Procedimentos de cura e suas similaridades imersão em vários textos do antropólogo escritor...

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Universidade Federal de São Carlos Departamento de Ciências Sociais Graduação em Ciências Sociais Curso de Introdução à Antropologia Atividade Avaliativa de conclusão de curso Empreendimentos de Cura e suas Similaridades David Bruno Narcizo R.A: 510440

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U n i v e r s i d a d e F e d e r a l d e S ã o C a r l o s

D e p a r t a m e n t o d e C i ê n c i a s S o c i a i s

Gra duação e m C iê nc i a s S oc i a i s

Cur so de In t roduçã o à An t ropo log iaAt iv ida de A va l i a t i va de conc l u sã o de cu r s o

Empreendimentos de Cura e suas Similaridades

David Bruno NarcizoR.A: 510440

São Carlos, 2012

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Empreendimentos de Cura e suas Similaridades

Uma rápida imersão por vários textos do antropólogo escritor Claude Levis-Strauss em

função da obrigatoriedade de apresentação de um material de comprovação da conclusão do

curso de iniciação à antropologia na UFSCar, me surgiu alguns questionamentos referente à

magia.

Não obtive contato com procedimentos mágicos além de práticas mágicas das religiões

de matrizes africanas no Brasil, destas a que se denomina como Umbanda ou, mais vulgarmente

conhecida como Macumba que, para amenizar o impacto do fato de muitos dos que as criticam,

também buscarem soluções mágicas mediante incursão em rituais para obtenção de riqueza,

sucesso emocional/sentimental e cura de pequenas doenças, chamam-na também de benzimento.

Porém, de formação religiosa cristã, essas práticas são, no o meio social que frequento tabus

intocáveis, más, segundo a proposta de Levi-Strauss, onde a tríade assertiva está no fato de

haver consentimento por parte do xamã, do indivíduo que procura a ação mágica e do público

ou grupo social que acredita no sucesso da prática miraculosa, destaco que há similaridades

entre essas práticas e as religiões cristãs, além de também encontrar pontos de congruência nos

procedimentos medicinais científicos, diferente, porém, na questão de organização do

significante e do significado.

Quanto as práticas mágicas e medicinais: Como pode um acreditar, realizar atos

mirabolantes de cura, sucesso profissional e financeiro? Em fim: Há porventura, semelhanças

entre as práticas miraculosas de “terreiros de macumba”, pastores curandeiros nos meios

religiosos cristãos e a figura do médico na sociedade ocidental?

***

Durante o debruço na bibliografia lembrei, após a narrativa dum procedimento

miraculoso no texto O feiticeiro e sua magia de Claude Levi-Strauss, de um fato milagroso da

Igreja Mundial do Poder de Deus na figura xamãnica, do líder religioso Valdomiro Santiago

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onde, após uma série de mimeses corpórea, uma garota de uns dez ou doze anos, que não se

locomovia por algum tempo, passou a andar, a princípio com certa dificuldade, mas

rapidamente saiu correndo. Além desse há diversos testemunhos de pessoas que afirmam terem

recebido dádivas miraculosas em círculos religiosos cristãos. Interessante é que acontecem

rapidamente e na frente de muitas testemunhas.

Diferente dos xamãs das religiões de matrizes africanas e de nativos brasileiros, que

também realizam práticas mágicas com fins milagrosos, exceto as práticas das igrejas

Internacional da Graça e da Igreja Universal, sendo interessante salientar que o Bispo Macedo

ter tido experiências com práticas de religiões de matrizes africanas antes de sua conversão e

que a Igreja da Graça tenha se originado na igreja Universal, não usam nenhum objeto mágico,

a não ser seu próprio corpo que mescla gritos e urros e uma partitura corporal que na maior

parte das vezes, surtem resultados.

Não há nenhum mecanismo que prove a fidelidade e seriedade do xamã, havendo, como

também encontrado no autor que me refiro desde o começo do texto, a grande possibilidade de

fraudes, porém, mesmo que haja fraudes, tacito é a realização do “milagre”. Não há outra forma

de explicar tal fenômeno, a não ser recorrer aos efeitos psicológicos que essas práticas surtem

nessa tríade, quase que aristotélica: xamã, aspirante e público.

