PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA - Ipea · Web viewUma outra preocupação que eu tenho é que os ônibus...

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I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiências Acessibilidade: Você também tem compromisso ANAIS Brasília 12 a 15 de maio de 2006

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I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiências

Acessibilidade: Você também tem compromisso

ANAIS

Brasília

12 a 15 de maio de 2006

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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICASECRETARIA ESPECIAL DOS DIREITOS HUMANOS

CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA

ANAIS DA I CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA

PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Brasília2006

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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

Luiz Inácio Lula da SilvaPresidente

SECRETARIA ESPECIAL DOS DIREITOS HUMANOSPaulo VannuchiSecretário Especial

CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIAAdilson VenturaPresidente

COORDENADORIA NACIONAL PARA INTEGRAÇÃO DA PESSOA PORTADORADE DEFICIÊNCIA Izabel Maria Madeira de Loureiro MaiorCoordenadora Geral

REALIZAÇÃOConselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADECoordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE

EXECUÇÃO TÉCNICANúcleo de Atenção Social à Cidadania e Educação - NASCE

Comissão OrganizadoraCândida Maria Bittencourt Carvalheira - CONADEIzabel Maria Madeira de Loureiro Maior - CONADENiusarete Margarida de Lima - CORDE/SEDHRitamaria Silva de Aguiar - CONADE

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Presidência da RepúblicaSecretaria Especial dos Direitos HumanosConselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADEEsplanada dos Ministérios, bloco T – anexo II – 2º andar – sala 211 - CEP 70 064 – 900 Brasília / DF telefones: (0XX 61) 3429.3673 e 3429.9219 - fax: (0XX 61) 3225.8457 e-mail: [email protected] page: www.presidencia.gov.br/sedh/conade

Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDESistema Nacional de Informações Sobre Deficiência – SICORDEEsplanada dos Ministérios, bloco T – anexo II – 2º andar, sala 200 - CEP 70 064 – 900 - Brasília / DF telefones: (0XX 61) 3429.3669 - fax: (0XX 61) 3225.8806 e-mail: [email protected] - home page: www.presidencia.gov.br/sedh/corde

Copyright @2006 by Secretaria Especial dos Direitos Humanos

É permitida a reprodução, total ou parcial da publicação, sem fins lucrativos, devendo citar menção expressa da fonte de referência. Os conceitos e opiniões nesta obra são de exclusiva responsabilidade dos autores

Distribuição gratuita

Impresso no Brasil/Printed in Brazil

Tiragem: 3.500 exemplares impresso5.000 cópias em CD-ROM500 exemplares em Braille

Revisão Ortográfica: Thiago Gonçalves da SilvaNormalização : Maria Amélia Elizabeth Carneiro Veríssimo - CRB-1- 303

Referência bibliográfica:

CONFERENCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 1: 2006, Brasília : Anais da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência:Brasília: CONADE, 2006. 360 p.

Ficha catalográfica:

C738a Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (1.: 2006 : Brasília)Anais da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.: Acessibilidade, você também

tem compromisso _ Brasília : CONADE, 2006.360 p. : il.; 21,0x29,7cm.

1. Direitos da Pessoa com Deficiência, Conferência, Brasil 2. Acessibilidade, Conferência, Brasil I. Brasil. Presidência da República. Secretária Especial dos Direitos Humanos. Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, II. Título

CDD 241.272

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CONSELHEIROS DO CONADE

Em Abril de 2006

I - REPRESENTANTES DE ÓRGÃOS GOVERNAMENTAIS:

A)- Secretaria Especial dos Direitos Humanos

Titular Mário Mamede

Suplente Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior

B)- Ministério da Ciência e Tecnologia

Titular João Carlos Martins Neto

Suplente Andréia Ingrid Michele do Nascimento

C)- Ministério das Comunicações

Titular Denise Costa Granja

Suplente Zuleide Guerra Antunes Zerlotini

D)- Ministério da Cultura

Titular Ritamaria Aguiar (Vice-presidente do Conade)

Suplente Miriam Clara Brum

E)- Ministério da Educação

Titular Cláudia Maffini Griboski

Suplente Kátia Aparecida Marangon Barbosa

F)- Ministério do Esporte

Titular Rivaldo Araújo da Silva

Suplente Francis Mary Rezende Matos

G)- Ministério da Previdência Social

Titular Ermelinda Christiane Anunciaçao de Paula

Suplente Leila Silva Cannalonga

H)- Ministério das Relações Exteriores

Titular Mariangela Rebuá

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Suplente Nicola Speranza

I)- Ministério da Saúde

Titular Sheila Miranda da Silva

Suplente Érika Pisaneschi

J)- Ministério do Trabalho E Emprego

Titular Adeilson Ribeiro Telles

Suplente Lucíola Rodrigues Jaime

K)- Casa Civil da Presidência da República

Titular Mariana Bandeira M. P. Sade

Suplente Ricardo Antonio de Souza Karam

L)- Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Titular Ana Maria Lima Barbosa

Suplente Simone Aparecida Albuquerque

M)- Ministério dos Transportes

Titular Marcos Cordeiro de Souza Bandeira

Suplente José Veríssimo da Silva

N)- Ministério das Cidades

Titular Renato Boareto

Suplente Gilson da Silva

O)- Ministério do Turismo

Titular Maria Madalena Nobre

Suplente Doroti Lamour Silveira Collares

P)- Ministério da Justiça

Titular Silvana Nunes da Silva

Suplente Junia Marília Pimenta Lages

Q)- Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres

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Titular Ione Pereira França

Suplente

R)- Conselho Estadual para a Política de Integração da Pessoa Portadora de Deficiência do Rio De Janeiro - CEPDE/RJ (Titularidade)

Representante Titular Genézio Fernandes Vieira

S) - Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência de São Paulo - CEAPPD/SP (Suplência)

Representante Suplente Emerson Cãnas

T) - Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência de Uberlândia (Titularidade)

Representante Titular Idari Alves da Silva

U) - Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência de Joinville - COMDE/SC (Suplência)

Representante Suplente Sérgio Luiz Celestino da Silva

II - REPRESENTANTES DA SOCIEDADE CIVIL

A)- Federação Nacional das Sociedades Pestalozzi

Titular Lizair de Moraes Guarino 

Suplente Zélia Maria dos Santos

B)- União Brasileira de CegosTitular Adilson Ventura (Presidente do Conade)Suplente Marcos Antônio dos Santos Bertoglio

C)- Federação Nacional de Educação e Integração de SurdosTitular Antônio Campos de AbreuSuplente Rodrigo Rocha Malta

D)- Federação Brasileira das Associações de Síndrome de DownTitular Antônio Carlos Sestaro Suplente Glória Maria Moreira Salles Amato

E)- Associação Brasileira de Ostomizados - AbrasoTitular Cândida Maria Bittencourt CarvalheiraSuplente Marcia Patrícia de Araujo  

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F)- Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos - ONEDEFTitular Regina Lúcia Barata Pinheiro Suplente Tarcísio Teixeira Cardoso

G)- Associação Brasileira de Autismo - AbraTitular Maria do Carmo Tourinho RibeiroSuplente Maria Helena de Azeredo Roscoe

H) - Associação de Pais e Amigos de Pessoas Portadoras de Deficiência dos Funcionários do Banco do Brasil - APABB (Titularidade)Representante Titular Messias Tavares de Souza

I)- Federação Bras. de Inst. de Excepcionais, de Integ. Social e de Defesa da Cidadania - FEBIEX (Suplência)Representante Suplente José Alcides Marton da Silva

J)- Federação Nacional das ApaesTitular Eduardo BarbosaSuplente José Diniewicz

K)- Ordem dos Advogados do BrasilTitular Joelson Costa DiasSuplente Wellington de Queiroz

L)- Confederação Nacional do ComércioTitular Janilton Fernandes LimaSuplente Magnus Ribas Apostólico

M)- Confederação Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia - CONFEATitular Renato de Melo RochaSuplente Telga Gomes de Araújo Filho

N)- Sociedade Brasileira de Medicina Física e Reabilitação

Titular Mauro Meirelles Pena

Suplente Linamara Rizzo Battistella

O)- Conselho Federal do Serviço Social – CFESS

Titular Laura Maria  Pedroso de Almeida

Suplente Neile D’Oran Pinheiro

P ) - Associação Brasileira de Educadores de Deficientes Visuais - ABEDEV

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Titular Edivaldo da Silva Ramos

Suplente Manoel Dias Santa Rosa

Q ) - Conselho Nacional dos Centros de Vida Independente - CVI

Titular Alexandre Carvalho Baroni

Suplente Regina Maria Melo Atalla

R) - Federação das Associações de Renais e Transplantados do Brasil - FARBRA (Titularidade)

Titular Humberto Floriano Mendes

S) - Movimento de Reabilitação dos Portadores de Hanseníase - MORHAN (Suplência)

Representante Suplente Artur Custódio Morais de Sousa

T) - Federação das Fraternidades Cristãs de Doentes e Deficientes do Brasil - FCD/BR

Titular Sérgio Ricardo Sá da Silva

Suplente Salete Inês Milan

U ) - Associação Nacional do Ministério Público de Defesa dos Direitos das Pessoas Idosas e com Deficiência - AMPID

Titular Waldir Macieira da Costa Filho

Suplente Luiz Roberto Salles Souza

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APOIO TÉCNICO E ADMINISTRATIVO

EQUIPE DO CONADE

José Carlos Pereira

Márcia Mendes Melo

Marlene Pinto da Silva Oliveira

Marta Alves de Souza

EQUIPE DA CORDE

Anne Giselle Santa Cavalho

Belmiro Santos Magalhães

Benicio Mendes Teixeira Junior

Carolina Angélica Moreira Sanchez

Cléber Fernandes Antunes de Oliveira

Dulce Ribeiro Canotilho

Ednardo Oliveira de Souza

Francisco Esmeraldo das Chagas Mourão

Gabriela Rodrigues Veloso Costa

Hélcio Eustáquio Rizzi

Hildebrando M de Oliveira Neto

Evanilde Tavares Silveira de Araujo

Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior

José Rafael Miranda

Maria Olívia da Silva

Niusarete Margarida de Lima

Paulo Nogueira de Lima

Rose Mary Bainy Valente

Rose Mary Leite de Araújo

Tatianne Santos Ferreira

Tereza Cristina da Costa Pinto

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SUMÁRIO

I Apresentação..........................................................................................................................................11

II Introdução..............................................................................................................................................13

III Solenidade de Abertura: Pronunciamentos............................................................................................15

• Adilson Ventura - Presidente do CONADE........................................................................................15

• Marcos Frota - Ator.............................................................................................................................17

• José Agenor Álvares da Silva - Ministro de Estado da Saúde.............................................................17

• Paulo Sergio Passos - Ministro de Estado dos Transportes.................................................................18

• Wellington Dias - Governador do Estado do Piauí..............................................................................19

• Paulo Vannuchi - Secretário Especial dos Direitos Humanos.............................................................20

IV Mesas Técnicas: Exposições/Debates....................................................................................................25

Condições Gerais de Implementação da Acessibilidade........................................................................25

Implementação da Acessibilidade Arquitetônica, Urbanística e Transporte..........................................30

Da acessibilidade à informação, à comunicação e ajudas técnicas.......................................................60

V Lançamento da Campanha Nacional de Acessibilidade.........................................................................73

VI Deliberações...........................................................................................................................................85

VII Moções.................................................................................................................................................103

VIII Solenidade de Encerramento ...............................................................................................................113

ANEXOS

1. Programação........................................................................................................................................119

2. Regimento Interno – Regulamento Aprovados em Plenária................................................................122

3. Participantes / Categorias.....................................................................................................................130

4. Painéis Temáticos – Dias 13 e 14 de maio...........................................................................................130

4.1 Turismo e Acessibilidade: Uma Visão de mercado.......................................................................130

4.2 O Sistema Único de Assistência Social – SUAS garantindo Acessibilidade.................................141

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4.3 O Estatuto da Pessoa com Deficiência: a elaboração e o processo de participação da Sociedade151

4.4 Passe Livre Interestadual..............................................................................................................180

4.5 Educação Inclusiva.......................................................................................................................192

4.6 Atuação do Ministério Público na Garantia da Acessibilidade da Pessoa com Deficiência...........211

4.7 O Sistema Único de Saúde e a Pessoa com Deficiência................................................................239

4.8 Trabalhando com as competência: Uma experiência de Inclusão escolar no ensino médio...........250

4.9 Apresentação Prática e Interativa das Normas de Acessibilidade da ABNT.................................260

4.10 Brasil Acessível..........................................................................................................................267

4.11 Tecnologia Assistiva e a Construção da Política Pública............................................................273

4.12 O Direito do Deficiente Auditivo de adquirir a linguagem oral de seu país................................290

4.13 O advento da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência na ONU......311

4.14 Inclusão para Pessoas Portadoras de Autismo e de Transtornos Invasivos         do Desenvolvimento............................................................................................................................330

4.15 A Política Nacional de Juventude e as Questões Específicas dos Jovens com

         Deficiência no País..............................................................................................................................345

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Apresentação 

 “Vitória” é a palavra que pessoas com deficiência, CONADE, Conselhos Estaduais e Municipais, Movimento Social estão usando para expressar o sentimento com relação a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que permitiu a discussão e deliberação dos mecanismos necessários para o fortalecimento de ações relativas à defesa de direitos da pessoa com deficiência no país. E não poderia ser outra.

 A Portaria nº 537, de 01/10/00, que cria o CONADE, resulta de uma luta de décadas, que passou por manifestações e estratégias diferenciadas para sensibilizar o Estado e a sociedade brasileira de que a defesa dos direitos da pessoa com deficiência não é um assunto da própria pessoa, mas um assunto de interesso público.

 Desde 2000, o CONADE trabalhou com determinação e de forma articulada com o movimento social e com o Poder Público para  que o Brasil despontasse como precursor da ação de cidadania, em defesa das pessoas com deficiência, realizando a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, convocada pelo Decreto 10/10/2005 - com etapas municipal e estadual. Durante esse período, vocês acompanharam, passo a passo, o percurso de criação de novos Conselhos e fortalecimento de Fóruns. Acompanharam as dificuldades e as disputas em torno do sonho. Mobilizaram-se para participar das etapas municipal e estadual, promoveram fóruns e enviaram Relatórios. Enfim, discutiram e abraçaram uma idéia de I Conferência que tem por finalidade criar mecanismos de defesa dos direitos que atendessem aos anseios e reivindicações do movimento e de milhares de pessoas brasileiras com deficiências  que passam (ou passaram) por situações de discriminação e violência.

 As dificuldades encontradas foram ultrapassadas pela garra  dos conselhos estaduais, CONADE e apoio incontestável da CORDE e sua equipe. A adoção do CONADE em convocar a Conferência Nacional é um importante instrumento para o enfrentamento da discriminação em relação à pessoa com deficiência. As políticas propostas no Relatório Final contribuirão para o fim da impunidade em relação aos direitos humanos das pessoas com deficiência no país.

 Acreditamos que o caminho percorrido por esse marco legal que foi a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e o apoio de todos (as) delegados (as) confirmam a necessidade de sua existência e das mudanças que, com certeza, serão introduzidas em nossa sociedade, por meio de políticas públicas.

 A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência significa uma conquista das pessoas com deficiência e ao mesmo tempo já nos coloca frente a mais um desafio:

Concretizar e monitorar a implementação das mudanças propostas e aprovadas

na I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

 Saudações a todos (as). Cândida CarvalheiraCoordenadora GeralI Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com DeficiênciaConselheira Titular pela ABRASO- Associação Brasileira de Ostomizados

Adilson Ventura

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Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência

Conselheiro Titular pela União Brasileira de CegosGestão 2004/2006

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II - Introdução

A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, realizada em Brasília nos dias 12 e 15 de maio de 2006, oportunizou um amplo debate sobre questões relevantes para a pessoa com deficiência, especialmente quanto à sua inclusão ativa no processo de desenvolvimento do País e à avaliação da implementação das diferentes políticas públicas e de providências para a adequação destas.

O tema central do evento foi “Acessibilidade: você também tem compromisso”, e, a partir dele foram trabalhados temas correlatos, mediante mesas redondas e painéis, com a participação de expositores qualificados, entre eles pessoas envolvidas com o aperfeiçoamento das políticas para a inclusão do cidadão com deficiência, tais como gestores, prestadores de serviços, políticos e outros.

Os trabalhos em grupos estimularam os debates sobre questões diretamente ligadas ao interesse dos participantes, contribuindo de forma substantiva para o encaminhamento de propostas de ações e deliberações a serem implementadas a curto, médio e longo prazos.

Espera-se que os resultados dessas reflexões possam contribuir para impulsionar o desenvolvimento de políticas sociais integradas, envolvendo todos os níveis de governo, que estimulem o controle social voltado ao combate de todas as formas de discriminação e a acessibilidade aos bens e serviços existentes.

Este documento, que seguramente construiu mais uma etapa na história da democracia participativa brasileira, contém o registro dos principais momentos técnicos e políticos do evento, em nível nacional.

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III - SOLENIDADE DE ABERTURA:PRONUNCIAMENTOS

Adilson Ventura

Presidente do CONADE

Boa noite a todas as pessoas aqui presentes!

Solicito às autoridades que integram esta mesa e às demais aqui presentes e a todos os conferencistas para, antes de tudo, falarmos algumas palavras fora do alcance do microfone para que nossos companheiros deficientes visuais da platéia possam ter a exata localização de onde nos encontramos neste momento.

Muito obrigado!

Gostaríamos de cumprimentar o governador do Estado do Piauí, Sr. Wellington Dias, e sua esposa, a Sra. Rejane Dias, primeira dama daquele Estado. Cumprimentamos também o Ministro da Saúde, Sr. José Agenor Alvarez, e o Ministro dos Transportes, Sr.Paulo Sérgio, que também estão prestigiando nosso evento. Saudamos também o nosso Ministro dos Direitos Humanos, Sr.Paulo Vannuchi, e o nosso querido ator Marcos Frota, este grande parceiro, companheiro e amigo, que se tornou um símbolo na luta das pessoas com deficiência nesse país desde que passou a personificar o nosso grande personagem “Jatobá”.

Gostaria de cumprimentar os conselheiros titulares e suplentes do CONADE e os delegados estaduais e as demais pessoas presentes a esse evento, agradecendo a todos por terem vindo prestigiar a nossa I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

A I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência é o clímax de uma jornada que teve início em 02 de dezembro de 2004, quando o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou o Decreto nº 5.296, considerado o Decreto da Acessibilidade. E eu me recordo muito claramente das palavras do Presidente naquele momento, em especial quando ele disse que neste país existem leis que “pegam” e outras que não “pegam”, e que caberia a nós, pessoas com deficiência, com o apoio do governo, fazer com que este Decreto “pegasse”.

A partir daí, o CONADE, com o apoio da Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE e da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, iniciou essa nossa jornada, realizando em vários Estados conferências e fóruns municipais para eleger os delegados para essa Conferência. Em todas as unidades federadas também foram realizados fóruns e conferências estaduais para eleger os delegados aqui presentes, que estão todos mobilizados para contribuir para a causa das pessoas com deficiência.

Nesses quatro próximos dias vamos centrar o nosso foco de trabalho no Decreto nº 5.296, que regulamenta diversos aspectos da acessibilidade à saúde, à educação, à reabilitação, ao trabalho, ao transporte, à cultura, ao lazer, enfim a todos os bens públicos que o governo e a sociedade oferecem aos cidadãos, e aos quais nós, pessoas com algum tipo de deficiência, também temos direito como cidadãos que somos, em pleno gozo de seus direitos constitucionais e infraconstitucionais. E temos exatamente que fazer valer esse direito de cidadania plena, assim como, em contrapartida, temos todos os deveres de cidadãos que nos são impostos.

Pretendemos que este 12 de maio seja um marco importante, um marco histórico, mercê do trabalho, do empenho, da dedicação de todos nós, de toda a sociedade brasileira em prol desta nossa causa, pois todos temos compromisso com essa questão de acessibilidade, todos, indistintamente.

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Pretendemos melhorar a Lei da Acessibilidade, ampliá-la, para que abranja o máximo possível de direitos das pessoas com deficiências e para que seja aplicada em sua plenitude. Num primeiro momento, ela foi chamada de “Lei Áurea das Pessoas com Deficiência”, porque é a lei que vai libertar totalmente essas pessoas desses grilhões que as prendem à exclusão, que as colocam à margem de uma vida em sociedade, negando-lhes direitos que legalmente lhes são assegurados.

O Brasil é um país riquíssimo em leis e temos que fazer valer essas leis. Temos que fazer executar essas leis e, para isso, contamos com o apoio dos diversos níveis de governo “ federal, estadual e municipal, porque - voltamos a repetir - o lema da nossa I Conferência é “Você também tem compromisso”, o que significa dizer que ninguém se exclui desse compromisso e dessa responsabilidade; absolutamente ninguém.

Quero dar as boas-vindas a todos e espero que tenhamos uma excelente Conferência.

Muito Obrigado!

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Marcos FrotaConvidado Especial

Boa noite a todos! Boa noite a todas!

Falei aqui fora do microfone porque entendi a mensagem do Professor Adilson. Fui pego de surpresa, mas se eu pudesse pedir a Deus um lugar para estar hoje, sexta-feira, seria aqui em Brasília, na abertura dessa I Conferência, porque esse é um evento que eu considero histórico.

Eu queria parabenizar o Professor Adilson Ventura e toda a sua equipe, porque tenho certeza que esta é a primeira de muitas conferências. Este é um dia histórico e uma noite que, realmente, vai marcar cada um de nós que acredita que nosso país vai encontrar o seu destino de uma grande Nação.

O Jatobá iluminou minha vida, curou minha dor e definiu minha carreira. Tudo o que eu fizer em prol da inclusão efetiva, real, das pessoas com deficiência é pouco perto do que eu recebi ao interpretar o Jatobá. Essa é que é a grande verdade. O Jatobá mostrou a mim e ao Brasil inteiro que, aos olhos de Deus, todos nós somos iguais; que em essência todo ser humano é igual e que todos temos o direito divino de lutar para construir a nossa felicidade. Cabe a mim dar a minha pequena parcela, a minha pequena contribuição, nessa luta, nessa causa, que é descobrir possibilidades de inclusão por meio da arte.

Agora que estou empenhado nessa luta, cabe a mim montar uma companhia de artistas deficientes para viajar por este país afora, mobilizando pessoas e aproximando idéias. Essa missão me honra. Eu tenho feito amigos, tenho conhecido um Brasil diferente, novo, ético, responsável, amoroso e terno.

Para encerrar, eu queria dizer que, em minha opinião, esse tema da inclusão das pessoas com deficiência e o lançamento nacional da Campanha da Acessibilidade é tão ou mais importante do que a Copa do Mundo e as próximas eleições que se aproximam.

Vou ficar o final de semana todo com vocês. Quero trocar idéias, quero aprender um pouquinho mais porque segunda-feira, dia 15 de maio agora, estarei com alguns companheiros no Programa “Roda Viva”. É aquele programa da TV Educativa, aquele programa da TV Cultura que é exibido em rede nacional. É um programa revolucionário, diferente, que estará discutindo e levando o resultado dessa I Conferência. Se vocês pudessem assistir e participar, ligando para lá, passando e-mails, dando idéias, acho que seria muito bom. Depois de muita batalha, conseguimos pautar para o próximo dia 15 agora, segunda-feira, um “Roda-Viva” ao vivo, discutindo esse tema.

Um beijo a todos e obrigado!

José Agenor Álvares da SilvaMinistro de Estado da Saúde

Inicialmente, eu queria cumprimentar o ministro Paulo Vannuchi, Secretário Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Queria cumprimentar também: o governador Wellington Dias, do Estado do Piauí; o meu colega de ministério dos Transportes, ministro Paulo Sergio Passos; o Sr. Adilson Ventura, Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ CONADE. Gostaria de cumprimentar, especialmente, o ator Marcos Frota, aqui presente, e reforçar o convite dele para o Programa “Roda Viva”, na segunda-feira. Cumprimento também às sras. e srs. parlamentares aqui presentes e demais autoridades.

Eu gostaria de cumprimentar, especialmente, a todos os presentes nesta Conferência. Por ser a I Conferência, eu tenho a impressão que ela pode ser um marco na mudança das políticas públicas desse país.

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Há duas semanas, um programa de televisão perguntou a dois participantes de um concurso de prêmios sobre a quantidade de pessoas no Brasil que têm algum tipo de deficiência. A primeira delas colocou no papel um número menor de 01 milhão; a segunda, por sua vez, chegou próximo dos 05 milhões. E quando a resposta certa veio à tona a apresentadora e os dois participantes ficaram surpresos.

Vou utilizar um segundo exemplo sobre a percepção da questão da deficiência no país. Em 1991, o censo demográfico mostrou ao país que pouco mais de um por cento (01%) da população tinha algum tipo de deficiência permanente. A pesquisa por amostragem domiciliar, que veio em seguida, apontou para um percentual de dois por cento (2%). O que fica evidente nesses dois casos citados é um perturbador desconhecimento que sempre existiu e que ainda persiste sobre a situação do portador de deficiência.

No Brasil de hoje, segundo o IBGE, que treinou seus pesquisadores para a coleta de informações sobre esse público, sabe-se que há no país mais de 24 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, o que representa não um por cento (1%), mas quatorze e meio por cento (14,5%) da população brasileira.

O tema, portanto, merece amplo debate em nossa sociedade e os governantes, em todos os níveis, têm a obrigação de voltar sua atenção para políticas públicas de inclusão e justiça social.

Esses são os compromissos que devem ser reafirmados nesta I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Daqui esperamos como resultado a consolidação de um marco para a permanente discussão de diretrizes para pessoas com deficiência, o aprimoramento de políticas públicas, a geração de empregos e a valorização da diversidade como valor fundamental para a nossa sociedade.

O Ministério da Saúde tem firmado esse compromisso por meio de sua Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência. As diretrizes dessa política prevêem: a promoção da qualidade de vida das pessoas portadoras de deficiência; a assistência integral à saúde da pessoa portadora de deficiência; a prevenção de doenças; a ampliação e fortalecimento dos mecanismos de informação; a organização e funcionamento dos serviços de atenção à pessoa portadora de deficiência e a capacitação de recursos humanos.

No campo da prevenção, mantemos a vacinação contra a rubéola em mulheres em idade fértil, e contra o sarampo, poliomielite e tríplice viral em crianças, todas com cobertura acima de noventa por cento (90%). O Brasil é exemplo no mundo em campanhas de vacinação em massa. Em áreas endêmicas, temos o controle da carência de vitamina A para prevenir a cegueira em crianças de 06 meses a 05 anos de idade, e o teste do pezinho teve a ampliação de cobertura, de cinqüenta e seis por cento (56%) para setenta por cento (70%) dos nascidos vivos. Em 2005, investimos 4,6 milhões de reais na aquisição de equipamentos para o serviço de reabilitação e estamos implantando 122 unidades descentralizadas para atender pessoas com deficiência em Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Rondônia. Repassamos também 406 milhões de reais para o atendimento médico, incluindo terapias, visitas domiciliares, serviços de estimulação neuro-sensorial e órteses e próteses, como cadeiras de rodas, muletas, óculos, prótese ocular, aparelhos auditivos e próteses para amputados.

Em 2005 ainda, na área de saúde auditiva, foram feitos investimentos de 162 milhões para que 57.000 portadores de deficiência recebessem órteses e próteses e outros 239 fizessem cirurgias de implante. Além disso, foram habilitadas 80 unidades de saúde auditiva, em 2005, e a meta para 2006 é habilitar mais 44 unidades.

Desde o ano passado, o grande desafio deste governo tem sido fortalecer o atendimento a pessoas com deficiência no programa Saúde da Família. Estamos capacitando anualmente 120.000 profissionais da saúde para prestar esse tipo de atendimento junto às comunidades.

O Sistema Único de Saúde foi criado pela Constituição federal com o objetivo de prestar uma assistência integral e universal à população brasileira. É um importante instrumento de inclusão social e devemos fazer tudo, para assim consolidá-lo. Nossa parceria e solidariedade são fundamentais nessa luta.

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Eu gostaria de dizer que todos esses dados que eu apresentei aqui não devem ser entendidos como uma concessão de governo, mas como um direito da população, e é um direito que nós temos que lutar por ele.

Podem contar comigo como um profissional de saúde e um militante histórico do Sistema Único de Saúde.

Muito obrigado!

Paulo Sérgio PassosMinistro de Estado dos Transportes

Eu quero cumprimentar o ministro Paulo Vannuchi, Secretário Especial dos Direitos Humanos; o governador Wellington Dias, do Estado do Piauí, e sua esposa; o meu colega ministro Agenor Álvares, ministro de Estado da Saúde; o Sr. Adilson Ventura, presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência; os parlamentares presentes; o ator Marcos Frota; os srs. delegados e conselheiros do CONADE; os delegados regionais e observadores.

Meus caros amigos! O Ministério dos Transportes está ligado à causa dos portadores de deficiência, principalmente mediante o Passe Livre Interestadual, criado pela Lei n° 8.899 para garantir aos portadores de deficiência o acesso ao transporte rodoviário, ferroviário e aquaviário. O que essa Lei prescreve demorou algum tempo até se efetivar de fato como direito. Isso se tornou realidade a partir de 2001 com a conclusão da regulamentação da Lei, numa ação conjunta que envolveu o Ministério dos Transportes, o Ministério da Saúde e o Ministério da Justiça. Hoje, nós podemos dizer, com satisfação, que temos cerca de 125.000 credenciados e é nosso desejo que, para o futuro, mediante a ação do Ministério, possamos melhorar o atendimento, que hoje já se faz de forma satisfatória. Desejamos que, num curto espaço de tempo, seja possível dar maior celeridade aos pedidos de credenciamento encaminhados ao Ministério, de modo que, num prazo máximo de 15 dias, a partir da data de entrada da solicitação, seja possível conferir esse direito ao requerente.

Ainda na busca da eficiência, estamos preocupados em descentralizar a execução desse programa e em assegurar a melhoria na condição da fiscalização das empresas transportadoras, para que aquilo que significa um direito que poderia ou poderá ser exercido mediante o prévio credenciamento, ocorra de fato, com efetividade.

Nessa oportunidade em que se realiza a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, é com muita satisfação que eu aqui compartilho com vocês esta Sessão de Abertura, dizendo-lhes que a nossa expectativa é que, efetivamente, esse evento possa significar a afirmação dos direitos da pessoa com deficiência e que, efetivamente, as condições de isonomia e de equanimidade sejam efetivamente afirmadas, a partir das conclusões a que se chegue nesta Conferência, para que o cidadão portador de deficiência possa se sentir integrado à sociedade, sem nenhum tipo de restrição, sem nenhum tipo de dificuldade, sem nenhum tipo de constrangimento.

É com muita satisfação que eu cumprimento a todos, desejando que o trabalho de vocês seja o mais frutífero possível.

Um forte abraço a todos!

Wellington DiasGovernador do Estado do Piauí

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Muito boa noite!

Eu quero saudar com muita alegria essa I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, saudando o Ministro Paulo Vannuchi.

Queria dizer que é uma satisfação muito grande ver o Brasil despertando para a necessidade de um debate nacional sobre esse tema, com todas as entidades, os Estados, os Municípios, enfim, com todos os parceiros importantes.

Queria saudar aqui o ministro da Saúde, Agenor Álvares; o ministro dos Transportes, Paulo Sergio; o nosso presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, Adilson Ventura, e o Marcos Frota.

É motivo de muita alegria ver esse trabalho dos artistas em prol dessa causa e fico contente também com a continuidade e divulgação desse trabalho em viagens por todo o Brasil.

Quero saudar também os parlamentares; as lideranças municipais, federais, estaduais; representantes de entidades e demais autoridades aqui presentes.

Meus senhores e minhas senhoras! Já com meus quase 40 anos de idade, minha esposa e eu tomamos conhecimento dessa dura realidade que vocês vivem porque temos uma filha, a Daniele, que é portadora de uma deficiência mental. Foi assim que eu pude descobrir, na própria experiência que Deus me ofereceu, a oportunidade de ver a realidade do Brasil, e, de forma mais clara, a realidade do meu Estado.

No Piauí temos uma tarefa gigantesca que é transformar nosso Estado uma região desenvolvida do Brasil. Isso é perfeitamente possível. Mas o Piauí só pode ter verdadeiro desenvolvimento com a erradicação da pobreza e com a redução da injustiça social que atinge tantas pessoas. Mas, há uma injustiça ainda mais marcante, que é a que afeta as pessoas com deficiência. Eu viajei por todos os 223 Municípios do Estado, por mais de quatro vezes, e em cada lugar que eu visitava encontrava situações que nos deixavam constrangidos, como, por exemplo, ver deficientes amarrados em árvores, pessoas presas nos fundos de uma casa, e o Estado completamente desestruturado, incapaz, despreparado para lidar com deficientes, especialmente nas áreas da educação, saúde e acessibilidade. Para se ter uma idéia, o órgão estadual que lidava com deficientes ficava no 3º andar de um prédio que não tinha elevador.

A partir daí, em parceria com diversas entidades “ e para minha alegria muitas delas estão hoje aqui presentes “, em parceria com os Municípios, organizamos sob a coordenação da Rejane, um trabalho voluntário nessa área, fruto do que aprendemos com a nossa Daniele. O resultado é que estamos vencendo etapas. É importante destacar, três anos após o inicio desse trabalho, o quanto a sociedade se integra e participa quando é chamada para um trabalho como esse.

Nós estamos trabalhando com o apoio muito forte do governo do presidente Lula. Na área preventiva, estamos trabalhando com a implantação, por exemplo, do teste da orelhinha. Nós éramos um dos poucos Estados do Brasil que não tínhamos o teste do pezinho em vários Municípios. Estamos trabalhando também na organização da atenção básica mediante a realização de eventos descentralizados, preparando desde o agente de saúde, as equipes do programa Saúde da Família, enfim, um conjunto de atores para a atenção básica, e também para a média e a alta complexidades, cujas ações estamos descentralizando. Ainda agora estamos para inaugurar, este ano, o primeiro Centro de Reabilitação para Média e Alta Complexidade, na cidade de Teresina. Contamos com a colaboração do Secretário Nogueira, que é um importante parceiro nosso nesse trabalho. Ainda na área da saúde, estamos trabalhando para criar as condições de descentralizar esse atendimento nas várias regiões do Estado. Na educação, estamos trabalhando o ensino especial e queremos atingir todos os Municípios do Estado, nesse segmento.

Estamos bem próximos de garantir a integração do SEBRAE a nossas ações, visando disponibilizar várias áreas de capacitação, de qualificação adequada, para que pessoas com deficiência possam também trabalhar. Criamos o programa “Empreendedor sem Barreiras”, que é uma ação de

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grande destaque no Estado, em que trabalhamos as áreas do esporte, cultura, enfim, um conjunto de áreas importantes.

Devo dizer que, assim como essa Conferência, também me alegra o fato de a Campanha da Fraternidade deste ano também ser uma oportunidade gigantesca para despertar o debate nessa área. E creio que somente introduzindo uma nova cultura na forma de lidar com essa situação é que vão ocorrer as grandes mudanças. O Marcos Frota colocava aqui o seu testemunho, do quanto aprendeu com as pessoas com deficiência. Eu acho que é essa troca de experiências que essa conferência e outros eventos que surgirão é que vão fazer a grande diferença, a grande mudança.

Eu estou muito otimista em relação ao que o Brasil pode avançar nessa área. É fundamental que nós brasileiros percebamos que são milhões de pessoas que precisam apenas de uma oportunidade. E creio que o país tem uma dívida muito grande com essa causa em várias áreas. Sem nenhuma dúvida, essa é uma das maiores dívidas que temos.

Eu posso afirmar aqui que é nosso compromisso, não só como governador, mas como brasileiro, trabalharmos com toda força para que o resultado dessa Conferência possa render frutos para essa nossa causa, seja no Parlamento, seja no Judiciário, seja no Executivo ou na sociedade em geral.

Assim, meu querido Paulo Vannuchi, deixo aqui o meu abraço e parabenizo toda a equipe da área federal e todos os participantes, torcendo para que possamos, juntos, nessa forma integrada, fazer a grande mudança que esse país merece nessa área.

Um grande abraço a todos e muito obrigado!

Paulo VannuchiSecretário Especial dos Direitos Humanos

Boa noite a todas e a todos!

Invertendo aqui um pouco a ordem protocolar, eu queria começar saudando os integrantes da Mesa: o professor Adilson Ventura, que presidirá a maior parte desta Conferência, presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ CONADE; o meu colega Ministro da Saúde, Agenor Álvares; o meu colega Ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos; o meu companheiro Wellington Dias, Governador do Piauí, e sua esposa, Sra. Rejane. O Piauí, foi o Estado que deu os primeiros passos no programa Fome Zero, a mais transversal das políticas de defesa dos direitos humanos em curso hoje no Brasil.

Quero saudar também o meu querido ator Marcos Frota, símbolo da militância por essa causa justa e indispensável, essa causa que tem por pilares a cidadania e a democracia. Ao fazer essa saudação, aproveito para lembrar que ele já antecipou que nesta segunda-feira haverá um Programa “Roda Viva” muito especial, inovador na forma, com a presença dele e do professor Adilson, num formato novo. Então, todos nós já temos um programa para segunda-feira próxima, a partir das 22 horas. O programa vai abordar justamente a luta de vocês, a nossa luta, mostrando tudo aquilo que fazemos e estaremos discutindo nessa Conferência.

Quero saudar ainda os representantes e dirigentes de outros Ministérios; os parlamentares presentes, os convidados, as delegadas e os delegados participantes. Quero saudar, em especial, a querida companheira, Drª Izabel Loureiro Maior, que é a nossa titular da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência “ CORDE, em nome de quem eu saúdo todo o trabalho militante da equipe da Coordenadoria, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos.

Vejo aqui várias companheiras e companheiros que trabalharam incansavelmente para assegurar o êxito dessa I Conferência, que é a coroação de um trabalhoso processo democrático.

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Eu divido a minha fala em uma saudação e em uma reflexão e afirmação de um compromisso. Na saudação, eu começo com um comentário que fiz aqui, enquanto aguardávamos o início dessa Solenidade de Abertura. Eu mencionava que, quem tinha dúvida sobre o êxito do trabalho de todos vocês já começou a acreditar nele quando viu a tremenda lua cheia que a natureza reservou para essa noite de hoje, iluminando aqui o lago de Brasília, numa demonstração dessa energia que está reunida nessa sala em comunhão com a natureza.

E como lua lembra Lula, eu quero dizer que está confirmada a presença aqui do nosso Presidente. A previsão inicial é de que ele estivesse presente nessa solenidade de abertura, falando no meu lugar - e eu me sentiria muitíssimo honrado com isso -, mas isso não foi possível porque ele está em missão oficial em Viena, na Áustria. Devemos lembrar que, em 1993, Viena foi a cidade que sediou a Conferência de Direitos Humanos das Nações Unidas, que deu início à criação da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, que hoje contribui na articulação do esforço institucional que vocês orientam e dirigem. Nesse evento Ele estará presente apenas na segunda-feira, terminando o ciclo que começou com uma convocação em que ele assinou um Decreto, há quase um ano, dando início a essa jornada, que passou por encontros municipais e estaduais; escolha de representantes e delegados. É possível que tenha havido outros encontros maiores numericamente, mas nunca um encontro como esse, com um circuito democrático completo, pauta preliminar, elaboração de reflexões, debates, que coroam um processo que, a partir de segunda-feira, seguramente levará a um novo degrau, a um novo patamar, no avanço histórico das reivindicações setoriais e da construção democrática que a luta do setor aqui presente conseguirá imprimir no Brasil.

Quero terminar essa minha saudação contando uma historia recente, ocorrida nesta semana, quando eu preparava, no Ministério, uma reflexão para uma comunicação de rádio e televisão, que acabou sendo adiada. Eu fazia uma afirmação, um chamado, enaltecendo e valorizando a dedicação, a militância e a coragem das pessoas aqui reunidas, que vivem a condição de deficiência, seja pessoalmente, seja como atividade profissional, seja como atividade política militante, na vida artística e cultural, como é o caso do nosso Marcos Frota, ressaltando como isso é um grande tesouro que o Brasil inteiro precisa compreender melhor e apoiar. É desse papel educador e pedagógico que emana a idéia que já ficou registrada em campanhas publicitárias, como aquela em que se diz “eu sou brasileiro e não desisto nunca”. Isso é justamente para desfazer o mito negativo que tantas vezes tentaram embutir em nossas consciências no sentido de ver o Brasil como um país em que as coisas quase sempre tendem a não dar certo. Ano a ano, estamos derrubando aquela mentalidade colonial do passado e já se foi o tempo em que o Brasil só conseguia vitórias espetaculares no campo do futebol e de outros esportes. O Brasil de hoje é um país que vai batendo recordes em diferentes áreas econômicas, e que se vai afirmando intelectual, artística e culturalmente. Nesta área que nos faz presentes aqui hoje nosso País é uma referência mundial. A Dra. Izabel esteve agora em Nova Iorque, há 15 dias, e pôde testemunhar que o Brasil é uma referência na construção da Convenção Internacional das Nações Unidas para a Questão da Deficiência. As convenções da ONU demoram 10 anos para serem feitas, depois mais 10 ou 20 anos para serem ratificadas e assinadas por uma maioria de países. Além disso, elas têm que passar pela ratificação dos Parlamentos. E assim o mundo avança nessa construção constante, gradual, mas firme. Esta semana, na Assembléia Geral das Nações Unidas, em Nova York, que elegeu os membros do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, recentemente construído, o Brasil foi o segundo país mais votado do mundo nessa Assembléia - fomos o país mais votado na América Latina - como reconhecimento a trabalhos e atividades como essas que realizaremos a partir de hoje, fechando um ciclo de quase um ano de mobilizações.

Minha assessoria argumentou que havia um risco nesse meu elogio, temendo que ele pudesse ser interpretado como recorrência ao velho paradigma do sentimento de compaixão. Para evitar isso, mudamos o texto, mas eu não queria perder a oportunidade de dizer aqui pessoalmente, para quem não me vê, mas pode me ouvir, para quem não me escuta, mas pode me entender pela tradução de sinais, para aqueles que talvez não acompanhem o ritmo da minha articulação de fala, da importância desse grupo aqui presente se entender, como um grupo que é a vanguarda dessa luta especial e tão importante que envolve diretamente cerca de 24 milhões de brasileiros, seus familiares e amigos. É uma vanguarda importante na construção dos direitos humanos no Brasil.

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No meu segundo bloco, eu quero fazer uma reflexão sobre os direitos humanos que ditos universais, indivisíveis e interdependentes. Há uma longa história de afirmação dos direitos humanos, que tem expressões importantes na Grécia antiga e no Código de Amurabi, sendo que esta data de 1.700 anos antes de Cristo. Eles já registravam que é preciso defender os mais fracos contra o perigo dos dominadores. Essa afirmação da defesa da pessoa humana como núcleo central, seja pela via da fé religiosa - que vê o ser humano como criado à imagem e semelhança de Deus - seja por outras construções filosóficas - que afirmam a dignidade como algo intrínseco e imanente da pessoa humana - atravessa uma longa história na Idade Média e se reflete nas revoluções européias, na Revolução Inglesa de 1688, na Revolução Francesa de 1789 e também na Revolução Americana de 1779. Os Estados Unidos mal se lembram de que aquele país nasceu de uma revolução contra a dominação britânica, em que houve uma Carta de Direitos da Filadélfia, em 1777. Foi um período em que o ideário dos direitos humanos se irradiou pelo mundo, perdendo força depois, e que no Século XX enfrentou um ciclo de duas guerras mundiais exterminadoras, genocidas, com um rápido intervalo entre elas.

Mas, por paradoxo, por reação a esse horror, nunca a humanidade avançou na compreensão e no estabelecimento de laços de defesa, promoção e proteção dos direitos humanos, como o fez imediatamente após a Segunda grande Guerra, que gerou já em 1948, no dia 10 de dezembro, na Assembléia Geral das Nações Unidas, a Carta Universal dos Direitos Humanos. É um texto poético, que todos nós conhecemos e lembramos, sobretudo, pela sua afirmação inicial: “livres e iguais em dignidade e direitos nascem todos os homens”. Em linguagem atualizada, com as conquistas da igualdade da mulher, diríamos: “nascem todos os homens e todas as mulheres”.

Hanah Arendt, pensadora alemã, judia, que fugiu da Alemanha no início do nazismo e morreu nos Estados Unidos em 1975, tem uma formulação brilhante que eu gosto de repetir. Alguns aqui já me viram falar isso várias vezes. Ela diz: não nascemos livres e iguais; nem nascemos livres, nem iguais. Não nascemos livres, sequer no sentido biológico, porque nascemos atados por um cordão umbilical, que requer uma intervenção autonomizadora. Não nascemos iguais em condições sociais, no mesmo ambiente de defesa da saúde. Não nascemos livres dos constrangimentos econômicos. Tornamos-nos iguais e livres, porque assumimos conscientemente, como comunidade, a decisão de sermos iguais e livres. A igualdade e a liberdade são sempre, a partir daí, uma construção humana e não uma dádiva natural, pois a história já demonstrou que em condição natural o homem propende à guerra de todos contra todos. É na vida social que nós construímos o que ainda não conquistamos como terra prometida, um reino de liberdade e de igualdade.

A luta de vocês é, sobretudo, a luta pela construção de um reino de liberdade e de igualdade. Para garantirmos esses direitos humanos, temos que criar regras, criar pressões e organização social para exigir dos governos o cumprimento da igualdade de direitos que as leis formulam. Os direitos do Brasil nasceram igualmente de um paradoxo. Pouco se falava desse tema no Brasil de 1910 ou de 1940. A sociedade brasileira se organizou em torno dos direitos humanos a partir do Regime Militar de 1964 a 1985, e, a partir daí, não deixou de dar passos adiante. O nosso governo deu passos importantes. Evidentemente, houve muitos passos importantes antes do atual governo. Leis conquistadas tendo sempre como mérito principal e protagonista número um a militância, a ação do segmento que vocês representam nessa Conferência nacional.

Dois colegas ministros já resumiram algumas das suas atividades nessa área. Meu companheiro, o governador Wellington, falou de avanços semelhantes do seu governo e evidentemente nós podemos lembrar avanços recentes como o Decreto n° 5.296, a regulamentação, a pressão maior, a efetivação, agora, da Língua Brasileira de Sinais, com uma série de articulações em curso com o Ministério das Comunicações; com os programas “Cão-Guia”; dos Livros em Braille; o programa “Brasil Acessível”, do Ministério das Cidades e dos Transportes; o benefício da Prestação Continuada; do Ministério de Desenvolvimento Social, pesquisas importantes em ciência e tecnologia; as ações do nosso governo na questão de biossegurança, enfrentando e se desgastando no enfrentamento de fundamentalismos religiosos, que não queriam as pesquisas com células-tronco; e vários outros temas que eu poderia citar, se fossem do nosso interesse aqui fazer um discurso de afirmação e realizações.

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O nosso interesse numa conferência como essa, o interesse do governo do presidente Lula é, sobretudo, ouvir vocês. Aqui viemos para ouvir. Estaremos na solenidade de encerramento para começar a colher todas as novas deliberações, toda a atualização de agenda que esta conferência certamente garantirá como um novo marco histórico, em debates ricos e com exposições conceituais, avanços e aprofundamento de temas, votações, etc. Temos certeza que, partindo de todos os debates em grupo deste evento, poderemos construir uma pauta histórica desta caminhada, que já vem de muitos anos, atualizando-a para o ano 2006.

Esse é o nosso interesse central: colher, levar adiante. As palavras “integrar” e “incluir” é que estão presentes no conceito de “acessibilidade”, que significa, justamente, essa compreensão de que a construção de uma sociedade de direitos humanos quer dizer uma sociedade profundamente democrática, que valorize a idéia da igualdade entre todos. Ela só pode ser imaginada como a realização e efetivação da pauta histórica que vocês constroem, conquistam, alargam, atualizam, num programa que nunca terá fim, porque a luta pela liberdade se confunde sempre com um horizonte, e, por mais que caminhemos na direção desse horizonte ele sempre se afastará um pouco, para nos obrigar a lutar por uma liberdade ainda maior.

Eu quero terminar esse bloco da minha reflexão para passar ao encerramento com a minha afirmação breve de compromisso, dizendo que aqui não se constrói apenas a atualização da pauta que o governo federal deve acatar e receber, e que os parlamentares aqui presentes e nossas articulações institucionais levarão para os governos estaduais e municipais, para as empresas, para as igrejas, para os meios de comunicação de massa, para a rica e plural sociedade civil, para que se incorpore, se ecoe aquilo que for formulado aqui visando assegurar o prosseguimento mais acelerado das conquistas no rumo dos direitos de justiça que estão vinculados ao tema nacional da afirmação dos direitos da pessoa humana.

Nesse trabalho, vocês estarão construindo um Brasil onde não haverá mais massacre do Carandiru, chacinas da Candelária ou de Eldorado de Carajás, ou a morte da irmã Dorothy Stang, em Anapu-PA, ou os grupos de extermínio e as violências que se espalham pela FEBEM de São Paulo e por muitas outras unidades do sistema sócioeducativo e do sistema prisional brasileiro. As notícias ruins, de Rondônia ao Espírito Santo, estarão sempre reiterando de forma clamorosa que não haverá uma democracia consolidada enquanto a dignidade da pessoa humana não estiver assumida e incorporada em sua plenitude na nossa convivência social.

Esta conferência é, portanto, parte importante da construção de um Brasil justo, democrático, livre, um País de afirmação da paz.

Eu termino, então, afirmando que o presidente Lula, seguramente, reafirmará o que digo agora, na segunda-feira, com a sua autoridade de Chefe Maior da República, de que se o objetivo da Conferência, encerrando um ciclo, é sensibilizar governos, é impulsionar a inclusão qualificada, é dar visibilidade maior a essa luta, é avançar no controle social sobre os governos federal, estadual e municipal, enfim, na democracia participativa. Se esse objetivo é prepara novas conquistas no plano legislativo, se é fazer cumprir as leis já conquistadas, então está firmado o compromisso de que, de nossa parte, haverá completo empenho em levar adiante esse compromisso, e naquilo em que, eventualmente, tivermos restrições orçamentárias, trabalharemos pela construção de futuros orçamentos. Mas, que não haja dúvida de que este governo está compromissado com a mobilização de vocês, como um governo verdadeiramente democrático, compromissado com a causa popular, que precisa, para se sustentar, de conferências e de mobilizações como essas que vocês concluem nesses 04 dias. Um governo precisa disso como a terra precisa de água para gerar vida.

Muito brigado a todas e a todos!

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IV - Mesas Técnicas: Exposições/Debates

A) Condições Gerais de Implementação da Acessibilidade

Composição da mesa:

Moderadora: Dra. Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior, Médica Fisiatra, Docente Mestre da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, titular da Academia de Medicina de Reabilitação, membro da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério do Planejamento. É Coordenadora Geral da CORDE e do CONADE, órgãos da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

Palestrante: Dra. Sandra Julião, Promotora de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, formada em Direito pela Universidade de Brasília e idealizadora e editora da Revista Reviva, da Promotoria de Defesa do Idoso e da Pessoa Portadora de Deficiência “ PRODIDE.

Sandra de Oliveira JuliãoPromotora Pública do Distrito Federal

Bom dia a todos os presentes!

Agradeço o convite para estar participando aqui de um debate tão importante, que faz parte do meu trabalho e da realidade de todos os que estão aqui.

Eu vou tentar resumir um trabalho que eu fiz, e acho que vocês devem receber aquilo que eu entreguei, inclusive para poder fazer parte de qualquer estudo posterior. Eu procurei fazer um trabalho completo, mas aqui vou resumi-lo para que a gente tenha mais tempo para debater, discutir, e não ficar somente numa exposição que poderia se tornar chata.

Como disse a Dra. Izabel, e como é o objetivo dessa Conferência, nós estamos aqui para discutir as questões afetas à implementação da acessibilidade, porque o Decreto nº 5296 acabou trazendo muitas novidades e definições e algumas questões práticas que trariam, a nosso ver, muitas mudanças no que se refere à questão da acessibilidade. Entretanto, esse Decreto já está em vigor há quase um ano e meio e nós percebemos que pouca coisa ainda foi modificada a partir de sua vigência. Não que nós não tivéssemos avanços. Tivemos sim e acho que o caminho é esse. Estamos avançando paulatinamente, mas é importante percebermos o que foi colocado na legislação e que ainda não foi passado para a prática.

Nós sabemos que o Brasil é um país muito conhecido pelo número de leis que tem. Se olharmos apenas por esse prisma, deveríamos ser um País justo. Entretanto, a gente percebe que não é o número de leis que garante a justiça. Os direitos somente são garantidos se forem realmente objeto de uma política de conscientização da população, e, sobretudo, se a legislação obedecer às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT. Muitas vezes nós temos problemas da falta de aplicação da legislação porque ela não está adequada às regras da ABNT.

Eu imagino que todos vocês devam conhecer o Decreto nº 5296. Eu escrevi aqui no meu texto algumas definições, mas não vou mencioná-las, porque isso já está escrito. A igualdade é a regra de ouro expressa no art. 5º da Constituição, e é com isso que nós temos que trabalhar. A noção do princípio constitucional da igualdade encontra sua razão maior na máxima de Aristóteles: “A igualdade consiste em aquinhoar os iguais igualmente, e os desiguais na medida da sua desigualdade”. Eu imagino que isso também deva ser do conhecimento de vocês. As pessoas conhecem muito essa máxima de Aristóteles, mas o difícil é transformar isso em realidade.

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A nossa Constituição é uma Carta Magna democrática, que trouxe, nos artigos. 227 a 248, além dos direitos fundamentais, princípios básicos que passam do direito da igualdade à garantia da atenção aos direitos especiais de pessoas portadoras de deficiência. Além disso, ela também diz que é responsabilidade plena do poder público cuidar da saúde, da assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. Isso quer dizer que a Lei Máxima do nosso país diz que é do poder público a responsabilidade de garantir que os direitos dessas pessoas, que são direitos tratados em leis especiais, sejam efetivamente implementados.

O que é a acessibilidade trazida aqui no Decreto nº 5296? É a condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida. Temos também várias leis a observar sobre isso. A Lei nº 7853, que veio a ser regulamentada pelo Decreto nº 3298, acaba reforçando aquilo que a Constituição estabelece: cabe aos órgãos e às entidades do poder público assegurar às pessoas que têm deficiência o pleno exercício dos seus direitos básicos. Nós estamos falando de todos os direitos, mas, como esta Lei segue uma técnica de redação, ela precisa dizer, de alguma forma, como é que se vai dispor sobre isso para depois se executar. Então, cabe aos órgãos e entidades do poder público assegurar às pessoas portadoras de deficiência o exercício pleno dos seus direitos básicos, e, além disso, os direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao desporto, ao turismo, ao lazer etc. Enfim, como a Lei ora em comento não é taxativa, podemos considerar todos os demais direitos do cidadão que vive numa sociedade sob a égide de uma Constituição democrática. Entretanto, a questão é muito ampla. Não adianta termos uma lei que diz que o poder público vai garantir o direito básico das pessoas portadoras de deficiência, se o acesso a esse direito não lhe for oferecido. Quanto à educação, de que adianta a Constituição garantir? O Ensino Fundamental obrigatório é garantido na Constituição, no art. 208, inciso I. Tanto o Ensino Fundamental quanto o Ensino Especial. Quer dizer, o direito ao ensino é plenamente garantido. Então, como está disposto na legislação que é obrigação e responsabilidade do poder público garantir esse direito à educação, ele oferece a escola pública, oferece o ensino público. Então, o poder público está garantindo, assim, o direito ao ensino assegurado na Constituição. Agora, se as escolas não forem acessíveis, como é que este direito vai ser garantido? As coisas têm que ser pensadas de uma maneira agregada. Nós temos vários exemplos. Eu não imagino o que se verifica, nesse sentido, em nível nacional, mas aqui no Distrito Federal a situação é gravíssima. As escolas não têm acessibilidade já a partir das suas entradas, de seus portões, como também nas suas calçadas, além de buracos que têm dentro. E isso apenas para se falar minimamente de uma acessibilidade urbanística que deveria existir. Além disso, deveríamos falar também da acessibilidade do ensino propriamente dito. Nós estamos vendo aqui a tradução da Língua Brasileira de Sinais. Isso é impensável no ensino público de Brasília. Como é que nós podemos integrar a pessoa portadora de deficiência auditiva no padrão de ensino garantido na Constituição? Então, nós estamos vendo que a legislação está muito distante da realidade, apesar dos avanços que eu coloquei no início. E isso acontece com os demais direitos.

A gente tem conseguido avançar um pouco, lá na nossa Promotoria de Justiça, mas a luta é grande. Por exemplo, no direito ao trabalho, temos a questão do ingresso do portador de deficiência no serviço público. Os editais de concursos são muito complicados. Eles não garantem nem a inscrição de maneira correta, da forma como a legislação exige. Dessa forma, após a realização do concurso, a pessoa que tem alguma deficiência vai ser avaliada por uma equipe profissional, vai ser submetida a uma perícia médica. Todavia, quando ela fez sua inscrição não sabia que teria que ser avaliada depois e acaba não tendo o acesso ao serviço público. Ou seja, essa é uma forma de retirar a possibilidade de a pessoa ingressar no mercado de trabalho, apesar de lhe ter sido assegurado o direito à inscrição no concurso. Isso é muito complicado. Então, a gente vê que a legislação está muito distante da efetivação do direito do trabalho.

O que é que acontece com relação ao turismo? Tomo como exemplo Brasília, que deveria ser uma cidade turística, já que administrativamente ela é uma cidade saturada, se levarmos em conta a finalidade para a qual foi planejada. Ela já está saturada porque já tem todos os órgãos públicos e com seus respectivos funcionários. Então, vamos concebê-la como uma cidade turística pelos seus

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monumentos, por sua história e a forma como ela foi construída. Como é que as pessoas têm acesso à Catedral? Alguém teve oportunidade de ir até a Catedral? Ela é o exemplo desse absurdo que é termos monumentos históricos, turísticos, mas onde não se garante acesso irrestrito às pessoas. E não é por falta de legislação; não é verdade? Então, está definido na Lei Nº. 7853 que é obrigação do poder público garantir essa acessibilidade. Essa lei foi regulamentada pelo Decreto nº 3298, que também reforçou que essa é uma responsabilidade do poder público. Enfim, nada se faz. Se o governo não for cutucado pelo Ministério Público, que é o fiscal da lei, pelas associações, pelas decisões de reuniões, conferências, fóruns etc, nada se faz. Então, esse é realmente um empurrão que o poder público precisa levar. Neste país, a política pública só anda quando a gente empurra.

Assim, para se garantir a acessibilidade para as pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, para se garantir que qualquer cidadão tenha acesso a seus direitos é preciso que tais direitos passem a fazer parte do pensamento natural de qualquer instituição que esteja envolvida nesse processo: não só o poder público, como as universidades, as instituições de ensino, as instituições de arquitetura e de engenharia, etc. Não se pode admitir mais que esse pensamento não seja natural agora: desenho universal, rota acessível e a barreira arquitetônica.

No caso das barreiras arquitetônicas, nós vamos dividi-las em três ítens: barreiras arquitetônicas nas edificações, barreiras arquitetônicas nos transportes e barreiras arquitetônicas nas comunicações. É assim que elas estão divididas nas normas da ABNT, embora nós não devamos falar em barreiras arquitetônicas em comunicação. O que seria o desenho universal? É aquele que visa atender a maior gama de variações possíveis das características antropométricas e sensoriais da população. O que significa isso? Significa que devemos pensar que tudo deve ser feito para que todos tenham acesso. Nós não precisamos estabelecer que aqui é necessário ter uma rampinha com tal e qual inclinação. Imagino que todos devem ter acesso a tudo e, portanto, as pessoas não serão mais divididas e segregadas. Serão simplesmente cidadãos.

O que é rota acessível? É o trajeto contínuo, desobstruído e sinalizado que conecta os ambiente externos ou internos de espaços e edificações que possam ser utilizados de forma autônoma e segura por todas as pessoas, inclusive, aquelas com deficiência. É interessante a gente ver que, até na definição, se diz que todas as pessoas podem ter acesso, até aquelas com alguma deficiência. Isso é uma norma, realmente uma universalização de cidadania. A rota acessível externa pode incorporar estacionamentos, calçadas rebaixadas, faixas de travessia de pedestres, rampas, etc. A rota acessível interna pode incorporar corredores, pisos, rampas, escadas, elevadores, etc.

Então, passemos a falar da barreira arquitetônica urbanística ou ambiental, que pode ocorrer nas edificações, transportes ou nas comunicações. O que seria uma barreira? É qualquer elemento natural, instalado ou edificado, que impeça a aproximação, a transferência ou a circulação no espaço mobiliário ou equipamento urbano. Então, se tivermos em mente o desenho universal, a rota acessível e as barreiras arquitetônicas urbanísticas ou ambientais, as barreiras nos transportes e as barreiras nas comunicações, a gente começa a falar em acessibilidade de uma maneira natural, acessibilidade para todos e não somente acessibilidade para pessoas com deficiência.

Quais são os instrumentos para implementação da acessibilidade, que é o objetivo dessa minha palestra aqui? Como eu falei, imagino que um dos instrumentos mais importantes seriam as leis e decretos federais, estaduais ou municipais. Então, a legislação, evidentemente, é importante e é o nosso ponto de partida. Por isso, nós realmente devemos sempre estar exigindo dos nossos representantes nas Casas Legislativas que realmente concretizem aquilo que está faltando para nortear nossos direitos para que a gente aqui, na hora de executar as políticas, possa ter essas metas, esses pontos, como foco de partida. Então, as leis e decretos federais, estaduais e municipais são os instrumentos mais importantes para que a acessibilidade seja implementada. E além disso, como eu falei, temos as regras da ABNT, inclusive, porque a lei exige. Então, a lei está em primeiro plano, mas a regra da ABNT é fundamental. A regra tem que ser seguida e tem que estar conectada com a legislação. Além disso, temos os Planos Diretores, que é trabalho do Executivo. Nós temos a questão legislativa, que é acompanhada de normas técnicas, que não deixam de compor a parte normativa. Depois disso, temos os Planos Diretores, que passam do normativo para o executivo. É alguma coisa no nível da administração local que vai

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transformar a norma, as leis, num plano que vai ser executado dentro da realidade de cada localidade. Então, os Planos Diretores são outros instrumentos que devem ser implementados para que possamos tirar a legislação da parte abstrata da administração e colocá-la em execução, concretizá-la.

E por último, para realmente se implementar a acessibilidade descrita na norma prevista nos Planos Diretores, temos a fiscalização. Eu acredito que esse é também um dos grandes problemas para a gente tratar dessa questão da implementação, porque não adianta nada se ter leis, vontade política para trabalharmos na sua efetivação em planos diretores, em projetos, se tudo isso não for fiscalizado. Infelizmente, nós não temos uma população que, culturalmente, esteja habituada a respeitar essas pessoas. E eu estou falando de pessoas com dificuldade e não só de pessoas com deficiência. Estou falando de crianças, de idosos, de qualquer pessoa que não esteja enfrentando a competitividade, ou seja, pessoa numa faixa etária que esteja no mercado de trabalho, que esteja em condições físicas adequadas. Se você não tiver nessas condições nesse país, você está fora, como se a legislação não o protegesse. É por isso que precisa existir tanta legislação para proteger essas pessoas. O problema é que, como há muitas leis, é complicado ficar correndo atrás da execução dessas leis, porque o que devia ser natural, cultura, educacional, acaba sendo legal, forçado, imposto por legislação. E a gente tem que corrigir isso pela via da conscientização. Nós temos que lançar mão do que nós temos na legislação e trabalharmos na norma da execução para, a partir daí, trabalharmos o respeito, a conscientização, a educação, para que isso tudo que nós estamos discutindo hoje passe a ser natural e para que a fiscalização seja feita por todos.

Quando eu falo de fiscalização muita gente pensa que é somente aquele agente fiscal do governo que usa aquele bloquinho de multas. É claro que eu acho isso importante. Eu acho que as pessoas aqui do Distrito Federal conhecem a nossa faixa de pedestre, uma referência nacional, quiçá, mundial. Mas, para isso, foi feito um trabalho de conscientização. No início, foi necessário, sim, o envolvimento de agentes da PM postados de frente para a faixa de pedestre com seu bloquinho de multa, por força de convênio com o DETRAN. Mas, depois, a questão ultrapassa a esfera restrita do agente político, do administrador e passa a alcançar a todos. Todos devemos fiscalizar. Todos temos que lutar na defesa do direito do outro. Assim como o fiscal que é agente público. Não é preciso, para se respeitar o direito garantido a alguém, que um PM diga: “Olha, não para nessa vaga não porque ela é reservada para deficientes”. Eu é que tenho que dizer para mim mesmo: “Eu não vou parar nessa vaga, porque ela está reservada para deficientes”. Ou seja, é uma questão de conscientização, que tem que ser ampliada, para virar uma consciência coletiva.

Eu estou resumindo bastante, porque acabei trazendo muito daquilo que a legislação diz e acho que vocês devem ter tudo isso no trabalho, na pasta de vocês. E se não tiverem, é fácil ter acesso a toda essa legislação, porque o trabalho do Sistema Nacional de Informações sobre Deficiência - Sicorde está sendo muito efetivo. Esse é também um grande trabalho na questão da acessibilidade. É importante que se tenha acesso ao conhecimento dos seus direitos. É isso também que nos transforma em cidadãos mais fortes. O Sicorde, da Secretaria Especial Nacional dos Direitos Humanos, tem trabalhado de forma intensa nisso. Como vocês têm acesso a essa legislação, eu não vou falar muito sobre ela; vou dar algumas pinceladas. Primeiro, devo ressaltar que não é só o acesso aos direitos, ao transporte coletivo, ao ônibus acessível, àquele que permite que o cadeirante entre sem nenhum desconforto. Podemos falar também da legislação que concede passe livre à pessoa com deficiência. Isso também é uma referência de acessibilidade. Além disso, temos uma novidade também, que é a Lei do Cão-Guia. Essa foi uma iniciativa do Distrito Federal e agora temos a Lei nº 11126, uma lei federal, que permite o acesso do portador de deficiência visual a todos os ambientes de uso coletivo com o seu cão-guia. Então, essa questão da acessibilidade via cão-guia é uma inovação muito interessante, porque nem se cogitava disso há alguns anos. Essa é uma questão nova, que foi muito bem-vinda, e que está crescendo de uma forma natural, como deve ser.

Além disso, temos as regras da ABNT. Eu vou terminando aqui porque estou resumindo as legislações novas. Quanto à fiscalização, uma coisa importantíssima para que as normas sejam implementadas é a questão dos defeitos que as leis e os decretos trazem, principalmente para os operadores dos direitos. Eu estou falando especificamente do Ministério Público, porque, no fundo, a

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sociedade, ou seja, vocês, é que vão reclamar conosco da ineficácia, da ineficiência e da falta de implementação da lei. E nós vamos ter que devolver para vocês assim: “Mas, não existe um instrumento que obrigue a se implementar essa lei”. Do que eu estou falando? Por exemplo, o Decreto nº 5296 dispõe sobre a implementação da acessibilidade arquitetônica e urbanística. O que ele diz? Em primeiro lugar, ele não estabelece prazo para que nada sobre acessibilidade urbanística e arquitetônica seja colocado em prática. Além disso, ele se refere somente aos Planos Diretores. Então, o que acontece? Nós temos que trabalhar em parceria com os governos locais para estabelecer Termos de Ajustamento de Conduta - TAC e cobrar aquilo que a norma somente dá como diretriz. Não existe na norma nenhuma sanção estabelecida caso a administração, o governo executivo local, não proceda da forma como está disposto na lei. Então, tudo isso fica muito difícil. É complicado trabalhar quando a norma não prevê uma sanção, e, principalmente, não estabelece multa, não estabelece intervenção, não estabelece nada. Isso é muito complicado. Qual é o instrumento que o Ministério Público tem? Imagino que seja somente o Ministério Público que tenha esse instrumento. Como fiscal da lei, nós temos o recurso da ação civil pública para tentar obter do juiz um mandamento sobre a questão. Ele manda que aquele órgão, que é omisso, faça aquilo que a lei exige que se faça, sob pena de pagar uma multa diária. Mas, não vamos esquecer que isso acontece numa ação judicial e nós sabemos o que significa uma ação judicial com a justiça morosa que nós temos nesse país.

Com relação ao transporte coletivo, esse é um outro exemplo muito importante. Com isso, eu vou finalizar, colocando uma questão que eu acho que é a mais importante e questionadora. O Decreto nº 5296 define prazos, define o que é acessibilidade, define as respectivas competências. Mas, o que aconteceu? Primeiro, o Decreto estabelece que cabe às empresas concessionárias e permissionárias das instâncias públicas assegurar a qualificação dos profissionais dos transportes coletivos. Elas é que são responsáveis por isso, só que não foi estabelecida nenhuma sanção caso elas não o façam. Portanto, elas são responsáveis por fazer isso, mas não há o que se possa fazer para cobrar que as empresas façam isso. Nós aqui do Distrito Federal trabalhamos com as empresas de transporte coletivo, mediante um Termo de Ajustamento de Conduta que fizemos conjuntamente. Elas fizeram um curso oferecido por uma ONG chamada Movimento Nacional de Educação no Trânsito “ MONATRAN. Esse curso foi muito bem aceito. Eu não sei como isso acontece no Brasil, fora do Distrito Federal, porque a lei é justamente para que isso seja exigido em todo o território nacional.

A gente tem que acreditar no trabalho de cada localidade. Isso é importante e vocês têm que nos dar força e cobrar também. O prazo para que toda a frota de ônibus do Brasil esteja realmente acessível é de 10 anos, a partir do Decreto. É importante que a gente saiba como é difícil renovar uma frota. Mas vocês não acham que isso já devia ter sido pensado há muito tempo? Por que, a partir da publicação do Decreto, se conceder mais 10 anos para que os ônibus todos sejam acessíveis? Portanto, reflitam sobre isso: se o próprio Decreto dispõe que apenas em 10 anos nós, fiscais da lei, podemos cobrar tanto dos órgãos públicos como das empresas os ônibus plenamente acessíveis, então, até lá, o Ministério público nada poderá fazer porque a própria lei diz que nós temos que esperar.

Eu vou terminar ressaltando que é com conferências como essa, com trabalhos conjuntos, com união de esforços, que nós temos que fazer os ajustes da legislação, para que, mesmo aquilo que esteja correto na legislação, se transforme na realidade que queremos. Eu imagino que se a gente não se reunir dessa forma, se a gente não trabalhar em conjunto, se a gente não trocar idéias e não trabalhar principalmente com informação, não vamos avançar. Muitos pensam que somente o advogado, somente o juiz, é que devem saber dos decretos ou das leis. Não é não. Cada um de vocês tem que saber o que está escrito na lei para saber quais são os seus direitos. Vocês têm que saber, por exemplo, que não adianta a gente cobrar e reclamar que o ônibus não é acessível, porque a lei determina que somente daqui a 10 anos é que nós vamos poder fazer isso. Assim, cada um de vocês tem a responsabilidade de conhecer a legislação, sim, para poder discutir e transformar os erros e as omissões da legislação e também aquilo que está certo na legislação e que o próprio poder público não colocou ainda em prática.

Eu agradeço a todos pela oportunidade de estar aqui colocando aquilo que a gente trabalha no dia-a-dia e a disposição muito grande de transformar essas injustiças que a gente vê na realidade que todos reclamamos.

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Obrigada!

Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior – Moderadora Coordenadora-Geral da CORDE e Conselheira do CONADE

Muito obrigada, Dra. Sandra Julião!

A Dra. Sandra fez o meu trabalho ficar bastante complicado porque o que ela levantou de polêmica é muito interessante. Eu vou colocar apenas a primeira polêmica para o nosso debate, que será feito em conjunto pela primeira e a segunda Mesas Redondas. A primeira polêmica é que o Decreto teve que ficar contido no que dizia a Lei nº 10048 e também a Lei nº 10098. As sanções só podem estar previstas em lei, não podem estar em Decreto. Portanto, qual seria a solução? Não devemos pensar que, não tendo sanção, vamos continuar vivendo assim. Não é isso. Se a sanção é importante e se os governantes dos níveis municipais, estaduais e federal têm que obedecer a lei - e não há dúvida sobre isso -, quando eles não obedecem o Ministério Público tem que agir. O Ministério Público não age apenas em relação à iniciativa privada: ele tem que agir também sobre a área governamental. Talvez, essa seja uma questão de mudarmos a lei para, em seguida, alterarmos o Decreto, definindo sanções. Fica, portanto, a questão para discutirmos depois. A idéia seria incluir essas sanções na Lei nº 10.098 ou na Lei nº 10.048. A Lei Nº 10.048 define sanções para a inadaptação da frota, estabelecendo multa de R$ 500,00 a R$ 2.500,00 reais para o ônibus não se tornar acessível no prazo.

Para terminar, eu vou levantar mais uma polêmica na sua polêmica, como moderadora. Na questão dos ônibus, nós não precisamos esperar 10 anos. Eu quero ver se é isso mesmo. Se, pelo art. 2º do Decreto, somente o administrador público, nos seus atos de administração pública, tem que obedecer aos ditames do Decreto, ele não pode, por exemplo, fazer uma intervenção na via pública e deixá-la sem acessibilidade. No momento em que ele quebra a calçada, ele, segundo o art. 2º do Decreto, tem que observar a questão da acessibilidade. Então, o Ministério Público tem como agir, caso tal não seja observado. E nós cidadão e a CORDE também podemos agir. Naturalmente, quando a CORDE faz alguma manifestação na tentativa de se enquadrar algum agente público ou a iniciativa privada, sempre que a situação for mais complicada ele se vale do Ministério Público, de imediato. Existe essa parceria entre o Executivo e o Ministério Público. Ao mesmo tempo, o Ministério Público sempre nos informa sobre as questões que os cidadãos têm levado ao conhecimento de seus procuradores e promotores. Portanto, na medida em que um prefeito de uma cidade faz um contrato de concessão de ônibus, já dentro da vigência do Decreto, há de constar nesse contrato que os ônibus serão tornados acessíveis progressivamente e não apenas ao final de 10 anos, porque são contratos novos. No caso dos ônibus que já estão rodando, sob a vigência de contratos anteriores ao Decreto, também há essa obrigação, pois está previsto que a frota em circulação também será adaptada. A frota nova é acessível. A seguir, nós teremos palestras sobre transporte e sobre arquitetura e urbanismo. Assim, na discussão vamos debater se o Ministério Público pode de fato agir desde já em relação a essas questões, porque, no meu entendimento, o art. 2º é o mais importante do Decreto. Ele é a chave no sentido de fazer com que o administrador público tenha, na sua relação com o ente privado, quando da contratação do serviço público, a obrigação de fazer valer todas as regras da acessibilidade. Na verdade, essas regras não são apenas para as pessoas com deficiência, mas para uma camada, um grupo, uma população muito grande, que são as pessoas com mobilidade reduzida. Acho que fiz um pouco de polêmica, um pouco de contraponto.

B) Implementação da Acessibilidade Arquitetônica, Urbanística e de Transporte

Composição da Mesa:

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Moderador – Sr. Cláudio Vereza, deputado estadual pelo Estado do Espírito Santo, Educador popular e estudante de jornalismo na UFES.

Palestrantes - Dra. Ângela Carneiro da Cunha, Consultora da CORDE, Arquiteta e urbanista com especialidade em acessibilidade e colaboradora no programa “Brasil Acessível”. Dra. Ângela Costa Werneck de Carvalho, Arquiteta e Mestre em Transportes, que atua no Riotrilhos, à frente da Coordenação do Programa de Acessibilidade, e colaboradora do INMETRO e da Associação Brasileira de Normas Técnicas “ ABNT.

Ângela Carneiro da CunhaConsultora da CORDE

Bom dia!

Eu queria agradecer a presença de vocês. Realmente, essa é uma manhã lindíssima. Nós precisávamos ter um evento como esse há muito mais tempo. Queria agradecer à Izabel, minha querida companheira, à Mesa, e ao Professor Adilson Ventura, pelo convite. Eu assumi esse grande desafio de tentar passar para vocês alguma coisa sobre esse tema tão amplo, que eu vou tentar resumir e explicar para vocês.

Eu queria começar falando da acessibilidade associada ao espaço físico da cidade. A imagem que está aqui presente mostra a concepção da acessibilidade que tem que ser considerada na cidade: o alcance, a percepção e o entendimento para a utilização, com segurança e autonomia, do espaço, das edificações, mobiliário, equipamentos e elementos. Depois, eu explico para vocês o que é a questão do mobiliário e do equipamento urbano. As fotos mostram, na cidade, como temos que compreender no momento de fazer uma travessia, para não irmos para o meio da rua e nos machuquemos. Então, o piso tem que ter algum tipo de sinalização. Ela também mostra a questão do alcance. Uma pessoa usuária de cadeira de rodas, passando por uma catraca de metrô, com o alcance para que ela possa por o cartão. Mostra também a questão da sinalização de piso, de orientação para a pessoa cega quando ela não tem o balizamento. E mostra uma pessoa usuária de cadeira de rodas, caminhando tranqüilamente por um local de lazer lindíssimo, sem nenhum obstáculo.

Aqui a gente fala da questão da inclusão social e da acessibilidade. O espaço urbano deve assegurar aos seus habitantes liberdade individual, o benefício da ação coletiva, o bem-estar da moradia, a felicidade do trabalho e o feliz emprego das horas livres. Isso é muito importante. Não é só viver a cidade de maneira pesada e carregada; precisamos viver a cidade de maneira leve e feliz.

É aí que temos que considerar a diversidade humana. Este slide mostra fotos de pessoas idosas, de pessoas obesas, uma pessoa cega tentando não cair em bueiros de uma cidade. Mostra fotos do Stephen Hawkins, um grande cientista inglês, que não faz nenhum movimento no corpo e, no entanto, é considerado hoje a pessoa mais importante na área da ciência, na nossa geração. Mostra uma foto de uma pessoa na cadeira de rodas jogando basquete e fazendo uma cesta, ou seja, a capacidade que o atleta cadeirante tem de chegar à cesta do basquete. E também mostra a diferença de proporções entre uma pessoa adulta e uma criança. Então, aqui está considerada a questão da diversidade humana.

Desculpem, por estar colocando algumas coisas que a Dra. Sandra já abordou, mas eu precisava dar ênfase à questão da acessibilidade arquitetônica e urbanística e mostrar quais os artigos que eu considero que são muito importantes nesse Decreto. A Constituição brasileira estabelece as competências de cada esfera governamental. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizam políticas, e, administrativamente, a República Federativa do Brasil compõe um todo harmônico indissolúvel. Então, essas esferas governamentais têm que ser consideradas quando trabalhamos a questão da implementação da acessibilidade. Duas leis federais “ Leis nºs 10.048/2000 e 10.098/2000 “ e o Decreto nº 5.296/2004 obrigam o poder público a fazer um reordenamento das suas ações práticas

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relativas às questões da acessibilidade. Reforçando as colocações da Dra. Izabel, eu considero o art.2º do Decreto muito importante, porque ele vincula a aprovação de projetos de natureza arquitetônica e urbanística, de comunicação, de informação e de transporte coletivo, bem como a execução de qualquer tipo de obra que tenha destinação pública ou coletiva à questão da acessibilidade. O Decreto vincula também o financiamento de projetos com utilização de dinheiro público à questão da acessibilidade. Esse é um grande instrumento de fiscalização para a implementação dessa questão da acessibilidade. Então, não se usa mais dinheiro público mais no nosso país, a partir da vigência do Decreto, se não se contemplar a acessibilidade, de maneira ampla. Nós temos que fiscalizar isso. Temos que ver o que as instituições financeiras estão aprovando e precisamos capacitar esses técnicos para que possam fazer valer essa norma. Então, eu acho que um dos grandes instrumentos de controle que nós temos é o art. 2º do Decreto nº 5.296.

No art. 10 o Decreto também aborda a questão dos princípios do desenho universal, que todos já devemos ter uma idéia do que é, mas que nós temos que projetar de maneira ampla e não para um grupo pequeno da população. Quer sejam pessoas com deficiência, sejam pessoas idosas, sejam pessoas de baixa estatura, sejam pessoas de alta estatura, sejam pessoas que não têm uma percepção maior do que se passa no seu entorno, essas pessoas têm que ser consideradas e esse desenho universal vai propiciar essa condição, na medida do possível, de a cidade ser projetada de maneira humana.

O art. 10 diz respeito também à questão da inclusão do tema “acessibilidade” nas diretrizes curriculares, não só na formação profissional e tecnológica do ensino superior, como também nos cursos técnicos. Temos que saber, por conseguinte, que esse é um tema muito novo no país e as pessoas não têm conhecimento sobre ele. Essa formação precisa ser cada vez mais estimulada. O espaço precisa ser adequado de maneira correta e com conhecimento da matéria. Então, precisamos fazer cursos de capacitação e de orientação técnica para que as pessoas possam realmente projetar os espaços de maneira acessível.

O art. 11, que trata da questão da construção, reforma e ampliação, não ser refere apenas aos projetos novos, mas também dos casos de intervenção, reforma ou ampliação de qualquer construção de uso público e coletivo. Qual é a diferença? Na construção de uso público a administração cabe ao poder público e na de uso coletivo a edificação pode ser privada desde que ela tenha um uso para a coletividade. Na edificação desta também tem que se considerar a questão da acessibilidade

Eu acho que aqui se insere também a questão da responsabilidade técnica, para que o Ministério Público possa atuar em relação aos responsáveis pelo o que se está fazendo nesse país. Tem que haver sempre uma responsabilidade técnica declarada. Nesse sentido, já existe um documento nos Conselhos de Engenharia e Arquitetura, denominado Anotação de Responsabilidade Técnica “ ART. O Decreto nº 5.296 diz que quando for anotada a ART deve-se considerar a questão da acessibilidade. Então, já existe uma decisão do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia no sentido de que, quando a ART for assinada pelos profissionais, eles devem atender à questão da acessibilidade. Quando se assina uma ART, em geral, tem-se que atender a toda a legislação existente no país, e nas discussões relativas à elaboração do Decreto houve um acerto no sentido de que isso deveria ser enfatizado para que o profissional tivesse conhecimento. Muitos profissionais dizem: “O que é isso?” E saem enlouquecidos para entender essa matéria. Então, essa é uma forma de estimular o conhecimento dessa questão tão importante.

O art. 13 trata do conjunto regulador do desenvolvimento humano. O Estatuto da Cidade dá um prazo até o final deste ano para que todos os Municípios brasileiros apresentem seus Planos Diretores, e uma das exigências do Plano Diretor é a questão da acessibilidade e da mobilidade urbana. Então, eu penso que esse é um grande momento para que saiamos daqui lutando pela criação de instrumentos de fiscalização para que esses Planos Diretores sejam apresentados contemplando a questão da acessibilidade, porque esse é o maior instrumento de regulação do Município.

Gostaria de citar a questão das normas brasileiras, assunto já abordado parcialmente pela Sandra. O que são essas normas? Quando se faz um processo legal tem-se um prazo de revisão disso, que, muitas vezes, é maior do que o da revisão de normas. A norma está sempre sendo revisada. Por

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exemplo, a NBR 9050, que é a principal norma de edificação e meios, vai ser revisada porque ela passou um ano sendo implementada e há nela algumas coisas que precisam ser revistas. Então, esse é um grande instrumento de atualização dessa legislação que nós dispomos. A principal norma que trata da questão da acessibilidade arquitetônica urbanística é a NBR 9050, que trata da questão da edificação, mobiliário, espaços e equipamentos.

Gostaria também de explicar às pessoas cegas o que existe na imagem que eu ora estou descrevendo. Esses slides para os quais eu não descrevi imagem é porque eles não têm imagens. Então, o que acontece? O mobiliário urbano é todo o objeto, elemento e pequena construção integrante da paisagem urbana, de natureza utilitária ou não, implementado mediante autorização do poder público, em espaços públicos ou privados. A foto mostra um orelhão, uma maquete táctil e uma parada de ônibus. Todas as pequenas construções sobre as calçadas, sobre as praças, têm que ser autorizadas pelo poder público. Então, precisamos entender que existe uma responsabilidade administrativa municipal sobre esses absurdos que acontecem nos nossos espaços públicos. Precisamos que isso seja regulamentado e efetivamente fiscalizado.

O que é o equipamento urbano? O equipamento urbano são as grandes construções necessárias ao funcionamento da cidade. Então, são todos os bens públicos e privados. Eu estou ressaltando os bens privados porque um mercado é público, mas também um shopping center, uma loja de atendimento, uma ótica, enfim, o comércio de maneira geral, os postos de saúde, os hospitais privados, as clínicas, todos esses equipamentos são necessários ao funcionamento da cidade e precisam contemplar a questão da acessibilidade. Assim, escolas, hospitais, postos de saúde, museus, teatros, igrejas, mercados públicos, tudo isso exige uma concessão do poder público para a sua utilização. Então, a gente precisa saber que, antes de o serviço chegar à população, ele é aprovado para ser colocado naquele determinado local.

O art. 26 fala da questão da sinalização visual e tátil para a orientação das pessoas. A cidade precisa comunicar aos seus usuários os serviços que ela lhes oferece e esses serviços têm que ser comunicados em todos os tipos de linguagem, como, por exemplo, na linguagem gestual, na linguagem sonora, na linguagem tátil. A foto mostra um sinal sonoro, mostra mãos interpretando LIBRAS, mostra uma pessoa na faixa tátil de orientação direcional, mostra um dedo lendo Braille.Tem uma foto aqui do Marcelo Pinto Guimarães que mostra a mão de um ser humano com um olho na ponta de cada dedo e um coração na sua palma, o que indica que aí está o olho da pessoa que tem deficiência visual. Também é mostrada aqui uma sinalização visual. Considerando a baixa visão, as placas têm que ter uma dimensão para que as pessoas que não têm uma visão completa possam ler também.

O art. 30, que trata da acessibilidade nos sítios históricos, é também muito importante. O tema da Campanha da Fraternidade deste ano é “Acessibilidade”. Há alguns que alegam que os sítios históricos não podem ser adequados. Isso não é verdade. A gente pode adequar as construções tombadas pelo Patrimônio Histórico. Nós fizemos um trabalho interessantíssimo em Olinda, que é uma cidade tombada pela UNESCO, e a Europa inteira está fazendo isso. Nós mostramos isso nessas fotos, onde se tem vários tipos de artifícios para que se possa comunicar, e assim por diante.

A Instrução Normativa 01 foi editada pelo IPHAN e o Grupo do IBAM, do Rio de Janeiro, após a promulgação da Lei nº 10.098. Ela é muito completa e vale a pena vocês terem conhecimento dela para não absorverem esse discurso de que uma edificação não pode ser adaptada porque é tombada. Depois a gente vai falar aqui das dificuldades que se tem para implementar na cidade essa questão da acessibilidade.

Aqui nós citamos alguns fatores importantes serem considerados na questão da implementação:

• o desconhecimento da matéria por parte dos beneficiários mais diretos e da própria pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, e também dos gestores públicos, e dos profissionais que estão diretamente ligados ao projeto e à construção das cidades;

• a dispersão da competência administrativa e a ausência de agentes públicos que centralizem poder suficiente para liderar as mudanças necessárias. Quando se trabalha com Municípios

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percebe-se o quanto é difícil existir um raciocínio único sobre essa vontade e essa capacidade de gerir a questão da acessibilidade dentro dessas grandes estruturas municipais;

• a diversidade de setores e complexidade das inter-relações necessárias para a implementação da acessibilidade. A gente está falando aqui de edificações, espaços públicos, transporte, comunicação e sinalização; em resumo, de toda a cidade. Se a gente for tratar de um tema aqui, como calçada, vocês vão ver a complexidade que envolve o trabalho com esse tema. Portanto, isso é uma coisa que dificulta o domínio sobre o tema;

• a identificação dos problemas e das barreiras existentes na cidade. Nós não temos levantamento disso. Precisamos urgentemente começar a trabalhar isso, e temos que aproveitar esse momento, em que os Municípios brasileiros estão apresentando seus planos municipais completos, e um dos instrumentos destes é o Plano de Acessibilidade do Município, que é a instância onde se administra a cidade.

Eu vou falar um pouco sobre a questão do Plano Municipal. Esse é um estudo que nós fizemos com base em um trabalho muito lindo, que é o Plano Municipal de Acessibilidade da Espanha. O Plano Municipal de Acessibilidade deverá ser concebido para dotar tanto os cidadãos em geral, como aqueles que atuam diretamente sobre as condições de acessibilidade, de ferramentas que lhes permitam atuar sobre o mundo nessa ótica da acessibilidade. Nós imaginamos que, se estamos todos sem unidade de raciocínio, precisamos ter alguma coisa que oriente a todos nós para a questão da acessibilidade. A acessibilidade se processa no espaço. Portanto, no planejamento do território, seja urbano ou rural, a quem compete administrar esse espaço? É ao Município. Então, a Federação dá uma regulamentação geral, ampla, mas na instância do Município é que a gente pode ver qual é a especificidade de cada espaço. Uma cidade onde se tem muitos morros, muitos declives; uma cidade onde se tem áreas com muitos rios, com um transporte baseado basicamente no transporte fluvial; uma cidade histórica, cada uma tem sua característica e isso precisa ser considerado individualmente pelos cidadãos que vivem nelas.

A adequação das áreas urbanas às necessidades especiais em acessibilidade deve ser conduzida pela orientação das premissas, dos mecanismos legais, e diretrizes estabelecidas nas políticas urbanas locais, incorporadas a estratégia de desenvolvimento urbano municipal. Eu estou lendo por conta do data show. Eu acho que foi feita aqui uma crítica importante. A gente não pode trabalhar imagens sem considerar que tem algumas pessoas aqui no auditório que não as estão vendo. Aqui nós temos duas imagens, que são dois planos que foram trabalhados na minha região: é o Plano de Acessibilidade para o Sítio Histórico de Olinda e o Plano de Acessibilidade da Cidade do Recife. O que seria esse plano de acessibilidade? A principal ação desse Plano de Acessibilidade seria uma campanha geral de conscientização em que seria criado um projeto de mídia para sensibilizar e divulgar os conceitos de uma cidade acessível a todos. A idéia é criar uma campanha voltada aos cidadãos, dando enfoques gerais sobre o tema e promovendo a participação e o envolvimento de todos com o problema. Quer dizer, se a população local não se envolver, nós não vamos ter um plano real, um plano que possa ser aplicado. Além disso, seriam criadas campanhas complementares informando sobre a existência de uma normativa a ser cumprida e de conscientização da existência da acessibilidade aos produtos como fator de qualidade. Acessibilidade é uma melhoria do espaço urbano para todos. Tudo o que contempla a questão da acessibilidade melhora a questão do uso para todas as pessoas; não só para o usuário de cadeiras de rodas, não só para a pessoa cega, não só para a pessoa idosa, mas melhora para todos. E depois, há a difusão das vantagens para toda a população no sentido de dispor de bens, serviços, espaços, edifícios, meios de transporte e sistema de comunicação acessível.

As fotos dos slides mostram um ônibus com desenho universal, onde você tem um usuário de cadeira de rodas saindo de um ônibus, e, ao mesmo tempo, duas senhoras também descendo do ônibus. Aqui também tem a questão da campanha de mídia. Esse foi um trabalho que a gente fez no início de 2003, relativo ao respeito às diferenças. É assim que começa a cidadania. Essa foi uma campanha para um jornal, para um outdoor, que é muito pequena frente ao que a gente precisa fazer nesse país.

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A segunda atitude do Plano seria sensibilizar e formar. Para sensibilizar, seriam realizados seminários com a finalidade de conscientizar os técnicos do Município quanto à necessidade de analisar os projetos. A gente tem que barrar a forma incorreta de se projetar já na aprovação de projetos. Se a gente não tem dinheiro para reformar o que existe, pelo menos que não deixemos que esses projetos saiam errados. Se a gente começar barrando logo o projeto, ou, então, conscientizando o técnico a fazê-lo correto, a gente vai começar, a partir de hoje, pelo menos, a trabalhar a questão da acessibilidade muito mais tranqüilamente. E precisamos também realizar cursos de capacitação para instrumentalizar os profissionais, de uma maneira geral, e não só os técnicos do Município, para que eles contemplem a questão da acessibilidade de uma maneira ampla.

Como terceira ação, teríamos que propor um Plano Municipal com o objetivo de tornar acessíveis os espaços da cidade, de maneira gradativa. A gente não vai conseguir pegar uma cidade já realizada e acessibilizá-la de uma vez só, mas a gente vai criar prioridades nesse plano para que as ações sejam feitas. Vão dizer que “não se pode fazer!”. E nós vamos replicar: “É possível sim; não tem como não poder!”. Esse é um desafio que a gente tem que assumir. Por quê? Porque não deve prevalecer o comodismo daqueles que dizem que não pode. É possível sim! A gente pode muito mais. Seria uma questão de avaliar as condições da cidade e tentar implantar a acessibilidade de maneira gradativa.

A quarta ação seria criar a Comissão Permanente de Acessibilidade, ou Comissão com qualquer outro nome que se queira dar, para que haja uma centralização das ações da acessibilidade no Município. Isso precisa ser feito, pois tem um grupo trabalhando de uma maneira, outro trabalhando de outro jeito, outro trabalhando de outro e isso não pode acontecer.

E por fim, teríamos que implantar rotas acessíveis. No momento em que implantamos um plano desses a gente tem que fazer uma rota, priorizar alguns percursos que deverão ser implantados em curto prazo, tendo em vista proporcionar à comunidade o efeito demonstrativo das ações do Município com relação ao trabalho de acessibilidade proposto. Aqui nós temos duas fotos. Tem a foto de um Plano de Acessibilidade de Olinda, que a gente já começou a implementar. Foi o Ministério das Cidades que financiou uma parte desse Plano. E tem um plano que a gente fez para Petrolina. Foi um trabalho feito em parceria com as entidades de pessoas com deficiência e os técnicos. Eu espero que esse trabalho seja realizado.

Por fim, a consideração final que podemos fazer aqui é que “a humanidade só encontrará a paz que deseja, quando todos os homens puderem fruir os melhores frutos da civilização”. Essa é uma frase do Edgar Graeff, um arquiteto goiano. Eu espero que, com isso, a gente consiga começar a trabalhar. É possível sim; a gente vai ter que fazer e vai poder fazer.

Finalmente, aqui está, para quem se interessar, meu contato via endereço eletrônico “ [email protected]

Muito obrigada!

ACESSIBILIDADE COM ÊNFASE NOS TRANSPORTES

Ângela Costa Werneck de CarvalhoRiotrilhos

Bom dia!

Há 14 anos milito nessa área, mas eu só consegui até agora ter uma tese com papel escrito sabendo o que tem que ser feito. Então, eu fico me questionando porque acho que eu não soube falar. Eu tive uma deficiência qualquer na fala, porque eu não falei as palavras certas para convencer, para conseguir implementar o que tem que ser feito. Eu não devo ter ouvido direito o que as pessoas ansiavam, porque eu não consegui chegar a elas. Eu não devo ter tido braços, agentes,

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compatibilizadores suficientes para conseguir reunir as pessoas e implementar essa acessibilidade. Eu não tive pernas suficientes para andar rápido o suficiente para conseguir implementar essas idéias. Então, eu me solidarizo com vocês nessa luta.

Antes de tudo, quero agradecer à Izabel, à CORDE, ao CONADE, ao INMETRO e à ABNT pela oportunidade de eu estar aqui. Eu vou dedicar essa minha palestra àqueles que são excluídos diariamente, não só do direito de ir e vir, mas do direito à vida, pela nossa imaturidade, de todos nós, seres humanos, mas que somos tão crianças evolutivamente.

Então, eu vou começar falando daquilo que nós já sabemos em termos de transportes. Nos grandes centros urbanos, altos custos sócioeconômicos são impostos à população por congestionamentos de trânsito, acidentes, longos tempos de viagem casa-trabalho, ausência de hierarquia e integração dos meios de transporte. Com o predomínio do modo rodoviário e a subutilização dos de alta capacidade, como metrô, trens e barcas, as pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, integrantes da sociedade, ou do universo da população, que somos todos nós, sentem esses problemas de forma amplificada e encontram grandes dificuldades em seus deslocamentos, apesar da existência de legislação garantindo seu direito de ir e vir.

O que impede grande parte desse segmento de acessar os direitos fundamentais de qualquer cidadão? Educação, saúde, trabalho e lazer, como já falaram a Dra. Sandra e a Dra. Ângela. Então, pessoas de baixa renda, em sua maioria, são freqüentemente submetidas a situações humilhantes e até agressivas, sobretudo no sistema de transporte por ônibus. Hoje em dia estão em desenvolvimento excelentes políticas nacionais. Por exemplo, uma proposta de reformulação global, “Brasil acessível”, e uma outra de priorização e subsídio ao transporte público, que é o Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos “ MDT. O Programa Interligado e o ATENDE, de São Paulo, são complementares e têm em suas soluções exemplos de como se pode reordenar uma grande cidade.

No Brasil, segundo dados atualizados no ano de 2003, há 23 Municípios que despontam com soluções para o transporte acessível, porém em diferentes níveis de implementação e técnica. Dessas grandes diferenças que a gente nota nesses 23 Municípios, dos quais sobressaem Belo Horizonte, Curitiba, Franca, Porto Alegre e São Paulo, em ordem alfabética, deduzimos a falta da aplicabilidade dessa Política Nacional de Transportes que unifique e interligue as atuações dos poderes públicos (municipal, estadual e federal) e o setor privado, que tem que estar em parceria, compartilhando responsabilidades, o que garantiria o acesso e deslocamento contínuo do universo de todos nós.

Então, qual é o objetivo do que eu pretendo apresentar? Reorganizar um sistema de transporte público, tornando-o acessível e integrado, permitindo a inclusão do universo da população que, tendo sua mobilidade assegurada pelos meios de transporte, passa a usufruir desses direitos fundamentais.

Tecnicamente, o que é a cadeia de transportes? A cadeia de transportes significa acesso e deslocamento contínuo. Uma viagem só é possível se o usuário consegue realizar todas as etapas da cadeia de transporte: pré-viagem, acesso ao ponto de parada ou ao terminal, espera do veículo, viagem propriamente dita, transferência entre modos e acesso ao destino. O foco do que eu vou falar são os pontos de parada em terminais e estações, onde há embarque e desembarque de usuários. Como eu já falei, esse binômio “ acessibilidade e mobilidade “ são vitais para o transportes, ou seja, para a mobilidade da gente, para a garantia da circulação de pessoas e bens. Para que essa circulação seja para todos, há que se dispor de ambiente acessível, como a Ângela mesmo já falou e nós todos já sabemos. O que é acessível, então? É o que permite acesso e deslocamento contínuo das pessoas, mas, principalmente, o que agrega o conceito do desenho universal para o universo da população. É isso que eu quero que vocês tenham focado em mente.

A origem remonta à década de 60, no início da luta pela vida independente, em que pessoas com deficiência severa saíram dos hospitais onde estavam, foram para as ruas e ficaram três dias acorrentados, falando assim: “A gente é que tem que decidir o que a gente quer”. A partir daí, passou a existir uma vida independente, havendo uma evolução da assistencialidade para a cidadania, e, em

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conseqüência disso, veio a acessibilidade ao meio físico e o desenho universal. Então, a gente tem que construir as coisas acessíveis.

Quem somos nós, afinal de contas? Será que somos apenas indivíduos porque o meio urbano é todo ele projetado para pessoas na plenitude física, com estatura média de 1,80m? O quanto isso significa na nossa realidade? Se nascemos de mulheres grávidas, se já fomos crianças, se já fomos pessoas, se somos pessoas também na plenitude física, se já fomos adolescentes... Muitos de nós engessou uma perna, engessou um braço, não conseguiu acessar nada. São as pessoas que têm a deficiência ou mobilidade reduzida mesmo, são os obesos, e, no mínimo, a gente envelhece...

Eu estava vendo numa reportagem na Revista Exame, que mostrava que hoje oito por cento (08%) dos países do mundo têm vinte por cento (20%) da população com 65 anos de idade. No ano de 2050 vai ser quase a totalidade do nosso planeta com pessoas com 65 anos de idade.

Em termos de transporte, para que o universo da população tenha a garantia do seu deslocamento, ele tem que ter pontos chaves acessíveis. Um deles é o entorno. Isso vai depender da municipalidade e do trabalho de uma comissão permanente de acessibilidade, que são as ruas, as travessias, o ponto de parada, o terminal, ou a estação propriamente dita, o local de compra de bilhetes, os equipamentos de controle de acesso, distribuição de usuários em grandes desníveis, o local de espera, o local de desembarque, a interface entre o terminal e o veículo, porque normalmente esse terminal de espera e o local de embarque e o veículo propriamente dito são coincidentes. Isso tudo tem que estar acessível. E, nós também precisamos de coisas complementares. Não é que isso vá substituir o que eu já acabei de falar, mas são coisas auxiliares; monitoramento e equipamentos auxiliares. O advento tecnológico necessita ter sua adoção acompanhada da intensificação da informação. O sistema de transporte público deve prover e manter agentes habilitados para atuar tanto na operação regular, quanto nas anormalidades do sistema. Essa é uma função complementar, tão importante quanto a garantia de ambientes acessíveis em que esses equipamentos auxiliares são necessários.

Nesses slides, há três imagens. Uma delas é de um pequeno ônibus, tipo o que tem aqui nesse centro, que ajuda a deslocar as pessoas quando os terminais são muito grandes. É preciso ajudar a fazer esse deslocamento com esses mini-ônibus, mini-carrinhos para que ele seja mais rápido. A segunda é a imagem de uma pessoa monitorando, colocando uma pessoa de idade numa cadeira de rodas. O problema é que, às vezes, o terminal é grande e uma pessoa de idade não consegue andar. Então, ela precisa dessa ajuda, dessa monitoria. E a terceira imagem é uma pessoa num terminal intermodal da Holanda, fazendo o monitoramento de uma pessoa cega para saltar do trem. Então, essas são coisas complementares, mas tudo tem que ser trabalhado junto.

Uma outra coisa é que não adianta a gente ter apenas um só meio de transporte acessível. A gente precisa ter todos os meios de transporte acessíveis, e, além disso, é preciso que eles estejam integrados. A integração modal significa que o funcionamento integrado do sistema de transportes é vital. Um sistema tem que ser integrado com o outro. O universo da população é beneficiado com uma operação conjunta de todos os serviços, públicos ou privados, porque isso elimina a superposição, por exemplo, de duas linhas (metrô paralelo e ônibus); possibilita a transferência eficaz e confortável entre esses meios de transporte; estende a disponibilidade desse serviço e melhora as condições de acesso e as condições viárias também.

Eu vou mostrar agora três slides sobre o diagnóstico atual. Aqui eu estou mostrando o entorno de pontos de parada e de terminais em que há necessidade de atuação, não só nas ruas principais, mas também junto aos pontos de embarque e junto aos terminais rodoviários. A ausência de sinal ou tempo de sinais curtos demais em relação às travessias perigosas e às calçadas e rampas inexistentes ou inclinadas demais dificultam e resultam na descontinuidade de acesso e deslocamento seguro para todos.

Nestas imagens aqui eu estou mostrando uma pessoa em cadeira de rodas. É a Ana Cláudia, que foi voluntária e que hoje trabalha com a Georgete Vidor no Rio. Ela foi voluntária, apesar de saber das condições do Rio, que talvez seja a metrópole de pior situação em termos de transportes no Brasil. Nós vemos a Ana Cláudia aqui, tentando atravessar a rua, sendo ajudada por uma pessoa que se preocupou com ela, porque apesar de ter um guarda, apesar de ter sinalização, e ter o sinal, houve uma

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pessoa que a acompanhou porque ficou preocupada. Aqui, no slide seguinte, vemos o João Gabriel sendo ajudado a atravessar uma rua. O segundo slide mostra a inexistência de calçada para você chegar até o Terminal Novo Rio. No outro slide é a Ana Cláudia tendo que se deslocar no meio da rua porque ela não conseguiu acessar as calçadas para chegar até o ponto onde ela ia embarcar. No momento seguinte, vemos a Ana Cláudia sendo ajudada numa rampa que está mal resolvida, para conseguir sair daquela calçada do ponto onde ela saltou. Aqui é exatamente num ponto de parada. As fotos mostram a dificuldade de todos nós. O primeiro slide mostra uma pessoa comum, uma pessoa na plenitude física tendo que se esforçar para conseguir entrar no ônibus. No segundo, é uma pessoa também na plenitude física, mas tendo que se segurar e tendo que se equilibrar para conseguir entrar no ônibus. No terceiro, é uma pessoa de idade que só consegue entrar no ônibus por etapas. Primeiro, ela põe o pé sobe o primeiro degrau e põe a sacolinha dela no piso do ônibus; no segundo slide, ela pega a sacolinha, e, na quarta etapa, é que ela vai conseguir sentar. E isso se o ônibus estiver parado, porque hoje ainda tem o problema da bilhetagem eletrônica, que é necessária, mas está sendo mal implantada, porque os motoristas estão ficando sobrecarregados e, por esse motivo, estão agindo com muito mais impaciência. Eles precisam cumprir um horário; então, eles tornam-se mais impacientes e a qualidade do serviço fica pior ainda. Na parte debaixo, vê-se também toda a dificuldade da Ana Cláudia na tentativa de conseguir entrar num ônibus que interliga os aeroportos do Rio e as principais rodoviárias no Rio. Esse é um ônibus que deveria estar acessível; deveria ter piso baixo, estar com o embarque em nível adequado, etc. Ela não conseguiu entrar porque, além de não lhe ser ofertada acessibilidade nem a gratuidade, as roletas são colocadas logo na entrada do ônibus.

Então, esse foi o diagnóstico do Rio, na parte de veículos, quanto à aplicabilidade dos princípios do desenho universal e do correto monitoramento do sistema de transporte público. Esse foi o diagnóstico no Rio, mas acho que isso acontece de uma maneira generalizada no Brasil. Com algumas exceções, verificou-se que o modo rodoviário versátil, podendo ser a principal ligação entre o transporte complementar e o de alta capacidade, não está equipado nem com frota, nem com pessoal habilitado para dar a necessária qualidade à prestação dos serviços para o qual receberam a concessão.

Os modos metroviário e ferroviário de alta capacidade estão paulatinamente sendo equipados com frota, assentos preferenciais e locais específicos para pessoas que usam cadeira de rodas e pessoal habilitado, de acordo com a NBR 14021, de 2005, que foi uma revisão. E o modo aquaviário, também de alta capacidade, tem, na interface terminal/ embarcação de pequeno porte, de navegação fluvial e de interior, o maior desafio para elaboração da norma que nós agora estamos começando a elaborar. A CORDE está participando, a ANTAQ, a Marinha, o INMETRO, estão todos participando dessa elaboração e a gente está contando também com a ajuda dos Institutos de Pesos e Medidas do Brasil inteiro para fazer um levantamento da situação do País em termos de terminais e embarcações para que a gente avance no que se propõe, no que a gente quer, e também para que essa norma reflita a nossa realidade.

Então, o que a gente precisa fazer nos pontos chaves em termos de desenho universal? No entorno, é fazer a aplicação da NBR 9050, como a Ângela falou. A municipalidade tem que agir nisso. No caso do entorno, em relação às condições mínimas de pontos de parada e de terminais, devem ser implantadas: a rota acessível externa, com travessias sinalizadas e seguras e rampas nos cruzamentos das ruas com faixa mínima de 1,20m livre de circulação, equivalente ao espaço necessário para uma pessoa em cadeira de rodas e outra pessoa do lado.Para os pontos de parada há que se prever local para cadeira de rodas, e os terminais têm que ter os pontos todos devidamente acessíveis “ os acessos, as áreas essenciais, os locais de compra de bilhete, os equipamentos de controle de acesso, circulação, grandes desníveis etc. São aqueles pontos chaves de que eu já falei.

Aqui, nós estamos vendo a informação tátil e balcões, tudo preparado dentro dos terminais para pessoas com deficiência. Em relação à interface do modo rodoviário, eu estou mostrando aqui um slide que mostra um ônibus de piso baixo com sistema de ajoelhamento. Nesses outros dois slides, mostramos o sistema de Curitiba, que faz o acesso em nível, e o sistema em uso na Colômbia, que tem o ponto de ônibus elevado. Este slide mostra o que é necessário para você ter acessibilidade no sistema

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metroviário, justamente nesta parte da interface. Enfim, esta interface e os pontos chaves deverão estar acessíveis.

Eu gostaria de finalizar com este slide para mostrar como é que os veículos devem ser acessíveis: eles devem ser identificados interna e externamente com o símbolo nacional de acesso; o piso deve ter superfície regular e antiderrapante; devem disponibilizar assentos preferenciais para pessoas com deficiência, identificados por gráficos e também para pessoas com cadeiras de rodas. É recomendável que esses locais sejam padronizados para facilitar a circulação das pessoas com deficiência visual e para elas se localizarem nesses veículos. Em todos os meios de transporte os veículos devem ser dotados de sinalização sonora e luminosa para indicar fechamento de portas, lado de desembarque e indicação de próxima estação, pois essa sinalização sonora é a segurança do usuário para saber se tem tempo ainda de embarcar ou não.

Finalmente, os três slides finais. A base do trabalho no transporte é o Decreto nº 5296, a Lei nº 10.048 e a Lei nº 10.098, mas o que está faltando também no modo de transporte é a elaboração do modo aquaviário. Um levantamento que está sendo feito pelos IPEM’s mostra que temos que promover campanhas de informação, reforçando o que a Ângela disse sobre esses avanços tecnológicos. É necessário um esclarecimento e constante monitoramento, para garantir compreensão e absorção dos novos conhecimentos, correta utilização desses equipamentos e a potencialização da inovação tecnológica. É importante a disseminação e a informação com cartilhas para todos. Isso é o que ajuda também a independência do universo da população. Nós brasileiros já temos conhecimento técnico para fazer a opção de mudar o sistema de transporte público, tornando-o de qualidade, visando mais igualdade e inclusão para o universo da população, idealizado no desenvolvimento inclusivo, eficaz na superação da exclusão social e na erradicação da pobreza. Ou, então, podemos deixar que essa questão continue sendo alvo de noticiários pelo alto índice de acidentes fatais, fabricando pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, persistindo a exclusão e estranheza.

Esse slide mostra uma criança diante dos degraus de um ônibus, para o qual ela está olhando como se dissesse assim: “O que é isso?” Somente quando todos nós tivermos o transporte público brasileiro de qualidade, com o seu desenho universalizado e integrado, é que os hoje excluídos, anônimos, terão direito à vida. Nós e todos os que se solidarizam na luta por um mundo mais igual e inclusivo poderemos sentir que fizemos nossa parte, cumprimos nossa missão e estaremos em paz.

Acessibilidade: nós todos temos compromisso!

Muito obrigada!

Cláudio VerezaDeputado Estadual – Moderador

Gostaria de agradecer à Dra. Ângela Werneck por sua contribuição a esse debate. Nós temos ainda o debate do plenário e as palavras finais das debatedoras, mas eu ainda tenho que fazer um breve comentário sobre as duas palestras aqui realizadas.

Gostaria de lembrar, inicialmente, que, lá no início, em 1980, a gente olhava o tema acessibilidade só para os cadeirantes, no máximo para os muletantes. Hoje, a gente debate acessibilidade envolvendo todas as áreas de deficiência, e, inclusive, os que não tem deficiência, mas que têm mobilidade reduzida. Então, nós estamos aqui debatendo um tema bem amplo.

Sobre a palestra da Dra. Ângela Carneiro, eu enfatizaria a importância de nós interferirmos junto aos Municípios no que se refere à elaboração do Plano Diretor Urbano, que os Municípios têm que concluir até o final desse ano. O Plano Diretor Urbano tem que contemplar todas as questões relativas à acessibilidade, e, além dele, como conseqüência dele, há que se cobrar dos Municípios que elaborem o

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seu Plano de Acessibilidade. A Dra. Ângela abordou muito bem isso. Esse Plano de Acessibilidade tem que envolver as mais diversas entidades, a sociedade civil como um todo, o CREA, o Ministério Público, enfim, todos os órgãos com interesse nessa causa.

A Dra. Ângela falou ainda que tudo isso tem que ser precedido, ou seguido, por campanhas de conscientização do conjunto da população, porque, sem o conjunto da população conhecer essas questões muitos problemas vão ocorrer. E, ainda, que não se lute apenas pela implementação das medidas, mas que se crie uma comissão Permanente de acessibilidade, que, permanentemente, cobre e monitore quais as medidas implementadas e as próximas que possam ser implementadas.

Ela ainda lembra que não há proibição para a garantia da acessibilidade em prédios do patrimônio histórico. Então, já há uma norma do IPHAN, que é o órgão responsável pelo patrimônio histórico, dizendo que são garantidas medidas para a acessibilidade, inclusive nos prédios tombados, nos prédios considerados históricos.

Na palestra da Dra. Ângela Werneck, chamou-me a atenção sua observação de que apenas 23 Municípios têm medidas mais ou menos razoáveis para garantir a acessibilidade no transporte coletivo. Isso acontece em apenas 23 Municípios, sendo que nós temos mais de 5.000 neste país. É gritante esse dado! Na área de transporte coletivo as coisas chegaram a algumas capitais e não estão chegando aos rincões, não estão chegando ao Brasil real, embora as capitais sejam reais também.

Ela abordou também a questão da cadeia do transporte. Quando a gente fala de acessibilidade ao transporte, normalmente a gente se lembra apenas do ônibus adaptado, do ônibus com elevador ou do trem ou do metrô e se esquece que há todo um conjunto, toda uma cadeia, desde a casa até o ponto de chegada. A reflexão já feita aqui anteriormente sobre o desenho universal, o desenho arquitetônico e do transporte tem que abarcar todas as pessoas, independente da condição dela. Esse desenho é universal, portanto, é para todo o ser humano. É diferente daquele modelo anterior da arquitetura, onde a engenharia e a arquitetura trabalhavam sobre um padrão médio de ser humano. Tinha até o desenho antropométrico desse padrão, o modular. O homem padrão era macho, branco, de altura média, não era gordo nem muito magro. Esse era o padrão e os que fugiam dele estavam fora. O desenho tem de ser universal, para todos e todas.

Ela ressaltou a importância das medidas complementares, como o monitoramento e os equipamentos auxiliares. E há ainda a questão da integração entre os modais. Quase sempre nós só nos lembramos dos ônibus, esquecendo que muitas cidades já têm metrô, transporte ferroviário, transporte aeroviário, transporte hidroviário etc. Isso já existe em muitas regiões do país. Ainda que o Decreto nº 5296 fale em prazos para a implementação, que começarão a contar em breve, quando as instruções estarão baixadas na área federal. Essas instruções e normas são para a fabricação de veículos de transporte coletivo e para a garantia da acessibilidade. A partir daí, começam a contar prazos para a fabricação e para a garantia da acessibilidade, no conjunto da cadeia.

Um último comentário é que no Decreto nº 5296 às vezes passa despercebido que o seu artigo 2º coloca uma série de condicionantes para que os projetos sejam aprovados “ tanto projetos de implementação, como projetos de captação de recursos, de financiamento. Já foi dito isso aqui, mas eu quero enfatizar. Isso se refere não só a financiamentos nacionais, como a financiamentos internacionais. Os governos não podem aprovar financiamento e implementação de projetos que não garantam a acessibilidade universal. Isso é seriíssimo e fundamental. O Banco Interamericano, o Banco Mundial, o FMI, o BNDES e os Bancos de Desenvolvimento Estaduais, nenhuma dessas organizações pode ter projetos de financiamentos aprovados sem que se garanta a acessibilidade. O Ministério Público e nós todos temos que ficar ligados nisso. Devemos cobrar que isso seja respeitado e garantido, porque, se não vão ser aprovados projetos para melhoria da cidade, para urbanização da cidade, maravilhosos projetos de transporte coletivo, mas sem que a acessibilidade seja garantida. Portanto, são projetos para uma parte da população apenas, e não projetos universais.

Encerro meus comentários aqui. Agora, passo a palavra para a Dra. Izabel conduzir o debate que vai ser feito agora com o plenário.

Obrigado!

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DEBATE – PERGUNTAS E RESPOSTAS

Dario Lopes CarneiroDelegação de São Paulo

Bom dia à Mesa!

Meu nome é Dario Lopes Carneiro. Eu sou do Conselho Estadual de São Paulo.

A minha colocação é para a Dra. Ângela Carneiro da Cunha e ela é no sentido de que as grandes construções pouco se têm lembrado das pessoas com dificuldades, portadoras de deficiência. Eu queria lembrar um fato relativo ao metrô de São Paulo. A linha norte-sul completou 31 anos e o Conselho Estadual fez a vistoria sobre acessibilidade, no ano de 2001. Em nenhuma estação da norte-sul tinha elevador. Em 2004 foi implantado elevador na Estação Armênia. Na estação República todo o fluxo de transeuntes se dirige para a Rua 7 de Abril e para a Barão de Itapetininga, mas colocaram o elevador para portadores de deficiência do lado do Lago do Arouche, ou seja, para onde não vai quase ninguém. Na Estação da Consolação, todo o fluxo de pessoa está direcionado à Paulista. Contudo, o elevador de portadores de deficiência foi construído duas ruas depois da Rua Augusta, aonde não vai ninguém. Concluindo, quando é feita a obra pública os cidadãos interessados não são consultados, as camadas mais interessadas da população não são consultadas.

Eu discordo da colocação da segunda expositora quando ela apresenta como justificativa os altos custos econômicos, pois as obras são realizadas assim mesmo, sem que se leve em conta as pessoas com dificuldades locomotoras. As decisões são políticas e são exclusivas; elas não são inclusivas. Essas obras hoje obedecem a critérios políticos. Hoje em São Paulo, virou um canteiro de obras: metrô para todo o lado, o governo estadual lá é do PSDB, e o PSDB tem candidato à Presidência da República. Então, essas obras - concluindo, mais uma vez - elas são políticas.

Muito obrigado e boa tarde!

Ronaldo Correia AlmeidaDelegação do Espírito Santo

Boa tarde a todos!

Meu nome é Ronaldo, e, como foi dito, eu sou do Estado do Espírito Santo.

Eu cumprimento a Mesa, na pessoa da Sra. Sandra, e gostaria de enfatizar a questão do Ministério Público como ferramenta para alavancar as políticas públicas para a população com deficiência. Ocorre que, na maioria das Faculdades de Direito do nosso país, a matéria de Direitos Humanos inexiste. No caso do Espírito Santo, nós fizemos uma solicitação ao Ministério Público, mais particularmente ao Município de Vila Velha, que interviesse em relação à empresa de telefonia para que ela fizesse a adaptação dos telefones para os Telefones de Utilidade Comunitária “ TUC e para que colocasse os aparelhos para cadeirantes. Lá no nosso Município, isso não existe. Esse processo já está no Ministério Público há dois anos. Então, é fundamental também que o Ministério Público e outras instituições em que nós vamos buscar nossos direitos tenham consciência e saibam também a problemática da pessoa com deficiência.

Em relação à questão da urbanidade, eu gostaria de saber também se nas Faculdades de Arquitetura essa questão é ensinada, porque, no nosso Estado, foi construído um Centro de Referência e

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nós verificamos a necessidade de serem feitas algumas modificações. Nós fomos lá, falamos com os engenheiros, falamos dessas questões e elas não foram levadas em conta. Tanto é que o banheiro que do Centro tem certa limitação para o cadeirante passar. Então, como é que continuam fazendo essas obras de qualquer jeito? A gente procura as pessoas, procura os órgãos para buscar nossos direitos e ficamos sempre a ver navios, de certa forma.

Eu gostaria de agradecer por participar desse evento e me sinto muito orgulhoso de estar aqui representando o meu Município e o meu Estado.

Obrigado!

Participante não identificado:

Gostaria de saber se a Sra. Ângela Werneck poderia nomear os 23 Municípios citados em sua fala.

Ronaldo Tavares

Em relação ao Decreto das pessoas com deficiência, falta uma maior divulgação junto aos meios de comunicação de massa, visando a conscientização da sua importância.

Fernando Muniz

A garantia de fazer valer junto ao Poder Executivo os direitos do deficiente e reconhecer o conselho como ele é juridicamente e não como uma associação.

Adão ZanandreaDelegação do Rio Grande do Sul

A minha saudação à Mesa e à plenária. Eu quero dirigir minha pergunta à Dra Sandra. O Brasil tem acompanhado o relevante papel que o Ministério Público tem exercido para a transparência das políticas públicas. Mas, parece-me, Dra Sandra, que hoje, talvez pela falta de tempo, ouvimos as barreiras mais físicas, arquitetônicas e não muito as barreiras em relação aos serviços, aos direitos do cidadão à saúde, à educação, enfim, todos aqueles direitos da cidadania plena. Nesse ponto, parece que a atuação do Ministério Público foi um pouco contemplativa. Eu queria fazer uma pergunta em relação aos concursos. Eu atuei como estagiário, ou voluntário, por mais de 38 anos, na condição de servidor público, no sistema público de emprego. Será que a grande dificuldade das reservas de vaga nos concursos e na iniciativa privada não é um pouco falta de informação? E como o Ministério Público se sente em relação ao Judiciário? Hoje, quando um cidadão é lesado nos seus direitos, ele é condenado a uma prestação de serviço ou uma cesta básica ou até pecuniária. Uma Promotora até me disse há pouco tempo: “Eu me sinto uma quitandeira atrás de um balcão dando um cacho de banana, condenando ao pagamento de um cacho de banana ou maçã”. Eu acho que falta alguma coisa mais impositiva.

Maria Laudicéia Silva de OliveiraDelegação do Amazonas

Bom dia a todos os delegados aqui presentes e bom dia à Mesa!

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Falou-se muito em acessibilidade, em transporte coletivo, mas tratou-se somente de transporte terrestre. E, nós, do Amazonas, que estamos aqui? Somos 17 Delegados do Amazonas e eu sou Presidente da Associação de Apoio aos Deficientes de Parintins. Eu estou aqui representando uma classe muito numerosa, pois no meu Município são 105.000 mil habitantes, sendo 15.222 deficientes. O que eu queria colocar é que se fala muito de transporte coletivo, mas fala-se menos no nosso transporte característico do Amazonas, feito por navios, barcos e canoas. Onde está a acessibilidade para os amazonenses? Nós também precisamos de acessibilidade nas embarcações, adequações nos grandes navios, nos barcos que transportam pessoas deficientes para levar até as escolas, no interior. Disso não se falou. A bem da verdade, nós somos esquecidos, ignorados. A acessibilidade não chega até nós. E nós estamos aqui requerendo esses direitos, requerendo também que a acessibilidade chegue até ao Amazonas. Nós precisamos ser vistos como cidadãos com direito de votar também, porque somos eleitores. Então, nós lá do fim do Amazonas estamos aqui necessitando do apoio do governo federal também. Um voto nosso, lá do Amazonas, também faz diferença. Nós somos diferentes, mas votamos.

Então, eu peço aqui que o Amazonas seja muito mais reconhecido e que pensem também não somente no transporte terrestre e aéreo, mas que pensem no transporte fluvial também porque da terra e da água também se vive. Lá no Amazonas o nosso transporte é assim. É disso que precisamos no Amazonas: que sejamos vistos também como brasileiros; nós precisamos e queremos saber onde é que está o modelo de transporte fluvial que nunca foi mostrado para nós.

Martinha Clarete dos SantosDelegação do Paraná

Bom dia a todos e a todas! Eu gostaria de expressar um pouco de preocupação, porque acho que numa conferência nacional não podemos admitir que a aplicação efetiva das leis em nosso país não tenha como ser cobrada e que tenhamos que nos conformar que nada pode ser feito nesse sentido. Eu acredito que tanto o Ministério Público quanto os conselhos municipais, fóruns de defesa de direitos de pessoas com deficiência, bem como todas as organizações do nosso movimento têm como papel fundamental a criação de mecanismos que garantam a implementação dessas belas leis que nós temos. E isso é possível de ser feito. E para sustentar essa tese, eu digo que em Londrina, através do nosso movimento organizado e juntamente com o Ministério Público local, construímos uma forma de participação no momento em que se deu o processo licitatório do transporte coletivo. Nós garantimos, nos termos da outorga do serviço, cláusulas que dizem que a cada compra de ônibus pelo menos trinta por cento (30%) têm que ser ônibus adaptados. Portanto, antes do Decreto nº 5296, Londrina já tem hoje vinte e sete por cento (27%) da frota comum adaptada e bem antes do prazo limite de 10 anos chegará a cem por cento (100%), graças ao nosso movimento. Então, é isso que nós temos que destacar nessa conferência e não ficar dizendo que não dá para fazer.

Ênio Rodrigues da RosaDelegação do Paraná

Eu quero provocar um pouco e começar pela fala do Cláudio. Por exemplo, a questão da legislação. Toda essa legislação que nós estamos vendo hoje, todos esses debates sobre ordem técnica e jurídica, na verdade estavam no bojo daquele movimento lá atrás. O que nós estamos fazendo hoje é, nada mais e nada menos, do que tentar recuperar aquilo que nós estamos debatendo neste país há 25 anos. Eu acho que o movimento das pessoas com deficiência está errando na sua estratégia. Por que é que eu digo que ele está errando na sua estratégia? Por que nós estamos deslocando todo o campo do enfrentamento político para a discussão técnica e jurídica e dando ênfase na questão técnica e na questão jurídica, em detrimento da luta política. O que eu quero dizer com isso? Não estou, de modo algum, dizendo que as questões técnicas não são importantes. Não estou negando, de modo nenhum, o reconhecimento de que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos das outras pessoas, segundo a

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Declaração da ONU de 1975. Mas, a própria Dra. Sandra reconhece os limites da aplicação da lei. O nosso problema no Brasil não é de falta de legislação; o nosso problema no Brasil “ e isso não é uma primazia do movimento das pessoas com deficiência, pois ocorre com outros movimentos “ é que eles abandonaram a luta política de enfrentamento e se incrustaram nos gabinetes da burocracia estatal, querendo, de dentro da democracia estatal, dar a direção para a sociedade civil. Eu acho que nós temos que inverter essa lógica. Enquanto nós não retomarmos a luta política do enfrentamento e do debate, esse movimento está cada vez mais fadado a ser um mero apêndice do Estado. Essa é a tese que nós temos que debater; é a tese que essa conferência está escamoteando e que nós precisamos pautar. Há questões do trabalho que são fundamentais; questões da educação estão ficando escondidas por trás de outras discussões que eu não estou considerando importantes. Portanto, eu acho que o papel do movimento hoje, a partir dessa conferência, é repensar a nossa estratégia de ação numa perspectiva política de enfrentamento, seja com que governo for, inclusive, com o governo do Partido dos Trabalhadores, ao qual eu sou filiado.

Jorge Luís Vieira CarvalhoDelegação do Pará

Eu quero dar um bom dia especial à plenária, aos delegados dos Estados e Municípios.

Primeiro, eu quero perguntar por que os Municípios do interior são esquecidos na parte da acessibilidade. Eu sou presidente de uma associação com 300 associados. Eu sou de Óbidos, no Pará, onde nós não temos cadeiras de rodas; não temos aparelhos auditivos, muletas, médicos especialistas para atender os deficientes. É uma dificuldade imensa. Nós não temos acessibilidade em ônibus, nós não temos acessibilidade em educação, nós não temos acessibilidade na saúde. A situação é muito difícil, até porque, quando os políticos precisam de voto eles batem em nossas portas, dizendo que vai haver acessibilidade, que os deficientes vão ser enxergados. Entretanto, o que já tem acontecido é de o deficiente ser jogado do ônibus, porque não apresentou o passe livre. Na Conferência Estadual realizada em Belém do Pará eu encaminhei dois deficientes para Belém e o Deputado Estadual Antônio Rocha os humilhou, de Óbidos até Belém, porque eles apresentaram o passe livre. Isso é uma falta de vergonha para nós que somos brasileiros.

Então, eu queria perguntar: até quando nós vamos ser esquecidos? Essa é a manifestação que eu queria fazer.

Muito obrigado!

Antônia Aparecida da Silva Delegação de Minas Gerais

Bom dia a todos!

Meu nome é Antônia Aparecida. Sou de Montes Claros, Minas Gerais. Eu gostaria de parabenizar a todos. É um prazer imenso estar aqui.

Quando o colega do Paraná disse que o problema está mais no nosso enfrentamento político, eu gostaria de enfatizar o que está acontecendo com os conselhos municipais. Eu sou presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Montes Claros, e nós dos conselhos municipais, nos sentimos muito enfraquecidos nessas nossas lutas. Muitas vezes, as nossas próprias deliberações não são vistas pela sociedade. Eu acho que esse é um processo que, às vezes, está começando de cima para baixo. Portanto, precisamos fortalecer o nosso movimento.

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Outra coisa é em relação ao transporte. Enquanto pensarmos que o transporte é muito oneroso jamais iremos conseguir realmente a sua acessibilidade. Enquanto nós aceitarmos paliativos esse transporte realmente não vai ser um transporte de qualidade e acessível a todos nós. Obrigada!

Valdecir MaiaDelegação do Pará

Nas regiões de Tocantins e Marajó predomina o transporte aquaviário e fluvial. Queremos modelos de transporte de navios, barcos e portos adaptados.

Maria Paula TeperinoDelegação do Rio de Janeiro

Bom dia!

Parabéns. Parabéns à Izabel, parabéns a todos vocês! Eu estou muito feliz de estar aqui encontrando antigos e novos companheiros. Na verdade, não é uma pergunta; é mais uma reflexão que deve servir tanto ao Ministério Público quanto às Ângelas que estão compondo a Mesa; as duas arquitetas. É o seguinte: depois do Decreto a gente tem um instrumento de cobrança, porque as prefeituras só podem dar alvará de funcionamento para construção ou reforma de locais de uso público desde que atendida a questão da acessibilidade. O Rio de Janeiro, de onde eu venho, continua lindo e inacessível e tem uma prefeitura que pouco está se mobilizando na questão da acessibilidade. Depois de dezembro de 2004 foram concedidos alvarás de funcionamento para diversos prédios de uso público sem que a questão da acessibilidade tenha sido contemplada. O Ministério Público do Rio de Janeiro tem uma limitação complicada, que é o fato de não ter uma coordenadoria especial para tratar da questão da pessoa portadora de deficiência. Ele trata conjuntamente da pessoa portadora de deficiência, da questão do idoso e da questão das pessoas com algum tipo de doença. Então, se eu fosse do Ministério Público e chegasse alguém precisando de um remédio para continuar vivendo ou de uma internação para uma cirurgia ou alguém pedindo uma rampa para entrar num cinema, talvez eu também me preocupasse, primeiro, com a questão da saúde, que é fundamental para o ser humano.

Então, a minha sugestão seria que os Ministérios Públicos Estaduais passassem a ter coordenadorias especiais para promover ações civis públicas contra as prefeituras que continuam desrespeitando acintosamente a questão da acessibilidade.

Com relação aos arquitetos, eu acho que o CREA tinha que ser mais enfático na obrigação e na criminalização desses profissionais que continuam a fazer suas plantas, os seus projetos, sem contemplar a questão da acessibilidade. Por duas vezes eu já conversei com alguns donos de empreendimentos no Rio sobre esse assunto. A dona de um restaurante “chiquérrimo” do Rio de Janeiro falou para a arquiteta: “Eu vou fazer um banheiro para minha amiga, que é deficiente, usar quando vier aqui!”. E a arquiteta disse: “isso é uma besteira. Você vai perder espaço!”. E trata-se de uma arquiteta “famosíssima” do Rio de Janeiro. E numa outra ocasião, em uma livraria no Rio de Janeiro, eu perguntei ao dono se iria ter acesso e ele me respondeu: “Vai ter sim. Está atrás dos elevadores. Serão dois pisos. Aliás, eu pedi para o arquiteto e ele me disse: “isso é uma besteira. Você vai gastar dinheiro à toa, porque ninguém vem aqui usar isso!”. E ele, o dono, falou: “Eu sou amigo do Marcelo Rubens Paiva e por isso quero botar o elevador !”.

Assim, eu acho que o empresário que faz a obra e contrata um escritório de arquitetura não é obrigado a entender de normas de acessibilidade. Todavia, o profissional que está sendo contratado é

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obrigado sim a não deixar o seu cliente ser processado por falta de acessibilidade. Eu acho que no dia em que esses grandes escritórios de arquitetura forem processados as coisas vão mudar. Precisamos cobrar uma ação mais sistemática do Ministério Público e do CREA nesse sentido.

Obrigada!

Vera Lucia Ruiz Rodrigues da SilvaDelegação do Paraná

Eu quero trazer algumas questões. É um escândalo o que vem acontecendo em todos os setores, tanto na saúde e na educação, pela falta de acessibilidade, de um modo geral. Há construções em que as rampas não foram previstas. Quando se cobra, a desculpa é que a rampa não foi prevista e tem que esperar terminar a obra para se fazer uma adaptação ali, que não ficará dentro das normas adequadas.

Em relação à educação, eu queria trazer a questão do cargo de intérprete de LIBRAS, no Estado do Paraná, que não existe no quadro dos servidores públicos das instituições estaduais públicas e das universidades públicas. Esse cargo de intérprete de LIBRAS nunca foi criado e a universidade não consegue fazer concurso, porque não tem o cargo. Há uma dificuldade enorme de contratação por teste seletivo, porque os intérpretes que estão na cidade estão trabalhando e não vão largar os seus trabalhos seguros para trabalhar via teste seletivo. Diante do problema, foi encaminhado um documento para a Casa Civil solicitando a criação do cargo. Desde outubro do ano passado esse documento está em mãos do Coordenador de Ensino Superior, mas não sai da gaveta dele e ele não dá nenhum encaminhamento. Isso é um descaso, pois à necessidade de Intérprete de LIBRAS nas universidades.

Evandro Dias SousaDelegação de Minas Gerais

Bom dia a todos!

Meu nome é Evandro e eu sou de Minas Gerais.

Eu gostaria de fazer algumas colocações rápidas. A primeira é sobre o Decreto nº 5296, que dispõe sobre a garantia de acessibilidade. Eu tenho um questionamento a fazer, porque o Decreto é um ato do poder Executivo e estabelece um prazo de 10 anos para ser garantida a acessibilidade em geral. O meu questionamento é a dificuldade de se poder, já na atual conjuntura, garantir a acessibilidade quanto a transporte, sabendo que esse prazo é longo e que a qualquer mudança de governo pode ser baixado um novo Decreto aumentando esse prazo. Eu penso que coisas dessa natureza deveriam ser garantidas por lei, cuja mudança é mais difícil, porque tem que ser apreciada pelo Congresso.

A outra questão é garantir a efetividade do direito. Nesse caso, eu acho que a gente tem que entrar no campo do pessoal que tem reclamado aqui da falta do respeito aos direitos e da mobilização da sociedade e das organizações. Eu acho que, enquanto representante de um segmento, a gente tem que ter a preocupação de que o governo, por si só, não vai buscar resolver o problema dos deficientes. Nós deficientes temos que fazer com que seja organizado o movimento na nossa localidade, com uma instituição forte, com uma associação que possa estar “correndo atrás” e lutando pelo respeito a esses direitos. E aí, entra a questão da co-responsabilidade na garantia dos direitos das pessoas com deficiência por parte dos diversos órgãos já existentes. Dentre eles, a gente ressaltou muito aqui o Ministério Público, mas temos também o Ministério do Trabalho.

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E outra questão que eu acho importante também é que haja, em cada local, um conselho forte, paritário, deliberativo para poder estar ali, em parceria com o governo, tratando de tudo isso que a gente está discutindo aqui hoje.

Tem muita coisa que deve ser resolvida em nível local; tem muita coisa que é obrigação do Município e tem coisas que são obrigação dos Estados e outras que são de responsabilidade do governo federal.

Penso que nós temos que sair daqui com a idéia de criar um conselho forte e deliberativo, uma associação forte, buscando também que esses órgãos que são co-responsáveis, como o Ministério Público, o Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho possam estar presentes, fazendo com que o movimento seja forte e respeitado.

Obrigado!

Adalberto da Silva SantosDelegação de Roraima

Bom dia a todos os companheiros delegados, conferencistas e demais membros da Mesa!

Minha manifestação não é tanto uma pergunta, mas, algumas explanações, causas de indignações por parte de nós conferencistas, delegados eleitos a participar dessa conferência.

Eu iniciaria aqui questionando a representante do Ministério Público, com a seguinte intervenção: por que somente se discute acessibilidade de forma técnica ou com um significado técnico? O Plano de Acessibilidade deve ir além de barreiras mobiliárias, arquitetônicas e de infra-estrutura Precisamos discutir direitos básicos, como educação, saúde, trabalho e lazer. O acesso a bens sociais nunca acontecerá se não educarmos os cidadãos quanto à garantia de seus direitos. Qualquer mudança sonhada só será possível se estiver fundamentada na educação como base dessa mudança. E, principalmente, por que promover acessibilidade sem quebra de paradigmas culturais, que somente percebem o visual e deixam de ver as barreiras culturais e humanas? Isso é impossível. Acreditamos que somente a educação é capaz de transformar a cultura da piedade que foi construída durante séculos.

Chega de medidas paliativas! O governo federal, a Justiça Federal e Estadual, a CORDE e o CONADE nos devem desculpas por todos os arranjos feitos para manipular a lei, a começar pelo local onde essa conferencia está sendo realizada, que é um local totalmente inapropriado.

Obrigado!

Cleidines Ribeiro ArruaDelegação do Mato Grosso

Boa tarde!

Eu sou do Mato Grosso e queria parabenizar todos que estão aqui, os delegados, o pessoal da Mesa, as pessoas que fizeram essa conferência. Faz 25 anos que estamos nessa luta. Nós, os deficientes de Mato Grosso - como os de todo o Brasil - queremos que se cumpra à lei. O problema é que não estão cumprindo a lei. Tudo o que está sendo falado aqui nós já sabemos. É preciso que se cumpra à lei, porque os deficientes já estão cansados. Eu estou nessa luta pelos direitos dos deficientes há mais de 20 anos e não parei porque ouço sempre a mesma coisa, falam sempre a mesma coisa e nunca se cumpre lei nenhuma. Eu quero que a lei seja cumprida.

Obrigado!

Janaína de Sousa AraújoDelegação de Minas Gerais

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Bom dia a todos os que compõem a Mesa!

Eu gostaria apenas de fazer um pedido para fazermos um pacto entre a plenária e os delegados que aqui estão e poder oferecer melhor qualidade e acessibilidade aos deficientes nas questões de transportes, educação e saúde, com o apoio de todos.

Obrigada!

Wesley Araújo da SilvaDelegação de Minas Gerais

Boa tarde!

Sou de Juiz de Fora e sou servidor público municipal. Eu queria deixar claro e conversar com a arquiteta a respeito da formação de novos profissionais e a necessidade das faculdades de arquitetura e engenharia estarem preocupadas com essa questão da acessibilidade.

No currículo da Universidade Regional de Juiz de Fora eu vejo que não há uma matéria sequer que cite a questão da acessibilidade. Outra preocupação que eu tenho é em relação ao CREA. A fiscalização das novas obras e das reformas não têm sido feitas. Isso é um absurdo, porque é um descumprimento total e frontal da legislação. Eu também sou advogado e entendo que o CREA deveria ter uma postura mais enfática em relação ao cumprimento das leis de acessibilidade.

Outra coisa é com relação ao poder público. Eu vou citar como exemplo a nossa Lei de Acessibilidade Municipal de Juiz de Fora, que até hoje não foi regulamentada pelo poder público Municipal. Não sei se é por falta de vontade política ou qualquer outra coisa, mas eu acho um absurdo uma cidade como Juiz de Fora, com 500.000 habitantes, existir uma lei que até hoje não foi regulamentada. Inclusive, essa lei é anterior à Lei Federal de Acessibilidade.

Eu queria, portanto, deixar claro que esse é um desabafo que eu estou fazendo, como morador da cidade de Juiz de Fora. Eu vejo que os órgãos públicos responsáveis pela fiscalização não estão tendo uma atuação eficaz no sentido de viabilizar a acessibilidade em nosso país.

Marcos de Paiva NunesDelegação de Minas Gerais

Bom dia a todos!

Eu sou da Universidade Federal de Juiz de Fora e estou aqui na conferência representando a Federação Brasileira dos Sindicatos das Universidades Federais “ FASUBRA.

Já foram mencionadas aqui questões relativas a cidades do Pará, Rio de Janeiro, Juiz de Fora e várias outras. A dificuldade que a gente tem em todas as nossas bases é geral. Até no caso de Brasília o Oscar Niemayer não fez a cidade para os deficientes. Já foi dito isso aqui e isso é verdade mesmo.

Mas, eu queria levantar a questão da acessibilidade de transporte. No artigo 38 do Decreto, que trata do transporte coletivo rodoviário, está dito que teríamos, a partir da publicação do Decreto, 10 anos para a implantação da acessibilidade do transporte coletivo. A minha preocupação é que aqui está dito que as normas técnicas de fabricação deverão ser feitas pelas instituições e entidades do Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, até 12 meses a contar da data da publicação desse Decreto. A partir dessas normas prontas e entregues às fábricas de ônibus, estas terão

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24 meses para passar a fabricar apenas ônibus com acessibilidade. Então, a minha preocupação é a seguinte: Essas normas já foram feitas? Eu vi desenhos ali de ônibus acessíveis. As normas já estão prontas e já foram entregues às fábricas de ônibus?

Uma outra preocupação que eu tenho é que os ônibus têm uma vida útil. Se eles tiverem 10 anos pra cumprir a lei, nós não podemos esperar 10 anos para começar a cobrar isso. Eu acho que isso tem que ser cobrado agora das fábricas. As normas técnicas têm que ser entregues às fábricas para começarmos a ter esses ônibus acessíveis daqui a 10 anos. Se a gente esperar 10 anos para começar a cobrar, isso vai demorar mais dez anos, porque empresário nenhum vai se desfazer de um ônibus que está na frota por que terminou o prazo.

Obrigado!

Valdir MacieiraPromotor de Justiça do Pará

Eu sou Promotor de Justiça de Belém do Pará.

Eu gostaria de reforçar aqui o papel do Ministério Público. Eu entendo que o Decreto nº 5296 é um ato administrativo, e, dessa forma, é considerado, formalmente, uma lei. A lei maior que rege essa questão do transporte coletivo é a Lei nº 10.048, que, no art. 5º, fala o seguinte: “os veículos de transporte coletivo a serem produzidos após 12 meses da publicação desta lei serão planejados de forma a facilitar o acesso ao seu interior das pessoas portadoras de deficiência”. A lei é do ano de 2000. Então, no meu entendimento, o prazo já venceu. Foi por isso que o Ministério Público em Belém, há dois anos, ajuizou uma ação civil pública exigindo a adaptação dos ônibus e das paradas de ônibus de Belém.

Eu acho que o Ministério Público já tem instrumentos suficientes para exigir essa acessibilidade para o transporte coletivo. Inclusive, esse processo já está em fase de sentença pelo juiz da 21ª Vara Cível de lá. Eu entendo que o Decreto nº 5296, nesse aspecto do transporte coletivo, é um retrocesso, porque ele estabeleceu um prazo de 120 meses, quando a lei é que deve prevalecer, nesse caso.

João Batista da Costa Delegação da Bahia

Bom dia a todos!

Eu sou de Feira de Santana, na Bahia. Gostaria de parabenizar esse plenário bonito e repleto, porque eu tenho certeza de que nós estamos todos aqui com o mesmo intuito. Eu gostaria de mandar um abraço especial ao pessoal da UFRJ, na pessoa do Sr. Antônio Borges, pela implantação e continuidade do projeto DOSVOX. Gostaria de enviar meus parabéns ao pessoal da UFRJ.

A minha pergunta é com relação ao Plano Diretor, cuja elaboração é uma obrigação das prefeituras até dezembro. As prefeituras já sabem disso? Isso é facultativo? Tem punição para quem não o fizer? Então, as minhas questões são essas. Se as prefeituras não fizerem nada em relação ao Plano Diretor, se não apresentarem até dezembro, o que vai ocorrer? Nós é que teremos que correr atrás? Creio que não! Eu gostaria de saber se eles já estão cientes disso.

Muito obrigado!

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Sandra de Oliveira JuliãoPromotora Pública do Distrito Federal

Eu acho que não vou conseguir responder cada pergunta, individualmente, por causa do tempo, mas imagino também que, falando em bloco, eu vou conseguir atender a todas as aspirações aqui colocadas.

Eu vou começar de trás para frente, pela colocação do meu colega lá do Ministério Público, até porque tem outras colocações nesse sentido. É a questão da crítica que eu fiz ao Decreto, quanto ao prazo que foi estabelecido para a renovação da frota de transporte coletivo. Enfim, a crítica em relação há esse prazo de 10 anos para que toda a frota de ônibus esteja acessível no Brasil. A crítica é justamente que o Decreto nº 5.296, em relação à Lei nº 10048/2000 concedeu um prazo muito maior, e, a partir daí, limitou a nossa atuação ainda mais, porque, antes do Decreto, já era difícil ajuizar uma ação civil pública. Eu não sei qual é o resultado da ação civil pública que o colega tem lá no Estado dele, mas nós ingressamos com uma, em conjunto com a Procuradoria da República, com relação à renovação de frota, inclusive de ônibus que fazem transporte interestadual, e a questão levantada foi justamente essa da regulamentação da lei e a discussão desse prazo. Então, nós ficamos limitados, porque, quando surgiu o Decreto nº 5.296, ele aumentou o prazo pra toda a renovação da frota. O Decreto concede um prazo de 10 anos para que toda a frota esteja renovada. Entretanto, isso se aplica somente à frota que já existe. Essa frota é que tem um prazo de 10 anos para ser renovada, respeitando o prazo da concessão e da permissão. Então, isso não significa que, quando a concessionária for renovar o contrato com o agente público, depois de terminado o prazo de concessão, esse novo contrato tem que ser feito já com base em ônibus acessíveis. A gente tem que fazer essa cobrança e podemos fazer. Não precisamos esperar 10 anos. O problema é que se houver um prazo de contrato de permissão de concessão com a vigência longa, durante esse tempo não podemos contestá-lo. Essa é a questão primordial.

Portanto, esse prazo de 10 anos é para a renovação da frota já existente, mas o Decreto nº 5.296 deixa claro que, no caso da fabricação de ônibus novos, eles têm 36 meses, a partir da data da publicação do Decreto, levando em consideração que as normas respeitariam o prazo de 12 meses para ficarem prontas. Essa questão que o Sr. colocou eu vou deixar para a Dra. Izabel responder, porque as normas estão para ficar prontas, e a partir daí as empresas teriam 24 meses para fabricar novos ônibus. Então, com relação ao prazo de 10 anos é aquilo que eu já falei aqui. Imagino que seja esse o esclarecimento.

Com relação à questão da legislação, eu imagino que a delegada Martinha não deva ter compreendido direito a minha colocação, até porque outras pessoas da plenária colocaram a mesma coisa que eu disse. A questão é só cumprir a lei, porque a lei existe. Então, se é tão simples assim é como se a gente não precisasse estar aqui na conferência, porque lei tem. O que eu quis dizer é que as leis não são auto-aplicáveis. É preciso que se faça alguma coisa quando a própria lei não cria instrumentos ou quando não há um decreto que regulamente a lei criando instrumentos para que ela seja colocada em prática. Alguma coisa tem que ser feita e se esses instrumentos não existem a lei fica apenas no papel. A gente sabe que isso é verdade, tanto que, o questionamento de vocês é justamente esse. Basta cumprir a lei.

As leis existem e é nosso trabalho fazer com que sejam cumpridas. Se eu acreditasse que não dá para fazer nada, eu não estaria nessa profissão de fiscal da lei. Então, eu acho que não foi entendido aquilo que foi falado.

Há uma pergunta aqui do Delegado Luis Maurício: Quais são as medidas tomadas contra as empresas de transporte e transporte alternativo aqui do DF em relação à acessibilidade?

Eu acho que isso está respondido no que eu falei com relação aos prazos da ação civil pública. A gente tem que aguardar os contratos de permissão vencerem para que se cobre que a frota seja acessível. Portanto, nós temos que ficar atentos com relação aos prazos de vencimento dos contratos e

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temos que aguardar o prazo de 24 meses após as normas ficarem prontas, para que os novos ônibus sejam fabricados de maneira a contemplar a acessibilidade.

Uma outra pergunta: Não falta uma maior divulgação junto aos meios de divulgação em massa, com relação ao Decreto de Acessibilidade? Eu acredito muito em informação. Eu acho que divulgar a lei é torná-la acessível a todas as pessoas, principalmente aquelas que não são operadoras do direito. Essa é realmente uma forma de tornar acessível o próprio direito.

Por conseguinte, é preciso divulgar o Decreto nº 5.296 de uma maneira mais esclarecedora. Eu acredito sim que falta uma divulgação, e, na medida em que agente proporcionar esse tipo de encontro, a mídia fica interessada nisso e cada vez que a gente divulga o direito fica mais próximo de nós.

Aqui tem uma pergunta sobre as audiências públicas. Em vários Municípios, via de regra, essas audiências públicas são manipuladas, e sabemos que os temas discutidos dizem respeito à sociedade como um todo, mas não há uma divulgação ampla. Somente são convidadas algumas entidades, por telefone, e com cartas marcadas. Em razão disso, os temas de relevância deixam de ser abordados. Como devemos agir para fazer prevalecer os direitos das pessoas com deficiência na localidade? Eu não sei se, nessas audiências públicas estariam presentes representantes do Ministério Público. Se não estiverem, acho que a primeira coisa a ser feita é comunicar ao Ministério Público. Aqui no DF, quando há alguma audiência pública não provocada pelo Ministério Público, nós somos comunicados. Se estiver acontecendo algum tipo de manipulação, o que você pode fazer é comunicar ao Ministério Público local.

Eu acho que tem uma outra colocação aqui sobre a demora do processo no Ministério Público. Eu imagino que se está demorando dois anos para que alguma ação seja tomada, pode ser que o Ministério Público tenha entrado com uma ação civil pública. Nesse caso, não sei o porquê, pois isso é uma questão de administração local. Mas se foi dada entrada numa ação civil pública, realmente, a ação judicial é demorada por causa dos prazos estabelecidos em lei e também por causa do acúmulo do Judiciário. Mas, o próprio Ministério Público pode fazer um Termo de Ajustamento de Conduta com a companhia que tem a concessão da informação no local. Normalmente, é isso que a gente faz.

Com relação à colocação da colega Paula, do Rio de Janeiro, que fala sobre as especializações, ela diz que acredita nelas para que haja uma atitude com maior resultado. Eu gostaria até de fazer um comentário. No Ministério Público do Distrito Federal, existem muitas áreas já com especialização e no âmbito do próprio Ministério Público isso é uma reclamação. Vocês não imaginam como as pessoas reclamam, porque acham que não tem que haver tantas especializações.

Ou seja, há idéias e idéias que estão sempre em debate, mas, apesar de acreditar na especialização - tanto que trabalho na área especializada e é por isso que eu consigo desenvolver trabalhos com maiores resultados -, eu acho que o problema hoje em dia não é só da especialização; é do número de profissionais; é da forma de trabalhar. A questão é que a demanda é muito grande para a forma de trabalhar.

A gente pode ver que isso acontece também na polícia. Se a gente vai com a demanda de questões envolvendo os idosos, por exemplo, a gente leva muitas situações em que os idosos são vítimas de maus tratos e a polícia não recebe a reclamação porque acha que isso é um crime de menor potencial ofensivo. Quer dizer, há certa seleção para poder agir. Isso é decorrente da falta de estrutura do órgão. Eu acho que há falta de profissionais e só com o aumento desses profissionais é que a gente pode melhorar essa situação.

Eu gostaria de esclarecer que as associações formadas há mais de um ano e que defendem as pessoas portadoras de deficiência têm legitimidade para ingressar com qualquer ação em juízo. Elas não precisam esperar o Ministério Público agir. Vocês também podem lançar mão do instrumento da ação pública também, porque vocês têm legitimidade para agir.

Eu acredito que eu respondi amplamente e vou deixar também as colegas falarem, porque a área delas também é muito importante.

Eu agradeço a todos!

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Ângela Carneiro da CunhaConsultora da CORDE

A primeira questão é sobre arquitetura e planejamento. Essa é uma matéria que tem que atender à questão utilitária e, para isso, o profissional tem que ter conhecimento pleno da necessidade dos usuários. Se o profissional não projetar considerando a diversidade e as necessidades para utilização de edificações ou qualquer tipo de espaço urbano, ele não está sendo um bom profissional.

O segundo item seria a questão da formação nas universidades. Não existe ainda um conhecimento dos multiplicadores, que são os professores. Os formadores não têm conhecimento sobre a matéria; portanto, a matéria não é repassada de forma ampla para os seus alunos. Essa é uma matéria que tem que permear todas as disciplinas do curso de formação profissional na área de arquitetura e cursos técnicos. Ela não é uma matéria específica do projeto, nem é uma matéria específica do planejamento. Ela é uma matéria que tem que estar em todas as disciplinas do curso. A primeira coisa que nós temos que fazer, urgentemente, é conscientizar esses multiplicadores para que eles formem contemplando a questão.

Gostaria de esclarecer outra questão. Eu hoje não tenho vínculo mais com o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de Pernambuco. Eu respondo aqui como profissional e vou falar do que é a função do Conselho. O Conselho é fiscalizador do exercício profissional. Ele faz parte da sociedade civil organizada. Portanto, ele tem sim que estar presente em todas essas ações que a sociedade civil tem que implementar para a questão da acessibilidade. Quando a gente vai fiscalizar a questão do Plano Diretor, é muito importante que a sociedade civil esteja presente e forte, porque somos nós, cidadãos, assumindo a nossa cidadania, que vamos conseguir fazer com que essas matérias estejam presentes e que a lei seja cumprida.

E por último, o Conselho não tem o poder de fiscalização sobre a obra, sobre a edificação para verificar se essa matéria está sendo feita de forma correta. Essa é uma função do Município, quando ele aprova o projeto. Então, a gente não pode fazer isso. O que a gente pode fazer é garantir a presença do profissional habilitado naquela obra, e, quando ele assinar a ART, enfatizar que ele tem que ter conhecimento sobre essa matéria. A partir daí ele vai instrumentalizar o poder público, inclusive, o Ministério Público, para que eles possam fiscalizar e responsabilizar o profissional.

Por último, a respeito do Plano de Acessibilidade que o Adalberto citou. Aqui foram citadas as questões dos Planos Municipais de Acessibilidade, com relação à questão de arquitetura e urbanismo, que foi a matéria que eu vim tratar aqui. Foi por isso que eu não dei uma amplitude maior às questões sociais.

Obrigada!

Ângela Costa Werneck de CarvalhoRiotrilhos

Dário, você não entendeu a colocação que eu fiz na parte dos custos socioeconômicos. Eu falei que altos custos socioeconômicos são impostos à população. O que são custos socioeconômicos? É o congestionamento que ele tem que enfrentar; são os acidentes de trânsito; longos tempos de viagem casa/trabalho, ausência da hierarquia e integração dos meios de transporte e o predomínio do modo rodoviário. Isso é um custo socioeconômico que todos nós pagamos, porque não temos um transporte organizado e acessível. Isso é o custo socioeconômico. Não é que custe mais ou custe menos; é o custo que cada um de nós paga; é o custo socioeconômico de nossa vida; é o tempo da nossa vida; é o custo de você não ter um transporte correto. Isso é que é o custo socieconômico.

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Em relação à pergunta da Jaciara, sobre os 23 Municípios, eu gostaria que ela me desse o contato dela ou ela pegasse o meu contato para eu poder, depois, passar para você essa informação, porque esses 23 Municípios constam da minha tese.

Para a Maria Oliveira, do Amazonas, e o Valdeci Maia, do Pará, a resposta é semelhante. O questionamento foi sobre o transporte aquaviário e hidroviário. Na minha explanação, eu falei que está em elaboração uma norma que se chama “Acessibilidade de passageiro no transporte aquaviário”. Essa norma começou a ser elaborada agora, porque no Brasil não há norma ainda para o modo de mar aberto e interior. Isso inclui rios, mar etc, e, consequentemente, está incluída a região do Amazonas.

Ontem, na reunião geral do INMETRO, da qual participaram representantes dos Institutos de Pesos e Medidas, estava lá a Ana, do IPEM do Amazonas. Ela estava justamente colocando a realidade do Amazonas. Já está começando a ser feito esse levantamento do que existe em termos de terminais e em termos de embarcações, ou seja, que tipos de embarcações você tem, para que a gente possa, nesta norma, avançar na acessibilidade e refletir a realidade nacional, a nossa realidade. Então, esse tipo de transporte não está sendo esquecido. Quando eu falei no transporte rodoviário, eu incluí, erroneamente, as barcas, mas nós também estamos tratando do transporte hidroviário ou aquaviário, ou de mar aberto e interior.

Para o Marcos Nunes, que fez a pergunta sobre as leis e as normas, eu queria dizer que as normas já estão saindo do forno. Elas já passaram por consulta pública, tanto a NBR 14022, que fala do transporte rodoviário/urbano, quanto a NBR 15320, que é a do transporte intermunicipal de longo percurso. Elas passaram por uma consulta pública e não estão aprovadas ainda porque, a exemplo desse anseio que vocês da platéia têm quanto à aprovação da norma, também está havendo muita cobrança e muita discussão.

A vontade que a gente tem é que essas normas já estivessem aprovadas, mas elas passaram por uma consulta pública oficial, através da ABNT, e estão para ser aprovadas. É só isso.

Izabel Maria Madeira de Loureiro MaiorCoordenadora Geral da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa

Portadora de Deficiência

Moderadora

A ordem será: José Eduardo, do Mato Grosso; Luiz Gonzaga Câncio, do Ceará; José Carlos, da Bahia; João Moreira dos Santos, de Rondônia; e Alfredo Roberto, do Paraná. Volto a lembrar que estamos na parte temática referente a perguntas ou colocações sobre o tema “Implementação Geral da Acessibilidade e Implementação da Acessibilidade Arquitetônica e Urbanística e Acessibilidade nos Transportes Coletivos”.

Obrigada!

Delegado José Eduardo, por gentileza!

José Eduardo Mattos RibeiroDelegação de Mato Grosso

A minha pergunta é a seguinte: participamos do I Fórum Municipal da Pessoa com Deficiência e do I Fórum Estadual da Pessoa com Deficiência, e agora estamos aqui participando da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

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Vimos que transporte e acessibilidade são um problema nacional, com características específicas nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, mas é um problema nacional. Eu queria perguntar ao Sr. Cláudio Vereza, que no momento não se encontra, o que ele e seus colegas legisladores em seu Estado estão fazendo para que as leis existentes sejam cumpridas. Peço que a mesma pergunta seja estendida ao nosso Ministro dos Transportes, ao nosso Ministro da Saúde e ao Secretário dos Direitos Humanos que esteve aqui ontem.

João Moreira dos Santos Delegação de Rondônia

Eu vou fazer uma colocação com referência à questão dos veículos e gostaria que prestassem muita atenção sobre o que vou falar. Eu vou falar também com referência às leis que, dizem, dão facilidades aos deficientes; por exemplo, com isenção de IPI, de IPVA. Mas eu queria fazer uma pergunta. Eu até gostaria que nossos delegados prestassem atenção para que defendêssemos uma proposta que eu acredito não estar escrita. O deficiente tem direito a desconto no IPI, mas o que adianta isso se ele não pode comprar um veículo? Ele só tem um salário e alguns vivem com menos de dois salários-mínimos. Como é que eles vão comprar um veículo? De que serve essa lei? Então esta é uma lei para deficiente de classe média, não é para o deficiente em geral. Eu não estou sendo contra a lei, mas tem que haver um incentivo para que o deficiente consiga ter automóvel, porque este vai substituir as pernas dele. Se eu estou em pé é porque estou em cima de uma prótese e se não fosse isso eu estaria aqui com uma muleta. Tem que haver condições para o deficiente comprar um veículo; tem que ter um incentivo.

Eu gostaria que essa proposta fosse encaminhada ao ministro dos Transportes, ao presidente da República, e, se possível, ao Congresso, para que o deficiente possa realmente comprar veículo.

Muito Obrigado!

Alfredo Roberto de Carvalho Delegação do Paraná

Obrigado!

Quando estamos discutindo a acessibilidade, estamos discutindo de forma indireta ou de forma direta a questão da inclusão. Eu queria colocar uma questão para refletirmos, porque ela depende necessariamente de alterações, de mudança, de inversão de valores na sociedade. Depende, fundamentalmente, de mudanças sociais e estas ocorrem a partir dos embates que nós travamos na sociedade, os nossos enfrentamentos.

Eu vejo aqui nesta plenária uma preocupação muito grande “ que eu acho que é pertinente “ em relação ao trabalho do Ministério Público, ao trabalho dos deputados, dos congressistas, e do Estado, como um todo. Eu acho pertinente, mas é importante compreendermos que não é o Ministério Público, que não é o poder Judiciário, não é o poder Legislativo, não é o poder Executivo que promove as grandes transformações, e a inclusão social é uma grande transformação. Quem promove as grandes transformações e as mudanças do próprio Ministério Público, do próprio poder Judiciário, do próprio Legislativo, do próprio Executivo, é a luta política, é o enfrentamento, o embate que as dificuldades e os problemas nos colocam.

Nós, pessoas com deficiência, temos que nos colocar como sujeitos do processo, enfrentando de forma organizada os problemas que temos, organizando nossas entidades, os nossos movimentos, e

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exigindo que o Ministério Público, os congressistas e o próprio Estado façam a transformação que nós precisamos e as reformas. Não devemos ficar aqui mendigando.

Para encerrar, eu queria sugerir que a próxima conferência tivesse como uma das temáticas principais a necessidade de organização das pessoas com deficiência, o que faltou nesta.

Muito obrigado!

Participante não identificado

Seria interessante que se editasse um Decreto complementar ao Decreto nº 5296, do ano de 2004, estabelecendo que as empresas de transporte renovem suas frotas no percentual de dez por cento (10%), anualmente.

Dino PradoDelegação de Goiás

Gostaria de sugerir a inserção de artigo obrigatório e de cumprimento indispensável pelas prefeituras e órgãos competentes para a liberação de alvarás de construção, comprometendo as empresas construtoras à adequação de rampas nos edifícios.

Aluízio Ferreira de Souza FilhoDelegação do Pará

Boa tarde a todos!

Sou do Município de Tucuruí onde está sendo gerada energia para grande parte do Brasil. Tucuruí está concluindo o seu Plano Diretor e a entidade de deficientes de lá participou, juntamente com outras entidades, da elaboração do Plano. Ele já está quase pronto. A nossa entidade apontou as dificuldades dos postos de saúde, dos colégios, etc. Esse Plano Diretor já está na sua fase final para ser entregue em tempo hábil aqui em Brasília.

Quero fazer uma pergunta: Depois que tudo isso estiver concluído, e após o Plano Diretor ser entregue, agora no final do ano, a partir do ano de 2007 de que forma as prefeituras municipais vão realmente fazer as rampas? A gente indicou o local adequado. Se for necessário, nós vamos procurar novamente o gestor para perguntar sobre a rampa que nós indicamos através de um relatório. Nós gostaríamos de saber de que forma isso vai ser feito para que possamos ter acesso àquele local. Foi isso que nós discutimos o ano inteiro.

Muito obrigado!

Ana Lúcia Fernandes da HoraDelegação da Bahia

Meus cumprimentos a todos. Eu estou aqui como líder da Associação de Cegos do Sul da Bahia e como Coordenadora do Centro de Apoio à Pessoa com Deficiência.

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Entendo que esse trabalho nosso possa ser feito com as autoridades, com os gestores políticos. Como disse o companheiro João Batista, de Feira de Santana, será que todos eles sabem e vêm a Brasília para discutir a problemática da deficiência? Será que todos eles são chamados a prestarem contas em relação às ações feitas nos seus Municípios? Faz–se necessário uma análise nos censos escolares, porque eles são uma vergonha. Há omissão de pessoas com deficiência nos estabelecimentos de ensino.

Então, eu venho como líder de uma entidade porque eu já fui ameaçada quando quero trabalhar com as famílias. Eu não tenho suporte junto ao Judiciário, porque ninguém quer comprar essa briga sozinho. Então, eu venho pedir ao Ministério Público que atue principalmente nos Municípios do interior, que são distantes da capital, onde a crueldade é bem maior, a rejeição e a exclusão se fazem presentes de forma bastante primitiva.

Muito obrigada!

Edson dos SantosDelegação de São Paulo

Boa tarde a todos!

Eu sou coordenador do Núcleo 10 da Baixada Santista e do Vale do Ribeira. Nós representamos 24 Municípios da nossa região. A pergunta é a seguinte: Quanto à concessão que é dada, antes e depois do Decreto nº 5296, eles têm 10 anos para se adaptar à reforma da frota, 10 anos para reformar totalmente a frota, após a regulamentação dessas normas. Só que estas não saíram ainda. Quando é que elas vão sair? Essa é a primeira pergunta. Dizem que elas estão no forno, mas, aqui no Brasil, muitas vezes, elas ficam 10 a 15 anos no forno.

A segunda questão é quanto à reforma dos prédios públicos, privados e vias. Quando se tem uma reforma posterior ao Decreto e que não se adequou às normas técnicas de acessibilidade, como agir para que se refaça a obra? É evidente que podemos entrar com uma ação civil pública, mas como podemos evitar que outras sejam realizadas? Podemos bloquear recursos para que não se façam mais obras antes de reformar aquelas que foram feitas de forma equivocada? E quanto à questão de acessibilidade: como podemos fazer uma carteira unificada em nível de regiões metropolitanas? Em nível nacional eu acho que uma carteira unificada para a gratuidade de ônibus para o deficiente seria inviável, porque teríamos que mexer em toda a estrutura. Isso teria que ser feito mediante uma Emenda Constitucional, porque os Municípios e Estados têm autonomia somente para atuar nas suas legislações.

Obrigado!

Raimundo Misondas Martins de AraújoDelegação de Pará

Boa tarde a todos e a todas!

Estou participando pela primeira vez de uma Conferência Nacional dos Diretos da Pessoa com Deficiência, mas eu já venho discutindo há 20 anos, em nível nacional, a questão da cidadania no que diz respeito ao portador de deficiência.

Eu quero chamar atenção dos companheiros participantes, dos delegados e, inclusive, da Mesa, para que esse não seja apenas mais um encontro de portadores de deficiência. Os nossos direitos já estão bastante avançados nas leis e no papel, mas na prática não. Eu digo isso porque sou um dos maiores defensores da questão da cidadania e dos direitos dos portadores de deficiência lá em Belém, no Pará,

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mas nossa atuação ainda está deixando muito a desejar. Por exemplo, eu venho discutindo a acessibilidade e a questão do transporte há 20 anos, mas agora me surpreendo quando me dizem que ainda vou esperar mais 10 anos. Isso quer dizer que os empresários, os donos das empresas, vão levar isso em consideração. Isso não quer dizer que eles vão ter que esperar 10 anos. A lei começa a vigorar a partir de agora. Então, ela já tem que ser cumprida. Isso tem que ser acompanhado pelo poder público. No caso de um prédio público que não tenha acessibilidade para o portador de deficiência, ainda vai levar quatro anos para que essas adaptações sejam feitas. Ou seja, eu ainda vou esperar mais quatro anos. São essas coisas que não dá pra entender.

Outra coisa que eu quero deixar bem claro aqui para os companheiros que estão participando é que eu vou esperar 10 anos, mas quem me garante, depois desses 10 anos, que isso vai ser cumprido? Nós temos leis que têm mais de 10 ou 15 quinze anos que foram sancionadas e até hoje não foram colocadas em prática.

A minha preocupação é justamente que esse encontro não seja apenas mais um encontro e que o que decidirmos aqui seja cumprido. Será que, como cidadão, como representante de uma ONG, eu vou ter que entrar com uma ação no Judiciário todo dia para que sejam cumpridos os meus direitos?

Manoel Ferreira LinoDelegação do Ceará

Boa tarde!

Sou da Cidade Maracanaú, no Ceará.

Eu queria lembrar uma coisa sobre os nossos deficientes visuais. A gente estuda, aprende o braile - não muito, porque a gente não tem posses para isso - mas a gente faz o possível, mas, quando chegamos a qualquer instituição bancária, cartorária ou outras instituições elas não têm equipamentos em braile para que possamos exercer nossos direitos. Então, onde está a acessibilidade? Nós não temos acesso aos equipamentos para que possamos utilizá-los. Se precisarmos de uma assinatura no cartório a gente tem que nomear um procurador, pagar R$ 20,00 ou R$ 30,00 para ele fazer isso. E quando não confiamos no procurador nós ficamos sem poder fazer o que precisamos nos cartórios, nas Secretarias de Finanças e em outras Secretarias às quais nós temos que recorrer, porque não tem quem assine por nós. O problema é que eles não aceitam a assinatura digital.

Ângela Costa Werneck de CarvalhoRiotrilhos

Sobre o questionamento das leis, da NBR 14022 e NBR 15320, não somos nós que estamos emperrando a questão da finalização da norma. Da mesma forma como democraticamente vocês estão aqui representando a população, as normas circularam oficialmente, teve circulação nacional pela ABNT e foram feitos vários questionamentos nas duas normas. Então, esses questionamentos têm que ser atendidos e debatidos em plenária. Isso está sendo finalizado e está saindo do forno sim. A próxima reunião é em São Paulo.

Em relação ao questionamento do Everaldo Batista, no sentido de que seria interessante que se editasse um Decreto complementar ao Decreto nº 5.296, para estabelecer que as empresas de transporte renovem suas frotas no percentual de dez por cento (10%) anualmente, o Decreto vigente já fala que não é anualmente e sim a partir da data da sua aprovação, que foi em dezembro de 2004. O prazo é de 10 anos, no total. Só que o ônibus que está sendo fabricado agora já tem que ser acessível e o que for sendo

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adaptado a partir da data de aprovação da norma é que está incluso no prazo de 10 anos. A frota vai ter que ser adaptada em função do ano de fabricação do veículo.

Ronaldo André Bacry BrasilDelegação do Amazonas

Boa tarde!

A minha responsabilidade aqui é extrair o maior número possível de informações para levar ao meu Estado para que sirvam de apoio na luta das pessoas com deficiência lá do Amazonas.

A minha pergunta é para a Dra. Ângela Werneck e se refere ao transporte aquaviário. Nós sabemos que tinha sido agendada uma visita a Belém para avaliação do porto de lá para servir de base da normalização do aquaviário. A pergunta é: essas viagens a Belém são de caráter definitivo ou vão ser feitas visitas a outros Estados? A realidade do meu Estado é diferente da de Belém, principalmente por causa dos portos de lá. Os Municípios do Estado do Amazonas têm uma realidade completamente diferente da situação de Belém. Então, a nossa preocupação é saber se no momento em que for feita essa normalização e essa pesquisa nos Estados o Amazonas vai ser contemplado com essa visita também. Estou perguntando isso porque há uma necessidade muito grande de que isso ocorra.

Quanto ao outro ponto que eu gostaria de focar solicito apenas um esclarecimento. Houve uma conferência ainda este ano no Estado do Amazonas, do ministério das Cidades, sobre a política de mobilidade urbana. Levaram o anteprojeto para a apreciação de toda a sociedade. Nós entendemos que, na verdade, o anteprojeto não foi levado para apreciação; acreditamos que ele já estava pronto. Nós fomos usados apenas para referendar um projeto pronto, porque no projeto não tem nada que sirva de referência ou que tenha uma referência ao Decreto nº 5296. Na discussão do tal anteprojeto nós perguntamos por qual razão não se contemplou no texto do mesmo alguma coisa do Decreto nº 5296 e nos foi dada a desculpa de que a lei de acessibilidade já existia, já era tratada nesse Decreto e que haveria redundância da lei. Ocorre que o tal anteprojeto está cheio de redundâncias ao dispor sobre outras leis. Então, se existe redundância com relação a outras normas, por que não contemplar o Decreto nº 5296, até mesmo porque o anteprojeto trata das novas licitações que deverão ser feitas para a concessão de transporte coletivo.

A minha preocupação é que essa comissão vai viajar o país todo e vai chegar aos Estados de vocês. É preciso que vocês fiquem atentos, porque nós estamos sendo usados pra referendar uma coisa que já está pronta.

Muito obrigado!

Ângela Costa Werneck de Carvalho Riotrilhos

André, eu só vou poder responder a você em relação à criação da norma. A coisa não é bem assim. O INMETRO e a ABNT estão fazendo uma norma de acessibilidade de passageiros no transporte aquaviário. Essas reuniões estão acontecendo no Rio de Janeiro e a próxima vai ser agora dia 17, na semana que vem, das 10 às 16 horas, na sede da ABNT, no Rio, que fica na Avenida 13 de maio, 27º andar. Quando começamos a fazer essa norma nós precisávamos avançar tecnicamente e refletir a realidade nacional. Todavia, para refletir a realidade nacional a gente precisava de uma pesquisa. Então, o próprio INMETRO, por meio dos Institutos de Pesos e Medidas, está fazendo esse levantamento, mas nós precisamos, primeiro, participar de uma reunião da Rede do IPEM, em nível nacional, que aconteceu em Macapá. Nós pedimos que os IPEM’s ajudassem a ABNT e ao INMETRO no levantamento do que

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existe no Brasil para que a norma refletisse a realidade e avançasse na sua acessibilidade. Essa reunião foi em Macapá. Nós tivemos que voar até Belém e visitamos o que havia lá, mas foi apenas uma amostragem. O levantamento está sendo feito pelos Institutos de Pesos e Medidas locais, em nível nacional. Esse levantamento vai dar o embasamento para que a norma reflita o avanço técnico e a realidade nacional. Você compreendeu agora?

