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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Psicologia PROCESSO DE SIGNIFICAÇÃO DO TRABALHO PARA DIARISTAS ATUANTES NA CIDADE DE NATAL, RIO GRANDE DO NORTE Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira Natal 2017

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

PROCESSO DE SIGNIFICAÇÃO DO TRABALHO PARA DIARISTAS ATUANTES

NA CIDADE DE NATAL, RIO GRANDE DO NORTE

Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira

Natal

2017

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Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira

PROCESSO DE SIGNIFICAÇÃO DO TRABALHO PARA DIARISTAS ATUANTES NA

CIDADE DE NATAL, RIO GRANDE DO NORTE

Dissertação de mestrado elaborada sob a orientação

do Prof. Dr. Pedro F. Bendassolli e co-orientação da

Profa. Dra. Tatiana de Lucena Torres, apresentada

ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como

requisito parcial à obtenção do título de Mestre em

Psicologia.

Natal

2017

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Oliveira, Kamilla Sthefany Andrade de. Processo de significação do trabalho para diaristas atuantesna cidade de Natal, Rio Grande do Norte / Kamilla SthefanyAndrade de Oliveira. - 2017. 147f.: il.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grandedo Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programade Pós Graduação em Psicologia. Orientador: Prof. Dr. Pedro F. Bendassolli. Coorientadora: Prof.ª Dr.ª Tatiana de Lucena Torres.

1. Trabalhadoras domésticas. 2. Diaristas. 3. Processos designificação (Psicologia). I. Bendassolli, Pedro F. II. Torres,Tatiana de Lucena. III. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 64.042.4(813.2)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -CCHLA

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Dedico este trabalho a todas as donas de casa, diaristas ou não.

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Agradecimentos

Não é sobre ter

Todas as pessoas do mundo pra si

É sobre saber que em algum lugar

Alguém zela por ti

É sobre cantar e poder escutar

Mais do que a própria voz

É sobre dançar na chuva de vida

Que cai sobre nós

É saber se sentir infinito Num universo tão vasto e bonito

É saber sonhar1

Sempre devaneei lendo os agradecimentos das dissertações e teses alheias, porque,

quando você se deixa levar pela imaginação, se consegue sonhar acordado; e eu me imaginava

devendo tantos agradecimentos que não via a hora de um dia expressar formalmente tamanha

gratidão pelas escolhas que fiz, mas também pelas pessoas que escolhi para percorrer esse

caminho comigo.

Por isso, não esperei findar a construção dos elementos textuais para que eu pudesse

dar início aos agradecimentos, pois o ato de agradecer, ao longo da minha caminhada, foi

primordial para que eu pudesse empreender novos passos.

O conteúdo das minhas palavras de agradecimento ao fim da minha graduação foi de

infindável alegria e agradecimento a Deus. Do mesmo modo, me despeço dessa caminhada:

“Deem graças ao Senhor, clamem pelo seu nome, divulguem entre as nações o que Ele tem

feito” (1 Crônicas 16:8). Obrigada, meu Deus, minha fonte de coragem, que sempre esteve a

me surpreender e me presentear com as melhores oportunidades.

Não é sobre chegar no topo do mundo

E saber que venceu

1 Música “Trem Bala”, de Ana Vilela.

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É sobre escalar e sentir

Que o caminho te fortaleceu

É sobre ser abrigo

E também ter morada em outros corações

E assim ter amigos contigo

Em todas as situações1

Agradeço às participantes desta pesquisa, as diaristas, cujas histórias de vida muito me

emocionaram. Sem vocês, a qualidade deste trabalho não seria a mesma. Ao SINE, em nome

de Joana D’arc, Jacirema, Miranilma e Suzy, que propiciaram conforto no campo de pesquisa.

Em especial, ao meu orientador, Dr. Pedro Bendassolli, pela acolhida, por provocar

inquietações, pelas sugestões, por acreditar no que eu poderia produzir ao longo desse tempo;

e à minha co-orientadora, Dra. Tatiana Torres, por ter exercido o papel de intermediação entre

a minha formação como pesquisadora e o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho

(GEPET), e por muitas vezes ter sido exemplo de dedicação.

Aos meus colegas acadêmicos, Joeder Messias e Danielle de Gois, e àqueles que

compõem o Grupo de Estudos sobre Processos Psicossociais, Organizações e Trabalho

(GPPOT), em especial Jessica Rodrigues, Suzana Sarmento e Andressa Medeiros, pelas

palavras que evocaram força para continuar e por estarem sempre dispostas a pensar a

construção de um bom trabalho.

Não é sobre tudo que o seu dinheiro

É capaz de comprar

E sim sobre cada momento

Sorriso a se compartilhar

Também não é sobre correr

Contra o tempo pra ter sempre mais Porque quando menos se espera

A vida já ficou pra trás1

Obrigada, professora Dra. Isabel Fernandes, que em meio a tantas tarefas pôde

contribuir para a minha formação acadêmica.

Ao meu eterno orientador de estágio, Dr. Marlos Alves, pela sensibilidade e pelas

conversas fora de hora, porém, necessárias.

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Segura teu filho no colo

Sorria e abraça seus pais

Enquanto estão aqui

Que a vida é trem-bala, parceiro

E a gente é só passageiro prestes a partir1

Agradeço ao meu painho, Paulo Oliveira, e à minha mainha, Eliene Andrade, pelo

apoio, mesmo que silencioso, pela torcida a cada desafio e pelas orações.

Ao meu companheiro de todas as horas, Douglas Oliveira, com quem tenho

compartilhado meus sonhos, e com quem pretendo construir toda uma vida. Ter você ao meu

lado, sem sombra de dúvida, tornou meus dias e as batalhas mais leves.

À minha avó, Lúcia Andrade, que dedicou parte de sua vida a minha educação.

A todas as trabalhadoras domésticas que passaram em minha vida: Dalva, Leilse,

Marinalva, Lúcia, Catarina, Maria e Neide. Essa última ainda presente.

Àqueles que ajudaram a aprimorar esta dissertação, Fellipe Coelho-Lima, pela

disposição e disponibilidade em ler parte deste material, e aos professores Marcelo Ribeiro e

Maria Chalfin Coutinho, pelas contribuições decorrentes da qualificação.

À CAPES, por aliviar as dificuldades financeiras.

E à banca que aceitou esse convite.

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Sumário

Lista de Figuras ..................................................................................................................... viii

Lista de Tabelas ....................................................................................................................... ix

Lista de Siglas ........................................................................................................................... x

Resumo ..................................................................................................................................... xi

Abstract ................................................................................................................................... xii

Introdução ............................................................................................................................... 13

1. Trabalho doméstico ............................................................................................................ 16

1.1. Aspectos históricos do trabalho doméstico .................................................................... 16

1.2. Aspectos jurídicos do trabalho doméstico ..................................................................... 21

1.3. Um caso particular de trabalho doméstico: as diaristas ................................................. 25

1.4. Um retrato do trabalho doméstico.................................................................................. 29

1.4.1. O trabalho doméstico em números .......................................................................... 29

1.4.2. O trabalho doméstico no contexto de gênero .......................................................... 31

1.4.3. O trabalho doméstico no contexto do envelhecimento populacional ...................... 35

a) Concepções de desenvolvimento humano .................................................................... 38

1.5. Em síntese ...................................................................................................................... 39

2. Processo de significação ..................................................................................................... 40

2.1. Estudos sobre sentido e significado do trabalho ............................................................ 40

2.2. A teoria da atividade como subsídio para compreender o processo de significação no

trabalho ................................................................................................................................. 42

2.2.1. Sentido, significado e atividade em Vygotsky ........................................................ 43

2.2.2. Sentido, significado e atividade em Leontiev ......................................................... 46

2.2.3. Sentido, significado e atividade em Engeström ...................................................... 48

2.3. Em síntese ...................................................................................................................... 53

3. Delineamento da pesquisa e aspectos metodológicos....................................................... 55

3.1. Delineamento geral da pesquisa .................................................................................... 55

3.2. Local e perfil dos participantes ...................................................................................... 56

3.3. Instrumento, técnica e acesso às informações dos participantes ................................... 58

3.4. Procedimento de acesso às informações e cuidados éticos ............................................ 59

3.5. Procedimento de análise das entrevistas ........................................................................ 61

4. Resultados e discussão ........................................................................................................ 66

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4.1. Núcleos de Significação inferidos e sistematizados a partir das entrevistas .................. 66

4.2. Análise intranúcleo ........................................................................................................ 68

4.2.1. Núcleo de significação 1 – “Minha vida é essa; eu vivo só para trabalhar”:

reflexões sobre a trajetória ocupacional das diaristas ....................................................... 68

4.2.2. Núcleo de significação 2 – “Tem que se virar com o que tem”: ferramentas,

impedimentos e estratégias de enfrentamento para execução da atividade de trabalho .... 82

4.2.3. Núcleo de significação 3 – “Nem todos os lugares são iguais e nem todas as

patroas são iguais”: relações sociais no processo de trabalho ........................................... 94

4.2.4. Núcleo de significação 4 – “Eu não sobrevivo daquilo ali?”: a percepção da

atividade de trabalho da diarista ...................................................................................... 100

4.2.5. Núcleo de significação 5 – “Não queria ser aquela diarista solta e irreconhecível”:

repercussões das mudanças no mundo do trabalho sobre a atividade da diarista ........... 104

4.2.6. Núcleo de significação 6 – “A gente vai trabalhar pensando em fazer as coisas bem

feitas”: a constatação do trabalho final ........................................................................... 110

4.3. Análise internúcleo ...................................................................................................... 113

5. Considerações finais ......................................................................................................... 122

Referências ............................................................................................................................ 125

Apêndices ............................................................................................................................... 137

Anexos .................................................................................................................................... 143

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Lista de Figuras

Figura 1. Modelo de Atividade de Vygotsky ........................................................................... 43

Figura 2. Estrutura hierárquica da atividade em Leontiev. ...................................................... 47

Figura 3. Estrutura de um sistema de atividade humana ......................................................... 50

Figura 4. Sistema de atividade proposto por Engeström (adaptado) ....................................... 54

Figura 5. Articulação dos núcleos de significação para análise internúcleos ........................ 114

Figura 6. Estrutura do sistema de atividade da diarista. ........................................................ 120

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Lista de Tabelas

Tabela 1 Caracterização sociodemográfica das participantes diaristas ................................. 57

Tabela 2 Número de pré-indicadores e indicadores por entrevista ......................................... 66

Tabela 4 Trecho do indicador 1h ............................................................................................ 69

Tabela 5 Trecho do indicador 1e ............................................................................................. 70

Tabela 6 Trecho do indicador 1d ............................................................................................ 71

Tabela 7 Trecho do indicador 1b ............................................................................................. 72

Tabela 8 Trecho do indicador 1c .............................................................................................. 74

Tabela 9 Trecho do indicador 1j .............................................................................................. 74

Tabela 10 Trecho do indicador 1g ........................................................................................... 75

Tabela 11 Trecho do indicador 1k ............................................................................................ 76

Tabela 12 Trecho do indicador 1a ........................................................................................... 77

Tabela 13 Trecho do indicador 1l ............................................................................................ 77

Tabela 14 Trecho do indicador 1m........................................................................................... 78

Tabela 15 Trecho do indicador 1f ............................................................................................ 80

Tabela 16 Trecho do indicador 1i ............................................................................................ 81

Tabela 17 Trecho do indicador 2d ........................................................................................... 83

Tabela 18 Trecho do indicador 2a ........................................................................................... 84

Tabela 19 Trecho do indicador 2c ........................................................................................... 85

Tabela 20 Trecho do indicador 2j ............................................................................................ 86

Tabela 21 Trecho do indicador 2b ........................................................................................... 87

Tabela 22 Trecho do indicador 2f ............................................................................................ 89

Tabela 23 Trecho do indicador 2i ........................................................................................... 90

Tabela 24 Trecho do indicador 2e ............................................................................................ 91

Tabela 25 Trecho do indicador 2g ........................................................................................... 92

Tabela 26 Trecho do indicador 2h ........................................................................................... 93

Tabela 27 Trecho do indicador 3a ........................................................................................... 95

Tabela 28 Trecho do indicador 3b ........................................................................................... 97

Tabela 29 Trecho do indicador 3c ............................................................................................ 99

Tabela 30 Trecho do indicador 4b ........................................................................................ 100

Tabela 31 Trecho do indicador 4a ......................................................................................... 103

Tabela 32 Trecho do indicador 5b ......................................................................................... 105

Tabela 33 Trecho do indicador 5a ......................................................................................... 107

Tabela 34 Trecho do indicador 5c .......................................................................................... 108

Tabela 35 Trecho do indicador 6a ......................................................................................... 111

Tabela 36 Trecho do indicador 6b ......................................................................................... 113

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Lista de Siglas

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBO Classificação Brasileira de Ocupações

CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CLT Consolidação das Leis do Trabalho

DIEESE Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos

DST Divisão Sexual do Trabalho

EPA Espaço Profissional Autônomo

EUA Estados Unidos da América

GEPET Grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho

GPPOT Grupo de Estudos sobre Processos Psicossociais, Organizações e Trabalho

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INSS Instituto Nacional do Seguro Social

IPESPE Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas

MOW Meaning of Work International Research Team

MT Mato Grosso

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

OECD Organisation for Economic Co-operation and Development

OIT Organização Internacional do Trabalho

OMS Organização Mundial da Saúde

PEA População Economicamente Ativa

PEC Proposta de Emenda Constitucional

PT Partido dos Trabalhadores

RN Rio Grande do Norte

SIDRA Sistema IBGE de Recuperação Automática

SINE Sistema Nacional de Emprego

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

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Resumo

Independente do reconhecimento jurídico, diaristas são trabalhadoras que prestam serviços

por até dois dias por semana para um mesmo tomador de serviço. A ocupação das diaristas é

marcada pela manutenção de um sistema estratificado de gênero e classe, o que ajuda a

reforçar desigualdades, agregando-se a isso outra dimensão: a idade. O número de pessoas

que trabalham como Diarista vem crescendo, principalmente nos grandes centros

metropolitanos. Mais recentemente, esse tipo de trabalho tem sido estudado pela Psicologia

do Trabalho, notadamente pela Psicologia Social do Trabalho. Diante disso, esta pesquisa

busca compreender o processo de significação do trabalho para diaristas que atuam na cidade

de Natal, no Rio Grande do Norte. Baseando-se, essencialmente, na teoria da atividade, esta

dissertação entende significados como construções mediadas pela atividade concreta. Para

tanto, 12 diaristas foram entrevistadas e suas respostas foram analisadas a partir da construção

de Núcleos de Significação. Neste estudo, inferimos e sistematizamos a construção de seis

núcleos de significação que têm como foco: a) a trajetória ocupacional das diaristas; b)

ferramentas, impedimentos e estratégias de enfrentamento para a execução da atividade de

trabalho; c) relações sociais no processo de trabalho; d) a percepção da atividade de trabalho

das diaristas; e) repercussões das mudanças no mundo do trabalho sobre a atividade da

diarista; e f) a constatação do trabalho final. Na atividade humana da diarista há a prescrição

de objetivos, regras e procedimentos relacionados aos resultados desejados e como fazer para

alcançá-los, porém, esse sistema é dinâmico, o que pode levar a semelhanças e contradições

no próprio sistema de atividade. Conseguimos confirmar os resultados com boa parte da

literatura, principalmente nos quesitos que desvelam a precarização do trabalho, pois essa

ocupação ainda carrega muito das estruturas das desigualdades brasileiras. Além das

contribuições desta pesquisa, constatamos uma série de temáticas a serem estudadas

futuramente.

Palavras-chave: trabalhadoras domésticas; diaristas; processos de significação; teoria da

atividade.

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Abstract

Regardless of legal acknowledgement, there are female housekeepers who work on a daily

hiring system that allows them to work on a maximum of two days a week for the same

employer. Their occupation is marked by the perpetuation of a gender and social status

stratified system, which yields the reinforcement of inequalities, and brings another

dimension to the matter: age. The number of people with this sort of employment has been

increasing, mainly in the great metropolitan areas. Recently, this kind of labor has been

studied by Work Psychology, notedly by the Social Psychology of Work. Contemplating this

data, this research seeks to understand the process of signification of work for the daily hired

housekeepers, in the city of Natal, Rio Grande do Norte. Basing essentially on the activity

theory, this dissertation comprehends significances as constructions mediated by concrete

activity. Therefore, 12 daily hired housekeepers were interviewed, and their answers analyzed

according to the construction of Meaning Cores. In this study, we inferred and systematized

the construction of six meaning cores that have as a focus: a) occupational trajectory of the

housekeepers; b) tools, obstacles and strategies for facing the execution of the work activity;

c) social relations in the working process; d) the perception of the housekeeping work

activity; e) repercussions of the changes in the work area regarding daily hired housekeepers;

and f) the conclusion about the final work. Within the human activity of housekeeping there is

the prescription of objects, rules and procedures related to the desired results and how to reach

them, however, it is a dynamic system, which can lead to similarities and contradictions in the

activity itself. We were able to verify the results through a large amount of literature, mainly

when it came to matters that unveil the precariousness of work, since this occupation still

carries a lot of the structures of the unequal social scheme in Brazil. Aside from the

contributions in this research, we brought up various themes that can be further studied.

Keywords: housekeepers; daily hired housekeepers; processes of signification; activity theory.

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Introdução

A história do trabalho doméstico é datada da época colonial brasileira e possui estreito

vínculo com a escravidão (Ávila, 2009). Após a abolição da escravatura, esse tipo de trabalho

começa a se fortificar (Macedo, 2013). Sua origem histórica guarda forte estigmatização e

desvalorização, o que sugere marcas da precarização do trabalho.

Somadas as transformações no mundo do trabalho, temos assistido um contexto de

intensa desproteção social dos trabalhadores, bem como de desvalorização formal de algumas

atividades de trabalho. A categoria dos trabalhadores domésticos é essencialmente feminina;

decorrente da desvalorização histórico-social do escravo e da mulher, por muito tempo o

trabalho doméstico não alcançou o patamar de atividade produtiva e profissional (Brito,

2012).

No ano de 2015, a categoria das empregadas domésticas conseguiu conquistar diversos

direitos, em decorrência da lei complementar nº 150, de 1º de junho; por outro lado, a

atividade das diaristas segue à margem do trabalho formal e do reconhecimento jurídico.

Porém, o trabalho de diarista se caracteriza como trabalhadores que prestam serviços por até

dois dias por semana para um mesmo contratante, sendo essa uma atividade sem vínculo

empregatício e, portanto, sem normatizações legais, consistindo em um trabalho autônomo e

de sobrevivência, marcado pela lógica do trabalho informal.

O número de pessoas que trabalham como diarista vem crescendo, principalmente nos

grandes centros metropolitanos. Algumas discussões presentes na literatura avaliam como

positiva essa modalidade de trabalho, pela existência de maior autonomia, sendo uma forma

das trabalhadoras saírem de um contexto de opressão, ou por fornecer uma alternativa, quando

não há outras possibilidades de inserção no mercado de trabalho formal (Brites, 2003).

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Longe de situar o trabalho informal como uma modalidade notadamente precária, há

outros indicativos que sugerem a precarização do trabalho de diarista, haja vista a feminização

nessa atividade de trabalho, acompanhada de más condições ocupacionais e piores

remunerações, a queda da qualidade dos vínculos trabalhistas e o envelhecimento da força de

trabalho que influencia o exercício das atividades domésticas. Dentre as atividades de maior

predominância de trabalhadores mais velhos, destaca-se a de serviços domésticos (Guimarães,

2012). Cada vez mais é evidente a relação existente entre gênero, idade e trabalho flexível

(Loretto & Vickerstaff, 2015).

O trabalho realizado pelas diaristas é uma modalidade que vem demonstrando novas

possibilidades de agências, subjetivações e desafios ao subdomínio da psicologia dedicado ao

estudo da relação sujeito-trabalho, a Psicologia Social do Trabalho, cujo leque de

preocupações tem se ampliado para além das temáticas associadas às organizações capitalistas

tradicionais.

A atividade, por sua vez, é o modo de mediação entre o sujeito e a realidade externa, é

o modo como nos enraizamos no mundo. A atividade humaniza o homem, na mesma medida

em que potencializa o seu desenvolvimento. O uso da Teoria da Atividade, portanto, é uma

forma de captar sentidos e significados a partir do fazer concreto das pessoas. A concepção

adotada nesta produção é de que sentido e significado são uma unidade indivisível mediada

pela atividade (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015), isto é, o processo de significação se

constitui pela unidade sentidos-significados mediada pela atividade. Assim, sentidos e

significados são produzidos na relação entre os sujeitos, por meio da atividade, que é marcada

pelas trajetórias e experiências, bem como pelas condições e características do contexto

histórico de cada um e de todos (Zanella, Reis, Titon, Urnaur, & Dassoler, 2007).

O processo de significação é um fenômeno que visa investigar a produção, reprodução

e reelaboração de sentidos e significados num contexto mediado pela atividade (Bendassolli

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& Coelho-Lima, 2015). Esta dissertação se baseia na teoria da atividade, cujo objeto de

análise é o processo dialético de transformação entre o sujeito e o meio (Piccolo, 2012). Nesse

contexto, este estudo busca compreender o processo de significação do trabalho para um

conjunto de diaristas atuando na cidade de Natal, RN. Especificamente, objetiva investigar os

significados associados ao trabalho a partir da compreensão da atividade concreta realizada

pela diarista e identificar as estratégias utilizadas por essas profissionais para realizar sua

atividade e nela encontrar sentido.

Diante disso, os dois primeiros capítulos desta dissertação têm por objetivo apresentar

os elementos teóricos que subsidiam a investigação. O primeiro capítulo visa resgatar a

historicidade do trabalho doméstico, assim como caracterizá-lo. O marco histórico é um

aspecto importante, pois se pretende fazer esse resgate até o momento em que surge o

primeiro marco legal, a Lei nº 5.859/1972, bem como apontar as contradições da formalização

do trabalho doméstico, culminando com a situação presente: as diaristas.

É perceptível que os marcos legais e jurídicos aparecem como uma forma de

regulamentação do trabalho doméstico. Entretanto, à medida que surgem meios de

regulamentação da profissão, institui-se uma nova atividade, oriunda do trabalho doméstico,

que insurge numa redefinição desse local. Eis o trabalho da diarista.

Em seguida, o capítulo 2, Processo de Significação do Trabalho, irá contextualizar os estudos

sobre sentidos, localizado na articulação entre sentido/significado como elemento essencial do

ser humano e, a partir disso, irá explorar suas conexões com a atividade concreta. Após essa

contextualização teórica, será apresentado, no capítulo 3, o delineamento metodológico da

pesquisa. Em seguida, serão apresentados os resultados empreendidos e as análises

sistematizadas.

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1. Trabalho doméstico

1.1. Aspectos históricos do trabalho doméstico

O trabalho doméstico remonta a séculos e possui uma longa tradição na história do

Brasil, precisamente no regime pós-escravocrata, isto é, a história do trabalho doméstico

guarda vínculos funcionais e simbólicos com a escravidão. Desse modo, o sentido histórico da

escravidão dá significado ao que hoje se denomina de emprego doméstico (Ávila, 2009). A

ênfase na escravidão é uma referência da qual se produz o saber histórico e se pensa a atuação

política (Bernardino-Costa, 2007).

No contexto brasileiro, o emprego doméstico esteve presente desde a colonização. As

primeiras referências de mulheres que realizavam atividades domiciliares eram as amas de

leite, as criadas e as mucamas (Monticelli, 2013). Existiam os escravos da Senzala e os

escravos da Casa Grande, que realizavam o serviço doméstico; esses últimos acabavam

conquistando uma ocupação privilegiada (Davis, 1998). Na casa, cenário da vida doméstica,

as práticas escravocratas se mesclavam com as leis patriarcais. As atividades destinadas aos

criados distribuíam-se em atividades portas adentro, a saber: o trabalho das cozinheiras, amas

de leite, mucamas e costureiras; e atividades portas afora: lavadeiras, carregadeiras de água e

as que faziam as compras (Brites, 2000).

A escrava da casa possuía alguns privilégios, pois ela quem tinha uma relação mais

próxima com os senhores brancos. Por outro lado, havia um excesso de controle e uma maior

sujeição à violência. Como podemos observar em Costa (1998, p. 247): “escolhiam-se as

mucamas entre as negras de presença mais agradável. Ocupavam posição invejada, embora

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estivessem sujeitas mais diretamente aos caprichos da ama e do senhor, e fossem muito mais

fiscalizadas. Já pela roupa diferenciava-se dos demais”.

Durante o período da segunda metade do século XIX, o trabalho doméstico ficava sob

a responsabilidade de mulheres livres, as quais pouco se distinguiam das escravas (Ávila,

2009). Além das mulheres livres, havia as amas de leite, que também eram identificadas com

as práticas domésticas e o cuidado de criação aos filhos de seus locadores ou proprietários

(Carneiro, 2006). Nessa época, à medida que cresciam o Rio de Janeiro e sua população,

também aumentava o mercado de serviços domésticos. Procedia-se a necessidade de

matricular todos os escravos existentes, com intuito de controlar a movimentação dos

escravos nos espaços urbanos. A maior parte da população escrava do município estava

empregada no serviço doméstico, perfazendo um total de 20.825 homens e mulheres nessas

condições (Carneiro, 2006).

Enquanto os homens negros se lançaram no mercado de trabalho após a abolição, as

mulheres negras ex-escravas tornaram-se trabalhadoras domésticas remuneradas, agregadas

de família, ou criadas (Bernardino-Costa, 2007) e, desse modo, ocupavam atividades de

babás, cozinheiras, arrumadeiras e lavadeiras (Monticelli, 2013). É após a abolição da

escravidão que essa modalidade de trabalho se fortifica (Macedo, 2013).

No Brasil, uma prática comum era trazer jovens de classes pobres, migrantes, ou seja,

do interior das grandes cidades, para trabalharem em casas de classe média e alta a fim de

realizarem o trabalho doméstico; a relação salarial se constituía no recebimento de roupas,

comida e lugar para morar. No mais, a questão salarial era ditada pela relação da empregada

com a família e pela definição dos vínculos (Ávila, 2009).

A história do serviço doméstico no Brasil é semelhante a história desse serviço nos

Estados Unidos da América (EUA). Antes da abolição da escravatura, os escravos domésticos

eram aqueles encarregados das tarefas do lar. Porém, ao longo do século XIX, além das

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escravas domésticas, as famílias contavam com mocinhas para uma espécie de “ajuda

contratada”, fonte tradicional de trabalho doméstico após a abolição (Melo, 1998).

Com o processo de industrialização e urbanização do Brasil, gradualmente o trabalho

doméstico vai se configurando em serviço remunerado, apesar de que a lógica de “casa e

comida” ainda fosse empreendida como uma forma de ajuda. Em meados da década de 60 e

70 do século XX, as empregadas representavam mais de um quarto da força de trabalho

feminina, e ainda havia forte estigmatização e desvalorização, haja vista que, para muitas

famílias de classes média e alta, as mulheres trabalhadoras apresentavam uma conotação de

“criadas” subservientes, voltadas a servir às classes superiores, mesmo que isso lhes custasse

a própria vida particular. Nesse momento, as marcas da precarização do trabalho estavam

ilustradas pelos salários baixos, extensas jornadas de trabalho e o maior índice de

informalidade (Macedo, 2013).

