda:

Existem ainda as redes sociais denominadas como impróprias, que seriam aquelas que funcionam como um apêndice de outro serviço ou ferramenta, gravitando e existindo em função deste. Estas redes impróprias podem oferecer um conjunto parcial das ferramentas típicas de interação encontradas nas redes sociais próprias, e podem ser mencionados como exemplos as redes sociais presentes em sites de comércio eletrônico (tais como o da Amazon.com, eBay ou o Mercado Livre) ou em sites que têm como objetivo primordial o intercâmbio de conteúdo e não propriamente a interação social mas que também cultivam suas próprias comunidades de usuários (tais como o Slideshareou o próprio YouTube).137

136 BOYD, Danahet; ELLISON, Nicole. Social network sites: Definition, history, and scholarship. Califórnia, 2007. Disponível em: <http://jcmc.indiana.edu/vol13/issue1/boyd.ellison.html>. Acesso em: 04 jun. 2013. “web-based services that allow individuals to construct a public or semi-public profile within a bounded system, articulate a list of other users with whom they share a connection, and view and traverse their list of connections and those made by others within the system”. 137DONEDA, Danilo. Reflexões sobre proteção de dados pessoais em redes sociais. Revista Internacional de Protección de Datos Personales. n. 1. Dezembro 2012. Disponível em: <http://habeasdatacolombia.uniandes.edu.co/wp-content/uploads/10_Danilo-Doneda_FINAL.pdf.pdf>. Acesso em: 5 fev. 2014.

Page 92: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

90

Ante essa assertiva, resta evidente que atualmente houve uma

transformação, com isso, deve-se atentar ao fato de que as redes sociais passaram

a ser também uma plataforma de utilização de aplicativos (jogos, utilitários) e de

comércio eletrônico (como é caso do YouTube, do Facebook), além da possibilidade

de criação de páginas institucionais e/ou pessoais.

Por tais causas, seria mais acertado conceituar as redes sociais como

espaços virtuais pré-estabelecidos que propiciam a interação de indivíduos e

instituições, por meio da composição de listas de relacionamento e o preenchimento

de informações nos perfis pessoais e páginas institucionais, bem como por meio de

aplicativos de informática.

Na grande maioria das vezes, a utilização das redes ocorre de forma gratuita,

todavia, a maioria das empresas oferecem seus préstimos em troca dos dados, e

esses dados são comercializados aos mais diversos setores da economia, ou seja,

os usuários inserem seus dados que são automaticamente processados para,

posteriormente, oferecerem publicidade personalizada e marketing de

relacionamento, destinados a pequenos produtores de programas de computador ou

artesanato, até bancos e montadoras de automóveis.

São as redes sociais os meios cibernéticos pré-estabelecidos que propiciam a

interação interpessoal, nas quais as pessoas inserem seus dados pessoais,

compartilham seus sonhos, frustações, realizações com outras pessoas conhecidas

ou não.

Do exposto, podemos afirmar que as redes sociais são um instrumento de

proliferação da comunicação que atingem de forma instantânea pessoas em todos

os lugares do mundo. São, também, um instrumento de participação popular nas

decisões dos governantes, tendo em vista que as manifestações se proliferam de

forma imediata e o alcance é sem precedentes, fazendo com que alguns

governantes revejam seus posicionamentos.

3.3 Evolução histórica das redes sociais

Page 93: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

91

No século XIX, mais precisamente em 1971 aconteceu um passo formidável,

ou seja, o envio do primeiro “e-mail”. Sete anos depois ocorreu a criação do Bulletin

Board System (BBS), tecnologia essa que usava linhas telefônicas e um modem

para transmitir os dados, oportuno mencionar que o sistema foi criado por dois

entusiastas de Chicago, para convidar seus amigos para eventos e realizar anúncios

pessoais.

Passados outros sete anos, outro fato marcante acerca da evolução histórica

das redes sociais adveio, ou seja, em 1985 a America Online (AOL), passou a

fornecer ferramentas para que as pessoas construíssem perfis virtuais nos quais

podiam descrever a si mesmas e criar comunidades para troca de informações e

discussões sobre os mais variados assuntos. Anos mais tarde (mais precisamente

1997), a empresa implementou um sistema de mensagens instantâneas, o pioneiro

entre os chats e a inspiração dos “menssengers” utilizados atualmente.138

A “internet”, na virada do século, anos 2000, teve um aumento significativo de

presença na casa das pessoas e no trabalho. Com isso, as redes sociais

alavancaram uma imensa massa de usuários139 e a partir desse período uma

infinidade de serviços foram surgindo, como o Fotolog, que consistia em publicações

baseadas em fotografias acompanhadas de ideias, sentimentos.

O denominado Friendster é considerado como o primeiro serviço a ganhar o

status de “rede social”. Suas funções admitiam que as amizades do mundo real

fossem conduzidas para o espaço virtual. Esse meio de comunicação e socialização

atingiu 3 milhões de adeptos em apenas três meses — o que significava que 1 a

cada 126 internautas da época possuía uma conta nele.140

Em ato posterior, as redes sociais passaram a ser apreciadas de tal forma

pelos usuários, que se volveram como efetivas máquinas de captação de dinheiro, o

que impulsionou a criação, em 2004 do Orkut e Facebook.

138 TECMUNDO. A história das redes sociais como tudo começou. Disponível em: <http://www.tecmundo.com.br/redes-sociais/33036-a- historia-das-redes-sociais-como-tudo-comecou. htm> Acesso em: 10 abr. 2013. 139 CARVALHO NETO, Frederico da Costa. Novas Ferramentas e Privacidade. Conpedi/Uninove. Florianópolis: FUNJAB. 2013. p. 233-249. 140 TECMUNDO. A história das redes sociais como tudo começou. Disponível em: <http://www.tecmundo.com.br/redes-sociais/33036-a-historia-das-redes-sociais-como-tudo-comecou.htm>. Acesso em: 10 abr. 2013.

Page 94: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

92

Durante anos, o Orkut foi a rede social de propriedade da Google, mais

usada pelos internautas brasileiros, até perder sua posição em dezembro de 2011

para o Facebook, criação de Mark Zuckerberg.

Em que pese sua criação, data de 2004, criado dentro do campus da

Universidade de Harvard, o Facebook só atingiu a grande massa de usuários no ano

de 2006. De lá para cá, a rede social é sinônimo de sucesso e crescimento,

superando a incrível marca de 908 milhões de pessoas cadastradas e a marca está

avaliada em US$ 104 bilhões.141

Não obstante, temos, também, outra recente rede social a entrar nessa

complicada contenda, é o Google+, um dos mais novos serviços da enorme e

mundialmente reconhecida Google. Difundido oficialmente em 2011, esse serviço

tem por volta de 400 milhões de inscritos (somente 25% deles estão ativos).

Conquanto ainda esteja muito longe de assustar o líder do segmento, a Google não

tem poupado investimentos e esforços para que o seu produto cresça. Contudo, por

enquanto, ele ainda não vingou e o volume de informações compartilhadas pelo

Google+ ainda é relativamente baixo.

Em contemporânea pesquisa, publicada pela The Social Habbit, nos Estados

Unidos da América, dentre os norte-americanos entrevistados, que na época

utilizavam alguma plataforma de mídias sociais, 18% possuem um perfil

no Instagram, 94% no Facebook e 47% no Twitter.

Nessa toada, e para demostrar que o acesso a essas redes sociais é mais

constante que outras formas de socialização do cidadão, daqueles que possuíam um

perfil do Instagram 61% estiveram ativos pelo menos uma vez por dia, um nível de

adoção apenas ultrapassado pelo Facebook (84%). Em comparação, o Twitter está

em 55%, Google Plus 44% e o Pinterest com 52%.142

Ante o exposto, percebemos cada vez mais o surgimento dessas novas

redes sociais e deparamos com a necessidade de realizarmos sua melhor

compreensão sociológica e jurídica para se conseguir regular tais relações virtuais.

141 TECMUNDO. A história das redes sociais como tudo começou. Disponível em: <http:// www.tecmundo.com.br/redes-sociais/33036-a-historia-das-redes-sociais-como-tudo-comecou.htm>. Acesso em: 10 abr. 2013. 142 BUSINESS SOLUTION INTERNATIONAL. Dados recentes sobre a ascensão do “Instagram”. Disponível em: <http://www.bsi-brasil.com/blog/dados-sobre-ascensao-do-instagram-102101218/>. Acesso em: 03 jul. 2015.

Page 95: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

93

3.4 Liberdade de manifestação na “era da informatica”

Com o surgimento da internet, é possível afirmar que a pulverização de dados

verdadeiros ou falsos sobre um determinado assunto ou pessoa, se tornou muito

mais fácil que outrora, permitindo-se a construção de uma biografia que pode

distorcer ou não a realidade dos fatos e a identidade das pessoas.

Sabemos que na atual era da cibernética, a manifestação de pensamento,

previsto no art. 5º, inciso IV da Constituição Federal de 1988, ganhou proporções

inimagináveis, frente a quase completa eliminação de barreiras para a disseminação

da liberdade de manifestação.

Salientamos que os mecanismos de comunicação cibernéticos são

considerados como avanço da ciência e da tecnologia143, assim, reconhece-se a

necessária reengenharia do tradicional conceito de manifestação nos dias atuais.

Todavia, não podemos esquecer que a proliferação do direito de manifestação

por meio da internet não jogou por terra o outro preceito constitucional que vem

aliado ao direito de manifestação, ou seja, continua vedada a manifestação às

escuras, em outras palavras, é garantido o direito de manifestação, mais vedado o

anonimato.

O cidadão ou e-cidadão pode, caso queira, fazer das redes sociais sua forma

de “palanque virtual” de manifestação contra aquela norma, ato ou ordem que

considere injusto; no entanto, não pode se esconder atrás da cibernética e falar o

que bem pensa sem o condão da responsabilização, pois somos responsáveis pelos

nossos atos dentro ou fora do mundo virtual.

O que temos, efetivamente, é uma ausência de regulamentação, por parte do

Estado que, por sua vez, deve criar mecanismos de policiamento virtual, similar ao

que ocorre no “mundo real”, de modo que seja possível identificar e punir o usuário

que pratica delitos no ambiente virtual, ou seja, usuários que vão além do exercício

do direito de manifestar.

143 MAIN, Lucimara Aparecida; MORO, Maitê. Reputação da organização: gerenciamento de crise da imagem, como forma de garantir a função social e sustentabilidade financeira da empresa. Florianópolis: FUNJAB. 2014. p. 493-516.

Page 96: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

94

Como mencionamos anteriormente, as empresas que administram as redes

sociais, buscam o lucro, ao passo que deve o Estado, também, criar mecanismos de

policiamento virtual e de responsabilização civil destinada às pessoas jurídicas.

Nessa esteira de pensamento, a criação de mecanismos estatais de

fiscalização e punição tanto para o indivíduo, quanto para as empresas que

administram as redes sociais, nos parece o melhor caminho para a efetivação da

democracia e o exercício da livre manifestação, sem, contudo, prejudicar terceiros.

3.5 Geração Z: as redes sociais como nova forma de manifestação

As redes sociais é de longe o melhor mecanismo de comunicação criado pelo

homem, não desprezamos a importância dos mecanismos anteriores, (telégrafo,

rádio, TV, telefones); contudo, podemos observar uma democratização por meio das

redes sociais.

A democratização ampla do acesso à internet alterou a forma com que as

pessoas interagem umas com as outras e, consequentemente, foram repensados os

métodos clássicos, até então desenvolvidos, para exercitar o direito de resistência e

a desobediência civil.

Presenciamos nos dias atuais o surgimento de uma nova geração. Certo é

que existe resistência entre alguns estudiosos em usar termos muito fechados para

definir povos, regiões ou gerações. Argumentam que definições simplificam os

problemas e que toda simplificação tende a tornar superficial o debate.

Contudo, existe outra corrente que defende a possibilidade de simplificar o

debate, no qual as definições têm o mérito de orientar as discussões. Acreditamos

mais acertada a segunda opção. Até pouco tempo atrás, revistas, livros e filmes

ainda falavam da Geração X, aquela que substituiu os yuppies dos anos 80. Essa

turma preferia a camisa de flanela e o bermudão à gravata colorida e ao relógio

Rolex, ícones de seus antecessores. Isso foi no início dos anos 90.

Posteriormente, surge a Geração Z, e a grande sacada dessa geração é

zapear. Daí o Z. Em comum, essa juventude muda de um canal para outro na

televisão. Vai da internet para o telefone, do telefone para o vídeo e retorna

Page 97: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

95

novamente à internet. Também troca de uma visão de mundo para outra, na vida,

em questão de segundo, e na grande maioria, influenciados pelas redes sociais.

Mulheres e homens da Geração Z, em sua maioria, nunca conceberam o

mundo sem computador, chats, telefone celular, tablete. Por isso, são menos

deslumbrados que os da Geração Y com chips e joysticks. Sua maneira de pensar

foi influenciada desde o berço pelo mundo complexo e veloz que a tecnologia

engendrou.

Diversamente de seus pais, sentem-se à vontade quando ligam ao mesmo

tempo a televisão, o rádio, o telefone, música e internet. Outra característica

essencial dessa geração é o conceito de mundo que possui, desapegado das

fronteiras geográficas, fato esse possibilitado pelo difundido acesso às redes sociais.

Essa nova Geração não vislumbra a globalização como um valor adquirido no

meio da vida a um custo elevado. Aprenderam a conviver com ela já na infância.

Como informação não lhes falta, estão um passo à frente dos mais velhos,

concentrados em adaptar-se aos novos tempos.

Enquanto os demais buscam adquirir informação, o desafio que se apresenta

à Geração Z é de outra natureza. Ela precisa aprender a selecionar e separar o joio

do trigo. E esse desafio não se resolve com um micro veloz. A arma chama-se

amadurecimento. É nisso, afirmam os estudiosos e especialistas, que os jovens

precisam trabalhar. Como sempre.

Assim, podemos afiançar que nos dias atuais, não existe a menor

possibilidade de se falar em direito, sem se levar em consideração os avanços

cibernéticos e o impacto causado pelas redes sociais na vida das pessoas.

Uma grande evolução, advinda da Geração Z, foi a transformação na forma

como se convocam e se realizam as manifestações, fato esse que restou evidente

pelas últimas manifestações, políticas ou não, que ocorreram no Brasil.

Imaginava-se que a Geração Z ficaria atrás de um smartphone, atrás de um

computador, notebook ou tablet, que seria uma geração de nerds virtuais,

desapegados do mundo além-paredes dos seus quartos, contudo introduziram, via

redes sociais, uma nova visão sobre como as pessoas no século XXI podem

mobilizar outras. Essa mobilização ocorre via canais disponíveis na internet, por

exemplo, YouTube, e principalmente pelas redes sociais, sendo que no Brasil

Page 98: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

96

Facebook, Twitter, Instagram têm se destacado e impulsionaram as últimas

manifestações.

Via de regra, os jovens utilizavam as redes sociais para mobilização,

convocação e realização das manifestações nas vias públicas, principalmente

aquelas de maior circulação, como ocorreu em diversas oportunidades na Avenida

Paulista (considerada o centro financeiro do país), na Cidade São Paulo/SP.

Nessa toada, tem-se que a Geração Z, via redes sociais, inflaram as

manifestações, uma vez que atingiram números antes nunca vistos em atos

populares/públicos no Brasil. Todavia, nem todas as manifestações propagadas

pelas redes sociais são de cunho político, uma vez que várias outras questões,

também, foram suscitadas nas redes sociais e motivaram manifestos públicos, que,

como ocorreram, a título de exemplificação veremos mais adiante, não eram de

cunho político, mas social.

Page 99: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

97

4 ANÁLISE DE CASOS EM QUE AS REDES SOCIAIS TIVERAM SUMA

IMPORTÂNCIA NA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA CONTEMPORÂNEA

Atualmente, existem diversas formas de manifestações por meio das redes

sociais no Brasil e no mundo. Nesse caso, destacaremos abaixo algumas formas de

participação democrática que tiveram forte participação das redes sociais como:

flash mobs, smart mobs, primavera árabe, rolezinhos e jornadas de junho de 2013.

4.1 Flash Mobs: manifestações sociais apolíticas pelas redes sociais

“Multidões instantâneas”, apolíticas e lúdicas. Em breves palavras, seria essa

a conceituação de “Flashmobs”. Geane Alzamora e Renata Alencar argumentam

que a “Flash mobs” são catalisadas por “ações preparatórias”, pulverizadas na rede

e consolidadas no espaço urbano.

Um caminho possível para abordarmos as flashmobs no contexto dessas inquietações é percebê-las como um modo possível de construir uma experiência estética socializada, a qual é catalisada por “ações preparatórias” pulverizadas na rede e consolidadas no espaço urbano, por um grupo de indivíduos, configuradores de uma comunidade (dentre as muitas pelas quais transitam). 144

No mesmo sentido, André Lemos aduz que flasmobs são apolíticas e lúdicas:

As flash mobs são encontros muitas vezes sem outro objetivo senão a realização de uma manifestação relâmpago, como um happening ou uma performance. A organização do experimento se dá via e-mail, blogs e SMS. Essas manifestações-relâmpago, apolíticas, onde pessoas que não se conhecem marcam, via rede, locais públicos para se reunir e se dispersar em seguida, causando estranheza e perplexidade aos que passam começaram em Nova York e se espalharam pelo mundo.145

Assim, com a propagação das redes sociais, um fenômeno, mais um, dentre

tantos outros fenômenos, surge e transforma nosso dia a dia. Nos dias

144 ALZAMORA, Geane; ALENCAR, Renata. Flashmob: reflexões preliminares sobre uma experiência de rede. In: Anais do V Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura. Disponível em: <http://www.cult.ufba.br/enecult2009/19558-1.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2016. 145 LEMOS, André, Cidade digital: portais, inclusão e redes no Brasil. Salvador: EDUFBA, 2007. Disponível em: <https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ufba/137/1/Cidade%20digital.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2016.

Page 100: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

98

contemporâneos, é comum as pessoas se associarem para realização de questões,

por exemplo, culturais e como acima mencionado apolíticas. Mesmo não

conhecendo uns aos outros, os indivíduos interagem por meios dos dispositivos

móveis.

Nesse contexto, as “multidões instantâneas” se formam por meio de avisos

que se espalham nas redes digitais, atingindo, pessoas em vários lugares com o

intento de se encontrarem, sendo que utilizam as redes como espaço de

organização e as ruas, por seu turno, como espaço de encontro.

André Lemos elucida que a primeira flasmobs ocorreu em agosto de 2003 em

São Paulo, na qual cerca de 80 pessoas, segundo a Polícia Militar, cruzaram a

avenida Paulista, próximo à rua Augusta, tiraram os sapatos e os bateram diversas

vezes contra o chão146.

Acreditamos que o os “rolezinhos” (maiores detalhes abaixo) são formas de

flasmobs “à brasileira”, na qual jovens, na grande maioria das periferias da Capital

Paulistana, se organizavam via redes sociais e se encontravam em parques e

shoppings.

É certo que nem toda manifestação tem cunho político e, nas flasmobs,

encontramos a confirmação dessa assertiva. Ao passo que vivemos uma nova

concepção com tais atos, porquanto realizados em todos os aspectos, sociais,

culturais e também políticos, sendo que, neste último caso, estaremos falando das

Smart Mobs.

4.2 Smart Mobs: manifestações políticas pelas redes sociais

As “Smart Mobs” em muito se assemelha às “flasmobs” quanto à forma de

organização, uma vez que as “Smart Mobs” versam sobre a possibilidade de

pessoas cooperarem umas com as outras, ou seja, em conjunto, mesmo não se

conhecendo uns aos outros. As pessoas que compõem “Smart Mobs” cooperaram

de forma nunca antes imaginável, tendo em vista que essas pessoas carregam

146 LEMOS, André, Cidade digital: portais, inclusão e redes no Brasil. Salvador: EDUFBA, 2007. Disponível em: <https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ufba/137/1/Cidade%20digital.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2016.

Page 101: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

99

consigo dispositivos móveis que possuem tanto as capacidades de comunicação

quanto a de computação.

André Lemos, sobre o tema, citando Howard Rheingold (2002), aduz:

Smart mobs é o termo criado por H. Rheingold (2002) para descrever as “novas” formas de swarming usando tecnologias móveis como celulares, com voz e SMS, pages, internet sem fio, blogs, etc. Os objetivos são os mais diversos. Para Rheingold, as smart mobs “consist of people who are able to act in concert even if they don’t know each other. The people who make up smart mobs cooperate in ways never before possible because they carry devices that possess both communication and computing capabilities“ (Rheingold, 2002, p. xii). Casos de smart mobs “non sens” (flash mobs) e políticas já aconteceram ao redor do mundo. As mais impactantes foram as manifestações que agregaram pessoas por SMS nos protestos anti-globalização, nas Filipinas, e em Madri, pós atentado nos trens em 2004. Nesses casos, as trocas de mensagens SMS causaram o deslocamento de uma multidão para protestar, tendo como resultado a deposição do presidente Estrada, das Filipinas, e a derrota do partido da situação na Espanha. Embora não possamos atribuir as conseqüências políticas apenas à mobilização por tecnologias móveis, parece ser evidente que estas constituem-se como ferramentas importantes de mobilização.147

Nesse contexto, podemos considerar os “Smart Mobs” como agrupamentos

sociais arranjados por pessoas com aptidão para atuar de forma ordenada, mesmo

sem se conhecerem previamente, utilizando, para tanto, dispositivos eletrônicos,

conectados via Wi-Fi, ou seja, sem fios, à internet.

Ante o exposto, resta evidente que os e-cidadãos organizam suas

mobilizações via redes sociais para posteriormente irem às ruas manifestarem.

Existem, também, os manifestos apenas virtuais, nos quais os e-cidadão postam

seus pontos de vista (seus manifestos) sobre determinado tema, buscando sempre

apoio dos demais participantes das redes sociais, sem, contudo, convocá-los para

manifestos em vias públicas.

Quando falamos de manifestações políticas contemporâneas no Brasil, de

pronto lembramo-nos da “jornada de 2013”, entretanto, num contexto internacional,

importa lembrar da “primavera Árabe de 2011, o uso da internet e as redes sociais

não se restringiu a mostrar ao mundo a realidade do Egito, porquanto foram

utilizadas, também, como mecanismo de união nacional.

147 LEMOS, André. Cibercultura e Mobilidade: a Era da Conexão. Revista Razón y Palabra. Disponível em: <http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n41/alemos.html>. Acesso em: 11 ago. 2016.

Page 102: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

100

4.3 Primavera Árabe de 2011: redes sociais como elemento de revolução

democrática no Oriente Médio

Em 2011, tivemos a oportunidade de conhecer a Praça Tahrir, no centro da

Cidade do Cairo-Egito, e de perto presenciarmos manifestações que explanavam a

ausência de expectativas para o futuro em um contexto de desemprego, miséria e

abandono estatal por parte do regime ditatorial instalado.

A população egípcia vivia marginalizada e sem esperanças, não restando

alternativa senão buscar por melhorias contra a condição de flagelo que vivia.

Poderíamos pensar, estamos vivenciando um fato histórico, e quando do

retorno para o Brasil falaremos aos nossos pares o ocorrido. Todavia, não

necessário se fez, porque o mundo inteiro tomou conhecimento, simultaneamente

aos acontecimentos, graças à utilização da internet e das redes sociais.