Quanto à conferência que aconteceu no Amazonas, eu não posso lhe responder, porque eu não estive lá.

Eu quero responder à Márcia e ao rapaz que falou da isenção de IPI e IPVA na compra de automóveis. Sobre isso, eu não tenho conhecimento. Eu estou trabalhando na parte de transporte coletivo. Existe uma norma para veículos na parte do CB-40, que fica acessível no site da CORDE. Todas as normas de acessibilidade estão lá. Até a parte que normatiza como é que tem que ser o veículo para uma pessoa deficiente comprar e quais são as condições do motorista. Isso está normatizado. Sobre a parte de impostos, isso foge ao meu conhecimento técnico e eu não posso responder se o IPI e o IPVA vão ser descontados ou não. Isso eu não posso responder.

Izabel Maria Madeira de Loureiro MaiorCoordenadora Geral da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa

Portadora de Deficiência

Moderadora

Existe a legislação do IPI em relação a compra de veículos por pessoas com deficiência, que foi estendida inclusive a pessoas com mobilidade reduzida. As pessoas cegas e as pessoas com deficiência mental severa são classificadas de acordo com uma normativa do Ministério da Saúde, em conjunto com a Secretaria de Direitos Humanos. O mesmo vale para o IPVA também. No Congresso Nacional, nesse momento, existem dois Projetos de Lei buscando a isenção do IPI também para os transportes coletivos acessíveis, no intuito de responder a um dos dispositivos do Decreto nº 5.296, que se refere à possibilidade de se conceder incentivos com redução de tributação e com isso agilizar o processo da acessibilidade.

João BatistaDelegação da Bahia

A minha pergunta é se as prefeituras estão cientes da obrigatoriedade de entregar esse Plano Diretor até dezembro. Isso é facultativo?

Ângela Carneiro da CunhaConsultora da CORDE

Eu consegui coletar aqui algumas preocupações da Plenária. A questão da obrigatoriedade da inserção da acessibilidade nas novas construções, nos alvarás para novos funcionamentos e mudanças de uso, para as reformas etc. estão inseridas e muito bem detalhadas no Decreto. Ele vincula todos os seus parâmetros às Normas Brasileiras, que, inclusive, ainda estão sendo discutidas na ABNT. Então, esse Decreto vai ser enriquecido com o passar do tempo, porque a ABNT está trabalhando sinalização e comunicação e uma série de outras normas para que o Decreto seja enriquecido. Então, eu quero comunicar a vocês que, qualquer atitude que aconteça neste País com relação à edificação, a partir deste momento, e do momento da assinatura do Decreto vai ter que contemplar a questão da acessibilidade.

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Inclusive, quem já tinha projetos anteriores e for pedir um “habite-se” depois da obra executada, este “habite-se” vai vincular a questão da acessibilidade de maneira ampla e as obras vão ter que ser revistas.

Com relação à questão do prazo para edificações, ele foi definido da seguinte forma: no caso das edificações de uso público, de uso coletivo, que são as edificações administradas pelo poder público, a partir do Decreto teriam um prazo de 30 meses, desde que não tomem nenhum tipo de atitude com relação às suas edificações. Se resolverem fazer qualquer tipo de reforma ou uma nova concessão para uso daquele funcionamento elas têm que cumprir as exigências de acessibilidade, a partir do momento em que forem pedir a concessão. Então, no caso das edificações públicas, o prazo seria de 30 meses, sendo que, 14 meses já se passaram. Então, restam 16 meses. No caso das edificações privadas de uso coletivo, o prazo é de 48 meses. Nesse caso, restam 34 meses. Quem vai fazer uma edificação nova, quem vai fazer reforma, quem vai pedir concessão para alvará agora, terá que cumprir a questão da acessibilidade ampla. Quem não vai fazer nada, quem quer ficar parado e não tomar nenhuma atitude vai ter que cumprir tais prazos (30 meses, no caso das edificações públicas, e 48 meses, no caso das edificações privadas de uso coletivo, ressaltando, que já se passaram 14 meses desse prazo). As novas edificações têm que ser acessibilizadas em todas as áreas da cidade. A única coisa em que o Decreto não interfere é na unidade autônoma, ou seja, a sua casa. Mesmo nas edificações de uso coletivo, multifamiliares, como, por exemplo, os edifícios de uso coletivo, todas as áreas comuns têm que ser acessíveis.

Com relação à questão do Código de Obras, do Código de Edificações e do Plano Diretor, ele, o Plano Diretor, é obrigatório, pela Lei nº 10.741, que é o Estatuto da Cidade, e deve ser apresentado até outubro deste ano. Isso é obrigatório. Cabe a nós, sociedade civil e ao governo, em todas as instâncias, cobrar para que o Município tenha esse instrumento. Ele é obrigatório.

Valéria de Oliveira SilvaDelegação do Rio de Janeiro

Primeiramente, eu gostaria de fazer uma pergunta à Dra. Ângela. Eu gostaria de saber o que podemos fazer com relação às áreas comuns dos edifícios residenciais; de que forma a gente pode sensibilizar os condôminos a fim de que eles concordem em fazer obras para tornar os prédios acessíveis? Muitos prédios são antigos e a gente fica sem poder receber um amigo cadeirante, que ande de muletas etc. Isso acontece também com as pessoas que moram num prédio e que vão envelhecendo ou sofrem algum acidente. Quando alguém reclama com o síndico, eles dizem que isso é para prédios públicos e que não existe necessidade de fazer nenhuma obra nos prédios residenciais particulares. Eu queria saber de que forma nós podemos fazer com que essas pessoas cumpram essas normas.

Eu gostaria de deixar registrado que, no caso dos nossos transportes coletivos no Rio de Janeiro, as empresas, ao invés de estarem preocupadas com esses coletivos que devem ser adaptados, estão tornando os ônibus cada vez mais inacessíveis, não apenas para as pessoas com deficiência, mas até mesmo para grávidas e pessoas com um peso mais elevado. Eles constroem verdadeiros currais e nós andamos como sardinhas em lata, tanto nos ônibus maiores, quanto nos microônibus que eles cismam em colocar nas linhas e as pessoas andam todas amontoadas.

José Edmilson SacramentoDelegação da Bahia

Boa tarde a todos e a todas!

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Eu estou aqui representando o Estado da Bahia, como delegado, pelo Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Eu sou cego e minha pergunta é com relação a um dos equipamentos urbanos que mais interferem no direito de ir e vir da pessoa com deficiência, sobretudo, da pessoa com deficiência visual, que é a instalação dos telefones de uso público (os conhecidos “orelhões”). Na nossa capital, nós vivemos um grande dilema, porque não se sabe quem faz a manutenção das calçadas. Pela legislação, a responsabilidade da manutenção das calçadas é do proprietário. Todavia, os proprietários não fazem essa manutenção e todo mundo sabe o que acontece. Sobre essas calçadas, existem os orelhões. Os Municípios não sabem e não regulam a disposição e a manutenção desses equipamentos em suas artérias, em suas vias. Enquanto isso, nós estamos há anos com essas barreiras no nosso caminho, que impedem a circulação não só de quem não enxerga, mas de todas as pessoas em geral. O CREA da Bahia estabeleceu uma parceria com a Comissão Civil de Acessibilidade de Salvador “ COCAS, e nela se estuda a possibilidade da implantação da Comissão Permanente de Acessibilidade, além do quê estamos fazendo uma fiscalização conjunta entre a sociedade civil e o próprio CREA.

Eu gostaria de pedir a opinião da Arquiteta Ângela Carneiro sobre essa possibilidade de todas as capitais de todos os Estados e do Distrito Federal fazerem uma inspeção coletiva desses “orelhões”, com base nos Grupos de Acessibilidade dos CREA’s, bem como sobre a normatização, da instalação dos telefones públicos.

Muito obrigado!

Hélio Ferreira OrricoDelegação do Rio de Janeiro

Boa tarde a todos!

Eu gostaria de dirigir uma pergunta à Mesa, objetivamente. Foram mostrados aqui no âmbito dessa questão da barreira arquitetônica, uma série de slides que mostraram toda essa dificuldade do ponto de vista da acessibilidade. Eu queria perguntar à Arquiteta Ângela, com base nessas denúncias contidas nessa série de slides que mostram pontos inacessíveis no Município do Rio de Janeiro, qual é o encaminhamento que dado a partir desse trabalho? Ou seja, que efeito prático essa pesquisa pode ter? Ela tem relevância social, mas eu queria saber que encaminhamento poderia ser feito com base nesse documento de pesquisa. Obrigado!

Cledson de Oliveira CruzDelegação da Bahia

Sou Presidente da Associação Municipal e Metropolitana das Pessoas com Deficiência, no Município de Salvador, Bahia, e gostaria de fazer uma pergunta à Dra. Izabel e à Sra. Ângela Carneiro, com relação ao monopólio dos elevadores colocados nos veículos coletivos. A empresa que atualmente, detém o maior número de veículos adaptados no Brasil sofre uma rápida depreciação da sua frota, prejudicando o cotidiano do uso dos veículos pelas nossas comunidades. Nada tem sido feito, porque as empresas alegam que elas vendem com preço menor. Eu não sei se há licitação ou se há uma fiscalização relativa a essa questão dos elevadores colocados. A empresa é a ORTOBRAS. A pergunta para a Dra. Izabel é sobre as condições gerais de acessibilidade. Eu gostaria de saber, com relação ao PSH e à Resolução nº 460, referente à moradia popular. O governo atual vem investindo maciçamente nisso e nós não temos visto o segmento das pessoas com deficiência ser beneficiado com casas adaptadas, além do que o Movimento dos “Sem-Terras” não aceita a filiação de pessoas com deficiência. Nós gostaríamos de saber em que movimento essas pessoas que moram nas palafitas de Salvador e nos morros do Rio de Janeiro, por exemplo, vão conviver e vão sobreviver?

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Luis Carlos Teixeira da SilvaDelegação do Rio de Janeiro

Boa tarde a todos!

Eu estou aqui representando o Estado do Rio de Janeiro.

A nossa Promotora disse que tem que ser exigida a adaptação dos ônibus quando vencer a concessão. Eu me permito discordar, porque, se não me engano, a Lei de Licitações é de 1940 e a nossa Constituição exige que haja licitação e isso não existe na prática. Os governos dão as concessões aos empresários de ônibus sem licitação e considero que essas leis são inconstitucionais.

Foi dito aqui que temos que nos mobilizar. Nossa presença aqui é uma prova de que estamos mobilizados, mas se existe poder Judiciário, ele tem que cumprir o seu papel de fiscalizar a aplicação da Lei. Do contrário, não há necessidade do Judiciário, com todo o respeito aos magistrados.

Muito obrigado!

Ana Cristina de Lima FerreiraDelegação do Rio de Janeiro

Boa tarde!

Eu queria perguntar à Dra. Ângela como é que fica quem usa muito a calçada. Quem é responsável pela manutenção das calçadas e rampas?

Onofre da Silva LeãoDelegação do Rio de Janeiro

Boa tarde a todos!

Eu sou portador de deficiência há 53 anos. Hoje pela manhã eu ouvi dizer que nós precisávamos ingressar com ações no Judiciário. Em 1999 eu entrei com uma representação no Ministério Público Estadual e com o pedido de garantia dos direitos constitucionais da pessoa portadora de deficiência. Essa ação foi transferida para a Promotoria dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência. Dei a mesma entrada no Ministério Público Federal, com base na legislação federal. O Ministério Público Federal disse que isso não era competência dele. A realidade é que temos uma vasta legislação e a política é séria com relação ao portador de deficiência, mas o que está faltando, na realidade, são políticos com compromisso para resolver a necessidade do portador de deficiência. Nós somos reclusos em nossas residências por conta de nossa deficiência. Estamos condenados à prisão perpétua, porque não existe autoridade. Quem manda é o capitalismo. Ele faz o que quer. O empresário está mandando e ninguém é capaz de se sobrepor à vontade dele. Pelo que estou vendo, o governo, de um modo geral, simplesmente faz o que o empresário quer. Está na hora de mudarmos isso. Não é só o Ministério Público. Nós estamos aqui falando em acessibilidade, em rampas, ônibus acessível etc. O empresário diz que não tem dinheiro para colocar rampas nos ônibus. Ele tem que ter; e se não tiver devolva a concessão.

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Quando a pessoa aluga um bar que não dá dinheiro, a pessoa devolve o ponto e rescinde o contrato de locação. Por que é que o empresário não está tendo lucro e fica com a empresa de ônibus? É isso que eu quero que o governo me responda.

Claricinda Regina Massa e BorgesDelegação de Minas Gerais

Muito obrigada por estar aqui hoje como convidada!

Eu sou Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência de Uberaba e também participo de mais quatro conselhos municipais, representando a sociedade civil organizada.

Diante das demandas que serão desencadeadas pelas adequações visando o cumprimento da Lei de Acessibilidade, não seria necessário que o Ministério Público se equipasse melhor? No caso da minha cidade, eu sinto que ele está mal equipado; inclusive, não tem condições, por exemplo, de contratar uma intérprete de LIBRAS quando a audiência pública envolve pessoas surdas. E também não existe acessibilidade no prédio do Ministério Público.

Uma outra coisa é que, por participar de vários conselhos, eu sinto que os conselhos fortes são aqueles que têm um Fundo. Na última pesquisa do IBGE as pessoas com deficiência estão incluídas na categoria de “Baixa Renda”. Logicamente, elas podem até ganhar muito, mas gastam muito mais do que os outros. Então, seremos fortes no dia em que os nossos conselhos tiverem Fundos. Eu queria propor nessa Conferência que a criação de Fundos em nível dos Municípios. Na nossa cidade, essa foi uma das decisões da Conferência Estadual, que teve o respaldo do prefeito e da Câmara Municipal. Nós já temos um Fundo Municipal e já estão sendo carreadas multas para ele. Inclusive, nós estamos fazendo as reclamações e o Ministério Público está multando e transferindo os recursos oriundos dessas multas para o nosso Fundo. Eu acho que poderemos solicitar ao Ministério Público que essas multas das pessoas que não cumprem a Lei da Acessibilidade sejam carreadas para os Fundos, que são geridos pelos Conselhos. Nesse caso, só os Conselhos poderão decidir o que fazer com esses recursos. Aí sim a sociedade civil organizada dentro dos Conselhos, participando cada vez mais, estará mais fortalecida. O trânsito mata e deixa muitas pessoas nas cadeiras de rodas. Eu acho que as multas de trânsito também podem ser carreadas para esses Fundos.

Obrigada!

Marionaldo Santos PenhaDelegação do Espírito Santo

Boa tarde a todos! No Município de Cachoeira do Itapemirim, com 196.000 habitantes, está havendo um monopólio das empresas de ônibus, porque o responsável pela empresa particular de ônibus alega que não pode instalar os aparelhos técnicos porque a topografia da cidade é muito acidentada e isso vai danificar os seus coletivos. É lógico que há nisso uma conivência da administração municipal.

Além disso, tem a questão da acessibilidade nos museus e prédios antigos que foram restaurados. Eles alegam que não podem colocar uma rampa ou um elevador, porque isso irá descaracterizar aquela obra, aquele prédio. Por outro lado, temos que mostrar para eles o que é deficiente, porque eles alegam que o muletante não é deficiente e não dão o passe livre municipal. Quem tem deficiência mental em grau mínimo também não é considerado deficiente. Portanto, nós precisamos

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de critérios e definições sobre o que é ser deficiente. Acredito que isso não esteja acontecendo apenas em Cachoeira do Itapemirim; muitas cidades por esse Brasil afora devem estar nesta mesma situação.

Obrigado!

Francisco Leovan de OliveiraDelegação do Maranhão

Boa tarde a todos.

Eu gostaria de fazer uma pergunta à Dra. Ângela sobre o acesso das pessoas com deficiência: que atitude os Municípios e Estados brasileiros vão tomar para enxergar as nossas dificuldades, sem que a pessoa com deficiência ou sua família tenha que cobrar.

Eu moro no interior do Maranhão, em São João dos Patos. Eu sou Presidente do Conselho Municipal de Defesa do Portador de Deficiência e nós temos uma visão ampla, porque, quando nós começamos o trabalho de defesa dos direitos das pessoas com deficiência, eu me dirigi às escolas estaduais e municipais para pedir que facilitassem o acesso das pessoas que andam de cadeiras de rodas. As diretoras das escolas chegaram a comunicar que isso não era necessário, porque em São João dos Patos não havia deficientes em cadeiras de rodas. Eu levei a briga adiante e as escolas estaduais agora têm acesso mediante rampas, nas suas entradas, e têm banheiros adaptados. Mas, como o Maranhão tem 217 Municípios e a maioria das autoridades conhece as leis sobre os nossos direitos e deveres, mas não faz esse trabalho, nada acontece.

Se a sociedade se sensibilizar, fizer manifestações em frente às prefeituras, às sedes dos governos estaduais, do governo federal, do Congresso Nacional, enfim, chamando a atenção de todos para essa questão, eu acho que isso pode ser resolvido. Nós não podemos ficar esperando pelas leis que estão no papel. Então, quero saber que atitude os Municípios devem tomar sem que a gente tenha que ir até eles.

Obrigado!

Ângela Carneiro da CunhaConsultora da CORDE

Foram oito perguntas e eu juntei-as por temas, porque tem algumas repetidas.

Em relação à questão da habitação social, dos conjuntos habitacionais, o Decreto é bem claro quando diz que a habitação de interesse social tem que contemplar a questão da acessibilidade. A acessibilidade não é só especificamente para o cadeirante. A Acessibilidade significa fazer um projeto onde a pessoa possa envelhecer na sua casa. Passamos a vida inteira juntando dinheiro para comprarmos nossos imóveis e não é justo que ao envelhecer e termos que sair de nossas habitações. É isso que acontece hoje em dia. Os projetos têm que prever que, um dia, poderemos ter que usar uma cadeira de rodas; há a possibilidade futura de termos uma deficiência visual e esse espaço tem que ser utilizado por toda a família, pelos netos, bisnetos; até pelo avô ou avó, com seus 100 anos, que é a expectativa de vida que se espera alcançar dentro em breve.

Em relação aos condomínios multifamiliares, eu penso que tudo começa pela sensibilização e pela informação sobre o tema à população, à sociedade civil. Nós precisamos recuperar a questão da nossa cidadania. A cidade nos pertence e nós precisamos entender que tudo o que tem nela pertence ao cidadão, e nós precisamos tomar conta disso. Tudo começa, portanto, por um trabalho de

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conscientização junto aos incorporadores e essas edificações vão ter um diferencial de qualidade na hora da venda. Isso já existe em todos os países civilizados do mundo. Os proprietários conseguem vender mais caro uma construção acessível. O que você investe para transformar uma construção em acessível é muito pouco com relação ao que se ganha. Quando a gente descreveu o Plano Municipal de Acessibilidade como um modelo que nós precisamos implantar no nosso Plano Diretor, mostramos que o trabalho começa com sensibilização, capacitação e formação. A participação da sociedade civil para que esse trabalho seja feito é importantíssima. O arquiteto e o planejador são apenas meros instrumentos para que isso seja feito. A sociedade civil e as entidades de pessoas com deficiência precisam estar presentes sim, porque é um grupo que precisa mostrar o que ele necessita, e, às vezes, isso tem que ser incorporado aos projetos.

Quando se fala de calçadas, essa talvez seja uma das áreas mais complexas da cidade. Hoje, nos países da Europa, por exemplo, a responsabilidade pela edificação da calçada, que é a artéria principal de circulação da cidade, não pode ser tratada como uma colcha de retalhos. O sistema de circulação da cidade no caso dos veículos motorizados está sempre associado à calçada e não dá para se planejar que cada pessoa responsável por seu lote faça sua calçada de maneira diferente. A gente precisa lutar para que o Município assuma a responsabilidade de planejar e normatizar sobre calçadas, no sentido de mostrar ao cidadão como ele deve mantê-las. É preciso definir uma área de serviços, nas calçadas, onde vão ser locados os “orelhões”, por exemplo. O orelhão é um dos mobiliários usados na calçada. Hoje, a NBR diz que o desenho que existe no Brasil dos “orelhões” é completamente falho, porque coloca a pessoa cega, a pessoa de baixa visão e a pessoa distraída em risco. Em função disso, acontece de as pessoas baterem o rosto no orelhão. Então, hoje existe uma normatização da obrigatoriedade da colocação do piso de alerta embaixo dos orelhões, mas o que a gente tem que fazer é mudar o desenho desses orelhões, porque ele é completamente inadequado.

A última questão é o que fazer para dar condições ao Ministério Público de trabalhar essa questão da acessibilidade. Eu posso falar para vocês sobre a experiência que a gente tem lá no Estado de Pernambuco. A primeira coisa que nós fizemos foi capacitar os técnicos do Ministério Público e orientar os nossos promotores para que eles compreendessem a questão e pudessem trabalhar na mesma em prol da sociedade. Estamos fazendo um trabalho educativo onde pegamos edificações públicas de uso coletivo, edificações privadas de uso coletivo e fazemos um trabalho de orientação e um Termo de Ajuste de Conduta para projetos, e também uma previsão, mesmo antes da obrigatoriedade do prazo legal, para que essas edificações sejam adequadas.

As atitudes do Município são importantíssimas. Tudo o que acontece no espaço urbano está diretamente ligado ao governo municipal e toda a população tem a obrigatoriedade de participar dessa atitude. Hoje existem instrumentos que não existiam no país anteriormente, de que é exemplo a consulta pública. Todas essas leis e normas são colocadas em consulta pública. Então, precisamos esclarecer a população que esses instrumentos estão em consulta pública para que haja uma participação efetiva e que todas essas atitudes municipais atendam à população.

Eu acho que foram essas as questões encaminhadas.

DA ACESSIBILIDADE À INFORMAÇÃO, À COMUNICAÇÃO E ÀS AJUDAS TÉCNICAS

Composição da Mesa:

Moderador: Dr. Omar Edson Varela, Graduado em Ciência da Computação pela UST e Pós-Graduado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e Diretor do Centro de Acessibilidade da IBM/Brasil.

Palestrantes: Professor José Antonio dos Santos Borges, Graduado em Informática pela UFRJ e Mestre em Informática pela COOPE; integrante do Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Trabalha no desenvolvimento de tecnologias assistivas para deficientes, em especial, o Projeto DOSVOX e Motrix, que são os dois mais conhecidos no Brasil para

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suporte de deficientes visuais e motores. Dr. Genézio Fernandes Vieira, do CONADE. Procurador da Fazenda Nacional, Pós-Graduado Stricto Sensu em Direito da Família e também Pós-Graduado em Direito da Criança e do Adolescente pela Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil. Professor Marcos Pinotti Barbosa da Universidade Federal de Minas Gerais. Graduado em Engenharia Mecânica, com Mestrado e Doutorado pela UNICAMP; é Coordenador do Laboratório de Bioengenharia da Universidade de Minas Gerais.

Omar Edson VarelaModerador

Bom dia a todos!

Representando a IBM, eu fico muito honrado em colaborar no sentido de moderar esta Mesa Redonda, que tem uma temática muito importante para nós, pessoas com deficiência. A questão da tecnologia representa uma possibilidade de oferecer autonomia e independência às pessoas com deficiência. No Brasil, infelizmente, nós temos muito que fazer na área da tecnologia, e essa Mesa Redonda é de suma importância dentro do contexto da conferência. Nós vamos ter a oportunidade de ouvir exposições a respeito de três subtemas extremamente importantes. O primeiro, é o tema das questões de tecnologia relativas à informação, destacando-se, principalmente, o uso do computador. Depois, teremos uma outra intervenção a respeito do mundo das comunicações, da telefonia. Estamos num momento importante, discutindo questões ligadas à TV Digital. E, finalmente, teremos também uma apresentação sobre ajudas técnicas.

José Antonio dos Santos BorgesProfessor da UFRJ

Bom dia a todos! É um prazer muito grande estar aqui, porque a questão da acessibilidade se está tornando o assunto da moda. Eu estou apresentando aqui dois personagens, o Jatobá e a Marquesine, apenas como uma coisa simbólica, para mostrar que as pessoas com deficiência, hoje, estão deixando de ser pessoas invisíveis.

Eu estava conversando com a minha mulher, Lenira, há umas duas semanas e ela estava me dizendo que, há 30 anos, quando ela ficou tetraplégica, ela passava pela rua e parecia que o pessoal estava vendo um ET. Todo mundo se juntava. Hoje, houve um incremento espantoso do número de pessoas com deficiência e isso já não acontece, embora traga sempre uma grande quantidade de problemas.

Vamos começar pensando quantos deficientes existem no Brasil, sendo que a grande maioria deles ainda está escondida. São muitos. Pelo Censo de 2000, a população brasileira é de 169.799.170 pessoas. O total de deficientes é de 24.537.984. Ou seja, quatorze e meio por cento(14,5%) da nossa população têm algum tipo de deficiência. Se você considerar que a grande maioria das pessoas idosas tem alguma deficiência, você vai descobrir que esse número não é errado.

Quantas dessas pessoas são bem-sucedidas do ponto de vista da sociedade? Eu tenho aqui algumas fotos, como, por exemplo, da Ethel, que aparece na televisão com o seu cachorro; do Ricardinho, que é o primeiro aluno do CEDERJ; do Glauco Cerejo, que é saxofonista do Ney Matogrosso; da minha esposa Lenira, que é Médica Radiologista; do Sandro Laina, que é campeão para olímpico na área de Go - Ball. Todos esses deficientes são bem sucedidos. O que faz essas pessoas serem bem sucedidas? Será que elas são diferentes? Será que elas têm algo mais? Na verdade, a

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desvantagem física dessas pessoas é real e elas são bem sucedidas. O que faz com que elas sejam bem sucedidas? Será que elas nasceram em berço de ouro? Ou será que a família delas é tão especial assim? Ou será que elas tiveram um suporte financeiro extraordinário na sua vida que tornaram as dificuldades menores? Ou será que elas são pessoas realmente fora de série? Pode até ser um pouco disso sim, mas a grande realidade é que elas tiveram condições de vencer as barreiras, que são as barreiras arquitetônicas ou as estratégias de ensino inadequadas. Por exemplo, uma pessoa cega que chega à universidade precisa ler um texto em Braille e o texto não está disponível. Os materiais são totalmente inadequados e os professores não sabem como atender essa situação. Um outro problema é o acesso precário aos meios de comunicação. O cego liga na NET para assistir um filme que está em inglês e não consegue escutar a dublagem; então, ele tem que saber inglês porque a dublagem não serve para nada. Ou um surdo que não tem a transcrição para Libras. Acima de tudo, elas venceram apesar de não existir, no tempo em que elas floresceram, tecnologias assistivas convenientes. E mais do que isso, mesmo existindo essas tecnologias, a família, os professores e a própria pessoa deficiente não tinham conhecimento sobre essas tecnologias. E, acima de tudo, conseguiram vencer o preconceito.

Então, essas pessoas venceram muitos desafios. Mas foram desafios demais. Não precisavam ser tantos. A idéia é que a pessoa deficiente tenha condição de lutar, como todo o ser humano, mas sem ter que vencer tantos desafios, sem ter desafios demais na sua frente. Se houvesse apoio e oportunidades, se houvesse disponibilidade financeira que desse suporte a todo esse processo e se houvesse, acima de tudo, políticas que lhes garantissem o que eu chamaria de “direitos especiais”, tudo seria mais fácil. O que eu estou chamando de “direitos especiais” substitui uma expressão que era utilizada há até bem pouco tempo atrás, chamada “necessidades especiais”. Não vamos pensar em necessidades especiais. Vamos pensar em direitos especiais. Que direitos são esses? Primeiramente, o direito ao acesso físico pleno, amplo, sem barreiras arquitetônicas; o direito ao acesso à informação sem barreias; o direito ao trabalho, independentemente da condição física ou mental. Não importa se a pessoa tem uma situação absolutamente precária, se está deitada numa maca e só consegue piscar o olho. Essa pessoa também deve ter o direito assegurado ao trabalho. Que trabalho? Eu não sei, mas esse é um direito e precisamos buscar que trabalho essa pessoa pode realizar. O direito à saúde diferenciada. Para a pessoa que tem uma deficiência, a saúde é um tema muito importante. Todos esses são temas muito interessantes, mas no tocante a essa fala de hoje, eu gostaria de ressaltar o direito à educação diferenciada e o direito ao acesso às tecnologias assistivas, que fazem realmente a diferença e faz com que a pessoa com deficiência possa se tornar uma pessoa mais produtiva, uma pessoa mais integrada, uma pessoa mais feliz.

Que direitos educativos especiais são esses? Toda a pessoa com deficiência vai apresentar certas dificuldades, que são maiores em relação às das demais pessoas. Essa pessoa vai precisar de caminhos alternativos para conseguir estudar com eficiência. Ou seja, ela deve ter direito a uma educação diferenciada. Aqui, há muitos caminhos: educação inclusiva, educação exclusiva. No Brasil, nós vivemos um momento de indefinição com relação a isso, um momento de chegar a novos caminhos. Esse tema é muito complexo e transcende à nossa conversa aqui.

Uma outra coisa muito importante é que a deficiência é provocada também pelo envelhecimento. Todos, um dia, ficaremos mais deficientes e o número de deficientes se amplia enormemente com o aumento da expectativa de vida dos seres humanos.

O tema que nós vamos tocar é exatamente o tema de tecnologias assistivas, que são coisas que tornam a vida da pessoa mais eficiente ou menos deficiente, e elas facilitam a integração e a inclusão.

Hoje em dia, praticamente todas as tecnologias assistivas envolvem algum tipo de computação e de eletrônica ou seus derivados. Essas tecnologias conseguem mudar tudo. Elas conseguem mudar as possibilidades de estudo, em todos os níveis, desde a alfabetização até à pós-graduação; conseguem mudar as oportunidades de trabalho, sejam de suportes às profissões usuais, sejam atividades com uso direto da tecnologia, como computação, telemarketing e tele-controle; e até as oportunidades de lazer, novas opções de diversão e com diversões usuais de não-deficientes, que são adaptadas mediante tecnologia para seu uso com deficientes. Que tecnologias são essas? É importante que a gente saiba que hoje há uma enorme quantidade de tecnologias, uma infinita quantidade de tecnologias, mas não para todas as situações. Infelizmente, não há tecnologias para todos os casos. Mas,

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o avanço nessa área é enorme. Se a gente pensar, por exemplo, que há três anos aqui no Brasil uma pessoa cega não tinha acesso, por exemplo, a um livro digitalizado, a um livro que ele pudesse ler no computador... Hoje, é completamente trivial que, mediante tecnologias de síntese de voz, uma pessoa cega chegue a uma livraria, compre um livro e leia esse livro em casa sem a ajuda de ninguém.

Então, vamos falar de alguns desses sistemas.

Sistemas para Deficientes Visuais

No caso dos deficientes visuais, a síntese de voz é a chave do acesso a tudo. Eu tenho aqui alguns exemplos. Vou fazer uma exibição de síntese de voz: “esta é a voz da síntese da IBM, denominada, outloud, que é base do desenvolvimento de inúmeros sistemas que fazem uso de síntese de voz. Infelizmente, a IBM vendeu seus produtos de síntese e reconhecimento de síntese de voz para a Skysoft, que descontinuou a comercialização de produtos para a língua portuguesa.” Eu quero dizer que nem tudo são flores. A IBM vendeu seus produtos para uma empresa, por razões de ordem comercial. Essa empresa decidiu que o Brasil não lhe interessava, que agora o que interessava era desenvolver o produto para o mandarim porque essa é a língua da moda. É claro que eu estou simplificando a situação, mas isso é só para deixar a coisa bem simples. Agora, vejam vocês a evolução dessa tecnologia. Olhem a qualidade que a síntese de voz tem hoje. Isso que vocês vão ouvir não é a voz de um ser humano, é um robô falando. É um sistema DOSVOX falando: “Brasília. O Chefe da Missão do Fundo Monetário Internacional “ FMI no Brasil, Charles Collins, elogiou a política de reestruturação da dívida que o governo vem desenvolvendo, com diminuição da parcela em dólar. Collins disse que está no país para uma avaliação de monitoramento pós acordo”. Então, você vê que o computador falando é igual ao ser humano. O uso de computadores para os deficientes visuais tornou a leitura escrita razoavelmente compatível com as pessoas que são videntes. Então, o que o cego escreve é lido e ele consegue ler o que as pessoas escrevem. Isso provocou uma revolução cultural, porque agora o estudante cego pode se integrar numa sala de aula. Ele pode escrever e os colegas lerem. Ele pode fazer um trabalho em conjunto com esses colegas. Ele pode fazer uma prova e o professor conseguir ler e ele pode fazer com que os seus textos sejam publicados no jornal. Quantos livros já foram publicados escritos pelo DOSVOX? Uma quantidade enorme, talvez uns 50 ou mais livros. Esses livros já existiam antes do DOSVOX, só que um cego chegava numa livraria para publicar esse livro e a livraria simplesmente negava. Então, o DOSVOX democratizou o acesso.

Existe o VirtualVision, que é uma iniciativa da Fundação Bradesco, com reconhecimento da Microsoft. É um sistema de leitura de telas. E existe o JAWS, que é um sistema produzido por uma empresa chamada RENTADRESS, que já sofreu várias mudanças, várias vendas e é o sistema de leitura de telas mais conhecido no mundo. Há uma grande quantidade de programas, por exemplo, para visão subnormal, desde equipamentos ampliadores de tela, equipamentos especializados e softwares, em particular, o IBM WAP, que é o Web Adaptation Technology, que integra diversos produtos de tecnologia em um único produto. E existem muitas outras tecnologias para deficientes visuais. Todas são automatizadas de Braille. Você coloca um texto que vem do word ou que vem de um bloco de notas em um programa chamado Braille Fácil, aperta um botão e isso sai em Braille.

Temos a localização pelo GPS. O cego vai andando pela rua, com um equipamento GPS na cintura e o equipamento vai guiando, dizendo: “Vira para a direita, vira para a esquerda”. Esse é um produto que foi desenvolvido recentemente e foi parte de um projeto que ganhou um dos prêmios que a MICROSOFT promoveu no ano de 2006.

Temos a telefonia móvel falante. O computador e o telefone hoje se aproximam muito. Hoje a pessoa usa o telefone e o telefone fala com ela, dando agenda, números etc. As pessoas têm as bibliotecas digitais sonoras à sua disposição. Então, o que eu quero dizer é que, para o deficiente visual, a situação melhorou incrivelmente.

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E para os deficientes motores também. É claro que, no caso dos deficientes motores, sempre serão necessárias adaptações físicas; adaptações no ambiente, tamanho das portas, adaptações no banheiro, cuidado com desnível, sinalizações etc. No caso de órteses e próteses, hoje em dia há um grande desenvolvimento de tecnologias inovadoras no Brasil. Temos a incorporação da biorrobotização. Um braço mecânico que se acopla a um braço que está faltando faz com que esse braço mecânico consiga produzir os movimentos. A ciborguização é o desenvolvimento da medicina que provoca a substituição de partes do corpo. A pessoa coloca um aparelho que a transforma num ciborg e aquele aparelho lhe proporciona uma visão robotizada. Há ainda adaptações para transportes e o Brasil já está instalando e fabricando veículos adaptados, cadeiras de rodas robotizadas e uma imensa quantidade de equipamentos há disposição das pessoas com deficiência.

O tema aqui seria mais voltado para computadores. Hoje, para uma pessoa que não tem as mãos ou que só pode fazer uso precário das mãos, é possível fazer o controle do computador utilizando diversos dispositivos, como mouse adaptado etc. Mas, hoje em dia é perfeitamente possível usar o computador pela voz. Você fala com o computador e ele faz o que você quer. Minha mulher Lenira é tetraplégica e não consegue usar o mouse e o teclado. Ela controla o computador completamente, utilizando um sistema chamado MOTRIX, e usa várias coisas. Ela manda e-mails, acessa a internet, faz uma porção de coisas utilizando essa tecnologia de acionamento de voz. Isso é muito ágil. A pessoa precisa falar com certa precisão.

O reconhecimento da voz ainda é uma tecnologia um tanto precária, mas representa um avanço muito grande. Imaginem uma pessoa que não podia mexer com computador há três anos e agora consegue usar o computador livremente, tendo acesso à informação e a todas essas inovações. Na nossa casa, existe um controle de ambiente. A Lenira pode acender uma luz, pode ligar o ventilador pelo computador. Ela está deitada na cama e fala: “computador, ligue o ventilador!”. O computador liga. Nós estamos instalando agora o X-10. É uma coisa que existe há muitos anos nos Estados Unidos, mas aqui é novidade. O computador pode controlar toda a casa, utilizando apenas a síntese de voz ou uns botões que você pode colocar na sua cama. É um pouco difícil achar isso no Brasil, mas nos Estados Unidos um plug X-10 para ligar uma lâmpada custa na faixa de US$ 15.00. Não é uma coisa tão cara.

Há algum tempo, há mais ou menos dois anos, eu conheci uma pessoa chamada Luciana de Novaes. É uma estudante da Universidade Estácio de Sá que levou um tiro e ficou completamente tetraplégica. Ela não falava, não mexia nada. Mesmo assim, ela conseguia usar o computador. Como? Inicialmente, ela usava o computador com os olhos. Depois, eu descobri que quando ela queria chamar a mãe, ela fazia um barulho com a língua. Eu coloquei um microfone na boca dessa menina e quando ela faz o movimento com a língua o computador faz o que ela quer. Aparece na tela do computador um menu com várias opções. Por exemplo: cima, baixo, esquerda, direita, clicar. Aquelas opções vão-se iluminando, uma após outra. Quando a opção “cima” se ilumina, ela faz um barulho com a língua e o computador move o curso para cima, ou faz um outro movimento com a língua e o computador clica. Uma pessoa que teria um acesso extremamente precário à tecnologia, hoje pode ter um acesso completo ao uso do computador. E se ela tem acesso ao uso do computador, ela pode controlar a casa também. Ela pode controlar uma cadeira de rodas e pode andar. Não sei se vocês já ouviram falar no Stephen Hawkins, que é um dos maiores escritores da área científica do mundo. Ele comanda tudo apenas com um único dedo que ele consegue mexer. De todo o corpo, a única coisa que ele mexe é um dedo. Ele não fala e já escreveu vários livros de grande sucesso e de importância extraordinária para a ciência.

Sistemas para Deficientes Auditivos

Infelizmente, existem poucos sistemas de computação para deficientes auditivos. Você sempre pensa que o uso do computador pelo deficiente auditivo é um uso simples, mas não é. Se a pessoa ficou surda depois de adulta ela já sabe português. Então, ela consegue ler tudo aquilo que está sendo apresentado na tela. Mas, no caso da pessoa que nasceu surda, o português é uma língua tão difícil quanto é o norueguês para vocês. Então, é muito difícil para a pessoa surda aprender português. A língua

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natural para ela é a libras. Embora já exista uma grande quantidade de facilidades, tais como mensagens pelo telefone celular, chats, close caption na televisão, conversa pela internet etc., tudo isso ainda é precário. Os deficientes auditivos vão usar bem o computador se a comunicação for essencialmente por imagens. Mas, se for uma comunicação escrita, isso vai ser sempre um problema enorme. A língua do surdo de nascença não é o português; é a libras. No caso da surdez total, a comunicação por libras é mais ou menos equivalente, anos atrás, à comunicação por Braille, no caso do cego. A pessoa cega escrevia Braille e ninguém lia. O surdo fala em libras e ninguém lê. É a mesma situação. Nós vamos ter que resolver essa situação, porque isso provoca um imenso isolamento cultural. Se essa questão do português para o surdo é de extrema dificuldade, isso também é um desafio. Incluindo a leitura labial, por exemplo, isso exige muitos anos de treinamento intensivo. Mesmo após esses anos de treinamento intensivo, o surdo, provavelmente, não vai conseguir chegar a um nível de entendimento corrente pelas outras pessoas. Seria bom, por exemplo, se o surdo estivesse numa sala onde o professor dá aula com um head phone conectado ao computador que faz reconhecimento de fala. Na tela do computador, para que o surdo pudesse entender, haveria um boneco robotizado falando libras. Não seria fantástico? Isso não é sonho. Isso pode existir.

Há inúmeras idéias novas. Por exemplo, se uma pessoa quer falar com um surdo por um telefone celular ela liga para uma operadora e alguém, um robô, ou um sistema de reconhecimento de voz vai pegar a informação que está sendo exibida e passar, em libras, para que apareça um desenho nessa linguagem no celular da pessoa.

Há a comunicação alternativa. Para as pessoas que têm uma dificuldade muito grande, hoje já existem muitas soluções para que ela consiga se comunicar. O computador fala por ela e assim ela consegue sair de si mesma.

Existem muitos sistemas. Existem soluções que estão prontas; soluções para cegos.Quase todas estão prontas. Mas, no caso de solução para a paralisia cerebral ainda temos muito caminho pela frente e não podemos deixar que isso seja interrompido. É por isso que o papel do Estado é importante. Não é fácil usar tecnologia no Brasil de forma ampla, porque o nosso país ainda é muito pobre. Quase sempre, a educação é precária devido à condição social e física. O acesso às telecomunicações ainda é precário. A grande maioria do nosso povo é analfabeto digital, pois nunca viu um computador, não têm a menor idéia de que isso existe. Se eu sou um cego que nasce lá no interior do Estado do Pará, teoricamente eu posso usar um DOSVOX, mas quem vai ensinar esse cego lá do interior do Pará a usar DOSVOX? Como é que ele vai comprar um computador, se ele mora no meio de uma floresta e lá não tem luz elétrica? Então, as dificuldades do Brasil são imensas, desafiadoras, e o papel do Estado é fundamental para que esse processo tenha uma solução.

No caso das tecnologias assistivas, é papel fundamental do Estado garantir o acesso de todas as pessoas à tecnologia, com respeito às diferenças. É necessário capacitar os deficientes. É papel do Estado desenvolver ações que promovam a capacitação dos deficientes, de suas famílias, de seus professores e terapeutas. Há grande maioria dos oftalmologistas do Rio de Janeiro não tem a menor idéia do que seja DOSVOX. O Estado tem que promover ações que removam não apenas as barreiras arquitetônicas, mas as barreiras dos ítens comuns. Por exemplo, um cego quer manipular um microondas, mas não sabe que botão apertar. Ele vai acabar decorando, mas não seria melhor que isso já viesse em Braille para ele? Temos também a barreira das comunicações. Por exemplo, um cego quer ir ao cinema e assistir a um filme com um alto teor de suspense, e, de repente, aparece aquela música indicando suspense e ele não sabe o que está acontecendo. É a questão do acesso no sentido amplo.

Hoje em dia, para fazermos a Declaração do Imposto de Renda temos que usar o computador. Cada vez se torna mais difícil fazer a declaração em papel. Mas se eu sou uma pessoa que mora lá no interior e não tenho computador, como é que eu vou fazer minha Declaração? O governo eletrônico é uma realidade, mas para quem?

Então, garantir o acesso a todos implica em muitas coisas que são pedras no sapato do governo. Por exemplo, isenção ou diferenciação de impostos. Outro dia, eu estava em casa assistindo a televisão e perguntei à minha mulher: “Quanto é que você pagou por esse remédio?”. E ela me disse:

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“R$ 10,00!”. Eu fui na internet para saber quanto custava o medicamento nos Estados Unidos. Lá custava R$ 2,50. Isso é um absurdo. Grande parte dessa diferença de preço do remédio é imposto.

Minha mulher tem um automóvel adaptado, mas sendo tetraplégica ela não tem direito a isenção de ICMS. Se ela fosse paraplégica, teria. Se sou cego e preciso de alguém para dirigir para mim eu não tenho isenção de imposto. Então, a questão de isenção de impostos para deficientes é muito importante para que se possa realmente promover o barateamento dos bens.

Outra coisa muito importante é o fomento à criação e disseminação de novas soluções tecnológicas. Por exemplo, aqui no Brasil, em 13 anos se desenvolveu uma quantidade extraordinária de softwares para acessibilidade. Por quê? Porque houve investimento para isso. Um dia, o MEC precisava promover a impressão em Braille em larga escala. Eles pagaram um projeto e foi criado um programa chamado “Braille Fácil”, que democratizou o acesso da impressão em Braille no Brasil. Então, é uma questão de alocar recursos, escolher as pessoas certas e está popularizada a tecnologia. O fomento à criação e disseminação de novas soluções tecnológicas é um papel essencial do Estado.

É importante fomentar projetos educacionais inclusivos. As ações políticas devem garantir aqueles direitos que eu mencionei no início: o direito ao acesso físico amplo, sem barreiras arquitetônicas. Isso é um direito. Direito não se discute. Não é necessidade. Direito é direito. É por isso que trocamos a expressão “necessidades especiais” por “direitos especiais”. O deficiente tem direitos especiais; direito ao acesso à informação sem barreiras; direito ao trabalho, independentemente da condição física ou mental; direito à saúde pública diferenciada; direito à educação diferenciada; direito às tecnologias assistivas.

No caso da educação, o Brasil é muito grande, mas existem algumas soluções, como a educação à distância, que podem ajudar. Uma delas é o treinamento à distância de professores de deficientes. Se eu sou um deficiente que moro muito longe, pelos meios de comunicação, da televisão, da internet, o professor, o deficiente e sua família, o seu terapeuta poderiam ter acesso à informação à distância. É claro que está sendo feito um grande esforço no treinamento de professores e o desenvolvimento de grandes tecnologias assistivas, mas o problema é garantir quantidade e qualidade. O importante é fazer isso em nível nacional e não apenas para um pequeno grupo. Temos que ir além.

Minha última observação diz respeito à questão da ética. Eu coloquei essa transparência ontem, depois que vi uma série de situações absolutamente indesejáveis em que muitas pessoas agiram neste congresso, sem considerar os aspectos da ética.

As regras são necessárias para impor limites. E não são apenas os limites que dizem respeito à manipulação genética. Não são apenas as regras de ética para evitar que haja “purificação” de nascimentos para que só nasçam pessoas perfeitas, ou, se nascer um deficiente, que seja permitido matá-lo. Não é esse tipo de ética. E não é só a ética de só ter acesso à tecnologia a pessoa bem dotada financeiramente. E também não é a ética do ser deficiente amplificado. Por exemplo, lá no Rio de Janeiro, o chefe de uma quadrilha é um cadeirante. Eu não estou falando desse tipo de ética. Eu estou falando de uma ética maior, de uma ética que permeia as nossas ações e que possa permitir que nós todos, deficientes e não deficientes, possamos construir um Brasil melhor. A tecnologia amplifica o ser humano, diminuindo as suas limitações. Então, nós não podemos permitir que a falta de tecnologia possa tornar o indivíduo comum um deficiente.

Muito obrigado!

COMUNICAÇÃO E A TECNOLOGIA

Genézio Fernandes VieiraCONADE

Bom dia a todos!

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Antes de entrar na minha fala propriamente dita, eu gostaria de fazer uma rápida menção ao “Caso Suzy”; aquele problema que ocorreu aqui na abertura.Como alguns aqui sabem, a Suzy é a minha paixão, ela é uma pessoa a quem eu dedico um momento muito especial da minha vida. Fiquei muito triste com o fato que ocorreu aqui na abertura e não poderia deixar de consignar aqui essa tristeza, ao mesmo tempo em que não posso também deixar de agradecer as autoridades organizadoras deste evento, notadamente a Dra. Izabel Maior, da CORDE, ao Professor Adilson Ventura, Presidente do CONADE, a Professora Rita Maria, vice-presidente do CONADE, e os delegados presentes. O que as autoridades responsáveis pelo evento podiam fazer foi feito, as desculpas foram aceitas, e eu só lamentei muito porque nós não tivemos a oportunidade de dar a este plenário um presente muito bonito e competente de uma pessoa com deficiência. Mas, enfim, as desculpas foram apresentadas em público. Com certeza a Suzy se desculpou, mas nós ficamos um pouco tristes e não podemos deixar de consignar isto.

Queria agradecer especialmente à delegação da Paraíba, que hipotecou toda solidariedade à Suzy, principalmente a Dra. Maria de Fátima, que é a Presidente da FUNADE da Paraíba. Quando ocorreu lá um fato semelhante, começaram a tocar a música e a Dra. Fátima, com a autoridade que lhe é peculiar, mandou parar para que a Suzy pudesse cantar à capela. Essa dificuldade é porque algumas pessoas não entendem o sentido de cantar à capela.

Falar depois do Professor Antônio Borges é complicado, porque, além dele falar muito bem, ele praticamente tratou de toda a temática que interessa à comunicação. Restou a mim, basicamente, os aspectos políticos da comunicação, porque o aspecto tecnológico já foi devidamente enriquecido. De qualquer forma, vou ousar continuar tentando falar alguma coisa, indo na esteira que o Professor Antonio Borges deixou.

Por um ruído de comunicação, eu havia entendido que a minha fala seria sobre acessibilidade de comunicação na televisão. Depois, lendo aqui a programação em Braille é que eu pude descobrir que é sobre todas as tecnologias de comunicação. Então, o que eu havia escrito está valendo ainda, mas vai ter que haver uma parte de improviso, porque falarei também de telefonia, televisão, internet, comunicação interativa etc.

Nós temos que falar com base nas diretrizes do art. 6º do Regimento Interno da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Cada uma dessas diretrizes constituem um tema que daria perfeitamente para ser discutido numa Mesa Redonda. Dentro das nossas limitações, vamos procurar tirar o melhor proveito deste momento para tentar contemplar as questões necessárias, para sairmos daqui com propostas concretas visando fazer com que as comunicações se tornem acessíveis de verdade, em conformidade com a regulamentação da Lei nº 10.098, contida no Decreto nº 5296.

Quando dizemos “acessibilidade, você também tem compromisso”, nesta afirmação já estão contidos os principais valores principiológicos que, de um lado, asseguram o direito sagrado que as pessoas com deficiência têm de ter acessibilidade, e, de outro lado, o dever da sociedade de criar os meios necessários para que sejam removidas as barreiras sociais, as barreiras culturais, físicas, de sistemas ou mecanismos. É imperioso que a sociedade tenha esta consciência solidária para que possamos realmente nos tornar uma sociedade efetivamente inclusiva. Sem remoção das barreiras de acessibilidade é impossível falar-se em inclusão social.

Urge evidenciar que a acessibilidade só será possível na justa medida em que as pessoas com deficiência tomarem, em suas próprias mãos, os destinos políticos. Não há como se imaginar que um segmento possa ter espaço na sociedade, se ele não for parte do poder político. Eu exemplificaria com a atual coordenadora-geral da CORDE, Dra. Izabel Maior, e o Professor Adilson Ventura, Presidente do CONADE. Eles estão há cerca de quatro anos à frente dessas entidades, e, sem a menor dúvida, promoveram um forte impulso político ao nosso segmento. Nós podemos ver isso com a realização dessa Conferência e vários outros fatos políticos que têm ocorrido ultimamente e que demonstram essa assertiva.

No tocante à TV acessível, o Professor Antônio Borges ainda há pouco falava que existem todos os mecanismos necessários para que haja uma perfeita interação entre os sistemas de comunicação e as pessoas com deficiência. O grande problema que eu colocaria aqui seria a necessidade de uma

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filosofia de vida na nossa sociedade: a consciência social. Se não houver a consciência social da acessibilidade, ainda que nós tenhamos todos os mecanismos necessários para que essa acessibilidade nos ocorra, ficaremos sempre há alguns passos dela, ficaremos sempre perseguindo aquilo que não vai ser possível, porque nós não dispomos dos meios econômicos para fazer com que as tecnologias existentes ao nosso dispor se tornem efetivamente realidade.

Sem embargo, o que foi dito aqui pelo Professor Antônio Borges é fato. Nós temos hoje todos os mecanismos de informática que permitem que a pessoa com deficiência visual, mediante o sistema de síntese de voz, possa ter acesso aos menus de telefone, de televisão, de rádio e de gravador. E também pode ter os bonequinhos de Libras para os deficientes auditivos que não são oralizados. Mas, a questão é fazer com que o poder econômico e o poder político tornem isto realidade. Nós percebemos, nos inúmeros debates a respeito de vários temas de que participamos, que falta vontade política por parte de quem detém o poder político para fazer com que essas tecnologias realmente sejam implementadas, mediante os meios econômicos - e políticos, propriamente ditos.

No tocante à TV acessível - e isso também vale para o cinema - o que se tem visto são deturpações da função social da empresa, visando atender, prioritariamente, os interesses econômicos, deixando a dignidade da pessoa humana em caráter secundário. A concepção da solidariedade, da cidadania e da dignidade da pessoa humana são princípios constitucionais em que se fundam a sociedade e o Estado brasileiro. Portanto, a construção das normas bem como a sua interpretação e aplicação, obrigatoriamente, devem-se pautar por esses princípios, além de outros que visarem sempre beneficiar a pessoa humana e sua dignidade.

Em relação ao poder econômico, embora a iniciativa privada seja um fundamento da Constituição, a dignidade da pessoa humana e a cidadania são princípios precedentes, até mesmo pela posição antecedente que ocupam no texto constitucional. Toda a empresa tem sua responsabilidade social e cada vez mais as pessoas procuram consumir produtos de empresas que possuem uma imagem ilibada. Ser uma empresa que acate as normas e os princípios da acessibilidade e da inclusão social é uma das facetas da imagem pública de uma empresa que tem chamado cada vez mais a atenção dos consumidores. Então, os produtos das empresas que respeitam os direitos de acessibilidade e de inclusão social também passam a constituir patrimônio público que essas empresas têm, fazendo com que os consumidores procurem mais os bens e serviços dessas empresas. Essa responsabilidade social da empresa vai ser muito mais marcante, muito mais forte, na justa medida em que a consciência social for mais exigente. Sendo assim, é necessário que nós que fazemos parte do segmento das pessoas com deficiência cada vez mais levemos essa consciência à sociedade em geral, tornando-a uma filosofia de vida.

No caso das emissoras de radiodifusão e de imagem, como se trata de mídia de massa que se destina a informar, divertir, educar, orientar, fazer propaganda de bens e serviços, que, inclusive, se destinam às pessoas com deficiência - nós já somos cerca de 25 milhões de possíveis compradores - e outros assuntos sociais de todos os gêneros, a responsabilidade social dessas empresas é muito mais significativa. Destarte, esses veículos de comunicação têm a obrigação de serem acessíveis, de fazer com que o conteúdo de suas programações chegue plenamente a todas as pessoas, inobstante as suas limitações ou deficiências.

Então, o que seria uma TV acessível? Uma TV acessível seria aquele mecanismo de comunicação que pode ser acessado por todas as pessoas, com todas as limitações, em caráter universal, diferentemente do que ocorre hoje. A televisão brasileira, com toda essa tecnologia que foi colocada agora a pouco pelo Professor Antônio Borges, não apresenta a janelinha de libras, e, quando apresenta, ela é minúscula, o que significa dizer que o deficiente auditivo, ainda que enxergue bem, vai ter que usar lunetas para entender o que está ocorrendo. E a pessoa com deficiência visual, naquelas cenas de musiquinha - como disse o Professor ainda há pouco - e naquelas cenas panorâmicas, há certos momentos que fica tentando adivinhar, pela música se está havendo uma cena de terror ou uma cena de amor. Pelas musiquinhas, às vezes a gente consegue até se aproximar do que está acontecendo, mas podemos errar.

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É interessante registrar que os meios de comunicação de massa veiculam as matérias pagas ou as de utilidade pública, que muitas vezes são destinadas à própria pessoa com deficiência, mas essas matérias não vão ser captadas por seus destinatários, por falta absoluta de acessibilidade. É necessário que nós façamos com que toda a sociedade fique indignada com esse fato que tem fundo absolutamente econômico. A questão da não disponibilização desse direito às pessoas com deficiência é econômica. Todos nós sabemos que o poder político é derivado dessa questão.

Nós participamos dos debates sobre a televisão e é por isso que eu estou trazendo essa questão dos representantes para que os senhores tenham uma idéia de como ocorrem as disputas; de como nós precisamos participar intensamente; de como nós precisamos brigar muito pelas conquistas dos nossos direitos e como são desvantajosas nossas batalhas.

Na verdade, embora os representantes das emissoras de televisão digam que querem produzir uma TV acessível, não faltam argumentos da parte deles para que essa acessibilidade não ocorra. Apesar da Lei nº 10.098/2000 e do Decreto nº 5296/2004, que a regulamentou na parte de acessibilidade, e da Norma Técnica 15290, da ABNT, que trata de “Acessibilidade e Comunicação na Televisão”, legislação esta que definiu tudo o que é necessário para que a televisão possa ser considerada acessível, os detentores dessas concessões, os donos dessas emissoras, encontram desculpas para não nos disponibilizarem esses direitos, tendo como escudo argumentações que eu reputo falsas. Eles dizem que a tv analógica já está com os seus dias contados; que não teremos muito tempo mais de tv analógica e passaremos para a tv digital. Essa passagem da tv analógica para a tv digital demandará custos elevados para as empresas de televisão, que serão obrigadas a arcar com os mesmos. Ou seja, a tv digital obrigará essa mídia a fazer investimentos. Eles alegam que não tem cabimento, hoje, realizar despesas, disponibilizar recursos para tornar a tv analógica acessível e argumentam, por exemplo, que vão precisar gastar muito dinheiro com equipamento e mão-de-obra qualificada - taquígrafos para legenda oculta, intérpretes de libras para a janela de libras, locutores especializados em áudio-descrição das cenas mudas e panorâmicas e para dublagem.

Eles alegam também que as janelas de libras e a áudio-descrição, se implementadas, poderão prejudicar os direitos autorais, face ao art. 24 e 25 da Lei nº 9610/96, que é a lei dos direitos autorais. Diante dessas alegações, eles entendem que a tv analógica não teria o espaço necessário para fazer com que essas programações fossem acessíveis, e que, portanto, vão esperar a tv digital. Ocorre que a experiência que nós temos com os atuais aparelhos digitais nos leva à conclusão de que é apenas uma forma de fazer com que isto seja jogado para frente. É apenas uma maneira de fazer com que os nossos direitos não sejam atendidos, tendo em vista que, a tv digital, provavelmente, virá com aparelhos semelhantes aos microondas que o Professor Antônio Borges acabou de falar, com um sistema de manuseamento impróprio para as pessoas com deficiências sensoriais. Quando eu falo de deficiências sensoriais, evidentemente eu não estou fazendo referência aos deficientes auditivos que falam português e sim aos que falam libras, exclusivamente. A pergunta que eu faço é se valeria a pena nós ficarmos esperando uma tv digital, que não conhecemos e que provavelmente poderá até nos trazer acessibilidade nas comunicações, mas que não nos trará acessibilidade nos aparelhos. Para ter assegurado esse direito nós temos que ter assegurado o acesso à televisão, seja analógica ou digital. Os grupos de trabalho deverão responder a essa pergunta.

No que diz respeito ao telefone, o sistema de comunicação telefônica, hoje, no caso do celular, de certa forma, afeta a pessoa com deficiência visual, mas, em geral, vai mais de encontro aos interesses das pessoas com deficiência auditiva. Em geral, as operadoras de celular jogam para o consumidor o dever de fazer com que a telefonia se torne acessível. Nós acabamos por gastar muito dinheiro para ter um equipamento que fale para as pessoas com deficiência visual e que tenha dispositivos para atender às necessidades das pessoas com deficiência auditiva. É a mesma coisa que ocorre com a televisão. Há o interesse político, que, mais uma vez, está subordinado ao interesse econômico, e esses interesses “ o político e o econômico “ só poderão ter diferença se nós puxarmos a corda política para o outro lado. A sociedade é um cabo de guerra e nós precisamos exercer o controle social puxando esse cabo de guerra para o nosso lado, exercer o controle social rigoroso, por meio das entidades representativas dos nossos segmentos e dos conselhos dos direitos “ nacional, estaduais, municipais e do Distrito Federal.

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No que se refere à comunicação interativa, mais uma vez nós dispomos de todos os meios tecnológicos para que uma pessoa com deficiência, com qualquer limitação, já possa hoje interagir perfeitamente com todos os sistemas de comunicação informatizados. A questão é: “Cadê” a vontade de fazer com que haja acessibilidade nas páginas, de fazer com que haja acessibilidade em todos os mecanismos de comunicação, de fazer com que todos esses mecanismos se utilizem das tecnologias que já estão disponíveis hoje? A interação das pessoas com deficiência e os sistemas informatizados têm inúmeras dificuldades. Eu diria que as páginas e fotografias são hoje das piores que nós podemos encontrar. No que fiz respeito à TV acessível, à TV digital, o problema que vamos encontrar é a falta de acessibilidade interativa. A diferença que vai haver entre a tv analógica e a tv digital é a possibilidade de o telespectador interagir com o sistema de comunicação.

Agora, eu gostaria de partir para uma conclusão quanto a esses temas. Eu gostaria de dizer que as páginas do próprio governo ainda não estão acessíveis. Seria interessante pensarmos em sair daqui com propostas dos grupos no sentido de fazer com que páginas como as da Receita Federal fiquem acessíveis. Eu sou procurador da Fazenda e é constrangedor dizer que se eu quiser fazer sozinho a minha Declaração de Imposto de Renda eu não vou conseguir. Eu vou precisar expor o meu sigilo tributário, o que é um crime, porque a Constituição me assegura o direito ao sigilo tributário. Todavia, por ser cego, tenho que expor o meu sigilo tributário para pedir a uma pessoa que me ajude a fazer uma coisa que eu sei fazer melhor do que ela. Então, nós temos que sair daqui com propostas para que, definitivamente, o governo se proponha a fazer com que todas as suas páginas e os seus formulários na internet sejam acessíveis a todas as pessoas com qualquer limitação.

Proponho também que nós levemos uma proposta concreta para o Ministério das Comunicações e para a ANATEL, no sentido de que, tanto a tv a cabo como a tv aberta sejam acessíveis imediatamente a todas as pessoas com qualquer limitação e deficiência.

Vou ficar por aqui. Eu espero, de alguma forma, ter contribuído para este evento grandioso, que veio promover o debate sobre acessibilidade em todo o território nacional. Foi muito importante, em todos os cantos do Brasil por onde eu tive a oportunidade de passar, ver que pessoas que nunca tinham ouvido falar em necessidades de pessoas com deficiência e muito menos em acessibilidade, agora passaram a se preocupar com este assunto. Se nós não conseguirmos sair daqui com propostas que resolvam todos os nossos problemas, só a realização dessa Conferência já terá sido de uma grandiosidade tal, digna dos meus efusivos parabéns aos seus mentores.

Muito obrigado!

AJUDAS TÉCNICAS

Marcos Pinotti UFMG

Bom dia a todos!

Eu gostaria de agradecer o convite e o privilégio de estar aqui. Garanto a vocês que minha alegria é muito grande, além de ser muito inspirador estar falando sobre tecnologias assistivas ou ajudas técnicas para vocês.

Eu vou fazer algumas considerações iniciais e mostrar alguns exemplos. Eu trabalho na Universidade Federal de Minas Gerais, no Departamento de Engenharia Mecânica, e sou responsável pelo Laboratório de Bioengenharia.

Realizar a reabilitação sem equipamentos adequados é a arte de entreter o paciente, enquanto a natureza resolve curá-lo ou até ele desistir. Nós precisamos de tecnologia. A face ainda perversa do desenvolvimento tecnológico é que a área de diagnóstico é mais avançada do que a área da reabilitação.

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Por esse motivo, o lema do Laboratório de Bioengenharia é que nada resiste ao trabalho. Nós estamos trabalhando para reverter essa característica do desenvolvimento tecnológico.

Há alguns fatos importantes a considerar. Alta tecnologia não significa, necessariamente, alto custo. Daí vem o papel fundamental das universidades e centros de pesquisas públicos. Existe uma enorme demanda reprimida por essas tecnologias, não somente para as tarefas cotidianas, mas também para o lazer e o esporte. O mercado consumidor potencial é muito grande e pulverizado em todo o país. Isso beneficia a proliferação de micros e pequenas empresas de produção desses equipamentos em massa para atender a demanda. Isso leva a uma necessidade de inclusão tecnológica e de incentivo ao empreendedorismo de criação de micro e pequenas empresas para produzir esses equipamentos.

Vamos deixar de ser subdesenvolvidos. A prática típica de um subdesenvolvido é não produzir o que necessita e comprar o que não precisa. Com as inovações para o desenvolvimento, nós precisamos ter legislação que garanta os direitos constitucionais da pessoa com deficiência. Nós temos a tecnologia que possibilita a implementação desses direitos e temos a política, que fomenta o desenvolvimento da tecnologia.

No meu caso, eu vou falar para vocês sobre a tecnologia.

Quais são os caminhos que vão ser desenvolvidos? A prática de desenvolvimento de assumir as limitações enfrentando os obstáculos. Para resumir isso, eu vou contar uma história de como se faz um avião. Vocês estão vendo projetado o EMBRAER 175, que é orgulho da indústria nacional? Para voar um avião precisa de asas. Para fazer essa asa, precisa-se de alguém que conheça de aerodinâmica. Para esse avião se movimentar, é preciso propulsão, e, portanto, você precisa-se de alguém que conheça propulsão. É preciso que o avião seja resistente e leve, ao mesmo tempo. Então, precisa-se de alguém que conheça estrutura. Para construir um avião precisa-se pagar para. Agora, por trás da construção e do projeto desse avião, estão os profissionais que trabalham. Se eu fosse alguém da área de aerodinâmica, eu gostaria que o avião fosse bonitinho, esbelto, com aerodinâmica perfeita. Se eu trabalhasse com propulsão, eu veria o avião como uma grande hélice; se eu trabalhasse com estruturas, o avião seria deformado daquela maneira; alguém da área de eletrônica já vê o avião cheio de circuitos e fios; alguém que quer fabricar o avião quer um prego para colocar uma asa; e quem quer pagar, quer pagar um aviãozinho de papel. Entretanto, nós fazemos um avião. Para isso, precisamos trabalhar juntos.

Quais são os pilares da tecnologia? Nós precisamos gerar o conhecimento e as técnicas para atender à nossa realidade. Nós precisamos proteger essa tecnologia por meio das patentes e difundir essa tecnologia para que ela beneficie a sociedade.

Eu vou mostrar alguns exemplos de desenvolvimento de órteses da UFMG. Foi feita uma órtese de membro inferior com um acionamento de músculo artificial pneumático. Aqui está o nome da patente. O músculo é considerado por nós engenheiros como um atuador linear. O que é isso? Significa que ele atua numa direção, apenas. O músculo reduz o tamanho e faz força, exatamente como o músculo pneumático que eu vou descrever para vocês. Existe músculo pneumático disponível no mercado, mas ele precisa de uma grande pressão para operar e custa muito caro. O que nós fizemos na UFMG foi gerar um sistema muito mais barato e que funciona a uma pressão muito mais baixa, misturando balões de aniversário e uma corda de alpinista. Misturando isso, nós fizemos um músculo artificial, que custa muito barato.

Ali nós estamos vendo dois músculos artificiais alinhados, que fazem uma força de 20 quilos. Depois, nós instalamos esse músculo numa órtese de quadril para movimentação da perna. Nós modificamos uma órtese já existente e instalamos um músculo artificial. Moldamos essa órtese numa pessoa voluntária, que nos ajudou muito nessa pesquisa, e fizemos os testes de marcha. Para que essa voluntária pudesse utilizar esse equipamento foi necessário desenvolver vários dispositivos para que ela comandasse o acionamento desse músculo. Para isso, ao desenhar essa órtese nós tivemos que minimizar o esforço que ela fazia para acionar o dispositivo. Ali vocês estão vendo o músculo funcionando, com o sinal que vem de um eletrodo implantado no braço. Quando ele mexe, o músculo também mexe. Você pode treinar um outro músculo e fazer com que a perna se movimente. Eu garanto que isso é altíssima tecnologia, mas de muito baixo custo.

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Fizemos também uma órtese de mão. A nossa terapeuta ocupacional nos proibiu de utilizar músculo artificial pneumático, porque os pacientes não iriam usar. Nós tivemos que desenvolver um músculo artificial eletromecânico, mais leve e mais interessante, para ser usado no braço. Ele é uma luva com motor. Então, o paciente tem a mão, mas não usa porque teve uma lesão neurológica. Você veste essa luva e ela possui tendões ligados a um motor. Esse motor é acionado por outros músculos do próprio paciente, que é treinado para isso. Aqui nós temos a ativação dos músculos das costas e ele tem esse movimento. Ele pode não ter o movimento do braço, mas ele tem o movimento do ombro e assim pegar objetos. Esse motor é muito barato. É um motor de parafusadeira e tem o movimento de abrir e fechar. Uma parafusadeira custa R$ 80,00. Você tira o motor e monta nesta órtese. Portanto, o custo é acessível.É claro que não paramos aí. Existem alguns desenvolvimentos, mas necessitam de ser protegidos antes de serem divulgados. Estamos fazendo vários trabalhos que modulam a força que essa órtese faz, em função da vontade do paciente. Não posso mostrar ainda como estamos fazendo isso, mas estamos fazendo.

Uma outra tecnologia interessante que foi desenvolvida é a adaptação de orelhões. Nós seguimos duas premissas: auxiliar a pessoa com deficiência e, ao mesmo tempo, não discriminar pessoas. Então, nós fizemos um telefone público acessível. Os senhores sabem que a lei exige que a cada três telefones públicos, um seja acessível. Neste caso, nós geramos um telefone com uma alavanca. Essa alavanca permite que, se o telefone estiver alto, um cadeirante puxe esse telefone para baixo. Uma vez que aquele telefone esteja baixo, é importante que ele não seja discriminatório para mim, por exemplo, que tenho 1,92 metros, para que eu não tenha que usar o telefone ajoelhado. Para isso, eu posso usar essa mesma alavanca e subir esse telefone. Entretanto, existe algum motor ali? Não. É um sistema de alavanca e contrapeso! Quando eu solto a alavanca, esse telefone trava. Essa tecnologia está disponível para ser implementada.

Nós geramos também o que chamamos de “caminho acessível”. São duas faixas pintadas no solo, com uma textura detectável por um cego. Ao andar por aquele caminho, ele não vai encontrar nenhum obstáculo. Da mesma forma, qualquer pessoa com deficiência, seguindo aquela linha, não vai encontrar nenhum obstáculo, além de encontrar dispositivos que o auxiliem. Isso pode ser facilmente pintado em locais públicos e pavimentos. Essa textura pode ser tanto areia como material reciclado, como, por exemplo, garrafa moída. Isso já está disponível.

Nós temos várias outras patentes disponíveis, mas o tempo não me permite que as descreva aqui. Há algumas muito simples. Fizemos o mesmo padrão para ser instalado em cadeiras-de-roda para que sejam visualizadas o mais longe possível. Foi um ano de trabalho para definir quais os padrões que otimizam essa visualização o mais longe possível. Essa tecnologia está disponível para todos, gratuitamente.

Eu gostaria de destacar um trabalho da UFMG, que nós estamos ajudando a ser propagado pelo país. A Universidade Federal do Paraná gerou tatames com rodas. Havia uma instituição paranaense onde as crianças com paralisia cerebral eram atendidas em tatames postos no chão. Isso dificultava o relacionamento desses pacientes com as outras pessoas e dificultava o trabalho dos profissionais da saúde. Uma designer que agora trabalha conosco ajudando nesse projeto desenvolveu um tatame com rodas, alto, para que essas pessoas possam ser atendidas mais adequadamente. Atualmente estamos construindo uma fábrica itinerante para que ela possa percorrer o país para que, ao chegar numa determinada cidade, possamos fabricar os tatames necessários e depois levar essa estrutura para a próxima cidade, para produzir outros tatames. Inclusive, estamos estudando a utilização de materiais diferentes, adequados a cada região.

Eu gostaria de finalizar mostrando para vocês uma árvore que é muito comum no Brasil, o ipê, que tem uma particularidade, uma deficiência. Quando ele está florido ele não tem folhas, mas não deixa de ser bonito por causa disso. Então, eu gostaria de deixar aqui uma mensagem para vocês: o papel da tecnologia é fazer com que a deficiência não seja importante. Esse é o nosso papel aqui.

Muito obrigado!

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Omar Edson VarelaModerador

Obrigado, professor Pinotti!

Eu gostaria de fazer as minhas considerações finais. Em primeiro lugar, gostaria de registrar meu orgulho de ser brasileiro. Definitivamente, nós temos que mudar a visão de que o Brasil não tem autonomia ou capacidade para desenvolver tecnologia assistiva. Nossas universidades estão muito bem preparadas. Nós estamos muito avançados nessa questão e um dos nossos objetivos era justamente mostrar isso.

Uma outra coisa importante que já foi dita aqui - e que eu acho que é uma oportunidade para os grupos aprofundarem -, porque é sempre uma questão ligada à tecnologia em geral, é como desenvolver o caminho de continuidade entre a pesquisa e o mercado para que as soluções passem desse estágio de projeto de pesquisa nas universidades para soluções a serem oferecidas por empreendedores brasileiros. Trata-se de fazer propostas de como incentivar o desenvolvimento do empreendedorismo na área da tecnologia assistiva. Nós tocamos em alguns pontos importantes a respeito de isenção de impostos, mas temos que discutir também como incentivar o empreendedorismo na oferta de produtos que não são caros. Como o professor Pinotti demonstrou, muita coisa pode ser feita a um custo muito baixo. Há um mito de que tecnologia assistiva é cara. Isso não é verdade. Então, acho importante os grupos discutirem também a questão de como incentivar o empreendedorismo para que as soluções fiquem disponíveis mais rapidamente.

Uma outra coisa importante a destacar é o desenho universal. O que é esse desenho universal? É o critério segundo o qual, quando se for desenvolver uma tecnologia assistiva, deve-se fazer um esforço para que ela esteja disponível para todas as pessoas e não apenas para um grupo específico. Muitas vezes isso viabiliza economicamente a introdução dos produtos no mercado, porque você passa a ter um público maior a ser atendido.

Portanto, o desenho universal é um tema que vocês também precisam aprofundar como critério a ser incentivado no projeto das soluções de tecnologia assistiva.

Dou por encerrados os trabalhos desta Mesa Redonda.

Muito obrigado!

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V Lançamento da Campanha Nacional de Acessibilidade

Composição da Mesa: Sr. Adilson Ventura, presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ CONADE; Sr. Rogério Sotilli, secretário-adjunto da Secretaria Especial de Direitos Humanos; Sra. Cláudia Griboski, da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação; Sr. Saulo Porto, da IBM/Brasil; Sr. Luis Carlos Azevedo, da Federação Brasileira de Bancos “ FEBRABAN; e o Sr. Janilton Lima, da Confederação Nacional do Comércio “ CNC, SESC, SENAC.

Rogério Sottili Secretário-Adjunto da SEDH

Boa noite, senhoras e senhores delegados, convidados e observadores presentes a esta solenidade da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência!

Em nome da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, gostaria de cumprimentá-los por essa iniciativa do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ CONADE, dos parceiros governamentais e da área empresarial, em particular, do MEC, aqui presente, do Ministério de Ciência e Tecnologia, da FEBRABAN, da IBM-Brasil e da Confederação Nacional do Comércio.

Com a campanha da acessibilidade, estamos reforçando e ampliando o trabalho das bases do movimento social. O governo federal trata a inserção social das pessoas com deficiência no âmbito dos direitos humanos, reconhecendo que já avançamos muito. Entretanto, há também muito a ser feito.

Com a campanha da acessibilidade e sua proposta de dar ampla divulgação ao tema, será mais fácil a mudança de atitude da sociedade. O que todos desejamos é o acesso e a igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência. Nesse momento do lançamento da campanha, o governo federal se une àqueles que a idealizaram e tornaram possível esta importante campanha de interesse público. Ao finalizar essa introdução, aproveito para reafirmar o compromisso e a determinação do governo Lula de fazer do Brasil um país de todos.

Obrigado e boa noite!

Cláudia GriboskiSecretária de Educação Especial do Ministério da Educação

Boa noite, senhoras e senhores, delegados e delegadas!

O Ministério da Educação assumiu o compromisso com a política de garantia dos direitos das pessoas com deficiência. No âmbito educacional, tem implementado a acessibilidade em todos os seus programas gerais e orientado os sistemas estaduais, municipais e do Distrito Federal para que essa política se efetive no âmbito local. Acreditamos que as escolas devem-se organizar para receber todas as pessoas. Nesse sentido, na I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência não poderia faltar um documento que estivesse sendo discutido nas escolas. O Ministério da Educação, então, apoiou a produção da Revista da Turma da Mônica, que será amplamente disseminada em todas as escolas, sendo motivo de reflexão e discussão da acessibilidade que acontece naquele contexto. O governo tem-se comprometido com essa política e demonstrado a necessidade de transformação dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos.

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Muito obrigada!

Saulo PortoIBM/BRASIL

Boa noite a todos!

É uma dupla honra estar aqui esta noite, pois é uma honra profissional e uma honra pessoal, se é que isso pode ser separado.

A IBM-BRASIL e a IBM no mundo, desde 1914 empregaram a primeira pessoa com deficiência física. Daquele ano até hoje já fizemos muitas coisas, e, neste ano de 2006, aqui no Brasil, anunciamos a abertura do Centro de Acessibilidade. É o primeiro centro da América Latina e o oitavo do mundo. Mas, hoje eu não estou aqui para falar disso. Estou aqui para cumprimentar, especialmente, a Secretaria dos Direitos Humanos, o CONADE, a CORDE e, principalmente, vocês. Eu ouvi uma frase hoje aqui de que os grupos de trabalho são catalisadores de mudança social. Meus parabéns!

Muito obrigado!

Luis Carlos AzevedoFEBRABAN

Senhoras e senhores, muito boa noite!

A inclusão das diferenças é uma realidade em várias organizações nacionais e internacionais. No mundo corporativo atual, diversidade tornou-se sinônimo de estratégias de negócios, diante de um mercado cada vez mais globalizado, em que saber conceber e gerenciar a diversidade é um grande diferencial competitivo. Ciente disso, a Federação Brasileira de Bancos “ FEBRABAN, cuja missão consiste em buscar a melhoria contínua da eficiência do sistema financeiro e de suas relações com a sociedade, elegeu a acessibilidade como tema prioritário no ano do Programa FEBRABAN de Inclusão Social. Entre as iniciativas já tomadas, a FEBRABAN patrocina o filme da Campanha Nacional de Acessibilidade, do CONADE, que já foi anunciado nesta Conferência Nacional. Com essa iniciativa, a FEBRABAN deixa claro o seu compromisso em contribuir, juntamente com os outros setores da sociedade, para a construção de soluções racionais e equilibradas que atendam às expectativas das pessoas com deficiência.

Muito obrigado!

Janilton LimaConfederação Nacional do Comércio

Boa noite a todas e todos!

A CNC tem um orgulho muito grande de estar fazendo parte de um momento histórico como esse aqui. A CNC está no CONADE desde o ano 2000. Ou seja, temos um envolvimento muito grande com o Movimento de Pessoas com Deficiência. Nós pretendemos continuar a apoiar esse movimento, mas de mãos dadas, como amigos, e não numa queda de braço.

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Eu espero que este seja um momento para que, no futuro, todas as cidades do Brasil fiquem tão acessíveis quanto Uberlândia, em Minas Gerais, e que, num segundo momento, fiquem todas mais acessíveis que Uberlândia. Quem não sabe o que é uma cidade bastante acessível, visitem Uberlândia e vocês vão ver.

Eu queria parabenizar a todos vocês, porque eu participei de oito conferências e sei da dificuldade que vocês tiveram para chegar aqui, das distâncias que vocês tiveram de percorrer, desde Colinas, no Tocantins, e Chapecó em Santa Catarina. Essa é uma vitória de vocês.

Obrigado!

Adilson VenturaPresidente do CONADE

Boa noite a todas as pessoas aqui presentes!

Em nome do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ CONADE, nós gostaríamos de agradecer a muita gente por nos possibilitar estar aqui neste momento, vivendo essa emoção, esse momento tão importante na vida das pessoas com deficiência no Brasil.

Eu peço permissão aos senhores para agradecer às pessoas que me precederam, porque essas instituições que elas representam são as instituições que nos possibilitaram realizar este evento neste momento, aqui em Brasília. A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência se concretizou pela ação, pelo empenho e pela vontade do governo federal, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos e da Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, mas o lançamento da Campanha da Acessibilidade nós devemos, principalmente, ao patrocínio e apoio das oito organizações cujos representantes nos falaram aqui neste momento.

A I Conferência Nacional é o clímax, é o ápice da nossa jornada iniciada em 02 de dezembro de 2004, e entendo que já é uma resposta àquele desafio que o nosso presidente Luis Inácio Lula da Silva nos lançou naquela oportunidade, durante o II Encontro das Pessoas com Deficiência. Ao assinar o Decreto nº 5296, o presidente Lula disse: “Tem lei que pega no país e tem lei que não pega. Cabe a nós fazermos essa lei pegar”. Estamos fazendo exatamente isso. A realização das conferências municipais e os fóruns municipais; as conferências estaduais e os fóruns estaduais; e essa I Conferência Nacional, que se realiza aqui em Brasília, neste momento, são exatamente uma prova de que nós estamos lutando e buscando o nosso espaço, o nosso lugar na sociedade, como cidadãos plenos e totais, com direitos e deveres iguais aos de quaisquer cidadãos neste País.

Essa campanha que está sendo lançada hoje não termina aqui, como também a I Conferência não acaba aqui. A Conferência está no ápice, a Campanha da Acessibilidade será lançada a partir de hoje e vai continuar em todos os Estados brasileiros e no Distrito Federal, e, sem dúvida, será lançada também em nível nacional.

A nossa luta não está começando, ela não está sequer no meio. Ela está num momento importante e caberá a nós, pessoas com deficiência, fazermos exatamente o que alguém disse quando foi assinado o Decreto, que ele seria a “Lei Áurea das Pessoas com Deficiência”. Quando nós conseguirmos incluir todas as pessoas com deficiência do Brasil - cerca de 25,5 milhões de brasileiros - numa sociedade plena, justa, igual para todos, aí sim poderemos dizer que alcançamos o nosso objetivo.

Portanto, a nossa luta vai continuar e se fortalecer mais ainda.

Eu agradeço, profundamente, a presença de todos vocês, que, com grande sacrifício, aqui se fazem presentes neste momento, trabalhando em prol da causa das pessoas com deficiência, e, principalmente, em nome daqueles que não sabem que nós existimos e que nós não sabemos aonde estão. Infelizmente, eles ainda são a grande maioria no Brasil.

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Muito obrigado e felicidades!

Daniel de Sousa X-Brasil

Boa noite a todas e a todos!

Antes de começar eu queria chamar aqui ao palco o Marcos Canettieri, da Acessibilidade Brasil. Vocês sabem que a Acessibilidade Brasil tem feito esse trabalho maravilhoso de tornar todos os sites acessíveis a todos. Nós vamos apresentar aqui a primeira fase da Campanha de Acessibilidade, que nada mais é do que a marca. Ou seja, para a X-Brasil é uma grande honra poder trabalhar com esse desafio, pela sua complexidade, pela sua importância. Nós vamos mostrar, em primeira mão, a marca dessa Campanha de Acessibilidade, que vai ganhar o Brasil, e, logo depois, o Marcos vai apresentar o site, também em primeira mão. Depois, apresentaremos os filmes e todo o material para tornar esse conceito de “Acessibilidade” - essa palavra que, às vezes, é tão pouco compreendida - de fato acessível.

Então, é um grande prazer e uma grande honra para mim estar aqui apresentando essa marca para vocês. Na verdade, eu vou mostrar para vocês como é que nós chegamos a esta marca.

Marcos CanettieriAcessibilidade Brasil

Boa noite a todos!

Eu sou Gerente de Projetos da Acessibilidade Brasil, que é uma ONG. É um imenso prazer ter construído esse site acessível. Construir um site acessível não é difícil; qualquer pessoa pode fazer isso. O que existe hoje é uma desinformação muito grande, mas, seguindo as regras estabelecidas pela internet, qualquer pessoa pode estar apta a construir um site totalmente acessível. O endereço do site é acessibilidade.sigaessaideia.org.br ou www.sigaessaideia.org.br. Há essas duas opções. Essa é a cara do site, que já carrega a marca. É um site bem leve. Dentro do conceito da acessibilidade, nós usamos leitores de tela, que são programas que interpretam o texto do site para um cego, por exemplo. Nós procuramos acoplar todos os leitores de tela, ou seja, os pagos, que são bem caros e os gratuitos. Existe um chamado DEBVOX, que é desenvolvido pela UFRJ e que pode até ser baixado pela página. Ele consegue interpretar esse site.

O site apresenta uma barra de acessibilidade, que fica no topo. Ela tem recursos de acessibilidade e de “usabilidade”. Muita gente fala em acessibilidade, mas esquece a usabilidade. O que é a “usabilidade”? É tentar simplificar a navegação de um site. Isso inclui milhões de regras e de conceitos, mas, para o que nós precisamos, a “usabilidade” serve para mostrar para a pessoa onde ela está na página, criar teclas de atalho que possam facilitar a navegação, simplificar a navegação de modo que não mude muito de cor, não mude muito de visual, exatamente para a pessoa não achar que saiu do site.

Portanto, o site apresenta essa barra de acessibilidade e o menu que é totalmente separado do contexto. Ele fica sempre no mesmo lugar, é hierárquico e é totalmente acessível. O site funciona com comando de voz para pessoas deficientes que têm membros amputados; funciona para os cegos; para todo mundo. Há uma área de notícias que está sendo atualizada constantemente e uma busca que também está dentro dos princípios da “usabilidade” e que permite facilitar a navegação.

Ampliando-se a barra de acessibilidade, vocês vão encontrar alguns botões. Primeiro, o acesso a todas as funções do site, via teclado e já embutido para comando de voz. Temos também o controle de acessibilidade, mediante o qual você pode alterar a “pele” do site. O que é a “pele” do site? Nós

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procuramos separar o que é conteúdo, ou seja, o que é texto, do design, da roupagem do site, que normalmente é o que atrapalha a acessibilidade, a exemplo de fotos, iluminações etc. Essa barra serve exatamente para auxiliar a pessoa na navegação. Uma coisa interessante é que a acessibilidade não é apenas para pessoas com deficiência. A acessibilidade é, por exemplo, para os idosos, para uma pessoa que tem glaucoma, que tem uma visão periférica e que precisa alterar essa “pele” do site. Clicando em alguns botões, por exemplo, você vê as letras maiores; as imagens que não são importantes somem e isso não demora para carregar por conta da tecnologia que nós estamos usando, no sentido de separar a roupagem, do conteúdo, que é o mais importante, realmente. E existe a versão preto e branco.

Uma outra coisa interessante é que todos os títulos de todas as matérias e de todas as sessões são apresentados numa barra de navegação, na parte superior, que permite que a pessoa possa voltar quantos níveis ela quiser, com um número mínimo de clicks possível. Você vai navegando, vai entrando numa seção, numa subseção e depois, se quiser voltar para o início da página, essa barra de usabilidade permite que você navegue de qualquer parte para qualquer parte com um click só. O princípio da “usabilidade” é justamente diminuir o número de clicks. Além disso, os formulários são muito acessíveis. Todo mundo acha chato preencher formulários grandes. Nós tentamos simplificar colocando só o que for realmente importante. Em relação à parte de impressão, o importante é o conteúdo. No momento em que você imprime uma notícia, por exemplo, vai ser impresso somente o conteúdo, o texto puro. É por isso que a gente usa essa tecnologia de dissociar o conteúdo do design.

O site já está no ar e havendo dúvida vocês podem entrar na parte de contato do site, tirar dúvidas, fazer sugestões ou críticas. Nós estamos abertos a qualquer questionamento.

Obrigado!

Daniel de SousaX-Brasil

Eu vou apresentar a vocês o processo que nós seguimos, passo a passo, para construir essa marca, que envolveu muitas discussões, muitas reuniões

A palavra “Acessibilidade” é uma palavra muito grande, difícil, mas o seu significado é um segredo justamente para aqueles que mais precisam conhecer a sua importância. Ela pode ser dita e explicada à vontade, mas quando utilizada como um núcleo visual não ajuda na sua disseminação, ou seja, não é uma palavra de fácil assimilação. Muitas pessoas a quem nós perguntamos não sabiam do que se tratava. Foi por isso que nós cortamos o uso da palavra “Acessibilidade” como marca.

O que nós estamos procurando é uma marca para muita diversidade. É impossível reunir a grande quantidade de conceitos e a diversidade de pessoas implicadas e o uso da palavra “Acessibilidade” em um único desenho de marca, porque, nesse caso, deixaria de ser uma marca e passaria a ser uma ilustração. Você juntaria muitas marcas numa só. Uma marca não precisa descrever nada; tudo o que ela precisa fazer é codificar alguma coisa de forma simples e imediata. A palavra e a campanha pela acessibilidade devem ser identificadas dessa forma. O importante é que seja um signo universal.

No universo dos signos capazes de representar o conceito de acessibilidade, a seta é certamente o mais universal. Acessibilidade é movimento, ação, liberdade de ir e vir, poder alcançar ou fazer algo como todo mundo. Nós estamos acostumados a ver setas em todos os lugares. Por outro lado, setas são signos muito usados e corriqueiros. Uma boa marca também pode e deve ser tão usada quanto os signos mais populares, mas precisa ser diferente de todo o resto. No caso de uma “cara” para a acessibilidade, se associadas a figuras humanas, as setas rapidamente produzem a identificação e a afeição. Essas são duas peças-chaves para que uma marca possa ser popular e quebrar a barreira da dificuldade de compreensão. Então, nós fizemos uma série de estudos com diversas carinhas,

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humanizando essa marca. As figuras resultantes são interessantes e ativas, mas falta a essas caras a diversidade que distingue as pessoas portadoras de deficiência, o que tende a reduzir a sua abrangência. Por outro lado, os resultados são bons, se considerarmos o engajamento pretendido pela campanha.

Curiosamente, a inicial “A”, da palavra acessibilidade, sugere a forma de uma seta. Foi daí que começamos a desenhar a marca. Mais do que isso, ela pode conter uma seta em seu vazio interno. A associação é muito boa, a forma é forte, mas o equilíbrio dos elementos é difícil de atingir. Ou seja, nós estamos trabalhando com símbolos que lembram a letra “A” e setas entre elas, no meio delas. São várias setas em vários tipos de letra “A” para a gente utilizar a inicial da palavra acessibilidade com a seta, que indica sentido e movimento. Temos dois critérios para resolver o problema. A inicial deve ser a principal responsável pela identificação da campanha e deve ser nitidamente percebida como letra. A seta deve aparecer depois, qualificando a inicial na sua forma original. A saída é mudar a entrada. O resultado é uma marca forte e positiva, capaz de falar com todos os brasileiros e de ser adotada instantaneamente. Eis aqui a marca de acessibilidade que foi criada. Você tem uma letra “A”, e, do lado esquerdo, você tem uma seta que entra nela e cria essa marca. É uma marca bem simples, bem direta e que funciona de diversas formas. O resultado é uma marca incisiva, com forte contraste entre a letra e a seta. A mensagem é clara: “Criar acessibilidade é romper barreiras”. É uma marca com desenho universal. Os desenhos da marca de acessibilidade são conhecidos de todos e caracterizam um desenho universal. A forma é simples o suficiente para ser sentida pelo tato ou descrita a alguém.

No estudo da aplicação dessa marca, há dois pontos fundamentais que devemos ressaltar: alto contraste e legibilidade. Temos que ver se por acaso tiver mos que fazer uma redução ela ainda tem uma boa legibilidade; como é que ela pode funcionar, porque ela foi pensada para ser facilmente percebida por qualquer um. O seu contraste com o fundo é forte e não importa se for usada com fundo claro ou escuro. Sua forma foi estudada para ser claramente percebida, mesmo em tamanhos muito pequenos. A estrutura da marca de acessibilidade foi estudada para produzir os melhores resultados perceptíveis. Ela também garante que a marca seja corretamente reproduzida, por muitos anos, sem distorções.

Aqui temos um estudo das proporções para que, ao longo do tempo, ela não seja modificada. A marca sugere a mensagem da campanha. Ela aponta firmemente para a mensagem da campanha quando é usada como assinatura.

Aqui temos o slogan que nós escolhemos para a campanha: “Acessibilidade - Siga essa idéia”. É a marca da versatilidade, porque ela mantém sua força mesmo quando participa de jogos gráficos. Esse componente lúdico pode ser utilizado para fortalecer o seu poder de penetração. Ou seja, é possível brincar sem distorcer a marca, é possível brincar com diversas formas gráficas e ela mantém o seu interesse e a sua força.

Essa é a marca da “Acessibilidade – Siga essa idéia”, que vocês estão vendo em primeira mão. Essa marca vai ser colocada em inúmeros instrumentos e inúmeras formas de comunicação, não apenas para colocar esse conceito de acessibilidade, mas principalmente, para divulgá-la. Nós vamos produzir filmes que vão ser veiculados em todo o País para falar dessa campanha de acessibilidade.

Obrigado pela oportunidade e boa noite!

PROGRAMAÇÃO VISUAL DA CAMPANHA

IMAGEM DA PALAVRA ACESSIBILIDADE CORTADA POR UM X NO CENTRO DA PALAVRA.

IMAGEM COM VÁRIOS SIMBOLOS REPRESENTATIVOS DAS DIFERENTES DEFICIÊNCIAS E CONVENÇÕES UTILIZADAS PARA SINALIZAÇÃO (CADEIRANTE, SIMBOLO INTERNCIONAL DE ACESSO, ESCADA, CÃO GUIA, ANIMAIS, SINAL DE LIBRAS, SIMBOLO DA SURDEZ ETC...)

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IMAGEM COM SETAS EM VÁRIAS DIREÇÕES COMO AS CONVENÇÕES UTILIZADAS PARA SINAIS DE TRÂNSITO

IMAGENS DA LETRA A SUGERINDO UMA SETA DIRECIONADA PARA CIMA

IMAGEM DA LOGO DA CAMPANHA : UMA LETRA A BRANCA COM FUNDO AZUL E AZUL NUM FUNDO BRANCO

IMAGEM DA LETRA A REFERENTE A MARCA DA CAMPANHA, COMO SE FOSSE UM TRIÂNGULO COM MARCAÇÕES NOS TRÊS LADOS, EM CENTÍMETROS DE 0 A 7 .

IMAGEM COM A LETRA A MAIOR E ABAIXO, UM POUCO RECUADO PARA A DIREITA OS DIZERES ACESSIBILIDADE SIGA ESSA IDÉIA

AS MESMAS IMAGENS DESCRITAS ACIMA EM TAMANHOS MENORES

IMAGENS DA LETRA A, EM DIFERENTES TAMANHOS, NUM FUNDO PRETO, MONSTRANDO AS CORES QUE PODEM SER USADAS ( AMARELA, LARANJA, AZUL, VERMELHA E VERDE) E NO RODAPE DA IMAGEM A LETRA A EM TAMANHO MAIOR COM OS DIZERES ACESSIBILIDADE SIGA ESSA IDÉIA LOGO ABAIXO E RECUADO PARA A DIREITA.

Vanda de SousaConvidada Especial

É um grande prazer estar aqui representando o meu pai, que não pôde estar nesse evento.

Nós estamos criando uma revista especial falando sobre acessibilidade e sobre o respeito em relação às pessoas. Eu fui educada no sentido de não ter nenhum tipo de preconceito. Acho que é fundamental a gente ser educada sempre tendo por princípios o respeito e o amor ao próximo. É daí que vem o resto.

Nós criamos uma revista que fala de uma historinha do Lucas no seu primeiro dia de aula e das dificuldades que ele teve para chegar à escola e até mesmo dentro da sala de aula, porque as calçadas são muito altas; existe uma escadaria na frente da escola; as portas são muito pequenas e o acesso até a janela para falar com a Diretoria é difícil.

Acho que este evento vai abrir um grande caminho para que a sociedade possa suprir as necessidades de todos. Todo mundo é diferente, mas todo mundo sente. Isso é muito importante. Eu estou emocionada, porque não estou acostumada a esse contato público em eventos como essa conferência, mas é uma honra muito grande estar aqui com vocês. Essa revistinha vai ser distribuída para 147.000 escolas e mais de 3 milhões de crianças vão ter acesso a ela. Então, acho que a criançada vai dar uma boa lição para os adultos e para todo mundo que queira aprender a respeitar os outros. Temos que mudar muita coisa e esse evento é apenas o começo.

Muito obrigado e boa noite!

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VI Deliberações

Como os cidadãos e as entidades da sociedade podem influenciar na caracterização do direito à acessibilidade?

1. Exigir do governo, nas suas diversas instituições, ações que atendam as especificidades das deficiências existentes para o pleno atendimento, no âmbito nacional, nos setores da educação, saúde, lazer, trabalho, transporte e assistência social, com políticas integradas nos três níveis.

2. Elaboração e implementação de um trabalho de conscientização pautado nas leis de acessibilidade, sob a iniciativa das três esferas de governo e da sociedade civil (empresas, comunidades, ONG’s), que assegure a observância dos princípios de direitos humanos e da inclusão social da pessoa com deficiência.

3. Criação e fortalecimento, mediante lei, no âmbito das três instâncias governamentais, de conselhos de defesa dos direitos das pessoas com deficiência, observando sempre o caráter deliberativo e paritário dos mesmos e a necessidade de se instituir Fundos específicos, até o final do primeiro semestre do ano de 2007.

4. Formar e fortalecer, sob a iniciativa dos Conselhos dos Direitos, uma rede de atenção às pessoas com deficiência onde se possa agregar e mobilizar os cidadãos, o setor público e as organizações da sociedade civil.

5. Buscar junto ao governo federal a criação de leis de incentivos fiscais (pessoas físicas e jurídicas) para atender aos programas e projetos das entidades que defendem os direitos das pessoas com deficiência (ex: Projeto de Lei de Incentivo Fiscal relativo ao Estatuto da Criança e do Adolescente e à Cultura).

6. Garantir o direito ao trabalho da pessoa com deficiência auditiva/surdo, facilitando o acesso à carteira de habilitação profissional, na categoria “D”, de baixo risco, constando nos automóveis somente os adesivos com o símbolo internacional da deficiência auditiva/surdez, conforme normas da ABNT.

7. Qualificar os recursos humanos para o atendimento às pessoas com deficiência mediante ações do poder público e de entidades de classe.

8. Implementar, em todos os Municípios comissões permanentes de acessibilidade, com participação paritária, caráter deliberativo e recursos financeiros próprios, dentro de uma visão intersetorial, garantindo-se infra-estrutura operacional adequada e a participação e fiscalização dos conselhos municipais e distrital dos direitos da pessoa com deficiência, onde existirem, visando garantir os direitos estabelecidos no Decreto federal nº 5.296/2004.

9. Criar coordenadorias municipais e estaduais de atenção à pessoa com deficiência objetivando garantir a transversalidade das políticas públicas.

10. Implementar políticas públicas de prevenção de deficiência.

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11. Exigir a aplicação da Emenda Constitucional nº 29, que estabelece o percentual mínimo de aporte de recursos da esfera federal (10%), estadual (12%) e municipal (15%), e viabilizar junto ao SUS a concessão de órteses e próteses.

12. Atuar na formação, mediante cursos e eventos, visando a conscientização da sociedade e de profissionais da área de edificações quanto às necessidades de acessibilidade das pessoas com deficiência.

13. Incentivar a formação e qualificação das pessoas com deficiência, estimulando-as a assumir o papel de protagonistas da sua própria história, exigindo, inclusive, das promotorias do Ministério Público e da Defensoria Pública que a legislação pertinente seja cumprida em todas as esferas.

14. Fortalecer as organizações da sociedade civil de defesa de direitos e as que prestam atendimento às pessoas com deficiência, bem como a ressignificação das mesmas, pautando-se no paradigma da inclusão/acessibilidade dentro de uma visão universal.

15. Capacitação de forma permanente e continuada de lideranças das pessoas com deficiência para participação nos Conselhos.

16. Promover a mobilização da sociedade em geral por meio dos movimentos sociais, associações, sindicatos, conselhos, comissões permanentes, grupos de trabalho, para debater e formular ações de acessibilidade enquanto ações transversais a todas as políticas.

17. Implementar nas grades curriculares do Ensino Fundamental, Médio e Superior, disciplinas específicas sobre inclusão e acessibilidade.

18. Ampliar e/ou implementar equipe multidisciplinar qualificada no programa Saúde da Família, conforme a realidade regional.

19. Ampliar nos Municípios, no Estado e no Distrito Federal os programas públicos de atenção às pessoas com deficiência, viabilizando o atendimento.

20. Incluir nos currículos profissionais de formação dos cursos de Ensino Superior e formação técnica, disciplinas específicas sobre acessibilidade, desenho universal e ajudas técnicas.

21. Influenciar na caracterização da acessibilidade, no acompanhamento e na fiscalização das leis, fazendo valer os direitos adquiridos.

22. Promover campanhas e debates sobre inclusão e acessibilidade em todos os setores da sociedade, iniciando-se pela educação, desde a educação infantil.

23. Criar no Ensino Fundamental disciplina específica sobre DIREITO e CIDADANIA, de caráter obrigatório, integrante do núcleo comum de cada instituição e não da parte transversal do ensino.

24. Implementar em nível federal, estadual, municipal e do Distrito Federal ações que efetivem a organização do atendimento educacional especializado, por meio da implementação de salas de recursos, na própria escola ou em escolas localizadas em pontos estratégicos.

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25. Criar junto a todas as esferas governamentais os cargos de intérprete, guia de intérprete, professores surdos de Libras, professor em técnica de Braille, entre outros, específicos para profissionais que atuam com surdos, cegos e na área de deficiência visual e auditiva.

26. Garantir aos profissionais da educação formação inicial e continuada com temáticas alusivas ao processo de ensino/aprendizagem de alunos com deficiência em todos os níveis e modalidades da Educação Básica e do Ensino Médio e Superior.

27. Promover mudanças significativas na ação pedagógica das escolas, envolvendo de modo efetivo a escola e a família nas discussões e nas práticas educacionais.

28. Incentivar a criação de programas que trabalhem com psicomotricidade, estimulação precoce e preparação pré-escolar na Educação Infantil.

29. Criar mecanismos de efetivação da Lei nº 10.436/2002, regulamentada pelo Decreto nº 5.626/2005, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras.

30. Adotar medidas específicas para que na realização de concursos públicos, inclusive provas de vestibular, seja assegurada a utilização de recursos específicos, tais como Libras, Libras tátil, outras formas de comunicação de pessoas com surdez/cegueira, Braille, ledores, textos ampliados; e ainda que sejam substituídas questões de fonéticas das provas de língua portuguesa dos surdos e surdo-cegos e que haja flexibilidade temporal para a realização das provas, principalmente, para as pessoas com mobilidade reduzida (paralisia cerebral).

31. Implantar, implementar e incentivar nas escolas a realização de cursos de Libras e formação de intérpretes, guia-intérpretes e professores surdos, auxiliares de ensino surdos (monitores) e tiflologia (técnicas da leitura escrita no sistema Braille), bem como curso de Braille, ministrados, preferencialmente, por profissionais com deficiência (visual e auditiva/surdo) habilitados e formados na área, com certificado de instituição oficial.

32. Disponibilizar intérpretes e guias-intérpretes com o objetivo de auxiliar pessoas surdas e pessoas surdo-cegas em eventos públicos.

33. Criar cadastro único das pessoas com deficiência para subsidiar políticas públicas.

34. Divulgar os direitos e as características inerentes a cada deficiência, mormente no Ensino Fundamental (inicio do aprendizado) e no Superior (graduação dos profissionais).

35. Promover programas, projetos, benefícios e serviços de proteção social básica para as famílias, no âmbito da assistência social, que garantam a convivência social e comunitária.

36. Aplicar com rigor punições aos Municípios que não cumprirem a Lei de Acessibilidade, criando instrumento que os obriguem a instituir conselhos municipais dos direitos da pessoa com deficiência;

37. Destinar recursos específicos dos Fundos (Nacional, Estadual, Distrital e Municipal) de Assistência Social, da Saúde, da Criança e do Adolescente, para o atendimento de políticas públicas e sociais pertinentes à pessoa com deficiência.

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38. Criar um programa de incentivo às empresas com menos de 100 funcionários para a contratação de pessoas com deficiência, mediante compensação financeira, nos moldes do programa Primeiro Emprego.

39. Destinar um percentual de dez por cento (10%) do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT para a qualificação profissional e a geração de emprego e renda para pessoas com deficiência.

40. Direcionar um percentual dos impostos recolhidos no País para o incremento de tecnologias voltadas para a pessoa com deficiência.

41. Definir que pelo menos cinco centésimos por cento (0,05%) do IPTU cobrado pelos Municípios deverão ser investidos no financiamento da acessibilidade.

42. Garantir que dois por cento (02%) da arrecadação da Federação Nacional das Entidades Seguradoras (Fenaseg) sejam revertidos para a acessibilidade.

43. Mobilizar o governo federal para a vinculação de repasses de recursos financeiros aos governos estaduais, municipais e do Distrito Federal para a efetiva implantação da política de acessibilidade.

44. Incentivar os Municípios e o Distrito Federal a criarem Coordenadorias ou Secretarias de Acessibilidade, condicionadas à realidade local e subordinadas ao controle e acompanhamento dos conselhos municipais e distrital dos direitos da pessoa com deficiência.

45. Fomentar o empreendedorismo e o cooperativismo voltados a pessoas com deficiência, apoiados por instituições financeiras e parcerias público-privadas, para garantir a inserção desse segmento social no mercado nacional e internacional.

46. Cobrar do Ministério Público a fiscalização dos direitos da pessoa com deficiência, inclusive no que se refere à agilização dos processos de concessão de aposentadoria e benefícios para pessoas com deficiência, principalmente por parte do poder público.

47. Criar um fórum permanente de acessibilidade nas três esferas do governo, envolvendo toda a sociedade civil, incluindo representantes de todos os tipos de deficiências.

48. Criar lei federal que obrigue os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a implementarem os conselhos dos direitos da pessoa com deficiência;

49. Propor aos Tribunais de Justiça a criação de varas judiciais específicas para atendimento de ações relativas à pessoa com deficiência;

50. Fiscalizar, como sociedade civil, toda e qualquer, lesão ao direito à acessibilidade, acionando o Ministério Público para que cumpra o seu papel.

51. Assegurar a aprovação imediata de projeto de lei que garanta que a pessoa com deficiência que recebe qualquer benefício da Previdência e da Assistência Social e que tenha que se afastar temporariamente do mercado de trabalho volte a ser beneficiária a qualquer tempo.

52. Formação pelo Conade de uma comissão, integrada por conselheiros estaduais e municipais e representantes da sociedade civil, para discutir o Estatuto da Pessoa com

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Deficiência e estudar a ampliação dos tipos de pessoa com deficiência, a exemplo dos portadores de LER/DORT (Lesão por Esforço Repetitivo/Distúrbio Ósteo-Muscular Relativo ao Trabalho) e demais doenças ocupacionais, obesidade mórbida, albinismo, lábio leporino e transplantado, entre outras patologias que levam a algum tipo de deficiência, para que estas possam usufruir dos direitos relativos a este segmento;

53. Garantir a permanência de peritos preparados, humanizados e capacitados na área da especialidade do requerente e/ou assegurado;

54. Garantir vagas para alunos com deficiência no ensino regular, no primeiro e segundo turnos, independente da faixa etária.

55. Criação de um fundo a ser constituído com recursos das multas aplicadas nas empresas que não cumprirem as leis de cota, visando à qualificação e capacitação para o mercado de trabalho da pessoa com deficiência.

56. Implementar política de emprego e geração de renda em prol da pessoa com deficiência, visando incorporá-la ao sistema produtivo e emancipá-la econômica, social e pessoalmente;

57. Garantir previsão de recursos pelos entes federativos para se viabilizar as ações previstas no Decreto nº 5.296/04, bem como a criação de comissão específica para fiscalizar as ações de acessibilidade;

58. Garantir ações de reabilitação na atenção básica, na lógica da saúde da família;

59. Garantir a inclusão no programa nacional de triagem neonatal e triagem auditiva (teste da orelhinha);

60. Mobilizar o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, estadual e federal, visando garantir a regulamentação da Emenda Constitucional nº 25, que dispõem sobre o financiamento da Saúde;

61. Aumentar de cinco por cento (05%) para dez por cento (10%) o percentual de cotas para deficientes nos concursos públicos

62. Implantar no âmbito federal ações e serviços de atenção à pessoa com deficiência visual.

63. Rever a legislação com objetivo de que o BPC seja permanente para a pessoa com deficiência mental severa e para a pessoa com deficiência múltipla.

64. Implantar casa-lar para a pessoa com conduta típica de família desestruturada em situação de risco pessoal e social, a partir dos 12 anos de idade.

65. Adaptar a língua portuguesa de Libras de forma a contemplar a comunidade surda nos concursos públicos.

66. Capacitar conselheiros nas três esferas.

Quais as etapas em que a acessibilidade arquitetônica e urbanística pode ser controlada pelos gestores públicos e pela sociedade para o alcance de políticas setoriais inclusivas?

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67. Conceber todos os projetos de desenvolvimento regional de urbanismo e arquitetura e os equipamentos auxiliares comunitários sob a ótica do desenho universal, de acordo com o Decreto nº 5.296/2004.

68. Submeter todos os projetos de desenvolvimento de urbanismo, arquitetura e de construções à avaliação dos conselhos nacional, estadual, distrital e municipal da pessoa com deficiência e/ou das comissões permanentes de acessibilidade.

69. Vincular à implantação do plano de acessibilidade a liberação de verbas do Ministério das Cidades em favor dos Municípios e do Distrito Federal

70. Sensibilizar e garantir a qualificação do corpo técnico de arquitetura e engenharia quanto às questões de acessibilidade e desenho universal, mediante a intermediação dos conselhos regionais das respectivas áreas.

71. Garantir que na celebração ou renovação de concessão e exploração de transporte de uso coletivo seja assegurada frota acessível, sem gerar aumento da tarifa ao usuário.

72. Realização de planos estaduais, distrital e municipais de mobilidade e transporte contemplando a acessibilidade, mediante incentivo do governo federal.

73. Responsabilização do gestor público pelas condições de acessibilidade e acompanhamento das obras pela sociedade civil.

74. Realizar campanha nacional de sensibilização e conscientização dos cidadãos sobre acessibilidade, voltadas à inclusão da pessoa com deficiência, com enfoque especial nas normas técnicas e na legislação.

75. Padronizar em nível nacional a credencial para acessibilidade a estacionamentos destinada à pessoa com deficiência.

76. Estabelecer que um percentual mínimo de dois por cento (02%) dos orçamentos municipais, estaduais, distrital e federal devam ser destinados à implantação e implementação da acessibilidade da pessoa com deficiência.

77. Assegurar que nos programas e ações desenvolvidos na educação básica e superior pelo MEC, inclusive os realizados em parceria no âmbito estadual, distrital e municipal, sejam disseminados os conceitos de acessibilidade e inclusão.

78. Formular nas municipalidades, com participação deliberativa no plano gestor, políticas públicas estruturais ligadas à acessibilidade nos campos urbanístico, arquitetônico e do acesso à comunicação e informação acessível.

79. Garantir continuidade na implementação e fiscalização das políticas públicas, independente da alternância do gestor público, com observância das leis vigentes quanto à acessibilidade.

80. Implementar ações que possibilitem a construção e o desenvolvimento de uma cultura que estimule a participação ativa de todos os segmentos da sociedade.

81. Efetivar a acessibilidade, garantindo-se a participação com voz e voto de todos os segmentos envolvidos no planejamento, implementação e execução, bem como a

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indispensável fiscalização por parte dos atores sociais, conselhos estaduais, distrital e municipais de defesa dos direitos da pessoa com deficiência, CONADE e afins, num exercício de cidadania para o controle social das políticas públicas.

82. Adequar os planos diretores municipais e distrital à Lei e ao Decreto de acessibilidade.

83. Cumprir a lei de acessibilidade nos projetos de calçadas e criar ciclovias.

84. Garantir acesso aos transportes coletivos com frota adaptada.

85. Capacitar de forma continuada os técnicos habilitados a aprovar projetos nos três níveis de governo, quando os mesmos tratarem de obras, reformas e aquisição de equipamentos.

86. Incluir na formação profissional dos técnicos, engenheiros civis, arquitetos e afins o cumprimento do art. 10 do Decreto nº 5.296/2004.

87. Aprovar projetos e fiscalizar obras observando sempre o cumprimento da NBR 9050/2005 nas construções, reformas e ampliações.

88. Criar mecanismo fiscalizador do cumprimento de projetos de acessibilidade nas obras financiadas pela União e o Distrito Federal e os Estados, coibindo-se a liberação de verbas para os Municípios que não cumprirem a acessibilidade.

89. Assegurar a realização de audiências públicas para assinatura de termo de ajustamento de conduta por órgãos públicos e privados visando a garantia da acessibilidade.

90. Criar ouvidoria com serviço do tipo “disque denúncia” para fiscalizar o descumprimento dos direitos da pessoa com deficiência, que atuará em consonância com o Ministério Público para aplicação de sanções.

91. Garantir a participação da sociedade organizada na etapa de elaboração dos instrumentos de planejamento - PPA, PDU, LOA, LDO, planos de políticas setoriais (educação, saúde, transporte, urbanismo etc.) -; na etapa de aprovação desses instrumentos pelo Legislativo, Executivo, conselhos, comissões etc; e no acompanhamento, controle e avaliação da execução desses instrumentos.

92. Criar no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mecanismos de fiscalização no Judiciário da tramitação de ações judiciais que envolvam questões do interesse de pessoa com deficiência.

93. Garantir que as etapas dos projetos de financiamento de obras públicas e ou coletivas sejam avaliadas pelas comissões e conselhos, visando garantir a acessibilidade.

94. Capacitar as equipes técnicas lotadas nas secretarias municipais, estaduais, distrital e federal com a finalidade de fiscalizar, acompanhar e monitorar obras de infra-estrutura, nos termos da legislação de acessibilidade vigente.

95. Regulamentar leis municipais e distrital que garantam o cumprimento de normas federais, nos termos do art. 2° do Decreto nº 5.296/2004

96. Enviar para as Casas legislativas estaduais, distrital e municipais, solicitação do CONADE de cumprimento da lei de acessibilidade.

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97. Assegurar que o CONADE promova campanha de divulgação dos principais instrumentos de acessibilidade arquitetônica e urbanística, envolvendo os conselhos estaduais, distrital e municipais.

98. Garantir recursos financeiros para acessibilidade arquitetônica das unidades de saúde e educação, prioritariamente.

99. Criar sistema de sinalização específico para pessoas com qualquer tipo de deficiência, nos pontos de embarque e desembarque de todos os meios de transporte.

100. Garantir espaço nos trechos de vias públicas próximos à instituições prestadoras de serviço para embarque e desembarque de pessoas com deficiência, vedados para estacionamento, utilizando-se selos móveis específicos para condutores e conduzidos e padronizando-os em nível nacional.

101. Incluir em todo o País conteúdos ou disciplinas de acessibilidade e de inclusão nos diversos cursos de graduação, pós-graduação e extensão.

102. Garantir, na forma de lei, que os Municípios e o Distrito Federal definam critérios e condições das construções em vias públicas, multifamiliares, populares e de uso público, visando à inclusão social das pessoas com deficiência.

103. Exigir que moradias econômicas financiadas por recursos públicos sejam construídas atendendo as normas de acessibilidade e acompanhadas por conselhos dos direitos da pessoa com deficiência e fiscalizadas pelo CREA, com exigência da Anotação de Responsabilidade Técnica – ART de acessibilidade, conforme estabelecido no Decreto nº 5.296/2004.

104. Criar selo de qualidade para edificações e espaços públicos acessíveis, em parceria com entidades como o CREA e chancelado pelas coordenadorias e conselhos dos direitos da pessoa com deficiência.

105. Garantir percentual mínimo de quinze por cento (15%) de moradias para pessoas com deficiência, em programas de habitação de interesse social.

106. Realizar diagnóstico das condições de acessibilidade arquitetônica e urbanística em todos os edifícios de uso público e coletivo, em âmbito federal, estadual, distrital e municipal, para encaminhamento ao Ministério Público.

107. Criar lei que garanta a aplicação de percentual de tributos municipais (ex. IPTU) para a promoção da acessibilidade nas calçadas e edifícios dos Municípios brasileiros.

108. Exercer o controle social na execução e uso dos logradouros.

109. Garantir recursos específicos para as adaptações e construções urbanísticas e arquitetônicas acessíveis na Lei de Diretrizes Orçamentária.

110. Garantir que as obras de uso coletivo a serem construídas pelo poder público e/ou privado só tenham seu alvará de construção liberado se atenderem as normas técnicas de acessibilidade previstas no Decreto nº 5.296/2004.

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111. Assegurar que as obras que não atendam ao desenho universal de acessibilidade sejam embargadas mediante interferência de entidades representativas junto ao Ministério Público, federal, distrital e estadual.

112. Aprovar lei estadual exigindo o plano de acessibilidade dos Municípios, prevendo penalidades aos gestores públicos pelo não cumprimento do Decreto nº 5.296/2004, inclusive cassação de mandato dos gestores ou ordenadores de despesas.

Quais são os papéis do poder público, do setor privado e da sociedade para que todos os tipos de transportes coletivos se tornem acessíveis?

Papel do poder público:

113. Formular uma política nacional de gratuidade para pessoa com deficiência, inclusive pacientes renais crônicos e transplantados, extensiva a todos os meios de transporte e com validade em todo território nacional, implantando-se a carteira única nacional, responsabilizando-se o poder público municipal pela liberação e emissão do passe livre e assegurando-se o direito a acompanhante.

114. Garantir recursos, nas três esferas de poder, para a implementação das políticas públicas que assegurem a acessibilidade no Plano Plurianual, na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual.

115. Reverter para o Fundo do Conselho de Direitos da Pessoa com Deficiência os valores referentes às multas decorrentes do não cumprimento das leis de acessibilidade, nas três esferas de governo, visando o custeio de programas e projetos aprovados pelos conselhos em prol da pessoa com deficiência.

116. Criar uma política nacional de estacionamento com vagas exclusivas para pessoas com deficiência, com emissão pelo órgão regulador do sistema de cartão com a identificação da pessoa com deficiência e do seu veículo.

117. Divulgar a normativa que garante os direitos relativos aos transportes e acompanhar a execução das ações afetas à política do setor.

118. Proibir a colocação aleatória do símbolo internacional de acesso em veículos de transporte coletivo que não disponha de sistema de acesso pleno e eficaz, e não certificar empresas e veículos que não garanta esse direito.

119. Exigir da iniciativa privada transporte coletivo acessível dotado de rampas, espaço para cadeira de rodas, e que permita o embarque direto ao veículo a partir de pontos de parada por meio de elevador, ou, preferencialmente, veículos rodoviários que tenham piso baixo etc, obedecendo-se o Decreto nº 5.296/2004 e cumprindo-se o prazo fixado no referido Decreto e o que dispõe o art. 38 e seus parágrafos.

120. Realizar contratos de concessão para as empresas de transportes coletivos em todos os modais, com obrigatoriedade de frota acessível ou escalonamento do processo de adaptação de veículos que inclua:• revisão das concessões existentes e a implantação progressiva das acessibilidades;• renovação da frota; • cassação das concessões e permissões das empresas responsáveis pela gestão dos serviços de transportes coletivos que não disponibilizem frota de veículos adaptados segundo as normas técnicas;

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• cancelamento de repasse de recursos destinados para transportes dos Municípios, do Distrito Federal e dos Estados das empresas que não cumprirem normas da legislação vigente.

121. Exigir nos editais de licitações que envolvam a prestação de serviço público concedido, como o transporte coletivo terrestre, aeroviário e aquaviário, que as empresas obedeçam as normas de acessibilidade e o princípio do desenho universal.

122. Desenvolver campanha permanente de educação focada no respeito à diversidade humana no campo do transporte público e coletivo, e promover campanhas de conscientização dos funcionários das empresas de transportes e da população em geral.

123. Repasse de recursos financeiros pelo poder público para que os conselhos de direitos da pessoa com deficiência possam melhor se aparelhar para fiscalizar e acompanhar as políticas públicas.

124. Condicionar a liberação de verbas federais e estaduais para obras de urbanização nos Municípios ao atendimento das normas de acessibilidade da ABNT.

125. Criar no âmbito da Secretaria Municipal responsável pelos sistemas de transportes coletivos, em todos os Municípios, um setor de fiscalização capacitado para verificar os aspectos de acessibilidade e atendimento a pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.

126. Responsabilizar efetivamente o poder público pelo entorno e pelas paradas, portos (ródulos) ou trapiches para que se tornem acessíveis.

127. Capacitação permanentemente, no setor público e privado, de motoristas, cobradores, condutores, administradores e demais trabalhadores envolvidos no sistema de transporte, bem como implantação de sinalização luminosa onde se fizer necessário.

128. Ampliar para dez por cento (10%) o número de vagas reservadas para as pessoas com deficiência e garantir o direito de reserva de vaga nos estacionamentos públicos e privados para todos os tipos de deficiências.

129. Criar mecanismos para o cumprimento das leis de acessibilidade vigentes, especialmente no que se refere ao desenho universal, regulamentando o que for necessário e impondo sanções aos infratores.

130. Fazer com que seja cumprida pelo poder Executivo em todas as suas esferas a lei que dispõe sobre o transporte adaptado para pessoa com deficiência.

131. Viabilizar transporte adaptado ou realizar a adaptação da frota já existente no sentido de atender bem a necessidade de transporte de alunos com deficiência.

132. Criar cadastro de famílias de pessoas com deficiência severa, nas regiões de difícil acesso à via pública, para a formulação de políticas específicas, caso a caso.

133. Criar exigências para que as auto-escolas se estruturem visando formar condutores com deficiência, disponibilizando veículos adaptados e com adequação específica de sinalização para surdos.

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134. Capacitar profissionais dos DETRAN’s e donos de concessionárias para que seja reconhecido os direitos da pessoa com deficiência e familiares relativos à isenção de IPI/ICMS na aquisição de veículos, incluindo-se na Carteira de Habilitação a condição de deficiência.

135. Eliminar barreiras existentes em virtude dos desenhos dos ônibus atuais, inclusive roletas, ou criar espaço paralelo para passagem de pessoas com deficiência, obedecendo-se as normas de acessibilidade e priorizando-se ônibus dotado de piso baixo.

136. Implementar ações de monitoramento e fiscalização, principalmente em relação ao estacionamento irregular sobre calçadas (veículo particular, viaturas policiais e outros), para garantir o ir e vir do cidadão.

Papel do setor privado:

137. Qualificar os operadores e profissionais para atendimento prioritário, oferecendo serviços de qualidade.

138. Trabalhar a conscientização quanto à necessidade e obrigatoriedade do transporte coletivo com frota acessível.

139. Cumprir a legislação em vigor, usando-se, inclusive, obrigatoriamente o símbolo internacional de acesso nos transportes coletivos e adquirindo-se e/ou adaptando-se todos os meios de transportes, em curto e médio prazo.

140. Obedecer às normas da ABNT quando da fabricação de seus equipamentos, em observância da NBR 14020, implicando o não cumprimento em multas a serem destinadas aos conselhos municipais, distrital, estaduais e federal das pessoas com deficiência;

141. Priorizar a pesquisa tecnológica na busca de soluções que visem melhorar cada vez mais a acessibilidade ao transporte coletivo.

142. Garantir que as concessionárias de transporte atendam prioritariamente às pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida, assegurando-se a qualificação continuada dos profissionais para o atendimento humanizado nos transportes acessíveis.

Papel da sociedade:

143. Exigir a responsabilização do poder público quanto à garantia do direito do transporte acessível e promover a mobilização dos segmentos sociais visando avaliar e acompanhar a execução da política de transporte.

144. Buscar informações mediante participação em fóruns, meios de comunicação e outras instâncias de discussão pública;

145. Cobrar do poder público a execução da política de transporte por meio dos instrumentos institucionais competentes (Conselhos, Ministério Público e demais organizações).

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146. Buscar alternativa de transporte especial para pessoas com deficiência impossibilitadas de utilizar o transporte coletivo convencional (micro ônibus bairro a bairro, ônibus que circulem em favelas, táxis, barcos, etc), lutando pelo respeito às suas peculiaridades.

147. Acionar o Ministério Público sempre que os direitos de pessoa com deficiência forem negligenciados.

148. Participar ativamente na elaboração e implantação das políticas públicas, combatendo o preconceito, fiscalizando-se as ações do poder público e a aplicação dos recursos, e mobilizando-se de forma organizada em torno do tema acessibilidade.

149. Exigir do poder público o cumprimento da legislação vigente;

150. Negociar por meio de seus segmentos parcerias, apoios, contratos e convênios.

Do poder público, sociedade e setor privado

151. Garantir que o poder público, o setor privado e a sociedade exijam providências do Ministério Público no sentido da propositura de ação civil pública contra o INMETRO, em razão de eventual omissão no cumprimento da legislação vigente.

152. Garantir a construção de postos flutuantes com adaptações para o acesso da pessoa com deficiência.

153. Garantir a criação de normas que disponham sobre acessibilidade, tornando obrigatória a realização de adaptações necessárias no transporte coletivo rodoviário e aquaviário, intermunicipal e interestadual.

154. Garantir transporte porta a porta para pessoa com deficiência com grande dificuldade de locomoção, sempre que o serviço de transporte coletivo urbano acessível não tiver condições de seu atendimento, com garantia de acompanhante.

De que forma a informação e a comunicação acessíveis contribuem para a inclusão de pessoas com deficiência?

155. Assegurar a regulamentação e a efetiva aplicação das normas nacionais e internacionais vigentes, para que os meios de comunicação e informação sejam acessíveis quanto ao atendimento das diversas necessidades da pessoa com deficiência, em especial em sites, publicações em meio magnético, livros digitais falados, enfim, em todos os meios de comunicação de massa e de domínio público.

156. Disponibilizar linhas de crédito e isenção fiscal na aquisição de equipamentos que viabilizem o acesso da pessoa com deficiência à informação e comunicação.

157. Disponibilizar programas de sintetizadores de voz em instituições públicas e privadas.

158. Cumprir a legislação específica para a efetividade das comunicações necessárias à inclusão da pessoa com deficiência em qualquer setor.

159. Garantir recursos públicos governamentais para que todos possam ter acesso à informação e comunicação.

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160. Mobilizar e conscientizar a população brasileira, sob a orientação dos conselhos e/ou instituições representativas dos deficientes, por meio de serviço de panfletagem e dos veículos de comunicação de massa, como jornais, internet, canais de TV e rádios, com vistas a instrumentalizar os cidadãos, enquanto agentes fiscalizadores, para que possam cobrar ações do poder público.

161. Formular uma política nacional de acessibilidade.

162. Disponibilização pelo poder público, nas suas respectivas áreas setoriais, de tecnologias assistivas.

163. Formação e capacitação de forma continuada, sob a responsabilidade da FENEIS/MEC, IES, SEED e Associações de Surdos, intérpretes de Libras e guias-intérpretes, para difusão das comunicações nos setores da educação, saúde, cultura, comércio, etc (Lei nº 10.436/2002 e Decreto nº 5296).

164. Incluir como comunicação suplementar e alternativa no currículo escolar e nas informações gerais sobre a pessoa com deficiência, a partir das séries iniciais, a Libras, o sistema Braille e as várias formas de comunicação utilizadas pelas pessoas surdo-cegas.

165. Equipar os estabelecimentos públicos e privados com telefones, computadores, bem como sinalização adaptada para todos os tipos de deficiência, além de transcrição em Braille da moeda brasileira e da comunicação específica de caixas-eletrônicos, cardápios, extratos bancários, material de divulgação relativo a turismo, e contas de telefone, água e luz.

166. Garantir que as emissoras de TV ofereçam recursos áudios-visuais e que as editoras financiadas com recursos públicos tenham uma percentual da sua programação transcrita para o Braille.

167. Garantir, nas contratações de concessão dos veículos de comunicação de massa, a exigência de que as empresas cumpram as leis vigentes relativas à acessibilidade nas suas comunicações e informações, fazendo uso de tecnologias que permitam atingir a pessoa com deficiências, inclusive.

168. Aprovar as propostas dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a I Conferência Nacional e reedição das mesmas, a posteriori, para envio a todos os Municípios e Unidades da Federação, no prazo de 45 dias após a data do término da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

169. Investir no desenvolvimento de tecnologia abrangente, de massa e de fácil acesso.

170. Divulgar as leis e os direitos e promover a capacitação permanente de conselheiros sobre o tema acessibilidade, sensibilizando os profissionais da saúde (PSF) e da educação, a comunidade, pessoas com deficiência e os demais setores.

171. Elaborar sites com ícones que contemplem todas as deficiências e que informe as peculiaridades de cada uma delas.

172. Garantir via sites, CD’s, DVD’s ou outros meios que as bulas possam ser acessíveis para que a compreensão da informação possa ser garantida a pessoa com deficiência .

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173. Garantir a entrega, antes do inicio do período letivo, de todo o material didático ampliado, em Braille, que contemple LIBRAS e formas de comunicação suplementar e alternativa.

174. Assegurar às escolas e espaços de uso público o acesso a softwares do sistema de comunicação suplementar e alternativa.

175. Criar jornal ou boletim de âmbito nacional com esclarecimentos sobre deficiências, mercado de trabalho, denúncias e conquistas da pessoa com deficiência, codificados em Libras e Braille.

176. Garantir que todas as pessoas com deficiência tenham acesso a todos os meios de comunicação e sejam contempladas pelas políticas públicas, de acordo com a legislação vigente.

177. Criar campanhas educativas que contemplem os três níveis de ensino e todas as categorias de deficiência, sob o patrocínio dos diversos níveis de governo e em articulação com o Ministério Público, utilizando-se a mídia e os meios educacionais públicos e privados, com vistas à aplicação efetiva da legislação vigente, a prevenção de deficiências, a sensibilização quanto à diversidade, o exercício da cidadania e a busca de formas eficazes e adequadas de acompanhamento às pessoas com deficiência.

178. Criar nos Municípios, em número proporcional à respectiva população e em interface com as secretarias de educação, saúde e assistência social, centros de apoio à educação inclusiva a serem construídos e mantidos por dotação financeira própria, priorizando-se programas multidisciplinares, com serviços complementares e/ou suplementares ao ensino regular, incluindo oficinas pedagógicas e terapêuticas desenvolvidas por profissionais especializados, sob a fiscalização da comunidade e dos conselhos locais.

179. Buscar parcerias para a produção de campanhas informativas a serem veiculadas nos meios de comunicação de massa, impressos e demais meios acessíveis, com vistas a viabilizar o conhecimento geral de todos os parâmetros acessibilidade.

180. Realizar reuniões CONADE e dos conselhos estaduais e distrital ampliadas e descentralizadas, com o objetivo de divulgar, fiscalizar e acompanhar a implementação do Decreto nº 5296/2004.

181. Fazer campanha nacional de mobilização, envolvendo os Estados, o Distrito Federal, e os Municípios, para divulgação do Decreto nº 5296/2004, utilizando-se todos os meios de comunicação.

182. Realizar, em todos os Municípios brasileiros, censo sem amostra de pessoas com deficiência, sob a responsabilidade das Secretarias - municipais, distrital e estaduais - da Ação Social.

183. Implantar em todas as instâncias de ensino a educação inclusiva como disciplina obrigatória.

184. Implementar campanhas educativas de prevenção às deficiências e de ajudas técnicas e financeiras, como forma de se evitar o agravamento de deficiências existentes, no âmbito de todas as unidades de saúde dos Municípios e do Distrito Federal (próprias e conveniadas).

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185. Promover a conscientização por meio de campanhas de informação sobre a rubéola e exigir dos órgãos públicos vacinação nacional contra a doença, considerando-se a isenção de mercúrio na constatação das cepas virais.

186. Fazer levantamento sistemático de dados demográficos e epidemiológicos das pessoas com deficiência, por micro e/ou macrorregião dos Estados e do Distrito Federal, organizando-se um cadastro único.

187. Divulgar para toda a sociedade os serviços e as comissões de transporte.

188. Promover a distribuição de jornais e apostilas, produzidas com vários estilos e formas de comunicação.

189. Criar campanhas a serem veiculadas pelos meios de comunicação, para divulgação de informações sobre a pessoa com deficiência, visando garantir a acessibilidade e a conscientização para a necessidade de eliminação de barreiras expressas por atitudes discriminatórias.

190. Criar programa de informação e orientação sobre a anemia falciforme, síndrome de Usher, bem assim de doenças vinculadas à etnia e outras patologias crônicas, usando para divulgação os meios de comunicação, a exemplo como das campanhas da dengue, hipertensão, diabetes, HIV, DST’s e outros.

191. Elaborar em nível estadual e municipal uma cartilha acessível a todas as pessoas com deficiência, que contenha informações de locais de atendimento médico, educacional, esportivo e cultural à pessoa com deficiência.

192. Garantir qualificação profissional para comunicação em Braille e Libras e para as formas de comunicação da pessoa surdo-cega.

193. Assegurar linha de financiamento bem como isenção fiscal como mecanismos facilitadores da aquisição de tecnologias assistivas que favoreçam a comunicação e a comunicabilidade das pessoas com deficiência.

194. Facilitar a aquisição de tecnologias assistivas mediante a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI.

195. Incluir na educação básica disciplina voltada ao ensino da Libras e das formas de comunicação utilizadas pela pessoa surdo-cega, como formas de se construir uma emergente cultura sobre uso funcional dessas formas especiais de comunicação.

196. Implementar políticas públicas, em parceria com iniciativa privada e a sociedade civil, mediante financiamento e investimento em tecnologias, prestação de serviços, capacitação e financiamento de projetos por Fundos específicos.

197. Garantir verbas e recursos públicos da área de comunicação, nas esferas federal, estadual, distrital e municipal, objetivando assegurar a comunicação universal, para que todos os segmentos tenham informações das políticas públicas.

198. Garantir, em todos os espaços e órgãos públicos, recursos para aquisição de telefones DDD acoplados com display Braille e tela ampliada com alto contraste, TS e centro de atendimento aos surdos por meio do TS.

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199. Garantir, em todos os espaços e órgãos públicos e nas instâncias federal, estadual, distrital e municipal, intérpretes de Libras, guias-intérpretes e material em Braille, a serem avaliados por bancada formada exclusivamente por instrutores surdos ou professores de Libras.

200. Assegurar que a secretaria de educação de cada Estado e do Distrito Federal seja responsável pela capacitação de intérprete de Libras.

201. Encaminhar proposta ao Ministério do Trabalho e Emprego para que a função, já existente, de intérprete de LIBRAS seja reconhecida e regulamentada como profissão.

202. Garantir a criação de uma central de intérpretes da Libras em cada Estado e no Distrito federal.

203. Garantir a criação de cargos de revisor em Braille.

204. Garantir a criação de cargos de ledor para cegos.

205. Criar cargos, acessíveis mediante concursos públicos, de instrutor e intérprete da Libras; guia-intérprete para surdo-cego e revisor Braille; professores formados em LIBRAS e em Educação, a serem fiscalizados pelo MEC e entidades reconhecidas pela comunidade surda.

206. Baixar custos de produtos eletrônicos específicos para a pessoa com deficiências, mediante isenção de imposto,

207. Tornar acessível a navegação na internet por cegos.

208. Propor que a CORDE edite uma coletânea comentada da legislação vigente, concernente aos direitos das pessoas com deficiência.

209. Divulgar no site da CORDE, mediante link próprio, súmulas e jurisprudências relativas à legislação de acessibilidade e desenho universal.

210. Propor que o Banco Central do Brasil determine, mediante Portaria, a implantação de sistema de voz com fone de ouvido nos caixas de auto-atendimento do sistema bancário brasileiro;

211. Exigir das instituições de ensino superior, públicas e privadas, maior divulgação dos projetos e respectivos resultados relativos às pesquisas do interesse da pessoa com deficiência, bem como a sua disponibilização às instituições de atendimento especializado.

Como impulsionar a criação, a produção e a oferta de ajudas técnicas para melhorar a vida das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida?

212. Cumprir os artigos 61 a 66 do Decreto nº 5.296/2004, que dispõem sobre a criação, produção e oferta de ajudas técnicas no âmbito das três esferas governamentais.

213. Instituir parcerias com o órgão específico, nos níveis federal, estadual, do Distrito Federal e municipal, para impressão de livros com conteúdos diversos em Braille e

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outros recursos disponíveis, para atendimento dos estudantes dos cursos de formação regular e outros interessados.

214. Editar lei federal que obrigue os gestores a cumprirem e implementarem as deliberações dos conselhos e das conferências, nas três esferas de governo.

215. Trabalhar em âmbito geral e com o apoio do poder público na formação e no conhecimento da causa da acessibilidade, por meio de entidades específicas e de especialistas, priorizando-se o repasse deste conhecimento.

216. Garantir em favor das pessoas com deficiência que o governo federal lhes assegure percentual de vagas de estágio e cargos comissionados, de acordo com a Lei de cotas, e que as empresas se responsabilizem pela formação das mesmas.

217. Criar mediante parceria público-privada e outras, centros de atendimento e convivência para pessoas com deficiência, casas-lares etc, com atuação de equipes interdisciplinares, equipamentos adequados e atendimento do instrutor mediador e/ou guia intérprete de pessoa surda e cega, com serviço de assistência às famílias de pessoas com deficiência.

218. Disponibilizar linhas de crédito e isenção fiscal na aquisição de equipamentos que viabilizem o acesso às ajudas técnicas pelas pessoas com deficiência.

219. Criar no BNDES linhas de créditos específicas para financiamento de empresas que venham a produzir ou manipular equipamentos/suportes de ajudas técnicas e tecnologias assistivas, com o benefício da isenção fiscal.

220. Garantir, no âmbito dos Municípios, o direito da pessoa com deficiência participar das discussões orçamentárias, buscando assegurar percentual de recursos para aquisição de órtese, prótese e meios auxiliares de locomoção, garantindo-se a qualidade destes produtos e obedecendo-se às normas da ABNT.

221. Ampliar os recursos para produção de órteses próteses e meios auxiliares de locomoção. E facilitar as parcerias com oficinas especializadas a fim de atender com tecnologia moderna a alta demanda reprimida.

222. Garantir isenção total de impostos em produtos nacionais e importados, na compra de equipamentos de ajuda técnica para pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida, bem como na manutenção do cão-guia de cego e do surdo-cego.

223. Criar, mediante lei, mecanismos de financiamento e co-financiamento a fundo perdido, nas três esferas governamentais, para capacitação e qualificação profissional da pessoa com deficiência, além de lhe garantir o atendimento na rede de serviços de saúde, educação, transporte e telecomunicação, bem como pelos programas e projetos técnicos do seu interesse, garantindo-se a manutenção da ajuda técnica que recebe, independentemente da renda.

224. Reformular a LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social), visando considerar baixa renda o per capita de um salário mínimo.

225. Instalar telefones, painéis e material de divulgação acessível ao surdo e à pessoa com deficiência visual, e exigir das operadoras que cumpram a legislação que obriga a instalação de telefones adaptados para os mesmos.

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226. Garantir que os televisores, nacionais e importados, tenham o dispositivo que permite o acesso à tecla SAP e à legenda oculta – closed caption, em benefício úteis da pessoa com deficiência auditiva.

227. Liberar o saldo do Fundo de Garantia para que a pessoa com deficiência adquira equipamento de ajuda técnica.

228. Criar nas três esferas de governo políticas públicas que venham incentivar o desenvolvimento de pesquisas científicas nas universidades públicas e privadas, priorizando-se a ajuda técnica e a tecnologia assistiva e oferecendo-se premiações aos cientistas que venham contribuir de forma significativa para a promoção de uma vida independente;

229. Favorecer parceria público-privada, inclusive com ONG’s, universidades, centros de pesquisas, empresas, escolas técnicas etc, de forma a democratizar a criação, a produção e a disponibilização de ajuda técnica para atender demandas da pessoa com deficiência no que se refere ao desenvolvimento e acesso às tecnologias, possibilitando a inclusão educacional e profissional, bem como a sua independência e inclusão social.

230. Incluir disciplina versando sobre ajuda técnica e tecnologia assistiva na grade curricular, desde o Ensino Fundamental até a universidade, como também a criação de cursos profissionalizantes nesta área.

231. Criar disciplinas específicas sobre a pessoa com deficiência e suas acessibilidades, com estágios curriculares, e cursos universitários de extensão e iniciação científica que incentivem a formação de estudantes.

232. Garantir a capacitação de técnicos e profissionais de ensino para a melhoria do atendimento em reabilitação da pessoa com deficiência, utilizando equipamentos adequados aos tipos de deficiência e firmar parcerias para reabilitação com órgãos governamentais, não governamentais e empresas privadas

233. Garantir que as unidades escolares estejam aptas a trabalhar com todas as deficiências, disponibilizando livros e equipamentos em braile, digitalizados e em outros formatos, equipando-se todos os estabelecimentos de ensino com material expositivo em Libras.

234. Disponibilizar intérpretes oficiais de Libras e guias intérpretes, reconhecidos pelo MEC e certificados por órgãos capacitados, de acordo com o Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, em todos os níveis da educação.

235. Estabelecer em cada Município parcerias com órgãos que ofereçam qualificação profissional para a pessoa com deficiência.

236. Incluir, mediante lei, nas redes de ensino de educação básica, profissionalizante e superior, em todas as áreas, de caráter obrigatório, no núcleo básico comum, disciplina que propicie conhecimentos básicos sobre a inclusão da pessoa com deficiência, com a presença de intérprete no caso de surdo.

237. Promover a efetiva criação das oficinas protegidas, de que trata o Decreto federal nº 3.298/99, priorizando a deficiência mental, severa ou profunda, e a múltipla deficiência sensorial (surdo-cego, pré-lingüístico), inclusas na rede regular de ensino e em período oposto.

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238. Garantir por meio de parcerias público-privada e institucionais a capacitação, formação e qualificação profissional de pessoa com deficiência, incluindo-se o uso do Sistema S.

239. Garantir a obrigatoriedade do conhecimento de Libras e do Braille para profissionais que atendam ao público e da criação de centrais de intérprete e guia-intérprete nos Municípios, com cursos específicos ministrados por profissionais competentes e avalizados pela ABRASC (Associação Brasileira de Surdo-Cegos) e pelo Grupo Brasil de Apoio ao Surdo-cego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial.

240. Exigir o cumprimento do Decreto nº 5296/04, especialmente no que diz respeito aos serviços públicos e congêneres, visando formar capacitar profissionais versados em Libras, Braille etc., para atendimento adequado ao público que se comunica apenas mediante essas linguagens ou formas de comunicação.

241. Implantar nos Municípios e no Distrito Federal centros integrados de recuperação de pessoa com deficiência que façam atendimento gratuito, dotando-os de recursos humanos, profissionais, técnicos e materiais (órtese e prótese).

242. Garantir a implantação dos centros de referência em reabilitação de pessoa com deficiência, conforme Portarias do Ministério da Saúde, dotados de recursos humanos, materiais e financeiros e que forneçam gratuitamente órteses, próteses e bolsas coletoras.

243. Viabilizar nos Municípios de médio porte a construção, pelo Ministério da Educação, com a interveniência das secretarias municipais de educação, centros de atendimento a todas as deficiências com intérpretes oficiais de Libras.

244. Promover encontros entre pessoas com deficiência e familiares para envolvê-las no processo de inclusão social.

245. Destinar recursos financeiros, humanos e tecnológicos, às bibliotecas públicas, em nível nacional, para tornar todos os seus acervos (livros, jornais, etc) acessíveis à pessoas com as mais diversas deficiência, promovendo a máxima utilização de meios avançados, inclusive digitais.

246. Cobrar e fiscalizar a implantação e funcionamento do Programa de Órtese e Prótese nos Municípios, como forma de agilizar o atendimento ao usuário.

247. Permitir que a pessoa com deficiência - inclusive a portadora de transtorno invasivo do desenvolvimento (todos os tipos de autismo) - ou seu representante legal, adquira equipamentos (computadores, órteses, próteses, aparelhos auditivos, e outros), software e qualquer tecnologia assistiva com o benefício de mecanismos de redução ou isenção de impostos, linha de crédito especial ou subsidiando o valor integral do produto, na impossibilidade de o usuário possa arcar com os custos do financiamento.

248. Garantir via SUS aporte financeiro compatível com o valor de mercado dos equipamentos e inclusão de outros itens na tabela desse Sistema (Grupo Específico de Órteses, Próteses e Meios Auxiliares de Locomoção), em função das demandas das pessoas com deficiência, e criar câmaras técnicas para orientação/fiscalização da qualidade dos equipamentos adquiridos pelos centros de reabilitação credenciados junto ao SUS.

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249. Reservar dotação orçamentária específica para implantação de acessibilidade nos Municípios, estabelecendo percentual nos orçamentos, nas três esferas de governo, com disponibilização de recursos das esferas federal e estadual para repasse aos Municípios e ao Distrito Federal.

250. Garantir subsídios das três esferas de governo para indústrias de bens e equipamentos de tecnologia assistiva, possibilitando que a pessoa com deficiência tenha acesso aos mesmos, mediante financiamento subsidiado e/ou isenção fiscal, visando sua participação efetiva na sociedade.

251. Manter e expandir a rede de habilitação e reabilitação de pessoa com deficiência, com vista à inclusão desta no mercado de trabalho e outros ramos de atividade humana (educação, esporte, lazer, turismo etc.), fortalecendo os serviços de concessão de ajuda técnica, nas três esferas de governo e ampliar

252. Assegurar, nas redes acima mencionadas, equipe multidisciplinar (fonoaudióloga, psicóloga, psicopedagoga, musicoterapeuta, psiquiatra infantil, fisioterapeuta, professor de educação física especializada etc.) e a aprovação de projetos para aquisição de equipamentos técnicos e de tecnologia, a fim de facilitar a vida da pessoa com deficiência.

253. Assegurar o cumprimento dos Decretos nºs 5.296/2004 e 5.626/2005 em todas as regiões do País, garantindo-se, especialmente, a interiorização do conhecimento e da aplicação dos mesmos.

254. Estabelecer que os governos federal, distrital, estaduais e municipais, criem mecanismos de difusão ampla das tecnologias assistivas desenvolvidas nas universidades públicas e privadas do país.

255. Emitir documentos públicos, como IPTU, IPVA e contas de consumo em Braille.

256. Facilitar a aquisição de impressoras Braille e sistemas de comunicação alternativa.

257. Assegurar ajuda técnica e tecnológica que auxiliem a pessoa com deficiência em seu cotidiano.

258. Garantir em caráter de urgência ajuda técnica necessária à reabilitação e manutenção da saúde de pessoas com distrofia muscular, incluindo-se nessa ajuda equipamentos de ventilação mecânica, a serem fornecidos pelas unidades federadas e pela União.

259. Regionalizar a possibilidade de ajuda técnica por grupos de Municípios, possibilitando a criação de convênios e consórcios.

260. Garantir atendimento de saúde bucal, especialmente para pessoas com deficiência mental, paralisia cerebral, transtorno invasivo do desenvolvimento (todos os tipos de autismo) e outras deficiências.

261. Incluir no SUS a equoterapia e a acupuntura como tratamentos para pessoas com deficiência, estimulando sua indicação terapêutica.

262. Garantir recursos para a adequação das redes ambulatoriais de primeiro a terceiro níveis, para que disponham de equipamentos e equipes capacitadas ao atendimento de

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pessoas com deficiência, incluindo-se a reabilitação e a estimulação precoce, em parcerias envolvendo a União, os Estados, o Distrito federal e os Municípios.

263. Garantir a edição de normas dirigidas aos fabricantes de produtos e equipamentos regulares que contemplem adaptações facilitadoras do entendimento operacional e do manuseio por pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.

264. Assegurar que todos os produtos industrializados sejam acompanhados de manual em formato acessível.

265. Aumentar os recursos humanos e financeiros para habilitação/reabilitação de pessoas com deficiência, objetivando assegurar material hospitalar, medicamentos, órteses, próteses e, quando necessário, tratamento extra domiciliar, bem como capacitação de profissionais da área de saúde no conhecimento da linguagem de sinais (Libras).

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VII Moções

MOÇÕES DE APOIO

Moção nº 01

A I Conferência dos Direitos das Pessoas com Deficiência do Brasil:

1) Considerando que na grande maioria dos países das Américas as pessoas com deficiência enfrentam condições difíceis de discriminação, pobreza e exclusão social;

2) Acreditando que seja importante promover iniciativas orientadas à melhoria das condições de vida e ao gozo pleno dos direitos humanos;

Apóia a iniciativa a ser proposta à Assembléia Geral dos Estados Americanos (OEA), que será realizada em junho próximo na República Dominicana, no sentido de que esta Assembléia declare o período de 2007 a 2016 como a Década Americana da Pessoa com Deficiência.

Moção nº 02

Apoio à implantação do passe livre no Município de Fortaleza – CE.

Moção nº 03

Apoio ao Senado Federal pela elaboração da Lei de Indenização aos exilados sanitários nas colônias de hanseníase das décadas de 1930 a 1980.

Moção nº 04

Os delegados da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência manifestam seu apoio ao Projeto de Lei nº 3.557-A, de 2004, em tramitação na Câmara dos Deputados, que acrescenta artigo à Lei nº 7.853, de 24/10/1989, que dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiência e sua integração, sobre a CORDE e sobre as DEFICIÊNCIAS ORGÂNICAS, com a seguinte redação:

Art. 1º - Para efeito do disposto nesta lei, entende-se......

I - deficiência física....

II - deficiência auditiva....

III - deficiência visual....

IV - deficiência mental....

V - deficiência orgânica – perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano;

VI - deficiência múltipla....

Moção nº 05

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Considerando que as Nações Unidas, pela Resolução 56/168, desde dezembro de 2001 iniciou um processo orientado a examinar propostas visando a elaborar uma Convenção ampla e integral para proteger os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência;

Considerando que o Comitê constituído para elaboração da Convenção tem trabalhado arduamente desde então, com participação da diplomacia do governo e da sociedade civil brasileira, e que sua 8ª sessão será realizada em agosto de 2006;

A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência propõe o apoio incondicional e irrestrito a esse processo, esperando que em 25 de agosto de 2006 seja aprovado o texto da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que será um marco histórico e jurídico por ser um tratado internacional de direitos humanos antidiscriminatório, específico para o segmento, que carrega em si princípios que mudam os paradigmas globais, além de elementos de desenvolvimento inclusivo.

Moção nº 06

Apoio à Secretaria de Vigilância em Saúde de Mato Grosso do Sul pelo cadastramento de todas as pessoas com deficiências provocadas pela hanseníase nos últimos 10 anos.

Estima-se para esse período em torno de 45 mil casos.

MOÇÕES DE RECOMENDAÇÕES

Moção nº 07

Nós, que subscrevemos a presente moção, desejamos, em primeiro lugar, parabenizar o governo federal por implantar, pelo MEC/SETEC, o programa de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, chamado de “programa Tec-Nep”, implantado nas IFET’s (XXX – técnicas, cafet´s e escolas técnicas).

Em segundo lugar, desejamos destacar e recomendar a continuidade desse modelo de educação inclusiva e que ele seja cada vez mais ampliado como importante programa de política pública educacional, objetivando reconhecer o potencial de empregabilidade das pessoas com deficiência, reconhecendo-se o direito a uma formação cidadã e à qualificação profissional gratuita, e, por conseguinte, sua ascensão social sem a prática do assistencialismo, tão danosa e perniciosa para a construção de uma sociedade para todos.

Moção nº 08

Que sejam criadas em todos os Municípios cargos públicos para instrutores e professores surdos e intérpretes da Libras/Língua Portuguesa/Libras, no âmbito de uma coordenadoria estadual para atender o surdo sempre que necessário.

Moção nº 09

Inclusão na grade curricular dos cursos de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo de disciplina que trate do tema “Acessibilidade Universal”, e que, para a regulamentação dessa iniciativa, que se consulte previamente o Conade.

Moção nº 10

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Criação de “Fundo para Acessibilidade Universal”, vinculado ao Conade e aos conselhos estaduais, municipais e distrital dos direitos das pessoas com deficiência.

Os recursos deverão advir das três instâncias de governo, de multas aplicadas às organizações que não cumprirem a Lei nº 8.213, que dispõe sobre o percentual de vagas para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, bem como percentual de multas de trânsito e outras pertinentes.

E.T: Outras fontes de recursos: Fundo de universalização das Comunicações ( 1% da receita operacional das empresas).

Moção nº 11

Nós, delegados participantes da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, queremos parabenizar a todos os que, nas diversas esferas governamentais e não governamentais, contribuíram para a realização desse evento, doravante um marco decisivo para a inclusão social desse segmento, ao tempo em que propomos a seguinte moção:

Recomendamos que seja criado um EGROUP permanente objetivando o intercâmbio, o acompanhamento dos temários e da consolidação legal das propostas e tudo o mais que diz respeito à supracitada Conferência.

Para tanto, indicamos como moderador desse trabalho uma comissão composta por conselheiros do Conade, sendo que a delegada responsável por esta moção também se dispõe a criar e moderar este E-GROUP, escolhendo para esse fim o provedor Yahoo, caso lhe seja facultada esta ação.

Moção nº 12

Solicitamos ao Ministério da Saúde que determine, em caráter de urgência, estudos aprofundados no sentido de diagnosticar as distrofias musculares, deficiências progressivas que estão matando muitos Jovens antes dos 40 anos de vida.

Moção nº 13

Que o Senado da República, o BNDES e demais bancos de fomento, com base nos incisos III e IV do artigo 2° do Decreto nº 5.296, de 02de dezembro de 2004, somente aprove financiamentos ou qualquer projeto a ser custeado com recursos públicos e empréstimos ou outra operação financeira desde que garantam as medidas previstas no Decreto nº 5.296, Leis n°s 10. 048, de 08 de novembro de 2000 e 10.098, de 19de dezembro de 2000 (Garantia de Acessibilidade).

MOÇÕES DE SOLICITAÇÕES / PROPOSITURAS

Moção nº 14

Face ao fato de que a aplicação dos planos de medidas técnicas (subtitulação por meios de legenda oculta; janela com intérprete de libras; descrição e narração em voz de cenas e imagens), previstos no Decreto nº 5296/04, só ocorrerá quando da implementação do sistema digital de TV, solicitamos:

- a reinserção da questão das barreiras, no caso da TV a cabo, no âmbito do Ministério das Comunicações;

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- que se acelere o processo de implantação da TV digital;

- e, ainda, que seja inserido explicitamente no Decreto a obrigatoriedade de legendas em filmes nacionais.

Moção nº 15

O albinismo é um distúrbio metabólico genético, associado a falta total ou parcial de melanina, o que confere, à pessoa com albinismo pele e olhos com pouca ou nenhuma pigmentação.

As pessoas com albinismo podem nascer com deficiência visual severa, cegos, ou desenvolver a cegueira no decorrer da vida pela agressão dos raios solares e a falta de proteção da melanina.

Os problemas de pele do tipo câncer são muito freqüentes. Portanto, as pessoas com albinismo são indivíduos com deficiência e necessitam, pois, de cuidados especiais ao longo de toda a vida.

Moção nº 16

Os delegados da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, reunidos de 12 a 15 de maio de 2006 em Brasília-DF, reivindicam aos governos estaduais e do Distrito Federal a isenção do IPVA - Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores para veículos de propriedade de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, a exemplo do que já existe para o IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados, independente de essas pessoas serem motoristas ou não.

Essa medida visa compensar a dificuldade de locomoção dessas pessoas e a falta de transporte coletivo acessível que lhes garanta inclusão social plena.

Moção nº 17

Garantir que os beneficiários do Benefício de Prestação Continuada que assumirem qualquer trabalho remunerado possam retornar ao benefício, após a rescisão do respectivo contrato.

E que as atividades de habilitação e reabilitação de que trata o Decreto nº 3.298/99, Seção IV, artigos 34 a 45, não constituam motivos para a cessação ou suspensão do benefício.

Moção nº 18

Nós, delegados da “I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência”, que tem por tema Acessibilidade: você também tem compromisso.

Vimos apelar ao governo federal para:

a) exigir que a regulamentação das leis relativas às PCD´s, sejam efetivadas em nível federal, estadual e do Distrito Federal e Municípios, notadamente a regulamentação das normas gerais e critérios básicos para acessibilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, de que trata a Lei nº 10.048, de 8 de novembro de 2000 e a Lei nº 10.098, de 19de novembro de 2000.

b) apressar a regulamentação pelo INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade Industrial – das normas técnicas para fabricação de veículos de transporte coletivo urbano, como previsto na lei acima, pois os prazos, além de longos, não estão sendo cumpridos.

Moção nº 19

Que a implantação de conselho municipal dos direitos da pessoa com deficiência ocorra de forma concomitante com a criação de fundo municipal dos direitos da pessoa com deficiência,

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objetivando autonomia para a execução de propostas e diretrizes do conselho, entidades parceiras e sociedade civil organizada.

Moção nº 20

Nós, pessoas com deficiência visual, representadas na I Conferência Nacional da Pessoa com Deficiência, vimos solicitar ao Exmo.Sr. presidente da República que interfira junto a Casa da Moeda com vista à confecção de cédulas acessíveis à pessoa com deficiência visual (cego).

Sugerimos que as cédulas e moedas tenham tamanhos diferenciados, conforme o valor das mesmas, o que possibilitaria aos cegos identificá-las com autonomia. Solicitamos também a interferência do Exmo.Sr. Presidente da Febraban - Federação Brasileira de Bancos no sentido de tornar os caixas eletrônicos acessíveis, assegurando que não se necessite de ajuda de terceiros para acessá-los.

olicitamos que esse documento seja levado às mãos do presidente da República por uma comissão integrada por seus signatários.

Moção nº 21

Que as entidades públicas e privadas, preferencialmente, firmem convênios trabalhistas nos cursos de libras com entidades/associações de surdos de todo o País.

Moção nº 22

Os delegados da I Conferência Nacional da Pessoa com Deficiência vêm, por meio desta, apresentar moção no sentido de que as editoras de nosso País disponibilizem livros didáticos e de literatura (em geral) digitalizados, para que todos tenham asseguradas à acessibilidade ao conhecimento, em especial a pessoa com deficiência visual, e que haja a disponibilização de livros acessíveis, em geral, aos deficientes auditivos.

Moção nº 23

Moção que as Associações que atendem pessoas com Autismo apresentam na I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, solicitando:

1- transformar a Resolução CNS n° 355, de 15 de setembro de 2005, em Portaria do Ministério da Saúde.

2- garantir medicamentos específicos para as pessoas com Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (autismo), na Portaria SAS/MS n° 846, de 31 de outubro de 2002.

3- garantir a criação de centro de referência em saúde – CAP´S para pessoas com autismo, com equipe multidisciplinar capacitada e atendimento integral, com interface com a educação.

Moção nº 24

Constituição de equipes interdisciplinares para apoio à inclusão escolar de alunos com deficiência, a ser composta por profissionais da educação especial, pedagogos, psicólogos, fonoaudiólogos e assistentes sociais, bem como instrutores e intérpretes da Libras.

Moção nº 25

Capacitação profissional para pessoas de baixa renda com deficiência, destinando-se para tanto um percentual de dez por cento (10%) dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT.

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Moção nº 26

(Sobre a Carteira de Habilitação do DETRAN para surdos)

Assegurar curso específico para surdos, com professor/profissional qualificado em Libras/Português, tecnologia visual, prova com tradução/interpretação com intérprete credenciado pela Feneis.

Moção nº 27

1) Considerando que em junho de 1999 a Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou a convenção interamericana para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência;

2) Considerando que esse instrumento tem um papel ativo na erradicação da discriminação de diferentes índoles que afetam milhares de pessoas com deficiência no continente americano;

3) Considerando que para a aplicação efetiva dessa convenção é necessário que se cumpra o artigo 6º, que dispõe sobre a criação de um comitê de vigilância e monitoramento da convenção e dos direitos por ela garantidos;

Vem requerer do Sr. José Miguel Insulza, Secretário-Geral da OEA, que institua, o mais rápido possível, o mencionado comitê.

Moção nº 28

Criação de bancada estadual e nacional para avaliação dos intérpretes existentes, uma vez que a profissão não está regulamentada, o que tem gerado descontentamento nas comunidades de todo o País e inviabilizado a autonomia da pessoa surda, que tem direito à comunicação de qualidade.

Moção nº 29

Credenciar pessoas com deficiência para utilização de vagas reservadas em estacionamentos, mediante documento único, portável e de âmbito nacional. A credencial será expedida em todos os postos de serviço do órgão de trânsito.

Moção nº 30

No âmbito da educação inclusiva e diante da necessidade de implantação de uma equipe multidisciplinar (fonoaudiólogos, psicopedagogos, musicoterapeutas, equoterapeutas, psicólogos, psiquiatras infantis, assistentes sociais e fisioterapeutas), que as secretarias municipais de educação possam contratar esses profissionais diretamente, com verbas destinadas pela educação especial (via FNDE), para que tais secretarias não dependam de outras secretarias que dispõem de poucas verbas para tal.

Moção nº 31

Para que um percentual mínimo de dez por cento (10%) dos recursos de multas de trânsito sejam revertidos em beneficio dos acidentados de trânsito, especialmente na construção e melhoria de hospitais, compra de tecnologias e equipamentos novos, implantação de sistemas de reabilitação, custeio de universidade pública de medicina e contratação de serviços e remédios para as pessoas carentes

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acidentadas. E que os recursos relativos ao percentual acima definido acima sejam destinados apenas ao setor público.

Moção nº 32

Nos casos de hospitalização de pessoa com dependência funcional e transtornos invasivos do desenvolvimento, que se aprove junto ao Ministério da Saúde o direito a acompanhante, independentemente da idade do paciente,

Moção nº 33

O autismo é uma síndrome incurável e incapacitante que afeta pessoas de todas as classes sociais, e de incidência maior em meninos (proporção de 14 meninos para uma menina), existindo crianças com a doença em todos os Municípios do Brasil. Atualmente, nós somos classificados como doentes mentais, o que é incorreto, pois existe um código CID-F84 para o autismo, o que assegura, assim, o direito de todas as crianças autistas receberem medicamentos e terapias específicas, inclusive equoterapia e musicoterapia.

Moção nº 34

Solicitar ao Ministério da Fazenda o abatimento no Imposto de Renda das despesas mensais com medicamentos e alimentação especial para a família de pessoa com deficiência.

Moção nº 35

Assegurar a educação bilíngüe para surdos (língua portuguesa e Libras) em todos os módulos de ensino, por meio da inclusão neles de disciplina específica a ser ensinada exclusivamente por profissionais surdos capacitados pela Feneis/ Mec/ Seed / Ies e /ou associações de surdos. A Libras é a Língua nata dos surdos.

Moção nº 36

Inclusão da pessoa com deficiências mental no mercado de trabalho, mediante programas e/ou parcerias com entidades afins e expansão do referido mercado no que concerne que às demais deficiências.

Obs: Moção baseada na realidade, pois as pessoas com deficiência mental não tem sequer o direito e nem a oportunidade de se inscrever para participar de estágios, cursos profissionalizantes, etc...

MOÇÕES DE REPÚDIO

Moção nº 37

Hélio Ferreira Orrico, Conselheiro Municipal do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência do Município de Duque de Caxias-RJ, eleito delegado pelo Estado do Rio de Janeiro, vem, pelo presente documento, manifestar-se quanto ao aspecto da acessibilidade.

Nesse sentido o presente documento vem chamar a atenção para a acessibilidade aos pontos de Internet disponibilizados aos participantes do evento. Os referidos pontos não estão contemplados com softwares ledores de telas, o que os tornaria acessíveis às pessoas com deficiência visual,

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democratizando assim o acesso delas ao serviço oferecido. A efetividade das ações de acessibilidade é compromisso de todos nós. Oxalá possamos efetivar a inclusão de tais softwares em outras conferências.

Moção nº 38

Que sejam colocados em prática novas diretrizes e programas específicos oferecidos pelo SUS/MS, como o “Programa Nacional de Assistência a Dor e Cuidados Paliativos”, do Ministério da Saúde, e que se proceda a atualização do código internacional de doenças incluindo-se com as novas síndromes dolorosas diagnosticáveis e que o SUS inclua medicamentos eficazes para a dor crônica, considerados de alto custo.

Moção nº 39

Que em conferências, fóruns e congressos em todas as esferas de governo os representantes se façam presentes integralmente em todo o evento, e não somente na abertura e no encerramento, o que certamente contribuirá para a maior eficácia em termos de propostas e ações a serem implementadas.

Moção nº 40

Os delegados e delegadas da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, realizada em Brasília entre 12 e 15 de maio de 2006, repudiam a decisão do Governador do Estado do Paraná, Roberto Requião de Mello Silva, de custear as despesas com transportes e hospedagem dos delegados eleitos na Primeira Conferência Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado do Paraná, ocorrida nos dias 13 e 14 de dezembro de 2005, para participarem da I Conferência Nacional. Repudiam também a falta de empenho do Coede na busca de alternativas que possibilitassem a participação de toda a delegação do Estado. Essa responsabilidade foi transferida para os próprios delegados. Ressaltamos que tanto a decisão do governador quanto a atitude do Coede impediram a participação de cinqüenta por cento (50%) da delegação do Estado do Paraná neste evento.

Moção nº 41

Repudiamos a ausência de discussão e votação pelos conferencistas eleitos nas instâncias estaduais e locais dos consolidados estaduais, para encaminhamento de um verdadeiro e legítimo documento nacional que defina diretrizes sobre acessibilidade. Afinal, quanto à acessibilidade todos temos compromisso!

Moção nº 42

Mesmo tendo conhecimento do conceito de acessibilidade, inclusive de sua natureza abrangente, que não é apenas urbanística ou arquitetônica, consideramos que as perguntas formuladas não contemplaram detalhadamente especificidades que a educação e a saúde demandam. Sentimos falta desse enfoque, inclusive nas Mesas-Redondas. Destacamos esse fato, pois esta discussão ocorreu, inclusive, na conferência estadual e também porque tem sido um grande desafio realizar a inclusão de qualidade nas referidas áreas, garantido-se os direitos das pessoas com deficiência.Ressaltamos a situação do deficiente mental: como podemos discutir acessibilidade para esse grupo? Sabemos que temos estratégias, porém era preciso que elas fossem definidas nos trabalhos de grupos.

Moção nº 43

Os integrantes da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência reivindicam que o CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária aprove a isenção do Imposto sobre

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Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS na aquisição de veículos automotores para pessoas com deficiência e ou com mobilidades reduzida, e para pessoas com patologias crônicas, como espondilite anquilozante ou similares, a exemplo do que já existe para o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI , mesmo que tais pessoas, devido à sua condição física, visual ou mental, não sejam condutoras habilitadas.

Moção nº 44

A classificação da fissura labiopalatal enquanto deficiência precisa ser aperfeiçoada para ganhar maior clareza, pois essa deficiência tem sido entendida como “má formação estética”. Essa má formação congênita traz inúmeros transtornos estéticos e funcionais graves, demandando tratamentos cirúrgicos e a participação de equipe multiprofissional durante vários anos, desde o nascimento até a idade adulta.

Moção nº 45

Repúdio à Anvisa pela flexibilização do controle da talidomida, droga utilizada atualmente como coagulante no tratamento de hanseníase, Aids e câncer.

Moção nº 46

Trago a esta plenária moção de indignação de duas mães de pessoas com deficiência mental residentes na Bahia, sendo uma representante da Pestalozzi e a outra da Apae, por não terem participado dessa I Conferência em curso, por força de impedimento preceituado no Regimento desta Conferência, republicado na Portaria nº 18, de 08 de fevereiro de 2006. Com um misto de pesar, angústia e indignação essas mães, cujo direito de comparecer a esse evento para lutar por todos que acreditaram em suas capacidades foi “amputado”, permaneceram na Bahia com seus “gritos” presos na garganta. Entendemos que o Regimento deve ser aprovado pela plenária e não autoritariamente imposto, e que o suplente serve justamente para substitui o titular, em suas ausências e impedimentos.

Moção nº 47

Os estudantes “PCD’s” ganharam bolsa integral do PROUNI – (Programa Universidade para Todos), porque não podem pagar o transporte para a escola (acesso). Que tenhamos os mesmos direitos básicos e fundamentais custeados pelo FUNDEP/MEC.

Moção nº 48

Reivindica-se que sejam proibidas a comercialização e venda de cadeira de rodas contendo assento de “lonita”, uma vez que comprometem a qualidade de vida do usuário em virtude do desconforto que causam. Além disso, que a qualidade da frenagem dessas cadeiras sejam padronizadas com a especificação de um material resistente e durável. Que também seja implementada uma política de acesso à cadeiras de rodas motorizadas para portadores de deficiência mútua de todos os níveis sociais. Que essas cadeiras de rodas sejam avaliadas por profissional técnico que leve em consideração essas especificações.

Moção nº 49

Minas Gerais é um dos Estados pioneiros na luta pela defesa de direitos da pessoa com deficiência, sendo, inclusive, a primeira Unidade Federativa a criar um órgão público de articulação de políticas estaduais voltadas ao segmento. Nesta Conferência, o Estado elegeu 70 delegados, que

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infelizmente não estão presentes em sua totalidade devido ao fato seguinte, que vimos repudiar: quatro dias antes do evento foi comunicado que o translado seria feito por transporte aéreo e que os delegados vindos do interior para a capital mineira seriam hospedados até o horário de embarque. Numa atitude de desrespeito para com o movimento das pessoas deficientes, um dia antes da viagem foi comunicado aos delegados que tal medida anunciada anteriormente não seria mais assumida pelo Estado. Nosso repúdio ao governo de Minas Gerais não se fundamenta simplesmente no tipo de transporte utilizado, mas na forma como o processo foi conduzido, caracterizado pelo desencontro de informações. O que mais nos deixa indignados é a falta de compromisso com este momento histórico vivido pelo movimento das pessoas com deficiência.

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VIII - Solenidade de Encerramento

Composição da Mesa: Senhor presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e Senhora Maria Letícia Lula da Silva; Senhor Paulo Vannuchi, Secretário Especial dos Direitos Humanos; Senhor Adilson Ventura, Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência “ Conade; Senhora Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior, Coordenadora-Geral da Coordenadoria-Geral para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência “ Corde e a Senhora Cândida Carvalheira, Coordenadora-Geral da Comissão Organizadora da I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

Adilson VenturaPresidente do CONADE

Boa tarde a todos companheiros e companheiras participantes dessa nossa I Conferência Nacional da Pessoa com Deficiência!

Inicialmente, nós gostaríamos de cumprimentar e agradecer ao nosso querido presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Dona Marisa Letícia por estarem aqui prestigiando o encerramento dessa nossa I Conferência. Cumprimentamos a todas as demais autoridades aqui presentes, a Mesa e essa plenária.

Presidente Lula, estamos encerrando essa nossa Conferência e é com emoção dos meus 40 anos de atividade na luta das pessoas com deficiência em busca de seus direitos que contamos, pela primeira vez, com a presença de um presidente da República. Estão presentes nesta plenária cerca de 1000 delegados provenientes de todas as Unidades da nossa Federação. Algumas pessoas se submeteram a um grande sacrifício da saúde, enfrentando, inclusive, ônibus, estradas, viagens de avião e por outros meios até chegarem aqui.

E isso tudo é uma resposta, presidente, que nós queremos dar a Vossa Excelência. Quando no dia 02 de dezembro de 2004 Vossa Excelência assinou o Decreto nº 5296, disse, naquela oportunidade: “No Brasil, tem lei que pega e tem lei que não pega. Cabe a vocês fazerem esta lei pegar”. E é por isso que nós todos estamos aqui reunidos, trabalhando em torno dessa lei, trabalhando em torno da acessibilidade e seus diversos aspectos para conseguirmos resgatar e desfrutar a plenitude dos nossos direitos, enquanto cidadãos plenos que somos.

Nós agradecemos a Vossa Excelência por ter convocado esta Conferência em 14 de julho de 2005. Este evento gerou no Brasil conferências municipais, estaduais e conferência no Distrito Federal para, inclusive, eleger os respectivos delegados, mobilizando uma grande quantidade de brasileiros. Infelizmente, a grande maioria não pôde estar aqui presente, porque nós somos 25 milhões de deficientes neste País.

Eu também ouvi de Vossa Excelência, no Conselho Econômico Social, que “aquilo que se gasta com o social não é gasto; é investimento”. Por favor, Presidente invista nesses 25 milhões de brasileiros, porque o retorno será muito dadivoso.

Obrigado!