Em virtude da desvalorização histórico-social do escravo e da mulher, por muito

tempo o trabalho doméstico não alcançou o patamar de atividade profissional (Brito, 2012).

Como afirma DeVault (1994), o trabalho doméstico passa despercebido pelo discurso público,

construindo o que o autor denomina de invisibilidade psicossocial dessa forma de trabalho:

com pouco reconhecimento social tanto para a sociedade quanto para os indivíduos aos quais

se atribui a atividade.

O tema do serviço doméstico só tem visibilidade da literatura científica a partir da

década de 70, por meio do trabalho de Heleieth Saffioti (1978), Emprego Doméstico e

Capitalismo, o qual levanta a questão sobre o trabalho doméstico, ainda pouco debatido no

espaço acadêmico. Para essa autora, o trabalho doméstico é o resultado de uma articulação

entre o modo capitalista de produção com formas não capitalistas de trabalho (Brites, 2000).

Consonante à expansão do fenômeno, alguns pesquisadores revelam uma produção acadêmica

crescente sobre o assunto (Brites, 2013).

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O crescimento desse tipo de trabalho está associado ao crescente número de mulheres

da elite realizando atividades liberais e administrativas, que dão condições para contratar o

trabalho doméstico de outras mulheres (Brites, 2000; Hirata, 2002). Foi, portanto, com a saída

das mulheres do ambiente doméstico para as esferas públicas que o cuidado do lar foi

demandado e transferido a outras mulheres, então, empregadas domésticas (Brito, 2012).

Segundo a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), os trabalhadores

domésticos:

Preparam refeições e prestam assistência às pessoas, cuidam de peças do vestuário

como roupas e sapatos e colaboram na administração da casa, conforme orientações

recebidas. Fazem arrumação ou faxina e podem cuidar de plantas do ambiente interno

e de animais domésticos. (Ministério do Trabalho e Emprego, 2016).

Para essa classificação, há quatro tipos de trabalhadores domésticos: empregado

doméstico de serviços gerais (caseiro), empregado doméstico arrumador (arrumador no

serviço doméstico), empregado doméstico faxineiro e empregado doméstico diarista (Maia,

2014).

Alternativamente, é possível classificar três tipos de trabalhadoras domésticas:

mensalista residente, mensalista externa e diarista (Ávila, 2009; Brites, 2013). A primeira é

aquela que mora no lugar do trabalho – o que chama a atenção de Ávila (2009), pois morar na

casa do empregador é uma situação que sugere a falta de liberdade, em que o controle do uso

do tempo, os objetos pessoais e as relações pessoais estão sob controle patronal.

A segunda categoria, mensalista externa, é aquela que trabalha para uma família,

recebe por mês, porém não reside na casa dos patrões. Por último, as diaristas, que recebem

por dia trabalhado, podendo prestar serviço para mais de um empregador (Brites, 2013).

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Considerando que muitas mulheres exercem serviços domésticos em suas próprias

casas, mas também na casa de outrem, é possível supor que nem toda trabalhadora doméstica

é empregada doméstica, uma vez que não há relação formal e contratual. Porém, o termo

trabalhador doméstico abarca tanto a empregada doméstica quanto a diarista (Fraga, 2010) e,

por isso, toda empregada doméstica é trabalhadora doméstica.

A definição de empregado doméstico aparece no artigo 3° do Decreto Lei 71.885, de

26 de fevereiro de 1973: “considera-se empregado doméstico aquele que presta serviço de

natureza contínua e de finalidade não lucrativa a pessoa ou à família, no âmbito residencial

destas”.

Para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE):

Considera-se empregado (a) doméstico (a) aquele (a) maior de 18 anos que presta

serviços de natureza contínua (frequente, constante) e de finalidade não lucrativa à

pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. Assim, o traço diferenciador do

emprego doméstico é o caráter não econômico da atividade exercida no âmbito

residencial do (a) empregador (a). Nesses termos, integram a categoria os (as)

seguintes trabalhadores (as): cozinheiro(a), governanta, babá, lavadeira, faxineiro(a),

vigia, motorista particular, jardineiro(a), acompanhante de idosos(as), entre outras

(MTE, 2016).

Dentre as escolhas profissionais dos trabalhadores, o trabalho doméstico não pode ser

considerado a ocupação preferida. Na verdade, quando não há outras possibilidades de

inserção no mercado de trabalho formal, é o trabalho doméstico que aparece como alternativa

(Brites, 2003). Para Velho (2012), “embora o trabalho doméstico profissional possa ter

declinado em certos aspectos, continua sendo uma alternativa importante para as camadas

populares” (p. 26).

Em um estudo empírico, Ávila (2009) destaca que o emprego doméstico aparece como

uma oportunidade de escapar de alguma situação não desejada, de pobreza e/ou violência

doméstica. Esse tipo de trabalho representa uma ruptura, ou seja, uma forma de dar um novo

rumo à própria vida. O estudo de Macedo (2013) desvela que se tornar empregada doméstica

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não é resultado de uma escolha de carreira, de uma vocação, relacionada à habilidade pessoal.

Entretanto, o serviço doméstico remunerado tem sua importância pelo fato de absorver

mulheres de menor escolaridade e sem experiência no mercado de trabalho (Melo, 1998).

Brandt (2004) caracteriza o trabalho doméstico como uma atividade degradante e

desvalorizada, pois é realizado por pessoas, por ela denominadas, inferiorizadas. O que

contribui para isso é a falta de reconhecimento social de sua atividade, caracterizada muitas

vezes como subtrabalho ou não trabalho. Outro fator que contribui para tal desvalorização é a

qualificação de ser uma atividade manual e, portanto, vista como trabalho hierarquicamente

inferior (Teixeira, Saraiva, & Carrieri, 2015).

Teixeira et al. (2015) apontam a diminuição do número de trabalhadoras domésticas

com jornadas de trabalho definidas. Isso se deve ao fato de as domésticas externas/diaristas

comumente serem mulheres pobres, com filhos menores de idade e que moram nas periferias

das zonas metropolitanas, sem creches e escolas em tempo integral. Além disso, verifica-se

que as patroas têm certa preferência por empregadas que tenham moradia própria, uma vez

que a doméstica residente retira a liberdade de dentro da casa. Nota-se também a necessidade

de cortar custos por meio do não oferecimento de alojamento, tampouco refeições. Esses

dados sugerem, por exemplo, o possível desaparecimento de trabalhadores domésticos

vivendo na casa dos patrões (Melo, 1998).

1.2. Aspectos jurídicos do trabalho doméstico

As primeiras referências jurídicas ao trabalho doméstico datam do período anterior à

República. O serviço doméstico era particularmente citado nas leis sanitárias e policiais, com

o propósito de proteger a sociedade contra as trabalhadoras domésticas, vistas como ameaça

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às famílias empregadoras (Bernardino-Costa, 2007). Com os surtos de febre e epidemias, as

criadas eram julgadas por trazer as enfermidades (Monticelli, 2013).

Os primeiros indícios de proteção social estavam relacionados ao reconhecimento

trabalhista por parte dos patrões, os quais ofereciam aos trabalhadores alimentação, abrigo,

roupa, remédio e até mesmo alforria, em troca de obediência e dedicação aos serviços

domésticos e à família (Graham, 1992, como citado em Monticelli, 2013).

Após a abolição da escravidão, crescente foi a preocupação em se estabelecer normas

visando propor proteção e garantias ao trabalho livre, muito embora, como poderemos

observar, a empregada doméstica tenha gozado proteção inferior quando comparada a outros

trabalhadores (Maziero, 2010).

As empregadas domésticas só se organizam politicamente em 1936, com a fundação

da primeira Associação de Trabalhadoras Domésticas. Esse momento foi liderado por

Laudelina de Campos Melo, militante e filiada ao Partido Comunista, em Santos, São Paulo.

A luta tinha o intuito de garantir o reconhecimento jurídico da categoria, isto é, os direitos

trabalhistas, pois, até então, as trabalhadoras domésticas não tinham direito à sindicalização e

sua profissão não era regulamentada pela CLT (Bernardino-Costa, 2007). Mas, é só na

década de 60 que a organização ganha fôlego (Ávila, 2009), a partir de discussões da situação

da trabalhadora doméstica na sociedade brasileira (Bernardino-Costa, 2007). Foi nessa década

que houve os primeiros congressos e encontros regionais e nacionais da categoria (Ávila,

2009).

Após muitas discussões, foi somente em 1972 que as trabalhadoras domésticas tiveram

alguns direitos reconhecidos (Bernardino-Costa, 2007), a partir da lei nº 5.859, de 11 de

dezembro de 1972, que garantiu três direitos: carteira assinada, férias de vinte dias por ano e à

previdência social. Essa lei foi, então, regulamentada pelo decreto nº 71.885, de 26 de

fevereiro de 1973, que estabeleceu que empregado doméstico “é aquele que presta serviço de

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natureza contínua e de finalidade não lucrativa a pessoa ou a família, no âmbito residencial

destas”.

Após a regulamentação em 1973, foi somente em 1984 que a questão do trabalho

doméstico foi retomada nas discussões jurídicas, por meio da lei nº 7.195, de 12 de junho de

1984. Essa lei tinha o ideal de estabelecer a responsabilidade civil das agências de

empregadas desta categoria sobre os danos causados pelos trabalhadores por elas indicados

(Maziero, 2010).

Em 1993, no sétimo Congresso Nacional das Trabalhadoras Domésticas, que tinha

como tema O Novo Perfil da Trabalhadora Doméstica no Brasil Hoje, constatou-se o

surgimento de um maior número de diaristas, haja vista o desejo dessas profissionais por

liberdade, ou até mesmo da recusa dos patrões em assumirem os encargos sociais. Desse

modo, ficou a cargo dos sindicatos assumirem a defesa dos direitos dessas trabalhadoras

(Bernardino-Costa, 2007).

A 100ª Conferência Internacional do Trabalho, da Organização Internacional do

Trabalho (OIT), que aconteceu em 2011, intitulada Trabalho decente para trabalhadoras e

trabalhadores domésticos, impulsionou a alteração do artigo 7º da Constituição Federal, que

versa sobre o estatuto diferenciado dos trabalhadores domésticos e suas garantias de proteção

legal. Essa alteração constitucional é parte de uma luta que durou décadas (Brites, 2013).

Foi, então, em abril de 2013 que a Emenda Constitucional nº 72, de 2 de abril de 2013,

conhecida como “PEC das Domésticas”, foi aprovada. A proposta equiparou os direitos dos

empregados domésticos aos demais trabalhadores urbanos e rurais, previsto no artigo 7º da

Carta Magna de 1988 (Macedo, 2013).

Uma questão um tanto intrigante não foi colocada em tela no debate: o direito das

diaristas. Levando em consideração que trabalhadores domésticos são aqueles que prestam

“serviço de natureza contínua e de finalidade não lucrativa a pessoa ou a família no âmbito

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residencial destas”, há certa divergência entre os juristas em definir se a diarista é ou não

trabalhador doméstico, em virtude da característica contínua que aparece no artigo 3° do

Decreto Lei 71.885 de 09 de março de 1973. Para parte das instâncias jurídicas do país, a

diarista não presta serviço de natureza contínua, ou seja, permanente. Entretanto, para os

sindicatos dos trabalhadores domésticos, o trabalho da diarista é contínuo e regular,

independente do número de dias que estejam na casa dos patrões. Assim, também para o

Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) e o Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mensalistas e diaristas são trabalhadoras

domésticas para efeitos demográficos (Bernardino-Costa, 2007).

Com o objetivo de cessar os impasses das divisões da categoria, em abril de 2009, a

senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) propôs três projetos ao Senado Federal: o projeto de

Lei nᵒ 159, que tinha por objetivo estabelecer uma multa aos empregadores que

descumprissem a legislação; o projeto de Lei nᵒ 160, que busca definir o trabalho da diarista;

e o projeto de Lei nᵒ 161, que busca diminuir de 12% para 6% o valor que o empregador tem

que contribuir para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com o intuito de aumentar a

formalização do trabalho doméstico remunerado (Monticelli, 2013).

Para o segundo projeto, definiu-se que a diarista deverá apresentar ao contratante o

comprovante de contribuição ao INSS como Contribuinte Autônomo, ou como Contribuinte

Funcional. Além disso, estipulou-se que a diária equivaleria a 1/30 (um trinta avos) do salário

mínimo vigente; a jornada de trabalho equivaleria a oito horas; e dois dias como definidor da

diarista. Entretanto, tendo em vista várias reivindicações, principalmente do movimento

sindical, a deputada Sandra Rosado do PSB de Pernambuco entrou com o Projeto de Lei nº

7.279 (2010), que dispõe que a diarista é aquela que presta serviço eventual ou no máximo

uma vez por semana para um mesmo contratante (Monticelli, 2013).

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Apesar dos dissensos jurídicos, o trabalho de diarista se caracteriza como

trabalhadores que prestam serviços por até dois dias por semana para um mesmo contratante,

sendo esta uma atividade sem vínculo empregatício e, portanto, sem normatizações legais,

consistindo em um trabalho autônomo e de sobrevivência (Teixeira et al., 2015). Além de não

conviver com os patrões e não limpar a mesma casa todos os dias, muitas vezes não se

encontram nem com seus empregadores na residência, pois tem uma rotina de trabalho

diversa (Monticelli, 2013).

Apesar de mudanças recentes na legislação (Debert, 2014), e das conquistas de

diversos direitos pelas empregadas domésticas, em decorrência da lei complementar nº 150,

de 1º de junho de 2015, as diaristas continuam às margens do trabalho formal.

Alguns módulos permanecem blindados a mudança social. Um deles diz respeito ao

direito das Diaristas, ainda profundamente vulneráveis. Mas o maior de todos os

impasses consiste em sair do corpo da lei para as práticas sociais. Mesmo com as leis

reguladoras do trabalho vigentes desde 1972, 73,2% das trabalhadoras domésticas

brasileiras subsistem sem carteira de trabalho assinada. Além da dificuldade de

formalizar o vínculo empregatício, o sistema de fiscalização dos direitos do trabalho

encontra obstáculos intransponíveis (Brites, 2013, p. 437).

É, portanto, a incompletude dos direitos alcançados que as caracterizam ainda como

uma categoria do setor informal, não incluída na Confederação das Leis do Trabalho (CLT)

(Ávila, 2009).

1.3. Um caso particular de trabalho doméstico: as diaristas

O mundo do trabalho tem passado por diversas transformações decorrentes do

processo de reestruturação produtiva. No Brasil, esse movimento aconteceu no final da

década de 80, como consequência das políticas neoliberais que incentivaram a flexibilização,

desregulamentação e precarização do trabalho (Alves & Almeida, 2009).

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Como resultado disso, os trabalhadores começaram a perder direitos trabalhistas e

sociais, o que fez com que buscassem alternativas de subsistência e novas formas de inserção

laboral, tal como a informalidade (Prisco, Carvalho, & Gomes, 2013).

Reflexo das mudanças, as trabalhadoras domésticas se viram na condição de redefinir

seus locais de trabalho. A opção de se inserir no âmbito da informalidade se dá pela

oportunidade que oferece ao trabalhador de ter mais controle sobre sua atividade, maior

flexibilidade quanto ao uso do tempo, maior autonomia e melhores rendimentos (Menezes &

Carrera-Fernandez, 1998).

Retrato disso é o que acontece com as diaristas, as quais têm autonomia para

administrar seus serviços, podendo escolher para quem desejam trabalhar, em quais dias e

horários, além de poderem prestar serviço para mais pessoas e, quando não satisfeita, escolher

usuários diferentes para oferecer seus serviços (Fernandes, 2009).

Entretanto, há que se notar a imprevisibilidade da renda e a falta de seguridade social

oriundas desse tipo de inserção laboral informal (Coutinho, Borges, Graf, & Silva, 2013),

além da falta de compensação financeira em casos de doenças e acidentes (Iriart et al., 2008).

A ocupação de diarista apresenta uma tendência de aumento expressivo em

comparação ao número de trabalhadoras domésticas. Apesar de desempenharem funções

idênticas às empregadas domésticas, sua condição no mercado informal não lhes possibilita

gozar dos mesmos direitos usufruídos por elas (Prisco, Carvalho & Gomes, 2013), mesmo

após a institucionalização da lei complementar nº 150, de 2015.

Como avalia Nunes (1993), a existência das diaristas se dá pelo contexto econômico e

social que o país ou região vive: “em período de recessão, tinha muitas poucas vagas de

diaristas a oferecer, mas ao contrário, muitas vagas para mensalistas, o que as diaristas não

aceitavam” (p. 255). Durante 1890-1930, as tarefas das diaristas se configuravam em

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trabalhos específicos, como a limpeza de um cômodo ou a lavagem das roupas. Enquanto que,

nos anos 90, as diaristas trabalhavam também com congelados, na limpeza pesada e como

ajudante por um dia da trabalhadora doméstica mensalista (Monticelli, 2013).

Ao passo que tem diminuído acentuadamente o número de empregadas mensalistas

residentes, cresce o número das que trabalham como diaristas, principalmente nos grandes

centros metropolitanos, como já constatado por Melo, em seu estudo da década de 90.

Algumas discussões, como a de Harris (2007), assumem posições sobre se a atividade das

diaristas é mais vantajosa quando comparadas ao trabalho doméstico da mensalista. Um

estudo comparativo realizado entre essas trabalhadoras, nos EUA e no Brasil, revelou que a

relação contratual de trabalho da diarista se configura como uma relação mais moderna,

racional e capitalista, uma vez que essa modalidade de trabalho permite que as trabalhadoras

tenham maiores rendimentos, mais chances de autonomia, bem como mais condições de

controlar as horas trabalhadas (Harris, 2007).

Outro estudo com diaristas, realizado na região metropolitana de Curitiba, salienta

certa valorização dessas trabalhadoras a possibilidade de consumo, ao fato de as relações de

trabalho permitirem dizer “não”, quando necessário, e a existência de maior autonomia

(Monticelli, 2013).

Uma pesquisa realizada por Nunes (1993) avalia que a categoria das diaristas consiste

em trabalhadoras que conseguiram sair de um contexto de opressão, e, por isso, investiram em

uma atividade menos formalizada, ou seja, encontraram um caminho mais autônomo, que

proporciona menos humilhação e ambivalências afetivas, mudando a percepção de si mesmas.

Ou, ainda, as diaristas estariam sendo as pioneiras em quebrar o ciclo de relações desiguais e

afetivas, construindo um distanciamento emocional e, consequentemente, mais empreendedor

(Monticelli, 2013).

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A tese defendida por Monticelli (2013) expõe que as escolhas profissionais das

diaristas eram influenciadas pelas experiências sofridas ao longo de suas vidas. A maior parte

do público desse estudo já havia se empregado em outros segmentos, como, por exemplo:

garçonete, operadoras de máquina, vendedoras de loja e até mesmo empregada doméstica

com contrato mensal. Entretanto, escolheram ser diaristas por causa do dinheiro. Assim, o

processo de escolha deste trabalho, para as diaristas, estava baseado tanto em suas emoções

como em suas experiências.

Em um estudo que discute as vantagens e desvantagens em ser diarista, Coutinho et al.

(2013) também observam que um dos principais motivos para a escolha de ser diarista é a

remuneração, principalmente quando comparada ao exercício da atividade doméstica com

registro formal e carteira. Algumas trabalhadoras declararam, inclusive, ganhar até o dobro da

remuneração auferida mensalmente, caso tivessem vínculo formal. Uma diarista relatou que

seu trabalho não requer custos altos, não sendo necessário o investimento em roupa, calçado e

comida.

As diaristas estão ganhando mais e trabalham menos horas (Fraga, 2010). O IBGE

revelou que, de 2009 a 2011, o rendimento dos trabalhadores domésticos que exerciam

atividades sem carteira aumentou 15,2%, enquanto que entre os que exerciam a atividade com

registro formal o aumento foi de apenas 5,2% (2012, como em Coutinho et al., 2013).

Outro dado que reflete o perfil dessas trabalhadoras é o aumento no número de

diaristas mais velhas, na faixa etária entre 30 e 60 anos, de 42,6% para 68% (Brites, 2013).

Prisco, Carvalho e Gomes (2013) coadunam com Brites (2013) ao revelar que esse público

está envelhecendo. Monticelli (2013) aponta que cerca de 45,9% das trabalhadoras tinham

entre 40 e 59 anos de idade, enquanto que o contingente de trabalhadoras jovens era de

18,26%. Isso acontece porque as mulheres mais jovens estão se recolocando em atividades

que, embora não sejam tão rentáveis, tem maior reconhecimento social (Brites, 2013).

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Além disso, a flexibilidade desse trabalho permite que as trabalhadoras conciliem seu

“ganha pão” com as exigências laborais do âmbito familiar e doméstico, ou seja, trabalhar

menos dias durante a semana permite que elas também deem conta de interesses pessoais,

como o cuidado dos filhos, além de terem mais oportunidade para descansar (Coutinho et al.,

2013).

Atualmente, as diaristas realizam todas as tarefas domésticas, como lavar louça, limpar

banheiros, lavar roupas, varrer, tirar o pó e passar roupa, coisas que antes eram designadas às

empregadas mensalistas (Monticelli, 2013). Ou seja, percebe-se a qualidade de um trabalho

polivalente nessa modalidade de atividade.

1.4. Um retrato do trabalho doméstico

1.4.1. O trabalho doméstico em números

Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas

(IPESPE), em 1992, traçou o perfil das empregadas domésticas nas seguintes cidades

brasileiras: Porto Alegre, Recife, Campinas, Salvador, Rio de Janeiro, Londrina, Volta

Redonda e São Paulo. Constatou-se que elas tinham baixo nível de escolaridade,

primordialmente as mensalistas residentes, das quais 5% nunca foram à escola e 26%

estudaram até antes da quinta série (IPESPE, 1992, como citado em Ávila, 2009).

Em 2006, o DIEESE apresentou que cerca de 60% das empregadas domésticas

brasileiras não chegaram a completar o ensino fundamental. Ainda assim, a faixa etária

predominante delas era de 25 a 39 anos. Essa faixa etária reflete o alto número de mulheres

desempenhando as atividades domésticas no auge de suas capacidades produtivas (OIT,

2006), muito embora essa realidade venha se modificando, como veremos adiante. Nas

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regiões Sul e Sudeste, percebe-se um maior número de mulheres numa faixa etária de pessoas

mais velhas, ou seja, com mais de 40 anos, quando comparada às outras regiões (IBGE,

2005).

Segundo o IBGE (2005), no Brasil, durante a década de 90, as empregadas mensalistas

residentes no trabalho eram as que trabalhavam o maior número de dias na semana e

chegavam a exceder oito horas de trabalho diário. Em Recife e em Salvador, por exemplo, as

jornadas de trabalho das empregadas domésticas eram em torno de 47 e 43 horas semanais,

respectivamente. Entre as mensalistas sem carteira assinada, as jornadas semanais alcançavam

52 e 45 horas para as mesmas cidades. Contraditoriamente, as jornadas de trabalho eram

maiores para aquelas que tinham a carteira assinada: em torno de 57 e 51 horas por semana

(Ávila, 2009).

Entre as décadas de 70 e 90, por exemplo, houve um crescente aumento no número de

trabalhadoras domésticas, que chegou a mais de 200% (Bruschini & Lombardi, 2000).

Contrário a isso, outros estudos apontam que, nesse mesmo período, o avanço da

industrialização explica a queda na importância do emprego doméstico para mulheres

brasileiras: na década de 70, as trabalhadoras representavam cerca de 27%, enquanto que, na

década de 80, decresceu para 20% (Melo, 1998).

No ano de 1995, as empregadas domésticas totalizavam quase 5 milhões de mulheres,

representando 19% da População Economicamente Ativa (PEA). Uma década depois, a

categoria das empregadas domésticas chegou a equivaler a 6,9% da PEA, o que corresponde a

6,65 milhões de brasileiros (Bernardino-Costa, 2007). Todavia, segundo dados da OIT, pela

primeira vez, no ano de 2011, foi registrada uma diminuição no número absoluto de

empregados domésticos (Carelli, 2011). Enquanto, em 2009, havia 6,7 milhões de

empregadas domésticas no Brasil, em 2011 foi registrada a tendência de diminuição dessa

categoria em 6,160 milhões (Macedo, 2013).

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O que se sabe é que, em 1992, havia 19,2% de trabalhadoras residentes, no Brasil;

porém, em 2008, a proporção caiu para 6,4%. Nesse mesmo período, o número de diaristas

aumentou de 16,5% para 26,5% (Brites, 2013). Para Melo (1998), as mensalistas estão

fadadas a desaparecer. Na verdade, tem crescido o número de pessoas prestando serviço para

mais de um empregador.

Em 2001, 74,1% das empregadas domésticas, distribuídas no setor de serviços, não

possuíam carteira assinada (IBGE, 2000). No ano de 2006, dados indicavam que 94% das

pessoas empregadas no trabalho doméstico não eram contribuintes da Previdência Social

(IBGE, 2006).

Conforme alguns levantamentos estatísticos sobre economia informal no Brasil, 74%

das empregadas domésticas não têm carteira assinada e, em sua grande maioria, não

pretendem estabelecer vínculo formal, uma vez que junto a regulamentação do trabalho os

deveres são talvez mais severos (Brites, 2003). Segundo o IBGE (2011), o número de

trabalhadoras domésticas remuneradas com carteira assinada é de apenas 29,3% entre as seis

milhões pertencentes à categoria, o que indica escassa formalização desse tipo de trabalho,

além do ínfimo impacto das conquistas no campo legislativo (Monticelli, 2013), apesar das

conquistas recentes, no ano de 2015.

1.4.2. O trabalho doméstico no contexto de gênero

A partir da segunda metade do século XX, em decorrência da reestruturação produtiva

e da globalização, mulheres que antes não exerciam atividades remuneradas passaram a

exercê-las (Bruschini, 2007). Todavia, esse trabalho era marcado por más condições, como,

por exemplo, extensivas horas de trabalho e piores remunerações (Daniel, 2011).

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Até a década de 80, as atividades de trabalho realizadas pelas mulheres apresentavam

caráter complementar em relação ao trabalho masculino no sustento da família. Nesse

momento, o trabalho das mulheres caracterizava-se pela intermitência, baixa escolaridade e

reduzida remuneração. Ainda nesse período, começam a haver modificações sobre esse

caráter complementar atribuído ao trabalho feminino, pois, em decorrência do fraco

desempenho da economia nacional nas décadas de 80 e 90, as mulheres brasileiras iniciaram a

procura por emprego como uma forma de garantir a renda familiar (Cirino & Lima, 2012).

Atualmente, as famílias brasileiras são caracterizadas pela presença de dois membros

provedores (Bartholo, 2009; Wajnman, 2012). A divisão sexual do trabalho (DST), ao mesmo

passo em que possibilita que as mulheres tenham uma renda própria, constrange a maneira

como elas se inserem, ou seja, facilitam a sua entrada em algumas áreas e dificultam em

outras (Young, 1996). Dessa forma, no mundo do trabalho remunerado há uma distinção entre

as atividades que podem ser desenvolvidas pelas mulheres e aquelas que podem ser

desenvolvidas por homens, e isso gera influência tanto na escolha profissional das mulheres

quanto na sua circulação nos espaços de trabalho.

