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158 POR QUE O SURDO ESCREVE DIFERENTE? Esp. Eliziane Manosso Streiechen (UNICENTRO) Resumo. Professores que têm alunos surdos em salas de aula (inclusão) enfrentam inúmeras dificuldades de comunicação. Alunos que se comunicam por meio da Língua Brasileira de Sinais LIBRAS têm um modo peculiar de escrever. Por não usarem os conectivos (conjunções, preposições, alguns verbos, etc.) em sua língua de sinais ou se comunicarem por meio de gestos caseiros criados pela família, a confrontação da língua escrita tradicional com a maneira que o surdo se comunica e escreve gera conflitos algumas vezes incompreensíveis. Portanto, este artigo irá mostrar alguns textos produzidos por alunos surdos usuários da Língua Brasileira de Sinais LIBRAS e compará-los com a Língua Portuguesa escrita analisando as diferenças entre as duas línguas. Alguns métodos e estratégias positivas utilizadas neste processo serão apontados, assim como dicas importantes sobre o olhar diferenciado que os profissionais da educação devem ter ao avaliar a escrita dos alunos surdos. Palavras-chave: Língua Brasileira de Sinais, intérprete, inclusão, bilinguísmo, surdos Abstract. Teachers who have deaf students in their classrooms (inclusion) face a lot of communication difficulties. The students who communicate themselves by means of LIBRAS Brazilian Sign Language have a special way of writing. Due to the fact that they don‟t use connecting words (conjunctions, prepositions, some verbs, etc) in their sign language, or to the use of domestic gestures created by their families, the confrontation between the traditional written language and the way deaf people communicate themselves and write, generates conflicts which are, sometimes, not understandable. This article will present, therefore, some written productions made by deaf students who apply LIBRAS Brazilian Sign Language for communication, and it will, as well, compare them to the written Portuguese Language in order to analyze the differences between both languages. Some methods and positive strategies employed in this process will be pointed out, as well as important considerations the Education professionals must have in mind when evaluating deaf students writing. Keywords: Brazilian Sign Language, interpreter, inclusion, bilingualism, deaf people.

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POR QUE O SURDO ESCREVE DIFERENTE?

Esp. Eliziane Manosso Streiechen (UNICENTRO)

Resumo. Professores que têm alunos surdos em salas de aula (inclusão) enfrentam

inúmeras dificuldades de comunicação. Alunos que se comunicam por meio da Língua

Brasileira de Sinais – LIBRAS têm um modo peculiar de escrever. Por não usarem os

conectivos (conjunções, preposições, alguns verbos, etc.) em sua língua de sinais ou se

comunicarem por meio de gestos caseiros criados pela família, a confrontação da língua

escrita tradicional com a maneira que o surdo se comunica e escreve gera conflitos

algumas vezes incompreensíveis. Portanto, este artigo irá mostrar alguns textos

produzidos por alunos surdos usuários da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e

compará-los com a Língua Portuguesa escrita analisando as diferenças entre as duas

línguas. Alguns métodos e estratégias positivas utilizadas neste processo serão

apontados, assim como dicas importantes sobre o olhar diferenciado que os

profissionais da educação devem ter ao avaliar a escrita dos alunos surdos.

Palavras-chave: Língua Brasileira de Sinais, intérprete, inclusão, bilinguísmo, surdos

Abstract. Teachers who have deaf students in their classrooms (inclusion) face a lot of

communication difficulties. The students who communicate themselves by means of

LIBRAS – Brazilian Sign Language – have a special way of writing. Due to the fact that

they don‟t use connecting words (conjunctions, prepositions, some verbs, etc) in their

sign language, or to the use of domestic gestures created by their families, the

confrontation between the traditional written language and the way deaf people

communicate themselves and write, generates conflicts which are, sometimes, not

understandable. This article will present, therefore, some written productions made by

deaf students who apply LIBRAS – Brazilian Sign Language for communication, and it

will, as well, compare them to the written Portuguese Language in order to analyze the

differences between both languages. Some methods and positive strategies employed in

this process will be pointed out, as well as important considerations the Education

professionals must have in mind when evaluating deaf students writing.

Keywords: Brazilian Sign Language, interpreter, inclusion, bilingualism, deaf people.

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1. Introdução

O processo de elaboração da escrita de alunos surdos tem sido motivo de grande

preocupação para professores que trabalham na área da surdez ou com a inclusão,

gerando inúmeros questionamentos sobre as estratégias e os métodos a serem utilizados

na produção de textos escritos e também os critérios que devem ser considerados no

momento da avaliação da escrita destes alunos.

Diante disso, este artigo visa desmistificar alguns conceitos equivocados sobre

as especificidades do sujeito surdo no processo da escrita, apresentando modelos de

textos produzidos por estudantes surdos entre oito e doze anos de idade que, hoje,

frequentam o Ensino Médio em um Colégio da Rede Pública de Ensino na cidade de

Ivaí/PR.

