Portugal em face dos níveis sociais...

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Raul da Silva Pereira Portugal em face dos níveis sociais europeus A recente inclusão de alguns aspectos so- ciais no próximo Plano de Fomento justifica uma análise da posição do nosso País, em matéria social, perante o resto do ocidente europeu. Esta análise ganha maior signifi- cado quando referida a três grupos de paí- ses: os do Mediterrâneo, os que formam a Comunidade Económica Europeia e os parti- cipantes da Associação Europeia de Comér- cio Livre. I. INTRODUÇÃO 1. Porquê o confronto internacional? O confronto entre as situações características de vários países ou regiões é correntemente utilizado no estudo dos problemas eco- nómicos e sociais. Pode mesmo dizer-se que tal prática vem tendo aplicação crescente, sobretudo desde a última guerra, devido a um processo de aproximação entre os povos, que o progresso técnico, nomeadamente a rapidez das comunicações, veio tornar possível e necessário. Há pouco mais de trinta anos que Marconi acendeu as luzes de Sidney com um sinal de rádio emitido do Mediterrâneo: estavam consagradas assim as emissões a longa distância. Desde então, o desenvolvimento das comunicações, sob as mais variadas formas, veio aumentar extraordinariamente a quantidade de informação difundida entre os povos e, por via desta, as próprias atitudes humanas em face das situações que se nos deparam. Alegrias e dores da Humanidade mas as dores, sobretudo são conhe- 802

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Raulda

SilvaPereira

Portugal em facedos níveis sociaiseuropeus

A recente inclusão de alguns aspectos so-ciais no próximo Plano de Fomento justificauma análise da posição do nosso País, emmatéria social, perante o resto do ocidenteeuropeu. Esta análise ganha maior signifi-cado quando referida a três grupos de paí-ses: os do Mediterrâneo, os que formam aComunidade Económica Europeia e os parti-cipantes da Associação Europeia de Comér-cio Livre.

I. INTRODUÇÃO

1. Porquê o confronto internacional?

O confronto entre as situações características de vários paísesou regiões é correntemente utilizado no estudo dos problemas eco-nómicos e sociais. Pode mesmo dizer-se que tal prática vem tendoaplicação crescente, sobretudo desde a última guerra, devido aum processo de aproximação entre os povos, que o progressotécnico, nomeadamente a rapidez das comunicações, veio tornarpossível e necessário.

Há pouco mais de trinta anos que Marconi acendeu as luzes deSidney com um sinal de rádio emitido do Mediterrâneo: estavamconsagradas assim as emissões a longa distância. Desde então,o desenvolvimento das comunicações, sob as mais variadas formas,veio aumentar extraordinariamente a quantidade de informaçãodifundida entre os povos e, por via desta, as próprias atitudeshumanas em face das situações que se nos deparam. Alegrias edores da Humanidade — mas as dores, sobretudo — são conhe-

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cidas, poucas horas depois de ocorridos os factos que as motiva-ram, nos lugares mais longínquos e inacessíveis; e a mesma folhade jornal que nos traz um novo acontecimento refere muitas vezesas reacções que o mesmo provocou em vários pontos do globo.

Certos problemas fundamentais da existência humana, aindaque geograficamente delimitados, são cada vez mais sentidos comoproblemas gerais da Humanidade e constituem, com frequência,fulcro de acções de cooperação entre nações diversas, mesmo dis-tantes: a pressão demográfica, a desigualdade dos níveis de vida,o problema da fome, a carência de instrução, a crise do alojamentoe tantos outros problemas económicos e sociais, preocupam actual-mente homens de todos os cantos da Terra,, mesmo daqueles ondenão assumem aspectos particularmente graves.

Uma das consequências deste processo de aproximação tra-duz-se pela criação de comunidades supra-nacionais, de que aComunidade Económica Europeia é o exemplo mais acabado,ainda que distante dos seus principais objectivos; mais modesta-mente, esboçam-se também outras formas de associação e coope-ração internacional, de âmbito mais ou menos restrito, quer dioponto de vista geográfico quer das finalidades que se propõematingir: a Associação Europeia de Comércio Livre, a Organizaçãode Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, a Aliança parao Progresso, são exemplos de instituições desta índole.

Todo este incremento de trocas, quer de produtos quer deideias, implícito nos projectos de associação entre países ou re-sultante das profundas alterações nos meios de comunicação, veioaumentar o interesse pelas comparações internacionais no domí-nio económico e no social, comparações que um acervo considerá-vel de informações estatísticas, entretanto surgidas, vai permi-tindo com crescente perfeição.

Deste modo, às comparações estabelecidas dentro de cada paísentre épocas diferentes — preocupação de um progresso nacionalfechado ao resto do mundo, que caracterizou de certo modo osanos que precederam o último conflito — vieram juntar-se as com-parações internacionais referidas a uma mesma data, que contri-buem para se tomar consciência das posições relativas dos váriospovos.

Mais recentemente, os aspectos temporal e espacial contidosnos dois tipos de análise anteriormente referidos começaram afundir-se. Associando o carácter dinâmico das comparações queexprimem a evolução ao nível de um só país e o carácter espacialda comparação de situações estáticas de diferentes países, temsido possível, para alguns casos, um novo tipo de confronto: acomparação internacional dos ritmos de progresso económico esocial — portanto, da evolução simultânea de vários países atravésde indicadores apropriados.

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Mas os elementos estatísticos disponíveis não permitem ainda,com carácter de generalidade, este tipo de confronto. Só paraum número muito limitado de indicadores — por exemplo, a com-paração internacional de taxas anuais médias de crescimento doproduto nacional em determinado período — ele tem sido praticadoe, mesmo assim, sujeito a especiais cautelas.

2. Portugal e o confronto europeu

È do confronto entre nações que este trabalho se ocupará:confronto referido a uma época recente e, quanto possível, seme-lhante para os vários paáses. E é Portugal o centro das compa-rações a estabelecer, conforme se compreende num contextode trabalhos referentes a aspectos sociais do desenvolvimentoeconómico no nosso País.

Se é certo que os factores considerados responsáveis pelodesenvolvimento económico estão em parte localizados fora dodomínio da economia, com especial menção dos aspectos sanitá-rios, educativas e, de um modo geral, culturais, a comparação dosníveis e dos ritmos de desenvolvimento económico, hoje usual paradiversos fins, não ficará completa se abstrairmos da análise dessesaspectos.

No entanto, parece fora de díúvida que o seu estudo tem sidobastante descurado, mesmo quando restrito ao ponto de vistainterno; e mais ainda no que toca às comparações internacionaisque, em alguns casos, poderiam contribuir para explicar proble-mas do desenvolvimento e, porventura, fornecer sugestões deprovidências a tomar.

Ora, estando o País empenhado actualmente em acelerar oritmo de desenvolvimento, através da realização de programas ade-quados, natural se torna o estudo da totalidade dos factores quecondicionam esse desenvolvimento, neles se incluindo os que, por sesituarem fora do âmbito directo da economia, podem facilmenteconstituir entraves sérios, sem que da sua influência se tenhasequer um conhecimento suficiente. E, nesta perspectiva, se incluio confronto internacional, pelo que este pode contribuir para aexplicação da diversidade de graus de desenvolvimento económicoe social existentes e, assdm, para encontrar caminhos de aproxi-mação às situações de maior progresso.

É certo que alguns dos elementos ora recolhidos têm já sidoobjecto de estudo, mas desconhecemos qualquer recolha sistemá-tica, do género da que se apresenta, a qual cobre uma razoávelsérie de indicadores sobre os principais aspectos sociais de quenos falam as estatísticas internacionais, cada um deles referido,praticamente, à totalidade dos países da Europa Ocidental.

É claro que não deve haver a pretensão de estabelecer, apenas

SOU

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com base nos indicadores apontados, um juízo de valor definitivosobre a posição portuguesa na Europa. Ê preciso que fiquebem expresso que os elementos recolhidos não são em muitoscasos os mais significativos, porque são apenas aqueles que exis-tem; mas dentro destes escolheram-se os que parecem mais dignosde confiança. As estatísticas internacionais têm, ali&s, um longocaminho a percorrer, no sentido de uma unificação que torne pos-síveis as comparações entre países, sem obrigar a constantescuidados e restrições.

As posições ocupadas por Portugal relativamente aos váriosindicadores reflectem uma recolha efectuada com critérios uni-formes sobre as fontes estatísticas disponíveis — o que não impedeque, a propósito de cada indicador, e na medida do possível, sefaçam observações baseadas em outras origens, nomeadamente emestatísticas e estudo® portugueses.