A inserção da mulher no mercado de trabalho é marcada pela feminização de algumas

atividades (Cirino & Lima, 2012). O trabalho doméstico é definidor de feminilidade, assim

como é um possível lócus de desigualdade (Macedo, 2013), por isso, tem um peso

significativo quando se trata da inserção da mulher no mercado de trabalho. O trabalho

doméstico como trabalho das mulheres é elemento de sustentação da DST e da sua

reprodução (Ávila, 2009). A feminilização não se trata apenas de um quantitativo

representativo de mulheres em um setor de trabalho, mas sim da qualidade ligada a uma

forma específica de trabalho (Gutierrez-Rodriguez, 2010).

Nas últimas décadas do século XX, as mulheres ampliaram o seu acesso à educação

formal (Bruschini & Puppin, 2004) e, como decorrência do aumento da escolaridade, foi

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possibilitado o seu ingresso em atividades que antes eram restritas aos homens, tais como

engenharia e medicina. Mas, apesar das transformações, algumas permanências insistem em

ser conservadas, como é o caso do emprego doméstico e a dinâmica dessa atividade de

trabalho (Daniel, 2011).

Entre 2011 e 2012, nas regiões metropolitanas, a participação feminina na força de

trabalho apresentou crescimento superior a dos homens. Enquanto a taxa de crescimento de

participação dos homens foi de 1,6%, a taxa de participação das mulheres foi de 2,5%

(Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados [Seade] & DIEESE, 2016). Em geral, 16%

das mulheres atuam no setor agrícola, 16% no comércio, 16% na saúde, serviços sociais e

educação e 17% no trabalho doméstico (Bruschini, 2007).

Apesar do aumento da participação das mulheres no mercado, essas ainda são as

maiores vítimas do desemprego (Batista & Cacciamali, 2009). Quando conseguem se incluir,

geralmente são em trabalhos mais precarizados e de pouca valorização social, como a

responsabilidade pelos afazeres domésticos e o trabalho doméstico assalariado (Cirino &

Lima, 2012). Há clara desvantagem em relação aos indivíduos do sexo oposto, haja vista os

resquícios do patriarcalismo, que colocou a mulher em posição de submissão ao homem, já

que o patriarca era quem detinha o poder diante da sociedade (Silva, 2014). “Na maioria dos

casos, aquilo que a mulher faz ou deveria fazer não recebe o nome de trabalho” (Rodrigues,

2005, p. 31). Isso acontece devido ao espaço social que a mulher ocupa, notadamente

reforçado pela DST, a qual atribui o trabalho produtivo aos homens e o trabalho reprodutivo

às mulheres (Ávila, 2009).

O termo divisão sexual do trabalho trata da distribuição diferencial de homens e

mulheres no mercado de trabalho, nos ofícios e nas profissões, além das variações no tempo e

no espaço dessa distribuição (Hirata & Kergoat, 2007).

Refletindo sobre isso, Fontoura e Gonzalez (2009) descrevem:

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Em 2008, enquanto o trabalhador brasileiro do sexo masculino recebia em média R$

1.070,00, as trabalhadoras ganhavam R$ 700,00, ou seja, 65% do rendimento dos

homens. Esta diferença se amplia: I) na área rural, onde as mulheres recebem somente

38% do que recebem os homens; II) nas faixas de idade mais avançada, nas quais as

mulheres com 60 anos ou mais de idade recebiam 42% do que recebiam os homens na

mesma faixa; e III) nas camadas mais pobres, nas quais as mulheres das famílias com

renda domiciliar per capita de até meio salário mínimo recebiam 51% do rendimento

masculino nas mesmas famílias (p. 23).

Bruschini (2007) completa:

Em 2005, nada menos que 33% da força de trabalho feminina ou 12 milhões de

mulheres situavam-se em nichos precários, ou de menos qualidade, no mercado de

trabalho, seja como trabalhadoras domésticas (mais de 6,2 milhões), seja realizando

atividades não remuneradas (3,3 milhões) ou trabalhos na produção para consumo

próprio ou do grupo familiar (2,7 milhões) (p. 22).

É válido ressaltar que, ao longo do tempo, o perfil das mulheres inseridas no mercado

de trabalho também foi se modificando. Enquanto, na década de 70, as mulheres eram em sua

maioria jovens, solteiras e pouco escolarizadas, atualmente, as mulheres possuem faixa etária

mais elevada e têm níveis mais elevados de escolarização (Jatobá, 1994; Leone, 2000).

A participação de mulheres mais velhas na força de trabalho é inferior a dos homens

idosos. Em geral, as mulheres mais velhas trabalham em empregos irregulares, no trabalho

doméstico, sofrem invisibilidade e não necessariamente constam em estatísticas laborais. À

medida que as mulheres envelhecem mais, a discriminação tende a aumentar e, por isso, essas

mulheres são vulneráveis em virtude de sua participação em trabalhos mal remunerados,

irregulares ou de economia informal (OIT, 2008).

Em 2006, 18% das mulheres ocupadas eram trabalhadoras domésticas. No contexto

metropolitano, esse percentual chega a ser 20%. Nesse setor, a maioria são mulheres e as

empregadas domésticas constituem uma das maiores categorias de trabalhadoras, seu total

sendo de 6.782.111, ou seja, 7,6% da população ocupada (DIEESE, 2006). Dentre 53 milhões

de trabalhadores domésticos no mundo, 43 milhões são do sexo feminino (Maia, 2014).

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1.4.3. O trabalho doméstico no contexto do envelhecimento populacional

Tendo em vista a baixa taxa de natalidade e o aumento da longevidade, as mudanças

na transição sociodemográfica percebidas nos últimos anos acarretaram um aumento no

número de idosos. A menos que a natalidade volte a crescer, as próximas décadas serão

marcadas por um crescimento ainda maior desse número. Em um período de 18 anos, dobrará

o número de pessoas idosas no Brasil (Costa & Soares, 2009).

Isso posto, diversos temas passaram a ser atravessados pelo processo de

envelhecimento populacional. O aumento da expectativa de vida dos brasileiros ocasionou

impactos nas diversas dimensões da vida social. A suposta nova era do envelhecimento é

capaz de evocar imagens de vitalidade, atividade e empreendedorismo, recolocando, por

exemplo, esses indivíduos em arenas sociais significativas, tal como o trabalho (Laranjeira,

2010).

A relação entre envelhecimento e trabalho vem sendo discutida de diversas formas. A

força de trabalho tem envelhecido na sociedade moderna (Padula et al., 2013). Do mesmo

modo, o processo de transição demográfica ocasiona o envelhecimento da população em

idade produtiva e da força de trabalho.

Segundo dados do IBGE, no Brasil, em 2006, cerca de 54% dos trabalhadores tinham

60 anos ou mais e, em 2009, cerca de 70% de pessoas idosas tinham alguma atividade

profissional. É esperado que em 2020 cerca de 11% da PEA seja constituída por trabalhadores

idosos (França & Soares, 2009). Entretanto, como apontam Queiroz e Ramalho (2009),

existem poucos estudos que se detêm ao trabalho do idoso no mercado de trabalho.

Em pesquisa recente, no ano de 2016, via Sistema IBGE de Recuperação Automática

(SIDRA), foi possível constatar que, nos anos de 2012 e 2013, houve um aumento, no Brasil,

na região Nordeste e no RN, no número de pessoas economicamente ativas nos grupos de

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idades de 40-49 anos, 50-59 anos e 60 anos ou mais. No país, cerca de 3,1 milhões de idosos

com 65 anos ou mais continuam trabalhando, muito embora 74,4% sejam aposentados

(Cockell, 2014).

O processo de envelhecimento ocorreu de forma tão rápida que, como consequência

disso, há uma participação mais elevada de trabalhadores mais velhos na dinâmica

ocupacional. Conforme prevê o Estatuto do Idoso: “o idoso tem direito ao exercício de

atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas” (lei nº

10.741, 2003). Por isso, hoje se tem encorajado o exercício de atividades de trabalho flexíveis

para a população mais velha, como uma forma de prolongamento da vida ativa, mas isso

difere quanto ao gênero.

Conforme é possível destacar no estudo realizado por Loretto e Vickerstaff (2015),

existe uma relação entre gênero, idade e trabalho flexível. A idade intensifica algumas das

desigualdades de gênero em experiências desse tipo de trabalho. As formas de trabalho

flexível realizadas por homens mais velhos tem um nível mais elevado de escolha e de

autonomia do que aquelas normalmente realizadas por mulheres mais velhas. Quando essas

conseguem o trabalho formal, o trabalho não é flexível. No Brasil, muitas das mulheres idosas

que estavam trabalhando em regime flexível e produtivo estavam em trabalhos invisíveis, de

caráter informal (OIT, 2008).

Além da feminilização do envelhecimento, ou seja, um elevado número de mulheres

idosas em comparação ao número de pessoas do sexo oposto em processo de envelhecimento,

há o aumento no número de mulheres em idades intermediárias e elevadas realizando algum

tipo de atividade, formal ou informal (Nascimento & Rabelo, 2008). No ano de 1995, foram

entre mulheres de 30 a 39 anos, e 40 a 49 anos, que foram encontradas as mais altas taxas de

atividade. O padrão feminino de participação econômica por idade apresenta um significativo

processo de envelhecimento, ou seja, as projeções indicam que a participação feminina no

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mercado de trabalho atingirá idades bem elevadas: 50 anos, o que já vem sendo observado

(Bruschini & Lombardi 2000; Wajnman & Rios-Neto, 2000).

Foi nesse sentido que a Declaração dos membros do Conselho Europeu apontou uma

missão a União Europeia: “deve ser prestada especial atenção à difícil situação de mulheres

desempregadas e dos trabalhadores mais velhos” (1994, como citado em Walker, 2005).

Segundo uma Comissão Europeia, o mercado deve se tornar mais flexível para aqueles

maiores de 60 anos, haja vista o aumento substancial de idosos em relação aos mais jovens

(D’Alencar & Campos, 2006).

Dentre as atividades de maior predominância de trabalhadores mais velhos, destacam-

se: atividades da construção civil, atividades que requerem maior qualificação e serviços

domésticos (Guimarães, 2012), este último que, não à toa, é composto, em sua maioria, por

mulheres. Tem havido o envelhecimento do perfil das trabalhadoras domésticas, algo

associado ao fato de que aos 40 anos mulheres já são consideradas mão de obra indesejada ao

mercado e acima dos 50 anos de idade isso apenas se agrava. A inserção no emprego

doméstico é considerada a única alternativa, haja vista as dificuldades de se absorver uma

mão de obra mais velha, principalmente quando se está em jogo outra variável: o baixo nível

de escolaridade (IBGE, 2012).

a) Concepções de desenvolvimento humano

A institucionalização do curso de vida baseado na idade cronológica é consequência

da modernização da sociedade (Debert, 1998). A velhice, por exemplo, é tida como uma fase

que se inicia notadamente aos 60 anos, entretanto, tem-se percebido o fenômeno do

“envelhecimento precoce” no âmbito do trabalho.

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Nesse contexto, a velhice, enquanto sinônimo de perda, desvalorização e abandono, se

inicia aos 40 anos (Peres, 2002). Para Neri (1996), no mundo do trabalho, a média de idade do

início da velhice é fixada em 50, 45, e 40 anos de idade.

A construção da velhice aos 40 anos, no mundo do trabalho, carrega muitos dos

estereótipos negativos que caracterizam a velhice (Neri, 1991; Palmore, 1999). À medida que

os profissionais atingem a faixa etária dos 40 ou 50 anos, eles sofrem com os estereótipos

dessa fase de vida (Palmore, 1999) e, por isso, há certa dificuldade desses profissionais em se

reintegrarem ao mercado ou continuarem nele (Peres, 2002).

A construção da categoria “idade”, no sentido biológico, é semelhante em diversos

países. Porém, sobre a categoria social dos idosos, que leva em consideração o relógio social,

há forte diversidade, uma vez que cada indivíduo constrói sua história do envelhecer e, por

isso, chega à velhice de diferentes formas. A velhice é, portanto, uma categoria histórica e

social (Lopes, 2006).

É importante mencionar que não há uma definição clara sobre quem seria o

trabalhador “mais velho”. Na Europa, entende-se que trabalhadores que possuem 45 anos são

trabalhadores mais velhos; noutra perspectiva, nos EUA, a idade atribuída ao trabalhador mais

velho é de 60 anos ou mais (Mendes, Bogéa, & Sobral, 2012). Isso porque é difícil estabelecer

um padrão do envelhecimento nas sociedades (Papaléo, 2006). “Um jogador de futebol com

40 anos pode ser considerado velho e um advogado com a mesma idade ainda não atingiu o

clímax necessário para obter credibilidade da sua clientela” (França, 1999, p. 13).

Fula, Amaral e Abraão (2012), ao tentarem contribuir com a definição do conceito,

constataram que a idade do trabalhador mais velho varia de 53 a 65 anos, idades transitórias,

que indicam que o sujeito está no final da sua vida ativa, ao passo que se prepara para a

aposentadoria.

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Outros estudiosos também se preocuparam em definir a idade do trabalhador mais velho,

como McCarthy, Heraty, Cross e Cleveland (2014); as análises estatísticas tendem a definir

essa idade a partir dos 45 anos (Tikkanen & Nyhan, 2006). Já a OECD (2006) define o termo

para trabalhadores a partir dos 50 anos. Entretanto, a depender do objeto de estudo, essa

idade pode variar (Kooij, Lange, Jansen, & Dikkers, 2008).

Apesar disso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu, no ano de 1991, como

trabalhador em processo de envelhecimento aquele com idade igual ou superior a 45 anos,

haja vista que é nesse momento que as pessoas começam a perder suas capacidades

funcionais, caso medidas preventivas não sejam adotadas, bem como se as condições de

trabalho não forem adequadas (Camarano & Pasinato, 2008; Gonçalves, et al., 2012; Hébert,

1997)

1.5. Em síntese...

Com base no que foi discutido, no Brasil, a relação do emprego doméstico é marcada

pela manutenção de um sistema estratificado de gênero, classe e cor, o que ajuda a reforçar

desigualdades. A esses elementos tem-se agregado, ainda, outra dimensão: a idade.

Entendemos que a questão do trabalhador mais velho não toma como parâmetro

apenas os aspectos biológicos ou a faixa etária, mas também a perspectiva de que a categoria

envelhecimento se processa de maneira diferente para todos os sujeitos. Uma vez que não

necessariamente estamos inseridos no mesmo contexto sociocultural, tampouco as

necessidades subjetivas de inserção e retorno ao trabalho devem ser compreendidas de

maneira homogênea. Por isso, é possível declarar que a velhice não é apenas uma: o que

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existe são velhices, no plural. Somado a isso, as atividades exercidas pelos diferentes idosos

no campo do trabalho apresentam impactos nos seus desenvolvimentos físico, psíquico e

social, o que torna a terminologia “trabalhadores mais velhos” incapaz de ser reduzida apenas

a aspectos biológicos e funcionais.

Vale ressaltar outras particularidades desse tipo de trabalho, que reiteram a

necessidade de aprofundar o tema e reafirmam a precarização desta atividade. Em geral, as

diaristas possuem baixa escolaridade, baixos rendimentos, desenvolvem atividades que

requerem esforço físico, estão expostas a riscos químicos, além de se inserirem precocemente

no mercado de trabalho, quando ainda crianças.

2. Processo de significação

2.1.Estudos sobre sentido e significado do trabalho

Os temas sentido e significado do trabalho têm sido estudados por diferentes áreas do

conhecimento, notadamente a Psicologia e a Sociologia do Trabalho. Desde a década de 1950,

vem sendo realizadas pesquisas visando compreender o que dá sentido ao trabalho para as

pessoas (Morin, Tonelli, & Pliopas, 2007), principalmente em decorrência das mudanças no

mundo do trabalho, a saber: a reestruturação produtiva.

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Para tanto, ora os estudos apontam diferenças entre sentido e significado, ora usam

esses termos indistintamente (Tolfo, Coutinho, Almeida, Baasch, & Cugnier, 2005). Para

Tolfo e Piccinini (2007), significado consiste no entendimento social do que seria o trabalho,

enquanto que o sentido remete a uma dimensão pessoal. Porém, por se tratar de um constructo

multidimensional, há uma interdependência entre esses dois conceitos. Assim, para Borges

(1998), sentido e significado são elementos do mesmo constructo, apresentando caráter de

complementaridade.

Os estudos realizados pelos pesquisadores do grupo Meaning Of Work (MOW, 1987)

usam apenas o termo significado, enquanto Morin (2001) utiliza o termo sentido do trabalho.

Aqueles realizaram um estudo, durante o período de 1978 e 1984, em oito países (Bélgica,

Alemanha, Inglaterra, Japão, Israel, Estados Unidos, Holanda e a antiga Iugoslávia), que

contou com a participação de mais de 14 mil pessoas. A grande contribuição desse estudo foi

definir um conceito e um modelo para a investigação sobre o significado do trabalho. Como

resultado, foi verificado que o significado do trabalho para o indivíduo é influenciado pelo

contexto organizacional e pelo ambiente familiar e social em que se vive. A partir disso,

foram definidas variáveis condicionantes compostas por três aspectos: 1) situação familiar e

pessoal; 2) características do trabalho atual e histórico de carreira; e 3) ambiente

socioeconômico (MOW, 1987).

Essas variáveis condicionantes ou antecedentes ajudaram a explicar o modelo central,

composto por três dimensões: 1) centralidade do trabalho; 2) normas sociais do trabalho; e 3)

resultados valorizados no trabalho. A primeira, refere-se ao grau de importância que o

trabalho tem na vida de um sujeito; a segunda, representa as normas e expectativas

relacionadas ao trabalho; por fim, a terceira, detalha os motivos que levaram o indivíduo a

trabalhar e a satisfação decorrente durante a realização do trabalho ou depois (MOW, 1987).

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Enquanto isso, Morin (2001) realizou uma pesquisa que apontou as principais

características para que o trabalho tenha sentido: ser eficiente, satisfatório, moralmente aceito,

permitir relações humanas, garantir segurança e autonomia, além de manter as pessoas

ocupadas.

2.2.A teoria da atividade como subsídio para compreender o processo de significação no

trabalho

O processo de significação se constitui por três componentes e a combinação deles: os

significados produzidos, os sentidos e a atividade (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015). A

concepção adotada nesta produção é de que sentido e significado são uma unidade indivisível

mediada pela atividade (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015). Desse modo, essa dissertação

está voltada às tradições da teoria da atividade, cujo objeto de análise é o processo dialético de

transformação entre o sujeito e o meio (Piccolo, 2012).

A atividade é o modo de mediação entre o sujeito e a realidade externa, é o modo

como nos enraizamos no mundo. O conceito de atividade deriva do tratamento sociológico

dado a categoria de trabalho por Marx (Piccolo, 2012). Para esse autor, por meio da ação

humana, o homem é capaz de transformar a matéria e atribuir utilidade a ela (Marx, 1987). Ao

longo do tempo, o processo de produção de sentido e significado é aprofundado nas teorias da

atividade, por meio da mediação pelas relações sociais implicadas ao trabalho, assim como a

mediação por ferramentas, equipamentos, tecnologia e cultura (Cole, Engeström, & Vasquez,

1997; Valsiner, 2007).

A categoria trabalho tem uma posição central nessa teoria, uma vez que ela humaniza

o homem, na mesma medida em que potencializa o seu desenvolvimento. Ao agir

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intencionalmente sobre a natureza, na busca de atender suas necessidades e produzir o que

deseja, o homem deixa suas marcas e também transforma a si próprio, produzindo sentidos e

significados. Como resultado disso, o homem torna-se parte do gênero humano (Moretti,

Asbahr, & Rigon, 2011; Molon, 2008).

Ao longo da história, surgiram diversas críticas a teoria da atividade, da qual existiram

três gerações. A primeira geração é representada por Vygotsky e Leontiev, os quais

sistematizaram o conceito da atividade e a hierarquia desse sistema.

2.2.1. Sentido, significado e atividade em Vygotsky

Para Vygotsky, tudo é resultado da atividade humana quando em relações sociais

(Zanella, 2004). Para tanto, há três aspectos fundamentais que caracterizam a atividade

humana:

a) ser orientada por um objetivo, b) fazer uso dos instrumentos de mediação, e c)

produzir algo que podemos caracterizar como elemento da cultura – seja por sua

existência física seja por sua existência simbólica - e que consiste na objetivação do

ser humano. (Zanella, 2004, p. 130).

Figura 1. Modelo de Atividade de Vygotsky.

Fonte: Vygotsky, 1978, p. 40.

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Na Figura 1, o sujeito é o agente cujo comportamento se pretende analisar;

artefato/ferramenta são objetos que auxiliem na obtenção do resultado; e o objeto é o material

bruto sobre o qual o sujeito vai agir. Desse modo, pressupõe-se que toda atividade é orientada

a um objetivo (Zanella, 2004), o que supõe que essa seja, portanto, consciente. A capacidade

de planejar as ações torna a consciência inseparável da atividade, o que constitui uma

dialogicidade.

É a partir disso que consciência e atividade se constituem mutuamente por meio do

uso da linguagem como artefato mediador. A atividade é o que mediatiza a relação do homem

com a realidade objetiva; e a consciência, a forma humana de reflexo psíquico da realidade,

ou melhor, produto das relações sociais instituídas pela vida social (Bernardes, 2010; Moretti

et al., 2011).

“A atividade mais geral e fundamental do ser humano, a que diferencia em primeiro

lugar o homem dos animais desde o ponto de vista psicológico é a significação, quer dizer, a

criação e emprego de signos” (Vygotsky, 1998, p. 84). Vygotsky (2001) introduziu uma

diferenciação entre sentidos e significados. As investigações psicológicas que abordam as

práticas sociais e seus processos de significação apresentam diversas implicações. Primeiro,

os sentidos, nos quais há relações de recursividade e de constituição dialética entre as relações

sociais e os processos psicológicos, são necessariamente contextuais; segundo, o que o sujeito

diz no curso de uma investigação psicológica não contém sentido em si mesmo, é uma criação

resultante da interação face a face; por fim, terceiro, as articulações entre sentido e significado

constituem um jogo de forças entre semelhanças e diferenças com estabilidades distintas

(Barros, Paula, Pascual, Colaço, & Ximenes, 2009).

O termo sentido aparece em Pensamento e Palavra (Vygotsky, 2001) como

fundamental na investigação da relação entre pensamento e linguagem, e esse mesmo termo é

apresentado em sua obra como central à dinâmica dos significados da linguagem verbal

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(Asbahr, 2014). Para tanto, reitera as particularidades da linguagem interior, dirigida ao

sujeito, em relação ao exterior. Nesse caso, o sentido é mais amplo que o significado e propõe

ressaltar aquilo que é especificamente humano do homem, o que o faz avançar numa

investigação acerca da constituição da consciência humana e estabelecer a unidade entre

cognição e emoção (Asbahr, 2014; Barros et al., 2009).

o sentido de uma palavra é a soma de todos os fatos psicológicos que ela desperta em

nossa consciência. Assim, o sentido é sempre uma formação dinâmica, fluida,

complexa, que tem várias zonas de estabilidade variada. O significado é apenas uma

dessas zonas do sentido que a palavra adquire no contexto de algum discurso e,

ademais, uma zona mais estável, uniforme e exata (Vygotsky, 2001, p. 465).

Contudo, o termo sentido ainda aparece com pouca notoriedade (Barros et al., 2009).

A emergência do conceito de sentido se deve ao esforço de Vygotsky em explicar a

especificidade da condição humana, tendo como foco a historicidade e o caráter semiótico dos

processos psicológicos humanos (Barros, 2012).

Pensando nisso, atribui-se a importância de dar maior visibilidade a esse termo como

uma forma de compreender os constructos que dele se originam. Principalmente as

possibilidades que o termo sentido oferece ao se fazer investigações que enfoquem na

centralidade dos processos de significação como constituinte social das funções psicológicas

propriamente humanas (Barros et al., 2009).

O sentido, portanto, é um acontecimento semântico particular, dinâmico, complexo e

instável da significação, constituído pelas relações sociais, haja vista o princípio da

historicidade dos processos humanos, legado do materialismo histórico dialético. Por isso, o

sentido se produz nas práticas sociais, por meio da articulação dialética (interno e externo)

para a construção do mundo psicológico. Desse modo, há múltiplas construções de sentido, ou

seja, a dimensão dos sentidos é integrada por aspectos cognitivos e afetivos, bem como por

processos individuais e coletivos (Barros et al., 2009).

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Assim, sentidos e significados são produzidos na relação entre os sujeitos, por meio da

atividade, que é marcada pelas trajetórias e experiências, bem como pelas condições e

características do contexto histórico de cada um e de todos do gênero humano (Zanella et al.,

2007).

2.2.2. Sentido, significado e atividade em Leontiev

Já para Leontiev, o trabalho é a atividade principal, e a estrutura da atividade apresenta

duas características centrais: 1) a de orientação, que compreende as necessidades, os motivos

e as tarefas; e 2) a de execução, constituída pelas ações e suas operações, conforme é possível

observar na Figura 2. Para entender a ação é preciso compreender o motivo por trás da

atividade em que está inserida, ou seja, a atividade que a direciona. Por isso, as ações se

transformam em atividade; e as atividades, ao perderem seus motivos, transformam-se em

ações. Enquanto isso, as ações, ao se tornarem procedimentos para alcançarem objetivos,

configuram-se em operações (Moretti et al., 2011).

Quando o ser humano passou a viver em sociedade, e com a consequente divisão do

trabalho, foi que apareceu o que Leontiev denomina atividade. A associação entre uma

necessidade e sua satisfação deixou de ser direta, mas fracionada em decorrência da atividade

coletiva, com o uso de diferentes ferramentas. Isto é, as necessidades passaram a ser

satisfeitas através de ações coletivas de um grupo em interação social (Damiani, 2006).

Desse modo, a atividade existe por meio de ações ou conjuntos de ações. Leontiev

(1978a) descreve: “por atividade, designamos os processos psicologicamente caracterizados

por aquilo que o processo, como um todo, se dirige (seu objeto), coincidindo sempre com o

objetivo que estimula o sujeito a executar essa atividade, isto é motivo” (p. 68). A atividade é

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abstrata, ela não pode ser diretamente percebida, o que se percebe são as ações que a

compõem.

Nesse sentido, a ação é um processo parcelar da atividade em unidades menores e não

possui relação direta com o motivo da atividade, mas, sim, guarda relação com o todo. Enfim,

no contexto da teoria da atividade, a ação é um processo subordinado a um objetivo

anteriormente estabelecido e consciente, orientado pelo motivo da atividade, uma vez que

existe como integrante de um conjunto maior que é o da atividade. A atividade só coincide

com a ação quando é composta por uma única ação (Piccolo, 2012). Cada tipo de ação

compõe diferentes tipos de atividade e cada atividade pode acontecer por meio de diferentes

ações.

Figura 2. Estrutura hierárquica da atividade em Leontiev.

Na Figura 2, é possível observar que as operações são acionadas por condições e

ferramentas disponíveis para a ação; já o objeto em mudança e em desenvolvimento de uma

atividade está relacionado ao motivo que o impulsiona. A ação individual é impulsionada por

uma meta consciente (Daniels, 2003). “Embora ações sejam despertadas pelo motivo da

atividade, parecem ser dirigidas para uma meta (...) e uma mesma ação pode servir a

diferentes atividades” (Leontiev, 1978a, p. 64).