O xamã, primeiramente, acredita que o fenômeno pode acontecer dessa forma

materializa uma série de ações que leva tanto o aspirante quanto o público a associação desses

atos a uma escola de xamãs, ou seja, mediante os urros e gritos pode-se associá-lo a um líder

religioso das diversas ramificações das igrejas cristãs; uma vestimenta típica, uma série de

elementos ingeridos durante um ritual e ervas para causar cheiros pode-se perceber uma prática

de Umbanda ou Candomblé.

O aspirante à cura, vendo nesse sacerdote a possibilidade de alcance de dádivas, mas só

acredita e o busca em função da forma que esse xamã se apresenta para a sociedade e seu grau

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de aceitação nesse meio social.

No conflito desses dois atores, encontra-se um ponto de conflito ou instabilidade, visto

que, quando entra no ritual, o aspirante não possui a cura e o xamã, que além de gozar de todas

as suas habilidades naturais, ainda, principalmente para o censo comum e para o aspirante,

possui um poder divino e miraculoso, assim:

Xamã = 2Habilidades

Aspirante = - 2Habilidade

X(2h) +A(-2H) = 0

A busca do aspirante é, por meio da habilidade milagrosa, alcançar a habilidade natural,

essa é a odisseia rumo à estabilidade.

Durante o conflito há o público, um coletivo de pessoas que, por meio da tradição

xamãnica, acredita que haverá efetivamente o milagre.

Essas práticas são na verdade procedimentos psicossociais de saber e tradição coletiva

que, quando postos em contato, ativam um pensamento mágico coletivo esse, com

procedimentos não científicos, porém, como na ciência, há uma margem de erros, mas possuem

também acertos, materializam o metafísico na matéria física.

Assim, sem fazer juízo de valor, questiona-se o “há acertos!”, “mas como?”.

Esse acreditar que há, tanto nas civilizações tidas como primitivas quanto nos povos

civilizados, engloba o pensamento selvagem. Mas, enfim, o maior questionamento, é como pode

um mesmo mecanismo ou máquina de pensamento, desenvolver mecanismos ou estruturas de

pensamentos tão diferentes e que, fazem indivíduos de diferentes sociedades acreditarem em

diferentes coisas e esse tal acreditar, faz existir, mesmo que existam num campo limitado, ou

seja, num saber coletivo e transcendental, que o indivíduo inserido num grupo social, permitiu-

se assimilar? Ou seja, um fato social total na tríade (aqui aristotélica) A eficácia simbólica/O

feiticeiro/sua magia.

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Duas práticas mágicas atuam numa mesma sociedade, a sociedade capitalista

multicultural, com suas ramificações. Tanto na macumba quanto nas religiões cristãs, existem

diferenças internas. Nas duas há a liberdade de, após um tempo de iniciado nas práticas

religiosas, o iniciado pode abrir seu próprio espaço religioso. Nas religiões cristãs não há data

definida, mas um código de assimilação da liturgia, ou seja, cantos, rezas e mimeses corpóreas,

além dos mitos relativos aos rituais e explicação sígnica do mundo. Nas religiões de matrizes

africanas, salvo algumas raras exceções, o tempo mínimo é de sete anos, pois após esse tempo,

o iniciado faz a sua primeira obrigação. Um ritual de aniversário seguido de um ritual restrito

aos iniciados, feita a obrigação, o individuo pode abrir seu próprio Terreiro. Já no caso dum

médico, para ser iniciado ele passa por uma graduação em medicina de quatro ou cinco anos e

passa por um tempo de treinamento quanto à aplicação das práticas de cura e “expurga” dores,

esse tempo é chamado residência.

É provado que tanto os rituais mágicos de tradição europeia, africanas e indígenas,

quanto os meios científicos dos médicos, curam, porém, há um ponto de intersecção das três

práticas. Tanto na prática mágica quanto na cientifica, esse ponto de intersecção está no campo

psicológico dos dois atores, médico/paciente ou xamã/paciente.