Luiz Inácio Lula da SilvaPresidente da República

Meus queridos amigos e amigas que estão participando dessa I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência! Meu querido Paulo Vannuchi, Secretário Especial dos Direitos Humanos; minha querida companheira Marisa; deputados federais Carlos Motta e Marinha Raupp; meu

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querido companheiro Adilson Ventura, Presidente do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência; minha querida Izabel de Loureiro Maior, Coordenadora - Geral da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; Senhora Cândida Carvalheira, Coordenadora - Geral da Comissão Organizadora da I Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência; meus amigos e minhas amigas.

Esta é a segunda vez que eu tenho o privilégio e o prazer de participar de um ato junto com vocês. Da outra vez, vocês estão lembrados que o Secretário Especial era o nosso companheiro Nilmário Miranda, e nós tivemos um encontro aqui em Brasília e que não era uma Conferência. Estou aqui para dizer que, vendo o entusiasmo de vocês e sabendo que vocês saíram do Oiapoque ao Chuí, em condições difíceis, para vir a uma Conferência, vocês estão consagrando uma coisa que eu venho afirmando há muitos e muitos anos neste País: o grande legado que um governo pode deixar para sua sociedade não é uma lei e não é um beneficio, apenas, mas é a mudança de padrão do relacionamento do Estado brasileiro e do seu governo com a sociedade.

A partir desta Conferência, quem quer que seja governo daqui para adiante tem que saber que todos os anos, neste país, teremos uma Conferência dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Antigamente nós só tínhamos a Conferência da Saúde e a Conferência da Saúde tomou uma força tão grande que, independentemente do governo ser de direita ou de esquerda ou de centro, quem fosse presidente ou ministro da Saúde fazia a Conferência.

Nós agora já temos 18 conferências realizadas no Brasil, desde a conferência dos “sem-teto” até a conferência dos portadores de deficiência. Então, quem entrar vai saber: a cada ano ou a cada dois anos, vocês estarão aqui em Brasília dizendo em alto e bom som: somos homens e mulheres do Brasil. Não queremos dó nem piedade. Queremos direito e respeito.

Então, meus parabéns pela conquista de vocês hoje. É uma conquista nobre para uma parcela enorme da sociedade brasileira. E ainda tem gente ali em cadeira de roda exibindo medalha, porque, graças a Deus, também no nosso governo os companheiros que participaram da Para-Olimpíada tiveram ajuda para realizar seu sonho de participar desse evento desportivo tão importante. E pelo que eu estou informado, esse ano a ajuda será muito maior e certamente vocês vão trazer muito mais medalhas do que já trouxeram da outra vez.

Bem, se todos aqueles que enxergam fechassem os olhos por alguns instantes, teriam, quem sabe, uma pequena amostra do que é enfrentar uma rua, uma cidade, um mundo aparentemente feito apenas para quem pode ver. Se todos aqueles que andam com as suas próprias pernas imaginassem que já não podem mais contar com elas, talvez entendessem o obstáculo quase intransponível de uma simples calçada sem rampa para cadeiras de rodas.

Estou falando de milhões de cidadãos e cidadãs deste País que, durante anos e anos, foram privados de viver uma vida com dignidade, foram privados de direitos humanos inalienáveis. Mas, estamos falando de brasileiros e brasileiras que lutaram sempre e que agora começam a colher os frutos de suas lutas.

Assim que assumimos parcerias com os movimentos sociais do setor, buscamos por em prática as propostas que há muito tempo vinham sendo reivindicadas. O Decreto da Acessibilidade, que assinei no final de 2004, depois de amplos debates com os setores diretamente interessados, representa importante avanço no reconhecimento dos direitos de todos os brasileiros e brasileiras portadores de algum tipo de deficiência: direito ao atendimento prioritário de qualidade; direito a acessibilidade arquitetônica e urbanística; direito ao sistema de transporte adaptado por necessidades; direito a uma educação inclusiva; direito, enfim, a uma vida digna.

Por mais que tenhamos feito, precisamos avançar muito mais para corrigir a dívida histórica do Brasil para com essa parcela de sua população, estimada em 24,6 milhões de pessoas. Mas, tenho certeza que estamos no caminho certo. Com o Sistema Brasileiro de Acessibilidade Urbana, estamos estimulando e apoiando os governos estaduais, e municipais e do Distrito Federal no desenvolvimento de ações que garantam o acesso de pessoas com restrição de mobilidade ao sistema de transporte urbano de circulação em áreas públicas.

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Muitas vezes a melhoria de qualidade de vida dessas 24,6 milhões de pessoas depende de medidas simples, como calçadas com rampa para os que utilizam cadeiras de rodas, piso tátil e semáforos sonoros para os portadores de deficiência visual, vagões de metrô com indicação visual nas estações para os que não ouvem. São medidas simples, mas que só se concretizam quando há compromisso social e disposição política para fazê-las.

Estamos trabalhando para garantir o direito de ir e vir de pessoas que, muitas vezes, passam a vida confinadas em suas casas porque as cidades não foram feitas para todos. Queremos cidades, Estados e um País para todos, mas é preciso, acima de tudo, construir um País para todos e um País assim só se constrói com educação acessível para todos.

Nos três primeiros anos de governo, mais 190.000 novos alunos com necessidades educacionais especiais foram matriculados no sistema de ensino. Houve um crescimento de quarenta e três por cento (43%) em relação a 2002. Dado igualmente importante: dos 641.317 alunos com necessidades especiais matriculados no sistema de ensino, nada menos que quarenta e um por cento (41%) estudam hoje em escolas comuns contra apenas vinte e quatro vírgula seis por cento (24.6%) nos anos anteriores.

Isso é fruto das ações que tomamos nestes três anos de governo, com o objetivo de promover a inclusão educacional das pessoas portadoras de deficiência. Escolas estão sendo adaptadas com laboratórios de informática, oficinas pedagógicas, materiais didáticos, equipamentos e condições de infra-estruturas, enquanto os professores passam por um processo de formação continuada para melhor receber estes alunos. Assinamos, por exemplo, cerca de 300 convênios com secretarias estaduais e prefeituras para eliminação de barreiras físicas nas escolas, visando a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Quando incluímos essas crianças em turmas convencionais, ensinamos e aprendemos uma importante lição: o respeito pela diversidade.

Universalizamos a distribuição de livros didáticos em Braille, que agora chegam aos estudantes matriculados até à 8ª série e não mais somente até a 4ª série. Em 2005, foram distribuídos 40.000 exemplares, o que significou um investimento de 1,2 milhões de reais.

Também tornamos obrigatória a inclusão da Língua Brasileira de Sinais no currículo dos cursos de formação de professores para o exercício do magistério em nível médio, superior e nos cursos de fonoaudiologia.

Esses e tantos outros investimentos de recursos e esforços têm o objetivo de reverter um quadro preocupante, herdado de anos e anos de descaso. Na verdade, 1/3 dos brasileiros e brasileiras com deficiência freqüentaram a escola por um período de três anos. Agora não vai ser mais assim.

Estamos implementando agora a Política Nacional para Pessoas com Deficiência, em parceria com Estados, Municípios e instituições não-governamentais. As ações abrangem desde a prevenção da deficiência, como controle de carência vitamínica, que provoca a cegueira infantil, até a reabilitação. Em 2005, investimos 4,5 milhões de reais em apoio técnico e financeiro a Estados e Municípios para a aquisição de equipamentos para serviços de reabilitação. Estão sendo implantadas 122 unidades descentralizadas de reabilitação em Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Rondônia, para que pessoas com deficiência possam ser atendidas mais perto de seus Municípios. Essas novas unidades atendem a quem sofreu amputações, pessoas com paralisia cerebral e lesões medulares, idosos com acidente vasculares cerebral.

Na Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva, investimos, no ano passado, 162 milhões de reais em tratamento clínico e cirúrgico e na reabilitação por meio de implantes de aparelhos auditivos e terapia com fonoaudiólogos. Em 2005, implantamos 80 unidades de saúde auditiva. Este ano serão mais 164 unidades, levando cobertura a todos os entes federativos.

Quero terminar com dois anúncios importantes. O primeiro deles é que a Caixa Econômica Federal acaba de fechar o patrocínio do programa “Arte sem Barreiras”. É um investimento de 01 milhão de reais na realização deste importante evento que promove a arte, a educação e a expressão de jovens e adultos com necessidades especiais. Mais do que o significativo valor do patrocínio, é o exemplo dado

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pela CEF às empresas, que, durante muito tempo, recusavam ter suas marcas vinculadas a imagens de pessoas com deficiência.

Felizmente, o Brasil está mudando. Este é um país que se orgulha de seus cidadãos e cidadãs, principalmente aqueles que superam suas limitações e enfrentam desafios. E isso tem a ver com o segundo anúncio que eu quero fazer. A CEF também acaba de renovar o patrocínio aos atletas para-olímpicos brasileiros, no valor recorde de 3,8 milhões de reais. Se nas Para-Olimpíadas de 2004, com o patrocínio de apenas 01 milhão de reais, nossa equipe trouxe na bagagem 14 medalhas de ouro, 12 medalhas de prata e 07 medalhas de bronze, imaginem com um investimento quatro vezes maior! Não vamos trazer todas porque nós queremos que os outros países também invistam nos seus atletas para-olímpicos e que eles também tenham o direito de ganhar algumas medalhas. Com toda a certeza, vamos fazer bonito no PAN do ano que vem no Rio de Janeiro e na Para-Olimpíada de 2008, em Pequim.

Eu quero terminar dizendo a vocês obrigado a todos pelo exemplo. Que Deus abençoe a todos vocês.

Muito Obrigado!

Cândida Carvalheira

Coordenadora da I Conferência Nacional das Pessoas com Deficiência

Na qualidade de presidente da Comissão Organizadora da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, declaro encerrados os trabalhos.

Obrigada!

ANEXOS

1. Programação

PROGRAMAÇÃO COMPLETA DOS TRABALHOS

CREDENCIAMENTO

DIA 12 Das 9h às 15h credenciamento dos delegados, convidados e observadores

internacionais

Dia 13 Das 9h às 12h credenciamento dos delegados, convidados e observadores

internacionais

Em nenhuma hipótese poderá ser credenciado delegado suplente sem que a substituição tenha sido

comunicada à Comissão Organizadora até 11 de abril.

DESENVOLVIMENTO DOS TRABALHOS

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12 DE MAIO

HORA LOCAL ATIVIDADE

19h

Auditório Principal

AMERICEL MUSIC HALL

solenidade de Abertura

com a presença de autoridades governamentais e não

governamentais

22h AMERICEL MUSIC HALL coquetel

23h retorno dos delegados aos hotéis

13 DE MAIO

HORA LOCAL ATIVIDADE

9h às 12h- Auditório Principal

Americel Music Hall

mesa-redonda: Das condições gerais da Implementação da Acessibilidadeexpositor: Sandra Julião – MP/DFmoderador: Izabel Maior – Coordenadora Geral CORDE/SEDHmesa-redonda: Da implementação da acessibilidade arquitetônica, urbanística e de transportesexpositores: Ângela Carneiro da Cunha – PE e Eduardo - SPTRANS, consultor para NBR ônibus acessível-INMETROmoderador: Cláudio Vereza – Presidente. Assembléia. Legislativa do Espírito Santodebates

12h às 14hRestaurante

Park Fair

almoço

14h às

17:30h

Salas de grupos - de 1 a 13

Park Fair

discussões em Grupos de Trabalho

17h Park Fair lanche

17:30 às

19:30h

Salas de Painéis - de 1 à 13

Park Fair

apresentação de Painéis específicos

Auditório Principal

Americel Music Hall

tribuna Livre

20h às

20h30

Auditório Principal

Americel Music Hall

atividade cultural

20h30 às

22hsRestaurantePark Fair

jantar

22hsretorno dos delegados aos hotéis

14 DE MAIO

HORA LOCAL ATIVIDADEmesa-redonda: da acessibilidade à informação, à comunicação e às ajudas técnicas

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9h às 12hs Auditório Principal

Americel Music Hall

expositores: 1) informação: Antonio Borges-UFRJ 2) comunicação e telefonia: Genézio Vieira – Conade/RJ e 3) ajudas técnicas: Maria Mello - MGmoderador: Omar Varela – Diretor do Centro de Acessibilidade da IBM/Brasil

debates

12h às 14h Restaurante/Park Fairalmoço

14h às

17:30h

Salas de grupos - de 1 a 13

Park Fair

discussões em Grupos de Trabalho

17h Park Fairlanche

17:30 às

19:30h

Salas de Painéis - de 1 a 13

Park Fair

apresentação de painéis específicos

Auditório Principal

Americel Music Hall

tribuna livre

19:30h às

20:30h

Restaurante

Park Fair

jantar

21h Americel Music Halllançamento da Campanha Nacional de Acessibilidade

23hretorno dos delegados aos hotéis

15 DE MAIO

HORA LOCAL ATIVIDADE

9h às 13hAuditório Principal

Americel Music Hallplenária final

13hAuditório Principal

Americel Music Hallsolenidade de encerramento

14hRestaurante

Park Fair

almoço

14 às 22hRetorno das delegações às respectivas Unidades Federadas

EVENTOS PARALELOS

De 12 a 15 de maio, de 09 às 21horas

De 12 a 15/05: Exposição em estandes montados por organizações não governamentais, Governo

federal, Estados, Distrito Federal e Municípios e empresas da iniciativa privada apoiadoras do evento.

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De 12 a 15/05: Mostra de artes

Dia 13/05 – 18h: Lançamento do Manual “Pessoa com deficiência e o Sistema Único de Saúde”,

elaborado pelo Ministério da Saúde, no estande do Governo Federal

2. REGIMENTO INTERNO – REGULAMENTO

REGIMENTO DA I CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Capítulo I Dos Objetivos

Art. 1º A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência será realizada em Brasília, Distrito Federal, no período de 12 a 15 de maio de 2006, conforme disposto no Decreto de 10 de outubro de 2005, e terá por finalidade analisar os obstáculos e avanços da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência.

Capítulo II Da Realização

Art. 2º A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência tem abrangência nacional e caráter deliberativo. As análises, formulações e proposições decorrentes da Conferência devem ter esta qualidade. A etapa nacional deverá considerar a consolidação das Conferências Estaduais e Municipais dos Direitos da Pessoa com Deficiência e tratar dos temas relevantes em âmbito nacional.

Parágrafo único. Todos os delegados (com direito a voz e voto) e convidados (com direito a voz) presentes à I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência devem reconhecer a precedência das questões em âmbito nacional e atuar sobre elas, em caráter avaliador, formulador e propositivo.

Art. 3º A realização da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência ocorrerá em etapas, no âmbito municipal, estadual e nacional, nas quais será debatido o temário central proposto para a etapa nacional.

§ 1º Os Municípios, o Distrito Federal e os Estados que já realizaram suas conferências poderão organizar, caso seja necessário, plenárias complementares para discutir o tema central e referendar suas delegações para a etapa nacional.

§ 2º Os Municípios, o Distrito Federal e os Estados que não possuem conselhos poderão realizar fóruns ou encontros com a presença de conselheiro designado pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência – Conade para referendar suas delegações para a etapa nacional.

Art. 4º As etapas da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência serão realizadas nos seguintes períodos:

I – Etapa I – Municipal, até 31 de novembro de 2005;

II – Etapa II - Estadual, até 31 de março de 2006; e

III – Etapa III – Nacional, de 12 a 15 de maio de 2006.

§ 1º O não cumprimento dos prazos das etapas I e II em todas as Unidades Federadas não constituirá impedimento à realização da Etapa Nacional no prazo previsto.

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§ 2º A Etapa Nacional será realizada em Brasília, sob os auspícios da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

Capítulo III Do Temário

Art. 5º Nos termos do Decreto de 10 de outubro de 2005 a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência terá como tema central: “Acessibilidade: você também tem compromisso!”, que será discutida em três (03) mesas-redondas, a partir dos seguintes eixos temáticos:

• das condições gerais da implementação da acessibilidade;• da implementação da acessibilidade arquitetônica, urbanística e de transportes; e• da acessibilidade à informação, à comunicação e às ajudas técnicas.

Art. 6º Os Termos de Referência de cada Mesa-Redonda observarão, obrigatoriamente, o Temário Oficial, e deverão ter em comum a abordagem dos seguintes aspectos:

a) a eqüidade e o direito de cidadania, assim como as demais diretrizes constitucionais da universalidade, integralidade, participação social e da descentralização;

b) a afirmação dos valores da solidariedade social e da responsabilidade de todos nesse processo;

c) as estratégias de controle social para o alcance dos objetivos delineados na proposta; e

d) a importância estratégica dos recursos humanos e financeiros para o tema central.

Art. 7º As Mesas-Redondas serão seguidas de trabalhos em grupo, com o objetivo de proporcionar participação ampla e democrática de todos os segmentos representados na Conferência e de obter um produto final que realmente possa servir de orientação para o Conade e a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde, nos anos subseqüentes.

§ 1º Cada grupo contará com um (a) facilitador (a) e um relator (a), indicados pela Comissão Organizadora, devendo o grupo escolher entre seus participantes um (a) relator (a) auxiliar.

§ 2º A plenária final compreenderá a aprovação do Relatório e das moções apresentadas pelos delegados, segundo o regulamento.

Art. 8º Nos trabalhos dos grupos não serão tratados temas específicos além daqueles definidos a partir do temário central.

§ 1º Para permitir a troca de experiências e a apresentação de aspectos particulares da implantação e funcionamento do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência em cada Município, no Estado e no Distrito Federal, será organizada uma exposição paralela à Conferência.

§ 2º Serão previstos na grade de programação horário e local para que grupos interessados em discussões de temáticas particulares referentes à pessoa com deficiência possam se reunir, paralelamente aos trabalhos da Conferência.

Art. 9º Os Relatórios das Conferências Estaduais dos Direitos da Pessoa com Deficiência devem ser apresentados em versão resumida com, no máximo, cinco(5) laudas, em espaço 1,5, impresso e/ou formato digital (cd, disquete), e devem ser entregues na Secretaria da Conferência até 15 (quinze) dias antes do início da etapa nacional para que possam ser consolidados e disponibilizados na página do CONADE – www.sedh.gov.br/conade e sirvam de subsídio às discussões na etapa nacional.

Art. 10. A Comissão Organizadora promoverá a elaboração de textos sobre o temário central para subsidiar as discussões da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

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Art. 11. A Conferência será presidida pelo Secretário Especial dos Direitos Humanos, e, na sua ausência ou impedimento legal, pelo Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - Conade e na ausência de um destes, por impedimento eventual, pelo representante indicado com essa finalidade.

Art. 12. Para a organização e o desenvolvimento de suas atividades a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência contará com uma Comissão Organizadora.

Seção I ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DA COMISSÃO ORGANIZADORAArt. 13. A Comissão Organizadora da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com

Deficiência terá a seguinte composição:

I – Coordenação-Geral;

II - Coordenação de Logística;

III - Coordenação da Programação Técnica; e

IV - Coordenação de Comunicação Social.

Parágrafo único. A Comissão contará com assessorias especiais e permanentes designadas para fins específicos.

Seção IIAtribuições da Comissão OrganizadoraArt. 14. A Comissão Organizadora tem as seguintes atribuições:

I – coordenar, supervisionar, dirigir e promover a realização da Conferência, atendendo aos aspectos técnicos, políticos, administrativos e financeiros;

II – propor o Regimento da Conferência e a programação.

III – propor os nomes dos expositores e o temário central da etapa nacional, bem como os documentos técnicos e textos de apoio;

IV – propor os critérios e as modalidades de participação e representação dos interessados, bem como o local de realização da Conferência;

V – propor o Plano de Aplicação de Recursos Financeiros relativos à Conferência e submetê-los à aprovação do Secretário Especial dos Direitos Humanos.

VI – providenciar a documentação para a prestação de contas dos recursos financeiros relativos à Conferência e submetê-la ao Secretário Especial dos Direitos Humanos;

VII – designar relatores auxiliares;

VIII – designar os integrantes das Assessorias Especiais e Permanentes, podendo ampliar o quadro técnico dessas Assessorias sempre que houver necessidade; e

IX – providenciar a publicação dos Anais da Conferência.

Parágrafo único. Serão aprovados pelo Conade os incisos II e VII acima mencionados.

Art. 15. À Coordenação-Geral cabe:

I – coordenar as reuniões da Comissão Organizadora;

II – coordenar as atividades da Comissão Organizadora e delegar competências aos membros;

III – designar técnicos e assessores da Comissão Organizadora, vinculados a uma ou mais das suas funções, quando necessário;

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IV – promover o relacionamento entre as comissões;

V – submeter à aprovação do Conade às matérias referentes aos incisos II e VII do art. 14; e

VI – apresentar relatórios nas reuniões ordinárias e extraordinárias do CONADE, informando sobre as atividades desenvolvidas pela Comissão Organizadora;

Parágrafo único. A Coordenadora-Geral da Comissão Organizadora será substituída, em seus impedimentos eventuais, por um dos membros da Comissão acima referida.

Art. 16. À Coordenação de Logística cabe:

I – elaborar o orçamento com base nas informações de atividades, consolidadas no Conade;

II – propor, elaborar e negociar parcerias, convênios e contratos junto a SEDH;

III – providenciar os atos e encaminhamentos pertinentes aos fluxos de gastos com as devidas previsões, cronogramas e plano de aplicação;

IV – preparar e apresentar à Coordenação-Geral da Comissão Organizadora a prestação de contas de todos os recursos concedidos para a realização da Conferência;

V – propor, elaborar e realizar métodos de credenciamento dos delegados da etapa nacional, bem como os controles necessários;

VI – propor e organizar o apoio da Secretaria da Conferência; e

VII – providenciar a hospedagem, traslado e alimentação dos participantes.

Art. 17. À Coordenação da Programação Técnica cabe:

I – coordenar a Comissão Relatora da etapa nacional;

II – indicar e coordenar os relatores dos Grupos de Trabalho, ouvido o Conade;

III – coordenar a consolidação dos relatórios da etapa estadual e prepará-los para distribuição aos delegados da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, conforme previsto no art.9º;

IV – consolidar a elaboração dos relatórios parciais e a Ata Geral da Conferência;

V – coordenar a elaboração dos consolidados dos Grupos de Trabalho;

VI – coordenar a ordenação e o consolidado das moções aprovadas na plenária final;

VII – coordenar a elaboração do Relatório Final e dos Anais da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência;

VIII – coordenar a elaboração dos Temos de Referência visando à produção de textos pelas entidades e instituições que compõem o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência e a apresentação pelos expositores das Mesas-Redondas do tema central; e

IX – submeter à apreciação do Conade a indicação dos expositores para cada uma das Mesas-Redondas, encarregando-se ainda de obter junto aos mesmos os textos completos de suas apresentações.

Art. 18. À Coordenação de Comunicação Social cabe:

I – articular com todos os veículos de comunicação das entidades e instituições que compõem o Conade, visando a sua participação profissional nas atividades de Comunicação Social da Conferência;

II – articular, especificamente com a Assessoria de Comunicação da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, um plano geral de Comunicação Social da Conferência;

III – coordenar as atividades de Comunicação Social da Conferência; e

IV – articular o envio das informações da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

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Capítulo IVDos Membros

Art. 19. A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em suas diversas etapas, deverá contar com a participação de membros representando órgãos públicos, entidades de classe, organizações patronais, representantes de Conselhos dos Direitos da Pessoa com Deficiência, demais representantes de entidades e organizações da sociedade civil, usuários e pessoas interessadas nas questões relativas aos direitos da pessoa com deficiência, em particular, e na defesa dos direitos humanos.

Parágrafo único. A representação na I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em todas as suas etapas, será paritária entre representantes do governo e da sociedade civil.

Art. 20. Os membros da etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência serão distribuídos em duas categorias:

a) delegados com direito a voz e voto;

b) convidados com direito a voz;

§ 1º Os critérios de escolha dos convidados serão definidos pela Comissão Organizadora e pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora Deficiência - Conade.

§ 2º As pessoas com deficiência, delegadas ou convidadas que justificarem a necessidade de assistente pessoal / acompanhante deverão comunicar na ficha de inscrição e aguardar o deferimento.

Art. 21. Serão delegados da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência:

a) delegados natos: conselheiros titulares e suplentes do Conade;

b) delegados eleitos nas Conferências Estaduais dos Direitos da Pessoa com Deficiência, conforme tabela em anexo;

Art. 22. O credenciamento de delegados à etapa nacional deverá ser feito junto à Secretaria da Conferência.

Capítulo VDos suplentes de delegados

Art. 23. Cada Unidade da Federação deverá eleger suplentes até o mesmo número de delegados, observada a paridade e a representação dos segmentos. Na substituição será observada a correspondente categoria do titular.

Parágrafo único: o suplente somente participará da etapa nacional da I Conferência na ausência do respectivo titular.

Capítulo VI Dos Recursos

Art. 24. As despesas com a organização geral e com a realização da etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência correrão à conta de dotação orçamentária consignada à Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e/ou por recursos de outras fontes.

Art. 25. Poderão ser firmados convênios e contratos com vistas à execução de ações necessárias à realização da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

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Capitulo VII Das Disposições Gerais

Art. 26. O Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência – CONADE acompanhará e deliberará sobre as atividades da Comissão Organizadora, devendo a Coordenação-Geral apresentar relatórios em todas as reuniões ordinárias e extraordinárias do Conselho.

Art. 27. A Secretaria Especial dos Direitos Humanos da presidência da República dará o suporte técnico, administrativo e financeiro necessários ao funcionamento da Comissão Organizadora da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

TOTAL DE DELEGADOS POR UNIDADE FEDERADA

POPULAÇÃO/HABITANTES

QDE UF’s UF’s Nº

DEL/UF TOTAL

Até 2 milhões 6 AC-RR-AP-RO-TO-SE 10 60

De 2 a 4 milhões 9AM-PI-AL-MS-MT-DF-PB-ES-

RN20 180

De 4 milhões a 6 milhões 3 MA-SC-G0 30 90

De 6 milhões a 8 milhões 3 PA-CE-PE 40 120

Entre 9 milhões a 11 milhões 2 PR-RS 50 100

Faixa de 13 a 15 milhões 2 BA-RJ 60 120

Faixa de 15 milhões a 20 milhões 1 MG 70 70

Acima de 20 milhões/ habitantes 1 SP 100 100

DELEGADOS NATOS 76CONVIDADOS 94ACOMPANHANTES 90OBSERVADORES INTERNACIONAIS 50

TOTAL: 1150

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Regulamento da Conferência1ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência

Capítulo I – Da finalidadeArt. 1º - A etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência,

convocada pelo Decreto de 14 de julho de 2005, com as alterações efetuadas pelo Decreto de 10 de outubro de 2005, foro de debates aberto a todos os segmentos da sociedade, terá por finalidade analisar os obstáculos e avanços do Plano de Ação dos Governos na área de atenção à pessoa com deficiência e propor diretrizes e caminhos para efetivar a acessibilidade no país.

Parágrafo único. A etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência será realizada em Brasília – DF, sob os auspícios da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da presidência da República.

Capítulo II – Da organizaçãoArt. 2º - A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência será presidida pelo

presidente do CONADE; e na sua ausência ou impedimento eventual, pelo vice-presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADE.

Art. 3º - O desenvolvimento da etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência estará a cargo da Comissão Organizadora, designada pela a Portaria nº 18, de 08 de fevereiro de 2006.

Capítulo III – Da programaçãoArt. 4º A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência desenvolver-se-á

sobre um tema central e por grupos de trabalho, em Mesas-Redondas, a saber:

a) credenciamento: das 09 às 15 horas do dia 12 de maio de 2006;

b) abertura oficial: às 18 horas do dia 12 de maio de 2006;

c) mesas-redondas: das 09 às 12 horas, com debates no dia 13 e sem debates no dia 14 de maio de 2006;

d) grupos de trabalho: das 14 às 17 horas, nos dias 13 e 14 de maio de 2006;

e) Painéis com temas específicos e tribuna livre: das 17:30 horas às 19:30 horas, nos dias 13 e 14 de maio de 2006;

f) Plenária Final: das 09 às 12 horas do dia 15 de maio de 2006

g) Solenidade de Encerramento: às 13 horas do dia 15 de maio de 2006.

Capítulo IV – Dos membrosArt. 5º São membros da etapa nacional da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com

Deficiência:

a) delegados com direito a voz e voto;

b) convidados com direito a voz;

c) Observadores Nacionais e Internacionais com direito a voz.

Parágrafo único. Os critérios para a escolha dos convidados serão definidos pela Comissão Organizadora e pelo CONADE.

Art. 6º São delegados:

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a) delegados natos: conselheiros titulares e suplentes do CONADE;

b) delegados eleitos nas Conferências Estaduais (tabela anexa).

§ 1º - O credenciamento de delegados à etapa nacional deverá ser feito junto à Secretaria da Conferência, até às 12 horas do dia 13 de maio de 2006.

Capítulo V – Do temárioArt. 7º A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência terá:

a) temário central;

b) painéis específicos; e

c) tribuna livre.

Art. 8º A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência terá como tema central “Acessibilidade: você também tem compromisso”, que será discutido em três(03) Mesas-Redondas.

Art. 9º A abordagem de cada tema que compõe o temário central será realizada mediante exposição, a cargo de até três (03) expositores, seguida de debates e posterior discussão em Grupos de Trabalho, considerando também os Relatórios das Unidades Federadas e dos Municípios.

Art. 10 Os expositores deverão enviar até 28 de abril de 2006 à Secretaria da Conferência textos completos de suas intervenções com até seis (6) laudas, que farão parte do material didático.

Art. 11 Os expositores disporão de vinte(20) minutos, prorrogáveis por mais cinco(05), para apresentar a síntese de documento baseado nos Termos de Referência elaborados pela Comissão Organizadora e pelo CONADE.

Art. 12 Após as exposições, o moderador, sob orientação da Comissão Organizadora, identificará aspectos polêmicos e contraditórios observados durante as exposições. A palavra será aberta ao plenário durante sessenta(60) minutos, improrrogáveis.

Art. 13 Será facultado a qualquer delegado manifestar-se durante o período dos debates, verbalmente ou por escrito, mediante perguntas ou observações pertinentes ao tema.

Parágrafo único. O tempo máximo para cada intervenção a que se refere o caput deste artigo será de três (3) minutos, improrrogáveis.

Art. 14 A Mesa dos trabalhos será dirigida por um moderador indicado pela Comissão Organizadora.

Art. 15 As exposições e debates terão registros sonoros para posterior tratamento, com vista a sua divulgação nos Anais da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Art. 16 Cada Grupo de Trabalho será composto por, no máximo, oitenta(80) participantes e terá um facilitador com as funções de conduzir as discussões, controlar o tempo e estimular a participação, de acordo com o roteiro previamente recebido.

Art. 17 Cada Grupo de Trabalho contará com um relator, designado pela Comissão Organizadora, e um sub-relator, indicado pelo próprio grupo, encarregados de sintetizar as conclusões do grupo, participar da consolidação dos relatórios e colaborar com a Comissão Relatora.

Parágrafo único. No sentido de agilizar os trabalhos, cada relator deverá, ao final de cada dia de trabalho, entregar à Comissão Relatora o produto das discussões ocorridas no âmbito de cada grupo.

Capitulo VI – Regimento da Plenária Final

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Art.18 A plenária final da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência terá como objetivo debater e aprovar o Relatório Final e as moções apresentadas.

Art. 19 Participarão da plenária final:

a) delegados com direito a voz e voto;

b) convidados com direito a voz;

c) observadores Internacionais com direito a voz

Parágrafo único. No sentido de facilitar o encaminhamento dos trabalhos, a Comissão Organizadora designará localização específica para os delegados e para os demais participantes.

Art. 20 Os trabalhos serão coordenados por uma Mesa, constituída de membros da Comissão Organizadora ou por delegados por ela indicados e presidida pelo Coordenador da Comissão Organizadora.

Parágrafo único. Os trabalhos serão secretariados por membros da Comissão Relatora.

Art. 21 A agenda da plenária final da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência contemplará os seguintes itens:

a) apreciação do Relatório Final;

b) apreciação das moções;

Art. 22 A apreciação do Relatório Final será encaminhada na forma que se segue:

a) Proceder-se-á com antecedência à distribuição do Relatório Final;

b) assegurar-se-á aos delegados o direito de solicitar o exame em destaque de qualquer item da proposta do Relatório Final;

c) as solicitações de destaque deverão ser encaminhadas por escrito, exceto quando se tratar de pessoas cegas ou com dificuldades para escrever, até o final da leitura da proposta de Relatório Final pela Mesa, constituindo-se em proposta de redação alternativa em relação ao item destacado;

d) as solicitações de destaque serão submetidas à deliberação da plenária, que decidirá, inicialmente, sobre sua pertinência;

e) identificado o conjunto dos ítens em destaque, proceder-se-á à votação do Relatório, ressalvados os ítens;

f) após a apreciação do Relatório, serão chamadas, uma a uma, as apresentações em destaque;

g) Os propositores de destaque terão dois (02) minutos, prorrogáveis somente para as pessoas com dificuldades de fala, para a defesa do seu ponto de vista. O presidente da Mesa concederá a palavra, a seguir, por igual tempo, ao delegado que se apresentar para a defesa de posição contrária à do propositor do destaque, não sendo permitida, em qualquer hipótese, réplica. Será colocado, então, em votação, o destaque apresentado;

h) a aprovação das propostas será por maioria simples dos delegados presentes.

Art. 23 As moções, encaminhadas exclusivamente por delegados, deverão ser apresentadas à Secretaria da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência até as 20 horas do dia 14 de maio, redigidas em uma lauda, no máximo.

§ 1º Cada moção deverá ser assinada por pelo menos dez por cento (10%) dos delegados credenciados.

§ 2º A Relatoria organizará as moções recebidas, classificando-as e agrupando-as por área temática e de subtema, dando ciência aos propositores para que organizem a apresentação na plenária, facilitando o andamento dos trabalhos.

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§ 3º Encerrada a fase de apreciação do Relatório Final da Conferência, o presidente da plenária final convocará os propositores das moções, por área temática, que deverão proceder à simples leitura do texto, garantindo-se a cada um o tempo de dois (02) minutos, no máximo, para a defesa da moção.

§ 4º Será concedido o mesmo tempo a outro delegado para a defesa de ponto de vista contrário ao do expositor da moção.

Art. 24 A aprovação das moções será por maioria simples dos delegados presentes.

Art. 25 Concluídas as apreciações das moções, serão encerrados os trabalhos da plenária final da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Capítulo VII - Das disposições gerais e comuns

Art. 26 Assegura-se aos delegados da plenária final o questionamento à Mesa, “pela ordem”, sempre que o critério de encaminhamento dado por qualquer um desses membros não esteja de acordo com o Regimento da plenária final.

Art. 27 Durante os períodos de votação serão vedados os levantamentos de “questão de ordem”.

Art. 28 Serão conferidos certificados aos delegados, convidados, expositores de temas, facilitadores e relatores, especificando a condição de sua participação na Conferência.

Art. 29 Os casos omissos serão dirimidos pela Comissão Organizadora e submetidos à plenária para aprovação.

3. PARTICIPANTES

CATEGORIA QUANTIDADE

DELEGADOS ESTADUAIS 837

DELEGADOS CONADE 52

ACOMPANHANTES 187

CORAL 26

AUTORIDADES 87

EXPOSITORES ESTANDES 135

EXPOSITORES/PALESTRANTES 6

PAINELISTAS (CONV) 66

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RELATORIA 16

CONVIDADOS 124

ESCOTEIROS 15

MÉDICOS E PARAMÉDICOS 20

APOIO CORDE/CONADE/ASSES.IMPRENSA 26

EQUIPE DE APOIO GERAL CONTRATADA 202

TOTAL 1799

4. PAINÉIS

4.1 Tema - Turismo e Acessibilidade: uma visão de mercado

Adriana Almeida PradoCoordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de

Deficiência – Corde

Eu vou iniciar a minha fala comentando um pouco o que é a ABNT para vocês entenderem um pouquinho o que é essa instituição. Depois, vamos falar especificamente na questão de como adequar os espaços conforme as normas da ABNT.

A ABNT, instituição fundada em 1940, é o órgão responsável pela normatização técnica no País. Na verdade, essa responsabilidade é do Inmetro, que transfere para a ABNT a responsabilidade de fazer as normas. É uma entidade privada, sem fins lucrativos, filiada às entidades internacionais da ISO, IEC e entidades regionais, como a Associação do Mercosul de Normatização “ AMN e a Comissão Pan-Americana de Normas Técnicas “ COPANT. A ABNT está dividida em 53 Comitês Nacionais e o Comitê de Acessibilidade é o CD-40.

Nosso trabalho é voluntário. Eu trabalho num órgão público, que sede as minhas horas de trabalho para que eu me dedique a esse trabalho de discussão das normas. Há boatos que a gente ganhe muito dinheiro com isso, mas não é assim. Nós não ganhamos nada, mas temos muito trabalho.

Geralmente, os Comitês de Acessibilidade são mantidos por uma ou mais empresas. No caso, o CD-40 é assumido pela empresa Abramed e é composto por quatro comissões: a Comissão de Edificações e Meio, que é a que eu coordeno; a Comissão de Transporte com Acessibilidade; a Comissão de Acessibilidade e Comunicação; e a Comissão de Acessibilidade para Inclusão Digital.

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Eu tenho aqui as normas que já estão válidas. Na verdade, vocês podem entrar no site da Corde e terão todas elas. Por exemplo:

• a NBR 9050 regula a “Acessibilidade a Edificações, Mobiliário, Espaços e Equipamentos Urbanos”, e já foi revisada;

• a NBR 13994 regula os “Elevadores de Passageiros “ Elevadores para Transporte de Pessoa Portadora de Deficiência”;

• a NBR 14020 regula a “Acessibilidade da Pessoa Portadora de Deficiência “ Trem de Longo Percurso”;

• a NBR 14021 regula a “Acessibilidade no Sistema de Trem Urbano ou Metropolitano”;

• a NBR 14022 regula a “Acessibilidade da Pessoa Portadora de Deficiência em Ônibus ou Trólebus para Atendimento Urbano e Intermunicipal”. Essa norma está em revisão;

• a NBR 14273 regula a “Acessibilidade da Pessoa Portadora de Deficiência no Transporte Aéreo Comercial”;

• a NBR 14970-1 regula a “Acessibilidade em Veículos Automotores – Requisitos de Dirigibilidade”;

• a NBR 14970-2 regula a “Acessibilidade em Veículos Automotores “ Diretrizes para a Avaliação Clínica do Condutor”;

• a NBR 14970-3 regula a “Acessibilidade em Veículos Automotores “ Diretrizes para a Avaliação da Dirigibilidade do Condutor com Mobilidade Reduzida em Veículo Automotor Apropriado”;

• a NBR 15250 regula a “Acessibilidade em Caixa de Auto-atendimento Bancário”; e

• a NBR 15290 regula a “Acessibilidade em Comunicação na Televisão”.

São essas as normas. A NBR 13994, que regula os elevadores, não é do Comitê de Acessibilidade. É uma norma do Comitê de Peças, mas está no site da ABNT também.

O importante é a gente ressaltar que estamos falando de turismo acessível para todas as pessoas. É por isso que temos aqui na tela imagens de uma pessoa gordinha, uma moça em cadeira de rodas, uma pessoa bem baixinha com deficiência, um senhor idoso e uma criança. Então, eu vou mostrar que acessibilidade é para todos, seja lá quem for. Na verdade, eu costumo dizer que, do jeito que as cidades são colocadas, nós somos todos atletas. Aliás, parece que elas foram construídas só para pessoas com 25 anos, porque, na medida em que nós começamos a envelhecer, já começamos a sentir que a cidade não está adequada para nós.

Quem é a população diretamente beneficiada quando se fala da questão de acessibilidade? São aqueles quatorze e meio por cento (14,50%) da população de pessoas com deficiência; são as pessoas com mais de 60 anos, que no Censo de 1980 representavam oito vírgula cinqüenta e seis por cento (08,56%) e nas previsões para 2050 representarão vinte e dois por cento (22%). Estamos aqui num fórum de pessoas com deficiência, mas é bom lembrar que a população de pessoas idosas está aumentando numa velocidade muito grande e as pessoas com deficiência também estão vivendo mais. As pessoas com deficiência, que antigamente faleciam mais cedo, hoje também estão vivendo mais. Então, nós temos um contingente de pessoas que estão envelhecendo e podem ficar presas em suas próprias casas, como também as pessoas com deficiência estão envelhecendo.

No ano passado, em junho, houve o Congresso Internacional de Geriatria e Gerontologia, e o Doutor Alexandre Kalache, responsável pela Política do Idoso na Organização Mundial de Saúde, abriu o Congresso Internacional dizendo assim: “O pessoal da saúde já está fazendo alguma coisa pelo idoso; e os engenheiros e arquitetos, o que estão fazendo pelas cidades?”. Se as cidades não forem acessíveis nós vamos ter um contingente de pessoas idosas sem poder circular ou sem poder viver nelas. Então, é

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importante destacar que a acessibilidade é para todos e que todos nós queremos, dignamente, desfrutar a vida e envelhecer.

O conceito de acessibilidade da NBR 9050 é “Permitir a qualquer pessoa a possibilidade e condição de utilização com segurança e autonomia de edificações, espaço, imobiliário, equipamento urbano e elementos”. Ou seja, é tudo só não acessibilidade dentro da minha própria casa. Aliás, a prefeitura de São Paulo está desenvolvendo agora um projeto para que os empresários se interessem em ter acessibilidade e desenvolver projetos que sejam acessíveis. Se eu quiser receber o Fabiano na minha casa, por exemplo, e a minha casa não for acessível, eu não vou poder recebê-lo. E mais, eu quero que minha casa seja acessível para quando eu envelhecer. Então, eu acho que essa consciência da importância também da nossa casa ser acessível é muito importante. Acho que ela é resultante do entendimento da acessibilidade em qualquer espaço.

Então, o que se espera de um ambiente acessível? Que ele seja seguro, que seja possível circular por todos os espaços, e que não se gaste muita energia para desfrutá-lo. E quando eu falo em gastar energia não me refiro apenas à pessoa que está em cadeira de rodas, mas também, por exemplo, à pessoa com deficiência visual. Quando o deficiente visual não tem nenhuma pista, nenhuma informação do ambiente, ele fica muito estressado, porque é evidente para todos nós que a pessoa em cadeira de rodas gaste energia, mas as pessoas com deficiência visual e deficiência auditiva também gastam quando elas não compreendem o espaço. O espaço, portanto, tem que ser de fácil compreensão, tem que estar bem sinalizado para ser acessível aos deficientes visuais, para facilitar o acesso às pessoas com deficiência e com baixa cognição, ou seja, pessoas com deficiência mental ou pessoas que, até por algum outro motivo, tenham algum rebaixamento, por doenças ou por velhice.

O espaço tem que ser traduzido em forma de letras e de símbolos também, que sejam adaptáveis e que possam ser modificáveis. Então, uma parte desse espaço tem que ser acessível e é importante que a outra parte possa ser adaptada e modificada.

Eu vou começar com algumas questões mais básicas:

1. a calçada: Por que eu quero uma calçada de melhor qualidade? Por que a norma coloca isso? Porque eu tenho pessoas com dificuldade de marcha. Na verdade, no caso da cadeira de rodas, quando eu tenho um espaço relativamente acessível a cadeira passa. O problema maior é quem está usando muleta, porque para passar vai depender do tipo de piso. É complicado também para quem tem um problema de marcha qualquer e até para a pessoa que está envelhecendo. Ou seja, a questão da necessidade de um piso melhor não é só para a pessoa que está na cadeira de rodas, mas para toda e qualquer pessoa que tenha qualquer dificuldade de mobilidade.

2. a travessia: qual é a importância de se facilitar a travessia? Há um grande número de acidentes causados pelo choque de pedestres com veículos. Se a gente facilitar essa travessia dando a ela melhor qualidade – colocando, inclusive, uma coisa que é pouco utilizada nesse País, que é a lombada mais alta - nós vamos facilitar muito. A gente tem aqui uma foto da faixa de pedestres mais alta, de maneira que ela fique da mesma altura da calçada. Então, quem vai subir é o veículo e não a pessoa. Isso já é bastante utilizado na Europa, e para as ruas de menor fluxo de pedestre é bastante razoável que essa proposta seja usada, porque o desgaste para o pedestre é menor. Então, só o rebaixamento da calçada já é um desgaste porque você tem que subir e descer. Ao contrário, se já fizermos a faixa elevada a gente garante a travessia mais tranqüila. Aqui nós temos um desenho de como deveria ser, mas ainda falta a faixa tátil para indicar a pessoa com perda visual, que está se expondo ao tráfego.

3. os parques: também é importante que os parques sejam acessíveis. Não adianta que eles tenham somente as calçadas acessíveis. Os parques também têm que ser acessíveis e temos que garantir locais para o passeio de barco, para passeios ciclísticos etc., porque uma coisa muito importante é o incentivo ao esporte. Portanto, eu tenho que permitir que aqueles três senhores que estão ali em um jardim, à sombra de uma árvore, possam ter seu lazer no parque, passeando de barco, por exemplo. Podemos ver aqui um casal mais velho desfrutando da delícia que é fazer um passeio de barco, enfim namorar, etc. Temos aqui também um deficiente visual caminhando com seu cão.

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4. os hotéis: para tornar um hotel acessível temos que pensar já a partir da sua entrada principal. Todo prédio acessível tem que ter uma rampa plana, além da escada. A escada deve ser combinada com rampa ou com algum elevador. Mas, a escada estará sempre presente até porque ela ocupa um espaço menor. Numa situação de emergência, por exemplo, a escada é importante para evacuar o prédio com maior rapidez.

5. o atendimento prioritário: esse não era o foco da questão da norma, mas o Decreto da acessibilidade fala disso. Eu sempre enfatizo nas minhas falas que de nada adianta ter um espaço acessível se as pessoas não mudarem de comportamento. O pessoal que trabalha no atendimento tem que estar preparado para atender uma pessoa com deficiência visual, com deficiência física...

Agora há pouco ouvi o Luís falando que vocês fizeram uma proposta de como atender todos os segmentos, inclusive travestis etc. Eu achei fantástico, porque nem tinha pensado numa situação desse tipo. Eu acho que se tem que dispensar esse tratamento às pessoas, sim. A pessoa que está no atendimento tem que estar à vontade para atender qualquer pessoa e fazer com que o cliente se sinta melhor no espaço onde está; no caso, o hotel. O Decreto coloca que o mobiliário tem que ser acessível; tem que haver uma pessoa que saiba Libras no balcão de atendimento; enfim, o hotel tem que ter funcionários treinados para atender pessoas que tenham alguma deficiência, idosos etc.

6. circulação vertical: para a circulação vertical também temos que ter escada e equipamento que subam escada, pois, caso não haja o elevador, pode-se utilizar esse equipamento.

Aqui nesta foto, por exemplo, temos a Izabel, em Roma. Esses símbolos que vocês estão vendo aqui são para sinalizar esse tipo de equipamento. Então, quando se entra em um espaço e se vê esse tipo de sinalização já se sabe para onde se dirigir. Por exemplo, eu quero caminhar? Quero subir escada? Eu vou procurar a escada. Se eu quero utilizar o elevador, vou para aquele outro lado. Ou, eventualmente, eu sei que lá pra frente tem uma plataforma. Em resumo, se eu tenho a informação do espaço eu poderei, portanto, escolher para onde eu deva ir. Isso é muito importante.

7. circulação horizontal: na circulação horizontal é importante que os vãos de porta tenham 80 cm, no mínimo. Por que não um (01) metro? Porque com um(01) metro a dobradiça não agüenta. Se a dobradiça não for de boa qualidade vai estourar e eu vou ter problema mais na frente. Eu posso até ter portas mais largas se eu tiver dinheiro para bancar uma boa dobradiça, bem resistente. Então, essas coisas são importantes.

Uma outra coisa básica, bem simples, é a questão da maçaneta. É preciso que a maçaneta seja fácil de abrir. A maçaneta de alavanca é uma delas. Ela permite que as pessoas entrem e saiam rapidamente.

8. sensores de luz: é importante colocar sensores nos corredores. É muito comum a gente estar em um hotel que o sensor acende parcialmente depois de se andar um pouco. Porém, às vezes é difícil circular assim. Entendo que temos que economizar energia; sem dúvida, não podemos desperdiçar, mas acho que temos que iluminar corretamente para que as pessoas circulem com segurança.

9. pisos táteis: outra coisa importante são os pisos táteis. Esses são obrigatórios, porque são os pisos táteis de alerta. É aquele que tem bolinha e que é colocado no início e final da rampa, no início e final da escada, na porta dos elevadores, em plataformas e também no mobiliário. Esse tem que existir sempre “ o piso de alerta e o piso direcional que está em baixo. O piso direcional é facultativo, eu posso ou não colocá-lo. Se eu tiver outras pistas eu posso até não colocá-lo.

10. sinalização visual: a sinalização visual das portas, ou até mesmo mapas táteis, são coisas muito importantes e que vocês têm que conhecer um pouco. Quando a gente entra num hotel, por exemplo, não tem iluminação suficiente e é até difícil enxergar uma coluna. E olhem que eu não sou deficiente visual. Muitas vezes, a iluminação não é suficiente e a pessoa perde a referência. Eu acho que, a essa altura, o deficiente visual se sai melhor porque ele já conta o número de portas; acho que ele erra menos do que nós. É importante pensar numa iluminação adequada, um número que seja destaque para que a pessoa possa enxergar. E evidentemente que para o deficiente visual tem que ter uma leitora de Braille, do lado do batente, dizendo qual é o número do apartamento do qual ele está entrando e saindo.

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Aqui é uma sinalização que está colocada em Braille e em letras grandes para quem tem perda visual. Não sei se todos sabem, mas setenta por cento (70%) das pessoas com deficiência visual têm visão parcial. Apenas trinta por cento (30%) não enxergam nada. Por conseguinte, a gente está lidando com setenta por cento (70%) de pessoas com deficiência visual, e um pouco de iluminação, contraste de cores, ajudam bastante; contraste de piso com paredes e porta ajuda muito a orientar qualquer um de nós. Isso ajuda quem tem perda visual e a todos nós também.

11. mapas táteis: não é uma coisa difícil de se fazer e é uma coisa que ajuda muito as pessoas a se orientarem. E a todos nós que também nos orientarmos naquele espaço.

12. sanitários públicos: o sanitário público tem que ter barras de apoio, toalheiro, papel higiênico próximo e torneiras de fácil acionamento. Atualmente está sendo bastante utilizada para sanitários públicos aquela torneira de apertar. Ocorre que ela não dá certo para quem é tetraplégico porque é preciso força para acioná-la. É melhor a torneira de alavanca porque ela é simples para ser colocada e facilita qualquer um manuseá-la. O Decreto dispõe que os banheiros acessíveis têm que ser fora dos banheiros coletivos. Pode-se até ter um lá dentro, mas também há que ter um fora. Por que isso? Para dar possibilidade ao casal de acessar o banheiro. Digamos que o Fabiano esteja acompanhado da sua esposa e ele precisasse de ajuda para entrar no banheiro. Em qual banheiro eles entrariam; no banheiro dos homens ou das mulheres? Fica difícil não é? Por isso, é importante que os banheiros acessíveis fiquem fora dos banheiros coletivos para que os deficientes possam usá-los quando estiverem acompanhados.

E isso não é só para os deficientes não! Isso facilita a vida das mães que estão acompanhadas de crianças. Às vezes é muito comum mães estarem na porta do banheiro gritando, desesperadas porque o filho está dentro do banheiro sozinho. Esse tipo de banheiro permite resolver esse tipo de situação.

Uma outra questão importante é o tamanho dos banheiros. Vamos acabar com esses banheiros minúsculos! As pessoas idosas ficam em apuros no banheiro para fechar a porta. Nós mulheres sofremos nesses banheiros minúsculos. Temos que ficar dançando no banheiro para conseguir fechar a porta: encolhe a barriga; fica de lado; equilibra-sei; encosta a perna no canto, que normalmente está sujo... Vamos crescer um pouquinho esses boxes para que as pessoas tenham um pouquinho de conforto. A população está envelhecendo. Não é todo mundo que fica fazendo esse joguinho de cintura já com seus 80 anos. É importante levar isso em conta. Isso é uma coisa que a gente vem preconizando para as construções novas.

13. os apartamentos acessíveis: nós desenvolvemos um projeto para a Caixa Econômica Federal-CEF sobre habitação popular acessível. Conseguimos fazer uma casa de 33 metros quadrados acessível para cadeira de rodas, que tinha uma sala pequena, cozinha, banheiro e quarto. É possível fazer um apartamento de um hotel pequeno dessa maneira. Para ser acessível não precisa ser grande; precisa ser funcional. É por isso que eu gosto de sempre falar desse projeto que a gente desenvolveu para a CEF, porque o espaço não precisa necessariamente ser grande para ser acessível.

14. restaurante acessível: é importante que tenha todo o seu mobiliário acessível - uma mesa em que se pode puxar a cadeira; que a pessoa possa se aproximar da mesa; bebedouro que permita a pessoa alcançar a água etc.

Também é importante que tenhamos, por exemplo, auditórios de cinemas e teatros que permitam a pessoa encaixar sua cadeira junto à platéia. A norma coloca várias situações em que o espaço para cadeira de rodas pode estar entremeado no centro do auditório, sempre nas pontas, porque é difícil organizá-las depois. Mas, isso deve ser feito de forma que ele possa estar incluído, junto, para que, caso a pessoa queira ir com sua namorada ou com sua esposa que não sejam pessoas com deficiência elas poderão estar a seu lado.

Também falamos da cadeirinha um pouco mais larga para os gordinhos; se não houver gordinhos pode-se até sentar os dois juntos, porque obviamente isso é até mais agradável...

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15. estacionamentos: o estacionamento pode ser público, que fica em um local público, e o privado. Temos que garantir vagas para que as pessoas com deficiência possam chegar ao local e estacionar normalmente.

16. piscina: para a piscina ser acessível, a norma diz que é necessário fazer uma adaptação. Porém, temos outras opções. Hoje há outros equipamentos que permitem que a pessoa entre na piscina com mais segurança. Eu diria que naquela escada lá no fundo teria que ter corrimão para a pessoa idosa entrar e sair da piscina com mais segurança. Uma pessoa mais velha não sobe aquela escadinha como aquele garoto está subindo; aquela escadinha tradicional de piscina. Quem está mais velho não agüenta subir, porque já não tem muita força no braço. É preciso uma alavanca para isso. Aquela outra escadinha sem corrimão é muito perigosa. Se alguém cair ali pode ter problema, pois a piscina é rasa nesse ponto. O piso tem que ser ranhurado para que a pessoa não escorregue. Isso é importante.

17. acesso à praia: é bastante complicado, mas a gente já viu soluções em outros países; o uso de rampas, por exemplo. Enfim, temos que pensar em alternativa que permita a pessoa chegar até o mar.

18. cidades históricas: elas têm que ter todo um tratamento especial... Já tem uma norma do IPHAN sobre isso, que é a Instrução Normativa nº 01. É muito importante que se faça as adequações necessárias. Na verdade, o que o IPHAN diz é que em quase todas as situações há solução, mas a gente tem que sentar e discutir.

E por fim, vou falar sobre a Chapada dos Veadeiros, para comentar como é possível fazer ecoturismo. Especialmente no caso de trilhas, evidentemente, é muito importante que haja condições de acessibilidade para as pessoas se adequarem, colocando carros e vans que possam acompanhar pessoas que não conseguem fazer uma trilha do seu interesse para que elas também possam desfrutar da natureza. Há condições de se fazer isso? Há sim, mas temos que desenvolver meios para isso.

Na questão do transporte, cito o caso de um ônibus que a prefeitura de Campo Grande pediu que fosse desenvolvido. A indústria brasileira tem condições de fazer isso. Inclusive, a “Marco Pólo” já fez isso. O ônibus tem uma rampa de acesso, a suspensão é regulável, a distância entre os eixos é menor, facilitando manobras em ruas estreitas etc. Hoje, a “Mercedes Benz” está desenvolvendo um ônibus que é menor ainda. Ele é mais curtinho, facilita ainda mais a manobra, ocupa menos espaço físico nas ruas e transporta mais pessoas. Isso permite que as pessoas circulem dentro de um ônibus. E há vantagem na questão panorâmica também. Como vocês podem ver, é muito mais fácil para as pessoas acessarem esse tipo de transporte. Para uma pessoa idosa subir um degrau, tudo bem.Todavia, subir vários degraus da escada de um ônibus comum; passar por aquela porta apertadinha já é muito mais difícil.

Há um outro tipo de transporte menor, porta a porta, do tipo que se encontra nas vans, mas, infelizmente, ainda não foram desenvolvidos aqui no Brasil. Eu vi na Espanha. São plataformas, chapas de metal que você põe em baixo do carro e puxa, e que tem um custo muito menor do que um equipamento desse tipo. Mas, enfim, infelizmente ainda não temos isso aqui no Brasil.

Na Argentina tem um trem turístico em que do lado direito há um dispositivo que facilita o ingresso de pessoas de cadeira de rodas.

No caso de acesso a aeronaves, hoje existem equipamentos que facilitam esse acesso. Aqui vocês estão podendo ver a nossa colega Silvana descendo do avião por meio de um dispositivo que facilita a saída e o embarque de pessoas com cadeira de rodas.

Essa é uma foto de uma praça em Buenos Aires. Está todo mundo congregado ali. Acho que turismo é isso; é poder proporcionar lazer para que as pessoas possam “carregar as pilhas” visando enfrentar a jornada de trabalho, enfrentar o que vem pela frente. Desculpem a correria.

Cristiane FornazieriCidadão Eficiente

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Primeiramente, eu queria agradecer ao Ministério do Turismo e à CORDE pela oportunidade de estar aqui.

Meu nome é Cristiane Fornazieri. Eu trabalho na OSCIP “Cidadão Eficiente”, que tem apenas três anos de vida. Nossa sede é em São Paulo e somos mantidos por uma Agência de Viagens chamada Commissair, Congressos, Eventos e Turismo. É a agência oficial da Reatech.

“Cidadão Eficiente” começou de uma proposta de levar um projeto de turismo e lazer acessíveis a essa empresa. Nós organizamos um evento chamado “Cidadão Eficiente”, em 2004, e a partir daí criamos uma consultoria de acessibilidade. Nesse evento nós vimos que o mercado é atrativo; que o deficiente é um consumidor em potencial, mas o mercado estava parado, porque os hotéis não estavam acessíveis, o transporte é falho, - principalmente o transporte aéreo -, e o atendimento ao turista com deficiência ainda deixava muito a desejar. Então, nós notamos que esse pode ser um novo nicho de mercado. Basta haver atendentes capacitados ao atendimento adequado de deficientes e que sejam implantadas novas tecnologias no hotel.

Eu vou falar um pouco da história dessa Organização Civil de Interesse Público “ OSCIP. Nós contamos com uma equipe de profissionais que desenvolvem projetos específicos, consultorias, implantam tecnologias depois do diagnóstico e ministram treinamento. As nossas soluções são baseadas na NBR, decretos e leis. E o mais positivo, além da consultoria, é que nós estamos com um projeto voltado ao treinamento desses hotéis, desses receptivos e desses equipamentos de lazer.

O treinamento tem como objetivo principal conscientizar os profissionais da área de turismo e lazer. Esse treinamento é feito de uma maneira lúdica. Não é aquele treinamento muito pesado com características de atendimento. Ele tem característica chamada “trilha sensorial”. Essa trilha sensorial foi um produto apresentado no evento “Cidadão Eficiente”, e hoje nós estamos com uma parceria com o Zoológico de São Paulo e o Museu da Pesca de Santos. Ele tem por objetivo que a pessoa privada de algum sentido, seja ele visual ou físico, num determinado período e num determinado percurso, passe por situações de inclusão no meio ambiente. Nós trazemos essa questão do resgate do meio ambiente do zoológico. O tema central é “A pessoa com deficiência e o meio ambiente”. Isso está sendo muito positivo e na Bienal nós atendemos 5100 pessoas. Foi uma questão positiva tanto para o zoológico, como para nós.

Também fizemos esse treinamento no Conjunto Nacional, onde nós atendemos desde o engraxate até o alto executivo da Avenida Paulista. Nós atendemos 970 pessoas. Era uma trilha que tinha um percurso de 20m por 2,5m, em que a pessoa passava por dificuldade de acessibilidade, por atividades sensoriais, aromas, paladar, tato, até sair no “safári sensorial”, onde estavam animais taxidermizados do Zoológico de São Paulo.

Na Reatech, em 2004, nós também desenvolvemos uma trilha com 200 metros onde tinha um túnel e um tipo de acampamento sensorial. Isso foi uma marca da Feira, naquela época.

No nosso evento de origem, que foi o Cidadão Eficiente, nós o montamos numa sala de 200 metros, também. Mas, era o início de uma proposta, e, a partir daí, é que nós vimos que tínhamos que conscientizar a sociedade de uma maneira positiva.

Uma novidade que nós estamos fazendo em São Paulo agora é o “Jantar às Cegas”.Fizemos uma parceria com o Gil Bistrot, um restaurante dos jardins, e nós atendemos sempre 25 pessoas por grupo. Houve até o caso de um representante de uma empresa que “fechou o jantar”, dizendo: “Eu gostaria de conscientizar os meus gerentes e o meu presidente”.

Em resumo, a gente está montando um produto que pode ser realmente uma parte mais descontraída, mais positiva dessa conscientização de ter que contratar na empresa e fazer com que os gerentes sintam na pele um pouquinho.

Aqui temos alguns projetos desenvolvidos pelo Cidadão Eficiente nesses três anos. O primeiro, foi o “Seminário de Turismo Acessível: Oportunidade Gerando Igualdade”. Nesse caso, em dois dias de evento nós tivemos 64 palestrantes divididos em três seminários, sendo que 1/3 eram voltados ao turismo. Naquele momento nós abordamos vários temas, como: ecoturismo, acessibilidade em São Paulo, inclusão, lazer, acessibilidade em cruzeiros marítimos, importância do metrô para ligação

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até o terminal rodoviário, o potencial internacional do turismo, acessibilidade no transporte aéreo, a nova visão dos hotéis para atendimento dos clientes, e a capacitação de pessoas com deficiência para trabalhar nos hotéis. O evento foi muito positivo, porque, a partir daí, nós fechamos várias parcerias.

O segundo projeto foi realizado em 2004 em parceria com a CVC, de Natal, com a ABIH e a Potiguar Turismo, que é o receptivo local que representa a CVC. O que nós fizemos, no primeiro momento, foi convencer a Diretoria da CVC quanto ao projeto, que poderia dar certo ou não. Fizemos um levantamento dos interessados, palestras e vivências para 40 guias da CVC, palestras de acessibilidade para o setor hoteleiro e para a equipe de arquitetos especializados, apresentação dos resultados à CVC e visita a hotéis e Secretarias para verificar se realmente o projeto tinha fôlego. Infelizmente, os hotéis não demonstraram interesse em contratar a consultoria e o projeto não pôde ir avante. Hoje eu tenho informação do Ministério Público de Natal de que muitos hotéis de lá tiveram que firmar um Termo de Ajustamento de Conduta - TAC com o MP, mas o projeto está parado, até porque a gente não também não teve o apoio da CVC. Eu acho que ela não quis realmente mexer com os hotéis. Então, a gente está aguardando uma possibilidade de retornar a Natal com o mesmo projeto.

O terceiro projeto envolveu com a Associação Brasileira de Operadoras de Turismo “ BRAZTOA. Durante um seminário fizemos uma apresentação sobre os fundamentos do turismo inclusivo, falamos da NBR e da acessibilidade no transporte aéreo etc. Mostramos como seria o treinamento desses executivos de turismo, a capacitação dos recreadores, porque se uma pessoa com deficiência vai para um hotel ela quer participar de atividades que lhe sejam direcionadas também. Então, é preciso preparar esse monitor, esse recreacionista, para esse atendimento.

Além disso,tivemos também várias participações em feiras. Na Equipotel, apresentamos um stand de 50 metros, mostrando as mais diversas tecnologias, desde a placa Braille até o piso tátil, adequações de banheiro etc. Na FeiraTur, que é uma feira mais voltada para o turismo rural, também apresentamos essas novidades para proprietários de hotéis de turismo rural, no final do ano passado.

Em relação ao trabalho de consultoria, o que nós conseguimos desenvolver até hoje foi com o Pathernon, que é da Rede Accor. Nós fizemos o diagnóstico e apresentamos essa consultoria.

Na Ilha de Comandatuba, em Ilhéus - BA, nós fizemos uma orientação técnica. Além disso, temos feito consultoria para parques.

Hoje nós temos dois parceiros fortíssimos. Um deles é a Fundação do Zoológico de São Paulo. Nós acabamos de realizar treinamento para 400 funcionários para esta Fundação, que quer que o zoológico de São Paulo se integre à sociedade, e está preparando um projeto chamado “Inclusão Social”, onde os recintos vão estar acessíveis e todos os funcionários daquele zôo vão estar aptos ao atendimento a esses clientes.

O Play Center é um segundo parceiro. É um parceiro positivo, porque ele já realiza há 32 anos um evento chamado “Dia Especial”. Nós estamos fechando essa parceria com eles. Eles não querem continuar a exibir sempre aquele monte de placas que alertam que as crianças não podem ir àqueles brinquedos. Para isso, eles estão reavaliando o atendimento das pessoas no parque e fazendo toda uma adequação, não só nessa parte de acessibilidade, como na parte de segurança dos brinquedos, e, ainda, no treinamento dos funcionários. Eles prezam por esse atendimento, que já é qualificado, e nós estamos preparando esse trabalho.

Em relação a projetos de longo prazo, um deles é a “Ilha do Turismo”. Nosso sonho é estar numa feira e montar a “Ilha do Cidadão Eficiente”, distribuída em várias regiões do País. A nossa idéia é fazer com que o trade do turismo se conscientize que a pessoa com deficiência é um consumidor, e, ao mesmo tempo, lhe ofereça mediante parcerias pacotes de viagens, hotéis acessíveis, companhias aéreas, aluguel de carros, seguros de viagem, lazer, recreação, transporte adaptado etc.

Nós já temos como parceiros fortes, nessa situação, algumas operadoras e hotéis que demonstram interesse nessa questão. Por exemplo, a BahiaTursa, que é a Secretaria de Turismo da Bahia, lançou, em Braille, todo o material de atendimento ao turista com deficiência visual. Nós estamos começando a colocar uma minhoquinha na cabeça nos Diretores de Turismo da BahiaTursa e a Cidade de São Sebastião, também no litoral norte de são Paulo, está começando um projeto. A idéia é que até o

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verão do ano que vem esta cidade seja um referencial no atendimento do turista com deficiência naquela região.

É muito importante citar que, ao longo desse tempo, a gente conseguiu fazer duas matérias falando do atendimento do turista com deficiência em hotéis. Uma foi no Programa Especial e a outra no Programa Companhia de Viagem. Isso foi muito importante para nós, porque as pessoas realmente nos param na rua e dizem que assistiram ao programa e que ele foi muito legal. A gente fez disso um mecanismo positivo de conscientização.

Tivemos apoio também da Revista da Equipotel, que é a “Hotel News”, em uma matéria sobre as tecnologias. E o nosso parceiro principal nesse trabalho de inclusão, nesse trabalho de turismo, é a “Revista Sentidos”. Hoje, o site “Sentidos” tem renome nacional, pelas matérias que eles estão fazendo. A matéria inicial começou em Natal, com o nosso projeto “Férias sem Barreiras”. A “Revista Sentidos” estava lá presente, enviou seu coordenador, jornalistas, e eu acho que tem que ser dessa maneira. A nossa idéia é ter parceiros que somem com agente nesse trabalho e a gente espera que esse evento propicie a oportunidade de o governo federal também nos ajudar para que possamos também ajudar vocês.

Obrigada!

Moacyr FlorentinoAssociação Brasileira da Indústria Hoteleira – ABIH

Boa noite!

Em primeiro lugar, eu gostaria de dizer que estou aqui representando o presidente da ABIH.

Vou tentar apresentar esse trabalho para que vocês tenham uma idéia da perspectiva da acessibilidade no setor hoteleiro, usando um pouco da experiência que eu sempre tive na área de hotelaria.

Desde os 16 anos eu trabalho como um profissional de hotel, no Brasil todo, e tenho vivenciado essa problemática nos Estados e países onde já trabalhei, no trato cotidiano com clientes, ouvindo suas angústias, suas reclamações, suas necessidades.

Eu dividi a minha apresentação em quatro blocos. No primeiro, eu vou falar sobre o panorama da hotelaria no mundo e no Brasil. Depois, a gente vai falar sobre o mercado atual e as perspectivas do Século XXI, porque a hotelaria mudou muito. Ao final, no quarto bloco, a gente vai falar sobre o que pode ser feito para que haja uma virada de página nesse cenário nacional.

Na virada do Século que passou, mais precisamente no final da década de 1990, o mundo todo registrava uma disponibilidade de 12,5 milhões de quartos de hotel. Era um contingente muito grande. O Brasil nesse período tinha mais ou menos 600.000 quartos e 18.000 hotéis, segundo a Embratur, sendo que quarenta e um por cento (41%) desses quartos estavam no Sudeste. Hoje, no Século XXI, já existem 25 mil hotéis. Como visto, isso cresce muito, principalmente no Nordeste, onde os Resorts estão em destaque, como acontece em Fortaleza, na Bahia e no Rio Grande do Norte.

Na verdade, oitenta por cento (80%) desses 25.000 hotéis são de pequeno e médio porte e são administrados por seus proprietários. Nós os chamamos de hotéis independentes. São hotéis que têm que sobreviver por si próprios, enquanto que vinte por cento (20%) representam a rede de hotéis nacionais e internacionais. Mas, sessenta e cinco por cento (65%) desses oitenta por cento (80%) são pequenos hotéis e somente quinze por cento (15%) são hotéis grandes, com mais de 200 quartos.

O mercado hoteleiro do Século XXI está passando por mudanças muito profundas, o que pegou o setor hoteleiro de surpresa. Isso é o tipo da coisa que você muda ou vamos mudar você. Não

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será o mais forte que vai sobreviver e sim o mais adaptável. Isso significa se adaptar ao mercado, se adaptar à situação, se adaptar à realidade. A hotelaria nacional tem que despertar para essa realidade.

Uma pesquisa feita em 30 países de 05 continentes no final do Século passado apontou cinco áreas de influência nas mudanças que a hotelaria deverá sofrer: (1) o perfil do cliente mudou. Você não tem mais aquele cliente que apenas procurava hotel. Agora, o hotel é que tem que procurar o cliente. A diferença está aí. (2) O padrão de consumo mudou. Você não tem um cliente que gasta muito. O cliente quer gastar o que ele pode gastar, o que ele acha que deve gastar. Nesse caso, você também tem que se adaptar a esse padrão de consumo. (3) A concorrência aumentou. Ela é muito forte e a competitividade é tão grande que começa o problema da sobrevivência. (4) A questão da segurança passou a ser extremamente relevante. Todo mundo procura um hotel seguro. E hotel seguro é para todos e não apenas para a pessoa portadora de deficiência. (5) As pessoas estão acompanhando os processos de tecnologia muito rapidamente. Com os computadores, hoje tem menos gente trabalhando nos hotéis. A gente aperta um botão e o computador faz quase tudo. Então, a gente perdeu aquele contato de hospitalidade que tinha, quando se ligava no hotel e um funcionário falava: “Muito prazer em atendê-lo”. Hoje, você liga para um hotel e ouve uma mensagem gravada. Isso não é hospitalidade; isso é máquina; é uma coisa muito automática. Então, esses são os fatos que estão fazendo com que a hotelaria se transforme não em centro de hospitalidade, mas sim em um negócio totalmente diferente do que foi na Idade Média, por exemplo.

Um outro ponto importante é a perspectiva do setor para atrair o cliente. O sucesso de qualquer meio de hospedagem naquela época, até o final do Século XX, estava pautado em três coisas: (1) A localização. O hotel era construído numa localização adequada, até porque você tinha aquele destino. Hoje, isso não mudou. A localização permanece sendo importante. Aliás, se a gente quiser ter sucesso em qualquer negócio uma boa localização ainda é importante. (2) A estrutura do serviço. Cada hotel tem um tipo de mercado, ou seja, a sua estrutura de serviço é para aquele tipo de mercado. Todavia, existe aquele hotel que tem todos os tipos de mercado. Os hotéis que mais crescem hoje, no mundo todo, são os resorts. Se a gente tem um hotel na praia, hotel de lazer, qualquer mercado está lá, porque hoje o que mais cresce é lazer. São hotéis onde a gente pode fazer negócios, pode fazer eventos, pode fazer lazer, pode hospedar famílias. É por isso que os resorts crescem tanto.

Hoje há uma idéia nova, que surgiu no México e depois passou para os Estados Unidos, que é o “Tempo Compartilhado”. Essa idéia cresce tanto lá fora, que já se marca as férias com antecedência. A gente compra as férias durante a vida toda e depois vai para onde quer. Então, o mundo todo atende hoje em termos de “tempo compartilhado”.

E o terceiro ponto é a gestão. Se você não tiver esses três elementos básicos “ localização, estrutura de serviço, tipos de serviço “ em qualquer que seja o tamanho do meio de hospedagem -, e não tiver a gestão, não vamos a lugar nenhum. A gestão é a visão maior, é a sensibilidade e a responsabilidade do empresário. Você tem que ter isso no seu hotel. Se você não fizer isso, você perde o mercado. Ir atrás do mercado é ter visão de gestão. Essa visão de gestão é o lado humano do hotel; é o lado da visão do mercado; é o lado da responsabilidade; e é o lado da política do hotel.

E o quarto ponto, é a contribuição do Ministério do Turismo na acessibilidade. De que forma? Hoje, os pequenos meios de hospedagem têm limitação financeira. Além dessa limitação, eles não têm ainda uma orientação e o senso da responsabilidade. Se eles estiverem preparados vão ganhar mais mercado. Mas, é preciso que alguém lhes diga isso, que alguém os oriente quanto à adaptação da estrutura desse serviço.

Como eles são obrigados por lei - porque, evidentemente, a lei está aí para ser cumprida - devem ter uma ajuda, uma orientação melhor, como foi o caso do turismo - hoje já existe a Lei Geral do Turismo. Eu acho que isso é visão de primeiro mundo.

O Marcelo Correia, em 2002, lançou um livro baseado nessa Lei, dando dicas para os hotéis no sentido de como eles devem proceder para melhorar as condições de seus hotéis visando receber esses clientes portadores de deficiências físicas. Segundo ele, seria um mercado de 18 milhões de

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pessoas portadoras de deficiência física. Se dez por cento (10%) desses clientes decidirem viajar, fazer o seu lazer, são 1,8 milhões de pessoas. É um mercado expressivo, que não pode ser desprezado.

Alguns hotéis estão mais bem preparados. Por exemplo, o Vila Bela, em Gramado, é um hotel que você pode visitar, porque está programado para isso; o Jaraguá Novo Hotel, de São Paulo, já pertenceu a algumas das redes onde eu trabalhei e também já sofreu a reforma necessária para atender esse público. Temos ainda o Novo Hotel e o Hilton Morumbi, que também estão muito bem preparados.

Em Brasília foi feita uma pesquisa por alunos do curso de Turismo da UnB e eles detectaram que apenas 10 hotéis no Plano Piloto preenchem esses requisitos, embora com algumas restrições, porque eles foram readaptados. Essa situação é mais favorável quando se trata de um hotel recentemente construído.

De que forma o Ministério pode contribuir? A classificação é uma referência para o hoteleiro. Classificar um hotel significa dizer quantas estrelas aquele hotel tem. Essa é uma referência. E existe a bandeira internacional. Você pode ir a um hotel da cadeia Holiday Inn, do Meliá, ou do Hilton, no mundo inteiro, que o padrão vai ser o mesmo. São referências no mundo todo. Mas, dos hotéis independentes, oitenta por cento (80%) não têm referência. A única referência é uma classificação ou uma certificação nacional. Quem pode fazer isso? A ABIH sozinha não pode fazer isso. Quem tem que fazer isso é o Ministério do Turismo, é o governo.

A hotelaria tem que ser organizada no Brasil. Lamento dizer que a rede de hotelaria está abaixo da indústria, está mais atrasada 10 a 20 anos em relação a nossa indústria, porque não houve uma preocupação maior com esse setor.

O surgimento do Ministério do Turismo foi uma das coisas mais importantes que esse País já teve. Se você tem uma Lei Nacional do Turismo, por que não criar uma Lei Nacional da Hotelaria, onde hotel é hotel, pousada é pousada e pensão é pensão? O mundo todo trabalha assim. Se a gente quer fazer um turismo de primeiro mundo, a gente também tem que dar as condições, estruturas de serviço e receptivo que possa acompanhar.

E temos que dar também condição para esse pobre coitado que mora lá no interior. Eu tenho viajado pelo Brasil todo; já trabalhei no Brasil todo, sei as condições que eles têm para sobreviver. É uma família que pegou um terreno, que construiu um hotel e vive dele. Mas, ele simplesmente colocou o nome hotel porque não tinha outro nome. Mas, será que aquilo é um hotel mesmo?

Então, tudo tem que ter um parâmetro, tem que ter normas, como é o caso do turismo que está surgindo agora.

Era isso que eu queria apresentar. Estou aqui à disposição naquilo que eu puder contribuir, em nome da ABIH Nacional, porque a ABIH hoje está trabalhando nessa referência, orientada por essas normas, para fazer com que a hotelaria cresça também junto com o turismo e com o País.

Muito obrigado!

Dada MoreiraPresidente da ONG Aventura Especial

Vocês querem saber como tudo começou? Um amigo me chamou para fazer uma escalada. Eu acabei fazendo a escalada também e vi que era mais um esporte que eu podia fazer. Depois disso, eu vi na TV um “cara” saltando de pára-quedas e então falei: “Vou nessa também!”. Saltei de pára-quedas e não tive dificuldade nenhuma.

Na verdade, o que eu queria passar é que, na verdade, todo mundo tem uma deficiência. A diferença é que umas deficiências são aparentes e outras não. No meu caso, é aparente. No caso do Mauro, a gente pode achar que ele é normal, mas ele é argentino e corintiano. Aí, “ferrou” tudo!...

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Mas, é bom passar o filminho, porque eu acho que expressa melhor o que eu estou querendo dizer.

Esse é um filminho do projeto da viagem de campo que a gente fez. Mas antes de começar o filme, eu tinha anotado algumas perguntas, em função do que estávamos ouvindo. Em princípio, eu gostaria de saber quem de vocês trabalha com turismo. E quem é turista? E o resto que não levantou a mão?...

A primeira pergunta que eu queria fazer é por que estamos falando da acessibilidade no turismo? Nós temos aqui duas pessoas muito importantes, que eu queria que me respondessem uma pergunta. Primeiro, o Ricardo Attuch, da Embratur, que se dedica a promover o Brasil no exterior.

Ricardo, existem três grandes categorias de turismo: turismo em centros urbanos, turismo de praia e turismo na natureza. Qual desses três tipos está crescendo em ritmo maior no mundo, neste momento? O turismo na natureza! Ao Geraldo, que acabou de desenvolver um grande trabalho na Itália e está chegando agora ao Ministério do Turismo, eu queria perguntar a mesma coisa: qual o segmento que mais cresce no Brasil e qual é aquele que o Ministério do Turismo imagina que tem mais potencial para crescer; turismo nas cidades, de praia ou na natureza? Falando em termos de todo o mercado, qual o que está crescendo em ritmo mais acelerado? É o turismo da natureza!

O que eu quero aqui destacar, basicamente, é que é muito bom a gente resolver essas questões, mas seria muito bom também que a gente acompanhasse o crescimento do mercado. Nós temos que pensar que podemos ter um hotel totalmente acessível, mas se não temos atrativos isso não serve para nada.

Depois que eu fiz essa atividade eu comecei a melhorar. Hoje, todo mundo consegue me entender. Eu ainda uso cadeira de rodas, eventualmente, mas eu já melhorei bastante. E não tinha nada adaptado no mercado. Então, foi por isso que essa ONG foi fundada. Para vocês nos acessarem na internet o nosso site é www.aventuraespecial.org.br. Lá tem várias dicas de relacionamento, várias dicas de todos os projetos que oferecemos.

Agora, vocês vão assistir ao filme e verão que eu não preciso falar mais nada.

Participante não identificado

Eu fui há pouco tempo para a Chapada dos Veadeiros e fiz a Trilha do Raizama. Vocês conhecem a Trilha do Raizama? Vocês acham que um cadeirante pode fazer aquela trilha? Não pode. Você acha que seria legal um cadeirante conhecer isso? Eu passei por uma experiência muito interessante no Raizama. Eu fui lá na época da chuva. Lá tem um cânion cujo acesso é muito difícil, não pela irregularidade do terreno e sim pela trilha estreita, que não permitia ao cadeirante andar ali. Começou a chover e eu presenciei um momento que eu considero único na minha vida e que não sei se terei oportunidade de presenciar de novo. Eu consegui ver a tromba d’água e ver o rio crescer em questão de 15 a 20 minutos no máximo, aproximadamente uns 10 metros mais ou menos. Foi uma coisa incrível. Essa experiência é única. Eu não sei quantas pessoas no mundo já conseguiram ver esse momento em que a natureza se represa. Muitas pessoas já conheceram o rio, mas esse fenômeno particular é muito louco. Vocês gostariam de ver isso? Tudo bem! É por isso que é bom que estejam fazendo acessibilidade para que vocês possam ficar nas cidades. Mas, a natureza proporciona momentos como esse. Vocês gostariam de ver esse fenômeno? Certeza? Então, eu vou convidar vocês para irem lá. Vamos partir de uma situação hipotética, em que vocês tivessem tempo e que nós chegássemos lá. Só que nós sabemos que lá não vamos ter um hotel para dormir. Então, a minha proposta era a gente armar tendas e dormir no chão. Vocês topam? Mas, se eu lhes desse segurança? Se eu lhes desse um hotel para dormir, vocês iriam? Isso é simplesmente uma espécie de pesquisa. Alguns topam e outros não. Então, sem hotel tem pessoas que gostariam de estar em Raizama. Essa é, basicamente, a mensagem final dessa pesquisa. Agora, vamos assistir ao filme.

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Não falei que era bom o vídeo? É uma experiência incrível. Na verdade, esse vídeo tem muito mais imagens, mas a gente fez aqui um vídeo curto para passar aqui. Na verdade, tinha pessoas com cara de pânico, com cara de emoção e alguns com lágrimas nos olhos. Isso é legal. Entre esses 08 participantes que foram lá tinha um tetraplégico, um paraplégico, um com paralisia cerebral, um surdo, um cego e um com Síndrome de Dawn. A única pessoa que tinha praticado alguma dessas atividades era o Dada. De resto, nunca ninguém tinha feito absolutamente nada.

Existem várias formas de enxergar o mundo, e se o vemos dessa forma, redonda, podemos imaginar que dentro dele temos algumas divisões reais: homens e mulheres, e por aí vamos. A espécie consegue nos dar variedade total: altos, magros, lindos, feios, loiros etc.

Inclusive, as opções que escolhemos por sermos seres racionais conseguem também criar diferenças nesse mundo. Existem outras diferenças criadas involuntariamente, como, por exemplo, a exclusão social, a pobreza, discriminação racial, mulheres que não conseguiam votar há algum tempo atrás... E pelo poder também se criam diferenças. São diferenças que, na verdade, têm que ser entendidas como parte desse todo, como parte desse mundo. Ou seja, podemos falar de um mundo como um todo sempre quando entendemos que esse todo é uma soma de partes. Na verdade essas divisões anteriores podem ir a tal ponto de chegarem à individualidade de cada um de nós, mas nenhum de nós é igual ao outro; todos temos diferenças. Ao mesmo tempo, somos todos partes de um todo, porque alguma coisa nos faz iguais; alguma coisa muito superior a qualquer diferença que possa nos fazer diferentes. E o que nos faz igual é a essência. Somos todos seres humanos por natureza.Em lugar de marcar uma diferença entre um todo, a gente está forçando a coisa. Se permitirmos que isso aconteça, se em nossas cabeças é isso que acontece, começamos a dividir e essa divisão começa a gerar muitas coisas piores. Por exemplo, começa a fracionar, pensar num mundo totalmente diferente para alguns tipos de pessoas. Isso já não é pensar num todo.

O que isso tem a ver com a maluquice que a gente faz? Pela cara de pavor da senhora da segunda fila, eu acho que ela não acompanha a gente, nem que eu lhe pague um milhão de dólares agora, à vista. Nós somos dois malucos? Acho que ele é, porque me convenceu a entrar nessa. Sim, somos muito malucos, vamos continuar sendo malucos e cada vez mais malucos.

Na verdade, a gente escolhe o turismo de aventura por quê? Porque é a aventura em si mesma! Se nós examinarmos a raiz da palavra e como ela está comentada num dicionário, aventura não é igual a esportes radicais. O dicionário diz que aventura é igual ao que está por vir, sucesso com conseqüência inesperada.

Então, se queremos avançar e se o mundo quer continuar mudando, é precisa haver aventureiro. Ou seja, é preciso quebrar paradigmas, o que significa fazer alguma coisa que ninguém nunca fez antes. Esse resultado inesperado é uma aventura, por definição. Esse resultado pode ser positivo ou negativo, mas, de qualquer forma, esse resultado nos gera um avanço. Se positivo, nós vamos utilizá-lo para continuar avançando sobre isso. Se for negativo, nos faz saber que dessa forma não temos que continuar mais. De qualquer forma, uma aventura é pensar para frente, ir para frente, seja qual for o resultado. Para avançar, temos que tentar desafiar, temos que ousar.

Cristóvão Colombo é um exemplo de aventureiro. Ele falou que a Terra era redonda e que por isso ele iria descobrir um novo continente. Todo mundo acharia, numa palestra, que ele era maluco. De fato, ele não era verdadeiramente um maluco, porque quando se comprovou o que ele dissera que ia acontecer ele deixou de ser maluco e passou a ser um herói reconhecido nos livros até hoje. Com outros aventureiros, a previsão que fizeram deu errado e eles continuam sendo malucos, mas isso serviu para que não se repita o erro novamente. Para mim, eles também foram heróis.

Na verdade, escolhemos o perigo da aventura, porque ela para nós é um símbolo. O turismo de aventura não é difícil, perigoso ou impossível para essa fração da população que acha que não pode fazer nada, porque são totalmente limitados, porque não conseguem andar, porque não conseguem se mover. Pode ser que seja, mas nós ousamos provar que não é assim. Queremos quebrar preconceitos. Essa é a nossa ousadia; essa é a nossa aventura. Se conseguimos demonstrar isso, o turismo de aventura começa a poder servir para unificar, e unificar significa eliminar barreiras.

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Demonstrando que o turismo de aventura é possível, demonstramos outras coisas também. Se eu resolvo um problema de turismo de aventura, estou resolvendo problemas, automaticamente, de como chegar a lugares para fazer eco turismo ou turismo rural. Se eu elimino barreiras, eu consigo somar. E o que é somar? É transformar essas frações numa coisa maior, começar a integrar, começar a enxergar no todo. Na verdade, isso prova que a acessibilidade é possível no todo. Nesse todo do turismo. Agora, ao unificar, somar e integrar, nós já quebramos esse preconceito. O resto é só querer. E se conseguimos o mesmo unificar, somar e integrar a gente automaticamente está incluindo.

Essa é a razão porque esses dois malucos estão fazendo essa maluquice. Então, a maneira como nós apresentamos essa maluquice para o resto das pessoas que não estão acostumadas a tratar ou a lidar com esse universo é que vai fazer a diferença.

Obrigado!

4.2 Tema: O Sistema Único de Assistência Social – SUAS Garantindo Acessibilidade

Odilon Fernandes de SouzaConselho Estadual de Assistência Social/RS

Eu não sei se nós poderíamos discutir a questão do BPC no que se refere à inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. Hoje, da forma como está, a partir do momento em que ela entra no mercado de trabalho tem que abandonar o BPC, e, se ele não der certo no mercado de trabalho, para que recuperar o BPC só mediante a justiça e isso demora.

Nós temos discutido isso lá nas instâncias do Rio Grande do Sul. A proposta seria de uma suspensão momentânea, porque, enquanto ela, a pessoa com deficiência, está tentando ingressar no mercado de trabalho o governo suspende o pagamento dela. Quando retorna - se não deu certo no mercado de trabalho porque houve alguma decepção ou não se adequou - reassume isso. Tendo em vista essa dinâmica, o deficiente não entra no mercado de trabalho porque corre o risco de perder a única coisa que ele tem. Na maioria das vezes, nós estamos perdendo a inserção desse deficiente no mercado de trabalho, no sentido de exercer a cidadania e prosperar enquanto cidadão. Então, eu gostaria que, se possível, nós discutíssemos essa questão.

JoãoConselho Estadual da Assistência Social de Alagoas

Meu nome é João. Eu sou de Alagoas. Sou membro titular do Conselho Estadual da Assistência Social e coordeno o Programa de Atenção à Pessoa com Deficiência da Secretaria Estadual da Assistência. A minha preocupação maior é quanto aos convênios com Municípios, em relação aos repasses que estão sendo feitos, e, também, a respeito dos CRAS. Essa é uma questão séria e observamos que até hoje nós não temos uma definição de como será o atendimento da pessoa com deficiência nos CRAS. Eu acho que tem que haver uma articulação maior do Ministério com os Estados e Municípios, criando essa rede. Senão, o atendimento e o prosseguimento das ações já desenvolvidas não irão acontecer.

Rose MarySecretaria de Estado e Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda de Santa

Catarina

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Meu nome é Rose Mary. Eu sou Assistente Social da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda de Santa Catarina. Sou Conselheira do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência e estou representando a Secretaria de Estado e do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional, pelo Conselho Regional de Serviço Social.

Estou aqui presente tendo em vista que trabalho com a gestão do SUS no nosso Estado, assessorando nossos 293 Municípios. Estou preocupada, uma vez que, no nosso Estado, infelizmente inexiste qualquer ação no que se refere à política dos direitos da pessoa com deficiência. Temos um Conselho totalmente fragilizado, apesar de estar vinculado à nossa Secretaria, sem nenhum tipo de apoio do governo do Estado, assim como as outras políticas públicas. Eu vim aqui debater e ver quais são as propostas do Ministério, para intervir de uma forma não ditatorial, mas articulando as ações, para que o nosso Estado possa se comprometer, no que se refere às suas atribuições.

Erivania Ferreira da SilvaConselho de Assistência Social/PE

Boa noite!

Meu nome é Erivânia Ferreira. Eu sou do Estado de Pernambuco, do Município de Garanhuns. Eu sou membro titular do Conselho de Assistência Social e também do Conselho de Saúde.

Eu tenho uma preocupação que eu não sei se caberia expor aqui. Há uma lei que determina o pagamento de um adicional de vinte e cinco por cento (25%) sobre o salário de uma pessoa inválida. O problema é que nem todas as pessoas inválidas conseguem receber esse benefício. Eles alegam que essa ajuda é assegurada às pessoas que realmente precisam de acompanhamento, mas nós vemos que há pessoas totalmente inválidas e que realmente não estão tendo esse direito. Nós gostaríamos de saber se o Ministério já pensou em dar uma ajuda a essas pessoas que estão no BPC, mesmo que não seja de vinte e cinco por cento (25%). Na minha própria associação há pessoas com problema de glaucoma, como eu, mas que nunca trabalharam e estão recebendo esse percentual, e há outras que, tendo o mesmo problema, dão entrada no requerimento do benefício e lhes é negado.

Obrigada!

Ana MariaRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Pela apresentação, eu vi que todos trabalham na área. Praticamente noventa e cinco por cento (95%) dos que estão aqui trabalham diretamente nas Secretarias de Assistência Social e nós ficamos muito felizes por todo esse envolvimento do Serviço Social e dos nossos assistentes sociais. Inclusive, amanhã é o “Dia do Assistente Social”. Eu também sou assistente social e creio que será um dia comemorado de forma muito importante, com a aprovação das propostas do Relatório da I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Como aqui todos já sabem, na IV Conferência Nacional da Assistência Social, realizada no ano de 2003, a grande discussão foi para a aprovação e inclusão, no Relatório Final, das propostas de criação de um Sistema Único de Assistência Social, o que aconteceu no ano seguinte. Imediatamente após a aprovação da Política Nacional de Assistência Social, iniciou-se o processo de discussão da Norma Operacional Básica, que todo mundo aqui conhece. Esse foi um momento muito interessante e já avançamos nesse processo de discussão.

Na última reunião ampliada do CNAS, já se colocou a discussão da Norma Operacional de Recursos Humanos. Para o assistente social, isso é um avanço. O Ministério acabou de fazer o concurso

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para admissão de assistentes sociais. Não foi criado o número de vagas que nós queríamos, mas o importante é que o concurso já aconteceu.

A partir da nova composição do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o Ministério tem três Secretarias que cuidam da Assistência Social: a Secretaria Nacional de Assistência Social; a Secretaria de Rede e Cidadania, que cuida do Bolsa-Família; a Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional, que cuida do Fome-Zero.

Na Secretaria Nacional de Assistência Social, hoje nós temos cinco Departamentos. É a Secretaria que tem o maior número de Departamentos. O Fundo Nacional de Assistência Social veio agora para a nossa Secretaria.

Temos também o Departamento de Gestão do SUAS, cuja diretora é a Simone Albuquerque. Inclusive, para quem não conhece, ela tem deficiência física.Temos o Departamento de Gestão dos Benefícios Assistenciais, cuja diretora é a Ana Ligia. Ela é a Diretora do Fundo e é assistente social também. E temos a Gisele, que é uma assistente social que se especializou na questão de orçamento e tem mestrado nessa área. A Ana Ligia é quem trata da questão dos benefícios assistenciais. Temos também o Renato, que depois vai nos falar um pouco mais detalhadamente sobre o Decreto que vai sair. Temos também o Departamento de Proteção Social Básica, ao qual os CRAS estão vinculados. E temos o Departamento de Proteção Social Especial, cuja diretora é a Marlene Azevedo, que é daqui do Distrito Federal. Ela veio da Secretaria de Estado da Assistência Social. A Solange é vinculada a esse Departamento de Proteção Social Especial, ao qual está vinculado o Serviço Sócio-Assistencial de Atenção à Pessoa com Deficiência.

Nós trabalhamos em um ritmo exaustivo lá no Ministério, para dar conta de toda demanda que está posta, e nós temos rapidez em regular e discutir com a sociedade, a partir dessa discussão da aprovação dos instrumentos, da política, da NOB e agora da nova discussão sobre a Norma Operacional de Recursos Humanos.

Nós estamos em um processo de regulação. Já existem várias Portarias que tratam da regulação, como, por exemplo, a Portaria que regula os pisos, especificando como eles devem ser construídos.

Temos um grupo que está trabalhando com a questão do sistema de informação. Acho que a maioria dos nossos assistentes sociais aqui já conhece e acessam o SUASweb, mediante uma senha. No mês passado, inclusive, tivemos a aprovação dos Planos Municipais no SUASweb, com a participação e aprovação do Conselho. Foi um processo difícil, porque teve a participação de todo mundo, o envolvimento do Ministério, a ida e vinda de profissionais a Brasília várias vezes, no sentido de construir, de ajudar nessa construção. Tudo isso culminou com o grande sucesso que foi a instalação do SUASweb.

Se vocês pegarem o documento que vocês receberam, na página 18 nós temos os diversos sistemas que estamos desenvolvendo. Uma coisa interessante que nós descobrimos é que o assistente social está em todas as áreas no nosso País. Quem coordena o desenvolvimento do sistema é uma professora da Universidade Federal de Santa Catarina. Ela é a pessoa responsável por estar construindo esse sistema. É esse sistema que nós estamos chamando de RedeSUAS. Alguns deles já estão instalados e outros estão em fase de instalação. A CGI, órgão que cuida da informática do Ministério, ainda não tem capacidade de absorver todo esse sistema que o SUAS está propondo. Então, nós tivemos que fazer um investimento financeiro nessa área, mas, como o orçamento não tinha sido aprovado, nós ficamos impedidos de comprar esses equipamentos. Mas, em breve tudo isso será resolvido.

Nós estamos trabalhando com um especialista nos diversos sistemas do SUS e ele está nos ajudando a implementar o SUAS, desenvolvendo os diversos sistemas de que necessitamos para compor essa RedeSUAS.

O SUASweb está em pleno funcionamento. Ele passou uns dias sem poder ser acessado, porque nós estávamos exatamente no momento de aprovação de entrada para trazermos para o Ministério, mas tudo já está regularizado agora.

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O InfoSUAS está em manutenção. Temos ainda outros sistemas, como o SISCON, que é um sistema que propõe os projetos. Ele ainda não está aberto para que os Municípios possam incluir seus projetos, porque está sendo ajustado, mas os técnicos dos Municípios já podem conhecer como é o sistema e já irem manuseando, no sentido de saber quais são as informações.

Todos aqueles projetos de emendas parlamentares, todos os projetos de CRAS, de inclusão produtiva, todos os projetos da Secretaria, serão preenchidos nesse sistema, para que todos possam acessar. Isso é só para mostrar o que nós estamos fazendo.

Voltando à questão da regulação, a Solange é uma das pessoas que trabalha na equipe e que está responsável por essa discussão de regulamentação da proteção social. Nós ficamos esses meses trabalhando nas portarias para regularmos as ações, de um modo geral. Vocês já têm as orientações no Guia da Proteção Social Básica, e peço que todos o leiam com atenção. Inclusive, fizeram aqui uma pergunta sobre como será o atendimento da pessoa com deficiência nos CRAS e na proteção social básica. Nós insistimos muito para que isso entrasse. Não tem um atendimento específico para a pessoa com deficiência. Não tem e nem vai ter, porque nós iremos trabalhar a família. Poderemos até ter a reabilitação com base na comunidade, mas isso ainda não está regulado. Então é importante vocês saberem, por exemplo, que dentro dos CRAS não haverá, por exemplo, serviço de fisioterapia, porque essa é uma ação da área da saúde. O Guia do CRAS está muito amplo e detalhado, e explica como a pessoa com deficiência deve ser realmente atendida.

Com relação ao atendimento à pessoa com deficiência, nós precisamos regular qual o papel da assistência social com relação à pessoa com deficiência. Nós sabemos que durante todos esses anos assumimos a rede histórica da LBA, com toda aquela concepção. Entretanto, nós não temos mais a questão das modalidades e muitas delas são agora da educação e da saúde. A verdade é que as outras políticas também avançaram no atendimento à pessoa com deficiência. Hoje em dia temos, por exemplo, a política de atenção à pessoa deficiente na saúde. Enfim, em todos os Ministérios há ações direcionadas para a pessoa com deficiência. Nós, da assistência social, ficamos presos àquele modelo antigo e precisamos sair dele, porque ele não cabe mais na Política Nacional de Assistência Social.

Qual foi a proposta do Ministério? Constituir um Grupo de Trabalho interno, com a participação de todos os Departamentos da Secretaria e com a consultoria de dois profissionais. Uma das consultoras foi a Berenice, da PUC/RS, e a Lenira, que trabalhou como gestora do Município de Taboão da Serra, em São Paulo. Esse grupo já aprontou uma proposta de Relatório, que deverá ser discutido agora, internamente, com todos os Departamentos da Secretaria. A partir daí, o relatório apresenta várias sugestões. Eu participei de todas as discussões. A Solange só participou mais recentemente, porque, quando ela chegou ao Ministério o grupo já estava bem adiantado. Esse relatório deverá ser discutido na reunião de diretores, já na próxima semana, e ele já aponta o que nós devemos fazer. Evidentemente, tudo isso deve ser disciplinado por uma Portaria. Depois a Solange pode complementar mais com alguma informação.

Com relação ao BPC, acho que já estamos avançando bastante. Logo que a Ana Ligia assumiu o Departamento, essa ação no Ministério era praticamente isolada. Havia apenas dois profissionais que cuidavam e davam apoio técnico, ainda que fragilizado. Quando a Ana Ligia assumiu o Departamento foi composta uma equipe, e hoje nós já temos duas coordenações-gerais. Uma dessas coordenações está a cargo da Maria José de Freitas, que é assistente social do INSS lá em Belo Horizonte - MG, e a outra está com a Fátima, assistente social que veio de São Paulo. Ela trabalhou na Secretaria Municipal de São Paulo também nessa área. De fato, nós assumimos o Benefício de Prestação Continuada no nosso Ministério. Todos nós sabemos que ele quase foi entregue ao Ministério da Previdência. Nós continuamos trabalhando em parceria com a Previdência, mas, agora com papéis bem definidos. Já especificamos qual é o papel da Previdência e estamos definindo qual é o papel da SNAS em relação a essa questão. Estão sendo realizadas várias discussões, nos dois Ministérios para se fazer os acertos e a coordenação do BPC.

A NOB incorpora a participação dos gestores no BPC. Vocês já conhecem essa discussão. Nós estamos com um grupo de trabalho nos dois Ministérios. Eu faço parte de um desses grupos,

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representando a SNAS, e estamos trabalhando com essas questões da pessoa com deficiência em todos os Departamentos, fora dos Departamentos e em outras Secretarias também. Esse grupo trabalho tem a participação de técnicos da SNAS e do INSS. Inclusive, tem quatro assistentes sociais do INSS que estão no grupo de trabalho e mais cinco peritos do INSS, por região. Eles vão discutir o instrumento que nós utilizaremos para incluir o acesso da pessoa com deficiência no BPC. Nós somos bem ousados, pois tem umas coisas que nós fazemos lá no Ministério que eu pensei que não teríamos coragem de fazer.

Nós trabalhamos com o Código Internacional das Funcionalidades “ CIF, pois essa é uma orientação mundial. Nós saímos um pouco daquele conceito de pessoa com deficiência, como estabelecido no Decreto. Inclusive, o Decreto trabalha aqueles conceitos de deficiência e estamos trabalhando nesse grupo de trabalho com os conceitos de incapacidade que a CIF traz, com dois instrumentos: a avaliação médica e a avaliação social. Isso passou por um teste e nós passamos por um pré-teste em várias Agências do INSS. Por que as Agências? Porque é lá que as pessoas têm acesso. Mais recentemente passamos por um teste mais concreto, já com um perito e uma assistente social trabalhando de duas formas. As pessoas que já têm benefícios e que estavam no processo de revisão foram convidadas a fazer essas duas avaliações, utilizando os dois instrumentos. Nós fizemos isso na Região Sul, em Londrina-PR e em outros Municípios. Para nossa surpresa, na semana passada houve uma reunião de avaliação, de análise dos problemas, e detectamos que os problemas são muito menores do que imaginávamos. Eu estou querendo mostrar para vocês e discutir o que nós estamos fazendo.

Nós fizemos vários ensaios de problemas por região, que depois poderemos disponibilizar. Vamos dizer quais são os assistentes sociais que estão participando de todo esse processo. Assim que tivermos uma relação, passaremos para vocês por e-mail. Vários assistentes sociais participaram desse processo, como a Adriane, que esteve aqui ontem, a Maria José de Freitas, uma assistente social do INSS de João Pessoa, a Divânia, que é assistente social de Pernambuco, a minha colega do Município do Rio de Janeiro e várias outras pessoas. Eu posso depois passar os e-mails das assistentes sociais que participaram desse teste. Já completamos essa primeira etapa e vamos voltar para aplicá-lo novamente.

Agora, vou passar a palavra à Solange para finalizar as informações sobre o BPC e apresentar a proposta de decreto. O decreto é problemático. Na verdade, prejudica mais do que ajuda. Foi por isso que nós resolvemos fazer essa discussão e modificá-lo. Tem outras coisas em que nós avançamos.

Eu gostaria que o Renato estivesse aqui para relacionar o que tem de diferente em um e no outro. Estamos discutindo exaustivamente em que podemos avançar. A Ana Lígia foi várias vezes discutir isso com a assessoria jurídica. Nós já avançamos o máximo que poderíamos avançar. O novo decreto está pronto para ir para a Casa Civil. E o Ministro já teve vários despachos para discussão sobre ele.

Temos também o lançamento do livro da campanha de esclarecimento do BPC. Nós estamos bastante avançados nessa questão.

Com relação ao que a colega colocou – sobre os vinte por cento (20%) da Previdência - eu acho que posso depois falar mais particularmente sobre isso. Eu sou assistente social do INSS também e estou cedida ao Ministério. Então, eu sei muito mais, não porque eu sou lá do Ministério, mas por ser do INSS.

A colega aqui falou sobre o percentual de vinte e cinco por cento (25%). Eu gostaria que nós conversássemos mais sobre a diferença, especificamente, porque no BPC não está previsto esse acréscimo.

Em relação a essa questão de as pessoas poderem voltar para o trabalho, tem coisas que dependem de uma mudança na lei, mas o decreto já faz um ensaio para nós entrarmos naquilo que não foi possível mudar na lei, mas já está apontando para essa tendência. Mas, tem outras coisas que requerem mudança de lei.

Todas as propostas do Estatuto estão contemplando essa questão e nós estamos também discutindo isso internamente. É por isso que pedimos a vocês para nos mandarem sugestões, porque nós estamos num processo de discussão do Capítulo da Assistência Social no Estatuto da Pessoa com

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Deficiência. Nós estamos no processo de discussão interna. Já conversamos várias vezes, mas ainda não fechamos uma proposta concreta. Já encaminhamos uma proposta técnica. É uma proposta muito mais minha e de mais algumas pessoas, mas ainda não é uma proposta oficial da Secretaria e do Ministério. Nós estamos preparando uma proposta de Capítulo da Assistência Social no Estatuto.

Eu vou pedir o apoio do Renato, porque ele trabalha com esse decreto todos os dias e pode dar um informe mais detalhado para vocês. Então, vou passar a palavra à Solange e depois ao Renato.

SolangeRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Eu vou fazer uma intervenção bem rápida, porque nós temos 20 minutos para encerrar os debates. Eu queria rapidamente retomar à questão da estruturação do Sistema Único de Assistência Social.Como a Ana Maria colocou, existem dois instrumentos que estabelecem as bases para a sedimentação, para a implementação do Sistema Único de Assistência Social. Quais são esses instrumentos? Esse daqui, a política nacional de assistência social, que foi aprovada no final do ano de 2004; e a Norma Operacional Básica - NOB, aprovada em julho do ano de 2005. Esses dois instrumentos legais estabelecem as bases para o Sistema Único de Assistência Social.

Quais são as bases do SUAS? Uma coisa importante é que a Assistência Social, conforme determina a Constituição federal, compõe o tripé da seguridade social. Ela é uma política responsável por oferecer proteção social às pessoas em situação de vulnerabilidade e risco social. Dentro dessa proteção social, o que cabe à Assistência Social? Ela tem, basicamente, que oferecer três seguranças: (1) a segurança de acolhida, para aquelas pessoas que tiveram os seus direitos violados e precisam de uma acolhida, inclusive do ponto de vista daquele atendimento imediato. Por exemplo, se a pessoa foi vitimizada, se foi agredida. É a segurança do acolhimento mesmo, do abrigo. (2) A segurança de sobrevivência. A Assistência Social deve oferecer minimamente àquelas pessoas que não têm renda, que não têm condições de se sustentar, uma renda mínima. Esse é o papel do BPC, o papel dos benefícios eventuais. Esse também é um tipo de segurança estabelecida na política nacional de assistência social. (3) A segurança do convívio. A Assistência Social deve trabalhar na perspectiva de fortalecer os vínculos familiares e comunitários da população. Então, é importante entender quais são essas seguranças que a Assistência Social deve oferecer, para que se entenda lá na frente os níveis de proteção que ela tem que ter.

Estabelecendo essas seguranças, o SUAS tem a política e a NOB estabelece outros aspectos que organizam esse sistema. Um deles, como a Ana já falou, é a questão de estabelecer novas bases do financiamento. É aquela mudança tradicional de per capita para piso. O que é isso? No piso, nós estabelecemos o que cabe ao financiamento, o que é financiado. Hoje, o Município tem determinados pisos que financiam vários serviços. Então, vamos supor: ele recebe o piso de alta complexidade. O Município recebeu aquele recurso para manter um abrigo de crianças e adolescentes. Todavia, pode ocorrer de surgir uma outra demanda e a demanda não é mais para atender crianças e adolescentes e sim para atender os idosos. Ou seja, hoje, o Município tem essa mobilidade de mudar os serviços, de mudar as entidades parceiras que prestam um serviço de forma complementar e mudar a prioridade de aplicação de recursos.

Enfim, nós precisamos avançar muito na definição do financiamento dos Estados e dos Municípios, definição do custo total dos serviços etc. Portanto, há ainda vários aspectos em relação a financiamento que nós precisamos avançar.

A Ana também citou a questão do repasse de recursos. Hoje, a perspectiva do Ministério é que seja superado o impasse burocrático desse repasse de recursos, fazendo a mudança da antiga relação via convênio para uma relação mais ágil. Essa semana vocês viram que implantamos o SISCON, que é um sistema de convênios. Hoje, antes de o Município mandar toda aquela papelada, ele apresenta um pré-projeto pela internet. Nós avaliamos esse pré-projeto e sugerimos as adequações. Então, quando o

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Município enviar o projeto ele já estará adequado e não vai haver todo aquele desgaste que acontece hoje. Tem ainda outros aspectos da informação, que a Ana também já citou. Se vocês quiserem, nós podemos retomar essa questão no debate.

Um outro aspecto que a Política e a NOB estabelecem é que hoje, na Assistência Social, nós temos níveis de habilitação dos Municípios. Hoje, um Município se habilita na Assistência Social de acordo com o que ele oferece na rede de serviços.

E, por último, um outro aspecto que eu queria tratar nesses ingredientes que compõe o Sistema Único de Assistência Social, é a questão da organização dos serviços. Hoje a Assistência Social se organiza em uma rede sócio-assistencial, constituída por serviços de proteção social básica e por serviços de proteção social especial. Isso são dimensões do atendimento. Essas coisas não são estanques. Uma mesma pessoa pode ser atendida no serviço de proteção social básica e no serviço de proteção social especial, se as necessidades que ela tem assim o exigirem. Então, é bom termos essa concepção das dimensões do atendimento e da complementação dos serviços.

A política estabelece esses dois níveis de proteção “ a proteção social básica e a proteção social especial. A proteção social básica tem um caráter mais preventivo. O objetivo dela é, sobretudo, prevenir situações de risco, por meio de desenvolvimento de habilidades e de aquisições. Então, hoje em dia, a unidade que executa basicamente os serviços da proteção social básica, que se constitui na porta de entrada da proteção social básica, são os Centros de Referência de Assistência Social “ CRAS. Ali são executados os serviços estabelecidos pela política, os serviços do programa de atendimento à família, os serviços de inclusão produtiva, os serviços sócio-educativos.

E a proteção social especial se ocupa de outras situações. Ela se ocupa daquelas situações pessoais, familiares e comunitárias, em que já ocorreu uma vitimização, uma situação de contingência. Então, nesse caso, já temos que afiançar condições de apoio a essas pessoas, porque elas tiveram seus direitos violados, porque foram vítimas de agressões, de vitimizações.

Essa proteção social especial tem um nível de agravamento e é esse nível que irá determinar o padrão de atenção. Então, dependendo da segurança que ela precisar, nós vamos oferecer os serviços que são de média complexidade. Por que é que são de média complexidade? Porque são pessoas que não tiveram ainda seus vínculos familiares e comunitários rompidos. Estão em risco disso acontecer, mas ainda não aconteceu ainda. Então, nós temos um serviço para essas pessoas, na perspectiva de fortalecer esses laços familiares e comunitários. Os serviços são de alta complexidade quando os vínculos familiares e comunitários já estão rompidos. Daí vem a grande rede de abrigos para atender a essas pessoas.

Então, nós precisamos entender essas proteções, esses serviços, para poder entender onde é que se insere, por exemplo, o serviço de habilitação e reabilitação. Como a Ana Maria já explicou, nós estamos regulando tudo isso, porque, até hoje, nós fazíamos tudo no serviço de habilitação e reabilitação. Ali se desenvolvem serviços que são da saúde, da educação, da política de trabalho etc., e se faz muito pouco do que é Assistência Social, realmente. Acho que estamos avançando nessa perspectiva e vamos caracterizar o que cabe à Assistência Social, em termos de habilitação e reabilitação. Acho que nós vamos ter um grande avanço nisso, porque, durante anos a fio, nós vimos fazendo essas ações pulverizadas, ações que são de outras políticas.

Essas consultorias que contratamos já nos deram alguns elementos importantes, e agora cabe a nós, lá na Coordenação de Regulação, do Departamento de Proteção Social Especial, fazer essa regulação, obviamente, como temos feito em todo o processo de regulação: ouvindo muitos os Estados, indo aos Municípios etc.

Acho que agora nós podemos ir para o debate.

Renato

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Representante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

A Ana estava me dizendo que vocês levantaram algumas questões com relação ao BPC. O BPC significa Benefício de Prestação Continuada. É um benefício de um salário mínimo mensal, pago aos idosos e deficientes, de acordo com a Lei Orgânica da Assistência Social. Nós mandamos o novo decreto para a Consultora Jurídica do Ministério e depois ele irá para a Casa Civil para que tenhamos uma nova regulamentação do BPC. Só para sabermos exatamente do que estamos falando - porque várias pessoas me perguntaram se vai mudar o per capita, se vai mudar isso ou aquilo - é importante sabermos os limites de um decreto e de uma legislação. O BPC é um benefício constitucional. Ele foi instituído na Constituição de 1988 e foi regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social “ LOAS, cinco anos depois.

Após alguns anos, os dois artigos que tratam do BPC na LOAS foram regulamentados por um Decreto. Então, tem uma hierarquia de legislação: temos em primeiro plano a Constituição; depois vem a Lei Orgânica de Assistência Social; depois o Decreto; e, finalmente, as Portarias. Nós vamos tratar aqui de uma legislação que fica bem abaixo disso. Então, ela tem alguns limites. É bom que isso fique claro, porque eu vou falar de algumas coisas que nós estamos propondo e que não seriam de competência do decreto, mas sim de outras legislações maiores.

O Decreto vigente é o de nº 1.744, de 1995. Esse Decreto vem sofrendo uma série de modificações com o passar do tempo, mas ainda não havia um outro que incorporasse essas mudanças que foram acontecendo no BPC, ao longo do tempo. No Caderno de Estudos que vocês receberam, na página 21 tem um texto que fala sobre o BPC, e no penúltimo parágrafo da página 23 há algumas propostas.

A Ana me disse que uma das questões que vocês colocaram foi essa situação da pessoa que recebe o BPC, que, ao arrumar um emprego e melhorar de condição, vem a perder o benefício. Depois, ela perde o emprego e volta a ter uma situação ruim, mas não pode recuperar o BPC. Essa é uma questão que não está disciplinada na LOAS, nem está prevista no Decreto nº 1.744, mas o INSS entendeu que nesse caso a pessoa não pode voltar a receber o benefício. Na verdade, esse é um entendimento equivocado, porque não está escrito em lugar nenhum que a pessoa não pode voltar a receber o benefício. Esse era um entendimento que o INSS tinha e que é equivocado.

O que nós fizemos? No novo decreto tem um artigo disciplinando que a pessoa que tiver o benefício cancelado ou suspenso porque adquiriu um emprego, caso ela perder o emprego e se enquadrar novamente nos critérios de percepção poderá ter o benefício novamente. Na verdade, esse já era o nosso entendimento, só que não estava escrito em lugar nenhum. A pessoa poderia voltar sim, mas, como está havendo esse equívoco no INSS nós deixaremos esse entendimento expresso no decreto para que isso seja resolvido. Assim, com o novo decreto não será preciso entrar na justiça para receber novamente o BPC. Isso estará no Diário Oficial da União. É só levar o Diário Oficial lá no INSS e mostrar que agora vocês têm direito expresso a receber o benefício.

Outra coisa que está entrando no decreto também e que nós achamos interessante é que o benefício tem que incentivar as pessoas a adquirir autonomia. O que estava acontecendo, na prática era exatamente, o contrário. Então, por exemplo, aquela mãe que tem uma criança e que recebe o benefício e não leva o menino a uma atividade de habilitação e reabilitação, porque acha que se a criança melhorar ela vai perder o benefício. Na verdade, isso também não estava escrito em lugar nenhum e é um entendimento equivocado. Nós vamos deixar expresso também no Decreto que o desenvolvimento de atividades de habilitação e reabilitação visando a autonomia não elide o direito ao BPC.

As principais alterações que estão no caderno são essas duas. Primeiro, a alteração que prevê que a pessoa poderá retornar ao benefício depois de perder o emprego, caso atenda as condições exigidas. E a outra coisa que está no caderno é que o benefício deve incentivar a autonomia. Se for uma atividade que permita que a pessoa que recebe o BPC tenha condições de trabalhar e ter uma vida independente, sem regressão, ela estará fora do critério. Isso vale para tudo. Não é só uma questão de habilitação ou reabilitação. Por exemplo, uma criança com deficiência que receba o BPC e que seja

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submetida a uma atividade educacional, por exemplo, e não necessariamente à habilitação ou reabilitação: muitas mães acham que a criança vai perder o benefício por causa disso. Não é esse o entendimento que vai sair no novo decreto.

Então, o que nós queremos com esse artigo é incentivar as pessoas a desenvolverem suas potencialidades e suas autonomias e não ficarem, para sempre, restritas ao benefício. Na verdade, o ideal é que elas possam ter condições de não dependerem mais do benefício.

A outra coisa é o que ela colocou e que não sei se todos entenderam. É a questão do INSS fazer a avaliação de um benefício que é assistencial. Nós estamos em um processo de transição e o SUAS é muito importante para isso, porque é a primeira vez nesse País que nós temos, no governo federal, no âmbito da Assistência Social um órgão especifico para cuidar do BPC. Então, isso já é um avanço. A outra coisa é que o BPC tem uma história muito peculiar dentre os benefícios da Assistência social. Vocês devem lembrar que, no começo, era o médico do SUS que fazia essa avaliação; era necessário um atestado de pobreza... A Assistência Social não tomou conta disso “ nós temos que assumir nossa responsabilidade também “, e o benefício acabou indo para a Previdência e ela foi obrigada a regular, porque ninguém tinha feito isso.Hoje nós estamos trazendo o BPC de volta e estamos dizendo para o INSS que esse é um benefício da Assistência Social, que é quem vai dar as diretrizes. O INSS vai continuar operando, mas a partir das diretrizes que nós iremos estabelecer no âmbito do Sistema Único da Assistência Social. Inclusive, o decreto trará o nome de Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Esse é o nome que vai sair publicado no Diário Oficial, justamente, para ratificar que ele é da Assistência Social. Isso também está escrito no caderno.

Uma das coisas que vai mudar é a forma de avaliação da pessoa com deficiência. Há a questão da assistência, que precisa ser avaliada, e agora há questões sociais e ambientais, enfim, outras condições que interferem na questão da deficiência e da vida independente para o trabalho. Então, o parecer social terá um peso, tanto quanto o do médico. Isso também é uma coisa importante. Entretanto, uma coisa que tem que ficar clara é que o decreto institui as normas, mas não as detalha. Vocês poderão dizer que nós estamos usando a Classificação Internacional de Funcionalidades “ CIF, da Organização Mundial de Saúde, e que isso não consta do decreto. Isso vai ser detalhado depois numa portaria, quando o grupo de trabalho concluir seu relatório. Está sendo feito um teste desse novo instrumento. Ele está sendo aferido e só depois é que vamos detalhar melhor tudo isso.

Participante não identificado

Haverá a avaliação do médico e a avaliação social. Depois, o médico não vai determinar se o benefício já está concedido ou não. Nós teremos que juntar as duas avaliações, considerando os pesos, para chegarmos a uma conclusão. É isso? Então, realmente, na perícia do médico pela primeira vez os peritos estarão fazendo uma avaliação social e eles terão que conhecer um pouco mais da vida do usuário para poder fazer a avaliação.

Participante não identificada

Renato, nós temos dois entraves. Um é a concessão do benefício, porque, no caso da pessoa idosa, o benefício é levado em conta, e, no caso a pessoa com deficiência, ainda não tem essa alteração. Esse é um ponto. E o outro é um problema com o qual nós nos deparamos constantemente, que é a questão da avaliação social. Em alguns Municípios, ela é até feita, é encaminhada com todos os documentos de concessão, mas ela não é levada em conta, em detrimento do parecer médico. A própria concessão diz que o médico é que não se aceita o laudo que a pessoa já trouxe de um outro especialista, atestando que ela é deficiente. Então, ele tem que ir para o SUS, marcar sua consulta, conseguir um laudo, para anexar em todo o protocolo.

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RenatoRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Isso que você está falando é o que acontece e o que vai mudar. O médico avalia que a pessoa tem uma deficiência que, segundo ele, não incapacita para a vida independente; para o trabalho. Só que essa pessoa mora na ponta de um morro, lá em cima, e tem que sair de cadeira de rodas ou de muletas e não consegue chegar. Não tem ônibus adaptado na cidade em que ela mora; ela não consegue fazer nada; não tem acesso à saúde; não tem acesso a nada. Essa deficiência não incapacita essa pessoa para a vida independente; então, o médico negaria o benefício. No entanto, existem milhões de outras condições que dificultam o acesso dessa pessoa a outras coisas. Daí, a importância da avaliação social. No novo modelo, esses aspectos são levados em conta. É por isso que nós adotamos a Classificação Internacional de Funcionalidades “ CIF, da Organização Mundial de Saúde, que considera os fatores ambientais, do entorno, da família; enfim, considera outros aspectos. Então, na hora da avaliação, isso acaba sendo balanceado.

O que está em discussão, até para abaixar um pouco da ansiedade de vocês, é o seguinte: é óbvio que nós colocamos um profissional, um assistente social, para fazer essa avaliação. Considerando que o BPC agora está no SUAS, fica mais fácil nós acompanharmos e fazermos a assistência. Então, essa coisa da avaliação vai mudar. Nós já vamos dar as diretrizes para o INSS de como nós queremos que a coisa funcione e isso está na NOB. Ela estabelece que os Municípios habilitados no SUAS têm que acompanhar os beneficiários do BPC e inserí-los na rede de serviços.

Com o Município acompanhando e o gestor da assistência municipal sabendo quem são esses beneficiários e onde é que eles estão, nós vamos ter condições de acompanhar sistematicamente esses beneficiários e fazermos um trabalho muito melhor até do que essa revisão que vimos fazendo a cada dois anos. Na verdade, essa revisão não se tem mostrado eficiente e por isso também vai mudar. Nós vamos instituir um programa de monitoramento e avaliação permanente, em que o beneficiário do BPC vai ser acompanhado permanentemente e não somente de 02 em 02 anos.

Em relação à renda per capita, é aquilo que eu disse no começo. A renda per capita está estabelecida na Lei Orgânica da Assistência Social “ LOAS. Um decreto não tem poder de mudar uma lei, que é superior a ele na hierarquia das normas.

A outra coisa que ela colocou é que o Estatuto do Idoso permite que dois idosos de um mesmo núcleo familiar acumulem o benefício e, no caso da pessoa com deficiência, isso não é possível. Só que um decreto também não pode mudar isso, porque o Estatuto do Idoso foi instituído por uma lei ordinária, que, na hierarquia das normas, é superior a um decreto. Então, um decreto não pode mudar uma lei; só pode regulamentá-la. Ele não pode criar nem extingüir direitos. Mas, vai sair o Estatuto da Pessoa com Deficiência e nós estamos torcendo que o Movimento das Pessoas com Deficiência peçam isso. Só que, na verdade, isso vai depender muito mais de vocês do que de nós. Por quê? Porque um decreto não tem o poder de mudar uma lei e essa coisa da isonomia para pessoa com deficiência só será possível com a alteração da LOAS ou inserindo-se isso no Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Participante não Identificado

Minha dúvida é a respeito disso. Por exemplo, ela é avó do menino. O benefício é da criança, mas ela está como responsável. É ela quem dá entrada, porque a filha dela, mãe do menino, também é portadora de deficiência mental. Então, o menino recebe o benefício. Só que ela já tem 76 anos de idade e, quando foi requerer o benefício para si, negaram. Eu gostaria de saber se é correto isso. Se você tem três filhos e todos eles forem comprovadamente deficientes, os três terão direito ao benefício. Era isso que eu gostaria de saber.

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RenatoRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Vou explicar. O Estatuto do Idoso dispõe que se um idoso tiver um benefício e um outro idoso da mesma família requerer também o benefício, quando se for calcular a renda da família o benefício que o primeiro idoso recebe não entra no cálculo. Isso é o que o Estatuto do Idoso prevê.

Como é que se faz o cálculo da renda per capita? Pega-se a soma dos rendimentos das pessoas daquela família e divide-se pelo número de pessoas. É assim que você tira a renda per capita. Então, o BPC do idoso não conta como renda na hora de você fazer essa conta. Nesse caso, por exemplo, há uma pessoa com deficiência que já tem o BPC. Se um idoso daquela família for solicitar o BPC, o INSS não tem razão para negar, se, no cálculo da renda per capita, a família continuar com uma renda de menos de ¼ do salário mínimo. Mas, o que acontece é que o BPC não é aposentadoria, é um beneficio da Assistência Social. A aposentadoria, a pensão, essas outras rendas, contam na hora de fazer o cálculo. Então, se tem um aposentado que recebe aposentadoria, na hora de se fazer o cálculo esse valor da aposentadoria dele entra, e, pelo que você está me dizendo, provavelmente vai passar de ¼ do salário mínimo, entendeu? Daí, não tem como ele receber o benefício, por conta do limite de 1/4 do salário mínimo.

Participante não Identificado

É que a NOB coloca os níveis de complexidade 01 e 02. O Nível 01 já está regulamentado, mas o Nível 02 ainda não. Então, a pergunta que eu faço é a seguinte: a questão da pessoa com deficiência que já perdeu seu vínculo vai ser regulada no nível 02, tal como os dependentes químicos? É isso?

A pergunta que nós estamos querendo fazer, desde o inicio é essa: como fica a questão da Assistência Social, quanto à pessoa com deficiência que já perdeu seu vínculo? Como é que a Assistência Social vai tratar essa situação?

RenatoRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Nós estamos regulando. Estamos trabalhando nisso agora e já tem um guia que trata de mais algumas questões. A pessoa com deficiência será trabalhada como qualquer outra, mas é claro que precisamos discutir isso.

Participante não identificado

Mas existem as especificidades.

RenatoRepresentante do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome

Sim. É claro que se a gente vai trabalhar a capacitação tem que garantir que a pessoa com deficiência esteja trabalhando. Se ele tem vínculo rompido, se tiver que ir para uma casa, para um abrigo, família substituta, seja lá o que for nós temos que ter esse foco. Mas, essa discussão está acontecendo com relação ao dependente químico. Não pensávamos em fazer isso ainda com o público da

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Assistência Social, mas tem que ser feito sim. Mas, é justamente o nível de complexidade 02 que ainda tem que ser regulamentado na NOB.

Nós temos vários Departamentos. Quem está cuidando da questão do BPC é o de Benefícios Assistenciais, que é um Departamento com estrutura e com profissionais capacitados para tanto. Quem está cuidando do especial, que é onde está todo esse público que você mencionou; é o Departamento de Proteção Social Especial, que já tem uma regulação inicial, uma regulação que ainda não está completa. Na verdade, a nossa expectativa era estar discutindo essa regulação do nível de complexidade 02. Eu acredito que isso ainda está no interior do Ministério, não está ainda sendo publicizado. É por isso que nós atropelamos o processo; não pensei que seria abordada aqui hoje a questão de trabalhar NOB, SUAS, Proteção Básica etc. Eu pensei que nós avançaríamos nessa discussão. Nós avançamos muito mais na discussão das outras proteções do que na Proteção Especial. Isso é verdade.

4.3 Tema – O Estatuto da Pessoa com Deficiência: a elaboração e o processo de participação da sociedade

Regina Maria Melo AtallaConselheira do Conade

Boa noite a todos!

Nós vamos dar início ao Painel de Discussão do Estatuto dos Direitos das Pessoas com Deficiência. Pelo número de pessoas aqui, nós vemos que é um assunto que mobiliza e interessa a muita gente, porque é, realmente, de muita importância.

Queria iniciar nosso Painel apresentando os componentes desta Mesa. Tenho aqui a meu lado o Deputado Leonardo Mattos, que preside a Comissão Especial que discute o Estatuto na Câmara dos Deputados.Temos também aqui presente o senador Paulo Paim, que é autor do Projeto de Lei nº 3.638, que está tramitando na Câmara dos Deputados, e do Projeto de Lei nº 006, que está tramitando no Senado. Temos também o deputado federal Eduardo Barbosa, conhecido militante do nosso movimento e apoiador da nossa causa. Aqui do outro lado está a Dra. Evanilde, assessora do senador Flávio Arns, que é Relator do Projeto de Lei nº 006 no Senado. Ao lado, temos o Dr. Ricardo Tadeu, que é procurador do Ministério Público do Trabalho, em Curitiba-PR, e é uma pessoa que tem atuado muito nessa área jurídica e tem nos auxiliado muito. Temos a Dra. Izabel Maior, coordenadora da CORDE e conhecida por todos aqui. E, por último, nós temos a assessora do senador Eduardo Azeredo, Maria Dolores, que está aqui também participando. O senador Eduardo Azeredo é presidente da Comissão do Senado.

Senhor Paulo PaimSenador

Meus amigos e minhas amigas. Eu queria dizer da alegria de estar aqui com vocês. Eu organizei uma palestra com a minha assessoria de quase 20 páginas, mas não vou lê-las, porque nós temos no máximo 10 minutos para cada exposição. Então, eu gostaria de fazer mais uma análise política desse momento e pedir para os relatores depois fazerem uma análise mais técnica.

Em primeiro lugar, eu queria dizer da importância desse momento histórico que nós estamos atravessando. Não tenham dúvida de que estamos vivendo um momento único e vocês explorem ao máximo essa oportunidade. O Estatuto só será aprovado se vocês entenderem que efetivamente ele representa um avanço. Se não tiver avanço “ e eu tomo a liberdade de falar em nome dos deputados e senadores “ ele não será aprovado. Vocês têm que nos cobrar isso. Eu não tenho nenhuma dúvida quanto a isso. É importante que essa I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência se constitua um marco.

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O senador Flávio Arns, embora não esteja aqui, tem acompanhado nosso trabalho diariamente. Quando eu apresentei esta peça pela primeira vez, lá no Senado, no ano de 2000, a capa era a mesma, mas não tinha nem a metade do conteúdo que tem hoje aqui. O senador Flávio Arns ouviu o Brasil, procurou experiências internacionais, e essa já é a última versão do Substitutivo, mas ainda é preliminar em relação a que poderá ser aprovada, se for necessário.

Eu queria dizer para vocês que eu confio no senador Flávio Arns como se ele fosse meu irmão. Ele é um homem íntegro, comprometido com essa causa, tanto que no ano de 2000, quando eu apresentei a primeira peça para ser debatida, eu lhe disse: “Tem muita coisa nessa primeira Peça que eu discordo, mas como eu sei que isso não será aprovado de hoje para amanhã; que haverá um longo debate na sociedade; se for preciso levamos um, dois, quatro ou seis anos, dez anos, se for necessário”. O importante é que a última palavra não seja do Senado ou da Câmara; seja de vocês que estão aqui. A última palavra será de vocês. É esse compromisso que nós queremos fazer.

E agora nós temos a Convenção Internacional. Isso é um outro compromisso que nós assumimos. Nós entendemos que o Estatuto não pode ser aprovado antes da Convenção Internacional. Vocês podem ver que eu não entrei tecnicamente no Projeto, porque o que eu quero é tranqüilizar vocês politicamente.

Na minha palestra, por escrito, eu falo da caminhada do Estatuto, falo da Convenção Internacional, falo da importância das tantas reuniões já realizadas. No mínimo, mais de 15.000 pessoas participaram desse longo debate até o momento. Mas, não é número que dá qualidade, não é? Pode ser 15.000, pode ser 20.000, pode ser 30.000, mas o que importa é a qualidade final, que eu tenho certeza que o Estatuto terá.

Eu queria também dizer a vocês, de forma muito rápida, que nós esperamos que a Câmara e o Senado debatam exaustivamente a questão da pessoa com deficiência. e, se for necessário, que construam uma Peça que represente aquilo que vocês imaginam ser o ideal.

Se vocês me permitirem, eu só vou ler aqui o encerramento do meu pronunciamento, até porque eu tenho apanhado muito na imprensa, porque dizem que eu sou um parlamentar muito polêmico. Então, aproveitando esse momento, vou ler apenas a última página, onde eu digo o seguinte: Eu queria encerrar dizendo para todos vocês que o Estatuto da Pessoa com Deficiência não será aprovado, em hipótese nenhuma, sem que vocês dêem a última palavra. Queria também dizer, quase que em um desabafo, que devido às minhas posições, já fui chamado de muitas coisas, entre elas demagogo. Se ser demagogo é amar e lutar para que ninguém seja discriminado pela cor da pele “ e por isso apresentei o Estatuto da Igualdade Racial “ podem escrever que eu sou demagogo, porque sempre irei defender as teorias de que ninguém pode ser discriminado pela cor da pele; se ser demagogo é amar e lutar por um reajuste decente para aposentados, pensionistas, portadores de deficiência e pela implantação do Estatuto do Idoso, então, eu sou demagogo; se ser demagogo é amar e lutar para que os trabalhadores brasileiros tenham um salário mínimo justo, podem saber que eu sou demagogo; se ser demagogo é amar e lutar para que no Congresso nós aprovemos, o mais rápido possível, uma política que combata a discriminação contra a mulher, então nós somos demagogos; se ser demagogo é lutar pela livre orientação sexual para todos os homens e mulheres, podem dizer que eu sou demagogo; se ser demagogo é amar e lutar pelos povos indígenas, então eu sou demagogo; se defender os índios é demagogia, então eu sou demagogo; se ser demagogo é lutar e pensar que a nossa juventude tem que ter direito ao ensino profissionalizante, à universidade gratuita, principalmente os que não podem pagar, então eu sou demagogo; se ser demagogo é lutar pela implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente, então podem nos chamar de demagogo; se ser demagogo é apoiar e apostar em um projeto que vocês vão ver um dia e falar que está sendo implantado no Rio Grande do Sul, chamado Cantando as Diferenças, cujo coordenador é o meu Chefe de Gabinete, o Santos Fagundes, podem saber que eu sou demagogo.”

Para concluir, eu quero dizer a vocês que se a minha vida é amar e lutar para que as pessoas com deficiência tenham direito a não somente um Estatuto da Pessoa com Deficiência, mas há muito mais, para que possam viver com dignidade, para que possam amar e serem amados, vocês podem saber que eu tenho muito orgulho que digam que eu sou demagogo.

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Viva a I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Vida longa a todas as outras conferências que virão.

Muito obrigado e um abraço a todos vocês!

Senhor Leonardo MattosDeputado Federal

Eu queria cumprimentar a Maria Dolores, nossa companheira de Minas Gerais. A Izabel Loureiro Maior, a quem eu tenho tido a oportunidade de acompanhar e com quem tive a oportunidade de trabalhar intensamente, quando da constituição do Sistema Único de Saúde e do Programa de Distribuição de Órteses e Próteses, que até então era um programa da LBA e outros órgãos assistencialistas que nós trouxemos para o SUS. O Dr. Ricardo Tadeu, que é procurador do Ministério Público do Trabalho. O nosso colega Eduardo Barbosa. A Sra. Evanilde, assessora do senador Flávio Arns. Quero fazer um cumprimento especial ao senador Paulo Paim, que está provocando uma grande discussão em todo o nosso País com a sua Proposição. É uma honra muito grande tê-lo ao nosso lado. E se me permitirem, eu gostaria de fazer um cumprimento especial à Simone, também, que é consultora da Câmara federal. Foi a Simone que começou a desenhar esse Estatuto, assistiu e participou das discussões.

Para discutir o Estatuto em 10 minutos nós precisamos ser absolutamente objetivos. Um Estatuto dessa magnitude pode alterar toda a legislação brasileira, toda a vida da pessoa com deficiência, mas essa é uma questão que não pode ser discutida apenas neste Painel. Esse é um processo. O senador Paim acaba de convidar a população brasileira para continuarmos debatendo até que tenhamos um denominador comum, até que tenhamos a possibilidade de construirmos um cenário futuro mais abrangente e mais democrático, e, principalmente, mais justo para com este segmento da população.

Quero, ainda, cumprimentar os organizadores da I Conferência Nacional das Pessoas com Deficiência do nosso país. Essa obra é importantíssima. Nós sabemos disso. Ao longo das nossas vidas nós acumulamos conhecimentos, aprendemos a viver com a diferença e temos muita contribuição a oferecer à sociedade brasileira. É por isso que estamos aqui, cada um de nós representando o seu universo, que é indispensável para as questões universais de nosso País.

E o momento desta Conferência Nacional é muito oportuno, porque, simultaneamente, nós estamos discutindo o Estatuto da Pessoa com Deficiência e a Convenção Internacional. São três discussões que estão sendo realizadas simultaneamente, e, como muito bem foi colocado aqui, uma não pode passar na frente da outra, porque perderemos o sentido se não soubermos harmonizar todo o encaminhamento desses debates.

Então, eu não posso imaginar que a Conferência terminará amanhã, assim como eu não posso aqui imaginar que o Estatuto esteja pronto para ser votado na Câmara federal e no Senado. Nós precisamos, agora, encontrar uma forma de nos comunicarmos, a ponto de sermos absolutamente resolutivos e capazes de absorver e de acolher todas as expectativas que temos com relação ao Estatuto.

Como é que tramita um projeto na Câmara? Um deputado apresenta um projeto e, dependendo da sua complexidade, ele vai passando por algumas Comissões de mérito. Essas Comissões discutem aquilo que lhes compete, aquilo que lhes cabe. Alguns projetos demandam discussões em mais de três Comissões. Então, pode ser criada uma Comissão Especial, integrada por membros de cada uma dessas Comissões pelas quais ele passaria, para discutí-lo, conjuntamente. E daí se ganha em escala, se ganha em conjunto, porque, se o projeto tramitar em cada Comissão, independentemente, cada uma delas pode fazer a sua alteração e corremos o risco de a versão final ficar muito segmentada, pouco harmoniosa. Cada Comissão dá a sua contribuição e a Proposição vira um somatório de contribuições, mas, no final, isso pode não significar aquilo que nós queremos.

Sabedores disso, quando esse Projeto estava tramitando lá na Câmara federal nós propusemos a criação de uma Comissão. Paulo Paim já não era mais deputado federal e sim senador. O presidente da

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Câmara acolheu a nossa sugestão, o nosso Requerimento, e instituiu essa Comissão Especial. Constituída a Comissão, nós precisamos definir quem seriam os seus membros. Foi a partir daí que nós enfrentamos o nosso primeiro problema, que foi a composição dessa Comissão Especial. Nós tivemos muita dificuldade, porque os partidos escolhem os seus membros de acordo com o volume de parlamentares que eles têm na Casa. Além disso, tivemos problema com relação à experiência desses parlamentares, membros da Comissão Especial, nessa questão da luta da pessoa com deficiência. Essa foi uma dificuldade imensa com a qual fomos obrigados a conviver e a administrar.

Apesar de os parlamentares manterem certo distanciamento daquilo que estava sendo pautado, a própria discussão, o próprio debate e as audiências públicas contribuíram de forma intensa para o preparo desse grupo. É claro que eu tenho aqui 30 anos de cadeira, o Eduardo Barbosa tem lá algumas dezenas de anos militando na área da pessoa com deficiência, mas os demais não tinham. Então, nós podíamos dar nossa contribuição e tentar fazer com o que todo o plenário da Comissão Especial estivesse coadunado na construção de um projeto.

Uma segunda dificuldade que tivemos foi o fato de termos dois Projetos de Lei tramitando nas duas Casas “ na Câmara e no Senado -, mas essa era uma dificuldade fácil de ser resolvida e nós fizemos isso em uma visita, em algumas reuniões com o senador Paulo Paim e o senador Flávio Arns e o próprio Eduardo Barbosa. Nós conseguimos fazer isso.

Eu tenho algumas críticas ao Estatuto. Eu vou colocar aqui as minhas considerações sobre aquilo que eu considero como inovação dele, mas farei algumas críticas também. A primeira crítica que faço ao Estatuto é que precisamos definir o público alvo. Um Estatuto que trata de um segmento e que não define que segmento é esse tem que ser alterado. Pelo menos, isso não está definido na versão que está hoje na Câmara à disposição dos parlamentares. Todavia, definir os deficientes talvez seja a coisa mais difícil desse mundo. Quando fizemos o Estatuto do Idoso nós definimos o idoso como aquele com mais de 60 anos de idade. Agora, definir o deficiente é uma questão absolutamente complexa. Então, como vamos definir o público alvo desse Estatuto? Como vamos definir os direitos das pessoas com deficiência? O problema é que algumas situações de deficiência vão ter direito a algum tipo de benefício e outras não. Mas, o Estatuto é um só e nós não podemos detalhar esses tipos de deficiência no Estatuto. Essa é uma das questões complexas que estamos analisando.

Um outro problema são os princípios contidos no Estatuto. Eu acredito que a convenção traz alguns outros. Acho que os princípios contidos no nosso Estatuto que está tramitando na Câmara ainda estão bastante rasos; precisamos aprofundá-los um pouco mais. Talvez, a Convenção Internacional nos ajude. Acho que o Estatuto ainda está carente de princípios mais contundentes, mais profundos.

Em relação aos objetivos, eu penso que o Estatuto inova ao defender uma transversalidade entre os organismos federais que tratam dos cidadãos. Ele inova porque exige que o Estado brasileiro, quando for discutir o transporte público, discuta o deficiente e o transporte público; quando for discutir saúde, discuta saúde e o portador de deficiência; quando for discutir educação, a mesma coisa. E, concomitantemente, esse instrumento precisa imediatamente dar consistência às nossas instituições, aos órgãos que estão responsáveis pela condução das nossas políticas. Eu vou dar um exemplo a vocês. Um dia antes desta Conferência, eu recebi um telefonema do coordenador estadual de deficientes de Minas Gerais, que é um Estado que tem dois deputados federais com deficiência. É o único Estado que elegeu um deputado federal do Movimento de Deficientes e cancelou a vinda dos nossos delegados por causa de R$ 40.000. Essa contundência da nossa representabilidade, essa força dos nossos organismos precisa ser registrada, precisa ser um compromisso de cada um de nós. Portanto, esse é um esforço que tem que ser compartilhado por todos.

Eu gostaria de me aprofundar em alguns outros pontos, mas eu tenho muito pouco tempo. Eu quero registrar duas ou três situações, se me permitirem. Primeiro, eu vou fazer aqui um elogio ao Ministério da Educação, que expediu uma norma estabelecendo que todas as ações do Ministério terão que considerar a pessoa com deficiência. Mas, ao mesmo tempo, eu pediria permissão para fazer uma crítica. Quando se trata da definição de quota, o Ministério não tem vindo apoiar lá na Câmara ou no Senado a reserva de vagas para deficientes. Nós estamos sendo obrigados a convencer deputados e senadores da importância de reserva de quotas para deficiente. Então, eu acho que poderíamos tomar um

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conjunto de medidas mostrando que a questão do deficiente é passível de uma definição de quotas também.

Quero também fazer um grande elogio ao Ministério da Saúde, que tem trabalhado há anos e anos nessa luta, e que me ensinou muito. Há 15 ou 16 anos, quando fui trabalhar no Sistema Único de Saúde e implantar o serviço de órteses e próteses em Minas Gerais, a Portaria nº 116 reservava dois e meio por cento (02,50%) do Orçamento do SUS para a aquisição de cadeiras de rodas, pernas mecânicas e aparelhos auditivos. De repente, de uma forma mágica, esse percentual sumiu do aparato legal brasileiro, desapareceu. Portanto, nós precisamos encontrar uma forma de recuperar isso. Por conta desse desaparecimento, milhares de crianças com deficiência auditiva não estão recebendo os seus aparelhos; milhares de pessoas com necessidade de cadeira de rodas motorizadas não estão recebendo essas cadeiras. E todo dia chega um pedido. Então, nós estamos atendendo de acordo com a nossa capacidade orçamentária. Eu acho que o Estatuto pode dar uma contribuição nesse sentido.

Eu acho que é importante o Estatuto estabelecer algumas responsabilidades que não podem ser afastadas. Por exemplo, a Constituição definiu que a verba da Saúde tem que ser, no mínimo, definida pela sociedade, porque se não o dinheiro não vai para a Saúde; tem que ter verba definida para a Educação, porque se não o dinheiro não vai para a Educação; e tem que ter verba definida para a questão das pessoas com deficiência, porque se não o dinheiro não vai para esse público. E agora eles estão municipalizando definitivamente o sistema de saúde em nosso País. Nunca mais os deficientes irão receber uma cadeira de rodas, um aparelho ortopédico. Então, precisa ter alguma ação, algum instrumento social que cobre isso.

Encerrando a minha fala, eu queria pedir ao Conselho Nacional que realmente crie um sistema de discussão desse Projeto, que convoque a Câmara, que convoque o Senado, que não deixe essa discussão parada. Se esse processo de discussão não for adiante ele tende a caminhar à revelia e, quando essas coisas correm à revelia, sempre acabam em prejuízo daquele que é o principal alvo do projeto.

Temos também que ter o compromisso de levar à Câmara federal o nosso compromisso com a Convenção Internacional. Temos que convencer os deputados e a Comissão de Relações Exteriores da importância de o Brasil também ser um signatário da Convenção Internacional, para que possamos trazer verdadeiros avanços para a nossa sociedade.

Portanto, fiquem aqui com os meus agradecimentos, com os meus cumprimentos e com o desejo de que nós possamos, cada vez mais, avançar na direção de um País mais justo, mais completo e mais rico para todos os brasileiros.

Senhor Eduardo BarbosaDeputado Federal

Boa noite para todos!

É uma grande satisfação rever nossos amigos aqui na nossa I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Neste momento, nós temos uma grande oportunidade de fazer uma nova agenda para a discussão do Estatuto da Pessoa com Deficiência, tendo dois Projetos tramitando no Congresso Nacional “ um na Câmara dos Deputados e o outro no Senado “ ambos de autoria do senador Paulo Paim.

Nós tivemos a felicidade de, na Câmara dos Deputados, presidir a Comissão que elaborou o Estatuto do Idoso e também estamos participando da discussão da Política Nacional da Juventude, que também está em fase de finalização. Nós percebemos que todas as vezes que se propõe uma coisa semelhante ao Estatuto, que é algo que tenta agregar e congregar toda uma legislação pertinente a um segmento significativo da nossa população, isso gera muitas expectativas e algumas angústias, mesmo porque todos nós que estamos aqui participamos de uma luta feroz, que foi a Constituinte de 1988. Nós entendemos que foi a Constituição de 1988 que nos deu os avanços que nós queríamos nas políticas sociais do país.

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Todas as vezes que nós vamos trabalhar alguma legislação que venha a complementar aquilo que é necessário, nós sempre nos preocupamos se não estamos também ameaçando aquilo que foi conquista anterior.

No caso da pessoa com deficiência, todos sabemos que a grande conquista foi a Lei nº 7853 e agora a Lei de Acessibilidade, com a sua regulamentação. Nós sabemos que ambas as leis trazem uma possibilidade de revolução em relação à plena cidadania de todas as pessoas com deficiência no País. É lógico que nesse entendimento talvez não houvesse a necessidade de travar, nesse momento, a discussão de mais uma legislação, vez que, na verdade, nós teríamos que aglutinar todos os esforços para fazer cumprir aquilo que já escrevemos e que já temos como aprovado. No entanto, o legislador também é provocado e traz também, na sua representabilidade, o desejo de querer contribuir para avanços.

O senador Paulo Paim, sempre atento a todas essas questões, faz essas propostas no sentido de tentar complementar ou aprimorar as leis existentes em relação aos diversos segmentos da sociedade, principalmente, aqueles grupos até então considerados excluídos. Quando da instalação, na Câmara dos Deputados, da Comissão Especial de Análise do Estatuto do Deficiente, proposto por Paulo Paim, a primeira reação de todos os segmentos foi a seguinte: “Meu Deus, o que é que nós vamos fazer? Será que nós iremos perder coisas?”. Esta preocupação foi muito salientada pela Corde e pelo Conade, no sentido de a Comissão Especial também refletir sobre quais os passos que deveriam ser dados, a partir da elaboração de um Parecer Final ao Estatuto. Se não houvesse essa sinalização, talvez hoje, nós pudéssemos até ter concluído esse trabalho na Comissão Especial, mostrando para vocês que a representatividade é importantíssima para minimizar os erros que podem ser cometidos.

Essa mobilização que se faz a partir dessa Conferência, como foi aclamado pelo deputado Leonardo Mattos, deve continuar, mas agora com outro viés - não mais resistindo à proposta do Estatuto - porque eu acredito que, apesar de todas as coisas que nos amedrontam, temos uma grande oportunidade nesse momento de identificar com muita clareza aquilo que há de lacuna na legislação brasileira. Quem sabe agora, de fato, possamos concretizar, em uma lei única, tudo aquilo que nos falta, esclarecendo, esmiuçando, ou melhorando o entendimento por parte da sociedade daquilo que é direito da pessoa com deficiência.

Então, nós precisamos aproveitar esses espaços. Por quê? São dois espaços formalizados “ as Comissões Especiais da Câmara e do Senado “ que estão mergulhando sobre essa temática. Nós temos que aproveitar esse espaço, porque vários segmentos desejariam tê-los e não o têm, pelo menos nessa profundidade. Todos aqueles que estão à frente dessas Comissões ou que estão atuando em funções importantes, como relatoria, presidência etc., são pessoas extremamente comprometidas com os segmentos de minorias e, talvez, pela primeira vez possamos desenvolver uma ação parlamentar conjunta, dentro dos princípios do Regimento da Câmara e do Senado. Nós temos uma articulação plena, inclusive, porque as pessoas que compõem esta Mesa, antes de tudo, são pessoas que têm ligações com os compromissos sociais anteriores ao processo do Estatuto. Isso facilita muito o diálogo para que nós possamos somar todos os esforços que a sociedade tem feito com relação aos direitos da pessoa com deficiência.

Eu gostaria de dizer para vocês que nós, do segmento que luta pela defesa de direitos da pessoa com deficiência, precisamos estabelecer nessa Conferência, com maior objetividade, alguns pactos de convivência. Eu me sinto no direito de expressar que, na minha militância de mais de 20 anos de luta em defesa dos diretos da pessoa com deficiência, nós temos um exemplo dado ao País, que é o exemplo de organização. Diversos segmentos invejam as organizações das pessoas com deficiência. No entanto, apesar de nós termos conquistado isso, as nossas organizações hoje não conseguem se aglutinar para um mesmo ideal. Nós temos, inclusive, criado ambientes de divergência e de competições entre as nossas organizações, o que nos afastam. Precisamos, de fato, aprimorar esta ação.

Em primeiro lugar, nós temos que identificar os nossos inimigos, que estão lá fora e não entre nós. Eu acho que isso é fundamental. Inclusive, em um momento como esse, em que se discutem subsídios para uma Convenção Internacional e se dá a possibilidade de estar aprimorando a legislação brasileira, em que temos condições via Conade, que é um conselho deliberativo, de influenciar as

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políticas públicas. Temos que afinar muito as nossas violas no sentido de identificarmos o que nos une, influenciando de forma sábia aquilo que nós temos que influenciar. E com relação ao Estatuto, nós temos que exercitar isso da mesma forma.

Quero chamar a atenção, no que se refere ao trâmite do Projeto na Câmara dos Deputados. Como o deputado Leonardo Mattos colocou, essa Comissão foi criada no fim de novembro de 2003. Nós já estamos em maio de 2006 e muitos pensam que ainda não houve tempo hábil para influenciar os deputados da Comissão. Isso não é verdade. Todos sabem que, desde o ano de 2003, existe uma Comissão criada para esse fim. Então, falta-nos mobilização adequada para fazermos a devida influência; falta-nos articulação adequada com os membros dessa Comissão para fazer a discussão que nós desejamos.

Essa Comissão Especial é representada por 31 deputados titulares e 31 deputados suplentes, de todos os partidos políticos e de Estados diversos. Como o deputado Leonardo Mattos colocou, nem todos estão realmente envolvidos com a discussão, mas eles passam a ser envolvidos na medida em que os próprios segmentos os convocam para isso ou cobram a sua participação. Eu acredito que todos aqui têm que sair sabendo quem são esses deputados e decidir qual o tipo de abordagem que vão fazer a esses parlamentares.

Na Comissão Especial da Câmara dos Deputados nós temos o Projeto de Lei do deputado Paulo Paim, que é do ano de 2000, mas lhe foram apensados mais dois Projetos de Estatuto e mais 55 Projetos de Lei. Isso mostra para vocês que nós estamos preocupados com a elaboração do Estatuto, mas, ao invés de permitir que leis avulsas fiquem tramitando no Congresso em relação à pessoa com deficiência, temos que aproveitar a oportunidade para avaliar esses projetos para não correr o risco de algum passar sem um crivo maior e sem uma avaliação mais profunda. Então, isso também é um lado positivo da Comissão Especial, porque nós aglutinamos os mais diversos projetos que são apensados ao Estatuto.

O Relator do Estatuto na Câmara dos Deputados, deputado Celso Russomanno, também possibilitou a participação de 10 Sub-relatores. Ele dividiu a relatoria dele em 10 subrelatorias, permitindo, inclusive, aos Sub-relatores a possibilidade de contribuir formalmente para o Relatório. Então, nós temos uma Sub-relatoria de Educação, uma Sub-relatoria de Desporto, uma Subrelatoria de Entidades de Atendimento, uma Subrelatoria de Justiça, uma de Orçamento, uma de Saúde, uma de Cultura, uma de Acessibilidade, uma de Turismo e Lazer e uma de Trabalho e Capacitação.

A Comissão já se reuniu 15 vezes e já tivemos 09 audiências públicas. Na primeira audiência pública, a Comissão entendeu que deveríamos chamar o Conade, que se fez presente.

Nós estamos aqui conversando entre nós. Sendo assim, posso colocar uma dificuldade que tivemos. O fato é que as contribuições aos Sub-relatores foram mínimas. Estou falando de contribuições formais, concretas. Apesar de todo esse tempo de tramitação da Proposição do deputado (hoje senador) Paulo Paim, nós ainda não conseguimos aglutinar contribuições dos diversos segmentos. Ou seja, o que está nos faltando é organização. Se nós temos críticas à Proposição, se nós temos algo que queremos acrescentar, se temos algo que queremos mudar, isso se faz de forma concreta. Então, é necessário que as organizações saiam daqui e se debrucem sobre essa proposta para que encaminhem, realmente, alguma coisa para ser avaliada. Inclusive, o presidente da Comissão, deputado Leonardo Mattos, até o final do ano pode tranqüilamente adiar a reunião dessa Comissão, porque nós não temos um tempo esse ano para finalizar os trabalhos. Teremos eleição este ano e, se o Projeto não for votado, nós temos que dar continuidade aos trabalhos no ano que vem com os novos parlamentares que estarão no Congresso em função da eleição.

Mas, há possibilidade, tranqüilamente, de tentarmos buscar todas as contribuições possíveis para o aprimoramento das lacunas existentes. O deputado Leonardo Mattos salientou algumas questões aqui, algumas lacunas reais que podem ser resolvidas. Nas discussões da Comissão, uma das questões importantes que foram debatidas no início foi que nós já temos todo um arcabouço legal contra a discriminação, mas promotores e juízes ainda nos pedem a criminalização da discriminação, porque, quando você não criminaliza não há como punir formalmente, com multa, com prisão etc. Isso não está

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escrito em lugar nenhum e, desde cedo, essa se tornou uma preocupação durante a discussão do Estatuto na Câmara.

Será que nós podemos criminalizar, definindo penas, como nós fizemos no caso do Estatuto do Idoso? Os idosos nos pediram a criminalização, pois seus filhos, suas noras, seus genros, ficavam com os seus cartões de banco e, mesmo quando a denúncia era comprovada e esses cartões eram devolvidos aos idosos, a questão ficava por isso mesmo. Na medida em que se criminalizou isso com multas, os próprios juizes ficam mais à vontade na determinação de penas. Hoje em dia as pessoas têm medo de cometer atos ilícitos como esse, porque vão ter que pagar de alguma forma. Isso também é importante na área da pessoa com deficiência. Temos que identificar se existe essa lacuna. Essas são coisas que nós podemos aprofundar a discussão sem precisar realmente correr, porque nós temos que ter um produto bem acabado.

A questão da participação é uma falha da sociedade brasileira. Na própria Convenção Internacional estamos discutindo qual será o nível real de participação de todos nós, naquilo que o Brasil irá levar de contribuição. Estamos priorizando a Convenção Internacional para discutir a nossa lei brasileira, mas o nosso nível de participação naquilo que o governo brasileiro irá levar como proposta foi muito pequeno. Na verdade, pouquíssimas pessoas tiveram a condição de opinar. É verdade ou mentira?

Então, vocês vêem a importância das conferências, inclusive, nesse sentido de mostrar o que está acontecendo e de nos fazermos presentes em todas essas discussões e nos mobilizarmos para que ela aconteça de uma forma mais representativa. Apesar de estarmos construindo um processo democrático, a questão da nossa representatividade é a nossa geração que terá que construir e influenciar.

Enquanto membros dessa Comissão Especial, nós estamos plenamente dispostos a acatar todas as sugestões. Isso nós fazemos sempre. A Dra. Izabel é testemunha de que não existe um projeto de lei que chegue às nossas mãos e que nós não buscamos o subsídio da Corde e do Conade, no sentido de nós fazermos aquilo que vem ao encontro dos interesses dos segmentos que essas entidades protegem. Com o Estatuto não será diferente. Com o deputado Leonardo Mattos na presidência, com a participação de todos os membros da Comissão Especial, tenho certeza de que temos capacidade de influenciar o Relator, deputado Celso Russomanno, no sentido de acatar aquilo que nos interessa. Com certeza, ele não apresentará nada que irá trair aquilo que é a nossa responsabilidade e o nosso compromisso.

Colocamos-nos aqui à disposição de todos também.

Muito obrigado!

EvanildeAssessora do Senador Flávio Arns

Boa tarde a todos!

Eu trago os cumprimentos do senador Flávio Arns, que é o Relator do Projeto de Lei nº 006, que está no Senado, e, ao mesmo tempo, pedir desculpas também por ele não estar presente. Infelizmente, isso não foi possível devido a compromissos anteriormente assumidos, mas ele talvez esteja aqui amanhã, no encerramento.

Nós temos participado ativamente das discussões sobre o tema e temos acompanhado todo o processo de tramitação e desenvolvimento da proposta que está no Senado. Então, eu acho que posso passar para vocês as informações, não como Relatora, mas, pelo menos as idéias do Relator e do que já se caminhou até o presente momento.

Ouvindo agora a exposição do deputado Eduardo Barbosa, eu vejo que a tramitação do PL no Senado aconteceu de forma um pouco diferente. Naquela Casa ele foi distribuído para uma única Comissão. Assim que o projeto chegou, foi distribuído para a relatoria do senador Flávio Arns. O senador nos solicitou que encaminhássemos a todos os segmentos interessado cópias do Projeto original,

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do deputado (hoje senador) Paulo Paim. Nós já fizemos isso no ano de 2003, quando o senador Flávio Arns foi encarregado de fazer a relatoria.

Como é uma única Comissão, nós estamos trabalhando no nosso próprio Gabinete e com a consultoria do Senado. Nesse período, em 2003 e 2004, como o senador Paulo Paim colocou, houve uma intensa participação da comunidade. Já foram organizados muitos seminários nacionais, promovidos por segmentos, organizações, universidades e listas de internet. Enfim, houve naquele período um movimento bastante intenso.

Nós recebemos um volume bastante significativo de contribuições. Com base nessas contribuições nós fizemos uma minuta e estamos sempre participando das discussões com o Conade. Havia um acordo com o Conade no sentido de que nós não divulgaríamos a minuta sem que o Conade se posicionasse. Porém, nós sabemos também as dificuldades do Conselho de se reunir para avaliar o documento e dar uma posição final. Passou todo o ano de 2004 e isso não foi possível. Então, continuamos o debate.

No final do ano de 2005, nós mudamos a nossa estratégia e criamos Grupos de Trabalho para fechar um documento, que não será um documento final, mas, enfim, o senador tem chamado de um “texto aceitável”. Isso é para mostrar como estamos caminhando. Em março deste ano nós apresentamos uma Minuta preliminar, como disse o senador Paulo Paim, que é essa versão que vocês receberam. Essa é a última versão do Projeto e esta é a primeira vez que ela está sendo divulgado publicamente. Essa Minuta também está disponível nos sites do senador Flávio Arns e do senador Paulo Paim.

No dia 29 de março fizemos um seminário no auditório do Interlegis, transmitido para todas as Assembléias Legislativas, com a possibilidade de as pessoas assistirem também em casa, nos seus computadores; enfim, tentamos divulgar ao máximo esta Minuta. Para este seminário, nós procuramos convidar especialistas, pessoas de renome nacional, que têm uma participação intensa e com bastante atuação na área da pessoa com deficiência e nas diferentes áreas, principalmente nas políticas públicas da saúde, educação, trabalho e assistência. Essas pessoas analisaram essa Minuta e depois participaram do debate, trazendo suas críticas e contribuições, fazendo uma análise em termos de política pública e fazendo uma ponte com a legislação vigente.

Como disse o deputado Eduardo Barbosa, nós temos realmente uma legislação e essa preocupação que vocês têm com perda de conquistas é uma grande preocupação também do senador Flávio Arns. É por isso que nós estamos fazendo a ponte com a legislação vigente para que não ocorra nenhum prejuízo e para que possamos aprimorar, quando for o caso, incluindo no texto da futura lei aquilo que irá corresponder às necessidades da pessoa com deficiência, em termos de necessidade e aplicabilidade também dessa lei.

Nós dividimos o Estatuto em vários Capítulos e eu vou mostrar isso rapidamente para vocês. Não vamos discutir cada um deles, mas apenas chamar a atenção quanto à forma como nós privilegiamos determinados Capítulos, para que vocês, voltando para as suas bases, possam estar avaliando esses Capítulos, Títulos, artigos e, se for o caso, provocar discussões lá na comunidade.

Nesse momento nós estamos sistematizando todas as contribuições que chegaram a partir do Seminário do dia 29 de março, oriundas dos debatedores e dos especialistas convidados. Inclusive, no próprio site do senador Flávio Arns vocês podem acessar o Estatuto e lá tem um espaço onde vocês podem oferecer sugestões também.

O Estatuto está organizado da seguinte maneira:

• o Título I trata “Das Disposições Preliminares”, em que nós privilegiamos o conceito de deficiência; as áreas de abrangência das diferentes áreas de deficiência; os conceitos de apoios especiais; ajudas técnicas; procedimentos. Tudo isso, na parte preliminar, que é o Título I;

• o Título II trata “Dos Direitos Fundamentais”, e nós contemplamos aqui o direito à vida, no Capítulo I; o direito à saúde, no Capítulo II; o direito à habitação, no Capítulo III; o direito à educação, no Capítulo IV; o direito ao trabalho, no Capítulo V; o direito à assistência social,

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no Capítulo VI; o direito à cultura, desporto, turismo e lazer, no Capítulo VII; e o direito ao transporte, no Capítulo VIII;

• o Título III trata “Da acessibilidade”. O Capítulo I é o das “Disposições Gerais” e o Capítulo II trata “Da Acessibilidade para o Exercício Eleitoral”;

• o Titulo IV trata “Da Ciência e Tecnologia”;

• o Título V trata “Do Acesso à Justiça”. O Capítulo I trata “Das Disposições Gerais”; o Capítulo II trata do “Ministério Público”; e o Capítulo III trata “Da Proteção Judicial, dos Interesses Difusos, Coletivos, Individuais e Homogêneos”;

• o Título VI trata “Da Atuação do Estado”;

• o Título VII trata “Dos Crimes em Espécie”;

• o Título VIII trata “Das Disposições Finais”;

Portanto, o Estatuto tem um formato um pouco diferente. A nossa idéia, era trazer para esta Conferência um texto já aprimorado, a partir do último debate, mas não foi possível. Como eu falei, nós estamos procurando fazer a ponte com a legislação atual. Estamos tendo muito cuidado com toda a legislação já existente.

A idéia agora é concluir essa sistematização e apresentar esta mesma Minuta aprimorada. Assim, nós não precisaríamos mais estar modificando significativamente a estrutura. Haveria, talvez, a inclusão de algum item. Então, devemos ter uma 2ª minuta quando nós terminarmos essa sistematização em que estamos trabalhando.

Em 2005, houve uma reorganização no Senado e foi criada a Comissão de Direitos Humanos. Todos os assuntos correlatos à pessoa com deficiência foram dirigidos para a Comissão de Direitos Humanos. Então, ele não vai mais tramitar na Comissão de Assuntos Sociais e sim na Comissão de Direitos Humanos.

A intenção do senador é concluir essa 2ª minuta e apresentá-la na Comissão de Direitos Humanos, para, depois, iniciarmos as audiências públicas no Senado. Num acordo com a Subcomissão Permanente de Assuntos Sociais da Pessoa com Deficiência, cujo presidente é o senador Eduardo Azeredo, a idéia é fazer as audiências públicas conjuntas, ou seja, com a participação da Comissão de Direitos Humanos e também da Comissão Permanente de Assuntos Sociais da Pessoa com Deficiência.

Nós acreditamos que, talvez, dentro de um mês nós estejamos com essa Minuta pronta. Entretanto, ela ainda não foi debatida dentro da Comissão. Ela foi debatida apenas em um seminário do Interlegis, justamente para chegarmos à Comissão com uma Minuta mais aprimorada e já considerando todas as contribuições recebidas pelos Gabinetes do senador Flávio Arns e do Senador Paulo Paim. Nós estamos avaliando tudo e tentando sistematizar. Então, é assim que está o projeto no Senado.

Apenas para concluir, devo dizer que o senador me pediu que ressaltasse aqui que nós temos que aprimorar a Minuta e é muito importante a participação de todos.

Obrigada!

Maria DoloresAssessora do Senador Eduardo Azeredo

É um prazer estar aqui com vocês, representando o senador Eduardo Azeredo, que preside a Subcomissão de Assuntos Sociais das Pessoas com Deficiência.

A nossa fala vai ser bem curta. Vou apresentar uma síntese do que o senador Paulo Paim e a representante do senador Flávio Arns já disseram. O que a Subcomissão tem de frisar é mais ou menos o seguinte: no mês de dezembro de 2005 nós recebemos um Ofício do Conade, no qual este Conselho

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posicionava-se contrariamente ao Projeto de Lei do Estatuto das Pessoas com Deficiência, porque considerava que isso poderia representar um retrocesso no conjunto de conquistas presentes nas legislações vigentes.

Em discussões posteriores, percebeu-se que íamos tendo uma modificação básica, lentamente. Logo depois, a Subcomissão fez a discussão no Interlegis, mediante uma audiência pública, onde nós tivemos até a presença da Corde e do Conade, quando o Sr. Adilson Ventura se posicionou no sentido do aperfeiçoamento do texto. Mas, oficialmente ainda não temos uma confirmação oficial do Conade quanto a sua posição atual sobre a Proposição.

Nós acreditamos que é necessário termos um Estatuto enquanto instrumento legal, para avançar nas conquistas legais já asseguradas. É indispensável a atualização do conjunto dessas conquistas, no contexto do avanço da própria participação popular, ressaltando o que representa hoje a pessoa com deficiência e a conquista dos seus direitos.Nós estamos num momento mundial ímpar na consolidação da participação do movimento das pessoas com deficiência.

A Subcomissão de Assuntos Sociais acredita que o que se quer são garantias aperfeiçoadas, de acordo com a realidade do cidadão com deficiência física. Alguns Decretos foram editados logo depois, mas estes não têm força de lei, enquanto o Estatuto irá reunir leis consolidadas.

Ao mesmo tempo, a construção do Estatuto, com o aperfeiçoamento que se pretende - como já foi mencionado pelo deputado Eduardo Barbosa e pelo senador Paulo Paim -, nesse momento em que há ampla participação da representação legislativa, vai retratar justamente o que o movimento organizado respectivo considera como essencial em termos de garantia legal.

Nenhum dos membros das Comissões está considerando-se dono da verdade. Ao mesmo tempo, trazer o Projeto mais uma vez para discussão significa que queremos que cada um de vocês presentes nesta Conferência leve essa Minuta do Estatuto novamente para a sua comunidade, para leitura e releituras, esperando que nos sejam encaminhadas contribuições essenciais para o seu aperfeiçoamento. É esse o nosso compromisso.

Nesta Conferência Nacional, mediante as discussões e debates nas plenárias, nós sabemos que deverão ser tirados indicativos essenciais para o aperfeiçoamento do PL. A Subcomissão faz um apelo ao Conade no sentido de que, ao re-estudar o Estatuto, se olhe atentamente que, fora as consolidações tiradas deste evento, já indiquemos ao Senado que nós temos plena certeza de que elas serão incorporadas para o aperfeiçoamento do Estatuto.

Em relação à Convenção da ONU, nós sabemos que temos de acatá-la, mas o deputado Eduardo Barbosa nos chamou à atenção para o fato de que as delegações brasileiras, na hora de participar das Convenções Internacionais, deverão levar questões discutidas internamente não apenas por uma equipe de iluminados, mas por movimentos participativos, em conferências como essa.

Então, nós esperamos que os representantes das convenções aqui presentes façam essa linha de mão-dupla, levando em consideração o que o parlamento nos traz, o que a comunidade nos traz, para que nós não fiquemos a reboque nas discussões internacionais. É importante que nós fiquemos na frente das comissões internacionais, postando-nos com conhecimento e como construtores de legislação.

Já reafirmando a fala dos senadores Paulo Paim e Flávio Arns, o que o Senado e a Câmara dos Deputados trarão para a comunidade será um Estatuto que retrate o avanço do povo brasileiro na garantia dos direitos das pessoas com deficiência. É isso o que temos a dizer.

Ricardo TadeuMinistério Público do Trabalho

Boa noite!

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Considerando o avançado da noite, eu prometo ser breve.

Vou lhes falar como aplicador da lei, cujo trabalho se limita a tirar do papel o texto de uma lei escrita e fazê-lo concreto. Pertenço ao Ministério Público do Trabalho e tenho lidado diuturnamente com o nosso sistema legal. Não posso deixar de reconhecer, por isso mesmo, que temos um dos sistemas legais mais adiantados do mundo. Em relação à pessoa com deficiência, temos algumas leis importantes, como a 7.853, a 10.048 e a 10.098. Estas são as leis centrais, que regulam os direitos gerais das pessoas com deficiência; o direito de acesso ao transporte; e o direito de remoção de barreiras arquitetônicas. Estas leis, no entanto, só se fizeram aplicáveis e concretas a partir da edição dos Decretos nºs 3298 e 5.296. Esta é a legislação básica das pessoas com deficiência.Como podem perceber, há vários dispositivos de leis e de decretos, sem falar em várias normas que estão contidas na nossa Constituição também.

Eu posso lhes assegurar - e empenho aqui a minha palavra profissional - que os juizes desconhecem esse vasto conjunto de normas e não sabem aplicá-las, até porque são normas muito complexas e que eles mesmos não dominam. O fato de essas leis e decretos estarem esparsos dificulta até mesmo para os juízes, procuradores e mais ainda para os advogados, a aplicação correta desse longo arcabouço legal.

Inegavelmente, como já mencionei, esse longo arcabouço de leis e decretos, foi um avanço, foi uma conquista que coloca o Brasil na vanguarda. A nossa legislação tem sido constantemente elogiada pelos organismos internacionais.

Todavia, nós estamos aqui a viver um momento histórico. Vocês se lembram que o Ministro Paulo Vannuchi disse ontem que o trabalho das pessoas com deficiência, no sentido de consolidar os seus direitos, é fundamental para a própria afirmação dos direitos humanos como um todo. Vocês sabem por quê? Eu vou tentar falar em português bem claro e, se não for claro, por favor, me interrompam. Quando terminou a 2ª Guerra Mundial, a Convenção da ONU, de 1948, afirmou que todo ser humano já nasce livre e igual em direito e dignidade. Por que foi feita essa afirmação? Porque um dos mitos que nasceram no século XVIII e no século XIX foi o de que a lei da maioria é boa, porque a maioria vota bem. Esses mitos foram importantes, porque eles conquistaram a democracia representativa. Então, a consolidação do Legislativo, do Judiciário e do Executivo como poderes foi conquista importante. Só que esta lei votada pela maioria foi quem elegeu Hitler, na Alemanha; a lei votada pela maioria elegeu Mussolini; e vocês sabem muito bem o que eles fizeram com algumas minorias, inclusive com pessoas com deficiência, não é? Seríamos todos eliminados se o Nazismo e o Fascismo tivessem vencido.

Qual a maior lição, portanto, a partir da 2ª Guerra Mundial? A idéia de que leis que são votadas pela maioria não são suficientes; a maioria deve ter leis que contemplem as minorias. Foi nesse momento, por exemplo, que as mulheres consolidaram os seus direitos de votar e serem votadas; e tiveram direito de participação no trabalho. Os negros, aqui na América, consolidaram direitos com o Estatuto de Igualdade Racial. Até o ano de 1960, nos Estados Unidos, os negros não tinham direito de igualdade em relação aos demais cidadãos americanos. Isto é uma verdade.

