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Revista Brasileira de Cineantropometria & Desempenho Humano ISSN 1980-0037 José Fernandes Filho 1 José Luís T. Carvalho 2 Artigo de Revisão POTENCIALIDADES DESPORTIVAS DE CRIANÇAS SEGUNDO A PERSPECTIVA DA ESCOLA SOVIÉTICA SPORT POTENTIALITIES OF CHILDREN ACCORDING TO THE SOVIET SCHOOL PERSPECTIVE RESUMO O Presente estudo visa realizar uma revisão sobre o assunto do conhecimento das potencialidades das crianças, para que desta forma, a descoberta de novos talentos seja melhor aproveitada. Muitos jovens talentos vêm sendo “esmagados” por treinadores despreparados, que não respeitam as fases do desenvolvimento humano e querem resultado precoces sem uma preocupação com a elaboração de um correto programa de treinamento. Mostrando a importância da hereditariedade, indicamos o caminho a ser seguido para se determinar a relação da influência familiar com os resultados dos grandes desportistas, para que, desta forma, possamos descobrir novos talentos não só por testes específicos, mas sim pelo histórico familiar, que é de fundamental importância. Palavras-chave: potencialidade, descoberta, talento, crianças. ABSTRACT This study aims to make a survey of the state of knowledge related to individual’s potentials, directed toward the better usage of talent discovery. Many talented young people have been “crushed “by coaches without proper preparation who do not respect the phases of human development and require results prior to the proper timing, without providing adequate training programs. Demonstrating the importance of heredity, we indicate the path that should be followed in order to detect the relationship between family influences and the results of great athletes. Following this pattern, this study proposes that new talent can be discovered through specific genetic tests plus family history. Key words: potentiality, discovering, talent, children. 1 José Fernandes Filho: Professor Titular do Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu em Ciência da Motricidade Humana da Universidade Castelo Branco / RJ. 2 José Luís T. Carvalho: Pós-Graduando do programa de Lato-Sensu em Treinamento Desportivo da UCB/RJ- formado pela UFRRJ, bolsista da FAPERJ.

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Revista Brasileira de Cineantropometria & Desempenho Humano ISSN 1980-0037

José Fernandes Filho 1

José Luís T. Carvalho 2

Artigo de Revisão

POTENCIALIDADES DESPORTIVAS DE CRIANÇAS SEGUNDO APERSPECTIVA DA ESCOLA SOVIÉTICA

SPORT POTENTIALITIES OF CHILDREN ACCORDING TO THE SOVIET SCHOOL PERSPECTIVE

RESUMO

O Presente estudo visa realizar uma revisão sobre o assunto do conhecimento das potencialidades das crianças, para que desta forma, a descoberta de novos talentos seja melhor aproveitada. Muitos jovens talentos vêm sendo “esmagados” por treinadores despreparados, que não respeitam as fases do desenvolvimento humano e querem resultado precoces sem uma preocupação com a elaboração de um correto programa de treinamento. Mostrando a importância da hereditariedade, indicamos o caminho a ser seguido para se determinar a relação da infl uência familiar com os resultados dos grandes desportistas, para que, desta forma, possamos descobrir novos talentos não só por testes específi cos, mas sim pelo histórico familiar, que é de fundamental importância.

Palavras-chave: potencialidade, descoberta, talento, crianças.

ABSTRACT

This study aims to make a survey of the state of knowledge related to individual’s potentials, directed toward the better usage of talent discovery. Many talented young people have been “crushed “by coaches without proper preparation who do not respect the phases of human development and require results prior to the proper timing, without providing adequate training programs. Demonstrating the importance of heredity, we indicate the path that should be followed in order to detect the relationship between family infl uences and the results of great athletes. Following this pattern, this study proposes that new talent can be discovered through specifi c genetic tests plus family history.

Key words: potentiality, discovering, talent, children.

1 José Fernandes Filho: Professor Titular do Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu em Ciência da Motricidade Humana da Universidade Castelo Branco / RJ.2 José Luís T. Carvalho: Pós-Graduando do programa de Lato-Sensu em Treinamento Desportivo da UCB/RJ- formado pela UFRRJ, bolsista da FAPERJ.

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PROBLEMA DAS POTENCIALIDADES

O problema de potencialidades podeser resolvido, por enquanto, no aspecto psico-lógico - pedagógico. Os psicólogos Teplov(1961), Leontiva (1977) & Platonov (1988) de-dicaram suas obras aos estudos teóricos des-se problema: o estudo das potencialidades daspropriedades psico-fisiológicas individuais deuma pessoa que permite realizar qualquer tipode atividade. Segundo Teplov (1961), para de-terminação de um potencial, deverá ser consi-derado o seguinte:

1) as potencialidades incluem particu-laridades psicológicas, as quais diferem de umapessoa para outra;

2) não bastam as particularidades in-dividuais em geral, mas sim aquelas que asse-guram o êxito de atividades específicas;

3) as particularidades psicológicas,sendo a base de uma potencialidade, não po-derão ser associadas aos conhecimentos; umaatividade bem sucedida não é determinada poruma capacidade, mas sim, pelo conjunto e com-binação específica das capacidades.