A metodologia utilizada com estes alunos durante todo o Ensino Fundamental

foi a Bilíngue. Este modelo metodológico consiste em trabalhar com duas línguas no

contexto escolar e, neste caso, as línguas em questão são a Língua Portuguesa (escrita) e

a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS. Para (SKLIAR 1997, p.144).

[...] o modelo bilíngüe propõe, então, dar às crianças surdas as

mesmas possibilidades psicolingüísticas que tem a ouvinte. Será só

desta forma que a criança surda poderá atualizar suas capacidades

lingüístico-comunicativas, desenvolver sua identidade cultural e

aprender.

O Decreto Federal 5.626, de 22 de dezembro de 2005, estabelece que os alunos

surdos devem ter uma educação bilíngue, na qual a Língua Brasileira de Sinais é a

primeira e a Língua Portuguesa, na modalidade escrita, a segunda. Neste modelo, a

Língua Brasileira de Sinais é a língua de instrução no sentido de que vai possibilitar o

acesso aos conteúdos de todas as disciplinas, inclusive de Língua Portuguesa. Para isso,

ela deve ser adquirida pelas crianças surdas o mais cedo possível, o que, em geral, vai se

dar na escola, preferencialmente na interação com interlocutores surdos, usuários da

Língua Brasileira de Sinais.

De acordo com (FERNANDES, 2007, p. 2):

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...embora brasileiras, as crianças surdas necessitam de uma

modalidade lingüística que atenda as suas necessidades visuais

espaciais de aprendizagem, o que significa ter acesso à Libras, assim

que for diagnosticada a surdez, para suprir as lacunas que a oralidade

não preenche em seu processo de desenvolvimento da linguagem e

conhecimento de mundo. Essa situação configura o bilingüismo dos

surdos brasileiros: aprender a língua de sinais, como primeira língua,

preferencialmente de zero a três anos, seguida do aprendizado do

português, como segunda língua.

2. Surdez: uma experiência visual

Antigamente os surdos eram discriminados e proibidos de usar a sua língua de

sinais. O acesso a todos os meios de interação social era limitado ou restrito. Os surdos

não podiam frequentar as escolas, pois eram considerados seres incapazes e sem

pensamento. Isso acabou culminando numa grande proporção de surdos analfabetos e

totalmente excluídos da sociedade.

Encontrar um método ideal para que pessoas surdas adquiram a língua

portuguesa escrita tem suscitado incontáveis discussões entre os estudiosos do ramo.

Muitas vezes as pessoas acham que basta escrever uma palavra no papel para

que o surdo entenda o que se está falando. Isso se deve ao fato que as pessoas ouvintes

ou tidas como “normais” aprendem ouvindo e associam o som ao objeto ou à coisa que

se fala. Assim sendo, basta falarmos a palavra “cavalo” para imediatamente se vir à

mente a imagem do animal. Também associamos a palavra silabicamente à imagem, o

que aprendemos a fazer desde pequenos.

Com o surdo tudo é diferente: ele precisa associar o objeto a um sinal específico.

Para cada nova palavra, novo sinal. Esse sinal deve ser comum entre eles e não

específico como o que algumas famílias criam em casa, os chamados gestos caseiros.

O ouvinte aprende pelo canal auditivo relacionando as palavras aos fonemas

apresentados a ele. O surdo aprende por meio do canal visual, portanto, precisa se

apoiar na imagem da palavra, seu sinal e seu significado e não nos fonemas. Ele tem em

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sua mente apenas o objeto, ou seja, a imagem das coisas que vê e, por isso busca

relacionar esta imagem ao sinal e a palavras para gerar sua escrita.

Por isso não se obtém resultado satisfatório somente escrevendo uma palavra para o

surdo, pois ele tem que associá-lo a um sinal que conheça. De acordo com (PERLIN,

2010, p. 510):

Um surdo não vai conseguir utilizar-se de signos ouvintes como, por

exemplo, a epistemologia de uma palavra. Ele somente pode entendê-

la até certo ponto, pois a entende dentro de signos visuais. O mesmo

acontece com a pronúncia do som de palavras. Não adianta insistir

neste ponto. Se dissermos que a escrita é do ouvinte e o surdo aprende

a escrita, estaríamos cometendo equívocos. O pensamento visual da

escrita é um dos aspectos de que o surdo se serve constantemente,

muito embora, hoje, os surdos evidenciem esforços demasiados em ler

e escrever. A escrita do surdo não vai se aproximar da escrita ouvinte.

Este trabalho enfatizará o fato de que o surdo precisa ser inserido em um

ambiente favorável para a aquisição das duas línguas, o que se faz necessário cercar-se

de pessoas que tenham domínio de ambas as línguas, ou seja, a língua portuguesa e a

língua de sinais. Conforme destaca (CAPOVILLA, 2008, p.1540):

A filosofia educacional do Bilinguismo defende a tese de que a

criança seja mergulhada desde tenra idade na Língua de Sinais para

que possa atingir suficiente desenvolvimento lingüístico e cognitivo. É

este desenvolvimento que lhe possibilitará, mais tarde, a fazer uso da

Língua de Sinais com metalinguagem para a aquisição das habilidades

de leitura e escrita.