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Ainda assim, conforme exposto na Figura 2, as operações remetem aos métodos para

realizar diferentes ações; a ação está para os objetivos, de como pode ser realizada, individual

ou coletivamente; e, por fim, a atividade responde à necessidade, ou seja, ao porquê de tal

ação.

O fenômeno mais desenvolvido explica o menos desenvolvido, porém o contrário não

é verdadeiro (...) A atividade é composta de uma cadeia de ações cujos fins respondem

indiretamente ao motivo da atividade. As ações, por sua vez, são constituídas por

operações (Martins & Eidt, 2010, p. 679).

Leontiev, ao se apropriar do termo sentido, o denomina de sentido pessoal e o

relaciona com atividade e consciência humana; e, ainda, alerta que o sentido é “antes de mais

nada uma relação que se cria na vida, na actividade do sujeito” (Leontiev, 1978b, p. 97). “(...)

o sentido se exprime nas significações (como o motivo nos fins) e não a significação no

sentido” (Leontiev, 1978a, p. 104).

Quanto ao significado, Basso (1998) evidencia, com base nos estudos de Leontiev

(1978b), que significado é a generalização e a fixação da prática social humana representada

por instrumentos, técnicas, linguagem e relações sociais; e sentido é a razão, o motivo que

incita a pessoa a realizar seu trabalho (Andrade, Tolfo, & Dellagnelo, 2012).

2.2.3. Sentido, significado e atividade em Engeström

A primeira geração apresentou limitações, pois Vygotsky utilizou, como unidade de

análise, os processos básicos superiores. A segunda geração da teoria da atividade foi

desenvolvida com base nos estudos de Engeström, que expandiu o modelo de Leontiev

adicionando o nível macro a estrutura da atividade, com os seguintes elementos: artefatos,

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sujeitos, objetos, divisão do trabalho, regras e comunidade (Piccolo, 2012). Segundo esse

autor, o estudo de ferramentas ou artefatos deve ser visto “como componentes do

funcionamento humano, integrais e inseparáveis” (Engeström, 1999), por isso, o foco do

estudo da mediação deveria ser na sua relação com os outros componentes de um sistema de

atividade (Daniels, 2003).

Enquanto isso, a terceira geração é de autores que investigam a teoria da atividade

como uma rede de atividades (Piccolo, 2012). Esses autores buscam desenvolver ferramentas

conceituais para a compreensão de diálogos, de múltiplas perspectivas e de redes de sistemas

de atividade em interação (Daniels, 2003).

Como é possível perceber, Vygotsky deu ênfase ao conceito de mediação e do estudo

de ferramentas e artefatos como partes do funcionamento humano, integrais e inseparáveis. Já

Leontiev deu ênfase à estrutura hierárquica da atividade. Por sua vez, Engeström, ao se

apropriar dessas concepções, propõe estudar a mediação na relação com outros componentes

de um sistema de atividade; ou seja, ele propõe ir além do sistema de atividade singular

(Bulgacov, Camargo, Canopf, Matos, & Zdepski, 2014). É com Engeström que o sistema de

atividade servirá de referência nessa produção, pois, com base em suas concepções,

encontramos caminhos para entender a realidade, haja vista o foco por estudar os motivos que

dão sentidos e significados a atividade.

Para Engeström (1987), a atividade é uma formação coletiva, sistêmica, que possui

uma estrutura mediadora complexa. O sistema de atividade produz ações e, também, é

realizado por meio de ações (Daniels, 2003). Na estrutura do sistema de atividade proposto

por Engeström, há uma relação de interdependência entre os elementos sociais/coletivos –

representados pela comunidade, regras e divisão do trabalho – e as ações orientadas por

objetos são sempre caracterizadas por ambiguidade, interpretação e produção de sentidos

(Daniels, 2003; Engeström, 1999), conforme é possível observar na Figura 3.

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Figura 3. Estrutura de um sistema de atividade humana.

Fonte: Engeström (1987).

Os elementos do sistema serão descritos abaixo, conforme é apresentado em Beffa

(2016):

Sujeito: representa a natureza individual, mas também coletiva, da atividade humana,

indivíduo e subgrupo de pessoas;

Objeto: é o significado, o motivo e a finalidade de um sistema de atividade coletiva:

É considerado como matéria-prima para os sujeitos envolvidos em uma atividade,

estando aberto a inúmeras e parciais interpretações. Essa matéria-prima, que contém

um determinado conflito ou problema a ser resolvido, é vista como decorrente de

constantes interpretações, reconstruções e modificações impelidas pela ação dos

sujeitos, interessando revelar, portanto, o caráter contraditório e historicamente

mutável dos sistemas envolvidos na produção da atividade (Beffa, 2016, p. 7).

Ferramentas: envolvem os instrumentos da ação dos sujeitos, de forma física ou

simbólica, interna ou externa;

Comunidade: onde a atividade está situada dentro do contexto sociocultural daqueles

sujeitos que compartilham o mesmo objeto da atividade;

Regras: relacionamento entre os sujeitos e a comunidade. Tem a ver com regulamentos,

normas, práticas e convenções relacionadas à prática das atividades. Pode aparecer de

forma explícita (leis) e implícita (relações de amizade e poder);

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Divisão do Trabalho: distribuição de responsabilidades e a variação de papeis dos sujeitos

envolvidos na execução de uma atividade dentro de uma comunidade; implica em relações

hierárquicas, submissões, conflitos;

Com base nessa abordagem, é possível estudar diferentes formas das práticas

humanas, ou seja, as atividades como processo de desenvolvimento (Engeström, 1987). A

análise da atividade humana e das práticas humanas como processo de desenvolvimento,

interligando o individual e o social, ajuda na compreensão do fazer humano, da consciência,

do pensamento e da ação voltada para a mudança (Beffa, 2016).

Nesse sentido, as ações humanas são voltadas para um objeto ou objetivo e esse

direcionamento é intermediado por um contexto social mais amplo, a saber: os artefatos

culturais, as regras sociais, a comunidade e a divisão do trabalho. Do mesmo modo, o sujeito

se direciona a um objetivo ou objeto, estando também sob mediação dos artefatos culturais ou

simbólicos (ferramentas). Esse modo de pensamento altera o foco para as interrelações

complexas entre o sujeito individual e sua comunidade.

As ações orientadas por objeto são sempre caracterizadas por ambiguidade,

interpretação e produção de sentidos, já que a atividade é um fenômeno dinâmico e construído

historicamente, e tendo em vista os cinco princípios que regem a teoria: 1) o sistema de

atividade é coletivo e deve ser visto em sua relação de redes com outros sistemas de atividade;

2) no sistema de atividade há uma multiplicidade de vozes, uma vez que há múltiplos pontos

de vista, tradições e interesses; 3) os sistemas de atividade humana tomam forma e são

transformados ao longo do tempo; 4) as contradições são fontes de mudança e

desenvolvimento; por fim, 5) no sistema de atividade humana é possível a existência de

transformações expansivas, isto é, quando o objeto e o motivo da atividade são conceituados

novamente (Daniels, 2003).

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É por meio das regras do seu ofício, dos valores e saberes compartilhados por sua

comunidade de pertencimento ou seus pares, que o sujeito tem acesso aos significados. Esses

significados se desenvolvem como recursos para a ação. Porém, para que haja ação, é exigido

do sujeito planejamento da ação. Em sendo consciente, o sujeito pode falar sobre a atividade.

Assim, a atividade possui duas dimensões: 1) objetiva, em que há a produção de objetos e

serviços; e 2) subjetiva, quando há a apropriação de vários significados envolvidos na

produção de novos sentidos (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015).

Todavia, a passagem do mundo real para o mundo interno não é reflexo do mundo

social. Para isso, faz-se necessário os artefatos mediadores, como, por exemplo, a linguagem e

a atividade coletiva laboral (Moretti et al., 2011). A relação entre linguagem e consciência

também tem sua importância, porém,

não é a palavra por si mesma o que constitui o eixo da consciência, mas os

conhecimentos socialmente acumulados e objetivados na palavra. A palavra é

essencial para a consciência precisamente porque nela se sedimentam, se objetivam, e

através dela se atualizam os conhecimentos graças aos quais o homem adquire

consciência da realidade (Rubinstein, 1965, p. 372).

A linguagem, por sua vez, denota importância, por conter elementos pessoais e

transpessoais vinculados a narrativas compartilhadas, o que auxilia na denominação de

determinados contextos, formas de vida, e compõe o processo de socialização; assim,

também, é por meio da linguagem que o sujeito se singulariza, por meio do movimento e

processo de interiorização e exteriorização (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015).

Ao se relacionar com o gênero humano, sob mediação, o homem consegue fazer

apropriações (interiorização) e objetivações do contexto em que vive (Moretti et al., 2011).

Portanto, nesse movimento, há o processo de subjetivação, decorrente dos significados

internalizados, e o processo de objetivação (externalização), por meio do compartilhamento

de sentidos (Bendassolli & Coelho-Lima, 2015).

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Para o processo de apropriação da realidade, importância se dá aos signos

(instrumento de significação) e instrumentos como mediadores, pois a atividade do indivíduo

sobre o objeto não é direta (Hila, 2009). Os signos são instrumentos psicológicos produzidos

socialmente e são utilizados pelo gênero humano na comunicação consigo e com os outros.

Caracterizam-se pela reversibilidade, ou seja, são capazes de representar algo tanto para quem

recebe quanto para quem emite, embora essa representação não seja coincidente (Zanella,

2004). São, portanto, os instrumentos que orientam a transformação da atividade externa ao

homem e, por outro lado, o signo que orienta a transformação da atividade interna. Eis as

significações (Bernardes, 2010).

2.3. Em síntese...

O sentido é resultado da interação real existente entre o homem e o mundo, ele é

inconstante e dinâmico, e mais: é o processo de produção singular dos significados. Enquanto

isso, o significado é a narrativa socialmente disponível sobre determinado tema, é resultante

das apropriações efetivadas pelo homem ao longo da história, isto é, produto do movimento

histórico de apropriação da realidade. É imutável e estável.

Os significados são o modo como sintetizamos as práticas sociais, a forma ideal de

existência no mundo objetal; porém, esses significados possuem uma relação de

interdependência com os sentidos, pois a forma como o indivíduo se apropria do significado

depende do sentido pessoal, cuja criação se dá pela relação entre o que incita a ação no sujeito

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e aquilo para o qual a sua ação se orienta, ou seja, a relação entre motivo e fim da atividade

(Asbahr, 2014).

Embora haja diferença entre sentidos e significados, estes compõem uma unidade

indivisível, medida pela atividade. Desse modo, ambos são parte do mesmo fenômeno e a

compreensão de ambos, mediados pela atividade, constitui o processo de significação

(Bendassolli & Coelho-Lima, 2015), como é possível observar na Figura 4.

Figura 4. Sistema de atividade proposto por Engeström (adaptado).

Fonte: Bendassolli & Coelho-Lima, 2015.

A significação, apropriação da atividade pelo sujeito (Kahhale & Rosa, 2009), é um

processo, pois implica no movimento de produção e transformação coletiva de significados e

sentidos, além da apropriação privada (Zanella, 2004). O sujeito atribui significados a

realidade objetiva, tornando-a subjetiva, por meio da atribuição de sentidos próprios

(Maheirie, 2002). Assim, as significações se referem àquilo que alguma coisa significa, pois

as coisas não significam por si só, tampouco significam a mesma coisa para indivíduos

diferentes (Zanella, 2001). Por significação do trabalho se entende a forma como o individuo

apreende, compreende e define o trabalho, assim como a importância e o valor que atribui ao

trabalho (Andrade et al., 2012).

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3. Delineamento da pesquisa e aspectos metodológicos

A concepção de homem adotada nesta dissertação resulta em um conjunto de aspectos

individuais e sociais (Moretti et al., 2011). Desse modo, a realidade do fenômeno humano

deve ser compreendida por meio da historicidade da condição humana, o que pressupõe que

estudar algo historicamente significa estudá-lo em processo de mudança (Vygotsky, 1995).

Diante dessa perspectiva, no presente estudo, assumimos uma compreensão dialética e

histórica da realidade social em que o objeto de análise da teoria da atividade é o duplo

processo dialético de transformação entre o meio e o sujeito (Piccolo, 2012). Isso subsidia o

método que orienta esta produção, bem como os objetivos e o modo de proceder na realização

da pesquisa empírica.

A seguir, será apresentado o delineamento da pesquisa, a descrição do plano de

execução da mesma, local e participantes do estudo, instrumento e técnica de pesquisa,

procedimentos de acesso e de análise das informações.

3.1. Delineamento geral da pesquisa

O presente estudo apresenta delineamento transversal, exploratório e descritivo, de

abordagem qualitativa, uma vez que responde a questões particulares que não podem ou não

devem ser quantificadas pelo fato de trabalharem com o universo de significados, crenças,

valores e atitudes (Minayo, 2013). Somado a isso, a abordagem qualitativa é mais adequada

na resolução da problemática aqui descrita, bem como para responder aos objetivos aqui

apresentados.

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A pesquisa qualitativa, ora descrita, busca realizar uma leitura interpretativa do texto,

das situações e registros, de modo que utiliza as representações das construções sociais, assim

como as significações dos sujeitos pesquisados inseridos num contexto histórico igualmente

importante para a construção dessas representações e significados. Ainda assim, propõe o

caráter construtivo interpretativo do conhecimento, o que implica dizer que o conhecimento é

uma construção, uma produção humana, bem como não é uma apropriação linear de uma

realidade ou que está pronto para conhecer (Rey, 2012).

Para tanto, esta pesquisa tem como objetivo compreender o processo de significação

do trabalho para diaristas que atuam em Natal, RN. Especificamente, investigar os sentidos

associados ao trabalho a partir da compreensão da atividade concreta realizada pela diarista e

identificar as estratégias utilizadas pelas participantes para realizar sua atividade laboral e nela

encontrar sentido.

3.2. Local e perfil dos participantes

Esta pesquisa foi realizada com diaristas que possuíam cadastro ativo pelo Sistema

Nacional de Empregos do RN (SINE), e aconteceu no próprio estabelecimento do SINE. No

momento do estudo, no Espaço Profissional Autônomo (EPA), havia cerca de 110 candidatos

cadastrados como profissionais autônomos diaristas, sendo 3 do sexo masculino e 107 do sexo

feminino. Entretanto, apenas 60 pessoas, dentre as 110, estavam com cadastro ativo e eram

agenciadas pela instituição; nenhuma dessas do sexo masculino. A função predominante das

pessoas cadastradas eram as seguintes: faxineira, lavadeira, passadeira e ajudante geral.

A seleção das diaristas ocorreu via livre consentimento, totalizando 12 participantes,

das quais 6 eram cadastradas para a função de lavadeira e passadeira e outras 6 para a função

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de faxina e ajuda geral. A Tabela 1 expõe algumas características sociodemográficas das

participantes:

Tabela 1

Caracterização sociodemográfica das participantes diaristas

Diarista Idade Escolaridade Onde

reside

Tempo como

diarista

Horas

trabalhadas

Dias da

semana

D 1 52 anos até o 1º ano Macaíba 19 anos 9 horas 5 dias

D 2 44 anos até o 5º ano Ceará

Mirim 21 anos 9 horas 3 dias

D 3 57 anos até o 4º ano Natal 34 anos 8 horas 2 dias

D 4 64 anos até o 3º ano

Natal 15 anos

8 horas 4 dias

D 5 59 anos até o 3º ano

Natal 14 anos 8 horas 4 dias

D 6 58 anos até o 3º ano

Natal 19 anos 8 horas 3 dias

D 7 53 anos até o 6º ano

Natal 24 anos 9 horas 4 dias

D 8 66 anos até o 9º ano

Natal 39 anos 8 horas 3 dias

D 9 44 anos até o 9º ano

Natal 22 anos 11 horas 2 dias

D 10 55 anos até o 2º ano

Natal 20 anos 8 horas 5 dias

D 11

50 anos

2º grau

incompleto

Natal

40 anos

8 horas

2 dias

D 12

43 anos até o 8º ano

Natal

20 anos

10 horas

3 dias

Como é possível observar, as diaristas entrevistadas encontravam-se numa faixa etária

que variava dos 43 aos 66 anos. Apenas uma delas ingressou no ensino médio, porém

inconcluso. Duas delas moravam na região metropolitana de Natal e as que residem na própria

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capital moravam, predominantemente, nas regiões administrativas da zona oeste e zona norte,

nos bairros de Felipe Camarão e Guarapes, e Potengi e Igapó, respectivamente.1

Apesar do SINE informar na carta de encaminhamento que o profissional deve

permanecer 9 horas na residência, sendo 8 horas de trabalho e uma hora de almoço, é possível

perceber que algumas delas excediam o tempo de trabalho previsto, reflexo da ausência de

direitos e deveres da atividade de trabalho.

3.3. Instrumento, técnica e acesso às informações dos participantes

O instrumento foi construído levando em consideração quatro dimensões e módulos

temáticos que têm influência sobre a atividade de trabalho das diaristas: 1) a história de vida e

características sociodemográficas; 2) caracterização da atividade de trabalho; 3) influência do

envelhecimento na atividade de trabalho; e 4) os sentidos e significados do trabalho.

A técnica de investigação utilizada foi a entrevista individual semiestruturada, com

auxílio de um roteiro (Apêndice A), que permitia ao entrevistado responder sobre o tema sem

se prender a indagação formulada (Minayo, 2013). As entrevistas foram gravadas e

transcritas. Tiveram duração entre uma hora e duas horas e vinte minutos.

O uso da entrevista individual é um processo social ou uma interação. Não consiste

num processo de informação única, na verdade é uma interação, uma troca de ideias e de

significados, em que as diversas realidades são exploradas e desenvolvidas. Desse modo, essa

técnica nos permitiu explorar em profundidade a história de vida dos indivíduos, as

1 Na zona oeste: no bairro do Guarapes, 34,94% dos rendimentos estão entre ¼ a ½ salário mínimo; em Felipe

camarão, 35,15% estão entre mais da metade de um salário a um salário mínimo. Na zona norte, ambos os

bairros estão com rendimentos entre mais da metade de um salário a um salário mínimo, sendo 34,77% no

Potengi e 37,38% em Igapó (Hora, Medeiros, & Capistrano, 2013).

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experiências individuais detalhadas e suas escolhas (Gaskell, 2002). São fontes que retratam a

reflexão do próprio sujeito sobre a realidade vivenciada. Do mesmo modo, “as entrevistas

geram compreensões ricas das biografias, experiências, opiniões, valores, aspirações, atitudes

e sentimentos das pessoas” (May, 2004, p. 145).

A apreensão da atividade se deu por meio do autorrelato, haja vista que não há

experiência humana que não possa ser narrada exatamente porque não há experiência humana

que não possa ser significada (Aguiar & Ozella, 2006; 2013). A fala, tomada na situação de

pesquisa, passa por um momento de reelaboração e serve como instrumento ou recurso

simbólico para a atividade (Bendassolli & Coelho-Lima, no prelo).

A etapa de realização das entrevistas foi finalizada quando foi observado o ponto de

saturação, por motivos teóricos e empíricos, com as 12 entrevistas. Nesse momento, temas

comuns começaram a aparecer, ou seja, não apareceram novas surpresas ou percepções nas

narrativas das pessoas, foi perceptível que já havia informações suficientes para responder a

problemática e os objetivos, considerando o aporte teórico (Guba & Lincoln, 1994).

3.4. Procedimento de acesso às informações e cuidados éticos

A pesquisa foi realizada com diaristas que possuíam cadastro ativo junto ao SINE do

RN, regional Natal/RN, e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/UFRN),

conforme o parecer 1.379.614, de 22 de dezembro de 2015.

Inicialmente, entramos em contato com o SINE/RN. O SINE consiste em uma

instituição vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), instituída pelo Decreto nº

76.403, de 08 outubro de 1975, que opera no estado desde 1977. Essa instituição visa

implementar políticas públicas de emprego e de combate ao desemprego; oferecer

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atendimento e orientação ao trabalhador através da participação nos Programas e Projetos de

Qualificação e Requalificação Profissional, Geração de Renda e Intermediação de Mão-de-

Obra, proporcionando ao empregador uma oferta de mão-de-obra mais qualificada para

atender às suas necessidades. No mais, o SINE/RN cadastra, seleciona e prepara os candidatos

para as necessidades do mercado.

Mediante apresentação do projeto, foi solicitada a anuência da instituição para a

execução da pesquisa, bem como autorização para o manuseio do banco de dados dos

profissionais autônomos, na modalidade de diarista, cadastrados na instituição para

identificação e delineamento da investigação.

A abordagem às participantes, inicialmente, se deu de forma presencial, quando a

pesquisadora começou a dar plantões no SINE, haja vista que algumas delas compareciam a

instituição para pegar a carta de encaminhamento, ou até mesmo em busca de oportunidades

de agenciamentos. Desse modo, a pesquisadora responsável poderia convidá-las para

participar da pesquisa. Porém, essa iniciativa não teve sucesso, o que nos fez recorrer ao

contato via telefone, quando, então, eram agendados o dia para a participação das diaristas na

referida pesquisa. Mesmo com os agendamentos e confirmação das entrevistas no dia anterior,

houve diversos episódios de não comparecimento.

Após os devidos esclarecimentos sobre a pesquisa e anuência das participantes

através da leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE,

disponível no Apêndice B) e do Termo de Autorização para Gravação de Voz (Apêndice C), a

coleta de dados ocorreu em entrevista individual, tendo início em abril de 2016 e se

estendendo até agosto do mesmo ano.

Para participar das entrevistas, as trabalhadoras deveriam apresentar os seguintes

critérios de inclusão: (a) realizar trabalhos domésticos na modalidade de diarista, (b) aceitar o

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convite para contribuir com a pesquisa de forma voluntária, (c) realizar suas atividades

laborais na cidade de Natal/ RN.

Torna-se válido esclarecer que foram encontradas dificuldades no acesso às

participantes no campo da pesquisa. O recurso utilizado para acessar e convidar as

participantes foi o contato telefônico, no entanto, por dificuldades financeiras de acesso ao

SINE e indisponibilidade de tempo, muitas das diaristas convidadas optaram por não

participar do estudo.

3.5. Procedimento de análise das entrevistas

“A atividade humana é sempre significada: o homem, no agir humano, realiza uma

atividade externa e uma interna, e ambas as situações operam com os significados” (Aguiar &

Ozella, 2006, p. 226). Pensando nisso, apostamos nos núcleos de significação como proposta

coerente para a análise das narrativas das diaristas. Nesse sentido, as palavras não são

suficientes para entender o discurso dos indivíduos investigados, é necessária a apreensão de

suas zonas de sentido, uma vez que o foco é apreender os significados das palavras que

expressam partes do pensamento e, ao mesmo passo, os sentidos que expressam os fatos

psicológicos vividos. Desse modo é possível compreender a maneira de pensar, sentir e agir

(Araújo, 2015).

A proposta de análise e de interpretação dos dados adotada nesse trabalho valoriza a

narrativa da diarista como instrumento de mediação que nos possibilita ter acesso aos

significados e aos sentidos que a mesma produz e reconstrói sobre a atividade. Entender a

diarista implica aproximar-se das zonas de sentido, isto é, os sentidos da sua atividade no

mundo (Aguiar & Ozella, 2013). As múltiplas determinações, aqui, no caso das diaristas, que

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incluem seus motivos, necessidades e interesses, tornaram-se alvo de nosso olhar cada vez

mais atento à medida que avançamos nas etapas de análise do material produzido (Araújo,

2015).

A proposta dos núcleos de significação visa dar respostas à “necessidade de uma teoria

que fizesse a mediação entre o método materialista histórico e os fenômenos psíquicos”

(Aguiar & Ozella, 2013, p. 300). Assim, com tal proposta encontramos a possibilidade de

penetrar no real por meio da aproximação do concreto, que é síntese de múltiplas

determinações. Por isso, no tratamento dos dados, a pergunta principal deixa de ser “o que é”

e passa a ser “como surgiu, se movimentou e se transformou” (Aguiar & Ozella, 2013, p.303).

A análise dos dados realizada por meio do núcleo de significação prevê três momentos.

Primeiramente, são feitas leituras recorrentes, que permitem a familiarização e a apropriação

dos conteúdos temáticos presentes no conjunto dos dados. É realizada uma leitura flutuante do

material transcrito, destacando conteúdos ou temas que se apresentem com maior frequência,

levando-se em consideração a importância dada pelo entrevistado, seja por apresentar carga

emocional, ambivalências ou contradições, e até mesmo por insinuações não concretizadas

(Aguiar, Soares, & Machado, 2015).

Nesse momento, é a palavra com significado que se destaca, sendo a intenção fazer

uma análise do sujeito, levando em consideração a sua narrativa, mas também as condições

históricas e sociais que o constituem. As palavras articuladas que compõem o significado são

denominadas de pré-indicadores. Esses, por sua vez, expressam a totalidade do sujeito e

constituem a unidade pensamento e linguagem, tendo como foco o objeto de investigação

(Aguiar & Ozella, 2013). Em geral, os pré-indicadores aparecem em grande número e com

vasta diversidade, até que sejam aglutinados por condições de similaridade,

complementariedade e contraposição.

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Em um segundo momento, é feita a articulação dos pré-indicadores em indicadores, os

quais só adquirem significados quando inseridos e articulados aos conteúdos temáticos

contidos nas expressões do sujeito. Por isso, é necessário selecionar trechos que ilustram e

esclarecem os indicadores (Aguiar & Ozella, 2006). Por fim, em um terceiro momento, é feita

a aglutinação dos indicadores em núcleos de significação, por meio da articulação de

conteúdos semelhantes, complementares e/ou contraditórios. Nesse momento, é possível

identificar as transformações e contradições que ocorrem no processo de construção dos

sentidos e significados, o que infere conhecer as condições subjetivas, contextuais e históricas

(Aguiar & Ozella, 2006).

Os núcleos de significação devem superar os pré-indicadores e os indicadores a fim de

avançar em direção ao concreto pensado, ou seja, as zonas de sentido. Por isso, deverá haver

um número reduzido de núcleos, de modo a expressar os pontos centrais e fundamentais que

tragam implicações para o sujeito, envolvam-no emocionalmente e tragam as determinações

constitutivas do sujeito (Aguiar & Ozella, 2013).

Para tanto, cada entrevista foi lida separadamente, seguida do destaque de possíveis

pré-indicadores. Os pré-indicadores e indicadores foram organizados no Software Excel 2010

(Apêndice D). Para cada entrevista havia a coluna pré-indicadores e a página onde se

localizava tal pré-indicador. Na segunda leitura, em atenção ao contexto da fala, foram feitas

as primeiras tentativas de identificar indicadores, adicionando-os a uma nova coluna. Desse

modo, cada pré-indicador era selecionado para integrar determinado grupo de indicadores.

Por conseguinte, é dado início a um processo de análise intranúcleo, que mostra as

semelhanças, ambivalências e contradições revelando o movimento do sujeito. Posteriormente

avançamos para uma análise internúcleo (Aguiar & Ozella, 2013). Essa última se trata de um

exercício de articular alguns temas que, ao terem sido abordados de modo peculiar pelos

sujeitos, atravessam diversos núcleos de significação deste trabalho. O processo de articulação

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internúcleos pode trazer a tona semelhanças e/ou contradições dos modos de ser dos sujeitos.