Por outro lado, o simples facto de se tratar de uma recolhasistemática para a quase totalidade dos países da Europa Ociden-tal, afasta qualquer hipótese de escolhas apriorísticas de unspaíses em detrimento de outros, consoante hipotéticas preferênciasou finalidades, que estão longe do pensamento do autor.

Além de Portugal, figuram nos quadros adiante publicadosos seguintes três grupos de países* :

I — Países do Mediterrâneo, com excepção da Itália, que,por fazer parte da C.E.E., figura no grupo seguinte;

II — Países da Comunidade Económica Europeia, começandopela Itália, para mais fácil confronto com os países doMediterrâneo, a cuja zona geográfica também pertence;

i n — Países da Associação Europeia de Comércio Livre, daqual Portugal participa,

A inclusão da Turquia (país que já pertence à Ãsia Menor)e da Jugoslávia (com sistema económico bastante diferente dosrestantes) justifica-se por surgirem, a cada instante, em estudose projectos de desenvolvimento da zona mediterrânica, da qualfazem parte pela geografia.

Em face destes agrupamentos), Portugal apresenta uma pro-blemática comum, principalmente, com o® paíseis do primeiro gru-po, por força da própria geografia; e com os do terceiro, depoilsda assinatura 'da Convenção de Estocolmo.

i Com excepção da Itália, pelo motivo adiante apontado, a ordemdentro de ciada grupo é a alfabética.

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O dados sobre Portugal — tal como para os restantes países —respeitam apenas à Metrópole, uma vez que a análise se limita aoâmbito europeu.

Antes de passar à análise dos indicadores recolhidos, algumasindicações mais, sobre as fontes utilizadas.

As imperfeições das estatísticas internacionais dizem res-peito, especialmente, ao significado que em cada país se atribuia dados estatísticos que se destinam a ser classificados segundocritérios uniformes. Este facto dificulta, quando não impede, oestabelecimento de comparações válidas — precisamente a finali-dade que justifica a existência de estatísticas internacionais.

Outra deficiência muito frequente é a variedade de datasa que se referem os elementos recolhidos, consoante os países,variedade que, sobretudo nos casos de maior afastamento, implicarestrições às comparações a efectuar. Felizmente, todas estasdiferenças de critério vêm indicadas em notas explicativas queacompanham os dados estatísticos.

Por todos estes motivos, houve o maior cuidado na selecçãodos elementos a recolher, evitando-se aqueles que enfermam dèdiferenças de significado prejudiciais ou se referem a datas de-masiadamente afastadas entre si, e indicando-se as restrições maisimportantes.

Utilizaram-se como principais fontes estatísticas e informa-tivas as das seguintes organizações internacionais: Organizaçãodas Nações Unidas (O.N.U.), Organização Mundial de Saúde(O.M.S.), Organização de Alimentação e Agricultura (F.A.O.),Organização Internacional do Trabalho (O.I.T.) e Organização deCooperação e Desenvolvimento Económicos (O.C.D.E.)—todaselas identificadas na altura própria.

Os comentários focam apenas os pontos considerados de maiorinteresse, dadas as limitações de espaço em relação à variedadedos temas abordados, variedade que deixa, no entanto, vasta ma-téria por explorar, em face da natural riqueza de aspectos de que secompõe a vida real dos indivíduos e das sociedades humanas.

BC PORTUGAL NA EUROPA

1. A População

Começaremos por examinar alguns dados sobre as popula-ções dos vários países, dados que as estatísticas1 demográficashoje fornecem com relativa segurança e regularidade.

Portugal apresenta a densidiade populacional mais elevadaentre os países do Mediterrâneo, aproximando-se mais da França,

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QUADRO IPopulação

Países

PORTUGAL .

ESPANHA ...GRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA ....

ITÁLIAALEMANHA OCED.BÉLGICAFRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIADINAMARCAGRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

População(milhares)

1961

8 932

30 5598 402

18 60728 602

49 73254 0279184

45 98311637

7 0814 617

52 9253 6117 5205 496

Densidadepor km2

1961

(B)97

61647337

16421730183

346

84107217

1117

133

Taxas de

Crescimen-to anual

1958-61

(C)0,5

1,00,91,12,9

0,71,20,51,01,3

0,30,70,70,80,51,9

Nupciali-dade1961

CD)

8,6

7,8[8,0]9,0X

8,09,46,86,98,0

8,57,97,56,57,07,7

Natalidade

1961

(E)

24,5

21,3[17,9]22,6X

18,818,317,018,22,12

18,616,617,917,513,918,1

Mortali-dade1961

(F)11,2

8,6[7>6]9,0X

9,411,011,710,9

7,6

12,19,4

12,09,19,89,3

PopuQaQão por idades1960

Com menos Com 60 anosde 20 anos e mais

(G)

37,6

35,334,0 o46,4 c49,6

32,029,029,532,2°38,0 c

30,0 °33,629,8 c33,029,931,3

11,7

12,412.2 c9,7«6,6

13,415,117,617,5 c13.3 o

17,8°15,517,3 c15,917,315,2

Dimensãomédia dasfamílias

1960

(D3,8

XX

4,0 o5,7»

XXX

X3,0XX2,8X

* 1955; b 1957; c .1961.NOTAS: Coluna A — Estimativas da popuOação a meio de 1961. A estimativa indicada para Portugal é a do Anuário Demo-

gráfico, I. N. E., 1962, p. LiXI. A população da Turquia, segundo o censo de 1960, repartia-se entre 2294 milhares na Europa e25 516 milhares na Ásia. Os dados que figuram entre parêntesis [ ] são considerados, segundo a fonte, como «discutíveis ou deamplitude desconhecida». O crescimento anual (coluna C) é expresso em percentagem. As taxas D, E, e F são por 1000 habitantes.

Colunas G e H — As percentagens referentes a Portugal foram colhidas no Anuário Demográfico, I. N. E., 1963, p. XV, vistoas indicadas pelas Nações Unidas, embora seinedhantes àquelas, serem anteriores ao último Censo.

FONTE: Annuaire DémQgraphique, N. Unidas, 1962: Quadros n.° 1 para as colunas, A B e C; n.° 22 para a D; n,# 14 para a E;n.o 18 para a F; n.° 5 para as colunas G e H; e n.° 12 para a I.

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dja Áustria ou da Dinamarca e estando ainda longe das densi-dades da maior parte dos países muito desenvolvidos, especial-mente os que formam a Benelux, a Alemanha Ocidlental e a Grã--Bretanha!».

Apesar de uma taxa de mortalidade não muito distante dasrestantes ítaxas europeias — ainda que superior às dos outrospaíses meridionais — e de uma taxa de natalidade que é a maisalta da Europa, o crescimento anual da população portuguesatem-se processado recentemente à taxa de 0,7 % se nos limitarmosao cálculo dos saldos líquidos, sem atender aos resultados do últi-mo Censo. Não parece, porém, muito realista, em face da actualtendência para a emigração, que se continue a considerar a mesmataxa de expansão verificada há alguns ano® atrás, até porque háque atender à intensidade com que se processa a emigração clan-destina. Por isso se aceita a taxa de 0,5 %, indicada pelas NaçõesUnidas para o período de 1958-1961.

Mercê da elevada taxa die natalidade, a população portuguesaé ainda uma das mais jovens da Europa: a percentagem de pessoascom menos de 20 anos é a mais elevada, <se exceptuarmos a Ho-landa e dois países do Mediterrâneo: a Jugoslávia e a Turquia;e apenas estes dois últimos países apresentam, relativamente aPortugal, menor proporção de pessoas idosas, se como tal enten-dermos as de 60 anos e dle idade superior. Esta situação não deve,porém, fazer-nos esquecer que o envelhecimento da populaçãoportuguesa se intensificou depois de 1950, de acordo com os dadosdo último Censo2.

Também se colheram alguns dados sobre a dimensão médiadas famílias, ainda que neste ponto as estatísticas sejam menoscompletas: encontrámos famílias mais numerosas do que emPortugal, na Jugoslávia e na Turquia. E também neste particulara nossa evolução é denunciadora de uma aproximação, relativa-mente aos países desenvolvidos1: as famílias compostas por menosde 4 pessoas, que representavam 45,5% do total em 1950, pas-saram para 52,6% dez anos depois; as de maisi de 6 pessoasbaixaram a sua posição relativa, de 22,2 % para 17,1 %.

