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Programa de Pós-Graduação Estudos da Linguagem Departamento de Letras - PUC-Rio V CDL- Ciclo de Debates em Linguagem - Tendências e Teses MINUTO DA PESQUISA LINHA 1 Descrição do Português, Ensino e Tecnologia Aluna: Sônia Maria do Nascimento Lisboa Nível: Mestrado Orientadora: Rosa Marina de Brito Meyer Relacionamentos amorosos entre ingleses e brasileiros: uma perspectiva interculturalista Uma vez que não acreditamos na possibilidade de aprender uma língua sem aprender a cultura do (s) país (es) em que ela é falada, estamos desenvolvendo uma pesquisa que parte de aspectos culturais como contribuição ao ensino do português para falantes de outras línguas. De acordo com o interculturalista Hofstede (2010), a cultura só existe por comparação; isso significa que só podemos descobrir o que é semelhante e o que é diferente entre as culturas se as compararmos umas às outras e observarmos o resultado. A partir dessa teoria, muito utilizada e reconhecida em pesquisas dentro do campo empresarial, o presente trabalho observa relacionamentos amorosos entre brasileiros e ingleses, que vivem no Brasil ou no Reino Unido, por meio de questionários e entrevistas realizados pessoalmente ou por meio de programas de comunicação online. Conhecido entre os interculturalistas por cross-marriage ou intermarriage, esse fenômeno está cada vez mais recorrente em nosso mundo globalizado e, por isso, se configura como um fértil objeto de estudo na área. Nosso objetivo é entender melhor como esses relacionamentos se dão, investigando qual a influência das culturas de origem nessas relações. Mais especificamente, procuraremos identificar situações em que há choques culturais e refletir sobre como essas práticas podem ser evitadas, mostrando a importância de se entender uma cultura e sua língua, independentemente do tipo de relacionamento em questão. Pretendemos, ainda, comparar os casais que vivem no Brasil e os que não vivem aqui, para que possamos identificar se há diferenças entre eles e ainda se essas diferenças são relevantes à pesquisa. Como a motivação desse trabalho é encontrar ferramentas que possam auxiliar estudantes de português como língua estrangeira ou segunda língua a entender melhor a cultura brasileira e como as relações interpessoais e afetivas são tratadas dentro dela, procuraremos olhar para os estudos culturais tendo como cenário o ensino de português

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Programa de Pós-Graduação Estudos da Linguagem

Departamento de Letras - PUC-Rio

V CDL- Ciclo de Debates em Linguagem - Tendências e Teses

MINUTO DA PESQUISA

LINHA 1

Descrição do Português, Ensino e Tecnologia

Aluna: Sônia Maria do Nascimento Lisboa

Nível: Mestrado

Orientadora: Rosa Marina de Brito Meyer

Relacionamentos amorosos entre ingleses e brasileiros: uma perspectiva

interculturalista

Uma vez que não acreditamos na possibilidade de aprender uma língua sem

aprender a cultura do (s) país (es) em que ela é falada, estamos desenvolvendo uma

pesquisa que parte de aspectos culturais como contribuição ao ensino do português para

falantes de outras línguas.

De acordo com o interculturalista Hofstede (2010), a cultura só existe por

comparação; isso significa que só podemos descobrir o que é semelhante e o que é

diferente entre as culturas se as compararmos umas às outras e observarmos o resultado.

A partir dessa teoria, muito utilizada e reconhecida em pesquisas dentro do campo

empresarial, o presente trabalho observa relacionamentos amorosos entre brasileiros e

ingleses, que vivem no Brasil ou no Reino Unido, por meio de questionários e

entrevistas realizados pessoalmente ou por meio de programas de comunicação online.

Conhecido entre os interculturalistas por cross-marriage ou intermarriage, esse

fenômeno está cada vez mais recorrente em nosso mundo globalizado e, por isso, se

configura como um fértil objeto de estudo na área.

Nosso objetivo é entender melhor como esses relacionamentos se dão,

investigando qual a influência das culturas de origem nessas relações. Mais

especificamente, procuraremos identificar situações em que há choques culturais e

refletir sobre como essas práticas podem ser evitadas, mostrando a importância de se

entender uma cultura e sua língua, independentemente do tipo de relacionamento em

questão. Pretendemos, ainda, comparar os casais que vivem no Brasil e os que não

vivem aqui, para que possamos identificar se há diferenças entre eles e ainda se essas

diferenças são relevantes à pesquisa.

Como a motivação desse trabalho é encontrar ferramentas que possam auxiliar

estudantes de português como língua estrangeira ou segunda língua a entender melhor

a cultura brasileira e como as relações interpessoais e afetivas são tratadas dentro dela,

procuraremos olhar para os estudos culturais tendo como cenário o ensino de português

para esses estudantes, e assim buscando entender quais são os aspectos relevantes que

podem ser trabalhados em sala de aula, a fim de melhorar a inserção do aprendiz de

português na cultura brasileira.

REFERÊNCIAS

BENNETT, Milton J. “Intercultural Communication: A Current

Perspective”. In: __________ (Org.). Basic Concepts on Intercultural Communication

– Selected Readings (pp. 1 - 34). Yarmouth: 1998.

DENZIN, N.; LINCOLN, Y. (org) O Planejamento da Pesquisa Qualitativa. Teorias e

Abordagens. Porto Alegre, Artmed, 2006.

HALL, Edward Twitchell. Beyond culture. New York: Anchor Books, 1989 [1976].

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Concepts on Intercultural Communication - Selected Readings (pp. 53 - 67). Yarmouth:

1998.

HOFSTEDE, Geert. Cultures and Organization: Software of the Mind. New York: Mc

Graw Hill, 2010 [1991].

Linha 2 - Língua e Cognição: representação, processamento e aquisição da

linguagem

Aluno: Ana Paula Passos Jakubów

Nível: Doutorado

Orientadora: Letícia Maria Sicuro Corrêa

A opcionalidade na expressão da concordância de número no português

brasileiro: uma proposta de modelo para o processo de aquisição

Descreve-se o processo de aquisição da expressão da concordância de número no

português brasileiro (PB) diante de input variável (Scherre & Naro, 1998) com base no

modelo de aquisição procedimental de base minimalista (MPAL - Corrêa, 2009)

associado a um modelo formal de variação (Adger & Smith, 2010). Elaborou-se um

experimento para verificar preferência por formas de expressão morfológica de número

e se a variável social, tipo de escola, afetaria a escolha de uma das formas. Participaram

20 crianças de uma escola privada no subúrbio do Rio de Janeiro (média: 5;7 anos) e

16 crianças de uma escola pública da mesma região (média: 5;9 anos). As variáveis

independentes foram: a) Redundância no DP (redundante e não-redundante); b)

Redundância no TP (redundante e não-redundante) e c) Grupo (escola: privada e

pública). A pesquisadora apresentava o Bob na tela do computador, um robô que às

vezes fala diferentemente do modo como falamos. Bob falava sentenças em 4

condições: 1. (DP Redundante/ TP redundante) Os cachorros chamaram o leão; 2. (DP