A mesma coisa está acontecendo com as pessoas com deficiência. Foi por isso que somente no ano de 1980 a ONU consagrou o “Ano Internacional da Pessoa com Deficiência”. Portanto, nós estamos consolidando a própria democracia, a partir da inclusão de normas que representem toda a diversidade das minorias que a compõe, para que nunca mais se eleja pessoas como Hitler. Por isso, é imprescindível para a consolidação dos direitos humanos que se façam normas na defesa das minorias, inclusive as nossas.

Agora, eu vou falar de um outro aspecto. Nós temos quatro níveis básicos de normas: a Constituição, que é a lei das leis; as leis complementares, que são normas que têm força de Constituição, mas não estão na Constituição - o Estatuto do Ministério Público, por exemplo; as leis ordinárias, como a Lei nº 1098; a Lei nº 1048; a Lei nº 7.853, e o Código Civil, que são leis importantíssimas, mas estão no 3º degrau da hierarquia. Temos ainda os decretos, que são normas monocráticas, o que significa que são feitos por uma pessoa somente, que é um representante do Executivo. No caso dos dois Decretos com que trabalhamos, citados aqui, são normas assinadas pelo presidente da República. Mas, vejam que

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um Decreto só faz e o outro só revoga. Quer dizer que, do mesmo jeito que foi feito por somente uma pessoa, o decreto também pode ser revogado com uma “canetada” por outra pessoa só. Prestem atenção nisso.

Eu defendo, sim, a importância do Estatuto e vou dizer agora por quê. As leis já existentes são inaplicáveis sem os Decretos. São leis que afirmam apenas normas gerais, mas que não prevêem nenhuma sanção, nenhuma punição e nem definem o que é a pessoa com deficiência. O que é que eu tenho visto na prática, no meu trabalho como procurador, aplicando e fazendo cumprir a lei?

Quero deixar bem claro aqui que eu sou um defensor empedernido desse sistema. Eu defendo os decretos e defendo as leis, mas eu devo reconhecer que muitos juízes não conhecem, não sabem aplicar, vacilam e erram, porque há várias normas esparsas. Em segundo lugar, os advogados, que são nossos adversários, já perceberam essa falha no nosso sistema, porquanto muitas questões que estão nos decretos não deveriam estar em decretos e sim em leis, porque elas são por demais importantes. Às vezes, os advogados que são nossos adversários e que não querem aplicar a lei, por uma razão ou por outra - porque não têm interesse de colocar deficientes nas empresas, porque não querem gastar dinheiro da Prefeitura para fazer remoção de barreiras arquitetônicas etc. - argumentam que o decreto é ilegal, porque extrapolou o seu limite. Isso é verdade. Muitas matérias que estão nos Decretos nºs 5.296 e 3.298 não deveriam estar em decreto e sim em leis. Tecnicamente, os nossos adversários podem nos fragilizar nesse ponto.

Portanto, é muito importante que todo esse arcabouço legal seja reunido em um corpo jurídico único, para que os juizes saibam aplicar, para que os advogados saibam aplicar e os procuradores e os cidadãos o conheçam.

Em segundo lugar, é muito importante que conquistas que estão contidas nos Decretos sejam convalidadas em lei. Por quê? Primeiro, porque dessa forma não poderão ser revogadas com uma “canetada”, apenas. Nós corremos um risco de se ter agora no Brasil um retrocesso político, porque a sociedade brasileira está decepcionada com episódios lamentáveis que ocorreram no Congresso; isso é um fato. Por outro lado, eu quero deixar claro que temos aqui a presença de alguns representantes do Legislativo, que demonstraram a honestidade e a retidão de caráter dos nossos políticos. Infelizmente, o que vai para a imprensa é o que é a “banda podre”, mas a maioria fos nossos políticos não faz parte dessa fração. Está aqui a prova concreta disso, não é?

Um segundo aspecto que eu quero ressaltar é que o que está acontecendo aqui é histórico. Eu não estou aqui usando retórica não. Eu estou fazendo essa observação como um aplicador da lei e como um profissional. Eu não tenho nenhum interesse em fazer retórica aqui.

Um dos maiores avanços que houve no Brasil foi a instituição do Legislativo, que exerce o que nós chamamos em direito de democracia representativa. Os deputados e senadores são mandatários do povo. Eles exercem um mandato em nosso nome e falam em nosso nome. Esse sistema foi criado no Século XVIII, por Voltaire, Rousseau e Montesquieu, e vem sendo aprimorado desde então. Só que, a partir dos anos 50, também se desenvolveu um conceito constitucional. A nossa Constituição de 1988 incorporou esse conceito de “democracia participativa”. Isto não é jogo de palavras. Eu não sei se vocês perceberam, mas tivemos aqui presentes os representantes do Legislativo, que vieram aqui e assumiram, perante um segmento fundamental da população, o compromisso histórico de não criar retrocessos. Esse foi o primeiro compromisso. O segundo compromisso é o de nos ouvir. O que está sendo realizado aqui é um sistema muito competente, historicamente instalado. Não é uma coisa que veio de graça. Isso é necessário para o aprimoramento da própria democracia. Ou seja, o Conade, os conselhos estaduais e os conselhos municipais têm poder deliberativo. Eu não sei se já perceberam isso, mas os senhores e senhoras delegados e delegadas estão a deliberar normas que vão impor aos presidentes, aos governadores, aos prefeitos; que vão impor também às nossas decisões e serão encaminhadas ao Congresso, que deverá acatá-las, se for o caso. Eles vieram aqui e disseram o seguinte: “Vocês estão organizados e nós vamos ouví-los, até porque, se não os ouvirmos, a norma não irá passar”.

Ou seja, o que nós temos que fazer aqui, do ponto de vista jurídico - eu estou falando aqui do ponto de vista da aplicação da lei - é lutar para sair um Estatuto. Mas, ainda mais importante do que isso,

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é estabelecermos métodos de controle e participação diuturna. Aliás, nossos nobres representantes estão aqui a assumir perante nós mesmos a idéia de acatar o que determinarmos.

Era só isso o que eu queria dizer. Não tenhamos medo! Avancemos firmemente em prol do Estatuto! Este é um movimento histórico inexorável. Temos que ter um Estatuto sim, mas é o Estatuto que nós escolhermos.

Obrigado!

Izabel Maria Madeira de Loureiro MaiorCoordenadora da Corde

Mais uma vez, boa noite à platéia e boa noite à Mesa!

Eu queria agradecer especialmente ao senador Paulo Paim, que veio do Rio Grande do Sul e volta para lá o Rio hoje ainda. Ele veio nos prestigiar e isso é muito importante. Tanto o deputado Leonardo Mattos, quanto o deputado Eduardo Barbosa têm acompanhado essa Conferência, juntamente com as assessoras legislativas aqui presentes, Dolores e Evanilde.

A Regina e o Joelson tiveram a idéia de fazer esse Painel. Eu queria cumprimentar a todos vocês que estão aqui. Vou me remeter ao primeiro debate de que eu participei sobre o Projeto de Lei nº 006, no ano de 2003, em Campinas. Essa foi a primeira vez que eu tive a oportunidade de debater a proposta do senador Paulo Paim. O Santos Fagundes, pela primeira vez, participou também do debate. Ele estava sendo inserido em sua equipe, senador. Naquele momento, todos nós percebemos que pairava alguma coisa confusa no ar. Mas hoje o cenário é diferente; totalmente diferente.

Eu entendo por que a Corde e o Conade, especialmente a Corde, tiveram que fazer o papel de “espírito de porco”. A Corde precisou emitir um parecer, considerando todos os pontos em que precisaria haver um aperfeiçoamento naquele Projeto apresentado naquela ocasião. Tanto é assim que, de lá para cá, inúmeras revisões foram feitas, tanto no Senado como na Câmara dos Deputados. Agora, este é um outro momento, são outras as circunstâncias, são outros os atores. Agora, é muito maior o círculo de pessoas e parlamentares envolvidos nesse processo, por meio das subrelatorias da Câmara.De certa forma, o senador Flávio Arns sempre esteve envolvido, porque nunca deixou de propor leis e relatar leis relativas à pessoa com deficiência.

O que nós temos que avaliar agora é a qualidade do texto do Estatuto. O problema não é mais se haverá ou não Estatuto. Essa situação já está superada. O problema é que só haverá Estatuto se o texto for bom. Então, se todos acreditam em algumas das posições que já foram colocadas aqui, com o brilhantismo característico dos oradores que me antecederam, é lógico que teremos Estatuto. Até porque nós não vamos ficar à mercê de decretos, apesar de que a base de toda a proposta original foi o Decreto nº 3298. Essa foi a base do PL 006 e do Decreto nº 3298. Significa que ele era tão bom que não pôde permanecer como Decreto, e tem que virar lei, só que precisa incorporar também outras questões.

Há uma questão, que de certa maneira, ainda não foi tratada, que é a da criminalização do preconceito. Isso é essencial e não adiantava o que estava referido no artigo 8º da Lei nº 7853, porque depois não se encontrava o correspondente na aplicação penal. Mais ainda, também não adianta que se coloque uma série de intenções, sem que aquelas intenções possam encontrar um exercício efetivo e prático. Isso há de ser trabalhado.

Todos nós já sabemos que será mais uma lei, porque o Estatuto é uma lei federal. Então, também não adianta criar uma expectativa muito grande. É preciso que haja um somatório de esforços entre os propositores atuais da nova legislação, que vai ser muito mais abrangente. Vamos procurar atingir o caráter quase que universal no tocante à pessoa com deficiência e ao poder Executivo em todos os seus níveis. Caso contrário, isso não se transformará em política pública.

Então, é preciso que nós tenhamos essa noção exata. A lei pela lei pode continuar parada, a não ser que as punições sejam tais que consigam impulsionar por si só a morosidade que a máquina

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administrativa teima em ter, apesar de alguns de nós que estamos no Executivo não sermos assim tão parados, não é?

Há uma outra questão ainda a ser colocada. Enquanto esses textos já tratam de matérias mais recentes, que não existiam antes. Elas são inovadoras e precisam existir. Há matérias que já existiam e que voltam a ser tratadas. A única preocupação que ainda páira na minha e em outras cabeças é se nós temos força hoje no Congresso Nacional para enfrentar determinados grupos empresariais, que cismam que nós não devemos ter os direitos que já foram conquistados.

A Corde responde a todos os Projetos de Lei que dizem respeito à pessoa com deficiência, em caráter geral, e os outros Ministérios respondem quando é específico: o assunto da educação vai para educação; o da saúde para a saúde e vai também para a Coordenadoria da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Por exemplo, o Dr. Ricardo acabou de dizer que a legislação de quotas não é aplicada, mas nós sabemos que é aplicada sim. Ela não é aplicada, talvez, com a mesma força que poderia ser aplicada, mas ela está sendo aplicada. A pergunta é: não teria uma maneira de ser colocada, nesse Estatuto, uma salvaguarda de tudo aquilo que é demasiadamente polêmico? Eu acho que o PL original não sofreu na Câmara um processo de maturação semelhante ao que já sofreu no Senado, como o próprio deputado Leonardo já explicou; e nós estamos satisfeitos com a explicação dele. Na Câmara, não encontramos sub-relatores do quilate do deputado Eduardo Barbosa. A partir daí, nós enfrentamos problemas e acabamos tendo Capítulos que são piores do que os do Decreto original, de onde é originário o Projeto. Então, a Câmara terá que avançar muito para poder se ombrear com o Projeto de Lei Substitutivo que hoje já é discutido pelo Senado.

Eu volto a insistir que, se esse Substitutivo avançar no sentido de trazer, por exemplo, as quotas - eu não vou discutir se sou a favor ou contra, mas elas existem e estão aí. Esse Projeto determina que as empresas com cinqüenta ou mais empregados se obriguem a reserva de vagas. Isso é um avanço, porque nós sabemos que a maioria das empresas realmente tem menos de 100 empregados. Mas, não se poderia resguardar daquelas que estão acima de 100 para não perder essa oportunidade? Acho que isso é possível, tanto que a legislação da acessibilidade ficou resguardada. Na própria questão dos ônibus acessíveis, o empresariado poderá voltar à discussão e nós sabemos que há muitos empresários que ainda tentam enfrentar certas situações. São empresários que não têm noção de responsabilidade social e nem noção de lucro, porque a pessoa com deficiência é um consumidor e vai pagar sua passagem. A era da gratuidade já foi ultrapassada e é nisso, principalmente, que peca o Projeto de Lei Substitutivo da Câmara, porque é cheio de gratuidade. Esse é um problema gravíssimo, porque a Proposição da Câmara acrescenta gratuidades enquanto nós estamos lutando por cidadania. Esse é um problema que tem que ser resolvido no outro Substitutivo.

Há uma outra questão que deveríamos esmiuçar mais, que é o Capítulo da Educação. O Capítulo da Educação, em ambos os Substitutivos, ainda não contempla o avanço da sociedade brasileira na área da inclusão educacional. A discussão já está presente em todas as escolas. A escola que hoje se recusa a pensar na matrícula de uma criança ou de um jovem com deficiência passa a sofrer uma ação de absoluto descontentamento da comunidade ao redor. Imediatamente é denunciada em jornais, em congressos, em conselhos, porque o senso comum diz que as pessoas com deficiência só poderão sair do processo de exclusão se começarem a freqüentar escolas com as outras crianças. O preconceito não se tira de gente que tem personalidade formada. O preconceito só pode acabar pela convivência das pessoas na mais tenra idade, porque são essas crianças de hoje, no convívio com seus “amiguinhos” com deficiência, que poderão influenciar o comportamento dos adultos. Seus olhares são verdadeiras flechas sobre os pais e as mães, quando estes não agem de acordo com o que é correto do ponto de vista dos direitos humanos. Quem está inserido no contexto dos direitos humanos sabe que a educação pautada nesses direitos é que pode transformar a convivência da diversidade. Eu acho, por conseguinte, que nós poderíamos aperfeiçoar também esse Capítulo nas duas propostas.

Eu acredito que em algum momento essas propostas vão ter que se juntar, seja na Câmara ou no Senado. Sabemos que há implicações que levaram a isso, como o senador Paulo Paim já explicou. Mas é preciso que haja imediatamente uma junção das duas propostas para que possamos evoluir mais rapidamente.

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Outra questão que eu gostaria de assinalar diz respeito à conceituação das deficiências, que é um problema razoavelmente sério hoje em dia. Eu queria conclamar vocês que permaneçam amanhã na plenária final, que é deliberativa, para que não venha a acontecer o que aconteceu no dia de ontem nesta Conferência. Algumas pessoas manipularam a opinião da maioria e a maioria perdeu todos os seminários marcados. A falta de leitura de Regimento poderia ser resolvida sem que nós precisássemos ter perdido o dia inteiro e perdido até a compostura no plenário. Eu conversava com o Dr. Ricardo Tadeu e lhe solicitava, encarecidamente, que permanecesse amanhã na plenária final, assim como peço a presença de todos os delegados e convidados que têm direito a voz, porque as vozes sabedoras e as vozes conscientes influenciam positivamente as deliberações dos que irão votar.

Para completar, porque o tempo é muito curto, nós queríamos dizer que o poder Executivo terá que se posicionar quando esses Projetos chegarem ao ponto de receber a avaliação do governo federal, juntamente com a sua bancada nas duas Casas do Congresso. Isso é fato e todos nós sabemos disso.

Há algumas questões que nós deveríamos colocar muito claramente aqui. Não há dúvida de que é muito difícil para nós do Executivo - sejam os técnicos da Corde, do Ministério da Educação ou do Ministério da Saúde - tentar melhorar as rubricas do orçamento para a área das pessoas com deficiência. Isso é muito difícil. O Ministério da Fazenda não costuma conceder aumentos no orçamento, nem costuma modificar drasticamente algumas dotações orçamentárias. Sendo assim, provavelmente o Estatuto não vai conseguir fazer isso. Mas, se ele souber rechear adequadamente os seus artigos, com certeza essa evolução do orçamento acompanhará a demanda consciente de todos nós, movimentos e técnicos, que militamos na área.

Muito obrigada!

Regina Maria Melo AtallaConselheira do Conade

Como o Ricardo Tadeu disse, esse é um momento histórico que nós estamos vivendo aqui hoje.

Eu queria contar uma história a vocês. No Conade, por sugestão de meus pares, eu fui eleita Coordenadora da Comissão Provisória do Estatuto. Isso aconteceu há cerca de mais ou menos um ano e pouco. Durante a discussão e a existência dessa Comissão, nós tentamos fazer uma aproximação com o Congresso Nacional, tanto do Senado como da Câmara, para demonstrar nossas angústias em relação a esse processo. Principalmente nós, do movimento, sentimos na carne a angústia de perder tudo o que nos custou muita luta para conquistar. Essa legislação e a conquista desses direitos não vieram e não caíram do céu. Tudo isso foi fruto de muita luta e muita persistência. Assim como as Comissões da Câmara e do Senado têm a sua setorialização, nós tentamos também dividir essa Comissão Provisória do Estatuto por áreas “ saúde, educação etc. “ para que nós pudéssemos contemplar todos esses direitos básicos.

Um fato que atravessa essa Comissão é que os conselheiros governamentais têm uma série de solicitações e uma agenda muito pesada, o que torna difícil reunir essa Comissão. Então, foram muitas tentativas, muitos e-mails e nós conseguimos produzir alguns grupos. Por exemplo, uma previsão que não havia no Projeto original, uma área nova que já foi incorporada no Projeto de Lei 006 do Senado e cujo desenvolvimento só tende a crescer, é a de ciência e tecnologia. Isso não existia e foi uma conquista do nosso grupo, quando nos reunimos com a Ângela Cunha, em Pernambuco. Nós passamos três dias discutindo essa questão. Alguns grupos tentaram e conseguiram fazer alguns ajustes, como, por exemplo, algumas sugestões em relação a medidas coercitivas que deveriam constar nesse Projeto.

O Conade está, nesse momento histórico, renovando sua composição. Inclusive, amanhã à tarde esses membros serão conhecidos e a Comissão Temporária foi extinta. A minha preocupação com a extinção dessa Comissão é que ela se extingue, mas o assunto continua. A preocupação que eu tenho é que a sociedade civil estabeleça um canal de comunicação e de construção objetiva para que nós possamos qualificar esse Projeto de Lei.

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Eu queria até fazer um parêntese, respondendo ao deputado Eduardo Barbosa, com relação à Convenção Internacional. O movimento da sociedade civil luta com muita dificuldade para fazer qualquer coisa. Eu estou preocupada com essa questão desde o ano de 2004. Está aqui o nosso amigo Luiz Fernando Astorga, o nosso convidado da Costa Rica, que também desde a primeira reunião se esforça para que a sociedade civil seja ouvida e participe. É importante que nós consigamos que essa Convenção Internacional seja um tratado temático de direitos humanos, que diga não à segregação, que diga sim à educação inclusiva, que diga sim à capacidade das pessoas com deficiência e que mude o paradigma. É por isso que nós lutamos há 10 ou 20 anos. Então, é isso que nos interessa. Nós fizemos um seminário em São Paulo, preocupado em levar para Nova York uma proposta que espelhasse o mínimo de democracia em relação a tudo que a sociedade civil poderia contribuir. Nós reunimos 300 pessoas em São Paulo e fomos à única Delegação latino-americana que conseguimos construir um documento com propostas sobre todos os artigos da Convenção Internacional. A Corde, inclusive, entrou com um pequeno apoio. Vocês vêem que no Brasil nós temos parceiros, ligamos para o Ministério da Ciência e Tecnologia, ligamos para a Sheila pedindo passagens, pegamos os professores da universidade daqui, mas é tudo muito difícil. Nós lutamos com muita dificuldade, mas nós temos o compromisso de atuar com legitimidade e com democracia, e acho que não fazemos mais por falta de apoio.

Isso nós precisamos rever. Talvez seja importante para os parlamentares dedicados ao PL do Estatuto levar em consideração, de alguma forma, que, em nossas entidades, nós prestamos um serviço público da maior importância e não temos nenhum apoio para atuar nessa defesa de direitos, que nós conhecemos muito bem, porque isso é fruto da experiência que acumulamos.

Em relação a esse processo da Convenção Internacional, eu diria que nos interessam todas as mudanças de paradigmas que estão lá e que asseguram a dignidade inerente à pessoa com deficiência.

Eu acho que essa Conferência Nacional é um evento muito feliz, porque irá enriquecer todo esse processo de aperfeiçoamento legal. Como o Dr. Ricardo disse, nós temos uma legislação razoável, mas agora temos que nos debruçar sobre essa legislação para descobrir todas as suas omissões. Como ele disse, é uma legislação genérica, incompleta, pouco aplicável, sem poder coercitivo. Em que lugar do mundo, as empresas, as entidades, as pessoas, começaram a tomar atitudes sem que tenham a obrigação de fazer expressa em lei e com previsão de sanção em caso de descumprimento? Em lugar nenhum do mundo. O uso do sinto de segurança, enfim, todas as práticas educativas se consolidam no nosso cotidiano pelo poder coercitivo da lei. Eu acho que nós podemos construir tudo isso conjuntamente e me preocupo agora que nós possamos, a partir daqui, estabelecer mecanismos que assegurem a qualidade da construção dessa discussão.

Para vocês terem idéia, a Convenção Internacional tem 33 artigos. Em sete reuniões nas Nações Unidas ela consumiu 450 horas de trabalho. Isso é para vocês verem que esse é um assunto muito complexo. Nós vamos ter que reunir todas as leis que nos interessam, pois esse tratado tem que ser auto-aplicável, tem que ser uma lei moderna que dure, que garanta os direitos básicos e que possa nos dar garantia de que esse vai ser o norte para realizarmos essas mudanças.

Eu acho que o Conade é o local, o fórum em que devemos, juntamente com os conselhos municipais e Estaduais, bem como as organizações nacionais, traçar uma estratégia objetiva de construção dessa discussão.

Muito obrigado. Vamos iniciar o debate!

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DEBATERosane da Silva Ferreira

Boa noite!

Meu nome é Rosane. Desde ontem eu estou angustiada e me sentindo usada, porque nós viemos aqui para discutir algo importante para nós, que seria esse assunto. Por quê? Porque houve a conferência estadual, de onde tiramos as nossas propostas, e foi tudo escrito no livro. Eu não posso ficar aqui sendo obrigada a fazer praticamente a mesma coisa. Nós deveríamos responder aqui a cinco perguntas, só que essas respostas já foram dadas na conferência estadual; ou seja, perdemos tempo; fomos usados, e o assunto principal, que era o Estatuto, não foi discutido.

O Estatuto começou errado. Em primeiro lugar, nós que somos deficientes sabemos e conhecemos as propostas. Como o deputado Leonardo disse, a Comissão não sabia e não conhecia direito o assunto. Quer dizer, o erro foi esse. Antes de fazer uma lei, tem que ser ouvida a sociedade civil, ouvir o que a gente quer e não se impor propostas de cima para baixo. Nós estamos organizados, nós exigimos atenção, porque nós sabemos o que queremos. Então, vocês têm que nos escutar e respeitar a nossa posição e não tem sentido ficarmos aqui repetindo respostas às mesmas perguntas que já haviam sido feitas. Eu me senti uma idiota por ter vindo aqui à toa. Vocês estão subestimando a nossa inteligência. Não é assim que vão mudar a nossa idéia. Vocês não podem continuar impondo o que vocês querem.

Jorge MárcioCampinas/SP

Boa noite a todos e todas!

Eu cumprimento a Mesa e os nossos representantes, tanto da Câmara quanto do Senado.

Eu vou tomar a palavra, porque, como disse o eminente representante do Ministério Público, para que tenhamos um Estatuto que reúna leis já consolidadas e algumas em processo de consolidação, ele tem que passar por um crivo social maior e uma avaliação mais profunda. Desde a primeira vez que tive contato com o Estatuto eu venho trabalhando pela sua difusão, divulgação, questionamento, discussão e debate. Tenho promovido isso pelo Brasil inteiro, independentemente de qualquer participação de partidos políticos. Quero deixar bem claro que essa é uma posição de um cidadão que é ativista dos direitos humanos há mais de 20 anos. Eu sou ex-membro da ONG Tortura Nunca Mais, do Rio de Janeiro.

Em função desse tema, eu fiz uma proposição que deve ser dirigida à Câmara, ao Senado e a esta Conferência, no sentido de ser constituída uma comissão mista, com participação paritária e democrática de pessoas com deficiência e seus conselhos de defesa, para a checagem dos Substitutivos ora em tramitação na Câmara e no Senado.

Formulamos quatro quesitos básicos para cada artigo ou parágrafo, que estão baseados em um documento a que eu tenho acesso porque sou médico psicanalista e psiquiatra e trabalho na área de saúde mental há muitos anos. Esse documento é o Livro de Recursos para Legislação de Saúde Mental e Direitos Humanos, da OMS, do ano de 2005. Essas quatro questões devem ser formuladas para a comissão e também podem ser usadas para a leitura do Estatuto. São elas:

1. a questão foi adequadamente coberta nessa legislação estatutária e contempla e respeita as leis e decretos já vigentes?

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2. ela foi coberta, mas não contempla ou resolve, de maneira plena e abrangente essa questão?

3. ela contempla pouco a questão da eficácia e a aplicação das leis que estão ali explicitadas?

4. qual a sua implicação conceitual e política, com os direitos humanos?

Eu digo isso porque, desde o dia 29 de abril venho emitindo via internet várias comunicações dizendo que o fundamento do Estatuto não trabalha com aquilo que o nosso representante aqui da área jurídica legal, o Dr. Tadeu, apontou. Se nós não tivermos, no art. 1º, uma definição clara de plena cidadania e respeito aos direitos humanos, esse Estatuto será anacrônico, porque todos os documentos internacionais, hoje, reafirmam a questão dos direitos humanos.

Eu traduzi e divulgo a Declaração de Montreal sobre os direitos humanos das pessoas com deficiência intelectual, onde se afirma que esses cidadãos são como todos os outros cidadãos, plenos em direitos humanos. Então, se essas quatro perguntas não forem respondidas positivamente e se essa comissão de reavaliação achar que não contempla nenhuma das respostas, o Projeto do Estatuto deverá ser reavaliado para se decidir sobre a viabilidade e a relevância da inclusão desse artigo, ou sua modificação conceitual, estrutural, vernacular, terminológica e de princípios éticos. Eu trabalho a nível nacional e internacional pela defesa de princípios bioéticos. Se alguém me apontar no atual texto do Projeto a palavra bioética eu rasgo o meu diploma de medicina aqui na frente de vocês. Certo?

Essa comissão deverá disponibilizar para domínio público, via internet e por publicações oficiais, todas as modificações que foram e estão sendo formuladas.

Finalizando, quero ler rapidamente um documento que eu lancei, via internet, no dia 29, dirigido ao eminente senador Flávio Arns. Esse documento foi enviado para a assessoria de imprensa dele, com algumas considerações, e eu digo o seguinte:

o Estatuto já esteve, historicamente, citado como uma necessidade no trabalho, no artigo “A defesa dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência”, de Mortari e Paula, datado de 1997, que pode ser encontrado no livro “Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência”, que é uma publicação oficial do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública. Os autores, uma promotora de justiça de São Paulo e um procurador de justiça de São Paulo, respectivamente, afirmam o seguinte: “Um código ou estatuto sistematizado não transformará a realidade de exclusão que caracteriza o conjunto das pessoas com deficiência no Brasil, porquanto somente a prática motivará a necessária revolução cultural. É preciso pensar em uma lei que seja potencialmente mais eficaz do que um amontoado de normas que hoje estão em vigor”.

Em seguida, eles dizem: “Para além da sistematização das regras existentes, fazia-se e faz-se necessário pensar em um documento legal que cobre judicial e extrajudicialmente o direito objetivo, assim com, penalize práticas discriminatórias e excludentes.”

É nesse sentido que o atual documento, já indicado como possibilidade no ano de 1997, ainda não contempla o nosso desejo de formato do Estatuto, posto que não contém como principal característica, em seus termos fundamentais e na conceituação de deficiências, a sua nascente nas desigualdades sociais e na exclusão socioeconômica e política brasileira, além de não reafirmar a questão dos direitos humanos das pessoas com deficiência.

As pessoas que quiserem o texto eu já o enviei pela internet, e depois vocês podem me procurar que eu, por e-mail, enviarei tudo que está escrito aqui e que foi enviado para as assessorias, inclusive do senador Paulo Paim.

Obrigado!

Wockton Santos Pereira

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Como fazer a integração das pessoas com deficiências mentais severas? Por que não estender os benefícios da isenção de impostos à aquisição de veículos pelas pessoas com deficiência?

Participante não identificado

Como assegurar que as deliberações, tanto das conferências municipais, estaduais, nacional e do Distrito Federal, quanto dos conselhos nacional, estaduais, municipais e do Distrito Federal, sejam implementadas e efetivadas pelo Executivo?

Sérgio Ricardo

Eu queria pedir aos colegas deficientes para ficarmos tranqüilos em relação à questão da aprovação do Estatuto, que é o que nós estamos questionando e reivindicando, para que essa lei estatutária não seja aprovada açodadamente, porque, com certeza, isso significaria perdas. Mas, ao mesmo tempo, nós temos que ficar vigilantes e não podemos relaxar, porque nós sabemos que, assim como existem pessoas que tratam dessa questão de forma séria, como os Senadores Paulo Paim e Flávio Arns, também existem pessoas que, de certa forma, podem querer utilizar essa temática como bandeira de luta, sem ter nenhum conhecimento mais aprofundado e nenhuma participação maior nesse nosso segmento.

Então, nós precisamos continuar vigilantes, mas sabendo que temos a garantia de que esse documento, esse instrumento, será aprovado no momento em que ele realmente representar tudo aquilo que o segmento das pessoas com deficiência considera como significativo e relevante.

Quando o deputado Eduardo Barbosa deu uma puxada de orelha em relação às divergências que existem dentro do nosso próprio segmento, nós sabemos que isso às vezes é saudável, porque fortalece a democracia, fortalece o debate, mas nós sabemos também que existem dentro desse segmento áreas de interesses que, às vezes, conflitam com aquilo que nós, pessoas com deficiência, achamos importante. Então, isso também tem que ficar registrado. Muitas vezes esses interesses representam vantagem para um determinado grupo e não para o segmento como um todo. Isso tem que ser combatido. Isso é o que nós não podemos deixar que aconteça.

Em relação ao que o Ricardo coloca sobre o Decreto das quotas, a Izabel foi feliz na sua afirmação de que ele está sendo cumprido em empresas privadas. Ontem, inclusive, nós íamos fazer um painel com essa temática, mas, devido à desorganização e manipulação, como a Izabel colocou, não foi possível fazer essa discussão mais aprofundada em relação à empregabilidade da pessoa com deficiência.

Quando o decreto não é cumprido esse fato tem forte ligação com uma interpretação tendenciosa de certos juízes, porque o Decreto é claro. Eu acho que não há nenhum tipo de dificuldade de entendê-lo em relação a essa questão do cumprimento das quotas. Está aí o caso Pimenta Neves, que, por uma questão de interpretação de um juiz, um cidadão condenado sai livre.

Então, essa questão da interpretação dos juízes também, tem que ser levada em consideração. Mas, na prática, nós que trabalhamos com essa área da questão da empregabilidade sabemos que esse Decreto vem sendo colocado em prática.

Obrigado!

Márcia Paes GoriConselho Estadual da Pessoa Portadora de Deficiência Física/SP

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Boa noite à Mesa!

Meu nome é Márcia Gori. Eu sou de São José do Rio Preto/SP e faço parte do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, da minha cidade. Também sou do Núcleo do Conselho Estadual do Estado de São Paulo.

Eu quero fazer um comentário sobre o que a Dra. Izabel disse. Eu concordo com ela, em tese, sobre a questão da gratuidade, mas isso é muito complicado. Todos os delegados que vivem nos seus municípios têm um contato mais direto com portadores de deficiência e podem perceber o quanto ainda é necessária a gratuidade para o deficiente, porque o nível de pobreza é muito grande. Essa questão é uma faca de dois gumes. Se nós tirarmos a gratuidade, o deficiente vai deixar de estudar, vai deixar de trabalhar. Muitas vezes, esses deficientes não são instruídos; grau de escolaridade deles é muito baixo. Eles estão tendo uma boa oferta de empregos, mas, como não são mão-de-obra qualificada, são excluídos do mercado de trabalho. Então, isso está muito complicado. O empresário quer empregar o deficiente, mas ele não tem a qualificação que esse empresário está buscando.

Dentro do nosso Conselho, nós temos uma dificuldade muito grande de achar a mão-de-obra que o empresário está buscando, mas nós estamos conseguindo aos poucos. Além disso, também é muito complicado o deficiente conseguir acesso às universidades privadas, porque, se ele não tem trabalho não tem como pagar e nós não temos como exigir das universidades privadas bolsas de estudos, porque eles dependem também da mensalidade. Assim, tudo está amarrado na educação; tudo começa na educação. A verdade é que só a pessoa qualificada tem condições de trabalhar. Vamos falar sinceramente: o deficiente conscientizado não gosta de gratuidade; ele quer cidadania, como a Dra. Izabel disse. Eu concordo com a senhora plenamente, mas a realidade brasileira ainda é muito diferente; nós temos ainda uma luta social muito grande.

Em relação ao Projeto de Lei do Estatuto da Pessoa com Deficiência, senador Paulo Paim, eu tenho uma preocupação muito grande, como a maioria dos deficientes aqui. Nós já temos algumas conquistas, temos leis ordinárias, temos decretos e tudo mais; todavia, tudo depende da luta de cada segmento, de cada comunidade e de cada instituição. Então, eu também tenho essa preocupação se lá na frente nós não vamos ter perda de algumas coisas que nós já conquistamos com imensa luta. Eu penso que se deve abrir, estender bem mais essa discussão na sociedade civil, buscando mais informações e deixando as pessoas participarem mais.

Essa semana eu abri um e-mail, que diz assim: “Tudo para nós, mas sem nós”. Acho que isso correu bem aberto, via internet, para todo mundo. Eu senti assim que tudo é feito por nós aqui em Brasília na Câmara dos Deputados e no Senado, mas isso ocorre sem a nossa presença, sem a presença da sociedade. Tudo isso é feito aleatoriamente. Desculpe-me se essa é minha opinião. Eu acho que devemos mudar isso, porque, se nós temos obrigatoriedade no voto, nós também temos que ter o direito à voz, também, como todo cidadão brasileiro.

Muito obrigado!

Joaquim Laranjeira da Silva NetoRegião Metropolitana de Salvador/BA

Boa noite a todos, em especial ao pessoal da Mesa!

Meu nome é Joaquim Laranjeira. Eu tenho um filho de 12 anos com deficiência. Ele nasceu no ano de 1994 com mielomeningocele, em Feira de Santana, Bahia, uma cidade com 500.000 habitantes e não tinham como operá-lo, porque lá não tinham a válvula de dreno para instalar no crânio, para drenar a provável hidrocefalia. Foi mais fácil ele se operar em Brasília, no Hospital de Base, do que em Salvador. Toda articulação foi feita em função da vinda dele para cá. Foi mais fácil ele pegar um avião e vir a Brasília operar aqui, no Hospital de Base, do que em Salvador.

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Aos o4 anos ele foi recusado ao tentar freqüentar o Instituto Sallete, uma escola católica de Salvador. Eles não matricularam o meu filho. A pedagoga do Sara esteve na escola para convencer a diretora, uma irmã de caridade, mas não teve jeito e ele não foi matriculado. Eu tive que retirar o meu outro filho desse colégio, que já estudava na alfabetização, porque eles não poderiam ficar juntos naquela mesma escola. Isso foi no ano de 1998. Eu não tinha conhecimento dos meus direitos, não existia ainda o Decreto nº 3.298 e ainda não tinha sido regulamentada a Lei nº 7.853. Ela só foi regulamentada no ano de 1999. Buscando a legislação durante todo esse tempo, até os dias de hoje, cheguei aos Projetos de Lei sobre o Estatuto que tramitam na Câmara e passei a me interessar. Não vou me intitular aqui um estudioso, mas sou um leitor compulsivo de todos os apensados e das propostas de Estatutos. Analisei o Projeto de Lei do então deputado, hoje senador, Paulo Paim e passei a ler e “puxar” na internet os outros apensados. Depois fui fazendo a comparação com a legislação vigente. Já existia o Decreto nº 3298 e percebi que este diploma legal e o Projeto de Lei do senador Paulo Paim eram muito parecidos. Aliás, acho que uns setenta por cento (70%) dos artigos são exatamente iguais aos do Decreto nº 3.298. Depois veio o PL 006, que, na verdade, tem uma alteração no sentido de não mais se usar a expressão “portador de necessidades especiais” e sim “portador de deficiência”.

Há umas duas semanas eu tive acesso à Minuta do Substitutivo do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que eu vou chamar de “Estatuto de Proteção da Pessoa Jurídica com Deficiência”, porque, se formos analisar as entrelinhas dos artigos nós vamos verificar que ele protege mais a instituição do que a pessoa com deficiência. A nossa intenção é fazer o Estatuto da Pessoa com Deficiência e não da pessoa jurídica. Então, eu peço que os delegados analisem isso friamente, porque eu cheguei à conclusão de que esse não é um Estatuto da Pessoa com Deficiência, mas sim o Estatuto da Pessoa Jurídica com Deficiência. Ocorre que para explicar isso é complicado, porque nós precisaríamos ter tempo e checar os artigos por artigos. Eu estou falando aqui da Minuta de Estatuto de que trata o Substitutivo do senador Flávio Arns. Eu acho que a pessoa com deficiência não está sendo priorizada nessa Minuta. Basta analisar artigo por artigo da proposta.

Muito obrigado!

Clodoaldo de Lima LeiteAssociação para Valorização e Promoção de Excepcionais/SP

Boa noite a todos!

Meu nome é Clodoaldo. Eu participo do Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência do Estado de São Paulo. Estamos acompanhando a luta da pessoa com deficiência desde a década de 70. Nós colaboramos na construção daquele Conselho Estadual no ano de 1984. Inclusive, ele serviu depois de modelo na Constituição de 1988 para a criação dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente e dos conselhos da assistência social. No entanto, os conselhos das pessoas com deficiência, na maior parte das Unidades da Federação, ainda são consultivos. Por mais esforços que a sociedade civil faça no sentido de viabilizá-los como conselhos deliberativos, nós ainda não criamos um mecanismo que possibilitasse isso. Eu esperava que esse Estatuto pudesse contemplar a criação de conselhos estaduais e municipais de caráter deliberativo, assim como o Conselho Nacional.

Uma outra questão é que o Capítulo II do PL do Estatuto, que trata do direito a saúde, tem 12 artigos e fala do Sistema Único da Saúde. No entanto, no Capítulo VI, que trata do direito à assistência social, há apenas dois artigos.

No momento histórico em que o Conselho Nacional de Assistência Social e os conselhos estaduais, municipais e do Distrito Federal conseguiram aprovar uma Política Nacional de Assistência Social e um Sistema Único da Assistência Social, não dá para entender porque, no Projeto do Estatuto, não se faz referência ao Sistema Único da Assistência Social, à criação dos Centros de Referência de Atendimento na Área da Assistência Social (os CRAS e os CREAS).

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Portanto, eu acho que poderíamos aprofundar um pouco mais essa questão, porque a pessoa com deficiência também está contemplada na Lei Orgânica da Assistência Social e, de certa forma, isso poderia ser contemplado no Projeto do Estatuto.

Eu acho que esses são dois pontos que eu considero extremamente relevantes: criar um mecanismo para que a sociedade civil tenha realmente os seus conselhos de caráter deliberativo, porque, do jeito que está, fica difícil. Os governos estaduais, municipais e do Distrito Federal, com algumas exceções, não aceitam que os conselhos sejam deliberativos, porque querem sempre tê-los em suas mãos, manipulando-os a seu bel prazer.

Então, são esses dois pontos: ampliar a questão do Sistema Único da Assistência Social e que houvesse uma normativa que obrigasse a criação dos conselhos deliberativos em todo o País.

Obrigado!

Maria Isabel da SilvaCentro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência

Boa noite a todos!

Meu nome é Maria Isabel. Eu sou jornalista em São Paulo e estou aqui representando o Centro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência.

Eu gostaria de salientar que este momento é muito favorável para o Estatuto. Ele está sendo elaborado desde o ano de 2003; foi apresentado pelo senador Paulo Paim e este é um momento em que ele está sendo bastante revisto e discutido por alguns setores da comunidade. Nós já alcançamos um ponto de bastante amadurecimento e estamos prontos para toda a comunidade participar. Sem a participação da comunidade, de fato, não será possível que as pessoas com deficiência sejam representadas, sejam atendidas e sejam contempladas.

Em São Paulo, eu acompanho um grupo de mais ou menos 100 pessoas, que faz a discussão do Estatuto via internet. Inclusive, eu trago aqui algumas contribuições deles. É importante salientar que tem havido muitas críticas em relação aos Projetos apresentados no Congresso. Na verdade, têm sido feitas muitas críticas e poucas propostas concretas.

Se os parlamentares apresentam proposta do Estatuto para que todos participem, eu acho que nós temos que sair do campo crítico e passarmos a ser mais propositivos. Contudo, é claro que as críticas são muito bem vindas, quando realmente pertinentes. O Sr. Joaquim ressaltou que o Estatuto salienta a proteção da pessoa jurídica. Sendo assim, seria muito interessante que ele elaborasse uma proposta concreta e encaminhasse aos parlamentares envolvidos m ais diretamente com os Projetos de Lei, porque eles não estão fechados a novas propostas. Se a proposição atual relativa ao Estatuto não está contemplando alguma coisa importante, se está extrapolando, se não está atendendo ao segmento, se não está sendo assistencialista, a proposta está aberta a modificações. Vamos mudar, vamos participar, vamos contribuir. Nós precisamos sair um pouco do campo exclusivo da crítica e participar concretamente.

Eu gostaria de fazer uma referência à fala da Dra. Izabel, quando ela enfatizou a importância da questão da educação inclusiva. Realmente, isso é essencial; é muito importante. Ela disse que é fundamental que consigamos, hoje, implementar uma educação para as crianças, no sentido de que, na sua formação, elas aprendam a não ter preconceito. Nós não podemos esquecer que estamos hoje formando os adultos de amanhã. Seria ingenuidade imaginar que se o Estatuto for implementado, for publicado hoje, amanhã todo mundo já está sem preconceitos e já teremos escolas inclusivas. Isso é ingenuidade; isso não existe. Obviamente, que todas as dificuldades que as pessoas com deficiência sofrem hoje estão arraigadas na sociedade. Então, obviamente, essa é uma construção do dia-a-dia.

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Em relação à legislação, que está pulverizada e dispersa, é realmente muito importante que toda ela seja reunida num Estatuto. Essa é a essência da Proposição relativa ao Estatuto. Ela não está concluída, ela não está publicada, ela está aberta a que todos participem.

Eu gostaria de me colocar à disposição. Se alguém quiser me contatar em São Paulo eu estou com esse grupo de discussão em relação ao Estatuto e o meu e-mail é [email protected]. Eu estou à disposição para continuarmos essa discussão, porque hoje o tempo é muito curto.

Aldenor Carneiro

Boa noite a todos e a todas! Eu cumprimento de maneira especial à Mesa e os idealizadores deste Painel. Eu não tenho nenhuma intimidade com a técnica legislativa, mas eu queria perguntar aos nossos legisladores porque a opção pelo Estatuto e não pela consolidação, nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho? Assim, com uma consolidação em vez de um estatuto, nós entendemos que preservaríamos todo o arcabouço legal e cumpriríamos a finalidade de condensar toda a legislação em um texto único, sem corrermos o risco de perder conteúdos, o que para nós seria muito caro. Essa é a minha colocação.

Agora, diante de tudo o que foi colocado sobre as deficiências técnicas do Projeto de Estatuto e no intuito de contribuir com esse processo, eu acredito que nós poderíamos ouvir, de fato, os beneficiários dessa proposta de Estatuto. Eu acho que caberia melhor, como eu já disse, uma proposta de consolidação, porque acho que grande parte das pessoas com deficiência ficaria muito mais tranqüila em relação aos direitos já conquistados.

Agora, a nossa preocupação maior é que, se os parlamentares são representantes do povo e falam em nome desse povo, se o Conade é o nosso órgão máximo, que congrega oficialmente o interesse das pessoas com deficiência, na oportunidade que teve de se pronunciar sobre o Projeto de Estatuto, conforme foi colocado, ele encaminhou um oficio contrário à Proposição, por representar risco à conquista de direitos. Se este é o documento oficial do Conade, ao que me consta ele não oficializou uma nova posição e a Dra. Izabel, quando se posicionou pela Corde, também emitiu um parecer. Ora, a Corde é um órgão importante para as pessoas com deficiência. Quero crer que na plenária nós teremos a oportunidade de deliberarmos sobre isso.

Quero aqui, uma vez mais, enfatizar a necessidade de os senhores parlamentares terem o compromisso de levar em conta o resultado da plenária desta Conferência, porque, para nós, além de histórica, ela é extremamente representativa dos anseios e dos interesses da população brasileira com deficiência.

Obrigado!

João Batista da Costa

Boa noite a todos!

Eu vou ser rápido, porque eu só queria fazer uma consideração com relação às propostas que foram aprovadas em cada Unidade da Federação. Eu acho que o texto final do Estatuto vai levar em consideração todas essas propostas. Eu acredito que o nosso nobre senador, a quem eu admiro muito, tem boas intenções e eu tenho certeza que ele vai lutar para que sejam analisadas todas as propostas que estão nesse livro, que foi catalogado pela Conferência. Eu acho que isso é fundamental.

Muito obrigado!

Domingos João Montagna

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Representante do Movimento Social – Fraternidade Cristã dos Doentes Deficientes

Meu nome é Domingos João Montagna. Eu sou de Chapecó/SC. Eu represento aqui o conselho municipal de Chapecó e, principalmente, o Movimento Social – Fraternidade Cristã dos Doentes Deficientes.

A minha pergunta é também, de certa forma, um protesto. Ela tem como eixo a questão da participação e do protagonismo. Eu tive contato com o Estatuto a partir da 3ª edição. Lá na base nós temos muitas dificuldades. Inclusive, nessa questão da Conferência da ONU, ainda estamos à margem do processo. Então, o meu protesto é nesse sentido.

A pergunta é: Por que o Conade, como nosso órgão de representação maior, as autoridades, os nossos parlamentares eleitos com o nosso voto, não estão garantindo acesso a essas informações e a nossa participação efetiva nesse processo? Eu estou falando, daquela pessoa com deficiência lá da base e não simplesmente os dirigentes ou os técnicos ou alguns iluminados que deliberam em nome de todos. Essa é a minha preocupação, até porque eu trabalhei com alguns educadores no Paraná, da base do senhor senador Flávio Arns, educadores da APAE, e ninguém tinha tomado conhecimento do processo de discussão do estatuto da pessoa com deficiência. A minha pergunta é nesse sentido, pois todos temos interesse em participar desse processo.

Muito obrigado!

Terezinha Luísa José Mansur CardosoPresidente da Associação de Psicólogos de Corumbá/MS

Eu gostaria de fazer uma pergunta para a assessora do senador Flávio Arns. Eu queria saber se os Decretos nº 3.298 e 5.296, de 2004, já foram contemplados no Projeto do Estatuto da Pessoa com Deficiência. A minha pergunta é somente essa.

Muito obrigado!

Luiz Cláudio Alves

Boa noite a todos! Na verdade, eu queria fazer apenas um registro. Eu acho que em uma reunião dessa magnitude, que era o que todos nós ansiávamos, tinha que ser propiciada uma discussão maior e ampliada em plenário, para contemplar todos nós. Com a realização apenas desse debate final de hoje isso ficou meio prejudicado. Era esse o registro que eu queria fazer.

Eu sou oriundo do movimento de luta já desde o ano de 1980, mas fiz uma opção política no sentido de que o esporte para a pessoa portadora de deficiência deveria ser a vitrine para traduzir a potencialidade e fazer com que as nossas questões avançassem. Portanto, nós temos conseguido fazer isso nas para olimpíadas e nas Olimpíadas. No ano que vem serão realizados os Jogos Pan-americanos e, lamentavelmente, nós não tivemos aqui nenhum painel sobre o esporte e a pessoa portadora de deficiência. Lamento que nós não estejamos utilizando esse instrumento, o esporte, que é muito importante. Já que o esporte é uma coisa que tem uma visibilidade muito grande, deveria estar aqui, porque muitas das coisas foram objetos de melhora e o esporte só existe porque houve uma deliberação política desse segmento aqui, mas nós não estamos utilizando esse instrumento. Eu queria, portanto, fazer um registro da falta que o esporte está fazendo nessa discussão.

Não será o Estatuto que vai garantir que nós tenhamos as conquistas que queremos. O que vai garantir isso é a conscientização e a vontade política. Nós sabemos que as nossas leis são as melhores do mundo. Todo mundo fala isso. Portanto, o que nós não conseguirmos implementar na prática é porque

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não se tem vontade política. Ora nós temos conquistas e ora nós temos perdas, por falta dessa conscientização.

Eu estive agora na Conferência Nacional do Esporte e ouvi de algumas pessoas portadoras de deficiência que não seria necessário participarmos da Conferência Nacional do Esporte, porque nós vamos ter o Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência, como se nós não tivéssemos que participar dessas outras questões, como por exemplo, na área do esporte, educação e saúde. É claro que é importante que o idoso dê a sua contribuição e a criança também, mas a criança portadora de deficiência será contemplada lá no Estatuto da Criança e do Adolescente, o idoso será contemplado lá no Estatuto do Idoso, e o cidadão comum só será contemplado no nosso Estatuto da Pessoa com Deficiência, porque, na Constituição brasileira, o que serve para ele, serve para nós também.

Não precisaríamos criar uma lei especificamente para o portador de deficiência, porque nós estaríamos consolidando e reafirmando o preconceito e a discriminação, que muitas das vezes acontecem de forma inconsciente.

Obrigado e desculpem por eu ter-me alongado!

Maria Laudicéia Silva de OliveiraAssociação de Apoio ao Deficiente de Parintins/AM

Boa noite a todos!

Meu nome é Maria Laudicéia Silva de Oliveira. Eu sou Presidente da Associação de Apoio ao Deficiente de Parintins, no Amazonas. Eu vim de um local muito distante. Pegamos uma embarcação e chegamos até a capital federal para participar desta Conferência, junto com representantes de toda a Nação e colocar as nossas dificuldades lá do Amazonas.

No Amazonas, como já foi falado aqui pelos senadores e membros da Mesa, muitas vezes as leis não são cumpridas, até mesmo pelo Ministério Público. Eu tenho um amigo que é deficiente visual e ele não está estudando por falta de escola e porque o diretor disse que não tinha professor especializado no atendimento de um deficiente visual. Onde é que está, então, a inclusão social para esse aluno? Ele vai parar de estudar para esperar a escola e os professores se qualificarem?

Eu espero que esse Estatuto venha amparar realmente todos os deficientes, de norte a sul do País. Acho que todos nós estamos aqui com essa mesma intenção.

Regina Maria Melo AtallaConselheira do Conade

O Rossini do Rio de Janeiro pergunta aos parlamentares se já estão discutindo o Fundo Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Agora então nós passamos a palavra aos debatedores, para as suas respostas.

Leonardo MattosDeputado Federal

Muito bem gente! Em relação à questão da consolidação, eu queria deixar claro que consolidar é um somatório daquilo que já existe e não mais do que isso. Então, não precisa de lei para consolidar o que já existe. Só uma encadernação resolve esse problema da consolidação. Nós podemos até discutir essa questão semântica, se deve se chamar de estatuto ou outro termo que seja mais adequado, mas o importante é que o estatuto precisa inovar.

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Eu vou fazer uma proposta aqui, até para ser rápido: que nós realizemos aqui no Senado, juntamente com representantes da Câmara, da sociedade, do Conade e da Corde, 27 seminários distribuídos pelo Brasil, para discutirmos profundamente essa questão. Eu acho que vocês têm razão: nós precisamos, realmente, discutir mais esse assunto.

Acho que nós já temos aqui contribuições para, pelo menos, três versões do Estatuto e, mesmo com todos os seus defeitos, eu posso fazer aqui uma série de elogios a elas também. O próprio Ministério Público daqui do Distrito Federal elaborou um Estatuto bastante interessante; a Câmara federal, apesar das dificuldades que tivemos, elaborou um Estatuto que tem alguns pontos muito interessantes. O Senado já avançou um pouco mais, não só pela experiência, mas porque não passou pela tempestade pela qual a Câmara passou nesses dois últimos anos, com tantas CPI’s. Isso comprometeu muito o nosso trabalho.

Agora, eu queria só fazer um contraponto aqui com a Izabel, se vocês me permitirem. O Brasil, recentemente, isentou os aplicadores internacionais de pagamento de Imposto de Renda. O cara vem aqui, faz investimentos, leva milhões e milhões e sequer paga Imposto de Renda. Então, como é que nós podemos negar aqui uma passagem de ônibus gratuita para uma pessoa com deficiência ir ao médico ou ir à escola?

Eu acho que nós precisamos contextualizar a questão da deficiência, a partir da pessoa com deficiência absolutamente carente, porque é só com a inclusão deles que todos nós aqui devemos nos preocupar. Só assim é que podemos dizer que estaremos verdadeiramente discutindo a inclusão. Não adianta eu discutir a inclusão para uma elite, para o gás nobre do movimento de deficiente. Nós temos que buscar a inclusão é de um camarada que está lá no fundo; aquele que está amarrado; que foi referenciado na abertura do nosso evento. É para essas pessoas que nós precisamos legislar ou, pelos menos, voltar os nossos olhos e as nossas preocupações.

Uma outra questão não colocada aqui e que eu acho muito importante, é que o Leonardo, um rapaz com uma deficiência mental leve, foi excluído da sua atividade laboral de muitos anos pelo próprio Ministério Público, que exigiu concurso público para o ingresso de servidores. Só que a função dele na escola era levar os meninos ao banheiro e encaminhar. Ele fazia esse tipo de atividade absolutamente nobre e importante, mas, como não sabia matemática, português, inglês, informática, física, química, foi reprovado no concurso. O que é que a sociedade vai fazer com esse moço? Como é que nós vamos tratar isso?

O Estatuto do Deficiente, ou qualquer norma que trate da inclusão de pessoa com deficiência, tem que pensar na forma de trazer essas pessoas para o centro da nossa sociedade.

Muito obrigado!

Eduardo BarbosaDeputado Federal

Enquanto deputado federal, para concluir eu só quero agradecer à organização dessa I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência por ter possibilitado a participação do Legislativo neste Painel, nos aproximando ainda mais. Eu queria enfatizar que os canais do Legislativo estão abertos para toda a sociedade organizada e que nós dependemos do que vocês apontam para nós formularmos, acrescentarmos e enriquecermos nossas propostas. Esse debate está se tornando cada vez mais constante dentro do Congresso Nacional. Muito poucas pessoas têm a oportunidade de vivenciar, às vezes, o dia-a-dia do Congresso Nacional, mas ele tem-se tornado, nos últimos tempos, um espaço extremamente aberto para a participação da sociedade, e nós parlamentares estamos sempre dispostos a facilitar essa relação.

Obrigado pela organização e pelo fato de estarmos juntos aqui com vocês neste evento!

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EvanildeAssessora do Senador Flávio Arns

Bom, ao fazer as considerações, eu já vou aproveitar para responder a duas questões que me foram formuladas. A primeira, é se o Decreto nº 3.298 já foi parcialmente incluído no Estatuto. Foi sim. Quanto à Lei nº 7.853, que criou o Corde, ela foi uma iniciativa do Executivo, pois o Legislativo não pode criar órgãos públicos. A Lei da Corde está toda contemplada nessa Minuta. Inclusive, é um bom exercício para vocês. O Decreto nº 3.298 está parcialmente incluído, mas ele foi aprimorado. É por isso que, em muitas situações, vocês vão encontrar algumas modificações em relação ao que está no Decreto original, porque nós já procuramos aprimorar na nova redação.

O Decreto nº 5.296 sobre a acessibilidade foi incluído parcialmente, porque estávamos aguardando o Seminário. Nós encerramos o Seminário achando que nós teríamos que levar mais itens do Decreto para dentro do documento. Então, vamos estar reformulando essa primeira versão da Minuta nesse sentido.

Eu gostaria de responder também ao Domingos, lá de Chapecó. No Senado, não houve várias versões do Projeto. Nós tivemos o Projeto original, do ex-deputado federal e atual senador Paulo Paim, e esta é a primeira versão da Minuta que está sendo divulgada agora. Além disso, só fizemos alguns trabalhos internos no intuito de colher subsídios. Nós enviamos 36.000 correspondências com o texto do Projeto original do Senador Paulo Paim. De repente, não sei por que não chegaram a todos os locais.

Essa é a primeira Minuta que o senador Flávio Arns está divulgando, a fim de tornar público o que ele pretende, enquanto Relator da matéria no Senado. Como eu disse, ela não foi discutida oficialmente na Comissão, justamente para que tenhamos um espaço para discutí-la mais com a sociedade. Ele até gostaria de já ter feito uma nova versão com algumas modificações, mas não foi possível.

A idéia do senador é que uma 2ª versão já seja divulgada agora na Comissão de Direitos Humanos para começarmos o debate em audiências públicas, onde nós estaríamos aprofundando os temas mais polêmicos, como, por exemplo, a questão do BPC e outros temas, alguns dos quais devem sofrer mudanças consensuais e positivas.

Eu deixo aqui como sugestão um bom exercício. Vocês podem pegar essa Minuta e comparar com a Lei nº 7.853, com os Decretos nºs 3.298 e 5.692 e outras normas afins, para verificar o que está aprimorado e o que não está; o que porventura ficou faltando... A partir daí, vocês nos mandem as suas contribuições. Entrem no site e coloquem as suas contribuições. Só assim é que poderemos aprimorar esse documento.

Eu quero agradecer por essa oportunidade de estar aqui, e podem ter certeza que vou levar para o senador todas essas considerações significativas que aqui foram feitas. Ele não vai levar nada para aprovação que não esteja respondendo às necessidades da pessoa com deficiência e à real aplicabilidade dessa lei estatutária que deve ser sancionada. Ele é pai de um menino com deficiência e tem todo interesse pela área. Isso é a bandeira de luta dele.

Obrigada!

Ricardo Tadeu

Eu acho que o que mais preocupa a todos nós é como fazer agora. Parece que só há uma objeção que foi colocada por um senhor no sentido de que não seria necessário um estatuto, porque já haveria leis para crianças e tudo mais. Só que tem um detalhe: uma criança negra, mulher e com deficiência é bem diferente de uma criança negra e uma criança mulher sem deficiência.

É claro que essa idéia de igualdade de todos perante a lei é muito bonita, só que existe no Direito uma parêmia muito antiga, que diz assim: “a verdadeira igualdade consiste em tratar

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desigualmente os desiguais, na justa medida da desigualdade”. O que se quer aqui é uma lei que atenda às necessidades de um grupo específico de pessoas.

Quanto àquele participante que falou sobre a questão de consolidar ou não a legislação já existente, tudo que nós estamos falando aqui é no sentido de consolidar. A Consolidação das Leis do Trabalho, na verdade, assim foi chamada porque o presidente Getúlio Vargas, no ano de 1943, baixou um Decreto que consolidou as leis trabalhistas. Esse decreto, no entanto, se tornou lei mais tarde, em 1946, quando se democratizou novamente o Brasil. Mas, manteve-se o nome “consolidação” em homenagem à importância histórica desse ato, que foi a Consolidação das Leis do Trabalho.

O que se vai fazer com o estatuto é justamente consolidar as leis já existentes, inclusive, elevando ao patamar de lei o que é decreto. Como fazer? Primeiro, é muito importante que a sociedade tenha clareza sobre que textos nós estamos trabalhando e sobre que textos nós vamos falar. Na Câmara, nós temos um texto bastante imaturo, que, para queimarmos etapas, deveria ser equiparado ao texto do Senado, pelo menos, considerando os avanços que esta Casa já logrou, porque não tem sentido ficarmos trabalhando dois textos diferentes, pois isso dificultaria muito o trabalho. Portanto, em primeiro lugar, nós precisamos saber que texto trabalhar. É essa clareza que nós precisamos ter logo, ou seja, de que texto nós vamos falar.

Seria importante que houvesse uma unidade, que houvesse um texto somente. Não sei qual é o processo legislativo que os senhores adotariam, pois eu não sou do Senado nem da Câmara. Mas, é importante que possamos saber do que estamos falando, para onde vamos falar e o que criticar efetivamente. Portanto, nós precisamos ter uma unicidade de texto. Esse é um aspecto importante e estou propondo que vocês unifiquem o texto e depois apresentem uma versão final para ser discutida pelos conselhos.

É preciso que se tenha clareza do que nós vamos discutir para depois não perdermos tempo discutindo algo que já foi até mudado. Isso é necessário para que tenhamos uma democracia participativa. Então, há que unificar os textos e apresentar uma proposta final para a sociedade discutir.

Acho que está na hora de suspender o trâmite desses Projetos e fazer uma Proposição final única, considerando as propostas já apresentadas. Nós temos que pensar em um mecanismo de colher a palavra dos conselhos municipais, Estaduais e do Distrito Federal. Então, esse texto deve ser apresentado com definição e com clareza sobre as propostas que o Congresso apresenta. Ele tem que ser submetido aos conselhos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e, a partir do que neles se deliberar, devemos encaminhar representantes para audiências públicas.

O que eu estou propondo é que sistematizemos o texto apresentado, porque sem clareza não dá para trabalhar. A partir da apresentação desse texto, os senhores devem fixar um prazo, a priori, para propor um mecanismo de oitiva desses conselhos todos. Assim, cada conselho municipal vai tirar a sua deliberação e encaminhar para uma comissão no conselho estadual. Os conselhos dos Estados e do Distrito Federal vão deliberar sobre qual é a proposta de cada um. Cada Estado e o Distrito Federal encaminharão seus delegados e vamos fazer uma conferência como essa, lá no Congresso, só para discutirmos a proposta de estatuto. Os senhores, então, aguardem a oitiva dos órgãos representados.

Eu quero deixar bem claro que nós estamos avançando muito na implementação da Lei de Quotas. Mas, um fato gravíssimo é não ter conselhos em todos os Municípios. Essa é uma denúncia séria e é lamentável. Eu desconhecia essa realidade temerária. O que eu proponho é que se formem grupos, fóruns e se faça muitos debates para garantir isso. Onde não há conselhos vocês têm que provocar o Ministério Público e exigir que ele seja criado, até porque existe uma demanda agora, premente, que é justamente o estabelecimento de medidas participativas; não é?

Eu acho que se deveria pensar, a partir de uma deliberação da plenária aqui, no sentido de o Conade aprovar uma moção de provocação do Ministério Público Federal para que este se mobilize, a partir dessa provocação, aplicando, por analogia, a Constituição e a legislação já existente. Quando se fala na necessidade de democracia participativa, a Constituição já estabelece mecanismos de aplicação analógica da lei e as próprias leis federais já existentes poderiam ser aplicadas. Por exemplo, o Estatuto da Criança e do Adolescente fala sobre os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, o

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Conanda, e sobre os conselhos estaduais e os municipais. Isso poderia ser aplicado, por analogia, no caso dos conselhos da pessoa com deficiência. Então, o que se pode fazer é uma mobilização provocando justamente o Ministério Público. Eu não conheço outro caminho. Eu acho que o Ministério Público é o instrumento adequado para pressionar mesmo no sentido da criação de conselhos em Municípios como Manaus, etc.

Eu aposto sinceramente na idéia de democracia participativa e creio que nós temos que pensar em um mecanismo de consulta apropriado para que essas audiências públicas sejam efetivamente representativas. Eu acho que o que se pode tirar amanhã na plenária é que se estabeleça esse mecanismo, que se construa esse mecanismo, e que o Congresso aguarde para que possamos ser ouvidos. Isso tudo tem que ser construído. Eu não tenho respostas prontas, mas eu acho que o caminho é esse. Eu não tenho dúvida nenhuma.

Em relação à Lei de Quotas, eu quero deixar bem claro que ela está sendo cumprida, mas eu vou confidenciar uma coisa para vocês: nós, do Ministério Público do Trabalho, evitamos que se possa levar a coisa para o Judiciário, porque há um risco muito grande de nós perdermos.Vocês querem ver um caso concreto? Eu vou contar para vocês. Eu entrei com uma ação civil pública. Nós ganhamos e obrigamos uma grande empresa do Paraná a contratar pessoas com deficiência. Daí, eles contrataram pessoas com deficiência mental levíssima. Eu não aceitei e disse que isso era contra o Decreto nº 3.298, que, no art. 4º, deixa bem claro que, para uma pessoa com deficiência ter direito à quota tem que ter uma deficiência severa em duas áreas de habilidade. Essa pessoa que a empresa testou tinha somente deficiência na área de aprendizagem. Sabem o que o Juiz disse? “Eu não aplico o Decreto porque considero o Decreto ilegal”. Foi isso que o Juiz da 1ª Instância disse. Está errado sim. Eu concordo com você, mas só que eu fiz um recurso que demandou 50 laudas e eu tive que ir para o Tribunal sustentar e se eu não tivesse ido nós perderíamos. Então, este é um dado de realidade.

Quando se fala que é necessário convalidar-se os decretos em lei a justiça já está questionando a própria legalidade destas normas. Já ouvi um juiz dizer: “Isso é uma matéria que o Decreto não devia tratar, pois isso deveria estar em lei. O Decreto foi além dos seus limites e eu não o aplico porque o considero ilegal por esse motivo. Acho que a pessoa com deficiência leve tem que ser considerada e ponto final”.

Então, essa questão não é tão simples. No dia-a-dia eu estou vendo que é necessário sim que tudo o que está nos Decretos nº 3.298 e 5.296 se transforme em lei, mesmo que isso demore. É importante que isso seja feito da forma mais democrática possível. Então, nós vamos ter que pensar em um processo de consulta efetiva porque se não a palavra empenhada aqui pelos representantes do Legislativo não será cumprida.

EvanildeAssessora do Senador Flávio Arns

Eu preciso falar, Dr. Ricardo, depois da sua colocação, porque agora eu fiquei preocupada. Nós estamos envolvidos com o nosso trabalho no Congresso e não temos mecanismos de articulação.

Sinceramente eu fiquei preocupada. Existe o site, existe o nosso endereço do gabinete do senador Flávio Arns. Nós estamos reformulando esse texto que foi divulgado. Quando o senador publicou essa Minuta ele deixou bem claro que ela seria aprimorada. Isso será cumprido porque as contribuições foram significativas. Ao invés de esperar essa Minuta ficar pronta eu penso que vocês já podem estar colaborando. É isso que eu ia dizer para a Izabel. Quando ela disse que o Executivo também se pronunciaria porque o estatuto poderá contemplar as questões financeiras. Eu pergunto: por que temos que esperar o Estatuto ficar pronto? As contribuições já podem vir agora para que possamos ganhar tempo.

Aqui nós temos a primeira Minuta. Nós estamos trabalhando nela e ela será modificada. Mas, se ela está sendo apresentada é claro que ela serve para discussão.

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Izabel Maria Madeira de Loureiro MaiorCoordenadora da Corde

Eu só queria lembrar que o Conade formou uma Força Tarefa que trabalhou durante uma semana e entregou ao deputado Celso Russomano, que foi o único parlamentar convidado que não se fez representar nessa Mesa. Se ele não podia vir, deveria ter mandado um assessor seu. Como ele é o Relator da matéria na Câmara nós lhe entregamos uma avaliação preliminar dos pontos mais preocupantes. Então, a Câmara poderia também trabalhar essa questão. No entanto, a única modificação apresentada até agora foi no título. Portanto, nós temos que tomar cuidado também com a relatoria. Na verdade, parece-me que ele foi um pouco apressado ao apresentar a Minuta, porque, pelo que sei, nem todos os parlamentares tinham conhecimento do conjunto. Eles até conheciam alguns dos seus capítulos, mas não tinham conhecimento do conjunto. Então, eu peço uma atenção especial da Câmara, porque nós sabemos que isso só vai ser acrescentado quando for o momento adequado.

Ele não apresentou esse texto, oficialmente, aos sub-relatores e nem à Comissão. Então, vocês têm que tomar bastante cuidado em relação a essa questão. A Simone também estava lá naquela reunião. Foi uma reunião bastante tensa. Seria bom que nós voltássemos, não para brigar porque brigar não adianta nada, mas sim para melhorar todo aquele conteúdo que está na proposta da Câmara. Se existe na Câmara uma Minuta de estatuto que ainda não foi apreciada pela Comissão, nós temos que demonstrar essa preocupação.

E as propostas não podem ficar na espera da mobilização de todos os Estados e do Distrito Federal. Para conseguir fazer essa conferência nós levamos um ano solicitando apoio dos conselhos e fóruns. Então, eu acho que as instituições e os conselhos instituídos têm que começar a discutir essas propostas para enviar contribuições, assim como os próprios cidadãos também. Só assim poderemos ter uma minuta cada vez mais aprimorada.

Obrigada!

Maria DoloresAssessora do senador Eduardo Azeredo

Eu quero agradece por todas as contribuições que foram feitas aqui e dizer que a minuta do estatuto está na internet justamente para que surjam contribuições. Como a Evanilde comentou, nós já estamos aperfeiçoando o processo, porque a discussão não ficará apenas na Subcomissão de Assuntos Sociais e passará a ser discutida também na Comissão de Direitos Humanos.

Por outro lado, eu concordo com a alternativa sugerida pelo Leonardo e acho que a própria Câmara e o próprio Senado podem discutir estratégias para estimular as Assembléias Legislativas a fazerem conferências em nível local, em apoio a nosso trabalho no Senado.

Então, eu acho que tem um lado importante para todos nós. A participação e as contribuições não se fazem somente através da crítica. Tem que haver críticas e propostas também. A intenção é que quanto mais grupos participativos surjam, melhor será. Eu acho que a Comissão estará refletindo sobre isso. Então, os nossos agradecimentos e nós estaremos à disposição lá na Subcomissão de Assuntos Sociais.

SimoneConsultoria da Câmara dos Deputados

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Eu pedi para me pronunciar porque eu sou da consultoria legislativa da Câmara dos Deputados e fui designada assessora da Comissão Especial e indicada para trabalhar com o Relator. O deputado Celso Russomano não pôde vir e me pediu para representá-lo. Entretanto, já que estavam aqui o deputado Eduardo Barbosa e o deputado Leonardo Mattos, nós achamos que eles já o estariam representando e não havia necessidade de me pronunciar também.

Quanto à minuta, já existe uma nova versão, mas eu fui uma das pessoas que falou para o deputado Celso, que seria melhor não tumultuar colocando-a antes da conferência. Eu tenho a versão aqui, mas achei mais viável disponibilizá-la no site esta semana.

Paulo PaimSenador

Eu vou fazer uma colocação muito rápida. Pediram-me para explicar o que nós poderíamos fazer para que os dois estatutos se convertam em um somente. É claro que são vocês que têm que refletir sobre isso. Quando das discussões do Estatuto do Idoso a polêmica era a mesma: “vamos perder os nossos direitos”. Perguntem aos companheiros que fizeram a Política Nacional do Idoso se eles acham que o Estatuto do Idoso não avançou muito mais do que a política que existia na época.

Eu entendo que é natural o receio que vocês têm. Eu fiquei muito feliz com a fala da Dra. Izabel, porque nós conversamos muito e entendi que nessa Mesa é unanimidade que devemos ter o estatuto. Todavia, o que está em debate é qual é a época que nós entendemos que ele estará maduro para ser votado, consolidado e aprovado, e que represente efetivamente a visão do movimento. Isto sim é muito bom.

Eu saio muito feliz daqui porque ninguém tem dúvidas sobre isso. Vocês podem pensar: “por que esse cara inventou esse tal de estatuto?”. A minha irmã ficou cega há mais ou menos 15 anos e eu já era deputado federal. Ela me perguntou o que eu já tinha feito nessa área e eu me dei conta de que não tinha feito nada. Eu fui verificar e vi que havia algumas leis esparsas e perguntei à consultoria da Câmara dos Deputados na época: “O que eu posso fazer para trabalhar mais nessa área?” E me disseram: “Paim, acho que você poderia pegar todos esses decretos, portarias e colocar tudo em uma coisa só”.

Eu não inventei isso. Foi sugestão da consultoria da Câmara dos Deputados. Eles me sugeriram que eu poderia colocar tudo em um único instrumento, fazer alguns seminários e foi assim que o estatuto surgiu. Inicialmente, com muitas imperfeições. Eu sei que a Corde e o Conade criticaram muito a primeira versão, e o fizeram corretamente, mas isso foi muito importante porque suscitou um grande debate em nível nacional. Eu apresentei novamente ao senador Flávio Arns e ele me disse que a idéia era boa, mas ainda havia uma série de problemas. Entretanto, ele iria apresentar para debate assim mesmo. E hoje eu vejo que, depois desses longos debates, nós estamos avançando muito.

Eu queria aqui dizer para todos vocês que esse é um momento muito rico, porque a pergunta que nós teríamos que fazer “ e que eu espero que a plenária de manhã reflita “ é sobre a versão que nós devemos encaminhar. Se vocês entenderem que é importante fundir as duas versões, vamos fazer isso. Daí, vocês analisem e, se acharem que a fusão ficou boa, nós aprovamos logo. Se entenderem que não ficou boa, ela pode voltar para a outra Casa ainda e passar por outra discussão. Então, nós ainda temos no mínimo mais três votações em Plenária. Esse é o processo.

Eu digo a vocês que parte do texto contempla exatamente o que está sendo discutido. Eu conheço o trabalho que o Leonardo, presidente da Comissão, está fazendo e ele está se propondo agora a viajar pelo Brasil todo, se for necessário. O guerreiro deputado Eduardo Barbosa viajou o País, junto com o Silas Brasileiro, para aprovar esse Projeto. Fizeram um belíssimo trabalho. O Eduardo Azeredo, presidente da Comissão, está fazendo um belíssimo trabalho também. E eu fiquei muito feliz aqui, Dr. Ricardo, de ouvir as suas argumentações sólidas, firmes, com muita clareza, não deixando dúvida quanto à importância desse debate. Eu somente quero dizer a todos vocês que o Estatuto somente será aprovado

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se ele significar um avanço em relação à legislação vigente e se ele acompanhar, inclusive, a Convenção Internacional. Nesses moldes, nós somos a favor do Estatuto; é isso.

E digo mais para vocês: o Senado não aprovará nada sem ter a lavra do Flávio Arns e do Azeredo. Eu estarei ao lado deles, porque, como presidente e relator, eles estão trabalhando dia e noite. Então, percam o medo e apostem que o estatuto será um avanço, não por mérito nosso, mas por mérito de vocês, que trabalham nesse tema há tanto tempo. O mérito também é de vocês. Quando o Estatuto ficar pronto, ele será uma conquista da sociedade. O Congresso somente fez a sua parte.

Eu saio daqui muito feliz, com muita energia para lutar pelo estatuto de vocês, mas vocês é que darão à última palavra.

Muito obrigado!

Regina Maria Melo AtallaConselheira do Conade

Bom, gente eu agradeço a vocês. Eu quero informar que o meu e-mail é [email protected]. Quem estiver interessado no texto da Convenção Internacional como subsídio a essa discussão basta me solicitar que eu envio por e-mail.

Obrigada a todos!

4.4 Tema: Passe Livre Interestadual

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

Boa noite!

Meu nome é Magdo Soares. Eu sou do Ministério dos Transportes, onde Coordeno o Programa “Passe Livre”. Nós vamos fazer uma explanação da situação do Passe Livre, o que temos, o volume que temos trabalhado e as dificuldades que temos encontrado. Depois vamos abrir para perguntas específicas de vocês.

O que é o Passe Livre? O benefício do “Passe Livre” é o transporte gratuito para pessoas portadoras de deficiências e comprovadamente carentes nos serviços de transporte interestaduais de passageiros, nos modais rodoviário, ferroviário e aquaviário. Considera-se carente a família com renda familiar per capita de até um salário mínimo. O “Passe Livre” não dá direito a acompanhante. Na legislação não foi previsto acompanhante.

Para divulgação do programa nós temos vários pontos. Para as pessoas que moram aqui em Brasília e no Entorno há um posto de atendimento no Setor de Autarquias Norte. O programa não está direcionado para atendimento em balcão e sim em nível de Brasil; por isso, trabalhamos exclusivamente com os Correios. A pessoa nos envia uma carta ou qualquer documento para nossa Caixa Postal, nº 9800, CEP 70.040-976 e nós mandamos o material de divulgação para a pessoa interessada; ou pelo e-mail [email protected]. Temos também o site www.transportes.gov.br, que é do Ministério dos Transportes. Neste site temos todo o material de divulgação. Temos o modelo de atestado médico e de requerimento, manual de instrução para o usuário; enfim, todas as informações necessárias para que qualquer pessoa, de posse da documentação que ela processou, nos encaminhe para análise. Esse mesmo material que está disponível na internet é o mesmo que distribuímos pelos Correios. Esse material pode

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ser enviado via Correios, mas quem mora aqui em Brasília pode pegá-lo no nosso endereço ou ainda via internet. Nós não temos condições de fazer a inscrição via internet, porque há a exigência de que o médico assine o Atestado Médico e que o requerente faça a Declaração de Renda.

Qual é a legislação básica do “Passe Livre”? Os principais documentos são: a Lei nº 8.899, de 29 de julho de 1994; o Decreto nº 3.691, de dezembro de 2000; o Decreto nº 3.298, que define o que é pessoa portadora de deficiência. Esse Decreto, que dispõe sobre a acessibilidade, teve o seu art. 70 alterado para aperfeiçoar o conceito de pessoa portadora de deficiência. Temos também três Instruções Normativas. que versam sobre os procedimentos administrativos do programa “Passe Livre” junto ao Ministério dos Transportes. Uma delas versa sobre o transporte terrestre rodoviário e ferroviário, e outra trata do transporte aquaviário. E temos também a Portaria nº 275, da Secretaria de Atenção a Saúde, do Ministério da Saúde, que aprovou o modelo de atestado médico da equipe multiprofissional do SUS a ser preenchido.

Quais são as exigências para se habilitar ao benefício? É necessário que se faça um requerimento ao Ministério dos Transportes, onde conste a renda familiar per capita, e que se junte cópia de um documento de identidade e um atestado médico constando o Código Internacional de Doença, que é o CID 10. A deficiência deve ser caracterizada pelo CID, de acordo com o Decreto nº 3.298, consoante a alteração já mencionada antes. Portanto, a habilitação ao “Passe Livre Interestadual” é relativamente simples. Com essa documentação do requerente nós vamos formar um processo. Se a pessoa tem direito ou não, mostrado mais adiante.

Em seguida essa documentação será por nós analisada. Se o requerimento for deferido damos seguimento e imprimimos a credencial. Se for indeferido nós enviamos uma carta para o requerente explicitando a razão do indeferimento. Todavia, há a possibilidade de o processo não ser deferido logo após analisado, quando verificarmos que há pendência(s) a serem sanadas. Nesse caso, remetemos pelo Correio uma carta ao requerente para que adote as providências pertinentes e ficamos no aguardo de sua resposta. Quando a(s) pendência(s) for sanada voltamos ao início e refazemos todo o processo. Por isso é que fazemos quase tudo pelo Correio.

Hoje estamos com 240 mil processos analisados, ou seja, noventa por cento(90%) dos nossos atendimentos são todos feitos pelo Correio. Na seqüência de um requerimento de p”Passe Livre” temos, basicamente, três posições: 1) se o processo for deferido imprimimos a credencial e enviamos pelo Correio por carta registrada e acompanhamos o recebimento dessa credencial pelo interessado via Correio, na Interne. 2) Se for indeferido, mandamos uma carta para o requerente com as devidas justificativas. 3)se cai em exigência, realimentamos o sistema.

Agora vamos, em linhas gerais, abordar a situação geral do programa ‘Passe Livre”. No início do programa - que foi lançado em abril de 2001 - nós tivemos algumas dificuldades de atendimento. Recebemos um volume muito grande de material e nossa capacidade de atendimento estava muito aquém da demanda. Depois de três meses do lançamento do programa, o Ministério chegou a receber 2.000 pedidos por dia. A nossa capacidade de atendimento não atingia nem 100 processos por dia. Então isso gerou uma série de dificuldades. O Ministério começou a desenvolver programas de informática para acompanhar o Passe Livre e hoje finalmente conseguimos superar todos esses problemas, mas até tirar todo esse atraso foi um trabalho bastante difícil. De abril de 2001 ao final de 2001, nós já havíamos distribuído 130.000 kits para os interessados. Esse número foi caindo e depois se estabilizou mais ou menos na ordem de 45.000 até 2005. Hoje, considerando o acumulado até dezembro de 2005, nós temos um total aproximado de 310.000 kits que já foram distribuídos.

Do material enviado o que recebemos de resposta? Acontece muito de a pessoa solicitar o kit, analisar e depois vê que não se enquadra, ou realmente não é o que ele estava buscando. De 2001 até 2005, dos 300.000 requerimentos que enviamos, recebemos mais ou menos 200.000 documentos. Em 2001, que foi o nosso momento inicial, em sete meses recebemos 60.000 documentos. Isso gerou toda aquela dificuldade que tivemos inicialmente. Depois começou a oscilar entre 40.000 a 50.000 documentos. Houve um acréscimo em 2003, mas depois, a quantidade de material se estabilizou. Parece

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que houve uma consciência maior e o material que estava sendo distribuído estava voltando em requerimento.

Em 2001 analisamos sete mil documentos. Foi a partir daí que começou a gerar um atraso nessas análises. Mas depois conseguimos evoluir e, em 2002, nós já estávamos com o programa de informática em teste e conseguimos passar para 80.000 documentos e, em 2005, analisamos 140.000 processos.

O programa Passe Livre conta hoje com cinqüenta pessoas entre estagiários e servidores do quadro do Ministério. Temos uma capacidade de análise mais ou menos de 500 a 600 processos por dia. Então, a cada mês analisamos na ordem de dez a doze mil processos tranqüilamente. O sistema é todo informatizado e o analista não tem condições de interferir diretamente na análise do processo. Quando a documentação chega, abre-se um processo desse requerimento, essa documentação é checada e toda digitada e transferida para o programa específico do Passe Livre. O analista que é uma pessoa do quadro do Ministério, pega o processo, através de uma senha abre o processo e vai fazer um checklist de todas as respostas que o sistema vai perguntar para ele, item por item. Ao fim da análise, o próprio programa dá o resultado para ele. Quando o processo é deferido, ele confirma, libera o processo ou o sistema coloca o processo em exigência e aponta o que está faltando. Se for documento, ou número do CID, assinatura, o analista indefere o processo e diz por que está indeferindo. O analista encerra o programa, arquiva o processo e o banco de dados vai gerar o resultado que tem. Ou seja, se o processo for deferido, vai imprimir a carteirinha, uma carta de encaminhamento, uma etiqueta, uma relação para o Correio aonde temos o controle de cada credencial que foi emitida. Se o processo foi indeferido, em geral, é encaminhada uma carta ao requerente. No caso do processo cair em exigência, o procedimento é o mesmo.

Vocês podem perguntar por que 308.000 processos analisados e apenas 240.000 processos concluídos. O problema é que há alguns processos que nós já tivemos fazer várias revisões. Quando o processo é colocado em exigência, a pessoa tem que reencaminhar nova documentação e o processo é submetido a uma revisão. Esse é um direito que a pessoa tem. No caso de solicitação de 2ª via devido a extravio ou danos na carteirinha, o interessado deve fazer uma justificativa ou uma ocorrência na delegacia, nos encaminha e nós enviamos uma 2ª via para ele.

Inicialmente nós trabalhávamos recebendo o material. Agora nós invertemos a situação. Em 2001 emitimos 3.700 credenciais. Depois fomos aumentando ao longo dos anos e, em 2005, já emitimos 56.000 credenciais. A credencial é preenchida no Ministério. Desde o início do Programa até dezembro de 2005, já foram emitidas 124.000, incluindo 2ª via. O Passe Livre é um documento impresso pela Casa da Moeda e nós só preenchemos os campos vazios. O número vem amarrado pela Casa da Moeda, nós preenchemos a data de emissão, o número do documento de identidade e a data de vencimento. O Passe Livre é emitido com validade por três anos e depois de vencido ou trinta dias antes do vencimento, o interessado pode solicitar a renovação. Para isso, ele precisa refazer toda documentação. É necessário um novo atestado médico e novo requerimento. Não precisa de documento de identidade porque já consta no processo anterior. Por que ele precisa de novo atestado e novo requerimento? Porque tem a possibilidade de mudança de renda e porque algumas deficiências podem sofrer algum tipo de alteração.

O Passe Livre, como foi dito anteriormente, é um documento emitido pela Casa da Moeda e ele tem alguns itens de segurança que dificulta a falsificação. Mas infelizmente, ainda temos alguns processos relacionados à falsificação. Qual o nosso procedimento quando recebemos a denúncia por parte da empresa de transportes? Nós verificamos o documento, abrimos um processo e encaminhamos para a Polícia Federal, que é o órgão que acompanha processos de falsificação no nível de Governo Federal. Temos também casos de uso indevido. Por exemplo, o beneficiário apresenta a sua credencial na empresa de transporte e tira a autorização de viagem e dá para outra pessoa viajar; Quando a pessoa vai embarcar, o motorista constata que essa pessoa não é o beneficiário do Passe Livre. Nesse caso o sistema é o mesmo. Ele aciona o segurança do terminal, montamos o processo e encaminhamos para a Polícia Federal para que sejam tomadas as devidas providências.

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Vamos falar agora do uso do benefício. As empresas de transportes rodoviário de passageiros, do transporte aquaviário e do transporte ferroviário, disponibilizam dois lugares nos veículos tipo convencional para uso do Passe Livre. Esses dois lugares ficam disponíveis até três horas antes do horário da partida. Depois, esgotado esse horário, caso não apareça nenhum Passe Livre, a empresa pode comercializar esses lugares. No caso da empresa não disponibilizar para o horário e dia pretendido pelo solicitante, ela deve disponibilizar para outro horário ou outro dia.

O Passe Livre não pode ser usado em deslocamentos intermunicipais ou urbanos. Às vezes, a pessoa acha que, por ter viajado em determinada empresa de um estado para o outro, ela tem o direito de se deslocar dentro do estado naquela mesma empresa. Às vezes a mesma empresa operadora faz dois sistemas diferentes, um para o transporte interestadual e outro para o intermunicipal. O Passe Livre intermunicipal, é de competência do município; o nosso é só interestadual. Não existe restrição quanto ao número de viagens, a pessoa pode viajar quantas vezes ela quiser. A bagagem e os equipamentos necessários à locomoção do beneficiário do Passe Livre devem ser transportados gratuitamente em local de fácil acesso. No caso da bagagem normal, seguimos o regulamento de cada modal de transporte, rodoviário ou ferroviário no que diz respeito ao transporte de bagagem, ou seja, dimensão, peso e tipo do material que é transportado.

Existe uma legislação específica no transporte rodoviário, ferroviário e aquaviário para o transporte de bagagem; E o beneficiário do Passe Livre está sujeito à mesma legislação. Como eu já havia falado, o Passe Livre não dá direito a acompanhante. A nível de Ministério dos Transportes, o programa “Passe Livre” tem um custo com material em geral, correio etc., da ordem de R$ 30.000,00/mês.

Quais as dificuldades operacionais que temos? Como eu já havia falado, no início do programa houve um grande volume de material recebido causando uma enorme dificuldade de atendimento. Chegamos a receber, em 2001, 60.000 pedidos e conseguimos analisar apenas 10.000 processos. Havia uma baixa capacidade de análise no início do programa porque o sistema ainda não era informatizado. Além disso, havia uma grande quantidade de documentação incompleta gerando duas análises, com apresentação de laudo médico indicando um CID que não caracterizava a deficiência. É muito comum o médico indicar o CID que caracteriza a doença e não a deficiência; e isso gera exigência no processo.

Quais as dificuldades que o usuário do Passe Livre tem encontrado para usar esse benefício?

• Desconhecimento da legislação do regulamento de transporte de passageiros interestaduais, rodoviário, ferroviário e aquaviário. Ele não tem conhecimento do que é um transporte interestadual, como ele opera, quais os direitos que o usuário tem, como funciona o sistema. Isso gera uma interpretação errada dentro do direito e condições de usar o Passe Livre.

• Tendência de solicitar viagens nos serviços intermunicipais e interestaduais, principalmente quando esses serviços são operados pela mesma empresa de transportes.

• Acompanhante do beneficiário menor, com até cinco anos de idade, pretendendo viajar gratuitamente com o filho no colo. É o caso do pai ou da mãe que solicita a credencial de Passe Livre para o menor de cinco anos; Não teria necessidade disso. Essa é uma opção dos pais e nós não temos nenhuma restrição, mas o próprio regulamento de transportes de passageiros fala que qualquer criança, menor de cinco anos de idade, desde que não ocupe lugar, não paga passagem. Então o que acontece com o Passe Livre? A mãe requer uma credencial para o filho menor de cinco anos e depois ela quer viajar com o filho no colo sem que ela pague a passagem. A legislação não dá cobertura para isso, porque dentro do veículo cada pessoa deverá estar identificada; E quem vai estar identificado nesse caso, é o menor beneficiário do Passe Livre.

• Atualização de endereço. A pessoa faz o pedido ao Ministério dos Transportes e quando respondemos, nossa carta não chega ao endereço do interessado e o processo fica parado.

• Dificuldades operacionais que afetam as transportadoras. Beneficiários do Passe Livre com problemas mentais, viajando sem acompanhante. As empresas têm tido alguns problemas

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com o credenciamento de pessoas com problemas mentais quando eles tentam viajar sozinhos. Em alguns casos, pela própria deficiência, eles tendem a ser agressivos dentro do veículo, e isso tem gerado algumas dificuldades para as empresas operadoras.

• Dificuldades no trato com beneficiários cadeirantes durante a viagem, nos pontos de embarque e desembarque. Em muitos casos, o cadeirante viajando sozinho, tem dificuldades de se locomover gerando alguns problemas para a empresa transportadora.

• Beneficiários do Passe Livre, solicitando autorização de viagem para vários horários no mesmo dia. Um Passe Livre mal usado pode gerar uma série de dificuldades para o sistema. E o que acontece aqui conosco? É muito comum chegar um beneficiário do Passe Livre nos terminais rodoviários e marcar a viagem em vários horários diferentes. Isso acaba acarretando problemas para as empresas porque o beneficiário está reservando um horário que, muitas vezes, não vai ser usado, tirando assim a oportunidade de outra pessoa poder usar naquele horário. Nesse caso, existe a condição do mal uso no Passe Livre e isso gera uma carga grande do sistema de transporte de passageiros com prejuízo para outros beneficiários.

• Tentativa de uso do Passe Livre com carteiras emitidas por associações ou organizações não-governamentais. É muito comum a pessoa chegar na empresa de transportes com a carteira de portador de deficiência de uma associação de um município ou estado e tentar conseguir a passagem. Não existe a menor possibilidade de isso acontecer porque a legislação exige que o beneficiário do Passe Livre seja credenciado pelo Ministério dos Transportes através de todo um processo. A carteira de beneficiário de uma associação ou de uma instituição não governamental não dá direito ao uso do passe livre.

• Excesso de viagens para o mesmo beneficiário sempre com a mesma origem e para o mesmo destino. Entra na mesma condição de uso indevido. Por não ter custo para o beneficiário ele vai e volta para o mesmo destino, muitas vezes por semana ou por mês. Existe um excesso de uso, onde pelas experiências que temos tido, não caracteriza nenhuma necessidade, e sim um uso inadequado.

• Viagens seqüenciais entre várias cidades caracterizando turismo, tipo norte sul. Nós recebemos da empresa uma relação informando quem viajou e quais os dias. É comum pegarmos um passe livre de uma pessoa e ver que ele viajou de Belém para Fortaleza, de Fortaleza para São Luiz, de São Luiz para o Rio de Janeiro dando a entender que essa pessoa está fazendo turismo. Nós sabemos que esse é um direito que a pessoa tem, mas caracteriza um uso não muito adequado do Passe Livre.

• Grande quantidade de viagens aos pontos de fronteira, como por exemplo, Foz do Iguaçu com possível uso do Passe Livre, para compra de mercadorias contrabandeadas. Nós temos um volume muito grande de ligações voltando exatamente para a zona de fronteiras. É um uso indevido também.

• Dificuldades operacionais que afetam as transportadoras. Falta de treinamento por parte das empresas de ônibus. As empresas de ônibus normalmente usam grande quantidade de funcionários e esse treinamento não tem chegado lá na ponta. A pessoa na cidade do interior, não tem conhecimento da Legislação do Passe Livre e, assim, não sabe como proceder ao atendimento.

• Centralização do atendimento do Passe Livre apenas em determinados pontos de venda de passagem, principalmente, nos casos de agências terceirizadas. Isso é um erro por parte da empresa transportadora, porque a legislação fala: “A autorização de viagem deve estar disponibilizada nos pontos de vendas”.

• Exigência de cópia do documento do beneficiário para emissão de autorização de viagem. Algumas empresas costumam pedir uma cópia da carteira de Passe Livre, chegando a negar a autorização caso a pessoa não tenha a cópia. Isso é um erro da empresa e temos batido em

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cima disso. Se a empresa quiser tirar cópia para manter um cadastro das pessoas que usam os serviços dela, ela mesma tem que tirar a cópia não podendo exigir isso do beneficiário.

• Atrito entre funcionários das transportadoras quanto à autenticidade da credencial e do direito do beneficiário do Passe Livre, principalmente quando se trata de deficiência não aparente. Em alguns casos, o motorista vê a pessoa, um deficiente auditivo por exemplo, que não está aparente o motorista por sua livre e espontânea vontade entende que o documento de Passe Livre é falsificado, entrando em atrito com o usuário. Isso também, tem gerado algumas dificuldades na operação do Passe Livre.

• Exigência de pagamento e alimentação no transporte, ou taxa de embarque nos terminais, principalmente na Região Amazônica. A legislação do Passe Livre garante o transporte, mas ela não garante a taxa de embarque e nem o rateio de pedágio. Isso é uma cobrança extra, inclusive do passageiro pagante. Esses valores são relativamente pequenos. Nós estamos falando de R$ 0,30 ou R$ 0,50 ou R$ 1,00, num total de passagem que custa R$ 60,00, por exemplo. Algumas empresas desconsideram isso; outras empresas, colocando dificuldades, fazem a exigência do pagamento da taxa de embarque e do pedágio em separado. Pela legislação a empresa não está errada, porque o Passe Livre garante o transporte e não o uso do terminal e o uso do pedágio.

Nós começamos o Programa em 2005, e temos algumas metas desenvolvidas pelo Ministério dos Transportes:

• Realizar o atendimento dos pedidos do Passe Livre dentro do prazo de 15 dias a partir da data do registro, como prevê a legislação. Isso, nós já estamos fazendo. Um requerimento que entra hoje no Ministério, dentro de quinze dias ele já está sendo analisado e mandamos a resposta ao solicitante. Essa meta nós atingimos, mas ela prevalece porque queremos continuidade nisso. Tem determinados meses em que recebemos um volume maior e temos que aumentar a capacidade de análise para que prevaleça o cumprimento da meta.

• Elaboração de convênios de descentralização. O Ministro dos Transportes esteve aqui na abertura da conferência e comentou sobre isso. O Ministério pretende fazer descentralização aos estados e quem sabe até aos municípios para que o requerimento do Passe Livre, possa ser analisado no próprio estado do requerente; Isso seria uma facilidade a mais que vai acelerar a quantidade de atendimento das pessoas e vai melhorar muito. Nós temos 240.000 processos, mas estamos trabalhando com um potencial de pessoas, na ordem de um milhão e meio.

• Revisão da legislação do Passe Livre. A legislação do Passe Livre foi elaborada em 2001 e hoje já sentimos a necessidade de fazer algumas adequações, algumas adaptações que atinjam melhor o usuário, que feche melhor com a empresa e facilite o trabalho do Ministério. Então temos que ver: melhores benefícios para o usuário; melhores condições de controle das empresas transportadoras e melhor condição administrativa do próprio Programa, inclusive a descentralização.

• Implantação de um serviço de fiscalização das transportadoras e do uso do benefício do Passe Livre, por parte do beneficiário. É aquilo que já falamos. A transportadora, às vezes, inventa alguma regra para ceder a autorização de viagem e o usuário do Passe Livre também arruma alguma coisa que aponte para o uso indevido do Passe Livre.

• Elaboração do anuário estatístico do Passe Livre, que estamos fazendo. Nós já temos esse material dentro do Ministério, que seria fazermos uma demonstração de como está sendo a utilização desse benefício, para que nós possamos ampliar, melhorar e adequar o atendimento.

• Ampliar o programa do Passe Livre, por meio da descentralização, com propaganda em rádios, televisão, jornal, etc.

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Essa é a visão geral do Passe Livre. Eu me coloco à disposição dos senhores e das senhoras caso queiram fazer alguma pergunta, comentário ou alguma observação. Obrigado.

Argemiro Medeiros de SouzaPresidente da Associação dos Deficientes Físicos de São Luiz – MA

Tenho alguma coisa a questionar com relação à explanação que ouvi. Esse prazo de 15 dias, no nosso estado, não acontece. Minha carteira demorou dois anos e oito meses, para chegar em minhas mãos. Primeiro me mandaram uma carta pedindo cópia da minha identidade. Eu enviei cópia de todos os documentos e o original do laudo médico acompanhado do meu cadastro no Hospital Sarah Kubtscheck e também do Passe Livre Municipal, e ainda assim esperei mais um ano e cinco meses. No total esperei dois anos e oito meses para receber a minha carteira. Eu sugeri no meu estado que a descentralização de emissão do Passe Livre, fosse feita pelo DNIT, que hoje é o órgão que substitui o DNER. Porque lá eles fornecem os formulários, mas não dão nenhuma informação com precisão, para que nós possamos fazer uma tramitação mais rápida e segura.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

Eu comentei que no início do programa nós tivemos uma série de dificuldades. Chegamos a receber 2.000 pedidos por dia e tínhamos uma capacidade de análise 100 documentos. Isso gerou uma dificuldade, um atraso e, em alguns casos, chegou a demorar mais de um ano. A maior dificuldade que temos tido, é que reenviamos o documento, respondemos a carta e a pessoa não nos responde.

Nós enviamos as credenciais e 10.000 foram devolvidas ao Ministério. Algumas estavam com endereço incompleto, outras a pessoa já não morava mais no endereço informado. Nós temos 113.000 processos em exigência e mandamos carta para todos esses requerentes. Desses 113.000, 97.000 ainda não nos responderam. Há processos em que o requerente demora dois anos para nos responder. Nós temos um total de 11.000 cartas que já foram enviadas e voltaram. Ou seja, nós reconhecemos que houve realmente um atraso no início do programa, mas agora, isso não existe mais. O que há é realmente alguma dificuldade de operacionalização por conta de exatidão das informações. Muitas vezes, a pessoa mudou de endereço e não fez atualização conosco. Esse talvez seja o motivo da demora.

Arcelino Arce Mato Grosso do Sul

Minha carteira venceu dia 07/11/2005. Eu fiz todo o processo de renovação em outubro e me devolveram. Procurei o mesmo médico que havia me atendido da primeira vez, pedi a ele que corrigisse o CID, mandei de novo todo o processo e voltou uma carta para Dourados dizendo que o CID estava errado. Telefonei para o atendimento no Ministério e me informaram que realmente o CID não caracterizava deficiência física. Fui ao médico novamente, ele fez um atestado carimbou, assinou, mas ainda assim não adiantou. Peguei fotos que comprovavam minha deficiência enviei mas, ainda assim, voltou uma carta dizendo que eu não era deficiente. Juntei, pela terceira ou quarta vez, tudo que pudesse comprovar minha deficiência. Além de documentos e atestados enviei também fotos de jornais, revistas, inclusive uma foto da minha participação na corrida de São Silvestre e até hoje não consegui renovar minha carteira. Sem contar que os números de telefones que tenho não atendem mais.

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Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

A legislação determina que só serão aceitos atestados médicos, requerimento e documento de identidade. Fotografia não classifica como deficiente. No início do programa a análise de atestados médicos era manual. Então, uma declaração do médico nos orientava e nós podíamos trabalhar em cima dessa orientação. Hoje o sistema é todo informatizado e, se o médico não colocar o CID que caracteriza a deficiência, a solicitação não passa no sistema. Eu cheguei a comentar que existe uma tendência muito grande do médico colocar a doença e não a deficiência.

Vou citar um caso que aconteceu. Uma senhora nos solicitou o Passe Livre e no atestado médico o CID era de câncer ósseo, ou seja, da doença e não da deficiência. Por três vezes foi e voltou o atestado informando sempre a mesma coisa. Até que um dia, ela resolveu nos mandar uma fotografia. Ela tinha uma perna amputada. De posse dessa fotografia fizemos uma carta para ela, juntamos os atestados que ela havia nos enviado e pedimos a ela que conversasse com o médico para que ele colocasse o número específico do CID que caracteriza membro amputado. E isso pode estar acontecendo com você. O CID que seu médico informou pode ser que não caracterize a deficiência e sim a doença. A legislação diz o seguinte: Trinta dias antes de vencer a credencial, o interessado deve mandar novo atestado e novo requerimento. Por que trinta dias? Porque é o prazo suficiente para que o documento chegue, para que nós possamos fazer a análise do processo e encaminhar uma nova credencial antes do vencimento.

Marina Felismina dos SantosParaíba

Boa noite a todos. Trabalho na Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência, com a questão do Passe Livre municipal e intermunicipal, mas também orientamos as pessoas que nos procuram pedindo esclarecimentos com relação ao Passe Livre Interestadual. Na verdade, o que temos visto são muitas pessoas que já enviaram sua documentação há mais de dois anos e ainda não tiveram nenhuma resposta se os pedidos foram aprovados ou não. Eu gostaria de saber que tipo de orientação poderia ser dada a essas pessoas.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

Nós já recebemos 4.800 pedidos de Passe Livre da Paraíba. Desses 4.800, temos apenas 75 processos pendentes de análise. Desses 4.800 processos, nós enviamos as credenciais referentes a 2.870 processos e 193 credenciais foram devolvidas pelo correio e até hoje nenhum interessado entrou em contato conosco. Tivemos 1.700 processos com exigências. Enviamos cartas para todos eles e ainda temos 1.459 processos sem resposta. Nós pedimos a todas as pessoas que deram entrada no pedido de Passe Livre, a gentileza de procurarem manter o endereço atualizado. Estamos citando o caso da Paraíba, porque foi o que ela citou; Mas isso é geral. Na maioria dos processos que temos, 50% são aprovados e entregamos as credenciais e os outros 50% caem em exigência. Dos 240.000 processos dos quais recebemos a documentação, só emitimos 110.000 credenciais. O restante está em exigência.

Silas

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Pará

Eu acho que o Ministério dos Transportes deveria ter colocado um stand para atender as pessoas que vieram para a Conferência Nacional, até porque, nem todos podem estar aqui ouvindo a palestra. Seria interessante que, no intervalo, essas pessoas pudessem passar no stand e pegar as orientações. Vários delegados trouxeram a documentação para requerer o Passe Livre. Alguns estão esperando há dois anos. Eu gostaria de saber o seguinte: há possibilidade de segunda-feira de essas pessoas já saírem daqui de Brasília com o seu Passe Livre em mãos?

Amaury Souza Filho Pará

Em nossa região, os meios de transportes mais comuns são aquaviários e as distâncias são muito longas. Uma viagem Belém/Manaus dura em torno de sete dias; de Belém para o Acre leva de quinze a vinte dias. O que acontece é que o Passe Livre não tem aceitação pelos donos das embarcações, em razão do pagamento da alimentação. É diferente do sul e do nordeste em que os ônibus param em restaurantes. No barco não tem como parar, ou você paga a alimentação ou faz um regime forçado. Nós entendemos que o transporte é gratuito, mas por uma razão que é peculiar a Amazônia, a alimentação também deveria ser gratuita. Uma passagem de Belém para Manaus custa R$300,00 e eles cobram em torno de R$150,00 de alimentação. Quando a pessoa não pode pagar, ela fica detida no barco e alguém precisa ir lá e pagar as despesas porque, senão, a pessoa não é solta. A outra questão é a dificuldade com relação a endereços. Muitas pessoas mandam a solicitação do Passe Livre com o endereço da associação, por não terem endereços residenciais. A maioria delas mora em áreas ribeirinhas e não têm endereço. Muitas vezes, o Ministério não aceita, porque tem que ser o endereço residencial do requerente. Outra coisa é que o senhor falou que não tem um quantitativo de passagens para o deficiente. Mas ao mesmo tempo o senhor disse ser inadequado o uso do Passe Livre para viagens ininterruptas de um estado para o outro. Afinal, é um direito ou não é um direito?

Magdo Soares Coordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

Por que não houve credenciamento aqui? Porque o objetivo da Conferência não é credenciamento, não é atender especificamente um ou outro programa a nível federal, estadual ou municipal, e sim um debate de idéias, de mudança de estatutos, regulamentos, uma série de coisas. Esta Conferência Nacional não tem como objetivo o atendimento de benefícios.

O segundo é que se têm delegados aqui que entraram com requerimento, nós vamos proceder a esse atendimento. Eu não tenho condição de parar um sistema e atender uma credencial com documentos que me chegaram hoje para eu atender amanhã, porque temos uma programação e um sistema informatizado que não me dá condições de parar tudo e fazer um atendimento. Se eu fizer isso, eu vou prejudicar todo o sistema. O que podemos fazer é corrigir cada caso, conforme as pessoas forem nos procurando. Eu não posso me comprometer em entregar credencial hoje e amanhã, mas vamos procurar corrigir erros, atualizar dados, etc.

Quanto ao problema na Região Amazônica e o transporte em barco, eu comentei aqui anteriormente que o programa garante o transporte, mas alimentação, taxa de embarque, e do pedágio não é transporte. Essa mesma dificuldade que nós temos, no transporte aquaviário, quanto à alimentação, nós temos também no transporte rodoviário quanto à taxa de embarque e com o pedágio. A legislação não prevê isso. Outra coisa, o transportador não recebe nada pelo transporte do Passe Livre, por isso, não podemos obrigá-lo a dar alimentação, já que o transporte é gratuito. Esse é um problema sobre o qual até

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já conversamos no Ministério e estamos buscando uma solução para essa situação. No caso do transporte rodoviário, o passageiro tem pontos de parada e no caso do transporte aquaviários não tem nada disso. A outra dificuldade é que, na maioria das vezes, a empresa de navegação não aceita que a pessoa leve o farnel, até por questões de segurança. Algumas pessoas insistem em acender um fogareiro dentro do barco e isso coloca em risco a integridade física de todos os outros passageiros. Essa é uma dificuldade que existe e é uma situação que tem de ser resolvida.

Então, o que estamos trabalhando hoje? Nós temos o transporte que foi garantido pela legislação, mas estamos descobrindo que há outras nuances nesse sistema, que deveriam ser previstas. Como as empresas de navegação não recebem nada pelo transporte, eles garantem o transporte por força de lei, mas a lei não diz que o transportador seja obrigado a dar alimentação aos passageiros.

Quanto à quantidade de passagem, quando você me pergunta se isso é um direito? É direito sim. Eu disse que a legislação não determina as quantidades, mas tudo aquilo a que se tem direito, tem também um determinado limite e o uso inadequado está prejudicando os próprios beneficiários do Passe Livre. Há aquele que está dando volta na fila e que está tirando a oportunidade de outros beneficiários. Foi por isso que eu chamei a atenção para a questão do mau uso, uso indevido e uso inadequado.

Em relação à questão do endereço, tudo tem o seu lado bom e o lado distorcido. Tivemos alguns casos, inclusive com interferência do Ministério Público, em que algumas associações nominavam as pessoas com o endereço da própria associação e obrigavam o credenciamento dessas pessoas junto à associação ou cobravam uma taxa para a entrega da credencial do Passe Livre. Foi por isso que houve uma determinação do Ministério Público para que se usasse o endereço residencial e não o endereço de associações. No caso de cidades pequenas, o documento vai para o posto dos Correios. Em alguns locais, não há entrega em domicílio porque o CEP é geral. Mas pelo volume de devolução que temos a maioria é por falta de atualização dos endereços. Quando o sistema usa o endereço residencial ele é mais seguro e mais perfeito porque evita o desvio. A associação é uma boa parceira do Ministério, dentro daquela condição de olhar se a documentação está em ordem, se não falta nenhum documento; ela pode mandar a documentação agrupada para ficar mais barato. Mas nós vamos mandar a credencial, mas para o endereço do requerente. Hoje nós fomos obrigados a colocar no nosso sistema a seguinte condição: se acontecer de ter dez solicitações de carteiras no mesmo endereço, nós colocamos esse endereço em cheque, para verificar a razão de tantos pedidos no mesmo endereço. O objetivo é dificultar a ação de pessoas que agem de má fé.

Vou aproveitar e citar um exemplo. Nós tivemos um caso de um agente que vendia a carteira. Ele mandava requerimentos sempre com o endereço dele. Certo dia, nós recebemos uma denúncia em que a pessoa reclamava que tinha que pagar R$ 50,00 para receber a carteirinha do Passe Livre. Fomos verificar e todas as solicitações estavam no endereço desse agente. Ele recebia a carteira e só entregava ao interessado, mediante pagamento.

Amaury Souza FilhoPará

Eu concordo com tudo isso que o senhor colocou, mas não podemos esquecer de um detalhe. Assim como existem entidades picaretas, existem também aquelas que trabalham com seriedade. Da mesma forma que existem aqueles que cobram um determinado valor para entregar a carteira ao beneficiário, as parcerias também podem utilizar isso como uma questão eleitoreira.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

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Foi por isso que eu comentei que as associações ao detectarem esses fatos, automaticamente, fizeram todas as mudanças. Inclusive, o envio de relação com atualização de endereços. Mas, infelizmente, o malandro não vai fazer isso. Ele quer tirar proveito da situação e por isso, fica caladinho. É preciso colocar regras para dificultar as ações de pessoas de má fé.

João Augusto Ferrari São Paulo

Gostaria de fazer uma pergunta com relação ao Passe Livre Estadual. Os renais crônicos e transplantados de São Paulo tinham Passe Livre. O Governador Geraldo Alckmin caçou o passe de todo esse pessoal. O que acontece? Essas pessoas têm que fazer sessões de hemodiálise três vezes por semana e os transplantados precisam retornar aos locais de transplantes quase que constantemente. Depois que foi caçado esse Passe Livre, essas pessoas têm tido uma grande dificuldade porque quando você se afasta do trabalho seu salário é reduzido e, ainda por cima, precisa arcar com todas essas despesas. Nós já tentamos de tudo para retornar o direito ao Passe Livre e ninguém consegue. Eu gostaria de saber se o senhor tem alguma informação de que maneira esse direito pudesse ser retornado a essas pessoas.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

No caso do transporte intermunicipal, o Ministério dos Transportes não tem como intervir porque é uma legislação estadual de competência do governo do estado. O transporte de passageiros tem três hierarquias diferentes. O transporte interestadual e internacional é da competência do Ministério dos Transportes: Legislação, regulamento, tarifa, fiscalização etc. O transporte intermunicipal é da competência dos governos estaduais através das suas Secretarias Estaduais de Transporte ou de agências específicas que fornecem a tarifa, inspecionam e controlam. E o transporte urbano é da competência das prefeituras. No caso do Estado de São Paulo eu já tinha sido comunicado sobre isso, mas infelizmente, nós não temos condições de intervir. O que deve ter acontecido é que a legislação sofreu alguma alteração, que imputou numa correção que antes dava o benefício ao renal crônico e depois entendeu que estava errado e suspendeu. No caso do Ministério dos Transportes foi ao contrário. Antes, o programa não contemplava o renal crônico, mas depois houve uma revisão por parte do Ministério da Saúde. Nós do Ministério dos Transportes fazemos o credenciamento e transporte e o Ministério da Saúde é quem faz o modelo de atestado e definição de deficiência. O Passe Livre envolve, Saúde, Justiça e Transportes. Houve uma revisão da legislação e incluiu o renal crônico, ostomizado e nanismo, que não eram contemplados. Inclusive, depois houve uma mudança no Decreto de Acessibilidade que mudou a definição das pessoas portadoras de deficiência, incluindo o renal crônico, o ostomizado e o nanismo. Infelizmente o Ministério dos Transportes não tem como intervir no Estado de São Paulo. É preciso ver primeiro a legislação, examinar o fundamento legal para o corte do benefício e, depois, se for o caso, procurar o Ministério Público. Vocês têm que lembrar que a legislação trabalha até um determinado tempo, mas se depois se descobre que tem um erro, o próprio legislador tem toda a condição de fazer a correção e readequar essa legislação. Se ela estava dando um benefício e descobriu que a legislação estava errada, voltou atualizou e corrigiu. Como também pode ser o contrário. Foi isso que aconteceu no Ministério dos Transportes. Nós não estávamos concedendo o benefício, entendemos que houve um erro, procedemos a uma revisão e passamos a atender.

Heldo Martins Acre

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Você disse que o Passe Livre está em vigor desde abril de 2001 e falou também que vocês estão sentindo a necessidade de fazer uma revisão no regulamento de uso do Passe Livre. Falou-se também da utilização de forma indevida, prejudicando outras pessoas. Por que o deficiente tem que marcar sua passagem três horas antes do embarque? Na minha opinião é um período muito longo para a pessoa ficar esperando, às vezes até em situação deprimente e viajando sozinho, sem ter alguém para o auxiliar. Acho que deve ser revisto esse prazo de três horas.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

A Legislação do Passe Livre é de abril de 2001. Nós já temos algumas minutas e o Ministério está procedendo à revisão; Mas, você não pode mudar a legislação num piscar de olhos. Há uma série de procedimentos e alguns ritos que você tem que seguir. Quanto ao problema do tempo, a legislação diz o seguinte: “A empresa é obrigada a manter reservados dois lugares até três horas antes da partida”. Eu entendo que está tendo uma interpretação equivocada. Não é a pessoa chegar com três horas de antecedência. A empresa é obrigada a manter a reserva daqueles dois lugares no veículo até três horas antes da partida. Depois dessas três horas antes do horário da partida, se ninguém buscou esse Passe Livre, a empresa pode vender. Esse é o limite para que a empresa possa vender os lugares. Mas se você quiser ir com dois, três dias de antecedência e marcar sua passagem, a legislação do transporte rodoviário fala que a empresa deve colocar os lugares à venda com trinta dias de antecedência. Então, três horas é o limite máximo que você tem da garantia da reserva do benefício. Agora se você sabe que o local para onde você quer ir só tem um horário e a procura é grande, então você faz sua reserva com dez ou cinco dias de antecedência. Entendeu? Não é que você tenha que chegar três horas antes para pegar sua autorização. Esse é o limite máximo.

Geraldo Luiz PinheiroRibeirão Preto

Isso a que você se referiu é em São Paulo. Mas no caso de Ribeirão Preto, por exemplo, você tem que chegar com cinco ou seis horas de antecedência, do contrário, não consegue vaga. Eles dizem que a reserva é feita no local de origem do ônibus, ou seja, São Paulo. Suponhamos que eu vá para o Pará, eu vou ter que chegar ao terminal em Ribeirão Preto, com cinco ou seis horas de antecedência, para conseguir a vaga. Se eu chegar depois desse tempo, mesmo estando dentro do meu limite de três horas, eu não consigo a vaga. Essa é a primeira questão.

A segunda questão é a seguinte: Já que o Passe Livre é um benefício federal, por que ele não se estende aos estados e municípios de maneira integral? Se eu tenho o Passe Livre, eu tenho direito a acesso ao transporte a qualquer parte do meu país. Por que não pode ser assim?

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

O que acontece em Ribeirão é porque você pega o ônibus em trânsito. A legislação fala que são três horas antes do ponto inicial da linha. Se o carro sai de São Paulo, mesmo o passageiro pagante está sujeito a aguardar o veículo chegar e saber se tem ou não os lugares disponíveis. No caso do Passe Livre, é a mesma coisa. Se você vai pegar um carro em trânsito, não tem como a empresa prever para você essa aplicação das três horas de antecedência. O carro que vai sair de São Paulo pode sair com os

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dois lugares de deficientes ocupados. Você deve chegar mais cedo, fazer sua reserva e garantir sua viagem. É a solução que a empresa colocou para disponibilizar essa viagem. A diferença entre o Passe Livre e o passageiro pagante é que o trecho São Paulo/Ribeirão Preto, que é numa viagem interestadual ele não tem porque está dentro do estado. Então quando o carro sai de São Paulo ele comunica Ribeirão e diz: “Eu tenho quinze lugares. Leva cinco horas até o carro chegar a Ribeirão, confirma?”. Nesse caso, São Paulo disponibiliza as vagas para Ribeirão, inclusive do Passe Livre. No caso dos veículos em trânsito é um procedimento que a empresa faz. Vou dar um exemplo de quem vai pegar um ônibus urbano. O ônibus sai do início da linha vazio. Se você embarca lá no início da linha você garante seu lugar, se você vai embarcar no meio da linha, às vezes o motorista te pede para esperar o próximo, porque esse já está cheio. No interestadual é a mesma coisa. Se ele saiu de São Paulo lotado, você não vai conseguir embarcar e nem o passageiro pagante. No caso do deficiente é mais difícil, porque são apenas dois lugares. Então, o procedimento da empresa está correto, porque estamos falando de ônibus em trânsito, e realmente são cinco horas o prazo máximo para pedido de reserva.

Se você tem a carteira do Passe Livre Interestadual, por que ela não vale para andar no ônibus urbano? Eu comentei que o serviço de transporte tem três hierarquias: interestadual, intermunicipal e urbano. Cada um tem a sua legislação e sua competência; E o governo não pode intervir na competência do estado. Na sua carteirinha está: Carteira de Passe Livre do Governo Federal, para usar nos transportes interestaduais, que é a competência do Ministério dos Transportes.

Nelson Barros de GóesParaná

Como o senhor falou que o sistema está informatizado, por que não faz cartão magnético ao invés de carteira de papel? E quem sabe na hora da revalidação pensar numa forma mais prática, menos burocrática, para a renovação do prazo de validade. O segundo ponto é que talvez se pudesse criar, nos estados, uma legislação para que a pessoa que tem o Passe Livre federal pudesse usá-lo nos estados.

Magdo SoaresCoordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos

Transportes

É o que já comentei anteriormente. O Ministério dos Transportes não pode intervir porque essa é uma legislação estadual. O Paraná está implantando agora, mas São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, todas essas capitais já têm. Inclusive a legislação do Passe Livre é diferente nos diversos estados. No Rio Grande do Sul, o corte é de dois salários mínimos. No Rio de Janeiro também é diferente, inclusive o alcance do benefício é diferente. O Ministério dos Transportes não tem condições de interferir na legislação de transporte estadual. Então se você viaja dentro do Paraná, você deve se credenciar para obter o Passe Livre do Estado do Paraná. Se você anda em Londrina, você teria que ter o Passe Livre de Londrina. Infelizmente a legislação é assim e um não pode se sobrepor ao outro. É uma questão constitucional. A Constituição garante a independência dos estados e municípios.

O transporte interestadual não tem roleta. Essa garantia de leitura está mais no sistema de transporte urbano, onde foi implantado catraca eletrônica. No caso é uma carteira com os itens de segurança. Para a renovação a legislação prevê um novo requerimento e um novo atestado médico. O que hoje nós observamos é que tem algumas deficiências que o médico poderia caracterizar como sendo definitivas. Então não haveria necessidade de se exigir um novo atestado médico e sim uma atualização de endereço e de declaração de renda. No caso das aposentadorias, por exemplo, você faz um recadastramento a cada três anos. Por que isso? Para garantir que o usuário está sendo atendido e para você poder excluir os que entraram irregularmente. Por enquanto, a carteira tem sido um item seguro,

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pelo menos até o momento. Agora, tem muitos municípios que têm o cartão eletrônico porque têm catraca.

José Veríssimo da SilvaANTT

Deixa-me fazer só uma complementação. Nós temos dois subsídios. Um é o subsídio direto onde toda a sociedade cobre determinadas questões polarizadas. E temos também o subsídio cruzado, onde as pessoas daquele mercado específico, no caso os usuários dos sistemas de transportes, cobrem as passagens daqueles que são beneficiados com a gratuidade. O que se discute hoje é que os meios de transportes motorizados, de uso popular, normalmente penalizam o usuário comum, que a maioria é de baixa renda. Quando você usa o subsídio que eu chamei de cruzado, significa que os demais usuários estão cobrindo a passagem daqueles que não pagam. Enquanto que, o subsídio de um modo direto da sociedade como um todo, também esbarra na questão da autonomia das esferas: a esfera municipal e estadual que, além de não legislar ao mesmo tempo as mesmas matérias, elas não admitem uma intervenção federal. São diretrizes que já vêm da Constituição de 1988 e que garantem a descentralização e a autonomia, evitando aquele passado de centralismo e executivismo. Então, quem paga, ou é a sociedade como um todo ou são os demais usuários da modalidade que vão cobrir a gratuidade e descontos dos segmentos populacionais atendidos.

A questão do empresário está ligada à questão do empreendimento particular. Vou dar um exemplo claro. Um indivíduo monta uma carrocinha de cachorro quente aqui na porta. Ele contabiliza as despesas que ele tem com o pão, com a salsicha etc., e sabe o retorno que ele vai ter para manter o negócio. Na medida em que você o obriga a dar cachorro quente de graça para algumas pessoas, isso desequilibra o negócio e acaba chegando à conclusão que não vale a pena continuar.

O Brasil conseguiu desenvolver um dos melhores sistemas de transporte, um dos mais organizados, se nós pensarmos nas dimensões continentais que temos. Portanto, seria desvantajosa a desistência de ofertas de serviços. Digamos que você não tivesse mais estímulo de ofertar um serviço melhor, com conforto. Você não quer um desestímulo à oferta de serviços, mas por outro lado, você também não quer que os benefícios sejam pesados para a sociedade como um todo. É por isso que as agências reguladoras observam a modicidade tarifária para que não pese para a entidade e nem desestimule o ofertante a oferecer os serviços. Nós temos que ter tarifas módicas mas também a manutenção da oferta dos serviços com qualidade. Além disso, a segurança também é uma diretriz que temos que observar.

Em relação a essa questão do acompanhante, em minha opinião, ela devia ser revista. No caso de uma pessoa com problemas mentais, por exemplo, ela precisa fazer tratamento fora de seu estado e não pode viajar sozinha.

Com relação à questão da renovação do Passe Livre, na concessão, o processo é todo enviado para o núcleo de referência, que no caso seria o Ministério dos Transportes. Mas eu acho que, na renovação, o DNIT poderia ser autorizado a fazer essa tramitação, para não demorar tanto como demorou o primeiro processo de concessão. No caso, isso já seria uma descentralização.

Outra coisa, seria a questão de respeitarmos ou acordarmos, um pacto federativo, ou seja, uma autonomia do estado e com a respeitabilidade do órgão superior. Isso facilitaria e não teria nenhum prejuízo no caso da legislação. O laudo médico por exemplo, é fornecido por dois profissionais. Como há uma averiguação para que sejam detectados erros ou irregularidades, se o estado tiver autonomia para resolver parte da questão, acho que não haveria problemas além dos que já foram citados aqui.

Magdo Soares

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Coordenador do Programa do Passe Livre Interestadual do Ministério dos Transportes

Quanto à renovação, a legislação aponta para a necessidade disso; Só uma revisão de legislação do Passe Livre, poderia simplificar isso. É como eu já havia falado, se a deficiência for definitiva o próprio médico atestar. O problema do acompanhante, também é uma condição que o Passe Livre não prevê. Na revisão da legislação, isso já foi comentado e pode-se rever também. O médico é que vai caracterizar, ou então o programa através da própria indicação do CID da deficiência se ele teria direito ou não do acompanhante. Isso vai implicar em alguma coisa. O problema é que são dois lugares, vai aumentar o valor e é uma condição muito difícil. O que vai acontecer é que um acompanhante vai concorrer para ocupação desses lugares que são disponíveis para o Passe Livre. Então, isso está dentro de um pacote que seria a revisão da legislação do Passe Livre.

Quanto à competência do governo federal em cima do estadual, isso é muito difícil porque é competência do governo estadual legislar sobre o transporte. Isso está garantido na Constituição. Primeiro, nós temos que lembrara que o programa “Passe Livre” não é do DNIT. O Passe Livre é Ministério dos Transportes. DNIT é infraestrutura. A descentralização que o Ministério pensa em fazer ainda não está decidido se seria para os órgãos estaduais ou órgãos federais localizados no estado. Tudo isso, ainda está em estudo. Muito obrigado.

4.5 Tema: Educação Inclusiva

Cláudia GriboskiSecretaria de Educação Especial - SEESP/MEC

É um prazer contar com vocês aqui neste Painel. Nós estivemos acompanhando uma mudança paradigmática na educação, uma mudança muito grande, que fez parte dos nossos debates, uma mudança que tratava a Educação Especial com a parte da educação que trabalhava da integração do aluno com necessidades educacionais especiais. Nesse sentido, se trabalhava com o aluno de forma que ele estivesse apto para se integrar ao sistema de ensino. A partir de um novo debate de sociedade, um novo debate que colocou a questão da acessibilidade nesse contexto, nós passamos então a entender a Educação Especial como aquela que organiza os serviços e recursos, como aquela que prepara o ambiente para, então, receber os alunos com necessidades educacionais especiais. Então o paradigma que se coloca inverte completamente a lógica que era trabalhada antes; as pessoas se adaptavam àquele espaço educacional e hoje é o espaço que se organiza para receber os alunos com deficiência.

Esse movimento – é importante destacar – não é um movimento que se faz somente no âmbito do Brasil, somente no nosso país, é um movimento mundial pela inclusão e que acontece em debates a partir de todas as conferências mundiais e declarações internacionais que colocaram, então, essa nova concepção para a Educação Especial. Faz então, do direito à educação, um movimento coletivo de mudanças, para a transformação das escolas e das práticas sociais.

A política educacional inclusiva se dirige a quem? Ela se refere às pessoas que estão excluídas do direito à educação, fora da escola, ou enfrentando barreiras para a sua participação e aprendizagem. Esse debate se faz necessário, porque, por muito tempo, se presenciou algumas crianças que estavam em espaços educacionais, mas com limitação do direito à educação, tendo inclusão nas áreas de lazer, tendo a inclusão trabalhando com a área artística, mas não tendo o direito à escolarização. Esse é um direito que traz a nossa Constituição, que todos têm direito à Educação.

A proposta de Educação Inclusiva faz esse debate: todos têm direito à educação. Como organizar o serviço de Educação Especial para que faça valer esse direito a todas as pessoas, incluindo,

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também, aqueles que têm necessidades educacionais especiais? Isso, então, constitui a nossa sociedade democrática, uma sociedade que garante o direito à igualdade e à não-discriminação, cabendo à sociedade possibilitar esse acesso a todos.

Como é que se constrói esse acesso a todos? Uma política educacional inclusiva prevê uma rede de apoio à inclusão, uma rede de serviços que garantam a inclusão de todas as pessoas, atendendo, então, às necessidades, às limitações e o enfrentamento às barreiras que são colocadas para as pessoas que têm necessidades educacionais especiais.

Eu quero colocar para vocês a situação, hoje, no âmbito brasileiro, como é que se encontra a educação, até para a gente poder discutir a política de educação para as pessoas com deficiência. Educação para todos: o que é que entendemos por educação para todos? A universalização do acesso à educação. Na busca por essa universalização, hoje, nós temos 96,4% das crianças e adolescentes em idade escolar que estão na escola. Então a universalização do acesso se faz presente hoje, com quase 100% das crianças tendo acesso à educação. São 56 milhões de alunos matriculados na educação básica, o que representa os 96,4%. 27% dos alunos repetem a mesma série, 50% das crianças não se alfabetizam ao final dos 04 anos iniciais do ensino fundamental.

E aqui nós chegamos ao debate da qualidade da educação: porque é que 50% das crianças não se alfabetizam ao final dos 04 anos do ensino fundamental? 51% dos alunos, apenas 51% dos alunos concluem o ensino fundamental e 27% das crianças e adolescentes com deficiência, em idade escolar, estão na escola. Então esse debate da qualidade para todos, da qualidade da educação, se faz presente para todas as crianças. E quando nós falamos em educação das pessoas com necessidades educacionais especiais, esse contexto vem para a nossa discussão. E aí é sempre dito: as escolas não estão preparadas. E elas não estão preparadas, também, para quem não tem deficiência. Então nessa discussão, quando falamos em qualidade de educação, temos que falar em qualidade de educação para todos. E não é justificando a existência de escolas que ainda não apresentam essa qualidade, que nós vamos enfrentar o desafio da exclusão. Nós precisamos nos organizar, enquanto movimento, lá no município, lá no estado e exigir essa organização do sistema educacional, exigir essa rede de apoio para, realmente, efetivar a inclusão de todos.

O direito das crianças com deficiência e a Convenção dos Direitos da Criança: eu destaquei um fragmento que foi trabalhado numa pesquisa, em algumas escolas que discutiam os direitos da criança na Convenção dos Direitos da Criança. E essa professora pesquisou várias escolas e encontrou todas aquelas justificativas de professor que não estava preparado, de pais que temem a inclusão de seus filhos até por uma questão de cuidado, de entender que esse local talvez não seja apropriado, acham que a criança tem que estar numa redoma, com mais cuidados. Essa pesquisa mostrou toda a questão da qualidade do ensino e quando se refere à questão das pessoas com deficiência, essas barreiras se apresentam com muito mais força. E ela disse, na sua pesquisa, que o presente temor com relação aos alunos com deficiência se explica pela histórica invisibilidade de crianças e jovens deste grupo social, no cenário educacional brasileiro, mas, todavia, não se justifica enquanto argumento para rejeitar sua presença nas escolas ou segregá-las em classes especiais.

E aqui eu trago uma reflexão para vocês: vejam que nós temos, hoje, muitas escolas organizadas com classes especiais. É uma política que foi implementada e que, no seu tempo, era o melhor que se apresentava. Naquele tempo se organizou, porque foi a forma de incluir, ainda naquele paradigma de que a criança se integrava no espaço escolar. Foram criadas as classes especiais. Hoje, nesse novo paradigma de Educação Inclusiva, o que é que entendemos desse espaço de classe especial? Um espaço segregado. Continuamos discriminando, dentro da própria escola: para aquela criança, somente esta sala de aula é que pode lhe oferecer educação. Há escolas, inclusive, que têm recreios em momentos separados, as crianças não convivem nem mesmo no espaço de lazer, no espaço do recreio. Essa visão hoje, de Educação Inclusiva, precisa transpor esse conceito; a classe especial, no seu tempo, foi necessária, mas hoje não podemos mais admitir uma discriminação aonde a criança esteja segregada dentro do mesmo espaço onde estão outras crianças da sua idade, da sua faixa etária e que é um ambiente de convivência e de aprendizagem.

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Esta frase dessa pesquisadora nos mostra exatamente isso: as crianças ficaram, por muito tempo, sendo invisíveis no processo educacional. Invisíveis porquê? Às vezes, dentro do mesmo espaço, elas não são vistas. Enquanto nós não estivermos convivendo com a pessoa com deficiência, nós não vamos conseguir transpor esse conceito de não-discriminação para as crianças, que, desde a educação infantil, passem a conviver com naturalidade e entendam a importância de estarem todos juntos, aprendendo neste mesmo ambiente.

O direito à não-discriminação: vamos falar agora não só do que nós entendemos por Educação Inclusiva, mas do que é que é esse direito. A pessoa tem o direito de não ser discriminada, o direito à não-discriminação. Este aluno não teve a sua opção, não está tendo a sua opção, ele tem o direito à não-discriminação. A Convenção da Guatemala, que hoje é um Decreto, no Brasil, é uma Legislação nacional, diz que as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as outras pessoas e que estes direitos, inclusive o de não serem submetidos à discriminação com base na deficiência, emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo o ser humano. A partir desse enfoque que nos traz a Convenção da Guatemala, entendemos que mais nenhuma instituição escolar pode se organizar pela deficiência. No momento em que eu organizo uma instituição somente para pessoas que têm deficiência mental, uma instituição somente para pessoas que têm deficiência auditiva, uma instituição somente para pessoas que têm deficiência visual, eu estou eliminando esse direito de convivência, esse direito de participação e estou, então, organizando pela deficiência. E todas as pessoas têm direito a participar de todos os espaços, de todos os locais e de não serem rotuladas pela sua deficiência.

O desenvolvimento de sistemas educacionais inclusivos: passamos então a trabalhar esse desenvolvimento de sistemas educacionais inclusivos, os sistemas municipais de educação, os sistemas estaduais de educação e o sistema federal.

Organização dos sistemas educacionais inclusivos: escolas regulares, com orientação inclusiva, constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias, criando comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos. A Declaração de Salamanca, em 1994, uma Convenção que reuniu muitos países, introduziu a questão da Educação Inclusiva e trouxe as escolas regulares como o melhor espaço, o melhor ambiente para se desenvolver a educação de todas as crianças, organizando escolas que tenham classes comuns com a prática e orientação para a Educação Inclusiva.

A preparação das escolas para acolher todas as crianças: a Declaração de Salamanca também coloca como preparar as escolas, como organizar as escolas para a Educação Inclusiva. As necessidades educacionais especiais, então, incorporam os princípios, já aprovados, de uma pedagogia equilibrada que beneficia todas as crianças. Parte do princípio de que todas as crianças humanas são normais e de que o ensino deve, então, ajustar-se às necessidades de cada criança, em vez de cada criança se adaptar aos supostos princípios quanto ao ritmo e à natureza do processo educativo. Aqui eu volto ao início da minha fala neste Painel: a mudança de concepção de educação que traz, então, a organização do sistema de ensino como o principal pressuposto para que aconteça a Educação Inclusiva. A política educacional inclusiva, então, em vez de focalizar a deficiência da pessoa, enfatiza o ensino e a escola, trabalha as práticas educacionais, trabalha a proposta de ensino, o projeto político-pedagógico da escola, bem como as formas e condições de aprendizagem. Em vez de procurar no aluno, a origem do problema define-se pelo tipo de resposta educativa e de recursos e apoios que a escola lhe deve proporcionar, para que obtenha sucesso escolar. Por fim, em vez de pressupor que o aluno deve ajustar-se aos padrões de normalidade para aprender, aponta para a escola o desafio de ajustar-se para atender à diversidade.

Nesse desafio de ajustar-se para atender à diversidade é que se coloca a participação da comunidade. Os pais, no momento da elaboração do projeto político-pedagógico, devem observar se essa escola contempla os princípios da Educação Inclusiva e se ela, realmente, se organiza para atender às necessidades de todos os alunos. Nós não entendemos que uma escola, ainda nos dias de hoje, possa negar a matrícula de um aluno em função da deficiência que ele apresenta. Já vivemos muitas situações nesse sentido: imaginemos uma família que tenha dois filhos, um com deficiência e um sem deficiência e que tem que dizer para o seu filho que não tem deficiência – Você pode estudar aqui na escola da

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nossa comunidade – e dizer para aquele que tem uma deficiência – Não, você não poder estudar nessa escola, você vai ter que pegar um transporte escolar, ir para um outro bairro ou até para uma outra cidade, para que possa ter acesso à educação. A organização do sistema educacional prevê que as crianças tenham acesso, sim, à escola do seu bairro. É naquela escola que ele deve estudar e essa escola tem que enfrentar esse desafio, para ter a organização nas suas salas de aula.

Nós tivemos uma Secretária de Educação de um município do interior, que esteve no Ministério da Educação há poucos dias e nos contava que o Ministério Público autuou a Secretaria Municipal de Educação porque tinha um aluno cego, uma criança em idade escolar que não estava na escola, estava sendo negado o direito à educação e a Secretária dizia que não tinha condições, porque não tinha nenhum professor para ensinar Braille, não tinha ninguém que pudesse dar atendimento para essa criança, que já estava com 10 anos e não estava na escola por isso. O Ministério Público, então, disse: Não, a senhora tem o dever de que essa criança esteja na escola. Ela então contratou um serviço de transporte escolar que a levava para um município vizinho. Foi aí, então, que ela resolveu organizar uma escola na sua rede de ensino. Preparou o professor, organizou uma sala de recursos numa escola municipal, deu atendimento especializado e garantiu a educação para aquela criança. No ano seguinte, quando ela matriculou essa criança na rede de ensino, apareceram mais seis crianças cegas. Então, vejam a invisibilidade das crianças e como se trata com normalidade elas não terem acesso à educação. Não têm mesmo! Se não têm mesmo, não vamos colocar! É uma falha da sociedade entender isso com normalidade e não buscar os seus direitos, direito enquanto pai, direito enquanto aluno, direito enquanto um gestor do sistema de ensino, que é responsável pela educação.

A inclusão, então, é trabalhada nesse sentido, como um princípio. É um princípio que está previsto na Constituição, é um princípio que traz claramente, na LDB, a necessidade dessa organização no sistema e é, então, uma concepção de Educação Inclusiva como parte de uma política mais ampla. Quando falamos em política de Educação Inclusiva, ela não pode ser isolada, ela é uma inclusão mais ampla. O que quer dizer essa inclusão mais ampla? São outros serviços que precisam estar presentes para que essa Educação Inclusiva aconteça: serviços de saúde, serviços de assistência social, serviços na área do trabalho, do lazer, esporte, cultura. A política educacional inclusiva se sustenta, também, nesses pilares. Nós precisamos prever essa rede de apoio à inclusão. Isto é uma política mais ampla. Quando pensamos num programa municipal de educação, ou num programa de município, essas políticas intersetoriais têm que contemplar a pessoa com deficiência. A educação está relacionada com a preparação das pessoas para construírem sociedades democráticas. O que é, então, essa sociedade democrática, que é tão excludente que ainda não tem, na sua organização, a possibilidade de dar educação a todos? Passa-se a pensar em como tornar as escolas mais inclusivas e como apoiar a participação e a aprendizagem dos alunos que estão em situação mais vulnerável. Então nós vamos trabalhar com uma proposta pedagógica: como é que eu faço para que esse meu aluno aprenda? De que tipo de recursos eu preciso? Porque sabemos, é comprovado, que todos têm condições de aprender, todos podemos aprender. Então não podemos rotular uma criança e dizer: esta criança está fadada a não ter aprendizagem, porque ela não pode aprender. Não somos nós que podemos destacar um limite de aprendizagem. A aprendizagem se dá, também, de acordo com o contexto, ela não se dá isoladamente, sem levar em consideração as condições que lhe são ofertadas. Então esse limite jamais poderá ser dado por quem organiza esse sistema, ou mesmo pelos professores, esse limite é dado pelo nosso aluno e, com certeza, é muito surpreendente quando deixamos que essa educação flua com naturalidade e a entendemos como um direito.

A Educação Especial, por muito tempo, foi trabalhada como um nível de ensino - escolas de Educação Especial – onde se trabalhava apenas com alunos da Educação Especial, sem um fluxo de escolarização. O que é que entendemos por educação de especial? Ela é uma modalidade da educação escolar que realiza o atendimento educacional especializado, definido por uma proposta pedagógica que assegura recursos e serviços especializados para apoiar o processo de escolarização. Então ela perpassa todos os níveis de ensino; a Educação Especial está presente na educação infantil, está presente no ensino fundamental, está presente no ensino médio e na educação superior. E a Constituição já dizia que temos que buscar a elevação, que o aluno tenha os mais elevados níveis de ensino. Hoje, comprovadamente, nós já temos uma política onde o ensino superior tem se dado, grandemente, com a

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questão do acesso, já temos um número mais amplo de alunos no ensino superior. E vejam que, até o ano de 2003, na coleta do censo escolar, nós não tínhamos a série do aluno da Educação Especial, fruto desse entendimento de que a Educação Especial é como se fosse um nível de ensino – ali cabiam todos os que tinham uma determinada deficiência. Desde 2003 nós passamos a coletar a série do aluno: primeira, segunda, terceira, quarta, quinta série. 2004, com essa reformulação, foi o primeiro ano da coleta, 2005, o segundo ano da coleta. Então, somente a partir deste ano é que se passou a pensar na perspectiva de que o aluno pode aprender, porque, até então, era um quadro que dizia: Eu tenho 500 alunos na Educação Especial, sem saber quantos alunos estavam na primeira, sem saber quantos alunos estavam na segunda. Quando fomos estabelecer a política do livro didático, o livro didático em Braille para o aluno cego, por exemplo, nós não sabíamos quantos livros deveríamos produzir para a primeira série, não sabíamos quantos alunos cegos estavam na primeira série, quantos alunos cegos estavam na segunda série. Então vejam a importância de sabermos, claramente, o acompanhamento da aprendizagem dos alunos, para efetivar políticas públicas que dêem esse suporte à educação.

Hoje, todos os alunos cegos, do ensino fundamental até à oitava série, têm o livro em Braille.

Então, é importante saber, efetivamente, como é que está se dando a educação no âmbito dos sistemas de ensino municipal, estadual e federal, para poder estabelecer essas políticas públicas. Foi assim que foi possível fazer a distribuição do livro didático em Braille para todos os alunos cegos do ensino fundamental.

Com relação a esse direito de acesso igualitário ao atendimento educacional especializado, nós colocamos aqui a questão do Estatuto da Criança e do Adolescente: os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular os seus filhos na rede regular de ensino. Isso está colocado no Estatuto. Também, na LDB, está colocado que os sistemas de ensino assegurarão aos educando com necessidades educacionais especiais currículos, métodos, recursos específicos para atender às suas necessidades, terminalidade específica, professores com especialização para atendimento especializado. E os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais e assegurando condições para uma educação de qualidade. A Resolução nº 2, que são as Diretrizes da Educação Especial na Educação Básica, desde 2001 asseguram que os sistemas de ensino são os responsáveis por assegurar a matrícula dos alunos com necessidades educacionais especiais. E o atendimento educacional especializado, que é o foco da política de Educação Inclusiva, traz então essa necessidade do atendimento educacional especializado, colocando que ele não substitui o direito de acesso à educação ou em classe comum da rede regular de ensino. Quer dizer, muitas vezes as crianças são retiradas da sala de aula para ter somente o atendimento educacional especializado e as crianças têm, como as demais, direito a quatro horas diárias de educação em classe comum, no ensino regular e mais, então, o atendimento educacional especializado.

Esse atendimento destaca o enfoque pedagógico. Quando falamos em atendimento educacional especializado, falamos do trabalho escolar, de educação. Aqui, mais também como um apoio suporte, tem os atendimentos clínicos, fonoaudiológicos e outros atendimentos que são necessários. Nós destacamos, para a Educação Inclusiva, a importância do atendimento educacional especializado, a área educacional, o ensino da Libras, o ensino do Braille, o desenvolvimento cognitivo, por meio de atividades complementares, para os alunos que têm necessidades educacionais especiais. Esse atendimento educacional especializado, visto desta forma, organizado desta forma, deve beneficiar todos os alunos e, com isso, eliminando barreiras que impedem a participação e a aprendizagem na escola, porque, muitas vezes, a falta deste atendimento é que impede esse acesso dos alunos às classes comuns do ensino regular.

O desafio colocado, então, para a educação brasileira, desafio colocado para nós, Ministério da Educação, desafio colocado no sistema estadual, no sistema municipal – para vocês, a maioria aqui de Conselheiros no sistema municipal e no sistema estadual:

• Garantir a organização das escolas que atendam a todos os alunos sem nenhum tipo de discriminação, escolas que valorizem as diferenças como fator de enriquecimento do processo educacional.

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• Valorizar a diferença na escola.

• Criar um novo ciclo de visibilidade da pessoa com deficiência dentro do sistema escolar.

• A transposição de barreiras para a aprendizagem e para a participação dos alunos com igualdade de oportunidades, oportunizar esse acesso à educação, às condições que lhe são necessárias.

• A implementação da política de inclusão educacional, da promoção do acesso e da qualidade.

• Informar, sensibilizar e promover a participação da família e da comunidade neste processo de inclusão.

• Formar as redes de apoio à inclusão. Fortalecer o processo educacional com a constituição desta rede, uma rede que esteja disponível para este atendimento de todos os alunos.

Ainda como desafio da educação brasileira:

• A transformação dos sistemas educacionais para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais.

Aqui eu quero dar um destaque para um programa que o Ministério da Educação começou a implementar no ano de 2003, o Programa Educação Inclusiva, Direito à Diversidade: é um programa que envolve 144 municípios-polo, distribuídos nacionalmente em todo o país - eu encontrei aqui muita gente que faz parte e que coordena o programa, estou vendo aqui na Plenária. Esse programa objetiva trabalhar com a gestão. Porque, inicialmente, a gestão? Porque, muitas vezes, esses empecilhos, essas barreiras, são colocados por falta de uma gestão que organize esses recursos, de uma gestão que preveja o financiamento para que esses serviços estejam organizados. Então trabalhamos com gestores, nos sistemas municipais e com educadores que organizam a rede de ensino para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais. A importância deste programa se coloca, também, pela abrangência: esses 144 municípios-polo têm uma responsabilidade com alguns municípios da sua área de abrangência. Em 2004 e 2005, cada um deles trabalhou com mais 20 municípios da área de abrangência. Neste ano de 2006, eles trabalham com mais 20 municípios. Então a abrangência do programa, hoje, está em 4.646 municípios. Vejam a importância do Ministério da Educação chegar com a política educacional inclusiva nesse número de municípios brasileiros, municípios que, muitas vezes, não registravam nenhuma matrícula de alunos com necessidades educacionais especiais. Nós, ainda hoje, temos 970 municípios que não têm nenhuma matrícula. Então vejam a importância, ainda, do acesso, porque quando a gente fala na universalização do acesso, nós ainda, na Educação Especial, temos problemas com o acesso, ainda é negada a simples questão do acesso. E hoje nós estamos debatendo, também, a questão da qualidade.

• Alterar a formação inicial dos professores para contemplar os conhecimentos sobre as necessidades educacionais especiais. Então todos os cursos de educação superior devem prever a organização da reorganização do currículo, para contemplar a Diretriz da formação de professores. Então teremos, também, que transpor esse argumento de que não temos professores preparados, quando temos um programa que está preparando a gestão e vários outros programas – que vou apresentar para vocês depois – que trabalham, especificamente, com as diferentes áreas da deficiência.

• A mudança da gestão da educação, que possibilite o acesso às classes comuns do ensino regular.

• A busca pela ampliação da oferta do atendimento educacional especializado, que propicie eliminação de barreiras para o acesso ao currículo.

Vejam que nós falamos em barreiras, mas não mais só em barreiras arquitetônicas. Para nós é importante, na Educação Inclusiva, discutir a eliminação das barreiras para o acesso ao currículo, o currículo escolar. Nós precisamos eliminar as barreiras que impedem essa participação e aprendizagem.

• Os sistemas de ensino, então, devem garantir a matrícula na rede na idade obrigatória, organizar-se para essa educação de qualidade para todos.

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É importante frisar qual é a competência do sistema de ensino, para vocês que estão retornando aos estados e municípios, como é que esse sistema de ensino deve se organizar.

• Ele deve conhecer as demandas de atendimento.

É aquela história que eu contei para vocês: a partir do momento em que a escola se organizou com sala de recursos para o atendimento à deficiência visual, apareceram mais seis alunos. Mas se eu tenho uma demanda de atendimento, eu faço uma pesquisa, é uma política pública e eu entendo que eu tenho que conhecer essa demanda, isto não aconteceria no momento da organização de uma sala. Quer dizer, precisamos conhecer essa demanda de atendimento, fazer uma organização com política de saúde e assistência social, para conhecer essa demanda e propiciar, então, esse atendimento.

• Manter um setor responsável pela Educação Especial ou Educação Inclusiva.

A nossa Resolução nº 2, que trata das Diretrizes da Educação Especial, coloca a necessidade de que todo o sistema de ensino tenha um setor responsável pela Educação Especial ou Educação Inclusiva, como alguns estão chamando. Esse setor, como organizador da política pública, como aquela pessoa que vai debater, dentro dum plano municipal, as inserções que são necessárias para a garantia desse direito.

• Promover a acessibilidade nas comunicações, nas escolas, nos equipamentos, mobiliários e transportes escolares.

Atendendo ao Decreto Nº 5.296, ter uma pessoa que é vigilante a essa garantia, a esses direitos que as pessoas têm.

• Ofertar esse atendimento educacional especializado.

Então vejam que esse setor toma uma dimensão de organizador dessa política nos diferentes âmbitos, seja municipal, estadual ou federal.

• Promover programas de formação de professores.

Eu quero dar aqui uma ênfase à questão do financiamento: a partir deste ano, de 2006, por meio do Decreto de 04 de janeiro deste ano, todos os alunos incluídos em classes comuns do ensino regular passam a receber, também, o per capita diferencial da Educação Especial, que é de 7%. Até então, só recebiam esse coeficiente diferenciado os alunos que estavam matriculados em classes e escolas especializadas. Então o aluno que está incluído em classe comum também tem. E tem porquê? Porque esse diferencial é que permite a organização desses recursos de apoio que são necessários.

Aqui é o projeto pedagógico, de que eu já falei, a necessidade da escola prever e a comunidade, então, fazer essa fiscalização do projeto pedagógico nas escolas, de que eles contemplem a acessibilidade nas edificações, contemplem professores habilitados, um currículo acessível, um atendimento especializado, uma aprendizagem cooperativa, a temporalidade flexível do ano letivo – prever o tempo de aprendizagem para que esse aluno possa ter uma educação de qualidade – e aprofundamento ou enriquecimento curricular, porque aqui, também, é tarefa da Educação Especial as altas habilidades e superdotação, isso também é função da Educação Especial. Então é preciso prever, também, currículos que tenham esse aprofundamento curricular para os alunos com altas habilidades e superdotação.

O Plano Nacional de Educação, que agora está sendo revisado nacionalmente - eu trouxe para vocês uma citação que existe nesse Plano, que diz: O grande avanço que a década da educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garantisse o atendimento à diversidade humana.

Aí eu coloco uma reflexão, que a gente pode discutir depois, no nosso tempo de debate: será que a educação, hoje, realmente, é para todos? Gostaria que vocês refletissem, dentro do sistema de educação de vocês, se a educação hoje, da forma como está sendo desenvolvida, realmente é para todos. O direito à educação não deve estar restrito à matrícula. Muitas vezes, quando a gente coloca esse âmbito do acesso, as pessoas dizem: Ah, mas o acesso não é só a matrícula. E concordamos, o acesso

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não é só matrícula, além do acesso, as políticas públicas devem garantir a permanência e a qualidade dentro desse sistema educacional. Como eu falei para vocês, a Legislação garante; em termos de Legislação, nós estamos embasados para que, realmente, todos sejam incluídos na escola. No entanto, essa inclusão tem que garantir a igualdade de oportunidades. As mudanças devem se efetivar, então, nos processos de gestão e na estrutura organizacional das escolas, na formação inicial e continuada dos professores, nas práticas e no ambiente escolar.

Esse paradigma da Educação Inclusiva inverte, então, a lógica da exclusão:

• Os sistemas devem estar adaptados às necessidades das pessoas, e não o contrário.

• Ajuda a quebrar esse ciclo de invisibilidade, como se as pessoas com deficiência não existissem, como se não tivessem um papel na nossa sociedade, como se fossem diferentes, sendo que essa diferença deve servir para enriquecer o processo educacional, ela passa então a ser vista.

• Permite a permanência das crianças nas suas comunidades, com as suas famílias.

Esse foi, por um longo tempo, um problema enfrentado pelas famílias; as crianças, para terem educação, tinham que se deslocar da sua comunidade.

• Pode melhorar a qualidade do ensino para todos, porque aqueles que não têm uma necessidade educacional especial também aprendem, também se beneficiam desse processo.

• Superar a discriminação que persiste na sociedade, quer dizer, conseguimos efetivar uma política de não haver discriminação em nenhum segmento da sociedade.

• Promove uma inclusão mais ampla nos programas gerais em todas as áreas, tanto na educação como na saúde, trabalho, lazer, assistência, em todas as áreas gerais das políticas públicas.

E aqui estão os programas da Secretaria de Educação Especial, que são vários:

• Eu já falei um pouco do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade. Também, dentro do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade nós desenvolvemos o Projeto Educar na Diversidade, que hoje já atendeu 300 escolas e vai atender a mais 300 no ano de 2006. É um material de formação docente que trabalha com os professores para a mudança da prática educativa.

• O Programa Interiorizando Libras, que forma professores para o ensino da Libras e já foi desenvolvido em todas as capitais, trazendo professores do interior para a gente, então, promover a difusão da Libras em todo o sistema de ensino.

• O Programa Interiorizando Braille, que também é desenvolvido para beneficiar as pessoas, para que elas tenham professores para o ensino do Braille.

Tanto o Braille quanto a Libras são programas desenvolvidos em parceria com instituições não-governamentais. A ABEDEV e a UCB têm participado no Interiorizando o Braille, e a APADA e a FENEIS têm participado junto conosco no Interiorizando Libras. Então são parcerias que se estabelecem no âmbito nacional e que devem se estabelecer também no âmbito municipal e estadual como suporte a esse processo de inclusão.

• Salas de recursos multifuncionais.

Além da proposta de transformação das classes especiais em salas de recursos multifuncionais, atendendo a todas as necessidades dos alunos, nós implementamos, no ano de 2005, 250 salas de recursos e, no ano de 2006, serão entregues mais 300 salas de recursos em escolas que têm matrículas de alunos com necessidades educacionais especiais.

• Os CAP’s, que são os Centros de Formação de Professores e Produção Braille em todos os estados, os CAS, que são Centros de Apoio à Formação de Professores e Atendimento ao Aluno Surdo em todos os estados, que atuam também disseminando a política e formando

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professores. E uma novidade é que, desde novembro do ano passado, começou a implementação do Programa Núcleo de Atividades no Desenvolvimento as Altas Atividades e Superdotação. Então todos os estados também estão recebendo Núcleos para contemplar o aprofundamento curricular necessário aos alunos com altas habilidades e superdotação.

As políticas de implementação de CAS, CAP e NAS são políticas de descentralização da política do governo federal, dando suporte, no âmbito estadual, a todos os municípios que precisam ter a formação e o atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais.

• O PROINESP, que é o Programa de Laboratórios de Informática.

De 2003 a 2006, estaremos fechando uma distribuição de mil laboratórios de informática em escolas que têm alunos com necessidades educacionais especiais.

• O Programa da TV Escola, que é um Programa de Formação de Professores à Distância.

• O Programa Incluir, que passa, então, a contemplar as instituições de ensino superior. São programas e políticas de acessibilidade arquitetônica, aquisição de equipamentos, formação de professores no ensino superior, para a promoção do acesso dos alunos com necessidades educacionais especiais.

• O PROESP, que é um programa de pesquisa na área de Educação Especial, e desenvolvido em parceria com a CAPES, que destina bolsas de mestrado e doutorado na área da Educação Especial, para que nós tenhamos pesquisas e desenvolvimento na área.

Nós distribuímos, este ano, 11.000 dicionários de Libras inglês-português, é um dicionário trilíngue. Esse dicionário foi fruto de uma das pesquisas de um professor da Universidade de São Paulo, que elaborou esse dicionário e oportunizou que a gente pudesse distribuir, aos sistemas de ensino, mais esse recurso para os alunos surdos.

• O TECNEP, que é um Programa que trabalha juntos aos CEFETs, então é a educação profissional desenvolvida na rede tecnológica.

• O Programa Nacional do Livro Didático, em que eu já destaquei para vocês a ampliação desse programa, com a distribuição do livro didático em Braille até à oitava série, então todos os alunos do ensino fundamental, hoje, têm o livro Braille. E tem também propostas de livro acessível, como é a coleção de literatura infanto-juvenil em Libras, que distribuímos aos alunos surdos de todo os sistemas de ensino.

• O Programa Nacional do Livro no Ensino Médio, que começou no ano de 2004 e também já está sendo trabalhada a proposta de acessibilidade para o livro do ensino médio.

Na área de deficiência auditiva nós tivemos muitos avanços, principalmente em decorrência da regulamentação da Lei de Libras, que foi muito debatida com toda a sociedade. Por três meses nós estivemos com esse Decreto em consulta pública, todos puderam contribuir e o Decreto, então hoje, já regulamentado, prevê a inclusão da Libras em todos os cursos de formação de professores e de fonoaudiologia. Então há necessidade de que as instituições de ensino superior readequem seus currículos e oportunizem também a graduação em Libras, que é uma das coisas que nós já temos, hoje, como novidade, para colocar.

O Instituto Nacional de Educação de Surdos pela primeira vez se amplia para o ensino superior e passa a executar a educação superior como o primeiro curso de educação superior bilíngüe, um curso que forma professores tendo como primeira língua a Libras e a segunda língua, então, é a língua portuguesa. As aulas começaram na semana passada e é a novidade que temos no Instituto Nacional de Educação de Surdos. E também, pela Universidade Aberta do Brasil, a Universidade Federal de Santa Catarina está disponibilizando, a partir de agosto, cursos à distância de graduação em Letras/Libras. São nove estados que terão essa proposta e estaremos formando 450 professores que serão, então, professores graduados em Letras/Libras, para ofertarem a disciplina.

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E também – agora a Kátia me lembrava – a partir do Decreto, o Exame Nacional de Proficiência em Libras. Os vários cursos formam instrutores para Libras e nós faremos, a partir de agosto, o primeiro Exame Nacional de Proficiência em Libras, uma prova para certificar professores de Libras em todo o país, até que nós tenhamos desenvolvido esses cursos de graduação e tenhamos naturalmente, dentro desses cursos, formado professores de Libras. Então, por dez anos, esse exame acontecerá anualmente, para que tenhamos professores de Libras nos sistemas de ensino, professores e tradutores e intérpretes de Libras.

Nós colocamos como avanços da política:

• A universalização da distribuição do livro didático em Braille.

• A difusão do uso e ensino da Libras como componente curricular nos cursos de formação docente.

• O curso de educação superior bilíngüe no INES.

• Curso de graduação em Libras na Universidade Federal de Santa Catarina.

• O Decreto da regulamentação da Lei de Libras.

Essas são, então, as Diretrizes da Educação Especial. O Ministério da Educação traz para o sistema de ensino, como Diretrizes:

• A inclusão, que é o princípio norteador das políticas nacionais, no âmbito da Educação Especial.

• A concepção da Educação Especial não como um nível de ensino, mas como modalidade transversal em todos os níveis de ensino.

• O conceito de acessibilidade, perpassando todos os programas.

Vejam o exemplo do livro didático, que hoje passa a ter esse conceito de acessibilidade dentro da sua ação.

• A atenção à diversidade, como pressuposto e valorização das diferenças na escola, com políticas públicas de promoção do acesso, formação de professores, acessibilidade, oferta do atendimento educacional especializado, de forma a atender às peculiaridades de cada aluno.

• O compromisso com uma política de financiamento.

Eu coloquei para vocês a importância desse percentual diferenciado para a Educação Especial.

• O princípio da participação da superação do preconceito e da segregação para a transformação dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos.

Eu preparei bastante coisa, até porque o nosso Painel era de duas horas, mas ele atrasou bastante. Eu acho que a gente pode encerrar aqui e começar o debate, porque senão não vai dar tempo. Eu me coloco à disposição de vocês para a gente iniciar esse debate e que eu possa esclarecer todas as questões que vocês colocarem.

Jorge Frederico dos SantosRio de Janeiro

Professora Cláudia, quanto à Educação Inclusiva, eu sou pedagogo, trabalho há muitos anos na orientação educacional em escola regular, sou um ex-aluno – para ficar bem frisado – ex-aluno do Instituto Benjamin Constant e eu percebo que a Educação Inclusiva, em particular para os deficientes visuais, está tirando o acesso à cultura de um modo geral. Não basta só que o professor saiba o Braille, quando sabe o Braille e Soroban. O aluno incluso, o deficiente visual no Rio de Janeiro em particular e no Brasil todo, onde vai ter acesso ao judô, onde vai ter acesso à natação, onde vai ter acesso às

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Olimpíadas? Numa escola pública regular municipal, onde vai ter afinação de piano? A não ser no Instituto Benjamin Constant, uma escola-padrão que está acabando. Pouco a pouco está acabando o número de alunos internos e a tendência é acabar de vez, depois vão acabar os semi-internos, como já acabou no INES, em Laranjeiras, no Rio de Janeiro e como já acabou em várias escolas especiais e estaduais no nosso Brasil. Companheira Cláudia, o que fazer do futuro do cego, ampliando a cultura na Educação Inclusiva?

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Jorge, eu entendo que a política de Educação Inclusiva fortalece o serviço de Educação Especial. Tu colocaste aqui natação, olimpíada, música, judô; todas essas atividades tu poderás continuar fazendo, o aluno vai continuar fazendo onde ele está fazendo, onde ele já faz hoje. Se ele já está numa instituição especializada, ele vai continuar fazendo. O que nós entendemos, é que essas atividades são complementares, elas são necessárias e são complementares. Inclusive, quando falamos em ampliação da oferta, é porque sabemos que o que temos hoje não é suficiente. São atividades necessárias, mas elas não podem ser substitutivas. Eu não posso entender que essas atividades substituam a escolarização, o direito à educação. Então as instituição que hoje ofertam estes atendimentos, vão continuar ofertando para muito mais alunos; se elas não tiverem alunos internados, elas vão ter só cem crianças e poderão, em turnos alternados, atender, quem sabe, duzentas, trezentas ou até mais crianças, dando esse suporte necessário às escolas comuns.

Tatiana Chioquetti PimentelSão Paulo

Meu nome é Tatiana, eu sou de Monte Alto, São Paulo. Lá em Monte Alto, nós formamos o Centro de Inclusão Municipal, onde tem salas de oficinas pedagógicas de recursos, num período contrário. A criança freqüenta primeiro o ensino regular e depois freqüenta essa sala de recursos onde nós complementamos as dificuldades que elas têm no ensino regular. E temos oficinas pré-profissionalizantes e as oficinas terapêuticas. Daí a minha pergunta: a Legislação nos coloca que nós temos que ter uma equipe multidisciplinar, como fono, psicóloga, psicopedagoga, fisioterapeuta, de tudo um pouco. Porém, dentro da Secretaria de Educação, não é permitido contratar profissionais dessa área. Só que, muitas vezes, a maioria das Secretarias de Saúde do município não tem dinheiro para contratar profissionais para a saúde e profissionais para a educação. Então o que a Secretaria de Educação, junto à Secretaria Nacional de Educação Especial, pode fazer para que se contrate esses profissionais sem ser por meio de PROER, contratos, licitação, para que depois, também, o Tribunal de Contas não venha e pegue no pé do prefeito.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Tatiana, quando a gente diz que a inclusão faz parte de uma política mais ampla, é isso que eu quis dizer. Política mais ampla é o quê? Eu tenho que fazer parceria dentro do próprio município. Essa divisão que se faz entre saúde e educação, que acontece no próprio município, tem que acabar quando discutirmos juntos um plano municipal de educação. Se a educação precisa da área da saúde para fazer o atendimento, a saúde vai contratar e vai colocar à disposição do atendimento educacional. Isso nós precisamos requerer no nosso município, é uma luta, não é fácil, não digo que é fácil, mas é uma luta que nós temos que conquistar. É preciso esse atendimento interdisciplinar, é preciso que a educação

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tenha isso, mas não é a educação que tem que contratar não! É a política que tem que assumir essa visão ampla e garantir esses serviços para a educação.

Lisandra Sandri RhodenRio Grande do Sul

Lisandra, do Rio Grande do Sul, Carazinho. Aconteceu a mesma coisa no meu município. Nós também temos essa mesma dificuldade com a equipe multidisciplinar e a nossa Secretária acabou contratando uma profissional e foi indicada pelo Tribunal de Contas. Então, a partir de agora, nós não podemos mesmo contratar ou chamar alguém para prestar esse tipo de serviço. E a Secretaria da Saúde diz que nós queremos fazer assistencialismo, que nós queremos dar assistencialismo para fono, psicológica, que nós não podemos estar oferecendo isso, que o município não tem condição para isso.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

É por isso que eu reafirmo para vocês a importância desta Conferência, dela apoiar a Educação Inclusiva, no sentido de garantir essas políticas. Nós sabemos que é uma luta, é um debate que tem que ser feito lá no município. Alguém já discutiu o financiamento da Educação Especial do município? Vocês sabem quanto é destinado para a Educação Especial? Tem que ter! Enquanto a gente deixar que aconteça essa política sem fazer essa discussão, as coisas vão continuar assim, não tem! Mas tem que ter a garantia. Vocês são de Conselhos, vocês podem fazer esse debate no município, dentro da revisão do Plano Municipal de Educação.

Hermes Antonio Machado SaldanhaRio Grande do Sul

Professora, eu sou Hermes Antonio machado Saldanha, de Passo Fundo, Rio Grande do Sul. Eu sou pai de um menino autista, com 16 anos de idade. Nós criamos uma ONG, lá em Passo Fundo, há seis anos atrás, mas, hoje em dia, eu vejo o seguinte: falam em trabalhos, estruturação, profissionais. Só que eu vejo que é muito bonito dizer: Vamos ter tantos professores, vamos ter tantos terapeutas, tantos psicólogos. Só que, na hora de achar esses profissionais, é a maior dificuldade, não existe. Por esses dias, com o Promotor de Justiça, fizemos até um encontro, já preparando o de Brasília, lá no nosso pólo municipal e regional também. E o Promotor disse que seria função, digamos assim, das universidades trabalhar essas áreas sociais, porque as universidades são públicas e isentas de impostos para ter um caráter comunitário. Mas temos universidades particulares em municípios. E o governo federal deveria facilitar para as universidades particulares ou subsidia-las para que proporcionassem cursos de especialização aos professores, para que houvesse então essa mão de obra especializada, tão reclamada pelo pessoal. Porque não é fácil, para o autista. Para a senhora ter uma idéia, a nossa escola agora é municipal porque nós, inclusive, reivindicamos ao prefeito e eu vou dar um auxílio que eu tenho dado para todo o mundo, até para quem é mãe de autista: recorram ao Ministério Público, é a primeira coisa, para reivindicar as suas causas e sejam amigos do prefeito da sua cidade. Têm que trabalhar em dois pontos: politicamente e juridicamente, as duas coisas; aí se consegue as coisas. Nós lá, hoje em dia, veio até a Secretaria Estadual de Educação numa audiência no Juizado, para atender às nossas reivindicações e foi o Secretário Municipal também, os dois estavam lá. Então agora, as coisas lá vão andar. Mas eu noto que vão andar, mas faltam profissionais. Aí, a Coordenadora Pedagógica da nossa escola foi professora emérita do município, quer dizer, uma mão de obra super especializada. E para fazer um projeto, ela, uma pessoa dita especializada, teve uma dificuldade enorme em fazer um projeto pedagógico para o atendimento dessas crianças. O nosso Secretário Municipal é ex-Reitor da

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Universidade, uma pessoa muito competente, ele viu que ela estava com dificuldades e aí o Padre Alcides Guareschi até sugeriu: Fala com o Mec, em Brasília, se tu não saber fazer um plano pedagógico. Então é o que eu digo, há uma dificuldade; então que facilitem às universidades a formação de professores.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Eu só gostaria de dizer para vocês que o Ministério da Educação elaborou um Edital, que fechou no dia 13 de abril, que se chama A Universidade Aberta do Brasil. Este Programa Universidade Aberta do Brasil tem, exatamente, este objetivo que o senhor coloca: as instituições, os municípios, os estados, poderiam apresentar projetos para a formação de professores à distância. Já tem uma comissão que está analisando, são inúmeros cursos que vão formar professores nas diversas áreas. A Comissão vai levar dois meses e meio para analisar, porque chegaram inúmeros pedidos de projetos. Então isso vai, justamente, ser incentivado. Eu já tenho conhecimento de projetos que chegaram no âmbito da Educação Especial. A Universidade Federal do Rio de Janeiro apresentou um projeto para a especialização de professores na área de deficiência visual, para todo o país, à distância. Nós temos também a Universidade Federal de Santa Maria, que já teve projeto aprovado na área de Educação Especial, pós-graduação. Então a Universidade Aberta do Brasil atende, exatamente, este objetivo. E, mais do que as universidades, ela abria a possibilidade para municípios que quisessem entrar. Bastava constituir, dentro do seu município, o pólo do educação à distância, que terá, pelo projeto, recursos para pagar os professores que irão ministrar, principalmente a partir da proposta de pagamento de bolsas para os próprios professores da rede de ensino, para trabalharem nesses cursos que serão ofertados pela Universidade Aberta do Brasil. Então eu acredito que, muito em breve, a gente vai ter notícias do quanto essa ampliação da universidade vai possibilitar a gente ter professores formados para atender essa demanda.

Keila Leite ChavesCeará

Eu queria só socializar a experiência de Fortaleza. Eu sou mãe de uma criança com deficiência, sem diagnóstico, porque a medicina também ainda não está capacitada e a nossa luta é pela inclusão. Nós somos um grupo de mães que acredita no Estatuto da Criança e do Adolescente, quando defende que toda a criança tem direito à escola perto de casa, mais ainda a criança com deficiência, porque a mãe não tem condições de estar carregando essa criança para o outro lado da cidade, uma vez que, geralmente, os bairros mais ricos é que têm instituições que atendem essas crianças. No caso de Fortaleza, nós estivemos com uma sede em que a gente ficava, num primeiro momento, com os nossos filhos, mas nós tivemos acesso à Declaração de Salamanca, que foi o que fez com que a gente lutasse pelo direito dos nossos filhos, a gente era desinformada. Eu recebi negação do meu filho em escola especial, nem escola especial paga recebia o meu filho. Quando eu tive acesso à Declaração de Salamanca, quem não quis mais a escola especial fui eu. Então eu queria a escola perto de casa, porque era um direito dele. Em 2005, matriculamos 25, entre adultos, crianças e adolescentes - que estavam na realidade de isolamento - em uma escola municipal. Fizemos seminários, o café da manhã com a equipe de transição da prefeita e hoje a gente participa da Comissão de Defesa do Direito à Educação. As crianças, que estavam todas numa escola só, hoje já estão nas escolas próximas de casa e estamos trabalhando junto com o município, estudando a melhor maneira para a questão da inclusão. Mas isso é um direito da criança. Quando nós chegamos, não encontramos a escola preparada para nenhuma criança – é a questão da exclusão, da pobreza, a gente sabe que a escola pública não está acontecendo – passamos por vários problemas, com certeza, mas estamos incentivando também os pais a lutarem pela

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qualidade da escola dos seus filhos, porque eles não acompanham a escola e é por isso que a escola não tem a qualidade devida.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

São experiências como essa que mostram que é possível. Eu gostaria de anunciar que o Rodrigo está aqui e o Conselheiro Antonio Carlos Cestaro está com uma moção de apoio à Educação Inclusiva. Ele vai passar e se os delegados quiserem ir assinando, ele vai passar. Pode continuar.

MargotSecretaria Municipal de Educação de Contagem/MG

Margot, da Secretaria Municipal de Educação de Contagem. A experiência da nossa cidade – quando nós entramos, no ano passado e a gente gostaria de falar nisso – é que nós apostamos no atendimento educacional especializado. Nós temos lá uma entidade que tem apostado nisso, que é a APAE de Contagem e, na verdade, trabalhando com os alunos, no horário extraturno, outras dimensões que não só o conteúdo e que têm contribuído para qualificar a educação deles. No início não foi fácil, nem todas as pessoas acreditam nisso. Nós trabalhamos junto com o Ministério Público, para discutir isso com os pais e estamos ampliando o atendimento educacional especializado, principalmente a questão que nós temos e que eu acho que todos têm, que é a formação dos professores. Eles não eram formados para isso, mas a formação se dá em serviço, a gente vive falando disso: se o aluno com deficiência não estiver na escola, ninguém vai se formar, ninguém vai querer aprender e estar com ele. Então, com todos os desafios, mas contando com a sociedade como um todo, com a comunidade, com as famílias e com os movimentos sociais. É lógico que temos grandes desafios: muitas vezes é uma escola que não está adaptada sob o ponto de vista físico, predial e a gente tem incrementado ações junto com outras Secretarias. A Secretaria de Educação não pode ficar sozinha tentando fazer a inclusão; assistência, saúde, obras, todos têm que estar ligados, principalmente porque o que a gente quer não é um projeto só para a educação, é um projeto para a sociedade. E a gente acredita que não tem que separar as pessoas por causa da diferença.