O termo “talento” é entendido comouma combinação específica das capacidades.Segundo Teplov (1961) o talento nãopredetermina o êxito, mas sim a condição desua realização. Na psicologia, o problema daspotencialidades é estudado junto ao problemado indivíduo. Isso é muito importante, pois oessencial das potencialidades poderá ser en-tendido, no caso de serem analisadas em rela-ção ao indivíduo. As potencialidades de um in-divíduo são as capacidades de uma pessoasocialmente determinada. Analisando-se aspotencialidades, é recomendado considerar ascaracterísticas pessoais, bem como, as propri-edades emocionais e evolutivas. Para estaanalise é muito importante definir sua estrutu-ra. Na psicologia deverão ser determinados osseguintes componentes estruturais das capaci-dades: o geral, a caracterizar as qualidades pró-prias para todas as pessoas; o especial, a in-cluir a atividade específica; o individual, a sercaracterizado pelas capacidades especiais in-dividuais próprias para o indivíduo. Tal estrutu-ra foi analisada, na psicologia alguma obras:capacidades musicais (Teplov, 1961), de vôo(Platonov, 1986), pedagógicas, artísticas (Krutetski, 1972), técnicas, desportivas(Radionov, 1973). Ao analisar algumas delas,observamos que a das capacidades de vôo in-clui as seguintes qualidades individuais psico-lógicas de uma pessoa:

1) particularidades do temperamento;2) interesse para a atividade de vôo;3) persistência, decisividade, coragem;4) possibilidade de melhorar consideravelmente

a produtividade de sua atividade;5) resistência motora emocional e sensorial;6) iniciativa, autocrítica, perspicácia;7) transformação da atenção e estabilidade da

atenção;8) velocidade e precisão das reações motoras

complicadas;9) boa coordenação de movimentos, agilidade;10) facilidade de formação e aperfeiçoamento

das habilidades motoras (Platonov, 1988).A capacidade de organizar atividades

pode ser caracterizada pelas seguintes quali-dades e características de personalidade:1. A capacidade de ativar outras pessoas;2. inteligência prática psicológica para assegu-

rar o clima psicológico, no qual o Homemutiliza suas capacidades da melhor manei-ra;

3. capacidade de entender a psicologia daspessoas;

4. avaliação crítica das atividades de outraspessoas;

5. capacidade de poder manter contato comoutras em conformidade com o fato psicoló-gico;

6. nível geral de inteligência, que surge emparticular na multiformidade e perspicácia;

7. iniciativa;8. exigente com as outras pessoas;9. tendências a atividades organizacionais;10. praticidades, capacidade de utilizar rapida-

mente suas experiências e conhecimentospara realizar tarefas práticas;

11. individualidade;12. espirito de observação;13. domínio de si, auto-domínio;14. sociabilidade;15. estabilidade;16. atividade pessoal;17. capacidade de trabalho;18. organização;

Para a avaliação das capacidadesdesportivas, é recomendável diferenciar trêsníveis de desenvolvimento das capacidades: 1)as capacidades gerais (condições gerais), quesão: boa saúde, desenvolvimento físico normal,laboriosidade, persistência, interesses; 2) ele-mentos gerais das capacidades desportivas:domínio rápido da técnica desportiva, boa adap-tação aos esforços, recuperação bem sucedi-

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da após a carga; 3) elementos especiais dascapacidades desportivas: alto nível de desen-volvimento das capacidades especiais, cresci-mento rápido dos resultados desportivos etc. Emcada modalidade desportiva a estrutura psico-lógica das capacidades não é igual. Nas cíclicasé muito importante a estabilidade das diferenci-ações musculares, sensação do ritmo, capaci-dade de avaliação correta do estado funcional.Nos jogos e lutas as capacidades psíquicas sãoprimordiais (Rodionov, 1973). O defeito princi-pal das estruturas das capacidades menciona-das consiste em sua esquematização e um dospostulados principais da psicologia de talentosconsiste na afirmação de que as capacidadesnão são inatas e se desenvolvem no processode atividade segundo Teplov (1961). As congê-nitas (inatas) são as capacidades anátomo-fisi-ológicas, isto é tendências que constituem ofundamento básico de desenvolvimento dascapacidades; as próprias capacidades são re-sultado do desenvolvimento. Sendo assim, ascapacidades não são invariáveis, elas se for-mam e se manifestam na atividade. De um lado,a atividade é a base de desenvolvimento dascapacidades, de outro; as capacidades a se-rem desenvolvidas enriquecerão a atividade. Ospesquisadores interpretam o termo “inclinaçõesinatas de desenvolvimento” de maneiras dife-rente, Teplov (1961) considera as inclinaçõespropriedades anatomo-fisiológicas a serem abase de desenvolvimento das capacidades. Aomesmo tempo, é constatado que as “capacida-des se formam conforme as leis específicaspsicológicas e não dependem das propriedadesdo sistema nervoso.” Já Leontiev (1977), consi-derando as inclinações às particularidadesanátomo-fisiológicas, afirma que o termo “incli-nações” não é categoria psicológica. Atualmenteé dominante a afirmação de que as inclinaçõesinatas não deverão ser consideradas anátomo-fisiológicas, mas, sim, as particularidades psí-quicas nervosas. Nas apresentações sobre asinclinações naturais, as alterações de termino-logias semelhantes não apresentam clareza.Primeiro existem atividades (por exemplodesportivas) onde as particularidadesanatômicas (morfológicas) têm um papel impor-tante segundo a nova terminologia e não nospermitem chegar a um entendimento das capa-cidades naturais. Sendo assim, as inclinaçõesinatas são questionadas e necessitam de novainterpretação no atual nível contemporâneo doconhecimento da genética. O problema das

capacidades é o problema das diferenças entreas pessoas. A base fisiológica das diferençasindividuais é o estudo de Pavlov (1961) sobreas propriedades dos processos nervosos e ti-pos da atividade nervosa superior. É muito im-portante citar as propriedades dos processosnervosos: força de excitação e inibição, semequilíbrio e flexibilidade. Devido a isso existemquatro tipos da atividade nervosa superior: 1)forte, equilibrado, com mudança rápida dos pro-cessos nervosos, isto é de sua flexibilidade alta.2) forte, mas não é equilibrado com predomi-nância dos processos de excitação. 3) forte,equilibrado, mas de baixa flexibilidade dos pro-cessos nervosos – tipo “calmo”. 4) fraco a sercaracterizado pelo desenvolvimento fraco tan-to dos processos nervosos de excitação, comoda inibição. Ao mesmo tempo propõem outrascombinações do sistema nervoso e a existên-cia de atividades nervosas intermediárias.