Quer o envelhecimento quer a redução da dimensão das fa-mílias isão características do aumento da população urbana, à me-dida que a indtustrialização se acentua.

Densidade superior à dos países menos desenvolvidos e muitoinferior à da maioria dos países industrializados; natalidade queé a mais elevada à escala europeia; mortalidade pouco diferenteda que ocorre nos restante® países; população jovem; famílias nu-

2 Sobre este aspecto veja-se, do autor, «O envelhecimento da populaçãoportuguesa e o Censo de 1960» — Análise Social, n.° 4, Out. de 1963.

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merosas — eis alguns traços característicos da nossa população, emface dos outros povos europeus.

2. Aspectos Sanitários

As referências feitas anteriormente à taxa de mortalidadegeral abrem caminho a observações mais pormenorizadas queconduzem directamente a problemas sociais de grande importân-cia. É o caso das taxas de mortalidade específicas.

O primeiro destes problemas é o da mortalidade infantil. Por-tugal apresenta a taxa de mortalidade infantil mais elevada daEuropa,, apenas seguida de perto pela Jugoslávia, faieto que temsido apontado frequentemente pelos estudiosos dos nossos proble-mas sociais, como revelador die uma aflitiva carência de protecçãoà maternidade, nos seus múltiplos aspectos: alimentação, higienee assistência médica, relativamente à mãe e à criança, duranteo período que campreendie a gravidez, o parto e os primeirosmeses de vida.

A taxa de mortalidade infantil, depois de um decrésícimo no-tável (era de 137 nas vésperas da últitaia guerra) parece estacio-nária, não tendlo registado melhoria desde 1956: a média do pe-ríodo de 1956-1962 foi de 84,7, mas as variações anuais não semostram significativas de qualquer tendência. As próximas redu-ções dependem, por certo, da generalização de um esquema deassistência e educação maternal eficiente; e a este respeito bastadizer que, por enquanto, apenas ^ dos partos dispõem de assis-tência médica; mais die metade não são assistidos quer por médicoquer por parteira.

Mas na mortalidade peri-natal3, embora a situação seja tam-bém a pior do quadro europeu, não são tão vincadas as dispari-dades entre as taxas mais elevadas e as mais baixas. Isto significaque é para além do período peri-natal que devemos procurar arazão imediata (em níimero de óbitos) do desfavor da nossa posi-ção, a qual se tradtoz numa perda anual de 18 milhares de vidas,que bem poderia limitar-se a metaJde, ou mesmo a um terço, fi-cando, ainda assim, longe das posições dos países mais adiantados1

neste campo.Por isso, vozes autorizadas afirmam que «as nossas; cifras

são ainda desprestigiantes e reclamam actuação mais intensa eordenada. A mortalidade infantil, sobretudo nalguns1 distritos,constitui uma chaga social e um índice die deficiente nível econó-mico e educacional das massas populares, ao mesmo tempo que dainsuficiente protecção materno-infantil»4. E num trabalho sobre

3 Fetos-martos com 28 e mais semanas de gestação e óbitos com me-nos de 7 dias.

4 Parecer sobre as Contas Gerais do Estiado de 1959, p. 313.

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Aspectos Sanitários

ooQUADRO

Países

Algumas taxas de mortalidade

Peri-natal1959

Infantil1961

Por tu-berculose

1961

Por doençasdo coração

1961

Médicos Enfermeirosdiplomados

Parteirasdiplomadas

por milhão de habitantes — 1960

Habitantespor cama

(hosu. e cen-tros médicos)

1960

PORTUGAL

ESPANHA ...GRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA

ITÁLIAALEMANHA OCIDENTALBÉLGICAFRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIADINAMARCAGRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

(A)

[45,7]

[34,2][24,7][29,0]

X

[42,5]36,1

[31,7]31,2 i26,3

35,728,637,023,9

[26,3]27,2 c

(B)

88,8

46,9[39,8]82,2

[165,0]

40,131,726,225,615,4

32,721,5 •22,118,9 e15,521,0

(C)

39,6

26,2 e[17,9]

42,1 e,gX

17,5 e14,217,1«20,42,7

21,24.2 e7,26.3 e8,0 e

12,4 e

(D)

153,1

127.8 d[110,8]191.9 «, s

X

256,4 e229,6240,4 e203,9211,3

312,3310.2 e388,6261,4 e338,4 e300.3 e

(E)

792

957 h1238645344

16321347<*1239*9784

1085 d

1609

10651096916 e

1429«

(F)

378«

X21241069

494 d, 32083

X1848

J

1629 *. J3558 d1757127878679 m3821a, m

(G)

1031

169*19721673

434 <3172418 *18777 d

231«142 d3351306226252 a

(H)

180

250 d170200640d

110d100X110 d130 d

100120d11011070801>

a 1950; b 1956; c 1958; d 1959; e 1960; f 1961; e Amostra de 30 % da população, correspondendo a 28,06% dos óbitos; h Nãoinclui «praticantes»; l Compreende as mortes fetais com 6 ou mais semanas d-e gestação; J Só pessoal hospitalar; * Há que adicio-nar 7591 enfermeiras e parteiras, cifra global não disariminada: m Inclui pessoal não diplomado oficialmente.

NOTA: As taxas das colunas A e B são por 1000 nado-vivos; as das colunas C e D são por 1000 habitantes.FONTES: Annuaire Démographique, N. Unidas, 1961, Quadro 11, para a coluna A; idem, 1962, Quadros n.os 17 para a coluna

B, 20 para as colunas C e D, e 175 para a oofluna E (utilizando as cifras de população indicadas no Quadro I do presentetrabalho). Statistiques Êpidemiologiques et Démographiques Annuelles, O. M. Saúde, 1960, Quadros n.° 29.3 para as colunas F « G, en.* 30.1.1. para a coluna H.

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níveis de vida na Europa Ocidental, o parágrafo sobre a mortali-dade infantil termina citando «un cas aberrant: le Portugal entre90 et 110 par 1.000)» \

Como incidência da mortalidade infantil sobre o desenvolvi-mento económico, acrescentaremos apenas o seguinte: o nasci-mento de crianças sadias e o seu crescimento acompanhado doscuidados que a Káênicia pediátrica aconselha não podem ser con-siderados como «luxo de países ricos»; mas, que dizer da pro-criação de indivíduos que morrem antes de atingirem a idade dlepassarem à população activa? Ainda que considerada sob umprisma exclusivamente económico, a mortalidade infantil é, naverdade, uma perda nacional irreparável,

O enfraquecimento da eapacidade de trabalho devido a certasdoenças, é também um factor relevante a considerar quando sepretende a elevação da produtividade, como condição para ace-lerar o desenvolvimento. E uma destas doenças é a tuberculose,cuja taxa de mortalidade em Portugal é ainda muito elevada,apesar dos progressos conseguidos neste campo, especialmente nadécada de 1950, em que foi reduzida a metade; tão elevada, ainda,que só a da Jugoslávia a excede ligeiramente6.

A taxa de mortalidade por tuberculose assinala a extensãoque esta doença atingiu no nosso País, outrora alarmante, tendodeixado como herança, quando debelada, milhares de indivíduosfisicamente diminuídos, e gerado muitos outros com predisposi-ções que não favorecem a robustez.

Por tudo isto, quando se fala em produtividade do trabalhonão é possível olvidar factores como a mortalidade infantil ou aque deriva da tuberculose, reveladoras de causas gerais subja-centes que, mesmo quando não matam, deixam efeitos perniciosossobre a capacidade fisj,ca dos indivíduos — e, portanto, sobre a suaeficácia como factor da produção.

O que fica dito chegaria para mostrar que a taxa de morta-lidade geral não é tão significativa como à primeira vista podeparecer. A confii-má-lo, se bem que em sentido oposto, vejamoso que se passa com a mortalidade por doenças do coração.

Esta causa d,e morte actua muito menos em Portugal do quena maior parte dos outros países europeus; apenas a Espanhae a Grécia têm taxas inferiores) à nossa. A explicação deste factodeve procurar-se de acordo com os graus de desenvolvimento: nos

5 Guy DUPUIGRENET-DESROUSSILLES — Nweaux de vie et coopérationéconomique ãans VEurope de VOuest — Paris, PUF, 1962, p. 45. Refere-seao período 1948-1957, esta análise da mortalidade infantil.

e Não se dispõe deste elemento para 'a Turquia. Para maior facilidadeda exposição recomenda-se que a leitura seja acompanhada oom a consultados quadros respectivos, visto que as afirmações feitas se devem referira£en!as aos dados disponíveis e não é prático indicar, a todo o momento,os dados em falta.