Ethel Rosenfeld Rio de Janeiro

Boa noite. sou professora de Educação Especial na área de deficiência visual, há 34 anos, no município do Rio de Janeiro. Cláudia, boa noite, parabéns pela sua exposição. Mas eu gostaria de propor ao grupo presente que nós, aqui, não ficássemos contando a experiência de cada município não. Nós sabemos que a realidade brasileira é bastante precária, nós sabemos que as políticas nacionais são muito boas, as escritas, mas nós não conseguimos implementar as ações. Então uma proposta que eu gostaria de fazer a todos, é que nós colaborássemos com o MEC e não criticássemos, nós trouxéssemos propostas de solução e não continuar cobrando. Não adianta, onde não tem dinheiro, onde não tem formação, não vamos nunca ter nada. Há 34 anos eu atuo e eu tenho certeza que quem foi para frente é porque sempre teve por trás uma família empurrando. Então nós temos que trabalhar na formação dos professores. Como é que se fala na inclusão se o professor de classe comum não está preparado nem para atender o aluno comum, quanto mais o aluno com alguma necessidade especial? Eu sou contratada periodicamente e quero dar um exemplo ridículo que acontece no estado do Rio de Janeiro: eu faço parte de uma equipe de professores que roda pelo estado todo para capacitar professores das cidades. Vocês sabem de quantas horas é o curso que me convidam a fazer? De 24 a 08 horas. Dependendo do tempo disponível daquela escola, daquela área, 24 horas. Aonde se prepara um professor para atender um aluno cego, em 24 horas? Nunca! Então, quando eu termino minhas capacitações, eu digo: Gente, desculpem, eu sei que eu não

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capacitei ninguém, mas apenas sensibilizei. Então temos que levar a sério, principalmente, a questão da capacitação do profissional nas universidades. E vocês sabem há quantos anos a gente ouve falar nisso? Eu já perdi as contas. Não é de agora, do governo da Cláudia não, é de muitos e muitos anos atrás.

Eu quero deixar claro que não é culpa dela, isso já rola no país há mais de vinte anos. Não é verdade, Edvaldo? Há quantos anos a gente tenta incluir essas cadeiras nas universidades e não conseguimos? Então é por isso que eu acho que, numa moção como essa, a gente tem que encontrar um caminho – que eu também não sei qual é, mas gostaria que todos ajudassem a pensar – para nós encontrarmos uma idéia concreta para ser dada, para ser levada. Não adianta contar experiências, todas são ruins. Desculpem, obrigada.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Eu só queria complementar, após a fala da Ethel, que o nosso curso Interiorizando Braille que já não é desenvolvido há bastante tempo, desde 2000/2001, é de 120 horas. E o Ministério da Educação coloca à disposição, por meio da apresentação de planos de trabalho, anualmente, apoio a projetos de formação continuada de professores até 80 horas. Então os municípios podem apresentar projetos, para a formação de 80 horas, em determinadas áreas que eles julgarem necessárias para a sua rede de ensino. É importante, mais uma vez, a pressão de vocês, que o município apresente projetos, porque é possível apoiar essa formação continuada com recursos do governo federal.

Secretarias Municipais de Educação e Secretarias Estaduais de Educação e, também, as instituições não-governamentais. Aqui eu quero fazer um parênteses sobre a importância da instituição não-governamental no apoio à Educação Inclusiva. Todos os municípios têm a instituição não-governamental e que ela seja, realmente, um apoio à Educação Inclusiva, com toda a sua experiência na área, desenvolvida até ao modo. Então é importante que haja esse apoio para a Educação Especial. É por isso que também apoiamos projetos das instituições para apoiar a Educação Inclusiva.

LianaCoordenadora do Grupo de Produção Braille/BA

O meu nome é Liana, eu sou de Senhor do Bonfim, na Bahia e sou Coordenadora do Grupo de Produção Braille. Eu queria fazer duas colocações: primeiro eu queria saber qual foi o critério que o MEC utilizou para escolher os municípios pólos na questão do direito à diversidade. E a segunda colocação é dizer ao pessoal que ainda não conseguiu – como falaram – psicológico, assistente social, fonoaudiólogo, como foi que nós conseguimos colocar esse pessoal na educação: através de concurso público, esse pessoal ficou lotado na administração e, com isso, nós os puxamos para a educação. Assim eles estão trabalhando na educação, psicólogos e assistentes sociais. Quanto à questão do fonoaudiólogo e dos outros, a gente buscou uma parceria com a saúde, porque todo o mundo é do mesmo governo, então a gente trabalha assim.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

É isso aí. Isso é que é importante.

A escolha dos municípios pólos se iniciou em 2003, com 106 municípios. Nós escolhemos, para fazer uma abrangência no município, a localização, em cada estado, de um município no norte, um

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no sul, um no leste e um no oeste. No mínimo quatro em cada estado, para a gente poder fazer uma abrangência que chegasse a municípios da abrangência. Nós não levamos em consideração número maior de população, nós não pegamos IDH, nada; então nós temos, no programa, municípios pequenos como pólo, municípios grandes como pólo e todas as capitais também entraram. Essa experiência também tem sido boa, porque a gente percebe que, muitas vezes, a política chega na capital, chega em municípios maiores, mas não chega em municípios pequenos que têm um bom trabalho a ser desenvolvido. Então o critério, realmente, foi a gente poder fazer uma abrangência dos municípios que estariam próximos. Em 2005 fizemos uma avaliação e percebemos que precisávamos incluir mais pólo para poder atingir uma meta de 83,5% dos municípios, que era a meta do programa. Então em 2005 nós incluímos mais 38 municípios e aí levamos em conta o número de municípios de cada região. Por exemplo, se em Minas Gerais eu tenho 800 municípios, eu precisava ter mais municípios pólos do que outros lugares que tinham municípios menores. A gente reconsiderou o número de municípios de cada estado, fizemos uma nova distribuição e também localizamos as abrangências para fazer essa seleção. O critério foi esse.

Célia Ricardino Moreira PereiraMinas Gerais

Eu sou Célia, de Minas. Eu queria fazer duas perguntas: vocês já têm uma data, uma previsão, de quando vai ser a inscrição para o Exame Nacional de Proficiência em Libras?

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Nós estamos com uma comissão técnica nomeada, que está trabalhando na elaboração do exame e estamos conveniando, ainda, com uma instituição de ensino superior, que fará a aplicação dos exames. Como temos uma previsão para agosto, acreditamos que no mês de junho, no máximo no início de julho, já estejamos iniciando as inscrições, mas esse momento ainda é um processo de organização do exame. Como é o primeiro exame, a gente está tendo muito cuidado, porque também estamos aprendendo nesse processo e, provavelmente para os anos seguintes, nós estaremos abrindo o credenciamento da instituição. Vejam que agora nós não tínhamos como credenciar, até porque tem instituição que não tem experiência na área. Então estamos buscando uma instituição que tenha experiência na área, que tenha capacidade técnica, inclusive, para aplicar em todas as capitais, porque nós vamos aplicar em todas as capitais. Então, precisamos estar conveniando com a instituição.

O exame vai acontecer em todas as capitais, no mesmo dia, no mesmo horário.

Participante não identificada

Mas não é o mesmo grupo que vai a todas as capitais?

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

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Não. Estarão sendo realizados em parceria com a instituição organizadora e instituições da capital. Então as universidades é que estarão apoiando a aplicação desse exame.

Sílvia de Souza CamposAlagoas

O meu nome é Sílvia. Eu represento o estado de Alagoas. Eu fiz aqui uma analise matemática com relação às porcentagens que você apresentou e estou preocupada. Enquanto nós temos 50% das crianças e adolescentes que, nos quatro anos do ensino fundamental, não se alfabetizam, nós temos 51% dos alunos concluindo o ensino fundamental, apenas. Significa que se 50% não estão alfabetizados, 51% passou, tem 1% boiando aí que não foi alfabetizado. Isso, no censo, com relação aos alunos que estão regularmente no ensino, na educação básica. Então me preocupa quando você coloca que a Educação Especial tem que assegurar esse recurso especializado. E quando se depende do SUS, quando se discute a questão da saúde presente como apoio à educação, todo o mundo conhece como é o perfil do SUS. Com relação à Educação Inclusiva, quando nós teremos 100% dos municípios brasileiros, cinco mil trezentos e poucos municípios brasileiros, participando, efetivamente, do Programa de Educação Inclusiva? Quando, se os programas contam com multiplicadores, esses multiplicadores vão somar? Porque, atualmente, eu percebo que esses programas que contam com multiplicadores estão mais para dividir, porque é um verdadeiro telefone sem fio, a gente não consegue ter uma qualidade. Tem-se uma quantidade mas não uma qualidade, na capacitação dos professores, como é, atualmente, no curso de licenciatura, quando os acadêmicos fazem a opção por Educação Especial, quando ela já é direito e então deve estar presente num programa de todos os alunos. Quais as estratégias do Ministério da Educação para que, realmente, se efetive a Educação Inclusiva, não apenas na questão de se ter quantidade, mas de se ter qualidade?

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Eu acho que a gente, por muito tempo, esteve fazendo uma grande confusão com relação a educação e a saúde. Muitas vezes a gente escuta: Determinada instituição é necessária. Aí dizem: Não, mas é para ela fazer só o atendimento educacional especializado. Sim, mas aí eu vou ficar sem os atendimentos de saúde. Essa importância da gente trabalhar como estratégia para a Educação Inclusiva. Eu estou aqui falando do que é que é preciso ter para acontecer a Educação Inclusiva. A estratégia é a formação de professores, é a organização do sistema de ensino, é uma gestão competente que fortaleça os serviços de Educação Especial. Ao mesmo tempo, eu tenho que trabalhar a questão da saúde, como apoio a esse processo. Então vejam que são duas áreas que têm que estar juntas e todo o tempo em que a gente fala que a Educação Inclusiva é necessária, as pessoas dizem: Mas eu não tenho fonoaudiólogo, eu não tenho psicólogo, eu não tenho atendimento de saúde. Eu estou falando aqui de atendimento educacional e nós precisamos, para que isso se efetive com maior qualidade, do atendimento de saúde coerente com o meu processo de inclusão, coerente com essa proposta. O que não se justifica é a gente dizer que a instituição especializada tem que se manter porque ela dá atendimento fonoaudiológico; ela dá e tem que continuar dando, para apoiar, para que os alunos tenham educação, para que eles possam avançar nesse processo educacional. Esta é uma política que fortalece esses serviços realizados pelas instituições não-governamentais. Fortalece porque é um suporte necessário à educação, eu preciso ter esse atendimento. Então a estratégia é fortalecer a educação e fortalecer a saúde, exigindo que esses serviços sejam disponibilizados. É a ampliação da oferta do atendimento especializado, o atendimento educacional especializado e o atendimento de saúde especializado. Acredito que, com uma estratégia que preveja na política esta formação de professores, a organização dos sistemas de ensino, a acessibilidade para a criação desses acessos e projetos pedagógicos que garantam a qualidade educacional para a educação, eu tenho um projeto coerente.

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Agora, que apoios de saúde mais eu preciso para garantir que esse aluno tenha a educação? O Ministério da Educação desenvolve o Programa Saúde do Escolar. Esse programa é destinado também aos municípios que solicitam consultas oftalmológicas e também aquisição de óculos para os alunos. Porquê? É uma política de saúde, porque se o meu aluno não está enxergando na sala de aula e ninguém identificou, ele não está tendo aprendizagem, ele está distraído e ninguém sabe porque, porque ninguém identificou que a necessidade dele era deficiência visual. Agora nós ampliamos, desde o ano passado, as consultas e exames de audiometria. Não existia financiamento, pelo governo federal, para consultas e exames de audiometria. Também colocamos, no âmbito do FNDE, o Programa Saúde do Escolar. Esses Programas Saúde do Escolar têm que ser multiplicados, têm que acontecer no município, tem que ser dada uma prioridade. Eu sei que o SUS trabalha sem priorizar o idoso, sem priorizar a criança, quem chegar primeiro, o SUS atende.

Olga Maria Tavares de SouzaRio de Janeiro

O meu nome é Olga, eu sou do Rio de Janeiro e gostaria de parabenizar a Secretaria de Educação Especial pelo trabalho que vem desenvolvendo agora, trazendo um novo rumo para a Educação Inclusiva, porque, ao longo dos anos, a história que nós temos de Educação Especial foi de segregação, foi de desrespeito, foi de manutenção de nossas crianças na escola sem que elas pudessem, efetivamente, mudar de série. Então hoje a gente vê mudanças efetivas e eu quero parabenizar vocês pela coragem de mudar uma política que vinha, ao longo dos anos, trazendo uma completa segregação. Você falou: Ah, que bom que a Conferência está trazendo esse assunto, eu quero manifestar aqui que a nossa Conferência não discutiu educação. Nós passamos dois dias aqui discutindo propostas que já vieram prontas. A gente tem uma moção passando aí de repúdio à Organização da Conferência, pela ausência de discussão da questão da educação e da saúde. Nós não teremos acessibilidade se não discutirmos educação. Então, colocar educação num Painel foi um desrespeito à educação. Na minha avaliação, educação tinha que ser tema de grupo, para que saíssem propostas. Agora estão todos desesperados aqui para fazer moções e tentar colocar ali. Isso foi um desrespeito, espero que a moção passe amanhã e eu gostaria muito que você, enquanto representante do MEC no CONADE, possa levar essa manifestação da Plenária. Foi um desrespeito a todos nós e agora que nós temos um tempinho para discutir educação, temos que discutir correndo, até no Painel, porque existem outras atividades. Então eu não me sinto contemplada nessa Conferência, mas eu entendo o trabalho que vocês vêm fazendo dentro do MEC, da mudança que ele tem trazido. Não está bom, existem várias reivindicações do meu estado e de todos os outros aqui que você precisava ouvir, porque você pode implementar aquilo que passa pelos nossos anseios, mas, infelizmente, estamos voltando para o nosso estado sem poder discutir a Educação Inclusiva. Isso é uma lástima e eu gostaria de registrar aqui.

Participante não identificada

Enquanto ONEDEF, organizando este Painel, eu gostaria de fazer um esclarecimento: esse Painel não está acontecendo por conta da Conferência, este é um Painel que está sendo promovido pela Organização Nacional de Entidades de Deficientes Físicos que tem a compreensão da necessidade desse debate. E nós não poderíamos perder a oportunidade de trazer esse debate. Então a Cláudia está como convidada. Fazemos parte do CONADE, mas, a partir do momento em que foi exposto no CONADE, que foi proposto esse tema, nós defendemos, mas, infelizmente, muitas vezes somos minoria. Então não poderia deixar de aproveitar a oportunidade e por isso a ONEDEF, enquanto entidade, é que está trazendo esse tema da Educação Especial. Portanto, se Cláudia não morasse aqui em Brasília, teria que custear a Painelista e tudo quanto envolvesse a vinda dessa Painelista. Eu agradeço por esse momento

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estar sendo muito importante, porque nós estamos vivenciando isso no cotidiano. É impossível não falarmos de Educação Inclusiva.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Vocês lembram bem que eu iniciei falando duma história que a Educação Especial viveu e, na época, o que se construiu era a concepção da época. Eu acho que, com certeza, a cada governo se busca implementar a ação de acordo com a política. Como ela não vai ter fala de novo, eu quero dizer que a importância do movimento que hoje acontece pela Educação Inclusiva é um movimento que não acontece sozinho pelo governo, ele acontece hoje porque ele tem esse amparo dos municípios, dos estados e da sociedade como um todo. E é por isso que a gente justifica que, realmente, o avanço que tivemos nos últimos anos da Educação Especial, se dá por essa atenção, por esse movimento que todos juntos estamos fazendo. Acho que é importante registrar, numa Conferência como essa, que Educação Inclusiva não se faz sozinha e ela hoje acontece porque ela tem esse apoio de toda a sociedade.

Mônica Dias de AraújoPará

Parabéns pela Palestra, Professora Cláudia. O meu nome é Mônica, eu sou de Altamira, no Pará e eu gostaria de saber se o programa de implementação do CAS é um programa específico da capital e se ele só pode ser vinculado às Secretarias Estaduais, ou se pode ser vinculado também às Secretarias Municipais e se pode ser estendido para o interior, uma vez que a realidade do Pará, por exemplo, é de municípios muito distantes da capital, o que dificulta esse acesso de todos os municípios a esse programa de apoio à pessoa surda.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Esse programa começou, inicialmente, com uma meta de todas as capitais, mas esse ano ele já está sendo implementado em municípios: nós temos Cascavel, no Paraná, nós temos Ribeirão Preto, em São Paulo e também Uberaba. Então a gente já está estendendo essa política para o município. Agora, é por isso que eu falo muito em parceria: o CAS, tanto no estado quanto no município, tem uma indução pelo Ministério da Educação, mas ele tem uma manutenção pelos estados e municípios. Então essa política tem que ser local; o município pode ter um CAS, mas ele também tem que querer esse CAS; o município pode participar do Programa Educação Inclusiva, mas o prefeito tem que querer participar, tanto que ele assina um termo de adesão que vai modificar o seu sistema educacional e vai transformá-lo num município que tem Educação Inclusiva. Esse compromisso é necessário, porque não adianta o Ministério da Educação implementar uma política que não seja apropriada pelo município ou pelo estado, a coisa está fadada ao insucesso.

Ilda da Conceição SalvatorioAPAE/RO

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Eu sou Presidente da Federação Estadual das APAE’s do estado de Rondônia e muito bem falou a companheira do Rio de Janeiro. Nós lançamos o nosso movimento das APAE’s há 52 anos. Nós não acreditamos na inclusão propriamente dita, não acreditamos que o ensino regular, com uma sala de 40 alunos, vá dar atendimento especial ao PC, por exemplo, em que você tem que levar no banheiro, trocar a fralda dele, dar banho, dar comida na boca e tudo. E é necessário também que nós tenhamos também as clínicas, porque ele precisa só da parte pedagógica, ele também precisa da fonoaudióloga, da fisioterapeuta, da terapeuta ocupacional, do clínico, do médico, do dentista, de todas essas pessoas. Agora muita gente está dizendo: Parabenizo o MEC, parabenizo a Educação Especial pelo trabalho que está fazendo de inclusão. Mas esse movimento começou com uma Procuradora de São Paulo, chamada Maria Eugênia, que tem uma criança portadora de Síndrome de Down. Dizem que a educação é para todos, está na Constituição, está na LDB, mas a filha dela não era aceita em escola nenhuma. Ela então usou os direitos que existem na Lei e fez esse movimento, em que dizia que os pais que não levassem os filhos para a escola seriam presos, na escola que não aceitasse o diretor poderia ser preso, etc. Aí começou esse movimento, mas ele já existe, desde 1960, com a palavra integração, que é a inclusão do portador de deficiência. Depois veio segregação, sociabilização e, agora, inclusão.

Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Gostaria de dizer que o movimento da inclusão começou em 1994, com a Declaração de Salamanca. E eu não quero começar de novo, aqui, porque no início eu já falei para vocês qual é a diferença entre integração e inclusão. Então eu acho que não cabe a gente dizer de novo qual é a diferença entre integração e inclusão, esse debate pode voltar em outra hora. Tem outras pessoas aqui que querem falar, mas a inclusão, hoje, está posta, ela não retrocede e eu acho que esse debate com relação ao Ministério Público de São Paulo é um debate que, se nós formos fazer aqui, eu tenho todas as respostas para te dar, mas vai faltar tempo e a gente até pode conversar depois.

Marilene Ribeiro dos SantosAPAE/DF

Quero realmente dar os parabéns ao Ministério da Educação pelo trabalho que apresentou, inclusive de enfrentar uma Assembléia como essa. Quando começou a discussão no país eu estava no Ministério da Educação, em 1994, sei que é difícil você mudar o paradigma. Mas eu estou preocupada porque você falou muito na questão da invisibilidade que tem a Educação Especial e os alunos da Educação Especial. Hoje eu estou trabalhando na Federação Nacional das APAE’s e tenho por incumbência – a gente já conversou, inclusive – estruturar o atendimento educacional especializado. É um trabalho que a gente vai começar, junto com o Ministério da Educação. Então o que eu quero trazer aqui, inclusive para serenar os ânimos, é exatamente como é que o Ministério da Educação, a Federação Nacional das APAE’s e as outras entidades congêneres vão institucionalizar esse atendimento e fazer com que a rede de ensino, o sistema educacional brasileiro, realmente incorpore, no sistema educacional, a Educação Especial – que é um trabalho em que todo o mundo vem trabalhando há muito tempo – e incorpore, aceite e enxergue o trabalho das APAE’s e das Pestalozzis e das outras nesse apoio da rede de ensino ao sistema educacional especializado. É um trabalho que a gente já começou a conversar, já fez um curso e agora a gente vai ter uma conseqüência ou seqüência. E nós estamos propondo a realização de cinco Encontros Regionais, trazendo os Presidentes das Federações Estaduais das APAE’s em todas as regiões e os diretores de escola, para a gente construir essa parceria. Eu entendo inclusive, Cláudia, que deveria sair do Ministério da Educação, após isso, um trabalho conjunto, um parecer conjunto – eu não sei que nome que se dê - algum documento, para que o município e a Secretaria de Educação Estadual e Municipal enxerguem, realmente, esse trabalho que a Federação está se propondo a fazer.

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Cláudia GriboskiSEESP/MEC

Eu acho que é importante colocar para vocês a criação do Programa PAED – Programa Complementação ao Atendimento Educacional Especializado. Ele foi criado em 2003, justamente para apoiar a realização do atendimento educacional especializado nas instituições não-governamentais. Esse programa pode ser pouco, é 33/50 per capita, mas ele se soma ao PDDE, a todos os outros programas que as instituições não-governamentais também têm. Nós precisamos fazer uma discussão, inclusive, desses programas. E o art. 3º da Lei deste programa tem a coisa mais importante de qualquer recurso que é destinado per capita: ele regulariza a situação dos professores que, hoje, estão cedidos para a instituição não-governamental. A realidade, hoje, é que a grande maioria dos professores que estão nas APAE’s, Pestalozzis e outras instituições são cedidos da rede municipal ou estaduais. Os melhores professores da rede municipal, que são habilitados e especializados, lá estão. Até então, antes da regulamentação do PAED, os professores que estavam cedidos não eram pagos pelo FUNDEF, eles eram professores de apoio e isso interferia na vida funcional deles a tal ponto que eles já não queria mais ser cedidos. A partir da Lei do PAED, ficou regularizada a situação e todo o professor cedido à instituição, pago pelo FUNDEF, pelo município – uma grande parceria estabelecida – está, hoje, com a sua vida funcional regularizada, porque passa a ter exercício das suas funções como se fosse num magistério público municipal ou estadual. Independente de qualquer valor per capita, que é um apoio, por menor que seja é um apoio, um programa que não existia e que foi somado a outros programas é essa regularização da vida funcional dos professores. Então é preciso analisar os programas numa amplitude; eu acho que a gente não pode discutir isoladamente todos os programas que existem, hoje, à disposição do sistema de ensino e das instituições não-governamentais. Quero colocar para vocês que, quanto essa intenção que a Marilene colocou da gente estar fazendo essa discussão, a gente já havia começado, também no ano passado. A Revista da FENAPAE publicou a política de Educação Especial entre o Ministério da Educação e Federação Nacional da APAE’s. Ela está publicada na última Revista da FENAPAE e é um passo muito importante, porque nessa modificação desta política, muitas coisas foram colocadas e coisas que não são verdadeiras. E nós precisamos ser pessoas esclarecidas, precisamos buscar a informação. Ninguém é dono da verdade, mas, muitas vezes, falta informação e há uma distorção de informação que, em vez de favorecer a política local, desvirtua o processo.

Joelson Estumano GonçalvesPará

Eu sou o último, vou fechar. Na verdade eu estava em outro Grupo, só que eu não achei a discussão interessante e procurei onde estava a Educação Inclusiva. Eu sou Joelson, sou do Pará, do município de Cametá. Eu queria fazer uma contribuição, porque se fala, hoje, em inclusão, eu acho que tem que se colocar a respeito de cada situação e condição. Por exemplo: em Cametá nós temos a cidade, que é a sede e temos o interior, que são as ilhas ribeirinhas. Quando se fala em incluir e, como a colega falou, integrar. Integrar não é a mesma coisa que incluir, porque integrar era as pessoas irem para a sala de aula e tentarem se adaptar ao meio e inclusão, agora, é o contrário. Então, em Cametá, quando se fala em inclusão, eu faço uma pergunta e quero ajuda: como é que eu vou incluir uma criança que tem paralisia cerebral ou deficiência múltipla no interior, onde eles vão de casquinho e têm que subir numa ponte, chegam lá e não tem escola, é um barraquinho? Como é que eu vou fazer isso? E na cidade, como é que eu vou incluir, se a inclusão, hoje, está atrelada à acessibilidade, escolas não adaptadas, professores não capacitados, toda essa problemática? Então eu acho que hoje a Educação Especial ainda é uma coisa diferente de realidade. Hoje, em Cametá, nós temos um Centro de Reabilitação, que é o CAD, do qual eu sou Diretor, onde nós damos suporte para a Educação Especial na reabilitação da criança, porque um dos erros que aconteceu – eu digo “erros” porque os professores iam buscar essas crianças nas casas, para a Educação Especial, mas elas já estavam adultas, crianças na sua idade mental,

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mas adultas na sua idade cronológica. E hoje o CAD serve na reabilitação e nesse apoio, mas eu ainda digo que essa inclusão deveria ser feita de acordo com a realidade de cada um. Muito obrigada.

Cláudia Griboski SEESP/MEC

É uma pena que tu não tenhas estado desde o início no nosso debate, porque, realmente a inclusão, hoje, está posta enquanto conceito, enquanto princípio e enquanto uma proposta de organização. E a todos nós cabe a tarefa de perseguir, de orientar e de buscar que ela se efetive. Nós não podemos dizer que a inclusão, a partir de amanhã, vai ser realidade, porque isso demanda uma organização e, dependendo da realidade, vai levar mais tempo sim. Mas ela não pode – e eu inclusive falei de um slide aqui antes – ela não pode justificar a rejeição de uma criança na escola devido a esses motivos de ainda não ter acessibilidade. Quer dizer, vamos buscar implementar e eu acho que é princípio, é concepção e nós não podemos voltar atrás. É um processo. Eu vou encerrar e quero só passar para vocês uma historinha que é importante para fechar o debate que a gente teve aqui. Eu acho que muitos já devem ter visto na Internet, já devem ter recebido, mas eu acho que é importante, porque muitas vezes a inclusão não acontece não só por todos esses motivos que ele colocou agora; muitas vezes a inclusão não acontece por uma pré-determinação, um pré-conceito que nós fazemos com relação às pessoas com deficiência. É a história dos sapinhos, que é uma lição de vida e que diz assim:

Era uma vez um grupo de sapinhos que organizaram uma competição e o objetivo era alcançar o topo de uma torre muito alta. Uma multidão se juntou em volta desta torre para ver a corrida e animar os competidores e a corrida, então, começou. Ninguém, naquela multidão, acreditava realmente que uns sapinhos tão pequenos pudessem chegar ao topo da torre. Eles diziam coisas como: É difícil demais, eles nunca vão chegar ao topo. Ou então: Eles não têm nenhuma chance, a torre é muito alta. E após todas essas vozes que falavam, os sapinhos começaram a cair, um por um. Só alguns poucos continuaram a subir mais e mais alto. A multidão, então, continuava a gritar: É muito difícil, ninguém vai conseguir! Outros sapinhos se cansaram e desistiram, mas um continuou a subir, a subir e a subir. Este não desistia. No final, todos os sapinhos tinham desistido de subir a torre, com exceção do sapinho que, depois de um grande esforço, foi o único a atingir o topo. Naturalmente, todos os outros sapinhos queriam saber como é que ele conseguiu chegar ao topo da torre. Um dos sapinhos perguntou ao campeão como é que ele conseguiu forças para atingir o objetivo. E o resultado foi que o sapinho campeão era surdo.

Então, muitas vezes nós temos que não ouvir coisas que nos dizem, nos fazermos de surdos e acreditar naquilo que realmente a gente, como princípio, entende que a educação tem que acontecer. Eu quero agradecer essa oportunidade de ter estado aqui neste Painel, quero agradecer à Regina pela indicação do meu nome para esse Painel, melhor ainda, pela participação do Ministério da Educação neste Painel. Eu também havia proposto um Painel que não conseguiu espaço, depois de tantos que foram propostos e a Regina já colocou que nós lutamos para que tivesse uma Mesa grande de educação, porque acreditamos que é pela educação que todo o resto vai acontecer. Muito obrigada.

4.6 Tema: Atuação do Ministério Público na Garantia da Acessibilidade da Pessoa com Deficiência

Rebecca Monte Nunes BezerraPromotora do Ministério Público/RN

Eu vou falar aqui um pouquinho do trabalho que está sendo desenvolvido no nosso estado. Lá nós somos um total de 70 Promotores na área de pessoas com deficiência, em todo o estado. Na capital, nós temos três Promotorias especializadas na área de direitos da pessoa com deficiência e do idoso e

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temos mais o Centro de Apoio Operacional a essas 70 Promotorias – o CAOP – e, no nosso Ministério Público, somos em número de 06 e um deles destinado a essa área.

Esse trabalho que eu estou apresentando aqui não é um trabalho só meu, muito pelo contrário, é um trabalho de toda a instituição, de todos os colegas, os 70 colegas que estão trabalhando nesta área.

Nós, enquanto Promotores de Justiça, temos duas maneiras de atuar: uma maneira preventiva e uma maneira repressiva. Como é que nós podemos fazer atuar de maneira preventiva, ou seja, antes mesmo que aquele direito seja violado? Uma das ações que nós desenvolvemos lá é palestras e cursos, por exemplo. Na palestra, nós saímos – tanto em termos de CAOP quanto em termos de Promotorias – a toda a sociedade. Onde está precisando levar o direito, nós vamos.

Irei mostrar uma iniciativa. Em Serrinha dos Pintos foi detectada uma síndrome, não sei se os senhores já ouviram na mídia; em virtude do casamento entre parentes, se desenvolvia essa doença genética. Então lá é preciso se investir muito em acessibilidade, mais ainda, você tem um problema pontual, quer dizer, há um grande número de pessoas com deficiência, no caso física, concentradas em Serrinha dos Pintos.

Então, Serrinha dos Pintos é uma cidadezinha muito longe de Natal, são seis horas de viagem depois de uma serra e muito carente. Nós estimulamos, o Promotor de Justiça vestiu a camisa, ele estava muito preocupado com a realidade da sua região e organizou, junto com a sociedade civil e as Prefeituras de Serrinha dos Pintos e Martins, este grande Evento. Aqui, como nós podemos ver, é um ginásio de esportes com mais de mil pessoas reunidas. Tinha de criança a idoso; as crianças estão aqui no chão, porque já não tinha mais cadeiras e então nós aproximamos. E o mais importante de tudo é que não se escutava um ruído. Parecia até que estavam prendendo a respiração para que pudessem escutar melhor o que a gente estava falando. O que é que isso indica? Isso indica o quando a sociedade necessita de conhecimentos, o quanto é importante que a gente vá até onde ela esteja. E eu gostaria de registrar que, nos meus sete anos de atuação no Ministério Público, para mim esse foi o momento mais emocionante da minha carreira, foi esse contato com o público. E juntamente com isso, naquela Mesa grande, às vezes uma comunidade ou um município que sequer conheceu um Promotor, nesse dia conheceu sete, porque nós também convidamos todos os Promotores da região e todos os Prefeitos de todos os municípios, a quem nós falamos sobre Educação Inclusiva, sobre acessibilidade.

Depois foi feito um mini-curso na cidade de Martins, que era muito próxima, para engenheiros, arquitetos e interessados na área da acessibilidade. Aqui é a administração do curso e aqui é a Mesa formada. Então é muito importante, também, esse contato direto, porque aqui nós ficamos sabendo exatamente onde nós podemos trabalhar, para onde nós podemos dirigir os nossos esforços. Foi realmente um aprendizado, para mim.

Aqui nós temos, na Mesa, os Promotores de Justiça. Susana, que é Professora da Sub-Coordenadoria de Direitos de Educação Especial e Ana Antonioni, uma médica geneticista, para esclarecer para a sociedade o que era a Síndrome. Voltando ao curso, outra atuação que nós estamos fazendo é uma parceria com o CREA e com os sindicatos da construção civil, no sentido de fazermos um curso de acessibilidade para mestre de obras e técnicos em edificações. Porque isso, além de haver cursos para arquitetos e engenheiros, juntamente com o CREA? Não é que o Promotor de Justiça vá ensinar como fazer uma rampa com a inclinação exigida pela Norma, como se tornar um banheiro acessível. Não, mas nós fazemos uma parceria com esses órgãos, nós passamos a bater na questão da Legislação e eles vão desenvolver o conteúdo técnico. Então esse curso de mestre de obras também já está para sair. Porquê? Porque nós entendemos que é importante que quem está lá na ponta, no canteiro de obras, executando o serviço, entenda o porquê de estar fazendo aquilo. Então isso evita que se faça uma rampa, um declive na calçada e, depois deixe, de espaço, uma vala de 30cm e a cadeira fica presa ali para poder chegar ao calçamento. Então, com isso a gente espera que realmente, atuando preventivamente, a gente possa estar colaborando e diminuindo o trabalho futuro, porque é muito mais sensato a gente construir certo do que derrubar e reformar.

Outra atuação preventiva que nós fazemos, tanto preventivamente quanto repressivamente, como o colega já falou, é a celebração em termo de ajustamento de condutas com as Prefeituras e

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Secretarias. A gente está difundindo esse trabalho também para o interior do estado. Nós firmamos um Termo de Ajustamento de Conduta que nada mais é do que um acordo, mas um acordo cujo descumprimento implica em uma sanção, em uma multa. Nós firmamos, com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, um Termo de Ajustamento de Conduta, em que ela se obriga a só liberar alvará de construção e reformas e conceder habite-se para aquelas edificações que cumpram ou estejam cumprindo rigorosamente as formas de acessibilidade. Então com isso, o que é que a gente está fazendo? Está evitando que sejam construídas novas edificações inacessíveis. As Recomendações também vão para as Prefeituras do interior e para as Secretarias de Obras, que também são responsáveis pelos alvarás, ou seja, nós estamos pegando no compromisso para que se cumpra a Lei.

Outra atuação nossa – eu estou falando assim porque é interessante falar um pouco sobre o que vem acontecendo com a gente, lá no Rio Grande do Norte – que tem dado muito resultado é nós criamos um grupo de estudo em matéria de acessibilidade. Que grupo é esse? Atualmente a gente está com 18 Promotores de Justiça e eles mesmos se encarregam, é um trabalho voluntário. Nós nos reunimos uma vez por mês com as duas arquitetas do CAOP e vamos destrinchar toda a Legislação em matéria de acessibilidade, tanto as Normas, como a Legislação. Porque isso? Porque a gente não pode cobrar aquilo que a gente não conhece. E, assim, com essa troca de informações com a arquiteta, nós estamos fazendo duas coisas: uma, uniformizando o nosso entendimento, porque é muito importante que a Promotora de Justiça de Natal esteja exigindo o cumprimento da Norma da mesma forma que o Promotor de Justiça da Comarca de Martins. E, com isso, também estão surgindo várias idéias de Recomendação em termos de ajustamento de conduta e, então, estamos firmando o nosso entendimento.

Uma outra ação que nós fizemos foi uma revistinha, uma revista em quadrinhos que fala pouco, de uma forma bem didática e faz parte de um projeto maior que temos na nossa instituição, que é Aprendendo a Ser Cidadão com o Ministério Público. Ela traz, de uma maneira bem clara, bem didática, os direitos básicos da pessoa com deficiência: direito à escola, o lazer, uma série de coisas, o acesso a escada, os acessos a shows e tudo o mais, de uma forma bem tranqüila, bem calma. Para quê? Para que seja aplicado no ensino básico e fundamental das escolas públicas. A escola privada, se quiser ter acesso a essa revistinha, ela paga, ela confecciona a revistinha. Na escola pública, dependendo da programação, ela é distribuída em toda cidade de Natal.

E temos o Projeto Aprendendo a Ser Cidadão com o Ministério Público, que vai desde um programa semanal, onde toda a semana vai um Promotor para uma rádio falar um pouco sobre os direitos dos cidadãos. Não é só da pessoa com deficiência, mas um dia é o direito à cidadania, outro dia é o direito ao meio ambiente e por aí vai.

Esta é uma revistinha e aqui está sendo aplicado a uma escola de Natal, a uma escola privada. A foto foi autorizada pelos pais. Aqui é uma edificação que fica na frente da minha janela, lá de casa – eu aproveitei para tirar a foto – mas quer dizer a preocupação da garantia das acessibilidades da forma que a Lei exige. Aqui, no caso de unidades habitacionais, o apartamento que precisa estar com a sua área coletiva acessível.

Aqui é só para dizer da necessidade do curso para mestre de obras e pedreiros. Gostaria de saber se existe algum cego aqui, que eu precise descrever? Perdoe, então, eu não estava descrevendo.

Aqui nós temos uma calçada que tem tudo direitinho, o piso alerta, nós vemos um rebaixamento correto, mas há um espaço entre a calçada e o calçamento que faz com que a cadeira fique presa. Então o pedreiro e o mestre de obras precisam de entender o porquê da necessidade de haver uma continuidade do piso.

Atuação repressiva: nós temos instauração de inquéritos civis para escolas, prédios públicos e de uso coletivo, celebração de táxis. Como é isso? Nós temos que eleger uma prioridade: nós nos deparamos com uma cidade totalmente inacessível, não só Natal, capital, como todas as cidades do nosso estado. Então, por onde começar? Ciente de que o direito da cidadania começa na escola, nós resolvemos começar, não deixando de lado as outras edificações – e aqui eu estou dando um enfoque maior à acessibilidade, já que é o tema da Conferência – sem deixar de lado também os outros setores, setores hoteleiros, de restaurantes, a questão de bancos, todas aquelas edificações de uso coletivo, etc.

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Inclusive nossa própria Procuradoria, no começo, não era acessível e agora nós temos uma Procuradoria muito próxima das condições ideais de acessibilidade. Eu também trouxe fotos dela.

Agora, o que é que a gente precisa, qual é o instrumento, uma grande ferramenta de que a gente precisa? A gente precisa ter laudos que identifiquem que aquela edificação está em desacordo com a Legislação em vigor. Então, para isso, nós tentamos conseguir arquitetos que fizessem essas perícias. Dentro dessa necessidade, foi firmado um convênio com o UNICEF, que bancou uma arquiteta e vistoriou mais de 600 escolas na capital, Parnamirim e Macaíba, sendo públicas e privadas. E a gente vem chamando cada responsável por essa edificação para celebrar um TAC. Todas as escolas já estão periciadas, nós estamos chamando - e já passamos da metade - para a celebração do TAC e até agora só uma escola se recusou a fazer a acessibilidade. E, nesse caso, a gente vai ter que entrar com uma ação civil pública.

É uma escola privada, inclusive uma escola privada que se dizia inclusiva. Nós temos pessoas com deficiência na nossa escola, mas ela não queria garantir, também, para a pessoa com deficiência física.

Esse movimento do UNICEF resultou em um programa, que eu vou mostrar mais adiante e todo um apoio que vem sendo dado à gente. Nós também contamos com duas arquitetas, no próprio CAOP: uma é voluntária e a outra é de extensão e vistoria as obras do interior e estamos conseguindo mais uma escola, que vem do governo do estado. Temos também uma parceria com a CORDE local. Como? Ela também, muitas vezes, nos fornece perícias.

Em matéria de escola, tudo isso está dentro dessa campanha da gente, que é A Escola é Para Todos, uma campanha do Ministério Público do estado do Rio Grande do Norte. E com isso nós vamos levando essa campanha para todas as comarcas do interior do estado. Como é que se dá essa campanha? Como é que a gente consegue envolver o governo municipal? Nós chamamos para uma reunião, com a presença do Promotor de Justiça da comarca. Se ele desejar a presença do Centro de Apoio, nós vamos também para conversar com Prefeito, Secretário da Educação, Secretário de Obras e Secretaria da Saúde. Visando o quê? Implementar a Educação Inclusiva na escola.

Porque é preciso tantas Secretarias? Na área de pessoas com deficiência, nós não podemos garantir a educação para todos se a escola não está acessível. Para isso é necessário que a Secretaria de Obras não construa escolas inacessíveis e reforme as já existentes, de forma a retirar os obstáculos arquitetônicos existentes nessa edificação. A Secretaria de Saúde precisa dar um respaldo; muitas vezes o aluno não vai para a escola porque não tem acesso à cadeira de rodas. Então, é preciso que a Secretaria de Saúde garanta, também, a parte de saúde. Muitas vezes é preciso ter um acompanhamento médico, precisa de medicamentos. Então não se pode falar em educação desassociada de ações de saúde. E a própria Secretaria de Educação: o é que a Secretaria de Educação, além de capacitar os professores, de tornar acessível a sua escola, vem fazendo? A nível estadual foi implantada uma idéia muito interessante para o atual estado em que nós estamos, que se chama a matrícula antecipada. Eu digo no atual estado em que nós estamos porque nós pretendemos que, um dia, não seja preciso fazer matrícula antecipada de ninguém. Aí, finalmente, nós chegamos à escola para todos. Essa matrícula antecipada ocorre em outubro. Para quê? Para que a escola tenha um tempinho a mais para correr atrás do material didático adaptado, carteira adaptada, ver como é que está o estado de acessibilidade dessa escola e tudo o mais.

Os outros envolvidos são os diretores de escola, Conselhos, correios e o CRI. Porque os correios estão envolvidos aqui na escola. Isso aqui foi outra ação que foi desenvolvida lá na capital, que foi uma parceria com os correios. Nós tínhamos um estado com 17% de pessoas com deficiência, mas só 2% dessa população estava na escola. E onde está o restante? Essa é a nossa grande dúvida. Então se fez uma parceria com os correios e o carteiro, cada vez que ia uma correspondência – e, na capital, o carteiro vai a todas as regiões – identificada quem estava lá, criança ou adolescente, fora da escola, preenchia um formulário e remetia à Promotoria de Justiça. A Promotoria de Justiça vai chamar o pai, vai chamar a mãe e vai saber o porquê. Aí nós identificamos crime de recusa de matrícula, nós identificamos falta de conhecimento desse direito à educação, à escola comum. Então nós podemos, realmente, ter contato com aquela criança e aquele adolescente que estão fora da escola.

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E o que fazer para o interior do estado, uma vez que o correio não chega em todos os pontos? Aqui nós tentamos fazer uma parceria no interior do estado com os agentes do Programa Saúde da Família, porque eles sim, chegam a todos os pontos daquele município. E, agora, nós também estamos fazendo com a capital uma parceria com o CRI – Centro de Reabilitação Infantil – um órgão público, do governo do estado, que atende 6.000 crianças e adolescentes com deficiência. Isso foi até uma coisa muito ousada, porque a Educação Inclusiva, agora, ou acontece ou vai ser um desastre, porque nós estamos trabalhando, exatamente, com aquele percentual da população que está na idade escolar – crianças e adolescentes – para verificar, exatamente, se eles estão ou não na escola. E uma característica do CRI é que 70% desses atendidos também são oriundos do interior do estado. Então isso vai nos permitir, também, desenvolver um trabalho não só na capital, mas também em nível de estado.

Nós temos aqui os parceiros diretores das escolas privadas. Muitos deles, graças a Deus, já estão recebendo tranqüilamente, procurando a Secretaria Estadual para saber como adaptar a escola para receber aquele aluno. Claro, temos muito trabalho, muitas vezes somos muito chatos, considerados até meio radicais, mas é porque, realmente, a gente trabalha com o seguinte pensamento: se o direito não é nosso, nós não podemos abrir mão. Então isso sempre vem nos norteando, quer seja em matéria de acessibilidade, quer seja em Educação Inclusiva, em todas as nossas ações.

O que cabe à Secretaria de Educação nessa campanha?

• Levantamento do número de alunos com deficiência matriculados, para a gente saber até quantos alunos foram inseridos na educação, depois desse trabalho de levantamento.

• Matrícula antecipada, de que eu já falei.

• O recebimento dos alunos com deficiência pela escola comum, na rede regular de ensino, nela os fazendo permanecer.

Isso porque não interessa, para o Ministério Público, o aluno “vaso”, aquele que fica ali na sala de aula, todo o mundo vê, todo o mundo sabe que ele está ali, mas ninguém interage com ele.

O Promotor de Justiça vai fazer:

• Requerimento do levantamento do número de alunos.

• Divulgação do direito da pessoa com deficiência na escola.

• Reunião com prefeitos, secretários, diretores e demais envolvidos.

• Expedições de Recomendação para a realização de matrícula antecipada e do recebimento dos alunos, com eficiência, pela escola.

• Celebração do ajustamento de condutas e convênios.

• Recebimentos dos formulários dos Agentes de Saúde.

• Análise de cada caso, de cada aluno com deficiência, através da escola.

Aqui eu estou mostrando fotos da nossa nova sede da Procuradoria Geral de Justiça. Houve um acompanhamento também da Promotoria e nós vivemos a preocupação, realmente, de implementar a acessibilidade. Está faltando agora a questão do piso alerta e piso direcional – já se vai fazer a licitação – a realização de projetos e a sinalização vertical. E também fizeram as barrinhas totalmente em desacordo com a Norma e há alguns banheiros lá em que é preciso fazer uma adaptação. Então a gente vem também acompanhando isso e, realmente, eu tenho esse sonho de ver a nossa Procuradoria, que é a nossa casa, um veículo em que você tem que dar o maior exemplo, acessível. E a gente vem procurando, também, que isso seja motivo de preocupação quando o Procurador Geral vai alugar uma casa no interior do estado para fazer a sede da Procuradoria. Temos agora a construção de Procuradorias padrão, que são sedes da Procuradoria de Justiça. O trabalho também foi analisado, está todo acessível, para a gente não ficar construindo e dando mau exemplo em edificações inacessíveis.

Nas escolas públicas e privadas nós tínhamos uma realidade. Eu estou mostrando uma transparência onde um degrau, muitas vezes - que não é nem percebido para quem não tem deficiência

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física, ou mobilidade reduzida – é um grande obstáculo para a adequação. Aqui nós temos uma menina parada numa porta onde existe esse degrau de que eu falei e a porta, também, não tem a largura de 90cm. E na outra foto nós temos - depois do TAC, depois da escola se adaptar – essa mesma criança dentro da sala de aula, inclusive com a carteira adaptada, porque o mobiliário também tem que fazer parte da preocupação na hora da celebração do Termo de Ajustamento de Conduta.

Aqui é uma outra foto, que graças a Deus aconteceu, porque quando eu falava em matéria de acessibilidade, sempre me falaram que isso era uma utopia e agora eu tenho uma foto para mostrar que a utopia está se tornando realidade: aqui tem a foto de duas plataformas verticais, que são uns elevadorezinhos bem básico do básico, em escolas públicas municipais, na cidade de Natal. Isso é uma prova de que o nosso sonho está, realmente, se tornando realidade.

É a plataforma vertical. É bem básica. Não é aquele elevador que a porta abre assim, mas permite, tranqüilamente, o acesso ao pavimento superior.

Aqui nós estamos com o Diretor do CRI, Rilder Campos – eu já falei da nossa parceria.

Aqui também é para mostrar que não é qualquer rampa que garante acessibilidade. A gente tem se preocupado e tem lutado por rampas, realmente, dentro da Norma. Aqui a inclinação está correta e é possível que se faça o giro da cadeira para se entrar na porta.

Eu estou mostrando aqui dois slides: um com a fachada frontal de uma escola, onde se tem a acessibilidade na calçada e também estou mostrando um banheiro onde, de uma forma muito simples, muito básica, esse banheiro já é acessível.

Aqui é uma escola, que eu visitei, que tem alunos surdos e alunos sem deficiência. O professor é quase um super-professor, porque aqui ele se comunica mesmo com os alunos e tem essa técnica. Eu estava falando com a turma e eu ainda não sei me comunicar em linguagem de sinais.

Aqui eu estou mostrando uma sala de apoio, onde tem computadores e a turma trabalhando, professores e alunos.

Aqui é a nossa campanha e eu vou passar – já está acabando o meu tempo – para o projeto que foi desenvolvido a partir do convênio com o UNICEF. Esse sistema foi batizado como SICAE – Sistema de Controle de Acessibilidade na Escola – e está sendo feito, primeiro, para o município de Natal. O SICAE, a partir dos laudos realizados pela arquiteta, no caso a Doutora Giordana Calado, que fazem parte desse sistema, é possível que a gente possa acompanhar e que qualquer pessoa da sociedade possa acompanhar o nível de acessibilidade que existe naquela escola.

Aqui na tela aparece o que é o SICAE – Sistema de Controle de Acessibilidade na Escola: visa reunir, num banco de dados, todas as informações referentes à acessibilidade existentes nas escolas da região metropolitana da grande Natal, Macaíba e Parnamirim, nos níveis infantil, fundamental e médio. Tais informações são de grande importância para a sociedade, pois possibilitam o acesso aos portadores de deficiência [inaudível] das instituições de ensino, contribuindo, assim, para que seja formado desde cedo, nessas pessoas, o sentimento da cidadania.

Essa transparência mostra que, a partir do laudo da arquiteta, nós formamos o banco de dados que vai para o Sistema SICAE e, com isso, é formado um mapeamento. Porquê? Porque a partir do momento em que esse banco estiver funcionando, a gente vai saber qual o nível de acessibilidade da escola e qual é a escola mais próxima à residência do aluno a que ele possa se dirigir e na qual vai ser melhor atendido. Também esperamos que esse banco não venha para ficar, até mesmo porque os TAC’s têm prazo para cumprimento e esperamos que eles não fiquem por tanto tempo com a necessidade de prorrogar uma escola melhor adaptada.

Aqui eu estou mostrando uma tela basicamente de computador, onde há informações do sistema de dados, como é que está cada setor, o setor administrativo, o setor de aulas, o setor de esportes, tem toda a identificação da escola. Em um dos pontos, a gente vê o laudo, o que é que está inacessível, porque isso aqui vai ter que ser permanentemente atualizado, já que nós celebramos os Termos de Ajustamento de Conduta de forma escalonada. Por exemplo, que no primeiro ano seja garantido, pelo

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menos, o acesso à entrada principal, o acesso a tantos banheiros, a tantas salas de aula, o acesso à cantina, o acesso aos principais departamentos. No segundo ano, que seja garantido o acesso a mais tantas salas de aula, mais tantos banheiros, mais isso e mais aquilo. E no final, por exemplo, de três anos, esteja realmente totalmente acessível.

É possível se ver, através do banco de dados, o acesso a todos os pontos constantes no laudo da arquiteta. Aqui, na transparência, aparece um pouco dos três municípios que foram vistoriados pela arquiteta, detalhando as cores. A cidade de Natal, na zona leste, porque também é dividido por zonas e por bairros. Vamos escolher Petrópolis: aqui nós estamos mostrando um mapinha que mostra as escolas existentes e a gente vai saber, com isso, o grau de acessibilidade dessa escola. Aqui, o que é que a gente vai saber? Informações referentes à escola: como está a calçada, como está o estacionamento, como está o acesso à educação, como está a circulação, como está o acesso aos ambientes e secretarias do ensino infantil, fundamental e médio, banheiros, enfermaria, sala dos professores, banheiro dos professores, sala de costura, departamento de materiais, área descoberta, cantina e por aí vai.

Voltamos ao último slide, para dizer que não é o Ministério Público sozinho que vai poder transformar uma realidade. É a sociedade civil, é o poder público, a família da pessoa com deficiência, a pessoa com deficiência, os professores, quer dizer, toda a sociedade precisa se conscientizar da responsabilidade de mudar uma realidade. E com um pouco dessas ações e de uma maneira progressiva; também não vamos dizer que em Natal está tudo um mar de rosas, porque realmente não está, mas nós acreditamos no trabalho de formiguinha, em cada escola adaptada, em cada porta modificada, cada batente retirado - isso é uma grande vitória para a gente. E, acreditando nesse trabalho de formiguinha, nós estamos contando com todos os órgãos, transformando a realidade e fazendo com que a nossa campanha saia do papel e se torne uma realidade.

Aqui é uma escola privada, particular. Nós temos, nessa salinha, três pessoas com deficiência mental e lá é um dos exemplo de como funciona bem a Educação Inclusiva. É só isso que eu tinha para colocar. Muito obrigada pela atenção de todos.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

Pensando nesse tema, o que o Ministério Público poderia fazer para implementar o Decreto de Acessibilidade? Na realidade, eu construí um texto mais crítico, não tanto ilustrativo quanto a colega Rebecca e, nesse aspecto, eu espero contar também com a contribuição de vocês, porque eu faço questão de ouvir a opinião de vocês sobre o papel que o Ministério Público tem desempenhado e o que ele pode vir a desempenhar em benefício da inclusão social das pessoas com deficiência.

O conceito de Ministério Público todo o mundo sabe. Houve até situações muito engraçadas, aqui. Por exemplo, ontem você se apresentou na Plenária como integrante, também, da sociedade civil. Ele teria dito: Eu também sou da sociedade civil. Nós todos somos sociedade civil. E algumas pessoas me questionaram: Mas como o Ministério Público é sociedade civil? O Ministério Público não é governo? Respondendo a essa pergunta, o Ministério Público é esta entidade às vezes um tanto estranha, porque tem duas cabeças, dois pés e dois braços, em que um é sociedade e o outro é governo. Dependendo do perfil do membro do Ministério Público e, às vezes, dependendo do próprio perfil institucional do Ministério Público estadual, ele vai pender para um lado ou pender para o outro, mas ele deveria sim, em primeiro lugar, representar a sociedade. Porquê? Porque isso está na Constituição Federal, que diz: O Ministério Público é uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbido de zelar pela ordem democrática, resguardar os direitos individuais disponíveis e os direitos transindividuais da sociedade. Então ele é o quê? Ele é o curador, ele é o protetor, ele tem o encargo de proteger a sociedade. Então, quando existir uma situação de conflito entre governo e sociedade, eu não tenho dúvida nenhuma, eu vou pender para o lado da sociedade, porque esse é o meu papel constitucional. Eu não sou defensora de entidade de direito público, para isso eles têm os Procuradores. Cada município, estado ou a União têm os seus advogados, os seus Procuradores para

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defender os interesses deles; nós, então, defendemos os interesses da sociedade. É por isso que eu sempre, respondendo a essa questão, insisto e acho que os senhores também devem cobrar do Ministério Público mais esse perfil de guardião da sociedade, de tutor da sociedade e não representante governamental.

O papel do MP nessa defesa e promoção dos direitos das pessoas com deficiência, eu dividi em tópicos:

• O primeiro seria a questão da implementação da Legislação.

• A questão da responsabilização dos gestores públicos e agentes públicos omissos ou ímprobos também é outro aspecto em que o Ministério Público pode desempenhar um papel muitíssimo importante.

• Políticas públicas, que é a organização e o funcionamento do terceiro setor.

Essa é a visão da Promotora de Justiça Cleide Ramos. Se vocês me perguntarem o que é que o Ministério Público pode fazer para implementar a acessibilidade, eu vou dizer: Ele tem que fazer com que a Legislação seja obedecida. Para isso ele vai ter essa atuação extra-judicial, que a colega Rebecca mostrou para os senhores e ele vai ter que ter, também, uma atuação judicial eventualmente porque, quando ele não conseguir realizar os ajustamentos de conduta em procedimentos administrativos, quando ele não conseguir, na base do diálogo e do consenso, fazer com que os direitos sejam observados, ele vai partir para a esfera judicial.

Além disso, um outro papel muito importante em que o Ministério Público é o principal ator e, digamos assim, um dos principais legitimados para fazer, em toda a Legislação nacional, é a questão da responsabilização daquelas pessoas que não seguem a Lei. O que a gente vê muito, no campo de direitos transindividuais, é que a sociedade civil vai denunciar ao Promotor uma ilegalidade, que um prefeito ou um agente público qualquer está descumprindo a Lei, seja uma norma de acessibilidade, seja qualquer outra situação. Por exemplo, o controle social de contas públicas: eu fundei uma ONG, na minha comarca anterior e, agora, a minha amiga que é Presidente dessa ONG, hoje, está aqui na Conferência e ela me disse que foi para a Promotora, abordou todos os procedimentos para o controle social das contas públicas e quando o vereador se negou a apresentar as contas, começou a botar empecilhos, que não podia tirar xerox, etc., ela foi para a Promotora reclamar. E a Promotora falou: Olha, eu não posso fazer nada, eu não tenho tempo, vá constituir um advogado. Como é que uma entidade sem fins lucrativos, recém-criada, sem recursos financeiros, contrata um advogado para exercer o papel de cidadania que cabe ao Ministério Público resguardar? Eu pergunto. E aí, claro que eu também já disse para ela o procedimento que ela tem que adotar: Você vai redigir uma representação escrita, você vai protocolar na Procuradoria Geral de Justiça, em Salvador, para que a Promotora responda por que é que ela não está cumprindo o papel dela. Isso se chama Processo Administrativo Disciplinar. Então, nessa questão de responsabilização dos gestores públicos e agentes públicos omissos ou ímprobos, é essencial que o Ministério Público assuma essa responsabilidade, porque a sociedade civil é mais fraca nesse aspecto. Infelizmente, o ideal seria – e é nisso que eu venho trabalhando, em capacitação de recursos humanos – o ideal seria que a própria sociedade civil pudesse fazer, mas a gente sabe que nós, enquanto sociedade civil, temos deficiências de recursos financeiros, em primeiro lugar, porque para a gente travar uma batalha dessa, contra um agente público ilegal, ímprobo, ou contra uma entidade, uma instituição, para a gente travar uma luta dessas, a gente precisa de recursos para contratar um advogado, dar entrada em procedimentos ou administrativos ou judiciais e, muitas vezes, a gente não tem essa perna longa assim para conseguir desempenhar esse papel. Já o Ministério Público, o Promotor de Justiça, é um funcionário público, um agente público muito bem pago – em que pesem algumas divergências. Nós somos muito bem pagos para fazer isso mesmo, para não ter medo de ninguém, para a gente ser independente e fazer cumprir a Lei, doa a quem doer.

Um outro aspecto que eu considero de extrema importância é a questão de políticas públicas, organização e funcionamento do terceiro setor. Eu considero essa questão um papel transcendental mesmo do Ministério Público. Eu diria que seria a pedra de toque de um projeto de um modelo de desenvolvimento inclusivo e sustentável se o Ministério Público exercesse esse papel de atuação tensa

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junto ao terceiro setor. E isso inclui ajudar o terceiro setor. Faz parte do processo democrático o discenso, tanto quanto o consenso. O Ministério Público poderia desempenhar um papel muitíssimo relevante nesta seara, por exemplo, em muitos municípios onde a organização da sociedade civil é tão incipiente e, às vezes, inexistente. Porque é que eu comecei a trabalhar criando ONGs, depois comecei a me associar e hoje sou viciada em terceiro setor? Porque as pessoas iam lá e diziam: Ah, Doutora, eu queria ter uma associação para tratar de defesa de pessoas com deficiência, mas a gente não sabe como é que a gente faz, a gente não sabe o que fazer. E marcamos reuniões com muitas dessas entidades, começamos a arrebanhar o povo para a causa, nessa questão de sensibilizar. E aí, reunião após reunião, vamos construir o Estatuto e vamos redigir o Estatuto e, quem sabe, redigir como um advogado redige? Um advogado de uma minha comarca, de uma certa feita eu estava muito atribulada, ele é do PT e tem aquele amor à causa e eu falei: Doutor [...], pelo amor de Deus, me ajude aqui, porque eu estou cheia de processos disciplinares e processos judiciais. Me ajude, faça esse Estatuto da ONG e depois me passe, que eu só dou os acabamentos. Aí ele pegou um Estatuto horroroso, copiou e me entregou. Aí eu falei: Então, está bem, obrigada. Tive que refazer tudo com as várias entidades. São coisas que parecem simples, mas o fato é que, depois de todo esse processo a gente tem, nesses municípios, entidades que começam a atuar na defesa da própria sociedade, começam a andar com as próprias pernas e, com o tempo, a tendência é que essas pessoas não precisem mais de uma tutela tão forte nem do Ministério Público nem de ninguém. Mas é um processo muito longo, nós não vamos alcançar isso em cinco, dez, quinze anos. Em que pese essa tendência da Legislação instituir as décadas da educação, décadas de não sei o quê, o processo de adaptação da sociedade às mudanças, o processo histórico de mudança tem uma atuação muito lenta, a gente sabe disso. Quem começou a trabalhar no movimento das pessoas com deficiência sabe que, na década de 80, começou um movimento forte, aqui no Brasil; estamos em 2006 e a gente ainda está discutindo o Estatuto da Pessoa com Deficiência, com N questões abertas, muitas deficiências na Legislação, na implementação. Então é um processo lento, que leva anos. A gente tem um Código de Defesa de Consumidor, que existe há mais de dez anos, é de 90; estamos em 2006 e a gente está vendo, agora, que os bancos conseguiram ganhar, no Supremo Federal, uma ação pela qual não se vai aplicar o Código de Defesa do Consumidor nas relação bancárias. Quer dizer, quando a gente está num processo, já pensando que agora vamos firmar, agora a coisa vai andar, aí vem uma instituição poderosa, entra com um processo judicial, aí vêm alguns entes políticos e mudam tudo, fazem a sociedade retroagir. Toda uma luta histórica social se acaba com a caneta de um homem. Enfim, isso é Brasil, então esse processo é um processo realmente muito lento. É por isso que eu acho que o Ministério Público deve ter uma atuação muito intensa na área de políticas públicas junto com o terceiro setor, inclusive, quem sabe, com a criação de uma Promotoria especializada em relacionamento com o terceiro setor. Já existem hoje, no Brasil, cursos de especialização em gestão do terceiro setor. Já se fala em setores de relacionamento com o terceiro setor, mas não dentro do Ministério Público. Dentro do Ministério Público é aquilo que a gente já viu nos depoimentos de algumas pessoas: é um Promotor da cidadania que fica encarregado de zelar pelos direitos da pessoa com deficiência, é um Promotor da cidadania que tem um leque enorme de atribuições e que pode dizer: Ah, eu sou Promotor da cidadania, mas eu prefiro lidar com direitos das pessoas idosas e não vou lidar com direitos das pessoas com deficiência. Ou: Eu prefiro lidar com questões de racismo, de movimentos negros e não de andar no meio das pessoas com deficiência, conhecendo suas reivindicações, suas necessidades e ajudando a implementar a Legislação. Enfim, são questões que a gente tem que colocar em pauta.

Na questão de fiscalizar a previsão de verbas para políticas públicas, eu fiz algumas citações, simplificativas mesmo, que eu pensei que o Ministério poderia, já a partir de hoje, aliás, de ontem, concretamente fazer, para tornar o Decreto de Acessibilidade uma realidade:

• Fiscalizar a previsão de verbas para políticas públicas e implementação do Decreto de Acessibilidade e programas de proteção dos direitos das pessoas com deficiência na Lei de Diretrizes Orçamentárias, na Lei Orçamentária Anual e no Plano Plurianual.

Porque é que isso é importante? Porque, quando a gente chama um prefeito desses para um ajustamento de conduta - porque o prédio da escola não está adaptado, nem os postos de saúde, nem as praças e outros logradouros públicos – a primeira coisa que ele diz é: Doutora, eu vou tirar dinheiro de onde? Eu não tenho previsão orçamentária! Então vamos assegurar que haja previsão adequada e como

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isso pode ser feito em todas as áreas. Na área de educação, por exemplo, o que é que pode ser feito, deveria ser feito e nunca é feito? Um percentual das verbas do FUNDEB, que é o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico, tem que haver um repasse do FUNDEB. Desse repasse do FUNDEB, obrigatoriamente ele tinha que reservar um percentual para a Educação Inclusiva, para recursos pedagógicos, para as pessoas com deficiência. Isso foi feito, eu pergunto, em algum lugar? Isso não é feito! Então o Ministério Público poderia fazer isso? Ele poderia fiscalizar, ele poderia utilizar procedimentos administrativos para fazer essas cobranças? Poderia, deveria!

• Estimular a criação de superintendências e comissões permanentes de acessibilidade com atribuições definidas em Lei, responsáveis pela execução das políticas públicas no setor de transportes e demais direitos complementares das pessoas com deficiência.

Para quem é do movimento, eu pergunto: há quantos anos se fala em criar essas comissões de acessibilidade? Há quantos anos se fala nisso e quantos municípios vocês conhecem que têm essas comissões de acessibilidade funcionando?

Estão vendo? O Ministério Público pode alavancar esse processo? Pode, sim. O Promotor de Justiça pode fazer isso e tem modos, inclusive, muito simples. Ele não quer brigar com o prefeito, porque quando o Executivo vê a sociedade civil se organizando fica com o pé atrás, fica com aquela orelha em pé e já acha que o Promotor e aquela gente daquela associação estão armando alguma coisa contra ele, querem persegui-lo, ficam perseguindo, que toda a hora estão lá na Prefeitura, na Promotoria. E quando chega alguém da associação, imediatamente alguém do Fórum, que sempre tem ligação com o prefeito, telefona e avisa: Olha, fulano de tal, Presidente do CVI, está no gabinete da Promotora agora. É uma relação muito tensa, o tempo inteiro. Mas não precisam brigar! Querem ver uma coisa que eu fiz, que eu experimentei agora, na minha nova comarca e deu certo? A gente fez o Seminário da Campanha da Fraternidade e conseguimos fazer um Seminário Ecumênico. Desde o início, eu falei para essa comissão de organização do Seminário, que eram representantes de diversas Igrejas: A gente faz o Seminário e, depois, cada Igreja vai indicar representantes para a comissão de acessibilidade. Aí eu fui à Prefeita e falei: Prefeita, vai estar assim, o Seminário é assim, tal, tal, tal. E depois o senhor gostaria de indicar alguém para ficar nessa comissão, para não ficar só sociedade civil, Prefeita? Ah, tudo bem, mande um ofício que eu indico os meus representantes. A comissão de acessibilidade não saiu ainda porque eu entrei de férias, mas vai sair. Quem é Promotor aqui, sabe que não existe uma forma – vocês viram a atuação da Rebecca aqui, era uma atuação muito individual – não existe uma forma fechada, um padrão, em que se diga: O Promotor de Justiça tem que agir assim. Em cada situação ele vai vendo e vai descobrindo um modo de driblar os problemas e de fazer acontecer! Agora, é lógico que é preciso vontade para isso.

• Propor ou efetivar medidas para a aplicação de uma política de difusão de programas e campanhas educativas nos meios de comunicação social, inclusive em espaços e horários nobres, bem como no sistema educacional formal.

Isso aí está na Lei da Política Nacional das Pessoas com Deficiência, na Lei 7853, que é de 1989. Já estava lá que tinha que ter campanhas abrangentes, nos meios de comunicação, sobre os direitos das pessoas com deficiência. Agora eu pergunto: como isso começou a ser feito, quando isso foi feito? Aí a gente vê o Jatobá andando para cima e para baixo e a Globo posando de quem tem responsabilidade social. E a gente vê o povão, lá no interior da Bahia, onde eu trabalho, que só consegue assistir uma TV de qualidade, sem estar toda riscada, cheia de ruídos, se for Globo, se for Record, se for SBT. Você vai para esses três grandes canais e o que é que você encontra? Porcaria, o dia inteiro! Aí eu pergunto: o Ministério Público não pode fazer nada em relação a isso? É claro que pode! Porque não faz? Se é a nível nacional, é o Ministério Público Federal! Eu estou pensando em fazer uma representação e mandar para o Ministério Público Federal. Eu não posso fazer, porque eu sou Promotora Estadual, a minha competência é dentro do meu estado. Só que essas redes são nacionais, então tem que ser essa competência, não é isso, colegas? Me ajudem, se eu errar a minha lição de casa. Então as coisas não são feitas e a gente fica sem entender porque é que não são feitas.

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• Instaurar procedimentos contra os entes públicos e privados responsáveis por sites eletrônicos para o ajustamento de conduta, ou ações civis públicas, visando a acessibilidade integral de todos os portais e sites eletrônicos.

Isso a gente já pode fazer agora, porque não tem prazo, isso é para ontem. Então, isso pode ser feito imediatamente.

• Orientar os Secretários Municipais de Obras, Viação e Transporte e Meio Ambiente a fim de que sejam implantadas as medidas administrativas que prevêem a execução de novas obras de construção, reforma ou ampliação de edificações de uso público ou coletivo, segundo as normas de acessibilidade.

O que é que são esses procedimentos? Todo o mundo, para construir, precisa de pedir o quê? Um alvará. Se alguém vai pedir um alvará para construir, ou mesmo para reformar, o que é que a Secretaria de Obras tem que fazer? Tem que checar se esta obra está de acordo com os parâmetros legais – no caso, se ela é acessível, se não tem perigo para a segurança das outras pessoas – enfim, uma série de situações. Não é muito, mas isso é feito? Não! Pede-se um alvará para reformar, ele vai lá e verifica que essa reforma é uma reforma inacessível. O que é que ele tem que fazer? Eu não vou conceder o alvará enquanto você não me apresentar um projeto arquitetônico acessível. Existem os procedimentos, há um procedimento administrativo que deve tramitar nas Secretarias de Obras, mas, até hoje, eu já passei por vários municípios e nenhuma Secretaria funciona assim. Funciona na base do telefonema, o amigo do prefeito, comerciante, não sei quem, ou, na pior das hipóteses – o que também é comum – não se pede alvará para nada, se mete a mão e depois, de vez em quando, uma vez na vida, o CREA – Conselho Regional de Administração – dá o ar da graça, aparece no município e multa algumas obras que ele vê que não têm nenhum projeto arquitetônico, ou anotação de registro técnico, quando for o caso. Mas quando é que o CREA faz essa fiscalização? Uma vez na vida! Então, o município não faz, o órgão não faz, o corporativo não faz, o estado não faz, ninguém faz! O Ministério Público pode muito bem expedir Recomendações para esses prefeitos e secretários municipais, dizendo: Olha, o procedimento tem que ser assim, assim, assim, assado. Todas as obras, a partir do Decreto 5296/04 têm que ser feitas acessíveis, de acordo com as INBRs tais, tais e tais. Em último caso, quando a obra continua sendo feita mesmo com os avisos, embargar. Isso eu nunca vi acontecer. A realidade da capital é diferente da realidade do interior. Realidade do interior é a pior coisa que existe, tudo é na base da amizade com o prefeito, com o secretário, com a mulher do prefeito, com não sei quem. Nada segue o procedimento legal e as coisas vão assim, aos trancos e barrancos. Quanto à questão do deferimento dos pedidos de alvará de construção, do pedido de alvará de funcionamento, a imissão de carta de habite-se, tudo isso está no Decreto. O órgão da Secretaria Municipal de Obras deveria fazer, verificar e fazer.

• Expedir Recomendações para os órgãos executivos e secretarias municipais competentes, órgãos de classe, a exemplo do CREA, sindicatos dos construtores e incorporadores e, ainda, representantes diretos dos órgãos responsáveis pela imissão de alvarás e cartas de habite-se, com cópia a outras entidades do terceiro setor.

Porque é que eu fiz isso? Porque eu acho que, se o Ministério Público vai exercer esse papel, como o braço longo de sociedade, ele também deve contar com a sociedade. Eu sei que tem CVI na minha cidade, tem a Casa da Solidariedade; o que é que eu vou fazer? Eu vou mandar um ofício: Olha, expedi essa Recomendação e me ajude também, vamos nos unir aqui. E aí, como diz o ditado, uma mão lava a outra.

O Promotor de Justiça deve informar a esses órgãos públicos com relação às obras novas a serem construídas ou reformadas. As reformadas têm o prazo de adaptação, que varia, 38 meses, 30 meses, se forem órgãos do Executivo, órgãos públicos mesmo, outros órgãos de acesso coletivo têm 36 meses, porém as obras novas já têm que ser feitas com acessibilidade. Então o que é que o Promotor tem que fazer? Ele tem que comunicar imediatamente ao Secretário de Obras, ao Prefeito, os funcionários. Porque sempre tem aquela hierarquia, depois o Prefeito engaveta o ofício, o Secretário engaveta, depois o funcionário executor não sabia... Então informa logo todo o mundo: As obras novas têm que ser feitas com acessibilidade. Porque eu tenho visto, desde que o Decreto entrou em vigor, que são construídas

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novas escolas, postos de saúde, órgãos públicos inacessíveis. O que é que é isso? Isso é desperdiçar o dinheiro público, porque ele constrói a porcaria dele inacessível e depois vai ter que fazer uma licitação fraudulenta, para beneficiar quem ele quer, para reformar! O que é que é isso? Isso é improbidade! Então vamos avisar logo a todo o mundo: Expedir Recomendações, fiscalizar e, se necessário, propor ação civil pública para assegurar a execução imediata, pelos responsáveis por terminais, estações, pontos de parada e veículos, de espaços de atendimento, assentos preferenciais e meios de acesso, devidamente sinalizados, para o uso das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Isso é o art. 35 do Decreto. Ele não tem prazo, o que significa que ele pode ser aplicado imediatamente! A gente vê que os terminais de transporte, de ônibus, ou o que for, não são acessíveis e não tem prazo para fazer a adaptação desses terminais.

• Orientar o Legislativo e o Executivo na proposição de Emendas aos Planos Diretores em vigor, para adequação às exigências de acessibilidade.

O Plano Diretor é um instrumento de gestão das cidades, hoje imprescindível. E esses Planos Diretores, que são obrigatórios para as cidades acima de 20.000 habitantes, estão sendo feitos em gabinete de vereador, sem a participação da sociedade civil e eles estão criando cidades insustentáveis e inacessíveis.

• Propor às instâncias públicas responsáveis pela gestão dos serviços de transportes coletivos para assegurarem a qualificação dos profissionais que trabalham nessa área.

Isso é uma outra coisa que não prazo no Decreto. O prazo é para a adaptação dos veículos, mas para a qualificação de pessoal, para a acessibilidade nos terminais, não tem prazo. Então o Ministério Público pode agir e é para ontem, estamos atrasados, é de dezembro de 2004.

O Decreto regulamentador federal prevê a acessibilidade completa da frota de veículos e a estrutura de transporte coletivo rodoviário no prazo de dez anos. Quando ele chegou no transporte ferroviário e metroviário, ele estabeleceu um patamar anual mínimo para que se fosse alcançando esse prazo proporcionalmente. Em relação ao transporte rodoviário, o lobby dessas empresas foi tão grande que, simplesmente, está lá: dez anos. Então daqui a dez anos essa empresa vai começar a modificar e aí a frota já vai estar acabada mesmo. Porque os novos já estão sendo construídos acessíveis, os novos ônibus que estão sendo comercializados já vão sair das fábricas acessíveis, porém, quanto à frota antiga, o Ministério Público tem que fazer o ajustamento e pedir para essas empresas mandarem o plano de execução, o planejamento para que se alcance esse patamar gradativamente, tipo 10% por ano, 10% de uma frota, por ano, tem que estar adaptada. Se já se passaram dois anos, já tem que ter 20% de toda a frota adaptada. Isso é uma falha do Decreto, que acho que a gente pode explorar muito bem em favor e benefício da sociedade civil.

Participante não identificado

Foi o próprio Ministério Público Federal que tentou federalizar o tema, exatamente tentando mostrar que o Ministério Público do Estado do Pará era incompetente para acompanhar o julgamento da Irmã Dorothy. E o Ministério Público, ao contrário, conseguiu manter a estadualização do julgamento e demonstrou que era competente, sim. Todos foram condenados, só falta um dos mandantes, foram confirmados, já, através da própria confissão do pistoleiro e estão sendo todos condenados.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

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E os mandantes foram denunciados?

Participante não identificado

Os mandantes foram denunciados e estão presos.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

Estão presos? Aleluia! Agora, o que aconteceu lá, também, no Pará? As testemunhas do caso da Irmã Dorothy começaram a ser perseguidas e começaram a ser criminalizadas. A polícia inventou crimes que essas pessoas nunca cometeram para desacreditar o testemunho delas. Então isso acontece no Brasil. E não é só no Pará, lá nos meus municípios, também, isso acontece até comigo, Promotora de Justiça. É por isso que a gente precisa se unir: no dia em que o Ministério Público estiver junto com a sociedade, os políticos vão tremer tanto nas bases antes de fazerem uma coisa errada, que a gente vai mudar e melhorar essa sociedade. Agora, eles se aproveitam, porque eles sabem que a gente ainda tem uma dificuldade de comunicação. Eles sabem e aí usam lá os mecanismos deles, mas a gente chega lá.

Vou terminar. Uma exigência que eu acho fundamental é que poderiam ser incluídas cláusulas, nos editais de licitação, para que somente as empresas que tenham responsabilidade social e ambiental, sejam acessíveis, obedeçam às normas de acessibilidade, somente elas possam ser contempladas nos procedimentos de licitação com o poder público. Alguma coisa impede que se faça isso? Nada impede.

Participante não identificado

Na minha cidade, nem licitação para contratar tem.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

Vamos na nossa casa! O Ministério Público faz licitação com entidades que não têm responsabilidade social e ambiental! Vou passar para o último.

• Zelar para que as questões de acessibilidade recebam tratamento intersetorial entre os seus diversos órgãos de execução, especialmente as Promotorias de Cidadania, cíveis, com atribuições de habitação e urbanismo e Promotorias do Meio Ambiente.

Acessibilidade não interessa a todas essas Promotorias? Interessa ou não interessa? É assunto da Promotoria do Meio Ambiente? É assunto da Promotoria de Habitação e Urbanismo? É assunto da Promotoria de Cidadania? E o que é que vocês vêem na prática?

A Promotoria da Cidadania está começando a lidar com algumas questões de acessibilidade. Quer dizer, essa intersetorialidade é necessária, hoje, não somente na gestão pública, mas em todos os campos de gestão administrativa. Isso se usa na gestão privada, isso está sendo usado na gestão pública e a gente está atrás, na contramão, porque a gente não consegue ter diálogo dentro da nossa própria instituição. Cada um faz um trabalho isolado, individual e a gente não chega a uma unidade. Então, desse jeito, a gente não vai conseguir implementar o Decreto de Acessibilidade, se a gente não mantiver esse diálogo permanente com os nossos Promotores.

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• Expedir Recomendações para que os órgãos públicos e privados de acesso coletivo passem a assegurar o atendimento prioritário.

Esse é outro campo que não está sendo obedecido adequadamente, quando essas Recomendações são expedidas.

• Orientar os membros do Legislativo e do Executivo para a elaboração de um Plano Municipal de Educação.

A gente tem um Plano Nacional de Educação que trata de todos aqueles recursos pedagógicos para alunos com necessidades especiais, inclusive estabelecendo prazos, prazos que já esgotaram, porque o Decreto é de 2001. Muitos prazos eram de quatro a cinco anos, por exemplo, para que todas as escolas da rede pública tivessem livros acessíveis para pessoas com visão subnormal, livros em Braille. Está lá, prazo de cinco anos! Esse prazo já se esgotou, na Legislação nacional e os municípios não têm, ainda, um Plano Municipal de Educação! Então eu, Promotora, posso pegar um modelo desses, me reunir com a sociedade civil, com vereadores e vamos fazer o nosso Plano Municipal de Educação? Eu posso fazer isso. E porque é que a gente não faz? Porque aí a gente vai começar a ter políticas públicas.

• Exigir o cumprimento dos Dispositivos do Plano Nacional de Educação, que estabelece esses prazos.

Nas minhas comarcas, eu ingressei com uma ação civil contra o município e o estado da Bahia, logo contra os dois, porque sempre tem aquela briga: um diz que não é competente, que a competência é do outro. Aí eu entrei logo contra os dois, para obrigá-los a cumprirem os prazos do Plano Nacional de Educação e apresentarem os recursos pedagógicos.

• Expedir Recomendações para que seja assegurada a Educação Inclusiva (de que a Rebecca falou).

Muitos secretários de educação ainda acham que podem negar a matrícula a uma pessoa com deficiência. Porquê? Porque ela tem deficiência de recursos humanos, porque os professores dela têm medo de dar aula para uma pessoa com deficiência intelectual, ou porque não têm sensibilidade para isso. E ela simplesmente diz: Eu não vou matricular. Então vamos expedir as nossas Recomendações!

• Propor ao chefe do Executivo que seja feito um censo local das pessoas com deficiência, através dos agentes de saúde, carteiros e entidades do terceiro setor.

Porque isso? Porque, se não se conhece quem são as pessoas com deficiência, como é que a gente vai protegê-las, promover os seus direitos, cuidar delas? E não se conhece! Nesses municípios de que eu estou falando, municípios muito pequenos, em que eu trabalhei até hoje, as pessoas com deficiência vivem em exclusão total. Não se vê cadeirante andando na rua, não se vê uma pessoa com deficiência visual com essa independência e autonomia que eu vi aqui na Conferência! Isso é impossível, impensável, num município pequeno!

Uma coisa muito importante é a criação dos Conselhos Municipais das Pessoas com Deficiência. Esses Conselhos não estão instalados na grande maioria dos municípios. Será que a gente vai repetir a história que aconteceu com os Conselhos Tutelares e Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente cujo Estatuto é de 1990 e até hoje, no estado da Bahia, 70% dos municípios não têm esses Conselhos instalados? Não podemos repetir isso com pessoas com deficiência, senão a gente vai condenar mais algumas gerações, mais alunos de exclusão! Então o Ministério Público pode e deve assessorar, propor, preparar um modelo de Projeto de Lei, remeter para um vereador simpático e conseguir que esse Projeto seja votado, junto com a participação da sociedade civil em todo o processo.

Eu queria dizer para vocês: Somos todos anjos de uma asa só. Para a gente voar, a gente precisa se abraçar.

O meu e-mail é: [email protected] E o e-mail institucional é: [email protected] Obrigada.

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Participante não identificada

Rio Grande do Sul

Boa noite a todos. É com grande prazer que eu estou aqui aguardando o dia inteiro, com muita ansiedade, esse momento. É uma colaboração quanto à dotação orçamentária no Plano Plurianual. Desculpe, eu sou de Gravataí, Rio Grande do Sul. Eu tomei conhecimento, por acaso, de uma audiência pública para PPA do nosso município. Não houve divulgação, como em todas as audiências públicas, que não são divulgadas, não há interesse de divulgação, justamente para a sociedade civil não se mobilizar e não participar. Mas, graças a Deus, eu sou iluminada e quase sempre eu chego lá por acaso, na hora certa. Então eu quero contar que, no nosso município, no ano passado, para a PPA 2006/2008, na Secretaria Municipal de Trabalho, Cidadania e Assistência Social constava R$ 500.000,00 para atendimento às pessoas com deficiência. Se fosse verdade, eu estaria saltitante e felicíssima da vida e isso eu sabia que não era verdade e não aconteceria. Então, o que foi que eu fiz? Denunciei na tribuna, numa sessão dos vereadores. Quinhentos mil reais parece muito, mas não é, seria para os próximos quatro anos, para atendimento. Constava assim: R$ 500.000,00 para atendimento psicológico e medicamentos para as pessoas com deficiência. Concluindo, quando isso consta no PPA, isso é ilusório, eles usam portador de receitas, utilizam essas rubricas que ganham essa verba, mas, na verdade, ela não é utilizada para aquele fim que está ali, é desviada. É isso que eu quero dizer: quando não consta e quando consta, não é para aquele fim. E aí eu cobrei do Secretário e ele disse que foi um engano, mas ele só me deu uma resposta depois que eu denunciei na tribuna.

Marceli Rodrigues de AmorimTocantins

Eu quero fazer uma contribuição com a Rebecca. Me perdoem se eu não acompanhei o trecho que vou passar. Ela colocou as parcerias levantadas - e acho interessante - que nós vivemos num Brasil onde a cultura ainda está em evolução num processo que diz respeito a procurar o órgão competente para a infra-estrutura e para a construção. E a colega colocava, muito bem, a respeito de procurar os órgãos competentes. Envolvendo o projeto que ela está desenvolvendo lá no Rio Grande do Norte também, Encontro com os Pedreiros, que estão diretamente ligados à sociedade civil de um modo geral, para que eles estejam fazendo as adequações, convencendo-os a também estarem envolvidos na causa, ou os comerciantes que vendem materiais para a construção e demais acessórios para a construção, para envolvê-los também no projeto, porque aí você também estará mexendo numa fonte. Eu não tenho dados de uma pesquisa, mas grande parte da sociedade não vai buscar a licença, não vai ao CREA e tal. Então, é só um encaminhamento. A minha pergunta é objetiva e simples: Ela falou em 90 cm; se for falta de conhecimento da minha parte, me perdoem, mas eu não sei. A Rebecca falou que a medida adequada da porta é de 90 cm. Eu quero um esclarecimento quanto a isso.

Participante não identificado

Eu só queria dar uma informação para os colegas. A Cleide estava até aqui me pedindo desculpas, mas eu acho que a violência existe em todos os estados. Então hoje, neste momento, nós temos em São Paulo uma ação terrível do PCC, 18 rebeliões ao mesmo tempo na cidade de São Paulo, 36 mortos, 26 policiais mortos, alem do que fora esse mesmo PCC que matou o Promotor de Justiça da área de Execuções Penais de São Paulo que estava, exatamente, tomando providências, um colega que estava realmente engajado na luta contra esses criminosos e um juiz também foi assassinado. Situação semelhante acontece no Rio de Janeiro. Não vamos esquecer a morte de três fiscais do trabalho em Minas Gerais, onde o Ministério Público Federal atuou e todos os três envolvidos, os mandantes e os

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pistoleiros, estão soltos. É só para colocar que essas situações, infelizmente, não são só no estado do Pará e sobre essa situação de São Paulo, a cidade está sitiada, nesse momento há várias barreiras policiais e a população, realmente, estão em suas casas, temerosa do que pode acontecer. Vamos passar para o próximo.

IvaniDistrito Federal

Boa noite a todos. O meu nome é Ivani, eu sou de Brasília. Primeiro eu quero reconhecer, de público, o grande trabalho que o Ministério Público tem feito, mas, ao mesmo tempo, além de fazer uma pergunta, eu também gostaria de fazer um pedido. Inclusive é um momento muito oportuno, porque aqui nós contamos com vários Promotores. Eu sei que o Ministério Público tem atuado muito na defesa dos deficientes, mas existe uma situação que nós estamos vivendo, principalmente os deficientes visuais, que eu considero muito grave, que é a questão dos concursos. As empresas que são contratadas para aplicarem as provas não estão nos respeitando, estão brincando com os direitos dos deficientes, pessoas passam no concurso e não assumem, pessoas fazem a inscrição e não fazem provas, não tem material. Inclusive no último concurso do Ministério Público eu fui uma vítima, fiquei sem fazer a prova. Então, eu gostaria de pedir para o Ministério Público, na pessoa dos membros que estão aqui, mais atuação nessa área e que essas empresas têm que ser punidas, porque elas não estão com medo, isso continua acontecendo todos os dias. A minha pergunta é exatamente essa: perguntar o que o Ministério Público vem fazendo e gostaria de pedir, também, o apoio, a tutela jurisdicional do Ministério Público para essa questão. Obrigada.

Cristiana Soares de HolandaAcre

Boa noite a todos. O meu nome é Cristiana e eu sou Presidente da Associação dos Ostomizados no Acre. Eu passei num concurso do estado como portadora de deficiência, para professora e fui impossibilitada de tomar posse. Eu recorri ao Ministério Público, à Promotoria da Cidadania e Saúde e ela me recomendou um mandato de segurança. Eu constituí um advogado e entrei com um mandado de segurança, só que ele foi indeferido. O advogado entrou com uma apelação, novamente, mas, como eu tive que vir para cá, não sei se saiu ou não o recurso da apelação. Mas eu queria uma orientação dos senhores: depois desse mandado de segurança ser indeferido, eu posso voltar ao Ministério Público, para recorrer? Porque é um absurdo! O que a junta médica pela qual eu passei alega é que a minha deficiência, a ostomia, foi por causa de um câncer e o câncer é uma doença invalidante. Mas eu tive o câncer há dez anos atrás, já me curei e vivo a minha vida normal, tanto é que eu passei no concurso. Obrigada.

Participante não identificado

Eu queria só dar uma informação com relação à questão do concurso público: o Ministério Público Federal tem um grupo especial, que é a Procuradoria de Defesa do Cidadão – PRDC – e a Doutora Ela Wiecko é a Presidente da Comissão. Em relação aos concursos federais, o Ministério Público Federal, através da PRDC, enviou uma Recomendação a todos esses órgãos que realizam concursos a nível federal, inclusive a UnB, ESAF, em relação ao cumprimento desses requisitos em concursos públicos para as pessoas com deficiência. Agora, em relação aos concursos estaduais, depende realmente da atuação de cada Promotor, dependendo da questão que envolva direitos difusos e coletivos. Existem casos individuais e isso, infelizmente, não é de competência do Ministério Público, isto é, quando o caso envolva direito individual, ou seja, o direito de uma só pessoa com deficiência em relação

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a uma questão peculiar dela, como é o seu caso, provar que você é capaz de exercer a sua função lá. No seu caso, não está em xeque a sua deficiência, é a doença que ele diz que você ainda é portadora, que seria um câncer, uma doença, no entendimento deles, com certeza, incapacitante para você assumir um cargo, uma função pública. E você vai ter que comprovar, através do laudo, que não, que você tem plenas condições de assumir. E só para dizer, existe já uma decisão recente do STJ em relação a essas questões e é por isso que às vezes a pessoa perde. Eu acompanhei um caso lá no Pará em que a pessoa era considerada incapaz, como no seu caso e aqui o STJ deu ganho de causa, inclusive dando condições já para a implementação dela, para a admissão dela no cargo que ela pleiteou perante, inclusive, o Tribunal de Justiça do Estado. Então, com relação a esses recursos, não fique temerosa porque você perdeu na primeira instância, vá recorrendo, porque muitas vezes demora, mas o STJ tem tido uma decisão bem favorável com relação às pessoas com deficiência. Passo para as colegas darem a resposta com relação a isso.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

O primeiro passo, já que tem um mandado de segurança, tem uma sentença, seria entrar com um recurso. Só que o recurso, se foi uma sentença definitiva, vai ser uma apelação com um prazo curto, de quinze dias, se o seu advogado conseguir obedecer a esse prazo. Caso o seu advogado tenha perdido esse prazo, eu ainda acho possível tentar uma ação ordinária de obrigação de fazer, mas depende da decisão. Se for uma decisão de carência do mandado de segurança, se for uma decisão meritória, tem que ver as peculiaridades da decisão do juiz. Mas, em tese, seria possível também uma ação de obrigação de fazer contra o governo do estado. Quem entraria com essa ação? Você, como pessoa, indivíduo, através do seu advogado, ou o Ministério Público? Aí a gente vai responder à pergunta: qual é o seu direito que está sendo violado ou ameaçado de lesão agora? Que direito é esse seu? Você acha que é só o seu direito ao trabalho ou tem outros direitos fundamentais seus que vão sofrer prejuízo com essa conduta do poder público? No meu entendimento, a sua dignidade está sendo afetada, o seu direito ao trabalho, uma série de direitos, direitos estes que eu considero direitos indisponíveis. E se são direitos indisponíveis, o Ministério Público pode, sim, propor ele mesmo a ação. Isso é só para mostrar para vocês como é a aplicação do direito. O direito é uma área do conhecimento humano, então interpretar o direito é assim: um pensa de um jeito, outro pensa de outro. É por isso que vocês vêem que um juiz decide de um jeito, outro decide de outro. Existem muitos caminhos que podem ser explorados, mas claro que a gente vai se deparar com um óbice muito grande nessa fase de jurisdicionalização do processo. Qual é? O despreparo do Poder Judiciário para lidar com a questão de inclusão social de pessoas com deficiência. O juiz hoje, no Brasil, não está preparado para dar uma sentença num processos desses, a não ser que seja um juiz do movimento Juízes pela Democracia, que é semelhante à nossa PID, que são juizes pró-ativos que têm compromisso social. Mas são poucos, a grande maioria não tem nenhum conhecimento, ele vai querer aplicar a letra fria da Lei. E aí o Procurador do Estado chega lá e prova por A+B que ele não é obrigado, que, no relatório, a perícia disse isso. E, apesar do juiz poder rejeitar a perícia, ele não gosta de rejeitar a perícia médica, ele gosta de decidir com base na perícia, para se cobrir, cobrir as costas dele. Ele não quer exercer aquele poder que ele tem de contrariar até mesmo os peritos, porque o juiz é o perito dos peritos. Mas enfim, tem mil peculiaridades, isso é o direito e isso é a justiça. É assim mesmo.

Marcelo Moreira dos SantosRelator

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Eu queria só queria colocar três coisas que a gente vê muito em relação a concurso público. Primeiramente em relação à cota: a Lei coloca muito claramente, para concurso público, que até 20% das vagas dos concursos têm que ser destinadas. E hoje nos temos se deparado com uma verdadeira fraude a esse direito da pessoa com deficiência. É que se fraciona! Por exemplo, concurso para professor, se coloca: professor tal, lugar tal, quer dizer, nos municípios, num concurso do estado, se fraciona esse número de vagas. A gente tem que estar muito atento a isso, o direito é o número total de cargos e vagas disponíveis. E a gente tem que evitar que, por exemplo, se coloque todos professores para determinado município e, com isso, se drible o direito da pessoa à escola.

Uma outra questão que eu gostaria de pontuar é exatamente, depois que o concurso passa, cercear essa inscrição é meio complicado, porque está expresso no Decreto, mas uma forma terrível que se criou de cercear o direito é, exatamente, no momento da avaliação médica. O exame de compatibilização entre a deficiência e o cargo almejado por quem tem a deficiência é uma missão específica de uma equipe multiprofissional, formada por quatro profissionais e sempre com um médico da área. O que é que se faz? Na prática, o que a gente tem combatido no Brasil inteiro, é que a junta médica, formada só por médicos e alguns que não atuam na área, diga se o candidato tem ou não compatibilidade! Isso daí é para ser avaliado só no estágio probatório, durante os três anos, saber se o candidato tem ou não compatibilidade. E ter a equipe multiprofissional, isso daí de forma muito clara.

Outra questão que a gente vê muito em alguns concursos e que a gente combate, é que em alguns concursos a Lei exige exame físico. Alguns exames físicos são tão duros que, com isso, eliminam os candidatos com dificuldade de locomoção, deficientes físicos. A gente tem vários casos nessa situação, no Amapá, em que a gente questiona isso, no concurso de Oficial da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros: você não pode, porque não pode correr, se a Lei fala que Oficial tem que atuar no planejamento, na estratégia e na operacionalização da atividade policial militar. Então a gente tem que estar muito atento a essas questões e, por mais que o Ministério Público esteja cobrando, a sociedade tem que cobrar da gente, para que, com isso, a gente reforce essa política, essa defesa.

Rebecca Monte Nunes BezerraPromotora do Ministério Público/RN

Vou falar um pouco mais sobre a questão do concurso, sobre a questão das vagas no mercado de trabalho, para as empresas privadas. Nós temos o Ministério Público Federal, temos o Ministério Público Estadual e temos o Ministério Público do Trabalho. No caso da gente, do Ministério Público Estadual, nós fiscalizamos a questão do concurso público. A nossa forma de atuação já foi colocada aqui pelos colegas e também, na questão de um acompanhamento, nós já temos, lá no Rio Grande do Norte, Recomendações dos colegas a secretários, a prefeitos, a quem estiver realizando o concurso. O final da pergunta diz da questão do mercado de trabalho: esse caso da reserva de vagas, de cotas para as empresas, cabe ao Ministério Público do Trabalho. Então há essa divisão e é interessante que todos tomem conhecimento.

Quanto à pergunta que ele fez, eu gostei muito da idéia, realmente, de envolver também os comerciantes de materiais de construção e ele tem razão – eu me confundi. As portas, segundo a NDR 9050, no seu item 26.9.1, diz: As portas, inclusive de elevadores, devem ter um vão livre mínimo de 80cm e altura mínima de 2,10m. E quando forem duas ou mais folhas, pelo menos uma delas deve ter o vão livre de 0,80m. A preocupação – e eu já tive vontade até de reunir esses comerciantes – é que o que a gente vê na prática é que eles vendem a porta de 80cm, mas quando ela é aplicada, ela é assentada, ela termina com 78cm, 76cm, 75cm. Então realmente precisa haver esse trabalho de conscientização até na construção das portas.

Outra coisa que eu gostaria de deixar bem clara é que essa atuação que eu coloquei aqui não é uma atuação só minha. Pelo contrário, tem um pouco da minha participação mas é a cara, realmente, do

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nosso MP. Nós temos realmente Promotores altamente comprometidos com a causa, que realmente vestem a camisa e correm atrás. Só quero deixar isso bem claro.

E, por último, a questão dos cargos, que podem ser impetradas medidas contra a Previdência Social para ela garantir o benefício da prestação continuada. Em relação à Previdência Social e em relação ao INSS, no benefício da prestação continuada, o serviço de Assistência Social, nós temos que trabalhar com o Ministério Público Federal, se o direito for individual, através da Defensoria Pública Federal e se a forma, vamos supor, de avaliação para esse benefício da prestação continuada ou a forma de pagamento desse benefício tiver alguma irregularidade que envolva o coletivo, aí nós devemos trabalhar, realmente, com o Ministério Público Federal.

Participante não identificado

Eu vou passar para o Marcelo. Mas antes eu queria dar só um exemplo, em algumas questões, de como ser feita a atuação do Ministério Público em relação ao concurso público. Só para vocês terem uma idéia, existem competências, mas os próprios Ministérios Públicos podem atuar juntos. Esse mês nós entramos, em conjunto com o Ministério Público do Trabalho, ou seja, Ministério Público do Trabalho e Ministério Público Estadual, contra o concurso público do estado no DETRAN, que não está obedecendo, exatamente, os requisitos do Decreto Nº. 3.248. É uma ação que foi impetrada para garantir exatamente essa questão da nomeação e da não-existência de um exame de inspeção médica para avaliar a deficiência de que a pessoa é portadora. Porque isso é um absurdo, a inspeção médica é para verificar a situação da saúde da pessoa, se ela tem alguma doença incapacitante para ser admitida naquela função pública. A deficiência vai ser avaliada durante o estágio probatório, pela equipe multidisciplinar, que vai ser composta por um médico especialista na deficiência de que a pessoa é portadora e mais três pessoas que exercem o mesmo cargo da pessoa com deficiência. E é isso que eles têm que entender, aí vai ser a oportunidade, apesar de ter essa obrigação da administração, de oportunizar as ajudas técnicas, a acessibilidade das pessoas no meio ambiente do trabalho.

Uma outra questão muito importante, uma decisão recente, é porque nós temos uma situação híbrida em relação às empresas públicas. As empresas públicas são obrigadas a realizar um concurso público, mas, no momento em que a pessoa é readmitida, ela passa a ser regida pela CLT. Recentemente, nós tivemos uma situação nos Correios: a pessoa passou, foi admitida; era uma pessoa com deficiência física, tinha um problema de poliomielite numa perna, uma perna mais fina do que a outra e passou para a função de carteiro. Ela passou os 45 dias do estágio probatório e foi eliminada. Só que ela tinha sido considerada apta e o Correio não deu nenhuma condição, nenhuma ajuda técnica para que ela pudesse exercer com plenitude a sua função. Ela procurou o Ministério Público, nós oficiamos para que o Correio pudesse mudar a decisão, o Correio não mudou e, como não havia competência, em virtude do direito individual, nós a encaminhamos para que fosse impetrada uma ação junto à Justiça do Trabalho. Vejam só, ela perdeu em primeira instância e, já a nível de Tribunal, teve uma decisão excelente, no caso dela, em que foi garantida a reintegração dela nos Correios e o Correio foi, também, condenado a uma multa em virtude do dano moral que provocou à pessoa com deficiência. Ela passou oito meses e, inclusive, ficou demonstrado que, diante daquela situação, ela tinha perdido o emprego anterior; ela abriu mão do emprego anterior para assumir aquela função nos Correios e não conseguiu voltar. Ficou desempregada, inclusive a luz da sua casa foi cortada, porque ela não tinha dinheiro e recebeu uma indenização de R$ 199.000,00. Essa é uma decisão que eu estou, inclusive, colocando na internet, assim que eu voltar. Vou colocar, inclusive, na página da AMPID, porque é bastante salutar, foi dada por uma Juíza Advogada, Doutora Rosita Nassar, que tem todo esse conhecimento dentro desse princípio da igualdade e dignidade que está na nossa Constituição.

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Jaciara Cedraz CarneiroBahia

Antes de mais nada eu quero parabenizar o Ministério Público pela atuação no nosso país. Existem exceções, no Ministério Público, por questões de inércia, de falta de atitude nos municípios, mas eu acho que a maioria vence. Então eu quero agradecer a presença de vocês nessa Conferência. Sobre o ponto previsto na questão da emissão do alvará de licença para construção e reforma, a minha pergunta é porque, no nosso Sindicato, nós temos nossa sede própria e uma Casa de Passagem que serve aos servidores do interior, para dar atendimento médico, enfim. Existem barreiras arquitetônicas na nossa entidade e eu venho combatendo isso na reforma. Quando foi contratado o engenheiro que, por sinal, também é da instituição, do Tribunal de Justiça que faz a questão de obras, esse engenheiro, na reforma, não fez a reforma obedecendo à questão da acessibilidade. Briguei com a minha presidente, briguei com o meu diretor financeiro, briguei com o engenheiro, fiz um discurso enorme no nosso Sindicato e fui vencida, porque fizeram a reforma, não tem banheiro acessível, não tem rampa nem no nosso Sindicato nem na nossa Casa de Passagem, como a Justiça do Trabalho também não tem acesso. Quem vai ao Fórum Rui Barbosa, lá na Bahia, se for cadeirante, tem dificuldade. Quem é cego, no Palácio da Justiça, não sobe no elevador, a não ser com ajuda, porque não tem nem Braille nem sistema de voz. Estive com o diretor administrativo agora, na questão do Conselho Nacional de Justiça que esteve lá visitando, aproveitei a instabilidade emocional dele e cobrei esse tipo de situação. O que eu quero saber é o seguinte: a justiça tem que começar de casa e esse alvará foi expedido. Eu quis denunciar a alguém, responsabilizar alguém e não pude, porque foi expedido o alvará e pronto, foi feita a reforma e não tem acessibilidade. Então eu quero saber a questão da sanção.

Rebecca Monte Nunes BezerraPromotora do Ministério Público/RN

Na verdade, o Decreto e a própria Legislação não estabelecem multa para o caso de descumprimento da Legislação. Agora, nós temos dois caminhos para obrigar, mediante multa: um, é através do Termo de Ajustamento de Conduta, que a gente sempre celebra com a colocação de um cláusula para o caso de descumprimento, geralmente com multa diária, por dia de inacessibilidade, vamos dizer assim e que seja, de fato, executada. O outro caso seria através de uma ação civil pública, de obrigação de fazer, por exemplo, que, no caso de descumprimento, no seu caso, ele está também obrigado ao pagamento de uma multa.

Na comarca de Natal, nós entendemos que, como o município também tem esse poder de disciplinar a acessibilidade, embora de uma forma suplementar, de uma forma complementar à questão estadual ou federal, na hora em que nós temos uma Lei Municipal que já expirou o prazo para a acessibilidade, a gente vai entrar com a ação, como já aconteceu lá em Natal. E aí, sob pena de pagamento de multa.

Participante não identificado

Eu só quero dar um esclarecimento sobre essa questão da acessibilidade, do prazo, que está no Decreto fala em 30 meses: isso é para os locais que já estavam construídos antes do Decreto, você não pode depender disso. Todo o projeto, toda a construção que começa, já tem que obedecer a esses requisitos de acessibilidade. Então aí não há negociação, a obrigatoriedade é imediata.

Rebecca Monte Nunes Bezerra

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Promotora do Ministério Público/RN

Para a engenharia, praticamente tudo é possível. Então, quanto a essa história de impossibilidade técnica, vamos abrir os olhos porque, realmente, é difícil ocorrer essa impossibilidade técnica.

Participante não identificado

A sanção só vem através da ação civil pública. Se já houver um TAC é mais fácil, porque você já não discute regra.

Jaciara Cedraz CarneiroBahia

Mas o Ministério Público impetra uma ação contra o Tribunal de Justiça?

Participante não identificado

Sim, claro, contra o Tribunal de Justiça.

Marcionila Verçosa do RegoAlagoas

Antes da minha palavra, eu gostaria de fazer uma pergunta à Mesa: se eu não me engano, alguém leu para mim que hoje também ia haver uma apresentação do Doutor Hélder Jucá de Maceió, Alagoas. É verdade? Mas não estava na programação? O Promotor de Maceió.

Participante não identificado

Eu queria dar uma justificativa: nós estamos aqui como associados da AMPID, todos os colegas aqui. Então os colegas vieram com os próprios recursos, não vieram financiados pelo Ministério Público, apesar de nós termos pedido. Com exceção de alguns colegas, como o Marcelo, que veio como delegado e aí o governo garantiu a vinda dele e a Rebecca – o Procurador Geral é comprometido, inclusive ela colocou isso, com essas causas – então ela veio com o custeio do Ministério Público. Os colegas Hélder e Valberto tinham a promessa de vir, mas, infelizmente, o Procurador de lá entendeu que não era pertinente, havia a ida de uns colegas para um Seminário do Meio Ambiente e, inclusive, não autorizaram que eles viajassem para cá. Então nós estamos, inclusive, mandando uma nota de repúdio aos Ministérios Públicos da Paraíba e de Alagoas, que inviabilizaram a presença dos colegas. Porque a nossa Associação é isso: a gente parte de um trabalho paralelo, fora, inclusive, da atuação propriamente dita dos Promotores de Justiça, tentando que a gente possa, também, fomentar políticas públicas da pessoa com deficiência. E eu queria concluir e lhe dizer o seguinte: Poder Judiciário e Ministério Público são duas coisas distintas. O Ministério Público é autônomo, nós não estamos subordinados a Juizes nem ao Ministério Público Federal, nós temos autonomia para a nossa atuação.

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Marcionila Verçosa do RegoAlagoas

Obrigada pela explicação. Só que eu manifesto aqui a minha tristeza, porque esta aula que nós assistimos, o Ministério Público alagoano precisa ouvir, precisa assistir, porque, em Alagoas, nós temos muitíssimo a desejar. Eu não sei, mas com certeza eu vou marcar uma audiência com o Ministério Público de Alagoas, precisamente em Maceió para levar o que eu pude gravar. O que eu sinto, meus nobres representantes do Ministério Público, é a gente não ter uma apostila com tudo isso que nós ouvimos, porque era uma grande lição que nós levávamos para os nossos estados e eu, particularmente, para Maceió. Mas aquilo que a gente pode detectar, que a gente pode gravar ou lembrar, nós falaremos com o Ministério Público em Alagoas, a não ser que ele não queira nos ouvir, mas eu não acredito. Então eu parabenizo a Doutora Rebecca, a Doutora Cleide e os demais pelo trabalho apresentado e pela bela lição que nos trouxeram. Que continuem assim e que Deus os abençoe.

Participante não identificado

Eu estou saindo com a Marcionila. Eu também sou de Maceió e queria ratificar tudo aquilo que ela colocou. Eu teria inúmeras perguntas, mas vou fazer só uma: Doutora Cleide, quanto tempo a senhora consegue demorar numa comarca? Quando a senhora procura trabalhar dessa forma atinge pessoas escusas, interesses escusos; quanto tempo a senhora fica em cada comarca?

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

Eu faço questão de responder. Realmente, como eu sou uma pessoa muito insistente, eu consigo ficar muito tempo brigando, mas isso não é uma coisa que não tem reflexo na minha pessoa. De vez em quando eu tenho crises depressivas e tal, porque são inúmeras representações administrativas, inúmero processos administrativos que eu respondo, promoção negada por conta dessa atuação. Os políticos chegam lá dizendo que eu sou arbitrária, isso e aquilo, que só fico com a sociedade civil, perseguindo o prefeito.

Participante não identificado

Você está trabalhando com colegas que, realmente, são invejáveis. Tem pelo menos oito anos a Promotoria de Defesa da Pessoa com Deficiência. Eu completei dez anos, agora em abril, na Promotoria de Justiça. A colega está há seis anos trabalhando nessa área e as colegas aqui com um ano, também estão aqui já engajadas e apaixonadas e comprometidas com a situação.

Participante não identificado

Eu tenho aqui três pessoas de Maceió que podem confirmar uma história bem curtinha que eu vou contar para vocês: nós tínhamos um Promotor Federal da Procuradoria Federal, uma pessoa maravilhosa, comprometidíssima com a causa dos mais excluídos, principalmente com aquelas pessoas com deficiência e, mais ainda com a inserção dessas pessoas no mercado de trabalho e afim de rever alguns casos do estado que tivessem conformidade com as leis trabalhistas. Enquanto ele mexeu com a privada – privada, no bom sentido – tudo bem; quando ele tentou entrar na Assembléia, ele saiu do estado e teve que ir para outro.

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Participante não identificadoSanta Catarina

Eu gostaria de dizer só uma palavrinha com relação ao seguinte: eu acho que a nossa Conferência está se consolidando nesse momento, porque é o momento em que nós estamos percebendo o que o Ministério Público é, realmente - infelizmente essa informação não chega à população em geral. Geralmente o Ministério Público é ligado ao Judiciário, então ficamos com medo, no interior, de chegar no Ministério Público, porque não tem a informação dessa leitura de que o Ministério Público, hoje, é o quarto setor. Porque ele está entre o privado e o público, então eu acho que ele é o quarto setor. Eu gostaria de fazer umas perguntas em relação ao seguinte: nós estamos numa cidade que é sui generis, a cidade de Joinville. Santa Catarina é o único estado onde a capital não é a maior cidade do estado. Joinville é a maior cidade do estado, tanto em população como no percentual de pessoas deficientes. Florianópolis, que é a capital, tem todos os recursos possíveis para essa área, com um Judiciário mais atendido, com um Ministério Público mais atendido e Joinville fica em segundo plano. Nós, atuantes na luta com os deficientes criamos a Comissão Permanente de Acessibilidade e tentamos negociar com a prefeitura – uma vez que a prefeitura destruiu as calçadas da cidade com a reforma da cidade – sem usar o Ministério Público, para que nós pudéssemos recuperar a calçada através de uma campanha. Criamos um projeto completo, entregamos na prefeitura e a prefeitura disse que o Decreto Nº 5.296 ainda estava sendo regulamentado no município, que eles precisavam criar Leis Municipais para que o Decreto pudesse ser aplicado. Nós contestamos isso e não fomos atendidos. E nosso representante do Ministério Público Estadual, uma pessoa fenomenal, o Doutor Genivaldo, infelizmente está sempre com a mesa cheia de trabalho e não consegue nos atender adequadamente, apesar da sua boa vontade. Então eu gostaria de saber quais as informações que o Ministério Público tem das necessidades do exterior, com relação à mão de obra de Procuradores, se essa informação é outro Procurador que tem que dar ou se existe, em relação à população, uma quantidade de Procuradores per capita.

Marlúcia Gomes Evaristo AlmeidaPromotora do Ministério Público/PI

Boa noite à Mesa. Meu nome é Marlúcia, eu sou do Piauí e sou Coordenadora do Centro de Apoio e Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Lá, a gente já trabalhou bastante. A sorte é que, como o governador do Piauí falou das realizações, mas ainda deixa muito a desejar. É como ele mesmo falou, a gente está começando do zero. E quando a gente começa do zero, por mais que o governo trabalhe, ele também não consegue fazer tudo. Com relação ao termo de ajustamento de conduta, ação civil pública, eu já dei entrada em tudo isso. Inclusive a gente já teve várias ações com o Ministério Público Federal. Fizemos vários termos de ajustamento de conduta com locais de uso coletivo para garantir a acessibilidade e ações civis públicas com o Ministério Público Federal para a área da saúde, órteses e próteses, que o município de Teresina não garantia. Então o que é que a gente fez? Nós mandamos uma recomendação que não foi atendida e ingressamos com uma ação civil pública na Justiça Federal, uma ação de tutela, garantindo o fornecimento de cadeiras de rodas de todo e qualquer tipo para a pessoa com deficiência que precise e comprove, através de médico ou fisioterapeuta, desse tipo de cadeira. E a gente também está tentando ver se muda a tabela SIA/SUS – Sistema de Informação Ambulatorial do SUS – a gente está tentando ver se modifica isso, porque a tabela restringe muito, ela realmente só paga se for um certo tipo de cadeira. E isso, para a pessoa com deficiência é ruim, porque nas cadeiras de rodas distribuídas lá, eles pegavam a cadeira de rodas para tetraplégico e davam para uma criança com paralisia cerebral usar, o que é um absurdo. Além disso, eu instaurei vários procedimentos administrativos para garantir acessibilidade para as pessoas com deficiência contra o município, o estado e agente coletivos. Estou expedindo uma Recomendação para todos os agentes

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coletivos para que eles garantam a acessibilidade, fora outras ações. Agora eu vou aproveitar para fazer a minha pergunta à Doutora Cleide: quando ela falou em fiscalizar a previsão de verbas para políticas públicas. No ano passado, tentando ver essa questão de fazer um Termo de Ajustamento de Conduta com o estado – influenciada pela Doutora Rebecca a apartir da ação deles lá em Natal, que eu conheci em outubro – nessa questão da educação, tentando implementar isso lá no estado, nós fomos procurar o governo do estado para fazer um Termo de Ajustamento de Conduta. Olha o que é que o Secretário de Planejamento – falando de orçamento, porque foi o que a Procuradoria do Estado alegou – me disse: Bom, o orçamento é uma peça meramente ilustrativa. Eu estou querendo saber, justamente, se o orçamento é uma peça ilustrativa, porque em todo o orçamento tem a rubrica Obras e Instalações. Eles dizem que a destinação quem dá é o secretário ou o gestor. Concluo: eu quero saber o que é que a gente pode fazer, no momento em que estiver aprovada a Lei de Diretrizes Orçamentárias, para que se garanta essa questão da destinação da verba, especificamente para a acessibilidade.

Solange Guerra BuenoSecretaria de Esportes e Lazer/SP

Boa noite a todos. Eu sou Solange, da Secretaria de Esportes e Lazer do estado de São Paulo. A minha pergunta vem em conjunto com a da Promotora, no seguinte tema: a gente está tentando, dentro do próprio Conselho Estadual do Deficiente de São Paulo, pegar uma bandeira de luta onde a gente estabeleça pelo menos um mínimo de 1% da dotação orçamentária para ser aplicado na implantação e implementação da acessibilidade. Tanto que aqui, no grupo que nós freqüentamos, ou pelo menos no meu grupo e em alguns grupos, a gente colocou, até como proposta para a Plenária, que a gente pegue como uma bandeira de luta um mínimo de 1% de dotação municipal, estadual e federal para a implantação e a implementação da acessibilidade, porque, o que nós recebemos sempre com a porta na cara, é: Não está na dotação orçamentária. Precisa fazer isso. Ah, mas isso não tem dotação, não tem reserva orçamentária para isso. Então, eu quero saber de vocês, da Mesa, se nessa bandeira de luta paira uma utopia ou se é uma bandeira viável de luta. Essa seria uma primeira pergunta para vocês.

Uma outra pergunta que eu gostaria de fazer é a interpretação da Legislação no montante: dez anos para que a frota completa esteja implementada. O que o Doutor falou foi que, realmente, a aquisição de agora até dez anos já tem que ser embasada na nova Legislação. Então eu queria saber essa interpretação da Legislação também, quer dizer, a partir de agora as frotas já têm que ser dentro da nova Legislação e a frota completa em dez.

Só mais uma colocação: na parte da arquitetura imediata, um usuário é competente para entrar com uma ação, uma obrigação de fazer, ou somente o Ministério Público pode atuar como autor da ação para uma obrigação de fazer, no caso de um usuário que se sente impedido de utilizar um espaço público ou alguma coisa? É somente o Ministério Público ou qualquer cidadão pode entrar com uma obrigação de fazer, de repente até pensando numa multa diária para algum Fundo ou alguma coisa?

Sérgio Luiz Celestino da SilvaCOMDE/SC

Sérgio Luiz, Presidente do COMDE, de Joinville. A maioria do que eu ia perguntar já foi dito. Eu só queria saber sobre o concurso público. Na Prefeitura Municipal de Joinville, nesse concurso público, em vez de 5% ela determinou 2%, que seriam as vagas para os deficientes. Outra empresa, a Águas de Joinville, que é uma empresa pública, disse que não era obrigada, no concurso, a abrir vagas para os deficientes, porque só tinha 90. A gente brigou e ela então colocou 2% e também colocou vagas com menor salário. Nós entramos para cancelar o concurso da Prefeitura e até hoje não conseguimos nada.

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Luiz Fernando M. BorgesRio Grande do Sul

Eu sou Fernando, do Rio Grande do Sul. A minha dúvida seria quanto à questão da Prefeitura de burlar a Lei e também a questão do concurso público, quando eles estipulam as vagas, digamos 80 vagas para professor, mas eles fracionam. São dois professores para uma área e nunca chega a 10%. Então, na verdade, nunca terá um professor portador de deficiência. A que mecanismo se pode recorrer ou para tentar cancelar o Edital ou para tentar que esse deficiente tenha a vaga garantida?

Participante não identificado

Eu queria fazer duas observações. Primeiro, com relação à questão dos transportes: a Lei deu o prazo de dez anos, mas eu sou do Rio Grande do Norte e já fui Diretor de Transportes do meu estado. A vida útil de um transporte, de um ônibus, é em torno de cinco. O que é que, na minha visão, a gente tem que fazer? A preocupação não é com os existentes, é com os novos que vão ser comprados. Esses que estão aí vão ser automaticamente renovados, a não ser que as empresas, se a saúde financeira delas não permite, não tenham essa renovação nesse prazo de cinco anos. As empresas saudáveis procuram, até porque a manutenção é muito cara, renovar essa frota. As que não têm, vão passar oito anos, dez anos. Então a gente tem que olhar, agora, a origem; se, a partir de agora, esses novos ônibus que vão ser comprados vão seguir o que determina a Lei.

Na questão do orçamento, eu também queria fazer uma observação. O orçamento vem mais de uma vontade política do gestor. Aí depende da mobilização que você possa fazer junto ao gestor. Ele tem o orçamento e tem o financeiro; ele pode querer colocar no orçamento e não ter a disponibilidade financeira, ou ele ter o financeiro e não ter o orçamento. É por isso que a gente vê muito nos finais de ano a sonegação orçamentária, que é quando o estado pode arrecadar mais do que estava previsto no seu plano.

Na minha entidade do terceiro setor, que tem 11 anos, a gente tem que dar ajuda constante, as portas abertas. E também, na parceria que a gente tem feito com o Ministério Público, no Centro de Reabilitação Infantil, na questão das demandas que a gente tem. É justamente uma conduta que o Ministério público tem feito e cobrando do próprio governo. Eu acho que é importante e tem até um dito popular lá que a gente usa muito que é quanto mais cabra, mais cabrito, ou seja, quanto mais pessoas a gente juntar na luta, o Ministério Público, todos os segmentos da sociedade no sentido de que a gente possa, efetivamente, fazer um bolo maior e com isso a gente vai conseguir avançar nessas questões. Eu acho que a gente tem que juntar essas forças. Obrigado.

Participante não identificado

Eu vou só responder em relação ao transporte porque eu já tinha falado isso na Plenária. Nós não vamos esquecer que o Decreto Nº. 5296 é um ato administrativo do Governo Federal, não é uma Lei formalmente, eu já expliquei isso. Os prazos que estão lá não podem contrariar a Lei maior, porque ele vem regulamentando que Lei? Duas Leis: a Lei Nº. 10.098 e a Lei Nº. 10.048.

O que é que diz a Lei Nº. 10.048? Nós vamos no art. 5º e ela fala o quê? Diz o seguinte: Os veículos de transporte coletivo a serem produzidos após doze meses da publicação desta Lei – a Lei foi publicada em 09 de novembro de 2000 - serão planejados de forma a facilitar o acesso a seu interior das pessoas portadoras de deficiência. Olha só o prazo que a lei deu. Dois anos depois da publicação dela. Esse prazo já venceu.

O Parágrafo 2º ainda diz o seguinte: Os proprietários de veículos de transporte coletivo em utilização – ou seja, aqueles que estão em utilização, aqueles que estão andando nas ruas - terão o prazo

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de cento e oitenta dias, a contar da regulamentação desta Lei, para proceder às adaptações necessárias ao acesso facilitado das pessoas portadoras de deficiência.

Quem regulamentou ela? Essa e o Decreto Nº. 5296 que é de dezembro de 2004? Esses cento e oitenta dias já passaram. O Decreto fala em cento e vinte meses e ele não pode contrariar o prazo que foi dado aqui na Lei Nº. 10.048 que foi de 180 dias depois da regulamentação da Lei. O Decreto nesse posicionamento é ilegal, porque ele não pode revogar uma Lei. A Lei, hierarquicamente, é maior. Na verdade, o que é que acontece? Nós temos que pedir o cumprimento deste prazo. Estão aí o Amaury e a Simone que são ex-Presidentes da maior associação de pessoas com deficiência de Belém e eles sabem muito bem que nós entramos com uma ação civil pública contra todas as empresas de ônibus, inclusive contra a CTBEL, para pedir o cumprimento desse prazo aqui.

É uma ação que está na 21ª Vara Civil de Belém pedindo que as 28 empresas de ônibus urbanos adaptem já os ônibus e a CTBEL torne acessíveis as paradas de ônibus. A prefeitura, para não contrariar, colocou 10% de ônibus adaptados com aquele elevador, mas nós entendemos que isso não é suficiente ainda, inclusive o Amaury sabe que, por causa de ações como essa contra empresas de ônibus, eu fui representado, entenderam que eu fui tendencioso. E aí a sociedade civil é importante: ela nos apoiou, apoiou o Promotor de Justiça, revertendo uma moção de apoio dos deficientes à Corregedoria e depois nós provamos que, em relação ao transporte gratuito, nós tínhamos razão. Colocamos inclusive a essa necessidade da sociedade civil organizada, essa mesma associação que está aqui o ex-Presidente e a única Emenda Constitucional popular do Estado do Pará que foi aprovada e virou Dispositivo Constitucional é uma Emenda Constitucional que foi através da mobilização dessas associações de pessoas com deficiência. Às vezes, a mobilização também da sociedade civil é muito importante, junto com o Ministério Público, para fazer as coisas acontecerem. Eu vou passar para a Cleide para ela responder os questionamentos da nossa colega Marlúcia e dos demais e também depois a Rebecca.

Participante não identificado

Eu queria um esclarecimento: a Doutora Izabel Maior, em uma entrevista na Rádio Nacional, na sexta-feira, sobre esse assunto, colocou que daqui a três meses vai haver uma reunião dos fabricantes de ônibus e eu não sei quem mais para decidir qual tipo de ônibus é mais adequado para o Sistema Nacional de Transporte Coletivo e só a partir desse momento é que seria exigido das empresas o cumprimento da Lei. Então a gente não sabe mais o que é que funciona...

Participante não identificado

Eu tenho o maior respeito pela Doutora Izabel. É uma pessoa realmente que é envolvida com a questão da pessoa com deficiência e é uma pessoa com deficiência, mas eu discordo desse posicionamento. Ela obviamente representa o Executivo, tem um posicionamento em relação ao Decreto que não necessariamente é o posicionamento do Ministério Público. Nós entendemos que as ações já devem ser tomadas, tanto que esse é o meu posicionamento pessoal.

Rebecca Monte Nunes BezerraPromotora do Ministério Público/RN

Eu vou falar um pouquinho, o Marcelo quer falar também. Vou falar da questão da uniformização de conviver com todos os colegas, todos os Promotores de Justiça dentro do estado. Eu acho duas práticas altamente salutares. Uma é a questão da Promotoria especializada. Então, naquelas comarcas de maior fluxo de processos, com maior numero de habitantes, é interessante a especialização das Promotorias. Com isso se pode chegar ao Procurador Geral e solicitar que, pelo menos na capital, se

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tenha a Promotoria de Justiça especializada na área da pessoa com deficiência ou na área de deficiência do idoso, no mínimo, nessas duas áreas.

Outra prática também que precisa ser adotada por muitos Ministérios Públicos é a questão do Centro de Apoio às Promotorias. Por exemplo: lá no Ministério Público do Rio Grande do Norte, eu, que estou agora na Coordenação, estou, inclusive, afastada das minhas funções para exercer esse cargo de Coordenadora. Eu respiro direito na área sobre deficiência do idoso, eu durmo pensando nessa área, então, eu estou à disposição para ajudar a atuação dos colegas. Nós somos peões dos colegas, quer dizer, se o colega está precisando de uma pesquisa jurídica em tal área, se o colega está precisando de uma minuta de uma peça, se o colega está precisando de uma palestra, se o colega está precisando fazer uma consulta, tirar uma dúvida, isso ajuda bastante. Fora isso, ainda tem uma Resolução do Conselho que determina que todas as ações civis e termos de ajustamento de condutas devem ser remetidos ao CAOP da área. Isso nos possibilita a tomar conhecimento de tudo que está acontecendo em nível de estado.

Nós fazemos duas ações. Uma é que nós fazemos um banco de dados e isso auxilia até para que os colegas possam consultar e também temos um informativo quinzenal que nós informamos tudo que está acontecendo em nível de Ministério Público na área da pessoa com deficiência e do idoso e, em nível de Brasil, a gente consegue as notícias na Internet. Isso estimula bastante e faz com que todos os colegas tenham conhecimento do que está acontecendo na área, em nível do Rio Grande do Norte.

Cleide Ramos ReisPromotora do Ministério Público/BA

A pergunta mais simples sobre a questão do prazo de dez anos é a seguinte: o transporte rodoviário vai ter dez anos para adaptar a frota antiga; os novos que ele for adquirir ele já vai adquirir acessíveis, porque os fabricantes já têm que fabricar veículos acessíveis. Só que com relação a essa frota antiga, que pode continuar funcionando durante os próximos dez anos, não se estabeleceu um percentual para ele cumprir por ano. Como não se estabeleceu, o que é que acontece no Brasil usualmente? Ele vai deixar estourar os dez anos, a frota vai se desgastar toda e não vai ter acessibilidade nessa frota antiga. Então, o que é que eu acho que a gente pode fazer? À semelhança do que acontece com outros.

A questão de cancelar concursos em que não se respeitou a reserva de vagas: quem vai responder isso é a colega aqui do Piauí, porque ela tem um procedimento instaurado. O Ministério Público pode ingressar com uma ação judicial para cancelar esse concurso. Ela tem um procedimento desses e ela vai explicar todos os trâmites daqui a pouquinho. São três procedimentos e ela disse que está estressada com a pressão da sociedade civil e do poder público.

A questão da previsão de verbas para as contas públicas nas Leis Orçamentárias: com base nesse perfil constitucional do Ministério Público, o Ministério Público pode cobrar dos agentes públicos, tanto membros do Legislativo quanto do Executivo, que eles cumpram as Leis. Então, se não houver previsão orçamentária, não vai haver políticas públicas, porque não se pode fazer políticas públicas sem a previsão orçamentária. O gestor não vai poder gastar legalmente se não houver previsão, a não ser, é claro, que se faça como usualmente os corruptos fazem no Brasil, que são altos esquemas de corrupção e aí eles conseguem gastar fácil, fácil, justificar e todo mundo engole. Mas, pelo caminho legal, tem que entrar nessas Leis Orçamentárias. Esse processo de discussão das Leis Orçamentárias começa em junho/julho. O período de exame das contas públicas pelo cidadão é durante os meses de abril e maio de cada ano. São 60 dias por ano que as contas ficam disponíveis na Câmara Municipal, tanto para os cidadãos indivíduo ING – indivíduo não-governamental, como para as entidades do terceiro setor. Nesse período, essas contas têm que ser disponibilizadas integralmente. O que significa isso? Com todos os documentos, contratos, pastas. Não é uma prestação de contas de balancete, de balanço, de dar um balancete lá. Não. Eles têm que apresentar todas as pastas da área de saúde, todas as pastas da área de educação, todos os contratos firmados, cópias dos procedimentos de licitação, cópias das datas de empenho, cópia de todos os documento de compras e aquisições que dizem respeito às contas públicas. Se essa prestação de contas é feita irregularmente, só com o balancete, cabe uma ação, que pode ser uma

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proposta tanto da entidade do terceiro setor quanto pelo Ministério Público. Na minha comarca, eu capacitei a ONG que eu criei, eles entraram em nome da própria Casa da Solidariedade. Na realidade eu fiz a ação, mas um advogado amigo assinou. Por que isso? Para empoderar mais a sociedade civil, mas o Ministério Público pode entrar também. Se a ONG tem aquele problema de não ter recursos, é bom procurar o Ministério Público e esperar que o Promotor tenha essa sensibilidade: Eu vou entrar com uma ação de obrigação de fazer para obrigar o Presidente da Câmara ou o Prefeito a remeter as contas com todos os seus documentos e, inclusive, permitir a retirada de cópias, de xerox, para os interessados. Esse é o primeiro processo de controle social de contas públicas, que começa em abril e maio.

A segunda etapa é essa que a nossa colega falou: é a inclusão, nos Projetos de Leis Orçamentárias, na Lei Orçamentária Anual e no Plano Plurianual. O Plano Plurianual só é feito no primeiro ano em que o prefeito chega; depois, a cada ano só vão ter as duas: a LO e a LDO. Esse processo de discussão começa entre os meses de junho e julho, no mais tardar, em agosto. Começa a tramitação na Câmara Municipal e eles começam a preparar o projeto. Algumas câmaras, que são corretas e seguem a Lei de Responsabilidade Fiscal, fazem audiências públicas onde a sociedade civil é ouvida e aí, nessas audiências públicas, o Ministério Público deve se fazer presente, deve ir para a Câmara Municipal participar dessas audiências, opinar, emitir pareceres, ou a Assembléia Legislativa, no caso de estado, para assegurar que haja essa previsão de verbas em todas as áreas fundamentais de políticas públicas. Essa participação do Ministério Público é muito importante. Desde previsão de verbas para ONG’s fantasmas criadas por políticos para a captação de sufrágio até coisa pior, tudo passa escandalosamente nas Leis de Diretrizes Orçamentárias ou na Lei Orçamentária Anual. Tudo passa escandalosamente, porque ninguém liga. Normalmente o vereador, como se faz com todo o processo de legislação no Brasil, ele pega projeto que já existe – ou, no caso, o prefeito, porque essa é uma iniciativa do Executivo - faz as adaptações que ele quer e manda para a tramitação na Câmara. E aí eles fazem uma movimentação política mesmo, orquestram uma articulação política para aprovar de qualquer jeito, com todo o tipo de ilegalidade. As Leis Municipais são as Leis mais absurdamente inconstitucionais que vocês podem imaginar. Tudo quanto é ilegalidade, as Câmaras Municipais aprovam. Se o Ministério Público tivesse uma participação mais ativa nesse processo de elaboração legislativa, a gente já teria aquele caminhozinho andado para a implementação das políticas públicas, porque primeiro a gente precisa do arcabouço legislativo e aí depois a gente vai partir para o arcabouço executivo. Ficou claro isso aí?

Só vou complementar que, quanto a esse processo todo de controle social das políticas públicas, o interessante que ele seja feito com o Ministério Público e a sociedade civil. Lá na Bahia tem uma entidade que eu sou associada que é a AATR - Associação de Advogados dos Trabalhadores Rurais, junto com uma outra ONG, que é o Movimento de Organização Comunitária. Eu fui advogada um dia, já era associada, continuei e ninguém me tira. Ninguém pode impedir, eu não estou assinando petição nenhuma! É uma ação da sociedade civil e eu continuo sendo cidadã. Essas entidades fizeram uma campanha, fizeram um convênio com a Procuradoria Geral de Justiça e desenvolveram uma campanha que se chama Quem não deve não teme. Essa campanha tem uma Recomendação do Procurador Geral para nós, Promotores de Justiça, que é para cobrir as nossas costinhas, onde o Procurador Geral diz que nós temos que fiscalizar o controle social de contas públicas do município e que nós devemos adotar todos os procedimentos para garantir que os cidadãos tenham acesso às contas públicas. Existem formulários que nós respondemos, nós mandamos ofícios para entidades, há uma série de procedimentos que nós adotamos. Claro, alguns Promotores que têm compromisso social como eu tenho; não tenho brio de dizer e espero ter sempre. Muitos não fazem e infelizmente fica por isso mesmo, porque a sociedade civil não reclama. Isso é o que está acontecendo com Cristina na minha ex-comarca em que eu já dei a orientação para ingressar com uma representação contra a Promotora, porque ela não cumpriu os trâmites de fiscalização do controle social de contas públicas. A minha sugestão é que vocês, ONG’s, se reúnam, peçam uma audiência pública com o Procurador Geral no estado de vocês, para fazer um convênio semelhante. Eu posso conseguir para vocês e mandar por e-mail a cópia desse convênio que a Procuradoria de Justiça da Bahia fez com essas entidades. É muito interessante.

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Marcelo Moreira dos SantosRelator

Eu sei que depois desse brilho todinho da colega aqui eu não preciso nem completar, mas quero falar que além desse papel do Ministério Público é importante a gente estar perto dos conselhos de cada uma das áreas, da assistência social, da saúde, acompanhar os conselhos, porque as Leis Orçamentárias, votadas sem a apreciação dos conselhos, são inconstitucionais. É preciso que a sociedade civil esteja atenta para somar mais essa questão. Os conselhos são também outra chave importante nessa fiscalização. Aproveitando que eu estou com o microfone eu queria colocar duas questões para a Solange e para o Luís Fernando: somente o Ministério Público pode entrar com alguma ação, obrigação de fazer?

Em relação à acessibilidade arquitetônica a gente tem que ver uma questão: a acessibilidade arquitetônica é um direito afeto a toda uma coletividade, a todo cidadão, à pessoa com mobilidade reduzida, a qualquer pessoa.

Historicamente, desde o ano de 1985, o Ministério tem sido responsável por 99% do ajuizamento dessas demandas coletivas, mas aí também tem outro ponto: as associações civis podem também entrar com essas ações da obrigação de fazer ou de não fazer. Mas o cidadão ainda não, porque a ação popular de cada cidadão tem que ser através de advogado e é preciso que seja para desfazer, desconstituir um ato administrativo. A alternativa que se tem, hoje, é através de uma associação civil a ajuização, como falou a Cleide. Outra questão é que essa associação busque potencializar essa discussão dela junto com o Ministério Público e possa entrar com a ação junto com o Ministério Público.

No Amapá, a gente entrou com uma ação exatamente depois de constatar isso. Os concursos de professores se dividiam em todas as cidades e a partir daí começou a contar cota por cada uma das cidades. Como se diria no futebol, a Lei é clara, fala que o concurso é por cargo, então não se pode fazer essa interpretação fracionada, em prejuízo. A gente entrou com a ação com um resultado muito bom, até favorável.

Facilitador

Eu acho que uma coisa muito importante para vocês é essa troca de experiência constante. Essa associação está sendo muito para isso, para a gente se conhecer e trocar experiências. Experiências fantásticas como as da Rebecca, experiências novas como as da Marlúcia, posicionamentos novos trazidos pela Cleide e eu não posso falar do Marcelo, porque a gente sempre está em contato aqui, mas também o Marcelo, que é um colega atuante. Essa troca de experiências faz, inclusive, com que facilite a nossa atuação perante as Promotorias. Marlúcia.

Marlúcia Gomes Evaristo AlmeidaPromotora do Ministério Público/PI

Falar com o Ministério público foi a primeira coisa que eu fiz. Eu mandei e-mail para todas as Promotorias que trabalhavam nessa área da cidadania pedindo para se tivessem alguma coisa, me mandar. Eu acho até que o senhor foi um dos poucos que me mandou um e-mail de volta falando justamente da AMPID.

Com relação à questão de concurso público, eu estou com três casos no Piauí. São cargos para Polícia Civil, Agente de Vigilância Sanitária, se eu não me engano, e o outro foi um da saúde, que foi o pior. Os dois primeiros de que eu falei, o Edital ainda não teve as provas. O que tem que se ver primeiro, nessas questões, é que a Constituição fala de uma reserva de vagas, que vai de 5 a 20%. Pela Constituição, a competência para legislar sobre os direitos da pessoa com deficiência é comum: União,

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Estado e Município. Então os estados legislam em relação a aplicar esse percentual. No meu estado é de 10% das vagas, dos cargos. O que eles fizeram lá? No da Polícia Civil, excluíram completamente. Eu expedi uma Recomendação mandando que incluíssem, porque, mesmo o Decreto Nº. 3298 falando daquela questão - porque tem um artigo que diz que o deficiente pode participar de concurso público para cargos ou empregos compatíveis - essa questão da compatibilidade do cargo tem que ser vista durante o estágio probatório. É uma coisa que tem que ter aquela equipe multiprofissional, já foi falado aqui e eu não vou me estender novamente. Eu entrei administrativamente ainda, entreguei a Recomendação, eles acataram a Recomendação, modificaram o Edital, retificaram e aceitaram. Vai ter para Delegado de Polícia, Agente da Polícia, Escrivão. Todos eles abriram cargo num percentual de 10%. O outro que eu estou com problema é porque tem também uma dispensa de taxa que eles não querem.

Agora, o pior foi um que já havia acontecido, já saiu inclusive o Edital homologando o concurso e, como a gente trabalha com poucos recursos, o Ministério Público do Piauí é pobre – eu trabalho numa sala pequena; eu, uma secretária e uma outra Promotora que vai duas vezes na semana - eu não tenho o Diário Oficial do Estado para estar acompanhando e então já peguei o bonde andando. O concurso já está homologado, mas olhem o que eles fizeram: pegaram as vagas, fracionaram por município e ainda fracionaram por hospitais. Então eu tinha 70 vagas para fisioterapeuta, das quais teriam que ter sido reservadas 10% - o que seria, pelo menos, sete - e deixaram zero vagas para fisioterapeutas. O que é que eu fiz lá com esse concurso todo pronto? Quinta-feira à noite - eu ia viajar sexta-feira de manhã para cá - eu preparei uma ação civil pública, entrei pedindo a nulidade do concurso e se o juiz não entendesse, que ele, pelo menos, retificasse o Edital de homologação do concurso para garantir essa reserva de vaga no percentual que a Lei Estadual manda. Então, o que vocês têm que observar em concurso público é se tem Lei Estadual. Se não tiver, vai para a Constituição Federal, mínimo de 5%. Se existir Lei Estadual, se rege pelo que a Lei Estadual está mandando. Se tiver ilegalidade, procurar o Ministério Público que ele vai pedir Recomendação e, se for o caso de não atenderem, entrar com ação civil pública. No nosso estado eu estou confiando que o juiz vai me conceder a liminar e vai suspender, no caso, a nomeação, porque estão em via de serem nomeados. No outro caso, que eu vou fazer na terça-feira, eu vou pedir a suspensão das provas que vão acontecer no dia 20. Eles não quiseram, atenderam a Recomendação em parte, mas não vão reabrir o prazo para a inscrição, mesmo existindo a Lei Estadual com a isenção de taxa. Vocês têm que brigar por isso também nos estados: isenção de taxa para a pessoa com deficiência, no concurso público.

Facilitador

Eu gostaria só de complementar um pontinho aí. A Marlúcia falou no ponto principal: o mínimo é de 5%, está na Constituição. Aqueles 2% que você me falou não é só ilegal, é inconstitucional. Cabe um mandado de segurança direto, com pedido de liminar para cumprir o percentual mínimo de 5% do concurso.

Participante não identificada

Existe um número mínimo de vagas para que o deficiente tenha direito à vaga?

Facilitador

Não. O mínimo é o percentual. É 5%.

Se tem duas vagas, a Aparecida diz, no livro dela, que uma vaga vai ser para a pessoa não deficiente e uma vaga para a pessoa com deficiência. Agora, se tiver uma vaga só, é a pessoa realmente que tirou a maior pontuação.

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Rebecca Monte Nunes BezerraPromotora do Ministério Público/RN

Existe já uma doutrina: um livro de Eugênia Fávero, onde ela fala que quando houver essa abertura de vagas de uma por uma, poderia se abrir uma investigação para ver se existe naquele cargo, naquele serviço público, uma pessoa deficiente já trabalhando e tudo mais. Já começa a haver uma doutrina nesse sentido.

Adão Alcides ZanandreaRio Grande do Sul

Meu nome é Adão Alcides Zanandrea. Hoje eu vou sair daqui com a alma lavada, porque eu tive uma oportunidade, como Conselheiro Estadual de Saúde. Hoje eu estou aqui como delegado, representando a Fraternidade Cristã de Doentes Deficientes, embora eu seja Presidente de uma Associação de Cegos que tem uma casa ao lado para cegos idosos, temos 46 cegos idosos. Eu não tive a oportunidade de ouvir a palestra da Doutora Rebecca, mas ao ver os Promotores, eu não vou fazer como o Conselho Estadual me disse, que o Conselho e os Promotores estavam atrás da Mesa travestidos de gestores. Pedi a dois Promotores; me pediram respeito. Aí eu disse: Está gravado e tem a Ata. Eu quero ver naquela ocasião os colegas, se foram eles ou quem, porque havia uma demanda da APAE, da Federação das APAE’s dos Cegos, dos Surdos e dos Físicos que pediam órteses e próteses. Ficou engavetada 8 anos e eu disse: Qual é aquele que não cumpriu o dever? Antes eu disse para a Doutora Cleide que era um dever, não era uma possibilidade, porque, não havendo essas ações, não estão sendo cumpridas. Eu quero dizer que fiz essas colocações em 1993 como Vice-Presidente de uma Associação de Cegos e conseguimos um aditamento do concurso para a Previdência Social, que dizia que só paralíticos e amputados - antes da Lei de reserva de vagas - podiam se inscrever. Aí saiu uma Resolução N.º 1 de 1994, da 7ª Câmara da Procuradoria da Justiça Federal, que proibia a caracterização de cada área de deficiência a se inscrever; só o deficiente físico, paralítico e amputado. Aí me telefonaram para que eu tirasse e eu falei: Porque não o cego? Não enxerga. Porque não o deficiente auditivo? Não ouve. Porque não aquele que usava muletas? Não podia ter problemas nos membros superiores, não podia manipular o processo.

Há uns dois anos e meio, como entidade, nós fizemos, como advogados, cinco depoimentos e um deles, agora em abril, está no Ministério Público, com o Doutor Alexandre, no Rio Grande do Sul, da Justiça Federal e que oficiou que, além do teste do pezinho, se fizesse o teste da acuidade auditiva e visual. E lá está, para responder ao Doutor Alexandre, que o Ministério da Saúde não poderia fazer o teste da acuidade visual porque era impraticável, então vai ter uma audiência pública. E eu quero, como às vezes eu disse que era pouco crítico, dizer que eu discordo de boa parte dos Promotores quando dizem que a ação individual é do advogado. Não. Quando aquela ação individual tipifica que aquele momento, aquele deficiente incorpora e tipifica todas as outras pessoas com deficiência, isso é obrigação do Ministério Público e não da defensoria e dos advogados. E lá no Rio Grande do Sul aconteceram várias ações em que no primeiro momento nós insistíamos a termo de tomarmos as decisões.

Outra coisa: Eu vejo que nós estamos com bastantes barreiras arquitetônicas, as atitudinais, as culturais e é preciso entrar nesse sentido e não ficar meio vesgo, ficar só olhando um lado. Eu participo da comissão de concurso. Eu trabalhei 56 anos, trabalhei 39 anos no SINE e, com a reserva de vagas, eu tive vivência e eu vejo uma análise da capacidade ocupacional. Lá se pede, no Edital, o CID. O maior problema é iludir o deficiente que vai fazer o concurso se ele não está capacitado para o desempenho daquela função. É importante que se observe o Edital; e aí nós conseguimos anular vários concursos porque, se tem a Lei e tem o Edital e o edital faz parte do contrato social, tem que ver as condições e nós temos a Lei Estadual e Municipal no Rio Grande do Sul e talvez – eu não lembro bem – o Decreto Nº.

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3.298 que, se não atingir o percentual dos 10%, pode ser embargada. Tem que ver os prazos e os critérios no edital.

Adão Alcides ZanandreaRio Grande do Sul

Eu vejo uma coisa que o Ministro falou: como é que está a situação de órtese e prótese? A Emenda Constitucional N.º 29 - eu acho que isso respeita também uma das finalidades - se não está previsto, se não está sendo cumprida. O Governo federal tem que aplicar 10%, os estados 12% e os municípios 15%. Eu quero ver o que é que o Ministério Público tem feito em relação a isso, porque com a concessão de órtese e prótese pode-se fazer a medicina preventiva. Eu peço desculpas.

Paulo César Bueno VenâncioADEVALE/MG

Eu sou Paulo César, Presidente da ADEVALE. Eu tenho três colocações a fazer. Vou tentar gastar os três minutos. Primeiro, eu quero agradecer pelo dia de hoje. Eu me alegro muito com a presença dos Promotores aqui. Daqui a cinco, seis anos, estaremos sendo colegas. Eu quero colocar aqui que eu sou um dos poucos estudantes do Brasil que está promovendo uma pesquisa sobre Direito Constitucional das ONG’s porque pouco se investe nas ONG’s nesse país dentro das academias, dentro das faculdades.

Eu me alegro muito, porque eu vou contar com colegas como vocês futuramente. Isso me alegra, porque eu acho que nós temos que ser mesmo participativos e jogar para fora o que precisamos fazer. Então, observamos que tem dois grupos em andamento: um é a discussão do Estatuto e o outro é aqui a questão da ação da Promotoria. O que é que eu observei? Quando eu cheguei lá na porta do Estatuto tinha cadeira de roda, uma por cima da outra, tinha cego um atropelando o outro, uma discussão tremenda sobre a questão do Estatuto. Eu vejo que o Brasil é o quinto país em Legislação de proteção à pessoa portadora de deficiência e eu fico preocupado. Nós temos investido pouco na questão processual. Foi por essa questão que eu vim para cá. É aqui que eu tenho que me comportar. Se você observar, nós estamos aqui trabalhando uma maneira de alcançar efetivamente o direito material que já tem garantido, mas precisa-se de um processo e esse processo tem que ser mais trabalhado.

Eu quero deixar aqui três perguntas. Doutora Rebecca, eu preciso da sua ajuda na questão da minha pesquisa sobre o Direito Constitucional das ONG’s. Você deve ter muita coisa para passar. Eu preciso de orientação sobre o seguinte: Como nortear as nossas entidades no país? Porque nós estamos vendo que as entidades estão esfaceladas, elas estão capengas, elas estão com dificuldades. Para você conseguir projetos você tem que saber como trabalhar essa questão de projetos, como a entidade tem que estar formada porque, infelizmente, é a única orientação que se tem. É como a doutora falou. O que é que acontece? A minha preocupação é que as entidades só estão orientando na questão do Estatuto, mas nós não orientamos na questão delas alcançarem seus objetivos, os projetos. Como se formaram juridicamente, como ela pode se portar? Eu queria saber se o Ministério Público tem alguma formação, alguma orientação nesse ponto de estar chamando as entidades, as ONG’s, para sentarmos na mesa e estarmos dando uma maneira delas serem estruturadas. Para finalizar, o Código de Processo Civil, no seu art. 1.211, dá garantia ao idoso para o seu processo ser acelerado. Eu queria saber se dentro do Código de Processo Civil tem alguma coisa que garanta que os processos movidos por pessoa portadora de deficiência sejam acelerados também. Muito obrigado pela oportunidade.

Juarez de Almeida Albues

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Associação Mato-grossense dos Cegos/MT

Senhoras e senhores, boa noite. Eu sou o Juarez Albues, de Mato Grosso, Vice-Presidente da Associação de Cegos. Eu sou deficiente visual. Essa chuva que está caindo no país é para lavar nossa alma hoje, depois de tantas coisas. Eu quero registrar uma coisa e eu queria endereçar os meus questionamentos à Doutora Cleide. Na Lei da Acessibilidade está tendo um parecer técnico referente à pessoa com deficiência visual, nomeando o percentual de 5% para a pessoa com deficiência visual ser considerada uma pessoa deficiente. Eu queria ver o que pode ser feito, como a gente pode fazer para ajudar os colegas que têm a baixa visão.

Participante não identificada

Tem bastantes coisas que eu ouvi, vi, presenciei e aí não tem como fugir da raia mesmo. Eu acho até que, para entrar no Ministério Público, já tem que ser uma pessoa para enfrentar tudo, porque é uma profissão, realmente, muita bonita. Eu quero aqui ressaltar o apoio que nós tivemos do nosso Procurador Geral de Justiça. Eu estou vendo a importância de toda a comunidade que está aqui, todos os segmentos da sociedade, a importância da credibilidade para Ministério Público e vejo a participação de pouquíssimos Promotores de Justiça aqui. O colega falou que vários Procuradores não deram esse apoio. Eu tive o apoio do meu Procurador Geral de Justiça, Doutor José Demóstenes. Eu quero parabenizá-lo perante os colegas e vou levar isso para ele também, a importância da oportunidade que me deu, eu que estou começando.

Na minha Promotoria lá de Cidadania do Deficientes e Idosos só tem eu, não tem nenhuma estrutura formada. O outro promotor titular que foi fazer um Mestrado na PUC, em São Paulo, tinha uma equipe e com a saída dele a equipe toda saiu e agora eu estou pedindo que essas pessoas retornem, porque eles têm uma certa experiência, a assistente social, a técnica, que é a Doutora Pauline e então, com isso, a gente vai começar praticamente do zero. Eu quero pedir o apoio de vocês que já têm essa experiência. Eu conto com esse apoio para poder vestir a camisa e realmente entrar nessa luta para defender os direitos das pessoas com deficiência. Muito Obrigada.

Marlúcia Gomes Evaristo AlmeidaPromotora do Ministério Público/PI

Essa questão de órtese e prótese e desse percentual lá da saúde tem que ser vista pelo estado. A gente aciona o estado ou o município. Por quê? Porque, onde a saúde não é municipalizada, o SUS repassa esses valores relativos à órtese e prótese para o estado, mas onde a saúde é municipalizada, como no caso a capital em que eu moro, que é Teresina, a responsabilidade aí é da Prefeitura Municipal. No caso, teria que acionar o prefeito. Existe esse percentual que tem que se destinar à saúde; se não for destinado, é o caso de se entrar com ação civil pública como, lá no estado do Piauí, a Promotora de Defesa da Saúde sai entrando. Eu só ingressei com essa ação na Justiça Federal porque a gente também estava querendo a modificação de uma tabela que era do SUS e o SUS está ligado à União. Então, por conta disso, a gente entrou em nível de Ministério público Federal também. No caso de ser só a não distribuição de órtese e prótese, é verificar se no seu município a saúde é municipalizada. Se ela não for, vai para a Secretaria de Estado da Saúde. Se ela for, vai para a Secretaria Municipal de Saúde. As ações transcorrem em nível de comarca ou, então, em nível de estado, na capital.

Marcelo Moreira dos SantosRelator

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Uma questão que o Paulo já colocou, é uma indagação dele, é se existe, no Código de Processo Civil, na legislação processual, algum tipo de prioridade no andamento processual da pessoa com deficiência. A resposta aí é negativa. Não existe esse tipo de prioridade que é concedido à pessoa idosa. Por enquanto a resposta é negativa e é necessária a mobilização, até mesmo na política legislativa, para mudar essa questão e se discutir se haverá o direito de prioridade, coisa que, com certeza, vem aí no Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Participante não identificado

Eu gostaria de complementar apenas dizendo que lá no meu grupo, eu estava como facilitador, deram uma idéia sobre exatamente isso. Foi um questionamento que foi feito e foi incluído para ser discutido amanhã na Plenária este ponto: que nos processos judiciais em relação às causas que envolvam pessoas com deficiência seja dada a prioridade, da mesma forma que está no Estatuto do Idoso. Dizendo que o Estatuto do Idoso garante essa prioridade não só nos processos judiciais, mas em qualquer procedimento administrativo seja a nível federal, estadual ou municipal e mesmo nas concessionárias de serviços públicos, como nas centrais de energia elétrica, água. Então, essa prioridade em relação ao idoso não é só nos processos judiciais é, também, nos procedimentos administrativos. É, por exemplo, uma reivindicação que pode ser colocada como um dos pontos principais amanhã, na Plenária da Conferência.

Marlúcia Gomes Evaristo AlmeidaPromotora do Ministério Público/PI

Existe também a questão do atendimento prioritário. Eu coloco os Termos de Ajustamento de Conduta em todos, a questão principalmente do ajuste coletivo. Eu coloco o que manda a Lei Nº. 10.048, que é o atendimento prioritário a idoso, gestante, lactante e pessoas portadoras de deficiência.

4.7 Tema: O Sistema Único de Saúde e a Pessoa com Deficiência

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Falando da política de saúde das pessoas com deficiência, aqueles que já me conhecem há algum tempo já têm idéia de quais são os objetivos, quais são as diretrizes, quais são as Portarias que norteiam essa política e, enfim, quais são os desafios. Daí, eu quero ver se a gente dispõe de um tempo para que a gente possa fazer uma análise dessa política do que mesmo dizer que o Ministério da Saúde faz isso e aquilo e aquilo outro, porque a gente tem, como tema dessa Conferência, a acessibilidade e o compromisso de todos nós, o compromisso de cada um. São poucas as pessoas com deficiência, mas a maioria das pessoas que estão aqui estão vinculadas muito mais aos serviços.

O que vocês acham? Eu me apresso um pouco, apresento a política para aqueles que não conhecem e a gente parte para uma análise de fato. Nessa análise, vocês vão ter muito mais condições de fazer proposições importantes do que simplesmente reivindicar por reivindicar. A política tem esse objetivo. Para quem não tiver conhecimento ainda dessa política depois eu retomo, mas a idéia é passar mais rápido por ela e enfatizar mais o que de fato é de interesse, o que na prática a gente precisa.

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Os dados do censo eu não vou apresentar porque todos já têm, todos conhecem. Quem não conhece os dados do censo levante a mão. Não conhece? Quanto nós somos, quantas pessoas com deficiência têm no país?

Nós estamos fazendo uma proposta de fazer desse Painel um Painel muito mais prático, de compreensão de nossos direitos em relação à saúde do que fazer, simplesmente, uma exposição sobre a política, sem que a gente tenha um conhecimento mais concreto. São 25 milhões. Os tipos de deficiência todos aqui temos conhecimento, o percentual de pessoas com deficiência mental, motora física, auditiva e etc. Esse material depois eu posso estar passando para vocês.

Vamos começar explicando que nenhuma política é feita à revelia dos nossos desejos. Todas as políticas são feitas baseadas numa Legislação. É importante que a gente saiba que tudo que nós fazemos hoje, tanto o governo federal, o estadual e o municipal, tem como base esse arcabouço legal. Quer dizer, o que é que a gente faz? É o que está escrito na Constituição, é o que está escrito na Lei Orgânica de Saúde, nas Leis e Decretos e na Política de Saúde da Pessoa com Deficiência. O que compete à saúde é o que a gente tenta realizar no governo federal, estadual e municipal.

O propósito dessa política é a reabilitação, reabilitar a pessoa com deficiência na sua capacidade funcional e desempenho humano, com o objetivo da sua inclusão. Qual é o objetivo maior? É a inclusão em todas as esferas da vida social desse indivíduo. Um outro propósito é a proteção à sua saúde e a prevenção dos agravos que levam à deficiência. Esse é o grande propósito da nossa política.

As nossas diretrizes: para que a gente alcance esse propósito, é importante que a gente trabalhe dentro dessas diretrizes, a diretriz da promoção da qualidade de vida, a diretriz da prevenção, da atenção integral e organização de serviços, da ampliação e fortalecimento dos mecanismos de informação e da capacitação de recursos humanos. Daí, nós vamos falar um pouquinho de cada coisa dessas, um pouquinho de cada diretriz.

Na promoção da qualidade de vida, a saúde também se preocupa. A questão da acessibilidade está mais vinculada a essa diretriz do que a qualquer outra diretriz, ajudando para que haja ambientes favoráveis, para que haja uma igualdade de oportunidades, para que se forneça ajudas técnicas aqui compreendidas como órteses e próteses, o desenvolvimento de habilidades individuais que favoreçam o desenvolvimento das potencialidades das pessoas com deficiência. Essa primeira diretriz diz que o Ministério da Saúde tem o compromisso fundamental de assegurar também a acessibilidade.

A outra diretriz diz respeito à prevenção das deficiências. Em todas as áreas do Ministério nós vamos ver que tem diversos programas com a preocupação de prevenir as deficiências. Temos ações de natureza informativa e educativa, programas de vacinação, programas de exame de tiragem neonatal, o acompanhamento ao desenvolvimento infantil, a prevenção de acidentes de trabalho, de acidentes domésticos. São várias ações que são desenvolvidas pelos municípios, no sentido de prevenir as deficiências. A área de prevenção mais difícil que acontece numa política de saúde, inclusive, são aquelas que ultrapassam os muros da saúde, por exemplo, a questão da violência urbana. A violência urbana não é um papel único do setor saúde, envolve outros setores também. Nesses, a gente tem muito mais dificuldade do que promover uma campanha de vacinação.

A outra diretriz está relacionada à atenção integral à saúde e organização dos serviços. Nós temos como princípio que a pessoa com qualquer deficiência deve ser atendida nos serviços de saúde como qualquer outro cidadão. É comum as pessoas com deficiência serem encaminhadas para centros de reabilitação. Elas devem ser encaminhadas para centros de reabilitação quando, de fato, isso for uma necessidade delas, mas muitas vezes elas têm outros problemas de saúde, outras intercorrências que precisam da rede de serviços de saúde. Isso é fundamental para que uma política de saúde possa contemplar o que de fato esse indivíduo necessita. Hoje, nós trabalhamos muito com a implantação de rede de serviços de reabilitação. O que significa a rede de serviços de reabilitação? Significa que essa atenção precisa ocorrer nos diversos níveis de atendimento. Por exemplo, é importante que uma criança com síndrome de Down seja atendida no posto de saúde, que ela possa também ir para um centro de reabilitação para estimulação precoce e aquelas que ainda têm dificuldades no aparelho locomotor serem encaminhadas para instituições de reabilitação e, mais tarde, para a escola. Aí elas deixam de precisar da

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saúde ou para um exame cardiológico, ou para fazer um exame da sua capacidade respiratória. O que eu quero dizer é que a pessoa com deficiência precisa ser atendida em toda essa oferta existente no SUS.

Por outro lado, nós sabemos que, tanto no Norte como no Nordeste, principalmente no Norte mais do que no Nordeste, os serviços de reabilitação são precários. Nós não temos quase nada de reabilitação na Região Norte do país. Quando eu digo, isso eu posso afirmar que você tem alguma coisa em Manaus e no Pará. No Pará e no Amazonas você tem dois ou três serviços que fazem algum atendimento em reabilitação e é comum você ver, no Amazonas principalmente, crianças com hidrocefalia e com lesões neurológicas importantes sem saber para onde encaminhar. Agora, eles estão estruturando dois hospitais e esses dois hospitais estão dando esse tipo de atendimento.

A gente vê, também, a importância de fortalecer as equipes de saúde da família para atender as pessoas com deficiência. Não é só o médico que tem uma especialização, mas também o ambulatório e o hospital têm que estar preparados. As demandas vêem de todas as ordens. Às vezes, a gente está pensando que é só uma questão da Síndrome de Down, mas agora Rosinha estava falando uma coisa muito grave que, às vezes, o lesado medular não tem uma assistência direta num hospital e a sua escara cresce tanto que não dá tempo para que ele possa ser atendido num hospital de referência e, muitas vezes, a pessoa chega a falecer porque não teve aquele atendimento adequado, aquele que necessita. Isso é para dizer para vocês que uma política de saúde requer um sistema hierarquizado e efetivo.

A importância de nós termos serviços estruturados por especificidade da deficiência e por equipe multiprofissional e multidisciplinar. O que é isso? Se por um lado a gente precisa que a pessoa com deficiência seja atendida em todos os hospitais de acordo com a sua necessidade, nós precisamos também de um centro de reabilitação especializado. Só isso.

Sobre a questão das órteses e próteses, eu vou falar já. Vou dar uns dados importantes para vocês e para a gente justamente discutir porque é que essas órteses e próteses não chegam e o que é que acontece, porque alguns estados fornecem e outros não. O problema é de financiamento, o problema é de capacidade técnica, o que há realmente nesse atendimento?

Essa atenção integral envolve também a família e a comunidade. Alguns municípios desenvolvem um trabalho de reabilitação baseada na comunidade, porque a pessoa com deficiência tem mais consciência dos seus direitos quando a comunidade e a família também participam. Eu não acredito que uma política de saúde possa ser efetiva e ser resolutiva se ela estiver só no nível da média e da alta complexidade. O que é que significa isso? Que a pessoa tenha um Sarah Kubitschek no seu estado. Não vai resolver, porque ele vai voltar para sua casa e não vai ter o tratamento adequado se a sua comunidade, a estrutura no seu município, não tiver estruturada para isso.

A importância, como eu falei, da atuação dos agentes comunitários de saúde e da equipe do PSF: muitas vezes, uma criança é atendida de uma forma precoce pela equipe de saúde da família ou um idoso com a seqüela de AVC e isso vai evitar que ele espere, tanto o idoso quanto a criança, eu estou dando dois exemplos bem distintos.

O Ministério começa a se organizar, alguns estados e alguns municípios, com centros de especialidades para atender as pessoas com deficiência. É o início de um trabalho, ainda. Integrar o dentista na equipe de saúde da família é novo, agora e o auxiliar de higiene bucal também é novo. Acontece que a gente já vê alguns trabalhos, algumas equipes atuando no domicílio e atendendo também pessoas com deficiência. Isso é uma divida muito grande e a gente sabe que assistência odontológica para pessoas com deficiência ainda deixa a desejar. O que se tem de fato, em alguns estados, são centros de reabilitação. Se você perguntar: Afinal de contas o que é que a gente tem mesmo? É mais isso, mas a assistência odontológica começou agora, nesse governo. Vamos ver se a gente consegue capacitar os odontólogos para que eles saibam atender uma pessoa com deficiência, principalmente com deficiência mental.

Outra diretriz dessa política é a ampliação dos mecanismos de informação. Hoje a gente teve um exemplo nos nossos grupos de trabalho: quanto mais informação as pessoas tinham mais compreensão elas tinham do que, de fato, solicitar enquanto direito. Quanto menos informação a gente tem, mais bobagem a gente diz, é óbvio. Quanto mais informações a gente tem sobre nossa deficiência,

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nossa incapacidade e sobre o que existe no SUS, na educação, no trabalho, mais a gente sabe como buscar essas soluções.

Existem alguns estudos da Organização Pan-Americana de Saúde que facilitam também a compreensão de quantas pessoas com deficiência tem nesse município, quais são os fatores que desencadeiam aquela deficiência e assim por diante. Por exemplo, eu acho que ela não está aqui presente, mas agora eu conversei com uma senhora que veio representar uma associação de uma síndrome, de que eu não estou lembrada o nome, mas é uma síndrome do envelhecimento em pessoas que, na adolescência, começam a perder todas as aquisições. A única pesquisa que se desenvolveu é na área da consangüinidade, mas, na verdade, é um município só desse país, Seridó, em que o número de pessoas com essa síndrome tem aumentado. Então, deve haver outro fator importante que causa a deficiência, por isso que são importantes esses estudos epidemiológicos, para saber por que se adoece mais, de que doença, o que leva àquela incapacidade naquele município, diferente daquele outro. Isso sem contar com o que nós temos conhecimento, que são os fatores que são os mais comuns.

E a capacitação de recursos humanos: se você quer implantar uma política de saúde sem capacitação de recursos humanos, você não consegue nada. A capacitação é fundamental, principalmente incorporando conteúdos de reabilitação nos currículos de graduação de saúde, educação permanente dos profissionais do SUS e dos agentes comunitários de saúde, do PSF e também a capacitação dos gestores. Quando eu digo gestores, são as pessoas responsáveis, no nosso município, pela saúde. Eu posso lhe garantir que a maioria dos secretários municipais de saúde do nosso país não sabem nem como lidar com a deficiência. Essa capacitação, essa compreensão é, de fato, muito nova. Nova para nós e nova para eles também.

Isso aí é só para a gente ter o entendimento de que há um gasto hoje no SUS significante e que nós temos consciência que nós temos uma dívida social importante. Não se gastava nada com deficiência mental e hoje nós estamos gastando quase 80 milhões por ano com deficiência mental, principalmente no estado de Minas e do Paraná. Porquê? Porque o estado de Minas e do Paraná têm mais conhecimento sobre a Legislação do SUS. É aquilo de que eu falei antes: quanto mais informação a gente tem, mais a gente busca o que é o nosso direito.

Com a deficiência física e visual e as órteses e próteses foram gastos 95 milhões. Nós vamos falar quem fez o que e como fez, por estado. Com os aparelhos auditivos, os aparelhos de amplificação sonora, que são para pessoas surdas, foram gastos 58 milhões 728 mil e tal. Esse valor é maior, porque esses aparelhos, além de serem mais caros, estão fora da tabela do SUS, estão fora do que o gestor tem como recurso para que ele possa gastar. Depois nós vamos entender isso mais ainda. Eu quero dar só um panorama geral. Com Implante Coclear, uma cirurgia para as pessoas voltarem a escutar, 12 milhões 397 mil e com Fisioterapia, 60 milhões. Isso aqui são alguns gastos que a gente utiliza que se repassa para os estados e municípios para poder atender pessoas com deficiência.

Aqui são alguns convênios. Há um valor aprovado para que a gente implante unidades de reabilitação em estados onde não se tem quase nada, principalmente nos estados da região norte e nordeste a que a gente está dando prioridade. E o que eu falei também, a capacitação de recursos humanos. As pessoas apresentam projetos e tal.

Temos uma meta, para o ano de 2006, para incluir o atendimento das pessoas com deficiência na equipe de saúde bucal e nos centros de especialidade odontológica, para esses centros de especialidades atenderem, também. pessoas com deficiência. A meta tem a ver com aquela diretriz que é capacitar profissionais de saúde da família para atender na atenção básica e nos domicílios. Inserir a reabilitação na comunidade em municípios com organização de serviços e reabilitação na retaguarda. O que é isso? É que essa reabilitação que ocorra na sua comunidade tenha garantido um centro de reabilitação que vai ajudar nessa reabilitação comunitária. Ampliar a rede estadual de saúde auditiva e uma grande dívida nossa é com a reabilitação visual. Muito, muito grande. Agora é que vai sair a Portaria de Saúde Ocular com a parte de reabilitação. A parte de reabilitação tem ações específicas que são voltadas para as pessoas com baixa visão e para as pessoas cegas.

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Essa parte de órtese e prótese é importante que vocês saibam. Eu já conversei até com o Deputado Leonardo Matos que a gente está arrumando umas estratégias de ver como a gente vai garantir esse pedaço.

Quais são os desafios nossos, enquanto gestores e delegados de uma Conferência nesse nível? A gente tem um desafio muito grande. O primeiro é dizer, no nosso município que, para qualquer secretário estadual, municipal fazer algum projeto, ele precisa saber da realidade: quantas pessoas com deficiência tem, o que é que elas fazem, de que elas adoecem. Não adianta estar inventando centros de reabilitação para reabilitar pessoas com deficiência mental quando, muitas vezes, ali precisa de uma reabilitação para pessoas com deficiência física e vice-versa. Esses planos e projetos são importantes para a gente estudar, naquela região, porque, de fato, aquelas pessoas adoecem. Hoje você vê que as pessoas põem grandes centros de reabilitação encostados um no outro. Tem vários municípios que têm isso enquanto um outro município, a 300 quilômetros, não tem nada.

Primeiro, existem recursos – é um dado que vocês podem me perguntar - para fazer esses estudos epidemiológicos ou censitários? Quantas pessoas existem naquele município e por que elas adoecem. É um desafio.

A pessoa com deficiência precisa ser tratada o mais próximo possível do seu município. Quanto mais perto do seu município, melhor para ela. Vocês não têm idéia do que existe de tratamento fora do domicilio de pessoas que vêm do norte do país para ir para o Sarah Kubitschek e voltam sem nenhum tratamento. Porquê? Porque nós precisamos de unidades de reabilitação em todo lugar e não desses grandes centros de reabilitação. Eles são importantíssimos, mas são importantes, também, os de média complexidade.

O desafio aí é maior cobertura assistencial no norte do país e nas áreas rurais.

Um desafio muito importante é a adoção de responsabilidades pactuadas. Não cabe só ao governo federal a responsabilidade de arcar com as despesas da saúde e reabilitação das pessoas com deficiência, cabe ao estado e ao município também. Hoje, eu posso lhe garantir que 90% ou até mais desses recursos são de aportes do governo federal.

Outro dado importante é que esse desafio significa trazer recursos dos estados e dos municípios também para atender as pessoas com deficiência, não só do governo federal.

Outro desafio é uma palavra difícil, mas que é importantíssima, que é a construção de parâmetros. O que é isso? A gente deve saber quais são os indicadores, quais são os parâmetros, qual o número que você pode estar vendendo a sua proposta de cobertura assistencial. Por exemplo, se eu estou em Maceió, eu tenho que saber qual é a cobertura dos centros de reabilitação existentes em Maceió. Eu posso saber a produção, que eles atendem 300 mil pessoas por ano ou por mês, mas isso não é suficiente. O que é que significa essa cobertura? Significa que vocês estão dando assistência a 10% da população, a 30%? E essas pessoas, uma vez reabilitadas, vão para onde? Elas estão sendo inseridas no mercado de trabalho? Elas estão indo para a escola? Esses parâmetros é que nos vão dar uma política adequada. Falar por falar, dizer por dizer: Meu centro de reabilitação é bom, atende a população. Atende como? Quantas altas vocês dão? Uma vez tendo alta, onde é que essas pessoas estão sendo incluídas? Quer dizer, a construção desses indicadores e desses números é fundamental para que, de fato, você mostre e venda a sua proposta de trabalho.

Isso aí é só para dizer o gasto com órtese e prótese. Foram 2 milhões em 2005. Um número bem arredondado.

Outros desafios têm a ver com cada vez mais as pessoas com deficiência terem conhecimento dos seus direitos no campo da saúde. Nós distribuímos um livrinho, lá no nosso stand, que vai falar exatamente isso. O que é direito no campo da saúde? A participação efetiva das pessoas com deficiência nos conselhos de saúde e de direitos. Em alguns estados e em alguns municípios as pessoas com deficiência fazem parte do Conselho Estadual de Saúde também, porque é lá que ele vai dizer da necessidade dele. Esse é um desafio. Por esses dias eu vou fazer um levantamento de quantas pessoas

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com deficiência participam dos conselhos estaduais, pelo menos nas capitais. Vamos ver se, de fato, as pessoas com deficiência estão buscando exercer o seu direito.

Outro desafio é que nós precisamos integrar a família à comunidade no processo e na construção da reabilitação, para que a família não fique alheia a todo esse processo.

Outro desafio é a capacitação de recursos humanos. Capacitar ortesistas e protesistas. Hoje tem um curso, na Pestalozzi de Niterói, que a Presidente disse para mim: Sheila, vê se divulga o nosso curso, porque nós estamos com poucos alunos. Para fazer órtese e prótese é preciso que a pessoa esteja capacitada, que saiba fazer. A gente precisa capacitar e ter mais gente sabendo fazer isso. E outra coisa é a capacitação do pessoal da atenção básica.

Articulação intersetorial é outro desafio. Nós ainda reconhecemos que nós trabalhamos isoladamente, a saúde, a educação e a assistência social. Esse é um outro desafio importante para que a gente possa estar construindo essa política. É a saúde garantir, para aquelas crianças que estão na escola, a sua retaguarda, porque muitas crianças estão num processo de inclusão, mas muitas não têm como garantir a sua permanência na sala, quer seja porque não tem uma cadeira de rodas, quer seja porque não tem um fisioterapeuta ou um terapeuta ocupacional que os coloque na posição adequada para que eles aprendam melhor, enfim. Assistência Social também: existem muitos serviços nossos que são executados pela Assistência Social. A gente tem que retomar. Notificação compulsória para todos os acidentes que geram deficiência, quer dizer, a gente tem um mundo todo a construir, também no campo da saúde.

Isso aí foi a Érica que fez essa apresentação para a gente. A gente agradece.

Quando eu falo que esse é um dos desafios, a participação do representante, de uma pessoa com deficiência no Conselho, é porque isso é um direito constitucional; a Lei Orgânica de Saúde, a Lei Nº. 8.142, fala sobre o controle social. O que ela diz? Ela diz que os conselhos têm que integrar representantes de pessoas com deficiência, usuários do sistema, profissionais, prestadores e pessoas que representem os estados, municípios e o governo federal. Eu creio que é muito importante passar para eles, no Conselho de Saúde, quem é que representa as pessoas com deficiência no Amazonas, no Pará. Eu acho que é um dado que a gente pode estar passando para vocês. É um dado importante. No Ministério da Saúde tem o assento da AMA na área dos autistas e tem da área de deficiências físicas, não tem? Tem. Então, vamos ver como é que estão os estados e os municípios porque é lá que você vai solicitar os seus direitos.

Porque o que é que acontece? Muitas vezes a composição do conselho não vai ter capacidade de inserir todo tipo de deficiência no segmento do usuário, no segmento da pessoa com deficiência. Se a senhora pegar, é publicada direitinho a eleição. Quando vai haver eleição há toda uma discussão, uma mobilização do Fórum, do segmento da pessoa com deficiência para escolher quem é que vai estar no dia lá. Há pactuação e articulação para conseguir nesse segmento.