Tal assertiva é reforçada nos argumentos de Rogério Martins de Souza e

Débora Alves da Costa, que aduziram que a internet foi utilizada para informar e,

também, como forma de unir a população:

Durante os protestos no Egito, a internet não foi apenas usada como um meio de comunicação para informar ao mundo a situação em que o país se encontrava, mas também como um meio para que a população pudesse se unir. Mesmo com a tentativa do ex-presidente Mubarak de cortar o acesso à internet, os egípcios souberam usar as redes sociais para burlar a vigilância do poder. Um exemplo é o site de busca Google, que criou um sistema chamado “Speak to Tweet” para que eles pudessem usar o Twitter através de um sistema de voz. Este é apenas um exemplo de como a internet e as redes sociais foram usadas na Primavera Árabe.148

Aduzem, ainda, que a internet foi o meio de organização dos protestos para

que a população dos países árabes pudesse se expressar:

Durante as manifestações de rua, era comum encontrar imagens de pessoas segurando cartazes que faziam alusão à internet, nos quais o nome de alguma rede social era seguido de incitação à revolta nas ruas. A internet não foi a razão dos protestos terem se iniciado. Ela foi, sim, usada de maneira influente para que os protestos fossem organizados e as populações desses países árabes pudessem se expressar.149

148 SOUZA, Rogério Martins de; COSTA, Débora Alves da. A revolta digital: impacto das redes sociais da internet nos protestos de rua dos países árabes em 2011. Revista Cadernos da UniFOA, n. 19, ago. 2012. p. 37-44. 149 Ibidem, p. 37-44

Page 103: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

101

Dessa forma, fica claro que a internet, e por consequência lógica as redes

sociais, podem e devem ser utilizadas para trocar informações, bem como viabilizar

as interações sociais. Certos, também, de que, quando bem utilizada, a internet

pode desconstituir governos ditatoriais e, de forma errada, fortalecê-los:

Isso nos mostra que a internet pode ser utilizada de outra maneira, além da troca de informações ou interações sociais. E preciso enxergar esse “poder” que a internet pode nos dar e usá-lo de maneira correta. Afinal, do mesmo jeito em que foi usada para derrubar governos ditatoriais, a internet também pode ser usada para fortalecê-los.150

A finalidade da Primavera Árabe, por meio dos protestos e manifestações, era

a busca ou luta em favor da democracia e pelo fim dos regimes ditatoriais. Sendo

que no Egito, o levante popular trazia como principal objetivo derrubar o ditador

Hosni Mubarak, que estava no poder há 30 anos.

Além do desemprego, miséria e abandono estatal por parte do regime

ditatorial instalado, acima mencionados, a carência de moradia, a repreensão à

liberdade de expressão, os altos índices de corrupção, a violência policial, dentre

outras mazelas fizeram com que o povo fosse às ruas e praças.

Uma data que ficou conhecida, mundialmente, foi 25 de janeiro de 2011, data

em que uma grande manifestação foi organizada no Egito. Tal manifestação foi

denominada “Dia da revolta”, sendo que em várias cidades egípcias milhares de

pessoas foram às ruas reivindicar seus direitos.

A internet e as redes sociais foram utilizadas pelos manifestantes para a

articulação e organização das manifestações, sendo que o Facebook e o Twitter,

tiveram importante papel na disseminação e fortalecimento das manifestações

populares conhecidas como “primavera Árabe”.

A propagação do movimento conhecido como Primavera Árabe, que completa um ano nesta quarta-feira (04/01), para toda a região do Norte da África e do Oriente Médio não teria sido possível sem os recursos e dispositivos proporcionados pelas redes sociais. A conclusão foi tirada de um relatório divulgado pela Dubai School of Government, que indica a importância de serviços como Twitter e Facebook na disseminação e fortalecimento das manifestações populares que, em última instância, se espalharam pelo mundo.151

150 Ibidem, p. 37-44 151 BORGES, Thassio. Redes sociais foram o combustível para as revoluções no mundo árabe. Disponível em: <http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/18943/redes+sociais+foram+o+ combustivel+para+as+revolucoes+no+mundo+arabe.shtml>. Acesso em: 11 ago. 2016.

Page 104: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

102

Sem maiores delongas, as redes sociais foram, de fato, o grande combustível

para as revoluções denominadas de “Primavera Árabe”. Do exposto, conclui-se que

as redes sociais e a internet apenas viabilizaram a articulação e organização dos

manifestantes, sendo que a causa, como ocorre em quase todos os manifestos

dessa natureza é a busca por direitos fundamentais e sociais, ou seja, busca-se a

efetivação da democracia, motivo pelo qual afirmamos que as redes sociais

desempenharam, como elemento fundamental, importante papel na revolução

democrática no Oriente Médio.

No Brasil, os motivos que desencadearam a maioria dos protestos políticos

não estão tão longe daqueles ocorridos no Oriente Médio; entretanto, outros

protestos de inclusão social, também, ocorreram, como é o caso dos denominados

“rolezinhos”.

Do exposto, resta claro que a convocação para os protestos ocorreu via redes

sociais, em especial, Facebook e/ou Twitter, todavia, outra característica que

podemos extrair de comum em todos os protestos mundiais é a falta de lideranças e

de instituições representativas das classes sociais, por exemplo, igrejas, sindicados

e partidos políticos.

4.4 Redes sociais e as jornadas de junho de 2013 no Brasil

Junho de 2013 ficará para sempre marcado na história de nosso país,

incontestavelmente serão acrescentados aos livros de História desta nação, como

um dos movimentos de maior adesão e expansão, desde as Diretas Já, na década

de 80 e o Fora Collor em 1992, já que as manifestações se alastraram por todo o

país quase que simultaneamente, paralisando os grandes centros urbanos das

principais capitais.

Mais de um milhão de brasileiros das mais diversas classes sociais, raças,

credos saíram às ruas inicialmente num só clamor, já que a princípio a motivação

era a revolta da população pelo aumento abusivo dos transportes públicos, chamada

revolta dos vinte centavos, porém, em pouco tempo surgiram bramidos por

mudanças dos mais variados tipos, logo, outras bandeiras também foram

Page 105: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

103

levantadas, como o combate à corrupção, a falta de educação, a falta de segurança,

o excesso de gastos com o evento esportivo da Copa do Mundo, entre outros.

Para entendermos as ‘jornadas de junho” de 2013 no Brasil, mister se faz

voltar no tempo e mencionar as primeiras manifestações, por causa do aumento

abusivo das tarifas dos transportes públicos, que surgiram em Salvador em 2003,

com a denominada “Revolta do Buzu”.

As revoltas de junho de 2013, desencadeadas pela luta organizada pelo MPL-SP contra o aumento das tarifas, não algo inteiramente novo. Para começar a compreender esse processo é preciso que voltemos a, no mínimo, 2003, quando, em resposta ao aumento das passagens, iniciou-se em Salvador uma série de manifestações que se estenderam por todo o mês de agosto daquele ano, que ficou conhecida como a Revolta do Buzu (...).152

Os manifestos iniciados em Salvador foram retratados em um documentário

que recebeu o nome do ato, ou seja, Revolta do Buzu de autoria de Carlos

Pronzato153. Documentário esse, utilizado em diversas cidades, o que possibilitou

maior amplitude sobre o transporte público, vindo a fomentar novos atos, como os

que ocorreram em 2004, “Revolta da Catraca”, em Florianópolis, 2006 em Vitória;

2011 Teresina; e, 2012, Aracaju e Natal e na cidade de Francisco Motao/SP,

oportunidade na qual os manifestantes viajaram de graça, uma vez que arrancaram

catracas e incendiaram a bilheteria.154

Entretanto, foi na cidade de São Paulo que as manifestações reuniram uma

quantidade, antes não vista, de manifestantes. Tais manifestações, posteriormente,

foram denominadas como “jornada de junho”. As manifestações envoltas nas

questões do transporte público contavam com a organização, via redes sociais, e

participação efetiva do Movimento Passe Livre (MPL155), sendo que os manifestos

152 MARICATO, Ermínia. Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Carta Maior, 2013. p.14. 153YOUTUBE. Revolta do Buzu. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=dQ ASaJ3WgTA>. Acesso em: 11 ago. 2016. 154 MARICATO, Ermínia. Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Carta Maior, 2013. p.15-16. 155 MPL – Movimento Passe Livre é uma organização horizontal, suprapartidária, fundado em 2005 e existente em várias cidades, fruto do acúmulo das revoltas contra o aumento das tarifas do transporte público que ocorreram em 2003 em Salvador e, logo depois, em Florianópolis. Ver Leo Vinicius, A Guerra da tarifa. São Paulo: Faísca, 2005.

Page 106: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

104

na Capital Paulista iniciaram-se no dia 06 de junho de 2013, após a prefeitura de

São Paulo, permitir um aumento de vinte centavos no valor da passagem de ônibus.

Dessa forma, a população revoltada com o aumento autorizado pelo poder

público e considerado por ela, abusivo, a partir de então decidiu tomar as ruas. Esse

momento é crucial para a formação do e-cidadão, porquanto os debates, as

convocações ganharam maior visibilidade e angariaram mais adeptos com o uso das

redes sociais, ou seja, as redes sociais romperam barreiras inimagináveis.

Cumpre lembrar que, inicialmente, as manifestações eram, repise-se, para

protestar contra o aumento abusivo das passagens, mas rapidamente foram

introduzidas outras demandas, a partir desse momento surgiu um novo discurso,

“Não é só pelos R$ 0,20”.

Outro contexto que precisa ser mencionado é o cenário internacional, que

teve várias insurgências populares a partir de 2008, respeitadas as particularidades

e conforme região da terra, mas sempre tendo a crise econômica, democrática ou

institucional como ponto central das insurgências.

Também, mencionamos o ocorrido nos Estados Unidos. É sabido por todos

que os Estados Unidos da América – EUA é a maior potência econômica mundial,

sendo que os acontecimentos econômicos ocorridos nos EUA impactam diretamente

quase todas as demais nações. Nos idos de 2008, ocorreu um colapso no sistema

de crédito interbancário americano, que teve como principais causas a quebra da

bolsa de valores, a crise das multinacionais e do mercado imobiliário. Tal crise

espalhou-se, rapidamente, por todo o mercado financeiro internacional,

desdobrando-se em uma crise econômica internacional.

Com um cenário tão caótico, os americanos perpetraram o surgimento de um

movimento conhecido como Occupy Wall Street156 que indagava o próprio sistema

capitalista e a acumulação de riquezas, tal movimento ocupou a principais vias de

Wall Street.

Os manifestantes expandiram seus protestos, buscando justiça econômica, e,

voltando-se contra a cobiça empresarial, a corrupção do sistema político e a

desigualdade, dentre outros temas. Importa mencionar que essas mobilizações e

156 OCCUPY WALL STREET. The and of protest: a new playboy for revolution from the co-creator of occupy wall street. Disponível em: <http://occupywallst.org/>. Acesso em: 28 jul. 2016.

Page 107: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

105

protestos sociais foram além das fronteiras americanas, pois tomaram dimensões

globais a partir dos elementos regionais de cada lugar; contudo, a proliferação

somente foi possível em decorrência do uso da internet e das redes sociais, que

transformam manifestações regionais em transnacionais.

Conforme mencionado anteriormente, (Primavera Árabe de 2011: redes

sociais como elemento de revolução democrática no Oriente Médio), tivemos a

derrubada de ditaduras no Egito, o que se espalhou para Tunísia, Líbia e Iêmen.

Posteriormente, evolui para a Europa, principalmente, com o “movimento dos

Indignados” na Espanha, tendo ocorrido manifestações, também, em Portugal,

Grécia, e outros países. Já, aqui na América Latina, tivemos, no Chile, a luta contra

os cortes e privatização da Educação.

Vários foram os motivos das outras nações, mas da mesma forma que

ocorreu aqui no Brasil, a crise social, política, econômica e financeira, que motivou o

aumento significativo do desemprego em especial da classe mais jovem que se

configura como a “Geração Z”, sempre figuraram como pano de fundo das

manifestações.

Foi justamente a “Geração Z” que se organizou pelas redes sociais e foram às

ruas, portando cartazes, escritos à mão, sem uso de megafones ou carros de som,

na maioria dos protestos, que desencadeou um sentimento coletivo, repise-se, a

proliferação dos ideais defendidos pela “Geração Z” foram propagados pelas novas

formas disponíveis na rede mundial de computadores, ou seja, utilizaram as redes

sociais da internet, principalmente, – Facebook e Twitter, que viabilizaram a

disseminação viral para todo o mundo de forma instantânea.

Assim, como ocorreu mundo afora, no Brasil não foi diferente e uma das

principais características das manifestações brasileiras foi a convocação por meio de

redes sociais e a participação massiva de jovens universitários e de ensino médio,

que, em pouco tempo, ganharam o apoio de outras classes, especialmente, quando

o movimento começou a tomar as principais avenidas dos grandes centros

comerciais, principalmente, em São Paulo.

Com números de manifestantes, até então nunca vistos, o Governo de São

Paulo determinou que a polícia interviesse de forma mais enérgica. De tal modo que

a polícia militar, principalmente, passou a empregar métodos ostensivos e violentos

Page 108: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

106

contra os manifestantes, o que tornou a cobertura midiática muito maior, o que

inflamou ainda mais a população a sair para as ruas. Conforme descreve Ermínia

Maricato:

Os atos que se iniciaram contra o aumento nas tarifas dos ônibus acabaram por levar centenas de milhares às ruas em São Paulo no dia 17 de junho de 2013, em solidariedade à ideia e repúdio à violência com a qual manifestantes e jornalistas haviam sido espancados e presos pela Polícia Militar dias antes, na quinta-feira, 13 de junho. Uma massa heterogênea, descontente, sob um guarda-chuva de uma pauta bastante concreta e objetiva. Que, dias depois, em 19 de junho, foi atendida após a revogação do aumento na tarifa dos transportes públicos informados pelo governador Geraldo Alckmin e pelo prefeito Fernando Haddad.

Uma manifestação de rua, dois dias antes, reunindo mais de 200 mil pessoas, acabou por mudar o perfil dos que estavam protestando em favor da redução da tarifa. O chamado, feito via redes sociais, trouxe as próprias redes sociais para a rua. Quem andou pela Avenida Paulista percebeu que boa parte dos cartazes eram comentários tirados do Facebook e do Twitter.157

Após as atrocidades cometidas pela polícia, que eram transmitidas online

pelas redes sociais, a grande mídia passou a dar maior cobertura às manifestações

e dessa forma em pouco tempo esse acontecimento sociopolítico ganhou a atenção

dos jornais de diversos países e, apoiados pelas redes sociais, alcançaram o mundo

por um todo, como outrora ocorreu na Primavera Árabe, acima esculpida.

Nessa toada, as manifestações tomaram proporções nunca imaginadas, pelos

governantes, pelos representantes políticos e até mesmo pelos próprios

manifestantes.

As jornadas de junho trouxeram um vigor novo ao cenário político do país, já

que provocaram novas formas de participação da sociedade na política, além de

novas formas de mobilização, por meio da utilização das redes sociais como uma

das principais ferramentas de convocação da massa, tornando a juventude, os

protagonistas desses manifestos.

Nós só testemunharíamos mais claramente a dimensão dessa revolução nos dias que viriam. A mudança nas comunicações foi uma das mais impressionantes que presenciamos nas ruas. Os celulares iriam ajudar a descrever a realidade partindo de variadas visões das pessoas que estavam nas ruas. Transformariam também todos os presentes em potenciais jornalistas. E mais. Cada dono de celular poderia virar protagonista de sua própria notícia, com os selfies em

157 MARICATO, Ermínia. Cidades rebeldes: passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Carta Maior, 2013. p. 112.

Page 109: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

107

protestos colocados no dia seguinte na timeline do Facebook.158

As redes sociais tiveram papel fundamental nessa abrangência, pois diferente

de outras manifestações do passado, estas conseguiram atingir um público muito

maior em pouquíssimo tempo, já que eram convocadas por meio da criação de

páginas e canais de redes online, tornando, assim, a comunicação muito mais eficaz

e eficiente, ou seja, através de um canal de comunicação que independe do controle

das grandes mídias, as informações se propagavam em tempo real, alcançando boa

parte da população, já que grande parte dela está conectada às novas tecnologias.

Com isso, as manifestações ganharam força, entusiasmo e magnitude em todo o

país.

Assim sendo, as manifestações ocorridas em junho de 2013 no Brasil, criaram

a figura do cidadão que utiliza as redes sociais para expor, apoiar, refutar, impugnar,

ou seja, debater sobre os rumos das questões sociopolíticas da nossa nação e esse

cidadão antenado denominamos de e-cidadão, ou seja, um cidadão que além de

estar envolto nas novas tecnologias, também, vai às ruas.

Dessa forma, durante as “manifestações de junho” ou “jornadas de junho”, as

redes sociais tornaram-se ferramentas de mobilização cidadã, já que, sem sombra

de dúvidas, elas foram o principal catalisador para que os protestos tomassem as

proporções que tomaram.

Durante as manifestações pudemos perceber que não havia uma direção

única e tampouco lideranças de movimentos sociais já conhecidos no panorama

político e com elas, foi possível notar uma grande diversidade de pensamentos e

posições.

Uma característica importante desses protestos que se tornou uma marca, foi

o uso de cartazes feitos à mão, expondo as mais diversas reclamações e

reivindicações, grande parte delas extraídas das redes sociais, o que comprova a

variedade de pensamentos e posições sobre a realidade brasileira, bem como a

influência das redes sociais nessa nova forma de participação democrática.

Tantas reivindicações diferentes demonstram a insatisfação da população

com a forma de representação política, com a qualidade das políticas públicas e,

158 SOLANO, Esther. Mascarados: a verdadeira história dos adeptos da tática Black Blocs. São Paulo: Geração Editorial, 2014. p. 43.

Page 110: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

108

principalmente, com o comportamento dos representantes políticos, deixando clara a

necessidade de mudanças no cenário político do país. Faz-se urgente haver sintonia

entre as políticas públicas e as necessidades da população.

A partir das jornadas de junho, gerou-se, na população, maior cobrança pela

participação na política. Cada vez mais serão exigidos serviços públicos de

qualidade, bem como, ética e honestidade dos representantes políticos, e tal

transformação somente alcançou tamanho antes inimaginável por causa do uso das

redes sociais.

Contudo, além do abuso por parte da polícia, tivemos, também, abusos, sem

precedentes, causados pelos denominados Black Blocs. Apesar disso, os

“mascarados” não receberam apoio da população, muito pelo contrário, o que

significa a evolução da concepção sobre democracia por parte de boa parte da

população.

Ante o exposto, resta evidente que o e-cidadão, além de antenado e vinculado

às redes sociais, não coaduna, na sua maioria, com atos violentos, eis que buscam

a efetivação da democracia, já os Black Blocs, buscam, tão somente, a anarquia.

Vejamos alguns pontos sobre os Black Blocs a seguir:

4.4.1 Os Black Blocs

Entendemos que a “jornada de junho” foi o despertar para uma nova forma de

participação política e social. Surgiu a figura do e-cidadão, indivíduo adstrito às

redes sociais, na grande maioria apartidário, que busca concretizar a tão sonhada

igualdade por meio da democracia.

Todavia, tivemos na “jornada de junho”, além do surgimento do e-cidadão, o

reaparecimento dos Black Blocs, ou mascarados. Estamos certos de que, boa parte

dos mascarados, divergiu dos demais manifestantes, uma vez que empregavam

violência e táticas que não receberam apoio da população, vindo os próprios

manifestantes, em dado momento, refutar os atos dos Black Blocs anarquistas, não

podemos generalizar, e, não é essa nossa intenção, ou seja, apenas boa parte dos

mascarados.

Page 111: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

109

Os Black Blocs ganharam ampla notoriedade no país com as “jornadas de

junho de 2013”, entretanto, importa frisar que essa tática não surgiu, e, não é tática

exclusiva do Brasil, porquanto, remonta o aparecimento de tais táticas no final do

século XX, com base na contracultura punk e de extrema esquerda ou

ultraesquerda. Teria aparecido em janeiro de 1991, na América do Norte, em

manifestação contra a Guerra do Golfo, vejamos o quanto elucida por Francis

Dupuis-Déri:

A tática dos black blocs se disseminou nos anos 90, sobretudo através da contracultura punk e de extrema esquerda ou ultraesquerda, via fanzines, turnês de bandas punks e contatos pessoais entre ativistas em viagens. Acredita-se que tenha surgido pela primeira vez na América do Norte em janeiro de 1991, durante manifestação contra a primeira Guerra do Golfo. O prédio do Banco Mundial foi alvejado e janelas foram quebradas.159

Já no Brasil, André Takahashi afirma que o primeiro sinal de propaganda

Black Bloc ocorreu no início dos anos 2000, durante o movimento denominado

“antiglobalização”, contra a Área de Livre Comércio das Américas:

O primeiro sinal de propaganda Black Bloc no país ocorreu no início dos anos 2000, durante o surgimento do movimento anticapitalista global (antiglobalização), mas foi descartado pelos ativistas autônomos da época por avaliarem a ação direta não violenta, manifestada principalmente nos 139 protestos contra a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), estrategicamente melhor para o cenário brasileiro. Anos depois essa opção pela ação direta não violenta combinada com trabalho de base, organização horizontal e uso intensivo da internet influenciou a criação do MPL e outros movimentos autônomos, como a Bicicletada, o Centro de Mídia Independente e o Rizoma de Rádios Livres.160

Em que pese, os Black Blocs tiveram seu embrião vinculado ao final do século

passado e somente em 2013, aqui no Brasil, se tornaram, efetivamente, conhecidos;

contudo, não restaram evidentes quais eram seus ideais e suas causas.

Nesse tocante, Jairo Costa, aduz que os objetivos dos Black Bloc são: a)

promover grandes prejuízos financeiros às empresas identificadas com o sistema

capitalista; b) participar de grandes batalhas, praticando o famoso bater e correr; c)

participar de ações contra o G8 (grupo dos 8 países mais ricos do mundo), vejamos:

159 DUPUIS-DÉRI, Francis. Black Bloc. São Paulo: Veneta, 2014. p. 50. 160 TAKAHASHI, André. O Black Bloc e a resposta à violência policial. Revista Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-blackk-bloc-e-a-resposta-a-violencia-policial-1690.html>. Acesso em: 19 jun. 2016.

Page 112: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

110

Um dos objetivos dos Black Bloc sempre foi promover grandes prejuízos financeiros às empresas identificadas com o sistema capitalista. Seus ativistas não hesitam em enfrentar diretamente as forças policias que veem como “o braço armado do capital”. Outra característica do Black Bloc é seu comportamento diante de grandes batalhas urbanas, movimentando-se concentrados, atacando e dispersando. Em outras palavras, praticando o famoso bater e correr. A tática dos Black Bloc acabou por conquistar os corações de milhares de ativistas mundo afora, sendo empregada nos mais diversos lugares, como em Chipas, no México, nas manifestações contra a invasão do Iraque, assim como as ações contra o G8 (grupo dos 8 países mais ricos do mundo).161

A tática Black Blocs, pós-junho de 2013, logrou diversos adeptos em nosso

país, a título de exemplificação, se utilizar a ferramenta de busca do Google – mais

conhecida como “dá um Google” – e digitarmos “Black Bloc Facebook Brasil”, temos

essa resposta: “Aproximadamente 1.340.000 resultados (0,33 segundos)”,162 isso,

por si só, já demonstra o quanto o assunto é comentado.