A figura do médico ou do xamã traz tanto uma expectativa de cura quanto o conforto

trazido pela esperança, esse duplo psíquico, pode ativar uma tremenda ação fisiológica que traz

a cura ao doente ou ameniza a dor. Não é só o remédio que cura, mas o acreditar que tanto o

xamã quanto o médico, dependendo da sociedade, pode curar, também cura. Há uma intersecção

do material e o transcendental (visível e invisível) que realiza a cura.

A semelhança entre esses dois tipos de provisão, está na figura. A figura do médico ou

do xamã traz em si uma série de significados tradicionais contidos dentro de uma sociedade,

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que, no momento que entra em conjunção com o indivíduo, após as suas práticas ou, ritual,

dentro de uma margem de erros, acontece o fenômeno.

A figura associada a uma série de significados é muito significante dentro de uma

sociedade. Todos da sociedade ocidental eurocêntrica acreditam que, ao ir ao médico, obterá a

cura. Todos sabem que o médico pode errar, porém, ninguém acredita que errará no momento

que estará a realizar seu empreendimento, salvo em sociedades que esse “xamã euro-ocidental”

está em descrédito pelo fato de que a maior parte de seus empreendimentos não surtira

resultado; da mesma forma que um xamã a partir do momento que seu empreendimento não

surtir resultados, este é excluído do grupo e passa a ser motivo chacota no meio social em que

este fora inserido.

Excluído do meio social onde além de relações sociais e afetivas, fazia relações

econômicas, retirado do principal meio de sua sobrevivência, há relatos de que chegam muitos a

loucura e a morte.

Tanto médico quanto xamã traz em si uma força que vem do inconsciente coletivo, que

no momento do empreendimento, a união do visível e do invisível, pode realizar a cura.

***

Na universalidade das relações econômicas do mundo capitalista, a necessidade de

convívio de muitas forças de trabalho dentro de uma sociedade com unidade econômica,

colocou em conflito diversas culturas, assim, foi necessária a criação de um pensamento

inclusivo e de aceitação do diferente. Nesse ambiente conturbado que de um lado há as práticas

do sagrado com seus procedimentos mágicos e de outro, as práticas cientificas da medicina,

coloca em conflito o médico (como representante da cura mediante procedimentos científicos) e

as procedimentos mágicos nos povos descendentes culturalmente de europeus ou adeptos das

tradições africanas ou ameríndias. Porém, talvez, como necessidade natural do indivíduo numa

imersão em práticas e criação de mitos que expliquem o inexplicável, cria-se, mesmo no meio

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“civilizado” com pensamento científico, práticas transcendentais. Nessas práticas, o homem

encarna seres e elementos metafísicos que são materializados no corpo do indivíduo em roupas,

sons e mimeses corpóreas, além de lançar mão de uma série de utensílios e ervas que o meio

social e religioso tem como sagrados. Nesse ambiente, nasce no inconsciente, um querer poder

fazer que, o indivíduo acredita que pode realizar atos além das leis da natureza.

Mas, há um ponto de conjunção tanto nos meios civilizados quanto nos primitivos, esse

ponto é a mente humana que com os mesmos mecanismos, chega diversos fins. Nessa relação

com o concreto, o Homem tem das mais variadas respostas, ou mitos, as quais podem ser

estranhas para uma cultura e natural para outra. Dessa forma, pode-se concluir que a sociedade

é um emaranhado de significantes que, a partir das relações sociais, criam-se diferentes

significados que depende dum fato social total, ou seja, a forma que o individuo assimila todos

os signos de uma cultura no momento que ele está inserido numa determinada sociedade. Tanto

o mago/xamã e suas praticas é resultante de significados que ativam a crença coletiva, quanto a

medicina é resultado do simbólico, assim tem-se a crença na figura do médico.

A sociedade humana é composta por muitos bichos estranhos, cabe a nós intelectuais

tentar, com nossa limitada capacidade de síntese, explicar, em fim... significados!

Bibliografia

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CAVALCANTE, Simone Gadelha, Entre a ciência e a reza: Estudo de caso sobre a

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CE. Introdução pp 01-06. Tese de Mestrado em Ciências Sociais. Universidade Federal Rural do

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