Essas contradições não exatamente estão manifestas nos discursos, são apreendidas a partir da

análise do pesquisador. Esse procedimento ajuda a constatar a totalidade do sujeito no

movimento da produção de sentidos (Aguiar & Ozella, 2006).

A proposta não é construir novos sentidos, mas reavaliar o modo de construção desses

sentidos, construindo uma trama interpretativa que liga todos os núcleos entre si, desvendando

os aspectos centrais dos sujeitos e expandindo, por meio da teoria, o conhecimento alcançado.

Isto quer dizer que o objetivo da pesquisa é explicar o concreto, ou seja, a realidade.

Para isto é preciso transpor, pela faculdade de abstração, o concreto dado para nossa

mente, produzindo assim o concreto-pensado, que é na realidade o concreto dado

transposto para mente humana. Após, feita esta transposição, deve se voltar novamente

o concreto pensado para o concreto dado, pois os dois devem estar em íntima relação.

Afinal, se fosse de outra forma, a pesquisa não teria sentido, na medida em que não

conseguiria explicar a realidade, fim último de qualquer pesquisa realmente

compromissada e livre. (Santos, 2004, p. 8).

A análise internúcleo não deve ser a repetição dos aspectos já tratados nas análises

anteriores. A proposta é identificar e apresentar analiticamente a relação dos aspectos que

estão presentes em todos os núcleos de maneira direta e indireta, com vistas a unicidade da

análise. Essa análise deve trazer algo novo ao revelar a relação entre os mais diversos

elementos (Silva & Davis, 2016).

A análise por núcleos de significação auxilia o pesquisador no processo de apreensão e

desvelamento da subjetividade do indivíduo analisado, isto é, seus modos de pensar, sentir e

agir ao discutir as zonas de significado e sentido que estão sendo produzidas (Aguiar &

Ozella, 2013). Esse modo de análise é considerado construtivo-interpretativo, uma vez que é

atravessado pela compreensão crítica do pesquisador em relação à realidade, ou seja, parte do

empírico ou do que é abstrato, mas o supera e concretiza (Aguiar & Ozella, 2013).

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Acreditamos na possibilidade de potencializar a abertura de novos caminhos, ou seja, a

constituição de elementos de sentido que possam contribuir com a mudança qualitativa da

forma como lidar com sua atividade de trabalho e com as circunstâncias que as rodeia.

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4. Resultados e discussão

4.1. Núcleos de significação inferidos e sistematizados a partir das entrevistas

Os pré-indicadores apareceram em grande número, como era de se esperar, mas, a

partir do processo de aglutinação, somaram-se 33 indicadores. Nem todos apareceram em

todas as entrevistas, conforme é possível observar na Tabela 2.

Tabela 2

Número de pré-indicadores e indicadores por entrevista

Entrevistada Número de pré-indicadores Número de indicadores

D 1 200 pré-indicadores 28 indicadores

D 2 279 pré-indicadores 32 indicadores

D 3 158 pré-indicadores 28 indicadores

D 4 118 pré-indicadores 27 indicadores

D 5 148 pré-indicadores 30 indicadores

D 6 155 pré-indicadores 28 indicadores

D 7 210 pré-indicadores 28 indicadores

D 8 205 pré-indicadores 30 indicadores

D 9 187 pré-indicadores 27 indicadores

D 10 140 pré-indicadores 29 indicadores

D 11 154 pré-indicadores 28 indicadores

D 12 134 pré-indicadores 29 indicadores

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Os indicadores criados se articularam conforme os critérios de complementaridade,

similaridade e contraposição, resultando na aglutinação de núcleos de significação, nomeados

com base na fala das participantes. Os indicadores e sua divisão entre os núcleos podem ser

observados no Apêndice E. Da análise das 12 entrevistas, inferimos e sistematizamos seis

núcleos de significação, cujos conteúdos temáticos se articulam dialeticamente. São eles:

1. “Minha vida é essa; eu vivo só para trabalhar”: reflexões sobre a trajetória ocupacional

das diaristas;

2. “Tem que se virar com o que tem”: ferramentas, impedimentos e estratégias de

enfrentamento para execução da atividade de trabalho;

3. “Nem todos os lugares são iguais e nem todas as patroas são iguais”: relações sociais

no processo de trabalho;

4. “Eu não sobrevivo daquilo ali?”: a percepção da atividade de trabalho das diaristas;

5. “Não queria ser aquela diarista solta e irreconhecível”: repercussões das mudanças no

mundo do trabalho sobre a atividade da diarista;

6. “A gente vai trabalhar pensando em fazer as coisas bem feitas”: a constatação do

trabalho final.

Como resultado da aglutinação realizada, a seguir será apresentada a interpretação de

cada núcleo (intranúcleo), com vistas a evidenciar as singularidades das diaristas, mas

também aproximá-las em suas semelhanças. Em sequência, articulamos essas aproximações e

distanciamentos a um contexto mais amplo, isto é, de que modo os achados nessa pesquisa,

junto a essas participantes, se relacionam a realidade brasileira. São tomados como parâmetro

a revisão de literatura, que auxilia a compreender os significados produzidos historicamente

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acerca do trabalho da diarista, bem como a perspectiva teórica adotada, como forma de

apreender o movimento de constituição das significações produzidas pelas diaristas.

4.2. Análise intranúcleo

4.2.1. Núcleo de significação 1 – “Minha vida é essa; eu vivo só para trabalhar”: reflexões

sobre a trajetória ocupacional das diaristas

A construção desse núcleo de significação é fruto da organização e articulação de pré-

indicadores e indicadores. No total, foram articulados 13 indicadores, que desvelam a

trajetória ocupacional das diaristas entrevistadas. Nesse primeiro núcleo, as informações

versam sobre as histórias de vida das diaristas, com o intuito de explorar os principais

momentos da trajetória; as funções desempenhadas ao longo da vida; as ações realizadas da

condição de diarista; as principais influências para o exercício de sua atividade; e outros

aspectos que tangenciam a opção por essa atividade de trabalho, já que atuar como diarista

corresponde a uma opção de ocupação, com vantagens e desvantagens, mas não exatamente

uma escolha profissional (Coutinho et al., 2013). Somado a isso, serão apresentadas as

projeções do futuro.

As participantes dessa pesquisa revelaram ter tido uma vida de muito sofrimento, pois,

ao nascerem em famílias humildes, de classe social baixa, tiveram poucas oportunidades e

perspectivas de futuro. Esse mesmo discurso aparece no estudo realizado por Coutinho et al.

(2013), quando as autoras destacam a predominância de mulheres oriundas de famílias

pobres.

Desde muito jovens, as diaristas investigadas tiveram que lidar com pais alcoolistas e

presenciaram a violência doméstica e maus tratos familiares. As diaristas, em sua maioria,

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moravam em cidades do interior e disseram que lá não havia condições materiais e financeiras

das quais se viver. Apesar disso, adentraram em atividades de caráter informal e autônomo,

com o intuito de ajudar os pais no custeio das despesas. Dentre as atividades, é possível

destacar o trabalho no roçado e na produção de farinha. Em Ribeiro (2014), essas informações

se reiteram, quando os dados apontam que as diaristas começaram a trabalhar para ajudar a

família na luta pelo sustento e sobrevivência.

Nesta pesquisa, quase todas as diaristas foram absorvidas pelo exercício de alguma

atividade de trabalho quando crianças ou adolescentes, por volta dos 8 aos 13 anos, outras aos

16 anos. A atividade predominante foi a de babá, semelhante ao que é descrito na dissertação

de Monticelli (2013). No contexto de casa ou da rua, estavam expostas a riscos relacionados

ao seu desenvolvimento físico, psíquico e cognitivo; a remuneração era simbólica (Ribeiro,

2014), todavia, foi com o dinheiro fruto desse trabalho ou prestação de favor que muitas

conseguiram pagar os estudos, além de se alimentar e comprar artigos de vestuário.

Tabela 3

Trecho do indicador 1h

Entrevistada Trecho Indicador

D 4

“Desde os 10 anos de idade que trabalho

nesse ramo. Fui moça... e continuo na

mesma luta (...). Aos 10 anos, eu trabalhava

com minha mãe. Ela lavava e eu passava”.

Trabalho durante a

infância e adolescência

Esses dados também são encontrados no estudo realizado por Iriart et al. (2008), no

qual constataram que os participantes se inseriram no mundo do trabalho quando ainda

crianças, todos com vínculo informal. O mesmo é descrito em Teixeira et al. (2015).

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As diaristas pesquisadas apresentavam escolaridade até o ensino fundamental

completo e o exercício dessa atividade de trabalho doméstico era associado ao fato de não

terem tido condições ou oportunidades de ter uma educação formal, motivo de

arrependimento. Faltaram-lhes ritmo e paciência, em decorrência das preocupações e outras

condições adversas. As que tentaram retomar os estudos logo renunciaram, pois tinham

dificuldades de conciliar o trabalho com a maternidade precoce, quando ainda adolescentes.

Sem qualificação suficiente para o mercado de trabalho, essas mulheres passaram a se

ocupar do trabalho doméstico (Ribeiro, 2014). A baixa escolaridade é apresentada como um

elemento limitador de oportunidades ocupacionais (Coutinho et al., 2013) e, por isso, a

dificuldade das diaristas de se inserirem em outros campos profissionais (Prisco et al., 2013).

Tabela 4

Trecho do indicador 1e

Entrevistada Trecho Indicador

D 1

“Eu passo o dia todo pensando: meu Deus,

se eu soubesse, eu tinha estudado, ralado

para não estar aqui hoje. Mas, fazer o quê?

Meus pais não tinham condições de me

educar”.

Escolarização como

prerrogativa de melhores

condições e oportunidades

de trabalho

Desse modo, o que conseguimos depreender desses resultados e exemplos é que os

aspectos da escolaridade, renda e opção pelo trabalho diarista estão mutuamente relacionados

e implicados um ao outro. A escolaridade influencia a opção pelo trabalho de diarista, e a

opção pelo trabalho de diarista se sustenta na falta de recursos e renda para financiar uma

melhor escolarização, que suprisse a busca por outras oportunidades de trabalho.

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As trabalhadoras domésticas da região Norte possuem melhor escolaridade que as do

Nordeste (Pinheiro, Fontoura, & Pedrosa, 2011). Para as trabalhadoras domésticas, assim

como os trabalhadores da construção civil, a falta de escolaridade, o medo do desemprego e a

falta de opção levam à aceitação de suas atividades de trabalho, ao mesmo passo que são

fatores que impossibilitam a mudança da ocupação (Iriart et al., 2008).

Por outro lado, a constituição de uma vida familiar foi o que mais as impulsionou na

busca de emprego, e a se tornarem diaristas, já que a renda individual ou familiar não era

suficiente para criar e sustentar os filhos em suas necessidades básicas. Há relatos daquelas

que não tinham, inclusive, onde morar, tampouco alimentação, apenas “água no pote” (D 3).

Tabela 5

Trecho do indicador 1d

Entrevistada Trecho Indicador

D 2

“Eu fui mãe muito cedo, então não tinha

opção, ou eu optava para criar meu filho ou

dava ele. (...) então, eu já trabalhava com

algumas pessoas, já direto; mas aí, como eu

não tinha quem tomasse conta do meu filho,

porque eu não tinha pai e não tinha mãe,

meus pais tinham falecido, eu tinha que estar

em casa à noite... aí eu fiquei trabalhando

como diarista... criei meus filhos assim,

trabalhando como diarista. Trabalhava

durante o dia e a noite estava em casa”.

Influência da vida familiar

na condição de diarista

“...meu rapaz, como foi criado com

sofrimento, que eu dormia em calçada, eu

morei em baixo de pé de pau, cheguei a

pedir esmola para criar meu filho que era

muito doente. Antes de chegar até aqui, até

eu arranjar esse trabalho de diarista, e depois

desse trabalho tudo na minha vida mudou”.

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Antes de se identificarem como diaristas, exerceram outras atividades, como:

merendeira, faxineira, babá, arrumadeiras, ambulantes, pintora letrista, auxiliar de serviços

gerais, cuidadora de idosos, auxiliar de cozinha, jardineira, catadora de lixo e empregadas

domésticas, que, mesmo sem registro formal, dormiam na casa dos patrões e só retornavam

para suas residências quinzenalmente, ou de mês em mês. Algumas também exerceram

atividades em empresas privadas, em funções de copeira e costureira, mas por pouco tempo.

Ademais, possuem um histórico de atividades de trabalhos invisíveis, de pouca valorização

social.

Em Coutinho et. al. (2013), aparecem outras atividades exercidas pelos sujeitos

pesquisados, tais quais: camareira, auxiliar de enfermagem e costureira. Em ambos estudos, as

diaristas já desempenharam funções variadas.

Tabela 6

Trecho do indicador 1b

Entrevistada Trecho Indicador

“Eu trabalhei como pintora letrista (...) mas

de tudo eu tentava um pouco, para não dizer

que só tem uma coisa pra fazer. Se mandar

pra outra área, vai e faz”. Funções desempenhadas D 7

ao longo da vida

“... que eu cuidei das filhas dele, que eu fui

babá das duas meninas (...). Nessa casa eu

fui geral, babá, cozinheira e arrumadeira”.

Mas, é válido salientar, a influência da mãe foi preponderante para o atual exercício de

atividades domésticas como ocupação. Em comum, muitas das diaristas entrevistadas

relataram que a inserção no mercado de trabalho doméstico se deu quando acompanhavam as

mães em seus trabalhos (como empregadas domésticas) e as auxiliavam nas tarefas; ou

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quando permaneciam em casa, responsáveis pelos serviços domésticos, enquanto a mãe

trabalhava.

O ritmo da sociedade atual implica em diversas mudanças na estrutura familiar e na

conciliação entre trabalho e família. A mulher passou a estar mais presente no mundo do

trabalho e isso exigiu uma reorganização de papéis do homem e da mulher dentro do cenário

doméstico. Isso trouxe implicações, inclusive, para os filhos, os quais têm tido mais

participação nos afazeres domésticos. No entanto, a geração atual não tem sido influenciada a

tornar o serviço doméstico como opção de atividade de trabalho. Na verdade, por terem tido

melhores oportunidades de escolarização, as mulheres jovens têm buscado mais qualificação

e, consequentemente, pouco têm optado pelo trabalho doméstico. Enfim, as diaristas que são

mães pouco têm influenciado seus filhos ao exercício dessa atividade, ou seja, os filhos ou

filhas não têm perpetuado a atuação como trabalhador doméstico ou trabalhadora doméstica.

As diaristas alegam, como vantagens de seu trabalho, poder dormir em casa ao final de

suas obrigações e, por isso, cuidar de sua vida pessoal e familiar. Isto é, a ocupação permite as

trabalhadoras conciliarem as exigências laborais com as do âmbito doméstico e familiar

(Coutinho et al., 2013). Uma das participantes do estudo de Teixeira et al. (2015) declarou

que no trabalho de diarista não há compromisso integral com o patrão, além de que se

consegue uma renda melhor. Por outro lado, essas mulheres desempenham dupla jornada de

trabalho doméstico, ora na casa do tomador de serviço, ora na sua própria residência (Prisco et

al., 2013).

Além disso, as diaristas transitam em realidades sociais, econômicas e simbólicas

particulares. No cenário da pesquisa, elas compreendem que a vida para pessoas de classe

social baixa está mais difícil, haja vista os parcos recursos financeiros. Por outro lado, é por

meio desse trabalho que suprem suas necessidades básicas.

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Tabela 7

Trecho do indicador 1c

Entrevistada Trecho Indicador

D 11

(...) Já que eu tenho meus dois filhos, eu já

trabalhei em forno de lixo... pra não chegar

na casa de papai e mamãe e dizer assim:

‘compre uma bolsa de leite, me ajude aqui

nesse aluguel’”.

Condicionantes sociais e

condição da vida material

No cotidiano, o trabalho de diarista envolve uma rotina com horários que afetam a

vida privada das mulheres, uma vez que precisam acordar muito cedo, por causa do

deslocamento para a cidade onde trabalham, considerando que, não raramente, tais

trabalhadoras residem nas regiões metropolitanas ou periféricas das cidades, neste contexto da

capital do Rio Grande do Norte, Natal.

Tabela 8

Trecho do indicador 1j

Entrevistada Trecho Indicador

D 4

“Então, eu saio mais cedo, as 6h30 (...), aí às

vezes quando eu chego é em cima da hora”.

Dia de trabalho

Em geral, dedicam cerca de 8 ou 9 horas ao trabalho, seja como faxineira, lavadeira,

passadeira ou ajudante geral. Além disso, as diaristas pesquisadas dizem que o trabalho

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permite fazer “freguesias” (D 8). Porém, diferente do que acontece em Natal/RN, em Porto

Alegre/RS as diaristas mantêm uma jornada estável de 26 horas (Seade & DIEESE, 2016).

Tabela 9

Trecho do indicador 1g

Entrevistada Trecho Indicador

“Você acredita que faz oito anos que ainda

tenho as duas primeiras lavanderias que

peguei aqui?”

“Aí lavei na terça-feira e ela já reservou dois

dias para ela, aí na quinta-feira era para mim

passar”.

D 5

“Aí, quando passou minhas oito horas, eu

disse: ‘meu horário passou’... aí ela disse:

‘termine minha roupa que eu pago’”.

Tempo de dedicação ao

trabalho

“Minha vida toda foi trabalhando (...), já

trabalhava de diarista desde 82”.

“Eu lavei roupa dela faz 20 anos (...). Aí

dona... faz 14 anos que eu lavo a roupa

dela”.

O aspecto da jornada de trabalho é um fator que chama atenção, que pode estar

associado às recentes modificações trabalhistas para o público das trabalhadoras domésticas.

A lei complementar nº 150 (2015), que garante direitos às empregadas domésticas, inclusive

jornada de trabalho definida, pode não ter sido regularizada, o que faz com que muitas

diaristas tenham de dar conta de muitos serviços do âmbito doméstico, responsabilidades de

uma empregada doméstica que são transferidas para elas, que, como forma de agradar os

patrões ou usuários, acabam por exceder a carga horária, inclusive aquela imposta pelo SINE.

As diaristas falam da necessidade de exercerem atividades de trabalho extra, ou

“bicos”. Trabalham como feirante ou em colheita de grãos, alternativas para complementar a

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renda, isso porque têm de arcar com muitas despesas: aluguel, água, luz, gás, alimentação,

IPTU, empréstimos consignados. Trabalham em feriados e finais de semana, tal como

também é apresentado por Coutinho et al. (2013).

Tabela 10

Trecho do indicador 1k

Entrevistada Trecho Indicador

D 3

“Eu fazia faxina de manhã, aí quando

terminava pegava um extra... aí enchi aquela

caçamba, quando foi quatro horas estava

cheia”.

Atividade de trabalho

extra

Nesta pesquisa, enquanto faxineiras, realizam ações como: vasculhar, tirar os móveis

do lugar para limpar, lavar banheiros, limpar porta, aspirar sofá, limpar a cozinha, limpar

fogão, geladeira, armário, lavar varanda, limpar enfeites, limpar cadeiras, limpar portas, lavar

tapetes de banheiro, lavar pano de chão, lavar louça e enxugar, passar o aspirador, passar o

pano. Na ajuda geral, fazem de tudo um pouco: varrer, passar o pano, espanar, fazer almoço,

lavar blusas. Caso seja apenas uma arrumação, passam o pano nos móveis, varrem e passam o

pano no chão. As que se dedicam a outras funções, lavam roupas e as engomam e fazem

congelamento.

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Tabela 11

Trecho do indicador 1a

Entrevistada Trecho Indicador

“Você tem que vasculhar, limpar os

móveis... você varre, passa o pano, aspira o

tapete, limpa vidros, limpa portas”. Ações realizadas da

D 12

“O básico é isso: lavar banheiros, pia,

espelho, a limpeza dos vidros e banheiros,

janelas dos banheiros...”

condição de diarista

Esta dissertação aponta que, em geral e quando possível, as doze diaristas obedeciam a

uma sequência e organização particular das atividades: “toda roupa que vai lavar eu vou

verificar os bolsos... é isso que eu faço, a sequência é minha... antes de engomar eu separo

tudo quanto é roupa” (D 3).

Tabela 12

Trecho do indicador 1l

Entrevistada Trecho Indicador

“A roupa já está toda lá, toda colecionada,

aqui é malha, aqui é roupa fina, essa é de

cabide, esse é de dobrar...”

D 4 “Se você passar uma camisa, você primeiro

passa a gola do lado esquerdo, direito, passa

os dois lados, a frente da gola e as costas

(...). E camisa é tudo pelo avesso, engoma

primeiro a parte, aquelas de cor, não tem

aqueles desenhos? É mesmo que manteiga

em venta de gato”.

Organização e sequência

da atividade de trabalho

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Em Ribeiro (2014), as diaristas organizam o seu cotidiano de trabalho tendo como

reflexo os costumes e hábitos desenvolvidos. Do mesmo modo, em Coutinho et al. (2013), as

diaristas possuem suas particularidades quanto a organização para efetuar a limpeza das

residências: algumas seguem padrões, outras limpam cada dia e lugar de forma diferente, isso

porque as ações das diaristas estão articuladas com as necessidades dos tomadores de serviço.

Desse modo, há clara diversidade entre o trabalho prescrito e real (Ribeiro, 2014).

Levando em consideração todo o histórico de vida das diaristas aqui apresentado, há

outro fator importante a se mencionar e discutir: a questão de gênero. Ainda quando crianças,

a divisão sexual e social do trabalho era notadamente percebida e foi constitutiva do processo

de socialização. Isso porque o pai não deixava as filhas mulheres sem trabalhar e as colocava

em atividades de cunho doméstico, como babá ou “desde mais jovens, as mulheres plantavam

e os homens ficavam aguando” (D 5).

Tabela 13

Trecho do indicador 1m

Entrevistada Trecho Indicador

D 12

“Eu comparo a faxina. No ramo de trabalho

da mulher, a faxina é o trabalho de peão... se

fosse falar do trabalho de peão da mulher: é

a faxineira”.

Condições de gênero

Um dos fatores que faz as famílias colocarem as filhas para trabalhar em residências é

ficarem em espaço privado, evitando as ruas. Para adultos e crianças, as atividades de cunho

doméstico são atribuídas às mulheres (Bernardes, 1992). A divisão sexual do trabalho é

herança do período colonial: sempre houve a separação do que é trabalho de mulher e do que

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é trabalho de homem. Enquanto à primeira é destinado o trabalho reprodutivo, invisível,

dentro do lar, no espaço privado; ao segundo é destinado o trabalho produtivo, remunerado e

na esfera pública; motivo da desvalorização do trabalho doméstico (Ribeiro, 2014).

A atividade da diarista é feita predominantemente por mulheres. As mulheres

pesquisadas têm um percurso profissional demarcado por atividades reprodutivas, de cunho

doméstico e de higienização, porém, há que se destacar a ínfima ruptura de pensamentos

tradicionais quanto à divisão sexual do trabalho, ou seja, quanto ao local do homem e da

mulher no âmbito do trabalho.

Senão, veja-se: “fazer trabalho de homem, vou ter que fazer. Aí fiquei pensando: não

tem mulher que é caminhoneira?! Não tem mulher motorista?! Não tem mulher pedreira?!

Então pode ter mulher pintora também” (D 6). Outra diarista, ao realizar uma atividade extra

de encher uma caçamba de entulho, revelou a surpresa de muitos que passavam na rua. As

pessoas se perguntavam como ela estava fazendo um “trabalho de homem” e ficavam olhando

se ela era mesmo uma mulher.

Embora neste estudo as diaristas tenham uma representação positiva do seu trabalho,

não desejam que seus filhos exerçam essa atividade, pois sua responsabilidade de mãe foi dar-

lhes estudo, o que pode lhes “garantir” melhores condições e oportunidades de trabalho. Em

Iriart et al. (2008), trabalhadores, tanto da construção civil como trabalhadoras domésticas,

declaram que não querem que seus filhos sigam a sua ocupação profissional e apresentam a

importância da educação formal, como prerrogativa para conseguirem melhores perspectivas

de futuro.

Esse aspecto nos remete a questão da generatividade, quando o indivíduo tem

preocupação com o que pode ser gerado, desde produtos, até ideias e filhos. Desse modo, há

certo cuidado com o que se gerou por meio da transmissão de valores de pai para filho. As

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necessidades de transmitir e ensinar são um aspecto de sobrevivência, de fazer valer todo o

esforço de sua vida e saber que tem um pouco de si no outro (Rabello & Passos, 2002).

Ao mesmo passo que acham o futuro imprevisível, não se prepararam para tal,

tampouco fizeram o “pé de meia” (D 11). Não se prepararam para envelhecer e acham que o

futuro está associado à morte. As participantes diaristas têm medo de ficarem sozinhas (medo

da solidão) e esperam ter saúde para continuar trabalhando como diaristas, ou não: vender

água mineral, trabalhar com carro de lanche e de frutas, embora se vejam velhas e cansadas.

Tabela 14

Trecho do indicador 1f

Entrevistada Trecho Indicador

“E eu gosto de trabalhar, mesmo se eu me

aposentar e tiver dois dias, três dias, eu vou

porque eu gosto da minha profissão”.

D 6

“Me aposentar e trabalhar só três dias,

continuar trabalhando. (...) se eu tivesse

aproveitado, hoje eu estava, tinha um

carrinho pra trabalhar na rua, vendendo

fruta, mesmo trabalhando de diarista, que

meu sonho era esse: comprar um carrinho e

botar na rua pra vender fruta”.

Projetos da vida

profissional e perspectiva

de futuro

Na mesma medida, projetam um futuro com direito a aposentadoria. Porém, essa

perspectiva chama atenção, já que não pagam a previdência social. As empregadas domésticas

conseguiram formalizar sua atividade de trabalho, porém as diaristas ainda seguem à margem

do emprego formal e, nesse sentido, sequer compõem um grupo profissional reconhecido pelo

próprio INSS.

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Tabela 15

Trecho do indicador 1i

Entrevistada Trecho Indicador

“No início, eu fazia o cadastro no INSS

como autônoma, pra pagar o

comprovantezinho do INSS, aí, no início

tinha colocado como diarista, mas o rapaz lá

falou que, perguntou o que eu fazia, aí eu

disse: ‘faxina’, aí ele disse que não era

diarista, era faxineira, porque diarista é só

um nome bonito que inventaram...”

D 9 Aposentadoria

“...já está com dois meses que eu não pago

por causa dessa bendita crise...”

“...o que eu pago só dá direito a idade. Vou

procurar outra profissão porque ficar em

casa parada não dá”.

Recentemente, temos assistido a proposta de significativas mudanças na legislação

previdenciária e trabalhista. Apesar disso, por estarem no setor de serviço informal e por não

terem direitos efetivos, as mudanças legislativas não irão gerar forte impacto para as diaristas.

No entanto, a reforma parece distanciar, cada vez mais, as diaristas da conquista de qualquer

direito trabalhista.

As mulheres participantes deste estudo descreveram o sacrifício de pagar as parcelas

do INSS, além de terem muitas dúvidas sobre a garantia de seus direitos enquanto

contribuinte. Conforme é apresentado em Iriart et al. (2008), a redução do salário devido ao

desconto do INSS é uma razão para preferirem o trabalho informal. Esse mesmo estudo

constatou que a falta de informação sobre os direitos trabalhistas foi levantada como fator

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preponderante para que as garantias asseguradas pelo trabalho formal não fossem vistas como

uma questão importante (Iriart et al., 2008).