Encontramos no “Facebook” diversas páginas e comunidades dos Black

Blocs, temos, e.g., “Black Bloc Brasil”163; “Black Bloc SP”164; “Black Bloc RJ”165. Na

grande maioria das páginas e comunidades do Facebook, os Black Blocs se definem

como apartidários, contra o autoritarismo, contra o governo, se definem como

anarquistas; entretanto, não podemos generalizar.

Nem todos os participantes de Black Blocs são anarquistas autodeclarados. No Egito, por exemplo, podem ser ativistas políticos ou torcedores de futebol, ou fãs de bandas de heavy metal. Entretanto, como diz o professor Mark LéVine, a Tahrir [praça pública central no Cairo, que protagonizou ajuntamentos a partir de 2011 de milhares de pessoas contra o novo governo da Irmandade Mulçumana] continua sendo em muitos aspectos o símbolo das ideias de horizontalismo e auto-organização que estão no centro da teoria e da prática do anarquismo moderno.166

No Brasil não é diferente, ou seja, não podemos atribuir a todos os “Black

Blocs” a caricatura de anarquista, porém, os atos violentos remetem a essa

concepção.

161 COSTA, Jairo. A tática do Black Bloc. Revista Mortal, out. 2010, p. 10 162 GOOGLE. Black Bloc. Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=blackk+bloc +facebook+brasil&ie=utf-8&oe=utf-8&client=firefox-b&gfe_rd=cr&ei=_yi6V4DeIYeF8QeAy6yQCA>. Acesso em: 21 ago. 2016. 163 FACEBOOK. Black Bloc. Disponível em: <https://www.facebook.com/Blackk-Bloc-Brasil-3 53035154737576/>. Acesso em: 21 ago. 2016. 164 FACEBOOK. Black Bloc. Disponível em: <https://www.facebook.com/Blackk-Bloc-SP-18 3027485203077/>. Acesso em: 21 ago. 2016. 165 FACEBOOK. Black Bloc. Disponível em: <https://www.facebook.com/BlackkBlocRJ/>. Acesso em: 21 ago. 2016. 166 DUPUIS-DÉRI, Francis. Black Blocs. Trad. Guilherme Miranda. São Paulo: Veneta, 2014. p. 55.

Page 113: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

111

Algumas medidas foram tomadas, por exemplo, no Estado de São Paulo foi

promulgada a Lei 15.556, de 29.08.2014, que com fulcro de garantir as liberdades

constitucionais de manifestação do pensamento (art. 5.º, IV) e de reunião, (art. 5.º,

XVI) proibiu o uso de máscara, ressalvando apenas a sua utilização em

manifestações e reuniões culturais incluídas no calendário oficial do Estado.

Proibiu, também, o uso de armas de fogo, armas brancas, objetos

pontiagudos, tacos, bastões, pedras, armamentos que contenham artefatos

explosivos e outros que possam lesionar pessoas e danificar o patrimônio público ou

particular, outrossim, condicionou a realização das manifestações e reuniões

públicas à prévia comunicação às Polícias Civil e Militar.

Em que pese a ausência de sanções para a violação das referidas restrições,

ficou previsto a atuação das Polícias Civil e Militar para a preservação da ordem

pública e social, da integridade física e moral dos cidadãos, do patrimônio público e

particular, além da fiel observância do cumprimento da norma.

É muito comum encontrar relatos, em especial nas redes sociais, de que a

violência policial alicerçou a disseminação descentralizada de uma “tática Black-

bloc”, como justificativa moral para tais atos, tendo seu início das “jornadas de junho

de 2013 no Brasil”.

4.4.2 Depois das jornadas de junho de 2013

As redes sociais desempenharam papel ímpar nas jornadas de junho de

2013, conforme elucidado anteriormente, eis que alastraram um sentimento de

solidariedade, de forma instantânea aos manifestantes paulistas, que motivou a

população de diversas cidades brasileiras a marcarem manifestações (Belém,

Brasília, Campinas, Curitiba, Fortaleza). Contudo, não ficaram as manifestações

somente envoltas na questão do abuso das tarifas dos transportes públicos,

porquanto, tal situação fez desabrochar outros desagrados contra os serviços

públicos, tais como educação e saúde, aliados aos gastos bilionários com os

Estádios da Copa do Mundo e isso ocasionou à ida de milhares de pessoas às ruas.

Tendo como base a causa primeira, ou seja, o aumento abusivo das tarifas

dos transportes públicos, o recuo por partes dos governadores e prefeitos,

Page 114: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

112

demonstra que as “jornadas de junho de 2013”, foram compreendidas, já que

medidas foram adotadas, ou seja, foi a primeira resposta por parte dos governantes

aos manifestos ocorridos.

Marco Aurélio Nogueira afirma que o recuo dos governantes comprova a

força do movimento e, ao mesmo tempo, a fragilidade do sistema político brasileiro,

uma vez que argumenta:

O recuo dos prefeitos e governadores no caso das tarifas prova ao mesmo tempo a força do movimento e o despreparo do sistema político. Pode ser um exagero dizer isso, mas tudo leva a crer que será difícil que se consiga continuar a governar como antes. O silêncio dos políticos foi constrangedor.167

Tantos outros temas, além dos protestos envoltos no transporte público,

surgiram nas jornadas de junho de 2013, não tendo agenda prévia ou liderança, os

questionamentos referentes aos gastos com a Copa do Mundo de 2014, que

contrapunham aos gastos com as escolas, hospitais, gerando a carência de

qualidade, implicou uma insatisfação nos manifestantes os quais pediam, nas redes

sociais e em seus cartazes nas ruas, que fosse atribuído aos serviços públicos o

denominado “Padrão FIFA”. A corrupção, também foi tema recorrente das

manifestações, em especial, lá no início, o grito contra a PEC que retirava os

poderes de investigação do Ministério Público.

Desses manifestos, vários slogans surgiram, tais como “Não é por 20

centavos.”; “O Gigante Acordou.” Vem! Vem pra rua! Vem!”.

Os governantes deixaram de lado o silêncio que assolava a população e, no

dia 21 de junho de 2013, a presidente Dilma Rousseff, utilizando-se da rede nacional

de rádio e de televisão, realizou um pronunciamento168 de 10 (dez) minutos, que se

tornou o assunto mais discutido no Twitter.

O Discurso da presidente Dilma Rousseff se tornou rapidamente o assunto mais discutidos no Twitter. As hashtags #CalaABocaDilma e #TamoJuntoDilma assumiram o topo do Trending Topics Brasil, os assuntos mais comentados da rede social. As mensagens marcadas como #CalaABocaDilma tinham se tornado o assunto mais discutido Trending Topics mundial e o #TamoJuntoDilma sequer figurara entre os dez itens dessa mesma lista.

167 NOGUEIRA, Marco Aurélio. As ruas e a democracia. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira; Rio de Janeiro: Contraponto, 2013. p. 71. 168 YOUTUBE. Pronunciamento Dilma Rousself. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=xETRrVw8rLI>. Acesso em: 25 maio 2016.

Page 115: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

113

No grupo contra a presidente, as três principais críticas eram referentes à vinda de médicos estrangeiros para o Brasil, a corrupção e ao fato de Dilma não ter feito nenhuma referência à PEC 37. Entre os apoiadores, os destaques foram em relação aos 100% da verba do Pré-sal para a educação, a reforma política e ao trecho em que Dilma lembrou as lutas contra a ditadura.169

Marco Aurélio Nogueira sobre o tema diz:

Reflexo claro disso foi o discurso de 21 de junho. Dilma foi firme, calma e equilibrada. Não anunciou nenhuma guinada para a esquerda ou para o centro. Se o discurso tiver de ser criticado, não é por ter sido moderado e tranquilizador, atento aos ruídos das ruas. Mas por ter sido vazio de propostas e ruim na comunicação. Por mostrar um governo que não sabe bem o que deve ser feito para dar um passo à frente.170

Várias outras tentativas de solucionar os problemas apontados na jornada

de junho foi tema de palanque político, todavia, em 2014, os jornais apontavam,

como herança das manifestações, a percepção de que as manifestações podem dar

resultados; o papel, sem igual, das redes sociais para articulação e engajamento das

pessoas, bem como a proliferação dos Black Blocs.

De maneira resumida, há três “heranças” dessa onda de protestos: a percepção da sociedade de que sua mobilização pode dar resultado, a capacidade de articulação e de engajamento das pessoas na rede social que pode chegar às ruas e a proliferação do uso das táticas black bloc em todas as manifestações a partir de então.171

A Copa do Mundo de Futebol foi motivo de manifestações Brasil afora, antes

e durante sua realização e, como dito, os manifestantes pediam nas redes sociais e

em seus cartazes nas ruas que fosse atribuído aos serviços públicos o denominado

“Padrão FIFA”. Contudo, mesmo diante de tanta adversidade no cenário pátrio,

frente às novas formas de manifestações promovidas pelas redes sociais, e grandes

protestos contra o megaevento esportivo, a Presidente Dilma se reelegeu na eleição

mais apertada da historia.172

Com o país divido, veja, por exemplo, a situação acima mencionada em

relação às eleições, as manifestações não cessaram, sendo que em 2015, em várias

169 TWITTER. Discurso. Disponível em: <http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2013/06/21 /interna_politica,410658/discurso-de-dilma-se-torna-o-assunto-mais-discutido-no-twitter.shtml>. Acesso em: 25 maio 2016. 170 Ibidem, p. 75. 171UOL. Manifestações de junho de 2013: Qual é o saldo dos protestos um ano depois? Disponível em: <http://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/manifestacoes-de-junho-de-2013-qual-e-o-saldo-dos-protestos-um-ano-depois.htm>. Acesso em: 25 maio 2016. 172 UOL. Eleições. Disponível em: http://eleicoes.uol.com.br/2014/noticias/2014/10/26/dilma-cresce-na-reta-final-e-reeleita-e-emplaca-quarto-mandato-do-pt.htm. Acesso em: 25 maio 2016.

Page 116: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

114

cidades do Brasil, a população que tinha nas redes sociais uma grande ferramenta

de organização e captação de adeptos, foi para ruas pedir o fim da corrupção,

reclamou da situação econômica e defendeu o impeachment da presidente:

Uma multidão foi neste domingo, 15, às ruas para protestar contra a presidente Dilma Rousseff, dois meses e meio após ela dar início ao segundo mandato numa acirrada disputa com o PSDB, principal adversário político do PT. Os manifestantes pediram o fim da corrupção, reclamaram da situação econômica e defenderam o impeachment da presidente. Uma minoria falou em intervenção militar. O antipetismo foi a marca comum entre todos os grupos que decidiram protestar. Segundo o instituto Datafolha, essa foi a maior manifestação política registrada no Brasil desde o movimento das Diretas-Já, em 1984. Em São Paulo, a Avenida Paulista foi praticamente toda tomada. Grupos organizados discursaram de carros de som para um público predominantemente vestido de verde e amarelo. Políticos de oposição até participaram dos protestos, mas preferiram ficar à margem, sem comandar palavras de ordem. Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB), principais adversários de Dilma em 2014, comemoraram a mobilização via rede social.173

Estávamos, sem dúvidas, diante de “dois Brasis” que representava uma

ordem social “desorganizada”, movida por indivíduos desencadeados, proprietários

de suas convicções.

Há dois Brasis hoje nas ruas, protestando e se manifestando. Não são somente dois blocos de posicionamentos políticos e ideológicos, ainda que isso esteja claramente presente. São também — e sobretudo — duas configurações de sociedade, expressões tanto de um mundo social que resiste agarrado a certas tradições e a certas “narrativas”, quanto de um mundo social que emerge impulsionado pela “novidade”, pela ausência de disciplina e por “narrativas pós-modernas”. Falando por metáforas: uma sociedade sólida ao lado de uma sociedade líquida, uma ordem social atada a organizações estruturadas à moda antiga — promotoras de comunidades mais “pesadas” — e uma ordem social “desorganizada”, individualizada, movida por enxames de indivíduos soltos, donos de suas cabeças, desagregados, que se reúnem por espasmos momentâneos, razões

flutuantes e lealdades erráticas.174

Esse cidadão, dono da sua consciência, desvinculado de bandeiras

partidárias, em sua maioria, demonstra transformação, causada pelas redes sociais,

ou seja, aquele cidadão alienado, por consequência da ausência de informação, deu

espaço ao e-cidadão que utiliza as redes sociais, para organizar e realizar

173JORNAL ESTADO DE SÃO PAULO. Manifestações. Disponível em: <http://politica.estadao.com. br/noticias/geral,manifestacoes-contra-dilma-levam-multidao-as-ruas-do-pais,1651418>. Acesso em: 25 maio 2016. 174NOGUEIRA, Marco Aurélio. Os dois Brasis e as ruas. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/marco-aurelio-nogueira/os-dois-brasis-e-as-ruas/>. Acesso em: 21 março 2016.

Page 117: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

115

manifestos, que não se prende a falácias, já que é possível a averiguação da

informação que lhe é apresentada, que acredita nessa nova forma de participação

democrática via redes sociais e que se faz cada vez mais presente na

ciberdemocracia.

Tanto que os protestos não cessaram e, em 2016, presenciamos um Brasil

ainda divido, principalmente entre aqueles que defendiam o processo de

impeachment da presidente e aqueles que eram contrários, sendo que, em 13 de

março de 2016, ocorreu a maior manifestação no Brasil de todos os tempos.175

Em 12 de maio de 2016, a Presidente da República Dilma Rousseff foi

afastada temporariamente pelo Senado, e seu Vice, Michel Temer, assumiu

interinamente. Importa lembrar que o então Presidente da Câmara Eduardo Cunha

afirmou, em sua conta no Twitter, que acatou o pedido devido à voz das ruas:

Em seu Twitter, Cunha diz que acolheu o pedido devido à "voz das ruas". Atendendo ao pedido das ruas, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, acolheu o pedido de #impeachment de @dilmabr pic.twitter.com/.176

Engana-se quem pensa que, com o afastamento da Presidente Dilma

Rousseff, as manifestações acabaram. Muito pelo contrário, tornaram-se cada vez

mais presentes em nossas vidas, sendo as redes sociais, nova forma de

manifestação, importante instrumento de transformação, trazendo, repise-se, novo

formato de participação política, pois o e-cidadão, conforme já mencionado, utiliza

das redes para pôr em voga sua opnião em relação aos rumos do nosso Brasil.

Importa lembrar que, tanto a Presidente afastada, quanto seus apoiadores

sempre defenderam que o processo pelo qual passou Dilma Rousseff tratou-se de

um evidente golpe.

No tocante ao golpe, em recente obra, Cláudio de Cicco e Alvaro de Azevedo

Gonzaga, com maestria trazem à baila concepções sobre o tema e argumentam que

existe golpe de Estado: a) quando ocorrer tentativa de mudança de governo de

forma violenta ou não; b) não utilização da democracia; c) quando a articulação

afrontar normas previstas na Constituição:

175 FOLHA DE SÃO PAULO. Protesto. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com. br/poder/2016/03/1749528-protesto-na-av-paulista-e-o-maior-ato-politico-ja-registrado-em-sao-paulo.shtml>. Acesso em: 25 maio 2016. 176UOL. Política. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/12/02/ eduardo-cunha-impeachment.htm>. Acesso em: 25 maio 2016.

Page 118: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

116

Em suma, pode-se dizer que existe um golpe de Estado quando: a) Há uma tentativa de mudança de autoridade Estatal ou governante, violentamente ou não; b) Por meio de via não democrática e excluindo a participação popular; c) Que se articula à revelia das normas constitucionais vigentes, no que tange à previsão de norma permissiva ou base fática ensejadora da consequência normativa. Destarte, nosso entendimento é que um golpe de Estado consiste em uma ruptura institucional que infringe o princípio democrático, assegurado pela

Constituição. 177

Ou autores não se referem ao ocorrido com a Presidente afastada, nem com

o Presidente afastado da Câmara dos Deputados, contudo retratam com

elevadíssima relevância para o momento atual concecpções sobre a “teoria do

golpe”, viabilizando ao leitor entendimento necessário para que tire suas próprias

conclusões sobre o processo de afastamente da chefa do executivo.

Acreditamos que “o depois das jornadas de junho de 2013” ainda não chegou

ao fim e não chegará tão rápido, tanto é verdade que, no início de agosto de 2016,

movimentos sociais organizaram, via redes socias, protestos contra o governo do

vice-presidente em exercício, Michel Temer.

Movimentos sociais e sindicais estão organizando dois atos em protesto contra o governo do vice-presidente em exercício Michel Temer a serem realizados na abertura das Olimpíadas, nesta sexta-feira (5); organização, que engloba entidades como UNE, CUT e MST, promete realizar o "maior escracho da história", além de pedir que a população grite "Fora Temer", após a execução do Hino Nacional e durante do pronunciamento do peemedebista; uma passeata pela sruas de Copacabana também está prevista para acontecer ao longo do dia.178

Durante a abertura das Olimpíadas, o Presidente em exercício, Michel Temer,

foi vaiado durante todo o seu pronunciamento, e cartazes de “Fora Temer”, iguais

àqueles que foram utilizados contra a Presidente Dilma “Fora Dilma", foram vistos

em quase todas as transmissões.

E, para regozijo daqueles que defendiam impeachment, e para desânimo

daqueles que acreditavam se tratar de um golpe, em 31 de agosto de 2016, por

sessenta e um votos favoráveis e vinte contrários, o Plenário do Senado aprovou o

impeachment de Dilma Rousseff179.

177 DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 295-296. 178 BRASIL 247. Movimentos sociais organizam protesto contra temer na abertura da rio 2016. Disponível em: <http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/247362/Movimentos-sociais-organizam -protesto-contra-Temer-na-abertura-da-Rio-2016.htm>. Acesso em: 10 ago. 2016. 179 SENADO FEDERAL. Senado aprova impeachment de Dilma Rousseff. Disponível em:

Page 119: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

117

O impeachmet da ex-Presidente Dilma Rousseff desencadeou uma nova onda

de protestos Brasil a fora, sendo, mais uma vez, utilizadas as redes sociais para

organização, bem como para protestar. O movimentos Frente Povo Sem Medo180 e

Frente Brasil Popular181 encabeçaram a nova onda de mobilização popular pelo

“Fora Temer”, exigindo “Diretas Já”.

Assim, resta evidente o poder de mobilização das redes sociais nessa nova

forma de manifestação, é, sem dúvidas, o principal legado que podemos afiançar

sobre o legado das jornadas de junho de 2016, ou seja, a efetivação do e-cidadão e

da ciberdemocracia, que ocorre pela redes sociais.

4.5 Rolezinhos: manifestação de inclusão social dos jovens da periferia

Após os burburinhos de 2013, deparamo-nos com diversas outras formas de

manifestações populares por todo o Brasil. Não sabemos, ao certo, se em

continuidade à “jornada de junho de 2013”, mas, certamente, impulsionadas pelo

grande alcance que tiveram.

Os motivos já não eram somente políticos, porquanto perceberam,

principalmente, os jovens – Geração Z – que as redes sociais é um excelente

instrumento para proliferação de manifestos de natureza diversas.

No final de 2013 e início de 2014, em especial na Cidade de São Paulo182,

tivemos a realização de vários manifestos populares organizados pelas redes sociais

<http://www12.senado.leg.br/noticias/audios/2016/09/senado-aprova-impeachment-de-dilma-rousseff>. Acesso em: 1 ago. 2016. 180 Frente Povo Sem Medo. Disponível em: https://www.facebook.com/groups/1043663679060107/ Acessado em 5 agosto 2016. 181 Frente Brasil Popular. Disponível em: https://www.facebook.com/FrenteBrasilPopular/?fref=ts Acessado em 5 agosto 2016. 182 A primeira iniciativa a ganhar repercussão aconteceu no Shopping Metrô Itaquera, Zona Leste de São Paulo, em 8 dezembro. Algumas lojas fecharam com medo de saques e o centro comercial encerrou o expediente mais cedo. (...) Em 8 de dezembro, o “rolezinho” no Shopping Metrô Itaquera reuniu cerca de seis mil adolescentes, segundo a administração do centro comercial. Houve tumulto, a polícia foi acionada e o shopping fechou uma hora e meia mais cedo. Na época, pessoas que se identificaram como clientes e lojistas comentaram na página do Facebook do shopping que houve arrastão e furtos naquela noite de sábado. A administração negou a onda de furtos. Na época, o G1 apurou que três pessoas foram presas por roubo. (...)Eventos em 2014 O primeiro encontro deste mês de janeiro aconteceu no Shopping Tucuruvi, na Zona Norte, em 4 de janeiro. O tumulto fez com que o centro de compras encerrasse o expediente três horas mais cedo. Não foram registrados furtos ou prisões. In: G1. Conheça a história dos 'rolezinhos' em São Paulo. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/01/conheca-historia-dos-rolezinhos-em-sao-paulo.html>. Acesso em: 18 maio 2016.

Page 120: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

118

e concretizados em shoppings, praças, parques públicos e outros espaços; tais

manifestos populares ficaram conhecidos como “rolezinhos”.

Desse modo, podemos definir os “rolezinhos” como sendo uma modalidade

de manifesto apolítico, formado por adolescentes que se ajustavam via redes sociais

para se encontrarem em shoppings, praças, parques públicos e outros espaços.

A revista Carta Capital publicou em 30/03/2014 entrevista realizada com o

coordenador da Juventude da prefeitura de São Paulo, Gabriel Medina. Alguns

trechos demonstram o caráter apolítico dos rolezinhos, vejamos:

Assunto da moda no começo deste ano, quando levaram milhares de adolescentes a se concentrar nos estacionamentos e praças de alimentação dos shoppings centers da cidade - foram 6 mil só no Shopping Metrô Itaquera - os rolezinhos mudaram de endereço. Mesmo sem a mesma atenção nos noticiários, seguem mobilizando a juventude, principalmente das periferias de São Paulo, em busca de diversão, cultura, consumo e ostentação.183

Podemos extrair, de fato, o caráter apolítico dos rolezinhos, bem como

podemos extrair o quanto as redes sociais têm influenciado nessas novas formas de

manifestos, no caso, cultural, ou para alguns a busca pela inclusão dos jovens das

periferias nos meios sociais.

Demonstrando em perfil, o Jornal Folha de São Paulo, publicou em

15/01/2014, reportagem intitulada – ‘Rolezinhos’ surgiram com jovens da periferia e

seus fãs –. Afirma o jornal que:

“Rolezinhos” são encontros marcados por redes sociais que atraem centenas de jovens a shoppings. Eles entram pacificamente nos locais, mas, depois, costuma promover correria assustando lojistas e frequentadores184.

Em todas as notícias realizadas sobre o tema em questão, e não foram

poucas, ao passo que todas as grandes mídias (escrita, televisiva, rádios e

principalmente pela internet) dispensam comentários, um núcleo se pode concluir,

ou seja, ou “rolezinhos”, são frutos das redes sociais, cujos participantes,

normalmente, tinham um perfil. Eram formados por jovens de baixa renda, na

183 MELO, Mariana. Rolezinhos migram do shopping para as praças em SP. Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/sociedade/feitos-em-parques-rolezinhos-funcionam-como-estrategia-de-ocupacao-das-ruas-em-sao-paulo-6724.html>. Acesso em: 18 maio 2016. 184 FOLHA DE SÃO PAULO. ‘Rolezinhos’ surgiram com jovens da periferia e seus fãs. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1397831-rolezinhos-surgiram-com-jovens-da-periferia-e-seus-fas.shtml>. Acesso em: 19 maio 2016.

Page 121: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

119

maioria negros, querendo se divertir. Por isso, afirmamos que, nas entrelinhas, o que

se buscava, de verdade, era a inclusão social.