Redundante/ TP não-redundante) Os pintinhos abraçou a galinha; 3. (DP não-

redundante/ TP Redundante) Os gato assustaram a borboleta; 4. (DP não-redundante/

TP não-redundante) Os macaco consertou a porta. A criança deveria contar para a

pesquisadora o que o Bob teria dito que aconteceu. Uma ANOVA 2X2X2 indicou que

não houve efeito significativo de grupo (p = .526), mas houve efeito significativo da

interação entre Redundância no DP e Grupo (p = .0001). As crianças da escola privada

preferem a forma redundante do DP, enquanto as crianças da escola pública não

demonstram preferência por uma ou outra forma do DP. O MPAL (Corrêa, 2009) prevê

que a especificação dos traços dos elementos de categorias funcionais se faz a partir de

padrões recorrentes na interface fônica a serem semanticamente interpretados (interface

semântica), compatível com a ideia de que variação seria fruto de subespecificação no

mapeamento entre forma fonológica/ morfológica e traços morfossintáticos das

categorias funcionais (Adger & Smith, 2010). A opcionalidade na expressão de número

no DP seria resultado da subespecificação dos traços formais da categoria funcional

Num, consequência de exposição a input variável.

Referências:

ADGER, D. SMITH, J. (2010). Variation in agreement: A lexical feature-based

approach. Lingua 120 (2010) 1109–1134.

CORRÊA, L. M. S. (2009). A identificação de traços formais do léxico pela criança

numa perspectiva psicolingüística. Organon (UFRGS), v.23, p.71 - 94.

SCHERRE, M. M. P. & NARO, A. J. (1998) Sobre a concordância de número no

português falado do Brasil. In Ruffino, Giovanni (org.) Dialettologia, geolinguistica,

sociolinguistica.(Atti del XXI Congresso Internazionale di Linguistica e Filologia

Romanza) Centro di Studi Filologici e Linguistici Siciliani, Universitá di Palermo.

Tübingen: Max Niemeyer Verlag, 5:509- 523, 1998.

http://www.ai.mit.edu/projects/dm/bp/scherre-naro98.pdf

Aluno: Danielle Novais Uchôa

Nível: Doutorado

Orientadora: Erica dos Santos Rodrigues/ Coorientadora: Cilene Rodrigues

Aceitabilidade dos pronomes resumptivos em orações relativas restritivas do PB

em função da posição sintática do pronome

Danielle Novais Uchôa (Doutoranda em Estudos da Linguagem – Puc-Rio)

Erica Santos Rodrigues (orientadora – Puc-Rio)

Cilene Rodrigues (co-orientadora Puc-Rio)

Do ponto de vista linguístico, pronomes resumptivos (PRs) são vistos como estratégias de último

recurso (Ross, 1967; Sells, 1984; Shlonsky, 1992; Hornstein, 2001; Grolla 2005). Quanto ao

processamento, estão relacionados, na produção, a situações pouco planejadas (Kroch, 1981) e à

natureza incremental da produção (Asudeh, 2004, 2011). Na compreensão, Hofmeister & Norcliffe

(2013) apresentam resultados de teste de julgamento de gramaticalidade que indicam que dependências

longas favorecem a aceitabilidade dos resumptivos em inglês. Dados sociolinguísticos do PB mostram

que resumptivos são licenciados em diferentes posições sintáticas nas relativas, embora com frequências

distintas (Tarallo, 1983; Lessa de Oliveira, 2009).

Neste trabalho apresentamos os resultados de um teste de julgamento de aceitabilidade dos

resumptivos em diferentes posições sintáticas na oração, usando uma escala Likert de 4 pontos. Esse

estudo pertence a um projeto de pesquisa mais amplo em que se pretende investigar os custos de

processamento envolvidos na produção e compreensão dos PRs. O teste foi conduzido na plataforma

online www.onlinepesquisa.com. As variáveis independentes foram (i) tipo de relativa (padrão/

resumptiva) e (ii) posição sintática (sujeito; OD; genitivo; OI). Havia 40 estímulos: 12 experimentais (4

por condição) e 24 distratoras.Tipo de relativa foi tomado como fator grupal e 120 participantes

concluíram o teste, sendo 60 em cada grupo.

Os resultados indicam que a proporção de notas 4 foi maior para o tipo padrão em todas as

condições. A aceitação dos resumptivos é maior na condição de OD (28,93%) (em que há interveniência

do sujeito da relativa), convergindo com os achados de Hofmeister & Norcliffe (2013). A posição de

genitivo não oferece dados claros: o maior percentual de respostas foi de nota 2 (42,08%) nas

resumptivas, seguido de respostas do tipo 3.

Em um segundo experimento de leitura automonitorada, visamos investigar possíveis custos

associados ao processamento dessas orações, por meio da comparação do tempo de escuta das relativas

padrão e resumptivas, considerando as variáveis do primeiro experimento e também levando em conta

o tipo de encaixamento da relativa (central ou final).

Referências bibliográficas:

ALEXOPOULOU, T. ; KELLER, F. Linguistic complexity, locality, and resumption.

In: Proceedings of WCCFL 22. Somerville, MA: Cascadilla Press, 2003.

BELTRAMA, A.; XIANG, M. Intrusive resumptives as processing facilitators: An

experimental investigation. In: IYER, J.; KUSMER, L. (eds.). Proceedings of the 44th

Annual Meeting of the North East Linguistic Society. pp. 41-54.

GIBSON, E. The dependency locality theory.A distance-based theory of linguistic complexity.

In MARANTZ, A.; MIYASHITA,Y.; O’NEIL, W. (Ed.). Image, language, brain. Papers from

the first mind articulation project symposium. Cambridge, MA: MIT Press, 2000. p. 95-126.

GOUVÊA, A. C. Complexidade sintática: o processamento de orações relativas em

português brasileiro e em inglês. In MAIA, M.; FINGER, I. (Org.). Processamento da

Linguagem. Pelotas, RS: EDUCAT, 2005.p. 201-220.

GROLLA, E. Pronomes resumptivos em Português Brasileiro adulto e infantil.

D.E.L.T.A. vol. 2, n.2, São Paulo, 2005.

HOFMEISTER,P.; NORCLIFFE,E. Does resumption facilitate sentence

comprehension?. Disponível em http://crl.ucsd.edu/~phofmeister/resumption-

hofmeister&norcliffe-rev1.pdf. Acesso em: 12/10/2013.

LESSA-DE-OLIVEIRA, A. S. C. A relativa resumptiva em dois momentos do

português brasileiro. Revista do GEL, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 61-84, 2009.

MIRANDA, F. V. C.; CORRÊA, L. M. S. (orientadora). O custo de processamento de

orações relativas: um estudo experimental sobre relativas com pronome resumptivo no

Português Brasileiro. Dissertação (Mestrado). Departamento de Letras, Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2008.