Para entender as capacidades naturaisé importante saber que as propriedades do sis-tema nervoso, por si, não predeterminam o de-senvolvimento das capacidades. Eles podemservir somente como fundo, e em alguns casosfacilitam a formação dos mesmos, e em outros- constituem fatores de contenção.

Analisando-se as capacidades comoregulador da atividade, é preciso determinar osíndices para regulação. Um dos índices bási-cos das capacidades é a facilidade de aprendi-zado da nova atividade. No esporte, um dos tra-ços do “talento motor” é a capacidade de deco-rar rapidamente a técnica de execução dos ele-mentos complicados.

Se por acaso o esportista aprender umdeterminado tipo de exercício rapidamente ecom perfeição, com certeza terá condição derepetir no futuro, como se fosse algo que tiveraaprendido há muito tempo. Esta mesma idéia écompartilhada por BURG, um dos grandes gi-nastas de renome, que afirma “ treinar não éobrigatório; o importante é realizar o exercíciode imediato”.

A facilidade de aprendizado é determi-nada pela capacidade do indivíduo à totalização.Quanto ao ponto de vista psicológico de ativi-dade mental, essa propriedade permite aproxi-mar-se de objetos concretos e fenômenos, dan-do possibilidades de observá-los de vários ân-gulos. Alcançando um nível de desenvolvimen-to satisfatório é possível transportar esta pro-priedade de uma atividade para outra: uma ca-pacidade de totalização permitirá, também, ex-

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plicar a formação acelerada da habilidademotora. As aptidões dos esportistas estão ca-racterizados mediante alto desenvolvimento dascapacidades de totalização, que permitem “re-duzir” vários elementos do movimento e, asse-gurando, a totalização e o aprendizado rápidodas habilidades motoras no geral. O problemade desenvolvimento das capacidades visa àconsideração das particularidades etárias: de-senvolvimento físico, mudanças funcionais, psí-quicas. Neste caso, é importante considerar ascorrelações entre o nível de desenvolvimentodas capacidades e capacidades funcionais doindivíduo. Em se tratando de crianças, a passa-gem de uma faixa etária à seguinte, significauma nova etapa qualitativa de formação do or-ganismo, pois trocam-se as premissas internasdo desenvolvimento. Elas trocam-se em cadaetapa em particular “clima psicológico de for-mação das capacidades”.

É constatado que muitas vezes a ma-nifestação precoce das capacidades perturbao desenvolvimento harmonioso do indivíduo. Porisso, junto ao desenvolvimento das capacida-des, tem importância especial a formação doindivíduo, pois a capacidade é um dos compo-nentes de sua estrutura. Como já foi dito antes,as questões sobre as premissas naturais dacapacidade constituem o elo de fragilidade dosproblemas de capacidades. Do ponto de vistada ciência contemporânea, as inclinações ina-tas são o objeto de estudo da ciência sobre ahereditariedade genética, identificado códigosgenéticos e mutabilidade do ser humano.

Influências genéticas e ambientais sobre odesenvolvimento das capacidadesdesportivas

Para entender as capacidadesdesportivas é importante o papel da hereditari-edade e meio ambiente. Existe noção de que, ohomem ao nascer - é “quadro limpo”, no qual anatureza, a educação, o treinamento, podem“escrever” tudo quanto queiram; a assimilaçãodo conhecimento dependerá do método deensinamento, experiência do pedagogo ou trei-nador. Outras afirmações contrárias evidenci-am que os fatores hereditários por si só,predestinam o desenvolvimento de todas as ati-vidades do homem. Atualmente é reconhecidoque sem características inatas é difícil conse-guir os melhores resultados. As inclinações ina-tas poderão ser desenvolvidas até o máximo

nível apenas no caso das condições adequa-das ao meio ambiente; do ensino racional e trei-namento da inclinação inata não depende o pró-prio êxito, mas apenas a sua probabilidade.

O desenvolvimento de uma pessoa éo resultado da interação da hereditariedade eambiente. A influência dos fatores de heredita-riedade e ambiente sobre o desenvolvimento decertos indícios não é igual. Uns indícios sãosujeitos à ação do genótipo, os outros, ao domeio ambiente. O estudo do grau de influênciada hereditariedade e ambiente é o objetivo im-portante da genética de uma pessoa.

As leis gerais de hereditariedade quesão estabelecidas entre os animais, vegetais emicrorganismos propagam-se também no ho-mem. Isto mais uma vez testemunha a unidadeBiológica do Homem com todo mundo orgâni-co. As moléculas do DNA, cujo núcleo das cé-lulas está composto pela concentração decromossomos, servem de portadores materiaisde hereditariedade nos diferentes níveis de or-ganização de vida. A unidade de hereditarieda-de é o gene. No homem 46 cromossomas (23pares) abrigam genes onde se concentram to-das as informações sobre a hereditariedade.Graças à criação de uma linguagem bem arti-culada e de qualidade, o homem diferencia-sede seus antepassados apesar da comunidadee união com a natureza. O homem não só sedistancia pelas suas particularidades biológicas,como também constitui um ser social comomembro de determinada sociedade.

Para o melhor entendimento da corre-lação do ambiente e hereditariedade é muitoimportante tomar em consideração que o pro-gresso do ser humano como criatura social nãoé determinado apenas por uma hereditarieda-de. A hereditariedade biológica relacionada coma transmissão das estruturas genéticas indicaque o homem possui uma continuidade social aser transmitida por meio da educação.

As particularidades do homem comoser social, excluem o uso de métodos de inves-tigação, usados de maneira satisfatória no es-tudo da hereditariedade de planta e animais. Aomesmo tempo foi criada uma ciência Falsa-Eugenia, cuja tarefa era de melhorar a heredi-tariedade da geração humana.. Os Eugêniosbaseiam-se em métodos utilizados da seleçãode animais, propondo trocar as bases genéti-cas da humanidade. Essas experiências foramprofundamente utilizadas pelos fascistas comofundamento às suas idéias loucas.