Conforme citado acima, uma criança ouvinte aprende, desde muito pequena,

através do canal auditivo e pela percepção visual, muitas palavras. Quando vem para a

escola, seu vocabulário é amplo e suficiente para produzir textos. Apenas é preciso

ensiná-la a ler e a escrever tais palavras. Ela já sabe que tal palavra denomina certo

objeto fazendo a relação do significado com o significante, apenas não conhece o

“código” escrito da palavra.

O surdo grava todas as imagens que vê, mas não ouve, portanto não sabe as

denominações. Quando vem para escola, não adianta apenas mostrar-lhe o sinal ou a

escrita sem lhe apresentar o objeto e vice-versa. Portanto, a criança surda deve ser

inserida à escola assim que a surdez for diagnosticada, pois, antes de iniciar o processo

de alfabetização, ela deve adquirir uma língua, no caso das crianças surdas brasileiras,

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essa língua é a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS. Como diz (QUADROS, 1997, p.

84):

A Libras é adquirida pelos surdos brasileiros de forma natural

mediante contato com sinalizadores, sem ser ensinada,

consequentemente, deve ser sua primeira língua. A aquisição dessa

língua precisa ser assegurada para realizar um trabalho sistemático

com a L2, considerando a realidade do ensino formal. A necessidade

formal do ensino da língua portuguesa evidencia que essa língua é, por

excelência, uma segunda língua para a pessoa surda.

Quanto mais precoce a criança surda iniciar o processo de estimulação mais

rápido ela irá se desenvolver.

Para alfabetizar o aluno surdo faz-se necessário trabalhar algumas etapas

importantes: o objeto, o sinal (LIBRAS) e o código escrito. Seu vocabulário para

produzir um texto escrito dependerá do número de palavras que a ele forem ensinadas e,

fundamentalmente o uso fluente da língua de sinais. O ensino da língua portuguesa

escrita deve passar pela visualização e associação com os sinais que ele conhece e os

que são empregados na LIBRAS. A interação deve ser sempre viso-associativa e não

verbo-escritiva.

Ao inserir-se em um meio escolar, o surdo encontra inúmeras dificuldades, tanto

socialmente como em relação aos conteúdos. Cabe à instituição de ensino a

responsabilidade de tentar identificar as dificuldades do aluno surdo e as suas,

procurando saná-las de maneira correta e não ofensiva, sem marginalizar ou reprimir,

isolar ou omitir. Além disso, levar sempre em conta que:

• A criança surda só iniciará seu aprendizado de uma língua escrita após dominar

a sua primeira língua ou língua 1 (L1), neste caso a LIBRAS;

• O aluno surdo não estará necessariamente alfabetizado se apenas copia do

quadro ou dos colegas e não associa o que escreve com o seu significado. A

cópia e reprodução de palavras ou textos não garantem o conhecimento;

• A presença do profissional intérprete de Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS

em sala de aula é fundamental para que o aluno surdo tenha acesso efetivo a

todos os conteúdos;

• As aulas devem ser enriquecidas com recursos visuais;

• A avaliação dos textos escritos pelos surdos deve considerar a inferência de

aspectos estruturais da língua de sinais;

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As dificuldades do surdo para a aquisição da linguagem escrita é enorme. Se

levarmos em consideração que até mesmo para muitos ouvintes ditos “normais” do

ensino regular a escrita é difícil de ser adquirida, para os surdos que não sabem se

expressar por meio de letras ou sons, a dificuldade é maior ainda. Vejamos um

depoimento narrado por uma pessoa surda de 40 anos de idade:

É tão difícil escrever. Para fazê-lo meu esforço tem de ser num clima

de despender energias o suficiente demasiadas. Escrevo numa língua

que não é minha. Na escola fiz todo esforço para entender o

significado das palavras usando o dicionário. São palavras soltas elas

continuam soltas. Quando se trata de pô-las no papel, de escrever

meus pensamentos, eles são marcados por um silêncio profundo. Eu

preciso decodificar o meu pensamento visual com palavras em

português que têm signos falados. Muito há que é difícil ser traduzido,

pode ser apenas uma síntese aproximada. Tudo parece um silêncio

quando se trata da escrita em português, uma tarefa difícil, dificílima.

Esse silêncio é a mudança? Sim é. Fazer frases em português não é o

mesmo que fazê-las em Libras. Eu penso em Libras, na hora de

escrever em português eu não treinei o suficiente para juntar numa

frase todas as palavras soltas. Agora no momento de escrever, eu

escrevo diferente. Quando eu leio o que escrevo, parece que não tem

uma coisa normal como a escrita ouvinte, falta uma coisa, não sei o

quê. Não sei se o que escrevo são palavras minhas, elas são exteriores,

não fazem parte do meu contexto. Parecem não cair bem na frase,

parece que a escrita do pensamento não ditar o que quero dizer. Vezes

sem conta parece-me dizer coisas sem sentido. Fonte: (PERLIN, 2010,

p. 57).