Eu estava colocando anteriormente e você pediu para finalizar sua fala. Desafios, realmente, todos nós temos muitos a enfrentar. O apoio tem que ser tripartite (estado, município e governo federal). A questão dos estudos: na Região Nordeste, especialmente no Estado do Piauí que é o estado que eu estou aqui representando, já há muitas cobranças de estudos nessa área. Tem alguns delegados até aqui nesse evento, não estão aqui a sala no momento, que são portadores de distrofia muscular. No município de Paulistana, eles estão colocando e colocaram na Conferência Estadual do Piauí, que muitas pessoas lá estão sendo acometidos de distrofia muscular. Eles querem saber o que é que está causando. As crianças estão começando a ter esse problema. Ela está até muito ansiosa e me colocou chorando, na hora do almoço, que no grupo de trabalho de que ela participou ela pensou que iria estar discutindo isso e o grupo rechaçou, na verdade, isolou, excluiu, achou um absurdo ela estar levantando aquela questão e é por isso que ela está aqui hoje, a Juliana. Ela está em outro grupo, nesse momento. Distrofia muscular progressiva é um problema sério que está acontecendo lá em Paulistana, no Piauí. Tem São Gonçalo do Piauí que é outro município onde 33% da população, segundo o IBGE, é portadora de deficiência. Não se sabe que tipo de deficiência está acometendo a população. O que se sabe é que lá tem muitos

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casamentos consangüíneos e eles pediram um estudo genético dessa população. Eu queria saber, de forma mais objetiva, se o Ministério tem algum recurso que possa nos apoiar nesses estudos, agora.

O Ministério, agora, abriu uma linha de pesquisa na Secretaria de Ciência e Tecnologia. Não tem ainda as pesquisas específicas, mas essa pesquisa epidemiológica para saber, vamos supor, se em Teresina e em alguns municípios próximos de Teresina quais são os fatores que levam à deficiência, na nossa área você pode estar apresentando projetos. Essa é uma pesquisa epidemiológica.

Agora, tem pesquisas específicas que são pesquisas para descobrir o aparecimento de certas doenças, de certas síndromes. Isso, também, na área da ciência e tecnologia. Vocês podem estar encaminhando para gente e a gente buscando, na Secretaria de Ciência e Tecnologia, o apoio para esse tipo de trabalho. Como para essa síndrome dessa senhora que apareceu lá no nosso setor pedindo para fazer um trabalho; ela é da Associação, ela trouxe o filho aqui na Conferência e pediu que uma endocrinologista e um grupo da Universidade identificassem quais são os fatores que estão levando, num único município, um número tão grande de pessoas com essa doença que causa o envelhecimento precoce.

Essa parte aqui seria a palestra de ontem, mas eu vou falar rapidinho porque o interesse maior das pessoas está na área de órtese e prótese e um dos desafios também tem a ver com as órteses e próteses.

Quando eu coloquei essa parte do Sistema Único de Saúde, é justamente para nós entendermos que a responsabilidade não é só federal, estadual e municipal, mas é nossa, também. Nós temos, também, o compromisso de buscarmos os nossos direitos. Aquele quarto ali é o que a gente já falou, a participação da população no controle social do sistema. É por isso que nós estamos aqui. Essa Conferência é exatamente para se dizer o que se quer no âmbito da saúde, da educação, da assistência social e tudo mais. Quando eu coloquei o SUS é porque ele tem esses princípios básicos e a gente precisa ter conhecimento desses princípios para não achar que a responsabilidade não é compartilhada.

A responsabilidade do financiamento acontece nos três níveis, como eu falei, nível federal, estadual e municipal. Os repasses de recursos se dão através de convênios, na remuneração por prestação de serviços e na transferência direta Fundo a Fundo. O repasse financeiro, o governo federal passa para o secretário estadual de saúde, passa para o secretário municipal através de uma prestação de serviços que ele desenvolve ou que ele presta, que ele executa de acordo com a sua população, com a sua capacidade instalada e por convênios também, de acordo com a necessidade. Por exemplo, no Estado do Piauí, aproveitando o Piauí que está aqui, o governo federal repassou recursos para o Estado compre equipamentos para montar unidades de reabilitação. Por outro lado, a contrapartida do estado e dos municípios é contratar pessoal, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional. A gente trabalha sempre assim. E tem um tipo de transferência direta Fundo a Fundo, que é quando o governo federal transfere recursos direto para esse município para uma situação específica, também. São modalidades de transferência que a gente não vai discutir agora.

As redes de reabilitação são hierarquizadas. Nós hoje temos a rede de reabilitação física, auditiva, ostomia, de distrofia muscular progressiva, serviço de atendimento à osteogênese imperfecta, deficiência mental e autismo e à deficiência visual.

Eu quero falar um pouquinho da distrofia muscular: existem já vários serviços que recebem um recurso diferenciado para adquirir equipamentos respiratórios para essas pessoas com distrofia muscular progressiva. Há uma Portaria específica, é só vocês encaminharem para o Ministério para a gente publicar e habilitar um serviço que tenha condições de atender essas pessoas com distrofia. Geralmente são as universidades que fazem esse trabalho.

Vamos à situação atual de órtese e prótese no Brasil. Pela tabela do SUS, nós temos as próteses ortopédicas, mamárias, auditivas, oftalmológicas, as bolsas de colostomia e urostomia e outras ajudas técnicas que têm a ver com andador, muletas, enfim. Aí eu quero conversar um pouquinho a respeito dos estados de vocês aqui: nós identificamos três tipos de próteses que são as mais comuns que são distribuídas, as próteses ortopédicas, auditivas e os ostomizados. Aquele número dos ostomizados é sempre maior, é obvio, porque são bolsas de colostomia. As pessoas que têm colostomia recebem um

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numero bem mais alto de bolsas, porque a bolsa é um material de consumo, então o número é sempre mais alto. Então, o que é que vocês vão ver ali? Na Região Norte, vejam a incoerência, é isso que eu quero mostrar para vocês: o estado do Acre fornece mais próteses ortopédicas do que o Amazonas. A minha finalidade, hoje, é fazer com que vocês reflitam o porque disso. Nós vamos já chegar lá. Prestem atenção. Se chega um Acre deste tamanhinho, Rondônia deste tamanhinho, o Amazonas, 301, Roraima, nada, Amapá, nada, o Pará, com 1.055 e Tocantins com alguma coisa. Isso, só com recursos federais. Roraima, 22, Tocantins, 533, e, em Rondônia, 892 próteses auditivas foram distribuídas em 2005. É muito para o tamanho de um estado. Estão vendo a discrepância? Eu queria que vocês começassem a refletir sobre isso. Os ostomizados: o Pará distribui 43 mil, o Amazonas distribui 56 mil bolsas e não fazem nada na área auditiva e nada na área dos deficientes físicos. Depois a gente vai entrar num debate para falar porque ocorre isso. É o governo federal que não passa dinheiro? Não é verdade. O conselho é uma parte só. Não vamos jogar a responsabilidade no conselho. Vamos para frente. Já está acabando.

Nordeste. Ortopédicas: a Bahia, 24.108. Pode ter algum erro, porque foi o data SUS que levou, mas, se for, é coisa pouca. Alagoas, 3.000. O que eu quero que vocês avaliem é não só a distribuição em relação à população e a dimensão de cada estado. Ceará, 9.000. Rio Grande do Norte, nada até agora, mas o Rildo que é o coordenador acabou de me dizer que fizeram uma compra grande, porque o serviço agora está bem estruturado. Sergipe, nada. O que é que acontece? Eu vou dizer, porque eu sei a situação desses estados. O Rio Grande do Norte compra, pela secretaria, alguma coisa com dinheiro do orçamento do estado. Pouquinho, provavelmente para as pessoas a quem eles querem dar. Se vocês fizerem uma análise, olhem as Auditivas: o Rio Grande do Norte distribuiu 7.172 próteses auditivas. Olhe o tamanho do Rio Grande do Norte, o tamanho da Bahia que já distribui bem, eu conheço bem o serviço. As pessoas, às vezes, me encontram no corredor e dizem: É porque vocês não passam dinheiro para o SUS. Por que uns trabalham melhor e outros menos? Por que uns fazem e outros não fazem? É por isso que vale a pena a nossa conversa de hoje.

Com relação aos ostomizados é a mesma coisa. Olhem: a Bahia, onde houve um tempo em que quase não havia distribuição nenhuma, hoje, tem uma distribuição muito importante de bolsas de colostomia. Pernambuco, Bahia. Eu coloquei essas três áreas e você vê que Visual não tem quase nada porque, de fato, tem tão pouco que eu nem quis trazer para cá. Eu quis colocar o que, de fato, são os mais comuns. Prestem muita atenção nos ostomizados. Os ostomizados estão em quase todas e, de certa forma, até que muito bem servidos.

Participante não identificada

Por que será que tem tanta incidência de pessoas ostomizadas pela quantidade de bolsas que estão sendo concedidas? Eu acho que a gente tem que levar em consideração os fatores externos e também o uso delas na região. Numa região muito quente, então, a tendência é você conceder um número de bolsas maiores. São fatores que a gente tem que levar em consideração.

Palestrante

Justamente o nosso intuito nesse Painel é levar vocês a essa reflexão, quer dizer, desde um fator epidemiológico e um fator climático. Vamos passar para o outro.

Região Centro-Oeste: os maiores números são de Brasília e Goiás. De ortopédicas. Mato Grosso do Sul não tem serviço organizado, mas distribui. Você vê que é uma coisa assim meio maluca. Auditivo: Mato Grosso do Sul tem um número alto e Brasília não tem nada. E não tem nada mesmo. O que tinha era gasto com recursos do governo federal. Ontem eu conversei com o Ministro da Saúde, porque ele perguntou por Brasília justamente nessa parte de prótese auditiva, e conversei com uma moça que trabalha na Secretaria de Saúde. Eu disse que eu não entendo porque Brasília tem dois serviços excelentes de Audiologia e nunca apresentaram um projeto para poder ter a habilitação. É a mesma coisa

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dos ostomizados. Os ostomizados obedecem um trabalho. No Mato Grosso do Sul tem um trabalho muito bom na área dos ostomizados.

Vamos para a Região Sul: no Paraná, 9.000 ortopédicas. De fato, eles têm uma rede de reabilitação muito grande no estado do Paraná. O Rio Grande do Sul tem um número pequeno, mas o Rio Grande do Sul tem uma série histórica de séculos. Mas aí é um fator isolado que diz respeito a um governador anterior que começou a comprar as próteses pelo orçamento do estado e depois não criou uma série histórica e agora, nessa gestão, eles estão retomando. A Autidiva, no Paraná, são 16 mil, porque tem muitos serviços de reabilitação auditiva e os ostomizados também. O Rio Grande do Sul, bem pouquinho.

Em São Paulo, 14.831 próteses ortopédicas foram distribuídas. Rio de Janeiro, 11 mil. Minas Gerais, 18 mil. Minas Gerais ganhou aí, apesar do número de habitantes ser bem inferior ao número de São Paulo. O Espírito Santo, bem pouco.

Na distrofia muscular progressiva os aparelhos respiratórios que utilizam recursos do SUS, do governo federal são esses três - Minas Gerais, Maranhão e São Paulo. Em São Paulo o número é maior, mas também tem mais serviços que distribuem o equipamento respiratório para que as pessoas aumentem a sua expectativa de vida.

LucianaAlagoas

Eu sou Luciana, de Alagoas. Sobre a Portaria da Distrofia. Porque lá estava se questionando porque na Portaria tem que é competência dos estados e municípios cadastrar as pessoas com distrofia muscular, mas não está claro a quem cabe a competência de dar o aparelho, quando necessário. É essa a dúvida, se é estado ou município.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Eu acho que é uma questão de compreensão. As associações trabalham muito junto às secretarias. Quando as associações têm o numero exato de pessoas com distrofia muscular progressiva, eles podem chegar junto. A Bahia teve agora o encaminhamento da Distrofia, vai ser a Universidade federal que vai prestar esse tipo de atendimento. Uma vez identificada a instituição que vai fazer esse trabalho, que vai prestar esse serviço de avaliação, de acompanhamento e também de compra do equipamento que, muitas vezes, é alugado, não tem nada que diga que não possa. O que você tem é identificar, de preferência, uma associação onde você tenha, pelo menos, a idéia de para quantas pessoas você vai dar atendimento.

Participante não identificada

A instituição que vai prestar reabilitação e o acompanhamento dos casos e quem vai comprar o aparelho ou é o estado ou o município? É essa a dúvida. E a equipe, vamos dizer, o serviço de reabilitação vai só fazer o atendimento? Nós temos essas dúvidas.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Minas Gerais faz isso bem, então, vai orientar os outros estados como fazer.

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Participante não identificado/MG

A gente lá credenciou um centro que atende adultos e outro que atende crianças de até 13 anos. Temos equipe formada. Uma fica no Júlia Kubitschek que é um hospital que tem lá e outra no CGP, que é o de criança. Esse aparelho, a FEMIG, Fundação Estadual Hospitalar, de Minas, alocou, porque é extra teto, ela aloca os aparelhos e, se a equipe avaliar que a pessoa precisa do aparelho, ele é disponibilizado e ele usa até o dia que ele precisar. A gente usa muito para desospitalizar os pacientes.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Pronto. É da própria instituição.

Vamos finalizar fazendo o que a gente propôs no início. Em relação às órteses e próteses, o primeiro fator a identificar é a questão do financiamento. Vocês viram que há uma discrepância de estado para estado, de equipamentos para equipamentos em relação ao financiamento. Por que será que alguns gestores disponibilizam mais recursos para uma área do que para outra, um percentual maior ou menor? Isso é verdade, tanto que nós vimos aí. Por que um estado como o Rio Grande do Norte tem tanto serviço de saúde auditiva? Porque um outro estado, como o Amazonas, não tem ainda? Houve um tempo em que havia uma dispensação bem alta, no tempo da Roseli, que era uma assistente social bem atuante, em que o Amazonas era um líder na Região Norte na dispensação de órtese e prótese.

A questão do financiamento e da escolha do que tem a gastar tem a ver com vários fatores:

• Porque o financiamento também não é um pouco do estado e do município?

É outro dado para a gente refletir.

• Existe algum dado importante onde o controle e a participação social é efetiva? Será que nesses lugares onde o controle social, onde as pessoas com deficiência brigam mais, acontece mais?

É uma outra interrogação. Será que é isso? É um pouco, mas não é tudo.

• Será que tem a ver com a competência do coordenador local ou gerencial?

É um outro fator importante. Muitas vezes, pode parecer tolice, seja o que for, mas um coordenador vinculado, compromissado, vestindo a camisa daquele trabalho, funciona muito bem. Faz 13 anos que eu estou nesse cargo e eu vejo que isso, de fato, é um fator importante. Ter dinheiro é bom, ter pessoas com deficiência participando e tendo consciência dos seus direitos é importante, é importante a competência do gerente. Às vezes você dá o dinheiro e a gente tem a experiência de passar um recurso importante para uma coordenação do estado e o estado passar quase três anos para executar, por não ter competência. Não é o secretário de saúde não, mas acontece.

• A questão que as pessoas falam como chavão, a decisão política: Será que a decisão política também não tem a ver com todos esses fatores que a gente está tentando identificar?

• A estruturação das redes.

Por que tem que se construir outro hospital como foi agora em Goiânia, um hospital imenso, com outro bem grandão a 30 quilômetros de Goiás e o Sarah Kubitschek aqui. E a gente sabendo que tem outros locais que precisam tanto. A estruturação dessa rede é fundamental.

• Essa política de órtese e prótese não é só dispensar uma cadeira.

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É importante que você saiba se existe uma tecnologia adequada, se essa cadeira vai andar bem numa estrutura que não seja asfalto, se essa cadeira lhe machuca, se uma prótese está bem adequada, que material em vez de lhe ajudar vai prejudicar na sua deambulação, enfim.

• Uma política nacional também que a gente pode estar implementando na área das próteses auditivas e das próteses físicas, enfim, um mundo.

• A questão também de recursos humanos capacitados para poder estar oferecendo essas órteses e próteses.

Quantas vezes você tem um estado com recursos para comprar próteses de membro inferior, que é o mais difícil, e não tem um técnico para juntar um componente com o outro? Há falta de capacitação.

Eu gostaria muito de deixar um recado para vocês em relação a esses três primeiros itens: Financiamento, Participação e Controle Social e Competência do Gerente. Eu acho que se você juntar esses três itens você consegue, muitas vezes, uma decisão política ,a não ser que seja uma coisa eventual de o político ou a pessoa, ter na sua família, uma pessoa com deficiência e ele ou ela tem um cargo importante e aí a política muda em função de um sentimento, de uma necessidade. Isso acontece também, mas não é o que acontece com freqüência. Eu posso lhe garantir que acontece com freqüência quando tem dinheiro, quando tem a participação social e quando tem a competência gerencial. Isso é que faz com que aqueles itens sejam mudados. Alguma pergunta para a gente encerrar? Eu vou passar isso para vocês depois.

Geny Catarine F. LopesFórum Permanente de Direito da Pessoa com Deficiência/MT

Em relação àquela fala anterior que é sobre um dos desafios que seria a questão da ampliação da cobertura que se colocou no norte do país e também na zona rural. Eu queria que a gente começasse a estar fomentando também a questão da cobertura do serviço de reabilitação para a população indígena. Por quê? No Mato Grosso a gente implantou umas unidades em reserva indígena e em municípios que são quase que 80% reserva indígena. Embora, a gente tenha feito uma discussão com o perfil dessa população, a gente não tinha percebido a dimensão que seria a estruturação desse serviço. Por exemplo, hoje a gente está vendo os Distritos Sanitários Indígenas, vindo chamar a gente da reabilitação para conversar, porque tem profissional mandando o índio sair de rede por conta de um distúrbio de coluna, mandando deixar de andar de canoa, mandando um monte de coisas. A gente tem uma outra demanda que nem deu conta dessa outra e a gente precisava, em algum momento, sentar junto com a Atenção de Saúde Indígena e estar conversando agora, porque vai ter também o olhar da reabilitação para essa população que, querendo ou não, tem toda uma lógica diferenciada da produção do cuidado na reabilitação. Eu queria só dar um alerta, porque tem outros estados também que têm.

Outra situação é a questão do pacto da saúde, pacto pela vida, que a gente sabe que vai reformular todo sistema de gestão do SUS. O que é que acontece? Em Mato Grosso eles têm esquecido, na discussão, da reabilitação e aí, quando nós fomos fazer a discussão, eles perceberam que a reabilitação tem um papel fundamental na questão do pacto pela vida, principalmente em relação à questão dos ambientes favoráveis, na prevenção de deficiência. E aí foi discutido num seminário junto com o Ministério.

Eu acho que é uma coisa tão importante porque está mostrando a importância de termos esse olhar agora, a gente que está, enquanto ator, nesse processo. Aí a gente mostrou a importância da reabilitação, está participando desses grupos que já estão discutindo como vai ser executado esse pacto da gestão na prática. Eu acho que a gente poderia também estar puxando essa discussão com o setor da reabilitação, para estar vendo como pode estar inserindo.

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Outra questão que também está se debatendo, é como a gente vai estar discutindo junto, que é uma coisa boa, da criação dos conselhos gestores e também da educação permanente para o controle social. Então, como é que nós vamos inserir também essas discussões em relação à questão da pessoa com deficiência com essa lógica da reabilitação.

São três aspectos que eu acho que estão acontecendo e por exemplo, a educação permanente é demanda do Ministério da Saúde, dos estados e dos municípios e que a gente poderia estar, de alguma forma, se mobilizando para ver.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Nós vamos ter agora em maio, junho e julho encontros de técnicos, encontros macro-regionais. A gente poderia estar amadurecendo essas propostas nesses encontros. A Cristina, que é a responsável pelo nosso departamento, já sinalizou da importância de nós nos situarmos no pacto. Eu vejo que você já poderia até trazer uma proposta, nos ajudar a orientar outros coordenadores de outros estados em como fazer, em como inserir.

Participante não identificada

Eu não sei o que aconteceu com a Portaria. Ela foi publicada e aí nós levantamos uma expectativa enorme e a gente está aguardando a Portaria ser regulamentada.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

É, mas não aguarde mais não. É horrível dizer isso. O que aconteceu foi que tinha uma proposta da outra gestão, dos coordenadores da Atenção Básica, de criar o Núcleo de Atenção Integral. O que significa isso? Significava criar equipes matriciais que podiam dar suporte à questão da deficiência mental, da saúde mental, da reabilitação, do esporte e da nutrição. Esses profissionais seriam contratados e a Atenção Básica passaria o recurso para os municípios que, por adesão, quisessem implantar esses núcleos. O que é que aconteceu? Aconteceu que houve uma mudança de gestão e também uma ausência de recursos para a implantação desses núcleos. Por outro lado, desencadeou-se, não de uma forma grande, a capacitação, o treinamento em alguns municípios para que o Programa de Saúde da Família começasse a atender as pessoas com deficiência. Uma experiência aqui, outra ali, mas cada vez aumentando mais; quer dizer, independente de recursos do governo federal, alguns municípios estão fazendo esse trabalho. Não tem nada a ver com nossa área. Foi a própria Atenção Básica que publicou uma Portaria dizendo que ia regulamentar e até hoje não houve essa regulamentação. Nós temos batalhado para retomar essa situação e eu, honestamente, não acredito que isso seja feito ainda nesse governo. Pode ser que eu esteja falando errado.

A nossa coordenação, tem interesse que as equipes de saúde da família também atendam as pessoas com deficiência. A gente está financiando a capacitação. A capacitação de como e de quem? A capacitação conjunta da equipe de reabilitação onde tem retaguarda de reabilitação e a equipe da saúde da família, para dizer como tratar, como encaminhar ou como identificar a pessoa com deficiência daquele município ou daquele bairro. Eu tomei uma parte disso para a nossa Coordenação porque, para nós, atendimento integral pressupõe também um atendimento desde a Atenção Básica. Eu estive no Ceará e alguns municípios fizeram a sua apresentação. Cada um faz de um jeito, mas que está acontecendo, está. Aos poucos, mas está. Às vezes, é só num bairro, uma equipe de Saúde da Família pega um bairro grande e já começa a fazer o treinamento, já vai com o profissional da reabilitação, mas

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sempre tendo como suporte um centro de reabilitação. Agora, o modelo mais comum, que não era o que eu queria, é o fisioterapeuta se incorporar à equipe da Saúde da Família e prestar o seu atendimento. Não era isso, mas é o mais fácil.

É um estudo da Prefeitura Municipal de Palmeirais. É um levantamento das pessoas com deficiência feito pelos agentes de saúde. Esse agente é Agente de Saúde da Família, não?

É o que eu acabei de falar: independente de haver ou não uma Portaria, algumas pessoas já começaram a se movimentar. Aqui é uma identificação. Deixa eu ver o resto. Qual é o objetivo dessa identificação?

Luis VelosoPiauí

É procurar não só reabilitar, mas saber as causas, para investigar.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Eu posso pedir a elas que me digam, de fato, qual é o objetivo do levantamento?

Participante não identificada

É em relação à deficiência mental, porque tem um número bastante grande, alto, de deficientes. São 57. Então, ele gostaria que fizessem um estudo, um levantamento para saber a causa.

Participante não identificada

A preocupação dele é com a toxoplasmose. Ele colocou a situação antes de vir para a Conferência. Ele não entrou em detalhes, porque ele já me falou na véspera da viajem para cá. Ele me colocou essa preocupação dele lá em Palmeirais e ele pensa que tem alguma relação com a toxoplasmose. Ele colocou isso para mim, eu também não sei. Como eu já estava vindo para cá no avião, eu falei que quando a gente voltar a gente vai sentar realmente para ver com mais calma, porque ele acha que tem caso de deficiência metal, visual, cegueira. Ele acha que tem alguma relação.

Sheila Miranda da SilvaPalestrante

Eu já entendi. Como está dentro do estado do Piauí, vejam como a Gardênia pode ajudar. Se for igual ao outro estudo de identificar as causas numa população da incidência de pessoas com deficiência mental ou auditiva, não importa, via secretaria estadual ou municipal, vocês podem estar pedindo ajuda ao Ministério para fazer essa pesquisa.

4.8 Tema: Trabalhando com as competências. Uma experiência de inclusão escolar no ensino médio

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Nancy Costa PagnanelliPsicóloga, co-autora do projeto desenvolvido pela Associação Carpe Diem. Coordenadora do

setor de Psicologia, e co-autora do livro “Somos Todos Iguais”.

A idéia foi trazer para vocês um trabalho que está sendo desenvolvido por algumas escolas de São Paulo e uma de Santos.

Eu vou fazer uma brincadeira junto com vocês porque, ao mesmo tempo em que a gente vai passar experiência, vamos mostrar como a gente trabalha quando está com os professores, quando está com a escola. Então, nós vamos trabalhar com a percepção e o modelo mental que a gente tem do conceito.

A minha idéia não é trazer nada novo porque a verdadeira viagem de descobrimento consiste não em procurar novas, mas olhar com novos olhos. Então, a idéia seria trabalhar a forma de olhar o conceito já existente.

O que vocês estão vendo aí? Preciso de vocês. Crianças brincando. O que mais? Uma criança ajudando a outra. O que mais? Uma pobreza.

Vamos fazer isso daqui, um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez. Dez crianças morreram enquanto a gente fez isso, no mundo, e a cada dois minutos uma criança morre de fome. Essa informação é uma informação importante, o que nós temos aí agora? Criança trabalhando, catando lixo. Isso acontece porque o nosso mundo, a nossa sociedade é uma sociedade de imundos, e cabe a nós, no papel de cidadãos fazer essa mudança.

Precisamos desconstruir esse conceito que hoje na nossa escola acontece, que foi construído ao longo da nossa história. O preconceito não vem da falta de informação e sim da falta de formação, nós precisamos modificar a nossa escola desde o começo, desde nossa infância, desde a pré-escola.

Quem é? Einstein. Einstein só começou a falar depois dos quatro anos de idade, vocês sabiam?

Newton era tão mau aluno na escola primária que ele foi considerado pouco promissor, pensou? Quem seria promissor, não é?

Quando Thomas Edson era menino a professora lhe disse que ele era burro demais para aprender qualquer coisa e hoje ele é um dos maiores inventores da humanidade. E disseram para ele que para ele ser bem sucedido, ele tinha que procurar um campo de interesse que fosse de personalidade agradável. A gente escuta isso também da pessoa com Síndrome de Dawn, não é?

Disney foi demitido de um jornal porque ele carecia de informação e não tinha boas idéias. Michael Jordan ficou fora do time de basquete do ginásio. John Lennon, quando a tia dele deu uma guitarra para ele, disse: “Fique sabendo que você não vai ganhar dinheiro com isso”.

O que nós estamos vendo aí? Um pato, pelo que eu vejo é um pato, todo mundo concorda? Um pássaro, uma cabeça.

Se eu disser para vocês que isso daqui é uma orelha vocês estão vendo o quê? Um coelho. Agora eu vou falar, não é orelha não, é bico. O que vocês estão vendo? O pato, porque depende de um referencial, a gente pode dizer um coelho ou um pato, dependendo de como é a leitura que nós vamos fazer desse ângulo, parte dessas fotográficas. A parte muda o todo, olha o modelo mental.

E agora o que vocês estão vendo? Uma mulher e um homem. Se eu falar que isso daqui é uma parte do braço, aqui é uma continuidade do braço, ou seja, a mulher, se eu falar que isso daqui é o nariz, e isso daqui é o bigode você vê um homem. Novamente, uma parte muda a visão do todo.

E aí o que nós vemos? Um país, o que mais? O rosto, um rabisco, uma nuvem, uma célula, um fantasma. Agora aquilo tudo se transformou numa bailarina.

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Agora o que vocês vêem? Uma cabeça. Tem mais alguma coisa? Deixou de ser todas as outras coisas para virar só cabeça. Isso significa que eu mexi com todo para seu modelo mental, o modelo mental está focado e a gente não consegue esquecer aquela mensagem.

Esse é o poder de foco da criatividade. Até então, a gente via até fantasma, não é? E agora a gente só vê uma cabeça. E agora? Uma fita. E agora? Duas fitas, um rabo.

Você vê, a gente vai fechando, não é? Vai fechando um modelo, e agora? Uma pomba, mas lá não está desenhando uma pomba, é que você se reporta ao seu passado, o que você está impregnada de informação, por isso que os movimentos hoje acontecendo são importantes por que nós temos que quebrar este conceito.

E agora o que vocês estão vendo? Estrela, o que mais? Triângulos, mas não tem desenho aí não. De novo o modelo mental, porque até a gente brinca com os professores, triângulo são três retos, aí não isso, mas a gente fecha isso.

E agora? Sapo. E agora? Cavalo. É a mesma figura, só que, olha como a gente vai fechando o modelo mental, porque que nós temos que desconstruir.

Nós temos duas formas de olhar a deficiência: uma como um grande problema, que nos mobiliza, e o outro como uma possibilidade, como uma grande idéia.

O caminhar que se refere às pessoas com deficiência eu nem ouviu falar, porque todo mundo sabe, não é?

A fase da exclusão, as pessoas indignas de educação escolar, a de segregação, escolas especiais, classes especiais, a da integração, que é da década de 1970, que aceitava os estudantes com deficiência que conseguisse se adaptar à classe comum, e a classe da inclusão que é da segunda metade da década de 1980, onde a gente adapta o sistema escolar às necessidades do aluno. E o sistema de qualidade para todos.

E eu quero mudar ainda mais, nós temos que adequar, ao adaptar. Adaptação a gente parte do modelo mental de que a diversidade faz parte do déficit e não das competências. A gente venha olhar como competência, nós vamos querer adequar o sistema às necessidades daquele aluno.

Qual é o nosso papel? Educar para a diversidade. Então, a gente tem que educar e equipar os valores, empatia, equidade, tolerância, compaixão, responsabilidade, respeito mútuo e honestidade. São os valores da educação.

Os alunos da escola, o que eles fazem? Aprendem juntos, jogam, compartilham, trabalham em equipe, resolvem problemas e solucionam conflitos, além de adquirir conceitos pré-estabelecidos.

Esse carinha está na quinta série e conta para gente como é a aula dele, o dia a dia dele na escola. Isso é muito interessante por quê? Ele recebe alimentação, fica o período integral, mas ele não tem amigos dentro na escola. Os amigos ficam fora da escola, que é onde a gente procura trabalhar.

Por quê? Porque trabalhando um, ele vai ser o multiplicador da nossa idéia. Então, a gente tinha um, e hoje, daquele único um, nós temos vários multiplicadores trabalhando os valores virtuosos. Na nossa escola, a intenção do currículo e da formação dos professores seria trabalhar essas virtudes: tolerância, solidariedade, direitos, deveres, diversidade, diferença, empatia, compaixão, e tudo o mais que se pode vir a trabalhar nas virtudes.

Olhamos o modelo educativo através da competência que se preocupa com: conhecimento do aluno, respeito às diferenças, olhar o contexto como um sistema complexo e holístico, estabelecer pontos cognitivos entre os alunos no currículo, e olhar a diversidade como um atributo.

Olhamos a inteligências de várias formas, ou melhor, vários tipos de inteligência. Eram estudadas sete inteligências, e temos mais duas hoje. Hoje, olhamos a inteligência como capacidade de resolver problemas e elaborar produtos que sejam valorizados pela comunidade. Quais são? Música, matemática, lingüística, etc.

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Como é que nós aprendemos? Algumas pessoas aprendem através de processo auditivo. O que a gente sugere para o professor? Explicações orais, vozes agradáveis, deixar falar, deixar trocar idéias. Temos que ouvir para entender esse aluno, propomos trabalho de grupo, questões para aprender, músicas, vídeos etc.

No ramo visual, ele precisa ver para aprender, precisamos mostrar muito mais demonstrações do que palavras. Quais são os recursos? Vídeos, transparências, caricaturas, murais, PowerPoint etc. Eles precisam do toque, da bolsa, do movimento, dos esportes, das avaliações pessoais. Para aprender, precisamos de jogos, dramatizações, construir, manipular objetos, experiências de laboratório.

Quando a gente está estudando o tipo de aprendizagem da criança, nós temos que estar olhando esses três campos. E a idéia é a gente conhecer qual é a ponte cognitiva daquela criança. Ela aprende como? Não são todos que aprendem visualmente, não são todos que aprendem sinestésicamente.

O objetivo do currículo, qual é? É ajudar os alunos a serem competentes para criar seus próprios processos e estratégias de raciocínio. O currículo deveria fazer esse caminho de ensinar a criança qual é a forma de aprendizagem dela. É por isso que temos que criar várias estratégias porque nós queremos trabalhar autonomia em todas as suas facetas “ pessoal, familiar, escolar e social.

Nós vamos começar a estudar o modelo do potencial e o modelo do déficit. Vamos olhar a competência e a inteligência como um processo lógico. Aprendizagem significativa e não mecânica, aprender a aprender e não a quantidade do aprender. Aprendizagem provocada e não só aprendizagem dada. Podemos olhar a diversidade como um valor e não como um defeito. Viva a autonomia e não a dependência.

Hoje nós temos essas escolas que estão mais preocupadas em olhar o déficit do aluno. Então, ele é castigado se não aprender. Por quê? Ele vai ter que fazer recuperação, vai ter que refazer aquela matéria, vai ter que re-olhar aquele processo. E não é uma autonomia onde ele vai procurar o que ele quer aprender, como ele quer aprender e descobrir a forma de aprender.

Essa mocinha está no segundo ano colegial de uma escola inclusiva, em São Paulo. Ela relata a importância de trabalhar em grupo, porque para ela é muito mais fácil o trabalho em grupo do que o trabalho individual. Por quê? Porque ela vai se relacionar com as pessoas. Ela dá um depoimento bastante interessante. A escola tem que ser inclusiva, mas o que temos que fazer dentro daquela escola? A gente quer uma escola inclusiva e, para isso, a gente precisa construir uma escola de qualidade para todos.

Começamos o projeto com o Colégio Stella Maris e começamos a trabalhar em cima de partes de uma construção. Começamos o trabalho com o projeto confiança. Quem são os grandes mediadores do projeto? A escola e a Associação dos Pais. Eles que escolhem a escola, eles levam alguma idéia para escola de como trabalhar depois nos convidam. A proposta do Projeto Confiança é ouvir a escola, ouvir qual é a demanda dos educadores, com muita humildade e reflexão conjunta, para trabalhar exatamente os valores de uma escola de qualidade.

Após o projeto Confiança nós fizemos o Projeto Arquiteto. Nós desenhamos o projeto com os professores e com os alunos, trabalhamos todas as questões de modelo mental e as diversas ações e introduzimos o papel do mediador.

O Projeto Ação, está sendo executado agora. Fizemos um contrato entre os participantes sobre a continuidade dos encontros periódicos, comprometimento e o viver no dia a dia dele na escola.

Nós tivemos muita discussão sobre qual é a função desse mediador e qual é o seu papel. O mediador é exatamente aquele que favorece a aprendizagem do outro. Ele pode ser amigo e professor, ele pode ser uma pessoa externa do colégio ou ele pode ser uma outra pessoa dentro do próprio colégio, não necessariamente um professor direto dele. Ele facilita a aprendizagem nos três contextos “ familiar, escolar e social “ orienta e acompanha automatizas de trabalho em cima de projetos específicos, ele ensina estratégias cognitivas tanto para o professor como para as pessoas que estão ao redor desse aluno. O trabalho do mediador não é direto com o aluno, ele é indireto.

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O foco do estudo é o conhecimento que o aluno adquiriu. Como ele adquiri? Então, por exemplo, como ele recebe a informação; como ele processa essa informação, como ele capta essa informação; e como ele coloca em uso, como ele planeja essa informação. Procuramos descobrir a forma de intervir nesse cognitivo, partindo da forma de como ele tem essa aprendizagem. Ninguém aprende igual a ninguém. São formas diversas de aprendizagem.

Para isso, nós fizemos algumas adequações. A inclusão tem que ser uma inclusão total. Ela parte da inclusão física, da inclusão pedagógica e da inclusão psico-social. Na inclusão física, o aluno vai entrar na escola no horário em que todos entram e vai sair da escola no horário em que todos saem. Ele participa de todas as atividades daquela escola. Ele vai fazer prova de química; vai fazer prova de geografia; vai participar do aniversário da escola; vai participar da festa junina; vai fazer simulado etc. E ele vai ter que respeitar todas as regras da escola, como os demais alunos. Se existe uma regra de segurança para entrar no laboratório, ele vai ter que respeitar essas regras, entendê-las e respeitá-las.

A outra questão da inclusão é a inclusão pedagógica. Aqui nós temos um exemplo bastante interessante. A professora de português dava determinada matéria para os alunos e esse aluno ficava sem entender. Nós começamos a fazer a adequações para esse aluno, aumentando a letra, dissecando o conteúdo, participar desse conteúdo com ele ativamente etc. Então, por exemplo, o aluno tinha que estudar figuras de linguagem. Nós dividimos as figuras de linguagem em três e ele aprendeu. Por exemplo, se nós dizemos “ “É suave como pelúcia” “ qual é a figura de linguagem? É uma comparação entre duas coisas. E assim fizemos vários exercícios sempre relacionados ao mesmo tema.

Nas atividades de português, a professora estava trabalhando ditados populares. Ele tinha que escolher um ditado popular e explicar o que ele tinha visto. Ele escolheu um ditado bastante interessante, que prevê justamente os valores com que nós queremos trabalhar: “Quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Ele disse que essa frase é uma frase bem normal.

Em português, eles estavam aprendendo formas de redação. Ele não queria aprender e a professora estava muito preocupada como é que ele ia aprender essa redação. Começamos por uma coisa que ele gosta muito, que é escrever bilhetinhos. O interessante é que essas adequações, de química, por exemplo, não é uma coisa difícil, porque na verdade a gente não quer trabalhar isso com todo mundo. O que a gente quer trabalhar? As relações estabelecidas entre essa aprendizagem e o aluno. Então, por exemplo, seguir regras, entender a regra, participar desta regra. Apesar de toda adequação, há muitos matérias que ele ainda não faz, por uma questão de motivação também.

Por exemplo, estudo das células. A sala desenhava a célula? Não, a sala não desenhava. A sala estudava cada parte da célula, mas uma das atividades dele era desenhar essas células. Essa é a diversificação do currículo.

A professora de física estava trabalhando movimento retilíneo uniforme e ele aprendeu. Só que, na hora em que ela foi fazer a prova, ela não soube usar a linguagem adequada, ela fez adequações adequadas na apresentação da matéria, mas na hora de executar a prova não. O que eu achei bacana foi que ela corrigiu porque a maioria dos professores não corrige, eles dão só um vistinho e a idéia é corrigir. Ele corrigiu, ele tirou nota 4,0 e viu que tinha que estudar mais.

No primeiro do colegial foi proposto um questionário da escola para o aluno responder. Foi bastante interessante porque todos os alunos responderam a esse questionário, mas esse aluno não queria responder. Quando ele entendeu onde a gente queria chegar com essas questões, ele ficou bastante motivado. Por quê? Porque a gente estava querendo trabalhar com eles exatamente o auto-conhecimento.

A gente dá adequação, diminui um pouco o material e ele vai respondendo aquilo que foi pedido. Interessante é que a gente diz que ele está só copiando, mas na verdade, ele começou a entender quais eram os processos, quais eram as perguntas e acabou sabendo a matéria. Ele precisa saber de mecanismos para chegar a isso.

No começo, os professores tinham muita resistência em trabalhar com os alunos. Eles não sabiam bem como ensinar a matéria que eles estavam dando, como escolher o material, adequar o conteúdo etc. Então, eles acabavam não exigindo que esse aluno fizesse a prova, não exigiam nota, não

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era exigido que ele ficasse o tempo integral dentro da sala de aula. Ao trabalhar conjuntos, ele tem que aprender como fazer a leitura do conjunto, qual o recurso que ele utiliza para fazer isso e, especialmente, como ele colocaria o conjunto. Esse é um exercício que ele gosta bastante.

Por fim, a inclusão psico-social. Isso é legal porque ele começa a colocar as coisas que ele gosta de fazer dentro do colégio e fora do colégio; a importância que o colégio tem para ele; as matérias que ele mais gosta, que são física e matemática. Antes, ele não queria nem saber dessas matérias e agora ele tem uma relação super saudável e no final ele coloca uma frase que expressa bem seus sentimentos: “Hoje é o momento mais feliz da minha vida”. Isso é muito legal porque significa que ele já consegue fazer algumas coisas dentro da escola. Antes, ele dormia muito dentro da escola e agora já está dormindo menos e vai precisar faltar menos também.

Como tudo isso aconteceu? Do começo do ano até hoje, nós fizemos três reuniões fora do Projeto Piloto. Nós tivemos três reuniões do Projeto Ação e esta é a avaliação. Aqui em verde, nós temos a avaliação dos professores quanto ao conteúdo das reuniões. Entre zero e 02, a avaliação seria razoável. Um professor avaliou dessa forma. Entre 02 e 03, seria uma avaliação boa. Dois professores deram essa nota de avaliação; em relação aos professores que avaliaram a reunião como boa, tivemos três professores; e com a avaliação de que a reunião foi de boa para ótima, nós tivemos sete professores.

O que aconteceu? Depois da segunda reunião, na terceira, eles foram começando a entender mais o processo da avaliação quanto ao conteúdo e foi ficando cada vez mais positiva. Por que é que eu trouxe o gráfico? Porque o gráfico demonstra uma avaliação para nós sabermos se nós devemos continuar ou não com esse processo. A cada reunião a gente pede informação para eles do que eles gostariam de trabalhar. Por quê? O que a gente está querendo que os professores façam? A mesma coisa que seus alunos. Trazer para os alunos uma avaliação, que o aluno tenha competência, porque ele tem, de avaliar a aula do professor, e o professor fazer a mudança dele.

Quanto às estratégias também, o que acontecia? Era uma avaliação, vamos dizer assim, mediana, e começou a ficar uma avaliação mais positiva. E quanto ao tempo o que a gente começou a perceber? Que o tempo está curto, nós ganhávamos uma hora a cada mês e meio e, agora nós estamos com uma hora e meia e os professores estão achando que o tempo ainda não está adequado. E isto significa que existe motivação do trabalho no projeto.

O que nós queremos é passar da certeza para curiosidade; é passar do gostar para o amar; do contra para a aceitação; da suspeita para a confiança; da competição para a compreensão; da debilitação para os potenciais; da simpatia para a empatia; da repetição de várias propostas, para novas idéias; da proteção do passado para criação do futuro; da separatividade para a união. A idéia é trabalhar exatamente essas mudanças de todo esse processo. A criança precisa ter simpatia do professor. Nós temos que sair daquele processo em que o professor não acredita na autonomia da criança, ou do seu aluno, do seu adolescente para passar exatamente em um processo onde nós temos as virtudes que nós colocamos no começo.

Eu queria colocar a idéia do Thomas Edson. Por quê? Ele coloca que muitos fracassos da vida ocorreram com pessoas que não perceberam o quanto próximo estavam do sucesso quando desistiram. A idéia é: não vamos desistir; vamos continuar porque uma hora a gente tem resultado.

Paulo Freire disse: Foi aprendendo que foi possível ensinar. Eu quis trazer esse texto “ “A beleza das virtudes para as crianças” “ em que ele fala em uma virtude muito interessante, que é a perseverança. Tente mais uma vez! Eis aqui um bom conselho a seguir. Tente mais uma vez! Se no início algo é difícil conseguir, tente mais uma vez e você verá a sua coragem aparecer. Nunca tema. Não há nada a temer. Persevere e verá que vai vencer. Tente mais uma vez!

Uma coisa que a gente sempre escuta é: “Ah! Eu estou tão cansado! Não sei se vou conseguir!”. Persevere porque uma hora você vai conseguir!

Eu quis fechar este encontro com esse slide desta mocinha. Na verdade a gente precisa estar nessa sincronicidade de corpo, alma, mente com o outro, com todo esse estar junto. Parece que ela não ganhou em primeiro lugar; ela ganhou em segundo, mas o primeiro lugar foi desclassificado. Por quê?

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Porque aquele fiozinho que tem que ter sempre atrás da mão do corredor estava pouco à frente, então, ele foi desclassificado e ela ganhou. Esse fiozinho é a coisa mais importante durante a competição, em que sentido? Ele tem que estar sempre no mesmo movimento, no mesmo lugar. A idéia é você se colocar o seu aluno no lugar do treinador, isto é, braços esquerdos no mesmo movimento, braços direitos no mesmo movimento, pernas, cochas, pé, rosto, tudo. Eu acredito que o coração deles estava batendo junto. E a idéia é que, se nós entrarmos no processo de empatia e de compaixão, a gente alcança esse sucesso. Obrigada.

Participante não identificado

Diante da experiência dessa mudança da perspectiva da tecnologia, gostaria de saber como foi dada a disciplina de história, porque é um conteúdo que revoluciona o cenário do passado para melhorar o presente, visando uma boa vivência em um todo. Como a escola trabalhou com os professores de história?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Não teve uma diferença entre professor de história, professor de português, de química etc. A idéia é trabalhar com o modelo mental, novamente voltamos a isso. Nós não estamos preocupados com o conteúdo, o conteúdo vem. A preocupação é com a dinâmica desse processo de aprendizagem.

Hoje em dia o que a gente percebe? Para a conclusão plena nós precisamos ter aqueles três tipos. Então, a gente tem a física e a pedagógica. Em relação à pedagógica, eu não sou a pessoa adequada para falar porque eu não sou pedagoga, eu sou psicóloga. No nosso grupo tem pedagogas também, mas na verdade, não muda muito se você acreditar no potencial do seu aluno. A única questão que a gente procura estar discutindo é o tipo de aprendizagem daquele aluno e, se o modelo é o modelo, como você colocou, o conteúdo é o conteúdo revolucionário ele vai participar.

Eu até tenho aqui, por exemplo, uma situação onde a escola jogou argumentos pró e contra o Lula e ele argumentou também. O importante é o aluno se sentir pertencendo àquele grupo. Não importa a temática, e ele é servido não é?

Participante não identificado

Seria assim, o professor aluno tendo a empatia e ali trabalhar a emoção de forma que o aluno possa gostar da escola, gostar da matéria. Porque o conteúdo ele vai ver na vida toda?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Exatamente, ele vai adquirir o conteúdo. Eu acredito que aprendizagem acontece se tiver noção, e é isso que estamos querendo trabalhar. Antes não era, porque não passou no vídeo. Nos dois últimos vídeos, ele fala do trabalho em equipe. Na primeira fala, ele é cobrado, mas na última fala, já não é. Dizem que se ele que não fizer não tem problema, os amigos não vão cobrá-lo. E é exatamente isso que nós queremos trabalhar, os alunos precisam cobrar sim, ele tem responsabilidade sim.

Por que é que eles não cobram? Nós começamos a fazer esse horário com os professores, então, ouvimos falar: mas eles vão fazer prova? Que prova? Mas é química, mas é física!

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Vai ter prova para todo mundo? Para eles também? O que aconteceu? Uma mocinha com Síndrome de Dawn desse grupo levou a prova para casa e não entregou. O professor não cobrou, e em uma reunião ele falou isso: “mas como que eu vou cobrar?” Você não cobra de todos? Porque você não vai cobrar dela? A professora de física deu nota na prova e avaliou o que ele aprendeu. Na prova a gente avalia o que a gente ensina e não o que o outro aprende. Nós precisamos começar a avaliar o que o outro aprendeu.

Participante não identificado

Nancy, eu queria que você falasse um pouco mais a respeito dessa dinâmica que acontece entre os professores para fazer essa adequação de conteúdos para esses alunos. E também falasse como é a instituição que apóia o projeto de inclusão, o Stella Maris, se é um colégio público, particular etc.

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Como que são feitas as adequações? Nós temos um mediador dentro da sala de aula. Esse mediador entra na escola, no horário normal do adolescente e sai no horário normal. Ele freqüenta a escola uma ou duas vezes por semana porque, como é colegial, a gente precisa estar mais próximo desse conteúdo. Nós pegamos o material da escola, levamos, estudamos o ensino daquele material, traçamos a linha de crescimento de aprendizagem do aluno. A gente propõe que o professor entregue o material para o aluno, mas nesse primeiro momento, nós é que executamos a adequação. Ainda não é o professor quem faz isso, por causa da demanda.

Nós é que fazemos isso, e temos uma supervisão de 15 em 15 dias. O grupo de mediadores se reúne comigo, elaboramos o material, entregamos na mão do professore e ele é quem desenvolve todo o processo com o aluno. Eu tenho um material interessantíssimo, que é todo um estudo em cima da forma de fazer adequações.

O Stella Maris é um colégio particular, católico, mas anteriormente, não faziam essas adequações. Esses alunos freqüentavam a escola, parece-me que a quinta e a sexta série foram motivadoras, mas a sétima e a oitava não. No ano passado, eles já estavam para sair do colégio quando nós tentamos fazer esse resgate. É um colégio que tem abertura e eles estão se propondo a fazer um crescimento em relação a todo esse processo.

O Carpe Diem é uma associação que tem por missão fazer a inclusão dos jovens adultos na sociedade. Em São Paulo, temos feito muito a inclusão no mercado de trabalho e a proposta agora é fazer o trabalho em cima do projeto de vida de cada um deles.

Participante não identificado

Eu só queria que você falasse um pouco mais da sua experiência como co-autora em relação à produção do livro “Somos Todos Iguais”. O que você tem a falar a respeito do livro? Como foi escrito na sua vida...

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

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É como falar de um filho. O livro: “Somos Todos Iguais” foi uma proposta minha e de uma outra psicóloga para trabalhar questões dos valores virtuosos já desde a pré-escola.

O MEC aprovou o livro e foi distribuído para todas as escolas. Foi bastante divulgado. A proposta é trabalhar as virtudes na pré-escola, porque é lá que a coisa surge. Muitas vezes, a gente não tem noção desse processo, mas a gente recebe a primeira virtude ao nascer. Esse é o primeira grande trabalho dos valores virtuosos.

O papel da escola e do professor é trabalhar essas questões dentro da sala de aula e, no livro “Somos Todos Iguais”, a gente esbarra com diversas deficiências, desde a deficiência física até a deficiência mental. Se der para você deixar o seu endereço eu te mando.

Cristino Gilmar do NascimentoProfessor de Geografia

Eu sou Professor de Geografia do Estado de São Paulo. Eu ouvi falar de inclusão e achei interessante essa fala. Geralmente, a escola hoje valoriza todas as disciplinas da grade curricular, mas sempre deixa a Geografia para depois. A matemática, português, física, química etc. vêm sempre primeiro. O aluno não tem condição de se localizar sem aprender geografia. Se nós temos um grupo de crianças com deficiência, a dificuldade desses deficientes se desenvolverem e se inserirem na sociedade é muito grande. Então, eu imagino o que eu poderia estar fazendo se trabalhasse da forma como vocês estão trabalhando o processo lá no Stella Maris. Eu achei a sua exposição toda muito bacana. Tem vários deficientes hoje que não sabe, que a identidade deles é colocar o dedão lá. E a gente queria pegar esse indivíduo e mandá-lo para escola para ele estudar, para ele aprender, mas essa inserção é difícil.

Eu também sou Presidente da Sociedade São Vicente de Paula em Pindamonhangaba, Campos do Jordão e Santo Antônio. Eu gostaria de saber como eu posso fazer para me envolver mais diretamente nesse processo. Muito obrigado.

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Eu gostaria de falar algumas coisas. Eu acredito em pessoas auto-determinadas. Então, quando eu olho para uma pessoa, eu não estou preocupada em olhar a deficiência dela. Em primeiro lugar está a pessoa; a deficiência está atrás. Quando o Professor de Geografia falou, eu quase me escondi debaixo da mesa porque eu odeio geografia. Mas eu adoro mapas, adoro decorar o nome das capitais, tipos de relevo etc. Então, o que eu queria dizer com tudo isso é que, se você acredita que uma pessoa é competente, o grande desafio é descobrir o que fazer para aquelas pessoas que estão escondidinhas. Nos Estados Unidos, eles pegaram um grupo de pessoas e dividiram em dois subgrupos. Para isso, eles fizeram a seguinte pergunta: Você encontra facilmente o estacionamento no shopping? Alguns disseram que sim e outros disseram que não. A partir daí, eles dividiram o grupo em dois subgrupos e foram ao shopping. Os que falaram que não encontravam o estacionamento com facilidade, não encontraram mesmo; e os que falaram que encontravam, encontraram. Como é que se deu isso? O que eles fizeram? Pegaram as pessoas dos dois grupos e fizeram pesquisa. Todos esses movimentos ajudavam encontrar estacionamento ou lugar para estacionar. Então, o que eu proponho que você faça para trazer motivação para essas pessoas é ouvir as motivações dela. Você precisa se movimentar muito para descobrir qual é a ponte para esse aluno, como é que ele estabelece a relação entre ensino e aprendizagem. Isso é difícil, mas só assim ele vai descobrir qual é o caminho dele, vai adquirindo autonomia e, a partir daí, vai poder estudar qualquer coisa, qualquer matéria.

Participante não identificado

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Como é que ele descobre isso? Como é que ele aprende?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Nós estamos levantando mais ou menos um questionário por aluno. O professor está levantando o que ele faz. Por exemplo, ao invés de você colocar o aluno para fora de sala porque ele fala muito, é muito levado etc., você observa bem esse aluno porque existem algumas características desse comportamento básico que se adapta ao tipo de aprendizagem daquela criança. Agora o importante é você não estabelecer pré-conceitos, ou as profecias pré-determinadas, enfatizando que o aluno é muito teimoso, o aluno é muito levado etc. Vocês sabem o que é empatia? É você sair do seu lugar, entrar no lugar do outro, olhar o fato e voltar. Se você fizer isso para o aluno você vai conseguir alguns sinais de qual é o tipo de aprendizagem dele. A gente fala muito: aquele aluno não pára sentado, parece que tem pulgas. Na verdade, nós não estamos tendo tempo para ver hiperativo. Essa hiperatividade também é um atributo. Todo mundo acha que não, mas eu acho que sim. Se a gente levar isso como um atributo, vai ver como é que ele está ligado, entendeu?

Participante não identificado

Nancy, o problema é que, às vezes, a gente tenta fazer alguma coisa e não consegue. A gente fica frustrado e a nossa auto-estima vai lá para baixo. No caso do aluno é a mesma coisa. Eu vou falar da Síndrome de Dawn, que é a minha realidade.

Como é que podemos trabalhar a auto-estima dele? Como podemos fazer para que ele volte, como trabalhar para ele ter a vontade de aprender? Muitas vezes ele quer, mas não sente que ele é diferente, que ele não consegue acompanhar. Então, a gente tem que ver como é que podemos trabalhar essa auto-estima dele, para fazê-lo querer, fazê-lo entender que ele é capaz. Essa é uma preocupação que a gente tem.

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Todo o processo de aprendizagem parte de uma diminuição positiva que você tem frente ao estímulo. Houve uma pesquisa em que eles fotografaram o cérebro, mapearam e toda vez que você consegue estabelecer uma conexão entre o estímulo e a percepção, você tem todo um caminho cerebral que já o torna motivado para um novo desafio. Ao estabelecer essas conexões, ele fica motivado ao ter resposta do meio.

Um outro ponto que eu acredito que é muito importante no processo de aquisição de qualquer conteúdo é a auto-estima. Agora, como que você trabalha essa auto-estima? Através do modelo de competência. Foi por isso que eu disse que ele está por trás e não no meio da relação. Normalmente, a gente coloca todas essas questões no meio da relação e não as coloca atrás desta relação, porque essa relação é singular. A auto-estima é sempre elevada se a gente trabalha em cima do modelo de competência. Só que nós, educadores, o que nós fizemos? Nós partimos do modelo da competência, mas temos que trabalhar com a singularidade de cada aluno. É difícil? Sim. O que a gente propõe? Nós, professores, temos que tornar nossos alunos professores. A melhor linguagem que vem a existir é do outro aluno, e isto, quando o outro aluno se relaciona com esse aluno em questão, não viria dizer que

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tem deficiência ou não. Esse outro aluno já está mexendo com essa auto-estima. Por quê? Porque vem a ser um relacionamento ultrapessoal. Há dois tipos de relacionamento, o interpessoal e o ultrapessoal.

Muitas vezes, e o aluno se sente sozinho, quando ele não tem amigos na escola, quando ele resolve fazer um trabalho em grupo, mas não é incluído no grupo. Os outros ficam só trocando entre si e ele fica sempre à parte, o papel do professor é mostrar que o importante não é só o conhecimento, mas o relacionamento interpessoal também. Essa é uma das virtudes do ser humano.

Participante não identificado

Nancy, eu fiquei encantada com a sua exposição. Eu acho que esse é um trabalho que precisa ser divulgado, implantado, difundido em outras as escolas. Muitas vezes, a nossa escola regular, pela experiência que a gente tem, é muito cruel com as pessoas que têm mais dificuldade de atenção. Ou ela destrói a auto-estima da pessoa, que fica só repetindo de ano toda a vida, ou ela passa sem a pessoa ter participado de fato do processo, é como se a pessoa estivesse na sala, mas não estivesse. Eu tive uma experiência de um menino que estava cursando pedagogia. Era um rapaz e ele simplesmente não acompanhava o processo. Ele copiava tudo. Ele pegava várias coisas da internet, copiava, colocava bibliografia e levava para sala. Como era uma pessoa que tinha uma deficiência mental, a gente ia deixando aquele aluno passar. Na verdade, não se fazia nada para que ele participasse de fato do processo.

E isso não é um caso isolado. Para mim, a melhor forma de recuperar a auto-estima é acreditar de fato e a atitude de vocês é uma atitude de crédito. Eu estava pensando que eu gostaria de ver as pessoas com deficiência mental participando dessa conferência também, tendo uma palavra, participando do debate. Mas a gente chega lá.

Participante não identificado

Nancy, eu gostaria você falasse mais para nós sobre a questão do mediador. Você colocou que o mediador era um colega da sala de aula. Pode ser, um deles não é? Mas falando desses mediadores que estão nessa escola, como é que os outros vêem o material deles ser adaptando? Eles têm menos coisas para fazer do que os outros. Como que é trabalhada essa questão?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

O nosso trabalho é indireto, é só com os professores. Nós temos um trabalho que é feito em casa e com esses mediadores dentro do projeto. A questão da mediação é uma questão polêmica. A gente sempre conversou sobre isso. Eu mesma questionei muito a questão da mediação, mas o que eu vejo hoje é que a proposta é que eles se sintam empoderados com os valores existentes do dia a dia. O que nós estamos tentando fazer é conhecer o estímulo de aprendizagem. Nós queremos trabalhar em cima disso. Nós ainda não estamos fazendo um trabalho daquela inclusão psico-social, mas nossos alunos já não se preocupam tanto em ter que inventar uma desculpa para sair da sala de aula, para chegar um pouco atrasado, para fazer algumas coisas. Ele já está mais dentro da sala de aula, e ele fica muito feliz em fazer a prova. Isso foi um dos relatos que nós tivemos. Antes, ele não fazia prova e passava. A escola teve um problema grande no ano passado quando um aluno foi questionar exatamente isso. Ele ia reprovar por falta. Então, ele questionou. Se aquele outro aluno não reprova, por que é que eu vou reprovar?

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De novo a gente cai nas virtudes. A gente cai no que nós deixamos para trás e esquecemos do que encontramos ao longo do caminho, que são as virtudes. Mas voltando, à questão do mediador, uma coisa muito interessante é que os outros alunos pediam para as mediadoras dicas de como estudar. E isso mostrou que valia para todo mundo. Os professores estão questionando a própria ação de checar conhecimento. Esse processo é muito interessante.

Nós temos um problema em relação a quem banca o projeto porque esse é um projeto muito caro. O que acontece aqui? Hoje, nós temos um problema do projeto em si, que é quem banca o projeto. Esse é um projeto caro, não é barato, mas em que todo mundo está investindo, porque amanha a gente quer vender esse projeto para outras escolas.

Participante não identificado

Nancy, eu queria que ficasse um pouco mais clara essa questão do mediador. Você falou primeiro que o mediador estaria dentro de sala, uma ou duas vezes por semana, e que seriam duas alunas da pedagogia. Em algum momento poderia esses mediadores ser os próprios alunos?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Nós não tivemos ainda a possibilidade de chegar ao estágio final desse projeto. Nós estamos na segunda fase, vamos dizer assim, segunda esfera da inclusão, que é a pedagógica. Nós queremos chegar depois na esfera psico-social, que é a esfera das mediadoras. Nós esperamos que seja logo, antes das férias. Fala-se muito em valores virtuais para as empresas e nós queremos os valores virtuosos para a educação porque é através disso que nós vamos conseguir chegar nessa questão da cidadania.

Participante não identificado

Acho muito interessante essa intervenção no plano psico-social porque é uma coisa aberta para todos, não só para as pessoas com deficiência. Acho que é uma brecha muito legal realmente para está trabalhando essa questão da inclusão. É aí que mora a inclusão. O projeto é muito baseado na leitura e na escrita. É assim que ele gera autonomia, gera entretenimento, construção de projeto de vida, ele verifica muito isso na leitura e na escrita.

Participante não identificado

Qual é a previsão de você colocar em prática essa questão da educação psico-social?

Nancy Costa PagnanelliPsicóloga

Nós queremos começar a fazer todo esse movimento antes de julho, até porque os mediadores que estão hoje na sala de aula devem conhecer a dinâmica. O primeiro foco foi desviar a atenção das observadoras das questões sóciopedagógicas. É difícil porque elas são pedagogas, mas esse é o primeiro movimento da questão interpessoal.

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E o segundo ponto é que, como os professores estão mais seguros, eles estão começando a delegar um pouco mais para os colegas. Agora, eu acredito que nós vamos ter que fazer muita dinâmica com o grupo de alunos. Nós não, favorecemos o professor para fazer essa dinâmica no grupo de alunos. E isso está ligado. A idéia é mudar esse contexto, mas não só por conta das pessoas com deficiência mental, mas no esquema todo.

O que eu posso também falar é que alguns professores começaram o projeto acreditando e outros não. A mudança que os outros estão tendo é impressionante. Vocês nem imaginam o avanço que eles estão conseguindo. E há ainda o questionamento também, do próprio Samuel, em relação às notas. Ele já não aceita tirar determinadas notas porque ele acha que ele poderia ter dado. Então, é impressionante a mudança nas reuniões que a Nancy provoca, de uma reunião para outra é uma coisa fantástica.

O que a gente coloca muito também é qual é o instrumento, que a gente sempre coloca aqui, para pessoa com deficiência visual é o braile, ou o data voto, ou deficiência auditiva e a grande sacada é a deficiência mental encontrar esse “instrumento”, “essa tecnologia”.

Eu posso dizer que houve sim muitos avanços e eu acho é um projeto que vai dar certo, aliás, que já está dando certo, mas como ela colocou, tem que ser divulgado. É um grande desafio, mas eu acho que as gerações futuras vão usufruir muito desse nosso trabalho porque nós estamos promovendo a inclusão desses alunos e isso vai acabar atingindo as gerações dos nossos filhos e netos. Essas gerações futuras vão se aproveitar disso com certeza.

Além disso, eu acho que essa inclusão propicia aos outros que estão ali junto, uma nova visão da sociedade, do ser humano, principalmente, aqueles que vão ser os professores de amanhã, que vão ser os prefeitos de amanhã para que a gente não precise em uma outra conferência estar plantando tudo isso de novo. Em São Paulo, tem alguns desembargadores que dizem que não têm oportunidade de conviver com pessoas com deficiência. Então, eles devem lutar pelos direitos das pessoas sem deficiência em conviver com as pessoas com deficiência, para que possam ser cidadãos em sua plenitude. Obrigado gente.

4.9 Tema: Apresentação prática e interativa das normas de acessibilidade da ABNT

Thamara de Farias Tannús Almeida dos ReisArquiteta, Mestre em Acessibilidade pela UNB, é voluntária na Associação

dos Paraplégicos de Uberlândia.

Boa tarde a todos! Agradeço a paciência de terem esperado. Vou fazer uma rápida explanação para depois mostrar o meu trabalho. Vou fazer uma apresentação mais concisa exatamente pelo atraso que houve, e sei que muitas pessoas têm compromissos já marcados.

Todos sabem que a mobilidade é uma necessidade do ser humano e um direito democrático; Nós temos a idéia de que as pessoas que têm dificuldade de acessibilidade, são só aquelas que usam a cadeiras de rodas; Mas no Brasil hoje temos 14.5% da população portadora de alguma deficiência e a nossa população está envelhecendo. Então nós temos a pessoa idosa considerada portadora de alguma deficiência; As deficiências temporárias, como por exemplo à mulher grávida a pessoa que quebra a perna, as pessoas que têm carrinhos de bebês gêmeos não cabe na calçada, quem está carregando malas, a pessoa portadora de deficiência visual. É uma gama muito grande de pessoas incluídas no rol das pessoas com certa dificuldade de locomoção. Até pouco tempo atrás, as pessoas com alguma deficiência física, eram motivo de vergonha, de tratamento desumano, desdenhadas, ridicularizadas e perseguidas pelas ruas. A própria história nos lembra isso, e o direito de ir e vir dessas pessoas não fazia parte dos administradores públicos responsáveis pela urbanização e muito menos da maioria dos arquitetos. Até hoje temos a avaliação pós-ocupação, e não o projeto sendo idealizado antes ou durante a sua concepção.

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As pessoas impedidas de usufruir a livre mobilidade, costumam adotar comportamentos dependentes na sua locomoção, além de sofrerem danos emocionais com sérios prejuízos à construção da cidadania. Há trinta anos, quantos arquitetos pensariam em construção de rampas nos cruzamentos das ruas? Ou ainda, possibilitar o acesso ao transporte público, em projetar instalações sanitárias ou mesmo espaço de trabalho às pessoas com deficiência física? Hoje já existem leis, mas infelizmente a maioria delas não é cumprida; Há uma conscientização crescente e aqui nessa conferência podemos ver a grande quantidade de pessoas interessadas nessa área; Porém, mesmo nessa fase de conscientização a respeito dessas questões, vemos muito ainda soluções parciais e não com adaptação de espaços construídos ou a retirada de elementos urbanísticos ou arquitetônicos, que impedem o livre acesso das pessoas com dificuldade de locomoção.

Os princípios de acessibilidade e desenho universal devem ser observados desde a concepção de um projeto simples para melhorar a vida do deficiente, prevenindo inclusive acidentes que na maioria das vezes causam sérias lesões; É muito comum encontrarmos pessoas andando na calçada, e principalmente o deficiente visual, esbarrando naqueles toldos que não deveriam, mas estão fora da altura normal.

O que vem a ser acessibilidade? Segundo as Normas Técnicas de Acessibilidade, é a possibilidade e condição de alcance para utilização com segurança e autonomia de edificações, espaços, mobiliários e equipamentos urbanos.

O que vem a ser desenho universal? É aquele que visa atender a maior gama de variações possíveis, das características antropométricas extensoriais da população.

O que vem a ser parâmetros antropométricos? Segundo o dicionário da língua portuguesa, parâmetros antropométricos é o conjunto de processos empregados para medição das dimensões do corpo humano ou de suas partes. Ou seja, esses parâmetros são as medidas básicas utilizadas para todas as pessoas, ou para a maioria delas.

Desde 1988, já existem leis consolidadas que determinam acessibilidade nas cidades; hoje estamos com vários grupos discutindo essas leis que como já foi dito, não são cumpridas na maioria das vezes. As Normas Técnicas, visam propiciar às pessoas com deficiências melhores condições de acesso aos edifícios públicos, as vias e espaços urbanos. A Norma Técnica de Acessibilidade é um instrumento importante de orientação para arquitetos, planejadores urbanos e outros profissionais afins, mas essas normas técnicas foram colocadas no site da CORDE muito recentemente, mais precisamente só em 2005; Então elas ainda são inacessíveis. Nas universidades públicas, às vezes consegue encontrar um exemplar, para todos os estudantes.

Delegado do Maranhão

Eu sou do Maranhão, e lá é muito difícil encontrar NBR. Eu consegui um exemplar na Universidade e tirei uma cópia. Alguns professores da área de arquitetura da universidade de São Luiz, que disponibilizam um CD Room. E as associações que tanto precisam não dispõe desse material. Acredito que boa parte das associações e conselhos municipais não dispõe da NBR por essa dificuldade de encontrá-la.

Thamara TannúsAssociação dos Paraplégicos de Uberlândia

E temos mais um problema, além de não encontrar a Norma Técnica, quando consegue uma tem uma tarja que diz da proibição da reprodução. As Normas Técnicas exigem algum conhecimento técnico. Muitas pessoas não entendem exatamente o que ela quer dizer, e normalmente as pessoas têm um pouco de preguiça de raciocinar e ver realmente o que ela quer dizer. Através das pesquisas que eu

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fiz em faculdades de arquitetura, foram pouquíssimos os professores que têm conhecimento prático de tais normas. As pessoas acham mais fácil seguir a regra geral; Para banheiros, porta de sessenta centímetros, entrada principal, oitenta centímetros; Eles esquecem que uma cadeira de rodas não passa por uma porta tão estreita, e que todos usam banheiro, isso faz com que as casas se tornem inacessíveis, na maioria das vezes; E os banheiros que são considerados públicos adaptados, nunca estão dentro das normas técnicas brasileiras. O fato de ter barras de apoio, vasos sanitários e pias adaptadas, não quer dizer que o banheiro esteja adaptado; Ele tem que estar com as medidas corretas, dentro dos padrões antoprométricos.

O mais importante não é remover as barreiras, e sim atentar para que elas jamais existam, ou que sejam construídas. É importante também que as soluções de acessibilidade, sejam complementares e não isoladas.

Eu vou finalizar essa parte, com os dizeres de uma colega que é advogada e que escreveu um livro sobre esse assunto: “É de fundamental importância que a inclusão seja a tônica da democracia, e que todas as pessoas sejam respeitadas em suas diferenças, onde quer que se encontrem, independentemente de qualquer deficiência, pois a acessibilidade mais que um dever pode respeitar a dignidade humana, a qualidade de vida e o exercício da cidadania, no cotidiano das cidades”. Isso quer dizer, que isso é um direito que todas as pessoas têm, de serem acessíveis e de serem cidadãos.

Eu vou apresentar para vocês o trabalho que fiz no mestrado. Procurei fazer de uma forma que ele fosse acessível a todas as pessoas, para que qualquer um pudesse abri-lo e entender, mas o tempo não deu e não pude concluir essa parte das Normas Técnicas; Mas fiz a parte dos parâmetros antropométricos, de normas básicas de circulação e como que um arquiteto, ou qualquer outra pessoa que queira por exemplo, uma orientação de como fazer uma rampa em uma escola, se ele tiver o CD ele vai estar à altura de projetar essa rampa dentro da Norma Técnica. Esse CD, é todo animado e falado. Se você passa o cursor ela começa com a música de Beethoven, que era deficiente auditivo e as músicas dele perduram até os dias atuais. Foram criados dois personagens, o Pin e a Dim, que vão estar presentes durante todo o trabalho. Esse CD, é justamente para conscientizar os alunos de arquitetura para essas questões da acessibilidade. Dentro de cada assunto tem os exercícios de fixação para que o aluno possa ver se ele entendeu tudo o que viu. Em todo o CD, a pessoa vai encontrar todos os assuntos falados e escritos, ou seja, para deficientes auditivos e visuais. Segue à demonstração do CD.

Delegado do Maranhão

Eu gostaria de pedir uma opinião sua. Eu sou do Maranhão, e lá nós formamos um grupo que atua em várias áreas, Direito, Turismo, Saúde etc., e estamos com um projeto de pesquisas sobre catalogação da acessibilidade dos serviços na grande São Luiz; Porque na nossa opinião, acreditamos que não adianta ver a acessibilidade apenas em alguns lugares. Nosso objetivo é fazer um trabalho de campo, com fotografias, medição de mobiliário urbano, guia de calçada, filmagem e aí sim, vamos ter toda a gama do mobiliário urbano que precisa ser modificado e vamos verificar o que está de acordo com a NBR. Outra coisa interessante é que na Bahia, existe uma parceria do CREA juntamente com as instituições, e formando também uma comissão que atua junto ao CREA. É interessante a participação do CREA com a IAB, através dessas instituições responsáveis pela parte de engenharia e arquitetura. Gostaria de saber, como se pode de fato efetivar um programa de acessibilidade para determinado local. São parcerias, projetos de pesquisas? O que você acha que deve se fazer para ser implantado um programa que funcione.

Thamara TannúsAssociação dos Paraplégicos de Uberlândia

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Se a maioria das pessoas que tiverem interesse na área fizerem sua parte, devagar tudo vai chegando ao ponto certo. Por exemplo, é muito interessante esse projeto que você está propondo. Em Uberlândia, tem no planejamento urbano uma área responsável só pela acessibilidade da cidade; A função deles é encontrar programas para tornar acessível às áreas públicas da cidade; Aprovação de projetos públicos em andamento, para que não haja o risco de se fazer e ter de quebrar para ser refeito; Na minha opinião, esse trabalho de pesquisa é muito interessante, porque começa a conscientizar a população, e os estudantes com relação a essa problemática, porque apesar de ser Lei, ainda não é instituída em todos os municípios.

Delegado do Maranhão

É muito mais fácil buscar projetos de pesquisas e parcerias do que leis. É muito fácil criar uma lei de acessibilidade em prédio público, em prédio privado, é muito fácil fazer a lei, mas é preciso que a lei seja cumprida. Em São Luis tem um monte de leis, mas não adianta. O que é importante é que o projeto de pesquisa seja efetivado.

Conselheiro do CONADE

O exemplo que a Thamara utilizou que nós fazemos em Uberlândia, funciona da seguinte maneira: Nós temos um código de obras que estabelece em lei, critérios de análise, aprovação e fiscalização, de construção, reforma ou ampliação do que é destinado ao uso público coletivo; Tanto de propriedade pública, como privada. Nós temos ferramenta de fiscalização, portanto legal. Temos a ação do município através do núcleo de acessibilidade, que analisa e aprova os projetos de acordo com a norma e depois fiscaliza para a liberação do habite-se; Ferramenta número dois: Havendo um descumprimento do projeto, ou seja, a construção em desacordo com o aprovado, nós não liberamos o habite-se da pessoa, diferentemente de algumas cidades que é estipulado uma multa, o interessado paga a multa e o ambiente continua inacessível. Existem coisas que são pedagógicas, o núcleo de acessibilidade tem duas funções: Fiscalizar e ensinar. Primeiro ensinamos, quando não há mais diálogo, usamos o poder imperativo da lei. Como fazemos isso? Apresentando ao Ministério Público, que é o nosso grande parceiro, a denúncia contra aquele estabelecimento. Exemplo: Tivemos um caso com o Carrefour na nossa cidade; A mãe de uma criança com deficiência, ficou esperando durante uma hora, uma cadeira de rodas que quando chegou estava com o pneu furado. Ela se reportou ao Conselho Municipal, fizemos uma denúncia ao Ministério Público, que chamou o Carrefour; O Ministério Público estabeleceu que em trinta dias o Carrefour comprasse duas cadeiras de rodas novas, dois carrinhos motorizados e fizesse uma leitura geral na loja, inclusive nos sanitários que estavam sendo usados como depósito. Isso funcionou e está funcionando; E a cada seis meses o Ministério Público determina que a Prefeitura mande a fiscalização o Carrefour, para verificar se está tudo em ordem. Falando sobre o CREA e o IAB, o CREA tem uma postura referente à acessibilidade, já muito clara no Brasil inteiro; Tem o Projeto Inacessível, Inaceitável, tem o Projeto Acesso para Todos, etc. Evidentemente que o Decreto Nº 5.296 estabelece uma ferramenta muito maior; Ele estabelece que, o arquiteto ou o engenheiro, ao assinar um projeto, ao recolher essa assinatura de responsabilidade técnica do projeto, que é na verdade o que liga o profissional eternamente a obra. O Decreto Nº 5.296, determina também que seja incluído na ART o projeto de acessibilidade, e isso em muitos casos não está acontecendo no Brasil, ainda. É importantíssimo, que nós que trabalhamos com a legislação, façamos cumprir isso no nosso município. O CREA às vezes não está exigindo isso, e as Prefeituras nas análises de projetos também não estão exigindo.

Conselheira do CREA do Rio Grande do Sul

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Só para complementar o que o senhor falou, a questão da ART, o CONFEA deliberou para que o CREA de cada estado crie o número certo da anotação de responsabilidade técnica para os profissionais. Em vários estados, na Bahia, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, já tem GT de Acessibilidade das Câmaras de Arquitetura, para valorizar e fazer valer mais com os profissionais.

Delegado do Maranhão

Eu citei o CREA, porque no meu estado ele está completamente alheio. Na nossa Conferência Estadual, eles estiveram presentes e ficaram alheios. Não tem profissionais capacitados em relação a NBR 9050, não explicaram nada. E também quanto ao exemplo que citei da Bahia, é que eu pesquisei e vi que essa parceria está funcionando.

Paulo Laércio VieriaPresidente do CREA/Paraíba

Primeiramente gostaria de parabenizar a exposição da ABNT. Existe um convênio do CONFEA com a ABNT, a respeito de suas normas técnicas, e nós sabemos que elas são pagas para que o profissional possa adquiri-las. Não seria possível, já que existe esse convênio a ABNT disponibilizar, esse CD dessa exposição que foi colocada tão brilhantemente nesse evento? Essa seria minha primeira indagação. E segundo, entrando na seara do que foi discutido, realmente sinto que há uma falta grande do nosso Conselho Federal estar presente mais ativamente nesse evento; Sinceramente, saio daqui frustrado. Porque tudo que se vê em favor do deficiente físico, está nas mãos do engenheiro, do arquiteto, do engenheiro agrônomo e dos técnicos desse país. Quem fabrica cadeira de rodas são os engenheiros mecânicos, os técnicos. Enfim, o que você imaginar nesse país a engenharia está presente. Aqui é o exemplo; Quando eu fui passando e vi na porta que seria aqui nessa sala o Painel da ABNT eu disse: Aqui é a minha casa, e estamos vendo como está vazio. O CONFEA indicou quatro profissionais; A Presidenta do CREA do Distrito Federal que esteve ontem comigo, aqui no evento, uma Conselheira de Minas Gerais, eu e um colega do Piauí, que faz parte do GT de Acessibilidade do Colégio de Presidente de CREA, que o CONFEA não deu condições a ele de participar de um evento como esse. A minha indignação eu vou levar para o CONFEA, vou conversar com o Presidente Marcos Túlio, que é de Minas Gerais e mostrar que nós temos uma responsabilidade grande, porque é lei, é uma realidade e não podemos deixar o CREA como autarquia nacional, só fiscalizar; Nós temos que ouvir as demandas dessa sociedade, desse povo que estão aí precisando do apoio da instituição. São essas as palavras que eu quero deixar nessa reunião.

Professora Neide

Por cinco vezes eu precisei usar muletas, por questões bem menores, e nessa ocasião é que vemos que o problema da noção de deficiente, nesse plano de acessibilidade principalmente ele não é um problema do deficiente, é um problema de todos nós que estamos aqui. Eu dizia isso na UnB com relação à aposentadoria, mas estou vendo que no caso aqui, o problema é o mesmo. As pessoas acham que aposentado é aquele velhinho que está caindo aos pedaços, que já trabalhou, que não está satisfatório e não consegue produzir mais. As pessoas se esquecem que a pessoa passou a vida fazendo licenciatura, mestrado, doutorado, de repente sai da UnB, e no primeiro cruzamento perigoso que não tem um sinal, ele vira um deficiente físico. Era um dos argumentos que eu usava para o problema da aposentadoria. Todos nós somos um possível deficiente físico. E a velhice, todos nós somos sujeitos a ela. Muitos querem chegar ao noventa anos e muitos têm medo até de chegar aos setenta, justamente pelo problema da possível dependência que a pessoa fica, numa sociedade onde a cidadania não é respeitada. Nós

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temos que pensar realmente, que cada cidadão é um indivíduo que é um deficiente físico em potencial, qualquer que seja o nível. Vários garotões lindos, encontramos depois obesos, sem o direito sequer de irem a um cinema porque não cabe nas poltronas, vai viajar tem que comprar duas passagens, porque uma só não cabe. Então essa consciência da cidadania e da fragilidade que cada um de nós tem é um problema que tem que ser levado quando se reivindica qualquer acesso, qualquer forma de defesa das pessoas que precisam gastar muito mais suas energias e ter muito mais problemas para continuar exercendo sua cidadania.

Jorge Luiz SilvaRio de Janeiro

Minha especialização é acessibilidade do ambiente urbano. Eu gostaria de dar uma sugestão, lá no Rio eu estou auxiliando a Arquidiocese na Campanha da Fraternidade, e uma das coisas que fiz, foi mostrar quais são os pontos que tínhamos que atingir para dar como se diz popularmente, um tapa com luvas de pelica; Então a Arquidiocese promoveu palestras e nós convidamos vários órgãos. No Rio tem um setor que cuida do direito da acessibilidade, e eu dei uma palestra sobre Acessibilidade no Ambiente Urbano, para uma platéia de advogados; A sugestão que eu dou, é que você procure a OAB do seu estado e ela convidar um arquiteto de fora para dar palestras. Sei que Minas Gerais, Bahia, Pernambuco tem muita gente especializada no assunto. Eu dou sempre como exemplo o seguinte: Por que o meio ambiente tem essa força toda? Porque um Banco Internacional se um projeto não tiver meio ambiente eles não liberam o recurso, e as ONG’s atuam diretamente nas instituições financeiras lá fora. E é isso que essa comunidade aqui precisa fazer, já que não atuam aqui no Brasil, então comecem atuando lá fora, diretamente na instituição financeira, ou seja, no BIRD, Banco Mundial, para que eles só liberem dinheiro para o Brasil para implementação da acessibilidade. E quem faz isso? É o Ministério Público e a OAB. O CREA não vai conseguir isso, são vocês que vão conseguir.

Cledson de Oliveira CruzPresidente da Associação do Município de Salvador

Boa noite! Eu não tive a oportunidade de assistir a apresentação, mas tenho algumas preocupações, conforme o Presidente do CREA da Paraíba colocou, a participação dos engenheiros, dos arquitetos, dos designers estão presentes na nossa vida no cotidiano sempre; As cadeiras de rodas que são confeccionadas e que estão a disposição em vendas, principalmente as que são construídas por algumas organizações de pessoas com deficiências, é preciso que seja revista à qualidade e o designer, porque não vem ofertando segurança, não vem ofertando o devido conforto para que possamos utilizá-las no dia a dia.

Esses novos modelos de geladeiras também é uma das coisas que precisam ser revistas, o puxador fica muito alto e uma pessoa na cadeira de rodas não alcança, sem contar à pressão que ela tem, se a pessoa é portadora de alguma deficiência nas mãos não vai conseguir abri-la; O vaso sanitário, num Seminário de Acessibilidade, promovido pelo IBAN juntamente com a CORDE, nós discutimos a questão do vaso sanitário, porque uma pessoa que não tem deficiência senta no vaso de uma forma vertical, e nós que usamos cadeira de rodas vamos nos posicionando de forma horizontal, praticamente que se arrastando até o vaso e isso tem causado acidentes, porque ele não tem um fixador próprio para manter o vaso estabilizado, e acaba acontecendo como aqui; Todos os vasos da academia estão soltos. Então é preciso que se pense numa forma de fazer com que haja um atendimento específico; Um outro problema sério que estamos enfrentando, é a questão dos acervos históricos; É um paradigma, os CREA’s, os arquitetos ainda não se mobilizaram em favor, mesmo o da Bahia que está fazendo um certo alarde, mas quando se trata de bater de frente com o governo, de bater de frente com algumas estâncias

Page 289: PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA - Ipea · Web viewUma outra preocupação que eu tenho é que os ônibus têm uma vida útil. Se eles tiverem 10 anos pra cumprir a lei, nós não podemos

eles ainda ficam na retaguarda e não querem se posicionar. Eles sabem que precisamos, mas quando colocamos isso para os técnicos, mesmo sabendo da nossa necessidade eles não nos dão suporte. E o que acontece, é que ficamos com o discurso prático da necessidade, mas não temos o apoio técnico dos engenheiros, dos arquitetos, para dizer que é possível sim, fazer a adaptação em sítios históricos preservando-se as características históricas do patrimônio, mas garantindo o acesso e a participação da sociedade do segmento das pessoas com deficiência.

Maria AméliaRio Grande do Sul

A questão da adequação dos museus, já é um problema do IPHAN, logicamente que é arquitetura também, mas vai muito em cima da lei e do desconhecimento. Eu quero falar sobre um problema de ontem, quando a plenária colocou de que a Conferência deveria ser noventa por cento de deficientes; Eu acho o seguinte, uma colega de Minas Gerais colocou, que nós como convidados, não somos deficientes, mas somos os técnicos que podemos ajudar aos deficientes. É preciso que haja uma preocupação dessa Conferência, de que ao invés de se fazer à inclusão social, não se faça à exclusão; Porque essa questão de só deficiente discutir a deficiência, fica muito difícil porque não abre para o técnico para que ele tenha esse conhecimento. Eu luto com acessibilidade há seis anos e alguns detalhes passam desapercebidos no desenho, e por isso é preciso que haja um pouco mais de integração e informação ao profissional. E a questão do CREA, é que ele tem como função fiscalizar o trabalho do profissional. A questão da fiscalização dos órgãos públicos, dos municípios que não há fiscalização do poder público. Acho que através da Conferência deveria haver uma pressão muito maior no poder público em cima da fiscalização. Em Porto Alegre, tem um shopping que estou a seis anos cuidando, tem um banheiro acessível que não é acessível nem para criança, e até hoje não vi nem uma fiscalização e nem um conserto. Acho que tem que estudar o caso; É lógico que quem sabe da necessidade é o deficiente, mas o técnico tem que ter esse conhecimento para poder melhorar e aprimorar o seu trabalho.

Conselheiro do CONADE

Eu acho que sua consideração é muito válida. Eu tenho uma posição referente a isso muito interessante; Eu já viajei praticamente o Brasil inteiro fazendo palestras sobre acessibilidade, mas nunca fui convidado porque sou deficiente, me convidam porque acham que sou bom naquilo que faço. Eu não tenho nenhuma dificuldade em trabalhar com quem não é deficiente, mas acredito que temos sim que pegar no pé do CONFEA, porque ele tem assento no CONADE, e é do CONFEA a responsabilidade pelo baixo números de arquitetos e engenheiros e CREAS, nessa Conferência também. A responsabilidade é dele também. O clamor do companheiro é justo e tem toda a fundamentação, porque é da caneta de vocês que saem os projetos que nós não conseguimos usar. Você companheira que pode ou não nos ajudar.

Gilmar Borges RabeloRelator - Conselheiro do CONADE

Quero fazer a minha fala com uma pequena alegria e uma grande tristeza. Alegria pequena de ter dois companheiros colegas profissionais, que são arquitetos e que participam ou que participaram, uma foi inspetora do CREA e o outro é presidente do CREA de seu estado. Essa é minha alegria, de ter vocês aqui presentes, que trabalham com a acessibilidade; E minha tristeza é justamente por saber que, mesmo tendo o CONFEA assento no Conselho, ele não promoveu a participação dos demais CREA’s nesse evento. Isso me causa uma tristeza muito grande, porque foi colocado aqui a criação da anotação da responsabilidade técnica em todos os CREA’s, com respeito ao Projeto de Acessibilidade. Porém,

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ainda não tive notícias de que nenhum deles estejam exigindo essa anotação em construções de prédios públicos, em construções de prédios de uso comunitário. Como eu trabalho na Secretaria de Planejamento de Uberlândia, eu sei de vários casos de projetos que já passaram sem a devida anotação. Há de se lembrar que essa exigência, foi criada através do Decreto Nº 5.296. Então, tem que ser cumprido e o órgão fiscalizador da nossa profissão é primeiro o CONFEA e depois os CREA’s, ou na sua ordem inversa. Eu lamento realmente, que os nossos profissionais que deveriam estar fiscalizando e que poderiam ser uma ferramenta de grande importância para divulgar as questões da acessibilidade, infelizmente não estão participando.

Paulo Laércio VieiraPresidente do CREA/Paraíba

Quando o colega fala que o CREA tem que fiscalizar a acessibilidade, a companheira Conselheira já falou que o CREA não pode fazer esse trabalho. Na minha opinião as prefeituras são as maiores responsáveis pela aprovação dos projetos. O CREA não tem condições de analisar os projetos. Eu acredito que essa Primeira Conferência, vai despertar em todos os CREA’s, a partir desse GT de Acessibilidade, de todos os presidentes, do qual eu faço parte, sou membro é levar essa campanha em todos os CREA’s de todo o Brasil; E quanto à participação do CONFEA no CONADE, a Presidenta do CREA aqui em Brasília está participando, mas não pode estar aqui nesse momento, mas me designou para representá-la. Sobre a ART que você falou, realmente nenhuma obra, nenhum edifício, nenhuma construção deverá, dentro do seu contexto, passar sem a fiscalização do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia; Agora, não podemos fiscalizar o projeto em si, por que isso faz parte das atribuições da prefeitura. O que se pode fazer, se juntarem todas as instituições e entidades, governamentais ou não, se darem às mãos, e aquele projeto não estando obedecendo ao mínimo das condições de acessibilidade, se unirem ao Ministério Público e a Prefeitura e interditar a obra; E o CREA estar ali presente dando aval e mostrando que o engenheiro ou arquiteto responsável, deixou de cumprir as normas. Esse era o esclarecimento que eu gostaria de deixar nesse Evento.

Maria AméliaRio Grande do Sul

Nós da Câmara de Arquitetura do Rio Grande do Sul, estamos tentando colocar dentro dos cinco itens básicos da ART, que são estrutura, hidráulicos, elétricos, projeto arquitetônico, colocar mais um item que é acessibilidade, e exigir em todas as ARTs dos arquitetos.

Gilmar Borges RabeloUberlândia

Talvez eu não tenha me feito entender. Quando eu me referi a fiscalização do CREA não é em cima do projeto. É em cima da ART, porque quando você deixa de anotar alguma coisa na ART, o CREA logo detecta e te manda uma cartinha dizendo que está errada. Esse é um erro de preenchimento das anotações. Eu me referi a isso. Não é a questão de estar fiscalizando a obra, porque eu concordo com você, isso é responsabilidade do órgão fiscalizador da prefeitura. Essa é a questão.

Conselheiro do CONADE

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Eu quero agradecer a todos que contribuíram conosco nessa tarde; Foi maravilhoso; Cem por cento das pessoas presentes participaram do nosso Painel; Agradeço a cada um que contribuiu com sua experiência em sua cidade e com sua experiência como profissional, e quero contar com o que vocês estão levando dessa Conferência para sua cidade, para sua vida profissional, para sua atuação, e agora usando o meu papel de educador enquanto professores, educadores e multiplicadores dessa experiência. Eu acredito muito que somente o ensinamento, a educação pode transformar essa realidade; Quero lembrar que todas normas da ABNT, que estamos conhecendo, estão disponíveis no site da CORDE, www.sedh.gov.br/corde, vocês podem baixar tudo gratuitamente para usar como ferramenta e trabalhar no seu estado. Quero dizer ainda, que como Conselheiro do CONADE, é muito gratificante poder contar com contribuições nessa linha. Porque eu sou uma das pessoas que veio para o CONADE com o objetivo de inserir o Tema Acessibilidade, e graças a Deus estamos tendo a nossa conferência sobre esse tema. Como coordenador dessa mesa indicado pelo CONADE, agradeço imensamente a todos vocês. Muito obrigado.

4.10 Tema: Ministério das Cidades – Brasil Acessível

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

Nós estamos aqui com o Roberto Moreira que é o Engenheiro do Departamento de Mobilidade da Secretaria Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana. É um prazer estar na Primeira Conferência Nacional da Pessoa com Deficiência, e principalmente com o tema de acessibilidade. O governo federal junto com a CORDE, através do Ministério das Cidades tenta implantar no espaço da cidade a questão da acessibilidade. Quando do surgimento do Ministério das Cidades, a Secretaria de Transporte e Mobilidade Urbana ficou encarregada em tornar acessível todo o sistema de transporte da cidade. Quando eu falo em sistema de transporte, são as calçadas, os terminais de ônibus, transporte por trem, por barca, por todos os modos de circulação nas cidades. Esse programa, o Programa Nacional de Mobilidade Urbana, chamado de Brasil Acessível, nasceu da Primeira Conferência das Cidades. Eu não sei se vocês conhecem a história do Ministério das Cidades, mas, ele nasceu em 2003. E a partir desta data, é que o governo federal retoma a discussão do transporte nas cidades. Então, eu gostaria de apresentar para vocês, como se fosse uma prestação de contas, como o governo federal está construindo esse programa. Vocês podem eventualmente me interromper, porque já que nós estamos com um número reduzido de pessoas, a gente poderia fazer uma Mesa Redonda efetivamente. Eu gostaria antes de pedir ajuda da apresentação. Têm pessoas com deficiência visual. Eu tenho vários exemplares do folder em braile, pois tenho aqui vários exemplares, e gostaria de saber quem quer em braile? Essa primeira projeção mostra o organograma do Ministério das Cidades onde as quatro secretarias, a Secretaria Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana, Secretaria da Habitação, Secretaria Nacional de Saneamento e a Secretaria Nacional de Programas Urbanos. Porque nós estamos mostrando essa organização da gestão da cidade? Porque o tema acessibilidade está implícito em todas as ações, em todas as obras que o governo federal apóia ao município. Ele exige que tenha a condicionante na acessibilidade, seja na elaboração de um plano diretor, através da acessória da Secretaria Nacional de Programas Urbanos, e nesse ano de 2006, até outubro as Câmaras Municipais deverão aprovar o plano diretor. Aquele município que tem acima de 20.000 habitantes, ou fazem parte de região metropolitana. Então, esse é um evento importante porque vocês vão nos ajudar junto ao município que o plano diretor tenha o capítulo da acessibilidade. O Ministério das Cidades não consegue nos mais de 2000 municípios que deverão estar com o plano diretor, fazê-lo até outubro. Então, a gente precisa que vocês nos ajudem, a perceber se o executivo se pôs no instrumento do Plano Diretor algum item que fale da acessibilidade, principalmente no sistema de transporte.

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Aqui, eu estou mostrando a estrutura do Conselho da Cidade, que é um órgão colegiado. Ele se assemelha à estrutura da Conferência da Pessoa com Deficiência, e tem a finalidade de assessorar o Ministério das Cidades nessa questão. Essa apresentação nós montamos na Conferência, mas, é lógico que agora nós vamos ter que incorporar as decisões da Conferencia Nacional da Pessoa com Deficiência, para também ser um mecanismo que a gente assimile o que está sendo discutido hoje aqui. Vocês têm essa incumbência de nos ajudar a fazer uma reflexão do que nós vamos abordar aqui. É importante a gente fazer uma reflexão sobre o porque que as cidades têm essa dificuldade de mobilidade, essa dificuldade de implantar políticas públicas. De 1940 para 2003, por exemplo, houve uma urbanização muito intensa. Em 1940 nós tínhamos 31% da população morando na cidade, em 2003 nós tínhamos 82% da população morando na cidade. Em que cidade? A cidade foi desenhada para os meios motorizados, quer dizer, o primeiro risco que se traça da cidade normal, é riscar a rua, e a rua para automóveis. O que nós estamos propondo, numa discussão com vocês, é mudar essa visão. A cidade também tem que ser desenhada para o andar da cidade, para as pessoas. Então, é uma nova visão. Fazer também um contra-ponto com a cidade existente, na medida que quanto mais espaços a gente dar para o sistema viário, mais automóvel tem, mais poluição, mais acidentes, e por fim, mais pessoas com deficiência. Então, esse é o modelo que nós estamos tentando produzir nos novos planos diretores, num processo de pensar a cidade, num processo de adequar a cidade, ter uma prevalência no espaço da calçada, no gesto de andar. Então, a Secretaria de Mobilidade Urbana se sustenta em quatro premissas principais, finalizando onde seja esse objetivo maior, que essa mobilidade sustentável construa cidades sustentáveis. Principalmente nas regiões metropolitanas, com certeza, da maneira com que elas estão caminhando tornarão insustentáveis em curto prazo, sustentáveis na qualidade, insustentáveis na poluição, na agressão ao meio ambiente e o mais importante, na agressão às pessoas. O primeiro pilar que sustenta esse conceito é o processo de planejamento, rever a questão das atividades urbanas, os usos dos solos, como o plano diretor entende esse andar das pessoas, esse novo andar acessível. Um outro pilar é a melhoria do transporte coletivo. O transporte coletivo tem que ser prioridade principalmente no orçamento municipal, o que vai ser investido no sistema viário, tem que ser pensado prioritariamente no transporte coletivo. A promoção da circulação dos meios não motorizados, quando falamos dos meios não-motorizados nós estamos falando do andar das pessoas, do andar na calçada de forma autônoma e acessível, e também no sistema de uso da bicicleta como um sistema de transporte. Então, a bicicleta faz parte também desse aporte de recursos que o Ministério das Cidades está dando para os municípios. A gente vai melhorar o transporte quando houver essa interação, da pessoa que sai da sua casa, tem acesso a uma calçada, a calçada com um ponto de ônibus, sendo esse trajeto de forma autônoma. Ou se ele tem a opção de andar de bicicleta, que ele faça isso também com segurança. Enfim, o uso mais racional ao automóvel. Essa está sendo uma premissa importante que o Ministério das Cidades está pautando. Agora a gente apresenta o que está por traz de todo esse conceito da mobilidade saudável. Quer dizer, é incluir o processo do desenvolvimento urbano, através de instrumentos legais para que a gente consiga implantar, por exemplo, a acessibilidade. O respeito ao meio ambiente na melhoria da poluição do ar, sonora, e o mais importante, que é o viés da inclusão social, que é proporcionar a todas as pessoas poderem escolher o que é essa mobilidade ideal dependendo da sua situação social.

Então, o Ministério das Cidades, através da Secretaria, amplia demais o espectro do que antes era um desafio primeiro pautado no transporte, no sistema regulamentar de ônibus ou de metrô. Quando a gente inclui o programa de acessibilidade, nós estamos incluindo os 5560 municípios do Brasil, porque em todas as cidades do Brasil a mobilidade tem que ter acessibilidade. Então, nas grandes metrópoles, nas regiões metropolitanas, por exemplo, 44% das pessoas se locomovem a pé. Então, se nós pegarmos 44% e mais as pessoas que usufruem transporte público, que são 29%, nós estamos com 70% desse desfio da Secretaria junto com os municípios, de tornar essa mobilidade urbana acessível. Nós temos que tentar tornar 100% das calçadas e mais 100% do transporte público. Nós temos os outros modais, 195 de automóveis, 7% de bicicleta e 1% de motocicleta. Aí nós mostramos o perfil da mobilidade. É uma comparação da dimensão da cidade e através da dimensão o modal de deslocamento das pessoas, por exemplo, em cidades de 100.000 habitantes, a maioria do deslocamento se dá através dos meios não-motorizados. Nas cidades acima de 1.000.000 de habitantes, predominam as viagens motorizadas, de forma significativa, mas, os meios não-motorizados também atingem valores bem significativos. Qual é o grande problema dessa evolução das cidades que tem mais de 1.000.000 de habitantes? É Porque os

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custos para nós tornarmos esse sistema viário para meios motorizados são altíssimos. São altíssimos na questão financeira, mas, também é muito alto na questão ambiental. Então, nós temos que realmente dar prioridade ao transporte coletivo. Nós estamos apresentando agora um exemplo de várias capitais do Brasil e o espaço que o transporte individual ocupa em relação ao sistema viário e a relação desse espaço com o transporte de ônibus e com o transporte individual. A Cidade de Brasília tem grande investimento nesse espaço viário de transporte individual, que em relação às capitais apresentadas é cidade que mais privilegia o transporte individual, mas, ocupa um espaço insignificante no transporte coletivo. Por outro lado nós temos Porto Alegre, que na área ocupada por transporte coletivo é mais próxima em relação ao transporte individual. O que eu quero comentar com relação a isso é que o Ministério das Cidades tenta inverter esse processo ou pelo menos ser mais equânime no investimento do espaço priorizando o transporte coletivo. Quando eu estou falando de transporte coletivo, vocês entendam como transporte acessível, vocês entendam a calçada acessível, e terminal de ônibus, o terminal de metrô acessível. Como que o Ministério das Cidades vai divulgar essa linguagem que foi retirada da Conferência das Cidades? Vai divulgar através de um guia de elaboração de planos diretores. Nós vamos divulgar para o município que queira implantar um plano específico de mobilidade ou que queiram incluir no plano diretor municipal, para que eles possam ter um capítulo que fale de todo esse conceito de mobilidade acessível. Então, esse guia vai estar sendo disponibilizado pelo município a partir de agosto de 2006.

Agora eu vou entrar no Programa Brasil Acessível, que foi lançado em 02 de julho de 2004, respondendo a uma solicitação da Conferência das Cidades. Então, ele privilegia os espaços para aos meios não-motorizados, o andar da cidade, privilegiando ciclovias, calçadas, travessias de pedestres, além da iluminação, paisagismo, iluminação das barreiras arquitetônicas, em resumo, melhorando o andar dos 44% das cidades do Brasil.

Especificamente às pessoas com mobilidade reduzida, uma criança, um idoso, deficientes físicos, deficientes visuais, fazendo adequações necessárias, com ajuda técnica e propondo uma revisão das legislações municipais. A visão de acessibilidade no sistema de transporte é a facilidade que cada um de nós pode ter no sistema de transporte. Essa facilidade vai desde acessar uma linha de ônibus até a questão da tarifa, porque muita gente não tem acessibilidade porque não tem recurso financeiro para pagar uma passagem. Se não tem o recurso financeiro, temos que questionar esse valor, e se não temos como questionar, como uma calçada pode ser acessível ou ir de bicicleta, para resolver a sua mobilidade. Então, essa política é construída desde a não construção de barreiras. Quando nós vamos fazer uma interferência no espaço público, só o fato de não construir barreiras melhora muito a acessibilidade. Então, vai desde a iluminação das barreiras arquitetônicas, até políticas de inclusão social propriamente dita, política de acessibilidade.

Todo mundo pensa que esse é um desafio muito grande, mas, não é, nós temos duas ações a serem feitas, a de adequar entendendo as dificuldades de cada município, as calçadas que são usadas mais constantemente para as pessoas com deficiência, e em reformas ou na construção de novas vias e condomínios habitacionais, construir conforme a NBR 9050, conforme as leis que nós temos. Isso tem que estar permeado em todos os setores do município; seja no departamento de trânsito, de obras ou em todos profissionais que constroem as cidades. Então, o grande diferencial que a Secretaria está construindo é que a mobilidade tem que dar atenção às pessoas, e não aos veículos. Primeiro, nós temos que saber se com todo esse investimento que estamos fazendo nas cidades, estamos atendendo todas as pessoas, independente se essa pessoa tem condições somente de andar a pé, de ônibus, de bicicleta, ou se realmente ela precisa de um transporte específico. Em resumo, independente dos meios existentes hoje nós temos que dar equidade nessa mobilidade valorizando as pessoas, principalmente as pessoas que têm dificuldade de mobilidade. A justificativa vocês conhecem. Nós temos 26.000.000 de pessoas com deficiência no Brasil, somando-se a isso, em 2025 a população de idosos vai chegar a 15% da população. Então, juntando os 26.000.000 de pessoas com mais os 15% da população nós vamos ter quase 70% da população do Brasil tendo que se adequar nessa questão da mobilidade. Então, esse é um desafio muito grande, sem contar que mesmo quem adora fazer essa mobilidade somente por transporte individual, em algum momento ele é pedestre também. Então, nós temos no mínimo 176.000.000 de pedestres. A gente tem que tornar esse espaço seguro, onde a travessia de uma avenida tenha seu tempo de semáforo, para que a gente possa fazer essa travessia de forma segura. Contando também que essas políticas de inclusão

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têm que ser aproveitadas principalmente nesse ano de 2006 onde nós temos a instancia da discussão do plano diretor, que é a discussão da constituição municipal. O Estatuto da Cidade dá tanto instrumento interessante para o município fazer os seus planos diretores. Nesse ano de 2006 nós teremos a Conferência da Pessoa com deficiência acontecendo alguns meses antes para que em outubro de 2006, os vereadores possam estar votando instrumentos que facilitem essa acessibilidade. Além do plano diretor nós temos que cumprir o Decreto Nº 5.296 de 2004, que é um Decreto que regulamenta as Leis Nº 10.048 e Nº 10.098 preconizando uma série de obrigações e datas para que o governo municipal, estadual e federal, implante efetivamente esse decreto. Só para vocês terem uma idéia, o desafio do Ministério das Cidades é capacitar os professores das faculdades de engenharia e arquitetura a ensinar como introduzir essa matéria de não construir barreiras na cidade, tornando os espaços acessíveis. Então, é o desafio do governo federal fazer isso em todas escolas de engenharia e arquitetura do Brasil, como também, a implantação dos planos diretores.

Como se inicia um processo de acessibilidade? Instituindo uma entidade de pessoas com deficiência e gestores públicos com o objetivo de definir rotas. Quais são aquelas ruas, aquelas calçadas que merecem uma interferência efetiva? Tem um cruzamento que é complicado para um deficiente físico, para um deficiente visual. Como solucionar isso? Através das pessoas com deficiência esse gestor pode determinar rotas acessíveis entendendo todas as dificuldades do espaço urbano, do espaço construído e eliminando barreiras, trabalhando tanto o espaço das ruas, das praças como os das edificações, e principalmente, como é o caso da Secretaria de Transporte, o transporte público. Como nós vamos adaptar os ônibus existentes e como o Ministério vai junto aos fabricantes de ônibus produzir ônibus acessíveis, com comunicação e com sinalização adequada. Foi por isso que na Conferência das Cidades elegeu a existência no Ministério das Cidades um programa específico, que tem como primeiro desafio sensibilizar os prefeitos, sensibilizar os vereadores, sensibilizar todos os que interferem na construção das cidades pela questão da acessibilidade. Desenvolver parcerias com município, estado e união. Elaborar políticas de planejamento. Adequar os ambientes. Dar prioridade ao tema da acessibilidade no sistema de transporte. Desenvolver tecnologias adequadas aos meios de mobilidade das cidades. Aperfeiçoar e aplicar as legislações no tema da acessibilidade com o conceito do desenho universal. Quer dizer, não vai mais existir algumas linhas acessíveis, alguns veículos acessíveis que passem uma ver por dia numa determinada linha, o conceito é desenvolver 100% dos veículos que ajudam na mobilidade da cidade, onde esses veículos tenham um desenho universal, onde a gestante, o idoso, o deficiente visual, consigam acessar qualquer modalidade de transporte de forma autônoma.

Participante não identificado

O elevador hoje é obsoleto, porque o elevador contempla apenas o deficiente cadeirante. Então, poderia ficar feliz porque está contemplando o meu filho, mas, não é apenas isso, o ônibus adaptado, rebaixado ou em forma de plataforma atende ao idoso, a gestante, o obeso, o velho, o acidentado. O ônibus adaptado hoje já é obsoleto. É só isso que eu queria colocar.

É importante. Porque o Ministério das Cidades faz parte do grupo que está desenvolvendo a norma dos veículos novos, e nós estamos batendo na tecla de que o acesso é em nível.

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

O Ministério das Cidades constrói isso através da capacitação de gestores públicos, por exemplo, capacitar a indústria que produz os ônibus para que ela entenda esse conceito, e depois, a eliminação de barreiras arquitetônicas, instituir o sistema de transporte acessível. Enfim, as demais abordagens nós falamos no slide anterior.

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Você imagina um caixote, e tem a calçada, eu sei que calçada aqui em Brasília é terrível, mas, o ônibus tem uma escada aqui e outra ali, então, quando essa parte encostar fica na altura do meio fio, e a outra é a plataforma, que em vez de rebaixar o ônibus, faz o ônibus numa altura. Igual o trem, então, você já entra direto, o motorista só tem que encostar o ônibus na plataforma. Justamente, aí é onde está o plano diretor.

O que o Ministério das Cidades faz é também capacitar a fazer calçadas e ponto de ônibus acessíveis. Quando nós estamos falando de ponto de ônibus acessível, é num patamar mais elevado da calçada com uma rampa adequando esse ponto ao ônibus. Então, tudo isso está sendo desenvolvido junto com as indústrias, com as prefeituras, porque quando nós estamos falando de sistema de transporte acessível nós não estamos falando só do veículo, nós estamos falando do ponto de ônibus, da calçada que chega ao ponto. Por isso a senhora deu o exemplo de que o ponto mais requisitado é o ponto onde a calçada é acessível. Então, vamos adiantar um pouco para vocês entenderem todo esse desafio. Então, um desafio importante que vocês vão obter a partir de agosto, que são novas publicações do Programa Brasil Acessível onde nós estamos ensinando aos gestores públicos a discutir com a sociedade como construir cidades acessíveis através de seminários, edições de normas municipais, fomento à pesquisa, pesquisar tecnologias alternativas, implantação de um banco de dados, enfim, o fomento a programas municipais de acessibilidade. O Ministério só passa dinheiro para o município se o município tiver algum instrumento permanente de acessibilidade na sua cidade. A criação de novas fontes de financiamento e edição da divulgação das boas práticas de acessibilidade. Aquele município que tem um projeto significativo na área de acessibilidade o Ministério vai estar divulgando para os demais municípios.

Participante não identificado

As prefeituras que vivem de FM tem uma capacidade muito pequena de endividamento e muitas delas também têm problemas de inadimplência, como o Ministério está vendo a situação dessas prefeituras visto que elas também teriam que fazer toda essa adequação com um baixo potencial, com uma baixa capacidade de endividamento e essa inadimplência em relação à firmação de convênio?

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

Eu gostaria de responder a sua pergunta no quadro que eu ou falar sobre financiamento, pode ser?

Então, antes da gente falar sobre financiamento o que a gente precisa fazer na sua cidade? Em primeiro lugar, capacitar o público, entender a necessidade da cidade, saber realmente se esse gestor está sabendo fazer a calçada acessível. Por isso que as publicações vão ser feitas em agosto. A nossa sugestão é que vocês comecem a pedir para os vereadores comecem a colocar instrumentos, se possível, no plano diretor ou ter uma lei no código de obras, por exemplo. Então, eu acho importante esse detalhe de capacitação e de ter instrumentos municipais. Quais são eles? O Plano Diretor Municipal ou o Plano de Mobilidade Urbana. Tudo isso, respondendo à questão ambiental através de uma agenda 21, por exemplo. O processo da Conferência das Cidades, a aplicação do Decreto Nº 5.296, a revisão de uma lei de parcelamento do solo, que é a Lei Nº 6.766, orientam aquele investidor que quer construir novos loteamentos. Como o novo loteamento habitacional vai ser acessível? A Revisão da lei federal já está incluindo as questões de acessibilidade. Naquele município que é tombado pelo Patrimônio histórico, por exemplo, o centro de Olinda, Salvador, ou aquelas cidades mineiras, São Luís do Maranhão, onde aquele gestor fala que a gente não pode alterar o espaço, o IFAN orienta como tornar acessível um museu, uma avenida. Então, é importante que o aporte de recurso no município se dê com a

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contribuição, com uma contra-partida, que é o município ter uma lei que vai garantir que aquele dinheiro que o governo federal vai aplicar vai ser em acessibilidade.

Então, o repasse de dinheiro se dá da seguinte forma: é uma adesão do município de que ele vai implantar programas efetivos de acessibilidade; capacitar aquele gestor na medida que o município descreveu que ele vai aplicar programas de acessibilidade, o Ministério das Cidades vai capacitar esse gestor para instrumentalizar a ele aplicar o Decreto Nº 5.296; ajudar no detalhamento desse projeto, no detalhamento de um sistema de transporte acessível, o Ministério das Cidades já tem uma linha de financiamento para isso. Essa capacitação se dá através de capacitação presencial e de publicações. Por exemplo, a primeira publicação no sistema de transporte coletivo é o atendimento às pessoas com deficiência, como um motorista ou um cobrador de ônibus deve lhe dar com uma pessoa com deficiência. Nós já estamos com um convênio com o Sistema SEST/ SENAT que está capacitando mais de 140.000 profissionais, motoristas e cobradores, a lhe darem com acessibilidade. Não é só no sistema de Ônibus, mas, isso também acontece no sistema de trem, metrôs, etc. Outra publicação é o caderno 2, que fala como construir uma cidade acessível. Como uma secretaria de obras entende que aquela calçada é acessível? Nós vamos iluminar essa calçada, nós vamos plantar árvores de forma que não atrapalhe a calçada, toda as coisas que atrapalha a calçada está nesse caderno, orientando os engenheiros, os arquitetos, os diretores de departamento de trânsito. Esse caderno também vai ser lançado em agosto. Dê uma maneira preliminar, esse caderno está com um CD. Tem fotografias de coisas erradas, de como se tem que fazer. A gente até gostaria de comentários. Quando vocês voltarem se os municípios tiverem alguma solicitação de contribuição ou crítica, também tem o site para a gente receber e publicar de forma adequada. Eu gostaria também de falar que nós temos um fórum de discussão, todos esses cadernos que nós vamos lançar em agosto estão sendo discutidos no Fórum do Brasil Acessível.

GenilsonMaranhão

Eu perguntava para a nossa amiga Simone se esse material tinha a correspondência, então, está claro. O CD fala de dois cadernos que serão lançados no futuro, junto com mais quatro? Esse Brasil Acessível é o começo do programa, é a expressão do programa geral?

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

Isso é o resumo e como o Programa está sendo construído.

GenilsonMaranhão

Nós discutimos no município essa questão de como ir até as empresas, porque já tivemos antes, enquanto entidades. Nós temos a experiência do fórum das entidades de pessoas com deficiência e patologias. Então, com a boa vontade, porque não tínhamos o conjunto das orientações, sobretudo, das orientações técnicas, só com base na NBR 14020, conversamos nas empresas, quer dizer, nós estávamos fazendo um papel de governo enquanto movimento, fazer isso para sensibilizar, porque nós vimos que as multas que eram, às vezes, registradas tinham que ser em nome das empresas e não do cobrador ou do motorista, não iam resolver, porque são taxas mínimas, são irrisórias, então, eles preferem pagar a enfrentar dificuldade no Ministério Público. Então, paga a multa, está resolvido, humilha de novo, faz de novo, desrespeita. Nós tivemos até exemplos de atropelamento de companheiros cadeirantes. Isso foi um aparte, nós agora já temos conselho municipal e estadual. Eu pergunto: tem uma orientação do ministério

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na composição, dependendo do nome, em São Luís a prefeitura disse que criaria um comitê técnico de acessibilidade, nesse comitê na pratica vão estar profissionais, porque entram vocês na capacitação dos municípios, e óbvio, o comitê tem que ter a sociedade civil, a gente tem que estar representado, e a liderança no sentido de encaminhar a questão no sentido da solicitação política, eu queria saber se já tem algo regulamentado? Porque já foi divulgado, não está implementado. Nós tivemos uma audiência na Câmara Municipal de São Luís, o Secretário de Transporte chegou a nos convidar para compor uma equipe, que seria uma espécie de comissão de acompanhamento do transporte.

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

Eu vou dar um preâmbulo importante para um caso como esse. São Luís do Maranhão é uma cidade importantíssima como patrimônio, como capital, como uma região metropolitana, então, o que nós cidadãos comuns dessa cidade teremos que fazer? Fazer valer o Estatuto da Cidade. O que o Estatuto da Cidade fala? Que o órgão gestor tem que respeitar uma plenária, tem que fazer audiência pública, e tem que fazer valer essa instância. Então, por exemplo, se São Luís do Maranhão tem um conselho de cidade, um conselho municipal de urbanismo, ou um conselho das pessoas com deficiência, o gestor público tem que fazer cumprir o que está no estatuto da cidade. O Estatuto da Cidade é uma lei aprovada, vocês têm todo o direito de cobrar. O Caderno 4, que é a implantação de política municipal de acessibilidade trata exatamente desse objetivo que você está me perguntando, de como o governo federal vai orientar a sociedade a se organizar e solicitar uma implantação permanente de acessibilidade no município, ou através de uma comissão permanente de acessibilidade, ou através de um conselho. Isso vai estar sendo colocado. Nós estamos chamando vários consultores que já implantaram em várias cidades e estão escrevendo esse caderno que entre agosto e setembro vai estar no site do ministério, essa orientação. Vários municípios estão ligando com o mesmo problema, como que a empresa de transporte urbano vai aplicar o Decreto Nº 5.296 ou como o prefeito vai enfrentar essa discussão na cidade, principalmente São Luís que tem toda essa questão histórica, essa questão da topografia, e assim por diante.

Outro caderno importante é o governo federal mostrar essa rede de acessibilidade que nós estamos falando, o que é, eu cidadão da cidade sair da minha casa e ter uma calçada acessível, eu ir num ponto de ônibus, eu tendo uma deficiência auditiva, visual ou física, e conseguir acessar o ponto de ônibus. Então são maneiras de adequação dos vários sistemas de transporte e acessibilidade. Por fim, o Caderno 6, que é o nosso desafio desse ano de 2006, o último caderno é a divulgação das boas práticas de acessibilidade em todas as cidades do Brasil. Eu estou lançando aqui um desafio para vocês, que já está no site do Ministério, um chamamento de bons projetos de acessibilidade. Se vocês têm um contato com os administradores municipais, peçam a eles que enviem para o Ministério das Cidades o formulário que está no site.

Participante não identificado

Eu gostaria de saber que procedimento deve ter o conselho, eu represento o Conselho em Pelotas, mas, como a gente poderia proceder nessa questão histórica? Uma outra pergunta seria assim: esse Brasil Acessível parte também daqui da Conferência por tudo que a gente já angariou aqui em termos de colaboração?

Augusto Valiengo ValeriMinistério das Cidades

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Com certeza. Com relação à participação do Ministério das Cidades, o Ministério das Cidades faz parte do CONADE, que está organizando esse evento. Nós temos que responder as moções que vocês estão falando e iremos apresentar também o que está sendo feito aqui na Conferência das Cidades, porque os delegados da Conferência das Cidades também são parceiros dessa questão. Com relação a esse Programa Monumenta, o Programa Monumenta também atua no espaço urbano. Por que isso? Porque o Ministério das Cidades, através da Secretaria de Mobilidade Urbana, atua em tudo o que se refere ao viário, ao espaço urbano, ela não atua no edifício, mas, nós somos parceiros do Programa Monumenta para dar acessibilidade a esse móvel. Então, por exemplo, em várias capitais onde o Programa Monumenta já está com projetos detalhados, isso está sendo revisto, readequado, a esse conceito de acessibilidade, como por exemplo, nas calçadas do entorno ou naquele sítio tombado. Então, existe um aporte de recurso no Programa Monumenta que nós pegamos carona, nós do Programa Brasil Acessível. Só no espaço físico, porque no Programa Monumenta já tem que aplicar a Norma 9050, que é qualquer reforma de um edifício de uso público tem que ser adequado. Se nós aplicarmos o Decreto Nº 5.296 e mais a NBR 9050, qualquer chefe de prefeitura tem que assinar uma IT dizendo que ele vai fazer naquela obra a adequação da acessibilidade no edifício. No espaço público, o Ministério das Cidades tem que orientar caso o município não tenha orientação técnica ou até precise de um aporte de recurso para financiar um projeto específico, nós temos essa rubrica para apoiar. Mas, o Projeto Monumenta também aplica no espaço da mobilidade. Público ou Privado.

Outra forma de repasse de dinheiro é através de financiamento. Nós temos uma linha que é chamado Pró-Transporte, que é através do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Outra linha de financiamento é o chamado Pró-Mobi, que é o Apoio à Infra-estrutura de Mobilidade, no qual o Gerente Coordenador é o Roberto Moreira, caso vocês queiram ter mais detalhes sobre o Pró- Mobi, o Roberto pode nos esclarecer. Por fim, os projetos vinculados a outros programas, como por exemplo, o Programa Monumenta, que nós falamos aqui. Quando o Ministério da Cultura, que é gestor do Programa Monumenta, ele tem que aplicar acessibilidade em todos os espaços, seja espaço do edifício ou o espaço público. Então, o nosso Programa dialoga com o Programa Monumenta como exemplo. Essa é a minha última fala, são outras ações que nós estamos trabalhando, que é como implantar a divulgação de mobilidade no município. Nós estamos tentando ver se a gente consegue apresentar ainda nesse segundo semestre um projeto de lei da mobilidade urbana, porque em pleno ano de 2006 o governo federal não tem uma política aprovada de qual é esse conceito de mobilidade acessível que está sendo construído. Então, nós temos um projeto de lei sendo discutido com a sociedade e talvez no segundo semestre, se o Congresso Nacional estiver funcionando adequadamente, para votar. Os dois outros programas que eu comentei, o próprio Programa Brasil acessível, o Programa de Mobilidade por Bicicleta e as novas linhas de financiamentos, retiradas dos planos diretores municipais. O Estatuto da Cidade propicia várias leis, várias legislações que transferem recursos da iniciativa privada para os espaços públicos. Era esse o recado que eu gostaria de dar a vocês para iniciar uma discussão saudável. Aí está o endereço do Ministério das Cidades, www.cidades.gov.br , onde a gente pode receber as contribuições, para quando vocês chegarem no município puderem dialogar com o Ministério das Cidades. Muito obrigado.

4.11 Tecnologia Assistiva e a Construção de uma Política Pública

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: O objetivo da gente aqui é discutir alguns pontos importantes sobre essa questão de tecnologia. Para quem não me conhece, meu nome é Antonio Borges e desde 1993 eu venho trabalhando num projeto que tem tido um sucesso muito grande no Brasil, o Projeto DOSVOX. E o que eu quis trazer para vocês agora não foi só informação sobre tecnologia, mas como todos vocês são pessoas altamente ligadas com essa questão da gestão das instituições e tudo mais, eu queria discutir como é que a gente faz para que a tecnologia avance, saia do gueto e atinja o maior número de pessoas.

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Quem é o gueto da tecnologia? É incrível dizer, mas o gueto da tecnologia não são os pobres não. O gueto da tecnologia são os deficientes visuais mais aquinhoados. O cara que é mais rico tem acesso, o cara que é mais pobre não tem, não é verdade? Então, se formou um gueto ao contrário. As pessoas que têm maior poder, elas têm acesso à tecnologia e as pessoas que são mais humildes não têm.

Então, vamos começar a chamar as pessoas aqui para que as pessoas digam como é na sua cidade. Vamos pensar em três questões que são muito importantes: (1) Os políticos da sua cidade sabem alguma coisa sobre essa questão? (2) Os professores da sua cidade sabem alguma coisa sobre essa questão? (3) As instituições e as associações da sua cidade fazem alguma coisa pela tecnologia? Vamos começar por você.

Ronaldo Tavares da Silva “ Rio Grande do Norte: Primeiro, eu quero dar boa noite aos colegas e dizer ao Professor Antonio Borges da minha admiração pessoal por ele, pela sua gentileza, presteza e, acima de tudo, pela sua atenção com as pessoas com deficiência. Eu sou Ronaldo Tavares da Silva e presido a Sociedade dos Cegos do Rio Grande do Norte e o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e também sou Vice-Presidente da Região Nordeste da Federação Brasileira de Cegos. O Projeto DOSVOX, além de ser um projeto excelente é gratuito e de fácil acesso.

Os políticos da minha cidade têm tomado conhecimento do projeto DOSVOX, pois realizamos audiências públicas e informamos sobre a importância do projeto. Então os políticos têm tomado conhecimento e a própria mídia porque nós temos a preocupação de esclarecer e de mostrar que as pessoas cegas interagem normalmente no microcomputador.

Com os professores, quando realizamos cursos de capacitação em Braille e outros, nós sempre enfocamos e ressaltamos a necessidade do profissional estar preparado para lidar com as pessoas com deficiência, inclusive, no que se refere à questão da informática.

O que a Sociedade de Cegos tem feito? Montou um laboratório com o Programa DOSVOX instalado em 8 microcomputadores, fruto de uma parceria com o Banco do Brasil através do Telecentro, além de outras iniciativas com organizações internacionais, visando levar a informática aos recantos do Rio Grande do Norte. Então, esse trabalho tem sido feito. Esse não é um discurso para inglês ver ou para fazer propaganda sobre o nosso estado. Isso tem realmente ocorrido. Quando nós criamos a Sociedade dos Cegos foi para mostrar a necessidade de se qualificar as pessoas na informática e volto a frisar que, para nós, o DOSVOX é fundamental, importantíssimo e indispensável. Até sugiro ao professor que deveríamos criar a Associação de Usuários de DOSVOX para dar uma maior visibilidade ao projeto, inclusive, na captação de recursos porque a gente sabe que tudo se faz com recursos. Existem investimentos que precisam ser feitos e essa associação teria como exigir do poder público a disponibilização de recursos para que a gente pudesse expandir esse atendimento às pessoas.

Quero agradecer a atenção. Professor Antonio Borges, muito obrigado pela sua atenção de sempre.

Antonio Borges “ Coordenador do Projeto DOSVOX: Fico feliz em saber que no Rio Grande do Norte a coisa está caminhando, mas existem lugares onde a coisa não está caminhando. Eu queria que alguém falasse de um lugar onde a coisa não está caminhando para a gente poder fazer um contraponto.

Então nós estamos falando que os políticos conhecem essa tecnologia. É claro que ele puxou a brasa para a sardinha dele, falou de cegos, mas a gente vai depois dizer que nem tudo em Natal é tão bom. Talvez os cegos sejam privilegiados porque têm uma associação atuante etc. Mas tem outras áreas onde a coisa não está tão boa não. E na sua cidade?

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Delegada de São Gonçalo, no Rio de Janeiro: Eu sou de São Gonçalo, Estado do Rio de Janeiro. Sou Professora do Curso Normal e Conselheira do Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência.

Com relação aos políticos, eles sabem, mas na maioria das vezes, quando se fala em políticas públicas em São Gonçalo, não se efetiva o saber e se sabem alguma coisa, ela não é efetivada. Agora com relação à educação o que mais me preocupa na rede de ensino do Município de São Gonçalo no que se refere à capacitação de professores para trabalhar principalmente com crianças com deficiência, e mais especificamente, com os alunos cegos, há um número muito reduzido de professores capacitados para isso. O acesso a essa capacitação ainda é menor porque não há professores substitutos. Então, para você fazer um curso de capacitação você tem que ir num horário alternativo porque, com certeza, você está trabalhando para manter a família. Além disso, as vagas não são democratizadas porque ficam na mão dos diretores que, por sua vez, numa gestão autoritária não permitem que todas as pessoas tenham acesso a essa capacitação.

Além disso, não é que as tecnologias não estejam implantadas nas escolas. Por exemplo, na minha escola, existem aproximadamente 60 computadores, mas ninguém tem acesso a eles. Eles ficam trancados sob o discurso da centralização. Eles alegam que existe o Núcleo de Tecnologia Educacional “ NTE e só os sábios amigos dos diretores é que têm acesso a esse curso e podem estar nessa sala do NTE, que é quase inviolável pela população.

Eu tenho um aluno que é cego. Ele está na escola desde o pré-escolar. Essa é uma escola de elite, são umas salas públicas de elite, todo mundo quer estudar lá e esse menino nunca teve acesso a um programa especial para vencer as dificuldades. Ele nunca foi sequer colocado como um aluno deficiente, apesar de toda a briga minha e de outros professores da casa, para que ele fosse colocado, pelo menos no censo, como aluno deficiente. Todos os alunos deficientes das escolas de São Gonçalo são tratados dessa forma. Lá, a inclusão não existe. Essa é uma luta que está sendo enfrentada por alguns professores e pela maioria das pessoas com deficiência que se organizam em algumas instituições. Mas está muito difícil, muito difícil.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Só uma pergunta. Quer dizer que então o prefeito e os políticos de São Gonçalo maqueiam os dados para que dê a impressão aos outros que São Gonçalo é um mar de beleza?

Delegada de São Gonçalo, no Rio de Janeiro: Eu acho que não só os políticos de São Gonçalo, mas do Estado do Rio como um todo. Na minha visão de pedagoga, a implantação dos ciclos foi uma implantação muito boa, no que se refere à prática pedagógica, porque o ciclo torna a prática pedagógica tão pessoal e tão efetiva que a reprovação torna-se desnecessária. Só que, com a implantação do ciclo no papel e nada na prática, o que ficou do ciclo? A aprovação automática. Na verdade, não é nem aprovação automática, o ciclo prevê avaliação continuada, mas concretamente, nós temos alunos aprovados automaticamente. Esse é um grande exemplo de maquiagem, quando você não vê quase reprovação na alfabetização nas escolas estaduais e nem públicas. Da mesma forma que isso é feito no que se refere à seriação, isso é feito em outros aspectos da escola.

Eu não sei quais os documentos que vão para o Estado, quais os documentos que vão para o Governo Federal. Devem ir muito bem feitos, com certeza, porque a gente recebe as verbas e consegue achar, nos banheiros das escolas, os livros de literatura que tinham sido enviados pelo Ministério da Educação porque a direção acha desnecessário entregar aos alunos. Para que é que o pobre vai ler?

Antonio Borges “ Coordenador do Projeto DOSVOX: Então, estamos vendo aqui duas vertentes. Uma vertente positiva, em que uma associação que está antenada com o governo responsável. E temos uma outra situação aqui em São Gonçalo que é muito crítica, em que os professores não estão tendo acesso ao ensino. E como os professores não aprendem, não podem ensinar também.

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Participante não identificado: São Gonçalo é o segundo colégio eleitoral do estado. Na verdade, também foi maquiado para menos na pesquisa do IBGE. Com certeza, a população de São Gonçalo ultrapassa 1 milhão de habitantes. Com desmembramento de algumas cidades no processo de fusão em Nova Iguaçu e em Campos, São Gonçalo passou a ser o segundo colégio eleitoral do estado e são muitas as dificuldades. E não é só na falta do DOSVOX não. Eu sou deficiente e sou cego e sou obrigado a pagar passagem de ônibus em São Gonçalo! É verdade! É por isso que São Gonçalo é terra de Malboro, ou terra de ninguém. Eu sou obrigado a dizer o quê? Que moro, onde não mora ninguém? Porque as empresas de ônibus maquiam os dados, colocando um ônibus de duas portas para 30 ou 40 microônibus. Esses dias, a cidade fez um manifesto grande, político, bonito, para entrega da carteira do passe livre. Mas a carteira do passe livre só dá direito a ônibus de duas portas e, como ele não existe, não adianta.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Agora, eu queria fechar com três depoimentos porque a gente começa a falar em tecnologia e a gente tem a impressão de que o mundo é uma maravilha. Eu quero exatamente que os depoimentos mostrem que a coisa não é uma maravilha. Tem lugares onde a coisa funciona e lugares onde a coisa não funciona. E agora a gente vai poder estabelecer uma discussão em cima de algumas idéias. Vamos ter mais um depoimento e depois eu queria que a gente fechasse por aqui. Alguém quer falar alguma coisa urgente? É só para a gente estabelecer uma discussão mais ou menos organizada. Não quero que aconteça como aconteceu na plenária não. A discussão aqui é uma discussão salutar.

Delegado de Vitória, Espírito Santo: Boa tarde a todos. Eu sou do Espírito Santo, sou de Vitória, onde nós temos hoje uma entidade da qual sou Presidente, que é a União dos Cegos D. Pedro II. Uma das grandes preocupações nossas é trabalhar a questão do deficiente visual e investir nele, de forma que ele consiga entrar no mercado de trabalho. Estou falando daqueles que querem. Agora, aquele que não quer, não tem como a gente buscar em casa e trazer no colo. Para aqueles que querem, nós temos um laboratório com 15 computadores que são apropriados para o sistema DOSVOX. Nós procuramos incentivar para que eles possam entrar na pesquisa também, para que possam ter facilidade à internet na faculdade.

Em Vitória, nós já realizamos o Encontro DOSVOX. Não sei se o Professor Antonio esteve presente. Aquela menina com o cachorro esteve lá e fez uma explanação também. Lá estava também o Douglas que está lutando pela universidade para todos dentro da faculdade. A gente vive, vê e pensa que a coisa é muito fácil, mas quando se fala em inclusão social, quando se fala na questão da demanda, é muito difícil. A nossa entidade tem uma preocupação de atender à região metropolitana que compreende sete cidades. Depois, nós temos 78 municípios que nós atingimos direta ou indiretamente.

Com a Campanha da Fraternidade, as pessoas estão nos procurando cada vez mais. A nossa entidade é uma entidade de porte, em que nós damos qualidade e condições para as pessoas estudarem, praticar esportes e praticar educação.

Eu não estou aqui me exaltando perante as pessoas, mas há pouco tempo nós fizemos um projeto em cima da educação especial e encaminhamos para o Banco Itaú/UNICEF. Nós conseguimos chegar, no Brasil, como uma das 30 melhores instituições do Brasil. Eu estou até escrevendo um livro sobre isso através da TELEFÔNICA. A União dos Cegos vai dar suporte a algumas cidadezinhas maiores, como Cachoeira, Linhares, Colatina. A idéia é criar uma Federação de Cegos lá na região, com escritório no Espírito Santo. Essa é a nossa proposta de luta para poder conseguir avançar mais.

O Professor Antonio já me deu o cartão dele e, assim que eu chegar lá, nós vamos entrar em contato com ele para que ele possa retornar novamente a Vitória para fazer um levantamento dessas cidades e para que possamos implementar o sistema DOSVOX nessas cidades. Eu só queria agradecer a

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todos vocês por nós estarmos juntos, mais uma vez, discutindo a nossa política nossa e não a política dos outros.

Vamos falar dos políticos. Nós temos um deputado, deficiente, cadeirante, que montou um laboratório na Assembléia Legislativa, ao qual o Douglas dá todo o apoio e que também participa do sistema DOSVOX. É isso o que a gente queria dizer. Obrigado a todos.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Vamos ao nosso ultimo depoimento. Isso aqui é uma introdução ao tema e nós estamos apresentando apenas alguns pontos aqui. Estamos chamando a atenção para o papel das instituições. Quando a gente deixa o governo sozinho, muitas vezes, o resultado não é exatamente o melhor. Mas temos também a situação de Vitória, onde o Governo conseguiu alcançar seu objetivo. Mas por que o Governo conseguiu? Porque um cadeirante era Deputado. Então, todos esses são ingredientes que vão palmilhar a nossa discussão. E aqui o último depoimento do Álvaro que é de Cachoeiro do Itapemirim.

Álvaro Luis Duarte Carneiro “ Cachoeiro do Itapemirim: Professor Antonio Borges, queria cumprimentá-lo. Boa noite a todos os colegas deficientes. Eu queria agradecer ao professor Antonio Borges, que elaborou esse Projeto DOSVOX, que acredito que já seja conhecido, acredito, no mundo inteiro. Às vezes, pode até ter alguém que se faça de bobo e diga que não conhece, mas na verdade, quem assiste televisão, até programas de nível internacional, sabe que o DOSVOX foi um alerta para que nós pudéssemos ser úteis a sociedade.

Inclusive, Professor Antonio, em Cachoeiro do Itapemirim, temos 11 computadores adaptados a toda a programação. O Núcleo Tecnológico Educacional “ NTE é uma coisa linda, mas tem um agravante e o Marionaldo e eu temos debatido muito sobre isso. O problema é que o NTE fica no 3º andar, onde ficam os computadores e as pessoas têm que subir três andares de degraus. O problema é que alguns deficientes que usam cadeiras de rodas e há cegos e paraplégicos. Então, eu fui à Câmara Municipal e quando eu apresentei um projeto de elevador em Braille, ele deu uma entrevista na Rede Gazeta do Espírito Santo dizendo que não tinha dinheiro para mudar os elevadores. Eu comecei a brigar, brigar, brigar e fui para a imprensa. Ele ficou com raiva e comprou um elevador novo adaptado. Então, eu disse: “Não era isso o que eu queria não. Eu queria que o senhor aproveitasse o elevador que já tinha aí”. Ele quis dar uma resposta e lucro foi nosso porque ele, com raiva, comprou um elevador novo. Problema dele! Então é isso que nós precisamos. Temos que ter compreensão e debater seriamente. Não é discussão boba não.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Agora a gente vai tentar organizar todos esses depoimentos numa discussão mais centrada e depois a gente vai abrir de novo para as conversas.

O nosso tema é “Tecnologia Assistiva e a construção de uma política pública”. Isso quer dizer que nós estamos antenados com a gente está antenado com o fato de que, se a gente não tiver uma política pública correta, essa coisa de tecnologia não vai dar certo, não vai atingir as pessoas.

Felizmente, eu tenho aqui uma figura na tela do computador que mostra o Jatobá e a Bruna Marquezzini. E essa figura é uma figura muito legal que eu tirei do site da TV Globo. As pessoas deficientes hoje estão deixando de ser invisíveis. Lena é minha mulher. Eu queria que ela falasse como era sair na rua há 30 anos sendo cadeirante. Vem cá, fala aqui. Quando você, cadeirante, saía na rua há 30 anos atrás, o que acontecia?

Lena:Boa noite primeiro. A gente estava conversando exatamente sobre isso. Esses encontros vão e voltam e as solicitações são sempre as mesmas. A coisa não muda, não anda. É claro que tem alguns aspectos em que nós avançamos: a tecnologia veio. Eu fiquei tetraplégica há 30 anos atrás e era muito diferente a forma como a sociedade via na gente. Eu nunca tive muito preconceito comigo mesma

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e sempre enfrentei muita coisa de frente. Quando me tiravam do carro e colocavam na cadeira, as pessoas paravam para olhar e faziam uma rodinha em volta de mim. Hoje, isso já não acontece. Hoje elas até olham, mas não param para ficar deslumbrando essa cena. Alguma coisa mudou.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Em outras palavras, em nosso país, deficiente está deixando de ser ET, quer dizer, deixando de existir. É como se todos os deficientes há 30 anos atrás fossem invisíveis. Estavam todos nas suas casas, não tinha deficiente na rua, deficiente não namorava pessoas que não fossem deficientes, cegos não namoravam cegas. Aí, nascia outra criança cega e era essa propagação. Hoje, a coisa está mudando e uma das causas da coisa estar mudando chama-se tecnologia.

Então vamos começar a falar de tecnologia e ver porque essa tecnologia começou a ser tão importante. Vocês já ouviram falar na Guerra do Vietnã, não ouviram? Então o que aconteceu? Os Estados Unidos perderam a guerra e os soldados americanos voltaram para os Estados Unidos naquela situação bastante precária. Eles foram recebidos e foram jogados nas suas casas – que nem aqui no Brasil – como indigentes. Só que alguns deles eram mais representativos e foram aos jornais: “Olha, eu voltei. Eu fui para a guerra, sou herói e voltei”. Eles começaram a reclamar, fizeram algumas passeatas incríveis na frente da Casa Branca. Se vocês forem à Internet vocês vão ver aquelas fotos incríveis. Eles começaram a pressionar, pressionar, incomodar as pessoas e dizerem que não eram invisíveis: “Eu existo e quero que o governo faça alguma coisa por mim. Eu quero que seja definido aqui nesse país uma política que garanta que eu tenho o direito porque eu fui lá. Eu perdi minha perna, perdi meu olho. Eu quero o meu direito”. E conseguiram. Conseguiram que, naquela época, fosse fabricada a cadeira de rodas motorizada, que a minha mulher está usando, e que lhe permite andar pela rua. Foi inventado o computador que fala, que permite que a pessoa cega possa se comunicar através do computador e arrumar um trabalho ali. Há o telefone para o deficiente auditivo. É claro que todas essas coisas não aconteceram assim de graça não. Houve um investimento muito, muito grande do governo. Olha, foram muitos milhões ou bilhões de dólares injetados na indústria de várias formas:

O primeiro passo foi a isenção de impostos. Se um deficiente quer comprar um determinado bem, ele tem isenção de imposto e pode comprar aquele bem mais barato. A segunda coisa são os incentivos. Se uma empresa quer fazer um desenvolvimento de alguma coisa para o deficiente, ela tem um incentivo. Ela vai ao BNDES dos Estados Unidos, por exemplo, e pede um empréstimo. Eu não sei se isso hoje é assim. Eu sei que era assim nos anos 70 e 80, logo após a guerra.

(Fala fora do microfone)

Participante não identificado: Nos Estados Unidos, eu desconheço se há esse incentivo, mas na Europa ainda é assim. Na Europa, você tem o que seria o BNDES lá e você tem uma isenção para as pessoas com deficiência, não é só para as empresas. No caso das empresas, você tem isenção de impostos e para as pessoas, dentro do que seria o SUS lá, você tem as ajudas técnicas, como órteses, próteses, ajudas técnicas também para AVDs. Você tem a doação total sem nenhum ônus para a pessoa com deficiência.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: E aqui no Brasil como é que é? Como é a vida de uma empresa que resolve criar um produto para deficientes? Se uma empresa resolve criar um produto para deficientes, ela vai ter do governo o mesmo tratamento como se ela estivesse criando, por exemplo, uma cadeira ou um abajur. Não existe nenhuma diferença se uma entidade ou se uma associação resolve investir.

Por exemplo, ontem, eu fiquei escandalizado. Eu estava vendo na Internet junto com a Lena, preços de algumas coisas. Então eu vi o preço de um remédio que ela toma. Nos Estados Unidos esse remédio custa aproximadamente R$ 4,00. O mesmo remédio aqui no Brasil custa R$ 10,00. Então nós somos um povo com uma situação econômica mais precária e, entretanto, pagamos tudo muito mais

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caro. E nós estamos falando em remédios, em cadeiras de rodas, de bens que tornariam a vida da pessoa deficiente mais fácil, ou melhor.

Por um lado, as pessoas deficientes estão deixando de ser invisíveis porque existe todo um entorno. Primeiramente, a influência internacional. Nos Estados Unidos os cadeirantes, e os cegos estão na mídia, são artísticas, então, a gente aqui imita. Nos outros países, existe esse apoio. Mas o deficiente tenta ser um deficiente de primeiro mundo aqui no Brasil e descobre rapidamente que, infelizmente, a coisa aqui tem que ser muito brigada ainda.

Quantos deficientes existem no Brasil? De acordo com uma estatística de 2000, a população brasileira é de 169 milhões e existem 24 milhões de deficientes. Ou seja, 14,5% da nossa população são deficientes. Isso significa que, de cada 10 pessoas, uma é deficiente. E você poderia pensar assim: “Mas onde é que estão esses deficientes?” A grande maioria não tem o mínimo de condições de sair de casa, de freqüentar os lugares.

Participante não identificado: Eu sou padre e a primeira coisa que me assustou muito foi que, na minha igreja, eu não via deficientes. Hoje, eu coordeno a Campanha da Fraternidade no Piauí e uma das nossas preocupações é que foi preciso primeiro o Ministério Público apelar para as rampas, para adaptar as igrejas. O cego não tinha direito a assistir uma missa, o pessoal que era surdo-mudo era muito difícil e o interessante é que, só agora, estamos descobrindo isso. Com relação à inclusão digital, a Arquidiocese está fazendo um projeto de laboratório para inclusão digital de Teresina para pessoas deficientes, porque nós não temos ainda. Então você veja que, na Igreja, onde nós deveríamos estar muito mais sensíveis a essas questões, essa conscientização foi difícil.

Participante não identificado: Eu vou lhe contar um caso de da igreja evangélica. Em particular, eu não sou nem católico e nem evangélico, mas eu conheço muitos católicos e muitos evangélicos. Esse caso me foi contado por um pastor evangélico. Ele é pastor evangélico. Vocês sabem que o pastor evangélico faz muitos cursos no exterior. O padre católico, infelizmente, não tem muito essa mordomia. Esse pastor ficou com uma doença chamada retinose, que vai comendo o olho e não tem cura. É uma situação muito difícil.

(Fala fora do microfone).

Não, não. A bíblia nunca relacionou a interpretação, tanto que Jesus diz: “Levanta-te e vem para o meio”. Isso está em Marcos, 3.3. Quando alguém pergunta quem pecou porque ele nasceu aleijado, cego etc. está escrito na bíblia: “Ninguém pecou. Isso aconteceu para que a Glória de Deus se manifestasse”.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Perfeito. Essa é uma opinião de uma pessoa esclarecida, mas que certamente não era daquele grupo lá.

Participante não identificado: As pessoas ainda hoje escondem as pessoas com deficiência nas suas casas. Em Teresina há muito disso porque ainda acreditam que seja uma questão bíblica, que seja castigo mesmo. Então, nós temos esclarecido muito essa questão.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: É. O ser humano é bio-psico-socio-espiritual. As religiões são só uma forma de ligação com a divindade. Ser uma pessoa com deficiência não implica absolutamente em ser do mal ou do bem. A pessoa vai construindo isso na vivência. Agora realmente, na maioria das vezes, a culpa da exclusão da pessoa com deficiência na história é da humanidade e foi em função das religiões. Eu discordo do padre porque a bíblia tem 65 livros e realmente só Jesus Cristo é que vê a pessoa com deficiência de uma maneira diferente. O Torah vê a pessoa com deficiência como

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se fosse algo realmente demoníaco. Mas nós somos o quê? Somos cidadãos, somos espíritos que estamos em evolução e a experiência da deficiência é só mais uma experiência da vida, mais nada.

E a tecnologia o que é que ela vem fazer com a gente? Ela vem fazer com que a gente mostre o nosso potencial para todo mundo, mostre a alma da gente. É legal saber que a igreja está se adaptando na sua cidade. Isso é ótimo.

Participante não identificado: A discussão bíblica é uma discussão extremamente complexa porque envolve a interpretação e envolve a evolução da história humana. Por exemplo, os índios, me contaram que, nas tribos indígenas, não existem deficientes. Eles matam todos os deficientes. Essa é uma coisa que é aceita pelas comunidades indígenas. A sociedade vai evoluindo e a igreja também vai tendo essa modificação.

Participante não identificado: Eu queria dizer que realmente você tem razão porque quando nós falamos muito da Bíblia falamos muito do Novo Testamento. O Antigo Testamento realmente traz até pelas antigas religiões primitivas que já traziam esses aspectos, que a pessoa que nasce com deficiência tinha que morrer porque tinha o castigo. Mas, Graças a Deus, Jesus veio exatamente para transformar essa mentalidade.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Muito bem. Agora, você não pode falar de tecnologia sem falar de história. O que é tecnologia? É uma adaptação do homem ao mundo de hoje. A tecnologia que serve hoje, provavelmente amanhã não vai servir. A tecnologia que servia antigamente, como o fogão a lenha, serve hoje? Era uma tecnologia maravilhosa nos anos 20. Era perfeita. O ferro de passar à brasa também era uma maravilhosa tecnologia. Hoje, ele não serve porque as condições são outras. Então, eu acredito que toda essa questão de deficiência vai sofrendo modificações. E graças a Deus, para os deficientes e para os que não são também, essa questão está sendo vista de forma diferente. Mas vamos voltar à questão da tecnologia.

Participante não identificado: A preocupação das pessoas é a seguinte: “Esse seu computador é diferente do nosso? Por que ele não é igual?” A visão que eles têm é de que a gente é prepotente mesmo.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Eu entendo, é claro, é claro. Eu não quero ser igual ao deficiente. Esse é um preconceito mesmo. Por que o meu computador tem que ser igual ao do deficiente? Eu quero que o meu seja diferente. É preconceito mesmo.

Eu coloquei aqui na tela cinco figuras de pessoas cegas, e tetraplégicas. Tem a foto da Eta e do cachorro; tem a foto da minha mulher que é médica; tem a foto do garoto que é primeiro lugar no CEDERJ; tem uma foto do Glauco Cerejo, que é saxofonista do Ney Matogrosso; tem uma foto do Sandrinho que foi meu estagiário que é campeão de Golbol, que é o futebol de cegos. Essas pessoas são deficientes e tiveram sucesso. Por que é que alguns deficientes têm sucesso e outros não?

Participante não identificado: Acho que depende da força de vontade e do empenho também de cada um de nós. É importante que cada um aceite a realidade como ela é e que a gente lute e mostre para a sociedade que a gente quer ocupar o nosso espaço, que a gente busca um lugar ao sol. Muitas vezes, os deficientes visam muito a questão da crítica pela crítica e a crítica pela crítica não é muito construtiva. A gente tem é que lutar; tem que ser determinado e conviver com a nossa limitação.

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Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Bom, ele já discorda. Vem cá, você discorda disso? Se você não concorda você fala o que você pensa. Vem cá perto do microfone.

Participante não identificado: Boa noite a todos. Eu tenho preconceito porque toda a vez que eu entro dentro do ônibus eles perguntam se eu tenho algum problema. Eu digo que o meu único problema é que eu tenho Síndrome de Down. São os outros que têm problema. Não sou eu.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Vamos prosseguir, senão, a gente não chega a lugar

nenhum. O que é que faz que essas pessoas sejam bem sucedidas? Será que elas têm alguma coisa a mais do que as outras? Porque realmente elas estão numa situação de desvantagem. Será que essas pessoas bem sucedidas nasceram em berço de ouro? Ou será que a família delas deu apoio? Será que elas tiveram um suporte financeiro muito forte? Será que elas são pessoas que realmente são muito especiais?

Eu diria que há inúmeras razões na vida para uma pessoa comum que não tem deficiência ser bem sucedida ou ser mal sucedida e para uma pessoa deficiente também ser bem sucedida ou ser mal sucedida. O problema é se uma pessoa deficiente que nasceu em berço de ouro, ou que tem uma família maravilhosa, ou que tem muito dinheiro, ou que é muito inteligente. Será que essas pessoas teriam condições de uma evolução maior do que as outras ou não? Acho que isso acontece com qualquer ser humano, não é verdade? Se você nasceu rico é diferente de você nascer pobre. A família é sempre importante

Participante não identificado: Nós temos dois atletas lá que foram representar o Brasil nas Para-Olimpíadas. Ela é a única campeã do Brasil. Ela foi pelo empenho dela. Tem um outro que também vai para a Alemanha e vai pelo esforço dele. Agora tem aquele filho de papai, que mora perto da praia, eque a mãe tem vergonha de ir até ao shopping com ela. Não vai. Quem tem dinheiro e quem é poderoso realmente não participa de nada. A família confina esse deficiente dentro de casa porque tem vergonha de apresentá-lo para a sociedade. “Eu tenho um filho cego? Eu tenho um filho aleijado? Deus que me livre!”.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Quem é bem sucedido? Deixa só eu completar para não perder o fio da meada. Então essas pessoas tiveram que vencer rompendo algumas barreiras. Primeiro, rompendo barreiras arquitetônicas. Se a pessoa mora, por exemplo, lá em cima da favela e ela tem que estudar na favela embaixo e ela é cadeirante, como é que ela vai fazer? Ela vai fazer das tripas coração para descer, ou seja, ela vai ter que batalhar mais que os outros. Então ela vai ter que batalhar para romper as barreiras arquitetônicas.

Um outro ponto é o ensino. Há determinadas situações que são tranqüilas, ou seja, uma pessoa que é cadeirante pode freqüentar uma turma convencional. Mas pode ser que, para virar a página, já não consiga. Uma pessoa que é cega já não. Uma pessoa que é cega já vai ter que quebrar essas outras barreiras que são as barreiras do ensino. Uma pessoa que tem Down vai aprender, mas vai aprender num ritmo mais lento. Então cada pessoa vai ter que romper suas próprias barreiras.

Além disso, essa pessoa deficiente vai ter que romper um negócio muito importante que chama acesso aos meios de comunicação. Alguém quer dar um depoimento aqui lá do interiorzão como é difícil você saber o que é um DOSVOX? Alguém quer falar sobre isso? Fala aqui.

Participante não identificado: Senhoras e senhores, boa noite. A minha história foi inclusive tocada em alguma parte desses comentários aqui. Há pouco mais de 20 anos atrás, eu morava no interior da Bahia, no município de Bom Jesus da Lapa e não havia ensino especial e nem tão pouco acesso à informática. Primeiro, eu aprendi o Braille em casa com o apoio das minhas duas irmãs que ainda estavam em casa e também com um colega que havia estudado no Instituto São Rafael. Ele me

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emprestou esse método e assim eu aprendi o Braille em casa. Consegui dois livros na Fundação para o Livro do Cego, hoje Fundação Dorina Nowill. Eu li esses dois livros em casa e eu cheguei à conclusão que tinha que sair porque a minha proposta era estudar e trabalhar e realmente crescer mais do que eu realmente tinha crescido na época. Foi quando eu vim para Brasília, no final de 1983. Eu comecei a trabalhar em 1985, fiz o meu primeiro curso de informática em 1988 já com o DOSVOX e, a partir daí, eu nunca mais larguei o computador. Até quando eu fui fazer o curso eu achei que eu não ia utilizar porque colocavam para a gente que computador era um bicho de sete cabeças, que só realmente pessoas super inteligentes é que tinham condições de aprender no computador. Eu aceitei esse desafio de aprender, mas fui realmente muito desmotivado. Eu comecei realmente a pegar num computador quando os outros colegas chegavam e iam bater papo e eu estava sentado treinando no computador. E hoje é assim. Eu tenho o meu computador em casa. Não é dos melhores, mas atende às minhas necessidades porque eu me comunico com o mundo através da Internet. eu sempre digo ao pessoal que o acesso ao computador veio quebrar a barreira da comunicação entre o cego e as pessoas que enxergam.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: E há outras barreiras que têm que ser quebradas, como a barreira do desconhecimento. É a barreira do desconhecimento de que as coisas existem. Por exemplo, eu sou uma pessoa bastante antenada e grande parte das minhas noites eu passo navegando na Internet, buscando coisas que possam vir a melhor a vida da minha mulher. Assim eu vou buscar numa variante, uma roda especial para a cadeira etc. Por exemplo, eu tenho esse plano de levá-la para fazer uma excursão na praia, mas se eu botar essa cadeira motorizada na praia, com certeza, essa bendita vai afundar. Então eu já descobri que em Goiás tem uma fábrica que produz umas cadeiras com umas rodas de mais ou menos 20 cm. É como se fosse uma cadeira caseira, só que é feita de PVC e tem umas rodas imensas. Então essa coisa do desconhecimento das tecnologias assistivas é muito importante. Se o cara não sabe por exemplo, que existe um programa que permite que o filho dele, que não fala por alguma razão, possa falar através do computador, o filho dele nunca vai falar. Entendeu? Então é muito importante que a família e o professor dessa pessoa esteja muito antenado, esteja muito ligado e tenha acesso a essas informações.

Agora, quem dá essas informações? Você queria fazer um comentário não é?

Participante não identificado: Eu queria fazer um comentário para quem é deficiente visual. Eu tive uma lesão de pescoço e fiquei com lesão nos braços e nas pernas. Quando eu fiquei deficiente, há 23 anos atrás, eu não conseguia nem tocar a cadeira. Então, quando você fala de barreiras, eu lembro que, naquela época, as cadeiras eram de ferro e eram uma porcaria. Mas eu ainda vi algumas dessas cadeiras aqui no evento. A mesma porcarias de cadeira que eu usei há 23 anos atrás ainda está no mercado. Hoje, eu tenho a mesma condição física, mas por conta de uma borracha que a minha cadeira tem no aro de propulsão, isso dá aderência à minha mão e eu consigo tocar a cadeira. O pneu que eu estou usando é o pneu de bicicleta, então, é muito mais barato para cadeira. Essa roda é uma roda de bicicleta, não é uma roda de cadeira, então ela é mais em conta. Esse pneu tem menos aderência ao chão, é mais fininho e é mais leve para tocar. Então eu sou um tetraplégico que tenho um bom acessório e parece que eu sou um paraplégico, parece que eu tenho problema mais nas pernas e não tenho. Eu tenho no corpo todo.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Além desse desconhecimento e da falta de acesso às tecnologias, tem ainda uma coisa muito importante, que é a criatividade. Criatividade para o deficiente é uma coisa completamente necessária. Por exemplo, pode ser que o deficiente não seja criativo assim, mas ele tem a sorte de ter uma professora que é criativa! A mulher realmente é demais, ou o marido, ou a tia. Alguém encontra sempre boas soluções. Agora eu acho que isso é um pouco de sorte, mas na verdade, não deveria ser assim. “Ah, que sorte que eu tenho um marido que é legal”. Não. “Que bom que eu tenho uma professora que estudou”. Isso seria melhor não é? Ou “Que bom que na minha associação

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as pessoas que estão lá sabem das coisas. Eles estão muito antenados”. Eu considero que um dos papéis importantes da associação é o papel que equivale ao papel do professor, não é verdade?

Participante não identificado: Sem dúvida, professor. Uma coisa que é fundamental é a razão da existência das entidades, é capitanear formas de permitir o acesso das pessoas com deficiência nos mais diversos setores, na formação, na qualificação e em diversos aspectos.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: E já que a gente está falando de religião Padre, a gente tem que pensar também no seguinte: em muitas cidades do interior, exatamente é o padre que cumpre esse papel, não é verdade? Com certeza.

Jorge Frederico “ Rio de Janeiro: Para quem não sabe, eu sou pedagogo, trabalho com orientação educacional no Rio de Janeiro. Eu sou Jorge Frederico. Eu tenho percebido ao longo das conversas com os companheiros duas coisas: (1) No caso dos cegos, daqui a algum tempo, vão dificultar mais ainda a compra e o acesso ao DOSVOX. Por quê? Infelizmente, o campo de trabalho para o cego ainda continua muito restrito. Nos anos 70 e 80 o cego era massagista. Agora trocou para câmara escura. E com isso diminui ainda o campo de trabalho para os cegos. Com a inclusão, com Benjamim Constant, a gente observa que tende a acabar o ensino internato e depois externato. Está sendo feita a inclusão dos alunos em escolas regulares próximas à sua residência. Mas infelizmente, sem que haja nenhuma adequação ainda com professores não especializados. As escolas especiais nos seus estados, também estão reduzindo o número de alunos cegos, reduzindo de 100 para 50, para 20, até o prédio ser vendido e fechar. No Fórum de Nova Iguaçu, tem uma companheira nossa, a Mariângela, que é funcionária do Tribunal há mais de um ano. Para quem não sabe, Nova Iguaçu é uma cidade da Baixada Fluminense, do Rio de Janeiro, uma grande cidade, mas até hoje o Tribunal ainda não comprou o DOSVOX para a companheira cega trabalhar. E assim vai continuando esse sistema perverso para o deficiente.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Bom, essa política de inclusão ou de ensino segregante ou não, é importante. Mas eu acho que se a gente sair por esse caminho, a gente não vai falar o tocante a tecnologia. Você está absolutamente certo. Esse é um item em que a gente tem que repensar e as instituições de cegos têm que discutir isso sério. Até que ponto isso é bom ou é ruim? Até que ponto isso ajuda ou prejudica? Eu não vou discutir isso agora porque essa é uma discussão imensamente longa e o nosso enfoque hoje é a questão tecnológica, mas você está absolutamente correto nas suas observações.

Preconceito é a última das barreiras que o deficiente tem que quebrar. O cara é muito bom. E eu vou contar um caso aqui, eu sou um cara que trabalho com deficientes há muito tempo e eu tenho preconceito. Quer ver um caso? Eu depois até falei: “Caramba, eu também tenho preconceito. E eu que me julgava tão isento de preconceito!” Vou contar um caso.

Há mais ou menos um mês atrás, eu recebi um telefonema do Departamento de Pessoal e eles me disseram: “Nós recebemos aqui uma moça concursada, que entrou numa vaga reservada para deficientes aqui na Universidade. Ela tem paralisada cerebral. Ela é uma menina que tem curso superior de educação, se formou na UERJ e ela fez uma especialização ou uma pós-graduação. Ela foi colocada na Escola de Química para fazer um atendimento ao público, mas não funcionou. A Diretora não quis que ela trabalhasse lá e ela está esperando alguém que queira recebê-la”. Aí eu pensei assim: “Caramba, paralisada cerebral, uma pessoa que não consegue falar direito, que anda com muita dificuldade, será que eu vou conseguir trabalhar com essa pessoa?” Gente! Eu estou absolutamente encantado com essa pessoa. É claro que ela anda com dificuldade, digita com dificuldade, mas ela trabalha; ela é pontual; tudo o que você manda ela fazer, ela faz com absoluta perfeição; ela é criativa. Então essa questão do preconceito meus amigos, existe e esse é um dos principais pontos que os deficientes que são bem sucedidos conseguem superar. Eles conseguem superar a barreira do preconceito, eles conseguem serem vistos sem preconceitos.

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O que é o que acontece, por exemplo, com o surdo cego. O cego realmente hoje na inclusão econômica ele tem muitas opções, não é só DOSVOX. Tem o Jaws, por exemplo, e há ainda outras opções. As empresas estão querendo contratar pessoas com deficiência visual e auditiva, até mais do que com deficiência física, porque a deficiência física tem que ter acessibilidade. E para deficiência visual existem programas que você até pode estar ganhando. Então as empresas estão pagando bem para pessoas com deficiência visual. Então o horizonte já se abriu muito.

Participante não identificado: Não é para qualquer um. Tem que ter qualificação.

Participante não identificado: Sim, a gente está no foco das ajudas técnicas, das tecnologias assistivas. Então por que é tão complicado ter essa informação? Por que é que não é todo mundo que está a par disso? Por que é que não tem, da parte do governo, realmente um incentivo nem para empresas, nem para quem conhece novas formas de fazer os equipamentos mais baratos serem divulgados? As empresas que já se consolidaram no mercado não facilitam em nada que outras cresçam. É por isso que todos os projetos de ajudas técnicas acabam sendo apenas para uma minoria de pessoas socioeconomicamente favorecidas. Todo mundo fica sabendo dessas coisas, mas a maioria não tem acesso a elas.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Perfeito. Então as pessoas vencem desafios. Mas como diz a minha mulher: “São desafios demais, não precisavam ser tantos desafios. É desafio arquitetônico, é desafio cultural, é desafio não sei de quê, é desafio do preconceito, e a gente tem que quebrar todos eles porque, se não quebrarmos todos eles, o sucesso não vem”.

(Fala fora do microfone)

Mas ela foi bem sucedida antes de eu conhecê-la. Eu sou casado com ela há três anos só.

Bom, agora vamos falar de políticas. Então, o legal seria que não houvesse tantos desafios. É claro que, ao longo da história, alguns caras conseguiram, mas esses caras tiveram que romper uma lista de desafios imensos para eles tentarem resolver e não precisava ser assim porque, para as pessoas que não são deficientes a lista é menor. A lista de desafios para quem não é deficiente é bem menor e a possibilidade de passar por aquela lista é muito mais fácil. Então não precisaria ter tantos desafios: (1) apoio e oportunidade. Isso significa que todo mundo precisa de apoio; (2) disponibilidade financeira adequada, seja na forma de uma garantia de trabalho, seja na forma de algum tipo de ajuda; e (3) uma política que garanta direitos especiais. Eu estou substituindo a expressão “direitos especiais” pela antiga expressão “necessidades especiais”. Vocês já devem ter ouvido essa expressão “ Pessoas com Necessidades Especiais “ só que, não são necessidades especiais, são direitos. Se nós temos direitos, não tem conversa! “Tenho necessidade de enfrentar uma fila menor, ou tenho direito de entrar primeiro na fila”. Esse é o meu direito! Acabou! Ninguém discute porque é direito.

Participante não identificado: – Um surdo e mudo chegou à igreja com um intérprete para se confessar e me disse: “Eu tenho direito de me confessar e quero me confessar nesse período que a igreja manda porque eu sou cristão católico”. Eu não sabia como fazer, fui consultar o meu Bispo e ele disse: “Claro! ele tem direito a se confessar e ele pode ter um intérprete na confissão”. Ele escolheu um intérprete de confiança dele e eu o confessei com intérprete. Mas muitos deixavam de se confessar porque não sabiam disso, e muitos padres também não sabem que podem fazer isso.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Então, ele rompeu a barreira do desconhecimento que é uma daquelas que a gente tinha falado, porque o Padre lhe deu apoio e oportunidade. Ele exigiu e teve a oportunidade de encontrar um sujeito, como esse padre, que se dispôs a lhe dar o apoio, como também

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poderia dizer que não, não poderia? Às vezes, é muito mais confortável dizer que não. Aliás, dizer que não quase sempre é muito mais confortável do que dizer que sim.

Que direitos especiais são esses? É aquilo que a gente já tinha visto: direito ao acesso físico sem barreiras arquitetônicas e direito ao acesso à informação. Ou seja, aquilo que fez com que aquelas pessoas fossem bem sucedidas, na verdade, é um direito.

Delegada do Mato Groso do Sul: Boa noite a todos. Sou do Mato Grosso do Sul e nesse acesso à informação eu gostaria de colocar a dificuldade do livro acessível para o cego, desde o primário até quando a gente chega à faculdade. Eu estou me referindo à faculdade porque fiquei cega já a partir da faculdade. Vocês nem imaginam o quanto é difícil, principalmente, para quem faz Direito. Acho que isso teria que ser revisto.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Alguém quer fazer algum comentário?

Participante não identificado: A título de esclarecimento, eu quero informar que foi realizado o Seminário do Livro Acessível e, pela nova lei que está sendo regulamentada, as editoras vão ter que disponibilizar todas as matrizes dos livros em Braille, digitalizados, em áudio, CD, ou seja, todas as matrizes serão disponibilizadas em livros acessíveis. Então, foi realizado esse Seminário em São Paulo e essa questão do livro acessível já está sendo regulamentada pelo Ministério da Educação junto com os editores e as entidades de portadores de deficiência visual.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Ronaldo, eu gostaria muito te dizer que você está certo, mas infelizmente, eu pertenço a esse grupo que você está falando e a coisa não é bem assim não. As editoras simplesmente não querem. Elas não querem porque aquilo ali é o grande ganha pão delas. Eu acho que existe uma grande briga tecnológica a esse respeito. Eu sou um dos que está nessa briga, torço para ganharmos essa briga, mas olha, não está ganha não, viu? Eu diria que ela está muito longe de ser ganha. Sabe aquela lei que não pega? Aliás, não é nem lei, é apenas uma regulamentação. Mas, se a gente não se mobilizar, a possibilidade de ela não pegar é muito alta.

Participante não identificado: O problema, realmente, é que não dá para quebrar as pernas das editoras, mas tem que se uma solução tecnológica de se ter uma edição eletrônica. O problema é que, se disponibilizarmos em PDF, nenhum programa consegue ler aquele arquivo. Teria que haver um avanço nos programas, de maneira que, chegássemos a uma tecnologia acessiva que pudesse ler arquivos que não podem ser copiados.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Bom, esse é um assunto tecnológico, já existem várias pessoas estudando isso e infelizmente não é vitória já não. Eu acho sim, que tem que brigar e tem que reclamar. Sabem por quê? Porque quando as pessoas deixam de reclamar o assunto morre. Se deixar de reclamar morre. Então, tem que reclamar, reclamar, reclamar, até que a coisa se torne realidade.

Participante não identificado: Uma situação semelhante a essa, referente à acessibilidade ao livro, é que, quando se fala em livro adaptado, geralmente, a gente se remete muito à situação da pessoa cega. Mas existe o surdo também que carece de uma literatura não convencional por meio da tradução na Língua Brasileira de Sinais. Uma editora do Rio de Janeiro, a Editora Arara Azul, da Professora Célia, da UERJ também se sente impedida de publicar livros contemporâneos porque eles não são de domínio público. Então, ela não pode fazer a tradução. O trabalho dela é feito em parceria com o MEC e os livros

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são disponibilizados para todas as escolas gratuitamente, mas isso não é possível porque ela teria que pagar os royalties de uso do livro que são altíssimos, no caso, por exemplo, de uma obra de Paulo Coelho. Então os surdos não podem ter acesso também aos livros.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Perfeita observação. Bom, então vamos ver aqui quais são os direitos especiais. Os direitos especiais são aqueles que a gente já falou. Só que agora não vamos apenas pensar que o cara era realmente muito bom e conseguiu quebrar as barreiras. Não. Agora vamos pensar assim: É direito ao quê? É direito ao acesso físico amplo, sem barreiras arquitetônicas; é direito à informação sem barreiras. Um cego pode ler o que ele quiser ler e tem que ter o entorno que permita que ele lei? O surdo pode ler o que ele quiser, em LIBRAS ou em outra forma qualquer?

Além disso, há a questão do direito ao trabalho porque ele tem que produzir recursos para poder subsistir e esse direito ao trabalho independente da condição física ou mental. Se por exemplo, uma pessoa tem síndrome de Down e isso, em princípio, a alijaria de uma condição de trabalho convencional, tem que haver mecanismos que garantam que qualquer pessoa, com qualquer deficiência possa trabalhar. Isso tem que ser uma realidade. Já existe alguma coisa nesse sentido, mas tem que ser direito. O direito a TODO deficiente trabalhar independente da deficiência. Você vai dizer que é utopia. Não! Direito é direito. Direito não se discute. “Como é que eu vou fazer com um sujeito que não anda, que não pisca, que não... como é que eu vou fazer com esse sujeito para ele trabalhar?” É um direito, então, vamos pensar como fazer. Foi isso que aquele padre fez quando o surdo quis se confessar. Vocês têm que pensar que, há muitos anos atrás, Daí, pensou-se e se encontrou a solução. E não foi nada de muito mágico! “Como é que eu vou fazer com o cara que não pisca usar o computador?” Eu não sei, mas se é um direito, temos que buscar uma solução. Alguém quer comentar?

Fábio Célio Oliveira de Araújo “ Mato Grosso do Sul: Meu nome é Fábio, eu sou do Mato Grosso do Sul. Nós merecemos todos os direitos; os deficientes têm direitos. Só que vamos pegar a linha do mercado de trabalho que nós estamos usando agora. O que acontece? Em muitos lugares, a barreira começa pela qualificação profissional. Às vezes, começa pela auto-estima. Todo ser humano tem que buscar o seu direito. Nós tínhamos direitos só que nós não partíamos atrás deles e eles não vão vir lá de cima não. Eles não vão nos mostrar nossos direitos. Às vezes eles fazem lá o direito e não divulgam. Falta informação. As pessoas não sabem os direitos que têm. Ou até sabem, só que também não buscam esses direitos.

Participante não identificado: Eu vou só complementar a sua fala. Por exemplo, existe a Lei 8.213, que obriga que as empresas com mais de um número “x” funcionários, têm que contratar um número “x” de deficientes. Isso é lei, agora, as Empresas cumprem? Não. Por que não cumprem? Porque os deficientes não vão em cima. O governo está muito tranqüilo lá, o Ministério Público está muito tranqüilo lá. Agora se os deficientes, se a Associação fosse lá e metesse o pau em cima da empresa, ela ia encontrar um jeito.

Fábio Célio Oliveira de Araújo “ Mato Grosso do Sul: Só para ilustrar do que você falou da Lei, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul hoje as empresas estão cumprindo mais porque o Ministério Público e a Delegacia do Trabalho com a defensora lá, estão no pé das empresas e fazendo-as cumprir a legislação. É direito. Só que, tem que haver uma conscientização, sem que haja necessariamente imposição para as empresas fazerem isso. Às vezes, ela contrata apenas por obrigação, porque a Lei exige. Então eu acho que tem que haver uma parceria com as empresas. O deficiente tem que ser tratado como qualquer outro funcionário que tem direitos iguais, sem que seja necessário se usar a lei para contratar.

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Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Perfeito. Bom, essa questão do direito é uma questão muito interessante. Tem duas pessoas aqui inscritas. Vamos lá.

Participante não identificado: Professor, eu encaminhei uma solicitação ao Banco Central porque o deficiente visual, quando vai usar o Caixa Eletrônico tem dificuldade às vezes de sacar o dinheiro porque ele não sabe o que está escrito na tela e no teclado. Então, eu mandei um projeto ao Banco Central no sentido de se elaborar uma cabine sonora, adaptada para o deficiente visual e eles responderam que fica muito cara. O senhor acha que é viável, que é possível criar uma cabine para o deficiente visual sacar o dinheiro? Quando eu envie o projeto, eles disseram que era uma coisa paliativa.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Olha só. Muitas pessoas chegaram aqui e não estavam entendendo nada do que estava acontecendo. Houve um atraso muito grande na plenária e por causa disso a gente ficou esperando e falou: “Bom, já que estamos um olhando para a cara do outro, vamos conversar sério”. Eu peguei a palestra que eu iria dar normalmente, só que eu não estou fazendo a palestra, eu estou usando a palestra. Eu estou usando essa palestra como uma forma de as pessoas darem o seu depoimento. Então, eu estou falando algumas coisas e as pessoas estão falando outras.

Presidente do Centro de Apoio a Pessoas com Deficiência de Cachoeiro do Itapemirim / ES: Boa noite a todos. Eu sou de Cachoeiro do Itapemirim, Presidente do Centro de Apoio a Pessoas com Deficiência. Na gestão passada, há dois anos atrás, nós tínhamos uma fila imensa no SUS. Eu costumo falar isso sempre no meio de deficientes, que a gente faz umas piadinhas que é para o deficiente acordar. Então existia uma imensa fila e não tinha médicos suficientes para atender tantos idosos e deficientes em todas as especialidades. O primeiro deficiente da fila era um cadeirante com múltiplas deficiências. Então, num dado momento lá, não tinha médico, não aparecia médico, virava noite, virava dia e então Jesus olhou lá de cima e disse: “Cadê o médico para atender esse povo?” Não tinha. Ele se vestiu de médico, desceu, abriu a porta do consultório e disse: “Que entre o primeiro”. O primeiro da fila era o cadeirante todo com muitas deficiências. Jesus já olhou para ele penalizado e disse: “Levanta e anda”. O cadeirante levantou abriu a porta e saiu. A turma de fora perguntou assim: “Vem cá, como é o novo médico aí?”. “É igual os outros, nem bota a mão na gente e já manda levantar”.