Nesse contexto, Eudes Teotônio Rodrigues e Meire Aparecida Furbino

Marques aduzem:

Acontece que, tomando por base a sociedade brasileira, a população aumentou, a renda das famílias cresceu, o acesso aos meios de comunicação foi facilitado e, hoje, os encontros modernos se dão sob a forma de “rolezinhos”. Afinal, o que significa “rolezinho”? O termo, que tem provocado variadas interpretações, não é tão novo. O grupo “Mamonas Assassinas”, em meados de 1990, já o descrevia como um passeio para namorar, no novo local denominado Shopping Center, como diz a letra da música que tanto sucesso fez à época: (...) Tais encontros, marcados via internet, ganharam visibilidade social na medida em que o boom do crédito, a diminuição do desemprego e o crescimento da classe C, possibilitou que jovens até então desconhecidos da classe economicamente mais favorecida, requeressem seu lugar ao sol, ou melhor, ao shopping. Ou seja, os “rolezeiros são os filhos da classe C, do pequeno milagre econômico da segunda metade da década passada”. (BEGUOCI, 2014, p. 7) Se os ditos “rolezinhos” são aparentemente inofensivos, por que, então, os representantes dos Shoppings Centers têm buscado a tutela do Poder Judiciário para, defendendo seus direitos, obstar a realização dos “encontros” no interior do estabelecimento comercial?. 185

Do exposto, resta evidente que as redes sociais atingiram diversos nichos e

grupos sociais envoltos em questões políticas e apolíticas, bem como é a mais atual

forma de participação política; todavia, vários são os desafios contemporâneos para

a real efetivação dos direitos do e-cidadão, uma vez que a exclusão digital é uma

triste realidade a ser superada, bem como a validação das petições digitais.

Assim, no próximo capítulo falaremos sobre os principais desafios

contemporâneos para efetivação dos direitos do e-cidadão por intermédio das redes

sociais.

185 RODRIGUES Eudes Teotônio; MARQUES, Meire Aparecida Furbino. Os “rolezinhos” vistos à luz da constituição no estado democrático de direito. In: Conpedi. Disponível em: <http://publicadireito.com.br/artigos/?cod=0ce68201e60fced9>. Acesso em: 18 maio 2016.

Page 122: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

120

5 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DO E-

CIDADÃO

Vários são os desafios na contemporaneidade que enfrentam o e-cidadão,

dessa forma, para tratá-los, importa frisar que a internet há algum tempo deixou de

ser uma simples rede de computadores, tornou-se um novo ecossistema social tão

presente em nossas vidas que, atualmente, não nos imaginamos sem sua presença.

A facilidade e a velocidade de comunicação desse meio tornaram o acesso à

informação mais democrático, criando, assim, novas formas de relacionamentos,

deram voz àqueles que, de certa forma, eram excluídos, permitindo a integração

entre ideias e ideais, além de permitirem uma participação efetiva dos cidadãos na

discussão do cenário político do país, expondo suas necessidades, inquietações e

insatisfações por meio das redes sociais.

Nessa toada, no presente capítulo falaremos sobre o e-cidadão como retrato

do cidadão contemporâneo que vê nas redes sociais um forte instrumento de

efetivação da democracia. Todavia, alguns desafios precisam ser superados,

conforme adiante será esculpido.

5.1 E-cidadão

Com o advento da internet e das redes sociais, os fatores geográficos e

sociais deixaram de ser limitadores para o agrupamento e a discussão política.

Por intermédio da internet, as pessoas conseguem facilmente se agrupar por

interesses comuns, sejam eles ideológicos, políticos ou sociais, mesmo estando

geograficamente distantes ou sendo de diferentes grupos ou classes sociais. Essas

novas tecnologias da informação estão mudando, inclusive, as formas de

manifestações políticas da sociedade, fato já mencionado anteriormente, visto que

as últimas manifestações políticas ocorridas no Brasil foram principalmente

convocadas através das redes sociais.

Page 123: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

121

Destarte, percebemos a formação, a transformação do cidadão para o e-

cidadão, que se deu pela democratização do acesso à rede mundial de

computadores, com marco inicial da revolução tecnológica.

Luciana Cristina de Souza aduz:

Defende-se a hipótese de que o exercício da capacidade da resiliência (e sua aplicação como princípio basilar do reconhecimento democrático) tanto enseja uma comunicabilidade de melhor qualidade entre a autoridade pública e a Sociedade Civil, quanto propicia a horizontalização das tomadas de decisão de interesse dos cidadãos. Após delinear o novo perfil da democracia no Brasil, explica-se o que é e como se aplica o princípio da resiliência estatal, considerando sua importante função para o ordenamento jurídico na atualidade tomando-se como exemplo a chamada e-democracia, ou democracia digital, meio de comunicação que tem crescido e se destacado na última década e pelo qual foram articuladas e convocadas muitas das recentes manifestações nacionais.186

Através da troca de informações entre os relacionamentos virtuais, o e-

cidadão foi se criando e, hoje, desponta como uma realidade, contudo, as redes

sociais, não retiraram do e-cidadão anseio pelas praças públicas, muito pelo

contrário apenas fomentou uma melhor organização e proliferação das convocações

para os manifestos em ruas, avenidas, parques, praças públicas.

Na verdade, as redes sociais possibilitaram uma comunicação transnacional o

que deixou, de certa forma, muito mais intensa as relações com aqueles com quem

mantemos, também, relações reais, do que com quem possuímos relacionamentos

apenas virtuais, porquanto, entendemos o e-cidadão como um indivíduo virtual mas

real, ou seja, utiliza as redes e também as ruas.

Entretanto essa realidade virtual, ainda, mesmo na atualidade, não é uma

realidade de todos, ao passo que um dos maiores impedimentos para a efetivação

plena do e-cidadão é a exclusão digital. Porém, essa realidade vem mudando

gradativamente com as ações implementadas pelo governo federal, além dos

programas de inclusão digital, criados nas esferas municipais e estaduais, há ações

fomentadas pela iniciativa privada, exemplo das lans house e por ONG’s espalhadas

por diversos estados, além de milhões de iniciativas voluntárias.

Para Manuel Castells, o desenvolvimento sem internet na era da participação

186 SOUZA Luciana Cristina de. Análise crítica da legitimidade do estado a partir da aplicação do princípio da resiliência. Direito, governança e novas tecnologias. CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara; Florianópolis: CONPEDI, 2015. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/66fsl345/81s48682/0cO30v9hDfn0KKv1.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2016.

Page 124: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

122

seria o equivalente à industrialização sem eletricidade na era industrial. Sustenta,

ainda, que, sem uma economia e gestão baseadas na internet, qualquer país tem

pouca chance de gerar os recursos necessários para cobrir suas necessidades de

desenvolvimento num terreno sustentável, sob todos os aspectos.187

Para melhor entendemos a figura do e-cidadão, temos de averiguar a

pirâmide criada por João Carlos Caribé188, baseada na Hierarquia das necessidades

de Maslow, que pode ser utilizada para descrever as necessidades que devemos

conhecer no decorrer do processo de inclusão digital bem como a construção do e-

cidadão.

Fonte: Caribé (2011)

O autor define cada um dos níveis, conforme abaixo exposto:

Conhecimento tecnológico – conhecimento técnico mínimo necessário para permitir o usuário utilizar um dispositivo computacional. Conexão, acesso – Esta segunda etapa está dentro dos objetivos de infraestrutura e acesso. Interação, participação – É o momento em que o usuário começa a interagir em mídias sociais, é o momento das descobertas que em geral são feitas com pares próximos – laços fortes. Estima, reconhecimento – O usuário já transita com facilidade no novo espaço e tornou-se de fato um integrante, um prosumer que produz e compartilha em busca de estima e reconhecimento.

187 CASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo (Orgs.). A sociedade em rede: do conhecimento à ação política. Belém: Imprensa Nacional, 2005. p. 71. 188 CARIBÉ, J. C. Classes Populares. In: BRAMBILLA, Ana (org.). Para entender as mídias sociais. E-book, 2011. Disponível em: http://designices.com/wp-content/uploads/2011/04/paraentenderas midiassociais.pdf >. Acesso em: 18 ago. 2016.

Page 125: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

123

Autorrealização – O usuário conseguiu produzir relevância junto aos seus pares, e dentro do seu nicho de atuação, é um ciber celebridade, conquistou respeito e admiração.189

Dessa forma, para que os objetivos da inclusão social, bem como a

efetivação do e-cidadão sejam atingidos, faz-se necessário muito mais do que o

simples acesso à internet ou o conhecimento técnico sobre ela, é imprescindível

entendermos como as relações entre os atores desse ecossistema social ocorrem,

ou seja, entender como se dá a relação entre os incluídos e a rede.

Fica evidente que o acesso à cibernética é fator crucial para que a exclusão

digital seja combatida e assim a participação política do e-cidadão seja plena.

Do exposto, podemos concluir que o e-cidadão é o indivíduo contemporâneo

preocupado com as questões políticas e sociais que está interligado com vários

outros indivíduos por meio da rede mundial de computadores e que utiliza as redes

sociais para expor seu ponto de vista, realizar e organizar manifestos, sem, contudo,

abandonar as praças públicas.

5.2 Convocações de manifestações pelas redes sociais: participação política

como expressão da democracia ou desordem?

A forma como o acesso à cibernética impactou nossas vidas é sem

precedentes. A ponto de podemos afirmar que não conseguimos mais viver sem o

uso das novas tecnologias, eis que foram vários os benefícios em todas as esferas

da vida humana.

Um dos principais benefícios, no que tange a relações interpessoais, foi as

redes sociais, que têm o condão de aproximar a pessoas, de viabilizar o dialogo, de

transmitir informações de forma instantânea num contexto transnacional, ou seja, as

redes sociais transpuseram barreiras antes inimagináveis, quer pela distância, quer

pelo idioma.

Várias são as redes sociais disponíveis aos indivíduos no ciberespaço, por

exemplo, o Facebook e o Twitter que, junto com as demais redes sociais, mudaram

a forma como nos comunicamos e como ocorrem as mobilizações sociais.

189 CARIBÉ, J. C. Classes Populares. In: BRAMBILLA, Ana (org.). Para entender as mídias sociais. E-book, 2011. Disponível em: http://designices.com/wp-content/uploads/2011/04/paraentenderas midiassociais.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2016.

Page 126: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

124

Se antes a mobilização social levava dias, semanas ou até meses, com o

advento das redes sociais, as mobilizações sociais acontecem em fração de

segundo, tendo em vista a instantaneidade da comunicação, assim, as redes sociais

são grandes facilitadoras para a viabilidade de sincronização de pessoas

desconhecidas, ou não, mas em diferentes locais.

As novas mídias sociais como Facebook e Twitter mudaram o uso da expressão ‘mobilização social”. Essas mídias são grandes facilitadoras uma vez que sincronizam diferentes grupos espalhados num mesmo país ou no mundo, facilitam a coordenação das ações e ajudam a documentar o que está acontecendo. E por mais que questione o grau de ativismo destas redes estudos já apontam que as mídias sociais ao contrário de uma visão comum, estão expondo mais pessoas a questões humanitárias e sociais. As causas políticas talvez sejam a melhor forma de exemplificar os sucessos e os desafios que essas mídias sociais enfrentam e vão enfrentar. Os recentes levantes no mundo árabe foram marcados por mobilização que, no mínimo, foram facilitadas e antecipadas pelo uso das mídias sociais. Se num primeiro olhar, se vê o sucesso para entender as Mídias Sociais, o uso da internet, nas revoltas do Egito e da Tunísia, por outros, sabe-se também que a onda verde invadiu o twitter e o facebook durante a luta do povo Iraniano contra o governo autoritário que se virou contra eles, a partir do momento em que a revolta falhou e estas mesmas mídias servem hoje como banco de dados para a busca e a apreensão de pessoas por esse regime. Mais recentemente, o governo da Líbia, assim que percebeu a mobilização online, bloqueou a internet no país. Mas isto também não é uma novidade histórica e nem a primeira vez que regimes autoritários se apoderam dos meios de comunicação para manter seu poder.190

Temos, então, que as redes sociais ocupam papel central nas recentes

transformações que estamos presenciando, em especial, em relação aos rumos da

política, mas também, em todos os demais aspectos da vida social.

As tecnologias digitais ocupam um papel central nas profundas mudanças experimentadas em todos os aspectos da vida social. A natureza, motivos, prováveis e possíveis desdobramentos dessas alterações, por sua vez, são extremamente complexos, e a velocidade do processo tem sido estonteante. O advento da Internet trouxe diversas mudanças para a sociedade.191

Destarte, as redes sociais digitais podem ser utilizadas para vários fins,

como, por exemplo, para convocação de show, para um jogo, bem como para as

pessoas protestarem por um país melhor:

Com as redes sociais digitais, embora possam ser usadas para fins diversos – para convocação de um show de um artista qualquer, para assistir a um

190 BARRETO, Fernando. Mobilização Social. In: BRAMBILLA, Ana (org.). Para entender as mídias sociais. E-book, 2011. Disponível em: http://designices.com/wp-content/uploads/2011/04/paraentenderas midiassociais.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2016. 191 RECUERO, R. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. Disponível em: <http://www.ichca.ufal.br/graduacao/biblioteconomia/v1/recuero.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2016. p. 24.

Page 127: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

125

jogo etc., para protestar por um país mais justo – como ocorreu no país, vão se criando identidades que extrapolam o tempo e o território, pois as ações por elas desencadeadas extrapolam as fronteiras, fazendo-as cada vez mais fluidas no âmbito das redes virtuais, embora tenham esse caráter indiferente, ou seja, podendo ser usadas para fins diversos.192

A partir das jornadas de junho de 2013, além do surgimento do e-cidadão,

surgiram, também, os Black Bloc, ambos já mencionados anteriormente. Outro

fenômeno também aconteceu com as manifestações vias redes sociais (no próprio

ciberespaço ou organizadas nele), trata-se do uso dos partidos políticos e dos

próprios políticos, seja qual for a sigla, fazem das redes sociais para se

beneficiarem, por intermédio de falácias com promessas, engodos, maiormente com

o “juramento” da efetivação da democracia.

Dessa feita, a utilização das redes sociais, seja para manifestar ou para

realizar convocações de manifestações, como forma de participação política como,

e, por consequente, como expressão da democracia, trouxe benefícios que

sobrepõe os pontos negativos, todavia esses também existem:

Os pontos negativos das convocações para manifestação pelas redes sociais são: 1- Um fato negativo que está acontecendo de maneira cada vez mais intensa com as manifestações que ocorreram no país no período citado, diz respeito às práticas de engodo dos diversos partidos políticos que estão ludibriando, com suas ideologias, a sociedade. (...) 2- Outra característica é que os seus participantes nem sempre são membros de uma mesma cultura. 193

Em que pese a existência de pontos negativos, não podemos negar que foi

graças às redes sociais digitais mencionadas, que surgiu esses novos instrumentos

de comunicação, por meio dos quais as massas ergueram-se contra as iniquidades

civis.

As convocações por esses meios cibernéticos, tais como Facebook e Twitter

que transformaram a participação política como, e, por consequente, democracia,

principalmente pelo e-cidadão e por meio da ciberdemocracia, já que milhares de

192 SANTOS, José Erimar dos.; SANTOS, Valmaria Lemos da Costa. Geografia dos protestos e meio comunicacional: redes sociais digitais e manifestações populares. Revista Movimentos Sociais e Dinâmicas Espaciais. Recife, v. 2, n. 2, 2013. Disponível em: <http://www.revista.ufpe. br/revistamseu/index.php/ revista/article/viewFile/50/92>. Acesso em: 18 ago. 2016. 193 SANTOS, José Erimar; SANTOS, Valmaria Lemos da Costa. Geografia dos protestos e meio comunicacional: redes sociais digitais e manifestações populares. Revista Movimentos Sociais e Dinâmicas Espaciais. Recife, v. 2, n. 2, 2013. Disponível em: <http://www.revista.ufpe.br/revistamseu/index. php/revista/article/viewFile/50/92>. Acesso em: 18 ago. 2016.

Page 128: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

126

manifestantes foram às ruas por meio de convocações, ocorridas via redes sociais,

aspirando, assim, novos espaços de efetividade da democracia e da cidadania, uma

vez que a cibernética permitiu transformações quanto à configuração de organização

social, sendo as redes sociais a arma das mobilizações ocorridas no país.

Como as redes sociais não fazem distinções, uma vez que o acesso é

irrestrito, podemos observar que os Black Blocs também fizeram das redes sociais

seus instrumentos de aparelhamento para suas táticas:

À medida que a violência do Estado era experimentada pelo corpo, captada por câmeras e smartphones, e denunciada nas redes sociais, cada vez mais manifestantes adotaram posições políticas radicais e aderiam à performance e indumentária peculiares à tática Black Bloc. Os pequenos danos ao patrimônio que teriam justificado a violência policial do início de junho multiplicaram-se à medida que um número crescente de jovens passava a vestir máscaras e engarjar-se em gestos iconoclastas de depredação de agências bancárias, prédios públicos, ônibus, viaturas e demais ícones do poder político e econômico.194

Ainda sobre o aparelhamento pelos Black Blocs via redes sociais, temos

que eles se organizavam/organizam principalmente via Facebook, todavia, utilizam

outras redes, também, pois através de marcação de protestos, posts que reforçam a

identidade BB:

Embora não seja um fenômeno novo, muito menos de raiz nacional, a atuação do Black Bloc no Brasil, até por não haver sites ou organização institucional formal, dá-se em boa parte via articulação no Facebook, através de marcação de protestos, posts que reforçam a identidade BB, relatos de manifestações etc. O cenário político em que eles atuam aponta para a emergência da compreensão de novas dinâmicas de atuação de movimentos sociais e de ativismo, que se utilizam das redes digitais. Entre as práticas e apropriações sociais da internet atualmente, o Facebook e outros sites de redes sociais são os mais utilizados no mundo. A ação de compartilhamento no Facebook ou a replicação de mensagens no Twitter, por exemplo, revelam um alargamento nas relações de contato, partilha ou interação entre os usuários, independente dos mesmos pertencerem a uma mesma rede social.195

Para alguns, os atos praticados pelos Black Blocs representavam apenas

desordem, frente à violência e táticas utilizadas, contudo, vamos analisar o quanto

posto por Esther Solano:

194 BEZERRA, Arthur Coelho; GRILLO, Carolina Christoph. Batalha nas ruas, guerra nas redes: notas sobre a cobertura midiática da violência em manifestações. Liinc em Revista. Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 195 – 210, maio 2014. p. 200. 195 CARREIRO, Rodrigo. Black Bloc em ação: reforço de identidade e outras dinâmicas de ativismo no Facebook. Liinc em Revista, v. 10, n. 1, 2014, p. 63.

Page 129: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

127

Às vezes os enfretamentos sociais são enfrentamentos semióticos, de categorias e símbolos. Afinal, quem tem o poder de definir é sempre que impõe sua visão das coisas. A linguagem sempre é uma opção política. Lembro-me da manifestação de 14 de setembro de 2013. Estávamos passando pela avenida Paulista, quando um dos adeptos do Black Bloc, com tom bastante severo, fez uma interpelação direta a um grupo de pessoas. Elas estavam sentadas num bar, olhando para rua, distraídas, leves, fotografando o protesto para, com grande possibilidade, colocar as imagens minutos depois na timeline do seu Facebook, continuando esse neurótico teatro cotidiano. Não nos vão acusar de rebeldes sem causa. Temos uma causa... Por que vocês se acomodam? Você que têm dinheiro, por que ficam aí? Seu silêncio é vandalismo. É que vocês vivem num mundo diferente? Parece que vocês estão vendo uma realidade diferente e não enxergam o que está acontecendo.196

Conforme elucidado no item 1.3.2 (Desordem: ausência de ordem ou ordem

em outra perspectiva), a des"ordem” é na verdade uma ordem em outra perspectiva,

onde o des”ordeiro”, busca tão somente convalidar seu ponto de vista sobre

determinada “ordem”, previamente estabelecida por/para conveniência de quem a

constituiu, sendo imputado a quem pensa contrariamente o “título” de desordeiro,

quando na verdade, apenas, expõe sua forma de pensar em disparidade com a do

outro.

Ou seja, pactuamos do entendimento de que as convocações de

manifestações pelas redes sociais representam uma nova forma de participação

política e a busca pela efetividade da democracia.

Igualmente, conforme bem relatou Esther Solano, defendem uma causa, que

eles acreditam ser a correta. Importa frisar que não concordamos com as táticas e o

aparelhamento utilizado pelos adeptos do Black Bloc, no entanto, não podemos

negar que eles também utilizam as redes sociais para, de alguma forma, efetivar a

democracia, ao passo que não os qualificamos como os propagadores da desordem,

contudo, a ausência de um diálogo mais aprofundado, bem como a ausência estatal

em diversos aspectos, motivou, motiva e motivará pessoas com pensamentos mais

radicais, e esse é mais um gargalo a ser enfrentado, ou seja, ouvir os radicais, pois

no processo democrático o “ouvir” desempenha papel tão importante quanto o

manifestar.

196 SOLANO, Esther. Mascarados: a verdadeira história dos adeptos da tática Black Bloc. São Paulo: Geração Editoral. 2014. p. 103.

Page 130: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

128

5.3 Exclusão digital como obstáculo à cidadania virtual

A questão da exclusão/inclusão digital não é tema apenas envolto nos

acontecimentos do agora, tendo em vista que “em 1992 foi inaugurado o primeiro

Telecentro da América Latina, na cidade de Brusque, em Santa Catarina”197,

demonstrando, assim, a preocupação dos nossos governantes com a exclusão

digital.

Importa frisar que somos uma pátria pioneira no tocante ao sistema de

votação, pois fomos os primeiros no mundo a utilizar o voto eletrônico (e-voting),

conforme anteriormente mencionado (verificar item 1.2.5 A ciberdemocracia), sendo

certo que em 2016 o uso da urna eletrônica fará 20 (vinte) anos, uma vez que sua

primeira utilização se deu na eleição de 1996.

Quatro anos após, mais precisamente no mês de outubro do ano 2000, foi

promulgado Decreto Legislativo que estabeleceu o “Governo eletrônico” que tinha

como objetivo formular políticas, estabelecer diretrizes, coordenar e articular as

ações de implantação do Governo Eletrônico, voltado para a prestação de serviços e

informações ao cidadão, que motivou a proliferação dos telecentros, programa que

representa uma forma de inclusão digital.

O decreto supra foi revogado pelo Decreto nº 8.638198 de 15, de janeiro de

2016, que instituiu a Política de Governança Digital, o que tornou, sem dúvidas, mais

abrangente a busca pela inclusão digital.

Contudo, e-cidadão e a ciberdemocracia, ainda, não atingiram um patamar

desejável, eis que máximo seria utopia. Em decorrência dessa realidade, temos que

reconhecer nem todos estão conectados, a rede mundial de computadores, e por

consequência as redes sociais, tornando a exclusão o grande filão que devemos

romper.

É sabido por todos que o acesso à informação possibilita a todo e qualquer

indivíduo o poder de obter, bem como difundir a informação recebida, ou seja,

197 DARELLI, Lúcio Eduardo. Telecentro como instrumento de inclusão digital para o e-gov brasileiro. Florianópolis: Telesc, 2003. p. 195. 198 BRASIL. Decreto 8.638 de 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Decreto/D8638.htm#art15 Acessado em 20 de agosto de 2016.