O trabalho, na verdade, é uma fuga da realidade, ou seja, fuga do histórico de

sofrimento que para algumas das diaristas se perpetua até o momento presente, “eu meti a

cara no trabalho mesmo” (D 2); “minha vida é essa, eu vivo só para trabalhar” (D 4); “procuro

ocupar a mente com o trabalho” (D7).

Em geral, não apresentam planos bem estruturados quanto a sua vida laboral futura

(Coutinho et al., 2013). Assim, restaram-lhes os sonhos. De ser professora, psicóloga,

advogada, chef de cozinha, pintora industrial e agrônoma.

4.2.2. Núcleo de significação 2 – “Tem que se virar com o que tem”: ferramentas,

impedimentos e estratégias de enfrentamento para execução da atividade de trabalho

Este núcleo resulta da articulação de 10 indicadores. Esses indicadores revelam os

instrumentos físicos e psicológicos que são utilizados pelas diaristas para a concretização de

suas atividades de trabalho. Ao longo do percurso, são encontradas muitas barreiras e

dificuldades, ou catalizadores que implicam no sucesso das ações a serem executadas e,

portanto, no resultado.

As diaristas pesquisadas revelaram que aprenderam a realizar as ações e executar sua

atividade sob influência da mãe e dos contratantes do serviço (patroas ou ex-patroas), ou,

ainda, que a condição de dona de casa lhes permitiu obter o conhecimento tácito, aquele que é

adquirido ao longo da vida e pela experiência. Acrescenta-se a isso o desejo, a iniciativa, a

facilidade e a necessidade de aprendizagem. Para tanto, as diaristas podem optar por seguir as

orientações ou normas deixadas pelos tomadores de serviço, ou fazer de acordo com suas

experiências, como parte da vivência.

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O SINE também tem um papel importante a ser considerado, no oferecimento de

cursos, o que lhes garantiu qualificação para o trabalho, a saber: cursos de engomado,

congelamento, e de faxina.

Tabela 16

Trecho do indicador 2d

Entrevistada Trecho Indicador

“...tudo eu aprendi muito, na casa de muita

gente. Tem muita gente que me ensinava e

eu agradeço até hoje por ter aprendido. E

aqui também, o SINE, pra mim, foi uma

coisa que me ensinou muito”. D 8 Educação para o trabalho

“Porque eu fiz o curso pelo SINE, lá em Candelária. O curso foi um curso de

congelamento, foram três meses, foi pouco

tempo, mas as coisas que eu aprendi no

curso serviu muito pra mim”.

Levando em consideração suas histórias de vida, algumas diaristas revelaram ter

histórico de problemas psiquiátricos e psicológicos, como, por exemplo, depressão e estresse.

A doença é algo que repercute em suas atividades de trabalho, haja vista o uso de

medicamentos psicotrópicos que, segundo elas, é o que lhes faz “se manter de pé para

trabalhar”.

Para além das heranças genéticas e outros determinantes da saúde, as diaristas revelam

comportamentos que sugerem sofrimento psíquico em virtude da falta de reconhecimento e

consideração pela sua atividade de trabalho. “Isso mexe muito com a cabeça”(D 1). Algumas

revelam que sua atividade é muito solitária e que às vezes ficam tristes por não ter com quem

compartilhar assuntos do trabalho. Do mesmo modo, Tamanini (2000) exemplifica que os

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sentimentos mais comuns de pessoas que trabalham com serviços domésticos são o cansaço

físico e emocional, a solidão e a tristeza, agravados pela consciência do preconceito.

Tabela 17

Trecho do indicador 2a

Entrevistada Trecho

Indicador “Ainda tem gente que não reconhece o que

você faz... e tem que aguentar (...). Então,

mexe muito, mexe muito com a cabeça da gente”. Saúde mental e sofrimento

D 1

“Já aconteceu de eu chorar, já chorei muito

no trabalho”.

psíquico

Chama a atenção os vários relatos, ao longo desta pesquisa, de diaristas acometidas

pela depressão. Aqui, é possível desmistificar que a depressão é uma doença que atinge

apenas pessoas de melhor poder aquisitivo. Na verdade, esse transtorno não escolhe raça,

escolaridade, nem mesmo a classe social, ou seja, o transtorno pode afetar pessoas de

qualquer idade e em qualquer etapa da vida.

Apesar disso, as exigências da atualidade talvez sejam os melhores indicadores

diagnósticos quando estamos falando dessa doença. Consequência disso, podemos relatar as

dificuldades das diaristas em ir ao trabalho e executar suas funções. Estimativas indicam que,

na América, há cerca de 300 milhões de pessoas vivendo com a depressão. Diante disso, a

depressão é tema do Dia Mundial de Saúde, celebrado no último dia 7 de abril deste ano

(OMS, 2017).

Ainda assim, a atividade de diarista é caracterizada pela sobrecarga e o excessivo uso

do corpo. “É uma carga muito pesada pra dar conta todos os dias... você sai esgotada e chega

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morta em casa” (D 1). O uso do corpo é central no desempenho das tarefas, pois é uma

atividade manual, que exige utilização de força física. A fadiga do corpo e a utilização de

produtos químicos fazem parte da condição de trabalho (Ribeiro, 2014).

Geralmente, é uma atividade propensa a riscos e acidentes no trabalho, durante a qual

eventualmente acontecem quedas, queimaduras e choques elétricos. Porém, as trabalhadoras

domésticas, assim como trabalhadores da construção civil, não estabelecem relação entre o

trabalho informal e o maior risco de acidente ou adoecimento no trabalho (Iriart et al., 2008).

Tabela 18

Trecho do indicador 2c

Entrevistada Trecho Indicador

D 8

“Aí fui e me queimei numa grade, grade do

fogão, quando puxei me queimei...”

Acidentes no trabalho

Os riscos de acidente no trabalho doméstico são vistos como irrisórios, já que exercem

atividades desenvolvidas em ambientes residenciais, sendo a casa vista como um ambiente

seguro, diferente das empresas e indústrias. As que percebem o risco citam quedas devido ao

piso úmido e a limpeza interna e externa de janelas, seguido do risco de cortes e queimaduras.

Quando acontecem, apesar da gravidade e da dor, são vistos como normais, uma vez que

poderiam acontecer em suas próprias casas, ou seja, o ambiente de trabalho é visto como

extensão de sua própria casa (Iriart et al., 2008).

Muitas delas são acometidas por doenças decorrentes ou não da atividade de trabalho:

dores de cabeça, artrite, artrose, problema de coluna, problemas no joelho, acidente vascular

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cerebral (AVC), erisipele, alergia a produtos de limpeza e até mesmo relatos de esgotamento

físico.

No estudo realizado por Iriart et al. (2008), as trabalhadoras domésticas declararam

problemas de coluna, dor nas pernas, bursite, inchaço no joelho e alergias a produtos de

limpeza, conforme também encontramos nesta pesquisa. Porém, é difícil para as trabalhadoras

perceberem o tipo de trabalho como a possível causa de adoecimento, ou seja, o

reconhecimento de que ficaram doentes no trabalho não as faz acreditar que a causa de sua

doença tem a ver com a sua atividade de trabalho, consideram-se responsáveis pelo acidente

(Iriart et al., 2008).

Por recomendação médica, são orientadas a diminuírem o ritmo. Porém, nem sempre

as recomendações são acatadas e ficam a disposição para a atividade mesmo quando doentes,

pois se disserem que estão doentes os usuários as descartam.

O corpo é contabilizado como mercadoria, vale dinheiro e, possuindo valor monetário,

tende-se a desconsiderar o seu valor qualitativo. A vida, em sua concreta riqueza de

qualidades, é colocada em segundo plano, é protelada em nome do salário, riqueza

abstrata (Ribeiro, 2014, p. 184).

Tabela 19

Trecho do indicador 2j

Entrevistada Trecho Indicador

“Eu tenho alergia a um sabão azul... que

estoura minha mão todinha...”

D 12 “A limpeza me cansa muito por causa da

minha coluna, depois que fiz duas

cirurgias... então, eu percebi que fiquei com

a coluna bem ruinzinha...”

Problemas de saúde

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Com isso, atualmente se sentem mais cansadas para o exercício da atividade, haja vista

passarem o dia todo em pé e as pernas ficam “latejando e bambas”, “parece que levou uma

surra” (D 7). Isso desestimula a disposição para o trabalho, pois não sabem se terão condições

de continuar no outro dia.

Tabela 20

Trecho do indicador 2b

Entrevistada Trecho Indicador

D 2

“Porque o povo quer uma ligeira, quer

alguém que faça bem feito, mas seja ligeira

(...). Aí já vai uma pessoa depois dos 40, aí

chega lá e não quer se trepar numa escada

porque tem medo de cair, chega lá e não

quer limpar as luzes porque não tem mais a

resistência que tinha de fazer tudo, de subir

escada e descer, subir e descer... você não

tem mais aquela resistência. (...) Quando a

gente vai chegando à velhice a gente vai

começando a ficar com artrite, artrose,

problema de coluna...”

Capacidade física para o

trabalho

Sendo assim, revelam não fazer o serviço no mesmo ritmo que antes, não mais se

sentem rápidas e ágeis, “não tem mais o braço forte, aquela força” (D 3), e há limitações

físicas para o desempenho do ofício. Por exemplo: não sobem mais escadas, evitam a função

de faxineira, não se abaixam.

Diante disso, é possível afirmar que as diaristas entrevistadas estão com a saúde

fragilizada. Isso porque percebemos uma série de problemas da ordem biopsicossocial.

Destaque merecem os problemas de saúde decorrentes de sua ocupação, muito embora não

atribuam apenas ao trabalho a causa da artrite, artrose, o problema de coluna e as

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enfermidades no joelho. Nas entrelinhas dos discursos, percebemos dores físicas e

psicológicas veladas. Isso nos mostra uma negação de suas próprias doenças como uma forma

de não demostrarem a fragilidade e indisponibilidade para o trabalho, pois precisam do

trabalho a qualquer custo.

A faixa etária das participantes do presente estudo variou dos 43 aos 66 anos, ou seja,

entre a meia idade e a velhice. Segundo Ribeiro (2014), a categoria diarista está

envelhecendo, algo já constatado por Pinheiro et al. (2011). As trabalhadoras domésticas, que

antes eram mais jovens, hoje passaram a ser mais velhas não apenas pela mudança do perfil

da população brasileira, como descreve Fraga (2010), mas isso está diretamente associado ao

aspecto da escolarização, já discutido no núcleo de significação 1.

Para as diaristas deste estudo, o trabalho é diferente de quando se é jovem. Até os 40

anos, espera-se que uma pessoa esteja apta a ser ágil, mas, após essa idade, começa a faltar

resistência e capacidade física para o trabalho. Algumas têm medo da velhice, se recusam a

envelhecer, e por isso não se acham velhas. O envelhecimento ainda é sinônimo de problemas

de saúde. “A velhice muda muita coisa... o velho é criança duas vezes” (D 6). As piores

consequências do envelhecimento são físicas: “não vê a mão mais lisinha, o rosto mudou,

engordou, a idade muda” (D 2).

No entanto, o processo de envelhecimento permite que as pessoas adquiram

maturidade e experiência. Mesmo assim, a maioria não se acha velha e se esforça o bastante

para fazer um trabalho bem feito, “é mais disposta que muitas jovens por aí” (D 2). As que se

acham envelhecidas declaram já ter trabalhado muito, e o trabalho intensifica os problemas de

saúde, além de que a idade intensifica o cansaço, assim como o trabalho intensifica o

envelhecimento. Para outras, a concepção de velhice é de que as pessoas mais velhas são

aquelas que têm pensamentos muito negativos, reclamam muito da vida, não saem e nem se

divertem.

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Tabela 21

Trecho do indicador 2f

Entrevistada Trecho Indicador

“Não me acho tão velha, mas me acho uma

mulher bem madura (...). O corpo da gente,

em si, ele envelhece. E, quando ele

envelhece, ele dá os primeiros sinais... a

velhice vai chegar para todos nós”.

D 7 “Acho que a pessoa nos seus 66 anos já é

uma pessoa bem idosa”.

Concepções de

envelhecimento humano

“...o trabalho pesado, você vai envelhecer

rapidamente, porque você vai ficar com a

pele mais desgastada”.

A temática do envelhecimento aparece ainda no início das entrevistas com as diaristas,

quando nos detemos às suas trajetórias profissionais. Apesar de terem consciência de suas

idades e das consequências desse fator em suas vidas, o processo de envelhecimento é

relativo. Ou seja, está bem mais associado a uma categoria social do que mesmo aos aspectos

normativos do desenvolvimento humano.

Outro problema vivenciado pelas diaristas é a discriminação pela idade, também

conhecida como ageísmo, velhismo ou idadismo. “Quando era jovem nunca tive sorte de

arrumar um emprego, agora que não arrumo mesmo” (D 2). Em Ribeiro (2014), fica evidente

a escolha pelo trabalho em função da idade avançada. Quando os usuários dos serviços

percebem que elas estão envelhecendo, rejeitam seu trabalho, há clara preferência por mão de

obra jovem, e por isso o medo das trabalhadoras de envelhecer. Os próprios anúncios de

emprego selecionam pela idade, pois há uma crença de que as pessoas mais velhas têm a

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saúde mais fragilizada, o que prejudica a quantidade e qualidade do trabalho. A idade dos 40

anos já é mão de obra indesejada para o trabalho doméstico.

Tabela 22

Trecho do indicador 2i

Entrevistada Trecho Indicador

“Se hoje em dia ainda aparecesse, mas da

minha idade não pega mais, de ASG não

pega”.

D 10

“Porque hoje em dia passou dos 30 anos e já

está velho. Já está velho... passou dos 30

anos tem que juntar tudo e jogar fora”.

Discriminação pela idade

“...não consegui mais nada, aí desisti,

porque sei que não pega mesmo, passou dos

40 é velha mesmo, diz que já está velha...”

Apesar disso, a temática de discriminação pela idade ainda tem sido pouco discutida,

ao mesmo passo que se trata de um tema atual. Lidar com assuntos como esses é lidar com o

nosso próprio futuro, haja vista a tendência de aumento de pessoas com idade igual ou maior a

60 anos, em virtude da transição demográfica. Além da desvalorização da ocupação da

diarista, faz-se necessário diminuir impedimentos para a execução de suas tarefas, não

acentuá-los.

Para que a atividade em si se realize, há a necessidade não só do corpo, mas de outros

tipos de ferramentas, artefatos ou instrumentos de mediação, materiais e utensílios de limpeza,

como vassoura, pano de chão, vaporeto, aspirador, escova, água, sabão, amaciante, passe bem,

bomba, ferro, pano, tábua de engomar, bucha, pá, água sanitária, etc. Em Iriart et al. (2008),

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umas das trabalhadoras pesquisadas alega a necessidade de melhores instrumentos de

trabalho, semelhante ao que encontramos no presente estudo.

Tabela 23

Trecho do indicador 2e

Entrevistada Trecho Indicador

D 3

“Aí eu disse: ‘quero os pertences para

começar a engomar’. Ela: ‘tem uma tábua

ali’. Arrumei a tábua, quando arrumei a

tábua, a tábua ‘tin, tin, tin, tin’... eu: ‘eu

quero uns paninhos pra colocar aqui’. Ela:

‘ali em cima!’ Eu: ‘eu quero o ferro, a

bomba’; aí o ferro que ela veio me deixar

era daquele tupi, bem pesado, tempo do

ronca. Aí coloquei o ferro para esquentar, aí

lá vem ela, eu disse: ‘está faltando a

bomba’; ela: ‘ali, procure ali no armário’”.

Instrumentos da atividade

de trabalho

Para além dos instrumentos de trabalho, as diaristas alegam enfrentar dificuldades e

impedimentos para e na sua ocupação. Muitas delas residem distante do local de trabalho e

precisam utilizar o transporte público, às vezes pegam mais de um ônibus, sofrem com o

trânsito nas grandes cidades e estendem suas horas dedicadas ao trabalho, quando se

considera o percurso percorrido entre suas residências e o local de trabalho. Monticelli (2013)

também traz relatos sobre o trajeto a se percorrer para o trabalho:

As narrativas eram marcadas por um intenso desgaste físico e emocional em relação

ao transporte público, pois não havia ônibus em horários regulares que passassem

perto de suas casas, normalmente o encontravam muito cheio e quando precisavam

ficar mais de duas horas no trânsito (p. 142).

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Outro fator que foi bastante comentado foi a violência urbana, como roubos e assaltos.

Esses eventos geram repercussão negativa para execução do seu trabalho e até mesmo geram

traumas.

Tabela 24

Trecho do indicador 2g

Entrevistada Trecho Indicador

D 11

“Se marcar de 7h, eu não vou chegar de 7,

vou chegar de 7h20, porque por onde eu

moro é um bairro perigoso. Lá no... eu não

tenho aquela coragem de 5h30, 6h ir pra

parada de ônibus, porque eu já fui vítima, já

vi gente sendo vítima, eu não tenho aquele

pique que eu tinha há um tempo atrás, hoje

não”.

Dificuldades para a

realização da atividade de

trabalho

“Sinto dificuldade porque tem canto que não

tem os materiais pra gente fazer...”

Isso resulta em trabalhos mal feitos. Porém, como estratégias de enfrentamento,

tentam “se virar com o que tem” (D 9) e improvisam, ou tentam dialogar com as patroas,

usuárias ou clientes. As características de seu trabalho permitem autonomia e liberdade para

trabalhar para quem quiserem e, por isso, podem evitar as residências desagradáveis, em que

haja os impedimentos já descritos. Além disso, usam da espiritualidade, como o apego a

Deus, e oram para que os problemas e impedimentos sejam superados.

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Tabela 25

Trecho do indicador 2h

Entrevistada Trecho Indicador

D 9

“Hoje em dia, por eu acreditar muito em

Deus, sempre segui minha religião católica,

eu tenho minha vida como uma provação,

foi só provações... que se você não tivesse

Deus pra você se socorrer, hoje você não

teria aquele equilíbrio, nenhum... hoje, eu

tenho um filho com 24 anos, aquele filho

que tinha 2 anos, que eu criei só eu e Deus,

já trabalha, já me ajuda. e então, com Deus

eu venci, com ele, porque sem ele eu não

tinha chegado a lugar nenhum”.

Espiritualidade

Ademais, as diaristas se sentem cansadas para o exercício de suas atividades, ao

mesmo passo em que dizem que o cansaço é intensificado pela idade, isto é, à medida que a

idade aumenta, assim, também, aumenta a fragilidade da saúde. As diaristas, então, estariam

mesmo envelhecidas, embora algumas não se sintam velhas? O que se sabe é que os

impedimentos e as dificuldades para a realização de suas atividades de trabalho são reais: têm

dificuldades para aprender as ações de sua atividade de trabalho; têm problemas de saúde

física e mental; estão em processo de envelhecimento; sofrem discriminação pela idade; a ida

ao trabalho e a volta para casa é contextualizada pela violência urbana; e faltam materiais e

utensílios de limpeza para que deem conta do objetivo e resultado de sua atividade; restando-

lhes buscar estratégias, já descritas, para enfrentar essas demandas.

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4.2.3. Núcleo de significação 3 – “Nem todos os lugares são iguais e nem todas as patroas

são iguais”: relações sociais no processo de trabalho

Para a constituição deste núcleo de análise, foram aglutinados três indicadores:

relações sociais entre as diaristas e seus patrões, usuários, clientes e outros funcionários da

limpeza; comparação da atividade de trabalho com outras diaristas ou outros profissionais;

condições dos locais de realização das atividades de trabalho das diaristas. As diaristas foram

indagadas a respeito da execução da atividade de trabalho delas, notadamente quem delegava

as atividades a serem realizadas e o que os donos das residências dizem do trabalho delas.

A relação das diaristas, precisamente com seus patrões, usuários, ou clientes – termos

designados pelas participantes do estudo – é acompanhada de controvérsias. Ora o

reconhecimento dessa atividade de trabalho lhes proporciona conforto, ora é atestada de

desencontros, discriminação e humilhação. “Uma dedicação nem sempre é suficiente para o

humilhado – a trabalhadora diarista não é humilhada porque sente ou supõe sê-lo: o

sentimento e a suposição estão cravados numa situação real de depreciação, de humilhação e

desprezo” (Ribeiro, 2014, p. 189).

“É difícil chegar num lar desconhecido, que não conhece ninguém, e você se sente

perdida de ter que lidar com pessoas diferentes... o modo de se expressar é diferente” (D 9).

As diaristas relatam que a primeira vez numa residência é um momento em que há

preocupação de saber como chegar, como se apresentar; e é quando as diaristas perguntam aos

clientes por onde devem começar, como querem o serviço e onde estão os materiais e

utensílios para a realização da atividade. Após a segunda ou terceira vez, as diaristas já se

apropriam da concepção da atividade naquele local: têm usuárias (os) que gostam que

comecem pelos quartos, outras (os) pelo terraço. Porém, nem todos os locais são iguais, assim

como as “patroas” e “patrões” têm suas particularidades.

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Algumas das diaristas entrevistadas dizem que poucos são os tomadores de serviço

que têm consideração pela sua ocupação e valorizam seu trabalho, bem como as incentivam.

Há, portanto, residências agradáveis, em que elas se sentem em casa, mesmo reconhecendo

certas exigências. Santos (2010) afirma que sentir-se em casa ou como se fossem da família

revela o reflexo do clientelismo, da cordialidade e do patriarcado brasileiro.

Há diaristas que revelam nunca ter ouvido reclamações, que são tratadas como se

fossem da família, como se fossem de casa, são chamadas para conversar e desabafar, são

vistas como amigas das donas da casa e comem na mesma mesa. As avaliações positivas que

as donas da casa fazem de seus trabalhos oferecem oportunidade de trabalho na casa de outras

pessoas da mesma família, até mesmo em casas de pessoas públicas.

Algumas relações entre as diaristas e seus usuários também são marcadaa por certa

fidelidade. Quando estão doentes, os tomadores de serviço aguardam a diarista melhorar, ou

dão medicamentos, ou deixam fazer só o básico e mais urgente. Há lugares em que existe

estreita relação de confiança, exemplificada pelo fato das diaristas terem a chave da casa de

alguns patrões.

Tabela 26

Trecho do indicador 3a

Entrevistada Trecho Indicador

D 4

“(...) Porque às vezes tem cliente que está de

mau humor, aí eu percebo e fico na minha.

Mas me tratam bem, tudinho, muito bem

mesmo. As secretárias que trabalham lá,

tudinho gostam de mim, tudinho, tudinho”.

Relações sociais entre as

diaristas e seus patrões,

usuários, clientes e outros

funcionários da limpeza

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As participantes deste estudo fazem referência a atitudes caritativas dos usuários.

Algumas patroas fazem caridade e doam diversos artefatos; outra, comprava feira e dava para

o filho da diarista, enquanto ela estava hospitalizada, e essa mesma foi quem ajudou a diarista

D 4 a pagar o INSS; dão roupa, comida. “Cativam muito” (D 2). Em Ribeiro (2014), isso é

visto como complemento ou substituição de uma parte da remuneração, ou é reconhecido

pelas diaristas como um ganho adicional. Já em Saffioti (1978), isso é compreendido como

uma tentativa de agradar a empregada, com intuito de criar um clima afetivo no local de

trabalho, o que pode permitir a solicitação de favores fora das atividades que foram acordadas

e do horário de trabalho estabelecido. Quem ocupa a posição inferior, mantém-se fiel e de

confiança (Coelho, 2006).

Pensando nisso, as diaristas relatam que fazem questão de agradar as patroas, fazem

serviços que não eram previstos e, se necessário, estendem seu horário de trabalho para

concluir alguma solicitação da cliente. Para Teixeira et al. (2015), as diaristas desenvolvem

táticas para serem bem aceitas no trabalho.

Nem todo dia as diaristas pesquisadas afirmam estar num lugar bom. Têm lugares que

as escravizam, o que lhes dá vontade de ir embora: “tem cantos que é perverso” (D 3). Há

aquelas usuárias que não reconhecem o exercício da atividade e excedem em reclamações e

comportamentos desconcertantes: “eu limpo essa mesa, a patroa passa o dedo e tem que

limpar de novo, eu vendo que tinha limpado” (D 1); ou “ela queria me fazer de escrava, tempo

de escravo já passou” (D 3). Do mesmo modo, tem casa em que a patroa faz averiguação,

remove o móvel para ver se limpou. Algumas das diaristas, inclusive, já receberam ameaças

das patroas por não terem executado o serviço como elas queriam.

Diante disso, quando as diaristas foram indagadas se mudariam alguma coisa em sua

atividade de trabalho, responderam que gostariam de mais respeito e exigências mais sensatas.

“Todo trabalho é trabalho, até um varredor de rua precisa de respeito” (D 1). Em um dia de

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chuva, a cliente queria que a diarista enxugasse a roupa toda no ferro; outras, tampouco se

preocupam com aspectos de segurança no trabalho; reclamam dos minutos em atraso e ainda

que a faxina não ficou bem feita. Isso é reflexo da cultura patriarcal e da instabilidade

ocupacional que as diaristas são vítimas. A precarização de sua atividade de trabalho é

claramente percebida nos discursos desse núcleo de significação.

Outro fenômeno que emerge nos seus contextos de trabalho é a comparação com

outras diaristas. As patroas dizem que outras que fizeram o serviço para elas não fizeram o

serviço bem feito, que eram preguiçosas. Porém, há um desafio no exercício das ações das

diaristas. Como já foi descrito, nenhuma casa é igual e, por isso, o tamanho e a quantidade de

cômodos são variáveis, além de que, em geral, há serviços acumulados de meses, o que pode

indicar a necessidade de mais um dia para a conclusão da atividade. É o momento de avaliar

junto à usuária as demandas mais urgentes, embora isso incomode as “patroas” e intensifique

a comparação entre outras diaristas.

Tabela 27

Trecho do indicador 3b

Entrevistada Trecho Indicador

D 1

“...sendo uma casa pequena, eu faço, mas

uma casa grande, eu digo logo: ‘não tem

condições’. Aí às vezes elas dizem assim:

‘porque Fulano veio e fez e você não faz’;

isso aí cada um é cada um”.

Comparação da atividade

de trabalho com outras

diaristas ou outros

profissionais

As diaristas também comparam sua atividade com outras diaristas ou outros

profissionais. “Eu acho que nem tem muita diferença entre doméstica e diarista, porque a

gente vive em função da casa todinha” (D 1). Para elas, a empregada doméstica cada dia faz

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uma coisa, tem mais tempo, enquanto que elas em um único dia têm que dar conta de tudo.

“Há um diferença entre as diaristas e domésticas: hoje se exige mais da diarista do que da

doméstica. A doméstica faz todo dia um pouquinho” (D 9).

Algumas diaristas não têm nem contato com a dona da casa, pois essas saem bem cedo

para trabalhar. Na pesquisa de Monticelli (2013), as diaristas dizem que em alguns casos

preferem não ter que conviver com os tomadores de serviço, pois eles podiam atrapalhar na

faxina, por exemplo. Nesse sentido, é aí que muitas vezes elas se relacionam mais diretamente

com as empregadas domésticas, as quais delegam tarefas para as diaristas ou ensinam a fazer

a atividade. Parte das diaristas acha essa experiência agradável, mas com ressalvas, pois

algumas chegam na residência e as empregadas se aproveitam delas. “As próprias empregadas

querem ser mais que as patroas” (D 2). Em geral, segundo as entrevistadas, os trabalhadores

formais da residência ficam especulando e fazendo fofocas dos patrões.