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Atualmente, considerando-se as parti-cularidades biológicas e sociais de uma pes-soa, é elaborada e amplamente usada uma sé-rie dos métodos de estudo da hereditariedadede uma pessoa.

Método de gêmeos. Os gêmeos sãosubdivididos em homozigóticos e heterozigóticos.O essencial do estudo do grau de influência dahereditariedade e ambiente pelo método de gê-meos consiste no seguinte: se o indício a serestudado do organismo depender da hereditari-edade, os homozigotos serão muito parecidos.Pelo contrário, quanto mais os indícios depen-dam do meio ambiente, maior será a diferençaentre eles. Isso é explicado pelo fato desta ca-tegoria de gêmeos possuir o genótipo igual aquaisquer mudanças entre eles serem o resul-tado da influência do meio ambiente. As maio-res diferenças entre os gêmeos acontecemquando eles se educarem em condições dife-rentes ou forem sujeitos a fatores desiguais dotreinamento. Por exemplo, um gêmeo treina,mas o outro – não. Sendo assim, a diferençaentre homozigotos que crescerem juntos ehomozigotos que crescerem em separado, em

condições diferentes, é determinada pela influ-ência dos fatores exteriores. Na maioria doscasos, os homozigotos se educam em condi-ções iguais; por isso, a semelhança entre elespoderá ser explicada pelas condições idênticasexteriores. A diferença entre homozigotos edizigotos, crescidos em condições semelhan-tes, é determinada pela ação dos fatores gené-ticos. Quanto maiores forem as diferenças, maisdependerá o dado indício da hereditariedade.A comparação de 3 tipos de gêmeos (Tabela 1)permitirá identificar o grau de influência da he-reditariedade e ambiente no desenvolvimentode certos indícios do organismo. Para a carac-terística da parcela dos fatores genéticos deve-rá ser definido o índice Holtsinger (H):

H = Tos – Tps 1 – Tps,

onde: H – índice Holtsinger;Tos – coeficiente de correlação entre os

homozigotos;Tps – coeficiente de correlação entre os

dizigotos.

Tabela 1: Tabela de influência de genótipo e do fenótipo.

Fonte: Nikitchuk & Gladixeva (1989).

Graças ao método de gêmeos são ob-tidos os dados segundo os quais certos índicesde desenvolvimento físico dependem de manei-ra diferente da hereditariedade e meio ambien-te. É comprovado o nível alto da influência dosfatores hereditários sobre o comprimento docorpo (altura). O meio ambiente (alimentação,condições de vida, exercícios físicos etc.) pou-co influencia sobre a altura, mas o fator heredi-tário influencia sobre a massa corporal (peso).

Segundo os dados de uma pesquisa,a parcela de influência da hereditariedade so-bre o comprimento do corpo é de 98% e sobreo peso corporal é menos de 74%. O peso cor-poral é composto do peso do esqueleto, mús-culos, órgãos internos (vísceras), gordura eoutros tecidos macios. Esses componentes ca-

racterizam a constituição de uma pessoa. Ahereditariedade tinha 50% das influências adeterminarem o desenvolvimento dos tecidosmacios dos membros superiores, e 70 – 80%das influências a formarem o esqueleto. Sendoassim, a correlação dos fatores hereditários eambientais não é igual para todo o indício daestrutura corporal. As pesquisas de gêmeospermitiram identificar alguns indíciosmorfológicos e funcionais do organismo (Tabe-la 2).

Segundo Nikitiuk (1978) a influênciados fatores hereditários e ambientais se modifi-ca com a idade. No período do crescimento maisintensivo (primeiros anos de vida, período depuberdade) aumenta a sensibilidade do orga-nismo à influência dos fatores ambientais. A

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hereditariedade mais determina as dimensõesfinais do corpo que os ritmos das mudanças devárias estruturas do organismo.

O desenvolvimento das capacidadesmotoras é o resultado de uma interação com-plicada da hereditariedade e ambiente. É com-provada a grande influência do genótipo sobrea rapidez da reação motora, alcance do alto tem-po de corrida de 10 – 30m. O desenvolvimentoda flexibilidade articular também depende dosfatores genéticos e tal influência é mais própriado organismo feminino que do masculino. Odesenvolvimento da força absoluta muscularque depende mais dos fatores ambientais é aforça relativa muscular, indício mais conserva-dor e depende dos fatores hereditários(Serguienko, 1975).

Segundo as pesquisas de gêmeos(Volkov, 1980) existe uma predisposição de cer-tas capacidades motoras, produtividadeaeróbica e funções vegetativas. O consumomáximo de oxigênio (VO2) de gêmeos tem aconcordância quase igual (89,4% de parecido).A grande predisposição hereditária é constata-da durante as pesquisas da reação motora sim-ples (84,2%) e a complexa (80,7%). As pesqui-sas dos índices de velocidade e força (salto emdistância, em altura, corrida de 30m) testemu-nham, também, a grande predisposição heredi-tária (76,1%, 79,4% e 77,1%, relativamente).São sujeitos aos fatores genéticos e tais índi-ces como a duração da retenção da respiração(82,5%) e grau de diminuição da oxigenaçãodo sangue arterial (76,9%).