Page 131: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

129

quanto maior o acesso, maior a capacidade de discernimento sobre os assuntos,

ideias, ideologias e opiniões da atualidade.

É certo que a ausência de informação coloca o indivíduo no abismo da

ignorância, foi assim nos primórdios da civilização e não seria diferente nos dias

atuais, assim, a erradicação da exclusão digital é o melhor caminho para retirar o

indivíduo do precipício da ausência de conhecimento cibernético.

Ainda assim, é preciso uma forma de atuação no intuito da erradicação da exclusão digital. Menciona-se o foco da inclusão na profissionalização, capacitação e educação dos cidadãos ao ser entendido que, em relação aos projetos de inclusão: “Atualmente, estão cada vez mais reclamando a ampliação da cidadania, e assim começam a surgir com mais força os discursos voltados ao fomento da inteligência coletiva local ou nacional”. 199

A inclusão digital não é tarefa fácil num pais onde as desigualdades sociais

são tão alarmantes e com alto índice de analfabetismo, contudo, é possível.

Entendemos, assim, que o ponto fundamental encontra-se vinculado ao investimento

pelo poder público na educação, não bastando mero ingresso nas escolas, pois a

permanência é que, de fato, propiciará a paridade entres as pessoas.

Consoante os argumentos iniciais do subcapítulo, o Governo tem investido e

buscado a banir a exclusão digital, porém, muito longe de ser razoável e desejável, o

que por si só, torna a questão de extrema importância.

Deve-se consistir, então, as políticas públicas como o caminho para a

erradicação da exclusão digital, ou seja, pela inclusão se acaba com a exclusão.

Entretanto, não basta o simples acesso à cibernética, já que devemos utilizar as

novas tecnologias para melhorar as condições de vida da população, principalmente,

dos mais necessitados, para, assim, diminuir a disparidade na luta contra a exclusão

digital e viabilizar percursos que abrandem a distribuição de riqueza e

oportunidades, ou seja, buscar, além da igualdade material, a igualdade formal, a

igualdade de oportunidades.

Assim, ficar no debate de quem tem ou não acesso não resolverá a questão

da exclusão digital, porquanto de nada adianta ter acesso e não compreender a

extensão de melhorias que tal acesso possibilita na vida do ser humano.

Bernardo Sorj e Luís Eduardo Guedes, sobre o tema em questão, aduzem:

199 MOREIRA JUNIOR, Ronaldo Felix. A cidadania virtual e os obstáculos a sua efetivação. In: CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara, Florianópolis: CONPEDI, 2015. p. 44.

Page 132: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

130

A exclusão digital não se refere a um fenômeno simples, limitado ao universo dos incluídos e excluídos, polaridade real mas que por vezes mascara seus múltiplos aspectos. A razão é simples: a oposição entre acesso e não acesso é uma generalização razoável quando se trata de serviços públicos ou de bens tradicionais de consumo intermediário. Para aferir a exclusão digital, contudo, o número de proprietários de computador ou de pessoas com acesso à Internet é uma medida primitiva demais, já que vários outros fatores devem ser considerados: o tempo disponível e a qualidade do acesso afetam decisivamente o uso da Internet; as tecnologias da informação e comunicação (daqui em diante usaremos o termo telemática) são muito dinâmicas e requerem constantes atualizações de hardwares, softwares e dos sistemas de acesso, que exigem um investimento regular por parte do usuário para não ficarem obsoletos; seu potencial de utilização depende da capacidade de leitura e interpretação da informação pelo usuário (no caso da Internet) e por sua rede social (no caso do e-mail). O valor efetivo da informação depende da capacidade dos usuários de interpretá-la. Informação só existe na forma de conhecimento, e conhecimento depende de um longo processo de socialização e de práticas que criam a capacidade analítica que transforma bits em conhecimento. Portanto, combater a exclusão digital supõe enfrentar a exclusão escolar.200

Edson Sadão Iizuka entende que a exclusão digital é uma forma de

radicalização do desenvolvimento desigual. Assevera que, sem acesso à internet, as

camadas menos favorecidas da sociedade serão cada vez mais marginalizadas:

A acentuação de um desenvolvimento desigual, com um aumento nítido na concentração de poder e renda, pode ser radicalizado ainda mais pela chamada exclusão digital. Esse é o raciocínio básico sobre a questão: sem o acesso e uso da internet, pode-se excluir ainda mais a população pobre e as camadas mais fragilizadas como os portadores de necessidades especiais, os idosos, os jovens, índios, entre outros. O termo exclusão digital ou divisão digital (digital divide) tem a sua origem em meados da década de 1990 com a publicação de um artigo de Jonathan Webber e Amy Harmon no jornal Los Angeles Times em 1995. A exclusão digital, por sua vez, parece remeter a uma compreensão de marginalidade, ou seja, algo que indica os que “estão dentro”, fazem parte do sistema econômico e social, e os que “estão fora”, à margem da sociedade. São duas percepções distintas e que devido a sua origem, digital divide (EUA) e exclusão digital (Brasil e América Latina), têm significados e “pesos” diferentes, pois carregam consigo não somente a definição de quem acessa e utiliza ou de quem não acessa e não utiliza as novas tecnologias, mas também uma visão e um conceito de sociedade. 201

Pode-se concluir, então, que a exclusão digital é um problema a ser superado

para a efetivação do e-cidadão e ciberdemocracia. Mas não é simples eliminar a

200 SORJ, Bernardo; GUEDES, Luís Eduardo. Exclusão digital: problemas conceituais, evidências empíricas e políticas públicas. Novos Estudos CEBRAP, n. 72, 2005. p. 101-117. 201 IIZUKA, Edson Sadão. Um estudo exploratório sobre a Exclusão Digital e as Organizações sem Fins Lucrativos da cidade de São Paulo. Dissertação. 2003. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2397/44687.pdf?sequence=2>. Acesso em: 21 ago. 2016.

Page 133: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

131

exclusão digital, ainda mais em um país em desenvolvimento como é o caso do

Brasil.

Se citarmos o universo jurídico ou o universo do direito que é conhecido por

seu tradicionalismo, aqueles que não o conhecem a fundo poderiam, num primeiro

pensar, dizer que os indivíduos envoltos no direito estão alheios às questões da

cibernética.

Engana-se, no entanto, quem por ventura pensa assim, porque nos dias

atuais, não existe a menor possibilidade de se falar em direito sem se levar em

consideração os avanços tecnológicos. Tanto é verdade que o Processo Judicial

Eletrônico já é uma realidade no Brasil, e todos os novos processos, pelo menos nos

grandes centros, são distribuídos pelos portais dos Tribunais de forma digital.

A título de exemplificação, podemos citar o Tribunal de Justiça de São Paulo,

onde, todos os novos processos são digitais e os antigos estão sendo digitalizados.

São Paulo, metrópole brasileira, referência em desenvolvimento econômico, social e cultural no país. Tribunal de Justiça de São Paulo - maior da América Latina, com 360 desembargadores, mais de 2 mil magistrados de primeiro grau, quase 50 mil servidores, 20 milhões de processos e 23 mil novas ações todos os dias. O desafio a ser vencido até o fim de 2015 é proporcional ao tamanho da maior corte do Brasil: transformar em digital todo o Judiciário paulista. A partir da implantação do processo eletrônico nos 331 Foros do Estado, os novos processos serão obrigatoriamente digitais.202

Vejam, não estamos falando de qualquer Tribunal, mais sim do maior Tribunal

de Justiça da América Latina onde o tamanho, sem igual, poderia inviabilizar a

evolução, contudo, ocorreu de forma contrária, e hoje observamos um Tribunal

totalmente informatizado.

Oportuno lembrar que, quando do surgimento Processo Judicial Eletrônico,

vários foram os posicionamentos contrários, porém, não é de se espantar, tendo em

vista que qualquer que seja a ruptura traz o medo da mudança consigo.

Vejamos o quanto, exposto pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ, a

propósito do Processo Judicial eletrônico (PJe):

O Processo Judicial eletrônico (PJe) é um sistema desenvolvido pelo CNJ em parceria com os tribunais e a participação da Ordem dos Advogados do

202 TJSP. Cem por cento digital. Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/CemPorCentoDigital/>. Acesso em: 27 jun. 2016.

Page 134: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

132

Brasil (OAB) para a automação do Judiciário. O objetivo principal é manter um sistema de processo judicial eletrônico capaz de permitir a prática de atos processuais, assim como o acompanhamento desse processo judicial, independentemente de o processo tramitar na Justiça Federal, na Justiça dos Estados, na Justiça Militar dos Estados e na Justiça do Trabalho. O CNJ pretende convergir os esforços dos tribunais brasileiros para a adoção de uma solução única, gratuita para os próprios tribunais e atenta para requisitos importantes de segurança e de interoperabilidade, racionalizando gastos com elaboração e aquisição de softwares e permitindo o emprego desses valores financeiros e de pessoal em atividades mais dirigidas à finalidade do Judiciário: resolver os conflitos. A utilização do sistema exige a certificação digital de advogados, magistrados, servidores ou partes que precisarem atuar nos novos processos. 203

Não é demais afirmar que todos os sujeitos envolvidos no direito devem,

necessariamente, fazer uso das novas tecnologias sob pena de não mais atuarem

no mundo jurídico.

Temos de reconhecer que a exclusão digital não tem rosto, ao passo que

muitos são os operadores do direito que ainda não foram apresentados a essa nova

realidade. Nessa toada, os cursos jurídicos têm o papel de educar o acadêmico do

direito, de forma diversa de outrora, uma vez que as Instituições de Ensino Superior

voltadas à educação jurídica não podem, somente, formar pensadores, mas também

operadores, para tanto a utilização da cibernética é uma realidade e necessidade.

Do exposto, podemos concluir que a forma de ensinar mudou, como mudou,

também, a forma como exercemos a cidadania, pois chegamos a um momento

adstrito à cibernética e aos ciberespaços, tendo no e-cidadão e na ciberdemocracia

a esperança de um futuro mais transparente e ao alcance de todos, entretanto, a

exclusão digital é o grande obstáculo para a concretização dos direitos do e-cidadão

e da cidadania.

5.4 Necessidade de instrumentos para efetivação dos direitos do e-cidadão e

da ciberdemocracia

A democratização ampla do acesso às informações alterou as necessidades

203 CNJ. Processo judicial eletrônico. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/tecnologiada-informacao /processo-judicial-eletronico-pje>. Acesso em: 27 jun. 2016.

Page 135: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

133

dos cidadãos em vários aspectos, mas a inclusão social, um ponto crucial, é

distanciada, cada vez mais, pela exclusão digital.

Entretanto, entendemos que a inclusão digital somente atingirá todos, por

meio da educação e não apenas por meio da compra de computadores, da

disponibilidade de espaços físicos, do acesso à internet, ou seja, não basta apenas

fomentar instrumentos e o mero ingresso nas escolas, é preciso possibilitar a

permanência, esta é que garantirá, de fato, a paridade entres as pessoas.

Além do ingresso e permanência nas escolas, fato preponderante para a

inclusão social, temos de efetivar mecanismos capazes de propiciar, também, a

inclusão digital. Entendemos que a escola desenvolve papel importante na rede de

relacionamentos que os jovens criam. Sabemos, também, que as novas tecnologias

são banais para alguns, enquanto que, para outros, é apenas um sonho.

Assim, aqueles que não dispõem de conhecimento mínimo sobre a

cibernética e não dispõem de acesso à rede mundial de computadores, às redes

sociais, acabam sofrendo Cyberbullying204 (trata-se de violência praticada contra

alguém por meio da internet, redes sociais).

Nesse diapasão, a conscientização é o melhor caminho a ser trilhado para a

efetivação do e-cidadão e da ciberdemocracia, sendo a inclusão digital um balizador

de oportunidades na contemporaneidade.

De tal modo, para promover maior acesso digital, cremos que o governo deve

promover, como disciplina básica do ensino médio, instrumento curricular que

viabilize o começo do fim da exclusão digital, ou seja, uma disciplina que aja como

propulsor para amenizarmos/eliminarmos a exclusão digital.

Não obstante, acreditamos que a aprovação do PLS nº129/2010 (que propõe

alterar a Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, para estabelecer a possibilidade

de subscrição eletrônica para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular),

que atualmente se encontra na Câmara dos Deputados (PL 7005/2013) aguardando

Parecer do Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC),

204 Na internet e no celular, mensagens com imagens e comentários depreciativos se alastram rapidamente e tornam o bullying ainda mais perverso. Como o espaço virtual é ilimitado, o poder de agressão se amplia e a vítima se sente acuada mesmo fora da escola. E o que é pior: muitas vezes, ela não sabe de quem se defender. Nova Escola. Cyberbullying: violência virtual. Disponível em: <http://novaescola.org.br/formacao/cyberbullying-violencia-virtual-bullying-agressao-humilhacao 567858.shtml>. Acesso em: 27 jun. 2016.

Page 136: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

134

deve ser relatado, aprovado e sancionado, para, assim, efetivar os direitos do e-

cidadão.

Com essas duas ferramentas, acreditamos que, aos poucos, romperemos

algumas barreiras para a efetivação dos direitos do e-cidadão.

5.4.1 Proposta de alteração da Resolução SE 81 de 16-12-2011, do Estado de

São Paulo

Consoantes os termos do a artigo 205 da Constituição Federal da República

do Brasil de 1988205, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família,

que visa, além do pleno desenvolvimento da pessoa, ao preparo para exercício da

cidadania:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

A concretização da educação deve ser realizada em regime de colaboração

pelas três esferas governamentais, ou seja, a União, os Estados e Distrito Federal e

os Municípios. Contudo, o ensino médio, conforme prescrito no §3º do artigo 211 da

CF206, fica a cargo dos Estados e do Distrito Federal, prioritariamente, cabendo a lei

ordinária, estabelecer as diretrizes básicas.

Nessa toada, a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes

Básicas), regulamentando o disposto na CF dispõe, dentre vários outros preceitos,

que os conteúdos curriculares da educação básica observarão a difusão de valores

fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito

ao bem comum e à ordem democrática, consoante os termos do artigo 27, caput e

inciso I.

205 Além do artigo 205, o artigo 6º e os 206 a 214 da CF garantem o direito à educação, que, como sabido por todos, é um direito fundamental, exercido nas três esferas de governo – União, Estados e Municípios e tem como um dos objetivos precípuos preparar os indivíduos para o exercício da cidadania. 206 Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. (...) § 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.

Page 137: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

135

Não obstante, dispõe, também, em seu artigo 35, que o ensino médio terá

como finalidade a preparação básica para a cidadania e o aprimoramento do

educando como pessoa humana.

Já o artigo 36, §1º, determina que os conteúdos, as metodologias e as formas

de avaliação devem garantir ao educando, ao final do ensino médio, domínio dos

princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna, bem como

conhecimento das formas contemporâneas de linguagem.

Nessa contextualização, é dever do Estado propiciar mecanismos capazes e

atuais, que viabilizem o pleno desenvolvimento do educando, bem como seu preparo

para o exercício da cidadania, para que a participação democrática seja mais

contundente e eficaz.

Já é reconhecida a utilização, difundida, dos aparelhos eletrônicos pelos

educandos, a grande questão, então, é saber se esse uso ocorre de forma correta,

quando se trata de participação democrática.

José Renato Nalini, Secretário da Educação do Estado de São Paulo, em

artigo publicado em seu Blog, no dia 06/09/2016, reconhece a força das redes

sociais, tanto que menciona que os youtubers precisam ser levados a sério, bem

como ser urgente a necessidade de liberação do celular para finalidades

pedagógicas:

Os youtubers precisam ser levados a sério. Eles constituem a grande novidade da Bienal do Livro de 2016. Eu os convoquei quando assumi a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, para uma comunicação ágil e direta com o alunado – 4 milhões de estudantes da Rede Pública de São Paulo. São eles que o jovem ouve e segue e se quisermos alavancar a educação pública no Brasil, vamos ter de ouvir suas recomendações. É urgente a liberação do celular para finalidades pedagógicas. O ensino prelecional está sendo questionado em todos os ambientes. Se quisermos manter o aluno interessado em aprender, temos de usar a linguagem dele. A linguagem de seu tempo.207

Além do uso dos aparelhos para finalidades pedagógicas, entendemos que a

conscientização de um uso correto, em todas as searas, mas principalmente na

participação democrática dos educandos, é fator preponderante no cenário atual, em

207 NALINI, José Renato. Celular para ensinar. Disponível em: <https://renatonalini.wordpress.com/>. Acesso em: 08 set. 2016.

Page 138: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

136

que as redes sociais são utilizadas em larga escala para organização e realização

de manifestos.

Não obstante, é notório que a participação democrática já não ocorre como

outrora, uma vez que a democratização ampla do acesso às informações alterou as

necessidades dos cidadãos em vários aspectos, mas a inclusão social é um ponto

crucial que é distanciada, cada vez mais, pela exclusão digital, ou seja, tem a escola

papel fundante de reverter tal assertiva.

Assim, a inclusão digital somente atingirá todos, por intermédio da educação,

não apenas com a compra de computadores e disponibilização de espaços físicos e

acesso à internet, uma vez que a escola deve ir além, deve demonstrar para o

educando o que é ser cidadão e como ele pode e deve participar do processo

democrático.

Com as inovações tecnológicas, a internet e o uso das redes sociais ocorrem

de forma tão acelerada que não podemos ficar para trás, sendo certo que o Estado

tem o dever de acompanhar tais inovações para propiciar a conscientização plena

do educando, tendo em vista que a educação é o melhor caminho a ser percorrido

para a efetivação dos direitos do e-cidadão.

Como o ensino médio cabe aos Estados e ao Distrito Federal, ficando sobre

sua competência baixar normas complementares para o seu sistema de ensino,

resta evidente que cabe a essas esferas promover mecanismos atuais que

acompanhem a nova realidade introduzida pela internet e pelas redes sociais,

especialmente no que tange às novas formas de participação democrática, repise-

se, ocorrem via internet e suas redes sociais.

Assim, é extremamente importante a inclusão de uma disciplina especifica

que trate sobre cidadania e redes sociais, com isso, o papel transformador

desempenhado pela educação atingirá patamares atuais atendendo anseios

contemporâneos.

Conforme anteriormente mencionado, os maiores protestos ocorreram no

Estado de São Paulo, tendo em vista tratar-se da capital econômica do país, sendo

em muitos aspectos, referência nacional. Assim, acreditamos que, se iniciada a

mudança de paradigma de ensino, introduzindo uma disciplina na 2º série do ensino

médio que, simultaneamente, trate de cidadania e redes sociais, produzirá

Page 139: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

137

resultados ímpares e, certamente, os demais Estados da federação e o Distrito

Federal também adotarão medidas similares.

Para tanto, a presente tese, propõe, como forma de efetivação dos direitos de

e-cidadão, a inserção na grade curricular da 2º série do ensino médio disciplina

denominada “Cidadania e redes sociais”.

Destarte, propomos alteração na Resolução SE 81 de 16-12-2011, para incluir

disciplina denominada “Cidadania e redes sociais”, sendo que a minuta de

Anteprojeto de Resolução, bem como o Plano de Ensino, segue anexo à presente

tese. Almejamos, assim, análise adequada e que seja posta em prática a disciplina e

seu conteúdo. Contudo, de pronto, sugerimos a seguinte ementa:

Estado e Sociedade. Teoria Política. Cidadania, Cidadão e e-cidadão. Democracia e ciberdemocracia. Participação democrática. Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDICs). Hardware e Software. Noções de informática. Internet. Redes sociais. Direitos e deveres do e-cidadão (crimes digitais).

Em ato contínuo, sugerimos, a seguir, os objetos da disciplina bem como

prévia do conteúdo Programático:

OBJETIVOS: 1) Geral: Dotar o aluno de uma visão ampla e crítica de aspectos comuns à política, à cidadania e à democracia. 2) Específicos: a) Iniciar o educando na vida cidadã, propiciando os conceitos e fundamentos básicos da teoria política clássica e moderna; b) Proporcionar conhecimento básico de informática, internet e redes sociais; c) Proporcionar elementos para um posicionamento crítico face aos temas estudados; d) Disponibilizar relações com áreas afins e com a realidade e outras áreas de conhecimento; e) Discutir a configuração do Estado e democracia brasileira na contemporaneidade via redes sociais. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO: 1) Cidadania: dos antigos aos modernos. 2) Cidadão e e-cidadão. 3) Cidadania: na contemporaneidade – o uso das redes sociais. 4) Democracia: dos antigos aos modernos. 5) Formas de democracia. 6) Ciberdemocracia. 7) Voto e urna eletrônica. 8) Revolução tecnológica e o desenvolvimento da cibernética 9) Noções básicas de informática. 10) Hardware e Software. 11) Editores de texto e planilhas eletrônicas. 12) Fundamentos e conceitos de redes de computadores. 13) Pesquisas na Internet. 14) Redes sociais. 15) Fundamentos e desafios contemporâneos do e-cidadão: incluir para excluir.

A disciplina sugerida deve ser apresentada na forma de aulas expositivas

acompanhadas de estudos de caso, teoria e prática das áreas estudadas,

Page 140: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

138

preferencialmente em laboratórios de informática ou por intermédio do Bring Your

Own Device -“BYOD”208.

A interação entre alunos em discussões e debates deve ser incentivada pelos

docentes. O docente deve substituir a aula-monólogo por exposições dialógicas e

interativas, utilizando-se de tecnologias que se comunicam por entre as diferentes

mídias, promovendo reflexão e interpretação das fontes do Estado, Cidadania,

Democracia e da rede mundial de computadores, bem como fomentando a pesquisa

e a leitura.

As atividades práticas poderão ser obtidas através do desenvolvimento de

trabalhos que façam uso da criatividade, como o desenvolvimento de comunidades

em redes sociais, a criação de chats e fóruns de debate, de forma a colocar em

prática todo conteúdo aprendido.

Os educandos, via de regra, matriculam-se na 2º série do ensino médio com

16 (dezesseis) anos, idade está prevista na Constituição para o início do exercício

da cidadania e democracia representativa pelo voto, de forma facultativa,

justificando, assim, a escolha da 2º série do ensino médio, como momento

adequado para tal disciplina.

Nossa atual Constituição, considerada “Constituição Cidadã”, faculta o voto

para os maiores de 16 e menores de 18 anos.209 Para nós, o voto é um exercício de

direito, ou seja, direito subjetivo do cidadão do que o execre por um dever cívico e,

em busca da efetivação do processo democrático. Sendo que para aqueles que se

encontram com idade entre 16 e 18 anos, o voto é apenas facultado, entretanto,

acreditamos que se o jovem detiver conhecimento mínimo de cidadania, e da

ciberdemocracia, possa se definir como e-cidadão.

Com a alteração apresentada, acreditamos que efetivaremos direitos do e-

cidadão, uma vez que, por meio da educação, propiciaremos aos educandos (futuros

e-cidadãos) conhecimento e suporte para que estes escolham, bem como auxiliem

208 Que significa: “Traga seu Próprio Dispositivo”. (Tradução livre) 209 Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei mediante. (...) II – facultativo para: a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos. (Grifos nossos)

Page 141: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

139

os rumos da nação, participando, efusivamente, do processo democrático, via redes

sociais.

Assim, resta evidente que acreditamos que a educação é o caminho a ser

trilhado para eliminarmos a exclusão digital, e, por consequência lógica, efetivarmos,

de maneira plena, o e-cidadão e a ciberdemocracia. Estamos certos de que existem

outros gargalos, contudo, sem educação nenhum outro será possível de ser

superado.