Dependendo do grau da surdez da criança e da detecção precoce do problema,

algumas famílias conseguem desenvolver uma linguagem própria e muito próxima à

ideal. Mas estes casos são insignificantes em um contexto geral. Não podemos,

portanto, generalizar e tomar como parâmetros casos isolados.

A Secretaria de Estado de Educação do Paraná elaborou e distribuiu às escolas

alguns materiais (apostilas, documentos, etc.) sobre os “Critérios diferenciados de

avaliação na Língua Portuguesa para estudantes surdos”, e “Avaliação em Língua

Portuguesa para alunos surdos: algumas considerações”, cujo objetivo é orientar

professores que trabalham com alunos surdos. Mas, isso ainda não foi garantia de que

todos os profissionais da educação mudassem suas estratégias, métodos e formas de

avaliar os alunos surdos.

O Decreto 5.626 de 22 de dezembro de 2005 que regulamenta a Lei 10.436 de

24 de abril de 2002 que oficializou a LIBRAS no Brasil, em seu Art. 14. § 1º, Incisos VI

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e VII, garante aos alunos surdos que as avaliações devem ocorrer em ambas as línguas,

Portuguesa/LIBRAS e não apenas na modalidade escrita.

Para entendermos a estruturação da escrita produzida pelos alunos surdos, suas

dificuldades e seu modo singular de compreender a nossa língua e expressá-la por meio

da escrita, vamos observar e analisar o texto abaixo, escrito por uma pessoa ouvinte que

tenta escrever em uma língua que não é a sua língua nativa.

Este é o e-mail enviado por um norte-americano (ouvinte) à sua cunhada

brasileira:

“Eu carro vende para $ 1600,00 ou posso para um pouco menos se preciso talvez

$1500,00 um pouco menos para família. Eu gosto esse computador muito, eu compra

uma pra me também and e ótimo!! Que vocês pensa com esse notebook? Pode vende

para esse preso? Sabe alguma pessoa intersante? Escreve para me por favor...tambem

tem outro cam para computador paricedo do que o cam eu compra para

Adriano...quanto voces pense eu possa venda pra? Um abraso para todo mundo...Ron”

Fonte: (FERNANDES, 2007 p. 9)

Ao ler este e-mail pode-se identificar uma singularidade: por ser americano e

usuário da língua inglesa ele está tentando escrever em uma língua que não é a sua.

A primeira língua ou a língua 1 (L1) do Ron é o inglês e ele escreveu o e-mail

utilizando a sua segunda língua ou a língua 2 (L2).

A pessoa que não domina o inglês e tenta produzir um texto, certamente,

colocará vestígios da sua L1 no texto: a estrutura, um vocabulário, etc., conforme fez o

Ron em seu texto.

Portanto, com o surdo não é diferente. Ele fala uma língua e escreve em outra.

Quando se trata de língua é importante lembrar que os surdos são praticamente

estrangeiros em seu próprio País. A língua de sinais apresenta gramática e estrutura

independentes e diferentes da língua portuguesa. Em LIBRAS não há o uso de

preposições, conjunções, artigos e alguns verbos. Por exemplo: uma pessoa surda ao

perguntar: “quantos anos você tem?” ela sinalizará apenas: “IDADE” mais a expressão

facial interrogativa. As expressões faciais e corporais são recursos imprescindíveis

dentro da LIBRAS, pois elas equivalem à entonação na língua portuguesa. Veja outro

exemplo: „“EU IR CASA” (LIBRAS). “Eu irei para casa” (Português). (SILVA, 2010,

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p.152) explica que durante a aquisição da linguagem escrita pelo aluno surdo é muito

comum a ocorrência da interlíngua. A autora afirma que:

... quando estão tentando elaborar mentalmente uma frase em

português, há interferência da Libras e, muitas vezes, a frase escrita

não será nem em uma língua nem em outra, mas em ambas. A essa

mistura chamamos de interlíngua, o que significa que o aluno não se

apropriou do português completamente e não se distanciou da Libras,

está em processo. Uma frase típica de interlíngua escrita por surdos é:

casa ir. Essa frase representa seu aprendizado no português, em que o

nome do lugar onde moramos é casa em que usamos o verbo ir

quando anunciamos que haverá deslocamento de um lugar para outro.

Porém ele desconhece a necessidade de conjugar o verbo para que

haja concordância com a pessoa, com o sujeito da frase que, neste

caso, seria eu irei. Além disso a pessoa surda ainda não aprendeu que,

depois do verbo ir, é necessário o uso da preposição para.”