Então existe uma questão que é o seguinte: o mudo falou que o surdo ouviu dizer que o cego tinha visto um aleijado correr. É a mesma situação. Nós deixamos de correr atrás dos nossos direitos e ficamos nessa situação, como no caso do cadeirante que Jesus curou e que, na hora, nem viu que tinha sido curado, já saiu andando e não viu a situação de ninguém mais. Ele se abandonou, já não era mais deficiente.

Em 29 de junho, nós vamos estar inaugurando na Câmara Municipal a Casa do Cidadão. Na semana que vem, vamos estar implantando a Lei contra a Discriminação Social encaixando todos os segmentos dos direitos humanos. Para a gente não precisa voltar o sentido para nós mesmos porque a maioria de pessoas com deficiência é da periferia das cidades, de cor negra principalmente e assim não tem nenhuma forma ou condição de acessar o mercado de trabalho.

Participante não identificado: Desculpe, companheiro, mas você está viajando! Nós estamos falando aqui de direitos da tecnologia assistida e você veio com um discurso meio político. Então vamos ser rápidos porque tem mais gente querendo falar. Deixa só eu continuar na linha que estava. A gente tem direitos sim, mas qual é a contrapartida que, não só o governo, mas a universidade que você freqüenta, por exemplo, podem dar para a gente? Nos cursos de engenharia, arquitetura e todos os cursos. Se você chegar lá com um problema, em vez de um problema teórico você tem um problema real. Você falou que queria levar sua esposa para praia. Você que mora no Rio de Janeiro, eu não tenho essa sorte. Você tem um problema e quer uma solução, você está achando essa solução. Não sei qual é a sua formação, mas se jogar isso na mão de pessoas que fazem coisas para o esporte, coisas para

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engenharia, torno, as pessoas acham a solução. Que nem um companheiro ali que fez um projeto de cabine com som. Isso não é tão caro assim para um banco. Aliás, todos os bancos tiveram um faturamento absurdo. Então, nenhuma dessas tecnologias que nós queremos são inviáveis e é um direito nosso termos acesso a elas e dá para fazer isso barato sim.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Eu não estou discordando do que você falou absolutamente. Claro que não. O nosso enfoque é o enfoque da tecnologia. Mas eu acho que você tem coisas para falar sobre isso também.

Presidente do Centro de Apoio a Pessoas com Deficiência de Cachoeiro do Itapemirim / ES – Eu ia concluir quando ele falou que eu estava viajando. Eu viajo bastante sim, o país inteiro para a gente conhecer as realidades e as necessidades. Por exemplo, você ouve falar que o Marcos Frota é o baluarte do deficiente e você bate palmas, mas eu fui discriminado no circo dele também. Então a gente não pode ser conivente com essas coisas não gente. Eu falei dos projetos colocados aqui dentro de Brasília na roda ativa que é nas tecnologias para estar atendendo a formação de mão de obra deficiente. Nós já enviamos projetos que, muitas vezes, por não terem apoio do próprio deficiente, são encostados de lado. Você sabe que, quando você chega numa prefeitura, dentro de qualquer lugar para você conseguir um trabalho, você está sendo discriminado na mesma hora porque você não tem formação e nem informação.

Então nessa questão tecnológica nós precisamos criar e construir, em todo o país, em cada município, em cada Estado, em qualquer lugar que seja, Centros de Reabilitação, Capacitação e Formação de Mão de Obra. O que é que acontecia? Quando você chegar na empresa com o seu diploma na mão e reivindicar os seus direitos àqueles 5%, você pode cobrar do Ministério Público. Porque quando chega lá sem diploma na mão e sem formação, o Ministério Público não pode fazer nada. É isso aí.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Bom, então vamos focar no principal que é a questão tecnológica. Eu acho que o assunto “deficiência” é um assunto enorme, enorme, mas a gente está aqui com um aspecto e vamos tentar ser fiel a esse aspecto. Nós estávamos falando de direitos especiais, direito ao acesso físico, direito ao trabalho e à saúde pública diferenciada, na linha de tudo o que estava sendo colocado. Mas dentro desse contexto de hoje, além de todos esses direitos há dois assuntos que têm a ver com o nosso momento agora, nessa sala. Um deles é a questão da educação diferenciada. Ela é diferenciada no sentido de que a pessoa não pode utilizar uma educação convencional e precisa de tecnologia para ser educada. O segundo ponto é que a tecnologia assistiva modifique a vida da pessoa. Então esses são os dois itens sobre os quais eu vou falar. Não vou falar sobre saúde, sobre trabalho porque é um tema muito grande.

Direitos Educativos Especiais são importantes porque a gente sabe que a pessoa deficiente pode apresentar dificuldades maiores do que o restante dos alunos. Ela vai precisar de caminhos alternativos e isso não vem ao caso aqui, porque a discussão até começou com educação inclusiva e exclusiva. Mas o que importa sobre esse tema é que, seja lá o que você pense para educação, a educação para deficientes está sempre conectada com tecnologia. Por exemplo, se a pessoa é cega, ela tem que ter instrumentos que lhe permitam a ler; se a pessoa é tetraplégica, como a Lena, por exemplo, para ela virar uma página de um livro é uma dificuldade enorme. Então, ela tem que ter mecanismos que supram essa dificuldade e esse mecanismo não é alguém virar o livro para ela. Esse mecanismo é uma tecnologia que não sei qual é. Eu posso supor. Por exemplo, quando ela se reabilitou, tinha uma maquininha que, quando ela fazia “krec” com o punho, o troço virava. Muito pouca gente conhece essa maquininha de virar página de livro, mas para ela é muito importante para estudar. Outra tecnologia que ela recentemente começou a usar é a do escaneamento. Há uma pessoa que escaneia os livros para ela, depois os livros são exibidos no computador para ela poder estudar. E depois, ela vai lá no computador,

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com a mão ou com o motriz e o livro vai sendo exibido. Ela não tem que virar as páginas. Bom, eu só sei que existem essas soluções e cada pessoa tem a sua solução específica.

O que são tecnologias assistivas? A tecnologia é Assistiva quando ela torna a pessoa mais eficiente, ou menos deficiente, se você quiser colocar assim, e são tecnologias que facilitam a integração e a inclusão. Hoje em dia, praticamente todas as tecnologias inclusivas fazem uso da computação e da eletrônica. As tecnologias mudam em estudo, trabalho, lazer, etc. Que tecnologias? Nós precisaríamos de um dia inteiro para explicar todas as tecnologias, mas o importante é saber que há muitas tecnologias, mas não há tecnologias para tudo. Por exemplo, não há tecnologia para o surdo hoje escutar. Não existe. O implante coclear é uma coisa que ainda não está muito satisfatória. Mas existem tecnologias para o cego ler. Então há tecnologias para muita coisa e não há para outras. O que é mais importante é que está havendo um avanço extraordinário nessa área. Hoje em dia, por exemplo, a gente pode sonhar que você está falando ao microfone e o que você está dizendo está sendo transcrito em LIBRAS, ou em letras. Isso não é nada de maluco. Você vai me perguntar: “Eu posso chegar ali na esquina e comprar um programa?” Eu diria que não, hoje! Daqui a dois anos talvez. Daqui a 10 anos, com certeza. Então isso é muito importante.

Agora, qual é o papel do Estado em relação a essas tecnologias? É fácil utilizar tecnologia no Brasil? Eu diria que não é fácil porque o nosso país é um país em que existe muita pobreza. Você falou em tecnologia. Pergunto para vocês, tecnologia significa grana? É possível você pensar em tecnologia sem pensar em dinheiro? O que vocês acham disso?

Participante não identificado: Não. Com certeza, hoje, ainda é muito necessária a disponibilidade de recursos devido ao alto custo desses programas especiais, à exceção do DOSVOX. Por exemplo, a Laramara disponibiliza o programa para celular, mas é uma coisa amplamente inacessível por falta de recursos.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Quer dizer, hoje é fácil um cego pegar o celular e saber que numero está aqui no display. Existe celular que roda um software chamado TALKS que diz isso. Só que, esse software só roda num celular que custa 1.600 reais e só o software custa R$ 800,00. Ou seja, se um cego quer usar um celular com um TALKS, ele tem que meter a mão no bolso e gastar, facilmente, R$ 2.400. Então nós caímos nessa questão da tecnologia. A tecnologia no Brasil não é fácil de ser usada amplamente porque há uma questão muito forte de pobreza. E você poderia dizer que há uma questão muito forte dos custos absolutamente incompatíveis com as realidades do nosso país. E quase sempre, um fator primordial é a educação precária devido à situação social e física. Por exemplo, se você pega uma pessoa cega que mora naquele barraquinho que eu estou mostrando na foto, lá em cima da Favela da Mangueira e você diz para ela “ “Toma aqui um celular que fala” “ será que aquele , ou aquele senhor, esse jovem, essa senhora ou essa velhinha vai conseguir usar um celular que fala? Pois é. Essa é uma outra questão. Tecnologia no Brasil não é fácil de ser usada amplamente.

Outra coisa é que há muitas tecnologias dizem respeito a telecomunicações. A gente estava falando aqui que hoje o cego pode usar a internet e, sem sair da casa, ele pode conversar com um amigo de Portugal. Mas, vocês sabem quanto custa? Chegou a minha conta do VELOX que eu coloquei lá em casa, no valor de mais de R$ 100,00. O VELOX permite que eu bata papo, usando a internet, amplamente, por quantas horas por dia eu quiser, mas eu paguei R$ 120,00 por isso. Se a pessoa ganha um salário mínimo e é deficiente, ela consegue ter acesso a isso? Não consegue.

Participante não identificado: Quanto às telecomunicações, no caso das pessoas surdas, também há uma grande dificuldade em relação ao acesso a essas tecnologias. O telefone para surdos, há cinco anos atrás era fabricado no exterior. Hoje já tem fábricas brasileiras, porém, o custo de um aparelho é muito alto. Por exemplo, um aparelho de telefone comum custa R$ 30,00 e o telefone para surdos custa R$ 600,00 e ainda vai pagar todos os impostos telefônicos que a gente também paga. É inaceitável também.

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Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Então, isso significa que, se a gente pensar em tecnologia, no caso do Brasil, a gente vai ter que pensar em políticas que ataquem essa questão do custo na raiz.

Outra questão importante é o chamado analfabetismo digital. Muita coisa hoje está acessível através do computador. Isso significa que todas as pessoas hoje em dia deveriam saber computação. Quer ver um exemplo? Muitos preenchem suas Declarações de Imposto de Renda. A partir do ano que vem, ou daqui a dois anos, não vai existir Declaração de Imposto de Renda no papel. Isso significa que você cego que se dane, porque você vai ter que usar o computador para fazer o seu Imposto de Renda ou pagar alguém para fazer isso. O analfabetismo digital está sendo assumido como premissa do próprio governo. Olha só que coisa louca! No nosso país, as ações governamentais estão assumindo que não existem analfabetos digitais no nosso país. Vocês vejam que coisa! No momento em que se cria essa imposição, você está pressupondo que todos sabem usar e têm acesso ao computador. Mas você vai dizer que a pessoa tem sempre a alternativa de pedir a alguém. Só que, pedir a alguém significa pagar a alguém para fazer isso. Isso é justo? Não é justo, não é justo.

Olha só, estamos falando de Estado. O papel do Estado é garantir a todos o acesso às tecnologias. Isso acontece nos países do primeiro mundo e não só nos do primeiro mundo não. Vou contar um caso de Portugal. Se um cego de Portugal chega num determinado momento da vida dele e decide que precisa de um computador, ele vai ao Ministério da Saúde e procura o Departamento de Ajudas Técnicas. Ele entra lá, é atendido por uma senhora que o ajuda a preencher um formulário e mais ou menos de 6 a 8 meses depois, esse sujeito recebe do governo um computador na casa dele. Como existe a Lei de Acessibilidade lá, tudo tem que ser acessível, inclusive, as coisas do governo. Se o governo faz a lei, ele também encontra formas para que a lei seja cumprida. É a questão do direito.

Participante não identificado: A Caixa Econômica tem esse projeto do governo “Computador para todos”. A dificuldade para se ter um computador daqueles é que, devido à qualidade, ele não suporta todos os programas. O pessoal lá da comunidade gostaria de ter esse computador. As pessoas muito simples das associações queriam um computador desses. Eu estive lá com o pessoal da CEF e nós desistimos, porque a quantidade de formulários que tínhamos que preencher era enorme. Primeiro, tínhamos que abrir uma conta na CEF para poder receber esse benefício e pagar R$ 62,00 durante 24 meses. Então, é uma dificuldade. No nosso país há muito disso. Você é livre? Sou. Pode fazer o que você quer? Pode. E os meios? Não tem. A mesma coisa são as leis. A lei nos dá todos os direitos; nós podemos tudo. Mas infelizmente, não temos meios para fazer todas as coisas. A nossa grande dificuldade é essa.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: É isso aí. Bom, um outro tema muito importante é a capacitação do deficiente. É o governo quem tem que garantir essa capacitação. Não são as instituições que são responsáveis não. É o governo mesmo! É o governo que é responsável pela educação do deficiente, da família e dos terapeutas. E é o governo que tem que encontrar formas de remover essas barreiras. Não são apenas barreiras arquitetônicas, mas todas as barreiras. Por exemplo, vejam o caso da televisão. Um cego tem condições de escutar um filme dublado? O cego vai conseguir ler aquela porcaria?

Então, é importante tirarmos algumas conclusões:

Precisamos garantir o acesso a todos implica primeiramente em se brigar pela isenção dos impostos. Isso não tem jeito. Um produto não pode custar R$ 2,00 nos Estados Unidos e custar R$ 10,00 aqui. Essa questão é uma briga que as pessoas deficientes têm que levar adiante para que possamos ter o barateamento dos bens.

Precisamos fomentar a criação de novas soluções tecnológicas. No Brasil, há 10 anos atrás, a pessoa cega não tinha acesso ao computador, a leitura em Braille era extremamente precarizada. Mas hoje, você vê o cego acessando a Internet, tem o DOSVOX tem uma série de outras coisas. Quem pagou

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isso? Quem pagou isso na verdade foi o investimento do governo nas universidades. Foi a universidade que criou todas essas soluções. E isso aconteceu em apenas em 10 anos. Em 10 anos, essa situação foi mudada porque houve um investimento correto, que promoveu a melhoria da qualidade de vida de muitas e muitas pessoas. Ou seja, é fundamental que haja o fomento à criação e disseminação de novas soluções tecnológicas. Por exemplo, as cadeiras de rodas. As cadeiras de rodas que são fabricadas aqui no Brasil são vergonhosas. Essa cadeira motorizada da Lena tem aproximadamente 10 anos. Outro dia nós fomos numa feira em São Paulo e o caro perguntou se ela queria vender a cadeira. Ele dava uma novinha zero quilometro brasileira e ela daria essa cadeira. Será que eu não me sentiria mais apoiado se eu recebesse incentivos fiscais para bolar soluções que pudesse trabalhar nessa área? É claro que sim.

E por último, temos que fomentar projetos educacionais inclusivos, na linha do que foi falado por várias pessoas aqui. Para uma pessoa deficiente conseguir ter um posto de trabalho de categoria, ele precisa ter educação de qualidade, ele precisa saber usar todos os produtos tecnológicos. Então, tem que haver um fomento do governo em relação aos projetos educacionais inclusivos. Está certo?

Bem senhores, eu terminei a minha fala, não vou falar mais nada. Abro aqui para o pessoal falar o que quiser e a gente está encerrando esse negócio. Quem quer falar?

Participante não identificado: Só para concluir a questão do direito, eu acho que já existem tantas leis que não pegaram e que estão basicamente dentro da Constituição. Quando a Constituição diz “Todos são iguais perante a Lei”, eu acho que basicamente ela já diz tudo. Então, cabe realmente nós, nos unirmos e cobrarmos do governo aquilo que ele mesmo nos concedeu por meio da Constituição. Eu acho que, se a gente fizer isso, com certeza, estaremos dando um grande passo.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Só um comentário. Eu falei que não ia falar mais nada, mas na linha do que ela falou, eu queria ressaltar a situação precária dos professores. Eu acho que essa questão do investimento na formação educacional especializada tem que ser de extrema importância e as pessoas deficientes têm que brigar muito, mesmo que elas próprias não se sintam beneficiadas. Mas tem que ser uma briga de todos realmente e não de professores. Tem que ser uma briga de todas as pessoas.

Tânia: Meu nome é Tânia. Eu sou deficiente visual e gostaria de compartilhar com vocês uma simples invenção da minha filha. Eu e meu marido somos cegos. Então nós tínhamos sempre dificuldade para apagar as luzes da casa. A minha filha mora em outra casa porque ela já é casada, então, era aquela dificuldade e as luzes ficavam acessas. Então, ela inventou uma coisa muito simples. Vocês sabem aquelas bolinhas de silicone que a gente compra? É baratinho. A gente compra uma cartelinha. Então, a gente colocou em todas as tomadas a bolinha de silicone para o lado que apaga e agora está facial apagar as luzes. Quando vai uma pessoa lá em casa e vai embora e a gente não precisa mais pedir para ninguém apagar a luz. Agora nós tocamos lá na bolinha e apagamos as luzes. Era isso que eu queria compartilhar com vocês. A gente compra essas bolinhas de silicone em qualquer lugar. Estou dizendo isso para vocês compartilharem com alguém que more sozinho, ou um casal de cegos. É para vocês compartilharem isso também.

Eu estava também explicando para a moça do Espírito Santo sobre o Programa Virtual Vision. É um programa que a gente consegue de graça, com o Banco Bradesco ou com o Banco Real, e que dá acesso a Internet. Ele dá acesso ao outlook e eu trabalho com ele. Eu sou advogada e trabalho no Tribunal Regional Eleitoral. Eu trabalho com esse programa há muitos anos. Ele é ótimo. Eu faço petições, faço tudo com ele. Se a gente mandar um e-mail para a Fundação Bradesco, www.fundacalbradesco.org.br você consegue fazer um convênio com eles e eles dão um curso sobre o Virtual Vision, principalmente, para as ONGs. É gratuito e muito bom. Obrigado, era só isso.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Alguém quer acrescentar alguma coisa?

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Ivoneide Damasceno Ribeiro “ Rio Grande do Norte: Boa noite. Meu nome é Ivoneide. Eu sou de Natal e pertenço à Sociedade de Cegos do Rio Grande do Norte. Eu só queria dar um testemunho. Lá em casa é dose dupla porque eu sou cega e tenho um filho surdo. Antes, eu nunca admitia que o meu filho estudasse numa escola que o professor não tivesse nenhum conhecimento do que é ser uma pessoa surda. Depois que eu perdi a visão e nós chegamos à Associação, eu comecei a fazer um trabalho junto aos professores da rede regular de ensino, com todo o apoio da minha associação, é claro, no sentido de que os professores deveriam conhecer o Braille para poder receber os alunos cegos. Então eu acho que é necessário que se faça uma campanha maciça. Nós lá da associação, como nós temos jurisdição a nível estadual, nós vamos para o interior fazer essa conscientização do professor para que ele, pelo menos, conheça o mínimo de que a pessoa cega precisa, as ferramentas que ele tem para se manter pelo menos na escola e concluir o ensino. Não adianta a gente falar em inclusão e o aluno chegar à escola e nem sequer permanecer, quanto mais concluir. O problema é que, para ele permanecer, ele tem que ter condições de acompanhar o que os outros alunos estão fazendo na escola. Obrigado.

Cristina Brasil “ Paraíba: Boa noite. Meu nome é Cristina Brasil. Eu sou Professora da Universidade Federal da Paraíba e também trabalho com a APAE. Nós fizemos um projeto para trabalhar com computadores com crianças deficientes mentais e com paralisados cerebrais e conseguimos através do PRONESP. Hoje em dia, nós atendemos mais de 200 alunos e, Graças a Deus, o pessoal está indo muito bem. Nós temos um adolescente, já com 18 anos, que tem muita dificuldade motora, mas ele tem uma garra muito grande e já está escrevendo um livro. A APAE se propõe a editar o livro dele, contando as aventuras amorosas dele, seus namoricos e brincadeiras. Na realidade, eu vivo acompanhando todas as peripécias. Realmente, a gente veio aqui para ver alguma coisa do Professor Antonio Borges. Eu gostaria imensamente que você nos desse alguma coisa a mais, algum subsídio porque nós ficamos só com aquele HP que o MEC mandou, estamos pescando aqueles programinhas da Mônica, mas gostaríamos de ter mais subsídios. Todos aqui conhecem o Fernando Capovilla e aquele outro Professor da UNICAMP, José Fernando Valente. Eles realmente têm muita coisa para passar para a gente. E no nosso caso, fomos favorecidos pelo governo. Agora esperamos que ele continue favorecendo.

Participante não identificado: Eu adorei essa mesa, até pelo formato que você colocou. As pessoas foram se colocando, se sentindo bem em casa e foi muito inovador. Mas a gente tem que sair daqui com alguma coisa para a plenária. Não sei o material que você tem. Algumas das coisas que você colocou talvez tivessem que ser colocadas por escrito para as pessoas falarem lá na plenária.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Só para o seu controle, essa palestra que eu dei aqui hoje não foi uma palestra, foi um pinçar de coisas. Essa palestra vai ser dada completa amanhã. É claro que ela vai ser muito compacta, não vai haver tempo para nenhuma intervenção, vai ser aproximadamente de 25 minutos e ela vai ser muito mais abrangente. Eu vou falar das tecnologias especificamente e eu acho que vocês não vão sair decepcionados com a palestra amanhã. Convido a todos para assistirem à palestra completa, sem intervenções, infelizmente. Vai ser amanhã, na parte da manha.

Participante não identificado: A questão é que o número de participantes que estão aqui é reduzido, em relação ao ao número de delegados e a gente vai fazer uma política para o país todo. Existe hoje um portal sobre tecnologia assistiva e ajudas técnicas, mas até o nome está confuso porque ainda não foi definido qual vai ser. Existe o Portal Nacional de Ajudas Técnicas, onde são divulgadas experiências como aquela experiência das bolinhas que a companheira colocou. Há também um espaço para isso. Não é só para produtos que vão ser vendidos, mas nós também criamos soluções e queremos compartilhar isso com todo mundo. A idéia é construir um conhecimento coletivo, não é? Então eu só queria que aquilo que a gente conseguiu aqui realmente a plenária toda tomasse ciência para que a gente conseguisse colocar isso para o coletivo do país.

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Participante não identificado: Eu queria lembrar a vocês que a CNBB, este ano, com a Campanha da Fraternidade, fez uma coleta de donativos e geralmente essas coletas são bastante generosas. Tudo isso está à disposição das instituições, das ONGS, para custear a elaboração de projetos, principalmente, recursos para projetos que favoreçam pessoas com deficiência. Vocês devem procurar a CARITAS Regional, na cidade de vocês, ou o Bispo, ou mesmo o padre da paróquia de vocês, para que ele possa assinar o projeto de vocês e enviá-lo para ser analisado.

Lá em Teresina, estamos fazendo um projeto de inclusão digital para todas as pessoas com deficiência. Esse projeto pode chegar a R$ 500.000,00, R$ 300.000,00 ou R$ 200.000,00. Isso não tem problema porque esse ano realmente as pessoas foram mais generosas. Diante da situação, elas abriram mais a mão e o coração para doar. Vocês podem procurar a CÁAITAS Regional ou se não tiver procure o Bispo ou o padre da paróquia de vocês que eles tem essas orientações de como adquirir esses recursos. Este ano a campanha é realmente para pessoas com deficiência.

Eu queria agradecer a todos vocês porque eu fiquei fascinado por esse momento aqui. Eu estava doente em casa, fiquei em casa até às 17h00min, depois melhorei, voltei e valeu a pena. Parabéns e muito obrigado.

Antonio Borges “ Projeto DOSVOX: Foi legal demais. Bom, eu acho que todo mundo que queria falar já falou. Eu só queria deixar uma ultima mensagem para vocês. Foram colocadas muitas informações na tela do computador. Foi uma pena que algumas pessoas chegaram tarde e outras chegaram e foram saindo, mas existe um registro de tudo isso e esse registro vai ser colocado no site do evento. Independente do dia que eles forem disponibilizar isso, se vocês quiserem uma cópia desse material, eu posso mandar por e-mail se for possível. Se não for, basta escrever para esse endereço que eu mando uma cópia de tudo aquilo que a gente apresentou hoje. O meu e-mail é [email protected] e se alguém quiser falar comigo, por alguma razão, o meu telefone é 021 2598 3339. Se você quiser receber esse material eu mando para você um ou dois dias depois. Vou tentar te mandar por correio eletrônico que fica mais fácil, mas se você por acaso não puder receber por correio eletrônico não tem problema. Manda para mim que eu te mando por correio. Conto com vocês lá amanhã. Boa noite. Muito obrigado

4.12 O Direito do Deficiente Auditivo de Adquirir a Língua Oral de Seu País

Marcos Cordeiro de Souza Bandeira - Coordenador: Boa noite. O meu nome é Marcos Bandeira, sou Conselheiro do CONADE e sou deficiente auditivo oralizado. Este Painel é para que possamos conhecer os trabalhos voltados para a área de deficiência auditiva oralizada. A Fonoaudióloga Ângela Alves, que é uma pessoa com larga experiência em exercício da fala, vai fazer uma apresentação do trabalho voltado para o aprendizado da fala. Eu gostaria de simplificar e passar para ela porque acredito que todos vocês vão achar fascinante o trabalho que é desenvolvido pela Ângela Alves.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Boa noite a cada um de vocês. Desculpem a demora, mas nós já estávamos saindo e guardando tudo. Que bom que nós podemos ter agora estes momentos com vocês, pessoas das quais nós somos fãs incondicionais porque trabalhamos na área da deficiência auditiva há muitos anos. Nós queremos agradecer, eu e a Renata, esta oportunidade, queremos agradecer ao CONADE por meio desse conselheiro tão especial que é o Marcos Bandeira. O CONADE, que é um Conselho tão importante e significativo, poderá escutar também as nossas vozes e as nossas solicitações.

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Nós vamos dividir com vocês esses momentos, trazendo um pouco da nossa experiência no trabalho com as crianças surdas e suas famílias. A deficiência auditiva tem um grande efeito principalmente nas vidas das crianças, e nós, fonoaudiólogos terapeutas, na clínica fonoaudiológica, deveremos ter sempre a percepção de que estamos fazendo um trabalho de qualidade com essas crianças, transformando as suas vidas e trazendo significação ao seu desenvolvimento. Nunca antes, na história da deficiência auditiva, houve tanto potencial para escutar. As tecnologias dos aparelhos auditivos e principalmente do implante coclear têm favorecido o acesso ao riquíssimo mundo dos sons e da linguagem oral. Essa tecnologia tem possibilitado para milhões de bebês, crianças e adultos do mundo inteiro, a possibilidade de desenvolver a comunicação oral por meio do resíduo auditivo, levando a essas crianças a compreensão da linguagem, que é o aspecto mais importante do nosso trabalho: é a atribuição de significado.

Portanto, hoje, nós temos uma diferente história para contar. Para situar um pouco a clínica fonoaudiológica na perspectiva do trabalho com a criança surda, nós vamos retomar um pouquinho a história, porque todo o trabalho há alguns anos, com a criança surda, era de responsabilidade dos professores. Como as crianças chegavam tarde na escola, os professores assumiam integralmente, tanto na vida acadêmica dessas crianças como no desenvolvimento da oralização ou dos gestos, dos sinais; toda essa responsabilidade era dos professores.

Com a possibilidade do diagnóstico da deficiência auditiva, mais ou menos na década de 70, um novo cliente surgiu: a criança pequena e sua família. Então a fonoaudiologia veio com outra proposta no atendimento às crianças deficientes auditivas que começaram a chegar bebês e a demanda, em função da idade, ficou sob responsabilidade da clínica fonoaudiológica. E hoje nós temos uma grande parceria com os professores; mesmo que eles não estejam atuando mais na reabilitação diretamente, a nossa parceria é muito grande porque, com o saber deles e com o nosso conhecimento, nós fazemos um trabalho de equipe bastante importante para o desenvolvimento dessas crianças. O foco de trabalho, então, passou das escolas especializadas para as experiências diárias dessas crianças, tendo os pais, a família como agentes ativos no desenvolvimento da linguagem das crianças. Todo esse deslocamento elevou a clínica fonoaudiológica a um movimento de reflexão muito grande e nos aproximamos de outras áreas do conhecimento.

A proposta da reabilitação antes, com todo esse movimento, era tratar da pessoa surda para integrá-la à sociedade, diferentemente do que tem acontecido agora, nos dias atuais, em que se qualifica o conceito de inclusão social, qualifica uma sociedade democrática. E a inclusão social é uma diversidade, é considerada uma diversidade como parte da condição humana e toda a pessoa com deficiência é parte integrante dessa sociedade, com direito e oportunidades que são equiparadas aos demais. Porém as suas potencialidades precisam ser simultaneamente desenvolvidas, porque só assim a sociedade vai ajustar-se à sua condição por meio do convívio, do respeito, da cidadania e da cooperação mútua.

Para que haja realmente essa equiparação de oportunidades, fundamentos importantes são parte do trabalho com as crianças na clínica fonoaudiológica:

• A intervenção e diagnóstico no primeiro ano de vida.

Nós sabemos que em função da plasticidade neural no sistema nervoso central, quanto mais cedo as crianças começarem a ser estimuladas, mais condição o cérebro vai ter de atribuir significados às informações da fala.

• O conhecimento a respeito do uso funcional da audição pelos dispositivos dos aparelhos de amplificação sonora ou do implante coclear.

• Estudos sobre a constituição da criança, porque a criança começou a chegar bebê na clínica.

Daí a importância de nós conhecermos o desenvolvimento desse bebê: como esse bebê chega? Quem traz? Como ele é inserido na família?

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• E uma grande contribuição para clínica fonoaudiológica foi um conhecimento maior em relação à concepção de linguagem, porque na relação dialógica adulto e criança é que se inicia a construção da linguagem.

A criança procura atribuir sentido e forma à fala do outro e o efeito de interpretação vai acontecendo. Essa criança, então, entra numa cadeia de significação, onde ela pode realmente atribuir significado às informações auditivas que ela recebe.

Então o trabalho com a criança surda tem como objetivo o desenvolvimento da linguagem, o aprendizado de uma língua com o aproveitamento máximo da audição, que é a condição básica que tem norteado as propostas orais para o trabalho da criança deficiente auditiva. A criança, por meio dos aparelhos auditivos ou do implante coclear, tem a possibilidade de escutar o que ela fala; então ela percebe o som, ela se escuta e ela produz esse som. E o nosso papel, como fonoaudiólogos, é sermos agentes de transformação, estarmos realmente comprometidos com a audição, que é a primeira via para que a informação chegue ao cérebro. Nós temos a participação sistemática das famílias, que são os maiores gerenciadores dessas crianças.

É importante a nossa interação em todos os aspectos médicos, audiológicos, sociais, cognitivos, afetivos e culturais, porque essa criança é trabalhada como um todo. É importante nós acreditarmos na nossa opção metodológica porque, só assim, os resultados vão acontecer. É certo que nenhum único método pode suprir as dificuldades de todas as crianças que são deficientes auditivas; outros métodos com certeza deverão ser usados, porque os casos são particularizados. O método melhor é aquele que mais vai auxiliar aquela criança e aquela família. Porém é importante que essas famílias sejam informadas das possibilidades que essa criança tem.

O que acontece muitas vezes é que, por desconhecer outros métodos, outras possibilidades, as famílias deixam de ter suas opções e, quando elas sabem de suas possibilidades, talvez não seja mais o momento daquela pessoa se desenvolver num método que foi a escolha da família. Os métodos não devem ser motivos de polêmica, exatamente porque cada caso é individualizado.

Nós tivemos aqui em Brasília, há uns seis anos, um encontro muito bonito de pais. Ele veio com uma programação dos Estados Unidos, aconteceu simultaneamente em cinco cidades brasileiras e uma delas foi Brasília, sob a minha coordenação. Nós tivemos, assim, um apoio muito grande das empresas de Brasília e o curso foi um sucesso. E, nesse curso, nós percebemos como, às vezes, as famílias não têm nenhuma noção do que tem acontecido na área da deficiência auditiva; muitas famílias carentes, principalmente, não têm essa informação. E as pessoas perguntam: Para que dar informações para as pessoas carentes? Elas nunca vão poder ter acesso! Com certeza elas podem ter acesso e nós somos responsáveis por levar esse conhecimento às famílias. Nós temos, a partir deste encontro, famílias que naquele momento souberam, famílias muito carentes, que souberam sobre a tecnologia do implante coclear e foram em busca dessas possibilidades. Tem uma família, que hoje está na clínica, que foi a primeira que conseguiu que o convênio pagasse a cirurgia; a criança, que já tinha perto de seis anos, foi implantada e, surpreendentemente para nós, está tendo um sucesso muito grande, apesar de feita a cirurgia com essa idade. Então nós temos, sim, o dever de levar as informações e as famílias, então, vão fazer as suas opções.

Nós trabalhamos, eu e a Renata, numa instituição de crianças surdas muito carentes. Essa instituição tem mais ou menos 300 crianças e o nosso programa foi denominado Aprendendo a Escutar. Ele tem 42 crianças e eu coordeno esse programa; esse é o terceiro ano de funcionamento, com crianças de 0 a 3 anos. Então é o começo, é quando nós acolhemos essas famílias e podemos então, se essas crianças tiverem condições, levá-las à habilitação ou reabilitação para que elas possam, ou por meio dos aparelhos ou por meio dos implantes cocleares, desenvolver a comunicação oral.

Quando nós entramos nesse programa as famílias não conheciam a tecnologia do implante coclear, elas não tinham essas informações, por serem famílias muito simples. Então, nós não tínhamos no programa nenhuma criança implantada. Hoje, no programa, de 42 crianças, mais da metade das crianças do programa estão implantadas; e o que é interessante é que as crianças estão chegando mais cedo no programa. Então crianças que às vezes chegavam com 4, 5 anos, estão chegando bebês, em

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função da identificação que hoje pode acontecer nos primeiros dias de vida e que depois a Renata vai falar para vocês. Eu vou mostrar o filme do nosso programa; nós ganhamos esse filme de uma agência de publicidade - tudo no CEAL nós ganhamos - e, se depois vocês quiserem discutir um pouquinho sobre ele, a gente pode estar falando.

As crianças do programa passam a manhã toda no CEAL; elas entram às oito horas e saem ao meio dia. Elas têm, além da terapia fonoaudiológica durante uma hora, outras atividades; nós temos a oficina das histórias, então, desde bebês, essas crianças podem, por meio dos livros, ter as suas possibilidades desenvolvidas. Vou parar de falar um pouquinho e mostrar o filme.

FILME

Locutor: O bebê começa a ouvir na barriga da mãe a partir do quinto mês de gestação. Do nascimento aos primeiros anos de vida, seis em cada mil crianças apresentam ou adquirem uma deficiência auditiva.

Depoimento 01: Ela teve meningite meningocócica. Foi um bebê que teve muito comprometimento e o engraçado é que ninguém acreditava que ela estava surda.

Depoimento 02: Tinha um monte de cachorros na casa da vizinha, eles latiam e ela dormia tranqüila e não acordava.

Depoimento 03: Não falava papai, mamãe, que é a fase da criança estar se desenvolvendo para isso, então eu comecei a desconfiar. Daí minha família achou que eu estava bastante estressada e falou: Você está é estressada. Eu falei: Não estou, eu tenho certeza de que ele não está escutando.

Locutor - No CEAL, em Brasília, famílias de vários cantos do país encontram apoio, diagnóstico e terapia individualizada para bebês de 0 a 3 anos.

Criança falando – O passarinho... Locutor - O programa Aprendendo a Escutar atende crianças de diversos graus de deficiência

auditiva.

Depoimento 04: Ela começou a terapia com quatro meses e eu pensei assim: Será que minha filha vai chegar lá como todas as crianças que tem aqui? Qual o destino dessas crianças?

Depoimento 05: Mamãe – é a mamãe!

Locutor - O teste da orelhinha, previsto em Lei, pode avaliar a audição nos primeiros meses de vida e prevenir que a surdez comprometa o desenvolvimento da fala, da linguagem e da criança.

Depoimento 06 – (batida de um sino) A Bruna está normal, passou no teste.

Locutor: Em um dos poucos equipamentos disponíveis em Brasília, os profissionais do CEAL fazem a triagem auditiva nos recém-nascidos.

Depoimento da Médica: Se é detectada uma perda auditiva, essa criança já é encaminhada para a protetização - colocar prótese auditiva na orelha - junto com o tratamento de terapia com a fonoaudióloga.

Depoimento do Médico: O diagnóstico precoce é a melhor intervenção, porque os primeiros 3 anos são fundamentais, a cabecinha dela, o cérebro dela ainda está disponível para ser estimulado.

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Então, se a gente estimula nesse tempo, o cérebro recebe melhor; e se estimulamos nesse tempo não só o cérebro mas o coraçãozinho dela, o corpo dela, significa que, como pessoa ela vai crescer muito mais e, como pessoa que tem esse limite, ela poderá ter muito mais chance de superar, de vencer esse limite.

Depoimento da Médica: Nós temos o que se chama de plasticidade neural. Então quanto mais cedo nós começarmos esse trabalho com essas crianças, melhores condições, melhores resultados elas terão no desenvolvimento de suas vidas.

Depoimento 08 - Essa é a Régine, é a caçula daqui, é a mais novinha. Ela iniciou a terapia há nove meses aqui no CEAL e ela está usando aparelho auditivo há quatro meses. Nós já estamos percebendo que a Régine está soltando muito som: quando a gente liga o aparelho dela, ela começa e emitir muitos sons, ela começa a balbuciar - como vocês estão percebendo - e quando o aparelho está desligado, o comportamento dela não é o mesmo. Então a gente vê que ela sente prazer em ouvir e de se escutar mesmo, de ouvir a própria voz dela.

Mãe da Régine: Eu acho que o progresso está avançando cada vez mais, que ela está ouvindo bastante assim. Tudo o que ela ouve ela aponta, ela chama a atenção da gente emitindo sons, balbuciando. Está saindo o implante dela agora e com o implante a criança progride mais, porque ela escuta mais e pode até falar.

Criança cantando - Atirei o pau no gato to to, mas o gato to to não morreu reu reu, dona Chica ca ca admirou-se se do berro, do berro que o gato deu. Miau!

Locutor: Gabriele foi a primeira das 18 crianças encaminhadas pelo CEAL para o implante coclear realizado fora de Brasília.

Depoimento da Médica: O implante é uma prótese auditiva, um equipamento eletrônico que substitui parcialmente a função do órgão sensorial da audição, dando condições das crianças experenciarem uma sensação auditiva, o que lhes dá uma qualidade de vida muito melhor, muito mais efetiva, com o desenvolvimento mais veloz da fala e da linguagem.

Depoimento 09: E não é mais um aparelho, é um ouvido, ela escuta de verdade e todo mundo percebe. Parecia mágica você pensar que uma criança que tem perda profunda vai ouvir... Escutar sim, ela escuta tudo, mas aqui na terapia ela aprende a ouvir, ouvir as coisas separadamente, ela percebe as pessoas diferentes, fala em momentos diferentes, os sons dos animais. Gabriele fala tudo, não é, Gabi? Gabi, fala para a Cris que ela está muito chique hoje: - tá chique.

Locutor: Hoje, o ouvido biônico permite que Guilherme freqüente uma escola da rede pública.

Depoimento da Médica: É natural que as crianças fiquem curiosas no início, elas querem saber o que é isso que elas estão usando: É radinho, é um brinquedo eletrônico? E os professores têm nos ajudado muito, dando essas informações nos primeiros dias em que a criança chega na escola com o implante.

Mãe: Meu filho é super inteligente, está no Jardim II e já escreve! Sabe as cores, encaixa bem, já fala, fala com a fono dele no telefone. Então, para mim, é perfeito.

Locutor: Envolver a família na terapia áudio e oral é o desafio do programa Aprendendo a Escutar do CEAL.

Mãe: Ele desenvolveu cada dia mais e está falando cada vez mais.

Mãe: Depois que ela colocou o implante, progrediu mais ainda.

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Depoimento 10: Não sei se tenho palavras para dizer o quanto essas crianças são corajosas, o quanto essas famílias são vencedoras, o quanto se pode chegar lá. A gente tem a realidade de famílias que cresceram como cidadãs, são famílias que se tornam felizes e integradas na sociedade a partir de uma criança surda em casa.

Depoimento do Médico: Se investirmos desde o começo, logo que for diagnosticado, daremos a esse cidadão a chance de desenvolver tudo aquilo que ele é, tudo aquilo que ele pode, todas as suas aptidões para a vida no dia-a-dia.

Locutor: Cristiane estudou no CEAL, onde conheceu Manuel, hoje professor de deficientes auditivos como ele. Os filhos de Emanuel e Ana Clara são candidatos ao implante coclear.

Depoimento da Ana Clara: Não quero passar para o meu filho tudo (ininteligível) que ele cresça mais bonito, lindo, feliz, independente, de bem com a comunidade, muito livre.

Locutor: O programa Aprendendo a Escutar, do Centro Audiológico Ludovico Pavoni, mantém uma equipe profissional de fonoaudiólogos, professores, psicólogos e assistentes sociais, além de voluntários. Você pode fazer parte desta equipe ou se tornar parceiro do CEAL.

Mãe da Gabriele: Se todos tivessem a oportunidade que a minha filha está tendo de ouvir, de participar do mundo como ela participa... E todo o mundo sente a evolução das crianças a cada palavra, a cada entendimento, porque não é só a palavra que conta; não adianta ela reproduzir tudo, o que adianta é ela participar, é ela modificar as coisas. Eu imaginei que minha filha ia ficar à margem da sociedade e ela não vai ficar. Gabriele, eu te amo.

Gabriele: Eu te amo.

Mãe da Gabriele: Lá do fundo do meu coração.

Depoimento 11: Minha filha ter capacidade para fazer isso, falar, ver que ela já está falando, aprendeu a falar, que ela não sabia e já está começando a conhecer o som; ela faz barulho, estava fazendo o barulho do sininho e eu estou feliz porque ela está me mostrando que ela tinha sentido o barulho, eu estou muito feliz.

FINAL DO FILME

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Depois, se vocês quiserem fazer alguma pergunta sobre o trabalho no CEAL que vocês viram, vai ser muito gostoso estar dividindo com vocês. [...]

[...]

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Vocês querem fazer as perguntas agora? Depois?

Renata de Sousa Tschiedel – CEAL/DF: Bom, então agora a gente vai conversar um pouquinho sobre a importância da audição nas nossas vidas.

A audição é a via de entrada para as informações auditivas, para as informações sonoras, para a gente escutar os sons cotidianos. Por exemplo, quando a gente amassa uma folha de papel isso tem um som, quando a gente dá descarga no banheiro isso tem um som, se a gente deixa uma caneta cair no chão e não vê que essa caneta caiu, pelo som que a caneta faz quando cai, a gente sabe que aconteceu. Para a gente identificar sons de alerta, se o telefone está tocando, se alguém está batendo na porta, se eu vou atravessar a rua e não olho direito, pela audição eu consigo escutar que um carro está se aproximando. E,

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também, a audição é a via de entrada dos sons da fala, que são os sons importantes para o desenvolvimento da linguagem do bebê e da criança.

Na barriga da mãe, na quarta semana de gestação, a orelha já começa a ser formada. Então o nosso ouvido é dividido em três partes; eu vou mostrar para vocês e isso começa na quarta semana de gestação. Quando o bebê está na 20ª semana de gestação, ele já consegue escutar a voz da mãe e sons produzidos pelo corpo da mãe. E também existem pesquisas que comprovaram que, diante de um estímulo sonoro, os bebês dentro da barriga da mãe, a partir dessa semana, têm modificação do batimento cardíaco, indicando que o bebê já está escutando a partir da 22ª semana de gestação.

Então, o nosso ouvido é dividido em três partes:

• A parte externa, que compreende o pavilhão auricular que nós chamamos de orelha, o conduto auditivo; essa é a parte externa do ouvido.

• A parte média do ouvido é compreendida pelo tímpano, pelos três menores ossos do nosso corpo, que são Martelo, Bigorna e Estribo. E esses ossos ficam conectados um no outro, suspensos nessa caixa de ar que é chamada cavidade timpânica, que tem uma ligação com o nariz, chamada Tuba Auditiva; essa é a parte média do ouvido.

• E aqui é a parte interna, que é composta pelo labirinto, responsável pelo equilíbrio do corpo, equilíbrio periférico e aqui é a Cóclea ou Caracol, que é onde nós temos as células sensoriais da audição; e aqui o nervo auditivo, que vai levar as informações da orelha até o cérebro.

Como é que nós ouvimos? O som chega aqui pelo conduto auditivo externo, vibra a membrana timpânica que vai vibrar esses ossículos, que vai movimentá-los; eles vão empurrar uma membrana que tem aqui e quando essa membrana é empurrada movimenta líquidos que tem aqui dentro da cóclea, e a movimentação desses líquidos faz com que as células sensoriais disparem uma informação para o nervo auditivo, que leva a informação elétrica para o cérebro.

Quando a gente tem alguma dessas partes do ouvido com problema, a gente pode ter um problema de audição que pode ser reversível ou irreversível. Então por exemplo, se eu tiver uma pessoa que nasce sem o pavilhão auricular, ela tem uma má formação e vai ter um problema na condução do som: o som passa, mas não passa muito som. Se eu tenho uma pessoa que tem rolha de cera aqui no conduto auditivo, o som também passa, mas ela, ainda assim, vai ter uma perda, porque o som não passa totalmente; mas se o médico tirar a cera, ela volta a ouvir de novo. Algumas pessoas, por exemplo, vão coçar o ouvido com caneta e furam um tímpano; quando isso acontece, a pessoa pode escutar menos, mas aí o médico pode fazer uma cirurgia para reconstituir o tímpano e a pessoa volta a ouvir novamente. Se você tem, por exemplo, uma inflamação no ouvido, quando a gente sente dor de ouvido, quando a gente sente o ouvido tampado, é porque aqui dentro está com alguma inflamação e aí a gente também tem uma perda auditiva. Se o médico passar algum medicamento, isso pode sarar.

Agora, se o problema acontece aqui na parte interna do ouvido e afeta as células sensoriais, aí nós vamos ter um problema permanente; é uma perda auditiva irreversível para a qual não existe cirurgia, não existe medicamento que faça a audição voltar ao normal. Por conta disso, a deficiência auditiva pode ser classificada em diferentes tipos: você tem a perda auditiva condutiva, que é quando o problema está localizado na orelha externa ou na orelha média; a gente tem um problema neurossensorial quando afeta as células da cóclea e a gente pode ter um problema de audição misto, que é quando você tem um problema na parte externa e na parte interna, ou na parte média junto com a parte interna, ou nas três partes da orelha. Às vezes eu tenho toda essa estrutura íntegra, mas se o nervo auditivo não existir ou se ele estiver danificado, a informação não chega ao cérebro; ou ainda, se eu tenho toda essa estrutura funcionando inclusive o nervo auditivo, mas - aqui está o ouvido, ele foi miniaturizado - se eu tenho um problema nas vias auditivas centrais, no caminho que o som vai levar do ouvido periférico até ao cérebro, se eu tiver algum problema aqui, aí eu vou ter uma perda auditiva central. A pessoa até escuta, mas não sabe o que fazer com aquela informação. Isso que eu acabei de falar para vocês é a classificação da deficiência auditiva quanto ao local da lesão.

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Agora a gente vai destacar a perda auditiva neurossensorial. A perda auditiva neurossensorial acontece quando você tem o conduto auditivo funcionando bem, o tímpano está integro, os ossículos estão bem articulados, mas você não tem as células ciliadas do órgão de corte, que são aquelas células sensoriais de que eu falei para vocês. Então, se a gente não tem essas células ou não tem o nervo auditivo ou esse nervo auditivo está alterado, nós vamos ter um problema neurossensorial. Esse desenho representa bem isso: aqui os ossículos, aqui a cóclea, aquele caracol e aqui são as células que recebem informação. Quando uma pessoa tem audição normal, essas células estão ligadas ao nervo auditivo e a informação consegue sair daqui e ser levada ao cérebro. Na perda auditiva neurossensorial a ligação das células com o nervo não existe, ou existem poucas células que fazem conexão com o nervo auditivo; aí você não tem informação auditiva chegando ao cérebro.

Quanto ao grau, a deficiência auditiva pode ser classificada também de quatro formas: você pode ter uma perda leve, moderada, severa ou profunda. Esse gráfico aqui, que muitos de vocês deve conhecer, é o audiograma por meio do qual a gente coloca o desenho da audição das pessoas quando elas fazem Audiometria. Aqui, no eixo vertical, eu tenho representadas as freqüências dos sons e aqui, no eixo horizontal, eu tenho a intensidade do som. Uma pessoa que tem a audição normal escuta desse número de 20 decibéis para cima, ou seja, ela consegue escutar muito bem todos os sons da fala que estão aqui representados. Uma pessoa que tem uma perda auditiva leve vai ter a audição aqui, então ela pode escutar alguns sons da fala e outros não. Uma pessoa que tem uma perda auditiva moderada tem entre 40 e 70 decibéis; a audição dela está aqui e os sons da fala estão aqui em cima, então ela já tem mais dificuldade ainda para escutar os sons da fala. Uma pessoa com perda severa vai ter o desenho da audição aqui. Sem amplificação dificilmente essa pessoa vai escutar o som da voz, a não ser que a pessoa fale numa intensidade muito forte. E uma pessoa que tem a perda auditiva profunda - o desenho da audição dela vai estar aqui embaixo – realmente, sem amplificação nenhuma, ela não tem possibilidade de escutar o som da fala, o som da voz.

Existem várias causas da deficiência auditiva. Essas causas podem acontecer antes do nascimento, por exemplo, se a mãe contrair rubéola durante a gestação, o bebê pode nascer com deficiência auditiva; um problema auditivo pode acontecer por causa de alguma coisa que aconteceu durante o parto, ou depois que a criança nasceu, se ela tomou medicamentos que lesaram o ouvido, se ela teve doenças como caxumba, sarampo que tiveram complicação e levaram a uma perda auditiva, se sofreu algum trauma craniano; e pelo envelhecimento a gente também perde audição, entre outras causas.

Para a gente descobrir que uma pessoa tem uma perda auditiva, existem vários testes que são feitos pelos fonoaudiólogos para verificar o quanto a pessoa está escutando; tem testes subjetivos, que são testes que dependem da resposta da pessoa que está sendo testada. Com crianças a gente faz esses testes aqui, avaliação comportamental, audiometria com reforço visual, audiometria lúdica. E existem os testes objetivos que não dependem da resposta da pessoa que está sendo testada: temos a imitanciometria e os testes eletrofisiológicos; esse daqui é o BERA, o Potencial Evocados Auditivos de Troncos Cerebrais e as emissões auto-acústicas, que hoje são chamadas de teste da orelhinha. O teste das emissões auto-acústicas pode ser feito a partir de quarenta e oito horas de vida do bebê. Então, como é um teste que pode ser realizado com a criança ainda na maternidade, os governos, de uma forma geral, têm se preocupado em implementar esse teste nas maternidades. Existem leis municipais, leis estaduais; no Distrito Federal tem uma Lei que obriga a realização do teste da orelhinha nas maternidades, porque quanto antes essa deficiência auditiva for diagnosticada, mais rápido a gente consegue fazer a intervenção. Agora, a realidade é outra: você tem as leis, mas essas leis, muitas vezes, não são cumpridas. Por exemplo, no DF pouquíssimos hospitais particulares têm realizado esse teste da orelhinha. E se o bebê não passou nessa triagem das emissões auto-acústicas, o que fazer? A gente tem que primar pela urgência no atendimento dessa criança.

Bom, já que o encontro é sobre acessibilidade, uma das formas de eliminar essa barreira para que uma criança deficiente auditiva possa vir a adquirir a língua oficial de seu país é que seja realizado, efetivamente, o diagnóstico precoce. Uma Portaria de 2004 lançou uma Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva, prevendo a prevenção, o tratamento e a reabilitação das deficiências da audição.

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Eu comentei com vocês que existem problemas auditivos reversíveis e irreversíveis. Em relação àqueles problemas que podem ser curados, o médico vai indicar o uso de remédios ou realização de cirurgia; e para os problemas de audição que são irreversíveis, nós temos a opção dos dispositivos auditivos, que são o aparelho de amplificação sonora, o implante coclear e equipamentos auxiliares.

Os aparelhos de amplificação sonora já evoluíram muito. Antigamente, pessoas com deficiência auditiva profunda não tinham beneficio nenhum com os aparelhos auditivos; isso em torno de uns 70 anos atrás, mas hoje isso tem mudado bastante: hoje os aparelhos auditivos estão cada vez menores, mais potentes e com uma qualidade de som muito melhor. Esse aqui, por exemplo, é um aparelho auditivo: essa pessoa está usando esse aparelho auditivo nesse momento, ele nem aparece aqui e ela não usa molde, ela usa só um fone que fica inserido lá dentro do ouvido, nem dá para perceber que ela está usando o aparelho auditivo. Esse aqui é um aparelho intra-auricular - ele fica daquela forma dentro do ouvido - o aparelho intra-canal, que é um pouco menor e o aparelho micro-canal, que é inserido completamente no conduto auditivo. Agora, nem todos esses aparelhos servem para qualquer grau de perda auditiva; por exemplo, uma pessoa que tem perda auditiva profunda não pode usar um aparelho desses, porque esse aparelho não tem potência suficiente para oferecer a quantidade de som de que, realmente, a pessoa necessita.

Quanto mais cedo se identificar que a criança tem uma perda auditiva e for realizado o diagnóstico do quanto essa criança escuta, qual é o tipo de deficiência auditiva que ela tem, ela pode sim, já desde bebê, colocar um aparelho auditivo. No caso de se fazer o diagnóstico o mais cedo possível, a amplificação deve ser imediata para que a criança venha a aproveitar o período critico de desenvolvimento da linguagem, para que você tenha uma intervenção adequada e melhores transformações na interação com a criança no dia-a-dia, interação com a criança no contexto de terapia também. A Ângela agora vai continuar com vocês, vai falar sobre o implante coclear e a reabilitação.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Nós vamos passar para vocês um filme que explica bem sobre o implante coclear e fica o momento mais ativo aqui com a gente. Foi importante a Renata mostrar para vocês todos esses aspectos da audição, para vocês poderem entender um dos critérios pelos quais as crianças podem passar pelo implante coclear, que é com a perda severa ou profunda; por isso é que nós fizemos essa explicação anterior a vocês. Então agora, para terem uma idéia melhor, tem um filme e depois nós vamos dar continuidade aos aspectos do implante coclear e como ele tem beneficiado as crianças surdas.

FILME

Locutora: O implante coclear é um auxilio para crianças e adultos deficientes auditivos que não podem se beneficiar com aparelhos de amplificação sonora convencionais. O equipamento transforma os sons em pulsos elétricos que estimulam as fibras nervosas do ouvido interno; desta maneira, os sons podem ser ouvidos novamente.

Para entender a função do implante coclear, nós seguiremos o caminho que o som faz em condições normais. A onda sonora viaja através do canal auditivo e chega à cóclea, através do ouvido médio. Na cóclea, a onda sonora é transformada em pulsos elétricos, que viajam através dos nervos até o cérebro. Então, o som é processado, o som é transmitido em alta velocidade.

A cóclea ocupa um papel importante no completo processo auditivo. A cóclea consiste de três pequenos canais cheios de fluído. A onda sonora recebida viaja através do fluído e estimula milhares de células no ápice das células ciliadas; as células ciliadas convertem energia mecânica em impulsos elétricos, que estimulam as fibras internas nervosas; elas formam um nervo acústico que envia mensagem para o cérebro. Os sons graves estimulam o ápice da cóclea e os sons agudos estimulam a base. Quando as células ciliadas estão parcialmente ausentes ou danificadas, a audição fica reduzida e prejudicada. Isto pode ser auxiliado por aparelhos de amplificação sonora convencionais.

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Quando as células ciliadas estão completamente ausentes ou danificadas, a deficiência auditiva ocorre. Normalmente as fibras nervosas estão intactas, mas elas não podem receber impulsos elétricos; neste caso o implante coclear pode ajudar. O cirurgião insere profundamente os eletrodos dentro da cóclea, coloca o magneto debaixo da pele, atrás da orelha; o magneto externo se encaixa exatamente no magneto interno, o som é transmitido através da pele; o microfone capta o som e o envia para um pequeno computador: o processador de fala. Esta é uma pequena caixa que pode ser usada no corpo ou atrás da orelha. Essa é uma parte muito importante do implante coclear: o processador de fala transforma os sons recebidos e os envia através dos magnetos para o eletrodo e a fala e os sons são transmitidos artificialmente para o nervo auditivo.

No intenso processo de reabilitação auditiva é necessário, para aprender, ouvir os sons e a fala novamente.

FINAL DO FILME

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: É um pouco complexo para entender, mas nós vamos depois passar novamente, numa outra situação e a gente vai entendendo melhor. É preciso muita familiarização para nós podermos entender a complexidade do implante. Mas não importa a sua complexidade, em função do benefício que ele tem trazido às pessoas surdas.

Eu vou passar agora para vocês o depoimento de uma paciente minha: quando a Fernanda entrou na clínica ela não tinha completado ainda dois anos e ela desenvolveu a habilidade da comunicação por meio do resíduo auditivo que ela apresentava com o uso de aparelhos auditivos. Aos quinze anos, ela pediu aos pais o implante coclear de presente de aniversário. E ela vai dar um depoimento a vocês, já com o implante, sobre qual foi a transformação na sua vida. A Fernanda, hoje, está fazendo arquitetura no CEUB, freqüenta regulamente uma universidade, só vai à clinica uma vez por mês, está praticamente de alta e é uma pessoa que enfrentou muitos desafios na sua vida. Ela vai se apresentar para vocês.

FILME

Doutora: Fernanda, você acha que o implante fez uma diferença significativa na sua vida?

Fernanda: Olha, antigamente, quando eu usava aparelho, eu não ouvia tudo. Por exemplo, na televisão, eu não conseguia escutar a frase do jornalista [inaudível] e também não conseguia escutar a fala do professor na sala de aula porque era muita bagunça, muito barulho e não dava para ouvir. Eu tinha que fazer leitura labial para entender, escutava crases que eram mais fáceis de captar, escutava sons altos, sempre aumentava a música muito alta, e também eu não falava o S.

Doutora: Que problema!

Fernanda: Eu não conseguia, mesmo com o aparelho, escutar o S, então não falava. Mas agora, com o implante, eu escuto o S e, de vez em quando, eu falo o S. Eu escuto normalmente tudo, o carro passando na janela, a voz do meu professor quando passa no corredor, a água caindo da torneira, tudo.

Doutora: Sons que você nunca tinha escutado antes?

Fernanda: É! Eu também não mexia o cabelo, não sabia o barulho que o cabelo faz, mas agora faz barulhinho.

Doutora: Fernanda, tinha assim um desafio muito grande que você gostaria de conquistar com o aparelho e que não foi muito possível, e que agora você tem conquistado com o implante?

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Fernanda: O implante foi importante. É que o telefone tinha muito ruído e ficava difícil para eu escutar também, porque o próprio aparelho tem um ruído, então fica tudo junto e aumenta mais ainda e fica mais difícil escutar; e o implante é mais suave, é mais natural, parece natureza, não é artificial. No telefone eu não falo muito, eu não falo normalmente. Eu escuto muito melhor no celular. No meu celular eu escuto muito alto, a potência de voz é muito boa e dá para identificar se a voz é masculina ou feminina, se é grave é homem [inaudível] Quando eu estava com aparelho eu tentava achar amigos e era difícil, não sei porque, mas [...]

[...] com meus amigos, isso facilita mais a comunicação, a gente ficou mais amigo ainda! E agora eu tenho cinco amigos, é muita coisa, isso é muita coisa mesmo. Eles são super legais, é muito [inaudível].

FINAL DO FILME

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Também sobre a Fernanda depois a gente pode falar um pouquinho; vão guardando as perguntas para a gente discutir depois, se vocês quiserem. O grande sonho, então, de grande parte da comunidade surda querer ouvir, começou a se transformar em realidade a partir dos implantes cocleares.

O implante dinamizou o mundo da audição, ofereceu acesso ao sinal da fala a níveis audíveis, talvez, pela primeira vez, para algumas pessoas surdas e deu algum ganho significativo na capacidade auditiva. Redimensionou, tem transformado e impulsionado o nosso processo terapêutico no que se refere à viabilidade da percepção auditiva dos sons da fala por meio do estimulo elétrico. Então, as crianças têm muito mais potencial para construir a sua linguagem oral perto do desenvolvimento de uma criança ouvinte.

O implante é uma opção atual para o tratamento efetivo de adultos e crianças, portadores de uma deficiência auditiva severa ou profunda, só nesses casos. Quando o implante começou, ele só podia ser feito em pessoas com perda auditiva profunda; hoje se faz o implante também em pessoas que têm perda auditiva severa.

É um dispositivo composto por uma parte externa - o corpo - e uma parte interna, que é inserida cirurgicamente na mastóide e ouvido interno do indivíduo; é uma prótese computadorizada que tem como objetivo substituir as funções do órgão sensorial da audição, que é o órgão de corte. Ele é capaz de fornecer impulsos elétricos para a estimulação direta das fibras neurais remanescentes da cóclea e estimula diretamente o nervo auditivo.

Sob o aspecto histórico, é a primeira prótese a substituir um órgão sensorial. Como dispositivo eletrônico, ele é o primeiro componente biônico do ser humano; por isso é chamado de ouvido biônico. Não é experimental, o implante não é mais uma investigação científica, ele é um componente que nós usamos, um componente hoje clínico; não é mais experimental e tem mais de 100 mil usuários no mundo, sendo que 22 % são adultos e 78 % são crianças e bebês.

Eu vou mostrar para vocês os modelos de implante que nós temos e mais um pouquinho sobre o seu funcionamento, para vocês terem uma idéia melhor. Nós temos três tipos de empresas que fabricam, três empresas, no mundo, que fabricam o implante. Esse é um implante da Nucleus; ele é fabricado na Austrália e é um dos implantes mais usados em crianças e bebês, pela resistência maior que apresenta.

Nós estamos, agora, entrando na quarta geração dos implantes: esse aqui é a segunda geração de implante e esse aqui é e terceira geração do implante. Então aqui nós temos o processador da fala: ele é como um computador, depois eu vou mostrar o funcionamento para vocês; aqui é um microfone que fica atrás da orelha, essa é a antena transmissora, seu componente externo, esse é o componente interno, que é o receptor estimulador e aqui são os eletrodos que são inseridos na cóclea.

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Esse tipo de implante, que já é a terceira geração de implante - por isso que ele se chama 3G - todo esse processador já está miniaturizado aqui. Então nós temos aqui o microfone, todo esse processador que vai fazer a conexão com a parte interna por meio dessa antena.

O componente externo tem três partes, aquele maior, não o miniaturizado. Ele tem aqui o microfone - não sei se dá para vocês verem, está aqui atrás da orelha - que capta o som e transmite por esse fio ao processador de fala, que envia a informação codificada para a antena transmissora, colocada junto ao receptor estimulador.

Depois nós temos o componente interno, que é inserido na mastóide; o cirurgião abre a mastóide no osso temporal e faz a inserção até a cóclea. Então nós temos esse receptor estimulador que recebe os sons pela antena transmissora, transmite esses sons para os eletrodos, que faz todo aquele trabalho que vocês viram; a cóclea, toda estimulada, envia essa estimulação para as fibras nervosas até o cérebro porque, na verdade, nós escutamos por meio do cérebro, o ouvido é apenas uma passagem.

Só para vocês observarem, olhem o que acontece: esses são os eletrodos que são inseridos na cóclea; a cóclea é do tamanho de uma ervilha, então vocês imaginem a espessura desses eletrodos, que são envolvidos por silicone e inseridos totalmente na cóclea. Quanto mais os eletrodos forem inseridos, melhor vai ser a percepção da fala do individuo.

Aqui, mostrando um outro tipo de implante da Nucleus mesmo, que tem uma inserção mais profunda, ele fica mais pertinho daquela volta da cóclea e dá uma melhor percepção da fala. E esse tipo de inserção não era possível, antigamente, em indivíduos que ficaram surdos por meningite, porque acontece uma calcificação muito rápida da cóclea e hoje é possível, com novas tecnologias, que a inserção possa ser feita mesmo em indivíduos que têm cóclea calcificada.

Esse é um outro tipo de implante que é confeccionado nos Estados Unidos.

Os da Medel são fabricados na Áustria. Na verdade eles têm os mesmo componentes, o funcionamento é igual; eles têm algumas características diferentes, mas o funcionamento em geral é o mesmo.

Os implantes são fabricados com peças bastante específicas, por isso eles têm um custo tão alto. Um implante hoje, incluindo a cirurgia, a parte hospitalar, não fica por menos de oitenta mil reais. O SUS oferece esses implantes em alguns Centros que nós temos no Brasil e temos também médicos que estão fazendo essas cirurgias particulares. Então, quando as crianças não estão dentro do programa dos critérios dos Centros que fazem o implante pelo SUS - Sistema Único de Saúde - nós temos clínicas particulares que realizam os implantes. Eles só podem ser realizados depois de muito estudo, depois de avaliação específica e os pais ou o próprio paciente assinam um termo de responsabilidade junto ao Centro ou junto aos hospitais, assumindo que, realmente, eles querem o implante e são conscientes dos riscos que podem acontecer. É uma cirurgia e tem seus riscos, como em qualquer outra cirurgia.

A durabilidade dos implantes é de mais ou menos cento e trinta e cinco anos, mais que o tempo de vida do indivíduo. Como eu disse, os materiais internos do implante são pecinhas de ouro, são envoltos de titânio e silicone; então são produtos que raramente ocasionam algum problema ou alguma dificuldade para o usuário, a não ser que haja alguma intercorrência. Nós já tivemos alguns casos de crianças, depois de implantadas, caírem de uma altura bastante significativa, baterem a cabeça e haver a extrusão do implante, dos eletrodos; e foi refeita a cirurgia. Esses casos acontecem raramente e nós não temos muita notificação de casos mais severos.

A diferença do implante com o aparelho: esse é o aparelho auditivo; o aparelho precisa das células ciliadas para enviar o sinal para o nervo auditivo, e o aparelho amplifica os sons. Então, quanto mais células ciliadas boas dentro do ouvido interno, melhor vai ser a resposta do aparelho auditivo; quanto mais danificadas, como vocês viram no filme, menores as possibilidades de amplificação. O implante não amplifica os sons, ele potencializa os sons; ele não precisa das células ciliadas, ele ocupa, ele faz o lugar das células ciliadas; ele substitui a sua função e manda as mensagens diretamente para o nervo auditivo.

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Aqui nós temos um audiograma de uma criança de quatro anos, com uma deficiência auditiva profunda, que recebeu um implante coclear.

Como a Renata explicou para vocês, todos os sons da nossa fala são amplificados pelo aparelho: a criança ganhou nas freqüências graves, porém, nas freqüências agudas, ela ganhou pouco. E é justamente nas freqüências agudas onde se localizam as informações da fala. Com o implante, essa criança ganhou quase igualmente em todas as freqüências, porque o implante permite que a criança possa perceber os sons em todas as freqüências, graves e agudas. Porém, se vocês perguntarem: Toda a pessoa que faz o implante, ela tem uma perda leve? O audiograma é muito útil, porém ele é limitado. Um adulto, por exemplo, que fez um implante nessa idade e que pode não ter a linguagem muito desenvolvida, não vai se beneficiar muito do implante, mesmo com o audiograma nesse linear. O que é importante também no implante, juntamente com o audiograma, é a resolução temporal e espectral da fala, ou seja, a velocidade com que esse sinal chega e a qualidade de percepção de fala que essa pessoa vai ter.

Então quem pode se beneficiar do implante? Adultos pré-linguais que adquiriram a surdez antes do desenvolvimento da linguagem e adultos pós-linguais que têm já linguagem e perderam a audição por algum motivo; e também as crianças na mesma situação.

Hoje o implante se faz em bebês a partir de seis meses de idade. No final do ano passado, em dezembro, o CPA, o Centrinho de Bauru, realizou o primeiro implante no Brasil com um bebê de seis meses. Porque a cóclea nasce pronta e se esse bebê é diagnosticado nos primeiros meses de vida, e depois de toda uma avaliação específica, que vocês vão ver, ele puder ser uma criança implantada, não há necessidade de esperar, porque quanto mais cedo fizer um implante mais o desenvolvimento desse bebê vai se equiparar ao desenvolvimento de uma criança ouvinte.

Então as pessoas que podem se beneficiar do implante são aquelas que tiveram poucos benefícios com o aparelho e devem ter todos os seus aspectos de desenvolvimento bastante íntegros: a adequação psicológica, motivação da família para o uso do implante e investimento na reabilitação, grau de expectativa da família; há questionários bastante específicos para avaliar o grau motivacional dessa família. É importante que tenha programas terapêuticos na cidade de origem do paciente, voltados ao aproveitamento máximo da capacidade auditiva, que são determinantes no desenvolvimento das habilidades auditivas das crianças implantadas. E as famílias depois seguem, tem todo um desenvolvimento pós-implante: as famílias vão, no primeiro ano, de dois em dois meses aos Centros para a ativação e mapeamento dos implantes. Portanto é trabalhoso, porém com bastantes benefícios.

É muito importante, no programa de implante, que nós tenhamos uma equipe bastante integrada e harmoniosa de vários profissionais. E, com certeza, os resultados serão muito melhores se essa equipe estiver em sintonia e fizer um trabalho bastante harmônico: o cirurgião, o otorrino, o fonoaudiólogo, para a reabilitação; e há, na equipe, um psicólogo que vai fazer todo um trabalho com essas famílias e com essas crianças, assistente social e o professor, que tem sido, também, um grande parceiro no nosso trabalho.

Então nós temos avaliação pré-cirúrgica, cirúrgica e pós-cirúrgica. Eu vou falar rapidinho para vocês na avaliação pré-cirúrgica: a criança passa por vários exames audiológicos e dois deles são muito importantes - são diagnóstico por imagem - a tomografia e a ressonância magnética, onde o cirurgião vai avaliar muito minuciosamente se aquela criança tem toda a parte do ouvido íntegra e pode, realmente, receber o implante de cóclea.

Na etapa cirúrgica há todo um acompanhamento médico, pediátrico, avaliação do anestesista, exames laboratoriais, exames para saber se o ouvido médio da criança tem boas condições e os pais assinam o termo de compromisso.

É uma cirurgia extra-craniana, não causa transtorno ao cérebro e tem os mesmos riscos de qualquer cirurgia. Aí vemos uma fotografia de uma paciente nossa do CEAL; ela é filha daquele casal surdo que vocês viram no filme do CEAL, lembram? Ana Clara fez a cirurgia agora, essas crianças demoraram um pouquinho para passar por esse processo do implante coclear; são dois irmãos, o Emanuel que é mais velho e a Ana Clara. Quando eles foram para o programa de implante e realmente,

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depois de toda a avaliação, se concluiu que eles eram candidatos potenciais ao implante, o pai, que não é oralizado - a mãe é oralizada - desistiu do implante e assinou um termo de que não queria mais, porque ele foi muito pressionado pelos amigos, foi muito pressionado até pela família: Como ele, um surdo não oralizado, iria oralizar o seu filho? E começou, então, um dilema muito grande entre o casal: ele não queria mais, ele desistiu, ela queria, e nós nesse momento demos um apoio muito grande a essa família, respeitando a posição desse pai e fazendo-a compreender que num momento desses, de uma decisão de assumir um outro trabalho, de grande expectativa, de desejo, de emoções, que realmente era melhor que a criança não fizesse o implante. Então teve psicólogo trabalhando no caso, as crianças continuaram no programa e, depois de um tempo, ele quis retomar. Não foi mais possível fazer no mesmo centro porque já tinha passado da idade; nós procuramos outros centros que tinham outros critérios e que atendiam crianças com mais idade, os dois hoje fizeram o implante de cóclea, o pai repensou e refez toda uma proposta e hoje as crianças estão implantadas.

Ana Clara ativou o implante há um mês. Depois de um mês pós-cirurgia é que as crianças ativam o implante, ou seja, os componentes internos são ligados aos componentes externos. Onde é feita a cirurgia, hoje se faz uma incisão muito pequenina e nem ponto se dá mais, usa-se apenas uma cola cirúrgica; aqui está ela com a bandagem e saindo do hospital. A recuperação dessas crianças é muito rápida, em dois dias elas saem do hospital. Quanto menor a criança, mais fácil a sua recuperação.

Nós fazemos um trabalho pré-implante com essas crianças. A psicóloga do programa e toda a equipe fazem um trabalho muito específico com cada família e com as crianças: nós fazemos uma representação de tudo o que elas vão passar no hospital. Então tem todos os equipamentos médicos e a psicóloga dramatiza com as crianças essas situações. E os Centros estão fazendo uma devolução muito gostosa para nós, porque todas as crianças do nosso programa que vão para o implante são as que menos dão trabalho para os enfermeiros nos hospitais, porque elas vão tranqüilas: quando colocam o soro elas já sabem o que está acontecendo e isso tem facilitado muito o processo cirúrgico e pós-cirúrgico.

Eu já falei para vocês que, depois de quatro semanas, é feita ativação dos eletrodos. E, no primeiro ano de implante, de dois em dois meses as crianças voltam ao Centro para fazer um mapeamento dos eletrodos, ou seja, como se fossem fazer um ajuste nos eletrodos para que eles funcionem cada vez melhor. No segundo ano as crianças vão de três em três meses, no terceiro ano duas vezes por ano e, a partir do quarto ano de implante, essas crianças só vão aos Centros uma vez por ano.

Hoje, até com as novas tecnologias, vai ser possível que, as crianças sejam encaminhadas para outros Centros, ou para Bauru ou para Natal ou para São Paulo ou para Campinas ou para o Rio Grande do Sul, enfim. Hoje, com a nova tecnologia, nós aqui com a nossa equipe vamos poder fazer, por meio de computador, o mapeamento ligado aos centros de origem. Então a audiologista e a fonoaudióloga dos centros vão, por meio de computação, entrar em contato conosco, com a nossa equipe e nós vamos poder fazer esse mapeamento sem que as crianças precisem se deslocar. E isso, sem dúvida, vai gerar um custo menor para o governo porque essas crianças recebem - nós temos um tratamento fora de domicílio - um auxílio para irem até aos Centros e, depois, em todo o processo de mapeamento. Quando é para cirurgia, essas crianças têm passagens áreas; e quando é só para mapeamento, nos estados mais próximos do DF essas crianças vão de ônibus. Para Natal, ou para o mapeamento ou para o implante, elas recebem passagens áreas. Os implantes não têm custo para essas famílias.

Como eu já disse, é um momento muito especial na vida dessas famílias e, portanto, só os pais podem se responsabilizar integralmente nas decisões da vida de sua criança. O implante é um dispositivo incorporado ao corpo humano, portanto é uma inserção invasiva, é um momento de muitas expectativas, desencadeia um processo de reflexão dos princípios éticos pertinentes à sua utilização. Portanto, é de responsabilidade única dos pais essa decisão e ninguém tem o direito de violar esse princípio ético de autoridade.

Para onde a ciência caminha? As investigações, os estudos da ciência da audição - que eu particularmente acho fantásticos - as pesquisas em relação à audição, o interesse pela surdez, têm atingido muito [...]

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[...] e esses estudos não param, com certeza, só no sistema de implantes cocleares. Nós teremos muitas novidades, num futuro breve, que poderão beneficiar ainda mais a pessoa surda. Então os implantes virão com melhor reprodução do código sonoro, com melhor percepção auditiva na presença de ruído, porque o implante, assim como os aparelhos, não elimina totalmente o ruído e, com certeza, os próximos implantes poderão eliminar bastante a presença de ruído. Se pensa já no implante totalmente implantável, sem aqueles componentes externos, só com os componentes internos. Uma das noticias que a gente tem é que, talvez, as baterias possam ser recarregadas à noite por meio de um travesseiro magnético.

Melhor reprodução do código sonoro para as músicas: as crianças implantadas têm uma facilidade muito grande para a música e poderão ter muito mais; e daqui a pouco a utilização de neurotrofinas, que são agentes farmacológicos, como forma de proteção e regeneração das fibras do nervo auditivo e células ciliadas. Então, daqui a pouco, num futuro próximo, a perda neurossensorial pode ter uma outra perspectiva.

Eu vou mostrar para vocês umas situações de terapia com uma de nossas crianças. Nós temos várias crianças para mostrar, mas vamos passar uma só; vocês vão poder observar um pouquinho e depois a gente pode trocar idéias sobre a terapia com essas crianças que, hoje, estão chegando cada vez mais cedo às clínicas.

Essa criança, que eu vou mostrar para vocês, teve alta com mais ou menos quatro anos e meio, época em que as crianças chegavam para a reabilitação. As crianças hoje, quando são implantadas muito cedo, têm alta na época em que as outras chegavam; então o implante tem, realmente, possibilitado um ganho significativo para essas crianças e para essas famílias.

O Rafael começou a terapia na clínica com seis meses de idade, ele fez o implante com um ano e dois meses e, no primeiro momento, ele tem nove meses pós-ativação do implante.

FILME

Ângela: Rafael, hoje tem sol?

Rafael: aaaaannnnn...

Ângela: Essa abelha grande que faz zzzz!

Rafael: É!

Ângela: Qual é o barco vermelho?

Rafael: - uuuu!

Ângela: Muito bem! A vaca vai comer o barco amarelo, dá o barco amarelo para a vaca comer! Tchau! Tchau, barco amarelo!

Rafael: Huuuuum!

Ângela: A vaca vai comer o barco verde!

Rafael: Esse!

Ângela: - Nhoc, nhoc! Tchau barco verde, tchau!

Rafael: Au!

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Ângela: A vaca vai comer o urso que está usando um óculos vermelho! Nhoc, nhoc. Tchau, urso! Urso vai comer o carneiro vermelho! Bééééééé!

Rafael: - Béééé!

Ângela: Nhoc! Agora a vaca vai comer o urso que tem o sapato azul. Nhoc, nhoc...

Rafael: Nam!

Ângela: Não vai comer?

Rafael: Nam!

Ângela: Vai embora, mu!

Rafael: U!Ângela: A vaca quer beber a coca-cola! Carro vai embora!

Rafael: ah! ah!

Ângela: Rafael, se você está feliz e sabe disso, bata palmas!

Rafael bateu palmas.

Ângela: Se você está feliz e sabe disso, toque o nariz! Você quer saber se realmente está feliz? Bata, bata, bata palmas!

Rafael bate palmas.

Ângela: Se você está triste disso, chore assim!

Rafael: Hum, hum, hum!

Ângela: Se você está triste e sabe disso chore assim: buá, buá! Se você está dodói e sabe disso faça assim: ai, ai, ai, ai, ai!

Rafael: Ai, ai, ai!

Ângela : Se você está feliz e sabe disso, bata palmas!

Rafael bate e grita dando risada.

FINAL DO FILME

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Nós vamos parar um pouco de mostrar o que nós trouxemos, tem um depoimento depois dos pais do Rafael que fala um pouquinho da diferença de vida deles. Tem uma outra situação, com a mãe, porque os pais participam das terapias, e não sei se vocês observaram que essa criança, mesmo com nove meses de ativação do implante, está com a audição integrada à sua personalidade, é uma criança que não precisa olhar para mim para compreender o que eu estou falando. Eu tenho um filme que quero mostrar para vocês no final para encerrar, mas agora a gente vai abrir um pouquinho para as questões que vocês tiverem.

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Intérprete do Carlos – Deficiente auditivo de Belo Horizonte/MG: Meu nome é Carlos e eu sou de Belo Horizonte. O implante é bom com a criança pequena, com o adulto é muito difícil. Com a criança pode ser bom, mas eu tenho uma pergunta: a criança pode tomar banho, pode pegar água, tomar banho de chuva, nadar na piscina, no mar? O implante dá problema, ou não?

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Quando a criança está em contato com a água, na verdade a criança deve tirar o implante para dormir e para tomar banho. Ela pode nadar sim, sem o componente externo, ela deve tirar o componente externo; ela pode nadar e ter as atividades normais de sua vida diária. Agora já tem no mercado - e o Brasil vai receber, provavelmente em setembro - a quarta geração do implante coclear. Então, além dos componentes internos mais avançados, o componente externo vai ser mais resistente à água. Então, se a criança eventualmente molhar o implante ou molhar pouco ou se tomar uma chuva, não vai ter o problema que hoje tem. Respondi? Carlos, obrigado pela sua pergunta.

(Fala fora do microfone)

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Não se preocupem a gente pode dormir aqui hoje!

Intérprete de Libras de Sédina dos Santos Jales Ferreira –Natal/RN: Boa noite a todos vocês. O meu nome é Sédina e eu lembro de uma história de pequena com a família, na cidade em que eu nasci, a minha família me ensinando a oralizar, oralizar. Tentaram que eu oralizasse, queriam que eu oralizasse, que eu falasse. E vinham conversar comigo e eu dizia: Para quê? Aí eles diziam: Para a comunicação com a família, precisava. Mas eu dizia: Eu não quero isso. A família queria que a comunicação fosse igual, que eu, surda, tivesse uma comunicação igual à deles. Daí eu dizia para eles: Eu não estou entendendo, eu sou surda, mas não estou entendendo porque é que vou ter que ficar movimentando a boca. Depois, com quatorze anos de idade, a minha família já tinha trocado.

Queriam que eu escutasse... Aí nós trocamos fomos para onde? Natal, isso, quem conhece sinal vai me ajudando. Isso, trocamos para Natal e minha família ficou perguntando, pensando no passado, pensando como foi difícil: não ouve, não tem comunicação; queriam que eu fosse igual a ouvinte... Foram procurar lá em São Paulo, foram procurar um médico em São Paulo, um médico que veio para Natal, um médico de São Paulo que veio para Natal, e a família bem feliz com essa novidade de que eu ia me tornar uma ouvinte, ficar igual aos ouvintes. Eu queria saber o que ia fazer no médico, explicaram que eu iria ficar natural, igual aos ouvintes. E a família disse: E a comunicação?

Bom, eles me disseram que era para eu ir e eu aceitei e fui junto com eles; queriam que eu aprendesse a oralizar, de novo queriam que eu fosse igual a um papagaio, porque era bonito para os ouvintes. Mas, para mim, eu sabia que era difícil oralizar, eu sabia que era difícil, eu não gostava de oralizar, mas a família queria... Passou um tempo e eu fiz a cirurgia, fui implantada, fiz o implante. Costuraram, colocaram o implante, fecharam toda a minha cabeça, cortaram todo o meu cabelo - eu tinha um cabelão todo cumprido, fiquei triste - me implantaram e enfaixaram a minha cabeça. Eu tinha muita dor e me falavam que era natural por causa da minha cirurgia, diziam que era para eu ficar quieta e eu fiquei muito nervosa e irritada com aquilo. Aí, com o soro foi aliviando, foi diminuindo essa dor, depois passou. Começaram o tratamento, comecei a fazer o tratamento: aí era diferente, colocaram o aparelho por dentro e por fora diferente.

Aquele antigo não é muito igual a esse de agora; as pessoas batiam palma para eu escutar e diziam que eu já estava escutando. E eu dizia: Não, eu não estou escutando. Eu sentia que aumentava e diminuía o som, dependendo da situação era maior ou menor o som. E as pessoas estavam felizes com

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isso: Ah, ela já está começando a escutar ela está escutando, mas eu não entendia aquilo. Daí eles diziam que tinha que cuidar com as piscinas, com a chuva, com o banho, tinha que cuidar para a água não entrar, não molhar.

Depois fui ficando triste, eu continuei triste, com problema, com doença, me sentindo magoada, angustiada, com depressão. Eu tinha um namorado surdo, a gente começou a namorar e eu, aprendendo a língua de sinais com ele, fui explicando para ele que eu tinha feito aquele implante e me sentia muito tonta com tudo aquilo. Eu sempre indo no médico, sempre com alguma doença, sempre no médico triste, e assim eu estava arrependida e a minha família também se arrependeu de ter feito o implante, porque para mim, lá em São Paulo, era novidade. Até hoje eu tenho tontura, tenho dor de cabeça, desmaios, depende da situação.

Como resolver isso? Falei para o médico, eu disse que quero tirar isso... Fiz uma tomografia, e aí olharam como estava aquilo ali, ficaram muito preocupados, era muito perigoso, queriam tirar. Tiraram e estava com problema, não estava com uma situação muito boa e aí, de novo, continuei sofrendo. Tirei, era perigoso para a saúde aquilo ali. Eu casei, meu marido junto comigo. Perigoso, o que que é? Se eu tirar, pode dar meningite ou alguma outra doença ou algum outro problema, alguma situação diferente. Tenho que operar de novo, tomar remédio.

Meu marido ficou triste e preocupado em eu operar e fazer isso de novo. Aí eu falei para ele não ficar preocupado Deus sabe, Deus vai cuidar, o importante é tirar esse implante, já tirei esse implante e Deus vai cuidar. A gente sabe que tem famílias que querem o filho oralize. Isso já foi a minha história, pode ser que agora seja diferente, agora está novo, mas eu sofri muito, isso foi um problema muito grande na minha vida, o implante. Eu quero ser surda, nasci surda; se Deus me deu a surdez, eu quero continuar surda. Cego nasce cego, ninguém é capaz de fazer um implante para voltar a enxergar! Deus deu a deficiência visual, para mim deu a surdez, porque eu sofri muito, sofro muito por causa da comunicação com a minha família, eu fiz pela família, aceitei pela família. Agradeço pela atenção.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Sédina, você é feliz e isso que é importante. O caso...

(Fala fora do microfone)

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Tem vários aspectos para a gente comentar: primeiro, é importantíssimo deixar claro para vocês que o implante é uma opção, é uma possibilidade que tem dado uma qualidade melhor de vida às pessoas que fizeram essa opção. O implante não cura a surdez, ele dá a possibilidade de desenvolver a comunicação oral por meio da audição, que é a primeira via para se desenvolver a comunicação oral.

No seu caso, a gente tem que considerar as expectativas da sua família; as famílias sonham com sua criança, projetam o nascimento de sua criança e esperam, por exemplo, chegar na Itália, fizeram uma projeção de chegar na Itália, é um exemplo que eu estou dando de projeção de família. Só que quando nasce o bebê e nasce com a surdez, essa família pode descobrir que na Itália não tem tudo mais que ela queria; na Holanda talvez possa ter as tulipas, outras coisas bonitas e que vão deixá-los felizes, também. Nós não podemos anular as expectativas da família; e, no seu caso, os seus pais tinham muitas expectativas e você não queria. Era uma opção muito mais deles que sua. Só que, como pais, eles investiram e fizeram tudo para você conseguir uma oralização. Então é um direito que eles tiveram. Talvez se eles não tivessem investido tanto em você, hoje você cobraria esse não investimento. Eu não sei onde você fez implante, em que Centro que você fez, também acho que não é necessário saber; eu só gostaria de saber com que idade você fez o implante. Quatorze anos.

Os primeiros implantes que foram inseridos na cóclea eram implantes monocanais, eles não eram implantes multicanais, que são os implantes atualizados de hoje. Os implantes monocanais davam

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aquele audiograma, no linear tonal, como uma perda leve, mas eles não davam o que é mais importante, a percepção da fala, principalmente com uma adolescente de 14 anos que não tinha linguagem desenvolvida e que não tinha essas experiências anteriores ao implante.

Então realmente - e hoje se tem muitos critérios - os Centros de implante, quando fazem uma cirurgia numa adolescente de quatorze anos que não tem a linguagem desenvolvida, fazem, - não vou dizer que não fazem - com esses implantes modernos multicanais, mas, mesmo assim, as respostas não são efetivas. E os Centros particulares fazem quando os pais querem muito e assinam o compromisso com todas essas realidades. Nenhuma clínica particular ou centro no Brasil que nós conhecemos fazem esses implantes indiscriminadamente e, se fazem, estão prestando um desserviço à comunidade, não deveriam.

Então seu caso tem vários aspectos para nós analisarmos. É por isso que os centros de implante têm critérios. No CPA de Bauru os implantes, hoje, são feitos a partir de seis meses até dois anos de idade. Porquê? Não adianta tanta tecnologia se nós não tivermos resultados. Os resultados são pesquisas, ninguém investe tanto numa tecnologia só para ter um dispositivo na orelha. O importante é que ele atribua significado aos seus usuários. E as criança realmente que recebem o implante com essas novas tecnologias - vocês viram e eu gostaria muito de mostrar outra criança para vocês, a quem eu já dei alta - têm se beneficiado muito e são opções. E ninguém pode intervir na opção das pessoas, o importante é que cada um possa ser feliz com as suas escolhas.

Intérprete de Libras do Vilson - FENEIS/RS: O meu nome é Vilson. Eu sou diretor regional da FENEIS e estudo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, preocupado com as pessoas. Tenho algumas perguntas, tenho várias perguntas. Sou da comunidade surda e não concordo e também não aceito a questão do implante. Uma coisa é o DA -deficiente auditivo - outra coisa é o surdo, aquele que tem identidade surda, faz parte de uma cultura surda.

Tem mais dois surdos na minha família, somos três filhos surdos. A minha família também não conhecia sobre a cultura surda, mas depois eles foram entendendo e falavam em implante ou alguma coisa para eles e eles percebiam que não era aquilo. As pessoas com implante, a gente ficou percebendo que não poderiam participar de campeonatos de futebol, a vida fica reduzida em algumas coisas de que não pode participar. Eu também fico pensando no ECA, em algumas coisas da questão do ECA, que é o Estatuto da Criança e do Adolescente; alguns pais, algumas mães, podem perceber sobre esse implante algumas coisas erradas e colocar processos contra os médicos.

Na Europa eu soube que alguns surdos fizeram o implante e o que aconteceu? Essa vida não ficou perfeita, deu problemas, ficaram com alguns problemas físicos motores. Também, em Florianópolis, eu encontrei um surdo em cadeira de rodas; a família pagou psicólogo, pedagogo, a associação gastou um monte com o implante, em função do implante e a família teve que gastar muita coisa também, depois do implante. Isso é um crime porque, para o surdo é natural ser surdo, é um crime, é perigoso; essa questão do implante pode ser um crime contra o surdo. A gente não se considera um deficiente, nós temos uma identidade surda própria, nós não somos diferentes do mundo, nós aprendemos; somos capazes de estar na sociedade, ter contato com nossas famílias, usando nossa língua que é a língua de sinais. Porque fazer uma cirurgia, abrir o cérebro, se a gente pode usar a língua de sinais e se desenvolver e se estimular? A família precisa aprender a língua de sinais, existe uma Lei que nos dá direito a isso. Eu tenho uma pergunta: o surdo implantado é perfeito? Ele está perguntando para os ouvintes aqui presentes se ouviram, se a fala era perfeita, deu para compreender é isso que ele quer saber! Se o tratamento vai continuar por quanto tempo, ao longo do tempo, a escola, os esportes, acaba tudo sendo comprometido [...]

[...]

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Intérprete de Libras: Eu só queria te pedir desculpas antes, porque eu não consegui continuar te traduzindo. Eu vou falar a minha opinião agora, vou cortar tudo aqui, porque traduzir essa questão de comparar a expectativa da família com a audição de ir até a Itália e até Holanda, desculpa, mas para mim, que sou profissional há 20 anos na área da surdez, não tem compreensão para o surdo de fazer esse tipo de compreensão para a família, porque a família não espera que tudo vá, faça... Claro que eu sei que foi uma comparação que tu fez, mas, para mim, é super difícil traduzir, porque é algo assim, que para o surdo ele sabe que não é isso que a família espera, e nem para o ouvinte. A família espera que ele escute e é o que o surdo menos quer, muitas vezes. O surdo...

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: É por isso que eu contei... Isso é uma história bastante interessante e que fala da expectativa da família quando ela recebe um bebê. Toda a família faz planos quando recebe um bebê. Então você deve ter compreendido o que eu quis dizer. O que eu disse sobre a Itália, é que a família faz expectativa de uma viagem, planeja a viagem, só que no meio do caminho alguma coisa acontece e o seu avião não desceu no lugar que ela gostaria, desceu em outro lugar e nesse lugar ela descobriu outras possibilidades para a sua criança ou para o seu bebê. Então, não ter chegado o seu sonho de ter uma criança sem alguma deficiência, não foi trabalhado. Ela pode enxergar aquela criança além da deficiência, entendeu agora? Você entendeu?

Intérprete de Libras: Eu entendo bem, porque eu tenho 3 filhos e eu sei todas as expectativas que eu tive.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Agora eu vejo, nós como profissionais, é o que eu disse para vocês, nós respeitamos todas as suas colocações, só que, na nossa vida profissional, toda a família tem direito às suas opções. As opções de métodos, de escolha, não deveriam entrar em conflito, porque nós devemos respeitar as escolhas de cada um. Eu trabalho há 30 anos com a deficiência auditiva, nós trabalhamos o método áudio-oral, que enfatiza o resíduo auditivo. Eu tenho, nesses anos todos de experiência, tido respostas fantásticas em relação ao uso da audição.

Os surdos podem se desenvolver e continuarem surdos. Então eu vejo que as opções são opções e eu não gostaria de entrar em conflito com vocês porque os respeito muito, sou fã de vocês incondicionalmente, dentro das opções que vocês fizeram. Eu só digo que, felizmente, a ciência da audição tem evoluído muito e eu acho fabuloso a ciência estar voltada para os surdos, procurando lhes dar outras possibilidades, outra qualidade de vida para aqueles que querem outra qualidade de vida. Isso não significa que as escolhas de vocês com a língua de sinais seja uma escolha pouco produtiva ou pouco sábia. Nós somos seres humanos e, como seres humanos, eu tenho direito a uma opção. Assim como os surdos que desenvolvem a comunicação oral por meio da audição respeitam vocês, com certeza vocês respeitam também as outras opções.

Marcos Cordeiro de Souza Bandeira – Coordenador: Um minuto. Eu queria pedir uma colaboração para que a gente pudesse fazer a pergunta num período mais curto, de uma forma mais objetiva. Imagino que já esteja muito fora do seu horário, eu queria colocar vocês à vontade.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Eu fico aqui até quando vocês quiserem. Eu acho importantíssimo, acho que é um momento importante e, como eu disse para vocês na questão das opções metodológicas, nós temos que assumir o trabalho que nós fazemos. Se Ficarmos em cima do muro ou não assumirmos o que nós fazemos, nós podemos não chegar a lugar nenhum. Nós temos o nosso trabalho, nós acreditamos no que nós fazemos e nós respeitamos todas as opções. Porque não existe um único método que possa suprir as dificuldades de todas as pessoas que são surdas. O melhor método é aquele que mais vai beneficiar a família e a criança.

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Regina - APADA/PI: Eu sou Regina, sou da APADA do Piauí. Eu tenho uma filha surda de 19 anos e, no Piauí, nós não temos oportunidade de escolha. Lá, aparelho auditivo é fornecido pelo SUS, mas um aparelho auditivo de péssima qualidade, onde nem a família e nem o surdo têm qualquer informação sobre esse tipo de aparelho auditivo, não sabem o que tem de bom para o surdo e a família também não tem essa informação. Nós brigamos, a APADA, junto com Fundação Municipal de Saúde, durante 8 anos, chegamos até a ir às vias legais para que essa coisa parasse de acontecer da maneira que estava acontecendo e houve uma mudança. Mas não houve uma mudança muito grande, recentemente, há 60 dias. Mas nesse tempo em que estou na APADA, mais ou menos 7 ou 8 anos, eu vejo que nós estamos batendo de frente com as empresas multinacionais que fornecem próteses e aparelhos auditivos, porque eles não têm responsabilidade social nenhuma com o surdo e nem com a família do surdo; eles vendem aparelhos muito caros, aparelhos hoje da alta tecnologia custam em torno de 15, 20 mil reais, manutenção caríssima. Você falou que o implante custa em torno de 80 mil reais, é muita coisa... E quanto à responsabilidade social, a gente não tem nada de lá para cá, é só daqui para lá. Então se gasta muito com essa tecnologia e nós não sabemos. Na sua fala mesmo, eu não ouvi nada dizendo: Olha, pode dar errado, pode ter problema... nada. Eu não tenho nenhum tipo de informação. Lá no Piauí nós somos tão carentes de informação que nessa Conferencia eu andava catando todo mundo: Você trabalha com surdo? A outra fala que sim. Oh, me passa suas informações porque eu vivo sozinha . Lá é muito longe de tudo, é muito caro o deslocamento para os grandes centros; às vezes eu converso através de e-mails com Antonio Campos e ele me passa algumas informações que são muito valiosas. Mas eu não tenho material nenhum, nem um dicionário em Libras nós não temos. E a nossa relação, a nossa briga com os governos é eterna, a gente tenta construir uma parceria com os governos, mas é muito complicado, é muito difícil porque os governos não têm informação. As famílias não sabem nada do que está acontecendo e é muito complicado você trabalhar sozinho.

Então eu tenho um grande sonho, uma grande vontade de manter uma parceria com o Brasil, com a FENEIS, ter um contato mais próximo, com o INES, com as APADAS, livros, jornais, folders; eu quero tudo, eu preciso de tudo, porque eu não tenho nada e eu não tenho recurso. Todo o recurso que nós temos na APADA, depois de brigas homéricas, são R$ 940,00 novecentos e quarenta reais que nós recebemos do Fundo Nacional de Assistência Social; e desse dinheiro nós gastamos quase que 100% com alimentação, porque nós estamos quase no mês de junho e o que nós recebemos de merenda escolar foi um litro de óleo, 5 quilos de arroz e 3 pacotes de macarrão para alimentar 60 pessoas. Então é muito complicado, nessa área de Saúde. No Piauí, nós não conhecemos surdo velho. O nosso surdo no Piauí morre cedo, porque não tem acesso à Saúde. Eu já fui a muitos velórios de surdos, alunos nossos que não têm acesso à saúde.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Eu só queria dizer que a minha fala não é perfeita e eu não mostro só situações perfeitas. Eu digo sempre que, mesmo o trabalho com crianças que usam amplificação, que podem tê-las ou que podem consegui-las dentro de suas possibilidades, é sempre um investimento muito grande, é um trabalho que é árduo, é uma conquista diária. Não pensem que essas famílias que fazem opção por implante são famílias em que, de repente, todas as dificuldades desaparecem, pelo contrário. E se eu não mostrei para você, se eu não disse que essas crianças tiveram problemas com implante, eu não quis esconder. Eu estou mostrando uma realidade, que eu tenho várias crianças implantadas, tanto na clínica particular quanto na instituição que eu trabalho e, até o momento, nós não tivemos nenhuma complicação cirúrgica entre aquela criança que eu comentei que caiu e teve extrusão dos eletrodos e foi reimplantada. Então, não é para esconder. Nós estamos aqui para sermos transparentes, para dizer a verdade; e a nossa verdade é uma luta diária, é uma luta constante. As famílias carentes dessa instituição, que fazem a opção por implante, também têm uma vida árdua e o nosso maior desafio é com essas famílias. Imagine essas famílias carentes que de repente recebem esse equipamento caríssimo: elas vão ter que saber lidar, elas vão ter que ser orientadas, portanto não é um trabalho fácil. O investimento é total em qualquer opção de trabalho. E nós temos que investir mesmo e cada um vai ganhando, aos poucos, com seus desafios.

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Luciana: Boa noite, meu nome é Luciana. A palestra foi maravilhosa, mostrou muito bem o implante. Mas precisa mostrar antes o bom e, depois, o ruim. O que acontece, porquê? Culpa o quê? A família precisa pesquisar, precisa se orientar sobre o oralismo. Aconteceu? Foi bom? Aconteceram três coisas importantes: o oralismo, comunicação total e o bilingüismo.

Primeiro, o oralismo que, de 1978 até 1980, não foi muito bem desenvolvido. Segundo, comunicação total. A comunicação não foi muito boa. Depois surgiu a filosofia de bilingüismo. Porquê? Eu cresci aprendendo oralismo. Oralismo, oralismo... Eu me comunicava muito bem, aparentemente, mas eu não tinha sensibilidade. Faltava sensibilidade para mim.

Eu já estudei muito, já pesquisei muito. O que é importante para a criança? Precisa da língua I, a língua de sinais, a própria língua dela, para ela se sentir bem e conseguir entender as coisas. Depois o principal é o quê? A escrita. Como? Com a língua de sinais ela lê, ela entende, ela consegue absorver o que foi passado. Depois, em uma outra sala, ela vai para uma pedagogia, lê e também vai para a escrita do que ela entendeu na sala com a Libras. Depois, todos esses trabalhos são separados. Muito bem.

A vontade da criança e da família é aprender o oralismo? Ótimo. Vai para uma outra sala. Fono. Precisa aprender a falar, precisa aprender dois mundos: o mundo dos surdos - porque a cultura dela é própria, a identidade dela também é surda – e o mundo dos ouvintes, a fala, porque se comunicar bem, falar bem é muito importante. Também ouve o ouvinte, aprende o português, que é a língua I e depois aprende a língua II, que é o inglês ou espanhol. Agora eu vou perguntar a você: você é a favor do bilingüismo? Precisa de [inaudível] oralismo ou bilingüismo. Há diferença. Precisa de informação. Mostrar o quê? O ruim, mostrar o bonito, maravilhoso, a criança se desenvolver muito bem. A família também é responsável por isso, a família também tem razão, porque ela assina um termo de compromisso com essa criança, a vontade, se tem vontade ou não do implante. Se acontecer alguma coisa futura, tomar banho, natação... Vocês próprias escolhem que é a identidade de vocês. Muito bem, parabéns para vocês.

Intérprete de Libras: O que a Lu está trazendo é o que nós todos estávamos discutindo. O que a Lu estava colocando é a nossa preocupação, nossa em geral, porque o que a Lu colocou também é a fala de nós todos que você sempre colocou: a família é responsável por isso. Então, no momento em que você assina aquele documento o médico tira a toda a sua responsabilidade de lado, o médico não tem mais responsabilidade. No momento em que toda a família aceita, no momento em que a família escolhe, no momento em que a família quer, a família assina e o médico se isenta de toda e qualquer culpa no futuro. E nós sabemos de casos que já aconteceram, a gente sabe. Não estou dizendo do trabalho de vocês, na clínica de vocês, porque fiquei babando, mas de outros casos, o caso da Sédina e outros casos que a gente conhece. Então, neste momento que a família assina o documento, o médico se isenta. E a culpa por qualquer conseqüência – isso eu sei porque eu tenho 4 implantados na escola, pequeninos, outro, um pouco maior, com 10 anos, que foi implantado aos 6 anos e mais os pequenininhos que estão agora na escola – a partir do momento do implante, o médico não assume nenhuma responsabilidade. Toda a responsabilidade é da família porque optou pelo implante. Isso é o que a Lu estava trazendo.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Então, na verdade, os pais assinam um compromisso porquê? É uma cirurgia e, como toda a cirurgia, o compromisso é grande da família, porque é uma cirurgia. E, como toda a cirurgia, pode ter os riscos cirúrgicos. Então é isso que o pai assina. Só que tem uma equipe que tem um compromisso consciente com essas crianças implantadas, até de só implantar crianças onde, na sua cidade de origem, tenha um centro de reabilitação. Nenhum centro de pesquisas implanta crianças e deixa crianças. Porque mais uma vez eu digo, se trabalha por resultados. Pode ter centros - e no Brasil a gente está vendo que tudo pode acontecer - que não tenham responsabilidades com essas crianças. Mas os centros com os quais eu trabalho, nós também como reabilitadoras, temos sim o compromisso de assistir essas crianças até que elas deixem ou tenham alta da clínica. E elas na verdade, estão sempre ligadas a esse centro porque elas fazem esse mapeamento, que é

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por toda a vida da criança. Eu vou só responder uma pergunta: você perguntou se eu era a favor do bilingüismo e, de novo, eu vou dizer que eu sou a favor das opções de cada um.

Intérprete de Libras de Tibiriçá Vianna Maineri - Caxias do Sul/RS: Boa noite a todos vocês. Concordo com tudo o que foi conversado aqui e o problema do surdo, os problemas que a gente está discutindo aqui sobre os cegos, os cadeirantes, sobre as pessoas que escutam pouco, sobre os implantados. O governo vai assinar muita coisa aqui, a gente vai continuar e eu vou continuar sem escutar. Ah, com implante eu vou escutar tudo, eu sou surdo profundo e vou... É diferente. O surdo profundo é diferente. Vocês entenderam? Quando o ouvinte é implantado, ele vai, ele cresce, ele quer escutar. Para o surdo, o que é importante? A identidade é importante para o surdo. A família não conhece, não sabe o que é identidade do surdo. A família pensa que é igual ao ouvinte e tem que ser igual ao ouvinte, que tem que ter o jeito de um ouvinte. Não, é diferente. Com a idade de 60 anos, um deficiente que perde a audição, que trabalha com muito barulho e perde a audição, essa pessoa pode fazer implante? Pode fazer implante nessa pessoa?

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Se ele perde a audição, por exemplo, com 16 anos, tem a linguagem a desenvolver... 60?

(Fala fora do microfone)

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Já falava e perde a audição? Quando tem a linguagem desenvolvida, por exemplo, ele está dizendo de um caso que perdeu a audição com 60 anos, essa pessoa passa por toda uma avaliação que é criteriosa e, se ele for um candidato potencial ao implante, ele pode sim, fazer o implante. Nós temos vários depoimentos, eu não trabalho com adulto, só com criança, mas eu tenho conhecidos, tem filmes de implantados idosos que têm uma qualidade de vida muito melhor.

(Fala fora do microfone)

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: É importante entender a pergunta. Ele disse que é um ouvinte que perdeu a audição com 60 anos.

Intérprete de Libras de Tibiriçá Vianna Maineri - Caxias do Sul/RS: Não, o que ele está te explicando é que ele concorda com isso que tu disse, que uma pessoa aos 60 anos perdeu a audição e pode fazer um implante porque já tem uma linguagem desenvolvida.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Pode ser, que o centro de implante, depois dos estudos criteriosos, avalie que ele pode fazer o implante. O implante não é feito assim, quer fazer faz, não é assim. Temos critérios.

Intérprete de Libras de Tibiriçá Vianna Maineri - Caxias do Sul/RS: Tem todos os critérios. Só que o que ele disse é que, com o surdo profundo que nasceu surdo, ele não concorda. Mas com uma pessoa de 60 anos, sim. Uma pessoa de 60 anos que perdeu a audição ele acredita que sim, porque já tem essa linguagem diferente. Ele disse que vai divulgar, ele vai divulgar isso lá em Caxias, onde ele mora, que ele vai divulgar que esses surdos podem fazer o implante. Só que ele, Tibiriçá, não acredita num implante de quem nasceu surdo profundo. Ele, opinião dele.

(Fala fora do microfone)

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Intérprete de Libras de Tibiriçá Vianna Maineri - Caxias do Sul/RS: Mas eu sou amigo dos surdos, quero continuar surdo, é a minha identidade. Obrigado.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: E quem recebe o implante não deixaria de ser surdo. Vocês querem ver o filme de uma criança que eu trouxe para a gente encerrar? Tem mais?

Intérprete de Libras de Tatiane de Souza – Passo Fundo/RS: Eu sou de Passo Fundo, o meu nome é Tatiane, sou do Rio Grande do Sul. Onde eu trabalho tem uma criança implantada, uma menina. A mãe fez o implante, trouxe para a escola e, na minha opinião, foi horrível. Os surdos acham natural, mas, na hora do intervalo, na hora da brincadeira, a mãe mandou: Não pode brincar, não pode correr por conta desse implante. A criança começou a brincar no balanço, deixei ela livre para brincar no balanço e ela disse que não podia. Daí eu tive que dizer para ela: Tua mãe não quer, tu não podes porque fizeste o implante. Daí ela chorou, chorou muito e ficou muito irritada com aquilo, ficou sofrendo muito porque não podia brincar, porque a mãe tinha medo que ela caísse. Culpa do pai e da mãe, ela queria brincar mas não podia, tinha que ficar ali. Ela não tinha uma liberdade e ela é muito triste por causa disso. Ela tem 4 anos. Fazer o quê, agora? Agora já está implantado. Desculpa, eu sou contra o implante, na minha opinião. Eu tenho uma identidade surda e acredito que essa é uma linguagem importante para os surdos. A língua de sinais é própria para os surdos. A cultura surda não pode diminuir por causa do implante. A cultura surda tem que continuar, tem que respeitar o negro, o índio, o chinês, tem que respeitar todas as culturas; a nossa, é uma cultura. Eu não sou feliz com isso, sou muito triste.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: É uma opinião sua, as crianças implantadas que nós recebemos têm, sim, algumas restrições com algum brinquedo de borracha, como escorregador de plástico, porque o plástico tem o que nós chamamos de eletricidade estática; quando nós vamos pentear o cabelo, por exemplo, que levanta o pente, que levanta o cabelo, isso é eletricidade estática – então ele provoca, ele não danifica o implante, mas ele altera a programação do implante. As piscinas de bolinhas, por exemplo, também as crianças devem evitar. Mas nós não temos crianças infelizes porque deixaram de brincar na piscina de bolinha ou porque os pais podem tirar o implante e elas vão brincar na piscina de bolinha, tirar o implante e elas irem para o escorregador. Nas escolas, geralmente nem tem escorregador de plástico, as crianças brincam naturalmente. É normal que, às vezes, os pais fiquem ansiosos e talvez não tenham a orientação certa sobre o que a criança pode fazer. Nós não temos essa experiência, pelo contrário, as crianças implantadas freqüentam escolas regulares, elas têm uma relação com as outras crianças e nós não temos casos de crianças que se entristeceram porque usam o implante. Talvez essa família precise ser melhor orientada.

Nós temos um contato muito próximo com os professores. No CEAL, por exemplo, nós não podemos visitar todas as escolas, mas fazemos periodicamente um encontro com os professores das escolas que as nossas crianças freqüentam e nós estamos tendo, assim, uma relação bastante forte, porque várias escolas estão recebendo as crianças implantadas, os professores estão muito interessados, vêem a diferença de comportamento auditivo e lingüístico dessas crianças e querem saber, conhecer. E nós estamos, portanto, tendo uma relação bastante bonita com os professores das escolas.

Intérprete de Libras de Participante não identificada: Tudo bem, eu gosto muito da língua de sinais. Parabéns pelo trabalho de vocês, mas eu fico preocupada, angustiada com [...]

[...] quer que todos sejam iguais, por exemplo, um que perde o braço. A família resolve, bota um implante, fica perfeito. Não é bem perfeito, não é natural. O implante também, não vai ficar um ouvinte natural, é igual a uma pessoa que tem um braço mecânico, uma perna mecânica, não é natural. Mas a questão do perigo, aconselhar a família o que é certo para essa família. Eu conheço um amigo que ficou com trauma, tirou o implante e sofre muito até hoje e isso o Brasil não mostra. Precisava mostrar

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esses casos dos que já foram implantados. O que é? A maioria é de coisas erradas no implante, ou não? Mostrar todas as hipóteses. O oralizado, o implantado reclama de que quem sabe a língua de sinais não sabe nada, nível baixo perto do oralizado... nós somos iguais, naturais, oralizados, implantados, usuários da língua de sinais, somos iguais. Precisa também mostrar a importância da língua de sinais para essas crianças, não só que eles têm que oralizar, a língua de sinais e a oralização. Língua I e língua II. LI e LII. Por que o que vai ser a vida dele no futuro? Ele, com certeza não vai ter sentimento, não vai ter emoção e precisa ajudar a continuar [inaudível] Muito obrigado.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Isso é que é importante, que você seja feliz na escolha que você fez.

Intérprete de Libras de Participante não identificada: Boa noite a todos. Eu não vou me alongar, vou ser bem rápida, estou com fome. Estão mostrando sobre o implante aqui, mas eu já vi lá no INES, no Rio de Janeiro, já estudei no INES; tinha o espelho para eu fazer o treino de fala em frente ao espelho, a fono também treinava comigo, não implante mas o treino da fala em frente ao espelho, eu tinha que fazer esse treino, assoprar papel, fazer esse treino de fala. Eu fui crescendo e telefonaram para minha mãe para dizer que eu já estava falando. Minha mãe ficou feliz. Depois, minha mãe pensou que eu queria ouvir. Eu voltei para o Rio e fui conversar com o médico na clínica para fazer implante, a minha mãe foi junto, fizeram uma avaliação e eu não podia fazer. E minha mãe ficou muito magoada, porque depois de fazer uma avaliação e tudo, não podia fazer o implante. A minha cóclea tem um espaço, está duro. Não pode fazer o implante porque o meu ouvido dentro é duro. Eu nasci surda profunda e não posso fazer o implante coclear. Por que o médico falou que eu não posso fazer, eu não entendi até hoje. Gostaria de uma resposta.

Julio Marcos de Souza/PR: Boa Noite, meu nome é Julio, do Paraná. Estão reclamando do sofrimento, de um monte de coisas, eu não vou falar sobre isso. O tema é mitologia do mundo dos ouvintes. É o sonho que a família pensa muito, que ele vai ouvir, até quando, a gente não sabe. A gente precisa ver se o surdo vai ouvir bem mesmo, que haja estímulo para que o surdo ouça igual ao ouvinte, para os surdos escutarem também junto ao ouvinte.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Eu vou responder à sua pergunta. Que bom que o médico foi consciente em dizer que o seu caso não seria um caso de implante. Porque se ele tivesse feito essa cirurgia sem possibilidade, talvez tivesse sido um insucesso para você. Tem muitos casos que não podem ser submetidos ao implante coclear. Tem pessoas, por exemplo, que não têm o nervo auditivo, tem pessoas que não têm o ouvido interno bem formado, tem pessoas que têm a cóclea calcificada, uma calcificação em que não é possível inserir os eletrodos, então tem vários casos. Nós temos uma criança no CEAL que não tem nervo auditivo. Agora, depois de todas as avaliações, fechou-se o diagnóstico e ela não poderá fazer implante e nem mesmo o aparelho auditivo porque não terá função, ela não tem nervo auditivo. Então, com certeza, essa família vai procurar uma outra opção para essa criança.

Participante não identificada: Você falou que é possível, através do SUS, alguns implantes serem realizados. Eu trabalho com alguns surdos e gostaria muito de levar essas informações. Ele teria que fazer parte do programa para começar um processo? Como seria?

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Que idade eles têm?

Participante não identificada: Já são todos adolescentes e adultos.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Não têm linguagem desenvolvida?

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Participante não identificada: Nenhuma.

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Nesse caso, não tem nenhum centro pelo SUS que faz a cirurgia pelo implante. Porque eles não têm linguagem desenvolvida, fazer o implante não vai levá-los a compreender a fala. Só vai dar uma audiometria melhor, como eu mostrei, mas não vai ter atribuição de significado.

(Fala fora do microfone)

Ângela Maria Vaccaro Silva Alves – CEAL/DF: Foi um prazer estar com vocês.

4.13 O Advento da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência na ONU

Intérprete de Libras de Mônica da Silva Lima – João Pessoa/PB: Boa noite, eu sou a Mônica, moro em João Pessoa. Lá tem um trabalho social que eu desenvolvo lá, ajudo deficientes diversos nas escolas, nos esportes, em diversas matérias. Eu sou auditiva e estou participando da Conferência.

Intérprete de Libras de Antonio Rúbio Andrade Carvalho – Estância/SE: Boa noite para todos. O meu nome é Rúbio, sou instrutor de Libras lá na prefeitura ou administração da cidade onde eu moro, em Sergipe.

Intérprete de Libras de Hoverdiano César P. Caetano – João Pessoa/PB: Boa Noite a todos. Tudo bem? Eu não ouvi vocês respondendo. Boa noite. Me copiem, por favor. Alguém pode copiá-lo? Boa noite. Muito bem, muito bem. É uma brincadeira, não se assustem não. O meu nome é César, sou da Paraíba, João Pessoa, a cidade mais maravilhosa, a segunda do mundo. Eu ajudo na Associação de Deficientes visuais e auditivos, mentais, cadeirantes, lá na Paraíba. Muito prazer a todos.

Eduardo Guimarães – Centro de Vida Independente Aracy Nallin/SP: Meu nome é Eduardo Guimarães. Sou jornalista e sou da Equipe técnica do Centro de Vida Independente Aracy Nallin, de São Paulo.

Alberto Alexandre Gonçalves Nogueira/PR: Boa noite, eu sou Alberto Nogueira, do CVI Curitiba. Comecei no movimento em 1977, com a nossa antiga ANDE, e depois criamos a nossa coalizão nacional, depois chegamos mais para frente. Eu sou também do Conselho Estadual de Direitos do Paraná, da nossa Federação Estadual das Entidades de Deficientes Físicos e também trabalho com jornalismo, na minha cidade.

Maria Rosa – APAE: Boa noite. O meu nome é Maria Rosa, sou da militância também, através das APAEs e estou aqui como assessora do Deputado Federal Eduardo Barbosa.

Carlos: O meu nome é Carlos. Eu sou irmão do Lilico ADN que vocês conhecem, estou aqui como acompanhante e aprendendo um pouco mais com vocês. Boa noite a todos.

Adelino Ozores Neto – Prefeitura da Cidade de São Paulo/SP: O meu nome é Adelino. Eu sou de São Paulo, trabalho na Prefeitura, dirijo duas casas de cultura e também milito na área já há 31 anos. Estamos com uma ONG nova, que é a 3-IN, na qual estou, junto com a Bárbara, fazendo parte desse novo trabalho.

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Jorge Luiz Silva – Campanha da Fraternidade/RJ: O meu nome é Jorge Luiz. Sou arquiteto, trabalho com esse assunto em decorrência de um trabalho final de graduação e desde então eu gostei, estou desenvolvendo o tema e atualmente auxilio a Arquidiocese do Rio de Janeiro na implementação da Campanha da Fraternidade.

Cristina – Casa da Solidariedade/BA: Eu sou Cristina, da Bahia. Faço parte de uma ONG chamada A Casa da Solidariedade.

Cleide Ramos Reis – Promotora de Justiça de Camacam/BA: Eu Sou Cleide Ramos, Promotora de Justiça de Camacam, Bahia e membro do CVI Bahia, aliás o título que mais me honra ultimamente.

José Luiz Zanzini – 3-IN/SP: O meu nome é José Luis Zanzini. Sou um dos diretores da 3IN, com muito orgulho, estou aqui participando com o pessoal dessa I Conferência e muito feliz por estar aqui. Muito obrigado. Sou de São Paulo, capital.

Regina Atalla – Coordenadora: Bom, eu acho que depois a gente pode continuar esse momento de se conhecer melhor e ficar mais dois dias. Eu sou Regina Atalla, sou Diretora do Conselho Nacional dos Centros de Vida Independente - nós estamos organizados em 24 entidades no Brasil. Sou Presidente do CVI Bahia, como Cleide disse, com muita honra, muita dificuldade, mas com muita honra dessa batalha e sou Conselheira do Conselho Nacional dos Direitos do Deficiente – CONADE. Vou passar aqui para a Flávia.

Flávia Paiva Vital – CVI Aracy Nallin/SP – Eu sou Flávia e trabalho na Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo. Eu gosto de falar isso porque lá a gente trabalha com mobilidade urbana e eu acho que isso acrescenta muito, uma visão gerencial de uma cidade como São Paulo. Eu também, com muito orgulho, sou Presidente do Centro de Vida Independente Aracy Nallin de São Paulo, e sou investigadora, no Brasil, do CIR – Centro Internacional para Reabilitação.

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: O meu nome é Laís. Eu sou advogada do Instituto Paradigma, onde desenvolvo um trabalho relacionado a direitos das pessoas com deficiência, de monitoramento da Legislação Nacional e Internacional. Sou membro, também, da Comissão da Pessoa com Deficiência da OAB de São Paulo.

Luiz Fernando Astorga - Diretor Executivo do Instituto Interamericano sobre Deficiência/Costa Rica: Boa noite, amigos e amigas. Meu nome é Luiz Fernando Astorga. Venho da Costa Rica e sou Diretor Executivo do Instituto Interamericano sobre Deficiência e Vice-Presidente da Rede Ibero Americana de Organizações de Pessoas com Deficiência. Estava trabalhando desde o início no processo para fazer a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiências na ONU e tenho um tempo para compartilhar com vocês sobre isso.

Regina Atalla – Coordenadora: Bom, é só para dizer que a gente fez uma organização, pedir desculpas a vocês pelo adiantado da hora, por todos os atropelos que fugiram do nosso controle. Eu acho que esse tema desperta muito interesse, não é à toa que, a essa hora, nós tenhamos aqui esse quantitativo. Então nós vamos começar a apresentação: Laís vai fazer uma introdução do que significa esse processo da Convenção e eu e Flávia vamos fazer uma fala do que significa a representação da sociedade civil de um modo geral, principalmente da sociedade civil brasileira atuando e intervindo nesse processo dessa Convenção, que hoje reúne 192 países. E, fechando esse painel, nós teremos o companheiro Luis

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Fernando Astorga, que vai trazer um pouco desse panorama mundial e latino-americano dessa participação da sociedade civil nesse processo de Convenção. Por favor, Laís.

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: Eu vou fazer uma análise introdutória e, nesse primeiro slide, na verdade o que a gente tentou trazer aqui como inicial é: O que eu tenho a ver com isso? O que a Convenção tem a ver com a minha vida? Então aqui eu trouxe um pensamento do Norberto Bobbio, que foi um grande jurista desse nosso século e escreveu um livro chamado a Era dos Direitos, onde ele trouxe esses conceitos de quanto os direitos humanos são importantes na construção do Estado Democrático de Direito e explica um pouco o pano de fundo da nossa Convenção específica dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

O processo que ele dialoga é colocado pós-segunda guerra mundial, 1945, onde teve a importância da positivação do valor da dignidade da pessoa humana como direito positivo, que é o direito escrito, o direito colocado como Lei; no caso aqui, o Tratado.

O processo de generalização é uma outra etapa onde a gente tem o princípio da igualdade como corolário máximo, que significa a não discriminação em geral. Em suma, estou resumindo.

A outra etapa seria a etapa da internacionalização, onde se reconhece que a proteção dos direitos humanos requer o apoio da comunidade internacional e requer que isso seja regido por leis de direito internacional público, não pode ficar restrito a uma localidade e precisa estar positivada no âmbito internacional.

E, por último, o processo da especificação, que é onde entra exatamente o sentido da nossa Convenção, que é exatamente o processo de aprofundamento desses direitos, deixando de tratar as pessoas como destinatários genéricos e, sim, considerando o ser humano na peculiaridade da sua situação específica, como temos a Convenção contra a Discriminação Racial dos Afro-Descendentes, a Convenção dos Direitos da Mulher e agora a Convenção para Pessoas com Deficiência.

Com esse pano de fundo, eu trouxe aqui um listado dos instrumentos de direitos humanos que já existem:

• 1945: a gente tem a Carta das Nações Unidas que tem a organização e todos os procedimentos de como funciona a ONU.

• Em 1948 foi editada a Declaração Universal dos Direitos Humanos; nesse mesmo ano também foi editada a Convenção Contra os Crimes de Genocídio, em resposta à 2ª Guerra Mundial.

• Em 1965, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.

• Em 1966 foram feitos dois pactos de direitos humanos, que é o Pacto de Direitos Civis e Políticos e dos Direitos Sociais e Culturais.

Esses dois pactos, na verdade, foram elaborados em conjunto mas editados separadamente, até por haver uma grande discussão sobre a aplicabilidade dos direitos civis e políticos e dos direitos econômicos, sociais e culturais. Um parênteses sobre isso é que os direitos civis e políticos seriam de caráter de aplicação imediata no sentido que o Estado simplesmente se absteria de praticar qualquer ato para deixar que os cidadãos fossem livres e pudessem exercer a sua cidadania. E o Pacto dos Direitos Econômicos e Sociais pressupõe ação e não omissão, pressupõe que o Estado tenha que prover bens e serviços e isso precisa ter uma aplicação progressiva. Na verdade essa própria discussão, na época, era permeada também por briga oriente e ocidente, como hoje nós temos briga norte e sul. Porque, por um lado, o oriente era o contrário, os direitos civis e políticos teriam uma aplicação progressiva e os direitos econômicos, sociais e culturais, imediata. Aqui a gente está falando de direito ao trabalho, saúde, educação, que está dentro dos econômicos e sociais. Mas é assim que funciona o sistema que foi positivado e isso vai aparecer também na nossa Convenção, quando a gente for pensar que a

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acessibilidade, o trabalho, são considerados como direitos econômicos, sociais e culturais e têm previsão de aplicação progressiva e não imediata, na medida em que for editada.

• Em 1979 foi feita a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação da Mulher.

• Em 1984, contra a Tortura;

• Em 1989, os Direitos da Criança.

• E por último, em 1990, dos Trabalhadores Imigrantes e Suas Famílias. Isso é o sistema que existe hoje.

Tem algum deficiente visual aqui? Aqui tem um slide que tem um diagrama com 3 círculos que fazem uma intersecção, onde eu tento colocar essa idéia das convenções por sujeitos. Por que ter uma Convenção específica? Num dos círculos estou considerando a questão da raça, que é a Convenção para os Afro Descendentes, a questão do gênero e a questão da idade. E a deficiência estaria na intersecção desses três círculos, sendo considerada como uma vulnerabilidade transversal, mas sem a visibilidade específica que é o que a pauta da deficiência requer. E esse movimento de especificação dos direitos humanos acabou exigindo o processo da Convenção, que é o que a gente está tratando aqui. Eu trouxe dois pensamentos interessantes que eu acho que embasam esse processo: um pensamento é da Flavia Piovesan; ela é Procuradora do Estado de São Paulo e professora dos Direitos Humanos e fala sobre esse processo de especificação dos direitos humanos. Ela coloca o seguinte: É um processo que adota como sujeito de direito um indivíduo historicamente considerado, com as particularidades de suas relações sociais, afirmando-se o reconhecimento de sua identidade própria. Ao lado do direito à igualdade, nasce o direito à diferença. E o outro pensamento é do Boaventura de Sousa Santos, que coloca sobre o princípio da igualdade: Temos direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza e o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Eu trouxe esses dois pensamentos porque eu acho que eles, justamente, embasam essa especificação dos direitos humanos. Obrigada.

Aqui eu tentei buscar uma tentativa histórica de tentar algumas manifestações a favor do processo da Convenção. Acho que foi lembrado aqui pelo Leonardo e pelo Alberto do CVI de Curitiba, o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência que foi em 1981, declarado pela ONU, quando o lema era justamente plena participação e igualdade. Teve toda uma preparação para esse Ano Internacional e em 1982 foi feito o plano de ação mundial relativo às pessoas com deficiência.

Esse plano de ação mundial previa também uma década das pessoas com deficiências declaradas pela ONU, que foi de 83 a 92. Nesta década houve uma reunião de especialistas em 1987, no meio da década, justamente para avaliar os 5 anos de execução do plano de ação e tinha programas e metas a serem aplicadas em relação às pessoas com deficiência. E a conclusão foi que não houve muitos avanços significativos na aplicação e que seria interessante ter uma Convenção específica para que tivesse maior força de veiculação jurídica. Essa proposta não foi aceita na época, mas, em resposta a essa necessidade de especificação, foram elaboradas as Normas Uniformes, em 1983, no final da década, das Pessoas com Deficiência, declaradas pela ONU.

As Normas Uniformes foram, então, uma resposta intermediária dessa pressão da comunidade internacional para que a ONU firmasse uma posição em relação às pessoas com deficiência. De qualquer forma, ela trouxe a positivação de alguns direitos. Apesar de ela ser apenas uma Declaração, ela não é uma Convenção, então não tem força política vinculante, mas ela trouxe uma coisa interessante também, que foi o monitoramento específico, ela criou um relator especial para deficiência na ONU.

Em 2000 houve uma Conferência Mundial de ONGs sobre a Deficiência. Esses dados históricos, só para esclarecer, eu muito aprendi com Luiz Fernando Astorga que está aqui, e também tirei de duas fontes que depois, se alguém interessar, eu posso passar: é um estudo da ONU chamado Deficiência em Direitos Humanos, estudo encomendado pela ONU para avaliar esse processo da Convenção. Ele é de 2000, então avalia tudo o que aconteceu até 2000 e o recorte da deficiência nos

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outros tratados de direitos humanos; e porque ter uma Convenção específica e o Manual formado pelo IDC – isso vai ser falado mais para frente pela Regina e pela Flávia, pelo Luiz Fernando – que é uma coalizão de ONGS que existe na ONU e foi feita exatamente para as pessoas que chegam no processo entenderem como o processo funciona, então se chama Manual para New Commer, para os novatos.

Em 2000, essa Conferência gerou uma Declaração Sobre Os Direitos Das Pessoas Com Deficiência No Novo Século. Muitas organizações internacionais estavam nessa Conferência e formaram posições para que fosse criada uma Convenção temática para trabalhar todos os esforços que fossem voltados para isso. Um exemplo disso foi, inclusive, o Instituto Interamericano de Discapacidad, do qual o Luis Fernando é o Diretor Executivo, que iniciou uma campanha na América Latina também para pressionar os delegados e os países para que houvesse, também, esse processo.

E finalmente, em 2001, numa Conferência sobre o racismo, o México fez uma proposta concreta que foi pela primeira vez escrita em algum documento oficial da ONU, especificando a necessidade de que haja uma Convenção específica. No final desse ano, em 2001, aí sim na Assembléia Geral da ONU, foi criado um Comitê Especial que é aberto à participação de todos os Estados Membros e Observadores para que fosse examinada a proposta da Convenção. O texto dessa Resolução fala também que a Convenção seria para promover e proteger os direitos à dignidade das pessoas com deficiência, baseada numa visão holística do trabalho realizado, em questão de desenvolvimento social, direitos humanos e não discriminação e levando em consideração as recomendações da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão de Desenvolvimento Social.

Os principais argumentos contrários ao processo da Convenção eram justamente a existência de diversos instrumentos de direitos humanos que já poderiam abarcar as pessoas com deficiência como sujeitos de direitos, ainda que não de forma específica; pelo fato de já existirem as formas de 1993, não precisaria que houvesse uma Convenção específica; o alto custo do processo de elaboração de uma Convenção é um processo caro de deslocamento para elaboração do documento e, depois, o custo de monitoramento e aplicação também seria um dos argumentos. E por último a posição contrária dos Estados Unidos e de alguns outros países, que alegavam que os custos de implementação poderiam ser transferidos dos países em desenvolvimento para os países já desenvolvidos – a velha guerra entre o norte e o sul.

Por outro lado, os argumentos a favor da Convenção eram justamente para a que a Convenção pudesse promover visibilidade e incorporar as pessoas com deficiência na pauta internacional dos direitos humanos. Isso é uma coisa que a gente viu presencialmente lá, do quanto a própria ONU, o prédio da ONU, precisa se sensibilizar. A gente teve um dia em que houve uma evacuação do prédio para testar como o prédio poderia evacuar tantas pessoas com deficiências juntas. Enfim, são processos de educação e formação de uma cultura em que os próprios participantes do processo também estavam, fazem parte do aprendizado. O outro argumento a favor é clarificar as obrigações dos Estados e os direitos das pessoas com deficiência; criar mecanismos de monitoramento específico para garantir a eficácia da aplicação das Normas, porque as Normas Uniformes não têm força vinculante, elas constituem uma mera declaração de direitos e não têm essa força de um tratado; a necessidade de considerar as peculiaridades específicas do segmento e influenciar a opinião pública e as políticas públicas locais.

E assim surgiu, em agosto de 2002, a primeira reunião do Comitê com o lema Nada Sobre Nós Sem Nós. Eu vou passar um pouco sobre esse processo da reunião do Comitê para que os outros participantes possam também desmembrar. Era só para pontuar um pouco esse pano de fundo, mas o processo começa com a pergunta: Se deveria ou não fazer uma Convenção? Na verdade, o Comitê era para avaliar as propostas; então, entre a primeira reunião, que foi em agosto de 2002 e a segunda, que foi em junho de 2003, foram realizados seminários regionais para que esse processo pudesse ser melhor desenvolvido de acordo com as peculiaridades locais e que as propostas pudessem ser realmente avaliadas, se realmente era necessário ter uma Convenção ou não. E aí, com o mundo dividido na posição que a gente conhece geopolítica, em 5 Continentes, foram feitas reuniões em Quito, Bruxelas, [inaudível] Bangkok, Líbano, contemplando todas as 5 regiões do mundo.

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Em junho de 2003 teve a segunda reunião do Comitê em que houve uma participação maior de ONGS, uma participação maior dos Estados e, nessa reunião, foi criado um grupo de trabalho para elaborar a minuta da Convenção, uma primeira minuta que pudesse basear o processo.

Na terceira reunião, em junho de 2004, aí sim, começou a ser trabalhado um processo em cima do texto específico, que foi uma minuta oficial realizada por esse grupo de trabalho.

Em setembro de 2004 foi a quarta reunião, onde houve a conclusão da leitura dessa primeira minuta inicial, considerando título, estrutura, parte do preâmbulo, definições, enfim. A quinta reunião do Comitê foi em janeiro de 2005, onde foi lida a segunda metade do texto. Quando a gente fala lida, na verdade é um processo em que artigo por artigo, a leitura do artigo e todas as opiniões dos Estados Partes que são os delegados oficialmente constituídos, que representam os Estados e posteriormente a isso as Organizações Não Governamentais da Sociedade Civil, podem falar também. Então o lido pressupõe também a discussão. Nessa 5ª Reunião a CORDE esteve presente, a Carolina Sanches foi do Brasil.

Na 6ª reunião, que foi em agosto de 2005, foi realizada a segunda metade da segunda leitura. Nessa reunião o Instituto Paradigma esteve presente.

A 7ª reunião do Comitê, em janeiro de 2006, que foi essa última reunião realizada este ano, foi uma reunião mais extensa onde, depois das duas leituras integrais realizadas meio a meio da 2ª até à 5ª sessão, foi feita uma leitura integral. Para isso o processo foi mais longo; em vez de duas semanas de reunião foram 3 e, nessa reunião, muitos de nós estivemos presentes, eu pelo Instituto Paradigma, Regina Atalla, Flávia, Fernando, estavam lá e o Joelson, Izabel, enfim. Destaco uma relevância do Projeto Sul que vai ser abordado pelas outras palestrantes, e ao final dessa reunião - uma característica dessa reunião entre a 6ª e a 7ª - o Presidente dos trabalhos, que a gente chama de Chairman, soltou uma proposta de minuta nova, limpa, com todas as considerações realizadas no Comitê até então e o trabalho da 7ª sessão fluiu muito mais rápido por conta disso. E agora a gente tem um relatório com os temas remanescentes, quais são os próximos temas, que não sou eu que vou abordar.

E aqui, o que é uma Convenção? A Convenção é um pacto. Convenção, tratado, pacto, na verdade são sinônimos de um acordo escrito realizado entre Estados Partes regidos pelas normas de direito internacional. A Convenção também pode ser definida como um acordo multilateral entre ações de alcance global que expressam consenso havido entre atores e negociantes. Essa característica do consenso é uma característica diplomática e que faz parte de todo um processo negociador das Nações Unidas.

O que difere uma Convenção de uma Declaração da ONU é justamente essa força jurídica vinculante onde a Convenção obriga os Estados que se comprometeram a respeitar os seus princípios e regras, a cumprirem o que na Convenção estiver disposto.

Como se divide uma Convenção? A Convenção tem, basicamente, 3 partes. Ela tem uma parte inicial do preâmbulo, que contextualiza uma situação e auxilia a interpretação dos textos; uma série de considerando, no contexto do processo; tem uma parte dispositiva onde há direitos e deveres das partes, que podem ser obrigações negativas que impõem omissões ou simplesmente o não fazer ou obrigações positivas que impõem ações de, efetivamente, realizar alguma coisa.

E a parte final especifica as cláusulas de formalização e entrada em vigor. No nosso caso, especificamente, essa parte final ainda não foi discutida e será discutida provavelmente na 8ª [...]

[...] A gente está finalizando a fase inicial. Então é constituído um Comitê Ad-Hoc, que a Regina estava comentando que é destinado a desenvolver e avaliar o texto da Convenção; e assim se iniciam as negociações sobre o texto. Nessa fase as Organizações da Sociedade Civil podem participar, desde que aprovadas e credenciadas junto à ONU.

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Na segunda fase, com o texto pronto, a Convenção vai para aprovação da Assembléia Geral, que, nesse caso, a gente espera que seja em janeiro de 2007. E aqui, novamente, eu ressalto a exigência do consenso; nenhuma Convenção pode ser imposta pela força, mediante ameaça ou qualquer coisa. Na verdade ela é quase um ato mais simbólico, formal, a questão da assembléia geral. A segunda fase é a fase da assinatura em que, uma vez tendo o texto oficial, o Estado pode assinar a minuta integralmente, ele pode assinar com reservas ou ele pode, simplesmente, não assinar.

Assinar com reservas, o que significa? Ele pode assinar e dizer que determinadas cláusulas, determinados artigos, determinados dispositivos ele não aceita, ele não vai cumprir. Isso aconteceu muito na Convenção da Mulher, onde essa questão da igualdade na família foi uma coisa muito questionada; o próprio Brasil fez reserva em relação a isso, porque o Código Civil não previa essa igualdade ainda. E é uma fase onde a gente vai poder atuar muito próximo para que o Brasil possa não fazer reservas na assinatura do tratado. A única disposição que a gente tem, a Convenção de Viena, que é a Convenção que trata das regras de como elaborar um tratado internacional, fala que as reservas não podem ser incompatíveis com objeto e o propósito do tratado, o que é muito vago, muito subjetivo. Será que a reserva desnatura o tratado ou não? Então é uma coisa que a gente tem que ficar muito em cima na parte do conteúdo específico, a definição de pessoa com deficiência pode ser uma polêmica para o nosso caso brasileiro mas...

(Fala fora do microfone)

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: Aqui eu estou considerando a minuta já pronta no Comitê, do Comitê ela já foi para Assembléia Geral e ela já virou o texto final da Convenção.

(Fala fora do microfone)

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: É. Eu estou falando aqui do texto oficial, se eu falei minuta, desculpa, porque a minuta é o esboço. Eu vou alterar o power point, na próxima.

A terceira fase do processo é o processo da ratificação, que é o processo que internaliza essa Norma, a Convenção dos Estados Partes. Isso vai ter que se harmonizar com a Constituição de cada país, com o Sistema Jurídico de cada país. No nosso caso, no Brasil, esse sistema pressupõe aceitação da Convenção pelo Congresso Nacional e depois pelo poder executivo, pelo Presidente da República. A gente tem no Brasil - eu não trouxe isso no power point porque isso era uma fala do Joelson - mas no Brasil existe uma Disposição que, para passar no Congresso Nacional, para ter status hierárquico, força de Norma de Constitucional, para virar Constituição, em suma, teria que ter um quorum qualificado de dois terços. Isso tem toda uma discussão e eu não queria entrar nisso agora, mas a idéia é que ela entre no Brasil com caráter de Constituição. E aí o Sistema Jurídico brasileiro precisa se harmonizar às regras da Convenção. Exato.

(Fala fora do microfone)

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: Depende de todos os processos e também da nossa força de auxiliar esse processo no Brasil, mas o texto provavelmente termine lá em 2007, em janeiro; e nós temos que fazer força para o Brasil assinar e ratificar. Às vezes o Brasil assina e o Congresso não ratifica, espera, demora, porque são processos políticos também. Às vezes ratifica e passa pelo Congresso e depois fica na mesa do Presidente. Então a cada fase, a cada etapa do processo a gente vai precisar atuar, tentando...

(Fala fora do microfone)

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Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: Sim, essa é a idéia, exatamente todos nós. Essa Convenção só tem valor jurídico se o Estado diz que sim, então o Estado precisa assinar, precisa fazer parte da Convenção. Quando a gente fala Estados Partes, Estados Membros, são os Estados que aceitaram o texto, que aceitaram o que lá está escrito, os princípios, as regras definidas. Para ela ter valor tanto em âmbito internacional quanto em âmbito interno, é preciso que o estado aceite essas regras.

O processo de aceitação é o que a gente chama de processo de ratificação, de confirmação dessas regras. Então com o texto pronto e aprovado na Assembléia Geral, precisamos dizer que sim e assinar e passar pelo Congresso Nacional e depois o Presidente assinar dizendo que sim. Daí a Convenção passa a fazer parte do Sistema Jurídico nacional. Nessa fase de ratificação, o instrumento de ratificação tem que ser depositado no órgão de custódia, que no caso é a ONU. No texto da nossa Convenção, a partir de 20 ratificações a Convenção passa a entrar em vigor. Então também é exigível que 20 países assinem e ratifiquem o processo para que a Convenção comece a valer internacionalmente. Então a gente vai ter um processo interno nosso no Brasil e também vai ter um processo internacional, onde 19 outros países vão ter que assinar junto para que comece a entrar em vigor. As Organizações da Sociedade Civil todas podem auxiliar nesse processo de implementação, tanto de ratificação quanto também de implementação da Convenção. Nenhuma Lei, por si, muda a vida e a cultura das pessoas, quem muda isso somos nós; então a gente precisa fazer com que essa mudança de cultura seja exercida na prática.

Como é que a gente pode ajudar? É justamente promovendo a disseminação de informações qualificadas sobre a Convenção e sobre a condição dos direitos humanos das pessoas com deficiência, encorajando os governos a aplicar os princípios e as regras da Convenção, suportando capacitação e empoderamento das pessoas com deficiência sobre os seus direitos e o acesso ao sistema judiciário local, sem prejuízo, também, de acessar o sistema global e regional de direitos humanos. Os Estados Partes adotarão reformas legislativas, administrativas e judiciais para adequação das práticas nacionais aos paradigmas definidos internacionalmente na Convenção.

O monitoramento: existe uma forma técnica e específica do monitoramento que a gente ainda não sabe como vai ser, porque isso é tema de discussão da 8ª reunião; mas, em suma, normalmente é criado um Comitê Temático que monitora a implementação das Normas. Pode ser que haja recebimento de relatórios e essa também é uma questão que as ONGS podem fazer, construir relatório dos direitos humanos sobre as pessoas com deficiência e enviar para o Comitê que faz esse monitoramento. Transversalmente, a gente pode querer incluir a pauta da deficiência nos outros relatórios de direitos humanos das outras convenções que já têm relatórios específicos que já funcionam.

Existe comunicação inter-estatal que não é muito utilizada, que é um Estado denunciar o outro e, diplomaticamente, ninguém quer denunciar ninguém, mas existe o sistema.

O Sistema de Petições Individuais seria o que a gente mais espera que aconteça, que é o sistema em que, individualmente, cada um possa ir à ONU e acessar o Comitê, reclamando e denunciando abusos de direitos. E existe uma idéia nova que seria o Ombudsman da deficiência, seria uma espécie de advogado geral, ouvidor ou coisa assim, mas que ainda é um processo que está em discussão.

Recentemente foi criado o Conselho de Direitos Humanos na ONU e eles estão estudando propostas de aperfeiçoamento do sistema de tratados. Acho que o Ministro Paulo falou na abertura da Conferência que o Brasil faz parte desse Conselho, um dos países mais votados do Conselho.

E aqui era um pouco dos benefícios da Convenção, de como isso aumenta a consciência, desenvolve conhecimentos, destaca os abusos, incentiva as políticas públicas e cria oportunidades de capacitações para as organizações de pessoas com deficiência com uma visão mais ampliada das questões que envolvem o segmento, prover dados estatísticos, enfim. Basicamente era isso o que eu queria trazer para vocês. Agora vou passar a palavra à Regina e estou à disposição para perguntas e comentários. E, para quem não está vendo o último slide, tem o telefone e e-mail: telefone de contato 011 5049 0075, é o telefone do Instituto Paradigma e o meu e-mail é [email protected]. Obrigada.

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Regina Atalla – Coordenadora: Bom, acho que com essa introdução da Laís a gente tem um panorama geral do que significa esse tratado internacional e o que representa, o que vai implicar para nós aqui, no Brasil. Eu diria, acrescentando ao que a Laís disse, que o motivo principal do México ter proposto em 2001, 2002, não lembro exatamente, a proposição dessa Convenção, é que havia, ou há ainda. a seguinte constatação: existem atualmente, no mundo inteiro, 600 milhões de pessoas com deficiência. 80% desse contingente vive nos países em desenvolvimento e grande parte, a grande maioria desse contingente vive em condições graves de carência econômica e de exclusão social, civil, política, enfim, de todos os seus direitos básicos e fundamentais. Então eu acho que essa constatação dessa situação gravíssima, inaceitável, eu acredito que tenha sido um dos grandes fatores a impulsionar a participação de 192 países, partindo do princípio de que teria que ser feita essa Lei para iniciar, de forma muito enfática, todos esses direitos que são direitos humanos da pessoa com deficiência.

Esse tratado é conceituado como tratado temático de direitos humanos e havia uma discussão, inclusive muito interessante, na ONU, que dizia que: Não estamos aqui tratando da discussão de novos direitos e sim da especificação e aprofundamento desses direitos que hoje precisam ser escritos porque não conseguem estar contemplados em outros instrumentos. Eu faria a seguinte reflexão também: se vocês observarem a nossa história latino-americana e brasileira, nós tivemos, durante todo o nosso movimento recente, 20, 30 anos de trás para cá, uma grande influência de toda a Legislação Internacional. O movimento internacional tem uma força muito grande, o movimento de defesa dos direitos da sociedade civil das pessoas com deficiência foi, inclusive, quem possibilitou e estimulou que várias Leis fossem criadas no nosso país. Bem, eu diria que essa Convenção tem uma importância especial. Porquê? Porque é um desses momentos em que se acredita que a democracia participativa é o futuro, é a solução de uma sociedade mais igual, conta com a participação intensa da sociedade civil e que, infelizmente, começa com uma participação muito concentrada dos países mais ricos que tinham condições, essas entidades localizadas na Europa e na América do Norte em geral, que tinham condições de participar desde o início e algumas outras, como o nosso bravíssimo companheiro Luiz Fernando, que, apesar de todas as dificuldades, tem participado desde o início desse processo.

Então eu diria que essa participação da sociedade civil impõe um ritmo e um significado a essa Convenção. Não é uma Convenção perfeita, mas ela traz a resposta muito clara e objetiva a várias reivindicações que nós fazemos há muito tempo. E essas mudanças de paradigma; eu gostaria de ler aqui, para vocês terem uma idéia, o que sustenta essa Convenção, os princípios gerais. Ela é baseada no respeito à dignidade inerente, autonomia individual, incluindo a liberdade de fazer as suas próprias escolhas e a independência das pessoas. A não discriminação, a inclusão e participação plena e efetiva na sociedade. O respeito pela diferença e aceitação da deficiência como parte da diversidade e da condição humana. A igualdade de oportunidades. A acessibilidade. A igualdade entre homens e mulheres. O respeito pela capacidade em desenvolvimento das crianças com deficiência e o respeito dessas crianças em preservar as suas identidades.

Bom, eu acho que, baseada nisso, resulta até esse momento e, chegando ao final, é o que vai prevalecer. Essa Convenção tem 33 artigos e ela fala e dá saltos que eu acho que nos interessam muito, porque isso quer dizer que, quando a gente for fazer essa adequação da nossa Legislação Internacional, nada poderá ser menor do que está escrito na convenção. E a convenção diz por exemplo, que: A educação inclusiva, partindo do princípio da não segregação, é um compromisso filosófico, ideológico, humano e que deve ser adotado por todos os Estados partes. Então, está partindo do pressuposto de que não aceitamos mais, no século XXI, no ano de 2006, que se faça a segregação. Está provado que a diversidade, inclusive o resultado dessa sociedade que discrimina, que exclui as pessoas com deficiência, é explicado por essa segregação. Se você não convive com as pessoas com deficiência desde a mais tenra idade nos seus espaços, todos os espaços de relação social, você não reconhece essa pessoa como fazendo parte do seu grupo. Então essa é uma raiz que tem que ser... eu acho que é um divisor de águas.

Olha, a gente reconhece tudo o que foi feito, é claro que ninguém vai começar acertando, mas, olhando para trás, nós temos que tomar algumas medidas e decisões que são emblemáticas e que vão definir a construção dessa Convenção. E eu diria, como é que a gente, Brasil, entra nessa história? Em

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2004, o Conselho Nacional dos Centros de Vida Independente realizou um Encontro Nacional de CVI Brasil Salvador. E nós temos notícias, enfim, uma relação de nosso amigo Luis Astorga por e-mail, não nos conhecíamos pessoalmente, o trouxemos com muito empenho, não havia verba, tiramos verba e conseguimos trazer Luis Fernando Astorga, Rosangela Berman que veio também com parte de recursos da sua entidade Mariociéde (?) e fizemos uma palestra sobre a Convenção Internacional. Já preocupados com o quê? Só para dizer a vocês o seguinte: qual é o nosso peso na América Latina? Se estima que na América Latina, hoje, existam cerca de 50 a 60 milhões de pessoas com deficiência. O Brasil tem 25 milhões. Nós somos metade, sozinhos, de todos os países latino-americanos na incidência de pessoas com deficiência. Então - sim, sim, é só para a gente ter idéia exata e mensurar - pessoas com deficiência, nós somos 25 milhões. Na América Latina há cerca de 50, 60 milhões em toda a América Latina, certo? Então nós temos uma importância crucial em todo o continente e estávamos já no meio do processo dessa Convenção, não conseguindo participar desse processo. E nós dizíamos, nós também somos parte, porque somos aqueles 80 % dos países em desenvolvimento que precisa ir à ONU dizer o que é necessário, ajudar nessa intervenção, nessa negociação.

Então, em 2004, há esse primeiro contato. E depois, enfim, é muito difícil e todas as entidades sabem disso muito bem, de se ter apoio governamental, institucional, para custear e suportar essas atividades. Porque há, eu acho ainda uma dificuldade, todo mundo diz: Não, democracia participativa, as ONGs são importantes, mas fica muito na fala oficial, quem ia lá era o governo. E mesmo assim, num primeiro momento, muito passivo, não fazia intervenções, não fazia sugestões. Então era uma participação que ainda precisava dessa qualidade, dessa vida, enfim, dessa intervenção que as organizações da sociedade civil podem fazer, porque são os atores, são as pessoas que têm melhor conhecimento da sua necessidade, portanto sabem o que melhor lhes convém e têm que estar lá como atores principais dessa negociação.

Enfim, passa-se o tempo, vem a 5ª Convenção, no CONADE a gente não consegue, tentando trazer essa questão para o Conselho Nacional e a 6ª reunião acontece. Vai o Instituto Paradigma por conta própria, sem uma articulação ainda com os outros movimentos das entidades da sociedade civil. E aí a na 7ª reunião, como eu disse, o Luis vai falar um pouco melhor disso, dessa participação internacional que é o Internacional Disability Caucus, que reúne organizações regionais e nacionais do mundo inteiro de pessoas com deficiência. Sim, obrigado. E aí, entre a 6ª e a 7ª, o Luiz, já numa iniciativa, angustiado com essa participação muito européia dos países em desenvolvimento, se dispõe, no Instituto Interamericano, a fazer um grande esforço e um projeto para assegurar que o mínimo de lideranças latino-americanas estivessem também presentes, participando desse processo. E foi um trabalho árduo, Luiz Fernando trabalhou madrugadas, dia e noite e conseguiram levar de 25 a 30 líderes latino-americanos e fizemos uma grande diferença.

No Brasil, o que acontece? Nós, do CVI Brasil, Instituto Paradigma, tentamos trazer essa questão para dentro do CONADE, conseguimos o apoio e interesse do nosso Conselheiro Joelson que está aqui e representa a OAB, que foi conosco a Nova York, para que a gente, de fato, pudesse participar. Então antes, para preparar essa participação na 7ª reunião, nós fizemos um Seminário em São Paulo, junto com o Instituto Paradigma, a CORDE ajudou, enfim, vários outras entidades entraram e reuniram-se mais ou menos 300 pessoas com a intenção de que se discutisse toda essa minuta e fizéssemos preposições a esse documento da ONU. Isso acho que foi uma contribuição importante, havia uma lista, discapacidad e derechos humanos; era uma lista virtual que foi muito importante, havia uma discussão, inclusive uma organização muito boa. Cada artigo tinha um facilitador, tinha um tempo, ele mediava essa discussão, ele fornecia os subsídios para essa discussão com tempo para fechar e a gente foi amadurecendo essa discussão. E esse documento ajudou nessa discussão, serviu em vários momentos para ajudar a enriquecer essa Convenção e a gente consegue, com o apoio do Fundo das Nações Unidas, com Handicap internacional, com a Fundação Interamericana, levar esse conjunto de pessoas – e aqui no Brasil 3 pessoas, com a Laís quatro, com a Luiza Russo Presidente, que esteve não o tempo todo, mas duas semanas, participando desse processo.

Inclusive, quando você participa desse processo na ONU, você tem o compromisso, como entidade, de multiplicar essa informação. E é o que eu tenho feito desde então. E fiz o meu relatório um

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pouco atrasado para o Fundo das Nações Unidas, Departamentos Sociais e Econômicos, mas esse atraso foi interessante porque permitiu espelhar um acúmulo do último dia da reunião, que foi dia 03 de fevereiro, há cerca de um mês. Então eu tive oportunidade de, nesse processo da Conferência mesmo, tocar e falar sobre essa Convenção.

Então hoje eu acho que já enviei - inclusive para as pessoas interessadas existe esse texto em português, a gente conseguiu fazer a tradução e ele está disponível para todo mundo, depois eu vou dar meu e-mail para quem tiver interesse - eu já distribui esse documento para mais de 200 pessoas no Brasil e já falei para mais de 1000 pessoas sobre essa Convenção. Porquê? Porque ela tem tudo a ver com a gente e há uma discussão, uma interface que é essa discussão que vocês estão acompanhando: estatuto, consolidação. Essa foi a discussão que fiz com Leonardo, tentando dizer que a Câmara e o Senado existem para formular Leis e que a gente está num momento muito propício porque a Convenção vai, avança em diversos pontos que são cruciais para os nossos direitos básicos e nada, não existe momento melhor, esse momento agora, tomando como base essa Convenção Internacional e traduzindo isso para o nosso aperfeiçoamento. Porque quando a gente olha também o nosso arcabouço legal, é um mito muito recorrente que nós temos uma boa Legislação, de que essa Legislação é perfeita e que não seria necessário outro tipo de Legislação para dar conta disso.

Mas isso não é bem verdade; se você for estudar a Legislação, você vai encontrar várias falhas, você vai encontrar uma Lei dispersa, uma Lei genérica, uma Lei sem coesão, uma Lei pouco aplicável. Eu estou convencida. Depois que eu voltei da Convenção, desse processo, participei... A gente tinha reunião que vocês não imaginam, de 9 às 11 da noite. Eu passei 3 semanas em Nova York e eu não consegui conhecer um museu. A gente trabalhou o primeiro final de semana, foi trabalho duro, enfim, mas a gente tinha uma gana, o grupo latino-americano principalmente, de se dar e participar desse processo. Eu escrevi um documento chamado O Estatuto, a Convenção Internacional e a Responsabilidade da Sociedade Civil. E eu colocava as preocupações, os pré-requisitos que devem reger essa discussão. Eu acho que a sociedade civil não pode mais ficar nessa posição de ser favorável ou contra, sem ir a fundo nesse processo. E acho que o que todo o mundo quer, quando você fala em aperfeiçoamento legal, é avançar, é aprimorar esses direitos. Então eu acho que esse esforço e essa qualidade do conhecimento das lideranças tem que servir para isso.

E como a Convenção Internacional também tentou fazer, a gente tem que tentar garantir que haja legitimidade e democracia nesse processo. Então é importante que o maior número de pessoas, claro todas interessadas, possam se aproximar dessa discussão, conheçam a Convenção Internacional e possam estar melhor habilitadas para construir a nossa Convenção, para construir esse aperfeiçoamento, seja estatuto, consolidação, que nome tenha.

E eu gostaria de salientar que, enfim, eu acho que as pessoas que quiserem ler, tem pontos riquíssimos e um deles, por exemplo, diz respeito à capacidade das pessoas. Nessa Convenção há cerca de, atualmente, 5 artigos pendentes, se não me engano. E esses vários artigos que estão definidos apontam, por exemplo, como não institucionalização.

Eu ouvi histórias de pessoas que sofreram violência porque tinham uma deficiência intelectual, que a família afastou, que foram estupradas, que foram abusadas, que sofreram dessa violência durante anos e anos da sua vida. Porquê? Porque o sistema permitia. Se ele não permitia claramente, ele não proibia. E a Convenção proíbe! Ela diz que qualquer pessoa tem a capacidade, com o apoio necessário, de tomar as próprias decisões e agir em diversas situações, inclusive como testemunha, como parte de processos judiciais.Pessoas com deficiência mental, todo mundo diz que são incapazes. Não! Isso era há 20 anos. Há vinte anos não se acreditava que pessoas com Síndrome de Down fossem capazes de aprender a ler ou escrever. Quem estava certo? Então já está provado que se tem que apostar na capacidade. Inclusive eu acho que quando os países perceberem isso, que essa exclusão tem uma magnitude tão grande que, se ela não tiver essa abordagem central...

(Fala fora do microfone)

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Regina Atalla – Coordenadora: Eu vou terminar para as outras pessoas poderem se colocar. Eu vou tentar encerrar aqui a minha fala. Mas eu queria dizer o seguinte, que esse processo [...]

[...] e aos nossos Senadores a importância da aprovação dessa Convenção. Quando nós conseguirmos convencer os nossos gestores e governantes, que sim, que tem ser aplicado, porque a magnitude dessa exclusão é tão grande que o programa das 8 metas do milênio, se elas não tiverem uma abordagem específica, elas não vão ser atingidas, tal a magnitude que representa esse conjunto nesse contexto global.

E eu diria que ainda é desperdício essa ação dos países nessa exclusão. Porquê? Porque você está deixando de fora do processo produtivo de produção de bens culturais e econômicos uma grande parcela da população que tem diversas outras capacidades diferenciadas. E aí é que está o nosso desafio, de fazer essa inclusão com dignidade, trabalhando na capacidade dessas pessoas, dizendo a esses governantes que o investimento de recursos nesse segmento não é despesa, é investimento. É isso gente, obrigado.

Flávia Paiva Vital – CVI Aracy Nallin/SP: Eu vou procurar ser super objetiva e bem curtinha para a gente poder ouvir o Luis Fernando. Primeiro, para poder tirar um pouco a ansiedade de todos, o texto em português está disponível no site do paradigma, que é o www.institutoparadigma.org.br. Porque não daria em duas horas para a gente colocar todo o conteúdo da Convenção Internacional para vocês.

Como a Regina falou, nós chegamos com o bonde andando, então quando a gente começou a participar do processo, na verdade o rascunho, a minuta primeira, já era a segunda minuta, ela já estava elaborada, então não havia mais possibilidade de uma mudança radical de conteúdo. E a gente está indo para a 8ª Conferência, como a Regina também colocou, com alguns pontos ainda em aberto, mas que, tirando o problema da [inaudível] da deficiência, porque como são 190 países, cada uma tem a sua escola diferente, tem a escola médica, a funcional, a social.

Agora, uma das coisas que a gente percebe bem é que, no Brasil, o doente mental não é deficiente e, na maioria dos países, o doente mental é deficiente. Então se se partir para uma linha funcional, que é o que se acredita, apesar de não se ter consenso nesse ponto, o Brasil vai ter que incorporar o doente mental como deficiente. O que é uma realidade. Tem muitos de nós que trabalhamos com pessoas bipolares, esquizofrênicas, que têm uma capacidade funcional muito boa e que têm direito pleno de suas ações. Então não tem porque eles estarem excluídos desse grupo.

Quanto ao resto que ficou em aberto, na verdade existe um consenso de idéias, o que não existe é um consenso de como escrever. Eu vou falar um exemplo pequeno, que é o problema das pessoas mais vulneráveis dentro do grupo das pessoas com deficiência, que somos nós, mulheres e as crianças. Por que nós somos mais vulneráveis? Se a gente olhar o quadro que o Banco Mundial faz, 80% das pessoas com deficiência gastam, para sobreviver, mais de 40% do que uma pessoa não deficiente. Então, para eu manter o mesmo padrão de vida dela, que não tem deficiência, eu gasto 40% a mais. Então não adianta, por exemplo, eu e ela ganharmos a mesma coisa porque, no final, o meu padrão de vida vai ser menor do que o dela. Então essa colocação do Banco Mundial é importante para a gente colocar, porque a população com deficiência, mesmo ganhando relativamente bem, ela já está abaixo da linha em que deveria estar. Mas, não considerando esse fator do gasto, a gente coloca que, no Brasil, mais de 70% da população com deficiência vive abaixo da linha da miséria. E várias coisas contribuem com isso, algumas Leis, inclusive, contribuem para isso. A Legislação do Brasil não é perfeita, não é a maravilha que nós queríamos que fosse, mas, frente aos outros países, ela é muito avançada.

Eu dividi quarto com uma menina lá na ONU que, aos 12 anos, foi esterilizada para não ter filhos com deficiência, sendo que ela teve poliomielite. Quer dizer, é uma pessoa que não tinha nenhuma doença que pudesse passar para frente, e mesmo assim com 12 anos ela foi esterilizada; e isso é uma

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realidade muito próxima de nós. A gente fala de outro país porque nunca chegou para mim alguém do Brasil e falou. Mas, com certeza, aqui também se faz isso de monte.

Como ontem o Governador do Piauí falou, que anda pelo interior do Estado dele e vê pessoas acorrentadas, crianças acorrentadas porque são deficientes, isso é uma realidade nossa. Somos poucos aqueles, apesar de estarmos aqui em 1500 delegados, somos poucos que podemos estar aqui perante toda a nossa população de pessoas com deficiência e que não participam desse processo porque não conhecem esse processo. Eles não podem reclamar dos seus direitos porque não conhecem os seus direitos. Por isso eu acho importante não só a participação das ONGs como dos Conselhos, que têm uma participação muito próxima a essa população mais carente, porque têm que ser levados a essa população esses princípios da Convenção. É essa população excluída, são os excluídos dos excluídos que têm que conhecer isso.

Mas voltando ao caso das mulheres e crianças, o que falta apenas para elaborar o texto é decidir se o texto da mulher, os assuntos da mulher vão estar transversalmente colocados em cada item da Convenção ou se vai ter um tema específico da mulher, outro da criança, outro da pessoa indígena, o que seria, também, um problema. Outra fala que tem esses fatores, cada um no seu item, por exemplo, quando se fala de educação se fala da educação da mulher e da criança e tem também um texto sobre a violência específica da mulher e da criança, os abusos a que essas pessoas estão vulneráveis, dentro das instituições e dentro das suas próprias famílias. E essa é a que tem o maior consenso dentro da Convenção e parece que se ruma para isso, para se ter a transversalidade e se ter um item específico por gênero da mulher, pela igualdade que já está nas definições da Convenção. Mas o que é demais nunca abunda, e além disso, você pode ter os textos, que é o que foi feito mais ou menos pelos textos da saúde. A saúde passa por alguns temas transversais e tem alguns temas específicos.

Então, dos textos que faltam, a maioria é apenas de redação. É um problema de onde colocar e como colocar e de palavras a serem usadas, porque isso também é muito complicado com a quantidade de países e de culturas tão diferentes que tem lá. Mas são coisas muito simples, por isso é que a gente acredita que em agosto deve terminar esse período da Convenção. E eu queria já passar para o Astorga, para não me prolongar.

Laís Lopes – Instituto Paradigma/SP: Eu queria só lembrar uma coisa. Na revista Sentidos tem uma seção que o Estudo Paradigma publica e, nessa edição de agora, tem um texto sobre os artigos das definições, artigos sobre título, preâmbulo, artigo primeiro e segundo; o segundo é das definições e na edição anterior foi falado sobre os temas remanescentes que estão pendentes para serem discutidos na próxima seção: essa questão do monitoramento, das definições, enfim, da capacidade legal, da intervenção, da institucionalização forçada de crianças e mulheres com deficiência, etc. na Revista Sentidos vocês podem achar essas reportagens, são textos curtinhos, os Boletins de devolutiva do processo da ONU, que foi o nosso compromisso. Claro.

Flávia Paiva Vital – CVI Aracy Nallin/SP: Eu só queria falar mais uma coisinha. Quem não tiver acesso à Internet e quiser o texto, deixa o nome e o endereço que a gente manda pelo correio. Então não se sintam excluídos, se são excluídos digitais a gente manda pelo correio, não se preocupem.

Luiz Fernando Astorga - Diretor Executivo do Instituto Interamericano sobre Deficiência/Costa Rica – Bom, companheiros e companheiras. Está um pouco tarde e, pelo horário, muitos devem estar cansados e cansadas. Mas é claro, é um tema que a todos e a todas nos interessa. Eu realmente me sinto muito bem de estar aqui compartilhando, inclusive para mim é muito grato encontrar-me sempre com o Brasil, há uma relação neste processo, em meu processo de vínculo com os trabalhos assumidos na Convenção das Nações Unidas, na Convenção onde tem estado o Brasil em forma permanente.

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Flávia Paiva Vital – CVI Aracy Nallin/SP: Vocês querem que façam uma tradução simultânea? está todo mundo entendendo, está ótimo?

Luiz Fernando Astorga - Diretor Executivo do Instituto Interamericano sobre Deficiência/Costa Rica – Muito bem, há uma relação que disse a Argentina em sua intervenção que vinculava a colega e amiga Rosangela Berman Bieler, que tem sido ativista do Movimento de Direitos das Pessoas com Deficiência no Brasil e internacionalmente. Precisamente o vínculo com Rosangela e dela conosco foi começarmos a trabalhar juntos ela é Presidente do Instituto Interamericano sobre Deficiências e eu sou o Diretor Executivo do Instituto. O vínculo com este processo teve início quando ainda não havia começado o processo na Convenção, quando o México estava negociando na ONU uma Resolução, que a Laís mencionou, a 50668, que abria este processo. Havia uma enorme resistência dos países ricos, dos países desenvolvidos contra este processo. Abri um processo com Normas Uniformes, melhoramos as Normas Uniformes que nós não vinculamos e estava bom. Para quê uma nova Convenção Temática? Nesse momento, quando conhecemos o que México estava trabalhando – estamos falando de agosto de 2001, mais setembro de 2001, outubro, para fechar aquele momento depois das torres Gêmeas em 11 de setembro – nesses meses trabalhamos muito duramente, apoiando o México como Instituto Interamericano sobre Pessoas com Deficiência. O México pedia que as organizações trabalhassem numa campanha que apoiasse essa Convenção para eliminar a resistência dos países desenvolvidos. E se logrou essa Resolução, pois queria se [inaudível] esse direito inicial, terminal, tendo uma companheira brasileira muito querida, trabalhando muito fortemente em uma campanha internacional que dá o fruto requerido, que foi aprovar a Resolução 56168, que abre este processo.

Este é um instrumento de um enorme valor, tem que conhecê-lo para ver o enorme valor que tem a troca de enfoque sobre a deficiência. Recordem que as Normas Uniformes sendo boas e havendo julgado um papel importante, as nuances vinculantes, tem Estados e tem sociedades que tomam nota delas e outros não. Uma Convenção como esta tem caráter universal. Universal para os Estados, universal para as sociedades e o mais importante: universal para os movimentos de pessoas com deficiência. Começamos a falar uma mesma linguagem de um mesmo elemento que nos unifica. Esse vínculo é também muito importante porque permite que seja ratificada por um Estado - pelo menos é assim na Costa Rica - uma Norma que está acima das leis nacionais e que cria um sistema jurídico. Se na lei nacional há algo mais avançado, obviamente que vai ter proeminência, mas o que aqui for negociado, numa negociação completa – recordem que das Nações Unidas participam 191 Estados e são negociações políticas puras, ou seja, não é fácil, aí se partem cadeias similares quando se negocia, porque intervêm interesses geopolíticos, econômicos, políticos, culturais, religiosos, sistemas jurídicos distintos, que se tem que converter em um documento unificado. Esta Convenção tem um grande valor por ter exposto outros temas que também integram os direitos civis e políticos e os direitos sociais e culturais.

O que acontece é que tem uma particularidade para a qual quero chamar a atenção: por exemplo, quando falo em transporte, estou falando de um direito econômico que me permite integrar-me às atividades da sociedade. Se eu não tenho transporte acessível, estou limitado nesse direito. Se se invoca o direito econômico e social – recordem que estes não são de aplicações imediatas, os direitos econômicos e sociais estão condicionados ao grau de desenvolvimento e recursos disponíveis do Estado – nos põe numa resolução desprezada, sem valor. Mas se eu reclamo da livre mobilidade, se eu perco completamente minha liberdade de movimento, que é um direito fundamental, a liberdade é uma troca de enfoque porque aí a acessibilidade não é um direito, a acessibilidade se converte num meio para que eu tenha essa liberdade. Essa troca de enfoque estava sendo aplicada na Costa Rica, não aplicada com êxito, porque a troca da perspectiva da Instância Constitucional da Costa Rica nos convenceu com esse tipo de argumentação.

Há outro elemento que é importante e que está na Resolução 56168, que fala de um instrumento anti-discriminatório, um instrumento de direitos humanos e desenvolvimento social. Na Convenção que temos como referência só há esse sistema regional que tem a Convenção sobre a Deficiência, que é o sistema da Organização dos Estados Americanos, sistema interamericano, mas é

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uma Convenção restritiva, porque só enfoca a discriminação, não integra direitos humanos e desenvolvimento social, que é o que fazem as Nações Unidas e é uma grande vantagem.

Isto simplesmente eu vou desenhar só em uma tela em que vocês vêem que este processo da Convenção, se iniciando em 2002, tem 4 anos e meio, ou seja, é muito pequenino, na verdade é quase uma criança. Há processos muitos mais extensos, como a Convenção Sobre os Direitos das Crianças desde que começou o processo, até que se aprovou há dois anos. Sem dúvida, muitos Estados consideraram o que se falou nessa Convenção e se aprovou e se resolveu em dois anos. De alguma maneira estava presente a idéia de que poderia acordar no tema de pessoas deficientes que haveria de submeter-se a uma sub-representação, uma subestimação, vai ser fácil fazer esse acordo. Não se tinha uma dimensão clara da complexidade de alguns temas vinculados com direitos das pessoas com deficiência, porque algumas pessoas, quando entraram, pensavam que era uma Convenção de onde se iria criar novos direitos; isso foi uma discussão muito forte e se mostrou que não. São os mesmos direitos, só que é uma Convenção que irá servir de rampa de acondicionamento para que se cumpram estes direitos.

Então desde que se tomou a resolução, aconteceram 7 reuniões do Comitê Ad-Hoc. O Comitê Ad-Hoc, tal como estava planejado, é um Comitê de composição aberta, ou seja, podem participar os 191 Estados, se for do interesse, e com direito a idas progressivas. Desde a primeira reunião, em que participaram 180, agora já se duplicou em muito os campos vazios e chegaram quando muito a 30, 25, 30, e anda por volta de 150 Estados. Isso é uma participação muito importante. Agora, recordem que só os Estados decidem, discutem e votam. As Organizações da Sociedade civil só são observadores e os Organismos Especializados da ONU, como a OMS, OIT, UNICEF, etc. são também observadores.

(Fala fora do microfone)

Luiz Fernando Astorga - Diretor Executivo do Instituto Interamericano sobre Deficiência/Costa Rica: Com muito gosto. Lembrem que as Nações Unidas são constituídas por Estados, países. Há 191 membros plenos com direito a voto. Agora, no Conselho de Direitos Humanos, a maioria é 96, porque eram 96 e ficaram 95. Esses são os Estados que, nesse processo de negociação, cada país tem uma missão nas Nações Unidas e essa missão manda um representante por país. O Brasil não entrou, e conosco já foram alguns delegados do Brasil, que não estavam na Comissão. Ele, a pessoa que está ali fala pelo Brasil, nunca se menciona o nome próprio, vai falar Brasil. E assim é sério, a pessoa que está representando o Estado e o que diga e o que negociar, é o Brasil. Sim, bom, as Organizações da Sociedade Civil internacionais, regionais ou nacionais não podem decidir. Podemos conversar com delegados, fazer as perguntas, satisfazer dúvidas, porém não votamos. Votam os países que são representantes legítimos. Então, digo isto porque é muito importante, eu inclusive escuto pessoas que estão muito perturbadas e dizem que se questionam como se a sociedade civil pudesse intervir diretamente e rebater. Isso são somente os representantes governamentais. Na realidade, quem negocia esses processos são as chancelarias. Além da linguagem das Nações Unidas, só as chancelarias, porque cada delegado ou delegado não vai dizer: Bem, aqui vou decidir isto. Não. Nos temas difíceis tem que chamar a capital e consultar e aí vem a linha que não se pode modificar. Aqui é muito importante se falar isso, porque nesta negociação todos os países intervêm com as chancelarias ou Ministérios de Relações Exteriores.