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países mais ricoa, que consagram maiores somas de recursos aocombate às doenças, a vida média é mais elevada, tornando-se,por isso, mais preponderantes as doenças próprias da senilidade^nomeadamente as do coração, A «agitação da vida moderna», dèque tanto se fala como origem das doenças cardíacas, não é, sópor si, responsável por taxas tão elevadas; compreende-se que empopulações envelhecida®, como são as dos países europeus maisricos, as doenças do coração se contem entre aquelas de que oshomens hão-de morrer pelo simples facto de... serem mortais.

Quanto ao aparelho assistência! que condiciona todas estasdiferenças entre países, apresentam-se alguns índices que, emboralonge de traduzirem a sua capacidade e eficiência, contribuempara explicar tais diferenças: do maior ou menor número de mé-dicos, enfermeiros e parteiras, bem como da maior capaleidadehospitalar para uma dada população, há-de resultar, naturalmente,uma assistência mais perfeita. A posição de Portugal quanto aestes indicadores não é das piores em face dos países do Mediter-râneo, mas o mesmo não acontece em relação aos restantes7.

3. Situação Alimentar

Nem só os cuidados médicos são responsáveis pela manuten-ção da saúde e do vigor físico e mental. O regime alimentar é outrofactor importante de uma vida sã, compatível com elevada capa-cidade de trabalho.

Ora, recordando um dos muito® «círculos viciosos» do subde-senvolvimento, podemos dizer que os países mais pobres, os queprecisam de despender maior esforço para saírem da sua pobreza,são os pior alimentados, em consequência dessa mesma pobreza.

Para avaliar a situação alimentar ao nível dos vários paísesdispõe-se das chamadas balanças alimentares, processo pouco rigo-roso, é certQ, mas que já permite uma apreciação em termos gerais.A afirmação antecedente!, que o simples bom senso chegaria paraformular, é confirmada pela observação das balanças referentesaos países europeus: são os meridionafe que apresentam as capi-tações mas baixas, particularmente quanto aos produtos de maiorvalor nutritivo.

Ê certo que as necessidades da alimentação diferem de paíspara país (ou, talvez melhor, de região para região), sob a influên-cia das condições climáticas, dos hábitos, etc, o que não explica,apesar de tudo, as maiores diferenças observáveis no Quadro UE.

Motivos deste género, conjugados com a conhecida imperfeiçãodas balanças alimentares, têm levado alguns nutricionistas a admi-

7 Alguns índices europeus, sobretudo quanto a enfermeiros e parteiras,necessitam de esclarecimentos complementares de que, infelizmente, nãodispomos.

812

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QUADRO

Situação Alimentar

(1980-1961)

Países

Capitações anuais, em quilogramas

Cereais a Batata

105,6

117,736,369,738,0

52,0133,5139,0

(109,0)101,0

87,7125,3102,298,786,671,8

Carne

18,8

18,623,130,2

(12,6)

27,057,058,5

(73,3)46,6

56,967,467,938,849,758,7

Ovos

3,5

6,25,93,2

(1,6)

8,913,115,1

(11,0)11,3

11,510,515,3

8,711,8

9,8

Leite Açúca-r

Capitações diárias

CaloriasProteínas (grs.)

Totais

73

769596

(91)

807988

(99)76

889388818290

de origemanimal

21

222826

(16)

28

48(53)U

5853495451

Gorduras(grs.)

PORTUGAL ..., ,...

ESPANHAGRÉCIA ,JUGOSLÁVIA ..., ,TURQUIA ..., ,...

ITÁLIA , ,...ALEMANHA OCIDBÉLGICA ..., ,...FRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIA , ,...DINAMARCA ..., ,GRÃ-BRETANHA ,...,.NORUEGASUÉCIA ,SUÍÇA

oo

124,8

118,6162,9186,1196,4

141,881,590,9

(104,8)80,8

107,175,181,979,071,595,5

26,3

59,642,678,9

(40,0)

63,4112,298,8

(105,0)120,6

166,2126,2147,4177,6145,9178,6

18,4

17,015,114,9(11,0)

21,132,632,831,145,7

36,354,252,041,642,142,5

2670

276029403070(2830)

274029702910(2990)2950

301034303260296029303210

68

848689(51)

78126118(112)129

111160141129132130

° Cereais panificáveis, cereais secundários e arroz. ( ) Estimativas do Secretariado <FONTE: Statistiques de VAgriculture et de VAUmentation, O. O. D. E., 1962, p. 100

O. C. D. E.

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tir a suficiência da nossa situação alimentar quanto ao HÍV€l C&1Ó-rico e às gorduras, reservando a sua maior atenção para os aspectosqualitativos da composição da dieta, nomeadamente a participaçãodas proteínas de origem animal. Assim, «a alimentação portuguesaparece ser caracterizada por um nível calórico suficiente, em média,com grave desequilíbrio qualitativo resultante da grande faltade alimentos protectores, especialmente leite, laticínios e ovos» 8.

Com efeito, se observarmos a nossa capitação de leite noquadro europeu, o confronto é chocante. Estará aqui uma dascausas da elevada mortalidade infantil? Mas... haverá dúvidas aeste respeito?

A fraca capitação die proteínas de origem animal é, apesar detudo, superior à de alguns paísesi mediterrânicos, ijgualando prati-camente a da Itália, o que só pode explicar-se pela elevada parti-cipação do peixe na nossa alimentação, do qual algumas espéciessão bastante nutritivas.

Algumas conclusões do® pouco® inquéritos à alimentação atéagora efectuados e o confronto com as capitações do® países maisdesenvolvidos justifica uma tomada de posição no sentido de pro-curar uma melhoria alimentar em Portugal. Por isso, nos estudospreparatórios do II Plano de Fomento se considerou como maisequilibrada uma distribuição igual de proteínas de origem animale vegetal, com 36g para cada uma destas espécies; e se admitiu,como hipótese mais modesta de uma melhoria, a elevação do nívelde calorias para cerca de 2 800, do de proteínas para 79 g (58 %de origem vegetal e 42 % de origem animal) e a subida das goi>duras para 90 g9. Esta hipótese corresponderia a uma capitaçãode 33 g de proteínas de origem animal,, portanto, superior à quese observa nas últimas balanças publicadas.

Outro aspecto a focar é a diminuição da capitação de cereaise por vezes de batata na<s dietas dos; países mais ricos. Trata-se deum fenómeno geral: à medida que melhora a situação alimentar,vai baixando a parcela representada por cereais e tubérculo®, pas-sando parte da energia calórica a provir dos aminoácido® — quetalvez devessem ser fundamentalmente alimento® protectores. Querdizer, algumas da® dietas mais ricas em proteínas animais nãosão necessariamente as mate saudáveis10, Isto, porém, pode serum problema em países cuja capitação de proteína® animais atingeo dobro da que nos toca, verificando-se em alguns dos produtos queas fornecem diferenças ainda maiores. No caso português, é possí-

s C. Santos REIS — «A nutrição e a saúde pública portuguesa», InRevista do Centro de Estudos Demográficos, n.° 12, 1960, p. 264.

9 Relatório Final Preparatório do II Plano de Fomento — I) Estudosgerais, pp. 21 e 33.

10 Por exemplo, é bem conhecida a relação entre as doenças cardíacase a composição química dos alimento? consumidos. Também por esta viatais doenças são um «tributo» ao progresso.

8U

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vel melhorar a dieta ficando longe de excessos prejudiciais; ou,talvez melhor, não será sequer fácil atingi-los.

4. Consumo e Nível de Vida

Apesar da sua posição de primeiro plano na manutenção davida, a alimentação representa apenas uma parcela das necessi^dades humanas: parcela cuja importância relativa depende do níveldos réditos da população considerada. Para se observar como talimportância varia não há como o estudo de orçamentos familiarestanto quanto possível representativos.