Em língua portuguesa, sabemos que os advérbios de tempo são incorporados aos

verbos, por exemplo, quando se diz: “estudo”,“estudei”, “estudarei” não é preciso

destacar o tempo, pois as terminações (sufixos) “o” “ei” e “arei” identificam o tempo:

presente, passado, futuro, respectivamente. Já em LIBRAS os sinais dos verbos

permanecem sempre iguais, independente do tempo. O que determinará a marcação de

tempo é um sinal auxiliar de advérbio que acompanha o verbo, por exemplo, o surdo

quando quer colocar o verbo ESTUDAR no presente passado, ou futuro,

respectivamente, ele sinaliza da seguinte forma: EU ESTUDAR AGORA “Eu estudo”

EU ESTUDAR PASSADO “Eu estudei” EU ESTUDAR FUTURO “Eu estudarei”.

Portanto, os sinais dos verbos não recebem afixos anexados à raiz como na

língua portuguesa. Por exemplo: “ESTUDAR” é um verbo que, na LIBRAS, não há

concordância, visto que o sinal é sempre o mesmo independente de tempo, número e

pessoa. Vejamos, agora, alguns exemplos de frases: AMANHÃ EU ESTUDAR

MATEMÁTICA VOCÊ ESTUDAR GEOGRAFIA. (LIBRAS). “Amanhã eu estudarei

matemática e você estudará geografia.” (Português). NÓS ESTUDAR FUTURO.

(LIBRAS). “Nós estudaremos.” (Português).

Por isso o surdo, ao escrever, terá dificuldades em empregar os elementos que

fazem parte da gramática da língua portuguesa e, na maioria das vezes, tenderá a usar a

estrutura da língua que fala, ou seja, da língua de sinais. Mas, não significa que o surdo

nunca fará uso destes elementos em seus textos, o que ocorrerá é que eles poderão estar

mal empregados. Portanto, cabe ao professor estar consciente disso e ter um olhar

diferenciado ao avaliar a escrita do surdo.

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A aquisição da linguagem escrita pelos surdos deve ser feita por meio da

interação de uma pessoa que domine a língua do aluno surdo, podendo ser um intérprete

de Língua Brasileira de Sinais ou o próprio professor. A linguagem truncada do aluno

surdo deverá ser aos poucos modificada ou adaptada ao português padrão dependendo

da capacidade de aprendizado de cada um. Os elogios e a aceitação da língua de sinais

são estímulos extremamente edificantes e que podem acelerar o processo de

aprendizagem destes alunos.

Uma criança surda pode aprender satisfatoriamente o português se for

corretamente estimulada e não repreendida de maneira ofensiva. O professor deve ter

muita cautela e evitar rabiscar de vermelho os supostos “erros” da criança. Sempre levar

em conta que está se tratando de um contexto bilíngue e resquícios da língua original do

surdo sempre aparecerá. Caso não entenda o que ele quis dizer, deve perguntar ao aluno

e mostrar que está interessado em entendê-lo.

3. Análise de textos produzidos por alunos surdos

A seguir faremos a análise de textos produzidos por alunos surdos, usuários da

Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, em diferentes séries e fases de suas vidas. Estes

alunos frequentam a escola desde os três anos de idade.

No dia em que esta atividade foi desenvolvida, havia uma acadêmica realizando

estágio de observação. A professora explicou aos alunos que primeiramente escreveria

um texto no quadro descrevendo as características mais importantes da estagiária.

Os alunos poderiam ajudá-la entrevistando a moça. Desta forma, os alunos

faziam uma série de questionamentos, por exemplo: “Tem sobrinhos? Avô e avó? Você

gosta deles? Tem gato?” Depois de escritas na lousa as características observadas pelos

alunos, novas indagações estimuladas pela professora foram lançadas: “Como ela é? O

que faz? Onde mora? Que animal tem em casa? Ela tem filhos? Irmãos? Quantos? É

casada? Estuda?”

Todas essas informações iam sendo registradas na lousa utilizando a estrutura da

língua portuguesa. Depois os alunos em conjunto e individualmente fizeram a leitura

utilizando, evidentemente, a língua de sinais.

Agora chegou a vez dos alunos elaborarem seus textos, explicou a professora. A

produção foi realizada em dupla. Cada um deveria escrever a respeito do colega, assim

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como fez a professora em relação à estagiária. Para a identificação dos alunos serão

usadas as letras “R” e “E” por questão didática e preservação de identidade.

Texto I - produzido pelo aluno “R” oito (8) anos de idade, 2ª série. Junho/2003

“Lúcio

O Lúcio tem cavalo, cachorro

O Lúcio é inteligente e gosta estudar. Ele meu amigo muito Lúcio.

O Lúcio tem irmão Luiz. Lúcio tem bebê Manuele

O Lúcio vem onibis. O Lúcio tem papai, mamãe”.

Observa-se que em poucas palavras o aluno conseguiu escrever muitas coisas a

respeito do seu colega.