O trabalho com outras pessoas requer muitas precauções, pois, de vez em quando, a

responsabilidade de certos atos pode recair para a pessoa errada. Eis o medo de trabalhar em

equipe: assumir responsabilidade depois de ter comido o que não devia, queimar ou manchar

uma roupa e roubar objetos.

Há que se destacar que as diaristas pesquisadas são agenciadas pelo SINE, onde para

cada agenciamento é emitida uma carta de encaminhamento de profissionais autônomos.

Nessa carta, há informações ao usuário, indicando o tempo de permanência da diarista na casa

e que ao valor da diária deve ser acrescido a alimentação e o valor de passagens de ônibus

locais. Porém, de acordo com as narrativas das entrevistadas, muitas casas oferecem a

alimentação – café da manhã e almoço – entretanto, outras chegam a oferecer comidas

estragadas ou de vários dias, e em horários incompatíveis.

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Tabela 28

Trecho do indicador 3c

Entrevistada Trecho Indicador

D 3

“Chega eu estava tremendo de fome... e

nada dela chamar para eu tomar café...

quando deu três e meia foi que ela deu um

grito (...). Quando olhei, aqueles pratos

fundos, tinha feijão, duas colheres de arroz e

a salsicha, quando eu mexi com a colher o

feijão borbulhou...”

Condições dos locais de

realização das atividades

de trabalho das diaristas

Outra particularidade desse modo de agenciamento é que o profissional solicitado

deverá apresentar a bolsa ao usuário na entrada e na saída do serviço. Para muitas diaristas,

isso é desconfortável e até humilhante, porém, para outras, isso lhes resguarda, é uma

segurança pessoal, caso alguma coisa desapareça da casa após o serviço prestado.

Ao final de cada agenciamento, o usuário deve preencher um campo de avaliação dos

serviços prestados pelo profissional: “muito bom”, “bom”, “regular” e “ruim”. Muitas vezes

as patroas elogiam, embora avaliem como “bom”, o que não é suficiente para as diaristas e,

por isso, antes de concluírem o serviço pedem para as usuárias averiguarem o trabalho

realizado, identificando a necessidade de mais algum serviço ou solicitando o

aperfeiçoamento em outros. Uma das diaristas declarou: “o pedreiro, ele é mais bem visto

porque ganha bem e tem que trabalhar bem, não fica sem trabalho; que nem as diaristas, tem

que trabalhar bem, que não fica sem trabalho” (D 7).

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4.2.4. Núcleo de significação 4 – “Eu não sobrevivo daquilo ali?”: a percepção da atividade

de trabalho da diarista

Indicadores como posicionamento das diaristas e modos de ser no trabalho; e

representação do trabalho para as diaristas compõem este núcleo. O trabalho da diarista é

caracterizado por não ser uma atividade fácil, é um trabalho “puxado” (D 1, D 8, D 11) árduo

e que exige muita responsabilidade. Por vezes é tido como obrigação, como sinônimo de

remuneração, porém, muitas entrevistadas associaram o seu trabalho a rotina – “todo dia eu

faço a mesma coisa...” (D 2). Por outras vezes, está associado a sustento e sobrevivência: “É

um trabalho bondoso, pois todo dia você ganha um dinheirinho para comprar o pão pra o seu

filho” (D 2); “Eu não sobrevivo daquilo ali? Meu ganha pão não é aquilo ali?” (D 1).

Destarte, ele é apresentado pelas diaristas “como outro qualquer” (D 11), tendo como

fundamento de que se trata de um trabalho honesto e digno; mas, também é uma troca de

serviços: “vai ajudar a patroa e a patroa vai ajudar” (D 3). Porém, a literatura designa que o

trabalho da diarista não é reconhecido como algo produtivo, já que as residências são espaços

privados, muito embora sua ocupação seja pública e não privada, uma vez que as mulheres

vendem sua força de trabalho nesse mercado de trabalho (Ribeiro, 2014).

Tabela 29

Trecho do indicador 4b

Entrevistada Trecho

Indicador “... já era um meio de sobrevivência... aí eu

comecei a trabalhar para sobreviver...” Representação do trabalho

D 9

“... é um serviço pesado”. para as diaristas

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As percepções que o público em geral tem delas são sentidas ao longo de conversas

sobre seus trabalhos e nos trajetos de volta para casa; quando não são nos locais que

trabalham. As diaristas deram a entender que ainda há uma visão estereotipada, o que ainda

demarca certa desvalorização dessa atividade de trabalho.

Isso está muito enraizado no baixo poder aquisitivo, nos modos como se vestem e se

transformam durante a realização do trabalho. Muitas vezes chegam arrumadas, “não é porque

é diarista que vai de qualquer jeito” (D 6), mas mudam de aparência, “você vem arrumada e

se desarruma, daqui a pouco você está toda arrepiada, até no canto dos olhos tem poeira” (D

2).

Ao se compararem a outras atividades de trabalho que ainda estão na celeuma das

legalizações e execuções trabalhistas, as participantes percebem que exercem um trabalho

invisível, como é possível destacar nas narrativas a seguir: “rico nunca enxergou empregada

doméstica e diarista... diarista e empregada nunca são umas pessoas vistas... depois que a

gente não trabalha pra aquele povo não enxergam” (D 8) ela acrescenta:

Algumas reconhecem a vida de uma diarista e a vida da empregada doméstica, mas

têm muitos que não reconhecem não, principalmente as pessoas de alto nível. É difícil

reconhecer a vida de uma diarista e uma empregada doméstica... o trabalho da diarista

não é visto ainda (D 8).

Inclusive pelo INSS, cujo órgão não reconhece a atividade de diarista, “disseram que

diarista é só um nome bonito que colocaram” (D 9).

Parcela da sociedade realiza atividades invisíveis, que representa um trabalho do qual

dependem as classes mais privilegiadas economicamente. A invisibilidade se traduz na forma

como algumas atividades de trabalho não são percebidas, nem consideradas (Ribeiro, 2014).

Também há outros modos de se compreender o trabalho das diaristas: como trabalho sujo,

dirty work, ocupações que estão relacionadas às atividades físicas, moral ou socialmente

humilhantes (Hughes, 1996).

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Ao refletirem sobre seus lugares no mundo do trabalho, as participantes desconfiam

que exercem um trabalho autônomo e que a atividade que exercem não se configura como

uma profissão, já que não estudaram para tal, diferente daquelas que declaram que todo

trabalho é profissão. Ainda assim, dizem: “diarista não é emprego fixo porque um emprego

fixo você ganha salário fixo, tem segurança” (D 2), “mas é profissão” (D 1).

Aspectos como esse foram evidenciados em estudo realizado por Dalmaso e Coutinho

(2010), e confirmado em estudo de Coutinho et al. (2013), cujos resultados apontaram que os

cobradores de ônibus, assim como as diaristas faxineiras, não consideram sua atuação como

profissão. A forte estigmatização da atividade de trabalho, assim como a natureza das relações

profissionais, contribuem para a precariedade do trabalho e, com base nesse fundamento,

levam à sensação de que o trabalho doméstico não é profissão (Iriart et al., 2008). A noção de

profissão foi conferida àqueles que têm posse de conhecimentos científicos e técnicos,

especializados e complexos, obtidos após formação universitária. Desse modo, diarista trata-

se de ocupação e não profissão (Gonçalves, 2008).

Para tanto, há que se destacar o aspecto do conhecimento tácito e do próprio

conhecimento técnico. As diaristas entrevistadas tiveram a oportunidade de falar sobre os

cursos que realizaram no SINE, tais quais: de congelamento, de lavadeira e de passadeira.

Diante disso, há aspectos que lhes conferem o título de profissionais, não apenas pela

certificação, mas pelo modo como organizam e dão sequência àss suas ações, pelas relações

com as usuárias, que não necessariamente estão baseados na troca de afetos. Além disso, há

uma relação mercadológica no ato de pagamento pelo serviço, embora injusta.

Diante dessas percepções, cada diarista entrevistada tem um modo de ser no trabalho.

Porém, o que mais chama atenção em seus discursos é que cientes ou não das suas condições

de trabalho, ora elas demonstram submissão quando afirmam que “ou aguenta ou não

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trabalha” (D 1), ora demonstram autonomia e liberdade quanto a sua prestação de serviço,

conforme também é declarado na tese de Ribeiro (2014).

Apesar de trabalharem como diaristas por necessidade financeira, ou por falta de

opção e de outras oportunidades, ou porque não estudaram, elas se dizem na condição e

privilégio de escolher para quem vai trabalhar, pois “todo dia é um desafio, uma casa

diferente” (D 9). “Nem sou obrigada a trabalhar pra senhora, nem a senhora a me querer” (D

1). A possibilidade de dizer “não” faz com que as diaristas permaneçam nessa atividade de

trabalho, o que torna o trabalho mais leve e menos injusto (Monticelli, 2013).

Desse modo, algumas entrevistadas manifestam o desejo de ir embora quando não

estão gostando das residências, como no exemplo: “tem locais muito ruins de trabalhar, que as

patroas são chatas, mas você evita discussões e espera a hora de ir embora e não volta nunca

mais” (D 12). Outra diarista reitera: “não somos obrigadas a ir aquela casa quando não gosta...

Você vai o dia que você quiser” (D 7).

Tabela 30

Trecho do indicador 4a

Entrevistada Trecho Indicador

D 7

“...setor de diarista é um trabalho, é um setor

honesto, é digno, não é um concursado, um

formado, mas você dá seu melhor pra fazer

uma limpeza numa casa. Aquilo que você

não pode fazer... então eu vou fazer do jeito

dela, se ela mandar eu limpar essa mesa, eu

limpo. É o meu trabalho”.

Posicionamento das

diaristas e modos de ser

no trabalho

“Não somos obrigadas a ir para aquela casa

quando não gosta...”

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Com isso, é possível perceber controle e autonomia das trabalhadoras quanto às suas

escolhas. Elas escolhem para quem trabalharão (Coutinho et al., 2013), conforme é possível

ler nos trechos destacados anteriormente, embora, para alguns autores, se trate de uma

autonomia relativa, uma vez que desenvolvem afeto e apego a alguns patrões (Teixeira et al.,

2015). Para outros, o discurso de autonomia e independência é uma personificação do

capitalismo, que confirma o retrocesso da proteção da legislação trabalhista, que legitima os

aspectos legais nas formas de trabalho precário através de trabalhos vulneráveis e

desprotegidos (Ribeiro, 2014).

Contudo, posicionam-se como mulheres felizes, dedicadas, satisfeitas e orgulhosas.

“Eu trabalho de diarista por prazer, por gostar, me sentir bem, é tudo” (D 6); “Me dedico

naquela coisa que vou fazer, de amor, não vou com cara feia” (D 11); “posso ver ouro em pó,

não é meu, deixo aí” (D 7). Na pesquisa de Monticelli (2013), as mulheres diziam se sentir

mais realizadas trabalhando enquanto diaristas.

4.2.5. Núcleo de significação 5 – “Não queria ser aquela diarista solta e irreconhecível”:

repercussões das mudanças no mundo do trabalho sobre a atividade da diarista

Este núcleo apresenta um aspecto contextual da atividade de trabalho das diaristas, a

partir da articulação de três indicadores, a saber: critérios e recrutamento de mão de obra;

conjuntura do mercado de trabalho; e aspectos relativos a atividade de trabalho informal.

A mudança no mundo do trabalho decorrente da reestruturação produtiva vem

redefinindo os locais de trabalho e fortalecendo o mercado de trabalho informal (Prisco et al.,

2013); além disso, a estagnação econômica e a crise político econômica dos últimos anos

tiveram reflexos em diversas áreas no Brasil. Isso gerou mudanças, inclusive, para o setor dos

profissionais autônomos, como é o caso das diaristas. Durante as entrevistas, muitas citaram a

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crise como o motivo da diminuição das demandas de trabalho. “Agora está uma crise, tem

semana que eu só trabalho dois dias... está difícil aparecer diárias, muito, muito difícil” (D 9).

Tabela 31

Trecho do indicador 5b

Entrevistada Trecho Indicador

“Mas aí agora parece que está meio fraco

nessa crise...”

D 2

“... nessa crise, está na dificuldade, de muita

gente ter dispensado os trabalhadores, ou

outras pessoas terem dispensado as diaristas

e ter ficado só com as empregadas...”

Conjuntura do mercado de

trabalho

Além da má gestão, a corrupção do Brasil foi alvo de críticas pelas diaristas. Para uma

delas, “nas décadas de 70, 80, até 89, 90, a vida financeira era melhor” (D 6). Para elas, nunca

faltaram diárias pelo SINE, por exemplo.

Apesar de reconhecerem os novos direitos para as empregadas domésticas, elas

alegam que se trata de manobras governamentais na área do trabalho, “enquanto melhora para

uns, piora para outros” (D 6). Uma delas revela que uma patroa para quem trabalhava teve de

escolher entre ficar com a empregada doméstica ou com as duas diaristas, e optou pela

empregada doméstica. Isso gera uma via de mão dupla: para Fraga (2010), quando a

empregada doméstica fica sem emprego, começa a trabalhar de diarista, aumentando a

concorrência de trabalho nessa área.

É notório o aumento do número de diaristas e, consequentemente, o aumento da

demanda por serviços de diária. Há possíveis causas para isso: (a) o empobrecimento da

classe média, enquanto maior empregadora; (b) a diminuição do tamanho das famílias; (c) o

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crescimento do número de domicílios de pessoas morando sozinhas; e (d) o aumento da

participação feminina no mercado de trabalho, além de mulheres com menor poder aquisitivo

e com mais dificuldade de contratar uma mensalista (Fraga, 2010).

As diaristas entrevistadas reconhecem, ainda, que têm muitas pessoas precisando de

uma pessoa para trabalhar na sua casa, porém, o dinheiro tem encurtado cada vez mais. Sendo

assim, “está um pouco difícil, pela crise no país... diminuiu muito” (D 7). Isso se deve,

notadamente, a falta do principal instrumento de trabalho no SINE: os telefones. Vez ou outra

as linhas estão indisponíveis. “O SINE aqui está muito fraco, não tem mais pedido como

antigamente... o telefone nem toca porque a crise está tudo muito difícil” (D 8).

Se já está difícil trabalhar por conta própria, quiçá os trabalhadores mais velhos e de

carteira assinada. Veja o relato de uma das diaristas: “quando era jovem, nunca tive sorte de

arrumar um emprego, agora que não arrumo mesmo” (D 2). O trabalho da diarista é

considerado informal e essa forma de trabalho ainda continua sendo uma alternativa a essa

crise e a crescente diminuição de emprego. A atividade de trabalho informal surge como um

elemento crucial para a sobrevivência dos trabalhadores (Ribeiro, 2014). Porém, vivenciar a

informalidade de maneira indesejável pode acentuar a perda da qualidade de vida (Lira, 2006;

Schwartz, 2004).

O trabalhador não entra no mercado informal por uma questão de escolha, mas por

necessidade, principalmente em se tratando de trabalhadores com baixa escolaridade e pouca

qualificação profissional (Leone, 2004). Essa modalidade de inserção no mundo laboral vem

ganhando força, pois tem sido acionada como produção preferencial do capital e não como

escolha dos sujeitos (Ribeiro, 2014).

Nesse sentido, as diaristas não relegam as oportunidades que o SINE ainda pode

oferecer, pois muitas delas mudaram suas vidas em decorrência da existência dessa

organização e, por isso, são muito gratas, inclusive às profissionais que lidam com elas

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diretamente: “pra mim o SINE é tudo! Por que, depois do SINE, acabou meu sofrimento” (D

2).

O ingresso das diaristas pesquisadas no SINE foi principalmente por indicação e

referência de alguém, o que facilitou o cadastro e agenciamento de muitas delas. Isso

corrobora com o estudo desenvolvido por Coutinho et al. (2013), que revela que o início das

atividades das diaristas se deu por diversas contingências e razões, como, por exemplo, a

indicação de parentes ou amigos. Houve uma delas que falou: “não queria ser aquela diarista

solta e irreconhecível” (D 7), o que implica a necessidade de gozar de reconhecimento social,

mas evitam a formalização, uma vez que isso implica em permanecer mais horas no serviço

(Prisco et al., 2013).

Porém, algumas vezes se veem em condições criteriosas para a escolha da mão de

obra. Existem usuários que solicitam diaristas pela idade e, inclusive, aqueles que solicitavam

que enviassem uma diarista que não fumasse. Com isso, uma diarista mencionou: “eu fui

obrigada a parar de fumar porque eles não queriam que a gente fumasse” (D 2).

Tabela 32

Trecho do indicador 5a

Entrevistada Trecho Indicador

D 1

“Procurei uma ex-patroa minha e ela me deu

referência, me indicou, aí eu entrei e, de lá

pra cá, desde 97, que trabalho como

diarista”.

Critérios e recrutamento

de mão de obra

O agenciamento pelo SINE gera outras repercussões: a indicação e referência “boca a

boca”. Elas relatam que já foram indicadas para muitos outros lugares, inclusive para pessoas

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da mesma família, e a intenção é essa: “é pra aquela usuária continuar com a gente, e

espalhar, espalhar a gente pra outras pessoas” (D 8), ou como declarou outra: “Natal todinha

tem meu telefone” (D 1).

A atividade de trabalho autônomo e informal tem suas vantagens e desvantagens. As

diaristas têm o benefício de trabalhar de dia e à noite dormirem em casa; trabalham no fim de

semana se quiserem. As que evitam criar vínculos, gostam da rotatividade de um dia estar em

uma residência e, no outro dia, estar em outra. “Eu prefiro diarista, porque todo dia é uma

casa diferente. Não tem elo pra nenhum dos dois, nem um lado, nem outro” (D 9). Assim

como os trabalhadores da construção civil, há alta rotatividade da atividade de diarista, o que

dificulta a identificação desses trabalhadores como uma categoria (Iriart et al., 2008).

Outras já veem isso com certo desconforto: “ela ali me chamou, se quiser me chamar

uma vez, chama, mas se não quiser chamar, chama outra, e vai pra outra e chama outra” (D

7). O cotidiano laboral é instável, haja vista a inexistência de vínculo empregatício e,

consequentemente, remuneração irregular e ausência de benefícios sociais (Coutinho et al.,

2013).

Tabela 33

Trecho do indicador 5c

Entrevistada Trecho

Indicador “... com o tempo, ela enjoa da sua cara, ela se acostuma com aquela pessoa, mas alguém poderia fazer melhor, então eles trocam...” Aspectos relativos à

D 12 “A diarista, nós trabalhamos sem carteira

assinada”.

atividade de trabalho informal

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No presente estudo, as diaristas afirmaram que não têm nenhum direito formal. Têm

horários de trabalho indefinidos e, quando não, sentem que tiveram seus horários violados;

além de não conseguirem descansar na hora do almoço. Diferente do que é apresentado em

Coutinho et al. (2013), em que as diaristas pesquisadas conseguem manter sua jornada de

trabalho dentro de limites razoáveis.

Por isso, é uma atividade com carência de direitos.

Não é um emprego fixo, porque um emprego fixo você tem um salário fixo, não tem

segurança. Você não trabalha de carteira assinada, então você não tem direito a nada...

pronto, se eu cair doente, eu não tenho direito de receber... Hoje, eu posso ir lá e,

amanhã, posso ser dispensada... Não é como ter um emprego fixo que você tem

carteira assinada, tem direito a auxílio doença, perícia, abono familiar, você tem

direito ao atestado, você tem todos os direitos (D 2).

A exclusão de direitos trabalhistas caracteriza a forma de trabalho precário (Ribeiro,

2014). A falta de direitos implica, de certo modo, na falta e indefinição de deveres. As

diaristas alegam que muitas vezes tem de dar conta de ações e serviços que não são de suas

competências, pois “faxina é faxina, lavado é lavado e engomado é engomado” (D 11). Mas

as usuárias sempre excedem em pedir a realização de outras ações, “Hoje eu quero que você

faça mais isso” (D 5). Isso gera uma demanda de ações intermináveis, maior do que uma

diarista poderia dar conta.

Essa função de limpar cozinha, eu acho que residência que tem empregada a gente não

tem direito de limpar cozinha, não... eu acho que diarista não tem o direito de lavar

louça, nem limpar fogão, nem geladeira, acho que isso aí precisa mudar (D 1).

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4.2.6. Núcleo de significação 6 – “A gente vai trabalhar pensando em fazer as coisas bem

feitas”: a constatação do trabalho final

Por fim, o presente núcleo foi constituído da aglutinação de dois indicadores: objetivo

e resultado da atividade de trabalho da diarista; e pagamento da diária como retorno

financeiro.

A lida das diaristas com a sua atividade de trabalho começa bem cedo, com rotinas

longas, trabalhos imprevisíveis e exercícios extenuantes. Carregam consigo, marcas da

violência, daquelas palavras que não precisavam ser ditas, do preconceito com seu ofício.

Como sinal de resistência, continuam desempenhando suas funções, “quando é de manhã, eu

coloco meu pé direito na frente e vou embora” (D 4).

Já saem com seus destinos, prevendo desenvolver suas ações, com objetivos e

antevendo resultados, porém, todos os dias estão em casas diferentes, acompanhadas de suas

particularidades. Doutro modo, “a gente vai trabalhar pensando em fazer as coisas bem feitas”

(D 8). Para as diaristas, o objetivo de seu trabalho é “chegar na hora do serviço, não faltar,

saber os detalhes, como começar, como terminar, deixar tudo organizado” (D 10). E a noção

de um trabalho bem feito, aquele que gera resultado, não é tão particular. O trabalho final é

quando elas percebem que, ao sair das residências, deixaram tudo “impecável” (D 1), ou seja,

deixaram os usuários satisfeitos, com as coisas em seus devidos lugares e conseguiram

administrar bem os materiais e utensílios necessários ao trabalho. O resultado é sempre fazer

um serviço de qualidade, que lhes gerem a sensação de dever cumprido. De outro modo, as

diaristas compreendem que realizaram um bom trabalho quando são agenciadas para os

mesmos tomadores de serviço.

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Tabela 34

Trecho do indicador 6a

Entrevistada Trecho Indicador

D 1

“Eu gosto de sair e deixar o patrão satisfeito.

Eu não gosto de sair e deixar ninguém

insatisfeito com meu trabalho”.

Objetivo e resultado da

atividade de trabalho

Uma das diaristas relata:

Um trabalho bem feito... eu não gosto de deixar a faxina sem terminar, por isso eu

tenho tanto que equilibrar o tempo e falar isso pra elas, explicar o trabalho, porque é

muito chato sair da casa sem terminar a faxina. Pra mim é chato, eu não saio satisfeita,

é como se tivesse falhado (D 12).

Dessa forma, o resultado de sua atividade de trabalho tem um pouco da realização

pessoal de cada diarista: “quando eu deixo ela satisfeita, eu saio satisfeita. Pra mim ficou

perfeito” (D 1).

Muitas se admiram pela capacidade do que fizeram, ao mesmo passo em que o

resultado do trabalho é uma “obra feita” (D 9), ver as coisas limpas é uma recompensa, e lhes

dá a sensação de “limpeza na alma” (D 11). Ao admirar-se pela atividade desenvolvida e

serem elogiadas pelo serviço, é possível suspeitar a ausência de cisão entre o trabalhador, sua

atividade e o produto do seu trabalho, reconhecendo-se como produtor do objeto que

produziu. Alguns relatos atestam a alienação como elemento característico da sociedade

capitalista. Por isso, as práticas alienantes na atividade da diarista pode ser o trabalho restrito

a um meio de existência física, ou seja, o trabalho não é uma atividade que desenvolve as

faculdades humanas, mas apenas uma forma de obter sobrevivência física.

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Ao final de sua atividade, as diaristas pesquisadas atestaram que há outro tipo de

recompensa: o pagamento da diária. Atualmente, o valor da diária do SINE, de segunda à

sexta-feira, é de R$ 70,00 (setenta reais), acrescido de alimentação e passagem. Domingo e

feriados, o valor é de R$ 80,00 (oitenta reais). A hora extra é 10% sobre o valor da diária. A

renda média por dia de trabalho, em Curitiba/Paraná, no ano de 2013, era de R$ 80,00 (oitenta

reais) (Monticelli, 2013).

Parte das diaristas pesquisadas revela que trabalhar de diarista é rentável, pois os

ganhos financeiros são maiores, “a gente ganha quase o salário todo por semana. As que se

tornaram freguesas de muito tempo, não paga diária do SINE, paga mais um pouco” (D 8).

Se eu trabalhar de carteira assinada de doméstica, eu vou ganhar setecentos e alguma

coisa. e então, o aluguel mais barato... que eu consegui foi de 400, aí eu vou pagar,

tenho um filho em casa... tem vale transporte, alimentação, roupa, calçado... (D 12).

Essa é, também, uma das vantagens elencadas pelas diaristas entrevistadas por

Coutinho et al. (2013), quando elas desvelam um maior retorno financeiro decorrente da

atividade quando comparado a rendimentos de outras atividades desenvolvidas, inclusive com

registro formal em carteira. No estudo desenvolvido por Prisco et al. (2013), as diaristas

argumentaram que, mesmo com a falta de regulamentação, continuavam nessa atividade

devido a obtenção de maiores rendimentos.

Para tanto, a recompensa financeira exige de muitas delas um planejamento e

economia, pois nem sempre tem agenciamento ou fregueses disponíveis a solicitar serviço:

“se eu trabalhar 5 dias todo, eu deposito dois dias” (D 6). Apesar disso, as diaristas encontram

incoerência no exercício da atividade realizada com o valor da diária “quando pega uma casa

grande você tem que terminar no mesmo horário da casa pequena e o dinheiro não compensa”

(D 7).

Algumas diaristas sabem que o seu trabalho chegou ao fim quando têm o retorno

financeiro. Receber o dinheiro é a atividade fim: “você chega, trabalha, recebe seu dinheiro”

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(D 9). Em consonância umas com as outras, declaram: “vou trabalhar, faço minha diária

direitinho, recebo meu dinheiro e vou embora pra casa” (D 4); “eu sou de fazer meu trabalho,

receber e ir pra casa” (D 2); “eu gosto de trabalhar e receber meu dinheiro” (D 8); “quando

terminar, receber meu dinheiro e ir pra casa” (D 2); “é bom, porque você termina, recebe seu

dinheirinho” (D 7).

Tabela 35

Trecho do indicador 6b

Entrevistada Trecho Indicador

D 7

“...se você gosta e quer trabalhar, é bom,

porque você termina e recebe seu

dinheirinho...”

Pagamento da diária como

retorno financeiro

4.3. Análise internúcleo

Com o propósito de aprofundar o objetivo geral dessa dissertação, a seguir será

apresentado o procedimento de interpretação internúcleos, conforme prevê Aguiar e Ozella

(2013). A análise internúcleo vincula os seis núcleos, procurando articular as significações,

bem como as mediações que permeiam os núcleos, conforme ilustrado na Figura 5.