O papel mais importante dos fatoresambientais e diminuição dos fatores hereditári-os são identificados no decorrer da definiçãoda dinamometria de mão e corporal. Então, aconcordância da dinamometria da mão direitae esquerda foi de 61,4% e 59,2% relativamen-te, e de 64,3% da força corporal(FC). É eviden-te a influência dos fatores ambientais sobre afreqüência cardíaca. O grau de semelhança daFC em repouso foi de 62,7%; após a carga apli-cada (Step test) – 58,8%; duração da recupera-ção da FC – 59,1%. O desenvolvimento da re-sistência é bem relacionado à capacidade doorganismo em consumir a quantidade maior(máxima) de oxigênio. A comparação dos da-

dos de homozigotos e dizigotos mostrou que ograu de hereditariedade da capacidade ao con-sumo máximo de oxigênio era de 80%, e fato-res ambientais – 20%. Esses dados atendemàs pesquisas de outros autores (Serguienko,1975). Não se pode menosprezar a influênciado meio ambiente sobre o desenvolvimento dascapacidades motoras, pois a importância doambiente na formação de uma pessoa é muitogrande, mas ela é diferente em relação a ou-tras capacidades físicas e mentais.

O significado do meio ambiente, na for-mação da personalidade do homem, é grande.Entretanto, ela é diferente em relação a váriaspropriedades físicas e intelectuais. De modogeral, a questão pode ser colocada da seguinteforma: até que ponto a diferença do desenvol-vimento individual entre os homens está condi-cionada pela genética, e até que ponto apre-sentam-se diferentes pelo caráter do meio am-biente no qual ocorreu o desenvolvimento ? Asexperiências realizadas com animais e plantaspermitem, em muitos casos, responder a essasperguntas de maneira rápida e exata. Por exem-plo, nós podemos dividir um e outro vegetal emvárias partes e cultivá-los em ambientes dife-rentes. Para o homem, uma analise simples nãoé possível. Por sorte, já existem métodos notá-veis para estudar a relação entre a hereditarie-dade e o ambiente - o estudo dos gêmeos.

A informação hereditária poderá serrealizada nas condições adequadas do ambi-ente. É considerado que o meio e os métodosde treino deverão contribuir e estimular as incli-nações inatas. Caso as interações sejam insu-ficientes, as potências ocultas podem até certoponto não surgir; caso sejam demasiado pesa-das podem ocorrer “esgotamentos” de formaantecipada de talentos congênitos. As pesqui-sas de gêmeos comprovam que o fator heredi-tário sofre influência sobre a chamada normade reação do organismo. Todo o indício trans-mitido por herança se muda sob a influência domeio ambiente até o limite geneticamente de-terminado. O limiar de mutabilidade do indícioé considerada a norma hereditária da reação.

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Tabela 2: Determinação preferencial dos indícios morfológicos e funcionais da influência da hereditariedade e ambiente.

Fonte: Nikitchuk & Gladixeva (1989).

Nos processos de desenvolvimento égeneticamente determinada apenas a norma dereação “para as capacidades somáticas, mas ocaráter” e particularidades do indivíduo são de-terminados pela influência do ambiente social.A norma de reação não é o valor constante. Eladepende do genótipo, sexo, idade, nível de trei-no. A norma de reação para todo organismo emgeral constitui-se de características especiaispara diferentes lados do organismo. Em rela-ção ao desenvolvimento das capacidades

motoras, a norma de reação consiste no valorde crescimento da força muscular ou resistên-cia sob a influência do treinamento.

Investigou-se durante vários anos umpar de gêmeos homozigóticos, que não obstantea prática do esporte (dos 8 aos 15 anos), tevebaixo consumo de oxigênio. Nos últimos anosum dos jovens continuou a prática do esporte ,o outro abandonou. As investigações, aos 21anos, mostraram um aumento do consumo deoxigênio em um com relação ao outro, mas este

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aumento não foi tão significativo e não passoudos limites médios.

Resultados semelhantes foram alcan-çados por Serguienko (1975). Nos seus expe-rimentos pedagógicos, foi observado um par degêmeos monozigóticos de meninas. Elas foraminvestigadas pela primeira vez ao 16 anos. An-tes deste período elas se dedicaram simples-mente ao remo durante 3 anos. O modo de vidae o caráter da atividade motora foram pratica-mente semelhantes. Posteriormente, uma con-tinuou a praticar remo e a outra abandonou oesporte. Após um ano, realizaram-se investiga-ções naquela que tinha abandonado o esporte,verificou-se uma diminuição da resistência, en-quanto que na outra verificou-se um aumentodo consumo de oxigênio. Constatou-se tambémque o aumento não foi grande e não passoudos limites médios. Concluindo, estes jovenstiveram uma pequena hereditariedade da nor-ma de reação, que determina relativamentepequenos resultados do treinamento.

Os exercícios sistemáticos, treinamen-to, poderão exercer grande influência no senti-do de realização do potencial genético, mas issopoderá acontecer apenas entre os limites de-terminados pelo genótipo. As capacidades deeducação e exercício não são ilimitadas; seulimiar é determinado pelo genótipo do indivíduoconcreto. Afinal, qualquer indício do organismodepende tanto da hereditariedade, como doambiente. O meio ambiente não favorável po-derá levar ao aparecimento de uma pessoa atra-sada, débil. O meio ambiente favorável abriráas capacidades da constituição hereditária, de-senvolvendo-as até o limiar máximo. Mas exis-tem limiares superiores e inferiores das capaci-dades hereditárias do indivíduo. Em conformi-dade com as leis de genética, as possibilidadesde treino, exercício não são ilimitadas. Seu li-miar, também, é programado pelo genótipo.

Método genealógico. O essencialdeste método consiste no estudo da genealogiade pessoas de muitas gerações. O estudo dosparentes (irmãos, irmãs, pai, mãe, avó, avô, etc.)permitirá identificar a herança de muitos indíci-os da pessoa, determinando as particularida-des próprias à geração. Por método genealógicosão obtidos os dados sobre as doenças adqui-ridas por herança, tais como, diabetes, surdezcongênita, hemofilia, etc. O estudo dagenealogia de desportistas comprova que osfilhos dos famosos desportistas no passadodemonstraram altos resultados. São conheci-

dos os casos quando irmãos e irmãs demons-traram altos resultados desportivos. Evidente-mente, que essas investigações não são sufici-entes para provar a influência dos fatores here-ditários no desenvolvimento das capacidadesmotoras. Os êxitos esportivos das crianças, ir-mãs podem ser condicionadas pelas particula-ridades de educação familiar ou outros fatoresdo meio ambiente.