Na maioria das frases, ele repetiu o nome “Lúcio”, talvez por ainda não dominar

o uso de pronomes. Na frase: “Ele meu amigo muito Lúcio” usou o pronome “Ele”, mas

no final da frase repetiu o nome “Lúcio”. Na mesma frase o “muito” indica “grande

amigo”, isto foi explicado pelo aluno (autor do texto).

Demonstrou domínio no uso dos substantivos próprios e noções de pontuação.

Fez uso da conjunção “e”, segunda linha, o que demonstra que ele já consegue fazer a

relação da LIBRAS com o português escrito; cometeu erro ortográfico, apenas, na

palavra “ônibus”.

A frase: “O Lúcio vem onibis” parece estar incompleta, mas o fato dos alunos

estarem na escola subentende-se que o Lúcio vem “à escola” de ônibus; “Lúcio tem

bebê Manuele” refere-se à irmãzinha do Lúcio.

Texto II: Neste texto foi utilizado a seguinte técnica: Os alunos assistiram, em

língua de sinais, ao vídeo: “A Lebre e a Tartaruga”. Depois de uma longa discussão, a

professora registrou o nome dos personagens da história no quadro. Os alunos contaram

a história e fizeram a dramatização. Em seguida desenharam os personagens e

elaboraram o texto. Segue a versão original da história:

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A Lebre e a Tartaruga

Era um lindo dia na floresta e vários animais estavam sentados, conversando, contando

as novidades. Aí chegou a lebre toda vaidosa e convencida. Cumprimentou todos e falou:

- Eu sou a melhor! Ganho de todos vocês numa corrida. Corro mais rápido do que

você... você... e você. A tartaruga pensou bem e resolveu desafiar a lebre:

- Quero apostar uma corrida com você. A lebre riu:

- Apostar corrida comigo? Você é engraçado... é muito devagar! Eu sou o mais rápido!

- Não faz mal. Eu te desafio mesmo assim.

- Tudo bem. Eu aceito.

A tartaruga foi até a linha de partida. A lebre se aqueceu e falou:

- Que piada!

A raposa que era o juiz pediu para os dois tomarem posição. A lebre e a tartaruga se

prepararam para a largada.

- Já!

A lebre saiu disparada. A tartaruga ficou para trás comendo poeira. Mesmo assim

começou a corrida.

A lebre parou, virou e viu que a tartaruga estava bem longe e falou:

- Eu tinha avisado!

O sol estava muito quente e ela viu a sombra de uma árvore, ótima para deitar embaixo.

Sem querer a lebre caiu num sono profundo. Paciente, a tartaruga continuava com sacrifício.

Viu a lebre dormindo e ficou surpresa:

- A lebre dormindo... estranho! Mas continuou andando suando cada vez mais.

Enquanto isso, a lebre continuava dormindo, nem reparou que tartaruga já tinha passado por ele.

E a tartaruga continuava, com muita paciência, esforço e suor. Ainda dormindo a lebre ouviu os

gritos dos amigos da tartaruga. Acordou assustada e saiu correndo desesperada. Ma mesmo

assim a tartaruga conseguiu chegar primeiro. A lebre chegou tarde de mais. Para comemorar os

amigos carregaram a tartaruga no alto. Ela se sentiu muito vitoriosa.

A lebre ficou observando a comemoração da tartaruga e se arrependeu de ter dormido.

Tinha que ter corrido até a chegada sem parar. Não podia ter dormido. Por isso chegou tarde de

mais. A lebre ficou desolada. E a tartaruga continuava comemorando.

É importante compreender que os alunos não tiveram contato visual com a parte

escrita da história, apenas assistiram à história narrada em língua de sinais, com

algumas imagens dos personagens em vídeo.

O autor do texto a seguir é o mesmo do texto I, mas agora com nove anos de

idade, 3 ª série do Ensino Fundamental, ano 2004.

“A Lebre e a Tartaruga

Eu gosto Tartaruga anda devagar.

A Raposa “já” para corrida.

A Lebre corre Rápido.

A Lebre corre cansada, sol calor suada. Ela árvore vê dorme.

Tartaruga suada vê Lebre dormindo.

Ela vai correndo sempre

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Tartaruga chegou ganhou 1º!

Animais gritam, batem palmas!

A Lebre acorda corre triste perdeu.”

Pode-se observar que o aluno escreveu em seu texto, apenas as partes que julgou

mais importantes da história e as que se lembrou.

Ao compararmos o texto I, com o texto II pode-se perceber que este aluno

obteve grande progresso em suas produções, demonstrando domínio no uso da

pontuação, pronomes, conjugação de verbos, concordância, etc. Não deixou de colocar a

sua opinião em relação a sua preferência pela tartaruga “Eu gosto Tartaruga...”

(primeira linha).

Na segunda linha do texto, ele escreve “já” colocando entre aspas para indicar a

hora em que a raposa (juiz) abaixa a mão para dar início à corrida.