MOLLICA, M. C. Relativas em tempo real no português brasileiro contemporâneo. In:

PAIVA, M.C. de; DUARTE, M.E.L (org.). Mudança lingüística em tempo real. Rio de

Janeiro: Contracapa/ FAPERJ, 129-138, 2003.

TARALLO, F. Relativization Strategies in Brazilian Portuguese. Tese (Doutorado).

University of Pennsylvania. PhD. Dissertation, 1983.

Aluno: Jessica Barcellos

Nível: Mestrado

Orientadora: Erica dos Santos Rodrigues/ Coorientadora: Cilene Rodrigues

O papel da linguagem na resolução de tarefas matemáticas: um estudo com

alunos do 2º Ano do Ensino Fundamental

Este trabalho insere-se na área da Psicolinguística e investiga a interface linguagem-

matemática (Spelke, 2003; Spelke & Kinzler, 2007). Busca-se verificar em que medida

dificuldades na resolução de problemas de divisão estão relacionadas puramente ao

raciocínio matemático ou se há interferência da complexidade linguística dos

enunciados (Lorensatti, 2009; Freitas et al, 2000; Abedi & Lord, 2001). Uma análise

linguística dos enunciados dos problemas de divisão usados em livros didáticos indicou

que os enunciados de divisão como medida são linguisticamente mais complexos do

que os de distribuição. Enquanto nos problemas de distribuição há maior uso de

sentenças coordenadas e tempo passado, nos enunciados de medida predominam as

subordinações e uso de tempo irrealis. Com o objetivo de avaliar a influência de

complexidade linguística no desempenho de crianças na resolução desses dois tipos de

problemas, conduzimos três experimentos com 20 alunos do 2º ano do Ensino

Fundamental. No primeiro experimento, uniformizou-se a estrutura gramatical dos dois

tipos de enunciados e, no segundo, foram utilizados os enunciados originais dos livros

didáticos. Comparou-se o desempenho das crianças nos dois experimentos e houve

diferença significativa apenas para os enunciados relativos a problemas de medida

(p=0,016) com pior desempenho dos alunos no experimento 2. Os resultados indicam

que a dificuldade dos alunos em problemas de divisão como medida pode ser

minimizada quando a complexidade gramatical desses enunciados está controlada. O

terceiro experimento objetivou examinar os DPs coordenados em posição de sujeito,

estrutura ambígua muito utilizada nos enunciados matemáticos. As variáveis

independentes manipuladas foram tipo de problema (medida x distribuição) e tipo de

retomada do sujeito (pronominal x DP pleno) e as variáveis dependentes foram tipo de

leitura e taxa de acerto. Houve preferência pela leitura coletiva em todas as condições,

mas houve incremento no número de leituras distributivas nas condições sem retomada

pronominal. Houve menor taxa de acerto na condição de medida sem retomada

pronominal, condição linguisticamente mais complexa. Tomados em conjunto, os

resultados dos três experimentos indicam que a estrutura linguística usada nos

enunciados matemáticos interfere bastante no desempenho dos alunos, podendo causar

a ilusão de um déficit matemático.

Referências bibliográficas:

Abedi, J & Lord, C. The language factor in Mathematics Tests. Applied Measurement

in Education, v14 n3 p219-34 2001.

Freitas, L.F; Ferreira, F.O; Haase, V.G. Linguagem e matemática: estudo sobre

relações entre habilidades cognitivas linguísticas e aritméticas. Ciências & Cognição;

Vol 15 (3): 111-125, 2010.

Lorensatti, E. J. C. Linguagem matemática e língua portuguesa: diálogo necessário na

resolução de problemas matemáticos. Revista Conjectura, vol. 14, n. 2, p. 89-99,

maio/ago. 2009.

Spelke, E. S. What makes us Smart? Core Knowledge and Natural Language. In:

Gentner, D. & Goldin-Meadow, S. (Eds.). Language in Mind. Advances in the Study of

language and Thought. MIT Press, 2003.

Spelke, E. S. & Kinzler, K.D. Core knowledge. In Developmental Science 10:89-96,

2007.

Aluno: Larissa Ferrari

Nível: Mestrado

Orientadora: Erica dos Santos Rodrigues/Coorientador: Daniel Mograbi (Depto.

Psicologia - PUC-Rio)

O processamento sintático no envelhecimento natural:

Um estudo interdisciplinar entre Psicolinguística e Neuropsicologia

Esta pesquisa está inserida no campo da Psicolinguística, em interface com a

Neuropsicologia. Explora-se em que medida o processamento sintático, com o avanço

da idade, pode ser afetado por comprometimentos cognitivos associados a funções

executivas mais gerais, como memória de trabalho e controle inibitório.

Segundo Burke & Shafto (2004), idosos hígidos (isto é, saudáveis) costumam

ter mais episódios em que sentem ter a “palavra na ponta da língua” sem conseguir

lembrá-las do que os jovens. De acordo com Burke (1997), os idosos tiveram um

desempenho pior do que os jovens na tarefa de fluência verbal. No entanto, as pesquisas

ainda são pouco claras quanto ao processamento sintático no envelhecimento tido como

natural.

Por isso, este projeto procura estabelecer um estudo comparativo do

desempenho linguístico entre o grupo de idosos hígidos e adultos jovens, com relação

ao processamento sintático de estruturas envolvendo ambiguidade temporária,

consideradas complexas, porque exigem esforço de reanálise sintática correta da

estrutura. Exemplo: “Enquanto a mulher acordava o marido era internado no hospital”.

A ambiguidade temporária nessa sentença está no sintagma nominal “o marido”, que

pode ser processado erroneamente, em primeira leitura, como objeto direto de

“acordava”, quando na verdade é sujeito de “era internado”.

Este trabalho toma como partida o estudo de Christianson et al. (2006),

conduzido com falantes nativos de inglês, o qual encontrou dificuldade por parte dos

idosos com esse tipo de estrutura. Para implementar a reanálise, é necessário inibir a

primeira estrutura construída (no caso do ex. acordava o marido). Segundo os autores,

os idosos, em função de restrições de memóia e déficit no controle inibitório, não

conseguiriam rever a estrutura e estariam mais dependentes da estratégia “good-

enough”, um tipo de análise que não é sintaticamente correta, mas seria “boa o

suficiente”.

Sendo assim, neste trabalho, além de experimento com sentenças ambíguas,

serão aplicados testes de avaliação neuropsicológica: Teste Stroop, Teste de Dígitos e

Mini Exame do Estado Mental, para averiguar possível correlação entre o desempenho

linguístico e déficits no controle inibitório e/ou na memória.

Esta pesquisa tem sua importância justificada com base também no

envelhecimento progressivo da população brasileira e mundial. Além disso, o estudo

poderá auxiliar no refinamento de testes linguísticos para verificar uma possível

tendência para a Doença de Alzheimer.

Referências bibliográficas:

BURKE, Deborah. Language, aging, and inhibitory deficits: evaluation of a theory.