Existem investigações inéditas quecarregam clareza sobre a questão até certoponto. Um dos trabalhos mostrou, que é possí-vel esperar em média bons resultados em 50%dos filhos de grandes atletas, sendo que nãosão obrigados a obter os mesmos resultadosque os pais. É suposto que, se a herança dascapacidades desportivas se realiza tanto pelalinha paterna, como pela materna, podemosesperar que elas sejam reais em 70% dos ca-sos ( se os dois pais foram os destacadosdesportistas) e em 33%, caso um for desportistade elite.

Outro exemplo, aproveitando os méto-dos matemáticos, foi determinar a interligaçãoentre os êxitos desportivos de dois filhos e pais.Na corrida veloz e saltos em distância, o níveldesta interligação era bastante alta. O alto graude semelhança dos pais e filhos foi reveladopelos índices antropométricos, dermatoglíficose grupos sangüíneos. Existe uma opinião que aherança das capacidades motoras, como, tam-bém, os indícios qualitativos (comprimento,massa corporal, etc.) acontece graças à influ-ência de muitos genes. Tal herança semelhan-te se realiza tanto pela linha materna, como pelalinha paterna. Nesse caso, é preciso tomar emconsideração o fato da mãe transmitir tanto parao filho, como para a filha cromossomo x , maso pai transmite o cromossomo x a filha, e ocromossomo y ao filho. Cromossomo x do paia ser transmitido para filha é maior pelo valor epela reserva da informação hereditária, que ocromossomo y a ser transmitido para o filho. Porisso existe a probabilidade da maior semelhan-ça do pai com a filha. A mãe transmite para afilha e o filho o conjunto igual dos cromossomos,mas aqui é possível a maior semelhança com ofilho. O cromossomo x da mãe transmitido paraa filha poderá resistir ao cromossomo x do pai;graças à existência do cromossomo y do paino filho, tal resistência ao cromossomo x damãe será menor. É considerado que a herançadas capacidades motoras se realiza pelo tipodominante. É constatado que no caso de exis-

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tência do indício dominante de um dos pais, esteestará presente nos descendentes. Isso facili-tará a análise da genealogia e permitirá estu-dar a herança das capacidades dominantes deuma pessoa.

Método ontogenético. Esse métodoé baseado numa pesquisa dos cromossomosnas células corporais. Uma das alternativas re-lativamente fáceis deste método consiste noestudo dos leucócitos no sangue. Para isso, usa-se umas gotas de sangue, separam-se osleucócitos e misturados a um alimentador nutri-tivo (meio de cultura, tipo caldo cultural), ondeeles começam a dividir-se. Ao dividirem-se, es-tas células dos cromossomos tornaram-se visí-veis. Pelo método citogenético foramidentificadas muitas doenças hereditárias; asaberrações são resultado das mudanças no sis-tema de cromossomos. Por exemplo; no con-junto de cromossomos, sob a influência de cer-tos fatores, poderá aparecer o cromossomocomplementar (47º). Em resumo: perturba-seo sistema íntegro de informação genética, o quepoderá levar ao, aparecimento das perturbaçõesqualitativas e quantitativas de desenvolvimen-to. Às vezes, as perturbações são considerá-veis e o embrião morre antes dos partos. Umadas causas de perturbações na divisão celulare aparecimento dos defeitos hereditários pode-rá ser o alcoolismo de um dos pais ou resultadodos remédios tomados pela mãe durante a gra-videz. Atualmente são identificadas por volta de100 várias perturbações relacionadas à mudan-ça do número ou formas dos cromossomos. Taisperturbações poderão ser manifestadas ematraso do desenvolvimento mental, em defeitosdo ouvido e visão, desenvolvimento fraco damusculatura de esqueleto, aparecimento dasdoenças nervosas, etc. O estudo das doençashereditárias revelou que elas eram o resultadodos relacionamentos consangüíneos e que aprobabilidade de nascimento das crianças comdoenças hereditárias neste caso é maior.

Método bioquímico – As perturbaçõeshereditárias (genéticas) dos cromossomos mui-tas vezes são acompanhadas pela perturbaçãodo metabolismo, porque os genes controlam aatividade das diferentes enzimas que regulamo intercâmbio de proteína, gordura, água e íons.Cada tipo de metabolismo é caracterizado pe-las perturbações específicas no organismo.Entre as perturbações está a diabete, que podeser resultado de genética condicionada pela in-suficiência de um hormônio(insulina) levando àinterrupção da troca do hidrato de carbono.

Os métodos bioquímicos são importan-tes para a identificação dos índices do organis-mo a serem relacionados com as particularida-des do corpo, funcionamento dos órgãos e sis-temas ou com o desenvolvimento de certas ca-pacidades motoras. Em forma de tais“marcadores” são aproveitados os indícios aserem transmitidos por herança, por exemplo,grupos sangüíneos ou alguns índicesbioquímicos do sangue. A identificação dosmarcadores genéticos ligados com as particu-laridades anatômicas e fisiológicas a determi-narem o resultado desportivo permitirá prognos-ticar o desenvolvimento das capacidadesmotoras. Para a avaliação da influência dos fa-tores genéticos e ambientais é importante umapesquisa da correlação nos músculos das fibrasmusculares lentas e rápidas. É comprovado queos velocistas (100m – 9,9 Seg.) possuem nosmúsculos dos membros inferiores 75% das fi-bras musculares rápidas e 25% das fibras mus-culares lentas, os meiofundistas (10 km – 28min.) – rápidas – 24%, as lentas – 76%.