A conjugação verbal, conforme explicado acima, é uma característica da língua

portuguesa, e, embora seja uma flexão da mesma palavra, para o surdo torna-se uma

dificuldade conjugar os verbos em seus textos. Neste texto, o aluno surdo conseguiu

escrevê-los com auxilio da professora.

Texto III - produzido pelo mesmo aluno, 6ª série, ano de 2007.

Antes dos alunos iniciarem a produção deste texto, foi realizada uma conversa a

respeito do que havia acontecido nos dias anteriores em relação ao acidente da TAM.

Cada aluno expressava sua opinião sobre a tragédia. A professora registrava no quadro

alguns vocabulários que surgiam na discussão, pois sabia que na hora da elaboração

poderiam usar nos textos.

TAM

O Tam cidades Porto Alegre avião

Demorou noite desceu escorregou

Bateu prédio pessoas morreram.

O dia 17 de Julho pessoas morreram.

Muita amanhã manhã hoje trabalhar

Corpo de bombeiros demorou

Todos e dias São Paulo.

A morreram muitas pessoas 180

Família chorar nervosos bavos

Gosto amor filhos.

170

O presidente LULA porque TAM

Avião escorregou ver ruim.

Pista hoje fazer construir Nova.

A maioria dos fatos narrados pelo aluno foi com base nas discussões realizadas

pelo grupo anteriormente.

Na primeira e na sétima linha ele cita as cidades envolvidas no acidente, ou seja,

na primeira linha a cidade “Porto Alegre” de onde o avião partiu e na sétima onde

ocorreu o acidente “São Paulo”. Os nomes das duas cidades estavam escritas no quadro.

Na quinta linha o aluno cita vários advérbios “amanhã manhã hoje” tentando

expressar o tempo que os Bombeiros demoraram para concluir o trabalho.

Nota-se que este aluno tem noções dos conectivos (conjunções, preposições,

etc.) e faz tentativas de uso. Na frase “Todos e dias São Paulo” certamente pretendia

usar “os”, mas trocou por “e”. Conforme já explicado, na língua de sinais não há o uso

de conectivos, como as conjunções, preposições, etc. E o emprego destes elementos é

extremamente difícil para os surdos.

Apesar de ter usado artigo antes do verbo “morreram”, oitava linha, o aluno

conseguiu conjugar vários verbos, o que é raro na escrita de pessoas surdas, pois,

normalmente escrevem os verbos no infinitivo.

Na frase “Família chorar nervosos bavos”, ele inicia a frase no singular,

entretanto os termos “nervosos e bravos, concordam entre si. Cometeu erro ortográfico

apenas na palavra “bravos” esquecendo-se do “r”.

A troca de letras é algo constante entre alunos surdos. É importante entender que

não há palavras na mente da pessoa surda, apenas sinais. E, muitas vezes, o aluno surdo

nunca teve contato visual com determinado vocábulo escrito, ou visualizou poucas

vezes, portanto na hora de escrever não lembra a ordem correta das letras. As idéias do

surdo são elaboradas em LIBRAS, mas na hora de escrever precisa seguir a ordem da

língua portuguesa, conforme visto acima, e, língua de sinais e língua portuguesa

obedecem a estruturas diferentes.

O aluno concluiu seu texto deixando claro que depois do acidente a pista estava

sendo consertada. Este aluno obteve grandes progressos se comparado este com os

textos anteriores.

171

Texto IV- produzido pelo aluno “E”, doze anos de idade 6ª série.

O principal objetivo desta aula era que os alunos conseguissem fazer a leitura do

poema sobre os “Super-heróis”. Então, primeiramente, assistiram ao filme “O Super-

Homem”.

Depois de um longo debate sobre as cenas do filme, os alunos lembraram outros

super-heróis que também conheciam. Os nomes foram registrados no quadro pela

professora, assim como toda parte lexical que surgiam durante a conversação.

Aproveitando o momento, de forma contextualizada, foi-se fazendo questionamentos a

respeito dos super-heróis, por exemplo: “Os super-heróis sentem medo? Dor?

Vergonha? Eles sofrem? Morrem? Alimentam-se? Têm famílias? Namorados (as)?” E

assim por diante. Sempre registrando no quadro e explicando o significado das palavras

e expressões que surgiam nos questionamentos e que, consequentemente, encontrariam

no poema.

Segue o poema original ao qual os alunos deveriam ler.

Super-heróis

Nós somos os super-heróis

Defendemos nossa nação

Vivemos nos gibis, nas telas dos cines

Nos filmes de televisão

Levamos bandidos, ladrões,

Malfeitores, larápios

A dormir na prisão.

Nós somos os super-heróis

Lutamos contra quem vier

Baixinhos, gordinhos, gigantes

Vilões maquiavélicos homem ou mulher

Mas temos momentos na vida

Em que somos pessoas como outras

Quaisquer.