Na comparação destes orçamentos depara-se com grandesdificuldades, como é de calcular, sobretudo se se pretende extrairdeles conalusões que representem algo mais do que simples ordensde grandeza. Mas é claro que nos orçamentos de países mais pobresas despesas com a alimentação absorvem parcelas muito maioresdos recursos familiares, apesar de, nem mesmo assim, se conse-guirem níveis alimentares suficientes. Esta verificação é, aliás1,intuitiva, mas dela há que tirar as necessárias conclusões, de causae de efeito, em relação com os graus de desenvolvimento. Umacoisa, no entanto, parece certa: as despesas com a alimentaçãorepresentam em Portugail entre 50 e 60 % dos orçamentos familia-res, consoante as cidades observadas!. Nos restantes países medi-terrânicas tais percentagens são também desta ordem de grandeza,por vezes mais baixas. Na Europa central e setentrional não exce-dem 30 a 40%, apesar das dietas serem qualitativamente supe-riores 11.

Ê difícitii encontrar indicadores suficientemente representa-tivos do nível de vida; o próprio conceito de nível de vida refere-sea um conjunto de satisfações difícil dê estabelecer em síntese, alémde ser variável de país para país. Aumentando estas dificuldades,há uma carência quase total de estatísticas de consumo.

Os indicadores apresentados no Quadro V ajudam no entantoa formar uma idteia sobre o grau de generalização de certas satis-fações (bens e serviços) e o sentido das disparidades encontradasharmoniza-se com observações feitas em camposi diferentes.

É certo que alguns destes indicadores poderiam figurar nosrestantes quadros apresentados, mas pareceu preferível reuni-tasnuma outra perspectiva. A qualidade da casa habitada não deveráser vista apenas como um «problema habitacional», nem a possede um aparelho de rádk> ou de T.V. recordar somente «problemas

ii Vd. Annuaire des Stattistiques du Travail, B.I.T., 1962, p. 472. Quantoàs fontes portuguesas, vd., nomeadamente, os inquéritos às condições de vidada população efectuados pelo I.N.E. em algumas cidades, para o estabeleci-mento de índices do custo de vida (Coimbra, Évora, Lisboa, Porto e Viseu).

815

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Alguns indicadores do Nível de Vida

2 QUADRO IV

Países

Fogos segundo as comodidadesde que dispõem

AnosElectricidade Água canaliz,

Telefonesp. 1000 hab.

1961

Recept. TSFp. 1000 hab.

1961

Eecept. TVpi 1000 hab.

1961

Automóveisde passai,

p. 1000 hab.

1961

PORTUGAL ..ESPANHA ...GRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA ....

ITÁLIAALEMANHA OCIDENTALBÉLGICAFRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIADINAMARCA ....GRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

(A)196019501951

XX

19511956194719541956

196119551951X

1980X

(B)

40,580,528,7XX

80,988,495,493,098,1

98,398,888,0X

99,0X

(C)28,934,212,1XX

35,296,7 b48,458,489,6

63,6

X94,5X

90,2X

(D)

486332159

81121131101150

106245161214367321

(E)

10189»1029853

171319298282263

288365289286378271

(P)

813X3

0,3

56109895689

4115322030176353

(G)

19 o11642

499691

13452

6710211677

173105

a 1960; b 1961; c apenas no Continente.FONTES: Colunas A, B e C — Annuaire Statistiquej N. Unida?, 1962, Quadro 176, e La Situation du logement dcms les pays

cVEurope uers 1960, N. Unidas (C.E.B.), 1963, Quadiro 7.Restantes colunas — Annuaire Statistique, N. Unidas 1962 (Quadros n.os 150, 184, 186 e 140, respectivamente, para as colunas

D, E, F e G; utilizaram-se as cifras de populaçãoi indicadas no Quadro I do presente trabalho, salvo para Portugal na coluna G-,em que se recorreu ao Anuário Demográfica* I. N. E., 1962— população do Continente),

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educativos ou de utilização dos tempos livres»; são também, d€algum modo, indicadores de nível de vida.

Começando pelos aspectos qualitativos da habitação, a posi-ção de Portugal exigiria amplos esclarecimentos que, infeliz-mente, teremos de resumir anotando apenas o seguinte.

Observada à escala nacional, a habitação rural é quase sem-pre qualitativamente inferior à urbana, qualquer que seja o paísobservado. Bastaria pois este facto para ajudar a compreenderque nos países onde é maior a percentagem de população não--urbanizada os índices qualitativos à escala nacional sejam pio-res. Mas a juntar a este aspecto há o nível dos réditos: estespaíses são também os mais pobres, pelo que não podem consagrarao alojamento e à urbanização recurso® tão avultados como ospaíses desenvolvidos.

Daqui se conclui que a industrialização actua por várias viassobre a melhoria qualitativa das habitaçõea Uma dessas viasreside no facto de as populações indusitriais se concentrarem emzonas urbanas susceptíveis de serem mais facilmente dotadas decertos equipamentos (água, electricidade, esgotos, etc.) do queas aldeias e os casais dispersos por todo o território.

Outro indicador do nível de vida, o número de aparelhos deT.S.P., não tem actualmente o mesmo valor que tinha há algunsanos. Antes do aparecimento dos receptores transitorizados só asfamílias que dispunham de instalação eléctrica poderiam usufruirdos benefícios da rádio. Actualmente não é assim: o número dereceptores vale apenas por si própriQ, isto é, relativamente à ne-cessidade que satisfazem; não como índice de electrificação, pois arádio surgiu agora em muitos lares onde a luz eléctrica ainda nãoexiste. Do que se não pode, porém, duvidar é da influência que osnovos meios de informação — rádio e TV — exercem sobre popu-lações outrora isoladas do mundo exterior. Neste ponto, a nossaposição entre os países do Mediterrâneo não é das piores. Assima saibamos aproveitar — sobretudo no que toca às possibilidadesnão exploradas da televisão — para auxiliar os programas edu-cativos, inestimável contributo que os meios de informação podemvir a prestar à aceleração do desenvolvimento

Outro indicador recolhido é o que respeita aos automóveis emcirculação. Portugal apresenta, entre os países do Meditemâneo,o maior número de automóveis de passageiro® por 1000 habitan-tes. O significado deste indicador suscita, porém, alguns reparos.De facto, em face da nossa posição em domínios de muito maiorinteresse social (como sejam as capitações de leite e de carne,a taxa de escolarização, etc.) em que ocupamos» as piores posiçõesdo quadro europeu, poderemos considerar como sintoma de eleva-ção geral do nível de vida o facto de menos de 8 % das famíliasdisporem de viatura própria?

Por outras palavras: o número de veículos automóveis cons-

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ti+uirá um índice atkiqiw&o ao grau de desenvolvimento de Por-tugal?

A resposta a estas e outras perguntas que o tema sugere exi-giria (e merece) uma investigação meticulosa, com intervençãode elementos de natureza económica e social, sem esquecer certosfactores psicológicos. Talvez o leitor possa encarregar-se desseestudo...12

5. Habitação e Segurança Social

O sector da habitação é daqueles em que os aspectos sociaise económicos mais se interpenetram, a ponto de não ser por vezesfácil distinguir as fronteiras entre uns e outros.

Como sede da família, lugar de repouso e de vida em comum,a aptidão das habitações para albergarem a população em condi-ções adequadas — considerada a sua quantidade, localização, di-mensões e outras características internas, custo, etc. — constituium factor d!e estabiíiídadie social e de múltiplas satisfações indi-viduais, das quais deriva em grande parte a possibilidade de edu-car convenientemente as novas gerações e de retemperar dia a diaas energias despendidas na actividade económica. Por tudo isto,a habitação constitui uma preoicupação corrente ao nível gover-namental, da qual resultam iniciativas que caracterizam em grandeparte a política social dos vários países.

Por outro lado, a própria actividade de construção de habi-tações representa um dos sectores económicos de maior peso,dada a soma de recursos financeiros que mobiliza, as indústriasque para ela contribuem, a mão-de-obra que absorve, eta; e emtodos estes aspectos é, portanto, origem e alvo de medidas de polí-tica económica.

12 Esperamos que alguns leitores se não sintam constrangidos a cons-truir respostas de alcance nacional a partir de situações subjectivas.