Eu queria indicar onde exatamente estamos hoje, depois de haver 7 reuniões de Comitê Ad-Hoc. Eu participei desse grupo de trabalho representando as Nações das Américas e dizemos que, nesse processo das negociações nos Estados, tem havido uma participação muito rica da sociedade civil. Nenhum processo – isso não tem para alguns – nas Nações Unidas, os processos das convenções não tem havido a participação que tem esses representantes da sociedade civil; isso tem incidido muito fortemente. Então há esse grupo de trabalho que havia participantes, 27 eram os Estados e 13 das Organizações de Pessoas com Deficiência e uma de Direitos Humanos. Eram 27 e 13. É bom dizer isto porque foi algo completamente novo. Nações Unidas normalmente faz uma relação de uma Convenção, criava um grupo de trabalho com 12 especialistas – muito caro para as Nações Unidas, custava não

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menos de 1 milhão de dólares esses grupos especializados – aqui se pensou, como havia pressão para baratear os custos, barateamos os custos com uma sessão, não um grupo de especialistas com 27 de todos os Estados e 13 de pessoas com deficiência, que formam interessantes, ou com mais pessoas com deficientes por que os Estados... Me recordo por exemplo, Tailândia que enviou uma pessoa cega que era o representante do Governo da Tailândia. Havia um grupo importante de pessoas com deficiência orando como primeiro orador da Convenção. Quanto custou as Nações Unidas? Praticamente nada, nada além de um gasto administrativo de 15 dias de uma excitante negociação porque se dobrou a quantidade de material. Se é esse o caminho completamente novo, melhorando o curso porque havia uma prévia negociação, com parte de Estados com organizações da sociedade civil.

Agora, quando digo onde estamos e que nesse momento se conta com um quadro da Convenção, o Comitê Ad-Hoc ou comitê especial, negociou em janeiro durante 3 semanas, artigo por artigo e um quadro que podia apresentar um grupo de trabalho para negociar e havia apresentado ao presidente Don Maquei, embaixador da Nova Zelândia, mas a diferença é que é um documento bastante consistente, bastante consensual de todos os Estados. Aí já há um veículo que está resolvido isto como em 70, 75% dos ideais desse documento consolidado.

Agora creio que estamos e aonde vamos, creio que entre 14 e 25 de agosto próximo, bem estamos a três meses, vejam a importância, há três meses de se começar a 8º Reunião e todo está confluindo para que aí se termine a negociação e digamos que as 6 da tarde em Nova York, quinta, 25 de agosto é aprovada a Convenção. Aprovada é aprovada. Porque aí os Estados irão estar presentes, só os Estados não importa que leve o documento a uma Assembléia Geral para se tornar formal e para que coloquem sua assinatura que é um ato formal. E aí pode estar o representante ou pode estar o presidente, porque é um ato e para saírem na foto não? É um ato histórico porque lembrem que essa seria a 1ª Convenção do milênio, a 1ª Convenção dos direitos humanos no novo milênio, seria essa das pessoas com deficiência. Agora vamos a coisas muito concretas. Há temas pendentes e [...]

[...] três categorias, não quero questões mais importantes pendentes. Estas são a maioria dos artigos, não têm mais nada relevante, só questões de performance. Na segunda, algumas questões pendentes, há poucas numa lista como a de vocês, 7 artigos. Mas há três, mas em espanhol eu não saberia qual a expressão em português, são “peluagudos”, são muito difíceis de resolver porque há diferenças muito grandes de enfoque. Por exemplo, os três seriam nos artigos doze, de igual reconhecimento como pessoas pela lei, que fala de capacidades jurídicas, sobretudo quando se fala de pessoas com deficiência intelectual, com pessoas com deficiências mentais e psiquiatras. Por que? Porque há uma grande preocupação dessa pessoa com esse tipo de deficiência poder exercer capacidades jurídicas para tomarem decisões, que tipo de assistência teria, qual seria o limite dessas assistências, que características... Essa é uma discussão complicada.

O outro tem haver com proteção a integridade pessoal. Este tem haver com história de experiências das pessoas com deficiência com risco de índices de abusos de todo tipo, médico-científicos, então que proteção tem? E para isso precisamente há uma organização da rede mundial de sobreviventes e usuários da psiquiatria que tem demonstrado muita preocupação porque são muitos os casos registrados de abusos com essas características.

E há outro que para nós poderia parecer como uma reivindicação claríssima do direito à saúde reprodutiva. No entanto isso cria muita polêmica e há um artigo da saúde e isso tenho que dizer , por exemplo, que influi nessa discussão, no barulho que faz essa discussão no Vaticano. Porque há alguns grupos e países de filiação muito católica que consideram que qualquer manifestação de expressão de saúde reprodutiva, já está pensando no aborto, como direitos que elas tem ao aborto. Então estou falando em um tema conflitivo. Estes são os três temas mais conflitivos nesse momento.

Para Caucus, e explico o que é Caucus. Caucus é um grupo organizado de pessoas com deficiências e ONGs que se formaram na primeira reunião, por exemplo, o Instituto estava na primeira reunião e tem acompanhado esse processo em todos os passos. Mas nessa segunda reunião, quando teve a afirmação da Convenção e se criou o grupo de trabalho, se uniu todo esse grupo, esse grupo de coordenação – nesse momento são mais de 30 organizações – e se criou o Caucus Internacional em

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Deficiência. O significado de Caucus, pelo menos em espanhol não soa muito bem como uma turma, isso é equivalente a uma equipe de coordenação para a incidência. As organizações se colocaram de acordo em trabalharmos juntos em uma só direção. Isso tem sido muito importante porque Caucus será consolidado. Pois bem, essa coalizão de pessoas com deficiência tem algumas preocupações. Em que temas? Na definição da pessoa com deficiência. Há Estados que tem dito que não há definição e que a definição tem os próprios Estados. Isso é muito perigoso porque pode excluir. A preocupação tem que ser com a exclusão que existe, se tem uma exclusão definitiva. Isso é assim com a definição que México tem sobre as pessoas deficientes, reconhece um único ponto, 65%. Os países escandinavos reconhecem 23%, 1,5 , 23%. Qual é a realidade? Então falta uma só definição para um enfoque médico reabilitador, senão passar por uma nova concepção onde a deficiência é um produto social e isso se está reivindicando como necessidade para essa nova definição. Então isso é uma, pelo menos em Caucus defende a tese que tem que haver uma definição e há bastante inclinação a que tenha uma definição. O problema é qual são as características dessa definição. Isso nós temos que resolver em agosto. Outra tem haver com o fortalecimento dos referencias de morte de meninos e meninas com deficiência, com a exceção de indígenas e outros grupos de condições muito vulneráveis e excluídas que se deseja que tenha uma menção concreta, isso de plena capacidade legal e o modelo de (ininteligível) que toma como apoio e outro que tem que ver com artigo 17, com sentimento livre e informado buscando garantias com todo o tratamento ou intervenção forçada baseada na deficiência e de cooperação internacional que já tem muitos acordos. Porém há resistências pelos paises desenvolvidos haja visto a cooperação internacional em duas dimensões. Uma é dinheiro do norte para o sul. Dinheiro. Não há outra forma de cooperação e isso é visto muito ofensivamente. E o outro que dizem “ah bom, estes países do sul querem uma Convenção muito ampla, muito forçada. Pois então vamos passar a fatura. Podemos aplicar os nossos direitos se temos dinheiro mediante a cooperação internacional”. Isso se tem rejeitado porsuposto desde que avance numa negociação, mas falta terminá-la. Mas outro que é monitoramento e supervisão, isso já tem planejado muito bem, no entanto não é um assunto resolvido, não porque não esteja sendo discutido, senão que esta hora vão haver texto... já tem textos concretos; um exemplo é uma proposta concreta de Costa Rica no monitoramento e supervisão. Porque? Porque Nações Unidas estão em uma transição. Há um questionamento aos mecanismos de monitoração e outros tratados então se querem melhorar e de alguma maneira se quer iniciar um processo completamente novo nesta Convenção.

Bom, eu dizia da importância fundamental que tem a incidência. Quero dizer a vocês como pessoas com deficiências, pessoas vinculadas com esse tema. Quando não esquecer a deficiência, como perceber, como ver, como funciona... e quando se deu na primeira reunião das Nações Unidas, nunca nas Nações Unidas se viu tantas pessoas raras. Imaginem vocês, funcionários e funcionárias muito quadrados, a vivenciar os problemas das portas pesadas. Gente raríssima eu digo porque me lembro de uma amiga da Delegação da Austrália que se move sozinha por um botão, ela é imobilizada completamente (interferência fora do microfone) Sim, entendo perfeitamente. Bem, 3 coisas que eu queria mencionar aqui. Essa situação nova para os delegados muitos delegados das Nações Unidas pensam como qualquer pessoa. Olham através dos olhos da compaixão e da discriminação e pensam a ouvir um tema novo: “Pessoas com deficiências numa Convenção”. Então quando chegam pessoas com deficiência, lideres de distintos países, sobretudo o norte e países desenvolvidos se expõem a situação maior. Primeiro que no primeiro momento na sala de sessões se deu uma grande amplitude à participação. Há uns outros processos de onde a gente chegava por fora, pela entrada da cafeteria, incidência de vazio. Mas aqui se abriu para a participação das pessoas com deficiências, compões – isso foi interessante porque as delegações de pessoas com deficiências não teriam voz e não se podia falar com os delegados, na plenária e em relações informais. É importante isso porque há uma autoridade moral e uma pressão moral que não há em nenhum outro grupo. Quando vem uma pessoa cega, surda ou cega, pessoas com todos os tipos de deficiência física, isso a 200, 300 pessoas juntas, cria uma pressão completamente nova. Isso é uma energia que por aí se pode ver. Agora, interessante que os princípios seguramente se poderiam afirmar. Bom o que querem os pobrezinhos por sua Convenção? Mas logo começam a encontrar temas técnicos e temas políticos e geram uma situação de incidência completamente nova. Porque não teriam todas as respostas, e então, como disse Maquem não tem definido muito bem, mas já tem aprendido muito e o disse bem sério. Porque não conhecia muitos temas

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que são de caráter absolutamente técnico. Então tem uma influencia de incidência de caráter ético, moral, político e portanto técnico de um grande valor. Esse tem sido o valor de Caucus internacional sobre Deficiências.

Mas aqui há uma pergunta. Vão me dizer que aqui no sul também existe. No processo da Convenção há uma grande parte deste processo e que está no sul mas com uma representação muito pequena, com muito poucos representantes porque esses 200 que chegaram, muitos são de países desenvolvidos, uns de organizações internacionais que tem endereços em países desenvolvidos ou organizações regionais. Por que isso? Porque há mais organizações, há mais recursos. Porque isso em Nações Unidas se negocia exclusivamente em inglês e então poderia ser alemão, francês ou italiano, mas com domínio pleno do idioma que se negocia, que é muito importante. E outro negócio que é importantíssimo: não necessita de visto para entrada em Nova York. Um árabe, um africano, latino americano, um asiático que tenham recursos poderia ter recursos aos montes, se não tem visto não ingressa nos Estados Unidos. Isso é uma realidade do sul frente ao norte por este encontro de situações. É por isso que duas das organizações, Instituto Interamericano e Randica Internacional trabalhamos muito forte para obter, sem discriminar a participação do sul não só em quantidade se não em qualidade participação. Porque sendo um instrumento universal, tem que ter seio no sul, não só seio no norte. Porque por mais pessoas com deficiências que sejamos, um e outro têm situações completamente distintas.

Situações tão distintas como esta que estamos falando de que no sul tem mais de 75% da população com deficiência, uma questão puramente de dados. Mas há outra que é a qualitativa, é aí onde se dá as piores condições de pobreza e exclusão social. Ou seja, por dois motivos: por representativa e pela realidade. Ou seja, é uma realidade que tem que estar presentes nos processos de negociação, se querem se livrar da marca das pessoas com deficiências no sul. Bom, é a partir dessas idéias que vemos a necessidade de impulsionar o modelo que denominamos Projeto Sul. O Projeto Sul tem dois propósitos: um para incluir no processo de negociação da Convenção o maior número de líderes com deficiência para levar aos contratos com suas idéias e propostas. E a outra, promover a capacitação dessa liderança como multiplicador em processo de ratificação de tratado em seus próprios países, depois de confirmado a Convenção e os esforços de monitoração e vigilância, uma vez que entre em vigor. Esta é uma iniciativa impulsionada por Randica Internacional que é uma entidade que tem sua sede na França e o Instituto Interamericano de Deficientes. Todo este esforço que temos passado com o Projeto Sul, não é só questão de visto, temos que resolver os detalhes e o custo que é muito caro, o transporte aéreo, estadia, 15 dias ou mais – como nessa ocasião em que eram 3 semanas – isto é caro. Pode-se trabalhar isso com dinheiro ou senão estimulando organizações para financiar as pessoas com deficiências no sul, com características muito fortes de participação de lideranças, e assim se obteve a ordem de 30, que foram 30 lideres com deficientes representando os países. Isto foi muito importante porque foi um processo prévio – precisamente em São Paulo, São Paulo foi ante-sala no caso de Brasil pela de atividade que mencionava Regina e isto impulsionava pelo Instituto Paradigma e CORDE.

Foi excelente, excelente esse preâmbulo porque permitiu uma discussão sobre as anotações de Maquei que são as propostas tanto de Brasil como país, como das pessoas com deficiências, que foi algo claro que eu digo, marcou uma diferença. E isto eu observava no exato momento da primeira reunião a participação dos países, esta foi a melhor participação do Brasil. Vamos saber que o Brasil corresponde na América Latina um líder nato neste tema e em outros temas que se refletiu na hora que se criou o Conselho, foi o segundo país mais votado. É um líder nato em direitos humanos, é um país que pode e deve contribuir, tanto de estado de governo como da sociedade civil que é uma enorme riqueza e diversidade humana. Bom, é muito lindo ver que esse processo em janeiro já se mostrou e digo que já se marcou nessa liderança latino americana que é absolutamente necessário.

É importante que focalize, que quem unificou o trabalho de ciência foi realmente do sul. O desenvolvimento, inclusive se juntar o desenvolvimento prévio a reunião em Nova York, que buscava primeiro as pessoas participantes, as pessoas novas que chegavam pela primeira vez, conheceram melhor como funcionava a lógica das Nações Unidas como fazia o trabalho em ciência, ou seja, os estilos que vieram aí tinham conteúdo e realmente o conteúdo foi muito bom, a participação foi muito boa, um

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grupo maduro, um grupo trabalhando na noite, trabalhando todo o dia com enorme entusiasmo, que marcou a diferença. Eu digo porque em outras reuniões, inclusive de organizações internacionais que foi alguns líderes da América do Sul, estiveram em silêncio, que não trabalharam, que fora fazer um passeio a Nova York. Também não pela situação ou porque eram lideres dos que o indicaram, senão porque estavam frente de organizações internacionais e não lhes apoiaram nesse esforço. E este foi um apoio que se deu no grupo de trabalho realmente profissional que marcou a diferença. Que isso é o no projeto sul, resultou da presença harmoniosa no CALCOS e obteve algo que CALCOS tem que agradecer-lhes. O CALCO não só se fortaleceu com mil idéias e proposta que se mostrou nos trabalhos, como também em legitimidade. O CALCOS para que seja um CALCOS realmente universal necessita rostos do sul, idéias do sul e o Projeto do Sul podem fazer esse rico suporte de onde um grupo importante de companheiras e companheiras, de Brasil, aqui temos que falar Regina, Joilson, pessoas da sociedade civil, Laís, Flavia, e também como um laço importantíssimo através da companheira Isabel Maior – Isabel foi como assessor, outra parte como governo – mas Isabel está embrenhada nessa realidade do movimento, este rico movimento da sociedade civil brasileira e então se deseja honrar a incidência, que para alguns países é nulo, para as pessoas sem deficiências na delegação ficam distantes, não há uma comunicação e se há reuniões são informais, não são reuniões de trabalho e intercambio que nesse caso seria. Por isso eu digo que o Brasil tem todas as condições neste momento, nas próximas negociações e nos passos seguintes, de exercer a liderança nesta Convenção, com já o está sendo.

Tecnicamente, só para assinalar, que o desenvolvimento inclusivo, esse conceito que tem não é de desenvolvimento é anti-exclusão ancestral histórica das pessoas com deficiência. Aqui há um grupo humano, uma grande parte da humanidade esses 10% que se fala que requer um espaço de participação real, um respeito integral dos direitos humanos civis e políticos, econômicos, sociais e culturais. Uma participação realmente protagônica na troca com respeito à diversidade humana. Essas condições são bases de orientação que nesta Convenção já está impressa. Estamos falando de desenvolvimento inclusivo como um produto da transversalização de direitos através das políticas públicas e ações inclusivas e a através de um processo permanente. É um produto e é processo, assim eu sei.

É importante disser que este timão de proa na Convenção, tem já uma expressão geral, por exemplo, no artigo 4º - Obrigação dos Estados da Convenção, tal como está relatado, diz ter em “conta em todas as políticas e programas a proteção e promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiências”. Há essa superação a pontualizar, senão estava aqui colocado como obrigação dos Estados. Nesse artigo 4 é uma troca completamente de enfoque e tem expressões concretas como o que mencionava Regina, como Educação Inclusiva. Isso é uma expressão muito atualizada. Penso que o desenvolvimento inclusive dos direitos das pessoas com deficiências são os direitos civis e político, e os direitos econômicos, sociais e culturais estão contidos nisso que estamos falando.

Então esta Convenção, e o reitero agora, está fazendo um novo paradigma. Realmente o que é mais interessante é que já não se trata de um paradigma com enfoque de discussão teórica ou acadêmica ou com enfoque parcial. Este é um instrumento internacional que ao ser ratificado, que ao entrar em vigor em muitos países, se converte grande leque, um guarda chuva para todas as pessoas com deficiência, não importa a cor da pele, idioma, gênero, etc. Este paradigma aos direitos humanos e desenvolvimento das capacidades é importante e isso tem que ficar impresso na definição das pessoas com deficiências como um produto social.

Este momento creio que vai acontecer em agosto, e isso é uma pergunta muito concreta, em 3 meses estaria começando a reunião e que vai acontecer? Há dois cenários: o que eu creio que vá suceder e não por desejo e por racionamento, lógico, ser o primeiro, que haverá uma negociação exitosa e eficiente em agosto que se aprove a nova Convenção da ONU e que se firme a assinatura em janeiro de 2007. Que a partir de janeiro entre em processo de ratificação para, em um tempo muito rápido entre em vigor no país que o ratifique, mas é necessário um número suficiente de 20 países que o ratifiquem. Para que? Para agarrar esse instrumento da sociedade civil e aplicá-lo e trabalhá-lo.

No outro cenário é muito provável, mas não podemos descartar completamente que não é de costume. Há alguns países que colocam algumas travas que impedem que em 25 de agosto se termine e se aprovem. Isso tem uma complicação e por isso temos que torcer para que haja a aprovação. E sendo

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este tema pelas características que tem, é terrível que mudem os delegados. Quando um processo como este se alarga, a troca de delegados que fizeram a negociação do começo até quase o final do documento e se vem um novo delegado, daí se tem que orientar sobre o documento, os procedimentos. Este é um problema realmente político na negociação que será superado se se terminar em agosto.

Bom, aqui pouco posso dizer, quando eu vejo 1.500 pessoas trabalharem sem a capacidade de mobilização... este não é um problema, nós nos atrasamos mas isso é maravilhoso porque tem uma força viva que, eu creio, que não se tem em nenhum outro país. Uma reunião como esta não se dá, não se dá e vocês talvez não tenha a consciência porque estão sendo submetido a ninguém de fora. Mas aqui está acontecendo algo completamente distinto e é muito bom que se construa em bases completamente distintas. E aqui me alegra porque aqui sobre todos os temas, mesmo que se fale diretamente sobre a Convenção ou não, aqui está emergindo um novo paradigma, onde há uma participação ativíssima, protagonica das pessoas com deficiências. Tudo isso se requer no caso da Convenção, que haja informação, comunicação, capacitação, debate, para poder existir. Há que nesse momento conhecer e propor melhoras, porque estão em negociação, por isso esperamos se votem em agosto. Eu venho de um cenário dos direitos humanos que populariza a doutrina e esta Convenção tem popularizá-la, tem que fazê-la sensível para que chegue a todo o mundo, para que se conheça como instrumento; tem que fazer incidência para melhorar a Convenção para ratificá-la e praticá-la. O que estamos fazendo aqui é parte desse grande esforço e o Brasil tem muito, não que aprender, todos temos que aprender, mas tem muito que mostrar de sua experiência. Vou terminando por respeito ao adiantado da hora. Este tratado universal que esperamos que esteja pronto em agosto, porque em agosto se aprovaria e o que faltasse entre agosto e janeiro, uma comissão poderia verificar o que não estivesse contemplado. Agora esta Convenção, podem estar certos de que do modo como a colocamos, esta é uma importância que pode ter e pode ser tão útil como nos é o nosso conhecimento e a destreza com que vamos utilizar. Isso é muito importante refletir porque não é como uma Convenção da ONU como algo qualquer; converte-se em lei concreta desse país, dessa nação, dessa grande Federação. Converte-se em lei que pode instrumentalizar-se. Termino dizendo-lhes e fazendo um agradecimento, não somente por este convite.

Regina Atalla – Coordenadora: Bom, são 10:10 da noite. Felizmente Joelson e Isabel queriam fazer parte, eu pergunto a vocês, a tolerância da platéia em poder ficar um pouco mais em ouvir esses companheiros, ou talvez a gente pensasse um pouco mais em função de todos os atrasos incontroláveis, que talvez a gente pudesse repetir para um público versado, outras pessoas que não puderam estar aqui, esse mesmo painel. Então gostaria de agradecer a todos a presença e vamos ver com as pessoas. O Luiz Fernando vai estar aqui assistindo e participando desse processo, nós fizemos questão que ele viesse porque compreendemos esse laço latino-americano como mais um laço de força para que a gente tenha consciência dessa ligação universal, e principalmente dessa realidade tão parecida que une os latino-americanos. Então gostaria de agradecer a participação de todos.

(Fala fora do microfone)

Regina Atalla – Coordenadora: Ah, perdão. A Flávia está colocando as questões, se as pessoas têm dúvidas, se gostariam de colocar alguma pergunta. Sim, Isabel, Joelson... Agora Isabel gostaria de acrescentar? Sim, então eu vou te passar o microfone e você faz a sua comunicação.

Izabel Maior – CONADE: Boa noite a todos. Como foi colocado pelo Luiz Fernando, uma pessoa que eu conheço há muito tempo, nós dois já fomos taxados de enfermos para embarcar na cidade de Acapulco, México, tínhamos que assinar uma ficha de enfermos. Eu, não conhecendo tanto o espanhol, fiquei na dúvida se enfermos era mesmo doente, e eu teria que assinar aquela ficha. Por sorte ele vinha do mesmo evento e eu perguntei a ele: Será que enfermo é mesmo doente? E aquela história toda, não assino, não assino, e ficou aquela confusão: Melhor deportar logo eles e mandar embora. E

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não assinamos mesmo não, passamos. Porque não vai assinar uma ficha de enfermo para embarcar em um avião na cidade de Acapulco, no México. Então a gente já se conhecia e firmou mais ainda essa amizade que une a todos nós.

O Governo brasileiro participa da discussão da Convenção da ONU desde 2003, formalmente. A diplomacia brasileira acompanhou todo esse processo da Convenção, mas, principalmente, um dos nossos representantes na missão da ONU, que é o diplomata Pedro Cardoso. O Pedro e outros também que trabalham na área de direitos humanos, mas ele, principalmente, se especializou na nossa área. E sempre acompanhamos através de e-mail, telefonemas, até que surgiu a oportunidade de que, no ano de 2004, pudéssemos participar diretamente. E Carolina, que é assessora da CORDE substituta, participou com ele da primeira vez. Naquele momento não havia um texto básico e uma discussão sem um texto básico fica uma coisa muito difícil, a não ser que uma delegação muito forte estivesse bem preparada. Isso acontecia de fato, com alguns países como Canadá, é um exemplo que nós continuamos vendo porque tem uma presença muito importante na discussão e outros países também; a própria Nova Zelândia, de onde vem o embaixador; naquela ocasião ainda era o embaixador Galegos, do Equador.

Participamos também na reunião regional como Governo, na reunião que houve aqui na América no Equador, na América do Sul e, posteriormente, nós não tivemos oportunidade de participar na seção seguinte, pulamos uma seção, continuamos participando sempre através da missão diplomática, que nunca deixou de estar presente, de acompanhar e de nos informar e de pedir informações prévias e até um documento foi assinado pelo CONADE e dois outros pela CORDE. Eu tive oportunidade de ir agora em janeiro e achei um processo extremamente rico, bastante diferente até de uma ONU que eu conheci há alguns anos atrás, uma ONU permitindo a participação, uma coisa diferente dando voz. Existe o momento certo em que as delegações falam e depois fala a sociedade civil. Com direito a expor suas colocações e com uma situação – que deve ter sido falada aqui, eu cheguei agora – uma questão de lobby. Lobby é uma palavra positiva, não tem nada de ruim com essa palavra, o lobby da sociedade civil feita na Convenção é uma coisa assim exemplar, não é nada do que eu vi aqui hoje nessa Conferência, nada disso, é uma coisa extremamente bem organizada e positiva no sentido de defesa de conceitos e de princípios.

E foi isso exatamente que a nossa própria sociedade civil, que já se organizou e teve um momento importante quando foi feito esse seminário de dezembro a que o Luis se referiu, que o Instituto Paradigma aceitou fazer, a pedido da CORDE, por intenção do próprio Instituto Paradigma com o apoio do CVI que já havia sido discutido isso em lista, acho que todos, nós todos crescemos ali, pudemos discutir muito mais. O que foi o meu papel lá? Graças a Deus não foi falar muito inglês não, porque o nosso diplomata fala fluentemente, ele a vida inteira estudou em escolas de língua inglesa, então ele é perfeito, e a gente não vai prejudicar aquilo que vai muito bem, obrigada. A minha função foi ficar ao lado dele, passar a segurança, o posicionamento que nós já tínhamos, um documento que facilitou muito. Nós tínhamos uma estratégia nisso, não sei se isso se revela uma estratégia, mas talvez valha a pena revelar para vocês entenderem como é a questão. As delegações que têm tudo pronto apresentam logo à mesa, então já começa com alguma proposta da delegação do país; aí não tem delegação do ponto de vista da organização não governamental. Nós não tínhamos tamanha experiência e nem preparação para isto. E daí ficávamos para discussão. Depois isso tudo é discutido, qualquer informação que é trazida por um país é discutida por todos, tem um processo de idas e vindas até que se vota. Não é uma votação, é uma espécie de avaliação, não é nem uma medida de quantos foram contra, quantos foram a favor, é uma avaliação que o condutor do Comitê Ad-Hoc adota, faz, de qual foi o posicionamento. E daí vai lançando então, à medida que se avança numa redação de um determinado capítulo ou artigo, ele então lança o texto para que, de novo, as delegações de governo façam a avaliação para saber quantos apóiam. E além disso existe um grupo de facilitadores que são destacados por ele; esses facilitadores são diplomatas das delegações dos países que mais se desenvolvem ou que mais trabalham com determinado tema. Esses facilitadores fazem uma série de reuniões com as outras delegações de países e está aberta aí a participação da sociedade civil, para você começar a discutir. Os temas mais difíceis, na sessão de janeiro, eram a inclusão ou não do capítulo da criança e da mulher – isso já foi falado aqui? Já. E o Brasil tinha uma posição favorável. Essa foi a posição com que nós saímos daqui. Para nós tanto faz, contanto que houvesse uma referência, podia ser disperso no texto ou não, ou podia ser no capítulo. O

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que importava para nós é que tivesse uma menção diferenciada de alguma maneira. E o capítulo do monitoramento e da cooperação internacional. Eu acho que o Brasil fez um papel importante, na medida em que nós percebemos que talvez pudéssemos mudar a estratégia no meio da sessão. Nós começamos os dias ouvindo muito mais as propostas e só depois interferindo na discussão. Só que, quando você só interfere no final, você já influencia poucos países e a mudança de estratégia que nós tivemos foi, na medida em que nós tínhamos mais certeza, porque participamos de todas as reuniões possíveis e imagináveis, tinha vez que eu já não sabia em qual reunião estava, se era de sociedade civil, se era de delegação, se era do Grulac, de onde era, e estávamos em todas. Daí mudamos a estratégia, começamos a falar mais rapidamente e percebemos que podíamos colocar algumas posições, que alguns países já acompanhavam, um maior número de países já acompanhava a nossa opinião.

Não são todos os países que falam, pelo contrário, num conjunto muito grande, poucos falam. Isso faz a diferença quando se pode, também, expor alguma colocação. E foi extremamente rico e importante poder trocar o tempo todo com brasileiros que estavam lá e com outras delegações também, porque nós já conhecíamos esse grupo do Projeto Sul. E mais, não sei se o Luiz mencionou, mas existe uma certa dificuldade com algumas instituições que são mais antigas, mais tradicionais dentro do próprio Caucus, que para mim não é difícil. Um deles eu posso até dizer que é a Revitacion Internacion que, desde 1921, é uma instituição muito antiga, com associações pesadas e tem uma certa dificuldade de diálogo ainda. Mas como eu fui Vice-Presidente para América Latina, já participei desse grupo e, então, também podia me valer de informações que vinham através dessa vertente. O que eu acho interessante é que algumas questões não foram definidas por nós. Talvez a maior dificuldade seja definir. O que está sendo a dificuldade lá, talvez seja a nossa dificuldade aqui também: definir quem são as pessoas com deficiência.

Hoje mesmo aqui, durante os trabalhos, dois grupos me procuraram para se inserirem como pessoas com deficiência: albinos e hemofílicos. Então é uma situação que nós também estamos passando, de uma procura. Estranho não é, ninguém quer ser deficiente e depois todo mundo quer ser deficiente. Deve ter alguma vantagem nisso, é que eu não descobri ainda, não é?

(Fala fora do microfone)

Izabel Maior – CONADE: É, porque naturalmente essas situações levariam a deficiências, mas não situação inicial de doença. Mas, na ONU, a grande discussão que vai se fazer é primeiro que se defina deficiência ou se defina pessoa com deficiência. E há de novo uma colocação muito forte, muito bem feita, das pessoas com distúrbios psicossociais. E é uma área em que nós aqui não nos detemos e precisamos ter uma noção mais clara dessa definição, se vamos fazê-la ou não.

As outras discussões não são assim tão complexas para nós, porque já temos, basicamente, as posições: cooperação internacional é uma posição assumida favoravelmente. Monitoramento também é a mesma coisa. Então isso não é problema. Há uma questão que o Brasil deixou de votar apoiando, que é inclusão no preâmbulo, do papel da família. Mas é porque nós temos que negociar uma coisa, foi por isso que a gente não apoiou. Mas é lógico que o interesse nosso também é apoiar. Mas isso nós vamos negociar, porque sendo um grande país católico, nós vamos guardar esse trunfo nas mãos, entendeu? Então é quase que uma prestação de contas de algumas pequenas coisas que nós andamos fazendo de encaminhamento. Indo ou não indo alguém da área específica, eu tenho plena certeza de que o Pedro Cardoso, junto com a sociedade civil que for, tem condição absoluta de conduzir os trabalhos. Se a gente puder ir, dá apenas uma segurança para ele no sentido governamental, mas, em termos de conteúdo, eu acho perfeitamente possível que com o grupo da sociedade civil que está se preparando - e deverá ir talvez um número até maior de pessoas - dessa vez, espero que nós tenhamos um bom desfecho e finalmente uma Convenção de Direitos Humanos para nós. Obrigada.

REGINA Atalla – Coordenadora: Bom, se todos resistem, pergunto se tem alguém que gostaria de fazer alguma questão, alguma pergunta. Você, Flávia, é você mesma?! Alguém gostaria de fazer alguma questão? Obrigada, boa noite, até amanhã.

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4.14 INCLUSÃO PARA PESSOAS PORTADORAS DO AUTISMO E DE TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Vamos dar início ao painel sobre a questão da inclusão para pessoas portadoras do autismo e de transtornos invasivos de desenvolvimento. Na realidade, eu preparei um material para apresentar para vocês. Não sei se seria do interesse de todos, se todos já dominam essas informações. Como eu não sabia quem estaria aqui, vou falar um pouquinho sobre o que é autismo, como se classifica, quais são os comportamentos e quais as possibilidades de inclusão de uma pessoa que tem essas características comportamentais e cognitivas.

Os transtornos invasivos do desenvolvimento. Essa é uma descrição da Associação Americana de Psiquiatria, no DSM-IV que é um Manual Diagnóstico, e que é muito utilizado para o diagnóstico de transtornos mentais. Então, junto da Classificação Internacional de Doenças “ CID, o DSM-IV é um manual bastante utilizado para o diagnóstico de transtornos mentais e essa é a descrição que nós temos dos transtornos invasivos do desenvolvimento. São casos que apresentam:

• prejuízo severo e invasivo em diversas áreas do desenvolvimento;

• habilidades de interação social recíproca;

• habilidades de comunicação ou presença de comportamentos, interesses e atividades estereotipados.

Vocês vão ver que há prejuízos importantes em quatro grandes áreas do desenvolvimento: a socialização, a comunicação, a parte de comportamento e a parte cognitiva. Então, é importante que a gente também fale sobre o estilo cognitivo dessas pessoas. Aliás, é uma coisa que atualmente está se falando mais até do que da questão do comportamento porque o comportamento já está mais sabido “ as estereotipias, a tendência ao isolamento, a dificuldade para se relacionar com as pessoas, a dificuldade para compreender a comunicação falada “ mas o estilo cognitivo é uma coisa que se está explorando e se pesquisando muito, até para compreender melhor todas essas áreas que estão afetadas.

Dentro dos transtornos invasivos do desenvolvimento, nós vamos encontrar:

• O transtorno autista, que é o quadro clássico de autismo;

• O transtorno de Retch, que é descrito só em meninas. Inclusive, não é um quadro que deveria estar nesse grupo, porque é um quadro neurológico, degenerativo, mas que o início é muito parecido com o autismo, e por isso que está aí. A gente espera até que numa outra descrição, numa outra classificação, ele saia desse grupo.

• O transtorno desintegrativo da infância, que são quadros clínicos, onde a criança tem o desenvolvimento normal até os três anos de idade, e depois dos três anos, quatro anos ela tem uma quebra, uma ruptura importante no desenvolvimento dela perdem habilidades já adquiridas, mas não é autismo. É um quadro que comportamentalmente pode até ser confundido, mas o diagnóstico é diferente, até porque, a história clínica é diferente.

No autista, ele não desenvolve as habilidades. Há um déficit, uma defasagem nas habilidades. Em alguns casos de autismo a gente vê um início do desenvolvimento de algumas habilidades e uma ruptura, mas muito mais precoce. Quando essa ruptura acontece por volta dos três ou quatro anos de idade, a gente fala do transtorno desintegrativo. O transtorno de Asperger até está bastante conhecido agora porque houve uma matéria no Fantástico. O Fantástico agora resolveu priorizar essas informações. No domingo passado, apareceu aquele rapaz que desenha e esse domingo também vai continuar com

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aquele pianista. Então, o transtorno de Asperger é um quadro dentro do espectro autista, onde as habilidades estão mais preservadas. Então, existe prejuízo no desenvolvimento social, na comunicação, na socialização, mas esses prejuízos são mais leves e a inteligência está preservada. Ao contrário, nos quadros de autismo nem sempre a inteligência fica preservada. Há uma co-morbidade grande e deficiência mental com autismo. E temos o transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra especificação, que é o que a gente chama de autismo atípico. Então, essa é a classificação do DSM–IV.

Todos esses quadros são os chamados “portadores de conduta atípica”, dentro do conceito educacional. Para o MEC, eles são elegíveis para a educação especial porque eles precisam de recursos pedagógicos especializados, mas não necessariamente em escolas segregadoras. Eles necessitam de recursos pedagógicos especializados. O conceito do MEC de educação especial é uma modalidade de educação escolar. Entende-se por educação especial um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente, para apoiar, complementar, suplementar, e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos, que apresentam necessidades educacionais especiais em todas as modalidades da educação básica.

A educação já é a primeira questão que acontece na vida de uma criança. No início da vida dessa pessoa, nós já vamos necessitar de propostas inclusivas para que ela possa ter acesso à educação com os recursos especializados que essa educação precisa: o professor preparado, o ambiente preparado para receber essa pessoa que tem todo um estilo cognitivo e comportamental diferente, como nós vamos ver mais na frente.

A inclusão, falando de uma maneira geral, e não só a inclusão das pessoas com autismo, visa reverter o percurso de exclusão de qualquer natureza e ampliar as possibilidades de inserção de crianças, jovens e adultos na sociedade. Deve incluir pessoas com deficiências, ou altas habilidades, moradores de rua e que trabalham, de origem remota ou de população nômade, pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas ou culturais e outros grupos vulneráveis ou marginalizados. Quando falamos em inclusão, estamos falando de todas as minorias, de todas essas pessoas que precisam de uma abordagem mais singular, mas de acordo com as características de cada pessoa.

Educar é sobreviver na diversidade, com qualidade de vida. A gente fala de qualidade de vida porque nos estamos muito preocupados com a maneira como essa inclusão é feita, ou é desenvolvida. Temos que ver se as pessoas estão preparadas, não no sentido que a inclusão está acontecendo e vai acontecer mesmo, mas é o preparo que os ambientes, os profissionais, a família e a sociedade precisa ter para realmente fazer uma inclusão com qualidade. Inclusão não é colocar junto. A inclusão é fazer com que a pessoa realmente participe.

Inclusão é um termo que exige uma explicação clara, de seu significado, contorno e limite dentro do campo do conhecimento social. Para alguns, falar de inclusão é ampliar os problemas da escola. A escola é o primeiro ambiente que essas pessoas vão precisar freqüentar fora de suas casas e que vão precisar estar preparados para isso, na medida em que, os alunos-problema invadirão os espaços dos alunos ditos “normais”. Então, muitos professores e muitas instituições educacionais ainda vêem essa questão da inclusão por essa ótica. Para outros, é uma proposta considerada como sobrecarga para os professores do ensino regular, que não se vêem com condições para atender às especificidades desse contingente de alunos. Para o nosso objetivo aqui, será utilizado o conceito de inclusão diretamente vinculado ao contexto das pessoas com espectro autista, com suas especificidades comportamentais e cognitivas.

O transtorno autista é um transtorno evolutivo, comportamental, incapacitante, inato, originado por desordens biológicas, descartando-se atualmente qualquer possibilidade de ser resultante de desordens emocionais, de um comportamento parental ou de disfunção familiar. É importante a gente falar isso, por mais que seja conhecido esse conceito, porque esse conceito acabou incluindo muitas famílias que se sentiam excluídas por descrições anteriores, mais antigas, atribuindo a responsabilidade dessa patologia a uma disfunção afetiva familiar. É importante que, quando a gente fale de inclusão, a

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gente fale que o autismo é um problema inato, evolutivo comportamental e que o fato de essa criança desenvolver o autismo independe de como essa criança foi recebida afetivamente. É claro que uma pessoa com transtorno de tamanha ordem, com tanto prejuízo, em tantas áreas de desenvolvimento, obviamente, afeta a dinâmica familiar, mas não que ela seja fruto de uma dinâmica familiar que geraria uma pessoa com esse transtorno. Isso precisa ficar muito claro.

(Intervenções fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Geneticamente, até pode. Quer dizer, nós todos temos uma herança genética.

(Intervenções fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Não. Agora, a maneira como a família trabalha com isso, como a família é orientada, dependendo de tipo de abordagem que essa família tem com a pessoa, pode agravar a situação, mas não em termos da constitucionalidade do quadro, da estrutura do quadro. Então, isso é biológico e não tem nada que possa interferir nisso, inclusive, até a gravidade do caso. O autismo pode estar associado a outras co-morbidades porque o autismo não elimina outros quadros. Nós temos autistas com deficiência visual, autistas com deficiência mental, autistas com deficiência física, autistas que desenvolvem um quadro psicótico, com Síndrome de Down etc. Agora, na grande maioria dos casos, nós vamos ver autistas que são autistas sem co-morbidades associadas. Isso acontece na maioria dos casos.

Aqui nós temos um quadro para vocês visualizarem as áreas que estão prejudicadas. Na socialização, por exemplo, temos o contato visual ausente. Quero ressaltar que essa é uma descrição didática. Eu conheço muitos autistas que têm contato visual, que não têm estereotipias motoras, que gostam de contato físico, então, não é uma condição sine qua non. Quer dizer, é uma descrição didática. São áreas que estão prejudicadas dentro de um espectro, em algumas pessoas mais, em outras menos, às vezes, numa área mais, em outra área menos. É uma coisa dinâmica. É um espectro, como a gente fala hoje, vai tanto do mais comprometido ao mais leve, mas as áreas que estão envolvidas são essas.

Então, na socialização nós vamos detectar a dificuldade com contato visual, resistência ao aprendizado, agressividade em alguns casos, tanto auto-agressão, como hetero-agressão, isolamento social etc. Na comunicação, a gente vai ver o mutismo, porque um número importante de autistas não desenvolve a fala, ou desenvolve a fala de uma maneira não comunicativa, só com ecolalias, repetem o que escutam, mas não usam a fala para se comunicar; com alterações na gramática, na modulação da voz; e um repertório comportamental resistente a mudanças, com hiperatividade e com estereotipias.

Uma questão que é importante, até para falar do estilo cognitivo dessas pessoas. Os autistas têm falha na teoria da mente. O que é isso? Diz respeito à capacidade de atribuir estados mentais a outras pessoas e predizer o comportamento das mesmas, em função dessas atribuições. É o seguinte: se por acaso eu estou aqui falando e tem alguém coçando os olhos lá no fundo da sala, bocejando, eu tenho dentro do meu repertorio cognitivo, informações que me sugerem que essa pessoa está cansada e com sono. Então, eu atribuo um estado mental a ela, eu atribuo idéias, eu consigo imaginar o que está se passando. Posso até errar muito nisso, mas eu consigo fazer isso. Às vezes, a gente tem tanta teoria da mente, que a gente peca pelo excesso. A gente fica atribuindo coisa que não existe. Eles têm uma dificuldade enorme nisso. Eles têm uma enorme dificuldade em se colocar no lugar de outras pessoas. Eles têm dificuldade de discriminar a mímica facial. Então, nas propostas de atendimento, de intervenção, de relacionamento com essas pessoas, isso precisa estar sempre muito pontuado. A gente não pode tratá-los como se eles tivessem o mesmo pensamento e a mesma percepção que a gente tem do outro, porque eles não têm essa percepção do outro. Então, muitas vezes a pessoa não percebe o que está acontecendo, e fica mais difícil prever o comportamento de outra pessoa. A coisa pior que existe nesse mundo é a gente não conseguir imaginar o que vai acontecer daqui a pouco. Quer dizer, aqui a gente já

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teve um pequeno mal-estar porque atrasou a programação, embora todas pessoas tivessem acesso a informação de porque estava atrasando. O problema é que uma outra programação não tinha terminado, então não tinha iniciado essa. Mas isso já causa um mal-estar. Vocês imaginem uma pessoa que não consegue entender a informação dessa forma. É por isso que eles são tão rígidos, tão ritualísticos, e há uma necessidade de abordá-los dessa maneira para depois irmos trabalhando isso.

Não poderíamos fazer absolutamente nada do que fazemos se não tivéssemos acesso à uma informação prévia. Se eu não soubesse que o meu painel ia ser na Sala 10, porque recebi isso pela internet, eu não ia conseguir. Eu ia ter dificuldade para chegar aqui na sala. Vocês também devem ter olhado na programação e selecionado o que vocês iam ver. Isso é análise de informação prévia. Eles têm muita dificuldade de fazer isso. Então, a informação prévia regula e modula nossas ações, nos predispõe a um estado mental e comportamental adequados para aquela ação. A falta de informação prévia provoca ações erradas e pode gerar ansiedade e frustração. Muitas crises comportamentais dos autistas se dão por essa incapacidade de avaliar essa informação prévia. Então, muitas vezes, eles se batem, eles têm uma frustração grande, eles entram numa crise comportamental e a gente não sabe a razão. É porque essa informação não chegou a eles, de uma maneira compreensível pra eles. Podemos afirmar, quase sem nenhum grau de risco, que a maior parte dos comportamentos emocionais, excluídos aqueles que são provocados por fome, por sono, por dor, são reforçados inadvertidamente pelos agentes do meio social. Então, as pessoas, o ambiente, precisam estar preparados para saber lidar com pessoas com esse nível de informação.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Existem casos muito graves de auto-agressão que, inclusive, precisam ser medicados. Mas geralmente, essa auto-agressão vem de uma situação de frustração, de uma situação de não compreender o que está acontecendo, às vezes, com ele e com os outros.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Isso depende muito da situação, mas como eles não têm outros canais de comunicação, eles acabam agindo de uma maneira muito primária. A gente até fala que, quando eles começam a bater nos outros, é porque eles já estão melhor porque, quando eles estão se batendo, é sinal que eles ainda estão voltados para eles mesmos. Quando agressão passa a ser com o outro, nós ainda achamos um pouco melhor do quando é consigo mesmo.

(Intervenção fora do microfone)

Participante não identificada: Eu gostaria de saber se, na parte da mutilação, se seria o meio que estaria interferindo, ou que estaria acontecendo. No caso dessa menina, é a mutilação com ela e com o próprio pai, que é a pessoa que convive com essa menina. A mãe a abandonou e são só eles dois. Mas a situação é bem séria porque ela tira muito a pele do próprio braço. Fica até parecendo que são queimaduras e o pai também está com os braços todos machucados.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: A auto-agressão é um comportamento que precisa ser eliminado do repertório comportamental deles. Eliminado, por linha de modificação de comportamento, por medicação porque esse é um comportamento dos mais graves e com o qual a gente não pode compactuar, quer dizer, no sentido de não fazer nada para impedir. Às vezes, são necessárias até intervenções que podem parecer chocantes, como o uso até de contenção das mãos dessas crianças, para que elas aprendam que a mão tem outra função, que não seja a de se bater. É claro que

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tudo isso que eu estou falando tem que ter muito critério. Não é em todos os casos que é recomendado. Tem criança que reage muito negativamente a isso. Geralmente, a auto-agressão é uma maneira de comunicação de que alguma coisa não está indo bem, ou uma dor, ou alguma coisa no meio, alguma coisa está acontecendo. Em casos muito graves de autismo onde a deficiência mental é muito grande, a auto-agressão também está presente pela falta de recursos de comunicação. A maioria dos estudos de comportamento do autista é pela questão da comunicação.

Uma das propostas inclusivas que a gente tem utilizado muito para fazer essa intermediação da pessoa autista com o meio em que ela vive, seja a escola, seja o trabalho, dependendo do quadro que ele tem, é o uso de um acompanhante nesses ambientes, para fazer a intermediação dessa comunicação, quando necessário. É claro que, tem que haver evolução do quadro positivamente a gente vai retirar essa pessoa para que haja uma comunicação direta com o meio. Mas é muito importante que haja alguém numa pré-escola, na escola, que esteja por conta disso. Esse recurso do acompanhante terapêutico era um recurso muito utilizado na clínica, mas que a gente usa também nas escolas. Esse tem sido um recurso que nós temos usado muito e que propicia essa intermediação das relações da dinâmica funcional. Podemos dizer que, na maioria das vezes, a demanda em jogo é que esse acompanhante possa responder pelas atitudes e pela educação da criança ainda não adaptada ao universo escolar e com a qual o corpo docente acredita não saber lidar.

Uma das coisas que eu tenho ressaltado, em todos esses anos que a gente vem trabalhando com essa questão da inclusão de pessoas com autismo em ambientes escolares, em ambientes profissionalizantes é justamente a importância de eles se sentirem compreendidos porque, senão, não tem jogo, tanto de um lado como do outro. Até há sempre uma tendência muito grande de eles sempre voltarem tudo contra eles. Se uma coisa não dá certo, é porque eles não fizeram determinadas coisas adequadamente. Isso os que têm mais condição de elaboração mental. É importante a gente falar desses casos mais “leves” porque, às vezes, os casos mais leves são os mais difíceis de a gente lidar, porque até pela consciência que eles têm das dificuldades que eles trazem consigo. Eles têm essa consciência da inadequação, da diferença, mas a mesma coisa que acontece nesse que consegue nos comunicar e verbalizar e se expressar com esse problema que ele está sentindo, acontece nos meninos menores e mais comprometidos. O processo é o mesmo. A gente pode fazer uma generalização. Eles têm dificuldade de generalizar conhecimentos. A gente espera que a gente não tenha. Então, quando a gente fala desses quadros que verbalizam sobre a sua condição de ser autista, é muito importante a gente ouvir. Tem um livro muito interessante, quem tem interesse nessa área, que chama-se “O Estranho Caso do Cachorro Morto”. É um livro maravilhoso, que é relatado como uma ficção, mas que é uma descrição perfeita da mente autista praticamente naquele livro. O autor é Mark Haddon. Esse livro é muito bom. Aqui em Brasília vocês podem encontrá-lo na Livraria Cultura, no Casa Park. É um livro sem compromisso de ser cientifico, mas que é maravilhoso.

Então, na escola, com relação às propostas educacionais, as propostas ocupacionais, profissionalizantes precisam ser funcionais porque se não fizer sentido na vida deles, eles dificilmente vão conseguir absorver, aprender e generalizar aquilo que ele aprendeu. Então, nunca a educação e as abordagens precisaram ser tão funcionais como precisam ser com o autista. Outras crianças aprendem coisas até para agradar os professores, eles só aprendem coisas que eles podem utilizar. Eles costumam resistir à aprendizagem, porque na maioria das vezes, o que é oferecido para eles não tem muito a ver com a realidade deles.

É importante falar do perfil do profissional para trabalhar com essas pessoas. A primeira coisa que a pessoa precisa ter é uma disponibilidade, como para qualquer coisa, mas vocês podem ter certeza que essa disponibilidade será posta a prova. Dizer que está a fim de trabalhar com autista é uma coisa, mas realmente estar a fim de trabalhar com eles é muito diferente. Então, a disponibilidade para fazer isso é que tem que ser verdadeira. O resto, a gente arranja. A gente informa, a gente capacita, a gente treina, a gente vai lendo, vai se informando, vai se desenvolvendo, mas o importante é a disponibilidade. Eu conheço pessoas que têm um currículo maravilhoso, mas que não têm disponibilidade, então, não conseguem fazer trabalhos produtivos.

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Esses profissionais precisam ser capazes de adquirir conhecimentos teóricos e práticos, estratégias de aprendizagem e terapêuticas. Com essa clientela, muitas vezes, o que é pedagógico é terapêutico e muitas vezes o que é terapêutico é pedagógico. É claro que tem a questão da formação do profissional mas, no dia-a-dia, isso é muito mais fluído e muito mais dinâmico do que a gente imagina. Esses profissionais têm que estar sempre se atualizando através de supervisões e contatos com outros profissionais. Tem que ser uma pessoa socializada e socializante. Vocês imaginem uma pessoa insípida, inodora e incolor trabalhando com esses meninos, que não têm uma expressão facial, que não têm uma modulação de voz diferente, que não têm alguma coisa que chame a atenção. Fica muito difícil.

Uma outra característica necessária é que esses profissionais tenham resistência à frustração porque é um trabalho lento, difícil e que precisa de muito empenho e, principalmente, sensibilidade aos problemas das famílias. Não dá para trabalhar só com o autista nunca. É preciso fazer todo um trabalho com a família também, em qualquer área. Essa coisa de dizer “não converso com a família,” não vai funcionar nessa área e com essa clientela. Esses profissionais têm que ser capazes de trabalhar em equipe, ou seja, de não ser autista trabalhando com autista, e tem que ter disciplina e seriedade.

Então cabe ao professor, ao profissional e ao familiar valer-se da criatividade e do bom senso para não excluir ninguém da possibilidade de participar e contribuir, porque vai precisar da somatória de muita gente. Incluir é atender às diferenças e oportunidade igual para todos não significa metodologia igual para todos. Pelo menos aqui em Brasília, eu tenho sentido muita dificuldade de fazer com que as escolas compreendam que incluir crianças diferentes não é fazer com que elas sejam iguais às outras. Até na metodologia, no comportamento, elas precisam entender que incluir significa respeitar as diferenças. Se aquele menino precisa de um método alternativo de comunicação dentro de uma sala de aula que não utiliza isso para os seus alunos, ignorar essa informação é excluir essa criança. E as escolas acham que incluir é fazer com que o menino tenha tudo igual aos outros, e não é. É muito difícil fazer as escolas entenderem isso. Aqui em Brasília a gente tem tido muito problema com isso. Às instituições de ensino, cabe a formação de encontros periódicos com professores e demais funcionários para sensibilizar, porque um professor excluído não sebe o que é inclusão. Então, se as pessoas na escola, ou no ambiente em que se está trabalhando com essas pessoas ou convivendo com elas, a gente excluir alguém, a gente não pode estar falando de inclusão.

Com essas reportagens que estão tendo, eu estou tendo a experiência na clínica, no consultório, de receber adultos que estão achando que são autistas. Eu acabei de fazer um diagnóstico num rapaz de 40 anos, advogado, concursado, um cara até que tem um cargo bastante importante, que tem a Síndrome de Asperger. Ele chorou de alívio quando eu confirmei, depois de uma série de avaliações que ele realmente estava com Síndrome de Asperger. Ele chorou por uns 15 minutos no consultório, de alívio e disse: “Graças a Deus isso que eu tenho tem um nome porque agora eu vou saber ir atrás das coisas que vão me ajudar”. É um cara que se casou, fez faculdade, mas com muito sofrimento. É um profissional. Agora, ele falou pra mim que ele está sendo colocado de lado. Ele trabalha na Justiça Federal. Ele está sendo colocado de lado porque os pareceres dele são muito detalhistas. Ele é muito perfeccionista e os processos ficam muito tempo na mão dele. Então essa é uma coisa que a gente vai ter que trabalhar. Mas, esse caso desse rapaz está se repetindo. Há pessoas que estão se identificando porque, realmente, está tendo muita divulgação. Antes, a gente só tinha aquela coisa do autista clássico, que balança a mão, não olha no olho, que tem estereotipia. Esse espectro é muito abrangente e as pessoas que têm esses quadros mais leves estão fazendo o diagnóstico por si sós. Realmente a gente está vivendo coisas interessantes. Mas uma coisa que os autistas jovens e adultos têm relatado é o quanto eles se sentem insatisfeitos também de serem monitorados o dia todo, o tempo todo, quando já não há mais necessidade disso. É importantíssimo fazermos a avaliação gradual do peso desse apoio, até onde esse suporte deve ir, até quando ele passa a incomodar essa pessoa porque passa a ser demais na vida dele.

Participante não identificada: Eu queria fazer a pergunta a respeito do diagnóstico, já que foi pontuado. A percebe muito que alguns sintomas isolados, principalmente nas escolas, os professores estão diagnosticando. Então, se o menino tem um movimento estereotipado, ele já é autista. Se ele não

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interage, se não se sociabiliza com os outros, ele é autista. Eu trabalho no Núcleo de Educação Especial, sou fonoaudióloga, e eu percebo muito essa dificuldade nas escolas em relação a isso. Então, eu queria saber o que hoje a gente tem de passos para se diagnosticar, realmente. Eu quero saber como é que se fecha esse diagnóstico.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Primeiro, a formação do profissional. Eu acho que quem faz diagnóstico é médico, neurologista, psiquiatra e psicólogo. Então, esses podem falar de diagnóstico. Por mais que o professor, ou qualquer outro profissional, tenha informações suficientes para subsidiar um diagnóstico, a competência do diagnóstico não é dele. No autismo, não existe nenhum marcador biológico, não existe nenhum indicador biológico de que aquela pessoa é autista. Então, o diagnóstico dele é fruto de observação clinica. É claro, que baseada em escalas de sintomas que o autista precisa apresentar para ser considerado estar dentro do espectro autista. Se ele tem aquilo ou não, a avaliação é do profissional. Tem escalas de muitos profissionais que orientam o diagnóstico para ir elencando se aquela pessoa tem aqueles traços importantes para gente considerar que pode ser outra coisa e não ser autismo. Então, eu trabalho muito com questão do diagnóstico. Acho extremamente importantes as hipóteses diagnósticas, mesmo que precisem ser revistas depois porque elas norteiam ações terapêuticas e pedagógicas. Então, por exemplo, no caso de criança com dois, três anos ou cinco anos, muitas vezes, não dá para se fechar um diagnóstico. Mas a gente pode ter a suspeita e pode fazer todas as intervenções necessárias para estimulá-la. Se não fechar o diagnóstico, não fechou. Mas há toda uma pesquisa a ser feita, exames laboratoriais, mapeamentos cerebrais etc. Tudo isso precisa ser feito, mas não existe nenhum marcador biológico típico para autismo. Acontece que tem outros quadros semelhantes que podem ter marcadores, e esses exames vão pontuar e a gente parte para outras hipóteses clínicas.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Eu acho que o pediatra pode levantar suspeitas. Agora, nós já estamos encontrando pediatras bem mais informados em relação a isso, Graças a Deus. E graças à ABRA também que bate nessa tecla há mais de vinte anos. É claro.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: O primeiro médico da criança é o pediatra. Mesmo em qualquer comunidade mais carente sempre tem um pediatra num posto de saúde.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É. Não precisa dos três. Um ou outro.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É. Psiquiatra, neurologista, e psicólogo.

(Intervenção fora do microfone)

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Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: A qualidade de vida e autismo. O que é que precisa?

• Um ambiente estruturado e previsível. Algumas pessoas falam: “Ah, mas ele é tão apegado à rotina, e a gente vai usar a rotina?” Vamos porque é assim que ele vai se organizar. Quando ele vai melhorando, essa rotina pode ser menos rígida ou mais rígida. Todos nós temos rotina, gente. E essa coisa de dizer que robotiza, que automatiza, tudo é balela porque, quando a criança está em sofrimento é isso que põe a rédea nela e que dá o conforto para ela.

• Procedimentos de antecipação e previsão das mudanças ambientais. Então, ela precisa entender quando que alguma coisa vai mudar. Se ela está costumada a ir para a escola todo dia de manhã, no dia que ela não vai, ela precisa saber antes porque, às vezes, ela vê que ela não vai e ninguém se lembra de avisar porque ela não foi, e ela não entende, por exemplo, que não foi porque é sábado ou porque é domingo. Tem crianças que não entendem isso e acabam tendo uma crise de comportamento completamente desnecessária, se ela tivesse sido informada que, naquele dia, ela não iria à escola.

• Sistemas para o controle dos comportamentos, sistemas de signos e linguagens. Precisamos ampliar o repertório comunicativo deles. Se não for com a fala, que seja com ficha, mas precisamos ampliar os repertórios comunicativos deles.

• Negociar a inflexibilidade. Eles são normalmente muito rígidos. A gente precisa ir quebrando aos poucos essa rigidez, porque a vida não é tão rígida. Precisamos prepará-los para isso.

• Experiências de aprendizagem explícitas e funcionais.

• Experiências positivas e lúdicas de relação interpessoal. Eles precisam aprender que se relacionar com os outros pode dar prazer. Eles têm muito receio, eles são extremamente inseguros com relação ao outro, porque ele não sabe o que o outro está pensando. Eles não têm idéia se estão agradando, se as pessoas o estão compreendendo e se ele está compreendendo os outros.

• Condições de aprendizagem sem erros no início. Começar qualquer novidade com coisas e suportes que ele possa compreender, com atividades que ele possa dar conta de fazer, para depois ir inserindo aquilo que ele precisa ser mais trabalhado porque, senão, a resistência à atividade já vai se instalar, porque ele não... normalmente com propostas que ele não tem condição de fazer. Contextos e objetivos individualizados de treinamento e de tratamento e aprendizagem.

Participante não identificada: Desculpa um momento. Professora, qual é a visão da senhora do trabalho fonoaudiológico? O que a senhora acha?

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Acho muito importante. Muito importante, desde que no trabalho fonoaudiológico não se perca a meta da comunicação. Algumas vezes, há crianças que precisam ser trabalhadas fono-articulatoriamente, mas, na maioria das vezes, essas crianças não falam porque a comunicação não faz parte do universo delas. A fala não faz parte do universo deles. Então, ficar estimulando língua, lamber, respirar, às vezes, isso não contribui. Precisa-se estimular a comunicação.

Participante não identificada: Isso. Por isso que eu perguntei, porque trabalha a linguagem e não só a parte articulatória.

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Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Exatamente. A comunicação.

Participante não identificada: E não só a parte articulatória. Não só fala, mas a linguagem. A interação.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: A linguagem. A linguagem.

Participante não identificada: Obrigada!

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: A formação da fono é muito falha nesse ponto. Nem sempre, os fonoaudiólogos estão preparados para trabalhar com essa clientela, pelo menos, em algumas faculdades em que a gente vê os cursos como são. Então, às vezes, as fonos precisam ser orientadas a trabalhar, para estar estimulando a linguagem, a comunicação e o repertório comunicativo dessa criança. Agora, nem sempre ela é tão importante no atendimento direto. Às vezes, ela pode ser mais importante no atendimento indireto, como o psicólogo também. Não é toda criança que é legível para atendimento psicológico em consultório. Tem muita gente ganhando dinheiro sem ter condição de trabalhar com a criança.

Participante não identificada: Isso. Eu sou do sul, sou de Santa Catarina, sou fonoaudióloga, especialista em motricidade oral, mas a nossa questão em relação ao autismo é o trabalho com a linguagem, e não com a motricidade oral.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É por aí mesmo. É por aí mesmo.

Participante não identificada: Obrigada.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Bem gente, era isso que eu trouxe como aquecimento. Eu espero que agora a gente converse um pouco a respeito, não só do que eu trouxe, mas do que vocês quiserem propor aqui. Obrigada.

Participante não identificada: Nós trabalhamos com alguns jovens em situação de inclusão social e escolar, mas no momento em que ele enfrenta a frustração, e nós estamos em local público, muitas vezes você vai ter de fazer uma intervenção. Muitas vezes, acontecem situações que chocam a comunidade. Quando a criança começa a se morder, a se bater, as pessoas que estão ao redor ficam achando que quem estava acompanhando aquela criança fez algo desencadeador e tem o momento que você tem de entrar em contenção.

Aconteceu um fato conosco numa praça que demonstra bem isso. De repente, começou uma situação como essa e fiquei sem saber como deveria proceder. De repente, eu me vi numa situação em que eu tinha de estar conversando com a comunidade, com o entorno, e avisando: vocês estão assistindo ele fazer isso, porque eu pressuponho que ele está reagindo assim por causa disso e disso, mas agora vou ter de segurá-lo nessa posição para não machucá-lo, mas não vou poder deixar que ele continue a se machucar. Nesse momento houve um conflito muito grande. Depois que nós saímos do FAP, eu fiz isso e foi interessante porque eu me expus na comunidade com muita tranqüilidade porque eu estava fazendo uma intervenção que eu considerava que era uma intervenção real, uma intervenção saudável e que eu tinha que comunicar. Se eu fosse fazer aquilo sozinha, sem falar com a comunidade, eles iam achar que

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eu estava sendo agressiva e eu estava me impondo. Esse foi o primeiro estágio em que eu vivenciei essa situação, mas na discussão que nós tivemos com a equipe, o pessoal ficou achando que eu não podia estar passando as informações para a comunidade do tipo da intervenção que eu faria e qual a situação que estava acontecendo porque eu estaria divulgando para o outro, situações que não deveriam ser divulgadas. Então, a pergunta que eu te faço é o que é ter uma intervenção saudável em público.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Quem trabalha e quem acompanha esses meninos e essas pessoas sabe que isso acontece sempre, acontece muito, no supermercado, na praça, num brinquedo, em qualquer situação. Não vejo nenhum problema nesse tipo de intervenção, desde que haja a indicação que seja feito, porque tem crianças que não reagem bem a isso. Então, é importante que o pai, o professor ou o profissional que está acompanhando aquela pessoa já esteja orientada devidamente o que fazer a intervenção. A intervenção precisa ser feita naquela hora sim, independentemente do que as outras pessoas possam pensar, muitas vezes, até para prevenir coisas muito mais graves, como uma criança que está tentando fugir, uma criança que está tentando se machucar muito, ou machucar outra pessoa.

Então, eu acho que qualquer intervenção é saudável quando é necessária. Qualquer intervenção pode ser doentia quando ela ultrapassa a medida. Então, eu acho que não existe uma receita. Mas, se você está segura do que está fazendo, eu acho que você precisa mostrar aos outros sim porque você está agindo assim. Eu acho que as pessoas de fazer isso estão tendo um papel muito importante na comunidade. A pessoa que não sabe o que é autismo, que nunca ouviu falar, vê aquela criança bonita, saudável, que não em cara de problemática, recebendo uma intervenção mais impositiva e mais firme pode até chamar a polícia achando que você está sendo agressiva, está recebendo maus tratos etc. Então, há uma necessidade de informação. Isso é informar. O ideal seria que os ambientes estivessem mais preparados para isso, que nas comunidades ali onde a criança circula, as pessoas já estivessem acostumadas. Agora, como é que elas vão se acostumar? Quando a gente sair com essas pessoas e fizer isso. Então, eu acho que a intervenção é saudável quando ela é necessária e a pessoa que a aplica precisa estar segura. Quando a gente está seguro do que a gente faz, a gente não prejudica nunca.

Elaine: Eu sou Elaine, eu sou mãe de um menino de cinco anos, com diagnóstico de autismo. A minha pergunta é dentro da pergunta dela. No meu caso, eu faço intervenções para ele não fugir porque ele quer sair correndo para o meio da rua, então, eu tenho que contê-lo para que ele não atravesse. Às vezes, ele vai para o meio da rua, num comportamento desafiador. Ele vai para o meio da rua, olha para trás, dá risadas e eu tenho que contê-lo. Eu tenho dificuldade quando eu vou explicar a situação para quem está em volta, em shoppings, em supermercados etc. Às vezes, eu tenho que contê-lo firmemente. Mas quando eu vou dar a explicação, o que eu me preocupo é como eu posso transmitir essa explicação para ele, como eu rotulo isso para ele, porque ele tem consciência.

Como eu estava conversando com o companheiro aqui do lado, que também é pai, eles são muito sensíveis, eles sabem o que está se passando ao redor, eles sentem quando a gente não está bem. Meu filho sabe quando eu estou com TPM, sabe quando eu briguei com o meu marido, ele sabe quando eu estou feliz, ele sente muito mesmo e eu tenho medo de rotulá-lo mais ainda. Eu tenho procurado lidar com essa questão de uma forma clara, procurando falar para as pessoas ao redor que essa é uma situação comum. Eu tenho que contê-lo porque ele tem um problema de comportamento e, de repente, eu chego e tenho que falar que ele é autista e tudo mais. E isso, para a cabecinha dele é difícil porque eu o estou rotulando novamente. Ele sente isso. Ele sente isso e ele chora. Então, quando eu faço essa intervenção, eu o contenho, mas quando eu dou as explicações ele começa a chorar, sentindo exatamente o que eu estou fazendo.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É. Eu fico aqui me perguntando se não é você que está sentindo necessidade de se explicar para os outros.

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Participante não identificada: Também.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Eu acho que tem situações em que realmente não cabe explicação para os outros. Você age e pronto. Você não precisa ficar falando que você está fazendo isso porque ele é uma criança autista, por isso ou por aquilo. Se ele entende, vai chegar uma hora em que ele não vai se sentir bem de estar agindo assim. Você está falando que ele é autista, mas você podia estar falando que ele é mal-criado. Nenhuma pessoa gosta de se sentir exposta. Quando você intervém dessa forma com os filhos de vocês que são normais, você não vai sair dando explicações, como por exemplo: eu estou fazendo isso com ele porque ele é mal-educado; eu estou fazendo isso com ele porque ele tirou nota baixa na prova, a gente não explica. Então eu acho que nós devemos evitar, o máximo possível, comportamentos mais impactantes em alguns ambientes. Eu acho que a gente tem que ir devagar, saber aonde a gente pode levar esse menino, e ir dosando homeopaticamente essa exposição, mais por ele do que pelos outros. Mesmo com tudo isso, pode acontecer realmente de uma vez você precisar fazer uma intervenção mais firme, mais impositiva com ele. Acho que é bom explicar para sensibilizar, mas não para dar satisfação. Eu acho que a diferença é essa. Não é você justificar. Eu já ouvi várias mães falando que tem horas em que é constrangedor um determinado tipo de comportamento. No caso dos filhos de vocês, esse constrangimento existe e vem essa necessidade de você se justificar porque você está fazendo isso ou aquilo, quase que pedindo desculpas de estar fazendo aquilo com aquele menino.

Participante não identificada: É porque as pessoas perguntam.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É.

Participante não identificada: Acontece a situação e aí juntam gente, e as pessoas questionam: “Mas o que está acontecendo? Posso ajudar? Ele está doente? Ele está tendo uma crise? Ele é diferente? Aí começam as perguntas e a que está numa situação difícil, de contenção, ainda tem que dar explicações e ele está prestando atenção em tudo. Uma vez, eu li na internet o depoimento de uma mãe que disse que ia andar com cartõezinhos no bolso, e quando alguém lhe perguntasse ela ia distribuir uma cartão para evitar falar na frente dele. Eu também já pensei seriamente em fazer isso para não ter que falar e para ele não sentir porque ele chora, ele também se constrange.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Eu acho que não é o constrangimento pela palavra “autista”, porque com cinco anos nem tem essa leitura, mas é o constrangimento, porque é a coisa da sua postura. É você quem está constrangida. Então, essa sua postura é que talvez incomode você e ele. Na hora em que você divide a atenção, você tira o foco da atenção inclusive dele naquela hora em que ele está precisando da atenção só para ele. Então, eu acho que tem horas e horas. Não tem receita de bolo. Infelizmente, ou felizmente.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Não. Eu acho que isso é sempre muito importante, embora, às vezes, na crise, não adianta falar muito porque eles ficam muito alterados. Aliás, qualquer pessoa em crise ouve muito pouco e é muito importante pontuar com poucas palavras o que está acontecendo. Eu acho isso sempre muito importante. Isso ajuda muito a organizar o pensamento deles. É importante vocês irem falando na medida em que as coisas vão acontecendo, como se houvesse um relato simultâneo às ações. Acho isso muito interessante.

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(Intervenção fora do microfone)

Telma Maria Viga de Albuquerque “ Manaus: Nós temos uns meninos lá que eles são bem hiperativos, então nós temos uma professora que ela não precisa nem falar. Só de dizer o nome dela, eles já se acalmam. E ela nunca bateu, nunca fez nada, trata com carinho e tudo. Ela nem fala. Ela só tira a criança, controla e diz: “Você não deve fazer isso”. Com ela, eles vão para um ambiente público e se comportam direitinho.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É interessante como alguns pais até colocam em dúvida a postura da professora, ou até de terapeuta na escola porque nem imaginam como os filhos se comportam na escola. Muitos dizem: “Nossa, ele faz isso aí, porque aqui na minha casa ele não faz”. É como se fosse duas crianças completamente diferentes. Isso é pelo fato de eles estarem num ambiente estruturado, com pessoal preparado etc. Pai e mãe não têm que ser técnicos. Eu acho que pai e mãe têm que ser pai e mãe. A postura é diferente. Eu sou psicóloga, mas eu não vou ser psicóloga dos meus filhos, por exemplo. Se eles precisarem de psicólogo, eles têm que procurar outro. Então, a gente tem que ser pai e mãe. O profissional tem um distanciamento afetivo, não que ele não seja afetivo, mas ele tem um distanciamento que permite que ele seja mais coerente, mais firme, porque a coerência é a grande arma dessa história toda. Você tem que ser coerente a vida toda porque, se você for incoerente dez minutos, ele vai lembrar desses seus dez minutos de incoerência. Como eles necessitam desse ambiente estruturado, quanto mais comprometido, quanto mais comportamentalmente ele for desorganizado, mais estruturado precisa ser esse ambiente. Isso é difícil em casa porque casa tem que ser casa. É claro que a rotina normal de uma casa é uma rotina mais solta do que um ambiente de trabalho. Então, às vezes, a gente filma para mostrar para os pais o que acontece. A criança faz e obedece porque ele está mais confortável, está mais seguro. Não é porque ele gosta mais da professora. Eu acho que muitas famílias, às vezes, ficam sensibilizadas porque acham que a criança prefere outro ambiente do que a sua casa, porque fica melhor. Mas, a criança fica melhor porque ele se sente melhor. Então a gente tem que entender isso pela ótica dele. Aonde ele se sente melhor é onde ele deve ficar mais. E ninguém pode se sensibilizar e se ofender com isso. Eu sei que é difícil entender isso como mãe, mas a gente tem que caminhar para isso.

Participante não identificada: Ana Maria, você falou a respeito da questão de intervir junto à outra agressão. Eu queria de saber como intervir junto à estereotipia, seja ela corporal ou mesmo oral. A questão da fala foi pontuada aqui pela colega. Eu tenho a mesma formação, nós somos fonoaudiólogas e a visão de vários profissionais é de ter o fonoaudiólogo junto ao autista direcionado para essa parte oral, quando na verdade a gente trabalha uma parte bem mais ampla, que é a questão da linguagem como um todo. Então, eu queria saber isso. Essa intervenção seja ela corporal, da estereotipia, ou na fala.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: É. A estereotipia, muitas vezes, é um traço de ansiedade. Na maioria das vezes, a criança está manifestando a ansiedade ou por uma ociosidade, porque ele está sem fazer nada. Geralmente, estereotipias aparecem quando eles não estão envolvidos em nenhuma atividade, ou quando eles estão mais ansiosos, ou quando estão querendo se negar a fazer alguma coisa. Em minha opinião, a estereotipia sempre está ligada a uma questão emocional. Agora, como é que a gente trabalha isso? Primeiro, identificando o foco da ansiedade. Qual é a primeira resposta que vem pronta: “Você tem que distrair a criança pra outra coisa”. E geralmente você consegue tirá-la, naquele momento. Chama a atenção dela para alguma coisa, para alguma coisa que seja do interesse dela, ela abandona aquela estereotipia, ou motora, ou comportamental, não é? Porque as estereotipias são motoras, são comportamentais, são de comunicação. Então, a primeira resposta é: “Tem que distrair a criança com alguma coisa em que ela tenha interesse e que seja funcional para ela”. Eu fico um pouco preocupada quando as pessoas começam a achar que a criança não pode apresentar estereotipia nenhuma porque a estereotipia faz parte deles. Alguns autistas de mais alta funcionalidade

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até falam: “Eu estou fingindo que eu sou normal”. Alguns autistas até conseguem se controlar porque eles não querem dar bandeira de autistas, mas em algum momento eles precisam manifestar aquilo porque isso faz parte deles. Alguns têm isso, outros não têm. Mas aqueles que têm precisam balançar de vez em quando porque é uma descarga. É uma descarga, é um desabafo. E a gente precisa preservar esse espaço deles porque isso faz parte da condição deles. Então, eu acho que a gente não pode eliminar do comportamento dele, porque a gente vai estar caindo naquela coisa de querer transformá-los em normal. O que é normal? Normal é não ter estereotipia? A gente até tem. A gente tem algumas estereotipias que a gente às vezes não se dá conta. Por exemplo, tem aquela coisa da síndrome das pernas intranqüilas. São aquelas pessoas que sentam e ficam balançando as pernas. Isso é uma estereotipia, não é? É uma estereotipia que está baseada num comportamento ansioso. E a gente não fala para a pessoa que ela tem que deixar de fazer isso. Ou então, fala isso de uma outra maneira. A gente não pode achar que as intervenções têm que anular o jeito de eles serem porque tem coisas que fazem parte da maneira deles serem. Eu acho que precisamos adequar o máximo que puder, mas tem que deixar um restinho ali, temos que deixar eles manifestarem o que eles são.

Participante não identificada: Doutora, eu de novo. E a ecolalia? O que eu faço? Incentivo? Trabalho junto? Tento cortar?

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Ela está louca por um livro de receita. Olha, a ecolalia, dependendo do momento em que a criança está, dependendo da idade da criança, ela pode ser estimulada ou pode ser inibida, então, isso vai depender muito da situação. Agora, a gente não precisa ser ecolálico junto com ele. Porque às vezes a gente vira também, igualzinho. Então a gente tem que dar um padrão do que é normal, esperar o que vem de lá, e não ficar reforçando, tipo assim: “Eu já falei uma vez. Não precisa repetir”. Não. Isso é uma tragédia. Por exemplo, um menino que se aproxima de você só pra perguntar para que time você torce. Daí, você fala: “Ah! Não vou mais responder”. Isso depende. Depende, por exemplo, se ele já está num outro nível de comunicação, se isso é um comportamento mais regressivo dele. Se ele já apresentou outras coisas mais adiante, você pode até lidar com uma coisa assim, meio de distinção, mas se não for, você tem que aproveitar isso, porque essa é a única hora em que a criança se aproxima de você. Então, você pode responder do futebol, e você já pode inventar uma outra coisa para ver se você o segura um pouco mais com você. Então, eu acho que isso depende muito; não tem receita.

Participante não identificada: Já que ninguém vai perguntar, vou eu de novo. Eu não ouvi você falando da questão sensorial e eu acho que tem uma ligação sensorial. Eu queria que você explicasse para gente um pouco disso, porque eu sentia muito no Lucas a dificuldade sensorial com barulhos muito fortes, repentinos, muitos altos, e inclusive em locais com muito estímulo, locais muito coloridos. Eu percebia a dificuldade dele. Ele levava as mãos aos ouvidos para tampar. Às vezes, não tinha barulho nenhum e ele levava as mãos aos ouvidos para tampar e eu nunca sabia identificar se era medo ou se era alguma coisa que eu não estava percebendo e ele estava percebendo.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Tem sim. É. Principalmente em crianças menores. Quer dizer, eu acho que essa desorganização sensorial pode até permanecer ao longo da idade, ao longo do desenvolvimento, se não for trabalhada, mas em crianças menores ela está sempre bem presente e a gente precisa realmente filtrar essas estimulações, porque o que acaba acontecendo é que tudo bombardeia ao mesmo tempo. Aqui, por exemplo, quem não é autista que está aqui consegue filtrar. Por exemplo, aqui tem o barulho do ar condicionado, alguns de vocês podem ter começado a ouvi-lo só agora porque a gente vai incorporando. Mas por exemplo, o autista podia estar só ouvindo isso e ouvindo a minha voz em segundo plano, então, ele já teria um problema se ele quisesse se comunicar porque ele estaria fixado no barulho do ar condicionado. Há algumas crianças autistas. Eu percebo a mudança em crianças clássicas autistas, dependendo da hora que eu atendo no consultório.

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Pelo jeito que o sol bate na janela, o comportamento da criança muda. Se é de manhã ou se é à tarde, já tem mudança. Tudo pode interferir. Então, eu acho que existe um trabalho de integração sensorial e, muitas vezes, as crianças precisam passar por este trabalho para se organizarem mais sensorialmente. Inclusive, tem um trabalho de uma autora americana, que é uma autista de alta funcionalidade, ela fala do quanto, no caso dela, foi importante esse trabalho de organização sensorial que foi feito pela fonoaudióloga dela. Esse trabalho é muito importante para essas crianças se organizarem mais sensorialmente, para eles estarem mais controlados. Às vezes, até para cortar o cabelo ou cortar a unha dói, e eles relatam isso. Só que, até eles conseguirem contar que é isso que está acontecendo, é difícil. Daí, as mães às vezes falam: “Vamos cortar a unha, você vai ver que não vai doer.” Não pode ser assim porque, às vezes, realmente não é frescura. Dói mesmo. Eu já vi um menino apagar um cigarro aceso, estando descalço. Fez um rombo na sola do pé dele e ele não sentiu nada, ou se sentiu, não se manifestou. É uma desorganização sensorial e, realmente, é muito importante estar atento a isso. Tem crianças que não têm isso tão acentuado. Mas para quem tem, precisamos estar atentos.

Participante não identificada: Ana, lá no internato, nós estamos com um problemazinho com Ramiro. Ele é muito organizado, as coisas têm que estar sempre no lugar, e ele se preocupa muito com o que ele tem. Para quem não conhece, o Ramiro é meu filho, ele tem 22 anos, está no sistema de residência na AMA lá de Sergipe. Quando ele chega da escola, ele sabe todo o vestuário que ele tem, porque tem a mania de querer estar bem vestido. Quando ele chega da escola, a preocupação dele é abrir o guarda-roupa e conferir se todas as roupas estão no guarda-roupa. Só que, nessa Conferência, tem a parte que fica em cima e tem a parte das bermudas e camisetas que fica na parte debaixo. Ele sacode tudo no chão, mas uma por uma para conferir se estão todas lá. Se não está, então, ele vai procurar. Ele vai no arame, se não está no arame, ele vai à máquina de lavar. Se estiver na máquina de lavar, ele pega molhada, arrasta e trás para cá.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Quer por no guarda-roupa a qualquer custo. Quando é a Detinha e a Lourdes que estão lá e já sabem administrar um pouco isso, não tem muito problema. Mas, às vezes, é a outra cuidadora que está lá e, como ela não tem prática, ela fica maluca. Uma vez, ela não queria deixar ele levar as roupas molhadas e ele entrou naquelas crises de auto-agressão porque ele estava sentindo que alguém estava interrompendo aquilo que ele queria fazer que era ver a roupa dele. Alguém até me disse: “Lourdes, você faz assim, você deixa ele desarrumar, e depois, quando você chegar, ele tem que arrumar tudo”. Com isso, agente pensou que ele iria parar, mas ele não pára. Ele quer ver toda a roupa quando chega, diariamente. Ele desarruma, as meninas mandam ele arrumar e ele arruma tudinho. Ele não tem preguiça, ele vai lá, arruma, mas enquanto ele não acha aquela roupa que ele está querendo aquela roupa, ele não consegue ficar sossegado. Não consegue.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Ultimamente, eu ando brincando dizendo que eu sou o dinossauro do autismo porque tem 30 anos que eu trabalho com autismo. Então, no começo, a gente achava que tinha que falar não porque isso é um comportamento obsessivo. “Vamos tirar isso daí, cada dia ele vai ter que chegar e fazer alguma coisa. Onde já se viu chegar e desmontar o guarda-roupa todo!” Passados trinta anos, eu entendo mais o Ramiro, porque aquela conferência da roupa, para ele, tem um sentido existencial. Agora é a conferência da roupa, daqui a um mês pode ser ver se as panelas estão no armário, enfim, é contando coisas que ele se dá conta da integridade dele porque a gente vê isso em outras coisas. É claro que o Ramiro é um caso de autismo bastante grave. Ele já evoluiu, diante do que era, mas ainda é um quadro com uma deficiência mental considerável. Então, ele tem todo um comportamento ritualístico e obsessivo próprio de um quadro de autismo desse perfil. Mas tirando isso, eu acho que a coisa precisa ser trabalhada com certa flexibilidade. Eu acho que a gente tem que ter a compreensão de quanto isso é importante para ele. Eu acho que pessoas que talvez não conheçam tanto desse assunto, podem pensar diferente de mim, acham que isso é um comportamento obsessivo que está atrapalhando a vida dele. Eu acho que ele tem que ter direito de ser autista, com todas

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as “nóias” que um autista tem. Às vezes eu vou dormir achando que eu deixei a porta aberta e eu não vou lá fechar? É claro que se eu ficar a noite toda levantando para ver se a porta está fechada, eu estou doente e preciso que me tratar, mas uma vez ou outra, isso acontece comigo. Para ele, que tem um repertório de ação tão restrito, que tem um repertório de interesses tão restrito, restam algumas coisas para que ele tenha o sentido da própria existência. Não sei se vocês estão percebendo o que eu quero dizer. Ele passou o dia todo fora, numa atividade institucional, quando ele chega em casa, ele quer ver como estão as coisas dele. Tem dias que eu chego em casa e eu também vou checar minhas coisas, ver se está tudo em ordem. A gente vai ver se a empregada fez aquilo que a gente queria, se a planta está molhada, se o filho fez a tarefa, enfim, a gente faz isso. E tem outros dias que eu não quero nem ver nada. No caso do Ramiro, ele vai contar as bermudas dele. Isso é um direito que ele tem. Agora, é claro que se precisa trabalhar mais a flexibilidade dele, para que no dia que isso não for possível, ele aceitar melhor isto. A gente precisa fazer alguma coisa nesse sentido. Tem que ir lá, ver o que pode ser proposto. Mas eu acho que, achar que a gente tem que quebrar isso não está correto porque é como querer a medula dessas pessoas. Eu acho que a gente tem que trabalhar com eles, adequando-os aos ambientes para eles serem felizes, mas temos que respeitar essas condições muito específicas deles. Então, ele está com 22 anos. Foi a vida toda muito trabalhada, porque eu conheço o Ramiro desde pequenininho, sempre na batalha com ele. Se ele chegou no ponto que ele chegou, ele precisa ser feliz, gente. Esses quinze minutos que ele faz isso, desde que ele guarde. O que a gente não pode é permitir que ele chegue, bagunce tudo e os outros vão guardar. Ele tem que entender que se ele quer conferir, a responsabilidade de guardar também é dele. Então, ele pode dobrar as roupas mais ou menos, até fazer todo um trabalho para que ele faça isso cada vez de uma maneira mais bem feita. E se está faltando uma bermuda, às vezes, para ele, isso é desestruturante mesmo porque ele quer saber onde é que está aquela bermuda. Agora, talvez precise trabalhar mais com ele que ela está molhada e precisa secar. Então, naquele dia ela vai precisar dormir no varal, no arame, e não vai estar ali. Mas, ele precisa ver a bermuda, ele não pode sentir que aquilo sumiu da vista dele, porque é como coisas que a gente também preza, e que a gente não quer que sumam da nossa. Eu acho que nós temos essa coisa de conferência, indireta ou diretamente depois de uma jornada. Tem gente que faz diário, que entra na caixa de e-mail, que faz uma oração, enfim, nós temos marcadores para as nossas rotinas, assim como eles têm para a rotina deles. Só que eles fazem isso à maneira deles e eu acho que a gente tem que respeitar isso.

(Intervenção fora do microfone)

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Pois é. Mas aí é o seguinte: isso tem uma conseqüência muito maior porque vai queimar a sua geladeira. Acho que toda geladeira não pode ser descongelada todos os dias. Acho que não pode. Não sei, se não entendo de geladeira, mas eu acho que não pode. Então, eu acho que isso pode ser substituído. E outra coisa, seu filho está só com cinco anos, então, eu acho que é diferente. É por isso que eu falo que a gente tem que avaliar, a tempo e a horas, o que está acontecendo, porque tem pessoas que a gente pode exigir mais, porque têm condição de dar mais, e tem pessoas que já deram tudo o que podiam dar. Então, é nesse sentido que a gente está falando.

Participante não identificada: Ana Maria, o que a certeza diagnóstica ajuda no processo pedagógico?

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Eu acho que a certeza diagnóstica é uma benção porque eu acho melhor a gente lidar com certezas do que com dúvidas. Outro dia uma fonoaudióloga me perguntou isso. Mais ou menos isso. Eu vi uma criança que não tinha três anos e que, na minha avaliação, tinha autismo. Os pais médicos não tinham visto nada de mais e já tinham ido a uma neurologista que tinha dado o diagnóstico; já tinham ido a um psiquiatra que já tinha dado o diagnóstico; mas é claro que quando eles foram falar comigo, eles não disseram falaram que já tinham consultado outras pessoas. É claro que, se eles estavam esperando que eu falasse uma outra coisa

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diferente, como é que eles já iam antecipar uma coisa que elas tinham achado? Até porque, o que estava todo mundo achando não era o que eles queriam ouvir. Quando eu falei o meu diagnóstico, eu disse: “Eu ainda não terminei a avaliação, por isso, não posso dar ainda um diagnóstico final”. Na verdade, o diagnóstico sozinho não serve muito para nada. Agora, se o diagnóstico vem acompanhado de orientações, de como trabalhar com aquela criança, ele serve para muita coisa. Então, as orientações podem até independer do diagnóstico. Eu acho que, com o diagnóstico, você faz uma projeção. Porque a gente já tem formas de agir, meios, embora respeitando os casos individuais e as evoluções individuais de cada caso, porque não tem um caso igual a outro, mas a gente consegue fazer projeções. No caso dessa criança, eu encaminhei para uma fonoaudióloga que já está acostumada a trabalhar com autismo e disse que se tratava de uma criança autista. Ela é uma criança com autismo leve, por tudo que eu já vi, embora não fale nada com três anos. E a fono me disse: “Por que é que você já falou que é autismo?”. De repente. pode até não ser”. Isso foi o que a fono me disse. Eu respondi: “Acho difícil não ser. Eu poderia até dizer que, pela idade, não vamos fechar esse diagnóstico agora”. Mas esses pais estão precisando dessa amarração porque eles estavam num movimento muito lento para tomar alguma providência com relação ao tratamento da criança. Então, se você não fechar um diagnóstico, isso pode até ser mais danoso para a criança do que fechar um diagnóstico precoce. De repente, a criança nem é autista e vai evoluir para um Asperger, que é um quadro mais brando, com um prognóstico mais aberto. Se for Asperger ou se é autista, precisa fazer alguma coisa já. Então, eu vou falar que é autista porque assim eles vão acelerar o processo. É claro que, com cinco ou seis anos, a gente faz o diferencial. Mas eu acho que o diagnóstico sozinho não faz nada. Ele só faz, se for feita uma avaliação junto com o diagnóstico e essa avaliação tem que vir acompanhada com orientações do que fazer em cada área em que a criança está defasada. Nesse caso, o diagnóstico tem uma funcionalidade. O diagnóstico só pelo número do CID é só para laudo.

Participante não identificada: Ana Maria, a gente estava falando da questão do comportamento e você começou a falar um pouquinho da questão pedagógica também. Eu não sei se tem professores ou pedagogos aqui, mas o que eu percebo com essa questão da inclusão é uma resistência muito grande por parte dos professores, e muito mais por parte dos pais que não têm filhos com necessidades especiais, no sentido de ter o filho convivendo com crianças que têm algum tipo de comportamento estereotipado, como acontece no caso do autismo, em que a criança tem ecolalia, o comportamento repetitivo etc. Então, eles têm muita resistência ao fato de que o filho deles vai conviver com essas crianças e que pode começar a imitar e acabar tendo o mesmo tipo de comportamento. Como você vê essa questão desse relacionamento, desse comportamento em si?

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: O que eu vou dizer não é demagógico, eu não tenho essa intenção, mas eu vejo isso como uma grande oportunidade. As crianças que têm essa oportunidade são crianças muito mais beneficiadas. A gente precisa convencer os pais disso. Acho que Essa coisa do imitar preocupa muito, principalmente, na pré-escola, porque depois que as crianças são mais velhas, os pais já têm mais segurança de como a criança deles vai evoluir e talvez não fiquem se preocupando tanto com a imitação. Mas na pré-escola, a gente vê muito essa preocupação de que aquela criança vai morder o seu filho etc. Mas toda criança da pré-escola leva uma mordida e dá uma mordida. Entretanto, se o que dá a mordida é autista, é um Deus nos acuda. Eu acho que os pais precisam ser preparados. A gente não pode exigir de alguém que não teve acesso à informação não tenha essas dúvidas e esses temores. O que está acontecendo é que as pessoas não são informadas. A gente acha um absurdo as pessoas que trabalham nessa área não saberem, mas as pessoas não sabem. As pessoas não sabem. A gente que trabalha com isso, fala: “Não, mas que é autista, como que não sabem o que é autista, tem até reportagem no Fantástico!”. Mas tem gente que não viu, tem gente que não ligou o nome à pessoa e não sabe. Por exemplo, tem gente que acha que baba de epilepsia é contagiosa. Então, eu acho que a informação é muito importante. Agora, junto com isso, precisa ser feito um trabalho de sensibilização mesmo, através das próprias crianças. Muitas vezes, o que a gente vê é que as crianças acabam sensibilizando muito mais os próprios pais do que até os diretores de escola. A partir do ano que

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vem, todas as escolas vão ter que receber essas crianças, mesmo as que não quiserem. Aliás, é isso que me preocupa porque é preciso abrir espaço para essas pessoas entrarem; não é só colocá-las junto com as outras crianças e pronto. A chance de darmos um passo atrás é muito grande. Se houver algum problema, as pessoas vão logo dizer: “Está vendo? Não deu certo! Vamos voltar ao que era antes”. Então essa é uma grande preocupação nossa. As instituições educacionais precisam colocar essa questão da inclusão na sua agenda, na sua pauta de reuniões para que seja feita essa discussão. Apesar de ter toda essa formação em autismo, no meu consultório, eu não atendo só pessoas com autismo. Eu atendo muitas crianças com hiperatividade, crianças sem limites, pais sem limites com as crianças. Aliás, nós estamo sendo muito requisitados para ir às escolas dar palestras sobre noção de limite. Como é que se educa filho. Nessas palestras, não podemos perder a oportunidade de dar exemplos de crianças que são mais diferentes porque os pais estão sempre muito preocupados com isso. Agora, a maioria dos pais se deu conta que não são bons pais porque não estão conseguindo impor limites aos seus filhos. Então, essa relação está sento até meio patologizada demais, mas as escolas não podem perder essa oportunidade de mostrar que a convivência com essas crianças é muito benéfica para os outros. Às vezes, até mais do que para a criança especial. Eu acho que precisamos priorizar fóruns desse tipo nas escolas, porque uma coisa que pega muito é quando os pais se organizam em grupos, ameaçando tirar os filhos da escola porque aquela criança autista está na escola. Isso acontece e é para isso que existe o Ministério Público. Eu acho que é por aí.

Participante não identificada: É interessante quando você coloca isso, porque eu estou trabalhando muito nessa questão da inclusão e eu vejo muito essa resistência. O que eu sinto é justamente essa questão da falta de informação, mas eu realmente acredito muito quando você coloca essa questão de que essa convivência é benéfica. Eu acho que a própria questão do preconceito só vai diminuir, quando começarmos a trabalhar desde a educação infantil. As crianças já vão crescer tendo uma outra visão, com um preconceito muito mais diminuído do que o nosso.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Com certeza.

Participante não identificada: Ana, eu queria saber o seguinte: Qual é a idade para a inclusão? Tem idade para o autista se incluir?

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Não, eu acho que tem condição. Acho que não tem idade.

Participante não identificada: Nós estamos com um menino de treze anos e já era para ele estar incluso há muito tempo. Ele não fala, mas escreve muito bem. Ele tem um comportamento até bom, mas os pais não o quiseram porque acham que ele é dependente, que ele não tem noção de perigo, não sabe ir ao banheiro, enfim. Só que a família não trabalhou essas questões com ele. Então ele está lá na AMA, é um menino que tem um potencial bom, que escreve muito bem, até no computador e eu fico pensando o que vou fazer com ele. Ele vai ficar todo tempo aqui, podendo ter outra oportunidade?” Ele fez quinze anos, já.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Eu acho que precisa ser feito um trabalho com essa família para sensibilizá-la da importância dele estar num processo inclusivo. Agora, a inclusão se faz de uma maneira gradual. Por exemplo, no caso de um menino de 13 anos, você não pode tirar o apoio do ambiente especial de uma vez, porque a família fica muito insegura. Ela só vai confiar em você se você propuser a coisa de uma maneira graduada e acompanhar essa inclusão no local. O que pode acontecer é a eles receberem a criança, mas não aceitar orientação de quem é mais especializado na área, essa coisa toda, porque a gente ouve milhares de histórias, de todos os tipos. Eu já cansei de ver familiares de pessoas com deficiência, que quando um membro da família consegue um trabalho, e vai

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perder aquele tal do beneficio porque está trabalhando, a família não deixa ele ficar empregado para não perder o beneficio. Então, a família, às vezes, é um grande obstáculo para a inclusão da pessoa, porque fica se pautando em outros parâmetros. É por isso que, cada vez mais, eu vou falar da informação. Quando a pessoa está informada, ela sente menos medo das coisas. Ela fica menos ansiosa e menos insegura. Acho que a informação e a orientação que vão fazer a mudança. Mas no caso desse menino, ele precisa estar convivendo num ambiente inclusivo. Agora, você vai por o suporte de acordo com o grau do comprometimento. Você pode fazer a inclusão com o monitor, ou a inclusão sem, ou a inclusão três vezes por semana. Por exemplo, tem casos de meninos que eu estou acompanhando que o monitor vai três vezes por semana, já foi todos os dias, e tem meninos que estão sem acompanhamento nenhum. A gente tem que ver que a inclusão não tem só uma mão. É uma via de mão dupla. Ele também não pode estar incluído atrapalhando a vida de mais vinte e cinco crianças, porque a relação custo-benefício precisa ser dos dois lados. Então, a criança precisa estar em condições de inclusão, mas ela precisa estar sempre preparada para ser incluída. Eu acho que, no caso de meninos do tamanho dele, a gente tem que falar em adaptação curricular, porque é claro que algumas coisas ele não vai conseguir fazer, mas as tarefas todas vão ter que ser adaptadas ao currículo.

Maria do Carmo Tourinho Ribeiro Vieira “ Coordenadora: Eu quero agradecer a todos, a vocês, e quero agradecer especialmente à Ana Maria, pedir desculpas pelo transtorno do atraso. Talvez a gente pudesse estar aqui hoje com a sala lotada, mas, com esse transtorno que houve na conferência, todo mundo ficou perdido, mas pelo menos a gente conseguiu fazer alguma coisa. Acho que temos um jantar daqui a pouco, então, vamos encerrar agora. Está bem? Obrigado a todos.

Ana Maria Bereohhf “ Associação Brasileira de Autismo: Obrigada. Boa noite!

4.15 A POLÍTICA NACIONAL DE JUVENTUDE E AS QUESTÕES ESPECÍFICAS DOS JOVENS COM DEFICIÊNCIA NO PAÍS.

Fábio Meirelles “ Coordenador: Eu sou oficineiro da inclusão, assistente de Projeto Escola de Gente, Comunicação em Inclusão e represento a nossa organização no Conselho Nacional de Juventude. Queria agradecer ao Antonio Carlos Cestaro pela disponibilidade de atender a federação e estar tentando construir essa aliança entre o Conselho Nacional de Juventude e o Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, tentando trazer a pauta da juventude para discussão das pessoas com deficiência. É um tema muito novo não só para as pessoas com deficiência, mas para todo o Brasil. Um tema que está crescendo e está se fortalecendo agora.

Eu estou aqui ao lado do Vice-Presidente do Conselho Nacional de Juventude, Daniel Cara, do Instituto Sou da Paz, da Carmem Barreira, da União dos Escoteiros do Brasil e da Cláudia Werneck que é Superintendente Geral da Escola de Gente. Vou dar a palavra, primeiro, à Carmem Barreira, da União dos Escoteiros do Brasil.

Carmen Barreira - União dos Escoteiros do Brasil: Boa noite a todos e todas. É um prazer estar aqui junto com vocês. A União dos Escoteiros do Brasil é uma instituição de nível nacional com 60 mil jovens participando desse grande movimento de cidadania. Estamos juntos no Conselho Nacional de Juventude e também juntos com todas as pessoas que têm deficiência ou lutam pelas pessoas serem incluídas junto com a Escola de Gente. A gente espera que o painel seja de grande valia para todos nós.

Fábio Meirelles - Coordenador: Daniel Cara.

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Daniel Cara - Instituto Sou da Paz/ RJ: Boa Noite a todos e todas. Em primeiro lugar, é um prazer integrar, fazer parte da I Conferência de Pessoas com Deficiência. Isso significa um avanço muito grande para o Conselho Nacional de Juventude. É um Conselho muito novo que está começando agora a sua caminhada, mas que graças à participação da Escola de Gente, uma participação substantiva no Conselho, é um Conselho completamente tomado, preocupado, dedicado à questão da acessibilidade e é um pouco disso que a gente vai conversar hoje aqui. Eu espero que a gente consiga fazer um debate para que não seja um monólogo da mesa e que a gente consiga de fato fazer um diálogo com todos e todas.

Fábio Meirelles – Coordenador: Claudia Werneck

Cláudia Werneck - Superintendente Geral da Escola de Gente: Boa noite. Eu queria agradecer a presença maciça dos amigos companheiros e companheiras nessa sala. Queria agradecer também ao Antonio Carlos Sestaro, que acolheu a proposta da Escola de Gente, nessa oportunidade realmente única na história do nosso país, por ocasião da Conferência, que fez com que nós uníssemos o Conselho de Pessoas com Deficiência, o nosso CONADE, com o Conselho Nacional de Juventude, pela convicção que nós temos que, sem trabalhar, sem atuar muito próximo à juventude do nosso país, nós estaremos desperdiçando anos da mudança que tanto almejamos, de práticas inclusivas em relação a qualquer grupo que se sinta ou que realmente esteja em situação de desvantagens.

Fábio Meirelles – Coordenador: E agora, vamos passar para as falas para a gente depois ter o nosso debate. Daniel.

Daniel Cara - Instituto Sou da Paz/RJ: Como eu disse, a área de juventude hoje a gente tem começado um trabalho intenso de construir políticas públicas no Brasil para a juventude. É uma área que é nova e que parte de um diagnóstico nacional importantíssimo que analisa que todos os grandes programas nacionais, sem exceção, têm entre os jovens as maiores vítimas. Então se você for pegar desemprego, educação, questão do acesso à educação de qualidade, a questão da saúde, a questão da moradia, habitação que, por exemplo, nos países de primeiro mundo é muito fácil o jovem conseguir sair de sua casa e começar uma nova vida sendo jovem ainda, quer dizer, tendo oportunidade de lazer e vivendo outras oportunidades na vida, analisando quais são os caminhos que ele pode tomar de carreira. E no Brasil isso não é possível. Mas principalmente a gente tem um problema muito grave que é a questão da violência que no Brasil hoje, infelizmente, se pratica um genocídio coletivo. 70% dos homicídios no Brasil atingem jovens e 80% dos autores dos homicídios são jovens também. Então, infelizmente, hoje o Brasil vive uma situação de ser um país que quem mata e quem morre é na verdade a futura geração do país, é na verdade quem vai consolidar o país para os próximos 20, 30 ou 40 anos.

E o Conselho Nacional de Juventude faz parte dessa conquista que é a área de juventude, que a temática das políticas públicas de juventude conseguiu estabelecer no país. Ele é um Conselho novo, um Conselho que tem quase um ano de vida. Ele foi empossado em agosto, a Lei é de fevereiro do ano passado, então é um Conselho muito recente mas é um Conselho que tem uma vantagem muito grande: é um conselho formador de políticas públicas. O que significa isso? É um Conselho que não tem só jovens, é um Conselho intergeracional, é um Conselho que envolve diversas temáticas e é um Conselho gerador de políticas públicas. Então, é um Conselho que não se preocupa no sentido de deliberar sobre uma determinada política ou administrar um fundo, que vários outros Conselhos seguem esse caminho. Mas é um Conselho que procura refletir, pensar, servir como uma caixa de ressonância da sociedade brasileira em relação aquilo que toca a juventude.

E nesse sentido, como o Conselho tem várias temáticas tratadas, ele decidiu trabalhar para construir uma Carta de Políticas Públicas, fazer um documento que subsidiasse a formulação, tanto no

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nível nacional quanto no nível estadual e municipal de políticas públicas de juventude, ele decidiu constituir Câmaras Temáticas. Então é um Conselho que tem hoje três câmaras temáticas que articulam as políticas de juventude.

A primeira Câmara Temática discute a questão do desenvolvimento integral do jovem que é educação. As temáticas que compõe essa câmara são: educação, trabalho, tecnologia da informação que hoje é fundamental para o desenvolvimento do país e para os acessos plenos dos direitos, principalmente os direitos de informação, de comunicação, basicamente Internet e outras tecnologias e a questão da cultura. Então essas são as temáticas tradicionais de juventude.

Depois disso vem uma visão nova do Conselho, quando o Conselho cria uma nova perspectiva que é a segunda câmara temática, que vai pautar a questão da qualidade de vida, colocando dentro da qualidade de vida a questão da saúde, que normalmente não é trabalhada dessa forma mas a OMS – Organização Mundial de Saúde, já defende que saúde é uma questão de qualidade de vida, não epidemiológica, não remediativa. A questão da saúde, a questão do lazer que tanto o jovem pode ter outras formas de divertimento como ele pode ter uma vida plena, um acesso pleno aos direitos. E a questão dos esportes. Então a câmara temática envolve isso.

Vocês percebam que as câmaras temáticas procuram evitar o paradigma da caixinha. Então quem discute educação vai lá discutir educação; quem discute trabalho vai lá discutir trabalho. Tem que todo mundo fazer esforço para discutir todas as temáticas.

E por último que é a câmara temática que eu, o Fábio e a Carmem participamos – a Claudia participa da câmara 1 – é a câmara de vida segura que é de direitos humanos: vida segura e valorização da diversidade, que a idéia é discutir como o jovem pode ter respeitado a sua diversidade e ter acesso pleno aos direitos. Então por exemplo, o Brasil é um país que mata, tanto a política como outros jovens, a vítima do homicídio é o jovem negro, morador de regiões periféricas das grandes cidades. Então como você consegue trabalhar a segurança desse jovem? Como ele pode conseguir na verdade ter o direito mais básico de todos os direitos que é o direito a vida, o direito pleno a vida, o direito a livre manifestação. Da mesma maneira trabalha a questão dos homossexuais, a questão dos homens negros,das mulheres negras e onde se aprofunda a questão do deficiente.

Agora o ponto importante do Conselho, que eu acho que essa é a grande vantagem desse nosso momento, desse nosso painel, é que o Conselho decidiu que em todas as câmaras temáticas, para não ficar só centralizado em uma, algumas questões poderão ser discutidas. Não na perspectiva daquilo que é transversal, mas na perspectiva daquilo que é estruturante da política pública. Então a gente discute a questão de gênero, que é a questão das mulheres em todas as câmaras temáticas; a questão racial e ética, então a questão das mulheres negras, dos homens negros, dos índios, das índias, dos quilombolas, dos ribeirinhos, em todas as câmaras temáticas; discute a questão da participação, porque para o jovem é importante ele ter espaço de participação política. Isso não é só uma necessidade geracional, mas também uma necessidade que tem um aspecto pedagógico nesse sentido de que se o jovem começa a participar politicamente, naturalmente ele desenvolve habilidades que vão contar no desenvolvimento do país no futuro, então tem um aspecto aí de conteúdo importante. A questão da religiosidade a respeito das diferentes religiões e aí é um tema que o grande mérito desse processo, e eu acho que é até o que faz com que a gente tenha esse painel e o Conselho Nacional de Juventude agradece a participação em nome da nossa diretora, eu posso dizer com total tranqüilidade que a gente agradece o convite para a participação nesse painel, que é uma questão estruturante para o Conselho e todas as suas câmaras temáticas, a questão da deficiência, discutir o problema da acessibilidade.

Nesse sentido, o que a gente tem percebido é que o Conselho é um Conselho aberto, ele não tem nenhuma temática. Como todas são respeitadas e todas têm seu espaço, não tem nenhuma temática que se sobressaia em relação ao outro. Nós tivemos um seminário em Fortaleza e a fala mais comentada que teve no seminário, uma das falas mais comentadas que teve no seminário foi uma fala do Fábio, quando ele disse que a questão da diversidade, a questão da especificidade não tem hierarquia. Então não se pode dar mais prioridade para a mulher em detrimento de um homem com deficiência; que não se pode dar prioridade para um homem negro ou para um homem indígena em relação aos demais. Quer

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dizer, dentro da diversidade de um país que pretende estabelecer uma igualdade plena de direitos, a questão da hierarquia, a questão de focos determinados e exclusivistas é uma questão que retrocede ao nosso sistema de direito. E nesse principio, graças ao trabalho substantivo da Escola de Gente, a questão da acessibilidade virou – dentro do Conselho Nacional de Juventude – um tema central. As grandes manifestações que teve e que mobilizou um grande número de conselheiros – isso eu posso dizer porque eu controlo votações, manifestações por e-mails, junto com a Regina que é presidente e o Danilo que é Secretário Executivo – foram dois casos que envolvem questões de acessibilidade. Na verdade o primeiro decorre do segundo. O primeiro numa reunião do Conselho, tinha acabado de ter sido completada a mesa diretora do Conselho, a gente teve um problema na saída do aeroporto com o Conselheiro Marcelo Iuca que é um conselheiro cadeirante, utiliza cadeira de rodas depois de um acidente que teve no Rio de Janeiro, vítima de arma de fogo e nesse dia, como é importante você ter um Conselho plural que tem diversas pessoas de diversas temáticas. Nesse dia, o que aconteceu? Coincidiu de o mesmo vôo que ele pegava estava nesse vôo a Claudia e o Fábio e o resultado disso é que a Gol – é Gol, depois eles podem dizer todo o processo porque senão fica muito extenso – mas a Gol cometeu uma série de equívocos gravíssimos em relação ao direito do Marcelo Iuca, ao direito básico e fundamental que é o direito de ir e vir, quer dizer, proibiu o direito de ir e vir do Marcelo, a ser atendido de maneira digna no avião, inclusive a Gol que uma semana antes tinha divulgado uma política de trabalhar com pessoas com deficiências, mostrando que era uma empresa moderna, sadia, inteligente, antenada com os novos tempos. E o resultado disso é que eu fiquei sabendo – isso aconteceu na sexta-feira e eu fiquei sabendo disso na segunda-feira – entrei em contato com o Marcelo e fiquei sabendo disso via o Boletim da Escola de Gente, Inclusive as Exclusivas, que soltou uma edição especial colocando vários pontos ali em relação ao que tinha acontecido com o Marcelo. E a partir daí, e não é só porque o Marcelo é um... e isso é um ponto muito claro do que aconteceu, não era só porque o Marcelo era do Conselho, era cadeirante e era artista de renome nacional. Na verdade a pauta quando chegou sempre foi de mostrar como é difícil para um jovem com deficiência – e aí a gente tem que pensar no nosso caso, na nossa especificidade que é a questão da juventude – como é difícil para um jovem deficiente ter de fato acesso ao mundo público. E aí a gente tem que pensar nesse sentido, o que é de fato o mundo público. Se a gente acredita, como nós acreditamos no Conselho, que todos devem ter direito a participação política, que a participação política é uma questão de direito fundamental, pensando só no aspecto político, esquecendo todos os aspectos talvez mais importantes e mais triviais que estão ligados ao cotidiano das pessoas, mas pensando no aspecto público de um Conselho que pensa política publica, qual é de fato o direito que um jovem com deficiência tem de participar – com direito não garantido por Lei mas direito efetivo – o acesso pleno ao direito que ele tem que participar das questões de decisão nacional. Como é difícil organizar, por exemplo, uma conferência. Eu imagino que para quem organizou,principalmente para o CONADE, como é difícil organizar, num país que tem uma série de debilidades de participação, uma conferência para pessoas com deficiência.

Então, pensando no caso do Iuca, o que a gente começou a perceber, a ai estimulando a Escola de Gente, várias conversas, conversas de sábado, domingo, o que a gente começou a perceber é que a questão da acessibilidade era uma questão que não fica restrita a uma pessoa portadora de deficiência. O que eu acho que mais me mobiliza em relação à questão da acessibilidade é de fato poder trabalhar a construção de um espaço público que de fato inclua todas as pessoas na medida em que todas as pessoas possam participar de maneira plena, possa falar, possam expressar, e esse é um pouco o desafio que se tem pensado.

Além disso um outro caminho que se percebeu nessa movimentação sobre a questão da acessibilidade, que eu acho que aí é o ponto onde a gente mais conseguiu avançar no Conselho, é a partir do caso do Iuca, o Conselho colaborou, enviou uma carta à GOL pedindo uma carta de repudio, fez se posicionando de uma maneira critica em relação à empresa; o Góes, da Escola de Gente, acompanhou o caso mas fundamentalmente o que aconteceu de avanço substantivo foi a primeira carta pública do Conselho. O Conselho teve três momentos públicos: o primeiro foi o apoio ao sim no movimento do desarmamento, até porque o jovem é o principal vitima da arma de fogo. O segundo é a lei do Aprendiz, que é uma Lei que garante o emprego ao jovem e que inclusive foi pautada a questão da deficiência na regulamentação da Lei do Aprendiz e por último o Conselho tem a primeira carta dele, a primeira carta

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substantiva, a primeira carta representativa para a sociedade, onde ele defende princípios que o Conselho advoga e luta por ele e defende em qualquer outro espaço que é a Carta de Março, que é uma carta de Acessibilidade que inclusive consta no material oficial da conferência. Se não me engano está no caderno. Isso significa que a questão da acessibilidade pelo trabalho da Escola de Gente e por ter conquistado todos os membros do Conselho, especialmente no campo das políticas públicas e já ter mobilizado jovens para essa questão, garante que daqui para frente, pelo menos no que tange a políticas pública de juventude, a questão da acessibilidade nunca vai ser esquecida.

Agora por exemplo, eu faço a gestão de um espaço em São Paulo e a coisa que eu mais tenho conversado na gestão do espaço é que ele é horrível, não tem nada de acessibilidade, quer dizer, é um espaço que é para ser público e ele não é público de fato ele é público pela metade. Quer dizer, isso só garante o acesso a um determinado grupo de pessoas.

Uma pesquisadora que faz parte do Conselho fez uma pesquisa e percebeu que não tinha incluído todas as questões relacionadas com deficiência. Então isso com certeza não vai acontecer mais.

Então, os documentos das câmaras temáticas todas, de todas as especificidades com certeza a deficiência é o que as pessoas mais lembram.

O resultado desse encontro foi que, se o movimento de juventude tem um aspecto muito particular, que é um movimento que está preocupado com as questões presentes do país, mas que também por ser de juventude, por envolver jovens, influencia o futuro, com certeza hoje a mobilização da juventude à questão da acessibilidade no que tange ao Conselho é completamente diferente. E na principal idéia que hoje a gente articulado no âmbito das políticas públicas que é a criação de um sistema nacional de políticas públicas que contemplem uma conferência – então eu já estou observando a conferência daqui para ter uma idéia de como tem que funcionar, quais as questões que a gente que avançar mais, como tem que ser feita a questão regimental, ou seja, aqui também está sendo feito um espaço de aprendizado – além do Conselho, eu tenho certeza que o sistema nacional de juventude vai avançar na questão de incluir a preocupação com a temática da acessibilidade como um ponto de prioridade plena.

E nesse esforço de construir de fato um país público eu acho que pelo Conselho nacional de juventude que quer muito se aproximar do CONADE, agradece o convite, agradece a Escola de Gente de fato, que é hoje constituir – inclusive na próxima monção que o Conselho vai lançar que a monção da reserva de vagas nas universidades, que é garantir que a questão da deficiência seja uma questão pautada na reserva de vagas, o caminho que a gente tem que fazer é de juntar pautas e unificar movimentos de luta. Quer dizer, não pode deixar de incluir dentro do CONADE a preocupação com o jovem deficiente, até porque o jovem deficiente é quem vai ter uma maior trajetória de vida daqui para frente e quem vai pautar essas questões. E aliás isso já nem é mais possível, que o Conselho nacional de Juventude nunca deixe de se pautar, nuca esqueça de que a questão da deficiência é uma questão prioritária, uma agenda efetiva de direitos, não no aspecto do direito específico mas no aspecto do direito estruturante, como eu coloquei, de fazer com que todos os espaços públicos de fato sejam públicos. Esse é que é o ponto mais importante em relação a essa aproximação.

Para finalizar eu agradeço a Escola de Gente pelo convite e eu espero que a gente consiga fazer essa ponte entre os movimentos de acessibilidade e os movimentos de juventude para que constituam essa pauta única, coesa, uma pauta de diálogo, uma pauta de luta que de fato essa seja uma prioridade para todos como é hoje para mim e para todo o Conselho nacional. Muito obrigado.

Fábio Meirelles – Coordenador: Obrigado Daniel, queria completar e dizer que o trabalho dos oficineiros da inclusão que são sistematicamente capacitados é esse, é tentar ocupar vários espaços, Conselhos, Conselhos estaduais, fóruns estaduais, participar de audiências públicas, na câmara dos Vereadores, na Assembléia Legislativa, no Brasil, em vários Estados, fora do país, para tentar transformar as políticas públicas de juventude, todos os programas e projetos governamentais e não governamentais, em políticas publicas inclusivas que ratifique a diversidade humana como um valor e que combatam a desigualdade social e econômica. Esse é o nosso principal objetivo sempre que a gente

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fala, sempre que a gente se posiciona, a gente está sempre tentando trazer reflexão e sensibilização para a questão da diversidade e da deficiência e mobilizar para que as políticas promovam a acessibilidade. Agora eu vou passar a palavra para Claudia.

Claudia Werneck - Superintendente Geral da Escola de Gente: Para nós esse ano, participando do Conselho, foi um ano de um incrível aprendizado, de poder exercitar a diversidade bastante na prática. Se a gente contribuiu com essa questão da acessibilidade, da deficiência, o que a gente aprendeu em relação a outras especificidades das quais a gente fala, mas é tão fácil falar mas na prática tantos dilemas surgem.

Eu me lembro de um momento no Conselho que foi lindíssimo, lindíssimo e eu me arrependi de ter me abstido. Antes de entrar um pouco mais profundamente na relação que eu quero propor eu quero lembrar esse fato que foi importante para mim. Quando o Conselho Nacional de Juventude lançou um concurso, a Secretaria Especial de Juventude lançou um concurso para textos acadêmicos, numa parceria com o CNPq para a juventude brasileira. E aprovar no Conselho esse concurso foi muito interessante porque ele exigia um nível de escolaridade e isso imediatamente deixava de fora pessoas com deficiência intelectual, algumas com deficiência. Enquanto eu pensava nisso, tentando me posicionar, porque ao mesmo tempo era coisa trazida, o resultado de um grande trabalho de articulação do Conselho onde as pessoas, Daniel, Regina, Danilo, todas são muitos interessados realmente nos avanços propostos. Enquanto eu pensava nisso uma pessoa representante do Grupo de Movimento Rip Rop, Lamartine, falou claramente – uma beleza que ela fala – falando com todo o respeito “Eu vou votar contra porque esse concurso deixa de fora as maiores autoridades do movimento Hip-Hop, os nossos letristas não podem participar”. E aí ele votou contra. E eu como não tenho experiência nenhuma do Conselho, na verdade é minha primeira experiência e eu assumo humildemente que eu não sabia que eu podia não votar. E acabei votando a favor, mas muito incomodada porque eu também queria que não tivesse o concurso e houve um compromisso de que outro concurso será feito de modo a contemplar realmente toda a juventude interessada em dele participar, e depois eu vi uma outra conselheira votar contra.

Estou contando isso para poder explicitar o que tem sido trabalhar num Conselho onde se tenta falar de diversidade na prática. Eu tenho a sensação de que quando a gente fala de conceito de diversidade a gente avançou um tiquinho. Mas quando se fala de política públicas inspiradas na diversidades, aí a gente está num tempo remoto, sem muita consciência do que seriam essas políticas públicas inclusivas inspiradas na diversidade, e que ao mesmo tempo combata fortemente a desigualdade social e econômica como o Fábio falou.

Mas para nós da Escola de Gente, e a idéia dessa reunião dos dois Conselhos aqui, do CONADE e do CONJUR, foi uma idéia compartilhada com a Isabel Maior, da CORDE, que também é conselheira representando do governo, prontamente acatada pelo Antonio Carlos Sestaro. E para mim é uma oportunidade de falar algo que eu venho pensando há muito tempo. Eu tentei falar de inclusão e tentei falar de inclusão para vários públicos na minha vida. Algumas vezes fui bem sucedida, outras vezes não. Passei por crianças, adolescentes, adultos, professores, médicos, passei por pessoas da Literatura Infantil. Em determinado momento eu pensei que ou eu encontrava um ator estratégico, um ator social estratégico social rápido, potente, com força suficiente para em poucos anos interferir no país ou eu ia na verdade morrer velhinha, bem sequinha, com a sensação de que na verdade eu tinha atacado o público errado.

Então eu comecei muito a pensar, principalmente quando eu ia nas cidades, no tempo que eu viajava mais em cidades pequenas, e eu via as famílias... eu sei que várias pessoas aqui representam famílias com pessoas com Síndrome de Down e outras deficiências, famílias com uma solidão acima da média e um esforço acima da média para tentar organizar na mentalidade daquela comunidade, implantar algo novo, realmente novo que garantisse direitos humanos a todas as crianças ali presentes, nascidas naquela comunidade. E eu imagina, há muitos anos já, mas nunca consegui colocar isso com maior clareza, que se a juventude daquela comunidade não fosse capacitadas na mesma medida em que as

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crianças era estimuladas, em que os professores eram acionadas, e depois mais tarde o Ministério Público passou a ser parceiro, que você teria brevemente uma geração de pessoas com deficiência mais bem cuidada, mais assistida por médicos da família em geral, não por conta do poder público, mas de algum modo abandonada. Abandonada por não ter sido reconhecida por sua geração como parte dela. Eu acredito que a juventude – acho que Daniel e Fábio podem explicar melhor o que é essa juventude que a gente fala, as especificidades, do que está acontecendo hoje no Brasil com a juventude – mas o que eu queria dizer que é a juventude do nosso país, pessoas entre 17 e 27 anos, 15 a 29 anos, eles são os próximos a ter filhos.

Vamos usar a juventude agora, vamos ser bastante egoístas. Não vou pensar em garantir os direitos a juventude. Vou falar como que nós mais velhos podemos utilizar a favor a transformação social almejada à força da juventude. Então a juventude é a primeira que vai ter filhos. Se você tem uma juventude com a mentalidade inclusiva, ao ter seus filhos, ao procurar escolas para seus filhos, vão ser parceiros do nosso movimento imediatamente, não vão procurar mais qualquer escola... não vão aceitar como eu ouvi no Rio na semana passada uma pessoa me falar que na Escola Particular do Rio está pedindo um teste que a criança faz com 1 minuto, 5 minutos, 10 minutos e que você tem uma nota em função da sua mobilidade, em função do choro, do batimento cardíaco etc. Seria até interessante uma escola que supostamente não dá conta de educar qualquer ser humano receber esse teste e depois perceber que sua filha tem Síndrome de Down. Então, o jovem que adquire essa mentalidade, na verdade ao ser pai ou ser mãe ele vai ter uma visão diferente da escola do seu país. Em geral os pediatras também são mais os mais jovens. Os professores primários também são os mais jovens. E vão estar em postos de trabalho rapidamente tomando decisões estratégicas.

Então, como que as famílias, os movimentos de pessoas com deficiências, as famílias de pessoas com deficiências se articulam ao movimento de políticas públicas que está sendo construído hoje no Brasil? De que modo isso pode ser possível para que de uma forma com muito mais impacto e estratégica, nós consigamos traçar alguma coisa a longo prazo que é bom para a juventude e que é bom para comunidade? Porque eu acho que nós, apesar de termos avançado, ainda temos muito trabalho pela frente.

Eu sempre fui militante, participei de movimentos estudantil e tendo recebido a incumbência na Secretaria do Estado de São Paulo de receber a Secretaria da Juventude junto com o Esporte que já existia e nós ganhamos de presente a Secretaria da Juventude e realmente, não querendo chamar de uma batata quente mas realmente é uma política pública e que não existia e não existe a política pública de juventude e eu acho que todos estão aprendendo, como o próprio Conselho tem quase um ano de existência, a nossa diretoria de juventude e acho que quase todo o país, todos os que encamparam e mesmo as Secretarias Municipais de Juventude, a gente está numa fase realmente de pensar junto para criar a política pública de juventude e crescer. Porque para que nós, na própria pele estamos sentindo, ela é uma construção nova e não existe, nunca se pensou. Mesmo... eu vejo na minha experiência que trabalho e sempre articulei muitos anos em movimentos estudantis e políticas públicas voltadas a parte mais política educacional, nunca se pensou na parte de acessibilidade, na parte do portador de deficiências. Sempre a política de juventude sempre a parte do deficiente ficou aos cuidados das mães, as mães sempre que articularam em montar uma política pública para seus filhos deficientes e correram atrás do prejuízo porque nunca existiu uma política pública de juventude para o deficiente.

Eu achei muito importante a fala da Claudia no que ela disse que é uma corrida atrás do prejuízo e principalmente de mudar uma mentalidade, de pensar a mentalidade de inclusão. Nessa fase etária é ideal. Então eu gostaria de perguntar e deixar para a mesa, para vocês, se vocês do Conselho Nacional, diante desse quase 1 ano de existência já tem uma política montada de como vamos começar a atingir a base, a atingir os Estados, os municípios, se já existe uma política de norteadora para que todos nós possamos abraçar a causa com vocês, partindo de uma visão de vocês ou se ainda essa fase ainda é um aprendizado geral e vocês precisam que as bases forneçam subsídios para que a gente possa começar a atuar.

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Fábio Meirelles – Coordenador: Vou pedir para eles falarem um pouco e pode ser que daí provoque mais algumas perguntas.

Daniel Cara - Instituto Sou da Paz: Eu acho que as perguntas foram muito boas. Acho que é importante, como era muito novo eu não sabia nem que caminho trilhar, então faltou acho que talvez uma conceitualização do que a juventude, aproveitando a proposta que a Claudia deixou para mim e para o Fábio.

Juventude – primeiro um pouco da história para responder e aproveito e respondo a pergunta da Solange. Juventude na verdade é um conceito social muito recente, é uma categoria social muito recente. Ela surge com força depois da 2ª Guerra Mundial quando os países começam a se desenvolver e se percebe que uma determinada faixa etária, que não é a faixa etária da infância, que é uma categoria que é descoberta no final do século XIX para o século XX, a infância é descoberta como uma categoria baseada no fato de que criança não pode trabalhar, criança tem que ir para escola. Então se cria uma categoria da infância, que é uma categoria que defende os direitos das crianças no sentido de terem acesso a escola, se prepararem, terem uma vida plena de lazer, divertimento e ter convivência familiar e escolar. Basicamente era isso. E a juventude ela se descobre como uma categoria a partir da 2ª Guerra quando se cria a indústria cultural e se percebe que uma determinada faixa etária precisava viver uma experiência que a gente chama conceitualmente, sociologicamente de moratória que é uma experiência onde se consolida a identidade.

Então basicamente a juventude é o momento em que se consolida a identidade, psicológica, identidade cidadã, identidade inclusive física, quer dizer, no momento em que você está esteticamente, teoricamente por aquilo que se conceitualizou e se defende, você está em sua plenitude física. Então é o momento em que você se descobre como ser humano, você se define como ser humano. E nesse momento se convencionou que não deve ser um momento de trabalho, de você partir para um trabalho que fosse um trabalho desgastante, tem que ser um momento em que você planeje uma carreira, planeje sua vida e que você tenha acesso básico à cultura e lazer. Então é aí que se constitui a juventude, principalmente no aspecto do lazer. É por isso que jovem é tão relacionado com divertimento, é tão relacionado com revolução porque é no momento em que está se pensando na sociedade que ele tem liberdade para decidir o que quer que seja.

Agora, esse conceito todo é pensando nos países de primeiro mundo, então é pensado na Europa, nos Estados Unidos... a revolução cultural que existiu na década de 60 ate 68; a revolução parisiense em 68; a revolução sexual; o movimento hipe é quem define isso. Só que num país de terceiro mundo, quando você cria uma categoria social e essa categoria social ela é absorvida e você não tem acesso pleno a direitos, você cria um problema. Por que qual é o mecanismo da revolta do jovem? Eu estava conversando isso com a Carmem hoje. O mecanismo da revolta do jovem é: eu tenho consciência que diversos jovens de classe média e de elite – isso para um jovem de periferia – eles tem acesso a qualquer possibilidade, eles praticamente estão inclusos no mundo, eles tem acesso a qualquer possibilidade que eles possam imaginar, tanto de construir uma carreira quanto de estudar nas melhores universidades do país, como inclusive de fazer uma viagem para fora, aprender a falar inglês, quer dizer, ele tem um acesso pleno. Para o jovem de periferia, por pior que seja o nosso sistema de educação, por pior que seja a televisão, por pior que seja a mídia, a mídia geral, a grande mídia, a mídia comercial, ele sabe, ele tem consciência de que os outros têm e ele não tem. Então essa fase de moratória que era para ser uma fase de desenvolvimento, passa a ser uma fase que é muito conflituosa, em que você convive com os problemas sociais de maneira muito difícil, de maneira muito pesada.

Eu trabalho no Jardim Ângela que era considerado um dos Distritos mais violentos do mundo e hoje é um dos distritos de São Paulo que mostrou a solução para os problemas da violência, muito baseado inclusive com a mobilização dos jovens. O jovem de periferia, o jovem que é a maior parte do país, que é a grande população do país, ele não tem, não consegue ter uma perspectiva plena. Então quer dizer, o trabalho que para quem é de classe média ou quem é de elite o trabalho é o início de uma carreira, para o jovem de periferia o trabalho é o início do acesso ao direito. Só trabalhando ele vai ter

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acesso a ir ao cinema, só trabalhando ele terá condição de ir para um parque de diversão, só trabalhando que ele vai ter acesso a transporte. E o maior problema da violência é o problema do transporte.

Agora se você pega toda essa questão e aproveitando o que o Julio falou, e coloca para o jovem com deficiência, isso fica potencializado a enésima potencia. O jovem surdo por exemplo, é um caso que quando o Júlio falou até me lembrei. Eu coordenei um projeto de Gregos que tinha numa escola um jovem que era surdo e ele não conseguiu manter no grupo, na escola porque a polícia muito violenta no Jardim Ângela, ainda hoje é muito violenta, ela não pergunta ao jovem o que ele está fazendo, não tem uma relação cidadã, o garoto era surdo e toda vez ele tomava uma geral, ele não respondia para a polícia e polícia batia mais nele. Isso foi para o Conselho tutelar, a gente fez uma mobilização, acabou que ele mudou de bairro e saiu do projeto e o contato se perdeu. E o que significa isso? Significa que se para o jovem de periferia ou para o jovem no geral, também o jovem de classe média começa a sofrer, principalmente o jovem homem. Não sei se o Fábio viveu isso mas, em geral todos os jovens universitários de São Paulo, quando tem alguns momentos de encontro com os jovens de periferia, também o encontro não é um encontro sempre pacífico. Muitas vezes você tem retaliação. E entre os jovens a violência é muito potencializada, muito mais presente.

Então se coloca todas essas questões que o jovem vive e coloca essas questões para a deficiência, você tem um problema muito complicado para trabalhar e que as políticas públicas, por mais que elas estejam avançando e por mais que elas pretendam avançar, se não tiver o estímulo, quer dizer, se não tiver encontros como esse a gente não vai avançar nunca. Então por exemplo, agora que o Julio falou, uma coisa que eu pensei é que na nossa Câmara Temática incluir uma preocupação em relação a vida segura no sentido da comunicação com a polícia por exemplo, que era uma coisa que nem passava pela minha cabeça. Uma outra coisa que eu estava conversando com a Carmem agora, só para se ver como esses momentos de encontro são momentos importantes, uma outra política que a gente pode defender e isso pode ser pauta dessa outra Conferência, dependendo de como for porque não sou especialista na área e nem vivo no dia a dia essa questão mas, se vocês disserem que é uma boa idéia dá para a gente batalhar, é que tenha nas escolas – a agora com a nova Lei de que amplia 1 hora de aula e essa nova hora de aula nacionalmente vai ser para matérias optativas, principalmente no ensino fundamental ciclo 1, que é o antigo primário e talvez o ciclo 2 supere também – uma coisa que a gente pode pautar é por exemplo, a questão da libras, dá para trabalhar isso como sendo matéria optativa. Não significa que todos vão ser obrigados a fazer mas vai ser uma matéria optativa. De repente pode até ser uma matéria obrigatória, porque um país só pode se constituir como um país de direito se ele consegue pensar que o direito não tem que se pensar que é uma população de 5%, mas você tem que na verdade pensar que sempre tem que alcançar os 100% da população. Então o argumento burro – e eu falo isso com muita raiva porque é o que a gente convive – o argumento burro na discussão de políticas públicas e aí leitura acadêmica do mestrado de como o estado pautava a política pública, o argumento que tem se fortalecido no Brasil é de que você tem pensar em grandes maiorias, você tem que atender a grandes maiorias, com a idéia de que o Brasil é um país que tem poucos recursos. Enquanto o Brasil continuar a pensar em grandes maiorias, ele nunca vai conseguir resolver as dívidas históricas que ele tem com os negros, nunca vai conseguir resolver o problema da violência doméstica com as mulheres e principalmente na relação com a deficiência nunca vai tratar isso como prioridade, porque não existe estatística boa. Como a questão da deficiência é invisibilizada porque as pessoas têm dificuldade de acesso, comunicação, fala, pronunciamento, como isso fica invizibilizado, você nunca vai ter uma estatística real de quantos deficientes existem no país. Isso é uma questão que a gente coloca sempre no Conselho. A gente não tem números seguros de quantos deficientes jovens existem no país, então a gente tem fazer política sempre para os 100% da população nem que uma ação seja por exemplo, colocar a linguagem de sinais, a libras como uma matéria obrigatória no ensino fundamental para que os jovens comecem a trabalhar com essa questão.

Então em relação ao que Solange e Julio... é muito difícil pensar em políticas públicas, mas o desafio ainda é um desafio de conceito. Só que a gente tem que fazer um desafio de conceito e um desafio de militância. Então a gente tem que procurar se reunir e procurar articular – e aí o Conselho acaba sendo um espaço privilegiado – mas por exemplo a Secretaria de Estado de São Paulo participar das reuniões do Conselho, as reuniões vão ser abertas, vai ter uma nessa semana 18 e 19; quem está em

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Brasília também participar da reunião do Conselho, ocupar as câmaras temáticas, porque é só nesses momentos de encontros que a gente vai construindo essas idéias de políticas públicas que é a partir da idéia que a gente vai analisar depois orçamento, possibilidade de viabilização, mas tem que tomar a questão da política como uma questão do cotidiano.

Eu fiquei muito revoltado porque eu ouvi num debate de juventude que dava a argumentação de que o voto é a grande arma do cidadão. O voto é uma arma do cidadão. Os outros 4 anos que a gente não vota em uma eleição, por exemplo, eles são os 4 anos mais decisivos. Um candidato quando ocupa um governo ele não é dono do governo, ele é representante. Então o estado é nosso, o estado não é da sociedade política é da sociedade civil. É a sociedade civil que inclusive fornece pessoas para a sociedade política. Então o desafio das políticas públicas ainda é um desafio de formulação até porque orçamento, essas questões todas só vem depois de uma formulação plena. A gente tem que se debruçar nesse desafio de formulação e o Conselho coloca que em agosto ele já tem que ter um documento para pautar, tanto o período eleitoral quanto para pautar referências de políticas públicas não só para o Estado mas para ONGS nos seus projetos e suas ações particulares.

E a questão da Leila que eu acho que é um pouco também da questão que a Claudia coloca. A vantagem de se trabalhar com jovem nesse sentido é que a gente tem uma... na câmara temática o que mais tem sido válido para nós e talvez a gente tenha que lançar campanhas e tenha que fazer com que não fique também só para os conselheiros, mas tem sido válido – e muitas vezes até pode parecer uma fala vazia, uma fala muito particularista – mas tem sido válida a convivência com as diferentes experiências. Então por exemplo, eu trabalhei uma vez com jovens com deficiência mental e eu acho que a preparação humana que eu tive em relação a isso, na verdade talvez a preparação mais forte que eu tive em minha vida de fato, é que eu tive a certeza de que eu não vou ter nenhum tipo de preconceito quando eu ver uma criança com deficiência mental. E eu saia com o meu afilhado que é uma criança que eu trabalhei nesse grupo, em todos os lugares que eu freqüentava com ele todo mundo me olhava com estranheza, ou então me olhava com aquela cara “nossa que bonitinho, ele está do lado de um garoto com deficiência mental”. Então me davam uma valorização para isso. Então quer dizer, o que eu acho que é a vantagem de trabalhar no Conselho, a vantagem de ter tido essas experiências e a vantagem que a gente pode promover fazendo com que de fato a gente construa um espaço público, que os jovens com deficiência possam ocupar, que é a preocupação do Julio, o que vai garantir é que na verdade a deficiência pode até ser diferente e de fato é diferente, mas ela não vai ser tratada como um jovem negro é diferente de um jovem branco, como uma mulher é diferente de um homem, o que a gente tem que fazer é normalizar, não no sentido negativo mas normalizar no sentido positivo a deficiência, fazendo com que na verdade a deficiência faça parte do cotidiano do país. Eu não vejo e eu trabalhei bastante com esses jovens com síndrome de Down, eles podem ter e sempre os educadores colocavam que eles têm dificuldade cognitiva pra isso, para aquilo, para aquilo outro. E nunca perguntaram – e aí eu falo como educador mesmo – nunca perguntavam para eles porque eles não podiam jogar futebol como outros jovens, que era a atividade que eu fazia, que era bem simples: levar eles para levar bola no Ibirapuera. E por que eles achavam, os pais principalmente, que os jovens com deficiência mental não poderiam ser bem aceitos por outros jovens que não tem deficiência mental? Então quer dizer, montar esses pontos de encontro, isso também é política pública, desde que essa política pública não seja tratada como assistencialismo, que essa não é a pauta, não seja tratada como um ato heróico, mas seja tratada como um ato normal do cotidiano, eu acho que a gente pode avançar nesse sentido.

Então essa mobilização, essa possibilidade dos jovens terem contato de fato, a gente promover os pontos de encontro de jovens com deficiência e jovens que não são deficientes, o que avança é um aspecto muito importante que não é no aspecto politicamente correto mas no aspecto de você reconhecer o outro como diferente no sentido de que de fato ele é diferente, mas igual como cidadão. Então é nesse sentido que eu acho que a gente pode caminhar.

Claudia Werneck - Superintendente Geral da Escola de Gente: Tentando responder as três colocações, eu acho que as idéias de Daniel são bem interessantes como estratégias. Eu acho que o nosso desafio, para nós é claro, a questão é interferir nas políticas gerais. Interferir nas políticas gerais é

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garantir participação como o Daniel também falou, aos processos que interessem direta ou indiretamente a juventude do país. E eu reparo e é uma coisa que me angustia muito, no terceiro setor brasileiro em relação as ONGS brasileiras levando em conta que a ONU e o Banco Mundial explicitam, atestam, escrevem, que você tem em torno de 600 milhões de pessoas com deficiência no mundo, você tem 400 milhões no país em desenvolvimento, tem 79 milhões e meio de pessoas com deficiência na América Latina e Caribe; você tem a convicção que a maioria dessas pessoas são crianças, adolescentes e jovens, ou seja, você tem um percentual enorme de pessoas com deficiência na pobreza, sendo que maioria dessas pessoas ainda está na idade da infância, adolescência e juventude.

E se você – e eu posso falar isso com toda a certeza – a maioria dos projetos de juventude no nosso país em regiões carentes não tem nenhum jovem com deficiência e acha natural não ter. Era esperado que no mínimo 50% dos jovens daquelas comunidades pobres tivesse algum tipo de deficiência. No mínimo 50%. Não tem nenhum e as pessoas não conseguem entender que isso é estranho. Não tem nenhum basicamente porque desde a hora em que os projetos são escritos e as políticas públicas são escritas, não é previsto nos orçamentos recursos para ajudas técnicas que são instrumental importantíssimo para dar conta na inclusão. É lógico que ajudas técnicas não garantem tudo, eu até as vezes fico muito preocupada como a gente fica seduzida pelo avanço tecnológico. Se você está numa sala, qualquer sala e vê interprete em línguas de sinais, cegos em Braille, total acessibilidade você pensa “nossa, que ambiente preocupado com a inclusão”. Se você entra num lugar que não tem nada disso você automaticamente pensa que as pessoas estão muito atrasadas em relação a inclusão. Mas eu parto do princípio que pode ser o contrário na verdade, porque uma coisa é você avançar numa pratica que não discrimine, então você aprende a não discriminar. Não discriminar é não dar acesso, é não garantir participação. Mas você pode aprender a não discriminar e continuar uma pessoa com todas as dificuldades inerentes a sua formação ou uma pessoa com muitas dificuldades em relação a pessoas com deficiência. Uma pessoa preconceituosa. O preconceito não é um problema se ele não se transforma numa prática discriminadora. E o problema é que as nossas políticas públicas são discriminadoras. E muitas das vezes são discriminadoras porque não dá para você depois mexer nessa política pública se não tem orçamento para ajudas técnicas, para o tipo de formação característica. O exemplo bem banal que a gente tem dado muito, muito, muito, no terceiro setor brasileiro. Se uma ONG – e eu estou falando de pessoas sérias, competentes, não estou falando de pessoas que não sejam sérias; estou falando de lideranças no Brasil premiadas no exterior como altamente comprometidas com seus idéias e com valores para dar conta desses ideais. Se você vai fazer, por exemplo, uma comunicação numa rádio comunitária, numa comunidade pobre para formar lideranças locais. Vamos supor numa comunidade baixo DH, menor que 3, você tem o projeto e o recurso para formar lideranças jovens. Você em geral, como convoca essas lideranças? Pela Rádio Comunitária. Então você vai na Rádio Comunitária e fala “Amanhã vai ter reunião, tantas horas no lugar tal, você que me ouve agora é bem vinda, não deixe de vir, vai ter lanche, vai ter isso, vai ter aquilo, vai ter dança...” Se você não fala “avisa seu amigo surdo que não ouve esse programa que ele também está sendo convocado, e que chegando lá amanhã... “ aí entra o dinheiro que se não for previsto... “e chegando lá amanhã vai ter intérprete de língua de sinais, ou vai ter fonoaudióloga.. e você que é cadeirante, pode ir na reunião. Você está sendo convocado também porque o lugar da reunião da juventude tem acessibilidade. Não é só para entrar não, é para ir ao banheiro. Vai poder ir ao banheiro sim porque não pode ser privado o seu direito a participação. E você que é cego e baixa visão, amanhã quando formos distribuir todo o material, vai ter o material em Braille, vai ter material em meio digital para você poder utilizar no seu grupo de inclusão, no seu grupo digital na sua comunidade. Se você não participa de nenhum grupo, mas tem o seu gravador em casa, não se preocupe porque nós vamos distribuir fitas com conteúdos dos folders. Então estão todos convidados, todos e todas. Como aprendemos lá. “ Mas uma coisa é você perceber que a sua convocação para os jovens da sua comunidade é capenga, no seu imaginário você não está imaginando no fundo, que o jovem com síndrome de Down possa ser uma liderança ou um jovem surdo possa ter uma liderança... porque se você acreditasse nisso você jamais acharia que uma mera convocação para uma rádio comunitária padronizada é eficaz.

O que nós temos percebido é que, mexer em políticas públicas para que elas se tornem inclusivas desde a fase do orçamento, depende muito dos processos de comunicação. A gente hoje

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trabalha com comunicação pela não discriminação, comunicação para um desenvolvimento humano inclusivo sustentável porque a gente começa a perceber que reside na comunicação, talvez para nós sim da Escola de Gente, reside ali nos processos de comunicação os entraves principais. Não são todos mas talvez os principais para garantir que você perceba que está sendo chamado para alguma coisa, para você decidir se quer ou não quer ir. Você não entra na pauta da convocação. Então eu acho que as estratégias têm que ser muito no sentido de adotar uma função sentinela para perceber de que modo nós falamos, quando nós escrevemos, quando nós expressamos sentimentos, ações e desejos, nós imediatamente deixamos de fora grande parcela da comunidade e principalmente humanidade com deficiência que reside na pobreza.

Fábio Meirelles – Coordenador: Perguntar se alguém quer fazer alguma colocação, alguma pergunta assim... o microfone chegou. A gente podia fazer então vocês quatro e a gente conclui... é preciso de microfone? Não?

Maria das Neves Marães Moutinho/AM: Eu sou a professora Neves, sou do interior do Amazonas e eu fiquei prestando muita atenção a fala da colega. E antes de reportar eu quero parabenizar ao Conselho Nacional da Juventude, que é muito bom quando a gente já está na minha idade com mais de 60 anos, a gente fica preocupada: E agora o barco, quem vai comandar? E aí é muito bom, gratificante quando a gente vê a juventude envolvida. Então a gente já fica “Ah, o Barco vai talvez singrar esses mares com mais velocidade, com mais eficiência em comparação com anos atrás .” A tecnologia que tem hoje é muito diferente não é? Então estão de parabéns e continue. Me reportando ao que ela falou sobre a eficiência das nossas crianças. E isso também é uma preocupação nossa lá interior, mostrar que os nossos alunos deficientes são capazes. Lá nós não usamos o termo eficiência, usamos o termo capaz. Então como nós fazemos isso? Com feiras mostrando o nosso artesanato produzido por eles; quando nós temos o nosso grupo de capoeira, de dança, nós fazemos aquela dança bem bonita e vamos para o SESC e cobramos o ingresso, todo mundo entra e vai ver. Não vai ver uma capoeira mal feita não, vai ver uma coisa bem treinada. O nosso grupo de dança vai vestido a rigor, se vão dançar Funk vão vestidos daquele jeito... então o nosso esporte nós temos um dos melhores times de futebol de salão, o futesal do Brasil. Todos os anos, nós temos a nossa Olimpíada Nacional, então nós fazemos a nossa Olimpíada Estadual para pegar o índice olímpico e nós vamos mostrar que nós temos capacidade. Na educação, nós fundamos a nossa associação há 10 anos e esse ano de 2006, 2005, nós tivemos a nossa primeira aluna terminando o ensino médio. Só uma que chegou durante 10 anos, mas chegou! Então nós também procuramos mostrar que nós temos preocupação com a integração desses deficientes, que eles tem que serem respeitados, a sociedade tem que aprender a respeitá-los. E os surdos, os auditivos é uma preocupação muito grande. Então o que fizemos? Todos os sábados, de 7 as 11 da manhã, nós temos algo sobre libras. É um filme, uma apostila – que é muito difícil a gente conseguir as coisas – a cada professor do município foi dada uma vaga para ninguém dizer “ah, eu não quero esse auditivo porque eu não sei libras”. Então ele está tendo essa oportunidade. E eu mais uma vez parabenizo o Conselho Nacional da Juventude e mandem alguma coisa para nós também.

Maria da Graça Reis Nascimento “ Maranhão: Eu sou Graça Reis, sou militante há 22 anos que é quando minha filha completa 22 anos, porque o meu caminho era outro. Eu era militante do canto coral da música clássica. E eu tenho uma filha com paralisia cerebral proveniente de erro médico... Eu estou pensando que estou começando a esquecer isso não é? Foi erro médico, paralisia cerebral. Então, eu quero sugerir ao Conselho Nacional, alguma coisa que se passa comigo, que seja trabalhado as famílias que eu ainda não tenho consciência que ela está jovem. Ainda agora eu tive um impacto porque ela disse: “Mãe, eu sou adolescente”. Isso talvez seja para uma mãe alguma coisa que satisfaça o medo, que esconda o medo da pessoa. E está sendo muito difícil para mim, pode crer. Um outro assunto importante também é oficina de arte para esses adolescentes. Quantos garotos que já passaram da adolescência que ficam pichando as paredes, porque eles não sabem como desenhar. E isso eu já falei em

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vários encontros que participo que é importante trabalhar a arte, a arte da pintura, a arte do desenho, grafite... é preciso que a gente desenvolva a tendência da arte nesses jovens, jovens da periferia. Mesmo aqueles que procuraram outros caminhos, o tóxico... Eu escuto sempre a Jovem Pan, lá em São Luis, falando que a falta de dialogo, a falta de afeto para os filhos é o que causa a busca pelos tóxicos. Eu também penso o seguinte: que a gente deveria trabalhar desde o ensino infantil que é o Jardim de Infância para mim, que eu também ainda sou dessa época do curso primário, tem que se trabalhar a cidadania, a filosofia, as práticas públicas, porque os nossos conceitos estão diferentes. A família é que educa mas a escola é quem tem que fortificar a família que está fragilizada, os meios de comunicação são uma força potente. Ao invés de darem programas educativos, levam a violência, a sexualidade exacerbada. A gente assiste a essas novelas, a esses filmes, a gente fica horrorizada. Hoje em dia a minha filha diz assim: “Mamãe, eu já tenho idade de assistir esse programa Linha Direta e minha psicóloga disse que eu posso assistir”. Quer dizer, isso aí eu paro para pensar... eu acho que é isso mesmo que ela já pode não é? Mas daí eu falo “Taiane, vai dar muita violência na sua cabecinha....” “Não mamãe, eu sei que isso é só simulação”. Ela já aprendeu a ler com 18 anos. Eu sou pedagoga, não de magistério, de orientação educacional mas sou professora, eternamente professora porque o pedagogo nunca será chamado de doutor, será sempre professor. Então ela diz assim “mamãe, eu assisto, eu sei que isso é simulação, isso não é verdade”. Ela diz que não é verdade porque ela não assistiu, não vivenciou. “Minha filha, você tem cuidado”. “Esses filmes, ah, eu já assisti isso, eu sei de tudinho.” Então isso me assusta, mas quando eu penso que ela é jovem, não é mais adolescente... quer dizer, quando ela está me falando que ela ainda é adolescente mas é um negócio que é importante trabalhar a família.

Um outro assunto que eu quero também falar ...

Claudia Werneck/RJ: – Graça eu vou pedir para você concluir para a gente poder ouvir as outras pessoas.

Graça Reis do Nascimento “ Maranhão: meu esposo diz que eu sou prolixa, meu pai dizia que eu era prolixa também. Aí eu sou prolixa por desconto porque eu passei 30 anos gaga sem falar, só observando não é? E eu quando pego eu falo muito. Mas eu acho que quem sabe um dia nós nos encontraremos. Obrigado.

Participante não identificada: Para o Daniel especialmente, uma coisa que eu não estou vendo aqui na Conferência, a gente vê muitos pais de pessoas com deficiência mental mas a gente não vê as pessoas com deficiência mental e eu queria que vocês cuidassem desse assunto também no Conselho da Juventude. È muito importante porque a pessoa com deficiência mental às vezes é mais lenta, ou entende mais devagar as coisas não quer dizer que ela não está pensando ou que ela não tem direito de participar ou de ser incluída em políticas públicas para a juventude e em toda a vida.

É uma coisa assim, eu tenho adolescentes em casa, minhas filhas são pré-adolescente e nessa fase todo mundo quer ser igual a todo mundo. Então eu acho que a deficiência mental realmente é a mais discriminada, junto até com os surdos porque a fala é mais comprometida, você não consegue... porque o cego tudo bem, dois minutos depois já está incluído, cadeirante também... mas o problema da comunicação eu vejo como maior empecilho para inclusão.

Então queria assim, um dia ver algum Conselheiro no Conselho da Juventude com alguma deficiência mental, não apenas cadeirante, cego, enfim...

Antonio Carlos Sestaro “ CONADE:Fábio, Daniel, Claudia e Carmem. Quero agradecer a vinda de vocês aqui, contribuir com esse trabalho de vocês. E Daniel, falar que o CONADE, posso falar pelo CONADE, que teria muito interesse também em conversar com o Conselho da Juventude. Seria

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bom se você pudesse, depois a gente entrar em contato para agendar a participação de vocês no CONADE.

Eu queria perguntar qual é hoje a amplitude no Brasil do Conselho. Se tem em estados, municípios... qual essa amplitude.

Se vocês têm algum plano de atuação nas universidades, nas escolas. A OAB tem uma comissão chamada Jovem Advogado que faz palestra nas escolas sobre os direitos das pessoas. Então se vocês tem esse tipo de planejamento no Conselho. É essa a pergunta.

Ângela “ Anatel: Meu nome é Ângela, eu trabalho na ouvidoria da Anatel. Vocês devem ter ouvido na imprensa, saiu o regulamento do serviço telefônico fixo comutado, foi bastante divulgado e dentro desse regulamento saiu um capitulo específico sobre acessibilidade porque nós na ouvidoria interagimos com CORDE, fizemos um trabalho conjunto com Ministério Público, Procuradoria Geral da República e conseguimos colocar um capítulo com o Centro de Intermediação e foi um trabalho que ainda vai ter continuado. De acordo com o Plano Geral de Metas de Universalização, 2% dos telefones públicos tem que ser adaptados para cada tipo de deficiência e muitas pessoas não sabem disso. Então se precisar de um telefone para surdo adaptado, tem uma forma e nós vamos agora a regulamentação de como o surdo vai requisitar esse telefone.

E uma outra questão que eu queria colocar também é com relação ao Fundo de Universalização das Telecomunicações, porque tem 4 bilhões que estão parados, não estão sendo utilizados para disseminação da informação, até pela Internet e quem é responsável pelas políticas públicas de telecomunicações é o Ministério das Telecomunicações. A Anatel apenas implementa. Então nós temos todo um trabalho desenvolvido pela Anatel a partir do ano de 2000, 2001, e que todo o trabalho foi paralisado, vocês devem ter visto pela televisão e eu acho que vocês poderiam atuar para que esse trabalho fosse recomeçado. Eu acho que tem que dar continuidade, é muito dinheiro para ficar parado e se esse dinheiro... se as empresas que depositam esse fundo que é 1% da sua receita operacional elas podem requerer de volta. Então esse dinheiro que está sendo usado para superávit primário, cerca de 98% está sendo perdido pela sociedade por falta, eu acho até, de uma mobilização da sociedade. Eu acho que todos podem se unir e fazer isso valer. Eu acho que consegue.

Elisane “ São Paulo: Boa Noite, meu nome é Elisane. Eu coordeno políticas públicas para pessoas com deficiência na cidade de Ribeirão Pires, São Paulo. Eu queria sugerir a vocês, principalmente o pessoal do Conselho que atendesse não só o convite do Sestaro mas também que se articulasse com outros Conselhos, com outros movimentos. Porque o que eu tenho percebido na gestão de coordenadoria de políticas públicas para pessoas com deficiência é que a gente tem tentado mudar o paradigma, a busca é essa, de tentar mudar o paradigma social cristalizado há muito tempo, cheio de cacos históricos e filosóficos, mudando uma sociedade formada para segregar a pessoa considerada diferente, considerada fora do que Caetano diz “Narciso acha feio o que não é espelho”. Nesse trabalho quanto mais a gente puder articular forças melhor.

Eu tenho um projeto na minha coordenadoria chamado ANDANÇAS, onde a gente leva pessoas com deficiência para passear. O verbo é passear. A gente não está preocupado com o que vai acontecer. A idéia é sair de casa, ver e ser visto. E para minha surpresa a maior parte dos jovens que passeiam com a gente nunca saíram de casa. Eu levo pessoas com paralisia cerebral com 18, 25 anos... Nós fomos ao Teatro há algum tempo atrás, ao Teatro Cultura Artística e uma garota de 18 anos extremamente esperta, muito articulada... a gente foi no sábado e a mãe ligou e disse que insistiu que ela fosse porque ela falava assim: “eu estou com mal pressentimento, alguma coisa vai acontecer”. Porque ela nunca havia saído de casa a noite, ela nunca havia saído de casa sozinha, ela não sabia o que era um teatro. E quando se apagou a luz um garoto cadeirante de 25 anos dizia para uma das pessoas do apoio “eu preciso ir ao banheiro agora” porque estava apavorado com o escuro.

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Então se a gente pudesse se articular com outros Conselhos, cultura, educação, esporte, seria muito bem vindo. A juventude precisa de muita coisa e a juventude com deficiência precisa de muito mais coisa ainda.

E mais uma sugestão só para concluir, queria lembrar que na questão da comunicação, que vocês também pensasse não só no Braille, na LIBRAS que são extremamente importantes, mas também na comunicação suplementar alternativa, no uso do PCS, do BLISS, enfim, de forma de comunicação que a gente consiga atingir pessoas com autismo, asperger, afásicos, enfim, uma gama de pessoas que a gente consegue se comunicar de maneira bastante fácil mas que é muito pouco difundido. Obrigado.

Keila: Eu queria só relatar um pouco de uma experiência nossa do campo. Nossas crianças são crianças que viveram no isolamento que nem escola especial recebia. Paralisados cerebral, deficiências que não têm diagnósticos. Então nós fizemos o seguinte, eles são protagonistas porque no primeiro momento nós tivemos uma sede onde nós mães passávamos uma tarde com os nossos filhos e trazia crianças da comunidade, envolvia com atividades com as nossas crianças para que houvesse um convívio, quebrasse um pouco o preconceito.

Nós fizemos uma atividade interessante na época das eleições. Nós fizemos partidos e cada partido tinha um candidato a prefeito e dois candidatos a vereador. E nós saímos para fazer as campanhas políticas dentro das escolas. “Pessoal, nós vamos começar a entrar nas escolas sem querer querendo. Vocês vão fazer a campanha, chamar os jovens para virem votar. Vocês vão falar sobre a proposta que vocês tem, cada candidato.” Então quatro candidatos a prefeito: Deficiente mental, cadeirante, paralisado cerebral. A gente saiu empurrando 6, 7 quarteirões, indo nas escolas próximas municipais e estaduais para eles fazerem a campanha. No dia da eleição a comunidade foi votar, parecia uma eleição de verdade. Era de 8 horas às 5 da tarde, 318 pessoas foram votar. As pessoas vieram com o numero anotado para votar e eu disse que as únicas pessoas de confiança para compor a mesa da votação eram os próprios candidatos porque as mães não eram confiáveis. Eu deixei lá fora mas ficaram fazendo boca de urna. Foi muito interessante, foi uma tarde muito divertida. Elegemos o nosso prefeito eleito que é um paralisado cerebral de 17 anos que até os 16 anos viviam dentro de uma rede e o único contato que ele tinha era com a televisão, ele conhece toda a programação da televisão, ele realmente trabalha. Porque uma das condições do candidato... eu disse “olha, o nosso prefeito não vai poder ficar com as pernas em cima da mesa não. Ele vai ter que falar lá fora pelos colegas”. Ele vai para audiências públicas, audiências do FUNDEB no nosso município; ele participa de todas as audiências do FUNDEB que é um Fundo que vem para educação que está sendo barrado e durante esse ano a gente está numa luta para que esse fundo venha, porque cobre crianças de 0 ano ao ensino médio. Porque o FUNDEF é só o ensino fundamental. Então é para serem incluídas todas essas crianças. Ele realmente participa. Ele está fazendo capacitações da prefeitura no município, sensibilizações com os professores... é o nosso prefeito que vai dar depoimento. É chamado pelo município para dar depoimentos quando tem muita resistência dos professores, “tem que trazer o Davi”, aí nós levamos o Davi e ele amolece todo mundo, explica a questão da inclusão e consegue conquistar a categoria para inclusão. Quer dizer, é esse protagonismo deles realmente falarem por eles. O que aconteceu dentro da escola dele? “Keila, a Diretora quer falar contigo porque ela queria que você falasse com a prefeitura para ver se conseguia as adaptações para a escola!”. “Eu Davi? Você vai fazer isso, não sou eu que vou fazer. Lute pela sua escola. Você quer o que na sua escola? Faça e ponha num ofício”. Ele está numa felicidade porque ele fez um oficio e recebeu uma carta da prefeitura dando um retorno, já foi profissionais lá... porque foi ele que conseguiu.

E ele antes minha gente, tinha medo de lavar as mãos fora de casa. Era uma criança que tinha medo, receio porque podia adoecer. Se não fosse uma água trazida de casa. Mas hoje ele está criando a independência dele, está tendo voz. Ele é chamado para audiências e os deputados vão cumprimentar a fala dele, todo mundo sai para falar com ele. É isso que a gente precisa dar aos nossos jovens, é essa a voz. Porque isso é autoestima que vai para cima e que eles vêem que realmente podem conseguir nessa participação. Esse que é o trabalho mesmo que a gente quer colocar. Por isso que a outra mãe falou, eles eram para estar aqui, crianças e adolescentes com deficiência. Infelizmente isso depende da família

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porque se a família está fragilizada como aquela mãe colocou aqui, aí isso é que prende um pouco eles porque a família também está precisando desse suporte.

Fábio Meireles “ Coordenador: Obrigado Keila. Ela vai concluir para a gente fechar.

Maria Tereza Antunes “ Recife: Eu sou Maria Tereza Antunes, de Recife. Represento a Associação de Pais e Amigos de Portadores da Síndrome de Down, filiado a Federação Brasileira. Parabéns a mesa, realmente essa trabalho de vocês eu já conhecia e é maravilhoso. Mas eu queria dizer que já fui contemplada com todas as perguntas, apenas minha curiosidade é saber: - Esse Conselho é consultivo ou é deliberativo e a composição desse Conselho? Eu acho que ninguém fez essa pergunta e eu queria que vocês informassem. Obrigado.

Fábio Meirelles “ Coordenador: Eu vou pedir para os nossos palestrantes se colocarem e responderem as perguntas e fazerem as reflexões finais.

Daniel Cara “ Instituto Sou da Paz: Bom, vamos lá, começando pelos últimos. O Conselho é consultivo, na verdade é um Conselho que segue a nova tradição do governo Lula que os Conselhos são consultivos mas tem força de formulação de políticas públicas e é muito ouvido dentro do governo. Mas ele é um Conselho consultivo. A composição dele é de 1/3 do poder público que significa que tem o poder municipal, o poder estadual, fórum de gestores de juventude, Ministério Público... o único sistema que não está representado é o sistema de justiça. Mas praticamente todos os outros sistemas, a Câmara dos Deputados está representada. Então é poder público no seu sentido mais pleno, das grandes agencias de governo municipais, estaduais, federais... respeitando o pacto federativo. E interessante isso. E os 2/3 restantes é da sociedade civil, então a sociedade civil tem a maioria no Conselho. Então são 60 conselheiros, 60 conselheiros que trabalham muito. Para vocês terem uma idéia são uma média de 70, 80 e-mails por dia no Conselho. Então é um Conselho muito intenso, muito denso que tem uma alta participação. A gente precisa avançar na participação do governo que não está muito alta e a gente tem feito toda uma mobilização nesse sentido.

Sobre as perguntas aqui, a primeira do Antonio Carlos, a gente tem todo o interesse em se aproximar do CONADE. Eu acho que a gente pode fazer duas coisas: na próxima reunião do Conselho vai pela primeira vez um Conselho visitar o nosso, então a gente pode fazer que na próxima reunião ordinária o CONADE nos visite, faça uma fala sobre acessibilidade. Eu acho que a gente poderia até ter pensado nisso antes na carta de Acessibilidade, teria sido uma boa não é? Mas agora a gente tem que tentar fazer de outra forma. E também a gente teria todo o prazer em sendo convidado, participar do plano do CONADE de discutir, aprender, como vocês se organizam.

O Conselho é nacional e a idéia agora é que tem como meta fazer para o próximo ano, não para esse primeiro ano de gestão que acaba em agosto e setembro, mas para o próximo ano seria criar uma cartilha para formação de Conselhos estaduais e municipais e a gente tem uma idéia que começa a se solidificar de criar um sistema nacional de políticas públicas de juventude, que tem uma Conferência e tem uma permanência na idéia do plano nacional de juventude está tramitando na câmara e a idéia é que ele seja aprovado, seja votado, tramitado, regulamentado, entre em ação e essa Conferência avalie esse plano. E além disso que a gente estimule no plano, no próprio plano que o Estado só recebe recursos de política pública de juventude do governo Federal se tiver um Conselho e uma Secretaria, Coordenadoria ou uma agência de juventude. O município é a mesma coisa. E então a idéia é que o sistema também crie condicionalidade, então, é o que a gente tem tentado trabalhar.

Eu achei uma coisa interessante na fala da Ângela, no Fundo de Universalização, que é uma coisa que a gente pode pensar nas Câmaras Temáticas é que o fundo de universalização da ANATEL garanta a universalização de fato. Então, que todos os brasileiros e brasileiras sejam contemplados o que

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significa trabalhar a questão da acessibilidade nas telecomunicações. Isso dá para a gente estudar. O Conselho tem poder nesse sentido de analisar orçamento, essas coisas, e mesmo recursos federais. A gente tem feito muito pouco disso inclusive. Isso poderia ser uma primeira coisa.

Em relação à colocação da Elisane, de Ribeirão Pires, eu tive uma reunião na Coordenadoria de Juventude e a gente tem pensado em fazer algumas coisas, algumas articulações que talvez valesse a pena você entrar na rodada e tudo mais. Você colocou uma questão que a gente concorda. Hoje o Conselho ele foi formulado por indicação o que significa que se identificou a sociedade brasileira as grandes temáticas de políticas públicas de juventude e que pegou pessoas que trabalhavam de maneira estratégica com juventude nessas temáticas. A Escola de Gente foi considerada uma instituição estratégica pela Secretaria Nacional de Juventude e foi chamada para discutir a questão da acessibilidade dentro do Conselho. Agora a idéia é que a próxima composição do Conselho em 2007 ela seja feita talvez, no novo modelo. Talvez por que isso contempla uma discussão interna do Conselho e uma discussão interna do governo. Agora tem eleição e tem que ver como vai ser esse processo, mas eu acho que isso tem que ser colocado. Hoje nós temos um conselheiro e o que acontece? A idéia é que seja 15% na temática da deficiência, então a gente tem avançar nesse sentido, identificar lideranças jovens que não sejam lideranças jovens como a gente está sempre acostumada a ver que aparecem sempre na sociedade então.

Perfeito. A Graça voltou. Eu achei que a sua fala é bastante interessante e na política pública eu acho que tem que ser criativo. Eu vivi uma experiência de política pública que é muito diferente do que o Brasil já viveu de política pública que foi o Estatuto do Desarmamento. Todo mundo fala “Violência é um problema geral, tem que trabalhar educação, saúde, mobilizar sociedade para resolver esses problemas.” Depois que o Estatuto do Desarmamento foi aprovado e entrou em vigor, mesmo com a derrota do Artigo 35 no referendo que era só um artigo que a gente estava votando, inclusive isso foi um processo ruim dentro do referendo. Eu particularmente critiquei muito porque votar um artigo da maneira que a gente votou foi equivocado. Mas de qualquer maneira se colocou a vontade democrática e o povo é soberano e ponto final. O artigo 35 não foi aprovado, agora o curioso do Estatuto do Desarmamento 99% já estava garantido e desde que quando entrou em vigor, foi diminuída absurdamente a violência. Em São Paulo tem uma entrada de violência gradativa que agora vai chegar a 70% do índice de homicídios anterior. Tem uma lei, um mecanismo de lei que revolucionou a questão da violência, não trabalhando nas questões fundamentais porque é a questão fundamental é importante e eu acho que todo mundo quer mais saúde, mais educação. Só que isso é uma palavra vazia porque não tem como implementar. Só perguntar hoje para um educador e falar qual é a política publica de educação revolucionária, eu tenho certeza, ele não vai conseguir responder; nem o Ministro de Educação. Então é aí que a gente tem que avançar em políticas inteligentes e como você fala que trabalhar com as famílias é importante, de repente isso é uma política de fato inteligente. Por exemplo, para as mães jovens – isso eu sempre falo, falei no CONEB que é o encontro da UNE, que ia discutir as políticas da UNE e tal – para mãe jovem a política de educação mais revolucionária não é vaga. Porque hoje você tem, com o PROUNI inclusive você tem muito mais vagas na faculdade do que você tinha no passado numa tendência de crescimento. A política não foi evolucionada para mãe jovem no sentido da educação e creche porque ela não consegue estudar. Então de repente uma política que trabalha com as famílias na questão da acessibilidade não sei, não sou estudioso nessa área, mas pode ser uma boa alternativa. Então tem que ver aí como... Quando eu trabalhei com jovens com deficiência mental eu percebi que a família era um empecilho, porque a família era muito machucada com a deficiência, tinha dificuldade de trabalhar como a Leila colocou, então talvez isso seja bom. Estou falando como impressão, não sei como a gente pode caminhar. Agora talvez uma política de juventude para trabalhar algumas questões com a família é mais estratégico do que trabalhar diretamente com jovem. A gente não pode limitar caminhos, a gente tem sempre que ter caminhos abertos, janelas para políticas publicas. Bem acho que respondi todas não faltou nenhuma. Queria agradecer rapidamente, acho que foi muito. Júlio. Vai lá Julião, pergunta. Pode.

Então, isso é na verdade o que a gente tem que conseguir construir. Eu acho que o encontro de hoje eu aprendi muito, vou levar esse aprendizado para o Conselho. É bom porque com essa convivência eu vou me sentir mais seguro em entender sobre o tema, foi ficar mais interessado sobre o tema e eu

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acho que o Conselho cada vez mais está mais interessado sobre o tema, está preocupado com o tema. Poucas vezes a gente vê uma ocupação de uma instituição que Sou da Paz e Escola de Gente, isso tem que se reverenciar mesmo. Que conseguiu palpar um Conselho que tem 60 cadeiras que são 60 temáticas e essas 60 temáticas uma se sobressai. Então isso de fato se sobressaiu. O fato de ter sido a primeira carta não é pouca coisa. Essa idéia de Escola que a gente trouxe que para mim pode ser que para o movimento de deficiência não seja o mais progressista mas para mim é o mais progressista de garantir o universal de fato que é o universal para todos, garantir o público de fato que é o público para todos, tratar a questão da acessibilidade como uma questão estruturante, essas questões acho que mobilizam o Conselho a pensar políticas públicas que atingem todos os jovens com deficiência. Acho que a participação do Julio, por exemplo, me fez pensar uma coisa aqui que o caso mais grave que tem para um jovem é ele não conseguir encontrar outro jovem. O fato de ele precisar de uma pessoa que tenha uma comunicação intermediária para ele conversar com outro jovem, inviabiliza a possibilidade dele ser jovem de maneira plena. Porque o que o jovem mais faz é conviver e se encontrar. Os jovens com deficiência mental é a mesma coisa. Então esse tipo de aprendizado é o que a gente vai levar para o Conselho. A resposta pronta a gente não tem, mas pelo menos a gente está sensibilizado, está tocando e principalmente está mobilizado para construir políticas públicas que sejam de fato inclusivas. Eu agradeço por vocês terem me incluído nesse debate, não entendo muito sobre o tema, mas nesse sentido conseguiu ser inclusiva no sentido de incluir pessoas como eu e a Carmem que não tratamos desse tema mas, que a gente veio aqui para aprender e eu acho que a gente aprendeu muito. Muito obrigado.

Cláudia Werneck “ Escola de Gente: Eu queria dizer que o trabalho da Escola de Gente na verdade foi muito construído pelo Fábio que é o legítimo representante da juventude lá da Escola de Gente entre outros jovens. O Fábio é jornalista e trabalha conosco há muito tempo, foi nosso estagiário. [...] Não precisam provar nada. Porque eu tenho muito medo quando a gente está junto e parece assim que a pessoa com deficiência, qual que é a deficiência, que é melhor aluno tem mais valor. Entenderam? Na verdade, é para eu avaliar muito o desenvolvimento dos nossos filhos, sobrinhos, etc., pelo desempenho escolar. Isso em relação a deficiência principalmente deficiência intelectual fica mais claro. Então é assim, o cara com deficiência que não quer fazer nada, que não é brilhante, que não é alegre, que não é sensível, que não quer fazer nada, tem o mesmo valor do que aquele que sobressai, que vai para a mídia... porque senão a gente começa a entrar na segunda questão que eu tenho um pouco de receio que tem haver com essa relação eficiência/deficiência. Qual é o contrario de eficiência? Ineficiência! não tem nenhuma relação com deficiência! Então quando a gente começa a querer falar que a pessoa é eficiente como contraponto de deficiente, a gente na verdade está reforçando o que a gente acha que o teu deficiente é ineficiente, entendeu? É um equívoco muito comum no país e a gente tem trabalhado muito isso na mídia, fala muito disso no Conselho, essa coisa de falar “ah, a minha deficiência é que eu não sei ler...” Não, a sua ineficiência é que você não sabe ler. “ah, a minha deficiência é que eu não sei dançar”. Não, a sua ineficiência é que se manifesta na dança. Então ter cuidado porque senão a gente entra meio no desespero de tentar provar que as pessoas com deficiência merecem as coisas. Na verdade não é questão de merecer. Existiu, tem direito. Não tem que discutir mais nada. E é esse o contexto que a gente tem que trabalhar para a construção de qualquer coisa, eu acho, em termos de políticas públicas inclusivas.

Carmem Barreira “ União dos Escoteiros do Brasil: Nossa. Como Daniel falou, muito obrigado por todos e todas ter nos incluído aqui hoje. E a partir de hoje é um marco. Nós podemos continuar nos comunicando, o Daniel está colocando ali o e-mail do Conselho de juventude, os nossos e-mails e estaremos atentos não só no Conselho mas em nossas instituições, no nosso dia a dia onde nós também estamos nos nossos espaços, a que todos tenham realmente direitos e que esses direitos possam ser juntos, todos nós juntos encontrando, conversando... e que a nossa sociedade brasileira possa ser cada vez melhor. Muito obrigado a todos.

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Fábio Meirelles “ Coordenador: Antes de a gente sair daqui lembrar que a gente tem dois conteúdos que a Escola de Gente produz que estão a disposição gratuitamente no stand da Federação Brasileira que é o Manual da Mídia Legal e o Manual sobre o Desenvolvimento Inclusivo. Acabaram? Eles acabaram mas estão a disposição no site da Escola de Gente que é www.escoladegente.org.br e solicitar que eles são distribuídos gratuitamente. E no caderno de textos dos subsídios para a discussão, na pagina 88 a gente tem a Carta de Março, a Carta do Conselho Nacional de Juventude sobre Acessibilidade, inclusão da Juventude com Deficiência; e na página 102 a gente tem um texto sobre o Desenvolvimento Inclusivo retirado do Manual sobre o Desenvolvimento Inclusivo. Mas os nossos conteúdos também estão a disposição em Braille, em meio digital, em todas as formas, em português e espanhol gratuitamente. Podem acessar o nosso site. Eu vou distribuir o nosso folder para a gente manter contato e todo mundo receber o nosso boletim. Muito obrigado e até a próxima.

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