Eu sou o Homem-Aranha

Eu vou lhes contar um pequeno segredo

Se esqueço da rede subindo num prédio

Eu fico morrendo de medo.

Eu sou o detetive Batman

E ontem à tarde perdi minha agulha

Caiu um botão da minha calça eu não

Pude

De noite fazer a patrulha.

Eu sou o leal Super-Homem

E hoje cedinho antes de ir pro batente

Estava com sono e passei sem querer

172

Criptonita na escova de dente.

Eu sou o conhecido Hulk

Eu vou revelar um segredo contido

No carnaval na avenida

Vou me fantasiar

Eu sou a Mulher maravilha

E super mulher que se preza não mente

Eu fui dar u beijo no meu namorado

E quebrei os dentinhos da frente.

Texto do aluno “E”:

O Super-Homem

Super-Homem passar rápido, rápido

Super-Homem ouviu qualquer pessoa ter Perigo.

Vê perigo transforma Super-homem.

A cabou perigo pessoa normal.

Ele muito forte, ter corgem.

O Super-Homem ir rápido proteger

Mulher carro porque não ter freio

Porque homens maus cortar.

O Super Homem com mulher junto

Ir longe. Eles juntos ver terra planeta

Lindo! O Super Homem quase morrer

porque criptonita. O Super-Homem

caiu ficou água, helicóptero mulher

nadar para ajudar, Super-Homem

rápido segura forte pedra muito

grande, O Super-Homem ajudar

família quase morrer água afogados.

Gosto muito Supes-Homem.

Segue a versão sinalizada da narrativa e traduzida em português pela intérprete.

“O Super-Homem

O Super-Homem é muito rápido. Sempre que ele ouve ou vê uma pessoa em perigo

transforma-se em Super-Homem. Quando o perigo acaba, transforma-se em pessoa

normal. Ele é muito forte e corajoso. No filme, ele salvou a mulher que estava com o

carro sem freio porque os bandidos cortaram. Mas era tudo combinado. A mulher era

amiga dos bandidos. Queriam só enganar o Super-Homem.

O Super-Homem e a sua namorada ficaram bem juntinhos e viajaram pelo espaço. Lá

de longe viam o Planeta Terra. Muito lindo! O Super-Homem quase morreu porque teve

contato com a criptonita. Ele não pode, então caiu na água e estava quase morrendo,

mas a mulher veio de helicóptero e o ajudou. Super-Homem é muito rápido e segurou

173

com força uma pedra para salvar a vida de uma família que estava quase morrendo

afogada. A pedra que era muito grande os impedia de saírem de baixo d‟água.

Eu gosto muito do Super-Homem.”

Finalmente, depois de terem compreendido toda parte estrutural e lexical, os

alunos fizeram a leitura do poema. Cada um ia à frente e explicava (em Língua de

Sinais), cada estrofe do poema. O mesmo poema foi utilizado para trabalhar as classes

gramaticais e análise sintática.

Considerações finais

A maneira peculiar de uma pessoa escrever depende de inúmeros fatores. O

aluno que teve uma educação isolada e familiar terá uma linguagem específica e irá

precisar adaptar-se aos demais. A LIBRAS, embora brasileira e reconhecida como

língua oficial, não deixa de ser uma “outra língua” o que causa contradições

principalmente com o português tradicional escrito.

Baseado no acima exposto pode-se observar que há uma independência sintática

entre LIBRAS e a Língua Portuguesa. Alguns elementos usados na Língua Portuguesa

falada e escrita tais como: artigos, conjunções, preposições e, em alguns casos, certos

tipos de verbos não são usados em LIBRAS. Essa diferença linguística sempre deve ser

levada em consideração pelo professor quando confrontar-se com um texto escrito pelo

surdo. O professor não deve corrigir um texto produzido por um aluno surdo como se

estivesse corrigindo um texto elaborado por um aluno ouvinte que usa a língua

portuguesa naturalmente. Deve lembrar-se sempre do detalhe que a LIBRAS tem que

ser vista como uma “outra” língua. E, mesmo reconhecida oficialmente em todo o

território nacional, ainda é desconhecida pela maioria da população que não tem contato

com a comunidade surda. Esta falta de conhecimento é uma das principais causas da

marginalização social que os surdos sofrem até hoje.

Cabe, portanto, aos professores e pessoas que se relacionam com surdos levar

sempre em consideração que estão lidando com outra língua e respeitarem essa

diferença linguística assim como seus usuários.

O Brasil, por ser um País de dimensões continentais, pode-se também observar

que existem regionalismos e maneiras diferentes de se dizer a mesma coisa, dependendo

174

da região ou do isolamento social que uma pessoa ou comunidade enfrenta: isso se

falando de pessoas ditas “normais”. Quando isso acontece agimos como se a nossa

maneira de falar fosse a única correta e as outras não. O que pode soar estranho para nós

também pode soar estranho para os outros. Para enfrentarmos um novo desafio devemos

antes tentar compreendê-lo.

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