QUADRO V •

FONTES: ^nwwaire Statistique, N. Unidas, 1962, Quadro 176, para as colunas A,B e C; as permilagens da ooluna B foram calculadas considerando a população ameio dos anos a que respeitam ou a dos censos desse? anos, quando existam, segundoo mesmo Anuário- e o Boletim Mensal de Estatística, igualmente das N. Unidas. Idem,1958, Quadro 172 para as colunas F e G; utilizaram-se as estimativas da populaçãoa meio dos anos respectivos (Ann. Deinog., N. U., 1962, Quadro 4) para coluna F; e apopulação activa segundo o Ann. Stat., N. U., 1957, Quadro 6, para a coluna G. ParaPortugal (coluna G) o número de pensionistas foi colhido na Estatística da Organi-zação Corporativa, I. N. E., 1957, Quadro 28, em virtude do erre manifesto dos númerosindicados pelas Nações Unidas, que não chegam a cobrir o total de pensionistas daCaixa Geral de Aposentações (21.6 milhares, contra 38,0 para 1956); apurou-se assimum total de 62,8 milhares de pensionistas em 1957. BuUetin Annuel de Statistiqnes duLogement et de Ia Construction pour VEurope. N. Unidas, 1962, Quadlros n.° 2 paraa coluna D e n.° 5 para a coluna E.

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Habitação e Segurança Social

QUADRO V

Países

Situação habitacional

AnosiFogos exist.p. 1000 hab.

N.° médio depessoas por

divisão

Construção de fogos

p. 1000 hab.

1961

pelo Estadoe cooperativas

% do total)1961

Diasde doençaindemniz.

p. habitante

1956

Pensionistasde velhicee invalidez

(%da P. Act)

1957

PORTUGAL

ESPANHAGRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA

ITÁLIAALEMANHA OCIDENTAL ...BÉLGICAFRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIADINAMARCAGRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

• 3954: b 1955; c 1956; d 1957

(A)

1950

1950195119531960

19511956194719541956

195119551951195019601950

(B)

268

228274207 a, f258

245251341324233

309312281271«356277

(C)

1,18

1,11,82,3X

1,31,00,71,00,8

0,90,70,81,00,80,8

(D)

4,3

4,48,05,4X

6,310,16,06,97,2

5,86,95,97,99,8

10,2

(E)

5,7

17,63,6

43,2X

X26,914,3 e32,742,1

44,926,639,930,8 e58,711,8

(F)

0,6

0,7

2,2 d0,1 d

2,9 b3,91,73,7 d2,0

4,22,6 b5,04,97,8

(G)1,97,4

a,9

0,4

13,0 b

15,87,8

11,222,1

11,714,1 o20,715,823,419,8 c

1960; fSó fogos ocupados; « Não compreende fogos ocupados per duas ou mais famílias.

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o número médio de fogos por 1000 habitantes é em Portugalrelativamente elevadlo: superior aos da Espanha, Jugoslávia,Turquia, Itália, Alemanha Ocidental e Hoíianda. Com base nesteíndice poder-se-ia compreender que o número de fogos construá-dos seja menor que nos restantes países 3, bem assim,, que seconte entre as mais fracas a nossa percentagem de fogos cons^truídos pelo sector público, pois que para uma situação habita-cional, poir hipótese, menos grave, esçaria indicado um esforçomenos acentuado.

A realidade é, porém, bastante maás complexa; no sector dahabitação a análise quantitativa tem que revestir-se de cuidadosmuito particulares, 'tornando-se mesmo assim muito difíceis ascomparações deste tipo.

A dificuldade principal esftá em conhelcer como se repartemno espaço as necessidades de habitação e asi próprias habitações;da conjugação de umas e outras se poderá então ajuizar do graude carência existente. Com efeito, pode haver um número elevadode casas em regiões cuja população emigra e onde, por isso, nãosão necessárias; e faltarem nos grandes aglomerados, cuja popu-lação se expandie rapidamente.

Ora, é este precisamente o caso de Portugal, como é em geral,o de qualquer país atravessando uma fase inicial de industrializa-ção: o crescimento rápido das zonas urbanas onde se instalam asactividades secundárias e terciárias provoca o aumento das ne-cessidades de habitações, enquanto muitas outras ficam desocupa-das nas regiões que se despovoam, mas continuando a contribuirpara um índíice elevado à escaia nacional, pelo simples facto deexistirem.

Além disso, se considerarmos simultaneamente a falta dtealojamentos e o número daqueles que se encontram em superlo-tação crídca, facilmente se conclui que cerca de % das famíliasportuguesas não dispõe de habitação conveniente. As necessidadesderivadas das migrações internas da população vêm somar-se,portanto, a uma situação habitacional preexistente, cuja gravi-dade é manifesta.

A consciência dse que este problema exige uma acção maisdecisiva dos poderes públicos em conjugação com a política geraldo desenvolvimento, está patente na recente inclusão do sector dahabitação no Plano de Investimentos para 1965-1967. Trata-se deum passo indispensável para se atingir, como na maior parte doapaíses europeus, uma percentagem relativamente elevada de fogoscuja construção possa ser controlada de acordo com os restantesaspectos do desenvolvimento.

Em face do que fica exposto, poder-se-á perguntar qualo motivo por que se apresentam os elementos das colunas B, C e Ddo quadro V, cuja análise pode conduzir a conclusões tão distantesda realidade...

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E se fosse apenas para sublinhar os cuidados que deve haverna observação de estatísticas internacionais?

A segurança sociaUl constitui um outro campo em que se revelamuito difícil a comparação internacional baseada em índices,isto é, com expressão quantitativa. A tal dificuldade não é estra-nha a grande diversidade dos sistemas de segurança saciai, dosconceitos nela utilizados e dos níveis de benefícios concedidos.

Não seria, no entanto, necessária a recolha se bastasse a con-clusão de que são os países industrializados que apresentam osesquemas de segurança mais perfeitos e com cobertura de maiorescamadas da população. É esta uma conclusão natural, porque umnível elevado de riqueza nacional há-de esitar na base da melhoriadas condições de vida das classes inactivas e da protecção de certosriscos.

Pretendia-se, porém, como nos casos anteriores, algumacoisa mais; se possível, índices que mostrassem as posições rela-tivas dos vários países. Os elementos recolhidos dizem respeitoao seguro por doença e à protecção na velhice e na invalidez,embora se reconheça que seria preferível dispor de outro®1.

É no segundo dos índices obtidos que Portugal se mostramais afastado da maior parte dos restantes países, revelandoquanto é ainda necessário caminhar.

Neste sentido», é de admitfr que as recentes alterações nosesquemas da Previdência Social venham a melhorar a posição por-tuguesa. Por outro lado, também se espera que a progressiva re-dução da população activa na agricultura venha a conribuirpara a melhor cobertura do País em matéria de segurança social,mediante a sua transferência para outros sectores de mais fácilintegração.

Com efeito, é na extensão do campo de aplicação da segu-rança social e no nível dos seus benefícios que se encontram asprincipais disparidades, já que a natureza das instituições e atéo seu modo de funcionamento se aproximam dos esquemas dospaíses desenvolvidos — com excepção, certamente, de alguma ten-dência para a dispersão de esforços, que constitui um dos pecadosnacionais.

6. Educação e Cultura

Os problemas da educação contam-se actualmente entre osmais estudados, nas suas relações com o desenvolvimento eco-nómico.

À medida que o progresso técnico se acentua, crescem asnecessidades de preparação daqueles que têm a missão de o inte-grar na vida quotidiana, mediante o aperfeiçoamento das activi-dades produtoras. No actual contexto de competição internacio-nal, a «batalha dos cérebros» é muito mais do que uma áimples

82.1

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Educação e Cultura

to

QUADRO VI

Países

Despesasc. ensinoem % doP. N. B.

19158»

Taxa deanalfabe-

tismo

Taxa de escolarização(%) —1958 •

5-14 anos 15-19 anos

Alunosuniveirsit.p. 100 000

habitantes1959

N.° de alunos porprofessor —1959

Ensinoprimário

Ensinessecundárioe técnico

Jornais):N.° exempl.

p. 100 000habitantes

1961

Cinemas:Frequênciaanual porhabitante

1901

PORTUGAL .

ESPANHA ....GRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA

ITÁLIAALEMANHABÉLGICA ....FRANÇAHOLANDA ..

OCID.

ÁUSTRIADINAMARCAGRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

(A)

2,1

1,61,42,62,0

3,42,82,83,54,2

2,83,03,73,74,12,9

(B)

41,7 d

X23,5 e25,0 «65,4 d

XX3,lo3,3 *>X

XXXXXX

(C)

56,2

74,974,566,344,7

78,880,295,490,185,5

84,876,4

77,382,678,6

(D)

8,8

13,316,916,93,3

15,717,631,530,832,8

13,118,517,635,732,322,9

(E)

239 3

255 i284758 1247 3

326455 i448498575 3

546 i381 i391247 i434426

(F)37.3 3

38.4 *38,437.5 i46,7 3

22,836,3 i24,226,733,7 3

28,5124.0 i29,026.1 i19,132,6

(G)39,5 3

18,9 i31,022,0 i21,0 3

12,232,9 1X

21,820,2 3

31,5 iX

20,420,0 i14,6X

(H)

81

70 i125 h6645

101307 i285252 i278

208 *345506384477374

(D2,9

6,3 e7.0 i1.1 h

15,1 **9,28,8 i7,14,4

14,29,6 I9,6 i9,46,67,3

* 1958 ou o ano mais próximo; b 1946; c 1947; d 1950; e 1951; ** 1953; § 1958; h 1959; * 1960; J 1961; ' apenas secundário; m p r i -mário e secundário; n apenas técnico. Na coluna A, as despesas são as indicadas domo «globais».