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Figura 5. Articulação dos núcleos de significação para análise internúcleos

A atividade é direcionada a um objetivo, e a transformação desse objetivo em um

resultado ou produto é a motivação da existência da atividade. Na atividade humana da

diarista, assim como outra atividade humana, há a prescrição de objetivos, regras e

procedimentos relacionados aos resultados desejados e como fazer para alcançá-los. A

prescrição é fornecida pela sociedade, pelos tomadores de serviço e pelo trabalhador. Quando

em atividade, há a produção de sentidos e significados; a existência das necessidades,

motivos, apropriação e desvelamento da subjetividade, considerando as múltiplas

possibilidades de vir a ser sujeito.

Este é o momento de evidenciar semelhanças e contradições presentes nas

significações das diaristas, a fim de continuar revelando zonas de sentido, que se relacionam

com o movimento de constituição de sua identidade (Aguiar, Soares, & Machado, 2015). Para

nos aproximarmos do modo de ser do sujeito, precisamos considerar a totalidade das zonas de

sentido apreendidas nos núcleos (Araújo, 2015). As contradições, por sua vez, não

necessariamente devem ser evitadas, pois são força motriz dentro da atividade. Podem

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representar o tipo de desenvolvimento que está ocorrendo dentro do sistema de atividade

(Engeström, 1987).

No sistema de atividade, os elementos interagem uns com os outros e estão sujeitos a

funcionarem por meio de mudança. A mudança em uma ferramenta, por exemplo, pode

mudar a orientação do sujeito em relação ao objeto. É possível que o próprio objeto e motivo

também sofram mudanças durante o processo da atividade (Araújo, 2015).

As diaristas são os sujeitos da atividade estudada. Essa atividade deve ser analisada

dentro do contexto de desenvolvimento e os elementos de uma atividade, por serem

dinâmicos e construídos historicamente, se transformam ao longo do seu desenvolvimento. A

função da faxina, da lavagem, do engomado, ou da ajuda geral são os objetos, que os

distingue de outras atividades. Para tanto, toda atividade é orientada a objetivos e, portanto,

incorpora o motivo da atividade.

O objeto é o espaço problema e as ações orientadas ao objeto se caracterizam por

incertezas, interpretação, surpresa, ambiguidades, criação de significados e potencial para

mudanças (Engeström, 2012). A primeira condição de qualquer atividade é a necessidade.

Para tanto, a necessidade não determina a orientação real da atividade, é apenas no objetivo da

atividade que ela encontra sua determinação. A necessidade encontra sua determinação no

objeto, se objetivando nele, e esse objeto torna-se motivo da atividade, aquilo que o estimula

(Heemann, 2010).

Do mesmo modo, no trabalho doméstico, o objeto é de extrema complexidade e há

certa dificuldade em se padronizar o cotidiano de trabalho, isso porque o processo de

organização e cuidado engloba uma união singular entre os sujeitos (Ribeiro, 2014). Ao

buscar compreender como as diaristas significam sua atividade de trabalho, revelamos zonas

de sentidos acerca da trajetória ocupacional (núcleo 1). A apreensão de como as diaristas

significam a trajetória ocupacional revelou que esses sentidos foram produzidos pela

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mediação de ferramentas psíquicas e físicas ao longo da sua vida pessoal. Isso produziu

reflexos no âmbito profissional, cujas tarefas são influenciadas pela história da vida familiar.

Essas histórias se relacionam, se entrelaçam e, muitas vezes, se confundem, haja vista

as relações sociais que as diaristas têm com seus patrões, clientes e usuários. Ao mesmo

passo, são essas relações que estruturam a sua atividade de trabalho (núcleo 3) e mediam a sua

atividade (núcleo 2). “Os vínculos afetivos que possui com esse empregador são

demasiadamente fortes, que interferem até mesmo nas suas noções de ‘'lar’, de história

pessoal e em sua própria concepção de sujeito” (Monticelli, 2013, p. 150).

As doze diaristas, aqui estudadas, compreendem que o seu trabalho se desenvolve ora

em um espaço profissional, ora em um espaço familiar (núcleo 1). A condição de dona de

casa lhes permite conhecer o exercício das atividades a serem realizadas na casa de seus

patrões. Para tanto, há uma contradição ao dizerem que arrumam a casa das patroas como se

fossem suas casas, já que em suas residências não necessariamente buscam um ideal de

limpeza (Teixeira et al., 2015). Quando se veem em espaço familiar, é perceptível certa

flexibilidade na sua atuação (núcleo 5). Quando em espaço profissional, as diaristas dizem

quão difícil é estar todos os dias em casas diferentes (núcleo 2), ao mesmo passo que têm de

ser relacionar com usuários e clientes, cada qual com suas particularidades (núcleo 3).

As dimensões profissional e familiar mediam uma interação sob constante tensão, pois

não se estabelecem por completo: há uma relação familiar que não perde o elemento da

subordinação. Desse modo, as relações não são construídas apenas pela afetividade, mas pelo

aspecto da hierarquização. De outro modo, a casa, se tornando esfera produtiva, faz com que,

em seu cotidiano, não haja uma delimitação precisa do que é público e privado (Teixeira et

al., 2015). Por isso, há uma certa ambiguidade na posição da diarista: se ela está integrada ou

excluída da família (Ribeiro, 2014).

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Muitas se sentem felizes por não serem tratadas como empregadas, mas como alguém

da família ou como amiga dos patrões. Para tanto, essa felicidade pode ter a ver com a recusa

de identidade de trabalhadora doméstica, e por isso assumem que os lugares que trabalham

são seus, lugares esses em que há um misto de sofrimento com pertencimento (Teixeira et al.,

2015).

Entre os princípios básicos da teoria da atividade, está a mediação por meio de

ferramentas, que moldam a maneira como se interage com a realidade. Por um lado, as

ferramentas podem expandir as habilidades para manipular ou transformar objetos diferentes

e, por outro, podem limitar ou restringir a percepção e manipulação do objeto em si

(Quevedo, 2005).

As ferramentas propostas neste estudo variam entre aquelas físicas e psicológicas, que

vão desde o uso do corpo e da mente, até o uso de instrumentos como a vassoura, a pá, o rodo,

etc. A ausência desses artefatos impede a consumação da atividade. Essas ferramentas podem

catalisar habilidades para manipular e transformar objetos diferentes, mas também podem

limitar a percepção e manipulação do objeto (Heemann, 2010).

Por isso, as mudanças no mundo do trabalho, que conferem variações nas modalidades

de trabalho (núcleo 5), trazem às diaristas diferentes modo de se relacionarem com os

tomadores de seus serviços e outros grupos profissionais (núcleo 3). Quando não há condições

favoráveis à realização de suas atividades, isto é, quando há impedimentos (núcleo 2), elas

usam a flexibilidade do trabalho (núcleo 5), ou melhor, a partir da percepção que têm da sua

atividade: usam a sua autonomia e liberdade (núcleo 4) como um recurso para enfrentar as

dificuldades (núcleo 2).

Essas relações conferem uma percepção desafiadora de suas atividades de trabalho

(núcleo 4), pois a atividade fim indica que casas diferentes resultam em sentidos e

significados diferentes (núcleo 6), haja vista que os artefatos mediadores acabam se tornando,

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também, particulares (núcleo 2). Outro aspecto a se pensar é que, enquanto no núcleo 4 o

retorno financeiro é uma das representações da atividade que realizam, no núcleo 6, ele

aparece como atividade fim, evidenciando outras necessidades e motivos que as impulsionam

para tal atividade.

Seus modos de pensar, sentir e agir como diaristas são reconfigurados a partir de sua

experiência prática. Enquanto nos núcleos 1 e 2 as diaristas apresentaram que as mães tiveram

papeis preponderantes na execução das atividades que exercem hoje, a herança materna têm

sido rompida aos poucos, pois seus filhos já tiveram melhores oportunidades de acesso à

escola. Do mesmo modo, as diaristas conseguem apreender que as mudanças decorrentes da

reestruturação produtiva merecem uma melhor reflexão sobre as trajetórias profissionais de

seus filhos, de atividades que lhes garantam melhor retorno no aspecto do valor humano, ou

melhor, da ascensão social.

O motivo que as impulsionaram a trabalhar (núcleo 1), mesmo quando ainda criança,

hoje se apresenta como a forma que compreendem sua atividade de trabalho, isto é, como

meio de sobrevivência e sustento (núcleo 4). Outra zona de sentido produzida é que o trabalho

é representado como uma atividade que é sobrecarregada e que exige força (núcleo 4), porém,

ter força e ritmo para o trabalho é algo que se traduz em dificuldade para a realização da

atividade (núcleo 2), haja vista as condições físicas discriminadas e outros fatores já descritos.

O ageísmo, por exemplo, também se configura como um impedimento para a realização da

atividade (núcleo 2, ao mesmo passo que também é parte do núcleo 5, requisitos para o

recrutamento de mão de obra).

As regras permitem certo nível de estabilidade para a atividade humana. Para tanto, na

atividade da diarista não há normas, regras ou diretrizes explicitas, haja vista a condição

invisível jurídico e social de sua atividade. Porém, é possível levar em consideração as

normas impostas pelo SINE, o qual é responsável pelo agenciamento das diaristas aqui

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representadas. As diaristas devem ter cadastros ativos e atualizados e quando agenciadas

devem permanecer na residência por um período de 9 horas. Por outro lado, as normas

implícitas implicam, notadamente, que as diaristas são indicadas ou referenciadas ao SINE

por meio de amizades e outros tipos de relações, seja com conhecidos ou ex-patrões.

No que diz respeito ao elemento social, comunidade, as diaristas circulam em um meio

sociocultural indefinido pela própria literatura, pouco se fala sobre esse gênero profissional,

sobre aquilo que as torna diferente de outras atividades ocupacionais. As relações com seus

pares, de mobilização e organização, ainda são muito frágeis. O SINE tem iniciativas

incipientes, com reuniões que estimulam o aprendizado e a capacitação contínua, indicam

formas de agir, apontando o que é verdadeiro e correto e prevendo formas de trabalhar. O

SINE, muitas vezes, se responsabiliza pelo que as diaristas aprendem e executam nas

residências, porém as regras são muitas vezes prescritas pelas patroas, ou pessoas em outras

condições hierárquicas.

Diante disso, a divisão do trabalho pode ser observada no modo como as participantes

da comunidade dividem a responsabilidade na influência e definição do objeto. A divisão

social diz do lugar das patroas, clientes e usuários na concepção da atividade, mas também de

outras atividades profissionais que apresentam objetos semelhantes, como as mensalistas. A

distribuição das responsabilidades é, em geral, das patroas, clientes e usuários. Porém, há

certa volatilidade nisso, a depender do relacionamento entre a diarista e seus tomadores de

serviço, ou com outras diaristas e mensalistas.

A atividade da diarista parte de sua necessidade de fazer a faxina, a lavagem,

engomado ou ajuda geral. Entretanto, sua necessidade em si não caracteriza uma atividade.

Como toda atividade tem um caráter objetal, a atividade só se realiza quando a necessidade

encontra o espaço problema, ou seja, o objeto – a casa para limpar, a roupa para lavar ou para

engomar – que são as patroas, usuários, clientes, ou mensalistas demandando o serviço,

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motivo da atividade. Os instrumentos, tais como: vassoura, pá, rodo, ferro e etc., mediam a

relação sujeito-objeto, influenciada pela aprendizagem tácita, ou da indicação e referência de

algumas pessoas conhecidas e a opção da diarista ser agenciada pelo SINE. As regras, na

condição do SINE, e a divisão do trabalho reforçam a estrutura do sistema de atividade.

Exemplificamos esse modelo na figura a seguir:

Figura 6. Estrutura do sistema de atividade da diarista.

No entanto, o sistema de atividade é dinâmico e não necessariamente a organização da

atividade da diarista é essa, o que pode contradizer o sistema de atividade. A diarista pode não

encontrar utensílios e materiais de limpeza necessários à execução de suas ações; pode não

querer realizar determinadas ações naquela residência, tendo em vista a relação que

estabeleceu com a usuária ou com a mensalista, reordenando uma nova divisão do trabalho.

Além de que a nova divisão do trabalho pode implicar na dissolução de regras impostas pelo

SINE. Isso implica em uma nova organização do tempo de permanência nas residências, por

conseguinte, novas regras. Por isso, reiteramos que as contradições no sistema de atividade

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não devem ser evitadas, são elas que dinamizam a atividade, ao mesmo passo em que

representam o desenvolvimento que está ocorrendo dentro do sistema de atividade e do

próprio sujeito.

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5. Considerações finais

A presente dissertação foi realizada com doze diaristas, com o objetivo de

compreender o processo de significação do trabalho para um conjunto de diaristas atuando na

cidade de Natal, RN. Para atingir o objetivo geral, delineamos um estudo qualitativo, com uso

da técnica da entrevista semiestruturada.

Como parte dos resultados, percebemos que as diaristas significavam seu trabalho de

diversas formas, a saber pela construção dos núcleos de significação aqui apresentados. Para

tanto, conhecer os sentidos e significados foi possível em virtude de considerarmos que a

atividade não está estritamente relacionada a um objeto, mas a um contexto mais amplo, pela

existência de elementos sociais e da interdependência desses.

A vida das diaristas é marcada pela migração e pelo trabalho infantil, motivado pela

necessidade de melhores condições de vida que pudessem suprir as necessidades básicas de

seus familiares. Essas mulheres têm um histórico de vida profissional influenciado

preponderantemente pelo contexto familiar e vivenciam o exercício de uma atividade

sobrecarregada, de relacionamentos instáveis e marcados pela rotatividade.

Os depoimentos apresentados nessa dissertação revelam a necessidade das diaristas de

gerirem a própria vida e, por isso, se permitirem estar numa ocupação que lhes confere mais

liberdade e autonomia. Todas elas começaram a trabalhar como diarista por meio de

indicações e referências por outras pessoas. A atividade de trabalho é semanal e em

residências diferentes, por meio da execução de ações num único dia de trabalho, o que as

difere da empregada doméstica.

No entanto, a liberdade e autonomia não se dão a qualquer custo; os sentidos

associados ao trabalho a partir da realização da atividade concreta são permeados por dúvidas,

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dificuldades e incertezas, decorrentes de suas histórias passadas, seus sentimentos e aspectos

da desvalorização pessoal e ocupacional. As diaristas têm problemas de saúde física e mental,

estão em processo de envelhecimento, além de sofrerem preconceito em virtude da idade.

Muito embora o processo de envelhecimento seja relativo, em aspectos conceituais e do

próprio discurso das diaristas.

Por isso, elas têm de buscar estratégias para realizar sua atividade e nela encontrar

sentido. Desse modo, ao mesmo passo que a autonomia e liberdade se constituem como

sentido do trabalho, também são usadas como estratégias de enfrentamento às dificuldades.

Além disso, usam da espiritualidade como mobilização para enfrentar as dificuldades. Aos

aspectos da maturidade e experiência também merece destaque, como uma forma de lutar e

resistir aos preconceitos e a desvalorização.

Como contribuições à área da Psicologia Social do Trabalho, reiteramos a importância

de estudar ocupações que estão à margem do emprego formal. Além disso, esta produção

propiciou compreender o trabalho a partir do olhar de quem o vivencia, o trabalhador. Isso

posto, a pesquisa permitiu a aproximação teórica e conceitual sobre um fenômeno ainda

pouco discutido. Conseguimos confirmar os resultados com boa parte da literatura,

principalmente nos quesitos que desvelam a precarização do trabalho. Ademais, essa

ocupação ainda carrega muitas das estruturas das desigualdades brasileiras.

Uma das limitações desse estudo foi a realização da pesquisa com diaristas que são

agenciadas pelo SINE. Talvez fosse necessário investigar o trabalho de diaristas que não tem

vínculos com agências de emprego. Isso possibilitaria a realização de um estudo comparativo

e a averiguação de se a construção de sentidos e significados se situam nos mesmos núcleos

de significação.

Essa dissertação possibilitou refletir sobre outras possibilidades de estudo, como, por

exemplo: aspectos que relevam ruptura de heranças maternas no exercício da atividade

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profissional e busca por ascensão social; aposentadoria para trabalhadores da economia

informal; e também sugerimos outra dimensão que poderá ser melhor investigada: a

transversalidade das temáticas trabalho e envelhecimento, já que os estudos são pontuais ao

revelarem que os trabalhadores domésticos estão envelhecendo. O próprio IBGE não

discrimina, em suas pesquisas, aqueles que são empregados domésticos e os que são diaristas.

Ambos se resumem a trabalhador doméstico. Além disso, o aumento da idade e o

envelhecimento populacional têm influenciado diretamente o perfil dos trabalhadores em

geral.

Esperamos que esta dissertação possibilite a abertura de novos caminhos para essa

atividade de trabalho. E, como contribuição prática, pretendemos socializar os resultados

junto ao SINE, auxiliando os profissionais na orientação de suas atividades e dúvidas

decorrentes do lugar da diarista no mundo do trabalho.

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Apêndices

Apêndice A

Roteiro de entrevista semiestruturada

Momento Tópicos norteadores

Aspectos

sóciodemográficos

Entrevistado/ Identificação

Idade

Sexo

Etnia/ Raça

Escolaridade

Estado Civil

Com quem mora?

Reside em Natal/RN? Quanto tempo trabalha como Diarista?

Trabalha quantas horas?

Quantos dias durante a semana?

Contextualização 1) Conte-me um pouco da sua história; como se tornou Diarista? Ou como

você chegou a ocupação atual?

Atividade 1) Como definiria o trabalho da Diarista? - Escolha um dia bastante representativo do que você faz e me conte

como é.

Explorar: quais as principais ações realizadas, como são realizadas,

(fazeres concretos), com quem e ainda para quem (sujeito > objeto)

2) Como é feita a concepção da atividade?

Onde e como aprendeu o que sabe para fazer o que faz? Quem delega as

atividades a serem realizadas, você ou a dona da casa para quem trabalha?

Você acha que atinge os objetivos quando finaliza a atividade de trabalho;

e os donos da casa, o que dizem do seu trabalho, ao finalizá-lo? Enfim,

como é feita a divisão e organização do trabalho?

3) O que você acha que as pessoas pensam o que é o trabalho da Diarista? 4) Se pudesse (se tivesse o poder para tanto), o que mudaria na atividade?

Por quê?

Envelhecimento 1) Como é ser uma diarista aos (idade da participante)?

Proc. Significação 1) Você acha que o que você faz é trabalho? Explique por quê. 2) Quando se fala em trabalho, o que lhe vem à cabeça? Qual imagem? Qual

palavra?

3) Você percebe que ao longo do tempo tem sido mais fácil, mais difícil o

trabalho? Quais as facilidades e dificuldades encontra no seu trabalho? o

que mais gosta? e o que mais lhes frustra? o que sente quando fala do seu

trabalho? e o que espera do futuro?

4) O que seria um trabalho bem feito? Essa concepção mudou ao longo da

sua vida? Em que momento?

5) Caso seus filhos (as) quisessem seguir essa mesma ocupação, o que você

pensaria?

Fechamento O que achou dessa entrevista? Gostaria de acrescentar mais alguma coisa?

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Apêndice B

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE

Esclarecimentos

Este é um convite para você participar da pesquisa: “Processos de significação do trabalho

para Diaristas mais velhas em Natal/Rio Grande do Norte”, que tem como pesquisadora

responsável Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira, sob orientação do Professor Doutor Pedro

Fernando Bendassolli e co-orientação da professora Doutora Tatiana de Lucena Torres.

Esta pesquisa pretende investigar o processo de significação do trabalho para um conjunto

de diaristas mais velhas atuando na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte (RN).

O motivo que nos leva a fazer esse estudo é contribuir com o tema e, especificamente,

compreender os sentidos associados ao trabalho a partir da compreensão da atividade concreta

realizada pela diarista; compreender, no contexto da realização da atividade, aspectos

relacionados à circunstância de se ser um trabalhador mais velho; e identificar as estratégias ou

mobilizações utilizadas pelas diaristas para realizar sua atividade e nela encontrar sentido, bem

como as estratégias de mobilização referentes à circunstância de se ser um trabalhador mais velho.

Caso você decida participar, você deverá responder uma entrevista, que será composta por

algumas questões, relacionadas a sua opinião e também por situações vivenciadas por você. O

tempo da entrevista dependerá do que você tem a nos dizer. Responda de acordo com o que você

realmente pensa, não há resposta certa ou errada. Sua participação é muito importante para nós!

Lembre-se que você não será identificado em nenhum momento da pesquisa e apenas a

entrevistadora e coordenadores do estudo terão acesso às suas respostas.

Para tanto, iremos solicitar, também, a assinatura do termo de autorização para gravação

da sua voz.

Durante a realização, o pesquisador fará uma pergunta, com a qual se baseará sua resposta,

ou seja, você será convidado a falar livremente sobre o determinado tema, enquanto isso, o

pesquisador poderá fazer outras perguntas, que buscam dar mais profundidade as reflexões. A

previsão de riscos é mínima, ou seja, o risco que você corre é semelhante àquele sentido num

exame físico ou psicológico de rotina.

Os riscos envolvidos ao responder a entrevista são psicológicos, uma vez que a temática

poderá suscitar reflexões e questionamentos, sendo assim, caso perceba que a entrevista lhe

sensibilizou, você poderá conversar conosco e poderemos lhe encaminhar para um serviço de

apoio psicológico da universidade.

Durante todo o período da pesquisa, você poderá tirar suas dúvidas ligando para Kamilla

Sthefany Andrade de Oliveira, email: [email protected] ou com Pedro Fenando

Bendassolli, email: [email protected].

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A participação nesse estudo é voluntária e, caso decida não participar ou desista de

continuar, você tem absoluta liberdade para fazê-lo, podendo retirar seu consentimento em

qualquer fase da pesquisa, sem que isso acarrete nenhum prejuízo para você.

Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas em

congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de nenhum dado que possa lhe

identificar. Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa em local

seguro e por um período de 5 anos.

Se você tiver algum gasto pela sua participação nessa pesquisa, ele será assumido pelo

pesquisador e reembolsado para você.

Se você sofrer algum dano comprovadamente decorrente desta pesquisa, você será

indenizado.

Qualquer dúvida sobre a ética dessa pesquisa você deverá ligar para o Comitê de Ética em

Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, telefone 3215- 3135.

Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com o

pesquisador responsável, Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira.

Consentimento Livre e Esclarecido

Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os dados serão coletados

nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios que ela trará para mim e ter

ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar da pesquisa “Processos de

significação do trabalho para Diaristas mais velhas em Natal/ Rio Grande do Norte”, e autorizo a

divulgação das informações por mim fornecidas em congressos e/ou publicações científicas desde

que nenhum dado possa me identificar.

Natal/RN, / / .

Assinatura do participante da pesquisa Impressão Datiloscópica do participante

Declaração do pesquisador responsável

Como pesquisador responsável pelo estudo “Processos de significação do trabalho para Diaristas

mais velhas em Natal/ Rio Grande do Norte”, declaro que assumo a inteira responsabilidade de

cumprir fielmente os procedimentos metodologicamente e direitos que foram esclarecidos e

assegurados ao participante desse estudo, assim como manter sigilo e confidencialidade sobre a

identidade do mesmo. Declaro ainda estar ciente que na inobservância do compromisso ora

assumido estarei infringindo as normas e diretrizes propostas pela Resolução 466/12 do Conselho

Nacional de Saúde – CNS, que regulamenta as pesquisas envolvendo o ser humano.

Natal/RN, / / .

Assinatura da pesquisadora responsável

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Apêndice C

TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ

Eu, , depois de

entender os riscos e benefícios que a pesquisa intitulada “Processos de significação do

trabalho para Diaristas mais velhas em Natal, Rio Grande do Norte” poderá trazer e

entender especialmente os métodos que serão usados para a coleta de dados, assim como,

estar ciente da necessidade da gravação de minha entrevista, AUTORIZO, por meio deste

termo, a pesquisadora Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira a realizar a gravação de minha

entrevista sem custos financeiros a nenhuma parte. Esta AUTORIZAÇÃO foi concedida

mediante o compromisso dos pesquisadores acima citados em garantir-me os seguintes

direitos:

1. Poderei ler a transcrição de minha gravação;

2. Os dados coletados serão usados exclusivamente para gerar informações

para a pesquisa aqui relatada e outras publicações dela decorrentes, quais sejam:

revistas científicas, congressos e jornais;

3. Minha identificação não será revelada em nenhuma das vias de publicação

das informações geradas;

4. Qualquer outra forma de utilização dessas informações somente poderá ser

feita mediante minha autorização;

5. Os dados coletados serão guardados por 5 anos, sob a responsabilidade da

pesquisadora coordenadora da pesquisa, Kamilla Sthefany Andrade de Oliveira, e após

esse período, serão destruídos e,

6. Serei livre para interromper minha participação na pesquisa a qualquer

momento e/ou solicitar a posse da gravação e transcrição de minha entrevista.

Natal/ RN, / / .

Assinatura do participante da pesquisa Impressão Datiloscópica do participante

Assinatura e carimbo do pesquisador responsável

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Apêndice D

Organização dos pré-indicadores e indicadores pelo Software Excel 2010

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Apêndice E

Indicadores e núcleos de significação inferidos a partir das entrevistas

Indicadores Núcleos de significação

a) Ações realizadas da condição de diarista;

b) Funções desempenhadas ao longo da

vida;

c) Condicionantes sociais e condição da

vida material;

d) Influência da vida familiar na condição

de diarista;

e) Escolarização como prerrogativa de

melhores condições e oportunidades de

trabalho;

f) Projetos da vida profissional e

perspectiva de futuro;

g) Tempo de dedicação ao trabalho; h) Trabalho durante a infância e

adolescência;

i) Aposentadoria;

j) Dia de trabalho;

k) Atividade de trabalho extra; l) Organização e sequência da atividade de

trabalho;

m) Condições de gênero.

1. “Minha vida é essa; eu vivo só para

trabalhar”: reflexões sobre a trajetória

ocupacional das diaristas.

a) Saúde mental e sofrimento psíquico;

b) Capacidade física para o trabalho;

c) Acidentes no trabalho;

d) Educação para o trabalho;

e) Instrumentos da atividade de trabalho;

f) Concepção de desenvolvimento humano;

g) Dificuldades para a realização da

atividade de trabalho;

h) Espiritualidade;

i) Discriminação pela idade;

j) Problema de saúde.

2. “Tem que se virar com o que tem”:

ferramentas, impedimentos e

estratégias de enfrentamento para

execução da atividade de trabalho.

a) Relações sociais entre as diaristas e seus

patrões, usuários, clientes e outros

funcionários da limpeza;

b) Comparação da atividade de trabalho

com outras diaristas ou outros

profissionais;

c) Condições dos locais de realização das

atividades de trabalho das diaristas.

3. “Nem todos os lugares são iguais e

nem todas as patroas são iguais”:

relações sociais no processo de

trabalho.

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a) Posicionamento das diaristas e modos de

ser no trabalho;

b) Representação do trabalho para as

diaristas.

4. “Eu não sobrevivo daquilo ali?”: a

percepção da atividade de trabalho da

diarista.

a) Critérios e recrutamento de mão de obra;

b) Conjuntura do mercado de trabalho;

c) Aspectos relativos à atividade de

trabalho informal.

5. “Não queria ser aquela diarista solta e

irreconhecível”: repercussões das

mudanças no mundo do trabalho

sobre a atividade da diarista.

a) Objetivo e resultado da atividade de

trabalho da diarista;

b) Pagamento da diária como retorno

financeiro.

6. “A gente vai trabalhar pensando em

fazer as coisas bem feitas”: a

constatação do trabalho final.

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Anexos

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