Em 1975, foi identificada a correlaçãodas fibras rápidas e lentas musculares dosfundistas e meiofundistas. Como regra, o nú-mero de fibras lentas musculares não ficou abai-xo de 65%, o número maior foi de 79%. Duran-te cinco meses, foi estudada a correlação dasfibras lentas e rápidas. No treinamento, o con-sumo máximo de oxigênio aumentou de 3,5 L/min. até 4,5 L/min e a correlação das fibras len-tas e rápidas foi atestado de que a correlaçãodos tipos de fibras constituintes do músculo sãode origem preferencialmente genéticas, do queadquiridas com o treinamento.

Seleção desportiva

O nível contemporâneo dos êxitosdesportivos visa às grandes exigências do or-ganismo do desportista. Por isso, o traço ca-racterístico do período atual de desenvolvimentodo esporte é a identificação da juventudetalentosa, organização da seleção desportivacientificamente argumentada. Os seguintesexemplos mostram com clareza as dificuldadesdas tarefas passarem ao apelo no processo deseleção. Suponhamos; queremos relatar sobreo indivíduo alto, que apresenta alto nível de cres-cimento na juventude. Alto é aquele que entraem 1% dos dados estatísticos dos mais altosda sua idade e categoria sexual – em média emcada 100 investigados, ou se pode dizer que

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este indivíduo é igual a 1/100. Essa mesma pro-babilidade é extensiva a pessoas com grandesníveis de crescimento.

Imaginemos que essas pessoas pos-sam ser encontradas com freqüência nas mes-mas proporções entre pessoas de diferentesalturas; a probabilidade de encontrar um indiví-duo alto será de 10-4 ou 1/10000. Se deste mes-mo indivíduo forem exigidos certos dotes taiscomo: boas habilidades e resistência, a possi-bilidade de selecionar um indivíduo entre ossemelhantes será de um em um milhão. A prá-tica da seleção na natação nos países mundi-ais comprova que de cada 5000 – 6000 crian-ças examinadas, são selecionadas 8 – 10 cri-anças para praticar a natação especializada edeste número, apenas uma pessoa se torna umdesportista de alto nível.

Existem algumas variedades da sele-ção desportiva.

1. Orientação desportiva – definição damodalidade desportiva onde seria mais racio-nal o treinamento.

2. Seleção – escolha periódica dosmelhores desportistas em várias etapas do aper-feiçoamento desportivo.

3. Formação das equipes – organiza-ção do coletivo desportivo, equipe para a parti-cipação nas competições.

Por isso, a seleção desportiva não éprocedimento de um momento só, mas sim oconjunto dos procedimentos de organizaçãometódicos a incluírem os métodos pedagógicos,psicológicos e médico-biológicos de pesquisa,baseando-se no que poderão ser reveladas ascapacidades de jovens desportistas de pratica-rem a modalidade desportiva específica. A se-leção desportiva é baseada nas característicasque mais se destacam dos melhoresdesportistas da modalidade desportiva determi-nada. Atualmente é elaborado bloco-esquemado modelo de desportista e existem três níveisde componentes do modelo dos melhoresdesportistas. O primeiro nível do bloco-esque-ma determina as características modelos dosdesportistas nas competições. No segundo ní-vel, ficam as características da preparação físi-ca especial, técnica, tática. O terceiro nível ca-racteriza as particularidades da compleição( apreparação funcional e psicológica), bem comoas etapas temporárias principais do caminhodesportivo (idade de início das aulas de treino,estágio desportivo, tempo dos êxitos, etc.). Estebloco-esquema é convencional. Além disso,

todo o organismo se desenvolve individualmenteem conformidade com as leis genéticas e sob ainfluência do meio ambiente. Por isso, a sele-ção desportiva é um procedimento muito com-plicado. Na seleção das principais característi-cas deverão ser considerados os critérios a se-guir: inadmissibilidade, indesejabilidade, neces-sidade e suficiência. As inadmissíveis são ascaracterísticas que permitem fazer certos exer-cícios físicos, mas prejudicam sua realização.As características desejáveis contribuem paraa atividade desportiva especial. As necessári-as são características sem as quais a atividadedesportiva não poderá ser realizada. As carac-terísticas suficientes são as que garantem arealização da atividade ( Briankin, Soldatov,Tchernov, 1980).

O desenvolvimento de um desportistaé o resultado da influência mútua da hereditari-edade e ambiente. O treinamento é muito im-portante para a formação das capacidadesmotoras. Além disso, as particularidades dacompleição, desenvolvimento das capacidadesmotoras são determinados pelo genótipo e oobjetivo importante é identificar as capacida-des motoras e determinar o grau de influênciados fatores hereditários e ambientais.

A influência dos fatores genéticos eambientais não é a mesma em períodos etáriosdiferentes. Existem os períodos especiais, sen-sitivos, para os quais é própria a sensibilidade avários fatores ambientais, de ensino e treinamen-to. É considerado que para estes períodos háuma diminuição do nível genético e dependên-cia crescente dos fatores do meio ambiente. Osperíodos sensitivos (idade, sua duração) são pró-prios à idade biológica e não à cronológica. Écomprovado que o desenvolvimento das capaci-dades motoras caráter de adaptação do orga-nismo dos adolescentes de 12 – 16 anos de ida-de não depende somente da idade cronológica,mas sim dos ritmos individuais de desenvolvi-mento (Volkov, 1971). Por isso, deverá ser con-siderada a idade biológica de desportistas; paradiagnosticar a idade biológica são aproveitadostais índices como o desenvolvimento de dentes,prazos de ossificação, avaliação dos indícios pri-mários e secundários do período de puberdade,valor da excreção 17 – KC etc. A avaliação damaturação sexual deverá ser feita em conjunto,isto é, considerando muitos indícios que carac-terizarem a idade de jovens desportistas.