FONTES: Annuaire Statistique, N. Unidas, 1956, Quadro 180 para a coluna B. Idem, 1962, Quadro 177 para a colunas E, Fe G, Quadros n.os 181 para a coluna H e 183 para a I.

Politiquex de croissunce êconomique et d'investissement dans renseignement — II Les objectifs de Véducatiovj, en Europe pour1970, O. C. D. E., Paris, 1962, págs. 104 para a coluna A e 114 para a.s colunas C e D.

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imagem discursiva; ela traduz-se em programas concretos degeneralização dos conhecimenítos de base e de especialização, avários níveis e nos1 mais diversos campos.

Assim se explica o interesse posto na colaboração interna-cional em matéria educativa, colaboração em que Portugal seencontra já integrado, através do projecto regional do Mediter-rânea, que visa à programação educaava como factor de desen-volvimento. A iniciativa deste projecto derivou, aliás* de uma su-gestão portuguesa feita à O.C.D.E.

Os países mediterrânicos parecem ser os únicos da Europaonde o analfabetismo constitui ainda um problema não resolvido.Nos restante®, a taxa de analfabetiismo já se pode considerar pre-sentemente urn indicador cultural ultrapassado, situando-se osproblemas educativo® muito para além da aprendizagem da lei-tura 13. O facto de se dispor de taxas à volta de 3 % para a Françae para a Bélgica leva a admitir que a escassez de dados pubJAcadosem relação a paá&es fora da zona mediterrânica se deve à suairrelevância.

Quanto a Portugal, não se coinhéce ainda a taxa referenteao último Censo, mas apenas a de 1950, que era de 41,7 %. Res-ta-nos, por ia?©, citar u "1* ODinião secundo a qual se admite «quea taxa global de analfabetismo tenha sido, em 1960, inferior a30 %»14. Se isto significa uma taxa não muito inferior aos alu-didos 30%, tanto a Grécia como a Jugoslávia se encontravamjá nessas condições há uma dezena de anosi.

Outros indicadores merecem igualmente a nossa atenção,sendo de destacar as taxas de escolarização. Estas são directa-mente influenciadas pelos períodos de escolarização obrigatória,que diferem de país para país.

As taxas de escolarização variam consideravelmente com aidade dos alunos a que dizem respeito. Por isso no grupo dos5-14 anos as diferenças entre os países do MedSítetrrâneo e osrestantes são menos acentuadas do que no dos 15-19, o que nãoé de estranhar, pois neste grupo de idades inclui-se grande partedos alunos dos ensinos secundário e universitário — graus que seacham menos desenvolvidos naquele primeiro grupo de países.

Quanto à frequência do ensino universitário, a nossa posiçãonão se afasta substancialmente das posições da Espanha, da Gré-cia ou da Turquia15. E mesmo em relação aos países mais adian-tado^, não parece que esteja no nível da frequência db ensino uni-versi ário o principal aspecto do nosso problema escolar; aliás, se

13 vd. Quadro VI para o que se segue.14 Váriasj Autores — Análise quantitativa da estrutura escolar portu-

guesa (1950-1959), Anais do I.S.C.E.F., 1962, tomo 2.°, p. 396.is O caso da Jugoslávia suscita reservas, tanto em face do resto da

Europa como das próprias posições deste país segundo os indicadores dascolunas C e D; é possível que haja diferença de significado nos conceitosutilizados.

823

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entre nós o número de alunos que frequentam as universidadesnão chega a 3 % dctô que passam pelo ensino primário, taJ percen-tagem não excederá 6 ou 7 nos países europeus mais adiantados,cuja densidade de alunos universitários (por 100 000 habitantes)é, nos casos mais favoráveis, pouco superior ao dobro da portu-guesa (coluna E do Quadro VI). O que suscita apreensões é a pro-dutividade do ensino ministrado — a relação entre o número dosalunos que entram nas universidades e o dos que concluem os cur-sos. Os indicadores apurados não esclarecem este aspecto, massabe-se que grande parte dos nossos alunos universitários (e tam-bém dos do ensino secundário) não chega a terminar os cursos,por falta de aproveitamento, dificuldades económicas ou outrosmotivoa O elevado número de alunos a cargo de cada professor(Vd. coluna G, especialmente) não pode ser estranho a tais re-sultados.

Não é este, porém, o único aspecto a considerar. O simplesfacto de ser a mais baixa dia Europa a nossa taxa de escolari-zação até aos 19 anos (cotanas C e D do Quadro VI) vem, afinal,pôr em destaque o problema da escoljaridade obrigatória, ou seja,o da educação de base.

O alargamento desta educação para níveis que eram já cor-rentes na maior parte da Europa há trinta anos16, há-de reve-Jar-se indispensável ao dlesenvolvimento do País. E só depoisdisso será então possível aumentar o consumo de jornais, bemcomo melhorar outros índices de cultura da população.

7. O Grau de Desenvolvimento

Talvez contrariamente ao que é habitual, deixámos parao fim a reicolha de alguns indicadores sobre o grau de desen-volvimento. Ê que, depois de se examinar a situação alimentar,sanitária, educacional, etc, tais indicadores já não nos surgemapenas como causas dos níveis sociais atingidos; sente-se quetambém eles próprios são efeito destes níveis sociais.

Dois exemplos extraídos do Quadro VII ajudam a esclareceresta reciprocidade.

Assim, os países onde é mais elevada a percentagem do pro-duto agrícola no produto nacional — portanto, os «essencialmente

i6 vd., por exemplo, os esquemas de ensino europeus em UOrganisationde Vlnstruction Publique dans 53 Pays — Bureau International de VEduca-tion} Génève, s/d. As situações descritas referem-se a 1930 ou a anos próximos.

Para o estudo actual dos ensinos primário e secundário nos paíseseuropeus, convém consultar: Jean THOMAS e Joseph MAJAULT — UEnseigne-ment primaire et secondawe — tendances actuelles et problèmes communs,Conseil de 1'Europe, Strasbourg, 1963.

82U

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agrícolas» — são também aqueles onde, de um modo geral, o con-sumo de azotados por hectare é inferior (coluna H), o que podeparecer um contra-seruso. Ora , este facto não pode deixar de terrelação com as dificuldades à penetração do progresso: menor ins-trução geral e técnica; resistência à formação de explorações agrí-colas bem dimensionadas; atitude pouco receptiva em relação àsinovações; falta de cooperação entre os agricultores.

Outro índice de desenvolvimento bastante característico é oque se refere ao consumo de aço (coluna G). A capitação deste con-sumo é menor no»s países menos desenvolvidos, não sendo por issoraro encontrar aqui e além, conselhos para a aumentar. Mas comoserá possível consumir mais aço sem um interesse generalizado pe-las questões técnicas ? Sem uma preferência acentuada pelos cursosde engenharia? Sem que se formem especialistas metalúrgicose mecânicos em grande escala? Como será isso possível em paísesonde ainda não é significativa a produção de máquinas?

Questões como estas relacionam-se directamente com o con-ceito de produtividade. É no aumento desta e na utilização defactores subempregados que se pode encontrar solução paragrandíe parte dos problemas da pobreza. Ora, na base no aumentoda produtividade encontram-se elementos de natureza sócio--cultural.

É um facto que os trabalhadores das fábricas onde a pro-dução se faz de acordo com as técnicas mais avançadas desfru-tam de níveis de vida superiores. Superiores em virtude dasmaiores possibilidades de pagamento dessas indústriias, nas quaisa produtividade é mais elevada? Sem dúvida! Mas a inversa étambém verdadeira: esses níveis: de vida mais elevados vão, porsua vez, influenciar a produção. Acaso poderíamos conceber umafábrica de aparelhagem de precisão secrvida por uma populaçãofabril subalimentada, analfabeta, alojada em barracas?...