Ante o exposto, a elaboração do presente projeto, tem como foco num futuro

próximo, amenizar/eliminar a exclusão digital, e principalmente viabilizar melhor

formação ao e-cidadão, ao passo que esperamos seja a proposta de alteração

acatada e a disciplina sugerida posta em prática pela Secretária de Educação do

Estado de São Paulo.

5.4.2 Aprovação do PLS nº 129/2010

Hoje. 5 de outubro de 1988, no que tange à Constituição, a Nação mudou. (...).A Nação nos mandou executar um serviço. Nós o fizemos com amor, aplicação e sem medo. (...)Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania aonde quer que ela desgrace homens e nações. (...) O enorme esforço admissionado pelas 61 mil e 20 emendas, além de 122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de assinaturas, que foram apresentadas, publicadas, distribuídas relatadas e votadas no longo caminho das subcomissões até a redação final. (...) Tem significado de diagnóstico a Constituição ter alargado o exercício da democracia. É o clarim da soberania popular e direta tocando no umbral da Constituição para ordenar o avanço no campo das necessidades sociais. O povo passou a ter a iniciativa de leis. (...) Foi a sociedade mobilizada nos colossais comícios das Diretas Já que pela transição e pela mudança derrotou o Estado usurpador. (...) A Nação quer mudar. A Nação deve mudar. A Nação vai mudar. A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança. Que a promulgação seja o nosso grito. Mudar para vencer. Muda Brasil."210 (Grifos nossos)

Acima parte do discurso do Presidente da Assembleia Nacional Constituinte

Deputado Ulysses Guimarães, quando da promulgação da Constituição Federal de

1988. Pelo discurso supra, podemos concluir, sem dúvidas, que a constituinte foi a

210 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Íntegra do discurso presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Dr. Ulysses Guimarães (10' 23"). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias /radio/materias/CAMARA-E-HISTORIA/339277-INTEGRA-DO-DISCURSO-PRESIDENTE-DA-ASSEMBLEIA-NACIONAL-CONSTITUINTE,--DR.-ULYSSES-GUIMARAES-(10-23).html>. Acesso em: 9 set. 2016.

Page 142: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

140

maior participação social da história do Brasil, até então, em especial a participação

popular, já que foram “122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de

assinaturas”.

A grande indagação que se faz é: se naquela época as petições online ou a

subscrição eletrônica para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular

fossem aceitas, quantas propostas e quantas assinaturas digitais teriam ocorrido?

Sem pestanejar, certamente, poderíamos afirmar que o número de emendas

populares seriam, facilmente, 10 vezes mais, e em igual monta a quantidade de

assinaturas digitais.

Ocorre que no final da década de 80 do século passado, participação

democrática, de forma instantânea, promovida pelas redes sociais não era uma

realidade, contudo, nos dias atuais se faz presente, ou seja, hoje a tecnologia nos

permite participar do processo democrático de forma muito mais eficaz e rápida.

Contudo, faltam alguns instrumentos para que isso possa ser concretizado e,

assim, garantirmos mais direitos ao e-cidadão. A disciplina mencionada no item

anterior tem como fito viabilizar maior aprofundamento sócio-político para que os

direitos do e-cidadão e sua participação democrática sejam adequados e eficazes.

Nossa Constituição Federal, no seu artigo 1º, parágrafo único, prevê que

“Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou

diretamente, nos termos desta Constituição”, ou seja, retrata a soberania popular,

por meio do exercício do poder, mas não somente através de representantes eleitos,

como também diretamente por meio de instrumentos de participação popular.

Tais instrumentos, estão previstos no artigo 14 da CF/88, são eles: I -

plebiscito; II - referendo; e, III - iniciativa popular. Vejamos:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular.

A artigo 14, supramencionado, é regulamentado pela Lei nº 9.709, de 18 de

novembro de 1988. Norma essa que conceitua e estabelece diferenças entre os três

institutos previstos nos incisos do citado artigo.

Page 143: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

141

O plebiscito e o referendo estão conceituados no artigo 2º da Lei nº

9.709/1988. Ambos são instrumentos de participação, contudo, o plebiscito é

convocado com anterioridade, e o referendo é convocado com posterioridade.

Ambos são consultas formuladas ao povo para que delibere sobre matéria de

acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa.

O Inciso III do artigo 14 da Constituição Federal (III - iniciativa popular) foi

regulamentado pelos artigos 13 e 14 da Lei em referência. Todavia, o caput do artigo

13 define a forma com deve ocorrer a iniciativa popular:

Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. (Grifos nossos)

Num primeiro momento, um por cento do eleitorado nacional pode aparentar

uma pequena quantidade, entretanto, estamos falando em 146.470.911211, o que,

por sua vez, torna impossível o alcance dessas assinaturas, mesmo porque, deve

ser distribuída pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por

cento dos eleitores de cada um deles, ou seja, o preceito normativo encontra-se

ultrapassado frente às novas tecnológicas que temos disponíveis.

Nos dias atuais, as petições digitais ou petições online, junto com as redes

sociais, têm ganhado cada vez mais espaço. Tanto é verdade que os diversos

protestos populares nos últimos anos, conforme anteriormente citados (Primavera

Árabe, Occupy Wall Street, Jornadas de Junho), apresentam como ponto comum,

além da insatisfação dos indivíduos, enquanto cidadãos, em relação à classe

política, o uso das petições online, da internet e das redes sociais para organizar.

O uso dessas petições, da internet e das redes sociais, uma vez que todas as

manifestações citadas encontraram na internet, bem como nas redes sociais,

ferramenta significativa e inovadora que serviu para organizar e divulgar os protestos

e, ainda, uma ferramenta de publicação dos acontecimentos durante os eventos,

simultaneamente, o que, sem dúvidas, garantiu mais adeptos.

As petições online contribuíram, e muito, para o reconhecimento e

211 TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Estatísticas do eleitorado – Consulta por região/UF/município. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/consulta-quantitativo>. Acesso em: 08 set. 2016.

Page 144: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

142

fortalecimento das novas formas de participação democrática e a busca pela

efetivação dos diretos do e-cidadão. Elas são disponibilizadas por vários sites, que

viabilizam a qualquer e-cidadão criar e divulgar nas redes sociais suas próprias

petições online, bem como possibilitam a participação nas petições já existentes por

meio de assinatura digital.

Tais petições são uma tendência, tanto que sites governamentais, conforme já

mencionado, possibilitam a participação do e-cidadão no processo político.

Além dos sites governamentais, existem vários outros sites que possibilitam

as petições online, sendo que o Avaaz é, sem dúvida, um dos maiores, uma vez que

consta como mais de quarenta e três milhões de membros212. O Avaaz utiliza o

slogan: “O mundo em ação”. Sendo que, quando o indivíduo assina uma petição do

site, automaticamente, faz parte dos membros.

O Avaaz está disponível em vários países do mundo e em 16 idiomas

distintos. No Brasil, tem promovido grandes petições. A petição online “Pela

cassação do mandato de Eduardo Cunha”213 já atingiu 1.350.533 assinaturas

digitais, e a petição online “NOVAS ELEIÇÕES JÁ! #FORATEMER” já angariou

212.488214.

Em que pese a excelente iniciativa, bem como a possível pressão que tais

petições, certamente, causam nos políticos do nosso país, ela não é contemplada

com validade, porquanto inexistente norma que valide as petições online e suas

assinaturas digitas, o que, para nós, é mais um desafio a ser superado para a

efetivação dos direitos do e-cidadão.

Nessa toada, além da reforma supramencionada na Resolução SE 81/2011

da Secretária de Educação do Estado de São Paulo, um outro caminho seria a

votação, aprovação e sanção do Projeto de Lei do Senado de nº 129/2010, anexo à

presente tese, que tem, como finalidade, alterar a Lei nº 9.709, de 18 de novembro

de 1998, para estabelecer a possibilidade de subscrição eletrônica para

apresentação de projeto de lei de iniciativa popular.

212 AVAAZ. Membros. Disponível em: https://www.avaaz.org/po/. Acesso em: 08 set. 2016. 213AVAAZ. Pela cassação do mandato de Eduardo Cunha. Disponível em: <https://secure. avaaz.org/po/petition/Conselho_de_Etica_da_Camara_Pela_cassacao_do_mandato_de_Eduardo_Cunha/>. Acesso em: 9 set. 2016. 214 AVAAZ. Novas Eleições já! #foratemer. Disponível em: <https://secure.avaaz.org/po/brasil _fora_temer_loc/?slideshow>. Acesso em: 9 set. 2016.

Page 145: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

143

O PLS nº 129/2010, de autoria da Senadora Serys Slhessarenko, tem por

objetivo acrescentar os parágrafos 3º e 4º ao art. 13, permitindo o uso de assinaturas

eletrônicas dos eleitores para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular e

determinando que os projetos que não alcançarem o número mínimo de assinaturas

tramitem na forma de sugestões legislativas.

A Senadora Serys Slhessarenko, em justificação apresentada ao PLS,

argumenta que o quantitativo exigido para apresentação dos projetos de iniciativa

popular inibe, e quase chega a inviabilizar, a mobilização em torno da apresentação

de projetos de iniciativa popular. Aduz, ainda, que o PLS visa sanar essa inibição,

bem como estimular a participação popular no que respeita à iniciativa legislativa.

Assim sendo, a Senadora Serys Slhessarenko propõe que seja permitido

contabilizar as assinaturas eletrônicas, coletadas pelos organizadores do movimento

ou pela própria Câmara dos Deputados, bem como direcionar os projetos que não

atinjam o percentual exigido ao processo legislativo. Conclui que a alteração

sugerida viabilizará o aumento da participação direta do cidadão e, ainda, contribuirá

para consolidar a legitimidade das instituições representativas no País.

No Senado Federal, o PLS ficou sob apreciação da Comissão de Ciência,

Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT), tendo como Relator o

Senador Valdir Raupp. Em 2012, o Parecer favorável ao PLS, anexo à presente

tese, foi aprovado no Senado e em 2013215, foi encaminhado à Câmara onde

recebeu o número de Projeto de Lei 7005/2013, e aguarda, desde 2014, Parecer do

Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).216

Ante o exposto, como instrumento para efetivação dos direitos do e-cidadão,

acreditamos que a PLS nº 129 de 2010, atualmente PL 7005/2013, deve ter seu

parecer aprovado pela CCJC, para consequente votação de ambas as casas com

aprovação e posterior sanção. Para, assim, efetivar os direitos do e-cidadão, uma

vez que o PLS nº 129 acrescentará os §§ 3º e 4º ao art. 13 da Lei n° 9.709/1988,

viabilizando a validação das assinaturas eletrônicas dos eleitores para os fins da

subscrição da iniciativa popular de lei prevista no caput.

215 SENADO FEDERAL. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96813>. Acesso em: 9 set. 2016. 216 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/propos icoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=604 888>. Acesso em: 9 set. 2016.

Page 146: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

144

Por derradeiro, propomos a criação de uma petição online, via site Avaaz

(sugestão de petição em anexo), como forma de pressionar os Deputados a

agilizarem o andamento do PL 7005/2013, e consequente aprovação, permitindo,

assim, a validação das assinaturas digitais/online/eletrônicas dos eleitores para

apresentação de projeto de lei de iniciativa popular, para a devida efetivação dos

direitos do e-cidadão.

Page 147: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

145

CONCLUSÃO

Acreditamos que o e-cidadão vê a questão do direito de resistência, bem

como a questão da desobediência civil de forma ampla, tendo em vista o alcance

proporcionado pelas redes sociais. Assim, a linguagem das ruas, que antes ficavam

apenas nas ruas e atingia pouquíssimas pessoas, pois não ia além dos próprios

participantes das manifestações, tem ganhado, cada dia mais, a característica de

transnacionalidade e instantaneidade.

A democracia que permeou por todos os tempos e sempre alicerceou os

principais avanços civilizatórios, na contemporaneidade, recebe a denominação na

contemporaneidade, também, de ciberdemocracia, porquanto enxerga na internet e

redes sociais uma grande ferramenta de participação democrática.

Contudo, importa mencionar que a evolução inerente à

democracia/ciberdemocracia tem seus pilares fincados na concepção grega que

define democracia como “governo do povo”, em que pese as diferenças crucias em

relação às especificidades de cada época, não podemos olvidar seu nascedouro.

Temos de reconhecer que, seja na antiguidade, seja na medievalidade ou na

contemporaneidade, o processo evolutivo civilizatório, principalmente, por intermédio

da democracia, somente foi viável devido ao processo de comunicação. Processo

esse que possibilitou ao homem desenvolver uma significativa ferramenta

denominada manifestação, exercida pela escrita, pela fala, ou atualmente pelas

redes sociais, entretanto, seja qual for o tempo ou o meio de comunicação, o

processo de comunicação conduziu o homem até os dias atuais, ao ponto de

podemos denominá-lo de e-cidadão.

Importa lembrar, por oportuno, que expressamos nossos manifestos, escritos,

falados, por meio de um processo, primeiro de interiorização, depois de

exteriorização. Ou seja, o homem realiza um processo mental pelo qual estabelece

dados conceitos aos objetos e fenômenos e, posteriormente, estabelece uma

valoração (juízo de valor), para, assim, chegar à construção de uma proposição,

que, quando exteriorizada, cria o manifesto, isto é, a manifestação é o meio pelo

qual damos “vida” a nossas opiniões, nossos pensamentos, nossos sentimentos,

Page 148: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

146

bem como a nosso pensamento racional, mediante um processo lógico de

comunicação.

Desse modo, o processo de comunicação que, no embrião da civilização era

adstrito aos signos e sons, alcançou, com o advento da palavra escrita, da tipografia

móvel, da comunicação de massa (jornais, rádios, televisão) da revolução

tecnológica, formas e ferramentas até outrora inimagináveis, haja vista que as

manifestações já não são realizadas como antigamente e isso é devido à forma

como o e-cidadão, via redes sociais, participa da ciberdemocracia.

Essa forma atual de manifestação, via redes sociais, contudo, só foi possível

com o advento da revolução tecnológica que deu ao homem a dimensão de

transnacionalidade sem, contudo, sair de trás de um computador, smartphone,

celular. Assim, podemos concluir que foi a revolução tecnológica o berço para as

redes sociais, e por consequência lógica para a instituição do e-cidadão e da

ciberdemocracia.

A internet e as redes sociais surgem, então, como grandes ferramentas, ao

alcance de todos, que transformaram a maneira de participação política, bem como

mudam a forma como o e-cidadão participa do processo democrático, sendo que a

internet e as redes sociais desempenham papal de mudança sem igual na história.

Nessa contextualização, podemos concluir que foi assim, com o uso

democratizado da internet e das redes sociais, que surgiu no Brasil e no mundo

novas formas de manifestações apolíticas e políticas, tais como “flashmobs”;

smartmobs”, desencadeando uma onda sem precedentes de manifestações, como a

Primavera Árabe, Occupy Wall Street e Jornadas de Junho. Sendo o ponto em

comum, entre elas, a utilização da internet e das redes sociais como principal aliado,

dando ao mundo notícias instantâneas dos ocorridos, o que acarretou apoio

internacional e derrocada dos sistemas ditatoriais (no caso da primavera Árabe).

No Brasil, não foi diferente, ou seja, a internet e as redes sociais

desempenharam importante papel em nossas manifestações, políticas ou não,

sendo que os eventos que mais se destacaram foram as jornadas de junho, de

cunho social-político e o “rolezinhos” de conotação cultural.

Page 149: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

147

As jornadas de junho ficarão para sempre marcadas na história de nosso

país, como o movimento de maior adesão e expansão na atualidade, ou melhor, de

todos os tempos.

Vários foram os motivos que fizeram as pessoas irem às ruas, pessoas essas

em especial, vinculadas à denominada “Geração Z”. As manifestações foram

propagadas pelas novas formas disponíveis na rede mundial de computadores, ou

seja, manifestantes utilizaram a internet e as redes sociais, principalmente –

Facebook e Twitter, para organização e angariação de adeptos, o que viabilizou a

disseminação viral para todo o mundo de forma instantânea.

Das jornadas de junho, podemos extrair, como herança, a percepção de que

as manifestações podem dar resultados; o papel, sem igual, da internet e das redes

sociais para articulação e engajamento das pessoas, bem como a proliferação dos

Black Blocs. Estes com concepções anarquistas, também, utilizaram as redes

sociais para pulverização de suas táticas e a adesão de simpatizantes.

Além do legado acima, tivemos o afastamento definitivo da Presidente da

República e o afastamento definitivo do Preside da Câmara dos Deputados (ambos

tiveram seus mandatos cassados). Em ambos os casos, podemos perceber as

intervenções das vozes das ruas, ou seja, os manifestos deram resultados, para uns

positivos, para outros a concretização de um golpe.

Mas, sem dúvidas, o maior legado de todos esses manifestos, mundo afora,

foi a constituição do e-cidadão e da ciberdemocracia, ou seja, chegamos com a

internet e com as redes sociais à evolução da concepção de cidadão e de

democracia. No entanto, como todo processo de transformação gera a necessidade

de várias adaptações, temos de concluir que vários direitos do e-cidadão necessitam

de uma efetivação.

A exclusão, seja no processo democrático grego, seja na atualidade sempre

foi, é e será a grande barreira a ser rompida. Nos dias atuais, temos o e-cidadão

como uma realidade, contudo, uma realidade para poucos, eis que a exclusão digital

não permite a efetiva democratização da cibernética, o que inviabiliza direitos do e-

cidadão, ou seja, entendemos que a exclusão é um grande desafio a ser superado.

Page 150: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

148

Concluímos, assim, que a internet e as redes sociais desempenham papel

importante, sem igual, na participação democrática, contudo são muitos os desafios

contemporâneos para a efetivação dos direitos do e-cidadão.

Dentre esses desafios, colocamos que a ausência de conhecimento e a

ausência de acesso à internet e às redes sociais – exclusão digital – para muitos

cidadãos, ainda é uma constante, ou seja, essa exclusão é a grande questão a ser

rompida. É sabido que existem outros desafios a serem superados, para tanto,

acreditamos que a educação é o melhor caminho a ser trilhado.

A solução, então, está na educação. Como forma de superar esses desafios,

propomos a inserção na grade curricular da 2º série do ensino médio da disciplina

“Cidadania e redes sociais”. Sabido por todos que não se resolverá tudo da noite

para o dia, no entanto, temos que dar o primeiro passo, e, esse primeiro passo deve

ocorrer por meio da educação como forma de inclusão digital e, por consequência

lógica, a eliminação da exclusão digital que é o maior desafio a ser superado para a

efetivação dos direitos do e-cidadão.

Destarte, propomos alteração na Resolução SE 81 de 16-12-2011 da

Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, para incluir disciplina “Cidadania

e redes sociais”, sendo que a minuta de Anteprojeto de Resolução, bem como o

Plano de Ensino, segue anexo à presente tese. Almejamos, com isso, análise

adequada pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e posterior

alteração da Resolução SE 81/2011, para que seja posta em prática a disciplina e

seu conteúdo, concretizando o pontapé inicial rumo à exclusão digital e, por

consequência lógica, à efetivação do e-cidadão.

Propomos, também, a criação de uma petição online, via site Avaaz (sugestão

de petição em anexo), como forma de pressionar os Deputados a agilizarem o

andamento do PL 7005/2013, e consequente aprovação, permitindo, assim, a

validação das assinaturas digitais/online/eletrônicas dos eleitores para apresentação

de projeto de lei de iniciativa popular, para, assim, viabilizar a devida efetivação dos

direitos do e-cidadão.

De todo o exposto, concluímos que as redes sociais são mecanismos atuais

de participação democrática, bem como, que são vários os desafios

contemporâneos para efetivação do e-cidadão, mas acreditamos, sim, ser possível

Page 151: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

149

efetivar e garantir os direitos do e-cidadão. Afirmamos, também, que as

manifestações, organizadas pela internet/redes sociais e concretizadas em ruas e

praças públicas representaram um exercício da democracia e não uma des”ordem”,

já que des”ordem” é tão somente uma ordem não desejada. E nesse ínterim, temos,

repise-se, de reconhecer o papel transformador das redes sociais nessa nova forma

de participação democrática.

Page 152: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

150

REFERÊNCIAS

ALVES, Alaôr Caffé. Lógica: pensamento formal e argumentação: elementos para o discurso jurídico. 5.ed. São Paulo: Quartier latin, 2011. ALVIM, Marcia Cristina de Souza; POZZOLI, Lafayette (Org.). Ensaios sobre Filosofia do Direito. 2. ed. São Paulo: Educ, 2016. ALZAMORA, Geane; ALENCAR, Renata. Flashmob: reflexões preliminares sobre uma experiência de rede. In: Anais do V Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura. Disponível em: < http://www.cult.ufba.br/enecult2009/19558-1.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2016. ARENDT, Hannah. Crises da república. São Paulo: Perspectiva, 1973. ARISTÓTELES. Política. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. ARISTÓTELES. Política: os pensadores. São Paulo: Nova Cultura. 1999. ASSIS, Machado. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

AVAAZ. Membros. Disponível em: https://www.avaaz.org/po/. Acesso em: 08 set. 2016. AVAAZ. Pela cassação do mandato de Eduardo Cunha. Disponível em: <https://secure. avaaz.org/po/petition/Conselho_de_Etica_da_Camara_Pela_cassacao_do_mandato_de_Eduardo_Cunha/>. Acesso em: 9 set. 2016. AVAAZ. Novas Eleições já! #foratemer. Disponível em: <https://secure.avaaz.org/po/brasil _fora_temer_loc/?slideshow>. Acesso em: 9 set. 2016. BARRETO, Fernando. Mobilização Social. In: BRAMBILLA, Ana (org.). Para entender as mídias sociais. E-book, 2011. Disponível em: http://designices.com/wp-content/uploads/2011/04/paraentenderas midiassociais.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2016. BEDONE, Rebeca. Em terra de whatsapp ligação é prova de amor. Disponível em: <http://www.revistabula.com/5323-em-terra-de-whatsapp-ligacao-e-prova-de-amor/>. Acesso em: 11 mar. 2016. BEZERRA, Arthur Coelho. GRILLO, Carolina Christoph. Batalha nas ruas, guerra nas redes: notas sobre a cobertura midiática da violência em manifestações. Liinc em Revista. Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 195 – 210, maio 2014.

Page 153: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

151

BEZERRA, Eudes Vitor.; SOARES, Marcelo Negri. Regime autoritário ditatorial brasileiro da década de 1960 e violações de direito humanos reconhecidas no caso gomes lund e outros desaparecidos na guerrilha do araguaia. In: CONPEDI. (Org.). Estado, Constitucionalismo e Sociedade. 1ed.Florianóplis: Conpedi, 2016, v. 1, p. 134-154.