Journal of Gerontoly: Psychological Sciences, v. 52B, n. 6, p. 254–264, 1997.

BURKE, Deborah; SHAFTO, Meredith. Aging and language production. Current

Directions in Psychological Science, v. 13/1, p. 21-24, 2004.

CHRISTIANSON, Kiel; WILLIAMS, Carrick C.; ZACKS, Rose T.; FERREIRA,

Fernanda. Younger and older adults’ “good-enough” interpretations of garden-path

sentences. Discourse Process, v. 42(2), p. 205-238, 2006.

Aluno: Mônica de Freitas Frias Chaves

Nível: Doutorado

Orientadora: Cilene Rodrigues/ Coorientador: Daniel Mograbi (Depto.

Psicologia - PUC-Rio)

Referencialidade em esquizotipia:

o papel da linguagem na organização do Pensamento

A esquizotipia é um conjunto de traços de personalidade, com influência tanto genética

como do meio-ambiente, cuja expressão varia significativamente dentro de um

contínuo que vai desde de indivíduos sem sintomas clínicos até aqueles com quadros

clínicos variados, sendo o mais grave a esquizofrenia.

Um dos sintomas principais da esquizotipia, em todo seu contínuo, é a desordem do

pensamento formal (Formal Thought Disorder – FTD). Segundo Kuperberg (2010), a

FTD característica da esquizofrenia apresenta disfunções na linguagem e na

comunicação, expressas numa fala desorganizada e muitas vezes ininteligível.

Hinzen e Sheenam (2013) postulam que o comprometimento linguístico na

esquizofrenia reflete uma incapacidade de converter conceitos em expressões

referenciais em situações reais de fala. Nessa visão, a gramática de portadores de

esquizofrenia não associa itens lexicais a significados gramaticalmente coerentes e

correspondentes a intenções comunicativas. Isso sugere que na esquizofrenia há uma

perda da capacidade de computar referencialidade e proposicionalidade.

A FTD tem como característica marcante, além do uso desproporcional de expressões

nominais indefinidas e genéricas, também, o uso de expressões nominais definidas com

referente impreciso ou indireto (Hinzen, 2012: 284), o que justifica a pesquisa em FTD

com foco nessas expressões.

A referencialidade das expressões nominais depende não só de como são computados

traços de definitude e especificidade, mas sobretudo da relação que essas expressões

estabelecem com outras expressões nominais previamente estabelecidas no discurso.

O objetivo dessa pesquisa é promover uma investigação teórico-experimental para

verificar as possíveis leituras que indivíduos com traços de personalidade esquizotípica

fazem de expressões nominais definidas em contextos discursivos nos quais um

antecedente prévio (+ especifico vs. +genérico) é dado. Os resultados deste grupo serão

contrastados com os resultados do grupo controle, e analisados vis-à-vis a literatura

sobre referencialidade em esquizofrenia.

Nossa pesquisa contribui para a compreensão da gramática em transtornos mentais e,

de maneira geral, para o entendimento da arquitetura da mente (e.g. questões de

especificidade de domínio). Do ponto de vista clínico, nosso objetivo é auxiliar na

elaboração de testes linguísticos refinados para diagnóstico da esquizofrenia e de outras

desordens mentais.

Referências bibliográficas:

KUPERBERG, G. (2010). Language in schizophrenia, Part 1: An introduction.

Language and Linguistics Compass 4(8): 576–89.

HINZEN, W. & SHEEHAN, M. (2013). The Philosophy of Universal

Grammar. Oxford, UK: Oxford University Press.

Linha 3

Linguagem, Sentido e Tradução

Aluno:: Ricardo Souza

Nível: Mestrado

Orientadora: Maria Paula Frota

A abordagem da tecnologia na formação universitária do tradutor

Recursos tecnológicos, sejam de escrita, de armazenamento, ou de consulta, sempre

foram indissociáveis da atividade do tradutor. A relação entre tradutores, tradução e

tecnologia, todavia, se insere no contexto maior da relação entre sociedades, culturas e

tecnologias. De Platão a Aristóteles, passando por Weber e Durkheim e chegando a

Heidegger, estudiosos que são referência para o pensamento ocidental já se

preocuparam com o tema em diferentes aspectos. Contudo, na formação universitária

dos tradutores, o assunto tem recebido uma abordagem apenas incidental.

Notadamente, o florescimento da chamada Virada Cultural dos Estudos da Tradução,

que coincidiu temporalmente com o impulso tomado pelas tecnologias da tradução,

relegou a tecnologia ao plano secundário de mera fornecedora de ferramentas, sem

preocupações de outra ordem.

Existe, ainda, a percepção de uma lacuna entre formação universitária e prática

profissional. Longe de ser exclusiva da formação de tradutores, essa lacuna acompanha

o senso comum que separa teoria e prática, especialmente no que tange às

Humanidades. No âmbito da formação universitária de tradutores, estudiosos como

Wills, Kiraly, Chesterman e Pym, em diferentes épocas, já abordaram o tópico,

discutindo-o em termos das competências tradutórias que a universidade deveria

fomentar nos discentes.

A isso soma-se o surgimento, nas últimas duas décadas, de recursos inteligentes de

auxílio à tradução que não só mudaram o fazer tradutório de forma radical, mas também

o perfil daquele que é considerado um tradutor profissional competente. A criação da

Tradumática foi uma resposta a essa mudança. Entretanto, essa disciplina, mesmo

novíssima e necessária, deixa a desejar no que tange a formar tradutores com uma visão

da tradução que vá além de aspectos produtivos e mercadológicos.

Com tais pressupostos, este trabalho discute como a relação entre tradutor, tradução e

tecnologia é marcada por influências e expectativas de competência tecnológica em seu

sentido mais amplo, sendo preciso que as instituições universitárias levem essas

expectativas em conta ao abordarem a tecnologia na formação de tradutores. Do

contrário, tradutores egressos dessas instituições poderão ter dificuldade de atender o

que deles esperam os diferentes públicos de traduções, com repercussão na própria

percepção da relevância da universidade na formação desses profissionais.

Linha 4

Discurso, vida social e práticas profissionais

Aluna: Naomi Orton

Nível: Doutorado

Orientadora: Liana Biar

Horizontalidade nos movimentos sociais contemporâneos: um estudo sobre

gênero, narrativa e interrupções

Esse estudo tem por objetivo lançar um olhar crítico sobre a negociação de

sentido no contexto microssocial de um grupo de cicloativistas localizados do Rio de

Janeiro, a fim de refletir sobre a construção da horizontalidade no contexto

macrossocial dos movimentos sociais contemporâneos.