A própria altitude dos agentes da produção (para além dosaspectos físicos e educativos, mais directamente mensuráveis)condiciona também a produtividade. Importa que haja muitaspessoas interessadas no progresso económico, quer se trate deempresários quer de pessoal, sobretudo cie pessoal qualificado.Mas são ainda elementos socio-cuilturais que condicionam emgrande parte essa atitude: por exemplo, a consciência da dignidadeprofissional! que deriva do conceito social em que é tido o operá-rio, o técnico, o próprio empresário; e também a convicção deque há uma compensação, direieta ou indirecta, do acréscimo dees£orço produzido.

Tudo isto se vai reflecti^, depois, nas taxa® de crescimentodo produto nacional'.

Mas se é certo que estas taxas se apresentam com firequência,nos países em vias de diesenvolvimento, em nível superior às dospaíses desenvolvidos, não devemos por esse facto concluir cine

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0 0 Alguns indicadores do Grau de Desenvolvimento

QUADRO VH

Países

RendimentoNacional:capit. em

dólares

1957

Crescimentoanual do

P.N.B. (%)

1958-61

ProdutoAgrícola

em % doP.N.B.

1961

População activana Agri-cultura

na Indús*-tria ttransf.

Em Yo da Popul. ajctivatotal —1950

Capitações de consumo

Energia(expr. era

Kg. hulha)1961

Aço(Kgs.)

1961

Cbnsumodo azotados

(Kgs. deN/ha cult.).

1960-61

PORTUGAL

ESPANHA ....GRÉCIAJUGOSLÁVIATURQUIA

ITÁLIAALEMANHA OCID.BÉLGICAFRANÇAHOLANDA

ÁUSTRIADINAMARCAGRÃ-BRETANHANORUEGASUÉCIASUÍÇA

(A)

321

456468X

437

5451002113011171087

933

1086

1139

1095

1181

1510

(B)

5,7

X

5,8XX

6,7

6,5

2,0 h

3,7

3,8

5,0

5,4

2,6

3,8

4,1

3,3 s

(C)

26 f

26 «

30

27

41 í

17

6

7*

9i

10

11«14

4121XX

(D)

48,4

48,848,1b

66,8 o77,4 e

40,1b

26,0

12,1a

27,7 «

19,3 a

25,1

25,9

20,4

16,5

(E)

18,9

17,615,9 b6,5 c6,0 e

21,9 b

31,0

37,7 a

26,4 d

23,9 a

26,7 b

26,1

37,2 b

25,7

31,5

36,0

(F)

405

855

540

904

229

1223

3626

4141

2514

2820

2198

2953

4925

2870

3523

1951

(G)

59

7448101

20

220

490

343

308

273

267

267

357

291

544

360

(H)

16,4

11,819,3(5,3)1,1

23,145»459,318,393,1

16,944,134,446,325,613,5

1047; b 1951; c 1953; d 1954; • 1955; f 1960; * 1957-59; 1958-60; * Não inclui a pesca. ( ) Estimativa da O.C.D.E.

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se estão atingindo altos padrões de produtividade naqueles países.O que acontece com frequência é que o ponto de partida é tãomodesto que qualquer aumento representa um grande progressoem termos relativos; o mesmo progresso a partir de uma situaçãomais desafogada passaria muitas vezes desapercebido. Pretende-mos daqui conctliiir que, apesar de algumas taxas de crescimentodo produto registadas em Portugal, sobretudo nos últimos anos,se poderem considerar elevadas em comparação com as de paíseseuropeus desenvolvidos, talve® elas sejam susceptíveis de eleva-ção, se se alterarem favoravelmente as condições sodo-culturaisdo desenvolvimento no nosso País.

Na análise dos resulítados a que se chegou procurou-se deli-beradamente não explicitar uma conclusão genérica de tipo valo-rativo que a si própria se classificasse de pessimista ou optimistaa respeito da nossa posição na Europa, quanto a índices d<e pro-gresso sociail.

Por certo que outro tipo de análise — a da evolução dos mes-mos indicadores em Portugal, num período recente — nos dá umapanorâmica diferente, mostrando que se tem progredido muitoem diversos campos. E, na verdadei, ambos os tipos de análisese mostram necessários, embora estejamos mais habituados aapreciar a evolução limitada <ao interior das nossas fronteiras,esquecendo com demasiada frequência que, enquanto nós progre-dimos, o re®:o do Mundo também não se queda nas posiçõesalcançadas, quaisquer que alas sejam; esquecendo, até, que aapreciação do crescimento em termos relativos não pode ser dis-sociada da noção dos valores absioíutos de que se parte.

De qualquer modo, porém, não se pode deixar de acentuara dificuldade que há em estabelecer uma conclusão de alcanceglobal sobre a nossa posição em face dos níveis sociais europeus;

< QUADRO VII

FONTES: Coluna A —J . P. OEDAHAUT e E. S. KIRSCHEN — «Lets revenusnationaux du mondo non oommuaiistei», in Cahiers Éoonomique de Bruxelles, n.° 10,Abril 1961 — Os valoreis indiciados representam rendimentos líquidos, tendo os Autoiresentrado em linha cie conta com o poder de compra interno das moedas dos váriospaíses, ao fazer a comveirsão em dólares.

Coluna E — AnnvMre Statistique cies Comptabilités Nationales, N. Unidas, 1962— Os elementos colhidos serviram de base ao cálculo das taxas de crescimento anualmédio do P. N. B., a preços constantes de mercado, durante um período de 3 anos(1959-1961).

Coluna C — Annua&re Statistique, N. Unidas, 1962, Quadro 164 — Produto daAgricultura, Silvicultura e Pesca.

Colunas D e E — Idem, 1957, Quadro 6.Coluna F — Idem, 1982, Quadro 122.Coluna G —Idem, 1962, Quadro 132.Coluna H — Les Engrais en Europe, O. E. C. E., 1958-61.

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as próprias comparações de índices específicos são susceptíveisde controvérsia em número apreciável de caso®, embora não afec-tando o seu sentido gerai. Basta acrescentar que «não existe umindicador único do nível de vida»17, e observar as dificuldadesdefrontadas por quantos se têm ocupado de comparações inter-nacionais deste género, para logo se condluir pela impossibilidadede estabelecer uma conclusão daquele tipo.

De resto, é por demais conhecido — através de estudos e d<edocumentos oficiais — o desfavor da nossa posição relativa, noseio de uma Europa cuja prosperidade (com algumas excepções)nos assombra, quando se recordam as cinzas de que partiu nãohá ainda vinte anosis.

Restringindo a comparação aos países de idêntico nível de de-senvolvimento pode ainda constatar-se que «a posição de Por-tugal é relativamente melhor no que respeita a índices de equipa-mento material — telefones, automóveis, rádios; é igual quanto aalimentação, embora em relação desfavorável no aspecto quantita-tivo genérico, traduzido no baixo consumo de calorias; e é piorquanto aos aspectos sanitários e educacionais.»19

O panorama que esta síntese nos fornece assume o seu maiorsignificado em face, precisamente, da actual problemática do pla-neamento nacional, em cujo contexto foi formulada. Mas maissignificativa, ainda, se mostra esta sua interpretação: «os aspectosdo nível de vida que derivam de gastos espontâneos dos consumi-dores apresentam entre nós situação superior à da Europa menosdesenvolvida, sucedendo o contrário nos domínios em que as me-didas de política coordenada e de organização nacional são deci-sivas— nos sistemas de instrução e saúde o ritmo de progressoportuguês foi inferior ao desse grupo de países europeus com aná-logo grau de desenvolvimento económico.» 20

Que mais concluir, então?Que importa estabelecer uma análise objectiva dos dados que

caracterizam a posição portuguesa. E que, a partir desta análise,há que desenvolver um esforço muito grande, coordenando os as-pectos sociais e económicos do desenvolvimento, se queremos me-lhorar a nossa posição no seio de uma Europa em rápido progresso,

is A recuperação económica da Europa podia considerar-se terminadaem 1950, iniciando-se então o período de expansão que actualmente prossegue.Vd. Besoins et Moyens de VEurope (obra colectiva sob a direcção de J. Fre-deric DEWHURST), Ed. Berger-Levrault, Paris, 1962, p. 10.

19 Parecer da Câmara Corporativa sobre o Plano Intercalar de Fomentopara 1965-1967 — Actas da Câmara Corporativa, N.° 82, 1964, p. 828.

20 Op. cit. nota anterior.

828