BÍBLIA SAGRADA. Daniel 3:1-23. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/dn/3>. Acesso em: 18 maio 2016. BÍBLIA SAGRADA. Gênesis 3:1-7. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/gn/3>. Acesso em: 18 maio 2016. BÍBLIA SAGRADA. Gênesis 3:23 <https://www.bibliaonline.com.br/acf/gn/3>. Acesso em: 18 maio 2016. BÍBLIA SAGRADA. Jonas 1:1-3. Disponível: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/jn/1>. Acesso em: 18 maio 2016. BÍBLIA SAGRADA. Romanos 3:19-24. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/acf/rm/3>. Acesso em: 18 maio 2016. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. BOBBIO, Norberto. Locke e o direito natural. 2.ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1998. BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de Janeiro: Elieser, 2000b. BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. BORGES, Thassio. Redes sociais foram o combustível para as revoluções no mundo árabe. Disponível em: <http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/18943/redes+sociais+foram+o+ combustivel+para+as+revolucoes+no+mundo+arabe.shtml>. Acesso em: 11 ago. 2016. BOYD, Danahet; ELLISON, Nicole. Social network sites: Definition, history, and scholarship. Califórnia, 2007. Disponível em: <http://jcmc.indiana.edu/vol13/issue1/boyd.ellison.html>. Acesso em: 04 jun. 2013. BRAGA, Sérgio Pereira.; BEZERRA, Eudes Vitor. Desobediência civil: uma forma democrática de participação política. In: CONPEDI. (Org.). Teorias da democracia e direitos políticos. 1ed.Florianóplis: Conpedi, 2016, v. 1, p. 472-489.

Page 154: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

152

BRASIL 247. Movimentos sociais organizam protesto contra temer na abertura do rio 2016. Disponível em: < http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/247362/Movimentos-sociais-organizam -protesto-contra-Temer-na-abertura-da-Rio-2016.htm>. Acesso em: 10 ago. 2016. BRASIL. Decreto 8.638 de 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Decreto/D8638.htm#art15 Acesso em: 20 ago. 2016. BUSINESS SOLUTION INTERNATIONAL. Dados recentes sobre a ascensão do “Instagram”. Disponível em: <http://www.bsi-brasil.com/blog/dados-sobre-ascensao-do-instagram-102101218/>. Acesso em: 03 jul. 2015.

CALVINO, João. Instituição da religião cristã, IV, 20. In: Sobre a autoridade secular. São Paulo: Martins Fontes, 1995. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Íntegra do discurso presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Dr. Ulysses Guimarães (10' 23"). Disponível em: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/CAMARA-E-HISTORIA/339277-INTEGRA-DO-DISCURSO-PRESIDENTE-DA-ASSEMBLEIA-NACIONAL-CONSTITUINTE,--DR.-ULYSSES-GUIMARAES-(10-23).html. Acesso em: 9 set. 2016.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=604 888>. Acesso em: 9 set. 2016. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2003. CARIBÉ, J. C. Classes Populares. In: BRAMBILLA, Ana (org.). Para entender as mídias sociais. E-book, 2011. Disponível em: http://designices.com/wp-content/uploads/2011/04/paraentenderas midiassociais.pdf >. Acesso em: 18 ago. 2016. CARREIRO, Rodrigo. Black Bloc em ação: reforço de identidade e outras dinâmicas de ativismo no Facebook. Liinc em Revista, v. 10, n. 1, 2014. CARVALHO NETO, Frederico da Costa. Novas Ferramentas e Privacidade. In: Direito e Novas Tecnologias. Conpedi/Uninove. Florianópolis: FUNJAB. 2013. p. 233-249. CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 19.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015. CASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo (Orgs.). A sociedade em rede: do conhecimento à ação política. Belém: Imprensa Nacional, 2005. CINTRA, Rodrigo Suzuki. Locke e o direito de resistência. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/artigos_2009/Rodrigo_S

Page 155: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

153

uzuki2.pdf. Acesso em: 19 jan. 2016. CNJ. Processo judicial eletrônico. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/tecnologiada-informacao /processo-judicial-eletronico-pje>. Acesso em: 27 de jun. de 2016. COELHO, Fábio Ulhoa. Roteiro de lógica jurídica. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2004. COSTA, Jairo. A tática do Black Bloc. Revista Mortal, out. 2010. DARELLI, Lúcio Eduardo. Telecentro como instrumento de inclusão digital para o e-gov brasileiro. Florianópolis: Telesc, 2003. DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência política. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 2006. DONEDA, Danilo. Reflexões sobre proteção de dados pessoais em redes sociais. Revista Internacional de Protección de Datos Personales. n. 1. Dezembro 2012. Disponível em: <http://habeasdatacolombia.uniandes.edu.co/wp-content/uploads/10_Danilo-Doneda_FINAL.pdf.pdf>. Acesso em: 5 fev. 2014. DUPUIS-DÉRI, Francis. Black Bloc. São Paulo: Veneta, 2014. FACEBOOK. Black Bloc. Disponível em: <https://www.facebook.com/Blackk-Bloc-Brasil-3 53035154737576/>. Acesso em: 21 ago. 2016. FACEBOOK. E-democracia. Disponível em: <https://www.facebook.com/e-Democracia-14961415 5088732//>. Acesso em: 20 ago. 2016. FACEBOOK. Frente Povo Sem Medo. Disponível em: https://www.facebook.com/groups/1043663679060107/ Acesso em: 5 ago. 2016. FERNANDES, Francisco. Dicionário Brasileiro Globo. 44. ed. São Paulo: Globo, 1996. FERRI, Caroline. A (in) compreensão do paradoxo da soberania popular na democracia contemporânea. 2012. Tese (doutorado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2012. FLICKR. E-democracia. Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/edemocracia/>. Acesso em: 20 ago. 2016. FOLHA DE SÃO PAULO. ‘Rolezinhos’ surgiram com jovens da periferia e seus fãs. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1397831-rolezinhos-surgiram-com-jovens-da-periferia-e-seus-fas.shtml. Acesso em: 19 maio 2016.

Page 156: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

154

FOLHA DE SÃO PAULO. Protesto. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com. br/poder/2016/03/1749528-protesto-na-av-paulista-e-o-maior-ato-politico-ja-registrado-em-sao-paulo.shtml>. Acesso em: 25 maio 2016. FREIRE, André Luiz. Manutenção e retirada dos contratos administrativos inválidos. São Paulo: Malheiros. 2008. G1. Conheça a história dos 'rolezinhos' em São Paulo. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/01/conheca-historia-dos-rolezinhos-em-sao-paulo.html>. Acesso em: 18 maio 2016. GADAMER, Hans Georg. Verdade e método II: complementos e índice. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. GARCIA, Maria. Desobediência civil: direito fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. GONZAGA, Álvaro Luiz Travassos de Azevedo. O direito natural de Platão na República e sua positivação nas leis. 2011. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011. p. 18. Disponível em: <https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/ 5640/1/Alvaro%20Luiz%20Travassos%20de%20Azevedo%20Gonzaga.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2016. GOOGLE. Black Bloc. Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=blackk+bloc +facebook+brasil&ie=utf-8&oe=utf-8&client=firefox-b&gfe_rd=cr&ei=_yi6V4DeIYeF8QeAy6yQCA>. Acesso em: 21 ago. 2016. GOUVEIA, Jorge B. Os direitos fundamentais atípicos. Madrid: Notícias, 1995. GUIA DO CELULAR. História do celular no Brasil. Disponível em: <http://www.guiadocelular.com/2011/10/ historia-do-telefone-celular-no-brasil.html>. Acesso em: 11 mar. 2016>. Acesso em 01 de set.de 2016. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003b. v. II. HOBBES, Thomas. Coleção os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002, IIZUKA, Edson Sadão. Um estudo exploratório sobre a Exclusão Digital e as Organizações sem Fins Lucrativos da cidade de São Paulo. Dissertação. 2003. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2397/44687.pdf?sequence=2>. Acesso em: 21 ago. 2016. JORNAL ESTADO DE SÃO PAULO. Manifestações. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,manifestacoes-contra-dilma-levam-multidao-as-ruas-do-pais,1651418>. Acesso em: 25 maio 2016.

Page 157: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

155

KELSEN, Hans. A democracia. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. KING, Martin Luther. “Letter from Birmingham Jail”. In: Herbert Storing What Country Have I? Political Writings by Black Americans. New York: St Martin’s Press, 1970. LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. LEMOS, André, Cidade digital: portais, inclusão e redes no Brasil. Salvador: EDUFBA, 2007. Disponível em: <https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ufba/137/1/Cidade%20digital.pdf>. Acesso em 11 jul. 2016. LEMOS, André. Cibercultura e Mobilidade: a Era da Conexão. In: Revista Razón y Palabra. <http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n41/alemos.html>. Acesso em: 11 ago. 2016. LIMA FILHO, Acácio Vaz de. O poder na Antiguidade: aspectos históricos e jurídicos. São Paulo: Ícone, 1999. LIMA, Sandra Lúcia Lopes. História da comunicação. São Paulo: Ebart, 1989. LIPSON, Leslie. A civilização democrática. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1966. LISTA DE PALAVRAS. Origem da palavra: site de etimologia. Disponível em: <http://origemdapalavra.com.br/site/pergunta/origem-de-protestar/>. Acesso em: 15 mar. 2016. LOCKE, John. Coleção os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002. LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Martin Claret, 2011. MAIN, Lucimara Aparecida; MORO, Maitê. Reputação da organização: gerenciamento de crise da imagem, como forma de garantir a função social e sustentabilidade financeira da empresa. Florianópolis: FUNJAB. 2014. p. 493-516. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/ adobeebook/principe.pdf>. Acesso em: 16 out. 2015. MARICATO, Ermínia. Cidades rebeldes: passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Carta Maior, 2013. MELO, Mariana. Rolezinhos migram do shopping para as praças em SP. IN: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/sociedade/feitos-em-parques-rolezinhos-funcionam-como-estrategia-de-ocupacao-das-ruas-em-sao-paulo-6724.html>. Acesso em: 18 maio 2016.

Page 158: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

156

MEYER-PFLUG Samantha Ribeiro; SILVEIRA, Vladmir Oliveira da Silveira (Org.). Experiências de Justiça de Transição: Aspectos Relevantes. 1. ed. São Paulo: letras jurídicas, 2015. MEYER-PFLUG Samantha Ribeiro; OLIVEIRA, A. A. (Org.); GUSMAO, H. C. A. (Org.). Direitos Fundamentais e Democracia II. 1. ed. Florianópolis: CONPEDI, 2014. MONTEIRO, Maurício Gentil. O direito de resistência na ordem jurídica constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. MOREIRA JUNIOR, Ronaldo Felix. A cidadania virtual e os obstáculos a sua efetivação. In: Direito, governança e novas tecnologias. CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara. Florianópolis: CONPEDI, 2015. MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. NALINI, José Renato. Celular para ensinar. Disponível em: <https://renatonalini.wordpress.com/>. Acesso em: 08 set. 2016. NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. NOGUEIRA, Marco Aurélio. As ruas e a democracia. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira; Rio de Janeiro: Contraponto, 2013.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Os dois Brasis e as ruas. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/marco-aurelio-nogueira/os-dois-brasis-e-as-ruas/>. Acesso em: 21 mar. 2016. NOVA ESCOLA. Cyberbullying: violência virtual. Disponível em: <http://novaescola.org.br/formacao/cyberbullying-violencia-virtual-bullying-agressao-humilhacao 567858>. Acesso em: 27 jun. 2016. OCCUPY WALL STREET. The and of protest: a new playboy for revolution from the co-creator of occupy wall street. Disponível em: <http://occupywallst.org/>. Acesso em: 28 jul. 2016. PAUPÉRIO, Arthur Machado. Teoria democrática da resistência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. PERELMAN, Chaim. Lógica jurídica: nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 2000. PIERRE, Martim. Dicionário Jurídico 2015: terminologia juridical e forense, brocados latinos. 7 ed. Niterói, RJ: Impetus, 2015. PLATÃO. Apologia de Sócrates, precedido de Êutifron (Sobre a piedade), e seguido de Críton (Sobre o dever). Porto Alegre: L&PM, 2011. PORTAL DA CAMARA DOS DEPUTADOS. E-democracia. Disponível em:

Page 159: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

157

<http://edemocracia. camara.gov.br/comunidades#.V7jwtMVZ7rd>. Acesso em: 20 ago. 2016. PORTAL DA CAMARA DOS DEPUTADOS. Transparência. Disponível em: <http://www2.camara. leg.br/transparencia>. Acesso em: 20 ago. 2016. PORTAL DA LEGISLAÇÃO. E-cidadania. Disponível em: <http://www2.planalto.gov.br/>. Acesso em: 20 ago. 2016. RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. Brasília: Universidade de Brasília, 1981. RECUERO, R. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. Disponível em: <http://www.ichca.ufal.br/graduacao/biblioteconomia/v1/recuero.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2016. RIOS, Aníbal Sierralta. A revolução tecnológica dos meios de comunicação e os desafios do direito e da democracia. Revista Meritum, v. 7, n. 1, p. 305-353, jan./jun. 2012. RODRIGUE, Joelza Ester. História em documento: imagem e texto. São Paulo: FTD, 2002. RODRIGUES Eudes Teotônio; MARQUES, Meire Aparecida Furbino. Os “rolezinhos” vistos à luz da constituição no estado democratico de direito. In: Conpedi. Disponível em: <http://publicadireito.com.br/artigos/?cod=0ce68201e60fced9>. Acesso em: 18 maio 2016. ROLIM, Luiz Antonio. Instituições de Direito Romano. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. ROQUE, Nathaly Campitelli. A ordem pública e seu regime jurídico do direito processual civil as questões de ordem pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 263 – 291. SANTOS, José Erimar; SANTOS, Valmaria Lemos da Costa. Geografia dos protestos e meio comunicacional: redes sociais digitais e manifestações populares. Revista Movimentos Sociais e Dinâmicas Espaciais. Recife, v. 2, n. 2, 2013. Disponível em: <http://www.revista.ufpe. br/revistamseu/index.php/ revista/article/viewFile/50/92>. Acesso em: 18 ago. 2016. SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. SENADO FEDERAL. E-cidadania. Disponível em: http://www12.senado.leg.br/ecidadania. Acesso em: 20 ago. 2016. SENADO FEDERAL. Senado aprova impeachment de Dilma Rousseff. Disponível em: <http://www12.senado.leg.br/noticias/audios/2016/09/senado-aprova-impeachment-de-dilma-rousseff>. Acesso em: 1 ago. 2016.

Page 160: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

158

SOARES, Marcelo Negri. BEZERRA, Eudes Vitor. (In)aplicabilidade do direito ao esquecimento no ambiente internético e a colisão de direitos fundamentais constitucionais: liberdade de expressão versus dignidade da pessoa humana. CONPEDI, v. 2016-1, p. 1-17, 2016. – Disponível em: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/y0ii48h0/kvg8f9o7/ypkuWOl8sDheXHpA.pdf. Acessado em: 1 ago. 2016. SILVEIRA, Vladmir Oliveira da.; CAMPELLO, L. G. B. Educação para o desenvolvimento sustentável (EDS) e o greening das universidades. Revista Thesis Juris, v. 5, p. 549-572, 2016. SILVEIRA, Vladmir Oliveira da.; CECATO, M. A. B. (Org.). Direito Constitucional, Direitos Humanos - III ENCONTRO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DO CONPEDI. 1. ed. Santa Catarina: Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - CONPEDI, 2015. SOARES, Marcelo Negri. Constituição, Devido Processo Legal e Coisa Julgada no Processo Civil. 1. ed. São Paulo: Editora Art Mutatis Mutandis, 2015. SOLANO, Esther. Mascarados: a verdadeira história dos adeptos da tática Black Blocs. São Paulo: Geração Editorial, 2014. SORJ, Bernardo; GUEDES, Luís Eduardo. Exclusão digital: problemas conceituais, evidências empíricas e políticas públicas. Revista Novos Estudos CEBRAP, n. 72, 2005. SOUZA Luciana Cristina de. Análise crítica da legitimidade do estado a partir da aplicação do princípio da resiliência. Direito, governança e novas tecnologias. In: CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara. Florianópolis: CONPEDI, 2015. Disponível em: < http://www.conpedi.org.br/publicacoes/66fsl345/81s48682/0cO30v9hDfn0KKv1.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2016. SOUZA, Rogério Martins de; COSTA, Débora Alves da. A revolta digital: impacto das redes sociais da internet nos protestos de rua dos países árabes em 2011. Revista Cadernos da UniFOA, n. 19, ago. 2012. STEFFEN, César. Midiocracia: uma nova face das democracias contemporâneas. 2010. Tese (Doutorado em Comunicação Social) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. SUA PESQUISA PONTO COM. Tecnologia e história da tecnologia. Disponível em: <http:/ /www.suapesquisa.com/tecnologia/>. Acesso em: 11 mar. 2016.

TAKAHASHI, André. O Black Bloc e a resposta à violência policial. In: Revista Carta Capital. Disponível em: < http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-blackk-bloc-e-a-resposta-a-violencia-policial-1690.html>. Acesso em: 19 jun. 2016. TECMUNDO. A história das redes sociais como tudo começou. Disponível em:

Page 161: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

159

<http://www.tecmundo.com.br/redes-sociais/33036-a- historia-das-redes-sociais-como-tudo-comecou. htm> Acesso em: 10 abr. 2013. TELLES Júnior, Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. THOREAU, Henry David. A desobediência civil. Porto Alegre: L&PM, 1999. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Cem por cento digital. Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/CemPorCentoDigital/>. Acesso em: 27 de jun. de 2016. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Estatísticas do eleitorado – Consulta por região/UF/município. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/consulta-quantitativo>. Acesso em: 08 set. 2016. TRUBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Informatização do voto. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleicoes/biometria-e-urna-eletronica/eleicoes>. Acesso em: 20 ago. 2016. TRUBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Transparência. Disponível em: <http://www.tse.jus.br /transparencia>. Acesso em: 20 ago. 2016.

TWITTER. Discurso. Disponível em: <http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2013/06/21 /interna_politica,410658/discurso-de-dilma-se-torna-o-assunto-mais-discutido-no-twitter.shtml>. Acesso em: 25 maio 2016.

TWITTER. E-democracia. Disponível em: < https://twitter.com/Edemocracia>. Acesso em: 20 ago. 2016. UOL. Eleições. Disponível em: http://eleicoes.uol.com.br/2014/noticias/2014/10/26/dilma-cresce-na-reta-final-e-reeleita-e-emplaca-quarto-mandato-do-pt.htm. Acesso em: 25 maio 2016. UOL. Manifestações de junho de 2013: Qual é o saldo dos protestos um ano depois? Disponível em: < http://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/manifestacoes-de-junho-de-2013-qual-e-o-saldo-dos-protestos-um-ano-depois.htm>. Acesso em: 25 maio 2016. UOL. Política. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/12/02/ eduardo-cunha-impeachment.htm>. Acesso em: 25 maio 2016. VIEGAS, Cláudia Mara de Almeida Rabelo; RABELO, Cesar Leandro de Almeida. A Participação da Sociedade Brasileira nas decisões do Governo a luz da Democracia Digital. Disponível em: < http://ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10708&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 20 ago. 2016.

Page 162: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

160

VILLELA. Gustavo. Fatos históricos: junho de 2013. Disponível em: <http://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/o-brasil-foi-as-ruas-em-junho-de-2013-12500090#ix zz45AUXI4GN>. Acesso em: 10 jun. 2016. VINICIUS, Leo. A guerra da tarifa. São Paulo: Faísca, 2005. XAVIER, Maria Leonor. Questões de Filosofia na Idade Média. Lisboa: Colibri, 2007. YOUTUBE. E-democracia. Disponível em: <https://www.youtube.com/user/edemocraciacd//>. Acesso em 20 ago. 2016. YOUTUBE. Pronunciamento Dilma Rousself. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=xETRrVw8rLI>. Acesso em: 25 maio 2016. YOUTUBE. Revolta do Buzu. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=dQ ASaJ3WgTA>. Acesso em: 11 ago. 2016.

Page 163: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

161

ANEXOS

Anexo I: Resolução SE nº 81/2011 e Resolução SE nº 03/2014

Resolução SE Nº 81, de 16-12-2011

Estabelece diretrizes para a organização curricular do ensino fundamental e do ensino médio nas escolas estaduais

O SECRETARIO DA EDUCAÇÃO, considerando a necessidade de adequar as matrizes curriculares da educação básica às diretrizes nacionais e às metas da política educacional, resolve:

Artigo 1º - A organização curricular anual das escolas estaduais que oferecem ensino fundamental e ensino médio desenvolver-se-á em 200(duzentos) dias letivos, com a carga horária estabelecida pela presente resolução.

Artigo 2º - O ensino fundamental terá sua organização curricular desenvolvida em regime de progressão continuada, estruturada em 9 (nove) anos, constituída por dois segmentos de ensino (ciclos):

I - anos iniciais, correspondendo ao ensino do 1º ao 5º ano;

II - anos finais, correspondendo ao ensino do 6º ao 9º ano.

Parágrafo único - As unidades escolares que ainda venham a manter, em 2012, a organização curricular seriada, deverão proceder aos ajustes necessários à organização anual ora estabelecida.

Artigo 3º - No segmento de ensino correspondente aos anos iniciais do ensino fundamental, de que trata o Anexo I desta resolução, deverá ser assegurada a seguinte carga horária:

I - em unidades escolares com até dois turnos diurnos: carga horária de 25 (vinte e cinco) aulas semanais, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 1.000 (mil) aulas anuais;

II - em unidades escolares com três turnos diurnos e calendário específico de semana de 6 (seis) dias letivos: carga horária de 24 (vinte e quatro) aulas semanais, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 960 (novecentas e sessenta) aulas anuais.

Parágrafo único - As aulas das disciplinas de Educação Física e de Arte, previstas nas matrizes curriculares dos anos iniciais, deverão ser desenvolvidas:

1 - com duas aulas semanais, por professor especialista na conformidade do contido no Anexo I, que integra esta resolução;

2 - com acompanhamento obrigatório do professor regente da classe e do Aluno/Pesquisador da Bolsa Alfabetização, quando for o caso;

3 - em horário regular de funcionamento da classe;

4 - pelo professor da classe, quando comprovada a inexistência ou ausência do professor especialista.

Artigo 4º - No segmento de ensino correspondente aos anos finais do ensino fundamental deverá ser assegurada a seguinte carga horária:

I - no período diurno, em unidades escolares com até dois turnos diurnos: carga horária de 30 (trinta) aulas semanais, sendo 6 (seis) aulas diárias, com duração de 50

Page 164: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

162

(cinquenta) minutos cada, totalizando 1.200 (mil e duzentas) aulas anuais, conforme disposto no Anexo II que integra esta resolução;

II - no período diurno, em unidades escolares com três turnos diurnos, apresentando calendário específico e semana de 6 (seis) dias letivos: carga horária de 24 (vinte e quatro) aulas semanais, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 960 (novecentas e sessenta) aulas anuais, na conformidade do Anexo III desta resolução;

III - no período noturno: carga horária de 27 (vinte e sete) aulas semanais, com duração de 45 (quarenta e cinco) minutos cada, totalizando 1.080 (mil e oitenta) aulas anuais, sendo que as aulas da disciplina Educação Física deverão ser ministradas fora do período regular de aulas ou aos sábados, conforme dispõe o Anexo IV que integra esta resolução.

Artigo 5º - O ensino médio, desenvolvido em três séries anuais, terá sua organização curricular estruturada como curso de sólida formação básica que abre, para o jovem, efetivas oportunidades de consolidação das competências e conteúdos necessários ao prosseguimento dos estudos em nível superior e/ou à inserção no mundo do trabalho.

Parágrafo único - O ensino médio terá sua matriz curricular organizada:

1 - no período diurno: com carga horária de 30 (trinta) aulas semanais, sendo 6 (seis) aulas diárias, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 1.200 (mil e duzentas) aulas anuais, conforme dispõe o Anexo V desta resolução;

2 - no período noturno: com carga horária de 27 (vinte e sete) aulas semanais, sendo 5 (cinco) aulas diárias, com duração de 45 (quarenta e cinco) minutos cada, totalizando 1.080 (mil e oitenta) aulas anuais, observando-se que as aulas da disciplina Educação Física deverão ser ministradas fora do período regular de aulas ou aos sábados, conforme dispõe o Anexo VI que integra esta resolução.