A investigação se insere em um paradigma de pesquisa qualitativa interpretativa

(Denzin & Lincoln, 2006) com dimensão autoetnográfica (Bossle & Molina Neto,

2009). O estudo é norteado pela visão socioconstrucionista do discurso (Moita Lopes,

2001), compreendendo as práticas discursivas e o mundo social são concebidos como

entrelaçados, constituídos um pelo outro (Fabrício & Bastos, 2009). Partindo desse

pressuposto, a microanálise fundamenta-se nos estudos narrativos (Bruner, 1997

[1990]; Ewick & Silbey, 2003; Labov, 1972; Linde, 1993) e na sociolinguística

interacional (Goffman, 1975), enfocando, mais especificamente, a tomada de turnos e

sobreposições de fala (Tannen, 2007 [1989]; 2010; West & Zimmerman, 2010).

A partir da análise de uma narrativa de resistência emergente de uma reunião

realizada entre um grupo de onze cicloativistas em abril de 2016, identifico que, apesar

de pausas estendidas durante a narração, sobreposições de fala feitas por cicloativistas

do gênero masculino ocorrem no auge da narrativa, no desenvolvimento da ação.

Nesses momentos, as escolhas lexicais da narradora são substituídas por vocábulos

mais “técnicos”, colocando a legitimidade das escolhas da narradora em xeque e

construindo, assim, relações assimétricas entre os participantes (Gastaldo, 2008; Smith,

2010).

Embora mais análises ainda sejam necessárias, tais entendimentos sugerem que

o poder não é distribuído igualmente nos movimentos sociais, assim como na sociedade.

Nesse sentido, para que os movimentos possam combater as desigualdades presentes

na sociedade ao invés de reproduzi-las, precisamos compreender a construção da

horizontalidade como um processo constante. Só a partir do monitoramento desse

processo, será possível que os militantes se engajem em práticas transformacionais,

reconstruindo esses espaços em outras bases (Bruzzone, 2012; Camarena, 2012).

Referências Bibliográficas

BOSSLE, F; MOLINA NETO, V. No “olho do furacão”: uma autoetnografia em uma

escola da rede Municipal de ensino de Porto Alegre. Revista Brasileira de Ciência do

Esporte, Campinas, v. 31, n. 1, p. 131-146, setembro 2009.

BRUNER, J. Atos de significação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997 [1990].

BRUZZONE. Putting the 'critical' mass in Critical Mass: patriarchy, radical feminism,

and radical inclusiveness. In: CARLSSON, C.; ELLIOTT, L.; CAMARENA, C. Shift

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CAMARENA, A. The Blind Spot: Subcultural Exclusivity in Critical Mass. In:

CARLSSON, C.; ELLIOTT, L.; CAMARENA, C. Shift Happens! Critical Mass at

20. São Francisco: Full Enjoyment Books, 2012.

DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. O planejamento da pesquisa qualitativa: Teorias

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conversas entre pessoas desconhecidas e de diferentes sexos. In: Linguagem, gênero

e sexualidade. São Paulo: Parábola, 2010.

Aluno: Natália Cuccinello

Nível: Mestrado

Orientadora: Liana Biar

"Por isso que eu confirmo que ele não fez": construção discursiva da inocência

em narrativas de experiência vicária

A dissertação é fruto de um "encontro misto", ou seja, um tipo de interação social que

reúne face a face identidades hegemônicas e estigmatizadas (Goffman, 1988),

proporcionado por entrevistas de pesquisa realizadas com mulheres envolvidas no

contexto prisional, especificamente na condição de parentes/visitantes de homens

presos, nas periferias de um presídio do Estado do Rio de Janeiro, em novembro de

2015. Nesse sentido, a dissertação dialoga com pesquisas elaboradas a partir da análise

de narrativas em interação que trazem à tona discursos que ajudam a reverter a

“invisibilidade social” dessas mulheres, que são, em grande parte, negras, pobres, mães

e moradoras de zonas periféricas do estado. Ao narrarem a causalidade da prisão de

seus pares, narrativas de experiência vicária emergem na interação, na qual as

entrevistadas não só “animam” discursos que desvinculam a agência de seus pares dos

respectivos crimes, como também se apropriam de recursos discursivos próprios que

validam a inocência deles. Esta pesquisa se propõe, então, a investigar, à luz dos estudos

das narrativas orais, amparados na Sociolinguística Interacional, a nível micro da

interação, quais as estratégias discursivas utilizadas por essas mulheres ao legitimarem

a inocentação de seus pares, e, partindo para uma análise mais macro, sob quais

sistemas de coerência estão ancoradas essas estratégias.

Referências Bibliográficas

GOFFMAN, E. [1979] Footing. Trad. Beatriz Fontana. In: RIBEIRO, B.T.; GARCEZ,

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RIBEIRO, Branca Telles & GARCEZ, Pedro. Sociolinguística Interacional. Porto

Alegre: AGE, 1998

Aluno: Mayara de Oliveira Nogueira

Nível: Doutorado

Orientadora: Maria das Graças Dias Pereira

Narrativas, prática profissional e ética social: negociação e coconstrução de

identidades

Propomo-nos investigar a coconstrução do sofrimento (SANTOS, BASTOS,

2009; LUPTON, 1988) na produção de narrativas sobre prisão ilegal de um adolescente

morador da periferia de Vila Velha/ES.

No arcabouço teórico, fazemos interlocuções entre Análise da Narrativa

(BASTOS, 2005; DE FINA, GEORGAKOPOULOU, 2008; DE FINA, 2008; GARCEZ, 2001;

GOODWIN, 1984; JEFFERSON, 1978; LABOV & WALETZKY, 1967) e Análise da Conversa

(GARFINKEL, 1967; LODER & JUNG, 2008; SACKS, SCHEGLOFF & JEFFERSON, 1974), a

fim de investigar a construção de sofrimento e estigma (GOFFMAN[1963] 1988;

BECKER, 2008) tecida pelos participantes da conversa e observar o estabelecimento da

intersubjetividade entre membros de uma comunidade profissional a partir das re-

narrativas dos clientes.

Tendo em vista que a autora deste trabalho é insider ao contexto investigado

e assume tanto o papel de advogada quanto de pesquisadora, optou-se pelo método

qualitativo (DENZIN & LINCOLN, 2006) e viés autoetnográfico (REED-DANAHAY, 1997;

VERSIANI, 2005).

O corpus é composto por três encontros: dois deles em que a atividade ou

tarefa desempenhada (DEL CORONA, 2009; DREW, HERITAGE, 1992) é enquadrada

(GOFFMAN, [1959] 2009) enquanto consulta jurídica, na qual atores se alinham aos

papeis de “cliente” e “advogado”; e uma segunda tanto mais aproximada às práticas,

fazeres e saberes do grupo que compõe o escritório observado – trata-se, na verdade,

da observação do intervalo de almoço entre os advogados – momento em que no curso

da pesquisa se mostrou período privilegiado para o estabelecimento de

intersubjetividade e construções de identificações coletivas.

Nosso foco de investigação é, portanto, a análise das (re)narrativas de

sofrimento tecidas em contexto profissional e a investigação das identidades que daí

emergem.

Na contextualização da narrativa, a prisão do jovem perdurou por cerca de

seis meses e dela outros atos ilícitos decorreram, dentre eles um dano moral por

ricochete (THEODORO JÚNIOR, 2010), tendo em vista que sua genitora tornou-se vítima

indireta do ato lesivo, experimentando os danos de forma reflexa pelo convívio

cotidiano com os resultados sociais do dano sofrido pela vítima imediata. Esta

ilegalidade é dimensionada na construção narrativa da participante através de uma série

de descrições e categorizações da experiência vivida (SACKS, 1972, 1979, 1992;

SCHEGLOFF, 2007; ABELEDO; FORTES; GARCEZ; SCHLATTER, 2014) na qual o

sofrimento adquire contornos significativos no interior das práticas discursivas em

curso no aqui e no agora da interação.

Inicialmente concluímos que o sofrimento apresenta diferentes nuances a

depender dos atores que narram a experiência desviante, bem como a depender da

atividade desempenhada (a busca pela solução de um conflito que se quer judicializado

ou conversa informal na qual uma ética de grupo é coconstruída) e participantes

envolvidos.

Aluno: Adriana Rodrigues de Abreu

Nível: Doutorado

Orientadora: Adriana Nogueira Accioly Nóbrega

Fluidez identitária e movimentos avaliativos em narrativas de professores

Este trabalho busca investigar narrativas de experiências pessoais produzidas por

professores de diferentes disciplinas da Educação Básica, tendo por objetivo analisar a

coconstrução das identidades profissionais dos participantes, sobretudo as flutuações

identitárias que surgem em seus discursos. Além disso, esta pesquisa visa analisar que

movimentos avaliativos são realizados pelos participantes e em que medida essas

avaliações constituem suas identidades profissionais. Para tanto, as seguintes perguntas

de pesquisa são propostas: (1) Como surgem as narrativas orais de experiências

pessoais e qual é a função delas para a construção da discussão do grupo?; (2)De que

forma as avaliações constituem as identidades profissionais dos participantes?; (3)

Quais movimentos avaliativos são realizados pelos docentes participantes da pesquisa

ao discutirem questões voltadas às suas práticas profissionais?. O alicerce teórico desta

pesquisa conjuga abordagens estruturais (LABOV e WALETZKY,1967 e LABOV,

1972) e interacionais (MOITA LOPES, 2001; BASTOS, 2004, 2005; DE FINA, 2008;

DE FINA e GEORGAKOPOULOU, 2008) para análise da narrativa, assim como

entrelaça estudos sociológicos (BAUMAN, 2005; HALL, 2005; GIDDENS, 1999,

2002) com a perspectiva socioconstrucionista de identidade (BUCHOLTZ e HALL,

2003, 2005; MOITA LOPES, 2002, 2003). Para alcançar os objetivos propostos, a

perspectiva metodológica qualitativa e interpretativa (DENZIN e LINCOLN, 2006) foi

utilizada, com foco em uma interação produzida em um Grupo de Discussão realizado

com quatro professores de disciplinas e instituições escolares diferentes. Resultados

parciais indicam que: (i) os participantes assumem múltiplas identidades sociais em

distintos momentos da interação, o que constitui o processo de flutuação/oscilação

identitária; (ii) os elementos avaliativos são constitutivos do processo de construção das

identidades profissionais dos professores; (iii) os professores, através de processos

discursivos, reorganizaram suas experiências profissionais, bem como reconfiguraram

suas identidades por meio de avaliações; (iv) os docentes, ao se reconstruírem

identitariamente, projetam identidades para outros participantes, especialmente,

aqueles diretamente envolvidos no processo educacional, a saber: alunos e pais; (v) os

participantes, muitas vezes, se eximem de suas responsabilidades profissionais e

transferem essas responsabilidades para terceiros, mitigando suas agentividades na

ação de ensinar.

Referências Bibliográficas

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14, 1º sem. 2004. p. 118-127.

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Aluno: Thais Dos Santos Borges

Nível: Mestrado

Orientadora: Adriana Nogueira Accioly Nóbrega

Por um sentir crítico: entendendo atravessamentos identitários interseccionais

na sala de aula de língua estrangeira

O objetivo deste trabalho é entender a socioconstrução de identidade de professoras de

inglês no que tange a seus atravessamentos interseccionais (FERREIRA, 2012) por

perceber a sala de aula de língua estrangeira como um lugar de dissenso e

desaprendizagem (MOITA LOPES et al 2006, 2013; FABRICIO, 2006), onde práticas

sociais e discursivas (FAIRCLOUGH, 2001) constroem pontos de pertencimento

temporário (HALL, 2000) das práticas identitárias de professores e alunos. Acredito

que ali, idealmente, deve ser vivida uma busca incessante pelo desenvolvimento da

empatia e pela não neutralização das diferenças culturais (FERREIRA, 2006), com

apreço à reflexividade crítica (PENNYCOOK, 2006) como forte aliada na formação de

uma consciência crítica (FREIRE, 1974) e às lutas hegemônicas (RESENDE e

RAMALHO, 2006, 2011) possíveis quando nos atemos a compreender e abraçar os

atravessamentos identitários que nos configuram com o mundo e no mundo (SOUZA,

2011). Nesta pesquisa de dissertação de mestrado, serão analisados o conteúdo de

depoimentos escritos e entrevistas de três professoras de inglês como língua estrangeira,

cada uma com alguma característica proeminente em relação aos atravessamentos

mencionados anteriormente, da ordem do feminismo interseccional (ANZALDÚA,

1981, 1987, 1990 apud KEATING, 2009; CRENSHAW, 1989; COLLINS, 1990,

FERREIRA, 2006, 2012; hooks, 1982, 1994, 2003; MOHANTY, 1984). Vale reforçar

que não há intenção de “dar voz” às professoras, mas sim, de “ouvir” suas

representações da realidade da sala de aula, de maneira a coconstruir e ressignificar

essa experiência (RIESSMAN, 1993) para que seja possível o amadurecimento de um

“sentir crítico” (BORGES, 2015), que se paute na sensibilização quanto a questões de

sofrimento humano (MILLER, 2013), estigma (GOFFMAN, 1963), ideologia e

relações de poder (FOUCAULT, 1972, 1979). Com base na Linguística Sistêmico-

Funcional (HALLIDAY e HASAN, 1989; HALLIDAY, 1994; HALLIDAY e

MATTHIESSEN, 2014), mais especificamente o sistema de avaliatividade (MARTIN

2001, MARTIN e WHITE, 2005), analiso as escolhas lexicogramaticais feitas pelas

professoras na construção discursiva de suas identidades (BUTLER, 1990, 1993), me

alinhando à epistemologia feminista (LYKKE, 2010) para o entendimento de seus

atravessamentos identitários interseccionais (FERREIRA, 2012). Seguindo uma

metodologia qualitativa de pesquisa baseada no conceito de conhecimento situado

(HARAWAY, 1988), analiso o que escrevem e dizem as professoras a respeito de

momentos críticos vivenciados por ela nas suas práticas pedagógicas cotidianas

(PENNYCOOK, 2015).

Palavras-chave: Sentir crítico – Feminismo interseccional – Sala de aula de línguas –

Linguística-sistêmico funcional – Sistema de Avaliatividade

REFERÊNCIAS

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professores de Línguas: ampliando perspectivas. (p.128-140) Jundiai: Paco Editorial,

2011.

Aluno: Gabriela Coelho

Nível: Mestrado

Orientadora: Adriana Nogueira Accioly Nóbrega/ Coorientadora: Profª Dr. Inés

Kayon de Miller

A co-construção de conhecimento entre dois professores de língua inglesa acerca

dos gêneros discursivos: uma análise à luz do Sistema de Avaliatividade

O presente estudo tem como objetivo analisar a co-construção de conhecimento acerca

do tema gêneros discursivos por dois professores de língua inglesa, em especial, sobre

como ambos avaliam suas práticas e se posicionam frente ao tema proposto. Para tanto,

busco analisar uma entrevista semiestruturada realizada com um amigo, também

professor de inglês de cursos de idiomas, a fim de entender de que forma ele utiliza, ou

não, os gêneros em sua sala de aula. Esta pesquisa tem como base a perspectiva

sociossemiótica de linguagem proposta por Halliday (1994), com foco no Sistema de

Avaliatividade (MARTIN e WHITE, 2005) em interface com os estudos sobre interação

propostos pela Análise da Conversa (SACKS; SCHEGLOFF, JEFFERSON, 2003

[1974]), uma vez que busco entendimentos sobre como se deu a co-construção de

conhecimento por meio da análise de elementos interacionais, como a tomada de turno,

realinhamentos e a escolha dos elementos avaliativos. A metodologia adotada insere-se

em um paradigma qualitativo interpretativista (DENZIN; LINCOLN, 2006) para a

análise da prática discursiva que se estabeleceu, privilegiando o entendimento da co-

construção de conhecimento ocorrida e não enfatizando a busca pela fidelidade aos

conceitos já estabelecidos sobre os gêneros discursivos. Com base no arcabouço teórico

apresentado, a pesquisa se volta para a análise da interação ocorrida, com foco na

avaliação que ambos os professores fazem sobre a temática proposta, e busca entender

de que forma as tomadas de turno e os realinhamentos contribuíram para o

entendimento daquela interação. Acredito que ao analisar a co-contrução de

conhecimento por meio de uma entrevista semiestruturada entre dois professores e

amigos, pode-se compreender melhor de que forma o professor se posiciona frente a

temas referentes à sua prática, além de como ele se constrói frente a outro professor.

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Aluno: Odete Firmino

Nível: Doutorado

Orientadora: Adriana Nogueira Accioly Nóbrega

Histórias que contam histórias: análise de uma trajetória de vida co-construída

na interação

O que acontece quando lemos uma obra literária? Podemos nos identificar com os

personagens (ou não), assim como podemos ter epifanias ou catarses diante do texto.

Essa relação afetiva que mantemos com a literatura pode fornecer inúmeras respostas

que leva, ainda, a outra pergunta: qual a importância da literatura em nossas vidas? O

momento mágico de abrir um livro e compartilhar os significados com o autor no

momento da leitura, nos faz perceber que todos os sentidos construídos pelo escritor

não estão inscritos no livro de maneira estanque, mas são co-construídos pelo leitor.

Dessa forma, para gerar alguns entendimentos sobre minhas perguntas, o objetivo deste

trabalho é analisar uma narrativa produzida a partir da interação entre a participante

Cássia (mãe da pesquisadora), a própria pesquisadora e a leitura da obra literária A hora

da estrela, de Clarice Lispector, que contextualizou uma conversa informal. Neste

estudo, observo a estrutura da narrativa (LABOV, 1972), discuto o conceito de mundo

dual (BRUNER, 1997 [1990]) e a co-construção de uma história de vida (LINDE,

1993). Além disso, percebo como a participante co-constrói identidades a partir dos

fatos narrados (MISHLER, 2002), e penso sobre a noção de pesquisadora-personagem

(GOODWING, 1984). Este estudo insere-se no campo da Linguística Aplicada

(MOITA-LOPES, 2006), fornecendo um instrumental teórico-metodológico para uma

maior compreensão do discurso em interação (BASTOS e BIAR, 2015) e, por ser um

estudo situado em teorias de bases sociais e interpretativas, o alinhamento

metodológico se dá com a pesquisa qualitativa (DENZIN e LINCOLN, 2006). Os

resultados indicam que a interlocutora Cássia produziu uma narrativa canônica, que se

constitui uma trajetória de vida, e co-constrói uma identidade pela diferença a partir do

contexto da leitura prévia da obra de Clarice Lispector e da interação com a

pesquisadora, que desconhece o ponto da história. Sendo assim, quando lemos uma

obra literária podemos recontextualizar nossas próprias histórias, co-construir

identidades e interagir com o mundo.

Referências:

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linguística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola, 2006.

Aluno: Carla Souza

Nível: Doutorado

Orientadora: Adriana Nogueira Accioly Nóbrega

(Des)construção de identidades e crenças em relatos sobre o estágio de

Inglês para Fins Específicos

Muito se tem pesquisado sobre identidade do professor na formação continuada

(CELANI e MAGALHÃES, 2002) e crenças docentes e discentes sobre linguagem,

ensinar e aprender línguas (BARCELOS, 2004; GIMENEZ & PEREIRA, 2007).

Entretanto, ainda são poucos os estudos sobre construção de identidades e sua relação

com crenças a partir da visão de licenciandos sobre o estágio supervisionado, momento

essencial na formação docente, fato que instigou a presente pesquisa. Visando trazer

uma contribuição para as áreas de Linguística Aplicada e Formação de Professores de

Línguas, principalmente de Inglês para Fins Específicos (IFE), este trabalho tem como

objetivos investigar que identidades e crenças emergem em relatos videogravados de

licenciandas sobre o estágio de IFE e como elas são (des)construídas no discurso. Para

tanto, a arquitetura teórica e metodológica segue uma abordagem qualitativa e

interpretativa (DENZIN e LINCOLN, 2006) e se baseia na visão socioconstrucionista

de identidades e crenças, visto que tanto quem estamos nos tornando, como no que

acreditamos, estão em constante processo de negociação, adaptação e reformulação nas

interações e contextos situacionais, socioculturais e históricos pelos quais transitamos

(FABRICIO & MOITA LOPES, 2002; OLIVEIRA & BARCELOS, 2012). Além

disso, para examinar como identidades e crenças estão imbricadas e podem ser

recuperadas e/ ou reconfiguradas no discurso, a análise se apoia na Linguística

Sistêmico-Funcional (HALLIDAY & MATHIESSEN, 2004), mais especificamente no

Sistema de Avaliatividade (MARTIN & WHITE, 2005), que oferece o embasamento

para entender como os significados interpessoais são construídos nos textos no nível da

semântica do discurso. Foi possível observar que instâncias avaliativas parecem

sinalizar reflexões sobre crenças e suas reformulações, bem como algumas mudanças

no percurso identitário. Os resultados preliminares também parecem indicar que os

licenciandos têm preconcepções muito negativas quanto ao ensino de IFE, da escola

pública e do estágio em si antes de seu início e essas crenças, bem como suas

identidades vão sofrendo transformações durante o período de pré-serviço.

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Nome do aluno: Bruno de Matos Reis

Nível: Doutorado

Orientadora: Inés Kayon de Miller

Procurando um CIEP encontrei este lugar: a escola como construção no discurso

No segundo semestre de 2016, a Educação brasileira é marcada por reações

provenientes do advento da Medida Provisória para reformulação do Ensino Médio

(MP 746/2016). Enquanto docentes e discentes críticos ao modelo imposto organizam-

se em greves e ocupações reivindicando a reabertura do debate, ganha terreno a intensa

disputa acerca do que seria a escola de qualidade. Nesse quadro, o surgimento de pautas

discentes que denunciam uma tentativa de silenciamento de suas vozes e indicam seu

desejo de tomar parte nesta disputa fazem mais oportuna a discussão que ora trago.

Enquanto contribuições de diversas áreas indicam que o processo educacional tende a

beneficiar-se de uma postura etnograficamente orientada do professor (Heath, 1983;

Rockwell, 1986), não raro hostilidades entre estudantes e professores ou autoridades

políticas da Educação têm origem justamente na ausência daquilo que há de mais

elementar no fazer etnográfico: a honesta vontade de conhecer, a genuína disposição

em escutar. Parte de uma autonarrativa etnográfica em que concebo o campo como uma

construção discursiva, neste trabalho apresento o processo de concepção e a análise em

andamento de textos em que alunos de uma escola pública do município de Nova

Iguaçu/RJ nos contam sobre o local onde estudam a partir de perspectivas particulares.

Compreendendo a escola como um lugar em seu sentido etnográfico (Augé, 2012),

parto dos sujeitos que ali frequentam para investigar a construção discursiva daquele

lugar. Realizo a análise dos dados pensando a identidade sob a perspectiva de Bauman

(2005), de teorizações foucaltianas em sua reflexão sobre o cuidado de si (2004 [1982])

e dos estudos de Face (Goffman, 1980). No atual momento da análise, chama atenção

a forma como identidades e lugar constroem-se mutuamente no discurso. Não parece

possível compreender aquela escola senão através - ou a partir - do olhar dos

participantes, de um estudo minucioso das identidades ali implicadas. Lugar é discurso.

No contexto das ocupações, se os ouvíssemos, de que escola nos falariam os alunos

ocupantes? Realizo um trabalho de escuta nesta pesquisa. Afinal, de que escola falam

meus alunos?

Aluno:: Amanda Dinucci

Nível: Doutorado

Orientadora: Maria do Carmo Leite de Oliveira

A imputação da culpa em vídeos de contravigilância

A construção da moralidade no discurso tem recebido a atenção de muitos

pesquisadores e tem sido analisada nos mais diversos contextos, profissionais ou não.

Uma prática social contemporânea altamente produtiva para o estudo da moralidade na

vida cotidiana é a contravigilância. Nomeado também como vigilância inversa, esse

fenômeno se refere à prática de vigiar aquele que nos vigia. Um exemplo, em termos

de segurança pública, são os vídeos, produzidos por cidadãos, que registram a ação

policial. O acesso do cidadão comum às tecnologias de imagem oferecidas pelos

telefones celulares e a facilidade de compartilhamento de imagens no mundo paralelo

da web favoreceram a produção e circulação desses vídeos, em que o cinegrafista

amador descreve a cena de modo a definir a conduta policial como moralmente

inaceitável. Esta pesquisa tem como foco a orientação dos participantes da cena para o

trabalho de imputação de culpa. À luz dos estudos da fala-em-interação e dos estudos

sobre vigilância, pretende-se identificar os recursos conversacionais utilizados pelos

participantes no processo de negociação da culpa. O corpus é constituído por duas

gravações da ação policial, realizadas por cidadãos comuns, em comunidades que

receberam uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), no Rio de Janeiro. Ambas

retratam um conflito entre policiais e moradores, e foram disponibilizadas na maior

plataforma de compartilhamento de vídeos da atualidade, o Youtube. A unidade de

análise são as sequências de imputação e refutação de culpa. Um dos resultados do

estudo é que uma das estratégias utilizadas pelo cidadão para atribuir culpa são as

perguntas retóricas que induzem a uma acusação de ilegalidade da ação policial. Outro

resultado obtido diz respeito ao modo como os policiais respondem à imputação da

culpa. Uma das estratégias utilizadas envolve um trabalho de contraacusação, que busca

atribuir a culpa do uso da força à agressividade do suspeito, além de descredenciar o

narrador, denunciando o viés tendencioso de sua versão.

Nome do aluno: Rony C. Ron-Rén Jr.

Nível: Mestrado

Orientadora: Maria do Carmo Leite de Oliveira

A Agência Moral na Narrativa de um Policial

A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) tem historicamente formado

seus profissionais de patentes mais baixas (conhecidos como praças) para atuarem

como meros cumpridores de ordem, algo relativamente comum em instituições

altamente hierarquizadas. Poderia se esperar, portanto, que, em seus contextos de

atuação, a agência desses profissionais fosse (quase) nula. Contudo, é na prática

cotidiana, na qual situações e desafios não previstos nos manuais, leis e diretrizes se

apresentam, que o policial é desafiado a tomar diversas decisões e a exercer a

discricionariedade policial. Além disso, desde a implantação das Unidades de Polícia

Pacificadora, em 2008, há tentativas de mudança - ainda que tímidas - no paradigma de

modelo policial. Nesse novo modelo, o trabalho policial não é orientado apenas para o

combate ao crime, mas também para o serviço ao cidadão, o que implica o

desenvolvimento de uma capacidade que leve o policial a ajustar sua conduta às

diferentes situações. Embora estudos já revelem o caráter agentivo do “fazer policial”,

nada se sabe sobre o papel da linguagem na construção dessas práticas e tampouco

sobre valores morais situados que as subjazem. A pesquisa, de cunho qualitativo e

interpretativo, tem como base teórica os estudos de narrativa, agência e moralidade.

Neste trabalho, examinamos uma narrativa produzida espontaneamente, durante uma

entrevista de pesquisa, após uma discussão sobre o tema “desacato à autoridade”. Nosso

objetivo é identificar que recursos linguístico-discursivos são mobilizados pelo

narrador na construção da agência moral de um policial. Os resultados revelam que, ao

exercer a discricionariedade, o narrador constrói, especialmente através do uso de

diferentes formas de accounts, um modelo de policial crítico, reflexivo mesmo em

situações de cumprimento da lei e em que o uso da força pode ser necessário. O ponto

da narrativa é, portanto, a construção de um ideal moral sobre o que é ser um bom

policial hoje.