Existem vários métodos de pesquisada hereditariedade; um método relativamente

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simples, são as pesquisas seletivas enormativas. Tais pesquisas permitirão abrangergrandes grupos dos pesquisados de certa ida-de e especialidade, graças aos quais poderãoser obtidos sobre o crescimento absoluto, volu-me de crescimento, nível médio, limiares danorma, etc. Considerando-se tanto os valoresmédios, como os desvios individuais poderá serobtido o material sobre as capacidades motoras.Alguns exemplos: Foi estudada a velocidade dareação motora. Aos 8 anos de idade ela era de0,30 Seg., em média; com a idade a velocidadede reação diminui e aos 17 anos ela será de0,20 Seg., em média, a velocidade de algumascrianças de 8 – 9 anos era menor que dos garo-tos de 17 anos – 0,170 Seg. Na idade de 8 a 15anos cresce consideravelmente a altura do sal-to vertical em altura. Para os meninos de 8 anosela era de 28 cm, em média e aos 15 anos – 48cm. Mas alguns meninos de 8 – 9 anos de ida-de conseguiram o valor do salto dos meninosde 15 anos. O último é explicado pelos fatoresgenéticos.

Prognóstico dos êxitos desportivos

Um dos aspectos mais importantes doproblema da seleção desportiva é o prognósti-co das capacidades desportivas. Um prognós-tico seguro poderá garantir a conclusão ade-quada sobre as mudanças futuras no organis-mo. A condição importante para o prognósticoé o estudo da dinâmica de alteração dos índi-ces da capacidade de trabalho. Uma boa pes-quisa a comprovar a estabilidade dos índicesfuncionais foi feita pelo Volkov (1971) que es-tudou a reação dos sistemas cardiovascular erespiratório à carga normal muscular; Revelouque durante 8 anos (de 11 a 18 anos) as mes-mas crianças demonstravam os dados estáveis,isto é, as crianças de 11 a 12 anos conserva-ram suas particularidades ao ficarem mais “ve-lhas”. Conclui-se que os prognósticossatisfatórios só podem ser realizados aos 11-12 anos. É também verdade que aos 13-14 anosa segurança dos resultados dos prognósticosligados ao amadurecimento sexual diminuem.Através da representação gráfica é possívelobservar com clareza a estabilidade das carac-terísticas.

Existem os indícios invariáveis com otreinamento e propriedades do organismo aserem facilmente alteradas no decorrer do aper-feiçoamento desportivo. Por exemplo, a altura

(comprimento corporal) é considerada indícioconservador. Várias partes do corpo crescemcom a velocidade diferente, o comprimento dopé em combinação com outros índicesantropométricos poderá ser a base sólida parao prognóstico do crescimento. Durante o prog-nóstico seleção desportiva, será necessário seorientar para os indícios conservadores, poiseles limitarão o crescimento do nível desportivoe os índices variáveis em grau menor limitarãoo aperfeiçoamento desportivo, pois o resultadodo treinamento racional poderá ser melhorado.

Prognosticando os êxitos desportivos,é necessário considerar que um desportistatalentoso é a pessoa à qual são próprias asqualidade diferentes. Por isso, o prognósticoadequado deverá prever tanto o aperfeiçoamen-to físico, como e desenvolvimento das capaci-dades psíquicas e características individuais. Émuito importante avaliar corretamente ainterligação entre os índices iniciais e êxitos. Aprática desportiva muitas vezes testemunha ofato de jovens desportistas terem demonstra-do bons resultados, segundo os exames inici-ais e, posteriormente, não confirmaram estesresultados, conclui-se assim, que um dos pro-blemas mais importantes da seleção desportivaé o prognóstico do nível final de desenvolvimen-to de certas capacidades físicas de jovensdesportistas. Normalmente tal prognóstico serealiza pelos seguintes meios: 1º) determina-ção da estabilidade dos índices de desenvolvi-mento físico ® o critério principal aqui é coefici-ente de correlação entre os valores do início dainfância e na parte final do desenvolvimento. Osmaiores valores do coeficiente de correlaçãoindicam a maior estabilidade do índice e possi-bilidade de prognóstico do nível final de seudesenvolvimento; 2º) Meio – determinação dograu genético dos índices de nosso interessepara os índices cujo desenvolvimento é condi-cionado geneticamente, onde será mais impor-tante o nível inicial de desenvolvimento; os rit-mos de crescimento destes índices não sãoessenciais no prognóstico, pelo contrário, paraíndices cujo desenvolvimento é condicionadopelas influências ambientais, no prognóstico sãomais importantes os ritmos de crescimento e onível inicial não poderá ser alto. Para o prog-nóstico é mais cômodo considerar o processode desenvolvimento como a totalização dosvalores do nível inicial e valores de crescimen-to dos índices.

Xt+1 = Xt + A Xt,

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Onde Xt e Tt+1 – valores do índice nosmomentos do tempo t e t+1

A Xt – crescimento do índice neste pe-ríodo

Daí decorre o bº meio de prognóstico– tentativa de descrever matematicamente ocaráter de crescimento dos índices em tempo(A Xt). Considerando-se o fato do desenvolvi-mento de organismo realizar-se irregularmen-te, é muito difícil elaborar a descrição minucio-sa e matemática da dinâmica de desenvolvi-mento de certos índices, mas se desprezarmosas oscilações de certos índices, poderemosdescrever o caráter de crescimento de qualqueríndice por meio da equação a seguir:

A Xt = ax c.ecx,Onde a, b, c – coeficientes a caracteri-

zarem as mudanças do índice em tempoe – base do logaritmo naturalx – valor do tempoA interligação entre os resultados inici-

ais e êxitos finais se nota no decorrer de taischamadas pesquisas longitudinais (duradouras,durante muitos anos).

Esperamos com este trabalho dar iní-cio a um ramo da ciência pouco divulgado noBrasil, que é a descoberta de novos talentosdesportivos.

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Endereço dos autores

Prof. Dr. José Fernandes FilhoAv. Santa Cruz, 1631 - Botafogo/RJ.CEP 21.710-250 - Rio de Janeiro.

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