Artigo 6º - Os cursos da modalidade de educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, observada a organização semestral que os caracteriza, adotarão, respectivamente, as matrizes curriculares objeto dos Anexos IV e VI da presente resolução, exceto com relação às aulas de Ensino Religioso, de acordo com o contido na Resolução SE nº 21, de 29.1.2002.

Artigo 7º - O Ensino Religioso, obrigatório à escola e facultativo ao aluno, será oferecido aos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, se houver demanda, na conformidade do que dispõe a Resolução SE nº 21, de 29.1.2002.

Artigo 8º - A Língua Espanhola, obrigatória à escola e facultativa ao aluno, será oferecida, fora do horário regular de aulas, a alunos da 1ª série do Ensino Médio, se houver demanda, de acordo com as disposições da Lei federal nº 11.161, de 5.8.2005 e da Resolução SE nº 5, de 14.1.2010.

Artigo 9º - As matrizes curriculares, constantes dos Anexos que integram esta resolução, deverão ser adotadas a partir do próximo ano letivo, em todos os anos e séries que compõem os ensinos fundamental e médio, respectivamente.

Artigo 10 - Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário, em especial a Resolução SE nº 98, de 23 de dezembro de 2008.

Notas:

Res. SE nº 21/02, à pág. 98 do vol. LIII;

Res. SE nº 05/10, à pág. 108 do vol. LXIX;

Lei nº 11.161/05, à pág. 52 do vol. 32;

Page 165: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

163

Revoga a Res. SE nº 98/08, à pág. 231 do vol. LXVI.

Alterada pela Res. SE nº 3/14.

ANEXO I * Matriz Curricular Básica Para o Ensino Fundamental Ciclo I – 1º ao 5º ano

Retificado de acordo com publicação no DOE de 28/12/2011 – Seção I – Pág. 50

ANEXO II - Matriz Curricular Básica Para o Ensino Fundamental

Ciclo II – 6º ao 9º ano - Período Diurno

Page 166: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

164

*Ensino Religioso – Se não houver demanda acrescentar 1 (uma) aula para Matemática.

ANEXO III ** Matriz Curricular Básica Para o Ensino Fundamental

Ciclo II – 6º ao 9º ano - Período Diurno Três Turnos

* Ensino Religioso – Se não houver demanda acrescentar 1 aula para Língua Portuguesa.

** Retificado de acordo com publicação no DOE de 28/12/2011 – Seção I – Pág. 50

ANEXO IV - Matriz Curricular Básica Para o Ensino Fundamental

Ciclo II – 6º ao 9º ano - Período Noturno

Page 167: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

165

*Educação Física deve ser oferecida no contraturno ou aos sábados. ** Ensino Religioso – Se não houver demanda, acrescentar 1 (uma) aula para Matemática.

ANEXO V - Matriz Curricular – Ensino Médio

Período Diurno

Page 168: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

166

ANEXO VI ** - Matriz Curricular – Ensino Médio

Período Noturno

*A Educação Física deve ser oferecida no contraturno ou aos sábados.

** Retificado de acordo com publicação no DOE de 22/12/2011 – Seção I, pág. 23.

Page 169: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

167

Resolução SE 3, de 16-1-2014

Altera dispositivos da Resolução SE 81, de 16-12- 2011, que estabelece diretrizes para a organização curricular do ensino fundamental e do ensino médio

nas escolas estaduais

O Secretario da Educação, à vista do que lhe representou a Coordenadoria de Gestão da Educação Básica- CGEB,

Resolve:

Artigo 1º - O Anexo I, que integra a presente resolução, passa a substituir o Anexo I da Resolução SE 81, de 16 de dezembro de 2011, abrangendo, em seus Subanexos 1 e 2, as seguintes matrizes curriculares:

I – no Subanexo 1: a Matriz Curricular – A, a ser implementada nas unidades escolares que darão continuidade, e nas unidades escolares inscritas em 2014, às aulas de Língua Inglesa – Early Bird, no 1º, 2º, 3º, 4º e 5º anos do ensino fundamental;

II – no Subanexo 2: a Matriz Curricular – B, a ser implementada nas unidades escolares que não oferecerão, em 2014, aulas de Língua Inglesa.

Artigo 2º - Os dispositivos da Resolução SE nº 81, de 16 de dezembro de 2011, abaixo relacionados, passam a vigorar com a seguinte redação:

I – o artigo 2º:

“Artigo 2º - O ensino fundamental terá sua organização curricular estruturada na seguinte conformidade:

I – nos anos iniciais, correspondendo ao ensino do 1º ao 5º ano;

II – nos anos finais, correspondendo ao ensino do 6º ao 9º ano.

Parágrafo único – Para efeito do regime de progressão continuada, os anos iniciais e finais do ensino fundamental serão organizados em 3 (três) ciclos de aprendizagem, na conformidade do que dispõe a Resolução SE n º 74, de 8 de novembro de 2013.” (NR);

II – o artigo 3º:

“Artigo 3º - Nos anos iniciais do ensino fundamental, deverá ser assegurada:

I – nas unidades escolares com até dois turnos diurnos, a carga horária de 25 (vinte e cinco) aulas semanais, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 1.000 (mil) aulas anuais;

II - em unidades escolares com três turnos diurnos e calendário específico com semana de 6 (seis) dias letivos, a carga horária de 24 (vinte e quatro) aulas semanais, com duração de 50 (cinquenta) minutos cada, totalizando 960 (novecentas e sessenta) aulas anuais.

§ 1º - As aulas das disciplinas de Educação Física, de Arte e de Língua Estrangeira Moderna - Inglês deverão ser desenvolvidas com a carga horária

Page 170: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

168

de 2 (duas) aulas semanais em cada disciplina, na conformidade da Matriz Curricular – A, constante do Subanexo 1 do Anexo I desta resolução.

§ 2º - As aulas das disciplinas, a que se refere o parágrafo anterior, serão ministradas, no horário regular de funcionamento da classe:

1. por professor especialista em cada disciplina, tendo acompanhamento obrigatório do professor regente da classe e, quando existente, também do Aluno/Pesquisador do Projeto Bolsa Alfabetização; ou

2. pelo professor regente da classe, quando comprovada a inexistência ou ausência do professor especialista.

§ 3º - Os conceitos, saberes e conhecimentos referentes aos componentes curriculares que integram as áreas de Ciências da Natureza e de Ciências Humanas deverão ser trabalhados integralmente, por meio de projetos temáticos que serão objeto de orientação específica da Coordenadoria de Gestão da Educação Básica - CGEB.” (NR).

Artigo 3º - Ficam acrescentados à Resolução SE 81, de 16 de dezembro de 2011:

I - item 3 ao parágrafo único do artigo 5º:

“3 - no período diurno, em unidades escolares com três turnos diurnos, apresentando calendário específico e semana de 6 (seis) dias letivos: carga horária de 24 (vinte e quatro) aulas semanais, com duração de 50 ( cinquenta) minutos cada, totalizando 960 (novecentas e sessenta) aulas anuais.”; (NR)

II – o Anexo VII, que integra esta resolução.

Artigo 4º - Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário.

ANEXO I

Subanexo 1 Matriz Curricular - A Ensino Fundamental - Anos Iniciais – 1º ao 5º ano

Page 171: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

169

Subanexo 2 Matriz Curricular - B Ensino Fundamental - Anos Iniciais – 1º ao 5º ano

ANEXO VII Matriz Curricular – Ensino Médio – Três Turnos Período Diurno

Page 172: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

170

Obs.: *As aulas de Educação Física poderão ser realizadas fora do período regular

de aulas. (Republicada por ter saído com incorreções).

Os Subanexos 1 e 2, do Anexo I, da Resolução SE 3, de 16.1.2014, publicada em 17.1.2014 e republicada em 21.1.2014 estão atualizados de acordo com retificação publicada no DOE de 25/1/2014 – Seção I, pág. 16.

Notas: Altera Dispositivo da Res. SE nº 81/11; Res. SE nº 74/13.

Page 173: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

171

Anexo II: – Proposta Minuta Anteprojeto de Resolução

Resolução SE __, de _____ de 2016

Altera a Resolução SE 81 de 16-12-2011, que estabelece diretrizes para a

organização curricular do ensino fundamental e do ensino médio nas escolas

estaduais.

O Secretário da Educação, levando em consideração as novas formas de

participação democrática,

Resolve:

Artigo 1º - Alteração de artigo:

Os dispositivos da Resolução SE nº 81, de 16 de dezembro de 2011, abaixo

relacionados, passam a vigorar com a seguinte redação:

I – o artigo 5º:

“Artigo 5º - O ensino médio, desenvolvido em três séries anuais, terá sua

organização curricular estruturada como curso de sólida formação básica que abre,

para o jovem, efetivas oportunidades de consolidação das competências e

conteúdos necessários ao prosseguimento dos estudos em nível superior e/ou à

inserção no mundo do trabalho, consolidação e o aprofundamento da cidadania/e-

cidadania e da democracia/ciberdemocracia.

Artigo 2º - Acrescenta o artigo 8º A:

I – Artigo 8º A

“Artigo 8º A - A disciplina Cidadania e redes sociais, obrigatória à escola e

facultativa ao aluno, será oferecida, fora do horário regular de aulas, a alunos da 2ª

série do Ensino Médio, se houver demanda, preferencialmente em laboratórios de

informática ou por intermédio do Bring Your Own Device -“BYOD.

Artigo 3º - Alteração de anexo:

I - O Anexo I, que integra a presente resolução, passa a substituir o Anexo V

da Resolução SE 81, de 16 de dezembro de 2011.

II - O Anexo II, que integra a presente resolução, passa a substituir o Anexo VI

Page 174: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

172

da Resolução SE 81, de 16 de dezembro de 2011.

Artigo 4º - Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando

revogadas as disposições em contrário.

ANEXO I - Matriz Curricular – Ensino Médio

Período Diurno

ANEXO II - Matriz Curricular – Ensino Médio

Período Noturno

Page 175: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

173

Justificativa:

1) A Lei de Diretrizes Básicas – Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996,

dispõe em seu artigo 27, caput e inciso I, que os conteúdos curriculares da educação

básica observarão a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos

direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática.

2) O diploma supra, dispõe, também, em seu artigo 35, que o ensino

médio terá como finalidade a preparação básica para a cidadania e o aprimoramento

do educando como pessoa humana.

3) Já o artigo 36, §1º, determina que os conteúdos, as metodologias e as

formas de avaliação devem garantir ao educando, ao final do ensino médio, domínio

dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna, bem

como conhecimento das formas contemporâneas de linguagem.

Page 176: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

174

4) É notório que a participação democrática já não ocorre como outrora,

não obstante, a democratização ampla do acesso às informações alterou as

necessidades dos cidadãos em vários aspectos, mais a inclusão social é um ponto

crucial que é distanciada, cada vez mais, pela exclusão digital.

5) Assim, a inclusão digital, somente atingirá todos por intermédio da

educação, não apenas com a compra de computadores e disponibilização de

espaços físicos e acesso à internet, uma vez que a escola deve ir além.

6) As inovações tecnológicas, a internet, o uso das redes sociais ocorre

de forma tão acelerada que não podemos ficar para traz e a conscientização é o

melhor caminho a ser percorrido.

7) Via de regra, os educandos matriculados no 2º ano têm 16 (dezesseis)

anos, idade prevista Constituição para o início do exercício da cidadania e

democracia representativa pelo voto.

8) Como o ensino médio cabe aos Estados e o Distrito Federal, ficando

sobre sua competência baixar normas complementares para o seu sistema de

ensino, resta evidente que o anteprojeto de Resolução se justifica.

9) O Estado de São Paulo, é visto como referência nacional, motivo pelo

qual uma vez introduzida tal preceito normativo, certamente os demais Estados

adotaram medidas similares.

Pelas razões supramencionadas e outras que podem vir a ser discutidas para

melhor elaboração do presente projeto espera-se que o tema obtenha análise

adequada se seja posto em prática.

São Paulo, ____ de ________ de 2016.

____________________

Proponente do Projeto

Page 177: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

175

Anexo III: Proposta de Plano de Ensino

PLANO DE ENSINO - 2016

2ª Série – Ensino Médio

Disciplina: CIDADANIA E REDES SOCIAIS Código:

Posição da grade do curso: 2º série – Ensino

Médio Carga horária semestral: A definir

EMENTA:

Estado e Sociedade. Teoria Política. Cidadania, Cidadão e e-cidadão. Democracia e

ciberdemocracia. Participação democrática. Tecnologias Digitais da Informação e da

Comunicação (TDICs). Hardware e Software. Nocões de informática. Internet. Redes

sociais. Direitos e deveres do e-cidadão (crimes digitais)

OBJETIVOS:

1) Geral: Dotar o aluno de uma visão ampla e crítica de aspectos comuns à política, a

cidadania e democracia. 2) Específicos: a) Iniciar o educando na vida cidadã, propiciando os

conceitos e fundamentos básicos da teoria política clássica e moderna; b) Proporcionar

conhecimento básico de informática, internet e redes sociais; c) Proporciona elementos para

um posicionamento crítico face aos temas estudados; d) Disponibilizar relações com áreas

afins e com a realidade e outras áreas de conhecimento; e) Discutir a configuração do

Estado e democracia brasileira na contemporaneidade via redes sociais.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO (PLANOGRAMA):

1) Cidadania: dos antigos aos modernos.

2) Cidadão e e-cidadão.

3) Cidadania: na contemporaneidade – o uso das redes sociais.

4) Democracia: dos antigos aos modernos.

5) Formas de democracia.

6) Ciberdemocracia, Ética e cibercultura.

7) Voto e urna eletrônica.

8) Revolução tecnológica e o desenvolvimento da cibernética

9) Noções básicas de informática.

Page 178: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

176

10) Hardware e Software.

11) Editores de texto e planilhas eletrônicas.

12) Fundamentos e conceitos de redes de computadores.

13) Pesquisas na Internet.

14) Redes sociais.

15) Fundamentos e desafios contemporâneos do e-cidadão: incluir para excluir.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA:

ALVIM, Marcia Cristina de Souza. A educação inclusiva na Constituição Federal de 1988.

Revista Jurídica Logos, v. 4, p. 231-250, 2008.

ARISTÓTELES. Política: os pensadores. São Paulo: Nova Cultura. 1999.

BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política. São

Paulo: Paz e Terra, 2012.

BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro:

Paz e Terra, 1986.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 17. ed. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 2013. [2010, 2006, 2005, 2001].

CASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo (Orgs.). A sociedade em rede: do conhecimento à

ação política. Belém: Imprensa Nacional, 2005.

DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Teoria geral do Estado e ciência

política. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.

NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. – 10. ed. Ver., atual. e ampl. – São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2013.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:

HABERMANS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. 2. ed. Rio de

Janeiro: Tempo brasileiro, 2003.

HADDAD, Eneida Gonçalves de Macedo. Justiça e segurança na periferia de São Paulo:

os centros de integração da cidadania. São Paulo: IBCCRIM - Núcleo de pesquisa, 2003.

IIZUKA, Edson Sadão. Um estudo exploratório sobre a Exclusão Digital e as

Organizações sem Fins Lucrativos da cidade de São Paulo. Dissertação. 2003. Disponível

em:

<http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2397/44687.pdf?sequence=2>

LEVY, Evelyn. Democracia nas cidades globais um estudo sobre Londres e São Paulo.

Page 179: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

177

São Paulo: Studio Nobel, 1997.

NALINI, José Renato. Blog do Renato Nalini. Disponível em:

https://renatonalini.wordpress.com/

NOGUEIRA, Marco Aurélio. As ruas e a democracia. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira;

Rio de Janeiro: Contraponto, 2013.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Possibilidades da Política. Blog – Disponível em:

http://marcoanogueira.blogspot.com.br/

SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo

de Cultura, 1961.

METODOLOGIA DE ENSINO:

O professor deve substituir a aula-monólogo por exposições dialógicas e interativas,

utilizando-se de tecnologias que se comunicam por entre as diferentes mídias, promovendo

reflexão e interpretação do conteúdo, bem como fomentando a pesquisa e a leitura de obras

doutrinárias recomendadas.

METODOLOGIA DE AVALIAÇÃO:

A definir...

Page 180: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

178

Anexo IV: PROJETO DE LEI DO SENADO

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº , DE 2010

Altera a Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, para estabelecer a possibilidade de subscrição eletrônica para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O art. 13 da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 3º e 4º:

“Art. 13. .............................................................................................

.............................................................................................................

§ 3º Para fins do disposto no caput serão contabilizadas as assinaturas manuais e eletrônicas dos eleitores.

§ 4º Os projetos que não lograrem alcançar o número mínimo de assinaturas tramitarão na forma de sugestões legislativas.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Hoje a Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, exige para os projetos de iniciativa popular a assinatura de 1% dos eleitores do País, distribuídos em pelo menos cinco Estados, com um percentual mínimo de eleitores em cada um deles. O eleitorado brasileiro provavelmente ultrapassa os 135 milhões de cidadãos, o que situa a exigência da Lei em algum ponto próximo a 1 milhão e 350 mil assinaturas.

Page 181: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

179

A magnitude dessa exigência inibe, e quase chega a inviabilizar, a meu ver, a mobilização em torno da apresentação de projetos de iniciativa popular. Afinal, ao trabalho de coleta, é preciso acrescentar o trabalho, ainda maior, de controle dessas assinaturas, indispensável à prevenção da fraude.

Nas condições estipuladas pela Lei, portanto, um importante instrumento de participação direta do cidadão, consagrado na Carta de 1988, permanece pouco utilizado.

O presente projeto de lei procura sanar essa situação e estimular a participação popular no que respeita à iniciativa legislativa. Para tanto propõe:

a) permitir a contabilização de assinaturas eletrônicas, coletadas pelos organizadores do movimento ou pela própria Câmara dos Deputados; e

b) direcionar os projetos que não atinjam o percentual exigido ao processo legislativo, na forma de sugestões legislativas, sujeitos, portanto, ao mesmo rito que as propostas originadas de sindicatos, associações e organizações não governamentais.

A alteração da regra no sentido proposto permitirá o aumento da participação direta do cidadão em termos de iniciativa legislativa e contribuirá para consolidar a legitimidade das instituições representativas no País.

Sala das Sessões,

Senadora SERYS SLHESSARENKO

Page 182: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

180

Anexo V: PARECER – PLS 129/201

PARECER Nº , DE 2012

Da COMISSÃO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA, INOVAÇÃO, COMUNICAÇÃO E INFORMÁTICA, sobre o Projeto de Lei do Senado nº 129, de 2010, da Senadora SERYS SLHESSARENKO, que altera a Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, para estabelecer a possibilidade de subscrição eletrônica para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular.

RELATOR: Senador VALDIR RAUPP

I – RELATÓRIO

Encontra-se sob apreciação da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) o Projeto de Lei do Senado nº 129, de 2010, de autoria da Senadora Serys Slhessarenko, que altera a Lei nº 9.079, de 18 de novembro de 1998, para estabelecer a possibilidade de subscrição eletrônica para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular. Após a manifestação desta Comissão, o projeto será analisado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), em decisão terminativa.

O projeto acrescenta dois parágrafos ao art. 13 da Lei nº 9.079, de maneira a permitir a contagem das assinaturas eletrônicas de eleitores em projetos de lei de iniciativa popular e determinar a tramitação daqueles projetos que não alcançarem o número mínimo de assinaturas na forma de sugestões legislativas.

Na justificação, a autora lembra que a lei exige hoje a assinatura de 1% dos eleitores do País para a apresentação de projetos de lei de iniciativa popular, distribuídos em pelo menos cinco Estados, com um percentual mínimo de eleitores em cada um deles. Como o eleitorado brasileiro ultrapassa os 135 milhões de eleitores, essa exigência importa hoje em mais de um milhão e trezentos e cinquenta mil assinaturas.

A autora aponta que coletar esse montante de assinaturas e controlar sua autenticidade constituem tarefas difíceis, que na prática inviabilizam um importante instrumento de participação direta do cidadão, consagrado na Constituição de 1988.

Page 183: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

181

A autora defende que a inclusão das assinaturas eletrônicas na coleta tornaria mais fácil o cumprimento da exigência legal e resultaria no incremento da participação popular em termos de iniciativa das leis. No mesmo sentido, afirma, caminha a segunda proposta objeto do presente projeto: as alterações que não lograssem chegar ao número de assinaturas exigido tramitariam na forma de sugestões legislativas.

Não foram apresentadas emendas ao projeto.

II – ANÁLISE

Nos termos do art. 104-C do Regimento Interno do Senado Federal (RISF), compete à CCT opinar sobre proposições pertinentes ao grande tema da informática. O reconhecimento da validade das assinaturas eletrônicas enquadra-se nesse tema, razão pela qual o projeto sob exame integra o campo temático desta Comissão.

No que respeita ao mérito, cabe assinalar que a utilização cada vez maior de assinaturas eletrônicas constitui aspecto inescapável da tendência à informatização de processos e procedimentos que se verifica no mundo e no Brasil.

Tal tendência avança célere no universo comercial, onde um percentual cada vez maior das transações é efetuado por meio eletrônico. E avança também no âmbito das ações governamentais. Cabe mencionar, como exemplos no ordenamento legal recente sobre a matéria, a Medida Provisória nº 2002, de 24 de agosto de 2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras; a Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, que autorizou os tribunais a utilizar meios eletrônicos para executar e comunicar oficialmente atos processuais; e o Código de Processo Civil, que permite, em seu art. 154, o uso, por parte dos tribunais, de meios eletrônicos, desde que atendidos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e interoperabilidade da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras.

Há instrumental tecnológico para garantir, portanto, a autenticidade das assinaturas eletrônicas, instrumental esse em processo de aperfeiçoamento acelerado, como quase tudo no campo da informática. Por essa razão, o projeto acerta ao não tratar de minúcias operacionais, que devem ser objeto de norma interna da Câmara dos Deputados.

É preciso considerar ainda as consequências do reconhecimento das assinaturas eletrônicas para fins de apresentação de projetos de lei de iniciativa popular. Nesse aspecto a mudança seria radical. Podemos afirmar que a iniciativa popular passaria de uma situação de quase inviabilidade, demonstrada pela quantidade mínima de projetos com essa origem já apresentados, para a viabilidade completa. O resultado previsível, como aponta a autora do projeto, será um incremento considerável na participação popular, a educação cívica dos eleitores e a consolidação da legitimidade das instituições democráticas.

Page 184: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

182

O mesmo resultado positivo teria a segunda mudança proposta. Hoje proposições de associações pequenas, com representação de interesses particulares, locais ou profissionais, são legítimas para originar sugestões legislativas. Como recusar igual legitimidade a proposições apoiadas por centenas de milhares de eleitores?

Considero, portanto, a proposta exequível, meritória, com efeitos benéficos de médio e longo prazo difíceis de estimar na perspectiva presente.

III – VOTO

Em razão do exposto, o parecer é pela aprovação do Projeto de Lei nº 129, de 2010.

Sala da Comissão, 13/06/2012

Sen. Gim Argello, Vice-Presidente, no exercício da Presidência

Sen. Valdir Raupp, Relator

Page 185: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP Eudes ... · de entender o papel das redes sociais no contexto de mudança, bem como quais os desafios contemporâneos para

183

Anexo VI: Proposta de Petição online: